rondinelli, r. c_ cap. 6_o conceito de documento arquivístico frente à realidade digital_tese

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  • Rondinelli, Rosely Curi. O Conceito de documento arquivstico frente realidade digital: uma revisitao necessria / Rosely Curi Rondinelli -- 2011. 270 f.: il. Tese (Doutorado em Cincia da Informaco) Universidade Federal Fluminense, Programa de Ps-Graduao em Cincia da Informao, Instituto de Arte e Comunicao Social, Instituto Brasileiro em Cincia e Tecnologia, Niteri, 2011.

    Captulo 6 - O CONCEITO DE DOCUMENTO ARQUIVSTICO FRENTE

    REALIDADE DIGITAL

    Conforme estudado no captulo 5 desta pesquisa que trata do conceito

    de documento arquivstico, este se constitui em registro de aes humanas

    independentemente da forma em que se apresenta e da base em que se

    encontra afixado. No caso especfico da base, lembremos que Jenkinson,

    Schellenberg e Heredia Herrera, bem como alguns dos dicionrios e glossrios

    contemplados, mencionam textualmente que o documento arquivstico pode se

    apresentar em qualquer suporte. Por essas assertivas inferimos que

    documentos digitais gerados no curso de atividades desempenhadas por

    pessoas fsicas e jurdicas e em suportes to diferentes como os magnticos e

    ticos, tambm podem se constituir em documentos arquivsticos.

    Ocorre, porm, que no ambiente digital a novidade vai alm da

    peculiaridade do suporte. Na verdade, nesse novo ambiente, o documento foge

    totalmente aos padres mais conhecidos como a linguagem alfabtica,

    registrada em papel e de leitura direta bem como sua relao inextricvel com

    o suporte. No mundo digital tudo codificado em linguagem binria que para

    se tornar acessvel aos olhos humanos, precisa da intermediao de

    programas computacionais igualmente codificados em bits, numa sofisticao

    tecnolgica que passa despercebida maioria dos usurios. Juntem-se a isto

    as tecnologias de rede com sua alta capacidade comunicacional. Mas

    comunicao de que? De dado, informao, documento, documento

    arquivstico? Seria mesmo possvel identificar em meio avalanche de objetos

    digitais que entram e saem de nossas estaes de trabalho a cada momento

    aqueles que se constituem em documentos arquivsticos? Em caso afirmativo,

    em que base terica isso se faria?

    Na verdade, a resposta a essa pergunta comeou a ser dada j no

    terceiro captulo desta pesquisa quando se abordou os conceitos de

    documento e informao a partir da Cincia da Informao e da Arquivologia.

    Por essa abordagem chegou-se materialidade e funcionalidade como

    pontos convergentes de ambas as reas no que tange s duas entidades

    conceituadas. Trata-se de conceitos fundamentais na medida em que se

    encontram estreitamente vinculados ao conceito de documento arquivstico e,

    consequentemente, ao conceito de documento arquivstico digital.

    E a resposta pergunta anteriormente formulada continuou sendo dada

    no captulo 4 desta pesquisa que trata da reassociao entre Arquivologia e

  • Diplomtica ocorrida a partir do sculo XX e incrementada com o advento dos

    documentos digitais. Na ocasio demonstrou-se o carter complementar

    dessas duas reas o qual aqui reiterado pelas seguintes palavras de Duranti

    e Thibodeau (2008, p. 404): [...] enquanto a teoria diplomtica examina os documentos arquivsticos enquanto itens, possibilitando a identificao das caractersticas desses mesmos documentos, a teoria arquivstica, ao tratar os documentos aquivsticos enquanto partes de agregaes, examina suas relaes com outros documentos arquivsticos, com as pessoas envolvidas na sua produo e com as atividades no curso das quais eles so produzidos e usados.

    Assim que o captulo que ora iniciamos se insere no contexto

    conceitual hierrquico a que nos referimos algumas vezes. Esse contexto

    comea com os conceitos de documento e informao a partir da Cincia da

    Informao e da Arquivologia, passa pelo conceito de documento arquivstico e

    culmina com o conceito de documento arquivstico digital ao qual ser aplicada

    a anlise diplomtica. Com isso queremos reiterar o importante papel da

    Cincia da Informao nas bases conceituais desta tese ao mesmo tempo em

    que ressaltamos o carter eminentemente arquivstico, em parceria com a

    Diplomtica, do presente captulo.

    H que registrar ainda que o captulo em questo ser

    predominantemente desenvolvido com base na vasta literatura produzida no

    mbito dos estudos e projetos sobre gesto e preservao de documentos

    arquivsticos digitais, desenvolvidos pela School of Library, Archives and

    Information Studies da University of British Columbia (UBC), em Vancouver,

    Canad, especialmente do Projeto InterPARES (International research on

    Permanent Authentic Records in Electronic Systems, ou, Pesquisa

    Internacional sobre Documentos Arquivsticos Permanentes em Sistemas

    Eletrnicos).

    O Projeto InterPARES tem por objetivo desenvolver o conhecimento

    essencial para a preservao permanente de documentos arquivsticos

    autnticos produzidos e/ou mantidos em meio digital. Iniciado em 1999, j

    concluiu duas fases: o InterPARES 1, desenvolvido entre os anos de 1999 e

    2001 e o InterPARES 2, que se estendeu de 2002 a 2007. A terceira etapa,

    InterPARES 3, foi iniciada em 2007 e tem concluso prevista para 2012.

    O referido projeto foi precedido por um outro intitulado A Proteo da

    Integridade de Documentos Arquivsticos Eletrnicos63, desenvolvido entre os

    anos de 1994 e 1997, o qual, por sua vez, teve sua origem nos estudos e

    artigos de Duranti conforme consta no subitem 4.1 desta pesquisa, relativo

    Diplomtica.

    Ambos os projetos, elaborados com base na associao dos

    fundamentos da Arquivologia com os da Diplomtica, resultaram numa

    literatura de grande consistncia epistemolgica, o que, no nosso

    entendimento, justifica a predominncia da mesma no desenvolvimento deste

  • captulo. Em que pese tal predomnio, registramos no presente captulo, a

    utilizao tambm das fontes produzidas pela Cmara Tcnica de Documentos

    Eletrnicos, em especial do seu glossrio.

    H que ressaltar que, doravante, sempre que nos referirmos

    Arquivologia e Diplomtica, estaremos considerando ambas as reas a partir

    da associao dos seus fundamentos.

    Comecemos, pois, a traar o caminho proposto a partir do conceito de

    documento arquivstico digital.

    6.1 DOCUMENTO ARQUIVSTICO DIGITAL, o que ?

    O desenvolvimento do presente item requer, em primeiro lugar, que se

    reapresente um dos conceitos de documento no mbito da Arquivologia

    apresentado no subitem 3.1.2.2 desta pesquisa sobre esse mesmo assunto.

    Assim, segundo Duranti e Preston (2008, p. 811), e com base na Diplomtica,

    documento : uma unidade indivisvel de informao constituda por uma

    mensagem fixada num suporte (registrada), com uma sinttica estvel. Um

    documento tem forma fixa e contedo estvel.

    Isto posto, vejamos o que vem a ser um documento digital. Segundo a

    CMARA TCNICA DE DOCUMENTOS ELETRNICOS (2011), grifo nosso,

    documento digital um documento codificado em dgitos binrios,

    interpretvel por meio de sistema computacional

    Neste momento, julgamos oportuno esclarecer que embora o termo

    documento eletrnico seja preferencialmente utilizado na literatura arquivstica

    internacional em detrimento do termo documento digital, no mbito desta

    pesquisa adotaremos este ltimo. Isto porque, em que pese a consagrao dos

    dois termos como sinnimos, tecnicamente h diferena entre ambos. Assim,

    segundo a Cmara Tcnica de Documentos Eletrnicos (2011), documento

    eletrnico um documento codificado em forma analgica ou em dgitos

    binrios, acessvel por meio de um equipamento eletrnico. Em outras

    palavras, pode-se dizer que todo documento digital eletrnico, mas nem todo

    documento eletrnico digital. Um exemplo seria uma fita cassete cujo som,

    embora necessite de um equipamento eletrnico para ser ouvido, no se

    apresenta codificado em bits.

    De posse dos conceitos de documento e de documento digital,

    consideremos agora um conceito de documento arquivstico, mais

    precisamente o da CMARA TCNICA DE DOCUMENTOS ELETRNICOS

    (2011), grifo nosso j apresentado no item 5.3 desta pesquisa. Segundo a

    referida Cmara, documento arquivstico o documento produzido e/ou

    recebido por uma pessoa fsica ou jurdica, no decorrer das suas atividades,

    qualquer que seja o suporte64.

    64 H que esclarecer que a escolha do conceito de documento arquivstico da Cmara Tcnica de Documentos Eletrnicos para compor este captulo, se deve exclusivamente ao objeto de

  • E uma vez munidos dos conceitos acima, podemos finalmente,

    apresentar o conceito de documento arquivstico digital o qual, ainda segundo a

    CMARA TCNICA DE DOCUMENTOS ELETRNICOS (2011), grifo nosso,

    o documento arquivstico codificado em dgitos binrios, produzido, tramitado e

    armazenado por sistema computacional.

    D-se, pois, que o conceito em questo formulado a partir da juno

    dos conceitos de documento, documento arquivstico e documental digital.

    Assim, em outras palavras, podemos dizer que o documento arquivstico digital

    um documento, isto , uma unidade indivisvel de informao constituda por

    uma mensagem fixada num suporte (registrada), com uma sinttica estvel

    [...], [...] produzido e/ou recebido por uma pessoa fsica ou jurdica, no

    decorrer das suas atividades [...], [...] codificado em dgitos binrios e

    interpretvel por um sistema computacional, em suporte magntico, tico ou

    outro.

    E uma vez apresentado o conceito de documento arquivstico digital,

    passemos anlise dessa entidade.

    6.2 DOCUMENTO ARQUIVSTICO DIGITAL: caractersticas e partes

    constituintes segundo a Diplomtica

    Do ponto de vista da Diplomtica o documento arquivstico digital,

    exatamente como o seu correlato em papel, apresenta as seguintes

    caractersticas: forma fixa, contedo estvel, relao orgnica, contexto

    identificvel, ao e o envolvimento de cinco pessoas: autor, redator,

    destinatrio, originador e produtor. H que ressaltar que dentre essas cinco

    pessoas, pelo menos as trs primeiras tm que estar presentes num

    documento arquivstico (MACNEIL e colaboradores, 2005; DURANTI;

    THIBODEAU, 2008; DURANTI, 2009 b; DURANTI, 2010).

    Passemos, pois, analise dessas caractersticas.

    Em relao forma fixa e ao contedo estvel, significam que o

    documento arquivstico digital tem que manter a mesma apresentao que

    tinha quando salvo pela primeira vez. Est-se, pois, falando da estabilidade

    do documento arquivstico digital a qual se encontra presente no conceito de

    documento arquivstico de maneira implcita e explcita, conforme se considere

    sua conotao arquivstica ou diplomtica. Assim, conforme visto no item 5, do

    ponto de vista arquivstico, a estabilidade se encontra implcita no conceito de

    documento arquivstico na medida em que este predominantemente

    identificado como documento e no como simples dado ou informao. J do

    ponto de vista diplomtico, e a destacamos o subitem 5.2.2, a estabilidade se

    encontra explcita j que esse documento que se constitui no documento

    estudo da referida Cmara, ou seja, os documentos digitais. Nesse contexto, tal conceito se configura como representativo do que foi estudado no item 5 desta pesquisa.

  • arquivstico, entendido como informao registrada num suporte (DURANTI;

    THIBODEAU, 2008).

    A questo da forma fixa e do contedo estvel ser aprofundada

    oportunamente.

    No que diz respeito relao orgnica, trata-se de mais uma

    caracterstica eminentemente arquivstica e que se encontra implcita no

    conceito de documento arquivstico, na medida em que, de acordo com esse

    conceito, os documentos se constituem em registros de atividades e,

    consequentemente, mantm um vnculo inextricvel entre si. No caso do

    documento arquivstico digital, essa vinculao se d entre documentos dentro

    e fora do sistema, isto , nos chamados ambientes hbridos os quais se

    caracterizam por abranger documentos digitais e no digitais ao mesmo tempo

    (DURANTI; THIBODEAU, 2008).

    Quanto ao contexto identificvel, trata-se de uma hierarquia de

    estruturas fora do documento arquivstico na qual se d sua produo e gesto.

    Esta caracterstica ser retomada mais adiante.

    No caso da ao, esta se refere ao fato do documento arquivstico

    participar ou simplesmente apoiar uma ao, significando que sua produo

    pode ser obrigatria ou facultativa. De acordo com o Duranti Preston (2008, p.

    796), ao sinnimo de ato o qual definido como O exerccio consciente da

    vontade, por uma pessoa, com o intuito de produzir, manter, modificar ou

    extinguir situaes.

    Finalmente, um documento arquivstico caracterizado pelo

    envolvimento no seu processo de produo das cinco pessoas anteriormente

    identificadas as quais se constituem nos elementos intrnsecos da forma do

    documento arquivstico, tema que tambm ser aprofundado oportunamente.

    H que registrar que enquanto as caractersticas de contexto e ao

    podem ser deduzidas do conceito de documento arquivstico, isto , esto ali

    implcitas, as pessoas envolvidas, so eminentemente oriundas da Diplomtica,

    sendo [...] consideradas importantes para se distinguir documentos

    arquivsticos de objetos digitais resultantes de simples consultas a bases de

    dados (DURANTI; THIBODEAU, 2008, p. 407, nota 6).

    D-se, pois, que as caractersticas ora apresentadas se aplicam a

    documentos arquivsticos digitais e no digitais, segundo pressuposto da

    Diplomtica e da Arquivologia. Da mesma forma, e agora com base

    exclusivamente na Diplomtica, entende-se que os documentos arquivsticos

    digitais, exatamente como os no digitais, se constituem de determinadas

    partes as quais, nos digitais, so as seguintes: forma documental, anotaes,

    contexto, suporte, atributos e componentes digitais.

    Em relao forma documental, trata-se de regras de representao de

    acordo com as quais o contedo de um documento arquivstico, seu contexto

    administrativo e documental, e sua autoridade so comunicados (DURANTI;

    PRESTON, 2008, p. 811). Essa forma documental possui elementos

    intrnsecos e extrnsecos.

  • No que tange aos elementos intrnsecos, estes se referem composio

    interna do documento arquivstico, isto , sua articulao, e transmitem a

    ao da qual esse documento participa bem como o contexto que o permeia.

    Entre os elementos intrnsecos de um documento arquivstico digital esto:

    cinco pessoas (autor, redator, destinatrio, originador e produtor), data

    cronolgica, data tpica, indicao e descrio da ao ou assunto e atestao

    do documento (MACNEIL, 2000; DURANTI; THIBODEAU, 2008). Definamos

    cada um deles;

    autor: pessoa fsica ou jurdica que tem autoridade e competncia

    para emitir o documento arquivstico ou em cujo nome ou sob cujo comando o

    documento foi emitido (DURANTI; PRESTON, 2008, p, 801);

    redator: pessoa que tem autoridade e competncia para articular o

    contedo do documento arquivstico (DURANTI; PRESTON, 2008, p. 843);

    destinatrio: pessoa para quem o documento arquivstico

    direcionado ou para quem se destina (DURANTI; PRESTON, 2008, p. 796);

    originador: pessoa designada no endereo eletrnico no qual o

    documento arquivstico foi gerado (isto , do qual enviado ou onde

    compilado ou mantido) (DURANTI; PRESTON, 2008, p. 827);

    produtor: pessoa a cujo fundo ou arquivo o documento pertence

    (DURANTI, 2010).

    data cronolgica: data (e, possivelmente a hora) de um documento

    arquivstico, includa no documento por seu autor, ou pelo sistema eletrnico

    em nome do autor, no decorrer da sua elaborao (DURANTI; PRESTON,

    2008, p. 804);

    data tpica: o lugar da elaborao de um documento arquivstico,

    includo no documento por seu autor (DURANTI; PRESTON, 2008, p. 841);

    indicao e descrio da ao ou assunto: a identificao do

    assunto (linha de assunto) e o teor propriamente dito do documento (DURANTI,

    2005, p. 195) e

    atestao: [...] validao escrita de um documento arquivstico [...]

    por parte daqueles que participam da sua emisso (autor, redator,

    autenticador) bem como por testemunhas da ao ou da assinatura do

    documento (DURANTI; PRESTON, 2008, p. 800-801). Assim, em mensagens

    de correio eletrnico (emails), por exemplo, o nome do remetente que aparece

    no alto da mensagem, se constitui em uma atestao.

    Os elementos extrnsecos da forma de um documento arquivstico digital

    constituem a aparncia desse documento. Exemplos desses elementos so:

    caractersticas de apresentao geral (texto, imagem, som, grfico);

    caractersticas de apresentao especfica (layout, hiperlinks, cor, resoluo de

    arquivo de imagem, escala de mapa, sinal de indicao de anexo); assinatura

    eletrnica como, por exemplo, a assinatura digital; sinais especiais como, por

    exemplo, marca dgua e logomarcas) (DURANTI; THIBODEAU, 2008);

    (DURANTI, 2005);

  • Passemos agora anlise de uma outra parte do documento arquivstico

    digital, ou seja, as anotaes.

    Anotaes so Acrscimos feitos ao documento arquivstico aps a sua

    produo (DURANTI; THIBODEAU, 2008, p. 409, nota 13). Compreendem trs

    grupos fundamentais:

    1. acrscimos feitos ao documento arquivstico no mbito da sua

    transmisso como, por exemplo, indicao de prioridade (urgente), data da

    elaborao e da transmisso, indicao de anexos;

    2. acrscimos feitos no curso das atividades das quais o documento

    arquivstico participa como, por exemplo, data e hora do recebimento,

    providncias tomadas e

    3. acrscimos prprios da gesto arquivstica como cdigo de

    classificao, data do arquivamento.

    E na seqncia da apresentao das partes constituintes do documento

    arquivstico, chegamos ao contexto o qual definido pela Cmara Tcnica de

    Documentos Eletrnicos (2011) como o ambiente em que ocorre a ao

    registrada no documento. Nesse sentido, o contexto se caracteriza por mudar

    o foco da anlise do documento em si para a estrutura que o permeia. Trata-se,

    na verdade, de uma hierarquia de estruturas que vai do geral para o especfico.

    Nessa hierarquia so identificados os seguintes tipos de contexto (CMARA

    TCNICA DE DOCUMENTOS ELETRNICOS, 2011):

    contexto jurdico-administrativo: refere-se a leis e normas externas

    instituio produtora de documentos as quais controlam a conduo das

    atividades dessa mesma instituio;

    contexto de provenincia: refere-se a organogramas, regimentos e

    regulamentos internos que identificam a instituio produtora de documentos;

    contexto de procedimentos: refere-se a normas internas que

    regulam a criao, tramitao, uso e arquivamento dos documentos da

    instituio;

    contexto documental: refere-se a cdigo de classificao, guias,

    ndices e outros instrumentos que situam o documento dentro do conjunto a

    que pertence, ou seja, ao fundo e

    contexto tecnolgico: refere-se ao ambiente tecnolgico (hardware,

    software e padres) que envolve o documento.

    No que diz respeito ao suporte, esta parte constituinte do documento

    arquivstico digital definida pela CMARA TCNICA DE DOCUMENTOS

    ELETRNICOS, (2011) como a base fsica sobre a qual a informao

    registrada.

    At o advento do documento digital, o suporte (tablete de barro, madeira,

    papiro, pergaminho ou papel) se constitua em um dos elementos extrnsecos

    do documento arquivstico, sendo a relao entre ambos considerada

    indissocivel.

    Assim, o exame do suporte sempre constou da anlise diplomtica dos

    documentos. De acordo com Duranti (1998, p. 135) esse tipo de anlise era

  • muito importante para os documentos medievais porque tornava possvel dat-

    los, estabelecer sua provenincia e testar sua autenticidade. Num exemplo

    fornecido por MacNeil e colaboradores (2005, p. 27, nota 18), esta relata que

    [...] um diploma real de Childebert I (Rei da Frana, sculo VI), escrito em

    pergaminho ao invs de em papiro, era considerado falso, isto porque quela

    poca o papiro ainda era o suporte predominante. A mesma autora acrescenta

    que

    O suporte tambm fornece evidncia da maneira na qual documentos

    medievais eram preparados. Os documentos da Chancelaria alem tm muitas

    rasuras e correes em comparao com documentos da chancelaria papal,

    indicando menor grau de cuidado e acurcia na preparao dos documentos

    finais.

    Duranti (1998, p. 135) nos adverte para o fato de que a importncia do

    suporte na anlise diplomtica comeou a se perder a partir do momento em

    que [...] os escritrios passaram a ser supridos de materiais industriais que

    atendiam a um grande nmero de clientes [...], ou seja, todos passaram a usar

    o mesmo tipo de suporte em papel. Entretanto, em que pese essa realidade,

    documento e papel continuavam sendo indissociveis. A mudana radical veio

    mesmo com o avento do documento digital na media em que nesse tipo de

    documento

    [...] (1) suporte e mensagem j no esto mais inextricavelmente unidos;

    (2) o que est escrito ou afixado no suporte no o documento em si (palavras

    ou imagens) mas uma cadeia de bits; (2) a escolha de um suporte pelo

    produtor ou mantenedor do documento sempre arbitrria e no

    carrega nenhum significado em particular (MACNEIL e colaboradores,

    2005, p. 27).

    Assim que, em relao aos documentos arquivsticos digitais, o

    suporte deixa de ser um dos elementos extrnsecos do documento arquivstico

    digital e passa a integrar seu contexto tecnolgico, mais especificamente o item

    hardware.

    Tomemos agora o chamado atributo do documento arquivstico digital o

    qual se constitui numa caracterstica definidora do documento arquivstico ou

    de seu elemento (DURANTI; PRESTON, 2008, p. 832). Assim, por exemplo,

    enquanto o autor um elemento intrnseco do documento arquivstico, o nome

    desse autor o atributo pelo qual esse documento diferenciado dos demais.

    Outros exemplos seriam: nome do destinatrio, data e hora da transmisso do

    documento etc. H que esclarecer que nem sempre os atributos de um

    documento arquivstico digital so aparentes. Ao contrrio, na maioria das

    vezes encontram-se ocultos em forma de metadados. Exemplos seriam

    formato do documento, informaes relativas a direitos autorais etc.

    Finalmente abordemos uma parte constituinte do documento arquivstico

    que se aplica somente sua apresentao digital. Trata-se do chamado

    componente digital.

  • Consideremos primeiramente o fato de que um documento digital,

    arquivstico ou no, exibido numa tela de computador muda completamente a

    partir do momento em que o salvamos, ou fechamos. Isto porque nesse

    momento, o documento deixa de ser compreensvel aos olhos humanos para

    se transformar numa cadeia de bits (bit strings). Cada vez que esse documento

    chamado tela de novo, um mecanismo acionado no qual a cadeia de bits

    processada por um software que a transforma no documento passvel de

    leitura e compreenso. Dito de outra maneira: ao digitarmos um texto, este

    codificado em dgitos binrios (0 1) por um software ou sequncia de

    software (Word, ASCII, por exemplo); o conjunto desses dgitos forma uma

    cadeia de bits; essa cadeia decodificada pelo mesmo software ou seqncia

    de software, permitindo que o documento seja apresentado na tela do

    computador. Por tudo isso, deduzimos que no possvel manter um

    documento digital exatamente como o vemos, a no ser que o imprimamos e,

    nesse caso, ele deixaria de ser digital. O que se pode manter a capacidade

    de reproduzir o documento sempre que necessrio.

    Trata-se, pois, de uma realidade dinmica inerente prpria natureza do

    documento digital pela qual este possui uma forma manifestada, isto , aquela

    que visvel ao usurio, qual corresponde uma codificao digital. Tal

    codificao se traduz em cadeias de bits inscritas num suporte magntico ou

    tico. As cadeias de bits se constituem nos chamados componentes digitais os

    quais compreendem dados que determinam a forma do documento e os que

    definem seu contedo. H ainda um terceiro grupo de dados que so aqueles

    que regulam o processamento dos dois primeiros, quando necessrio, bem

    como os metadados relacionados ao documento. So os chamados dados de

    composio. Assim que um componente digital pode conter dados de forma

    e/ou de contedo e/ou de composio. Consideremos os seguintes exemplos:

    um relatrio em Word possui um componente digital que, por sua vez, contm

    dados de forma (a aparncia do documento) e dados de contedo (o teor do

    documento). Quanto aos dados de composio, estes no se fazem

    necessrios j que, neste caso, o documento manifestado, isto , o relatrio

    que aparece na tela, possui apenas um componente digital com dados de

    forma e de contedo. Num outro exemplo, uma pgina Web pode conter vrios

    componentes digitais: um com o layout da pgina (dados de forma) e outros

    com os diversos textos e imagens (dados de contedo). Nesse caso o mesmo

    componente do lay out contm tambm os dados de composio (DURANTI;

    THIBODEAU, 2008; DURANTI 2009 b; 2010).

    O tema componentes digitais sugere que se faa um esclarecimento

    quanto relao entre documento arquivstico digital e arquivo digital, j que,

    em geral, um confundido com o outro. Na verdade trata-se de duas entidades

    distintas mas relacionadas. Essa relao pode se dar da seguinte maneira:

    relatrio em Word e seu arquivo tambm em Word;

  • Exemplo: um

    relatrio em Word com anexos em Tiff e Power point;

    um relatrio em Word, um mapa em Autocad e um fotografia em Tiff, ou seja,

    trs documentos arquivsticos distintos, encapsulados em um nico arquivo em

    Pdf e

    Exemplo: base de dados 65.

    O tema componente digital ser retomado mais adiante. Por hora

    importa registrar que, no mbito da Diplomtica, se trata de uma das partes do

    documento arquivstico em formato digital.

    Finalizemos o presente item recapitulando o que foi apresentado por

    meio do diagrama que se segue.

    DOCUMENTO ARQUIVSTICO DIGITAL: caractersticas e partes constituintes segundo a Diplomtica

    Caractersticas: forma fixa, contedo estvel, relao orgnica, contexto identificvel, ao e cinco pessoas (autor, redator, destinatrio, originador e produtor) Partes constituintes: forma documental, anotaes, contexto, suporte, atributos e componentes digitais . Forma documental: elementos intrnsecos e extrnsecos

    . elementos intrnsecos: cinco pessoas (autor, redator, destinatrio, originador e produtor), data cronolgica, data tpica, indicao e descrio da ao ou assunto e atestao; . elementos extrnsecos: . apresentao geral: texto, imagem, som, grfico . apresentao especfica: layout, cor, hiperlink, indicao de anexo . outros: assinatura digital; marcas dgua, logomarca etc. . Anotaes: indicao de prioridade (urgente), data e hora do envio e do recebimento, indicao de anexo etc. . Contexto: jurdico administrativo, de provenincia, de procedimentos,

    documental e tecnolgico. . Atributos: nome do autor, do destinatrio, formato, direitos autorais etc. Obs.: na maioria das vezes os atributos encontram-se expressos em metadados. . Componentes digitais: dados de forma, de contedo e de composio Autoria: Rosely Curi Rondinelli

    65 Segundo a Cmara Tcnica de Documentos Eletrnicos, base de dados o conjunto de dados estruturados, com as respectivas regras de acesso, formatao e validao, e gerenciados por um Sistema Gerenciador de Banco de Dados SGBD. A mesma Cmara define um Sistema Gerenciador de Banco de Dados como um software que implementa o banco de dados e permite a realizao de operaes de manipulao de dados (incluso, alterao, excluso, consulta) e administrativas (gesto de usurios, cpia e restaurao de dados, alteraes no modelo de dados).

  • Nesse momento julgamos oportuno ressaltar que a apresentao das

    caractersticas e partes constituintes do documento arquivstico digital ora

    efetuada no deve sugerir um entendimento estanque dos mesmos. Isto

    porque caractersticas e partes se interpem e se movem entre si de tal

    maneira que o que caracterstica pode ser tambm parte e o que elemento

    da forma tambm pode ser atributo. No caso da forma fixa e contedo estvel

    (caractersticas), por exemplo, estes podem se inserir tanto no contexto

    tecnolgico como no de procedimentos (partes). Da mesma forma, a

    identificao do nome de um destinatrio (atributo) vincula-se ao elemento

    intrnseco destinatrio (elemento da forma).

    Um outro aspecto a ser ressaltado que um documento no tem que

    conter todos os elementos da forma documental para ser arquivstico. Na

    verdade, todo documento que se adeque ao conceito de documento

    arquivstico, se constitui de fato num documento dessa natureza mesmo que

    incompleto no tocante a seus elementos intrnsecos e extrnsecos. Nesse caso

    teramos o que Duranti e Thibodeau (2008, p. 404, nota 3) classificam como

    mau documento arquivstico, ou seja, um documento que, em que pese sua

    baixa qualidade de forma, continua sendo arquivstico. Geoffery Yeo nos ajuda

    a entender melhor a questo quando relata o caso de um telegrama enviado

    por Victor Hugo ao editor de Les Miserables indagando sobre a situao das

    vendas dessa publicao. Segundo Yeo (2008, p.139) O telegrama continha apenas o sinal ?, mas, o editor entendeu que Hugo estava perguntando o quanto o livro estava sendo vendido e enviou a resposta ! para indicar que as vendas eram excelentes.

    E Yeo conclui ressaltando que, a menos que uma informao contextual

    seja providenciada, usurios futuros tero muita dificuldade para entender

    esses telegramas, os quais ainda assim se constituem em documentos

    arquivsticos.

    Assim que, conforme estudado no captulo 3 desta pesquisa e aqui

    devidamente expressado no conceito da Cmara Tcnica de Documentos

    Eletrnicos, para ser de natureza arquivstica o documento tem que existir no

    mbito das atividades desempenhadas por pessoas fsicas ou jurdicas,

    independentemente de ser ou no completo no que tange aos seus elementos

    de forma. J em relao s suas caractersticas, estas se encontram latentes

    no prprio conceito em questo. Isto porque um documento dessa natureza

    implica necessariamente em ao, contexto, pessoas, interrelacionamento

    (relao orgnica), forma fixa e contedo estvel.

    Finalmente, h que se perguntar como, de fato, as caractersticas de

    forma fixa e contedo estvel, as quais do ponto de vista da Diplomtica so

    consideradas essenciais, se aplicam aos documentos arquivsticos digitais.

    Afinal, trata-se de documentos que primam por um dinamismo prprio dos

  • sistemas computacionais, o que, em princpio, no se ajusta a tais

    caractersticas.

    A questo pressupe que se aborde primeiramente os documentos

    digitais em geral, ou seja, no necessariamente os arquivsticos. o que nos

    propomos a fazer em seguida.