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Análise dos Modelos de Parceria Público-Privada em projectos de Alta Velocidade Ferroviária em Portugal e no Brasil Rui Miguel Pereira Carvalho Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Civil Júri Presidente: Prof. Doutor Augusto Martins Gomes Orientador: Prof. Doutor Rui Domingos Ribeiro da Cunha Marques Vogal: Prof. Doutor Amílcar José Martins Arantes Vogal: Prof. Doutor Pedro Manuel Gameiro Henriques Outubro 2011

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Análise dos Modelos de Parceria Público-Privada em

projectos de Alta Velocidade Ferroviária em Portugal e

no Brasil

Rui Miguel Pereira Carvalho

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Civil

Júri

Presidente: Prof. Doutor Augusto Martins Gomes

Orientador: Prof. Doutor Rui Domingos Ribeiro da Cunha Marques

Vogal: Prof. Doutor Amílcar José Martins Arantes

Vogal: Prof. Doutor Pedro Manuel Gameiro Henriques

Outubro 2011

AGRADECIMENTOS

Esta dissertação não poderia ter sido possível sem a ajuda de todos os que, de uma forma ou

de outra, me incentivaram, motivaram e acompanharam durante toda a sua elaboração.

Ao Professor Rui Cunha Marques, o meu obrigado por toda a orientação, conhecimentos e

incentivo que me transmitiu, e especialmente pela sugestão do tema que, quer pela sua

actualidade quer pela pertinência para a Engenharia Civil, muito contribuiu para completar a

bagagem de conhecimento com a qual entrarei no mundo profissional.

Ao Eng. Duarte Silva, da RAVE, que demonstrou grande disponibilidade e boa-vontade na

cedência de muita informação sobre o projecto português.

À Eng. Ana Colaço, também da RAVE, pela prontidão com que me recebeu e total boa-vontade

em facultar-me elementos essenciais para o desenvolvimento deste trabalho.

Aos Compinchas do Técnico pelo companheirismo e grande amizade. Não especificamente na

realização deste trabalho, devido à minha preferência em trabalhar sozinho, mas ao longo de

todo o percurso académico. Foram os principais responsáveis por não ter mudado de curso.

Aos meus pais, irmã, cunhado e sobrinhos, agradeço especialmente pelo permanente estímulo

que me deram ao longo de toda a minha vida e a segurança que me transmitem, acreditando

sempre em mim.

À Sílvia pelas formatações, gargalhadas, carinho e motivação.

ABSTRACT

The promotion of public-private partnerships (PPP) in the construction of infrastructures and

provision of public services has increased in recent decades. Governments are increasingly

taking a role as regulator and controller instead of producer and distributor.

The main purpose of this dissertation is to analyze the public procurement models established

for the recent high-speed rail networks projects in Portugal and Brazil. Both countries have

adopted models of PPP but with different characteristics that are discussed and compared.

The theory related to the PPP is exposed in order to define the main characteristics of this

procurement model, followed by a presentation of the regulatory framework for PPP in Portugal

and Brazil. Then a review is carried out on the international experience in implementing PPP in

rail infrastructure projects and rail services provision.

The PPP models adopted by the Portuguese and Brazilian governments are presented and this

approach is divided in four parts: business model, tendering process, risk sharing and contract

management.

Finally, a SWOT analysis is performed on both models presented, in which are discussed the

advantages and disadvantages of different choices made in both countries.

Both projects have failed their implementation for different reasons. The high risk attributed to

the private partner and the price cap established led to the absence of proposals in the Brazilian

tendering process. The main problems in the Portuguese project arose from the lack of broad

political and social consensus on whether to implement high-speed network that led to the

suspension of the all project.

Keywords: Public-Private Partnership (PPP), High Speed Railway, business model, public

tender, risk sharing, contract management.

RESUMO

A adopção do modelo de parceria público-privada (PPP) na construção de infra-estruturas e na

provisão de serviços públicos tem aumentado nas últimas décadas. Os Governos assumem

cada vez mais uma função reguladora e controladora do que produtora e distribuidora.

A dissertação tem como objectivo analisar os modelos de contratação pública estabelecidos

para os projectos das redes de alta velocidade ferroviária em Portugal e no Brasil. Ambos os

países adoptaram modelos de PPP, com diferentes características, que são discutidas e

comparadas.

É realizada uma exposição da teoria relacionada com as PPP, seguida do enquadramento

regulamentar das PPP em Portugal e no Brasil. Seguidamente realiza-se uma resenha da

experiência internacional na aplicação de PPP em projectos de infra-estruturas e provisão de

serviços ferroviários.

Os modelos de PPP adoptados pelos governos português e brasileiro são apresentados e esta

abordagem abrange quatro aspectos, a saber, modelo de negócio, acesso ao negócio, partilha

de riscos e gestão do contrato.

Por último, é realizada uma análise SWOT aos dois modelos apresentados, onde se discute as

vantagens e desvantagens das diferentes opções tomadas nos dois países.

Ambos os projectos falharam a sua implementação, por diferentes razões. O elevado risco

atribuído ao parceiro privado e a limitação do preço a cobrar aos utilizadores conduziram à

inexistência de propostas no concurso brasileiro. Enquanto que no projecto RAV, em Portugal,

os principais problemas surgiram da falta de consenso político e social sobre a implementação

da rede de alta velocidade ferroviária, que levou à suspensão do projectos nos moldes

apresentados.

Palavras-Chave: Parceria Público-Privada (PPP), Alta Velocidade Ferroviária, modelo de

negócio, concurso público, partilha de risco, gestão de contrato.

i

ÍNDICE

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 1

1.1 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS EM PROJECTOS DE ALTA VELOCIDADE FERROVIÁRIA................................... 1

1.2 OBJECTIVOS E METODOLOGIA ............................................................................................................... 1

1.3 ESTRUTURA ...................................................................................................................................... 3

2 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS EM GERAL ............................................................................... 4

2.1 ENQUADRAMENTO ............................................................................................................................ 4

2.2 DEFINIÇÃO ....................................................................................................................................... 5

2.3 CLASSIFICAÇÃO ................................................................................................................................. 5

2.4 CONTRATAÇÃO PÚBLICA TRADICIONAL E PPP EM PROJECTOS DE INFRA-ESTRUTURAS ........................................ 6

2.5 ABORDAGEM DE CICLO DE VIDA DAS PPP ............................................................................................... 7

2.5.1 ESTUDOS INICIAIS ............................................................................................................................ 7

2.5.1.1 VALUE FOR MONEY (VFM) E COMPARADOR DO SECTOR PÚBLICO (CSP) ................................................................ 7

2.5.1.2 IDENTIFICAÇÃO, VALORAÇÃO E ALOCAÇÃO DO RISCO ......................................................................................... 9

2.5.2 FASE DE CONCURSO ....................................................................................................................... 10

2.5.3 FASE DE CONSTRUÇÃO.................................................................................................................... 11

2.5.4 FASE DE EXPLORAÇÃO .................................................................................................................... 11

2.6 GESTÃO DO CONTRATO ..................................................................................................................... 11

2.6.1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 11

2.6.2 DESENVOLVIMENTO DO PLANO ESTRATÉGICO DE GESTÃO DO CONTRATO ................................................... 12

2.6.3 DESENVOLVIMENTO E IMPLEMENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS DE MONITORIZAÇÃO ..................................... 13

2.6.4 REVISÃO SISTEMÁTICA .................................................................................................................... 13

2.7 AS PPP NO BRASIL .......................................................................................................................... 13

2.7.1 ENQUADRAMENTO ........................................................................................................................ 13

2.7.1.1 CONCESSÕES .......................................................................................................................................... 14

2.7.1.2 PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS ................................................................................................................... 14

2.7.1.3 COMPARADOR DO SECTOR PÚBLICO ............................................................................................................. 16

2.8 AS PPP EM PORTUGAL ..................................................................................................................... 17

3 A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL E NACIONAL DO USO DE PPP NO SECTOR FERROVIÁRIO .......... 19

3.1 ALTA VELOCIDADE ........................................................................................................................... 19

3.1.1 LINHA PERPIGNAN–FIGUERAS .......................................................................................................... 19

3.1.2 HSL-ZUID .................................................................................................................................... 21

3.2 METROPOLITANO ............................................................................................................................ 22

3.2.1 CANADA LINE ............................................................................................................................... 22

3.2.2 METRO SUL DO TEJO ..................................................................................................................... 23

ii

3.2.3 METRO DO PORTO ........................................................................................................................ 24

3.3 CONVENCIONAL DE LONGA DISTÂNCIA ................................................................................................. 25

3.3.1 AUSTRALASIA RAILWAY .................................................................................................................. 25

4 O PROJECTO RAV.......................................................................................................................... 27

4.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................................................................... 27

4.2 MODELO DE NEGÓCIO ...................................................................................................................... 27

4.2.1 DESAGREGAÇÃO DA CADEIA DE VALOR ............................................................................................... 27

4.2.2 REMUNERAÇÃO DO PARCEIRO PRIVADO ............................................................................................. 29

4.2.2.1 REGIME DE PERFORMANCE ........................................................................................................................ 30

4.2.2.2 CONCEITO DE DISPONIBILIDADE .................................................................................................................. 30

4.2.3 INVESTIMENTO PÚBLICO E FINANCIAMENTO PRIVADO .......................................................................... 31

4.3 ACESSO AO NEGÓCIO ........................................................................................................................ 32

4.3.1 ASPECTOS GERAIS .......................................................................................................................... 32

4.3.2 CONCURSO .................................................................................................................................. 33

4.3.3 CRITÉRIOS DE ADJUDICAÇÃO ............................................................................................................ 34

4.3.3.1 FACTOR A - CUSTO .................................................................................................................................. 35

4.3.3.2 FACTOR B - QUALIDADE ............................................................................................................................ 35

4.3.3.3 FACTOR C – RISCO .................................................................................................................................. 36

4.3.4 ANÁLISE DE PROPOSTAS .................................................................................................................. 37

4.4 PARTILHA DE RISCOS ........................................................................................................................ 40

4.4.1 RISCO POLÍTICO ............................................................................................................................. 40

4.4.2 RISCO LEGAL ................................................................................................................................. 41

4.4.3 RISCO DE CONCURSO ...................................................................................................................... 41

4.4.4 RISCOS DE PLANEAMENTO E CONCEPÇÃO ............................................................................................ 42

4.4.5 RISCO DE FINANCIAMENTO .............................................................................................................. 42

4.4.6 RISCO DE EXPROPRIAÇÕES ............................................................................................................... 42

4.4.7 RISCO DE CONSTRUÇÃO .................................................................................................................. 43

4.4.8 RISCO AMBIENTAL ......................................................................................................................... 43

4.4.9 RISCO ARQUEOLÓGICO ................................................................................................................... 43

4.4.10 RISCO DE DISPONIBILIDADE ............................................................................................................ 44

4.4.11 RISCO DE PROCURA ...................................................................................................................... 44

4.4.12 RISCO DE INTEGRAÇÃO ................................................................................................................. 45

4.4.13 RISCO DE MANUTENÇÃO ............................................................................................................... 45

4.4.14 RISCO DE FORÇA MAIOR ................................................................................................................ 46

4.4.15 MATRIZ SÍNTESE DE ALOCAÇÃO DE RISCOS ........................................................................................ 46

4.5 GESTÃO DO CONTRATO ..................................................................................................................... 47

4.5.1 MONITORIZAÇÃO DO DESEMPENHO .................................................................................................. 47

4.5.2 MONITORIZAÇÃO DO RELACIONAMENTO ENTRE AS PARTES E GESTÃO DE CONFLITOS .................................. 51

iii

4.5.3 FLEXIBILIDADE DO CONTRATO .......................................................................................................... 51

4.5.4 PLANOS DE CONTINGÊNCIA .............................................................................................................. 53

5 O PROJECTO TAV .......................................................................................................................... 54

5.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................................................................... 54

5.2 MODELO DE NEGÓCIO ...................................................................................................................... 55

5.2.1 MODELO DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA ................................................................................................. 55

5.2.2 REMUNERAÇÃO DO PARCEIRO PRIVADO ............................................................................................. 55

5.2.2.1 LIMITE DE PREÇOS ................................................................................................................................... 55

5.2.3 REGIME DE PERFORMANCE.............................................................................................................. 56

5.2.4 FINANCIAMENTO ........................................................................................................................... 57

5.2.5 ALTERAÇÃO AO MODELO DE NEGÓCIO .............................................................................................. 57

5.3 ACESSO AO NEGÓCIO ....................................................................................................................... 58

5.3.1 CONCURSO .................................................................................................................................. 58

5.3.2 CRITÉRIOS DE ADJUDICAÇÃO ............................................................................................................ 59

5.3.3 DEFINIÇÃO DO OUTPUT ................................................................................................................... 60

5.3.4 ANÁLISE DO CONCURSO .................................................................................................................. 61

5.4 PARTILHA DE RISCOS ........................................................................................................................ 62

5.4.1 RISCO POLÍTICO ............................................................................................................................. 62

5.4.2 RISCO LEGAL ................................................................................................................................. 62

5.4.3 RISCO DE CONCURSO ...................................................................................................................... 63

5.4.4 RISCOS DE PLANEAMENTO E CONCEPÇÃO ............................................................................................ 63

5.4.5 RISCO DE FINANCIAMENTO .............................................................................................................. 64

5.4.6 RISCO DE EXPROPRIAÇÕES ............................................................................................................... 64

5.4.7 RISCO DE CONSTRUÇÃO .................................................................................................................. 65

5.4.8 RISCO AMBIENTAL ......................................................................................................................... 65

5.4.9 RISCO ARQUEOLÓGICO ................................................................................................................... 65

5.4.10 RISCO DE DISPONIBILIDADE ............................................................................................................ 65

5.4.11 RISCO DE PROCURA ...................................................................................................................... 66

5.4.12 RISCO DE INTEGRAÇÃO ................................................................................................................. 66

5.4.13 RISCO DE MANUTENÇÃO ............................................................................................................... 66

5.4.14 RISCO DE FORÇA MAIOR ................................................................................................................ 67

5.4.15 MATRIZ SÍNTESE DE ALOCAÇÃO DE RISCOS ........................................................................................ 67

5.5 GESTÃO DO CONTRATO ..................................................................................................................... 68

5.5.1 MONITORIZAÇÃO DO DESEMPENHO ................................................................................................... 68

5.5.2 MONITORIZAÇÃO DO RELACIONAMENTO ENTRE AS PARTES E GESTÃO DE CONFLITOS .................................. 70

5.5.3 FLEXIBILIDADE DO CONTRATO .......................................................................................................... 70

5.5.4 PLANOS DE CONTINGÊNCIA .............................................................................................................. 71

iv

6 ANÁLISE SWOT ............................................................................................................................. 73

6.1 INTRODUÇÃO E DEFINIÇÃO DE ANÁLISE SWOT ...................................................................................... 73

6.2 PROJECTO PORTUGUÊS ..................................................................................................................... 73

6.1.1 PONTOS FORTES............................................................................................................................ 73

6.1.2 PONTOS FRACOS ........................................................................................................................... 76

6.1.3 OPORTUNIDADES .......................................................................................................................... 76

6.1.4 AMEAÇAS .................................................................................................................................... 77

6.3 PROJECTO BRASILEIRO ...................................................................................................................... 78

6.2.1 PONTOS FORTES............................................................................................................................ 78

6.2.2 PONTOS FRACOS ........................................................................................................................... 79

6.2.3 OPORTUNIDADES .......................................................................................................................... 79

6.2.4 AMEAÇAS .................................................................................................................................... 80

7 CONCLUSÕES ................................................................................................................................ 81

7.1 SÍNTESE CONCLUSIVA ....................................................................................................................... 81

7.2 DESENVOLVIMENTOS FUTUROS........................................................................................................... 84

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................ 85

ANEXOS ................................................................................................................................................. 1

A DEDUÇÕES POR DESEMPENHO .................................................................................................................. 1

A.1 Deduções por indisponibilidade ................................................................................................ 1

A.2 Deduções por má condição dos activos .................................................................................... 2

B. MODELO DE DISPONIBILIDADE .............................................................................................................. 2

C. CONCURSO DE CONCESSÃO RAV POCEIRÃO/CAIA ................................................................................... 3

C.1 Valoração dos Critérios ............................................................................................................. 3

C.1.1 Métrica ................................................................................................................................. 3

C.1.2 Factor A – Custo .................................................................................................................... 4

C.1.3 Factor B – Qualidade ............................................................................................................ 5

C.1.4 Factor C – Risco ..................................................................................................................... 5

D. INDICADORES DE DESEMPENHO DO CONTRATO DE CONCESSÃO TAV RIO DE JANEIRO/SÃO PAULO ..................... 6

v

ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 4.1 Factores e subfactores de avaliação das propostas do concurso RAV Poceirão/Caia (Fonte:

RAVE 2008a) ............................................................................................................................................... 34

Quadro 4.2 Lista de concorrentes do concurso RAV Poceirão/Caia .......................................................... 37

Quadro 4.3 Pontuação das propostas dos quatro concorrentes ao concurso RAV Poceirão/Caia na

primeira fase de avaliação .......................................................................................................................... 37

Quadro 4.4 Pontuação das propostas dos quatro concorrentes ao concurso RAV Poceirão/Caia na

primeira fase de avaliação .......................................................................................................................... 37

Quadro 4.5 Pontuação das propostas dos dois concorrentes ao concurso RAV Poceirão/Caia na segunda

fase de avaliação ........................................................................................................................................ 38

Quadro 4.6 Pontuações finais das BAFO dos consórcios ELOS e Altavia Alentejo ..................................... 39

Quadro 4.7 Comparação das pontuações globais na primeira e segunda fase do concurso ..................... 39

Quadro 4.8 Pontuação das propostas finais .............................................................................................. 39

Quadro 4.9 Pontuação das propostas inicial e final do concorrente vencedor ......................................... 40

Quadro 4.10 Matriz de partilha de riscos do contrato de concessão RAV Poceirão/Caia (Legenda: A -

Alta, M - Média, B - Baixa) .......................................................................................................................... 47

Quadro 5.1 Matriz de partilha de riscos do contrato de concessão TAV Rio de Janeiro/São Paulo

(Legenda: ND - Não definido, A - Alta, M - Média, B - Baixa) ..................................................................... 67

Quadro D1. Indicadores de desempenho do contrato de concessão TAV Rio de Janeiro/São Paulo .......A6

vi

ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 2.1 Comparador do Sector Público (Adaptado de Partnerships Victoria 2001a) .............................. 9

Figura 2.2 Etapas da valoração do risco. .................................................................................................... 10

Figura 2.3 Desenvolvimento e implementação do processo de monitorização de um contrato

(Partnerships Victoria 2003) ....................................................................................................................... 12

Figura 3.1 Modelo Contratual da PPP relativa ao Projecto de Alta Velocidade Perpignan-Figueras

(PriceWaterHouseCoopers 2006). .............................................................................................................. 20

Figura 3.2 Modelo Contratual da PPP relativa ao Projecto de Alta Velocidade HSL-Zuid (KPMG 2006).... 21

Figura 4.1 Modelo de negócio do Projecto RAV Portugal (Fonte: Fernandes 2010) .................................. 28

Figura 4.2 Conceito de unidade de Indisponibilidade (adaptado de Audsley 2011) .................................. 31

Figura 4.3 Origem do investimento durante a fase de construção (Fonte RAVE 2010) ............................. 32

Figura 4.4 Fases do concurso público da Concessão RAV Poceirão/Caia. .................................................. 34

Figura 5.1 Traçado referencial da linha ferroviária do Projecto TAV Rio de Janeiro/São Paulo (Fonte:

Halcrow – Sinergia 2009). ........................................................................................................................... 54

Figura 5.2 Fases do concurso público da Concessão TAV Rio de Janeiro/São Paulo.................................. 59

Figura C1. Variação da pontuação do factor A em função do VAL dos pagamentos dos parceiros públicos

(Adaptado de RAVE 2008a). .......................................................................................................................A5

vii

LISTA DE ACRÓNIMOS

ACE – Agrupamento Complementar de Empresas

ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres

BAFO – Best and Final Offer

BBO – Buy Build Operate

BEI – Banco Europeu de Investimento

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BOO – Build Own Operate

BOOT – Build Own Operate Transfer

CCP – Código dos Contratos Públicos

CSP – Comparador do Sector Público

DBO – Design Build Operate

DFBO – Design Finance Build Operate

DFBOM – Design Finance Build Operate Maintain

EN – Euronorms

GIF – Gestor de Infraestruturas Ferroviárias

HSL-Zuid – Hogesnelheidslijn Zuid

PFI – Private Finance Initiative

PPP – Parceria Público-Privada

QREN – Quadro de Referência Estratégico Nacional

RAMS – Reliability, Availability, Maintenability and Safety

RAVE – Rede Ferroviária de Alta Velocidade, SA

REFER – Rede Ferroviária Nacional

RENFE – Red Nacional de Ferrocarriles Españoles

RFF – Réseau Ferré de France

RTE-T – Rede Transeuropeia de Transportes

SNCF – Société Nationale des Chemins de fer Français

S&T – Sistemas de Sinalização e Telecomunicação

SWOT – Strengths Weaknesses Opportunities Threats

TAV – Trem de Alta Velocidade

TSI – Technical Specification for Interoperability

UI – Unidade de Indisponibilidade

UIC – Union Internationale des Chemins de Fer

VAL – Valor Actual Líquido

VfM – Value for Money

1

1 INTRODUÇÃO

1.1 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS EM PROJECTOS DE ALTA VELOCIDADE

FERROVIÁRIA

A crescente necessidade dos países em aumentar a eficiência energética, a sustentabilidade

ambiental e a capacidade dos seus sistemas de transportes tem ajudado a promover a alta

velocidade ferroviária um pouco por todo o mundo. Este modo de transporte é caracterizado

por elevados níveis de pontualidade, regularidade e conforto associados à grande capacidade,

segurança e fiabilidade.

Em Portugal, a decisão da implementação de uma rede ferroviária de alta velocidade teve

origem, entre outras razões, no desejo de aumentar a competitividade dos portos e aeroportos

nacionais; no aumento da participação portuguesa na oferta global de transporte, quer de

mercadorias, quer de passageiros; no aumento dos preços dos combustíveis fósseis; no

desenvolvimento da Rede Nacional de Plataformas Logísticas; e na necessidade de cumprir as

metas do protocolo de Quioto.

No Brasil, para além das vantagens ao nível da sustentabilidade ambiental e das qualidades do

serviço ferroviário de alta velocidade, a decisão de avançar para um projecto deste tipo teve

origem na necessidade de aliviar a saturação existente nos modos de transporte que fazem a

ligação entre as cidades de Campinas e São Paulo, e criar uma alternativa viável ao transporte

aéreo entre São Paulo e Rio de Janeiro.

Ao longo das últimas décadas, as parcerias público-privadas (PPP) na concepção, construção

e operação de infra-estruturas de transporte (e não só) tornaram-se cada vez mais comuns em

muitos países. Os governos pretendem melhorar e aumentar a capacidade das suas redes de

transporte de modo a lidar com a crescente necessidade de mobilidade mas encontram-se

muitas vezes limitados ao nível dos recursos financeiros. Esta impossibilidade do sector público

em suportar os custos de projectos desta envergadura, associada à reconhecida inovação,

know-how, maior eficiência de processos e flexibilidade de financiamento do sector privado,

torna as PPP num modelo de contratação pública muito atractivo.

1.2 OBJECTIVOS E METODOLOGIA

A oportunidade da presente dissertação surge da necessidade de se analisar e comparar dois

modelos de contratação pública baseados em PPP diferentes e a sua aplicação a um mesmo

serviço público – o transporte ferroviário de alta velocidade.

2

A escolha dos projectos português e brasileiro justifica-se pela simultaneidade da sua

implementação e com o facto de serem os primeiros projectos no sector ferroviário de alta

velocidade nos respectivos países.

Para o desenvolvimento desta dissertação foi realizada uma vasta pesquisa bibliográfica sobre

Parcerias Público-Privadas nos seus variados domínios de modo a reunir todo o tipo de

informação que permitisse o conhecimento das características deste modelo de contratação

pública e suas vantagens e desvantagens relativamente ao modelo de contratação tradicional.

De modo a conhecer a experiência internacional e nacional no tema, foi também levada a cabo

uma pesquisa bibliográfica sobre a aplicação do modelo de PPP em projectos do sector

ferroviário que abrangeu projectos de alta velocidade, metropolitano e ferrovia convencional de

longa distância.

A análise que se pretende efectuar encontra-se organizada em quatro aspectos principais das

PPP como modalidade de contratação pública, designadamente modelo de negócio, acesso ao

negócio, partilha de riscos e a gestão do contrato.

Sobre o modelo de negócio interessa numa primeira fase analisar a cadeia de valor de um

projecto deste tipo ao nível da desagregação possível e respectiva adequação ao mercado que

pretende abordar. Interessa também avaliar a possível remuneração do parceiro privado e o

respectivo mecanismo de avaliação do seu desempenho. Por último, é elaborada uma

exposição da organização do investimento tendo em conta a sua origem pública ou privada.

Para a realização desta análise foi realizada uma vasta pesquisa bibliográfica sobre vários

projectos ferroviários de modo a permitir uma melhor compreensão da cadeia de valor de um

projecto deste tipo e das relações de dependência que se estabelecem entre as suas

componentes. Da mesma forma foi também levada a cabo uma pesquisa bibliográfica sobre

projectos de infra-estruturas nos dois países em análise (Portugal e Brasil) de modo a

caracterizar o tecido empresarial do sector da construção que tem interesse nos projectos nos

projectos em análise.

A análise do acesso ao negócio é realizada através do estudo dos concursos públicos

estabelecidos em Portugal e no Brasil referentes à implementação de uma rede ferroviária de

alta velocidade. A análise aborda o formato adoptado para os concursos (fases adoptadas e

sequência), os seus requisitos e critérios de adjudicação, com a respectiva descrição e análise

dos factores e subfactores inerentes à avaliação de propostas. Os resultados do processo de

concurso e as propostas dos concorrentes são expostos e analisados.

Para a concretização desta análise tomou-se como base a informação fornecida pela RAVE e

pela ANTT sobre os referidos concursos, nomeadamente, o Programa de Procedimento do

Concurso, os relatórios de avaliação das propostas nas fases inicial e de negociação, assim

como os contratos que foram estabelecidos com os concorrentes vencedores.

No que diz respeito à partilha de riscos inerente a este modelo de contratação pública, é

efectuada uma resenha aos riscos expectáveis inerentes a cada projecto descrevendo os

3

acontecimentos possíveis associados a cada tipo de risco, são analisados os contratos das

duas PPP relativamente à atribuição da gestão de cada risco aos parceiros público e privado e

é definida a matriz de risco de cada projecto. Para a concretização desta análise contribuiram

os estudos realizados pelas entidades responsáveis pela contratação em cada país – RAVE e

ANTT.

A análise à gestão do contrato é realizada tendo como referência as melhores práticas

internacionais no que diz respeito à implementação de Parcerias Público-Privadas. Este estudo

aborda quatro aspectos essenciais da gestão de contratos, a saber, a monitorização do

desempenho do parceiro privado, a gestão de conflitos, a flexibilidade do contrato e a

prevenção de contingências. A realização desta análise teve como principal referência os

documentos de orientação da entidade responsável pelas Parcerias Público-Privadas no

Estado Australiano de Victoria – Partnerships Victoria.

1.3 ESTRUTURA

Este trabalho encontra-se dividido em sete capítulos, sendo o primeiro e o sétimo

correspondentes à introdução e conclusão, respectivamente, estando ainda incluído neste

último uma breve referência a desenvolvimentos futuros.

No segundo capítulo são apresentados os conceitos essenciais ao conhecimento do modelo de

contratação em PPP e suas principais características, e são expostos os enquadramentos das

PPP em Portugal e no Brasil.

No terceiro capítulo é apresentada a experiência internacional e nacional na aplicação das PPP

em projectos ferroviários de alta velocidade, ferrovia convencional de longa distância e

metropolitano.

O quarto e o quinto capítulos são referentes aos projectos de PPP para implementação de uma

rede ferroviária de alta velocidade em Portugal e no Brasil, respectivamente. Nestas secções

são apresentadas as suas características ao nível dos quatros parâmetros já referidos,

nomeadamente, modelo de negócio, acesso ao negócio, partilha de riscos e gestão do

contrato.

No capítulo seis é efectuada uma análise SWOT aos dois modelos de PPP apoiando-se

sobretudo nas escolhas efectuadas pelas entidades públicas de cada país relativas aos quatro

aspectos principais apresentados ao longo do trabalho.

4

2 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS EM GERAL

2.1 ENQUADRAMENTO

O Governo e Administração desempenham quatro funções político-administrativas

fundamentais (Pombeiro, 2003):

A definição dos interesses e das necessidades públicas e sua respectiva prioridade;

A concepção estratégica e táctica para responder aos mesmos;

A regulamentação e implementação das políticas definidas; e, por último,

A contratação pública de bens ou serviços para a sua execução.

O processo de contratação pública segue, normalmente, um de dois processos:

O modelo de contratação tradicional, no qual a Administração paga pela aquisição, construção,

produção, restauro, manutenção, remodelação ou desenvolvimento dos activos, definindo o

produto final, e as técnicas e materiais a utilizar para o conseguir, através de projectos,

cadernos de encargos, especificações, entre outros.

No modelo de contratação pública em regime de PPP estabelece-se uma relação de

cooperação entre os sectores público e privado. Numa PPP a Administração define qualitativa

e quantitativamente as necessidades públicas a prover (output) através de parâmetros de

eficiência, qualidade, disponibilidade e níveis de serviço e utilização, e o parceiro privado é

remunerado consoante o grau de realização desses parâmetros previamente balizados. O

parceiro público assume, neste caso, uma função de controlo sobre todo o processo de

provisão do serviço público ou da infra-estrutura.

As Parcerias Público-Privadas são um modelo de contratação pública relativamente recente

que se baseiam no conceito de Private Finance Initiative (PFI) criado no Reino Unido pelo

governo de Margaret Thatcher em 1992. São parcerias nas quais o sector privado fornece

activos e serviços que, tradicionalmente, são providos pelo Governo. A elevada carga fiscal, o

crescimento, em volume e natureza, das necessidades públicas, e o contínuo aumento da

despesa pública forçaram os Governos a reestruturar o seu sistema de aprovisionamento,

passando estes a desempenhar uma função mais reguladora e controladora do que produtora

e distribuidora.

A diminuição do peso do estado na economia é um processo que dura há cerca de 25 anos e

reflecte-se nos diferentes tipos de contratação pública usados, nos quais se destacam as

privatizações. Na sua forma mais usual, as PPP distinguem-se das privatizações na medida em

que representam a cooperação entre o governo e o sector privado para construir novas infra-

estruturas e prestar os respectivos serviços (IMF, 2004).

5

Na última década, as PPP desenvolveram-se em variados domínios do sector público. São

vários os factores que explicam esta tendência, entre os quais destacam-se as restrições de

carácter orçamental que as Administrações têm vindo a ser confrontadas e os requisitos de

qualidade dos serviços cada vez mais exigentes. Este modelo de contratação serviu também

para responder à inexistência de oferta disponível no mercado para a provisão de serviços em

determinados sectores como o hospitalar, prisional, infra-estruturas de transportes, entre

outros.

2.2 DEFINIÇÃO

As características de uma PPP variam consoante o serviço que se pretende prestar, não

existindo, portanto, uma definição única e universalmente aceite para o conceito.

A Comissão Europeia (COM 327/2004) define PPP como ―a forma de cooperação entre as

autoridades públicas e as empresas, tendo por objectivo assegurar o financiamento, a

construção, a renovação, a gestão ou a manutenção de uma infra-estrutura ou a prestação de

um serviço‖. Este modelo de contratação é, normalmente, caracterizado pela duração

relativamente longa dos contratos, que podem chegar a várias décadas; pela satisfação de

necessidades colectivas definidas pelo parceiro público; pelo financiamento em parte ou no seu

todo pelo parceiro privado; e pela significativa transferência de riscos das instituições públicas

para os parceiros privados.

Para o parceiro privado é uma oportunidade de negócio adicional cujo acesso, normalmente,

lhe está vedado. Para a entidade pública representa ganhos de value for money (VfM)

relativamente ao Comparador do Sector Público (CSP)1. Tipicamente, envolve pagamentos por

subvenções orçamentais públicas, variáveis em função do grau de realização dos objectivos,

dos requisitos de disponibilidade, níveis de serviço oferecidos e utilizados, entre outros

parâmetros, previamente definidos pela entidade pública. Pode envolver cobrança de tarifas

aos utentes e a exploração acessória de activos ou mercados do domínio público com o

objectivo de reduzir os encargos para os utentes ou para a Administração (Pombeiro, 2003).

2.3 CLASSIFICAÇÃO

Existem diferentes formas de classificar as PPP. No livro verde da Comissão Europeia

intitulado ―Parcerias público-privadas e o direito comunitário em matéria de contratos públicos e

concessões (COM327/2004)‖, as parcerias são divididas em PPP do tipo puramente contratual,

em que a parceria entre os sectores público e privado assenta em relações exclusivamente

contratuais, e em PPP do tipo institucionalizado, implicando a cooperação entre os sectores

1Os conceitos de Value for Money (VfM) e Comparador do Sector Público (CSP) serão definidos no

presente capítulo.

6

público e privado numa entidade distinta. Já o Conselho Nacional para as Parcerias Público-

Privadas nos Estados Unidos da América classifica as parcerias em função das fases de

projecto cuja responsabilidade pertence ao parceiro privado. Entre os diferentes modelos

podemos destacar o BOO (construção, propriedade e operação), o BOOT (construção,

propriedade, operação e transferência), BBO (compra, construção e operação) que

normalmente aplica-se à reabilitação de imóveis propriedade do sector público, o DBO

(concepção, construção e operação) e o DFBO (concepção, construção, financiamento e

operação) (GAO, 1999). No Brasil, as PPP são classificadas consoante a origem da

remuneração recebida pelo parceiro privado. As concessões patrocinadas são as que

implementam um sistema que combina a cobrança de tarifas aos utilizadores e um pagamento

pecuniário proveniente do parceiro público. Nas concessões administrativas, a entidade pública

contratante efectua o pagamento integral do serviço prestado.

2.4 CONTRATAÇÃO PÚBLICA TRADICIONAL E PPP EM PROJECTOS DE INFRA-

ESTRUTURAS

A contratação de serviços públicos que envolvam a construção de infra-estruturas tem

características próprias que ―convidam‖ à sua implementação através do modelo de PPP. Em

projectos deste tipo, como os serviços ferroviários ou rodoviários, por exemplo, em que a

qualidade das infra-estruturas e a sua manutenção influencia, de modo determinante, a

prestação do serviço aos utilizadores, a atribuição da responsabilidade sobre estes factores à

entidade que as concebe e constrói incentiva a uma abordagem de ciclo de vida do projecto.

Esta transferência de risco conduz não só à concepção e execução das infra-estruturas com

qualidade e durabilidade, mas também ao aumento do nível de inovação e eficiência dos

processos, resultando em ganhos de value for money para o sector público. Para além destes

ganhos, a situação financeira internacional, em cada país, caracterizada por dívidas públicas

cada vez maiores, não permite aos Governos considerar como boa solução arcar com todo o

investimento inicial da implementação de projectos deste tipo. O modelo de PPP permite dividir

o investimento inicial com o parceiro privado e fasear os restantes pagamentos do parceiro

público ao longo do período de concessão, diminuindo o impacto do investimento nas contas

públicas. Estas subvenções podem, por sua vez, ser indexadas ao nível de performance do

parceiro privado na execução das suas funções e servir assim de incentivo a um desempenho

de nível elevado.

A principal desvantagem das PPP é o maior custo financeiro envolvido. Em geral, o custo do

endividamento público é inferior ao das entidades privadas, a diferença entre os dois depende

das condições do mercado financeiro onde os privados se financiam e do rating do Estado. No

caso português, o custo do endividamento público tem vindo a crescer com a contínua

diminuição do rating do Estado, situação que tem também afectado o sistema bancário do país

que enfrenta cada vez mais dificuldades em financiar-se nos mercados internacionais. Um

7

projecto de grande investimento como a linha de alta velocidade portuguesa, que abrange

grande parte do território nacional, pode ser atractivo para investidores estrangeiros cujo custo

de financiamento é mais baixo que o verificado nas instituições bancárias portuguesas. Neste

caso, a diferença entre o custo de financiamento público, em contratação tradicional, e o

privado seria reduzida.

2.5 ABORDAGEM DE CICLO DE VIDA DAS PPP

Sendo um contrato de longa duração, as PPP implicam uma abordagem de ciclo de vida pelas

partes envolvidas. Ao contrário do modelo de empreitada tradicional, a fase de construção é

apenas uma das partes do contrato de PPP. O ciclo de vida inclui o também o período de

funcionamento da infra-estrutura até á sua amortização/envelhecimento. Este tipo de

abordagem permite ganhos de value for money mas, por outro lado, implica um

acompanhamento exaustivo de todas as fases do projecto.

2.5.1 ESTUDOS INICIAIS

A implementação de uma PPP requer a execução de estudos que permitam definir o seu

objecto – Plano Estratégico e Estudo de Viabilidade – a sua necessidade – Estudo de

Procura/Consumo e Avaliação Custo/Benefício – e possíveis soluções técnicas – Estudos

Técnicos e Avaliação Ambiental.

Na fase de montagem do projecto é necessário ainda avaliar se os encargos são comportáveis

para o parceiro público, através do Estudo de Comportabilidade Orçamental, e testar a

adequabilidade do modelo através do cálculo do Comparador do Sector Público.

O principal objectivo desta fase inicial é a definição completa do Projecto e os principais riscos

associados a esta são essencialmente riscos políticos relacionados com indefinições ou

alterações tardias do Projecto, atrasos nos processos de aprovação política e em estudos de

impacto ambiental, e perturbações no Projecto devido à resistência ou oposição de terceiros

(autarquias, proprietários de terrenos, etc.).

2.5.1.1 VALUE FOR MONEY (VFM) E COMPARADOR DO SECTOR PÚBLICO (CSP)

A entidade responsável pelo programa de PPP no Reino Unido, no seu documento orientador

―Value for Money Assessment Guide‖, define VfM como a combinação óptima do custo e da

qualidade de um bem ou serviço, tendo em consideração o seu ciclo de vida, de modo a

responder adequadamente às necessidades e aos requisitos dos utilizadores. Esta definição

defende ainda que na montagem de uma PPP, os agentes do sector público devem ter em

conta os custos e as poupanças de toda a duração do contrato, e que a avaliação do VfM deve

8

focar-se na qualidade do trabalho e competência do sector privado, e não apenas na proposta

menos onerosa, de modo a responder aos objectivos estabelecidos no projecto (HM Treasury,

2006).

As diferentes autoridades responsáveis pelos programas de PPP em vários países aplicam

diferentes metodologias para avaliar o VfM. No entanto, normalmente estas englobam duas

avaliações principais: uma quantitativa e outra qualitativa. A componente quantitativa inclui

todos os factores que possam ser avaliados em termos monetários. A metodologia que,

normalmente, é adoptada na avaliação desta componente, passa pela montagem de um

cenário hipotético designado Comparador do Sector Público, através do qual o serviço ou bem

é obtido segundo o modelo tradicional de contratação pública. Este comparador fornece uma

estimativa do custo na hipótese do projecto ser financiado e explorado pelo sector público. A

avaliação qualitativa do VfM abrange os aspectos do projecto que não são quantificáveis como

as características do mercado, o nível de concorrência do concurso e o nível de eficiência e

inovação que o parceiro privado pode acrescentar ao projecto (Morallos et al., 2009).

Componentes do Comparador do Sector Público

A Partnerships Victoria considera o CSP o somatório de quatro componentes: o custo-base; a

neutralidade competitiva; o risco transferível; e o risco retido (Partnerships Victoria 2001a A

figura 2.1 ilustra as referidas componentes do CSP e os possíveis ganhos de value for money

do modelo de PPP em relação a este.

Custo-base

O custo base refere-se ao custo de produção do objecto alvo da contratação. Esta componente

abrange os custos com a construção, propriedade, manutenção e a prestação de serviço em

período de tempo igual ao da PPP. Nela incluem-se os fluxos de caixa da prestação de

serviços, e exclui-se qualquer tipo de valor associado aos riscos, já que este é considerado

noutras componentes separadamente.

Neutralidade Competitiva

Esta parcela representa o valor das vantagens e desvantagens competitivas inerentes a um

projecto implementado pelo modo tradicional de contratação pública mas que estão vedadas

ao sector privado numa PPP. Entre as vantagens do sector público destacam-se as isenções

sobre alguns impostos e outras taxas. As desvantagens surgem dos riscos políticos inerentes a

determinadas obras públicas ou a projectos de prestação de serviços públicos, que são objecto

de escrutínio público e estão sujeitos à prestação de relatórios e contas. A estimativa desta

componente baseia-se, normalmente, em dados actuais e históricos sobre os custos das

referidas vantagens e desvantagens. Depois do seu cálculo há que obter o seu valor actual

líquido. A consideração deste valor permite fazer a comparação directa entre o CSP e o

modelo de PPP.

9

Risco Transferível

O risco transferível é o risco que é viável transferir do parceiro público para o privado. O seu

valor representa o custo que o sector público pagaria por esse risco caso o projecto fosse

moldado nos termos do modelo tradicional de contratação pública.

Risco Retido

O risco retido é o risco que não é viável transferir para o parceiro privado, que portanto é igual

nos dois modelos de contratação pública em causa.

Figura 2.1 Comparador do sector público (Adaptado de Partnerships Victoria 2001a)

2.5.1.2 IDENTIFICAÇÃO, VALORAÇÃO E ALOCAÇÃO DO RISCO

A gestão do risco é um processo que deve ser desenvolvido ao longo de toda a vida do

projecto. Este envolve, normalmente, três fases: identificação, valoração e alocação. Após este

processo, cada parceiro desenvolve a sua estratégia de mitigação dos riscos sobre os quais

assumiu responsabilidade.

Identificação do risco

O processo de levantamento e análise de todos os riscos de um projecto não segue uma

metodologia comum. A mais usual consiste em reuniões de trabalho com os técnicos das

sucessivas áreas, que permite a identificação e documentação de todos os riscos associados

ao projecto. Esta metodologia permite a criação de uma base de dados para projectos futuros.

Valoração do risco

O risco é medido pelo valor esperado. Este é calculado multiplicando a probabilidade de

ocorrência do acontecimento desfavorável (ou não), pelo valor do prejuízo (lucro) causado por

este acontecimento. Existe sempre uma subjectividade inerente à avaliação dos risco pelo que

é frequente determinar-se um intervalo de variação em vez de um valor único, calculado a

10

partir de intervalos de variação das probabilidades de ocorrência e dos respectivos prejuízos

(Pombeiro, 2003).

A Partnerships Victoria considera que a valoração do risco percorre quatro etapas que se

indicam na figura 2.2 (Partnerships Victoria, 2001a).

Figura 2.2 Etapas da valoração do risco

Alocação do Risco

Depois da valoração do risco, deve ser encontrada a sua distribuição óptima com base na

premissa de que cada risco deve ser alocado à parte que melhor o souber gerir de modo

reduzir a sua probabilidade de este ocorrer e minimizar as consequências na eventualidade.

No processo de partilha de riscos, a entidade contratante deve assegurar-se que:

O Estado não transfere para o parceiro privado riscos que estão sob o seu controlo, e

que não assume riscos que não está em condições de controlar;

Em caso de transferência de riscos para o sector privado, o benefício público de tal

transferência supera o agravamento de custos que irá ocorrer.

2.5.2 FASE DE CONCURSO

Nesta fase o projecto de PPP é apresentado ao mercado e pretende-se criar um ambiente

competitivo de modo a gerar o maior value for money possível para o Estado. Os principais

riscos associados a esta fase estão relacionados com a capacidade de resposta do mercado,

associada à simultaneidade de vários projectos; à incerteza quanto ao interesse do sector

privado, à incerteza relativa à capacidade e condições do mercado financeiro para financiar o

Projecto, e à incerteza quanto à duração do processo de contratação.

Avaliação das consequências

• A consequência de cada risco corresponde à diferença entre o custo base e o custo esperado caso o risco ocorra.

Cálculo da probabilidade

• Tendo por base dados históricos, a probabilidade das consequências de cada risco é calculada através de técnicas de estimação de probalidade.

Factor de segurança

• Introdução de um factor de segurança para ter em consideração custos não observáveis conducentes a uma subvaloração do risco.

Cálculo do valor

• Valor do risco = Consequência x Probabilidade + Factor de Segurança

11

2.5.3 FASE DE CONSTRUÇÃO

Os riscos inerentes à fase de construção estão relacionados com o próprio processo de

construção, e variam com o tipo de obra pretendida. Estes são, na sua maioria, atribuídos ao

parceiro privado já que é o mais habilitado a geri-los. Esta assunção do risco de construção

pelo parceiro privado constitui uma das grandes diferenças entre uma PPP e uma empreitada

de obra pública, onde o Estado assume grande parte deste tipo de risco.

Os riscos de concepção inserem-se também nesta fase e estão relacionados com as decisões

que são necessárias tomar a este nível. É desejável que o parceiro público seja responsável

pela concepção até determinado nível mas que permita aos parceiros privados um determinado

grau de flexibilidade no planeamento da infra-estrutura. É também essencial garantir a clareza

das definições dos requisitos funcionais que evite alterações em fase tardia do Projecto.

2.5.4 FASE DE EXPLORAÇÃO

Na fase de exploração, os riscos a gerir são os inerentes à operação do serviço e manutenção

das infra-estruturas. Os principais riscos estão associados à procura do serviço e à

disponibilidade deste. Os riscos de manutenção decorrem da qualidade do processo

construtivo, dos materiais utilizados e da realização das intervenções correntes e das grandes

intervenções.

Nesta fase de exploração insere-se também o risco de interface que surge na desagregação

vertical da cadeia de valor, originando um conjunto de subprojectos que se encontram

integrados num mesmo projecto e contribuem para este como um todo.

O parceiro público deve controlar o serviço público que está a ser provido pelo privado através

de mecanismos de remuneração associados ao desempenho do privado ou através da

aplicação de multas ou outras sanções em caso de incumprimento.

2.6 GESTÃO DO CONTRATO

2.6.1 INTRODUÇÃO

Depois da assinatura de um contrato de PPP, este tem de ser gerido pela entidade pública

responsável pela monitorização e implementação do contrato.

Um contrato de parceria deve conter procedimentos de comunicação e monitorização que

permitam ao parceiro público o acompanhamento da execução dos objectivos do projecto, a

avaliação do desempenho do parceiro privado e a previsão de potenciais problemas. A

Partnerships Victoria, no seu documento Contract Management Guide, fornece um guia com as

12

melhores práticas relativas à gestão do contrato. De acordo com esta entidade, o processo de

gestão do contrato envolve três etapas, como se indica na figura 2.3.

2.6.2 DESENVOLVIMENTO DO PLANO ESTRATÉGICO DE GESTÃO DO CONTRATO

A elaboração de um plano estratégico de gestão do contrato deve ter inicio na fase de

preparação do projecto de PPP e deve começar por responder a três questões:

Quais as ferramentas e procedimentos de gestão de contratos serão necessárias para

o projecto em causa?

Quais os recursos humanos, financeiros e tecnológicos disponíveis para esta tarefa?

Qual o tempo disponível para o desenvolvimento das ferramentas e procedimentos da

gestão do contrato?

As respostas a estas questões vão ajudar a estabelecer a relação mais equilibrada entre os

recursos disponíveis e as limitações temporais, e consequentemente, ajudarão a definir os

objectivos a atingir.

As PPP são, normalmente, regidas por contratos de longa duração. Deste modo, é normal que

o perfil de risco se modifique ao longo da vigência do contrato. Esta mudança está associada a

factores como a alteração do tipo de relacionamento entre as partes, mudança de legislação,

mudanças tecnológicas e também à própria progressão natural do projecto pelas diferentes

fases (construção, exploração e terminação do contrato). À medida que estas mudanças

ocorrem, o parceiro público deve reunir e analisar a informação sobre o impacto da mudança

no perfil de risco do projecto e na estratégia de gestão do contrato. Caso se verifique

necessário, devem ser desenvolvidas novas estratégias de gestão do contrato.

A recolha e análise de informação tem um papel fundamental no desenvolvimento e

optimização dos procedimentos de gestão do contrato. A análise da informação relevante deve

dar origem a uma matriz de riscos que deve ser mantida regularmente actualizada e

monitorizada. Nesta matriz, cada risco deve ser descrito e acompanhado de uma avaliação da

probabilidade de ocorrência, de uma listagem das suas consequências e de formas de

mitigação possíveis.

Desenvolvimento do

Plano Estratégico

Desenvolvimento e

Implementação do

Processo de Monitorização

Revisão Sistemática

Figura 2.3 Desenvolvimento e implementação do processo de monitorização de um contrato

(Partnerships Victoria 2003)

13

Enquanto na fase de montagem do concurso é dada especial importância aos riscos a ser

alocados ao parceiro privado, no planeamento da gestão do contrato deve-se focar a atenção

nos riscos retidos pelo Estado e nos riscos associados à própria gestão do contrato. O

planeamento da gestão do contrato deve incluir o desenvolvimento de um manual de

administração do contrato composto por planos de contingência, relatórios de monitorização do

desempenho, entre outros procedimentos.

2.6.3 DESENVOLVIMENTO E IMPLEMENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS DE MONITORIZAÇÃO

O segundo passo refere-se à concretização do plano elaborado no primeiro passo e à

implementação dos procedimentos de monitorização. Como refere Partnerships Victoria (2003),

os procedimentos a desenvolver devem ter em consideração os seguintes objectivos: a

monitorização do desempenho; a monitorização do relacionamento entre as Partes e gestão de

conflitos; a reacção à mudança; e a reacção face a imprevistos.

2.6.4 REVISÃO SISTEMÁTICA

Os processos de gestão do contrato devem ser constantemente actualizados, adaptados e

optimizados ao longo do ciclo de vida do projecto. A revisão sistemática dos procedimentos e

ferramentas da gestão do contrato deve ser, ela própria, uns dos procedimentos de gestão do

contrato.

Este procedimento deve garantir que o conhecimento e a informação estão actualizados, rever

e testar os procedimentos e ferramentas existentes e identificar e registar as ―lições‖

aprendidas.

2.7 AS PPP NO BRASIL

2.7.1 ENQUADRAMENTO

Nas décadas de 60 e 70 assistiu-se a um aumento do número de empresas públicas e à

transferência para as mãos do sector público de empresas em dificuldade financeira. Em 1980,

31,6% das 500 maiores empresas brasileiras eram propriedade estatal. Reconhecendo a sua

ineficiência no exercício das funções de gestão do aprovisionamento, de produção e de

distribuição, e enfrentando uma elevada e crescente dívida pública, o Estado delineou um

plano de privatizações que teve início em 1981 com a criação da Comissão Especial de

Privatização. Na década de 90 seguiu-se o Plano Nacional de Desestatização e a ―Lei das

Concessões‖2 (Ribeiro, 2008).

2 Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995

14

Até 1995 não existia legislação específica para parcerias entre a Administração e o sector

privado. As relações deste tipo eram regidas pela lei de contratações públicas3, na qual o

―parceiro‖ privado é o fornecedor da Administração, não podendo cobrar qualquer tipo de taxa

ou tarifa a utentes, e os contratos têm a duração máxima de 5 anos.

2.7.1.1 CONCESSÕES

Em Fevereiro de 1995 a ―Lei das Concessões‖ criou o conceito de concessão de serviços

públicos precedida ou não de execução de obra pública, e permissão de serviço público. Nos

três modelos de parceria:

O investimento do parceiro privado é remunerado e amortizado mediante a exploração

do serviço ou da infra-estrutura executada, através da cobrança de tarifa aos

utilizadores;

A tarifa é definida na proposta de cada parceiro privado e actualizada de modo a

manter o equilíbrio económico-financeiro da parceria;

Não é permitido nenhum tipo de pagamento por parte do parceiro público pelo serviço

prestado pelo privado;

Pode existir o pagamento por parte do parceiro privado ao público pela outorga da

concessão;

Os prazos contratuais são definidos caso a caso, exceptuando as permissões de

serviço público que são vínculos a título precário;

Os contratos podem ser renovados;

Nos casos que envolvem a construção de infra-estruturas, o Concedente é responsável

por fornecer no edital do concurso ―os dados relativos à obra, dentre os quais os

elementos do projecto básico que permitam sua plena caracterização‖.

Os principais objectivos desta legislação eram a geração de receitas, a desoneração do estado

dos investimentos e a transferência de dívidas, como tal não era permitido qualquer tipo de

pagamento ou tratamento tributário diferenciado ao parceiro privado pelo serviço prestado4.

Deste modo, do conjunto de concessões criadas no seguimento desta lei ficaram de fora

alguns serviços públicos nos quais seria indispensável o contributo estatal para a sua

viabilidade financeira, como as rodovias, ferrovias, abastecimento de água e saneamento de

águas residuais e habitação social (Ribeiro, 2008).

2.7.1.2 PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS

A eficiência na gestão dos serviços públicos demonstrada pelo sector privado nas concessões

entretanto lançadas aumentou a ambição do sector público com o processo de desestatização.

3 Lei nº 8.666, de 21 de Junho de 1993

4 Art. 17. da Lei nº 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995.

15

Para que os serviços públicos menos financeiramente atractivos beneficiassem também do

desempenho privado era necessária a contribuição financeira da Administração nas parcerias.

Em Dezembro de 2004 é aprovada a Lei Federal nº 11.079 que cria o conceito legal de

parceria público-privada e o define como ―o contrato administrativo de concessão, na

modalidade patrocinada ou administrativa‖. A esta altura, já alguns estados5 tinham aprovado

leis que regulavam as PPP, com ligeiras diferenças em relação à lei federal, mas que, ao longo

do tempo têm vindo a ser alteradas com o objectivo de se harmonizar a legislação reguladora

deste tipo de parcerias.

A concessão patrocinada trata-se de uma concessão de serviço público ou de obra pública, tal

qual está definida na Lei nº 8.987/1995 referida anteriormente, que envolve, adicionalmente à

tarifa cobrada aos utilizadores já prevista nesta lei, uma subvenção orçamental pública.

A concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços directa ou indirectamente à

Administração, podendo envolver a execução de infra-estruturas ou fornecimento e instalação

de bens, no qual a Administração efectua o pagamento integral pelo serviço prestado pelo

privado. Na prática, esta concessão é equivalente a um contrato administrativo de prestação de

serviços ou fornecimento de bens com a possibilidade de uma maior duração e um valor

monetário mínimo obrigatório, entre outras ligeiras diferenças (Freitas, 2005).

Uma das principais inovações desta lei é a criação de um fundo que fornece garantia aos

pagamentos a efectuar pelo parceiro público ao privado no desenvolvimento das parcerias.

Outra é a limitação das despesas relativas a PPP; segundo a lei, só se efectuará a contratação

de uma PPP quando ―a soma das despesas de carácter continuado derivadas do conjunto das

parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita

corrente líquida do exercício, e as despesas anuais dos contratos vigentes, nos 10 (dez) anos

subsequentes, não excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os

respectivos exercícios.‖

Segundo a legislação brasileira, uma PPP:

Pressupõe a partilha dos riscos envolvidos;

Pode envolver uma contraprestação pecuniária do poder Concedente, adicional ao

valor da tarifa cobrada pela Concessionária aos utentes;

Deve respeitar a indelegabilidade das funções exclusivas do Estado, nomeadamente

as de regulação e controlo;

Tem uma duração de 5 a 35 anos;

Envolve o valor mínimo de 20 milhões de reais;

Pode envolver a remuneração variável do parceiro privado vinculada ao seu

desempenho, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos em

contrato;

5 Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo, Goiás e Bahia.

16

Requer a constituição de uma sociedade veículo, que terá a incumbência de implantá-

la e de geri-la;

É atribuída por concurso público e, neste processo, a lei admite a hipótese de se

proceder a uma disputa de preços antes da qualificação técnica;

Atribui a responsabilidade pela concepção do projecto ao concessionário sempre que a

parceria envolva a construção de infra-estruturas.

Sintetizando a legislação brasileira sobre parcerias entre o sector público e privado podemos

aferir que:

A Concessão comum é uma concessão de serviços públicos ou fornecimento de bens na qual

o parceiro privado obtém o retorno do seu investimento cobrando tarifas aos utentes, estando

vedado qualquer tipo de pagamento do parceiro público ao privado. No caso de envolver a

construção de infra-estruturas, o investimento é responsabilidade do parceiro privado.

As PPP resumem-se a dois tipos de concessão. Uma que prevê a existência de pagamentos

por subvenção pública ao concessionário, para além da cobrança de tarifas aos utentes -

concessão patrocinada. E outra que atribui ao poder Concedente todo o encargo financeiro,

sem a possibilidade de cobrança de tarifa aos utentes - concessão administrativa. Não existe

no Brasil especificado o modelo de PPP institucionalizado ainda que existam muitos casos

reais da sua aplicação.

As principais diferenças entre as PPP e a concessão comum são:

Os pagamentos parcial ou integral do parceiro público ao privado pelo serviço;

A obrigação da constituição uma sociedade veículo nas PPP;

A alocação do risco de concepção das infra-estruturas ao parceiro privado em PPP;

A duração dos vínculos entre 5 a 35 anos nas PPP;

O valor mínimo da parceria de 20 milhões de reais.

2.7.1.3 COMPARADOR DO SECTOR PÚBLICO

A legislação não refere especificamente o conceito de comparador de sector público mas dita

que a autorização da montagem de uma PPP está condicionada à demonstração,

fundamentada em estudos técnicos, da ―conveniência e a oportunidade da contratação,

mediante identificação das razões que justifiquem a opção pela forma de parceria público-

privada‖.

17

2.8 AS PPP EM PORTUGAL

Em Portugal a legislação relativa à modalidade de contratação pública PPP foi surgindo no

âmbito dos contratos de concessão, segundo as necessidades de cada sector. Tratam-se de

contratos com características de PPP mas sem financiamento privado. Um dos primeiros

contratos a contar com financiamento privado seria o contrato de concessão para a concepção,

projecto, construção, financiamento, exploração e manutenção da Ponte Vasco da Gama, em

1995.

No sector rodoviário, as concessões iniciaram-se em 1972 com a constituição da BRISA para

a construção, conservação e exploração, em regime de portagem das Auto-estradas

Lisboa/Porto (A1), Fogueteiro/Setúbal (A2), Estádio Nacional/Cascais (A5) e Porto/Famalicão

(A3), num total de 390km. A empresa viria a ser nacionalizada em 1974 (25 de Abril) e

reprivatizada entre 1997 e 1999. Em 1994 é adjudicada a concessão para as travessias do Rio

Tejo à Lusoponte.

Em 1997, o Decreto-Lei n.º 9/97, de 10 de Janeiro fixou o regime das concessões para a

concepção, projecto, financiamento, exploração e manutenção de auto-estradas com portagem

efectiva nas zonas Norte e Oeste do país, num total de 19 lanços de rodovia. No mesmo ano, o

Decreto-Lei n.º267/97, de 2 de Outubro, fixa o mesmo regime para as concessões SCUT (sem

custos para o utilizador), no qual estavam previstos mais 20 lanços de auto-estrada. Estes

regimes viriam depois a ser alargados a outros lanços de auto-estrada e a grandes obras de

arte.

No sector ferroviário de passageiros, o primeiro contrato com financiamento privado surge

em 1999 na concessão do serviço público de transporte ferroviário de passageiros no Eixo

Ferroviário N/S atribuindo ao sector privado a gestão e exploração comercial da linha

ferroviária da travessia da Ponte 25 de Abril, mediante o pagamento à REFER de taxas pela

utilização, gestão e ocupação das infra-estruturas.

Nos serviços públicos de saúde, o modelo de contratação PPP surge com a publicação do

Decreto-Lei 185/2002, de 20 de Agosto, que ―define o regime jurídico das parcerias em saúde

com gestão e financiamentos privados‖, e a Resolução do Conselho de Ministros 162/2001, de

16 de Novembro, que cria uma estrutura de missão denominada «Parcerias. Saúde» destinada

a desenvolver e implementar no sector da saúde ―experiências inovadoras de gestão‖,

designadamente parcerias público-privadas. Em 2002 seria apresentado um programa para a

concepção, projecto, construção, financiamento e exploração de 10 hospitais, dos quais

apenas 2 encontram-se actualmente em exploração, os de Cascais e Braga.

Ao nível da Administração Local, a partir de 1998, surgiram muitos projectos com

semelhanças a PPP, devido à publicação da Lei nº 58/98, de 18 de Agosto, que permite às

autarquias, a criação de empresas ―para a exploração de actividades que prossigam fins de

18

reconhecido interesse público‖, permitindo a delegação de ―poderes respeitantes à prestação

de serviços públicos‖ (Pombeiro, 2003).

O Decreto-Lei 86/2003, de 26 de Abril, veio regulamentar o regime de contratação pública

baseado em PPP. Definiu PPP como ―O contrato ou a união de contratos, por via dos quais

entidades privadas, designadas por parceiros privados, se obrigam, de forma duradoura,

perante um parceiro público, a assegurar o desenvolvimento de uma actividade tendente à

satisfação de uma necessidade colectiva, e em que o financiamento e a responsabilidade pelo

investimento e pela exploração incumbem, no todo ou em parte, ao parceiro privado.‖

Este documento veio a sofrer várias alterações pelo Decreto-Lei 141/2006, de 27 de Julho,

que procurou incrementar o controlo financeiro, protegendo melhor o interesse público em

futuras parcerias ou em alterações a contratos já celebrados, particularmente no que se refere

à partilha de riscos e benefícios.

O Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado em 2008, no que concerne às PPP,

introduziu algumas melhorias no processo de avaliação das propostas e simplifica alguns

procedimentos.

Relativamente ao Comparador do Sector Público, a alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-

Lei 141/2006, de 27 de Julho prevê que as vantagens da utilização do modelo de PPP em

relação a ―formas alternativas de alcançar os mesmos fins‖ sejam avaliadas com base nos

termos previstos no n.º 2 do artigo 19.º da Lei de Enquadramento Orçamental. Esta avaliação

da economia, da eficiência e da eficácia das PPP, segundo a referida legislação, toma como

base um programa alternativo visando a obtenção dos mesmos objectivos com exclusão de

financiamentos ou de exploração a cargo de entidades privadas, devendo incluir, sempre que

possível, a estimativa da sua incidência orçamental líquida.

Em Portugal tem sido dado pouca importância a este mecanismo em quase todos os sectores

onde o modelo de PPP vem sendo adoptado e, nas poucas vezes em que é utilizado, é

determinado de forma pouco rigorosa e adoptando cenários de ganhos de eficiência

pessimistas ou pouco favoráveis (Marques e Silva, 2008).

19

3 A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL E NACIONAL DO USO DE PPP NO

SECTOR FERROVIÁRIO

3.1 ALTA VELOCIDADE

3.1.1 LINHA PERPIGNAN–FIGUERAS

A linha ferroviária de alta velocidade Perpignan-Figueras resulta do esforço dos governos

espanhol e francês para criar a primeira ligação ferroviária sem ―quebra‖ de bitola entre os dois

países, e da União Europeia para aumentar a rede transeuropeia de transportes. Esta ligação

transfronteiriça será acrescentada à linha Barcelona-Figueras que tinha a sua conclusão

prevista para a mesma data que esta, e posteriormente será complementada com uma ligação

à capital francesa. Estudos indicam que esta ligação de características ferroviárias

harmonizadas entre os dois países permitirá reduzir o tráfico de mercadorias em 10 a 12 horas

e o de passageiros em 2 horas, o que terá um impacto significativo na procura do transporte

ferroviário. O projecto envolveu a construção de 45km de linha compostos por 5 pontes e um

túnel de 8km de comprimento (EC, 2004).

O primeiro concurso para a concessão da construção, financiamento e manutenção da infra-

estrutura ferroviária, lançado em Julho de 2001, caracterizou-se pela fraca definição das

características do projecto e conduziu a um longo processo de negociações entre o consórcio

vencedor e as entidades francesas e espanholas. Após um ano de negociações, o consórcio

alegou que o projecto não seria financeiramente exequível e exigiu garantias adicionais aos

governos espanhol e francês, especificamente que estes assumissem o risco de procura. Dado

que, nesta altura, faltava apenas uma semana para a proposta perder a validade, o concurso

foi cancelado. No mês seguinte foi lançado outro concurso, que beneficiando da experiência

do anterior, levou a que os governos apresentassem um contrato baseado nas premissas deste

mas com menos aspectos negociáveis, de modo a acelerar o processo de contratação, o que

foi conseguido em cinco meses (PriceWaterHouseCoopers 2006).

O contrato para a construção, financiamento e manutenção de toda a infra-estrutura da ferrovia

foi assinado entre o consórcio TP Ferro (Eiffage e ACS) e os estados francês e espanhol em

2004, e completado na data prevista, em 2009. A concessão tem a duração de 50 anos, 5 para

a construção e 45 para a operação, no final da qual a infra-estrutura é transferida para a

propriedade dos estados. O custo total do projecto foi de aproximadamente € 1100 milhões,

dos quais € 550 milhões foram subsidiados pelos governos francês e espanhol e pela União

Europeia (PriceWaterHouseCoopers 2006). Na figura 3.1 está representado modelo contratual

da PPP.

20

Nesta parceria verificou-se uma transferência de riscos muito significativa para a

Concessionária. O aparente objectivo de ambos os estados foi disponibilizar contributos

públicos numa fase inicial do projecto e não assumir compromissos que se prolongassem pelo

período da concessão. Deste modo, a Concessionária assumiu os riscos de procura,

financeiros, de construção, de operação, de manutenção e de disponibilidade.

Por sua vez, os estados espanhol e francês assumiram os riscos de planeamento, políticos e

de força maior. A sua contribuição, através de subsídios públicos, na fase de construção,

correspondeu a € 550 milhões divididos por 10 pagamentos semestrais, que representaram

cerca de 50% do investimento nessa fase (45% proveniente dos estados e 5% da União

Europeia) (PriceWaterHouseCoopers 2006).

O planeamento e a concepção da rede ficaram a cargo da Gestor de Infraestruturas

Ferroviárias (GIF) e da Réseau Ferré de France (RFF). Pelo facto de serem entidades públicas

espanhola e francesa, respectivamente, facilitou a coordenação necessária ao

desenvolvimento do projecto, que poderia não acontecer se, para a realização dos estudos

técnicos, fosse contratada uma empresa de natureza privada.

O atraso de 3 anos na construção da ligação de Barcelona a Figueras provocou o adiamento

da plena utilização do serviço Barcelona-Perpignan para 2012, sendo necessário efectuar

transbordo em Figueras até esta data. Por conseguinte, a procura ficou muito aquém dos

valores apresentados nos estudos efectuados. Para compensar a Concessionária, foi

prolongado o período de concessão de 50 para 53 anos, e o governo espanhol financiou € 66

milhões através de uma garantia pública e mais € 62 milhões em subsídios (Railway Gazette

2009).

Ao longo da concessão, o consórcio TP Ferro encarregar-se-á da operação, gestão e

manutenção da infra-estrutura de modo a garantir a sua disponibilidade para as empresas

Estado Espanhol

Estado Francês

Concessionária SNCF / RENFE

Utilizadores

Subsídios

Financiamento

Privado

Tarifas

Operador paga taxa

de uso

Pagamentos de disponibilidade

Contrato de Financiamento

Figura 3.1 Modelo Contratual da PPP relativa ao Projecto de Alta Velocidade Perpignan-Figueras

(PriceWaterHouseCoopers 2006)

21

operadoras de transporte ferroviário, que pagam taxas de uso da infra-estrutura à

Concessionária, sendo esta a sua fonte de receita a par dos pagamentos de disponibilidade

dos Estados francês e espanhol.

3.1.2 HSL-ZUID

O projecto holandês HSL-Zuid é uma linha de alta velocidade ferroviária com 100km de

comprimento, que faz ligação entre Schiphol, Roterdam e a fronteira com a Bélgica a sul, de

onde segue a linha de alta velocidade belga até Antuérpia e Bruxelas. O custo total do

investimento foi aproximadamente € 7200 milhões, para o qual a União Europeia contribuiu

com € 193 milhões (European Union 2009). A figura 3.2 apresenta o modelo contratual do

projecto.

O processo de contratação foi composto por:

Seis contratos de empreitada pública de concepção e construção para os trabalhos de

construção civil (túneis, viadutos, etc.) relativos à subestrutura, financiados

inteiramente pelas entidades públicas holandesas;

Um contrato de concepção-construção-financiamento-operação-manutenção (DBFOM)

da superstrutura ferroviária e dos sistemas necessários à operação ferroviária, que

inclui também a manutenção da subestrutura, com duração de 25 anos adicionados

aos 5 anos de construção;

Um contrato de fornecimento do material circulante e de concessão dos serviços

ferroviários nacional e internacional com duração de 15 anos.

Estado Holandês

Superstrutura Utilizadores

Operador Subestrutura

Financiamento

Privado

Tarifas

Pagamentos de disponibilidade

Contrato de

Financiamento

Operador paga taxa de uso

Pagamentos com

Milestones

Contrato Operação

Contrato

Concepção-Construção

Figura 3.2 Modelo Contratual da PPP relativa ao Projecto de Alta Velocidade HSL-Zuid (KPMG 2006)

22

A separação dos trabalhos de construção da subestrutura dos trabalhos relativos à infra-

estrutura causou alguma dessincronização entre as partes responsáveis. Quando os contratos

de concepção e construção da subestrutura foram assinados em 1999, os projectos das

construtoras vencedoras serviram de base para a montagem das propostas para a construção

da superstrutura ferroviária, levadas a concurso em 2001. Enquanto estas propostas eram

preparadas, os projectos da subestrutura foram sendo melhorados e não foi garantida a

coordenação necessária com a superstrutura, o que implicou modificações importantes no

projecto da superstrutura logo após a conclusão do concurso (Wilden 2004).

Para além desta problemática, esta divisão dos trabalhos não permitiu usufruir de todas as

mais-valias do modelo de PPP. Como já foi referido, uma das novidades que o modelo de PPP

introduziu na contratação pública foi a possibilidade de atribuir a responsabilidade de manter e

operar uma infra-estrutura a quem a concebe e constrói, incentivando o recurso a melhores

práticas construtivas e ao dimensionamento adequado à longevidade e eficiência que se

pretende para a infra-estrutura. A opção por esta desagregação da cadeia de valor implica

assim uma boa preparação dos contratos de concepção e construção e um rigoroso controlo e

fiscalização da parte do sector público sobre as operações de modo de evitar os habituais

atrasos na entrega das infra-estruturas, que poderiam prejudicar o início dos trabalhos de

construção da superstrutura e da posterior operação comercial.

O risco de disponibilidade foi atribuído à Concessionária responsável pela manutenção da

infra-estrutura. O pagamento anual que esta recebe pelo seu serviço, cerca de € 105 milhões,

depende de um esquema de incentivo à sua performance, no qual receberá a quantia completa

se o nível de disponibilidade da linha for igual ou superior a 99.46% (Wilden 2004). A não

atribuição do risco de procura ao consórcio responsável pela infra-estrutura resultou num

processo de contratação eficiente e em condições de financiamento competitivas

(PriceWaterHouseCoopers 2005).

A Concessionária responsável pelo fornecimento do material circulante e pela operação do

serviço assume o risco de procura e paga taxas de acesso à infra-estrutura ao Estado

holandês (KPMG 2006)

3.2 METROPOLITANO

3.2.1 CANADA LINE

A Canada Line é uma linha ferroviária de metropolitano de superfície automatizado com

19.2km de comprimento que serve as cidades de Vancouver e Richmond e o Aeroporto

Internacional de Vancouver. Esta ligação entre o aeroporto e as cidades adjacentes estava nos

planos do poder político, desde o final da década de 90, mas foi o sucesso da candidatura de

Vancouver aos Jogos Olímpicos de Inverno de 2010 que fez o projecto avançar.

23

O concurso foi lançado em 2003 e atraiu 10 consórcios a competir pelo projecto. No ano

seguinte seria finalizado com a atribuição do contrato ao consórcio InTransitBC para a

concepção, construção, financiamento, operação e manutenção (DBFOM) da infra-estrutura

ferroviária, incluindo 16 estações, para um período de 35 anos.

Estudos prévios ao concurso público estimaram que o custo total do projecto seria € 1100

milhões. No entanto, na preparação do acordo financeiro, o consórcio vencedor avaliou o custo

do projecto em € 1300 milhões. A diferença entre valores gerou uma renegociação dos termos

do contrato, resultando numa redução do âmbito e extensão do projecto de modo a ser

viabilizado dentro do financiamento público e privado disponível (Siemiatycki, 2007).

Na fase de construção, o sector público efectua pagamentos ao privado consoante o avanço

das operações, com marcos específicos pré-determinados no calendário de operações e

relacionados com uma elevada concentração de custos como são os casos de um túnel

principal ou das estações.

O risco de procura foi repartido pelos dois sectores em partes desiguais, o parceiro público

assegura 90% das receitas previstas no início do projecto relativas às estimativas de procura. A

Concessionária é responsável pela disponibilidade da infra-estrutura, sendo esta o principal

parâmetro de avaliação de desempenho do qual depende o valor da subvenção paga pelo

parceiro público ao longo da concessão (Redlin 2003).

A linha abriu em Agosto de 2009, 3 meses antes do prazo previsto, e o valor do investimento

foi aproximadamente € 1385 milhões devido a custos adicionais relativos à construção,

correspondendo a um investimento privado de cerca de € 485 milhões.

3.2.2 METRO SUL DO TEJO

O Metro Sul do Tejo é um metropolitano ligeiro de superfície que serve os concelhos de

Almada e Seixal, numa extensão de 13,5 km. O principais objectivos da sua criação foram o

desenvolvimento de um sistema integrado de transporte colectivo e a conexão dos principais

pólos urbanos da margem Sul do Tejo.

O contrato assinado em 2002 concedia ao consórcio privado o projecto, a construção, o

fornecimento de equipamentos e de material circulante, o financiamento, a operação e a

manutenção da infra-estrutura ferroviária (DFBOM), por um período de 30 anos. O investimento

do Estado foi relativo à construção das infra-estruturas e atingiu o montante de € 268,7 milhões

(GASEPC 2010). Os pagamentos públicos nesta fase eram realizados mediante as

quantidades executadas, pressupondo um acompanhamento próximo do modelo de

contratação pública tradicional. A Concessionária assumiu o investimento referente ao material

circulante, ao Parque de Material e Oficinas e ao sistema de bilhética, que correspondeu a € 63

milhões.

24

O risco de procura foi amortecido por meio de um sistema de bandas. O mesmo dita que o

Estado assume este risco nos anos em a procura se situar abaixo do limite mínimo da banda

de tráfego de referência, e a Concessionária entrega ao Concedente uma contribuição nos

anos em que a procura se situar dentro ou acima da banda superior de tráfego.

Os trabalhos de construção atrasaram três anos e custaram mais € 70 milhões que o

investimento inicial previsto de € 320 milhões, representando um desvio orçamental de 22%

(Agência Lusa 2006). Estes problemas tiveram origem na falta de coordenação entre os

protocolos assinados entre o Governo e os municípios envolvidos e o Contrato de Concessão,

que culminou na renegociação do contrato (TC 2005).

3.2.3 METRO DO PORTO

O Metro do Porto é um sistema de transporte público ferroviário metropolitano ligeiro de

superfície e subterrâneo que serve sete concelhos da área metropolitana do Porto, perfazendo

uma extensão total de rede de 67 km, servindo 80 estações, 14 das quais subterrâneas. O

principal objectivo da sua implementação foi a obtenção de melhorias ao nível da mobilidade

local, do descongestionamento e da reabilitação urbana e, consequentemente, ao nível

ambiental.

A Metro do Porto, sociedade anónima de capital social integralmente público, detém desde

1998 um contrato de concessão para explorar, em regime de exclusividade, durante 50 anos, o

metro ligeiro de superfície da área metropolitana do Porto. Os trabalhos de concepção do

projecto, construção, fornecimento e montagem do material circulante e operação por um

período inicial (DBOM) foram, por aquela, subconcessionados ao agrupamento complementar

de empresas NORMETRO após a realização de um concurso público internacional que foi

concluído com a assinatura dos contratos em Dezembro de 1998 no valor de € 845 milhões.

Este valor viria a ser aumentado em cerca de € 360 (43%) milhões devido a aditamentos ao

contrato com alterações ao projecto inicial (Jornal de Notícias 2005).

O início da exploração comercial arrancou em Janeiro de 2003 com a abertura do troço

Trindade – Senhor de Matosinhos, num total de 18 estações e 11,8 km de rede e a operar nas

cidades do Porto e de Matosinhos. No decurso de 7 anos, o sistema cresceu e passou a servir

sete municípios da área metropolitana do Porto: Porto, Matosinhos, Maia, Vila Nova de Gaia,

Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Gondomar (TC 2010).

Em 2009, com a conclusão do período inicial de operação do sistema pela Normetro, a Metro

do Porto foi obrigada a subconcessionar a operação e manutenção do sistema, conforme ditam

as bases da concessão contratualizada com o Governo (Despacho n.º 9049/2009, de 2009-04-

01, do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações). Foi então lançado um

Concurso Limitado por Prévia Qualificação para a subconcessão da operação e manutenção

do sistema de metro por um período de 5 anos no valor de € 265 milhões. Este concurso viria a

25

ser ganho pelo consórcio ViaPorto liderado pela Barraqueiro em parceria com a Mota-Engil que

iniciou funções a 1 de Abril de 2010.

O Estado financiou financiou a concepção do projecto, a construção, o fornecimento e

montagem do material circulante, a operação e ainda os custos associados às expropriações.

O financiamento das actividades respeitantes à construção dos acessos ao sistema e das

interfaces com outros sistemas de transporte foi assegurado pelos municípios da área

metropolitana do Porto, segundo as bases da concessão do sistema de metro ligeiro (Anexo I

do Decreto-Lei n.º 394-A/98).

Segundo a auditoria realizada pelo Tribunal de Contas à Concessionária em 2010, até Julho de

2008 a Metro do Porto havia obtido um financiamento acumulado de € 2394,532 milhões e

realizado investimentos no montante de € 2138,689 milhões. Este financiamento foi

assegurado através de dotações do Orçamento do Estado no valor de € 132,401 milhões

(5,5%), de fundos de origem comunitária no valor de € 375,921 milhões (15,7%), de

contribuições dos accionistas (empresas públicas e autarquias locais) no valor de € 4,679

milhões (0,2%), de leasing operacional no valor de € 250 milhões (10,4%), através de

endividamento bancário no valor de € 1442,440 milhões (60,2%), sendo que em 2008 o Estado

avalizava quase 80% dos contratos de empréstimo de médio e longo prazo da Metro do Porto,

e o saldo em dívida das garantias concedidas totalizava € 993,690 milhões, e € 189,081

milhões (7,9%) provenientes de outras fontes.

3.3 CONVENCIONAL DE LONGA DISTÂNCIA

3.3.1 AUSTRALASIA RAILWAY

O Australasia Railway é um projecto que visou a construção do prolongamento da linha

ferroviária australiana que atravessa o país de Sul a Norte, numa extensão de 1420km, desde

Alice Springs até Darwin. O modelo de PPP aplicado abrangia a concepção, construção,

operação, financiamento e manutenção (DFBOM) dos 1420km de linha por um período de 50

anos, envolvia também a operação e manutenção do trecho ferroviário a Sul numa extensão de

830km, de Alice Springs a Tarcoola, e ainda a integração da linha, no extremo norte, no porto

de Darwin, com a construção de um terminal intermodal de contentores. O processo de

contratação envolveu um Estado e um Território atravessados pela linha, a saber o Território

do Norte e o Estado da Austrália do Sul, que se fizeram representar numa única entidade

criada para o propósito, a Australasia Railway Corporation (Wettenhall 2006).

O projecto custou cerca de € 770 milhões, € 445 milhões (58%) de investimento privado e os

restantes € 325 milhões (42%) provenientes dos dois estados referidos e da Commonwealth,

em partes aproximadamente iguais (Williams et al. 2005).

26

Em 2000, a Australasia Railway Corporation chegava a acordo para a parceria com o consórcio

Asia Pacific Transport que por sua vez indicava a sua empresa subsidiária FreightLink para

operar a via férrea. O parceiro privado assumiria na íntegra o risco de procura.

O risco ambiental foi responsabilidade do sector público e antecipadamente mitigado pelas

entidades estatais. Entre outras medidas, estas entidades responsabilizaram-se pelas

negociações com os Concelhos Aborígenes das terras atravessadas pela linha, com vista a

aquisição do corredor necessário à sua construção (Wettenhall 2006).

A exploração teve início em Janeiro de 2004. A procura do serviço alcançou o valor esperado

apenas no primeiro ano de exploração. Nos anos seguintes, a Concessionária teve de lidar

com uma procura abaixo do esperado. A situação manteve-se até 2008, altura em que os

direitos de concessão foram colocados à venda (railwaygazette 2008). Em Junho de 2010, a

empresa norte-americana Genesee & Wyoming Inc. adquiria os activos da FreightLinkPty Ltd ,

da Asia Pacific Transport Pty Ltd e das restantes entidades relacionadas por € 180 milhões e

assumia uma dívida de € 900 mil (railwaygazette 2010).

27

4 O PROJECTO RAV

4.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

O projecto para o estabelecimento de uma rede ferroviária de alta velocidade em Portugal é

parte integrante da rede transeuropeia de transportes (RTE-T), cujo objectivo é assegurar

mobilidade às pessoas e mercadorias, através de infra-estruturas de qualidade, incluindo todos

os modos de transporte. A rede portuguesa conectará os principais centros de transporte de

passageiros e mercadorias na Península Ibérica.

O projecto português de alta velocidade ferroviária inicial abrange cinco ligações: Lisboa –

Madrid, Lisboa – Porto, Porto – Vigo, Aveiro – Salamanca e Évora – Faro/Huelva. As três

primeiras eram consideradas prioritárias pelo Estado português e tinham a sua calendarização

definida (embora todo o projecto esteja suspenso desde Julho de 2011 por decisão política), as

duas últimas estão ainda em estudo. O eixo Lisboa – Madrid inclui um troço de plataforma

comum com a linha convencional de transporte de mercadorias entre Évora e Caia, que integra

a ligação entre o porto de Sines e Madrid.

Relativamente aos aspectos contratuais, o presente trabalho analisa o contrato de concessão

da infra-estrutura do troço Poceirão/Caia dado ter sido o único a ser firmado antes de todo o

Projecto ser suspenso por decisão política.

4.2 MODELO DE NEGÓCIO

O modelo de negócio é definido como a organização de um projecto que dita o modo como

este responde às exigências financeiras e de gestão que surgem na sua implementação. Este

define o modelo de contratação, a divisão do projecto, o modo de financiamento, o papel do

sector público, o envolvimento privado e a partilha de riscos.

4.2.1 DESAGREGAÇÃO DA CADEIA DE VALOR

A dimensão e a complexidade de um projecto de alta velocidade ferroviária como o português

inviabiliza a sua introdução num único contrato. Além disso é prática comum nas linhas de alta

velocidade europeias dividir o projecto em várias partes. Esta divisão pode ser horizontal ou

vertical.

A divisão horizontal consiste em dividir a linha de alta velocidade em troços mais pequenos.

Esta permite diminuir o valor do investimento necessário a cada projecto, abrangendo um

maior leque de potenciais interessados e, consequentemente, tornando o concurso mais

competitivo. Em relação à cronologia do lançamento dos concursos, dado que algumas

ligações ferroviárias foram consideradas mais prioritárias que outras, a divisão horizontal do

projecto permite também um faseamento dos concursos.

28

A divisão vertical permite separar as várias componentes da linha de alta velocidade que se

agrupam em três partes principais, a saber infra-estrutura, gestão e operação. A relação de

dependência entre as várias componentes, a sua especificidade, o objectivo de tornar os

concursos competitivos e o maior número de combinações possíveis torna esta divisão mais

complexa do que a horizontal.

O modelo de negócio proposto para a rede de alta velocidade ferroviária portuguesa foi

organizado da seguinte forma:

Cinco PPP para a concepção, construção, financiamento e manutenção (DBFM) da

subestrutura e superstrutura, excepto a sinalização e sistemas de telecomunicação, por

um período de 40 anos. Cada PPP corresponde a um troço de linha, que em média

tem um comprimento igual a 150km;

Uma PPP para a concepção, fornecimento, instalação e manutenção da sinalização e

sistemas de telecomunicação de toda a rede ferroviária, por um período de 20 anos;

A estação do Oriente é concebida pela REFER e construída através de empreitada

pública. A estação internacional, na fronteira entre Portugal e Espanha, pertencente à

ligação Lisboa-Madrid, é concebida por ambos os Estados e construída também sob o

modelo de empreitada pública. As restantes estações são incluídas nas PPP dos

respectivos troços onde estão integradas;

A gestão da circulação e a alocação da capacidade ficam a cargo da REFER;

O modelo de negócio para a operação dos serviços ferroviários não está ainda

definido, mas em relação ao material circulante, o Estado irá adquiri-lo e alugá-lo ao

futuro operador.

A desagregação das componentes do sistema pode ser representada graficamente da forma

que se apresenta na figura 4.1.

Substrutura /Superstrutura

Lisboa-Pombal

(PPP)

Substrutura /Superstrutura

Pombal-Porto

(PPP)

Substrutura /Superstrutura

Lisboa-Poceirão

(PPP)

Substrutura /Superstrutura

Poceirão-Caia

(PPP)

Poceirão-Caia

Substrutura /Superstrutura

Braga-Valença

(PPP)

Braga-Valença

Âmbito: Concepção, Fornecimento, Financiamento e Manutenção Prazo Concessão: 40 anos Mecanismo de Pagamento: Disponibilidde + Procura

Sinalização / Telecomunicações (PPP)

Âmbito: Concepção, Fornecimento, Instalação, Financiamento e Manutenção Prazo Concessão: 20 anos Mecanismo de Pagamento: Disponibilidde

Gestão de Circulação e Alocação de Capacidade (Estado/Refer)

Figura 4.1 Modelo de negócio do Projecto RAV Portugal. (Fonte: Fernandes 2010)

29

O modelo de negócio para a operação do serviço ferroviário não está ainda definido mas dada

a estrutura apresentada para as restantes partes do sistema, a operação ficará isolada das

restantes constituintes do sistema ferroviário. Esta separação é comum noutros projectos de

alta velocidade e a razão principal é a necessidade de isolar as restantes componentes do

sistema do risco de procura.

Da mesma forma que se deve isolar o risco de procura, deve-se também agrupar as

componentes de acordo com a sua especificidade de modo a não existir, dentro de cada grupo,

diferenças acentuadas entre o preço, a complexidade ou o risco envolvido.

A junção da subestrutura e da superstrutura reflecte a necessidade da coordenação entre

ambas ao nível da concepção e construção. O projecto holandês HSL-Zuid separou estes

elementos e passou por alguns problemas devidos à necessidade de efectuar alterações ao

projecto da subestrutura, que consequentemente implicavam a revisão dos projectos da

superstrutura realizados por empresas distintas.

A alocação da capacidade e gestão do tráfego foi atribuída à REFER de modo a manter as

funções de planeamento e estratégia sob a responsabilidade do Estado.

4.2.2 REMUNERAÇÃO DO PARCEIRO PRIVADO6

No período de disponibilidade, o parceiro privado é remunerado pelo parceiro público através

de pagamentos periódicos. Cerca de 75% do valor destas subvenções estão indexadas a um

regime de performance que avalia a disponibilidade do sistema e as condições dos activos,

podendo resultar em deduções no valor dos pagamentos públicos, no caso de não ser atingido

um nível mínimo de desempenho. Os restantes 25% constituem um valor fixo e têm o intuito

de cobrir os custos de manutenção que seriam cobrados aos operadores pelo uso da infra-

estrutura. O valor total, após aplicadas as deduções, pode ainda sofrer um aumento ou

diminuição de 3% consoante o nível de tráfego real verificado. A influência do risco de procura

nos pagamentos é assim diminuta, de modo a não responsabilizar em demasia o parceiro

privado por um risco que ele não pode gerir directamente, e tem o desígnio de incentivar à

colaboração entre os vários parceiros para maximizar o uso das linhas ferroviárias (Fernandes

et al. 2010).

As seguintes fórmulas, que constam no contrato, resumem a remuneração da Concessionária

no período de disponibilidade.

6 A análise realizada neste capítulo é referente ao contrato de concessão da infra-estrutura do troço

Poceirão/Caia pelas razões já mencionadas no início do capítulo 4.1.

30

em que:

Rt Remuneração devida no ano t;

RCt Remuneração devida pelo Concedente, no ano t;

PMt Pagamento de Manutenção, no ano t;

em que:

PDt Pagamento de desempenho, no ano t;

Dt Deduções de desempenho a aplicar à Concessionária, no ano t;

CTt Componente de tráfego, no ano t.

As deduções de desempenho (Dt) são a soma das deduções de indisponibilidade do sistema

(Id) e das deduções por deficiente condição dos activos (Cd), relacionadas com a falta de

manutenção de activos cuja falha não afecte a operação ferroviária. As formas de cálculo

destas deduções são apresentadas no anexo A.

4.2.2.1 REGIME DE PERFORMANCE

Numa PPP, a concepção e a construção são responsabilidade do parceiro privado e o público

não deve evitar especificar o modo como o empreendimento deve ser realizado. No entanto, o

modo como o parceiro privado realiza as suas tarefas afectará o desempenho da infra-

estrutura. O contrato deve, assim, especificar o nível mínimo de desempenho e o desempenho

real deve ser monitorizado. O esquema de remuneração do parceiro privado deve estabelecer

uma relação entre a motivação do parceiro privado – o lucro – e o desempenho real da infra-

estrutura.

No caso português, a calibração do regime de performance teve o objectivo de relacionar o

desempenho com o impacto real das suas falhas mas não reflectir nas deduções o real impacto

financeiro causado, dando a oportunidade à Concessionária para corrigir processos.

4.2.2.2 CONCEITO DE DISPONIBILIDADE

A disponibilidade da linha e, deste modo, o desempenho do parceiro privado é medido pelo

nível de funcionalidade da ferrovia. A separação dos responsáveis pela sinalização e sistemas

de telecomunicação da restante infra-estrutura e da operação do serviço ferroviário implicou a

31

criação de um indicador de desempenho que avaliasse a disponibilidade do sistema

exclusivamente em função das actividades que são controladas pelo parceiro privado em

questão, como a concepção, a construção e a manutenção. Esta abordagem permite avaliar a

disponibilidade sem ter em conta o desempenho de outros actores do sistema e facilita a

identificação da relação causa-efeito das perdas de disponibilidade, ajudando o parceiro

privado a conhecer as suas falhas e agir de forma a melhorar o seu desempenho.

No modelo de disponibilidade, a funcionalidade total do sistema significa que os comboios

podem usar a linha ferroviária em toda a sua extensão, em ambos os carris, à velocidade

máxima da linha, durante as horas normais de operação (24 horas menos os períodos

destinados às operações de manutenção previstos em contrato). Para avaliar o desempenho

do parceiro privado, o regime é baseado numa unidade de indisponibilidade (UI) como medida

do nível de funcionalidade da ferrovia (Audsley 2011).

A UI é calculada pela multiplicação da restrição ou redução da velocidade pela extensão de

linha afectada e pela duração do evento. A figura 4.2 representa esquematicamente o cálculo

do total de unidades de indisponibilidade.

O modelo de disponibilidade que define as regras para calcular as deduções de

indisponibilidade é apresentado no anexo B.

4.2.3 INVESTIMENTO PÚBLICO E FINANCIAMENTO PRIVADO

O investimento da Concessionária na fase de construção foi avaliado em cerca de € 1644

milhões (incluindo projecto, expropriações e equipamentos) (RAVE 2010). A figura 4.3

apresenta a origem do financiamento durante a fase de construção.

Velocidade

máxima normal

da linha

Extensão da

linha afectada

Tempo de

reparação

Velocidade

permitida

Número de vias

afectadas

Atraso

Administrativo

e Logístico

Limitação de

velocidade

Extensão total

das vias

afectadas

Tempo total de

indisponibilidade

Extensão total

das vias

afectadas

Figura 4.2 Conceito de Unidade de Indisponibilidade (adaptado de Audsley 2011)

32

Figura 4.3 Origem do investimento durante a fase de construção (Fonte: RAVE 2010)

A entrada do Banco Europeu de Investimento (BEI) no financiamento do projecto revelou-se de

extrema importância dado o menor custo do seu financiamento em relação à banca comercial,

e também devido ao seu contributo técnico para o projecto proveniente da sua experiência

noutros projectos de alta velocidade ferroviária em PPP. Metade dos € 600 milhões financiados

ao parceiro privado pelo BEI foram inicialmente garantidos pelo Estado português, mas esta

garantia viria a ser retirada no aditamento ao contrato em Janeiro de 2011.

Relativamente aos fundos comunitários disponíveis para a rede de Alta Velocidade em

Portugal, a Comissão Europeia, desde o início do projecto até à data, atribuiu um

financiamento no montante global de € 1378 milhões para aplicação até 2013 de:

€ 423 milhões da Rede Transeuropeia de Transportes (RTE-T), para aplicação nos

projectos definidos como prioritários: as ligações Lisboa – Porto (PP3), Lisboa – Madrid

(PP3), Aveiro – Salamanca (PP3), Porto – Vigo (PP19) e a ligação convencional entre

Évora e Caia (PP16) incluída na PPP referente à ligação Poceirão – Caia;

€ 955 milhões do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN).

Na fase de disponibilidade, a estimativa do Estado relativa aos pagamentos de desempenho é

que este atinja um valor médio de € 41 milhões, que é variável consoante as deduções a

aplicar à Concessionária.

4.3 ACESSO AO NEGÓCIO

4.3.1 ASPECTOS GERAIS

Até à decisão de suspender o projecto, em Julho de 2011, tinham sido lançados dois concursos

públicos relativos à concessão da subestrutura e superstrutura dos dois troços que integram a

parte portuguesa do eixo Lisboa-Madrid – Poceirão-Caia em 2008 e Lisboa-Poceirão em 2009.

€ 197 M

€ 471 M

€ 54 M € 116 M

€ 600 M

€ 210 M

RTE-T (12%)

QREN (29%)

REFER (3%)

Estado Português(7%)

BEI (36%)

Promotores e BancaComercial (13%)

33

O último viria a ser cancelado em 2010 quando se encontrava na primeira fase de avaliação de

propostas, e o primeiro em 2011 já depois de ter sido assinado o contrato em Maio de 2010.

O concurso é regulamentado pelo CCP, aprovado em 2008. Este define especificamente todos

os procedimentos possíveis do concurso.7

4.3.2 CONCURSO

O concurso público internacional para a PPP referente ao troço Poceirão-Caia corresponde a

um contrato de concessão de obra pública cujo objecto é o projecto, construção, financiamento,

manutenção e disponibilização por todo o período da concessão das infra-estruturas

ferroviárias correspondentes ao troço. A concessão inclui ainda a exploração da estação de

Évora, que engloba a gestão e comercialização da publicidade nela instalada, das áreas

comerciais que a compõem e dos parques de estacionamento que lhe são adjacentes.

No processo de concurso foi adoptada uma fase de negociação à qual passam os dois

concorrentes melhor classificados na primeira fase do concurso, e admitiu-se a apresentação

de, no máximo, duas propostas variantes, de conteúdo técnico e/ou financeiro. Este formato

tem sido frequentemente utilizado em concessões de obra pública no sector rodoviário, dos

transportes e da saúde.

O Programa do Procedimento (RAVE 2008a) fixa de forma muito clara os standards mínimos

que devem ser observados pelos concorrentes, define a metodologia de avaliação de

propostas e fixa o desenvolvimento do concurso. A publicitação da metodologia de avaliação

de propostas no Programa do Procedimento é uma das novas imposições do CCP, já que

normalmente, esta era elaborada entre a data de lançamento do concurso e o acto público de

abertura das propostas.

O Caderno de Encargos incluiu uma minuta do Contrato de Concessão e vários dos seus

anexos, garantindo o conhecimento, por parte dos concorrentes, das condições contratuais

espectáveis pela entidade adjudicante.

Uma das medidas tomadas pela RAVE foi a publicitação antecipada do concurso e dos estudos

e projectos por si desenvolvidos que poderiam interessar aos futuros concorrentes no âmbito

da elaboração das respectivas propostas a apresentar em sede de concurso.

A comissão de avaliação de propostas foi nomeada antes do lançamento do concurso,

conforme exposto no Decreto-Lei n.º 141/2006, de 27 de Julho, e esta antecipação da

nomeação, relativamente ao procedimento em concursos anteriores, permitiu o envolvimento

desta na fase de prestações de esclarecimentos aos interessados no concurso.

7 Para efeitos desta dissertação apenas se analisará o concurso referente à PPP da infra-estrutura do

troço Poceirão/Caia.

34

Atendendo ao elevado custo que os concorrentes normalmente têm na elaboração das

propostas, introduziram-se mecanismos de compensação para os concorrentes preteridos.

A figura 4.4 apresenta a sequência das diferentes fases do concurso.

Figura 4.4 Fases do concurso público da Concessão RAV Poceirão/Caia

4.3.3 CRITÉRIOS DE ADJUDICAÇÃO

O critério de adjudicação adoptado foi a escolha da proposta economicamente mais vantajosa,

de acordo com os factores e subfactores que se apresentam no quadro 4.1.

Quadro 4.1 Factores e subfactores de avaliação das propostas do concurso RAV Poceirão/Caia (Fonte:

RAVE 2008a)

Factor Ponderação Subfactor

Ponderação

Relativa Absoluta

A. Custo 50% - 100% 50%

B. Qualidade 30%

B1. Soluções técnicas 50% 15%

B2. Organização da manutenção 20% 6%

B3. Estação de Évora-Norte 15% 4,5%

B4. Segurança, Qualidade e Ambiente 15% 4,5%

C. Risco 20%

C1. Risco associado aos encargos a

suportar pelos parceiros públicos 50% 10%

C2. Exequibilidade do planeamento 20% 4%

C3. Equilíbrio e robustez financeira 15% 3%

C4. Solidez da estrutura contratual e

transferência de risco 15% 3%

•Preparação dos documentos do concurso

•Anúncio Lançamento

•Esclarecimentos

•Apresentação de propostas Propostas

•Verificação de admissibilidade

•Avaliação de propostas Avaliação (1ª fase)

•Negociação

•Propostas finais (BAFO) Negociação

•Verificação de admissibilidade

•Avaliação de propostas Avaliação (2ª fase)

•Adjudicação

•Assinatura do contrato Fecho

35

Para além de ser obrigatória pelo CCP, a elevada ponderação atribuída ao critério relativo ao

custo e a relegação do critério qualidade para segundo plano é justificada pelo tipo de

contratação (em regime de PPP) que se está a desenvolver. A Concessionária será

responsável pela manutenção da infra-estrutura ao longo da concessão, será assim do seu

interesse que se aplique na fase de construção, as técnicas construtivas e os materiais de

construção adequados à obtenção de infra-estruturas de qualidade e, na fase de exploração,

que a organização da manutenção seja eficiente e apropriada à infra-estrutura, de modo a que

permitam manter o custo de manutenção próximo do que foi apresentado na proposta

vencedora do concurso, ou eventualmente reduzi-lo. O facto de se tratar de uma infra-estrutura

ferroviária, que se caracteriza pela elevada complexidade e pouca liberdade técnica, também

justifica o peso diminuto da qualidade na avaliação das propostas. Os requisitos técnicos

impostos por normas internacionais neste tipo de projectos são tais que o seu cumprimento

garante, por si só, níveis de qualidade elevados. Esta menor liberdade na concepção das infra-

estruturas também facilita a avaliação das propostas devido à harmonização das

características técnicas.

Nos pontos que se seguem, realiza-se uma análise critério a critério, mais ou menos detalhada

consoante a importância que cada um representa, remetendo-se para o anexo C a definição

dos respectivos factores de valorização estabelecidos.

4.3.3.1 FACTOR A - CUSTO

O factor A avalia o custo a suportar pelos parceiros públicos (Estado, REFER e União

Europeia), baseando-se nos montantes dos pagamentos a efectuar à Concessionária, ao longo

da concessão.

A classificação tem como variante a estimativa do valor actual líquido (VAL) dos referidos

pagamentos em cada proposta. São considerados os seguintes pagamentos:

Pagamentos do Estado e da REFER durante o período de desenvolvimento;

Pagamentos relativos a Fundos Comunitários;

Pagamentos de desempenho;

Pagamentos de manutenção.

4.3.3.2 FACTOR B - QUALIDADE

Neste factor avaliam-se os atributos técnicos das propostas que influenciam o funcionamento

da infra-estrutura, considerando os seguintes subfactores: soluções técnicas; organização da

manutenção; estação de Évora-Norte; segurança, qualidade e ambiente.

O subfactor B1 tem em consideração as soluções técnicas propostas, a Integração dos

subsistemas de engenharia e a adequação ao modelo de disponibilidade.

36

O subfactor B2 avalia a estratégia de manutenção e o programa base RAMS8 proposto.

No subfactor B3 é objecto de avaliação o desempenho funcional do edifício de passageiros, da

interface rodo-ferroviária e da zona envolvente da nova estação Évora-Norte.

No subfactor B4 são avaliadas as metodologias propostas nas notas técnicas para a

implementação da segurança e da qualidade e o programa preliminar de gestão ambiental de

empreendimento.

4.3.3.3 FACTOR C – RISCO

Avaliam-se neste factor os aspectos das propostas que possam ter impactes nos riscos para os

parceiros públicos ou nas condições de desenvolvimento da concessão.

O subfactor C1 ―Riscos acrescidos para os parceiros públicos‖ avalia a exposição dos parceiros

públicos aos riscos técnico-financeiros e ao risco associado à lista de preços unitários. Este

subfactor tem o peso de 10% na avaliação global, sendo o mais elevado dentro do factor risco,

e está associado aos custos em que o parceiro público incorre numa possível reposição do

equilíbrio financeiro devido a alterações aos projectos ou à construção impostas pelo parceiro

público. Este é um critério muito importante dado que se a reposição do equilíbrio financeiro

não for bem gerida, pode ser ruinosa ao nível financeiro para o parceiro público.

No subfactor C2 ―Exequibilidade do planeamento" é avaliado o risco de exequibilidade

associado ao planeamento proposto e a sua adequação ao cumprimento das datas fixadas

para a concretização do empreendimento.

No subfactor C3 ―Equilíbrio e robustez financeira‖ é objecto de avaliação a adequação da

estrutura de financiamento da futura Concessionária às necessidades do projecto, com base no

nível de fundos próprios e alheios proposto, na rentabilidade dos fundos próprios e do projecto,

e no cumprimento de níveis de rácios de cobertura da dívida.

O subfactor C4 ―Solidez da estrutura contratual e transferência de risco‖ avalia capacidade

demonstrada na gestão e alocação dos riscos do projecto, incluindo o programa de seguros

proposto.

8 Acrónimo de ―reliability, availability, maintenability and safety‖, regulado pela Norma Técnica NPEN

50126.

37

4.3.4 ANÁLISE DE PROPOSTAS

Apresentaram-se a concurso os quatro consórcios apresentados no quadro 4.2.

Quadro 4.2 Lista de Concorrentes do concurso RAV Poceirão/Caia

Concorrente Membros maioritários

1 – ELOS – Ligações de Alta Velocidade Brisa e Soares da Costa

2 – Eurolinhas FCC Construccion

3 – Cintra Cintra - Concesiones de

Infraestructuras de Transporte

4 – Altavia Alentejo Mota-Engil

Os resultados da primeira fase de avaliação são apresentados no quadro 4.3 e encontram-se

sintetizados no quadro 4.4. A escala numérica utilizada varia entre 0 e 20 valores.

Quadro 4.3 Pontuação das propostas dos quatro concorrentes ao concurso RAV Poceirão/Caia na

primeira fase de avaliação

Proposta A B1 B2 B3 B4 C1 C2 C3 C4 Pontuação

Final

ELOS 18,00 15,00 14,00 18,00 13,00 13,00 16,00 11,00 12,00 16,12

Eurolinhas 0,00 5,00 11,00 13,00 11,00 8,00 5,00 11,00 9,00 4,09

Cintra 15,79 12,00 16,00 14,00 8,00 11,00 12,00 13,00 13,00 14,01

Altavia Alentejo

18,42 13,00 13,00 12,00 14,00 10,00 12,00 13,00 15,00 15,43

Quadro 4.4 Pontuação das propostas dos quatro concorrentes ao concurso RAV Poceirão/Caia na

primeira fase de avaliação

Proposta A B C Pontuação

Final

ELOS 18,00 14,95 13,15 16,12

Eurolinhas 0,00 8,30 8,00 4,09

Cintra 15,79 12,50 11,80 14,01

Altavia Alentejo 18,42 13,00 11,60 15,43

38

Desta primeira fase destaca-se a baixa pontuação do concorrente 2, principalmente no factor

de maior peso na avaliação, o custo. A sua proposta previa pagamentos pelo desempenho da

Concessionária de valor muito mais elevado do que os previstos nas restantes propostas, que

conduziu a um VAL dos pagamentos públicos elevado e correspondente baixa pontuação.

A entidade competente pela decisão de contratação poderia ter optado por definir o número de

concorrentes que passariam à fase de negociação após a primeira fase de avaliação. O artigo

150.º do CCP prevê esta possibilidade e creio que o nível de concorrência poderia ter sido mais

elevado caso esta opção tivesse sido tomada dado que havia três concorrentes com propostas

bastante semelhantes ao nível da pontuação obtida na primeira fase.

O quadro 4.5 apresenta o resultado da avaliação da 2ª fase de avaliação de propostas.

Quadro 4.5 Pontuação das propostas dos dois concorrentes ao concurso RAV Poceirão/Caia na segunda

fase de avaliação

Proposta A B1 B2 B3 B4 C1 C2 C3 C4 Pontuação

Final

1 - ELOS 15,04 18,50 18,00 19,00 19,00 5,00 19,00 16,00 4,00 14,95

4 - Altavia Alentejo

13,62 16,90 16,90 16,00 16,90 5,00 17,00 16,90 5,00 13,68

Nesta fase, os dois concorrentes apresentaram propostas com pontuação global inferior à das

versões iniciais. Esta desvalorização deveu-se sobretudo aos subfactores C1 e C4.

Relativamente ao C1 (risco associado aos encargos a suportar pelos parceiros públicos),

ambos os concorrentes acrescentaram na sua proposta final a garantia do estado ao

financiamento realizado pelo BEI por um período de 20 anos, quando nas versões iniciais esta

dizia respeito apenas à fase de construção. Em relação ao C2 (solidez da estrutura contratual e

transferência de risco), ambas as propostas finais apresentavam várias áreas de indefinição

nos modelos contratuais.

O CCP determina a exclusão das versões finais cuja pontuação global seja inferior à das

respectivas versões iniciais, e prevê que as versões iniciais mantenham-se para efeitos de

adjudicação. O júri do concurso considerou que as propostas iniciais representavam

significativo prejuízo e risco para o interesse público e recomendou a não adjudicação de tais

propostas. Esta decisão resultou do facto de que as propostas iniciais não possuíam o grau de

compromisso necessário por parte dos bancos financiadores que garantissem a sua

bancabilidade no momento da adjudicação, bem como o compromisso do ACE construtor e da

empresa encarregue da manutenção do empreendimento. Além disto, as propostas iniciais

assumiam um conjunto de condições financeiras que eram irrepetíveis na segunda fase do

concurso (após um ano) devido às alterações verificadas no mercado financeiro internacional,

conduzindo provavelmente à inexistência de financiamento.

39

O concorrente 1 apresentou disponibilidade para rectificar a sua proposta final no que diz

respeito aos aspectos relacionados com os subfactores C1 e C4 referidos. Dado não ser

permitido efectuar alterações à proposta final, o júri considerou, no entanto, a possibilidade de

introduzir estas alterações em forma de ajustamentos ao conteúdo do contrato previstos no

artigo 99º do CCP. O quadro 4.6 apresenta a classificação final e o quadro 4.7 apresenta a

comparação das pontuações globais das propostas na primeira e segunda fases do concurso.

Quadro 4.6 Pontuações finais das BAFO dos consórcios ELOS e Altavia Alentejo

Proposta A B1 B2 B3 B4 C1 C2 C3 C4 Pontuação

Final

1 - ELOS 16.10 18.50 18.00 19.00 19.00 16.00 19.00 16.00 15.00 16.90

4 - Altavia Alentejo

15.92 16.90 16.90 16.00 16.90 5.00 17.00 16.90 5.00 14.82

Quadro 4.7 Comparação das pontuações globais na primeira e segunda fases do concurso

Proposta Classificação

na 1ª Fase Classificação

na 2ª Fase Diferença

1 - ELOS 16,12 16,90 + 0,78

4 - Altavia Alentejo 15,43 14,82 - 0,61

Como se pode concluir, o concorrente n.º 4 não efectuou as alterações recomendadas pelo júri.

Deste modo, tal como previsto no CCP, manteve-se para adjudicação a versão inicial da sua

proposta. O quadro 4.8 apresenta a ordenação das propostas finais.

Quadro 4.8 Pontuação das propostas finais

Proposta Classificação

1 - ELOS 16,90

4 - Altavia Alentejo 15,43

Relativamente à versão inicial, a proposta final do concorrente 4 apresentou níveis de

avaliação mais baixos no factor relativo ao custo e registando aumentos nos factores de

avaliação mais subjectivos que resultou num aumento da pontuação global. Deveria ter sido

acautelada esta situação, sendo impedidas alterações negativas nos principais critérios de

40

avaliação. O quadro 4.9 apresenta a pontuação das propostas inicial e final do concorrente

vencedor do concurso.

Quadro 4.9 Pontuação das propostas inicial e final do concorrente vencedor

Proposta A B1 B2 B3 B4 C1 C2 C3 C4 Pontuação

Final

ELOS (1ª fase)

18,00 15,00 14,00 18,00 13,00 13,00 16,00 11,00 12,00 16,12

ELOS (2ª fase)

16,10 18,50 18,00 19,00 19,00 16,00 19,00 16,00 15,00 16,90

4.4 PARTILHA DE RISCOS

4.4.1 RISCO POLÍTICO

Esta categoria de risco diz respeito, entre outros factores, à incerteza relativa ao suporte

político ao projecto ao longo da sua duração, através da adopção de políticas que contribuam

para o desenvolvimento esperado do projecto. Este risco é particularmente relevante em PPP

de projectos de infra-estruturas de grande dimensão por se tratarem, normalmente, de

parcerias de longo prazo que, consequentemente, ficam expostas à referida incerteza por mais

tempo, além de envolverem investimentos elevados.

Dado que a concessão em causa não envolve a exploração comercial do projecto pelo parceiro

privado e a procura do serviço ferroviário tem um peso muito reduzido nos pagamentos do

parceiro público ao privado, o Estado seria o principal prejudicado por uma possível negligência

ao apoio político ao projecto.

Concretamente, um dos principais problemas ao nível político é relativo a possíveis atrasos no

lançamento da PPP2 (referente ao troço compreendido entre Lisboa e Poceirão), que podem

causar atrasos no eixo Lisboa/Madrid. Estes, por sua vez, podem comprometer o cumprimento

da data acordada entre Portugal e Espanha para o início da operação ferroviária entre as duas

capitais ibéricas. Estes atrasos poderão também afectar os apoios comunitários concedidos ao

projecto.

O projecto RAV teve o apoio do Partido Socialista que governou com maioria absoluta entre

2005 e 2009, o que permitiu o avanço do projecto, mesmo com a oposição do maior partido da

oposição, o Partido Social Democrata. A mudança de poder em 2011 para a coligação CDS-

PP/PSD viria, no entanto, a ditar a suspensão do projecto, o que levou ao pedido de

indemnização por parte da Concessionária.

41

4.4.2 RISCO LEGAL

O risco legal representa o risco de que o Governo, na execução das suas funções legislativas,

altere direitos e deveres dos agentes públicos e privados, de modo a afectar os resultados

esperados do projecto.

O contrato dita que as alterações à legislação nacional e comunitária, designadamente à lei

fiscal e à lei ambiental, não conferem direito à reposição do equilíbrio financeiro da concessão.

O mesmo não se aplica às normas específicas para o sector ferroviário, as Normas REFER e

as Normas Técnicas9. Qualquer alteração das primeiras que altere o equilíbrio financeiro da

concessão conferem o direito ao seu reequilíbrio. Relativamente às Normas Técnicas, uma

possível alteração destas que imponha alterações das características técnicas de base para a

infra-estrutura do troço ou alterações das características geométricas da linha, ou que imponha

o recurso à aplicação de novas tecnologias em sistemas e equipamentos de utilização global,

que não tenham sido exigidos à data da implementação da solução adoptada, confere à

Concessionária direito ao reequilíbrio financeiro.

O risco legal é, deste modo, encarado, separando as leis de aplicação geral das normas de

carácter técnico e regulatório, o que garante por um lado equidade na rentabilidade dos

investidores em geral e, por outro, a atribuição ao parceiro público dos encargos relativos à

compatibilização das características técnicas das infra-estruturas com as alterações às normas

e regulamentos técnicos, tendo em conta que a concessionária, na montagem da sua proposta,

apresentou um custo relativo aos trabalhos tendo em consideração as normas e regulamentos

técnicos em vigor na data da realização da mesma.

4.4.3 RISCO DE CONCURSO

Este risco está associado à inexistência de propostas competitivas (quer em fase de

apresentação de propostas, quer na fase de negociação) que poderá traduzir-se na

impossibilidade de gerar value for money para o Estado e, a longo prazo, encargos acrescidos

para este. Na origem deste tipo de risco pode estar a simultaneidade das várias PPP previstas

para o Projecto RAV com as PPP previstas para os sectores rodoviário, saúde e energia

(barragens) que pode afectar o nível de resposta do mercado.

Nesta categoria de risco, insere-se também o risco de atraso no calendário do concurso e na

duração do processo de contratação que, consequentemente, provocam atrasos no início da

fase de execução do Projecto.

9 Definido no contrato de concessão, ―Normas Técnicas‖, designa as regras, instruções, recomendações e

regulamentos técnicos aplicáveis ao Troço Poceirão -Caia, emitidas por organismos internacionais e nacionais, nomeadamente de regulação e gestão das infra-estruturas ferroviárias e de normalização, como sejam, sem limitar, a UIC — Union Internationale des Chemins de Fer, a International Standards Organisation, o Comité Européen de Normalisation, o ISQ — Instituto da Soldadura e Qualidade, o IPQ — Instituto Português da Qualidade e o Comité Européen de Normalisation Electrotechnique.

42

4.4.4 RISCOS DE PLANEAMENTO E CONCEPÇÃO

O planeamento da rede é responsabilidade das entidades estatais que definem os eixos

prioritários, os pontos de passagem obrigatória dos traçados das linhas e as estações que

constituem a rede ferroviária. A gestão da circulação e alocação da capacidade ficam também

sob a alçada da REFER. A concepção do Projecto é assim responsabilidade do parceiro

público ao nível do planeamento, da aprovação dos projectos de execução e da definição dos

requisitos funcionais do projecto. Um dos principais riscos em projectos deste tipo surge de

possíveis indefinições no projecto ou alterações tardias ao mesmo que normalmente conduzem

a reposições do equilíbrio financeiro bastante onerosas para o parceiro público.

O parceiro privado assume até determinado nível a responsabilidade pelo planeamento da

infra-estrutura, realizando os estudos e projectos necessários.

Deste tipo de riscos, no Projecto em estudo destacam-se a estabilidade da tecnologia de

alguns sistemas de alta velocidade que se encontram pouco testados e a falta de clareza do

processo de certificação do sistema de AV (RAVE 2008b).

4.4.5 RISCO DE FINANCIAMENTO

Os riscos de financiamento englobam as incertezas relativas à capacidade e condições do

mercado financeiro para financiar o Projecto, dado o seu nível de complexidade técnica e

dimensão.

Em Maio de 2010, quando se chegou ao primeiro financial close, o acordo estabelecido ditava

que o Estado assumia o risco sobre a variação do indexante Euribor na fase de exploração do

serviço, e ainda que este fornecia garantia pública sobre metade do financiamento proveniente

do BEI, correspondente a € 300 milhões (Campos et al. 2010). Estas duas medidas foram

retiradas no aditamento ao contrato efectuado em Janeiro de 2011, e o consórcio assumiu a

responsabilidade sobre estes riscos (RAVE 2011). Em todo o caso, tal como inicialmente

definido, o Concedente assumiu o risco de variação do indexante de taxa de juro entre a

BAFO e o Financial Close.

O restante risco financeiro relativo ao financiamento que o parceiro privado necessita para

suportar o projecto é da sua inteira responsabilidade.

4.4.6 RISCO DE EXPROPRIAÇÕES

A Concessionária é responsável pela condução e realização dos processos expropriativos dos

bens ou direitos necessários ao estabelecimento da concessão, como entidade expropriante

em nome do Estado, cabendo-lhe suportar todos os custos inerentes à condução dos

43

processos expropriativos e o pagamento de indemnizações ou outras compensações

decorrentes das expropriações.

Todas as expropriações efectuadas são consideradas expropriações de utilidade pública e com

carácter de urgência. O Concedente é responsável pela emissão e publicação das declarações

de utilidade pública dos terrenos a expropriar, e qualquer atraso imputável a este e superior a

trinta dias da data estabelecida, confere à Concessionária o direito à reposição do equilíbrio

financeiro.

4.4.7 RISCO DE CONSTRUÇÃO

Os riscos de construção abrangem diversas variáveis transversais ao processo de execução do

Projecto. Inserem-se neste domínio todos os eventos susceptíveis de gerar desvios ao nível

dos custos ou dos prazos de construção.

Entre os riscos de construção destacam-se, a título de exemplo, os relativos à incerteza quanto

às condições geológicas e geotécnicas, o aumento do preço das matérias-primas, os

problemas com entidades subcontratadas e os problemas com a qualidade de gestão de

projecto.

A maior parte destes riscos são geridos pelo parceiro privado. O parceiro público encarrega-se

da gestão do risco associado à possível necessidade de alteração de tecnologia,

especificamente, a relativa à introdução de novas funções adicionais nos sistemas de

comando, controlo e sinalização (RAVE 2008b).

4.4.8 RISCO AMBIENTAL

O risco ambiental está relacionado com o impacto ambiental da localização da futura rede

ferroviária e, mais objectivamente, com os atrasos ao projecto que possam ser causados por

atrasos nas aprovações ambientais.

Este é um risco suportado pelo parceiro privado, já que, anteriormente ao concurso, o Estado

obteve as aprovações ambientais necessárias relativas aos corredores previstos para o

projecto, de acordo com a legislação. Mas uma concepção de traçado que saia destes

corredores obrigará à realização de um novo processo de avaliação ambiental, que será da

responsabilidade da Concessionária.

4.4.9 RISCO ARQUEOLÓGICO

Inicialmente o contrato concedia à Concessionária o direito à reposição do equilíbrio financeiro

da concessão no caso do Concedente impôr uma alteração de traçado, devido à descoberta de

44

qualquer património histórico ou arqueológico, que implicasse a realização de nova Avaliação

de Impacte Ambiental. No aditamento ao contrato, realizado em Janeiro de 2011, acordou-se

que a descoberta de qualquer património histórico ou arqueológico não confere à

Concessionária o direito à reposição do equilíbrio financeiro.

Em caso de atraso no cumprimento de alguma das datas constantes do calendário de

actividades acordado por ambos os parceiros, devido à descoberta de qualquer património

histórico ou arqueológico, a Concessionária dispõe de 12 meses para compensar o atraso sem

que lhe sejam aplicadas qualquer tipo de multas. Os pagamentos de disponibilidade serão

também pagos pelo Concedente desde que as restantes obras, não afectadas pela descoberta,

sejam entregues nas datas previstas e nas condições acordadas.

Deste modo, o risco arquelógico é suportado por ambos os parceiros. Perante a descoberta de

qualquer património histórico ou arqueológico, a Concessionária terá de actuar diligentemente,

empregando os recursos necessários para a resolução da situação. O Concedente, por outro

lado, assume o risco de não ter a infra-estrutura disponível na data acordada.

4.4.10 RISCO DE DISPONIBILIDADE

O risco de disponibilidade é suportado pelo parceiro privado, todavia o parceiro público absorve

parte deste risco, pois, se, por um lado, o modelo de negócio prevê que os pagamentos que a

Concessionária recebe durante o período de operação variam consoante a disponibilidade

verificada, por outro, nos casos de indisponibilidade, a dedução respectiva não reflecte os reais

prejuízos causados pela indisponibilidade. A diferença entre a dedução e valor real do prejuízo

será suportada pelo Estado.

4.4.11 RISCO DE PROCURA

O tráfego real do sistema é um dos parâmetros que influenciam o valor dos pagamentos

periódicos do Estado à Concessionária da infra-estrutura. Este conduz a um aumento ou

diminuição de, no máximo, 3% do valor total do pagamento após as restantes deduções

aplicadas. Esta condição integra o esquema de performance e tem o objectivo de incentivar à

colaboração entre os vários parceiros para maximizar o uso das linhas ferroviárias. A

Concessionária suporta assim uma parte muito reduzida deste risco. O modelo de negócio para

a operação do serviço ferroviário não está ainda definido, mas provavelmente será o Estado a

assumir o risco de procura.

Como se verificou em vários casos de PPP analisados, os níveis de tráfego previstos na

montagem dos processos de contratação verificaram-se, posteriormente, demasiado

optimistas. Este tipo de situação provoca o desequilíbrio do modelo de negócio estruturado

para o projecto e tem sido o principal motivo de insucesso das PPP em projectos de alta

velocidade. Enquanto a Concessionária depende apenas do seu desempenho para atingir os

45

seus objectivos finais, o lucro, o Estado depende dos níveis de procura do serviço para que o

Projecto seja sustentável. Este é um tipo de risco cuja mitigação é muito difícil, dependendo de

múltiplos factores incontroláveis pelas partes envolvidas, e especialmente num eixo

internacional como é o caso do troço Poceirão/Caia que se insere no eixo Lisboa/Madrid.

4.4.12 RISCO DE INTEGRAÇÃO

Este risco, também apelidado de risco de interface, surge quando existe um conjunto de

subprojectos, que se encontram integrados num mesmo projecto, e que contribuem para este

como um todo. O modelo de negócio do Projecto RAV caracteriza-se pela desagregação

horizontal e vertical da cadeia de valor que deram origem a vários interfaces. Este risco é

sobretudo gerido pelo parceiro público, que é responsável pela gestão dos contratos. A sua

mitigação no Projecto em estudo passou essencialmente pela forma como o modelo de

negócio foi estruturado, conforme foi referido no capítulo 4.1 e será mais desenvolvido no

capítulo 6 referente à análise SWOT . Um dos poucos riscos que se inserem neste tipo e são

geridos pelo parceiro privado são os problemas de compatibilidade electromagnética que

poderão surgir no interface entre a infra-estrutura e a operação.

Dado que o parceiro público possui uma visão geral de todo o projeto da rede de alta

velocidade e é responsável pela gestão dos contratos, este analisa e lista todas as situações

passíveis de gerar conflitos entre as diversas componentes e define as respectivas formas de

mitigação, atribuindo em contrato a responsabilidade pela execução destas aos parceiros

privados.

4.4.13 RISCO DE MANUTENÇÃO

Os riscos de manutenção decorrem, na sua maioria, da qualidade do processo construtivo, dos

materiais utilizados e da realização, no tempo certo, das intervenções correntes e das grandes

intervenções. A falta de qualidade associada è infra-estrutura ferroviária despoleta

necessidades de manutenção mais exigentes ao longo da sua vida útil. Uma falha da infra-

estrutura pode desencadear falhas na circulação ferroviária, afectando o tráfego e a qualidade

do serviço prestado.

O contrato de concessão incumbe à Concessionária o dever de manter o empreendimento

concessionado em bom estado de funcionamento, de operacionalidade, de manutenção e

conservação e segurança, realizando de imediato os trabalhos de manutenção, de

conservação, de reparação, de renovação e de adaptação que sejam necessários para que o

empreendimento concessionado satisfaça o fim a que se destina. O incumprimento das

obrigações de manutenção, por parte da Concessionária, concede o direito ao Concedente de

rescindir o contrato de concessão.

46

As condições dos activos, a par da disponibilidade do sistema, são um dos inputs do esquema

de avaliação do desempenho da Concessionária, do qual depende o valor do pagamento que o

Estado efectua ao parceiro privado. O parceiro privado assume assim, integralmente, o risco de

manutenção da infra-estrutura.

4.4.14 RISCO DE FORÇA MAIOR

O risco de força maior está relacionado com os custos que possam surgir do resultado da

ocorrência de casos de força maior. Estes são, por definição, acontecimentos imprevisíveis e

irresistíveis, como por exemplo, actos de guerra, terrorismo, inundações graves ou tremores de

terra.

A ocorrência de um caso de força maior exonera a Concessionária da responsabilidade pelo

incumprimento das obrigações emergentes do contrato de concessão que sejam directamente

por ele afectadas. Esta situação poderá dar lugar à reposição do equilíbrio financeiro ou, caso

a impossibilidade de cumprimento do contrato de concessão se torne definitiva ou a reposição

do equilíbrio financeiro seja considerada excessivamente onerosa pelo Concedente, à

resolução do contrato de concessão.

Se o caso de força maior corresponder, desde pelo menos 6 meses antes da sua verificação, a

um risco segurável em praças da União Europeia, por apólices comercialmente aceitáveis, a

Concessionária não fica exonerada do cumprimento, pontual e atempado, das obrigações que

constam no contrato de concessão. Há lugar à reposição do equilíbrio financeiro, apenas na

medida da perda de receitas ou do aumento de custos sofridos, pela Concessionária, que seja

superior à indemnização que seria aplicável ao risco em causa. Caso a Concessionária se

encontre impossibilitada, de modo definitivo, de proceder ao cumprimento das suas obrigações

constantes no contrato de concessão ou caso o Concedente considere a reposição do

equilíbrio financeiro da concessão excessivamente onerosa, há lugar à resolução do contrato

de concessão, devendo a Concessionária pagar ao Concedente o valor da indemnização que

seria aplicável ao risco em causa.

4.4.15 MATRIZ SÍNTESE DE ALOCAÇÃO DE RISCOS

Apresenta-se no quadro 4.10 a matriz de risco do contrato de concessão RAV Poceirão/Caia

RAVE (2008b).

47

Quadro 4.10 Matriz de partilha de riscos do contrato de concessão RAV Poceirão/Caia (Legenda: A -

Alta, M - Média, B - Baixa)

Riscos

Alocação do Risco Probabilidade de Ocorrência

Nível de Impacto

Público Privado

Político X A A

Legal X X M M

Concurso X B B

Planeamento e Concepção X X B M

Financiamento X M M

Expropriações X M B

Construção X M M

Ambiental X B M

Arqueológico X X B M

Disponibilidade X B A

Procura X M M

Integração X X B M

Manutenção X M M

Força Maior X X B A

4.5 GESTÃO DO CONTRATO

4.5.1 MONITORIZAÇÃO DO DESEMPENHO

O objectivo da monitorização da performance do parceiro privado é fornecer ao parceiro

público uma melhor compreensão da sustentabilidade do projecto. Assim, é essencial que se

efectuem reuniões regulares de forma a acompanhar as realizações e o desempenho da

Concessionária em todas as fases do projecto.

A monitorização da performance do parceiro privado é o processo que vai permitir calcular o

valor dos pagamentos a efectuar pelo Estado. Deste modo, é necessário que haja um bom

entendimento, de ambas as partes da parceria, sobre a relação entre os requisitos dos outputs,

o sistema de medição de desempenho e o método de cálculo das deduções no mecanismo de

pagamento.

De acordo com a Partnerships Victoria, a monitorização da performance pode ser estruturada

atendendo aos seguintes parâmetros:

48

a) Conhecimento do modelo de negócio

É essencial que a entidade que gere o contrato perceba o modelo de negócio do projecto e

tenha em mente os objectivos do Estado no projecto em causa. O modelo de gestão do

desempenho deve estabelecer a ligação entre os parâmetros sujeitos a avaliação e os

resultados desejados pelo parceiro público.

No contrato analisado, o output que o Estado pretende é uma linha ferroviária de alta

velocidade disponível para a operação do serviço correspondente, com as características por

este inseridas no contrato e que cumpra as normas que se apliquem a este tipo de infra-

estrutura. Deste modo, os indicadores de desempenho criados para a sua avaliação foram a

própria disponibilidade da linha na sua funcionalidade total e a condição dos seus activos,

conforme já referido no ponto 4.1.

A calibração do regime de performance teve o objectivo de relacionar o desempenho da

Concessionária com o impacto real das suas falhas mas não reflectir nas deduções o real

impacto financeiro causado, dando a oportunidade à Concessionária para corrigir processos. O

modelo de disponibilidade montado envolve o registo de todos os eventos que afectam a

disponibilidade, o cálculo das unidades de indisponibilidade acumuladas em cada período de

desempenho e a determinação das deduções mensais de indisponibilidade.

A compreensão do negócio é um dos passos mais importantes na montagem do modelo de

desempenho. Para isso é necessário conhecer os fluxos de caixa, através do conhecimento

dos variados custos e das obrigações para com as entidades financiadoras, bem como ter

conhecimento da matriz de risco envolvida e eventuais alterações a ter em consideração ao

longo da vida do projecto.

O concurso relativo à PPP1 implicava a inclusão nas propostas das estimativas dos custos de

construção e manutenção, deste modo o parceiro público tem, no início do projecto, o

conhecimento da perspectiva do parceiro privado sobre estes valores. No período de

construção e manutenção, o contrato estabelece a obrigatoriedade da Concessionária

apresentar ao Concedente, semestralmente, as actualizações do modelo financeiro que

resultem, nomeadamente, da evolução real da concessão e as actualizações da condição

financeira da Concessionária desde a entrada em vigor do contrato de concessão até ao termo

do semestre anterior, bem como uma projecção da sua posição entre esse período e o termo

previsto da concessão.

Em relação às obrigações para com as entidades financiadoras, os contratos de financiamento

são do conhecimento do parceiro público e o contrato de concessão prevê que a substituição,

suspensão, modificação, cancelamento ou rescisão dos contratos de projecto requer a

aprovação prévia do Concedente.

49

b) Análise da qualidade subjacente do projecto

A qualidade do projecto é avaliada pelos aspectos relativos à estrutura organizacional do

parceiro privado e à sua situação financeira, a qualidade das equipas de gestão e técnicas, a

performance do serviço e a monitorização entre as partes.

É essencial que a entidade pública tenha perfeito conhecimento da estrutura organizacional do

parceiro privado, de modo a poder aferir se existe uma actualização regular do modelo de

organização, se a Concessionária possui uma cultura de redução de custos e de

implementação da qualidade, e se as suas unidades organizacionais trabalham em sinergia

para o objectivo proposto.

Em relação ao conhecimento, por parte do parceiro público, sobre a estrutura organizacional do

privado e a qualidade das equipas de gestão e técnicas, não existem referências concretas no

contrato. Dada a subjectividade da matéria, esta avaliação ao parceiro privado deve ser feita

através dos resultados obtidos por este no desenvolvimento das suas tarefas.

No que diz respeito à situação financeira da Concessionária, em cada ano da concessão,esta

fornece ao Concedente os documentos legalmente exigidos, bem como a certificação legal de

contas, o parecer do órgão de fiscalização e o relatório dos auditores externos respeitantes ao

ano anterior. Para além das obrigações legais referidas, a Concessionária faculta ao

Concedente, ou a qualquer entidade por este nomeada, livre acesso a todo o empreendimento

concessionado, bem como a todos os livros de actas, listas de presenças e documentos

anexos relativos à Concessionária, livros, registos e documentos relativos às instalações e

actividades objecto da concessão, incluindo as estatísticas e registos de gestão utilizados, e

presta sobre todos esses documentos os esclarecimentos que lhe forem solicitados.

O contrato estabelece ainda, em várias cláusulas, a obrigação da Concessionária manter o

Concedente regularmente informado sobre: o património que integra a concessão; a

titularidade das acções da Concessionária; as entradas de fundos relativos ao Acordo de

Subscrição de Capital; a composição do ACE10

e do operador de manutenção.

c) Relatórios de informação

Os relatórios de desempenho devem ser executados diariamente e têm o objectivo de avaliar a

conformidade entre o nível de serviço que está a ser fornecido e os requisitos acordados entre

o Estado e a Concessionária, e também pretendem avaliar as medidas correctivas aplicadas

pela Concessionária quando não atingidos os parâmetros de desempenho acordados.

A monitorização deve focar-se nos outputs fornecidos pela Concessionária. O parceiro público

deve evitar o controlo dos processos utilizados e dos inputs, procedimento comum no modelo

de contratação tradicional, pois, normalmente, estes estão associados aos riscos que a

10

Agrupamento Complementar de Empresas, constituído por alguns membros do consórcio vencedor do concurso que é responsável pelas actividades de projecto e construção da infra-estrutura ferroviária.

50

Concessionária está responsável por gerir. O parceiro público não deve investir recursos na

monitorização de factores sob os quais delegou responsabilidade ao parceiro privado e ―pagou‖

por isso.

Os sistemas de monitorização impostos pelo parceiro público devem ser sujeitos a auditorias

periódicas com realização de controlos aleatórios no local de modo a garantir que os relatórios

apresentados traduzem fielmente o executado no local.

Fase de desenvolvimento

No contrato analisado, o controlo da fase de construção é efectuado mediante a apresentação,

pela Concessionária, a cada seis meses, de um relatório geral de progresso, tendo em

consideração o previsto no Calendário de Factos Relevantes, e a cada três meses, dos planos

parcelares de trabalhos. O Concedente pode ainda solicitar directamente à entidade

fiscalizadora quaisquer esclarecimentos ou informações.

Conforme já referido, ao longo de toda a concessão, a Concessionária faculta ao Concedente,

ou a qualquer entidade por este nomeada, livre acesso a todo o empreendimento

concessionado, bem como a todos os documentos relativos às instalações e actividades

objecto da concessão e presta sobre todos esses documentos os esclarecimentos que lhe

forem solicitados.

Nesta fase, é exigida a contratação de uma entidade de acompanhamento ambiental e esta

deve apresentar a ambos parceiros relatórios trimestrais com a descrição, resultados e

conclusões do trabalho desenvolvido no período decorrido.

Fase de disponibilidade

Na fase de disponibilidade, a Concessionária é responsável por entregar, a cada três meses,

um relatório sobre todos os eventos relativos aos três períodos de desempenho. Para além

deste relatório, o Estado recolhe informações sobre o desempenho da Concessionária através

do operador dos serviços ferroviários e das suas próprias equipas de fiscalização.

O contrato estipula que o Estado aplica as deduções em cada período de desempenho sem

consultar a Concessionária. Sempre que esta discordar das decisões do Estado, deve

demonstrar provas do seu ponto de vista.

De modo a incentivar a Concessionária a monitorizar o seu próprio desempenho, foram

introduzidos no contrato os conceitos de ―falhas declaradas‖ e ―falhas detectadas‖. Se a

Concessionária assumir nos relatórios as suas falhas, são aplicadas as penalizações normais.

Se o Estado detectar falhas que não estão incluídas nos relatórios da Concessionária, são

aplicadas penalizações mais elevadas.

Em relação à qualidade das actividades a realizar pela Concessionária, o contrato prevê que

esta implemente, mantenha e actualize continuamente um sistema de gestão da qualidade

51

referente às actividades por si desempenhadas. A demonstração da permanente conformidade

do Sistema de Gestão da Qualidade com as Normas referidas no contrato pode ser objecto de

auditorias e testes a realizar, sempre que o Concedente entenda necessário.

4.5.2 MONITORIZAÇÃO DO RELACIONAMENTO ENTRE AS PARTES E GESTÃO DE CONFLITOS

A longa duração das PPP implica que haja um bom relacionamento entre os parceiros de modo

a permitir que ambos atinjam os seus objectivos. É, deste modo, imprescindível, o

estabelecimento de uma comunicação contínua entre ambos que permita uma eficaz

monitorização do contrato. Subjacente a esta cooperação está o entendimento e a

compreensão dos objectivos de cada uma das partes e dos objectivos comuns.

É de primordial importância reconhecer que conflitos e problemas de prestação de serviços

possam surgir. O principal objectivo a ter em consideração nestes casos é o de assegurar que

estes sejam reconhecidos e resolvidos de uma forma rápida e eficaz

Neste sentido, é essencial que se estabeleça um procedimento de troca de informações de

modo a resolver-se mais rapidamente os problemas que surjam no decorrer da concessão.

Relativamente a este ponto, o contrato estabelece, na cláusula 21.ª, algumas obrigações de

informação da Concessionária. Estas referem-se a acontecimentos que prejudiquem ou tornem

mais onerosa a entrega do serviço e obrigam à entrega de um relatório preliminar e outro mais

exaustivo sobre o acontecimento com indicação das medidas tomadas ou a implementar para a

superação da situação. De modo a incentivar ao acautelamento e o estabelecimento de

mecanismos de resolução rápida deste tipo de situações por parte da Concessionária, a

cláusula 78.ª estabelece sanções pelo incumprimento dos seus deveres ou obrigações

estabelecidas em contrato. Os casos mais graves podem dar origem ao sequestro ou rescisão

da concessão por parte do Concedente.

Relativamente à resolução de conflitos, o contrato prevê o recurso ao processo de arbitragem

que é bastante mais célere do que um processo judicial e não permite o recurso das decisões

tomadas pelo tribunal.

4.5.3 FLEXIBILIDADE DO CONTRATO

Como já foi referido, em contratos de longo prazo, o número e o tipo de variáveis podem

mudar. Por conseguinte, é essencial que estas mudanças sejam previstas no contrato. As

mudanças referidas podem ser originadas por um dos parceiros ou por alterações à legislação,

por exemplo. A flexibilidade de um contrato é o parâmetro que vai permitir responder a estas

mudanças que, normalmente, dão origem a alterações no perfil de risco e nos custos do

projecto. O objectivo é evitar as divergências entre os parceiros perante este tipo de situação.

52

O contrato dita que as possíveis alterações à legislação nacional e comunitária,

designadamente à lei fiscal e à lei ambiental, não conferem direito à reposição do equilíbrio

financeiro da concessão. Mas uma possível alteração das Normas Técnicas que imponha

alterações das características técnicas de base para a infra-estrutura do troço ou alterações

das características geométricas da linha, ou que imponha o recurso à aplicação de novas

tecnologias em sistemas e equipamentos de utilização global, que não tenham sido exigidos à

data da implementação da solução adoptada, confere à Concessionária direito ao reequilíbrio

financeiro.

Em relação à gestão do risco de interfaces, o contrato dispõe de medidas de forma a ter em

consideração os interfaces horizontais e vertical existentes, com particular atenção ao

problemas que podem surgir entre a superstrutura e a sinalização e os sistemas de

telecomunicação.

A cláusula 100.ª admite a existência de alterações à proposta, por parte da Concessionária, em

qualquer das fases do Projecto, protegendo os interesses do parceiro público e vinculando esta

possibilidade à sua autorização. Esta cláusula incentiva ainda à inovação dos processos

construtivos por parte do parceiro privado ao atribuir todos os benefícios económicos derivados

desta alteração à Concessionária. Em relação a alterações impostas pelo parceiro público,

estas conferem à Concessionária o direito à reposição do equilíbrio financeiro, salvo se as

alterações tiverem a natureza de correcções de incumprimento por parte da Concessionária.

Caso as alterações sejam determinadas na fase de construção, na referida reposição do

equilíbrio financeiro ter-se-á por base a listagem de preços unitários incluída na proposta ou

uma lista a acordar previamente à execução das obras. Caso as alterações sejam

determinadas após a fase de construção, o contrato prevê a adopção dum procedimento

concursal para a sua execução.

Um dos aspectos mais importantes na gestão de um contrato de PPP é a reposição do

equilíbrio financeiro. O contrato analisado prevê a possibilidade da Concessionária ter direito à

reposição do equilíbrio financeiro nos seguintes casos: modificação unilateral, imposta pelo

parceiro público, das condições de desenvolvimento das actividades integradas na concessão;

ocorrência de casos de força maior, excepto se, em resultado dos mesmos, se verificar a

resolução do contrato de concessão; e outras várias situações, especificadas pelo contrato,

relacionadas com os riscos suportados pelo parceiro público que estão em linha com a partilha

de riscos analisada no capítulo anterior. As situações referidas conferem o direito à reposição

do equilíbrio financeiro se, em resultado directo do seu acontecimento, se verifique, para a

Concessionária, aumento de custos e ou perda de receitas, independentemente de os mesmos

terem sido, ou não, efectivamente incorridos.

O contrato prevê procedimentos de comunicação, devidamente documentados, entre os

parceiros e obriga a que estes cheguem a um acordo sobre a responsabilidade pela situação

que dá origem à reposição do equilíbrio financeiro e sobre os valores aí envolvidos. Estes

53

valores são calculados através do Caso Base, documento que representa a equação financeira

sobre a qual assentam os pressupostos macroeconómicos e microeconómicos do projecto de

PPP e que traduz a condição financeira do parceiro privado. O equilíbrio financeiro é atingido

mediante a reposição dos valores de cash flow contidos no Caso Base.

O contrato regula também o refinanciamento da concessão, podendo este processo ser

iniciado por qualquer dos parceiros público ou privado, e dita que os custos com o processo e

os proveitos são repartidos em partes iguais pelos parceiros.

Em relação ao termo do contrato e continuidade do serviço, a cláusula 90.ª define a duração

residual mínima que os activos da concessão devem ter no termo do contrato, e é imposto à

Concessionária que demonstre que os activos encontram-se nas condições definidas. No

entanto, o contrato não especifica o modo como deve ser realizada a referida demonstração.

O contrato não prevê medidas para a transferência de conhecimento da Concessionária para o

parceiro público de modo a que este possa desenvolver as actividades inerentes à concessão,

da qual depende a disponibilidade da linha.

4.5.4 PLANOS DE CONTINGÊNCIA

A possibilidade da ocorrência de atraso em relação às datas constantes do Calendário de

Factos Relevantes está prevista no contrato. A resposta a esta situação está na elaboração

imediata de um Plano de Recuperação de Atrasos que tem de conter a indicação do reforço de

meios para o efeito necessários, bem como o respectivo custo e a imputação da

responsabilidade pelo seu pagamento, tal como entendida pela Concessionária. Este plano

está sujeito à aprovação do Concedente e, caso esta seja negada, o Concedente pode impor à

Concessionária a adopção das medidas que entender adequadas e/ou o cumprimento de um

Plano de Recuperação de Atrasos por ele elaborado.

O contrato prevê a possibilidade de resgate da concessão nos últimos 10 anos de vigência

desta. Nesta situação, o parceiro público assume todos os direitos e obrigações da

Concessionária, e esta tem direito a uma indemnização.

Em caso de incumprimento grave, pela Concessionária, das suas obrigações, ou estando o

mesmo iminente, o parceiro público pode proceder ao sequestro da concessão, tomando a seu

cargo o desenvolvimento das actividades integradas na concessão pelo período de tempo

necessário para restabelecer o normal funcionamento da concessão.

Situações de incumprimento considerado muito grave sem posterior correcção ou reparação

das consequências, permitem ao parceiro público rescindir o contrato, tendo direito a uma

indemnização. O contrário também se aplica.

54

5 O PROJECTO TAV

5.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

A implementação de uma linha ferroviária de alta velocidade entre Rio de Janeiro e São Paulo

é um projecto do governo federal com o objectivo de ligar as duas principais metrópoles

brasileiras. Um projecto antigo do Estado de São Paulo para a alta velocidade ferroviária previa

o estabelecimento de uma ligação entre Campinas e a cidade de São Paulo, chamado

Expresso Bandeirantes. A inclusão da ligação ao Rio de Janeiro aconteceu mais recentemente

por responsabilidade do governo federal. O principal objectivo é aliviar o congestionamento

existente nas ligações aéreas e rodoviárias entre Campinas, São Paulo e o Rio de Janeiro, e

dotar a região mais populosa do Brasil de um sistema de transporte rápido, cómodo e

sustentável ao nível ambiental. Um dos objectivos secundários era a conclusão do projecto e

consequente início da exploração do serviço a tempo do Campeonato do Mundo de Futebol de

2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016.

A ferrovia terá cerca de 510 km de extensão e ligará os dois maiores aeroportos internacionais

do Brasil: o Aeroporto Internacional Governador André Franco Montoro (Guarulhos) em São

Paulo e o Aeroporto Internacional Maestro Antonio Carlos Jobim (Galeão) no Rio de Janeiro. A

figura 5.1 apresenta o traçado referencial da ferrovia.

Figura 5.1 Traçado referencial da linha ferroviária do Projecto TAV Rio de Janeiro/São Paulo (Fonte:

Halcrow – Sinergia 2009)

55

5.2 MODELO DE NEGÓCIO

5.2.1 MODELO DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA

O tipo de contratação pública adoptada foi a concessão de serviço público precedida de

execução de obra pública, regulamentada pela Lei n.º 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995. A

concessão diz respeito ao serviço público de transporte ferroviário de passageiros e abrange o

projecto, a construção, a operação, a manutenção e a conservação de todo o sistema. O

período de construção será de 6 anos seguido de 40 anos de exploração do serviço.

Como já foi referido no capítulo 2, segundo a legislação brasileira, este tipo de contratação

pública não permite a existência de pagamentos do parceiro público ao privado como a

modalidade jurídica PPP. Deste modo, o investimento privado é remunerado e amortizado

apenas mediante a exploração do serviço ferroviário, através da cobrança de tarifa aos utentes

e da exploração económica das estações e outras receitas extraordinárias decorrentes da

exploração da concessão.

5.2.2 REMUNERAÇÃO DO PARCEIRO PRIVADO

A Concessionária é remunerada através da cobrança de tarifa aos utilizadores do serviço

ferroviário e da exploração comercial das estações e outras receitas extraordinárias

decorrentes da exploração da concessão.

5.2.2.1 LIMITE DE PREÇOS

O preço máximo que será apresentado nas propostas dos concorrentes está limitada ao valor

de R$ 0,49 (€ 0,21) por quilómetro e é referente ao serviço ferroviário em classe económica

entre os municípios do Rio de Janeiro e São Paulo, com ou sem paragem em estações

intermédias. O trecho entre o município de São Paulo e Campinas não é limitado em termos de

tarifa.

O preço máximo definido na proposta vencedora é reajustado anualmente segundo a seguinte

fórmula:

( )

Em que:

IRT Índice de reajustamento para actualização monetária do valor da Tarifa-Teto;

56

IPCAi Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo de dois meses anteriores à

data do reajuste;

IPCA Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo do mês de Dezembro de

2008;

Factor X Factor que representa a projecção dos ganhos de produtividade da

Concessionária.

5.2.3 REGIME DE PERFORMANCE

De modo a incentivar a Concessionária a desenvolver as suas actividades com qualidade foi

estabelecido um regime de performance. Este modelo estabelece os indicadores sujeitos a

avaliação e respectivas penalizações em caso de incumprimento dos níveis mínimos

acordados. Estas penalizações serão baseadas numa percentagem da receita operacional

líquida apurada no período correspondente ao incumprimento. A monitorização do

desempenho será realizada pela própria Concessionária mediante apresentação de relatórios

periódicos sobre o seu desempenho ao parceiro público e através de solicitações de

informação efectuadas pelo parceiro público sempre que existir a necessidade.

O contrato prevê um período de adaptabilidade ao regime de desempenho, durante o qual não

será aplicado o valor total das multas previstas. No primeiro ano de exploração do serviço

comercial será cobrado 25% do valor das multas, no segundo ano 50% deste valor, e no

terceiro ano e seguintes será cobrado 100% do valor estabelecido.

De modo a diminuir o risco financeiro suportado pela Concessionária, o regime de performance

prevê a existência de tolerância na aplicação das multas. Na avaliação de cada indicador,

sempre que a Concessionária obtiver resultados muito próximos do nível mínimo exigido, não

será aplicada a penalidade correspondente. Para cada indicador em falha, a Concessionária

perde este benefício nos dois períodos de avaliação seguintes, e só voltará a tê-lo se obtiver

resultados iguais ou superiores ao nível mínimo durante dois períodos de avaliação seguidos.

Para cada indicador é definido um valor de tolerância.

De modo a evitar consecutivos desempenhos abaixo do nível mínimo, a partir do terceiro ano,

inclusive, é aplicado um sistema de progressividade das multas. Caso a Concessionária venha

a repetir desempenhos em desconformidade com o nível mínimo, em determinado indicador,

por mais de dois períodos de avaliação de desempenho consecutivos, o valor percentual da

multa a ser cobrada será dobrado. Caso se repita nos dois períodos seguintes, o valor será

dobrado novamente.

Em caso de reincidência no não cumprimento dos padrões exigidos em 4 dos indicadores ou

mais, durante 5 anos consecutivos, o Concedente poderá rescindir o contrato.

57

No anexo D são apresentados os indicadores de desempenho e a penalização correspondente

em caso de incumprimento. As penalizações mais elevadas referem-se à segurança de

utilizadores e trabalhadores, disponibilidade e pontualidade do serviço e satisfação dos

utilizadores. A destacar a subjectividade da aplicação de alguns indicadores como

correspondente à ―condição dos activos‖ à ―condição das Estações e Oficinas‖. O Concedente

não fornece um guia com especificações de conformidade para cada tipo de activo, tornando

esta avaliação subjectiva.

5.2.4 FINANCIAMENTO

O investimento está avaliado no contrato em cerca de € 13800 milhões.

No modelo de negócio proposto, a participação pública está restringida à garantia de um

possível financiamento com recursos públicos através do Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social (BNDES) e aos custos de expropriação e socio-ambientais. A garantia ao

financiamento é limitada ao menor dos seguintes valores, a saber: 60,3% do valor dos

investimentos a serem realizados pela Concessionária, conforme apresentado no seu plano de

negócios; ou € 8380 milhões.

Os custos socio-ambientais são relativos às intervenções necessárias efectuar em elementos,

como a rede viária existente ou áreas urbanas, que são afectados pela construção da nova

linha ferroviária.

Os custos com as expropriações e socio-ambientais estão avaliados em € 950 milhões e € 480

milhões, respectivamente. Esta contribuição pública será realizada por meio de participação

accionista detida por uma empresa pública, criada para o efeito, na Sociedade Veículo a quem

será adjudicada a concessão (Conselho Nacional De Desestatização 2010).

5.2.5 ALTERAÇÃO AO MODELO DE NEGÓCIO

Em Julho de 2011, após novo fracasso do concurso, a Agência Nacional de Transportes

Terrestres (ANTT) decidiu proceder a alterações no modelo de negócio separando a infra-

estrutura da operação e manutenção do sistema e admitindo a possibilidade da divisão da

construção da infra-estrutura em lotes (ANTT 2011). O início do novo concurso está previsto

para o final de 2011, neste momento a ANTT reavalia a documentação referente ao Edital de

modo a identificar as alterações técnicas e jurídicas necessárias efectuar para o lançamento do

novo concurso.

58

5.3 ACESSO AO NEGÓCIO

5.3.1 CONCURSO

O concurso público corresponde a um contrato de concessão de serviço público de transporte

ferroviário de passageiros precedido de obra pública cujo objecto é a concepção, construção,

operação, manutenção e conservação da respectiva infra-estrutura.

No procedimento do concurso, os concorrentes apresentam os seguintes documentos:

Garantia da Proposta: garantia de cumprimento da proposta apresentada. Esta tem o

valor de € 140 milhões e poderá ser prestada em dinheiro, títulos da dívida pública,

seguro-garantia ou garantia bancária;

Documentos de Pré-Qualificação: conjunto de documentos destinado a comprovar a

capacidade técnica do concorrente para desenvolver as actividades inerentes à

concessão;

Proposta Económica: documento que apresenta a tarifa máxima a cobrar aos

utilizadores do serviço em classe económica, com ou sem paragem em estações

intermédias, entre os municípios de Rio de Janeiro e São Paulo, em qualquer dos

sentidos;

Documentos de Qualificação: conjunto de documentos destinado a comprovar a

regularidade jurídica, fiscal e qualificação económico-financeira do concorrente;

Plano de Negócios: plano de negócios relativo à concessão;

Metodologia de Execução: documento que deve estar em conformidade com as

directrizes e os parâmetros técnicos definidos pelo parceiro público, que contém a

descrição completa da metodologia de execução a ser empregue na implementação do

objecto da concessão, o cronograma físico-financeiro dos trabalhos previstos e o

programa de Transferência e Absorção de Tecnologia.

O edital do concurso prevê a inversão da ordem das fases de habilitação e avaliação, opção

criada pela Lei n.º 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995. Em caso do 1.º classificado não obter

aprovação dos documentos de qualificação, serão analisados os documentos do 2.º melhor

classificado, e assim sucessivamente, até que um concorrente seja aprovado. A figura 5.2

apresenta a sequência das diferentes fases do concurso.

59

Figura 5.2 Fases do concurso público da Concessão TAV Rio de Janeiro/São Paulo

A fase de pré-qualificação veda o acesso às fases seguintes do concurso aos concorrentes que

não comprovem possuir experiência em obras e serviços de alta velocidade ferroviária ou do

mesmo nível de complexidade (em alguns parâmetros). A adopção desta fase pode estar

relacionada com a opção de inverter as fases de habilitação e avaliação de propostas pois

evita que se avalie a proposta de concorrentes que não cumpram esses requisitos mínimos.

Por outro lado não é espectável que consórcios sem capacidade para executar

empreendimentos desta dimensão, em valor e complexidade, se apresentem a concurso.

A inclusão de uma minuta do contrato de concessão no Edital do Concurso é imposta por lei.

Deste modo, os textos contratuais são definidos pelas entidades públicas e todos os

concorrentes possuem textos contratuais iguais nas suas propostas, focando-se apenas na

optimização das partes técnica e económico-financeira

Os estudos e projectos relevantes para o Projecto levados a cabo por entidades estatais são

postos à disponibilidade dos interessados de modo a servir de apoio à montagem das suas

propostas. O custo destes estudos é fixado no Edital e, posteriormente, pago pelo concorrente

vencedor do concurso.

5.3.2 CRITÉRIOS DE ADJUDICAÇÃO

A Lei n.º 8.987, de 13 de Fevereiro de 1995, estabelece os seguintes critérios possíveis e

respectivas regras para os concursos de concessões:

―I - o menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado;

II - a maior oferta, nos casos de pagamento ao poder Concedente pela outorga da concessão;

III - a combinação, dois a dois, dos critérios referidos nos incisos I, II e VII;

IV - melhor proposta técnica, com preço fixado no edital;

•Preparação dos documentos do concurso

•Anúncio Lançamento

•Avaliação dos documentos de pré-qualificação

Pré-qualificação técnica

•Apresentação e avaliação da proposta ecnonómica

•Classificação dos concorrentes Proposta Económica

•Qualificação jurídica, económico-financeira e técnica Qualificação do 1º classificado

•Adjudicação

•Assinatura do contrato Fecho

60

V - melhor proposta em razão da combinação dos critérios de menor valor da tarifa do serviço

público a ser prestado com o de melhor técnica;

VI - melhor proposta em razão da combinação dos critérios de maior oferta pela outorga da

concessão com o de melhor técnica; ou

VII - melhor oferta de pagamento pela outorga após qualificação de propostas técnicas.‖

O critério escolhido para o concurso em causa foi o menor valor do preço por quilómetro para o

serviço ferroviário em classe económica entre os municípios do Rio de Janeiro e São Paulo,

estabelecendo como valor máximo R$ 0,49 (€ 0,21) por quilómetro.

O tipo de competição esperada no concurso apenas envolve as propostas económicas,

concretamente o preço máximo a cobrar por um serviço específico num troço específico. A

qualidade técnica da proposta e o risco envolvido para o parceiro público não são sujeitos a

competição, sendo apenas sujeitos a aprovação, como já foi referido. Esta opção pode trazer

vantagens ao nível da celeridade do processo de contratação mas prejudica a qualidade do

serviço e não contribui para a minimização dos riscos que se pretende neste tipo de

contratação.

Deste modo, não existe um incentivo à qualidade técnica e à minimização de riscos. O foco dos

potenciais concorrentes está em cumprir os requisitos mínimos definidos no concurso e

apresentar o menor preço para o serviço especificado no critério de avaliação.

5.3.3 DEFINIÇÃO DO OUTPUT

Num concurso em que não existe uma competição que envolva a avaliação da qualidade

técnica e dos riscos para o parceiro público inerentes às condições apresentadas em cada

proposta, é essencial que se defina o mais detalhadamente possível o output pretendido. No

Projecto TAV, o output é definido, entre outros documentos, pelo Programa de Exploração.

O Programa de Exploração Ferroviária, para além de incluir o regime de avaliação do

desempenho da Concessionária, define os objectivos e as directrizes a serem observados

pelos concorrentes no desenvolvimento do Estudo Técnico de Engenharia. Fornece também

uma lista de parâmetros técnicos de referência para a metodologia de execução a apresentar

nas propostas pelos concorrentes. Estes parâmetros técnicos referidos são requisitos que

definem o output pretendido pelo Estado, não referindo o modo como este deve ser obtido.

O Edital remete para normas internacionais e brasileiras todos os aspectos por estas

abrangidos referentes a sistemas ferroviários de alta velocidade. Não excluindo outras de

aceitação internacional, refere as seguintes, a saber: os padrões técnicos europeus de

interoperabilidade (TSI), os padrões das Normas Europeias (ENS) e as publicações da União

Internacional de Ferrovias (UIC).

61

A entidade adjudicante definiu um traçado referencial, apresentando uma avaliação dos custos

de expropriações pelos quais o Estado assume responsabilidade. Não obstante da

Concessionária poder definir o seu próprio traçado, assumindo ambos os parceiros em partes

diferentes a possível diferença de custos.

Relativamente ao output em termos de serviço ferroviário a prestar aos utilizadores, o Edital

define, entre outros, os seguintes requisitos:

Estações Obrigatórias: O Edital define 9 locais que devem ser servidos por uma

estação ferroviária.;

Serviços: A Concessionária deve fornecer dois tipos de serviço, um directo e outro

com paragens em estações intermédias;

Tempo máximo de viagem: 93 minutos no serviço directo entre o município do Rio de

Janeiro e São Paulo, e 30 minutos entre o município de São Paulo e Campinas.

Intervalo de tempo entre comboios: no máximo 3 minutos.

Relativamente à infra-estrutura, são definidos requisitos sobre os seguintes elementos:

segurança, traçado e requisitos do sistema, via permanente e layout, conforto dos passageiros

na movimentação dos veículos, túneis e pontes, layout e instalações das estações, material

rolante e plataformas de acesso, instalações e sistemas operacionais, operação e controlo dos

veículos, energia, disponibilidade e manutenção, vida-úÚtil de projecto dos activos do sistema.

5.3.4 ANÁLISE DO CONCURSO

O concurso estava inicialmente previsto para Dezembro de 2010 mas, devido à inexistência de

propostas foi adiado para Abril de 2011. Em 2011 voltaria a ser adiado duas vezes, em Abril e

em Julho pela mesma razão.

A ausência de propostas pode ter várias justificações. Destacam-se as seguintes:

Risco elevado: O risco a suportar pela futura Concessionária é elevado, e

possivelmente excessivo, na medida em que esta é responsável pelos riscos mais

representativos como o de construção, operação, disponibilidade e procura. A

regulação por limite de preços também acresce o risco da Concessionária pois o limite

do preço pode não estar alinhado com custos que esta tem. Para além disso os

capitais por si investidos no projecto não têm remuneração garantida;

Desagregação da cadeia de valor: A inexistência desta desagregação gera uma

elevada complexidade na formação de consórcios com capacidade financeira e técnica

para desenvolver as actividades inerentes à concessão. As valências técnicas

necessárias vão desde a construção da infra-estrutura à operação e exploração

comercial do serviço, passando pela instalação dos sistemas de sinalização e

telecomunicações;

62

Capacidade das empresas: O sucesso das candidaturas brasileiras aos Jogos

Olímpicos de 2016 e ao Campeonato do Mundo de Futebol de 2014 e o recente

crescimento da economia brasileira geraram muitos investimentos em infra-estruturas

no país, que pode ter provocado a falta de meios que um projecto como o TAV requer;

Experiência e conhecimento das empresas: o facto do Brasil e dos países da

América do Sul ainda não possuírem sistemas ferroviários de alta velocidade limita

também o número de possíveis concorrentes com a experiência e conhecimento

exigidos no concurso.

Em Julho de 2011, após o novo fracasso do concurso, a ANTT decidiu alterar o modelo de

negócio separando a construção da infra-estrutura da operação e manutenção do sistema,

conforme referido no capítulo 5.1. Não apresentando detalhes sobre o novo concurso, remete

para o final de 2011 a apresentação do novo Edital.

5.4 PARTILHA DE RISCOS

5.4.1 RISCO POLÍTICO

O risco político advém da incerteza quanto às futuras acções do Governo e as suas

consequências no desenvolvimento do projecto. Este risco tem especial importância nos países

em desenvolvimento devido à inexistência da estabilidade política necessária à realização de

parcerias de longo prazo e de elevado investimento com entidades públicas.

O facto do risco de procura deste projecto ser gerido pelo parceiro privado aumenta a

importância do risco político pois, um possível Governo que não suporte o projecto através da

política económica, de transportes, entre outras, afecta de modo determinante os resultados

esperados do projecto.

Deste modo, o risco político é gerido pelo parceiro privado, já que é este que terá de lidar com

as consequências de decisões políticas que afectem o desenvolvimento do projecto.

De referir que o projecto TAV foi um dos temas de discórdia entre os principais candidatos à

presidência do Brasil nas eleições de 2010, contando com o apoio da actual presidente Dilma

Rousseff e a oposição de José Serra.

5.4.2 RISCO LEGAL

O Estado assume a responsabilidade por eventuais alterações de legislação ou de

regulamentos que afectem a Concessionária ao nível económico-financeiro, exceptuando

tratar-se de legislação relativa a impostos sobre o rendimento. O risco legal é, deste modo,

maioritariamente gerido pelo parceiro público.

63

5.4.3 RISCO DE CONCURSO

Este risco está associado à competitividade das propostas e ao calendário do concurso ao

nível de possíveis atrasos neste que adiem o início da exploração do serviço.

A dimensão, em valor e em complexidade técnica, do Projecto em causa, e a simultaneidade

de várias outros empreendimentos de infra-estruturas no país, são susceptíveis de afectar o

nível de resposta do mercado que, por sua vez, afecta a competitividade do concurso e

também, como aconteceu na realidade, o calendário do concurso.

O critério único referente às características económicas da proposta, associado à inversão das

fases de qualificação e avaliação, atribui extrema importância à definição do output pretendido

pelo Estado já que não são avaliadas todas as propostas ao nível da qualidade técnica.

5.4.4 RISCOS DE PLANEAMENTO E CONCEPÇÃO

A Concessionária será responsável pela gestão da circulação e alocação da capacidade, tendo

em consideração os níveis de procura por si inicialmente estimados e apresentados na sua

proposta e alguns requisitos definidos pelo Concedente no contrato, como por exemplo, a

obrigação de construir estações em locais definidos pelo Estado, garantir que estas são

servidas diariamente, ou ainda garantir que 60% dos assentos no comboio são referentes à

classe económica.

A responsabilidade do parceiro público ao nível destes riscos esgota-se na definição dos

requisitos mínimos que têm de ser tidos em consideração pela Concessionária e na aprovação

do traçado final. O Estado será responsável por uma eventual má qualidade dos serviços que

seja consequência de uma definição incompleta dos requisitos, mas não assume

responsabilidade por uma eventual quebra de receitas do Projecto devida a erros de

planeamento ou de concepção. A Concessionária assume assim a maior parte deste risco pois

os cash flows do projecto dependem do seu planeamento e concepção.

As indefinições do projecto ou posteriores alterações tardias por parte do parceiro público

incluem-se também nesta categoria de risco. Destaca-se neste ponto a falta de planeamento

da coordenação do futuro transporte ferroviário de alta velocidade aos outros modos de

transporte, especialmente nas zonas urbanas. Como ponto positivo destaca-se a antecipação

do Estado ao crescimento da procura ao determinar em contrato que a capacidade da infra-

estrutura deve permitir futura expansão.

Nos riscos de concepção inserem-se também os relativos à estabilidade da tecnologia utilizada

em alguns sistemas de alta velocidade, que ainda se encontram pouco testados.

64

5.4.5 RISCO DE FINANCIAMENTO

O parceiro privado assume a responsabilidade por todo o risco envolvido no financiamento

privado que necessitar para o Projecto. O risco a que o parceiro público está sujeito é referente

ao financiamento com garantia do Estado que o parceiro privado tem acesso.

Conforme referido no ponto 5.1, existe a possibilidade de um financiamento através BNDES no

valor máximo de cerca de € 8380 milhões, com garantia do Estado. Em Novembro de 2010, a

Medida Provisória nº 511, de 5 de Novembro de 2010, estabeleceu algumas medidas sobre

esta garantia que atribui ao parceiro público parte do risco financeiro.

A Medida Provisória estabelece que a Concessionária tem de apresentar uma contragarantia

de modo a poder usufruir da garantia do Estado. Esta contragarantia pode tomar duas formas:

acções da sociedade veículo ou a vinculação das receitas da concessão.

O risco assumido pelo Estado reside nesta definição da contragarantia. Em caso de

incumprimento da Concessionária, os activos financeiros previstos na contragarantia podem

não ter condições de compensar o Estado.. O mesmo se aplica ao segundo tipo de

contragarantia: se o projecto não gerar receitas suficientes para cobrir os custos, esta será uma

das razões do incumprimento do pagamento da dívida, não devia ser uma contragarantia.

A mesma medida estabelece que, caso a receita do projecto nos primeiros 10 anos de

operação seja inferior ao menor valor entre a receita apresentada na proposta vencedora da

concurso ou a receita projectada pelo Concedente, o Estado pode compensar o BNDES

através de um subsídio no valor máximo de € 2100 milhões referentes a juros devidos pela

Concessionária.

5.4.6 RISCO DE EXPROPRIAÇÕES

O parceiro público é responsável pela execução das expropriações e todos os processos

inerentes a estas. Este será responsável por eventuais atrasos nos processos de

expropriações que sejam a causa do atraso do início dos trabalhos de construção ou do início

da operação comercial do sistema.

Relativamente ao custo das expropriações, este será pago pelo parceiro público até o valor

máximo de € 950 milhões, que corresponde à avaliação do traçado referencial. Caso os custos

inerentes ao traçado proposto pela Concessionária sejam superiores aos do traçado

referencial, o custo acrescido é dividido pelos dois parceiros da seguinte forma:

65

( )

( )

Onde:

PPP Parcela do parceiro público;

PC Parcela da Concessionária;

VTR Valor do traçado referencial;

VTP Valor do traçado proposto.

5.4.7 RISCO DE CONSTRUÇÃO

Inserem-se nesta categoria de risco todos os acontecimentos que possam gerar desvios ao

nível dos custos ou prazos de construção.

A título de exemplo, podemos destacar os riscos relativos a problemas ambientais, às

condições geológicas e geotécnicas, problemas com entidades subcontratadas e os problemas

com a qualidade de gestão de projecto.

Relativamente ao tipo de infra-estrutura prevista, o traçado referencial é constituído por 91km

em túnel, 108km em ponte e 312km em superfície (Halcrow – Sinergia 2009).

A Concessionária é quem assume a totalidade dos riscos de construção do Projecto.

5.4.8 RISCO AMBIENTAL

Em relação aos estudos de impacte ambiental, a legislação brasileira obriga à obtenção da

aprovação ambiental prévia antes do processo de concurso, deste modo o Estado inclui nos

documentos do concurso um traçado referencial, já com aprovação ambiental, e define pontos

de passagem obrigatória e locais onde, obrigatoriamente, será construída uma estação

ferroviária. Como a Concessionária pode propor um traçado diferente na sua proposta, o

Estado pode ser obrigado a desenvolver um novo processo de aprovação ambiental e será

responsável por eventuais atrasos que possam surgir e que afectem o calendário acordado

com a Concessionária para o início dos trabalhos de construção e operação comercial.

5.4.9 RISCO ARQUEOLÓGICO

O contrato não prevê o risco arqueológico associado à construção da infra-estrutura.

5.4.10 RISCO DE DISPONIBILIDADE

O risco de disponibilidade está associado a situações que possam causar a indisponibilidade

da linha como as más condições dos activos que a constituem, problemas com os sistemas a

66

sinalização e telecomunicações ou a necessidade de manutenção fora dos horários previstos.

A Concessionária assume integralmente o risco de disponibilidade.

5.4.11 RISCO DE PROCURA

A multiplicidade de variáveis, e o seu carácter incontrolável, de que depende a procura de um

serviço como o ferroviário de alta velocidade, faz deste um dos maiores riscos envolvidos neste

tipo de empreendimentos. Neste caso, em particular, a maior parte do risco concentra-se no

troço Rio de Janeiro/São Paulo, já que os estudos de procura apresentam estimativas altas

para o troço São Paulo/Campinas. A limitação do preço a cobrar no serviço RJ/SP em classe

económica associada à fraca procura prevista para este troço pode afectar todo o

empreendimento e afastar potenciais interessados. Para sustentar uma parte deste risco, o

Estado, através da Medida Provisória n.º 511, de 5 de Novembro de 2010, autoriza-se a pagar

uma parte dos juros relativos ao financiamento do TAV por parte do BNDES, caso a receita

bruta da exploração do serviço ferroviário entre o primeiro e o quinto ou entre o sexto e o

décimo anos de operação, seja inferior àquela apresentada na proposta económico-financeira

do vencedor da concessão ou àquela projectada nos estudos apresentados pela ANTT, o

menor dos dois valores.

5.4.12 RISCO DE INTEGRAÇÃO

Os riscos de integração dizem respeito aos problemas que podem surgir na coordenação dos

vários trabalhos e tecnologias inerentes às diferentes componentes do sistema ferroviário

desde a subestrutura à gestão da operação. Os problemas de interface podem resultar em

atrasos do início das operações, custos acrescidos com possíveis alterações que sejam

necessárias executar, entre outras situações.

Como já foi referido no capítulo 4.1, os sistemas ferroviários apresentam uma cadeia de valor

constituída por várias componentes com diferentes características que necessitam de ser

coordenadas. No projecto em causa, exceptuado o planeamento até determinado nível, toda a

cadeia de valor foi incluída na concessão, sendo assim a Concessionária responsável por gerir

a coordenação das interfaces.

5.4.13 RISCO DE MANUTENÇÃO

Os riscos de manutenção estão relacionados com a possibilidade de ocorrência de falhas na

infra-estrutura que afectem a operação do serviço ferroviário quer ao nível do tráfego como ao

nível da qualidade do serviço.

67

A Concessionária é responsável por realizar de imediato os trabalhos de manutenção que

sejam necessário ao bom estado de funcionamento do empreendimento.

5.4.14 RISCO DE FORÇA MAIOR

A assunção do risco relacionado com ocorrência de acontecimentos imprevisíveis e irresistíveis

que afectem o desenvolvimento das actividades inerentes à concessão depende da

possibilidade do acontecimento em causa poder ser objecto de cobertura por seguro no Brasil

na data da sua ocorrência. Assim, caso o risco em causa possa ser segurável, a

Concessionária assume o risco, caso contrário será o Estado a assumi-lo.

5.4.15 MATRIZ SÍNTESE DE ALOCAÇÃO DE RISCOS

Apresenta-se no quadro 5.1 a matriz de risco do contrato de concessão TAV Rio de

Janeiro/São Paulo.

Quadro 5.1 Matriz de partilha de riscos do contrato de concessão TAV Rio de Janeiro/São Paulo

(Legenda: ND - Não definido, A - Alta, M - Média, B - Baixa)

Risco

Alocação do Risco Probabilidade de Ocorrência

Nível de Impacto

Público Privado

Político X A A

Legal X M M

Concurso X B B

Planeamento e Concepção X X B M

Financiamento X X M M

Expropriações X X M B

Construção X M M

Ambiental X B M

Arqueológico ND ND B M

Disponibilidade X B A

Procura X M M

Integração X B M

Manutenção X M M

Força Maior X X B A

68

5.5 GESTÃO DO CONTRATO

5.5.1 MONITORIZAÇÃO DO DESEMPENHO

a) Conhecimento do modelo de negócio

Tendo em conta que as possíveis fontes de receita da Concessionária estão bem definidas, o

conhecimento do modelo de negócio traduz-se no conhecimento dos valores reais

provenientes das referidas fontes e, especialmente, dos custos inerentes às actividades que

constituem a concessão. Deste modo o parceiro público tem uma visão real da sustentabilidade

do negócio.

O contrato de concessão estabelece uma série de procedimentos de modo à Concessionária

manter o parceiro público informado sobre a procura dos serviços, os resultados da sua

exploração, a programação e execução financeira. A Concessionária deve ainda apresentar as

suas demonstrações financeiras com a frequência de três meses e as demonstrações

financeiras anuais devem ser devidamente auditadas por empresa de auditoria independente,

de acordo com as normas brasileiras de contabilidade.

Relativamente aos serviços prestados, a Concessionária deve apresentar ao Estado,

semestralmente, o seu plano de operação para o semestre seguinte com o detalhe dos

serviços a serem executados, assim como a frequência a ser adoptada e as tarifas a serem

cobradas, tendo em conta os requisitos mínimos definidos nos documentos do concurso.

O sistema de gestão de desempenho, o qual pode originar multas para a Concessionária, em

caso de incumprimento, será alvo de revisões de modo a calibrá-lo com o objectivo de

encontrar o equilíbrio entre os objectivos do parceiro público ao nível do output e as

capacidades da Concessionária. Não é do interesse do parceiro público que o sistema de

gestão de desempenho torne o modelo de negócio insustentável mas sim que forneça o

incentivo adequado à Concessionária para alinhar os objectivos públicos e privados. A primeira

revisão é feita no final do primeiro ano de operação comercial e as seguintes a cada cinco

anos.

b) Análise da qualidade subjacente do projecto

Esta análise da qualidade do Projecto, referida pela Partnerships Victoria, no seu documento

Contract Management Guide, é baseada no conhecimento do parceiro privado das

características da estrutura organizacional do parceiro privado. A incorporação de

procedimentos que permitam ao parceiro público obter este tipo conhecimento num contrato é

difícil pela sua natureza. Estas características da estrutura do privado podem antes ser aferidas

do seu desempenho, da sua situação financeira e do relacionamento que o privado mantém

com o parceiro público no desenvolvimento da concessão.

69

c) Relatórios de informação

Em relação aos procedimentos de registo de informação relevante, destaca-se no contrato de

concessão, na subcláusula 15.2, a indicação que os relatórios, registos e outros documentos

de informação relevante para a monitorização da concessão, por parte do parceiro público,

devem ser organizados em bases de dados em suporte informático e o acesso a estas é

assegurado em tempo real e sem qualquer restrição. O contrato acrescenta ainda que os

documentos originais referidos, após analisados e aprovados pela entidade competente, a

ANTT, devem ser arquivados na sua sede e mantidos até a extinção da concessão.

Em relação à informação financeira referente a todo o período de concessão, os relatórios

previstos são os mencionados na alínea a).

A Concessionária é responsável por dar conhecimento ao parceiro público de qualquer

acontecimento que altere de modo relevante o normal desenvolvimento da concessão,

incluindo, se for o caso, avaliações técnicas, com as medidas tomadas para resolver o

problema.

O contrato obriga a Concessionária à implementação de um sistema de gestão da qualidade

relativos à fase de construção e à fase de exploração comercial, que inclui medidas para

assegurar a actualização técnica e tecnológica de produtos e serviços e o desenvolvimento de

recursos humanos.

Fase de desenvolvimento

A Concessionária deve apresentar à ANTT as informações necessárias de modo a verificar o

cumprimento da Metodologia de Execução e do Projeto Executivo, incluindo os cronogramas

físico-financeiro das obras. Devem também ser apresentados relatórios periódicos com

informação detalhada sobre a qualidade ambiental ao longo da infra-estrutura, bem como os

impactos ambientais decorrentes da execução das obras.

Fase de disponibilidade

Conforme já referido na alínea a), relativamente aos serviços prestados, a Concessionária

apresenta, semestralmente, o seu plano de operação com o detalhe dos serviços a serem

executados, assim como a frequência a ser adoptada e as tarifas a serem cobradas, tendo em

conta os requisitos mínimos definidos nos documentos do concurso.

No desenvolvimento da operação do serviço ferroviário, a Concessionária produz relatórios

periódicos contendo os resultados observados dos Indicadores de Desempenho. Esta

monitoriza também volume de passageiros, atrasos e acidentes, com análise de pontos críticos

e medidas saneadoras implementadas ou a serem implementadas.

70

5.5.2 MONITORIZAÇÃO DO RELACIONAMENTO ENTRE AS PARTES E GESTÃO DE CONFLITOS

O acompanhamento do desenvolvimento da concessão que deve ser realizado pela entidade

pública provém da análise da informação fornecida pela Concessionária e da fiscalização que

esta entidade pode fazer por si própria ou por entidades por si nomeadas para o efeito. Como

já foi referido, o contrato estabelece várias obrigações da Concessionária relacionadas com o

registo de informação relativas ao seu desempenho e respectiva informação à Concessionária.

Subjacente a este acompanhamento deve estar o entendimento e a compreensão dos

objectivos de cada uma das partes e dos objectivos comuns. Um contrato não pode

estabelecer obrigações de ―bom relacionamento‖ entre os parceiros, mas deve conter

mecanismos de resolução de conflitos que são prováveis de acontecer.

No que diz respeito a esta gestão de conflitos, o contrato estabelece um procedimento

específico para a resolução de divergências de natureza técnica ou de natureza económico-

financeira. Nesta situação, é constituída uma comissão técnica, composta por três membros,

com conhecimentos aprofundados na matéria objecto da divergência. Cada parceiro nomeia

um dos membros e o outro é escolhido por comum acordo entre os parceiros.

Em relação a divergências relacionadas com o contrato de concessão ou aos contratos a este

associados, que não possam ser resolvidas de forma amigável por meio de negociações ou por

meio da comissão técnica referida no parágrafo anterior, estas devem ser resolvidas por

recurso à arbitragem.

5.5.3 FLEXIBILIDADE DO CONTRATO

As mudanças ao longo do desenvolvimento da concessão são esperadas, quer sejam por

alterações originadas pelos parceiros, por mudanças na legislação referente às actividades da

concessão ou pela própria evolução da concessão nas mudanças de fase (construção,

operação e conclusão da concessão). A flexibilidade de um contrato avalia-se pelo nível de

preparação que este possui para lidar com as consequências dessas mudanças que afectam,

entre outros factores, o perfil de risco do Projecto.

Em relação a modificações à legislação referente à concessão, o Estado assume a

responsabilidade pelas modificações que alterem a composição económico-financeira da

Concessionária, com excepção da legislação fiscal sobre os seus lucros.

O contrato prevê a possibilidade da proposta sofrer alterações técnicas sugeridas pela

Concessionária, mas estas só podem ocorrer durante a elaboração do projecto de execução,

antes do início dos trabalhos de construção, e estão dependentes da aprovação do parceiro

público.

Em relação à reposição do equilíbrio financeiro, a Concessionária dispõe desse direito em

situações relacionadas com os riscos assumidos pelo parceiro público que causem

71

efectivamente uma alteração das condições inicialmente acordadas. Em casos de reposição do

equilíbrio financeiro, a ANTT escolhe uma ou mais formas de proceder à recomposição. Entre

as possibilidades estão as seguintes:

Aumento ou redução do preço máximo cobrado aos utilizadores do serviço Rio de

Janeiro/São Paulo em classe económica;

Pagamento à Concessionária;

Modificação de obrigações contratuais da Concessionária, de forma proporcional e

directamente relacionadas ao evento provocador da recomposição;

Diminuição ou extensão do prazo para a construção ou do prazo para a operação,

manutenção e conservação do empreendimento.

Em relação ao termo do contrato, devem ser asseguradas as condições de continuidade do

serviço, de modo a evitar problemas nesta transição de competências. Também para esta fase,

é necessário definir as condições mínimas dos bens relativos à concessão. A este nível o

contrato determina que, até um ano antes do termo do contrato, a ANTT realizará uma

fiscalização detalhada de modo a avaliar a condição dos bens referidos e compará-la com os

requisitos mínimos de vida útil inseridos no contrato. O contrato prevê ainda que terceiros

serão autorizados a realizar pesquisas de campo quando se aproximar o termo contratual, de

modo a realizar estudos para a promoção de novos concursos ou realização de novas obras.

Uma das medidas mais importantes para assegurar a continuidade dos serviços é a obrigação

da Concessionária transferir o conhecimento da tecnologia para o parceiro público. Os

procedimentos relativos a esta transferência são descritos no anexo ao contrato Programa de

Transferência e Absorção de Tecnologia. A transferência de tecnologia compreende todos os

conhecimentos técnicos e científicos necessários à construção, operação e manutenção de

sistemas de transporte ferroviário de alta velocidade em condições operacionais compatíveis

com as do TAV Rio de Janeiro - Campinas.

5.5.4 PLANOS DE CONTINGÊNCIA

Ao longo da concessão é susceptível de ocorrer situações imprevistas que afectem o normal

desenvolvimento previsto dos trabalhos que envolvidos. O contrato deve possuir medidas que

permitam a sua resolução rápida.

Relativamente aos atrasos que poderão surgir no desenvolvimento dos trabalhos de

construção, o contrato analisado não dispõe de um mecanismo de resolução, mas incentiva a

Concessionária ao bom desempenho através da aplicação de uma multa por cada dia de

atraso do início da operação comercial do serviço. O mesmo se aplica a um possível atraso na

apresentação do projecto de execução.

72

O contrato prevê a possibilidade de sequestro da concessão por parte da ANTT, assumindo

esta as funções da Concessionária, em situações de incumprimento de normas contratuais,

regulamentares ou legais, ou devido à prestação desadequada do serviço. As receitas obtidas

durante o período da intervenção são utilizadas para a cobertura dos investimentos, custos e

despesas necessários para restabelecer o normal funcionamento do empreendimento. Se

eventualmente as receitas não forem suficientes para cobrir o valor dos investimentos, dos

custos e das despesas decorrentes da concessão incorridas pela ANTT, esta poderá recorrer à

Garantia de Execução do Contrato para cobri-las, integral ou parcialmente. Cessada a

intervenção, se não for extinta a concessão, os serviços objecto do contrato voltarão à

responsabilidade da Concessionária.

O contrato também prevê a possibilidade de resgate da concessão em qualquer altura, por

motivos de interesse público. Nesta situação, o parceiro público assume todos os direitos e

obrigações da Concessionária, e esta tem direito a uma indemnização.

Para situações mais graves, o contrato prevê a possibilidade do Concedente rescindir o

contrato mediante o pagamento de uma indemnização à Concessionária que se restringe ao

valor dos investimentos vinculados aos bens da concessão ainda não amortizados.

Em caso de incumprimento pelo parceiro público dos seus deveres acordados em contrato, a

Concessionária pode rescindir o contrato tendo direito a uma indemnização.

73

6 ANÁLISE SWOT

6.1 INTRODUÇÃO E DEFINIÇÃO DE ANÁLISE SWOT

A análise SWOT é uma ferramenta de planeamento estratégico usado para avaliar os pontos

fortes (Strenghts), os pontos fracos (Weaknesses), oportunidades (Opportunities) e ameaças

(Threats) envolvidos num projecto ou num empreendimento empresarial. O método envolve a

especificação dos objectivos do projecto e a identificação dos factores internos e externos que

são favoráveis e desfavoráveis à concretização dos objectivos.

Os pontos fortes e os pontos fracos estão relacionados com o ambiente interno, as decisões e

os níveis de performance que se pode gerir. As oportunidades e ameaças têm origem no

ambiente externo e estão relacionadas com factores provenientes do mercado e do meio

envolvente.

A análise que se realiza de seguida aborda os pontos fortes e os pontos fracos de cada

projecto com base nas decisões tomadas ao nível dos quatro parâmetros apresentados

anteriormente, a saber, o modelo de negócio, o acesso ao negócio, a partilha de riscos e a

gestão do contrato. As oportunidades e ameaças advêm sobretudo da resposta do tecido

empresarial na fase de concurso, da relação entre os concessionários das várias componentes

do sistema (no projecto português) e da sustentabilidade económica do serviço.

6.2 PROJECTO PORTUGUÊS

6.1.1 PONTOS FORTES

O modelo de negócio adoptado para o projecto da rede de alta velocidade portuguesa

apresenta uma desagregação da cadeia de valor, quer horizontal quer vertical, que

teoricamente traz grandes benefícios ao processo de contratação pública. A desagregação

vertical permitiu isolar componentes com elevado nível de especificidade de modo a não limitar

a formação de consórcios concorrentes devido à existência de poucos fornecedores deste tipo

de componentes. Permitiu também adequar os prazos de cada PPP à vida útil e rentabilidade

de diferentes tipos de componentes. A separação da operação do serviço ferroviário das

restantes componentes do sistema resultou no isolamento destas do risco de procura, que

poderia ter dificultado o financiamento ao projecto dada a dificuldade em mitigar este tipo de

risco.

A desagregação horizontal do conjunto da subestrutura e superstrutura em cinco PPP permitiu

obter contratos de valores comportáveis (entre € 800 e € 2100 milhões) e ao mesmo tempo

atractivos para o sector privado, adequando a sua dimensão ao tecido empresarial português e

74

aumentando, desta forma, o número de possíveis concorrentes. Esta desagregação permitiu

também um faseamento temporal do lançamento dos concursos.

A não inclusão da estação ferroviária de Lisboa nos contratos de PPP é uma opção justificada.

Esta será uma ampliação da estação do Oriente, que serve a rede ferroviária convencional. Os

trabalhos de construção irão interferir com estas linhas e será necessário um entendimento

entre os operadores da linha convencional e as equipas de construção. O risco de construção

envolvido e as demais restrições inerentes a esta obra são melhor geridos pelo Estado do que

por uma empresa privada, razões suficientes para a sua implementação em modelo de

empreitada pública.

A associação da remuneração do parceiro privado à avaliação do seu desempenho permite

alinhar os objectivos de ambos os parceiros – o lucro do privado e a disponibilidade da infra-

estrutura do público. O mecanismo de avaliação caracteriza-se pela sua clareza e facilidade de

aplicação.

Ao prolongar os pagamentos públicos ao longo da concessão, o Estado suaviza o seu impacto

financeiro nas contas públicas.

Relativamente ao processo de concurso, entre os aspectos positivos destaca-se a definição

clara dos requisitos mínimos a observar pelos concorrentes e a inclusão da metodologia de

avaliação de propostas no programa de procedimento que permitiu alinhar as características

destas com os objectivos do parceiro público desde a sua fase de preparação. A introdução da

minuta do contrato de concessão no caderno de encargos aumentou a probabilidade de se

obter, na fase de negociações, textos contratuais idênticos para os dois concorrentes, focando

a atenção desta fase nos aspectos técnicos e financeiros, onde a liberdade de concepção é

mais desejada.

A introdução de mecanismos de compensação dos concorrentes preteridos com propostas

meritórias viria a ajudar a não diminuir a atractividade do concurso de PPP que, devido à

complexidade normalmente envolvida nestes projectos e à consequente necessidade de maior

tempo de maturação, torna-se moroso. Esta medida contribui também para desincentivar

possíveis acordos entre concorrentes.

A publicitação antecipada do concurso e dos estudos projectos desenvolvidos pela RAVE

permitiu identificar os potenciais agrupamentos interessados no Projecto e apoiou desde o

início do processo a elaboração das propostas dos concorrentes, reduzindo o tempo

necessário para o efeito.

75

A partilha de riscos pelos parceiros teve em consideração as regras do Eurostat11

relativas à

inclusão dos investimentos em PPP nas contas públicas. Ao atribuir ao parceiro privado a

responsabilidade pelo risco de construção e disponibilidade, permitiu a exclusão das verbas

relativas aos pagamentos de desempenho, do orçamento de Estado.

A aprovação ambiental prévia, agora obrigatória por lei, reduz o risco ambiental associado a

possíveis alterações aos traçados após o concurso que levaria provavelmente a reposições de

equilíbrio financeiro onerosas para o Estado.

Relativamente à gestão do contrato, em termos gerais, são garantidas as condições

necessárias a uma eficaz gestão. Pode-se, no entanto, destacar a salvaguarda das condições

de reversão para o parceiro público no termo do contrato mediante o estabelecimento da vida

útil residual dos componentes, e a obrigatoriedade da Concessionária em comprovar as

referidas condições. É também garantido o acompanhamento efectivo das actividades

concessionadas através de relatórios de progresso periódicos, a garantia de livre acesso a todo

o empreendimento e aos documentos relativos à concessão e a disponibilidade da

Concessionária para o esclarecimento de qualquer situação. De referir ainda o incentivo dado à

Concessionária para esta monitorizar o seu próprio desempenho, com a criação dos conceitos

de ―falhas declaradas‖ e ―falhas detectadas‖, em que as penalizações nas segundas são

superiores às primeiras. Relativamente aos problemas de integração das diferentes

componentes, concretamente a superstrutura e os sistemas de sinalização e telecomunicação

(S&T), o contrato lista as funções da Concessionária na mitigação do risco de integração,

nomeadamente ao nível do cumprimento dos requisitos das infra-estruturas essenciais de

suporte aos sistemas de S&T; ao nível da compatibilidade técnica entre os seus sistemas e os

sistemas de S&T; da articulação dos seus ensaios de validação, de certificação e de

demonstração da segurança das infra-estruturas a seu cargo com as actividades homólogas da

concessão dos sistemas de S&T. A relação de dependência entre o início da montagem dos

sistemas de S&T e a finalização de algumas componentes da restante infra-estrutura foi

também tida em consideração no Calendário de Factos Relevantes com a obrigação da

Concessionária fornecer os elementos necessários à concepção dos sistemas S&T, e com a

obrigação da Concessionária ter concluídas as infra-estruturas necessárias à montagem dos

sistemas de S&T em datas específicas. O contrato tem o mesmo tipo de considerações para as

restantes interfaces.

Destaca-se também ao nível da gestão do contrato, a recorrência a um plano de recuperação

de atrasos que permite dar uma resposta rápida e eficaz a estes acontecimentos obrigando a

Concessionária a um reforço de meios até restabelecer as condições do calendário

previamente acordado.

11

O Gabinete de Estatísticas da União Europeia, para efeitos de contabilização nas contas públicas,

determina que o risco da construção e o risco de procura ou, em alternativa, o risco de disponibilidade

devem ser suportados pelo parceiro privado.

76

6.1.2 PONTOS FRACOS

A desagregação da cadeia de valor, quer horizontal quer vertical, diminuiu a atractividade que

um projecto como este possui a nível internacional, perdendo com isso a possibilidade do

estabelecimento de economias de escala e uma respectiva diminuição do custo. A par desta

hipótese, a desagregação deu origem a várias interfaces verticais e horizontais que podem

causar diversos problemas de integração das várias componentes do projecto que são

realizadas por diferentes entidades, implicando assim uma gestão e coordenação constante, ao

longo de todo o processo de implementação do projecto.

A desagregação implicou também o lançamento de várias PPP relativas às diferentes

componentes do projecto que, a par de outras PPP previstas para os sectores rodoviário,

saúde e energia (barragens) aumentou o risco de concurso. Para o aumento deste risco

contribuiu também a longa duração da fase de negociações.

Outro ponto fraco do modelo de negócio adoptado é o risco político associado à dependência

da PPP correspondente ao troço Lisboa/Poceirão que, com a PPP em estudo, completa o eixo

Lisboa-Madrid.

No mecanismo de remuneração definido no modelo de negócio as deduções aos pagamentos

de desempenho devido à indisponibilidade da linha não reflectem os prejuízos financeiros reais

causados. Provavelmente será o Estado a suportar este prejuízo pois nenhum futuro operador

do serviço ferroviário assumirá a responsabilidade por um risco sobre o qual não tem controlo.

A subjectividade inerente aos factores de avaliação das propostas referentes à qualidade e aos

riscos para o parceiro público não contribui para a transparência e a eficácia desejada para o

concurso.

A não adopção do Diálogo Concorrencial, através do qual o promotor poderia beneficiar do

conhecimento das entidades privadas interessadas no concurso, colmatando alguma

inexperiência técnica. O procedimento é também apontado por algumas experiências

internacionais como mais célere.

A introdução de modificações das condições de desenvolvimento das concessões noutros

sectores, como o rodoviário, tem sido a principal causa de reequilíbrios financeiros que são

normalmente bastantes penalizadores para o Estado (Marques e Silva, 2008). O contrato não

contém regras específicas que dificultem a introdução deste tipo de modificações.

6.1.3 OPORTUNIDADES

O facto do modelo de negócio para a operação dos serviços ferroviários ser delineado num

momento posterior ao resto do sistema permite ter mais tempo para melhor compreender o

77

funcionamento do recém liberalizado mercado internacional de passageiros12

; da mesma forma

que o isolamento da sinalização e sistemas de telecomunicação da restante infra-estrutura

possibilita também a sua contratação mais tardia, dando mais tempo à estabilização da

tecnologia envolvida (Fernandes et al. 2010).

A abrangência de toda a rede pela PPP relativa à sinalização e sistemas de telecomunicação

tornou-a mais atractiva para empresas a nível mundial dado o valor estimado de € 600 milhões

para a sua concretização, aumentando assim o nível de concorrência e beneficiando assim de

uma possível economia de escala neste âmbito.

O aproveitamento dos fundos comunitários disponíveis para o projecto que se encontra

inserido em três projectos prioritários da EU – PP3, PP16 e PP19.

A adopção de uma fase de negociação no processo de concurso aumentou a pressão

competitiva e permitiu uma maior maturação das propostas.

A delegação do risco de expropriações ao parceiro privado garante maior flexibilidade no

planeamento, que permite lidar com eventuais atrasos nas expropriações. Esta delegação

permite também ao parceiro privado conciliar a concepção e as expropriações.

O contrato inclui um incentivo claro à inovação dos processos construtivos, por parte da

Concessionária, ao atribuir a esta as mais-valias económicas que possam surgir das alterações

às técnicas construtivas que resultem em reduções de volume ou do valor da construção.

A adopção de um procedimento concurso em caso de alterações ao projecto impostas pelo

parceiro público após a fase de construção diminui o risco político associado a estas alterações

tardias que noutros projectos de PPP conduziram a indemnizações onerosas para o Estado.

6.1.4 AMEAÇAS

Uma das maiores ameças ao projecto surge da desagregação horizontal e vertical da cadeia

de valor. Os vários interfaces por ela criados podem dar origem a problemas de integração das

várias componentes do sistema. A interface que necessita de maior coordenação é entre a

superstrutura e a sinalização e sistemas de telecomunicação devido à ligação existente entre

ambas em termos construtivos.

Em relação ao concurso, há alguns pontos negativos que puseram em risco o seu sucesso. A

destacar a possibilidade, que se verificou efectivamente no decorrer do concurso, da

diminuição da pontuação dos factores de avaliação na fase de negociação, desde que a

pontuação global se mantenha ou aumente. Verificou-se uma degradação das condições das

características económicas das propostas, da 1ª fase de avaliação para a 2ª, essencialmente

12

O transporte internacional de passageiros é liberalizado desde Janeiro de 2010 e o de cargas desde

2007.

78

devido a duas razões: a não exigência de um elevado nível de comprometimento das entidades

financiadoras nas propostas na 1ª fase de avaliação; e a morosidade do concurso que sujeitou

as propostas à instabilidade dos mercados financeiros verificada no momento.

A simultaneidade de outros projectos de PPP noutros sectores como o da saúde, rodoviário ou

da energia (barragens) pode afectar a resposta do mercado, dado que grande parte das

empresas são as mesmas.

Em relação à partilha de risco, as maiores ameaças para o parceiro público são a constatação

de uma sobrestimação da procura do serviço ferroviário e o risco político que envolve a

concretização do projecto que, até ao momento, levou à sua suspensão, com encargos para o

Estado relativos a indemnizações à concessionária.

O contrato prevê também a partilha, em partes iguais para ambos os parceiros, dos benefícios

de um possível refinanciamento da concessão. Tendo em conta que a melhoria das condições

de financiamento podem surgir do bom desempenho da Concessionária, a partilha dos

benefícios nos termos referidos não incentiva à optimização de processos, redução de custos e

o bom desempenho em geral da Concessionária.

6.3 PROJECTO BRASILEIRO

6.2.1 PONTOS FORTES

A principal característica que se destaca no modelo de negócio do Projecto brasileiro é o facto

de não implicar pagamentos do parceiro público ao privado, resumindo-se o envolvimento

público directo no investimento aos custos das expropriações e aos custos socioambientais.

O financiamento com recursos públicos posto à disposição da futura Concessionária reforçou a

confiança que o parceiro público tem no sucesso do empreendimento e, deste modo, aumentou

a segurança dos consórcios nas negociações com investidores.

Do modelo de avaliação do desempenho da Concessionária, do qual podem surgir multas em

caso de incumprimento, destacam-se duas características positivas: o período de

adaptabilidade ao regime de desempenho que atribui dois anos à Concessionária para alinhar

os seus mecanismos de trabalho com os requisitos do parceiro público; e o sistema de

progressividade das multas que torna a repetição do mesmo tipo de incumprimento bastante

onerosa para a Concessionária.

Do acesso ao negócio destaca-se a celeridade do concurso devida à aplicação de um critério

de carácter exclusivamente económico que encurta bastante a fase de avaliação e também

devido inversão das fases de habilitação e avaliação, que faz com que seja necessário

proceder à fase de habilitação de uma só proposta.

79

Relativamente à gestão do contrato, há que destacar a criação de um sistema de informação

que regista dados e acontecimentos relevantes para a monitorização da concessão, que são

organizados em bases de dados em suporte informático e que permite o acesso do parceiro

público em tempo real, facilitando o processo de avaliação de desempenho. Outra medida a

destacar é a abordagem a conflitos de natureza técnica ou económico-financeira através da

criação de uma comissão técnica com profundo conhecimento da matéria que deu origem ao

conflito.

No último ano da concessão está prevista uma fiscalização detalhada aos bens da concessão,

por parte do parceiro público, de modo a avaliar o cumprimento dos requisitos de vida útil

definidos em contrato.

6.2.2 PONTOS FRACOS

No desenvolvimento do concurso, a qualidade técnica e o risco para o parceiro público

inerentes a cada proposta apresentada não são avaliados em ambiente de competição, mas

antes aprovados ou desaprovados os relativos à melhor proposta económica, traduzindo-se no

desincentivo à criação de VfM por partes dos concorrentes, sendo preferível apresentar uma

proposta com um preço máximo bastante baixo e cumprir os requisitos mínimos.

O facto da Concessionária, na exploração do serviço, estar sujeita a cumprir os requisitos

mínimos de qualidade técnica e estar sujeita à avaliação de desempenho não pode justificar a

não avaliação da qualidade e do risco das propostas apresentadas a concurso. A ocorrência de

falhas graves na prestação do serviço coloca, em último caso, as responsabilidades sobre o

Estado por se tratar de um serviço público.

A inexistência de mecanismos de compensação para concorrentes preteridos pode limitar a

competitividade do concurso. Estes mecanismos justificam-se neste tipo de empreendimento

dado o investimento necessário na preparação das propostas.

Um dos grandes riscos para o parceiro público surge das contragarantias exigidas ao privado

relativas à garantia pública do financiamento do BNDES. O valor das contragarantias está

directamente relacionado com o desempenho financeiro da concessão, e se este precisar da

garantia do Estado é muito provável que as contragarantias não possam cumprir o seu

desígnio.

6.2.3 OPORTUNIDADES

A elevada dimensão do empreendimento, devida à inclusão de todo o traçado e todas as

actividades inerentes ao serviço ferroviário numa só concessão, aumenta a atractividade para

grandes empresas internacionais, para além das brasileiras, e possibilita também ganhos de

poupança ao nível dos custos que é consequência da economia de escala que se instala.

80

A regulação por limite de preços, ainda que não se aplique a toda a extensão da linha nem a

todos os serviços, estimula a redução de custos e o incremento de eficiência e inovação por

parte da Concessionária.

De modo a que possa ser dada continuidade ao serviço ferroviário no termo do contrato, este

estabelece que a Concessionária deve transferir o conhecimento da tecnologia envolvida em

todo o processo ao parceiro privado.

6.2.4 AMEAÇAS

A regulação por limite de preços tem algumas desvantagens. O risco associado a este tipo de

regulação pode ser causador de alguma instabilidade na concessão. Destaca-se também a

dificuldade na definição do limite de preços e o risco que existe deste não estar alinhado com

os custos do empreendimento. Ao aplicar a regulação por limite de preços, a entidade pública

deve ter em conta que o principal objectivo dos privados é o retorno do investimento e que este

deve estar minimamente garantido de modo a atrair este investimento.

A especificidade de alguns componentes do empreendimento, sobretudo os relativos à

sinalização e sistemas de telecomunicação, pode significar um número diminuto de

fornecedores deste tipo de activos. Este facto, associado à necessidade de apresentar em

consórcio estes fornecedores, pode limitar o número de concorrentes. A elevada dimensão do

empreendimento, em valor e em complexidade, pode também levar ao mesmo resultado.

O critério único da melhor proposta económica, nos termos já apresentados no capítulo 5.2,

obriga a uma definição de requisitos mais exaustiva, limitando a liberdade de concepção do

parceiro privado. Ao não estabelecer um ambiente competitivo, o processo de avaliação do

concurso não reconhece o mérito da qualidade inerente às propostas nem incentiva a

inovação.

Na partilha de riscos, o destaque negativo diz respeito à vulnerabilidade da sustentabilidade do

projecto derivada do risco político. O facto da concessionária assumir na totalidade o risco de

procura torna-a dependente de futuras decisões políticas relativas à política económica, social,

de transportes, entre outras.

81

7 CONCLUSÕES

7.1 SÍNTESE CONCLUSIVA

A presente dissertação visou analisar individualmente e comparar os dois processos de PPP

implementados em Portugal e no Brasil relativos à implementação de sistemas de alta

velocidade ferroviária. Pretendia-se com esta análise abordar quatro parâmetros gerais das

PPP, a saber, o modelo de negócio, o acesso ao negócio, a partilha de riscos e a gestão do

contrato.

O modelo de negócio português caracteriza-se por uma desagregação horizontal e vertical da

cadeia de valor que permitiu adequar a dimensão, em valor e complexidade, do projecto às

características do tecido empresarial português. Porém, esta deu origem a várias interfaces

verticais e horizontais, que podem ser causadoras de vários problemas de integração se não

forem devidamente geridas e controladas desde a fase de contratualização das concessões à

fase de execução das actividades previstas.

Como é aconselhável no modelo de PPP, a remuneração do parceiro privado, no contrato

analisado, foi associada a um mecanismo de avaliação do seu desempenho que, ao colocar as

receitas da Concessionária em risco, funciona como incentivo ao provimento de um serviço ao

nível exigido pelas entidades públicas, sendo neste caso a disponibilidade da linha ferroviária o

objectivo principal.

Um dos factores essenciais para a concretização do projecto português foi a entrada do BEI no

financiamento do projecto na fase de construção, com cerca de 36% do investimento total

inicial, a par da obtenção de fundos comunitários para a mesma fase do projecto,

representando 41%. Em conjunto com o capital dos promotores e o financiamento destes

proveniente da banca comercial, representando em conjunto 13% do investimento inicial,

constituíram a principal alavancagem financeira do projecto. Esta permitiu ao Estado diluir o

investimento necessário para o projecto por vários anos, a realizar nos pagamentos de

manutenção e de desempenho à Concessionária, diminuindo assim o impacto do investimento

nas contas públicas.

O acesso ao mercado, no que diz respeito ao caso português, centrou-se na análise do

concurso referente à PPP relativa à concepção, construção e manutenção do troço

Poceirão/Caia. As opções tomadas relativamente ao processo de concurso permitiram atrair

quatro consórcios e estabelecer um ambiente competitivo. A adopção de uma fase de

negociações permitiu obter uma maior maturação das propostas e alinhar os objectivos da

entidade contratante e dos concorrentes. Na avaliação das propostas, as características

económicas associadas aos custos para os parceiros públicos tiveram mais peso (50%) na

decisão de adjudicação, mas não foram descuradas a qualidade técnica (30%) e os riscos do

projecto (20%). Como aspecto negativo destaca-se a morosidade do processo que expôs as

82

propostas à instabilidade financeira mundial que resultou em piores condições económicas da

primeira para a segunda fase de avaliação.

No que se refere ao estudo da partilha de riscos nos contratos analisados, conclui-se que a

maior parte dos riscos referentes a este tipo de projectos são previstos nos contratos. Os riscos

com maior probabilidade de ocorrer em ambos os casos são os riscos políticos associados a

indefinições e alterações tardias nos contratos e a processos de aprovação de entidades

externas às parcerias. A partilha de riscos é, no entanto, diferente nos dois projectos devido à

natureza dos dois modelos.

Destaca-se no caso português a assunção por parte do Estado do risco de procura, que é o

mais directamente relacionado com a sustentabilidade económica do projecto e, a constatar

pela experiência internacional no sector do transporte ferroviário, verifica-se uma elevada

probabilidade de ocorrer uma sobrestimação das estimativas dos estudos de procura. Um dos

maiores riscos do projecto é, no entanto, o risco político, derivado da não existência de um

consenso alargado entre as forças políticas quanto às vantagens da implementação da rede de

alta velocidade. Esta falta de consenso conduziu à suspensão do projecto após as eleições

legislativas de 2011 que levaram ao poder a coligação CDS-PP/PSD, que desde cedo

demonstrou a sua oposição ao mesmo. O risco legal, por outro lado, revelou uma boa gestão

por parte da entidade pública responsável pela contratação, ao atribuir a responsabilidade por

possíveis alterações na legislação geral ao parceiro privado e a alterações de normas ou

regulamentos técnicos ao parceiro público, garantindo equidade na rentabilidade dos

investidores em geral e a manutenção do nível de custos relativos aos requisitos técnicos

apresentados em concurso. Outro risco que merece destaque é o risco de concurso associado

à simultaneidade de lançamento de várias PPP relativas a infra-estruturas de outros sectores

que pode ter comprometido a capacidade de resposta das empresas de construção. Por último,

destaca-se o risco de integração que surge da desagregação da cadeia de valor, já referida no

2.º parágrafo deste capítulo, que é partilhado por ambos os parceiros, assumindo o parceiro

público a gestão dos contratos e prevendo em cada um destes as medidas de integração

necessárias. O parceiro privado é, então, responsável por tomar todas as medidas de gestão

de interfaces referidas no contrato.

Relativamente à gestão de contratos, concluiu-se que o contrato referente ao troço

Poceirão/Caia prevê um acompanhamento adequado de todas as fases do projecto. Neste

campo destaca-se a importância da monitorização do desempenho da Concessionária que é

fulcral no sucesso das PPP, e o contrato encontra-se preparado para executar o

acompanhamento adequado da parceria a este nível. Destacam-se, no entanto, algumas

medidas introduzidas no mesmo que constituem exemplos de boas práticas, e que se

enumeram de seguida. A criação do conceito de ―falhas declaradas‖ e ―falhas detectadas‖ que

penaliza a Concessionária pela omissão do seu próprio incumprimento, criando um incentivo à

monitorização do seu próprio desempenho; o estabelecimento da vida útil residual dos

componentes e a obrigatoriedade da Concessionária em comprová-las; a previsão dos conflitos

83

na interface entre a superestrutura e os sistemas de sinalização e telecomunicação; a resposta

rápida a possíveis atrasos da concessionária obrigando esta a reforçar os seus recursos até

restabelecer as condições do calendário previamente acordado; a atribuição à Concessionária

das mais-valias económicas que possam surgir com a introdução de processos construtivos

invovadores; e a adopção de um procedimento de concurso em caso de alterações impostas

pelo parceiro público após a fase de construção. Em oposição às boas práticas, apontam-se

também algumas falhas no contrato que põe em causa sucesso da parceria, das quais

destacam-se a não introdução de cláusulas que dificultem ou impeçam a introdução de

modificações tardias ao projecto por parte do Concedente, e a partilha por ambos os parceiros,

em partes iguais, dos benefícios de um possível refinanciamento da concessão.

O modelo de negócio do projecto brasileiro incluiu toda a cadeia de valor numa só concessão,

sendo responsabilidade do parceiro privado garantir a sustentabilidade do projecto remurando

o seu investimento através da exploração comercial do serviço de transporte, das estações e

outras receitas extraordinárias decorrentes da exploração da concessão, não existindo a

possibilidade do Concedente efectuar qualquer tipo de pagamento à Concessionária. A

contribuição pública restringiu-se à possibilidade de conceder garantia Estatal a um

financiamento de, no máximo, € 8380 milhões ou 60,3% do investimento total, o menor destes

valores, e aos custos relativos às expropriações e socio-ambientais. Apesar desta

―desestatização‖ no investimento, o Estado define o output estabelecendo, entre outros

detalhes, locais que devem ser providos de uma estação ferroviária, tipos de serviço, tempos

máximos de viagem e intervalos de tempo entre comboios. A par destes requisitos, o Estado

apresenta um regime de performance com vários indicadores que resultam em multas em caso

de incumprimento.

Este modelo de concessão, ao englobar todas as componentes do sistema ferroviário, permite

criar uma economia de escala reduzindo os custos e aumentando a rentabilidade do projecto,

garantindo a provisão de um serviço público com investimento quase totalmente privado. As

grandes desvantagens do modelo poderão ter sido a sua elevada dimensão e complexidade, a

reduzida participação do Estado no investimento, e a limitação do preço a cobrar por parte do

serviço, que viria afectar a resposta dos investidores privados no processo de concurso. Em

Julho de 2011, devido à inexistência de propostas a concurso, a ANTT anunciou que o modelo

de negócio seria revisto e encontrava-se em estudo a possibilidade da divisão da construção

da infra-estrutura em lotes (ANTT 2011).

O concurso da concessão do projecto TAV Rio de Janeiro/São Paulo adoptou o critério único

do menor preço por quilómetro para o serviço ferroviário em classe económica do troço Rio de

Janeiro/São Paulo. Ao não avaliar a qualidade técnica das propostas, o processo de concurso

não incentivou a criação de value for money por parte dos concorrentes, mas por outro lado a

simplicidade de todo o processo, acrescida pela inversão das fases de qualificação e avaliação,

permitia garantir a celeridade deste. A resposta do mercado todavia não foi positiva, não tendo

sido efectuado o concurso devido à inexistência de propostas. Das possíveis razões para tal,

84

destacam-se as seguintes: o elevado risco a suportar pela Concessionária; a complexidade na

formação de consórcios devido às exigências financeiras e técnicas derivadas da reunião de

toda a cadeia de valor numa só concessão; a incapacidade de resposta do tecido empresarial

brasileiro devido à simultaneidade de vários investimentos em infra-estruturas no país; e a

inexperiência das empresas em projectos deste tipo devido à inexistência de infra-estruturas de

alta velovidade ferroviária na América do Sul.

Em relação à partilha de riscos, as maiores diferenças relativamente ao projeto português, é o

facto do Estado brasileiro assumir parcialmente os riscos de expropriações, participar na

gestão do risco financeiro com o privado, e atribuir a responsabilidade pelo risco de procura e

pelo risco político à Concessionária. Salienta-se, no entanto, que estes dois últimos riscos

estão associados ao facto de ser a Concessionária a explorar comercialmente o serviço,

ficando exposta às futuras decisões políticas ao nível da política económica, social, e de

transportes, que não acontece no contrato português por tratar-se de uma PPP que não

engloba a operação do serviço de transporte. Destaca-se ainda no contrato TAV a não

previsão do risco arqueológico associado à descoberta de património histórico ou arqueológico

na fase de construção.

No que concerne à gestão de contratos, pode-se concluir que o contrato brasileiro prevê um

acompanhamento adequado de todas as fases do projecto, com especial detalhe na

monitorização do desempenho das Concessionárias que é fulcral no sucesso de qualquer PPP

deste tipo. Destaca-se, no entanto, a criação de uma base de dados em suporte informático

para registar dados e acontecimentos relevantes na monitorização das actividades e na

avaliação de desempenho, a definição da vida útil residual e a previsão de uma fiscalização

detalhada aos bens da concessão no último ano desta, e a obrigação da Concessionária

transferir o conhecimento da tecnologia envolvida em todo o processo ao Concedente.

7.2 DESENVOLVIMENTOS FUTUROS

Na completação do estudo efectuado, seria interessante analisar em detalhe os estudos que

justificam a escolha do modelo de PPP para a implementação dos dois projectos estudados,

concretamente, o Comparador do Sector Público. A arbitrariedade da escolha de valores input

na sua montagem tem posto em causa a utilidade da realização deste estudo (Quiggin 2004).

Seria interessante efectuar o cálculo de dois CSP para um mesmo projecto, um com valores de

input arbitrados mais favoráveis à adopção do modelo de contratação tradicional e outro em

sentido contrário, e analisar até que ponto esta arbitrariedade influencia a escolha do modelo.

Seria igualmente importante realizar um estudo mais detalhado aos riscos de construção e

operação do projecto de alta velocidade ferroviária por se tratar de um tipo de transporte

relativamente recente que ainda se encontra em desenvolvimento.

85

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A1

ANEXOS

A DEDUÇÕES POR DESEMPENHO

A.1 Deduções por indisponibilidade

A perda de disponibilidade da infra-estrutura é quantificada, como já foi referido, através do

cálculo do número de unidades de indisponibilidade pela seguinte fórmula:

( )

Em que:

VML Velocidade máxima normal da linha;

VP Velocidade permitida;

v Número de vias afectadas;

l Extensão da linha afectada;

t Tempo do evento.

De modo a minimizar os conflitos na gestão do contrato, estas variáveis assumem um número

limitado de valores discretos, excepto o tempo (t) que assume o valor da duração do evento.

O número total de UI em cada período de desempenho será a soma das UI relativas a falhas

da Concessionária e das UI relativas aos períodos de manutenção adicionais ocorridos nesse

período, subtraindo-se de seguida as UI extra referentes a compensações, quando necessárias

e disponíveis.

As deduções por indisponibilidade em cada período são calculadas multiplicando o total de UI

pela taxa de UI (€/UI) estipulada em contrato, através da fórmula:

*(∑

)

+

Em que:

UIf UI resultantes de falhas f que ocorreram no período de desempenho;

ϕ total de falhas durante o período de desempenho;

UIp UI relativas a períodos de manutenção adicionais;

A2

ѱ total de períodos de manutenção adicionais durante o período de desempenho;

T Tolerância ;

UIC Número de unidades de indisponibilidade de compensação;

K Taxa de UI (€/UI).

A.2 Deduções por má condição dos activos

A Concessionária incorre em deduções por más condições dos activos em caso de falha na

manutenção de algum activo cuja perda de função não afecte a operação dos comboios. Para

cada categoria de activo é definida um conjunto de especificações de conformidade, assim

como uma quantidade de pontos de penalização por cada período de desempenho e o

respectivo período de rectificação.

Quando é detectada uma falha de conformidade num activo, pela Concessionária ou pelo

Estado, a Concessionária dispõe de um período de rectificação para corrigir a falha. No caso

de esta correcção não ser efectuada, os pontos de penalização indexados ao activo em

questão são aplicados um dia após a expiração do período de rectificação. A partir deste

momento, por cada dia de atraso na correcção, são adicionados mais pontos de penalização.

As deduções por má condição dos activos são calculadas através da seguinte fórmula:

∑( )

Em que:

Taxa de condição de activo (€/ponto de penalização);

Número de pontos de penalização atribuído a cada tipo de activo;

Número de dias em que o activo não esteve conforme as especificações;

Número total de falhas durante o período de desempenho;

Período de rectificação atribuído a cada tipo de activo.

B. MODELO DE DISPONIBILIDADE

O modelo de disponibilidade define as regras para calcular as deduções de indisponibilidade. O

modelo envolve o registo de todos os eventos que afectam a disponibilidade, o cálculo das

unidades de indisponibilidade acumuladas em cada período de desempenho, e a consequente

A3

determinação das deduções mensais de indisponibilidade tendo como referência o Limite

Mínimo de Disponibilidade (LMD) e a taxa de indisponibilidade (em €/UI) definida em contrato.

A duração do período de desempenho escolhida foi um mês, por ser considerada

suficientemente longa para assegurar a estabilidade estatística necessária à calibração do

modelo, e suficientemente curta para incentivar a rápida reacção do parceiro privado.

O modelo é constituído pelas seguintes componentes:

a) Períodos destinados à manutenção

O modelo prevê um espaço temporal para a Concessionária monitorizar e realizar operações

de manutenção sem que lhe sejam imputadas quaisquer penalizações. Este espaço temporal é

dividido num largo espectro de durações e frequências que a Concessionária deve usar para

executar procedimentos de manutenção preventiva e correctiva e também para renovações.

b) Períodos de manutenção adicionais

A Concessionária pode adquirir períodos de tempo adicionais para executar as suas operações

de manutenção e renovação. Estes períodos não estarão isentos de penalização, mas não são

aplicadas as mesmas deduções que se aplicam às falhas de desempenho da Concessionária.

O modelo inclui incentivos para que a Concessionária planeie os seus períodos extra de

manutenção com antecedência, de modo a permitir aos operadores dos serviços ferroviários

adaptar as suas operações à disponibilidade da linha e reduzir o impacto da indisponibilidade.

Quanto maior for a antecedência do aviso, menor será a dedução.

c) Compensações de Indisponibilidade

Sempre que a Concessionária atinja um nível de disponibilidade superior ao LMD, é lhe

atribuído um determinado número de UI que pode depois ser usado noutros meses em que a

disponibilidade se situe abaixo do LMD. Estas UI extra têm a validade de 3 meses e são

aplicados numa lógica first in first out, para evitar a acumulação excessiva que pudesse

compensar um desempenho muito fraco.

C. CONCURSO DE CONCESSÃO RAV POCEIRÃO/CAIA

C.1 Valoração dos Critérios

C.1.1 Métrica

O Metodologia de Avaliação do Programa do Procedimento adoptou uma escala de

classificação numérica, para cada factor e subfactor, fixada entre zero e vinte valores, com a

seguinte representatividade genérica:

MUITO BOM entre 17,0 e 20,0 valores

A4

BOM entre 14,0 e 16,9 valores

SUFICIENTE entre 10,0 e 13,9 valores

INSUFICIENTE entre 6,0 e 9,9 valores

MEDÍOCRE entre 0,0 a 5,9 valores

C.1.2 Factor A – Custo

A classificação tem como variante a estimativa do valor actual líquido (VAL) dos referidos

pagamentos em cada proposta. São considerados os seguintes pagamentos:

Pagamentos do Estado e da REFER durante o período de desenvolvimento;

Pagamentos relativos a Fundos Comunitários;

Pagamentos de desempenho;

Pagamentos de manutenção.

De modo a obter-se valores comparáveis, é feita uma harmonização dos pressupostos base

não controláveis como o nível de tráfego e o nível de disponibilidade. Os valores a preços de

2008 dos pagamentos de desempenho e dos pagamentos de manutenção apresentados pelos

concorrentes serão inflacionados, numa base anual e para todo o horizonte temporal da

concessão, considerando uma taxa de inflação anual de 2%, de acordo com o Despacho do

Ministério das Finanças n.º 13.208/2003, de 7 de Julho.

Para o cálculo do VAL são assumidos os seguintes pressupostos:

Actualização financeira é referente a 1 de Janeiro de 2008; e

Taxa de actualização semestral de 2.995% considerada equivalente a uma taxa

nominal anual de 6.08%, de acordo com o Despacho do Ministério das Finanças n.º

13.208/2003, de 7 de Julho.

A pontuação do factor é obtida através da função de valor não linear a seguir apresentada.

V ( ) VAL

Em que:

V Pontuação do factor A;

VAL Valor actual líquido dos pagamentos a efectuar pelos parceiros públicos à

Concessionária.

A figura C1 apresenta a variação da pontuação do factor em função do referido VAL.

A5

Figura C1 Variação da pontuação do factor A em função do VAL dos pagamentos dos parceiros públicos

(Adaptado de RAVE 2008a)

C.1.3 Factor B – Qualidade

Subfactor B1 – Soluções Técnicas, Subfactor B2 – Organização da Manutenção e

Subfactor B4 – Sistemas de Gestão da Segurança, da Qualidade e de Ambiente

A valoração dos subcritérios B1 e B2 e B4 baseia-se numa comparação das soluções

apresentadas nas propostas com os padrões patentes nos estudos da RAVE e as boas

práticas nacionais e europeias.

Subfactor B3 – Estação de Évora-Norte

O subfactor B3 é valorado mediante a avaliação do nível de cumprimento dos requisitos

estabelecidos no programa preliminar e o que é considerado as boas práticas nacionais e

europeias.

C.1.4 Factor C – Risco

Subfactor C1 – Riscos acrescidos para os parceiros públicos

A valoração do subcritério C1 varia com a dimensão dos riscos a suportar pelo parceiro

público.

Subfactor C2 – Exequibilidade do planeamento

A valoração deste subcritério varia com a avaliação da garantia de cumprimento das datas

fixadas e a conformidade do Programa de Trabalhos

Subfactor C3 – Equilíbrio e robustez financeira

A6

O subcritério C3 é valorado consoante a avaliação do equilíbrio e robustez financeira das

propostas.

Subfactor C4 – Solidez da estrutura contratual e transferência de risco

A valoração deste subcritério depende do ajustamento e equilíbrio de cada proposta e da

presença de alguma insuficiência grave.

D. INDICADORES DE DESEMPENHO DO CONTRATO DE CONCESSÃO TAV RIO DE

JANEIRO/SÃO PAULO

Quadro D1. Indicadores de desempenho do contrato de concessão TAV Rio de Janeiro/São Paulo

Tipologia Indicador Unidades Penalização (% da ROL

13)

Segurança Danos a

trabalhadores Nº de acontecimentos ≤1,0%

Segurança Danos a utilizadores Nº de acontecimentos ≤1,5%

Operação Disponibilidade do

serviço % de comboios em

actividade 1,0%

Operação Pontualidade % de comboios

pontuais 2,0%

Infra-estrutura Qualidade da Infra-

estrutura Índice 0-10 0,5%

Infra-estrutura Condições dos

activos Índice 0-10 0,5%

Material Circulante Falhas do material

circulante DMEF

14 0,5%

Estações/Oficinas Condições das

estações e oficinas Índice 0-10 0,5%

Utilizadores Satisfação dos

utilizadores % utilizadores

satisfeitos 1,0%

Utilizadores Reclamações dos

utilizadores Reclamações por

milhão de utilizadores 0,5%

Ambiente Ruído Decibéis 0,5%

Ambiente Consumo de

Energia kWh/passageiro-km 0,5%

13

Receita Operacional Líquida 14

Distância Média entre Falhas