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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP FACULDADE DE EDUCAÇÃO Um estudo de caso da prática docente: a produção de saberes na sala de leitura Fany Cristina Wirthmann São Paulo 2008

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SPFACULDADE DE EDUCAÇÃO

Um estudo de caso da prática docente:

a produção de saberes na sala de leitura

Fany Cristina Wirthmann

São Paulo2008

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SPFACULDADE DE EDUCAÇÃO

Um estudo de caso da prática docente:

a produção de saberes na sala de leitura

São Paulo2008

Trabalho de conclusão de curso

apresentado como exigência parcial à

graduação no curso de Pedagogia, sob a

orientação da Prof.ª Dr.ª Alda Luiza Carlini.

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Agradecimentos

Agradeço a todos que participaram direta ou indiretamente do meu processo de formação. A minha família que sempre me apoiou, aos amigos do curso que compartilharam seus conhecimentos comigo. E em especial a todos aqueles que acreditam em uma educação transformadora.

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WIRTHMANN, Fany Cristina. UM ESTUDO DE CASO DA PRÁTICA DOCENTE: A PRODUÇÃO DE SABERES NA SALA DE LEITURA. São Paulo – 2008.Orientadora: Prof.ª Dr.ª Alda Luiza Carlini.

Resumo

Este trabalho teve como objetivo analisar o saber docente e seu campo de produção e/

ou reprodução por meio do Projeto da Sala de Leitura da Secretaria Municipal de São

Paulo.

Constatamos por meio das práticas observadas e do depoimento da Professora

da Sala de Leitura, que a prática docente pode sim ser disparadora de saberes, no

entanto para que isso aconteça é necessário que os professores se reconheçam como

tal, caso contrário, estarão condenados à reprodução de modelos ultrapassados e à

alienação.

Palavras - chave: saber docente, produção de saber e reprodução de saber.

Abstract

This study aimed to analyze the teacher and know their field of production and / or

reproduction through the Project of the Reading Room of the Municipal Secretariat of

São Paulo.

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SUMÁRIO

I) Introdução...................................................................................................................06

II) Tema-Problema.........................................................................................................09

III) Referencial Teórico..................................................................................................10

1. Algumas concepções: homem, mundo, trabalho, sociedade e educação e a importância da Orientação Vocacional............................................................................102. O papel do coordenador pedagógico e o contexto atual: o Projeto Político

Pedagógico e suas perspectivas ....................................................................................19

3. Subsídios teóricos para fundamentação do tema – problema ...................................29

IV) Metodologia.............................................................................................................35 V) Dados de campo.......................................................................................................38

1. Instituição....................................................................................................................382. Análise dos dados observados na Sala de Leitura (SL) e do depoimento da

POSL...............................................................................................................................45

V)Considerações Finais...............................................................................................55

VI) Plano de ação..........................................................................................................57

Referências Bibliográficas...........................................................................................61

Anexos

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I) INTRODUÇÃO

O objetivo da primeira parte deste trabalho de conclusão de curso é descrever a

minha história de vida, enfatizando o que me levou a querer ser uma educadora e que

caminho trilhei para aqui chegar.

Desde a infância carrego em mim uma essência para a educação. Aos sete

anos, quando ainda começava meu processo de alfabetização com a cartilha “Caminho

Suave”, já dividia minhas descobertas do mundo da leitura e da escrita com minha avó

analfabeta. Foi com ela que tive minha primeira experiência de ensino.

Ensinei-lhe a escrever seu nome e as letras do alfabeto, senti então a satisfação

de presenciar a alegria de minha avó ao assinar o seu documento de identidade e

contar orgulhosa que eu a ensinei escrever seu nome.

Continuei meus estudos e sempre admirava aulas bem dadas e apreciava a

profissão com certo encantamento, mas no decorrer de minha vida fui presenciando

frustrações de professores, a degradação do ensino e me desencantando com a

profissão.

Quando terminei o ensino médio não pensava em fazer faculdade por ser algo

ainda muito distante de minha realidade.

Trabalhava desde os 15 anos e, aos 19 anos, trabalhando como consultora de

vendas de uma empresa, ganhava o suficiente para pagar um curso universitário, mas

não sabia o que fazer, queria algo que me fizesse ascender economicamente e o mais

rápido possível.

Pesquisei alguns cursos e descobri o curso de secretariado executivo trilingüe,

onde aprenderia dois idiomas. Mesmo sem conhecer muito bem as atribuições da

profissão, resolvi fazer o curso. Entrei na faculdade aos 19 anos.

O primeiro ano foi produtivo, as disciplinas eram gerais, como: filosofia,

sociologia, psicologia, e eu estava entusiasmada. Porém, no segundo ano da faculdade

o conteúdo ficou mais específico e eu já não ia mais para a faculdade com a mesma

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vontade. Meu trabalho também não me agradava mais, queria algo diferente que me

desafiasse, que despertasse algo adormecido.

Decidi trancar a faculdade em meados do quarto semestre, mesmo sem saber o

que faria. Fui julgada por estar abandonando a faculdade, faltando tão pouco para

acabar, e confesso que eu também me sentia frustrada e até derrotada por não

conseguir continuar.

Para não ficar sem estudar, decidi fazer um cursinho pré-vestibular comunitário,

localizado próximo da minha casa. E foi lá que minha essência de educadora

reapareceu, com a paixão dos professores que atravessavam a cidade para ir até a

zona leste dar aula para jovens carentes. No segundo mês de cursinho já havia

escolhido, faria Pedagogia.

Fiz quatro meses de cursinho e passei no vestibular da PUC, mas sem ter como

pagar tentei uma bolsa do governo do estado de São Paulo, em um programa chamado

“Escola da Família”, onde eu teria que trabalhar aos fins de semana para garantir a

bolsa integral. Consegui a bolsa no primeiro mês, mas o meu trabalho exigia atividades

nos finais de semana. Outro dilema: para continuar a faculdade, teria que sair do

emprego e foi essa a minha escolha.

Aos 22 anos, iniciava o curso de pedagogia. Logo no primeiro ano de faculdade,

comecei a estagiar em uma escola municipal próxima de casa, foi então que comecei a

me interessar pelo assunto formação de professores, pois percebia os professores

angustiados, sem saber o que fazer, precisando de apoio, de orientação, e muitas

vezes sem ter a quem recorrer.

Percebia também o despreparo de muitos, por falta de instrução, por ter uma

formação obsoleta e até por falta de identificação com a profissão. Enfim, desde o

primeiro ano de faculdade já pensava em fazer a habilitação em Orientação

Educacional e Supervisão Escolar – OE/SE.

Trabalhei no Núcleo de trabalhos Comunitários - NTC da PUC, em uma

formação de educadores de movimento social chamado MOVA (Movimento de

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Alfabetização de Adultos). Foi uma experiência muito válida, onde pude reafirmar minha

escolha e ter certeza do caminho escolhido.

Minhas experiências seguintes na área da educação foram em instituições

particulares e atualmente trabalho como professora auxiliar de uma escola particular no

Butantã. A instituição tem uma boa estrutura e um trabalho contínuo de formação de

professores, que me possibilita muitas aprendizagens. Para fazer o trabalho de

conclusão de curso, fiquei em dúvida entre diversos temas que me despertam

interesse, como: formação de professores, avaliação, cultura escolar, mas foi devido às

leituras que fiz para o trabalho de iniciação científica que consegui encontrar um tema

para meu TCC.

Articulando minha breve experiência como educadora e meus estudos até o

momento, resolvi investigar sobre o saber docente, por ser um campo ainda pouco

explorado pela pesquisa acadêmica e por se referir à instituição escolar propriamente

dita e aos saberes lá produzidos.

Tendo em vista a abrangência do tema, realizei um estudo de caso, em que

procurei explorar o saber docente produzido na sala de leitura de uma escola da rede

municipal de São Paulo. Escolhi a sala de leitura, devido a relevância desse espaço-

tempo nos dias atuais e à responsabilidade que recai sobre os ombros do professor da

sala de leitura (POSL) em uma sociedade em que as imagens ocupam um grande

espaço nas vidas de crianças e adolescentes e a leitura está cada dia mais distante da

realidade das escolas públicas.

Pretendo com este trabalho pesquisar o saber docente construído e reconstruído

por meio do Projeto Sala de Leitura da Rede Municipal de Ensino de São Paulo

(RMESP). Para esta pesquisa serão analisados a Sala de Leitura (SL) e o professor da

sala de leitura (POSL), em termos das relações que estabelece: relação professor-

aluno, professor-conhecimento, aluno-conhecimento, além de outras informações que

ajudem a identificar a produção de saberes nesse espaço-tempo.

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Espero, com esse trabalho, sanar algumas dúvidas que ainda tenho acerca da

atuação dos professores e despertar outras questões para que a chama de aprendiz

permaneça sempre acesa em minha trajetória.

II) TEMA-PROBLEMA

O tema da pesquisa realizada englobou várias temáticas educacionais, porém

mais restritivamente o saber docente e seu contexto de produção e reprodução, sendo

a SL o espaço escolhido para observação e análise desse processo.

A questão central que guiou este estudo foi: O que as práticas docentes da/na

SL da RMESP expressam/revelam sobre a produção ou reprodução do saber docente?

Conforme dito anteriormente, essa questão vem acompanhada de várias outras

questões que nos ajudaram nesta investigação, tais como: o professor considera sua

prática relevante para a produção de saberes? Reflete sobre ela? O professor se

percebe como produtor de conhecimento? Qual a sua relação com o trabalho do aluno

em sala de aula? Qual é o papel do coordenador na organização dos saberes

produzidos nesse espaço escolar?

Essa pesquisa objetivou verificar se os professores são produtores de saberes e

se enxergam como tal. Mais especificamente a POSL, para isso, realizamos um

levantamento das práticas que possam expressar essa produção, por meio da

observação do cotidiano escolar, concepções, normas, relações, padrões, valores, em

suma tudo o que acontece nesse espaço. Também para isso vamos analisar a história

de vida da POSL, para procurarmos a partir de sua história tentar entender sua prática

docente.

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III) REFERENCIAL TEÓRICO

Neste item tenho por objetivo descrever e refletir sobre as concepções que fui

construindo ao longo de minha trajetória no curso de Pedagogia. Pretendo esboçar um

breve panorama da sociedade atual e analisar algumas temáticas relacionadas à

educação, que constituirão a base para o desenvolvimento desta pesquisa. Iniciarei por

concepções mais gerais: homem, mundo, educação e sociedade, em seguida passarei

para algumas concepções mais específicas, como: o papel do coordenador pedagógico

na sociedade contemporânea e a orientação vocacional como mais uma ferramenta do

trabalho educacional.

Na segunda parte deste item recorrerei a concepções mais específicas ao meu

objeto de investigação, com um breve relato histórico do surgimento da SL, análise das

concepções de leitura, cultura escolar e saber docente, procurando relacioná-las com

meu tema-problema.

1. Algumas concepções:

Homem, mundo, trabalho, sociedade e educação, e a importância da Orientação Vocacional

A concepção de ser humano presente neste trabalho é perpassada de diversas

teorias que apresentam o homem como ser social. O ser humano se constitui no âmbito

social, não há ser humano sem o meio social. E, antes desse ser humano, há uma

história da humanidade, composta por hábitos de uma determinada cultura, portanto, o

homem é um ser histórico e social. Não negamos aqui a individualidade do ser humano,

mas acreditamos que ela seja constituída também na relação com outro.

Rego referenciando Vygotsky

“afirma que as características tipicamente humanas não estão presentes

desde o nascimento do individuo, nem são mero resultado das pressões

do meio externo. Elas resultam da interação dialética do homem e seu

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meio sócio-cultural. Ao mesmo tempo em que o ser humano transforma

o seu meio para atender suas necessidades básicas, transforma-se a si

mesmo.” (1995, p. 41)

Conforme citado, o homem transforma a si mesmo e transforma o mundo,

portanto, podemos concluir que o mundo, assim como o homem, estão em constante

mudança, em constante processo de construção.

Esse processo de construção e de transformação do mundo se dá por meio do

trabalho. Em uma concepção mais genérica e baseada no materialismo histórico de

Marx, o trabalho é a ação do homem na natureza, é uma ação material, pela qual o

homem busca a sobrevivência.

Ao fazermos um breve panorama histórico do trabalho e suas relações sociais,

percebemos que seu significado muda conforme o momento histórico e a sociedade em

que está inserido. E isto reafirma o homem como ser histórico que, por meio do

trabalho, constrói a sua sobrevivência. Portanto, as idéias de ser humano e de trabalho

estão sempre associadas, pois sem o trabalho o homem não garantiria sua existência e

sua evolução no mundo.

Saviani também defende a idéia de que o homem é produtor de sua própria

existência e faz isso transformando a natureza, e assim “criando um mundo humano (o

mundo da cultura).” (1994, p. 11)

O mundo da cultura é fabricado pelo homem, que o cria a partir de sua ação

sobre a natureza, produzindo objetos para facilitar sua existência material para garantir

sua sobrevivência. Porém, o homem não produz apenas objetos materiais, produz

também objetos imateriais (Saviani, 1994), ou seja, produz idéias sobre esse mundo,

sobre sua existência nele, e assim o ser humano produz conhecimento, que será

passado para outros seres humanos ao longo da história da humanidade, e esses

conhecimentos serão reproduzidos e transformados.

Esse processo de aquisição e reprodução da cultura se dá com a educação, seja

ela formal (dada por instituições especializadas), ou informal (família, igreja e outros

órgãos não especializados).

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Para Saviani, a educação tem dois princípios: fazer com que o ser humano

assimile a cultura em que vive e conseqüentemente encontrar a melhor maneira para

que essa assimilação aconteça. Segundo ele: “o trabalho educativo é o ato de produzir,

direta ou intencionalmente, em cada individuo singular, a humanidade que é produzida

histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens.” (1994, p. 13)

A educação é o meio pelo qual o homem se torna humano, a escola é uma

instituição formalmente criada para educar o homem, e o seu objeto é imaterial, ou seja,

o conhecimento sistematizado. (Saviani, 1994)

Outro autor que defende a idéia de um mundo cultural produzido pelo homem é

Charlot que, baseado no marxismo, conclui:

“A humanidade (ou a “humanitude”), isto é, o que constitui o ser

humano no que ele tem de específico, não é uma natureza que cada

indivíduo traria em si no nascimento, é o que é produzido pela espécie

humana ao longo de sua história.” (2005, p. 76)

Assim como os autores citados, partimos da premissa de que o mundo é um

mundo inacabado e em constante transformação, assim como o ser humano, e a escola

é o espaço onde conhecimentos já construídos e sistematizados serão aprendidos e

pensados na busca da construção de novos conhecimentos.

Conforme constatamos, o homem é produtor de sua própria existência e o faz

por meio do trabalho, fabricando assim sua cultura e seu modo de vida, e é por meio da

educação que essa cultura perpassa gerações e se renova na medida das

necessidades sociais.

Para melhor compreender a relação entre escola e sociedade, recorremos a

Cortella, que destaca duas concepções: na primeira delas, que o autor denomina

“otimismo ingênuo”, a escola é vista como a salvadora da pátria, ela é o alicerce da

sociedade, e está incumbida de tarefas como: acabar com a pobreza, inserir na

sociedade indivíduos excluídos e marginalizados. Essa concepção nos traz a idéia de

uma escola que não é influenciada pelas relações sociais, como se fosse um organismo

fora da sociedade, e não pertencesse a nenhuma classe social.

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Na segunda concepção, intitulada “pessimismo ingênuo”, ocorre o movimento

contrário: a influência social e das classes dominantes é tão forte e acentuada que a

escola é vista como o aparelho ideológico de Estado. Tudo o que se faz na escola

atende às idéias da classe dominante. Essa concepção nega a transformação, e o

papel da escola e dos educadores consiste em “perpetuar o sistema” (Cortella, 2004, p.

134)

Em contraposição às duas concepções anteriores, Cortella traz uma concepção

de educação em que a determinação das classes dominantes não é absoluta e o papel

da escola na sociedade é reconhecido, mas não como missão de salvação e sim, como

possibilidade de transformação. Nessa concepção, a escola deve ser um espaço

propício para que o sujeito possa se desenvolver e desenvolver habilidades para uma

ação transformadora da sua realidade.1

Sendo assim, a escola é sim um espaço de reprodução de conhecimentos, mas

é, principalmente, um espaço de construção, onde o sujeito conhece, interage,

experimenta e assim se descobre como ser histórico e social.

Partindo das premissas de que o homem é um sujeito que se forma na relação

com o outro e com o mundo, e que esse mundo, enquanto matéria, está inacabado,

assim como o próprio homem, cabe à educação, mais especificamente à escola,

selecionar conhecimentos que ajudem o ser humano a entender sua realidade e a

caminhar na direção de uma transformação que atenda às necessidades e aos

interesses da sociedade.

Conforme dito anteriormente, as concepções de ser humano e de trabalho são

indissociáveis e, se acreditamos na escola como instituição formadora e

transformadora, não podemos deixar de ressaltar a importância da educação na

preparação para o mundo do trabalho.

Na Antiguidade, o trabalho ainda era visto como um meio de produzir a

sobrevivência, mas era uma atividade dos servos, artesãos, camponeses ou

1 Quando falamos de ação transformadora da realidade estamos nos referindo a sociedade capitalista e seu sistema de divisão de classes, pois acreditamos que a educação tem importante papel para a redução dessas diferenças.

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trabalhadores manuais, ou seja, daqueles que não eram livres. Aqueles que dependiam

de outros para sobreviver. O que determinava o tipo de trabalho do indivíduo era a sua

condição familiar ou as conquistas e derrotas de guerra. (Bock, 2006)

Na Idade Média, a situação não era muito diferente. A sociedade passa a ser

dividida em classes e a posição social se deve à ocupação familiar, isto é, filhos de

nobres serão nobres, filhos de vassalos terão o mesmo destino que os pais. Essa

explicação se justifica pela dominação da igreja, que defende que tudo acontece por

vontade divina.

Nas duas perspectivas históricas citadas anteriormente: a Antiguidade e a Idade

Média, percebemos que o trabalho não tem uma definição em si, mas é determinado

pela organização social vigente e por quem detém o poder.

Com a chegada do capitalismo, embasado pela ideologia liberal, ocorrem

grandes mudanças na sociedade e nas relações de trabalho. Na sociedade capitalista:

“as pessoas somente conseguem sobreviver se comprarem os produtos

do trabalho uns dos outros, já que possuem atividades especializadas,

não produzindo todos os bens de que necessitam. (...) A transformação

da matéria prima em produtos é feita pelo trabalhador, que vende sua

força de trabalho ao capitalista em troca de um salário. O capitalista é

dono dos meios de produção (matérias primas, ferramentas, etc.) e se

apropria dos produtos acabados. A sociedade capitalista tem como

elementos fundamentais a propriedade privada, a divisão social do

trabalho e a troca.” (Pereira e Gioia, 2004, p. 165.)

Segundo Manacorda, baseado no marxismo: “A divisão do trabalho condiciona a

divisão da sociedade” (1991, p. 67). Assim como o trabalho foi fragmentado, a

sociedade também foi, entre operários e proprietários.

Desse ponto de vista, há na sociedade capitalista um paradoxo: o individuo

precisa trabalhar para viver e, ao mesmo tempo, é livre para escolher seu ofício e para

quem vai trabalhar, e é nesse momento que o campo de orientação vocacional começa

a ganhar espaço, pois o ser humano agora tem liberdade de escolha e uma condição

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de igualdade. Mas, como explicar as desigualdades geradas pelo sistema? Segundo

Bock, nos primórdios do capitalismo

“não se pode mais utilizar a idéia de que “Deus” quer que a sociedade

seja assim”, como se fazia no modo de produção feudal. (...) para

justificar essas diferenças encontradas no seio da sociedade

desenvolve-se o conceito de vocação biológica. Agora o orgânico

explica as diferenças individuais e sociais.” (2006, p. 24)

Em suma, é com o modo de produção capitalista que surge a visão de que o ser

humano pode escolher o caminho que quer seguir, “a partir das condições em que vive

e em função de suas vontades e aptidões.” (Bock, 2006, p. 25).

Surgem então as teorias de Orientação Vocacional, que foram mudando a partir

da compreensão e da idéia que se tinha do ser humano, da sociedade e do trabalho.

Primeiramente, a escolha da profissão era vista como uma determinação externa

ao sujeito, estabelecida pela cultura, sociedade, família. Essa explicação é a base das

teorias não-psicológicas, ou seja, que dão grande ênfase aos fatores sociais, mas não

se atentam a como o sujeito reage a esses fatores, não abrindo espaço para nenhum

modo de orientação. Bock chama a atenção para o fato de que: “seriam forças agindo

sobre o individuo, mas que seriam tomadas como mera explicação e que não seriam

operadas pelo sujeito em qualquer nível.” (2006, p. 28)

Em contrapartida, surgem as teorias psicológicas, que acreditavam que fatores

internos impulsionavam o sujeito na escolha profissional. Para a abordagem

psicometrista, o sujeito possuía aptidões inatas e o trabalho de orientação vocacional

se limitava a mensurar essas aptidões, para traçar um perfil do individuo e adequá-lo ao

mercado de trabalho e à sociedade vigente. Nessa abordagem, o foco está no

desenvolvimento do individuo, baseado no conceito de personalidade, que acredita que

esta diferencia o sujeito dos demais seres humanos. Não existem possibilidades,

existem aptidões humanas. Na abordagem desenvolvimentista, a história de vida do

sujeito é levada em consideração junto com sua personalidade, mas ainda prevalece a

idéia de que o individuo deve se adequar à sociedade.

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Para as abordagens psicológicas, todo poder de escolha está nas mãos do

indivíduo, enquanto ser psicológico, sendo essa escolha determinada por fatores inatos

ou processuais. Portanto, a sociedade possui uma estrutura fixa e acabada, cabendo

ao ser humano se ajustar a ela e às profissões nela existentes.

O papel do orientador vocacional na primeira abordagem, a psicometrista, fica

restrito a testes, e na segunda, desenvolvimentista, à adequação da pessoa à

profissão, como bem explica Quartiero:

“Analisando estes dois diferentes momentos históricos de busca

do entendimento e da conseqüente orientação para o processo de

escolha profissional, poderíamos dizer que passamos de um momento

de pura adequação para um outro onde a adequação aparece de forma

sutil, ou seja, envolta numa maior discussão sobre o individuo e suas

motivações externas, via estudo de seus recalques.” (1996, p. 24)

Em oposição às teorias que só olham para o individuo, surge a teoria crítica.

Nessa perspectiva, a sociedade não possibilita liberdade de escolha para o sujeito, seu

sistema de divisão de classes determina que só quem faz parte da classe dominante

tem o privilegio de escolher uma profissão. As pessoas marginalizadas pela sociedade

ficam à mercê do que o meio social em que estão inseridas pode oferecer. Aqui se

estabelece fortemente o paradoxo da sociedade capitalista citado anteriormente: o

sujeito é livre para escolher, mas sua condição social não lhe dá possibilidades de

escolha.

À luz dessa teoria, conseguimos perceber o papel da escola com mais nitidez.

Cabe a essa instituição conscientizar o sujeito, discutir as relações sociais e o mundo

do trabalho e refletir sobre como transformá-las.

O papel do orientador vocacional fica então em suscitar discussões que levem o

sujeito a refletir sobre o trabalho e sua posição social, debater sobre o sentido de

ingressar na vida profissional.

“Uma escolha profissional consciente/refletida é o objetivo central

desta abordagem teórica, onde a orientação profissional tem o papel de

provocar uma reflexão que vá além do momento da escolha, ou seja,

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que discuta, principalmente, o que é ‘...o ingresso em uma atividade

profissional’. (Ferreti: 45) tendo como tema central de suas discussões o

trabalho e sua realização dentro da sociedade brasileira.” (Quartiero,

1996, p. 25)

A perspectiva socio-histórica não nega todas as críticas à sociedade dividida em

classes, trazida pela abordagem crítica, mas acredita que a sociedade é construída

pelas relações sociais e, portanto, é por meio dessas relações que pode ser

transformada.

O sujeito, para essa teoria, é um ser ativo e histórico e não simplesmente um

reflexo da sociedade, ele não é individualizado, mas possui uma individualidade. As

profissões não são estáticas, podem ser mudadas e sofrem mudanças devido à grande

instabilidade da sociedade contemporânea.

A teoria socio-histórica não nega o determinismo das classes sociais, mas

acredita que ele não é absoluto, conforme afirma a teoria crítica. Crê na possibilidade

de mudança social, tendo em vista que o que faz o indivíduo são suas relações sociais

em um movimento dialético. Portanto, o sujeito como ser social e histórico constrói sua

história por meio do trabalho, como afirma Bock:

“É por meio do trabalho que o ser humano mostra-se ativo, ao

buscar sua sobrevivência. (...) A forma de exercício do trabalho é

histórica, isto é, o modo de produzir e de relacionar-se com a natureza e

com os outros ocorre de acordo com o modo de produção de cada

período.” (2006, p. 72.)

A sociedade é, portanto, parcialmente determinada, pois o ser humano, enquanto

sujeito histórico e participante ativo, pode e deve transformá-la, sendo o trabalho seu

principal instrumento de transformação. Se a escola é o espaço formalizado para a

formação do sujeito, é necessário que ela participe ativamente do processo de

orientação vocacional.

“A escolha profissional deve ser apropriação do sujeito. Cabe à

escola acompanhá-lo nessa trajetória, estimulando o processo de

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interiorização e reflexão pessoal sobre sua escolha profissional.” (Silva,

2004, p. 272)

A sociedade contemporânea, com suas rápidas mudanças e exigências cada vez

maiores, pressupõe um sujeito que faz escolhas cada vez mais cedo. Isso faz com que

o indivíduo enfrente a batalha da escolha da profissão sem, na maioria das vezes, estar

preparado para ela.

Em meio a todas as exigências mercadológicas, encontra-se o adolescente, que

passa por um turbilhão de mudanças e, dentre elas, enfrenta a obrigação de definir um

rumo profissional a seguir, para se posicionar diante da sociedade e, para isso, é

preciso que se pense em sua identidade. E é neste ponto que se requer a contribuição

da Orientação Vocacional (OV).

O trabalho na sociedade atual exige competências e habilidades diversas,

flexibilidade para atender às rápidas mudanças. A OV é responsável por auxiliar o

indivíduo a optar por uma profissão, por meio do autoconhecimento, seguindo a

premissa de que a identidade profissional fortifica e estrutura a identidade pessoal.

Para cumprir seu papel, a OV procura fazer o sujeito pensar sobre si, se

autoconhecer para poder lidar com os conflitos do mercado. Ela atua para fornecer

informações acerca das profissões e para o conhecimento das aptidões do individuo.

Isso levará o jovem a compor um plano vocacional, a caminho de uma escolha,

reconhecendo as dificuldades que irá enfrentar.

Portanto, o processo de OV é construído com base no contexto social e

econômico, na história e na subjetividade, em constante interação com os outros. É

importante ressaltar que a escolha não se finda no período de orientação, pois a

identidade profissional se forma ao longo da vida, com novos caminhos que podem

surgir, novas transformações sociais e outras mudanças que possam interferir nas

escolhas.

E o profissional de OV é um facilitador desse percurso para o autoconhecimento

e para a busca da identidade profissional que integra a identidade geral do sujeito.

Cabe à escola desenvolver projetos que levem os alunos a conhecer as profissões e a

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se conhecerem nessa sociedade, a desenvolver competências, que mais tarde estarão

ligadas a sua vida profissional e social. Segundo afirma Perrenoud:

“(...) ligar os saberes à ação e ao trabalho está no centro da existência

individual e coletiva e somente os ricos mais inconscientes podem

permitir-se desprezar essa ligação que torna sua existência possível.”

(2002, p. 9)

Enfim, é reconhecendo o individuo em sua subjetividade e enquanto ser social

que a orientação vocacional constrói o seu campo de ação. Assim, a escola é um

espaço privilegiado onde o sujeito se forma e contribui para a formação do outro,

visando sempre uma conscientização do sujeito em busca de uma sociedade melhor e

mais justa.

À luz de todas as teorias acima citadas concluímos que o homem é um ser social

e histórico, que trabalha para produzir sua existência, e assim o mundo e a sociedade

em que vive. A escola é a instituição sistemática, que tem como objetivo central formar

esse sujeito e a orientação vocacional é uma ferramenta a ser utilizada pela escola na

preparação do sujeito para o trabalho.

2. O papel do coordenador pedagógico e o contexto atual: o Projeto Político Pedagógico e suas perspectivas

Conforme já mencionado neste trabalho, vivemos em uma sociedade em

constante mudança, e que sofre nos dias atuais uma crise de valores e uma espécie de

desumanização, com o crescimento do desemprego, a alta de juros, o aumento de

preço dos alimentos básicos e necessários e a diferença social continuamente

acentuada. Percebemos que vivemos, cada dia mais, no limite da sobrevivência

imediata e não atentamos para questões éticas e morais, fatores que contribuem para a

sobrevivência da espécie humana. Vale refletir: como viveremos no futuro sem nos

relacionar bem, com boas regras de convivência e propósitos coletivos que nos guiem

no caminho de uma vida melhor?

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Sendo a escola uma instituição social, ela não poderia estar fora dessa crise, e

isso se observa pela queda na qualidade do ensino, no descaso das autoridades e na

pouca preocupação, da população em geral, em relação ao tema. E isso pode ser

observado até mesmo entre os profissionais da área educacional.

Devido a todos os problemas acima citados e a outros, que as linhas deste

trabalho não dariam conta de apresentar, se faz necessário promover debates e

reflexões acerca da educação brasileira, mais especificamente sobre o papel dos

profissionais da educação nesse quadro caótico em que se encontra o sistema escolar.

Como este trabalho está centrado na prática docente e os saberes que a

envolvem, cabe aqui refletir sobre o papel do coordenador pedagógico, quais são as

suas principais atribuições e como ele pode contribuir para a construção de um

ambiente educacional que vise a produção de saberes.

Temos por objetivo entender como se construiu a função do coordenador, ao

longo da história, em um panorama amplo, a fim de traçar com mais precisão seu papel

na sociedade atual.

Iniciaremos pela década de 50, em que a ação pedagógica era autoritária, as

ações escolares eram controladas e, segundo Scapin, o professor era uma figura

respeitada e tinha a liberdade de escolher com que método desejaria trabalhar. Os

conteúdos de ensino ocupavam papel de destaque nesse modelo educacional, sendo o

professor o grande responsável pela transmissão desses conteúdos e também pelo

sucesso ou fracasso do aluno. Nessa época, a escola não tinha orientadores ou

supervisores, pois os conteúdos e as avaliações eram definidos previamente e

determinados.

“Acompanhando de perto o trabalho escolar, havia os DECs

(Distrito de Educação e Cultura), por sua vez ligados todos ao órgão

central. Deste provinham as listagens de conteúdos por série e as

provas finais que promoveriam, ou não, os alunos.” (Scapin, 2005, p.

18)

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Ocorrem mudanças sociais e políticas, trazendo a necessidade de alterações no

contexto escolar, no modo de gerir a escola, na sua organização sistêmica e assim

evidencia-se a carência de outros profissionais.

É na década de 70 que aparece a figura do orientador, que desempenhava as

funções de atender alunos individualmente, coordenar atividades, atuar na sala de aula

semanalmente, receber encaminhamentos, fazer o atendimento de pais, consultar

outros profissionais da área e decidir a melhor maneira de intervir em cada situação.

Sua atuação tinha por objetivo principal procurar adaptar o aluno com problemas de

aprendizagem ou indisciplina à cultura escolar vigente.

O coordenador, nessa perspectiva, não era visto e nem se via como integrante

da escola e sim como uma pessoa à parte daquela realidade, que estava ali para

ajudar, no entanto, atuava como autoridade. Podemos constatar, diante da descrição

das suas atividades, o quanto o seu papel é revelador de uma política autoritária e de

um sistema de educação tecnicista, no qual as relações de poder são ressaltadas e a

realidade escolar não é levada em consideração. Como descreve Scapin, que passou

pela experiência de ser Orientadora nesse contexto,

“Falava-se em visão sistêmica, em modelo empresarial, em

setores especializados contribuindo para atingir objetivos

operacionalizados. (...) condições tecnicistas sobre mecanismos de

entrada, de processo e de saída. O aluno visto como matéria-prima que

na fábrica se transforma no produto final previsto.” (2005, p. 20)

Com o fim do militarismo, as teorias que estavam exiladas junto com seus

defensores, vieram à tona, mostrando que a realidade escolar é subsidiada pela

realidade social em que essa escola está inserida, explicando assim como problemas

internos da instituição podem ter suas origens no modelo econômico gerador de

injustiças e de abandono de alguns segmentos sociais. Ocorria o início da

democratização do ensino.

No entanto, com a idéia de democratização do ensino, evidenciou-se também o

despreparo da escola para essa universalização do saber. A partir da idéia de uma

ampla influência social no âmbito escolar, verifica-se a necessidade de uma redefinição

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nos papéis funcionais dessa instituição, ou seja, uma escola que pretende pautar sua

atuação na realidade social requer profissionais qualificados para isso.

“Para compreender o aluno, a escola, a sociedade, teremos que

refletir sobre vários temas que não se esgotam no interior de sua

realidade física e pedagógica da escola, mas que assumem um dado

significativo se considerarmos a teia de relações que esta instituição

estabelece com a própria sociedade ...” (Grinspun, 2005, p. 73)

E é assim que se reafirma a necessidade de um coordenador pedagógico que

tenha preparo para lidar com a realidade em seus diferentes âmbitos: relação

professor-aluno, relação professor-coordenador, coordenador-diretor, família,

comunidade, cultura e sociedade. Como podemos perceber, o campo de trabalho é

amplo e a tarefa não é fácil. Então, como desenvolvê-la com qualidade no caminho de

transformação da realidade?

Para ambicionarmos a transformação social, a mudança nas relações e a

construção de uma sociedade baseada em valores humanitários, precisamos pensar na

escola que queremos para essa sociedade. Como bem disse Carlos de Menezes, “Não

se resolvem na escola todos os problemas do mundo, mas sem ela não resolveremos

nenhum.” (Revista Nova Escola, 2007)

Segundo Rangel, temas transversais ou integradores como: ética, meio ambiente

e cotidiano escolar e sexualidade são de suma importância, por terem grandes

possibilidades de aplicação e de contextualização. Cabe ao coordenador pedagógico,

no seu papel de liderança dentro da escola, ressignificar tais temas buscando

informações científicas e sociais, para melhor integrar conhecimentos e valores.

Alguns desses temas ainda sofrem resistência na sociedade atual, como a

sexualidade, por exemplo, por isso cabe ao coordenador pedagógico a tarefa de

conscientizar os profissionais da escola e a família da relevância do trabalho com tais

temas, pois desde a infância é preciso reconhecer e respeitar as diferenças históricas e

culturais entre gêneros e é também nessa fase que nos descobrimos diferentes do

outro. Nesse sentido, negar a dimensão sexual do individuo seria tratá-lo de forma

superficial, sem considerar a sua totalidade.22

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O papel da escola também se constitui de preparar indivíduos livres e

conscientes para escolher, de tal forma que suas opções sejam norteadas pelo

respeito, pela tolerância e pela ética coletiva. Esse trabalho não é simples, requer

profissionais bem preparados, capazes de quebrar paradigmas educacionais e sociais,

e pode ser um bom começo para uma efetiva mudança de comportamento. E é nesse

momento que se torna indispensável a atuação do coordenador pedagógico, na

preparação de sua equipe para que tenham condições de trabalhar com tais temas.

Essa relação do conhecimento com valores deve constar das entrelinhas do

currículo escolar, ou seja, deve nortear a ação pedagógica, para que possam ser

efetivamente colocadas em prática por meio de projetos escolares.

Para que isso se torne possível, precisamos de uma gestão democrática, que

proporcione discussões sobre os limites éticos que irão basear o trabalho da equipe

escolar. Entendemos aqui por gestão democrática, uma gestão que tenha a

participação ativa de todos os segmentos da escola, como mostra Padilha:

“Essa questão está diretamente relacionada à dificuldade da

participação popular nos processos decisórios das diversas instâncias

políticas e, por conseguinte, nos processos de planejamento escolar,

educacional e de definição do projeto da própria escola.” (2001, p. 63)

A ética pressupõe limites nas relações, tão ausentes na sociedade atual, orienta

a diferenciação do público e do privado e, para que esses limites sejam respeitados

coletivamente, é preciso que todos discutam sua importância e que a reconheçam. O

coordenador precisa se assumir como modelo que é, e como líder de equipe precisa

dar bons exemplos de como respeitar limites éticos, para que o discurso não se

desloque da prática, e se transforme em um compromisso coletivo.

Essa grande diversidade de atividades, que englobam o papel do coordenador

na escola atual e na perspectiva de uma ação para a transformação, pode parecer

massacrante se não for bem instrumentalizada, e como fazer isso, sem perder o caráter

democrático?

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Devem ser ressaltados três aspectos do trabalho do coordenador pedagógico,

que são fundamentais à ação transformadora: a contextualização, ou seja, um trabalho

norteado pela realidade, um aspecto já tão mencionado nesta reflexão; o planejamento

democrático, que traduz a maneira como as questões sociais serão trabalhadas e

abordadas na escola; e as expectativas trazidas por esse trabalho dialógico e cidadão,

sempre tendo em vista que o aluno é o centro do processo ensino-aprendizagem.

A contextualização requer um levantamento de dados da realidade. Esse

levantamento requer a participação de todos os membros da comunidade escolar: pais,

alunos, professores e funcionários. E é necessário para descobrirmos onde estamos,

identificar quais são as principais representações sociais daquela comunidade,

entendendo por representação social a expressão e a interpretação do sujeito de um

dado da realidade, portanto, nessa representação está inserida também a dimensão

subjetiva do indivíduo.

“Realizar os diversos planos e planejamentos educacionais e

escolares, organizando a educação, significa exercer uma atividade

engajada, intencional, cientifica, de caráter político e ideológico e isento

de neutralidade. Dessa forma, planejar, em sentido amplo, é um

processo que visa dar respostas a um problema, estabelecendo fins e

meios que apontem para sua superação, de modo a atingir objetivos

antes previstos, pensando e prevendo necessariamente o futuro, mas

sem desconsiderar as condições do presente e a experiência do

passado, levando em conta os contextos e os pressupostos filosófico,

cultural, econômico, e político de quem planeja e de com quem se

planeja” (Padilha, 2001, p. 63)

Essa busca poderá ser feita por meio da aplicação de questionários, reunião de

pais, conversa com alunos, professores e funcionários e, até mesmo, em bate-papos

informais2.

2 Mais informações ver: PADILHA, R. Paulo. Planejamento educacional na perspectiva da escola cidadã. In:

PADILHA, R. Paulo. Planejamento dialógico: Como construir o projeto político pedagógico da escola. São Paulo: Cortez, 2001.

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A família deve ter uma ativa participação nesse processo, pois os pais também

são educadores, como considera Szymanski (2003), “que têm o que transmitir e o que

aprender” (p.10). E se partimos do pressuposto de que a educação é um fenômeno

social, precisamos considerara a necessidade de incluir a atuação e a responsabilidade

das famílias, principalmente no que diz respeito a contextualização desse processo.

No trabalho com a família, é preciso que se respeite sua estrutura e que não haja

expectativa de querer mudá-las. É necessário que nos desliguemos de modelos ideais

de família e reconheçamos a família da maneira como ela se configura na sociedade

atual.

“Reconhecer significa sair dos limites do preconceito e abrir-se para as novas

possibilidades de ser do outro e de ser-com-o-outro.” (Szymanski, 2003, p. 70) Para a

autora, trabalhar com famílias é preparar a escola para recebê-la e mudar a ótica das

interpretações. Ao invés de acharmos que uma determinada família não cuida

devidamente de seu filho porque é irresponsável, procurar entender a concepção de

criança e de educação que aquela família tem, como bem ressalta Szymanski (2003):

“Compreender como pensamos e como vivemos é, ao nosso ver, o ponto de partida

para o trabalho de mudança.” (p.41)

Em meio a tantos temas geradores precisamos priorizar aspectos que estejam

influenciando negativamente a aprendizagem dos alunos, pois seria ingênuo acreditar

que conseguiríamos resolver todos os problemas daquela realidade, mas podemos

conscientizar os integrantes da comunidade que esses problemas existem e trazê-los

para a reflexão sobre como e quanto somos capazes de agir para que esses problemas

se reduzam ou deixem de existir.

Nos parágrafos acima foram destacados dois elementos para a contextualização:

a participação da comunidade escolar e a descoberta de um ou mais itens prioritários

de trabalho naquela realidade.

Essas informações extraídas da realidade e a definição de consensos e acordos

grupais serão o marco referencial para a construção do Projeto Político Pedagógico

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(PPP). E é por meio dele que essas informações organizadas permitirão a construção

de projetos que viabilizarão a aprendizagem.

A construção do PPP, assim como a construção do marco referencial, deve ser

feita coletivamente, para que todos se sintam responsáveis pelo trabalho, co-autores do

projeto, e que assim comprometam-se em honrar os compromissos nele descritos.

Esse documento tem a função de integrar os interesses de todos os atores

sociais, a partir dos consensos e das prioridades estabelecidas, respeitando o

movimento da realidade, por isso, o planejamento é um processo infindável, pois a

realidade não é estática e requer atualização, novas reflexões e novas prioridades,

conforme afirma Gonçalves, o PPP é

“Movimento porque reflete a situação da escola pública em

determinado momento de sua história. Como essa situação está em

permanente mudança pela atuação das forças político-educacionais

presentes na escola, o projeto pedagógico se caracteriza sobretudo por

ser um espaço coletivo de discussão, análise, tomada de decisões,

direcionamento e acompanhamento das ações e de avaliação contínua

da situação.” (grifo do autor,1998, p. 2)

Portanto, o PPP é um instrumento com o qual o coordenador diagnosticará as

necessidades de sua escola e, a partir disso, planejará a superação dos problemas.

O PPP tem um caráter orientador e, por isso, devem ser registradas todas as

decisões tomadas pela equipe, pois aí constarão as diretrizes do trabalho daquela

escola. Devido a isso, desse documento, devem constar alguns itens relevantes para

uma ação pedagógica consciente e transformadora. Como bem destaca Gonçalves,

esse “documento-movimento” deve trazer as concepções de sociedade, ser humano e

educação daquela comunidade escolar, identificar quais os processos de

conhecimentos estão envolvidos em uma aprendizagem efetiva, como se dará a

formação continuada de seus profissionais e diversos aspectos que englobem a

unidade escolar e a sociedade em que está inserida.

Os itens acima também devem ser discutidos e construídos coletivamente,

procurando não perder de vista o caráter democrático do trabalho.26

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Podemos dizer que esse processo de construção e re-construção de conceitos

deve passar por uma espécie de avaliação, a priori diagnóstica, e a posteriori

continuada. Para isso, é preciso que se estabeleça um conceito de avaliação

condizente com o caráter democrático acima citado, pois “a definição de por que, o que

e como avaliar pressupõe uma concepção do Homem que se quer formar (...).” (Sousa,

1998, p. 165)

A concepção de avaliação que deve perpassar um processo dialógico é a de

uma avaliação interativa, contextualizada, contínua, que considera o sujeito e sua

história. Um processo que envolve diagnóstico, planejamento e prática.

O trabalho pautado na realidade social e nos princípios de uma gestão

democrática, onde todos se sintam autores e atores do processo, traz expectativas de

uma formação cidadã e autônoma, que sabe analisar sua realidade, refletir sobre ela e

agir para transformá-la.

Um planejamento que é construído, e não determinado, tem mais possibilidades

de sucesso, pois todos são responsáveis pelos objetivos levantados, todos podem se

identificar com as propostas e assim saber qual é, de fato, o papel que desempenharão

nessa sociedade.

A gestão democrática é, portanto, um exercício de cidadania e delineia a

possibilidade de vislumbrar um futuro melhor.

Tais teorias nos permitem entender que o coordenador pedagógico tem um

árduo trabalho pela frente e que é, sem dúvida, um dos responsáveis pela produção do

saber docente e que, ainda, pode e deve auxiliar para que os professores se

reconheçam enquanto produtores de saber. E esse auxílio se dá pela via da formação

continuada dos professores.

Santos (2007) afirma que, da mesma maneira que devemos salientar e valorizar

os conhecimento dos alunos, cabe ao coordenador pedagógico “considerar e valorizar

os sentimentos e saberes dos professores...” (p. 93)

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A formação continuada é uma maneira de mantermos o diálogo entre a

coordenação e o corpo docente para que seus saberes e sentimentos possam se

manifestar e assim possibilitar a reflexão na busca da produção de novos saberes.

Ferreira (2003) concebe a formação continuada como uma necessidade da

cultura globalizada e pondera que, sendo a escola “lócus privilegiado de transmissão,

assimilação e produção de conhecimento, deverá possibilitar a formação continuada...”

(p. 38)

Para desencadear um bom processo de formação, o coordenador precisa estar

disponível para ouvir o professor, para que suas ações em sala de aula possam ser

partilhadas pois, “quando alguém é ouvido (e compreendido), isso traz uma percepção

de si mesmo...” (Almeida, 2007, p. 79). Ouro aspecto apresentado por Almeida, como

atribuição ao trabalho do coordenador pedagógico é o de cultivar a leveza, chamando

atenção para o fato de que quando tiramos o peso das coisas, das pessoas

colaboramos “com a alegria, não só com a alegria de um final de processo, do objetivo

atingido, mas a alegria do percurso.” (p. 81)

O autor pontua mais dois fatores relevantes para o processo de formação

docente: o planejamento coletivo e a reflexão da/na prática. Ressalta que, quando se

planeja em grupo, se definem objetivos claros e comuns a todos, percebendo assim

que a integração possibilita o desenvolvimento de novas competências. (Almeida, 2007)

“Os professores percebem que o saber da experiência e da

formação, para atingir resultados, precisa ser refletido, formulado,

organizado, sistematizado. É assim que ele se transforma em

conhecimento.” (Almeida, 2007, p. 83)

A partir disso pode-se afirmar que o papel do coordenador é decisivo para criar

momentos em que os saberes da experiência possam ser compartilhados, pensados e

reformulados com a finalidade de contribuir para uma prática reflexiva e transformadora

de si e do meio.

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3. Subsídios teóricos para fundamentação do tema-problema

Como educadores, sabemos da complexidade que envolve o tema proposto

neste trabalho, por isso recorremos a alguns autores que há algum tempo efetuam

pesquisas acerca do saber docente. Primeiramente, nos ateremos a algumas definições

que justifiquem nossa preocupação com o tema e tragam fundamentos científicos e

sociais para a escolha do nosso objeto de pesquisa.

A Sala de Leitura (SL) da Rede Municipal de Ensino de São Paulo (RMESP)

assume um papel de grande importância na organização da escola como um espaço-

tempo dedicado ao desenvolvimento da leitura. Esse espaço foi criado em 1972, por um

grupo de profissionais da educação, preocupados com o baixo rendimento dos alunos

nas áreas de Comunicação e Expressão. Foi implantado, então, um projeto que

explorasse o livro, a partir de uma parceria entre as escolas municipais de 1º grau

(EMPG) e as bibliotecas públicas. O interesse dos alunos pela leitura aumentou, devido

a isso, fez-se necessário a criação de um espaço especifico para a leitura em cada

escola da rede municipal: a SL.

Segundo o site da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, o objetivo

desse espaço é colocar o aluno em contato com os diversos gêneros de textos

presentes em seus cotidianos, a fim de inserir os alunos na cultura escrita. E ressalta

que o ponto central das “Salas de Leitura da Rede Municipal de Ensino é atender a uma

emergência social contemporânea – formar leitores qualificados com condições de

compreender e atuar com competência no mundo em que vivem. Nessa perspectiva, ler

com autonomia é condição de cidadania e garantia de aprendizagem permanente.”

(http://educacao.prefeitura.sp.gov.br/)

Sem desconsiderar os dados gerais apresentados, partimos do pressuposto de

que existe uma cultura escolar intrínseca à instituição escolar, que corresponde a um

determinado espaço-tempo. Segundo Julia (2001), a cultura escolar só pode ser

analisada se contextualizada em seu cenário contemporâneo, mas no interior dessa

instituição há algo que precisa ser analisado.

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Seguindo essa linha de reflexão, podemos dizer que a cultura escolar diz

respeito aos acontecimentos cotidianos da escola, à transmissão de conhecimentos e

valores, que olhados de maneira superficial podem ser imperceptíveis, como bem

realça Julia:

“A cultura escolar é descrita como um conjunto de normas que

defendem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto

de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a

incorporação desses comportamentos.” (2001, p. 9)

É sobre essas práticas que nos debruçamos neste trabalho, procurando

compreender melhor como elas podem ser utilizadas na produção e não simplesmente

na transmissão ou reprodução de saberes. Cabe ressaltar que a cultura escolar não é

nosso objeto de estudo, mas o saber docente que nela se insere.

Outro conceito que acreditamos ser necessário ressaltar é o de “cultura docente”

apresentado por Gómez (2001), de suma importância para melhor entendermos a

relação do professor com seus saberes. O autor define a cultura dos docentes como

sendo:

“Um conjunto de crenças, valores, hábitos e normas dominantes

que determinam o que este grupo social considera valioso em seu

contexto profissional, assim como os modos politicamente corretos de

pensar, sentir, atuar e se relacionar entre si.” (p. 164)

Tardif, baseado em outros pesquisadores, afirma que o docente produz saberes

relativos ao seu trabalho. O autor justifica sua preocupação com essa questão

considerando que a atividade docente ocupa um lugar de destaque na escola e

ressalta: “é sobre os ombros do professor que repousa, no fim das contas, a missão

educativa da escola.” (2002, p. 113)

Defende o professor enquanto produtor de conhecimento a partir de sua

atividade, e não apenas como mero reprodutor de saberes ou como um ser sem reação

que é manipulado pelo “jogo das forças sociais”. (Tardif, 2002, p. 115). Devido a isso,

ressalta a importância de incluir a visão dos professores nas pesquisas sobre ensino e

pontua fortemente que:

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“a pesquisa sobre ensino deve se basear num diálogo fecundo com os

professores, considerados não como objetos de pesquisa, mas como

sujeitos competentes que detém saberes específicos ao seu trabalho.”

(2002, p. 115)

Tardif critica o que chama de “saber produzido fora da prática”, ou seja, as

pesquisas em que os professores são vistos como executores de conhecimentos

produzidos pela universidade. E, seguindo a premissa de que o saber também se

constrói na prática, completa:

“a relação entre a pesquisa universitária e o trabalho docente nunca é

uma relação entre uma teoria e uma prática, mas é sempre, ao contrário,

uma relação entre atores, entre sujeitos cujas práticas são portadores de

saberes.” (2002, p. 121)

Em contrapartida, Tardif pondera que cabe ao professor assumir o seu papel de

produtor de saberes e se apropriar das pesquisas e da elaboração do seu próprio

discurso.

Monteiro (2003) traz reflexões acerca da prática docente como aparato teórico,

ou seja, a relação dos conteúdos ensinados com quem os ensina e aponta que:

“o ‘saber docente’ que permite focalizar as relações dos professores com

os saberes que dominam para poder ensinar e aqueles que ensinam, sob

uma nova ótica, ou seja, mediadas por e criadoras de saberes práticos,

que passam a ser considerados fundamentais para a configuração da

identidade e competência profissionais.” (TARDIF, LESSARD e

LAHAYE,1991; PERRENOUD,1993,1999; THERRIEN, 1996; TARDIF,

1999; MOREIRA, LOPES E MACEDO,1998 apud 2003, p.123)

A autora acredita que o conceito acima não contempla totalmente e

especificamente a relação do professor com o conteúdo que ensina, e retoma algumas

concepções, tanto no que diz respeito ao saber escolar, como no que se refere ao

saber docente.

Monteiro, fundamentada em Tardif, Lessard e Lahaye apresenta o saber docente

como “heterogêneo e plural por ser constituído dos saberes das disciplinas, dos

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saberes curriculares, dos saberes da formação profissional e dos saberes da

experiência.” (2002, p. 137)

Salienta dentre esses saberes o saber da experiência, que é nessa perspectiva

teórica a maneira que o professor seleciona ou descarta conhecimentos que considera

importantes para sua própria prática. (MONTEIRO, 2002)

Também sustentada por Tardif, Lessard e Lahaye, Monteiro chama atenção para

o fato de que ao focar na experiência, esses autores acabam deixando de lado outros

fatores que compõem o saber docente. E adverte quanto a uma possível “ambigüidade”

na formulação do conceito, pois questiona “o saber docente é o saber da experiência ou

é a soma dos quatro saberes citados anteriormente?”. Considerando esse saber como

um conjunto de saberes polemiza “não se resgata de certa forma, o viés da

racionalidade técnica?” (2001, p. 132).

A autora também faz referência a Schön e a sua proposta direcionada à ação e

ao conceito de “reflexão-na-ação, segundo o qual o professor analisa e interpreta a sua

própria realidade no ato, e o de reflexão-sobre-a-ação, que implica o olhar retrospectivo

e a reflexão sobre o que foi realizado.” (2001, p.133) e alerta quanto ao risco de retorno

das práticas espontaneístas.

Outro pesquisador também ressaltado por ela é Perrenoud, que considera que “o

saber científico pesquisa e busca objetos na experiência” (2001, p.133) e enfatiza na

obra desse autor o conceito de competência, ou seja, a mobilização de saberes para a

ação. Para ele, a experiência docente pura e simples não garante a competência, é

necessária a aquisição de saberes científicos como preparação para a ação.

Por fim, a autora faz menção ao trabalho de Shulman, que apresenta um

conjunto de caracteres elaborados acerca da atividade docente, que aqui não nos cabe

ressaltar. No entanto, o que Monteiro destaca nessa proposta é relativo ao “domínio

dos saberes na ação”. (2001, p.137)

No que diz respeito ao saber escolar, Monteiro recorre a três conceitos de

currículo que pretendem explicar a relação entre escola e cultura. O currículo real,

baseado naquilo que realmente acontece na escola se opondo ao currículo oficial, e o

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currículo oculto, uma vertente que defende a idéia de aprendizados adquiridos na

escola “por experiência, impregnação, familiarização ou inculcação” (2003, p.125), de

forma implícita nos diversos âmbitos da educação escolar. Uma outra vertente

destinou-se aos estudos da história das disciplinas escolares, direcionada a pesquisar

como “nascem e evoluem as disciplinas escolares.” (2003, p. 125)

Busca também contribuições de estudos sobre o “processo de constituição do

conhecimento escolar” e cita os processos de transposição didática, fundamentada em

Chevallard. Explica que se trata da transposição dos saberes acadêmicos aos saberes

ensinados e que existem vários saberes que compõem o processo de transposição

didática: “o saber acadêmico, saber a ensinar, saber ensinado e saber aprendido”

(2003, p. 15) e destaca que “o saber acadêmico é sempre anterior ao saber ensinado.”

(grifo da autora, 2003, p. 15)

Para a autora, a contribuição trazida por Chevellard é de suma importância para

a compreensão dos processos de ensino em sua complexidade, e assinala que esses

“processos de explicação do texto do saber, inerentes a transposição

didática, implicam numa descontextualização face às problemáticas do

campo científico. (...) Sua recontextualização no campo educacional decorre

de constrangimentos próprios à cultura escolar e, segundo Chevellard, gera

saberes originais que precisam da interlocução com o saber acadêmico,

através da análise epistemológica, para poderem ser desvelados.” (2003, p.

16)

Para completar e contestar Chevellard, a autora recorre a Develay, pois este

acredita ser necessário considerar, além do saber acadêmico, os saberes da prática

social e salienta que “o movimento não é apenas descendente, do saber acadêmico

para o saber a ensinar (...). As práticas sociais podem, por sua vez também, influir na

formulação dos saberes acadêmicos.” (2003, p. 18)

Outra ressalva feita pela autora a respeito do trabalho de Develay, que

acreditamos ser interessante aqui ressaltar, diz respeito ao caráter axiológico do

processo de transposição didática, enfatizando que os valores escolhidos pelos

33

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promotores da transposição estão entrelaçados nos conteúdos e métodos de ensino.

Como bem afirma Monteiro

“A axiologização representa a opção feita no que tange à dimensão

educativa, podendo expressar-se através da seleção cultural - ênfases -

omissões - negações, através de aspectos inerentes ao chamado currículo

oculto e também às formas como os professores mobilizam os saberes que

ensinam.” (2003, p. 19)

Consideramos que o propósito de Monteiro, assim como o nosso, está em

aproximar e articular as abordagens acima mencionadas para melhor compreender

esse campo de pesquisa ainda pouco explorado, o saber produzido na e com a prática.

A partir dessas concepções, podemos perceber o quanto o saber docente é

produzido na prática, mas será que essa prática está sendo pensada de modo a gerar

novos saberes? Como os saberes de referência são transmitidos aos alunos?

Conforme apresentado, a SL tem um importante papel no desenvolvimento da

leitura nas escolas da RMESP, e o que esse espaço-tempo pode nos revelar sobre a

produção e/ou reprodução de saberes, por meio das observações realizadas e da

entrevista com o professor, foi um dos principais focos deste trabalho de pesquisa.

34

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IV) Metodologia de pesquisa

A história oral é uma metodologia de pesquisa atual. Um instrumento de

pesquisa para/da sociedade contemporânea, que por meio de entrevistas e com o

auxílio da tecnologia produz um estudo em constante movimento. Sendo assim, um

método indutivo, por trazer experiências particulares, a fim de chegarmos a um melhor

entendimento da realidade social.

Existem várias compreensões de história oral, mas nos ateremos aqui à história

oral como metodologia de pesquisa. Segundo Meihy: “história oral é um conjunto de

procedimentos” (2007, p. 15) que pressupõe a elaboração de um projeto, pessoas a

serem entrevistadas, planejamento das gravações, definição de locais, tempo de

duração, transcrição e estabelecimentos de textos, conferência do produto escrito,

autorização para uso e arquivamento.

O mesmo autor faz referência à história oral e ao uso de entrevistas quanto a sua

relevância social:

“A observância em relação à pessoa em sua unidade, contudo, é

condição básica para se formular o respeito à experiência individual que

justifica o trabalho com entrevista, mas ela vale no conjunto. Nesse sentido,

a história oral é sempre social. Social, sobretudo porque o indivíduo só se

explica na vida comunitária. Daí a necessidade de definição dos ajustes

identitários culturais.” (2007, p. 28)

Como podemos perceber, a entrevista e a observação resultaram em

documentos, o que nos auxiliou a criar hipóteses sobre a produção de saberes na SL.

Assim, o conjunto de informações obtido nas observações e na entrevista com o

professor nos forneceu elementos para fazer a análise referente à produção de

saberes.

A memória ocupa papel de destaque na prática da história oral e, como destaca

D’Alessio, “os estudos de memória respondem a uma necessidade de busca de

identidades ameaçadas.” (1998, p. 270)

35

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D’Alessio compara o imediatismo das informações na sociedade contemporânea,

com a narrativa, que é, segundo a autora, um momento de lembranças que perdura e

ultrapassa a instantaneidade dos fatos apenas noticiados.

O tempo e o espaço são fatores que constituem a identidade do sujeito.

Demartini, considerando Pollak, pontua que “a memória é um fenômeno construído

social e individualmente.” (2006, p. 99), portanto, a identidade é resultado de uma

construção individual e social.

Ainda referenciando Pollak, D’Alessio ressalta que a memória pode ser um

instrumento para a construção de uma história dos menos favorecidos, os que não

foram contemplados pela memória oficial e faz menção à relação poder-história. Para a

autora, o uso da memória é um artefato político e junto com a identidade pode criar

possibilidades para a construção de uma nova narrativa, produzindo debates acerca da

veracidade dos fatos históricos, e conclui que a “presença do múltiplo obriga poderes a

negociarem sua legitimidade.” (1998, p. 280)

É nessa perspectiva que vamos entrevistar o POSL, a fim de conhecê-lo melhor

e procurar entender suas práticas, por meio de sua história de vida, como alguns

saberes foram construídos ao longo de sua trajetória, e como isso reflete em sua

prática docente e na sua postura produtora e/ou reprodutora de saberes.

Para isso se fez necessário um breve estudo sobre a relação memória-educação.

Segundo Demartini (2006):

“Memórias da educação poderiam ser as memórias que acompanham

toda a aprendizagem dos indivíduos, realizadas ao longo de sua vida (...).

Haveria memórias sobre as mais diversas situações de aprendizagem como

a educação escolar, educação informal, e não-formal, envolvendo também

personagens variados – professores, administradores, pais, treinadores,

colegas, amigos – em lugares distintos - casas, escolas, fábricas,

movimentos sócias ou mesmo simples brincadeiras.” (p. 100)

A autora faz referência à memória social e, baseada em autores como Nóvoa,

afirma que a memória social é passada de geração a geração por meio da educação e

conclui que, seguindo esse raciocínio, a educação é a memória social.36

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Acrescenta que as metodologias qualitativas são uma forma de dar voz ao sujeito

e a sua memória e assim os relatos pessoais (as entrevistas) são instrumentos para a

produção de conhecimento, pois tanto o entrevistador quanto o entrevistado são

levados a refletir.

Referindo-se à educação escolar, a autora explica que alunos e professores são

sujeitos da história e a escola é um cenário que está fortemente guardado em suas

memórias. Nessa perspectiva, enfatiza a possibilidade de, a partir dessas memórias,

entender a realidade atual e assim ressignificar a memória da educação.

Ela esclarece que não excluiu outras fontes e cita a opinião de outros autores

quanto à subjetividade presente no trabalho com vivências e relatos e ressalta que a

subjetividade pode enriquecer o trabalho e trazer à tona uma face oculta que talvez em

outros momentos históricos não puderam ser explicitadas. E é aí que se estabelece

uma das relevâncias dos relatos, a extração de fatos que não foram discutidos em

outros documentos.

E foi partindo dessas premissas que fiz as observações da prática docente na SL

e que efetuei a entrevista, cujos roteiros encontram se no anexo I e II deste trabalho.

Além dos dados colhidos com esses procedimentos, foi necessário elaborar a análise

institucional, na perspectiva da descrição do contexto educacional, apresentada no

próximo item.

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V) DADOS DE CAMPO

Este item destina-se a descrever a instituição em que realizei o estudo de caso,

descrever a observação feita e analisá-la juntamente com a entrevista realizada com a

POSL, a fim de organizar informações e levantar hipóteses para o encaminhamento

desta pesquisa.

1. Instituição

Identificação

A EMEF José Maria Lisboa fica situada no bairro da Saúde. Segundo

informações obtidas na escola, existem algumas comunidades carentes no seu entorno

e é esse o público que a escola atende. Essa instituição fica a aproximadamente 20

minutos dos metrôs Santa Cruz, Vila Mariana e Ipiranga. Na mesma rua da escola tem

uma biblioteca municipal, o bairro aparentemente é um bairro calmo e residencial, não

possuindo muitas opções de lazer.

Essa instituição faz parte da coordenadoria do Ipiranga e funciona em três

períodos, sendo o primeiro turno das 6:50 às 10:50, o segundo das 10:55 às 14:55 e o

terceiro das 15:00 ás 19:00 horas. O primeiro período está reservado para o Ensino

Fundamental II, o segundo para o Ensino Fundamental I e no terceiro, os dois estágios

se misturam

Prédio Escolar

O prédio da escola foi construído especificamente para esta finalidade e mostra-

se razoavelmente conservado, possuindo salas de aulas, uma sala de informática, uma

sala de professores, salas de coordenação e de direção, secretaria, cozinha para

funcionários, cozinha para preparação de merendas, cujo serviço é terceirizado, uma

quadra descoberta e uma biblioteca, que é utilizada como sala de leitura. Fazem parte

das dependências da escola também um pátio e algumas áreas com árvores e bancos.

Além disso, a escola possui parceria com um posto de saúde da comunidade, que faz

trabalhos periódicos de prevenção de doença bucal com os alunos.38

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Estrutura administrativa e Social, organização e funcionamento

As reuniões de pais acontecem bimestralmente e a escola possui Associação de

Pais e Mestres.

Os professores são remunerados por horas de estudos direcionadas pela

coordenação e uma vez por semana têm direito a duas horas de estudo livre, as

reuniões pedagógicas com todo o grupo de professores acontecem mensalmente ou

bimestralmente, dependendo da necessidade, quando essas reuniões acontecem as

aulas são suspensas.

Foi solicitado, pelo pesquisador, o Projeto Político Pedagógico, PPP, mas foi

apresentado somente o regimento escolar, sob a justificativa de não haver PPP. Esse

documento é datado de 1998.

A análise que faremos neste trabalho está embasada nas observações feitas

pela observadora, ou seja, no currículo oculto e na cultura escolar e também nas

informações colhidas por meio do relato da POSL, à luz de conceitos já explicitados

neste trabalho. E, como bem afirma Brito (1998)

“Ainda que as organizações escolares estejam integradas num contexto

cultural mais amplo, produzem uma cultura interna própria, revelando os

valores, os ideais (sócias) e as crenças compartilhadas pelos membros da

organização.” (p. 135)

Outro conceito que deve ser considerado é o de clima de trabalho. Segundo

Brunet (1992), o clima está inserido na cultura da instituição e revela o modo em que se

dão as relações de trabalho e como os sujeitos dessa instituição percebem suas

relações. Para este autor, os fatores determinantes do clima “resultam dos

comportamentos e das políticas dos membros da organização, (...) uma vez que o clima

é causado pelas variáveis físicas (estrutura) e humanas (processo).” (p. 126)

Segundo o regimento escolar, cabe ao diretor a coordenação do funcionamento

geral da escola e a execução das deliberações coletivas do Conselho Escolar, de

acordo com as diretrizes da Política Educacional da Secretaria Municipal da Educação.

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O diretor possui um assistente e a esse cabe: substituir o diretor, responder pela

coordenação e colaborar com o diretor no desempenho das funções específicas.

Cabe aos Professores Orientadores da Sala de Leitura e de Informática

Educativa participarem da elaboração do Plano Escolar e das Reuniões Pedagógicas,

organizando e fazendo funcionar a Sala de Leitura e o Laboratório de Informática

Educativa. Os professores Orientadores da Sala de Leitura e de Informática Educativa

deverão garantir, em conjunto com a Equipe Escolar, que seus recursos sejam

utilizados pelos alunos e professores, como atividade integrada às desenvolvidas em

sala de aula, nos termos da legislação vigente.

A escola tem dois coordenadores pedagógicos e suas funções, segundo o

regimento escolar, são: acompanhar horários adicionais dos professores, participar da

execução do plano escolar, juntamente com a equipe escolar e o conselho da escola,

coordenar e avaliar as propostas pedagógicas da escola, participar de propostas de

articulação das diferentes áreas do conhecimento visando a superação da

fragmentação, estimular a continuidade do processo de construção do conhecimento,

estimular, articular e avaliar os processos da escola, organizar com o diretor e a equipe

escolar as reuniões pedagógicas e outras.

Como mostra o regimento escolar, a escola organiza suas ações com base em

um documento que determina a participação de todas as instâncias na elaboração de

um plano escolar e na continuidade do processo de construção do conhecimento.

Porém, nas observações feitas e na entrevista com a professora da sala de leitura,

pudemos constatar que muitas dessas diretrizes se contradizem com o cotidiano da

escola.

Brunet (1992) pondera que “São os actores no interior de um sistema que fazem

da instituição aquilo que ela é.” (p.127). Não queremos com isso desconsiderar a

importância de um documento, mas demonstrar que sua legitimidade só se confirma

nos acontecimentos cotidianos de uma instituição.

Ainda segundo o regimento escolar, os alunos são agrupados em classes, com

base na idade e na sua competência. Nas aulas observadas na SL, pude verificar que

os conteúdos selecionados pela POSL eram os mesmo para os alunos de 5ª a 8ª

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séries, que suas idades e competências não foram respeitadas, mesmo que esse fosse

um critério para a organização das salas. No entanto, na prática esse critério não

estava legitimado.

As aulas de Educação física acontecem fora do período de aula. Segundo a

POSL (professora da sala de leitura), a escola não possui professor de artes desde o

início do ano, a solicitação já foi feita pela direção, mas não obtiveram resposta,

estando os alunos impossibilitados de cursar essa disciplina e ficando sem aula no

horário reservado para ela.

Quanto ao acesso à escola, há um portão de entrada dos alunos que, após o

horário de entrada e saída, permanece trancado; um portão de entrada dos professores

e um portão para entrada de pais e outros visitantes. A entrada para visitantes fica

trancada e possui um interfone que toca na secretaria. Na primeira vez que a

pesquisadora visitou a escola, demorou em média 20 minutos para que alguém viesse

abrir o portão. De certo modo, esse fato permite afirmar, que não há uma integração

muito forte entre a escola e a comunidade. Parece que não há interesse, por parte dos

funcionários da escola, em atender de forma rápida e amistosa o interfone ou o portão

dos visitantes e isso pode nos revelar que a instituição parece não estar aberta para a

comunidade.

Fui bem recebida pela coordenação que, após conhecer minha pesquisa, me

apresentou para a POSL, que também foi muito atenciosa. Depois desse dia, encontrei

poucas vezes com a coordenadora. Ela estava sempre apressada sob a justificativa de

estar resolvendo problemas disciplinares dos alunos. Algumas vezes, presenciei

situações em que ela se desculpava com os professores por não poder participar do

horário de estudos, que deveria ser dirigido por ela.

Na hora do intervalo dos alunos, os professores se reúnem na sala dos

professores, que fica bem distante do local onde os alunos lancham. Os professores

não podem compartilhar do lanche dos alunos, pois a cozinha é terceirizada, e não é

permitido que professores comam nesse local. Esse é mais um dado que pode ser

revelador das relações entre professores e alunos: os professores têm de ficar em um

lugar separado e os alunos são monitorados por inspetores.41

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Em seis semanas de observação, não tive a oportunidade de conhecer a diretora

do colégio, pois ela não esteve presente no período em que eu fazia a observação.

Segundo a POSL, o tema dos projetos que acontecem na escola são definidos

pela equipe de professores, pela coordenação e pela direção, em reuniões.

Brunet considera que um conjunto de elementos, entre eles todos os acima

descritos, podem ser reveladores do clima da instituição e, para guiar nosso

entendimento, descreve categorias que regem o clima. Combinando tais categorias,

menciona dois tipos de sistema que norteiam o clima da escola: um sistema fechado,

autoritário, e um aberto, participativo. Dentro dessas categorias, elenca dois subitens

para uma classificação do clima organizacional: autoritarismo explorador e autoritarismo

benévolo e participativo consultivo e participação de grupo.

Seguindo essa teoria, é possível concluir que o clima da instituição que foi objeto

de estudo neste trabalho está entre um autoritarismo benévolo, em que segundo o

autor “a maior parte das decisões são tomadas no topo, mas por vezes verifica-se uma

delegação de poderes” (1992, p. 131) e o participativo consultivo, no qual apesar das

decisões serem tomadas no topo são permitidas algumas sugestões provenientes de

outros níveis organizacionais. (Brunet, 1992, p. 131). A seguir, complementaremos com

alguns dados e análises que serviram de sustentação para essa conclusão.

A SL fica próxima ao refeitório, onde são servidos os lanches, e sua porta

sempre está suja, após o intervalo, com papéis e migalhas de pão. Isso

pode revelar algo sobre a cultura da escola, que não se preocupa com o

fato dos alunos sujarem os espaços. Ou mesmo que se incomodem, nada

é feito para que essa situação mude, pois os projetos são definidos em

reuniões pelo corpo docente e coordenação, portanto, as necessidades

cotidianas emergentes não são levadas em consideração.

“Em uma aula da oitava série, os alunos reclamaram da proposta de

produzir hai-kai, pois afirmaram já ter feito isso nas aulas de língua

portuguesa. A POSL argumentou que escrever nunca é demais.” Isso

pode nos revelar uma falta de comunicação entre os professores, que

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pedem a mesma atividade. Do mesmo modo que a observadora percebeu

essa falta de integração, os alunos também podem percebê-la.

Em um dos dias, houve um caso atípico de um aluno que não queria

mudar de lugar e insultou a professora com um palavrão. Ela gritou com

ele, perguntando o que ele havia dito. Ele disse que estava falando

sozinho, mas ela insistiu, dizendo que não aceitava aquele tipo de

desrespeito, pois ela os respeitava muito. A professora que acompanhava

a turma interveio relembrando que o aluno tinha acabado de voltar de uma

suspensão e perguntou se ele gostaria de ser suspenso novamente. Isso

mostra que medidas de controle disciplinar são aplicadas nessa escola,

sustentando assim a idéia de autoritarismo.

Na semana seguinte, ocorreu a exposição. Um dia antes não houve aula

para que eles organizassem a escola para a exposição, que aconteceu

em uma quinta-feira. Segundo a professora, poucos pais visitaram a

exposição e os alunos também não vieram, em sua maioria. Isso pode

revelar a falta de sentido do projeto para os alunos e pouca interação

escola-comunidade. O tema do projeto foi imposto para os alunos e, para

os professores, foi sugerido pela coordenadoria de educação. Esse dado

mostra uma característica do clima de tipo participativo, em que todos

participam, mas a decisão já fora previamente tomada.

Na sexta-feira, que sucedeu à exposição, houve aula, mas os alunos

estavam ajudando a desmontar a exposição. Alguns alunos, que estavam

se comportando mal nesse dia, foram dispensados pela diretora, pois

segundo ela estavam atrapalhando, ao invés de ajudar. Dispensar os

alunos em horário de aula em dia letivo é inconstitucional.

Em uma conversa entre a POSL e a professora da sala de informática,

elas falavam que, se ninguém estava dando aula, elas também não iriam

dar. Isso pode revelar algo sobre o clima escolar, em que os professores

ficavam perguntando: “posso mandar os alunos para cá?” Pareciam

querer se livrar dos alunos.43

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Em relato, a POSL disse: “acho que a dificuldade que a maioria dos

professores e escolas passam, principalmente da rede pública, é que não

temos muito material, nós temos uma escola do século XIX e os alunos

são do século XXI, então é uma coisa bem difícil, porque escola que ainda

tem mimeógrafo, porque não tem outro recurso, você tem cota de xerox,

se você quer dar um material diferente sai do seu bolso, então isso

restringe muito. Temos materiais tudo, mas chegam muitos livros, então

aqui na sala de leitura até que tem bastante recurso, porque chegam livros

novos, sempre, o ano passado chegou muitos livros, mas no geral da

escola, eu acho que falta muita coisa, hoje em dia é tudo com clic clic clic

clic e você vai resolvendo a sua situação, eu estou sem internet desde

janeiro aqui na minha sala, quer dizer pesquisa: Barsa. Para pesquisa

então sem internet, com Barsa fica meio... Tem muito livro de literatura

tem. Agora de pesquisa não, mesmo porque eu acho que hoje em dia é

mais internet, é difícil você achar em livros, então isso dificulta um pouco,

mas aqui na escola o pessoal se vira muito, quando você precisa mesmo

de um material, sai da APM, sai de onde for o pessoal tenta te ajudar o

máximo que consegue também, mas eu acho que aí o entendimento dos

alunos, eu também acho que dificulta bastante.” Neste trecho de sua fala,

podemos observar como a percepção da professora sobre seus colegas

de trabalho é positiva, quando afirma que todos se “viram”, porém esta

pode ser uma maneira de justificar o modo como trabalha, pois os

problemas sempre são causados por fatores que não dependem dela. O

fato de não participarem das decisões faz com que não se sintam

responsáveis pelo insucesso do processo educativo.

A POSL fala que os projetos sempre têm um bom resultado, porém

conforme descrito na observação, poucos alunos visitaram a exposição

sobre os 100 anos da imigração japonesa.

Conforme podemos perceber, muitas variáveis compõem o clima da instituição, e

fica claro, por exemplo, que mesmo com regras sendo ditadas, os professores

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encontram-se desamparados pela gestão da escola e pela coordenação, cumprindo

determinações, mas não se responsabilizando por elas, influenciando diretamente a

eficácia do ensino, assim como considera Brunet (1992) “A eficácia da escola e o

sucesso dos alunos são afectados pelo clima organizacional.” (p. 138)

2. Análise dos dados observados na Sala de Leitura (SL) e do depoimento da POSL

As aulas acontecem na biblioteca da escola, que dispõe de um acervo

considerável de livros dispostos em ordem alfabética, porém um pouco desorganizado,

com livros empilhados em um canto da sala. A sala possui um aparelho de som e um

computador, duas mesas de professores com pequenas pilhas de livro. A sala possui

sete mesas redondas com cinco ou seis cadeiras cada. Na porta da biblioteca há um

cartaz com os seguintes dizeres: “Venha para a sala de leitura, é só entrar e descobrir o

mundo da magia”.

Durante o tempo em que observei as aulas na SL, o trabalho deste espaço

estava voltado para um projeto, que a escola estava desenvolvendo no primeiro

semestre de 2008, chamado: “Os 100 anos da imigração japonesa”, portanto a maioria

das atividades propostas pela professora, nesse período, trazia essa temática.

Como as observações começaram em abril, o projeto iniciado com o ano letivo já

estava em andamento e a proposta era a construção de Hai-Kai3, para os alunos do

Ensino Fundamental II (EFII) e leitura de histórias e construção de Origami4 para os

alunos do Ensino Fundamental I (EFI).

As observações foram feitas com alunos de sexta, sétima e oitava séries, uma

vez que aconteceram no período da manhã. A proposta era a mesma para as três

séries, construir Hai-kai’s, que foram publicados em livros e expostos em uma feira

temática que aconteceu no fim do semestre.

3 É um forma poética de origem japonesa, que valoriza a concisão e a objetividade. Os poemas consistem em três linhas, contendo na primeira e na última cinco letras japonesas, e sete letras na segunda linha. Fonte: www.wikipedia.com.br4Origami é a arte japonesa de dobrar o papel. Fonte: www.wikipedia.com.br

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As aulas tinham em média 27 a 35 alunos. Segundo a professora, as salas

tinham um número maior de alunos, porém o índice de faltas era muito grande entre

alunos dessas séries. As aulas na SL eram acompanhadas pelos professores

especialistas de língua portuguesa.

Considerando, conforme Carlini (2004), que a aula corresponde à organização

de um conjunto de relações essenciais à prática educativa, como aquelas que se

estabelecem entre professor e alunos; ensino e aprendizagem; ensino e pesquisa;

teoria e prática; conteúdo e forma, na direção das finalidades e objetivos do ensino e no

contexto escolar e social onde se produzem, a análise a seguir pretende destacar as

características do processo de construção dessas relações nas situações observadas.

Relação professor-aluno

Na relação do POSL com os alunos, a professora procurava deixar explicito seu

papel de autoridade que exigia respeito, sempre procurava demonstrar afetividade

chamando os alunos de “meu amor”, “queridos”. A POSL, também usava o reforço

positivo como recurso, elogiando quando os alunos respondiam corretamente.

Na entrevista, faz uma comparação entre o papel de professora e o papel de

mãe: “para você conseguir que eles façam, se envolvam num trabalho, não é tão

simples não, tem que ser um pouco na marra, aquela coisa de mãe: vai fazer por quê?

Porque eu estou mandando”.

Conforme já mencionado, a cultura docente tem muito a nos revelar sobre as

práticas e, como considera Gómez (2001), o professor se sente inseguro em meio a

tantas mudanças e incertezas da sociedade contemporânea, sem saber o que fazer e

“por isso, com lamentável freqüência, suas reações são ineficazes, se caracterizam

pela passividade, inércia ou regresso a comportamentos gregários, conservadores e

obsoletos que dão primazia ao isolamento ou ao autoritarismo.” (Gómez, 2001, p. 165)

De acordo com este autor, podemos identificar o quanto a fala da POSL está

carregada de valores que se mantém estáticos ao longo de sua vida, e essa relação

ficará mais explicita no decorrer da análise.

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Muitas vezes, a POSL, se dirigia aos alunos com um tom irônico, conforme

descrito no seguinte trecho da observação, “Isso mesmo... Até que enfim, alguém

esperto nessa sala.”, em resposta a uma observação feita por um aluno. Além da ironia,

neste tipo de fala está implícito um juízo de valor de que os alunos daquela sala não

são espertos, e isso pode nos revelar que a POSL tem preconceitos sobre aqueles

alunos.

Em situações como essas, a professora sempre respondia com certa ironia como

se esse fosse um jeito de mostrar que a pergunta do aluno era inadequada sem

repreendê-lo diretamente, ou um jeito descontraído de dizer o que pensa, provocando

muitas vezes a ridicularização de um aluno perante os colegas. Na entrevista, a POSL

diz ter uma maneira alegre de trabalhar e parece sempre procurar se descontrair,

enquanto trabalha. Essa é uma prática condizente com seu discurso.

Ainda na entrevista, podemos perceber o quanto ela fala sobre o comportamento

dos alunos, a agressividade, a preguiça, a falta de interesse, mas raramente faz

menção ao seu comportamento como professora, mostrando assim que reflete pouco

sobre sua relação com os alunos. E isso nos parece ser um fator que implica

diretamente na questão dos saberes, pois um professor que não repensa sua prática

está longe de ser um produtor de saberes. Segundo Gómez (2001), a influência que o

meio escolar exerce sobre o professor cria concepções pedagógicas implícitas e “estas

concepções tendem a se reproduzir facilmente na prática (...), já que se encontram

ancoradas nas crenças do senso comum da ideologia pedagógica dominante...” (p.

192). Cabe-nos aqui questionar: como um professor que não demonstra preocupação

com sua prática poderá sair da alienação em busca da produção de novos saberes?

O autor ressalta que os problemas pedagógicos não estão na aquisição dos

saberes de referência, e sim em como os professores os articula com sua prática

cotidiana, e como utilizam esses saberes em busca da produção de seus próprios

saberes. Ele destaca que a produção de saberes é “conseqüência de prolongados e

motivados processos de reflexão, debate e experimentação em contextos reais”

(Gómez, 2001, p. 192)

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O rigor e a preocupação com o controle disciplinar também foi uma característica

muito presente nas aulas observadas. Para ilustrar, citaremos um exemplo: “Uma das

alunas apontou o lápis na mesa, infringindo uma regra do combinado que a POSL fez

com o grupo. A professora repetiu a regra em tom agressivo e a aluna, no mesmo tom,

retrucou: “Eu não escutei o que você falou e também não sou adivinha”. A POSL

aparentava nervosismo e pediu que a aluna a respeitasse. Um outro aluno interveio,

chamando a amiga de mal educada, e a POSL falou em tom de reprovação “Não

preciso de comentários”, gerando uma inquietação no grupo que começou a fazer

gozação do aluno.” A POSL procura manter o respeito e a disciplina do grupo,

mostrando que valoriza o controle do comportamento.

Sempre que comenta seus comportamentos da adolescência deixa claro que foi

uma boa estudante e que respeitava os professores, talvez por isso cobre a mesma

postura de seus alunos e, além disso, percebemos que quando se refere a sua infância

o faz com certo saudosismo.

Outro aspecto que parece interessante ressaltar é que a PSOL, no relato de sua

trajetória de vida, se lembra pouco de seus professores e não menciona relações

estabelecidas entre ela e seus docentes. Esse comportamento pode fornecer uma

hipótese dos motivos pelos quais parece não analisar, avaliar ou repensar sua relação

com os alunos.

Relação ensino-aprendizagem

Conforme a observação descrita no anexo II, é possível observar que a POSL

não parece respeitar os níveis de aprendizagem e as idades dos alunos, propondo

atividades iguais para todas as séries e desconsiderando o interesse dos alunos, seus

conhecimentos prévios e as possibilidades de trabalho que cada série pode oferecer.

Esse dado também nos mostra o quanto o trabalho fica repetitivo e cansativo

também para a professora. Em uma das aulas observadas, a POSL passou pelas

mesas, recolhendo os livros a serem entregues e tirando dúvidas. Quando terminou,

parou perto da observadora e comentou que, em dias de mau-humor, é muito difícil

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responder àquelas perguntas. A POSL parecia exausta, pois já havia dado aquela

mesma aula para diversos grupos de diferentes faixas etárias e, como eram alunos em

níveis diferentes com características diferentes, apresentavam interesses e modelos de

interação distinta, porém este fator em nenhum momento apareceu como disparador de

reflexão por parte da POSL.

Outro fator que pode revelar uma defasagem na relação ensino-aprendizagem é

a questão dos empréstimos dos livros feitos pelos alunos. Os alunos escolhem livros

aleatoriamente, sem saber se aquele título é adequado a sua idade. Isto é, quando

escolhem, pois não há nenhum tipo de estímulo por parte da POSL para que os alunos

façam empréstimos.

A professora desconsidera alguns temas geradores que acabam surgindo

durante a aula. Um exemplo foi o caso do garoto que contestou a sugestão da

professora de observar a natureza: “Observar a natureza... que natureza? Só vemos

prédios e poluição.” Mesmo que naquele momento ela não interrompesse a aula para

falar daquele assunto, o comentário do aluno poderia ser um elemento disparador para

a leitura de artigos atuais a respeito do tema, fazer uma pesquisa, sobre uma questão

que havia partido dos alunos e assim talvez pudesse causar mais interesse.

A esse respeito, Gómez (2001) afirma que: “a aprendizagem relevante se refere

àquele tipo de aprendizagem significativa que, por sua importância e por sua utilidade

para o sujeito, provoca a reconstrução de seus esquemas habituais de conhecimento.”

(p. 268)

Verifica-se, portanto que, para a aprendizagem acontecer, é preciso que o aluno

se sinta estimulado e que seu interesse seja despertado por temas que façam parte de

seu cotidiano, procurando respeitar conhecimentos prévios para que sejam utilizados

na construção de novos conhecimentos.

No trecho citado a seguir, percebemos que a POSL não tem clareza dos

objetivos de aula, o que também é revelador de uma contradição entre seu discurso e

sua prática: “Os alunos que já haviam terminado, deveriam escolher um livro e fazer

leitura silenciosa. Os alunos retiraram os livros da estante aleatoriamente, mas apenas

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um ou dois realmente leram, os outros brincaram e conversaram entre si. Na tentativa

de conter o barulho, a professora falou que os alunos que não quisessem fazer nada

deveriam ter ficado em casa. Ela ficou sentada em sua mesa, observando os alunos.”

Na entrevista, a POSL relata o desinteresse dos alunos e culpa o sistema por esse

descaso e a falta de rigidez de normas, mas no momento em que os alunos estão na

sala pede que façam leitura livre, com escolha aleatória dos livros. Ainda na entrevista,

cita que eles não têm o hábito de ler e têm preguiça. Mesmo sabendo disso, pede que

escolham um livro e leiam em silêncio. Ela diz que todas as atividades têm objetivos

específicos, mas não deixa esses objetivos claros para os alunos. Age de modo que

parece que os alunos estão ali somente para cumprir o horário estabelecido.

Relação ensino-pesquisa

Durante o período de observação não pude registrar nenhum comportamento

que pudesse ser caracterizado como atividade de pesquisa, por parte da professora.

Ela parecia conhecer os textos, as lendas que dava para os alunos ler, mas não tinha

nenhum tipo de informação nova que acrescentasse àqueles textos como, por exemplo,

falar da cultura japonesa de modo que os alunos pudessem entender o contexto no

qual aqueles textos foram escritos.

Em sua entrevista, ela cita muitas vezes que leitura é um hábito que precisa ser

criado, mas nas observações feitas na SL ela não proporciona situações que

provoquem nos alunos a habilidade ou a vontade de criar esse hábito. Ela não propõe

pesquisa, pois parece não entender que a pesquisa pode ser um desencadeador para o

hábito da leitura.

Ela sempre cita a leitura como lazer, como algo prazeroso e afirma que ela lê por

prazer. Ela não relaciona essa atividade com produção de conhecimento. Quando fala

de textos científicos usa como exemplo uma revista que traz temas supérfluos, como:

“meleca no nariz”, e enfatiza que os alunos se divertem com tais temas, permitindo a

compreensão de que a SL pode servir como um lugar de passa-tempo e não de

aprendizagem.

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“A POSL reservava os últimos cinco minutos da aula para empréstimo e

devolução de livros. Apenas quatro alunas pegaram livros emprestados. O controle de

empréstimos é feito em um caderno universitário.” Podemos perceber neste relato da

observação que o tempo reservado para empréstimos é muito curto. Não é possível

para um aluno escolher um livro em cinco minutos, mesmo porque eles não tinham

indicações ou referências prévias. Isso ajuda a demonstrar que a POSL não parecia

estimular os empréstimos, porque não reservava tempo suficiente para a escolha dos

livros a também não fazia indicações de títulos para os alunos.

Em uma determinada turma, a POSL não fez o procedimento de retirada e

devolução de livros como nas aulas anteriores. Apenas pediu que entregassem os

materiais e dispensou os alunos. Isso mostra como o empréstimo de livros não constitui

uma atividade direcionada, com objetivos claros e compartilhados, mas apenas que faz

parte da rotina, se tornou algo automática e não é realizada quando não sobra tempo

Outra situação observada, que ajuda a perceber a falta de estímulo para um

comportamento leitor é a seguinte: “o aluno pegou um livro infantil com ilustrações e

mostrou para ela avisando que aquele seria seu empréstimo. Ela, sem olhar para o

aluno, autorizou. Ele sorriu e resolveu trocar de livro, mas após procurar um pouco por

algo que lhe interessasse saiu da sala sem levar nenhum livro.” O aluno pareceu testar

a atenção da POSL, para ver se ela contestaria a sua escolha, por se tratar de um livro

infantil. Vendo que ela não se manifestou, resolveu devolver o livro. Podemos perceber,

pela atitude do aluno, que ele identifica que a professora não se preocupa com o que

eles lêem.

Relação teoria-prática

Na entrevista, quando perguntamos sobre os conteúdos nos quais se baseia

para ensinar, ela disse que confia muito em sua intuição, revelando pouca preocupação

com a seleção dos conteúdos de ensino.

As estratégias de ensino, que observei na SL, não demonstram nenhum tipo de

aprofundamento. Tanto os trabalhos propostos, como as leituras realizadas, me

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pareceram bem superficiais, mostrando que o saber declarado importante pela

professora, não se materializa na prática. Selecionar conteúdos por intuição parece ser

uma maneira de não contextualizar o saber, escolher leituras sem critérios prévios é

uma característica de reprodução de saberes. Ela demonstra (e declara) não ter

nenhum critério para a escolha do material a ser trabalhado em sala de aula, não

importa o que se lê, o importante é que eles leiam.

A POSL revela uma concepção romântica de leitura e não parece se importar

com a qualidade dos textos que os alunos lêem. Se preocupa em ocupá-los e distraí-

los, para que, no tempo que eles ficam ali, permaneçam entretidos com alguma coisa.

Em seu relato deixa isso explícito, quando menciona oferecer reportagens antigas para

seus alunos lerem: “Que nem essa semana eu estou trabalhando com reportagem com

eles: Professora isso é velho. Lê de novo. Vamos ver o que você, como você vai

interpretar essa leitura, essa reportagem que você já conhece, sempre tem alguma

coisa: olha não tinha pensado nisso!”

Nas observações feitas, verificamos que a POSL parece pensar pouco em

estratégias de ensino de leitura, talvez porque não tenha conhecimento teórico sobre o

assunto. Em uma aula, ela comentou com a observadora que gostava de deixar a

organização da leitura livre, para ver como os alunos a realizariam: se leriam em voz

alta, se cada um leria um parágrafo. Porém, não utilizou essa situação como um

diagnóstico, para fazer futuras intervenções.

Em determinado momento da entrevista, perguntamos a ela o que mudaria em

sua prática e a POSL nos respondeu que mudaria os alunos, não mencionou nada

sobre sua prática e em nenhum momento se queixou da falta de formação dos

professores, sempre atribui os problemas a fatores externos.

Conteúdo-forma

Quando solicitado aos alunos que façam Hai-Kai ou a reescrita da lenda

japonesa, o objetivo de ensino comunicado pela professora, e que fica explicito para os

alunos e para a observadora, está focado no produto final, na forma da apresentação

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das produções na feira temática que aconteceu no fim do semestre. Os textos não

foram revistos ou corrigidos pela professora, muitos foram apresentados com erros ou

até mesmo inacabados, causando uma desvalorização do trabalho do aluno e da

proposta.

Os alunos levaram em média quatro aulas para fazer, digitar e ilustrar o Hai-kai,

e parece que a atividade ficou um pouco infantilizada e sem sentido, para os alunos do

ensino fundamental II. Tanto tempo e o que será que produziram, em termos de

conhecimento, principalmente relativos à leitura, que deveria ser o foco do trabalho

nesse espaço?

Em uma conversa da pesquisadora com a POSL, a professora explicou que a

atividade de reescrita fora proposta apenas para que houvesse tempo para a impressão

dos textos ficar pronta. Essa atividade não havia sido planejada, mas como houve um

atraso na impressão precisou fazer alguma coisa para essa aula. Em situações como

essa, é possível verificar que nem tudo que é proposto na Sala de Leitura tem um

objetivo especifico, como disse a POSL na entrevista.

Outra situação que pode nos ajudar a compreender a ausência de planejamento

e de objetivos de ensino foi uma lição de casa solicitada pela professora: “Ao terminar a

leitura, pediu tarefa para a próxima aula, valendo ponto para língua portuguesa. Os

alunos reclamaram em coro. Ela explicou que terão que escrever um texto interativo,

como aquele que acabaram de ler, falou que pode ser feito em dupla. Eles perguntaram

se terão que ler para a sala, ela respondeu que sim.” Qual será o objetivo de uma

produção em dupla e ainda como lição de casa. Será que os alunos conhecem o

suficiente esse gênero para produzir um texto? Será que têm disponibilidade para fazer

um trabalho em dupla fora do espaço escolar? Essas questões parecem não ter sido

pensadas pela POSL, antes de solicitar esse tipo de atividade, dificultando assim a

realização da mesma.

A falta de planejamento também esteve muito presente em sua vida pessoal,

conforme relatado na entrevista. Afirma que as coisas aconteciam em sua vida sem

muito planejamento prévio, queria trabalhar com criança, ser pediatra, depois fez

magistério, assistiu um filme e foi fazer psicologia, mas também queria ser artista e é 53

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professora da SL. Corremos aqui o risco de ser simplistas se afirmarmos que isso é um

fator de sua vida pessoal que influencia a sua prática, mas não podemos deixar de citá-

lo, enquanto hipótese, para compreender a prática docente e suas possibilidades de

reprodução.

Na entrevista, a POSL enfatiza o desinteresse dos alunos pelos trabalhos, mas

ao expor os trabalhos dos alunos sem correção, sem ter dado um retorno para os

autores, a professora atua no sentido de reforçar esse desinteresse, demonstrando que

não há problemas se não fizerem o trabalho bem feito.

A POSL fala que os projetos sempre têm um bom resultado, porém conforme

descrito na observação, poucos alunos visitaram a exposição sobre os 100 anos da

imigração japonesa. Esse dado indica a hipótese de que, para os alunos, aquele

trabalho não foi muito significante e que o produto final não lhes interessava.

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VI) CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os relatos e narrativas apresentados nesta pesquisa, analisados à luz do

referencial teórico selecionado, destacam a necessidade e a relevância do professor se

perceber como produtor de conhecimento.

As práticas descritas demonstram que as situações cotidianas podem e devem

ser repensadas, em busca de novas produções, e que essa mudança de postura por

parte do professor é necessária.

Quando a POSL fala em atingir os alunos, não me parece que esteja se referindo

apenas à leitura, propriamente dita, ou a algum conhecimento construído. Seu trabalho

sempre parece estar mais voltado para os comportamentos e atitudes. Não que isso

seja uma característica negativa, pelo contrário, é algo positivo a ser ressaltado, porém

quando age assim ela parece desvalorizar o conhecimento como possibilidade de

crescimento humano, dirigindo o foco de seu trabalho apenas para as questões

psicológicas. Quando a professora afirma que não precisa de novos elementos

acadêmicos, demonstra que não reconhece o conhecimento como construção humana

e não acredita que ele seja capaz de mudar a realidade dos alunos.

A POSL parece estar satisfeita com sua atividade, tanto na prática como no

discurso, ela demonstra acreditar em seu trabalho e isso pode indicar que ela não

considera a possibilidade de pensar em mudanças ou de rever sua ação profissional.

A professora tem um discurso comum a muitos professores insatisfeitos com o

trabalho e que não se enxergam como agentes de transformação. Professores que

trabalham apenas pela manutenção daquilo que lhes tem sido imposto.

Cabe ressaltar ainda, nas linhas finais dessa pesquisa, que as histórias de vida

dos professores podem ser muito úteis à investigação, na medida em que revelam

inúmeros elementos sobre a prática pedagógica e que poderiam ser mais utilizadas nas

reflexões propostas aos docentes, na busca da ação transformadora.

Concluímos, portanto, com base nas reflexões elaboradas que, de fato, recai

sobre os ombros dos professores uma imensa responsabilidade no processo de ensino-

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aprendizagem, porém é preciso que eles as assumam e que se reconheçam como

protagonistas dessa história, pelo olhar crítico sobre sua própria prática. Quanto à

produção de saberes na prática, sustentamos a idéia defendida pelos teóricos

estudados de que ela pode ser sim uma fonte de novos saberes e uma prova disso é

este trabalho que aqui se encerra.

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VII) PROPOSTA DE AÇÃO

PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

Público AlvoProfessores da Instituição de ensino que foi objeto desta pesquisa.

Objetivo GeralConstruir uma consciência coletiva a respeito da relevância da reflexão na ação,

de maneira a levar os professores a refletirem e a questionarem suas práticas, afim de

que os docentes se percebam como protagonistas do cenário educacional.

Tempo estimadoPreferimos não estabelecer um prazo para a realização do projeto, tendo em

vista a amplitude de seus objetivos e a disponibilidade do grupo.

Justificativa

Esse projeto se torna necessário a partir dos resultados obtidos neste trabalho

de pesquisa, em que a professora analisada não se reconhece enquanto produtora de

saberes e, além disso, não tem a consciência desse não reconhecimento.

Gómez (2001) afirma:

“Os objetivos prioritários dos programas de formação e

desenvolvimento profissional dos docentes deve-se situar na

reconstrução do pensamento prático cotidiano, isto é, na facilitação da

reflexão. Como afirma Zeichner (1993), a reflexão implica imersão

consciente do homem no mundo de sua experiência, um mundo

carregado de conotações, valores, intercâmbios simbólicos,

correspondências afetivas, interesses sociais e cenários políticos. A

reflexão, ao contrário de outras formas de conhecimento, supões uma

análise e uma proposta totalizadora, a qual captura e orienta a ação.

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Nesta perspectiva, ela é um processo de reconstrução da própria

experiência(...)” (p. 194)

Nesse sentido, é necessário que os docentes reflitam sobre suas práticas e

reconheçam nelas a possibilidade de transformação, para deixarem de ser meros

reprodutores e se tornarem elo da imensa cadeia que é a educação.

Também nos pareceu evidente a falta de participação da coordenação

pedagógica nos processos educacionais da escola. E, por acreditarmos que é papel do

coordenador estimular e orientar os professores para que se percebam como

produtores de saberes, será necessário e de suma importância envolvê-lo de modo

efetivo e atuante na execução deste projeto.

Metodologia

Os encontros acontecerão semanalmente, com pequenos grupos de professores,

nos horário reservados para os estudos direcionados. Bimestralmente, serão

promovidos encontros com todos os professores, para que os grupos troquem

experiências.

Nos primeiros encontros, serão feitas atividades de sensibilização para que,

antes de pensarem suas práticas, possam entender a relevância desse processo de

reflexão. Procuraremos neste momento fazer com que os professores repensem sua

escolha profissional, relembrem os motivos pelos quais estão ali e quais as concepções

de educação, homem, mundo, trazem de sua trajetória tanto pessoal quanto

profissional.

Após a etapa de sensibilização, começaremos a segunda etapa que terá como

foco reconstruir práticas, por meio de relatos e registros, a fim de problematizar

situações re-interpretando-as e construindo novos significados para elas.

O cronograma inicial inclui os encontros de sensibilização e está sujeito a

alterações porque a continuidade do trabalho depende da aceitação e do

reconhecimento dos professores de que é necessário refletir sobre a prática, para que

ela se torne produtora de saberes.

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1ª etapa: Sensibilização

Estimamos que essa etapa requeira, no mínimo, quatro encontros. Cada grupo

terá, em média, seis professores.

Encontro Objetivo Procedimento Avaliação

Resgatar a trajetória de vida do professor, os motivos pelos quais escolheu essa profissão e quais as expectativas que traz a respeito dessa escolha, atualmente.

Os professores serão convidados a falar sobre o que os levou a serem professores, por que escolheram a profissão.

Após todos os depoimentos, será solicitado que eles falem sobre suas expectativas e projetos, no que diz respeito tanto ao campo profissional como pessoal.

Procuraremos avaliar como eles encaram esse formato de reunião, como se sentiram para falar de suas vidas. Também faremos uma tabulação de quantos deles fizeram uma escolha consciente da profissão, ou seja, escolheram porque gostam e quantos escolheram por outros motivos.

Levar os professores a refletirem sobre suas concepções.

Será dada uma ficha para os professores preencherem suas concepções de ser humano, educação e sociedade. Após o preenchimento, discutiremos essas concepções coletivamente. As fichas serão entregues para análise da coordenação.

As fichas deverão ser entregues para sabermos quais temas precisaremos trabalhar na próxima etapa desse projeto. Ao final do encontro, cada um deverá falar como se sentiu ao repensar suas próprias concepções e ao explicitá-las para o grupo. Dessa maneira poderemos perceber como os professores reagem ao fato de terem suas idéias contestadas por colegas de trabalho.

Fazer com que os professores reflitam, a partir de suas expectativas profissionais e de suas concepções, sobre o que mudariam no seu ambiente de trabalho.

Pedir para que os professores registrem as mudanças que gostariam que ocorressem em seu trabalho para que sua prática pudesse melhorar. Entregar os registros para a coordenação.

Pedir que os professores escrevam no fim do registro o que estão achando de nossos encontros, pode ser uma palavra ou uma frase.

Levá-los a refletir sobre sua prática.

A partir do que escreveram no registro do último encontro, pensar como seria a sua prática com tais mudanças, mudaria? O que mudaria? E se os problemas persistirem? E a partir disso pensar no que está ao alcance de todos para que a mudança efetivamente ocorra.

Avaliaremos, em todos os encontros, o envolvimento dos professores ao pensarem tais temas, para que possamos fazer os ajustes necessários para que todos se envolvam.

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Essa etapa corresponde a um diagnóstico. Para que a segunda etapa ocorra, a partir

dos dados obtidos, serão planejados encontros que levem os professores a refletir

sobre suas práticas e a compreendê-las, como ações desencadeadoras para a

produção de novos saberes.

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ANEXOS

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Anexo I: Dados observados

Os alunos entraram na sala calmamente falando bom dia para a professora e

foram sentando em lugares escolhidos por eles. Após todos os alunos terem entrado, a

POSL mudava alguns alunos de lugar argumentando que aquele grupo era muito

indisciplinado para ficarem juntos, os alunos contestavam, mas acabavam aceitando a

mudança.

Havia um conceito de hai-kai exposto em um cartaz pendurado na parede e a

POSL resgatou esse conceito com os alunos, relembrando o que havia falado na aula

anterior. A proposta da aula anterior havia sido observar a natureza e procurar na

Internet alguns hai-kais para que pudessem criar um certo repertório, para escreverem

seus poemas.

Os alunos, apesar de parecerem estar bem familiarizados com o tema, não

efetuaram a pesquisa solicitada pela professora e um deles comentou: “Observar a

natureza... que natureza? Só vemos prédios e poluição.”

A POSL não parou para discutir a questão levantada pelo aluno e continuou a

explicar a proposta de aula: eles deveriam construir três hai-kais cada um e, para

inspirar os alunos, colocou uma música com sons da natureza.

Explicou que, para efetuar o trabalho, precisariam de lápis e borracha, que

seriam distribuídos por ela, mas que precisariam ser bem conservados e devolvidos,

pois os materiais seriam utilizados por outros alunos. Pediu ajuda para dois alunos na

distribuição dos materiais.

Durante a exposição da proposta de aula, alguns alunos conversaram e a POSL

parou a explicação pedindo silêncio. Eles ficaram em silêncio. Outros alunos fizeram

perguntas sobre a proposta, ela tirou as dúvidas e pediu para que iniciassem o trabalho.

Alguns alunos pediram para que ela mudasse a música, porque essa está

provocando sono. Outro aluno interveio explicando que a música é inspiradora e a

POSL completou: “Isso mesmo... Até que enfim, alguém esperto nessa sala.”

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Enquanto os alunos trabalhavam, a POSL andava por entre as mesas tirando

dúvidas e lendo o que os alunos estavam escrevendo. Após alguns minutos de silêncio,

um grupo começou a falar e a rir alto, a professora especialista que acompanhava o

grupo advertiu em voz alta, que quem não se comportasse voltaria com ela para a sala

de aula.

Um aluno que estava sentado em uma mesa perto da observadora pegou um

canivete e começou a se tatuar. Parecia querer impressioná-la. Ao ver a POSL se

aproximar, tentou esconder o canivete, que foi retirado do aluno, que tentou

argumentar, mas a POSL, disse que ele não poderia trazer aquele tipo de material para

escola e finalizou a conversa.

A POSL reservava os últimos cinco minutos da aula para empréstimo e

devolução de livros. Apenas quatro alunas pegaram livros emprestados. O controle de

empréstimos é feito em um caderno universitário. Nas aulas que se seguiram com a

mesma proposta, a situação era parecida: ninguém havia feito a pesquisa solicitada

pela professora na aula anterior. Em apenas uma das aulas, um aluno da sétima série

trouxe um livro de hai-kai. A POSL enfatizou a importância da leitura para que se

produzam bons textos escritos. Mais uma vez retomou o conceito de hai-kai e,

conforme fazia perguntas sobre a estrutura desse tipo de texto, como: “o que é um hai-

kai?; como se escreve um?”, os alunos respondiam e ela elogiava as repostas corretas.

Em um clima descontraído, a POSL brincou com alguns alunos, e foi interrompida por

um batuque, que veio do fundo da sala. Imediatamente advertiu: “Quem está querendo

aparecer?”, e o batuque parou.

A proposta foi a mesma durante as aulas da sexta, sétima e oitava série. Devido

a isso, me aterei a descrever aqui apenas as situações que diferenciaram uma aula da

outra.

Os alunos da sétima série reagiram melhor à música com sons da natureza

colocada pela POSL e solicitam mais a professora para tirar dúvidas. Ela passou de

mesa em mesa e repetiu várias vezes a mesma explicação, aparentando paciência e

disposição.

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Nos momentos finais da aula com a sétima série, ela recolheu os textos feitos

pelos alunos e disse que quem quisesse pegar livros emprestados poderia pegar e

devolver também. A mesa da POSL ficou com vários alunos em volta e um aluno pegou

um livro infantil com ilustrações e mostrou para ela avisando que aquele seria seu

empréstimo. Ela, sem olhar para o aluno, autorizou. Ele sorriu e resolveu trocar de livro,

mas após procurar um pouco por algo que lhe interessasse saiu da sala sem levar

nenhum livro. Os alunos saíram calmamente da sala. Uma aluna mostrou para o amigo

um desenho na porta da sala e comentou com orgulho que aquele desenho foi ela

quem fez.

A SL fica próxima ao refeitório, onde são servidos os lanches, e sua porta

sempre está suja, após o intervalo, com papéis e migalhas de pão. Em uma aula com

outra sétima série, POSL recebeu os alunos com abraços e saudações alegres como,

por exemplo: “Quanto tempo... Estava com saudades...” Antes de iniciar a aula, cobrou

que eles tivessem mais postura de estudante e pediu aos alunos que estavam de touca

que a tirassem, para que ela pudesse ver o seu rosto. Pediu também para jogarem fora

os chicletes. Os alunos acataram a ordem sem muitas contestações, enquanto os

amigos faziam gozação. Três alunas entraram na sala atrasadas, a POSL apenas olhou

com semblante de reprovação, mas não falou nada.

Explicou a proposta, conforme as aulas anteriores e, ao final da explicação

perguntou se tinham alguma dúvida. Eles ficaram em silêncio e ela pediu para que

iniciassem o trabalho. Assim que a professora parou de falar, os alunos começaram a

conversar em voz alta. Uma das alunas apontou o lápis na mesa, infringindo uma regra

do combinado que a POSL fez com o grupo. A professora repetiu a regra em tom

agressivo e a aluna, no mesmo tom, retrucou: “Eu não escutei o que você falou e

também não sou adivinha”. A POSL aparentava nervosismo e pediu que a aluna a

respeitasse. Um outro aluno interveio, chamando a amiga de mal educada, e a POSL

falou em tom de reprovação “Não preciso de comentários”, gerando uma inquietação no

grupo que começou a fazer gozação do aluno.

Essa sala pareceu ser bem agitada e, a todo o momento, foram necessários

pedidos de silêncio. Um dos grupos escreveu na mesa, a POSL pediu que apagassem

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e perguntou se eles costumam fazer isso na casa deles. Os alunos sorriram e não

responderam. Um aluno, em tom irônico, perguntou se era para escrever e a POSL,

aparentemente irritada, respondeu :“Não, é para você ficar olhando minha beleza!” (sic)

A conversa e as brincadeiras continuaram e a POSL falou com certa ironia que

eles não estavam no parque de diversões, na tentativa de conter o barulho. Ela então

se dirigiu até a mesa onde se encontravam os alunos mais dispersos, sentou junto com

eles e re-explicou a proposta. Ficou ali alguns minutos, ajudando-os na produção do

hai-kai. A seguir, ela olhou para o relógio e se deu conta de que já passaram cinco

minutos do horário de término da aula, avisou os alunos, que saíram correndo da sala.

A aula seguinte foi com alunos da sexta série e, antes dos alunos chegarem, a

POSL comentou com a observadora que os alunos dessa sala eram “terríveis” (sic). A

proposta de produção de hai-kai se repetiu e os procedimentos também. Durante a

explicação da professora, eles falavam ao mesmo tempo e ela pediu para que

levantassem a mão para falar. Um aluno começou a falar e cometeu um erro de

português, ela corrigiu o aluno com indignação, os outros alunos riram.

Em um outro momento, um aluno fez uma pergunta e usou a palavra “refletir”. A

POSL elogiou o uso da palavra e questionou o seu significado, o aluno explicou e ela

reforçou o elogio.

A professora de língua portuguesa que acompanhava o grupo fez intervenções

na tentativa de apaziguar o barulho que começava a aumentar. Ela também ajudou na

orientação do trabalho.

Um aluno perguntou sobre algo que a POSL já havia explicado e ela pediu para

que ele ficasse mais atento às explicações. Como o barulho continuava e alguns alunos

gritavam, ela pediu: “Pelo amor de Deus, parem de gritar”. O barulho cessou, mas

recomeçou após alguns minutos.

A POSL passou nas mesas recolhendo os livros a serem entregues e tirando

dúvidas. Quando terminou de recolher os livros parou perto da observadora e comentou

que em dias de mau-humor é muito difícil responder àquelas perguntas.

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Ao término da aula os alunos saíram correndo e deixaram livros sobre as mesas,

que foram tirados das estantes. A professora reclamou, mas todos já haviam saído da

sala. Então, ela fez a reposição dos livros nas prateleiras com uma aparência cansada.

Na segunda semana de observação, a proposta das aulas era terminar o hai-kai

começado na semana anterior. Os alunos que já haviam terminado, deveriam escolher

um livro e fazer leitura silenciosa. Os alunos retiraram os livros da estante

aleatoriamente, mas apenas um ou dois realmente leram, os outros brincaram e

conversaram entre si.

Na tentativa de conter o barulho, a professora falou que os alunos que não

quisessem fazer nada deveriam ter ficado em casa. Ela ficou sentada em sua mesa,

observando os alunos.

Um garoto mostrou um livro de Vinícius de Moraes e disse para ela que iria ler

aquele livro. Ela concordou e, olhando para a observadora, falou em voz baixa: “Ele não

tem compreensão para isso”.

Ao se reportar aos alunos a professora usava expressões como: meu amor,

querida, meu bem. Ela pedia para que eles colocassem os livros no lugar de que

tiraram e começou a fazer a entrega e a devolução de livros.

Os alunos foram se aproximando da mesa dela e entregando os trabalhos. Ela

leu e fez correções ortográficas e gramaticais, devolvendo e pedindo que corrigissem.

Os aluno que não tinham erros, ela elogiava e parabenizava. Apenas um aluno não

conseguiu terminar o trabalho durante a aula e a POSL o alertou que se ele não

terminasse o trabalho em casa e trouxesse pronto na próxima aula mandaria um bilhete

para sua mãe.

Ao final da aula os alunos saíram andando calmamente da sala.

Em uma aula da oitava série, os alunos reclamaram da proposta de produzir hai-

kai, pois afirmaram já ter feito isso nas aulas de língua portuguesa. A POSL

argumentou que escrever nunca é demais.

Passou pelas mesas lendo os textos que os alunos estavam produzindo, e leu

em voz alta, uma frase que o aluno escreveu com abreviações como “vc”. Pediu para 69

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ele escrever corretamente, explicando a diferença entre um bate-papo na Internet e um

texto produzido na escola. Corrigiu os erros de pontuação e de ortografia. Assim como

nas outras aulas, pediu aos alunos que terminaram, que lessem seus poemas.

Nesta turma, a POSL não fez o procedimento de retirada e devolução de livros

como nas aulas anteriores, pediu para eles entregarem os materiais e dispensou os

alunos.

Após duas semanas de produção de hai-kai, os alunos usaram as aulas de

informática para a digitação dos poemas e, nas aulas seguintes na SL, fizeram

ilustrações para os seus textos.

As aulas têm a mesma dinâmica e os mesmos conteúdos, mesmo tratando-se de

séries diferentes.

Concluído o livro de hai-kai, a proposta agora é fazer a leitura e a re-escrita de

lendas japonesas. A proposta foi explicada pela professora e as lendas distribuídas. Os

alunos deveriam ler e re-escrever em grupo.

Em um dos grupos, um aluno leu em voz alta para os outros. Não houve critério

explícito na formação dos grupos. A POSL passou nas mesas tirando dúvidas e

cobrando que eles começassem a trabalhar. Um aluno perguntou para a professora

qual o significado de uma palavra japonesa que constava no texto, ela respondeu de

imediato, parecendo conhecer o texto.

A professora de língua portuguesa que acompanha o grupo também passava

pelas mesas tirando dúvidas e, ao final do percurso, sento-se com um grupo de

meninos.

Após tirar dúvidas, a POSL passou novamente pelas mesas com o caderno na

mão perguntando quem queria entregar ou retirar livros. Os alunos se agitaram e

começaram a levantar para pegar livros, retiraram livros da estante e repuseram em

outros lugares. A POSL parecia não perceber. E, depois de alguns minutos de agitação,

perguntou para os alunos: “Chuchuzinhos, (sic!) vocês estão bagunçando ou

procurando livros?”, a professora acompanhante interveio e pediu para que

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escolhessem o livro rápido. Os alunos voltaram para o lugar sem ter escolhido nenhum

livro.

A POSL explicou que na próxima aula farão a ilustração dos hai-kais, pois essa

sala ainda não fez essa parte do trabalho, e na outra, concluirão a reescrita. Ela

dispensou os alunos que saíram da sala calmamente, porém um aluno ficou e pediu a

indicação de um livro de terror, ela indicou e mostrou para o aluno onde se encontrava

o livro. Ele procurou e não achou. Então a POSL pediu que ele deixasse para outro dia

e se despediu.

Em uma outra aula com a oitava série, a POSL começou pedindo para eles

pararem de gritar, pois estavam bem agitados. Ela explicou o que farão nessa aula e na

próxima, lembrou que precisavam terminar de digitar o hai-kai, para fazerem as

ilustrações e advertiu que quem não fez o hai-kai não participará do livro.

A POSL perguntou se precisava explicar como se fazia a reescrita. Os alunos

ficaram calados e ele pediu para começarem. Ela foi até os grupos e fez mudanças de

lugares. Um dos grupos fez comentários irônicos acerca do texto: “Que texto legal...”.

Todos liam e a POSL se dirigiu até a observadora e comentou sobre a

organização dos grupos. Explicou que os deixava livres para ela poder observar a

maneira como eles se organizavam para ler e escrever. Em um grupo, um só aluno lia

para os outros, no outro grupo cada um lia um parágrafo.

A professora que acompanhava o grupo ficou sentada em uma mesa separada,

corrigindo trabalhos.

A POSL passou pelas mesas com seu caderno na mão perguntando se os

alunos queriam retirar livros. Um aluno perguntou sobre um livro de contos e ela indicou

onde o livro estava. O aluno foi até a estante, pegou o livro, folheou e devolveu no

mesmo lugar, pegou outro livro e fez a mesma coisa.

Um outro aluno se levantou para pegar livro e a POSL reclamou que ele nunca

pegava livros, que se fosse levantar para “bagunçar” (sic!) poderia continuar sentado. O

aluno resmungou e voltou para o lugar. Depois de alguns minutos, o mesmo aluno

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pediu para ir tomar água e a POSL respondeu com voz firme que na aula dela ninguém

sai e eles já sabem disso.

Ela continuou passando pelos grupos e tirando dúvidas, explicando a estrutura

de um texto. Enquanto isso, os alunos se agitavam e começavam a falar alto. Ela pediu

de maneira calma para falarem baixo.

Outro grupo reclamava do texto, falavam que era “uma história chata”, uma aluna

completou com um palavrão o que achava do texto e a POSL a repreendeu quanto ao

palavreado.

Apenas dois alunos retiraram livros, a professora pediu para eles entregarem o

trabalho e dispensou os alunos, que saíram calmamente da sala, se despedindo com ar

descontraído.

Um aluno ficou sozinho na sala, sentado escrevendo. A POSL foi até ele,

colocou a mão em seu ombro e falou que ele poderia sair, pois terá tempo para

terminar na próxima aula.

As professoras conversaram sobre a postura dos alunos e sobre os seus

trabalhos.

Na semana seguinte, os alunos que ainda não haviam terminado seus hai-kais

deveriam terminá-los. A POSL os colocou em uma mesa separada para que

terminassem. Trata-se da sétima série. A POSL relembrou que precisam terminar para

que sejam publicados no livro.

Os outros alunos deveriam fazer uma leitura silenciosa e individual de uma

crônica, para depois discutirem coletivamente.

Nesse dia houve um caso atípico de um aluno que não queria mudar de lugar e

insultou a professora com um palavrão. Ela gritou com ele, perguntando o que ele havia

dito. Ele disse que estava falando sozinho, mas ela insistiu, dizendo que não aceitava

aquele tipo de desrespeito, pois ela os respeitava muito. A professora que

acompanhava a turma interveio relembrando que o aluno tinha acabado de voltar de

uma suspensão e perguntou se ele gostaria de ser suspenso novamente.

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O aluno finalmente sentou-se no lugar recomendado pela professora e ela

prosseguiu as explicações da aula. Depois de algum tempo, se dirigiu à observadora e

pediu desculpas pelo ocorrido, mas considerou que se não fosse firme eles abusariam.

Um dos alunos que estava terminando o hai-kai era alvo de brincadeiras de mau

gosto por parte de outros meninos que estavam sentados em outra mesa. A POSL

comentou com a observadora que esse aluno estava sempre isolado.

Os alunos se agitaram e ela pediu silêncio. Ela foi até o aluno que a havia

desrespeitado e, de maneira respeitosa e até carinhosa, colocou a mão em seu ombro

e pediu para que fizesse silêncio e terminasse seu trabalho.

A POSL então pediu para alguém começar a ler o texto em voz alta. Uma menina

se ofereceu e começou a ler. A POSL interrompeu e perguntou por onde se começa a

ler um texto, pois a garota não tinha lido o título. Ela explicou que todas as informações

de um texto devem ser aproveitadas. A aluna recomeçou a leitura e quando acabou a

POSL perguntou se eles tinham algum comentário para fazer sobre o texto e pediu que

levantassem a mão para falar.

Os alunos começaram a levantar a mão e a falar o que entenderam do texto. Ela

se dirigiu a um aluno que estava quieto e perguntou o que ele tinha entendido do texto.

Ele respondeu e ela foi explicando a partir do que os alunos iam falando. O sinal bateu,

os alunos se agitaram, mas ela pediu para eles continuarem sentados até que ela

terminasse a explicação. Ao concluir o que estava falando, dispensou-os e lembrou que

quem quisesse retirar livros poderia ficar à vontade.

Três alunos ficaram para retirar livros, entre eles o aluno que a desrespeitou. Ela

anotou o livro e o nome do aluno e se despediu dele pedindo que ele tivesse juízo.

Duas meninas ficaram escolhendo livro. Uma falou para a outra que se

demorassem não conseguiriam entrar na próxima aula. A outra sorriu e disse “Melhor

assim”. A POSL se aproximou e fez indicações de alguns livros, elas pegaram o livro e

a POSL fez uma autorização por escrito para que a professora da aula seguinte as

deixasse entrar em sala.

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Em uma outra aula, também para a sétima série, a proposta foi a mesma, porém

os alunos eram mais dinâmicos e terminaram de ler o texto rapidamente. A POSL

começou a discussão perguntando o que entenderam e, assim como na outra sala, foi

explicando trechos do texto. Ela enfatizou a questão da interação com a leitura e disse

que eles precisavam interagir com o texto para entenderem. Os alunos começaram a

conversar e ela falou em voz alta que não ficaria falando com as paredes.

Eles pararam de conversar por alguns minutos, mas logo voltaram. Ela advertiu

novamente e continuou a explicação fazendo perguntas sobre o texto, para estimular a

participação dos alunos. Após uns dez minutos de discussão, ela autorizou os alunos a

retirarem livros e quem não quisesse poderia sair. Quatro alunos pegaram livros

emprestados.

Na semana seguinte, ocorreu a exposição. Um dia antes não houve aula para

que eles organizassem a escola para a exposição, que aconteceu em uma quinta-feira.

Segundo a professora, poucos pais visitaram a exposição e os alunos também não

vieram, em sua maioria.

Na sexta-feira, que sucedeu a exposição, houve aula, mas os alunos estavam

ajudando a desmontar a exposição. Alguns alunos que estavam se comportando mal

nesse dia foram dispensados pela diretora, pois segundo ela estavam atrapalhando, ao

invés de ajudar.

A POSL estava ajudando a desmontar a sala de informática e não deu as duas

primeiras aulas. Na terceira aula, foi para a sala e recebeu cerca de 15 alunos.

A POSL explicou a proposta da aula que era ler os hai-kais que os alunos das

outras séries escreveram. Os alunos reclamam, mas ela distribuiu os livrinhos e pediu

para que os comentários maldosos fossem calados e recomendou que tivessem

cuidado com os trabalhos.

Alguns alunos liam, outros conversavam. Uma menina devolveu um livro, a

POSL perguntou se ela gostou, ela respondeu que sim e pediu que a professora

indicasse um livro bonito. A POSL indicou Clarice Lispector e Machado de Assis e

explicou que se trata de clássicos da literatura.

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Outros alunos conversavam sobre Internet e outros assuntos, a POSL explicou

para a observadora que aquele é um dia atípico e que os deixaria mais à vontade.

Os alunos continuavam conversando, as professoras conversavam com eles,

brincavam, perguntavam o que haviam achado da exposição e a maioria afirmou que

não havia visto a exposição. Elas reclamaram e falaram que eles não valorizavam os

trabalhos deles e dos amigos. O sinal bateu, os alunos saíram calmamente, se

despedindo da professora.

As aulas das oitavas séries que seguiram tiveram como proposta a leitura do

mesmo texto que já havia sido lido pelos alunos da sétima.

A POSL explicou a proposta e afirmou que precisariam de muita atenção na

leitura, pois era um texto difícil, e se não ficassem atentos não iriam entender. Os

alunos reclamaram, falaram que o texto era muito longo, ela insistiu e falou que a

interpretação seria oral e coletiva. Pediu com voz firme para parassem de brincar e

começassem a ler.

A professora que acompanha a sala ficou em uma mesa separada corrigindo

atividades.

Todos liam silenciosamente. Um aluno que terminara a leitura falou em voz alta

que não entendeu. A POSL repetiu que era um texto difícil e falou que sem

concentração realmente não daria para entender. Ela passou pelas mesas e parou em

um grupo onde os alunos estavam dispersos, ameaçou separá-los caso não se

concentrassem. Outros alunos terminaram a leitura e falaram que não entenderam. A

POSL sorriu.

Um aluno falou um palavrão em voz alta. Ela repreendeu dizendo que

dispensava os palavrões. O aluno pediu desculpas e ela disse que ele só sabia fazer

isso: falar besteiras e depois pedir desculpas (sic!).

A POSL perguntou quem entendeu o texto. Três alunos levantaram a mão e uma

dessas alunas tentou explicar o que entendeu, mas todos falaram ao mesmo tempo e

não foi possível escutar o que a aluna estava falando. A POSL interrompeu pedindo

silêncio, mas a aluna não retomou a sua fala.

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Um aluno perguntou qual era a intenção do texto. A POSL não respondeu e

começou a ler o texto em voz alta. Quando os alunos começaram a conversar, ela

aumentou o tom da voz. Durante a leitura, foi fazendo pausas e explicando algumas

expressões e o significado das palavras. Ela leu um trecho do texto que falava “não

tinha nenhum respeito” e completou “que nem vocês”, se referindo aos alunos.

Durante a explicação da professora, alguns alunos acompanharam a leitura,

outros olharam pela janela, e um grupo de alunos conversava. Ela fez uma pausa na

leitura e olhou para esses que estavam conversando. Eles pararam. Ela fez uma

pergunta sobre o texto e completou com voz de incentivo “vamos lá pessoal, vamos

pensar!”

A POSL fez perguntas e eles responderam. Ela pediu para darem as suas

explicações, mas a maioria se manteve quieta, e foram sempre os mesmos que

interagiram. Ela contou para eles que também não entendeu o texto da primeira vez

que leu.

Ao terminar a leitura, pediu tarefa para a próxima aula, valendo ponto para língua

portuguesa. Os alunos reclamaram em coro. Ela explicou que terão que escrever um

texto interativo, como aquele que acabaram de ler, falou que pode ser feito em dupla.

Eles perguntaram se terão que ler para a sala, ela respondeu que sim.

O grupo de meninos que estava mais disperso pediu para fazer o trabalho em

grupo. Ela falou que eles atrapalharam o tempo todo e agora pediam para fazer o

trabalho em grupo, se aproximou da mesa onde estavam, e ficou alguns minutos

conversando com eles em voz baixa. No final, autorizou o trabalho em grupo.

Um aluno se aproximou dela e falou que vai se matar. Ela brincou com ele e o

colocou no colo, pedindo em tom de brincadeira que não fizesse isso. Ela fez a rotina

de devolução e empréstimos e uma aluna renovou o livro “O pequeno príncipe”. Cerca

de dez alunos retiraram livros. Os alunos foram dispensados e saíram da sala

calmamente.

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Anexo II: Entrevista editada

Cristina Murano. Onde eu nasci? São Paulo, Ipiranga, bem pertinho daqui. Meu

pai se chama Luís ele era contador, atualmente aposentado. Minha mãe Odete, veio de

Portugal, a família do meu pai é Italiana, mas ele é daqui. Minha mãe a família dela é

portuguesa e ela também é, ela nem naturalizada é. Tenho dois irmãos. Minha irmã é

arquiteta e meu irmão é funileiro.

Sempre morei aqui em São Paulo, sempre nessa região entre Vila Mariana e

Ipiranga, morei até os oito anos mais ou menos com a minha avó, com os meus pais e

na casa da minha avó, lá era uma bagunça geral, tinha um quartinho nos fundos que a

gente fazia trem fantasma (risos) e assustava os sobrinhos, os sobrinhos não, primos

mais novos (risos). A gente era mais velho, assustava os mais novos, fazia muita

bagunça. Queimamos uma boneca uma vez e quase pusemos fogo na casa

Meus pais depois disso se separaram eu fui morar com a minha mãe, mas via

meu pai regularmente, nunca teve muita briga, nunca presenciei briga nem nada, nunca

teve briga de guarda pelos filhos, sempre foi tudo... foi uma separação bem pacífica,

mas depois disso sempre morei com a minha mãe.

É a casa da minha avó tinha um quintalzão um quartinho nos fundos, não era

aquelas casas enormes, era uma casa só de dois quartos, mas tinha o quartinho nos

fundos onde a gente morava, não, mentira eu morava lá dentro com a minha avó e no

fundo morava meu tio uma época, mas aí depois quando meu tio saiu que a gente

transformou em quarto de bagunça, o quartinho do fundo.

Ah... (suspirou) a gente fazia, como eu falei, o trem fantasma, brincava de

boneca, era um quartinho com uma cozinha e um banheiro, era uma casa independente

como uma edícula, a gente brincava de boneca, tinha a mesinha lá a gente fazia as

brincadeiras, tinha um carrinho que a gente andava no corredor um empurrava o outro,

brigava porque um quebrava o brinquedo dos outros (risos) sempre meus primos

estavam juntos, a gente brincava bastante.

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Da escola? Eram muitas e ao mesmo tempo vagas, eu lembro o primeiro dia que

eu entrei na escola, esse dia me marcou demais porque, na primeira série que era fase

de transição que eles, meus pais, estavam se separando, então eu faltei bastante e

quando eu cheguei a professora foi super rude comigo, perguntei se era para pular

linha para escrever, naquela época, faz um tempinho, pouquinho tempinho atrás. Tinha

que copiar “abelha”, copiar a folha inteira a palavra abelha e eu não sabia se tinha que

pular linha e ela não me respondeu porque se eu tinha faltado, agora eu tinha que

descobrir, pouquinho de tempo, não faz muito tempo isso não, sou novinha (risos).

É esse foi o fato mais marcante, eu lembro que eu fiz duas vezes o pré porque

eu entrei no pré eu era muito novinha, eu não tinha idade para ir para primeira série,

então eu fiz de novo o pré, quando meu irmão também entrou novinho, mas aí meu

irmão foi... De ano para ano muda muita coisa, então como ele é mais novo, ele já pôde

ir para primeira série, eu lembro que eu fiquei revoltada por causa disso, por que eu tive

que fazer pré duas vezes... (risos)

Professora do meu segundo pré, professora Cecília, eu lembro bastante dela, ela

era muito boazinha, do primeiro ano foi esse que me marcou e eu não lembro mais,

coisas dela, coisas afetivas eu tenho só do pré.

Depois eu mudei de escola, porque meus pais se separaram e eu mudei de

escola porque fui para uma escola que eu fiquei até o ginásio, o ginásio completo, é

oitava série, depois da oitava série eu fui para outro colégio de novo.

Não lembro muito de professor não, me lembro mais do colegial, eu já me lembro

mais dos professores que marcaram e aí eu fiz o magistério, no colegial fiz o magistério

que na época ainda tinha (abaixa o tom de voz) que tem os professores mais

marcantes (aumenta o tom de voz) me lembro de fases, de usar salto alto na escola,

não podia usar, era proibido, a gente levava na mochila, eu lembro quando o muro do

colégio caiu, aí todo mundo começou a chamar o colégio de brejão, porque era perto do

rio aqui, e aí começaram a chamar o colégio de brejão porque encheu de sapo, encheu

de sujeira porque o rio subiu e a força do rio estourou o muro do colégio, como fala...

Enchente mesmo.

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Escola pública, sempre escola do estado.

Minha adolescência foi bem, bem gostosa, eu sempre fui meio, como que eu

posso dizer... (pausa) não era revoltada não, mas era irreverente, todo mundo andava

na moda e eu tudo que era moda eu era contra, para ir do contra mesmo, mas foi

tranqüila, não tive nenhum problema de adolescência, meus pais embora separados,

sempre foi muito tranqüilo porque eu tinha a presença dos dois, os dois orientavam,

ajudavam se precisasse de qualquer coisa sempre estavam os dois, eles se

conversavam, eles têm amizade até hoje, conversam, meu pai é casado novamente,

minha mãe é super amiga da minha madrasta, é assim uma coisa bem tranqüila não

me lembro de nenhum problema, é lógico, separação é sempre separação, mas foi

sempre bem tranqüilo e eu era bagunceira, eu pulava muro da escola (risos) no

colegial, para cabular aula, para ficar na porta do colégio, não fazendo nada, porque a

gente nunca tinha dinheiro para nada, então era uma dureza, mas a gente se divertia

bastante, fazia altas bagunças, vivia na diretoria, eu era terrível, mas nunca deixei os

estudos de lado, eu era muito responsável por meus estudos eu estudava, fiquei para

recuperação acho que no segundo colegial de física, mas eu era sempre muito

responsável com os estudos, é que a física mesmo foi uma coisa que foi duro de descer

pela goela (risos), mas tudo bem, mas era assim, era bem bagunceira, mas não

deixava nada, para trás do estudo, estudava, bagunçava muito, a moçada tinha um

grito de guerra, mas era diferente de hoje, a gente bagunçava, brincava, mas não tinha

responsabilidade, a gente brincava, vamos dizer assim na hora que era possível

brincar, não tinha agressividade, hoje você vê os alunos são muito agressivos, eles não

respeitam, não é uma bagunça saudável, costumo dizer que a gente bagunçava, mas

era tudo saudável, nunca desrespeitei professor, nunca deixei de fazer as minhas

coisas embora cabulasse aula, beijasse todos os meninos (risos) fazia bagunça na

quadra, quando tinha aula de educação física, a gente mais se exibia para os meninos

do que qualquer coisa (risos), participava do grêmio, a gente ficava à tarde, estudava

de manhã e ficava à tarde no grêmio, mas promovia eventos não era para ficar, vamos

dizer assim "zuando", promovia mesmo, jogos, brincadeiras e a gente assim ia se

divertindo, ia para casa, voltava, ficava o dia inteiro no colégio.

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Eu comecei a trabalhar quando eu já tava eu acho que no segundo ou no terceiro

ano de magistério... o magistério eram quatro anos, o primeiro foi básico, acho que foi

no terceiro ano de magistério, eu comecei a trabalhar numa escola particular, pré -

escola e aí eu não parei mais de trabalhar. (suspirou fundo)

Educação infantil é, e que era pré-escola, ainda, alguns aninhos atrás, poucos

(risos). Eu sempre gostei muito de criança, eu sempre quis trabalhar muito com criança,

quando era pequena eu falava que eu ia ser pediatra, todas as profissões... porque

quando a gente é criança, adolescente, a gente vai pensando em tudo isso, é natural e

tudo o que eu ia pensando tinha criança envolvido, nunca pensei em uma coisa que

não tivesse criança, que não tivesse movimento, eu gosto muito de movimento, tanto é

que eu não penso em sair de sala de aula, coordenação, direção, estou fora, não dá, eu

gosto de... como dizia uma coordenadora minha que eu sou ombro a ombro não tem,

não tem trabalho burocrático, eu gosto desse movimento, eu sempre pensei e sempre

gostei de trabalhar com criança. Tudo que eu pensei, foi nesse intuito.

Eu sou psicóloga, eu fiz o magistério, quando comecei a trabalhar com educação

infantil, trabalhei bastante tempo com educação infantil até me formar no magistério foi

com educação infantil, depois também eu fiz faculdade de psicologia e continuei

trabalhando com educação infantil (pausa e suspiro) depois é que eu entrei na

prefeitura, mas eu pegava primeira série, segunda série, porque o magistério é P1 só

até quarta série, e a formação de psicólogo te dá formação para trabalhar só com

psicologia o ensino médio de primeira a oitava não dá (pausa).

Brincava bastante de boneca, eu me lembro disso, da gente brincando de

boneca, eu cortava os cabelos das bonecas, minha irmã ficava doida, porque a gente

não tinha muito dinheiro, eu ganhava uma boneca, não é que nem hoje, a criançada

tem uma, duas, três, quatro, cinco bonecas, tinha boneca que era em conjunto minha e

da minha irmã, as mais caras, vamos dizer, era minha e dela, não tinha essa de meu e

seu, era tudo dividido, então joguinho de copinho era meu e dela, a mesinha era minha

e dela, eu brincava muito com meu irmão, eu me lembro de quando era menorzinha, eu

brincar com a minha irmã, depois que eu fui morar só com a minha mãe, eu me lembro

mais de brincar com o meu irmão, ele tinha o Falcol (risos) e a gente brincava e era um

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combinado, um dia era com os brinquedos dele e o outro era com os meus brinquedos,

porque é menino, era assim que a gente combinava.

A psicologia foi de um filme na verdade, quando eu estava fazendo magistério.

Porque depois do primeiro colegial eu optava no colégio que eu estudei tinha o

magistério e o normal, o ensino na época era colegial que chamava, eu optei por fazer

o magistério, porque eu queria trabalhar com criança e no meio disso eu assisti a um

filme: Cibil, vocês conhecem esse livro? Eu primeiro assisti o filme Cibil e depois eu li o

livro, por conta desse filme, eu me encantei pela psicologia e aí resolvi fazer (pausa).

Eu fiz um ano de cursinho, depois do magistério e aí eu já entrei na faculdade, eu

prestei psicologia e artes plásticas, sempre gostei também muito de arte, mas aí deu

um rolo lá no exame da faculdade, teve que fazer de novo porque teve maracutaia

sabe, e eu não fiz de novo porque eu já tinha entrado na psicologia e eu não fiz mais.

Eu fiz na FMU, fiz faculdade na FMU.

Olha o magistério, hoje que eu estou na sala de leitura, ele me dá mais subsídios

de leitura de livros infantis e tudo mais, a psicologia ajuda bastante porque não é fácil

lidar com esses... rapazes não, porque agora eu pego de primeira a oitava na sala de

leitura, eu pego todas as turmas, uma vez por semana cada turma, e preciso bastante

dos meus conhecimentos para lidar com eles, porque não é fácil, eles estão muito

agressivos, desinteressados, então para você conseguir que eles façam, se envolvam

num trabalho, não é tão simples não, tem que ser um pouco na marra, aquela coisa de

mãe sabe vai fazer por quê? Porque eu to mandando (risos), aquela coisa é mais de

autoridade mesmo não autoritária, mas de autoridade, exercer a sua autoridade, mas

ao mesmo tempo, só com isso você não consegue, porque eles não estão nem aí, eles

não têm muita punição, hoje a legislação que a gente tem dentro da escola impede da

gente fazer muita coisa, você não tem muitas armas para lidar, entendeu? Você não

tem muitas ferramentas, você não tem uma... Falam: Tem que punir? Tem hora que

tem sim, tem hora que tem, você dentro da sua casa com teu filho, não tem hora que

você tem punir, punir não significa por de joelho no milho (risos) como antigamente se

fazia, mas tem uma troca tem, nós não temos a nota hoje. Quer dizer, deixa eu me

expressar melhor, nota nós temos, prova nós temos, temos toda essa parte de

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avaliação, mas o aluno só reprova por falta, então você não tem a reprovação como

uma ferramenta, você não tem essa ferramenta da reprovação, então eles falam que eu

vou fazer trabalho se eu não vou repetir de ano e aí a estrutura pede sensibilização,

conscientização, então a gente trabalha com tudo isso, a gente tenta conscientizar os

alunos, conscientizá-los, sensibilizá-los, do que eles precisam, como subsídios para

aquilo que eles vão ser, para aquilo que eles vão atuar mais para frente, de profissão

etc., mas adolescente acho que todo mundo aqui já foi (risos), é bem irreverente não

quer saber de sensibilização (risos), então às vezes você tem que ter outras

ferramentas, a não ser essa, e essa questão de você não poder reprovar, só reprova na

quarta e na oitava, impede muito nosso trabalho, impede porque se nós temos aprova

São Paulo temos essas coisas então quando a gente coloca isso na mesa, vamos dizer

assim: olha nós vamos daqui um tempo tem a prova, então vamos batalhar em cima

disso porque a gente também tem que falar muito a linguagem deles e (que eles não

entendem) e também não param para te ouvir, eles se empenham mais... Eu me lembro

quando eu estava com uma quarta série há uns anos atrás, tinha uma prova e eles “não

professora, o que vai cair nos vamos fazer bem”, porque aí você trabalha com toda a

sensibilização, “a gente vai ser a melhor quarta série”, então vamos lá vamos trabalhar

para ser, tem um feedback mesmo, eles ficam sem por quê, se eles tiram NS (não

satisfatório), tudo bem, passa, se eles tiram S (satisfatório), tudo bem, passa, se eles

tiram P (pleno satisfatório), tudo bem, passa, então aqueles que têm uma família que

também sensibilizam, se eles têm uma família que também trabalha nesse sentido, olha

você precisa tirar nota não para passar de ano, você precisa para aprender, aí o aluno

é diferente, aí ele faz, porque ele sabe que aquilo vai ser bom para vida dele, mas a

gente precisa muito da família e não contamos com todas, então atravanca um pouco.

No começo da minha carreira mesmo? Eu acho que um pouco de mudar o

mundo, eu sempre tive muito de consertar, de querer melhorar, de igualdade social,

sempre fui um pouco militante na questão da igualdade social, porque me incomoda

muito ver muita coisa desigual, muito sofrimento, então acho que isso era muito da

minha expectativa, continua sendo, eu acho que em outro grau, porque você sabe que

você não vai consertar o mundo, quando você está no começo de tudo, você acha que

você pode consertar o mundo, o mundo eu acho que você não conserta, você consertar 82

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aquilo que está ao seu redor, então eu acho que se você, de uma classe que você tem

de 40 alunos, 35 no mínimo, de 35 a 40 alunos, se você conseguir resgatar a vida de

dois, três, eu acho que o seu objetivo aquele ano já... Porque é muito, é muita coisa,

que luta contra, é mídia, é sociedade, é estrutura é política, é muita coisa, família, é o

mundo em si, então sabe aquela coisa que eu tinha de querer consertar os 35, eu não

tenho mais porque eu sei que não é possível, então se eu consegui 3, 4, para mim já

está bom (risos) e eu sei que eu já consegui, eu sei que eu já consegui e vou... no

tempo que ainda tenho.

Meu primeiro dia como professora, eu não me lembro, deixa tentar achar, a

escola chamava Lindos Pequeninos, nem sei se existe ainda, lá na em Mirandópolis, eu

lembro da escola, que essa foi a primeira, mas primeiro dia eu não lembro.

Não me lembro assim de primeiro dia não, sempre quando você muda de escola,

quando você inicia, por mais experiência que você tenha é sempre um inicio, por ter

pessoas diferentes, ambientes diferentes, eu me lembro de quando eu cheguei aqui,

que eu estava fora da rede pública há uns 10, 11 anos, porque eu fiquei por esse

período trabalhando na educação especial, então eu trabalhei muito tempo na

educação especial, continuava sendo funcionária da prefeitura porque eu estou na

prefeitura há 21 anos já, que eu sou funcionária. Trabalhei um tempo, depois fui

trabalhar na educação especial, então quando eu voltei aqui, eu me senti muito crua,

por mais que eu tivesse muito tempo já de sala de aula porque eu fiquei muito tempo na

educação especial, eu achei que fosse muito diferente, eu fiquei um pouco assustada

quando eu saí da educação especial e peguei a sala de aula aqui nessa escola mesmo,

peguei uma quarta série, então eu fiquei um pouco... Falei para o diretor: eu vou

precisar de ajuda, porque faz tempo que eu não pego uma quarta série regular, assim

normal. Aí o tempo foi passando e eu vi que não era um bicho de sete cabeças, que

dava para tocar facilmente, e foi uma chegada assim impactante, porque era uma

classe muito difícil, eram alunos que andavam em cima das mesas, xingavam o

professor, tacava bolinha. Quando eu cheguei, o diretor olhou para mim e falou: é, você

vai mesmo precisar de ajuda, porque a classe era... Bom, mas enfim, cheguei daquele

meu jeito, brinco demais com eles, eu falo gíria com eles, as vezes eu falo umas gírias

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da minha época, eles falam: mas que é isso professora? eu falo: ai é da minha época.

Não queira também que eu fale gíria da época de vocês (risos) e aí vira aquela

bagunça. Porque tudo é motivo para virar auê, mas aí você puxa o fio condutor de novo

e vai embora, e eu lembro que foi bem... Mas depois de um tempo, a classe já estava

do meu jeito, eu trabalhei muito com auto-estima com eles porque eram alunos muito

segregados na própria escola, eles não podiam participar de nada, porque eles eram

bagunceiros, aí eu comecei a me impor e falar não, são bagunceiros, mas são alunos

vamos lá, eu comecei a puxar eles para cima, trabalhei com máscara com eles,

trabalhei com a auto-estima mesmo. No começo não quis saber de livro não, fechei os

livros e falei espera, aqui não está precisando neste momento, de nada acadêmico,

agora é resgatar a humanidade e aí, depois disso, voltamos para os livros.

Começo de começo mesmo? Eu acho que é a agressividade mesmo, eles são

muito agressivos, muito impacientes. Não tem muita humildade, eu acho também que o

interesse. Antes eles tinham mais interesse, agora eles não estão muito aí para coisa

não.

Costume da minha vida que eu trago para sala de aula? É de procurar se divertir

(pausa), eu acho que tudo que a gente faz, tem que fazer por obrigações, mas sabe

aquela coisa, tudo por pior que esteja, tem o lado bom, eu penso muito isso. Hoje, eu

estou cansada, hoje, eu estou com dor de cabeça, mas tem o lado bom, então vamos

achar esse lado bom e vamos caminhar a coisa por esse lado, sabe a luzinha está ali e

é bem pequenininha, mas é nela que eu vou, porque tem que acontece, a coisa tem

que acontecer. Você achar o lado bom das coisas em tudo, eu acho que a gente tem

que se divertir o tempo todo.

Da escola? Eu fui muito bem recebida, eu acho a escola bonita, embora às vezes

esteja com pichação, está com não sei o quê, mas na época, o muro que hoje está

branco, ele era cheio de grafite, aquilo me agradou, porque eu acho que o ambiente

que a gente está tem que ser bonito, tem que estar agradável, e tem que... Eu acho que

tudo tem que ter arte, não sei se eu sou uma artista frustrada porque eu acabei não

fazendo (risos), mas eu sempre trabalho muito com a arte, porque eu acho que a arte,

em qualquer linguagem, as artes plásticas, a música, o teatro, a dança, qualquer

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linguagem da arte, eu acho que resgata muito a auto-estima, é muito projetivo, a arte é

muito projetiva, então eu acho que você consegue resgatar muita coisa e alcançar

muito do psicológico deles, nosso e da humanidade, eu acho que a arte resgata muito a

humanidade e eu gosto de trabalhar muito em cima disso. Tinha um diretor aqui quando

eu entrei, ele um dia me chamou e eu estava com os alunos todos espalhados na, não

era essa quarta série, já era outra quarta série que eu gosto mais de pegar quarta série

hoje em dia, eu estava com eles espalhados todos no pátio, cada um num canto, no

pátio, na quadra, todos espalhados, cada um com uma caixa de tinta, pincel, folha e

fazendo... Colocando a criatividade deles para fora, e ele me chamou, eu falei: ih vou

levar uma bronca, todo mundo espalhado, mas estava tudo sob controle, mas você

sempre fala “ai meu Deus, é agora”, e ele falou: eu gosto do seu trabalho por causa

disso, porque você não está com todos juntos, mas todos estão com você, eu falei: é

isso mesmo, a idéia é essa. Eu acho que arte proporciona muito isso, eu gosto muito de

trabalhar... Logo que eu cheguei nós transformamos isso, mas quando eu cheguei já

estava assim, esse muro aqui fora que tem os desenhos, a própria porta, era tudo

cinza, eu falei: ah não, ambiente cinza não, me lembro da música da Marisa Monte, que

canta do muro, como chama aquela música... na música ela fala: (Canta) apagaram

tudo, pintaram tudo de cinza, só ficou no muro tristeza e tinta fresca.

Na profissão? Desafios... Eu acho que eu consegui aquilo um pouco, que eu já

falei, resgatar alguns alunos, eu acho que é isso o tempo todo que me move, é o maior

desafio mesmo, é conseguir passar alguma coisa de cidadania, de humanidade, eu

acho que é mais isso mesmo, acho que a dificuldade que a maioria dos professores e

escolas passam, principalmente da rede pública, é que não temos muito material, nós

temos uma escola do século XIX e os alunos são do século XXI, então é uma coisa

bem difícil, porque escola que ainda tem mimeografo, porque não tem outro recurso,

você tem cota de Xerox, se você quer dar um material diferente sai do seu bolso, então

isso restringe muito. Temos materiais tudo, mas chegam muitos livros, então aqui na

sala de leitura até que tem bastante recurso, porque chegam livros novos, sempre, o

ano passado chegou muitos livros, mas no geral da escola, eu acho que falta muita

coisa, hoje em dia é tudo com clic clic clic clic e você vai resolvendo a sua situação, eu

estou sem internet desde janeiro aqui na minha sala, quer dizer pesquisa: Barsa. Para 85

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pesquisa então sem internet, com Barsa fica meio... Tem muito livro de literatura tem.

Agora de pesquisa não, mesmo porque eu acho que hoje em dia é mais internet, é

difícil você achar em livros, então isso dificulta um pouco, mas aqui na escola o pessoal

se vira muito, quando você precisa mesmo de um material, sai da APM, sai de onde for

o pessoal tenta te ajudar o máximo que consegue também, mas eu acho que aí o

entendimento dos alunos, eu também acho que dificulta bastante.

Conquistas eu acho que é o dia-a-dia, tudo que você consegue fazer, eu acho

que é uma conquista, todo o objetivo que você alcança, quando você se propõe a...

Aqui na escola a gente trabalha muito com projeto, você até viu o desenvolvimento de

um projeto o semestre passado, que foi os cem anos da imigração, sempre tem um

bom resultado, que o pessoal se empenha bastante, é lógico que tem aqueles que se

empenham e aqueles que não, mas isso tem no corpo docente, no corpo discente, no

corpo administrativo, dentro de casa, isso tem em todo lugar, em qualquer profissão,

mas acaba sempre tendo um bom resultado, sempre. Eu acho que quando você pega

um aluno que você vê falando coisas que você disse dá uma alegria, você diz

conquistei alguma... Consegui alguma coisa, quando você vê uma mudança de atitude,

quando você vê aquele menino que às vezes é aluno, que xinga, que briga, pedindo

licença para entrar na sua sala, eu acho que isso é uma conquista, e isso acaba

acontecendo, pode não ser 100 por cento e eu acho que isso nunca vai acontecer

mesmo, mas, você vê, eles escrevendo, você trabalha o semestre inteiro com poesia,

você vê depois eles escrevendo poesia é muito gostoso, acho que isso é uma conquista

e esse semestre o projeto é música, vamos ver o que é que vai sair.

O porquê foi meio ao acaso, porque eu nunca pensei na sala de leitura como

objetivo de vida, foi uma coisa que aconteceu, que foi bacana porque eu estou

gostando, eu acho que meu trabalho está se expandindo, eu consigo atingir mais

alunos do que com uma única sala, apesar do trabalho ser diferente, mas quando eu

comecei, foi em 2005, a professora da sala de leitura se aposentou, abriu a vaga, eu

pensei: será que eu pego? e fiquei pensando, será que eu me candidato? Ficou aquela

angústia natural, aí eu falei: ah quer saber, eu vou, se eu não gostar, eu volto para sala

de aula, e se não gostarem de mim também eu volto para sala de aula e assim eu

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resolvi enfrentar mais esse desafio, e para mim foi um grande desafio, porque eu estou

habituada com primeira a quarta série, eu pego oitava, então planejar atividades para

oitava série já é uma coisa que foi um pouco difícil, ainda atividade que envolvesse e

que despertasse o interesse (risos), acaba sendo um pouco mais difícil, mas eu acho

que eu estou conseguindo, agora com esse trabalho de música, eu estou pedindo

trabalho para eles fazerem, eles estão trazendo, a oitava série trouxe, foi a série que

mais trouxe o trabalho, que está mais envolvida, quer dizer, isso eu acho que é um

feedback para mim, eu considero como um feedback. E o porquê, eu já falei foi meio ao

acaso.

Faz diferença em vários sentidos, acho que é um trabalho diferenciado, no

sentido deles poderem trabalhar em grupo, é um trabalho mais livre, não tem aquela

cobrança de nota, apesar de que às vezes a gente dá uma cobrada, olha não trouxe vai

levar... Porque o professor acompanha, o ano que vem vai ser diferente, mas esse ano

ainda o professor da sala de aula acompanha, e no nível dois, vem o professor de

português, e no nível 1, vem o professor da sala, eles acompanham e dão continuidade

na sala de aula, eu, por exemplo, conto uma história, o professor emenda na sala de

aula essa história para trabalhar ou alguma mensagem que a história transmitiu, ou

para trabalhar a própria escrita, ou para trabalhar a imaginação, através de um

desenho, então tem sempre uma continuidade. E no nível 2, tem aquela coisa da

interpretação também e do gosto pela leitura. (enfatiza) Isso que é difícil! Fazer eles

gostarem de ler, como é difícil isso! E eu falo para eles, leitura é habito, é que nem

escovar o dente, você não escova o dente todo dia, leitura é todo dia, lê duas páginas,

começa lendo uma página, amanhã, daqui uma semana, você estará lendo duas, daqui

duas semanas, você estará lendo quatro e aí cria o hábito, é hábito mesmo a leitura, e

é lógico que é gosto, mas como é que você vai saber se você gostou de ler se você não

lê? Não tem como, e eu falo isso para eles, eu falo: vocês não vão gostar de tudo

mesmo, às vezes a gente lê e fala “nossa que lixo” e aí o outro fala adorei! Por quê?

Porque entra uma questão individual, por isso que tem que ter de tudo e tem que ler um

pouco de tudo para saber aquilo que gosta, não adianta ler só poesia, não estou

gostando, então vamos ler uma crônica, eles adoram crônica, crônica é o que eles mais

gostam, além de ser rápida, curta, (risos) é divertido, e eles lêem, tem aqueles que 87

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lêem mais, os que lêem menos, mas acho que a maior dificuldade mesmo é fazer eles

gostarem de ler, como é difícil criar o hábito, e a gente estimula, e dá cada dia uma

coisa diferente, e dá revista, e assim vai tentando.

Eu gosto de ler, eu gosto bastante de ler, não sou uma leitora é... vamos dizer,

que eu devoro livros em pouco tempo. Não. Isso não. Mas eu leio habitualmente, leio

todos os dias, vou lendo uma coisa, vou lendo outra, eu me cobro muito da questão

teórica, então eu acabo querendo ler coisas que vão ajudar no trabalho, leio muita coisa

de psicologia ainda, por mais que hoje eu não esteja atuando em consultório ou em

instituição, mas eu leio, para começar tem que ler coisa para se divertir também, aí eu

passei a ler mais do que eu lia, só que eu tenho um grande defeito, eu começo um aqui,

não sei se é defeito, mas eu começo um livro, depois começo outro e volto no primeiro,

aí vou no outro, às vezes eu não termino (risos) aí outro dia eu estava até falando para

uma amiga, ela falou: mas o mais gostoso é o fim do livro, você não lê? Eu falei: às

vezes não, às vezes eu não termino o livro (risos) – Você fica sem saber o final? Fico. E

não te atrapalha? Não, eu fico com vontade de começar outro (risos), não que não leia

todos os finais, mas tem um monte de livro que eu acabo deixando para lá. E aí vai.

Sou. Não ajuda muito não. Porque eu não sei se a pós-graduação, na época que

eu fiz, não contribuiu muito para meu conhecimento. Eu fiz Psicopedagogia, para mim

foi chover no molhado, eu tinha coisas, por exemplo, eu já era formada em psicologia, e

coisas assim da psicopedagogia, psicologia, eram coisas que para mim não

acrescentou, é lógico que acrescentar sempre acrescenta alguma coisa, mas eu acho

que a minha expectativa era muito maior, então me frustrou um pouco, por conta disso,

que eu não eu uso. Sim algumas coisas, mas eu acho que não foi de encontro com a

minha expectativa, então você acaba ficando um pouco mais, é, não gostei muito, então

acho que por conta disso você acaba não usando muito.

Eu acho que limite não tem, eu acho que o mesmo material você pode usar de

várias maneiras, e mesmo se você repete a estratégia ela já é outra porque você está

em outro momento da sua vida, a mesma reportagem que você lê... Que nem essa

semana eu estou trabalhando com reportagem com eles: Professora isso é velho. Lê de

novo. Vamos ver o que você, como você vai interpretar essa leitura, essa reportagem

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que você já conhece, sempre tem alguma coisa: olha não tinha pensado nisso! Pois é,

uma coisa que você já tinha visto, então eu acho que mesmo a mesma estratégia, uma

reportagem antiga, eu acho que sempre tem algo que você... É como ler um livro, você

pode lê-lo 3, 4 vezes, nunca é da mesma maneira, sempre alguma coisa diferente você

tira. (pausa para virar a fita)

De uso do material... Eu acho que todo material é possível você achar uma

utilidade, o que dificulta é você não ter material, porque aí você tem que usar muito a

sua imaginação e haja criatividade (risos), é, eu acho que há possibilidade.

O papel, o objetivo maior da sala de leitura, é realmente o estímulo à leitura, é

tentar resgatar o gosto pela leitura, criar esse hábito. O hábito sou eu, sou eu que digo

que é um hábito... O que chega para gente como objetivo, o que a gente estuda, o que

a gente vê é sempre proporcionar mesmo o gosto pela leitura, se virar para fazer com

que eles gostem de ler porque a leitura na vida de qualquer pessoa é muito importante,

e além do aprendizado tem a diversão, tem a cultura geral etc., existe uma

precariedade muito grande nesse sentido literário mesmo, eles têm pouco

conhecimento eles... Não sei se eu estou sabendo me expressar, mas eles não têm

esse gosto, para eles é um saco ter que ler, é mais fácil assistir uma televisão, que já

vem moído, mais fácil assistir um filme, mesmo que seja um filme que existe um livro, a

imagem já está pronta, você não tem que construir, e o livro você constrói a imagem,

você é que cria aquele... Você vai ler um romance, mesmo um depoimento, um diário,

você que cria a imagem, então eu acho que a geração de hoje, está muito acostumada

com tudo pronto, só clicar e está pronto.

Olha tem uma coisa muito importante, eu acho que eu tenho facilidade e eu acho

importante que é intuição, às vezes parece que o livro cai na minha mão, é lógico que

isso não acontece (risos), eu encaro um pouco desse lado. Eu estou arrumando

prateleira, e vamos dizer assim, o livro cai na minha mão, e aí eu leio, vejo que tem a

ver com o que a gente está trabalhando, mas é lógico que não é a única maneira de eu

selecionar, eu procuro de tempos em tempos trabalhar com reportagem, com texto

cientifico, eu tento abrir o leque de tipo de leitura, o máximo que dá, eu não me estendo

muito em reportagens, em textos científicos, porque isso não estimula muito eles não,

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mas eu não deixo de trabalhar, eles gostam mesmo é de trabalhar com coisas

divertidas então eu procuro, eu dou quadrinhos, eu dou... Porque eu quero que eles

leiam, eu quero que eles... Porque depois que eles começarem a gostar, aí a gente

pode introduzir coisa mais difícil, coisa mais chata, mas é que para eles começarem a

gostar, que é objetivo maior da sala de leitura, e é o que contribui na sala de aula e na

escola, é o gosto mesmo, e se eles começarem a gostar, se eles começarem a ter

curiosidade, eles vão se desenvolver vão ler mais as ciências, a geografia, a história

etc., então eu procuro fazer da minha prática essa coisa mais divertida.

Como eles vêem? Como eles enxergam a sala de leitura? Muitos vêem como um

momento de lazer (risos) vêm para num fazer lição (risos), mas chegando aqui: ah,

professora deixa a gente só conversar? Falo: não é aula, eu acho que o fato de ser

mesa redonda, que eles sentam em quatro, já aquela coisa de mesa de bar, sabe

vamos conversar (risos), só que em toda aula eu tenho um objetivo, às vezes eu dou

aula livre, só que eles falam: professora, isso não é aula livre, eu falo: hoje é aula livre,

aí todo mundo: aee! Pega o livro que vocês quiserem e começa a ler, professora, isso

não é aula livre! Aula livre a gente tem que conversar. Eu falo: não, conversa é

momento livre, aula livre é aula, então se é aula de leitura que nós vamos fazer? Ler.

(risos) eu não sei se eu respondi a sua pergunta.

Material, até que vem bastante material para cá, não é tanto, mas é lutar para

que eles criem o hábito da leitura, que eles passem a gostar de ler, porque isso é o

mais difícil, porque eles têm muita preguiça de ler, eles falam: ai professora não dá

para ler tudo isso aqui, essa reportagem é muito... Lê o que dá, não escolhe pelo

tamanho, eles escolhem pelo tamanho, quando eles vão ler alguma coisa, quando eu

dou, eu trabalho bastante com a ciência hoje, sabe aquela revista ciência hoje? Então,

quando eu vou trabalhar mais textos científicos, eu pego dessas revistas que são

interessantes, às vezes a gente acha uma reportagem que fala por que eu tenho chulé,

por que tem meleca de nariz, eles adoram, porque aí vira aquela baderna, mas no

fundo disso tudo eles estão aprendendo o porquê tem meleca no nariz, daí eles leram

um texto cientifico, como é que fala? A linguagem cientifica, não estava vindo essa

palavra, que quanto mais leitura, mais vocabulário a gente tem também.

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Da sala de leitura, você ta falando ou do meu tempo de professora?

Ai meu Deus, da escola, mudança de aluno, não sei, acho que cada dia o desafio

é maior, eu acho que cada dia que passa o desafio é maior de você conseguir fazer o

seu trabalho, desenvolver as atividades com os alunos, acho que cada dia está mais

difícil, acho que é isso, o desafio é maior cada vez.

Influencia porque cada vez você tem que rebolar mais (risos) vamos dizer assim,

cada dia você tem que inventar uma coisa diferente porque se você não inventar, ficar

na mesma, como você aquele monte de gente com aqueles cadernos amarelados

fazendo a mesma coisa anos a fio, primeiro que você não vai atingir mais o aluno, você

não vai controlar a disciplina porque uma grande dificuldade é controlar a disciplina,

muito difícil, porque as classes são bem numerosas, eles são bem desinteressados,

você tem que trazer coisa que realmente faça: opa! isso aí eu quero prestar atenção, e

para isso você tem que estar no século XXI, junto com eles porque se não (risos) fica

difícil.

Olha, eu levo em conta tudo isso que você falou, mais principalmente o projeto

que está sendo trabalhado na escola como eu falei, nessa escola a gente trabalha cada

semestre envolvido num projeto que é para dar um uma linha condutora para as

disciplinas, para todo mundo estar falando a mesma língua, mesmo porque se não,

hoje em dia, é muito difícil porque, a rotatividade de professor em uma escola é muito

grande, tem classe que passa no mínimo por três professores, tem aulas que ficam

sem, nós não temos aulas de educação artística até hoje desde fevereiro, não a escola

inteira, mas algumas classes não têm, não vem professor, não chega, é pedido, não

vem, tem uns que se afastam e então essa estrutura por conta de... agora parece que

vai mudar porque tinha dois... tinha o professor titular tinha o professor adjunto e o

adjunto rodava muito, cada ano estava numa escola diferente e agora parece que, se a

idéia der certo, isso vai diminuir bastante porque o adjunto passa a ser titular também,

eles vão ter escola de lotação, como os titulares tem, então eu acho que isso vai

diminuir muito a rotatividade porque a rotatividade prejudica o andamento da escola,

mas cada um faz o melhor que pode, diante dessas dificuldades, mesmo rodando a

gente tenta resgatar o máximo que pode do aluno e eu acho que entre muitas escolas

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essa ainda é muito boa, ainda continua sendo referência lá fora, porque não vejo

professores não comprometidos aqui dentro, tem a falta de professor que é estrutural,

como eu falei não chegou, não veio, então não é culpa da escola e muitas vezes nem

do professor, é uma coisa estrutural mas o que estão aqui estão todos envolvidos.

Eu acho que a responsabilidade é bem grande, porque fica aquilo puxa professor

da sala de leitura, aquela que lê, aquela que vai fazer os alunos lerem, e isso fica muito

em evidência, mas eu acho ótimo, eu estou adorando ficar aqui eu estou há pouco

tempo, mas eu estou gostando, eu acho que tem muito sentido a sala de leitura, ela é

muito importante sim porque por mais que os alunos podem até encarar como uma

coisa que é, como eu falei, assim um momento de lazer, e é mesmo, porque ler é

gostoso, ler é um prazer, ler é divertido, toda aula tem um objetivo, toda aula tem

alguma coisa para ler ou tem uma brincadeira, mesmo as brincadeiras são com a leitura

envolvida, ontem para o nível 1, eu dei trava-língua, mas foi tão engraçado, a gente deu

tanta risada que eu coloquei, depois eu mostro para vocês , eu coloquei o trava-línguas

enrolado num lápis, então eles têm que girar o lápis, mas professora isso não acaba

nunca? Não acaba nunca vai travando a língua e aí eles vão, eles dão risada que o

outro erra, então é divertido, eles adoram, quando é um livro, toda aula eu empresto

livro.

Relação do meu trabalho com a minha vida lá fora... Eu acho que um influencia o

outro em vários sentidos, e a leitura eu acho que permeia a vida da gente o tempo todo,

em casa, na escola, no bar, na lição de casa da filha e acho que a leitura tem relação

com tudo, então acho que é um bate-volta o tempo todo.

De vida? Meu maior sonho de vida? Uma cabana na praia com uma rede (risos),

muita música, muita planta, adoro planta, isso é para frente, (fica séria) mas sonho

mesmo de vida eu acho que é conseguir melhorar aquilo que está ao meu redor, acho

que melhorar com o pé no chão, eu acho que a pessoa que quer fazer muito acaba não

conseguindo, eu acho que é um pouco o que você perguntou antes mesmo, no início,

eu queria tudo, não é possível, não adianta e todo mundo sai da faculdade, eu acho

que a maioria das pessoa sai da faculdade assim, querendo atingir tudo, não, vai

devagar, e vai atingindo aquilo que está ao seu redor porque eu acho que aí é possível,

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mais um papel de bala no chão que vai alterar? Vai alterar um papel de bala no chão,

um mais um mais um mais um, se eu conquisto dois ao meu redor, vai ser dois, você

dois, você dois, já são seis, se esses seis conquistaram dois cada um e assim vai

multiplicando, é assim que você consegue, eu acho que isso é um sonho que é

possível, só não querer fazer mais do que o braço alcança.

Que eu mudaria? Não sei, eu acho que eu, na minha atuação profissional ou no

ambiente todo? Ai eu não sei, eu gosto de trabalhar nessa escola, eu gosto de trabalhar

com esses alunos, eu acho que eu mudaria um pouco a questão da agressividade,

vamos dizer assim se eu pudesse eu tiraria a agressividade em todos os sentidos e em

todos os níveis, se é uma coisa de sonho (risos), eu acho que isso facilitaria muito, a

violência está demais, e não é só no mundo não, na sala de aula eles brigam demais,

eles não se respeitam é uma luta diária, eu acho que isso mudaria eu tiraria, eu

eliminaria a violência , agressividade, eles não podem se olhar, difícil.

No começo eu fiquei um pouco assustada, ai meu deus, vai fazer pergunta que

eu não vou saber responder (risos), mas depois relaxou e ai foi, você fica um pouco

preocupada com gravador, porque você fala uma palavra errada, fica lá registrado, você

fala uma concordância errada, fica lá registrado, não tem jeito, e isso às vezes quando

a gente está muito empolgada de falar acaba cometendo alguns erros ou gaguejando,

mas isso é natural, depois vocês vão editar. (risos)

A parte da minha vida geral, acho que eu falei pouco da questão do meu trabalho

na educação especial, porque foi muito importante para minha vida também, em todos

os sentidos, para minha vida profissional, para minha vida pessoal, familiar, foi muito

importante esses 11 anos que eu passei na educação especial, a minha filha nasceu eu

estava lá, e ela foi criada lá dentro, criada assim na fase mais importante da vida da

gente que é primeiro ano, segundo, a fase até os 5 anos de idade, ela estava lá, o lugar

onde eu trabalhava era maravilhoso, depois por questões de vaidade de diretoria ele foi

até instinto, porque começou a aparecer demais e quem aparecia não era o dono da

bola, era quem jogava, então isso muitas vezes incomoda muita gente, hoje nem existe

mais o setor que eu trabalhava e o setor que eu trabalhava era uma família, era uma

coisa maravilhosa, sinto muita saudade disso, mas carrego muita, não só experiência

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profissional, mas de vida também, a coordenadora que eu falei que falou que eu era

ombro – a – ombro inclusive é de lá, amo de paixão ela e foi uma coisa muito boa que

aconteceu na minha vida, foram as pessoas, os alunos por mais dificuldade que eles

tinham, um era porque não podia andar porque tinha trombose, outro que não

conseguia falar por causa disso e a gente saia direto e ia em exposição direto, convívio

social, a gente fazia trabalho, o setor chamava preparação para o trabalho, centro de

preparação para o trabalho, então eu só trabalhava com adolescente e deficiente

mental e a gente colocava eles para trabalhar, tinha aulas de parte pedagógica de

leitura, de escrita, etc., e tinha a parte do trabalho mesmo, então tinha oficinas e tinha

um trabalho que nós fazíamos de vivências, nós chamamos de vivências, fomos nós

que criamos e já tinha estágio, isso já existia, o aluno, depois que tava mais preparado,

ia fazer um estágio numa empresa, só que acabava muitas vezes tendo muitas

dificuldades, e resolvemos fazer esse trabalho de vivência, e esse projeto de vivência

que deu muito certo e foi bárbaro, que hoje não existe mais, nós fizemos parcerias com

locais comerciais, em volta do nosso setor, tudo pertinho que desse para ir a pé,

fizemos parceria, então a gente levava o aluno até lá e ele ficava uma semana

trabalhando lá. Ele ia para escola, da escola a gente levava lá, período de aula, ele

ficava lá e voltava, na outra semana ele ia para outro ambiente e assim até quando a

gente achava que ele podia sair do setor, ele passava por várias vivências, por isso o

nome de vivência, quando eles iam para o estágio diminui os problemas em 50 por

cento, porque eles ali na vivência, por mais que a gente fizesse tudo isso no setor, não

era o trabalho, era uma simulação, na vivência não, ele tinha que estar lá no horário

certo porque ele tinha que fazer o trabalho certo, ele tinha que respeitar, ele tinha

pessoas diferentes porque ali é que nem mãe, está ali perto da mãe eu vou... já já, eu

faço, bom chegou no patrão, a coisa é diferente, então tinha que fazer, então deu muito

certo, foi muito legal só que aí começou a aparecer, começou ficar, e fomos nós,

mortais, que descobrimos a pedra preciosa, aí entrou a questão de vaidade e acabou.

Foi acabando tudo e foi todo mundo mandado embora, a coisa diluiu e o trabalho se

perdeu, mas eu penso assim, de repente, aquilo foi para aquelas pessoas, não era para

continuar, foi para atingir aqueles meninos, aquelas meninas e tudo bem, mas foi uma

experiência maravilhosa. Estou falando da minha filha, a minha filha é uma figura, como

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falei, ela não tem preconceito algum, e ela conhece já, ela tem 11 anos, ela conhece

um deficiente de olhar, e tem aquele respeito, tem aquela compreensão, não tem

preconceito, é muito difícil isso, você achar em muitas pessoas isso, então eu acho que

essa experiência contribui para vidinha dela também.

De nada!

Anexo III - ROTEIRO PARA OBSERVAÇÃO NA SALA DE LEITURA / ESCOLA

Práticas que podem ser observadas:

• previsão do fracasso

• reuniões pedagógicas

• ritual das aulas: formar fila (meninos/meninas)

• ida ao banheiro, “ponto” na lousa, questionário, cópia

• uso do livro didático

• rotular alunos

• castigos / punição (ficar fora da sala, ficar em pé no corredor, chamar os pais, assinar

caderno de ocorrências)

• resolução de exercícios

• uso de vocabulário que a criança não entende

• alunos ouvem, copiam, fazem exercícios

• organização do espaço (carteira enfileiradas, grupos...)

• indisciplina

• lição de casa

• “desobediência” – correm quando devem caminhar

• se fizer tudo o que a professora mandar terão boa nota

• padrão temporal – não se espera os atrasados / não se explica pra quem erra

• leitura silenciosa / leitura oral

• leitura pela professora

• repreensão do professor – sobre disciplina, sobre erros

• encher a lousa de lição e apagar e encher novamente

• estabelecimento de padrões de comportamento, aprendizagem.... pelo prof.

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• indiferença

• regras / ausência de regras

• desinteresse

• divisão de alunos: fracos / fortes

• trabalho em grupo

• elogios

• prof. cordial / agressivo

• clima harmoniosos / “pesado”

• tratamento dado aos alunos: ouve os alunos

• como avalia o interesse dos alunos

• como lida com o desinteresse

• atividades que são desenvolvidas (proposta pela professora e reação dos alunos)

• registra as aulas

• planeja as aulas

• Existe um saber escolar e práticas próprias da sala de leitura? O que é? Quais são? Em

que consiste? Qual a sua especificidade? Como se constitui? Como é criado, inventado

e/ou reinventado?

Anexo IV – ROTEIRO DA ENTREVISTA

Identificação

1. Qual é o seu nome?

2. Diga o local (cidade) e a data de nascimento.

Família

3. Qual o nome dos seus pais e dos avós? Qual a atividade profissional deles?

4. Qual a origem da sua família?

5. Fale sobre a sua família.

a. Tem irmãos? O que eles fazem?

Infância

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6. Conte um pouco sobre a sua infância? Em que cidade morava?

7. Como era a casa, a rua e o bairro em que você morava?

8. E, como era o seu dia a dia?Quais eram as suas brincadeiras favoritas?

Escola

9. Quais são as lembranças que você tem do seu período escolar?

a. Algum fato marcante?

b. Algum professor em especial?

Adolescência

10.O que você e seus amigos faziam na adolescência?

Formação profissional

11.Qual foi o seu primeiro emprego?

12. O que lhe motivou a ser professora?

13.O que o levou a escolher a universidade que cursou?

14.Quais são as suas principais lembranças da sua época de faculdade?

15.Como os estudos influenciaram a sua atividade profissional?

16.Quais eram as suas expectativas em relação a ser professor, no inicio da sua

carreira?

17.Fale sobre o seu primeiro dia como professor.

18.Como era a escola e os alunos naquela época?

19.Você tem algum costume na sua vida pessoal, que você leva para sala de aula?

Quais?

20.Quando entrou na escola que trabalha atualmente, quais as impressões e

expectativas você teve?

21.E hoje?Quais são as suas principais conquistas, desafios e dificuldades?

22. Quando, porque e como começou trabalhar na SL?

23.Você acredita que esta atividade faz alguma diferença na vida dos alunos?De

um exemplo.

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24.Qual a sua opinião sobre os limites e as possibilidades do uso de materiais

didáticos em sala de aula?

25. Qual o papel/objetivos da SL no funcionamento da escola?

26. Como você seleciona os conteúdos a serem trabalhados na SL?

27. Como você acha que os alunos vêem a SL?

28. Qual a maior dificuldade que você encontrou nesse tempo que trabalha na SL?

Hoje

25.Nesses anos de prática, você sentiu mudanças na escola?

26.Qual a relação dessas mudanças com o seu jeito de dar aula?

27.Como você planeja seu curso?O que mais você leva em conta? (Tem alguma

relação com a coordenação, PCNs, livros, projetos da prefeitura?)

28.Qual o sentido de ser professor da SL hoje?

29.Qual a relação do seu trabalho com sua vida fora da escola?

Finalização - Futuro/Avaliação

30.Qual é hoje seu maior sonho?

31.Se você pudesse mudar alguma coisa em sua vida profissional, o que seria?

32.O que você achou de contar um pouco sua história?

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