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Título del documento:
CULTURA PERIFÉRICA, CIDADANIA E ESPAÇO PÚBLICO: o potencial político do
movimento hip hop da Ceilândia/DF
Peripheral culture, citizenship and public space: the political potential of Ceilândia‟s hip hop Movement
Documento para su presentación en el VIII Congreso Internacional en Gobierno, Administración y
Políticas Públicas GIGAPP. (Madrid, España) del 25 al 28 de septiembre de 2017.
Autores: PERES1, Janaina Lopes Pereira e BESSA
2, Luis Fernando Macedo;
Institución de procedência: Universidade de Brasília
Dirección electrónica: [email protected]; [email protected]
RESUMO A partir da proposta de Étienne Balibar, filósofo francês que define „cidadania‟ como o direito à palavra no
espaço público, o presente artigo lança luz sobre as formas de apropriação do espaço público urbano e da
palavra, no contexto da urbanidade contemporânea marcada por conflitos, disputas e negociações. Para isso,
nosso olhar repousou sobre a Ceilândia, uma das 31 Regiões Administrativas – RAs que conformam o
controverso e contraditório território de Brasília, Distrito Federal – DF e, mais especificamente, sobre os
caminhos abertos pela cultura periférica ceilandense, fortemente marcada pelo Movimento hip hop. Buscar-
se-á, a partir deste Movimento hip hop, revelar novos caminhos – abertos a partir das margens, das ruas – e
discuti-los, criticamente, enquanto formas de cidadania e de comunicação insurgentes, capazes de resistir a
poderes hegemônicos e de transformar os fazeres e saberes artísticos e poéticos - presente nas letras de rap,
nos muros grafitados e nos corpos periféricos - em fazeres e saberes políticos.
Palavras-chave: cultura periférica, espaço público, potencial político, Movimento hip hop, Ceilândia.
ABSTRACT
Based on the proposal of Étienne Balibar, a French philosopher who defines 'citizenship' as the right to speak
in public space, this article aims to shed light on the forms of appropriation of the urban public space and the
forms of appropriation of the „word‟ in the context of contemporary urbanity, marked by conflicts, disputes
and negotiations. To that end, our gaze rested on Ceilândia, one of the 31 Administrative Regions - ARs that
make up the controversial and contradictory territory of Brasília, Federal District - DF and, more
specifically, on the roads opened by the Ceilandian peripheral culture, strongly marked by the hip hop
Movement. From this Movement, we sought to reveal new paths - opened from the banks, from the streets -
and to critically discuss them as forms of citizenship and of insurgent communication, capable of resisting
hegemonic powers and of transforming artistic and poetic actions and knowledge - present in rap lyrics,
graffiti walls and peripheral bodies - in political actions and knowledges.
Key-words: peripheral culture, public space, political potential, hip hop Movement, Ceilândia.
1 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação Internacional –
PGDSCI/CEAM, da Universidade de Brasília -UnB. E-mail: [email protected] 2 Doutor em Geographie Humaine et Organization de l‟Espace, pela Université Paris 1 (Panthéon-Sorbonne). Docente e
pesquisador no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação Internacional -
PPGDSCI/CEAM e do Departamento de Gestão de Políticas Públicas – GPP/FACE, ambos da Universidade de Brasília -
UnB. E-mail: [email protected].
Introdução
Desde os anos 1980, a cultura ou o Movimento hip hop vem atraindo a atenção
de acadêmicos, pesquisadores – sobretudo nas ciências sociais – Organizações Não
Governamentais – ONG, movimentos sociais, sindicatos e governos. Com o tempo, os
mais diversos campos disciplinares adotaram o hip hop como objeto de estudo (letras,
comunicação, educação, pedagogia, etc.). A partir disso, “o hip-hop passou de cultura
juvenil urbana a constructo científico, isto é, um campo discursivo elaborado por dentro
e por aqueles que são de dentro do movimento para pensar o social, a cultura, a arte,
etc.” (Carvalho, 2012, p. 304). A pergunta posta por Carvalho (ibidem, p. 305) é muito
pertinente: “É sabido que os movimentos sociais „se pensam‟, mas qual a validade
científica desse pensamento para compreender a sociedade?”.
A partir desse questionamento, dos mitos e contradições que envolveram o
nascimento da Nova Capital do Brasil, do processo de formação e de transformação
socioterritorial do Distrito Federal-DF e dos números que colocam o DF no topo do
ranking da desigualdade no Brasil3, formulamos a questão-geradora da presente
pesquisa: qual é o lugar (ou o papel) simbólico e político da Ceilândia e do ceilandense
na maquete-moderna, cristalizada no Planalto Central, desde o início dos anos 1960, e
reconhecida enquanto Patrimônio Cultural da Humanidade, pela Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO, desde 1987?
A partir dessa pergunta (central e geral), derivaram outras quatro questões, mais
específicas, que estruturaram este artigo: a) onde se localizam as brechas urbanas na
sociedade contemporânea (sociedade do hiperconsumo, da informação, do risco, do
cansaço, do medo)?; b) quais os pontos de interseção entre o processo de formação
identitária do povo ceilandense e o Movimento hip hop?; c) quais as respostas da
cultura urbana ceilandense ao chamado das ruas?; d) como, nesse contexto, o fazer
artístico pode ser transformado em fazer político?
Em função da complexidade e da amplitude dos questionamentos propostos, vale
esclarecer que, em lugar de buscar respostas que se pretendam completas ou definitivas,
o presente artigo objetiva apresentar discussões iniciais e resultados parciais da pesquisa
de doutoramento em curso, no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento,
Sociedade e Cooperação Internacional – PPGDSCI, da Universidade de Brasília-UnB.
O que se busca, precisamente, é revelar quais caminhos a sociedade periférica tem
trilhado, a partir das margens, das ruas da Ceilândia, dos movimentos artístico-culturais,
que se afirmam, crescentemente, como movimentos socioespaciais e políticos. A partir
dessa aproximação, busca-se discutir, criticamente, o potencial de resistência e de
construção de novas formas de olhar e de se relacionar com a cidade e de pensar
políticas públicas. Nesse exercício, de observar a cidade a partir de outras centralidades,
não oficiais, a “arte” emerge como um importante elemento mediador.
3 Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (IBGE, 2015, p. 227), realizada em
2013 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, o Distrito Federal – DF possui as piores
taxas de desigualdade de renda do Brasil, com índice de Gini de 0,57, frente à media nacional de 0,50.
A arte ou cultura urbana, compreendida como uma forma de pensamento crítico,
mostrou-se, por intermédio das vozes, dos muros e dos corpos periféricos, capaz de ser
traduzida em políticas públicas urbanas e territoriais. Entrevistas realizadas com quatro
representantes do Movimento hip hop da Ceilândia, palestras e debates em eventos
promovidos no âmbito do Movimento revelaram que as diferentes formas de expressão
do hip hop podem ser considerados saberes ou “epistemologia do sul”, em referência à
obra de Santos (2007) – saberes contra-hegemônicos e pós-colonais –, potencialmente
capazes de reescrever a história, a partir do olhar periférico, e de dotar a periferia, a arte
urbana e a política de novos significados.
O medo, a periferia e as brechas urbanas
Se, anteriormente, a vida cotidiana era marcada pela ideia de progresso e pela
promessa de uma felicidade universal e duradoura, hodiernamente, como nos recorda
Bauman (2009, p. 23), a descrença em um futuro promissor, o temor de “ser deixado
para trás”, evocado pela necessidade permanente de progresso e pela falta de controle,
conferem “vida própria” a nossos medos. As profundas mudanças na estrutura, mas não
na condição social, como nos recorda Harvey (1993), foram acompanhadas pela
aceleração e pelo aprofundamento do processo de fetichização das cidades e da vida
urbana. Tudo se atualiza para o mercado: a arte, a cultura, a arquitetura, o espaço
público, a saúde, a alimentação, a religião e, também, a identidade e o medo
(Lipovetsky, 2004).
A solução imediata para o medo e para a violência urbana tem sido, nas palavras
de Bauman (idem ibidem), a construção de “cápsulas defensivas”: os robustos e
blindados Sport Utility Vehicles – SUVs juntamente com muros, grades e cercas
proliferam a ideologia das gated communities (ou condomínios fechados), que
cristalizam dicotomias como eu-outro, seguro-perigoso, dentro-fora. Trata-se de uma
solução pret-à-porter, incapaz de alcançar o cerne do problema, mas capaz de se
espraiar por todas as dimensões da vida em sociedade. A hiperindividualização
anunciada por Lipovetsky (idem ibidem) não se resume ao “auto-insulamento” em
automóveis amplos e confortáveis, assim como os condomínios fechados também não
se restringem apenas a um novo estilo de habitação. O que se observa, atualmente, são
condomínios fechados na educação, na saúde, na cultura, na política, na economia, nos
meios de comunicação e, inclusive, nas relações sociais e/ou profissionais: a vida em
condomínios fechados vem se transformando, no extremo, em uma forma de (não-)
relação com o outro; e os muros, que delimitam as fronteiras (físicas ou simbólicas)
desses condomínios, cumprem o papel de tornar o outro invisível e de alimentar o vício
pela segurança.
Como em um ciclo perverso, “a insegurança alimenta o medo” e este mata, nas
ruas, a flexibilidade, a espontaneidade e a capacidade de surpreender-se e de aventurar-
se (Bauman, idem, p. 39). Por outro lado, nem os condomínios fechados conseguem
impedir o sofrimento e minar as diferenças, como discute o psicanalista Christian Ingo
Lenz Dunker (2015a), em seu livro “Mal-estar, sofrimento e sintoma – uma
psicopatologia do Brasil entre muros”. De acordo com a tese defendida por Dunker
(2015b, s/p), mais do que uma “forma concreta de vida entre muros”, a vida em
condomínios transformou-se em uma espécie de “patologia das nossas relações com o
outro e com o espaço social”: o espaço público é entregue à iniciativa privada, em uma
espécie de concessão – em troca da criação artificial de uma “vida entre iguais” –,
justificada pela necessidade de defesa e de aumento infinito da segurança.
Por outro lado, como lembram Font e Albet (2008, p. 208), “nem tudo chega a
todos os lugares” e, apesar do domínio da lógica „universalizante‟, tanto da
modernidade quanto da globalização, esses processos não atuam homogeneamente e
seus alcances são desiguais, como também é desigual a velocidade com que se instalam
e se consolidam em cada lugar, em particular. Nesse sentido, entre os espaços
cristalizados, é sempre possível encontrar brechas (ou abri-las à picareta): espaços
escondidos, não regulados, não condicionados, a partir dos quais é possível criar outros
lugares, em sobreposição aos já existentes – contraespacialidades. O Movimento hip
hop, embora inspirado pela cidade estabelecida, pela realidade cristalizada, pelo
cotidiano que já está dado, está mais interessado nessa cidade possível, na utopia, nas
brechas, nas oportunidades de mudança, seja da cidade, seja das mentalidades de quem
constrói, diariamente – e, tantas vezes, inconscientemente – as quebradas brasileiras.
Castells (1999a, p. 43, grifo nosso) recorda-nos que “entramos em um mundo
realmente multicultural e interdependente, que só poderá ser entendido e transformado a
partir de uma perspectiva múltipla que reúne identidade cultural, sistemas de redes
globais e políticas multidimensionais”, um novo mundo originado entre as décadas de
1960 e 1970, por meio da confluência de três processos independentes: a revolução da
tecnologia da informação, a crise econômica do capitalismo e do estatismo (e suas
reestruturações) e a culminância de movimentos sociais e culturais. Tais processos,
combinados, teriam resultado, segundo Castells (1999b), em uma Sociedade em Rede,
em uma nova economia (informacional-global) e em uma nova cultura. Essa nova
estrutura social é, em grande parte, impulsionada por movimentos sociais libertários,
críticos à sociedade de consumo, crítico às metanarrativas, à imposição de uma
identidade oficial, à soberania do capital, à efemeridade e à espetacularização da vida
urbana (Lipovetsky, 2004).
Em Brasília, o constante movimento centro-periferia revela tensões e chama
atenção para o fato de que a (re)construção das identidades e da cidade – sempre por
fazer – também se dá de fora para dentro. Para Canclini (2007), é na fronteira que se dá
tal reconstrução; é na fronteira que se reivindicam as identidades, que se busca o
reconhecimento e é, também, na fronteira que se exacerba a desigualdade. Por outro
lado, de acordo com Castells (1999b), não há dominação sem resistência e as fronteiras
também podem ser chamadas de „brechas‟. Fronteiras não precisam ser,
necessariamente geográficas, pois a ideia aplica-se, também, a fronteiras intraurbanas e
a fronteiras imaginárias, que suscitam resistências e encerram possibilidades de
convivência.
Uma vez que a existência do eu pressupõe um outro, pode-se afirmar, a partir de
Ruiz (2003), que a constituição das diversas identidades, em oposição ou em resposta à
imposição de uma identidade oficial (cultura oficial ou história oficial) depende, em
primeira medida, do reconhecimento das diferenças entre um nós e um eles (Mouffe,
2005), depende de autoconsciência, da construção simbólica de sentidos, significados e
do reconhecimento de mundos múltiplos; depende de subjetividades dinâmicas e abertas
e depende, principalmente, da religação do ser humano com a realidade, da criação de
pontes que soldem a “fratura aberta” (RUIZ, 2003, p. 61).
Nesse sentido, é possível afirmar, ainda com Ruiz (idem ibidem), que não é na
homogeneidade, na pasteurização dos valores e dos comportamentos que seremos
plenos, felizes ou irmanados. Ao contrário, promover a aproximação entre os fazeres
artísticos e os fazeres políticos pode constituir uma forma de “superar a visão
homogeneizante tanto do Estado quanto da sociedade civil” e de reconhecer sua
diversidade interna. Inspirados por Mouffe (2005), afirmamos que o apagamento da
linha que divide o eu do outro silenciará, inevitavelmente, uma infinidade de vozes.
A Ceilândia, o ceilandense e o hip hop
Toda história é construída a partir de um processo de recortes, de escolhas, de
ângulos específicos do olhar, o que faz com que cada história seja apenas parcial: uma
entre tantas outras possíveis. Essa reflexão, embora aplicável a qualquer tipo de
história, auxilia-nos a compreender não apenas a história de Brasília, mas, também, da
Ceilândia – Região Administrativa IX, cidade, cidade-satélite, bairro (?) –, que
representa um dos tantos e diversos fragmentos de vidro colorido que formam Brasília,
uma cidade-caleidoscópio. Seguindo essa linha reflexiva e tendo em mente que as
cidades, como os caleidoscópios, transformam-se a cada movimento, aproximamo-nos
das noções de espaço público e de cultura urbana periféricos, aproximamo-nos da
Ceilândia e do Movimento hip hop, e, por este caminho, aproximamo-nos, também, de
outras versões da história da Ceilândia.
Talvez seja importante começar a contar essa história esclarecendo que, ao
inventar Brasília, Lucio Costa não inventou a Ceilândia ou nenhuma das demais
Regiões Administrativas que conformam, atualmente, um conglomerado com população
estimada em 3.039.440 pessoas (IBGE, 2017). Em seu relatório do Plano Piloto de
Brasília, submetido ao Edital para o Concurso Nacional do Plano Piloto da Nova
Capital do Brasil, Lucio Costa apresenta (In: IPHAN, 2014, p. 29) uma “solução
possível, que não foi procurada, mas surgiu, por assim dizer, já pronta.”. Dentre as
vantagens do projeto proposto por Lucio Costa, o júri destacou o fato de o tamanho da
cidade ser limitado, o que significava dizer que, após 20 anos, o crescimento da cidade
dar-se-ia por penínsulas e por cidades-satélites.
Embora urbanista não tenha restringido, em seu relatório, o crescimento da
cidade ou determinado o tamanho de sua população, o número de 500.000 habitantes já
estava previsto no Art 1º, §2º da Lei 1.803, de 05 de janeiro de 1953, que autorizou o
Poder Executivo a realizar estudos definitivos sobre a localização da nova Capital da
República, na região do Planalto Central (BRASIL, 1953). É curioso ressaltar, também,
que Lucio Costa não utilizou o termo cidade-satélite no relatório de 1957, mas 30 anos
depois, quando redigiu o documento intitulado Brasília Revisitada 1985/87, anexado ao
Decreto nº 10.829/1987 (GDF, 1987) e à Portaria nº 314/1992 do Iphan (1992). Neste
documento, Lucio Costa reconhece que o surgimento das cidades satélites foi “precoce
e improvisado” e que se, por um lado, isso permitiu a manutenção da “feição original de
Brasília”, por outro lado, “a longa distância entre as satélites e o „Plano Piloto‟ isolou
demais a matriz dos dois terços de sua população metropolitana que reside nos núcleos
periféricos, além de gerar problemas de custo para o transporte coletivo.”
Fica claro, no relatório do urbanista, o desejo de certo grau de “coexistência
social” e de evitar o impedimento da “enquistação de favelas tanto na periferia urbana
quanto na rural” e de garantir a oferta de “acomodações decentes e econômicas para a
totalidade da população.” (IPHAN, 2014, p. 38, grifo nosso). Não foi o que aconteceu e
os rumos tomados pela cidade surpreenderam seu próprio criador. Em visita à Brasília,
no dia 30 de março de 1987, Lucio Costa (In: IPHAN, 2014, p. 12) diz ter caído “em
cheio na realidade” e confessa ter se surpreendido, especialmente, com a rodoviária:
Eu sempre repeti que essa plataforma rodoviária era o traço de união
da metrópole, da capital, com as cidades satélites improvisadas da
periferia. É um ponto forçado, em que toda a população que mora
fora entra em contacto com a cidade. Então eu senti esse movimento,
essa vida intensa dos verdadeiros brasilienses, essa massa que mora
fora e converge para a rodoviária. Ali é a casa deles, é o lugar onde
eles se sentem à vontade. Eles protelam, até, a volta para a cidade-
satélite e ficam ali, bebericando. Eu fiquei surpreendido com a boa
disposição daquelas caras saudáveis. (...) Isso é tudo muito diferente
do que eu tinha imaginado para esse centro urbano, como uma coisa
requintada, meio cosmopolita. Mas não é. Quem tomou conta dele
foram esses brasileiros verdadeiros que construíram a cidade e
estão ali legitimamente. É o Brasil.... E eu fiquei orgulhoso disso,
fiquei satisfeito. É isto. Eles estão com a razão, eu é que estava errado.
Eles tomaram conta daquilo que não foi concebido para eles. Foi
uma bastilha. Então eu vi que Brasília tem raízes brasileiras, reais,
não é uma flor de estufa como poderia ser (...). Na verdade, o sonho
foi menor do que a realidade. A realidade foi maior, mais bela.
(COSTA, Lucio In: IPHAN, 2014, p. 12, grifo nosso)
Para Lucio Costa, a cidade nascia para dar vazão, também, ao devaneio e à
especulação intelectual, para fomentar as artes e a cultura. Mas, qual cultura? A priori,
uma cultura predominantemente exógena e predominantemente branca, que atendesse às
elites políticas, burocráticas e intelectuais que, para cá, migraram, fazendo de Brasília
uma espécie de sucessora política e sociológica do Rio de Janeiro. Durante muitos anos,
a cidade deu vazão apenas à cultura encerrada dentro dos muros do Plano Piloto - com a
poesia de mimeógrafo, com o jovem poeta morador da Asa Sul, Nicolas Behr, com o
rock – de Legião Urbana e Cássia Eller – e, embora tenha sido exportada para o resto do
Brasil como tipicamente brasiliense, camuflava o fato de que havia muitas „cidades
inventadas‟ dentro da „cidade inventada‟.
A visão romantizada de Lucio Costa acerca da apropriação do espaço público da
rodoviária por parte daqueles que construíram Brasília – a quem, na verdade, foi negado
o direito de viver dentro da cidade – em muito se afasta da realidade de milhares de
brasilienses, que se deslocam, diariamente, das outras 30 Regiões Administrativas
periféricas, em direção à RA I – Plano Piloto em trajetos que podem durar muitas horas.
De acordo com Schlee (En Saboia; Derntl, 2014, p. 19), desde fins de 1957, as
fotografias divulgadas por Thomas Farkaz, Borglund ou Gautherot já revelavam o
flagrante contraste entre a Brasília pulsante, modernista e racionalista, e “o mundo do
entorno, o dos candangos e do cotidiano brasileiro no Núcleo Bandeirante”, fundado
oficialmente, em 1956, como Cidade Livre, comprovando “a tese de que nunca houve
um Plano Piloto real sem o seu entorno populoso e problemático” (Schlee, ibidem, p.
20).
De acordo com Campos (En Paviani, 2010a, p. 111), a cidade de Brasília foi
estruturada, inicialmente, à semelhança de um “canteiro de obras”, com três áreas
oficialmente destinadas aos acampamentos de operários: a Cidade Livre ou Núcleo
Bandeirante; o acampamento central da Novacap; e áreas para acampamentos de
construtoras particulares, que deram origem à Vila Paranoá, Vila Planalto, Vila Amauri,
Vila Metropolitana e Candangolândia (Schlee, ibidem). Desde sua inauguração, em abril
de 1960, já se percebia a seletivização do espaço urbano: esperava-se que o Plano Piloto
constituísse o locus do funcionalismo público e de uma classe média-alta, enquanto, das
cidades-satélites, esperava-se que absorvessem a pressão por moradia de trabalhadores
migrantes menos qualificados (Campos, ibidem).
Batista (et. al., 2003) registra que, a partir de 1955, quando anunciado o
compromisso com a transferência da capital, o número de migrantes para o Planalto
Central não parou de subir. Apesar disso, em lugar de se expandir a capacidade
planejada para a cidade, a Novacap adotou “uma política de urbanização em subúrbios
dormitórios, para as populações de menor renda” (Batista et. al., 2003, p. 11).
Emergiram, segundo Paviani (2010a, p. 140) ações “no sentido de periferizar, com
sucessivas „limpezas‟ de acampamentos de obras e de favelas do Plano Piloto” – mais
comumente chamadas de invasões. As diferentes “cidades-satélites”4 originaram-se de
núcleos rurais ou urbanos pré-existentes, como Planaltina (1859) e Brazlândia (1933);
de consolidações de acampamentos, como a Cidade Livre (1957), que se transformou no
Núcleo Bandeirante; ou, da criação de novos assentamentos, como foram os casos de
Taguatinga (1958), Sobradinho (1959), Gama (1960), Guará (1968) e Ceilândia (1971),
instalados estrategicamente ao redor do Plano Piloto, conformando uma espécie de
cordon sanitaire, que contribuiu para o polinucleamento da cidade e para sua
segregação socioespacial (Batista, op. cit.).
Em Brasília, a “erradicação de invasões riscou do mapa do Distrito Federal as
favelas do IAPI, as Vilas Tenório, Esperança e Bernardo Saião e o Morro do Querosene,
criando-se, com suas populações, a Ceilândia” (Paviani, 1976, p. 66). Em Brasília, o
conflito entre o real e o aparente se evidencia nas lutas entre o centro decisório (o Plano
Piloto) e as chamadas cidades-satélites (regiões administrativas não autônomas) e se
perpetua pela concentração das atenções por parte do poder central do Distrito Federal
no próprio Plano Piloto, onde, ao longo das últimas cinco décadas, foi implantada a
grande maioria dos equipamentos – físicos, sociais e culturais – e as melhores
possibilidades de emprego, com os salários mais elevados, promovendo, na cidade, um
duplo processo de “metropolização com periferização” (idem ibidem, p. 94).
4 Em 1998, a denominação cidade-satélite foi proibida de figurar em documentos oficiais, devido ao
reconhecimento de carga semântica pejorativa. Apesar disso, o termo continua bastante presente, tanto no
cotidiano urbano quanto no imaginário dos habitantes de Brasília.
Observa-se, claramente, um desenvolvimento desigual, legitimado por dois
fatores que consideramos centrais: a necessidade de fortalecimento/reafirmação do
Plano Piloto enquanto core político-administrativo da cidade – por reunir os edifícios e
as atividades que mantém em funcionamento a máquina pública federal – e a
necessidade de preservação não só da cidade, mas de uma pretensa qualidade de vida,
em cumprimento às leis e decretos que a protegem (também de forma fragmentada),
desde seu nascimento.
Ceilândia nasce desse contexto conturbado, com o objetivo de abrigar todos os
que não eram bem-vindos no Plano Piloto. O incômodo provocado pelas ocupações
irregulares nas proximidades do Plano deu origem, em 1970, à Campanha de
Erradicação de Invasões – CEI, conduzida pelo Governo de Hélio Prates, com o
objetivo de cadastrar os barracos5 existentes em lugares considerados inadequados,
lotear a região escolhida e transferir para a CEI-lândia, região a Oeste do Plano Piloto e
contígua à Taguatinga, 82 mil pessoas. Segundo relatos de rappers que participaram da
gravação do documentário “Rap, o canto da Ceilândia” (2005), de Adirley Queirós, os
primeiros habitantes da RA IX foram carregados em caminhões e jogados na Ceilândia,
sem água, sem luz elétrica, sem rede de esgoto, sem asfalto e, principalmente, sem
respeito ou dignidade6. Foram afastados mais de 30 quilômetros de seus locais de
moradia, seus laços comunitários, afetivos e de vizinhança foram desfeitos, suas
identidades foram, em alguma medida, achatadas pelo abandono em um uma terra sem
lei, no fim do mundo7. Estes sujeitos enfatizam, ainda, a dificuldade que de assumir,
com orgulho, seu pertencimento à Ceilândia, sua identidade de “ceilandense”.
Se o aglomerado urbano foi resultado de uma iniciativa oficial de erradicação de
invasões – uma política oficial de periferização da população mais pobre –, nesse
mesmo processo, forjou-se, também, a identidade do „ceilandense‟, uma identidade
consolidada a partir de uma “dupla naturalidade” (Peixoto et al., 2017), uma vez que a
geração de 1970, que nasce com a Ceilândia, é ceilandense “de solo”, mas é, também,
nordestina “de sangue”, uma vez que 64,45% da população da cidade ainda é, mesmo
passadas mais de quatro décadas da fundação da RA, proveniente da Região Nordeste,
segundo dados da PDAD/2013 (CODEPLAN, 2014).
Na Ceilândia, o processo de construção da identidade assumiu o papel de
cimento social e de escudo contra a rejeição, a exclusão e a segregação impostas pelo
centro político-administrativo. A identidade ceilandense forjou-se na rua – o espaço
público, por excelência –, o que a reveste, simultaneamente, de um potencial explosivo,
mas ao mesmo tempo de uma dimensão passional e potencialmente criativa que se
pauta, sobretudo, no orgulho oriundo do sentimento de vitória na luta pela
sobrevivência e pela superação dos desafios impostos à população da Ceilândia.
Embora desprovida do status constitucional de cidade, é assim que a Ceilândia é
tratada por seus habitantes, que viveram na clandestinidade identitária por longos anos,
5 Segundo Severo, foram cadastrados cerca de 15 mil barracos nas redondezas do Plano Piloto.
6 É a visão do rapper Markim, do grupo Tropa de Elite, no documentário “Rap, o Canto da Ceilândia”
(2005). 7 São palavras do rapper X, do grupo Câmbio Negro, no documentário “Rap, o Canto da Ceilândia”
(2005)
devido ao estigma da criminalidade, da violência, da pobreza e da precariedade que
pairava sobre a região. Atualmente, afirmar-se “100% Ceilândia”, na opinião do rapper
Japão (2016), vai muito além da promoção de um nome, é uma questão de resistência,
um ato político. Mais do que isso, a afirmação da identidade territorial representa um
ponto de inflexão na história da Ceilândia, pois, segundo Japão (op. cit.), quando o
Câmbio Negro – grupo de rap criado na Ceilândia, em 1990 – gravou seu primeiro
álbum, “Sub-Raça”, em 1993, com a faixa intitulada “Careca sim e daí?” (Câmbio
Negro, 1993), a afirmação “sou negão careca da Ceilândia mesmo e daí?” não tinha o
intuito de lançar moda, mas “era uma parada que tava engasgada, era um desabafo!”.
Foi nesse contexto que surgiu o Movimento hip hop da Ceilândia, como um
desabafo: o desabafo de um povo que se sentia excluído, rejeitado, sofrido e humilhado.
O rap da Ceilândia é um protesto, que não tem a pretensão de agradar ou de ser bonito,
mas tem o compromisso de narrar uma realidade, sem maquiagem. Nasceu como a voz
da periferia empobrecida, esquecida ou invisibilizada, em um movimento análogo ao
que aconteceu nos Estados Unidos, onde, de acordo com George (1998) o hip hop
emergiu8 nas ruas de Nova Iorque, em reação ao mundo caótico da década de 1970,
mobilizando toda uma geração de jovens majoritariamente negros e hispânicos, que
cresceram com a Guerra do Vietnã, com a ganância de Wall Street, com a ideologia
neoconservadora, com a AIDS, etc.
Tanto lá como aqui, o hip hop encontrou ressonância nos guetos ou nas
periferias, mas não nasceu desatrelado de uma sociedade branca, que sempre fez parte
do hip hop, seja como audiência, como criadora ou financiadora. No caso de Brasília,
embora o hip hop tenha encontrado terreno fértil para se desenvolver e adquirir
relevância nacional nas periferias, com destaque para a Ceilândia, sua porta de entrada
foi o Lago Sul, uma das regiões mais abastadas de Brasília. O primeiro encontro de hip
hop de Brasília, como recorda o Dj Jamaika (2016), aconteceu em 1986 ou 1987, na
boate Le Club, no Gilbertinho: “E aí foi quando muita gente passou a se conhecer... Foi
quando eu conheci o Dj Raffa Santoro, o Dj Leandronic, o Sowtto, o X do Câmbio
Negro, o Toninho Pop...Essa galera toda (...) A gente saiu do mesmo lugar, mas
ninguém se conhecia. E daí pra frente a coisa foi crescendo9”. Em pouco tempo, a
Ceilândia tornou-se a grande referência do movimento hip hop no Distrito Federal.
Entre o final da década de 1980 e o início dos anos 2000, foram
criados os principais grupos de rap da cidade, entre eles o Tropa de
Elite (1989), com o Dj Markim; Câmbio Negro10
(1990), com X
(equis), Dj Jamaika (voz) e Dj Chokolaty (toca-discos); Cirurgia
Moral (1993), sob o comando do rapper Rei; o Álibi (1995), criado
pelo Dj Jamaika e por seu irmão, Kabala, com apoio do Cirurgia
Moral; [o Grupo Sobreviventes de Rua – SRD (1997), atualmente
8 No final da década de 1970, a música Rapper‟s Delight, da banda The Sugarhill Gang, foi responsável
pelo boom do rap nos guetos norte-americanos e, quando transformada no “melô do tagarela”,
popularizou o gênero musical no Brasil, uma faixa de 15 minutos, falada do início ao fim. 9 Nessa festa, o Dj Jamaika cantou sua primeira música, o rap do Piolho, que estourou nas rádios
(Jamaika, 2016). 10
O grupo Câmbio Negro foi três vezes indicado ao prêmio Vídeo Music Brasil - VMB, na categoria
“melhor grupo de rap” e vencedor da edição de 1999.
formado por Buda, Preto Beto, Rebeca REalleza e Henrique EXP]; e o
grupo Viela 17 (2000), sob o comando do rapper Japão. Dentre os
indicados ao Prêmio Hutúz11
ou ganhadores de importantes prêmios
nacionais, além dos grupos Câmbio Negro e Viela 17, também está o
Dj Jamaika, vencedor da edição 2007, na categoria de “Produtor
Revelação” (Peixoto et al., 2017, p. 09)
É nesse sentido que podemos afirmar que tanto o ceilandense quanto o hip hop
da Ceilândia nascem imbricados, produtos da descrença com relação ao futuro e às
promessas da cidade planejada sob os cânones modernistas. O transbordamento
desordenado e pauperizado dos operários-pioneiros para as bordas da cidade-patrimônio
indicava que a modelização racional do espaço urbano não era suficiente para tornar a
sociedade mais justa, mais igualitária ou mais pacífica. Depois de construir a cidade da
esperança, sob condições precárias e mediante baixos salários, os candangos,
transferidos para um “cerradão” em carroças ou na boleia de caminhões, ao se verem
sem água, sem asfalto e sem luz, perceberam que as promessas de progresso e de
superação total das amarras, não seriam cumpridas.
Nas palavras de George (op. cit. p.xiii-xiv, trad. nossa), a história do hip hop,
porém, não é a “história de uma minoria amargurada breaking out of the ghetto, ou de
uma cultura marginal ou de uma moda passageira. Narra uma geração em um momento
de extrema confusão racial”. O hip hop reflete as tendências sociais de diferentes
tempos e de diferentes espaços, para o bem ou para o mal. De acordo com Japão (2017),
fazer com que cada pessoa se reconheça parte da sua comunidade é a luta diária do
Movimento hip hop. Foi necessário um trabalho de quase três décadas para levar o
sentimento de pertencimento aos moradores da Ceilândia: foi “o rap [que] falou
[primeiro] que amava essa porra. (...) Minhas músicas nunca contribuíram para
estigmatizar a Ceilândia. (...) Só o rap pediu justiça social pra cidade. (...) Tudo que eu
faço faz parte de uma estratégia de divulgação e de propagação do nome da minha
quebrada” (Japão, ibibem, s/p).
Boaventura de Sousa Santos (2010, s/´p), em entrevista concedida ao Globo, por
ocasião de seus livros “Rap Global” e “Epistemologias do Sul”, questiona
Onde estão as pessoas e os seus dramas íntimos; as lutas de resistência
e as resistências na luta; a criatividade moderna entre a loucura, a
violência e o fanatismo; a ruptura com o ancien régime e todos os
novos silêncios do universo a que chamamos deus e com quem
julgamos falar na farmácia, no ponto de droga, na meditação, nas
massagens, no jogging; a poesia, sempre à beira de não existir; a
brutalidade sedutora da ordem e do progresso; e sobretudo tanta coisa
que nem imaginamos que existe porque existe sobre a forma de
ausência e que no pior (melhor) dos casos nos cria mal-estar, provoca
insônias [?].
Fomos procurá-los – as pessoas, os dramas, as lutas, as resistências, a
criatividade, a violência, o fanatismo, a ruptura, os silêncios, a poesia, a brutalidade, as
coisas que não imaginamos existir, a ausência, o mal-estar, as insônias... – na Ceilândia.
11
O prêmio Hutúz, criado pela Central Única de Favelas - CUFA, em 2000, foi a principal premiação do
hip hop brasileiro, tendo tido 10 edições.
Diferentes respostas ao chamado das ruas
Há uma voz contida em cada peito escuro..
(...)
Essa voz que nunca sai e que também não se cala
é uma voz da cozinha, da senzala, dos guetos.
É uma voz de pretos, deserdados, desvalidos,
que atravessa paredes. É uma voz de sede
de fome e de medos.
(...)
E quem teve a voz roubada hoje tem multiplicada.
Os moleques das quebradas cantam quando as ruas chamam.
[Cacá Poeta12
– Quando as ruas chamam]
Os versos acima, extraídos do poema intitulado Quando as ruas chamam,
revelam que o movimento hip hop objetiva multiplicar as vozes roubadas dos moleques
da quebrada. A resposta ao chamado das ruas é artística, mas também é política. A
Ceilândia dá suas respostas por meio de suas rodas de conversa, da promoção de
debates, de festivais, de saraus e de encontros que reúnem rap, discotecagem, break,
graffiti, moda, etc.. Cada um a seu modo, o rapper Japão, o Dj Jamaika, o b.boy Alan
Jhone Moreira, conhecido artisticamente como “Papel” e o grafiteiro Rivas
(anteriormente conhecido como rapper Kabala) manifestam-se, participam, denunciam,
inserem-se politicamente, afirmam-se, reconhecem-se e constroem, diariamente, novas
espacialidades, a partir desse estilo de vida, bastante particular, que é o hip hop.
A resposta do breaking
O b.boy Papel, nascido na Ceilândia, em 1981, envolveu-se com o breaking em
meados dos anos 1990, quando os jovens que viviam em bairros afastados do centro da
Ceilândia – na periferia da periferia – tinham pouco ou nenhum acesso a espaços
culturais. Esses jovens reuniam-se nas praças, nos campinhos de futebol, nos pátios das
escolas, nas ruas ou nos montes de terra das madeireiras, para ensaiar os movimentos
que viam na televisão ou que aprendiam com os garotos mais velhos, e para treinar seus
saltos mortais. Inicialmente, para Papel, o Movimento hip hop representava uma
oportunidade de se tornar popular na periferia e, era, ainda, um escudo contra o bullying
sofrido, na infância, em função de sua compleição física magrinha. Em um segundo
momento, depois de sua primeira apresentação de dança a menores infratores, no Centro
de Atendimento Juvenil Especializado – CAJE, percebeu que o Movimento hip hop
também tinha uma função social.
Nas décadas de 1980 e 1990, quando o hip hop emergia nas quebradas do
Distrito Federal, dançar breaking significava mais do que apenas aprender um
movimento de dança, significava, sobretudo, a superação dos limites sociais impostos.
Se, na atualidade, o Movimento experimenta alguma aceitação da grande mídia, das
grandes marcas, dos teatros, das companhias de dança, das galerias de arte, etc., a dança
de rua, àquela época, fazia parte de uma cultura verdadeiramente marginal, periférica e
12
Excertos do poema Quando as ruas chamam, de Carlos Augusto – conhecido como Cacá Poeta. A
íntegra do poema encontra-se em Moreira (2015).
impregnada de preconceitos e estigmatizações. Apesar dos contras, na opinião de Papel
(Moreira, 2017), “o movimento hip hop tornou-se universal. Saiu do gueto e hoje ocupa
todos os espaços, periféricos ou não.”.
Em 2017, não há mais como falar sobre a Ceilândia sem perpassar o Movimento
hip hop:
Ceilândia respira hip hop: em todo lugar que você vai, algo
relacionado com a arte urbana acontece – seja um muro sendo
grafitado, uma oficina de dança sendo ofertada em uma escola (...). O
Estado já consegue enxergar a nossa arte marginal como uma parceira
importante tanto no resgate (por esse lado social), como na educação,
na saúde, etc. Simultaneamente, muitos espaços estão sendo abertos,
no Plano Piloto, para eventos relacionados à arte urbana. (idem
ibidem)
Questionado acerca dos impactos do hip hop na vida urbana e acerca de sua
relação identitária com a Ceilândia, Papel esclarece que, antes de seu envolvimento com
o breaking, mal conhecida o lugar onde morava, o Setor O. Por meio do hip hop –
“movimento periférico, marginal, de rua” – teve a oportunidade de apresentar seu
trabalho em mais de 05 países, de conquistar mais de 30 títulos nacionais e de participar
em importantes programas e projetos, no Brasil e no exterior13
: “a arte foi um
instrumento que me proporcionou coisas muito bacanas e, por meio dos meus projetos,
eu devolvo para a comunidade o que eu tive”. Em agradecimento, afirma-se
ceilandense em todos os espaços que frequenta e, em todos os seus trabalhos, busca
potencializar e promover o que a Ceilândia tem de melhor. Se antes havia a necessidade
de estar dentro de Brasília (do Plano Piloto), para adquirir visibilidade, hoje, na visão de
Papel, os integrantes do Movimento hip hop trilha um “contra-caminho”:
As pessoas têm que vir onde a gente está: hoje, a gente procura fazer o
caminho contrário. É como se a gente estivesse morando em outro
Estado... a Ceilândia é tão perto, mas ao mesmo tempo tem uma
diferença tão grande. (...) Pra mim, a Ceilândia é o berço do hip hop
mundial, independentemente do que a história oficial conta, a gente
procura contar a nossa história aqui. (Moreira, 2017)
Mas, como discutido anteriormente, nem sempre a relação do ceilandense com a
Ceilândia foi tão bem resolvida: “Se você falasse que era da Ceilândia, o pai da menina
não queria nem saber”, lembra Papel (idem ibidem). Diante da estigmatização da
Ceilândia, promovida, em grande medida, pela mídia, a arte – a cultura de rua – teve um
papel fundamental no processo identitário. As letras de rap contribuíram para
disseminar a noção de que, apesar de todos os problemas, é bom ser da Ceilândia.
Permanece, porém, a preocupação:
Hoje está na moda dizer que é da periferia. (...) meio que maquiaram
essa ideia do que é viver na periferia. Continuo dizendo que, para
13
Papel destaca sua participação em um Programa do Departamento de Estado Americano voltado para
jovens líderes envolvidos em trabalhos com minorias; seu trabalho em parceria com o Cirque du Soleil e
sua experiência com a dança contemporânea, na Alemanha.
muitos, as dificuldades são as mesmas daquela época. Mudou só a
imagem. Hoje a periferia está nas novelas, é moda, é bonito, é bacana
ser underground, ser marginal... (...) Até o dia em que as televisões
perderem o interesse... talvez a periferia e o hip hop ainda voltem a ser
descartáveis. (idem ibidem)
A história do breaking e a história da Ceilândia apresentam-se como dois lados
da mesma moeda. São, ambas, histórias de resistência, de superação.
Não é fácil ser um dançarino, e de rua, principalmente. (...) A forma
como eu relaciono a dança com a Ceilândia é pela história de
resistência: todos os dançarinos, da época em que eu comecei ou os
atuais, enfrentam diversas dificuldades e todos os dias têm que superar
essas dificuldades, para continuar nesse movimento contra-
hegemônico. Os dançarinos são artistas-resistentes, como todos os
ceilandenses, que levantaram uma cidade inteira com as próprias
mãos. Se, hoje, o movimento hip hop ocupa as festas de bacana da
cidade, se está nos teatros, nas universidades, é justamente porque
construímos essa história, por meio da resistência. Não tínhamos o que
calçar, não tínhamos espaços para praticar. (idem ibidem).
A resposta do breaking ao chamado das ruas é a resposta do improviso. Na
dança de rua, cada um tem a autonomia de ser o que é e de expressar, na sua dança, seu
estado de espírito, sua agressividade, sua alegria, sua visão de mundo. Cada um coloca
na dança o que está sentindo: “(...) você pode colocar o que você de fato é e isso é o
importante pra gente. (...) O movimento é você e quanto mais diferente você for,
melhor... Esse é o bacana de se dançar break.” (idem ibidem). Ainda que todo mundo
aprenda a fazer power moves ou wind mills – movimentos tradicionais do break dancing
– cada dançarino executa os movimentos de uma forma particular. No breaking, tudo é
improvisado – inclusive o espaço onde a dança acontece – motivo pelo qual, talvez, a
dança de rua tenha sido a porta de entrada para os demais elementos do Movimento hip
hop: “O [rapper] Japão foi b.boy e hoje é um cantor renomado no mundo do rap; o Dj
Raffa, hoje um ótimo produtor [musical], também começou como b.boy; o próprio
Rivas, que hoje é um excelente grafiteiro, já foi b.boy [e rapper].” (idem ibidem).
A resposta do graffiti
Rivanilson da Silva Alves – o Rivas – já foi b.boy, integrante dos grupos
Reforços Breakers (1984) e DF Zulu Breakers (1989); foi nacionalmente reconhecido
como o rapper Kabala, integrante dos grupos BSB Boys e, posteriormente, Álibi
(1995), este formado com seu irmão, o Dj Jamaika; fez carreira solo no rap; e,
atualmente, aos 48 anos é um dos grandes nomes do graffiti da Ceilândia e do Distrito
Federal. Tendo transitado, desde 1982, por todos os elementos que compõe o
Movimento hip hop, Rivas conta que, quando sua família se mudou para o Setor P
Norte, ele e o irmão começaram a se envolver com o rap e a criar suas crews na
Ceilândia, apenas por diversão.
À época, não havia espaços institucionais para acolher os quatro elementos do
hip hop: o rap era cantado nas esquinas, nas escolas, nas praças; o breaking era dançado
nas ruas; o graffiti confundia-se com a pichação nos muros da cidade. Em 1989,
começaram a organizar eventos, como a batalha de breaking, na Plataforma superior da
Rodoviária do Plano Piloto, entre o Conic e o Conjunto Nacional – um encontro de
b.boys e b.girls que acontece todo primeiro sábado do mês, hoje nos pilotis da
Biblioteca Nacional. No início da década de 1990, as idas para o Plano Piloto tinham
dois ideais: desbravar um lugar desconhecido e mostrar para os “playboys do Plano” um
estilo de música e um estilo de vida típicos da periferia. Nesse movimento, da periferia
ao centro, esteve sempre presente a tensão e o conflito com a polícia, que associava o
visual (considerado agressivo) dos integrantes do Movimento hip hop, sobretudo jovens
negros das cidades-satélites, à marginalidade e à criminalidade.
O hip hop, desde o princípio, constituiu a linguagem da rua e, por esse motivo,
demorou a entrar nas casas das famílias e a ganhar o respeito e a aceitação dos pais
dessa primeira geração de jovens da Ceilândia, que cresceram junto com a cidade. Foi
esse mesmo Movimento, porém, o responsável por despertar, no ceilandense, um senso
de pertencimento. “Um cara que não tem identidade ou alguma coisa que não tem
identidade fica vagando muito, entendeu? (...) Eu entendo que ter uma identidade é
descobrir quem você é nesse lance todo aí...” (Rivas, 2017). Bem como todos os demais
entrevistados, Rivas (idem ibidem), também cita a Faixa 2 do álbum Sub-Raça como um
ponto de inflexão na história da Ceilândia:
Antigamente falava-se muito mais em Brasília, porque falar que era da
Ceilândia queimava. Só que, por exemplo, a música do Câmbio Negro
mudou essa história, quando eles colocaram a identidade, falaram que
nós somos “Ceilândia”, que nós somos isso aqui, acabou... Aí pronto,
aí muda tudo, a galera começa a olhar e se sentir representada e
valorizar aquilo ali. É massa ver o Japão, ver todo mundo, com
camiseta da Ceilândia. Eu creio que é a única cidade que a galera pega
e compra as camisetas pra vestir e falar assim “Eu sou da Ceilândia” e
vai pra qualquer lugar, e gosta de ir com a camiseta, porque tá
representando. A gente entende que tem uma identidade muito forte, a
galera entendeu isso, tá representando muito bem... (idem ibidem).
Dentro do Movimento hip hop, o graffiti talvez tenha sido o elemento que mais
tardou a se desenvolver, em função, sobretudo, das dificuldades de acesso aos
instrumentos e materiais necessários e em função da criminalização. Rivas conta que,
até os anos 2000, tinha-se acesso apenas a pistolas com compressor – os aerógrafos –,
enquanto, no exterior, todo graffiti era feito com tinta spray especial. Havia muitas
barreiras que dificultavam o caminho para se tornar um grafiteiro. Além disso, no
Brasil, diferentemente do que ocorre no resto do mundo, a origem do graffiti foi
desvirtuada, ao se criarem duas categorias: “Nos Estados Unidos, graffiti é graffiti, mas
aqui, não, um é pichação e o outro é graffiti, um é crime e outro é arte. Tipo isso, né?
(...) não tem nada a ver (...), mas isso foi impregnado na mente de todo mundo... e
mudar isso pode demorar muitos anos, é cultural”.
Interessante ressaltar que as entrevistas realizadas evidenciaram que o
Movimento hip hop busca sempre estimular o auto-reconhecimento de seus integrantes.
No mundo do graffiti, por exemplo, é artista todo aquele que se reconhece como artista.
O Movimento está impregnado de um espírito de luta, de resistência e de construção de
um espaço público mais democrático: são características próprias da vida urbana e do
cotidiano periféricos. O hip hop, por meio de seus festivais, encontros e batalhas não
está interessado apenas em fortalecer cada morador(a) da periferia, mas em criar uma
rede mais ampla, uma consciência periférica em rede. A opção de realizar eventos de
hip hop no Plano Piloto, por exemplo, pouco tem a ver com o status de estar no centro
da capital e muito tem a ver com as facilidades de acesso. Com uma passagem de
ônibus, qualquer pessoa de Valparaíso, da Cidade Ocidental, do Gama ou do Guará,
consegue chegar à Rodoviária do Plano Piloto e participar das atividades. “Por mais que
ele [o Movimento hip hop] entre no Plano Piloto, entre nas galerias ou na televisão, ele
é rua e sempre terá um papel social” (Rivas, 2017).
A resposta do graffiti ao chamado das ruas dá-se pela ligação entre arte e
comunicação. Ao mesmo tempo em que promovem diálogos internos, os muros também
carregam mensagens de diferentes tipos, em um diálogo constante com a cidade e com a
comunidade. Rivas (idem ibidem) conta que, ao criar o Grupo Força Tarefa – com
Fernando Cordeiro, conhecido no mundo do graffiti como “Elon” – a proposta era tratar
cada graffiti, cada trabalho, como uma missão e transmitir, por meio de cada um, uma
mensagem positiva e contextualizada. Um graffiti na Ceilândia Norte, por exemplo, que
sofre mais fortemente com o tráfico de drogas, fala sobre os conflitos daquela área;
outro graffiti, em um local frequentado por jovens pichadores, nas madrugadas, busca
dialogar com esses jovens. “A intenção é trocar ideia com a cidade” (Rivas, 2017).
Embora reconheça que não se pode romantizar o Movimento hip hop, Rivas
considera que todos os estilos de rap e de graffiti têm espaço e tem seu papel dentro do
Movimento. Mesmo o estilo gangsta, por exemplo, cujos maiores traumas foram
denegrir a imagem da mulher, fazer apologia pesada às drogas e às armas, teve seu
papel: chamou atenção para uma realidade periférica que precisava ser modificada.
Nesse sentido, é muito comum o envolvimento de integrantes do Movimento hip hop
com projetos sociais com jovens da periferia, em escolas, em presídios, em centros de
atenção a menores infratores, seja individualmente ou em parceria com as
administrações regionais ou o Governo distrital. Segundo Rivas (idem ibidem), depois
de todos os projetos sociais que realizou, pode afirmar que o graffiti influencia
positivamente a vida dos jovens das periferias do DF. O Movimento tem o potencial de
fortalecer a periferia e sua filosofia, pautada na coletividade e na solidariedade
comunitária.
A resposta do rap
“Nos colocaram pra escolher entre a fome e o crime / Optamos pela
guerrilha, resistência sobrevive / Traz motivação, que nos inspira ser melhor / A lágrima de uma mãe que chora, fala por si só / Estudo e
militância infelizmente é exceção / A revolta da minha gente é fruto da
sua exclusão / De seu padrão que nos mantém no subemprego / Senhores de engenho, ainda exploram nosso povo negro”
14
Embora o rap seja considerado, na história do Movimento hip hop, um acrônimo
para rithm and poetry, para o rapper Japão (2017), as iniciais remetem à revolução, arte
e poesia. As letras dos raps escritas e cantadas por grupos da Ceilândia desde o início
dos anos 1990 não apenas narram o cotidiano violento das periferias, como denunciam a
ausência do poder público, a violência da polícia, a falta de acesso à saúde e à educação,
etc. Ao mesmo tempo que o rap constitui uma ferramenta de resistência à realidade das
ruas, ele também se afirma, na rua, como resistência. Nas palavras de Japão (2016), é
“um meio de comunicação de áreas de conflito, entre pessoas que vivem em conflito
morando na mesma área...” e, nesse sentido, ele é, também, a expressão máxima do
direito à palavra no espaço público – a mesma definição que o filósofo francês Étienne
Balibar (1998 apud Canclini, 2007) dá à cidadania. Ao lançar luz sobre os conflitos e ao
conferir pessoalidade e identidade à quebrada, o rap desafia (de forma não unívoca) o
status quo.
Nem o Movimento nem o rap podem ser vistos, como nos lembra o Dj Jamaika
(2016), como o salvador do mundo ou o “Jesus Cristo” da música, respectivamente,
mas, ainda que cante maldades, vícios ou ideologias questionáveis e ainda que, às
vezes, pareça sofrer de um transtorno dissociativo de identidade – ou transtorno de
múltiplas personalidades – o Movimento hip hop não se furta a oferecer respostas em
recusa aos padrões culturais convencionais. Nas palavras de Contier (2005, s/p.) “o rap
caracteriza-se pela reinvenção do cotidiano, através da oralidade de pessoas comuns,
que denunciam, em suas canções, problemas graves, vivenciados em situações sociais
extremamente adversas e totalmente negligenciados pelos Donos do Poder”.
Para a geração da década de 1970, que nasce e cresce junto com a Ceilândia – da
qual fazem parte Japão, Jamaika e Rivas – a dimensão geográfica sempre teve
preponderância na sua formação social e identitária. A viela 17, localizada na expansão
do Setor O, também conhecido como “Fundão”, dá nome ao grupo de rap liderado,
desde 2000, pelo rapper Japão. Tanto o nome da rua, quanto o nome da Ceilândia –
também referida como CEI – figura implícita ou explicitamente na quase totalidade das
letras de rap do grupo, em um claro sinal de apropriação, por meio do fazer artístico, de
um espaço impregnado de disputas de significado e disputas de poder.
Quando questionados se Brasília e a Ceilândia são partes da mesma cidade, o
rapper Japão e o Dj Jamaika reafirmam o ponto de vista de todos os entrevistados:
Pro Governo é. Porque era Governo de Brasília e do Distrito Federal e agora
é só Governo de Brasília, então pro Governo é... Só que aquela Brasília é
muito mais bem tratada do que essa aqui... Então não é... Pra mim, aqui é
Distrito Federal, sempre foi... Sempre foi...
Eu costumo falar, eu falei até no filme do Adirley Queiroz , quando eu
participei, eu falo: „Não, peraí... Eu sou ceilandense... Eu não sou
brasiliense!‟ (Japão, 2016, grifo nosso)
14
Trecho da música Eles falam enquanto deveriam ouvir, do Grupo Viela 17 (2014), comandado pelo
rapper Japão.
***
Não. Naquele filme, Rap, o canto da Ceilândia, a gente definiu muito bem
isso, assim... Ceilândia é Ceilândia... Nós estamos dentro do Distrito Federal
e não dentro de Brasília. Tanto que, na época, a galera não foi colocada aqui,
foi jogada aqui. Essa é a grande verdade. Ninguém veio querendo vir pra cá...
Lá [onde estavam], por pior que fosse, tava bom, mas quanto mais distante
ficasse [do Plano Piloto], seria melhor pra eles lá...morou?
Afastou, afastou, mas aí nasceu outra... Afasta e nasce... [a periferia] é como
um vírus, né? (Jamaika, 2016)
Dentre os elementos do Movimento hip hop, o rap talvez seja o que tem
conseguido formular a resposta mais clara ao chamado das ruas. Trata-se de uma
resposta crua, que não acredita que os muros que segregam o povo periférico sejam
imaginários.
Ele [o muro] é real, ele existe, e ele segura ... E ele expele. Se você chega, ele
te expulsa. Sabe por quê? Porque você não se sente bem em um local em que
as pessoas que são parecidas com você não se sentem bem... Japão (2016)
O rap periférico atua na tentativa de criar algo diferente no espaço urbano, uma
forma de chamar atenção para um espaço público abandonado, geralmente em função
do medo endêmico denunciado por Bauman (2009) e Dunker (2015): da violência, da
polícia ou de enfrentar os próprios medos, fato que se agrava se tomarmos em conta que
a criminalidade endêmica é um elemento que faz desaparecer o espaço público
Bourdieu (1999). “... Pra que essas grades?”, questiona Japão, apontando pras grades
que cercam o bar onde o rapper nos concedeu a entrevista. “... Ah, é pra segurança!"...
“Não, não é pra segurança não, é pra se esconder de si próprio...”, ele mesmo responde.
Eu acredito na paz, chega mais, vai que vai... / Troque o canhão por um
livro, mostre que é capaz / Olha bem, polícia invade seu barraco, sem
mandato / Xinga sua esposa, quebra tudo, depois sai vazado / Aqui a lei do
tom impera, quem tem quadrada é o cara / O dono da favela... / Aqui é foda,
mas, irmão, eu amo essa porra / Ceilândia Norte, resistência, véi, eu to de
boa!15
Na faixa 07 do álbum 20 de 40, intitulada “Foi complicado pra chegar aqui”, o grupo
Viela 17 (2014b) narra a história da Ceilândia, pelo viés da resistência e da superação:
Passaram vários anos, vários planos, mas aqui cheguei / Como foi sofrido,
foi corrido, como sustentei.../ Moleque, com coragem meu cansaço sempre
superei; muitos na ganância, despreparo, os “fora da lei”... / Com o sangue
quente, uns caíram mortos, outros vivem, uns cresceram fortes, outros
fracos, quem tem fé insiste. / Tipo cheio de ódio, mas não pode ou não foge à
visão, o tipo de artista de quebrada vindo da prisão./ Não colhi o fruto da
discórdia onde eu passei, fui nocauteado várias vezes, mas me levantei /
junto a fé em Deus com muita força, nunca a queda vinga / fui com todo gás
em cima do que mais queria / Tive bons momentos, mas sonhar não cansa
meu irmão, ...de empilhar lixo a soldar, honrei a missão / Filho do orgulho,
tá ligado? Minha mãe confirma / Foi com muito esforço e muito trampo,
criei minha família / mas a caminhada tá distante, não temo o açoite / virei
lata igual cão, Ceilândia o palco das dores / Sempre calejado, o pivete foi
guerreiro, liga / Nunca tive infância, pois lazer não é sustento, firma / ...O
15 Trecho da música Ceilândia Resistência, do grupo Viela 17.
frio da noite, o pouco rango, a falta de opção, fez de mim um homem, não um
fraco, maldito cuzão / Não temo a queda, nem tampouco acredito em sorte,
sou de raça bruta, e ser ligeiro me livrou da morte.
Refrão: hei, foi complicado, mas cheguei aqui / quebrei todo limite que havia
em mim / sorrir, chorar, cair, aprender, me levantar... / eu sei... / o que me
permite respirar é o dom que a vida deu pra superar e caminhar sem olhar
pra trás, seguir enfim...
De forma ainda mais agressiva, o Grupo Álibi escancara a realidade da Ceilândia,
narrando o cotidiano e a disputa por território, na música Reino da Morte, faixa 11 do
Álbum Abutre, dedicada à „cidade‟:
Cansei de ver meus chegados serem baleados, esfaqueados / condecorados
com o aço da sorte / vivendo entre a vida e a morte, tá ligado?
Calibre por calibre, lado movimentado, roubos, assassinatos, maconha,
merla e coca / mais uma boca de fumo estourada nas tora / Enquanto isso
outras 10 são abertas, é festa! /
Cuidado para não levar um eco na testa / a morte é gente boa, véi, ela é
quem te escolhe / sempre fode o lado da rapaziada, vê se pode... / Mas tá
limpo com um pouco de sacrifício / atravessar a vontade de viver, não é tão
difícil /
Limitada, véi, entre Taguá e Cei / seu ponto forte poucos sabem e é bom
assim / entardecer, quase escuro, já eram três tubos
Um Dreher, uma cerva / assim é o dia inteiro, dominó, um vício, Jamaika,
meu parceiro / Quina de Ás, você sabe como é que faz / Décima sétima, se
Deus quiser, véi, nunca mais
Refrão
Os versos do Reino da Morte ditam sua sorte
nossa vida já é escassa em Ceilândia Norte
O rap e as periferias não apenas têm muito a dizer, como têm um papel central
na construção de espaços públicos mais democráticos e na construção cotidiana das
cidades e, sobretudo, das periferias contemporâneas.
Construindo um discurso: o potencial político da cultura periférica
Em tempos hipermodernos, de movimentos sociais cada vez mais fragmentados
e multidimensionais já não parece adequado afirmar que a “garantia de permanência”
seja uma prerrogativa das obras de arte, conforme afirma Gorovitz (En Saboia e Derntl,
2014, p. 38). Apesar do desejo precoce de se proteger a cidade de Brasília – antes
mesmo de seu nascimento, como discutido em trabalho anterior (Peres, 2016) – e da
iniciativa de reconhecê-la como Patrimônio Mundial, porque representa, na opinião da
UNESCO (2015), “uma obra-prima do gênio criativo humano”, não se pode esperar que
uma cidade permaneça, no tempo, cristalizada no espaço. A cidade, comparada
inicialmente a um caleidoscópio, está em constante transformação, pois é moldada,
inevitavelmente, por uma coletividade que tem a liberdade de construí-la e reconstruí-la.
Se a cidade é a tentativa mais bem-sucedida do homem de reconstruir o mundo
em que vive o mais próximo do seu desejo, como afirma Robert Park (1987), e se as
cidades são “por excelência, os „laboratórios‟ onde as resistências, as rebeldias, as novas
formas de solidariedade e os novos discursos críticos se vão gestando”, como afirma
Souza (2006, p. 27), então é possível concluir que a Ceilândia, espaço periférico,
culturalmente complexo e pujante, parece-se mais com as definições de cidade
propostas pelos autores supracitados do que o próprio centro urbano, cidade-patrimônio
que se pretende imutável. A cidade, enquanto locus de partilha, de dissenso e de
resistência evidencia-se, talvez, mais na Ceilândia do que no Plano Piloto.
A periferia carrega o germe da impermanência e, nesse sentido, alimenta-se da
mesma coisa que a transforma: o conflito. Ao mesmo tempo, constitui um terreno fértil
para a manifestação de diversas formas de arte urbana, um tipo de arte comumente
controlada e domesticada, às vezes considerada uma subcategoria, ilegítima, por ser
transgressora e ter seu fazer desautorizado (Marzadro, 2013). Para que possamos incluir
a arte urbana periférica no hall das obras de arte, há que se abandonar, necessariamente,
a noção de que a permanência é requisito de tais obras e assumir a arte como qualquer
tentativa de contradomesticação ou contranaturalização, que nos incite a realizar
ressignificações antropofágicas e a assumir que “arte não é o que o curador diz que é
arte” (Russi, 2017, s/p). Não nos interessa, de fato, a discussão sobre o enquadramento
ou não do Movimento hip hop em um movimento artístico ou do rap, do break e do
graffiti, considerados individualmente, no repertório de obras de arte. Interessa, por
outro lado, seu potencial de construir outras narrativas, perspectivas, visões de mundo,
caminhos interpretativos. Nesse sentido, a própria cidade pode ser considerada uma
obra de arte coletiva.
O que seria, então, a potência periférica no contexto dessa outra modernidade?
Utopia? Heterotopia? Um espaço justaposto ou superposto ao centro? Se o discurso pós-
moderno se constrói por colagem ou montagem e se o Movimento hip hop faz parte de
um discurso mais amplo acerca da identidade periférica e da afirmação de
pertencimento cultural e geográfico, parece lógica a necessidade de aceitar não apenas
sua fragmentação, como reconhecer seu papel político. O que é a periferia se não um
fragmento de vidro colorido, enquadrado por um caleidoscópio, diverso e em constante
mutação?
Segundo Bauman (2010, p. 97), na cruzada cultural, “a luta pelo espaço público,
então cada vez mais compreendido como um espaço policiado, um espaço ordeiro, um
sistema seguro de fossos e barreiras de proteção que guardam a fortaleza do novo poder
social”, torna-se uma questão política central. Analogamente, Castells (1999b)
considera que as “batalhas culturais são as lutas pelo poder na Era da Informação”, lutas
travadas, sobretudo, no campo midiático, simbólico, pelos detentores do poder, aqueles
que têm a capacidade de impor comportamentos, manipular símbolos e atribuir
significados e valores hegemônicos. Nesse espaço de lutas e de disputas, diversos
direitos são negados à sociedade em nome da racionalidade e da funcionalidade; em
nome do compromisso estético (e em detrimento do ético). O que está em jogo, nas
cidades não é apenas o julgamento estético, mas “o controle dos lugares” (Bauman,
2010, p. 97).
De acordo com Dunker (2015b), a saída para a asfixia e para o empobrecimento
provocado pela vida condominial são as ruas. Essas ruas – sobretudo as periféricas,
mais facilmente apropriadas pelo Movimento hip hop – demonstram maior capacidade
de resistir às ambições modernistas de homogeneização e às tendências pós-modernas
de cristalização do abismo entre o eu e o outro. Espaços públicos como estes, que
reconhecem o “valor criativo das diversidades e sua capacidade de tornar a vida mais
intensa, encorajam as diferenças a empenhar-se num diálogo significativo.” (Bauman,
2009, p. 62).
Embora a periferia ainda constitua um espaço de ausências – sobretudo do poder
público –, o termo “periferia” transborda a noção dominante até os anos 1980, de franjas
urbanas em que se amontoam residências precárias, e assume, atualmente, por meio da
cultura – da música, da literatura, do cinema, do teatro, da dança – um novo significado
(Tommasi, Em Silva e Ziviani, 2016). É provável que os sofrimentos cotidianos da vida
periférica, muitas vezes pautados em experiências de injustiça ou de desigualdade, não
sejam compartilhados e, consequentemente, reconhecidos. Dentre as diversas formas de
compartilhamento de um sofrimento, pode-se citar a história oral, as rodas de conversas,
os encontros temáticos, os debates acadêmicos ou a arte – música, dança, graffiti,
batalhas de breakers, rappers ou mcs. De acordo com o psicanalista e professor
Christian Ingo Lenz Dunker (2015b), enquanto o Brasil adota o modelo da “sociedade
de condomínio” e se enclausura na “lógica da rejeição do outro”, a juventude lança-se
na reivindicação radical do espaço público.
Ainda segundo Dunker (idem), um sofrimento, quando escutado e reconhecido,
tem um potencial de “enlaçador social”, tem uma força simbólica de transformação da
experiência por meio da narrativa e tem, ainda, um sentido político, pois coloca o
indivíduo diante da necessidade de agir e tomar decisões. Na opinião do b.boy Papel,
Não só a cultura periférica, mas a periferia como um todo não sabe o
potencial que ela tem. O dia que ela descobrir isso, vai ser uma grande
revolução. (...) A arte urbana, e a arte em geral, tem esse desafio e tem
que ter essa responsabilidade, de entender o que a gente é capaz de
fazer e de difundir isso para a nossa comunidade. (Moreira, 2017).
A fala de Rivas (2017) ilustra a fragmentação hipermoderna do Movimento hip
hop da Ceilândia, ao defender que
a cultura periférica sempre teve potencial político, mesmo sem saber.
Enquanto a periferia não sabia, quem olhava e sabia, usava a periferia.
Hoje é diferente, porque essa consciência política muita gente já tem
hoje... então hoje sabe que existe uma força muito grande e existe uma
voz muito forte... e às vezes é tão grande e é tão forte que acaba não se
juntando.
O maior desafio do hip hop, na atualidade, uma vez adquirida a consciência
política, é, justamente o de transformar o fazer artístico em fazer político. Para alcançar
sua pretensão macro de mudar o sistema, o hip hop tem como objetivo causar
microimpactos locais, “porque, o sistema, ele é sinistro, só bater de frente dá conflito,
dá barulho, mudanças acontecem, mas muita violência vai rolar, muita gente vai morrer
(...) Hoje, eu prefiro influenciar você do que tentar influenciar toda a faculdade lá”
(idem ibidem). O caminho político que vem sendo trilhado pelo Brasil tem demonstrado
que a mudança é um processo e que mudanças estruturais exigirão mais do que pessoas
bem intencionadas assumindo o poder. Ainda segundo Rivas, o grande desafio político
do hip hop reside na diferença e na distância que existe entre luta e gestão: “o cara que
luta tem uma mente diferente do cara que administra”.
A modernidade ocidental, ao mesmo tempo que (...) separou a
racionalidade estética da racionalidade política angustiou-se sobre as
relações entre elas. Desde Richard Wagner (“Arte e Revolução”, de
1849) a Leon Trotski (“Literatura e Arte”, de 1923) o que separa a arte
e a política é também o que as une: são dois modos de fazer emergir o
possível, o “ainda-não” das sociedades. Os meios que usam e os
modos como surgem fazem toda a diferença e por isso é que a relação
entre elas é tão complexa. Uma coisa é certa: o rap, tal como o blues,
não podia ter sido inventado pela classe dominante. Rimbaud dizia
que a arte, como a poesia, vai sempre à frente. Mas à frente de quê?
(SANTOS, 2010)
Mesmo distante do centro – geográfica, política, econômica, social e
culturalmente – a periferia exerce sua influência. Desagrada, pela desordem, os
acostumados com a branquidão, a ordem e a limpeza dos centros. No caso de Brasília,
as periferias desafiam os inventores do Plano Piloto modernista ao apresentar-lhes uma
outra estética, não-planejada. O Movimento hip hop, essa mistura de diferentes
linguagens que coexistem na periferia, desafia o saber colonizador e assume, às vezes
inconscientemente, o papel de descolonizá-lo, de tirar a ciência eurocêntrica do
pedestal. Ao extrapolar os 4 elementos que constituíam o Movimento em seus
primórdios, o hip hop do século XXI atua nos campos social, estético, intelectual,
cultural e político, construindo novas epistemes e ressignificando a periferia a partir de
uma perspectiva que se poderia chamar „decolonial‟, porque olha para a periferia e para
as questões periféricas, com olhos periférico. Nesse movimento „da periferia ao centro‟,
o objetivo não é chegar ao centro, permanecer no centro ou tornar-se centro, mas fazer o
centro virar periferia – reforçar a ideia de pertencimento e de identificação entre o
periférico e sua periferia, contar novas histórias, com as quais o periférico e identifique,
reescrever a história na visão dos oprimidos, desconstruir falsos heróis, tornar-se uma
tecnologia social, descer dos palcos, para disseminar novos saberes e fazeres, promover
a soldagem das fraturas urbanas: entre a consciência e o mundo, a utopia e a realidade, o
passado e o futuro, o eu e o outro.
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