os siddhis no yogasutra
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OS SIDDHIS NO YOGASUTRA
Como resultado das primeiras formas do sabīja samādhi, samādhi “com suporte”, o praticante adquire a qualidade de conhecer áreas da Realidade que são habitualmente inacessíveis. Ao exercer saṁyama sobre um tema, o yogi assimila o siddhi, o poder inerente a essa manifestação.
Esses poderes são formas diferentes de relacionar-se com as leis naturais, que visam a estimular o sādhaka, desenvolvendo confiança para assim conhecer a liberação, mokṣa.
Patañjali dedica uma boa parte do capítulo III dos Sūtras à enumeração e descrição dos diferentes suportes sobre os quais é possível fazer saṁyama, e as perfeições derivadas dessas contemplações. Apresentamos aqui uma lista (incompleta) desses poderes, esperando não cansar o paciente leitor.
“Praticando a disciplina nas três formas de evolução obtém-se o conhecimento do passado e do futuro.
“O som, seu significado e a ideia correspondente se confundem devido à superposição. Praticando-se saṁyama sobre o som produzido por qualquer ser, se obtém o conhecimento da sua distinção.
“Pela percepção direta dos saṁskāras se conquistam os conhecimentos inerentes à sua herança cultural (jāti, “nascimento”).
“Por esse meio, se conhecem os pensamentos de outra pessoa.
“Mas não se pode obter essa percepção a menos que se apóie nos seus elementos materiais.
“O saṁyama realizado sobre o próprio corpo pode suspender a perceptibilidade visual da sua forma.
“O karma pode ser imediato ou retardado; praticando saṁyama sobre ele, pode-se prever o curso das ações, e até mesmo conhecer o momento da morte.
“Efetuando saṁyama, por exemplo, sobre a amizade (e outras virtudes) adquirem-se essas respectivas qualidades.
“Praticando saṁyama sobre a força de um elefante (ou outro animal), se obtém o seu poder.
“Aplicando saṁyama à luz, adquire-se o conhecimento das coisas sutis, ocultas ou remotas.
“Efetuando saṁyama sobre o Sol, adquire-se conhecimento do Universo.
“Praticando saṁyama sobre a Lua, obtém-se o conhecimento dos corpos celestes.
“Aplicando saṁyama sobre a Estrela Polar, adquire-se o conhecimento dos movimentos das estrelas.
“Efetuando saṁyama sobre o círculo do umbigo, obtém-se o conhecimento da constituição estrutural e funcional do corpo.
“Praticando saṁyama sobre a cavidade da garganta, consegue-se a cessação da fome e da sede.
“Aplicando saṁyama sobre kūrma nāḍī (canal kūrma), consegue-se a estabilidade do corpo.
“Mediante saṁyama sobre a luz que envolve a cabeça, adquire-se visão paranormal.
“Mediante saṁyama sobre a intuição, consegue-se todo tipo de conhecimento.
“Praticando saṁyama sobre o coração, obtém-se o conhecimento de chitta.
“A falta de discriminação entre sattva (inteligência, entendimento, equilíbrio) e Puruṣa leva a fundi-los, embora sejam inteiramente distintos um do outro. Aplicando saṁyama sobre essa distinção, alcança-se o conhecimento de Puruṣa.
“Então se começa a adquirir percepções paranormais através da intuição.”
Porém, o próprio autor adverte em seguida sobre o perigo que corre o yogi, que é ser seduzido por estes siddhis: “Esses poderes são obstáculos para alcançar o samādhi, embora sejam perfeições no conceito profano.”
Portanto, se o siddha, o detentor dos poderes, cair na tentação de usá-los ou brincar com eles de maneira irresponsável, perderá a possibilidade de atingir a libertação. Por isto, os poderes são um
poderoso estímulo à prática, mas são também uma perigosa cilada para o ego.
O sannyasin
Um dia meu instrutor de ásanas me levou à floresta para conhecer um velho saddhu que havia renunciado a tudo: família, casta, nome, propriedades, roupas, absolutamente tudo. Sua única posse era uma cuia que utilizava para comer e beber água. Imagine uma pessoa que só possui uma cuia e nada lhe faz falta!
Como ele falava inglês, pudemos comunicar-nos. Parecia ser um homem muito culto. Era um verdadeiro sábio. Em dado momento, percebi que no calor da conversa ele passava a frente da velocidade com que eu conseguia colocar as idéias em palavras e começara a responder minhas questões antes que as formulasse. Estava simplesmente lendo meus pensamentos.
Aproveitei para consultá-lo sobre os siddhis, pois no Brasil os ensinantes "da yóga" tinham tanto medo disso que o assunto virou tabu e não se podia, sequer, mencionar o assunto sem gerar violentas reações de protesto. Uns achavam perigoso. Outros declaravam que desenvolver os siddhis era censurável por motivos éticos.
- Isso é meramente uma questão de opinião. Há Mestres que são a favor dos siddhis uma vez que estes facilitam a vida do praticante e ainda lhe dão a convicção de que está obtendo progressos com a sua prática de Yôga. Outros Mestres são contra e opinam que tais progressos observáveis ocorrem só na área do psiquismo e que as verdadeiras conquistas estão muito além desses planos medianos.
Alguns Mestres - continuou - são a favor, pois nem se detêm a analisar a questão e encaram os siddhis com muita naturalidade. Pode haver, afinal, milagre maior do que o fenômeno da digestão, da reprodução, da vida em si? Diante de tais milagres da natureza, que notoriedade pode ter uma simples viagem astral? Outros são contra, já que os siddhis dispersam o interesse e a concentração dos discípulos para meros folguedos tais como levitar ou materializar objetos. Tais poderes são tão fúteis comparados com o samádhi, que muitos yôgis não lhes dão importância alguma, embora o leigo fique fascinado com a idéia. Outros despertam o siddhi da palavra, o do olhar, o da criatividade, o do carisma, que são mais importantes e produtivos do que levitar.
E concluiu:
- Se você quiser usar os seus siddhis, use-os. Mas jamais fale deles. Se alguém duvidar de que você os tenha e o desafiar a demonstrá-los, diga a essa
pessoa que ela pense o que quiser e que você não perde tempo com tais bobagens. É o que são: bobagens, úteis e fúteis a um só tempo.
Terminada a conversa, agradeci:
- Obrigado, sannyasin.
Mas ele me corrigiu categoricamente:
- Não sou sannyasin.
- Pensei que fosse, pois vejo que o senhor fez voto de sannyasa (renúncia) e desapegou-se de tudo...
Foi quando ele me deu a resposta contundente:
- De tudo, não: ainda tenho o meu ego.
Foi mesmo uma lição para aqueles pretensiosos ou iludidos que não renunciaram a nada e saem por aí alardeando-se sannyasins, só por terem-se convertido a alguma seita exótica.
Extraído do livro Quando é preciso ser forte, do Mestre DeRose
Siddhis são como luzes de velas
Vocês fazem todo tipo de coisas para chegar a esta estranha beleza do
silêncio. Não façam, apenas observem. Olhem, senhores, vocês sabem que
nisso tudo há vários poderes de clarividência, ler o pensamento de alguém.
Existem vários poderes, vocês sabem do que eu estou falando, não? Vocês os
chamam siddhis, não? Vocês sabem que todas essas coisas são como velas -
luz de velas ao sol? Quando não há sol, há escuridão, e então a luz de uma
vela é muito importante; mas quando há sol, a luz, a beleza, a claridade, então
todos esses poderes, esses siddhis são como luzes de velas. Eles não têm
valor, absolutamente. E quando você tem a luz, não há nada mais -
desenvolver vários centros, os chakras, kundalinis, vocês sabem, esse negócio
todo. Você precisa de uma mente sã, lógica, razoável, não de uma mente
estúpida. Uma mente embotada pode sentar-se por séculos respirando,
concentrando-se nos vários chakras, e vocês sabem todo esse jogo com
kundalinis - isso não pode nunca chegar àquilo que é atemporal, que é a real
beleza, verdade e amor.
Krishnamurti in India 1970-71, pp 180-181
Não é o caminho da meditação correta
E essa constante luta para tornar-se virtuoso, para adquirir virtude através da
disciplina, através da examinação cuidadosa de si mesmo, e assim por diante,
obviamente também não é meditação. A maioria de nós é pego nesses
processos, e como eles não proporcionam entendimento de nós mesmos, eles
não são a maneira da meditação correta. Afinal de contas, sem entender a si
mesmo, que base você tem para pensar corretamente? Tudo o que você vai
fazer sem o entendimento de si mesmo é conformar-se ao seu background, a
resposta do seu condicionamento. E tal resposta ao condicionamento não é
meditação. Mas estar ciente dessas respostas, ou seja, estar ciente dos
movimentos do pensamento e dos sentimentos sem qualquer senso de
condenação, para que os movimentos do ego, as maneiras do ego, sejam
entendidas - essa é a maneira da meditação correta. The Collected Works vol V, p 361
Meditação não é oração, nem é devoção
Oração obviamente produz resultados; ou milhões de pessoas não rezariam. E
ao rezar, obviamente a mente torna-se quieta; pela constante repetição de
certas frases, a mente torna-se quieta. E nessa quietude há uma certa
intimação, certas percepções, certas respostas. Mas isso ainda é uma parte do
truque da mente, porque afinal, através de uma forma de mesmerização você
pode deixar a mente muito quieta. E naquela quietude existem certas respostas
escondidas surgindo do inconsciente e de fora da consciência. Mas ainda
assim é um estado no qual não existe entendimento.
E meditação não é devoção - devoção a uma ideia, a uma figura, a um
princípio - porque as coisas da mente ainda são idólatras. Alguém pode não
idolatrar uma estátua, considerando-a idólatra e boba, supersticiosa; mas se de
fato idolatra, como a maioria das pessoas, as coisas na mente - e isso também
é idolatria. E ser devotado a uma figura ou ideia, a um Mestre, não é
meditação. Obviamente, é uma forma de fuga de si mesmo. É uma fuga muito
confortável, mas ainda é uma fuga. The Collected Works vol V, p 361
Meditação não é uma repetição de palavras
Meditação é uma maneira de viver, não uma fuga da vida. Obviamente a
meditação não é ter experiências de visões ou ter estranhas experiências
místicas; como vocês sabem, você pode tomar uma droga que expandirá a sua
mente, ela produzirá algumas reações químicas, que tornarão a mente
altamente sensível e naquele estado sensível você pode ver coisas
aumentadas, ainda que de acordo com o seu condicionamento. E meditação
não é uma repetição de palavras. Vocês sabem, tem havido uma moda
ultimamente de alguém lhe dar uma palavra, uma palavra em sânscrito, você
fica repetindo aquela palavra e por isso espera atingir alguma experiência
extraordinária - o que é uma bobagem total. Logicamente, se você ficar
repetindo um monte de palavras sua mente torna-se amortecida e, portanto
quieta; mas isso absolutamente não é meditação. Talks & Dialogues Saanen 1968, p 94
O alicerce de uma vida justa
Meditação é trabalho duro. Ela demanda a mais alta forma de disciplina - não
conformidade, não imitação, não obediência - mas uma disciplina que vem
através da constante sensibilização, não apenas das coisas externas, mas
também internas. Assim, a meditação não é uma atividade de isolamento, mas
sim uma atividade na vida cotidiana que demanda cooperação, sensibilidade e
inteligência. Sem lançar o alicerce de uma vida justa, a meditação torna-se
uma fuga e consequentemente não tem qualquer valor. Uma vida justa não
significa seguir a moralidade social, mas sim a liberdade da inveja, ganância e
busca por poder – os quais geram discórdia. A liberdade dessas coisas não
vem através da atividade da vontade, mas por estar ciente delas através do
autoconhecimento. Sem conhecer as atividades de si mesmo, a meditação se
torna excitação dos sentidos e logo, de muito pouca significância.
Meditations, p 6
A explosão da meditação
O pensamento estilhaçando-se contra sua própria insignificância é a explosão
da meditação.
Krishnamurti’s Notebook, p 166
Meditação... a própria investigação sobre o que é meditação
Meditação não é um processo de aprender como meditar; é a própria
investigação sobre o que é meditação. Para investigar o que é meditação, a
mente deve livrar-se do que ela aprendeu sobre meditação, e o libertar-se da
mente daquilo que ela aprendeu é o início da meditação.
The Collected Works vol IX, p 192
Pondo sua casa em ordem
Entender o relacionamento, o medo, o prazer e a tristeza é trazer ordem à
nossa casa. Sem ordem não é possível meditar. Agora, o orador põe a
meditação no fim das palestras porque não há possibilidade de meditar
corretamente se você não pôs a sua casa, sua casa psicológica, em ordem. Se
a casa psicológica está em desordem, se o que você é está em desordem, qual
é o sentido de meditar? É apenas uma fuga. Isso leva a todos os tipos de
ilusões. The Network of Thought, p 96
O que impede o insight
É surpreendentemente belo e interessante como o pensamento está ausente
quando você tem um insight. O pensamento não consegue ter um insight.
Somente quando a mente não está funcionando mecanicamente na estrutura
do pensamento é que você tem um insight. Tendo tido um insight, o
pensamento tira uma conclusão desse insight. E então o pensamento age, e o
pensamento é mecânico. Tenho portanto de descobrir se ter um insight de
mim, o que significa do mundo, e não tirar uma conclusão dele, é possível. Se
eu tirar uma conclusão, eu ajo sobre uma ideia, sobre uma imagem, sobre um
símbolo, que é a estrutura do pensamento, e portanto estou constantemente
me impedindo de ter um insight, de entender as coisas como elas são.
On Mind and Thought, p 34
Insight que ocasiona uma mutação nas células cerebrais
O insight não é uma questão de memória, de conhecimento e tempo, os quais
são todos pensamento. Eu diria então que insight é a ausência total de todo o
movimento do pensamento como tempo e lembrança. Há portanto percepção
direta. É como se eu estivesse indo para o Norte nos últimos dez mil anos, e
meu cérebro estivesse acostumado a ir para o Norte, e alguém chega e diz que
isso não me levará a nenhum lugar, que eu devo ir para o Leste. Quando dou
meia-volta e vou para o Leste as células cerebrais mudaram. Porque eu tive
um insight de que o Norte não leva a lugar nenhum.
Vou explicar de outra maneira. O movimento total do pensamento, que é
limitado, está agindo agora em toda a parte do mundo. É a ação mais
importante, nós somos conduzidos pelo pensamento. Mas o pensamento não
solucionará nenhum de nossos problemas, exceto os tecnológicos. Se eu vir
isso, eu parei de ir para o Norte. Eu penso que com o término de uma certa
direção, o término de um movimento que tem acontecido durante milhares de
anos, há nesse momento um insight que ocasiona uma mudança, uma
mutação, na célula cerebral.Questioning Krishnamurti, p 165
O primeiro passo é o último passo
... O primeiro passo é o último passo. O primeiro passo é perceber, perceber o
que você está pensando, perceber sua ambição, perceber sua ansiedade, sua
solidão, seu desespero, esta extraordinária sensação de dor, percebê-la, sem
qualquer condenação, justificação, sem desejar que fosse diferente. Somente
percebê-la, como ela é. Quando você a percebe como é, há então um tipo de
ação totalmente diferente acontecendo, e essa ação é a ação final. Certo? Isto
é, quando você percebe algo como sendo falso ou como sendo verdadeiro,
essa percepção é a ação final, que é o passo final. Agora ouça isso. Eu
percebo a falsidade de seguir alguém, a instrução de outro - Krishna, Buda,
Cristo, não importa quem seja. Vejo que existe a percepção da verdade que
seguir alguém é absolutamente falso. Porque sua razão, sua lógica e tudo mais
mostram quão absurdo é seguir alguém. Agora essa percepão é o passo final,
e quando você tiver percebido, você abandona isso, esquece-o, porque no
minuto seguinte você tem de perceber novamente, o que é de novo o passo
final. Krishnamurti in India 1970-71, p 50
A mente que está vazia de todo o seu passado
Você deve então fazer esta pergunta, questionar-se, se sua mente pode estar
vazia de todo o seu passado e apesar disso reter o conhecimento tecnológico,
seu conhecimento sobre engenharia, seu conhecimento linguístico, a memória
de tudo isso, e contudo funcionar a partir de uma mente que está
completamente vazia. O esvaziamento dessa mente acontece naturalmente,
docemente sem convite, quando você entende a si próprio, quando você
entende o que você é. O que você é é a memória, um feixe de memórias,
experiências, pensamentos. Quando você entender isso, olhe para isso,
observe isso; e quando você o observar, veja nessa observação que não há
dualidade entre o observador e o observado; então, quando você vir isso, verá
que sua mente pode ficar completamente vazia, atenta, e nessa atenção você
pode agir completamente, sem qualquer fragmentação.
Krishnamurti in India 1970-71, p 56
O que é a consciência?
A consciência não é um compromisso com qualquer coisa. A consciência é
uma observação, quer exterior quer interior, em que a direção parou. Você tem
consciência, mas a coisa de que tem consciência não está sendo encorajada
nem alimentada. A consciência não é concentração em qualquer coisa. Não é
um ato de vontade que escolhe que vai ter consciência, e analisa para obter
certo resultado. Quando a consciência é deliberadamente focada num objeto
em particular, como um conflito, esse é o ato da vontade que é concentração.
Quando você se concentra, isto é, põe toda sua energia e pensamento dentro
das suas fronteiras que escolheram, quer seja ler um livro ou olhar a sua raiva
– então, nesta exclusão, a coisa sobre a qual você se concentra é reforçada,
alimentada. Então aqui temos que perceber a natureza da consciência: Temos
que entender do que estamos falando quando usamos a palavra consciência.
Urgency of Change, The
Desatenção e Atenção
Existem os estados de desatenção e de atenção. Quando você estiver dando
completamente a sua mente, seu coração, seus nervos, tudo o que tem para
prestar atenção, então os velhos hábitos, as respostas mecânicas, não
aparecem, o pensamento não se insere nisso. Mas não podemos manter isso
todo o tempo, portanto estamos quase sempre num estado de desatenção,
num estado em que não há uma consciência atenta sem escolha. O que
acontece? Há desatenção e pouca atenção e estamos tentando fazer uma
ponte entre uma e outra. Como pode a minha desatenção tornar-se atenção
ou, pode a atenção ser completa, todo o tempo?
Talks and Dialogues Saanen 1968
Concentração implica em reduzir nossa energia
Você sabe o que é concentração - desde a infância nós somos treinados a
concentrar-nos. Concentração é reduzir toda nossa energia a um determinado
ponto e segurá-la neste ponto. Um garoto na escola olha pela janela para os
pássaros e as árvores, para o movimento das folhas ou para um esquilo
subindo na árvore. E o professor diz: "Você não está prestando atenção,
concentre-se no livro", ou "Escute o que eu estou dizendo".
Isso é para dar muito mais importância à concentração do que à atenção. Se
eu fosse o professor, eu o ajudaria a observar; eu o ajudaria a observar este
esquilo por completo; observar o movimento do rabo, como suas garras se
movem, tudo. Então, se ele aprende a observar com atenção, ele prestará
atenção ao livro.Questions and Answers, p 43
Atenção não é concentração
Atenção não é concentração. Quando você se concentra, como a maioria das
pessoas tenta fazer - o que acontece quando você está se concentrando? Você
está se isolando, resistindo, afastando todo pensamento, exceto aquele
determinado pensamento, aquela determinada ação. Assim, sua concentração
gera resistência, e, portanto a concentração não traz liberdade. Por favor, isto é
muito simples se você observar a si mesmo. Mas desde que você esteja
atento, atento a tudo o que está acontecendo com você, atento à sujeira, à
imundície da rua, atento ao ônibus que está sujo, atento a suas palavras, seus
gestos, à maneira como você fala com seu chefe, à maneira como você fala
com seus funcionários, seu superior, seu subalterno, o respeito, a
insensibilidade com aqueles que estão abaixo de você, as palavras, as ideias -
se você estiver atento a tudo isso, não corrigindo, então nessa atenção você
pode conhecer um tipo diferente de concentração. Você estará então cônscio
da paisagem, do barulho das pessoas, pessoas conversando ali no telhado,
você tentando abafa-las, pedindo a elas para não falarem, virando sua cabeça;
você estará cônscio das diversas cores, as roupas e mesmo assim a
concentração continua. Esse tipo de concentração não é exclusivo, nela não há
esforço. Ao passo que a mera concentração exige esforço. The Collected Works vol XV, p 321
Diferença entre concentração e atenção
Há uma diferença entre concentração e atenção. Concentração é trazer toda
sua energia para focá-la em um ponto determinado. Na atenção não existe um
ponto de foco. Nós estamos familiarizados com um e não com o outro. Quando
você presta atenção ao seu corpo, o corpo torna-se quieto, o qual tem sua
própria disciplina. Ele está relaxado, mas não indolente e tem a energia da
harmonia. Quando existe atenção, não há contradição e, portanto não há
conflito. Quando você ler isto, preste atenção à maneira que você está sentado,
à maneira que você está escutando, como você está recebendo o que a carta
está dizendo a você, como você está reagindo ao que está sendo dito e porque
você está achando difícil prestar atenção. Você não está aprendendo como
prestar atenção. Se você estiver aprendendo o como prestar atenção, então
isto se tornará um sistema, que é o que o cérebro está acostumado, e então
você faz da atenção algo mecânico e repetitivo, ao passo que a atenção não é
mecânica ou repetitiva. É a maneira de olhar para sua vida inteira sem o centro
do interesse próprio.Difference between concentration and attention
Se eu estiver atento, não há formação de imagens
Como se pode estar livre das imagens que se tem? Primeiramente, eu preciso
descobrir como estas imagens surgem, qual é o mecanismo que as cria. Você
pode notar que no momento do relacionamento efetivo, isto é, quando você
está falando, quando há argumentos, quando há insultos e brutalidade, se você
não estiver completamente atento nesse momento, então o mecanismo de
formação de uma imagem inicia. Isto é, quando a mente não está
completamente atenta no momento da ação, então o mecanismo de formação
de imagens é colocado em movimento. Quando você diz algo para mim que eu
não gosto - ou que eu gosto - se nesse momento eu não estiver
completamente atento, então o mecanismo inicia. Se eu estiver atento, ciente,
então não haverá formação de imagens. The Awakening of Intelligence, p 337
Estar ciente da inatenção
Atenção é este ouvir e este ver, e esta atenção não tem limitação, resistência,
então ela é ilimitada. Prestar atenção implica nesta vasta energia que não está
fixada a um ponto. Nesta atenção não existe movimento repetitivo; não é
mecânico. Não existe a questão de como manter esta atenção, e quando
aprendeu-se a arte do ver e do ouvir, esta atenção pode focar-se em uma
página, uma palavra. Nisto não há resistência, que é a atividade da
concentração. A inatenção não pode ser aprimorada em atenção. Estar ciente
da inatenção é o fim dela: não que ela se torne atenta. O fim não tem
continuidade. O passado modificando a si próprio é o futuro - uma continuidade
do que tem sido - e nós encontramos segurança na continuidade, não no fim.
Assim a atenção não tem a qualidade de continuidade. Tudo que continua é
mecânico. O vir-a-ser é mecânico e implica em tempo. A atenção não tem a
qualidade de tempo. Tudo isso é uma questão tremendamente complicada. É
preciso adentrá-la delicadamente, profundamente. Letters to the Schools vol II, p 31
A atenção envolve o ver e o ouvir
A atenção envolve o ver e o ouvir. Nós não ouvimos somente com nossos
ouvidos, mas nós também somos sensíveis aos tons, à voz, à sugestão das
palavras, ouvir sem interferência, captar instantaneamente a profundeza de um
som. O som tem um papel extraordinário em nossas vidas: o som do trovão,
uma flauta tocando à distância, o som não ouvido do universo, o som do
silêncio, o som do próprio coração batendo; o som de um pássaro e o barulho
de um homem andando na calçada; a cachoeira. O universo está preenchido
de som. O som tem seu próprio silêncio; todos os seres vivos estão envolvidos
neste som do silêncio. Estar atento é ouvir este silêncio e mover-se com ele. Letters to the Schools vol II, p 30
Se você estiver ciente sem escolha
Fique simplesmente ciente; isto é tudo o que você tem de fazer, sem condenar,
sem forçar, sem tentar mudar aquilo do qual você está ciente. Então você verá
que é como a maré que está subindo. Você não pode evitar que a maré suba;
construa um muro ou faça o que você quiser, ela virá com tremenda energia.
Da mesma forma, se você estiver ciente sem escolha, o campo todo da
consciência começa a manifestar-se. E enquanto ele for se revelando, você
tem de seguir; e o ato de seguir torna-se extraordinariamente difícil - seguir no
sentido de seguir o movimento de todo pensamento, de todo sentimento, de
todo desejo secreto. Torna-se difícil no momento em que você resiste, no
momento em que você diz "isso é feio", "isto é bom", "isso é ruim", "isto eu vou
manter", "isso eu não vou manter." The Collected Works vol XV, p 85
Estar ciente sem condenação
Não pense em fazê-lo, mas realmente faça-o agora. Isto é, esteja ciente das
árvores, da palmeira, do céu; ouça os corvos crocitarem; veja a luz sobre a
folha, a cor do sari, o rosto; então volte-se para dentro. Você pode observar,
você pode estar cônscio sem escolha das coisas externas. É muito fácil. Mas
voltar-se para dentro e estar cônscio sem condenação, sem justificativa, sem
comparação é mais difícil. Esteja simplesmente ciente do que está
acontecendo dentro de você - suas crenças, seus medos, seus dogmas, suas
esperanças, suas frustrações, suas ambições e todo o resto. Então a
manifestação do consciente e do inconsciente começa. Você não precisa fazer
nada. The Collected Works vol XV, p 85
Observando ainda que não haja nada a prender
Estou aprendendo sobre mim mesmo – não de acordo com algum psicólogo ou
especialista – estou observando e vejo alguma coisa em mim mesmo; mas não
a condeno, não a julgo, não a ponho de lado – apenas a observo. Observo que
sou orgulhoso – vamos tomar isso como exemplo. Eu não digo, “Eu devo pôr
isso de lado, como é feio ser orgulhoso.” – mas apenas o observo. Como estou
observando, estou aprendendo. Observar significa aprender que o orgulho
envolve como ele veio a existir. Não posso observá-lo por mais de cinco ou
seis minutos – se alguém puder, isso seria uma grande coisa - no próximo
minuto torno-me desatento. Tendo estado atento e sabendo o que é a
desatenção, eu me esforço para tornar atenta a desatenção. Não faça isso,
mas observe a desatenção, faça-se ciente de que você está desatento – isso é
tudo. Pare aí. Não diga, “Devo gastar todo o meu tempo estando atento”, mas
apenas observe quando está desatento. Avançar o que seja nesse processo
seria realmente muito complexo. Há uma condição da mente que está desperta
e observando todo o tempo, observando mesmo que não haja nada a
aprender. Isso significa uma mente que é extraordinariamente clara calma,
extraordinariamente silenciosa. O que tem uma mente clara, silenciosa, a
aprender?The Impossible Question, pp 25-26
Deixa-se de aprender quando se argumenta com a vida
O ato de ouvir é o ato de aprender.
Deve-se aprender muitíssimo sobre a vida, pois a vida é um movimento no
relacionamento. E esse relacionamento é ação. Nós temos que aprender – não
acumular conhecimento advindo desse movimento a que chamamos vida e
então viver de acordo com esse conhecimento, o que é conformismo.
Conformar-se é ajustar-se, encaixar-se em um molde, ajustar-se a várias
impressões, demandas, pressões de uma sociedade particular. A vida é para
ser vivida, entendida. Deve-se aprender sobre a vida, e deixa-se de aprender
no momento em que se argumenta com a vida, chega-se à vida com o
passado, com um condicionamento como o conhecimento.
Portanto há uma diferença entre adquirir conhecimento e o ato de aprender.
Vocês devem ter conhecimento; de outro modo não saberão onde vivem,
esquecerão seu nome, e assim por diante. Então, a certo nível o conhecimento
é imperativo, mas quando esse conhecimento é usado para entender a vida – a
qual é um movimento, a qual é algo que está vivendo, movendo-se,
dinamicamente, mudando a cada momento – quando vocês não podem mover-
se com a vida, então estão vivendo no passado e tentando compreender a
extraordinária coisa chamada vida. E para entender a vida vocês têm que
aprender cada minuto sobre ela e nunca chegar a ela tendo aprendido. The Collected Works vol XV, pp 13-14
Aprendendo com a experiência?
Questionador: Podemos aprender com a experiência?
Krishnamurti: Certamente não. Aprender implica liberdade, curiosidade,
investigação. Quando uma criança aprende uma coisa, ela é curiosa sobre
aquilo, ela quer saber, é um momento livre, não um momento de ter apreendido
e de afastar-se daquela aquisição. Temos inumeráveis experiências; temos tido
cinco mil anos de guerras.
Não aprendemos uma só coisa com elas exceto por inventar maquinaria mais
letal com a qual matar um ao outro. Temos tido muitas experiências com
nossos amigos, com nossas esposas, com nossos maridos, com nossa nação
– não temos aprendido. Aprender, de fato, só pode acontecer quando existe
liberdade a partir da experiência.The Impossible Question, p 78
O ato de ouvir é o solo
Ouça simplesmente, pois se você é capaz de ouvir e ver a verdade do que está
sendo dito, então o pensamento não agirá. Se você estiver no estado de ouvir,
o fato, a verdade, agirá. Se uma semente for plantada na terra e tiver
vitalidade, ela crescerá. Da mesma maneira, o ato de ouvir é o solo. O ato de
ouvir só é possível quando existe atenção, e a atenção não existe se houver
interpretação, avaliação, condenação, ou julgamento daquilo que você está
ouvindo. Se você ouvir completamente, atentamente, sem qualquer observador
que é o pensador, então esse próprio ato de ouvir afastará o que é falso, e
você ouvirá somente o que é verdadeiro.
O ato de ouvir é o campo. Nesse campo todo tipo de semente é semeada, e
somente a semente que tem vitalidade, energia, força, aparecerá, florescerá.
Isso é o que estamos fazendo agora. Nós estamos realmente ouvindo, não
estamos aceitando, nem discordando, nem julgando. Nós realmente estamos
ouvindo tão completamente, que o próprio ato de ouvir destrói o que é falso e
deixa a semente da verdade enraizar. The Collected Works vol XVI, pp 146-147
O próprio ato de ouvir é um grande milagre
Ouvir é uma arte da qual muito poucos de nós somos capaz. Nós nunca
ouvimos realmente. A palavra tem um som e quando nós não ouvimos o som,
interpretamo-lo, tentamos traduzi-lo para nossa própria linguagem ou tradição
específica. Nós nunca ouvimos vivamente, sem qualquer distorção. Portanto, o
orador sugere, respeitosamente, que vocês assim ouçam e não interpretem o
que ele diz. Quando vocês contam uma história muito emocionante para um
garotinho, ele ouve com um enorme sentido de curiosidade e energia. Ele quer
saber o que vai acontecer e espera com excitação mesmo até o final. Mas nós
adultos perdemos toda essa curiosidade, a energia para descobrir, essa
energia que é necessária para ver muito claramente as coisas como elas são,
sem qualquer distorção. Nós nunca nos ouvimos uns aos outros. Você nunca
ouve a sua mulher, não é? Você a conhece bem demais, e ela você. Não há
sentimento de profunda apreciação, camaradagem, amizade que faria se
ouvirem um ao outro, independentemente de você gostar ou não. Mas se vocês
realmente ouvirem assim completamente, esse mesmo ato de ouvir é um
grande milagre. That Benediction is Where You Are, pp 22-23
Ouvindo sem o ouvido
Existe uma arte de ouvir. A palavra "arte" implica colocar tudo em seu lugar
certo. Se você entende o significado dessa palavra, a verdadeira arte não é
pintar quadros, mas sim a arte de colocar sua vida em seu lugar devido, que é
viver harmoniosamente. Quando você tiver colocado tudo em você em seu
lugar certo, você será livre. Colocar tudo em seu lugar certo faz parte da
inteligência. Vocês dirão que estamos dando um novo significado a essa
palavra "inteligência". Tem de ser. Inteligência implica ler nas entrelinhas, entre
as palavras, entre dois silêncios, entre a fala, ouvir com sua mente o tempo
todo alerta para ouvir. Você não ouve somente com o ouvido, mas também
sem o ouvido. On Love and Loneliness, pp 87-88
Duas maneiras de ouvir
Sabe, existem duas maneiras de ouvir: ouvir casualmente, escutar uma série
de ideias, concordando ou discordando delas; ou existe uma outra maneira de
ouvir, que não é somente ouvir as palavras e o significado dessas palavras,
mas também ouvir o que está realmente acontecendo em você. Se você ouvir
desta maneira, então o que o orador diz está relacionado com que você está
ouvindo em você; então você não está meramente ouvindo o orador – o que é
irrelevante – mas sim o conteúdo total do seu ser. E se você estiver ouvindo
dessa maneira com intensidade, ao mesmo tempo e ao mesmo nível, então
estamos ambos participando, compartilhando, do que está realmente
acontecendo. Então você tem a paixão que vai transformar aquilo que é.Beyond Violence, pp 37-38
Ouvindo tudo
Você já sentou muito silenciosamente, não com a sua atenção fixa em algo,
não fazendo um esforço para se concentrar, mas com a mente muito tranquila,
realmente calma? Então você escuta tudo, não é mesmo? Você escuta tanto
os barulhos à distância como aqueles mais perto e aqueles que estão
realmente bem próximos a você, os sons imediatos - o que significa, realmente,
que você está ouvindo tudo. Sua mente não está confinada a um pequeno
canal estreito. Se você conseguir ouvir desta maneira, ouvir com facilidade,
sem tensão, você descobrirá uma extraordinária mudança acontecendo dentro
de você, uma mudança que chega sem sua vontade, sem você pedir; e nessa
mudança há grande beleza e profundidade de percepção.This Matter of Culture, p 32
Existe o ver sem preconceito?
O significado no dicionário da palavra 'percepção' é tornar-se consciente de
apreender. Ou seja, você vê o armário, tem um preconceito dele; isso não é
percepção. Existe o ver sem preconceito? Só a mente que não tem conclusão,
essa é a mente que pode ver. A outra não pode. Se eu tiver um conhecimento
prévio desse armário, a mente identifica-o como um armário. Olhar para esse
armário sem a acumulação prévia de preconceitos ou mágoas, é olhar. Se eu
tiver mágoas, memórias, dor, prazer, desagrado anterior, não olhei.
Tradition and Revolution
Observação sem a tela do conhecimento
Observar não implica acúmulo de conhecimento, apesar de o conhecimento ser
obviamente necessário em um certo nível: conhecimento como médico,
conhecimento como cientista, conhecimento da história, de todas as coisas do
passado. Afinal de contas, isso é o conhecimento: informação sobre as coisas
do passado. Não há conhecimento do amanhã, apenas conjecturas sobre o
que poderia acontecer amanhã, baseado no seu conhecimento do que já
aconteceu. Uma mente que observa com conhecimento é incapaz de seguir
rapidamente o fluxo do pensamento. É apenas pelo observar sem a tela do
conhecimento que se começa a ver toda a estrutura do seu próprio pensar. E
quando você observa - o que não é condenar ou aceitar, mas simplesmente
observar - você descobrirá que o pensamento chega a um fim. Observar
casualmente um pensamento ocasional não leva a lugar nenhum. Mas se você
observa o processo do pensar e não se torna um observador separado do
observado, você vê todo o movimento do pensamento sem aceitá-lo ou
condená-lo, então essa própria observação põe um fim imediatamente no
pensamento - e consequentemente a mente está compassiva; ela está num
estado de constante mutação. The Collected Works vol XIII, pp 299-300
Eu não posso observar instantaneamente?
Suponham que estou ligado a algo ou alguém. Eu não posso observar as
consequências da ligação, o que está envolvido nisso, como a ligação surgiu?
Eu não posso observar toda a sua natureza instantaneamente? Eu estou ligado
porque estou solitário, eu quero conforto, eu quero depender de alguém porque
não posso ficar sozinho, eu preciso de companhia, eu preciso de alguém para
me dizer, "Você está indo muito bem, garotão". Eu preciso que alguém segure
a minha mão; eu estou deprimido e ansioso. Assim eu dependo de alguém, e
dessa dependência surge a ligação, e dessa ligação surge o medo, a inveja, a
ansiedade. Eu não posso observar toda a sua natureza instantaneamente? É
claro que posso se eu estiver ciente, se estiver profundamente interessado em
descobrir.This Light in Oneself, p 59
Saber o que você é pelo observar a si mesmo
Por olhar-se no espelho todos os dias, você começa a conhecer o seu rosto, e
você diz: "Aquele sou eu." Agora, você pode da mesma maneira, saber o que
você é pelo observar a si mesmo? Você pode observar seus gestos, a maneira
como você anda, como se comporta, se você é duro, cruel, grosseiro,
paciente? Então você começa a conhecer a si mesmo. Você se conhece ao
olhar-se no espelho do que você está fazendo, do que está pensando, do que
está sentindo. Esse é o espelho - o sentimento, o fazer, o pensar. E nesse
espelho você começa a observar-se. O espelho diz 'este é o fato'; mas você
não gosta do fato. Então quer alterá-lo. Você começa a distorcê-lo. Você não o
vê como ele é. Krishnamurti on Education, p 61
Ver sem a sombra de si mesmo
Ver é um assunto muito complexo. As pessoas vêem casualmente com seus
olhos e passam rapidamente, nunca vendo os detalhes de uma folha, sua
forma e estrutura, suas cores, a variedade de verdes. Observar uma nuvem
com toda a luz do mundo nela, seguir um curso d'água tagalerando por uma
colina; olhar o seu amigo com a sensibilidade na qual não há resistência e ver
a si mesmo como você é, sem as sombras da negação ou fácil aprovação; ver
a si mesmo como parte do todo; ver a imensidão do universo - isso é
observação: ver sem a sombra de si mesmo. Letters to the Schools vol II, pp 30-31
O que é percepção?
O que é percepção, o que é ver? Como você vê aquela árvore? Olhe para ela
um momento. Com que visão você a vê? É somente uma observação ótica,
apenas olhar para a árvore com a reação ótica, observando a forma, o padrão,
a luz refletida na folha? Ou você, quando olha para a árvore, nomeia-a, dizendo
"Aquele é um carvalho" e passa por ela? Ao nomeá-la você não vê mais a
árvore - a palavra nega a coisa. Você consegue olhar para ela sem a palavra?
Assim, você está ciente da maneira com a qual você aborda, você olha para a
árvore? Você a observa parcialmente, com apenas um sentido, a visão; ou
você a vê, ouve-a, sente-lhe o cheiro, sente-a, vê o seu desenho, capta a coisa
toda? Ou, você olha para ela como se fosse diferente dela - é claro, quando
você olha para a árvore você não é a árvore. Mas você consegue olhá-la sem a
palavra, com todos os seus sentidos respondendo à totalidade da sua beleza? The Flame of Attention, p 34
Aprende-se muita coisa observando
YAprende-se muita coisa observando, observando as coisas sobre você,
observando os pássaros, a árvore, observando os céus, as estrelas, a
constelação de Orion, a Ursa Maior, a estrela D'alva. Aprende-se apenas
observando, não apenas as coisas ao seu redor, mas também observando as
pessoas, a maneira como estão vestidas. Você observa não somente o que
está do lado de fora, mas também observa a si mesmo, porque você pensa isto
ou aquilo, seu comportamento, a sua conduta cotidiana, porque seus pais
querem que faça isto ou aquilo. Você está observando, não resistindo. Se você
resiste, não aprende. Ou se você chega a algum tipo de conclusão, alguma
opinião que você julga correta e a qual se atém, então naturalmente nunca
aprenderá. A liberdade é necessária para aprender, e curiosidade, um senso
de querer saber por que você ou os outros se comportam de uma certa
maneira, porque as pessoas ficam bravas, porque você fica chateado.
Aprender é extraordinariamente importante porque o aprendizado é infinito.
Aprender porque os seres humanos matam uns aos outros, por exemplo.
Obviamente existem explicações em livros, todas as razões psicológicas pelas
quais os seres humanos se comportam da sua maneira particular, porque os
seres humanos são violentos. Tudo isso tem sido explicado em livros de vários
tipos por autores eminentes, psicólogos e assim por diante. Mas o que você lê
não é o que voce é. O que você é, como você se comporta, porque fica bravo,
com inveja, porque fica deprimido, se você observa a si mesmo, aprende muito
mais do que de um livro que te diz o que você é.Letters to the Schools vol II, pp 75-76
Quando o organismo inteiro torna-se altamente sensível
Não há um perigo, o inquiridor pergunta, na mente quando o organismo
humano inteiro torna-se altamente sensível; não há um perigo de tensão
nervosa? Por que devemos ter tensão, afinal? A tensão não existe apenas
quando há resistência? Há ruídos por aqui: um cão está latindo, os ônibus
estão passando, e há uma criança chorando. Quando você resiste, a tensão é
desenvolvida. Isto realmente acontece. Se você não constrói nenhuma
resistência e deixa o ruído passar, escuta-o calmamente, sem resistência, não
dizendo que isso é bom ou ruim, não dizendo, “Eu gostaria que esse cão não
fizesse barulho; esse ônibus é terrível”, mas apenas escuta – então, desde que
não haja resistência, não há nenhuma tensão, nenhum esforço. Penso que um
dos problemas da vida moderna é morar em casas-caixote chamadas flats,
onde não há nenhum espaço, nenhuma beleza, mas tensão constante. Se você
é vulnerável a tudo isso – estou usando a palavra “vulnerável” no sentido de
acolher, deixar que tudo venha – então eu não vejo como vocês possam ter
colapso nervoso ou tensão nervosa.The Collected Works vol XVI, pp 148-149
Uma mente presa ao hábito é insensível
A maioria de vocês é fisicamente insensível porque vocês comem em excesso,
fumam, negligenciam em várias formas de delícias sensuais – não que vocês
não devessem. Mas a mente torna-se embotada dessa forma, e quando a
mente torna-se embotada, o corpo torna-se ainda mais embotado. Esse é o
padrão no qual temos vivido. Vocês veem como é difícil mudar sua dieta.
Vocês estão habituados a uma forma particular de dieta e gosto, e devem tê-la
o tempo todo; se não a têm, sentem que ficarão doentes e até atemorizados.
Hábito físico gera insensibilidade; obviamente qualquer hábito como drogas,
álcool, ou tabagismo faz o corpo insensível, e isso afeta a mente – a mente que
é a totalidade da percepção, a mente que deve ver muito claramente, não
confusamente, e na qual não deve haver nenhum conflito, qualquer que seja. O
conflito não é tão somente um gasto de energia; ele também faz a mente
embotada, pesada, tola. Tal mente aprisionada no hábito é insensível; a partir
dessa insensibilidade, desse embotamento, ela não aceitará nenhuma coisa
nova porque há medo.
The Nature of the New Mind, p 262
Quando nossos corações estão vazios
Qualquer tendência ou talento que contribua para o isolamento, qualquer forma
de autoidentificação, embora estimulante, distorce a expressão da
sensibilidade e gera insensibilidade. A sensibilidade é embotada quando o
talento torna-se pessoal, quando a importância é dada ao “mim” e ao “meu” –
eu pinto, eu escrevo, eu invento. É só quando estamos cientes de nosso
próprio pensamento e sentimento em nosso relacionamento com as pessoas
com as coisas e com a natureza, é que a mente é aberta, flexível, não atrelada
a demandas autoprotetoras e buscas; e só então há sensibilidade ao feio e ao
bonito, desimpedida pelo eu.
A sensibilidade à beleza e à feiura não surge através do apego; ela vem com o
amor, quando não há conflitos autocriados. Quando somos pobres
internamente, rendemo-nos a toda forma de ostentação, de riqueza, poder e
posses. Quando nossos corações estão vazios, juntamos coisas. Se podemos
sustentar isso, cercamo-nos de objetos que consideramos bonitos, e porque
atribuímos enorme importância a eles, somos responsáveis por muita miséria e
destruição.
O espírito aquisitivo não é o amor da beleza; ele surge do desejo de
segurança, e estar seguro é estar insensível. Education and the Significance of Life, pp 125
Sensibilidade de mente e coração
YVocês têm que ter este extraordinário sentimento, esta sensibilidade a tudo –
ao animal, ao gato que caminha pelo muro, à falta de asseio, à sujeira, à
imundície dos seres humanos na pobreza, em desespero. Vocês têm que ser
sensíveis – o que é sentir intensamente, não em uma direção particular, que
não é uma emoção que vem e vai, mas que é ser sensível com seus nervos,
com seus olhos, com seu corpo, seus ouvidos, com sua voz. Vocês devem ser
completamente sensíveis todo o tempo. A menos que você seja assim
completamente sensível, não há inteligência. A inteligência vem com
sensibilidade e observação.
A sensibilidade não vem com informações e conhecimentos infinitos. Vocês
podem conhecer todos os livros do mundo, podem tê-los lido, tê-los devorado;
vocês podem ser familiares a todo autor, podem saber todas as coisas que
foram ditas, mas isso não traz inteligência. O que traz inteligência é essa
sensibilidade, uma total sensibilidade de sua mente, tanto consciente quanto
inconsciente, e do seu coração com suas extraordinárias capacidades de afeto,
simpatia, generosidade. E com isso vem esse intenso sentimento, sentimento
pela folha que cai de uma árvore com todas as suas cores mortiças e a sujeira
de uma rua imunda – vocês têm que ser sensíveis a ambos; vocês não podem
ser sensíveis a um e insensíveis ao outro. Vocês são sensíveis – não
meramente a um ou a outro.The Collected Works vol XIV, p 143
O analisador e o analisado
PPor favor, acompanhe isto com cuidado. Há o analisador e a coisa a ser
analisada. Nós nunca questionamos quem é o analisador. Ele é obviamente um
dos muitos fragmentos e trata de analisar a estrutura inteira de si mesmo. Mas
o próprio analisador, sendo um fragmento, é condicionado. Quando ele analisa
há várias coisas envolvidas. Antes de tudo, toda análise deve ser completa ou
caso contrário torna-se a pedra em volta do pescoço do analisador quando ele
começa a analisar o próximo incidente, a próxima reação. Então a memória da
análise prévia aumenta a sobrecarga. E a análise também implica tempo; há
tantas reações, associações e memórias a serem analisadas que isso tomará
toda a sua vida. No momento em que você tivesse analisado completamente a
si mesmo – se isso acaso fosse possível – você estaria pronto para o túmulo. Beyond Violence, p 102
O experienciador e o experienciado
Você pode experienciar isso por você mesmo muito simplesmente e muito
facilmente. Na próxima vez em que você estiver ciumento ou ganancioso ou
violento ou o que quer que seja, observe-se a si mesmo. Nesse estado, “você”
não é. Há somente esse estado de ser. O momento, o segundo seguinte, você
designa esse estado, nomeia-o, chama-o de ciúme, raiva, ganância; então
você criou imediatamente o observador e o observado, o experienciador e o
experienciado. Quando existem o experienciador e o experienciado, então o
experienciador tenta modificar a experiência, mudá-la, recordar coisas sobre
ela e assim por diante, e então mantém a divisão entre ele mesmo e o
experienciado. Se você não nomeia esse sentimento – o que significa que você
não está buscando um resultado, você não está condenando, está
simplesmente silenciosamente ciente desse sentimento – então você verá que
nesse estado de sentimento, de experienciar, não há nenhum observador e
nenhum observado, porque o observador e o observado são um fenômeno
conjugado e assim há somente a experienciação. The First and Last Freedom, pp 175-176
O controlador faz parte da tagarelice
Você não pergunta: Por que está minha mente tagarelando, tão agitada?
Alguma vez você fez essa pergunta a si mesmo. Por que está tão inquieto,
movendo-se de uma coisa a outra, sempre buscando distração? Por que está
sua mente tagarelando? E o que você fará a respeito? Sua resposta imediata é
controlá-la, dizer: “Eu não devo tagarelar”. O que significa o quê? O próprio
controlador está tagarelando. Há um controlador que diz: “Eu não devo
tagarelar”; ele é, ele mesmo, parte da tagarelice. Veja a beleza disso! Então, o
que você fará?
On Mind and Thought, p 75
O controlador e o controlado
Há, na existência diária, uma maneira de viver na qual toda forma de controle
psicológico deixa de existir? - porque controle significa esforço, significa divisão
entre o controlador e o controlado; estou raivoso, devo controlar minha raiva;
eu fumo, eu não devo fumar e devo resistir a fumar. Estamos dizendo que há
algo totalmente diferente e isso pode ser mal entendido e pode ser rejeitado
completamente porque é muito comum dizer-se que a vida inteira é controle –
se você não controla você se tornará permissivo, despropositado, sem sentido,
portanto você deve controlar. Religiões, filosofias, professores, sua família, sua
mãe, todos eles encorajam-no a controlar. Nós nunca perguntamos: Quem é o
controlador? The Network of Thought, p 79
Sem a palavra, há sentimento?
A própria palavra “inveja” encerra sua própria condenação. Quando a pessoa
diz: “Sou invejoso”, já existe uma sensação de afastamento. Então a pessoa
precisa ficar livre da influência da palavra para observar. E isso exige tremenda
vigilância, tremenda atenção, percepção, para não fugir e para ver que a
palavra “inveja” criou o sentimento, pois, há sentimento sem a palavra? Se não
houver palavra e, portanto, se não houver movimento de pensamento, haverá
inveja?
A palavra criou o sentimento porque a palavra está associada ao sentimento,
está ditando o sentimento. Seria possível observar sem a palavra?
The Wholeness of Life, p 149
A palavra é o pensador
Sem a palavra, há pensamento? Ou a mente está escravizada às palavras de
tal modo que não consegue ver o movimento do pensamento sem a palavra?
Noutras palavras, será que eu posso, que a mente pode, observar o “eu”, todo
o conteúdo do “eu”, sem a palavra? Posso observar o que sou sem associação
(a associação é a palavra, a memória, a recordação)? Portanto, há um
aprendizado sobre mim mesmo sem recordação nenhuma, sem o
conhecimento acumulado como experiência de raiva, ciúme, antagonismo ou
desejo de poder. Então, posso olhar para mim mesmo – não eu – pode a
mente olhar para si mesma sem o movimento da palavra, pois a palavra é o
pensador, a palavra é o observador? On Mind and Thought, p 49
A divisão entre o observador e o observado
Há uma divisão entre o observador e o observado; isto é, você olha para a vida
como um observador, como algo separado da sua vida. Certo? Então, há uma
divisão entre o observador e o observado. Essa divisão é a essência de todo
conflito, a essência de toda luta, dor, medo, desespero.
Onde houver divisão entre os seres humanos – a divisão das nacionalidades, a
divisão das religiões, as divisões sociais – tem de haver conflito. Isso é lei, isso
é razão, lógica. Há o Paquistão de um lado e a Índia do outro, guerreando entre
si. Você é brâmane e outro é não brâmane, e há ódio, divisão. Então, essa
divisão exteriorizada, com todos os seus conflitos, é a mesma que a divisão
interior, aquela entre observador e observado. Você compreendeu isso? Se
você não compreende isso, não pode prosseguir, pois a mente que está em
conflito é uma mente torturada, uma mente deformada, uma mente distorcida.Mind in Meditation, p 6
Como é que surge o observador?
Então, como é que surge o observador? Quando você olha para esta flor, no
momento em que você a observa com atenção, não há observador, só existe o
ato de olhar. Então você começa a dar nome a essa flor. Você diz: “Gostaria de
tê-la no meu jardim ou na minha casa.” Então você já terá começado a
construir uma imagem acerca dessa flor. O criador de imagens é o observador,
certo? Está acompanhando o meu raciocínio? Observe-o por si mesmo, por
favor. Portanto, a imagem e o criador de imagens constituem o observador, e o
observador é o passado. O “eu”, como observador, é o passado, o “eu” é o
conhecimento que tenho acumulado: conhecimento da dor, do sofrimento, da
agonia, do desespero, da solidão, do ciúme, e da enorme ansiedade por que a
pessoa passa. Isso é o “eu” em sua inteireza, que é o conhecimento
acumulado do observador, que é o passado. Certo? Assim, quando você
observa, o observador olha para essa flor com os olhos do passado. E você
não sabe olhar sem o observador, e, portanto, produz conflito.Mind in Meditation, pp 8-9
O pensador precisa descobrir-se por meio dos seus muitos aspectos
O “eu'', o pensador, o observador, observa os seus pensamentos-sentimentos,
opostos e conflituosos, como se não fizesse parte deles, como se estivesse
acima e além deles, controlando, guiando, moldando. Mas o “eu”, o pensador,
não é também esses conflitos? Não foi ele quem os criou? Seja qual for o nível,
o pensador está separado dos seus pensamentos? O pensador é o criador dos
impulsos opostos, assumindo papéis diferentes em momentos diferentes, em
conformidade com o seu prazer e a sua dor. Para se compreender a si mesmo,
o pensador precisa descobrir-se por meio dos seus muitos aspectos. The Collected Works vol IV, p 45
O “eu” e o outro “eu”
O que você quer dizer quando emprega o termo “eu mesmo”? Como você é
composto de muitos e está sempre mudando, será que há um momento
duradouro em que possa dizer que esse é o “eu” definitivo? É a entidade
múltipla, o feixe de memórias, que precisa ser compreendido, e não
aparentemente a entidade que chama a si mesma de “eu”.
Somos pensamentos-sentimentos contraditórios em constante mudança – -
amor e ódio, paz e paixão, inteligência e ignorância. Então, qual é o “eu” em
tudo isso? Devo escolher o que for mais prazeroso e descartar o resto? Quem
é que precisa entender esses “eus” contraditórios e conflitantes? Há um ego
permanente, uma entidade espiritual além dessas? Não seria esse ego
também produto contínuo do conflito de muitas entidades? Há um ego que
esteja acima e além desses egos contraditórios? A verdade disso só pode ser
experimentada quando os egos contraditórios forem compreendidos e
transcendidos.
Todas as entidades conflitantes que compõem o “eu” também trouxeram à
baila o outro “eu”, o observador, o analista. Para compreender a mim mesmo,
preciso compreender as muitas partes de mim mesmo, inclusive o “eu” que se
tornou o observador, o “eu” que compreende. O pensador deve, não só
compreender seus muitos pensamentos contraditórios, mas também
compreender a si mesmo como criador dessas muitas entidades.The Collected Works vol IV, p 45
O processo dualista
Afora as dualidades óbvias – como homem e mulher, preto e branco – há uma
dualidade psicológica interior, que é o observador e o observado, aquele que
tem a experiência e a coisa experimentada. Nessa divisão, na qual tempo e
espaço estão presentes, reside todo o processo do conflito; você pode
observar isso em si mesmo. Você é violento, isso é um fato, e você tem
também o conceito ideológico da não violência; com isso, há dualidade. Agora
o observador diz: “Preciso tornar-me não violento”, e a tentativa de tornar-se
não violento é conflito, que é desperdício de energia; ao passo que, se o
observador estiver totalmente cônscio dessa violência – sem o conceito
ideológico de não violência – então ele é capaz de lidar com ela
imediatamente.
É preciso observar esse processo dualista em ação dentro de si mesmo – essa
divisão entre o “eu” e o “não eu”, o observador e a coisa observada.Talks with American Students, p 111
O pensador e o pensamento
Quando você se observa com muita clareza, quando está, sem escolha,
cônscio de cada pensamento, de cada sentimento, então você encontra
alguma coisa, a saber, que existe um pensador e existe o pensamento; que há
um experimentador, um observador, e há a experiência, a coisa observada.
Isso é um fato, não é? Existe um sensor, uma entidade que julga, que avalia,
que pensa, que observa; e existe a coisa que é observada...
Então, há um pensador, há o pensamento. Há uma divisão entre o pensador e
o pensamento – o pensador tentando dominar o pensamento, tentando mudar
o pensamento, tentando modificar o pensamento, tentando controlá-lo, forçá-lo,
tentando imitar, etc. Essa divisão entre pensador e pensamento cria conflito
porque o pensador é sempre o sensor, a entidade que julga, que avalia. Essa
entidade é condicionada porque surgiu como reação ao pensamento, que, em
si mesmo, é simplesmente a reação do condicionamento, da memória.
Compreendem, senhores? Isso é uma coisa muito fácil de descobrirem por si
mesmos. The Collected Works vol XIII, p 90
O que é o pensamento?
Todas as nossas atividades, todos os produtos da nossa imaginação, todas as
coisas que constam dos Upanishads – ou qualquer outro livro religioso – são
formuladas pelo pensamento. A arquitetura, a tecnologia do mundo, todos os
lugares de adoração – quer seja o templo, a mesquita ou a igreja – e as coisas
aí contidas, resultam do pensamento. Todos os rituais são inventados pelo
pensamento – o puja, a adoração – tudo se baseia no pensamento. Todos os
nossos relacionamentos, todas as nossas estruturas políticas e econômicas
são baseadas no pensamento. Nossas divisões nacionais resultam do
pensamento.
Como vê, sempre inquirimos sobre coisas externas, mas nunca nos
perguntamos: O que é o pensamento? Qual a raiz e a consequência do
pensar? A Timeless Spring, p 161
O estado de atenção
Começa-se a descobrir que no estado de atenção, completa atenção, não
existe o observador, com seus velhos condicionamentos do consciente assim
como do inconsciente. Neste estado de atenção, a mente torna-se
extraordinariamente quieta. As células cerebrais, ainda que elas possam reagir,
já não funcionam psicologicamente, dentro de um padrão; elas se tornam
extraordinariamente quietas psicologicamente.
Talks in Europe, 1967
Expondo os conteúdos do inconsciente
Por que damos tão profundo significado e importância ao inconsciente? – pois
em última análise, ele é tão trivial quanto a consciência. Se a mente consciente
é extraordinariamente ativa, prestando atenção, ouvindo, vendo, então a mente
consciente torna-se bem mais importante que a inconsciente; nesse estado
todos os conteúdos do inconsciente são expostos; a divisão entre as várias
camadas chega ao fim. Observando suas reações quando você se senta em
um ônibus, quando está conversando com a esposa, seu marido, quando em
seu escritório, escrevendo, estando só – se você alguma vez fica sozinho –
então esse completo processo de observação, esse ato de enxergar (no qual
não há divisão entre o observador e o observado) cessa a contradição.
The Flight of the Eagle, p 28
Esta faculdade ganhará impulso
Quanto mais você estiver cônscio durante as horas de vigília, menos sonhos
haverá. Sonhos são indicações de pensamentos-sentimentos, ações não
completadas, não entendidas, que precisam interpretação renovada, ou
pensamento-esperança que precisa ser completamente compreendido. Alguns
sonhos não têm importância alguma. Aqueles que têm importância devem ser
interpretados, e essa interpretação depende de sua capacidade de não
identificação, de inteligência aguda. Se você está profundamente cônscio, a
interpretação não é necessária, mas você é muito preguiçoso e assim, se
puder pagar, vai a um especialista em sonho; ele interpreta o seu sonho de
acordo com o entendimento dele. Você se torna gradualmente dependente
dele; ele torna-se o novo padre, e assim você tem outro problema
acrescentado a você. Mas se você estiver ciente mesmo que por um breve
período, você vai ver que aquela curta consciência aguçada, por fugaz que
seja, começa a despertar um novo sentimento, o que não é o resultado do
desejo, mas uma faculdade que é livre de todas as limitações pessoais e
tendências. Esta faculdade, esse sentimento, apreenderá o momento na
medida em que você se tornar mais amplo e profundamente ciente, de modo
que fica consciente apesar de sua atenção estar sendo dada a outras
questões. Embora você esteja ocupado com outros deveres e dê atenção à
existência diária, internamente a consciência continua; ela é como uma
sensível placa fotográfica na qual toda impressão, todo pensamento-
sentimento está sendo impresso para ser estudado, assimilado e
compreendido. Essa virtude, esse sentimento novo, é de extrema importância,
pois revelará aquilo que é eterno.
The Collected Work vol III, pp 219- 220
As horas de sono, uma intensificação das horas em vigília
Quanto mais você está consciente de seus pensamentos-emoções, mais está
ciente do seu ser completo. Então as horas de sono tornam-se uma
intensificação das horas em vigília. Funções conscientes mesmo no assim
chamado sono, das quais estamos bem cientes. Você pensa em um problema
com muito afinco e mesmo assim não consegue resolvê-lo; você “dorme sobre
ele”, frase que frequentemente usamos. De manhã descobrimos que suas
saídas são mais claras, e parece que sabemos o que fazer; ou percebemos um
aspecto novo dele que ajuda a esclarecer o problema. Por que isto acontece?
Podemos atribuir-lhe muito mistério e despropósito, mas o que acontece? No
assim chamado sono, a mente consciente, fina camada está quieta, talvez
receptiva; ela preocupou-se com o problema e agora, estando consciente, está
quieta, a tensão esvaneceu. Então as incitações das camadas mais profundas
da mente são discerníveis e quando você acorda, o problema parece ter-se
tornado mais claro e mais fácil de resolver. Portanto, quanto mais você está
ciente de seus pensamentos-sentimentos durante o dia, não por uns poucos
segundos ou durante um expediente, a mente torna-se mais calma, alerta,
atentamente passiva, e assim capaz de responder e compreender as
insinuações mais profundas. Mas é difícil estar tão cônscio; a mente consciente
não é usada a tal intensidade. Quanto mais ciente a mente consciente, mais a
mente interior coopera com ela, e assim há compreensão mais profunda e mais
ampla.
The Collected Work vol III, p 219
A mente inconsciente é tão trivial quanto a consciente
Muito tem sido escrito sobre a mente inconsciente, especialmente no Ocidente.
Extraordinária importância lhe tem sido dada. Mas ela é tão trivial, tão rasteira
quanto a mente consciente. Você pode observá-lo por si próprio. Se você
observa verá que o que é chamado inconsciente é o resíduo da raça, da
cultura, da família, de suas próprias motivações e apetites. Ela está lá, oculta.
E a mente consciente está ocupada com a rotina diária da vida, indo ao
escritório, sexo, e assim por diante. Dar importância a uma ou a outra parece
absolutamente estéril. Ambas têm muito pouca importância, exceto que a
mente consciente tem que ter conhecimento tecnológico para garantir uma
subsistência.
Esta constante batalha, ambas incluídas, no nível mais profundo assim como
no nível superficial, é nosso estilo de vida. É um estilo de desordem, de
confusão, contradição, miséria, e para uma mente presa a isso, tentar meditar
é sem sentido, infantil. This Light in Oneself, p 20
Existe algo como o inconsciente, com certeza?
Nós dividimos essa consciência em consciente e inconsciente. Estamos
ocupados com um cantinho dela, o qual é a maior parte da nossa vida; e do
resto estamos inconscientes, não sabemos nem mesmo como penetrá-lo. Nós
o notamos somente quando há uma crise, quando há certa demanda urgente,
uma determinada provocação imediata, que tem que ser respondida
imediatamente, somente então agimos como entidades completas. Tendo
dividido a mente em consciente e inconsciente, olhamos a partir do consciente
– que é só uma pequena parte dela – no todo da mente.
Agora o palestrante está perguntando: Existe tal coisa como o inconsciente,
com certeza? Existe algo que esteja oculto, que tem que ser interpretado
através de sonhos, mediante investigação, análise e assim por diante, que
chamamos de inconsciente? Ou é apenas isso, porque você prestou atenção
demais ao cantinho desse campo que chama de consciência e não prestou
atenção ao campo inteiro, não está ciente de todo o conteúdo do campo. Para
penetrá-lo muito cuidadosamente, você tem que olhar sua própria consciência. The Collected Works vol XVII, p 146
Existe alguma outra parte da mente?
Vejam, nós só temos operado dentro da área do pensamento na medida do
conhecimento. Certo? Existe outra parte, outra área da mente, a qual inclui o
cérebro, que não seja tocada pelo esforço humano, dor, ansiedade, medo, e
toda a violência, todas as coisas que o homem tem feito através do
pensamento? A descoberta dessa área é a meditação. Isso implica a
descoberta de se o pensamento pode chegar a um fim, mas ainda operar
quando necessário, no campo do conhecimento? Precisamos do
conhecimento, caso contrário não podemos funcionar, não seríamos capazes
de falar nem capazes de escrever, e assim por diante. O conhecimento é
necessário para o cérebro funcionar, e seu funcionamento torna-se neurótico
quando o status torna-se de todo importante, o que é a entrada do pensamento
como o “mim”, como status. Portanto o pensamento é necessário e, todavia a
meditação é para descobrir, ou trazer à tona, ou observar, uma área na qual
não haja nenhum movimento do pensamento. Podem os dois viver juntos, em
harmonia, diariamente?Talks in Saanen 1974, p 69
Quando a máquina assume as atividades do cérebro
O cérebro tem capacidade infinita; ele é realmente infinito. Essa capacidade é
hoje utilizada tecnologicamente. Tal capacidade tem sido usada para reunir
informações. Essa capacidade tem sido empregada para armazenar
conhecimentos – científicos, políticos, sociais e religiosos. O cérebro tem ficado
ocupado com isso. Então, é precisamente essa função (essa capacidade
tecnológica) que a máquina vai assumir. Quando isso acontecer, o cérebro –
sua capacidade – vai encolher, assim como os meus braços se eu não os
utilizar o tempo todo. A questão é: Se o cérebro não estiver ativo, se não
estiver trabalhando, se não estiver pensando, o que acontecerá a ele? Ou ele
mergulhará no entretenimento – e as religiões, os rituais e os pujas são
entretenimentos – ou se voltará para a investigação interior. Essa investigação
é um movimento infinito. Essa investigação é religião.
A Timeless Spring, pp 164-165