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Rev. TST, Brasília, vol. 79, n o 2, abr/jun 2013 17 DOSIMETRIA DO DANO MORAL Alexandre Agra Belmonte * 1 – INTRODUÇÃO D uas espécies de direitos podem ser vislumbradas nas relações de traba- lho: direitos econômicos, destinados a remunerar o trabalho prestado ou a cessação do contrato, como salários, adicionais, diferenças de desvio de função ou de equiparação salarial, FGTS e indenização compensatória de 40%, e direitos extrapatrimoniais, próprios da condição humana e que visam dignificar o trabalhador e valorizar o trabalho. São eles: direitos à intimidade, à vida privada, à honra, à imagem, à livre manifestação do pensamento, à liber- dade de consciência, de crença, de comunicação, de expressão, a informação e sexual, à igualdade de tratamento, ao tratamento respeitoso, ao trabalho livre e quantitativamente limitado, à vida, à saúde, à integridade física, à subsistência, à greve e à liberdade de associação profissional e sindical. Os direitos de natureza econômica, quando violados, geram a respon- sabilidade patrimonial, mediante reparação dos danos decorrentes do descum- primento das obrigações trabalhistas, abrangendo os danos emergentes e os lucros cessantes. Embora seja comumente utilizada a expressão danos materiais como caracterizadora da responsabilidade patrimonial, nem sempre os danos mate- riais têm essa natureza, a exemplo do dano estético, que é um dano material extrapatrimonial. Em virtude da violação de direitos econômicos, pode o trabalhador postular a respectiva reparação via reclamação trabalhista individual e, se for o caso, além da reparação econômica, também a rescisão indireta do contrato, por violação das obrigações contratuais do empregador. Nada impede que o sindicato ou o Ministério Público do trabalho, diante de violações de natureza metaindividual postule, em nome dos trabalhadores, * Ministro do TST; doutor em Direito; professor universitário de mestrado e graduação; membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho.

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dano moral

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  • Rev. TST, Braslia, vol. 79, no 2, abr/jun 2013 17

    DOSIMETRIA DO DANO MORAL

    Alexandre Agra Belmonte*

    1 INTRODUO

    Duas espcies de direitos podem ser vislumbradas nas relaes de traba-lho: direitos econmicos, destinados a remunerar o trabalho prestado ou a cessao do contrato, como salrios, adicionais, diferenas de desvio de funo ou de equiparao salarial, FGTS e indenizao compensatria de 40%, e direitos extrapatrimoniais, prprios da condio humana e que visam dignificar o trabalhador e valorizar o trabalho. So eles: direitos intimidade, vida privada, honra, imagem, livre manifestao do pensamento, liber-dade de conscincia, de crena, de comunicao, de expresso, a informao e sexual, igualdade de tratamento, ao tratamento respeitoso, ao trabalho livre e quantitativamente limitado, vida, sade, integridade fsica, subsistncia, greve e liberdade de associao profissional e sindical.

    Os direitos de natureza econmica, quando violados, geram a respon-sabilidade patrimonial, mediante reparao dos danos decorrentes do descum-primento das obrigaes trabalhistas, abrangendo os danos emergentes e os lucros cessantes.

    Embora seja comumente utilizada a expresso danos materiais como caracterizadora da responsabilidade patrimonial, nem sempre os danos mate-riais tm essa natureza, a exemplo do dano esttico, que um dano material extrapatrimonial.

    Em virtude da violao de direitos econmicos, pode o trabalhador postular a respectiva reparao via reclamao trabalhista individual e, se for o caso, alm da reparao econmica, tambm a resciso indireta do contrato, por violao das obrigaes contratuais do empregador.

    Nada impede que o sindicato ou o Ministrio Pblico do trabalho, diante de violaes de natureza metaindividual postule, em nome dos trabalhadores,

    * Ministro do TST; doutor em Direito; professor universitrio de mestrado e graduao; membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho.

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    por meio de Ao Civil Pblica, a cessao da infringncia, mediante astreintes e outras medidas cabveis, alm da reparao dos danos econmicos.

    Quanto aos direitos extrapatrimoniais, quando ofendidos, so suscetveis de gerar responsabilidade pelos danos morais decorrentes, quer em sede indivi-dual, quer em sede coletiva, aqui tambm podendo o sindicato ou o Ministrio Pblico atuar na defesa dos direitos individuais e coletivos da categoria ou na defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogneos, conforme o caso.

    Danos morais so, portanto, os resultantes das ofensas a direitos extra-patrimoniais.

    Note-se, no entanto, que a ofensa a direitos extrapatrimoniais pode gerar danos patrimoniais reflexos, como ocorre no acidente do trabalho, no qual a perda de um membro, alm do dano esttico, refletido no defeito fsico aparente e do dano moral, decorrente dos complexos e limitaes experimentados pela vtima, gera a reparao de danos patrimoniais (ressarcimento das despesas mdicas e hospitalares, alm de indenizao ou penso vitalcia decorrente da perda parcial ou total da capacidade laborativa).

    Os danos morais podem ser individuais e coletivos. So individuais os decorrentes das violaes integridade valorativa, fsica e psicolgica da personalidade da pessoa humana, a exemplo das ofensas honra, sade e liberdade de expresso do trabalhador, e ao bom nome da pessoa jurdica; so coletivos os resultantes das ofensas a atributos metaindividuais de grupos de trabalhadores ou classe trabalhadora, a exemplo da arrecadao de pedidos de demisso ou recibos de quitao em branco como condio de contratao, a prtica do trabalho forado ou escravo ou a utilizao de trabalho infantil.

    Danos morais trabalhistas so as ofensas individuais aos direitos da per-sonalidade do trabalhador ou do empregador e as ofensas coletivas causadas aos valores extrapatrimoniais de certa comunidade de trabalhadores, decorrentes das relaes de trabalho. A Emenda Constitucional n 45, publicada em 31 de dezembro de 2004, atribuiu expressa competncia Justia do Trabalho para a resoluo dos danos morais decorrentes das relaes de trabalho, incluindo os originados de acidentes do trabalho.

    Anteriormente expressa atribuio legal da competncia trabalhista para a resoluo dos danos morais provenientes da relao de emprego, vinha o STF e o TST decidindo que era ela da Justia do Trabalho. A nova redao do art. 114, I e VI, da CRFB atribuiu Especializada uma competncia mais ampla, porque abrangente dos danos morais e patrimoniais oriundos de qualquer

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    relao de trabalho e dos acidentes do trabalho, sepultando de vez eventuais controvrsias a respeito dessa competncia.

    Como consequncia do fato do rompimento do contrato com ou sem culpa , a lei infraconstitucional trabalhista tarifa as indenizaes acaso devidas, mas silencia a respeito da composio do dano moral derivado do desrespeito aos direitos personalssimos do trabalhador, ainda que intimidade, honra, imagem, integridade fsica e ao tratamento respeitoso do empregado se refira, expressamente, em algumas oportunidades (arts. 483, a, b, e e f, e 373-A, VI, da CLT, bem como no Anexo II da NR-17, itens 5.12 e 5.13).

    A lei infraconstitucional tambm silencia quanto s ofensas aos direitos personalssimos dos trabalhadores nas fases pr-contratual e contratual.

    Indaga-se, portanto, que critrios devem orientar o magistrado trabalhista na fixao dos danos morais individuais e coletivos.

    Essa a finalidade deste artigo.

    2 DIREITOS DA PERSONALIDADE DO TRABALHADOR

    Nem sempre os bens jurdicos esto situados no mundo exterior. Determi-nados direitos integram o prprio homem, sendo-lhe essenciais a uma existncia livre e valorizada, que lhe permita, com igualdade de oportunidades, ter acesso aos bens da vida e efetiva e justa participao social e poltica.

    Tais direitos, que tm por fundamento a dignidade da pessoa humana, so to merecedores de tutela jurdica quanto os bens exteriores, pelo que tambm podem ser objeto de direito. So, no plano constitucional, os chamados direitos fundamentais, notadamente os constantes dos arts. 5 a 12 da Constituio Fe-deral, destinados a garantir ao ser humano uma existncia integral. Entre eles esto os direitos sociais constantes do elenco dos arts. 7 a 11.

    Na dimenso juslaborativa, direitos fundamentais so os valores de que os trabalhadores necessitam para a garantia de uma existncia igualitria, livre, valorizada e justa na ordem econmica e social, tendo por substrato a dignidade da pessoa humana.

    No plano infraconstitucional, os direitos subjetivos destinados a garantir, numa relao de trabalho, a integridade fsica, intelectual e moral do indivduo costumam receber a denominao de direitos da personalidade. Essa denomi-nao, na tutela dos direitos subjetivos decorrentes dos direitos fundamentais, tambm permeia as relaes civis, a exemplo dos arts. 11 a 21 do Cdigo Civil brasileiro.

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    Nas relaes de trabalho, podem ser apontados como direitos da perso-nalidade dos trabalhadores, entre outros:

    direito vida;

    direito integridade fsica;

    direito sade;

    direito ao trabalho; direito ao trabalho quantitativamente limitado; direito igualdade de tratamento;

    direito liberdade fsica (ir e vir e circulao);

    direito liberdade intelectual (pensamento, convico, crena, expres-so, comunicao, artstica, cientfica e literria);

    direitos intimidade, vida privada e sigilo das comunicaes;

    direito ao tratamento humano e respeitoso da condio pessoal e pro-fissional;

    direito subsistncia;

    direitos de associao, inclusive sindical e de greve; direito ao meio ambiente seguro e saudvel.Enfim, para desfrutar de uma existncia digna e valorizada no ambiente

    de trabalho, o ser humano necessita de direitos que possam proteg-lo nos aspectos fsico (direito vida, segurana, higidez fsica, sade, liberda-de de locomoo e circulao, subsistncia e ao trabalho quantitativamente limitado), intelectual (liberdades de pensamento, convico, crena, criao artstica, literria e cientfica, associao) e moral (direito intimidade, honra, imagem, ao tratamento respeitoso da condio pessoal e profissional).

    Os direitos da personalidade ingressam na categoria de direitos extrapa-trimoniais, destitudos, a priori, de avaliao econmica.

    A importncia da distino entre os direitos patrimoniais e os direitos da personalidade est em que os danos causados aos direitos patrimoniais tm direta reparao pela via indenizatria econmica. Se pelo meio pecunirio so valorados ou medidos, por essa via devem ser os prejuzos compostos. J os danos causados aos direitos da personalidade, porque extrapatrimoniais, no tm representao econmica imediata, pelo que as violaes so inibidas ou compostas por outra via de tutela, na qual eventual aspecto econmico visa inibir as ofensas e/ou dar uma resposta que atenue o sofrimento imposto ao ser humano.

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    Convm, no entanto, no esquecer, como j observado, que ofensas causadas a direitos da personalidade, como a cometida integridade fsica de uma pessoa em decorrncia de acidente de trabalho, pode produzir, alm da dor causada pelo dano direto higidez fsica do ofendido, reflexos patrimoniais ou econmicos (dano patrimonial indireto, consistente no ressarcimento de des-pesas hospitalares, indenizao pelo impedimento temporrio ou permanente de exerccio de labor remunerado).

    3 DANOS MORAIS TRABALHISTAS

    Como dito anteriormente, danos morais trabalhistas so as ofensas in-dividuais aos direitos da personalidade do trabalhador ou do empregador e as ofensas coletivas causadas aos valores extrapatrimoniais de certa comunidade de trabalhadores, decorrentes das relaes de trabalho.

    Partindo-se da ideia de que os danos morais decorrem da ofensa aos direitos da personalidade, que por sua vez resultam da repercusso dos direitos fundamentais nas relaes privadas, tem-se que os danos morais trabalhistas podem ocorrer:

    a) em relao natureza da ofensa:

    a.1) por ofensas de natureza individual:

    aos atributos valorativos da personalidade (danos dimenso tica da pessoa, ou seja, integridade moral da pessoa humana e ao bom nome da pessoa jurdica). Caso das violaes honra e imagem;

    aos atributos fsicos ou materiais da personalidade (danos integridade fsica da pessoa humana). Caso das violaes vida, integridade fsica, sade, subsistncia, liberdade fsica ou de locomoo;

    aos atributos psquicos ou intelectuais da personalidade (danos in-tegridade intelectual da pessoa humana). Caso das violaes intimidade, ao sigilo, ao recato ou vida privada, igualdade, s liberdades de pensamento, convico, crena, expresso, comunicao, autoria cientfica, artstica e lite-rria, associao, sexual.

    a.2) por ofensas de natureza coletiva:

    aos atributos de comunidade de trabalhadores ( integridade cultural coletiva). So as violaes a direitos metaindividuais, de grupos de trabalha-dores ou classe trabalhadora, como promoo de trabalho escravo ou forado.

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    b) em relao repercusso da ofensa:

    b.1) por ofensas morais de natureza subjetiva (danos morais subjetivos), quando se referem considerao delas em relao prpria pessoa do ofendido (sofrimento interior ou dores dalma);

    b.2) por ofensas morais de natureza objetiva (danos morais objetivos), assim entendidos os pertinentes projeo dessas ofensas em relao ao meio social (considerao do dano em relao ao meio social)1.

    Note-se, por fim, que o art. 5, V, a Constituio da Repblica faz refern-cia a trs tipos de danos: o dano patrimonial, o dano moral e o dano imagem.

    Embora a Carta Magna tenha pretendido dar relevo autonomia de tratamento e respectiva proteo dimenso tica e psicolgica da pessoa, independentemente do dano psicolgico provocado pelo uso deturpado da imagem, o dano fsico ou esttico, que tambm de natureza extrapatrimonial, igualmente suscetvel de reparao, porque compromete a aparncia fsica da pessoa (Smula n 387 do STJ), gerando-lhe sofrimento ntimo. Da a referncia destacada ao dano imagem.

    A responsabilidade por dano moral trabalhista , fundamentalmente, de natureza subjetiva, assim fundada na culpa.

    Ocorre que mesmo diante de fatos no imputveis culpa ou dolo do empregador, determinadas sequelas ou traumas psquicos podem ensejar a reparao por responsabilidade objetiva, como ocorre nos casos especificados em lei ou naqueles em que o empregador promove atividade de risco acentuado (art. 927, pargrafo nico, do CC c/c o art. 8, pargrafo nico da CLT). Como exemplos, o sofrimento, a humilhao e o estresse ps-traumtico experimenta-dos pelo bancrio por ter servido de refm em assalto a banco do empregador; o abalo decorrente da contaminao em usina nuclear; a sndrome do pnico adquirida aps anos de exerccio na funo de vigilante de carro-forte; a perda de membro em virtude de carga eltrica em trabalho desenvolvido com energia eltrica de alta tenso; a sequela fsica decorrente de trabalho com explosivos.

    Por outro lado, o estabelecimento de presunes pode incidir em deter-minados casos.

    Assim que se o trabalhador comprova que informaes incorretas foram prestadas a seu respeito e que no obteve novo emprego junto pessoa a quem foram dirigidas, presume-se que a no obteno tenha como causa as

    1 REALE, Miguel. Temas de direito positivo. So Paulo: RT, 1992. p. 20 e segts.

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    informaes prestadas, cabendo, assim, ao ex-empregador o nus da prova de que outro foi o motivo que ensejou a falta de colocao do ex-empregado.

    Outrossim, quando a situao normal a presumida ausncia de culpa, da vtima o nus de provar a falta do ofensor, mas se a situao normal suscetvel de implicar na existncia de culpa do ofensor, fica ele onerado com a prova de que no agiu com culpa. Pelo que nos casos de doena ocupacional, inerente ao tipo de trabalho efetuado, como LER/DORT, decorrente de trabalho permanente de digitao ou doena pulmonar que atinja trabalhador em minas de carvo, do empregador o nus de provar que a doena no decorreu do exerccio da atividade (fato impeditivo) e do empregado o nus de provar que a doena pulmonar que o atingiu decorrente da submisso a trabalho prestado (fato constitutivo).

    Ao contrrio do dano patrimonial, que admite correspondncia com a leso, fatores como a subjetividade da leso, a diferena de padro tico e sentimental entre as pessoas, a dificuldade de mensurao da dor, a impos-sibilidade de restabelecimento do status quo ante dificultam a sua aferio.

    4 FORMAS E MTODOS DE REPARAO DO DANO MORAL

    O revogado Cdigo Bevilqua apenas estabelecia o legtimo interesse moral como condio para o exerccio do direito de ao (art. 76), determi-nando somente em casos especficos a forma de reparao dos danos a direitos personalssimos (por exemplo, para os crimes de violncia sexual e danos por injria). Consequentemente, muitos sustentaram que o sistema era limitativo, com restrio da reparabilidade do dano basicamente s hipteses previstas em lei e assim mesmo, via de regra, quando se verificava a existncia de prejuzo material. Havia, dizia-se, a impossibilidade de avaliao pecuniria de dores e sofrimentos o pretium doloris2, tese por muito tempo acolhida pela jurispru-dncia3, a afastar a fixao de dano moral puro.

    Se, num primeiro momento, a interpretao fria da lei afastou, salvo nos casos especificados, a reparao do sofrimento ntimo, o passar do tempo e o alcance de uma poca em que a socializao dos riscos, fundamento da respon-sabilidade objetiva, cada vez mais encontra adeptos (destinando-se o seguro de vida exatamente a compensar, pela via econmica, a morte ou acidente sofrido4),

    2 CAHALI, Yussef Said. Dano moral. So Paulo: RT, 1998. p. 50-51.3 V.g., GOMES, Orlando. Obrigaes. 1995. p. 334; e ALVIM, Agostinho. Da inexecuo das obrigaes

    e suas consequncias, ns. 159 e 160, p. 220 e 221.4 WALD, Arnoldo. Obrigaes e contratos. 1992. p. 118. v. II.

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    abalaram, sobremaneira, esse posicionamento. Quando menos, impunha-se a fixao de indenizao em pecnia para coibir as ofensas morais e satisfazer a vtima com algum lenitivo ou prazer compensatrio do dano experimentado.

    Assim, da construo da reparabilidade dos direitos personalssimos decorrente da reflexo no patrimnio (com tutela pela via obrigacional e inde-nizao do concreto prejuzo de natureza patrimonial acaso verificado como resultado de uma ofensa moral), passou-se a sustentar, embora no sem resis-tncia, a compensao do sofrimento ntimo, independentemente da verificao de prejuzo material.

    No demais lembrar a lio de Ihering de que a pessoa tanto pode ser lesada no que tem como no que 5.

    A atual Constituio da Repblica encerrou definitivamente a questo. Aponta a justia social como um de seus valores supremos (art. 3, I), apresenta a dignidade humana como um dos fundamentos do Estado brasileiro (art. 1, III) e assegura a inviolabilidade da honra, da imagem, da intimidade e da vida privada (incluindo o sigilo da correspondncia e das comunicaes telegrficas, de dados e das comunicaes telefnicas art. 5, XII), alm de indenizao por dano material ou moral decorrente da transgresso a esses valores (art. 5, V e X).

    Ao assim proceder, veio a consagrar, definitivamente e sem limitaes, o direito reparao de ofensa a interesses morais. Ou seja, sem fazer qualquer exigncia necessidade de repercusso econmica para a respectiva indenizabili-dade, demonstrou contentar-se com o simples fato da violao (dano moral puro).

    Concluindo, a reparao do dano moral, mormente quanto aos atributos valorativos da personalidade do sujeito enquanto ente social, no est, neces-sariamente, ligada a prejuzo de ordem patrimonial (dano patrimonial), menos ainda existncia de uma economicidade imediata, pelo que eventual compen-sao pecuniria da dor causada, por exemplo, vida privada, intimidade e ao sigilo, no decorre de ofensa patrimonial6.

    Duas podem ser as formas de reparao do dano moral: in natura e in pecunia.A reparao in natura tem por fim a reconstituio natural ou de alcance

    de situao material correspondente. So exemplos a retratao pblica de delito, a publicao de notcia em jornal de grande circulao, a assuno das providncias para a realizao de uma cirurgia plstica destinada a recompor o dano esttico.

    5 IHERING, Rudolf von. Actio Injuriarum des lsions injurieuses em droit romain (et em droit franais). Paris: Chevalier, 1988. p. 1 e 24.

    6 Observa Caio Mrio da Silva Pereira, a enumerao constitucional meramente exemplificativa (In: Responsabilidade civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 58).

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    J a reparao em dinheiro tem por fim confortar a vtima, amenizar os efeitos da dor ou, no dizer de Maria Helena Diniz7, neutralizar os sentimentos negativos de dor, tristeza e angstia por lenitivo pecunirio que permita o alcance de prazeres destinados a minimizar a dor ntima do ofendido.

    Trs podem ser os mtodos para a fixao dos danos: Consensual, judicial e por arbitramento privado. Consensual, quando decorrente de acordo entre as partes; judicial, quando resultante de fixao pelas vias judiciais; por arbitra-mento, quando as partes se servem de rbitro para a fixao da compensao.

    A reparao pode ser in natura e in pecunia. Sendo pecuniria, dois po-dem ser os sistemas de avaliao: aberto ou de compensao por arbitramento judicial e fechado ou de compensao tarifada ou legal. Por arbitramento judi-cial, quando fica ao prudente arbtrio do juiz a fixao; tarifrio, quando a pr-pria lei fixa ou estabelece limite mximo para a fixao da indenizao devida.

    O sistema brasileiro no exige a necessidade de repercusso econmica para a indenizabilidade pecuniria do dano moral (art. 5, X, da CR), podendo ento servir para compensao, nica e exclusiva, da dor ntima.

    O art. 12 do Cdigo Civil estatui que se pode exigir que cesse a ameaa, ou a leso, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuzo de outras sanes previstas em lei.

    Os arts. 948 e 940 do mesmo diploma estabelecem a indenizabilidade do dano patrimonial nos casos de homicdio e de ofensa sade, ressalvando a possibilidade de obteno de dano compensatrio da dor ntima.

    A revogada Lei de Imprensa fixou um teto mximo de 50 salrios-mnimos para as hipteses de dano com culpa (art. 51 da Lei n 5.250/67) e o Cdigo de Telecomunicaes prev, para indenizaes que variam de 5 a 100 salrios-mnimos e que se levem em considerao a posio social ou poltica do ofensor, a intensidade do nimo de ofender, a gravidade e a repercusso da ofensa (art. 84, 1), mas os arts. 953 e 954 do Cdigo Civil de 2002, posteriores quela legislao, determinam que nos casos de injria, difamao, calnia e ofensa liberdade pessoal sejam indenizados os prejuzos patrimoniais e, equitativa-mente, os morais (arts. 953 e 954 do CC), no se referindo, portanto, a valores.

    Enfim, o Direito brasileiro adota o sistema aberto de fixao da inde-nizao do dano moral, cabendo ao magistrado fix-la, no exerccio do poder discricionrio conferido pela lei para o desiderato.

    7 Ob. cit., p. 91.

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    H Projeto de Lei do Senado Federal (n 150/99) destinado a tarifar os danos morais e estabelecer critrios para a respectiva fixao, nos seguintes termos:

    a fixao da indenizao conforme a natureza da ofensa (leve, mdia e grave), com valores pr-estipulados (respectivamente, at R$ 20.000,00; de R$ 20.000,00 a R$ 90.000,00; e, de R$ 90.000,00 a R$ 180.000,00);

    em relao natureza da ofensa, a considerao do grau de dolo ou culpa e o teor de bem jurdico sob tutela;

    em relao aos efeitos da ofensa, os reflexos pessoais e sociais do ato, a possibilidade de superao fsica ou psicolgica da ofensa, a extenso e durao dos efeitos da ofensa e a intensidade do sofrimento ou humilhao;

    em relao s circunstncias da ofensa, a situao social, poltica e econmica das pessoas envolvidas e as circunstncias da ocorrncia da ofensa ou o prejuzo moral;

    em relao ao arrependimento, a existncia de retratao espontnea e o efetivo esforo para minimizar a ofensa ou leso e o perdo, tcito ou expresso.

    O substitutivo da PGE/SP ao referido projeto fixa valores mnimos e mximos para as leses morais, conforme o tipo de dano (abalo de crdito, ofensa liberdade, morte, etc.).

    Embora os parmetros 1 a 5 possam, efetivamente, auxiliar o juiz na fixao da indenizao, a limitao valorativa pretendida desaconselhvel, obrigando o juiz a fixar valor que, na situao concreta, pode se revelar insu-ficiente.

    Entendemos, portanto, que a melhor soluo a anlise do caso concreto e o arbitramento judicial, que considere os diversos aspectos da ofensa (arts. 944, caput e pargrafo nico, 945, 953, pargrafo nico, e 954 do CC, subsi-diariamente aplicveis CLT por fora do art. 8, pargrafo nico).

    Assim, verifica-se a necessidade do estabelecimento de parmetros que orientem a fixao do valor em pecnia.

    5 CRITRIOS GERAIS PARA A FIXAO DO VALOR DA INDENIZAO DO DANO MORAL

    Nos termos do art. 944, caput e pargrafo nico, do Cdigo Civil, a indenizao deve ser avaliada segundo os critrios da extenso do dano, da

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    gravidade da culpa em relao ao dano e da reduo equitativa da indenizao se houver desproporo.

    O primeiro critrio diz respeito ao princpio da integralidade. A inde-nizao, que no tem carter retributivo ou reparatrio, deve ser integral, de sorte a compensar a ofensa e seus efeitos.

    Todavia, para a investigao da ofensa e do dano por ela produzido, deve ser feita uma avaliao luz dos dois outros critrios mencionados na lei civil.

    O critrio da gravidade da culpa em relao ao dano impe a atuao do princpio da proporcionalidade. Tanto assim, que o pargrafo nico do citado dispositivo legal menciona que se houver desproporo deve ser feita a reduo equitativa da indenizao.

    O princpio da proporcionalidade exige a comparao entre o poder ofen-sivo do ato e efeitos por ele produzidos, para permitir, por meio da ponderao, a fixao de um valor adequado ou pertinente e necessrio ou exigvel para a realizao do direito pretendido.

    Finalmente, o critrio da reduo equitativa da indenizao em caso de desproporo, impe a observncia do princpio da razoabilidade. Observado o dano produzido na comparao com o poder ofensivo do ato que o ensejou, o montante encontrado deve ser congruente, equitativo, ou seja, avaliado conforme as circunstncias do caso, observadas a suficincia compensatria segundo as condies econmicas do ofensor e sua pertinncia para coibir futuras investidas.

    Esses so, portanto, por fora de lei, os critrios gerais que devem ser observados pelo magistrado na fixao da indenizao, ou seja, do valor com-pensatrio do dano moral.

    Pensamos assim que devem informar a fixao dos danos morais em pecnia:

    o princpio da extenso do dano (integralidade da indenizao);

    o princpio da proporcionalidade da culpa em relao ao dano (para a delimitao proporcional do poder ofensivo, com as suas nuances (parcela de culpa, natureza do dano e efeitos produzidos).

    o princpio da razoabilidade (para atendimento da tripla funo da in-denizao carter compensatrio, dissuasrio e exemplar, no qual, observado o dano produzido, deve a indenizao ser ajustada suficincia compensatria

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    segundo as condies econmicas do ofensor e sua pertinncia para coibir futuras investidas).

    Observa Clayton Reis: (...) da maior importncia que o ato de conhecer conduza o julgador a dimensionar, com a preciso possvel, o dano que se ope-rou no esprito do lesionado, ou seja, identificar situaes como a repercusso do dano na sua intimidade fsica e psquica; as consequncias advindas na sua vida de relao; os fatores que concorreram para o seu desagravo; a perda da sua autoestima; a durao da sua dor ntima; procurar o julgador estabelecer a medida exata do preo da dor (...)8.

    Prossegue dizendo que, atento ao comando do art. 5 da LICC, possui o magistrado nessa fixao uma relevante funo, que depender essencial-mente da sua capacidade sensitiva de captar o verdadeiro sentido contido na pretenso indenizatria9.

    Conclui dizendo que o estabelecimento de valores que sejam incompa-tveis com a dimenso de todas essas leses vivenciadas pela vtima no possui o desejado efeito indenizatrio10.

    Apesar da discricionariedade na fixao da indenizao, pensamos que, abstrados limites de indenizao contidos no antes referido projeto de lei, os demais critrios gerais ali mencionados podem, de forma sistematizada, auxiliar no arbitramento.

    De fato, possvel em cada um desses critrios gerais considerar aspec-tos internos que possam atuar como agravantes ou atenuantes na fixao da indenizao. Por exemplo, se a ofensa incide sobre bem jurdico mais relevante do que outro (acidente de trabalho com perda de membro em comparao com um xingamento; acidente de trabalho com perda da vida em comparao com perda de membro), a indenizao deve ser agravada, assim tambm quando decorre de dolo, em comparao com um ato de negligncia.

    Se o empregador, todavia, toma imediatamente todas as providncias para minimizar os efeitos de um acidente de trabalho, a indenizao dever ser atenuada, o que no ocorrer se agir de forma negligente tambm no socorro e encaminhamento do acidentado ao INSS.

    Se o abalo supervel, a indenizao deve ser menor do que a decorrente de abalo insupervel ou permanente, como a perda de um membro.

    8 Os novos rumos da indenizao do dano moral. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 225.9 REIS, Clayton. Ob. cit., p. 226-227.10 Idem, ibidem, p. 229.

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    O sofrimento presumivelmente mais intenso deve sofrer maior gravame do que o sofrimento menos intenso.

    O dano causado a pessoa notria deve gerar indenizao maior, porque , presumivelmente, mais extenso em relao aos efeitos.

    As condies econmicas dos envolvidos importam no aumento ou di-minuio do valor da indenizao, porque deve ser ela significativa para quem paga e para quem recebe, exemplar para a sociedade e dissuasria para o ofensor.

    Prope-se, portanto, que sejam avaliados, como critrios gerais o poder ofensivo do ato violador (consideradas a natureza e efeitos da ofensa) e as circunstncias em que ocorreu.

    Cada um desses itens ir considerar, por sua vez, subitens internos que podero servir de atenuantes ou agravantes na fixao da indenizao11:

    Em relao ao poder ofensivo, os subitens cuja avaliao proposta so a natureza da ofensa, segundo a sua gravidade objetiva (relevncia ou teor de bem jurdico atingido) e a intensidade ou grau de culpa, nos termos do pargrafo nico do art. 945 do CC (fatores agravantes), considerada, ainda, a eventual concorrncia de culpa para a verificao do evento, conforme art. 945 do CC (fator atenuante).

    Em relao aos efeitos da ofensa, os subitens cuja avaliao proposta so a dor da vtima (a intensidade ou grau do sofrimento, privao ou humilhao), os reflexos pessoais e sociais do ato e a extenso e durao das consequncias da ofensa (permanncia ou temporalidade do dano possibilidade de superao fsica ou psicolgica da ofensa) elementos agravantes.

    Em relao s circunstncias da ofensa, os subitens propostos so a situao social, poltica e econmica das pessoas envolvidas (notadamente as possibilidades econmicas do ofensor) e os meios utilizados para possibilitar a ofensa (elementos agravantes), considerados, ainda, retratao espontnea e o efetivo esforo para minimizar a ofensa ou leso e o perdo, tcito ou expresso (elementos atenuantes).

    Em se tratando de danos patrimoniais, o grau de culpa desimportante: basta verificar o montante do dano emergente e dos lucros cessantes para ser encontrado o valor da justa reparao. Mas, no tocante aos danos morais, a intensidade da culpa deve ser levada em considerao. Quem provoca, queren-do, o resultado (dolo) deve responder com valor maior do que aquele que por

    11 Embora o tarifamento seja desaconselhvel, a falta de critrios para a fixao e a respectiva demons-trao nas decises judiciais violam o princpio da motivao contido na Constituio Federal.

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    imprudncia ou negligncia termina provocando a ofensa. E o mais negligente deve responder em montante maior do que o menos negligente, porque mais intensa a sua culpa para a caracterizao do evento.

    A gravidade da ofensa tambm deve ser apreciada: ofensa mais grave, como a morte do trabalhador, em confronto com a perda de um membro, deve desafiar resposta maior, ou seja, indenizao mais elevada; da mesma forma, ofensa mais duradoura, como a perda de um membro em decorrncia de acidente de trabalho por culpa do empregador, em confronto com a fratura de uma perna tambm por acidente de trabalho culposo.

    Dependendo dos meios e instrumentos utilizados, ou do ambiente em que se d a ofensa, o dano pode ter maior ou menor repercusso, como ocorre se utilizados meios de comunicao como jornais, televiso e internet. A di-vulgao do fato, no ambiente de trabalho, por meio de correspondncia aos funcionrios ou a disseminao pblica de uma imputao infundada tem o condo de dar a publicidade capaz de agravar a ofensa e influir no valor da indenizao a ser fixada.

    Fatores como popularidade e posio ocupada pelo ofendido (por exemplo, um diretor em uma empresa ou um artista de televiso) podem igualmente influir na maior ou menor extenso dos efeitos da ofensa e no valor da indenizao.

    Quando se diz que as condies pessoais dos envolvidos influem na indenizao porque a condio social, econmica, cultural, o grau de discer-nimento, o estado civil, o sexo, o modo de vida e a notoriedade dos envolvidos devem ser considerados na sua fixao. Uma cicatriz no rosto de quem vive da imagem, como o caso de uma modelo, por certo atinge a vtima de forma mais intensa, devendo ser mais significativa a indenizao.

    A possibilidade econmica deve ser levada em considerao quando da fixao da compensao financeira, no podendo revelar-se insignificante para as condies econmicas do ofensor. Uma indenizao de pequena monta como forma de coibir revistas ntimas numa grande empresa pode se revelar intil e ela at preferir assumir o risco, porque sairia mais barato do que os danos materiais causados por eventuais furtos. A reparao precisa ento ser significativa para cobrir os trs aspectos apontados: lenitivo, dissuasrio e exemplar. A indenizao deve ser fixada de forma proporcional certeza de que o ato ofensivo no fique impune segundo as possibilidades econmicas do ofensor, e que assim lhe sirva de desestmulo a prticas que possam retirar do trabalhador a sua dignidade.

    Evidentemente, nem todo sofrimento decorre de ofensa moral ressarcvel, eis que os aborrecimentos normais, prprios da vida em coletividade, so

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    juridicamente indiferentes, como ocorre, em princpio, com a despedida sem justa causa. Mas se essa despedida ocorre em condies humilhantes ou se realizada de forma a privar o trabalhador dos bens indispensveis existncia digna, como a negativa ao fornecimento das guias para levantamento do FGTS e recebimento do seguro-desemprego, a ento incide a indenizao.

    H decises que levam em considerao o tempo de servio do obreiro. Pode ser um parmetro auxiliar na fixao, mas no necessariamente. Por exem-plo, pouco importa se o trabalhador tinha um ms ou dez anos de casa se perde a perna por culpa do empregador, mas pode servir de agravante quando a honra de um empregado com 10 (dez) anos de tempo de servio e folha imaculada injustamente ofendida pelo empregador.

    H decises que partem do pressuposto de que a indenizao deve ser pequena quando uma revista ntima no causa maior repercusso. Ocorre que o bem violado a intimidade e no a honra, pelo que a pouca repercusso nos parece, na hiptese, totalmente desimportante como parmetro limitador.

    Em caso de homicdio, os danos morais decorrentes de acidente do trabalho devero ser pagos de uma s vez aos beneficirios, porque visam amenizar, de imediato, a dor causada pela perda do ente querido e desestimular novas investidas. Tero direito as pessoas correspondentes ao ncleo familiar diretamente afetadas. J nas hipteses de acidente do trabalho sem bito, os danos morais e estticos devero, igualmente, ser pagos vtima de uma s vez, eis que no tm carter alimentar e visam amenizar o sofrimento, limitaes e complexos causados pelo afeiamento ou invalidez permanente, total ou parcial, ou ento as sequelas da incapacidade temporria, com ou sem afastamento do trabalho. Nessa hiptese, a prpria vtima sobrevivente a parte legtima para postular a indenizao.

    A indenizao referente ao dano moral coletivo deve ser revertida em benefcio da comunidade atingida, por exemplo, ao Fundo de Amparo ao Tra-balhador, e o provimento inibitrio deve ser proferido mediante o pagamento de astreintes. Como no se trata de feixe de aes individuais, o nmero de trabalhadores atingidos pela ofensa nos parece desimportante para a fixao da indenizao. Ela deve ser mensurada conforme o grau de culpa, a relevncia social do ato e em valor que iniba novas investidas.

    Finalmente, vale observar que a fixao de indenizao por danos morais no inibe a cumulao com indenizao pelos danos patrimoniais experimentados, como ocorre nos acidentes de trabalho e nos danos causados honra e imagem.

    Passemos ento ao roteiro que poder auxiliar na fixao.

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    6 FIXAO DO VALOR DA INDENIZAO

    6.1 Tipos de ofensa

    Ofensas fsicas: complexos e limitaes decorrentes de leses fsicas, privaes de liberdade e outras ofensas do gnero.

    Ofensas estticas: deformidades aparentes.Ofensas morais e psicolgicas: discriminao, assdios moral e sexual,

    ofensas intimidade, privacidade, honra e imagem, restries s liberdades de pensamento e crena e outras ofensas do gnero.

    6.2 Princpios da extenso do dano (integralidade da indenizao) e da proporcionalidade (ponderao, necessidade e adequao)

    Para efeito da fixao da indenizao segundo a extenso do dano e sua proporcionalidade, preciso estipular um valor bsico, a partir do qual incidiro as circunstncias destinadas a considerar os vrios aspectos inerentes ao poder ofensivo, seus efeitos e condio econmica do ofensor.

    Considerado que o valor mdio do salrio dos brasileiros, medido pelo IBGE, varia em torno de 3,3 salrios-mnimos (R$ 2.337,40), prope-se o clculo a partir de trs vezes a remunerao mensal do trabalhador, variando o resultado para mais ou para menos conforme a natureza da ofensa, o grau de culpa do ofensor, a concorrncia de culpa, a dor presumida da vtima, a reper-cusso do ato, a durao das consequncias, a originalidade ou reincidncia do ato e a possibilidade econmica do ofensor, sendo cada uma das variveis internas multiplicveis por 1, 1,5 ou 2, conforme o caso, cumulativamente, exceto quando atenuantes, hipteses em que sero divisveis por 1, 1,5 ou 2.

    6.2.1 Variveis em relao ao poder ofensivo

    a) a natureza da ofensa, segundo: a gravidade objetiva da ofensa (relevncia ou teor de bem jurdico

    atingido pequena, mdia e alta) (X 1, X 1,5 e X 2); a intensidade ou grau de culpa leve, mdia e grave (pargrafo nico

    do art. 945 do CC) (X 1, X 1,5 e X 2); a concorrncia de culpa (art. 945 do CC) (: 2).b) os efeitos da ofensa, considerados: a dor presumida da vtima (a intensidade ou grau do sofrimento, pri-

    vao ou humilhao pequena, mdia e alta) (X 1, X 1,5 e X 2);

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    repercusso do ato violador restrita e ampla (X 1 e X 2);

    a extenso e durao das consequncias da ofensa (permanncia ou temporalidade do dano possibilidade de superao fsica ou psicolgica da ofensa) passageira e duradoura (X 1 e X 2).

    c) as circunstncias da ofensa, considerados:

    originalidade ou reincidncia do ato violador (X 1 e X 2);

    retratao espontnea ou efetivo esforo para minimizar a ofensa ou leso e o perdo, tcito ou expresso presente e ausente (X 1 e : 2).

    6.3 Princpio da razoabilidade

    Fixado, pelos princpios da extenso e da proporcionalidade, o valor final ento submetido ao princpio da razoabilidade, para o ajuste do valor da indenizao ao caso concreto.

    Aqui ser avaliada a adequao da pena obtida, visando dupla finalidade (punitiva e pedaggica), hiptese em que, observado o dano produzido, sero mensurados, entre outros aspectos, a suficincia compensatria segundo as con-dies econmicas do ofensor e sua pertinncia para coibir futuras investidas, de modo a aumentar-se ou reduzir-se a indenizao (X 1,5 e X 2 ou : 1,5 ou : 2).

    6.4 Casos prticos

    Caso 1:

    Empresa de mdio porte resolve restringir a utilizao do banheiro pelos trabalhadores, para maximizar a produtividade. Imaginemos que o trabalhador perceba R$ 1.000,00 de remunerao mensal.

    Pena-base 3 X a remunerao R$ 3.000,00Gravidade objetiva da ofensa: intimidade pequena X 1Intensidade ou grau de culpa leve X 1Concorrncia de culpa ausente X 1Dor presumida pequena X 1Repercusso restrita X 1Extenso e durao passageira X 1Originalidade ou reincidncia originalidade X 1Tentativa de minimizao ausente X 1Total da indenizao R$ 3.000,00

    Fixado, pelos princpios da extenso e da proporcionalidade, o valor final revela-se reduzido para o atendimento dupla finalidade (punitiva e pe-

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    daggica), considerado o porte da empresa e a necessidade de se coibir futuras investidas, razo pela qual deve ser majorado para a quantia de R$ 6.000,00, razovel para a composio do dano.

    Caso 2:

    Trabalhador que sem equipamento de proteo ou instrues adequadas morre eletrocutado trabalhando para empresa de pequeno porte. Imaginemos que perceba R$ 1.000,00 de remunerao mensal.

    Pena-base 3 X a remunerao R$ 3.000,00Gravidade objetiva da ofensa: intimidade grande X 2Intensidade ou grau de culpa grave X 2Concorrncia de culpa ausente X 1Dor presumida alta X 2Repercusso restrita X 1Extenso e durao duradoura X 2Originalidade ou reincidncia originalidade X 1Tentativa de minimizao ausente X 1Total da indenizao R$ 48.000,00

    Fixado, pelos princpios da extenso e da proporcionalidade, o valor final para o atendimento dupla finalidade (punitiva e pedaggica), revela-se adequado, considerados o dano produzido, o porte da empresa e a necessidade de se coibir futuras investidas.

    Caso 3:

    Empresa de pequeno porte despede o trabalhador acusando-o de ato de improbidade, que vem a ser de conhecimento geral e que, depois verificada, infundada a acusao. Imaginemos que perceba R$ 1.000,00 de remunerao mensal.

    Pena-base 3 X a remunerao R$ 3.000,00Gravidade objetiva da ofensa: intimidade mdia X 1,5Intensidade ou grau de culpa grave X 2Concorrncia de culpa ausente X 1Dor presumida alta X 2Repercusso ampla X 2Extenso e durao passageira X 1Originalidade ou reincidncia originalidade X 1Tentativa de minimizao ausente X 1Total da indenizao R$ 36.000,00

    Fixado, pelos princpios da extenso e da proporcionalidade, o valor final revela-se elevado para o atendimento dupla finalidade (punitiva e pedaggica),

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    considerados o dano produzido, a necessidade de se coibir futuras investidas e o porte da empresa, posto que compromete a continuidade do empreendimento, razo pela qual deve ser reduzido para a quantia de R$ 12.000,00 (metade), razovel para a composio do dano.

    Caso 4:

    O trabalhador de empresa de mdio porte sofre doena profissional pelo no fornecimento de EPI, que resulta em reduo permanente da capacidade laborativa.

    Pena-base 3 X a remunerao R$ 3.000,00Gravidade objetiva da ofensa: intimidade grande X 2Intensidade ou grau de culpa grave X 2Concorrncia de culpa ausente X 1Dor presumida alta X 2Repercusso restrita X 1Extenso e durao duradoura X 2Originalidade ou reincidncia originalidade X 1Tentativa de minimizao ausente X 1Total da indenizao R$ 48.000,00

    Fixado, pelos princpios da extenso e da proporcionalidade, o valor final revela-se elevado para o atendimento dupla finalidade (punitiva e pedaggica), considerados o dano produzido, a necessidade de se coibir futuras investidas e o porte da empresa, pelo que deve ser reduzido para R$ 24.000,00 (: 1,5) ou R$ 32.000,00 (: 2), ficando a cargo do magistrado a dosagem equitativa.

    6.5 Reparao do dano moral coletivo

    Dano moral coletivo, nas relaes de trabalho, a leso aos valores extrapatrimoniais de uma comunidade de trabalhadores, por exemplo, a ofensa generalizada aos trabalhadores que tm determinada religio ou raa.

    Observa, com propriedade, Xisto Tiago de Medeiros Neto que a de-nominao dano moral coletivo imprecisa, eis que o termo moral est relacionado a sentimento e dor fsica ou psquica da pessoa humana, que no se ajusta s ofensas ensejadoras da responsabilidade pelos danos extrapatrimo-niais causados a comunidades. Prope, em substituio, a denominao dano extrapatrimonial coletivo12.

    12 Dano moral coletivo. 2. ed So Paulo:. LTr, 2007. p. 123-124.

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    Concordamos plenamente com a observao. O dano causado a valores extrapatrimoniais no necessariamente causa dor ou sofrimento, bastando dizer que a pessoa jurdica, que no ser humano e assim no possui sofrimento nti-mo, pode fazer jus a indenizao por danos morais compositivos de ofensa sua credibilidade. De igual sorte, no correto pensar em sofrimento de massa de trabalhadores. Individualmente, podem at sofrer com a ofensa cometida, mas no apropriado falar em angstia, aflio ou trauma psicolgico de co-letividade, o que no significa dizer que ela no possa ser atingida por ofensas de natureza extrapatrimonial ou fazer jus a composio do dano cometido.

    So inmeras as hipteses em que o empregador pode ofender, extrapatri-monialmente, grupos de trabalhadores: quando indiscriminadamente promove trabalho escravo, forado ou ainda de menores de 16 anos; quando, deliberada-mente, no cumpre as normas de segurana e medicina do trabalho, colocando em risco a sade vida do trabalhador; quando promove atos discriminatrios s mulheres, por exemplo, imposio de intervenes para esterilizao como condio de continuidade do vnculo; quando, de forma generalizada, promove causas simuladas para acordos de resciso ou a obteno, por ocasio e como condio da contratao, de assinaturas em branco em termos de quitao; quando discrimina por sexo, raa ou religio nas admisses; quando atinge grupo de trabalhadores por racismo ou preconceitos; quando o empregador pratica atos atentatrios da liberdade sindical ou do direito de greve; quando o empregador, de forma generalizada, no cumpre a legislao trabalhista, dei-xando de registrar os empregados e com esse procedimento no concede frias, no paga horas extras, gratificaes natalinas e demais direitos trabalhistas.

    Essas ofensas podem, conforme a hiptese, ferir interesses puros, que retratam situaes individuais, mas tambm, nos termos do art. 81, pargrafo nico, do CDC: a) interesses ou direitos difusos, assim entendidos, os transindi-viduais, de natureza indivisvel, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstncias de fato (interesses de pessoas dispersas, como ocorre com a empresa pblica que no realiza concurso para o preenchimento de quadro funcional, servindo-se de mo de obra terceirizada para o desen-volvimento de sua atividade-fim); b) interesses ou direitos coletivos, assim entendidos os transindividuais, de natureza indivisvel, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrria por uma relao jurdica base (interesses de pessoas determinadas, ligadas por laos associativos, como ocorre com o impedimento patronal ao exerccio do direito de greve); e, c) interesses ou direitos individuais homogneos, assim entendidos os que, embora individuais, so identificveis com os de outros trabalhadores na mesma situao, por terem origem comum (a partir de um s

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    ato patronal, a leso atinge um sem-nmero de trabalhadores, que podem agir coletivamente por lhes ser comum o interesse: um s interesse, o mesmo, os une, homogeneizando o direito, como ocorre no caso da alterao prejudicial de norma regulamentar de concesso de complementao de aposentadoria dos empregados de uma empresa).

    Os direitos individuais podem ser puros e homogneos. So puros os contidos em pleitos como reintegrao em virtude de gravidez, promoo, equiparao salarial e punies disciplinares, que retratam situaes individuais; so homogneos como ocorre com as diferenas salariais decorrentes de planos econmicos, as diferenas de FGTS decorrentes de expurgos inflacionrios, as decorrentes de descumprimento de norma coletiva e a alterao prejudicial de norma regulamentar de concesso de complementao de aposentadoria.

    O dano extrapatrimonial coletivo que atinge uma classe de trabalha-dores igualmente merecedor de tutela sob o enfoque das agresses a liber-dades no ambiente de trabalho, cabendo, na Justia do Trabalho, ao Ministrio Pblico, por meio da Ao Civil Pblica, na tutela dos interesses sociais ou difusos, individuais de incapazes e homogneos, a titularidade da ao visando ao provimento inibitrio e a compensao do prejuzo moral.

    Tambm o Sindicato pode promover a Ao Civil Pblica na defesa dos interesses individuais e coletivos da categoria, inclusive heterogneos (art. 8, III, da CF), assim como associaes profissionais (formalizadas) de trabalha-dores nas empresas.

    As aes pertinentes tm por fim inibir o ofensor, proteger a coletivi-dade contra investidas do gnero e buscar indenizao de natureza coletiva, sem prejuzo da responsabilidade pelos danos individualmente sofridos, caso da imposio de indenizao aos consumidores pela omisso de informaes sobre a periculosidade do produto ou da inibio prestao de trabalho es-cravo, forado ou prestado em ambiente que no oferece condies mnimas de segurana ou de higiene.

    No tocante aos interesses individuais homogneos, como o acionamento coletivo no inibe a ao individual, a legitimao extraordinria, atuando o legitimado coletivo em nome prprio, na defesa de interesse alheio e de forma concorrente. No concernente aos interesses difusos e coletivos, a legitimao no extraordinria e sim autnoma, posto que falece aos integrantes da co-munidade legitimao para agir13.

    13 MELO, Raimundo Simo de. Ao civil pblica na justia do trabalho. So Paulo: LTr, 2002.

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    No tocante aos danos morais coletivos, importante ressaltar que eles so autnomos em relao aos danos individuais. Pode no verificar-se indivi-dualmente, a exemplo do empregador que no cumpre a legislao trabalhista em relao aos seus empregados, mas verificar-se coletivamente, posto que esse procedimento fere, no plano coletivo, interesses metaindividuais, que ensejam reparao moral por ofensas a valores extrapatrimoniais de uma comunidade.

    Assim, embora o nmero de trabalhadores atingidos deva ser considerado, porque o dano atinge a comunidade, o clculo dano moral coletivo no resulta do somatrio de danos individuais, que podem at no existir.

    Importam, pois, para a fixao de indenizao comunidade, apenas a natureza do dano (com descarte dos efeitos e circunstncias do dano) e a considerao de uma percentagem de trabalhadores, de forma que, avaliado o porte da empresa, tenha efeito dissuasrio e pedaggico.

    Por exemplo, numa empresa com 3.000 trabalhadores, na qual o salrio mdio de R$ 1.000,00, a considerao do percentual de 20% dos trabalhado-res importar em indenizao de R$ 300.000,00, razovel para a composio do dano.

    No caso do dano moral coletivo, a indenizao deve ser revertida em benefcio da comunidade atingida, por exemplo, ao Fundo de Amparo ao Tra-balhador, e o provimento inibitrio deve ser proferido mediante o pagamento de astreintes, destinadas a compelir o ofensor a, imediatamente, fazer cessar o dano imposto comunidade.

    A indenizao fixada no impede a postulao de indenizao de natu-reza individual, acaso cabvel e acaso devida, eis que tm, ambas, titularidade, destinao e natureza distintas.

    7 CONCLUSES

    H direitos que integram o prprio homem e passam a ser objeto de tutela especfica, porque essenciais a uma existncia livre e valorizada, destinada a permitir-lhe, com igualdade de oportunidades, ter acesso aos bens da vida e efetiva e justa participao social e poltica. Tm por fundamento a dignidade da pessoa humana, sendo chamados, no plano constitucional, de direitos fun-damentais. Os arts. 5 a 12 da Constituio Federal os enumera, garantindo ao ser humano uma existncia integral.

    No plano infraconstitucional, os direitos subjetivos destinados a garantir, numa relao de trabalho, a integridade fsica, intelectual e moral do indivduo

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    costumam receber a denominao de direitos da personalidade. a mesma denominao que permeia as relaes civis, a exemplo dos arts. 11 a 21 do Cdigo Civil brasileiro.

    Os direitos da personalidade ingressam na categoria de direitos extrapa-trimoniais, destitudos, a priori, de avaliao econmica.

    Nas relaes de trabalho, podem ser apontados como direitos da per-sonalidade dos trabalhadores, entre outros, os direitos vida, integridade fsica, sade, ao trabalho, ao trabalho quantitativamente limitado, igualdade de tratamento, liberdade fsica, liberdade intelectual, intimidade, vida privada, ao sigilo das comunicaes, ao tratamento humano e respeitoso da condio pessoal e profissional, subsistncia, associao, inclusive sindical e de greve, e ao meio ambiente seguro e saudvel.

    A importncia da distino entre direitos econmicos e direitos extrapa-trimoniais est em que os danos a estes causados tm as violaes respectivas garantidas por tutela em que eventual aspecto econmico visa inibir as ofensas e/ou dar uma resposta que atenue o sofrimento imposto ao ser humano, surgindo, assim, os danos morais como meio compositivo dessas ofensas.

    Como decorrncia das ofensas a direitos econmicos no curso do con-trato de trabalho e do fato do seu rompimento com ou sem culpa , a lei in-fraconstitucional trabalhista tarifa as indenizaes acaso devidas, mas silencia a respeito da composio do dano moral derivado do desrespeito aos direitos personalssimos do trabalhador, ainda que intimidade, honra, imagem, integridade fsica e ao tratamento respeitoso do empregado se refira, expressa-mente, em algumas oportunidades (arts. 483, a, b, e e f, e 373-A, VI, da CLT, bem como no Anexo II da NR-17, itens 5.12 e 5.13).

    Em face do silncio da legislao trabalhista a respeito do tema, recorre-se ao direito comum, por fora do art. 8, pargrafo nico, da CLT. E o Cdigo Civil, nos termos do art. 944, caput e pargrafo nico, determina que a indenizao deve ser avaliada segundo os critrios da extenso ou integralidade do dano e da proporcionalidade da culpa em relao ao dano, critrio geral que pode ser utilizado na fixao do valor dos danos morais em pecnia.

    Nos termos do art. 944, caput e pargrafo nico, do Cdigo Civil, a indenizao deve ser avaliada segundo os critrios da extenso do dano, da gravidade da culpa em relao ao dano e da reduo equitativa da indenizao se houver desproporo.

    O primeiro critrio diz respeito ao princpio da integralidade. A inde-nizao deve ser integral, de sorte a compensar a ofensa e seus efeitos, mas,

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    para a investigao da ofensa e do dano por ela produzido, deve ser feita uma avaliao luz dos princpios da proporcionalidade e da razoabilidade contidos nos dois outros critrios mencionados na lei civil.

    Por meio do princpio da proporcionalidade far-se- a comparao entre o poder ofensivo do ato e efeitos por ele produzidos, para permitir, por meio da ponderao, a fixao de um valor adequado e necessrio para a composio do dano; por meio do princpio da razoabilidade, o valor antes encontrado ser ajustado s circunstncias do caso, observadas a suficincia compensatria segundo as condies econmicas do ofensor e a sua pertinncia para coibir futuras investidas.

    Esses so os critrios gerais que devem ser observados pelo magistrado na fixao da indenizao, ou seja, do valor compensatrio do dano moral.

    No entanto, ser preciso avaliar subitens internos aos critrios da gra-vidade da culpa em relao ao dano e do ajuste equitativo para a obteno de indenizao suficiente e razovel, contextualizada ao caso concreto.

    Cada um desses itens poder servir de atenuante ou agravante na fixao da indenizao14, mas para tornar possvel esse procedimento preciso estipular um valor bsico, a partir do qual incidiro as circunstncias destinadas a con-siderar os vrios aspectos inerentes ao poder ofensivo, seus efeitos e condio econmica do ofensor.

    Considerado que o valor mdio do salrio dos brasileiros, medido pelo IBGE, varia em torno de 3,3 salrios-mnimos (R$ 2.337,40), prope-se o clculo a partir de trs vezes a remunerao mensal do trabalhador, variando o resultado para mais ou para menos conforme a natureza da ofensa, o grau de culpa do ofensor, a concorrncia de culpa, a dor presumida da vtima, a reper-cusso do ato, a durao das consequncias, a originalidade ou reincidncia do ato e a possibilidade econmica do ofensor, sendo cada uma das variveis internas multiplicveis por 1, 1,5 ou 2, conforme o caso, cumulativamente, exceto quando atenuantes, hipteses em que sero divisveis por 1, 1,5 ou 2.

    Encontrada a indenizao base, far-se- finalmente o ajuste final, hi-ptese em que o magistrado poder adequar a pena obtida, aumentando-a ou reduzindo-a, visando dupla finalidade (punitiva e pedaggica), hiptese em que, observado o dano produzido, sero mensurados, entre outros aspectos, a suficincia compensatria segundo as condies econmicas do ofensor e a sua pertinncia para coibir futuras investidas.

    14 Embora o tarifamento seja desaconselhvel, a falta de critrios para a fixao e a respectiva demons-trao nas decises judiciais violam o princpio da motivao contido na Constituio Federal.

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    As tabelas apresentadas demonstram como, concretamente, calcular a indenizao devida.

    Quanto aos danos morais coletivos, autnomos em relao aos danos individuais, o clculo da indenizao no deve resultar do simples somatrio de danos individuais.

    Importam, pois, para a fixao de indenizao comunidade, apenas a natureza do dano (com descarte dos efeitos e circunstncias do dano) e a considerao de uma percentagem de trabalhadores, de forma que, avaliado o porte da empresa, tenha efeito dissuasrio e pedaggico.

    A indenizao deve ser revertida em benefcio da comunidade atingida, por exemplo, ao Fundo de Amparo ao Trabalhador, e a indenizao fixada no impede a postulao de indenizao de natureza individual, acaso cabvel e acaso devida, eis que tm, ambas, titularidade, destinao e natureza distintas.

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