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ASPECTOS IMUNOLÓGICOS DOS TRANSPLANTES DE CÉLULAS TRONCO HEMATOPOÉTICAS IMMUNOLOGICAL ASPECTS OF HEMATOPOIETIC STEM CELL TRANSPLANTATION Júlio C. Voltarelli 1 & Ana Beatriz P.L. Stracieri 2 1 Prof. Associado do Departamento de Clínica Médica (Divisão de Imunologia Clínica) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP e Coordenador da Unidade de Transplante de Medula Óssea do Hospital das Clínicas da FMRPUSP, 2 Médica Assistente da Unidade de TMO-HCFMRPUSP. CORRESPONDÊNCIA: Unidade de TMO - 5º andar, Hospital das Clínicas - Campus USP, 14048-900 Ribeirão Preto-SP, E-mail: [email protected] VOLTARELLI JC & STRACIERI ABPL. Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hemato- poéticas. Medicina, Ribeirão Preto, 33: 443-462, out./dez. 2000. RESUMO: A integridade funcional do sistema imunológico é vital para o sucesso das várias modalidades de transplantes de células-tronco hematopoéticas (TCTH). Nesta revisão, discu- tem-se a reconstituição imunológica pós-TCTH, o papel das citocinas e dos antígenos de histo- compatibilidade nas complicações, e nos resultados dos transplantes e o emprego dos TCTH para tratamento de deficiências imunológicas e de doenças auto-imunes. UNITERMOS: Transplante de Medula Óssea. Transplante de Células Hematopoiéticas Primitivas. Imunologia de Transplantes. Citocinas. Inflamação. Antígenos HLA. Doenças Auto- Imunes. 443 A importância central do sistema imunológico nos transplantes de células-tronco hematopoéticas (TCTH), é bem ilustrada pelas observações de que: 1) tais transplantes só se tornaram clinicamente possí- veis após a identificação do complexo principal de his- tocompatibilidade (o sistema HLA humano) e do de- senvolvimento de medidas eficientes para prevenir a doença do enxerto-contra-hospedeiro (graft-versus- host disease, GVHD); 2) os primeiros transplantes alogênicos bem sucedidos foram realizados em 1968, para corrigir deficiências imunológicas; 3) progressos na aplicação e nos resultados dos TCTH dependem, em grande parte, de avanços na tecnologia imunológi- ca, tanto laboratorial como terapêutica, como foi sumarizado por Thomas, em 2000 (1) e será discutido nesta revisão. Essas observações mostram, também, que os TCTH necessitam de um funcionamento ade- quado do sistema imune para seu sucesso e podem ser utilizados para tratar doenças desse sistema, como imunodeficiências, enfermidades auto-imunes e neo- plasias imunocitárias. Os aspectos históricos da evolução dos co- nhecimentos imunológicos aplicados aos TCTH fo- ram resumidos no artigo introdutório de um extenso simpósio dedicado a tal tema pelo Immunological Reviews em 1997 (2) . Neste capítulo, trataremos de quatro aspectos imunológicos que têm implicações clínicas diretas nos TCTH: 1) a reconstituição dos sistemas imune e hematopoético após o transplante; 2) a fisiopatologia de reações inflamatórias pós-trans- plante; 3) o papel da alorreatividade e dos antígenos de histocompatibilidade na evolução dos TCTH; 4) o emprego dos TCTH para tratar imunopatias, como as deficiências imunológicas e as doenças auto-imunes. Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio: TRANSPLANTE DE MEDULA OSSEA - 2ª PARTE 33: 443-462, out./dez. 2000 Capítulo XII

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Page 1: Aspectos Imunologicos Transplantes

ASPECTOS IMUNOLÓGICOS DOS TRANSPLANTES DECÉLULAS TRONCO HEMATOPOÉTICAS

IMMUNOLOGICAL ASPECTS OF HEMATOPOIETIC STEM CELL TRANSPLANTATION

Júlio C. Voltarelli1 & Ana Beatriz P.L. Stracieri2

1Prof. Associado do Departamento de Clínica Médica (Divisão de Imunologia Clínica) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USPe Coordenador da Unidade de Transplante de Medula Óssea do Hospital das Clínicas da FMRPUSP, 2Médica Assistente da Unidade deTMO-HCFMRPUSP.CORRESPONDÊNCIA : Unidade de TMO - 5º andar, Hospital das Clínicas - Campus USP, 14048-900 Ribeirão Preto-SP,E-mail: [email protected]

VOLTARELLI JC & STRACIERI ABPL. Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hemato-poéticas. Medicina, Ribeirão Preto, 33: 443-462, out./dez. 2000.

RESUMO: A integridade funcional do sistema imunológico é vital para o sucesso das váriasmodalidades de transplantes de células-tronco hematopoéticas (TCTH). Nesta revisão, discu-tem-se a reconstituição imunológica pós-TCTH, o papel das citocinas e dos antígenos de histo-compatibilidade nas complicações, e nos resultados dos transplantes e o emprego dos TCTHpara tratamento de deficiências imunológicas e de doenças auto-imunes.

UNITERMOS: Transplante de Medula Óssea. Transplante de Células HematopoiéticasPrimitivas. Imunologia de Transplantes. Citocinas. Inflamação. Antígenos HLA. Doenças Auto-Imunes.

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A importância central do sistema imunológiconos transplantes de células-tronco hematopoéticas(TCTH), é bem ilustrada pelas observações de que:1) tais transplantes só se tornaram clinicamente possí-veis após a identificação do complexo principal de his-tocompatibilidade (o sistema HLA humano) e do de-senvolvimento de medidas eficientes para prevenir adoença do enxerto-contra-hospedeiro (graft-versus-host disease, GVHD); 2) os primeiros transplantesalogênicos bem sucedidos foram realizados em 1968,para corrigir deficiências imunológicas; 3) progressosna aplicação e nos resultados dos TCTH dependem,em grande parte, de avanços na tecnologia imunológi-ca, tanto laboratorial como terapêutica, como foisumarizado por Thomas, em 2000(1) e será discutidonesta revisão. Essas observações mostram, também,que os TCTH necessitam de um funcionamento ade-

quado do sistema imune para seu sucesso e podemser utilizados para tratar doenças desse sistema, comoimunodeficiências, enfermidades auto-imunes e neo-plasias imunocitárias.

Os aspectos históricos da evolução dos co-nhecimentos imunológicos aplicados aos TCTH fo-ram resumidos no artigo introdutório de um extensosimpósio dedicado a tal tema pelo ImmunologicalReviews em 1997(2). Neste capítulo, trataremos dequatro aspectos imunológicos que têm implicaçõesclínicas diretas nos TCTH: 1) a reconstituição dossistemas imune e hematopoético após o transplante;2) a fisiopatologia de reações inflamatórias pós-trans-plante; 3) o papel da alorreatividade e dos antígenosde histocompatibilidade na evolução dos TCTH; 4) oemprego dos TCTH para tratar imunopatias, como asdeficiências imunológicas e as doenças auto-imunes.

Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio: TRANSPLANTE DE MEDULA OSSEA - 2ª PARTE33: 443-462, out./dez. 2000 Capítulo XII

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As manipulações do sistema imune – imunoterapia-para aumentar a eficiência dos transplantes na elimi-nação de células neoplásicas foram discutidas no Ca-pítulo IX deste Simpósio.

1. IMUNORRECONSTITUIÇÃO, ENXERTIAE IMUNODEFICIÊNCIA

Os regimes de condicionamento empregadosnos TCTH alogênicos convencionais, mieloablativos,incluem combinações de agentes quimioterápicos (ali-ados ou não à radioterapia corporal ou nodal totais)em altas doses, com três funções básicas: 1) destruiras células tumorais ou outras células anormais, permi-tindo a cura da doença básica; 2) criar espaço na me-dula óssea para permitir a enxertia das CTH trans-plantadas; 3) destruir o sistema imunológico do recipi-ente, para a mesma finalidade. Em algumas doenças,como na anemia aplástica e em outras doenças auto-imunes e em algumas deficiências imunológicas, ape-nas a última função é necessária para o sucesso dotransplante. Entretanto, a imunoablação é ampla, pro-funda e prolongada, o que, juntamente com a mieloa-blação, produz pancitopenia hematopoética e imunoci-topenia e acarreta infecções oportunistas freqüentes egraves, que comprometem seriamente o resultado dostransplantes.

Discutiremos, a seguir, a reconstituição hema-topoética e imunológica, nas diversas categorias deTCTH atualmente praticadas. A reconstituição imu-nológica, nos transplantes utilizados como terapêuticadas imunodeficiências, será discutida na Secção 4.

1.1. Transplantes alogênicos

Nos transplantes autólogos e singênicos paradoenças neoplásicas, o condicionamento não tem fina-lidades imunoablativas, mas produz, além de mieloa-blação, considerável grau de imunodeficiência, pelo seufeito antiproliferativo sobre os sistemas imune e he-matopoético, mesmo na ausência de GVHD e de suaprofilaxia imunossupressora, que potenciam a imuno-depressão, como veremos abaixo. Já nos transplantesque empregam regimes de condicionamento de inten-sidade reduzida, não mieloablativos ou subablativos(os chamados “minitransplantes”), o grau e a du-ração da pancitopenia são consideravelmente reduzi-dos, conservando-se ou se intensificando a magnitudeda imunossupressão no condicionamento. De fato, emuma análise de 15 pacientes, submetidos a transplantealogênico com um regime não mieloablativo (ciclofos-

famida + fludarabina), foi demonstrada uma rápidaenxertia mielóide (média de 11 dias), inicialmente, decélulas do receptor e, gradualmente, substituídas pe-las do doador, mas a reconstituição imunológica comlinfócitos T do doador foi mais rápida, completando-se, em 30 dias, em seis pacientes, e, em 200 dias, apósinfusão de linfócitos do doador (donor lymphocyteinfusion, DLI), em sete pacientes. Essareconstituição, caracterizando o quimerismo comple-to do doador no compartimento de células T, prece-deu a expressão das respostas alorreativas no recep-tor, incluindo a facilitação da enxertia hematopoéticado doador, GVHD e a regressão da doença neoplásica,mediada pelo efeito GVL (graft-versus-leukemia)(Childs et al, 1999)(3).

1.1.1. Transplantes de medula óssea aparenta-dos HLA-idênticos

A reconstituição imunológica pós-transplante demedula óssea (TMO) alogênico tem sido estudadadesde sua implantação, na década de 70, e se desen-volveu bastante com o advento da citometria de fluxona década de 80 (revisado por Voltarelli & Stites,1987(4) e Voltarelli, 2000(5)). Desde os primeiros estu-dos funcionais (revisados por Whiterspoon, Lum &Storb, em 1984)(6) e fluorocitométricos (Ault et al,1985)7, observou-se que, inicialmente, após um TMOHLA-idêntico, predominam, no sangue periférico, cé-lulas NK com atividade citotóxica preservada e célu-las B CD5+, surgindo, depois, células B convencio-nais, células T CD8+ e, então, as CD4+. A relaçãoentre o número de células T auxiliares e citotóxicas(CD4+/CD8+) e a maioria das atividades funcionaisque dependem de células T e B, incluindo a produçãode imunoglobulinas, normalizam-se em torno de umano após o TMO, nos casos não complicados, mas semantêm alteradas por vários anos nos pacientes comGVHD crônico. O GVHD agudo também mantéminvertida a relação CD4/CD8 e compromete as rea-ções de hipersensibilidade tardia, mediadas por linfó-citos T, a resposta anticórpica primária e a recupera-ção de células dendríticas, que constituem as maiseficientes células apresentadoras de antígenos, até hojedescritas (Fearnley et al. 1999)(8). A explicação paraa interferência do GVHD, principalmente o crônico,na recuperação imunológica pós-transplante, repousana ação da terapia imunossupressora e na imunomo-dulação, causada pela própria doença(9), através decélulas T supressoras (CD8+), produtoras de prosta-glandina-E2, e CD4+ de fenótipo Th2, deficiente pro-

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dução de ou resposta a citocinas, como a IL2, reduçãodo número e seqüestração de células CD4+ nos tecidoslesados e diminuição de células dendríticas, como ascélulas de Langerhans da pele e de outros tecidos.

No Brasil, o grupo do Instituto Nacional do Cân-cer, no Rio de Janeiro, estudou a imunorreconstitui-ção de pacientes portadores de anemia aplástica ou deleucemias (LMC, LMA e LLA), submetidos a TMOalogênico HLA-idêntico. Nos primeiro grupo, mostra-ram que células NK CD8+ são as primeiras a surgiremno sangue periférico e que GVHD aguda e crônica, cir-rose hepática, rejeição do transplante e infecções viraisretardam a reconstituição imunológica (Souza et al.1994)(10). Já nas leucemias, mostraram que os pacien-tes com LMC reconstituem o sistema imune mais lenta-mente do que os com leucemias agudas, principalmenteno compartimento das células T (Diamond et al.1995)(11).

1.1.2. Imunorreconstituição em outros tipos detransplantes alogênicos

Atualmente, além do transplante de medula ós-sea HLA-idêntico relacionado não-manipulado (T re-pleto) e completamente mieloablativo, vários outros ti-pos de transplantes alogênicos têm sido realizados, comoos depletados de células T, os HLA-incompatíveis, osnão-relacionados, os de CTH mobilizadas do sangueperiférico, de cordão umbilical, intra-uterinos e os em-pregando regimes de condicionamento sublativos (videSecção 1.1). A análise da imunorreconstituição, nos di-ferentes tipos de transplantes citados, tem até maiorimportância do que no TMO convencional, pois, freqüen-temente, ela está qualitativamente e temporalmente maiscomprometida e repercute decisivamente na evoluçãodo transplante.

O TMO alogênico HLA-idêntico aparentado,depletado de células T para prevenir GVHD, está asso-ciado a um retardo na reconstituição imunológica, nonível funcional, e ao aumento de infecções oportunistas,o que evidencia a importância das células T maduras doenxerto, pelo menos para a fase inicial da recuperaçãoimunológica(9). Do mesmo modo, no TMO, o uso dedoadores não aparentados, HLA idênticos ou não, tam-bém se associa com uma alta frequência (12 a 28%) deinfecções oportunistas fatais. Nesses transplantes, e nosaparentados HLA-incompatíveis, a imunodeficiência éagravada pelas disparidades imunogenéticas nomicroambiente tímico, que dificultam o desenvolvimen-to das células T, pela maior intensidade da imunossu-pressão pós-transplante e pela maior incidência de

GVHD crônico. Quando se combinam esses dois ti-pos de transplantes (depletado de células T e nãoaparentados), observa-se que a imunorreconstituiçãode pacientes adultos está muito mais comprometidado que a de crianças, e que ela pode ser significati-vamente acelerada pela infusão de baixa dose delinfócitos do doador (DLI) (Small et al. 1999)(12).

A gravidade adicional da imunodeficiência empacientes submetidos a TCTH HLA incompatível,aparentado ou não, é bem ilustrada pelo Caso clíni-co Nº 1 apresentado a seguir.

Caso clínico ilustrativo Nº 1:

VMM, 16 anos, sexo feminino, estudante.Diagnosticada anemia aplástica grave em 9/10/96, sem transfusões. Não havia nenhum irmãoHLA-idêntico, mas a extensão da pesquisa na fa-mília revelou um primo compatível em 5/6 antíge-nos HLA, com uma incompatibilidade no "locus"DR. Realizado o condicionamento com ciclofos-famida 200 mg/kg, infusão de 2,43 x 108 célulasnucleadas/kg de MO e profilaxia de GVHD comCSA e MTX. Evolução pós-primeiro transplante:D+2: diarréia e lesão na língua, D+9: mucositegrau II, D+33: falha de enxertamento e flebitejugular a D, D+37: Globulina anti-timocitária(ATG): 30 mg/ Kg/d x 3 dias, D+42: infusão demedula óssea 3,5 x 108 cel/kg, G-CSF 5 ug/kg/d.Evolução pós-segundo transplante: D+10: icte-rícia e lesões na língua, D+17: biópsia de lesõesna língua compatível com herpes símplex, inicia-do aciclovir EV, D+20: velamento pulmonar in-tersticial de etiologia indefinida, iniciada Anfo-tericina B, D+36: GVHD agudo de pele e intesti-nal grau III, iniciado solumedrol 4mg/kg, reduzi-do no D+39 para 2 mg/kg, D+46: piora doGVHD intestinal, aumentado solumedrol nova-mente para 4 mg/Kg, D+51: biópsia de cólon com-patível com GVHD, D+59: mantém GVHD de pelee intestino, herpes labial e na língua em regres-são e insuficiência renal aguda (IRA), D+64:endoscopia digestiva mostra grande lesãovegetante no esôfago, biópsia compatível com her-pes esofágico, solumedrol diminuído para 1mg/kge CSA para 25% da dose, D+69: GVHD intesti-nal em remissão, esofagite herpética, IRA emeningoencefalite herpética, D+70 óbito: porchoque séptico.

Comentários: neste caso, a falha de enxer-tamento do primeiro transplante deve ter sido

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causada por uma combinação da disparidadeHLA, da dose insuficiente de células infundidas,causada por problemas na coleta e pelo uso iso-lado de ciclofosfamida no condicionamento. Apósa segunda infusão, com uma dose adequada decélulas e complementação do condicionamentocom ATG, houve enxertamento, mas sobrevieramGVHD agudo e infecções virais graves que cau-saram o óbito. Devido a estas complicações adici-onais do TMO incompatível ou não aparentado,mesmo em pacientes jovens com AA, prefere-se, atu-almente, a imunossupressão isolada como terapêu-tica de primeira escolha. Quando o TMO é reali-zado em casos com disparidade HLA, como este,deve-se usar TBI (irradiação corporal total) nocondicionamento, o que não era disponível emnosso centro naquela oportunidade, tendo sidosubstituída pelo ATG.

Mobilização de CTH para o sangue periféricousando fatores de crescimento hematopoéticos (prin-cipalmente G- ou GM-CSF) tem sido realizada comsucesso e esse tipo de produto substituiu quase com-pletamente o TMO autólogo (vide abaixo) e tem sidoempregado de maneira crescente nos transplantes alo-gênicos. Por conter um número aumentado, em rela-ção à medula óssea, de precursores hematopoéticosmais diferenciados e de células T, o sangue periféricomobilizado com fatores de crescimento (M-PBSC,mobilized peripheral blood stem cells) proporcionauma aceleração, tanto do enxertamento hematopoéti-co, como da reconstituição imunológica (Ottinger etal. 1996)(13). A seleção de CTH CD34+ do M-PBSCnão parece comprometer a recuperação linfóide nemaumentar a incidência de infecções oportunistas nostransplantes alogênicos HLA-idênticos (Behringer etal. 1999)(14), mas tem efeitos catastróficos nos trans-plantes HLA-incompatíveis (Bacigalupo et al, 1997)(15).

1.2. Imunorreconstituição em transplantes au-tólogos

A reconstituição imunológica fenotípica e fun-cional pós-transplante autólogo de CTH foi revisadapor Guillaume et al. em 1998(16). A produção de imu-noglobulinas sugere uma recapitulação da seqüênciaontogenética na recuperação funcional de células B,pois os níveis séricos de IgM se normalizam em 3-6meses, seguidos pelos de IgG, após 12-24 meses, e,posteriormente, pelos de IgA. Entretanto, evidênciasmais recentes, obtidas do estudo de rearranjos dosgenes das cadeias pesadas de imunoglobulinas, con-

tradizem a explicação de que a diferenciação de linfó-citos B pós-transplante autólogo ou alogênico recapi-tula o desenvolvimento fetal (Raaphorst, 1999)(17).

Nos primeiros meses pós-TCTH autólogo, afunção de células T também está deprimida, quandoavaliada por proliferação policlonal, produção de cito-cinas e de linfócitos citotóxicos contra vírus Epstein-Barr, ao contrário dos reativos contra CMV, que semostraram preservados já nos três primeiros mesesapós os transplantes e devem ser responsáveis pelabaixa incidência da infecção por CMV, em pacientessubmetidos a autotransplantes. Entretanto, a alta inci-dência (22,6%) e mortalidade (12.9%) da infecção porCMV(18) e de outras infecções oportunistas(19) noTCTH de células CD34 selecionadas, aparentementecorrelacionadas com o número de células T no enxer-to, mostra que as células imunocompetentes, presen-tes no enxerto, mais do que as recém-diferenciadas,a partir das CTH, são essenciais para a imunidadeantiinfecciosa nos primeiros 100 dias pós-transplante.Por outro lado, assim como nos transplantes alogêni-cos, as células NK se recuperam prontamente apósos autotransplantes, tanto em quantidade como em qua-lidade, exibindo maturação extratímica e respostacitotóxica a IL-2, IL-7 e IL-12(16).

Como destacado acima, a capacidade de mobi-lizar CTH da medula óssea para o sangue periférico,com fatores de crescimento hematopoéticos (G- ouGM-CSF), resultou em um processo de enxertia signi-ficativamente mais rápido nesses transplantes do quenos de medula óssea, o que, praticamente, levou aoabandono do TMO autólogo em favor do sangue peri-férico. A diferença, provavelmente, se deve à presen-ça, nas células-tronco periféricas mobilizadas com fa-tores de crescimento, de um número maior de precur-sores celulares já comprometidos com a diferencia-ção das várias linhagens hematopoéticas. A recupe-ração imunológica, após esses transplantes, também émais rápida do que após o TMO autólogo, em relaçãoàs contagens de monócitos, linfócitos T auxiliares, in-cluindo os CD45RA+ (virgens), aos TCR gama-del-ta+ e NK e à função proliferativa de células T e B(Talmadge et al. 1997)20. Nos TMO autólogos, a ad-ministração de G-CSF pós-transplante acelera, prefe-rencialmente, a recuperação de células CD8 ativadas(HLA-DR+CD11b-), enquanto o GM-CSF favorecea regeneração de células CD4+, tanto virgens, comode memória (CD45RO+) e não há diferenças nareconstituição de células B e NK (San Miguel et al.1996)(21). Em pacientes infundidos com CTH CD34+purificadas no FACS (por cell sorting), ocorreu um

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retardo na recuperação de células T e B e uma restri-ção no repertório dos receptores de células T, avalia-do pelas famílias de Vβ, em relação ao transplante deM-PBSC não selecionadas (Bomberger et al. 1998)(22).Já em pacientes adultos, infundidos com célulasCD34+, purificadas em colunas de afinidade, e rece-bendo GM-CSF pós-transplante, a recuperação decélulas T foi semelhante à observada em transplantesnão manipulados, enquanto a produção de células Tpelo timo foi aumentada, o que se correlacionou coma produção de novas células T (virgens, de fenótipoCD45RO/CD27+) e com a diversidade do repertóriode TCR (Douek et al. 2000)(23) (Figura 1). Outro estu-do mostrou que, nos transplantes autólogos de PBSCselecionadas, ocorre uma recuperação rápida de cé-lulas dendríticas, T, B e NK, mas a composição dapopulação de células T é anormal, com predomínio decélulas CD8+ e redução de células T virgens, tanto defenótipo CD4 como CD8 (Galy et al. 2000)(24). Taisalterações persistiram vários anos após TMO autólo-go depletado de células neoplásicas (Nordoy et al.1999)(25). A recuperação de células dendríticas nãovariou entre recipientes de TMO e M-PBSC, selecio-nadas ou não (Fearnley et al. 1999)(8).

1.3. Papel do timo na imunorreconstituição

A influência do timo no processo de reconstitui-ção imunológica pós-TCTH foi hipotetizada desde osprimórdios dos transplantes, mas só recentemente sur-giram metodologias adequadas para o estudo da dife-renciação tímica de células T na idade adulta. Tradici-onalmente, utilizava-se o fenótipo CD45+RA+ comomarcador de células recém-produzidas pelo timo, mas,atualmente, reconhece-se que o CD27 é um melhormarcador para células virgens e que elas, embora se-jam células de vida longa, nem todas são recém-pro-duzidas pelo timo, podendo sofrer diferenciaçãoextratímica. A metodologia mais sensível para detec-tar as células recém-produzidas pelo timo é a quantifi-cação, por técnicas de biologia molecular, de fragmen-tos circulares de DNA, pertencentes ao TCR, que selocalizam em epissomos de linfócitos T (T cell recep-tor excision circles, TREC) (Haynes et al. 2000)(26)

(Figura 1). Utilizando tal tecnologia, foi verificado quecrianças que receberam TMO, depletado ou não decélulas T, para imunodeficiência combinada grave(severe combined immuodeficiency, SCID), apresen-taram altos níveis de TREC um a dois anos após otransplante (vide secção 4), enquanto adultos que re-ceberam transplante de cordão umbilical não-relacio-nado, ao contrário das crianças, apresentaram baixos

níveis de TREC e expansão de células T diferencia-das extratimicamente, provavelmente devido à profi-laxia da GVHD. Por outro lado, pacientes adultos quereceberam transplantes autólogos, com células CD34selecionadas, mostraram maiores níveis de TREC doisanos após o transplante do que os que receberam trans-plantes não manipulados(23). A última observação evi-dencia, ao contrário do que se acreditava, que o timode pacientes adultos, na ausência de imunossupressãopós-transplante, contribui substancialmente para a re-constituição imunológica em seguida ao TCTH.

Utilizando métodos convencionais de marcaçãode células virgens (CD45RA), combinados com a aná-lise simultânea da diversidade do TCR (V-betaspectratype), Roux et al. (2000)(27) mostraram que a re-cuperação dessas células e de seu repertório, em pa-cientes adultos, era dependente da idade, em seguida aTMO HLA-idêntico, depletado de células T. Empre-gando o mesmo marcador no seguimento de um pacien-te timectomizado, submetido a TMO alogênico, Heitgeret al. (1997)(28) mostraram que a ausência do timo im-pediu a regeneração de células CD4+45RA+, mas nãoa das CD8, mostrando que o antígeno 45RA não iden-tifica apenas as células virgens produzidas pelo timo.

1.4. Considerações práticas

Quais são as conseqüências práticas dos co-nhecimentos sobre imunorreconstituição pós-TCTHpara o tratamento de pacientes transplantados? Elassão muitas e muito importantes, como a previsão dosvários tipos de infecção em diferentes fases das di-versas modalidades de transplantes existentes, a de-terminação da época oportuna de suspender precau-ções de isolamento e de empreender medidas imuno-terapêuticas, desde vacinações comuns até infusão deimunoglobulinas ou linfócitos especificamente reativoscontra determinados patógenos (Trigg, 1999)(29). As-sim, baseando-se na relação observada entre baixascontagens linfocitárias no trigésimo dia pós-TMO alo-gênico não manipulado e a percentagem de recaídasleucêmicas (Powles et al. 1998)(30), iniciaram-se pro-tocolos de infusão profilática de linfócitos nos pacien-tes de maior risco. Do mesmo modo, protocolos deinfusão de clones de linfócitos T (CD4 e CD8+), sen-sibilizados contra antígenos do CMV, estão sendo de-senvolvidos, visando a proteger pacientes que tardama desenvolver reações de imunidade celular contra ovírus (Riddell. 2000)(31). Ademais, baixos níveis de imu-noglobulinas e de função de linfócitos B, no primeiroano pós-transplante, justificaram, nessa fase, o usoprofilático de imunoglobulinas por via endovenosa, mas

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resultados positivos não foram comprovados (Sullivanet al. 1996)(32). Finalmente, como a transmissão deimunidade antiinfecciosa do doador para o receptorcostuma ser transitória, recomenda-se reimunizar pa-cientes no período pós-transplante (Ljungman etal.1995)(33). Monitorização dos títulos de anticorpos es-pecíficos pré e pós-vacinação pode ajudar a individu-alizar o esquema de vacinação, especialmente em pa-cientes com GVHD crônico e/ou em uso de drogasimunossupressoras (ver Capítulo X deste Simpósio).

Avaliações fenotípicas e funcionais do sis-tema imune não são realizadas rotineiramenteapós TCTH, mesmo em centros avançados, tor-nando a imunorreconstituição, na opinião demuitos pesquisadores, o aspecto dos TCTH maisnegligenciado atualmente, com profundo impac-to na sua evolução. Assim, baseando-se nos estu-dos realizados em pacientes com AIDS, propõe-seuma monitorização imunológica rotineira e periódica,pelo menos dos níveis de células CD4+ pós-transplan-te, usando-se esses parâmetros para guiar a suspen-são da profilaxia antimicrobiana, das medidas de iso-lamento e de imunoprofilaxia (Trigg,.1999)(29).

2. PAPEL DOS ANTÍGENOS DE HISTOCOM-PATIBILIDADE NA EVOLUÇÃO DOS TCTH

Como foi mencionado na introdução deste capí-tulo, os TCTH só se tornaram uma alternativa clinica-mente viável após a descoberta dos antígenos de his-tocompatibilidade principais (major histocompatibilitycomplex, MHC) e o desenvolvimento, após a décadade 60, de métodos de tipificação desses antígenos noHomem, reunidos no sistema HLA (human leukocyteantigens). Antes disso, as tentativas de transplantarmedula óssea alogênica esbarravam em reações fa-tais de GVHD agudo ou de rejeição.

A gravidade dessas reações de alorreatividade,mediadas pelos antígenos HLA, praticamente restrin-giu, durante muitos anos, os TCTH a pares doador-receptor oriundos da mesma família, com identidadeHLA e esta é, ainda, a situação em nosso país, que éfavorecido pelo grande tamanho das famílias e, por-tanto, pela grande disponibilidade de doadores HLA-idênticos (Tabela I). A ocorrência de significativa fre-qüência (35-40%) de GVHD, aguda ou crônica, e, emcertas circunstâncias, de rejeição do enxerto, em

A)

B)

C)TCRD locus

Figura 1: A) Geração de dois tipos de TREC (sinalizador - sj e codificador - cj) durante o rearranjo do receptor de células T,produzindo a excisão do locus D (TCRD). B) Tanto o TREC cj (o) como o sj (•) declinam exponencialmente com a idade.C) Cinética da produção de células T pelo timo, medida pela quantidade de TREC, após TCTH autólogo. A produção é nula naenxertia (E), volta a níveis basais (B) em 1 ano e aumenta, em 2 anos, nos transplantes de CTH (CD34) selecionadas (•).Adaptada das refs.: 23 e 26.

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Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hematopoéticas

TCTH HLA-idêntico, revelou a importância de umconjunto de antígenos não-HLA, denominados antíge-nos secundários de histocompatibilidade (minorhistocompatibility antigens, mHA). Por outro lado,o conhecimento mais detalhado da estrutura do siste-ma HLA e, principalmente, o grande avanço nas téc-nicas de sua tipificação, por biologia molecular, permi-tiram, gradativamente, expandir a aplicação dos TCTH,usando, inicialmente, doadores de medula óssea da fa-mília expandida, além dos irmãos, evoluindo para osdoadores não-relacionados de MO, provenientes debancos internacionais e, finalmente, para os doadoresde cordão umbilical, relacionados ou não. A análisedas complicações imunológicas e resultados do TCTHrealizado com diferentes graus de incompatibilidadeantigênica permitiu dissecar o papel do sistema HLAna evolução dos transplantes, como veremos abaixo.

Nos transplantes entre membros relacionadosda família estendida, não-irmãos, pode-se usar doado-res, em relação ao sistema HLA, fenotipicamente idên-ticos (tipados no nível protéico por métodos sorológi-cos e celulares convencionais), genotipicamente idên-ticos (tipados a nível gênico por técnicas de biologiamolecular) ou incompatíveis em um haplotipo (três an-tígenos dos locos HLA-A, B e DR) ou em um ou doisdesses antígenos. Os resultados desses transplantes

mostraram, desde a década de 80, que a sobrevida depacientes transplantados com uma MO apresentandoapenas uma incompatibilidade HLA era comparávelaos dos transplantes fenotípica ou genotipicamenteHLA idênticos (revisto por Henslee-Downey &Gluckman, 1999(34) e Mickelson et al. 2000(35)). Comduas ou três incompatibilidades, o aumento da inci-dência de GVHD, rejeição e infecções afeta signifi-cantemente a sobrevida global, sendo a incompatibili-dade no locus HLA-DR mais nociva do que a dosloci HLA-A ou B. Devido à dificuldade logística, amaioria dos centros de TMO pesquisa doadores rela-cionados apenas entre irmãos. Entretanto, a pesquisana família estendida, quando realizada sistematicamen-te, guiada por uma estratégia imunogenética racional,pode identificar doadores aceitáveis (HLA idênticosou incompatíveis em apenas um locus) em quase me-tade dos casos(34). Em nosso centro, de 1992 a 2000,fizemos esse tipo de pesquisa em 17 famílias estendi-das e identificamos três familiares HLA idênticos edois com uma disparidade antigênica. Desses, uma pa-ciente foi transplantada (Caso ilustrativo Nº 1), commau resultado (óbito por infecção e GVHD). Outrospacientes foram transplantados com doadores fenoti-picamente idênticos (pai/mãe para filho), com melho-res resultados.

, ,Tabela I - Pesquisa de doadores HLA idênticos entre irmãos de candidatos a TMO alogênico no Labora-tório de Imunogenética do Hemocentro Regional/HCFMRPUSP.

Nº de famílias com pelo menos um doador idênticoAno

Nº de famíliaspesquisadas

Nº médio de irmãosna família Observado Esperado*

1991 28 2,9 19 16

1992 52 2,1 32 24

1993 36 3,4 26 23

1994 50 3,8 32 33

1995 50 3,8 30 33

1996 60 3,6 34 39

1997 70 3,9 49 47

1998 64 2,7 47 35

1999 57 5,0 37 43

2000 70 4,0 48 48

Total 537 3,5 (média) 354 (66%) 341 (63%)

* Dado pela expressão N(1-0,75n) onde N é o número de famílias avaliadas e n é o número de irmãos pesquisados.

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A escassez de doadores relacionados HLA-idênticos, principalmente nos países desenvolvidos, le-vou à organização de bancos de doadores de medulaóssea, voluntários, que, atualmente, armazenam da-dos de mais de cinco milhões de doadores. Milharesde transplantes já foram realizados, usando-se essesdoadores, verificando-se, também, a grande influên-cia que o sistema HLA exerce sobre o resultado detal tipo de transplantes. A incidência de rejeição doenxerto aumentou significativamente com a presençade disparidades em classe I e com prova cruzada po-sitiva entre soro do doador e linfócito do receptor. Já aincidência de GVHD aguda, grave (graus III e IV)aumentou com a presença de disparidades múltiplasem classe I ou únicas em classe II. Pacientes incom-patíveis em mais de um locus (classe I ou classe II)têm menor sobrevida do que pacientes com nenhumaou apenas uma compatibilidade.

Entre receptores de transplantes de cordão um-bilical de doadores relacionados, a compatibilidade HLAtambém foi um fator importante, influenciando a so-brevida dos pacientes. Já em transplantes de cordãoumbilical não relacionados, a influência da compatibili-dade HLA sobre a ocorrência de GVHD agudo, rejei-ção e sobrevida é controvertida, sendo superada, emalguns estudos, pela dose de células infundidas(34).

Nos transplantes HLA-idênticos, as reaçõesimunológicas (GVHD, rejeição, efeito GVL e outras)são mediadas pelos antígenos secundários de histo-compatibilidade, que incluem os do grupo HA, antíge-nos mitocondriais, antígenos associados ao cromosso-mo Y (H-Y), ao sistema ABO e muitos outros emidentificação (Simpson et al. 1998)(36). Os antígenosHA humanos foram descobertos pelo grupo de Goulmy,na Holanda, estão associados aos antígenos HLA declasse I, assumem cinco formas alélicas (HA-1 a –5),em que o HA-1 exibe imunodominância, isto é, na pre-sença de múltiplas incompatibilidades, a maioria dasrespostas é dirigida contra ele. Assim, em pacientesque receberam TMO compatíveis na classe I do HLA,a ocorrência de GVHD agudo correlacionou-se forte-mente com disparidade no locus HA-1, o qual pode-ria ser, então, utilizado para selecionar doadores emfamílias com vários HLA-idênticos. Ao contrário,mHA têm sido utilizados como alvo de reações deenxerto-contra-leucemia. A importância clínica de ou-tros mHA, além dos HA, nos TCTH, é ilustrada pelaobservação antiga da incidência aumentada de GVHDquando se usam, como doadores, mulheres multíparas(sensibilizadas para os antígenos H-Y do receptor) epela observação da provável correlação entre GVHD

agudo e incompatibilidade secundária (minor) no sis-tema ABO (Bacigalupo et al.1988)(37).

Várias tentativas têm sido feitas, ao longo daevolução dos TCTH alogênicos, para minimizar asreações de alorreatividade e permitir o uso de doado-res incompatíveis, principalmente os haploidênticos (ir-mãos ou pais/filhos). Entre essas tentativas, revisadaspor Drobyski (2000)(38) e por Hensley-Downey &Gluckman (1999)(34), destacam-se:1) Depleção de células T do transplante, de uma ma-

neira que não comprometa a enxertia nem o efeitoenxerto-contra-leucemia. O objetivo tem sido alcan-çado, pelo menos em parte, usando métodos de de-pleção parcial ou seletiva de linfócitos T in vitro, comanticorpos monoclonais de especificidade restrita,por exemplo, anti-CD6 ou anti-TCR αβ (T10B9),combinados ou não com imunossupressão peritrans-plante in vivo (com imunotoxina anti-CD5-ricinaou globulina anti-timocitária e metilprednisolona).

2) Tratamento in vitro do transplante com anticorposmonoclonais (anti-B7 ou CTLA4Ig) que bloque-iam a via B7-CD28 de coestimulação de linfócitosT do doador e os tornam tolerantes (anérgicos) aoenxerto.

3) Uso de megadoses de CTH (10-19 milhões/kg)mobilizadas da MO com G-CSF, combinadas commedula óssea depletada de células T com hemá-cias de carneiro. As doses altas de CTH pareceminativar as células T do doador com capacidadecitotóxica (efeito veto) e, assim, evitar a rejeiçãodo enxerto. O efeito benéfico do número aumenta-do de CTH, na redução da rejeição, foi tambémobservado em pacientes submetidos a tratamentoin vivo com o anticorpo monoclonal CAMPATH-1 (anti-CD52, de especificidade ampla).

3. PAPEL DAS CITOCINAS NAS COMPLICA-ÇÕES INFLAMATÓRIAS DO TCTH: FE-BRE, GVHD E OUTRAS

As citocinas pró-inflamatórias compreendemum grande grupo de mediadores, cujos principais re-presentantes são o TNF-α, o IFN-γ, a IL-1, a IL-2, aIL-6 e a IL-8, responsáveis pelo desencadeamento dafebre (pirógenos endógenos) e de muitas outras rea-ções inflamatórias agudas e crônicas, incluindo o cho-que séptico e a falência múltipla de órgãos (revisadopor Voltarelli, 1994)(39). Vários trabalhos, clínicos eexperimentais, têm mostrado a participação dessascitocinas no desencadeamento e na evolução de com-plicações dos TCTH, como as próprias síndromes in-

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Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hematopoéticas

fecciosas, VOD (doença venoclusiva hepática), mu-cosite, pneumonite intersticial, reações transfusionaise medicamentosas, febre de origem indeterminada e,principalmente, GVHD (vide abaixo). Entretanto, amedida dos níveis plasmáticos das citocinas pró-infla-matórias ou de outras (IL-10, TGF-β) não tem semostrado útil para prever a ocorrência de complica-ções em pacientes individuais, devido à limitação desensibilidade e especificidade (Singer & Bianco,1999)(40). Mais recentemente, a quantificação de cito-cinas intracelulares, principalmente em monócitos,parece ter um melhor valor preditivo para a ocorrên-cia de doenças inflamatórias pós-transplante.

Em transplantes autólogos de medula óssea oude sangue periférico, mobilizado com fatores de cres-cimento, tem sido observada, com freqüência elevada,uma síndrome de enxertia, caracterizada por "rash"cutâneo, febre asséptica, infiltrados pulmonares, disp-néia e extravasamento capilar (Lee et al.1995)(41). Talsíndrome parece ser mediada por um conjunto de cito-cinas pró-inflamatórias, algumas delas liberadas porfatores de crescimento hematopoéticos (G- ou GM-CSF). Nos transplantes alogênicos, as reações de alor-reatividade podem mediar uma síndrome semelhante,sem associação com fatores de crescimento exógenos.

Em nossa unidade, monitorizamos um conjuntode citocinas plasmáticas em 39 episódios febris, noperíodo pós-transplante imediato, e verificamos que amaioria delas (IL-6, IL-8, IL-10, IFN-γ e TNF-α) es-tavam aumentadas durante infecções por bactériasgram-positivas e gram-negativas, enquanto a IL-1 sóestava aumentada nestas últimas e nas reações à an-fotericina B. Por outro lado, nos episódios infecciososde causa indeterminada, com hemoculturas negativas,nenhuma das citocinas estava elevada no plasma, cor-relacionando-se com o caráter benigno destes casos(Figura 2). Além disso, não foi observada correlaçãoentre os níveis plasmáticos das citocinas e as conta-gens de neutrófilos circulantes, o tipo de transplante(autólogo ou alogênico), a terapêutica antitérmica em-pregada (paracetamol ou dipirona) e a mortalidade dospacientes acometidos de infecções (Stracieri, 1998)(42).

Baseando-se nas observações relatadas acimae na ocorrência de febre no período de aplasia, hiper-citocinemia no período de enxertia e evidências de le-são endotelial, num grupo de pacientes com complica-ções clínicas pós-TCTH (GVHD, microangiopatiatrombótica, VOD, síndrome de angústia respiratóriado adulto, pneumonite por CMV e falência de múlti-plos órgãos), elas foram consideradas parte de umareação inflamatória sistêmica, desencadeada por doistipos de agressões (Takatsuka et al. 2000)(43). Na pri-

meira, lesões teciduais, provocadas pelo regime de con-dicionamento, e mediadores liberados nas reações fe-bris provocam aumento dos níveis de citocinas, sensi-bilizando o endotélio vascular à ação de um segundotipo de agressão, desencadeada por drogas imunossu-pressoras, agentes infecciosos e reações alorreativas,resultando em um processo inflamatório multissistêmi-co. De acordo com tal modelo, para se evitar a morbi-mortalidade das complicações inflamatórias pós-TCTH,faz sentido: 1) empregar regimes de condicionamentomenos agressivos, como os subablativos; 2) prevenir aocorrência de reações febris durante o período aplástico;3) ajustar a dose da imunossupressão após a enxertia;4) evitar as lesões do endotélio vascular e a ação exa-cerbada das citocinas, como veremos a seguir.

As citocinas desempenham, também, um im-portante papel na patogênese da GVHD, tanto em suaforma aguda como na crônica. Na primeira, a se-qüência de eventos, considerada responsável pelo de-sencadeamento das lesões teciduais da GVHD agu-da, compreende três fases (Ferrara, 2000)(44): 1) Oregime de condicionamento lesa e ativa tecidosdo receptor, principalmente aqueles mais expostos aendotoxina e outros produtos bacterianos, como a pele,fígado e intestino, levando a um aumento da produçãode citocinas pró-inflamatórias (TNF-α, IL-1) e fato-res de crescimento (GM-CSF). Essas citocinas esti-mulam a expressão de moléculas de adesão e de antí-genos de histocompatibilidade nos tecidos do hospe-deiro, facilitando seu reconhecimento pelas células Tdo doador; 2) O reconhecimento de aloantígenosrequer dois tipos de sinais, o primeiro provido pelainteração específica entre o receptor para células T(TCR)-peptídios-MHC e o segundo, coestimulatório,provido por um conjunto de ligantes, dos quais os maisbem caracterizados são os antígenos B7, nas célulasapresentadoras de antígenos, e os receptores CD28 eCTLA-4 na célula T. Quando adequadamente ativadas,as células T do doador produzem um conjunto de cito-cinas do tipo Th1, principalmente Il-2 e IFN-γ, queiniciam a cascata de eventos inflamatórios da GVHD.Elas são contrabalançadas por citocinas do tipo Th2,principalmente Il-4 e IL-10, e por diversos tipos decélulas T supressoras (CD4-CD8-NK1.1+, Tr1, etc).O equilíbrio entre células T reativas, incluindo as Th1,e supressoras, incluindo as Th2, pode controlar a fre-qüência e intensidade da GVHD; 3) Os mecanismosefetores da GVHD aguda compreendem reações in-flamatórias e citotóxicas, ambas dependentes da açãode citocinas. Nas primeiras, fagócitos mononucleares,sensibilizados por citocinas Th1, na fase anterior, so-frem uma outra estimulação, provavelmente por lipo-

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Figura 2: Níveis de citocinas plasmáticas em vários tipos de episódios febris pós-TCTH: FOI: febre de origem indeterminada,Gram +: iinfecção por gram-positivos, gram-: infecção por gram negativos, Anfo: toxicidade à Anfotericina B. (ref. 42)

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Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hematopoéticas

polissacarídeos bacterianos, que atravessam a mucosaintestinal, lesada pelo condicionamento, secretando ci-tocinas pró-inflamatórias, notadamente IL-1 e TNF-αe outros mediadores, como o óxido nítrico (NO). Es-ses mediadores produzem dano tecidual diretamenteou ativando outras células ou ainda causando a libera-ção de outras citocinas. Assim, o TNF-α pode produ-zir necrose ou apoptose pela via do Fas, e, juntamentecom a IL-1, Il-6 e IL-8, pode ser um importante medi-ador da desnutrição, febre (vide acima) e outras mani-festações inflamatórias da GVHD, e o NO pode con-tribuir para a imunossupressão associada à doença.Essas ações das citocinas sinergizam com os efeitoscitotóxicos diretos de linfócitos T e, possivelmente, NKcontra tecidos-alvo de GVHD.

A GVHD crônica, por sua vez, é causada peloreconhecimento tardio de aloantígenos secundários dehistocompatibilidade ou por auto-antígenos (porção co-mum de antígenos HLA de classe II). De acordo coma última hipótese, ele se assemelharia à GVHDautóloga, observada em transplantes singênicos ou au-tólogos e, em ambos, há participação da disfunçãotímica, dificultando o estabelecimento de tolerância do-ador-receptor, e de citocinas, mediando lesão tecidual.Diferentemente da GVHD aguda, há uma mistura decitocinas do tipo Th1 e Th2 (IL-4, IFN-γ e TNF-α,mas não IL-2), que, entre outras ações patogênicas,estimulam a produção de colágeno por fibroblastos,produzindo lesões fibróticas, características da doen-ça (Margolis & Volgesang, 2000)(45).

O reconhecimento do papel das citocinas napatogênese da GVHD tem levado ao desenvolvimen-to de estratégias terapêuticas, dirigidas a essas molé-culas, para prevenir ou tratar a doença. Elas incluem:1) o fortalecimento da barreira intestinal (“cytokineshield”) antes do condicionamento, empregando, porexemplo, IL-11 ou fator de crescimento de queratinó-citos, para diminuir a passagem de substâncias imuno-estimulantes do intestino para a circulação, ou 2) o usode inibidores de citocinas pró-inflamatórias (anticorposmonoclonais anti-TNF-α ou receptores solúveis da IL1–IL1ra) para profilaxia ou tratamento da doença.

4. TCTH PARA IMUNOPATIAS: IMUNODE-FICIÊNCIAS E DOENÇAS AUTO-IMUNES

Se, por um lado, o sistema imune influencia de-cisivamente a evolução dos TCTH para doenças on-cológicas e hematológicas, por outro, esses transplan-tes podem ser empregados com sucesso para o trata-mento de várias doenças que acometem o sistema

imune, como as deficiências imunológicas, as enfermi-dades auto-imunes e linfoproliferativas. As duas pri-meiras serão discutidas nesta secção e as últimas fo-ram discutidas nos Capítulos VIII e IX deste Simpósio.

4.1. TCTH para deficiências imunológicas

Como mencionado na introdução deste capítu-lo, os primeiros transplantes alogênicos bem sucedi-dos foram realizados em 1968, em dois pacientes comimunodeficiências, portadores, respectivamente, de de-ficiência imunológica combinada grave (SCID) e desíndrome de Wiskott-Aldrich (SWA). Estas doençaspermanecem sendo as principais indicações de TCTHpara ID na atualidade. Desde aquela época, muitosavanços alcançados nos transplantes para ID, como adepleção de células T, os transplantes HLA-incompa-tíveis e os acoplados à terapia gênica, foram generali-zados e aplicados aos pacientes transplantados paraoutras doenças.

A maioria dos TCTH realizados para IDs sãoaplicados a alguma forma de SCID, pois o transplanteé a única modalidade terapêutica curativa para tal do-ença (revisto por Parkman, 2000)(46). Apenas uma mi-noria de pacientes com SCID recebe TCTH de doadorHLA-idêntico, tendo uma sobrevida de aproximada-mente 80%, a qual se reduz para 60 a 70% nos recepto-res de transplantes haploidênticos, depletados de célu-las T. Nestes últimos, a reconstituição imunológica decélulas T, exclusivamente a partir das CTH, demoratrês a quatro meses, em contraste com dias a três se-manas nos transplantes não manipulados, refletindo aimportante contribuição das células T maduras do en-xerto. Por outro lado, o compartimento de células B nãose normaliza em um grande número de pacientes comSCID após TCTH, requerendo reposição com imu-noglobulina EV (vide Tabela II). Esse fato parece sermais comum nos pacientes que não recebem condicio-namento pré-transplante. Estudos recentes e detalha-dos da imunorreconstituição em TCTH para SCID re-velaram que tais pacientes, algumas semanas após otransplante, têm capacidade de produzir células T pelotimo, medidas pelo fenótipo CD45RA e pelo ensaio TREC(vide Figura 1), as quais proliferam em resposta a mitó-genos. Entretanto, um a dois anos após o transplante, ascélulas recém-emigradas do timo começam a diminuirem um ritmo mais acelerado do que em indivíduos nor-mais (Patel et al. 2000)(47). Finalmente, as característi-cas clínicas que têm maior impacto na evolução dosTCTH para SCID, além da compatibilidade HLA, são aidade do paciente na época do transplante, a presençade infecções oportunistas e de GVHD materno-fetal.

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A segunda ID mais freqüentemente transplan-tada é a síndrome de Wiskott-Aldrich, caracterizadapor imunodeficiência celular, deficiência de IgM e trom-bocitopenia. Ao contrário da SCID, há necessidadede condicionamento pré-transplante, para evitar rejei-ção, mesmo nos transplantes HLA-idênticos e o regi-me mais comumente empregado, na atualidade, ébussulfan mais ciclofosfamida. Dentre 170 transplan-tes, registrados no IBMTR, a sobrevida longa de reci-pientes de transplantes familiares HLA-idênticos foide 86%, semelhante à dos transplantes não relaciona-dos em pacientes menores de cinco anos (83%), cain-do para 26% em pacientes com mais de cinco anos epara 51% em recipientes de transplantes relacionadosHLA-incompatíveis, incluindo os haploidênticosdepletados de células T. Assim, a SWA pode ser cu-rada por TCTH alogênico, mas eles devem ser feitosprecocemente para evitar o desenvolvimento de com-plicações da doença, principalmente as auto-imunes(46).

Uma variedade de outras IDs tem sido tratadapor TCHT, incluindo a síndrome de híper-IgM (defici-ência do ligante de CD40), doença granulomatosa crô-nica infantil, síndrome do linfócito desnudo (deficiên-cia de expressão de moléculas HLA), síndrome de

Chediak-Higashi e a linfohistiocitose hereditária (defi-ciência genética da perforina). Em algumas dessas do-enças, como a síndrome de Chediak-Higashi, o TCTHnão corrige as manifestações neurológicas da doença,enquanto, em outras, como na doença granulomatosa crô-nica infantil, apenas um subgrupo de pacientes de altorisco tem indicação de transplante. Nesses pacientes, umcondicionamento subablativo com ciclofosfamida, flu-darabina e ATG combinado com DLI mostrou resulta-dos bastante promissores (revisto por Dinauer, 2000)(48).

O TCTH também tem sido empregado comoveículo de terapia gênica em algumas IDP, como aimunodeficiência combinada grave (formas ligada aoX e deficiência de adenosina deaminase) e a própriadoença granulomatosa crônica infantil.

A Unidade de TMO da UFPR, em Curitiba,transplantou seis crianças portadoras de ID primárias(1 SWA e 5 SCID) entre maio de 98 e dezembro de2000, sendo três com medula óssea (duas HLA-idên-ticas e uma haploidêntica) e três com cordão umbili-cal não aparentado (duas com uma incompatibilidadee uma com duas incompatibilidades HLA). Todos ospacientes sobreviveram, alguns com complicações crô-nicas (Tabela II).

Tabela II - Experiência da Unidade de TMO da UFPR com TCTH para imunodeficiências primárias.

ReconstituiçãoIdade Sexo Diagnós-tico Tipo HLA Con-

dic.Depl.

Cels T PMN Plq. Cels T BComplicações Status

atual

2a M SWA TMO Id BuCy não D+13 sim sim sim Glaucoma,CMV

OK

2a M SCID TMO Id BuCy não D+22 lenta + sim GVHD hepáti-co e intestinal

OK,Ig EV e

AZA

2m M SCID TMO Haplo Não Simroseta E

-- -- sim não GVHD cutâ-neo e hepático

c/ citopenia

OK,usa

Ig EV

1a M SCID SCUP 1 Ag≠ Não Simroseta E

-- -- + não D. linfoprolife-rativa p/ EBV,

Tb, volvo

Desnu-trição,

emNPT eIg EV

1a M SCID SCUP 2 Ag≠ Bu não D+15 lenta sim não Síndrome dapega, VOD,Insuficiência

Renal

OK,Ig EV

10m M SCID SCUP 1 Ag≠ BuCyATG

não D+19 lenta sim sim Tb, GVHDcutâneo, VOD

OK

SWA: Síndrome de Wiskott Aldrich, BuCy: bussulfan/ciclofosfamida, SCID: deficiência imunológica combinada grave, SCUP: san-gue de cordão umbilical e placentário, roseta E: roseta com eritrócitos de carneiro, Tb: tuberculose, NPT: nutrição parenteral total.AZA: azatioprina, Id: idêntico, Condic.: condicionamento, Depl.: depleção, Plq: plaquetas, ATG: globulina anti-timocitária,VOD: doença venoclusiva hepática.

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Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hematopoéticas

senvolvem LES espontaneamente, e outra, 2) induzi-da pela injeção de auto-antígenos, como da proteínamielínica básica, que provoca a encefalomielite alérgi-ca experimental, ou de colágeno ou antígenos bacte-rianos, que provocam artrite experimental. Em ambasas categorias, a DAI pode ser prevenida ou curadapela infusão de CTH, mas, na primeira, as célulasalogênicas são mais eficientes, enquanto, na segunda,que parece se aproximar mais da situação humana,tanto os transplantes alogênicos como os autólogos sãoeficientes. Dois grupos de pacientes, um com artritereumatóide que desenvolveu anemia aplástica apósterapia com sais de ouro e outro com doença de Crohne leucemia, receberam TMO alogênico, ao lado deoutros casos isolados com outros diagnósticos. A maio-ria desses pacientes obteve remissão da DAI, masalguns tiveram recidiva, mesmo com reconstituiçãolinfoematopoética completa, do doador. Casos isola-dos de remissão de DAI em seguida a TCH autólogopara neoplasias hematológicas também foram obser-vados, mas uma série de cinco pacientes transplanta-dos com CTH não manipuladas teve recidiva precoceda DAI (Euler et al. 1996)(51). Baseando-se nas evi-dências apontadas acima e neste último relato, várioscentros começaram a transplantar pacientes portado-res de DAI graves e refratárias à terapia convencio-nal com CTH autólogas, depletadas in vivo ou in vitrode linfócitos T e B, sendo os primeiros casos, em lúpuseritematoso sistêmico, relatados em 1997. O transplan-te descrito abaixo, realizado no Brasil, no início de 1996,com CTH não manipuladas, é um dos primeiros a serfeito em DAI isolada, mas, infelizmente, não foi rela-tado na literatura internacional.

Caso clínico ilustrativo Nº 2

Paciente LKS, do sexo feminino, de 54 anosde idade, apresentava lesões cutâneas do tipolivedo reticular desde 1992, sendo diagnosticadaanemia hemolítica por aglutinina a frio, em maiode 1994. Foi tratada com corticoesteróides (dexa-metasona e prednisona) e, devido aos efeitoscolaterais, com clorambucil, até setembro de 95.Houve regressão das lesões cutâneas e estabiliza-ção da hemoglobina (entre 9 e 11 g/dl), mas, man-teve-se auto-aglutinação à temperatura ambientee teste de Coombs positivo. Em setembro de 95, foiadmitida no Hospital Albert Einstein com pancito-penia (Hb 5,5 g/dl, GB 1500/ul e plaquetas 31000/ul). A biópsia de medula óssea revelou componen-te mielodisplásico. Foi suspenso o clorambucil e

4.2. TCTH para doenças auto-imunes

As doenças auto-imunes (DAI) podem ser lo-calizadas, causando, geralmente, uma endocrinopatia(tireoidite de Hashimoto, tireotoxicose de Graves, dia-betes insulino-dependente, insuficiência adrenal deAddison), ou multissistêmicas, originando doenças reu-máticas que podem afetar órgãos vitais e causar sig-nificativa morbimortalidade (artrite reumatóide, lúpuseritematoso sistêmico, febre reumática, esclerose sis-têmica, dermatopolimiosite e vasculites). Numa regiãointermediária desse espectro, há DAI, como a escle-rose múltipla, a miastenia gravis e as citopenias auto-imunes, que acometem apenas um sistema orgânico,o qual, por sua distribuição universal, acarreta conse-qüências semelhantes às das doenças multissistêmi-cas. Englobaremos as duas últimas categorias de en-fermidades como DAI sistêmicas. Embora tenha ha-vido grandes progressos no entendimento dos meca-nismos fisiopatológicos envolvidos nessas doenças, aetiologia da grande maioria delas permanece obscura,limitando o desenvolvimento de terapêuticas específi-cas. Uma exceção ilustrativa da situação é a auto-imunidade causada pela infecção estreptocócica dogrupo B, em que, tanto a febre reumática, como aglomerulonefrite difusa aguda podem ser facilmenteprevenidas pelo tratamento precoce ou profilaxia dainfecção primária.

Os avanços inegáveis na terapêutica anti-infla-matória e imunossupressora para DAI sistêmicas, re-centemente, não impediram que uma subpopulação depacientes com formas agressivas dessas doenças ti-vessem um mau prognóstico, em termos de qualidadee duração de vida, semelhante ao de muitas doençasneoplásicas (Lowenthal & Graham, 2000)(49). Nos úl-timos cinco anos, foram desenvolvidos vários proto-colos de tratamento desses pacientes com imunoabla-ção intensa, seguida de resgate com CTH autólogasou alogênicas, baseando-se em modelos experimen-tais e em resultados clínicos de TCTH em casos deconcomitância de neoplasia e auto-imunidade e emcasos esporádicos de transplante em DAI isoladas (re-visto por Marmont, 2000)(50). Embora a maioria doscasos de anemia aplástica severa seja considerada deetiologia auto-imune, esta não pode ser comprovadaem pacientes individuais e seu tratamento foi discuti-do separadamente no Capítulo I deste simpósio.

Os modelos animais de DAI distribuem-se emduas categorias: 1) uma geneticamente determinada,como na linhagem de camundongos NZB/W, que de-

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introduzido G-CSF. Houve recuperação das con-tagens de leucócitos e de plaquetas, mas a pacien-te tornou-se dependente de transfusão de hemá-cias, persistindo a hemaglutinação à temperaturaambiente. Em abril de 1996, recebeu transplanteautólogo de células-tronco hematopoéticas peri-féricas, mobilizadas com G-CSF, após condicio-namento com altas doses de ciclofosfamida (200mg/kg), associado a plasmaferese. Como compli-cações precoces do transplante, apresentoucolestase grave, sem características de VOD, e bac-teremia por E.coli, mas teve enxertamento rápidoe alta hospitalar no dia +23 pós-transplante. Des-de maio de 1996, não recebe transfusões de he-mácias e houve negativação do teste de Coombs eda hemaglutinação a frio.

Comentários: este caso foi relatado no Con-gresso da Sociedade Brasileira de Hematologia,em 1996, por Ferreira et al.(52) e constitui, prova-velmente, o primeiro paciente com doença auto-imune, excluída a AA, transplantado no Brasil comCTH autólogas e um dos primeiros da literaturamundial. É interessante notar que uma remissãoprolongada da citopenia auto-imune foi obtida comum regime de condicionamento imunoablativo comciclofosfamida, isoladamente, semelhante ao utili-zado para transplante alogênico em anemia aplás-tica não transfundida, sem se recorrer a depleçãode células T ou B do enxerto, "in vivo" ou "invitro". Resultados similares têm sido obtidosesporadadicamente na literatura, mas, atualmen-te, recomenda-se alguma forma de depleção decélulas auto-reativas do enxerto, seja por seleçãopositiva ou negativa "in vitro", seja por anticor-pos anticélulas T "in vivo". A plasmaferese con-comitante ao condicionamento pode ter contribuí-do para uma resposta terapêutica precoce, mas,provavelmente, não seria suficiente, "per si", parauma remissão duradoura. Recentemente, foi veri-ficado que pacientes com citopenias auto-imunespossuem adequadas função estromal e reserva me-dular, medidas pelo fenótipo e função de várioscompartimentos mielóides, condições importantespara o sucesso do TCTH autólogo nesses pacien-tes (Papadaki et al. 2000)(53).

4.2.1. Resultados iniciais

O registro europeu de TCTH em DAI possuía,até janeiro de 2001, 332 casos relatados por 71 cen-tros, em 22 países, incluindo Austrália, Japão e China,

casos que foram submetidos a uma análise clínica glo-bal, baseada nos relatórios médicos de seguimento(Tyndall et al.(54) e Tabela III). A grande maioria dospacientes recebeu transplante autólogo de CTH peri-féricas, mobilizadas com ciclofosfamida mais G-CSFe o condicionamento variou de acordo com a doençade base. Noventa e cinco pacientes portadores de es-clerose múltipla foram transplantados, usando-se oBEAM (BCNU, etoposídio, aracytin e melfalan) comoregime de condicionamento, aproveitando a boa pene-tração do BCNU e do melfalan na barreira heamto-encefálica. A maioria desses pacientes foi transplan-tada pelo grupo de Fassas, na Grécia , sem manipula-ção "in vitro" de enxerto. Houve sete mortes (cincopor complicações do transplante e duas por progres-são da doença) e, entre 81 pacientes com seguimentosuperior a dois meses, a sobrevida livre de progres-são, em três anos, foi de 72% (78% para a forma se-cundária progressiva, que constitui 80% dos pacien-tes). A resposta clínica foi comprovada pelos estudosde imagem por ressonância magnética (houve dimi-nuição das lesões ativas de 38 para 13% dos pacien-tes na forma secundária progressiva e de 27 para 1%na forma primária progressiva). Sessenta e cinco pa-cientes portadores de esclerose sistêmica receberam,na sua maioria, CTH selecionadas in vitro, após con-dicionamento com ciclofosfamida, com ou sem ATGe/ou TBI. A mortalidade relacionada ao transplantefoi de 17%, inicialmente, caindo para 7,5%, quando seadotaram critérios mais estritos de exclusão de paci-entes com comprometimento cardíaco ou uso préviode doses altas de ciclofosfamida. Esta “curva de apren-dizagem”, traduzindo a redução da mortalidade napopulação tratada mais recentemente, foi observadano grupo dos pacientes como um todo, pois a mortali-dade dos pacientes transplantados antes de 1998 foide 12%, caindo para 10% em 1999 e 4% em 2000,aproximando-se, assim, das taxas observadas emtransplantes autólogos para doenças neoplásicas. Den-tre 45 pacientes com seguimento superior a três me-ses, a avaliação clínica global mostrou que dois terços(30) dos pacientes melhoraram após o transplante, mashouve um grande número (11) de recaídas (Tabela III).Já em 29 pacientes analisados mais detalhadamente,através do score cutâneo de Rodney e da difusão deCO (Binks et al.)(55), a doença cutânea melhorou em70% (20/29), enquanto a pneumopatia estabilizou-sena metade dos pacientes, melhorou em 10% e progre-diu em 40%. A maioria dos pacientes transplanta-dos para artrite reumatóide (n= 43) obteve resposta

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Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hematopoéticas

clínica, semelhante à produzida pelo anti-TNF, combaixa toxicidade (apenas um óbito), mas, aproximada-mente, a metade deles teve recidiva da sinovite. Esta,entretanto, foi facilmente tratada com drogas imuno-moduladoras (metotrexate, ciclosporina e lefluonomide),que não haviam sido efetivas antes do transplante. Umestudo australiano, com 33 pacientes, mostrou que adose de 200 mg/kg de ciclofosfamida, no condiciona-mento, era superior a 100 mg/kg e que a seleção invitro de CTH não ofereceu vantagens em relação aostransplantes não manipulados. Pacientes com as for-mas sistêmica ou poliarticular da artrite reumatóidejuvenil (n= 35) foram transplantados na Holanda (n=15) recebendo condicionamento com ciclofosfamida(200 mg/kg), TBI (400 rads) e ATG, ou em outros cen-tros. Vinte pacientes obtiveram remissões duradouras,sete recidivaram e três morreram com a síndrome deativação macrofágica, induzida por infecções. Dos 23pacientes transplantados para LES, 14 melhoraram,cinco recaíram, um piorou e três foram a óbito.

O grupo da Northwestern University, de Chica-go, relatou, recentemente, sua experiência com trans-

plante autólogo de CTH selecionadas “in vitro”, em 9pacientes com LES refratário a pelo menos seis ciclosde ciclofosfamida (Traynor et al. 2000)(56). A mobili-zação foi feita com ciclofosfamida 2 g/m2 e G-CSF e ocondicionamento incluiu ciclofosfamida (50 mg/kg x4),ATG (30 mg/kg/d x3) e metilprednisolona (1 g x3).Todos os pacientes, seguidos por um tempo médio de25 meses, obtiveram remissão da doença, mas um pa-ciente teve uma recaída tardia. O mesmo regime apli-cado à artrite reumatóide manteve remissão em ape-nas 2/4 pacientes, levando o grupo a explorar regimesde condicionamento mais agressivos, incorporando ir-radiação corporal total. Regimes deste tipo (800 radsde TBI mais 120 mg/kg de ciclofosfamida e 90 mg/kgde ATG) têm sido utilizados pelo grupo coordenadopelo FHCRC, em Seattle, que relataram recentemen-te, no congresso da ASH, seus resultados em esclero-se sistêmica (ES) (McSweeney et al. 2000)(57) e es-clerose múltipla (EM) (Nash et al. 2000)(58). Dezoitopacientes com ES, a maioria com pneumopatia pro-gressiva, foram transplantados com CTH autólogas,selecionadas in vitro, dois morreram por pneumopatia

Tabela III - Resultados de TCTH autólogo para DAI em estudos piloto (fases I e II).

Resposta clínica MortesDoença Nº TtAv

Centro Condicionamentoe tipo de CTH pre-

dominantes

F-Upÿ ⇔ � ÿ� TRM Progr.

EM** 9581

EULAR/EBMT

BEAM e CTH s/seleção >2m 31* 26 20 4

5 2

ES 6545

Idem CY+ATGSeleção CD34 >3m 30* 1 3 11

8 4

AR 4339

Idem CY+ATGC/ ou s/ sel. CD34 13* 1 7 18

1

ARJ 3529

Idem CY+TBI+ATGTMO + TCD 20* 1 1 7

5

LES 2320

Idem CY+ATGSeleção CD34 14* - 1 5

3

LES 97

NWU CY+ATGSeleção CD34

>12m6 - - 1

1

ES 186

FHCRC TBI+CY+ATGSeleção CD34 >1a 6 (pele) - -

3 1

EM 2013

Idem Idem 1-24m>3m 4 7 2 -

1

*Avaliação clínica global, declarada pelo médico no formulário de seguimento. ** Vide abreviações na Fig. IV.Tt: total Av: avaliáveis, F-up: followup, EULAR: Liga Européia contra o Reumatismo, EBMT: Grupo Europeu de TMO,NWU: Northwestern University, Chicago, TCD: depleção de células T, ÿ: melhora, ⇔: estabilização, � : piora, ÿ� : melhora e recaí-da, TRM: Mortalidade relacionada ao transplante, Progr.: Progressão da doença. Dados compilados das refs. 54-58.

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458

intersticial, antes de se adotar a proteção pulmonar naTBI, um morreu por doença linfoproliferativa (DLP)EBV+ associada ao uso de ATG de coelho e um mor-reu em insuficiência renal aguda, por progressão dadoença. Entre os sobreviventes, houve melhora signi-ficativa da doença cutânea e da qualidade de vida eestabilização da doença pulmonar. Vinte pacientes comEM foram transplantados com o mesmo regime, umpaciente teve exacerbação da doença, inclusive na MRI,após o uso de G-CSF na mobilização e outro teve DLP-EBV+ associada ao uso de ATG de coelho. Três pa-cientes tiveram progressão clínica da doença, sem le-sões novas na MRI, quatro tiveram regressão, em sete

a doença estabilizou e, em nenhum houve necessidadede reintroduzir a terapia medicamentosa.

O caso relatado abaixo, que acompanhamos naScripps Clinic, em San Diego, EUA, ilustra a poten-cialidade do TCTH autólogo no tratamento de DAIrefratárias, mas, também, um dos seus principais pro-blemas, que é a recidiva da doença básica.

Caso clínico ilustrativo Nº 3

DWG, 45 anos, do sexo feminino, domésti-ca, procedente de San Diego, CA, USA. Há 16 anosfoi diagnosticada Esclerose Múltipla, exteriorizadapor adormecimento e formigamento das pernas edos braços, que evoluiu com leves exacerbações

Tabela IV - Exemplos de protocolos cooperativos de TCTH para DAI em fase final de planejamento ou em an-damento.

Doença Mobilização Condicionamento Transplante Entidade Observações

I. Protocolos internacionais

ES

ES

LES

AR

EM

EM/ ES

CY 4 g/m2

G-CSF16 ug/kg/d

CY 2 g/m2+G-CSF 5 ug/kg

CY 4 g/m2

CY 4 g/m2 +G-CSF

----

CY 200 mg/kg +ATG 7,5 mg/kg

CY 120 mg/kg +TBI 8 Gy + ATG 90mg/kg

CY 200 mg/kg+ATG 90 mg/kg.

CY 200 mg/kg

BEAM + ATG

TBI 2 Gy +FLU

AutólogoCD34 selecionado

Idem oualogênico

AutólogoCD34 selecionado

Idem

Autólogonão manipulado

Mini-alo

EULAR/ EBMT

Seattle/ NIH

Chicago/ NIH

EULAR/ EBMT

Idem

Seattle

Randomizado c/ pulsosde CY (0,75 g/m2 x12)

Randomização c/ CY(.75 g/m2 x6) planejada

Marcação gênica dasCTH; randomização c/CY planejada

Randomização c/imunossupressão(anti-TNF?) planejada

Randomização comMitoxantrone ouβ- IFN planejada

Randomização comautoTCTH planejada

II. Protocolos-piloto brasileiros

LES

ES

EM

CY 2 g/m2 +G-CSF 10 ug/kg/d

Idem

Idem

CY 200 mg/kg +ATG 90 mg/kg

CY 120 mg/kg +ATG 90 mg/kg/d+FLU 150 mg/kg

BEAM

Autólogo,não-manipulado

Idem

Idem

CTC/FAPESP

Idem

Idem

Baseado na experiênciaeuropéia e americana(refs. 50,54,56)

Condicionamento iné-dito p/ ES

Baseado no consensoeuropeu (ref. 60)

LES: lúpus eritematoso sistêmico, ES: esclerose sistêmica, EM: esclerose múltipla, AR: artrite reumatóide, CY: ciclofosfamida,ATG: globulina antitimocitária, G-CSF: fator estimulador de colônias granulocitárias, FLU: fludarabina, BEAM: BCNU, etoposídio,aracytin e melfalan, EULAR: Liga Européia contra o Reumatismo, EBMT: Grupo Europeu de Transplante de Sangue e Medula Ós-sea, NIH: Instituto Nacional de Saúde (dos EUA), CTC/FAPESP: Centro de Terapia Celular/Fundação de Amparo à Pesquisa doEstado de São Paulo, Hemocentro - Ribeirão Preto.

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Aspectos imunológicos dos transplantes de células tronco-hematopoéticas

durante 13 anos. Há dois anos, após uma histe-rectomia, teve uma recaída mais grave, com fra-queza nas pernas, dificuldade para deambular, di-sautonomia em membros (eritema e edema flutuan-tes), ataxia e lombalgia intensa. Foi tratada cominterferon, sem sucesso, obtendo alguma melhoracom pulsos de ciclofosfamida (0,5-1,0 g/m2 x9), oque a fez procurar o transplante. Na avaliaçãopré-transplante, apresentava um escore de inca-pacidade (EDSS de Kurtzke) de 6,0, num máximode 10, necessitando de auxílio de bengala paraandar e lesões na ressonância magnética, típicasda doença. Foi transplantada na Scripps Clinic,em San Diego, em outubro de 1998, com 7,6 mi-lhões de células CD34/kg, mobilizadas com ciclo-fosfamida (1,5 g/m2 e G-CSF 10 ug/kg/d) e purifi-cadas em coluna de afinidade com anticorpo anti-CD34. O esquema de condicionamento foiMelfalan 140 mg/m2 e irradiação linfóide total (300rads x4). O enxertamento mielóide foi observadono dia +9 pós-TMO e teve alta hospitalar no dia+11. Dois meses após o transplante, a lombalgiahavia desaparecido completamente e a disautono-mia havia migrado distalmente nos membros infe-riores; a contagem de células CD4 circulantes erade 41/ul (VN 400-1400). Nove meses após o TCTH,a disautonomia estava restrita aos pés, conseguiadeambular no plano sem auxílio e a contagem deCD4 era de 111/ul. Catorze meses após, houve umdiscreto enfraquecimento de músculos das pernas(EDSS= 6,5) e CD4= 206/ul e, 17 meses depois, adisautonomia tinha migrado distalmente (para osdedos dos pés), continuava melhorando a capaci-dade de deambulação e CD4= 236/ul. Com 2 anosde transplante, notou-se diminuição da mobilida-de dos quadris e progressão da disautonomia e, 3meses depois, uma reavaliação por MRI mostrouum nova lesão na cápsula interna à D, indicando-se o uso de Copaxone (Copolímero-1), medicaçãoanti-EM que a paciente não tinha usado anterior-mente. Como complicação de terapêutica anti-agre-gação plaquetária para a disantonomia, com ti-clopidine, desenvolveu uma púrpura trombocito-pênica trombótica 28 meses após o transplante.

Comentários: Esta paciente apresentava,como a maioria dos candidatos a TCTH com EM,a forma secundária progressiva da doença, e, comomuitos pacientes, descobriu a alternativa do trans-plante pesquisando na Internet. Foi condicionadacom um regime agressivamente imunoablativo, se-guindo um protocolo peculiar da Scripps Clinic, e

obteve alívio de muitos de seus sintomas, melhorafuncional e estabilização da doença. Entretanto,coincidindo com o aumento progressivo das célu-las CD4, houve uma deterioração lenta do quadroclínico, culminando com o aparecimento de lesõesnovas no MRI. A recidiva da doença, como ocor-reu neste caso, é o principal problema dos trans-plantes autólogos para doenças auto-imunes, le-vando os investigadores nesta área a proporemregimes imunoablativos cada vez mais intensos,muitos deles incorporando irradiação corporaltotal, associados ou não com infusão de célulasalogênicas. Neste mesmo protocolo, foram trans-plantados outros 4 pacientes, com melhora ou es-tabilização da doença, mas com menor tempo deseguimento).

4.2.2. Perspectivas futuras no exterior e no Brasil

A experiência clínica, acumulada até agora emTCTH para DAI (Tabela III), mostrou apenas a po-tencialidade da terapia, mas não respondeu, ainda, ne-nhuma das questões importantes relacionadas a ela:1) qual é o papel da infusão das CTH, já que a imu-nossupressão isolada com doses altas de ciclofosfa-mida parecer dispensar o transplante em algumas do-enças (Brodsky et al. 1998)(59)?; 2) quais são os me-lhores esquemas de mobilização de CTH e de condi-cionamento para cada doença?; 3) o transplante autó-logo vai ser suficiente para induzir remissão duradou-ra na maioria das DAI ou vai ser necessário recorrera transplante alogênico, mieloablativo ou subablativo?;4) no caso do transplante autólogo, a depleção in vitroe/ou in vivo de linfócitos autorreativos é necessáriapara o efeito terapêutico?; 5) a toxicidade do procedi-mento estará dentro de limites aceitáveis para garan-tir o encaminhamento de pacientes pelos especialistasresponsáveis pelo tratamento convencional? Os estu-dos randomizados de fase III, que começam a ser de-senvolvidos (vide Tabela IV), deverão responder taisquestões e determinar o papel definitivo do TCTH naterapêutica das DAI.

Atualmente, a experiência acumulada com ca-sos esporádicos e séries limitadas de pacientes, emestudos de fase I ou II, levaram ao desenvolvimentode protocolos prospectivos randomizados (fase III),comparando o TCTH com as melhores opções de te-rapêutica convencional em algumas DAI. Assim, noprotocolo europeu ASTIS (Autologous Stem CellTransplantation International Scleroderma Trial)estão sendo comparados pulsos de ciclofosfamida comTCTH autólogo, em esclerose sistêmica, e grupos co-

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“in vivo” de células T com globulina antitimocitária(Tabela IV). Uma vez testado, o projeto deverá evo-luir para o emprego em outras DAI, como a AR, epara o desenvolvimento de protocolos randomizados,de fase III.

AGRADECIMENTOS

Aos drs. Eurípedes Ferreira, do Hospital AlbertEinstein, em São Paulo, James Mason, da Scripps Clinic, emSan Diego- EUA, e Carmem Bonfim, do Hospital das Clíni-cas de Curitiba-PR, pelos dados clínicos de seus pacientes;aos drs. Richard Burt, da Northwest University, Chicago-EUA, Ewa Carrier, da Universidade da Califórnia em SanDiego- EUA e Alan Tyndall, do Hospital Cantonal da Basi-léia, Suíça, por discussões encorajadoras e pela cessão dematerial bibliográfico não publicado; à FAEPA-HCFMRP,FUNDHERP-Hemocentro-RP, FAPESP e CNPq pelo contí-nuo suporte financeiro.

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No Brasil, um Workshop Internacional, realiza-do em Ribeirão Preto, em outubro de 2000, com a pre-sença de especialistas da Europa, dos EUA e dos prin-cipais grupos de TMO e reumatologia do país, decidiuiniciar um projeto piloto (de fase I/II) de TCTH emDAI, cooperativo, de âmbito nacional, coordenado peloCentro de Terapia Celular/FAPESP do HemocentroRegional de Ribeirão Preto. Deverá ter início, em 2001,inicialmente em LES, esclerose sistêmica e esclerosemúltipla, refratárias à terapia convencional, empregan-do CTH autólogas, não manipuladas, com depleção

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Recebido para publicação em 25/10/2000

Aprovado para publicação em 20/12/2000