educação wayuri web

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“NOSSAS EXPERIÊNCIAS E LIÇÕES APRENDIDAS PARA POLÍTICAS PUBLICAS” Essa é a segunda edição do Wayuri Educação , elaborado para divulgação nas sedes municipais e comunidades do rio Negro e para parceiros institucionais da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro. O objetivo é informar os moradores da região sobre os resultados dos oito seminários regionais de educação escolar realizados nas Terras Indígenas do Rio Negro e nas sedes dos municípios de São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos, assim como, sobre os processos desenvolvidos no âmbito das políticas de educação escolar indígena. A discussão sobre educação escolar indígena é um tema central na atuação da Foirn e conta com o apoio e parceri a do Instituto Socioambiental e da Coordenação Regional da Funai. Essa luta travada pelos povos indígenas do rio Negro acumulou conquistas, temos experiências que deram certo e o nosso desafio é fazer com que as experiências exitosas Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro FOIRN/São Gabriel da Cachoeira AM. Edição Especial Educação maio/2014. Foto: Aloísio Cabalzar/ISA Nesta edição: Síntese dos dados escolares do médio e alto rio Negro pg. 2 Regional rio Içana e Aiari pg. 3 Regional baixo rio Uaupés e Tiquié pg. 4 Regional alto rio Uaupés e Papuri pg. 5 Regional alto rio Negro e Xié pg. 6 Regional médio e baixo rio Negro pg. 7 Formação profissional de agentes comunitários indígenas de saúde: o caso do alto rio Negro pg. 8 Escolas Indígenas: Desafios LinguísRcos pg. 10 Os Hupd'äh e a escola pg 12 PolíRcas do Estado e a Educação Escolar Indígenas no alto rio Negro pg. 13 Os desafios e a ampliação das parcerias das escolas Yuhup pg. 15 Escolas Indígenas: construindo novas práRcas educaRvas e pedagógicas pg. 16 Histórico do Projeto de Educação Indígena no alto rio Negro ISA/FOIRN pg. 17 InsRtuto dos Conhecimentos Indígenas e Pesquisa do Rio Negro pg. 18 Publicações Rio Negro pg. 19 Departamento de Educação FOIRN pg. 20 Wayuri Educação

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Wayuri - Edição Especial. Uma síntese sobre a situação atual da Educação Escolar Indígena no Rio Negro. Material de apoio para o Seminário Rio Negro de Educação Indígena.

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Page 1: Educação wayuri web

“NOSSAS EXPERIÊNCIAS E LIÇÕES APRENDIDAS PARA POLÍTICAS PUBLICAS”

Essa é a segunda edição do Wayuri Educação, elaborado para divulgação nas sedes municipais e comunidades do rio Negro e para parceiros institucionais da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro. O objetivo é informar os moradores da região sobre os resultados dos oito seminários regionais de educação escolar realizados nas Terras Indígenas do Rio Negro e nas sedes dos municípios de São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos, assim como, sobre os processos desenvolvidos no âmbito das políticas de educação escolar indígena. A discussão sobre educação escolar indígena é um tema central na atuação da Foirn e conta com o apoio e parceria do Instituto Socioambiental e da Coordenação Regional da Funai. Essa luta travada pelos povos indígenas do rio Negro acumulou conquistas, temos experiências que deram certo e o nosso desafio é fazer com que as experiências exitosas

Federação  das  Organizações  Indígenas  do  Rio  Negro  -­‐  FOIRN/São  Gabriel  da  Cachoeira  -­‐AM.  Edição  Especial  Educação  maio/2014.

Foto:  Aloísio  Cabalzar/ISA

Nesta  edição:  Síntese  dos  dados  escolares  do  médio  e  alto  rio  Negro  -­‐  pg.  2  Regional  rio  Içana  e  Aiari  -­‐  pg.  3  Regional  baixo  rio  Uaupés  e  Tiquié  -­‐  pg.  4  Regional  alto  rio  Uaupés  e  Papuri  -­‐  pg.  5  Regional  alto  rio  Negro  e  Xié  -­‐  pg.  6  Regional  médio  e  baixo  rio  Negro  -­‐  pg.  7  Formação  profissional  de  agentes  comunitários  indígenas  de  saúde:  o  caso  do  alto  rio  Negro  -­‐  pg.  8  Escolas  Indígenas:  Desafios  LinguísRcos  -­‐  pg.  10  

Os  Hupd'äh  e  a  escola  -­‐  pg  12  PolíRcas  do  Estado  e  a  Educação  Escolar  Indígenas  no  alto  rio  Negro  -­‐  pg.  13  Os  desafios  e  a  ampliação  das  parcerias  das  escolas  Yuhup  -­‐  pg.  15  Escolas  Indígenas:  construindo  novas  práRcas  educaRvas  e  pedagógicas  -­‐  pg.  16  Histórico  do  Projeto  de  Educação  Indígena  no  alto  rio  Negro  -­‐  ISA/FOIRN  -­‐  pg.  17  InsRtuto  dos  Conhecimentos  Indígenas  e  Pesquisa  do  Rio  Negro  -­‐  pg.  18  Publicações  Rio  Negro  -­‐  pg.  19  Departamento  de  Educação  FOIRN  -­‐  pg.  20

Wayuri Educação

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!No  município  de  Santa  Isabel  do  Rio  Negro  a  diferença  de  número  de  alunos  matricula-­‐dos  na  área  urbana  e  rural  é  mínima,  dos  4.982  alunos,  cerca  de  51%  estudam  em  es-­‐colas  do  interior,  seja  na  área  que  se  encon-­‐tra  já  demarcada  ou  não.

!Em  Barcelos  o  número  de  alunos  matricula-­‐dos  é  maior  na  área  urbana  do  que  na  área  rural,  com  uma  diferença  66%  do  número  de  alunos  matriculados  na  cidade  e  34%  matri-­‐culados  nas  comunidades  indígenas  e  ribei-­‐rinhas.  !

De  acordo  com  IBGE  (2010),  os  municípios  de  Barcelos,  Santa  Isabel  do  Rio  Negro  e  São  Gabriel  da  Ca-­‐choeira  possuem  362  escolas  em  funcionamento,  das  quais  343  ofertam  ensino  fundamental  e  apenas  19  ofertam  o  ensino  médio,  e  destas  apenas  4  estão  localizadas  em  terra  indígena.  As  362  escola  atendem  à  27.856  alunos,  são  majoritariamente  indígenas,  sendo  que  52%  destes  alunos  estão  matriculados  nos  anos  iniciais,  34%  nos  anos  ]inais  do  ensino  fundamental  e  14%  cursam  o  ensi-­‐no  médio.  E  nestas  atuam  1.483  professores   indígenas,  este  número  corresponde  a  aproximadamente  20%  do  total  de  professores  que  atuam  em  escolas  indígenas  no  Brasil.

Tabela:  Dados  Escolares  de  Santa  Isabel  do  Rio  Negro  

Tabela:  Dados  Escolares  de  Barcelos  

Síntese dos dados escolares do médio e alto rio Negro

PERGUNTA:  Porque  (ainda)  utilizam  escola  RURAL  ao  invés  de  escola  indígena?  

Tabela:  Dados  Escolares  de  São  Gabriel  da  Cachoeira

No  município  de  São  Gabriel  da  Cachoeira  existe  um  total  de  240  escolas  em  Terra  Indígena,  destas  234  são  municipais  e  6  são  estaduais,  cabe  destacar  que  apenas  4  escolas  ofertam  o  ensino  médio.  O  número  de  alunos  matriculados  em  Terra  Indígena  é  de  12.292,  sendo  que  o  total  de  alunos  matriculados  é  17.289,  ou  seja,  60%  que  frequentam  escolas  estão  em  Terra  Indígena.

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“ Nossa escola adotou a metodologia de ensino via pesquisa. Antes dela o professor ficava escrevendo na lousa, a criança ficava com sono. Era só bater o sino que as crianças saíam correndo da sala de aula. O ensino via pesquisa mudou isso, e era justamente esse sistema que queríamos quebrar. Queríamos provar que não era preciso se vestir igual, como na época do internato, para poder aprender. Que não era preciso ser rico para aprender. Isso nós conseguimos provar com nossa escola. Nossa escola tem laboratórios de informática, tem criação de alevinos, tem hortaliças. E não consideramos o prédio como um espaço único de aprendizagem”. André Fernando – Seminário de

Educação Escolar Indígena

!escolapamaali

Abril:  Lançamento  do  volume  2  da  Coleção  “O  que  a  GENTE  precisa  para  VIVER  e  ESTAR  BEM  NO  MUNDO?,  em  Ucuqui  Cachoeira,  alto  Aiarí,  durante  a  inauguração  da  segunda  Casa  da  Pimenta  Baniwa.  A  publicação  é  da  Escola  Herieni,  da  comunidade  Ucuqui,  no  âmbito  da  Rede  de  Escolas  Baniwa  e  Coripaco.Foto:  Ray  Benjamim  /FOIRN

Dados  de  Escolas:  !Escolas  de  Ensino  Fundamental:  57  !Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  iniciais):  1.173  !Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  ]inais):  720  !Escolas  de  Ensino  Médio:  1  !Alunos  de  Ensino  Médio:  192  !Número  de  Professores  (SEMEC):  187  

!Em  fevereiro  de  2014,  lideranças  e  professores  Baniwa  entregam  ao  Governador  do  Amazonas,  Omar  Aziz  documento  reforçando  a  criação  de  cinco  escolas  estaduais  na  bacia  do  Içana,  demanda  encaminhada  no  V  Seminário  de  Educação  Escolar  Baniwa  e  Coripaco,  em  julho  de  2013.

OYicina   de   Elaboração   dos   Projeto   Político   Pedagógico   –   reuniu   100  pessoas,  entre  lideranças,  professores,  jovens  e  velhos.  Foram  quatro  dias  de   discussão   sobre   processos   educacionais;   valorizando   experiências   já  existentes. Construímos uma agenda de trabalho para construção e aprovação PPPs dos Ensinos Médio, pelo povo Baniwa e Coripaco e assim, uma agenda estratégica para criação e reconhecimento das Escolas-projetos Baniwa e Coripaco.

V   encontro   de   Educação   Baniwa  &   Coripaco   –   aconteceu   em   junho   de  2013   na   comunidade   de   Tunuí   Cachoeira.   O  Objetivo   do   encontro     foi   de    discutir   a   organização   e   o   modelo   de   Escola   de   Ensino   Médio   Integrado  Baniwa  e  Coripaco.  Ao   longo  da  discussão,   chegou-­‐se   ao   consenso  de  que  deveriam   ser   criadas   cinco   escolas   para   atender   toda   a   bacia   do   Içana.   O  maior  problema  é  a   falta  de  reconhecimento  do  ensino  médio.  No  ]inal  do  Encontro,   foi   organizado  um  documento   a   ser   enviado  para  o   governador  do  estado  solicitando  uma  audiência.  

Regional rio Içana e Aiari

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“A discussão da educação escolar indígena está parada a nível do rio Negro, precisou-se desse momento para avaliar o que avançou e o onde está a dificuldade, os

problemas, para poder avançar”- professor Armando da Silva Menezes/Seminário de Educação Escolar Indígena de Taracuá do Uaupés.

Segundo  Seminário  Interno  de  Educação  Escolar  Indígena  foi  realizado  em  Taracúa  -­‐  Médio  Uaupés  no  Yinal  de  fevereiro  de  2014.  O  evento  reuniu  estudantes,  professores  e  lideranças  indígenas  da  região  de  abrangência  da  Coordenadoria  das  Organizações  Indígenas  do  Tiquie  e  Uaupés-­‐COITUA.    A  educação  escolar  na  região  do  médio  waupés  não  é  recente.  Deu  inicío  com  a    implantação  da  missão  salesiana  ainda  nos  meados  da  década  de  1920.  Mas,  a  proposta  e  os  objetivos  voltados  para  uma  prática  de  educação  escolar  que  respeite  e  valorize  a  cultura  dos  povos  de  lá  é  recente,  não  passa  de  uma  década.  Um  exemplo  dessa  transformação  ou  conquista  é  a  gestão  da  escola  hoje,  o  quadro  de  professores,  incluindo  o  gestor,  são  da  própria  comunidade.  

Dados  de  Escolas:  !Escolas  de  Ensino  Fundamental: 46!!Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  iniciais):  937  !Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  ]inais):  333  !Escolas  de  Ensino  Médio:  2  !Número  de  Professores  (SEMEC):  108

Calendário  Ecológico  elaborado  pelos  alunos  da  escola  AEITY  e  AIMA  de  acordo  com  as  pesquisas  e  anotações  diárias,  sobre  passagem  de  cada  constelações,  ]loração  e  fruti]icação  das  arvores  silvestres  e  cultivadas,  doenças  que  acompanham  cada  constelações,  piracemas  de  peixes  (reprodução  natural),  subidas  (piracemas)  de  animais,  clima  do  dia  a  dia…

!Agentes Indígenas de

Manejo Ambiental do Rio Tiquié

Atividade  de  formação  de  Agentes  Indígenas  de  Manejo  Ambiental  -­‐  AIMAS,  em  Caruru  Cachoeira,  rio  Tiquié.

Regional baixo rio Uaupés e Tiquié

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“Nossos pais tinham respeito com a cachoeira da onça. As mulheres em menstruação não podiam tomar banho e nem as parturientes. Hoje em dia, cresceu a população e as pessoas não respeitam mais. Antigamente também tinha muito peixe e hoje em dia tem muita gente, os benzedores já vieram de

outros lugares, começam a tomar banho no rio, jogam resto de cigarro benzido no rio, com isso os peixes vão escasseando. Essas atividades de pesca,

antigamente, era muito diferente, hoje em dia o peixe é escasseado e só estamos comendo comida de fora. Por isso que nossa geração atual já tem outro tipo de

doença, não são mais as doenças de nossos avós. Isso já foi previsto. O meu avô já havia previsto que Iauaretê ia ser grande, teria muita dificuldade e não teria mais peixe.

Eu estou constatando isso agora”. Professora Maria da Glória Maia Gonçalves, da etnia Tariana – Seminário de Educação Escolar Indígena de Iauarete

Terceiro  Seminário  Interno  de  Educação  Escolar  Indígena  do  Rio  Negro,  em  Iauaretê  em  março  de  2014.  

Dados  de  Escolas:  !Escolas  de  Ensino  Fundamental: 45  !Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  iniciais):  1.178  !Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  ]inais):  576  !Escolas  de  Ensino  Médio:  1  !Alunos  de  Ensino  Médio:  259  !Número  de  Professores  (SEMEC):  128  !

Seminários de Educação Escolar Indígena que reuniram clãs Hupd’äh em abril

Participaram professores Hupd’äh, Yuhupdeh e Tukano, agentes indígenas de saúde, líderes comunitários, jovens e anciãos das comunidades Barreira Alta (rio Tiquié), Santa Cruz do Cabari (igarapé Japu) e Yuhupdeh, na comunidade de Guadalupe (igarapé Ira). A discussão, voltada às especificidade dos Hupd’äh e Yuhupdeh, foi pensada com o objetivo de promover o debate em relação à educação indígena/educação escolar indígena e fortalecer os diferentes espaços de se produzir saberes, visando construir!estratégias culturalmente adequadas a esses povos, de recente contato, em relação à educação escolar e, ao mesmo tempo, garantir seus modos próprios de ensino aprendizagem sejam respeitados, valorizados e incentivados.

Foto:  Lirian  Monteiro/ISA

Foto:  Ray  Benjamim  /FOIRN

Regional alto rio Uaupés e Papurí

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Regional alto rio Negro e Xié

“O que nós pensamos? O que está dentro da nossa cabeça? Hoje temos esse questionamento, sobre o que é educação escolar indígena e o que é

educação indígena. Nós devemos ter muita preparação, curso de capacitação, realizar planejamentos, trabalhar através de temas

transversais, mas hoje em dia nós não trabalhamos mais com temas transversais em nossas escolas. Trabalhamos por disciplinas. Por isso

nós estamos fracos, muito fracos. Outros estão muito melhores capacitados. E os culpados somos todos nós, começando pelo Estado e município”- Professor Rafael Brito, professor da etnia Tariana –

Seminário de Educação Escolar Indígena de Iauarete

Dados  de  Escolas:  !Escolas  de  Ensino  Fundamental: 38!Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  iniciais):  506  !Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  ]inais):  381  !Escolas  de  Ensino  Médio:  0  !Número  de  Professores  (SEMEC):  140  !

Projeto  Político  Pedagógico  da  Escola  Aí  Waturá  !Objetivos  da  Escola:  Formar  alunos  para  que  no  futuro,  se  tornem  bons  pais  de  família,  sabedores  das  coisas  dos  brancos  mas  principalmente  da  cultura  indígena,  caça,  pesca,  dança,  benzimentos,  agricultura,  artesanato  e  outros  saberes.  Com  esses  conteúdos,  a  escola  estará  formando  alunos  capazes  de  contribuir  para  melhor  qualidade  de  vida  nas  comunidades,também  com  capacidade  de  conviver  em  qualquer  lugar  do  país.  Esclarecidos  através  desse  conhecimento,  terão  um  futuro  digno,  sabendo  tirar  proveito  do  seu  território  para  sustentar  sua  família,  movimentar  a  comunidade  e  melhorar  a  renda  comunitária.

Mobilização  reuniu  jovens  indígenas  Baniwa,  Baré  e  Werekena  em  Boa  Vista-­‐Foz  do  Içana  O  encontro  começou  com  a  pergunta:  A  juventude  é  o  futuro?  Os  jovens  presentes  e  os  mais  velhos    entreolharam-­‐se  em  busca  da  resposta.  Um  ou  dois  minutos  de  silêncio.  Resposta,  em  meio  de  dúvidas:  Sim  para  uns  e  não  para  os  outros.  “Tem  certeza”?  –  pergunta  a  Ednéia  Teles,  coordenadora  do  DAJIRN,  com  microfone  na  mão,  na  frente  de  um  platéia  cheia  de  jovens  Baniwa,  Werekena  e  Baré  da  comunidade  de  Boa  Vista,  foz  do  Içana,  e  comunidades  próximas.  É  a  primeira  vez  que  o  Departamento  de  Jovens  da  FOIRN  chega  às    comunidades  para  informar,  animar,  incentivar  e  fortalecer  os  jovens  dessa  comunidade  e  incluí-­‐los  no  movimento,  que  vem  se  fortalecendo  a  nível  do  rio  Negro  e  do  país.

Foto:  Ray  Benjamim  /FOIRN

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“Queria dizer que Barcelos passa por momentos importantes na sua historia, relacionado a demarcação de terras indígenas, temos conflitos, grandes, mas aqui hoje o centro é educação. Ninguém promove mudança na sociedade sem passar pela educação. O que vamos fazer aqui é

discutir a educação escolar indígena. Muito se fala, mas pouca experiência nós temos. Nós travamos essa discussão e aos poucos se vai avançando e hoje percebemos, que nossas

escolas da zona rural, nossos professores começam a compreender o que é uma educação diferenciada. Nós queremos, para Barcelos, uma escola que atenda as especificidades, uma

escola que promova a cidadania. Vamos aproveitar, é o momento de começarmos a construir efetivamente uma proposta de educação escolar em Barcelos, Santa Isabel e reforçar a

educação escolar indígena em São Gabriel”. Martinho - vereador Baniwa e professor/ Seminário de Educação Escolar Indígena de Barcelos

Nos  dias  14  a  16  de  maio  deste  ano,  foi  realizado  o  oitavo  seminário  interno   de     educação   escolar   indígena   na   sede   do   município   de  Barcelos.  O  evento  reuniu  10  comunidades/escolas,  somando  cerca  de   100   participantes.   Durante   três   dias,   foram   debatidos   vários  assuntos,   entre   eles,   a   legislação   da   educação   escolar   indígena   e  foram   apresentadas   as   experiências   das   escolas   e   professores  participantes.   Cada   escola   fez   o   levantamento   da   situação   atual   e  suas  demandas.  Todas  as  escolas  e  comunidades  presentes  apóiam  e  querem   que   a   educação   escolar   indígena   seja   implantada   no  município.  

Seminário  de  Educação  Escolar  Indígena  foi  realizado  em  Santa  Isabel  do  Rio  Negro,  em  2013.

OYicina  de  elaboração  de  Projeto  Político  Pedagógico  da  Escola  Yandé  Potira  da  Comunidade  de  Canafé  -­‐  no  município  de  Barcelos.  No  dia  11  de  maio  de  2014  aconteceu  o]icina  para  a  discussão  do  projeto  político  pedagógico  da  escola  indígena  Yandé  Potira,  na  comunidade  de  Canafé,  médio  rio  Negro.  Participaram  do  encontro  professores,  lideranças,  agente  comunitário  indígena  de  saúde,  pais,  avós  e  jovens.  As  principais  discussões  se  pautaram  no  histórico  de  escolarização  no  rio  Negro,  re]lexão  sobre  a  educação  indígena  antes  da  chegada  da  escola,  objetivos  da  escola  indígena  e  esclarecimentos  sobre  o  signi]icado  e  processos  de  elaboração  de  um  projeto  político  pedagógico.  

Dados  de  Escolas  SEMEC/SGC:  !Escolas  de  Ensino  Fundamental: 19!Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  iniciais):  507  !Alunos  de  Ensino  Fundamental  (anos  ]inais):  142  !

I  Seminário  Interno  de  Educação  Escolar  Indígena  do  Rio  Negro  foi  realizado  em  Itapereira  -­‐  Médio  Rio  Negro  em  janeiro.    foto:  Lirian  Monteiro/ISA

Foto:  Lirian  Monteiro/ISA

Regional médio e baixo rio Negro

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Entre  os  anos  2006/2007,  a  Federação  das  Organizações  Indígenas  do  Rio  Negro  e  o  Conselho  Distrital  de  Saúde  Indígena-­‐CONDISI/DSEI-­‐  ARN  (Resolução  001/2007),  avaliando  a  situação  formativa  de  agentes  de  saúde,  chamou  o  Instituto  Leônidas  e  Maria  Deane/  Fiocruz  –  Amazônia  (ILMD/Fiocruz),  para  discutir  a  possibilidade  de  implantação  de  um  curso  que  possibilitasse  o  aumento  do  nível  de  escolaridade  e  a  pro]issionalização  destes  trabalhadores.  A  base  que  utilizaram  para  tal  re]lexão  foi  a  comparação  que  ]izeram  com  os  professores  indígenas  que  conseguiram  se  organizar  e  lutar  pela  melhoria  de  sua  formação.  O  passo  seguinte  foi  ampliar  esta  discussão,  com  a  realização  de  o]icinas  e  seminários  com  a  participação  de  professores,  gestores  de  escolas,  lideranças  de  comunidades  e  de  associações  indígenas,  agentes  de  saúde,  pro]issionais  de  saúde  do  DSEI,  para  se  discutir  os  princípios  norteadores  da  proposta  formativa.    A  partir  daí  iniciou  um  trabalho  de  construção  

de  parcerias  para  discussão  da  proposta,  a  FOIRN  e  o  ILMD/Fiocruz  para  implementar  o  curso  ]izeram  parcerias  com  outras  instituições:

Escola  Politécnica  de  Saúde  Joaquim  Venâncio  –  EPSJV/  Fiocruz;  Distrito  Sanitário  Especial  Indígena  do  Alto  Rio  Negro  –  DSEI/  ARN/  SESAI/  MS;  Secretaria  de  Estado  de  Educação  e  Qualidade  do  Ensino  –  SEDUC,  através  de  Gerência  de  Educação  Escolar  Indígena  –  GEEI;  Prefeitura  Municipal    de  São  Gabriel  da  Cachoeira  (Secretaria  Municipal  de  Educação  e  Cultura  e  Secretaria  Municipal  de  Saúde).  !Para  a  elaboração  curricular  utilizamos  o  

Referencial  Curricular  para  Curso  Técnico  de  Agentes  Comunitários  de  Saúde  (MS/MEC,  2004)  e  os  princípios  da  Educação  Escolar  Indígena.  Do  ponto  de  vista  do  per]il  pro]issional  dos  AIS,  re]letimos  que  esse  trabalhador,  inserido  na  equipe  multipro]issional  de  saúde  indígena,  desenvolve  ações  de  promoção  e  vigilância  à  saúde,  tendo  por  objetivo  compreender  modos  de  vida  dos  grupos  sociais  e  as  formas  diversi]icadas  de  expressão  do  processo  saúde-­‐doença,  buscando  intervir  nos  condicionantes  e  determinantes  desse  processo.  Dessa  forma,  se  elaborou  o  plano  de  curso   de                        Técnico  de  Agentes  ComunitáriosIndígenas  de  Saúde  (CTACIS)  articulado  à  escolaridade  ao  nível  médio,  concluída  em  março  de  2010.  

Por Sully Sampaio,

Negro Acima, Baixo Rio Içana e Rio Xié; 2) Pólo Rio Negro abaixo, Santa Isabel do Rio Negro e

Barcelos; 3) Pólo Rio Médio e Alto Rio Içana e afluentes; 4) Pólo Baixo Rio Waupés e Rio Tiquié; e, 5)

Pólo Médio e Alto Rio Waupés e Rio Papuri. E está organizado em três etapas formativas, totalizando

1440 h/aula, realizadas em momentos presenciais e atividades de prática profissional nas comunidades.

Atualmente, estamos finalizando a segunda etapa formativa, com previsão de conclusão do curso no

primeiro semestre de 2015.

Do ponto de vista da profissionalização em saúde,

busca-se a constante articulação com os profissionais

e gestores do DSEI-ARN/Sesai, na construção e

fortalecimento das atribuições do AIS na equipe

multiprofissional no modelo de atenção primária

preconizado para a saúde indígena. Nesse sentido,

consideramos que se tem ampliado o potencial de

atuação dos AIS nas suas comunidades, com o

ensino de técnicas e conhecimentos relacionados à: a) saúde da criança, no acompanhamento alimentar e

nutricional, vacinação e a prevenção e atendimento às doenças prevalentes; b) saúde da mulher, no

acompanhamento do pré-natal, parto e puerpério, orientações sobre a prevenção do câncer de colo de

útero e planejamento familiar; c) saúde bucal, nas orientações de alimentação e higienização oral,

doenças prevalentes; d) saúde do adulto, no controle e prevenção da Hipertensão e do Diabetes,

vigilância e controle de doenças transmissíveis; e) Vigilância ambiental, com produção de mapas,

controle de água, lixos e dejetos; f) Vigilância epidemiológica e sistemas de informação; entre outros

assuntos.

No desenvolvimento das atividades didáticas, busca-se o estabelecimento de relações de ensino-

aprendizado pautadas pela pesquisa e pela valorização

da cultura pela articulação de conhecimentos do

campo da saúde pública com os saberes, práticas e

modos de vida próprios às culturas indígenas.

Como experiência piloto e pioneira de formação

técnica de AIS no país, o curso também foi entendido

como capaz de gerar um modelo de formação para

AIS, a ser utilizado – com as devidas adaptações às

diversas realidades culturais – em outras regiões do

Amazonas ou do país.

ACIS em prática do aprendizado. Foto: Sully Sam-

Formação profissional de agentes comunitários indígenas de saúde: O caso do Alto Rio Negro

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Do  ponto  de  vista  da  pro]issionalização  em  saúde,  busca-­‐se  a  constante  articulação  com  os  pro]issionais  e  gestores   do   DSEI-­‐ARN/Sesai,   na   construção   e   fortalecimento  das  atribuições  do  AIS  na  equipe  multipro]issional  no  modelo  de   atenção   primária   preconizado   para   a   saúde   indígena.  Nesse  sentido,  consideramos  que  se  tem  ampliado  o  potencial  de   atuação   dos  AIS   nas   suas   comunidades,   com  o   ensino   de  técnicas  e  conhecimentos  relacionados  à:  a)  saúde  da  criança,  no   acompanhamento   alimentar   e   nutricional,   vacinação   e   a  prevenção  e  atendimento  às  doenças  prevalentes;  b)  saúde  da  mulher,  no  acompanhamento  do  pré-­‐natal,  parto  e  puerpério,  orientações   sobre   a   prevenção   do   câncer   de   colo   de   útero   e  planejamento   familiar;   c)   saúde   bucal,   nas   orientações   de  alimentação   e   higienização   oral,   doenças   prevalentes;   d)  saúde  do  adulto,  no  controle  e  prevenção  da  Hipertensão  e  do  Diabetes,   vigilância   e   controle   de   doenças   transmissíveis;   e)  Vigilância   ambiental,   com   produção   de   mapas,   controle   de  água,   lixos  e  dejetos;   f)  Vigilância  epidemiológica  e   sistemas  de  informação;  entre  outros  assuntos.  !No   desenvolvimento   das   atividades   didáticas,   busca-­‐se   o  

estabelecimento  de  relações  de  ensino-­‐  aprendizado  pautadas  pela  pesquisa  e  pela  valorização  da  cultura  pela  articulação  de  conhecimentos  do  campo  da  saúde  pública  com  os  saberes,  práticas  e  modos  de  vida  próprios  às  culturas  indígenas.  Como  experiência  piloto  e  pioneira  de  formação  técnica  de  AIS  no  país,  o  curso  também  foi   entendido   como   capaz   de   gerar   um   modelo   de   formação   para   AIS,   a   ser   utilizado   –   com   as   devidas  adaptações  às  diversas  realidades  culturais  –  em  outras  regiões  do  Amazonas  ou  do  país.

Formação profissional de agentes comunitários indígenas de saúde – O caso do Alto Rio Negro.

Sully Sampaio, Ana Lúcia Pontes e Luiza Garnelo

Entre os anos 2006/2007, a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro e o CONDISI/DSEI-

ARN (Resolução 001/2007), avaliando a situação formativa de agentes de saúde, chamou o Instituto

Leônidas e Maria Deane/ Fiocruz – Amazônia (ILMD/Fiocruz), para discutir a possibilidade de

implantação de um curso que possibilitasse o aumento do nível de escolaridade e a profissionalização

destes trabalhadores. A base que utilizaram para tal reflexão foi a comparação que fizeram com os

professores indígenas que conseguiram se organizar e lutar pela melhoria de sua formação. O passo

seguinte foi ampliar esta discussão, com a realização de oficinas e seminários com a participação de

professores, gestores de escolas, lideranças de comunidades e de associações indígenas, agentes de

saúde, profissionais de saúde do DSEI, para se discutir os princípios norteadores da proposta formativa.

A partir daí, iniciou-se um trabalho intenso de construção de parcerias para discussão da propostra e sua

posterior implementação, e assim, juntaram-se à FOIRN e ao ILMD/Fiocruz outras instituições como:

Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio – EPSJV/ Fiocruz; Distrito Sanitário Especial Indígena

do Alto Rio Negro – DSEI/ ARN/ SESAI/ MS; Secretaria de Estado de Educação e Qualidade do

Ensino – SEDUC, através de Gerência de Educação Escolar Indígena – GEEI; Prefeitura Municipal de

São Gabriel da Cachoeira (Secretaria Municipal de Educação e Cultura e Secretaria Municipal de

Saúde).

Para a elaboração curricular utilizou-se o Referencial Curricular para Curso Técnico de Agentes

Comunitários de Saúde (MS/MEC, 2004) e os princípios da Educação Escolar Indígena. Do ponto de

vista do perfil profissional dos AIS, refletiu-se que esse trabalhador, inserido na equipe multiprofissional

de saúde indígena, desenvolve ações de promoção e vigilância à saúde, tendo por objetivo compreender

modos de vida dos grupos sociais e as formas diversificadas de expressão do processo saúde-doença,

buscando intervir nos condicionantes e determinantes desse processo. Dessa forma, se elaborou o plano

de curso de Técnico de Agentes

Comunitários Indígenas de Saúde

(CTACIS) articulado à elevação da

escolaridade ao nível médio, concluída em

março de 2010.

O curso, voltado para os AIS contratados pelo

DSEI-ARN e PACS, funciona com 5 Pólos de

formação, levando em consideração o

pertencimento lingüístico e étnico: 1) Pólo Rio Mapa do Rio Negro, abrangência do Curso de

formação

www.foirn.org.br

Negro Acima, Baixo Rio Içana e Rio Xié; 2) Pólo Rio Negro abaixo, Santa Isabel do Rio Negro e

Barcelos; 3) Pólo Rio Médio e Alto Rio Içana e afluentes; 4) Pólo Baixo Rio Waupés e Rio Tiquié; e, 5)

Pólo Médio e Alto Rio Waupés e Rio Papuri. E está organizado em três etapas formativas, totalizando

1440 h/aula, realizadas em momentos presenciais e atividades de prática profissional nas comunidades.

Atualmente, estamos finalizando a segunda etapa formativa, com previsão de conclusão do curso no

primeiro semestre de 2015.

Do ponto de vista da profissionalização em saúde,

busca-se a constante articulação com os profissionais

e gestores do DSEI-ARN/Sesai, na construção e

fortalecimento das atribuições do AIS na equipe

multiprofissional no modelo de atenção primária

preconizado para a saúde indígena. Nesse sentido,

consideramos que se tem ampliado o potencial de

atuação dos AIS nas suas comunidades, com o

ensino de técnicas e conhecimentos relacionados à: a) saúde da criança, no acompanhamento alimentar e

nutricional, vacinação e a prevenção e atendimento às doenças prevalentes; b) saúde da mulher, no

acompanhamento do pré-natal, parto e puerpério, orientações sobre a prevenção do câncer de colo de

útero e planejamento familiar; c) saúde bucal, nas orientações de alimentação e higienização oral,

doenças prevalentes; d) saúde do adulto, no controle e prevenção da Hipertensão e do Diabetes,

vigilância e controle de doenças transmissíveis; e) Vigilância ambiental, com produção de mapas,

controle de água, lixos e dejetos; f) Vigilância epidemiológica e sistemas de informação; entre outros

assuntos.

No desenvolvimento das atividades didáticas, busca-se o estabelecimento de relações de ensino-

aprendizado pautadas pela pesquisa e pela valorização

da cultura pela articulação de conhecimentos do

campo da saúde pública com os saberes, práticas e

modos de vida próprios às culturas indígenas.

Como experiência piloto e pioneira de formação

técnica de AIS no país, o curso também foi entendido

como capaz de gerar um modelo de formação para

AIS, a ser utilizado – com as devidas adaptações às

diversas realidades culturais – em outras regiões do

Amazonas ou do país.

ACIS em formação apresentam trabalho durante o curso. Foto: Sully S.

O   curso,   voltado   para   os   AIS   contratados  pelo  DSEI-­‐ARN   e   PACS,   funciona   com  5   Pólos  de   formação,   levando   em   consideração   o  pertencimento  lingüístico  e  étnico:  1)  Pólo  Rio  Negro  Acima,  Baixo  Rio  Içana  e  Rio  Xié;  2)  Pólo  Rio  Negro  abaixo,  Santa  Isabel  do  Rio  Negro  e  Barcelos;  3)  Pólo  Rio  Médio  e  Alto  Rio  Içana  e  a]luentes;   4)   Pólo   Baixo   Rio   Waupés   e   Rio  Tiquié;   e,   5)   Pólo  Médio   e  Alto  Rio  Waupés   e  Rio   Papuri.   E   está   organizado   em   três   etapas  formativas,   totalizando   1.440   h/aula,  realizadas   em   momentos   presenciais   e  atividades   de   prática   pro]issional   nas  c omun idades .   A tua lmen te ,   e s t amos  ]inalizando   a   segunda   etapa   formativa,   com  previsão   de   conclusão   do   curso   no   primeiro  semestre  de  2015.  

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Escolas Indígenas: Desafios Linguísticos !Por: Kristine Stenzel e Nathalie Vlcek

Demandas e desafios !Uma das discussões mais importantes para as escolas indígenas é a da valorização da diversidade de línguas e o papel que estas devem desempenhar no âmbito escolar. A Referência Curricular Nacional para as Escolas Indígenas1 afirma o direito ao uso das línguas indígenas como línguas de instrução oral e escrita e estabelece a inclusão destas como objeto de estudo no currículo. O intuito destas diretrizes é assegurar os direitos linguísticos aos índios, atribuindo prestígio às suas línguas e fortalecendo seu uso nas formas tanto escrita como oral. !Entre os ideais destas diretrizes e a realidade da maioria das escolas indígenas, no entanto, a distância é enorme; e para caminhar na direção de implementá- las concretamente nas escolas, as comunidades muitas vezes demandam a colaboração de linguistas. Para ilustrar alguns desafios que já presenciamos, falaremos brevemente sobre nossas experiências com as comunidades Kotiria (Wanano), Wa’ikhana (Piratapuyo) e Tuyuka, sobre três demandas fundamentais relacionadas à questão linguística: o desenvolvimento ou reformulação de ortografias, a produção de materiais didáticos nas línguas e a implementação de estratégias de valorização da oralidade. !Ortografias, materiais escritos e documentais !Desde os primeiros encontros e oficinas com as comunidades Kotiria e Wa’ikhana, a questão do desenvolvimento de ortografias práticas foi colocada como prioridade. No caso dos Wa’ikhana, não havia proposta ortográfica existente, mas algumas pessoas conheciam a ortografia proposta para a língua Tukano. Já para a língua Kotiria, uma proposta ortográfica havia sido feita por linguistas missionários na década de 80. Esta ortografia refletia convenções ortográficas adotadas do espanhol (seu objetivo principal sendo o de facilitar o processo de letramento na língua nacional), e tinha sido mais utilizada nas comunidades Kotiria colombianas do que nas comunidades no Brasil.

Os professores da escola Khumuno Wʉ’ʉ Kotiria, que estavam se formando na época na comunidade de Carurú Cachoeira, queriam discutir esta proposta, conhecida por alguns, mas não utilizada de forma geral, para poder avaliar possíveis modificações. !Com ambas as comunidades, adotou-se uma metodologia de trabalho que casava atividades de análise da língua (principalmente os sistemas fonológicos - sons distintivos da língua - e de composição das palavras) com atividades práticas de escrita. No primeiro momento, a partir de atividades de escrita, levantamos dúvidas que serviam para nortear as atividades de análise. E com base nestas análises, feitas em conjunto durante as oficinas, propusemos soluções a serem testadas e avaliadas em novas atividades práticas. Esta metodologia circular e acumulativa, em que o estudo e a prática alimentam e reforçam um ao outro, permite que as questões fiquem mais claras para aqueles que efetivamente usam a ortografia, e valorize as decisões tomadas, testadas e avaliadas coletivamente. Apostamos em propostas ortográficas de autoria compartilhada, que refletem e incorporam o conhecimento linguístico dos falantes e que respeitam as suas decisões como usuários, mas reconhecemos que é uma metodologia que exige um investimento de tempo e certa dose de paciência da parte de todos, pois conhecer, praticar e avaliar são atos de cultivo, cujos frutos demoram a brotar e amadurecer. !Quando chegamos à escola diferenciada Tuyuka, em que já havia uma ortografia bastante difundida e funcional, encontramos frutos já bastante amadurecidos. Nossos esforços se voltaram, portanto, para a produção de materiais didáticos na língua. A partir de um projeto de dicionários temáticos, cujos temas e estrutura foram discutidos por toda a comunidade, alunos e professores da escola se envolveram na pesquisa com conhecedores e membros de outras comunidades, a fim de aprofundar o conhecimento que possuíam de sua própria cultura. Apesar de grande parte dos esforços do dicionário terem se voltado para registro de áudio e imagens, valorizando a l íngua viva em sua si tuação contextualizada de uso, diversas questões adormecidas da ortografia vieram à tona. Uma delas é o reconhecimento da impossibilidade de se ter uma ortografia única que reproduza a fala, já que a fala é variável e a ortografia possui um alto nível de neutralização destas variações. Outra questão é de se encontrar o equilíbrio entre a representatividade de detalhes da fala e um nível de abstração que torna a ortografia mais econômica e confortável de usar (basta perguntar para si mesmo se prefere escrever com vários acentos em cada palavra ou omitir aqueles que não são necessários para entender). Desta forma, o trabalho do linguista em parceria com a comunidade deve ser compreendido como uma atividade cíclica de troca de conhecimentos, em que o investimento em um produto gera a demanda de outros.

Análise da língua Kotiria durante a Oficina Linguística-Pedagógica em maio de 2002, Carurú Cachoeira, Alto Uaupés / Foto: Kristine

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Avaliação e revisão fazem parte deste processo, não só porque a língua é viva, mas também porque quanto mais nos debruçamos sobre ela, mais questões enxergamos. Assim, por exemplo, enquanto a ortografia possibilita grande parte da produção de materiais didáticos, este mesmo trabalho de produção tende a gerar novas discussões que podem afetar o acordo ortográfico. !Sempre tentamos trabalhar também em parceria com pedagogos e antropólogos na produção de materiais de natureza didática. Sendo estas praticamente inexistentes para a maioria dos grupos, as demandas são muitas, e incluem desde ferramentas de apoio a alfabetização na língua (cartilhas e livros de leitura e prática graduadas) até recursos de referência mais geral, como dicionários e gramáticas pedagógicas. Tais recursos reforçam e valorizam, sobretudo, a modalidade escrita em desenvolvimento, que reconhecemos ser uma ferramenta que contribui para a valorização e fortalecimento das línguas. !No entanto, não devemos esquecer que a vitalidade de qualquer língua, em último caso, não depende desta modalidade, e sim da sua transmissão e uso como meio de comunicação oral. Como linguistas sempre “batemos nesta tecla”, pensando em estratégias e promovendo atividades que reforçam e valorizam a oralidade, além de investir na produção de materiais documentais multimídia, uma das demandas prioritárias atuais. !Cada vez mais presentes nas pesquisas linguísticas e altamente valorizados pelas comunidades indígenas, materiais documentais capturam e refletem a relação íntima entre língua e cultura, retratam o uso da língua em vários contextos, e permitem o registro da beleza das artes verbais e da riqueza da literatura oral. Em uma única oficina sobre documentação multimídia em São Pedro, centro da escola Tuyuka, um simples exercício de transcrição de um vídeo levou a discussão do tema da dança tradicional, que acabou motivando uma festa em que muitos destes costumes foram revividos por seus membros e registrados pela equipe. Esta riqueza é possível porque nos projetos documentais que buscamos desenvolver com as comunidades Kotiria, Wa’ikhana e Tuyuka, os temas de pesquisa são auto-determinados pelos membros e as atividades são desenvolvidas por equipes de pesquisadores indígenas, seguindo um modelo de pesquisa colaborativa. Mas para o professor, assim como para o linguista, não basta apenas os projetos existirem. Estes precisam ser armazenados em um acervo, para que futuros alunos o utilizem como pesquisa e para que a escola possua um registro de suas atividades. Mesmo existindo hoje muitos mecanismos de armazenamento de dados multimídia, ainda é difícil em locais com acesso a internet remoto ou inexistente. !

Dito isto, começa a ser compreensível que o sistema de avaliação das e nas escolas tenha a escrita como premissa, já que esta é uma forma barata e prática de documentar, transportar e armazenar conclusões de trabalhos e projetos. !Porém, devemos reconhecer que a maioria das culturas indígenas amazônicas possui gêneros de fala próprios da oralidade e possuem uma tradição oral muito mais antiga e enraizada do que a escrita. Desta forma, pré-estabelecer a escrita como ponto de partida para a documentação ou avaliação das atividades escolares é levar a este espaço um pressuposto da escolarização da cultura branca, impondo determinadas estratégias discursivas que não são comuns a línguas de tradição oral, como conjunções para manter a coesão em um texto em que ambos falante e ouvinte estejam afastados dos fatos de que falam. Além disso, precisamos nos atentar para o fato de que muitas destas línguas estão ameaçadas e um dos papeis da escola é fortalecer e criar registros delas, visto que a mudança linguística alem de inevitável, pode muitas vezes ser acelerada em situações de desequilíbrio entre línguas dominante e minoritária. Assim, mecanismos de filmagem e gravação de som e vídeo de trabalhos produzidos pelos falantes não só são documentos duradouros e transportáveis das avaliações escolares, mas também são uma forma de gerar acervos destas línguas como efetivamente usadas por seus falantes. !Investimentos !Gostaríamos de fechar essa breve discussão (de um tema que é, de fato, bastante abrangente!) lembrando que o grau de investimento — tempo, recursos e trabalho — necessário para atender às demandas mencionadas é bastante elevado. É importante reconhecer a complexidade inerente a qualquer língua humana e o estudo profundo necessário para compreendê-la. É igualmente importante lembrar que trabalhos colaborativos interculturais também são complexos, exigem paciência e investimento de todas as partes para que relações de confiança e entendimento possam ser construídas. Por isso, acreditamos que materiais e produtos de qualidade não podem ser feitos às pressas, e que as preocupações linguísticas das escolas indígenas e as demandas apresentadas só poderão ser bem atendidas com dedicação, compromisso e investimento à altura.

Equipe de Documentação Wa’ikhana apreendendo a fazer filmagem, Iaua-retê, 2007. Foto: Kristine Stenzel

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Os Hupd’äh e a escola  Participantes  do  Seminário  de  Educação  Escolar  Hupd’äh,  realizado  em  abril  de  2014,  no  igarapé  Japu.  Foto  Ana  Lima.

Por Lirian Ribeiro Monteiro – Instituto SocioambientalOs  Hupd’äh  costumam  dizer  que  a  educação  Hup  se  inicia  

desde  o  momento  em  que  a   criança   recebe  o  nome  de   seu  clã.   Segundo   eles,   no  momento   do   benzimento,   o   nome   já  traz   todo  o  conhecimento  que  a  criança   irá  desenvolver  no  decorrer   de   sua   vida,   tornando-­‐a   uma   pessoa   Hup,   com  todos  os  conhecimentos  necessários  para  viver  bem  em  seu  território.   Para   essas  pessoas  o  Náw   Ibiy,   traduzido  para  o  conceito  de  ”viver  bem”,  está  fortemente  associado  ao  estar  no   interior   da   ]loresta,   quando   estão  engajadas   nas   formas   de   consumo   e  de   sociabilidade   ligadas   à   caça   e  coleta.   Contudo,   atualmente,   buscam  aliar  a  vida  no  interior  do  mato  com  a  vida   em   comunidades   próximas   aos  seus   vizinhos   e   patrões,   da   família  linguística  Tukano.  O   primeiro   contato   dos   Hupd’äh  

com   a   escola   se   deu   a   partir   dos  internatos   salesianos,   instalados   na  região   do   rio   Negro   nas   primeiras  décadas   do   século   XX.   No   início   dos  anos   70,   modelos   salesianos   de   escola   chegavam   às  comunidades  ribeirinhas,  levando  muitas  famílias  Hupd’äh  a  se   instalarem   nas   proximidades   para   que   seus   ]ilhos  aprendessem   o   português   e   a   religião   católica   com  professores   de   outros   grupos   étnicos.   Somente   em   2005,  com   o   inicio   de   um   magistério   voltado   para   as  especi]icidades   dos   povos   das   etnias  Hupd’äh,   Yuhupdeh   e  Däw,  se   inicia  o  processo  de  contratação  de  21  professores  Hupd’äh   pela   Secretaria   Municipal   de   Educação   de   São  Gabriel  da  Cachoeira.    Contudo,  mesmo   havendo   uma   demanda   cada   vez  mais  

crescente  de  alunos  Hupd’äh,  no  primeiro  semestre  de  2014  a   contratação  de  professores  Hupd’äh   foi   reduzida  a  partir  do   edital   para   o   Processo   Seletivo   Simpli]icado   (PSS),  lançado  pela  prefeitura  de  São  Gabriel  da  Cachoeira.    

O  PSS  desconsiderou  as  especi]icidades  da  educação  escolar  indígena,   que   garante   a   contratação   de   professores   do  mesmo  grupo  étnico  dos  alunos.  A  preocupação  atual  de  professores  e  lideranças  Hupd’äh  

em   relação   à   escola   é   como   fazer   com   que   a   escola   –   no  sentido   indígena   –   incentive   os   conhecimentos   que   são  produzidos  em  outros  espaços,  como  na  roça,  em  expedições  

de   caça   e   coletas   de   frutos,   em   rodas   de  ipadu,   durante   os   rituais   das   ]lautas  sagradas   e   dabucuris,   pois   percebem   que  os   jovens   de   hoje   estão   perdendo   o  interesse  no  conhecimento  de  seus  avós.  Consideram   de   muita   importância   que   o  governo   reconheça   seus   calendários  especí]icos  -­‐  que  contemplam  as  atividades  cotidianas   fora   da   escola   –   de   forma   a  promover   os   diversos   espaços   de   saberes  em   seus   te r r i tór ios .   Des tacam   a  importância   no   processo   de   letramento  

das  crianças  Hupd’äh  em  sua  própria  língua  e  isso  tem  sido  uma   das   principais   demandas   das   comunidades   Hupd’äh  dos  rios  Tiquié,  Papuri  e   igarapé   Japu,  com  a  solicitação  de  apoio   da   Coordenação   Geral   de   Índios   Isolados   e   Recém  Contatados/Funai  para  a  realização  de  o]icinas  pedagógicas  com  a  ]inalidade  de  produzir  materiais  didáticos  e  elaborar  projetos   políticos   pedagógicos   junto   aos   professores  Hupd’äh.  Salientam,  também,  o  desejo  em  aprender  sobre  os  conhecimentos  de  outros  povos  e  que  a  escola   tenha  como  objetivo   o   incentivo   em   seus   próprios   processos  educacionais   assim   como   no   aprendizado   de   outros  conhecimentos   da   sociedade   envolvente,   a   partir   de  metodologias  como  o  ensino  via  pesquisa.

“Segundo eles, no momento do benzimento, o nome já traz todo o conhecimento que a criança irá desenvolver no decorrer de sua vida, tornando-a uma pessoa

Hup, com todos os conhecimentos necessários para

viver bem em seu território”

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Políticas do Estado e a Educação Escolar Indígena no alto rio NegroLaise Lopes Diniz – antropóloga do Instituto Socioambiental

A   implantação   de   políticas   públicas   para   a  educação   escolar   indígena,   não   podem   ser  assumidas  como  solucionadas  pela  a  de]inição  das  leis   de   educação   no   Brasil ,   se   não   for  acompanhadas  de  programas  e  acompanhamento  real   da   aplicação   de   recursos   públicos.   Desde  1993,   o   MEC   através   do   Comitê   de   Educação  Escolar   Indígena,   elaborou   as   Diretrizes   para   a  Política   Nacional   de   Educação   Escolar   Indígena,  que   orientou   os   sistemas   de   ensino,   tal   como   o  Referencial   Curricular   Nacional   para   as   Escolas  Indígenas  (1998),  os  Referenciais  para  a  Formação  de   Professores   Indígenas   (2002),   e,   também   o  Programa   Parâmetros   em   Ação   de   Educação  Escolar   Indígena,   que   integram   o   conjunto   de  documentos   dos   Parâmetros   Curriculares  Nacionais  em  Ação,  implementado  pelo  MEC.  É   fato   que   o   ]inanciamento   especí]ico   à  

educação  escolar   indígena  passou  a  ser  uma  ação  do   governo,   de   modo   gradativo   e   diversi]icado,  concentrado  primeiro  na  formação  de  professores  e   paralelamente   com   o   apoio   à   publicação   de  materiais   didáticos   (Cf.  MEC,   1998).   Inicialmente  vo l tada   a   in i c i a t ivas   coordenadas   por  o r g a n i z a ç õ e s   n ã o -­‐ g o v e r n a m e n t a i s ,  posteriormente   as   universidades   federais   que  assumiram   os   programas   de   formação   de  professores  e  de  edição  de  materiais  didáticos.  O  MEC  então  estimulou  a  criação  de  núcleos  de  

educação   escolar   indígena   nas   Secretarias  Municipais  e  Estaduais  de  Educação  e  propôs  que  os   setores   se   responsabilizassem  pela   elaboração  de   propostas   que   atendessem   à   diversidade   dos  povos   indígenas   nos   estados   e   municípios  brasileiros.  O   objetivo   era   que   os   sistemas   de   ensino  

municipal   e   estadual   assumissem   a   criação   de  programas  de  formação  de  professores  e  linhas  de  publicação   para   os   povos   indígenas,   sendo   que   o  recurso   deveria   sair   das   próprias   secretarias,   o  que   provocou   uma   reação   de   resistência   das  secretarias,  tanto  municipal  quanto  estadual,  pois  estas   a]irmam   categoricamente   que   não   seria  possível  desenvolver  as  atividades  necessárias  ao  desenvolvimento   da   educação   escolar   indígena  sem   a   criação   de   uma   linha   de   ]inanciamento  especí]ico.  

!Há   o   que   se   comemorar.   Existem   avanços   e  

conquistas  a  partir  da  década  de  70  em  diante  em  relação   à   educação   escolar   indígena,   com   o  reconhecimento  dos  direitos  de  uma  educação  que  considere   os   direitos   da   diversidade   étnica.  Entretanto,   o   que   se   pode   comemorar   com   as  conquistas   em   leis,   não   se   pode   comemorar   com  as  ações  implantadas.  Infelizmente,   os   programas   de   formações   de  

professores   e   o   investimento   ]inanceiro   referente  às  escolas   indígenas  ]icam  à  mercê  da  vontade  de  cada   gestor   que   assume   o   MEC   e   as   Secretarias  Estaduais   e   Municipais,   quem   decide   se   a  educação  escolar  indígena  é  ou  não  é  uma  linha  de  ação,   apesar   de   existirem   as   leis.   As   políticas  públicas  não  alcançam  a  população  indígena.  As   lideranças   e   professores   indígenas   do   alto  

rio  Negro   apontam  que  os   gestores  do  Estado  do  Amazonas   e   do   município   de   São   Gabriel   da  Cachoeira,   responsáveis  pelo  ensino  médio  e  pelo  ensino   fundamental,   respectivamente,   apesar   de  receberem  recursos  ]inanceiros  (Fundeb  e  outros)  para   o   desenvolvimento   da   formação   de  professores   e   implantação   de   políticas   especí]ica  às  escolas  indígenas;  não  estão  preparados  para  o  cumprimento   dessas   ações   ou   desconhecem   as  especi]icidades   e   demandas   da   educação   escolar  indígena.  É   fato,   as   comunidades   que   desenvolvem  

diretrizes   da   educação   escolar   indígena  diferenciada   só   o   ]izeram   através   da   obtenção   de  apoio   de   instituições   não   governamentais,   com  projetos   próprios   e   não   via   o   ]inanciamento   por  parte  do  Estado.  No  cenário  atual,  além  da  falta  de  recursos   ]inanceiros,   há   também   a   falta   de  recursos  humanos  quali]icados  no  atendimento  do  sistema  de  ensino,  dado  a  grande  rotatividade  dos  pro]issionais   ou   a   baixa   formação   técnica,   o   que  provoca   o   total   descompasso   entre   o   que   é  de]inido  por   lei  e  as  práticas  da  educação  escolar  indígena  no  estado  e  no  município.  Como  mostra  a  fala  do  professor  Tuyuka:  !

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Acesse:    federacaodasorganizacoesindigenasdorionegro  

Futebol comunidade Tunuí Cachoeira / Foto: Laise Diniz /ISA

As   concepções   sobre   a   educação   escolar  indígena   divergem   de   acordo   com   a   posição   dos  atores   –   indígenas   e   governo.   Mesmo   com   a  formulação  de  propostas  de  políticas  diferenciadas  para   os   indígenas,   destacando-­‐se   as   leis   que  reforçam   a   diversidade   étnica   e   cultural   na  Constituição  de  1988,  a  concepção  das  políticas  de  inclusão   sobrepõe-­‐se   às   políticas   de   educação  escolar   indígena.   A   leitura   da   legislação  normalmente  realizada  pelos  governos  municipais  e   estaduais   é   de   garantir   a   oferta   de   escola   com  acesso   a   todos,   garantindo   o   direito   à   equidade   e  não   à   construção   de   um  programa  de   ensino   que  garanta  o  direito  à  diversidade,  no  caso  a  educação  escolar  indígena  diferenciada.  As   propostas   educacionais   desenvolvidas   nas  

escolas   Tuyuka   e   Baniwa   inspiraram   um   outro  modelo   educacional,     comprovando   que   era  possível  fazer  uma  educação  escolar  de  qualidade,  sob  a  gestão  dos  próprios  indígenas  e  valorizando  parcer ias .   I sso   provocou   uma   mudança  fundamenta l   toda   a   reg ião :   as   esco las  originalmente  missionárias  e  geridas  pela  Diocese  do   rio   Negro   passaram   a   ser   coordenadas   pelos  indígenas,   ao   passo   que   muitas   comunidades  decidiram  fazer  suas  próprias  escolas.  Essas   experiências   escolares   propuseram  

rupturas   e   reformas   na   política   escolar  desenvolvida   pelo   Estado   brasileiro,   totalmente  

“Temos   o   objetivo   da   nossa   escola   descrito   no  PPP,   e   a   escola   Tuyuka   persiste   em  manter   o   que  foi   de;inido   no   nosso   PPP,   apesar   da   Semec   fazer  política   contrária   e   desconsiderar   o   que   já   foi  aprovado.  Na  Semec  é  desse  jeito,  muda  secretário  e   cada   um   quer   de   um   jeito,   mas   o   povo   Tuyuka  sabe  o  que  quer,  e  não  vai  mudar  de  acordo  com  a  vontade   da   gerência   da   secretaria”.   (Entrevista  Professor  Alexandre  Resende,  Tuyuka,  Comunidade  São  Pedro/alto  rio  Tiquié,  2012).  

das   tradições   indígenas.   Um   dos   preceitos  fundamentais   da   escola   é   o   acesso   à   cultura  letrada,   o   que   se   faz   não   através   de   uma   via  espontânea,   mas   sim   por   meio   de   um   processo  sistematizado   que   ordena   as   rotinas   de   ensino-­‐aprendizado.  Conteúdos  de  outra  ordem,  como  as  tradições   indígenas,   são   entendidos   como  processos   educacionais   secundários   e   não   como  papel  fundamental  da  escola  (SAVIANI,  1991).  É  certo  a]irmar  que  as  escolas  Baniwa  e  Tuyuka  

não   rompem   completamente   com   o   modelo   da  escola  moderna.   Apesar   de   todo   o   esforço   destes  povos   para   desenvolver   um   ensino   que   não   se  restrinja  aos  paradigmas  escolares  convencionais,  desde  reformulação  do  conteúdo  programático  do  currículo  nacional  e  da  de]inição  de  metodologias  de   ensino   e   objetivos   mais   adequados   de  formação.  Contudo,  estes  povos  indígenas  (Tuyuka  e   Baniwa)   fazem   outros   usos   da   escola,   que   por  isso   se   intitulam   de   “diferenciada”.   Priorizam  outros   valores,   entre  os  quais   a   ênfase  que  dão   à  escola   como  um  espaço  de   reunião   entre   saberes  de   dois   mundos,   caracterizando   o   que   seria   um  ensino   intercultural ,   que   faz   convergir  conhecimentos   diferentes   ao   que   interessa   à  população,   segundo   suas   potencialidades   de  serem  úteis  na  lide  com  questões  atuais.  O  processo  desenvolvido  nas  escolas  Tuyuka  e  

Baniwa  é  uma  revisão  do  modelo  da  escola  formal,  podendo   contribuir   para   a   renovação   dos  processos   pedagógicos   num   sentido   amplo   e  colaborar   para   a   reformulação   dos   processos  pedagógicos   aprisionados   na   instituição   escolar  convencional.   Promove   uma   nova   forma   de  organização   escolar   e   se   afasta   do   modelo  ocidental  quando  abre  espaço  para  os  mais  velhos,  pais   e   lideranças   de]inirem   os   parâmetros   na  formação   dos   jovens   alunos,   o   que,   no   contexto  atual,   con]igura-­‐se   na   constituição   de   novos  sujeitos.   Tanto   os   Tuyuka   quanto   os   Baniwa  consideram   que   a   formação   ofertada   em   suas  escolas   é   de  melhor   qualidade   e   que   seus   jovens  estão   mais   bem   quali]icados   para   desenvolver  atividades  demandadas  de  suas  comunidades.  

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Os desafios e a ampliação das parcerias das escolas Yuhup Por: Pedro Lolli –USP e Henrique Junio Felipe – UFSCar

No contexto atual as escolas yuhup não têm funcionado nem no modelo tradicional, espelho das escolas rurais brasileiras, nem no modelo diferenciado, que vem sendo construído pelo movimento indígena da região. Em lugar disso, as escolas até pouco tempo estavam sob a assessoria de uma ONG formada por missionários evangélicos e católicos, cujo modelo pedagógico não era claro. A decisão da maior parte das comunidades yuhup, de interromper a parceria com a ONG, trouxe um novo cenário com desafios específicos em torno da construção de um projeto de escola. Sem dúvida, a criação de um departamento específico dentro da FUNAI em São Gabriel para apoiar os povos Maku foi fundamental para que a associação das escolas yuhup – mas também escolas hup e dow – encontrasse respaldo institucional para os desafios assumidos. O apoio de antropólogos que trabalham com essas comunidades também teve sua contribuição nesse processo.

Em meados de 2013, uma equipe técnica da FUNAI formada por Sirlene Bendazolli (CGPC/FUNAI) e Fernanda Nunes de Araujo Fonseca (CRRN/FUNAI) realizaram viagem às comunidades yuhup e hup para fazer uma avaliação pedagógica resultando no relatório “Diagnóstico da Educação Escolar Indígena entre os Povos Hupd’äh e Yuhupdeh do rio Tiquié”.

Ainda no segundo semestre de 2013, foi realizada a 1a Oficina Pedagógica da AECIPY (Associação das Escolas e Comunidades Indígenas do Povo Yuhupdeh) que contou com a assessoria dos antropólogos Henrique Junio Felipe e Pedro Lolli.

As discussões realizadas entre comunidades indígenas, indigenistas e antropólogos têm revelado a preocupação com o movimento de escolarização referente ao povo de língua yuhup e a necessidade de maiores discussões a respeito face à sua conhecida especificidade dentro do sistema social do Alto Rio Negro. Também ressaltou-se a necessidade da construção física das escolas, já que na maior parte das comunidades é utilizada uma casa improvisada.

Outro ponto destacado se relaciona à consolidação de um projeto político pedagógico de uma escola diferenciada a partir do que já foi realizado pela associação das escolas yuhup. Além disso, coloca-se também como desafios prementes: a decisão do que ensinar e em que ciclo, a elaboração de materiais didáticos na língua, a consolidação de um método de alfabetização.

Ainda no final do ano de 2013 houve uma mobilização dos envolvidos para procurar uma aproximação maior com a FOIRN, já que esta tem vasta experiência em relação à construção de projetos na área de educação indígena. O intercâmbio entre a associação das escolas yuhup e a FOIRN é fundamental para a consolidação do projeto político pedagógico dessas escolas. O primeiro passo oficial dado nessa direção foi a inclusão das escolas yuhup no grande Seminário de Educação que ocorreu em toda região do Alto Rio Negro. O Seminário foi realizado no mês de abril de 2014 e teve como foco a discussão de estratégias para que os objetivos acima citados possam ser alcançados. Com isso a associação das escolas yuhup vêm ampliando suas parceiras no sentido de fortalecer suas ações em relação a consolidação de um projeto político pedagógico.

Grupo  de  Trabalho  Yuhupdeh  -­‐  Semi-­‐nário  de  Educação  Escolar  Hupdah  e  Yuhupdeh.    /  Foto:  Lirian  Monteiro/

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Escolas Indígenas: Construindo novas práticas educativas e pedagógicas Por Pe. Justino Sarmento Rezende1

Depois dos quinze anos de novas histórias da educação escolar dizemos que acumulamos muitas experiências positivas e também não tão positivas. Hoje já é possível dizer como e quando uma escola indígena funciona bem, o que impede o seu bom funcionamento e o que se deve fazer para melhorar. Antes disso não tínhamos referenciais para falar da educação escolar indígena.

Se alguém me perguntasse quais foram as maiores dificuldades eu apontaria algumas para que estejamos atentos e evitemos os mesmos erros: 1. No nível interno das comunidades indígenas: preconceitos ao novo modelo de educação escolar. 2. Dificuldades com as secretarias de educação, municipal e estadual, que não reconhecem nem legitimam os Projetos Políticos Pedagógicos, mesmo com amparo jurídico, com suas legislações de educação escolar indígena. 3. Nossa dependência (indígena) à pessoa do assessor externo e financiamento externo. As assessorias externas não indígenas parecem ter compromissos bem passageiros. Quando elas se vão deixam os indígenas com o ar de desânimo. Diante disso eu me pergunto: quem fazia tudo isso?

Faço ainda uma observação que eu vejo como muito importante: nós indígenas devemos aprender a trabalhar sem depender tanto de assessorias não indígenas. A assessoria externa não pode ser paternalista conosco, mas deve ser colaboradora ao nosso protagonismo no campo de educação escolar indígena e em outros setores de nossas vidas. Na construção de nossas histórias da educação escolar indígena devemos estar convencidos de que ela está lidando com os povos indígenas contemporâneos e preparando os indígenas para viverem nos tempos contemporâneos. Dois objetivos devem fazer parte da educação escolar indígena atual: cuidar de temas importantes para nossas vidas indígenas e trabalhar com temas importantes do mundo contemporâneo globalizado.

1. É do povo Tuyuka. É salesiano padre. Tem formação acadêmica: Filosofia, Teologia e mestrado em Educação [Linha de pesquisa: Diversida-de cultural e Educação Indígena; área de concentração: Formação de professores].

Foto:  Aloísio  Cabalzar/ISA

Amigo leitor e amiga leitora eu partilho com você uma importante história da educação escolar indígena no nosso município de São Gabriel da Cachoeira – Amazonas! No final da década de 1990 e início da década de 2000, vimos surgir novas políticas de educação escolar para crianças, adolescentes e jovens indígenas. Estou falando de duas escolas que marcaram essa nova história: Escola Tuyuka e Pamáali. A partir dessas duas escolas vimos o surgimento de muitas outras escolas. Temos que nos orgulhar dos trabalhos de todas essas escolas, de todos os membros das comunidades, dos sábios, sábias, dos professores, dos estudantes. Todos eles protagonizam até hoje essas novas histórias educacionais!

Essas escolas que surgiram mostram para nós mesmos, para nossa região, para o Brasil e para o mundo que é possível educar as crianças, adolescentes e jovens indígenas a partir da participação de todos os membros das comunidades desde o momento em que se pensa essa educação, na programação, execução e na avaliação. Mostram que os membros das comunidades são educadores-professores. Que as comunidades são espaços educativos. Que o cotidiano e eventos especiais dão ritmo ao novo modelo educacional. Que os ambientes, as pessoas, sábios, homens e mulheres são bibliotecas a serem pesquisados.

Essas escolas utilizam a metodologia de estudo ensino via pesquisa. Todos os membros das comunidades são responsáveis pela organização de conteúdos, pela transmissão de conhecimentos e pela educação prática. Assim fortaleceram as identidades e diferenças culturais. A política linguística ganha prioridade: falar, escrever e ler na sua própria língua. Outra política importante é de criar amor às nossas terras, desenvolver os trabalhos, pesquisas e implantar projetos de sustentabilidade. Ensinam também os conhecimentos da sociedade nacional para preparar os estudantes para serem cidadãos brasileiros que saibam falar a língua portuguesa e dominem outros conhecimentos.

Essas histórias da nova educação escolar contam com a participação das assessorias qualificadas não indígenas, financiamentos internacionais e nacionais. Foi importante a parceria construída entre a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), Instituto Socioambiental (ISA) e as Comunidades. Os resultados dessa educação foram tão marcantes em nossas histórias que repercutiram no entorno regional, nacional e internacional.

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Histórico do Projeto de Educação Indígena no alto rio Negro – ISA / FOIRN

O registro histórico do contato dos povos indígenas na região do Alto Rio Negro teve início no século XVII, com a chegada de comitivas do governo português, os registros revelam que os primeiros contatos resultaram na introdução de doenças infecciosas (gripe, sarampo e varíola) que dizimaram boa parte da população, assim como o registro da exploração da mão- de-obra indígena nas construções e na extração de produtos florestais.

É neste período que tem os primeiros registros de presença missionária (jesuítas, carmelitas e franciscanos), contudo a presença mais contundente foi no século XX com a instalação da missão salesiana, sendo que a presença mais efetiva se deu através da construção dos centros salesianos: São Gabriel da Cachoeira em 1915; Taracuá em 1923; Iauareté em 1929, Santa Isabel em 1942; Pari-Cachoeira em 1945 e Assunção do Içana em 1955. O objetivo principal destes centros era o trabalho de catequese, eram dotados de igreja, hospital, escola e internatos destinados a receber crianças e jovens entre 10/12 anos até 16/18 anos.

A missão salesiana foi responsável pela ampla difusão da escolarização na região do Alto e Médio Rio Negro. Como resultado até os dias de hoje a região possui um alto índice de alfabetização, quando comparado as demais populações indígenas. Este é certamente o ponto positivo apontado pelas lideranças indígenas sobre a presença dos missionários salesianos, contudo, não se pode deixar de registrar que a ação da missão salesiana por meio de internatos provocou o esvaziamento das comunidades, criação de grandes missões com concentração de muita gente para facilitar a atividade catequética e escolar, além de empenharem campanhas contra o uso das línguas maternas nos internatos, a prática de danças e rituais, a residência nas malocas (casas comunitárias), entre outros aspectos socioculturais, ou seja, ações contrárias ao modo de vida tradicional.

Porém, vale ressaltar, que na avaliação das lideranças dos povos indígenas do alto rio Negro a presença salesiana propiciou a aprendizagem sobre o “o mundo dos brancos”, e que tais conhecimentos foram fundamentais para a organização do movimento indígena e passou a ser uma importante ferramenta para a conquista e defesa dos direitos indígenas.

Na década de 70, através da Resolução n. 114 do Conselho Estadual de Educação (Diário Oficial de 27/01/1970) o Regimento Escolar da Unidade Educacional Dom Pedro Massa é aprovado, resultando que as escolas salesianas passaram a ser mistas e deixam de ser internatos. Deste modo, as escolas estavam sob o controle das irmãs da congregação Filhas de Maria Auxiliadora (irmãs salesianas), mas sob a fiscalização da Secretaria Estadual de Educação do estado do Amazonas.

A extinção dos internatos se deu principalmente pela política do governo brasileiro, que passou a investir nas secretarias de educação como responsáveis pela educação escolar em todo o território brasileiro. Tal ação obrigou aos salesianos a estabelecer uma nova estratégia para a oferta da educação escolar para as aldeias indígenas no Alto Rio Negro. A principal estratégia foi a criação de escolas nas aldeias católicas, com o objetivo principal de alfabetizar na língua portuguesa e ensinar as primeiras noções de matemática, sendo que os ex-alunos dos internatos passaram a atuar como professores.

Somente na década de 80 é que foi instituído o Órgão Municipal de Educação de São Gabriel da Cachoeira, vinculado a Prefeitura e responsável pela organização e administração do sistema escolar do Município. As escolas das aldeias indígenas passaram para a jurisdição municipal, entretanto as irmãs salesianas continuaram com a função de supervisoras escolares até o início dos anos 90. Todas as escolas de responsabilidade do município ministravam as quatro primeiras séries do ensino fundamental, em turmas multisseriadas.

Atualmente, as escolas salesianas estão registradas no Censo Escolar como escolas indígenas, e são conveniadas com a SEDUC-AM (Pari Cachoeira, Taracuá e Assunção do Içana, e a Escola de São Miguel em Iauaretê). A SEDUC-AM também possui convênio com o exército, onde estão instalados os pelotões de infantaria da selva (Querari, fronteira com a Colômbia; São Joaquim, no alto rio Içana e Cucuí, povoado que faz fronteira com a Colômbia e Venezuela).

Apesar de as comunidades receberem a educação escolar imposta pelo Estado, buscam adequar seus projetos de educação visando construir autonomia, gestão própria e poder de decisão, numa clara contraposição aos propósito do processo de colonização. As experiências de educação escolar indígena dos Baniwa e Coripaco e dos Tuyuka são referenciadas como propostas inovadoras, por marcarem uma ruptura político-pedagógica com o sistema educacional salesiano, apoiado pelo Estado.

Essas experiências não se prendem a modelos escolares convencionais, e permitem articular suas memórias histórico-discursivas com os conhecimentos de outros povos, que interessam à população, por serem úteis na lide com questões atuais. Um dos grandes avanços desta estratégia de educação escolar é o fato de possibilitar que a gestão administrativa e pedagógica possa ser exercida pelos próprios índios.

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O  Instituto  dos  Conhecimentos  Indígenas  e  Pesquisa  do  Rio  Negro  -­‐  ICIPRN  é  uma  proposta  de  formato  institucional  que  tem  como  perspectiva  constituir  uma  rede  de  conhecedores  e  pesquisadores  indígenas  e  não  indígenas,  fomentando  processos  de  produção  e  transmissão  de  conhecimentos  e  práticas  para  o  manejo  ambiental,  gestão  territorial  e  o  “bem  viver”  na  Amazônia.    

O  ICIPRN  será  um  espaço  acolhedor  à  diversidade  cultural  e  linguística  do  rio  Negro,  propiciando  condições  para  o  fortalecimento  da  produção  de  conhecimentos  dos  povos  do  rio  Negro  e  conexões  com  outras  redes  de  conhecimento  e  pesquisa  cientí]ica.  Operará  como  uma  rede,  com  núcleos  regionais  situados  em  diferentes  partes  da  bacia  do  rio  Negro,  onde  serão  desenvolvidas  pesquisas  e  realizadas  etapas  de  formação  dos  pesquisadores  indígenas.  Em  vários  desses  núcleos  já  existem  escolas  com  nível  médio.  

O  Instituto,  junto  ao  Programa  de  Formação  Avançada  Indígena  do  Rio  Negro,  está  em  fase  inicial  de  preparação,  pretendendo  iniciar  com  a  primeira  turma  em  2016,  com  um  grupo  de  trabalho  operando  em  São  Gabriel  da  Cachoeira,  sob  supervisão  da  FOIRN,  e  assessorado  pelo  ISA  e  em  parceria  

com  Ministério  da  Educação  e  Ministério  da  Ciência  e  Tecnologia  através  da  Centro  de  Gestão  e  Estudos  Estratégicos/CGEE.  

Essa  formação  será  em  áreas  que  contribuam  para  enfrentar  os  graves  problemas  das  populações  indígenas  do  rio  Negro  –  êxodo  das  terras  indígenas,  erosão  linguística,  abandono  de  práticas  e  conhecimentos  tradicionais.  Inicialmente,  a  formação  dará  ênfase  na  gestão  territorial  e  manejo  ambiental  e  gestão  territorial,  economia  indígena  e  línguas  indígenas  (o  município  de  SG  é  o  único  que  reconhece  três  línguas  indígenas  como  coo]iciais).  

Pretende-­‐se  que  o  Instituto  se  constituirá  na  forma  de  organização  social  conforme  o  disposto  na  Lei  nº  9.637.  Isso  implica  observar  os  critérios  básicos  de  composição  do  conselho,  entre  os  quais  a  participação,  de  representantes  do  poder  público  e  de  entidades  da  sociedade  civil;  e  formalizar  parceria  com  ministérios  por  meio  de  contrato  de  gestão.  

O  que  queremos?  !✴ Queremos  curso  superior  que  nos  permita  atuar  

nas  comunidades.  ✴ O  cidadão  indígena  deve  ser  capaz  de  melhorar  sua  

condição  de  vida  comunitária  social  e  econômica.  ✴ Conhecimentos  indígena  e  ocidental  não  indígena  

devem  trabalhar  juntos:  o  diálogo  intercultural  deve  ser  o  princípio  de  construção  da  proposta  de  formação;  

✴ Que  o  ensino  seja  por  meio  de  pesquisa  e  interdis-­‐ciplinar.  

✴ Que  essa  formação  nos  permita  gerir  de  forma  sus-­‐tentável  os  recursos  que  temos  na  nossa  região.  

✴  Um  desenho  institucional  aberto  e  ]lexível,  como  espaço  aberto  para  gerar  e  apreender  diversas  ex-­‐pectativas.  

✴ Que  alunos  e  formadores  possam  cursar  ou  ofere-­‐cer  cursos  e  o]icinas  nas  universidades  parceiras  e  vice-­‐versa.  

✴ O  ensino  deve  ser  reconhecido  legalmente  e  os  alu-­‐nos  que  concluírem  essa  formação  possam  ter  cer-­‐ti]icado  reconhecido.  

✴ Seguiremos  o  princípio  de  acolher  a  diversidade  de  calendários  microrregionais,  regionais  e  étnicos  de  toda  região  do  rio  Negro.

O que não queremos? ✴ Replicar  o  que  já  existe:  não  vamos  fazer  cursos  su-­‐

periores  de  disciplinas  que  já  existem,  por  exemplo,  Direito,  Medicina,  Antropologia,  Biologia  e  outras.  

✴ Competir  com  alternativas  existentes:  licenciatura  intercultural;  acesso  diferenciado  a  universidades.  

✴ Que  seja  somente  numa  língua  e  com  predominân-­‐cia  do  conhecimento  cientí]ico.  

✴ Estruturas  burocratizadas.  

Atividade  de  ensino  e  pesquisa  na  escola  Yupuri  -­‐  rio  Tiquié.  Foto:  Aloísio  Cabalzar

Instituto dos Conhecimentos Indígenas e Pesquisa do Rio Negro - ICIPRN

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Publicações Rio Negro - educação

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Objetivo: Atuar   no   controle   social   referente   às  po l í t i cas   públ i cas   munic ipa is  estaduais   e   nacionais   referentes   à  Educação   Escolar   Indígena   no   rio  Negro  e  no  Brasil.  !Equipe:

Coordenador:   Ivo   Fontoura,  mestre  em  antropologia,  da  etnia  Tariana.    ! !!!!!!!!!!!Técnico:   Ismael  Moreira;  especialista  em  gestão  escolar.

Departamento de Educação FOIRN

Editores:  Ray  Baniwa/SETCOM-­‐FOIRN  |  Laise  Diniz/ISA  |  Lirian  Monteiro/ISA  Textos:  Ana  Lúcia  Pontes  |  Ivo  Fontoura  |  JusGno  Resende|  KrisGne  Stenzel|  Laise  Diniz|  Lirian  Monteiro|  Luiza  Garnelo|  Nathalie  Vlcek  |Ray  Benjamim  |  Sully  Sampaio  Fotos:  Aloísio  Cabalzar  |  Ana  Lima  |  Carol  da  Riva  |  KrisGne  Stenzel  |  Laise  DIniz|  Lirian  Monteiro  |  Ray  Benjamim  |  Sully  Sampaio.

Wayurí Educação

A  Federação  das  Organizações  Indígenas  do  Rio  Negro  -­‐  FOIRN  que  re-­‐presenta  os  23  povos  indígenas  do  rio  Negro  tem  a  missão  de  garantir  os   direitos   indígenas   diante   do   estado   brasileiro   conforme   consta   na  constituição  federal.  Para  efeitos  práticos  de  acompanhamento,  atua  na  questão  do  controle  social  das  políticas  publicas  pertinentes  a  região  do  rio  Negro  -­‐  área  de  abrangência  da  instituição.    Dessa  forma  com  rela-­‐ção  as  atividades  de  atendimento  a  questão  da  educação  nessa  região  a  FOIRN  criou  um  departamento  de  educação  que  acompanha  a  execução  das   instancias  publicas  quanto   ao   atendimento  da  oferta  da   educação  escolar  no    município.  E  como  na  região  90%  da  população  é  indígena  se  preocupa    na   implantação  e   reconhecimento  das   escolas   indígenas  que  é  garantido  pela  Lei.    

Por  essa  razão,  como  uma  instancia  de  controle  social  durante  os  anos  de  2013  e  2014  vem  realizando  consultas  nas   regiões  de  abrangência  das  cinco  coordenadorias  CABC,  CAIARNX,  CAIMBRN,  COITUA  e  COIDI  com   o   objetivo   de   realizar   um   diagnóstico   sobre   a   atual   situação   do  atendimento  da  oferta  de  educação  em  nível  do  município,   sejam  elas  escolas  municipais,   estaduais  e   instituições  de  ensino   superior  que   se  encontram  na   região.   Essas   consultas   vem   sendo   realizadas   por  meio  dos  seminários  internos  de  educação  escolar  indígena  onde  participam  estudantes,   pais,   lideranças   indígenas,   professores,   coordenadores   e  gestores  das  escolas  estaduais    que  conforme  o  decorrer  da  realização  dos   seminários   foram   apresentando   os   problemas   que   as   escolas   en-­‐frentam  na  atualidade  e  as  possíveis  propostas  que  poderão  contribuir  na  melhoria  do  atendimento  na  oferta  de  uma  educação  escolar  indíge-­‐na  da  forma  como  almejam  a  população  indígena  dessa  região.  Isto  é,  a  ]inalidade  também  é  de  proporcionar  a  oferta  de  uma  educação  escolar  indígena   de   qualidade   e   que   realmente   atenda   as   especi]icidades   da  região.  Nesse  sentido  por  meio  do  apoio  da  FUNAI  a  FOIRN  hoje  cons-­‐trói  subsídios  para  a  elaboração  de  planos  municipais,  estaduais  e  fede-­‐rais  de  educação  por  meio  de  informações  levantadas  durante  os  semi-­‐nários  e  a  serem  apresentadas  para  as  instituições  de  ensino  por  meio  de  relatórios  resultantes  de  cada  seminário   interno.   Já  que  as   institui-­‐ções  públicas  não  conseguem  atingir  e  percorrer  toda  região  do  rio  ne-­‐gro  dada  a  sua  dimensão  territorial.