seguranca publica e dh roger spode brutti

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 SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS ASPECTOS RELACIONAIS ENTRE SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS Por Roger Spode Brutti* 3. ASPECTOS RELACIONAIS ENTRE SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS Por meio dos órgãos de segurança pública, o Estado procura impor a ordem expendida no sistema legal. Referido proceder estatal atinge diretamente o direito de liberdade da pessoa humana, daí o cuidado que se deve observar pelo Poder Público no sentido de não serem violados os direitos mínimos inerentes à pessoa. Não se pode mais conceber uma estrutura policial similar à época da ditadura militar, onde se via o cidadão como um inimigo do Estado. Vale lembrar, por exemplo, que a Polícia Militar, em nosso país, foi criada por meio da união da Força Pública Estadual com a Guarda Civil, na oportunidade do Golpe de 64. Constituiu-se, assim, em numa milícia auxiliar do Exército, a fim de conter as manifestações populares e o movimento de guerrilha estimulado pelos ideais comunistas.  A realidade imposta pela ditadura militar no Brasil, onde eram públicos e notórios atos de abuso para com a dignidade da pessoa humana, deve ser relegada ao passado, servindo como paradigma de um modelo vencido e não mais desejado por uma sociedade evoluída. Percebendo-se que a atuação da segurança pública deve ser norteada pelos princípios atinentes aos Direitos Humanos, justamente, porque a atuação referida atinge os seres humanos, conclui-se, sem gris algum, que há patente relação entre segurança pública e Direitos Humanos. Em verdade, estes disciplinam a conduta daquela. Quanto mais afastada desses referidos princípios, mais próxima estará a atuação estatal do chamado abuso de poder. O Brasil, nessa linha de raciocínio, procurando esquecer o seu passado ostentado, mormente, pela ditadura militar, demonstra patente vontade em erradicar a tortura praticada por age ntes do Estado. Com efeito, a Constitu içã o Federal considera a tor tur a crime gra ve, imprescritível e insuscetível de graça ou anistia. Por outro lado, ainda, as Convenções da ONU e da OEA pela abolição da tortura foram ratificadas. Além disso, em abril de 1997, foi sancionada a Lei 9.455 a qual tipificou o crime de tortura. O aspecto relacional existente entre segurança pública e Direitos humanos encontra suporte, ainda, no fato de que, separando-se referidos institutos, ver-se-ia uma manifesta e nefasta crise no Estado moderno, ocasião em que se retornaria às características de um Estado Monárquico e Absolutista dos séculos XVII e XVIII, no qual o rei era o soberano e exercia a plenitude do poder sem nenhuma limitação de ordem constitucional. Com a teoria da vontade geral, voltada para os Direitos humanos, o exercício da soberania sai das mãos do monarca e passa para as mãos da nação.  A soberania, então, deixa de ter o seu caráter de “absolutismo” contra a pessoa

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  • SEGURANA PBLICA E DIREITOS HUMANOS

    ASPECTOS RELACIONAIS ENTRE SEGURANA PBLICA E DIREITOS HUMANOS

    Por Roger Spode Brutti*

    3. ASPECTOS RELACIONAIS ENTRE SEGURANA PBLICA E DIREITOS HUMANOS

    Por meio dos rgos de segurana pblica, o Estado procura impor a ordem expendida no sistema legal.

    Referido proceder estatal atinge diretamente o direito de liberdade da pessoa humana, da o cuidado que se deve observar pelo Poder Pblico no sentido de no serem violados os direitos mnimos inerentes pessoa.

    No se pode mais conceber uma estrutura policial similar poca da ditadura militar, onde se via o cidado como um inimigo do Estado.

    Vale lembrar, por exemplo, que a Polcia Militar, em nosso pas, foi criada por meio da unio da Fora Pblica Estadual com a Guarda Civil, na oportunidade do Golpe de 64. Constituiu-se, assim, em numa milcia auxiliar do Exrcito, a fim de conter as manifestaes populares e o movimento de guerrilha estimulado pelos ideais comunistas.

    A realidade imposta pela ditadura militar no Brasil, onde eram pblicos e notrios atos de abuso para com a dignidade da pessoa humana, deve ser relegada ao passado, servindo como paradigma de um modelo vencido e no mais desejado por uma sociedade evoluda.

    Percebendo-se que a atuao da segurana pblica deve ser norteada pelos princpios atinentes aos Direitos Humanos, justamente, porque a atuao referida atinge os seres humanos, conclui-se, sem gris algum, que h patente relao entre segurana pblica e Direitos Humanos. Em verdade, estes disciplinam a conduta daquela.

    Quanto mais afastada desses referidos princpios, mais prxima estar a atuao estatal do chamado abuso de poder.

    O Brasil, nessa linha de raciocnio, procurando esquecer o seu passado ostentado, mormente, pela ditadura militar, demonstra patente vontade em erradicar a tortura praticada por agentes do Estado. Com efeito, a Constituio Federal considera a tortura crime grave, imprescritvel e insuscetvel de graa ou anistia.

    Por outro lado, ainda, as Convenes da ONU e da OEA pela abolio da tortura foram ratificadas. Alm disso, em abril de 1997, foi sancionada a Lei 9.455 a qual tipificou o crime de tortura.

    O aspecto relacional existente entre segurana pblica e Direitos humanos encontra suporte, ainda, no fato de que, separando-se referidos institutos, ver-se-ia uma manifesta e nefasta crise no Estado moderno, ocasio em que se retornaria s caractersticas de um Estado Monrquico e Absolutista dos sculos XVII e XVIII, no qual o rei era o soberano e exercia a plenitude do poder sem nenhuma limitao de ordem constitucional.

    Com a teoria da vontade geral, voltada para os Direitos humanos, o exerccio da soberania sai das mos do monarca e passa para as mos da nao.

    A soberania, ento, deixa de ter o seu carter de absolutismo contra a pessoa

  • humana do pas, passando a caracterizar-se como sendo, um poder que juridicamente inconstratvel, pelo qual se tem a capacidade de definir e decidir acerca do contedo e da aplicao das normas, impondo-as coercitivamente dentro de um determinado espao geogrfico, bem como fazer frente a eventuais injunes externas.

    CONCLUSO

    Consoante se viu, a inseparabilidade relacional que h entre os institutos da segurana pblica e dos Direitos Humanos manifesta e irrefutvel.

    J no mais se concebe o barbarismo similar quele ocorrido nos tempos de outrora da ditadura militar.

    No que tange aos atos de abusos ocorridos nos dias de hoje, alm do fato de que as polcias em geral contam com ouvidorias e corregedorias atuantes, a legislao nacional ostenta penas pesadas a respeito.

    A preocupao governamental, alis, para com o assunto, mostra-se ainda mais patente, quando o Ministrio da Justia, por meio da SENASP, incentiva os integrantes dos rgos de segurana pblica a especializarem-se, junto a instituies de ensino superior, em Segurana Pblica e Direitos Humanos, por meio da concesso bolsas de estudos integrais.

    Dessa arte, v-se que, doravante, a segurana pblica no mais poder ser proferida sem que sejam tambm sugeridas, como integrantes do seu contedo, noes cristalinas a respeito dos principais tpicos atinentes matria dos Direitos Humanos.

    *Texto retirado de: BRUTTI. Roger Spode. Segurana Pblica e Direitos Humanos. Disponvel em: http://www.apriori.com.br/cgi/for/seguranca-publica-e-direitos-humanos-t6647.html. Acesso em 13/08/2008 s 13h.

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