acidente de trabalho - estudo de caso

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO MESTRADO E DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTRATÉGIA E ORGANIZAÇÕES DISSERTAÇÃO DE MESTRADO ANÁLISE MULTICAUSAL PARA A COMPREENSÃODE ACIDENTES DE TRABALHO: UM ESTUDO DE CASO DE UMA EMPRESA PARANAENSE DE ALIMENTOS VILMA PIMENTA CIRILO MUNHÊ CURITIBA 2009

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Acidente de trabalho - um estudo de caso

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAN

    SETOR DE CINCIAS SOCIAIS APLICADAS

    CENTRO DE PESQUISA E PS-GRADUAO EM ADMINISTRAO

    MESTRADO E DOUTORADO EM ADMINISTRAO

    REA DE CONCENTRAO: ESTRATGIA E ORGANIZAES

    DISSERTAO DE MESTRADO

    ANLISE MULTICAUSAL PARA A COMPREENSODE ACIDENTES DE

    TRABALHO: UM ESTUDO DE CASO DE UMA EMPRESA PARANAENSE

    DE ALIMENTOS

    VILMA PIMENTA CIRILO MUNH

    CURITIBA

    2009

  • VILMA PIMENTA CIRILO MUNH

    ANLISE MULTICAUSAL PARA A COMPREENSO DE ACIDENTES DE

    TRABALHO: UM ESTUDO DE CASO DE UMA EMPRESA PARANAENSE

    DE ALIMENTOS

    Dissertao de Mestrado apresentada como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em Administrao pelo Curso de Mestrado em Administrao, do Setor de Cincias Sociais e Aplicadas da Universidade Federal do Paran.Orientador: Prof. Dr. Acyr Seleme

    CURITIBA

    2009

  • DEDICATRIA

    Ao Wagner, meu marido, instigador do meu crescimento e meu parceiro

    de reflexo e amadurecimento deste trabalho e a todos os funcionrios da empresa

    pesquisada, por serem a minha inspirao e propsito neste trabalho.

  • AGRADECIMENTOS

    Ao Wagner, marido e companheiro, pelas broncas para que eu parasse de

    reclamar e me concentrasse no objetivo que queria alcanar.

    A Norma, minha irm, companheira de mestrado, que compartilhou comigo

    as inseguranas e as risadas, as longas noites de estudo, o apoio e a fora para ir

    sempre em frente.

    A Magda, minha irm, que rezou muitas vezes por mim, para que tudo

    corresse bem.

    Aos meus cunhados, Janete e Wesler e minhas sobrinhas Jssica, Karen e

    a pequena Gabriele por me receberem de braos abertos em sua casa.

    Aos meus pais pela compreenso e apoio.

    Aos amigos de mestrado pelas palavras de apoio e pelo compartilhamento

    dos bons e maus momentos.

    Ao meu orientador Seleme, que me instigou a achar o meu prprio caminho.

    A todos os membros da empresa pesquisada que abriram o corao e me

    forneceram todas as informaes de que necessitei para desenvolver o trabalho, em

    especial ao meu amigo Orlando, Engenheiro de Segurana, que no poupou

    esforos para me ajudar.

    Aos amigos Evaldo e Margarida, que compreenderam o meu afastamento.

    A minha querida equipe de trabalho que compartilhou comigo as angstias e

    as vitrias.

    Ao universo pela sua sabedoria e mistrio, que nos leva por caminhos

    estranhos at o lugar da chegada.

    A vida pelas suas surpresas e beleza.

  • VI

    SUMRIO

    LISTA DE QUADROS............................................................................................... IX

    LISTA DE SIGLAS.................................................................................................... XI

    LISTA DE FIGURAS............................................................................................... XIII

    LISTA DE TABELAS ..............................................................................................XIV

    RESUMO................................................................................................................XVII

    ABSTRACT...........................................................................................................XVIII

    1. INTRODUO ......................................................................................................19

    1.1. FORMULAO DO PROBLEMA DE PESQUISA..............................................24

    1.2. OBJETIVOS DA PESQUISA ..............................................................................24

    1.2.1. OBJETIVO GERAL..........................................................................................24

    1.2.2. OBJETIVOS ESPECFICOS ...........................................................................24

    1.3. JUSTIFICATIVAS TERICA E PRTICA ..........................................................25

    1.4. ESTRUTURA DA DISSERTAO .....................................................................27

    2. BASE TERICO-EMPRICA ................................................................................28

    2.1. O ACIDENTE DE TRABALHO ...........................................................................28

    2.2. FATORES HUMANOS E ORGANIZACIONAIS QUE IMPACTAM NOS

    ACIDENTES..............................................................................................................30

    2.3. FATORES SELECIONADOS .............................................................................48

    2.3.1. IDADE E EXPERINCIA NA FUNO ...........................................................49

    2.3.2. PERCEPO DA PRESSO NO TRABALHO ...............................................50

  • VII

    2.3.3. PERCEPO DE RISCOS .............................................................................51

    2.3.4. PERCEPO DO COMPROMETIMENTO DA LIDERANA COM A

    SEGURANA............................................................................................................52

    2.3.5. SATISFAO NO TRABALHO .......................................................................53

    2.3.6. SISTEMA DE GESTO DA SEGURANA .....................................................59

    3. METODOLOGIA ...................................................................................................60

    3.1. QUESTES DE PESQUISA ..............................................................................60

    3.2. CLASSIFICAO DA PESQUISA .....................................................................61

    3.3. DELINEAMENTO DA PESQUISA ......................................................................62

    3.4. MTODO DE COLETA E FONTES DE EVIDNCIAS .......................................63

    3.5. ESCOLHA DO CASO.........................................................................................68

    3.6. PROTOCOLO DE ESTUDO...............................................................................68

    3.7. DEFINIES CONSTITUTIVAS E OPERACIONAIS ........................................69

    3.7.1. CATEGORIAS ANALTICAS E ELEMENTOS DE ANLISE...........................72

    3.8. ANLISE DOS DADOS......................................................................................74

    3.9. LIMITAO DO ESTUDO..................................................................................75

    4. DESCRIO E ANLISE DO CASO ...................................................................76

    4.1. DESCREVENDO O CASO.................................................................................76

    4.1.1. MUDANAS ORGANIZACIONAIS SIGNIFICATIVAS NO PERODO

    CONSIDERADO PELA PESQUISA ..........................................................................77

    4.1.2. SISTEMA INTEGRADO DE GESTO SIG ..................................................84

    4.1.3. SISTEMA DE SEGURANA NO TRABALHO ................................................88

  • VIII

    4.1.4. A PRODUO E O RITMO DE TRABALHO NO PERODO

    CONSIDERADO........................................................................................................92

    4.1.5. ACIDENTES DE TRABALHO..........................................................................93

    4.2. ANLISE DAS CAUSAS DOS ACIDENTES ......................................................95

    4.2.1. ANLISE MONOCAUSAL - ADOTADA PELA EMPRESA PESQUISADA .....96

    4.2.2. A ANLISE MULTICAUSAL PROPOSTA PELO ESTUDO..........................97

    4.2.2.1. Idade e experincia ......................................................................................98

    4.2.2.2. Presso no Trabalho ....................................................................................99

    4.2.2.3. Satisfao no trabalho................................................................................101

    4.2.2.4. Percepo do comprometimento da liderana ...........................................110

    4.2.2.5. Percepo de riscos...................................................................................116

    4.2.2.6. Sistema de Gesto da Segurana..............................................................119

    4.2.3. COMPARAO ENTRE A VISO MONO E MULTICAUSAL.......................123

    5. CONSIDERAES FINAIS ................................................................................125

    6. RECOMENDAES...........................................................................................131

    7. REFERNCIAS...................................................................................................135

    8. ANEXOS .............................................................................................................142

    8.1. Fatores Humanos que Influenciam nos Acidentes de Trabalho .......................142

    8.2. Fatores Organizacionais que Influenciam nos Acidentes de Trabalho.............143

    8.3. Fatores Humanos que Afetam as Falhas Humanas.........................................144

    8.4. Fatores Organizacionais que Afetam as Falhas Humanas...............................144

  • IX

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1- Classificao segundo a OECD (NEA/CSNI/OECD,1998).......................35

    Quadro 2 - Fatores humanos e organizacionais que causam os acidentes de

    Trabalho.....................................................................................................................37

    Quadro 3 - Fatores humanos e organizacionais que afetam as falhas humanas......40

    Quadro 4 : Idade e experincia .................................................................................41

    Quadro 5 : Presso no Trabalho................................................................................42

    Quadro 6: Percepo de risco ...................................................................................43

    Quadro 7 : Percepo do Comprometimento da Liderana ......................................44

    Quadro 8: Satisfao no Trabalho..............................................................................45

    Quadro 9: Sistema de Gesto da Segurana.............................................................47

    Quadro 10: Fontes Primria e Secundria Utilizadas na Pesquisa............................67

    Quadro 11 Categorias Analticas e Elementos de Anlise .....................................73

    Quadro 12 - Principais eventos ocorridos na empresa de 2001 a 2007....................78

    Quadro 13 - Comparativo dos principais aspectos da mudana relativos a conduo

    do negcio, antes e depois de 2004...........................................................................81

    Quadro 14 - Comparativo dos principais aspectos da mudana relativos cultura

    organizacional, antes e depois de 2004.....................................................................82

    Quadro 15 - Comparativo dos principais aspectos da mudana relativos ao

    relacionamento empresa-empregado, antes e depois de 2004.................................83

    Quadro 16 - Principais mudanas ocorridas na gesto do SIG, antes e

    aps 2005...................................................................................................................86

  • X

    Quadro 17 Quadro 17: Pontos Fortes das Abordagens Mono e Multicausal........123

    Quadro 18: Pontos Fracos das Abordagens Mono e Multicausal............................123

  • XI

    LISTA DE SIGLAS

    ABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    ACSNI Advisory Committee and the Safety of Nuclear Installations

    AESP Anurio Estatstico da Previdncia Social

    ASN - Agncia Sebrae de Notcias

    CBI Confederation of British Industry

    CIPA Comisso Interna de Preveno de Acidente

    CNAE Classificao Nacional de Atividades Econmicas

    CORIND - Comit de Relaes Industriais

    FAP Fator Acidentrio Previdencirio

    FUNDACENTRO - Fundao Jorge Duprat Figueiredo de Segurana e Medicina no

    Trabalho

    ICNA - Insurance Company of North America

    ISOs - Sistemas de Gesto da Qualidade, Ambiental, Sade e Segurana no

    Trabalho

    NAT Teoria da Normalidade

    OECD Economic Co-Operation and Development

    OHSAS - Occupational Health and Safety Assessment Series

    OIT Organizao Internacional do Trabalho

    PIB Produto Interno Bruto

    PRL Participao dos Lucros e Resultados

  • XII

    RAT Risco de Acidente de Trabalho

    ROI Relatrio de Ocorrncias Internas

    RH Recursos Humanos

    SAT Seguro Acidente do Trabalho

    SEBRAE Servio de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

    SESMT Servio Especializado em Engenharia de Segurana e em Medicina

    do Trabalho

    SIG Sistema Integrado de Gesto

  • XIII

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - Evoluo da compreenso das causas dos acidentes de trabalho...........21

    Figura 2 Viso monocausal nas anlises de acidentes...........................................22

    Figura 3 Viso Multicausal......................................................................................23

    Figura 4: Expandindo da viso monocausal para a multicausal................................26

    Figura 5 - Pirmide da ICNA (1969)...........................................................................29

    Figura 6 Modelo do Queijo Suo .........................................................................33

    Figura 7 Tipos de Erros Humanos ..........................................................................39

    Figura 8: Seleo dos Fatores Pesquisados .............................................................48

    Figura 9: Critrio de Escolha dos Fatores Pesquisados............................................49

    Figura 10 - Representao do SIG ............................................................................85

    Figura 11: Sistema de Gesto da Segurana no Trabalho .......................................89

    Figura 12: Modelo bsico sugerido para anlise de acidentes na viso

    multicausal................................................................................................................132

  • XIV

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Quantidade mensal de acidentes do trabalho registrados, por motivo,

    no Brasil 2004/2006.................................................................................................19

    Tabela 2 - Volume de produo, em tonelada (ton), no perodo de 2000 a 2007

    por ano....................................................................................................................93

    Tabela 3 - Acidentes ocorridos no perodo de 2003 a 2007 por ms......................95

    Tabela 4 - Freqncia das causas dos acidentes de 2003 a 2007 (ano)..................96

  • XV

    LISTA DE GRFICOS

    Grfico 1: Evoluo da participao nos Lucros ou Resultados (PLR) paga

    aos funcionrios 2001 a 2007 (n de salrios nominal) ..........................................79

    Grfico 2: Evoluo das admisses e Demisses ocorridas de 2001 a 2007............80

    Grfico 3 : Acidentes ocorridos no perodo de 2003 a 2007 por ano......................94

    Grfico 4: Freqncia das causas dos acidentes consideradas nas anlises

    dos acidentes ocorridos no perodo de 2003 a 2007.................................................97

    Grfico 5: N de acidentes por faixa de idade, no perodo de 2003 a 2007...............98

    Grfico 6: N de acidentes por tempo na funo, no perodo de 2003 a 2007..........99

    Grfico 7: Comparativo das notas mdias atribudas pelos funcionrios, na

    pesquisa 100 Melhores Empresa para se Trabalhar, nas 5 dimenses

    pesquisadas - 2001 a 2007......................................................................................102

    Grfico 8: Notas mdias atribudas pelos funcionrios, na pesquisa 100

    Melhores Empresa para se Trabalhar, em relao a autonomia, participao e

    orgulho 2003 a 2007..............................................................................................105

    Grfico 9: Notas mdias atribudas pelos funcionrios, na pesquisa 100 Melhores

    Empresa para se Trabalhar, em relao a remunerao 2003 a 2007................106

    Grfico 10: Notas mdias obtidas pela empresa, na pesquisa 100 Melhores

    Empresas para se Trabalhar, nas questes relativas camaradagem

    2003 a 2007..............................................................................................................106

    Grfico 11: Notas mdias atribudas pelos funcionrios, na pesquisa 100 Melhores

    Empresas para se Trabalhar, em relao a questo empresa ser um excelente

    lugar para se trabalhar - 2001 a 2007.....................................................................108

    Grfico 12: Notas mdias atribudas pelos funcionrios, na pesquisa 100 Melhores

    Empresas para se Trabalhar, em relao a demisses 2003 a 2007..................108

  • XVI

    Grfico 13: Notas mdias obtidas pela empresa, na pesquisa 100 Melhores

    Empresas para se Trabalhar, em relao s condies de trabalho

    2003 a 2007..............................................................................................................109

    Grfico 14: Notas mdia atribudas pelos funcionrios, na pesquisa 100

    Melhores Empresa para se Trabalhar, em relao a superviso - 2003 a

    2007..........................................................................................................................115

  • XVII

    RESUMO

    No Brasil as empresas normalmente adotam uma viso monocausal nas anlises de acidentes, que consiste na procura por uma causa nica e fundamental para a ocorrncia do acidente, no indivduo ou no meio que o cerca - atos e condies inseguras, respectivamente. A anlise sob essa perspectiva superficial e tem sido insuficiente para a adoo de solues para a reduo dos acidentes. Em 90% dos acidentes a falha humana considerada como causa, o que uma viso limitada, e que por isso impede solues definitivas para o problema. Para compreenso das causas dos acidentes faz-se necessrio buscar respostas mais profundas, que s podero ser obtidas com a migrao da viso monocausal para uma viso multicausal, a qual considera que as causas dos acidentes so decorrentes da interao de diversos fatores humanos e organizacionais. Esse estudo tem por objetivo investigar se estes fatores, selecionados da literatura, esto presentes nas causas dos acidentes da empresa estudada, procurando ampliar a viso monocausal adotada pela empresa para uma abordagem mais sistmica. Especificamente, so analisados os fatores idade e experincia na funo, percepo do comprometimento da liderana com a segurana, percepo dos riscos, presso no trabalho, satisfao no trabalho e sistema de gesto da segurana". Trata-se de um estudo de caso qualitativo, numa indstria de alimentos localizada no norte do Paran, com dados referentes ao perodo de 2003 a 2007, os quais foram coletados por intermdio de documentos internos, observao-participante e no-participante, entrevistas e na experincia da pesquisadora na empresa, o que possibilitou uma anlise mais profunda sobre o tema. Os resultados do trabalho sugerem que os fatores pesquisados estavam presentes na organizao e que podem ter contribudo para as falhas humanas deslizes ou lapsos e erros -ocasionando os acidentes de trabalho.

    Palavras Chaves: acidentes de trabalho, erros humanos, anlises de acidentes.

  • XVIII

    ABSTRACT

    Organizations in Brazil usually adopt monocausal vision in the analysis of accidents, which consists in the search for a single and fundamental cause of the accident, on the individual or the environment that surrounds him unsafe acts and conditions, respectively. The analysis in this approach is superficial and has been insufficient for the adoption of solutions to reduce accidents. In 90% of the accidents, human error is considered as cause, which is a limited vision, thus impeding finding efficient solutions for the reduction of accidents. To understand the causes of accidents, it is necessary to search for answers in a deeper level, which can only be obtained with the migration from the monocausal vision to the multiple causation vision, which considers that the causes of accidents are a result of the interaction of various human and organizational factors. This study aims to investigate whether these factors, selected from the literature, are present on the causes of the accidents in the studied organization, trying to expand the monocausal vision adopted by the company to a more systemic approach. Specifically, the analyzed factors are "age and experience in the function", "perception of leadership commitment to safety", "risk perception", "work pressure", "satisfaction at work" and "safety management system". This is a qualitative case study, in a food industry located in the north of Paran, with data period from 2003 to 2007, which were collected from internal documents, participant and non-participant observation, interviews and the experience of the researcher in the company, which allowed a deeper analysis on the topic. The results of the study suggest that the factors studied were present in the organization and that may have contributed to human error slips or lapses and mistakes - causing labor accidents.

    Keywords: labor accident, human error, analysis of accidents.

  • 19

    1. INTRODUO

    Segundo dados da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), de 2005,

    anualmente ocorrem no mundo cerca de 270 milhes de acidentes de trabalho e

    aproximadamente 160 milhes de casos de doenas ocupacionais, sendo que todos

    os dias morrem, em mdia, 6.000 pessoas em decorrncia de uma destas duas

    condies (FUNDACENTRO, 2008).

    No Brasil, quarto colocado no ranking mundial em acidentes de trabalho com

    morte e 15 em nmero geral de acidentes de trabalho (GAZETA MERCANTIL,

    2008), apesar dos esforos que as empresas vm fazendo para reduo dos

    acidentes, os nmeros ainda so considerados altos pela previdncia social. O setor

    industrial foi responsvel por 47% dos acidentes registrados no Anurio Estatstico

    da Previdncia Social (AEPS, 2006), dos quais a indstria de transformao foi

    responsvel por 188.321 acidentes. Em segundo lugar vem a indstria de alimentos

    e bebidas, com 48.424 casos, ficando o setor de servios responsvel por 45%. No

    Brasil, no perodo de 2004 a 2006 ocorreram 1.469.270 acidentes, conforme mostra

    a Tabela 1. O ndice de acidentes na indstria de aproximadamente trs acidentes

    de trabalho para cada 100 trabalhadores ao ano (ASN, 2007).

    Tabela 1: Quantidade mensal de acidentes do trabalho registrados, por motivo, no Brasil

    2004/2006

    2004 2005 2006 2004 2005 2006 2004 2005 2006 2004 2005 2006Total 465.700 499.680 503.890 375.171 398.613 403.264 60.335 67.971 30.194 30.194 33.096 26.645Janeiro 34.002 39.599 42.220 27.473 31.720 34.023 4.401 5.079 2.128 2.128 2.800 2.534Fevereiro 32.565 37.311 38.266 26.510 29.435 30.631 4.012 4.947 2.043 2.043 2.929 2.373Maro 41.095 44.163 46.250 33.058 34.785 36.893 5.211 5.916 2.826 2.826 3.462 2.754Abril 35.382 41.191 37.796 28.259 32.785 29.859 4.709 5.554 2.414 2.414 2.852 2.212Maio 38.228 42.207 44.088 30.765 33.674 34.854 5.147 5.722 2.316 2.316 2.811 2.594Junho 39.407 42.012 41.666 31.588 33.498 33.040 5.220 5.922 2.599 2.599 2.592 2.166Julho 41.858 40.678 43.765 33.775 32.552 35.032 5.396 5.655 2.687 2.687 2.471 2.352Agosto 44.469 46.105 46.523 35.730 36.719 37.192 5.714 6.380 3.025 3.025 3.006 2.450Setembro 42.117 42.482 41.234 33.979 34.071 33.027 5.312 5.715 2.826 2.826 2.696 2.040Outubro 39.777 42.998 43.912 32.296 34.615 35.536 4.966 5.762 2.515 2.515 2.621 2.015Novembro 40.181 41.819 41.463 32.375 33.767 33.618 5.242 5.565 2.564 2.564 2.487 1.785Dezembro 36.619 39.115 36.707 29.363 30.992 29.559 5.005 5.754 2.251 2.251 2.369 1.370Fonte: DATAPREV, CAT.NOTA: Os dados so preliminares, estando sujeitos a correes.

    Tpico Trajeto Doenas do TrabalhoMeses

    QUANTIDADE DE ACIDENTES DE TRABALHO REGISTRADOSTotal Motivo

  • 20

    O Brasil perde por ano, por causa dos acidentes de trabalho, o equivalente a

    2,3% do PIB (NOTADEZ, 2008; FUNDACENTRO, 2008). Em 2007, no pas, foram

    concedidos pela Previdncia Social, benefcios previdencirios decorrentes de

    acidentes de trabalho e de atividades insalubres na ordem de 10,7 bilhes. Foram

    503.890 acidentes em todo o Pas, no ano de 2007, o que, apesar de ter cado em

    relao a 2006 e 2005, ainda considerado alto (FUNDACENTRO, 2008).

    Para as empresas os acidentes tambm representam custos, podendo ser

    agravados pela Resoluo 1.236, de 28 de abril de 2004, do Conselho Nacional de

    Previdncia Social, que instituiu o FAP Fator Acidentrio Previdencirio, que trata-

    se de uma medida tributria, que entrar em vigor em janeiro de 2010, que

    flexibiliza, reduzindo em at 50% ou aumentando em at 100%, as alquotas de

    contribuio ao RAT Risco de Acidente de Trabalho (antigo SAT Seguro

    Acidente do Trabalho), que atualmente so de 1%, 2% e 3%, de acordo com o grau

    de risco, passando a ser calculado de acordo com o grau de incidncia de doenas,

    critrio epidemiolgico, em substituio ao critrio de percentuais fixos, vigentes at

    ento, que so estabelecidos por ramo de atividade, independentemente da

    qualidade do ambiente de trabalho e dos ndices reais de acidentes e doenas.

    Outra ofensiva que vem sendo adotada na inteno de pressionar as

    empresas com alto ndice de acidentes de trabalho parte das Procuradorias Federais

    e do INSS. Esta estratgia visa cobrar das empresas os valores gastos pelo INSS

    em indenizaes aos trabalhadores que sofreram acidentes de trabalho pela falta de

    equipamentos de segurana e outras falhas de atendimento legislao, ou seja, as

    empresas tero que arcar com todas as despesas de indenizao se for sua a

    responsabilidade pela ocorrncia do acidente (GAZETA MERCANTIL, 2008).

    A compreenso das causas dos acidentes vem passando por um processo

    de evoluo, migrando de uma viso monocausal, que procura por uma causa nica

    para a ocorrncia do acidente, no indivduo ou no meio que o cerca, para uma

    abordagem que considera os fatores humanos e organizacionais significativos para

    a ocorrncia dos eventos (Figura 1). Essa nova abordagem ajuda a evidenciar a

    ineficcia do enfoque tradicional, que se limita a culpar e punir as vtimas,

    recomendar treinamentos e normas, sem alterar os sistemas em que ocorrem os

  • 21

    acidentes. Permanecer na viso tradicional no ir contribuir para significativa

    reduo dos acidentes de trabalho e dos custos para as empresas e para o pas.

    Figura 1 - Evoluo da compreenso das causas dos acidentes de trabalho

    Nas empresas brasileiras, a prtica dominante analisar os acidentes dentro

    de uma viso monocausal, o que acaba por limitar a compreenso das causas dos

    acidentes e, conseqentemente, a adoo de aes mais eficazes. O assunto

    acidentes de trabalho normalmente no foco de discusso na grande parte das

    reas de recursos humanos e nem das lideranas porque a segurana no trabalho

    vista como uma responsabilidade da rea de segurana. Sob o ponto de vista

    acadmico, nos cursos de formao dos administradores, dos profissionais de

    recursos humanos, da psicologia e da segurana no trabalho, o tema segurana no

    tratado como um assunto multidisciplinar. Mas, para se compreender os acidentes

    de trabalho, preciso conhecer a relao homem-empresa, e para tanto faz-se

    necessrio mergulhar na complexa rede de relaes entre os diversos fatores que

    afetam o comportamento humano nas organizaes, e isso exige um trabalho

  • 22

    conjunto de todos os nveis e reas da organizao por um lado, e por outro uma

    nova forma de olhar para o assunto atravs da formao de pessoal pelos meios

    acadmicos.

    Em resumo, a anlise monocausal tradicional vai apenas at o ponto em que

    se descobre se a causa do acidente foi devido a um ato ou condio insegura, mas

    no consegue responder por que o colaborador cometeu o ato inseguro ou os

    porqus da condio inadequada para um trabalho com segurana (Figura 2).

    Entende-se por ato inseguro, aquele que contrariando preceito de segurana, pode

    causar ou favorecer a ocorrncia de acidente e condio insegura, a condio do

    meio que causou o acidente ou contribuiu para sua ocorrncia (NBR 14.280, 1999).

    Figura 2 Viso monocausal nas anlises de acidentes

    Fonte: elaborado pela autora

    Falhas humanas

    - Deslizes- Lapsos- Erros- Violaes- etc.

    Condies de trabalho

    - Ergonomia- Lay-out- Mquinas, equipamentos, instalaes- Temperatura, umidade, iluminao- etc.

    Causas dos acidentes de

    trabalho

    Ato inseguro?

    sim

    no

    Ao

    No o foco do trabalho

  • 23

    A anlise multicausal, por outro lado, considera toda uma malha de fatores

    humanos e organizacionais para entendimento do problema, conduzindo a uma

    anlise mais completa da situao, permitindo assim uma compreenso mais ampla

    das causas do acidente, condio essencial para que se possa reduzir sua

    incidncia (Figura 3).

    Figura 3 Viso Multicausal

    Fonte: elaborado pela autora

    Estudos vm demonstrando que para compreender as causas dos acidentes

    e adotar solues eficientes, preciso sair da viso microscopia que v o homem

    como causa, para uma viso ampliada que considera os diversos fatores humanos e

    organizacionais influenciando nas causas dos acidentes, principalmente nas falhas

    humanas. Contribuies importantes so trazidas por autores como: Zohar (1980);

    Van Zelst (1954, apud Dela Coleta, 1991); Hofmann et al. (1995); Rundmo (1996);

    Falhas humanas

    - Deslizes- Lapsos- Erros- Violaes- etc.

    Condies de trabalho

    - Ergonomia- Lay-out- Mquinas, equipamentos, instalaes- Temperatura, umidade, iluminao- etc.

    Causas dos acidentes de

    trabalho

    Ato inseguro?

    sim

    no

    Ao

    Identificar fatores

    causadores das falhas humanas

    No o foco do trabalho

  • 24

    Binder e Almeida (1997);Thompson, et al. (1998); Cox et al. (1998); Meli (1998);

    Rundmo et al. (1998); Sawacha et al. (1999); HSE (1999); Flin et al. (2000); Cox e

    Cheyne (2000); ODeal e Flin (2001); Kim et al. (2002); Dedobbeleer e Beland (1998,

    apud HSL, 2002); HSL (2002); Wagner III e Hollenbeck (2002); Barling et al. (2003);

    Mullen (2004); HSL (2005); Evans et al. (2005); Spector (2006); Mendes e Wnsch

    (2007); Witt (2007); EI (2008).

    1.1. FORMULAO DO PROBLEMA DE PESQUISA

    Em funo desse contexto o problema de pesquisa ento colocado:

    Quais e como os fatores humanos e organizacionais considerados

    influenciaram nos acidentes de trabalho na Empresa Paranaense de Alimentos,

    no perodo de 2003 a 2007?

    1.2. OBJETIVOS DA PESQUISA

    Visando facilitar a compreenso do problema de pesquisa proposto, foram

    definidos alguns objetivos para o estudo, aqui representados pelo objetivo geral e

    pelos objetivos especficos.

    1.2.1. Objetivo Geral

    Investigar se os fatores humanos e organizacionais mencionados na

    literatura influenciaram nos acidentes de trabalho na Empresa Paranaense de

    Alimentos, no perodo de 2003 a 2007.

    1.2.2. Objetivos Especficos

  • 25

    A fim de permitir a consecuo objetivo geral da presente pesquisa, os

    seguintes objetivos especficos so elaborados:

    Analisar a evoluo dos acidentes de trabalho na empresa pesquisada;

    Investigar se os fatores humanos e organizacionais mencionados na

    literatura como causadores de acidentes se encontram na empresa pesquisada no

    perodo de 2003 a 2007;

    Identificar que eventos significativos ocorreram na empresa no perodo

    estudado;

    Identificar como os fatores selecionados podem contribuir para entender

    as causas dos acidentes do trabalho, segundo uma viso multicausal;

    Avaliar os possveis ganhos da viso multicausal na identificao dos

    acidentes - suas contribuies e restries.

    1.3. JUSTIFICATIVAS TERICA E PRTICA

    No Brasil, ainda muito comum analisar o acidente do trabalho de forma

    superficial, dentro de uma viso microscpica ou monocausal. Segundo esta

    compreenso, o acidente visto como resultado de ato inseguro e de condies

    inseguras (ALMEIDA, 2001, 2003; BINDER; ALMEIDA, 1997). A culpa normalmente

    recai sobre o trabalhador que, na nsia de realizar sua funo, no tomou os

    devidos cuidados, ou que, na introduo de uma nova tecnologia, no soube

    adaptar-se, e acabou por provocar um acidente (TEIXEIRA; FREITAS, 2003).

    Segundo Almeida e Binder (1997), a partir de 1994, tem havido iniciativas do

    Ministrio do Trabalho no sentido de tornar obrigatria a investigao dos acidentes

    de trabalho com o Mtodo de rvore de Causas, que uma iniciativa para uma

    anlise mais ampla das causas, mas essa mudana no est considerando alguns

    aspectos como: aspectos tcnicos do mtodo, a heterogeneidade quanto ao grau de

    segurana das empresas brasileiras e a necessidade de capacitao de grande

    nmero de profissionais para aplicao; o que pode vir a comprometer os resultados

    de tais iniciativas.

  • 26

    Expandir para uma viso sistmica ou multicausal, traz novos elementos de

    anlise deslocando da nfase do subsistema homem-instrumento de trabalho, para

    a interao desse subsistema com o ambiente organizacional, reconhecendo dessa

    forma o intrincado relacionamento homem-ambiente. Esse olhar sistmico no

    considera que os atos inseguros (erros ou falhas humanas) sejam causas dos

    acidentes apenas, mas conseqncia de outros fatores (Figura 4).

    Figura 4: Expandindo da viso monocausal para a multicausal

    A contribuio terica deste estudo est em trazer informaes advindas de

    diversas reas de conhecimento para uma maior compreenso dos fatores que

    influenciam nas falhas humanas que levam aos acidentes de trabalho.

    A contribuio prtica est em sugerir a incluso de novos fatores na anlise

    dos acidentes, todos selecionados da literatura sobre o assunto: 1) idade e

    experincia na funo, 2) percepo do comprometimento da liderana com

    segurana; 3) percepo de risco pelo trabalhador; 4) sistema de gesto de

    segurana; 5) presso no trabalho e; 6) satisfao no trabalho.

    necessrio expandir para

    uma viso

    sistmica ou multicausal trazer novos

    elementos de anlise deslocando do subsistema homem-instrumento de trabalho, para a interao desse subsistema com o ambiente organizacional

    Adoo de solues eficientes(reduo de

    custos e preservar a

    vida humana)

  • 27

    Alm disso, esse trabalho pretende tambm, dentro de sua contribuio

    prtica, sugerir que a rea de segurana componha equipe multidisciplinar para as

    anlises dos acidentes, e fornecer aos dirigentes de empresas subsdios para que

    considerem nas estratgias do negcio meios para equilibrar produo, presso e

    segurana, podendo com isso reduzir custos com acidentes e ganhos de

    produtividade.

    1.4. ESTRUTURA DA DISSERTAO

    O primeiro e presente captulo constitudo por uma breve introduo ao

    tema de estudo proposto, seguido pela apresentao do problema de pesquisa e

    objetivos, bem como as justificativas terica e prtica que delinearo a pesquisa.

    A segunda parte da dissertao apresenta a base terica-emprica

    relacionada ao tema.

    Na terceira parte so estabelecidos os procedimentos metodolgicos que

    norteiam e delineiam a investigao emprica do estudo.

    A quarta parte trata da descrio e anlise do estudo de caso, incluindo a

    caracterizao da empresa pesquisada, a evoluo dos acidentes de trabalho e os

    fatores pesquisados.

    A quinta parte traz as consideraes finais, seguida das recomendaes e

    referncias e finalmente na ltima parte os anexo.

  • 28

    2. BASE TERICO-EMPRICA

    Neste captulo, apresenta-se a base terica do presente estudo, cuja

    principal finalidade delinear as concepes e conceitos necessrios para um

    melhor entendimento das teorias e abordagens que possam subsidiar este estudo.

    Esta fundamentao est organizada em partes. Inicialmente apresentada a

    varivel dependente acidentes de trabalho, que aborda definio e custo; na

    segunda parte sero abordados os fatores humanos e organizacionais e os

    acidentes de trabalho.

    2.1. O ACIDENTE DE TRABALHO

    A lei vigente a Lei n 8.213, que define acidente como: acidente do

    trabalho o que ocorre pelo exerccio do trabalho a servio da empresa ou pelo

    exerccio do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei,

    provocando leso corporal ou perturbao funcional que cause a morte ou a perda

    ou reduo, permanente ou temporria, da capacidade para o trabalho.

    A Associao Brasileira de Normas Tcnicas ABNT define o acidente do

    trabalho como: "ACIDENTE DO TRABALHO (ou, simplesmente, ACIDENTE) a

    ocorrncia imprevista e indesejvel, instantnea ou no, relacionada com o exerccio

    do trabalho, que provoca leso pessoal ou de que decorre risco prximo ou remoto

    dessa leso" (NBR 14280/99, Cadastro de Acidentes do Trabalho - Procedimento e

    Classificao).

    Segundo o Anurio Estatstico de Acidentes da Previdncia Social (AESP,

    2006), os acidentes podem ser classificados em tpico, que aquele decorrente da

    caracterstica da atividade profissional desempenhada pelo acidentado; de trajeto,

    aquele ocorrido no trajeto entre a residncia e o local de trabalho do segurado; a

    doena profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exerccio

    do trabalho peculiar a determinada atividade; e a doena do trabalho, adquirida ou

    desencadeada em funo de condies especiais em que o trabalho realizado e

    com ele se relacione diretamente.

  • 29

    Os acidentes de trabalho representam custos para o pas, para as

    empresas, alm de todo o impacto emocional, psicolgico e social. Esses custos se

    traduzem por exemplo, em horas perdidas, despesas com os primeiros socorros,

    danos a equipamentos e perdas de materiais, interrupo da produo, necessidade

    de formao de mo-de-obra adicional, custo de substituio de trabalhadores,

    pagamento de horas-extras, restabelecimento dos trabalhadores, salrios pagos aos

    trabalhadores sinistrados, despesas administrativas, gastos com medicina e

    engenharia de reparao, aumento do prmio de seguro, impacto na imagem da

    empresa, entre outros (CAMPELO, 2004). Existe um outro custo que pode ser

    representado pelo estudo realizado pela ICNA (1969), que analisou e publicou um

    resumo estatstico de dados sobre acidentes pessoais e materiais, levantados junto

    a 297 empresas que empregavam cerca de 1.750.000 pessoas, onde foram obtidos

    1.753.498 relatos de ocorrncias. Este estudo demonstra, conforme Figura 5, que

    para cada acidente com leso grave associam-se 10 acidentes com leso leve, 30

    acidentes com danos propriedade e 600 acidentes sem leso ou danos visveis -

    os quase acidentes, ou seja, quando uma empresa tem 10 acidentes com leses

    no incapacitantes ou 20 acidentes com danos propriedade, mais 600 situaes

    esto ocorrendo sem que ela perceba (ALBERTON, 1996).

    Figura 5 : Pirmide da ICNA (1969)

    Fonte : Alberton (1996)

  • 30

    2.2. FATORES HUMANOS E ORGANIZACIONAIS QUE IMPACTAM NOS

    ACIDENTES

    As teorias sobre as influncias dos fatores humanos e organizacionais nos

    acidentes so vistas sob diferentes aspectos por variados estudiosos. Em linhas

    gerais, essas teorias foram classificadas em mono e multicausais.

    Na abordagem monocausal, procura-se por uma causa nica e fundamental

    para a ocorrncia do acidente no indivduo ou no meio que o cerca, teorizando sobre

    o erro humano ou atos inseguros; mas sem porm levar em conta a variabilidade

    das situaes de trabalho, e nem o conhecimento prtico do trabalhador, que

    influenciam na estratgia que ele utiliza para realizar suas tarefas e para evitar os

    riscos presentes. Nesta abordagem o ser humano o elo fraco do sistema e por isso

    deve ter seu comportamento controlado por instrumentos de estmulos e respostas,

    como por exemplo premiaes e punies (BINDER; ALMEIDA, 1997; ALMEIDA,

    2001, 2003; TEIXEIRA; FREITAS, 2003; VILELA et al., 2007; CMARA et al., 2007).

    Rasmussen (1997) faz crticas da idia de causa bsica ou causa raiz de

    acidentes, pois no pensamento tradicional, uma vez eliminada a causa bsica

    aquele tipo de acidente no ocorreria mais. Para ele acidentes com aspectos

    semelhantes podem ocorrer sem a presena daquela determinada causa

    identificada isoladamente, porque na situao de trabalho real o cenrio para os

    acidentes resultado da interao ou acmulo de efeitos colaterais de decises

    tomadas por pessoas diversas em cenrios que dificilmente permite antever os

    efeitos decorrentes delas. Isoladamente cada deciso no capaz de produzir o

    efeito revelado pelo acidente. Esse cenrio de vulnerabilidade chamado por ele

    como migrao do sistema, que uma vez ocorrida, o acidente pode ser

    desencadeado por muitos tipos de pequenas mudanas.

    No modelo de Rasmussen (1997), considera-se que as mudanas normais

    encontradas nas condies de trabalho levam a freqentes alteraes de

    estratgias, e a atividade mostra grande variabilidade. Essas variaes locais,

    induzidas pela situao, promovem uma migrao sistemtica para as fronteiras de

  • 31

    segurana do sistema, saindo dos procedimentos pr-estabelecidos. Ao fazer isso,

    no temos uma falha humana, mas sim uma readequao no formalizada ao novo

    contexto (ALMEIDA, 2006).

    A abordagem multicausal tem seus fundamentos na Teoria Geral de

    Sistemas, e possibilita a evoluo de uma viso microscpica e esttica para uma

    abordagem mais abrangente e dinmica da explicao das causas dos acidentes.

    Isto significou um deslocamento da nfase do subsistema homem-instrumento de

    trabalho, para a interao desse subsistema com o ambiente organizacional. O

    deslocamento do eixo da anlise da simples atribuio de culpa ou de falhas

    humanas para as formas de gesto e organizao do trabalho em que os fatores

    humanos e organizacionais so analisados como significativos para a ocorrncia dos

    eventos, decorre, em grande parte, dos estudos de Perrow (1999) e Reason (1990,

    2000), dentre outros (CONCEIO; FICHER, 2006).

    Perrow (1999), analisando o acidente ocorrido numa planta nuclear construiu

    a base da sua Teoria da Normalidade dos Acidentes (NAT). A tese bsica a de que

    os acidentes so inevitveis em sistemas tecnologicamente complexos e fortemente

    interligados, como por exemplo em plantas nucleares, plantas petroqumicas e na

    aviao. O termo acidente normal significa que, em razo de as caractersticas dos

    sistemas possurem interaes mltiplas e no previstas, as falhas so inevitveis.

    Ele considera que por mais que esforos sejam feitos para controle total dos

    diversos subsistemas, determinadas reaes so imprevisveis e quando h a

    interao de mltiplas falhas conduzem a um acidente ou catstrofe.

    Essa teoria leva a uma reflexo sobre a causalidade dos acidentes,

    migrando de um modelo que v os eventos isoladamente, para uma viso que

    considera o acidente como resultado de interaes mltiplas. A partir da leso,

    busca-se recompor a situao de trabalho que deu origem ao acidente, identificando

    a fatores causais situados na sua origem (VILELA et al., 2007).

    Reason (1990), desenvolveu o modelo do Queijo Suo, Figura 6, baseado

    na idia de que defesas, barreiras e salvaguardas ocupam uma posio chave.

  • 32

    Essas barreiras tm por funo proteger vtimas potenciais e o patrimnio dos

    perigos do ambiente.

    Ele considera que sistemas de alta tecnologia tm muitas camadas

    defensivas, advindas da engenharia, tais como: alarmes, barreiras fsicas,

    desligamentos automticos. Outras defesas esto nas pessoas, por exemplo os

    operadores, e outras dependem de procedimentos e controles administrativos. A

    maioria das defesas, barreiras e salvaguardas funcionam bem, mas sempre existem

    fraquezas.

    Esse autor ainda menciona que hipoteticamente cada camada de defesa,

    barreira ou salvaguarda deveria estar ntegra. Entretanto, normalmente elas so

    como as fatias de um queijo suo, cheias de buracos. Esses buracos esto

    continuamente se abrindo e se fechando em diferentes momentos. Quando ocorre

    um alinhamento destes buracos nas diferentes camadas do sistema de defesas,

    barreiras ou salvaguardas, h a possibilidade de ocorrncia de um evento perigoso.

    Os buracos nas defesas surgem por duas razes: falhas ativas e condies latentes.

    Para Reason (2000), os erros humanos podem ser estudados sob os pontos

    de vista da aproximao pessoal (que foca os atos inseguros: erros e violaes de

    procedimentos), e da aproximao do sistema, cada qual possuindo um modelo

    prprio de causa dos erros e cada um apresentando sua prpria filosofia de

    gerenciamento. A premissa bsica do sistema que os seres humanos so falveis,

    logo erros so esperados, at mesmo nas melhores organizaes.

    Ainda segundo o autor, as falhas ativas so decorrentes de erros ou

    violaes que esto associados realizao das atividades pelas pessoas,

    representadas pelos atos inseguros cometidos pelas pessoas que esto em contato

    direto com o sistema, podendo assumir diferentes formas: deslizes, lapsos, perdas,

    erros e violaes de procedimentos. As falhas ativas geralmente tm um impacto de

    curta durao sobre as defesas. As falhas latentes so as patologias intrnsecas do

    sistema, e podem ser decorrentes de falhas tcnicas, condies inusitadas,

    desenhos e projetos inadequados, decises ou aes que tm conseqncias

    danosas. Toda deciso estratgica pode, potencialmente, introduzir um patgeno no

  • 33

    sistema. Essas falhas podem ficar adormecidas por longos perodos, mas quando

    combinadas com as falhas ativas, provocam acidentes (Figura 3).

    Figura 6: Modelo do Queijo Suio

    Fonte: Reason (2000)

    As falhas ativas no podem ser previstas facilmente, mas as condies

    latentes podem ser identificadas e corrigidas antes de um evento adverso. A

    compreenso deste fato leva ao gerenciamento proativo ao invs do reativo

    (REASON, 2000).

    O clima e a cultura de segurana so fatores tambm considerados dentro

    da viso sistmica e vm sendo conceituados e analisados em diversos estudos.

    Dentre eles pode-se citar os estudos realizados por Zohar (1980), para ele o

    conceito de clima de segurana tem uma relao direta com as percepes dos

    trabalhadores sobre as condutas de segurana nas situaes de trabalho. O autor

    prope oito dimenses para a determinao do clima de segurana: importncia dos

    programas de treinamento focados em segurana, atitudes da alta administrao em

    relao segurana, efeitos do comportamento seguro na carreira profissional, nvel

    de risco no lugar de trabalho, efeitos do ritmo do trabalho na segurana, status dos

    profissionais da rea de segurana, efeitos da conduta segura na imagem perante o

    grupo de trabalho e o status dos comits de segurana existentes na empresa.

  • 34

    Brown e Holmes (1986, apud Bley, 2006) colocam prova o modelo de

    Zohar, utilizando uma amostra com 425 trabalhadores norte-americanos, divididos

    em dois grupos: 225 que no tinham registros de acidentes no ltimo ano de

    trabalho e 200 que haviam sofrido algum tipo de acidente no trabalho, no mesmo

    perodo. Nesse estudo, eles reduzem os 8 fatores de Zohar para trs fatores:

    preocupao da alta administrao com o bem-estar de seus funcionrios, como a

    alta administrao responde a estas preocupaes e o risco fsico presente nas

    atividades dos empregados.

    na dcada de 90 que se desenvolve a maior parte das pesquisas

    relacionadas com o clima de segurana. Dedobbeleer e Bland (1991, apud Bley,

    2006) questionam o modelo de Brown e Holmes e propem uma soluo com dois

    fatores: compromisso da alta administrao a percepo dos trabalhadores em

    relao s atitudes dos diretores, a respeito das prticas seguras e da segurana

    dos trabalhadores, disponibilidade de equipamentos de proteo individual,

    percepo dos trabalhadores sobre o comportamento dos supervisores e os

    procedimentos e instrues de segurana; compromisso dos trabalhadores - a

    percepo dos trabalhadores acerca do potencial de exposio aos acidentes, os

    riscos existentes no ambiente, como o trabalhador percebe o nvel de controle que

    tem sobre a segurana nas atividades que executa.

    O conceito de clima e cultura de segurana recente. Segundo Oliver et al.

    (1992) clima entendido como:

    Uma percepo subjetiva da organizao , seus membros, suas estruturas e seus processos, que apresentam aspectos comuns, apesar das diferenas individuais, baseados em indcios ou elementos objetivos do ambiente, e que, alm disso, atua como antecedente da conduta dos sujeitos, qualidade que lhe confere sua verdadeira importncia. (OLIVER et al., 1992, p.161-172).

    A cultura da segurana pode ser descrita como a forma como fazemos as

    coisas por aqui (CBI, 1990).

  • 35

    A cultura de segurana o produto dos valores individuais e de grupo. So

    as atitudes, percepes, competncias e os padres de comportamento que

    determinam o comprometimento da gesto da sade e da segurana na organizao

    (HSL,2005).

    Flin et al. (2000), procuraram identificar os fatores mais comuns na cultura

    de segurana que emergiram a partir de pesquisas recentes e em 18 estudos

    realizados nos anos de 1991 e 1998, numa amostra de mais de 100 empresas em

    diversos pases (nucleares, gs, qumica, petrleo, leo, manufatura, companhias de

    aviao, construtoras, bebidas e alimentos), das quais 50% dos setores pesquisados

    eram energia/petrolfero) e encontraram os fatores Gesto e Superviso (72% dos

    estudos); Sistema de Gesto da Segurana (polticas de segurana, equipamentos

    de segurana, equipe da rea de segurana, etc) em 67% dos estudos; Risco

    (67%), alm de temas relacionados Presso de Trabalho e Competncias que

    aparecem em um tero dos estudos.

    Importante debate sobre os fatores humanos e organizacionais relativos

    segurana, foi realizado no workshop realizado na Sua em 1998, reunindo os

    pases membros da Organization for Economic Co-Operation and Development

    OECD e a Rssia, com o objetivo de identificar e avaliar fatores humanos e

    organizacionais relativos segurana em instalaes nucleares e que gerou uma

    listagem de doze fatores humanos e organizacionais, conforme Quadro 1.

    Quadro 1: Classificao segundo a OECD (NEA/CSNI/OECD,1998)

    CLASSE DE FATORES ELEMENTOS CONSIDERADOS

    Metas e estratgias Objetivos da alta administrao e das reas, como: prioridades, alocao de recursos, promoo da segurana,: poltica, planos estratgicos, definio da estrutura organizacional, responsabilidades e autoridade, etc.

    Funes de gerenciamento esuperviso

    Funes de organizar, planejar, controlar e monitorar processos e atividades para suportar as metas e as estratgias, como: identificao, desenvolvimento e apoio dos gestores, promoo e reforo das prticas de segurana, monitoramento, anlise de tendncias e desempenho de segurana e outras informaes; promoo de um processo de aprendizagem

  • 36

    organizacional; etc.

    Alocao de recursos Identificao, aquisio e desenvolvimento de know-how necessrio e recursos tcnicos, como: equilbrio entre a presso econmica, as exigncias de segurana e horrios; estrutura organizacional e grau de centralizao das decises; etc.

    Gesto de Recursos Humanos

    Especificar atribuies e responsabilidades para satisfazer requisitos organizacionais e selecionar, atribuir, desenvolver e avaliar pessoal, como: recrutamento, seleo, movimentao de pessoas; definio das polticas de recursos humanos; adaptao da organizao s mudanas na tecnologia; sistema de recompensa e reconhecimento; acompanhamento das atitudes em relao a uma cultura de segurana; etc.

    Treinamento O processo de identificao das funes e tarefas, e identificar os conhecimentos, competncias e habilidades requeridas para realizar essas tarefas em uma maneira segura e eficiente, e a prestao de uma formao adequada, como: processo de formao para assegurar uma melhoria contnua dos conhecimentos, aptides e habilidades para satisfazer exigncias profissionais e as estratgias, etc.

    Coordenao de trabalho

    Processo de planejamento, programao, alocao de recursos, execuo e definio de responsabilidades para a coordenao das atividades laborais, como: identificao de papis e delegao de responsabilidades; volume de negcios e o deslocamento e composio da equipe; priorizao, planejamento e programao das atividades laborais; gesto da carga e fluxo de trabalho; etc.

    Conhecimento organizacional

    O entendimento pessoal sobre a organizao formal e informal, processos, procedimentos, e prticas, como a forma como o trabalho efetivamente cumprida na organizao.

    Estabelecimento de procedimentos

    O processo de identificao, desenvolvimento, verificao, validao e implementao de normas, procedimentos e mtodos, baseados em padres para trabalhar.

    Cultura organizacional Refere-se aos pressupostos compartilhados, normas, valores, atitudes e percepes dos membros de uma organizao. Alguns aspectos deste fator: cultura da segurana como um aspecto da cultura organizacional; conscincia individual de segurana; apoio da organizao para os aspectos de socializao dos empregados; sistema de reconhecimento e recompensa que reforam trabalho seguro; conscientizao das penalidades para comportamentos inadequados; competncia psico-social; etc.

  • 37

    Aprendizado organizacional

    Processo pelo qual as organizaes identificam os problemas e aprendem com a experincia adquirida no passado e a experincia de outros, a fim de melhorar o seu desempenho futuro.

    Comunicao Processo pelo qual so trocadas informaes, tanto formal como informal, escrita e verbal, dentro e fora da organizao. Alguns aspectos deste fator: fluxo de informao entre os diversos nveis da organizao; comunicao entre os membros do grupo, abertura de cima para baixo e vice-versa; formalizao dos processos de comunicao, etc.

    Fonte: elaborado pela autora

    Fatores humanos e organizacionais que afetam os acidentes de trabalho,

    segundo a abordagem de outros autores, so apresentados no Quadro 2.

    Quadro 2: Fatores humanos e organizacionais que causam os acidentes de trabalho

    FONTE CLASSE DE FATORES

    ELEMENTOS CONSIDERADOS

    HSE (2003) Indivduo e o grupo de trabalho

    Comportamento, atitudes, idade, experincia na funo, perfil e competncia, comunicao, superviso imediata, fadiga e sade do trabalhador, etc.

    Local de trabalho Cronograma de produo, limpeza, condies ambientais (iluminao, barulho, umidade, calor, frio, etc.)

    Materiais e equipamentos

    Condies, uso e conformidade dos materiais, etc.

    Gesto Gesto de riscos, cultura de segurana, gerenciamento de projetos, construo dos processos, o design permanente, etc.

    Influncias Externas Fatores que ocorrem fora da organizao, mas que podem afetar sua cultura e desempenho, como: aspectos econmico, legal e poltico; percepo do funcionrio sobre o status de seu trabalho, etc.

    HOFMANN (1995)

    Aspectos individuais Atitudes, comportamentos e conhecimento dos empregados.

    Aspecto micro-organizacional

    Criao de gerenciamento e grupos de trabalho que mutuamente concordem sobre as medidas de segurana; polticas organizacionais; representantes da segurana; percepo sobre atitude da liderana.

    Aspecto macro-organizacional

    Complexidade tecnolgica; comunicao vertical e horizontal; especializao da fora de trabalho, dentre outros.

    Fonte: elaborado pela autora

  • 38

    Dentre os vrios fatores que podem causar os acidentes, existe um

    consenso entre os profissionais de segurana de que 90% dos acidentes de trabalho

    ocorrem em decorrncia do comportamento humano (KIM et al., 2002).

    Para Dela Coleta (1991), os estudos relacionados a acidentes de trabalho,

    necessitam levar em conta a forma como o Ser Humano se relaciona com seu meio

    de trabalho:

    Os comportamentos, as atitudes e as reaes dos indivduos em ambiente de trabalho no podem ser interpretados de maneira vlida e completa sem se considerar a situao total a que eles esto expostos, todas as inter-relaes entre as diferentes variveis, incluindo o meio, o grupo de trabalho e a prpria organizao como um todo. O acidente de trabalho, neste sentido, pode ser visto como expresso da qualidade da relao do indivduo com o meio social que o cerca, com os companheiros de trabalho e com a organizao(DELA COLETA,1991, p. 77).

    A compreenso sobre como o comportamento humano influencia na

    segurana importante, pois o erro (falha) humano deve ser visto como

    conseqncia de outros fatores e no apenas como causa dos acidentes. Essa

    compreenso possibilita recomendaes mais apropriadas para a reduo dos

    acidentes (KIM et al., 2002; ALMEIDA, 2006; EI, 2008).

    Para Reason (1990) o erro humano Termo genrico que engloba todas

    aquelas ocasies em que uma seqncia planejada de atividades fsicas ou mentais

    falha em conseguir um resultado desejado e quando essas falhas no podem ser

    atribudas ao acaso (REASON, 1990, p.9).

    Existem diferentes tipos de erros humanos (falhas) e inmeros fatores que

    os afetam. As falhas humanas podem ser classificadas em erro e violao

    (REASON, 1990); erros decorrentes da competncia, erros de decises e erros de

    percepo (SHAPPELL; WIEGMANN, 2000); erro por deslizes ou lapsos de ateno

    ou memria, o erro propriamente dito e violaes intencionais ou no intencionais

    (HSE, 2005), representado na Figura 7. Para o presente estudo as aes

    intencionais no foram considerados.

  • 39

    Figura 7: Tipos de erros humanos

    Fonte: HSE (2005)

    Fatores humanos e organizacionais que afetam as falhas humanas esto

    destacados no Quadro 3.

    Atos inseguros

    Aes no intencionais (erros)

    Aes intencionais

    Lapsos

    Erros

    Violaes

    Falhas de ateno

    Atos de sabotagem

    Falhas de memria

    Situacional

    Baseado em regras

    Baseado em conhecimento

    Rotinas

    Excepcional

    Planejamento satisfatrio, mas a ao executada de forma diferente, intencionalmente ou no.

    Infraes no rotineirasfeitas em situaesespecficas

    Aplicao incorreta de umaboa regra ou aplicao de uma regra ruim

    Nenhuma soluo anterior, situao nova abordada precisar pensar em responder a partir do zero

    Desvio habitual de prticas regulares

    Infraes no rotineiras, feitas pela extremacircunstncia do momento

    Deslizes

  • 40

    Quadro 3: Fatores humanos e organizacionais que afetam as falhas humanas

    FONTE CLASSE DE FATORES

    ELEMENTOS CONSIDERADOS

    EI (2008) Fator humano Condies ambientais (temperatura, rudo, umidade, etc.), mental e fsica; disponibilidade de instrumentos, equipamentos e procedimentos adequados;aspectos pessoais (personalidade, perfil para executar as tarefas, competncia, etc.); etc.

    Gerenciamento da segurana

    Polticas eficazes de segurana e sade; disponibilizao de estrutura necessria para o funcionamento adequado da segurana; dispor de controles apropriados e auditoria; etc.

    Cultura de segurana Atitudes e crenas da organizao para com a segurana; comunicao; liderana; nfase em segurana na execuo dos trabalhos; etc.

    HSE (2005) Indivduo Competncia individual; personalidade; atitudes; condies da sade fsica e emocional do indivduo; percepo de risco; satisfao no trabalho; etc.

    Trabalho Inclui reas como a natureza da tarefa; carga de trabalho; condies de trabalho; instrues e procedimentos claramente definidos; concepo de equipamentos e instrumentos; etc.

    Organizao Cultura do local de trabalho; cultura de segurana; disponibilizao de recursos; comunicao; liderana; distribuio de tarefas; produo priorizada frente a segurana; sistema de gesto de segurana eficiente; mudana organizacional bem conduzida; polticas de recursos humanos adequadas, etc.

    Fonte: elaborada pela autora

    Como observado, dentro de uma viso sistmica ou multicausal, so vrios

    os fatores que podem impactar nas falhas humanas nos acidentes (Anexo 1). Para

    efeitos desse estudo sero considerados os seguintes fatores: Idade e experincia

    na funo (Van Zelst (1954, apud Dela Coleta, 1991); Dela Coleta (1991); Sawacha

    et al., 1999; HSL, 2005), que apontam para a tendncia dos trabalhadores mais

    jovens e menos experientes estarem vinculados a taxas maiores de acidentes;

  • 41

    Percepo da presso no trabalho (Hofmann et al.,1995; Flin et al., 2000; HSL,

    2002; Evans et al., 2005; Mullen, 2004; Mendes; Wnsch, 2007); Percepo de

    risco (Hofmann et al., 1995; Rundmo,1996; Dedobbeleer; Beland,1998, apud HSL,

    2002; Cox; Cheyne, 2000; Flin et al.,2000); Percepo do comprometimento da

    liderana com a segurana (Zohar, 1980; Thompson, et al., 1998; Cox et al.,1998;

    Meli, 1998; Dedobbeller e Beland,1998, apud HSL, 2002; Flin et al.,2000; ODeal e

    Flin, 2001; HSL, 2002; Mullen, 2004; Evans et al., 2005); Satisfao no trabalho

    (Thompson et al., 1998; HSE, 1999; ODeal e Flin, 2001; Kim et al., 2002; Wagner

    III; Hollenbeck, 2002; Barling et al., 2003; Spector, 2006; Witt, 2007) e, o Sistema de

    gesto da segurana, (Zohar,1980; Binder; Almeida,1997; Rundmo et al.,1998;

    Sawacha et al.,1999; Flin et al., 2000; ODeal; Flin,2001; EI, 2008), conforme

    apresentado nos Quadros 4 a 9.

    Quadro 4 : Idade e experincia

    Fonte: elaborado pela autora

    Autores Idade e Experincia

    Van Zelst (1954, apud Dela Coleta, 1991); Dela Coleta (1991); Sawacha et al. (1999); HSL (2005).

    Idade e da experincia na ocorrncia de acidentes de trabalho, estando os mais jovens e menos experientes mais suscetveis a se acidentarem.

  • 42

    Quadro 5 : Presso no Trabalho

    Fonte: elaborado pela autora

    Autores Presso no Trabalho

    Hofmann etal.(1995) Trabalhadores so mais propensos a encurtar caminhos na execuo das tarefas do que enfrentar a presso, renunciando assim as prticas seguras no intuito de realizar mais rapidamente a atividade

    HSL (2002) Pressono trabalho vem sendo tratado por diversos autores como um fator importante a ser considerado no clima de segurana.

    Flin et al. (2000) Considerado o quarto fator mais comum nas pesquisas sobre clima de segurana, dentre 18 estudos analisados

    Mullen (2004) Efeito da presso do trabalho sobre as falhas humanas, decorrente da percepo do trabalhador sobre a sobrecarga de trabalho, presso por atingir resultados e ritmo acelerado de produo

    Evans etal.(2005) Os resultados sugerem que uma maior nfase na produtividade est relacionada com a um aumento do nmero de incidentes, enquanto um forte clima de segurana tinha uma relao inversa.

    Mendes e Wnsch (2007) Intensificao do ritmo do trabalho considerada com uma das causas que levam o indivduo a atos inseguros

  • 43

    Quadro 6: Percepo de risco

    Fonte: elaborado pela autora

    Autores Percepo de Risco

    Hofmann et al. (1995) Aborda que a falta de percepo de risco influencia para que os trabalhadores tomem atalhos perigosos quando na execuo de suas atividades.

    Rundmo (1996) Trabalhadores percebem o risco a que esto expostos durante a execuo do seu trabalho e melhora suas condies de trabalho.

    Dedobbeleer e Bland(1998, apud HSL, 2002)

    Considerada a importncia do risco na mensurao do clima de segurana. Eles examinaram nove estudos de 1980 a 1995 e descobriram que a percepo de risco do empregado foi identificada em dois dos nove estudos e, em outros ela foi associada a percepo do controle empregado.

    Cox e Cheyne (2000) Encontraram que a percepo de risco pode ser til na mensurao do clima de segurana.

    Flin et al. (2000) Identificou em 18 estudos realizados de 1991 a 1998, que a este o terceiro fator mais comum nas pesquisas da cultura de segurana.

    Arezes (2002) Processo perceptivo fundamental, uma vez que, quando se lida com preservao da sade, estamos vinculados capacidade das pessoas de se relacionar com os perigos de forma cuidadosa, evitando danos integridade fsica e psquica dos indivduos, isto , prevenir acidentes e doenas.

    Bley (2006) A percepo de risco diz respeito capacidade da pessoa de identificar os perigos e reconhecer os riscos, atribuindo-lhes significado.

  • 44

    Quadro 7 : Percepo do Comprometimento da Liderana

    Fonte: elaborado pela autora

    Autores Percepo do Comprometimento da Liderana

    Zohar (1980) ... o mais importante o compromisso sincero da gesto, pois caso contrrio como se olhasse para a floresta sem porm se ver as rvores.

    Dedobbeller e Beland (1998apud HSL, 2002)Dedobbeleer e Bland(1991, apud Bley, 2006)

    Compromisso da alta administrao a percepo dos trabalhadores em relao s atitudes dos diretores, comportamento dos supervisores e os procedimentos e instrues de segurana, como um dos dois fatores que compe o clima de segurana .

    Meli (1998) Uma resposta mais segura dos superiores afetaria de forma significativa a conduta de segurana do trabalhador e a forma deles perceberem os riscos reais.

    Cox et al. (1998) Estudos realizados em indstrias de manufaturas em UK, encontraram que o comportamento do indivduo influenciado pela percepo dele sobre as aes da liderana para com a segurana.

    Thompson et al. (1998) As atitudes dos gestores para com a segurana, influenciavam no comportamento seguro dos empregados atravs da comunicao e da interao com eles.

    Flin et al. (2000) Identificou em 18 estudos realizados de 1991 a 1998, que a este o primeiro fator mais comum nas pesquisas da cultura de segurana.

    ODeal e Flin (2001) Sugerem que os gestores sejam profundamente conscientes do seu papel em segurana.

    HSL (2002) O compromisso da liderana percebido pelo empenho pessoal do supervisor, juntamente com os seus subordinados para com a segurana.

    Mullen (2004) Aponta em sua pesquisa a importncia do papel gerencial em reforar e ensinar atitudes e comportamentos seguros.

    Evans et al. (2005) Haver menos incidentes em um ambiente de trabalho em que os trabalhadores so encorajados a trabalhar de forma segura e supervisores que ponham considervel nfase na segurana .

    Pesquisa envolvendo 526 operrios de 4 indstrias de mveis na Pensilvnia, identificaram que os funcionrios que percebiam que seus gerentes e supervisores enfatizavam mais a produtividade, relatavam maior nmero de ocorrncias relacionadas com a segurana.

  • 45

    Quadro 8: Satisfao no Trabalho

    Autores Satisfao no Trabalho

    Kerr (1957, apud Dela Coleta, 1991)

    Quanto mais rico o ambiente em oportunidades de recompensas, maior a vigilncia e mais elevado o nvel de qualidade de vida no trabalho.

    Dejours (1992) A tolerncia crescente dos trabalhadores numa forma de organizao do trabalho, que vai contra seus desejos, necessidades e sade, ocasiona uma perda de investimento afetivo neste, uma vez que o trabalhador perde o acesso ao sentido de sua tarefa no todo da produo.

    Thompson et al.(1998) Resultados de estudos demonstraram que a gesto no s desempenha um papel importante na manuteno de um trabalho seguro, que deveria ser bvio, mas que os gerentes e supervisores podem faz-lo de diferentes maneiras, como o sentimento de justia nas promoes, na interao com os funcionrios.

    HSE (1999) As taxas de acidentes melhoram em situaes nas quais funcionrios e gestores confiam no sistema de promoo, em que os funcionrios percebem que sero reconhecidos por adotarem atitudes seguras.

    Dethlefsen e Dahlke (2000) Assim como as doenas so decorrentes de um processo de somatizao, os acidentes tambm o so.

    Murata et al. (2000) 139 operrios haviam tido algum tipo de acidente no trabalho, constatou que a maior incidncia de acidentes de trabalho ocorria com as mulheres com alta demanda psicolgica e baixo controle, assim como com aquelas com baixo apoio social no trabalho.

    Moscovici (2000) Quando alguma mudana proposta, quase sempre gera-se uma percepo de ameaa ao status quo, situao segura e organizada da pessoa. Essa percepo de ameaa provoca um desequilbrio interno - estresse.

    SILVA (2000) Ser humano quando se sente incapaz de comunicar com palavras os seus pensamentos, o faz com a linguagem dos rgos, adoecendo e se acidentando.

    ODeal e Flin (2001) Acreditam que a melhor forma de promover a segurana atravs do desenvolvimento participativo e um relacionamento aberto entre os lderes e subordinados.

  • 46

    Fonte: elaborado pela autora

    Wagner III e Hollenbeck(2002)

    Satisfao com o trabalho o sentimento agradvel que o indivduo tem, decorrente da percepo de que o trabalho que esta desenvolvendo permite atingir resultados que para ele so valorizados.

    Kim et al. (2002) Estudo realizado com 40 empregados (indstria), identificaram que a satisfao com a gesto e com o trabalho influencia num desempenho seguro. Fatores como comunicao mais aberta, nvel de decises descentralizadas, tarefas mais variadas e com mais autonomia, aumentam a satisfao e reduzem as taxas de acidentes.

    Tamoyo et al. (2004) Estudos realizados vm identificando a cultura organizacional como causa primria do estresse na organizao

    Cruz (2004) ... o corpo, lugar da percepo do sofrimento e de restrio de condutas. atravs dele que identificamos, talvez, a medida do sofrimento, seja na leso, na dor, na incapacitao de movimentos, na auto-agresso, na vivncia do estresse e da fadiga.

    Mendes (2004) A cultura organizacional viabiliza a sade quando permite a formao de compromisso entre o indivduo e a realidade.

    Ferreira e Assmar (2004) Um processo de mudana, normalmente gera o sentimento do medo da perda de emprego, e esse a segunda maior causa de angstia e estresse entre os trabalhadores.

    FISCHER et al. (2005) No Brasil, um estudo com 354 trabalhadores adolescentes identificou a associao entre alta demanda psicolgica e acidentes de trabalho.

    Cimbalista (2006) O trabalhador considera que enquanto estiver produzindo ele compensa para a empresa .

    Spector (2006) Quando o indivduo tem uma relao de prazer com o trabalho que realiza, isso entendido como satisfao no trabalho, podendo gostar do que faz e assim estar satisfeito com o trabalho, ou no gostar, estando insatisfeito

    Witt (2007) Os resultados sugerem que os trabalhadores que percebem uma maior satisfao profissional tendem a ter fortes sentimentos percepo de segurana no trabalho

    Limongi-Frana(2008) Faz referncia a importncia da Segurana do Trabalho estar atenta s queixas psicossomticas.

  • 47

    Quadro 9: Sistema de Gesto da Segurana

    Fonte: elaborado pela autora

    Autores Sistema de Gesto da Segurana

    Zohar (1980) Um dos fatores considerados como importantes para a mensurao do clima de segurana.

    Rundmo et al. (1998) M gesto pode diminuir o interesse dos empregados em propor melhorias segurana, podendo resultar em um reduzido nvel de segurana.

    Sawacha et al. (1999) Identificaram os comits de segurana como um importante fator para o desempenho da segurana.

    Flin et al. (2000) Identificou em 18 estudos realizados de 1991 a 1998, o SGS como sendo o segundo fator mais comum nas pesquisas da cultura de segurana.

    Cooper (2000) Sugeriu que o status do responsvel pela segurana deveria se reportar ao alto nvel da hierarquia, pela representatividade quanto importncia da segurana que estaria passando.

    ODeal e Flin (2001) Normalizao, clareza da poltica de segurana, so alguns dos fatores a serem mais profundamente avaliados, como influenciadores da competncia pessoal e uma participao mais ativa em segurana.

    Bley (2006) Pesquisas realizadas por vrios autores em reas aeroporturias, manufatura e empresas do setor de petrleo, utilizando os indicadores atitudes em relao segurana, aes dos gestores em segurana e relaes dos comits de segurana nas organizaes como indicadores de clima de segurana, concluram uma importante relao entre o clima de segurana e as atitudes em relao segurana dos gestores e as atitudes em relao responsabilidade individual de cada trabalhador.

    OHSAS 18001 (2007) SGS corresponde ao conjunto de elementos inter-relacionados utilizados para estabelecer a poltica e os objetivos e atingir tais objetivos.

    EI (2008) Polticas eficazes de segurana e sade, disponibilizao de estrutura adequada para as demandas de segurana, controles apropriados e auditorias, so vistos como fatores que podem afetar as falhas humanas.

  • 2.3. FATORES SELECIONADOS

    So diversos os fatores organizacionais e humanos

    afetam as falhas humanas e os acidentes de trabalho (Anexos 8.1. a

    presente estudo a seleo dos fatores

    freqentes na literatura relativa a cu

    Presso no Trabalho e Satisfao no Trabalho que foram

    levantamentos na empresa

    Figura 8: Seleo dos Fatores P

    Fonte: elaborado pela autora

    . FATORES SELECIONADOS

    So diversos os fatores organizacionais e humanos indivduo e grupo, que

    afetam as falhas humanas e os acidentes de trabalho (Anexos 8.1. a

    seleo dos fatores foi efetuada com base naqueles

    freqentes na literatura relativa a cultura de segurana, acrescidos

    Presso no Trabalho e Satisfao no Trabalho que foram identificados durante os

    antamentos na empresa (Figuras 8 e 9).

    o dos Fatores Pesquisados

    Fonte: elaborado pela autora

    Fatores pesquisados

    Organizao

    Indivduo

    Grupo

    48

    indivduo e grupo, que

    afetam as falhas humanas e os acidentes de trabalho (Anexos 8.1. a 8.4.), para o

    foi efetuada com base naqueles mais

    ltura de segurana, acrescidos dos fatores

    identificados durante os

  • 49

    Figura 9: Critrio de Escolha dos Fatores Pesquisados

    Fonte: elaborado pela autora

    2.3.1. Idade e Experincia na funo

    Com relao idade e experincia dos trabalhadores e sua relao com os

    acidentes de trabalho estudos realizados por Van Zelst (1954, apud Dela Coleta,

    1991); Dela Coleta (1991); Sawacha et al. (1999); HSL (2005), apresentam

    resultados que indicam a influncia da idade e da experincia na ocorrncia de

    acidentes de trabalho, estando os mais jovens e menos experientes mais suscetveis

    a se acidentarem.

    Importante lembrar que o perfeito desempenho das tarefas est diretamente

    relacionado aos conhecimentos de que dispe sobre a execuo da mesma, seja

    terico ou prtico. Assim, o desconhecimento da forma correta de execuo por

    parte dos operrios pode acarretar erros e omisses no desenvolvimento de suas

    atividades e, conseqentemente, aumento do perigo de acidentes para si ou para os

    seus colegas de trabalho (SAWACHA et al., 1999).

    - 1) Trs mais importantes fatores pesquisados na cultura de segurana-2) Identificados durante o levantamento de dados e abordados na literatura

  • 50

    2.3.2. Percepo da Presso no Trabalho

    A presso para realizao dos trabalhos (ritmo e carga de trabalho,

    prioridade de produo vir antes da segurana) tem se tornado foco de discusso

    como fator de risco, por diversos pesquisadores como Hofmann et al. (1995), Flin et

    al. (2000), HSL, 2002, Mendes e Wnsch (2007), Mullen (2004), entre outros.

    Segundo Mendes e Wnsch (2007), a intensificao do ritmo do trabalho

    considerada com uma das causas que levam o indivduo a atos inseguros. Hofmann

    et al.(1995) sugerem que os trabalhadores so mais propensos a encurtar caminhos

    na execuo das tarefas do que enfrentar a presso, renunciando assim as prticas

    seguras no intuito de realizar mais rapidamente a atividade.

    Mullen (2004) identifica em sua pesquisa que a execuo de tarefas sem os

    devidos cuidados de segurana, ocorre quando o indivduo se sente pressionado no

    trabalho. Essa presso pode ser decorrente da percepo do empregado quanto a

    sobrecarga de trabalho - quando tende a se centrar sobre o desempenho em vez da

    segurana; e na falta de tempo para executar a tarefa com segurana quando se

    sente pressionado pela chefia para fazer rapidamente sua atividade.

    O efeito da presso do trabalho sobre as falhas humanas (decorrente da

    percepo do trabalhador sobre a sobrecarga de trabalho, a presso por atingir

    resultados e o ritmo acelerado da produo) tem tambm respaldo nos estudos de

    Evans et al. (2005) e Mendes e Wnsch (2007).

    Para Dejours (1992), o modelo de gesto do trabalho inspirado no

    Taylorismo, que preconiza a racionalizao do trabalho, gera exigncias fisiolgicas

    at ento desconhecidas, especialmente as exigncias de tempo e ritmo de

    trabalho. O corpo aparece como principal ponto de impacto dos prejuzos do

    trabalho. O esgotamento fsico envolve todo o conjunto de operrios da produo de

    massa.

  • 51

    2.3.3. Percepo de riscos

    A percepo de risco diz respeito capacidade da pessoa de identificar os

    perigos e reconhecer os riscos, atribuindo-lhes significado. No processo de

    percepo do indivduo h uma subjetividade que decorrente da interferncia de

    diversos fatores, tais como: o nvel de sade, do conhecimento, da ateno, do

    estado emocional, dentre outros. O que faz com que o risco real (objetivo) seja

    diferente do risco que foi percebido pela pessoa, e esse processo pode variar de

    indivduo para indivduo (BLEY, 2006).

    Perceber o risco, tem sido considerado pela Psicologia da Segurana no

    Trabalho como importante para a compreenso dos aspectos psicossociais

    relacionados preveno dos acidentes de trabalho. O ser humano estabelece

    contato com o mundo externo pelos seus sentidos (tato, olfato, audio, gustao e

    viso). , portanto, por meio dos seus sentidos que recebe e d significado aos

    dados da realidade. Quando se tem o processo de atribuio de sentido

    informao recebida, chamado de percepo (BLEY,2006).

    Ainda segundo a autora, a no-percepo de risco pelo trabalhador, onde

    ele mais se expe aos perigos (desvios/incidentes), aumentando o risco de suas

    atividades e, como conseqncia, acontecem os acidentes. Se no percebe o risco,

    muito provavelmente no ter capacidade de escolher o meio mais seguro de agir

    (comportamento seguro consciente). Tambm pode ocorrer de perceber o risco e,

    mesmo assim, por fatores internos (despreparo, herosmo, etc) ou externo

    (condies de trabalho, presso desmedida de produo, etc), escolher em no

    faz-lo.

    A maneira como os trabalhadores percebem o risco a que esto expostos

    durante a execuo do seu trabalho, poder contribuir para uma melhor

    compreenso da sua gesto e, dessa forma, para a melhoria das suas condies de

    trabalho (RUNDMO, 1996).

    Em preveno, o processo perceptivo fundamental, uma vez que, quando

    se lida com preservao da sade, estamos vinculados capacidade das pessoas

  • 52

    de se relacionar com os perigos de forma cuidadosa, evitando danos integridade

    fsica e psquica dos indivduos, isto , prevenir acidentes e doenas (AREZES,

    2002).

    Em ltima anlise, quem no percebe os riscos dificilmente tem condies

    de escolher o meio mais seguro de agir, pois a percepo pr-requisito para um

    comportamento seguro consciente (escolhido e no por acaso). Algum que no

    identifica os riscos da sua tarefa, tem alta probabilidade de agir de forma arriscada

    (AREZES, 2002).

    2.3.4. Percepo do comprometimento da liderana com a segurana

    Haver menos incidentes em um ambiente de trabalho em que os

    trabalhadores so encorajados a trabalhar de forma segura e supervisores que

    ponham considervel nfase na segurana (EVANS et al., 2005).

    ODeal e Flin (2001), sugerem que os gestores sejam profundamente

    conscientes do seu papel em segurana, enquanto lderes. Acreditam que a melhor

    forma de promover a segurana atravs do desenvolvimento participativo e um

    relacionamento aberto entre os lderes e seus subordinados.

    Com relao influncia do comportamento do superior na conduta segura

    do trabalhador, Meli (1998), menciona que uma resposta mais segura dos

    superiores afetaria de forma significativa a conduta de segurana do trabalhador e a

    forma deles perceberem os riscos reais.

    Thompson et al. (1998), concluram que as atitudes dos gestores para com a

    segurana, influenciavam no comportamento seguro dos empregados atravs da

    comunicao e da interao com eles.

    Evans et al. (2005), em uma pesquisa envolvendo 526 operrios de 4

    indstrias de mveis na Pensilvnia, identificaram que os funcionrios que

  • 53

    percebiam que seus gerentes e supervisores enfatizavam mais a produtividade,

    relatavam maior nmero de ocorrncias relacionadas com a segurana.

    Zohar (1980) menciona que na tentativa de melhorar os nveis de segurana

    numa empresa, freqentemente criam-se novas normas de segurana e fazem-se

    campanhas e competies entre reas, quando o mais importante o compromisso

    sincero da gesto, pois caso contrrio como se olhasse para a floresta sem porm

    se ver as rvores.

    2.3.5. Satisfao no Trabalho

    Para Wagner III e Hollenbeck (2002), a satisfao no trabalho e o estresse

    ocupacional so identificados como os mais importantes itens entre a grande

    variedade de atitudes e emoes geradas no local de trabalho. Sendo que, a

    satisfao com o trabalho o sentimento agradvel que o indivduo tem, decorrente

    da percepo de que o trabalho que esta desenvolvendo permite atingir resultados

    que para ele so valorizados.

    Barling et al. (2003), identificaram em seus estudos que nas empresas de

    alto desempenho, por exemplo, a pessoa que se sente mais satisfeita no seu

    trabalho, est sujeita a menos fadiga, o que possibilita maior concentrao no

    trabalho e a adoo de medidas preventivas de segurana, resultando na diminuio

    dos acidentes. Essas empresas obtm esses resultados pela forma de

    administrao adotada, pois a mesma possibilita ao trabalhador ter mais autonomia,

    a participar na tomada de decises e a ter controle sobre o seu trabalho.

    Estudo realizado por Murata et al. (2000), no Japo, com 139 operrios

    (homens e mulheres), dos quais 24 homens e 15 mulheres haviam tido algum tipo de

    acidente no trabalho, constatou que a maior incidncia de acidentes de trabalho

    ocorria com as mulheres com alta demanda psicolgica e baixo controle, assim

    como com aquelas com baixo apoio social no trabalho. No Brasil, um estudo com

    354 trabalhadores adolescentes identificou a associao entre alta demanda

    psicolgica e acidentes de trabalho (FISCHER et al., 2005).

  • 54

    Kim et al. (2002) em estudo realizado com 40 empregados de uma indstria,

    identificaram que a satisfao com a gesto e com o trabalho influencia num

    desempenho seguro. Fatores como comunicao mais aberta, nvel de decises

    descentralizadas, tarefas mais variadas e com mais autonomia, aumentam a

    satisfao e reduzem as taxas de acidentes.

    Quando o indivduo tem uma relao de prazer com o trabalho que realiza,

    isso entendido como satisfao no trabalho, podendo gostar do que faz e assim

    estar satisfeito com o trabalho, ou no gostar, estando insatisfeito (SPECTOR, 2006;

    ROBBINS, 2007). A relao entre satisfao no trabalho e segurana est

    fortemente suportada nos estudos empricos (BARLING et al., 2003).

    Empresas que desenvolvem trabalhos em que o funcionrio exerce

    atividades de alto desempenho, naturalmente executam atividades mais variadas,

    tem maior nvel de autonomia, melhor treinado, recebe mais informaes e

    desenvolve competncias, tem maior participao nas tomadas de decises, tem

    uma chefia mais participativa,o que oportuniza mais concentrao no seu trabalho,

    na segurana e na tomada de melhores decises sobre segurana. Tem atitudes

    positivas com relao a empresa, pois percebe que ela tambm investe nele e que

    ali consegue atender suas necessidades. Esse sentimento de bem estar gerado

    conduz ao aumento da satisfao no trabalho e na segurana nos seus postos de

    trabalho, reduzindo conseqentemente os acidentes (BARLING et al., 2003).

    Segundo HSE (1999), as taxas de acidentes melhoram em situaes nas

    quais funcionrios e gestores confiam no sistema de promoo, em que os

    funcionrios percebem que sero reconhecidos por adotarem atitudes seguras.

    O prazer no trabalho um caminho para a sade porque cria identidade

    social e pessoal para o indivduo. Ele, indivduo, sente-se integrado ao que faz, no

    executa uma mera tarefa, mas sim, encontra no que produz a realizao de si

    mesmo. Ao produzir algo, o trabalhador sente-se estruturado como pessoa por se

    sentir valorizado e reconhecido pelo que faz. O trabalho vem atender suas

    necessidades que podem variar desde a da sobrevivncia at a da auto-realizao

    (MENDES, 2004).

  • 55

    Limongi-Frana (2008), faz referncia a importncia da Segurana do

    Trabalho estar atenta s queixas psicossomticas, pois a ausncia da segurana

    fsica pode levar a um acidente ou a uma doena ocupacional, identificada como

    resultado de condies inseguras combinadas a atos inseguros, mas uma anlise

    cuidadosa do comportamento (atos) poder a levar a causas psicossomticas.

    Segundo ela, os estudos sobre psicossomtica partem da premissa de que os

    processos psquicos influenciam muito mais a dinmica do corpo, e quando

    abordada a questo da queixa psicossomtica, deve-se considerar a interao

    mente-corpo-ambiente.

    Ainda segundo a autora, nessa interao pode ocorrer a somatizao, que

    so disfunes fsicas, visveis ou no, cujas sensaes so de dor, mal-estar ou

    doena. As respostas psicossomticas ou somatizao, correspondem a

    indisposies, dores, disfunes orgnicas e leses de rgo ou sistema do corpo,

    carregada de contedos emocionais relativos a prazer, desprazer e situaes de

    estresse, que so respostas dinmica humana, de ordem orgnica.

    Segundo Dejours (1992), a tolerncia crescente dos trabalhadores numa

    forma de organizao do trabalho, que vai contra seus desejos, suas necessidades

    e sua sade, ocasiona uma perda de investimento afetivo neste, uma vez que o

    trabalhador perde o acesso ao sentido de sua tarefa no todo da produo. Nas

    empresas passa-se a ter o corpo dcil e disciplinado, entregue sem obstculo a essa

    nova organizao do trabalho, ao engenheiro de produo e direo hierarquizada

    do comando

    Para Cruz (2004), o que est implicado no sofrimento humano no trabalho ,

    antes de tudo, o corpo, lugar da percepo do sofrimento e de restrio de condutas.

    atravs dele que identificamos, talvez, a medida do sofrimento, seja na leso, na

    dor, na incapacitao de movimentos, na auto-agresso, na vivncia do estresse e

    da fadiga.

    Dethlefsen e Dahlke (2000), interpretam os acidentes de trabalho da mesma

    forma como inter