gestalt terapia 02

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Documento não controlado - AN03FREV001 38 PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA Portal Educação CURSO DE Gestalt-terapia Aluno: EaD - Educação a Distância Portal Educação

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gestalt terapia 02

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  • Documento no controlado - AN03FREV001 38

    PROGRAMA DE EDUCAO CONTINUADA A DISTNCIA Portal Educao

    CURSO DE

    Gestalt-terapia

    Aluno:

    EaD - Educao a Distncia Portal Educao

  • Documento no controlado - AN03FREV001 39

    CURSO DE

    Gestalt-terapia

    MDULO II

    Ateno: O material deste mdulo est disponvel apenas como parmetro de estudos para este Programa de Educao Continuada. proibida qualquer forma de comercializao ou distribuio do mesmo sem a autorizao expressa do Portal Educao. Os crditos do contedo aqui contido so dados aos seus respectivos autores descritos nas Referncias Bibliogrficas.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 40

    MDULO II

    Conceitos Estruturantes 6 PSICOLOGIA DA GESTALT

    A Psicologia da forma, Psicologia da Gestalt, Gestaltismo ou simplesmente

    Gestalt uma teoria da psicologia que considera os fenmenos psicolgicos como

    um conjunto autnomo, indivisvel e articulado na sua configurao, organizao e

    lei interna.

    A teoria foi criada pelos psiclogos alemes Max Wertheimer (1880-1943),

    Wolfgang Khler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1940), nos princpios do sculo

    XX, mais precisamente em 1912. Estes trabalhos foram uma continuao dos

    trabalhos de Christian Von Ehrenfels (1859-1932), psiclogo austraco, precursor

    desta escola do pensamento.

    Ehrenfels lanou, em 1890, as bases da Psicologia da Gestalt. Sua primeira

    constatao foi a diviso de duas espcies de qualidades da forma: as sensveis,

    prprias do objeto, e as formais, prprias da nossa concepo. So as primeiras

    agrupadas de acordo com as ltimas que formam o conjunto e possibilitam a

    percepo.

    A partir destas ideias e da oposio concepo de Wilhelm Wundt (1832-

    1920), considerado o fundador da psicologia moderna e experimental, Wertheimer,

    Khler e Koffka comearam um trabalho dentro da Universidade de Frankfurt.

    A Psicologia da Gestalt um movimento que atua na rea da teoria da

    forma. Ela prope que o crebro humano tende automaticamente a desmembrar a

    imagem em diferentes partes, organiz-las de acordo com semelhanas de forma,

    tamanho, cor, textura, etc., que por sua vez sero reagrupadas de novo em um

    conjunto grfico que possibilita a compreenso do significado exposto. O princpio

    bsico da teoria gestaltista que o inteiro interpretado de maneira diferente

  • Documento no controlado - AN03FREV001 41

    que a soma de suas partes. Esta premissa levou ao descobrimento de diferentes fenmenos que ocorrem durante o processo da percepo.

    FIGURA 21

    A mesa um objeto distinto da soma de suas partes.

    Wertheimer pde provar, experimentalmente, que diferentes formas de

    organizao perceptiva so percebidas de forma organizada e com significado

    distinto por cada pessoa. Basearam nisso a ideia de que o conhecimento do mundo

    se obtm por meio de elementos que por si s constituem formas organizadas. Por

    exemplo: uma cadeira mais do que quatro pernas, um assento e um encosto. Uma

    cadeira tudo isso, mas mais que isso: est presente na nossa mente como um

    smbolo de algo distinto de seus elementos.

    Um importante movimento estudado e denominado por ele foi o fenmeno

    phi. Quando a representao de determinada frequncia no transposta, se tem a

    impresso de continuidade e movimento. O cinema e/ou os desenhos animados

    foram construdos baseado nessa iluso de movimento.

    Os gestaltistas, por meio de experincias em laboratrios, resolveram

    estudar a personalidade como um todo. Eles comearam pelos mecanismos

    fisiolgicos e psicolgicos, mas depois estenderam suas pesquisas memria, 1 FONTE: Disponvel em: . Acesso em: 20 nov. 2010.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 42

    inteligncia e expresso, sempre baseadas na percepo e nas relaes do

    organismo com o meio.

    No processo de percepo h fatores objetivos e subjetivos, cuja

    importncia relativa ir variar. Para representar esta relao entre o organismo e o

    meio, a pessoa tende a isolar as boas formas. O mesmo acontece entre as

    relaes de figura-fundo. Todo o campo perceptivo se diferencia em um fundo e em

    uma forma ou figura. Estes dois elementos esto intimamente ligados e no existem

    independentemente. Estes conceitos representam um foco importante dentro da

    teoria da Gestalt-terapia.

    Por meio das confirmaes dos Gestaltistas, pode-se provar que h uma

    relao dialtica entre o sujeito e o objeto, ao contrrio do que at ento se

    pretendia comprovar por intermdio da pretensa objetividade cientfica. Eles

    acreditavam e provaram que o aspecto do objeto depende das necessidades do

    sujeito e vice-versa.

    O design, a arquitetura, a arte, a moda e a prpria Gestalt-terapia utilizam as

    leis da Gestalt o tempo todo, muitas vezes, at de forma inconsciente. Este

    pensamento ajuda as pessoas a assimilarem informaes e entenderem as

    mensagens que so passadas.

    Esta teoria descobriu certas leis que regem a percepo humana das

    formas, facilitando a compreenso das imagens e ideias. Essas leis so nada menos

    que concluses sobre o comportamento natural do crebro, quando age no processo

    de percepo.

    Os elementos constitutivos so agrupados de acordo com as caractersticas

    que possuem entre si, como semelhana, proximidade e outras que veremos a

    seguir. O fato de o crebro agir em concordncia com os princpios Gestlticos j

    poderia ser considerado a evidncia fundamental de que a Lei da Pregnncia

    verdadeira.

    Segue abaixo um resumo sobre as Leis da Gestalt:

    LeidaSemelhanaouLeidaSimilaridade:possivelmente a lei mais bvia, que define que os objetos similares tendem a se agrupar. A similaridade pode

    acontecer na cor dos objetos, na textura e na sensao de massa dos elementos.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 43

    Estas caractersticas podem ser exploradas quando desejamos criar relaes ou

    agrupar elementos na composio de uma figura. Por outro lado, o mau uso da

    similaridade pode dificultar a percepo visual como, por exemplo, o uso de texturas

    semelhantes em elementos do "fundo" e em elementos do primeiro plano 2.

    Lei da Proximidade: os elementos so agrupados de acordo com a distncia a que se encontram uns dos outros. Quanto mais perto uns dos outros,

    mais so percebidos como um grupo. Quanto mais longe, menos so associados a

    uma mesma unidade ou grupo.

    Lei da Continuidade: est relacionada coincidncia de direes, ou alinhamento, das formas dispostas. Se vrios elementos de um quadro apontam

    para o mesmo canto, por exemplo, o resultado final "fluir" mais naturalmente. Isso

    logicamente facilita a compreenso. Os elementos harmnicos produzem um

    conjunto harmnico. O conceito de boa continuidade est ligado ao alinhamento. Em

    vez de ver linhas e ngulos separados, elas so vistas como uma s, pois dois

    elementos alinhados passam a impresso de estarem relacionados.

    2 Todas as figuras a seguir referentes s Leis da Gestalt e possuem a seguinte fonte: Disponvel em: . Acesso em: 20 abr.. 2010.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 44

    Lei da Pregnncia ou Lei da Simplicidade: esta lei a que mais influencia a Gestalt-terapia e, tambm, a mais importante de todas, possivelmente,

    ou pelo menos a mais sinttica. Diz que todas as formas tendem a ser percebidas

    em seu carter mais simples, por isso simplicidade: uma espada e um escudo

    podem tornar-se uma reta e um crculo, e um homem pode ser um aglomerado de

    formas geomtricas. o princpio da simplificao natural da percepo. Quanto

    mais simples, mais facilmente assimilada: desta forma, a parte mais facilmente

    compreendida em um desenho a mais regular, que requer menos simplificao.

    Assim, a pregnncia da imagem diz respeito ao caminho natural que ela

    segue em direo boa forma, que , idealmente, a mais simples de todas. E essa

    simplicidade formada justamente por equilbrio, homogeneidade, regularidade e

    simetria.

    O equilbrio final da forma, entretanto, prprio tambm dos elementos que

    a compem. A forma equilibrada quando suas partes tambm estabelecem

    correlaes equilibradas, pois, para a Gestalt, o todo um elemento prprio, mas

    refere-se sempre s correlaes entre suas partes.

    LeidoFechamentoouLeidaClausura: elementos so agrupados se eles parecem se completar. Nossa mente v um objeto completo mesmo quando

    no h um, ou seja, o princpio de que a boa forma se completa, se fecha sobre si

    mesma, formando uma figura delimitada. O conceito de clausura relaciona-se ao

  • Documento no controlado - AN03FREV001 45

    fechamento visual, como se completssemos visualmente um objeto incompleto.

    7 AQUI E AGORA

    Prestem ateno naquilo que se encontra presente, aqui e agora para vocs,

    neste momento. Do que voc est consciente? Do texto que est lendo? De um

    barulho que est do lado de fora? De um toque do telefone? De uma campainha?

    De alguma dor presente em voc?

    A ideia de que apenas o presente existe agora est no cerne do

    entendimento de homem e de mundo na abordagem gestltica, e,

    consequentemente no olhar que lana sobre a relao teraputica.

    Durante muitos anos, os psicoterapeutas trabalharam com a ideia de um

    presente como se: o sentimento presente na relao teraputica era compreendido

    como se fosse uma reedio de um sentimento do passado; uma atitude na relao

    teraputica era como se fosse uma revivncia de uma relao no resolvida no

    passado. Todas estas vises esto impregnadas das ideias psicanalticas, que, no

    podemos negar, ampliou muito a concepo das foras que estavam em jogo na

    relao teraputica. Porm, todo o presente visto como uma projeo do passado.

    Pensemos em um exemplo:

    Em determinado momento de uma sesso de terapia, o cliente mostra-se

    visivelmente bravo com o terapeuta (o visivelmente tambm possvel, a partir do

    momento em que podemos perceber o cliente no aqui e agora, em sua totalidade,

    isto , embora este possa no dizer verbalmente que est bravo ou com raiva, seu

    corpo, sua postura, sua voz ou sua fisionomia o fazem. Para que eu assim o

    perceba preciso contat-lo para alm do discurso).

    Aps esta percepo do terapeuta, temos alguns caminhos a seguir: posso

    negligenciar esta percepo e continuar agarrado ao discurso; posso apontar a

  • Documento no controlado - AN03FREV001 46

    minha percepo por meio de uma interpretao (o como se); ou posso explorar

    fenomenologicamente o momento presente, explorando como se sente desta forma,

    o que acontece com seu organismo quando se sente assim, o que est fazendo com

    isso, o que quer fazer com isso agora. Se voc for um Gestalt-terapeuta, certamente

    escolher o terceiro caminho.

    A nfase no momento presente, ou no aqui e agora, no exclui de forma

    alguma as experincias passadas ou planejamentos futuros. Devemos ter cuidado,

    pois em nossa sociedade, na maior parte das vezes, priorizar uma posio significa

    excluir outras. Isto no verdade, pelo menos neste contexto do qual estamos

    falando. As experincias passadas tm enorme importncia para o nosso

    entendimento do presente.

    Pensemos no momento em que estamos vivendo no que se refere s

    alteraes climticas no mundo. Ao fazermos uma explorao fenomenolgica de

    como estas alteraes acontecem, os efeitos que tm no presente, como se

    encontra a camada de oznio, como ela se comporta, estaremos no momento

    presente deste fenmeno. Mas, para que possamos ter uma maior compreenso do

    fato presente, at mesmo em termos de planejamento futuro, precisamos contatar o

    passado; este sem dvida proporcionar mais sentido ao presente. Mas vejamos um

    pouco mais aprofundada esta questo.

    As dimenses de passado e futuro constituem contornos psicolgicos para a

    experincia presente, formando um contexto psicolgico, da qual a figura emergente

    no presente se destaca. No entanto, no podemos confundir a importncia do

    passado e do futuro com a forma de vida como se, isto , viver o presente como se

    estivesse no passado ou no futuro, como muitas pessoas o fazem. Estar no

    presente, lembrando o quanto bom era o passado ou o quanto melhor ser o futuro,

    compromete as possibilidades vitais da existncia. Ouvir de um cliente o quanto

    sofrido e traumtico foi sua infncia de abuso sexual e moral, e tratar o fato apenas

    como acontecimento passado, embora no aqui e agora estejam aparecendo suas

    emoes e reaes a estas lembranas, faz com que o cliente esteja minimamente

    presente.

    De que forma ento poderamos ajudar o cliente a contatar-se efetivamente

    com o presente? Polster e Polster nos respondem:

  • Documento no controlado - AN03FREV001 47

    Se ele tomasse conscincia de sua tenso, sua experincia presente seria

    bastante intensificada. Ento, se pudesse permitir ainda mais que sua

    tenso estagnada crescesse at um sistema vivo de tenso, bem poderia

    contar a sua histria com raiva (...). A tenso tem seu prprio poder de

    direo e lembrana ou no se move para o presente ao expressar-se

    na eloquncia verbal, no choro, no grito, no soco, na repreenso ou em

    outras aes expressivas. O que anteriormente havia ficado sufocado,

    engessado no passado, revive agora por meio das realidades motoras e

    sensoriais atualmente disponveis (POLSTER e POLSTER, 2001, p. 26).

    Outro aspecto importante que compromete o contato com o presente o que

    chamamos de falar sobre. Imagine-se contando uma experincia que teve numa

    viagem. Ao falar sobre a viagem, bem provvel que seus interlocutores ouam o

    que est sendo dito e, aps alguns dias, nem lembrem mais dos detalhes da

    experincia narrada. Experimente, pois, levar os interlocutores a contatarem a sua

    prpria experincia de viagem naquela regio. Suponhamos que voc esteve em

    Bariloche e pela primeira vez viu neve. Optando por no ficar exclusivamente

    falando sobre a viagem, mas explorar a experincia tambm dos interlocutores (por

    exemplo, se eles j viram neve, como foi a experincia, como acham que , qual

    expectativa, o que teriam vontade de fazer, etc.), aps alguns dias bem provvel

    que todos se lembrem para onde voc viajou, qual foi a sua sensao, os lugares

    que voc visitou.

    O que estamos querendo mostrar que quando a fala somente narrativa

    sem envolvimento emocional e sem interesse pela experincia do interlocutor bem

    possvel que esta no represente nada alm de um desabafo, ou seja, tem um valor,

    mas est aqum dos ganhos que podemos ter com uma descrio fenomenolgica

    da experincia.

    O quanto voc aprende com as palestras ouvidas em um congresso?

    Relembre-se de algum que voc tenha ido. O que ainda acessvel a voc em sua

    memria? Compare esta experincia com outra em que voc estava

    verdadeiramente envolvido com o conhecimento em questo. Em qual das duas

    experincias voc estava mais presente? Qual est mais consciente para voc?

    Diante disso, na Gestalt-terapia, o aqui e agora incorporado como uma

    estratgia de enfoque, ou seja, todo o trabalho teraputico est centrado no que o

    cliente traz, naquilo que neste momento ele vive (...) e no descartando qualquer

  • Documento no controlado - AN03FREV001 48

    tipo de informao que seja (...) relevante para o processo teraputico (ELDIO,

    2000, p. 60).

  • Documento no controlado - AN03FREV001 49

    8 A RELAO FIGURA-FUNDO

    Antes de nos debruarmos teoricamente sobre os aspectos relevantes da

    relao figura-fundo, observemos as figuras abaixo. O que conseguem ver? Qual

    figura emerge e qual fundo permanece? Seria possvel a emergncia desta figura

    sem este fundo delineado? Conseguem perceber o dinamismo entre figura que ora

    emerge, ora vai para o fundo?

    FIGURA 33

    Figura 44

    3 FONTE: Disponvel em: . Acesso em: 1 abr. 2010.

    4 FONTE: Disponvel em: . Acesso em: 1 abr. 2010.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 50

    Este apenas um exerccio para que possamos perceber os fenmenos

    presentes em nossa percepo. Na primeira figura conseguiram ver uma velha e

    uma moa? E na segunda, conseguiram perceber um saxofonista e um rosto de

    mulher? bem possvel que aquilo que voc percebeu primeiro esteja relacionado

    com as suas experincias, necessidades ou familiaridade. Esta ideia est ligada

    teoria da Psicologia da Gestalt de que a pessoa que percebe no meramente um

    alvo passivo para o bombardeamento sensorial originrio do meio; ela estrutura e

    impe uma ordem s suas prprias percepes.

    Trazendo esta noo para nossa vida cotidiana, tomemos um exemplo para

    ilustrarmos o dinamismo da relao figura-fundo:

    Lembre-se de um momento em que voc estava com muita fome,

    caminhando na rua de sua cidade. Nos quarteires pelos quais passou, voc passou

    por drogarias, boutiques, livrarias e cinemas. Possivelmente voc olhou, mas no

    viu estes estabelecimentos, ou os viu como no restaurante, limitando o objeto

    quilo que voc espera dele (esperaria que fosse um restaurante, como um no

    restaurante, no me detenho a sua existncia propriamente dita). Provavelmente o

    que voc percebeu foram os restaurantes e lanchonetes, o que refora a ideia de

    que nossas necessidades prioritrias guiam nossa percepo.

    No caso acima a figura emergente no seu campo perceptivo a fome.

    Mesmo que voc tenha que comprar um remdio ou um livro, naquele momento o

    seu organismo est orientado a satisfazer quela necessidade prioritria. Aps a sua

    satisfao ou o fechamento da figura, em que esta se torna fundo, bem provvel

    que voc possa entrar na drogaria ou na livraria, caso estivesse precisando de algo

    neste contexto.

    O fundo compreendido na Gestalt-terapia como o contexto de onde a

    figura emerge. No exemplo acima, a figura fome-restaurante emerge do fundo rua.

    Da mesma forma que a pessoa faminta percebe a comida, mesmo na sua ausncia

    (olha para uma almofada redonda e v um hambrguer), no caso da figura no ser

    fechada e poder ir para o fundo, uma pessoa insatisfeita pode continuar a elaborar

    em suas atividades atuais as questes inacabadas do passado.

    Para Polster e Polster (2001) todas as experincias da vida de uma pessoa

    compem o fundo para o momento presente e identificam trs elementos que

    compem o fundo na vida de uma pessoa.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 51

    8.1 VIVNCIAS ANTERIORES

    O fundo construdo com base nas experincias que vamos acumulando ao

    longo da vida e nos valores a elas associados. Quanto mais diversificadas so

    nossas experincias desde o incio da vida, mais rico ser o nosso fundo e mais

    possibilidades de figuras podem ser produzidas e podem emergir. Ao mesmo tempo,

    a fluidez na relao figura-fundo ser maior, quanto mais flexvel forem os valores

    aprendidos. A criana que desde pequena protegida pelos pais de viver o

    machucar, o cair, o andar, o subir, etc., ter menos chances de ter um fundo muito

    rico, ou com maior acessibilidade e, consequentemente, uma vida menos

    diversificada, talvez at mais repetitiva em seus aspectos negativos e positivos.

    Se o fundo de uma pessoa contm carinho, gentileza ser mais fcil que se

    torne figural para esta pessoa, expresses de simpatia, parceria ou amizade, j que

    isto lhe familiar, logo mais facilmente percebido contra um fundo que contm

    outras informaes no emergentes.

    Em contrapartida, se outra pessoa possui desejos homossexuais e seus

    valores levam em considerao a proibio do choro no homem ou da dureza de

    uma mulher, qualquer emergncia destas demonstraes ter menos probabilidade

    de vir tona, mantendo a figura em aberto (a necessidade de relacionamento

    homossexual), havendo, pois, um ocultamento de partes do fundo. Desta forma, o

    fundo no est livremente disponvel como uma fonte de novas figuras.

    Para Polster e Polster (2001, p. 50):

    (...) medida que o fundo de sua experincia se torna mais diversificado,

    ele tambm se torna potencialmente mais harmonioso com todo um

    contnuo de acontecimentos. A diversidade resultante tem maior

    probabilidade de assegurar um fundo relevante para qualquer coisa que

    possa estar acontecendo no presente.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 52

    8.2 SITUAES INACABADAS

    Podemos considerar situaes inacabadas como aquelas em que a energia

    presente na no satisfao de uma necessidade continua em atividade

    comprometendo as experincias posteriores. Inevitavelmente, nossas figuras

    clamam por clausura, tm uma tendncia natural a se realizar e desocupar o

    status de necessidade (est ligada eliminao do excesso ou da reparao da

    falta), cedendo lugar a novas figuras.

    Se voc no discute com seu chefe, embora quisesse muito faz-lo, e chega

    a casa e descarrega sobre seus filhos, mais provvel que isto no funcione, sendo

    somente uma tentativa parcial de terminar algo que ficou inacabado.

    Se eu tenho um imenso talento para a rea artstica, mas minha famlia quer

    que eu seja mdica, caso me torne mdica, esperado que eu vivencie um enorme

    desconforto por no ter seguido o fluxo de minha figura. Se tiver coragem de abrir

    mo da minha carreira de mdica e seguir o meu talento, possvel que esteja mais

    satisfeita e possa viver genuinamente as minhas experincias atuais.

    claro que nem sempre podemos realizar todas as nossas necessidades. A

    maioria das pessoas tem uma grande capacidade de tolerar situaes inacabadas,

    afinal durante nossa vida estamos destinados a ter muitas delas.

    Apesar de nossa tolerncia, realmente estas situaes procuram a inteireza

    e estas direes incompletas quando obtm poder suficiente, a partir de um grande

    acmulo de energia, o indivduo reage com preocupaes, ruminaes, compulses,

    ansiedades, temores, etc.

    Sempre que as questes inacabadas formam o centro da existncia de uma

    pessoa a efervescncia mental dela fica impedida. Quando, pelo contrrio, somos

    livres e sem impedimentos (inacabamentos), podemos nos envolver em qualquer

    coisa que desperte nosso interesse e permanecer com isso vivo at que diminua e

    algo diferente atraia a nossa ateno; este um processo natural e uma pessoa que

    viva neste ritmo experincia a si mesma como flexvel, clara e efetiva.

    Segundo Polster e Polster (2001) existem dois obstculos que podem

    interferir neste processo natural. O primeiro seria uma necessidade rgida de

  • Documento no controlado - AN03FREV001 53

    completar a situao antiga e inacabada que podemos classificar de compulso ou

    obsesso, levando a uma rigidez na relao figura-fundo. O segundo e oposto

    obstculo seria a labilidade da mente, sendo a pessoa incapaz de focar no presente

    e concluir a experincia, impedindo o fechamento.

    Pessoas com estas caractersticas demonstram dificuldade para explorar a

    formao de uma figura, interrompendo a todo o momento este processo, existindo

    pouca possibilidade dentro delas para que o desenvolvimento de qualquer figura

    atinja a totalidade; no conseguem permanecer ativas o suficiente para sentir uma

    sensao de inteireza. Esta caracterstica de forma exacerbada aponta para um

    quadro manaco: no so capazes de identificar o limite entre a sensao de incio e

    de final.

    8.3 O FLUXO DA EXPERINCIA PRESENTE

    No entanto, mesmo que estejamos imersos num constante movimento entre

    figuras e fundo e este fluxo acontea aqui e agora, no possvel, ou melhor,

    importante que a prpria escolha da figura leve um tempo para se solidificar. Isto ,

    precisamos depurar aquela necessidade emergente a tal ponto que ela esteja

    pronta para ser satisfeita.

    Em alguns momentos, por outro lado, certas imposies do meio, ou

    impossibilidades por ele colocadas impedem que a figura roube a cena e a

    precisamos estar conscientes deste processo de escolha e nos colocarmos, mesmo

    que temporariamente, em suspenso ou entre parnteses. Esta, porm uma

    tcnica arriscada, pois pode significar a supresso de si mesmo ou a represso de

    desejos e necessidades. A distino que no processo de colocar-se entre

    parnteses h uma eleio de prioridade, conforme falamos anteriormente; existe

    um processo consciente de escolha por uma suspenso no momento em que

    julgamos adequado.

    Vivemos muito esta suspenso em nossos relacionamentos afetivos. Se em

    muitos momentos de um relacionamento h uma coincidncia de necessidades, em

  • Documento no controlado - AN03FREV001 54

    tantos outros nos exigido que abramos mo de uma necessidade, naquele

    momento, em prol de um melhor processo comunicativo, ou entendimento.

    Quantas vezes j fomos a reunies familiares estando com outra

    necessidade em aberto, para conseguirmos uma maior harmonia com o meio? Mais

    uma vez, importante ressaltar que o funcional dessas escolhas poder colocar-se

    temporariamente entre parnteses at que seja possvel o fechamento da figura,

    mais a frente.

    A repetio desta tcnica a leva categoria de padro rgido de

    comportamento, o que certamente ter consequncias desastrosas. O colocar-se

    entre parnteses deve ser uma tcnica que nos ajude na nossa relao com o

    mundo e no que nos paralise frente a ele.

    9 TEORIA DE CAMPO

    Para entender o mtodo chamado de Teoria de Campo Fenomenolgica

    preciso entender a concepo do fenmeno. Primeiramente, todo fenmeno deve

    ser considerado legtimo e pode ser investigado. Segundo, experienciar um evento

    significa clarificar os sentimentos, apontar os aspectos subjetivos e os objetivos da

    experincia, e dar-se conta dos aspectos inibidos e negligenciados, sempre

    buscando o processo de aware do cliente (falaremos sobre a awareness mais

    adiante).

    Estes pressupostos s podero tornar-se viveis quando a abordagem

    enfatiza o agora. Esta nfase no presente uma influncia direta da Psicologia da

    Gestalt. A abordagem fenomenolgica de campo utiliza a experimentao

    sistemtica para encontrar uma descrio que seja verdadeira para o estudo do

    fenmeno. Esta experimentao capacita a pessoa a perceber o que adequado ou

    verdadeiro para si mesmo.

    A teoria de campo est muito ligada ao processo cognitivo, ou seja, ela

    indica o processo pelo qual pensamos. Ela nos orienta em relao aos mecanismos

    de avaliao, assimilao de ideias e metodologias e um referencial de

    comunicao.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 55

    Para entendermos o processo de conscientizao da awareness

    necessrio que haja uma interao entre a maneira de pensar e a de estar inserido

    no mundo. A Teoria de Campo se contrape s ideias mecanicistas newtonianas,

    contrariando tambm os pensamentos reducionistas ou dualistas. Ela traz o conceito

    de holismo para dentro do seu escopo terico e abrange uma perspectiva que

    fornece uma integrao do corpo, da mente, das interaes sociais, alm dos

    aspectos espirituais e transpessoais. Esta troca to intensa e dinmica que o

    campo indivduo/ambiente influencia o resto do campo, e o resto do campo

    influencia o indivduo.

    A Teoria de Campo capacita a Gestalt-terapia a manter o foco na pessoa

    como agente ativo. Neste ponto, podemos descrever a relao entre o conceito de

    self e a Teoria de Campo. Se self fosse entendido fora do contexto da Teoria de

    Campo, este poderia ser entendido como um existente concreto, retirando o carter

    ativo da pessoa, ou seja, haveria um centro que faz coisas, mas o Eu deixaria de

    ser este centro do agente ativo.

    A Teoria de Campo tambm ajuda a manter em mente as complexidades

    das relaes de campo no presente e das mudanas que, inevitavelmente, ocorrem

    com o passar do tempo e os diferentes contextos e maneiras pelas quais as pessoas

    constroem os seus selfs.

    O self a fronteira de contato em funcionamento. Sua atividade formar

    figuras e fundos. O self a interao contnua no campo organismo/ambiente, e que

    faz parte do campo.

    Campo um instrumento bsico na abordagem da Teoria de Campo e traz

    uma viso holstica e interativa das foras presentes nele. Para a Gestalt-terapia, o

    relacionamento inerente existncia. Ou melhor, tudo que existe consiste de uma

    teia de relacionamentos que determinada por uma multiplicidade de variveis. O

    contato/relacionamento constitui a primeira realidade para a pessoa, e o organismo

    no tem significado separado do seu ambiente.

    Outro ponto importante que os relacionamentos se constituem dentro de

    uma organizao dinmica e sistmica inerente ao todo. A proposta do campo

    fazer com que a pessoa perceba de forma dinmica e energtica que existem

    possibilidades para o movimento e a interao global do mundo. Podemos ento

    dizer que tudo pode ser definido em termos de um campo todo. Cada evento

  • Documento no controlado - AN03FREV001 56

    nico, ordenado, e pode ser estudado, independente do nmero de repeties para

    classific-lo.

    O campo psicolgico no existe independente das pessoas; as pessoas no

    existem sem esse campo. O indivduo definido, num dado momento, apenas pelo

    campo do qual faz parte, ou seja, os fatores contextuais so considerados inerentes

    e necessrios para a compreenso da pessoa, inclusive, pois o comportamento

    tambm uma funo do campo. O campo organismo/ambiente determina a

    pessoa. A seguir alguns outros conceitos nos ajudaro a compreender a Teoria de

    Campo formulada por Kurt Lewin.

    Devemos perceber que o comportamento regulado pelo meio, mas no um

    meio geogrfico (onde se est), e sim um meio comportamental (onde se pensa que

    est). O meio comportamental uma ligao, um meio termo, entre o meio

    geogrfico e o comportamento. O interessante que a partir do meio

    comportamental podemos, em terapia, conhecer melhor o fenmeno trazido pelo

    cliente, e colocando-o dentro do seu campo, compreender como o todo funciona.

    o prprio conceito de campo que nos conduz a uma totalidade em que se

    unem os conceitos de meio geogrfico e meio comportamental num nico campo, o

    psicofsico, que o lcus do comportamento. Portanto, a pessoa sendo vista como

    um todo na sua relao dentro-fora com o ambiente.

    A teoria de campo de Lewin influenciou fortemente a Gestalt-terapia (GT), e

    apresenta uma grande influncia dos constructos da fsica. Atualmente esta teoria

    tambm aplicada no trabalho com grupos e na psicologia social.

    As principais caractersticas de sua teoria so: o comportamento uma

    funo do campo que existe no momento em que ocorre o comportamento; a anlise

    comea com a situao como um todo, a partir do qual as partes componentes so

    diferenciadas; a pessoa concreta em uma situao concreta pode ser representada

    matematicamente, ou seja, a pessoa sempre vista dentro de um espao maior que

    ela. Um campo definido como a totalidade de fatos coexistentes que so

    concebidos como mutuamente interdependentes, e traz em si uma noo dinmica e

    no esttica.

    O comportamento deixa de ser entendido apenas como resultado da

    realidade interna da pessoa e passa a ser analisado em funo do campo

  • Documento no controlado - AN03FREV001 57

    que existe no momento em que ocorre. A situao comportamental vista

    como um todo, da qual decorrem partes diferenciadas (PONCIANO, 1985,

    p. 95)

    O espao de vida, proposto por Lewin, composto pela pessoa + ambiente

    psicolgico, o universo do psiclogo, o todo da realidade psicolgica, e contm a

    totalidade dos fatos possveis capazes de determinar o comportamento de um

    indivduo; onde o comportamento ocorre. Fora do espao de vida, temos o meio

    no psicolgico que considerado o meio fsico (podendo incluir alguns fatos

    sociais).

    O espao de vida consiste em uma rede de sistemas interconectados, com

    fatos empricos e fenomenais e fatos hipotticos ou dinmicos. As formas como as

    reas interconectadas iro se comunicar determinam o que ele chama de

    dimenses.

    A dimenso proximidade-distncia diz que duas regies so acessveis aos

    fatos de outra regio; a dimenso firmeza-fragilidade determina a resistncia de uma

    fronteira, ou sua permeabilidade, e representada pela largura da linha da fronteira;

    a dimenso fluidez-rigidez a mais importante delas, e determina a qualidade de

    sua superfcie, facilitando a criatividade. Um meio fluido aquele que responde

    rapidamente a qualquer influncia agindo sobre ele, flexvel e malevel. Um meio

    rgido resiste mudana, duro e inelstico.

    Os principais fatos da regio intrapessoal so chamados de necessidades,

    enquanto os fatos do ambiente psicolgico so chamados de valncias. Cada

    necessidade ocupa uma clula separada na regio intrapessoal e cada valncia

    ocupa uma regio separada no ambiente psicolgico.

    O aumento de tenso ou a liberao de energia em uma regio intrapessoal

    causado pelo surgimento de uma necessidade. Lewin conectou a necessidade

    ao, por meio da ao motora. Ele ligou a necessidade a certas propriedades do

    ambiente que ento determinam o tipo de locomoo que vai ocorrer. Essa uma

    maneira muito interessante de conectar a motivao ao comportamento.

    Por valncia, entende-se o valor daquela regio para a pessoa, que pode

    ser: positivo e negativo. Uma regio de valor positivo aquela que contm um

  • Documento no controlado - AN03FREV001 58

    objeto-meta que reduzir a tenso quando a pessoa entrar na regio, ao contrrio da

    negativa, que vai aumentar a tenso.

    Uma valncia uma fora, afinal ela dirige a pessoa por meio de seu

    ambiente psicolgico, mas no proporciona a fora motivadora para a locomoo.

    As propriedades conceituais da fora so: direo, potncia e ponto de aplicao.

    A direo para a qual esse vetor aponta representa a direo da fora, o

    comprimento do vetor representa a potncia da fora, e o lugar onde a ponta da

    flecha se insere na fronteira externa da pessoa representa o ponto de aplicao. A

    mudana do cliente se d quando estes trs conceitos ficam claros para ele. Ele

    sabe que quer ir, em que direo, sente-se com energia e para onde ir. As aes

    que ocorrem dentro do campo so momentneas em funo da inter-relao entre

    as foras e da interdependncia entre elas.

    Conhecer todos esses conceitos, principalmente esta forma fenomenolgica

    de lidar com as situaes, nos leva a um ponto muito interessante que perceber a

    Gestalt-terapia como uma abordagem em que se referencia a filosofia do bvio. O

    bvio no to ntido como parece, pois est repleto de preconceitos, crenas, etc.

    Porm, o maior desafio do bvio conseguir ser agarrado.

    10 AWARENESS E TEORIA PARADOXAL DA MUDANA

    Awareness um conceito fundamental na Gestalt-terapia. Supe-se que

    quanto mais awareness uma pessoa est, mais prxima de si e mais sade ela

    conseguir alcanar.

    No entanto, no tarefa muito fcil alcanar este nvel de awareness,

    principalmente se levarmos em conta o ritmo de vida que temos ultimamente

    apressado e, muitas vezes, implacvel com aqueles que perdem tempo.

    Aware significa conscincia; awareness, conscientizao. Quanto mais

    estamos conscientes de quem ns somos, de como fazemos e para qu fazemos;

    quanto mais estamos conscientes de nossas sensaes corporais, de nossa relao

    figura-fundo, do nosso campo psicolgico e at mesmo geogrfico, mais poderemos

    assumir a responsabilidade pelas nossas escolhas e maiores chances de estarmos

    vivos pelo que somos e no pelo que deveramos ser, ou pelo que os outros

  • Documento no controlado - AN03FREV001 59

    esperam que sejamos. Enfim, temos mais chances de viver a autenticidade de

    nossa existncia, com as dores e delcias de sermos quem somos, parafraseando o

    compositor Caetano Veloso. As funes de contato, no entanto, precisam se

    desenvolver bem para que possamos estar realmente awareness. Discutiremos

    exclusivamente estas funes no mdulo seguinte.

    Yontef (1998) define awareness como:

    (...) uma forma de experienciar. o processo de estar em contato atento

    como evento mais importante do campo indivduo/ambiente como apoio

    energtico, cognitivo, emocional e sensrio-motor totais. Um continuum

    constante e ininterrupto de awareness leva a (...) uma percepo imediata

    da unidade bvia entre elementos dspares no campo. Novas totalidades

    significativas so criadas por contato aware (YONTEF, 1998, p. 236).

    Algumas proposies este autor nos apresenta a respeito deste conceito:

    A awareness eficaz somente quando baseada na energia (necessidade)

    dominante atual do organismo, isto , s estaremos de fato conscientes do

    que se passa conosco se formos realmente capazes de nos colocarmos

    em contato direto com o que est acontecendo aqui e agora.

    A awareness no se completa sem o conhecimento direto da realidade da

    situao (novamente o contato aqui e agora) e de como se est na

    situao. fundamental que este processo seja sucedido pela aceitao

    de si e a assuno da escolha e responsabilidades posteriores.

    A awareness est sempre mudando evoluindo e se transcendendo.

    Existem duas maneiras de o indivduo se autorregular (veremos no prximo

    item): por hbito, isto , pois estamos acostumados a fazer de uma determinada

    forma, sem necessariamente estarmos conscientes da necessidade emergente

    (figura) naquele momento; ou por escolha consciente, onde estaremos awareness

    de nossas necessidades e responsveis pelas escolhas em questo.

    Para que possamos alcanar a mudana em nossa forma de se

    autorregular, passando de uma autorregulao por hbito para uma autorregulao

    aware, primeiramente necessrio aceitarmos quem somos.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 60

    Para isso, precisamos conhecer a ns mesmos: quem somos; o qu

    fazemos; para qu fazemos; como fazemos. Quanto mais consciente somos de ns

    mesmos, mais ser possvel termos controle sobre o ambiente e sobre as mudanas

    que buscamos realizar em ns e no mundo que nos cerca. bem provvel que

    menos sofrimento vivenciemos.

    No entanto, boa parte das pessoas leva a vida tentando ser o que no , ou

    o que acha que deveria ser. Quando nos autorregulamos, mais em funo das

    expectativas do mundo sobre quem deveramos ser do que em funo de nossas

    prprias necessidades, mais nos distanciamos de quem somos e maior o estado de

    tenso produzido em nosso organismo: ele necessita de uma coisa, mas buscamos

    outra para satisfazer s exigncias do mundo e no a nossa.

    Passamos a funcionar deste jeito e seguindo um caminho bastante perigoso,

    pois em algum momento este organismo precisar aliviar a sua tenso. Podemos

    ser surpreendidos por um sintoma fsico e at uma patologia orgnica, como

    tambm podemos externalizar via transtornos mentais.

    A grande parte dos clientes chega para o tratamento esperando que algum

    saiba sobre ele mais do que ele mesmo e lhe d as respostas que busca a respeito

    de um comportamento no adaptado, por exemplo.

    Muitas abordagens aceitam este lugar do terapeuta de quem tudo sabe e o

    cliente, ento, seguir as orientaes deste para a to esperada mudana; aqui h

    claramente um pacto de que minha mudana est nas mos de outrem, reforando

    assim sua falta de awareness e funcionando, muitas vezes, baseado mais em como

    o terapeuta acha que o cliente deve ser do que naquilo que o cliente acha que . O

    cliente acaba agindo mais em razo dos hbitos caracteriolgicos rgidos do que

    pela necessidade atual, e o terapeuta fica com o papel de agente de mudana.

    Beisser apud Yontef (1998, p. 219) prope outra maneira de se enxergar a

    mudana, a partir de sua Teoria Paradoxal da Mudana:

    (...) esta mudana ocorre quando a pessoa se torna o que ela , e no

    quando ela tenta se tornar o que no . A mudana no ocorre por meio de

    uma tentativa coercitiva do indivduo ou de qualquer outra pessoa em mud-

    lo, mas acontece se a pessoa faz o esforo, e leva o tempo necessrio,

    para ser o que estando integralmente de posse de suas posies atuais.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 61

    Pela rejeio do papel de agente de mudana, a tornamos mudana

    ordenada e significativamente possvel.

    Logo, a Gestalt-terapia rejeita o papel de agente transformador, pois, como

    j dito anteriormente, para que possamos dar um passo frente, primeiro temos que

    ter os ps bem firmes no cho. Esta firmeza, este suporte ser alcanado quanto

    mais aware estivermos de ns mesmos, j que muito difcil dar um passo sem esta

    base firme de sustentao de apoio.

    11 TEORIA ORGANSMICA

    O mais importante precursor mdico do conceito organsmico foi Hughlings,

    eminente neurologista ingls. Jan Smuts, soldado e grande estadista ingls da frica

    do Sul, reconhecido como o precursor filosfico da Teoria Organsmica. Smuts

    construiu a palavra holismo da raiz grega holos, todo, completo, inteiro. Outras

    fontes de onde a Teoria Organsmica bebeu foi Aristteles, Goetche, Spinoza e

    William James.

    O movimento gestaltista tambm se utilizou das ideias organsmicas para

    pautar suas observaes. Este movimento defendia uma nova espcie de anlise da

    experincia consciente. No entanto, os gestaltistas e a Psicologia da Gestalt

    basearam seus estudos nas dimenses perceptivas e no fenmeno da conscincia,

    dispensando poucos estudos sobre o organismo ou a personalidade como um todo.

    A Teoria Organsmica tomou por emprstimos muitos conceitos da Psicologia da

    Gestalt; a Psicologia organsmica pode ser considerada uma extenso dos princpios

    da Psicologia da Gestalt ao organismo como um todo.

    Kurt Goldstein, neuropsiquiatra, considerado um expoente da Teoria

    Organsmica. Em grande parte como resultado de suas observaes sobre as

    leses cerebrais dos soldados durante a Primeira Guerra Mundial e de seus estudos

    sobre a linguagem, Goldstein conclui que um determinado sintoma no pode ser

    compreendido somente a partir de certa leso orgnica, mas do organismo como um

    todo. O organismo se comporta como um todo unificado e no como um conjunto de

    partes (noo muito semelhante ao da Psicologia da Gestalt, mas aplicado ao

  • Documento no controlado - AN03FREV001 62

    organismo total e no s percepo).

    Hall e Lindzey (1973, p. 330) afirmam que o corpo e a mente no so

    entidades separadas, e nem mesmo a mente constituda por faculdades ou

    elementos independentes. O organismo uma s unidade; o que ocorre em uma

    parte, afeta o todo.

    As principais caractersticas da teoria organsmica so:

    A teoria organsmica destaca a unidade, a integrao, a consistncia e a

    coerncia da pessoa normal. O organismo tende a estar organizado; um estado

    natural do organismo. A desorganizao, por sua vez, pode ser considerada

    patolgica e, frequentemente, consequncia do impacto do meio ambiente.

    Entende o organismo como um todo organizado, no qual suas partes,

    para serem compreendidas, precisam estar em relao ao todo; nunca isoladas,

    como frequentemente fazem atualmente os especialistas em medicina (olham a

    parte, o rgo, o sintoma e esquecem o todo, o holos). Os tericos organsmicos

    creem ser impossvel compreender o todo estudando as partes de forma isolada.

    Acredita que o organismo age motivado por um impulso dominante, o de

    autorrealizao, e no por vrios impulsos. Isto quer dizer que o homem luta

    continuamente para realizar suas potencialidades inerentes (mesmo que, muitas

    vezes, possamos boicotar esta autorrealizao, o que veremos mais frente ao

    abordarmos o eu neurtico).

    Tende a diminuir as influncias do meio externo ao organismo rumo

    sua autorrealizao, embora no o considere como um sistema fechado. O indivduo

    seleciona aspectos do meio aos quais vai reagir e, salvo em circunstncias

    especiais, o meio no pode obrigar o organismo a se comportar de forma estranha

    sua natureza. Cr que as potencialidades do indivduo lhe permitem desenvolver-se

    de forma ordenada, em um meio apropriado. Nada naturalmente mau no

    organismo, faz-se mau por interferncia de um meio ambiente inadequado,

    lembrando as ideias de Jacques Rousseau, de que todo homem naturalmente

    bom, mas pode ser corrompido por um meio que lhe negue oportunidade de atuar

    conforme sua natureza.

    Acredita que o estudo sobre as percepes e a aprendizagem do

    organismo constitui a base para a compreenso do organismo total.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 63

    Afirma que pode aprender mais com o estudo compreensivo da pessoa

    do que em uma investigao extensiva de uma funo psicolgica especfica e

    isolada do indivduo (em clara oposio psicologia experimental).

    Embora outros tericos tenham se debruado sobre os estudos da teoria

    organsmica e realizado modificaes em suas verses, nos deteremos aqui

    explorao da teoria tal qual formulada por Kurt Goldstein.

    A organizao inicial do funcionamento organsmico o da relao figura-

    fundo. A figura qualquer processo que emerge de um fundo; a figura a principal

    atividade do organismo. A figura tem um limite definido, um contorno que a encerra,

    enquanto o fundo contnuo; no s circunda a figura como se estende atrs dela.

    Goldstein faz uma distino entre figuras naturais e no naturais. Afirma que

    a figura natural quando representa uma preferncia da pessoa e quando o

    comportamento ordenado, flexvel e apropriado para a situao. E no natural

    quando representa uma tarefa imposta pessoa e resulta em um comportamento

    rgido e mecnico (uma criana que canta a letra de uma msica sem saber o

    significado, no momento em que canta est em contato com uma figura no natural).

    11.1 A DINMICA DO ORGANISMO

    Goldstein apresenta trs conceitos dinmicos a respeito do funcionamento

    do organismo:

    O processo de equalizao

    Goldstein acredita que h uma tendncia organsmica de manter uma

    distribuio equilibrada de energia pelo corpo; esta constante e tende a distribuir-

    se uniformemente por todo o organismo. O objetivo, pois, de uma pessoa em estado

    de tenso (como, por exemplo, o provocado pelo desequilbrio causado pela falta de

    gua) distribuir a energia pelo organismo e no descarreg-la. Enquanto no

    satisfaz esta figura emergente h uma reorganizao de energia, ou pelo menos

    uma busca de, para manter o organismo equalizado. Quando bebe gua a energia

    pode ser mais bem distribuda e o equilbrio retomado.

  • Documento no controlado - AN03FREV001 64

    Autorrealizao

    Representa para Goldstein o nico motivo que possui o organismo. O sexo,

    a fome, o desejo de poder, a curiosidade so formas de manifestar o propsito

    soberano da vida que a autorrealizao. Esta vista como uma tendncia criativa

    da natureza humana. O organismo humano se desenvolve pela autorrealizao, a

    partir da satisfao de necessidades ou superao de estados deficitrios

    organsmicos. Mas, o que determina a escolha destas necessidades ou a das

    potencialidades inerentes? Goldstein prope investigar as preferncias da pessoa e

    o que ela realiza melhor. Suas preferncias corresponderiam s suas

    potencialidades.

    Pr-se em acordo com o meio ambiente

    Consiste fundamentalmente em dominar o meio; e o indivduo que no o

    consegue tem que aceitar as dificuldades e se ajustar da melhor maneira realidade

    externa. Se as discrepncias entre as aspiraes do organismo e a realidade do

    meio so muito grandes, o organismo fracassa ou tem que limitar suas ambies,

    realizando-se em um nvel inferior da existncia.

    Goldstein pouco aprofundou seus estudos a respeito de uma psicologia

    organsmica do desenvolvimento. Um pequeno trecho, no entanto, poder

    brevemente nos esclarecer sobre o seu posicionamento sobre o desenvolvimento:

    (...) uma criana exposta a situaes que possa enfrentar se desenvolver

    normalmente, por meio da maturidade e do treino. medida que surgem

    novos problemas ela constri novos padres para solucion-los. (...)

    Contudo, se as condies do meio so muito difceis para a capacidade da

    criana, ela desenvolver reaes imprprias para o princpio da

    autorrealizao. (...) o processo tende a se isolar dos padres de vida do

    indivduo. O isolamento de um processo a condio primria para o

    desenvolvimento de estados patolgicos (HALL e LINDZEY, 1973, p. 341).

  • Documento no controlado - AN03FREV001 65

    FIM DO MDULO II