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Análise de textura de um aço 0,2%C-1,5%Mn-1,5%Si assistido pelo efeito TRIP
C. N. dos Santos (a) *, C. S. C. Viana (a)
(a) Instituto Militar de Engenharia - Departamento de Engenharia Mecânica e de Materiais - Praça General
Tibúrcio, 80 - Urca - 22290-270 - Rio de Janeiro - RJ, Brasil
ABSTRACT: Automobiles play an important role in part of our daily life. This makes it
necessary to incessantly try to reduce their production cost in line with the innovation of
production technology. At the same time, measures are being taken toward the reduction of
fuel cost and the improvement of safety so that eagerly-pursued harmony with the social and
natural environment can be established. A high strength dual phase steel applying the
transformation induced plasticity (TRIP) of retained austenite or a TRIP aided dual phase
steel, was recently developed for a drastic weight reduction of automotive structural parts.
The microstructure of these new TRIP steels is attractive because they contain a significant
amount of retained austenite with a multiphase nature consisting of polygonal ferrite, pearlite,
bainite and acicular ferrite. Retained austenite is expected to increase the strength-ductility
balance as a result of TRIP effect during subsequent room temperature forming. The amount
and stability of retained austenite controls the mechanical properties of TRIP steels. The main
goal for the present work is to clarify the influence of the thermomechanical processing on the
microstructure was investigated using the TRIP assisted steel with 1,5% Si and 1,5% Mn.
Palavras-chave: Aço TRIP, Microestrutura, Textura.
Corresponding author; e-mail: * [email protected]
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1. Introdução
A metalurgia física de materiais ferrosos é um campo ativo, no qual o aço é uma liga metálica
amplamente usada e objeto de estudo e desenvolvimento de intensas pesquisas, uma vez que
uma compreensão completa das variáveis metalúrgicas que controla processos e propriedades
desse material ainda não foi obtida.
As diferentes formas alotrópicas e os mecanismos de transformação de fase conferem ao aço
uma versatilidade tanto nos microconstituintes quanto nas propriedades a serem exploradas
industrialmente.
Na indústria automobilística, por exemplo, chapas de aço de alta resistência apresentam uma
utilização crescente relacionada com a redução do peso dos veículos bem como com a
redução do consumo de combustível. Dentre esta classe de aços, destacam-se os aços
multifásicos: bainíticos, bifásicos (Dual Phase) e os aços assistidos pelo efeito TRIP
(Plasticidade Induzida por Transformação), os quais são empregados como componentes
estruturais.
Os aços multifásicos oferecem boa combinação resistência/ductilidade, associada a uma
microestrutura complexa formada por ferrita pró-eutetóide, produtos da transformação
austenítica e frações significativas de austenita retida.
A contribuição de cada microconstituinte ainda não é totalmente clara no comportamento
mecânico desses aços, por isso, recentemente, tem sido enfocada a contribuição de cada fase,
bem como a influência do tratamento termomecânico, na intenção de otimizar suas
propriedades mecânicas sem comprometimento de sua conformabilidade.
O presente trabalho tem por objetivo o estudo de diferentes tratamentos termomecânicos em
um aço Fe-C-Si-Mn, a fim de investigar a variação da fração volumétrica e distribuição das
fases presentes na microestrutura, bem como determinar suas orientações cristalográficas para
aplicação na indústria automobilística.
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2. Procedimento Experimental
O material utilizado neste trabalho foi um aço C-Mn cuja composição química pode ser vista
na tabela 1.
Tabela 1. Composição química do aço
Elemento C Mn Si P S Al Cr Ni Nb N
(p/p)% 0,20 1,5 1,5 0,020 0,006 0,026 0,020 0,006 0,029 0,0039
Este aço foi produzido nos laboratórios do Centro de Pesquisa da Companhia Siderúrgica
Nacional (CSN) em um forno de indução a vácuo, seguido de laminação controlada em um
laminador duo reversível (segundo um esquema de reduções predeterminado), atingindo em
cada material tamanhos de grão austeníticos semelhantes (ASTM-8). Os elementos de liga tais
como Mn, Ni e Si foram adicionados em fases diferentes do processo. Os pontos críticos AR1
e AR3 respectivamente 620,6ºC e 752,7ºC, foram determinados por dilatometria de têmpera1.
Dois esquemas de laminação controlada foram simulados em um laminador duo reversível
FENN-153, o primeiro consistia no recozimento de dois estágios2 e o segundo esquema teve
por objetivo produzir aços multiconstituídos laminados a quente, conforme mostram as
figuras 1 e 2.
400ºC, tB
800ºC, 4min
Resfriamento ao ar
Têmpera
Ac1
Ac3
Figura 1. Primeiro esquema de laminação. Recozimento em dois estágios.
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No primeiro esquema utilizou-se 800°C como temperatura intercrítica (Ti), tempo de
recozimento (tR) de 240 segundos; temperatura de transformação bainítica (TB) de 400°C e
tempos de transformação bainítica (tB) de 180segundos. No segundo esquema, os três últimos
passes foram feitos com grau de deformação variável abaixo da temperatura normal de
recristalização (TNR=984ºC), para avaliar os efeitos da precipitação induzida por deformação e
da subestrutura de deformação resultante, na fração volumétrica de austenita retida.
Em ambos os esquemas, o resfriamento consistiu em dois tratamentos isotérmicos
consecutivos. O primeiro deles foi feito no campo bifásico (γ + α), em um forno mufla a
800°C por 240s, com o objetivo de controlar a fração de ferrita pró-eutetóide, precipitada nos
contornos de grão da austenita anterior. O segundo tratamento isotérmico foi feito no campo
bainítico, em banho de sal a 400°C durante 180s, visando obter frações apreciáveis de
austenita retida ao lado do produto da reação bainítica. O tempo de reação bainítica foi
variado com o propósito de verificar sua influência na fração volumétrica e na estabilidade da
austenita retida. Posteriormente, os corpos de provas foram resfriados ao ar. As medidas da
fração volumétrica de cada produto de transformação foram feitas através de metalografia
quantitativa. Os dados obtidos por difração de raios- X foram usados para a determinação da
concentração de carbono na austenita retida, segundo a seguinte expressão empírica 3:
a0 = 3,578 + 0,044%Cγr
Resfriamento ao ar
800ºC, t= 4min
Ac1
Ac3
400ºC, tB= 3min
Figura 2. Segundo esquema de laminação.
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em que a0 é o parâmetro de rede da austenita retida e Cγr é a concentração de carbono contida
nela. A partir dos dados de Cγr, foi calculada a temperatura de início da transformação
martensítica (Ms) por meio da expressão:
Ms = 550 – 360 * Cγr – 40 * Mnγr em que Mnγr corresponde à concentração de Mn contido na austenita retida estimada em 1,5
vezes a concentração de Mn de cada aço, de acordo com os trabalhos de Speich et al.4 e
Gilmour et al.5. As amostras foram embutidas em resina a frio. Foi feito lixamento na politriz
do Laboratório de Metalografia do IME com lixas d’água de 400, 600, 1000 e 1200 mesh.
Logo após, foi feito um polimento mecânico usando alumina 1, 0,3 e 0,05 microns.
Posteriormente foi feito um polimento com sílica coloidal por aproximadamente 50 minutos,
com o objetivo de retirar a deformação mecânica induzida durante as operações de lixamento
e polimento.
A caracterização das microestruturas foi feita através de microscopia ótica, microscopia
eletrônica de varredura e difração de raios X. Utilizou-se a técnica de EBSD para analisar as
orientações cristalográficas da ferrita, martensita e austenita retida
3. Resultados e Discussão
Microestrutura
As micrografias das amostras obtidas por microscopia eletrônica de varredura (MEV), figura
3, apresentam a microestrutura do material após tratamento térmico. As regiões claras
correspondem ao microconstituinte MA e a matriz em cinza corresponde as ferritas α e
bainítica. De acordo com Girault e colaboradores6, com um tempo de ataque maior é possível
revelar alguns microconstituintes presentes na microestrutura de um aço multiconstituído. Por
ter sido adotado um maior tempo de ataque para as amostras foi possível distinguir os
microconstituintes ferrita e MA.
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A temperatura de recozimento intercrítico, o teor de carbono, a maior quantidade e
temperabilidade da austenita formada são fatores que facilitarão a transformação da austenita
em estruturas martensíticas ou não. Para as amostras em questão, a temperatura de
recozimento intercrítico foi 800ºC (240s), o que conferiu às microestruturas uma
homogeneidade. O tratamento isotérmico no campo bainítico aplicado às amostras teve como
objetivo a obtenção de frações apreciáveis de austenita retida simultaneamente com o produto
da transformação bainítica. De acordo com Matsumura e colaboradores7, para pequenas
variações de tempo na transformação bainítica, o teor de carbono da austenita é baixo, assim
após resfriamento para a temperatura ambiente, a austenita não-transformada se transforma
em martensita. A difusão de carbono da bainita para a austenita não-transformada durante o
processo ajuda na estabilidade térmica da austenita.
A amostra produto do segundo esquema de laminação apresenta uma conservação dos
contornos de grãos originais da austenita anterior. Ambas microestruturas apresentam um
bandeamento, conseqüência do alto teor de manganês presente na composição química do
aço.
(b)(a)
B
F F MA
MA
IME LME 20kV 5μm x5000 IME LME 20kV 5μm x5000
Figura 4. Micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura (MEV) (a) R8043A (b) L8043A.
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Fração volumétrica de austenita retida
A técnica de difração de raios-X foi utilizada para determinar a fração volumétrica da
austenita retida. Pela fração volumétrica foi possível observar a influência do processamento
na microestrutura final do material. A presença do pico (200)γ nos difratogramas indica a
presença de austenita retida na microestrutura. O pico (200)γ do difratograma correspondente
a amostra L8043A do segundo esquema de laminação apresenta maior intensidade, indicando
uma presença maior de austenita retida.
A tabela 2 apresenta as frações volumétricas dos microconstituintes no material após
tratamento térmico obtidas por metalografia quantitativa e difração de raios-X. Observa-se
que a fração volumétrica da ferrita permaneceu em torno de 64%.
Tabela 2. Fração volumétrica dos microconstituintes obtidas por metalografia quantitativa e
difração de raios-X.
Amostras Vα(%) VMA (%) VB (%) B
Recozida (1º tratamento)
64 ± 1,7
16,5 ± 0,8
19,5± 2,3
Laminada (2º tratamento)
66 ± 1,0
25,9 ± 1,6
8,1 ± 2,3
Microtextura
A microestrutura apresentada na figura 5 (a) assemelha-se à microestrutura obtida no
microscópio ótico. Os mapas de orientação cristalográfica da amostra do segundo tratamento
também apresentam grãos com componentes de textura variadas.
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Figura 5. Amostra L8043A (a) Mapa de IQ (b) OIM ccc (c) OIM cfc (d) triângulo
estereográfico.
Os mapas da amostra R8043A, figura 6, apresentam grãos equiaxiais da fase ccc, com grãos
de orientações cristalográficas variadas. De modo geral, os mapas de IQ tanto das amostras
recozidas quanto das amostras laminadas apresentaram uma boa concordância com as
fotomicrografias obtidas, apesar de apresentarem uma microtextura variada.
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Figura 6. Amostra R8043A (a) Mapa de IQ (b) OIM ccc (c) OIM cfc (d) triângulo
estereográfico. Textura Todas as texturas foram obtidas sobre material revenido após ter sido tratado
termomecanicamente. As ODFs estão graficadas em coordenadas de Bunge, (ϕ1, φ, ϕ2), e
representadas na seção de ϕ2 = 450, cujo ábaco de interpretação está mostrado na figura 7.
Figura 7. Ábaco de referência.
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De modo geral, as texturas das fases ccc e cfc de ambas amostras são fracas, mesmo aquelas
que sofreram deformação anterior ao tratamento.
GAUSS MODEL ODF PHI 2 = 45º BSD CRYSTALS MAX: 3.2 LEVELS: 1.0 1.2 1.8 2.0 2.2 2.8 3.0
GAUSS MODEL ODF PHI 2 = 45º BSD CRYSTALS MAX: 2.2 LEVELS: 1.0 1.2 1.6 1.8 2.0 2.2
GAUSS MODEL ODFPHI 2 = 45º BSD CRYSTALS MAX: 2.2 LEVELS: 1.0 1.4 1.6 1.8 2.0 2.2
GAUSS MODEL ODFPHI 2 = 45º BSD CRYSTALS MAX: 3.7 LEVELS: 1.0 1.2 1.4 1.6 1.8 2.0 2.4 2.6 3.0 3.4
(a) (b)
(c) (d) Figura 8. ODFs, orientações em ϕ2 = 450 (Figura 7). Amostra R803A (a) fase ccc (b) fase cfc.
Amostra L8043A (c) fase ccc (d) fase cfc. As ODFs da amostra L8043A estão apresentadas na figura 8 (c) e (d). A fase ccc apresenta
picos próximos de {001}<130>, {001}<110> e {332}<1 –1 0>. A ODF da fase cfc apresenta
picos máximos em {111}<130> e {112}<1-10> – textura de cobre – transformado. Tais
componentes concordam com os resultados encontrados por Verlinden e colaboradores8.
4. Conclusões
Foi possível observar que a amostra do segundo esquema de laminação apresentou uma maior
fração volumétrica de austenita retida e de bainita na microestrutura, evidenciando uma
diferença na cinética da transformação bainítica para os dois processos termomecânicos
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estudados. Observou-se ainda que a fração volumétrica da ferrita permaneceu em torno de
64%, confirmando que a porcentagem de ferrita é determinada principalmente durante a
laminação e o recozimento intercrítico.
Com relação a microtextura observou-se que ambas amostras apresentaram um grão ferrítico
equiaxial, porém não apresentaram uma textura forte. Acredita-se que a ausência de uma
textura forte está relacionada com as pequenas áreas analisadas, a pouca sensibilidade do
equipamento para aços multifásicos, bem como à reduzida quantidade de deformação que se
conseguiu acumular na austenita abaixo da temperatura de não recristalização.
Agradecimentos
Os autores agradecem o Centro de Pesquisas da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), ao
Instituto Militar de Engenharia (IME) pela análise de microtextura e ao Instituto Nacional de
Tecnologia (INT) pelas análises de difração de raios-X.
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