a influência do diagnóstico psiquiátrico no tratamento de abordagem psicanalítica

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UNIVERSIDADE PAULISTA UNIP VICE-REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA Curso de Psicologia A INFLUÊNCIA DO DIAGNÓSTICO PSIQUIÁTRICO NO TRATAMENTO DE ABORDAGEM PSICANALÍTICA Benivaldo do Nascimento Junior Campus Brasília Brasília 2011

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Para entendermos como o discurso médico psiquiátrico se consolida como discurso hegemônico é importante refazer brevemente o caminho histórico que a psicopatologia percorreu até os dias de hoje.

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UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP

VICE-REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA

Curso de Psicologia

A INFLUÊNCIA DO DIAGNÓSTICO PSIQUIÁTRICO NO TRATAMENTO DE ABORDAGEM PSICANALÍTICA

Benivaldo do Nascimento Junior

Campus Brasília – Brasília 2011

UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP

VICE-REITORIA DE PÓS GRADUAÇÃO E PESQUISA

INICIAÇÃO CIENTIFICA – UNIP / SANTANDER

RELATÓRIO DE PESQUISA

TÍTULO: A INFLUÊNCIA DO DIAGNÓSTICO PSIQUIÁTRICO NO TRATAMENTO DE ABORDAGEM PSICANALÍTICA

AUTOR: Benivaldo do Nascimento Junior CURSO: Psicologia CAMPUS: Brasilia

ORIENTADOR: Maria do Rosária Varella

Pesquisa financiada pelo Santander, Programa Santander Universidades Bolsas de Educação

Agradecimentos

Agradeço a Professora Dra. Maria do Rosário Varella, minha orientadora por confiar em mim

e acreditar que seria possível concluir esse trabalho mesmo diante de tantos percalços e

contratempos.

Agradeço a coordenadora do CPA - Centro de Psicologia Aplicada dessa Universidade

Professora Dra. Simone Garcia por disponibilizar os prontuários e trabalhos que fizeram parte

desse projeto.

Agradeço a Andréia Maria de Oliveira do Departamento de Pesquisa da UNIP pela

consideração e todo trabalho que realizou a distância em São Paulo, para que essa pesquisa se

tornasse possível.

ATO MÉDICO...

Na primeira noite eles aproximam-se e colhem uma Flor do nosso jardim

e não dizemos nada. Na segunda noite,

já não se escondem; Pisam as flores, matam o nosso cão,

e não dizemos nada. Até que um dia

o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua,

e conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta.

E porque não dissemos nada, Já não podemos dizer nada.

Vladimir Maiakóvski

RESUMO

As ciências biológicas juntamente com as neurociências, hoje são o fundamento

principal da psicopatologia e subsidiam de instrumentos teóricos a construção da “explicação

psiquiátrica” na contemporaneidade. A instituição médica psiquiátrica baseada no paradigma

clínico fornece “nomes” para os mais diversos sofrimentos psíquicos dos sujeitos. A

psicopatologia enfim encontrou sua vocação médica e assim como aconteceu nas outras

especialidades, aqui também, a padronização de sintomas, o funcionamento psíquico

fundamentado em bases orgânicas e o grande desenvolvimento dos psicofármacos,

consolidam o saber médico psiquiatra pautado numa perspectiva cientificista, isto é, numa

suposta objetividade.

A medicalização e agora a psiquiatrização dos sujeitos, disseminados pelas diversas

formas de mídia (internet, televisão, revistas, etc.) fornecendo todo tipo de informação,

permitem que qualquer um, diante do sofrimento, consiga encontrar um nome ao sintoma que

considera doença. Esse diagnóstico aparece na maioria das vezes muito antes da primeira

visita do paciente a um profissional de saúde, sendo previamente construídos através dos

discursos ofertados pelos mecanismos de comunicação e pelo senso comum.

Vários pacientes que comparecem a Clínica Escola da Universidade Paulista, campus

Brasília em busca de alívio para o sofrimento psíquico, vêm muitas vezes acompanhados de

diagnósticos sobre seu sofrimento, construídos através das representações sociais dos seus

sintomas ou por orientação de outros profissionais da saúde, na maioria das vezes com a

chancela médica.

Esta pesquisa buscou mensurar qual a influência que um diagnóstico psiquiátrico

prévio tem na evolução das intervenções clínicas de orientação psicanalítica na Clínica Escola

da referida instituição. Através de levantamentos realizados nos arquivos de prontuários nos

anos de 2009 e 2010, juntamente com entrevistas dos estagiários, descrevemos várias

situações onde o diagnóstico prévio esteve influenciando a prática da Psicoterapia Breve de

Abordagem Psicanalítica. Divididos em diferentes grupos, tanto de pacientes como de

estagiários, o diagnóstico prévio atuou de forma a dificultar o desenvolvimento da clínica em

várias situações descritas, confirmando a hipótese inicial.

ABSTRACT

Nowadays, the biological science along with the neurosciences are the main

foundation of the psychopathology and subsidize the construction of the “psychiatric

explanation” on the contemporary. The psychiatric medical institution based on the clinical

paradigm provides names for a variety of psychological suffering of many subjects. The

psychopathology, finally, found its medical vocation, and just as happened in other

specialties, here also, the standardization of the symptoms, the psychological function based

on organic bases and the great development of the psychotropics consolidate the psychiatrist

knowledge grounded in a scientific perspective, that is, in a supposed objectivity.

The medicalization and now the psychiatrization of the subjects, disseminated by the

many kinds of media (internet, television, magazines, etc) provides all kind of information,

which allows that anyone facing the suffering, can find a name to the symptom that they

consider a disease. This diagnosis appears most of times long before the patient's first visit to

a health professional, being previously constructed by the discourses offered by the

communication mechanisms and the common sense.

Many patients that attend the Clinical School of the university – UNIP - Universidade

Paulista, campus in Brasilia, seeking for a relief for the mental suffering often come

accompanied by its diagnosis, constructed by social representations of their symptoms or by

the orientation of other health professionals, most of the times with medical approval.

This research aimed to measure what influence that a previous psychiatric diagnosis

has in the evolution of the psychoanalytical interventions of the Clinical School mentioned.

Through surveys conducted in the archives of the medical records on the years of 2009 and

2010, along with trainees interviews, it was described many situations in which the previous

diagnosis influenced the practice of the brief psychotherapy psychoanalytic approach. The

prior diagnosis divided in many different groups of , as well as, trainees acted in a way that

impeded the development of the clinic in many situations described, thus confirming the

initial hypothesis.

SUMÁRIO

1. Introdução ........................................................................................................................ 8

1.1. Breve Levantamento Histórico da Psicopatologia ......................................................... 8

1.1.1. Os conceitos de Biopoder e Somatocracia ................................................................. 9

1.1.2. A sociedade autodisciplinada ................................................................................... 10

1.2. Instituição, Instituído e Intituinte.................................................................................. 11

1.3. O Discurso Psiquiátrico ................................................................................................ 14

1.4. O Discurso Psiquiátrico e o Curso de Psicologia ......................................................... 16

2. Objetivo Geral ............................................................................................................... 18

2.1. Objetivos específicos .................................................................................................... 18

3. Hipótese ......................................................................................................................... 18

4. Justificativa .................................................................................................................... 18

5. Métodos ......................................................................................................................... 19

5.1. Sujeitos ......................................................................................................................... 21

5.2. Instrumentos ................................................................................................................. 21

5.2.1. Prontuários de pacientes no período de 2009-2010 .................................................. 21

5.2.2. Relatório dos estagiários no período de 2009-2010 ................................................. 21

5.2.3. Entrevistas com estagiários cursando o último ano .................................................. 22

5.3. Aparatos de Pesquisa .................................................................................................... 23

5.4. Procedimentos .............................................................................................................. 23

5.4.1. Coletas de dados ....................................................................................................... 24

5.4.2. Análise dos dados ..................................................................................................... 36

6. Resultados ...................................................................................................................... 38

6.1. Prontuários .................................................................................................................... 38

6.2. Entrevistas .................................................................................................................... 42

7. Discussão ....................................................................................................................... 45

8. Conclusão ...................................................................................................................... 48

9. Bibliografia .................................................................................................................... 50

10. ANEXOS ....................................................................................................................... 53

10.1. ANEXO 1 - ENTREVISTAS ................................................................................... 53

10.2. ANEXO 2 - Roteiro de Entrevista ............................................................................ 73

10.3. ANEXO 3 - TERMOS DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO .......... 74

8

1. Introdução

Para entendermos como o discurso médico psiquiátrico se consolida como discurso

hegemônico é importante refazer brevemente o caminho histórico que a psicopatologia

percorreu até os dias de hoje.

Para responder essa questão utilizaremos uma perspectiva sócio-histórica-cultural

percorrendo bibliograficamente autores como Foucault, Deleuze, Illich, Bourdier que vinham

desde a década de 60 antevendo que os mecanismos ideológicos levariam a luta de classes a

patamares onde não mais a exploração do trabalho, mas da vida, passaria a ser o principal

instrumento de controle do poder. Conceitos como violência simbólica, biopoder,

somatocracia, iatrogênese, medicalização, patologização, biologização, surgiram então como

perspectivas teóricas que buscam compreender essas transformações e que utilizaremos para

subsidiar a hipótese.

1.1. Breve Levantamento Histórico da Psicopatologia

O Cartesianismo, o Liberalismo, a Revolução Francesa, o Iluminismo e as Ciências

Humanas e Exatas criaram um sujeito ligado à sua individualidade as concepções interiores de

cada um e a norma social. (Guimarães C. F., Meneghel S. N, 2003)

A emergência do capitalismo em contraposição ao modelo feudal promoveu a

separação da sociedade em duas classes: a) burguesa formada pelos proprietários dos meios

de produção, a classe dos capitalistas modernos, a qual representa uma negação da sociedade

feudal e b) proletária, entendida como sendo:

“o conjunto de assalariados que, não tendo meios de produção, são obrigados a vender

sua fonte de trabalho para viver, são importantes no contexto de entendimento do processo da

construção da ideologia que juntamente com o Estado são utilizadas pela classe dominante (os

proprietários) como ferramenta de coerção e controle da classe dominada (trabalhadores)

(Chauí, 1980).”

A ideologia, ou seja, a idéia que a classe dominante tem de si mesma, da natureza, dos

demais homens e do Estado, incorpora o pensamento científico como mais um instrumento de

controle da classe dominada, (Chauí, 1980). Luz (1988), em sua análise sócio-histórica da

racionalidade científica moderna, a caracteriza como um modelo explicativo mecanicista, com

método empírico, analítico-dedutivo e linguagem matematizante, que é dominante até hoje e

que busca desqualificar outros saberes, que não o conhecimento científico.

9

O trabalhador está sob controle, o mecanismo ideológico agora é o controle do

indivíduo através das massas. Braga (2004) aponta que “com a sólida estruturação do sistema

capitalista, emerge uma nova tecnologia de poder preocupada menos com o disciplinamento

do corpo individual, já moldado pelo trabalho parcelar”, portanto o objeto agora é o controle

do corpo social.

O modelo biomédico apoiada na indústria química farmacêutica se consolida então

como instrumento de poder sobre os corpos. O processo de medicalização ganha força no

contexto da perspectiva higienista, predominante no final do século XIX e início do século

XX, privilegiando procedimentos que evitassem a sujeira e promovessem a higiene médica e

doméstica. A partir da II Guerra Mundial surge um enfoque preventivo em função de avanços

nos campos do diagnóstico e do tratamento de doenças, surge nesse período com muito

impulso a industrialização dos antibióticos, dos antiinflamatórios, dos corticóides (Lima,

Parrila 2004).

Nesse momento histórico, uma série de intervenções políticas e econômicas, volta-se

para a incidência de epidemias, para o controle das taxas de natalidade, longevidade e

mortalidade, forjando as tecnologias de população. “O poder investe, nesse momento, sobre

os corpos socializados”, Pogrebinschi (2004).

“Nesse período o modelo biomédico atinge seu apogeu” (Lima, Parrila 2004).

Para Foucault (1977), na década de 1940 a 1950 formulou-se um novo direito, uma

nova moral, uma nova economia e uma nova política do corpo: “Desde então, o corpo do

indivíduo se converte em um dos objetivos principais da intervenção do Estado.”

1.1.1. Os conceitos de Biopoder e Somatocracia

Entre 7 de janeiro e 17 de março de 1976, Michel Foucault ministra, no Collège de

France, um curso intitulado “Il fault défendre la societé”. É na última aula desse curso que o

filósofo introduz o conceito de biopoder (Braga, 2004). Este biopoder ou “somatocracia”

(onde somato do grego sõmatikós = referente ao corpo e cracia do grego kratía = governo,

poder, autoridade, Cunha 1982) vinha sendo preparado desde o século XVIII e desde seu

nascimento viveu em crise, segundo o autor.

A medicina passa ser ferramenta do poder não mais importando seus efeitos, mas sim

o controle que pode ser exercido através dela.

10

A medicina passa então por um intenso processo de estatização e socialização.

Foucault (citado por Soares 2000) destaca a separação ou distorção entre o caráter científico e

a positividade de seus efeitos, apontando que:

“seus resultados nocivos não são mais devidos a erros de diagnóstico ou ingestão

acidental de substâncias, mas devidos à própria ação da intervenção médica, como é

o exemplo dos medicamentos.” (Soares 2000).

Em 1975 Ivan Illich (citado por Nogueira (1999)) na sua obra Nêmesis da Medicina

declara: “a Medicina institucionalizada transformou-se numa grande ameaça à saúde”. Nesse

trabalho o autor desenvolve o conceito de iatrogenia1 em três situações diferentes:

iatrogênese clínica com conseqüências em danos à saúde devido à falta de segurança e

ao abuso das drogas.

a iatrogênese social, proveniente de uma ampla dependência da população para com as

drogas, e as orientações ditadas pela medicina.

iatrogênese cultural, que destrói o potencial cultural das pessoas e das comunidades

para lidar de forma autônoma com a enfermidade, a dor e a morte.

1.1.2. A sociedade autodisciplinada

Torrano (2007) comenta esses jogos de poder lembrando que: “os textos tardios de

Foucault envolvem uma denúncia do funcionamento desses dispositivos de poder/saber”

tornando o controle dos sujeitos algo constituinte do próprio sistema.

A abordagem de toda obra de Foucault tem sua base apoiada sobre o conceito de

história. Nesse sentido Foucault apresenta o conceito de poder disciplinar como sendo uma

contraposição do poder soberano, que o antecede historicamente no período feudal.

“O poder soberano tem na sua extremidade de autoridade, a individualidade do

soberano, e, na sua base, multiplicidades que pairam acima de qualquer

individualidade corporal – enquanto o poder disciplinar, pelo contrário, se dá por

meio de um exercício progressivo, que se caracteriza pela falta deste dualismo: aqui

a individualidade está apenas na base. Há no seu ponto de mais autoridade somente

1 Iatrognia é uma palavra que deriva do grego: o radical iatro (“iatrós”), significa médico, remédio, medicina; geno (“gennáo”),

aquele que gera, produz; e “la”, uma qualidade. A iatrogenia poderia, portanto, ser entendida como qualquer atitude do médico. Entretanto, o

significado mais aceito é o de que iatrogenia consiste num resultado negativo da prática médica. Tavares (2007)

11

dispersão e multiplicidade, um “sistema disciplinar” que é “feito para funcionar

sozinho” (Foucault, 2006).

No processo de transformação do capital, que caminhou para sua fase monopolista (no

viés econômico) e imperialista (no viés político) no século XIX, poder disciplinar e biopoder

passaram a constituir uma unidade, por meio da eclosão da sociedade normalizadora, cujos

mecanismos de regulação e correção produzem, avaliam e classificam as anomalias do corpo

social, ao mesmo tempo em que as controlam e eliminam (Foucault, 2000).

Esse processo de auto regulação do processo de dominação de Foucault se relaciona

com o conceito, um tanto mais determinista, de violência simbólica de Bourdier. Assim

conceitua Bourdier (BORGES 2005): “a violência simbólica é esta violência que extorque

submissão e que não são percebidas como tais por se apoiarem sobre as expectativas

coletivas, e as crenças socialmente inculcadas.2”

Acreditamos que poderíamos, inclusive para melhor entendermos o conceito, mudar a

expressão “violência simbólica” para “imposição simbólica”.

1.2. Instituição, Instituído e Intituinte

Além da abordagem sócio-histórica é conveniente utilizar conceitos da Psicologia

Institucional como outra leitura possível para o mesmo fenômeno. Tentar entender como o

Discurso Psiquiátrico ganha tanta relevância no meio social através da ótica dessa disciplina é

importante definir primeiramente os conceitos de Instituição, Instituído e Intituinte.

O conceito Instituição adquire uma nova roupagem quando em 1762 Rousseau (2005)

na publicação de sua obra Do Contrato Social, legitima a idéia de instituição ligada ao povo

soberano, em contraposição à concepção de Estado ou instituição ligado a esfera divina. Esse

momento seria o ato de fundação de um corpo social baseado no princípio de uma alienação

consentida. De uma forma abrangente eram idéias revolucionárias para sua época visto que

várias instituições tal como a escravidão, entre outras, estavam protegidas de toda ação

2 “El análisis de la aceptación dóxica del mundo, que resulta del acuerdo inmediato de las estructuras objetivas con las

estructuras cognoscitivas, es el verdadero fundamento de una teoría realista de la dominación y de la política. De todas las formas de

“persuasión clandestina”, la más implacable es la ejercida simplemente por el orden de las cosas.”(CALDERONE 2004) (Dóxica do

espanhol, Doxa - sistema ou conjunto de juízos que uma sociedade elabora em um determinado momento histórico supondo tratar-se de uma

verdade óbvia ou evidência natural, mas que para a filosofia não passa de crença ingênua, a ser superada para a obtenção do verdadeiro

conhecimento (HOUAISS 2001))

12

política ou jurídica e a partir daí passaram a serem analisadas como dependentes da

coletividade sendo assim capazes de causar mudanças na esfera social.

Com o aparecimento do Estado Moderno, as grandes indústrias e a preponderância das

ciências, a discussão do tema sobre as instituições aparece novamente na obra de Hegel

(1980, apud LAPASSADE, 1983) - A Fenomenologia do Espírito, fundamentada pela

concepção de que o povo não encontraria nenhuma possibilidade de alcançar a universalidade

a partir de uma independência sócio-institucional, restando-lhe apenas a submissão às formas

determinadas pelas instituições burguesas e pela organização política do trabalho passando a

ser definida como uma “sociedade instituída e burocratizada”.

Contrariamente a essa concepção, no marxismo, as instituições se confundem com a

hierarquização do saber, com os interesses particulares e econômicos e com a burocracia

sendo essa última uma “doença” que se alastra e mantém as sociedades capitalistas. Sua

principal ação é manter uma distribuição desigual e hierarquizada do poder sendo motivo,

portanto as classes operárias lutar por uma desinstitucionalização radical da sociedade.

Essas rápidas considerações históricas visam demonstrar que até o começo do século

XX duas noções de Instituição predominavam no campo das ciências políticas e sociais:

“ [...] um modelo tradicional denominado funcionalista ou descritiva, pensando a

instituição nível instituído — entendida como sistema coerente, harmônico, natural,

isto é, sem contradições sem lutas, sem história. Já o segundo modelo, a análise de

cunho histórico-dialético, considera o aspecto estrutural da instituição, sendo esta

mero reflexo da prática de dominação resultante de uma sociedade de classes.”

(LEITE, 2003)

Ambas as abordagens desconsideram, o contraponto que a existência predominante

dos sujeitos impõe às suas teorias causando rompimentos tanto nas possibilidades quanto nas

impossibilidades de execução das práticas institucionais. Assim, nos dois modelos citados,

permanecemos numa perspectiva macro-social, voltados somente para análise das relações de

poder, independente dos sujeitos aí presentes.

Recentemente a psicologia institucional, de origem argentina resultante de uma

necessidade dos psicanalistas argentinos participarem do momento político de seu país,

passaram a entender a idéia de instituição como sendo relacionada não somente aos

estabelecimentos e organizações (escolas, hospitais, empresas, etc.), mas também aos

dispositivos instalados no interior das instituições (grupos de discussão, assembléias, equipes

de trabalho, conselhos de classe, etc.).

13

Na leitura da análise institucional, proveniente da escola francesa, Lapassade (1983

apud LEITE, 2003) define o conceito de instituição como algo que não possui um lócus, ou

seja:

“ [...] forma que produz e reproduz as relações sociais ou forma geral das relações

sociais, que se instrumentaliza em estabelecimentos e/ou dispositivos. A instituição

é concebida, dessa forma, como produto de uma sociedade instituinte, em

determinado momento da história, não sendo, portanto, uma natureza, algo

universal.” (LEITE, 2003).

Partindo do pressuposto de que as instituições são construídas nas relações sociais,

podemos identificar duas perspectivas importantes na sua constituição, o instituinte e o

instituído.

Instituinte é o conjunto de forças que tendem a transformar as instituições, enquanto

instituído é o resultado desta ação instituinte dentro de uma instituição. “O instituinte

transmite uma característica dinâmica; o instituído transmite uma característica estática,

congelada” (MORATO, 2009).

Assim, em uma determinada instituição, podemos reconhecer no movimento criativo

instituinte, uma resposta a uma demanda que o grupo reconheceu como sua e por ser

historicamente construída possui uma parcela de alienação e se opõe dialeticamente ao

instituído que por sua vez é fruto de um acabamento, uma cristalização deste processo

fazendo com que essas forças estejam sempre se interpenetrando e em constante movimento.

Como afirma Guirado (1987), o objeto da psicologia institucional é: “as relações

(imaginadas, simbolizadas, representadas, enfim) que, nascendo dos lugares que a burocracia

(o ‘grande simbólico’) estabelece, passam a ser ratificadas, legitimadas e assumidas pelos

sujeitos ou grupos como ‘naturais’, como ‘tendo que ser assim.” (GUIRADO, 1987).

Portanto, podemos pensar a Psiquiatria como uma instituição com representações

instituídas em todas as esferas da sociedade, sejam no meio jurídico, na opinião pública, na

mídia, junto aos profissionais da saúde, nas escolas, etc. Dentro desse escopo percebemos que

as práticas instituídas nos diversos segmentos, são dependentes de um movimento instituinte

que os sujeitos que estão submetidos ao fenômeno exercitam na maioria das vezes de forma

inconsciente e com ações instituintes que atravessam e transpassam o instituído.

Uma das tendências identificadas no campo social é a de se naturalizar o instituído, de

se reconhecer a ordem estabelecida como natural e autêntica. A própria invisibilidade do

14

fenômeno estudado remete aos que dele participam, a perceber que há um aspecto negativo

que faz com que a instituição Medicina Psiquiátrica desconheça a si própria uma vez que

ações instituintes a modificam em função dos mais diferentes aspectos (culturais, gênero,

valores, conveniência, poder, etc.). Se acompanharmos a visão do Movimento

Institucionalista em suas diferentes correntes, veremos que neste não-saber está possibilidade

de identificarmos o fenômeno da nossa pesquisa. Lapassade (apud, Magalhães, 1986) vê que

nesses grupos “há uma dimensão oculta, não analisada e, portanto, determinante: a dimensão

institucional”.

1.3. O Discurso Psiquiátrico

Mais recentemente a psiquiatria americana se constitui como discurso hegemônico e o

DSM-IV, por ser atualmente referência mundial de diagnóstico dos transtornos mentais,

consolida o modelo psiquiátrico americano como um padrão global.

Temos que levar em consideração nessa análise a socialização do discurso médico

disseminado pela mídia e as campanhas de marketing financiadas pela indústria farmacêutica,

para entender a relevância desse paradigma na produção de verdade acerca do sofrimento

psíquico e de sua natureza.

Segundo Almeida (2009), com o advento dos neurolépticos na década de 50, a

psiquiatria percebeu-se finalmente capaz de dispensar conteúdos descritivos da loucura e

reaproximar-se do ideal pragmático de ciência e de objetividade dominante no resto da

medicina.

Para Guarido (2007) “a psiquiatria contemporânea promove uma naturalização do

fenômeno humano e uma subordinação do sujeito à bioquímica cerebral”. Nesse contexto o

sofrimento psíquico é regulável pelo uso dos remédios considerando que a medicação é

atualmente indicação prioritária das intervenções médico-psiquiátricas que estão associadas a

procedimentos diagnósticos descritivos provenientes dos manuais CID e DSM, padronizados

pelo discurso científico.

“Perceber a inversão não pouco assustadora, da lógica atual de construção

diagnóstica onde o remédio participa da nomeação do transtorno, visto que não há

mais uma etiologia e uma historicidade a serem consideradas, pois a verdade do

sintoma/transtorno está no funcionamento bioquímico, e os efeitos da medicação

dão validade a um ou outro diagnóstico.” GUARIDO (2007).

15

Almeida (2009) remete essa discussão para o campo filosófico e ressalta, “Temos que

saber primeiro o que é um esquizofrênico, como age, como se faz problema, para depois

agirmos terapeuticamente. A própria terapia constitui o seu esquizofrênico e passa a tratá-lo”.

Esse autor após o exame amplo da introdução aos usos e conceitos do DSM-IV

demonstra que a constituição do manual evita ampliar as margens das definições de tal forma

que os objetivos clínicos, estatísticos e consensuais, a essência do trabalho do grupo

estabeleçam uma posição independente de conteúdos e não fiquem contaminados por

explicações enigmáticas e profundas.

Encontramos na leitura do CID-10 também a mesma aspiração asséptica quando o

texto tenta banir as “explicações enigmáticas e profundas” provenientes da psicanálise:

“F44 – Transtornos Dissociativos (ou conversivos) [...] É, portanto, freqüentemente

possível fazer interpretações e suposições sobre os meios do paciente para lidar com

estresse intolerável, mas conceitos derivados de qualquer teoria em particular, tais

como “motivação inconsciente” e “ganho secundário” não estão incluídos entre as

diretrizes ou critérios para diagnóstico.” (CID-10, p. 147, grifo nosso)

Segundo Bolguese (2005),

“As idéias freudianas foram sendo abandonadas e questionadas pela psiquiatria e nas quatro revisões

posteriores à primeira publicação do manual, deu-se o que Roudinesco (2000) bem chamou de uma limpeza

gradual, dita teórica, visando a demonstrar que os distúrbios da alma e do psiquismo deviam ser reduzidos a uma

explicação orgânica, quase mecânica do funcionamento cerebral”. (BOLGUESE, 2005).

Alvarenga (2009) apud Deleuze (1992), descreve esse momento a partir da visão do

autor em sua obra “Conversações”, afirmando que:

“[...] estamos passando da sociedade disciplinar, descrita por Foucault, para uma

sociedade de controle. As sociedades disciplinares atuam basicamente pelas

instituições de confinamento, como: família, escola, hospital, prisão, fábrica. No

entanto, depois da Segunda Guerra Mundial, essas instituições entram em crise e

desmoronam os seus muros. Assim, a família nuclear burguesa pulveriza-se; a

escola entra em colapso; o manicômio vira hospital-dia; a fábrica se atomiza na

acumulação flexível; mas, por mais paradoxal que possa parecer, a lógica de

controle se generaliza. Dessa maneira, o controle social prescinde das instituições

disciplinares e sua decorrente necessidade de confinamento para assumir

modalidades mais fluídas, flexíveis, tentaculares, deslizantes.” (ALVARENGA,

2009).

Bolguese (2005) sugere que a psiquiatria, até 50/60 anos atrás considerada uma

ciência incerta do anormal, se converteu cada vez mais na prática da normalização, da

16

adaptação e da conformidade com a média. Por um lado, a psiquiatria caminhou na direção da

descrição e classificação dos estados mentais e, por outro, juntamente com o desenvolvimento

da psicofarmacologia, buscou no progresso das ciências biológicas, sobretudo na genética

psiquiátrica, a elucidação da base orgânica das doenças mentais.

1.4. O Discurso Psiquiátrico e o Curso de Psicologia

Conhecer essa realidade, entretanto, não alivia o mal-estar causado entre a

discrepância do paradigma das Ciências Biomédicas, utilizado para entender o conteúdo de

Psicopatologia em relação às demais abordagens clínicas que até então foram apresentadas

durante o curso de psicologia, e mais especificamente em nosso caso a Psicanálise. Cabe

nesse momento questionar também se a escola não é um reprodutor desses mecanismos de

poder até agora descritos.

Nessa ótica, o argumento de Stival (2008) reproduz nosso entendimento, quando a

escola participa da nossa formação como mero reprodutor de conhecimento:

“[...]Os autores Bourdieu e Passeron desenvolveram a “teoria da reprodução”

baseada no conceito de violência simbólica. Para estes autores, toda ação pedagógica

é objetivamente uma violência simbólica enquanto imposição de um poder

arbitrário.[...]Desse modo, o sistema educacional consegue reproduzir por meio de

uma violência simbólica as relações de dominação, ou seja, a estrutura de classes,

reproduzindo de maneira diferenciada a ideologia da classe dominante.” STIVAL

(2008).

As instituições sociais entre elas a escola não só refletiram modelos que atendiam aos

interesses da classe dominante, mas mais do que isso, foi o palco onde a ideologia foi

inculcada nos indivíduos. Alguns autores criticaram essa posição da escola de reprodução e

manutenção do status quo da classe dominante desmistificacando a concepção ingênua e a-

crítica da escola: teoria do Sistema enquanto Violência Simbólica (Bourdieu e Passeron,

1970); teoria da escola enquanto Aparelho Ideológico do Estado (AIE, Althusser, 1968); e

teoria da escola Dualista (Baudelot e Establet, 1971), todas dentro do que Saviani (2003)

denominou de “crítico-reprodutivistas”, explicavam os mecanismos de marginalização das

classes populares e a impotência e o imobilismo da escola reprodutora (Saviani, 2003a).

É evidente que por reproduzir modelos sociais e ser mantida pelo poder dominante a

escola, incorpora como verdade absoluta à neutralidade científica e a transposição dos

acontecimentos naturais à sociedade. Por conseqüência a medicalizacão e os demais conceitos

17

acima descritos também compõem os objetivos operacionais utilizados para manter os

“produtos desejáveis” pela sociedade capitalista e industrial.

Conhecer essa realidade, entretanto, não alivia o mal-estar causado entre a

discrepância do paradigma das Ciências Biomédicas, utilizado para entender o conteúdo de

Psicopatologia e as demais abordagens clínicas que até então foram apresentadas durante todo

o curso de psicologia, e mais especificamente em nosso caso a Psicanálise.

Diante da dimensão ocupada pelo discurso psiquiátrico na sociedade, ficamos cônscios

que em nossa futura posição de psicólogos clínicos, devemos incorporar muito bem a cartilha

médica, não só para podermos nos vincular às equipes interdisciplinares onde prevalece a

concepção médica de doença, mas acima de tudo ocupando o espaço deixado para nós nessa

aproximação, garantindo nossa subsistência.

Seria ingênuo também não reconhecer o alívio do sofrimento que pacientes psicóticos

obtém quando são tratados com psicofármacos, entretanto devemos questionar amplamente a

sua utilização em pacientes neuróticos que estão vivendo crises das mais diversas ordens

(familiares, existenciais, econômicas, sociais) muitas vezes atuando repetições que causam

sofrimento psíquico e sendo medicados simplesmente para alívio do seu padecer imediato

inibindo assim soluções definitivas para seus males que a psicoterapia possibilita em muitos

casos.

Perguntamo-nos então se a possibilidade de diálogo entre a psicopatologia e as outras

abordagens psicológicas não seriam na verdade um monólogo onde a primeira a partir de uma

política, uma tomada de posição, portanto ideológica, marcada pelo desenvolvimento da

indústria, impõe às demais abordagens um espaço restrito, “um quintal”, para sua atuação.

Neste tempo, em que reina a pulsão, o imperativo categórico de gozo, (Danziato

(2010), devemos nos questionar. Qual a influência dessa abordagem em uma clínica situada

exclusivamente no campo da linguagem? Devemos recuar perante o recurso da medicação ou,

ao contrário, valer-nos desse uso diante da angústia dos sujeitos que procuram tratamento?

18

2. Objetivo Geral

Qual a influência de um diagnóstico psiquiátrico prévio para a evolução nas

intervenções clínicas de orientação psicanalítica em uma clínica-escola?

2.1. Objetivos específicos

Comparar pacientes com e sem diagnóstico psiquiátrico prévio em relação aos

seguintes aspectos:

Foco da queixa: Se houve alteração da demanda inicial do paciente;

Diagnóstico Psiquiátrico: Se houve alteração da hipótese psiquiátrica ao longo do

tratamento;

Tempo de duração: Comparar o tempo de duração do tratamento.

3. Hipótese

O paciente que chega para o tratamento psicanalítico com um diagnóstico psiquiátrico

prévio dificulta a instalação de um processo de tratamento de orientação psicanalítica que

prioriza através do discurso a elaboração pelo paciente de seu sofrimento psíquico.

4. Justificativa

O fenômeno abordado apresenta grande influência na prática psicanalítica

principalmente no que concerne a sua atuação em instituições de saúde tendo sido tema de

discussões em sociedades de psicanálise bem como na academia.

O trabalho longe da pretensão de esgotar o tema procura sim, levantar questões que

possam subsidiar tanto os novos estudos quanto as práticas realizadas, além de tentar

delimitar as fronteiras ou uma possível interface entre psiquiatria e psicanálise.

A pesquisa será divulgada no meio acadêmico podendo ser usada ou aperfeiçoada

pelos profissionais que se interessem pela mesma. O trabalho induz o interesse a um vasto

campo de investigação para novas pesquisas, uma vez o que temos hoje na área da saúde é um

possível retrocesso em função da iminência de aprovação, no Senado, do Ato Médico. Esta

ação política contraria as intenções, diretrizes e princípios do SUS que visa ao processo de

humanização na área da saúde, buscando superar o enfoque biologicista das práticas em saúde

e direcionar essas práticas para uma atuação que inclua os “aspectos sociais que condicionam

19

e determinam a vida, o adoecimento e a morte das pessoas.”3 envolvendo nesse processo

vários campos de conhecimento concebidos como produção social e determinados pelos

aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais.

Na área educacional amplia a consciência de todos os sujeitos que participarão da

pesquisa tornando-os co-participantes do saber revelado o que naturalmente trará

conseqüências práticas na esfera dos futuros profissionais, permitindo a construção de novos

significados.

5. Métodos

A metodologia deste estudo seguiu o modelo da Análise Hermenêutica Objetiva

fundada e utilizada por Ulrich Övermann (apud Vilela; Nápoles 2008) buscando desvendar e

revelar com um caráter reconstrutivo a realidade sui generis que está no fenômeno estudado a

partir da interpretação textual de prontuários e entrevistas.

“Trata-se de um procedimento de pesquisa qualitativa interpretativa, que realiza a

análise hermenêutica de textos com a pretensão de encontrar a validade da

interpretação. A finalidade da análise hermenêutica é descortinar a lógica entre as

estruturas de reprodução social e as estruturas de transformação.” (Vilela; Nápoles

2008)

Segundo esses autores a Hermenêutica de Övermann está conceitualmente, centrada

em interpretação de textos escritos. Originalmente utilizado em pesquisas na área educacional

o método, indica a utilização do que se denomina “protocolo”. O objeto de pesquisa deve

estar portando registrado no protocolo. O protocolo pode ser a transcrição de uma entrevista,

o diário de campo, a redação de uma observação, assim como obras de arte, música,

arquitetura, uma gravação de uma entrevista ou como no nosso caso um prontuário. Este

protocolo deve ser fiel ao que ocorreu. O protocolo evidencia passo a passo o acontecido,

registrando tudo o que ocorreu ou o que foi dito devendo-se checar a procedência e

fidedignidade de toda e qualquer informação.

O protocolo deve ser analisado com a finalidade de buscar a “reconstrução objetiva do

texto, o que está registrado nele, o que está revelado no registrado” (Vilela; Nápoles 2008). A

hermenêutica objetiva opera principalmente como um processo de “reconstrução estrutural da

situação porque para ela, qualquer resultado da práxis social é estruturado segundo normas,

3 http://www.naoaoatomedico.com.br/paginterna/profis_psicologia.cfm

20

nenhum produto da práxis humana é aleatório.” (Vilela; Nápoles 2008). Essa concepção vai

diretamente ao encontro do tipo de informação que buscamos em um prontuário e nos

trabalhos, quando realizado por alunos do CPA. As teorias psicológicas apresentadas nos

trabalhos (estudo de caso), o formato, aquilo que é oferecido como modelo de descrição, as

concepções e representações sociais da doença configuram o que na Análise Hermenêutica

Objetiva denomina de “regras”.

A compreensão da intervenção psicológica não está na regra na qual se modela a ação

ou o fato, mas na estruturação da própria regra. Buscar-se-á, portanto não entender como os

alunos optaram pela regra revelada numa relação social concreta, mas, no desvendamento de

quais foram as possibilidades dadas pela regra que permitiram as condições de realização do

prontuário e do trabalho e por conseqüência da intervenção psicológica.

O modelo biomédico nosológico, a própria estrutura médica de prontuário, a

linguagem descritiva subsidiada por referenciais teóricos estão presentes na estrutura do

fenômeno. Compreender esse processo não está no entendimento da regra, mas, na

reconstrução estrutural da relação entre aluno e a teoria e o método, entre autor e regra.

“Essa orientação metodológica está substancialmente influenciada pelo principio do

“SACHHALTIGKEIT”(o princípio da coisa encerrada na coisa mesma) e, nas palavras do

próprio Övermann:

“significa que, na sociologia, o desenvolvimento de teoria e o progresso no

conhecimento (Erkenntnisfortschritt) só podem ser realizados através de análises

concretas, que ajustando-se ao objeto estudado levam o objeto a se expressar.

Através dessa busca de apreender a manifestação radical na particularidade

respectiva do objeto estudado, chega-se a uma compreensão esclarecida e crítica da

realidade social” (Oevermann, 1983, S.234 apud Vilela; Nápoles 2008).

Foi adotada também a técnica da entrevista semi-estruturada, utilizada para a coleta de

dados, definida como uma conversa entre duas ou mais pessoas, com o propósito de obter

informações que o respondente supostamente as tenha. Na entrevista semi-estruturada foi

elaborado um conjunto de questões, que funcionou como um roteiro para o pesquisador

contendo os tópicos necessários baseados no tema e objetivos da investigação. Entretanto

durante as entrevistas foram investigados assuntos pertinentes a cada caso suscitando na

formulação de questões peculiares em cada entrevista, bem como foi permitida e registrada

21

através da expressão livre, as concepções individuais dos entrevistados em relação ao tema

como numa entrevista aberta.

5.1. Sujeitos

A amostra tomada por conveniência foi composta por prontuários de pacientes da

Clínica-Escola da Universidade Paulista no período de 2009 a 2010 (Tabela 1), bem como os

relatórios dos estagiários matriculados no último ano do Curso de Psicologia desse mesmo

período. Foram realizadas 07 entrevistas com alunos do CPA, cursando o estágio de

Psicoterapia Breve de Abordagem Psicanalítica no ano de 2011.

5.2. Instrumentos

5.2.1. Prontuários de pacientes no período de 2009-2010

Leitura dos prontuários dos pacientes encaminhados para a clínica de orientação

psicanalítica que autorizaram a utilização das informações pessoais em pesquisas, buscando

selecionar aqueles que farão parte do estudo separando-os em dois grupos:

a) Grupo 1 - Informaram que possuíam diagnóstico prévio de orientação psiquiátrica

na triagem;

b) Grupo 2 - Não possuíam diagnóstico prévio de orientação psiquiátrica;

Foram destacadas as seguintes informações nos prontuários:

a) Data do Início do tratamento;

b) Demanda inicial do paciente;

c) Diagnóstico psiquiátrico quando houver;

d) Breve resumo do caso

5.2.2. Relatório dos estagiários no período de 2009-2010

Leitura dos relatórios de estagiários a partir dos prontuários selecionados para a

pesquisa, visando compreender qual foi a influência do diagnóstico prévio psiquiátrico em

todo o transcorrer da análise.

Para cada conjunto de prontuário/relatório foram realizadas as seguintes tarefas:

22

a) Verificou-se se houve alteração da demanda inicial do paciente avaliando se durante a

terapia o aparecimento de questões pessoais, sociais ou familiares se tornaram objetos

de análise.

b) Nessa leitura foi destacada qual a influência que o diagnóstico psiquiátrico teve na

produção de sentidos e significados para promover soluções terapêuticas sob a ótica

psicanalítica.

c) Verificou-se nos relatórios qual a incidência do diagnóstico psiquiátrico no discurso

do par analítico e como ele influencia a relação transferêncial.

d) Verificou-se quando registrado se houve alteração da hipótese psiquiátrica ao longo do

tratamento;

5.2.3. Entrevistas com estagiários cursando o último ano

Foram entrevistados 07 estagiários da Clínica de Orientação Psicanalítica cursando o

último ano utilizando-se de entrevista semi-estruturada buscando entender os seguintes

aspectos:

Avaliar o sistema de crenças e valores dos estagiários em relação ao modelo médico

vigente e sua concepção crítica em relação a temas como medicalização, patologização,

biologização, ou seja, qual seu posicionamento em relação à opinião médica e psiquiátrica e

como isso influencia a sua prática como futuro psicólogo.

Foi utilizado o seguinte questionário semi-estruturado durante a entrevista.

Pergunta 1: “Como reconhece o diagnóstico psiquiátrico, qual o sentido, relevância,

quanto considera, qual a importância no seu contexto profissional”.

Pergunta 2: “Quanto você acredita nas soluções de tratamento, num prognóstico

positivo à partir da clínica psicanalítica.”

Pergunta 3: “Como você avalia a medicação como forma de tratamento eficaz para o

neurótico? Para o psicótico?

Pergunta 4: Como você entende a eficiência no controle de processos afetivos que

causam prejuízos a vida do paciente, através de medicamentos.

Estabelecer qual a condução do caso a partir de um diagnóstico psiquiátrico dentro de

uma abordagem psicanalítica.

23

Pergunta 5: Como é a escuta psicanalítica para você a partir da revelação do paciente

do seu diagnóstico psiquiátrico?

Pergunta 6: Já atendeu algum caso sem diagnóstico psiquiátrico prévio? A condução

foi diferente? Se sim quais foram as diferenças?

Pergunta 7: Se não, como poderia supor se o paciente chegasse sem um diagnóstico

como acha que seria o desenvolvimento da terapia.

A entrevistas tiveram a duração média de 20 minutos.

5.3. Aparatos de Pesquisa

Materiais a serem utilizados na investigação:

Carta de Apresentação (Anexo I);

Termo de consentimento livre e esclarecido (Anexo II);

Termo de consentimento para gravação da entrevista (Anexo III);

Roteiro de Entrevista (anexo IV)

Gravador de Voz – Modelo: LG ME970 (Shine), para gravação das entrevistas, a fim

de obter o registro fidedigno das informações obtidas na entrevista;

Caneta esferográfica;

Folha A4;

Computadores.

5.4. Procedimentos

A análise dos dados coletados nas entrevistas, na leitura dos prontuários e dos

relatórios dos alunos seguiu os passos propostos pela metodologia de Övermann (Vilela;

Nápoles, 2008), tendo como base central dois princípios:

“Análise seqüencial, de uma situação particular de interação existente e registrada

num contexto mais amplo, no qual a relação entre a teoria e os dados empíricos da

interação delimitam o processo de interpretação;

A interpretação detalhada de dados da sociedade com cruzamento dos dados de

todos os envolvidos na situação de interação social a ser interpretada; (Oevermann,

1983, S.234 apud Vilela; Nápoles 2008)

24

A análise seqüencial segundo Vilela; Nápoles (2008) deverá ser conduzida pelos

seguintes procedimentos:

1) Independência do contexto - A interpretação deve ater-se à situação registrada sem

projetar na interpretação informações de do contexto, genéricas ou pressupostas em

dados anteriores, utilizando a pergunta: o que está explicitado aqui? O exame do

contexto só é significativo após o desvendamento do que foi registrado fora do

contexto.

2) Literalidade: A interpretação deve decifrar o que está escrito e não o que foi

pensado pelo agente da expressão uma vez que foi expressado numa relação social e

numa situação em particular.

3) Seqüência: Interpreta-se desde a primeira até a última palavra do texto

considerando-se a que a palavra inicial é definidora do se segue e cada palavra final é

definidora do que se inicia após ela.

4) Substancialidade da informação: A interpretação procura responder a um sentido

lógico, como cada situação registrada faz sentido dentro da situação, como se liga

frases e situações anteriores do registro.

5) Parcimônia (regra do poupar): Não se deve fazer conjecturas acerca do que está

informado no registro, que não se deve imaginar situações não protocoladas e agregá-

las. Indica que deve se renunciar ao fictício, considerações “exóticas”, ao improvável,

deve se evitar buscar explicações que poderiam ser complementares ao registro. A

interpretação deve ater-se ao fato revelado e não ao pressuposto. Atentar a esse

princípio impede conclusões apressadas, interpretações infundadas. (Vilela; Nápoles,

2008)

5.4.1. Coletas de dados

Tomou-se uma série de cuidados éticos, para que se obtivesse êxito na coleta de dados.

Preservaram-se os colaboradores de possíveis riscos, e foram deixados seguros em relação aos

resultados obtidos. Portanto, seguiram-se os princípios éticos, para evitar situações que

envolva constrangimento por parte dos colaboradores.

Segundo as “Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo

Seres Humanos”, resolução Nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde:

25

“[...]As pesquisas envolvendo seres humanos devem atender às exigências éticas e

científicas fundamentais.

III.1 - A eticidade da pesquisa implica em:

a) consentimento livre e esclarecido dos indivíduos-alvo e a proteção a grupos

vulneráveis e aos legalmente incapazes (autonomia). Neste sentido, a pesquisa

envolvendo seres humanos deverá sempre tratá-los em sua dignidade, respeitá-los

em sua autonomia e defendê-los em sua vulnerabilidade;

b) ponderação entre riscos e benefícios, tanto atuais como potenciais, individuais ou

coletivos (beneficência), comprometendo-se com o máximo de benefícios e o

mínimo de danos e riscos;

c) garantia de que danos previsíveis serão evitados (não maleficência); [...]”

No primeiro momento foi explicado verbalmente de forma clara e objetiva aos

colaboradores como se dará o processo de coleta de dados. Foi entregue o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido, contendo os objetivos da pesquisa, a descrição dos

procedimentos a serem realizados, e também informações como o nome da instituição

acadêmica, orientador responsável e relevâncias sociais, acadêmicas e cientificas, para as

quais este projeto contribuirá.

Esclareceu-se também que o sujeito poderá desistir a qualquer momento de contribuir

para esta pesquisa e por se tratar de participação voluntária será preservada a identidade dos

mesmos.

Os procedimentos foram realizados no CPA da UNIP no segundo semestre de 2011 e

por ser um tema repleto de significados, experiências e opiniões internas particulares de cada

sujeito, e pensando em como os participantes poderão reagir a determinados conteúdos

explorados nesta pesquisa, seguiu-se o regimento Nº 196/96 do conselho Nacional de Saúde,

que também corresponde a relação de riscos e benefícios:

“ [...] Considera-se que toda pesquisa envolvendo seres humanos envolve risco. O

dano eventual poderá ser imediato ou tardio, comprometendo o indivíduo ou a

coletividade.

V.1 - Não obstante os riscos potenciais, as pesquisas envolvendo seres humanos

serão admissíveis quando:

26

a) oferecerem elevada possibilidade de gerar conhecimento para entender, prevenir

ou aliviar um problema que afete o bem-estar dos sujeitos da pesquisa e de outros

indivíduos;

b) o risco se justifique pela importância do benefício esperado;

c) o benefício seja maior, ou no mínimo igual, a outras alternativas já estabelecidas

para a prevenção, o diagnóstico e o tratamento.

V.2 - As pesquisas sem benefício direto ao indivíduo, devem prever condições de

serem bem suportadas pelos sujeitos da pesquisa, considerando sua situação física,

psicológica, social e educacional.

V.3 - O pesquisador responsável é obrigado a suspender a pesquisa imediatamente

ao perceber algum risco ou dano à saúde do sujeito participante da pesquisa,

conseqüente à mesma, não previsto no termo de consentimento. Do mesmo modo,

tão logo constatada a superioridade de um método em estudo sobre outro, o projeto

deverá ser suspenso, oferecendo-se a todos os sujeitos os benefícios do melhor

regime. [...]”

Fundamentado por esta resolução, o pesquisador estava preparado para oferecer

suporte baseado na psicoterapia breve, para acolher estes indivíduos desde que se mostrasse

necessário levando em consideração que este estudo se realizou dentro de um Centro de

Psicologia Aplicada e teve tempo limitado.

5.4.1.1. Prontuários

Na primeira etapa do trabalho foram lidos detalhadamente 54 prontuários totalizando

726 páginas entre prontuários e trabalhos.

Desses 54 prontuários 26 tinham diagnóstico psiquiátrico prévio ou seja 48% e 29%

aderiram parcial ou totalmente ao tratamento fornecendo uma taxa de 53% de adesão

Dos 26 Prontuários que tinham diagnóstico prévio foram selecionados 15 prontuários

e 5 trabalhos obedecendo às seguintes condições:

- O paciente aderiu parcial ou totalmente ao tratamento;

- O aluno produziu trabalho;

Ou seja, foram selecionados 65% dos prontuários em que o paciente tinha diagnóstico

prévio.

Desses 15 prontuários 5 trabalhos não foram encontrados nos arquivos.

27

Um paciente não tinha diagnóstico prévio, mas foi encaminhado para psiquiatria

durante o tratamento – seu prontuário e trabalho foram selecionados.

Abaixo a Tabela 1 apresenta um resumo dos prontuários e relatórios lidos na primeira

etapa do levantamento de dados:

Tabela 01.

RELAÇÃO DOS PRONTUÁRIOS SELECIONADOS PARA O ESTUDO

ITEM

Nro do Prontuário

Diagnóstico Psiquiátrico

Prévio

Prontuário Selecionado

Aderiu ao tratamento

Trabalho do Aluno

Selecionado

Observações

1 002/2009 Não Não Sim Não

2 005/2009 Não

Examinadado

3 006/2009 Sim Sim Sim Sim

4 015/2009 Sim Sim Sim Sim

5 016/2009 Sim Não Não Não

6 017/2009 Não

Examinadado

7 018/2009 Não

Examinadado

8 034/2009 Não

Examinadado

9 041/2009 Não

Examinadado

10 043/2009 Não Sim Sim Sim

Paciente encaminhado ao Psiquiatra que receitou medicamentos

11 050/2009 Sim Sim Sim Sim

12 051/2009 Não Não Sim Não

13 060/2009 Não Não Sim Não

14 061/2009 Não Não Sim Não

15 069/2009 Não Não Sim Não

16 010/2010 Sim Não Não Não

17 011/2010 Sim Não Não Não

18 016/2010 Não Não Sim Não

19 017/2010 Não Não Sim Não

20 020/2010 Sim Não Não Não

21 025/2010 Sim Não Não Não 22 026/2010 Sim Não Sim Não Grupo de Adolescente

23 030/2010 Não Não Sim Não

24 032/2010 Sim Sim Sim Sim

25 033/2010 Não Não Sim Não

26 038/2010 Não Não Sim Não

27 040/2010 Sim Sim Sim Sim

28 041/2010 Não Não Não Não

29 042/2010 Não Não Não Não

30 045/2010 Não Não Sim Não

31 046/2010 Não Não Não Não

32 047/2010 Sim Sim Sim Sim

33 048/2010 Sim Não Não Não

34 049/2010 Não Não Não Não

35 050/2010 Sim Sim Sim Sim

28

RELAÇÃO DOS PRONTUÁRIOS SELECIONADOS PARA O ESTUDO

ITEM

Nro do Prontuário

Diagnóstico Psiquiátrico

Prévio

Prontuário Selecionado

Aderiu ao tratamento

Trabalho do Aluno

Selecionado

Observações

36 059/2010 Sim Não Não Não

37 126/2010 Sim Sim Sim Sim

38 129/2010 Não Não Sim Não

39 134/2010 Não Não Sim Não

40 138/2010 Sim Sim Sim Sim

41 147/2010 Sim Sim Sim Sim

42 153/2010 Sim Sim Sim Sim

43 155/2010 Sim Sim Sim Sim

44 158/2010 Sim Não Não Não

45 161/2010 Não Não Não Não

46 162/2010 Sim Não Não Não

47 164/2010 Não Não Não Não

48 168/2010 Sim Sim Sim Sim

49 169/2010 Não Não Não Não

50 171/2010 Não Não Não Não

51 172/2010 Sim Sim Não Sim

52 173/2010 Não Não Não Não

53 175/2010 Sim Sim Sim Sim

54 177/2010 Sim Sim Não Sim

Na segunda etapa da coleta de dados os 15 prontuários e os 5 relatórios selecionados

foram resumidos sendo gerada a Tabela 2 durante a leitura. Abaixo o resumo desses

prontuários.

Prontuário 1: Grupo 2

Paciente de 36 anos, diagnosticado com depressão profunda e Transtorno de

Personalidade Dependente por um neurologista. Toma irregularmente remédios controlados e

foi diagnosticado por um psicólogo com desequilíbrio emocional, auto-estima baixa, muito

desequilibrado, desestabilizado, mania de perseguição, ansiedade. Durante todas as sessões os

problemas relatados são de ordem conjugal e familiar com vários conflitos com a esposa que

se recusa a morar com ele, além de vivenciar vários tipos de humilhações (sic). O paciente na

nona sessão diz achar que os remédios não fazem nenhum tipo de efeito e que iria consultar o

neurologista sobre a possibilidade de parar, pois acredita não ser depressivo e sim triste por

causa das coisas que acontecem na sua vida, ao que a estagiária responde:

Interferi neste momento falando justamente sobre depressão, pois expliquei que

depressão é doença e precisa ser tratada sim, mas a tristeza é estado de espírito e é

preciso cuidado para não se confundir.

29

Em outro momento pergunta ao estagiário qual é realmente a sua doença o que ele

realmente tem, ao que o estagiário responde que ele é uma pessoa boa que está ali para

organizar os pensamentos. Não foi abordado o diagnóstico prévio e o paciente terminou o

tratamento acreditando possuir uma doença.

Relatório 1:

O Relatório não evoluiu para uma abordagem psicanalítica típica. A hipótese inicial é

a mesma que o paciente trás do neurologista e o relatório se desenvolve no sentido descrever

sintomas do DSM IV e CID 10 citando autores como Dalgalarrondo. A conclusão do trabalho

reafirma a hipótese inicial. Não está descrito nenhum tipo de evolução do caso utilizando

elementos da psicanálise muito menos da Psicoterapia Breve.

Prontuário 2: Grupo 2

O paciente de 52 anos foi diagnosticado com depressão grave e em estado avançado

por um neurologista. Faz usos de medicamentos para controlar a depressão e a ansiedade. Está

convivendo a dois anos na mesma casa com a esposa apesar de viver uma separação de

corpos. A esposa entrou na justiça para oficializar a separação. O paciente corre risco de

perder sua casa, local onde exerce sua profissão sua única forma de seu sustento. Crise

conjugal acentuada inclusive com repercussões com filhos e família. O Prontuário descreve

minuciosamente todas as situações voltadas à crise conjugal que o paciente está vivendo.

Durante várias sessões relata que sofre de solidão angustia e tristeza. O Diagnóstico prévio

não foi abordado e as sessões se desenvolveram em torno dos problemas pessoais do paciente.

As crises pessoais aumentam e o paciente comparece a décima primeira sessão dizendo que

“aumentou os medicamentos para suportar a semana que teve fortes crises com a esposa”.

Segundo a estagiária apresenta confusão mental, muita ansiedade. Após essa sessão o paciente

abandona o tratamento.

Prontuário 3: Grupo 3

Paciente com 37 anos, procura atendimento por ser vítima de estupro o agressor não

foi denunciado em função de seu pai ser pastor evangélico radical e não querer prejudicar as

outras três irmãs; Toma remédios controlados, vem com diagnóstico de depressão dado por

um psiquiatra. Realizou uma cirurgia que gerou uma hemorragia interna e por isso tem medo

de morrer. O Prontuário se desenvolve enfocando as crises profissionais, familiares

principalmente com as irmãs e o pai. No encerramento da terapia a paciente diz que aprendeu

a lidar com seus problemas, está muito satisfeita e que “nunca havia pensado por esse lado”,

30

que aprendeu a enfrentar os problemas em vez de desenvolver toda ordem de sintomas

somáticos. Em nenhuma sessão a estagiária abordou o diagnóstico psiquiátrico prévio e

desenvolveu o trabalho de acordo com os princípios da Psicoterapia Breve.

Relatório 3:

Relatório somente com desenvolvimento teórico e sem fazer nenhuma referência ao

caso.

Prontuário 4: Grupo 2

Paciente 28 anos procurou o CPA, por ter terminado um namoro de um ano e seis

meses, após um, envolvimento conturbado com a filha do pastor de sua igreja evangélica.

Tendo sido afastado de suas atividades da igreja pela pastora, que inclusive ordenou que os

demais membros não o procurassem. Relata que se encontra irritado, sente-se desconfiado de

todos, tornou-se superficial nas suas relações. Vai consultar um neurologista que diagnosticou

“ansiedade” e foi indicado para tomar remédios (Daforim, Aprazolan e Rivotril). O paciente

reclama que está frustrado está “com a medicação tão pesada”. O paciente declara que tem

crises de ansiedade, ou seja, que fica com uma sensação de tédio e no ápice da crise uma

chuva de pensamentos. Quando questionado não consegue descrever os pensamentos. Declara

que tem tédio em relação à rotina. Declara que tem dificuldades escolares e de concentração.

A terapia se desenrola em função das suas relações amorosas, fala de seus medos. A estagiária

ensina uma técnica de respiração para diminuir a ansiedade e o paciente deixa de tomar o

Rivotril por sua conta. Na sexta sessão a estagiária questiona o diagnóstico médico e pede

para consultar outro médico psiquiatra. O paciente começa a melhorar entretanto ao receber a

notícia que sua namorada está montando uma sociedade com outra pessoa passa a ter crises de

ansiedade mais fortes. Após a consulta do paciente com novo psiquiatra é diagnosticado como

Transtorno Depressivo Ansioso e sua medicação é alterada. A partir daí nas últimas dez

sessões sua terapia se desenrola em torno de suas questões pessoais sem grandes avanços.

Prontuário 5: Grupo 1

O paciente relata que teve dois surtos psicóticos graves, foi diagnosticada pelo

psiquiatra “com surto psicótico” (sic) e foi internada no Hospital Psiquiátrico São Vicente e

toma uma série de medicamentos. Nas sessões iniciais a paciente descreve os surtos

psicóticos e as sessões seguintes o tema fica exclusivamente em torno de sua doença e da

série de perícias e visitas médicas que a paciente realiza semanalmente. A paciente tenta

aposentaria em função da sua doença e em uma das perícias o médico diz que sua doença,

31

transtorno bipolar não foi adquirida no exercício da sua profissão e sim que era de origem

genética. Fala da lentidão que os remédios causam nas rotinas em seu dia-a-dia. A estagiária

faz a escuta voltada para o acolhimento durante todas as 24 sessões. Seus relatos giram em

torno do cotidiano da paciente que aos poucos se mostra mais animada e sociável. Seu

diagnóstico psiquiátrico foi o tema central durante todo o tratamento.

Prontuário 6: Grupo 2

Paciente procura o CPA se queixando de ansiedade com palpitações, já fez uso de

Diazepan e Fluoxetina diagnosticada com ansiedade. Sofreu um assalto e reclama de uma

constante “dor no peito” e insônia. As sessões se desenvolvem em função de seus

relacionamentos amorosos. A estagiária ressalta a possibilidade de procurar um psiquiatra em

função da dor no peito e de uma tristeza profunda relatada, ou seja, para que seus problemas

físicos sejam minimizados (sic). Após a décima sessão abandona o tratamento, sem maiores

alterações de seu quadro.

Relatório 6:

No relatório a estagiária descreve Transferência e Contratransferência e Neurose de

Angústia, a partir de Freud fazendo uma transposição com o conceito psiquiátrico de

Síndrome do Pânico. A paciente ao ser questionada quanto a hipótese de suicídio diz viver

muito feliz e saudável, mesmo assim foi orientada a procurar um psiquiatra para resolver seus

problemas de angustia. A paciente não concluiu o tratamento abandonando após a décima

sessão. Não foi abordado o diagnostico prévio e sim levantado a hipótese da paciente sofrer

de Síndrome do Pânico sendo orientada a procurar um psiquiatra.

Prontuário 7: Grupo 2

Paciente casada 34 anos com três filhos, com Diagnostico de Transtorno Depressivo

Obsessivo Compulsivo Crônico. Toma medicamentos e faz visitas regulares ao psiquiatra. Na

infância foi diagnosticada com epilepsia e passou a tomar Gardenal. Por orientação da sua

mãe que achava que o remédio fazia mal, suspendeu o uso. Hoje tem tricotilomania, passou a

primeira sessão se coçando. Descreve que existe um buraco em sua memória em determinado

trecho de sua vida. Relata que quando sente raiva e ansiedade arranca e come os cabelos.

Relata problemas de relacionamento conjugal família. Após a décima sessão abandona o

tratamento. O diagnóstico não é enfocado durante o tratamento. O caso não evolui.

Prontuário 8: Grupo 2

32

Procura atendimento porque se sente autoritária e irritada com a família e a filha de 14

anos. Fez tratamento contra tabagismo e toma antidepressivo e para aliviar a ansiedade e

ansiolítico (sic). Irmão tem diagnóstico de esquizofrenia. Sofre de psoríase e toma uma série

de medicamentos entre eles antidepressivos e ansiolíticos. As sessões se desenvolvem em

torno dos problemas domésticos e das questões pessoais da paciente e da família. Sua irritação

com marido, filha e com pessoas próximas. Luta para não voltar a fumar e a medida que

transcorre o tratamento relata avanços no sentido de diminuir a raiva que sente das pessoas,

lidando melhor com suas questões. Na sessão de encerramento declara: “Estou feliz hoje

porque consigo administrar a minha vida”. O Diagnóstico prévio não foi abordado em

nenhum momento.

Prontuário 9: Grupo 3

Paciente 19 anos acompanhada pela mãe que relata que a filha tem dificuldades de

aprendizado, problemas de assimilação, baixa estima e depressiva. Teve também convulsões e

enurese noturna negada. Dorme num quarto com o mãe e o irmão dorme com o pai porque

moram com a tia. A estagiária na 4ª sessão encaminha ao neurologista para avaliar a

capacidade de Aprendizado comprometida apesar da paciente já ter ido ao neurologista e não

ter nada em seus exames. Durante o transcorrer das sessões o tema gira em torno da vida

pessoal da paciente suas relações familiares, medos, vergonhas etc. Relata as dificuldades de

relacionamento social no colégio, das dificuldades para entender as matérias principalmente

matemática. Na 10ª sessão a estagiária insiste com a ida ao neurologista para que o mesmo

possa investigar a dificuldade de aprendizado, as repetidas reprovações e a enurese noturna.

As sessões não evoluem e tornam-se repetitivas. Após a vigésima sessão a paciente realiza

uma série de exames e não é constatada nenhuma anormalidade. Caso encerrado sem maiores

questões. O diagnóstico prévio não é abordado.

Prontuário 10: Grupo 2

O paciente casado procura a clínica com queixa de muita Ansiedade e Depressão.

Trabalhava numa transportadora de valores sob forte estresse. Foi demitido após 12 anos de

trabalho e desenvolveu uma fobia para dirigir. Consultou e foi orientado por um psiquiatra a

fazer terapia em grupo no Hospital São Vicente e passou a tomar ansiolítico e antidepressivo

que acabou desistindo por causa dos efeitos colaterais. Tem insônia, e pesadelos que não

consegue acordar com falta de ar. O medo fóbico de dirigir incomoda e ele relata querer

melhorar isso, tomou remédios de vários psiquiatras durantes 10 anos. Algumas sessões se

33

desenvolvem em torno de um diagnóstico que obteve de ansiedade onde a psicóloga

aposentou-o por invalidez. Após a décima sessão relata estar tendo um caso extra-conjugal. A

terapia se desenrola e a medida que o paciente expõe suas questões alguns sintomas da queixa

inicial vão atenuando principalmente o que diz respeito a insônia e ansiedade.

Relatório 10:

O relatório se desenvolve sob uma base teórica psicanalítica. A fobia do paciente em

sua hipótese inicial é explicada através de conceitos freudianos, assim como a angústia e a

melancolia. O relatório também enfoca as questões provenientes da idade do paciente e das

transformações que surgem nessa época com a proximidade da terceira idade. O enfoque da

estagiária no tratamento não abordou nem considerou o diagnóstico prévio, mas sim se apoiou

nos conceitos da PB de abordagem totalmente psicanalítica. O que ficou evidente foi que o

diagnóstico psiquiátrico que levou a aposentadoria forçada do paciente concomitante a morte

do filho é que desencadeou uma série de sintomas ansiosos e fóbicos. O paciente após

elaborar suas questões ao final voltou a dirigir e diminuiu consideravelmente sua ansiedade e

reorganizou sua vida social.

Prontuário 11: Grupo 2

Paciente 55 anos com diagnóstico prévio de depressão chora muito por qualquer

motivo, dorme mal se considera dependente do remédio. Separou-se do primeiro marido e o

filho saiu de casa. Vinte e nove anos depois casa-se novamente, mas descobre que o novo

companheiro é usuário de drogas e fica extremamente decepcionada. Tem dívidas e vários

problemas familiares. Ainda gosta do ex-marido que usa drogas. As sessões se desenvolvem

em torno do drama da paciente que passou por vários percalços na vida. Na quinta sessão

revela estar muito insegura em relação ao tratamento pergunta porque o psiquiatra passou

remédio e o que ela tem. Indaga também como é o tratamento psicoterápico e como a

estagiária poderia ajudá-la. Apesar de ser esclarecida pela estagiária quanto a natureza do

tratamento durante as outras sessões seguintes ainda acredita que a mesma iria propor as

soluções de seus problemas. Seus problemas familiares e de relacionamento continuam sendo

colocados nas sessões seguintes relativos a filho, parentes e ao ex-marido. O diagnóstico não

foi abordado em nenhum momento nem serviu de referência para o tratamento.

Relatório 11:

O relatório inicia descrevendo a histeria sob o ponto de vista freudiano, O trabalho

apresenta descrições técnicas sobre a paroxetina e uma descrição neurológica sobre o uso de

34

álcool. O desenvolvimento do trabalho e da hipótese inicial gira em torno de conceito

psicanalíticos. Não foi abordado a diagnóstico prévio psiquiátrico nem fez parte da orientação

da terapia.

Prontuário 12: Grupo 3

Paciente com 20 anos procurou o atendimento fonoaudiológico, pois troca o R pelo L

acha que tem transtorno bipolar através de pesquisas na internet e com outras pessoas.

Problemas conjugais e declara-se muito triste e depressiva, casada a sete meses sofreu

violência sexual por um vizinho quando tinha aproximadamente cinco anos. As sessões

decorrem em torno da sexualidade da paciente e da relação com o marido com quem está

casada a quatro meses. Abandonou o tratamento após a nona sessão.

Relatório 12:

O trabalho descreve um longo histórico sobre homossexualismo e não trás nenhuma

referência a psicanálise. O estudo de caso não foi comentado.

Prontuário 13: Grupo 2

O paciente trás queixa de ansiedade, nervosismo tem diagnóstico de TOC, Bipolar e se

diz que toma remédio anti-psicótico (sic), fez tratamento no hospital São Vicente de Paula ex-

viciado em drogas, bebe eventualmente sem limites. Estuda na UNIP e segundo a estagiária é

intelectualizado. Vem de uma família desestruturada (sic). Teve uma relação homossexual

para comprar drogas. Depois da décima sessão é internado por usos de álcool junto com os

remédios e fica extremamente agressivo. A partir desse momento o paciente passa a tomar

uma bateria imensa de psicotrópicos e a estagiária relata que ele "parece melancólico" se

mostrando distanciado (sic).

Relatório 13:

O trabalho inicia descrevendo o paciente e suas crises e faz uma longa descrição de

depressão da bipolaridade a partir de autores das neurociências e do próprio DSM IV e CID10

descrevendo inclusive uma série de síndromes supostamente associada ao paciente. Na

conclusão descreve unicamente o que ocorreu sem fazer qualquer tipo de interpretação.

Prontuário 14: Grupo 2

Paciente indicada pela secretaria de educação tomando remédios para depressão,

melancolia e baixa estima (sic) conforme laudo psiquiátrico. Professora afastada da sala de

aula por esses motivos com uma série de sintomas somáticos como fibromialgia e gastrite

35

severa em função da grande quantidade de medicamentos. A paciente perdeu o pai quando

jovem o irmão e recentemente a mãe. Relação conjugal cheia de altos e baixos querendo se

separar. A paciente abandona o tratamento na sétima sessão quando diz não concordar com a

estagiária que solicita que ela volte para sala de aula para trabalhar e aí sim possa discutir seus

problemas.

Prontuário 14: Grupo 2

O paciente com 27 anos, desempregado, toma medicamentos e se diz ansioso a maior

parte do tempo. Falou que se arrumasse um emprego resolveria e preencheria o vazio. Foi

usuário de drogas e foi encaminhado para tratamento psiquiátrico em função de um surto

psicótico induzido por substância psicoativa, diz escutar vozes que dizem para ele fazer

coisas. Receitado com três medicamentos diz não entender como as sessões podem ajudá-lo.

O paciente abandona o tratamento, o diagnóstico não foi abordado.

Prontuário 15: Grupo 1

O paciente com 35 começou a ouvir vozes e foi diagnosticado com surto psicótico.

Sentia-se perseguido pelos amigos e pessoas próximas. Pensou em suicídio para se livrar dos

problemas. As sessões se desenrolam com o paciente relatando seus surtos, dificuldades de

relacionamento e dificuldades profissionais. As intervenções da estagiária são no sentido de

melhorar a qualidade de vida do paciente tais como, observância dos remédios, alimentação e

evitar entrar em contato com coisas que o deixem mais triste (sic). Durante o tratamento a

estagiária lidou com a intenção de suicídio do paciente dissuadindo-o de tal ação. O

desenrolar do caso se limitou assistir ao paciente em suas crises tentando melhorar sua

qualidade de vida. O diagnóstico não foi abordado.

Relatório 15: A fundamentação teórica apenas cita algumas passagens sobre o ponto

de vista da psicanálise, sobre a histeria. O tema paranóia é desenvolvido sobre o aspecto

freudiano tendo como base o caso Schreber. O paciente foi re-encaminhado ao CPA para dar

continuidade ao tratamento. O diagnóstico psiquiátrico prévio foi o centro de todo

desenvolvimento do trabalho.

5.4.1.2. Entrevistas

Foram realizadas três entrevistas individualizadas e duas entrevistas em duplas

totalizando sete entrevistados. As entrevistas foram transcritas de forma literal afim de

expressar as percepções dos entrevistados. Em todas as entrevistas procurou-se deixar os

36

entrevistados livres para expressar suas opiniões, mesmo que não fosse objeto das perguntas

semi-estruturas. A transcrição das entrevistas encontra-se no ANEXO 1.

5.4.2. Análise dos dados

5.4.2.1. Prontuários e trabalhos

Os prontuários analisados possuíam na sua maioria uma descrição sucinta das queixas

dos pacientes e descrevem o desenvolvimento dos processos terapêuticos dos diversos

pacientes. Os problemas apresentados pelos pacientes são de ordem familiar, conjugal,

profissional e de relacionamentos. Os prontuários foram lidos e anotados utilizando-se a

metodologia descrita no item 7.4, ou seja, considerando-se exclusivamente a independência

do contexto, literalidade, seqüência, substancialidade e parcimônia dentro da perspectiva do

método.

Os prontuários seguem o modelo médico tradicional onde a maioria das estagiárias

conforme orientações prévias limitou-se a transcrever o processo terapêutico de forma

descritiva sem fazer qualquer indagação quanto a questões técnicas envolvidas nos trabalhos e

muito menos quanto as questões pessoais, limitando-se a registrar nesse caso somente as

intervenções que foram realizadas.

Dividimos os prontuários em três grupos:

Grupo 1: Os pacientes possuíam diagnóstico prévio e o paciente havia tido de forma

bem clara e registrada e sem conjecturas, ocorrências que determinassem que seu diagnóstico

era de psicose, tais como ouvir vozes, psicose induzida por substâncias psicoativas e surtos

psicóticos bem definidos.

Grupo 2: Os pacientes possuíam diagnóstico prévio e o paciente não possuía nenhuma

característica de psicose.

Grupo 3: Os pacientes não possuíam diagnóstico prévio.

No Grupo 1 os tratamentos se desenvolveram em torno do diagnóstico psiquiátrico

onde as estagiárias em sua maioria procuram melhorar as condições de vida do paciente,

buscando estimular comportamentos positivos. Em todos os casos o diagnóstico não é

questionado e o paciente passa a ser encarado como portador de uma doença. As estagiárias

exercem funções educativas, de orientação profissional, melhoria na alimentação, nas

37

condições de enfrentamento da doença, reforço na aderência ao tratamento químico, manejo

das crises, manejo de estresse entre outras.

Os Grupo 2 e 3 foram selecionados para comporem o objeto central da pesquisa ou

seja, como o diagnóstico prévio influência na condução do tratamento, uma vez que aí

encontram-se os pacientes com sofrimentos causados pelos mais diferentes motivos. No

Grupo 2 encontram-se os que possuem diagnóstico prévio e no Grupo 3 não possuem.

No Grupo 1 estão dois prontuários com pacientes com diagnóstico de Transtornos

Psicóticos. Em ambos os casos as estagiárias fizeram a escuta voltada para o acolhimento e o

desenvolvimento de melhores condições de vida dos pacientes.

No Grupo 2 estão onze prontuários de pacientes que receberam diagnóstico prévio e

foram constatados:

- 8 pacientes diagnosticados com depressão ou depressão profunda;

- 4 pacientes diagnosticados com ansiedade;

- 4 pacientes diagnosticados com transtornos diversos:

Transtorno Depressivo Obsessivo Compulsivo Crônico;

Transtorno de Personalidade Dependente.

- 5 pacientes acreditam que os medicamentos não fazem efeitos esperados ou fazem

mal;

- 2 pacientes pararam de tomar os medicamentos por conta própria;

- 3 estagiárias encaminharam o paciente ao médico neurologista ou psiquiatra;

Todos os pacientes estão vivendo toda ordem de conflitos e perdas que causam

sofrimentos.

No Grupo 3 estão 2 prontuários de pacientes que não receberam diagnóstico prévio.

Abaixo a Tabela 2. Foi elaborada durante a leitura dos prontuários:

Tabela 2.

Prontuário Grupo O diagnóstico

prévio foi

abordado

O paciente rejeita os

medicamentos

O diagnóstico dificultou o

tratamento

O diagnóstico prévio foi

desconstruído

O paciente conclui o

tratamento

O estagiário faz

referência a

PB e Psicanálise

1 2 Não Sim Indeterminado Não Sim Não

2 2 Não Não Sim Não Não Não

38

3 2 Não Não Não Não Sim Sim

4 2 Sim Sim Sim Sim Sim Sim

5 1 Sim Sim Não Não Sim Sim

6 2 Sim Não Sim Não Não Não

7 2 Não Sim Indeterminado Não Não Não

8 2 Não Não Não Não Sim Sim

9 3 Sem diag. Sem diag. Sem diag. Sem diag. Sim Não

10 2 Sim Sim Sim Sim Sim Sim

11 2 Não Não Não Não Sim Sim

12 3 Sem diag. Sem diag. Sem diag. Sem diag. Não Não

13 2 Sim Não Não Não Sim Não

14 2 Sim Não Sim Não Não Sim

15 1 Sim Não Não Não Sim Sim

Extraindo-se do cálculo os dois prontuários que não possuíam diagnóstico prévio

encontraram-se os seguintes valores:

53% dos casos o diagnóstico foi abordado durante o tratamento;

38% dos casos o paciente rejeita o medicamento ou discorda do diagnóstico prévio;

38% dos casos o diagnóstico prévio dificultou o tratamento em 46% não dificultou e

dois casos não puderam ser determinados;

84% dos casos o diagnóstico não foi desconstruído;

66% dos pacientes chegaram até o fim do tratamento;

53% dos estagiários seguem os princípios da Psicoterapia Breve de Abordagem

Psicanalítica.

5.4.2.2. Entrevistas

As entrevistas foram analisadas a partir dos textos transcritos utilizando-se a mesma

metodologia proposta no item 7.4, ou seja, considerando-se exclusivamente a independência

do contexto, literalidade, seqüência, substancialidade e parcimônia. Nas entrevistas o tema da

pesquisa foi abordado diretamente nas perguntas e respostas, portanto vários aspectos da

fundamentação teórica foram considerados.

6. Resultados

6.1. Prontuários

Quanto ao tema, observou-se que o diagnóstico de um paciente é construído a partir de

diferentes fontes que se originam nas representações sociais da doença e evolui até o veredito

39

final fornecido por um profissional em “doença mental”, muitas vezes estigmatizando o

paciente com um rótulo. Guimarães e Ferraz (2002) colocam que:

“a fixidez do olhar do outro, “dos normais”, estabelece com o objeto estigmatizado

uma relação que se dá em dois momentos: no primeiro, paralisa-se o objeto no

sentido de aprisioná-lo, classificá-lo em categorias rígidas, enquanto em um segundo

momento ocorre uma operação de fixação, ou seja, invalida-se qualquer argumento

ou demonstração factual que possa levar o objeto fixado a um movimento em

direção à desconstrução do estigma. Uma vez estigmatizado, torna-se difícil voltar

ao ‘normal’” (p. 78).

Observamos em alguns casos o diagnóstico sendo construído não somente pelos

profissionais da área médica, mas também por psicólogos, como é o caso do paciente do

Prontuário 1, que após consultar um profissional recebe o veredito: “Toma irregularmente

remédios controlados e foi diagnosticado por um psicólogo com desequilíbrio emocional,

auto-estima baixa, muito desequilibrado, desestabilizado, mania de perseguição e

ansiedade.”(sic)

Conforme descrito em seu prontuário o paciente vive uma situação limite com a

esposa e a filha com várias impossibilidades que não permitem a solução de seus problemas

de forma rápida. Após nove sessões o paciente que já teve tempo suficiente para olhar suas

impossibilidades, começa a questionar a utilização dos medicamentos com a estagiária. “Diz

achar que os remédios não fazem nenhum tipo de efeito e que iria consultar o neurologista

sobre a possibilidade de parar, pois acredita não ser depressivo e sim triste por causa das

coisas que acontecem na sua vida”. Ao que a estagiária responde:

“Interferi neste momento falando justamente sobre depressão, pois expliquei que

depressão é doença e precisa ser tratada sim, mas a tristeza é estado de espírito e é

preciso cuidado para não se confundir. Ele só deveria parar se o médico autorizasse”

(9º Sessão).

Em outro momento pergunta a estagiária qual é realmente a sua doença o que ele

realmente tem (sic), ao que o estagiário responde que ele é uma “pessoa boa” que está ali pára

organizar os pensamentos. (grifo nosso)

A análise da seqüencia conforme orienta a metodologia adotada nesse trabalho, deixa

evidente que a estagiária não consegue lidar com o diagnóstico prévio. O discurso

hegemônico médico prevalece, mesmo diante do questionamento do próprio paciente e das

evidências. É difícil imaginar que um neurologista em 15 minutos (tempo médio de uma

40

consulta) possa ter mais informação que a própria estagiária após nove horas de escuta,

mesmo assim o discurso médico prevalece.

Durante a leitura dos prontuários e nas entrevistas fica bastante evidente o

desconhecimento dos estagiários, quanto a qualidade e intensidade que os mais diferentes

medicamentos causam nas mudanças de humor dos pacientes. Segundo TOURINHO, 2002:

“Nós sabemos que um dos efeitos da medicação é produzir uma alteração de

identidade. Já ouvi de pacientes em uso de medicação antidepressiva: “Já não sei

quem eu sou, se sou o que era antes do remédio ou o que sou agora”. “Não me

reconheço sem a minha tristeza”. “Sinto uma indiferença frente aos fatos que me faz

pensar que sou outra pessoa”. “Tenho medo de parar a medicação e perder esta

facilidade para falar e escrever que agora tenho; ela não é minha, é do remédio”.

Essas e muitas outras falas podem atestar alterações de identidade e modificar a

posição desejante do sujeito; isso sem entrarmos na questão dos feitos secundários,

que atuam no nível do corpo e que também se revestem de preocupações. A todas

essas questões o psicanalista tem que estar atento”, (TOURINHO, 2002).

A mudança de medicação não foi levada em consideração para a avaliação do paciente

o que fica evidente no Prontuário 2 em que o paciente vive uma experiência de grande perda

em sua vida, uma separação litigiosa com a esposa e possibilidade de perder o emprego e a

moradia. O paciente toma medicamentos para depressão e ansiedade. As crises pessoais

aumentam e o paciente comparece a décima primeira sessão dizendo que: “aumentou os

medicamentos por conta própria para suportar a semana que teve fortes crises com a esposa”

(11º sessão). Segundo a estagiária o paciente apresenta confusão mental e muita ansiedade.

Após essa sessão o paciente abandona o tratamento.

Nesse caso o diagnóstico, por não ter sido abordado prevaleceu sobre o tratamento

psicoterápico, uma vez que o paciente acredita que intensificando o uso de medicamentos terá

um alívio do seu sofrimento e abandona a terapia.

Outro momento onde se evidencia a falta de conhecimento sobre os efeitos dos

medicamentos aparece no Prontuário 13 na descrição da 10º sessão.

“O paciente foi internado por uso de álcool junto com os remédios e fica

extremamente agressivo. A partir desse momento o paciente passa a tomar uma

bateria imensa de psicotrópicos e ele "parece melancólico" se mostrando

distanciado.” (sic) (grifo nosso) (10º sessão).

41

No Prontuário 6 aparece o discurso médico prevalecendo sobre os recursos

terapêuticos quando a estagiária ressalta a possibilidade da paciente:

“procurar um psiquiatra em função da dor no peito e de uma tristeza profunda

relatada, ou seja, para que seus problemas físicos sejam minimizados” (sic). (7º

sessão).

O mesmo ocorre no Prontuário 9, quando a estagiária na 4ª sessão encaminha a

paciente ao neurologista para avaliar a Capacidade de Aprendizado comprometida apesar da

paciente já ter ido ao neurologista e não ter nada em seus exames. Na 10ª sessão a estagiária

insiste com a ida ao neurologista para que o mesmo possa investigar a dificuldade de

aprendizado, as repetidas reprovações e a enurese noturna. As sessões não evoluem e tornam-

se repetitivas. Após a vigésima sessão a paciente realiza uma série de exames e não é

constatada nenhuma anormalidade. Em nenhum instante a estagiária procurou olhar para os

sintomas acima pela ótica da psicanálise, prevalecendo o discurso médico na sua abordagem.

Vários pacientes se julgam dependentes dos medicamentos ou não compreendem

porque tomam remédios, como relata a paciente do Prontuário 11. A estagiária mesmo

questionada pelo paciente, em nenhum momento abordou o diagnóstico prévio procurando

esclarecer a paciente.

Em contrapartida ao relatado acima, se observou em dois prontuários os quais se

obtiveram resultados positivos. A estagiária deixou prevalecer os conceitos da Psicoterapia

Breve e Psicanalíticos como foi o caso descrito no Prontuário 9. O paciente relata que o medo

fóbico de dirigir incomoda e ele chega ao CPA para resolver isso. “Tomou remédios de vários

psiquiatras durantes 10 anos”(sic). Ao final do tratamento, o que fica evidente para a

estagiária foi que: “o diagnóstico psiquiátrico que levou a aposentadoria forçada do paciente

concomitante a morte do filho é que desencadeou uma série de sintomas ansiosos e fóbicos.”

(sic). O paciente após elaborar suas questões ao final voltou a dirigir e diminuiu

consideravelmente sua ansiedade, reorganizando sua vida social e suspendeu o uso dos

remédios. O desenvolvimento do trabalho Estudo de Caso da estagiária, seu diagnóstico

inicial, sua abordagem no tratamento, e a prevalência do discurso psicanalítico sobre o

psiquiátrico foram uma constante durante todo o desenvolvimento da terapia.

Assim também aconteceu com o paciente do Prontuário 4 que foi diagnosticado com

ansiedade depois que, em função da separação da namorada e de uma discussão na igreja que

freqüentava, procura um neurologista para aliviar seu sofrimento. O paciente se diz frustrado

com uma medicação tão pesada que foi receitada. Na sexta sessão a estagiária questiona o

42

diagnóstico médico e pede para consultar outro médico psiquiatra. A seguir a estagiária ensina

uma técnica de respiração para diminuir a ansiedade e o paciente deixa de tomar um dos

medicamentos por sua própria conta. Ela insiste para que seja feita uma nova avaliação por

outro médico e assim sendo sua medicação é alterada. A partir daí nas últimas dez sessões sua

terapia se desenrola em torno de suas questões pessoais. Observa-se ai que o diagnóstico

prévio foi questionado e a estagiária desconstruiu o conceito com o paciente.

Quanto aos trabalhos (Estudo de Caso) elaborados pelas estagiárias, pode-se concluir

que o diagnóstico psiquiátrico prévio de uma forma geral foi abordado na maioria dos

trabalhos. Na fundamentação teórica desses trabalhos conceitos provenientes das

neurociências explicam e disputam espaço com temas psicanalíticos. Para um número menor

de pacientes os trabalhos apresentados são exclusivamente calcados em autores provenientes

das neurociências e do DSM IV/CID 10. Um número menor ainda de trabalhos ficou com sua

fundamentação teórica exclusivamente desenhada a partir de conceitos da Psicoterapia Breve

de Abordagem Psicanalítica.

Algumas estagiárias tentam fazer uma aporte entre as duas abordagens como no

Relatório 6 a estagiária descreve Transferência e Contratransferência e Neurose de Angústia,

a partir da ótica freudiana e tenta fazer uma transposição com o conceito psiquiátrico de

Síndrome do Pânico. Sugere também a paciente, que procure um psiquiatra para ajudar a

resolver seus problemas de angústia.

6.2. Entrevistas

Quando o tema é abordado diretamente, como aconteceu nas entrevistas, o discurso

psiquiátrico perde muito do seu caráter universal. As estagiárias passam a discordar da

possibilidade de assumir o diagnóstico prévio como sendo um discurso totalizante e

verdadeiro. Observou-se nas entrevistas que na sua grande maioria as estagiárias acreditam

que o diagnóstico estigmatiza como se observa nas seguintes falas:

“Ah sim, eu vejo que é uma forma que tem um peso muito grande pro paciente né, e

assim até porque socialmente tem as doenças da moda, eles se colocam naquele tipo.

Dali começa a buscar a estudar sobre aquilo e começam a adquirir comportamento

começa adquirir até sintomas mesmo daquela doença[...] é um efeito em cadeia acho

que um vai contaminando o outro o outro vai contaminando o outro daqui a pouco

tá todo mundo se achando ah todo mundo tem transtorno de humor... todo mundo

né...eu vejo mais nesse sentido”. (Entrevista 1)

43

“[...]independente mesmo do que o médico deu eu tento excluir aquilo para eu ver,

eu tentar descobrir o que aconteceu, o que ele (paciente) possa ter, até descobrir a

verdade mesmo.” (Entrevista 2)

“Eu acho que quando a pessoa vem com o diagnóstico pronto, a gente tem que

buscar identificar se ela realmente tem ou não e se apresenta alguma característica

desse diagnóstico, dessa doença no caso, eu trato assim, eu já recebi alguns

pacientes com diagnóstico pronto vamos dizer assim, psiquiátrico.”(Entrevista 3)

“[...] eu acho que a gente tem que realmente pesquisar e tentar identificar na clinica

se realmente é isso ou não, para quebrar rótulos.” (Entrevista 3)

“[...] vou falar da minha experiência, eu fui ao psiquiatra uma vez e eu estava com

variações de humor e na primeira consulta ele falou que eu era bipolar e já me

passou remédio [...] eu preferi acreditar nos professores larguei os medicamentos

comecei a trabalhar isso na terapia e estou ótima” (Entrevista 4)

“Eu acho que assim, em relação ao diagnóstico, quando eu entrei na faculdade,

quando isso vem dito pelo médico, então tem todo uma história cultural de uma

verdade absoluta, porque vem de um médico, e a partir do momento que eu comecei

a estudar eu vi que não é bem assim.” (Entrevista 4)

Quando questionados sobre qual a influência que o diagnóstico tem na escuta do

paciente, a grande maioria das estagiárias declara que ao receber um paciente com essa

característica, utiliza parte do tempo do tratamento para checar a veracidade do diagnóstico

afirmando, que isso dificulta o desenvolvimento da terapia, como se constata nas anotações

abaixo:

[...] eu vejo como negativo eu vejo 60 ou 70% negativo porque eu acho pouco tempo

pra gente trazer tanto conteúdo de um pessoa que já vem com algo introjetado, então

até a gente modificar aquilo, saber de onde vem, entendeu? (Entrevista 1)

“Vou perguntar pra ele, questiono, quem foi que disse pra você que você é bipolar,

neurótico e histérico? Quem foi que falou? Acho que primeiro é investigar, ver o

psiquiatra, ai a gente começa a investigar também, a gente vai buscar história. No

caso, a gente faz um abordagem psicanalítica prá buscar essa história.” (Entrevista

4)

[...] tem que tá quebrando esse rótulo para ele ver que realmente não tem, ou se tem

- tratar, porque ele é uma pessoa e isso também vem de alguma coisa psíquica, a

gente tem que tentar trabalhar com ele. Tem que desconstruir essa idéia que ele trás

com ele.

44

[...] eu recebo e começo a investigar, como que está isso na vida do paciente, e como

é, leva tempo para você ir percebendo algumas coisas, eu não fico pontuando aquilo,

(o diagnóstico) (Entrevista 5)

[...] isso prejudica porque a pessoa as vezes não da conta de sair daquele rótulo [...]

(Entrevista 5)

Quando foi solicitado as entrevistadas que manifestasse sua opinião em relação aos

medicamentos e se havia diferenças na utilização de remédios entre psicóticos e neuróticos, as

respostam se diversificaram muito como vê-se em algumas transcrições:

[...] o neurótico eu já vejo assim, dá pra ter outros efeitos que não a medicação, mas

com tratamento psicoterápico. Já com o psicótico eu acho totalmente efetivo porque

sem ele, pelo menos nos casos que eu vi que eu atendi, foram poucos, dos casos que

eu pude atender eu vejo que quando o paciente tá bem medicado ele tem uma

estrutura muito bem orientada [...] (Entrevista 1)

[...] a questão do neurótico hoje, eu acho que ele busca essa primeira medicação

como bengala [...](Entrevista 1)

[...] os pacientes tomam uma medicação a longo prazo sem probabilidade de

desmame e se vêem mais dependente da medicação do que tudo [...] (Entrevista 1)

[...] eu faria assim trazendo para a realidade se realmente aquilo é efeito da

medicação ou se ele realmente tá conseguindo ver, tendo uma outra visão.

(Entrevista 2)

[...] mas eu sou contra a medicação, pra mim só em último caso mesmo, porque o

psiquiatra não pode ver o paciente triste que tá achando que ele tá com depressão e

já vai tacar um anti-depressivo [...] (Entrevista 2)

[...] caso do psicótico que eu atendi eu defendi que ele teria que tomar porque ele

tava a beira do suicídio [...] (Entrevista 2)

“Neurótico... acho que a população inteira é, então acho que o neurótico não precisa

de medicamento não [...] o psicótico não, a esquizofrenia é um tipo de psicótico tem

vários outros que precisa realmente de medicamento, a pessoa surta, a pessoa delira

tem essas questões todas eu acredito que medicamento é para esses casos, cada caso

é um caso.” (Entrevista 4)

[...] acredito que o neurótico não precisa de medicação [...] (Entrevista 4)

[...] nós temos talvez um senso comum muito forte em relação a isso, eu preciso de

um remédio, eu preciso de uma pílula, isso atrapalha sim, eu preciso que o paciente

passe comigo no processo de rever aquelas condições de tentar trabalhar aquela

angústia, porque não dá para viver 24 horas dopado de remédio por causa da

angústia [...]

45

Em alguns casos as opiniões são a favor de medicar tanto os neuróticos como os

psicóticos, mesmo que essas diferenciações sejam exclusivamente da psicanálise não estando

no campo da psiquiatria.

[...] eu acho que o remédio é um ponto realmente importante, se o remédio não fosse

eficaz não teria, só que o remédio separado da relação terapêutica ele já não faz

tanto efeito. O remédio tem seu efeito próprio tanto para o neurótico como para o

psicótico. (Entrevista 3)

Nesse caso quando questionadas como o remédio pode ajudar na terapia:

“O remédio pode te ajudar com o neurótico, a sair de uma depressão com um pouco

mais de facilidade pelo efeito do remédio e do seu trabalho você ta ali estimulando

aquele paciente, acredito que essa seja a relação de te ajudar a estimular o paciente a

sair de uma situação que ele esteja passando”. (Entrevista 3)

[...] as vezes eu acho que o remédio tem um efeito de placebo. (Entrevista 3)

Fazem associações entre a qualidade do processo transferencial e o efeito dos

medicamentos:

“Eu acho que a coisa da transferência ela tem que ser bem forte pra gente perceber,

se você tá trabalhando com um paciente depressivo durante um tempo e você não tá

vendo resultado por mais que você tente, por mais que o paciente tente e você não tá

tendo resultado acho que é hora de começar a introduzir um remédio para poder te

ajudar nessa relação, nesse efeito.” (Entrevista 3)

7. Discussão

Essa pesquisa busca entender, em seu objetivo geral, qual a influência de um

diagnóstico psiquiátrico prévio para a evolução nas intervenções terapêuticas utilizando-se

Psicoterapia Breve de orientação psicanalítica em uma clínica-escola.

Essa questão surgiu de termos sido ainda no estágio na referida escola, confrontados

com situações de pacientes que ao nosso entender, não precisavam utilizar medicamentos para

resolver sofrimentos provenientes de relações pessoais e interpessoais, como ocorria com a

grande maioria deles.

Esse estudo subsidia-se de autores que propõem uma arqueologia da psiquiatria

através de uma abordagem sócio histórica e dos conceitos de instituição instituído e instituinte

para relativizar e desnaturalizar idéias que através de uma lógica contemporânea, atravessam

os fundamentos psicanalíticos e propõem a medicalização como única forma de saber-poder

46

sobre os corpos, estabelecendo com isso, uma espécie de hierarquia no campo da produção do

saber e portanto, sobre o corpo social.

Sob essa ótica observou-se a influência do diagnóstico prévio nos prontuários de

alunos entre 2009 a 2010 e entre os alunos entrevistados e questionados diretamente sobre

esse tema.

A primeira separação foi em grupos de pacientes com e sem diagnóstico prévio

ficando o primeiro caso com um enfoque maior uma vez que se trata do tema da pesquisa.

A ação medicamentosa sobre o tratamento psicanalítico não foi explorado em toda sua

extensão pelas limitações óbvias desse trabalho, mas separaram-se desde o início dessa

análise dois grandes grupos a partir de referências psicanalíticas, ou seja, o grupo dos

neuróticos e dos psicóticos uma vez que o uso de medicamentos é conseqüência quase

obrigatória do diagnóstico psiquiátrico. Avaliou-se, portanto quais são os significados que os

medicamentos têm na escuta dos estagiários principalmente durante as entrevistas uma vez

que nos prontuários somente dois deles fizeram referências a medicação.

A partir da análise dos dados descritas no item 6.1 e 6.2, de forma a sistematizar para

melhor compreender os resultados, relacionou-se as principais conclusões da pesquisa:

a) O próprio formato do prontuário em si propõe um modelo médico clássico para

descrição da problemática do paciente, tornando o terapeuta e a relação (processo

transferencial) ausentes das descrições.

b) Em tratamentos com psicóticos, o diagnóstico prévio constrói a idéia que o

terapeuta tem do paciente sendo o principal tema abordado pelos estagiários

durante o tratamento e em seus relatórios. Direciona-se a escuta exclusivamente

para o acolhimento e para a melhoria da qualidade de vida do paciente, reforçando

o diagnóstico sem qualquer possibilidade de avaliação ou desconstrução do

estigma.

c) O diagnóstico prévio como discurso hegemônico e a naturalização da doença e dos

processos bioquímicos frente ao psíquico, como descrito na fundamentação teórica

desse trabalho, ficou evidente na maioria dos prontuários, entretanto perde sua

força nas entrevistas, demonstrando que a pesquisa atinge seus objetivos quando se

questiona e desperta o interesse dos alunos para o tema.

47

d) O diagnóstico prévio quando questionado e desconstruído, como aconteceu em

dois prontuários resultou em avanços significativos na solução dos conflitos e nos

prognósticos, demonstrando que o discurso médico pode sim ser questionado e

quando for o caso, até desconstruído com o intuito de diminuir o sofrimento dos

pacientes. Não houve nenhum outro caso em que o diagnóstico foi desconstruído e

o resultado do caso foi negativo.

e) Nas entrevistas ficou evidente que o diagnóstico prévio quando existe serve de

ponto de partida para as ações da maioria das entrevistadas uma vez que, somente

uma delas declara que não avalia ou tenta desconstruir o diagnóstico. Nesse caso, a

abordagem do diagnóstico disputa o curto tempo que o paciente tem para elaborar

suas questões pessoais.

f) Em dois dos casos registrados, o diagnóstico não foi considerado em nenhum

momento pelas estagiárias. Nos prontuários e nos trabalhos seguiram a risca os

princípios da Psicoterapia Breve de Orientação Psicanalítica e obtiveram

excelentes resultados na terapia. Isso evidencia a importância e a eficiência do

modelo clínico proposto pela instituição.

Um dos objetivos secundários da pesquisa foi o de avaliar se houve alteração da

demanda inicial do paciente e se houve alteração da hipótese psiquiátrica. Quase na totalidade

dos prontuários o diagnóstico prévio manteve-se o mesmo durante toda a terapia, entretanto

ficou claro que a demanda inicial sai do campo do sofrimento e se encaminha para questões

pessoais e interpessoais dos pacientes. Mais uma vez a fundamentação teórica é confirmada.

O sintoma, objeto de tratamento da psiquiatria, deixa de ser o foco e ao longo da terapia se

transforma na demanda pessoal, revelando as limitações na formação e maturação do

psiquismo do paciente.

Observou-se ainda em relação a esse tema uma aderência de 66% dos pacientes ao

tratamento psicológico contra somente 38% dos pacientes rejeitando medicamentos ou

diagnóstico prévio. Seria esse outro ponto para uma próxima pesquisa sobre o tema, ou seja,

verificar se prevalece o discurso médico sobre a psicoterapia também entre os pacientes.

Certificamos em várias situações, que a hipótese inicial foi confirmada na maioria dos

casos, entretanto não significa com isso que a questão esteja encerrada. Pelo contrário abre-se

perspectivas para estudar outras formas da influência do discurso médico nas terapias como

um todo.

48

8. Conclusão

Nessa trajetória que se finda agora, no tempo da pesquisa é o tempo de concluir. A

experiência de ter-se entrado em contato com o discurso médico-psiquiátrico em vários níveis

desde a fundamentação teórica até a análise de dados, durante mais de um ano, deixa mais do

que uma experiência intelectual, mas uma sensação.

A hipótese inicial: o paciente que chega para o tratamento psicanalítico com um

diagnóstico psiquiátrico prévio dificulta a instalação de um processo de tratamento de

orientação psicanalítica; por mais óbvia que tenha sido na sua concepção, deixou mais que

uma certeza, uma constatação.

Ao final, consideramos a instituição médica-psiquiátrica como um ente de efeitos

significativos na práxis da Psicoterapia Breve de Abordagem Psicanalítica. Dentre esses

efeitos estariam o da medicalização das psicoterapias, essas que na sua aproximação com as

neurociências seriam como descreve Foucault (2006), agregadas aos objetivos ideológicos

historicamente construídos destinados a normalização social e ao desenvolvimento econômico

das indústrias químicas.

Devemos pensar que o diálogo entre os dois discursos se torna essencial para a

sobrevivência de ambos no mesmo espaço, pensando assim no bem estar do paciente. É,

portanto necessário discriminar a especificidade de cada um deles e do campo de suas

atuações. Com isso poderemos pavimentar um caminho entre as duas disciplinas, com as

possibilidades próprias da contemporaneidade, ou seja, renovando-se, aperfeiçoando-se,

fundindo métodos e elaborando novos conceitos.

Deixamos a idéia para que em uma próxima pesquisa possamos avaliar com maior

rigor as diferenças entre esses campos do saber e resolver os impasses epistemológicos entre

eles, discutindo principalmente como a hierarquização dos saberes proposta pela medicina,

tornando o corpo bioquímico referencia central, dificulta de antemão a perspectiva

interdisciplinar.

Dentro do escopo político, uma das justificativas constantes do item 5 desse trabalho,

poderíamos considerar o Ato Médico hoje em pauta como uma impossibilidade para essa

pavimentação, tornando qualquer aproximação das disciplinas uma utopia.

Não podemos esquecer, no entanto, como cita CASTEL (1978), que a Reforma

Psiquiátrica destituiu tantos valores e procedimentos consagrados, humanizando a psiquiatria

como um todo. Esse fato, segundo o autor se deve entre outros “a difusão da psicanálise, no

49

campo psiquiátrico” ocorrendo o que o autor denominou de “desmedicalização da psiquiatria”

promovendo os efeitos das reformas e transformações tão importantes naquele período.

Portanto não é utópico pensar que como aconteceu no passado na Reforma Psiquiátrica ou

quando Freud realizou a ruptura com as neurociências poderemos hoje ainda achar formas de

humanizar e resolver as diferenças entre essas disciplinas.

Para encerrar e satisfazer todas as justificativas descritas no item 5, não podemos

deixar de fazer referencia a escola, lugar de construção dos saberes de todos que participaram

dessa pesquisa. Cabe a essa instituição por parte dos professores, a reafirmação das diferenças

epistemológicas dessas disciplinas, no sentido de aperfeiçoar os currículos, de fortalecer as

diferenças, de delinear melhor as fronteiras, criticando e desconstruindo configurações de

saber-poder ideologicamente estruturadas.

Assim a escola cumpre sua função de ser fonte permanente de reconstrução das relações

sociais, deixando os alunos mais a vontade com uma prática que muitas vezes se coloca na

contramão da instituição médica, causando um “mal estar” para o paciente contrariando as

expectativas de uma cultura voltada para o “imperativo do gozo” (Danziato, 2010), ou aos

objetivos médicos que Foucault (1987) denomina de “ortopedia social”.

Podemos somente concluir essa pesquisa retomando uma citação clássica de FREUD

(1919):

“Como vocês sabem, nós não nos vangloriamos jamais da completude e do

acabamento definitivo de nosso saber e de nosso poder. Estamos tão prontos, agora,

como estávamos, antes, a admitir as imperfeições de nosso conhecimento, a

considerar qualquer coisa nova que se apresente e a modificar, na nossa abordagem,

o que possa ser colocado como algo melhor.” (FREUD:1919:201)

50

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53

10. ANEXOS

10.1. ANEXO 1 - ENTREVISTAS

Entrevista 01

Entrevistador: O objetivo da pesquisa é entender como o aluno do CPA da UNIP

recebe uma paciente que vem com diagnóstico ou não, prévio, do psiquiatra. Como reconhece

o diagnóstico psiquiátrico, qual o sentido, relevância, quanto considera e qual a importância

seu contexto profissional?

Entrevistada: Ah sim, eu vejo que é uma forma que tem um peso muito grande pro

paciente né, e assim até porque socialmente tem as doenças da moda ele se colocam naquele

tipo dali começa a buscar a estudar sobre aquilo e começa a adquirir comportamento começa

adquirir até sintomas mesmo daquela doença então assim na troca de informação ah eu sou sei

lá tem um transtorno de humor alguma coisa assim ele vai conversar com outro e vê que

tem coisa similar e ele já intitula daquela forma então assim eu vejo como prejudicial e

socialmente e um efeito em cadeia acho que um vai contaminando o outro o outro vai

contaminando o outro daqui a pouco tá todo mundo se achando ah todo mundo tem transtorno

de humor... todo mundo né...eu vejo mais nesse sentido

Entrevistador: O Diagnóstico atinge o sujeito de alguma forma, quanto você acredita

que o diagnóstico psiquiátrico e o tratamento psicanalítico dentro da clinica são compatíveis

como isso afeta seu trabalho ou quanto isso pode contribuir ou atrapalhar.

Entrevistada: Bom, acho que é muito negativo, eu vejo assim, eu vejo das duas

formas, eu vejo positivo e negativo, do ponto de vista clinico, talvez até eu possa estar

equivocada, mas assim o paciente vir com algum esclarecimento ele é positivo né. Eu acho

que é como nós temos muito pouco tempo eu acho que é bem negativo, eu acho que é muito

pouco tempo pra gente tratar essa demanda dentro psicanálise, eu vejo como negativo eu vejo

60 ou 70% negativo porque eu acho pouco tempo pra gente trazer tanto conteúdo de um

pessoa que já vem com algo introjetado, então até a gente modificar aquilo, saber de onde

vem, entendeu?

Entrevistador: Como você avalia a medicação como forma de tratamento eficaz para o

neurótico? Para o psicótico? Você percebe alguma diferença entre esses dois grandes grupos?

Entrevistador: Bem aí faço uma diferenciação entre neurótico e psicótico, vamos

imaginar que separei esses dois grupos. Como você avalia a medicação como forma de

54

tratamento eficaz para o neurótico? Para o psicótico? Você percebe alguma diferença entre

esses dois grandes grupos?

Entrevistada: Eu acho assim, os pacientes hoje já chegam... a primeira tomada do

paciente eu que ao invés de tratar eles já querem se medicar então assim, o neurótico eu já

vejo assim, dá pra ter outros efeitos que não a medicação, mas com tratamento psicoterápico.

Já com o psicótico eu acho totalmente efetivo porque sem ele, pelo menos nos casos que eu vi

que eu atendi, foram poucos, dos casos que eu pude atender eu vejo que quando o paciente tá

bem medicado ele tem uma estrutura muito bem orientada a não ser que tenha alguma outra

orientação mas eu vejo que o paciente psicótico bem medicado ele é bem sociável e já o

paciente neurótico eu acho que ele pode fazer algumas vezes como uma bengala da

medicação, e ficar nessa medicação por muito tempo sem tratar outras questões.

Entrevistador: É exatamente essa pergunta, a próxima né, e era exatamente isso que eu

queria que você desenvolvesse um pouquinho mais avaliando só os neuróticos como é que

essa medicação pode alterar a psicoterapia.

Entrevistada: É, eu acho que assim, a questão do neurótico hoje, eu acho que ele busca

essa primeira medicação como bengala eu se fosse psiquiatra eu trataria em primeiro

momento com medicação mas com a probabilidade já de fazer um calendário para o desmame

então assim trabalharia com o desmame aos poucos junto com a psicoterapia. Não seria uma

coisa a longo prazo. E hoje é assim, os pacientes tomam uma medicação a longo prazo sem

probabilidade de desmame e se vêem mais dependente da medicação do que tudo coisa que

assim, coisas que outrora se resolveriam sem a medicação com uma estrutura psíquica melhor

ou em outro momento de vida que ele conseguiria resolver e que depois de tomar a

medicação eu percebo que o paciente neurótico se vê totalmente dependente daquilo como se

ele não conseguisse resolver mais nada sem a medicação. Como sair dessa medicação, então

assim, talvez ele pense assim: sem a medicação eu vou ao fundo do poço. Sair da medicação

eu acho... tem que ser uma medida paliativa... vai tentando tirar, vai tentando tirar , e sempre

conscientizando o paciente de que aquilo não é definitivo diferente do psicótico.

Entrevistador: Você profissionalmente como você acredita que pode fazer isso?

Entrevistada: Eu acho que a primeira coisa seria, eu veria como entrar com uma

medicação, por exemplo: tem paciente que entra com tantas miligramas, percebendo o

comportamento, se o paciente percebe melhoria depois da medicação, que melhorias são

essas, se essas melhorias são realmente reais ou não, tem paciente que toma a medicação e

55

acha que tá ótimo, a medicação nem fez efeito ainda, e o paciente como uma semana já acha

que ta tudo resolvido, eu faria assim trazendo para a realidade se realmente aquilo é efeito da

medicação ou se ele realmente ta conseguindo ver, tendo uma outra visão.

Entrevistador: Isso com o psiquiatra?

Entrevistada: Com o psiquiatra, sem dúvida, é uma coisa que pra mim não tem como

separar, eu acho que falta muito esse link entre os dois profissionais, ah o psiquiatra tá

passando o que? Ah então ta to te acompanhando daqui, mas não vê a melhora do paciente e

não troca com o psiquiatra, entendeu

Entrevistador: Você já atendeu aqui algum paciente com diagnóstico prévio?

Entrevistada: A paciente que eu atendi aqui tava com um quadro depressivo, e eu

trabalhei com uma com quadro depressivo.

Entrevistador: ...mas ela veio com um diagnóstico médico

Entrevistada: ...diagnóstico médico não, diagnóstico dela e por um estado de luto, mas

assim, foi uma coisa bem trabalhada, mas que não ficou naquilo, ah vc é depressiva, não

uma coisa assim, uma coisa que foi sendo desenvolvida, uma coisa que veio com o

diagnóstico dela, mas que foi desconstruída.

Entrevistador: É basicamente isso, obrigado.

56

Entrevista 02

Entrevistador: Essa pesquisa ela objetiva entender como que os alunos da clinica de

psicanálise, se comportam e convivem com os pacientes que já chegam na clinica com o

diagnóstico prévio psiquiátrico, se vem com diagnóstico de toda ordem psicótico, se é bipolar.

Como você enxerga o diagnóstico prévio, não do ponto de vista só da psicologia mas também

do contexto social?

Entrevistada: Bom, primeiramente eu não tento tirar uma conclusão pelo diagnóstico

que a pessoa veio. No semestre passado eu atendi um que ele tentou suicídio, ele veio com um

diagnóstico pronto, então assim, depois que eu atendi eu vi que não tinha nada haver com o

diagnóstico que ele veio, então a primeira coisa, foi até uma lição pra mim, que independente

mesmo do que o médico deu eu tento excluir aquilo para eu ver, eu tentar descobrir o que

aconteceu o que ele possa ter até descobrir a verdade mesmo.

Entrevistador: Você entende o discurso psiquiátrico como relevante dentro da clínica

psicológica?

Entrevistada: Eu não me assusto mais com essas coisas, ...ah fulano é bonito tem

dinheiro tá tentando se matar, não tem motivo prá se matar, então eu já não penso assim,

nunca sabe o que pode tá acontecendo, então assim, prá da mesma forma se fulano tem

esquizofrenia também é bom avaliar tudo provavelmente ele tem isso, isso e isso e pode

desenvolver alguma coisa assim ou assado.

Entrevistador: Então se eu entendi o que você falou você não considera o discurso

psiquiátrico como um discurso absoluto.

Entrevistada: Não, não considero

Entrevistador: É uma verdade, pra você que é questionável

Entrevistada: Com certeza

Entrevistador: E aí como profissional mais ainda, descarta e tira suas conclusões

Entrevistada: Exatamente, eu tento nem ver quando vem, ah fulano tem isso eu não

quero nem ver eu quero atender do zero, para exatamente para eu ver se é aquilo mesmo ou eu

tirar minhas próprias conclusões e ver com a supervisão.

57

Entrevistador: Outra pergunta agora, como você vê a eficiência do tratamento feito a

partir de uma psicoterapia breve com abordagem psicanalítica aqui na clínica escola dá ou não

resultado.

Entrevistada: Eu acho que para algumas coisas sim, para outras não, confesso que eu

tenho uma tendência para o comportamental também e então acho que pra algumas coisas a

psicanálise dá bem e muito, para algumas coisas não, um exemplo: fobia, eu não conseguiria

atender uma pessoa com fobia na psicanálise eu ainda não consigo atender com enfoque

psicanalítico e já na comportamental eu conseguiria alguma coisa. Então a clínica dá conta de

algumas coisas e outras não

Entrevistador: Queria fazer uma diferenciação entre dois tipos de pacientes, paciente

neuróticos. Como é que você vê o uso da medicação nesses dois casos.

Entrevistada: Bom como a gente não trabalha com medicação, teríamos que consultar

um profissional para ver se aquela medicação é realmente aceitável, mas eu sou contra a

medicação, pra mim só em último caso mesmo, porque o psiquiatra não pode ver o paciente

triste que tá achando que ele tá com depressão e já vai tacar um anti-depressivo, então eu sou

totalmente contra, eu vou mesmo ver se é indicado. Se o paciente meu está tomando remédio

eu vejo qual é o remédio vou atrás do profissional pra ver se esse remédio é mesmo indicado e

também vejo a demanda dele para saber se realmente ele precisaria daquilo.

Entrevistador: Então de novo você questiona você questiona o discurso médico, o

próprio medicamento e você questiona no caso de neurótico se realmente seria necessário. No

caso do psicótico você acha mais aceitável.

Entrevistada: E isso mesmo. No caso do psicótico que eu atendi eu defendi que ele

teria que tomar porque ele tava a beira do suicídio assim mesmo muito depressivo então esse

mês eu até conversei com o psiquiatra aqui e realmente pelo estado dele ele deve tomar.

Entrevistador: Observando os processos psicológicos do paciente dentro da clínica

psicanalítica e os processos emocionais dele se você observa através do seu estado que tratado

com remédio não é necessário, como você lida com isso? Ou já lidou?

Entrevistada: Bom é aquela coisa, primeiro vou atendê-lo não querendo saber do

diagnóstico psiquiátrico para eu realmente ver a situação dele e bom e dependendo do caso eu

tento entrar em contato com o psiquiatra. Aí o procedimento seria voltar para primeiramente

com o psiquiatra tirar as dúvidas. Então eu posso até consultar outro psiquiatra para realmente

ter certeza daquilo e depois vejo como fazemos para tirar o remédio.

58

Entrevistador: É isso, muito obrigado.

Entrevistada: Espero ter ajudado.

Entrevistador: Ajudou muito.

59

Entrevista 3

Entrevistador: O objetivo da pesquisa é entender como o aluno do CPA da UNIP

recebe uma paciente que vem com diagnóstico ou não, prévio, do psiquiatra. Como reconhece

o diagnóstico psiquiátrico, qual o sentido, relevância, quanto considera e qual a importância

seu contexto profissional?

Entrevistado 1: Eu acho que quando a pessoa vem com o diagnóstico pronto, a gente

tem que buscar identificar se ela realmente tem ou não e se apresenta alguma característica

desse diagnóstico, dessa doença no caso, eu trato assim, eu já recebi alguns pacientes com

diagnóstico pronto vamos dizer assim, psiquiátrico.

Entrevistado 2: Eu acho que independente dele ter ou não esse diagnóstico psiquiátrico

ele é uma pessoa que tem que ter o tratamento, então ele tendo esse diagnóstico a gente pode

ver o que pode trabalhar dentro desse diagnóstico dele pra que ele seja trabalhado.

Entrevistador: Mas qual é a relevância desse diagnóstico dentro da sua abordagem

nessa clínica.

Entrevistado 1: Eu pra mim a relevância, dele chegar e falar que é alguma coisa, eu

acho que a gente tem que realmente pesquisar e tentar identificar na clinica se realmente é

isso ou não, para quebrar de rótulos

Entrevistado 2: Acho que é exatamente isso, tentar pesquisar se aquilo que ele está

falando é verdade durante as sessões vê se realmente ele apresenta tais sintomas, se ele está

devidamente medicado, se ele aparecer com esquizofrenia ele já tem que vir também com

medicamento, se ele viu isso na novela, tem que tá quebrando esse rótulo para ele ver que

realmente não tem, ou se tem tratar, porque ele é uma pessoa e isso também vem de alguma

coisa psíquica, a gente tem que tentar trabalhar com ele. Tem que desconstruir essa idéia que

ele trás com ele.

Entrevistador: Como você entende a eficiência da Psicoterapia Breve de Abordagem

Psicanalítica.

Entrevistado 1: Claro que é um resultado eficiente, vai depender também da sua da

relação com o paciente, como você tem um tempo já predeterminado de inicio meio e fim do

tratamento acho que você tem focar em algumas coisas que estejam mais relevantes que

apareçam mais no momento você tem focar o seu trabalho para que ali você tenha efeito sobre

ele, acho que o importante aqui é o foco, o problema do paciente.

60

Entrevistado 2: Eu tenho exemplo da minha paciente que tem uma evolução muito boa

então com certeza pra mim é muito eficiente

Entrevistador: Como você avalia a medicação como forma de tratamento eficaz para

os pacientes em geral neurótico? Para o psicótico? Você percebe alguma diferença entre esses

dois grandes grupos?

Entrevistado 1: Bom, eu acho que o remédio é um ponto realmente importante, se o

remédio não fosse eficaz não teria, só que o remédio separado da relação terapêutica ele já

não faz tanto efeito o remédio tem seu efeito próprio tanto para o neurótico como para o

psicótico claro que cada um com um tipo diferente de remédio o neurótico ele é mais aquela

coisa mais do momento, dele está com dificuldade em alguma coisa no momento, o remédio é

eficaz naquele momento, o psicótico ele já vai usar um remédio de longa duração que é

exatamente para inibir aqueles efeitos da psicose das alucinações, auditivas, visuais ou

qualquer tipo de sintoma que ele esteja, então é alguma coisa mais duradoura, os remédios

para os neuróticos acredito que seja de curto prazo.

Entrevistado 2: O remédio pode te ajudar com o neurótico, a sair de uma depressão

com um pouco mais de facilidade pelo efeito do remédio e do seu trabalho você ta ali

estimulando aquele paciente, acredito que essa seja a relação de te ajudar a estimular o

paciente a sair de uma situação que ele esteja passando

Entrevistado 1: Acho que faz muito efeito até mesmo para o neurótico tenho uma

paciente que ela é depressiva e quando ela começou a tomar o remédio que começou a surgir

efeito, e também no nosso estágio hospitalar, no Hospital São Vicente, a gente percebe muito

bem que os psicóticos precisam sim estar medicados porque senão eles vão piorando, acho

que o medicamento é eficaz sim.

Entrevistador: Inclusive para os neuróticos você tem essa mesma perspectiva.

Entrevistado 1: Eu acho que sim, uma depressão - acho muito necessário a medicação

e trabalhar junto com o terapeuta, acho que só a medicação não faz tanto efeito no neurótico.

Entrevistado 2: Quando necessário não tomar aleatoriamente, se o psiquiatra passou

acho legal tomar.

Entrevistador: Você poderia elaborar um pouco mais essa questão do remédio.

Entrevistado: Eu acho que a coisa da transferência ela tem que ser bem forte pra gente

perceber, se você tá trabalhando com um paciente depressivo durante um tempo e você não tá

61

vendo resultado por mais que você tente, por mais que o paciente tente e você não tá tendo

resultado acho que é hora de começar a introduzir um remédio para poder te ajudar nessa

relação, nesse efeito.

Entrevistador: Existe alguma diferença entre o paciente que vem com o diagnóstico

prévio e o que não vem na sua escuta?

Entrevistado 1: Porque assim, acredito que quando o paciente chega para você falando

de uma situação, ele está com problema, porque quem não tem problema não vai procurar

terapia, o paciente chega te falando assim eu sou bipolar, acho que você vai começar a ter um

olhar em cima dele a partir disso para ver realmente se ele é se ele apresenta esses sintomas, e

se ele apresenta esse sintoma você tem que tratar esses sintomas dele, da clínica psicanalítica,

se ele veio com esse rótulo e ele não apresenta esses sintomas, você tem que trabalhar para

desconstruir esse rótulo, desconstruir essa imagem que ele tem de si porque mesmo ele sendo

uma pessoa bipolar ele não é só isso então eu acho que sempre tem que ser trabalhada, acho

que tem uma abordagem sim diferenciada porque a partir do momento que ele eu sou bipolar

você vai atrás, você vai procurar, tentar identificar nele aquele sintomas de um bipolar, acho

que tem uma escuta diferenciada sim.

Entrevistado 2: Aqui na clínica psicanalítica eu recebi um esquizofrênico, um

esquizofrênico que já tinha constatado a doença há uns quatro anos ele foi encaminhado pelo

Dr. Ulisses do ICN faz acompanhamento com ele e ele veio com o diagnóstico de

esquizofrenia, e é muito interessante ver a dinâmica deles, como pra eles a gente pergunta as

coisas e é bem concreta assim, do tipo ah ele falando que se sente sozinho, e eu falando pra

ele o que você tá fazendo pra sair desse lugar, ah eu tô caminhando, então saia do meu lugar

lá em casa e vou caminhar, então é diferente você passa a atuar junto com ele com aqueles

sintomas que ele vai apresentando que são características da doença para trabalhar esses

sintomas é um olhar diferente que você tem com ele.

Entrevistador: E quanto ao remédio como você avalia esses avanços rápidos que se

obtêm utilizando medicamentos como no exemplo que você citou agora pouco.

Entrevistado 1: As vezes eu acho que o remédio tem um efeito de placebo.

Entrevistado 2: Eu acho que é aquele tal do ah não tá dando certo, efeito placebo, eu

vou começar a tomar o remédio e vou ficar boa, lógico que o remédio tem eficácia mas 40%

ali é seu pensamento, eu to tomando remédio por isso que eu vou ficar boa, então ela começa

a tomar o remédio e com o pensamento de que ela ia ficar boa por causa do remédio, ela foi

62

ficando boa, efeito placebo, claro que o remédio é eficiente, mas a partir do momento que ela

ta pensando que realmente vai ser eficiente o remédio vai ser mais eficiente ainda, acredito

nisso

Entrevistado 1: Porque o remédio é eficaz, mas você precisa do outro também precisa

ter uma escuta, precisa falar o que tá sentindo, mas o remédio também ajuda no tratamento, o

remédio sozinho não adianta.

63

Entrevista 4

Entrevistador: O objetivo da pesquisa é entender como o aluno do CPA da UNIP

recebe uma paciente que vem com diagnóstico ou não, prévio, do psiquiatra. Como

reconhece o diagnóstico psiquiátrico, qual o sentido, relevância, quanto considera e qual a

importância seu contexto profissional?

Entrevistado 1: Essa questão do diagnóstico o psiquiatra geralmente é que dá esse

diagnóstico, vou falar da minha experiência, eu fui ao psiquiatra uma vez e eu estava com

variações de humor e na primeira consulta ele falou que eu era bipolar e já me passou remédio

eu estava no inicio da faculdade e falei com alguns professores sobre isso e ele falou que eu

não era bipolar, então a questão é, você diz o que está sentindo e o profissional já diz o que

você tem na primeira consulta, então você fica eu sou ou não bipolar, e eu preferi acreditar

nos professores larguei os medicamentos comecei a trabalhar isso na terapia e estou ótima,

isso influencia muito a pessoa fica dependente de remédio a pessoa se rotula e aquilo passa a

fazer parte da vida dela quando ele falou que eu era bipolar, tomei aquilo como verdade para

mim e eu me achava bipolar, realmente eu sou bipolar uma hora to feliz outra tô triste, uma

hora quero comprar outra hora não quero, estigma vem e você aceita aquilo pra você e acaba

vivendo nesse contexto.

Entrevistador: Então como você trabalha o paciente com o diagnóstico psiquiátrico

prévio?

Entrevistado 1: Vou perguntar pra ele, questiono, quem foi que disse pra você que

você é bipolar, neurótico é histérico, quem foi que falou, acho que primeiro é investigar vê o

psiquiatra, ai a gente começa a investigar também, a gente vai buscar história, no caso, a gente

faz um abordagem psicanalítica pra buscar essa história, vai conversar com ele porque disso

da onde vem, eu acredito muito em repetição, que a gente repete muito o que a gente aprendeu

lá traz o que a gente viveu, eu acredito nessa questão da repetição, se de repente você foi

criada de um jeito, eu estou até lendo um livro que fala ou você as vezes casa com seu pai ou

sua mãe tá repetindo um história lá traz, eu acho que tem que investigar pra poder ajudar.

Entrevistado 2: Eu acho que assim, em relação ao diagnóstico, quando eu entrei na

faculdade, quando isso vem dito pelo médico, então tem todo uma história cultural de uma

verdade absoluta, porque vem de um médico, e a partir do momento que eu comecei a estudar

eu vi que não é bem assim, eu acho que muita coisa, a partir do momento que entrei na

faculdade isso foi se desconstruindo, porque passei a ver isso tudo com outro olhar, quando

64

entrei na clínica pro estágio e quando você me pergunta como que você vê isso quando o

paciente traz, primeiro a gente tem que escutar, tem que ter uma escuta muito atenta, tem que

observar porque hoje em dia ta tudo muito na mídia, tá na novela, tá na internet, algumas

pessoas ouvem muito falar e falam eu tenho isso, e aí eu acho que tá muito na moda inclusive

para os médicos, as vezes você chega como ela mesma diz o médico te ouve e fala é estresse,

em quinze minutos, é estresse, a doença da moda, né, é estresse é isso é aquilo, não que o

médico não tenha parâmetros para diagnosticar, mas acho que tem que ter uma avaliação mais

aprofundada, eu acho que tem que ter um outro olhar, não acho que tem que ter um olhar na

especificidade da pessoa mesmo, no que ela tá trazendo, aí eu acho que minha atuação seria

nesse sentido eu acho que ela é mais importante, NE. O que isso traz porque que isso tá

trazendo isso, e esse diagnóstico eu acho que ele não é só medicamentoso não, só olhando

essa parte biológica mas também do que está acontecendo, o que isso tem de importante pra

você, o que é relevante acho que o diagnóstico tem que ser um conjunto.

Entrevistador: Outra pergunta agora, como você vê a eficiência do tratamento feito a

partir de uma psicoterapia breve com abordagem psicanalítica aqui na clínica escola dá ou não

resultado.

Entrevistado 1: Essa questão de acabar bem ou acabar mal é muito relativo, né. A

gente nunca sabe o que vem pela frente, a gente acredita que no tratamento psicanalítico na

terapia, aquele sobe e desce às vezes o paciente tá lá em cima, estou ótimo hoje estou me

sentido super bem, alguma coisa acontece ele vai lá em baixo de novo, acho que é um

processo mesmo. Não tem como garantir se vai terminar bem se vai terminar mal tem

paciente que é muito resistente quando você mexe numa ferida dele se aquilo vai fazer ele

sofrer ele acaba desistindo ele vai embora ele não quer mais se tratar, não quero mais mexer

nisso, as vezes ele nem fala, simplesmente ele abandona e nem fala nada, se quer mexer ou

não, porque você foi no ponto, outro começa a refletir sobre isso, não realmente tenho que

começar a trabalhar nisso, enfrentam e conseguem até um bom resultado, definir se vai

terminar bem ou mal é muito relativo.

Entrevistador: Acabar bem é uma questão de sorte?

Entrevistado1: Não diria uma roleta de sorte não, acho que depende do paciente o

nosso trabalho aqui é a gente estar orientando e ajudando abrindo caminhos, mas a decisão é

dele, e pode não dar certo.

65

Entrevistador: Os médicos acreditam sim na ciência e técnicas deles...fazem

estatísticas e determinam qual a porcentagem que vão ser curados com esse ou aquele

medicamento.

Entrevistado 1: Sim, eles tem um olhar mais biológico, aquela coisa.

Entrevistado: É eu também acho isso, não existe nada fechado na nossa clinica a

gente não pode dar um prognóstico ah vai ser assim vai ser assado, quando o paciente vem a

gente lida na maioria das vezes com o sofrimento desse paciente, não tem como eu dizer que

vai dar certo isso depende muito dele, como ela disse, é um processo, e o processo depende

efetivamente do paciente, se ele vai conseguir , se ele vai se propor a querer fazer essas

mudanças, a gente está ali como uma mediação como uma ferramenta para que aquilo possa

acontecer ali naquele teste, eu acho assim, que não tem como eu dizer se é sim ou não, se vai

ser sucesso ou não, estamos lidando com a singularidade de cada um. Aí não tem como a

gente mensurar isso.

Entrevistador: Queria fazer uma diferenciação entre dois tipos de pacientes, paciente

neuróticos. Como é que você vê o uso da medicação nesses dois casos?

Entrevistado 1: O remédio ajuda, eu acredito que sim, cada caso é um caso, uma

pessoa que é esquizofrênica, acho que ele vai ter que tomar o remédio

Entrevistador: E quanto ao remédio para o neurótico e psicótico você avalia que deve

haver alguma diferença?

Entrevistado 1: Neurótico... acho que a população inteira é, então acho que o neurótico

não precisa de medicamento não, na minha concepção, eu acho que a neurose e aquela coisa

mesmo você está insatisfeito. É aquela pessoa que tá sempre insatisfeita está sempre em busca

de alguma coisa inalcançável, enfim eu vejo o neurótico assim sempre reclamando sempre

com algum problema, o psicótico não, a esquizofrenia é um tipo de psicótico tem vários

outros que precisa realmente de medicamento, a pessoa surta, a pessoa delira tem essas

questões todas eu acredito que medicamento é para esses casos, cada caso é um caso. Tem

dois esquizofrênicos cada um tem um organismo, um medicamento que as vezes serve pra um

não serve pro outro, não posso generalizar vai servir para os dois, não um vai ficar mais

sonolento outro mais agitado, a dosagem é muito importante isso tudo tem que ser avaliado, e

buscar mesmo qual o melhor medicamento qual a melhor dosagem recomenda para aquele

paciente, acredito que o medicamento é mesmo muito importante para os psicóticos para os

neuróticos não.

66

Entrevistado 2: Questão da medicação, se ela é importante? Acho que sim, acho que

neurótico cada um de nós somos também, cada um tem um pouquinho da neurose, mas nesse

sentido mesmo, acredito que o neurótico não precisa de medicação não, acredito que

dependendo do caso é um acompanhamento terapêutico, mas o psicótico dependendo do caso

também, sendo diagnosticado, é necessário sim, o esquizofrênico costuma criar uma realidade

que é dele, acho que a medicação tem que vir junto com um acompanhamento terapêutico não

só a medicação não, acho que tem que ser um tratamento, junto acho que é mais efetivo.

Entrevistador: Vocês já tiveram pacientes com diagnóstico prévio psicanalítico? Se

sim qual a influência que teve na escuta.

Entrevistado 1: Eu não tive não, eu faço estágio também no hospital, lá realmente a

gente trabalha com psicótico mesmo, hospital psiquiátrico, AGAPAPE, lá sim, mas aqui na

clinica não.

Entrevistado 2: As pessoas já vem com algo pronto, eu sou assim ou então se ele não

sabe nomear isso, começa a falar eu sinto assim eu sinto assado, eu tive uma paciente que ela

falava que tinha muito medo que ela não conseguia sair ai a gente na supervisão falava tem a

síndrome do pânico como é que a gente trata isso, interessante encaminhar, vamos

encaminhar então para o psiquiatra, então a gente faz esse encaminhamento, com a fala do

paciente se ele demonstra realmente que ele está em sofrimento ele não tá conseguindo lidar

com aquela situação ele precisa realmente de uma acompanhamento de um psiquiatra de um

medicamento para poder estar auxiliando ele também não sair na rua, a gente vai fazer esse

encaminhamento.

Entrevistado 1: É não atendi ainda com esse diagnóstico, acredito que primeiro

observar né, verificar se de fato existe, se existir fazer encaminhamento para o psiquiatra,

como eu disse, tem que ser junto, se houver necessidade da medicação não abandonar o

acompanhamento terapêutico acho que é bem importante

Entrevistado 1: Eu queria falar mais uma coisa...Essa é uma opinião muito pessoal

minha, eu vejo que a indústria farmacêutica ela tá bombando, e o médico ele ganha com isso.

Então quando o médico te passa o Prosac ele tá ganhando do laboratório assim como um

neurocirurgião quando faz uma cirurgia de coluna ele ganha no material, ele ganha nos

parafusos, tem cirurgia de coluna que custa cem mil reais, ele leva em média 10 até 20%

desse valor, eu sei disso porque trabalhei num hospital e os médicos levam e levam muito

dinheiro, eu acredito que também na indústria farmacêutica os farmacêuticos ao dar amostra

67

grátis e quando o médico está oferecendo esse remédio pro paciente ele tá ganhando uma

comissão em cima disso.

68

Entrevista 5

Entrevistador: O objetivo da pesquisa é entender como o aluno do CPA da UNIP

recebe uma paciente que vem com diagnóstico ou não, prévio, do psiquiatra. Como reconhece

o diagnóstico psiquiátrico, qual o sentido, relevância, quanto considera e qual a importância

seu contexto profissional?

Entrevistado 1: O que acontece, meu paciente ele foi diagnosticado com fobia social e

com síndrome do pânico, ele veio e está sendo medicado, então como eu vejo isso, eu estou

quase 6 meses no atendimento e no inicio ele trouxe a demanda e o que aconteceu, como eu

estou há quase 6 meses, que aconteceu agora no final que eu consigo perceber dessa

indicação, ele parou de tomar a medicação, ele conseguiu, veio a angústia a gente conseguiu

trabalhar isso, só que ele tá dependente do remédio, aí ele voltou no psiquiatra aí ele falou que

estava sentido um pouco de angústia. Então eu sinto assim, que o paciente fica preso, no meu

caso especificamente que eu estou atendendo, ele tá preso a esta medicação, e ele não

conseguiu reconhecer que ele estava dando conta de lidar com aquela angústia com aquela

condição que ele tá passando e aí ele volta e pede remédio. Então assim, eu observando que a

gente não pode entrar nesse assunto muito né, porque essa é uma atuação do médico do

psiquiatra então assim eu só pontuei para ele para ver se ele conseguia perceber que ele estava

conseguindo mesmo a lidar com a angústia. Lidar e passar por isso, não sei se por causa da

condição dele, eu não sei se eu saberia de responder em relação se é ele assim, atrapalha

porque pra mim ele não precisava da medicação, ele estava dando conta, tanto é que ele ficou

um mês sem tomar a medicação, ele estava tomando outro, ele estava tomando três

medicações, ai ele tirou o antidepressivo por conta própria, eu lógico que não concordei, acho

que teria que ser com o médico, e ele parou simplesmente de tomar, ai ele veio observando,

como estava tudo tranqüilo aí ele continuou, como ele já tinha parado muito tempo, ai eu

achei melhor, ele veio falar comigo, ele voltar no psiquiatra, ai quando ele volta, ele foi

medicado com outra medicação mais forte, ele falou que seria uma punição, então assim, pra

mim ele não precisava dessa medicação porque ele estava lidando, então atrapalha porque a

pessoa fica presa, ela está aqui tratando mas ela está presa a uma outra condição, aí ela sai da

terapia por exemplo nosso aqui que o trabalho é rápido, é uma psicoterapia breve, por

exemplo eu já estou até preparando o meu paciente para ele sair mas e ai ele vai ficar com

essa medicação como que ele lida com isso, porque também o psiquiatra mandou que ele

69

procurasse a psicoterapia, você não poder tratar só a parte fisiológica você precisa tratar

também a psíquica então uni as duas, então tá ele sai daqui e ele fica com essa medicação ai

vem a angustia ai ele vai se apoiar no remédio. Eu acho assim, que o remédio em algumas

crises ele ajuda muito, com certeza, não tenho dúvida, mas pra outras coisas ele atrapalha, é

como se ele não se libertasse, ela nem percebe a dimensão da prisão que ela tá, talvez eu tenha

me perdido um pouquinho.

Entrevistador: De forma nenhuma.... Mas esse seu paciente veio com diagnóstico

prévio?

Entrevistado: Ah é, ele trouxe, do psiquiatra, falando que ele tinha síndrome do pânico

e fobia social, inclusive com o CID.

Entrevistador: Então como o diagnóstico prévio influencia seu trabalho?

Entrevistado: Não, eu recebo e começo a investigar, como que está isso na vida do

paciente, e como é, leva tempo para você ir percebendo algumas coisas, eu não fico

pontuando aquilo, eu tento perceber, uma demanda dele é que ele não conseguia vir de metrô,

tinha muita gente, então como ele tinha que vir para a clínica de metrô ou de ônibus, eu ficava

sempre tentando tocar nesse assunto para sabe como ele estava lidando, e aí tiveram situações

que ele se envolveu na igreja, então quer dizer eu fui deixando e observando eu acho que é

meio que rotular uma pessoa sabe, isso prejudica porque a pessoa as vezes não da conta de

sair daquele rótulo, então ela acha que está sempre daquele jeito, então ele tem angústia, ele

tem uma fobia então ele fica preso naquilo, ele não consegue sair. Eu tento, eu tento trabalhar

isso, mas aí de vez em quando eu tento pontuar naquilo que eu vejo que está dentro da

rotulação.

Entrevistador: Como você avalia a medicação como forma de tratamento eficaz para o

neurótico? Para o psicótico? Você percebe alguma diferença entre esses dois grandes grupos?

Entrevistado: Olha, assim, pela minha pouca experiência, e é também por atender uma

pessoa com esquizofrenia, eu acho que tem importância sim, eu achava que era entupir a

pessoa de remédio, mas como eu estou com uma paciente em crise, o psicótico é importante

pra ela agora nesse processo, eu não sei como vai ser, até mesmo porque é inicio de

tratamento de caminhada com ela não sei se daria para eu falar muita coisa, mas ele é

importante para segurar as crises, no psicótico, no neurótico aí é que tá a minha briga, é que

eu acho que as vezes, ele dá importância de mais a esse suporte, não sei se também pela

condição do paciente que estou atendendo que eu acho que não precisa, talvez se eu pegar um

70

outro paciente mais ansioso, talvez para eu conseguir tentar até trabalhar o inicio talvez seria

bom, mas eu acho, é a minha postura, posso mudar depois, tem como você tentar trabalhar

isso e mostrar pra ele que não precisa estar dependente daquilo, porque se ele tiver

dependente ele está sempre com um amuleto, encostando em alguma, por exemplo, aconteceu

uma coisa interessante, o paciente se utilizou desse amuleto, para trabalhar uma situação lá no

trabalho dele, aí ele pega e fala assim, não, porque eu estou doente, porque eu estou em

tratamento, porque a pessoa se considera doente, ele toma medicação, porque eu acho que o

trabalho psíquico não é que você é doente, é você se vê, e você conseguir lidar com suas

próprias coisas, então não é uma doença, você lidar com você, e o neurótico

Entrevistador: Então se eu entendi no caso do neurótico o remédio pode vir até

atrapalhar?

Entrevistado: Sim porque aí é você tamponar alguma coisa, você dopar uma pessoa,

como você trabalha como uma pessoa dopada, sobrecarregada de medicação, de substância,

minha experiência com o paciente ele estava na ansiedade, ele estava na angústia, ele estava

sob pressão, então veio esse afeto maior, ele estava sem medicação já tinha 20 dias, ele estava

passando pela angústia ele estava dando conta de lidar, ai de repente ele começa a tomar o

remédio de novo, isso para mim meio que pesou, mas é uma área que a gente tem que

respeitar né; e eu respeito. Eu acho que é uma área importante, mas eu acho que às vezes, o

paciente chega com uma demanda e ele tem que resolver alguma coisa aí o médico pega e dá

remédio, não sei, é uma área que eu não sei o que vou dizer, porque não é a minha, a do

psiquiatra.

Entrevistador: Você já teve paciente com diagnóstico prévio psicanalítico como você

vai trabalhar com esse tipo de paciente, ou seja aquele que já vem diagnosticado? E quanto a

medicação para neuróticos e psicóticos como você avalia? Existem diferenças?

Entrevistado: Eu na medida do possível, vou tentar trabalhar para tentar resgatar esse

paciente, enquanto houver possibilidade de você mostrar isso pro paciente, eu dependo do

paciente, então o meu trabalho é voltado para tentar resgatar essa pessoa como um todo,

dentro das ferramentas que a gente tem, não é ficar calado, e se algum dia dentro da pesquisa,

assim como você está fazendo aqui tentar mostrar, não é assim que funciona, mas tentar

dentro do consultório mostrar porque você é uma pessoa importante ali dentro para aquele

paciente, igual estou tentando mostrar para o meu paciente, eu começo a pontuar para ele,

você está percebendo que você está na ansiedade, que você está sob pressão, que você está

71

sem a medicação, se você esta conseguindo lidar com isso? Eu tento pontuar, só que ele tem

uma necessidade, não sei se é um conforto que a gente tem, eu fui ao médico estou com dor

de cabeça, o médico me passou um remédio e eu vou melhorar, porque a sensação que as

pessoas têm é que vão chegar aqui e a gente pudesse medicar é que desse um remédio e isso

vai passar, nós temos talvez um senso comum muito forte em relação a isso, eu preciso de um

remédio, eu preciso de uma pílula, isso atrapalha sim, eu preciso que o paciente passe comigo

no processo de rever aquelas condições de tentar trabalhar aquela angústia, porque não dá

para viver 24 horas dopadas de remédio por causa da angústia, então assim acho que é uma

coisa que tem que ser trabalhada e é difícil, então é melhor ir pelos caminhos mais rápidos, se

eu conseguir na medida do possível do meu trabalho tentar mostrar, porque eu acho que as

pessoas mais capazes para mostrar o conhecimento somos nós, nos detemos o conhecimento

da psicoterapia, nós que temos que ser os divulgadores e até mesmo contestadores dessa área,

acho assim, não é que vou deixar livre esse discurso, mas na medida do possível acho que se

cada um fizesse um pouquinho, a gente tentaria construir algo maior porque também eu não

vou deixar de fazer porque eu sou uma, eu vou estar fazendo, porque o meu intuito é mostrar

até que ponto isso está fazendo bem pro paciente ou se está fazendo mal, por exemplo esse

que eu estou trabalhando na clínica aqui eu estou trabalhando dessa forma, a outra que está

com surto a gente está tentando trabalhar para ela, porque ela está jogando os remédios fora,

aí eu vi a importância dessa medicação na vida da paciente porque era impossível até manter

um diálogo com ela porque como ela entrou em surto aí o que acontece ela começa conversar

com você ela devaneia ela começa a conversar com as vozes, eu acho que a gente tem que

avaliar cada caso ele é importante ser avaliado, chegou pra gente tem uma rotulação tem todo

um caminho que já sustenta um paciente tem hora que ele mesmo se diagnostica porque tem

um nome lá, ele dá o nome, ele pesquisa ele se encaixa, ele aceita então fica um pouco difícil

você resgatar essa pessoa com esses rótulos, se eu puder de alguma forma dentro do meu

trabalho não só com o paciente mas mostrar pra sociedade que a gente precisa tomar cuidado

com essas coisas, esse é o meu intuito.

Entrevistador: Então para o psicótico o remédio é necessário? É isso que você está

dizendo?

Entrevistado: Você tem vários mecanismos de defesa, o neurótico mesmo que ele use

algumas defesas parecidas com psicótico, é muito claro até o discurso é diferente, é bem

diferenciado, há necessidade, eu achava que não, eu pensava você dopa a pessoa, tem aquele

filme que retrata essa internação, medicação, Bicho de Sete Cabeças, e aí você fica com

72

aquilo, a gente tinha muito isso, vai dopar o paciente vai encher ele de remédio e ai o que

vamos fazer com isso, mas na verdade acho que tem que avaliar, e se todo mundo se

conscientiza e preocupa mesmo, está inteiro na clinica acho que você conduz melhor sabe.

Entrevistador: Do grupo de pessoas que consome psicotrópicos quanto você acha

desse grupo que são psicóticos e precisaria de remédios.

Entrevistado: Ah eu não sei se eu conseguiria te responder até pela minha caminhada

inicial, mas eu acho assim a nossa sociedade está muito adoecida, talvez não sei uns 50%,

talvez igual, não sei, ah o psiquiatra, ah tem transtorno de personalidade que eu acho que hoje

está mais em evidencia, talvez, porque tem muita gente que vai procurar o psiquiatra e as

vezes não tá com aquela demanda toda mas está em crise entendeu, e na crise a gente pede

ajuda de alguma forma as vezes não da continuidade a ajuda, então eu não sei, saiu uma

reportagem que o Brasil é o maior consumidor do mundo de Rivotril.

Entrevistador: É mesmo. Eu não sabia...

Entrevistado: Todo mundo que eu conheço fala: tomo Rivotril pra dormir.

Entrevistado: E tem um livro, não sei se seria interessante você ler, Quem ama não

adoece, é a experiência de um médico, ele começou a ver que as demandas que chegava para

eram demandas de angústia, não era chegar ali e passar uma medicação, as consultas dele

começou a demorar, porque ele começou a perguntar como é que estava a semana da pessoa,

e aí eu não li o livro todo, mas até onde eu consegui perceber ele entendeu e foi por isso que

ele escreveu o livro, que na verdade as demandas não eram demandas fisiológicas, mas o

fisiológico estava afetado pelas emoções pelas condições pela qual as pessoas estavam

passando e ai o livro foi feito em torno disso, então a gente hoje não tem tempo, o medico não

tem tempo, ele precisa ganhar dinheiro, ele precisa cumprir o horário dele, ele não tem tempo

para escutar essa demanda que a gente escuta acompanhar na verdade você se doa ali naquele

momento para aquele paciente para aquele momento dele e você resgata muita coisa dele,

então a gente tem que tomar muito cuidado porque a medicação e o rotulo atrapalha muito o

processo de trabalho, e eu estou lutando na medida do possível bem tranqüila para tentar

mostrar isso para a pessoa que ela precisa entrar em contato com ela e as vezes na neurose

numa crise , nos temos pessoas que estão dependente de remédio e que tem crises que dão

para resolver sem o remédio, já o psicótico ele tem crises, ele precisa que a medicação

sustente, e a gente precisa dessa medicação para trabalhar.

Entrevistador: Obrigado pela entrevista.

73

10.2. ANEXO 2 - Roteiro de Entrevista

Pergunta 1: “Como reconhece o diagnóstico psiquiátrico, qual o sentido, relevância,

quanto considera, qual a importância seu contexto profissional”.

Pergunta 2: “Quanto você acredita nas soluções de tratamento, num prognóstico

positivo à partir da clínica psicanalítica.”

Pergunta 3: “Como você avalia a medicação como forma de tratamento eficaz para o

neurótico? Para o psicótico?

Pergunta 4: Como você entende a eficiência no controle de processos afetivos que

causam prejuízos a vida do paciente, através de medicamentos.

Pergunta 5: Como é a escuta psicanalítica para você a partir da revelação do paciente

do seu diagnóstico psiquiátrico?

Pergunta 6: Já atendeu algum caso sem diagnóstico psiquiátrico prévio? A condução

foi diferente? Se sim quais foram as diferenças?

Pergunta 7: Se não, como poderia supor se o paciente chegasse sem um diagnóstico

como acha que seria o desenvolvimento da terapia.

74

10.3. ANEXO 3 - TERMOS DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO

<INCLUIDOS SOMENTE NO ORIGINAL >

75

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