liÇÕes de argumentaÇÃo jurÍdica...1« oi ia e prática da narrativa jurídica, teoria e...

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2a edição revista, atualizada e ampliada IC K ' FORENSE LIÇÕES DE ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA Da Teoria à Prática Alda da Graça Marques Valverde Néli Luiza Cavaiieri Fetzner Nelson Carlos Tavares Junior

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Page 1: LIÇÕES DE ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA...1« oi ia e Prática da Narrativa Jurídica, Teoria e Prática da Argumentação luririica e Teoria e Prática da Redação Jurídica, no curso

2a ediccedilatildeorevista atualizada

e ampliada

IC K FORENSE

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Da Teoria agrave Praacutetica

Alda da Graccedila Marques Valverde Neacuteli Luiza Cavaiieri Fetzner

Nelson Carlos Tavares Junior

Este livro representa uma parcela da vivecircncia da pesquisa e da paishyxatildeo dos autores pelo discurso jushy

riacutedico especificamente pela argumenshytaccedilatildeo juriacutedica Em razatildeo do progresso de seus alunos apoacutes a praacutetica de estrashyteacutegias de produccedilatildeo textual exaustivashymente desenvolvidas em sala de aula revelou-se necessaacuterio organizaacute-las e oferecer um conteuacutedo teoacuterico que fundamentasse tais estrateacutegias

Os trecircs autores jaacute possuem obras pushyblicadas a respeito do mesmo tema e colaboram na produccedilatildeo do material didaacutetico utilizado pelos alunos do Curshyso de Direito da Universidade Estaacutecio de SaacuteAssim eacute este livro instrumento dashyqueles que desejam mergulhar na fascinante arte de redigir uma argushymentaccedilatildeo juriacutedica

w w w e d i t o r a f o r e n s e c o m b r

LICcedilOtildeES DEARGUMENTACcedilAtildeOJURIacuteDICADa Teoria agrave Praacutetica

abdr^iacutejireito si(ora

GrupoEditorial ---------------------------------------------------------------------------------------------Nacional

0 GEN | Grupo Editorial Nacional reuacutene as editoras Guanabara Koogan Santos Roca AC Farmacecircutica Forense Meacutetodo LTC EPU e Forense Universitaacuteria que publicam nas aacutereas cientiacutefica teacutecnica e profissional

Essas empresas respeitadas no mercado editorial construiacuteram cataacutelogos inigualaacuteveis laquoltgtin obras que tecircm sido decisivas na formaccedilatildeo acadecircmica e no aperfeiccediloamento de v 1 1 iin I1oraccedilotildees de profissionais e de estudantes de Administraccedilatildeo Direito Enferma- (raquo1 ui I Hfeu liaria Fisioterapia Medicina Odontologia Educaccedilatildeo Fiacutesica e muitas outras igt iilt ir luido se tornado sinocircnimo de seriedade e respeito

v io eacute prover o melhor conteuacutedo cientiacutefico e distribuiacute-lo de maneira flexiacutevel e1 nurim iiic i preccedilos justos gerando benefiacutecios e servindo a autores docentes livrei- III Iiiik ioiiii ios colaboradores e acionistas

I Jovo comportamento oacutetico incondicional e nossa responsabilidade social e ambiental ugt iclorccedilados pela natureza educacional de nossa atividade sem comprometer o cres- i imento contiacutenuo e a rentabilidade do grupo

Alda da Graccedila Marques Valverde Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner

Nelson Carlos Tavares Junior

LICcedilOtildeES DEARGUMENTACcedilAtildeOJURIacuteDICADa Teoria agrave Praacutetica

CoordenadoraNeacuteli Luiza Cavalieri Fetzner

2o ediccedilatildeorevista atualizada

e ampliada

Rio de Janeiro

OCc 33amp33

A EDITORA FORENSE se responsabiliza pelos viacutecios do produto no que concerne agrave sua ediccedilatildeo aiacute compreendidas a impressatildeo e a apresentaccedilatildeo a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseaacute-lo e lecirc-lo Os viacutecios relacionados atilde atualizaccedilatildeo da obra aos conceitos doutrinaacuterios agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas e referecircncias indevidas satildeo de responsabilidade do autor eou atualizadorAs reclamaccedilotildees devem ser feitas ateacute noventa dias a partir da compra e venda com nota fiscal (interpretaccedilatildeo do art 26 da Lei n 8078 de 11091990)

Direitos exclusivos para o Brasil na liacutengua portuguesa Copyright copy 2013 byEDITORA FORENSE LTDAUma editora integrante do GEN | Grupo Editorial NacionalTravessa do Ouvidor 11 - Teacuterreo e 6o andar - 20040-040 - Rio de Janeiro - RJ Tel (0XX21) 3543-0770 - Fax (0XX21) 3543-0896 forensegrupogencombr | wwwgrupogencombr

O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida divulgada ou de qualquer forma utilizada poderaacute requerer a apreensatildeo dos exemplares reproduzidos ou a suspensatildeo da divulgaccedilatildeo sem prejuiacutezo da indenizaccedilatildeo cabiacutevel (art 102 da Lei n 9610 de 19021998)Quem vender expuser agrave venda ocultar adquirir distribuir tiver em depoacutesito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude com a finalidade de vender obter ganho vantagem proveito lucro direto ou indireto para si ou para outrem seraacute solidariamente responsaacutevel com o contrafator nos termos dos artigos precedentes respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reproduccedilatildeo no exterior (art 104 da Lei n 961098)

Liccedilotildees de argumentaccedilatildeo juriacutedica da teoria agrave praacutetica coordenadora Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner autores Alda da Graccedila Marques Valverde Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner Nelson Carlos Tavares Junior - Rio de Janeiro Forense 2013

Inclui bibliografia ISBN 978-85-309-4538-1

1 Direito - Linguagem 2 Linguagem e loacutegica 3 Redaccedilatildeo forense 4 Praacutetica forense I Fetzner Neacuteli Luiza Cavalieri 1948- II Valverde Alda da Graccedila Marques III Tavares Junior Nelson Carlos 1977-

07-3431 CDD 34014

Capa Danilo Oliveira2-WAuml-7A)3

L679

CDU 340113

COORDENADORA E AUTORA

Neacuteli Luiz Cavalieri Fetzner eacute mestre em Educaccedilatildeo pela Universidade I iraquocio de Saacute Doutoranda em Anaacutelise de Discurso Psicopedagoga Ex- holessora da PUC Professora da Escola da Magistratura do Estado do

llt Kgt (Ir Janeiro (EM ER J) Coordenadora de Metodologia da Pesquisa e Di-bull Lii ii i da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro (EM ER J) Orientadora ltI pesquisas cientiacuteficas na UNES e na EM ER J Coordenadora de Oficinas I- I citura para professores do curso de Direito na Universidade Estaacutecio de -i I -professora do ensino meacutedio e de vestibular na rede particular de en- iiio I lx-professora do Curso de Letras da UNESA Membro da Comissatildeo

Ir Oiialiiacuteicaccedilatildeo e Apoio Didaacutetico-Pedagoacutegico na Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Coordenadora-geral e Professora Titular das disciplinas 1laquo oi ia e Praacutetica da Narrativa Juriacutedica Teoria e Praacutetica da Argumentaccedilatildeo luririica e Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica no curso de Direito daI NI SA Possui artigos publicados em revistas juriacutedicas e eletrocircnicas so- Ihv Anaacutelise de Discurso Liacutengua Portuguesa Teorias da Interpretaccedilatildeo e Ar- rumentaccedilatildeo Juriacutedica E autora de vaacuterias obras de Liacutengua Portuguesa e de Ifoi ii da Argumentaccedilatildeo Juriacutedica

1

AUTORES

A Ida da Graccedila Marques Valverde Graduada e licenciada em Letras I In I inivcrsidade Santa Uacutersula (USU) Especialista em Liacutengua Portuguesa I l i I Inivorsidade do Estado do Rio de Janeiro (U ER J) Mestre em Liacutengua li Iiipursn pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Ex-coordenadorabull I I iiipua Portuguesa do Coleacutegio Santa Rosa de Lima Ex-professora do tniMiio limdamental do Coleacutegio Santo Amaro Ex-corretora das bancas de s IiluI n da Universidade Federal do Rio de Janeiro (U FR J) e da Univer- nldiulr do Rio de Janeiro (UN IRIO ) Professora de Portuguecircs Juriacutedico daI bull I iacutei da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J) Professorabull In bull uio dc Direito da Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) onde lecionabull bull lifit iplinas de Teoria e Praacutetica da Narrativa Juriacutedica Teoria e Praacutetica da iiiimrntaccediluumliacuteo Juriacutedica e Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica Coautora i ii ui mi ii dc outros livros da aacuterea juriacutedica

Nelson Carlos Tavares Junior graduado e licenciado em Letras l lii I Inivcrsidade Federal do Rio de Janeiro (UFR J) Mestre em LetrasI I i iir Vernaacuteculas) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFR J) Mm lu irl em Direito pela Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Graduan- i bull m Ivdagogia pela Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Ex-professorbull In firinos fundamental e meacutedio Atualmente eacute professor da UNESAbull lii I m ola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J) da Poacutes- riiitlimccedillo em Direito e de diversos cursos preparatoacuterios para concursos

bull bulliiii-ioi das bancas de vestibular do ENEM do ENADE e de concursos liililiroN Dedica-se a questotildees inerentes agrave linguagem juriacutedica e agrave formaccedilatildeobull I 1111gt11 sores do Curso de Direito Ministra as disciplinas Liacutengua Portu- |ibull i Niacuteirrativa Juriacutedica Argumentaccedilatildeo Juriacutedica Redaccedilatildeo Juriacutedica Me- iHilnlii|-ia da Pesquisa e Didaacutetica do Ensino Superior Possui vaacuterios artigos piililn idos Coautor tambeacutem dos livros Liccedilotildees de Gramaacutetica Aplicadas ao Ulsquola luridico Interpretaccedilatildeo e Produccedilatildeo de Textos Aplicadas ao Direito e iiiiiIi i c Espiritismo assuntos atuais e questotildees polecircmicas Atualizador llr 1ortuyjiecircs no Direito

APRESENTACcedilAtildeO

Sabemos que argumentar representa para a aacuterea juriacutedica uma exishygecircncia profissional especiacutefica Argumentar constitui um preacute-requisito funshydamental para o processo de formaccedilatildeo em qualquer das carreiras juriacutedicas O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo em documento referente ao desenvolvishymento das habilidades necessaacuterias agrave formaccedilatildeo juriacutedica destaca como prioshyridade a leitura criacutetica a interpretaccedilatildeo e a escrita

Participamos de um movimento dentro e fora do Poder Judiciaacuterio que vem estabelecendo como mais um fator decisivo da melhor prestashyccedilatildeo jurisdicional o que aqui eacute chamado de habilidade para ldquo saber dizer o Direitordquo uma demanda extensiva a advogados defensores procuradores promotores juizes e desembargadores

Em outras palavras hoje a Liacutengua Portuguesa de uso juriacutedico estaacute posshyta em questatildeo por seus proacuteprios usuaacuterios Muitos deles - por sua vez - tecircm procurado conferir a essa modalidade de uso uma nova expressividade que recusa entre outros aspectos a retoacuterica vazia o vocabulaacuterio erudito e tortuoshyso agrave inteligibilidade ou o emprego de jargotildees e clichecircs envelhecidos e sem qualquer funccedilatildeo a natildeo ser eacute claro a de acumular a poeira do tempo

Com base nessas novas molduras e demandas que circunscrevem a complexidade da escrita e da argumentaccedilatildeo dos profissionais da aacuterea juriacuteshydica um novo (re)encontro com a teoria da argumentaccedilatildeo eacute fundamental Um texto consequente como deve ser o juriacutedico exige do seu redator aleacutem da observacircncia dos aspectos teacutecnicos proacuteprios de cada peccedila redacio- nal - peticcedilatildeo inicial contestaccedilatildeo agravo de instrumento sentenccedila acoacuterdatildeo

o domiacutenio das ferramentas linguiacutesticas que datildeo forma e comunicabilida- de aos conteuacutedos Natildeo haacute texto bem produzido sem o manejo consciente dos instrumentos que a liacutengua disponibiliza

Sabendo das especificidades da produccedilatildeo de peccedilas processuais os autores reapresentam aqui a teoria da argumentaccedilatildeo de maneira didaacutetica acessiacutevel

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Nessa perspectiva parabenizo os autores por mais este livro que daacute continuidade agraves Liccedilotildees de gramaacutetica aplicadas ao texto juriacutedico por estabelecerem outro acordo com o estudo da produccedilatildeo dos textos juriacutedishycos com vistas a uma dinamizaccedilatildeo de suas orientaccedilotildees e prescriccedilotildees de modo a tornar a redaccedilatildeo do texto juriacutedico mais consistente e em conforshymidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito que presshysupotildee aleacutem da capacitaccedilatildeo teacutecnica a habilidade de tornar comunicaacutevel a sua accedilatildeo profissional

Desembargador Seacutergio Cavalieri FilhoEx-Presidente do Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro

Ex-Diretor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de JaneiroProcurador-Geral do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro

PREFAacuteCIO

Oportuna e relevante eacute a publicaccedilatildeo destas Liccedilotildees de argumentaccedilatildeo juriacutedica da teoria agrave praacutetica sobretudo porque realizada por um grupo de professores que haacute alguns anos se dedica agrave formaccedilatildeo de futuros profissioshynais do Direito Trata-se pois de uma obra cuja autoridade nasce da praacutexis e da sensibilidade pedagoacutegica de seus autores

Sem qualquer reducionismo a simplicidade da abordagem e a orgashynizaccedilatildeo teoacuterica didaticamente acessiacutevel atestam natildeo apenas a propriedade dos autores no tratamento da mateacuteria mas tambeacutem a pertinecircncia de seu estudo como preacute-requisito fundamental a qualquer das carreiras juriacutedicas

Que estas Liccedilotildees representem o anuacutencio e a promessa de novas e sempre necessaacuterias liccedilotildees destinadas agrave construccedilatildeo da qualidade dos texshytos juriacutedicos

Dr Andreacute Cleoacutefas Uchocirca CavalcantiJuiz de Direito

Nota da Editora o Acordo Ortograacutefico foi aplicado integralmente nesta obra

SUMAacuteRIO

INTRODUCcedilAtildeO 1

CAPIacuteTULO I - TEO RIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTONO ESPACcedilO E NO T EM PO 3

11 A proposta positivista 412 Criacuteticas agrave loacutegica formal e agrave doutrina positivista 813 Demonstraccedilatildeo e argumentaccedilatildeo 914 A relevacircncia da argumentaccedilatildeo para o Direito 13

CAPIacuteTULO II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTO S A SER shyVICcedilO DA ARGUM ENTACcedilAtildeO 17

21 A contribuiccedilatildeo do texto narrativo para a argumentaccedilatildeo 2022 A contribuiccedilatildeo do texto descritivo para a argumentaccedilatildeo 2423 O texto dissertativo 28

CAPIacuteTULO I I I - ALGUM AS Q UESTOtildeES TEOacute RICAS SO BRE AARGUM ENTACcedilAtildeO 31

31 A argumentaccedilatildeo e a retoacuterica claacutessica 3132 As noccedilotildees de auditoacuterio polifonia e intertextualidade 3233 A argumentaccedilatildeo e o processo de produccedilatildeo de textos juriacutedicos 3434 Gramaacutetica e produccedilatildeo do texto argumentative 4235 Argumentaccedilatildeo e Teoria Tridimensional do Direito 45

XIV LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

CAPIacuteTULO IV - PLAN EJAM EN TO DO TEXTO ARGUMENTA- TIVO JU R IacuteD IC O 51

41 Situaccedilatildeo de conflito 5242 Tese 5643 A contextualizaccedilatildeo do real 5844 Hipoacuteteses 6345 Anaacutelise desse planejamento em sentenccedila e acoacuterdatildeo 64

451 Sentenccedila 65452 Acoacuterdatildeo 73

CAPIacuteTULO V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 85

51 Seleccedilatildeo e organizaccedilatildeo das ideias argumentativas 8552 Fundamentaccedilatildeo simples e fundamentaccedilatildeo complexa 9553 Tipos de argumento 97

531 Introito100532 Argumento proacute-tese103533 Argumento de autoridade106534 Argumento de oposiccedilatildeo113535 Argumento de analogia115536 Argumento de causa e efeito122537 Argumento de senso comum126538 Argumento a d ho minem128539 Argumento a fortiori 1305310 Argumento por absurdo1325311 Argumento de fuga133

54 O uso da deduccedilatildeo e induccedilatildeo na produccedilatildeo dos argumentos134

CAPIacuteTULO V I - PR IN C IacutePIO S G ERA IS DO D IREITO E A FORshyM ULACcedilAtildeO DOS ARGUM EN TO S 147

61 Princiacutepios gerais do direito e regras147611 Os valores morais147

SUMAacuteRIO XV

612 Os valores eacuteticos 148613 Diferenccedilas entre princiacutepios e regras149

62 A relevacircncia norteadora dos princiacutepios agrave formulaccedilatildeo dos argumentos 15163 Organizaccedilatildeo hieraacuterquica de algumas fontes do Direito na estrutura ar-

gumentativa razoabilidade princiacutepios lei doutrina e jurisprudecircncia 156631 Proposta 157632 Comentaacuterio159

CAPIacuteTULO V II - FIGURAS DE RETOacute R IC A 16171 Por que o estudo das figuras retoacutericas 16172 O efeito persuasivo das figuras de retoacuterica16373 Figuras retoacutericas muito utilizadas no discurso juriacutedico165

731 Figuras de palavras1657311 Figuras de ritmo e de som1657312 A etimologia 167

732 Figuras de sentido1677321 Metoniacutemia1687322 Metaacutefora1707323 Hipeacuterbole1707324 Eufemismo1717325 Paradoxo1727326 Antiacutetese 1737327 Personificaccedilatildeo174

733 Figuras de construccedilatildeo 1757331 Inversatildeo1757332 Quiasmo1767333 Reticecircncias1767334 Repeticcedilatildeo1777335 Gradaccedilatildeo178

734 Figuras de pensamento 1787341 Ironia 179

XVI LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

7342 Pretericcedilatildeo1807343 Prolepse 181

CAPIacuteTULO V III - PA REC ER TEacuteCN ICO -JUR IacuteD ICO 183

81 A estrutura de um parecer juriacutedico teacutecnico-formal 18382 Ementa 18883 Relatoacuterio 19184 Fundamentaccedilatildeo 19385 Conclusatildeo 19486 Exemplo de parecer teacutecnico-juriacutedico19587 Esquema da disposiccedilatildeo das partes do parecer teacutecnico-juriacutedico 198

CAPIacuteTULO IX - EX ER C IacuteC IO S 201

B IBL IO G R A FIA 259

INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que a disciplina Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou nos uacuteltimos anos contornos cada vez mais claros Os Cursos de Direito no paiacutes inteiro comeccedilaram a inserir em seus curriacuteculos uma disciplina de fundamento cuja finalidade eacute aprofundar o estudo das teacutecnicas e das estrateacutegias de pershysuasatildeo agrave disposiccedilatildeo de quem lida com a produccedilatildeo das peccedilas processuais- de peticcedilotildees iniciais a sentenccedilas

O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e Cultura (M EC) e a Associaccedilatildeo dos Magistrados do Brasil (A M B) tecircm incentivado a implementaccedilatildeo dessa disciplina no iniacutecio do Curso de maneira a favorecer uma melhor formashyccedilatildeo humaniacutestica e reflexiva aos estudantes de Direito acerca das temaacuteticas que essa disciplina enfrenta cotidianamente o que de fato tem se observashydo em vaacuterios cursos de Direito e nas escolas de formaccedilatildeo como na Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J)

Portanto natildeo haacute duacutevidas de que a argumentaccedilatildeo deixou de exercer papel secundaacuterio e hoje funciona como premissa fundamental de todo aquele que pretende obter sucesso nas lides em que atua Por essa razatildeo debruccedilamo-nos agrave busca de meacutetodos que didaticamente organizados ofeshyreccedilam teacutecnicas e estrateacutegias para a produccedilatildeo de um texto argumentativo competente natildeo apenas do ponto de vista da persuasatildeo mas tambeacutem do domiacutenio de estruturas de raciociacutenio loacutegico coeso e coerente

Enfatiza-se tambeacutem a relevacircncia do conhecimento conceituai ofereshycido na primeira parte da obra sobre a teoria da argumentaccedilatildeo a fim de que se possa instrumentalizar os profissionais da aacuterea juriacutedica Lembramos as ideias de Aristoacuteteles que tatildeo bem sinalizam nossos sentimentos Segundo ele a linguagem juriacutedica eacute a arte de convencer e comover atraveacutes de proshyvas fatos e argumentos

Capiacutetulo I

TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

A proposta dos autores deste livro eacute oferecer aos graduandos e aos profissionais do Direito um instrumento de qualificaccedilatildeo da atividade que desenvolvem Aos alunos dos periacuteodos iniciais do Curso de Direito entreshygamos uma obra didaacutetica de leitura acessiacutevel pois um dos entraves que enfrentam na leitura inicial das obras que tratam de importantes teorias da sua aacuterea - tal como ocorre com a Teoria da Argumentaccedilatildeo - eacute a falta de reshypertoacuterio que gabarite uma reflexatildeo ampla e natildeo ingecircnua desses conteuacutedos

Aos formandos dessa mesma aacuterea e aos jaacute advogados promotores defensores juizes procuradores esperamos auxiliar na qualificaccedilatildeo e na reflexatildeo criacutetica sobre a produccedilatildeo de sentido nas peccedilas redigidas Sabemos que mesmo sendo detentores de enorme repertoacuterio juriacutedico muitos satildeo levados agrave reproduccedilatildeo de valores e de ideias jaacute cristalizados pela ciecircncia juriacutedica

O profissional que deseja manter-se em sintonia com a tendecircncia contemporacircnea de consolidaccedilatildeo dos direitos fundamentais pela via princi- pioloacutegica por exemplo necessita para argumentar a favor de novas teses- sem descurar da teacutecnica e da consistecircncia persuasiva - de raciociacutenio juriacutedico coesatildeo e coerecircncia entre as ideias que constituem o texto domiacuteshynio de estrateacutegias inteligentes de convencimento e adaptaccedilatildeo aos diversos auditoacuterios a que se dirigem tais profissionais

Enfim para adotar um novo posicionamento juriacutedico diante de quesshytotildees ineacuteditas ou de temas jaacute aparentemente consolidados eacute necessaacuterio reushynir mais do que vontade torna-se imprescindiacutevel ter fluecircncia no manejo de todas essas ferramentas linguiacutesticas e discursivas que favorecem alcanccedilar os objetivos pretendidos

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Sabemos que essa eacute uma demanda a qual constatamos tanto na grashyduaccedilatildeo quanto nos cursos preparatoacuterios e nas escolas de formaccedilatildeo

A sistematizaccedilatildeo do estudo da Teoria da Argumentaccedilatildeo foi apresenshytada inicialmente por Chaim Perelman e L Olbrechts-Tyteca em 1958 na obra La Nouvelle Rheacutetorique Traiteacute de 1rsquoArgumentation Os autores sustentaram que eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo de uma praacutetica da razatildeo agraves ciecircncias sociais e humanas das quais se pode citar o Direito Para isso apoiaram-se principalmente em autores como Aristoacuteteles Ciacutecero e Quintiliano

Antes de enfocar a proposta perelmaniana propriamente dita faz-se necessaacuterio compreender um pouco do contexto cultural histoacuterico e poliacutetico que a motivou e lhe serviu de berccedilo Natildeo pretendemos esgotar a reflexatildeo necessaacuteria a essa tarefa mas apenas sugerir algumas informaccedilotildees que facishylitem a compreensatildeo dos natildeo iniciados no tema

Comecemos pela afirmaccedilatildeo de que o ensino de Direito no Brasil funshydou suas raiacutezes em forte influecircncia do chamado Positivismo juriacutedico1 Por essa razatildeo antes de iniciar uma abordagem sobre a argumentaccedilatildeo faz-se necessaacuterio investigar com mais cuidado o que representa esse sistema deshynominado Positivismo que se mostra superado mas que tatildeo intensamente influenciou as bases da Teoria da Argumentaccedilatildeo

11 A PRO PO STA PO S IT IV IST A

Historicamente situada a doutrina positivista ganhou forccedila a partir da segunda metade do seacuteculo X IX Suas bases desenvolveram-se na conshyfianccedila de que o progresso somente seria possiacutevel se pautado na teacutecnica e na ciecircncia Assim sendo propunham os positivistas uma reforma completa da sociedade de maneira a que a ordem fosse alcanccedilada soberanamente

Assinala Maria Helena Diniz que ldquoo Positivismo socioloacutegico adveio da teoria de Augusto Comte que pretendeu realizar por meio da ciecircncia uma reforma social afirmando que a uacutenica ciecircncia capaz de reformar a sociedade eacute a sociologia () que era a ciecircncia positiva dos fatos sociais () Emile Durkheim continuando a obra de Comte pretendeu tambeacutem substituir a filosofia moral ou direito natural consishyderado aprioriacutestico e anti-histoacuterico pela ciecircncia positiva da origem e evoluccedilatildeo dos costumes sociais Logo a pressatildeo social seria a causa dos fenocircmenos humanos () O direito como fato social natildeo eacute simples produto da consciecircncia individual mas o resultado da consciecircncia coletiva O direito portanto por ser um fato social deve ser estudado pelo meacutetodo socioloacutegicordquo (DINIZ Maria Helena Compecircndio de introduccedilatildeo agrave ciecircncia do Direito Satildeo Paulo Saraiva 1988 p 92-93)

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 5

No campo do Direito acreditou-se que a ordem e a seguranccedila somenshyte seriam garantidas se a teacutecnica cooperasse na elaboraccedilatildeo de leis gerais cashypazes de antever os acontecimentos sociais sobre os quais o Estado deveria atuar Essa proposta prosperou porque a ciecircncia e seu rigor metodoloacutegico mostravam-se extremamente promissores nas soluccedilotildees de problemas que impediam o progresso

Com base nesses pressupostos eacute importante entender que para a dogmaacutetica juriacutedica tradicional os profissionais que atuam na soluccedilatildeo de conflitos levados ao Judiciaacuterio - em especial o juiz - deveriam encontrar o sentido do direito no sistema de normas escritas que regulam a vida social de um determinado povo em um dado momento histoacuterico

Essa crenccedila reforccedilava tambeacutem a ideia de seguranccedila juriacutedica uma vez que se as normas criadas pelo Estado eram conhecidas pela sociedade o seu descumprimento - em certas circunstacircncias - por um determinado sushyjeito que natildeo observou a conduta descrita deveria ser punido pelo Estado que lhe imporia uma sanccedilatildeo por tal descumprimento Ora como se acredishytava ter um sistema juriacutedico perfeito estava reforccedilada a tese de que havia plena seguranccedila juriacutedica

De acordo com os adeptos dessa teoria portanto a praacutetica juriacutedica deveria limitar-se agrave aplicaccedilatildeo objetiva das normas vigentes ao caso conshycreto que se pretendia analisar por meio de um meacutetodo previamente deshyterminado Esse meacutetodo caracterizava-se por uma operaccedilatildeo loacutegica em que competia ao juiz amoldar os acontecimentos da vida cotidiana ao suporte normativo eleito pelo Estado

Mas como essa operaccedilatildeo loacutegica era realizada Para a proposta poshysitivista caberia ao juiz desenvolver um raciociacutenio silogiacutestico para poder ldquodizer adequadamente o direitordquo Consiste o silogismo em apresentar trecircs proposiccedilotildees - premissa maior premissa menor e conclusatildeo - que se disshypotildeem de tal forma que a conclusatildeo deriva de maneira loacutegica das duas preshymissas anteriores como se exemplifica a seguir

O enunciado ldquomatar algueacutem pena de 6 a 20 anos de reclusatildeordquo foi previamente determinado pelo Estado como uma norma a ser seguida Esse fundamento legal deve ser encarado pois como uma premissa maior (PM ) Ao observar o caso concreto verifica o juiz que ldquo Joatildeo Alberto ma- tou Patriacutecio Mottardquo Essa segunda proposiccedilatildeo seraacute a premissa menor (Pm) do silogismo Ora se matar algueacutem gera como sanccedilatildeo o cumprimento da pena de reclusatildeo e se Joatildeo matou Patriacutecio chega-se agrave conclusatildeo (C) loacutegica de que deveraacute o acusado cumprir pena fixada pelo juiz dentro dos limites legais estabelecidos

Esquematicamente estruturado o silogismo pode ser assim representado

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Premissa Maior (PM) (= fundamento juriacutedico)

lt iacute = ^ gt

Premissa menor (Pm) (=fato do caso

concreto)

ldquoMatar algueacutemJoatildeo matou Patriacutecio

Conclusatildeo (C)

O reacuteu deve cumprir pena fixada pelo juiz

Resumidamente a aspiraccedilatildeo dos positivistas foi a de construir um sistema racional incontestaacutevel inspirado no meacutetodo utilizado por ciecircncias como a Matemaacutetica a Fiacutesica e a Astronomia Na matemaacutetica por exemshyplo eacute possiacutevel alcanccedilar conclusotildees verdadeiras ou previsiacuteveis a partir de premissas assumidas como tal pois a validade dessas eacute que determina a validade das conclusotildees desde que observadas as regras delimitadas pelo meacutetodo utilizado

Esse raciociacutenio parece bastante adequado mas natildeo se pode supor que todos os acontecimentos da vida social com repercussatildeo no mundo juriacutedico conseguiriam ser previstos com exatidatildeo pelo legislador ou mesmo que todos os casos em que um ato semelhante fosse praticado teriam necessashyriamente as mesmas consequecircncias juriacutedicas

Recentemente valores como ldquo funccedilatildeo socialrdquo ldquo dignidade da pessoa humanardquo ldquo boa-feacuterdquo entre outros reforccedilam que ldquo cada caso eacute um casordquo e portanto natildeo se pode dar tratamento sistemaacutetico paradigmaacutetico a situashyccedilotildees aparentemente semelhantes

A tiacutetulo de exemplo nem sempre que uma pessoa constroacutei sua resishydecircncia em terreno alheio estaacute de maacute-feacute E possiacutevel que a construccedilatildeo irreshygular tenha sido motivada por um equiacutevoco de quem executou a obra ou por uma leitura imprecisa da planta do terreno Enfim muitas justificativas podem ser aventadas para explicar a motivaccedilatildeo da praacutetica de uma conduta vedada pelo ordenamento juriacutedico Se assim o eacute natildeo seria justo que uma mesma conduta praticada por pessoas diferentes em contextos distintos fosse avaliada da mesma maneira pelo juiz

E paciacutefico hoje ser impossiacutevel criar um sistema juriacutedico perfeito infaliacutevel que preveja com exatidatildeo as especificidades que cada caso con-

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

ereto pode apresentar Tal maneira de conceber o Direito faz dele o que na realidade natildeo eacute uma ciecircncia estaacutetica imobilizada por um nuacutemero deshyterminado de regras que natildeo datildeo conta de organizar a conduta humana e viabilizar a paz social

Eacute fundamental - e isso tambeacutem eacute paciacutefico - que o contexto em que se deram os fatos as influecircncias que o motivaram o estado psicoloacutegico de quem praticou a conduta etc sejam tambeacutem considerados A ponderaccedilatildeo de tais situaccedilotildees portanto foge agrave previsibilidade de um sistema formal previamente concebido com precisatildeo absoluta Natildeo haacute enfim como transshypor as certezas matemaacuteticas para as ciecircncias de natureza humana e social tal como propunha Descartes2

Todas essas questotildees abordadas sugerem ser fundamental ao operashydor do direito ter condiccedilotildees de argumentar a favor de teses de receptividade minoritaacuteria no ordenamento juriacutedico paacutetrio

A fim de ilustrar tal raciociacutenio podemos citar a recente autorizaccedilatildeo do STF com o advento da ADPF n 54 para a realizaccedilatildeo do aborto de feto anencefaacutelico Como se sabe qualquer hipoacutetese diferente daquelas previsshytas no Coacutedigo Penal (feto concebido em decorrecircncia de estupro e perigo iminente de morte para a gestante) era rejeitada de pronto Se natildeo fosse a perseveranccedila de inuacutemeros advogados ao longo de tantos anos talvez a tese de antecipaccedilatildeo terapecircutica do parto em respeito agrave liberdade da mulher natildeo fosse aceita ateacute hoje

No mesmo sentido podem ser citados diversos outros temas tais como a aprovaccedilatildeo da uniatildeo entre pessoas do mesmo sexo e a proteccedilatildeo das minorias Existem ainda diversas situaccedilotildees juriacutedicas em que a tutela de direito ainda natildeo eacute reconhecida no Brasil A uacutenica saiacuteda para buscar a aplicaccedilatildeo justa da lei no sentido mais pleno exceto a alteraccedilatildeo legislatishyva - o que natildeo depende do Judiciaacuterio eacute a defesa eficiente de teses cuja argumentaccedilatildeo lhe serve de fundamento

Sustentamos que essa concepccedilatildeo de interpretaccedilatildeo da norma baseada apenas na leitura gramatical da letra da lei era adequada ao contexto hisshytoacuterico em que se desenvolveram o Positivismo Juriacutedico e a loacutegica formal Atualmente essa proposta natildeo mais pode ser aceita uma vez que se mostra insuficiente do ponto de vista filosoacutefico e metodoloacutegico para dar conta da praacutetica juriacutedica

A respeito veja DESCARTES Reneacute Discurso sobre o meacutetodo Traduccedilatildeo de Maacutershycio Pugliesi et alii Satildeo Paulo Hemus 1978

12 C R IacuteT IC A S Agrave LOacute G IC A FO RM AL E Agrave DO UTRINA PO SIT IV ISTA

Vimos que o cenaacuterio em que se desenvolveu a doutrina positivista era fruto do momento poliacutetico em que prevalecia forte tendecircncia autorishytaacuteria Exemplos dessa tendecircncia na poliacutetica eram o nazismo o fascismo as demais formas de autoritarismo e a poliacutetica de guerra-fria Por todas essas barbaridades cometidas a sociedade natildeo mais aceitou a intoleracircncia predominante

Relevante se faz ressaltar que essa transformaccedilatildeo no campo da poshyliacutetica estendeu-se tambeacutem para a Filosofia O uso cartesiano da razatildeo e uma loacutegica excessivamente matematizante precisavam dar lugar a outra postura a abertura para o diaacutelogo e a ponderaccedilatildeo das controveacutersias inerenshytes a todo fato social requisitos fundamentais dos Estados democraacuteticos emergentes

E importante salientar que a atmosfera de decepccedilatildeo com a loacutegica formal3 e a doutrina positivista impulsionou as pesquisas na aacuterea da argushymentaccedilatildeo na segunda metade do seacuteculo XX

A partir da proposta de mudanccedila de paradigma de razatildeo Chaiacutem Pe- relman4 insurge-se contra a ditadura cartesiana da evidecircncia o dogmatismo das ciecircncias e as reduccedilotildees positivistas Propotildee a Teoria da Argumentaccedilatildeo como alternativa entre a Loacutegica ateacute entatildeo vigente e a metodologia das Ciecircncias Humanas tidas como subjetivas e imprecisas

Perelman propocircs uma metodologia mais afinada com o tratamento dos problemas concretos trazidos ao Judiciaacuterio cm que a ponderaccedilatildeo dos valores- ateacute entatildeo relegada ao plano do irracional e da imprecisatildeo - possibilitava uma nova concepccedilatildeo de razatildeo que natildeo a formal mas a razatildeo praacutetica

Realmente tendo em vista o dinamismo dos eventos sociais obsershyva-se um permanente descompasso entre a norma e a realidade social Mais

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

3 Aristoacuteteles eacute considerado um dos principais precursores da loacutegica formal contrishybuiu para o desenvolvimento de uma teoria da demonstraccedilatildeo e do uso do silogisshymo

4 Participaram ainda dessa tendecircncia de revisatildeo da Epistemologia contemporacircnea autores como Bachelard Gadamer Lenk Ricoeur Habermas e muitos outros Resshypeitadas as diferentes orientaccedilotildees metodoloacutegicas a meta comum eacute a ampliaccedilatildeo do conceito de razatildeo As escolas hermenecircuticas alematilde italiana e francesa asseguraram agrave razatildeo ampliada um lugar importante na praacutetica filosoacutefica () Mais especificashymente no territoacuterio da Teoria da Argumentaccedilatildeo aleacutem de Perelman tambeacutem Toul- min Johnstone e Viehweg A semioacutetica tambeacutem ocupa lugar de destaque nesse processo na medida em que valoriza o aspecto pragmaacutetico da linguagem

um exemplo dessa realidade satildeo as sanccedilotildees a serem criadas para coibir os crimes ligados ao mau uso da internet

Enfim ressaltamos a importacircncia do estudo da Teoria da Argumentashyccedilatildeo sob o enfoque da proposta perelmaniana pois ela possibilitou uma mushydanccedila que nos parece fundamental ao passo em que o projeto cartesiano buscava a verdade ancorada na ideia de evidecircncia e na coerccedilatildeo Perelman propocircs alcanccedilar o verossiacutemil por meio da adesatildeo e do diaacutelogo O que o meacuteshytodo cartesiano demonstrativo formal faz pela coerccedilatildeo e pela violecircncia a argumentaccedilatildeo permite que se faccedila pela adesatildeo e pela democracia Anteveshymos o futuro do direito calcado em valores de fraternidade paz e justiccedila sem os quais o homem natildeo encontraraacute eco para a plenitude que almeja

Para melhor entender a proposta da Teoria da Argumentaccedilatildeo de Chaim Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca eacute importante contrapor a arshygumentaccedilatildeo agrave demonstraccedilatildeo tal como o fizeram os autores no Tratado da Argumentaccedilatildeo a Nova Retoacuterica5 Realizaremos semelhante tarefa no proacuteximo capiacutetulo

13 D EM O N STRACcedilAtildeO E ARG UM EN TACcedil AtildeO

Em primeiro lugar entendamos que demonstraccedilatildeo e argumentaccedilatildeo natildeo se ocupam de propostas distintas mas de procedimentos que se completam

Enquanto a demonstraccedilatildeo busca a verdade a argumentaccedilatildeo preocushypa-se com a adesatildeo do auditoacuterio ou seja a argumentaccedilatildeo eacute uma atividade praacutetica que tem por objeto o ldquoestudo das teacutecnicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentamrdquo 6 nas mais variadas atividades humanas

A demonstraccedilatildeo por outro lado eacute um meio de prova fundado na proposta de uma racionalidade matemaacutetica que visa a delimitar os passos a serem percorridos - isto eacute o meacutetodo si logiacutestico - para deduzir premissas de outras jaacute existentes desde que siga rigorosamente as regras estabelecishydas por um sistema formalizado

Assim a demonstraccedilatildeo opera-se por axiomas - premissas considerashydas evidentes e que por isso natildeo precisam ser comprovadas a argumenta-

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

Os autores tratam deste tema no sect 1 da obra PERELM AN Chaim Tratado da argushymentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 15-17

PERELM AN Chaim Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 4

10 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ccedilatildeo natildeo recorre aos axiomas mas agraves teses - proposiccedilotildees que precisam ser sustentadas pelo orador e cuja aceitaccedilatildeo dependeraacute de sua maior capacishydade de persuasatildeo7 - o que faz com que a Teoria da Argumentaccedilatildeo guarde dependecircncia mais evidente com a experiecircncia faacutetica

O que isso representa Bom se a demonstraccedilatildeo possibilita que alshygueacutem formalize um sistema cujas regras satildeo previamente delimitadas e controladas natildeo importaraacute em que contexto seja ele aplicado o resultado almejado sempre seraacute tido como verdade independente do momento histoacuteshyrico e do lugar em que for empregado

De maneira distinta o argumentador para alcanccedilar a adesatildeo de seu auditoacuterio natildeo pode desconsiderar a historicidade e a temporalidade em que se inserem seus destinataacuterios pois o contexto em que atua eacute determinante de quais valores prevalecem e de quais estrateacutegias satildeo acatadas com mais facilidade para alcanccedilar a permeabilidade com o auditoacuterio

A esse respeito pode-se dizer enfim que a demonstraccedilatildeo eacute impesshysoal e independe do meio em que eacute desenvolvida Isso natildeo ocorre com a argumentaccedilatildeo pois eacute exatamente o ldquo contato entre os espiacuteritosrdquo que legitishyma seu exerciacutecio

Eacute importante frisar que natildeo se pode depreender do que ateacute aqui foi dito que a demonstraccedilatildeo eacute um procedimento adstrito agraves ciecircncias exatas e naturais como a Matemaacutetica e a Fiacutesica E verdade que eacute nessa aacuterea do conhecimento que a demonstraccedilatildeo se desenvolve com mais propriedade mas haacute tambeacutem espaccedilo para o uso da demonstraccedilatildeo nas ciecircncias humanas e sociais

Perelman em nenhum momento nega a relevacircncia da racionalidade caracteriacutestica das ciecircncias exatas e naturais para a sua teoria O que ele sustenta eacute que o modelo de racionalidade promovido por esses ramos do conhecimento mostra-se insuficiente e redutor se aplicado agraves ciecircncias hushymanas e sociais Propotildee entatildeo que nessas aacutereas - tal como ocorre com o Direito - a demonstraccedilatildeo seja utilizada juntamente com a argumentaccedilatildeo

O que se pretende mostrar eacute que o argumentador para sustentar sua tese inuacutemeras vezes necessita de um conjunto de informaccedilotildees preacutevias (base probatoacuteria miacutenima) a partir do qual produziraacute seus argumentos Ou seja a demonstraccedilatildeo poderaacute ser utilizada a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

Imagine a situaccedilatildeo em que um advogado necessite comprovar o nexo de causalidade entre a conduta de uma construtora - que eacute acusada de agir

7 Para este trabalho natildeo importa discutir a distinccedilatildeo entre convencimento e persuashysatildeo A respeito veja PERELM AN Chaiacutem OLBRECIITS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 29

com negligecircncia na utilizaccedilatildeo de materiais considerados de baixa qualidashyde - e o desabamento de um edifiacutecio evento em que morreram vaacuterios moshyradores Natildeo haacute duacutevidas de que o argumentador soacute conseguiraacute convencer o julgador de que existe a responsabilidade civil do construtor se recorrer por exemplo a laudos produzidos por profissionais de aacutereas especiacuteficas da construccedilatildeo civil (engenharia de caacutelculo estrutural estudo do solo projeto arquitetocircnico etc)

Nesse sentido a argumentaccedilatildeo se serviraacute de pareceres de especialisshytas que demonstrem por exemplo que o ferro utilizado na sustentaccedilatildeo das colunas natildeo era adequado para suportar o peso esperado Repetimos que neste caso a demonstraccedilatildeo eacute necessaacuteria mas natildeo suficiente para evidenciar a culpa ela se coloca portanto a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

Veja que sem a evidecircncia da inadequaccedilatildeo do material natildeo haacute que se falar em responsabilidade civil ou em culpa por negligecircncia Por outro lado a mera produccedilatildeo da prova demonstrativa natildeo garante a condenaccedilatildeo do reacuteu Outras questotildees devem ainda ser discutidas existe algum fato sushyperveniente que alterou a condiccedilatildeo em que os caacutelculos iniciais foram realishyzados Isso deveria ser previsto pelos engenheiros e arquitetos que fizeram o projeto A execuccedilatildeo da obra pelos operaacuterios ocorreu conforme suas deshyterminaccedilotildees Outros pontos precisam ainda ser enfim investigados

Natildeo eacute por outra razatildeo que Perelman entende que a Teoria da Deshymonstraccedilatildeo deve ser completada pela Teoria da Argumentaccedilatildeo que estuda os raciociacutenios dialeacuteticos

Na verdade para formular uma teoria da argumentaccedilatildeo que admitisse o uso da razatildeo a fim de dirigir a proacutepria accedilatildeo e influenciar a dos outros foi necessaacuterio desconsiderar a ideia de evidecircncia como caracteriacutestica da razatildeo siacutembolo da teoria cartesiana Essa ideia segundo a qual toda prova seria reduccedilatildeo agrave evidecircncia e o que eacute evidente natildeo teria necessidade alguma de prova impunha uma limitaccedilatildeo agrave loacutegica

Perelman levou em conta a teoria da demonstraccedilatildeo cujo desenvolvishymento seguiu o pensamento de Leibniz - o qual considerava que mesmo o evidente necessitava de alguma prova Estabeleceu-se assim uma relaccedilatildeo direta com a teoria da argumentaccedilatildeo que soacute poderia desenvolver-se se a prova natildeo fosse concebida como reduccedilatildeo agrave evidecircncia

Como consequecircncia dessa visatildeo o objeto da teoria do autor eacute o estushydo das teacutecnicas discursivas que possibilitam provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentam agrave sua aprovaccedilatildeo Por outro lado o que caracteriza a adesatildeo dos espiacuteritos eacute a variabilidade de sua intensidade haacute diferentes graus de adesatildeo

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

12 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Paulo Roberto Soares Mendonccedila8 ao abordar as diferenccedilas entre a demonstraccedilatildeo e a argumentaccedilatildeo ressalta que o argumentador tem de ldquoneshygociarrdquo com seu auditoacuterio certas normas comuns que balizem uma boa argumentaccedilatildeo Ele natildeo estaacute falando necessariamente de normas vigentes mas de conteuacutedos que fazem parte do cotidiano do homem meacutedio e que satildeo implicitamente aceitos por todos (auditoacuterio universal) apesar de natildeo expressamente formuladas

Outro cuidado que o orador deve ter eacute com a utilizaccedilatildeo de uma linshyguagem comum ao longo de sua exposiccedilatildeo ela deve ser compreensiacutevel por todos os membros do auditoacuterio de maneira a favorecer um entendimento claro e objetivo do que se diz Quanto mais se exigem preacute-requisitos do interlocutor para entender o conteuacutedo da mensagem transmitida maiores satildeo as chances de natildeo se fazer entender O uso de uma linguagem simples objetiva acessiacutevel eacute fundamental a um argumentador que se dirige a um auditoacuterio universal Mas palavras de Chaiacutem Perelman ldquo o miacutenimo indisshypensaacutevel agrave argumentaccedilatildeo parece ser a existecircncia de uma linguagem em comum de uma teacutecnica que possibilite a comunicaccedilatildeordquo 9

O mesmo natildeo se pode dizer da demonstraccedilatildeo porque quem recorre a um raciociacutenio baseado na loacutegica formal tem a garantia de que seus interlocutores dominam a linguagem teacutecnica sobre a qual se desenvolveu pois a verdade construiacuteda utilizou-se de uma liacutengua artificial que lhe confere autoridade

Como vocecirc pocircde perceber adotamos o meacutetodo comparativo para mostrar as semelhanccedilas e distinccedilotildees entre a demonstraccedilatildeo e a argumenshytaccedilatildeo por acreditarmos que assim fique bastante claro quais satildeo as suas principais caracteriacutesticas Adiante temos as principais caracteriacutesticas de ambas esquematicamente organizadas

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

Meio de prova fundado na proposta de uma racionalidade matemaacutetica que visa

a delimitar os passos a serem percorridos (silogismo) para deduzir premissas de

outras jaacute existentes

Atividade que objetiva o ldquoestudo das teacutecshynicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves

teses que se apresentamrdquo

8 MENDONCcedilA Paulo Roberto Soares A argumentaccedilatildeo nas decisotildees judiciais Rio de Janeiro Renovar 2001

9 PERELM AN Chaiacutem OLBRECHTS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 17

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 13

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

Estabelece regras imutaacuteveis proacuteprias das ciecircncias exatas e naturais raciociacutenios

matemaacuteticos e analiacuteticos

Adota procedimentos flexiacuteveis proacuteshyprios das ciecircncias humanas e sociais

raciociacutenios dialeacuteticos - mais de uma tese - valores

Orador x auditoacuterioLoacutegica formal

Meacutetodo dedutivo (geral para o particular)

Loacutegica do razoaacutevel Meacutetodo indutivo

(particular para o geral)

Opera-se por axiomas Recorre agraves teses

Na aacuterea juriacutedica pode estar a serviccedilo da argumentaccedilatildeo - premissas

verdadeiras

Busca a adesatildeo dos espiacuteritos agrave tese apresentada - premissas verossiacutemeis

Silogismo loacutegico Premissa maior (PM) - norma Premissa menor (Pm) - fato

Conclusatildeo (C)

Entimema (tipo de silogismo dialeacutetico) Premissa menor (Pm) - fato

Premissa maior (PM) - norma Conclusatildeo (C)

Atemporal Histoacuterica e temporalUtiliza uma linguagem artificial teacutecnica Recorre a uma linguagem comum simshy

ples acessiacutevel que facilite a persuasatildeo

Natildeo haacute duacutevidas de que a argumentaccedilatildeo veio ocupar em determinashydas aacutereas do conhecimento o lugar que anteriormente foi preenchido pela demonstraccedilatildeo Mas ainda hoje a argumentaccedilatildeo exerce o mesmo papel de relevacircncia para o Direito

14 A R ELE V Acirc N C IA DA ARG UM EN TACcedilAtildeO PARA O D IR E IT O

Uma vez conhecidas as diferenccedilas entre Demonstraccedilatildeo e Argumenshytaccedilatildeo e suas implicaccedilotildees na produccedilatildeo do conhecimento nas diversas aacutereas um proacuteximo passo necessaacuterio seria verificar a relevacircncia da argumentaccedilatildeo como ferramenta de trabalho para o operador do Direito

Vivemos atualmente um paradoxo De um lado eacute fato que a discishyplina Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou nos uacuteltimos anos contornos cada vez mais claros Os Cursos de Direito no paiacutes inteiro comeccedilaram com maior ou menor rapidez a inserir em seus curriacuteculos uma disciplina autocircnoma cuja finalidade era aprofundar o estudo das teacutecnicas e das estrateacutegias de persuasatildeo agrave disposiccedilatildeo de quem lida com a produccedilatildeo das peccedilas processuais

14 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e Cultura (M EC ) e a Associaccedilatildeo dos Magistrados do Brasil (AM B) tecircm incentivado a implementaccedilatildeo dessa disciplina no iniacutecio do Curso de maneira a favorecer uma melhor formashyccedilatildeo humaniacutestica e reflexiva aos estudantes de Direito acerca das temaacuteticas que essa disciplina enfrenta cotidianamente

De outro lado eacute inquestionaacutevel que o advento da informaacutetica e a necessidade crescente de uma produccedilatildeo cada vez mais volumosa de peshyccedilas potencializaram o cenaacuterio em que a reproduccedilatildeo (e natildeo a produccedilatildeo) de conteuacutedos e de conhecimento se opere sem que haja a preocupaccedilatildeo com a utilizaccedilatildeo consciente da linguagem e de seus recursos argumentativos

Uma das importantes criacuteticas que se costuma fazer aos advogados na praacutetica forense aliaacutes eacute a redaccedilatildeo de peticcedilotildees iniciais extremamente longas com diversas citaccedilotildees de pertinecircncia duvidosa que apenas repetem desneshycessariamente um mesmo conteuacutedo acessado pela internet e largamente reshyproduzido Natildeo haacute na maioria das peccedilas produzidas uma seleccedilatildeo apurada e criteriosa de fontes que estejam a serviccedilo de uma proposta argumentativa

Os recursos ldquo recortarcopiarrdquo e ldquo colarrdquo oferecidos pelo editor de texto estimulam os estagiaacuterios de Direito a reproduzirem em suas peccedilas longos trechos de outras sem a preocupaccedilatildeo com a autenticidade e com as peculiaridades do caso sobre o qual se debruccedilam

Chega-se agrave situaccedilatildeo absurda de muitos profissionais terem uma coleshytacircnea de modelos armazenada em seu computador - peticcedilatildeo inicial sobre descumprimento de contrato sobre indenizaccedilatildeo por danos morais etc - que seraacute mecanicamente utilizada em qualquer outra situaccedilatildeo

Veja que a criacutetica aqui natildeo se dirige agrave proposta de usar o ldquo modelordquo como metodologia de ensino para o acadecircmico de Direito Esse procedishymento se faz muitas vezes necessaacuterio e quase sempre muito eficiente para algueacutem que ainda natildeo possui nenhuma referecircncia visual para uma peccedila de que somente ouviu falar e com a qual nunca travou qualquer contato

Ressalte-se tambeacutem que existem excelentes advogados que utilizam com propriedade a linguagem e que se recusam agrave simples subsunccedilatildeo do fato agrave norma positivada Com isso desenvolvem de maneira brilhante suas teses para o caso decidendo

A questatildeo aqui desenvolvida defende a concepccedilatildeo de que o ldquo modelordquo deva apenas servir como referecircncia para outras produccedilotildees autocircnomas em que o conteuacutedo acumulado pelo aluno seraacute utilizado de maneira consciente Isso ajudaraacute a entender que para produzir uma peticcedilatildeo inicial eacute necessaacuterio utilizar o conteuacutedo trabalhado em Direito Civil em Introduccedilatildeo ao Direito em Argumentaccedilatildeo Juriacutedica e em Processo Civil por exemplo

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 15

A coacutepia natildeo faraacute certamente com que consiga essa visatildeo orgacircnishyca e interdisciplinar que a ciecircncia juriacutedica exige de seus profissionais Ao contraacuterio estimula a percepccedilatildeo fragmentada e esteacuteril do direito Por essa razatildeo eacute que entendemos que natildeo haacute motivaccedilatildeo suficiente para a citaccedilatildeo de longos trechos de doutrina e de dezenas de fontes jurisprudenciais salvo sc se fizerem absolutamente necessaacuterias agrave sustentaccedilatildeo que o proacuteprio caso concreto exige para a persuasatildeo do magistrado

Outro fator acadecircmico relevante a considerar eacute a reduzida aprovashyccedilatildeo dos Bachareacuteis em Direito no Exame da Ordem O crescente rigor das bancas avaliadoras e a necessidade de frear o crecimento exponencial das Instituiccedilotildees de Ensino Superior tecircm sido fator determinante para que as Fashyculdades de Direito natildeo abram matildeo da qualidade de formaccedilatildeo acadecircmica e profissional de seus alunos

Portanto o paradoxo a que nos referimos anteriormente pode ser reshysumido da seguinte maneira ao mesmo tempo em que a Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou o status de disciplina autocircnoma e indispensaacutevel agrave formashyccedilatildeo do acadecircmico de Direito a modernidade impulsiona - por meio dos recursos computacionais - o redator agrave reproduccedilatildeo de um discurso pronto irrefletido e ineficiente do ponto de vista argumentativo

Em que pese a aparente contradiccedilatildeo natildeo haacute duacutevidas de que a arshygumentaccedilatildeo deixou de exercer papel secundaacuterio e hoje funciona como requisito fundamental de todo aquele que pretende obter sucesso nas lides cm que atua E ela um elemento diferencial entre os profissionais de qualishydade - altamente requisitados no mercado - e os que se limitam a sustentar apenas teses de menor complexidade

O reconhecimento da importacircncia da argumentaccedilatildeo para o Direito natildeo eacute recente jaacute em 1958 Perelman e L Olbrechts-Tyteca afirmavam na introduccedilatildeo do Tratado da Argumentaccedilatildeo que durante seacuteculos a argumenshytaccedilatildeo foi relegada a segundo plano porque as decisotildees judiciais natildeo precishysavam de fundamentaccedilatildeo A atividade jurisdicional do magistrado consistia na busca da decisatildeo justa para cada caso a ele apresentado Os criteacuterios que determinavam tal decisatildeo eram quase sempre imprecisos e subjetivos muitas vezes se confundiam com valores morais sem vinculaccedilatildeo necessashyriamente juriacutedica

No mesmo sentido Viacutetor Gabriel10 assinala que com o advento da necessidade de fundamentaccedilatildeo das decisotildees judiciais decorrente inclusive

111 RODRIacuteGUEZ Viacutetor Gabriel Argumentaccedilatildeo juriacutedica teacutecnicas de persuasatildeo e loacuteshygica informal 4 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2005 p 09

16 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

da separaccedilatildeo dos poderes e da possibilidade de muacutetuo ldquo controlerdquo entre eles passou-se a privilegiar mais intensamente ldquo a necessidade de construshyccedilatildeo do discurso dos processos escritos e da racionalizaccedilatildeo do processo de construccedilatildeo do Direitordquo

No iniacutecio de 1970 Chaim Perelman inseriu um curso de Argumenshytaccedilatildeo na Universidade de Bruxelas onde lecionou Essa proximidade hisshytoacuterica talvez ainda nos dificulte perceber a relevacircncia fundamental que a argumentaccedilatildeo tem para a atividade jurisdicional de um Estado Democraacutetishyco de Direito mas o tempo continuaraacute se encarregando de trazer os esclareshycimentos necessaacuterios agrave valorizaccedilatildeo adequada da teoria da argumentaccedilatildeo

Capiacutetulo II

NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

Em geral classificam-se os textos quanto agrave tipologia sob trecircs noshymenclaturas texto narrativo texto descritivo e texto dissertativo1

A primeira observaccedilatildeo relevante a fazer eacute que apesar de a classifishycaccedilatildeo ser didaticamente uacutetil raramente satildeo produzidos textos puramente narrativos descritivos ou dissertativos O que ocorre na verdade eacute uma classificaccedilatildeo que considera a predominacircncia das caracteriacutesticas de um tipo de produccedilatildeo textual em detrimento das demais menos evidentes mas natildeo menos importantes

Na praacutetica redacional de todo texto eacute extremamente comum por exemplo que uma narrativa seja permeada por trechos descritivos certas caracteriacutesticas descritas de uma cena de um objeto ou de uma pessoa enrishyquecem de detalhes de forma inquestionaacutevel os fatos narrados e fornecem material precioso para que essa narrativa possa ser valorada a partir dos interesses de quem conta a histoacuteria

1 Charaudeau (1983 e 1992) propotildee uma classificaccedilatildeo distinta O autor faz distinccedilatildeo entre tipos de textos e modos de organizaccedilatildeo do discurso Os primeiros vistos como um resultado satildeo o publicitaacuterio o noticioso o didaacutetico o cientiacutefico o juriacutedico etc os segundos encarados como um processo satildeo o descritivo o narrativo o argumentativo e o enunciativo Segundo ele as duas noccedilotildees natildeo devem ser confundidas pois embora haja em alguns casos certa relaccedilatildeo entre tipo de texto e determinado modo de orgashynizaccedilatildeo discursiva (vejam-se os editoriais e o modo argumentativo) cada tipo textual pode organizar-se discursivamente por meio de qualquer um dos modos E o que ocorre com textos didaacuteticos que se organizam de maneira tanto descritiva quanto argumenta- tiva ou com os textos de imprensa que dependendo do gecircnero privilegiam os modos descritivo e narrativo vindo o argumentativo somente como contraponto

18 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Da mesma maneira fundamentar um determinado ponto de vista exishyge do argumentador muitas vezes que alguns fatos motivadores de sua tese sejam narrados A descriccedilatildeo de determinadas condutas pode igualmenshyte colaborar para justificar a tese sustentada A uacutenica certeza enfim eacute que narraccedilatildeo descriccedilatildeo e dissertaccedilatildeo podem compor juntas um soacute texto e sua separaccedilatildeo soacute se justifica natildeo raro por razotildees acadecircmicas

Enquanto narrar consiste em evidenciar fatos experienciados e deshysenvolvidos em um determinado tempo e espaccedilo descrever caracteriza-se por deitar sobre o mundo um olhar estaacutetico localizando os elementos da descriccedilatildeo e atribuindo-lhes qualidades que os singularizam Apesar de se oporem (narraccedilatildeo e descriccedilatildeo) satildeo estritamente ligados pois as accedilotildees soshymente tecircm sentido com relaccedilatildeo agraves identidades e agraves qualificaccedilotildees de seus agentes E mais o modo descritivo natildeo apenas completa o narrativo - ou o dissertativo - mas daacute-lhes sentido

Para que essa relaccedilatildeo entre os textos fique mais clara observe um fragmento do relatoacuterio de um Recurso Especial2 ao Superior Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro Os nomes das partes foram alterados

RELATOacute RIO

O Exmo Sr Ministro Ceacutesar Marciacutelio Rocha Luiz Ignaacutecio da Costa Filho ora recorrido ajuizou accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por danos morais em face do Flospital Satildeo Miguel objetivando o recebimento de quantia equivalente a 2000 (dois mil) salaacuterios miacutenimos ldquo tendo em vista todo o sofrimento experimentado pelo autor desde o iniacutecio do sofrimento de seu filho advindo da malsucedida cirurgia que culminou na hemorrashygia interna causadora da morte do menorrdquo (f 05)O MM Juiacutezo Monocraacutetico julgou parcialmente procedente o pedido inishycial e condenou a reacute ao pagamento da importacircncia equivalente a 1000 (hum mil) salaacuterios miacutenimos agrave eacutepoca do efetivo desembolso Irresignados o Hospital Satildeo Miguel e a Associaccedilatildeo Satildeo Miguel instituiccedilatildeo filantroacutepica e sua mantenedora apelaram ao Eg Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro o qual por maioria negou provimento ao apelo ()

Sabe-se que o relatoacuterio eacute a parte da peccedila processual em que satildeo narshyrados cronologicamente todos os fatos juridicamente importantes do caso concreto em anaacutelise Isso quer dizer que esse texto deve ser puramente narshyrativo Jaacute indicamos que a ideia de ldquo texto purordquo quanto agrave tipologia textual eacute praticamente impossiacutevel e que o mais comum eacute a utilizaccedilatildeo de um tipo de

2 Texto adaptado Os nomes foram alterados por razotildees eacuteticas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 19

lexto para compor um outro que c predominante Eacute exatamente isso que ocorre no fragmento anteriormente lido

Observe que o trecho entre aspas extraiacutedo do relatoacuterio do RecursoI special acima eacute dissertativo ldquo tendo em vista todo o sofrimento expeshyrimentado pelo autor desde o iniacutecio do sofrimento de seu filho advindo da malsucedida cirurgia que culminou na hemorragia interna causadora da morte do menorrdquo O ponto de vista sustentado entretanto mostra-se extremamente necessaacuterio agrave narraccedilatildeo de uma peccedila em que o autor ajuiacuteza uma accedilatildeo objetivando receber indenizaccedilatildeo por danos morais Em outras palavras a motivaccedilatildeo da indenizaccedilatildeo pleiteada depende da valoraccedilatildeo (texshyto argumentativo) de alguns acontecimentos narrados

Natildeo soacute encontramos dificuldade em separar com clareza os trechos narrativos descritivos ou dissertativos do texto que compomos como tamshybeacutem desenvolvemos com esforccedilo a redaccedilatildeo de uma narraccedilatildeo imparcial sem sustentar - tenuamente que seja - uma opiniatildeo ou enfatizar uma cashyracteriacutestica descrita por concebecirc-la mais relevante

Na verdade nada impede afirmar por exemplo que a descriccedilatildeo do estado psicoloacutegico de uma pessoa cujo filho morreu por conta de negligecircnshycia meacutedica seja o recurso utilizado para persuadir o interlocutor de que o autor de uma accedilatildeo faz jus agrave indenizaccedilatildeo Essa interdependecircncia entre osI ipos de texto pode ocorrer na produccedilatildeo dos textos juriacutedicos como tambeacutem em qualquer outra produccedilatildeo escrita

Garantido o entendimento de que natildeo existe ldquo texto purordquo e que a classificaccedilatildeo dc alguns segmentos honestamente dependeraacute de criteacuterios muitas vezes subjetivos passemos agrave identificaccedilatildeo das principais caracteshyriacutesticas dos textos narrativo descritivo e dissertativo

Ressaltamos que nosso objetivo neste livro natildeo eacute esgotar o tema tiposhylogia textual sequer pretendemos fazer uma exposiccedilatildeo longa e complexa sobre o tema mas precisamos traccedilar linhas gerais que caracterizem algumas especificidades de cada tipo textual para que o profissional do Direito tenha subsiacutedios miacutenimos que colaborem na sua produccedilatildeo textual argumentativa Importante tambeacutem que se adquira a compreensatildeo de como a narraccedilatildeo e a descriccedilatildeo fornecem elementos relevantes para que se defenda uma tese mediante o texto argumentativo

Antes de passarmos agrave contribuiccedilatildeo dos textos narrativo e descritivo agrave produccedilatildeo da argumentaccedilatildeo nosso objeto principal de estudo oferecemos exemplos de textos em que predomina cada uma das tipologias tradicionais (narraccedilatildeo descriccedilatildeo e argumentaccedilatildeo) a fim de facilitar a compreensatildeo dishydaacutetica pelo aluno

20 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Exemplo de texto narrativo predominante

A inicial que foi recebida por despacho de 28 de abril de 1997 veio acompanhada do inqueacuterito policial instaurado na la Delegacia Policial Do caderno informativo constam de relevantes o auto de prisatildeo em flashygrante de f 08 a 22 os boletins de vida pregressa de f 43 a 45 e o relatoacuterio final de f 131 a 134 Posteriormente vieram aos autos o laudo cadaveacuterico de f 146 e seguintes o laudo de exame de local e de veiacuteculo de f 172 a 185 o exame em substacircncia combustiacutevel de f 186 a 191 o termo de restishytuiccedilatildeo de f 247 e a continuaccedilatildeo do laudo cadaveacuterico que estaacute na f 509O Ministeacuterio Puacuteblico requereu a prisatildeo preventiva dos indiciados A prisatildeo em flagrante foi relaxada natildeo configurada a hipoacutetese de quase flagracircncia por natildeo ter havido perseguiccedilatildeo tendo sido os reacuteus localizashydos em virtude de diligecircncias policiais []

Exemplo de texto descritivo predominante

Um estudo da Nasa revelou que 2005 foi o ano mais quente desde que a temperatura global comeccedilou a ser medida no fim do seacuteculo XX A mediccedilatildeo feita por sateacutelites e estaccedilotildees meteoroloacutegicas instaladas na terra e no mar mostrou que os termocircmetros apresentaram as maiores elevaccedilotildees nos poios e nas regiotildees mais altas do Hemisfeacuterio Norte como o Alasca a Sibeacuteria e a Groelacircndia O ano mais quente na Terra havia sido 1998 quandoo El Nino deixou um rastro de anomalias climaacuteticas no mundo inteiro

Exemplo de texto argumentativo predominante

O princiacutepio do estado de inocecircncia ou como preferem da presunccedilatildeo de inocecircncia previsto na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 (art 5deg LV II) detershymina antes de a sentenccedila condenatoacuteria transitar em julgado a impossibishylidade de se impor ao acusado de um crime qualquer medida de coaccedilatildeo pessoal ao seu direito de liberdade que se revista de caracteriacutestica de execuccedilatildeo de pena Proibe-se a denominada ldquopena antecipadardquo exceccedilatildeo agraves providecircncias de natureza cautelar (prisatildeo em flagrante preventiva e temporaacuteria) Nesse sentido TJSP HC n 79434 (Damaacutesio de Jesus)

21 A C O N TR IBU ICcedil Atilde O DO T EXTO N ARRAT IVO PARA A ARG UM EN TACcedil AtildeO

A narraccedilatildeo eacute a modalidade de texto que se caracteriza pelo sequencia- mento damp fatos ao longo do tempo Trata-se na verdade de contar uma histoacute-

i ia com todos os seus eventos por meio dc um narrador3 O primeiro passo eacute exatamente escolher se esse narrador participaraacute ou natildeo da histoacuteria contada (gtu seja se a narraccedilatildeo seraacute em Ia ou em 3a pessoa4 Feito isso o narrador contaraacutei mi dado fato que se passou em determinado tempo e lugar Soma-se a isso que soacute existe fato soacute haacute accedilatildeo se praticada por determinados personagens

Narrar eacute portanto uma atividade posterior agrave existecircncia de uma reashylidade que se daacute necessariamente como passada (daiacute ser adequada a utilishyzaccedilatildeo do verbo no preteacuterito para narrar os fatos em qualquer peccedila processhysual) Aleacutem disso eacute ao mesmo tempo uma atividade que tem a faculdade dc fazer nascer de todas as partes um universo narrado que se apoia sobre outra realidade a qual soacute existe por meio desse universo

Soma-se a isso que eacute importante para a produccedilatildeo de uma narrativa clara completa que tambeacutem sejam apresentadas as causas motivadoras das accedilotildees dos personagens e as possiacuteveis consequecircncias geradas por esse acontecimento Todo esse conjunto de informaccedilotildees indicaraacute como a hisshytoacuteria se desenrolou e faraacute com que o leitor desse texto entenda com mais clareza o que efetivamente aconteceu

Assim sendo os elementos do texto narrativo tradicional satildeo os seshyguintes

bull fato - o que se vai narrar os acontecimentos e as accedilotildees propriashymente ditos

bull personagem - aquele ou aqueles que participaram da histoacuteria ou observaram os fatos ocorridos

bull lugar - onde se passa a histoacuteriabull tempo - quando o fato ocorreubull enredo - a sequecircncia encadeada e articulada dos fatos que comshy

potildeem o conteuacutedo da histoacuteria

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

1 Charaudeau diz que narrar natildeo eacute somente descrever uma seacuterie de fatos ou aconteshycimentos Para que essa atividade ocorra eacute necessaacuterio um narrador (escritor tesshytemunha advogado) que esteja munido de uma intencionalidade isto eacute de umavontade de transmitir alguma coisa (uma certa representaccedilatildeo da experiecircncia do mundo) a algueacutem (auditoacuterio particular ou universal) dentro de um contexto

4 A respeito do uso da pessoa gramatical nas formas verbais do texto juriacutedico re- comenda-se a utilizaccedilatildeo da terceira pessoa marcada pela impessoalidade porque mesmo que a narrativa dos fatos esteja sendo feita pelo proacuteprio titular do direito subjetivo de accedilatildeo - oportunidade em que exerce autonomamente a capacidade pos- tulatoacuteria - deve esse narrador posicionar-se como parte e natildeo como personagem

22 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

bull causa - o motivo que determinou a ocorrecircnciabull consequecircncia ~ o que decorreu das accedilotildees praticadasbull modo - como ocorreram os eventos

Imprescindiacutevel eacute esclarecer ao acadecircmico do Curso de Direito a relevacircnshycia do texto narrativo para a sustentaccedilatildeo de uma tese juriacutedica Vejamos entatildeo

Sustentar teses eacute por certo a atividade mais complexa no cotidiano de qualquer profissional da aacuterea juriacutedica Os filmes hollywoodianos apreshysentam com frequecircncia o estereoacutetipo do advogado audacioso que defende com brilhantismo causas aparentemente perdidas O espectador tende a se sentir atraiacutedo pelas habilidades de um profissional que contrariando todas as expectativas consegue convencer os outros do impossiacutevel Satildeo igualshymente sedutores a capacidade de dominar a arte oratoacuteria e os recursos mais sutis da linguagem E com base nesse modelo de atuaccedilatildeo profissional que muitos jovens escolhem a carreira que seguiratildeo

Assim mostrada no cinema a atividade profissional dos advogadoso leigo deixa de dimensionar uma importante tarefa desse profissional a saber antes de argumentar deve-se narrar os fatos ocorridos no caso conshycreto de maneira a contextualizar para todos os envolvidos na atividade jurisdicional o que ocorreu no caso em anaacutelise

Entretanto parece claro que nenhum juiz pode apreciar um pedido sem conhecer os fatos que lhe servem de fundamento Dessa forma a narshyraccedilatildeo ganha status de maior relevacircncia porque serve de requisito essencial agrave produccedilatildeo de uma argumentaccedilatildeo eficiente

Soma-se a isso que o princiacutepio da igualdade processual das partes exishyge que cada um tome ciecircncia das informaccedilotildees trazidas aos autos pela parte adversa para que tenha condiccedilotildees de exercer em plenitude a sua defesa

Por todas essas razotildees a narrativa deve ser vista dentro da peccedila proshycessual como parte fundamental da construccedilatildeo persuasiva do raciociacutenio

Leia a seguir um fragmento dos fatos e fundamentos de uma peticcedilatildeo inicial5 e observe nele as caracteriacutesticas do texto narrativo

FATOS E FUNDAM ENTOS

A autora matriculou sua filha na Instituiccedilatildeo de Ensino da reacute em 1999 para cursar o Jardim I Desde entatildeo a jovem permanece estudando na

5 Adaptaccedilatildeo de trecho de peticcedilatildeo inicial redigida por Taiacutes dc Jesus de Sousa Tavares Os nomes das partes foram alterados por razotildees eacuteticas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 23

mesma Instituiccedilatildeo onde cursa atualmente com 7 anos a I a seacuterie do Ensino FundamentalNo iniacutecio do ano letivo de 2003 a escola contratou os serviccedilos dc uma empresa particular especializada que ministra aulas de informaacutetica e de inglecircs para seus alunos nas dependecircncias da instituiccedilatildeo durante o horaacuteshyrio regular de aulas conforme paraacutegrafo primeiro da claacuteusula quinta do contrato de prestaccedilatildeo de serviccedilos educacionais firmado entre a autora e a reacute para o ano letivo de 2003Alegando que no iniacutecio do segundo semestre de 2003 passou a haver muita inadimplecircncia no pagamento das mensalidades a Diretora da Instishytuiccedilatildeo Neide Ana P Ramos e a Coordenadora Pedagoacutegica Raquel Les- sa passaram a adotar corno estrateacutegia meses depois reiteradas visitas agraves salas de aula para cobrar das crianccedilas que avisassem a seus pais que as aulas de informaacutetica e de inglecircs seriam canceladas se a escola natildeo conseshyguisse honrar o pagamento das empresas terceirizadas contratadasPor vaacuterias vezes as filhas da autora chegaram agrave sua casa dizendo que as aulas seriam canceladas se os pais natildeo efetuassem em dia o pagamento das mensalidades o que passou a preocupar a autora pelo comportashymento inadequado de fazer comunicados considerando que tal recurso era dirigido a crianccedilas de apenas quatro e sete anos sem condiccedilotildees porshytanto de discernir se seus pais estavam entre os inadimplentes ou natildeo Reitera-se que tais comunicados natildeo foram feitos por circulares como se espera de uma instituiccedilatildeo de ensino mas verbalmente para as crianshyccedilas que deveriam transmitir o recado para seus pais A filha mais nova da autora perguntou-Ihc por vaacuterias vezes se natildeo poderia mais assistir agraves aulas porque ela natildeo havia pago a mensalidade quando a autora explicou agrave filha de apenas quatro anos que a matildee havia pago sim a menshysalidade do coleacutegio ()

Acompanhe a sequecircncia cronoloacutegica dos principais eventos

A autora fez a 1a

matriacutecula da sua filha na

escola

Aumentou a inadimplecircncia no pagamento

das mensalidades

A autora foi impedida de assistir

agraves aulas

1999 20031deg sem 20032deg sem Meses despois ()

O elemento tempo talvez seja o que melhor caracterize a narraccedilatildeo E a sucessatildeo de eventos no tempo que denuncia a existecircncia de um enredo a ser contado Uma seacuterie de adjuntos adverbiais pode ser observada na narshyraccedilatildeo da peccedila inicial tal como foi destacado em negrito

24 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A seguir algumas das marcas temporais mais utilizadas na indicaccedilatildeo do tempo segundo proposta de KOCH Ingedore G Villaccedila Argumentashyccedilatildeo e linguagem Satildeo Paulo Cortez 2000

MARCAS TEMPORAIS UTILIZADAS NA NARRACcedilAtildeOEm relaccedilatildeo ao

momento da falaEm relaccedilatildeo ao marco

temporal

Concomitacircncia

AgoraHojeNeste momento Nesta altura

EntatildeoNo mesmo dia

Anterioridade

Haacute pouco Ontem Anteontem Haacute semanas Haacute meses No mecircs passado No ano passado

Na veacutespera No dia anterior No mecircs anterior Um ano atraacutes Uma semana antes Um mecircs antes Por vaacuterias vezes

Posterioridade

Daqui a poucoLogoAmanhatildeDepois de amanhatilde Em dois meses Duas semanas No proacuteximo dia

No dia seguinte Uma semana depois Um ano depois Um dia depois Daiacute uma(s) hora(s) Daiacute um(ns) dia(s)

Natildeo apenas o texto narrativo contribui para a produccedilatildeo de uma boa argumentaccedilatildeo O texto descritivo eacute tambcm uma importante ferramenta para a construccedilatildeo de textos em que se sustentam pontos de vista Vamos a essa questatildeo

22 A C O N T R IB U ICcedil Atilde O DO T EX T O D E S C R IT IV O PA R A A A R G U M EN T A Ccedil Atilde O

A descriccedilatildeo eacute marcada pela enumeraccedilatildeo de caracteriacutesticas de um obshyjeto de um ambiente de uma pessoa A descriccedilatildeo realiza uma espeacutecie de ldquo recorterdquo das imagens disponiacuteveis e enumera as caracteriacutesticas observadas em um determinado momento e em pontos especiacuteficos

Ademais uma boa descriccedilatildeo de uma pessoa por exemplo deve levar em conta senatildeo todos pelo menos grande parte das caracteriacutesticas fiacutesicas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 25

(altura peso cor da pele e dos cabelos idade traccedilos do rosto voz modo de sc vestir etc - descriccedilatildeo objetiva) e das caracteriacutesticas psicoloacutegicas do iiuliviacuteduo (personalidade temperamento caraacuteter preferecircncias e aptidotildees dentre outros - descriccedilatildeo subjetiva)

Diferente do que se pensa essas caracteriacutesticas natildeo satildeo importantes apenas para a redaccedilatildeo de narrativas literaacuterias em que o autor gasta longas paacuteginas nessa tarefa Tambeacutem nas argumentaccedilotildees e nas narrativas forenshyses a descriccedilatildeo das caracteriacutesticas subjetivas das partes exerce importante papel A esse respeito observe o art 59 do CP em que o legislador detershyminou orientaccedilotildees para a fixaccedilatildeo da pena

Art 59 O juiz atendendo agrave culpabilidade aos antecedentes agrave conduta soshycial agrave personalidade do agente aos motivos agraves circunstacircncias e consequecircnshycias do crime bem como ao comportamento da viacutetima estabeleceraacute con- foirne seja necessaacuterio e suficiente para reprovaccedilatildeo e prevenccedilatildeo do crimeI - as penas aplicaacuteveis dentre as cominadasII - a quantidade de pena aplicaacutevel dentro dos limites previstosIII - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdadeIV - a substituiccedilatildeo da pena privativa da liberdade aplicada por outra espeacutecie de pena se cabiacutevel

Veja que elementos como ldquo conduta socialrdquo ldquo personalidade do agen- lerdquo e ldquo comportamento da viacutetimardquo podem ateacute ser depreendidos dos fatos narrados em um relatoacuterio mas satildeo principalmente verificaacuteveis por meio da descriccedilatildeo de certas caracteriacutesticas do agente ou da viacutetima

Outro exemplo de texto predominantemente descritivo eacute apresentado adiante

Uma pessoa trafegava com sua moto em alta velocidade por uma aveshynida a mais ou menos 100 kmh Essa avenida fica dentro de um bairro movimentado e cheio de sinais O condutor estava drogado e totalmente alcoolizado sem qualquer condiccedilatildeo de discernir e reagir a eventos que ocorressem na pista

Observe o caraacuteter estaacutetico das informaccedilotildees natildeo haacute uma linha do tempo em que os fatos ocorrem sucessivamente como na narraccedilatildeo Mesmo havendo referecircncia aos anos 1998 e 2005 o objetivo da repoacuterter foi o de estabelecer uma comparaccedilatildeo qualitativa e natildeo necessariamente um espaccedilo de tempo em que fatos se desenvolvem Soma-se a isso que o texto natildeo eacute rico em elementos gramaticais que indiquem progressatildeo temporal como ocorre na narraccedilatildeo

26 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O trecho eacute tambeacutem farto em expressotildees adjetivas que caracterizam e qualificam o objeto do texto descritivo ldquo o ano mais quenterdquo ldquoos termocircmeshytros apresentaram as maiores elevaccedilotildees nos poiosrdquo e ldquo regiotildees mais altas do Hemisfeacuterio Norte como o Alasca a Sibeacuteria e a Groclacircndiardquo

Caracteriacutesticas semelhantes ocorrem no trecho a seguir em que as partes sacirco qualificadas em uma peticcedilatildeo inicial6

Simone da Rocha Silva casada gerente bancaacuteria portadora da carshyteira de identidade ndeg 123456789-00 e inscrita no CPFMF sob o ndeg 444777123-77 domiciliada na Rua Maacuterio Costa 180 casa 9 Madu- reira Rio de Janeiro CEP 21221-221 por seu advogado com procurashyccedilatildeo infra-assinada propotildee

Accedilatildeo de Reparaccedilatildeo de Danos Morais pelo rito sumaacuterioEm face de Odaleia Melo brasileira solteira autocircnoma portadora da carteira de identidade ndeg 123456789-55 inscrita no CPFMF sob o ndeg 123456789-33 domiciliada na Rua Adolfo Luiz 171 apto 200 Engeshynho de Dentro Rio de Janeiro CEP 21221-00 pelos motivos de fato e de direito expostos a seguir

Observe que em ambos os casos ilustrados a descriccedilatildeo feita - seja no texto jornaliacutestico seja no texto juriacutedico - eacute objetiva pois enumera caracshyteriacutesticas concretamente observadas sem que seja necessaacuteria a percepccedilatildeo subjetiva dos sujeitos No segundo exemplo as caracteriacutesticas necessaacuterias agrave qualificaccedilatildeo das partes satildeo objetivamente determinadas pelo Coacutedigo de Processo Civil no art 282 inciso II Haacute situaccedilotildees tambeacutem em que a desshycriccedilatildeo subjetiva serviraacute de estrateacutegia modalizadora7 de grande importacircncia para a argumentaccedilatildeo do ponto de vista defendido8

Suponha a hipoacutetese em que esteja sendo apreciado um pedido de inshydenizaccedilatildeo por danos materiais decorrentes de uma colisatildeo de automoacuteveis A extensatildeo dos danos provocados seraacute aferida pelo orccedilamento meacutedio de

6 Adaptaccedilatildeo de trecho de peticcedilatildeo inicial redigida pela estagiaacuteria Taiacutes de Jesus de Sousa Tavares

7 A modalizaccedilatildeo consiste na atitude do falante com relaccedilatildeo ao conteuacutedo objetivo de sua fala Um dos elementos discursivos mais empregados na dissertaccedilatildeo argumen- tativa refere-se agrave conveniente seleccedilatildeo lexical De fato em muitos casos uma messhyma realidade pode ser apresentada por vocaacutebulos positivos neutros ou negativos tal como ocorre em sacrificarmatarassassinar - comporescreverrabiscar

8 Charaudeau diz o seguinte enquanto argumentar consiste em levar em conta operashyccedilotildees abstratas de ordem loacutegica destinadas a explicar os laccedilos de causalidade entre fatos ou acontecimentos descrever consiste em identificar os seres no mundo classishyficando-os sem estabelecer necessariamente entre eles uma relaccedilatildeo de causalidade

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 27

oficinas mecacircnicas que realizam reparos dessa natureza Mas o que confere credibilidade ao orccedilamento juntado aos autos do processo Certamente poderia ajudar nessa tarefa a descriccedilatildeo minuciosa dos estragos na lataria do automoacutevel causados pela colisatildeo que serviria de fundamento na exposishyccedilatildeo da narrativa dos fatos ao pedido do polo ativo Ajuntada de fotografias lambeacutem seria providecircncia desejaacutevel

Veja a seguir um caso publicado no JB9 em que se discute a ocorshyrecircncia de superfaturamento no contrato para locaccedilatildeo de um prcdio pelal undaccedilatildeo Nacional de Sauacutede (Funasa) Leia a reportagem

MP ACUSA ESTEVAtildeO DE SUPERFATURARBR A SIacuteL IA O Ministeacuterio Puacuteblico Federal aponta indiacutecios de superfatushyramento no contrato para locaccedilatildeo de um preacutedio no centro de Brasiacutelia firshymado sem concorrecircncia puacuteblica entre a Fundaccedilatildeo Nacional de Sauacutede (Funasa) e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio Construccedilotildees e Projetos que pertence ao ex-senador Luiz Carvalho Responsaacutevel pela investigaccedilatildeo o procurador da Repuacuteblica Luiz Fernando de Souza disse que o aluguel de R$ 170 mil acordado entre a Funasa e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio com base em avaliashyccedilatildeo da Caixa Econocircmica Federal estaacute acima dos preccedilos de mercado Para Luiz Carvalho o valor do aluguel natildeo poderia ultrapassar R$ 120 mil ldquo O valor do imoacutevel foi avaliado pela Caixa Econocircmica ()rdquo O preacutedio alugado tem o nome do pai de Luiz Carvalho Lino Carvalho Pinto e pertence ao grupo JK SA cujos donos satildeo o ex-senador e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio Na semana passada depois que as denuacutencias foram divulgadas o ex-senador disse que comprou a Fundaccedilatildeo AbiacutelioLuiz Francisco tambeacutem estranhou o fato dc a Funasa ter alugado um preacutedio menor do que o exigido previamente No edital que divulgou a Funasa pedia um imoacutevel com aacuterea uacutetil miacutenima de oito mil metros quadrados para escritoacuterios Segundo a documentaccedilatildeo do contrato o edifiacutecio tem 17160 metros quadrados mas apenas 727282 metros quadrados satildeo destinados a escritoacuterios ldquo Essa exigecircncia publicada vincula a administraccedilatildeo e serve unishycamente para afastar outras possiacuteveis empresasrdquo afirmou o procurador em carta enviada ontem ao presidente da Funasa Mauriacutecio Ribeiro Marcos

Observe como a descriccedilatildeo do imoacutevel e de seu contrato de locaccedilatildeo eacute de grande relevacircncia para a apreciaccedilatildeo da questatildeo juriacutedica discutida Por esse motivo na narraccedilatildeo dos fatos da peccedila acusatoacuteria deveraacute o MP descreshyver tais caracteriacutesticas como fundamento juriacutedico de sua acusaccedilatildeo

Publicaccedilatildeo de quinta-feira 12 de julho de 2012 Consultado em lthttpjbonIineter- racombrjbpapelbrasi12012071 ljorbra20010711014htmlgt Acesso em 11 ago 2012 Texto adaptado para preservar os envolvidos

28 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Da mesma maneira vaacuterios outros exemplos podem ser encontrados nas mais variadas peccedilas processuais

23 O TEXTO D1SSERTATIVO

A dissertaccedilatildeo estaacute presente no cotidiano de todas as pessoas que a todo o momento precisam sustentar opiniotildees posicionarem-se em relaccedilatildeo aos acontecimentos que ocorrem agrave sua volta

A tradicional classificaccedilatildeo do texto dissertativo costuma apresentar uma proposta bipartida distingue-se a dissertaccedilatildeo expositiva da dissertashyccedilatildeo argument ativa

Dissertaccedilatildeo expositiva eacute a maneira como a maior parte dos autores deshysigna a dissertaccedilatildeo em que se expressam ideias sobre determinado tema sem a preocupaccedilatildeo poreacutem de persuadir o auditoacuterio acerca da tese defendida

Nesse tipo de texto natildeo se faz necessaacuterio profundo conhecimento a respeito da questatildeo abordada pois natildeo eacute necessaacuterio posicionar-se diante da problemaacutetica investigada O objetivo eacute passar um conjunto de informaccedilotildees relevantes que possam contribuir com o esclarecimento do auditoacuterio acerca de um assunto especiacutefico para que ele o conheccedila melhor

Dissertaccedilatildeo argumentativa eacute aquela que implica defesa de uma tese com a finalidade de tentar persuadir algueacutem de que este eacute o ponto de vista mais adequado a adotar em determinada circunstacircncia Eacute importante seleshycionar um conjunto consistente de fatos (provas ou indiacutecios) por meio dos quais se pretende demonstrar a superioridade da tese defendida

Dessa forma a dissertaccedilatildeo argumentativa em que predomina a funshyccedilatildeo conativa ou apelativa da linguagem tem por objetivo sustentar a supeshyrioridade de uma tese em detrimento de outra seu discurso eacute extremamente carregado de ideologias A dissertaccedilatildeo expositiva por outro lado natildeo preshytende convencer o interlocutor a respeito de coisa alguma eacute um discurso neutro apenas expondo informaccedilotildees a respeito de um dado assunto

Essa postura de distinguir dois tipos de dissertaccedilatildeo tem sido muito criticada em estudos recentes porquanto se acredite que a neutralidade na construccedilatildeo de um discurso seja impossiacutevel Assinala Ingedore Koch10 queo discurso que se pretende neutro ingecircnuo ao assim se colocar jaacute tomou uma posiccedilatildeo em detrimento de vaacuterias outras possiacuteveis estrateacutegias de cons-

10 KOCH Ingedore G Villaccedila Argumentaccedilatildeo e linguagem 2 ed Satildeo Paulo Cortez 1987 p 09

liiiccedilatildeo de seu conteuacutedo Em outras palavras a dissertaccedilatildeo que se pretende meramente expositiva tambeacutem conteacutem uma ideologia

Ademais a proacutepria seleccedilatildeo de informaccedilotildees que poderiam ser impor-l antes para a dissertativa expositiva jaacute caracteriza certas escolhas dentro de uma hierarquia abstrata de valores que aquele que escreve tem de fazerI )n mesma maneira a ordem em que os fatos seratildeo apresentados na exposhysiccedilatildeo eacute outro fator que determina ser impossiacutevel fazer uma exposiccedilatildeo neu- ira sobre determinado tema Natildeo haacute portanto como produzir um discurso verdadeiramente neutro

O modo dissertativo-argumentativo efetivamente se configura quanshydo existe a defesa de uma tese O texto argumentativo particularmente apresenta

a) uma proposta sobre o mundo que provoque um questionamento quanto agrave sua legitimidade

b) um sujeito que se engaje com relaccedilatildeo a esse questionamento e deshysenvolva um raciociacutenio para tentar estabelecer uma verdade (que seja proacutepria ou universal que se trate de uma simples aceitabilidashyde ou de uma legitimidade) sobre essa proposta

c) um outro sujeito que relacionado agrave mesma proposta questionamenshyto e verdade constitua-se no alvo da argumentaccedilatildeo (pessoa a que se dirige o sujeito arguinentador)

Ainda que a distinccedilatildeo entre as duas propostas de dissertaccedilatildeo seja uacutetil apenas do ponto de vista didaacutetico observe-se que no Direito desenvolshyvem-se textos dissertativos muito mais elaborados que em algumas outras aacutereas profissionais por conta da proacutepria natureza da atividade

Para que o receacutem-iniciado na praacutetica argumentativa se sinta habilitado a produzir textos tatildeo complexos assinala Toledo satildeo necessaacuterios alguns requisitos certo amadurecimento no assunto sobre o qual discorreraacute coshynhecimento da mateacuteria raciociacutenio loacutegico e dialeacutetico capacidade de anaacutelise e siacutentese domiacutenio da norma culta e conhecimento teoacuterico-refiexivo consisshytente que decirc bases soacutelidas para o desenvolvimento de um bom texto

Pela complexidade inerente agrave argumentaccedilatildeo juriacutedica o profissional do Direito precisa aleacutem dos requisitos jaacute destacados desenvolver as seshyguintes habilidades adquirir um repertoacuterio vasto dominar tipos diferentes

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

TOLEDO Marleine Paula Marcondes e Ferreira de NADOacuteLSKIS Hecircndricas Coshymunicaccedilatildeo Juriacutedica 4 ed Satildeo Paulo Sugestotildees Literaacuterias 2002

30 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

de argumentos e de estrateacutegias argumentativas avaliar a aceitabilidade do auditoacuterio perante os seus argumentos e as suas estrateacutegias argumentativas operar juiacutezos e reflexotildees complexas por meio dos quais se deseja encamishynhar o raciociacutenio do aLiditoacuterio

Quanto ao conteuacutedo teoacuterico desenvolvido por autores consagrados acerca da argumentaccedilatildeo ressaltamos inicialmente que eacute extremamente vasto mas ainda assim trataremos adiante das questotildees que nos pareceram mais importantes

Capiacutetulo III

ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

No que diz respeito agrave relaccedilatildeo do tratado da argumentaccedilatildeo com os aushytores gregos e latinos Perelman destaca em sua obra algumas motivaccedilotildees a seguir expostas

U A ARG UM EN TACcedilAtildeO E A R ET Oacute R IC A C LAacute SS IC A

Os loacutegicos e filoacutesofos modernos natildeo tratavam a argumentaccedilatildeo como ciecircncia autocircnoma relegando-a simplesmente ao estudo da arte de persuashydir e convencer como a teacutecnica da deliberaccedilatildeo e da discussatildeo Destaca-se aqui Aristoacuteteles com as provas que chama de dialeacuteticas cuja utilizaccedilatildeo mostra na Retoacuterica Daiacute aliaacutes a denominaccedilatildeo Nova Retoacuterica agrave proposta perelmaniana

Outra razatildeo mais importante entretanto conduziu-o a forma com que a Antiguidade se ocupou da dialeacutetica e da retoacuterica O raciociacutenio diashyleacutetico eacute considerado paralelo ao raciociacutenio analiacutetico mas trata do verossiacuteshymil em vez de lidar com proposiccedilotildees necessaacuterias Aleacutem disso a ideia de adesatildeo e de espiacuteritos a quem se dirige um discurso eacute essencial a todas as teorias antigas da retoacuterica A aproximaccedilatildeo do autor em relaccedilatildeo agrave retoacuterica visa a enfatizar que eacute em funccedilatildeo de uni auditoacuterio que qualquer argumento se desenvolve

Vale destacar ainda que em alguns aspectos o Tratado de Argushymentaccedilatildeo de Perelman ultrapassa os limites da retoacuterica antiga ao mesmo tempo em que deixa outros de lado

Um dos aspectos destacados se refere agrave distinccedilatildeo de metas entre a reshytoacuterica antiga e a nova retoacuterica Enquanto aquela valorizava a argumentaccedilatildeo oral esta daacute ecircnfase aos textos escritos A preocupaccedilatildeo de Perelman (e aqui

32 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ele se espelha em Aristoacuteteles) eacute compreender o mecanismo do pensamento e estudar a estrutura da argumentaccedilatildeo Aleacutem disso enfatiza que a discusshysatildeo com um uacutenico interlocutor ou mesmo a deliberaccedilatildeo iacutentima dependem igualmente de uma teoria geral da argumentaccedilatildeo Em tal aspecto foi aleacutem dos limites da retoacuterica antiga

Perelman e L Olbrechts-Tyteca em seu Tratado da Argumentaccedilatildeo vinculado agrave tradiccedilatildeo da retoacuterica e da dialeacutetica gregas definem argumentashyccedilatildeo como o ato de provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentam ao seu assentimento

Charaudeau (1992) em sua Grammaire du Sens et de I rsquoExpression diz que argumentaccedilatildeo eacute uma atividade discursiva que encarada do ponto do vista do sujeito argumentador participa de uma dupla busca 1deg) uma busca de rashycionalidade que tende a um ideal de verdade quanto agrave explicaccedilatildeo de fenocircmenos do universo 2deg) uma busca de influecircncia que tende a um ideal de persuasatildeo o qual consiste em fazer dividir com outro (interlocutor ou destinataacuterio) um certo universo do discurso a ponto de levaacute-lo a ter as mesmas propostas

A primeira pelo fato de nenhum sujeito ser ingecircnuo torna-se uma busca do verossiacutemil de um verossiacutemil que depende das representaccedilotildees so- cioculturais divididas pelos membros de um dado grupo em nome da exshyperiecircncia ou do conhecimento A segunda eacute um pouco ambiacutegua na medida em que se apresenta como fazendo parte de um processo racional e loacutegico quando a divisatildeo da proacutepria convicccedilatildeo com o outro pode ser obtida por meios diferentes daquele do raciociacutenio por intermeacutedio por exemplo da seduccedilatildeo que tambeacutem se vale de outros modos de organizaccedilatildeo do discurso (Descritivo e Narrativo)

Enfim seja considerando o fenocircmeno do ponto de vista da busca de adesatildeo seja considerando do ponto de vista da busca do verossiacutemil e da influecircncia que tende a um ideal de persuasatildeo seja ainda levando em conta ambas as visotildees sua importacircncia para o estudo da argumentaccedilatildeo eacute inegaacutevel

32 AS NO CcedilOtilde ES D E A U D ITOacute R IO PO L IFO N IA E IN T ER T EX T U A L ID A D E

Outro ponto importante da proposta de Perelman eacute a noccedilatildeo de auditoacuteshyrio Segundo o autor para que uma argumentaccedilatildeo se desenvolva eacute preciso que aqueles a quem ela se destina lhe prestem atenccedilatildeo Por seu turno para isso ocorrer eacute indispensaacutevel prender o interesse do puacuteblico condiccedilatildeo funshydamental para o andamento de qualquer argumentaccedilatildeo

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 33

Destaque-se que tal puacuteblico cuja adesatildeo agrave argumentaccedilatildeo visa a obter constitui portanto o que Perelman chama de auditoacuterio No niacutevel da retoacuteshyrica ele define auditoacuterio como o conjunto de pessoas que o orador quer influenciar com sua argumentaccedilatildeo

Por outro lado como o importante na argumentaccedilatildeo natildeo eacute saber o que o proacuteprio orador considera verdadeiro ou probatoacuterio mas qual eacute o parecer daqueles a quem ela se dirige ele registra e trabalha com duas espeacutecies de auditoacuterio o universal e o particular

O auditoacuterio universal eacute constituiacutedo pela humanidade inteira ou pelo menos por todos os homens adultos e normais O particular divide-se em dois tipos o formado no diaacutelogo somente pelo interlocutor a quem se dirige o constituiacutedo pelo proacuteprio sujeito quando ele delibera ou apresenta as razoes de seus atos Opondo-se a argumentaccedilatildeo agrave demonstraccedilatildeo o disshycurso argumentativo destina-se a auditoacuterios particulares embora vise com IVequecircncia ao universal

Insta salientar neste ponto a noccedilatildeo de polifonia Esse conceito possishybilita a expressatildeo e a percepccedilatildeo de vozes simboacutelicas no interior dos enunshyciados que representam as artes do dizer e as diferentes possibilidades do sentir por meio de siacutembolos e mitos

O conceito de polifonia noccedilatildeo elaborada por Ducrot em 1983 signishyfica a incorporaccedilatildeo ao discurso do locutor de asserccedilotildees emitidas por terceishyros sejam eles seus interlocutores a opiniatildeo puacuteblica ou outras fontes Esse aspecto eacute retomado por Angelim em 1996 que assinala ser a polifonia um recurso de persuasatildeo no processo argumentativo

A autora citada presta importante esclarecimento ao estabelecer a dishyferenccedila entre polifonia e intertextualidade Segundo seu ponto de vista a polifonia implica o reportar de falas alheias como recurso e reforccedilo agrave linha argumentativa ao passo que intertextualidade decorre de repeticcedilatildeo de falas de outros emissores com quaisquer outras intenccedilotildees A polifonia eacute definida como ldquoa incorporaccedilatildeo que o locutor faz ao seu discurso de assershyccedilotildees atribuiacutedas a outros enunciadores ou personagens discursivos - ao(s) interlocutor(es) ou agrave opiniatildeo puacuteblica em geralrdquo (Koch 1996 p 142)

Entende-se que a polifonia eacute um fato constante no discurso que ofeshyrece ao locutor a possibilidade de tirar consequecircncias de uma asserccedilatildeo cuja responsabilidade natildeo assume diretamente pois a atribui a enunciador estranho A condiccedilatildeo para que haja polifonia eacute portanto que o locutor seja diferente do enunciador o locutor faz com que outro personagem diga algo no interior do seu proacuteprio discurso

34 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Koch (1996 p 149) afirma que a autoridade polifocircnica constitui o proacuteprio fundamento do encadeamento discursivo Nesse caso o locutor introduz no seu discurso uma voz responsaacutevel pela asserccedilatildeo de uma detershyminada informaccedilatildeo Com isso essa asserccedilatildeo eacute apenas representada e sobre ela encadeia uma segunda relativa a outra proposiccedilatildeo como faria sobre a proacutepria proposiccedilatildeo considerada como verdade

Conforme o estudo da autora referida na argumentaccedilatildeo o recurso agrave autoridade polifocircnica permite ao locutor

a) natildeo se portar de modo ditatorial (discurso autoritaacuterio)b) prever os argumentos possiacuteveis do adversaacuterio e reconhecer-lhes

certa validade incorporando-os ao proacuteprio discurso (argumento de lsquooposiccedilatildeo)

c) dotar o seu discurso de maior poder de persuasatildeo desarmando o seu adversaacuterio porque natildeo pode ser contestado porque permite antecipar-se a ele introduzindo no proacuteprio discurso os argumentos possiacuteveis

E interessante salientar que segundo Ducrot (1984) por meio da iroshynia procuramos mostrar a falsidade de uma tese utilizando em seu favor argumentos absurdos atribuiacutedos aos defensores dessa tese de tal modo que o absurdo de suas palavras possa fazer parecer o absurdo da tese As posiccedilotildees de ambos mostram ser bem plausiacutevel tratar a ironia como um fenocircmeno polifocircnico visto que ela pode ser considerada como recurso linshyguiacutestico que possibilita ao locutor sugerir pelo contexto ou pela entoaccedilatildeo o contraacuterio do que o enunciado parece exprimir

33 A ARG UM EN TACcedil AtildeO E O PRO C ESSO DE PRO DUCcedilAtildeO DE TEXTO S JU R IacuteD IC O S

Argumentar como jaacute foi destacado anteriormente exige que se deshysenvolvam vaacuterias competecircncias dentre elas que se adote uma postura criacuteshytica perante o texto lido e o texto que se pretende redigir

Esse enfoque ao processo comunicativo e expressivo permite que se problematize a aprendizagem da leitura e da escrita Segundo Osakabe (1979)

Aprender a ler e escrever natildeo corresponde simplesmente agrave aquisiccedilatildeo de um novo coacutedigo ou muito menos ao simples desenvolvimento de um

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 35

tipo de percepccedilatildeo atraveacutes do acreacutescimo de uma nova habilidade Aprenshyder a ler eacute tambeacutem ter acesso a um mundo distinto daquele em que a oralidade se instala e organiza o mundo da escrita

De acordo com esse autor a produccedilatildeo escrita deve permitir ao argu- mentador reconhecer sua identidade seu lugar social as tensotildees simboacutelicas e imaginaacuterias que animam o contexto em que se insere a questatildeo discutida sempre questionando e compreendendo as vozes dos seus sentidos no real em que a proacutepria argumentaccedilatildeo se insere

Osakabe destaca ainda a importacircncia da leitura como instrumento de reforccedilo ao poder argumentativo e portanto de desenvolvimento do potencial de expressatildeo escrita que algumas pessoas definem como ldquobem escreverrdquo

Na accedilatildeo discursiva a coesatildeo e a coerecircncia satildeo elementos de granshyde importacircncia porque aquela estabelece relaccedilotildees de sentido conectando na superfiacutecie do texto as palavras as sentenccedilas e os paraacutegrafos esta diz respeito agrave possibilidade de um texto fazer sentido para os usuaacuterios encon- tra-se no niacutevel profundo do texto Sendo assim fica demonstrado que o argumentador deveraacute trabalhar o planejamento e execuccedilatildeo de seu texto em funccedilatildeo desses aspectos

Esse pensamento encontra respaldo em Perelmann amp Olbrechts-Tyteca (1996) precursores de uma teoria da argumentaccedilatildeo em que se apoiam muitos estudiosos do discurso na atualidade O trabalho desses autores baseia-se na retoacuterica greco-latina mas ultrapassou os seus limites ao deshyli nir como argumentativa toda a atividade discursiva oral ou escrita com finalidade persuasiva A Retoacuterica Claacutessica que era considerada uma arte oratoacuteria restringia-se ao discurso oral proferido diante de uma multidatildeo com objetivos persuasivos

Numa breve retrospectiva histoacuterica destacamos que Aristoacuteteles (384- 322 aC) tem grande importacircncia para o estudo da teoria da argumentaccedilatildeo pois abordou temas que deram origem a duas vertentes dessa teoria nos Toacutepicos (1967) ele tratou do assunto sob o acircngulo do raciociacutenio isto eacute do ponto de vista loacutegico Na Retoacuterica (1967) ele se concentrou em aspectos relativos agrave persuasatildeo do auditoacuterio privilegiando fatores sociais

Jaacute na Idade Moderna com Descartes (1946) e a busca da verdade objetiva a retoacuterica perdeu espaccedilo no acircmbito do discurso cientiacutefico Nesse periacuteodo ficou vinculada predominantemente ao estilo literaacuterio sendo conshysiderada como ornamento A argumentaccedilatildeo por sua vez assumiu caraacuteter de demonstraccedilatildeo pois a proposta cartesiana buscava demonstrar racionalshymente o caraacuteter universal das coisas

36 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Identificamos novos rumos no estudo da argumentaccedilatildeo apenas na seshygunda metade do seacuteculo XX com o desenvolvimento da Psicologia Cognishytiva das Teorias da Enunciaccedilatildeo e da Pragmaacutetica Na sequecircncia desta seccedilatildeo apresentamos as contribuiccedilotildees de alguns estudiosos das questotildees referentes agrave argumentaccedilatildeo tendo em vista obter suporte teoacuterico para esta obra

Como jaacute registrado anteriormente Perelman amp Olbrechts-Tyteca (1996) ultrapassaram os limites da Retoacuterica Claacutessica ao definir como ar- gumentativa toda atividade discursiva oral ou escrita com finalidade pershysuasiva

Seu trabalho auxilia-nos a repensar o paradigma claacutessico de estudo das ciecircncias humanas e sociais particularmente no que se refere aos seus fundamentos calcados na loacutegica matemaacutetica de fundo demonstrativo Peshyrelman propotildee que se substitua o citado paradigma por um novo tipo de loacutegica embasado no que designa como o processo de argumentaccedilatildeo

Na perspectiva de Perelman o conhecimento possui uma dimensatildeo diashyleacutetica e por meio da teoria da argumentaccedilatildeo toma-se possiacutevel ao estudioso natildeo apenas lanccedilar matildeo da razatildeo (como fazem os formal istas) mas tambeacutem utilizaacute-la para obter a adesatildeo das demais pessoas para determinada tese

Decorre daiacute que a praacutetica da argumentaccedilatildeo natildeo eacute um exerciacutecio esshypeculativo nem se confunde com a simples descriccedilatildeo de um objeto ou a narraccedilatildeo de um acontecimento eacute um encaminhamento pelo qual uma pesshysoa visa a exercer influecircncia sobre outra Para atingir esse objetivo o coshynhecimento natildeo eacute suficiente eacute necessaacuterio saber valorizaacute-lo e fazecirc-lo aceito pelo interlocutor seja ele uma pessoa ou um grupo isto eacute o auditoacuterio que possui inteligecircncia e vontade proacutepria

Aleacutem disso a praacutetica argumentativa envolve o raciociacutenio e a loacutegica jaacute que o argumentador deve elaborar provas para defender sua tese Enfim argumentar na realidade implica a tentativa de convencer o auditoacuterio agrave luz de um raciociacutenio coerente e consciente mediante a apresentaccedilatildeo de razotildees em face da compatibilidade das provas com as demonstraccedilotildees

Entende-se entatildeo que eacute em funccedilatildeo da influecircncia que se deseja exershycer sobre um auditoacuterio que se desenvolve toda uma argumentaccedilatildeo Nessa linha de pensamento verificamos que o sentido de um enunciado comporshyta como elemento constitutivo essa forma de influecircncia a qual denominashymos forccedila argumentativa

Desse modo a liacutengua ao mesmo tempo em que contribui primeirashymente para determinar o sentido dos enunciados eacute um dos lugares privileshygiados em que a argumentaccedilatildeo eacute elaborada

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 37

Tais enunciados obedecem a uma orientaccedilatildeo argumentativa quando seu conteuacutedo visa a fazer admitir outros enunciados

Importa destacar a avaliaccedilatildeo de Koch (1996) a respeito da argumenshytaccedilatildeo como o ato mais importante da linguagem que busca a persuasatildeo e procura atingir a adesatildeo e a vontade do interlocutor Acrescenta relevantes aspectos para a anaacutelise da argumentaccedilatildeo quando esclarece que a linguashygem eacute uma forma de accedilatildeo dotada de intencionalidade o que implica sishymultaneamente a caracteriacutestica de ser veiacuteculo de ideologia que se expresshysa mediante a argumentaccedilatildeo

Vai (1994) auxilia na anaacutelise desse fenocircmeno ao dizer que a ideoshylogia dominante quer fazer crer que haacute sempre um jeito certo de fazer as coisas um jeito certo de enxergar e interpretar a realidade um jeito certo de pensar

A compreensatildeo desse aspecto torna-se mais evidente considerando- se o posicionamento de Benveniste (1966) ao afirmar que o sujeito se

apropria da linguagem num momento individual todavia ele o faz sob determinadas condiccedilotildees sociais culturais e ideoloacutegicas Focalizando-se a questatildeo do discurso sob esse acircngulo podemos dizer que pela consideraccedilatildeo fundamental das condiccedilotildees de produccedilatildeo na Anaacutelise do Discurso natildeo eacute o sujeito (argumentador) que se apropria da linguagem O que existe eacute uma forma social de apropriaccedilatildeo da linguagem em que estaacute refletida a ilusatildeo do sujeito isto eacute sua interpelaccedilatildeo feita pela ideologia E nesse jogo do lugar social e dos sentidos estabelecidos que estaacute representada a determinaccedilatildeo histoacuterico-social do discurso

Orlandi (1996) menciona que de forma geral podemos dizer que o argumentador natildeo eacute um sujeito-em-si mas tal como existe socialmente A apropriaccedilatildeo da linguagem eacute um ato social Com respeito agrave relaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo discursiva e a formaccedilatildeo ideoloacutegica resta-nos especificar que a interaccedilatildeo entre argumentador e auditoacuterio estaacute marcada por essa relaccedilatildeo Isso porque o lugar que os interlocutores ocupam numa formaccedilatildeo social e na sua relaccedilatildeo com a ideologia eacute constitutivo de seu discurso isto eacute daacute substacircncia agravequilo que este significa

Assim a relaccedilatildeo entre argumentador e auditoacuterio pode variar desde a maior harmonia ateacute a maior incompatibilidade ideoloacutegica o que vai inshyterferir na compreensatildeo do texto uma vez que como vimos a leitura eacute produzida socialmente Cabe lembrar que esse processo estaacute marcado no e pelo funcionamento discursivo Platatildeo amp Fiorin (1996) satildeo coerentes com os pontos de vista citados pois apresentam o discurso como resultado de

38 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

criaccedilatildeo ideoloacutegica coletiva a voz de seu produtor se manifesta ao lado de um coro de outras vozes que jaacute trataram do mesmo tema e com as quais se potildee em acordo ou desacordo

Diante do exposto nesta seccedilatildeo podemos inferir que no discurso haacute grande engajamento daquele que argumenta Conforme a anaacutelise de Pinto (1996) esse viacutenculo eacute explicitado por meio de algumas marcas formais entre as quais podemos destacar

bull Status da mensagem que corresponde ao papel exercido pelo EU no discurso

bull Sujeitos enunciadores (argumentador) e receptores (auditoacuterio) Enten- da-se como sujeito algueacutem que se apropria de uma linguagem constishytuiacuteda socialmente e que estaacute mergulhado no social que o envolve Parshytindo desse pressuposto a pesquisadora citada acrescenta que o sujeito eacute preso agrave contradiccedilatildeo que o constitui Charaudeau (1992) refere-se ao sujeito argumentador que natildeo eacute o produtor empiacuterico de todas as falas do discurso ele eacute o responsaacutevel por uma estrutura argumentativa

bull Marcas formais do EU que estabelecem os elos coesivos de primeishyra pessoa e mostram o grau do engajamento do EU ao discurso

bull Momento e lugar da enunciaccedilatildeo que se referem agraves condiccedilotildees conshyjunturais mais precisamente ao momento e ao lugar social em que ocorre o ato da emissatildeo do discurso

bull Modalizadores que satildeo todos os elementos linguiacutesticos diretamenshyte ligados ao evento da produccedilatildeo do enunciado e que funcionam como indicadores das intenccedilotildees sentimentos e atitudes do locutor com relaccedilatildeo ao seu discurso

Encontramos tambeacutem na contribuiccedilatildeo de Pinto (1996) referecircncia agraves seguintes formas de abordagem do discurso a situacional a lexicoloacutegica a pragmaacutetica a enunciativa e a textual

Abordagem situacional leva em conta elementos pertinentes agrave situashyccedilatildeo identificados por perguntas que podem ser aparentemente ldquobanaisrdquo como quem fala Onde Quando De quecirc Como Para quecirc

Abordagem pragmaacutetica procura descrever as unidades miacutenimas de comunicaccedilatildeo e as intenccedilotildees de comunicaccedilatildeo dos participantes atos de fala e valores ilocutoacuterios dos enunciados

Abordagem enunciativa estuda os traccedilos que caracterizam a enunshyciaccedilatildeo ou seja o ato de produccedilatildeo do enunciado presente no discurso

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 39

( omo operaccedilotildees enunciativas caracteriacutesticas destacam-se os enunciadores (marcas pessoais) a retomada do referencial do lugar e do momento da enunciaccedilatildeo (emprego de decirciticos tempos verbais indicadores espaccedilo-tem- porais) as relaccedilotildees que os enunciadores estabelecem com seus enunciados (tematizaccedilatildeo modalidades) e as relaccedilotildees que os enunciadores estabelecem entre eles (modalidades marcas pessoais) (Orlandi 1988)

Abordagem textual visa a descrever os modelos textuais que refle- icm a competecircncia linguiacutestica e os modelos discursivos que mostram a eompetecircncia discursiva O texto eacute definido como qualquer unidade discurshysiva (Orlandi 1988)

Abordagem lexicoloacutegica considera o campo lexical de um corpus como uma seacuterie de termos ligados a uma mesma realidade ou a um mesmo conceito Aponta a seleccedilatildeo lexical como a responsaacutevel pelas oposiccedilotildees os jogos de palavras as metaacuteforas o paralelismo riacutetmico entre outras Nessa abordagem ressalte-se a existecircncia de palavras que colocadas estrategicashymente no texto trazem consigo uma carga poderosa de impliacutecitos (Orlandi 1994)

Ainda tentando buscar subsiacutedios agrave compreensatildeo do processo argu- mentativo cabe mencionar que segundo Angelim (1996) haacute diferentes tipos de argumentaccedilatildeo

a) argumentaccedilatildeo simples - quando se apresentam provas naturais verdades comprovadas ou exemplos de conhecimento aprioriacutestico geral para fundamentar a tese

b) argumentaccedilatildeo ad hominem - quando o emissor se dirige a interloshycutor especiacutefico para refutar-lhe o ponto de vista

c) argumentaccedilatildeo disjuntiva - quando se levantam diferentes hipoacuteteses explicativas do fenocircmeno para ao final selecionar uma e buscar comprovaacute-la por meio de procedimentos similares aos da argushymentaccedilatildeo simples

d) argumentaccedilatildeo mediante dilema - quando se estabelecem duas hipoacuteshyteses uacutenicas para provar que a soluccedilatildeo eacute relativa pois depende do ponto de vista do emissor que a defende

e) argumentaccedilatildeo pelos contraacuterios - quando se refuta uma tese proshyvando que os fatos a contradizem

iacute) argumentaccedilatildeo pelo absurdo - quando a defesa da tese ocorre pela via indireta iniciando-se pela tentativa de provar a falsidade de contradishyccedilatildeo da tese para fundamentar os argumentos favoraacuteveis a ela

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Mendonccedila (1997) refere-se a duas teacutecnicas baacutesicas de estruturaccedilatildeo dos argumentos para convencer um auditoacuterio a associaccedilatildeo de ideias e a dissociaccedilatildeo de ideias No primeiro caso menciona que os processos poshydem ser agrupados em trecircs classes principais a dos argumentos quase loacuteshygicos dos argumentos fundados na estrutura do real e dos argumentos que fundam a estrutura do real Ao abordar a ldquodissociaccedilatildeo de ideiasrdquo o autor referido (Mendonccedila 1997) afirma que esta ocorre ldquo quando se pretende dar uma nova abordagem a um determinado fato tomando-se em consideraccedilatildeo as suas dimensotildees real e abstratardquo

Com relaccedilatildeo aos constituintes de um texto eacute inegaacutevel a contribuiccedilatildeo de Charaudeau (1992) ao esclarecer que o texto argumentativo eacute composto dos seguintes elementos proposta proposiccedilatildeo epersuasatildeo Todavia nos casos em que a argumentaccedilatildeo eacute predominantemente justificativa segundo Pinto (1996) citando Mirabail (1994) a proposta pode coincidir com a proposiccedilatildeo

Outro ponto a assinalar tomando como referecircncia as contribuiccedilotildees de Ducrot (1984) eacute que a argumentaccedilatildeo natildeo pode ser entendida na persshypectiva da transparecircncia imediata nem da visatildeo loacutegico-matemaacutetica Isso porque na argumentaccedilatildeo haacute um lugar destacado para o impliacutecito para o natildeo dito que tambeacutem comunica Entre outros aspectos interessantiacutessimos esse pesquisador estudou particularmente o papel do pressuposto fenocircmeshyno linguiacutestico que ele considera como ato de fala

Importa ainda compreender a distinccedilatildeo entre pressuposto e subentenshydido O subentendido estaacute situado num segundo niacutevel de interpretaccedilatildeo ao qual o destinataacuterio tem acesso E o caso da litote ou da ironia que aceitam duplo sentido O pressuposto por sua vez eacute parte integrante do enunciado eacute considerado como algo previamente estabelecido mesmo sem ser forshymulado explicitamente Por isso o destinataacuterio natildeo encontra espaccedilo para colocaacute-lo em questatildeo

Para esclarecer tal ponto de vista podemos citar o exemplo Pedro parou de fumar que expressa aleacutem do que eacute dito verbalmente o pressushyposto de que Pedro fumava Esse exemplo leva-nos agrave inferecircncia de que no uso cotidiano da liacutengua existem mecanismos os quais embora natildeo explishycitados formalmente satildeo pressupostos na interaccedilatildeo entre os sujeitos do discurso Eles satildeo verdadeiros atos de fala na medida em que permitem ao destinataacuterio chegar agrave conclusatildeo pretendida pelo emissor

Pela anaacutelise semiolinguiacutestica do discurso o ato de linguagem deve ser concebido como o resultado de uma relaccedilatildeo do impliacutecito com o expliacutecito enshytre dois processos um de produccedilatildeo e outro de interpretaccedilatildeo Nesse contexto situa-se a argumentaccedilatildeo como um dos modos de organizaccedilatildeo do discurso

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 41

Na mesma linha de raciociacutenio Patrick Charaudeau (1992) trata do dispositivo argumentativordquo de um texto e aborda a tese e a(s) prova(s) preshysentes numa argumentaccedilatildeo Ele esclarece que nesse dispositivo haacute trecircs pon- los importantes o Propoacutesito - em que se explicita um ponto de vista enunshyciativo do sujeito falante ou de outrem a Proposiccedilatildeo - por meio da qual o mi jeito argumentador se coloca (contra ou a favor) em relaccedilatildeo ao Propoacutesito e a Persuasatildeo - em que se enquadram as diversas funccedilotildees das proposiccedilotildees destacaacuteveis no texto dentro do ldquoquadro de raciociacutenio persuasivordquo

Segundo Charaudeau (1983) a proposiccedilatildeo coloca em causa a validashyde da proposta ou seja ela depende da tomada de posiccedilatildeo do argumentashydor em relaccedilatildeo agrave proposta o que eacute fundamental para a definiccedilatildeo do camishynho a seguir no desenvolvimento da argumentaccedilatildeo Em outras palavras ugt colocar em causa a proposta o argumentador pode mostrar-se favoraacutevel ou desfavoraacutevel a ela ou ainda natildeo apresentar uma tomada de posiccedilatildeo A proposiccedilatildeo segundo a formulaccedilatildeo de Charaudeau corresponde ao que Mirabail (1994) citado por Pinto (1996) denominou ideia de tomada de posiccedilatildeo ou ao que Perelman amp Olbrechts-Tyteca (1996) designaram como tese A proposiccedilatildeo pode ser secundaacuteria ou principal de acordo com seu jrau de importacircncia no universo textual

Acrescenta-se que perante uma proposiccedilatildeo o sujeito argumentador adota atitudes tais como a refutaccedilatildeo a justificaccedilatildeo e a ponderaccedilatildeo e a eontra-argumentaccedilatildeo orientadas de um quadro de raciociacutenio e manifestashydas no texto argumentaccedilatildeo

Nessa linha de pensamento lembramos ainda que para expressar- se o sujeito utiliza procedimentos argumentativos de natureza semacircntica

discursiva e de composiccedilatildeo Os primeiros estatildeo relacionados ao valor dos argumentos os seguintes recorrem a categorias linguiacutesticas para produzir eleitos discursivos e os uacuteltimos contribuem para o conjunto de argumentashyccedilatildeo Tendo em vista que o propoacutesito eacute definido como a meta da comunicashyccedilatildeo argumentativa ele pode confundir-se com a tese que como apresentashymos anteriormente se caracteriza pela explicitaccedilatildeo da posiccedilatildeo (verdadeira ou falsa) do sujeito argumentador em relaccedilatildeo ao tema para convencer o auditoacuterio

Um texto caracteriza-se tambeacutem pelo assunto pelo seu conteuacutedo Dentre os procedimentos discursivos com apoio em Charaudeau (1983) destacamos seis tipos a definiccedilatildeo a comparaccedilatildeo a citaccedilatildeo a descriccedilatildeo narrativa a acumulaccedilatildeo e o questionamento

a) Definiccedilatildeo - eacute uma atividade linguiacutestica que consiste em descrever os traccedilos semacircnticos de uma palavra num contexto Ela tem finalidades

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estrateacutegicas e visa a produzir um eteacuteito de evidecircncia e de saber pelo sujeito que argumenta

b) Comparaccedilatildeo - eacute um procedimento que utiliza duas categorias da liacutengua a quantificaccedilatildeo e a qualificaccedilatildeo De acordo com a primeira as cashyracteriacutesticas dos seres e dos comportamentos satildeo expostas para marcar a semelhanccedila ou a diferenccedila A segunda estaacute presente quando haacute um paraleshylo ou uma gradaccedilatildeo entre as qualidades Na argumentaccedilatildeo a comparaccedilatildeo produz efeitos diversos um efeito pedagoacutegico de caraacuteter objetivo (quando ela eacute utilizada como ilustraccedilatildeo ou para fazer compreender melhor um conshyceito) ou um efeito de ldquo cegamentordquo (quando ela desvia a atenccedilatildeo do intershylocutor para fato anaacutelogo o que estrategicamente o impede de identificar a verdadeira intenccedilatildeo do autor) Se a comparaccedilatildeo for objetiva ela eacute verishyficaacutevel lsquomas se for subjetiva seraacute preferencialmente sugerida e costuma despertar a evidecircncia no plano do imaginaacuterio do interlocutor

c) Citaccedilatildeo - consiste em reportar da maneira mais fielmente possiacuteshyvel propostas escritas ou orais de um locutor diferente daquele que fala o que provoca um efeito de autenticidade ao que eacute transmitido A citaccedilatildeo assume conotaccedilatildeo de argumento de autoridade na medida em que atribui autenticidade ao texto e pode testemunhar um dito uma experiecircncia ou um saber

d) Descriccedilatildeo narrativa - este procedimento se assemelha agrave comparashyccedilatildeo pois pode ser utilizado tanto para descrever um fato quanto para conshytar uma histoacuteria Sua finalidade eacute todavia diferente a descriccedilatildeo narrativa produz um efeito de exemplificaccedilatildeo

e) Acumulaccedilatildeo - consiste no emprego de vaacuterios argumentos para fundamentar uma mesma prova

f) Questionamento - trata-se de um procedimento voltado a instigar o interlocutor em relaccedilatildeo agrave proposta Ele tem vaacuterios objetivos incitar o interlocutor a fazer algo propor uma escolha verificar um saber provocar ou denegar

34 G RA M Aacute T IC A E PRO DUCcedilAtildeO DO T EXT O ARG U M EN TA TIVO

O sentido produzido pelo profissional do Direito no texto argumen- tativo natildeo se daacute apenas pelas ideias organizadas sucessivamente A proacutepria frase o encadeamento das estruturas linguiacutesticas dos enunciados as figuras de linguagem a que se recorre a seleccedilatildeo vocabular entre outros fatores satildeo tatildeo responsaacuteveis pelo conteuacutedo final do texto quanto as informaccedilotildees que nele estatildeo contidas

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 43

O domiacutenio da norma culta portanto deixou haacute muito de ser item acesshysoacuterio na formaccedilatildeo do acadecircmico de Direito Liacutengua e discurso argumentativo integram-se de tal maneira que a eficiecircncia das peccedilas processuais depende luinbeacutem da construccedilatildeo de paraacutegrafos simples claros objetivos e concisos

A coesatildeo entre os paraacutegrafos ou seja a ldquoamarradurardquo entre as ideias deve constituir preocupaccedilatildeo do argumentador tanto quanto a proacutepria sele- ccedilatildeo das ideias a serem incluiacutedas no texto Ora essa coesatildeo se daacute essencialshymente pelos elementos linguiacutesticos

A argumentatividade assim considerada natildeo constitui apenas algo nerescentado ao uso linguiacutestico mas ao contraacuterio eacute um atributo da liacutengua tslo eacute o uso da linguagem eacute inerentemente argumentativo Nesse sentido i significaccedilatildeo de uma frase eacute vista como o conjunto de instruccedilotildees concershynentes agraves estrateacutegias a serem usadas na decodificaccedilatildeo dos enunciados pelos quais esta frase se atualiza

As instruccedilotildees contidas na significaccedilatildeo dessas frases determinam a intenccedilatildeo argumentativa a ser atribuiacuteda a seus enunciados Os enunciados portanto satildeo empregados com a finalidade de orientar o auditoacuterio para certos tipos de conclusatildeo com exclusatildeo de outras Esse processo em que o enunciado serve de argumento para dadas conclusotildees chama-se orientashyccedilatildeo discursiva

Na gramaacutetica de cada liacutengua haacute uma seacuterie de vocaacutebulos responsaacuteshyveis por esse tipo de relaccedilatildeo os chamados operadores argumentativos ou discursivos Na liacutengua portuguesa estatildeo entre eles os que a NGB (Norshyma Gramatical Brasileira) enquadrou como denotadores de inclusatildeo - ateacute mesmo tambeacutem inclusive - ou exclusatildeo -soacute somente apenas e os que a gramaacutetica tradicional considera elementos meramente relacionais - conecshytores como jaacute que pois mas poreacutem embora etc

Quando pensamos em procedimentos argumentativos merecem ainda destaque os conectores argumentativos cuja funccedilatildeo eacute operar como instrushymentos que fornecem ao discurso uma orientaccedilatildeo argumentativa A partir de sua anaacutelise podemos inferir que eles servem para ligar duas unidades semacircnshyticas e conferir um papel argumentativo agraves unidades que eles relacionam ( )s conectores servem tambeacutem para articular duas proposiccedilotildees orientadas a conclusotildees diversas que pertenceriam a dois enunciadores diferentes

No processo da construccedilatildeo argumentativa Charaudeau (1992) apreshysenta a modalizaccedilatildeo e a enunciaccedilatildeo como fenocircmeno complexo que testeshymunha o modo como o sujeito argumentador se apropria da liacutengua para organizaacute-la em discurso Esse estudioso considera a modalizaccedilatildeo como uma categoria conceituai que se refere ao grau de certeza ou de possi-

44 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

bilidade ou verossimilhanccedila de um sujeito em relaccedilatildeo a uma realizaccedilatildeo assertiva Quando aborda a modalizaccedilatildeo lembra que a tradiccedilatildeo gramatical natildeo lhe reconhece existecircncia proacutepria visto que os fatos de modalizaccedilotildees satildeo distribuiacutedos em vaacuterias categorias na liacutengua

Angelim (1996) inclui nas modalizaccedilotildees os operadores argumenta- tivos os conectores selecionados pelo sujeito argumentador Koch (1996) considera que os operadores argumentativos determinam o valor argu- mentativo dos enunciados constituindo-se pois em marcas linguiacutesticas importantes da enunciaccedilatildeo Conforme o ponto de vista de Pinto (1996) os conectores argumentativos satildeo marcas linguiacutesticas que estabelecem a progressatildeo textual

Da mesma forma Angelim (1996) afirma que os conectores explishycitam linguisticamente uma relaccedilatildeo de dependecircncia entre as proposiccedilotildees Oliveira (1996) informa que os conectores mais importantes no texto argu- mentativo satildeo os conclusivos introdutores de tese os explicativos introshydutores de argumentos os concessivos que introduzem concessotildees e os adversativos que introduzem restriccedilotildees

Muitas vezes os iniciantes na praacutetica argumentativa queixam-se por natildeo ter um repertoacuterio vocabular suficiente que faculte iniciar frases ou pashyraacutegrafos de maneira criativa ou pelo menos natildeo repetitiva na utilizaccedilatildeo dos elos coesivos entre enunciados A seguir algumas expressotildees que poshydem ser utilizadas na redaccedilatildeo de textos juriacutedico-argumentativos

A primeira observaccedilatildeo a fazer No que se refereInicialmente cabe lembrar Os itens arroladosQuanto aos fatos Remontando aEacute preciso observar que Em primeiro (2deg) lugarTodavia No entantoCom muito mais razatildeo SeguramenteEste caso apenas ilustra 0 exemplo deconfirmaEacute certo que Aleacutem do maisEacute de se verificar que Como se pode notarConveacutem ressaltar Cumpre observarEm virtude das consideraccedilotildees Necessaacuterio eacute lembrarOutra questatildeo relevante consiste em Na verdade o objetivo da lei eacuteNatildeo eacute despiciendo observar que Nessa linha de posicionamento

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

Percebe-se Configura-seConstata-se Sabe-seEacute indiscutiacutevel que Valecumpre ratificar queUm dado a acrescentar Como professaPassemos a Pelas razotildees aduzidasPor uacuteltimo Pertinente eacute a colocaccedilatildeo do professorContudo Cumpre antes de mais nadaConsidere-se o caso de Tem-seIncontestavelmente Nota-sePode ser que

35 ARG UM EN TACcedil AtildeO E T EO R IA T R ID IM EN S IO N A L DO D IR E IT O

Antes de entrarmos no planejamento propriamente dito do texto ar- gumentativo precisamos compreender qual a sua importacircncia para a proshyduccedilatildeo da peccedila processual Muitos graduandos neoacutefitos na produccedilatildeo desse texto ignoram a relevacircncia dessa parte da peccedila para o processo e a relaccedilatildeo que a argumentaccedilatildeo tem com as demais partes do texto juriacutedico

Peticcedilotildees contestaccedilotildees contrarrazotildees sentenccedilas pareceres habeas corpus apelaccedilotildees e inuacutemeras outras peccedilas contecircm em sua estrutura uma parte argumentativa

Para melhor compreender essa importacircncia recorreremos agrave Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale Essa teoria eacute responsaacutevel pela orientaccedilatildeo sobre como os profissionais do Direito da atualidade devem enshycarar o fenocircmeno juriacutedico para serem eficientes na atividade advocatiacutecia

Miguel Reale1 sustenta que para existir um fenocircmeno juriacutedico deve haver sempre um fato social e histoacuterico relevante sobre o qual deveraacute atuar a praacutetica juriacutedica

Esse fato para representar algo de significativo ou relevante para a ciecircncia juriacutedica deve receber certa significaccedilatildeo que o valore de maneira a contextualizaacute-lo como adequadoinadequado justoinjusto nocivobeneacutefishyco agraves finalidades pretendidas pela sociedade

1 REALE Miguel Liccedilotildees preliminares de Direito 25 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 pp 64-68

46 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim haveraacute uma norma ou uma regra que integre a relaccedilatildeo entre o fato e o valor a ele atribuiacutedo

Essas trecircs dimensotildees - fato valor e norma - satildeo fundamentais para que o Direito possa ser entendido tal como o eacute atualmente2 Qual a relaccedilatildeo entatildeo da Teoria Tridimensional do Direito com a estrutura do raciociacutenio argumentativo que os operadores do Direito devem desenvolver

Ora se argumentar eacute conseguir aumentar a intensidade de adesatildeo do ouvinte a uma tese de maneira que desencadeie nele a accedilatildeo pretendida (accedilatildeo positiva ou abstenccedilatildeo) ou ao menos a disposiccedilatildeo para accedilatildeo e se o Direito soacute se efetiva sob as trecircs dimensotildees jaacute tratadas natildeo haacute como persuashydir um auditoacuterio acerca da adequaccedilatildeo de uma tese se o argumentador natildeo buscar no conjunto probatoacuterio agrave sua disposiccedilatildeo fatos a serem valorados de maneira tal que a aplicaccedilatildeo de uma norma possa parecer adequada e convincente

O argumentador necessita na argumentaccedilatildeo desenvolver raciociacutenios dedutivos e indutivos a partir dos fatos selecionados da narrativa redigida antes da fundamentaccedilatildeo

A atribuiccedilatildeo de valores a esses fatos eacute complexa e as escolhas realishyzadas podem ser determinantes do sucesso persuasivo pretendido pelo adshyvogado Tal valoraccedilatildeo se daacute por meio de uma exposiccedilatildeo clara dos motivos fundamentos que sustentam essa interpretaccedilatildeo Veja a tabela a seguir com a correlaccedilatildeo de cada dimensatildeo da Teoria Tridimensional com as partes das peccedilas processuais

PECcedilAS PROCESSUAISDIMENSOtildeES DA TEORIA TRIDIM

DIREITO

peticcedilatildeoinicial

sentenccedila acoacuterdatildeo parecer

FATO Essa dimensatildeo consiste na narshy

rativa de todos os fatos importantes do caso concreto

analisado

Dos fatos(versatildeo do autor sobre os fatos)

Relatoacuterio(fatos reshylevantes

do conflito e do proshycesso)

Relatoacuterio(fatos

relevanshytes do

conflito e do proshycesso)

Relatoacuterio3(fatos

relevantes do conflito e do proshycesso)

2 Jaacute se fala hoje em teoria quadridimensional do Direito3 Dependendo do tipo de parecer produzido podemos ter uma narrativa valorada ou

natildeo valorada

Cap Ill - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

PECcedilAS PROCESSUAISVALOR Essa dimensatildeo

consiste na valo- raccedilatildeo dos fatos

narrados ou seja o ponto de vista

defendido depenshyde da maneira

como os fatos satildeo interpretados

Do direito Motivashyccedilatildeo

Motivashyccedilatildeo

Fundashymentaccedilatildeo

NORMA Essa dimensatildeo consiste na aplicaccedilatildeo de

uma norma como consequecircncia

de um raciociacutenio argumentativo anteriormente desenvolvido

Do pedido Disposishytivo

Disposishytivo

Conclushysatildeo

Ressalte-se que assim como ocorre com as peccedilas indicadas todas as demais peccedilas processuais complexas seguem uma estrutura loacutegica de construccedilatildeo descriccedilatildeo das partes envolvidas no litiacutegio narrativa dos fatos relevantes da lide fundamentaccedilatildeo de um ponto de vista e conclusatildeo (na forma de pedido decisatildeo opiniatildeo fundamentada etc)

Nesse sentido Viacutetor Gabriel Rodriacuteguez4 assinala que o conhecimento propriamente dito da doutrina da jurisprudecircncia e da proacutepria legislaccedilatildeo reshypresenta apenas uma seacuterie de informaccedilotildees que se encontram agrave disposiccedilatildeo do argumentador mas elas por si mesmas natildeo garantem a capacidade de persuasatildeo

Isoladas puras diz ainda o autor natildeo produzem sentido natildeo conshyvencem ningueacutem de que haacute coerecircncia no raciociacutenio desenvolvido ldquoa natildeo ser que estejam intencionalmente dirigidas articuladas para persuadir alshygueacutem a respeito de algordquo Assim a folha de antecedentes criminais do reacuteu juntada aos autos eacute apenas uma informaccedilatildeo que soacute alteraraacute o resultado de um processo se for intencionalmente invocada para sustentar o raciociacutenio de que isso eacute motivo suficiente para fixar a pena no maacuteximo legal (e essa eacute apenas uma das leituras possiacuteveis para essa informaccedilatildeo)

4 RODRIacuteGUEZ Viacutetor Gabriel Argumentaccedilatildeo juriacutedica teacutecnicas de persuasatildeo e loacutegica informal 4 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2005 p 06

48 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim tambeacutem ajuntada de um contrato aos autos natildeo evidencia necessariamente a obrigaccedilatildeo do contratado em face do contratante O ideal nessa hipoacutetese eacute que o argumentador desenvolva o raciociacutenio de que o doshycumento gera um viacutenculo juriacutedico entre as partes e que a doutrina sustenta que todo viacutenculo de natureza juriacutedica eacute marcado por direitos e obrigaccedilotildees muacutetuos entre os sujeitos de direito

Posto isso um mesmo fato (o conteuacutedo de uma folha de antecedentes criminais ou um contrato - primeira dimensatildeo apontada por Reale) pode ter inuacutemeras leituras pode significar muitas coisas (valoraccedilatildeo dada aos fashytos - segunda dimensatildeo da Teoria Tridimensional) mas as hipoacuteteses inter- pretativas daiacute derivadas seratildeo clarificadas como mais ou menos pertinentes quando contextualizadas por um raciociacutenio que natildeo se pode esperar que seja coqstruiacutedo apenas pelo juiz Cabe ao advogado trilhar os caminhos interpretativos adequados para sustentar sua tese (aplicaccedilatildeo da norma ao caso concreto - terceira dimensatildeo)

Sustentamos que o Direito como atividade social natildeo tem condiccedilotildees de ser articulado sozinho Ele somente pode existir concretamente por meio de argumentos que atribuem a determinados fatos a relevacircncia e o signifishycado possibilitados pelo contexto em que satildeo produzidos e inteipretados

A doutrina e a proacutepria legislaccedilatildeo satildeo a priori ldquo esteacutereisrdquo constituem simples informaccedilatildeo disponiacutevel para que o argumentador possa delas se apropriar e construir um raciociacutenio aceito como razoaacutevel

A pertinecircncia da Teoria Tridimensional do Direito no estudo da argushymentaccedilatildeo eacute reforccedilada tambeacutem por meio da proacutepria produccedilatildeo legislativa Tome como exemplo alguns dispositivos do Coacutedigo Penal esse diploma legal prevecirc logo no iniacutecio da parte especial os crimes de homiciacutedio e de infanticiacutedio sob tipos penais distintos Este foi capitulado no art 123 e aquele no art 121 do Coacutedigo Penal O que levou o legislador a criar dois tipos penais distintos se uma mesma conduta - ldquomatar algueacutemrdquo - estaacute senshydo reprovada nos dois crimes

Fica evidente que o legislador entendeu que apesar de o fato ser basishycamente o mesmo a maneira de valoraacute-los de interpretaacute-los natildeo pode ser idecircntica em decorrecircncia das especificidades - princiacutepio da especialidade- que o infanticiacutedio apresenta em face do homiciacutedio Isso implica dizer que cabe ao argumentador perceber as peculiaridades que guarda cada norma para que sua fundamentaccedilatildeo possa dar conta dessas tecircnues distinccedilotildees

Dessa forma o advogado ao produzir sua argumentaccedilatildeo natildeo pode deishyxar de realizar a ponderaccedilatildeo dos valores subjacentes agrave norma que evoca sob pena de ser pouco teacutecnico na capitulaccedilatildeo das condutas imputadas ao reacuteu

Resumidamente o argumentador deve em primeiro lugar expor os latos importantes do caso concreto para que as partes e o proacuteprio magistrado possam ter condiccedilotildees de apreciarponderarvalorar os aconshytecimentos A exposiccedilatildeo desses fatos importantes seraacute feita predominanshytemente por meio de uma narraccedilatildeo Uma vez conhecidos os fatos sua viiloraccedilatildeo deveraacute ser feita em seguida na peccedila processual por meio de uma argumentaccedilatildeo

Desenvolvida a sustentaccedilatildeo argumentativa de um ponto de vista - lese - que pareccedila adequado eacute hora de o operador do Direito manifestar-se quanto agrave aplicaccedilatildeo da norma adequada ao caso em anaacutelise

Para melhor compreender o raciociacutenio desenvolvido neste capiacutetulo observe uma frase dita por Julio Clemente - teacutecnico do Athletic Bilbao - e publicada na seccedilatildeo ldquoVeja essardquo da Revista Veja ldquoCuspir eacute um compor- liacuteiinento feio Eu acho que esse eacute o tipo de coisa que soacute quem acabou de descer das aacutervores fazrdquo

Assim descontextualizada a fala de Julio tem bastante pertinecircncia Quando diz que ldquoesse eacute o tipo de coisa que soacute quem acabou de descer das arvores fazrdquo imaginamos que ele estaacute qualificando o ato de cuspir como uma conduta social pouco adequada agraves expectativas atuais de um ldquoestaacutegio de evoluccedilatildeo mais avanccedilado do ser humanordquo Quanto a isso natildeo haacute aparenshytemente nenhum problema

Entretanto quando contextualizada a situaccedilatildeo em que pronunciou tal IVase - segundo a revista ldquo referiu-se ao atacante africano Samir Atono do Barcelona que cuspiu no rosto de um jogador catalatildeordquo - o enunciado ganha novas possibilidades interpretativas

Deriva dessa discussatildeo a necessidade de entender como se daacute o comshyportamento anocircmico - ou de desvio - em uma sociedade O Desembargashydor Seacutergio Cavai ieri Filho na obra Programa de sociologia juriacutedica vocecirc conhece realiza didaacutetica e completa exposiccedilatildeo a respeito das causas do comportamento anocircmico aleacutem de fazer breve siacutentese a respeito das proshypostas de conhecidos filoacutesofos sobre o assunto6

Sozinhas as informaccedilotildees natildeo dizem muito mas a possibilidade de associaccedilatildeo semacircntica das palavras e expressotildees ldquo cuspirrdquo ldquodescer da aacutershyvorerdquo e ldquojogador africanordquo facultam o desenvolvimento de um raciociacutenio que leva agrave conclusatildeo de que o teacutecnico agiu de maneira preconceituosa pra-

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

Revista Veja p 44 Seccedilatildeo ldquoVeja essardquo Ediccedilatildeo do dia 25 de janeiro de 2006 h Sobre o assunto consulte CAVALIER1 FILHO Seacutergio Programa de sociologia

juriacutedica (vocecirc conhece) 10 ed Rio de Janeiro Forense 2002 p 199

50 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ticando conduta prevista na legislaccedilatildeo brasileira Lei 74371985 a qual dispotildee no art 1deg que ldquoconstitui contravenccedilatildeo a praacutetica de atos resultantes de preconceito de raccedila de cor de sexo ou de estado civilrdquo

Capiacutetulo IV

PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURlDICO

Compor conflitos de interesse por meio judicial eacute uma das funccedilotildees primordiais do Direito Tais conflitos advecircm de divergentes formas de se interpretar um determinado fato juriacutedico E nessa instacircncia que se legitimao texto argumentativo

A argumentaccedilatildeo juriacutedica caracteriza-se especialmente por servir de instrumento para expressar a interpretaccedilatildeo sobre uma questatildeo do Direito que se desenvolve em um determinado contexto espacial e temporal Ao operar a interpretaccedilatildeo impotildee-se considerar esses contextos ater-se aos fashytos agraves provas e aos indiacutecios extraiacutedos do caso concreto e sustentaacute-la nos limites impostos pelas fontes do Direito Forccediloso tambeacutem eacute considerar a interpretaccedilatildeo e o discurso do opositor a fim de neutralizaacute-los jaacute que na argumentaccedilatildeo o discurso do orador se constroacutei cm concordacircncia com alshyguns discursos e em oposiccedilatildeo a outros Concluiacuteda a interpretaccedilatildeo o orador deve entatildeo estar convicto da posiccedilatildeo que adotaraacute perante o caso concreto e a tese que defenderaacute sem menosprezar aquela que lhe eacute adversa

Consciente dessas preliminares aleacutem de interpretar os sentidos expliacuteshycitos que compotildeem o caso concreto eacute preciso apreender os que se enconshytram impliacutecitos subjacentes aos fatos Em seguida importa dimensionar cada fato extraindo-lhe as circunstacircncias especiacuteficas jaacute que essas podem acarretar natildeo soacute como afirma Reale (1995) ldquo uma consequecircncia de direito por assim estar previsto na normardquo mas tambeacutem inspirar uma conclusatildeo sustentada no que eacute justo e razoaacutevel para o indiviacuteduo e para a sociedade Imprescindiacutevel ainda eacute a seleccedilatildeo das provas - meio persuasivo eficaz - e dos indiacutecios que suscitam inferecircncias complementares aos fatos

Cumpridas essas etapas eacute chegado o momento de organizar no papel um caminho coeso e coerente que serviraacute de alicerce ao texto que se deseja

52 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

elaborar Com esse procedimento o orador teraacute clareza de cada etapa a ser vencida da pertinecircncia e da consistecircncia de cada uma na composiccedilatildeo da argumentaccedilatildeo e assim da melhor forma de alcanccedilar o seu objetivo persuashydir o auditoacuterio a assumir a sua tese como a mais verossiacutemil para a soluccedilatildeo do conflito Para tal analisemos os elementos que estruturam a composiccedilatildeo da argumentaccedilatildeo juriacutedica

41 SITUA CcedilAtildeO DE C O N FLITO

Registrar a situaccedilatildeo de conflito eacute fundamental para delimitar a quesshytatildeo sobre a qual se argumentaraacute Isso porque seratildeo fornecidos os elementos indispensaacuteveis para compor o caso concreto e inseri-lo no contexto juriacutedico Nesfa parte do planejamento o orador definiraacute a centraidade da questatildeo juriacutedica que estaraacute sob apreciaccedilatildeo isto eacute o fato juriacutedico Em seguida idenshytificaraacute as partes envolvidas na lide devidamente descritas determinando aquele que em tese representa o sujeito passivo e o que seraacute considerado sujeito ativo Por fim estabeleceraacute quando e onde o fato ocorreu

Eacute importante definir as partes que compotildeem a lide uma vez que soshybre uma recairaacute um direito subjetivo e sobre a outra um dever juriacutedico Ora em algumas situaccedilotildees atribui-se um dever a uma parte que na verdade natildeo lhe cabe A tiacutetulo de exemplo suponhamos que X vendedora da loja Y conclui que a cliente Z tenha subtraiacutedo uma peccedila de roupa que X havia deixado sobre o balcatildeo e laacute natildeo se encontrava mais Dirigiu-se a Z e de forma ofensiva mandou que esvaziasse a bolsa e mostrasse o que havia em seu interior A cliente muito nervosa comeccedilou a chorar e negou-se a abrir a bolsa Nesse momento o seguranccedila da loja segurou-lhe o braccedilo retirou sua bolsa e abriu-a na frente dos demais clientes Constatou que natildeo havia nada da loja na bolsa de Z A cliente perante o constrangimento vivencia- do decidiu mover uma accedilatildeo de reparaccedilatildeo pelos danos morais sofridos em face daqueles que lhe impuseram tal constrangimento Orientada por um advogado foi-lhe esclarecido que embora a vendedora e o seguranccedila teshynham promovido o constrangimento a responsabilidade civil pelo evento seraacute da empresa onde o fato ocorreu jaacute que aqueles profissionais satildeo seus prepostos e suas condutas satildeo responsabilidade da pessoa juriacutedica que os contratou Portanto a accedilatildeo deve ser proposta em face da empresa e natildeo de seus funcionaacuterios

Com relaccedilatildeo agrave caracterizaccedilatildeo das partes quando couber importa que sejam objetivamente descritas suas caracteriacutesticas fiacutesicas psicoloacutegicas sociais e econocircmicas uma vez que essas informaccedilotildees podem servir de ar-

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 53

l-mnento na defesa de uma tese Importa considerar que por estarmos lidando com a valoraccedilatildeo de certos atributos particulares de cada parte eacute necessaacuterio justificar a interpretaccedilatildeo operada a respeito destes Por exemshyplo digamos que um liacuteder comunitaacuterio homem de 35 anos enfermeiro lenha atraiacutedo ateacute a sua casa uma jovem de 13 anos moradora da mesma comunidade e ali estupra-a Seu ato assume uma proporccedilatildeo maior de culshypabilidade do que se igualmente fosse protagonizado por um rapaz de 18 anos colega de 7a seacuterie da menina Dimensionando os atributos de ambos os acusados imputariacuteamos ao primeiro maior discernimento para o ato pra- licado uma vez que se pressupotildee ser mais experiente do que o segundo e ainda saber avaliar melhor as consequecircncias dos seus atos Aleacutem disso era uma pessoa que inspirava a confianccedila dos moradores da comunidade que liderava Usou portanto de abuso de confianccedila para atrair a jovem e alcanccedilar o seu intento

Observamos agora a importacircncia de definir o espaccedilo e tempo em que ocorre o fato juriacutedico Haacute enfoques importantes a serem observados quanto agrave precisatildeo de situaacute-los

Ressalta-se inicialmente a forma como eacute dimensionado o fato juriacutedi- eo mediante essas duas circunstacircncias espaccedilo e tempo Tal avaliaccedilatildeo estaacute situada no plano objetivo e no plano subjetivo

Quanto ao plano objetivo analisemos a questatildeo sob o acircngulo proshycessual De acordo com o art 69 inciso I do Coacutedigo de Processo Penal determinaraacute a competecircncia jurisdicional o lugar da infraccedilatildeo Dessa forma eacute incontestaacutevel a necessidade de sermos expliacutecitos quanto ao local em que sc produziu o fato

Com relaccedilatildeo ao tempo em que se deu o fato juriacutedico haacute implicaccedilotildees legais que orientam a forma como essa informaccedilatildeo deve ser avaliada senshydo portanto imprescindiacutevel defini-lo Fixemo-nos no art 4deg do Coacutedigo Penal ldquoConsidera-se praticado o crime no momento da accedilatildeo ou omissatildeo ainda que outro seja o momento do resultadordquo Quais as possiacuteveis conseshyquecircncias dessa norma Uma delas eacute a definiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave lei que deveraacute orientar o julgador no caso de haver entrado em vigecircncia uma lei nova Imaginemos que a nova seja mais rigorosa do que a anterior Nesse caso como no Direito Penal uma lei soacute retroage em benefiacutecio do reacuteu esse seraacute julgado segundo a lei vigente no tempo em que se produziu o ato iliacutecito

No plano subjetivo haacute questotildees relativas ao tempo e ao espaccedilo que devem ser destacadas Isso porque a valoraccedilatildeo de um fato juriacutedico estaacute sushyjeita tambeacutem agrave eacutepoca e ao local onde ele se desenvolve quanto mais proacuteshyximo dos grandes centros urbanos estiver o local onde se produziu o fato

54 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

juriacutedico e quanto mais contemporacircneo for esse fato maior a expectativa de que as partes envolvidas estejam mais conscientes quanto agraves consequecircncias juriacutedicas dos seus atos

Por essa razatildeo mais tolerante seraacute a nossa avaliaccedilatildeo por exemplo com o marido que no interior de Pernambuco em 1970 forccedila sua esposhysa agrave praacutetica sexual do que o mesmo ato praticado no municiacutepio do Rio de Janeiro em 2013 Isso porque no interior de determinados estados do Brasil ainda se considera a mulher como objeto de posse por quesshytotildees culturais distintas das que predominam em outras localidades Natildeo se trata de julgar adequada a conduta do marido que estupra a mulher somente porque estatildeo no interior mas de apurar com coerecircncia a culpashybilidade do agente a partir da informaccedilatildeo referente ao espaccedilo geograacutefico porquanto o elemento ldquo costumerdquo nunca deve ser afastado da apuraccedilatildeo do iliacutecito penal

Quando fazemos referecircncia ao ldquo costumerdquo como elemento relevante para a apuraccedilatildeo do evento juriacutedico em anaacutelise partimos do pressuposto de que o Brasil eacute um paiacutes plural e nas regiotildees mais afastadas ainda hoje o marido entende ter direitos sobre a mulher que lhe deve obediecircncia Jaacute nas capitais com a crescente inserccedilatildeo da mulher no mercado de trabalho com a sua conscientizaccedilatildeo quanto aos seus direitos e com a liberdade sexual mediante o uso de anticonceptivos a mulher passou a se ver e a ser vista como um ser capaz de decidir sobre a disposiccedilatildeo do seu corpo Nesse conshytexto o ato sexual imposto pelo marido sem a concordacircncia da mulher eacute estupro nos termos do art 213 do CP

Esperamos que tenha ficado claro que todas essas informaccedilotildees (o quecirc quem onde e quando) iratildeo compor um contexto que seraacute explorado na construccedilatildeo do texto argumentativo

Como elaborar a situaccedilatildeo de conflito para o seguinte caso concreto

Caso concreto com adaptaccedilotildees

Crianccedila entrou no hospital para fazer cirurgia corriqueira e morreu por ruptura no estocircmago

24052012 - Gazeta do Povo

Jaacute estaacute marcada a exumaccedilatildeo do corpo de Joatildeo Victor da Silva 4 anos que morreu depois de uma cirurgia em 03 de maio de 2012 em Ponta Grossa nos Campos Gerais O pedido foi feito pela famiacutelia

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 55

e autorizado pela Justiccedila para averiguar a hipoacutetese de erro meacutedico O atestado de oacutebito indica que o menino morreu por conta de ruptura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas Os pais estatildeo inconformados com o desfeshycho traacutegico do que era para ser uma corriqueira cirurgia nas amiacutedalas e na adenoacuteideJoatildeo Victor foi internado agraves 6h30min do dia 3 de maio e a operaccedilatildeo deshyveria durar entre 15 e 30 minutos Quando retomou ao quarto por volta de 8 horas os pais notaram que o abdocircmen do menino estava inchado Foi feita a pulsatildeo mas o quadro continuou se agravando ateacute que foi internado na unidade de terapia intensiva (UTL) com sangramento pela boca e pelo narizJoatildeo foi operado porque tinha crises de amidalite frequentesA advogada Liciane Silva e o engenheiro civil Rozenildo Torres Silva pais do garoto afirmam que nenhum meacutedico prestou qualquer esclashyrecimento sobre o que estava acontecendo Eles insistiram em vatildeo para que Joatildeo Victor fosse operado para encontrar a causa das comshyplicaccedilotildeesSoacute depois das 22 horas e apoacutes a intervenccedilatildeo de dois meacutedicos eacute que o cirurgiatildeo pediaacutetrico do hospital aceitou fazer a operaccedilatildeo exploratoacuteria A cirurgia comprovou a perfuraccedilatildeo no estocircmago mas natildeo conseguiu salvar o menino que morreu uma hora depois O inqueacuterito aberto indica a possibilidade de imperiacutecia durante a entubaccedilatildeo e de negligecircncia pela demora na realizaccedilatildeo da cirurgia corretivaO cirurgiatildeo pediaacutetrico Augusto Nunes nega qualquer responsabilidade na morte de Joatildeo Victor Ele afirma que apenas tratou os sintomas de um problema causado anteriormente ldquoA causa morte da crianccedila natildeo eacute pelo meu procedimentordquo destaca Ele reforccedilou que espera uma apuraccedilatildeo rishygorosa do caso para entender o que aconteceu0 anestesista Nilton Pereira tambeacutem natildeo sabe explicar o que causou as complicaccedilotildees que resultaram na morte do menino Ele assegura que dushyrante a operaccedilatildeo tudo transcorreu normalmente e discorda do atestado de oacutebito que aponta problemas anesteacutesicos1 - Situaccedilatildeo de conflito (pequeno paraacutegrafo redigido sem juiacutezo de valor que conteacutem as seguintes informaccedilotildees o quecirc Quem Quando Onde)

Sugestatildeo Augusto Nunes cirurgiatildeo pediaacutetrico e Nilton Pereira anestesista satildeo acusados de terem causado a morte de Joatildeo Vitor 4 anos representado por seus pais - Liciane Silva advogada e Rozenildo Torres Silva engenheiro civil - quando da realizaccedilatildeo de uma cirurgia em 3 de maio de 2012 em Ponta Grossa nos Campos Gerais

56 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

42 T ESE

Entendemos como tese uma interpretaccedilatildeo que se extrai de um conshytexto a fim de se alcanccedilar um determinado fim que se espera ver agasashylhado pelo Direito e que seraacute submetida a um julgamento A tese eacute aquilo que se precisa provar objetivando persuadir o auditoacuterio acerca da sua veshyrossimilhanccedila Natildeo haacute expectativa de que ela assuma o status de verdade jaacute que nas Ciecircncias Humanas a tese eacute subjetiva adstrita a valores sendo portanto discutiacutevel

Considerando que o orador deseja persuadir um auditoacuterio eacute imporshytante tambeacutem que a sua tese natildeo contrarie as presunccedilotildees desse auditoacuterio particular e muito menos do auditoacuterio universal Isso porque soacute haveraacute adesatildeo aos argumentos enunciados se esses estiverem em conformidade com os valores desses auditoacuterios A tese por isso triunfaraacute se houver inteshyraccedilatildeo entre orador e auditoacuterio e se for empreendida uma argumentaccedilatildeo com base em argumentos loacutegicos e razoaacuteveis

Tendo em vista que a norma (lei doutrina princiacutepios jurisprudecircncia etc) eacute acolhida como premissa aceitaacutevel pelo auditoacuterio universal e consishyderando ainda que a tese deve preferencialmente natildeo contrariar as preshysunccedilotildees do auditoacuterio entendemos que a tese para ter maior probabilidade de ser aceita pelo auditoacuterio particular deve buscar amparo na norma

A tese que sustenta a possibilidade de realizaccedilatildeo da eutanaacutesia em doentes terminais por exemplo dificilmente seria aceita hoje ein qualquer tribunal ou corte superior brasileira pois atualmente natildeo existem no ordeshynamento juriacutedico paacutetrio fundamentos para sustentaacute-la

E por essa razatildeo que dissemos que a tese tem ldquomais chancerdquo de ser acolhida quando encontra amparo na norma Veja que natildeo dissemos que a tese sem amparo na norma deixaraacute de ser acolhida Muitos direitos hoje gashyrantidos foram fruto da insistecircncia de advogados promotores e defensores que natildeo se acomodaram diante das dificuldades Decorrente desse esforccedilo muitas teses minoritaacuterias ou inicialmente isoladas passaram a ser acolhidas no judiciaacuterio brasileiro

Consideram-se loacutegicos os argumentos que tecircm como elemento gerashydor uma tese coerente com o ponto de referecircncia a que essa se associou isto eacute a uma premissa maior legitimada pelo Direito Portanto natildeo se pode negar que o sistema juriacutedico impotildee fontes especiacuteficas do Direito que lishymitam a arbitrariedade e oferecem seguranccedila ao procedimento juriacutedico Quando se deseja defender algueacutem que se arroga senhor de um direito subshyjetivo eacute necessaacuterio verificar o que tais fontes de fato lhe conferem e com base nessa afericcedilatildeo construir a tese que se pretende defender

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 57

Como exemplo pode-se citar o caso concreto publicado pelo jornal () (1obo em janeiro de 2004 de um cidadatildeo 27 anos desempregado com fome que invadiu o Campo de Santana Rio de Janeiro de madrugada e estrangulou um pavatildeo branco de aproximadamente 39 quilos A ave vivia no parque haacute 14 anos Esse cidadatildeo foi perseguido por travestis da Praccedila da Repuacuteblica que o agrediram com socos e com pontapeacutes Ao fugir tentou pular de volta para o Campo de Santana e ficou preso pelo braccedilo esquerdo nas grades de ferro do campo Foi resgatado por bombeiros encaminhado ao hospital e em seguida preso Sabe-se que a norma condena o ato prati- eado por esse cidadatildeo prescrevendo pena de prisatildeo jaacute que o pavatildeo branco e um animal protegido pelo Ibama

O orador caso esteja na situaccedilatildeo de defensor do reacuteu deve estar cons- eiente de que a norma dispotildee tal ato como iliacutecito Entretanto caso assumaii tese de estado de necessidade - hipoacutetese prevista pela norma - e tendo sucesso em comprovaacute-la estaraacute extinta a ilicitude do ato cometido pelo seu cliente A questatildeo entatildeo seraacute provar que segundo as circunstacircncias que envolvem esse caso especiacutefico eacute possiacutevel admitir tal tese

Dessa forma adotando como premissa maior a norma dever-se-atildeo reunir os fatos as provas e os indiacutecios estabelecer uma interseccedilatildeo entre eles de forma a extrair um ponto comum em que se possa inferir o estado de necessidade Nesse caso o melhor raciociacutenio a ser desenvolvido eacute o indutivo jaacute que reunimos premissas menores dimensionamos tais premisshysas - praacutetica subjetiva em que a emoccedilatildeo ocupa preponderante funccedilatildeo - e aplicamos o criteacuterio da razoabilidade a fim de persuadir acerca da mais justa forma de solucionar o conflito

Como vimos quando elaboramos uma tese precisamos ter consciecircnshycia de que ela se encontra limitada pelas possibilidades de soluccedilotildees adshymitidas pelas normas pela interpretaccedilatildeo que se opera em relaccedilatildeo a essas normas visando adaptaacute-las ao nosso tempo ao nosso espaccedilo e agraves circunsshytacircncias do caso concreto e pelas circunstacircncias em que ocorre Na verdashyde sua elaboraccedilatildeo depende de um movimento equilibrado entre razatildeo e emoccedilatildeo

Voltando ao caso concreto registrado referente agrave morte do menino Joatildeo Victor que tese os advogados dos pais da crianccedila poderiam defender

Uma sugestatildeo

Tese (Expressatildeo do juiacutezo de valor deve registrar a presunccedilatildeo do direito e o que se precisa provar para alcanccedilar tal objetivo) Sugestatildeo

58 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Os meacutedicos devem indenizar a famiacutelia por ter havido imperiacutecia e neshygligecircncia

43 A C O N TEXTU A LIZA Ccedil Atilde O DO R E A L

A argumentaccedilatildeo juriacutedica difere especialmente de outros tipos de arshygumentaccedilatildeo por algumas razotildees dentre elas destacam-se a) estaacute limitada por um sistema normativo b) embora limitada por esse sistema admite a assunccedilatildeo do criteacuterio de razoabilidade c) baseia-se em provas fatos e indiacuteshycios Relativamente a esse uacuteltimo aspecto fixar-nos-emos agora

Um propagado princiacutepio do Direito eacute ldquo cada caso eacute um casordquo Ora entendemos que na verdade satildeo as peculiaridades de cada caso concreto que determinam o caminho a ser adotado em uma argumentaccedilatildeo e que hashyveratildeo de lhe dar sustentaccedilatildeo Daiacute a validade do brocardo juriacutedico ldquodaacute-me os fatos que eu te darei o direitordquo

Insistimos que tal caminho deva estar legitimado pelas fontes do Direito Dessa forma torna-se necessaacuterio extrair do caso concreto todas as informaccedilotildees que expliacutecita ou implicitamente concorram para a comshyprovaccedilatildeo da tese Compreender o caso concreto interpretar todas as suas sutilezas valoraacute-las apreender os diversos sentidos que um mesmo fato prova ou indiacutecio promovem eacute fundamental para a produccedilatildeo de um texshyto argumentativo consistente Observa-se pois que natildeo basta identificar tais informaccedilotildees eacute necessaacuterio dimensionaacute-las de forma a utilizaacute-las com mestria

Acrescente-se que eacute fundamental se antecipar ao seu opositor e destashycar todas as informaccedilotildees que possam fragilizar a sua tese Assim iraacute elaboshyrar estrateacutegias que demonstrem os pontos fracos dos argumentos contraacuterios aos seus

Importa que se reveja o que vem a ser fato prova e presunccedilatildeo ou indiacutecio e em que proporccedilatildeo um ou outro exerce um poder de persuasatildeo maior ou menor no discurso juriacutedico Ao nos referirmos a fato desejamos expressar uma ocorrecircncia baseada em uma realidade objetiva logo aferida Segundo De Plaacutecido e Silva (1975) muitas acepccedilotildees se extraem do termo fato A noacutes interessaraacute natildeo soacute aquela que indica a ldquoexistecircncia de evento ou coisa que veio ou foi feita () materialidade ou a demonstraccedilatildeo concreta do acontecimento ou da accedilatildeo sem interferecircncia do direito () a realidade do que aconteceu ou estaacute acontecendordquo mas tambeacutem accedilotildees negativas isto eacute consequecircncia do que deveria ter sido feito e natildeo foi a omissatildeo

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 59

O fato pode ser um acontecimento natural natildeo volitivo como uma Icmpestade que ldquo pode trazer consequecircncias de direito uma inundaccedilatildeo pode transportar porccedilotildees de terra de uma para a outra margem de um rio alterando relaccedilotildees de propriedaderdquo (Miguel Realc) ou acontecimento reshysultante da vontade humana considerado ato comportamento ao qual ldquoa norma juriacutedica confere consequecircncias de direito tais como as de constituir modificar ou extinguir uma lsquorelaccedilatildeo juriacutedicarsquo ou mais amplamente uma lsquosituaccedilatildeo juriacutedicarsquordquo (Miguel Reale) Enfim podemos observar que o ato juriacutedico eacute uma espeacutecie de fato Entretanto como nossa finalidade eacute levan- larmos informaccedilotildees que correspondam agrave realidade faacutetica natildeo nos prendeshyremos a essa distinccedilatildeo entre ldquo fatordquo e ldquo atordquo O fundamental eacute que estejamos conscientes de que os fatos tecircm grande poder persuasivo jaacute que raramente podem ser contrariados

Quanto agraves provas importa registrar o que ensina De Plaacutecido e Silva cm seu Dicionaacuterio Juriacutedico

Do latim proba de probare (demonstrar reconhecer formar juiacutezo de) entende-se assim no sentido juriacutedico a denominaccedilatildeo que se faz pelos meios legais da existecircncia ou veracidade de um fato material ou de um ato juriacutedico em virtude da qual se conclui por sua existecircncia do fato ou do ato demonstradoA prova consiste pois na demonstraccedilatildeo de existecircncia ou da veracidade daquilo que se alega como fundamento do direito que se defende ou que se contestaE nesta razatildeo no sentido processual designa tambeacutem os meios indicashydos em lei para realizaccedilatildeo dessa demonstraccedilatildeo isto eacute a soma de meios para constituiccedilatildeo da proacutepria prova ou seja para conclusatildeo ou produccedilatildeo de certeza

A prova pode fundar-se na afirmaccedilatildeo ou na negaccedilatildeo de fatos sobre que se pretende tenha nascido ou originado direito Assim orienta-se na afirmaccedilatildeo positiva ou na afirmaccedilatildeo negativa do fato contestado de cuja demonstraccedilatildeo decorreraacute a certeza da afirmaccedilatildeo

A prova por isso constitui em mateacuteria processual a proacutepria alma do processo ou a luz que vem esclarecer a duacutevida a respeito dos direitos disputadosMas tomada num duplo sentido objetivo e subjetivo natildeo se mostra somente a demonstraccedilatildeo material revelada pelo conjunto de meios utishylizados para a demonstraccedilatildeo da existecircncia dos fatos (sentido objetivo) como tambeacutem a proacutepria certeza ou convicccedilatildeo a respeito da veracidade da afirmaccedilatildeo feita (sentido subjetivo)

60 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

E assim sendo juridicamente compreendida a prova eacute a proacutepria conshyvicccedilatildeo acerca da existecircncia dos fatos alegados nos quais se fundam os proacuteprios direitos objetos da discussatildeo ou do litiacutegio Em consequecircncia somente haacute provas quando pela demonstraccedilatildeo se produz uma luz sushyficiente para achar a verdade ou quando os elementos componentes da demonstraccedilatildeo estabeleceram uma forccedila suficiente para produzir certeza ou convicccedilatildeo

Na busca por essa ldquo luz suficiente para achar a verdaderdquo pode-se reshycorrer basicamente agrave prova testemunhal agrave prova pericial e agrave prova docushymental

Com relaccedilatildeo agrave prova testemunhal aquela formulada mediante deshypoimentos ou declaraccedilotildees de pessoas que tiveram conhecimento direto ou indireto dos fatos em causa importa destacar que sua eficaacutecia se restringe especialmente a dois aspectos 1) grau de idoneidade da testemunha de envolvimento com as partes e o de firmeza de sua declaraccedilatildeo acerca do fato ou fatos depostos 2) o nuacutemero de testemunhas normalmente uma uacutenica testemunha costuma ser insuficiente para a produccedilatildeo de uma prova perfeita e plena Acrescenta-se que esse tipo de prova somente eacute admitido de acordo com a regra legal quando for produzida diante do juiz e com o conhecimento da parte contraacuteria Ela representa enfim a reconstituiccedilatildeo do fato tal qual existiu no passado

A prova documental eacute representada ldquopor documento ou pela demonsshytraccedilatildeo do fato alegado por meio de documento isto eacute um papel escrito onde o mesmo se mostra materializadordquo (De Plaacutecido e Silva) Aleacutem disso conforme o art 383 do Coacutedigo de Processo Civil acerca da prova docushymental ldquo qualquer reproduccedilatildeo mecacircnica como a fotograacutefica cinematograacuteshyfica fonograacutefica ou de outra espeacutecie faz prova dos fatos ou das coisas representadas se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conforshymidaderdquo Tal prova visa a representar o fato e surtiraacute o efeito desejado de acordo com a sua autenticidade a sua legitimidade e o seu conteuacutedo Destaca-se ainda o valor permanente que a prova documental possui dishyferentemente da prova testemunhal que eacute transeunte

A prova pericial se concretiza mediante o trabalho de um perito ou por meio de exames vistorias arbitramentos Ela descreve a forma atual dos fatos Dessa maneira exige a presenccedila de pessoas com incontestaacutevel idoneidade e com formaccedilatildeo teacutecnica referente agrave especificidade que cada caso a fim de contemplar os seguintes objetivos 1) cumprir uma ldquo inspeccedilatildeo determinada judicialmente para a verificaccedilatildeo de qualquer circunstacircncia ou fato alegado por uma das partes cuja veracidade natildeo pode ser comprovada

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURlDICO 61

sem ser por esse meio ()rdquo De Plaacutecido e Silva) Nesse caso denomina-se lal procedimento de exame que pode incidir sobre coisas fatos animais c pessoas Caso o exame seja ocular e incida sobre a realidade material dos fatos ligados agrave coisa chamar-se-aacute vistoria Seu objetivo eacute verificar a existecircncia da coisa sua realidade sua situaccedilatildeo e seu estado 2) ldquo apreciar o valor de determinados fatos ou coisas de que natildeo se tecircm elementos certos de avaliaccedilatildeordquo De Plaacutecido e Silva) Nesse caso deseja-se uma orientaccedilatildeo teacutecnica que promova a estimaccedilatildeo judicial dos fatos ou coisas a fim de se estipular um valor equivalente em dinheiro

As provas periciais representam importante instrumento persuasivo uma vez que procedimentos cientiacuteficos norteiam a sua execuccedilatildeo e por essa razatildeo utilizam-se de meacutetodo de teacutecnica satildeo sistemaacuteticos e estatildeo sujeitos agrave comprovaccedilatildeo Evidentemente que natildeo eacute apenas com um laudo teacutecnico que se persuade o auditoacuterio mas esse eacute um expediente eficaz e deve-se sempre que possiacutevel utilizaacute-lo

Por fim destacam-se os indiacutecios O valor probante desses se equivale aos tipos de prova jaacute destacados Entretanto difere dos demais porque

() natildeo se prestam a anaacutelises nem a classificaccedilotildees Natildeo se trata aqui de fatos representativos nos quais por sua proacutepria natureza a funshyccedilatildeo probatoacuteria eacute meramente essencial senatildeo de fatos autocircnomos cuja funccedilatildeo probatoacuteria c meramente acidental e surge pela eventualidade de uma relaccedilatildeo sua indefiniacutevel a priori com o fato a provar Por conseguinte natildeo cabe mais destacar o caraacuteter essencialmente relativo dos indiacutecios uni fato natildeo eacute indiacutecio em si senatildeo que se converte em tal quando uma regra de experiecircncia o potildee com o fato a provar em uma relaccedilatildeo loacutegica que permita deduzir a existecircncia ou natildeo existecircncia deste (CARN ELUTTI)

E possiacutevel entatildeo compreender o indiacutecio como um sinal um vestiacutegio um rastro extraiacutedo de um fato que proporciona a criaccedilatildeo de provas cirshycunstanciais conciliaacuteveis ou conexas para que se torne evidente o fato que se quer demonstrar Essa operaccedilatildeo depende da experiecircncia de quem execushyta o processo e da sua habilidade em dimensionar o fato e em estabelecer relaccedilotildees Tomemos como exemplo um assalto a uma mansatildeo onde soshymente o quarto da dona da casa estava revirado e de laacute foi levada uma caixa de joias valiosas Digamos que se deseja provar que o assalto foi praticado por algueacutem que conhecia a intimidade da casa Destaca-se portanto queo fato de a atenccedilatildeo do assaltante ter-se fixado apenas no quarto da dona da casa e de ter subtraiacutedo somente o porta-joias serviriam como indiacutecios de que o assaltante sabia exatamente o que deveria ser levado Admitidas

62 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

tais circunstacircncias eacute possiacutevel presumir que o assalto foi praticado por um empregado ou ateacute um morador da residecircncia Observemos que o procedishymento executado leva-nos a conceber um fato de presunccedilatildeo que embora seja autocircnomo do fato principal (o assalto) serve para a deduccedilatildeo do fato a provar uma vez que seguiu uma sequecircncia que manteacutem entre seus passos e tambeacutem com a realidade uma relaccedilatildeo loacutegica

Vamos retomar o caso concreto de Joatildeo Victor e destacar fatos e proshyvas que permitam comprovar a imperiacutecia e a negligecircncia por parte dos meacutedicos Aleacutem disso registrar as alegaccedilotildees que o seu opositor utiliza para contrariar a sua tese

Esse levantamento deve ser criterioso a fim de selecionar as informashyccedilotildees em que se assenta a sua tese Lembre-se de se manter fiel aos fatos e agraves provas natildeo eacute o momento de se registrarem impressotildees pessoais

Sugestatildeo de contextualizaccedilatildeo do real

Fatos favoraacuteveis agrave tese

1 - Apoacutes a cirurgia o abdocircmen do menino estava inchado Foi feita apulsatildeo mas o quadro continuou sc agravando ateacute que foi internado na unidade de terapia intensiva (UTI) com sangramento pela boca e pelo nariz

2 - Os pais afirmam que os meacutedicos natildeo esclareceram o que estavaocorrendo Tambeacutem registraram que insistiram para que o menino fosse novamente operado para que se encontrassem as causas das complicaccedilotildees

3 - Apoacutes a intervenccedilatildeo de dois meacutedicos o cirurgiatildeo pediaacutetrico do hosshypital realizou a operaccedilatildeo exploratoacuteria que comprovou a perfuraccedilatildeo no estocircmago

4 - 0 atestado de oacutebito revelou que o menino morreu por conta de rupshytura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas

Fatos contraacuterios agrave tese

1 - O cirurgiatildeo pediaacutetrico Augusto Nunes afirmou ldquoA causa morte da crianccedila natildeo eacute pelo meu procedimentordquo

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 63

2 - 0 anestesista Nilton Pereira tambeacutem assegurou que durante a opeshyraccedilatildeo tudo transcorreu normal mente e discordou do atestado de oacutebito que aponta problemas anesteacutesicos

44 H IPOacute T ESES

Importa inicialmente entender o significado da palavra hipoacutetese Seshygundo o Dicionaacuterio Eletrocircnico de Liacutengua Portuguesa de Antonio Houaiss dentre outros significados estes estatildeo registrados

1) proposiccedilatildeo que se admite independentemente do fato de ser verdashydeira ou falsa mas unicamente a tiacutetulo de um princiacutepio a partir do qual se pode deduzir um determinado conjunto de consequecircncias suposiccedilatildeo conjectura

2) suposiccedilatildeo conjectura pela qual a imaginaccedilatildeo antecipa o conhecishymento com o fim de explicar ou prever a possiacutevel realizaccedilatildeo de um fato e deduzir-lhe as consequecircncias pressuposiccedilatildeo presunccedilatildeo

Na argumentaccedilatildeo juriacutedica as hipoacuteteses satildeo proposiccedilotildees formuladas com base nos fatos elencados na contextualizaccedilatildeo do real que fornecem as suposiccedilotildees necessaacuterias para que se possa presumir a verossimilhanccedila da tese com o fato a provar Sendo assim as hipoacuteteses mantecircm uma relaccedilatildeo de coeshyrecircncia entre si jaacute que todas se dirigem a um mesmo ponto Isso natildeo represenshyta dizer que as possibilidades formuladas seratildeo iguais mas estaratildeo em uma relaccedilatildeo de interseccedilatildeo grosso modo satildeo caminhos autocircnomos que orientam o raciociacutenio para um mesmo ponto por terem algo em comum Nesse moshymento adota-se o raciociacutenio indutivo jaacute que se concebem hipoacuteteses como premissas menores que encaminharatildeo a uma uacutenica conclusatildeo a tese

Com base nas hipoacuteteses todas relacionadas pelo mesmo objetivo estru- turar-se-aacute o texto Nesse as suposiccedilotildees se transformaratildeo em afirmaccedilotildees isto eacute em inferecircncias das quais natildeo se tem duacutevida Tais afirmaccedilotildees ainda deveratildeo estar acompanhadas das justificativas que representaratildeo como se processou a conexatildeo entre elas e a conclusatildeo que se extraiu a partir dessa conexatildeo

Natildeo se pode perder de vista que sendo um texto argumentativo eacute indisshypensaacutevel que se registrem proposiccedilotildees que contenham argumentos de oposishyccedilatildeo Para tal eacute preciso o conhecimento e o uso dos conectores argumentativos de oposiccedilatildeo restritiva (adversativos) e contraste (concessivos) para que os argumentos de oposiccedilatildeo do orador sejam ilididos A estrutura do argumento de oposiccedilatildeo seraacute estudada no capiacutetulo referente aos tipos de argumento

eduardodasilvaramos
Highlight

64 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Como elaborar hipoacuteteses que visem agrave defesa da tese proposta no caso de Joatildeo Victor

Estrutura da hipoacutetese

Conector + Informaccedilatildeo extraiacuteda da contextualizaccedilatildeo do real + Inferecircncia extraiacuteda da

informaccedilatildeo anterior

Observaccedilatildeo Utilize na inferecircncia um verbo no futuro do preteacuterishyto (desinecircncia modo-temporal -ria) para indicar uma possibilidade

Sugestatildeo de hipoacuteteses

bull 1 - Jaacute que apoacutes uma cirurgia de amiacutedalas e adenoacuteide o abdocircmen da crianca apresentou inchaccedilo teria havido falha durante o proshycedimento ciruacutergico

2 - Uma vez que os pais afirmam que os meacutedicos natildeo esclareceramo que estava ocorrendo e que registraram que insistiram para que o menino fosse novamente operado a fim de encontrar as causas das complicaccedilotildees estaria comprovada a negligecircncia no atendimento agrave crianccedila

3 - Tendo em vista que o atestado de oacutebito revelou que o meninomorreu por conta de ruptura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas esshytaria comprovada a imperiacutecia meacutedica durante a cirurgia

Observaccedilatildeo Reserve as alegaccedilotildees dos meacutedicos para produzir arshygumentos de oposiccedilatildeo no Capiacutetulo 5

45 A N Aacute L ISE D ESSE PLA N EJA M EN T O EM SEN TEN CcedilA E ACOacuteRDAtildeO

A teoria desenvolvida nos capiacutetulos anteriores formou o alicerce soshybre o qual se pretende estruturar um texto argumentativo juriacutedico Com a intenccedilatildeo de demonstrar como tais conhecimentos auxiliam nessa tarefa propomos a anaacutelise da fundamentaccedilatildeo de uma sentenccedila e de um acoacuterdatildeo a fim de se percorrer o caminho inverso sugere-se uma possiacutevel estrutura que pode ser adotada como a expressatildeo da sequecircncia loacutegica do raciociacutenio exposto nas peccedilas E importante enfatizar que haacute outras possibilidades de se registrar o conteuacutedo da estrutura oferecida

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 65

451 Sentenccedila

Neste passo agrave luz da teoria do discurso e da teoria da argumentaccedilatildeo juriacutedica perscrutar-se-aacute o caminho adotado pelo juiz ao elaborar a fundashymentaccedilatildeo de sua sentenccedila Para tal foi preciso analisar compreender e construir o percurso seguido pelo magistrado Reafirme-se que se operou uma praacutetica inversa do texto para uma possiacutevel estrutura

Poder JudiciaacuterioEstado do Rio de JaneiroComarca de Volta RedondaJuiacutezo de Direito da 3a Vara CiacutevelProcesso ndeg 15386SENTENCcedilAVistos etcTrata-se de Accedilatildeo Ordinaacuteria de Responsabilidade Civil ajuizada por Eva Azevedo de Paula por si e representando seus filhos menores impuacutebeshyres Pedro Henrique de Paula e Carlos Henrique de Paula em face da autarquia municipal denominada Serviccedilo Autocircnomo HospitalarAlegam os autores como causa de pedir em siacutentese que1) O marido da autora foi atingido por disparo acidental de arma de fogo tendo sido encaminhado ao Hospital Satildeo Joatildeo Batista adminisshytrado pelo reacuteu onde se constatou a necessidade de imediata internaccedilatildeo ciruacutergica a fim de estancar hemorragia interna2) Ocorre que o mencionado hospital natildeo dispunha de meacutedico anesshytesista de plantatildeo em que pese contar com meacutedico cirurgiatildeo para tal operaccedilatildeo (f 03)3) Em vez de providenciar a remoccedilatildeo imediata da viacutetima para outro hosshypital o responsaacutevel ldquo limitou-se a tentar conseguir meacutedico anestesista por meio de telefonemasrdquo (f 03)4) Finalmente quase duas horas depois a viacutetima deu entrada no Hospishytal da CSN com o seu estado de sauacutede agravado ldquo por falta de socorro adequado e imediatordquo (f 03)5) Aguardam portanto a condenaccedilatildeo do reacuteu no pagamento de indeshynizaccedilatildeo consistente nos danos morais e materiais que especifica nas folhas 0607Inicial instruiacuteda com os documentos de f 0829O reacuteu apresentou a contestaccedilatildeo de f 3639 arguindo em resumo que o socorro imediato foi prestado pela equipe do Hospital Satildeo Joatildeo Batista

66 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dentro das normas teacutecnicas natildeo havendo que se ldquo falar em omissatildeo eou negligecircncia uma vez que natildeo se transfere paciente para outro serviccedilo aleatoriamente razatildeo dos procedimentos adotados pela equipe meacutedica para garantir as condiccedilotildees baacutesicas de vidardquo (f 37)Quanto aos contatos telefocircnicos alega o reacuteu ter cumprido o que estabeshylece a resoluccedilatildeo n 1787 do C REM ERJ em seu art 9deg sendo que ao chegar agrave Casa de Sauacutede Santa Margarida foi informado de que ela natildeo dispunha de CTI razatildeo pela qual foi recusada a internaccedilatildeo da viacutetima que foi entatildeo encaminhada ao Hospital da CSNAssim ldquo a se falar em negligecircncia meacutedica para a ocorrecircncia de culpa deveraacute ela ser atribuiacuteda agrave Casa de Sauacutede Santa Margaridardquo (f 38)Por fim alega que a responsabilidade do meacutedico natildeo eacute de resultado mas de meio razatildeo pela qual aguarda a improcedecircncia do pedidoReacuteplica de f 4749 reiterando os termos da inicial instruiacuteda com coacutepia do Registro de ocorrecircnciaEm provas os autores protestaram pela oitiva das testemunhas arrolashydas a f 55 e o reacuteu pelas arroladas a f 60Realizada a audiecircncia de instruccedilatildeo e julgamento de f 7078 na qual foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas foi proferida a sentenccedila de f 8892 tendo posteriormente o processo sido anulado a partir de f 58 por forccedila do acoacuterdatildeo de f 115116Realizada a audiecircncia de conciliaccedilatildeo de f 122 essa terminou frustrashydaFrustrada a realizaccedilatildeo da audiecircncia de instruccedilatildeo e julgamento de f 133 face agrave ausecircncia de 2 testemunhas essa veio a realizar-se consoante ata de f 140 na qual foram ouvidas 4 testemunhas conforme termos de fls 141146As partes apresentaram suas alegaccedilotildees finais por meio dos memoriais de f 148152 e 154155O Ministeacuterio Puacuteblico ofereceu denuacutencia de f 157158 opinando pela procedecircncia do pedidoEacute o relatoacuterio decido

Os autores fundamentam a presente accedilatildeo com o art 37 paraacutegrafo 6deg da Constituiccedilatildeo Federal que estabelece a responsabilidade objetiva das pessoas juriacutedicas de direito puacuteblico prestadoras de serviccedilo puacuteblico tenshydo em vista a natureza autaacuterquica do reacuteu a quem cabe administrar o Hospital Satildeo Joatildeo Batista ex vi do Decreto n 520A e 521 de f 1524O Ministeacuterio Puacuteblico por sua vez reitera a responsabilidade objetiva do reacuteu com fundamento entretanto na Lei 80781990 - Coacutedigo do

Consumidor jaacute que se trata de serviccedilos meacutedicos prestados por hospital como fornecedor de serviccedilosDe fato a responsabilidade do reacuteu na hipoacutetese deve scr apurada no campo da responsabilidade objetivaApesar da controveacutersia existente na doutrina no que se refere agrave resshyponsabilidade civil dos hospitais se objetiva ou subjetiva a verdade eacute que no caso trata-se dc hospital puacuteblico administrado pelo reacuteu aushytarquia municipal devendo portanto responder objetivamente pelas falhas na prestaccedilatildeo do serviccedilo hospitalar seja pela regra geral previsshyta no art 37 paraacutegrafo 6deg da CRFB ou mesmo pelo disposto no art 22 paraacutegrafo uacutenico combinado com art 14 do Coacutedigo de Proteccedilatildeo e Defesa do ConsumidorCom efeito o referido Coacutedigo prevecirc em seu art 4deg os objetivos e a Poliacutetica Nacional das Relaccedilotildees de Consumo estabelecendo no seu inshyciso V II o princiacutepio da

ldquo V II - racionalizaccedilatildeo e melhoria dos serviccedilos puacuteblicosrdquo

Em seguida no art 6deg satildeo previstos os direitos baacutesicos do consumidor entre os quais eacute exigido

ldquo X - A adequada e eficaz prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos em geralrdquo

Finalmente o art 22 e seu paraacutegrafo uacutenico da Lei 80781990 que dispotildee

Os oacutergatildeos puacuteblicos por si ou suas empresas concessionaacuterias permis- sionaacuterias ou sob qualquer outra forma de empreendimento satildeo obrishygadas a fornecer serviccedilos adequados eficientes seguros e quanto aos essenciais contiacutenuosParaacutegrafo uacutenico Nos casos de descumprimento total ou parcial das obrigaccedilotildees referidas neste artigo seratildeo as pessoas juriacutedicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados na forma prevista neste Coacutedigo

Portanto constata-se que para o Coacutedigo de Defesa do Consumidor as entidades puacuteblicas e privadas que prestam serviccedilos puacuteblicos tecircm tratashymento igualitaacuterio conforme doutrina Maria D rsquoAssunccedilatildeo Merecello in Direito do Consumidor RT ndeg 19 p 233) respondendo assim objetishyvamente pelos danos causados aos consumidoresO Des Seacutergio Cavai ieri por sua vez em Programa de Responsabilidashyde Civil ressalta que a responsabilidade das instituiccedilotildees hospitalares como prestadoras de serviccedilos eacute objetiva in verbis

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO

68 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A responsabilidade do hospital embora natildeo vaacute ao ponto de garantir a vida ou assegurar a cura do paciente inclui um dever de incolumidade na medida em que tem de resguardar o paciente de quaisquer conseshyquecircncias que um bom serviccedilo poderia evitar Tem obrigaccedilatildeo natildeo soacute de prestar assistecircncia medica mas tambeacutem como hospedeiro respondenshydo pelas consequecircncias da violaccedilatildeo de quaisquer dos seus deveres conshysoante o art 1521 IV do Coacutedigo Civil Como prestadores de serviccedilos a responsabilidade das instituiccedilotildees hospitalares eacute objetiva pois enquashydra-se tambeacutem no art 14 do Coacutedigo do Consumidor (grifo nosso)

Com efeito em se tratando de estabelecimento puacuteblico administrado por autarquia municipal eacute de se impor o enquadramento da hipoacutetese no campo da responsabilidade objetiva repita-se seja por forccedila do art 37 paraacutegrafo 6deg da CRFB ou o mesmo disposto no art 22 paraacutegrafo uacutenico cc art 14 do Coacutedigo de Defesa do ConsumidorCumpre verificar portanto se houve ou natildeo na hipoacutetese defeito na prestaccedilatildeo do serviccedilo desempenhado pelo hospital em razatildeo da ausecircncia do meacutedico anestesista do hospital o qual se encontrava de sobreaviso e natildeo foi encontrado quando da emergecircncia impedindo a realizaccedilatildeo da intervenccedilatildeo ciruacutergica bem como se existe nexo de causalidade entre o aludido fato e a morte da viacutetimaO exame dos autos revela que realmente existiu falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo emergencial Isso porque um hospital que realiza atendimento de emergecircncia deve dispor dos equipamentos miacutenimos e da equipe neshycessaacuteria para ocorrendo a emergecircncia prestar o pronto atendimento ao paciente seja ele ciruacutergico ou natildeo o que natildeo ocorreu no casoOra na hipoacutetese constata-se que a viacutetima frise-se chegou ao Hospital administrado pelo reacuteu com vida ainda luacutecida e caminhando conforme declarou a testemunha de f 76 em depoimento ratificado a f 144Assim prestados os primeiros socorros pelo cirurgiatildeo plantonista este concluiu ser indispensaacutevel a intervenccedilatildeo ciruacutergica a fim de conter a hemorragia do paciente a qual natildeo pocircde ser efetivada face agrave ausecircncia do meacutedico anestesista que se encontrava em regime de sobreaviso e natildeo pocircde ser encontradoCom isso o paciente teve de ser transferido para outro hospital qual seja o da Companhia Sideruacutergica Nacional em que deu entrada cerca de duas horas depois face agraves dificuldades da transferecircncia ldquo em estado grave apresentando choque hipovolecircnico e hemotoacuterax agrave direitardquo (f 45)A prova testemunhal revela claramente que houve falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo na medida em que a intervenccedilatildeo ciruacutergica que se fazia neshycessaacuteria para aumentar as chances de sobrevivecircncia do paciente natildeo foi realizada devido agrave ausecircncia do anestesista fato que agravou o estado

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 69

de sauacutede da viacutetima que teve de ser removida para outro hospital aonde chegou cerca de duas horas depois repita-se jaacute em estado criacuteticoEacute o que se colhe do depoimento de f 7475 (ratificado a f 146 e f 7778 e f 141) in verbis

ldquo () que em medicina para se salvar o paciente eacute necessaacuterio que o atenshydimento seja o mais imediato possiacutevel salientando-se que o paciente com o quadro hemorraacutegico como ocorrido nesta hipoacutetese em exame soacute teria chance de sobrevivecircncia no caso de socorro imediato sendo por conseguinte o retardo terapecircutico determinante de extrema piora prognostica() que diante do quadro apresentado pelo paciente o ideal eacute que tivesse sido operado no primeiro hospital que deu entrada() a cirurgia naquele momento era imprescindiacutevel ateacute para conter a hemorragia do paciente() se houvesse anestesista no hospital no dia dos fatos afirma o depoenshyte que teria realizado a cirurgiardquo

Constatara-se portanto ter havido evidente falha na prestaccedilatildeo do servishyccedilo em questatildeo considerando que se trata de atendimento emergencial que deixou se ser prestado adequadamente face agrave ausecircncia do anesteshysista o que impossibilitou a realizaccedilatildeo da cirurgia privando a viacutetima de um direito baacutesico que eacute a ldquo adequada e eficaz prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicosrdquo Assim conforme a doutrina jaacute citada embora a responsabilidade do hospital natildeo vaacute ao ponto de garantir a vida ou assegurar a cura ele tem o dever de resguardar o paciente de quaisquer consequecircncias que um serviccedilo adequado poderia evitar e o serviccedilo na hipoacutetese soacute o seria se realizada a cirurgia de emergecircnciaCumpre ressaltar ad argumentandum tantum que a gravidade da lesatildeo apresentada no momento da internaccedilatildeo natildeo afasta a obrigaccedilatildeo do hosshypital em prestar o serviccedilo de forma adequada e eficaz o que significa dizer completo natildeo se podendo admitir que uma cirurgia deixe dc ser realizada por ausecircncia de meacutedico anestesistaHouve portanto negligecircncia por parte da direccedilatildeo do hospital o qual elegeu arriscado sistema de sobreaviso para o meacutedico anestesista assushymindo assim o risco de ele natildeo ser encontrado fato que na hipoacutetese impediu a realizaccedilatildeo da cirurgia e consequentemente agravou o estado de sauacutede da viacutetima devendo se impor a obrigaccedilatildeo de indenizarConstatada a obrigaccedilatildeo de indenizar cumpre fixar as verbas indenizaacute- veis a comeccedilar pelos danos materiais

70 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Os autores requereram a condenaccedilatildeo da Reacute ao pagamento de ldquo pensatildeo progressiva a ser arbitrada por esse Juiacutezo seguindo o salaacuterio baacutesico para os empregados em construccedilatildeo civil em que exercia o de cujus sua ativishydade vincenda e vencidardquo (f 07 com a constituiccedilatildeo de capital durante o periacuteodo de sobrevida provaacutevel da viacutetima)A alegaccedilatildeo de que a viacutetima agrave eacutepoca dos fatos trabalhava na construccedilatildeo civil aleacutem de natildeo impugnada pela reacute (art 30 do CPC) encontra respaldo nos documentos de f 1228 e 29 razatildeo pela qual sendo os autores cocircnjuge e filhos menores da viacutetima tem-se entendido que a dependecircncia econocircmica eacute presumida evidenciando assim o dano qual seja o lucro cessanteO pensionamento pretendido entatildeo eacute devido acrescido de 13deg salaacuterio o qual integra a remuneraccedilatildeo do trabalhador e portanto independe de pedido sendo que a jurisprudecircncia dos tribunais brasileiros eacute no sentido de fixaacute-la em 23 dos ganhos da viacutetima jaacute que 13 equivaleria aos seus gastos pessoais devidos ateacute a data em que completaria 65 anos a qual reflete a sobrevida provaacutevel tranquilamente aceita pela jurisprudecircnciaNo entanto inexistindo nos autos prova do quantum da remuneraccedilatildeo percebida pela viacutetima a pensatildeo deveraacute ser fixada em quantia equivalenshyte a 23 dos ganhos da viacutetima valor esse que deveraacute ser convertido em salaacuterio miacutenimo vigente na eacutepoca do fato conforme suacutemula 490 do STF tudo a ser apurado em liquidaccedilatildeo de sentenccedilaA pensatildeo devida aos filhos menores apesar de a reacute natildeo impugnar natildeo pode se estender pelo resto de suas vidas Deve ela perdurar por tempo que lhes permita educar-se e buscar seus caminhos proacuteprios o que jaacute eacute praxe dura ateacute os 24 (vinte e quatro) anosEste o limite o termo final do pensionamento dos filhos da viacutetimaQuanto agrave reversatildeo da pensatildeo dos filhos para a I a autora entendo deva ser deferida apesar de inexistir pedido expresso nesse sentido Isso porshyque o pedido dos autores eacute abrangente pois natildeo fixa termo ad quem para a pensatildeo dos menores devendo ser portanto deferida a reversatildeo no momento em que estes completarem 24 anos sem o que haveraacute por parte da reacute enriquecimento iliacutecitoO dano moral por sua vez tambeacutem existe na hipoacutetese e deve ser concedidoApesar de inexistirem paracircmetros fixos a serem observados para a fishyxaccedilatildeo destes a verdade eacute que alguns princiacutepios devem ser observados especialmente aquele que atribui ao dano moral a natureza de pena prishyvada conforme sustentado pelo eminente Min Moreira AlvesAssim o caraacuteter punitivo no caso deve ser suficiente para desestimular a repeticcedilatildeo de fatos semelhantes de forma que a administraccedilatildeo puacuteblica tenha mais zelo na prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos essenciais como no caso da sauacutede em que satildeo noticiados frequentemente casos como o presente

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 71

Deve-se considerar ainda o sofrimento do ofendido que se apresenta na hipoacutetese sem seu grau maacuteximo considerando a morte da viacutetima cocircnshyjuge e pai dos autoresPortanto norteado pelos paracircmetros em apreccedilo acolho o pedido inicial e fixo os danos morais em R$ 3500000 (trinta e cinco mil reais)Posto isso JULGO PRO CED ENTE o pedido para condenar a parte reacute a pagar aos autores1) Pensotildees vencidas e vincendas desde a eacutepoca do evento (23101993) no valor mensal de 23 dos ganhos da viacutetima na proporccedilatildeo de 13 para cada um devidamente corrigido nos termos da suacutemula 490 do STF a ser apurado em liquidaccedilatildeo de sentenccedila2) Durando a pensatildeo para os filhos menores ateacute a data em que completashyrem 24 anos momento em que deveraacute ser revertida agrave primeira autora3) Indenizaccedilatildeo por danos morais em valor equivalente a R$ 3500000 (trinta e cinco mil reais) a ser dividido pelos autores na proporccedilatildeo de 13 para cada um a ser paga direta e imediatamente a representante legal dos menores quanto agraves respectivas partes4) Juros simples desde a data do evento ateacute a do efetivo pagamento (Suacutemula ndeg 54 STJ)5) Despesas com o processo e honoraacuterios de advogados na base de 15 (quinze por cento) sobre as prestaccedilotildees vencidas e 12 vincendas incluindo o valor referente aos danos moraisPor fim no que se refere agrave constituiccedilatildeo de capital considerando a idoshyneidade econocircmica da reacute deveraacute ele providenciar o pagamento da penshysatildeo mediante a inclusatildeo dos autores em folha de pagamento na forma do art 20 paraacutegrafo 5deg do Coacutedigo de Processo Civil

PRIVolta Redonda 23 de maio de 1997

Gustavo Bandeira da Rocha Oliveira

Juiz de Direito

Com o objetivo de delinear um provaacutevel rumo seguido pelo raciociacuteshynio do magistrado destacam-se os elementos constitutivos da argumentashyccedilatildeo juriacutedica

1) Situaccedilatildeo de conflitoEva Azevedo de Paula por si e representando seus filhos menores

impuacuteberes Pedro Henrique de Paula e Carlos Henrique de Paula acusa a

72 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

autarquia municipal denominada Serviccedilo Autocircnomo Hospitalar de falha no atendimento a seu marido causa provaacutevel de sua morte no dia 23 de oushytubro de 1993 no Hospital da Companhia Sideruacutergica Nacional em Volta Redonda para onde fora transferido

2) TeseA Autarquia Municipal Serviccedilo Autocircnomo deve indenizar por danos

morais e pagar pensatildeo agrave viuacuteva e a seus dois filhos por ter sido negligente na prestaccedilatildeo do atendimento agrave viacutetima

3) Contextualizaccedilatildeo do real

Proacute-tese1) A viacutetima atingida por um tiro acidental chegou ao Hospital Satildeo

Joatildeo Batista luacutecida e caminhando com hemorragia interna conforme tesshytemunho de f 76

2) De acordo com o cirurgiatildeo plantonista que prestou os primeiros s o c o it o s era indispensaacutevel uma intervenccedilatildeo ciruacutergica para conter a hemorshyragia (f 7475) e por ausecircncia dessa seu estado agravou-se

3) Segundo consta nos autos o meacutedico anestesista natildeo estava no hosshypital encontrava-se de sobreaviso e natildeo foi localizado

4) De acordo com o Hospital da CSN (f 45) em face das dificuldades de transferecircncia o paciente chegou ao referido hospital ldquo em estado grave apresentando choque hipovolecircnico e hemotoacuterax agrave direitardquo

Contraacuterio agrave tese1) Segundo consta nos autos a parte reacute afirma que o paciente jaacute cheshy

gou ao hospital em estado grave e recebeu socorro imediato2) De acordo com os autos a parte reacute entende que a responsabilidade

do meacutedico natildeo eacute de resultado mas de meio

4) HipoacutetesesIa) Jaacute que a viacutetima atingida por um tiro acidental chegou ao hospishy

tal luacutecida e caminhando haveria como salvar-lhe a vida prestando-lhe o devido atendimento

2a) Uma vez que de acordo com o cirurgiatildeo plantonista que prestou os primeiros socorros era indispensaacutevel uma intervenccedilatildeo ciruacutergica para conter a hemorragia (f 7475) e por ausecircncia desse procedimento seu estado agravou-se teria havido falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo

3a) Tendo em vista que segundo consta nos autos o meacutedico anesshytesista natildeo estava no hospital (encontrava-se de sobreaviso mas natildeo foi localizado) a autarquia teria assumido o risco de prestar um atendimento inadequado

4a) Jaacute que de acordo com o Hospital da CSN (f 45) face agraves dificulshydades de transferecircncia o paciente chegou ao referido hospital ldquoem estado rrave apresentando choque hipovolecircmico e hemotoacuterax agrave direitardquo seu estashydo teria se agravado pela negligecircncia do Hospital Satildeo Joatildeo Batista

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO

152 Acoacuterdatildeo

O acoacuterdatildeo oferecido a seguir constitui um pronunciamento exemplar quanto ao conteuacutedo juriacutedico e quanto agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua portuguesa Por essa razatildeo demonstra-se oportuna a sua leitura assim como a tentativa de recuperar o modo pelo qual o julgador ordenou o seu raciociacutenio para identishyficar a questatildeo a ser decidida avaliar as particularidades do caso concreto a serem valoradas analisar os argumentos dos litigantes definir-se a respeito da norma e dos princiacutepios incidentes e a aplicabilidade desses Para tal larefa recorreremos mais uma vez ao levantamento dos elementos cons- litutivos da argumentaccedilatildeo juriacutedica

ACOacuteRDAtildeO 2a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel no 76096 Relator Des Seacutergio Cavalieri FilhoRESPO N SA BIL ID AD E C IV IL DE EM PRESA JORNALIacuteST ICA Pushyblicaccedilatildeo OfensivaI L IBER D A D E C IV IL DE INFORMACcedilAtildeO VERSUS IN V IO LA B IL IshyDADE DA V ID A PRIVADA Princiacutepio da Unidade ConstitucionalNa temaacutetica dos direitos e garantias fundamentais dois princiacutepios consshytitucionais se confrontam e devem ser conciliados De um lado a livre expressatildeo da atividade intelectual artiacutestica cientiacutefica e de comunicaccedilatildeo independentemente de censura ou licenccedila de outro lado a inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem das pessoasSempre que princiacutepios constitucionais aparentam colidir deve o inteacutershyprete procurar as reciacuteprocas implicaccedilotildees existentes entre eles ateacute chegar a uma inteligecircncia harmoniosa porquanto em face do princiacutepio da unishydade constitucional a Constituiccedilatildeo natildeo pode estar em conflito consigo mesma natildeo obstante a diversidade de normas e princiacutepios que conteacutem

74 H l LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim se ao direito agrave livre expressatildeo da atividade intelectual e de comushynicaccedilatildeo contrapotildee-se o direito agrave inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem segue-se como consequecircncia loacutegica que este uacuteltimo condiciona o exerciacutecio do primeiro atuando como limite estabelecido pela proacutepria Lei Maior para impedir excessos e abusosII DANO MORAL ConfiguraccedilatildeoNa tormentosa questatildeo de saber o que configura o dano moral cumpre ao juiz seguir a trilha da loacutegica do razoaacutevel em busca da sensibilidade eacutetico-social normal Deve tomar por paradigma o cidadatildeo que se coloca a igual distacircncia do homem frio insensiacutevel e o homem de extremashyda sensibilidade Nessa linha de princiacutepio soacute deve ser reputado como dano moral a dor vexame sofrimento ou humilhaccedilatildeo que fugindo agrave normalidade interfira intensamente no comportamento psicoloacutegico do indiviacuteduo causando-lhe afliccedilatildeo angustia e desequiliacutebrio em seu bem estar natildeo bastando mero dissabor aborrecimento maacutegoa irritaccedilatildeo ou sensibilidade exacerbada Agrave luz desse contexto ningueacutem pode negar que fere a sensibilidade do homem normal e configura humilhaccedilatildeo doshylorosa divulgar em revista de grande circulaccedilatildeo que conhecida artista de novela teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou a elas comparecer alcoolizadaIII ARBITRAM ENTO DO DANO MORAL Princiacutepio da Razoabili- dadeO arbitramento judicial eacute o mais eficiente meio para se fixar o dano moral E embora nessa penosa tarefa natildeo esteja o juiz subordinado a nenhum limite legal nem a qualquer tabela prefixada deve todavia atentando para o princiacutepio da razoabilidade estimar uma quantia comshypatiacutevel com a reprovabilidade da conduta iliacutecita e a gravidade do dano por ela produzido Se a reparaccedilatildeo deve ser a mais ampla possiacutevel natildeo pode o dano transformar-se em fonte de lucro Entre esses dois limites devem se situar a prudecircncia e o bom senso do julgadorReforma parcial de sentenccedilaVistos relatados e discutidos estes autos de Apelaccedilatildeo Ciacutevel no 76096 em que eacute Ia apelante Editora Abril SA 2a apelante Maria Zilda Bethelm Vieira e apelados os mesmosAcordam os Desembargadores que integram a 2a Cacircmara Ciacutevel do Trishybunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro por unanimidade em dar provimento parcial agrave apelaccedilatildeo a fim de reduzir a indenizaccedilatildeo para 500 (quinhentos) salaacuterios miacutenimos e negar provimento ao recurso adesivo confirmando-se no mais a brilhante sentenccedila da lavra do eminente Juiz Dr Luiz FuxReporto-me ao relatoacuterio de f 407409 aduzindo que se trata de accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por dano moral decorrente de publicaccedilatildeo em revista

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 75

de grande vendagem e repercussatildeo ofensiva agrave honra e agrave intimidade da autora Postulou indenizaccedilatildeo compatiacutevel com o grau dc culpa a intensishydade do sofrimento do ofendido e o caraacuteter punitivo da indenizaccedilatildeoA sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido condenando a reacute a pagar agrave autora a quantia equivalente a quatro mil salaacuterios miacutenimos a tiacutetulo de indenizaccedilatildeo por dano moral e verba honoraacuteria de 20 sobre o valor da condenaccedilatildeoApela primeiramente a reacute (f 420439) alegando ter a sentenccedila legado ao obliacutevio todas as disposiccedilotildees da Lei de Imprensa e da Constituiccedilatildeo Federal no livre direitodever de informar Sustenta em siacutentese que a) o julgador de primeiro grau tratou desigualmente as partes na anaacutelise da instruccedilatildeo processual b) a apelante procurou mostrar nas provas docushymentais que trouxe aos autos as caracteriacutesticas da apelada o que natildeo foi considerado pelo julgador de primeiro grau c) a revista Veja atuou em absoluta conformidade com a Carta Magna informando seus leitores a respeito de fato de interesse puacuteblico como lhe asseguram os artigos 5deg incisos IV e IX e 220 sectsect 1deg e 2deg d) nada se imputou agrave pessoa da apelada tendo a notiacutecia sido dada na forma condicional como mandam todos os manuais de imprensa e) a sentenccedila incorre em engano quando afasta a aplicaccedilatildeo da Lei de Imprensa no presente caso trazendo agrave colashyccedilatildeo acoacuterdatildeo do STJ 0 a condenaccedilatildeo imposta agrave apelante viola qualquer princiacutepio que possa ser aplicado ao montante razoaacutevel da indenizaccedilatildeo eis que o proacuteprio Presidente da Repuacuteblica natildeo ganharia essa importacircnshycia em todo o seu mandato g) a indenizaccedilatildeo no valor em que foi arshybitrada importa em enriquecimento sem causa Traz agrave colaccedilatildeo vaacuterios arestos deste Tribunal no sentido de que a indenizaccedilatildeo pelo dano moral deve respeitar os limites estabelecidos na Lei de Imprensa Pede a total reforma da sentenccedila para o fim de ser julgado improcedente o pedido ou alternativamente que a condenaccedilatildeo seja reduzida aos limites da lei especial que rege a mateacuteriaRecorre adesivamente a autora (f 473484) postulando que a indenizashyccedilatildeo seja elevada para importacircncia correspondente a pelo menos 20 do valor total da tiragem da Revista Veja ou seja 632115 salaacuterios miacutenimos e que os juros moratoacuterios sejam computados a partir do ato iliacutecitoOs recursos foram respondidos (f 443471 e 488493) cada parte pugshynando pela manutenccedilatildeo da sentenccedila no ponto em que lhe foi favoraacutevel Haacute preliminar de descabimento do recurso adesivo por natildeo ter havido sucumbecircncia reciacuteprocaE o relatoacuterioEnsejou a presente accedilatildeo mateacuteria jornaliacutestica publicada na seccedilatildeo ldquo Genterdquo da Revista Veja noticiando que a autora quando estava sendo transmi-

tida a novela ldquo Olho por Olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada O fato aleacutem de natildeo contestado estaacute comprovado com um exemplar da revista trazida aos autos resta pois a anaacutelise de suas consequecircncias juriacutedicasColocadas em ordem loacutegica as questotildees levantadas nos recursos cumpre apreciar em primeiro lugar a que diz respeito agrave liberdade de informaccedilatildeo garantida pela Constituiccedilatildeo na qual se escuda a apelante para justificar a sua conduta Em seu entender teria agido em absoluta conformidade com a Carta Magna informando seus leitores a respeito de fato de inteshyresse puacuteblico pelo que natildeo teria praticado ato iliacutecitoNingueacutem questiona que a Constituiccedilatildeo garante o direito de livre exshypressatildeo agrave atividade intelectual artiacutestica cientiacutefica e de comunicaccedilatildeo independentemente de censura ou licenccedila (arts 5deg inc IX e 220 sectsect 1deg e 2deg) Essa mesma Constituiccedilatildeo todavia logo no inciso seguinte (no X) dispotildee que ldquosatildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeordquo Como se vecirc na temaacutetica atinente aos direitos e garantias fundamenshytais esses dois princiacutepios constitucionais se confrontam e devem ser conciliados Eacute tarefa do inteacuterprete encontrar o ponto de equiliacutebrio entre os princiacutepios constitucionais em aparente conflito porquanto em face do princiacutepio da unidade constitucional a Constituiccedilatildeo natildeo pode estar em conflito consigo mesma natildeo obstante a diversidade de normas e princiacutepios que conteacutem a fim de evitar contradiccedilotildees antagonismos e antinomiasEm outras palavras natildeo eacute possiacutevel analisar-se uma disposiccedilatildeo consshytitucional isoladamente fora do conjunto harmocircnico em que deve ser situada princiacutepios aparentemente contraditoacuterios podem harmonizar-se desde que se abdique da pretensatildeo de interpretaacute-los de forma isolada e absolutaCelso Ribeiro Bastos citando Willoughby diz que ldquo a Constituiccedilatildeo corshyresponde a um todo loacutegico onde cada provisatildeo eacute parte integrante do conjunto sendo assim logicamente adequado senatildeo imperativo intershypretar uma parte agrave luz das previsotildees de todas as demais partesrdquo (Curso de Direito Constitucional 15 ed Saraiva p 204)Agrave luz desses princiacutepios eacute forccediloso concluir que sempre que direitos consshytitucionais satildeo colocados em confronto um condiciona o outro atushyando como limites estabelecidos pela proacutepria Lei Maior para impedir excessos e arbiacutetrios Assim se ao direito agrave livre expressatildeo da atividade intelectual e de comunicaccedilatildeo contrapotildee-se o direito agrave inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem segue-se como conshysequecircncia loacutegica que este uacuteltimo condiciona o exerciacutecio do primeiro

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 77

Pondera o insigne Carlos Alberto Bittar que na divulgaccedilatildeo da imagem eacute vedada qualquer accedilatildeo que importe em lesatildeo agrave honra agrave reputaccedilatildeo ao decoro (ou agrave chamada imagem moral ou conceituai) agrave intimidade e a outros valores da pessoa (uso torpe) Natildeo satildeo permitidas pois quaisshyquer operaccedilotildees que redundem em sacrifiacutecio desses valores que receberatildeo sancionamento em conformidade com bem violado e nos niacuteveis possiacuteveis (Os direitos da personalidade Forense Universitaacuteria 1988 p 90-91)Leandro Konder por sua vez explica que a vida privada eacute uma conquisshyta relativamente recente da humanidade e que mesmo se entendendo que pessoas puacuteblicas tecircm o seu cotidiano naturalmente mais devassado eacute preciso que alguma liberdade lhes sobre Uma sociedade eacute feita de indiviacuteduos livres Acredito prossegue o citado autor que a revelaccedilatildeo de verdades da vida privada capazes de causar transtornos soacute se justifica se isso for essencial para se entender um fenocircmeno histoacuterico Se natildeo vira artifiacutecio sensacionalista o que eacute eticamente condenaacutevel e politicamente perigosoEm conclusatildeo os direitos individuais conquanto previstos na Constishytuiccedilatildeo natildeo podem ser considerados ilimitados e absolutos em face da natural restriccedilatildeo resultante do princiacutepio da conveniecircncia das liberdashydes pelo que natildeo se permite que qualquer deles seja exercido de modo danoso agrave ordem puacuteblica e agraves liberdades alheias Fala-se hoje natildeo mais em direitos individuais mas em direitos do homem inserido na sociedashyde de tal modo que natildeo mais exclusivamente com relaccedilatildeo ao indiviacuteduo mas com enfoque de sua inserccedilatildeo na sociedade que se justificam no estado social de direito tanto os direitos como as suas limitaccedilotildeesSempre que haacute invasatildeo da disciplina constitucional e consequente vioshylaccedilatildeo ou ameaccedila de violaccedilatildeo de direito de outrem o Judiciaacuterio eacute convoshycado a prestar a jurisdiccedilatildeo natildeo como censor da liberdade de pensamento do cidadatildeo mas para que possamos conviver democraticamente como magistralmente colocou o eminente Desembargador Carlos Alberto Dishyreito um dos luminares desta Corte em brilhante voto prolatado na Apelaccedilatildeo ndeg 631893 da I a Cacircmara Ciacutevel O reacuteu eacute livre para manifestar o seu pensamento prossegue o erudito voto mas por ele eacute responsaacutevel Cada cidadatildeo sabe que a Constituiccedilatildeo exclui da liberdade de manifestashyccedilatildeo do pensamento a ofensa aos direitos subjetivos privados de outrem Natildeo cabe ao Poder Judiciaacuterio limitar o vocabulaacuterio do cidadatildeo Pode e deve impedir que um juiacutezo seja exteriorizado se e quando provocado previamente para coibir a ameaccedila de violaccedilatildeo de direitos nunca para censurarAssentados os limites do direito de expressatildeo e informaccedilatildeo em face da inviolabilidade da vida privada cumpre agora perquirir se a apelante ao veicular a notiacutecia que deu causa a esta accedilatildeo invadiu a esfera iacutentima da autora causando-lhe dano moral

78 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Na falta de criteacuterios objetivos para a configuraccedilatildeo do dano moral a questatildeo vem se tornando tormentosa na doutrina e na jurisprudecircncia levando o julgador a situaccedilatildeo dc perplexidade Ultrapassadas as fases de irreparabilidade do dano moral e da sua inacumulabilidade com o dano material corremos agora o risco de ingressarmos na fase da sua industrializaccedilatildeo onde o aborrecimento banal ou mera sensibilidade satildeo apresentados como dano moral em busca de indenizaccedilotildees milionaacuteriasTenho entendido que na soluccedilatildeo dessa questatildeo cumpre ao juiz seguir a trilha da loacutegico do razoaacutevel em busca da sensibilidade eacutetico-social norshymal Deve tomar por paradigma o cidadatildeo que se coloca a igual distacircnshycia do homem frio insensiacutevel e o homem de extremada sensibilidadeNessa linha de princiacutepio soacute deve ser reputado como dano moral a dor vexame sofrimento ou humilhaccedilatildeo que fugindo agrave normalidade interfira intensamente no comportamento psicoloacutegico do indiviacuteduo causando-lhe afliccedilotildees anguacutestia e desequiliacutebrio em seu bem-estar Mero dissabor aborrecimento maacutegoa irritaccedilatildeo ou sensibilidade exacerbada estatildeo fora da oacuterbita do dano moral porquanto aleacutem de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia no trabalho no tracircnsito entre os amigos e ateacute no ambiente familiar tais situaccedilotildees natildeo satildeo intensas e duradouras a ponto de romper o equiliacutebrio psicoloacutegico do indiviacuteduo Se assim natildeo se entender acabaremos por banalizar o dano moral ensejando accedilotildees judiciais em busca de indenizaccedilotildees pelos mais triviais aborrecimentosTomando-se com o paradigma o homem normal parece-me que ninshygueacutem pode negar que fere a sensibilidade do profissional seacuterio comshypetente responsaacutevel e configura humilhaccedilatildeo dolorosa ser tachado de relapso faltoso e alcooacutelatra em notiacutecia publicada em revista de grande circulaccedilatildeo E a autora natildeo eacute detentora desses defeitos pois caso contraacuteshyrio natildeo teria chegado aonde chegouA notiacutecia pelo que se infere das reportagens de f 168177 natildeo era verdadeira eis que a apelada durante a gravaccedilatildeo da novela ldquo De corpo e Almardquo natildeo faltou aos seus compromissos profissionais nem quando fraturou uma pema (f 169) pelo que foi considerada um exemplo de profissionalismoMesmo que assim natildeo fosse natildeo havia justificativa para a divulgaccedilatildeo de um fato da vida privada da autora que se verdadeiro fosse seria do exclusivo interesse do seu empregador O direito agrave privacidade segunshydo a doutrina da Suprema Corte dos Estados Unidos universalmente aceita eacute o direito que toda pessoa tem de estar soacute de ser deixada em paz e de tomar sozinha as decisotildees na esfera de sua privacidade O ponto nodal desse direito na precisa liccedilatildeo do jaacute citado Carlos Alberto Bittar encontra-se na exigecircncia de que o isolamento mental insista no psishyquismo humano que leva a pessoa a natildeo desejar que certos aspectos de sua personalidade e de sua vida cheguem ao conhecimento de terceiros

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 79

Limila-se com esse direito o quanto possiacutevel a inserccedilatildeo dc estranho na esfera privada ou iacutentima da pessoa Satildeo elementos a vida privada o lar a famiacutelia etc No campo do direito agrave intimidade satildeo protegidos dentre outros os seguintes bens confidecircncias informes de ordem pesshysoal recordaccedilotildees pessoais memoacuterias relaccedilotildees familiares vida amorosa ou conjugal sauacutede fiacutesica ou mental afeiccedilotildees atividades domeacutesticas etc Esse direito conclui reveste-se das conotaccedilotildees fundamentais dos direitos da personalidade devendo-se enfatizar a sua condiccedilatildeo de dishyreito negativo ou seja expresso exatamente pela natildeo exposiccedilatildeo a coshynhecimento de terceiro de elementos particulares da esfera reservada do titular Nesse sentido pode-se acentuar que consiste no direito de impedir o acesso a terceiros nos domiacutenios da confidencialidade (obra citada p 103-104)Costuma-se ressalvar no tocante agrave inviolabilidade da intimidade a pesshysoa dotada de notoriedade principalmente quando exerce vida puacutebica Fala-se entatildeo nos chamados ldquo direito agrave informaccedilatildeo e direito agrave histoacuteriardquo a tiacutetulo de justificar a revelaccedilatildeo de fatos de interesse puacuteblico independenshytemente da anuecircncia da pessoa envolvida Entende-se que nesse caso existe reduccedilatildeo espontacircnea dos limites da privacidade (como ocorre com os poliacuteticos atletas artistas e outros que se mantecircm em contato com o puacuteblico) Mas o limite da confidencialidade persiste preservado sobre fatos iacutentimos sobre a vida familiar etc natildeo eacute liacutecita a divulgaccedilatildeo sem o consentimento do interessadoE assim eacute segundo essa mesma doutrina porque a vida dessas pessoas compreende um aspecto voltado para o exterior e outro voltado para o interior A vida exterior que envolve a pessoa nas relaccedilotildees sociais e nas atividades puacuteblicas pode ser objeto das pesquisas c das divulgaccedilotildees de terceiros porque eacute puacuteblica A vida interior todavia que se debruccedila sobre a mesma pessoa sobre os membros de sua famiacutelia sobre seus amigos integra o conceito de vida privada inviolaacutevel nos termos da ConstituiccedilatildeoPelo que ateacute aqui ficou exposto a sentenccedila natildeo merece nenhum reparo nos pontos jaacute examinados O mesmo natildeo ocorre todavia no que respeishyta ao quantum da indenizaccedilatildeo fixada pelo eminente Juiz sentenciante natildeo obstante dos mais cultos e talentosos da magistratura fluminenseO arbitramento do valor da indenizaccedilatildeo pelo dano moral eacute outra questatildeo que deve merecer a atenccedilatildeo do julgador para natildeo nos tornarmos imitashydores do direito norte-americano onde as indenizaccedilotildees pelo dano moral atingem somas milionaacuterias vultosiacutessimas sem qualquer base cientiacutefica ou juriacutedicaLembro que os primeiros julgados concedendo reparaccedilatildeo pelo dano moral falavam em uma compensaccedilatildeo pela dor pelo sofrimento algo que pudesse substituir a tristeza pela alegria como uma televisatildeo um

80 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

aparelho de som (entre as classes mais humildes) uma viagem de feacuterias (para as pessoas mais abastadas) etc Hoje jaacute temos notiacutecias de decisotildees concedendo indenizaccedilotildees astronocircmicas centenas e agraves vezes ateacute mesmo milhares de salaacuterios miacutenimos a tiacutetulo de dano moral sem qualquer crishyteacuterio loacutegico ou juriacutedicoEstou convencido de que o arbitramento judicial continua sendo o meio mais eficiente para se fixar o dano moral e que nessa penosa tarefa natildeo estaacute o Juiz subordinado a nenhum limite legal nem a qualquer tabela prefixada mormente apoacutes a Constituiccedilatildeo de 88 Em vaacuterios julgamenshytos anteriores (Ap Ciacutevel n 348592 6a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel n 324194 8a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel n 521394 2a Cacircmara Ciacutevel) tive a oportunidade de manifestar o meu entendimento a este respeito e que agora reiteroNatildeo se questiona a natureza especial da Lei de Imprensa nem o prinshyciacutepio segundo o qual a lei especial afasta a incidecircncia da geral Quesshytiona-se apenas otilde poder que alguns querem atribuir agrave Lei de Imprensa a ponto de poder limitar restringir e ateacute de tornar inoacutecuos direitos que foram consagrados pela nova ordem constitucional posterior e supeshyrior agravequela Lei infraconstitucional alguma eacute de todos sabido subsiste agrave ordem juriacutedica estabelecida por uma nova Constituiccedilatildeo naquilo que com ela for incompatiacutevel ou restritiva Importa dizer que se a Constishytuiccedilatildeo confere direitos subjetivos que antes eram vedados ou limitados pela lei ordinaacuteria tal lei perde imediatamente a sua eficaacutecia Seria um contrassenso pretender que norma superior nascesse limitada por lei inshyferiorA liccedilatildeo dos insignes Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins vem bem ao casoEacute loacutegico que a regra eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo pode ser interpretada a partir da legislaccedilatildeo infraconstitucional Trata-se de particularidade proacuteshypria da Lei Maior o natildeo poder ela tomar por referencial interpretativo outras normas do sistema Tal fenocircmeno dejlui do seu caraacuteter inicial e inovador A Constituiccedilatildeo eacute o marco a partir do qual se erige a ordem juriacutedica Seria um contrassenso admitir-se que o que lhe vem abaixo (diriacuteamos noacutes tambeacutem antes) - devendo portanto sofrer o seu influxo - viesse de repente a insurgir-se contra esta ordem loacutegica fornecendo criteacuterios para a inteligecircncia do proacuteprio preceito que lhe serve de fundashymento de validade (Com agrave Constituiccedilatildeo do Brasil Ed Saraiva 1988 Io volume p 349-350)Recorde-se entatildeo que antes da Constituiccedilatildeo de 1988 havia grande disshycussatildeo doutrinaacuteria e jurispaidencial em torno de reparabilidade do dano moral Numa primeira fase entendeu-se que ele natildeo era indenizaacutevel passando-se jaacute na segunda fase a admitir a indenizaccedilatildeo desde que natildeo acumulada com o dano material Foi nesse quadro que veio a lume a

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 81

Lei de Imprensa em fevereiro de 1967 dando um passo no sentido da reparaccedilatildeo do dano moral tiacutemido todavia posto que soacute para os casos de crimes contra a honra No momento em que nova Constituiccedilatildeo atenshydendo os reclamos da realidade social moderna consagrou amplamente a reparabilidade do dano moral tal como se fez no seu artigo 5deg incisos V X e outros mais tornou-se inconcebiacutevel data venia negar essa repashyrabilidade ou restringi-la pelo enfoque de leis ordinaacuterias anteriores o que constituiria uma total inversatildeo de princiacutepios e valoresNesse sentido o brilhante acoacuterdatildeo da Ia Cacircmara Ciacutevel deste Tribunal de Justiccedila no julgamento da Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg526091 do qual foi relator o eminente Desembargador Carlos Alberto Direito A ementa desse v acoacuterdatildeo na parte relativa ao tema em debate diz assimA indenizaccedilatildeo por dano moral com a Constituiccedilatildeo de 1998 eacute igual para todos inaplicaacutevel o privileacutegio de limitar o valor da indenizaccedilatildeo para a empresa que explora o meio de informaccedilatildeo e divulgaccedilatildeo (Lei de Imshyprensa) mesmo porque a natureza da regra constitucional eacute mais ampla indo aleacutem das estipulaccedilotildees da lei de imprensaMas estou igualmente convencido de que se o juiz natildeo fixar com prushydecircncia e bom senso a indenizaccedilatildeo pelo dano moral vamos tomaacute-lo inshyjusto c insuportaacutevel como de resto jaacute vem ocorrendo em alguns paiacuteses comprometendo a imagem da justiccedilaO princiacutepio da razoabilidade inserto no artigo 1059 do Coacutedigo Civil para a fixaccedilatildeo do lucro cessante pode e deve ser adotado pelo juiz no arbitramento do dano moral Razoaacutevel eacute aquilo que eacute sensato comedishydo moderado que guarda certa proporcionalidade Importa dizer que o juiz ao valorar o dano moral deve arbitrar uma quantia que de acordo com o seu prudente arbiacutetrio seja compatiacutevel com a reprovabilidade da conduta iliacutecita e a gravidade do dano por ela produzido Deve-lhe tamshybeacutem servir de norte aquele outro princiacutepio que veda que o dano se transshyforme em fonte de lucro Se a reparaccedilatildeo deve ser a mais ampla possiacutevel a indenizaccedilatildeo natildeo se destina a enriquecer a viacutetima Entre esses dois limites deve se situar o bom senso do julgador Qualquer quantia a mais do que a necessaacuteria agrave reparaccedilatildeo do dano importaraacute em enriquecimento sem causa ensejador de novo danoNa liccedilatildeo do insigne Caio Maacuterio dois motivos ou duas causas estatildeo conjugados na reparaccedilatildeo por dano moral 1) puniccedilatildeo ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem juriacutedico da viacutetima posto que imaterial 2) pocircr nas matildeos do ofendido uma soma que natildeo eacute o pretium doloris poreacutem o meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfaccedilatildeo de qualquer espeacutecie seja de ordem intelectual ou moral seja mesmo de cunho material o que pode ser obtido no fato de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa Recomenda todavia o mestre fazendo referecircncia ao seu anteprojeto de obrigaccedilotildees que esse

82 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

arbitramento deve ser moderado e equitativo para que se natildeo converta o sofrimento em moacutevel de captaccedilatildeo de lucro (o lucro capiendo) (Responshysabilidade Civil Forense p 315-316)Em suma o bom senso deve nortear o juiz no exame do caso concreto concedendo e graduando a indenizaccedilatildeo pelo dano moral de acordo com a reprovabilidade da conduta iliacutecita a intensidade e duraccedilatildeo do sofrishymento experimentado pela viacutetima a capacidade econocircmica do causador do dano as condiccedilotildees pessoais do ofendido etcEsta Cacircmara em inuacutemeros julgamentos anteriores tem procurado arbishytrar o dano moral com razoabilidade e moderaccedilatildeo motivo pelo qual afishygura-se-me absolutamente excessiva fora da realidade socioeconocircmica brasileira uma indenizaccedilatildeo de 4 mil salaacuterios miacutenimos hoje equivalente a quatrocentos mil reais Eacute quantia que algueacutem que ganhe cerca de cem mil reais por ano correspondente ao mais elevado salaacuterio pago pela administraccedilatildeo puacuteblica levaria mais de 4 anos para amealharParece-me que uma indenizaccedilatildeo de 500 salaacuterios miacutenimos equivalente a 50 mil reais eacute mais do que suficiente para servir de lenitivo para o dissashybor experimentado pela autora e de puniccedilatildeo para a reacute sem chegarmos ao extremo de transformar o dano moral em fonte de enriquecimento sem causaDestarte o meu voto eacute no sentido de dar provimento parcial agrave apelaccedilatildeo para o fim de reduzir a indenizaccedilatildeo para 500 salaacuterios miacutenimosQuanto ao recurso adesivo da autora deve ser conhecido porque em tese foi parcialmente vencida porquanto recebeu menos do que pleishyteou Contudo em face do que jaacute ficou exposto deve ser-lhe negado provimento na parte em que pede a elevaccedilatildeo do quantum indenizatoacuterio bem como no respeitante aos juros de mora a partir do evento A norma do artigo 962 do C Civil soacute eacute aplicaacutevel nos casos de obrigaccedilatildeo proveshyniente de delito assim entendido o iliacutecito penal e natildeo mero iliacutecito civil como no caso dos autosPor todo o exposto salvo quanto ao valor da indenizaccedilatildeo reduzida para 500 (quinhentos) salaacuterios miacutenimos a sentenccedila deve ser mantida por seus juriacutedicos fundamentosRio de Janeiro 23 de abril de 1996

DES THIAGO R IBA S FILHO PRESIDENTE

DES SEacuteRG IO CAVALIERI FILHO RELATOR

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 83

1) Situaccedilatildeo de conflitoMaria Zilda Bethelm Vieira acusa a Editora Abril SA de publicaccedilatildeo

ofensiva agrave sua honra e agrave sua intimidade por publicar na Revista Veja na seccedilatildeo Gente que a atriz durante as gravaccedilotildees da novela ldquo Olho por olhordquo leria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada

2) TeseA Revista Veja ofendeu a honra e invadiu a intimidade da atriz Por

essa razatildeo deve-lhe indenizar por danos morais com valor compatiacutevel com o grau de reprovaccedilatildeo da conduta iliacutecita e com a gravidade do dano produshyzido

3) Contextualizaccedilatildeo do real

Fatos favoraacuteveis agrave tese1) Segundo consta nos autos (f 168177) estaacute comprovado medianshy

te um exemplar da Veja que ela publicou que a autora durante a gravaccedilatildeo da novela ldquo Olho por olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada

2) A atriz segundo consta nos autos (f 169) eacute considerada um exemshyplo de profissionalismo por nunca ter faltado agrave gravaccedilatildeo da novela ldquoDe corpo e almardquo mesmo quando fraturou uma perna

3) De acordo com os autos a vendagem da Revista Veja e conseshyquentemente a repercussatildeo dos fatos noticiados eacute expressiva

4) A sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido da autora e condenou a reacute a pagar quatro mil salaacuterios miacutenimos

Fatos desfavoraacuteveis agrave teseSegundo consta dos autos f 4204391) A notiacutecia foi publicada com os verbos na forma condicional como

mandam todos os manuais de imprensa2) A sentenccedila incorre em engano quando afasta a aplicaccedilatildeo da Lei de

Imprensa no presente caso trazendo agrave colaccedilatildeo acoacuterdatildeo do STJ

4) Hipoacuteteses1) Jaacute que segundo consta nos autos (f 168177) estaacute comprovado

mediante um exemplar da Veja que ela publicou que a autora durante a gravaccedilatildeo da novela ldquoOlho por olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

chegar alcoolizada teriam sido divulgadas informaccedilotildees que natildeo pertencem agrave vida externa de Maria Zilda mas agrave sua esfera iacutentima

2) Uma vez que a atriz segundo consta nos autos (f 169) eacute consishyderada um exemplo de profissionalismo por nunca ter faltado agrave gravaccedilatildeo da novela ldquo De corpo e almardquo mesmo quando fraturou uma perna teria sido ofendida natildeo soacute em sua honra objetiva mas tambeacutem em sua honra subjetiva

3) Tendo em vista que a sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido da autora e condenou a reacute a pagar quatro mil salaacuterios miacutenimos teria interpretado com acerto a Constituiccedilatildeo salvo quanto ao valor por ela arbitrado

Capiacutetulo V

FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Fundamentar conforme visto anteriormente eacute condiccedilatildeo de validade de toda decisatildeo judicial (arts 165 e 458 do CPC) Mas natildeo apenas o juiz tem a obrigaccedilatildeo de fundamentar suas decisotildees Tambeacutem os advogados quando formulam suas teses devem fundamentaacute-las consistentemente de modo que natildeo sejam tidas como natildeo razoaacuteveis

Mas se a simples subsunccedilatildeo do fato agrave norma natildeo caracteriza a proshyposta argumentativa - e sim apenas um procedimento demonstrativo - o que deve fazer o operador do Direito para dar a seu discurso status de arshygumentaccedilatildeo Quais procedimentos devem ser adotados e qual metodologia de construccedilatildeo de sentido deve ser operacionalizada para que se sustente efetivamente uma tese persuasiva Como enfim pocircr em praacutetica o que Perelman apontou como argumentaccedilatildeo juriacutedica

51 SELECcedil Atilde O E ORGANIZACcedilAtildeO DAS ID EIA S ARGUM ENTATIVAS

A produccedilatildeo do texto juriacutedico-argumentativo tal como a de qualquer texto natildeo pode ser fruto da improvisaccedilatildeo e do amadorismo Selecionar e organizar as ideias a serem desenvolvidas eacute imprescindiacutevel para a eficiecircnshycia do resultado final Aquele que conta com a fluecircncia do pensamento e com o meacutetodo frequentemente denominado brainstorming (tempestade de ideias) corre uma seacuterie de riscos que leva quase inevitavelmente a uma proshyduccedilatildeo truncada pouco criativa inconsistente e natildeo raro com problemas de coesatildeo e de coerecircncia

Apenas o profissional muito qualificado em termos redacionais e basshytante conhecedor da temaacutetica em pauta pode se arriscar a produzir um texto sem planejamento redacional e argumentativo Mesmo assim repare que

86 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

estamos falando em ldquo se arriscarrdquo pois sem duacutevidas o mais aconselhaacutevel eacute planejar cuidadosamente a produccedilatildeo textual que seraacute redigida

Quando falamos em planejamento cuidadoso natildeo estamos necessashyriamente dizendo planejamento minucioso O momento da redaccedilatildeo propriashymente dito deve ser relativamente livre a fim de que o argumentador natildeo fique limitado ao mero encadeamento de palavras ou trechos Poreacutem se o planejamento foi feito com cuidado e esmero se a organizaccedilatildeo de sentidos eacute loacutegica e razoaacutevel o momento da escrita torna-se um fluir prazeroso de ideias que promovem um resultado final simples claro e muito inteligente

Qualquer texto de qualidade precisa portanto passar pela fase do planejamento mas o texto juriacutedico-argumentativo apresenta ainda mais uma demanda especiacutefica a necessidade de que a argumentaccedilatildeo seja persuasiva a tal ponto que o seu auditoacuterio acolha a tese sem restriccedilotildees de valores ou sem questionamentos de ordem teacutecnico-profissional

Em outras palavras um texto pode estar bem organizado em termos de paraacutegrafo as partes denominadas introduccedilatildeo desenvolvimento e conshyclusatildeo podem ser adequadamente observadas eventualmente natildeo enconshytramos sequer desvios de norma culta poreacutem nada disso garante que a argumentaccedilatildeo seja eficiente e persuasiva

Em sala de aula quando avaliamos e comentamos paraacutegrafo a paraacuteshygrafo o texto de nossos alunos pode ocorrer que natildeo haja qualquer criacutetica aos argumentos desenvolvidos nem mesmo do ponto de vista da estrutura sugerida a cada um deles Curiosamente ao teacutermino da leitura podemos ficar com a sensaccedilatildeo de que o texto natildeo eacute consistente

Eacute difiacutecil explicar que o texto ldquonatildeo estaacute bomrdquo se natildeo conseguimos apontar o dedo em um paraacutegrafo ou trecho e justiccedilar a ineficiecircncia daquela produccedilatildeo com a caneta vermelha em riste circulando fragmentos e corrishygindo frases

O convencimento e a eficiecircncia argumentativa na peccedila processual satildeo tratados portanto em um ldquoplano mais complexordquo isto eacute a justificativa para a sua revisatildeo extrapola a mera tessitura coesiva das frases e das oraccedilotildees

Para ilustrar o que estamos defendendo recorreremos a um caso conshycreto Inicialmente vamos enfrentar as situaccedilotildees cada vez mais frequenshytes em que o advogado se depara com um caso criminal que tecnicamente falando natildeo deixa margem de duacutevida quanto agrave aplicaccedilatildeo da lei positivada no entanto o clamor popular e a influecircncia midiaacutetica forccedilam decisatildeo judishycial contraacuteria agrave aplicaccedilatildeo dos dispositivos legais pertinentes por entender que nesses casos a norma tomar-se-ia injusta

eduardodasilvaramos
Highlight

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 87

O caso adiante eacute impactante mas se presta agraves necessidades deste moshymento

Maria do Carmo de 31 anos matou Robson seu vizinho de 15 anos depois que o adolescente violentou seu filho de apenas trecircs anos de idade O crime aconteceu dentro da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Satildeo Carlos enquanto era registrada a ocorrecircncia da agressatildeo sexual agrave crianccedilaSebastiatildeo Terteluano de 35 anos surpreendeu o filho caccedilula sendo vioshylentado pelo vizinho num bambuzal do distrito de Santa Eudoacutexia na zona rural de Satildeo Carlos O rapaz fugiu A poliacutecia foi acionada e ele foi preso em casaO adolescente e os pais da crianccedila foram levados agrave Delegacia de Defesa da Mulher para o registro de ocorrecircncia Por volta das 13h a crianccedila foi encaminhada ao Pronto-Socorro para exame de corpo de delito para confirmar a violecircncia sexual em companhia do pai e de um policial militar Maria do Carmo Robson e outro PM permaneceram ali De repente Maria do Carmo atacou Robson cravando-lhe um a faca de coshyzinha no pescoccedilo O adolescente morreu no localO autor do crime jaacute tinha passagens pela poliacutecia por furto e havia cumshyprido medida socioeducativa junto ao Nuacutecleo de Atendimento Integrado (NAI) que atende menores infratores na cidadeMaria do Carmo foi presa em flagrante e levada agrave Cadeia Feminina de Ribeiratildeo Bonito deixando com o marido seus seis filhos com idades entre 3 e 13 anos Segundo o delegado Mauriacutecio Dotta da Delegacia de Investigaccedilotildees Gerais (DIG) de Satildeo Carlos a matildee da crianccedila violentada disse que matou o adolescente porque ele a teria provocado afirmando que por ser menor natildeo ficaria presoldquo Estou tatildeo surpresa quanto os senhores (jornalistas) TNunca imaginei que ela fosse praticar esse atordquo declarou a delegada E lelze Martins que atendia a ocorrecircncia na hora do crime A policial destacou que Maria do Carmo retirou uma faca debaixo da blusa Como a mulher era viacutetima do crime a Poliacutecia Militar natildeo efetuou uma revista detalhada nela para apurar se ela estava armada ou natildeo dentro da delegacia- A Delegacia de Investigaccedilotildees Gerais (D IG ) vai apurar agora onde a m ulher conseguiu a facaO advogado da mulher disse que a sua cliente mulher humilde analshyfabeta matildee de famiacutelia estava transtornada ldquo Eacute d ifiacutec il uma matildee que tem um filho de 3 anos violentado natildeo ficar emocionalmente deseshyquilibradardquo disse Ele deveraacute entrar com pedido de relaxamento da prisatildeo

Para o delegado Mauriacutecio Dotta a mulher contou que encontrou a faca dentro da garagem da DDM Depois contou que trouxe o objeto de casa O menino de 3 anos estaacute sob os cuidados do Conselho Tutelar Ele deveraacute ser submetido a uma cirurgia no acircnus para recompor o oacutergatildeo

(Adaptado da Internet Fonte desconhecida)

Natildeo haacute duacutevida quanto agrave aplicaccedilatildeo do artigo 121 do Coacutedigo Penal segundo o qual matar eacute crime puniacutevel com reclusatildeo Natildeo entraremos na discussatildeo sobre a aplicaccedilatildeo de possiacuteveis qualificadoras Tambeacutem natildeo preshytendemos apreciar a possibilidade juriacutedica de diminuir a pena com base na violenta emoccedilatildeo Partimos do pressuposto de que doloso ou culposo qualificado ou privilegiado houve homiciacutedio e a reacute seraacute condenada Isso eacute certo natildeo eacute mesmo

Pois bem No caso narrado o Tribunal do Juacuteri em Satildeo Carlos absolveu a reacute pela segunda vez em 07 de fevereiro de 2006 A tese que motivou a sentenccedila foi a da legiacutetima defesa Ora qualquer estudante de Direito que jaacute passou pelo estudo da parte geral do Coacutedigo Penal brasileiro sabe que essa tese eacute incompatiacutevel com o caso concreto Seria essa uma oportunidade em que os jurados por falta de motivaccedilatildeo mais apropriada para absolver uma matildee e fazer o que ele entende por justiccedila ldquo aplicam mal a leirdquo Trata-se de impropriedade teacutecnica decorrente de serem os jurados ldquo homens do povordquo Arriscamos dizer que o juiz togado responsaacutevel por lavrar a sentenccedila talvez decidisse monocraticamente naquele contexto da mesma maneira

O advogado que defende os interesses da reacute - matildee do menino viacutetima de violecircncia sexual - precisaria ter a sensibilidade humana de perceber que aquele contexto favorecia o pedido de absolviccedilatildeo (tese da legiacutetima defesa) e natildeo apenas a pena mais branda (tese de homiciacutedio privilegiado pela vioshylenta emoccedilatildeo)

Um caso concreto com esse teor apelativo quando potildee de um lado uma excludente de ilicitude (legiacutetima defesa) e de outro uma causa de diminuishyccedilatildeo de pena (violenta emoccedilatildeo apoacutes a injusta provocaccedilatildeo do ofendido) leva o advogado a refletir muito aleacutem da aplicaccedilatildeo deste ou daquele dispositivo O que estaacute em jogo aqui satildeo os valores sociais dominantes que condenam ou natildeo matildees que vingam seus filhos quase bebecircs viacutetimas de violecircncia sexual contra adolescentes infratores com histoacuterico de violecircncia

Perceba que natildeo estamos sustentando nem a condenaccedilatildeo nem a abshysolviccedilatildeo mas ignorar essa problcmatizaccedilatildeo do caso concreto eacute mostrar-se um advogado ineficiente

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 89

Se pretendemos a condenaccedilatildeo com pena mais branda eacute preciso enshyfrentar cuidadosamente a necessidade de respeito agraves normas juriacutedicas sob pena de violar os princiacutepios mais baacutesicos de um Estado Democraacutetico de Direito Precisariacuteamos sustentar que a absolviccedilatildeo da reacute eacute uma maneira deshyturpada de fazer justiccedila pois o mal provocado seria muito pior que o da proacutepria condenaccedilatildeo pois toda a sociedade sofreria com as consequecircncias ilessa decisatildeo natildeo teacutecnica

Caso optemos por sustentar a absolviccedilatildeo pela tese da legiacutetima defesa como desenvolver essa fundamentaccedilatildeo Certamente o argumento de autoshyridade natildeo seria o mais adequado por falta de fontes - na lei na doutrina c na jurisprudecircncia - que sustentem com consistecircncia a validade desse rashyciociacutenio

Outros desdobramentos de difiacutecil soluccedilatildeo o senso comum sozinho poderia motivar uma decisatildeo judicial especialmente quando manifestashymente contraacuterio agrave lei A conduta de trazer a faca de casa (premeditaccedilatildeo) afasta logicamente a violenta emoccedilatildeo (fruto de ato impensado impulsivo) ou premeditaccedilatildeo e violenta emoccedilatildeo seriam conciliaacuteveis

Lembremos que natildeo estamos aqui para dar aula de Direito Penal mas a motivaccedilatildeo condutora de nossa reflexatildeo eacute uma argumentaccedilatildeo juriacutedica seraacute eficiente se natildeo resolver essas questotildees

Sustentamos que definida a tese (que pode ser de acusaccedilatildeo ou de defesa) o enfrentamento argumentativo do caso pode seguir caminhos absolutamente diferentes Os problemas a resolver satildeo determinados por essas escolhas e cada ponto da argumentaccedilatildeo recorreraacute aos argumentos mais eficientes Esta seraacute outra questatildeo tormentosa a qual(is) argumento(s) recorrer em cada ponto da argumentaccedilatildeo

Por ora continuemos a questionar o Tribunal do Juacuteri de Satildeo Carlos (interior de Satildeo Paulo) possui peculiaridades distintas das observadas no Tribunal do Juacuteri do Rio de Janeiro Seraacute que essa decisatildeo que data de 2006 seria a mesma hoje Se fosse o pai da crianccedila a matar o adolescente agressor de seu filho e natildeo a matildee seraacute que a decisatildeo seria a mesma Jaacute que a reacute tinha seis filhos os jurados consideraram a situaccedilatildeo das crianccedilas sem a presenccedila da matildee encarcerada E se natildeo houvessem outras crianccedilas

Enfim iniciamos esse capiacutetulo apenas chamando a atenccedilatildeo do leitor para a importacircncia argumentativa das questotildees natildeo propriamente teacutecnicas do direito material Esperamos suscitar o gosto pela discussatildeo de teor absshytrato com caraacuteter reflexivo-argumentativo a fim de qualificar as produccedilotildees que hoje na maioria primam pela repeticcedilatildeo e pela mesmice na contramatildeo do que a modernidade parece estar vislumbrando

90 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Nos capiacutetulos anteriores vimos que o sucesso na defesa de uma tese depende de um raciociacutenio fundamentado por meio de uma seacuterie de assoshyciaccedilotildees a serem feitas pelo argumentador A maneira como o operador do Direito deve direcionar o raciociacutenio para a tese depende portanto de plashynejamento adequado do texto e da seleccedilatildeo apurada de informaccedilotildees

Na produccedilatildeo das peccedilas processuais o prejuiacutezo pela falta de organizashyccedilatildeo de um plano textual talvez fique mais evidente porque a persuasatildeo do magistrado e o consequente sucesso na demanda satildeo favorecidos por esse encadeamento

A coerecircncia e a validade de determinados institutos juriacutedicos depenshydem natildeo raro da ordem em que satildeo apresentados Exemplificando essa questatildeo pensemos na situaccedilatildeo de uma consumidora cujos cabelos caiacuteram quando da utilizaccedilatildeo de uma tintura capilar Pretende a lesada indenizaccedilatildeo por danos morais e materiais em virtude do ldquo fato do produtordquo 1

E certo que a indenizaccedilatildeo constitui o objetivo final do argumentashydor Devemos comeccedilar entatildeo pela sustentaccedilatildeo minuciosa das razotildees que demonstram a existecircncia do dano Sugerimos que natildeo O dano eacute fruto de outros pontos relevantes que natildeo podem ser ignorados na sequecircncia argu- mentativa

Para esclarecer vamos lembrar que a indenizaccedilatildeo eacute uma forma de compensar e de ressarcir o lesado Em contrapartida sanciona quem violou o direito e atua pedagogicamente para que tais situaccedilotildees deixem de continuar ocorrendo Assim o dano eacute fruto da violaccedilatildeo de uma obrigaccedilatildeo juriacutedica

Se assim o eacute como fundamentar minuciosamente o direito agrave indenishyzaccedilatildeo se o magistrado sequer conhece qual obrigaccedilatildeo foi descumprida O dever juriacutedico violado pode ser a necessidade de informar eventuais efeitos colaterais (princiacutepio da informaccedilatildeo - art 6deg III e art 9deg do CDC) ou a proteccedilatildeo da sauacutede do consumidor (art 6deg I do CDC) por exemplo

ldquo Ftiacuteo do produto e fato do serviccedilo satildeo institutos juriacutedicos Necessaacuteria eacute a distinccedilatildeo preliminar entre viacutecio e defeito Em ambos o produto desenvolve comportamento atiacutepico sendo que quando a anomalia resulta apenas em deficiecircncia no funcionashymento do produto ou serviccedilo mas natildeo coloca em risco a sauacutede ou seguranccedila do consumidor natildeo se fala em defeito mas eni viacutecio Portanto fato do produto ou serviccedilo estaacute ligado a defeito que por sua vez estaacute ligado a dano Desse modo temos a noccedilatildeo de fato do produto tambeacutem chamado de acidente de consumo que eacute o evento danoso verificado pela utilizaccedilatildeo de produto eivado de defeitordquo (QUEIshyROZ Ricardo Canguccedilu Barroso de Responsabilidade pelo fato do produto e do serviccedilo e responsabilidade pelo viacutecio do produto e do serviccedilo -paralelo Disponiacuteshyvel em lthttpwwwujgoiascombrgt Acesso em 01 jun 2002)

eduardodasilvaramos
Highlight

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 91

As obrigaccedilotildees das partes em uma relaccedilatildeo juriacutedica (neste caso relaccedilatildeo de consumo) servem de fundamento para suscitar a existecircncia da responshysabilidade civil de onde emana o dever de indenizar Esquematicamente poderiacuteamos assim representar a relaccedilatildeo entre os institutos de que precisashymos para argumentar

Obrigaccedilotildees juriacutedicas

estabelecidascm uma relaccedilatildeo de

consumo

O descump ri mento desse dever pela reacute gerou danos

agrave consumidora (nexo causal entre conduta e

resultado)

pound

A responsabilidade civil pelo evento

enseja o direito agrave indenizaccedilatildeo

a) obrigaccedilatildeo de informar K laquo r - - o M s A r v i d a o r - Indenizaccedilatildeo por

b) obrigaccedilatildeo de E3 sect gt CIVIL bull J3 l a danosmoraiserespeitara sauacutede do OBJETIVA H j f l l l p j materiais

consumidor I

Em siacutentese a argumentaccedilatildeo que pretende sustentar o direito agrave indeshynizaccedilatildeo por danos morais e materiais em decorrecircncia do fato do produto (queda do cabelo) deve em primeiro lugar sustentar que a reacute tinha uma obrigaccedilatildeo - ou mais de uma - fruto da relaccedilatildeo de consumo a(s) qual(is) deixou de observar Em seguida mostrar que a violaccedilatildeo desse dever juriacutedishyco gerou danos para a autora-consumidora e responsabilidade civil para a reacute-empresa A indenizaccedilatildeo eacute fruto desse percurso loacutegico

Ainda que muitos profissionais comccem o texto argumentativo jaacute estabelecendo relaccedilatildeo entre o direito de indenizaccedilatildeo e os danos sofridos subverter a ordem proposta eacute produzir uma fundamentaccedilatildeo apartada da coerecircncia e da consistecircncia

E certo que nossa intenccedilatildeo com o exemplo analisado natildeo eacute tratar da mateacuteria juriacutedica relativa ao Direito do Consumidor mas mostrar que a loacuteshygica argumentativa no Direito natildeo eacute apenas gramatical ou textual depende tambeacutem do domiacutenio baacutesico dos raciociacutenios proacuteprios dessa ciecircncia

Conheccedila mais um caso concreto a seguir a partir do qual seratildeo desenshyvolvidos indutivamente os passos para a estruturaccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo de uma peccedila juriacutedica2

2 Essa metodologia de trabalho eacute endossada pela proposta da Professora Harriet Chrisshytiane Zitscher (ZITSCHER Harriet Christiane Metodologia do ensino juriacutedico com casos teoria e praacutetica Belo Horizonte Del Rey 2004)

92 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

CASO CONCRETOApoacutes relacionamento de um ano e meio Maria e Joatildeo tiveram um filho Gustavo Cinco meses apoacutes o nascimento da crianccedila Joatildeo pocircs fim ao relacionamento com Maria e voltou a morar com seus pais Maria e Gustavo passam por graves problemas financeiros A matildee tem dificulshydade ateacute mesmo de comprar comida para a crianccedila Diante da negatishyva de prestar auxiacutelio financeiro ao filho eacute ajuizada accedilatildeo de alimentos em face do pai Joatildeo o qual alega impossibilidade dc cumprir com tal obrigaccedilatildeo na medida em que estaacute desempregado e tem vaacuterias diacutevidas a serem pagas Maria afirma que apesar do desemprego o requerido manteacutem elevado padratildeo de vida pois eacute sustentado pelos avoacutes paternos do menino que possuem vaacuterios imoacuteveis alugados como fonte de renda aleacutem de aposentadoria no valor de RS 680000O que diz a legislaccedilatildeo sobre esse assunto

Lei 10406 de 1001200 (Coacutedigo Civil brasileiro)Subtiacutetulo III

Dos Alimentos

Art 1694 Podem os parentes os cocircnjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compashytiacutevel com a sua condiccedilatildeo social inclusive para atender agraves necessidades de sua educaccedilatildeosect I o Os alimentos devem ser fixados na proporccedilatildeo das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigadasect 2o Os alimentos seratildeo apenas os indispensaacuteveis agrave subsistecircncia quando a situaccedilatildeo de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteiaArt 1695 Satildeo devidos os alimentos quando quem os pretende natildeo tem bens suficientes nem pode prover pelo seu trabalho agrave proacutepria manten- ccedila e aquele de quem se reclamam pode fornececirc-los sem desfalque do necessaacuterio ao seu sustentoArt 1696 O direito agrave prestaccedilatildeo de alimentos eacute reciacuteproco entre pais e filhos e extensivo a todos os ascendentes recaindo a obrigaccedilatildeo nos mais proacuteximos em grau uns em falta de outrosArt 1697 Na falta dos ascendentes cabe a obrigaccedilatildeo aos descendentes guardada a ordem de sucessatildeo e faltando estes aos irmatildeos assim gershymanos como unilateraisArt 1698 Se o parente que deve alimentos em primeiro lugar natildeo estiver em condiccedilotildees de suportar totalmente o encargo seratildeo chamados a concorrer os de grau imediato sendo vaacuterias as pessoas obrigadas a prestar alimentos todas devem concorrer na proporccedilatildeo dos respectivos recursos e intentada accedilatildeo contra uma delas poderatildeo as demais ser chashymadas a integrar a lide

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 93

Art 1699 Se fixados os alimentos sobrevier mudanccedila na situaccedilatildeo financeira de quem os supre ou na de quem os recebe poderaacute o interesshysado reclamar ao juiz conforme as circunstacircncias exoneraccedilatildeo reduccedilatildeo ou majoraccedilatildeo do encargoArt 1700 A obrigaccedilatildeo dc prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor na forma do art 1694

Diante de tal situaccedilatildeo quais as questotildees que um profissional do direi- lo precisa abordar para alcanccedilar a persuasatildeo do juiz quanto agrave procedecircncia do pedido de alimentos em face dos avoacutes Eacute possiacutevel associar de pronto as ideias de que a crianccedila precisa alimentar-se e os avoacutes podem pagar uma penshysatildeo ou eacute preciso percorrer um caminho relativamente longo ateacute que tal obrishygaccedilatildeo recaia sobre eles Essas satildeo questotildees que um bom argumentador preshycisa enfrentar antes mesmo de comeccedilar o seu texto natildeo por uma exigecircncia de ordem processual material ou doutrinaacuteria mas por ser necessaacuteria a coerecircncia na linearidade do raciociacutenio que leva agrave conclusatildeo da fundamentaccedilatildeo

E imprescindiacutevel perceber que antes mesmo de escolher que tipos de argumento utilizar na construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo deve-se ter em mente a estrateacutegia argumentativa que seraacute utilizada ou seja qual o caminho a ser percorrido ateacute ser possiacutevel afirmar com convicccedilatildeo que um dado pedido eacute procedente por tal ou qual motivo

Para o caso concreto em questatildeo a construccedilatildeo do raciociacutenio seguiria os seguintes passos

___ IUumlEIacute2reg

i39 p^deg

A filiaccedilatildeo enseja o direito subjetivo a

alimentos

Paraacutegrafo sem maior complexidade basta

relacionaro caso ao art do U

A crianccedila e a matildeenecessitam de dinheiro para suprir suas

necessidades baacutesicas

lldquoV Questatildeo a enfrentar

quaisas necessidades da crianccedila

Impossibilidade paterna de prestar

os alimentos

Questatildeo a enfrentar desemprego representa

impossibilidade de alimentar

Diante da impossibilidade a obrigaccedilatildeo paterna pode ser estendida

aos avoacutes

OQuestatildeo a enfrentar se 0 pai eacute 0 devedor os avoacutes

paternos devem substituiacute- lo antes dos avoacutes

matemosOs avoacutes podem

prestar alimentos sem prejuiacutezo da

proacutepria subsistecircncia

Paraacutegrafo sem maior complexidade basta

relacionaro caso ao art 1696 do CC

O lazer estaacute entre essas necessidades

Tem direito a plano de sauacutede e a escola

particularA eventual existecircncia de nova famiacutelia pode reduziro padratildeode vida a oferecer ao

alimentado

94 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Natildeo queremos o falso entendimento de que em decorrecircncia do fato de haver previsatildeo legal ou doutrinaacuteria - argumento de autoridade conforshyme seraacute mostrado adiante - para todas as questotildees que seratildeo abordadas ao longo dessa fundamentaccedilatildeo deve o operador do direito ignorar ou minorar o efeito das demais fontes na produccedilatildeo do texto argumentativo

Muitas vezes o fundamento legal natildeo garante sozinho o convencimento Haacute situaccedilotildees em que a aplicaccedilatildeo da norma positivada natildeo se mostra adequada agrave soluccedilatildeo do conflito nessas oportunidades outras fontes seratildeo consideradas para que o juiz firme seu livre-convencimento Haacute casos ainda em que o mashygistrado pode interpretar a norma de diferentes maneiras A presenccedila de outras fontes que reforcem um desses entendimentos como o mais adequado seria tambeacutem desejaacutevel Natildeo faltam igualmente as questotildees atuais e polecircmicas em que o legislador ainda natildeo teve tempo suficiente para atualizar a norma posishytivada a qual estaacute em dissonacircncia com o sentimento de justiccedila Enfim satildeo dishyversas as situaccedilotildees em que apenas a lei natildeo garante a persuasatildeo do magistrado e outras fontes tomam-se inevitaacuteveis na fundamentaccedilatildeo de uma tese

Na construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo importa entatildeo que um fato conshycreto colhido da realidade circundante em que se materializa a situaccedilatildeo de conflito possa ser avaliado segundo muacuteltiplas possibilidades argumentati- vas dependendo da valoraccedilatildeo que se queira atribuir a tal fato Natildeo se pode dizer que um argumento eacute mais importante que o outro mas que possui maior capacidade persuasiva em um determinado contexto

Dessa forma admite-se por exemplo que o princiacutepio do ldquodever de alishymentarrdquo pode ser sustentado no caso analisado como conclusatildeo da observacircnshycia do fato de que ldquoos pais devem proteger os filhosrdquo (Direito Natural) ou como consequecircncia da determinaccedilatildeo objetiva do Coacutedigo Civil art 1696 ldquoO direito agrave prestaccedilatildeo de alimentos eacute reciacuteproco entre pais e filhosrdquo (Direito Positivo)

Dispositivos legais satildeo fontes tal como a jurisprudecircncia a doutrina os princiacutepios a razoabilidade entre outros A argumentaccedilatildeo desenvolve-se e sustenta-se em fundamentos juriacutedicos Um mesmo fundamento pode ser sustentado por meio de diversas fontes

Essa questatildeo nos parece importante porque eacute muito comum vermos advogados que citam inuacutemeros artigos de determinados diplomas legais- apenas isso - e julgam que com esse procedimento desenvolveram uma argumentaccedilatildeo O ideal eacute que cada questatildeo abordada seja devidamente valoshyrada e consistentemente justificada por variadas fontes que se completam

O nosso proacuteximo passo seraacute investigar alguns dos tipos de argumento que estatildeo agrave disposiccedilatildeo dos operadores do direito para que seja possiacutevel concretizar a proposta argumentativa ateacute aqui desenvolvida

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 95

52 FUNDAMENTACcedilAtildeO SIMPLES E FUNDAMENTACcedilAtildeO COMPLEXA

A argumentaccedilatildeo conforme estudamos em capiacutetulo anterior eacute um tipo de texto que se materializa em todas as peccedilas processuais Como na maioshyria das vezes natildeo nos referimos especificamente a esta ou agravequela peccedila deshynominamos esta parte argumentativa genericamente de ldquo fundamentaccedilatildeordquo

Fazemos a distinccedilatildeo entre fundamentaccedilatildeo simples e complexa por ser didaticamente uacutetil A doutrina juriacutedica endossa amplamente essa distinccedilatildeo quando classifica os casos concretos como casos simples e casos difiacuteceis (ou complexos) A relaccedilatildeo eacute bastante clara quando temos de enfrentar um caso concreto simples a fundamentaccedilatildeo para ele desenvolvida seraacute simshyples quando o caso for difiacutecil a fundamentaccedilatildeo complexa

As diferenccedilas essenciais entre os dois tipos de fundamentaccedilatildeo estatildeo em trecircs criteacuterios a) temaacutetica juriacutedica a ser enfrentada b) tipos de argumen- to a que se recorre para alcanccedilar os objetivos pretendidos pelo operador do direito e consequentemente c) a extensatildeo do texto argumentativo

Quanto agrave temaacutetica juriacutedica sobre a qual o argumentador se debrushyccedilaraacute podemos dizer que os casos concretos simples satildeo aqueles em que o profissional do direito jaacute possui estruturado no ordenamento juriacutedico paacutetrio todo o repertoacuterio a que necessitaraacute recorrer na fundamentaccedilatildeo a legislaccedilatildeo regula de maneira clara especiacutefica e natildeo controvertida a mateacuteria a dogmaacuteshytica juriacutedica natildeo levanta problemas no tratamento do tema a jurisprudecircncia mostra-se uniformizada quanto agrave soluccedilatildeo mais adequada acerca das quesshytotildees relativas ao assunto

Por tudo isso os casos concretos simples satildeo resolvidos pela mera aplicaccedilatildeo das regras entatildeo vigentes suscitando do argumentador esforccedilo argumentativo reduzido

Com relaccedilatildeo aos tipos de argumento os casos simples exigem a proshyduccedilatildeo de uma estrutura bastante simplificada que consiste em introito argumento proacute-tese argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e conclusatildeo nesta ordem

Seraacute explicada minuciosamente toda essa estrutura no toacutepico 53 mas por ora faremos uma breve siacutentese a fim de facilitar a compreensatildeo do leitor

O introito tem as funccedilotildees de apresentar e contextualizar a questatildeo juriacutedica a um soacute tempo Existem muitas estrateacutegias para introduzir a funshydamentaccedilatildeo simples

O argumento proacute-tese recorre ao que haacute de mais essencial na defesa de um ponto de vista - o encadeamento consistente de fatos com os quais

96 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

seraacute possiacutevel a defesa da tese A organizaccedilatildeo sintaacutetica do paraacutegrafo que se estrutura a partir de elos coesivos bem marcados eacute uma evidecircncia desse argumento Sugerimos o uso dos conectores porque e tambeacutem aleacutem disso para introduzir cada uma das razotildees relevantes que validam a tese

O argumento de autoridade de grande prestiacutegio evidencia que a norshyma positivada acolhe a tese sustentada pelo argumentador o que faz de seu ponto de vista mais que uma opiniatildeo porque valida a soluccedilatildeo proposta como uma maneira prevista no ordenamento juriacutedico como correta e aceitaacutevel

O argumento de oposiccedilatildeo arremata a fundamentaccedilatildeo simples exshycluindo qualquer oacutebice que se possa fazer agrave tese do argumentador pois os eventuais pontos fraacutegeis apontados pela parte contraacuteria satildeo dirimidos por fatos ainda mais significativos levantados pelo argumentador

Aconclusatildeo se daacute pela retomada da tese de forma sinteacutetica objetiva e clara

Como se percebeu a extensatildeo da fundamentaccedilatildeo simples eacute reduzishyda pois carece de apenas cinco paraacutegrafos Parece pouco mas precisamos lembrar que a proacutepria OAB em diversas oportunidades sustentou que uma boa peticcedilatildeo inicial em toda a sua estrutura para os casos simples natildeo deshymanda mais que duas ou trecircs laudas

Proporcionalmente a argumentaccedilatildeo (ldquo Do direitordquo na peticcedilatildeo inicial) teria aproximadamente 20 a 30 linhas quase uma lauda plena Temos como paracircmetro essa extensatildeo pois um paraacutegrafo costuma ter em meacutedia 6 linhas

Vale ressaltar ainda que os casos concretos simples ocorrem em nuacuteshymero reduzido

L Estrutura da Fundamentaccedilatildeo Simples

Introito

Argumento proacute-tese

Argumento de autoridade

Argumento de oposiccedilatildeo

Conclusatildeo

A fundamentaccedilatildeo simples eacute aquela usada para casos

concretos simples em que a

subsunccedilacirco do fato agrave norma eacute

suficiente para resolver o conflito

juriacutedico

Os casos concretos difiacuteceis ou complexos natildeo cabem nas soluccedilotildees pronshytas emolduradas previsiacuteveis que a dogmaacutetica juriacutedica preparou para operar a subsunccedilacirco do fato agrave norma Natildeo precisam ser ineacuteditos mas a complexidade do

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 97

fenocircmeno juriacutedico exige o olhar sempre atento do argumentador cuja sensibishylidade vislumbra detalhes que merecem enfrentamento mais acurado

Haacute desdobramentos que necessitam ser encarados como circunstacircncias que desestabilizam a tese defendida se natildeo forem enfrentados por meio dos princiacutepios do direito Satildeo os princiacutepios que orientaratildeo em primeiro plano o adequado tratamento a ser dispensado agrave questatildeo complexa enfrentada na arshygumentaccedilatildeo Em um segundo momento os demais tipos de argumento comshyplementaratildeo o raciociacutenio e daratildeo consistecircncia aos raciociacutenios propostos

Natildeo se trata de propor uma nova estrutura para a fundamentaccedilatildeo complexa mas de partir daquela apresentada para a fundamentaccedilatildeo simshyples (introito + proacute-tese + autoridade + oposiccedilatildeo) e agregar outros tipos de argumento em nuacutemero variedade e sequecircncia sempre imprevisiacuteveis dependendo de cada caso concreto

Apenas para reforccedilar o que expomos citamos um trecho de Lenio Luiz Streck

Autores como Albert Calsamiglia3 consideram que a preocupaccedilatildeo das teorias poacutes-positivistas eacute com a indeterminaccedilatildeo do direito nos casos dishyfiacuteceis ou seja para os poacutes-positivistas o centro de atuaccedilatildeo se haacute desshylocado em direccedilatildeo da soluccedilatildeo dos casos indeterminados (mais ainda os casos difiacuteceis natildeo mais satildeo vistos como excepcionais) Afinal os casos simples eram resolvidos pelo positivismo com recurso agraves decisotildees passadas e agraves regras vigentes Jaacute nos casos difiacuteceis se estava em face de uma ldquo terra inoacutespitardquo

Reforccedilamos que a classificaccedilatildeo ldquo fundamentaccedilatildeo simplesrdquo e ldquo fundashymentaccedilatildeo complexardquo natildeo constitui uma demanda para o aluno saber quanshytos paraacutegrafos seratildeo usados na produccedilatildeo do texto argumentativo Trata-se somente de recurso didaacutetico facilitador da atividade docente na redaccedilatildeo desta parte da peccedila processual

53 TIPOS DE ARGUMENTO

A busca da persuasatildeo do auditoacuterio como vimos pode ser alcanccedilada por meio de vaacuterios tipos distintos de argumento Nesta oportunidade trashy

3 CALSAM IGLIA Albert apud STRECK Lenio Luiz Hermenecircutica Neoconsti- tucionalismo e ldquoo problema da discricionariedade dos ju izesrdquo Disponiacutevel em lthttpwwwanima-opetcombrprimeira_edicaoartigo_Lenio_Luiz Streckher- meneuticapdiacuteX Acesso em 17 jul 2012

98 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

taremos de nove tipos diferentes de argumento a) argumento proacute-tese b) argumento de autoridade c) argumento de oposiccedilatildeo d) argumento de anashylogia e) argumento de causa e efeito f) argumento de senso comum g) arshygumento ad hominem h) argumento a fortiori e i) argumento por absurdo

A classificaccedilatildeo dos argumentos natildeo segue na doutrina da aacuterea uma regularidade Eventualmente uma mesma estrateacutegia recebe de autores disshytintos nomenclaturas diferentes Como o mais importante natildeo eacute o nome que o argumento recebe mas o conhecimento de sua estrutura de seu conteuacutedo e da sua eficiecircncia em determinados contextos adotamos a classificaccedilatildeo mais simples possiacutevel tendo em vista principalmente o caraacuteter didaacutetico desta obra

Considerando que Perelman e L Olbrechts-Tyteca foram precursores na sistematizaccedilatildeo da teoria da argumentaccedilatildeo entendemos adequada breve apreshysentaccedilatildeo da classificaccedilatildeo proposta pelos autores no Tratado da Argumentaccedilatildeo

Com base na associaccedilatildeo de ideias - teacutecnica de estruturaccedilatildeo dos argushymentos que buscam o convencimento do auditoacuterio os autores destacam os argumentos quase loacutegicos os fundados na estrutura do real e os que fundamentam a estrutura do real

Os argumentos quaseloacutegicos apresentam-se como comparaacuteveis a rashyciociacutenios formais loacutegicos ou matemaacuteticos embora tenham traccedilos peculiashyres ao campo da argumentaccedilatildeo Identificam-se com as demonstraccedilotildees forshymais justamente pelo esforccedilo de reduccedilatildeo ou precisatildeo de uma caracteriacutestica natildeo formal

O argumento por definiccedilatildeo assim como outros pertence ao grupo dos quase loacutegicos Constitui o procedimento mais caracteriacutestico de identishyficaccedilatildeo completa de diversos elementos que satildeo o objeto do discurso

Veja-se o que apresenta Perelman ldquo Spinoza no iniacutecio de sua Eacutetica define a causa de si mesmo como lsquoaquilo cuja essecircncia envolve a existecircncia ou aquilo cuja natureza soacute pode ser conhecida como existentersquordquo

Ele define substacircncia ldquoO que estaacute em si e eacute concebido por si isto eacute aquishylo cujo conceito pode ser formado sem necessitar do conceito de outra coisardquo

Os argumentos fundados na estrutura do real valem-se da realidade para estabelecer um elo entre os juiacutezos admitidos e outros que se procura proshymover Vale dizer como na argumentaccedilatildeo eacute indispensaacutevel a interaccedilatildeo entre o orador e o auditoacuterio os argumentos satildeo obtidos da proacutepria realidade desse auditoacuterio ligando a tese do orador aos valores predominantes do puacuteblico

Como exemplo desse tipo tem-se o argumento pragmaacutetico e o argushymento por autoridade entre outros

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 99

O argumento pragmaacutetico eacute aquele que permite apreciar um ato ou um acontecimento consoante suas consequecircncias favoraacuteveis ou desfavoraacuteveis presentes ou futuras

Perelman expotildee o seguinte

Para apreciar um acontecimento cumpre reportar-se a seus efeitos E a esses efeitos que Locke se refere para criticar o poder espiritual dos priacutencipesldquo Jamais se poderaacute estabelecer ou salvaguardar nem a paz nem a segushyranccedila nem sequer a simples amizade entre homens enquanto prevaleshycer a opiniatildeo de que o poder eacute fundamentado sobre a Graccedila e de que a religiatildeo deve ser propagada pela forccedila das armasrdquo

O argumento por autoridade como seraacute adiante tratado eacute aquele cujo alcance eacute totalmente condicionado pelo prestiacutegio Constitui-se dos atos ou juiacutezos de uma pessoa ou de um grupo de pessoas como meio de prova a fashyvor de uma tese Quanto mais importante eacute a autoridade mais indiscutiacuteveis parecem suas palavras No limite a autoridade divina sobrepuja todos os obstaacuteculos que a razatildeo poderia opor-lhe

Os argumentos que fundamentam a estrutura do real constituem-se de exemplos ilustraccedilotildees modelos ou ainda analogias que refletem as lishygaccedilotildees da realidade com o caso particular

A argumentaccedilatildeo pelo exemplo caracteriza-se pela passagem de um caso particular a outro sucessivamente com a finalidade de consolidar uma regra geral aplicaacutevel a todos os casos O caso particular utilizado como exemplo permitiraacute uma generalizaccedilatildeo

Nesta passagem de Berkeley retirada de Perelman encontra-se a arshygumentaccedilatildeo pelo exemplo

Observo ademais que o pecado ou a torpeza moral natildeo consiste na accedilatildeo fiacutesica exterior ou no movimento mas estaacute no afastamento interior da vontade com relaccedilatildeo agraves leis da razatildeo e da religiatildeo Isso eacute claro pois matar um inimigo na batalha e condenar legalmente agrave morte um crimishynoso natildeo eacute considerado pecado contudo o ato exterior eacute exatamente o mesmo que no caso do assassiacutenio

A argumentaccedilatildeo por ilustraccedilatildeo a contraparte pelo exemplo daacute-se a partir da utilizaccedilatildeo de um caso concreto a fim de consagrar uma regra jaacute existente O caso particular que desempenha o papel de ilustraccedilatildeo estearaacute uma regularidade jaacute estabelecida

100 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A ilustraccedilatildeo nesta passagem de Leibniz apresentada por Perelman tem a funccedilatildeo de facilitar a compreensatildeo da regra por meio de um caso de aplicaccedilatildeo discutiacutevel

() cumpre que ele [o mal moral] soacute seja admitido ou permitido na medida em que eacute visto como uma consequecircncia certa de um dever indisshypensaacutevel de sorte que aquele que natildeo quisesse permitir o pecado alheio faltaria ele proacuteprio ao seu dever como se um oficial que deve guardar um posto importante o largasse sobretudo em tempo de perigo para impedir uma briga na cidade entre dois soldados da guarniccedilatildeo prestes a se matarem mutuamente

A argumentaccedilatildeo pelo modelo constitui-se a partir de um agir ideal na crjaccedilatildeo de um padratildeo de conduta que deveraacute ser seguido por todos O caso particular como modelo incentivaraacute a imitaccedilatildeo

Perelman mostra a argumentaccedilatildeo pelo modelo no seguinte trecho em que Montesquieu faz Usbek dizer

Assim mesmo que natildeo houvesse Deus deveriacuteamos sempre amar a jusshyticcedila ou seja empenharmo-nos para nos parecer com esse ser de quem temos uma ideia tatildeo bela e que se existisse seria necessariamente justo

A argumentaccedilatildeo pela analogia caracteriza-se pela busca de uma equishyparaccedilatildeo do tratamento atribuiacutedo a situaccedilotildees em realidades diferentes toshymando como referecircncia seus pontos comuns

Perelman oferece um exemplo bastante simples e tiacutepico de analogia tirado de Aristoacuteteles ldquo Assim como os olhos dos morcegos satildeo ofuscados pela luz do dia a inteligecircncia de nossa alma eacute ofuscada pelas coisas mais naturalmente evidentesrdquo

531 Introito

Em primeiro lugar precisamos lembrar que o introito natildeo eacute propriashymente um tipo de argumento mas um paraacutegrafo com a funccedilatildeo de iniciar o texto argumentativo Essa introduccedilatildeo natildeo eacute mera formalidade porque possui o papel bem marcado de facilitar a aceitaccedilatildeo dos argumentos que viratildeo em seguida

A utilizaccedilatildeo de introitos na estrutura argumentativa complexa apesar de natildeo ser obrigatoacuteria mostra-se bastante eficiente Os ceacutelebres sermotildees do

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 101

Padre Antoacutenio Vieira utilizavam com frequecircncia esse recurso A estrutura dos sermotildees desse ilustre orador era regularmente a seguinte

a) introito - momento em que o orador expunha o assunto e as ideias que defenderia ou o assunto e as ideias agraves quais se oporia cm seguida As frases de efeito a que recorria eram normalmente extraiacutedas da Biacuteblia e tinham a funccedilatildeo principal de captar a atenccedilatildeo do auditoacuterio

b) invocaccedilatildeo - momento em que o orador invocava o auxiacutelio de Deus para expor com clareza suas ideias

c) argumentaccedilatildeo propriamente dita - o orador desenvolvia o tema inicialmente apresentado por meio de diversos recursos retoacutericos linguiacutesticos e argumentativos Com isso levava o auditoacuterio a agir sob a forccedila de seus argumentos (persuasatildeo)

d) peroraccedilatildeo - o orador retomando as ideias principais jaacute desenvolshyvidas recorria a novas frases de efeito com o objetivo de trazer um desfecho vibrante que estabelecesse viacutenculos afetivos com o auditoacuterio de modo que se sentisse motivado a pocircr em praacutetica os valores pregados

E certo que no texto juriacutedico tal estrutura argumentativa natildeo pode ser usada na iacutentegra mas agregar ao texto juriacutedico e ao discurso do advogashydo alguns desses artifiacutecios retoacutericos ceacutelebres pode ser de grande valia para o sucesso dos profissionais do direito

Os tipos de introito mais comuns no Direito satildeo os que seguem locashylizaccedilatildeo do fato no tempo e no espaccedilo explanaccedilatildeo de ideia inicial enumeshyraccedilatildeo e retomada histoacuterica

A escolha de um desses tipos depende da temaacutetica enfrentada pelo argumentador e da tese selecionada pelo profissional Para exemplificar suponha que o autor pretenda buscar a revisatildeo de cobranccedilas indevidas prashyticadas por uma empresa de telefonia que eacute tida haacute muito como prestadora de um serviccedilo de maacute qualidade

Nessa situaccedilatildeo faacutetica entendemos que a localizaccedilatildeo do fato no tempo e no espaccedilo eacute a proposta de introito mais eficiente Todos sabem que as emshypresas de telefonia em geral - e esta em especial no Rio de Janeiro mdash satildeo as campeatildes de violaccedilatildeo dos direitos dos consumidores E paciacutefico ainda que a reacute estaacute entre as empresas que mais figuram no polo passivo da demanda nos Juizados Especiais Ciacuteveis fluminenses Essas informaccedilotildees contribuem para a compreensatildeo de que as praacuteticas comerciais da reacute satildeo reprovaacuteveis e isso facilita a aceitaccedilatildeo da tese sustentada pelo argumentador

102 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

No introito intitulado explanaccedilatildeo de ideia inicial o paraacutegrafo tem a funccedilatildeo de apresentar em linhas gerais o tema a ser debatido Quando o insshytituto em pauta eacute bastante conhecido talvez natildeo haja funccedilatildeo argumentativa em realizar essa explanaccedilatildeo mas quando ele eacute relativamente recente no orshydenamento juriacutedico ou quando o argumentador pretende dar novo enfoque ou tratamento a tema jaacute difundido do direito essa estrateacutegia de introduzir o texto argumentativo pode ser bem eficiente

Pense na cobranccedila das verbas rescisoacuterias praticada pelo empregado conshytra seu empregador quando de sua demissatildeo E paciacutefico que o empregado tem direito a receber tudo que a legislaccedilatildeo trabalhista lhe garante A proacutepria natureshyza alimentar dessas verbas daacute a elas status de grande relevacircncia Atualmente poreacutem os Tribunais Superiores vecircm ponderando que a execuccedilatildeo da sentenccedila que garante ao trabalhador o recebimento desses valores deve ser feita de mashyneira a considerar a funccedilatildeo social da empresa isto eacute seria pouco razoaacutevel para tutelar o direito violado do trabalhador levar um bem da empresa a leilatildeo e inviabilizar a proacutepria atividade empresarial Isso prejudicaria inuacutemeros funcioshynaacuterios a fim de garantir a proteccedilatildeo do direito de apenas um

Natildeo se trata de minorar os direitos individuais mas de sopesaacute-los agrave luz de um bem maior Esse raciociacutenio natildeo vigorou desde sempre no direishyto brasileiro ao contraacuterio ele eacute relativamente recente Daiacute a necessidade eventual de apresentar ao auditoacuterio - por explanaccedilatildeo de ideia inicial - em que consiste a execuccedilatildeo de um bem que pode representar o fim da ativishydade realizada pela reacute enfatizando a ldquo funccedilatildeo social da empresardquo naquele contexto Talvez esse instituto natildeo esteja suficientemente difundido para nortear e validar a tese da inexecuccedilatildeo do bem ainda que inegaacutevel o direito de o empregado receber as verbas rescisoacuterias

A proposta de introduzir a argumentaccedilatildeo por enumeraccedilatildeo eacute uma das mais tradicionais Tendo em vista que esse tipo de texto deve aleacutem de apresentar um ponto de vista defendecirc-lo por meio de argumentos a introshyduccedilatildeo pode ter o papel de apresentar em siacutentese esses fatosraciociacutenios e desenvolver cada um deles pormenorizadamente em seguida

Exemplificando essa estrateacutegia observe a introduccedilatildeo de uma motivashyccedilatildeo da lavra do Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho

Ato juriacutedico perfeito direito adquirido direito a tenno expectativa de direito ato administrativo negociai ato-condiccedilatildeo contribuiccedilatildeo parafisshycal relaccedilatildeo juriacutedica estatutaacuteria enriquecimento de causa etc Satildeo as teses sustentadas pelos protagonistas deste processo em busca de uma soluccedilatildeo para a lide Antes de acolher qualquer delas entretanto cumpre identificar a real relaccedilatildeo juriacutedica existente entre o autor e o reacuteu e analishysar os efeitos dela decorrentes

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 103

A retomada histoacuterica eacute outra forma de introduzir as fundamentaccedilotildees juriacutedicas Para um texto de tamanho relativamente curto como eacute o caso da fundamentaccedilatildeo simples natildeo cabe a exposiccedilatildeo minuciosa de um histoacuterico Sugerimos que seja realizada apenas uma relaccedilatildeo analoacutegica entre um eleshymento do passado e um do presente

De maneira alguma ldquo chuterdquo fatos histoacutericos ou estatiacutesticos dos quais natildeo haja certeza absoluta (cientiacutefica) sob pena de a estrateacutegia ser frustrada

Um tema para o qual esse tipo de introito seria bastante eficiente eacute a autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo do aborto terapecircutico O Brasil jaacute teve embates anteriores sobre esse tema e as consequecircncias advindas das escolhas feitas no passado estatildeo presentes hoje para serem avaliadas e iluminar o futuro

532 Argumento proacute-tese

Se levarmos ao peacute da letra a nomenclatura ldquo argumento proacute-teserdquo deshyvemos entender que essa eacute a estrateacutegia argumentativa que desenvolve um raciociacutenio a favor da tese defendida Mas isso natildeo eacute muito esclarecedor

Todo argumentador quando desenvolve seu discurso pretende pershysuadir seu auditoacuterio de que sua tese eacute adequada coerente justa O contraacuterio seria absurdo Dizer portanto que um argumento eacute a favor da tese natildeo chega a ser esclarecedor

Sabemos que cada tipo de argumento se caracteriza pela utilizaccedilatildeo de uma estrateacutegia especiacutefica que lhe garante certos contornos de atuaccedilatildeo O argumento de autoridade por exemplo recorre agrave legislaccedilatildeo agrave doutrina e agrave opiniatildeo fundamentada de especialistas o argumento de analogia baseia-se em uma seacuterie de procedimentos que tecircm na comparaccedilatildeo e na semelhanccedila sua estrateacutegia para defender um ponto de vista

Disso se depreende que necessariamente todo argumento eacute a favor da tese escolhida pelo argumentador e a defesa desse ponto de vista recorre a uma estrateacutegia marcada por algum artifiacutecio especiacutefico O argumento proacuteshytese eacute aquele que utiliza a razoabilidade e a coerecircncia do encadeamento sistematizado de fatos-razotildees como fundamento de validade ou seja o argumento proacute-tese eacute aquele que desenvolve uma explicaccedilatildeo razoaacutevel para determinada questatildeo relevante do raciociacutenio argumentativo

A questatildeo relevante a que nos referimos estaacute expressa na tese refere-se agravequilo que se precisa provar (levar a crer convencer) para se alcanccedilar um ldquodever serrdquo ou melhor levar a fazer (persuadir)Esse argumento eacute bastante recorrente na produccedilatildeo das peccedilas processuais mas muitas vezes o argumen-

104 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

tador apresenta dificuldades de montar um projeto de argumentaccedilatildeo para seu texto em que os argumentos proacute-tese sejam utilizados de forma eficiente

Conheccedila o caso concreto a seguir a partir do qual foi proposto um argumento proacute-tese

AacuteGUA DE HEM ODIAacuteLISE CONTAMINADASecretaria interdita hospital em Recife

Duas mortes satildeo investigadas(O Globo)

REC IFE Cinco anos apoacutes a trageacutedia da hemodiaacutelise - que matou 44 pacientes e intoxicou 100 no Instituto de Doenccedilas Renais de Caruaru- a Secretaria de Sauacutede de Pernambuco interditou parte da central de hemodiaacutelise do Hospital Real Portuguecircs em Recife O motivo foi a contaminaccedilatildeo por bacteacuterias da aacutegua usada no atendimento aos doentes Duas mortes estatildeo sendo investigadasO hospital atende a 312 pacientes renais e o serviccedilo eacute de referecircncia do Norte-Nordeste Foi o hospital que constatou a contaminaccedilatildeo ao invesshytigar calafrios nos doentes No dia 20 anaacutelises indicaram concentraccedilatildeo de 6800 bacteacuterias heterotroacuteficas por mililitro de aacutegua quantidade 23 vezes maior do que a tolerada pelas autoridades sanitaacuteriasAs bacteacuterias heterotroacuteficas (que natildeo produzem o proacuteprio alimento) natildeo satildeo perigosas como as da trageacutedia em Caruaru mas em grande quantishydade podem causar infecccedilatildeo segundo o chefe da Vigilacircncia Sanitaacuteria Jaime Brito Ele acredita que a contaminaccedilatildeo pode estar ocorrendo no sistema de filtragemSegundo o chefe do Setor de Hemodiaacutelise do hospital William Stan- ford quando o problema foi constatado a direccedilatildeo chamou um teacutecnico de Curitiba para revisatildeo e limpeza do sistema de tratamento O niacutevel de contaminaccedilatildeo foi reduzido mas as bacteacuterias continuaram em concenshytraccedilatildeo maior que a permitida - 1100 por mililitro Os pacientes contishynuaram se queixando de calafriosO hospital natildeo comunicou o fato agrave secretaria que soube do problema por denuacutencia anocircnima Depois de inspeccedilatildeo a Vigilacircncia Sanitaacuteria lashycrou as salas A e C do Setor de Hemodiaacutelise Cem doentes foram transshyferidos para o Hospital Baratildeo de LucenaO secretaacuterio-adjunto de Sauacutede Liacutevio de Barros tranquilizou os 2100 pacientes pela televisatildeo Ele disse que o problema natildeo eacute tatildeo grave quanshyto o registrado em 1996 em Caruaru- Em Recife natildeo encontramos algas cianofiacutecias (azuis) na aacutegua mas bacteacuterias que respondem bem a antibioacuteticos Mas eacute necessaacuterio que esteshyjamos alerta Estamos tomando como medida cautelar o monitoramento das maacutequinas - disse

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 105

A media mensal de calafrios estava assustadora Segundo a secretaria em circunstacircncias normais os casos chegavam a sete por mecircs No pico da contaminaccedilatildeo da aacutegua foram 20 queixas em dois dias

Registremos inicialmente a tese que se pode assumir neste caso ldquoo hospital deve indenizar os pacientes que receberam a hemodiaacutelise e as fashymiacutelias dos pacientes que faleceram em razatildeo desse procedimento porque foi negligenterdquo

No argumento proacute-tese ter-se-aacute a oportunidade de demonstrar por meio dos fatos a negligecircncia do hospital

O paraacutegrafo argumentativo proacute-tese - cuja estrutura eacute ldquo tese + porque (fato l) + e tambeacutem (fato 2)+ aleacutem disso(fato 3)rdquo -pode ser assim redigishydo O hospital foi negligente porque utilizou aacutegua contaminada no tratashymento de hemodiaacutelise de pacientes renais e tambeacutem natildeo comunicou o fato agrave secretaria de sauacutede Aleacutem disso mesmo apoacutes ter conhecimento do alto iacutendice de contaminaccedilatildeo por bacteacuterias continuou a utilizaacute-la colocando pois em perigo iminente a vida dos pacientes

Sugestatildeo de esquema para argumentar

Argumento proacute-tese (Tese + porque + e tambeacutem + aleacutem disso)

O hospital foi negligente porque utilizou aacutegua contaminada no tratamento de hemodiaacuteshylise de pacientes renais e tambeacutem natildeo comunicou o fato agrave secretaria de sauacutede Aleacutem disso mesmo apoacutes ter conhecimento do alto iacutendice de contaminaccedilatildeo por bacteacuterias continuou a utilizaacute-la colocando pois em perigo iminente a vida dos pacientes

Demais paraacutegrafos

Proposta 1

bull ldquoEacute bem verdaderdquo deve comeccedilar o 2o paraacutegrafoldquoAteacute porquerdquo deve iniciar a 2a frase do 2o paraacutegrafobull ldquoPor outro ladordquo ou ldquoEm contrapartidardquo deve comeccedilar o 3o paraacutegrafobull ldquoPor conseguinterdquo (conclusivo) deve comeccedilar o 4o paraacutegrafo

Proposta 2

bull ldquoHaacute quem digardquo deve comeccedilar o 2o paraacutegrafoldquoAliaacutesrdquo deve iniciar a 2a frase do 2o paraacutegrafobull ldquoDesse modordquo deve comeccedilar o 3o paraacutegrafoldquoEmborardquo deve estar no 3o paraacutegrafobull ldquoAssim sendordquo deve comeccedilar o 4o paraacutegrafo (conclusivo)

106 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Para ampliar o repertoacuterio do nosso leitor propomos mais alguns pashyraacutegrafos exemplificativos Cada um trata de um tema diferente e seria utishylizado logo apoacutes o introito

Tema importacircncia do Coacutedigo de Defesa do Consumidor para o ordeshynamento juriacutedico paacutetrioO Coacutedigo de Defesa do Consumidor criou uma sobre-estrutura juriacutedishyca multidisciplinar aplicaacutevel a toda e qualquer aacuterea do Direito em que ocorrer relaccedilatildeo de consumo porque esse diploma legal possui princiacuteshypios proacuteprios e autonomia sistecircmica e tambeacutem porque permeia a sua disciplina tanto pelo direito puacuteblico quanto pelo privado nas relaccedilotildees contratuais e extracontratuais materiais e processuais Aleacutem disso tudo tem a ver com o consumidor - a sauacutede a seguranccedila os transportes a alimentaccedilatildeo os medicamentos a moradia

Tema reduccedilatildeo da maioridade penal no BrasilA reduccedilatildeo da maioridade penal no Brasil ajudaria a resolver a violecircncia endecircmica que vivemos na sociedade atual porque os ladrotildees e assassishynos que praticam seus atos a sangue frio podem ser menores de idade como no caso de Joatildeo Heacutelio menino de 6 anos morto apoacutes ser arrastado por quilocircmetros nas mas do Rio de Janeiro por um adolescente e dois adultos Soma-se a esse fato (semanticamente igual a ldquoe tambeacutemrdquo) que muitos menores satildeo aliciados por bandidos e conduzidos agrave praacutetica de atos iliacutecitos sob a proteccedilatildeo da menoridade penal Ademais (semanshyticamente igual a ldquoaleacutem dissordquo) alguns jovens assumem a autoria de atos delituosos a fim de proteger criminosos adultos

Repare que neste uacuteltimo exemplo o conector ldquo e tambeacutemrdquo foi substituiacuteshydo por ldquo soma-se a esse fatordquo de mesmo valor semacircntico por questotildees coesishyvas isto eacute como o periacuteodo jaacute estava bastante longo preferiu o argumentador recorrer a um ponto e reiniciar a estrutura tal como vimos sugerindo

A seguir outro tipo de argumento de grande valor para os profissioshynais do Direito o argumento de autoridade

533 Argumento de autoridade

O argumento de autoridade como a proacutepria nomenclatura sugere eacute aquele que invoca o prestiacutegio dos atos ou juiacutezos de uma determinada pesshysoa ou grupo a partir do qual a afirmaccedilatildeo ganha relevacircncia

A primeira observaccedilatildeo a fazer acerca desse argumento eacute que por longo tempo ele foi atacado sob a alegaccedilatildeo de que nenhuma autoridade eacute

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 107

infaliacutevel em suas opiniotildees e por isso mesmo essa estrateacutegia possibilita o uso coercitivo de uma opiniatildeo sem garantias objetivas de sua adequaccedilatildeo

Ressalte-se que atualmente essa preocupaccedilatildeo natildeo mais existe porque a proacutepria natureza da argumentaccedilatildeo pressupotildee certo grau de subjetividade na recepccedilatildeo dos valores que deveratildeo ser compartilhados pelo auditoacuterio

Importante sim seria identificar quem satildeo as pessoas ou os grupos de onde proveacutem a fala da autoridade Natildeo haacute duacutevidas de que a liccedilatildeo de um profissional conhecido e reconhecido em determinada disciplina - um psicoacutelogo para tratar de questotildees ligadas agrave personalidade um meacutedico para opinar sobre uma patologia um historiador para avaliar as consequecircncias de um dado evento de grande relevacircncia para a sociedade de uma eacutepoca etc - possui grande valor

Mas apenas a qualificaccedilatildeo teacutecnico-profissional do indiviacuteduo natildeo lhe garante necessariamente status suficiente para que seja reconhecido como autoridade Satildeo ainda necessaacuterios outros requisitos para que enfim sua opiniatildeo tenha grande relevacircncia argumentativa

E fundamental por exemplo que a autoridade consiga manter o disshytanciamento e a imparcialidade necessaacuterios a que nenhum outro fator ex- lerno agrave questatildeo avaliada possa interferir em demasia na sua avaliaccedilatildeo Para licar mais claro imagine a situaccedilatildeo em que um meacutedico queira utilizar a sua autoridade de profissional da medicina para opinar acerca da ocorrecircncia de erro meacutedico cometido contra um irmatildeo seu E claro que o grau de parenshytesco poderaacute interferir na sua avaliaccedilatildeo e mesmo que isso natildeo ocorra sua opiniatildeo ficaraacute sempre sob suspeiccedilatildeo

Uma pista interessante para determinar se haacute imparcialidade c distanshyciamento de quem opina eacute saber se satildeo observadas as hipoacuteteses de impedishymento (art 134 do CPC e art 252 do CPP) e de suspeiccedilatildeo (art 135 do CPC e art 254 do CPP) listadas pelos Coacutedigos de Processo

Algumas das hipoacuteteses previstas nos referidos artigos do Coacutedigo de Processo Civil satildeo

Art 134 CPC Eacute defeso ao juiz exercer as suas funccedilotildees no processo contencioso ou voluntaacuterioI - de que for parteII - em que interveio como mandataacuterio da parte oficiou como perito funcionou como oacutergatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou prestou depoimento como testemunhaIII - que conheceu em primeiro grau de jurisdiccedilatildeo tendo-lhe proferido sentenccedila ou decisatildeo

108 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

IV - quando nele estiver postulando como advogado da parte o seu cocircnjuge ou qualquer parente seu consanguiacuteneo ou afim em linha reta ou na linha colateral ateacute o segundo grauV - quando cocircnjuge parente consanguiacuteneo ou afim de alguma das partes em linha reta ou na colateral ateacute o terceiro grauV I - quando for oacutergatildeo de direccedilatildeo ou de administraccedilatildeo de pessoa juriacutedishyca parte na causaArt 135 CPC Rcputa-sc fundada a suspeiccedilatildeo de parcialidade do juiz quandoI - amigo iacutentimo ou inimigo capital de qualquer das partesII - alguma das partes for credora ou devedora do juiz de seu cocircnjuge ou de parentes destes em linha reta ou na colateral ateacute o terceiro grauIII - herdeiro presuntivo donataacuterio ou empregador de alguma das partesIV - receber daacutedivas antes ou depois de iniciado o processo aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou subministrar meios para atender agraves despesas do litiacutegioV - interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes Paraacutegrafo uacutenico Poderaacute ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo iacutentimo

Outro requisito importante para que uma pessoa seja considerada uma autoridade eacute o preenchimento do lugar da legitimidade tatildeo caro agrave ciecircncia juriacutedica Isso quer dizer que mesmo uma pessoa sendo meacutedico com ampla experiecircncia em cliacutenica geral se natildeo estiver cadastrado como meacutedico autorizado pelo Ministeacuterio do Trabalho um atestado por ele proferido natildeo teraacute validade para fins de exame admissional exigecircncia perioacutedica de toda empresa a seus empregados

Veja que mesmo que o referido profissional tenha preenchido toshydos os requisitos teacutecnicos de formaccedilatildeo acadecircmica e natildeo esteja impedido nem seja suspeito isso natildeo lhe garante a autoridade necessaacuteria para exercer dada atividade juriacutedica Faltou-lhe legitimidade Por essa razatildeo pode-se afirmar que o Direito cria regras proacuteprias que determinam quem ocupa ou natildeo o aqui denominado ldquo lugar da autoridaderdquo

Do ponto de vista praacutetico interessa ressaltar que um contador por exemplo pode preencher todos os requisitos que deem validade a um deshyterminado caacutelculo por ele realizado Na praacutetica forense entretanto eacute faculshytado agraves partes discutirem a autoridade que tem esse profissional e esse proshycedimento eacute utilizado como recurso para procrastinar o fim do processo

Mais uma vez ressaltamos que a melhor decisatildeo eacute a parte requerer que um contador judicial ou perito juramentado realize as tarefas atinentes

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 109

u esses profissionais pois isso dificulta que o adversaacuterio utilize a natildeo auto-i u liide ou a inobservacircncia da feacute puacuteblica como estrateacutegia de desmerecimen- lo da autoridade que se manifesta

Natildeo se pode deixar de assinalar tambeacutem que mesmo natildeo tendo forshymaccedilatildeo acadecircmica em aacuterea alguma um indiviacuteduo pode exercer o papel de uitoridade Provavelmente um agricultor teraacute os conhecimentos necessaacute-i ms para saber se o solo de uma propriedade eacute ou natildeo adequado ao plantio ilc uma determinada safra mesmo natildeo sendo agrocircnomo talvez tenha conshydiccedilotildees de avaliar as possibilidades de chuva mesmo natildeo tendo formaccedilatildeo meteoroloacutegica Os iacutendios de nosso paiacutes por exemplo dominam conhecishymentos ainda pouco explorados por botacircnicos e quiacutemicos

Muitas vezes basta que a opiniatildeo de quem fala seja sustentada pela icpresentatividade social4Um liacuteder comunitaacuterio um pastor uma missioshynaacuteria ou um cantor dependendo do tema tratado podem ser reconhecidos como autoridade Com relaccedilatildeo ao referendo sobre o desarmamento natildeo raro as campanhas utilizavam artistas muacutesicos religiosos e pessoas viacute- innas da violecircncia para convencer o puacuteblico em geral a votar a favor ou contra a proibiccedilatildeo de venda de armas e municcedilatildeo

Outro exemplo recente eacute a participaccedilatildeo de cadeirantes na blitz da Lei Scca A condiccedilatildeo de viacutetima do mal que se pretende evitar (e fiscalizar) eacute altamente persuasiva As empresas de propaganda conhecem bastante bem a eficiecircncia que tais discursos podem alcanccedilar quando dirigidos ao grande puacuteblico razatildeo pela qual contratam artistas para promover suas marcas e produtos mesmo que ele natildeo tenha qualquer autoridade teacutecnica para opishynar sobre o produto da propaganda Reiteramos que o lugar da autoridade deriva da representatividade social que essa pessoa possui

A utilizaccedilatildeo da hermenecircutica polifocircnica no discurso juriacutedico tem por objetivo fortalecer o processo da persuasatildeo por meio da incorporaccedilatildeo no discurso do sujeito de informaccedilotildees de asserccedilotildees de outros enunciadores como da opiniatildeo puacuteblica (conhecida como senso comum) da norma da jurisprudecircncia da miacutedia da Igreja da famiacutelia enfim vozes de diversos campos culturais que reforccedilam a posiccedilatildeo do sujeito-enunciador

Reiteramos portanto que a opiniatildeo de um indiviacuteduo ou de um grupo c apenas uma das fontes a que o argumentador pode recorrer para desenshyvolver um argumento de autoridade

1 A Representatividade Social eacute a relaccedilatildeo do personagem com o contexto social eacute o que ele representa para a sociedade

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Perelman nos ensina5 a respeito das fontes que constituem a autorishydade na produccedilatildeo de argumentos que elas satildeo muito variadas ldquo o parecer unacircnimerdquo ldquo a opiniatildeo comumrdquo e ldquo certas opiniotildees de cientistas filoacutesofos religiosos e profetasrdquo Por vezes a autoridade poderaacute emanar tambeacutem de uma fonte impessoal ldquo as leis da fiacutesicardquo ldquoa legislaccedilatildeo positivada de um ordenamento juriacutedicordquo ldquo a doutrina juriacutedicardquo ldquo a religiatildeordquo e ldquo a Biacutebliardquo

Portanto a doutrina a opiniatildeo fundamentada de especialistas em geshyral e a legislaccedilatildeo podem ser utilizadas como fundamentos relevantes na redaccedilatildeo de argumentos de autoridade

Eacute fundamental tomar cuidado entretanto com uma posUira cada vez mais comum na praacutetica forense alguns operadores do Direito se iludem com a ideia de que a simples referecircncia a um dispositivo legal jaacute caracteriza a funshydamentaccedilatildeo de uma tese pelo argumento de autoridade Isso natildeo eacute verdade

Como jaacute dissemos eacute possiacutevel que a um mesmo caso concreto possam ser aplicados diversos dispositivos igualmente relevantes Essa eacute uma das muitas razotildees por que se exige que o argumentador aleacutem de fazer refeshyrecircncia agrave fonte legal a que recorre sustente por meio de uma justificativa coerente que a aplicaccedilatildeo daquela norma eacute pertinente ao caso e que natildeo gera qualquer situaccedilatildeo conflituosa ou incoerente

Natildeo bastaria portanto em dada fundamentaccedilatildeo dizer que ldquoo que se verifica no caso em anaacutelise eacute a verificaccedilatildeo da carecircncia de accedilatildeo por parte do ente puacuteblico-autor conforme determina o art 301 X do CPCrdquo Fica evidente que haacute uma tese aqui sustentada mas natildeo haacute argumentos que garantam a existecircncia da ldquo carecircncia de accedilatildeordquo Melhor seria se o paraacutegrafo argumentativo por autoridade fosse assim redigido

O que se comprova no caso em anaacutelise eacute a verificaccedilatildeo da carecircncia de accedilatildeo (art 267 V I e 301 X do CPC) por parte do ente puacuteblico-autor em virtude da ausecircncia do chamado interesse de agir condiccedilatildeo indispenshysaacutevel para o regular exerciacutecio do direito de accedilatildeo uma vez que o autor nunca teve a posse efetiva da aacuterea objeto do litiacutegio Isso impede que o seu pedido seja possessoacuterio

Veja que no paraacutegrafo anterior a legislaccedilatildeo reforccedila o que o argumenshytador sustenta por meio dos fatos

Para exemplificarmos a utilizaccedilatildeo do argumento de autoridade lereshymos dois fragmentos um em que o argumento de autoridade - com base na doutrina - estaacute mal utilizado e outro em que foi adequadamente utilizado

O fragmento a seguir foi retirado de uma sentenccedila e natildeo recorre agrave doutrina de maneira a aproveitar sua autoridade para reforccedilar a tese que estaacute sendo defendida pelo argumentador6

()O comportamento indicado agrave re eacute gerador de dano extrapatrimonial cuja existecircncia independe de prova de efetivos prejuiacutezos morais Acresshyccedila-se que ldquona prova do dano moral c das circunstacircncias que influem na determinaccedilatildeo do quantitativo a arbitrar os juizes teratildeo de recorrer agraves regras de experiecircncia comum subministradas pela observaccedilatildeo do que ordinariamente acontece referidas no art 335 do Coacutedigo de Processo C ivilrdquo (THEODORO JR Humberto Curso de Direito Processual Cishyvil 39 ed Rio de Janeiro Forense p 179)()

Perceba que se o argumentador sustentou no iniacutecio do paraacutegrafo que o dano extrapatrimonial natildeo depende de prova de efetivos prejuiacutezos moshyrais por que entatildeo citou o doutrinador para discutir a maneira como se arbitra a indenizaccedilatildeo por dano moral

O papel da doutrina eacute exatamente o de trazer legitimidade ao que se estaacute defendendo E uma maneira de se dizer que algum jurista cuja autorishydade jaacute foi reconhecida pela maioria pensa como vocecirc e que por isso sua tese deve ser acolhida

Deveria o operador do Direito ter trazido no fragmento anterior algum trecho da doutrina que reforccedila a ideia de que a existecircncia do dano extrapatrishymonial independe de prova de prejuiacutezos morais mas isso natildeo foi feito

De maneira diversa o fragmento abaixo retirado de uma fundamentaccedilatildeo de um agravo julgado pelo Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro7 reshycorre agrave doutrina adequadamente para construir seu argumento de autoridade

Certamente o sistema judiciaacuterio deve ser remunerado sob pena de inshycentivar-se a litigacircncia irresponsaacutevel em detrimento do interesse puacuteblishyco existente na prestaccedilatildeo jurisdicional Natildeo obstante referida atividade natildeo pode ser fonte de enriquecimento sem causa para o EstadoO valor da causa corresponde segundo D1NAMARCO agrave ldquo expressatildeo monetaacuteria do significado econocircmico dos benefiacutecios procurados pelo aushytor atraveacutes do processordquo (D INAM ARCO Instituiccedilotildees de Direito Proshycessual Civil v III 3a ed Satildeo Paulo Malheiros 2003 p 370) Como

5 PERELM AN Chaim amp OLBRECHTS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 350

6 Por razotildees eacuteticas natildeo seraacute indicada a fonte do trecho criticado7 Processo ndeg 1979804 Fl 83

112 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

nota o insigne processualista por natildeo se dispor a prestar gratuitamente o serviccedilo jurisdicional o Estado distribui entre os usuaacuterios as despesas que suporta em tal mister fazendo-o na proporccedilatildeo do interesse econocircshymico que cada um pretende satisfazer por meio do processo (ob cit pp 271-272) Em outras palavras o valor da causa haacute que observar o proveito econocircmico pretendido e obtido pelo demandanteIn casu o processo de conhecimento versou acerca da reparaccedilatildeo de danos materiais e morais tendo o autor formulado pedido geneacuterico E cediccedilo que em nosso direito a fixaccedilatildeo da indenizaccedilatildeo por dano moral ficou entregue ao prudente arbiacutetrio judicial

Perceba que a tese exposta no primeiro paraacutegrafo do fragmento - ldquoa prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo pode ser fonte de enriquecimento sem causa para o Estadordquo - foi defendida com base nas liccedilotildees de um ilustre doutri- nador Dinamarco cuja citaccedilatildeo foi contextuaiizada ao caso concreto disshycutido Tsso representa dizer que a citaccedilatildeo da legislaccedilatildeo da doutrina ou do especialista deve estar claramente relacionada com o caso concreto

Eacute importante frisar que apesar de muito persuasivo o argumento de autoridade deve ser exposto de maneira a que se comprove seu percurso loacutegico Ele natildeo vale apenas porque estaacute amparado pela legislaccedilatildeo ou pela doutrina espera-se que o ponto de vista sustentado seja tambeacutem coerente e razoaacutevel Por isso esteja atento natildeo faccedila de sua argumentaccedilatildeo um amonshytoado de citaccedilotildees8 Use-as apropriadamente

Quanto agrave citaccedilatildeo de doutrina recomendamos que o argumentador avalie com cautela quais e quantos autores seratildeo citados Existe uma relashyccedilatildeo diretamente proporcional entre a credibilidade de que goza um doutri- nador e a forccedila persuasiva da citaccedilatildeo de suas liccedilotildees Por isso eacute sempre mais interessante buscar autores e obras de referecircncia (satildeo eles fontes primaacuterias e fontes da atualidade) para cada mateacuteria tratada

A maioria dos autores cita a jurisprudecircncia como fonte de argumento de autoridade A esse respeito faremos alguns comentaacuterios quando trabashylharmos o argumento de analogia

Sabe-se que polifonia satildeo vozes que se incorporam ao texto do sujeito argumentashydor juriacutedico para dar consistecircncia agrave sua fala Existem basicamente duas maneiras de utilizar a polifonia por meio da paraacutefrase e da citaccedilatildeo A paraacutefrase consiste em reproduzir o conteuacutedo de uma fala com um discurso autocircnomo sem copiar o texto original Eacute importante contudo que a paraacutefrase seja fiel ao conteuacutedo original Citaccedilatildeo eacute o procedimento por meio do qual aquele que escreve copia textualmente a fala de outrem Para marcar que a autoria do texto natildeo eacute daquele que escreve usam-se as aspas para trechos de ateacute trecircs linhas ou recuo apropriado para trechos maiores A indicaccedilatildeo da fonte entretanto eacute adequada agraves duas fonnas de polifonia

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

s J4 Argumento de oposiccedilatildeo

Inicialmente ressaltemos que todo profissional do Direito quando argumenta sabe que seu ponto de vista seraacute contraposto por outro pro- Irsional que atua no polo adverso O contraditoacuterio eacute uma realidade a ser i-iifrentada pelo argumentador na praacutetica forense

Nesse sentido tentar prever alguns valores ou argumentos a serem nlilixados pela outra parte ao longo da busca da soluccedilatildeo jurisdicional para o conflito pode ser uma estrateacutegia discursiva bastante uacutetil pois ao mesmo u-inpo em que o advogado argumenta a favor de sua tese jaacute conseguiria lambeacutem mostrar que outra possibilidade de compreender os fatos - a do seu adversaacuterio - seria incompatiacutevel com a razoabilidade

Eacute justamente por essas razotildees que a oposiccedilatildeo se mostra um tipo de argumento eficiente para a redaccedilatildeo de uma boa fundamentaccedilatildeo juriacutedica Seguem assim os princiacutepios teoacutericos apresentados sobretudo por Ducrot ao longo de sua obra acerca da determinaccedilatildeo fraacutesica da argumentatividade por intermeacutedio de operadores argumentativos do tipo mas e embora que caracterizam esse tipo de argumento

Eacute comum que seja feita a distinccedilatildeo entre a oposiccedilatildeo restritiva - que utiliza os conectores coordenativos adversativos mas poreacutem entretanto contudo todavia - e a oposiccedilatildeo concessiva construiacuteda com as conjunccedilotildees Mibordinativas concessivas embora ainda que apesar de

Os autores ao longo dos anos vecircm se dedicando ao estudo do fenocircshymeno da concessatildeo veiculado sobretudo por estruturas com operadores argumentativos do tipo mas Eventualmente eles tratam da concessatildeo em estruturas com operadores do tipo embora

Ducrot diz que a expressatildeo [X mas Y ] pressupotildee que a afirmaccedilatildeo de X possa servir de argumento para uma certa conclusatildeo e que a proposiccedilatildeoY seja um argumento que anule essa conclusatildeo

Veja a construccedilatildeo a seguir

X0 motorista atropelou vaacuterias pesshysoas quando subiu na calccedilada mas9

Ypercebeu que aleacutem dos feridos as pesshysoas do lugar tambeacutem queriam linchaacute-lo

A conduta esperada para o caso de um motorista atropelar vaacuterias pessoas na calccedilada eacute que ele pare o automoacutevel e lhes preste socorro

A informaccedilatildeo de que as proacuteprias viacutetimas e outras pessoas do lugar queriam linchar o condutor do veiacuteculo eacute um argumento que anula a expectativa criada pela primeira proposiccedilatildeo e justifica a aushysecircncia de prestaccedilatildeo de socorro

9 Aleacutem do conector mas outras conjunccedilotildees poderiam ser utilizadas para unir os dois periacuteodos entretanto as relaccedilotildees semacircnticas estabelecidas seriam outras

114 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

No periacuteodo redigido ldquo o motorista atropelou vaacuterias pessoas quando subiu na calccedilada (X ) mas percebeu que aleacutem dos feridos as pessoas do lugar tambeacutem queriam linchaacute-lo (Y )rdquo atropelar as viacutetimas e linchamento conduzem a conclusotildees contraacuterias O emprego do mas entretanto natildeo imshyplica uma contradiccedilatildeo entre os dois conceitos X e Y satildeo duas informaccedilotildees que se opotildeem com relaccedilatildeo apenas ao movimento argumentativo colocado em evidecircncia pela conclusatildeo

Destaque-se que a conclusatildeo esperada para a primeira proposiccedilatildeo podeshyria ser algo como ldquo logo o motorista parou para lhes prestar socorrordquo e a conshyclusatildeo contraacuteria seria ldquo logo o motorista natildeo parou para lhes prestar socorrordquo

Trata-se do mas restritivo A afirmaccedilatildeo que precede o mas aparece como uma coisa que se concede que se reconhece e que a afirmaccedilatildeo seshyguinte vai ultrapassar sem anular Natildeo anula no sentido de que a manteacutem no niacutevel dos fatos mas a ultrapassa no sentido de que a desqualifica do ponto de vista argumentativo

A concessatildeo eacute uma estrateacutegia discursiva Se natildeo o fosse por que um locutor buscando fazer admitir alguma coisa concederia razatildeo a outrem sobre a existecircncia de objeccedilotildees agravequilo que ele mesmo afirma

O autor diz que assinalando objeccedilotildees agrave sua proacutepria tese daacute-se uma aparecircncia de objetividade e imparcialidade O indiviacuteduo apresenta-se como sendo capaz de considerar outros pontos de vista que natildeo o seu valoriza a opiniatildeo do outro e essa valorizaccedilatildeo parece um esforccedilo de clarividecircncia de honestidade e natildeo de propoacutesito

Como se pode constatar o autor ao estudar o mas com valor de resshytriccedilatildeo identifica o fenocircmeno da oposiccedilatildeo na oraccedilatildeo que o precede

Em Provar e Dizer (1981) ao falar da conjunccedilatildeo mas e das construshyccedilotildees de oposiccedilatildeo Ducrot explica que ao se dizer ldquo O tempo estaacute bom mas eu estou cansadordquo se reconhece que o bom tempo poderia levar o auditoacuterio a conclusotildees do tipo ldquo estou contenterdquo ou ldquoquero sairrdquo mas acrescenta-se a segunda proposiccedilatildeo a fim de dar uma razatildeo para recusar a conclusatildeo razatildeo que parece sobrepujar a inversa apresentada na primeira proposiccedilatildeo

No caso das concessivas introduzidas por operadores do tipo embora- ldquo Ele eacute forte embora seja pequenordquo Ducrot mostra a possibilidade de se argumentar por meio do que eacute dito na oraccedilatildeo subordinada ldquo Ele eacute pequenordquo contra o que afirma a principal ldquo Ele eacute forterdquo Haacute entretanto uma recusa de se seguir essa virtLialidade argumentativa e afirma-se a principal

O autor diz que escolheu o verbo reconhecer no que concerne a esses exemplos para assinalar que o argumentador natildeo somente atribui ao audi-

toacuterio uma tendecircncia a concluir ldquo a ausecircncia de forccedila da pequenezrdquo ou ldquoa sashytisfaccedilatildeo a partir do bom tempordquo mas tambeacutem admite a legitimidade dessa tendecircncia que ele reconhece por assim dizer como se fosse tambeacutem sua

Verifica-se entatildeo em Provar e Dizer o processo da concessatildeo sendo registrado por intermeacutedio de estruturas com mas e com embora A oposishyccedilatildeo eacute percebida e explicada por meio do verbo reconhecer no sentido de conceder

A estrutura que sugerimos para operacionalizar o uso deste tipo de argumento eacute a seguinte

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Embora proposiccedilatildeo acei- Apesar de ta como possiacute-Ainda que rnas Que se

quer negarEm que pese

tese

jaacute que _1 w proposiccedilatildeo queuma vez Se sobrepotildee agraveque anterior anulan-porque do ou minorando

os seus efeitosporquanto

Embora seja obrigaccedilatildeo do condushytor de um veiacuteculo socorrer as viacutetishymas de um acidente de tracircnsito

o motorista que deixou de parar para socorrer os feridos natildeo pratishycou omissatildeo de socorro

porque a lei natildeo pode exigir de algueacutem que ponha sua proacuteshypria vida ou sua integridade fiacutesica em risco para socorrer outrem

535 Argumento de analogia

Antes de apreciarmos como a analogia pode ser utilizada como esshytrateacutegia argumentativa e como se caracteriza esse tipo de argumento eacute imshyportante que se entenda o significado desse termo e quais as implicaccedilotildees de sua utilizaccedilatildeo

Segundo Miguel Reale10 a analogia consiste em sua essecircncia no preenchimento da lacuna verificada na lei graccedilas a um raciociacutenio fundado em razotildees de similitude ou ainda na correspondecircncia entre certas notas caracteriacutesticas do caso regulado e as daquele que natildeo o eacute

Assinala tambeacutem o doutrinador que o recurso agrave analogia natildeo impeshyde que lancemos matildeo concomitantemente dos costumes e dos princiacutepios gerais do Direito mesmo porque todo raciociacutenio analoacutegico pressupotildee a

10 REALE Miguel Liccedilotildees preliminares de Direito 25 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 p 317

116 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

apontada correspondecircncia entre duas modalidades do real confrontadas e conduz de maneira natural ao plano dos princiacutepios

Analogia portanto eacute o procedimento por meio do qual se pode esshytabelecer uma relaccedilatildeo de semelhanccedila entre coisas diversas Recorrer agrave analogia significa fazer uma espeacutecie de comparaccedilatildeo entre os termos em questatildeo

Ensina-se jaacute no Ensino Meacutedio uma figura de linguagem denominada metaacutefora que eacute na verdade uma forma de expressatildeo da analogia Em que ela consiste A metaacutefora caracteriza-se pelo emprego de uma palavra em sentido diferente do proacuteprio em decorrecircncia de uma relaccedilatildeo por semelhanshyccedila vislumbrada entre os termos comparados

E o que ocorre na frase ldquo O Estatuto da Crianccedila e do Adolescente (ECA ) eacute uma matildeerdquo Veja que foi estabelecida uma relaccedilatildeo associativa entre os termos ldquoEstatuto da Crianccedila e do Adolescenterdquo e ldquomatildeerdquo Quais caracteshyriacutesticas em comum guardam as duas expressotildees A metaacutefora sugere que o ECA seja protetivo acolhedor complacente compreensivo e vise ao bem estar das crianccedilas e dos adolescentes

O raciociacutenio eacute o seguinte

Estatuto da Crianccedila e do Adolescente Matildee

Legislaccedilatildeo Humana

Defensor da condiccedilatildeo de ldquoser em desenshyvolvimentordquo dos menores Compreensiva com os defeitos dos filhos

Tutela de maneira quase incondicional os direitos das crianccedilas Protetora incondicional de seus filhos

Considerado demasiadamente protecioshynista por alguns Acolhedora e carinhosa

Visa ao bem estar das pessoas cujos dishyreitos deve proteger Visa ao bem estar e agrave felicidade dos filhos

Assim o ECA assemelha-se agrave MAtildeEPerceba que soacute foi possiacutevel a associaccedilatildeo metafoacuterica entre os entes

porque ambos guardavam entre si alguns elementos em comum O mesmo ocorre em contextos como ldquomeu vizinho eacute um cavalordquo ldquo a prova foi mamatildeo com accediluacutecarrdquo etc

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 117

O argumentador aproveita-se do conhecimento preacutevio do auditoacuterio para que um dado conteuacutedo posto a esse grupo particular possa ser aplicashydo por semelhanccedila a outra situaccedilatildeo nova que se pretende sustentar Essa ideia reforccedila o entendimento de Miguel Reale de que todo raciociacutenio anashyloacutegico pressupotildee a apontada correspondecircncia entre duas modalidades do real confrontadas

Observe tambeacutem o raciociacutenio usado no paraacutegrafo abaixo quando se quer por exemplo sustentar que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil exerce sobre seus cidadatildeos poder soberano

A Constituiccedilatildeo protege os direitos fundamentais dos seus cidadatildeos e estabelece as normas de estruturaccedilatildeo e organizaccedilatildeo do Estado assim como a Biacuteblia reuacutene as orientaccedilotildees de Deus ao homem para que este viva em paz e seja feliz

Situaccedilatildeo conhecida pelo auditoacuterio

Conhecimento a ser alcanccedilado

Biacuteblia Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

orientaccedilotildees de Deus aos homens

orientaccedilotildees do Estado aos seus cidadatildeos

Ora se as orientaccedilotildees da Biacuteblia satildeo soberanas em decorrecircncia de quem as inspirou por analogia essa caracteriacutestica - soberania - passa agrave Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica por consequecircncia da aproximaccedilatildeo sugerida na argumentaccedilatildeo

Natildeo eacute adequado nesta hipoacutetese falar-se em lacuna mas ainda assim a analogia mostra-se eficiente pois eacute por meio dela que se podem transshymitir caracteriacutesticas conhecidas - garantidas pelo conhecimento preacutevio do auditoacuterio - a situaccedilotildees novas produzindo conhecimento novo

Importante eacute que ao estabelecer uma analogia entre dois ou mais tershymos - seja por meio de uma metaacutefora de uma gradaccedilatildeo ou de uma compara-

11 Como vimos o auditoacuterio desempenha um papel predominante na Teoria da Argumenshytaccedilatildeo de Perelman amp Tyteca e eacute definido como o conjunto de todos aqueles em que o orador quer influir com sua argumentaccedilatildeo Por isso a classificaccedilatildeo de maior vulto de tipos de argumentaccedilatildeo feita por Perelman amp Tyteca baseia-se na distinccedilatildeo entre a argumentaccedilatildeo que ocorre diante do auditoacuterio universal a argumentaccedilatildeo diante de um uacutenico ouvinte (o diaacutelogo) e a deliberaccedilatildeo consigo mesmo (Atiema 2000 p 86)

118 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ccedilacirco12 - uma consequecircncia decorre desse procedimento caracteriacutesticas de um ser passam a fazer parte do conjunto de traccedilos que compotildeem o significado do seu anaacutelogo em decorrecircncia da relaccedilatildeo loacutegica existente entre eles

Perelman13 tambeacutem distingue o argumento de analogia do argumento por comparaccedilatildeo Nas palavras do autor ldquo os argumentos de comparaccedilatildeo deveratildeo ser distinguidos tanto dos argumentos de identificaccedilatildeo quanto do raciociacutenio por analogiardquo Entretanto os criteacuterios a que Perelman recorre para mostrar essa diferenccedila satildeo de natureza subjetiva Ele afirma que a comparaccedilatildeo eacute um procedimento muito mais suscetiacutevel de prova que a anashylogia ou a semelhanccedila

Ainda segundo o autor eacute importante avaliar tambeacutem qual a vantashygem de se recorrer a esse procedimento como estrateacutegia relevante de arshygumentaccedilatildeo se os pensadores empiacutericos por exemplo sustentavam que ldquo seu uacutenico valor seria possibilitar a formulaccedilatildeo de uma hipoacutetese que seria verificada por induccedilatildeordquo 14

O legislador no artigo 4deg da Lei de Introduccedilatildeo agraves normas do Dishyreito Brasileiro facultou ao julgador a utilizaccedilatildeo da analogia como fonte do Direito O dispositivo legal prevecirc textualmente que ldquoQuando a lei for omissa o juiz decidiraacute o caso de acordo com a analogia os costumes e os princiacutepios gerais de direitordquo Essa faculdade dada pelo legislador ao aplicador do Direito esclarccc que a analogia ocupa um papel muito mais

12 Autores como Ulisses Infante - veja Curso de Gramaacutetica Aplicada aos Textos Satildeo Paulo Scipione 2001 p 595 - e Faraco e Moura - veja Gramaacutetica Satildeo Paulo Aacutetishyca 2002 p 578 - estabelecem a seguinte distinccedilatildeo a comparaccedilatildeo eacute operacionalizada na frase por meio de um tenno de valor comparativo - ldquocomordquo ldquo tal comordquo ldquo feitordquo ldquoque nemrdquo ldquo semelhante ardquo ldquocomo se fosserdquo etc - enquanto a metaacutefora permite a substituiccedilatildeo de um termo pelo outro e recorre ao verbo de ligaccedilatildeo ldquoserrdquo Assim no enunciado ldquo Essa dificuldade de falar em puacuteblico eacute uma pedra no meu caminhordquo veshyrifica-se uma metaacutefora diferente seria se a frase fosse ldquoEssa dificuldade de falar em puacuteblico eacute como uma pedra no meu caminhordquo em que ocorre uma comparaccedilatildeo Esse natildeo eacute poreacutem um criteacuterio absoluto pois Perelman amp Tyteca usam como exemplo de ocorrecircncia da analogia exatamente o que seria uma comparaccedilatildeo para esses autores ldquoAssim como os olhos dos morcegos satildeo ofuscados pela luz do dia a inteligecircncia de nossa alma eacute ofuscada pelas coisas mais naturalmente evidentesrdquo Entendemos que essa distinccedilatildeo natildeo se mostra relevante para a praacutetica argumentativa desenvolvida nos textos juriacutedicos Por argumento de analogia entenderemos aquele que recorre tanto agrave comparaccedilatildeo quanto agrave gradaccedilatildeo agrave semelhanccedila e a analogia propriamente dita

13 PERELM AN ChaTm Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 274

14 PERELM AN ChaTm Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 423

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 119

importante que o de ldquopossibilitar a formulaccedilatildeo de uma hipoacuteteserdquo Em todos os casos em que houver lacuna na lei para o tratamento de uma determinashyda mateacuteria o magistrado natildeo precisaraacute declinar de sua jurisdiccedilatildeo poderaacute julgar com base na analogia

Isso ocorre com muito mais frequecircncia do que se pode imaginar Atualmente o tema dos direitos civis dos homoafetivos requer a argumenshytaccedilatildeo por analogia para alcanccedilar a tutela desses direitos tendo em vista a ausecircncia de legislaccedilatildeo que trate do assunto apesar das inuacutemeras decisotildees laacutevoraacuteveis a essa minoria especialmente as recentes decisotildees do Superior Tribunal Federal Leia a reportagem abaixo

LACcedilOS AFETIVOS15ST J julga se homoafetivo pode ser beneficiaacuterio de plano de sauacutedeHomossexuais tecircm levado a melhor no processo em que se examina o direito de o companheiro ser beneficiaacuterio de plano de sauacutede Por enshyquanto o julgamento estaacute em trecircs a dois pela inclusatildeo na Terceira Turshyma do Superior Tribunal de Justiccedila O pedido de vista do Ministro Carshylos Antocircnio interrompeu o julgamento A informaccedilatildeo eacute do site do STJOs Ministros analisam se o companheiro homossexual Paulo Motta do funcionaacuterio da Caixa Econocircmica Federal de Porto Alegre Joatildeo Abreu pode ser beneficiaacuterio no plano de sauacutede O posicionamento final da Turma pode repercutir tanto nos movimentos homoafetivos no Brasil quanto nos planos de previdecircncia e de sauacutedeO Recurso Especial que estaacute em segredo de Justiccedila eacute da Caixa Econocircshymica Federal O relator eacute o Ministro Maacuterio Gomes Houve tambeacutem um recurso da Funcef - Fundaccedilatildeo dos Economiaacuterios Federais - mas por questotildees processuais natildeo foi admitidoA Caixa questiona acoacuterdatildeo do Tribunal Regional Federal da 4a Regiatildeo A segunda instacircncia reconheceu o direito de o autor da accedilatildeo incluir seu companheiro como beneficiaacuterio no plano de sauacutede dos economiaacuterios O TRF-4 no entanto afastou o reconhecimento de uniatildeo estaacutevel do casalDe acordo com o processo os dois moram juntos haacute sete anos dividem despesas da casa e ambos satildeo portadores do viacuterus HIV Por causa da doenccedila o autor da accedilatildeo teve de se aposentar e pediu a inclusatildeo do comshypanheiro em seu plano de sauacutede A CEF negou o pedidoA primeira instacircncia tambeacutem reconheceu o direito de admitir o compashynheiro no Plano de Assistecircncia Meacutedica Supletiva (PAM S) e na Funcef na condiccedilatildeo de dependente do autor da accedilatildeo O juiz federal da 10a Vara

15 Texto Adaptado da Revista Consultor Juriacutedico de 26 de abril de 2005

120 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

do Rio Grande do Sul Rogeacuterio Raul entretanto concluiu pela impossishybilidade de se reconhecer a uniatildeo estaacutevel por falta de amparo legalA relatora no TRF-4 Margarida Sampaio argumentou que a recusa das empresas em incluir o companheiro foi motivada pela orientaccedilatildeo sexual dos autores da accedilatildeo atitude que viola o princiacutepio constitucional da igualshydade

O caso em apreccedilo avalia a possibilidade de os homoafetivos terem direito agrave inclusatildeo de seu ldquocompanheirordquo 16 como dependente no plano de sauacutede A problemaacutetica central da questatildeo como jaacute apontado antes das deshycisotildees das Cortes Superiores passava pela suposta ausecircncia de previsatildeo expressa para reconhecer tal direito Muitas das vezes os argumentadores precisam recorrer a princiacutepios gerais como a dignidade da pessoa humana ou a igualdade de todos perante a lei para ter condiccedilotildees de se posicionar quanto ao conflito Hoje a preferecircncia tem sido pela analogia com a Lei de Uniatildeo Estaacutevel Sem o amparo da analogia portanto a tutela dos direitos do homoafetivo neste caso nunca seria garantida

Para se poder fundamentar adequadamente veja o raciociacutenio analoacuteshygico desenvolvido

1deg) A Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica pretende proteger a famiacutelia

Art 226 CRFB88 A famiacutelia base da sociedade tem especial proteccedilatildeo do Estadosect 3o Para efeito da proteccedilatildeo do Estado eacute reconhecida a uniatildeo estaacutevel entre o homem e a mulher como entidade familiar devendo a lei facilitar sua conversatildeo em casamento

2deg) Todos satildeo iguais perante a lei

Art 5o CRFB88 Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros reshysidentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualshydade agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes1 - homens e mulheres satildeo iguais em direitos e obrigaccedilotildees nos tershymos desta Constituiccedilatildeo

16 Discute-se a possibilidade de os homoafetivos serem reconhecidos como companheishyros Essa nomenclatura somente eacute paciacutefica quando aplicada aos relacionamentos heteshyrossexuais previstos na chamada Lei de Uniatildeo Estaacutevel

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 121

3deg) A proteccedilatildeo agrave entidade familiar deve se estender aos homoafetivos por analogia agrave entidade familiar composta entre o homem e a mulher seja no casamento seja na uniatildeo estaacutevel Eacute necessaacuterio poreacutem justificar fundamenta- damente por qual motivo a proteccedilatildeo de um caso se estende ao outro

Ao resumir esse raciociacutenio em um enunciado teriacuteamos o seguinte assim como a entidade familiar composta por homem e mulher estaacute amshyparada pela Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica a uniatildeo entre dois homens ou duas mulheres - jaacute que todos satildeo iguais perante a lei - deve ser tambeacutem ampashyrada pelo Estado

Uma vez entendida a analogia como recurso argumentativo de granshyde importacircncia eacute uacutetil mencionar que o Direito Penal tem a lei como uacutenica fonte para determinar se uma conduta eacute ou natildeo iliacutecita Isso ocorre por conta do princiacutepio da legalidade Por essa razatildeo eacute que natildeo cabe o recurso agrave analoshygia - analogia in malam partem - bem como agrave interpretaccedilatildeo integrativa ou ampliativa17 para imputar um crime ao reacuteu Somente eacute possiacutevel a analogia in bonampartem ou seja a favor do reacuteu

Em capiacutetulo anterior mencionamos que fariacuteamos nesta oportunidade uma reflexatildeo sobre a possibilidade de a jurisprudecircncia ser encarada como motivadora do argumento de analogia Na verdade a postura que adota a maioria dos autores eacute a de sugerir que a jurisprudecircncia daacute origem a um argumento de autoridade

Antes de enfrentar qualquer questatildeo poreacutem tomemos como conceito de jurisprudecircncia em sentido estrito o conjunto de decisotildees uniformes sobre uma determinada questatildeo juriacutedica prolatadas pelos oacutergatildeos do Poder Judiciaacuterio

O proacuteprio conceito atribuiacutedo agrave fonte aqui discutida sugere que sua autoridade adveacutem do oacutergatildeo que a profere Isso eacute inegaacutevel O que se quesshytiona eacute que independentemente da autoridade que a reveste o que faculta verdadeiramente seu uso - e a torna eficiente - eacute a proximidade do caso analisado com os outros cujas decisotildees satildeo tomadas como referecircncia

Isso implica dizer que em uacuteltima instacircncia o que faz do uso da jurisshyprudecircncia uma estrateacutegia interessante para a argumentaccedilatildeo eacute o raciociacutenio de que casos semelhantes devem receber tratamentos anaacutelogos por parte do Judiciaacuterio para que natildeo sejam observadas injusticcedilas ou inseguranccedila juriacutedica E a semelhanccedila entre o caso concreto analisado e o processo jaacute transitado em julgado que autoriza o uso da jurisprudecircncia

17 A respeito veja M IRABETE Julio Fabbrini Coacutedigo Penal Interpretado 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2003 p 98

122 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Tanto eacute assim que se ambos os conflitos versarem sobre direito pos- sessoacuterio por exemplo mas as circunstacircncias em que cada um deles ocorshyreu natildeo forem as mesmas a simples proximidade temaacutetica natildeo autoriza o uso da jurisprudecircncia pela autoridade de que eacute revestida Por essa razatildeo preferimos elencar as decisotildees judiciais reiteradas como motivadoras de argumentos por analogia

As suacutemulas representam uma discussatildeo agrave paite Quando o argumentador recorre a uma suacutemula vinculante sabe que ela tem ldquo forccedila de leirdquo e por isso mesmo essa fonte caracteriza na essecircncia um argumento de autoridade

Se a suacutemula natildeo eacute vinculante tem a mesma natureza juriacutedica que a jurisprudecircncia e portanto eacute fonte que caracteriza o uso do argumento de analogia pelas razotildees jaacute expostas

Lembramos poreacutem que para o acadecircmico de Direito importa muishytas vezes mais o domiacutenio das estrateacutegias argumentativas e dos tipos de argumento do ponto de vista praacutetico que a sua proacutepria classificaccedilatildeo pois essa eacute uma preocupaccedilatildeo prioritariamente didaacutetica

536 Argumento de causa e efeito

Causa e efeito - ou causa e consequecircncia - satildeo como duas faces de uma moeda pois para que haja um efeito naturalmente deve ter havido uma causa que o motivasse Assim tambeacutem um fato soacute pode ser visto como causa de algo se houver outros eventos que deles derivaram Enfim causa e consequecircncia satildeo quase indissociaacuteveis dependentes entre si

De acordo com as razotildees que deram origem a um determinado fato eacute possiacutevel que o Direito se importe mais com a causa do que com o dano propriamente dito Quando se fala em aumento no nuacutemero de atos infra- cionais cometidos por crianccedilas e adolescentes na cidade do Rio de Janeiro pode-se estar querendo discutir quais as causas de tal fenocircmeno Qual seria a relaccedilatildeo entre a praacutetica desses ldquodelitosrdquo e a pobreza por exemplo ou o grau de escolaridade desses menores ou o traacutefico iliacutecito de entorpecentes Somente seraacute possiacutevel avaliar adequadamente como coibir as consequecircnshycias desse fenocircmeno ao localizar a sua causa

A esse respeito o Desembargador Seacutergio Cavaiieri Filho assinala a necessidade de distinguir causa de fator comumente confundidos Nas pashylavras do autor

Antes de mais nada entretanto eacute necessaacuterio distinguir causa de fator coisas diferentes mas que por muitos satildeo confundidas Por causa enten-

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 123

de-se aquilo que determina a experiecircncia de uma coisa a circunstacircncia sem a qual o fenocircmeno natildeo existe E pois o agente causador do fenocircshymeno social sua origem princiacutepio motivo ou razatildeo de ser Eliminada a causa o fenocircmeno haveraacute de desaparecerJaacute o fator embora natildeo decirc causa ao fenocircmeno concorre para a sua maior ou menor incidecircncia Eacute a circunstacircncia que de qualquer forma concorshyre para o resultado Pode-se dizer por exemplo que a pobreza a miseacuteshyria eacute um fator de criminalidade porque segundo as estatiacutesticas 90 ou mais da populaccedilatildeo carceraacuteria satildeo constituiacutedas de pessoas provenientes de classes sociais mais humildes Mas natildeo eacute certamente a causa do crishyme porque haacute um nuacutemero muito grande de pobres que natildeo delinquem Pode-se dizer igualmente que o analfabetismo a ignoracircncia eacute outro fator da criminalidade ()18

Para a ciecircncia do Direito o nexo causal19 existente entre dois eventos tem grande relevacircncia porque todo indiviacuteduo tem direitos e obrigaccedilotildees decorrentes dos atos que pratica em face das demais pessoas que vivem sob as regras de um mesmo ordenamento juriacutedico Isso implica dizer que se um consumidor contrata uma empresa para reformar seu escritoacuterio e dushyrante a prestaccedilatildeo de serviccedilo um dos pedreiros causa um buraco na parede do escritoacuterio vizinho sua conduta gera como consequecircncia a responsabilishydade pelos danos materiais causados

Se houve o dano mas sua causa natildeo estaacute relacionada ao comportashymento do agente inexiste a relaccedilatildeo de causalidade e tambeacutem a obrigaccedilatildeo de indenizar Mesmo havendo nexo de causalidade poreacutem natildeo se podem desprezar as excludentes da responsabilidade civil como a culpa exclusiva da viacutetima ou de terceiro o caso fortuito e a forccedila maior20

Analisemos o caso concreto a seguir para melhor esclarecer a imshyportacircncia do nexo de causalidade e do argumento a que daacute origem para a atribuiccedilatildeo de responsabilidades na ordem civil

18 CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de sociologia juriacutedica (Vocecirc Conhece) 10 ed Rio de Janeiro Forense 2002

19 Para GRECO Rogeacuterio Curso de Direito Penal parte geral 4 d Rio de Janeiro Impetus 2004 p 232 ldquonexo causal ou relaccedilatildeo de causalidade eacute aquele elo necesshysaacuterio que une a conduta praticada pelo agente ao resultado por ela produzido Se natildeo houver esse viacutenculo que liga o resultado agrave conduta levada a efeito pelo agente natildeo se pode falar em relaccedilatildeo de causalidade e assim tal resultado natildeo poderaacute ser atribuiacutedo ao agente haja vista natildeo ter sido ele o seu causadorrdquo

20 A respeito consulte CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de responsabilidade civil 6 ed Satildeo Paulo Malheiros 2005

124 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Certa vez um soldado do Exeacutercito Marco Aureacutelio colocou sobre um armaacuterio do quartel um colchonete e acima dele um aspirador de poacute Quanshydo o soldado Joatildeo Ameacuterico foi puxar o colchonete dias depois foi atingido pelo pesado aparelho de aspirar poacute que natildeo havia conseguido visualizar

Seraacute que a conduta de guardar esse objeto no referido lugar eacute um comshyportamento esperado para aquele contexto ou Marco Aureacutelio agiu de maneira imprudente Na verdade o que perguntamos eacute existe nexo de causalidade entre a conduta de Marco Aureacutelio (deixar o aspirador de poacute sobre um colchoshynete) e o resultado (os ferimentos causados em Joatildeo Ameacuterico)

Aquele que entende que a conduta de Marco Aureacutelio foi adequada e previsiacutevel provavelmente entende que Joatildeo Ameacuterico deveria ter tido mais cautela ao puxar o colchonete pois ningueacutem puxa algo de cima de um armaacuterio sem o cuidado de se proteger de coisas que possam cair junto com o objeto puxado

Ao contraacuterio aqueles que entendem que Marco Aureacutelio foi quem adotou uma conduta imprudente ao colocar o aspirador de poacute onde natildeo se poderia vecirc-lo atribuiratildeo a ele a responsabilidade pelos ferimentos causashydos em Joatildeo Ameacuterico

A argumentaccedilatildeo acerca da relaccedilatildeo de causa e efeito nesta hipoacutetese passa pela discussatildeo sobre se a conduta adotada por Marco Aureacutelio eacute ou natildeo a causa dos ferimentos de Joatildeo Ameacuterico Eacute necessaacuterio contar portanto com certo grau de subjetividade sobre o que o auditoacuterio entende por conduta adequada (dever de cuidado) ou imprudente para soacute entatildeo discutir seus efeitos

Perelman assinala que ldquoessa argumentaccedilatildeo para ser eficaz reshyquer um acordo entre os interlocutores sobre os motivos de accedilatildeo e sua hierarquizaccedilatildeordquo 21 Exemplifica que se um jogador ganha sucessivas vezes no jogo de azar torna-se menos verossiacutemil que a causa de seu sucesso seja a sorte a tendecircncia eacute julgar que ele estaacute trapaceando Da mesma maneira se natildeo haacute contradiccedilatildeo entre a fala de testemunhas supotildee-se que a causa de tal coincidecircncia de explicaccedilotildees seja a veracidade de suas falas

Examinemos outro caso concreto se uma pessoa contrata um hospital para fazer uma cirurgia e em decorrecircncia da conduta imperita adotada pelo meacutedico durante a realizaccedilatildeo do procedimento ciruacutergico o paciente passa por problemas graves a responsabilidade pelos danos causados agrave sauacutede do consushymidor eacute da contratada Perceba que o viacutenculo causal entre a conduta adotada e o resultado alcanccedilado gera a obrigaccedilatildeo juriacutedica de indenizar E fato portanto

21 PERELM AN Chaiacutem Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 pp 301-302

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 125

que a relaccedilatildeo de causa e consequecircncia entre dois eventos eacute de grande importacircnshycia por exemplo para a atribuiccedilatildeo da responsabilidade de indenizar

Se tomarmos o viacutenculo causal entre dois eventos como elemento es- truturante de um raciociacutenio argumentativo trecircs possibilidades satildeo inicialshymente vislumbradas Perelman22 as enumera da seguinte maneira

a) A argumentaccedilatildeo facilita a relaccedilatildeo entre dois acontecimentos sucessivos por meio de um viacutenculo causalb) A argumentaccedilatildeo seleciona um acontecimento e busca descoshybrir qual a causa que pode tecirc-lo determinadoc) A argumentaccedilatildeo analisa um acontecimento e tenta evidenciar quais os efeitos que dele devem resultar

A tendecircncia natural do homem eacute na verdade a de sempre tentar racionalizar os acontecimentos e tentar entender o porquecirc dos fatos que observa Sempre se quer saber a causa ou o motivo que impeliu algueacutem a adotar certo comportamento pois eacute por meio da causa que se consegue estabelecer uma interpretaccedilatildeo coerente da conduta do indiviacuteduo

A relaccedilatildeo de causa e efeito entre dois eventos muitas das vezes aproshyxima-se do proacuteprio problema que a argumentaccedilatildeo precisa enfrentar Leia o relatoacuterio a seguir

2 Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg 121793Relator Des Seacutergio Cavalieri FilhoVistos relatados e discutidos estes autos de Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg 117296 em que eacute apelante Casa de Sauacutede Santa Helena Ltda e apelado Hamilshyton da Paixatildeo Amaratildeo e sua mulherAcordam os Desembargadores que integram a 2a Cacircmara Ciacutevel do Trishybunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro por maioria em dar proshyvimento parcial ao recurso para restringir a indenizaccedilatildeo ao dano moral e despesas com funeral vencido o Des Joatildeo Wehhi Dib que julgava a accedilatildeo improcedenteAccedilatildeo de responsabilidade civil pelo rito sumariacutessimo em razatildeo da morte de crianccedila receacutem-nascida Apontou-se como fato gerador da resshyponsabilidade da reacute o fato de ter sido dado alta hospitalar ao filho dos

22 PERELM AN Chaiacutem Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 299-300

126 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

autores logo apoacutes o seu nascimento quando ainda natildeo tinha condiccedilotildees fiacutesicas para tal A sentenccedila (f 3035) acolhendo parcialmente o pedido condenou a reacute a pagar aos autores indenizaccedilatildeo por dano moral - 100 salaacuterios miacutenimos - despesas com funeral e pensotildees vincendas a serem apuradas em liquidaccedilatildeo durante nove anos compreendidos entre os 16 e os 25 anos do filho dos autoresRecorre a vencida (f 3741) sustentando que natildeo existe nos autos proshyva da culpa da apelante natildeo podendo esta ser presumida mormente em se tratando de crianccedila nascida de matildee desnutrida e fumante Assim prossegue culpar a apelante pelo infeliz acontecimento importa em imputar-lhe responsabilidade pelo procedimento dos proacuteprios pais que sem condiccedilotildees resolveram ter mais um filho Aduz natildeo ter a sentenshyccedila considerado a baixa situaccedilatildeo social-fiacutenanceira dos apelados causa principal da mortalidade infantil e que a introduccedilatildeo da sonda natildeo foi a causa mortis da crianccedila Pede a reforma da sentenccedilaAo responder o recurso (f 4647) pugnam os apelados pelo seu des- provimentoEacute o relatoacuterio

Repare como a problematizaccedilatildeo do caso concreto coincide exatamenshyte com a relaccedilatildeo de causalidade entre a conduta do meacutedico que autorizou a alta hospitalar e o evento morte o problema seria de que maneira poder- -se-aacute comprovar que Alan Marques Amaral faleceu em decorrecircncia da alta hospitalar prematura e natildeo em decorrecircncia de seu fraacutegil estado de sauacutede

Por fim reforccedilamos que nenhuma relaccedilatildeo de causa e consequecircncia deve ficar sem uma explicaccedilatildeo coerente para justificar que o agente deveshyria adotar conduta diversa para evitar os resultados a ele imputados Mera relaccedilatildeo entre dois eventos (fato e consequecircncia) sem essa explicaccedilatildeo do argumentador natildeo passa de narraccedilatildeo de fatos insuficiente portanto para a fundamentaccedilatildeo de uma tese

537 Argumento de senso comum

Jaacute conhecemos a importacircncia das fontes formais do direito para a argumentaccedilatildeo Sabemos que a lei em especial em virtude do Positivismo Juriacutedico gozou sempre de tamanha credibilidade que certos profissionais julgam que podem argumentar apenas com base nessa fonte Nesse contexshyto o senso comum ficaria relegado a segundo plano porque fruto de um conhecimento vulgar (oposto a conhecimento cientiacutefico) aparentemente pouco valorizado no meio juriacutedico

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 127

Vimos poreacutem que o poacutes-positivismo proporcionou um novo panoshyrama para o tratamento das questotildees juriacutedicas relevantes que interferem na decisatildeo do processo Exemplificamos oportunamente que existem casos concretos em que a lei positivada deixa de ser aplicada em nome do sentishymento de justiccedila haacute ainda casos que necessitam do amparo da analogia pois a norma eacute lacunosa na regulaccedilatildeo do tema especiacutefico em debate

Em virtude dessa nova perspectiva poacutes-positivista houve uma rearrushymaccedilatildeo do prestiacutegio que todas essas fontes possuem diante do julgador e dos pensadores do direito O papel cada vez mais relevante da miacutedia nas decisotildees judiciais por exemplo eacute tema de diversos livros da atualidade E certo que a denominada ldquomiacutediardquo eacute fonte de argumento de autoridade mas o que os espeshycialistas vecircm apontando eacute a iacutentima relaccedilatildeo dos veiacuteculos midiaacuteticos e o senso comum pois aqueles promovem ou asseveram os sentimentos predominanshytes na coletividade denominada com frequecircncia ldquohomem meacutediordquo

Artur Ceacutesar de Souza23 lembra que quando os meios de comunicaccedilatildeo de massa determinam quais seratildeo as questotildees e os problemas de primeira relevacircncia fazem com que as pessoas direcionem toda a sua atenccedilatildeo para essa agenda ou ordem do dia

Quando essa agenda tem por finalidade as provas contidas num proshycesso judicial os meios de comunicaccedilatildeo aleacutem de informar tambeacutem reashylizam um ldquojulgamento paralelordquo desencadeando na opiniatildeo puacuteblica um complexo conjunto de sentimentos como por exemplo perplexidade oacutedio vinganccedila sensaccedilatildeo de impunidade etc

Enfim por todas as razotildees apresentadas o senso comum eacute hoje fonshyte de prestiacutegio cada vez maior no meio juriacutedico

O profissional do direito que recorre a essa fonte aproveita-se de uma afirmaccedilatildeo que goza de consenso geral e estaacute amplamente difundida na soshyciedade para validar seus raciociacutenios

O senso comum natildeo precisa estar necessariamente afastado do senso criacutetico Ainda que assistemaacutetico natildeo deve se afastar do bom senso sob pena de natildeo ser validado pela coletividade e perder o status de ldquoconsenso geralrdquo

Este argumento eacute muito bem recebido quando funciona como reforshyccedilo de outros argumentos Existe uma questatildeo importante que precisamos enfrentar com cuidado acerca desse assunto A validade da norma juriacutedica depende de vigecircncia e de eficaacutecia

23 SOUZA Artur Ceacutesar de A decisatildeo do juiz e a influecircncia da miacutedia Rio de Janeiro RT 2012 sinopse

128 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Por ter sido criada pelo processo legislativo proacuteprio a norma apreshysenta vigecircncia - forccedila que tem a norma para cumprir com sua finalidade regular condutas gerar efeitos sobre os eventos tatildeo logo ocorram no acircmshybito dos fatos

Mesmo em plena vigecircncia se a norma natildeo for acolhida como justa e capaz de resolver de maneira adequada o conflito seraacute letra morta Daiacute exisshytirem no Brasil as ldquo leis que pegamrdquo e as ldquo leis que natildeo pegamrdquo isto eacute normas que nunca saem do papel por natildeo gerarem os efeitos que dela se esperam

Se a coletividade representada pelo senso comum valida a aplicaccedilatildeo de uma norma se o sentimento social predominante eacute de que a norma alcanccedila os fins pretendidos ela passa a gozar tanto de vigecircncia quanto de eficaacutecia

E por essa razatildeo que sugerimos associar na abordagem dos temas polecircmicocircs o argumento de autoridade e o argumento de senso comum Os dois juntos promovem a condiccedilatildeo de validade desejada para a norma (vigecircncia + eficaacutecia) Haacute ainda casos em que a responsabilidade civil fica pouco clara na relaccedilatildeo juriacutedica A noccedilatildeo de dever de cuidado tatildeo bem exshyplicada pelo Desembargador Seacutergio Cavaiieri Filho24 seria portanto bem argumentada pela causa e efeito e reforccedilada pelo senso comum que valida a conduta cuidadosa e responsaacutevel a ser adotada pelo homem meacutedio

Oferecemos exemplos em que o argumento de senso comum reforccedila os argumentos de autoridade e de causa e efeito mas ele pode ser tambeacutem associado a qualquer outro dando-lhe completude e validade

538 Argumento ad hominem

Vimos que o argumento de autoridade invoca o prestiacutegio de uma deshyterminada pessoa ou grupo a partir do qual sua afirmaccedilatildeo ganha relevacircncia O argumento ad hominem de forma diametralmente oposta consiste no ataque a uma pessoa cujas ideias argumentos ou depoimentos pretende desqualificar Ao inveacutes de se enfrentar o argumento do adversaacuterio ataca-se a pessoa do adversaacuterio Ataca-se o homem e natildeo a ideia

O argumento ad hominem possui como organizaccedilatildeo baacutesica de racioshyciacutenio a seguinte estrutura

24 CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de responsabilidade civil 12 ed Satildeo Paushylo Atlas 2012

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 129

1 A considera B verdadeiro2A c pessoa contra quem pesam acusaccedilotildees graves jaacute comprovadas3 Entatildeo B eacute falso

Sabemos que a verossimilhanccedila e a aceitaccedilatildeo de urna assertiva estatildeo muito mais na sua razoabilidade e na loacutegica que somente na autoridade daquele que a enuncia Apesar de natildeo possuir bases loacutegicas este argumento constitui uma forte arma retoacuterica

O ataque agrave pessoa pode ocorrer por duas diferentes estrateacutegiasa) ataque direto agrave pessoa (argumento ad hominem abusivo) quando

coloca seu caraacuteter e seus valores morais em duacutevida e portanto a validade de sua argumentaccedilatildeo porque eivada de descredibilidade

Dois exemplos desse argumento estatildeo adiante sugeridosa 1) As afirmaccedilotildees de Richard Nixon a respeito da poliacutetica de relaccedilotildees

externas em relaccedilatildeo aacute China natildeo satildeo confiaacuteveis pois ele foi forccedilado a abshydicar durante o escacircndalo de Watergate

a2) O Ministro Joaquim Barbosa em sessatildeo no Supremo atacou o Ministro Gilmar Mendes quando disse que ele natildeo tem condiccedilotildees de lhe dar liccedilotildees de moral jaacute que conquistou sua condiccedilatildeo de prestiacutegio usando capangas cm sua cidade de origem e fazendo uso poliacutetico da miacutedia o que estava destruindo a credibilidade do STF Fecha seu raciociacutenio recorrendo ao senso comum ldquo Saia agrave rua Ministro Gilmar e constate o que as pessoas dizem a vosso respeitordquo A quem interessar sugerimos assistir agrave cena em que o debate argumentativo ocorre O acesso estaacute disponiacutevel em http wwwyoutubecomwatchv=Z 1 yOqrD 1 BTs

b) ataque agraves circunstacircncias em que o adversaacuterio realiza certa afirshymaccedilatildeo (argumento ad hominem circunstancial) que ocorre quando a pesshysoa natildeo por seu valores morais ou pessoais mas pelo contexto mostra-se incapaz de fazer certas afirmaccedilotildees

E esse o caso da desqualificaccedilatildeo da chamada ldquo testemunha ocularrdquo pelas condiccedilotildees em que assistiu aos fatos sobre os quais testemunha

b l) Em um processo criminal no qual se imputava o crime de hoshymiciacutedio a um policial militar o defensor puacuteblico questionava agrave uacutenica tesshytemunha do crime uma senhora de 72 anos o seguinte como a senhora- que tem 65 graus de miopia - pode garantir que foi o reacuteu quem matou se acabou de afirmar que levantou de madrugada com o barulho do tiro e olhou pela janela A senhora dorme de oacuteculos ou sua miopia natildeo a impede de reconhecer um rosto agrave noite a quase oitenta metros de distacircncia

130 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

b2) A disse - Foi este o homem que vi roubando aqriele carroB respondeu - Como pode afirmar isso se vocecirc estava becircbado

Perceba que o argumento ad hominem circunstancial pode ser muishyto eficiente quando a instruccedilatildeo do processo ainda estaacute em curso ou seja quando a produccedilatildeo das provas depende da maior ou menor credibilidade de quem a oferece

539 Argumento a fortiori

O argumento a fortiori - com mais razatildeo - eacute aquele que estabelece uma relaccedilatildeo entre dois eventos de maneira a orientar a conduta de um bashyseada no paracircmetro estabelecido pelo outro

O argumento a fortiori pode sempre ser resumido numa foacutermula como esta se a soluccedilatildeo X eacute adequada para o caso Y com maior razatildeo deve ser tambeacutem adequada para o caso Z que eacute uma forma mais grave (ou mais evidente ou mais ampla ou mais intensa ou maior) de X

Em virtLide disso eacute comum recorrer-se agrave noccedilatildeo de proporcionalidade que no direito tem natureza juriacutedica de princiacutepio O princiacutepio da proporcioshynalidade tem o objetivo de coibir excessos desarrazoados por meio da afeshyriccedilatildeo da compatibilidade entre os meios utilizados e os fins pretendidos a fim de evitar restriccedilotildees desnecessaacuterias ou abusivas Celso Ribeiro Bastos25 entende que a proporcionalidade natildeo eacute um princiacutepio mas um paracircmetro interpretativo do direito

Com base na proporcionalidade prevalece o entendimento de que natildeo eacute liacutecito valer-se de medidas restritivas aplicar penas ou formular exishygecircncias aleacutem daquilo que for estritamente necessaacuterio para a realizaccedilatildeo da finalidade almejada

A tiacutetulo de esclarecimento pensemos no artigo 213 do CP o qual prevecirc o crime de estupro A pena abstrata prevista para essa conduta iliacutecita eacute reclusatildeo de 6 a 10 anos Perceba como a proporcionalidade pode auxiliar na discussatildeo sobre a aplicaccedilatildeo da pena

A atual redaccedilatildeo do dispositivo eacute a seguinte ldquo art 213 do CP - consshytranger algueacutem mediante violecircncia ou grave ameaccedila a ter conjunccedilatildeo carshynal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinosordquo

25 BASTOS Celso Ribeiro apud TAVARES Andreacute Ramos Curso de direito constishytucional Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 551

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 131

Dessa forma o bandido que ficou conhecido como ldquomaniacuteaco do parshyquerdquo praticou o mesmo crime que um rapaz o qual encosta propositalmente em algueacutem dentro do ocircnibus a fim de se excitar O primeiro praticou meshydiante violecircncia a conduta prevista na parte inicial do dispositivo (conjunshyccedilatildeo carnal) o segundo com ameaccedila velada a conduta prevista na parte linal (ato libidinoso)

Ambos praticaram certamente condutas moralmente reprovaacuteveis mas seria justa a aplicaccedilatildeo da pena de 6 anos (miacutenimo legal) agravequele que se dedicou ao ato obsceno A severidade da sanccedilatildeo deve corresponder agrave maior ou menor gravidade da infraccedilatildeo penal Quanto mais grave o iliacutecito mais severa deve ser a pena

Muitos profissionais vecircm sustentando que o legislador perdeu excelenshyte oportunidade quando da alteraccedilatildeo da lei penal de propor uma pena proshyporcional agraves diversas condutas inclusas na tipicidade do crime de estupro

Alberto Marques dos Santos26 reuacutene alguns outros exemplos elucishydativos

Do menor se deduz o maior do menos evidente se deduz o mais evidenshyte Assim se a negligecircncia deve ser punida afortiori deve ser punido o ato premeditado [Ferraz] Se a prova testemunhal foi aceita afortiori deve tambeacutem ser aceita a prova documental [Nunes] Se a oferta de contestaccedilatildeo na data da audiecircncia do procedimento sumaacuterio afasta a reshyvelia a fortiori a entrega da contestaccedilatildeo em cartoacuterio antes dessa data tambeacutem a afasta

E liacutecito dizer da mesma maneira que o argumento a fortiori deriva do brocardo ldquoquem pode o mais pode o menosrdquo Quando o argumenta- dor recorre a essa estrateacutegia seu objetivo eacute conseguir uma aplicaccedilatildeo mais extensiva da lei para que se aplique agrave situaccedilatildeo faacutetica que nela natildeo estaacute expliacutecita

Um exemplo que ilustra essa explicaccedilatildeo se a lei exige dos Promoshytores de Justiccedila que nas denuacutencias discriminem as accedilotildees de cada um dos acusados com mais razatildeo se deve exigir que o Magistrado as individualize na sentenccedila

26 SANTOS Alberto Marques dos Argumentaccedilatildeo juriacutedica os melhores e os piores argumentos na retoacuterica forense Disponiacutevel em lthttpalbertodossantosword- presscomartigos-juridicosargumentacao-forensegt Acesso em 18jul 2012

132 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

5310 Argumento por absurdo

O argumento por absurdo eacute aquele que natildeo apenas mostra que o ar- gumentador estaacute certo mas tambeacutem que o advogado da parte contraacuteria estaacute errado

Consiste portanto em demonstrar a natildeo validade de uma tese Para isso eacute necessaacuterio apenas pressupor que ela seja verdadeira mas mostrar dividindo sua explicaccedilatildeo em pedaccedilos que sua aplicaccedilatildeo leva a resultados contraditoacuterios e inadmissiacuteveis ou seja absurdos

Trata-se de demonstrar a falsidade de uma afirmaccedilatildeo ou a invalidade de uma ideia evidenciando que seus efeitos ou desdobramentos contrashydizem essa mesma ideia ou conduzem ao impossiacutevel ao inadmissiacutevel Portanto o argumento pelo absurdo aceita provisoriamente a tese que se quer combater e desenvolve-a ateacute conseguir demonstrar seus efeitos absurdos

No campo hermenecircutico27 usa-se o argumento por absurdo para mosshytrar que a aceitaccedilatildeo de uma interpretaccedilatildeo da norma levaria a) a contrariar o fim visado pela mesma norma b) a contradizer norma hierarquicamente superior c) agrave antinomia entre a norma interpretada e o sistema em que estaacute inserida ou d) a uma inconstitucionalidade

Adiante citamos dois exemplos desse tipo de argumentos disponibishylizados tambeacutem internet28 No primeiro deles a prevalecer a tese da defesa de que sem periacutecia de prestabilidade natildeo se reconhece a qualificadora do art 157 sect 2W 1 do CP a referida qualificadora jamais seraacute aplicada E que semelhante entendimento coloca nas matildeos do assaltante a escolha entre querer responder por roubo qualificado ou por roubo simples Bastaraacute ao meliante esconder a arma e jamais a qualificadora seraacute aplicada Assim a tese da defesa deixa a incidecircncia da qualificadora ao arbiacutetrio do marginal e faz letra morta do art 157 sect 2o I

Outro exemplo se a eliminaccedilatildeo do prejuiacutezo pela recuperaccedilatildeo da res apoacutes a consumaccedilatildeo justificasse a aplicaccedilatildeo do privileacutegio do art 155 sect I o entatildeo todo furto tentado seria privilegiado jaacute que nele sempre a res eacute recuperada

27 REDUCcedilAtildeO ao absurdo Disponiacutevel em lthttpgrandeaboboracom reducao-ao- absurdohtmlgt Acesso em 18 jul 2012

28 Ibidem

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO m

5311 Argumento de fuga

Argumento de fuga eacute o argumento de que se vale o advogado para escapar agrave discussatildeo central em que seus argumentos provavelmente natildeo prevaleceriam Apela-se em regra para a subjetividade

Eacute o argumento por exemplo que o advogado utiliza quando enalteshyce o caraacuteter do acusado lembrando tratar-se de pai de famiacutelia de pessoa responsaacutevel de reacuteu primaacuterio quando haacute acusaccedilatildeo por exemplo de lesotildees corporais ou homiciacutedio culposo na direccedilatildeo de veiacuteculo automotor

Perceba que qualquer pessoa ldquode bemrdquo pode em algum momento praticar um crime culposo Se a autoria a materialidade e a culpabilidade desse crime forem inegaacuteveis resta ao advogado apenas enaltecer suas quashylidades a fim de conseguir a fixaccedilatildeo de uma pena branda ou - quem sabe- desqualificar o crime a ele imputado

Um caso de grande repercussatildeo em que esse argumento foi utilizado diversas vezes foi o do goleiro Bruno O primeiro advogado que lhe reshypresentou insistiu imensamente na ideia de que a viacutetima Eliza Samudio estava viva e pressionou os jurados com a possibilidade de condenar um inocente jaacute que natildeo foi encontrado seu corpo Levantou a possibilidade de que uma foto desfocada e de longe seria da suposta viacutetima que estava na Europa afirmou que estivesse filmando uma produccedilatildeo eroacutetica em oushytro estado e aventou ateacute mesmo uma conspiraccedilatildeo contra seu cliente entre outras coisas

Enfim todas essas afirmaccedilotildees sem qualquer verossimilhanccedila trazishydas pelo advogado apenas tumultuaram o processo e deixaram os jurados confusos Trata-se de verdadeiros argumentos de fuga

Esse argumento somente eacute recomendado quando natildeo houver como se opor aos argumentos da parte contraacuteria O ideal eacute sempre enfrentar as quesshytotildees relevantes do conflito de maneira clara objetiva concisa e consistente No entanto existem situaccedilotildees em que o advogado natildeo tem muito a fazer pois o processo eacute francamente desfavoraacutevel a seu cliente

Natildeo seraacute exercida a defesa Claro que sim A saiacuteda eacute evitar o reforccedilo exagerado das questotildees tormentosas e enfocar outras em que as eventuais qualidades pessoais ou morais do reacuteu possam ser destacadas

Caso o profissional esteja patrocinando o autor natildeo eacute adequando o uso do argumento de fuga Para ajuizar a accedilatildeo o advogado deve no miacuteshynimo ter um bom conjunto probatoacuterio uma adequada causa de pedir e consistentes argumentos que sustentem a tese Caso contraacuterio o melhor eacute desistir da demanda por absoluta falta de fundamento juriacutedico

134 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Outra observaccedilatildeo que se mostra pertinente eacute que o argumento de fuga causa menos prejuiacutezos ao argumentador quando desenvolvido em situaccedilatildeo de fala durante audiecircncias nas sustentaccedilotildees orais em debates na tribuna quando discursa etc

No discurso oral o uso de estrateacutegias argumentativas menos qualifishycadas pode ser minimizado por outros recursos retoacutericos como a utilizaccedilatildeo competente da voz preenchimento adequado do ldquo espaccedilo cecircnicordquo frases de efeito bem colocadas entre outros

Nas peccedilas processuais e no texto escrito em geral a possibilidade de manusear a argumentaccedilatildeo e estudaacute-la com cuidado fragiliza-a em demasia quando se recorre a argumentos como o de fuga pois repetimos trata-se de estrateacutegia liltima para minimizar as consequecircncias nocivas de um proshycesso difiacutecil para a parte reacute

54 O USO DA DEDUCcedilAtildeO E INDUCcedilAtildeO NA PRODUCcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

Ao longo do capiacutetulo anterior vocecirc estudou diversos tipos de argushymento disponiacuteveis para convencer o auditoacuterio da validade da tese que se pretende sustentar Passaremos agora agrave compreensatildeo de que o desenvolshyvimento de tais raciociacutenios argumentativos pode se dar tanto pelo meacutetodo dedutivo quanto pelo meacutetodo indutivo Ambos estatildeo agrave disposiccedilatildeo do profisshysional do direito para facilitar a persuasatildeo de seu interlocutor

Em primeiro lugar vamos conhecer melhor o processo dedutivo de construccedilatildeo dos argumentos Para isso eacute necessaacuterio defini-lo A deduccedilatildeo eacute uma inferecircncia que parte do universal para o particular Considera-se que um raciociacutenio eacute dedutivo quando a partir de determinadas afirmaccedilotildees (premissas) aceitas como verdadeiras o advogado chega a uma conclusatildeo loacutegica sobre uma dada questatildeo discutida no processo

Dito em outras palavras a deduccedilatildeo parte de uma verdade geral (preshymissa maior) previamente aceita para afirmaccedilotildees particulares (premissas menores) A aceitaccedilatildeo da conclusatildeo depende das premissas se elas forem consideradas verdadeiras a conclusatildeo seraacute tambeacutem aceita Por isso todo conteuacutedo da conclusatildeo deve estar contido pelo menos implicitamente nas premissas

Ainda que jaacute se tenha compreendido o que caracteriza o processo dedutivo o leitor deve estar se perguntando como na praacutetica se redige

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 135

um paraacutegrafo argumentative que recorre a esse meacutetodo Para cumprir essa tarefa vamos conhecer o caso concreto adiante

Socircnia pouco antes de entrar em trabalho de parto foi internada na C liacuteshynica Nova Iguaccedilu Dor no Rio de Janeiro Necessitando de cuidados especiais o meacutedico plantonista recomendou a sua remoccedilatildeo para outro hospital Autorizada a saiacuteda da paciente ela foi conduzida por uma das enfermeiras ateacute o veiacuteculo da remoccedilatildeo um fusca Durante o trajeto deu- -se o parto vindo a morrer a parturiente e seus dois filhosEm accedilatildeo indenizatoacuteria a autora pleiteia indenizaccedilatildeo por danos morais Alega que a morte de sua filha e netos decorreu de negligecircncia da C liacuteshynicaEm contestaccedilatildeo sustenta a reacute que natildeo haacute relaccedilatildeo de causalidade entre a conduta da cliacutenica e os oacutebitos pois a autora foi informada de que a ambulacircncia estaria agrave sua disposiccedilatildeo em 2 horas e a transferecircncia soacute foi realizada antes em virtude da impaciecircncia da autora e de seus familiashyres que providenciaram a remoccedilatildeo em veiacuteculo particular

Retomemos brevemente o que o caso discute a autora ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria em face da cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor porque sua filha e netos faleceram apoacutes a realizaccedilatildeo de um parto dentro de um fusca quando eram transferidos para outro hospital jaacute que um meacutedico da cliacutenica (portanto preposto da prestadora de serviccedilos) entendeu que a parturiente necessitava de cuidados especiais o que natildeo conseguiria naquele estabelecimento em que foi atendida inicialmente

O que levou a autora a crer que faz jus ao ressarcimento por danos morais Provavelmente ela assim raciocinou

PREMISSA MAIOR (norma)

PREMISSA MENOR (fato)

CONCLUSAtildeO (junccedilatildeo das premissas)

0 Coacutedigo de Defesa do Conshysumidor estabelece em seu art 14 que ldquoo fornecedor de serviccedilos responde indepenshydentemente da existecircncia de culpa pela reparaccedilatildeo dos dashynos causados aos consumishydores por defeitos relativos agrave prestaccedilatildeo dos serviccedilosrdquo

A cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor natildeo tinha disponiacuteveis os reshycursos necessaacuterios para reashylizar o parto de minha filha e a remoccedilatildeo para outro hosshypital seria excessivamente demorada

A cliacutenica tem a responshysabilidade de me indeshynizar mesmo que natildeo tenha agido com culpa porque houve defeito na prestaccedilatildeo de seus serviccedilos

136 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Se assim ocorreu seu raciociacutenio para desenvolver o argumento de autoridade foi dedutivo Repare como a partir de uma afirmaccedilatildeo geral abstrata decorrente da norma foi possiacutevel apreciar os fatos do caso conshycreto e assim chegar agrave conclusatildeo desejada

Eacute importante ainda compreender como a empresa reacute prestadora de serviccedilos Cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor teria desenvolvido um argumento de sua contestaccedilatildeo por meio do procedimento dedutivo

Lembremos que a autora sustenta a tese de que houve prestaccedilatildeo deshyfeituosa do serviccedilo Por serviccedilo defeituoso nos termos do art 14 sect 1deg I do CDC entende-se aquele que natildeo fornece a seguranccedila que o consumidor dele pode esperar levando-se em consideraccedilatildeo as circunstacircncias relevanshytes entre as quais o modo de seu fornecimento

Ora se o meacutetodo dedutivo eacute uma inferecircncia que parte do geral (norshyma) para o particular (fato) eacute fundamental buscar amparo na norma - preshyferencialmente no proacuteprio Coacutedigo de Defesa do Consumidor - para dizer que natildeo haacute obrigaccedilatildeo de indenizar

Com esse propoacutesito veja o que dispotildee o art 14 sect 3o II do CDC o fornecedor de serviccedilos soacute natildeo seraacute responsabilizado quando provar a culpa exchisiva do consumidor ou de terceiro Poreacutem seraacute que existe algum fato que demonstre ter sido a culpa da morte da parturiente e de seus dois filhos decorrente de culpa de terceiro Lendo novamente o caso concreto seraacute possiacutevel atentar para o fato de que a paciente foi removida em veiacuteculo particular por seus proacuteprios familiares em vez de esperar a remoccedilatildeo adequada (por ambulacircncia) o que na visatildeo da empresa prestadora de serviccedilos foi determinante para que as mortes ocorressem

O argumento de autoridade produzido pela empresa reacute pelo meacutetodo dedutivo ficaria assim estruturado

PREMISSA MAIOR (norma)

PREMISSA MENOR(fato)

CONCLUSAtildeO (junccedilatildeo das premissas)

0 Coacutedigo de Defesa do Consumidor estabelece em seu art 14 sect 3o II que ldquoo fornecedor de sershyviccedilos soacute natildeo seraacute responshysabilizado quando provar a culpa exclusiva do conshysumidor ou de terceirordquo

Autorizada a saiacuteda da paciente ela foi conduzida ateacute o veiacuteculo da remoccedilatildeo um fusca A transshyferecircncia soacute foi realizada antes em virtude da impaciecircncia da autora e de seus familiares que providenciaram a remoccedilatildeo em veiacuteculo particular

A remoccedilatildeo inadequada da paciente foi motivo sushyficiente para causar-lhe a morte A culpa eacute exclushysiva de terceiros - seus familiares

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 137

Vocecirc deve ter percebido que houve uma busca pelos fatos que se ldquo encaixassemrdquo agrave norma ldquoadequadardquo para defender a tese escolhida Esse procedimento eacute dedutivo e se caracteriza pela subsunccedilatildeo do fato agrave norma

Por tudo o que se viu eacute indiscutiacutevel a importacircncia do raciociacutenio deshydutivo para o Direito no Brasil Jaacute mencionamos que para a dogmaacutetica juriacutedica tradicional os profissionais que atuam na soluccedilatildeo de conflitos leshyvados ao Judiciaacuterio deveriam encontrar o sentido do direito preferencialshymente no sistema de normas escritas que regulam a vida social de um determinado povo (direito positivo)

Isso implica dizer que tradicionalmente o meacutetodo dedutivo tem sido privilegiado na praacutetica juriacutedica Existem situaccedilotildees em que a pretensatildeo da parte eacute acolhida de forma quase inequiacutevoca pela norma o dispositivo legal natildeo tem interpretaccedilotildees ambiacuteguas ou diacutespares Tanto a doutrina quanto a jurisprudecircncia jaacute fixaram entendimento favoraacutevel ao interesse da parte En- lim em lides com esse perfil recorrer agrave norma e realizar a subsunccedilatildeo dos fatos a ela (meacutetodo dedutivo manifestado pelo silogismo) eacute com certeza a melhor opccedilatildeo

Mas seraacute que o meacutetodo dedutivo eacute sempre o mais apropriado para redigir paraacutegrafos argumentativos

Haacute momentos em que a norma dispotildee de forma muito geneacuterica como devem proceder as pessoas na vida social Haacute ainda casos em que a aplicaccedilatildeo fria da lei toma-se indiscutivelmente pouco razoaacutevel Ou seja natildeo satildeo poucos os contextos em que partir da norma em abstrato para solushycionar conflitos juriacutedicos seraacute uma escolha pouco produtiva

A recomendaccedilatildeo entatildeo eacute observar os acontecimentos do conflito em discussatildeo e comparar esses fatos com os de outros casos e daiacute extrair certas regularidades de conduta e de valor Isso que dizer que a norma a ser aplicada e a interpretaccedilatildeo a ela cabiacutevel satildeo extraiacutedas a partir da observaccedilatildeo dos fatos O raciociacutenio vai do particular para o geral

E importante assinalar tambeacutem que eacute um equiacutevoco pensar que indushyccedilatildeo e deduccedilatildeo satildeo procedimentos essencialmente argumentativos Vaacuterias outras ciecircncias recorrem a esse meacutetodo para produzir seus conhecimentos especiacuteficos

Em uma pesquisa eleitoral por exemplo a estatiacutestica utiliza com freshyquecircncia a induccedilatildeo Por meio de amostragem de eleitores realiza-se a pesquishysa que seraacute utilizada para encontrar o percentual de votos que cada um dos candidatos receberaacute no dia da votaccedilatildeo E claro que a validade dos resultados depende da representatividade da amostra de eleitores escolhidos

138 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Contudo o que nos interessa eacute como a induccedilatildeo pode ajudar os opeshyradores do direito a alcanccedilar seus objetivos em situaccedilatildeo de argumentaccedilatildeo Observe o raciociacutenio que se desenvolve adiante um advogado pretende sustentar em juiacutezo no ano de 2002 que seu cliente - com 75 anos de idade e com grau de escolaridade elevado - foi ludibriado ao assinar um contrato de concessatildeo de creacutedito em um banco que faz propagandas na televisatildeo oferecendo altas taxas de juros mas muitas outras facilidades para os aposhysentados Pretende o advogado conseguir a anulaccedilatildeo do contrato sem o pagamento dos juros pactuados no momento da assinatura do contrato

Por que deve o negoacutecio juriacutedico ser desfeito Que tipo de viacutecio foi observado A proposta argumentativa do advogado eacute sustentar que em deshycorrecircncia da idade do contratante ele era mais vulneraacutevel que outra pessoa rfiais jovem ainda que possuiacutesse alto grau de escolaridade Seria facilmente acolhida essa tese naquele ano Lembre que o Estatuto do idoso29 somente foi sancionado pelo Presidente da Repuacuteblica em outubro de 2003

Ainda assim em 2002 o advogado poderia afirmar - por induccedilatildeo- que seu cliente por ser idoso deve receber tratamento mais favoraacutevel da lei porque o Estado protege o mais fraco A argumentaccedilatildeo seguiria o seguinte raciociacutenio

REFLEXAtildeO CONCLUSAtildeO

Ainda que homens e mulheres sejam iguais em direitos e obrigaccedilotildees (art 5o I da CRFB) a mulher recebeu da Carta Magna direitos de proteccedilatildeo mais amplos que os hoshymens no mercado de trabalho Leia o art 7o XX da CRFB ldquosatildeo direitos dos trabalhadores urbanos e rurais aleacutem de outros que visem agrave melhoria de sua condiccedilatildeo social proteccedilatildeo do mercado de trabalho da mulher mediante incentivos especiacuteficos nos termos da leirdquo

Homens e mulheres satildeo iguais perante a lei mas quando um fica em situaccedilatildeo de desvantashygem em relaccedilatildeo ao outro o leshygislador originaacuterio tenta proteger o hipossuficiente e restabelecer a igualdade

29 Apoacutes sete anos tramitando no Congresso o Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e sancionado pelo presidente da Repuacuteblica no mecircs seguinte ampliando os direitos dos cidadatildeos com idade acima de 60 anos Mais abrangente que a Poliacutetica Nacional do Idoso lei de 1994 que dava garantias agrave terceira idade o estatuto institui penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadatildeos da terceira idade Disponiacutevel em lthttpwwwserasacombrguiaidoso20htmgt Acesso em 3 fev 2008

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 139

REFLEXAtildeO CONCLUSAtildeO

No art 170 da CRFB lecirc-se que ldquoa ordem ecoshynocircmica fundada na valorizaccedilatildeo do trabalho humano e na livre iniciativa tem por fim asshysegurar a todos existecircncia digna conforme os ditames da justiccedila socialrdquo Entretanto o incisoV do mesmo artigo assinala que apesar desshysa liberdade a defesa do consumidor deve ser promovida

As relaccedilotildees econocircmicas no Brashysil satildeo regidas pela liberdade mas o consumidor deve receber tutelas especiacuteficas em relaccedilatildeo agraves empresas porque nessa relaccedilatildeo tendem a ser hipossu- ficientes

O Coacutedigo Penal brasileiro prevecirc vaacuterias conshydutas tiacutepicas que seratildeo punidas caso alguma pessoa resolva praticaacute-las Em geral qualquer um independente de sexo condiccedilatildeo social profissatildeo etc estaraacute sujeito agraves sanccedilotildees ali previstas mas a crianccedila e o adolescente - que satildeo seres ainda em desenvolvimento- receberam amparo de legislaccedilatildeo especiacuteshyfica (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente)

Todos satildeo iguais perante a lei mas crianccedilas e adolescentes por sua condiccedilatildeo peculiar de seres em formaccedilatildeo ou seja por serem hipossuficientes satildeo protegidos com maior amplitude pelo Estado

Observe o esquema

0 Estado protege de maneirapeculiar as mulheres nas relaccedilotildeesde trabalho porque haacute situaccedilotildeesespeciacuteficas em que elas estatildeo

em desvantagem em relaccedilatildeo aoshomens

O Estado protege de maneira peculiar as crianccedilas e os

adolescentes porque satildeo mais fracos que os adultos

0 Estado protege de maneirapaculiar os consumidores nas

relaccedilotildees de consumo porque haacutesituaccedilatildeo especiacutefica em que eles

estatildeo em desvantagem em ralaccedilatildeoas empresas

J

O Estado deve proteger o

hipossuficiente tal como o satildeo os

idosos

140 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Para melhor ilustrar esse procedimento vejamos mais um caso concreto

Roberto Veloso ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria em face de Agecircncia de Viashygens Solimar Ltda e Hotel Fazenda Cruzeiro pretendendo o ressarcishymento pelos danos sofridos em acidente que lhe causou tetraplegia O autor afirma haver contratado com a primeira reacute pacote de turismo com excursatildeo para Serra Negra em Satildeo Paulo onde se hospedou nas instalaccedilotildees da segunda reacute por volta das 22hNa mesma noite ao dar um mergulho em uma das piscinas do hotel o autor bateu violentamente no piso da piscina que estava vazia Susshytentou inexistir qualquer aviso nem mesmo um obstaacuteculo ou uma coshybertura que impedisse o acesso dos hoacutespedes agravequele local Postula o ressarcimento a tiacutetulo de dano proveniente de relaccedilatildeo de consumo que o deixou tetrapleacutegico aos 21 anos de idadeEm contestaccedilatildeo a segunda reacute aduz que o autor apoacutes ingerir bebidas alcooacutelicas resolveu por volta das 3h usar a piscina existente no hotel na qual jaacute se banhavam alguns amigos seus o que evidencia natildeo se encontrar completamente vaziaEsclarece ainda que o autor utilizou a piscina apoacutes o horaacuterio de seu regular funcionamento e ao fazer uso de um escorregador para crianshyccedilas mergulhou de cabeccedila em local onde a profundidade era de 110 m Sustenta haver culpa exclusiva da viacutetima

Retomando as questotildees de maior relevacircncia deve ficar evidente que o autor Roberto Veloso deseja ser indenizado porque ficou tetrapleacutegico em acidente motivado pela falta de informaccedilatildeo do hotel em que se hospeshydou sobre os riscos que a piscina e seus acessoacuterios podiam oferecer

Uma das questotildees importantes a serem enfrentadas no caso concreto eacute se foi respeitado o princiacutepio da informaccedilatildeo que rege as relaccedilotildees de conshysumo Perceba que natildeo haacute duacutevidas de que o direito agrave informaccedilatildeo natildeo pode ser negado agrave parte hipossuficiente dessa relaccedilatildeo juriacutedica ou seja o autor consumidor

O que estaacute em discussatildeo portanto natildeo eacute a existecircncia do direito mas como ele deveria ser observado no caso em anaacutelise Em outras palashyvras estaacute em discussatildeo quais procedimentos deveria ter adotado a empreshysa neste caso concreto para que o direito agrave informaccedilatildeo fosse adequado e claro

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

O QUE DETERMINA A LEGISLACcedilAtildeO

O autor sustenta com base no art 6o III do CDC que eacute um direito baacutesico do consushymidor a informaccedilatildeo adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem

a) Existia aviso no local do fato que indicava o horaacuterio de funcionamento daqueshyle serviccedilo oferecido pelo hotel

b) Os hoacutespedes deveriam receber folhetos informativos no momento do check in sobre o horaacuterio de todos os serviccedilos que satildeo oferecidos

c) Apenas informar o horaacuterio de funcionamento eacute suficiente ou algum outro procedimento seria indispensaacutevel

d) O desrespeito pelo consumidor das orientaccedilotildees sobre o horaacuterio de funcioshynamento da piscina exime a empresa de qualquer responsabilidade

e) Seria necessaacuterio tambeacutem disponibilizar um funcionaacuterio por tempo integral para guardar aquele local por se tratar de aacuterea de potencial risco para os hoacutespedes Isso seria razoaacutevel

f) A piscina deveria estar pelo menos cercada para evitar o afogamento de crianccedilas muito pequenas ou mesmo animais

g) Seria necessaacuterio ainda cobrir a piscina

h) Cobrir a piscina natildeo traria mais riscos que vantagens conforme se pocircde verificar nos inuacutemeros casos de afogamento de crianccedilas que caiacuteram por pequenas brechas nas bordas se afogaram sem que qualquer pessoa pudesse imaginar que estavam sob a lona

i) O hotel teve comportamento imprudente ou negligente nessas tarefas

j) Quaisquer dessas providecircncias se adotadas pela empresa impediriam que um jovem de 21 anos alcoolizado que pretendesse efetivamente entrar na piscina conseguisse fazecirc-lo de qualquer forma

k) Natildeo parece claro que um escorregador para crianccedilas localiza-se na parte mais rasa da piscina e por isso natildeo deve ser usado por adultos

Mas o que era nessa hipoacutetese dar informaccedilatildeo adequada para que o acidente natildeo ocorresse

ALGUNS DOS QUESTIONAMENTOS POSSIacuteVEIS

142 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Pelo esquema acima deve ter ficado claro que natildeo haacute como realizar pura subsunccedilacirco dos fatos agrave norma porque por sua proacutepria natureza a inshyterpretaccedilatildeo mais adequada da norma deve ser ainda discutida

A comparaccedilatildeo com outras situaccedilotildees tambeacutem pode ajudar a estabeleshycer o que se deve entender no caso analisado por ldquo direito agrave informaccedilatildeordquo

COMPARACcedilAtildeO COM ALGUMAS OUTRAS SITUACcedilOtildeES FAacuteTICAS

a) Existe diferenccedila entre o caso do autor e o de uma consumidora que escorreshyga dentro de um supermercado porque o piso estava molhado

b) Avisar que o piso estaacute escorregadio com um pequeno cavalete amarelo onde se lecirc ldquocuidado Piso molhadordquo eacute suficiente para excluir a responsabilidade de um sushypermercado Esse entendimento seria semelhante ao que deveria ter sido adotado para o escorregador na aacuterea da piscina

c) Se o mesmo acidente ocorrido com o autor se desse sem a suspeita de a viacutetima estar alcoolizada a situaccedilatildeo se alteraria

d) Se o acidente natildeo ocorresse em uma propriedade particular mas em uma praccedila a obrigaccedilatildeo do Estado teria natureza juriacutedica diferente ou ainda estaria caracshyterizada a responsabilidade civil objetiva

Enfim para responder agrave questatildeo principal (direito de informaccedilatildeo) e solucionar esse caso concreto o meacutetodo dedutivo mostra-se ineficiente pois a aplicaccedilatildeo objetiva da norma via subsunccedilacirco natildeo permite esclarecer as inuacutemeras dificuldades que lhe peculiarizam Mais produtivo seria forshymular um argumento pelo meacutetodo indutivo o qual consiste em um movishymento que parte de casos particulares para concluir uma verdade geral

No caso concreto em anaacutelise portanto natildeo basta reconhecer o direito do autor a ter informaccedilotildees claras sobre o serviccedilo que lhe eacute prestado eacute neshycessaacuterio ainda compreender - por induccedilatildeo - o que significa esse direito e quais obrigaccedilotildees gera para a prestadora de serviccedilo

Com esse propoacutesito o argumentador precisaria recorrer a situaccedilotildees anaacutelogas para delas extrair uma ldquo regularidaderdquo o que o ajudaria a detershyminar uma interpretaccedilatildeo especiacutefica e eficiente da ldquonormardquo para o caso anashylisado Pode-se dizer entatildeo que na induccedilatildeo a conclusatildeo enuncia algo que supera a informaccedilatildeo contida nas premissas possibilitando ampliar os conhecimentos

Muitos acadecircmicos de Direito podem em especial no iniacutecio de sua formaccedilatildeo teacutecnico-profissional natildeo dimensionar com exatidatildeo a dificuldade

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 143

ile se delimitar o que seria ldquo informaccedilatildeo adequada e clarardquo em casos como o de Roberto Veloso Alguns diriam ser absurdo um jovem de 21 anos descer por um escorregador de crianccedila e natildeo perceber que a piscina estava vazia (ou quase vazia) e acreditam de imediato na alegaccedilatildeo da reacute quando afirma que a viacutetima estava alcoolizada

Para demonstrar a relevacircncia dessa discussatildeo enriqueceremos essa explicaccedilatildeo com um caso publicado na Revista Eacutepoca30 em que se denunshycia a falta de seguranccedila de um dispositivo do carro Fox da montadora Volkswagen Usado para rebater o banco traseiro isto eacute para aumentar o tamanho da mala deitando o banco traseiro o usuaacuterio (consumidor) deshyveria utilizar um dispositivo em forma de argola O problema eacute que essa argola quando acionada de forma errada decepou parte do dedo de oito donos dessa marca de automoacutevel somente no Brasil

A questatildeo veio a puacuteblico quando um dos consumidores buscou auxiacuteshylio no Procon para ajuizar accedilatildeo em face da Volkswagen e ser indenizado Alega natildeo ter sido informado de forma adequada e suficiente sobre os risshycos que o dispositivo pode oferecer A montadora nega que haja informashyccedilatildeo insuficiente ou inadequada e que o mecanismo eacute seguro razatildeo pela qual natildeo haacute necessidade de realizar recall3I

Oportuno eacute ressaltar que os especialistas na aacuterea divergem quanto agrave seguranccedila do dispositivo e a necessidade de alertas mais especiacuteficos ao consumidor ao realizar o procedimento de rebater o banco traseiro Mas o leitor deve estar se perguntando como afinal a empresa orientou seus consumidores a realizarem esse procedimento

30 MACHADO Flaacutevio A armadilha do Fox In Caderno Sociedade Ediccedilatildeo ndeg 507 de 31 de janeiro de 2008 Disponiacutevel tambeacutem em lthttprevistaepocaglobocomRevista Epoca0bdquoEDG81441-601400htmlgt Acesso em 07 fev 2008

31 Um recall (do inglecircs ldquochamar de voltardquo ldquochamamentordquo ) ou recolha de produto eacute uma solicitaccedilatildeo de devoluccedilatildeo de um lote ou de uma linha inteira de produtos feita pelo fabricante do mesmo Geralmente isso ocorre pela descoberta de problemas relativos agrave seguranccedila do produto O recall eacute uma tentativa de limitar a responsabishylidade por negligecircncia corporativa (a qual pode motivar severas puniccedilotildees legais) e aprimorar ou evitar danos agrave publicidade da empresa Os recalls custam caro para as empresas porque frequentemente envolvem a substituiccedilatildeo do produto recolhido ou o pagamento pelos danos causados pelo seu uso embora possivelmente custem menos do que os custos indiretos que se seguem aos danos agrave imagem da empresa e agrave perda de confianccedila no fabricante Recalls satildeo comuns na induacutestria automobishyliacutestica poreacutem jaacute haacute alguns anos tecircm sido estendidos a outros tipos de produtos como medicamentos e brinquedos Disponiacutevel em lthttpptwikipediaorgwiki Recallgt Acesso em 07 fev 2008

144 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Haacute dois momentos em que a empresa ensina a rebater o banco traseishyro e em ambos alerta para o risco de ldquo acidentesrdquo no manual do usuaacuterio e em um adesivo colado atraacutes do banco bem ao lado do dispositivo em questatildeo Entenda o problema que o mecanismo apresenta

ARGOLA DESLEALEntenda o erro que pode decepar um dedo

O manual do Volkswagen Fox orienta o proprietaacuteshyrio a fazer o rebatimento do banco pela traseira do carro com a porta do porta-malas aberta

O primeiro passo para rebater o banco eacute destrashyvar o encosto Para isso basta puxar uma alccedila flexiacutevel que fica presa numa argola de metal

Acidentes ocorrem quando a pessoa instintivamente coloca o dedo na argola de metal Destravado o meshycanismo puxa a argola com forccedila o que pode decepar a ponta do dedo

(Disponiacutevel em lthttprevistaepocaglobocomRevistaEpoca0bdquoEDG81441-6014-50700 htmlgt Acesso em 02 set 2012)

Essas duas oportunidades (manual do usuaacuterio e adesivo colado ao lado do dispositivo) representam informaccedilatildeo clara e suficiente para o consumidor O engenheiro Maacutercio Montesani diretor do Nuacutecleo de Periacutecias Teacutecnicas de Satildeo Paulo analisou o rebatimento do Fox e entende que natildeo o satildeo Especialista em periacutecias automotivas ele critica o sistema e o manual ldquoHaacute erro de projeto O dispositivo induz o usuaacuterio a colocar o dedo instintivamente na argola o que pode resultar em mutilaccedilatildeo O manual deveria prevenir sobre falhas na operaccedilatildeo e dizer como proceder na ausecircncia da alccedilardquo

Se existe portanto qualquer oportunidade de induzir o consumidor- parte hipossuficiente da relaccedilatildeo juriacutedica - a erro e causar-lhe dano a inshyformaccedilatildeo natildeo pode ser dita suficiente e clara Trata-se de conduta culposa motivadora de dano com o qual guarda nexo de causalidade

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 145

Por fim para facilitar a compreensatildeo do tema deste capiacutetulo estashybeleceremos uma comparaccedilatildeo esquemaacutetica entre os meacutetodos dedutivo e indutivo Observe a seguir

MEacuteTODO DEDUTIVO MEacuteTODO INDUTIVOParte de uma verdade geral para cheshygar a afirmaccedilotildees particulares

Parte de casos particulares para conshycluir uma verdade geral

A aceitaccedilatildeo da conclusatildeo depende das premissas se as premissas forem vershydadeiras a conclusatildeo eacute verdadeira

A conclusatildeo enuncia algo que supera a informaccedilatildeo contida nas premissas posshysibilitando ampliar os conhecimentos

Frequentemente operacionaliza-se por meio do silogismo Premissa Maior + Premissa Menor = Conclusatildeo

Frequentemente recorre agrave comparashyccedilatildeo para reconhecer uma regularidade entre os fatos avaliados e dali extrair os valores juridicamente adequados ao caso concreto

Capiacutetulo VI

PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

Inicialmente precisamos justificar a abordagem que adotamos para o tema neste capiacutetulo Natildeo caberia aprofundar conceitos doutrinaacuterios relashytivos agrave distinccedilatildeo entre os princiacutepios gerais do direito e as regras juriacutedicas por meio da abordagem de correntes tampouco classificar de forma sisteshymaacutetica os princiacutepios distribuiacutedos por aacutereas do direito e estabelecer regras hermenecircuticas para seu campo de atuaccedilatildeo Esse natildeo eacute o nosso objetivo

Pretendemos esclarecer isso sim como tais normas podem ser utilizadas para compor o texto argumenlativo juriacutedico e qual o efeito que se extrai desse procedimento dada a relevacircncia atual atribuiacuteda a essa fonte do direito de nashytureza estruturante de todo o sistema

61 PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E REGRAS

Considerando que os princiacutepios refletem valores eacuteticos e morais de uma determinada sociedade bem como garantias miacutenimas de um Estado Democraacutetico de Direito eacute fundamental que se compreenda o significado de ldquovalores moraisrdquo e ldquo valores eacuteticosrdquo De forma breve vamos esclarecer esses conceitos

611 Os valores morais

Ao falarmos de valor vecircm agrave nossa mente a utilidade a beleza a bonshydade a justiccedila o respeito a confianccedila etc O homem ser histoacuterico-social atribui esses valores a coisas a seres agrave conduta humana Tal atribuiccedilatildeo deriva portanto da cultura e da relaccedilatildeo social Assim algo que se consishy

148 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dera ura valor em determinada eacutepoca pode deixar de secirc-lo em outra Por exemplo conforme evolui a tecnologia determinados objetos perdem sua utilidade sendo substituiacutedos por outros mais modernos assim tambeacutem satildeo os valores para o homem

E quando o valor eacute atribuiacutedo agrave conduta humana A conduta humana realizada de forma consciente e voluntaacuteria encarna valores morais Assim podem-se qualificar moralmente os atos dos indiviacuteduos ou de grupos soshyciais as intenccedilotildees desses atos os resultados as consequecircncias etc Satildeo os valores morais que direcionam a conduta humana Por exemplo quando uma mulher graacutevida em uma entrevista de emprego decide consciente e voluntariamente omitir sua gravidez tal decisatildeo foi guiada pelos valores morais adquiridos em sua formaccedilatildeo Da mesma maneira quando um casal de mepdigos encontra uma expressiva quantia em dinheiro e a devolve ao seu respectivo dono demonstra possuir um valor moral que estaacute acima da necessidade evidente dessa quantia

Haacute determinados valores morais considerados universais outros dishyzem respeito a uma determinada comunidade em um tempo e espaccedilo defishynidos A caridade por exemplo eacute um valor moral universal Espera-se que norteie o agir de qualquer pessoa em qualquer lugar e em qualquer eacutepoca Entretanto a fidelidade considerada no seu aspecto especiacutefico de relaccedilatildeo conjugal pode constituir um valor moral ou natildeo dependendo do costume da sociedade jaacute que para algumas a bigamia eacute praacutetica corrente

612 Os valores eacuteticos

Natildeo resta duacutevida de que o homem eacute dotado de uma consciecircncia moral- formada por valores universais e pelos especiacuteficos do seu ldquo aquirdquo e ldquo agoshyrardquo - geradora de regras que guiam seus juiacutezos e suas accedilotildees Certamente haacute uma conduta social esperada do ser humano em conformidade com essa consciecircncia moral A eacutetica seria essa conduta social geradora de conshysequecircncias que possibilitam a correta convivecircncia entre os homens com fulcro na preservaccedilatildeo da dignidade humana

A eacutetica fundamenta-se em uma seacuterie de praacuteticas morais essenciais que emergem da necessidade que todo indiviacuteduo possui de contribuir com a coletividade em prol do bem comum

Observa-se que a eacutetica adquire uma perspectiva social porquanto se considera que cada pessoa deva ser responsabilizada pelo seu agir consciente e pelas consequecircncias de suas escolhas no seio da sociedade Ora cada um tem uma ideia daquilo que deve ser feito Configura-se assim um viacutenculo entre eacuteti-

ca e Direito jaacute que essa convicccedilatildeo pode servir de criteacuterio para que se expresse um juiacutezo e se avalie ser justa ou natildeo uma conduta nas relaccedilotildees interpessoais

Com efeito um profissional liberal mesmo consciente de que natildeo tem condiccedilotildees de fornecer um serviccedilo mas se dispotildee a prestaacute-lo demonstra estar ferindo um valor que se espera estar presente nesse tipo de relaccedilatildeo a boa-feacute O homem a princiacutepio idealiza que seus semelhantes sejam dignos de confianccedila bem que se deseja preservar para que as relaccedilotildees humanas transcorram de forma harmocircnica Entretanto ao constatar que a conduta do fornecedor em vez de estar solidificada na boa-feacute demonstrou estar fincada na maacute-feacute ou na desiacutedia gera o repuacutedio da sociedade por considerar que feriu um valor moral e eacutetico

Com a crise do positivismo juriacutedico que natildeo se mostrou apto agrave consshytruccedilatildeo de uma sociedade harmocircnica e juridicamente justa a eacutetica e a moral ganharam novamente forccedila sobre o Direito ocorrendo a aproximaccedilatildeo entre direito e moral estreitando-se os viacutenculos entre eacutetica e Direito

Com o poacutes-positivismo1 e com o estabelecimento de valores como base constitucional impocircs-se um dever de fazer em que se concretizam os valores eacuteticos e morais - essecircncia dos princiacutepios antes apenas considerashydos como elementos externos agrave ciecircncia do direito Observemos entatildeo de que maneira esses valores eacuteticos e morais compotildeem os princiacutepios

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

613 Diferenccedilas entre princiacutepios e regras

O Direito se concretiza mediante normas que se constituem em prinshyciacutepios e regras Os princiacutepios satildeo compostos por valores morais e eacuteticos

ldquoA dicotomia entre direito e moral foi um dos traccedilos caracteriacutesticos do positivismo juriacutedico que veio a desmoronar ante a constataccedilatildeo de que um ordenamento juriacutedico positivo pode encarnar contornos crueacuteis aos ideais de justiccedila que se pretende das normas juriacutedicas o que levou ao questionamento da tese positivista quando do estabelecimento do Estado de Direito pondo em questionamento tambeacutem as relashyccedilotildees entre o direito a moral e a eacutetica o que exigiu a reformulaccedilatildeo de alguns conshyceitos como a superaccedilatildeo da riacutegida distinccedilatildeo entre direito e moral e agrave consequente abertura do debate filosoacutefico-juriacutedico contemporacircneo aos valores eacutetico-poliacuteticosrdquo (SANTOS Karina Alves Teixeira A relaccedilatildeo entre o Direito e a Moral e suas conshysequecircncias no Poacutes-Positivismo Disponiacutevel em lthttpAvwwconteudojuridico combrartigo a-relacao-entre-o-direito-e-a-moral-suas-consequencias-no-pos-po- sitivismo38077htmlgt Acesso em 02 set 2012)

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

que servem de alicerce para todo o ordenamento juriacutedico Segundo Luiacutes Roberto Barroso2

O novo seacuteculo se inicia fundado na percepccedilatildeo de que o Direito eacute um sistema aberto de valores A Constituiccedilatildeo por sua vez eacute um conjunto de princiacutepios e regras destinados a realizaacute-los a despeito de se recoshynhecer nos valores uma dimensatildeo suprapositiva A ideia de abertura se comunica com a Constituiccedilatildeo e traduz a sua permeabilidade a eleshymentos externos e a renuacutencia agrave pretensatildeo de disciplinar por meio de reshygras especiacuteficas o infinito conjunto de possibilidades apresentadas pelo mundo real Por ser o principal canal de comunicaccedilatildeo entre o sistema de valores e o sistema juriacutedico os princiacutepios natildeo comportam enumeraccedilatildeo taxativa mas naturalmente existe um amplo espaccedilo de consenso em que tecircm lugar alguns dos protagonistas da discussatildeo poliacutetica filosoacutefica e juriacutedica do seacuteculo que se encerrou Estado de direito democraacutetico liberdade igualdade justiccedila

De fato os princiacutepios normatizam um nuacutemero ilimitado de situaccedilotildees cujas previsotildees legais podem estar ou natildeo positivadas pelas regras Aliaacutes como o sentido de justiccedila nem sempre se associa agrave aplicaccedilatildeo de uma reshygra ao caso concreto vale-se o Direito dos princiacutepios jaacute que conforme a citaccedilatildeo de Luiacutes Roberto Barroso esses sustentam a preservaccedilatildeo de valoshyres essenciais como Estado de direito democraacutetico liberdade igualdade e justiccedila

Quanto agraves regras essas tecircm caraacuteter especiacutefico incidem sobre uma determinada conduta Conforme sustenta o Desembargador Seacutergio Cava- lieri Filho3

Regras satildeo proposiccedilotildees normativas que contecircm relatos objetivos desshycritivos de determinadas condutas aplicaacuteveis a hipoacuteteses bem definidas perfeitamente caracterizadas sob a forma de tudo ou nada Ocorrendo a hipoacutetese prevista no seu relato a regra deve incidir de modo direto e automaacutetico pelo mecanismo da subsunccedilatildeo O comando eacute objetivo e natildeo daacute margem a elaboraccedilotildees mais sofisticadas acerca da sua incidecircncia A aposentadoria compulsoacuteria aos 70 anos eacute um bom exemplo de regra que incide automaticamente quando o servidor atinge essa idade

Sintetizando as noccedilotildees ateacute aqui registradas observe o esquema

Registre-se ainda a importacircncia da Loacutegica do Razoaacutevel na aplicaccedilatildeo dos princiacutepios uma vez que essa loacutegica tem como fundamento a ponderashyccedilatildeo o equiliacutebrio a busca do justo com fulcro nos valores emanados desses princiacutepios Ademais uma conclusatildeo alcanccedilada por meio dessa loacutegica poderaacute substituir outra subsumida de uma operaccedilatildeo dedutiva Representa dizer que uma decisatildeo judicial pode estar em desconformidade com a regra mas jashymais em desacordo com os princiacutepios que balizam o ordenamento juriacutedico

Tal desacordo eacute fruto do inteacuterprete do Direito - ser histoacuterico e social- que natildeo apenas associa o caso concreto agrave regra e dessa operaccedilatildeo extrai a conclusatildeo contida na proacutepria regra (subsunccedilatildeo) seguindo a loacutegica formal mas principalmente analisa as peculiaridades do caso concreto valoranshydo-as conforme a sua eacutepoca e o seu espaccedilo e simultaneamente interpreta as fontes do Direito de forma sistemaacutetica Tal interpretaccedilatildeo visa a capturar o espiacuterito dessas fontes seu real alcance isto eacute pretende entender como poderatildeo proporcionar o bem-estar social E esse um exerciacutecio de ponderashyccedilatildeo que somente a loacutegica do razoaacutevel permite executar

62 A RELEVANCIA NORTEADORA DOS PRTNCIPIOS A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

A partir da anaacutelise de um caso concreto avaliaremos a relevacircncia dos princiacutepios e da loacutegica do razoaacutevel na formulaccedilatildeo dos argumentos Para tal tambeacutem mencionaremos uma regra especiacutefica cabiacutevel ao caso concreto

BARROSO Luis Robero Fundamentos teoacutericos e filosoacuteficos do novo Direito Constishytucional brasileiro Jus Navigandi Teresina ano 7 n 59 1 out 2002 Disponiacutevel em lthttpjuscombrrevistatexto3208gt Acesso em 27 ago 2012CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de Direito do Consumidor 3 ed Satildeo Paushylo Atlas 2011 p 25

JL

Estado do Rio daacute a religiosos direito de recusar transfusatildeoMatheus Leitatildeo

O Estado do Rio vai reconhecer o direito dos fieacuteis da igreja Testemushynhas de Jeovaacute de recusar transfusatildeo de sangue por motivos religiosos

152 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A decisatildeo se refere ao caso de uma praticante de 21 anos que foi intershynada com doenccedila pulmonar grave e se negou a receber o tratamento o que gerou uma consulta do hospital envolvido agrave Procuradoria-Geral do Estado O caso ficou cm estudo por quatro mesesNesta semana a procuradora-geral Lucia Lea Guimaratildees Tavares resshyponderaacute que se trata de ldquoexerciacutecio de liberdade religiosardquo Segundo o parecer ao qual a Folha teve acesso esse eacute ldquoum direito fundamental emanado da dignidade da pessoa humana que assegura a todos o direito de fazer suas escolhas existenciaisrdquoldquoA minha convicccedilatildeo eacute que a pessoa tem direito a escolher desde que seja maior e esteja consciente Natildeo eacute um tema muito simples manter a vida de um paciente mas desrespeitando aquilo em que ele mais acreditardquo disse a ProcuradoraA Folha apurou que o governador Seacutergio Cabral acataraacute o parecer transformando-o numa norma estadual no Rio com poder de deshycretoA determinaccedilatildeo contraria parecer do Conselho Federal de Medicina que diz ldquoSe houver iminente perigo de vida o meacutedico praticaraacute a transshyfusatildeo de sangue independente do consentimento do paciente ou de seus responsaacuteveisrdquo A Procuradora do Rio vai entrar com uma Accedilatildeo Direta de Inconstitu- cionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal) para discutir a consti- tucionalidade do parecer dos meacutedicosSe o precedente aberto no Rio for acatado pelo STF os cristatildeos da ldquoTesshytemunhas de Jeovaacuterdquo teratildeo amparo legal para a manutenccedilatildeo do que conshysideram seus direitos

Divergecircncias

O assunto eacute tatildeo polecircmico que houve inicialmente divergecircncia dentro da Procuradoria do Estado do Rio Diante disso a procuradora-geral Lucia Lea pediu um estudo sobre o tema ao constitucionalista Luis Roberto BarrosoldquoA liberdade religiosa eacute um direito fundamental Pode o Estado proteger um indiviacuteduo em face de si proacuteprio para impedir que o exerciacutecio de lishyberdade religiosa lhe cause dano irreversiacutevel ou fatal A indagaccedilatildeo natildeo comporta resposta juridicamente simples nem moralmente baratardquo diz Barroso no estudoNo fim das 42 paacuteginas o texto conclui pelo reconhecimento do direito das testemunhas de Jeovaacute com a seguinte cautela ldquoA gravidade da reshycusa de tratamento sobretudo quando presente o risco de morte ou de

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 153

grave lesatildeo exige que o consentimento seja genuiacuteno o que significa dizer vaacutelido inequiacutevoco livre informadordquo 4

Algumas questotildees referentes ao caso concreto e aos posicionamentos registrados merecem anaacutelise

Com relaccedilatildeo ao caso concreto destacam-se os seguintes fatos a seshyrem valorados

a) Quem Jovem de 21 anos portanto de maioridade isto eacute ldquo idade legal em que uma pessoa eacute reconhecida como plenamente capaz e responsaacutevelrdquo (Dicionaacuterio Eletrocircnico Houaiss)

b) Por quecirc E Testemunha de Jeovaacute cuja religiatildeo proiacutebe a transfusatildeo de sangue

c) Doenccedila pulmonar grave risco de morted) Consultada a paciente se negou a ser submetida a transfusatildeoe) Anaacutelise do caso pela Procuradoria-Geral do Estado posicionamenshy

to favoraacutevel agrave liberdade de religiatildeo com imposiccedilatildeo de condiccedilotildeesf) Parecer contraacuterio do Conselho Regional de Medicina intervenccedilotildees

necessaacuterias sem o consentimento do paciente se houver risco de morte

g) Divergecircncia de opiniotildees na Procuradoria-Geral do Estado questatildeo complexa

h) Solicitaccedilatildeo de parecer sobre a questatildeo a constitucionalista renomado necessidade de aprofundar a anaacutelise devido agrave sua complexidade

i) Decisatildeo da Procuradoria favoraacutevel agrave vontade da paciente ressalvashydas algumas condiccedilotildees

Interessa-nos analisar as justificativas dessa decisatildeo Segundo a pro- curadora-geral Lucia Lea Guimaratildees Tavares deveraacute prevalecer o ldquo exerciacuteshycio de liberdade religiosardquo jaacute que esse eacute ldquo um direito fundamental emanado da dignidade da pessoa humana que assegura a todos o direito de fazer suas escolhas existenciaisrdquo

4 LEITAtildeO Matheus Estado do Rio de Janeiro daacute a religiosos direito de recusar transshyfusatildeo Folha de Satildeo Paulo Sucursal de Brasiacutelia 27 abr 2012 Disponiacutevel em lthttp wwwnoticiasjwbrothersorgrio-dc-janeiro-reconhece-o-direito-das-testemunhas- de-jeova-recusar-sanguegt Acesso em 27 ago 2012

154 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Observa-se a prevalecircncia do princiacutepio da dignidade humana que gashyrante a todas as pessoas liberdade religiosa acima da preservaccedilatildeo da vida que conforme o parecer meacutedico estaacute em risco em razatildeo de doenccedila pulshymonar grave Entretanto condiciona-se essa liberdade de escolha agrave idade e agrave consciecircncia das consequecircncias que essa opccedilatildeo acarreta

Como se pode observar pelo texto transcrito o posicionamento da Procuradora natildeo se coaduna com o parecer do Conselho Federal de Meshydicina que diz ldquo Se houver iminente perigo de vida o meacutedico praticaraacute a transfusatildeo de sangue independente do consentimento do paciente ou de seus responsaacuteveisrdquo Tambeacutem na proacutepria Procuradoria opiniotildees divergiram da conclusatildeo da procuradora-geral Por essa razatildeo foi solicitado um estudo a respeito do tema ao constitucionalista Luis Roberto Barroso

As questotildees que o constitucionalista propotildee expressam claramente a adoccedilatildeo da loacutegica do razoaacutevel em que pondera o que deve prevalecer o poder do Estado de proteger o indiviacuteduo de si mesmo ou o poder do indiviacuteshyduo de exercer sua liberdade religiosa e escolher o seu destino Conforme o proacuteprio autor sustenta natildeo eacute uma anaacutelise faacutecil mas decidiu adotar o mesmo entendimento da Procuradora-Geral apenas especificando o que ela certamente quis dizer com ldquo conscienterdquo isto eacute uma decisatildeo inequiacuteshyvoca livre e informada Ora mas em que se baseou o parecer do Conselho Federal de Medicina para emitir tal entendimento contrariando a posiccedilatildeo da procuradora-geral Possivelmente para o Conselho prevalece o prinshyciacutepio do direito agrave vida acima do direito de liberdade religiosa No entanto conforme Schreiber5

[] a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica coloca a liberdade de religiatildeo e o direishyto agrave vida no mesmiacutessimo patamar Aqui como em outros campos natildeo pode o inteacuterprete correr o risco de se agarrar agrave regra mais especiacutefica esquecendo os princiacutepios que lhe servem de fundamento de validade e que podem ser diretamente aplicados ao caso concreto A vontade do paciente deve ser respeitada porque assim determina a tutela da dignishydade humana valor fundamental do ordenamento juriacutedico brasileiro

A que regra especiacutefica estaria se referindo o doutrinador Destaqueshymos uma a que pode ser subsumida a hipoacutetese em exame art 146 do Coacuteshydigo Penal - ldquoConstranger algueacutem mediante violecircncia ou grave ameaccedila ou depois de lhe haver reduzido por qualquer outro meio a capacidade de resistecircncia a natildeo fazer o que a lei permite ou a fazer o que ela natildeo mandardquo

5 SCHREIBER Anderson Direitos da personalidade Satildeo Paulo Atlas 2011 p 52

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 155

O paraacutegrafo 3deg do referido dispositivo acentua ldquoNagraveo se compreendem na disposiccedilatildeo deste artigo 1 - a intervenccedilatildeo meacutedica ou ciruacutergica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal se justificada por iminente perigo de vida II - a coaccedilatildeo exercida para impedir suiciacutediordquo

De acordo com o artigo mencionado de fato o meacutedico estaria autorishyzado a contrariar a vontade do paciente caso sua intervenccedilatildeo possibilite a manutenccedilatildeo da vida do paciente Aleacutem disso estaria impedindo o paciente de se suicidar Mas a opccedilatildeo por natildeo se submeter a transfusatildeo de sangue poderia ser considerada suiciacutedio Pensamos que natildeo

Se assim o fosse tambeacutem seria suiciacutedio algueacutem se negar a tratamento quimioteraacutepico sendo esse o uacutenico recurso para prolongar sua vida mas esse paciente jamais foi denominado um suicida Tambeacutem o proacuteprio Conshyselho Federal de Medicina vem adotando o entendimento de que o paciente tem o direito de escolher se quer se submeter a tratamentos como esse

Portanto apesar de essa lei salvaguardar a intervenccedilatildeo do meacutedico alheia agrave vontade expressa do paciente a praacutetica vem demonstrando que se busca uma autorizaccedilatildeo judicial nesses casos Eacute cediccedilo que aleacutem da regra especiacutefica muitos julgadores apoiam-se no princiacutepio do direito agrave vida a fim de fundamentar sua decisatildeo de contrariar a vontade do paciente Para esses o direito agrave vida se sobrepotildee ao direito agrave liberdade religiosa conforme se verificaraacute no proacuteximo caso concreto6

Em fevereiro de 2009 o Hospital das Cliacutenicas da Universidade Fedeshyral de Goiaacutes conseguiu autorizaccedilatildeo da Justiccedila para fazer transfusatildeo de sangue em um paciente da religiatildeo Testemunha de Jeovaacute Em liminar o desembargador federal Fagundes de Deus do Tribunal Regional Federal da la Regiatildeo registrou que no confronto entre os princiacutepios constitucionais do direito agrave vida e do direito agrave crenccedila religiosa importa considerar que atitudes de repuacutedio ao direito agrave proacutepria vida vatildeo de enshycontro agrave ordem constitucional Para exemplificar lembrou que a legisshylaccedilatildeo infraconstitucional natildeo admite a praacutetica de eutanaacutesia e reprime o induzimento ou auxiacutelio ao suiciacutedioNa accedilatildeo a Universidade Federal de Goiaacutes autarquia responsaacutevel pelo Hospital das Cliacutenicas argumentou que o estado do paciente era grave e pedia com urgecircncia a transfusatildeo de sangue Explicou que o hospital eacute obrigado a respeitar o direito de autodeterminaccedilatildeo da pessoa humana reconhecido pela ordem juriacutedica nada podendo fazer sem autorizaccedilatildeo

6 MARTINS Geiza Fiel tem direito de recusar transfusatildeo de sangue Consultor Juriacutedico 8 mai 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2010-mai-08 legitimo-recusar-tratamento-saude-crenca-religiosagt Acesso em 26 ago 2012

156 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

da Justiccedila Aleacutem disso o hospital sustentou na accedilatildeo que o direito agrave vida eacute um bem indisponiacutevel cuja proteccedilatildeo incumbe ao Estado e que no caso concreto a transfusatildeo sanguiacutenea eacute a uacutenica forma de efetivaccedilatildeo de tal direitoPara o desembargador Fagundes de Deus ldquoo direito agrave vida porquanto o direito de nascer crescer e prolongar a sua existecircncia adveacutem do proacuteprio direito natural inerente aos seres humanos sendo este sem sombra de duacutevida primaacuterio e antecedente a todos os demais direitosrdquo Com isso autorizou a transfusatildeo

Como se pode constatar os princiacutepios ao mesmo tempo em que lishymitam a vontade subjetiva do aplicador do direito contecircm um grau de abstraccedilatildeo e de generalidade amplo que lhe permite exercer seu senso de razoabilidade de forma plena e consequentemente fazer a justiccedila do caso concreto

63 ORGANIZACcedilAtildeO HIERAacuteRQUICA DE ALGUMAS FONTES DO DIREITO NA ESTRUTURA ARGUMENTATIVA RAZOABILI- DADE PRINCIacutePIOS LEI DOUTRINA E JURISPRUDEcircNCIA

Embora natildeo se tenha nesta obra a intenccedilatildeo de abordar as diversas concepccedilotildees doutrinaacuterias sobre o tema ldquo fontes do direitordquo impotildee-se inishycialmente determinar o significado do termo ldquo fonterdquo que tem duas definishyccedilotildees especiacuteficas

Conforme Nunes fonte eacute a nascente da aacutegua e especialmente eacute a bica donde verte aacutegua potaacutevel para uso humano De forma figuratishyva entatildeo o termo fonte designa a origem a procedecircncia de alguma coisaEm Gusmatildeo fonte como metaacutefora significa a origem do direito ou seja de onde ele proveacutem7

Dessa forma em sentido amplo poder-se-ia dizer que fonte indica a origem de algo Jaacute associando o termo ao direito consideraremos ldquo fonte do direitordquo como o nascedouro de normas juriacutedicas que compotildeem esse sistema Muito embora se faccedila a distinccedilatildeo entre fontes materiais e fontes

7 Fontes do direito Disponiacutevel em lthttpwwwwebartigoscomartigosfontes-do- direito4192gt Acesso em 15 set 2012

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 157

formais fontes imediatas e fontes mediatas8 preferimos adotar o seguinte entendimento

O conceito-chave eacute o de ato juriacutedico enquanto condutas que positivam o direito e que satildeo executadas por diferentes centros emanadores dotashydos do poder juriacutedico de fazecirc-lo como o Estado e seus oacutergatildeos a proacutepria sociedade os indiviacuteduos autonomamente considerados etc O direito afirma-se emana desses atos que passam a ser considerados9

Assim conforme a origem e a forccedila com que se impotildeem esses atos assumem a hierarquizaccedilatildeo que determina sua aplicabilidade como elemenshytos norteadores na produccedilatildeo e na defesa de teses juriacutedicas Alguns desses atos resultam em leis decretos sentenccedilas contratos etc

Mais uma vez reforccedilamos que o nosso objetivo eacute pragmaacutetico isto eacute a aplicaccedilatildeo no texto de algumas fontes juriacutedicas a fim de que se avalie sua forccedila argumentativa Por essa razatildeo sugerimos a anaacutelise de um caso concreto e a possibilidade de produccedilatildeo textual em que se buscou utilizar algumas fontes do direito de forma hierarquizada Passemos ao caso conshycreto

Suponha que um menino de 9 anos pertencente atilde religiatildeo Testemunhas de Jeovaacute sofra de leucemia grave e segundo o meacutedico que o acomshypanha necessita urgentemente de transfusatildeo de sangue Os pais natildeo autorizaram a transfusatildeo Segundo eles o sangue eacute como se fosse uma digital algo inerente a cada pessoa que natildeo pode doar nem receber de ningueacutem No lugar da transfusatildeo pedem que sejam adotados tratamenshytos alternativosO meacutedico recorreu agrave justiccedila para obter autorizaccedilatildeo a fim de realizar a transfusatildeo

631 Proposta

Como utilizar as fontes do Direito em uma argumentaccedilatildeo que defenshyda a tese do meacutedico Oferecemos uma possibilidade de construccedilatildeo do texto

8 Sugere-se a leitura de CAVALIacuteERI FILHO Sergio Programa de sociologia juriacuteshydica Vocecirc conhece 8 ed Rio de Janeiro Forense 2000

9 FERRAZ JR Tercio Sampaio Introduccedilatildeo ao estudo do direito Teacutecnica decisatildeo dominaccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2001 p 221

158 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

e em seguida uma anaacutelise da utilizaccedilatildeo dos princiacutepios regra doutrina e jurisprudecircncia

O presente caso exige ponderaccedilatildeo cuidadosa entre dois princiacutepios o dishyreito agrave vida assegurado no artigo 5deg caput da Constituiccedilatildeo e o direito agrave liberdade religiosa no mesmo artigo inciso VI Tal cuidado se justifica em razatildeo de na hipoacutetese em anaacutelise estar em risco a vida (sofre de leucemia grave um menor impuacutebere portanto sem capacidade civil para optar entre esses dois direitos)

Seria pois razoaacutevel deixar a cargo de seus pais tal decisatildeo Estes lhe deram a vida mas conforme o ordenamento juriacutedico brasileiro nenhuma lei lhes confere o direito de tiraacute-la mas sim de preservaacute-la Destaque-se do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente o art 4deg que dispotildee dentre outros deveres da famiacutelia a efetivaccedilatildeo dos direitos referentes agrave vida e agrave sauacutede bens indisponiacuteveis

Acrescente-se ainda a orientaccedilatildeo fornecida por Luiz Roberto Barroso de que a ldquogravidade da recusa de tratamento sobretudo quando presente o risco de morte ou de grave lesatildeo exige que o consentimento seja genuiacuteno o que significa dizer vaacutelido inequiacutevoco livre informadordquo Ora no presente caso mesmo que o menor se manifestasse sua opccedilatildeo natildeo teria valor juriacutedico uma vez que o art 3deg do Coacutedigo Civil eiva dc nulidade a expressatildeo de sua vontade sobre a disposiccedilatildeo de sua vida Conforme o referido artigo ldquo satildeo absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vidardquo

Ademais em um paiacutes laico como o nosso natildeo deve o julgador deshycidir se determinado preceito biacuteblico eacute vaacutelido e se pode ser desobedecido Para aquele que tem feacute ir de encontro agraves suas crenccedilas e viver com a maacutecula de ter transgredido os dogmas da sua religiatildeo pode significar a morte em vida Entretanto seraacute que uma crianccedila estaria convicta de que a transfusatildeo de sangue lhe causaria algum dano O que estaacute em jogo a sauacutede fiacutesica c mental da crianccedila ou a consciecircncia dos pais Qual o dever do Estado A todas essas perguntas muito bem ponderadas soacute se pode chegar a uma resposta proteger a vida da pessoa que quando adulta e consciente das consequecircncias que seus atos iratildeo lhe impor poderaacute exercer com plenitude o direito agrave liberdade de religiatildeo

Por fim registre-se a decisatildeo da Juiacuteza Federal Dra Vacircnia Hack de Almeida em caso anaacutelogo no processo AC 155 RS 20037102000155-6 desfavoraacutevel agrave adoccedilatildeo de procedimentos alternativos agrave transfusatildeo de sangue quando esta se apresentava indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da vida de menor impuacutebere Como se observa no caso em qLiestatildeo o fato de o pa-

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 159

ciente ser um menor impuacutebere justifica a preponderacircncia do direito agrave vida em detrimento do direito agrave liberdade de escolha Sem duacutevida o pedido do meacutedico deve ser deferido jaacute que natildeo seria razoaacutevel natildeo proporcionar a esse menor a oportunidade de exercer todos os outros direitos agasalhados no ordenamento juriacutedico

632 Comentaacuterio

Natildeo haacute regra que determine em que ordem as fontes do direito devem ser utilizadas em um texto argumentativo Entretanto devemos considerar que

Sobretudo depois do advento do neoconstitucionalismo (que ganhou forccedila inusitada a partir dos julgamentos de Nuremberg em 1945-1946 jaacute que eles enfatizaram com toda clareza a distinccedilatildeo entre a lei e o direito) jaacute natildeo haacute como negar a forccedila normativa (cogente imperiosa e civilizacional) dos princiacutepios dentro do direito (ou seja na ciecircncia do direito)10

Com efeito natildeo haacute como ignorar a forccedila argumentativa que conteacutem um princiacutepio uma vez que ele fornece as diretrizes gerais do ordenamento juriacutedico Assim antes de se pensar qual regra deve ser aplicada ao caso concreto entendemos que seja fundamental definir o princiacutepio juriacutedico que norteia a soluccedilatildeo justa e razoaacutevel para a hipoacutetese em anaacutelise Essa estrateacuteshygia foi adotada no texto apresentada no item 631 ao se ponderarem dois princiacutepios constitucionais direito agrave vida e direito agrave liberdade religiosa amshybos contidos no art 5deg da Constituiccedilatildeo Natildeo houve muito embora possa parecer conflito de princiacutepios mas uma colisatildeo que exige ponderaccedilatildeo das circunstacircncias atinentes ao caso concreto a fim de estabelecer que princiacuteshypio prevaleceraacute

Em seguida adotou-se como argumento de autoridade a regra isto eacute o art 4deg do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente que explicitamente proclama valores resguardados pelos princiacutepios que se aplicam ao caso em anaacutelise direito agrave vida e agrave sauacutede Como se observa a utilizaccedilatildeo desse artigo reforccedila a conclusatildeo extraiacuteda apoacutes a ponderaccedilatildeo dos princiacutepios O

10 GOMES Luiz Flaacutevio Normas regras e princiacutepios conceitos e distinccedilotildees (parte 1) Extraiacutedo de rede de ensino Luiz Flaacutevio Gomes 3 fev 2010 Disponiacutevel em lthttplfgjusbrasilcombrnoticias2074820normas-regras-e-principios-concei- tos-e-distincoes-parte-lgt Acesso em 14 set 2012

160 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

texto segue portanto uma linha de raciociacutenio estruturada com base em um princiacutepio constitucional direito agrave vida

No terceiro paraacutegrafo evoca-se o reconhecido saber do constitushycional ista Luiz Roberto Barroso manifestando-se a voz da doutrina que se alinha ao art 3deg do Coacutedigo Civil Fica estabelecido o viacutenculo entre a doutrina e a lei reforccedilando a tese defendida no texto Aliaacutes a doutrina ao interpretar o direito contribui para o seu aprimoramento De fato algumas leis se alteram em virtude da atualizaccedilatildeo de sua interpretaccedilatildeo promovida pelos doutrinadores

Em sequecircncia a loacutegica do razoaacutevel se apresenta com maior ecircnfase por meio da ponderaccedilatildeo de valores As perguntas retoacutericas expressam essa ponderaccedilatildeo compartilhada com o auditoacuterio Dessa forma adota-se uma cumplicidade com esse auditoacuterio na busca de fazecirc-lo refletir sobre o que deve preponderar os argumentos dos pais ou o do orador Promove-se nesse momento espaccedilo para o argumento de oposiccedilatildeo a fim de demonstrar sua fragilidade perante os argumentos defendidos pelo orador

Por fim recorreu-se agrave jurisprudecircncia com o objetivo de estabelecer uma aproximaccedilatildeo entre o caso em apreccedilo e outro semelhante jaacute julgado Essa praacutetica eacute muito comum na fundamentaccedilatildeo de teses por se reconhecer a relevacircncia juriacutedica de uma decisatildeo de meacuterito em face de sua natureza cientiacutefica Portanto serve de fonte para orientar na soluccedilatildeo de questatildeo ainshyda natildeo positivada ou para aprimorar alguma regra existente Da mesma forma que a doutrina a jurisprudecircncia tem ainda a funccedilatildeo de atualizar no tempo e no espaccedilo conforme os costumes determinada regra e ateacute suscitar a criaccedilatildeo de outras regras Presta pois relevante serviccedilo na busca pelo justo pelo razoaacutevel

11 Sugere-se a leitura de FERRAZ JR Tercio Sampaio Introduccedilatildeo ao estudo do dishyreito Teacutecnica decisatildeo dominaccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2001 p 237-242 para ampliar o conhecimento relativo aos costumes e agrave jurisprudecircncia

Capiacutetulo VII

FIGURAS DE RETOacuteRICA

A linguagem do Direito haacute de conformar-se aos rigores da teacutecnica jushyriacutedica Mas sem desprezo agrave clareza agrave transparecircncia agrave elegacircncia e ao ritmo melodioso da poesia As palavras para o professor para o advoshygado para os operadores do Direito em geral satildeo feitas para persuadir demover incentivar Natildeo basta sintaxe E preciso paixatildeo (Luiacutes Roberto Barroso)

A citaccedilatildeo registrada destaca a importacircncia da linguagem verbal parao profissional do Direito no desempenho de suas funccedilotildees Observa-se que Luis Roberto Barroso enfatizou o uso de uma linguagem clara objetiva precisa em que a razatildeo direcione o discurso a ser produzido a fim de que se alcance o principal objetivo no discurso juriacutedico a persuasatildeo Entretanshyto com destaque exaltou um componente indispensaacutevel a ser associado agrave razatildeo a emoccedilatildeo Ora o orador deve envolver emocionar apaixonar o seu auditoacuterio a fim de que este adira com maior rapidez suas teses E como utilizar a linguagem com paixatildeo Uma das estrateacutegias para atingir esse objetivo eacute usar figuras de retoacuterica

71 POR QUE O ESTUDO DAS FIGURAS RETOacuteRICAS

Inicialmente importa compreender o sentido dos termos ldquo figurardquo e ldquo retoacutericardquo a fim de justificar tal estudo neste livro Retoacuterica conforme Reboul1 ldquo eacute a arte de persuadir por meio do discursordquo Adotaremos dentre algumas definiccedilotildees de discurso a seguinte produccedilatildeo verbal oral ou escrita formulada por meio de palavras frases paraacutegrafos que se conectam em

1 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Bencdetti Satildeo Paushylo Martins Fontes 2000 p XIV

162 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

sequecircncia foimando uma unidade de senlido Tal arte eacute exercida ldquo em sishytuaccedilotildees de incerteza e conflito em que a verdade natildeo eacute dada e talvez jamais seja alcanccedilada senatildeo sob a forma de verossimilhanccedilardquo 2 Com efeito em tais situaccedilotildees o embate de teses exige do orador um verdadeiro exerciacutecio criativo mas planejado Esse planejamento visa agrave produccedilatildeo de uma estrashyteacutegia que oriente o orador no embate com seu opositor

Estrateacutegia eficaz pode se estear na teoria de Aristoacuteteles (384-322 aC) Segundo ele a retoacuterica se estrutura em quatro fases que permitem a ordenaccedilatildeo do discurso de maneira a garantir-lhe consistecircncia coerecircncia e clareza Tais fases satildeo assim denominadas a) invenccedilatildeo (reuniatildeo de todos os argumentos e quaisquer meios de persuasatildeo relativos ao tema do disshycurso) b) disposiccedilatildeo (seleccedilatildeo e organizaccedilatildeo dos argumentos) c) elocuccedilatildeo (produccedilatildeo escrita do discurso escolha do estilo da forma como se iraacute comshypor o discurso) d) accedilatildeo (profericcedilatildeo do discurso com o conteuacutedo revestido por determinada forma e auxiliado por recursos de oratoacuteria)

Em capiacutetulos anteriores estudamos estas duas fases invenccedilatildeo e disposiccedilatildeo Neste capiacutetulo abordaremos a elocuccedilatildeo portanto ao estilo agrave forma do dizer mais precisamente a um dos seus aspectos as figuras de retoacuterica Certamente sem o domiacutenio do vernaacuteculo torna-se difiacutecil persuadir um auditoacuterio Isso significa adotar um vocabulaacuterio usual sem arcaiacutesmos ou neologismos Aleacutem disso na busca da clareza e da precisatildeo eacute fundamental ater-se agrave gramaacutetica normativa da liacutengua Entretanto satildeo as figuras que forshynecem um sentido extra ao discurso Dessa forma adornam o estilo com construccedilotildees inesperadas portanto mais aderentes ao auditoacuterio e condenshysam o argumento sintetizando as justificativas das valoraccedilotildees produzidas Segundo Reboul3

A figura eficaz pode ser definida como algo que se desvia da expressatildeo banal mas precisamente por ser mais rica mais expressiva mais eloshyquente mais adaptada numa palavra justa do que tudo que a poderia substituir

Por fim eacute preciso frisar que nem todas as figuras satildeo retoacutericas cujo objetivo eacute funcional jaacute que visam a persuadir um auditoacuterio Haacute aquelas cujo objetivo eacute produzir prazer ou humor etc Vamos portanto nos deter nas figuras retoacutericas analisando seu efeito persuasivo e sua utilizaccedilatildeo no discurso juriacutedico

2 Ibidem p 393 Ibidem p 66

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 163

72 O EFEITO PERSUASIVO DAS FIGURAS DE RETOacuteRICA

Especialmente no texto argumentativo em que o primeiro objetivo do orador eacute estabelecer um viacutenculo com o auditoacuterio deve aquele consshytruir o seu discurso de forma a tornaacute-lo acessiacutevel e atraente Assim aleacutem de planejar o texto escolher os tipos de argumento e elaboraacute-los torna-se imprescindiacutevel utilizar a palavra - ldquoguia de toda accedilatildeo e de todo o pensashymentordquo (Isoacutecrates 439-388 aC) mdash a seu favor explorando-lhe todas as facetas

Para tal tarefa as figuras de retoacuterica segundo Reboul4 desempenham um papel persuasivo isto eacute satildeo mecanismos de que se vale o orador para encaminhar o raciociacutenio do auditoacuterio surpreendendo-o com construccedilotildees criativas numa linguagem viacutevida ou melhor que foge ao comum Obsershyve-se que tal expediente tem ainda por objetivo promover um apelo emoshycional ou motivacional Dessa forma o auditoacuterio receberaacute com surpresa e aguccedilaraacute a sua atenccedilatildeo para as palavras do orador

Natildeo se pode aferir agrave figura retoacuterica a uacutenica funccedilatildeo de evocar prazer ou emocionar o auditoacuterio mas especialmente condensar um argumento que se constitui no proacuteprio enredo No exemplo que se segue isso ficaraacute bem claro O Ministro Ayres Britto ao proferir seu voto sobre a possibilishydade de autorizaccedilatildeo do aborto do feto anenceacutefalo disse ldquoO anenceacutefalo eacute uma crisaacutelida que jamais se transformaraacute em borboletardquo 5

Observe-se que ao comparar o anenceacutefalo a uma crisaacutelida - terceiro estado do ciclo de vida da borboleta em que ainda eacute uma lagarta mas pronta para se transformar em borboleta - objetivou situaacute-lo no mesmo niacutevel de um ser em formaccedilatildeo que se encontra em um estaacutegio intermediaacuterio de vida plena

Entretanto algo os distingue enquanto a crisaacutelida jaacute estaacute madura e completamente formada para se tornar uma borboleta o anenceacutefalo natildeo se formou nem teraacute a possibilidade de se formar plenamente Portanto mais do que evidenciar o que haacute em comum entre ambos (anenceacutefalo e crisaacutelida) desejou o ilustre ministro explicitar aquilo que distingue os dois elementos com o objetivo de persuadir o auditoacuterio sobre a incapacidade de um anenceacutefalo atingir o estaacutegio final de desenvolvimento

4 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Benedetti Satildeo Paushylo Martins Fontes 2000

5 Julgamento da ADPF 54 pelo Supremo Tribunal Federal em 12 de abril de 2012

164 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A ilustraccedilatildeo poderaacute explicitar ainda melhor o que foi dito

Anenceacutefalo sempossibilidade de vida apoacutes deixar o uacutetero materno jaacute que tem ausecircncia parcial ou total de enceacutefalo

possibilidade de vida apoacutes deixar o casulo

jaacute quedesenvolveu-se

plenamente

Crisaacutelida com

Como se observa a aproximaccedilatildeo desses dois elementos aparenteshymente sem algo em comum favoreceu a tese do ex-Ministro Ayres Britto de que o anenceacutefalo eacute um ser fadado agrave morte mesmo que nasccedila com vida Com a figura retoacuterica atenuou-se a dramaticidade do tema ocorrendo o que A BREU (2000 p 74) chama de esfriamento do texto sem no entanshyto atenuar a sua relevacircncia Ademais utilizou-se um repertoacuterio conhecido pelo auditoacuterio universal cuja imagem remete a um ser fraacutegil (borboleta) poreacutem de reconhecida beleza que natildeo alcanccedilaraacute o anenceacutefalo condenashydo prematuramente agrave morte Dessa aproximaccedilatildeo (anenceacutefalo crisaacutelida borboleta) extrai-se uma conclusatildeo incompatiacutevel com a vida condensou- se a tese do orador Certamente o efeito persuasivo obtido com o uso da metaacutefora foi mais intenso do que se o ex-Ministro Ayres Britto tivesse dito apenas o anenceacutefalo eacute um embriatildeo sem expectativa de vida

Pode-se ainda demonstrar como uma figura retoacuterica auxilia a defesa de uma tese encaminhando o raciociacutenio do auditoacuterio na direccedilatildeo determinada pelo orador por meio da prolepse Esse efeito consiste em antecipar um arshygumento do opositor para afirmar sua fragilidade Tal figura eacute muito utilizashyda pelo profissional do direito jaacute que natildeo existe argumentaccedilatildeo se natildeo houver controveacutersia Ademais se o orador estiver atento antevendo os possiacuteveis arshygumentos do seu opositor e voltando-os contra ele surpreenderaacute e o forccedilaraacute a reformular os seus argumentos Um bom exemplo de prolepse foi utilizado por Schreiber ao defender a tese de que seria possiacutevel ampliar a interpretaccedilatildeo do art 953 do Coacutedigo Civil a fim de possibilitar ao magistrado quantificar as indenizaccedilotildees por danos patrimoniais difiacuteceis de serem mensuradas Eis o trecho em comento em que se sublinhou a prolepse

Um observador atento argumentaraacute que a hipoacutetese eacute ainda assim lishymitada agrave conduta que ataquem a honra rdquo da pessoa juriacutedica tema de que trata o caput do art 953 Eacute verdade mas nada impede sua aplicaccedilatildeo analoacutegica aos danos derivados de outras condutas que agridam a pessoa

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 165

juriacutedica como a violaccedilatildeo de segredo industrial O paraacutegrafo uacutenico do art 953 deixaria assim a absoluta inutilidade para assumir o papel de norma oxigenadora da quantificaccedilatildeo das indenizaccedilotildees permitindo ao magistrado arbitrar por si mesmo os danos patrimoniais cuja prova nushymeacuterica se mostrasse extremamente dificultosa (grifo nosso)

Certamente vocecirc deve tecirc-la associado ao argumento de oposiccedilatildeo De fato a prolepse se inclui nesse tipo de argumento Sua particularidade reside no fato de a parte contraacuteria poder ser uma pessoa real ou fictiacutecia Voltaremos agrave anaacutelise do uso e do efeito da prolepse no item 7343

Enfim conforme defende Reboul eacute fundamental conhecer as figushyras retoacutericas e compreender o efeito favoraacutevel ou desfavoraacutevel que podem produzir agrave defesa das nossas teses a fim de interpretaacute-las e utilizaacute-las nas nossas argumentaccedilotildees

73 FIGURAS RETOacuteRICAS MUITO UTILIZADAS NO DISCURSO JURIacuteDICO

E fato que o discurso juriacutedico se utiliza de figuras retoacutericas Dessa forshyma apresentamos algumas dessas figuras sem a pretensatildeo de esgotar o tema mas objetivando a identificaccedilatildeo e os efeitos que elas provocam Destacamos a funccedilatildeo argumentativa das figuras de retoacuterica mais utilizadas no discurso juriacutedico Para tal analisaremos aquelas que se inserem nas figuras de palashyvras figuras de sentido figuras de construccedilatildeo figuras dc pensamento

731 Figuras de palavras

As figuras de palavras referem-se aos significantes que as represenshytam isto eacute aos sons e grafemas pelos quais as identificamos e as distinguishymos umas das outras Ao explorar essa parte fiacutesica das palavras em que o ritmo e o som satildeo destacados pode-se atrair a atenccedilatildeo do auditoacuterio e este receber e aderir ao argumento com mais facilidade

7311 Figuras de ritmo e de som

O ritmo confere musicalidade ao discurso (Reboul) Sabe-se que nos textos destinados agrave propaganda investe-se muito na musicalidade Tal ca-

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA

decircncia pode ser marcada por exemplo pelas siacutelabas tocircnicas e pela extenshysatildeo das siacutelabas das palavras

Aleacutem do ritmo a escolha e a combinaccedilatildeo de sons das palavras tecircm tambeacutem o objetivo de produzir prazer ao puacuteblico a que se destina isto eacute ao consumidor induzindo-o a comprar o produto Seraacute que no discurso juriacutedico caberiam tais estrateacutegias para se conseguir a adesatildeo do auditoacuterio agrave tese do orador O trecho a seguir extraiacutedo do Voto de Ayres Brito refeshyrente ao julgamento da Accedilatildeo Direta de Inconstitucionalidade (A D I) n 4277 e a Arguiccedilatildeo de Descumprimento de Preceito Fundamental (DPF) n 132 que reconheceu a uniatildeo estaacutevel para casais do mesmo sexo responderaacute agrave pergunta

Ayres Britto relator das accedilotildees em reforccedilo agrave sua tese citou Max Scheler6 ldquoO ser humano antes de um ser pensante ou volitivo eacute um ser amanterdquo7

Se quisermos marcar o ritmo destacando a tonicidade do enunciado teriacuteamos o seguinte

O ser humano antes de um ser pensante ou volitivo eacute um ser amanterdquo (3+3+3+3)

Aleacutem do ritmo a musicalidade se manifesta pela rima em ldquoantes pensanteamanterdquo

O argumento de autoridade utilizado pelo ex-Ministro Ayres Britto reforccedila a tese de que a vocaccedilatildeo para amar encontra-se em estado latenshyte no ser humano antes mesmo de adquirir a capacidade de raciocinar Aproveitou-se assim de um argumento em que a mensagem embalada pela harmonia do som das palavras e pelo ritmo da sentenccedila penetra deshylicadamente na consciecircncia do auditoacuterio e reforccedila o significado Segundo Reboul (2000) ldquo as figuras de palavras instauram uma harmonia aparente poreacutem incisiva sugerindo que se os sons se assemelham provavelmente natildeo eacute por acasordquo

ldquo Max Scheler 22 de agosto de 1874 Munique-l9 de maio de 1928 Frankfurt am Main) foi um filoacutesofo alematildeo conhecido por seu trabalho sobre fenomenologia eacutetica e antropologia filosoacutefica O centro de seu pensamento era a sua teoria do valor segundo a qual o ser-valor de um objeto precede a percepccedilatildeo A realidade axioloacutegica dos valores eacute anterior a sua existecircncia Os valores e seus correspondenshytes opostos existem em um ordem objetivardquo (Disponiacutevel em lthttpptwikipedia orgwikiMax_Schelergt Acesso em 02 set 2012)Textos recolhidos de ensaio escrito por Seacutergio da Silva Mendes e a ser publicado no X X Compedi com o nome de ldquoUnidos pelo afeto separados por um paraacutegrashyfordquo a propoacutesito justamente da questatildeo homoafetiva perante o sect 3deg do art 226 da CRFB

7312 A etimologia

Destaque-se ainda que a etimologia eacute considerada figura de palashyvra isto eacute a definiccedilatildeo de um termo com base na sua origem A etimologia representa um argumento retoacuterico Isso porque quando o orador define o sentido de uma palavra objetiva impor esse sentido ao auditoacuterio Foi exashytamente o que fez o ex-Ministro Ayres Britto em trecho do seu voto no julgamento da ADI 4277 e da DPF 132

Vida em comunidade portanto sabido que comunidade vem de lsquolsquocoshymum unidade E como toda comunidade tanto a famiacutelia como a soshyciedade civil satildeo usinas de comportamentos assecuratoacuterios da sobreshyvivecircncia equiliacutebrio e evoluccedilatildeo do Todo e de cada uma de suas partes (grifo nosso)

Observe-se que ao expor a origem da palavra explorando-lhe os sentidos fortaleceu sua tese de que a famiacutelia assim como a sociedade criam comportamentos comuns aos seus membros assegurando a sobrevivecircnciao equiliacutebrio e a evoluccedilatildeo do Todo (sociedade) e daqueles que a compotildeem Com efeito a etimologia foi utilizada com um objetivo funcional valorizar a funccedilatildeo da ceacutelula familiar

732 Figuras de sentido

As figuras de sentido dizem respeito ao significado que uma palavra adota fora do seu uso habitual a fim de enriquecer essa ideia ou ateacute criar outro significado Como o utilizado por exemplo no art 5deg XI da Consshytituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil

A casa eacute asilo inviolaacutevel do indiviacuteduo ningueacutem nela podendo penetrar sem consentimento do morador salvo em caso de flagrante delito ou desastre ou para prestar socorro ou durante o dia por determinaccedilatildeo judicial

Conforme o dicionaacuterio eletrocircnico Houaiss a palavra asilo significa

1 instituiccedilatildeo de assistecircncia social onde satildeo abrigados para sustento eou educaccedilatildeo crianccedilas mendigos doentes mentais idosos etc

2 Derivaccedilatildeo por extensatildeo de sentido proteccedilatildeo amparo seguranccedila Ex depois do divoacutercio buscou a na casa dos pais

168 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Depreende-se que o sentido que se quis dar ao termo ldquo asilordquo conshyforme o dicionaacuterio vai aleacutem daquele atribuiacutedo originariamente agrave palavra Destaque-se que no mesmo dicionaacuterio no verbete destinado agrave palavra ldquocasardquo haacute 27 acepccedilotildees para esse termo mas em nenhuma delas consta o sentido ldquoasilordquo Portanto pode-se considerar que tenha ocorrido uma figura de sentido especificamente uma metoniacutemia Utilizou-se ldquoasilordquo para destashycar uma caracteriacutestica de casa lugar seguro que oferece amparo proteccedilatildeo Justifica-se portanto a proibiccedilatildeo de algueacutem entrar na casa de outrem sem permissatildeo jaacute que tal ato poderia expor ao perigo aquele que se abriga em casa Analisemos algumas dessas figuras

7321 Metoniacutemia

O dicionaacuterio eletrocircnico Houaiss assim define metoniacutemia

Rubrica estiliacutestica linguiacutestica retoacuterica1 figura de retoacuterica que consiste no uso de uma palavra fora do seu contexto semacircntico normal por ter uma significaccedilatildeo que tenha reshylaccedilatildeo objetiva de contiguidade material ou conceituai com o conteuacutedo ou o referente ocasionalmente pensado [Natildeo se trata de relaccedilatildeo compashyrativa como no caso da metaacutefora]Obs cf metalepse antonomaacutesia sineacutedoque

11 relaccedilatildeo metoniacutemica de tipo qualitativo (causa efeito esfera etc) mateacuteria por objeto ouro por lsquodinheirorsquo pessoa por coisa autor por obra adora Portinari por lsquoa obra de Portinarirsquo divindade esfera dc suas funccedilotildees proprietaacuterio por propriedade vamos hoje ao Venacircncio por lsquoao restaurante do Venacircnciorsquo morador por morada continente pelo conteuacutedo bebeu uma garrafa de aguardente por lsquoa aguardente de uma garrafarsquo consequecircncia pela causa respeite os meus cabelos brancos por lsquoa minha velhicersquo a qualidade pelo qualificado praticar a caridade por ldquo atos de caridaderdquo etc

Considere-se portanto haver metoniacutemia quando se substitui palavra por outra por se perceber entre ambas uma semelhanccedila objetiva concreta de contiguidade Tal semelhanccedila permite associar com facilidade a palashyvra utilizada pela que foi substituiacuteda Com efeito quando Gustavo Tepedi- no registrou ldquo com a entrada em vigor do Coacutedigo Civil de 2002 debruccedila- -se a doutrina na tarefa de construccedilatildeo de novos modelos interpretativosrdquo pretendia se referir aos ldquodoutrinadoresrdquo termo facilmente detectaacutevel pela

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 169

leitura Ora mas por que preferiu a palavra doutrina Certamente por preshytender evidenciar o produto do esforccedilo interpretativo de juristas e filoacutesofos do direito que objetivam esclarecer conceitos propor novos paracircmetros e caminhos para soluccedilotildees razoaacuteveis e justas

Observe-se o uso retoacuterico da metoniacutemia neste trecho do julgamento da AD I 4277 e da DPF 132 em que o ex-Ministro Ayres Britto objetiva persuadir o auditoacuterio acerca da importacircncia da famiacutelia independentemente do sexo de seus membros para a formaccedilatildeo de valores morais da pessoa com ecircnfase na toleracircncia concepccedilatildeo reforccedilada no final do trecho

Afinal eacute no regaccedilo da famiacutelia que desabrocham com muito mais viccedilo as virtudes subjetivas da toleracircncia sacrifiacutecio e renuacutencia adensadas por um tipo de compreensatildeo que certamente esteve presente na proposiccedilatildeo spnozista de que ldquo nas coisas ditas humanas natildeo haacute o que crucificar ou ridicularizar Haacute soacute o que compreenderrdquo (grifo nosso)

Conforme o dicionaacuterio Houaiss ldquo regaccedilordquo significa

Substantivo masculino1 parte do corpo que vai da cintura aos joelhos na posiccedilatildeo sentada colo2 concavidade formada pela saia ou avental que se suspende para coshylocar algo3 Derivaccedilatildeo sentido figurado espaccedilo meacutedio interior4 Derivaccedilatildeo sentido figurado lugar em que se repousa ou que serve de abrigo

Certamente no trecho destacado do voto o sentido 4 do verbete foi o pretendido Isso porque considerando-se a famiacutelia como um abrigo onde a pessoa encontra proteccedilatildeo suficiente para desenvolver valores esta deve ser reconhecida e valorizada

Quanto agrave segunda metoniacutemia destacada ldquo crucificarrdquo note-se que o verbo remete agrave cruz siacutembolo do sacrifiacutecio de Cristo Com o uso desse verbo destaca-se o siacutembolo natildeo a accedilatildeo de prender algueacutem em uma cruz Certamente esta segunda compreensatildeo natildeo seria a esperada de um leitor atento Entende-se pois que o orador desejou evidenciar o sentido ldquo estigshymatizarrdquo contido no verbo crucificar Assim objetivou persuadir o auditoacuterio de que essa atitude demonstra extrema falta de sentimento de compaixatildeo A forccedila argumentativa da metoniacutemia encontra-se na simbologia da palavra

170 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

empregada em substituiccedilatildeo agravequela que representa Conforme Reboul ldquoa metoniacutemia cria siacutembolos como por exemplo a foice e o martelo a rosa e a cruz Nesse sentido condensa um argumento fortiacutessimordquo

7322 Metaacutefora

Na metaacutefora associam-se dois termos completamente distintos compashyram-se ambos e se extrai algo em comum entre eles Estabelecido o viacutenculo um termo substitui o outro Observe-se que a identificaccedilatildeo dessa semelhanccedila eacute subjetiva isto eacute depende exclusivamente da interpretaccedilatildeo daquele que esshytabelece a aproximaccedilatildeo Por conseguinte a criatividade eacute uma caracteriacutestica marcante da metaacutefora E justamente essa criatividade que conforme Reboul ldquo permite entender o poder argumentativo da metaacuteforardquo Com efeito em senshytenccedila referente ao Processo n 2003001050626-8 em que ajuiacuteza critica a forshyma como o autor dispocircs seus argumentos considerando-os preconceituosos observa-se que a utilizaccedilatildeo da metaacutefora expressa claramente sua indignaccedilatildeo

Esses poreacutem e infelizmente satildeo os momentos mais comedidos do aushytor quando comparados a outros em que as suas erupccedilotildees discriminatoacuteshyrias assumem contornos de bravatas histeacutericas e francamente ofensivas (grifo nosso)

O sentido da palavra ldquo erupccedilatildeordquo adapta-se perfeitamente agrave avaliaccedilatildeo da juiacuteza ao excesso cometido pelo autor em sua peticcedilatildeo inicial Certamente o auditoacuterio reconheceraacute que o termo estaacute ligado agrave geologia isto eacute significa a emissatildeo de materiais magmaacuteticos por um vulcatildeo Entretanto considerando todo o processo discursivo natildeo estranharaacute o seu uso Ademais o termo meshytafoacuterico sintetiza o argumento da juiacuteza da falta de controle do autor sob suas emoccedilotildees da mesma forma que natildeo se controla a larva de um vulcatildeo

7323 Hipeacuterbole

Conforme Reboul ldquo a hipeacuterbole eacute a figura do exagerordquo Sua utilizaccedilatildeo objetiva intensificar o que se diz a fim de se atenuar o que se tem a intenshyccedilatildeo de dizer Nas palavras de Fiorin ldquo quando se intensifica no enunciado e se atenua na enunciaccedilatildeordquo Entenda-se enunciado como aquilo que se diz o material concreto do discurso Enunciaccedilatildeo diz respeito ao como se diz ao significado que o autor do discurso deseja transmitir isto eacute agrave intenccedilatildeo comunicativa do orador

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 171

Assim quando o juiz Joatildeo Baptista Herkenhoiacutef no despacho de 09081978 no Processo ndeg 3775 da la Vara Criminal de Vila Velha (ES) registrou ldquoeste Juiz renegaria todo o seu credo rasgaria todos os seus prinshyciacutepios trairia a memoacuteria de sua matildee se permitisse sair Edna deste Foacuterum sob prisatildeordquo sem duacutevida exagerou ao enunciar que ldquo renegaria todo o seu creshydordquo que ldquo rasgaria todos os seus princiacutepiosrdquo e que ldquo renegaria a memoacuteria de sua matildeerdquo jaacute que sua intenccedilatildeo natildeo alcanccedila tal amplitude Na verdade deseja angariar a adesatildeo do auditoacuterio agrave tese de absolviccedilatildeo da reacute mesmo existindo provas contra Para atingir tal objetivo registra o quatildeo fora de propoacutesito eacute a condenaccedilatildeo da mesma forma que seria um excesso praticar as accedilotildees por ele enunciadas Dessa maneira o auditoacuterio eacute induzido a admitir sua tese

Enfim a hipeacuterbole tem por objetivo ldquo levar agrave proacutepria verdade e de lixar atraveacutes do que ela diz de incriacutevel aquilo que eacute realmente preciso crerrdquo (Reboul)

7324 Eufemismo

O eufemismo eacute o oposto da hipeacuterbole jaacute que o orador procura atenuar aquilo que a enunciaccedilatildeo enfatiza Buscam-se palavras que amenizem o que estaacute sendo enunciado ldquo simulando moderaccedilatildeo para afirmar de maneira enshyfaacuteticardquo (Fiorin) Com essa estrateacutegia argumentativa o orador dissimula aquilo que realmente deseja fazer crer

Acrescente-se que tal dissimulaccedilatildeo demonstra a preocupaccedilatildeo do orashydor de transmitir ao auditoacuterio uma imagem de polidez sensibilidade Natildeo se pode olvidar que a forma como o auditoacuterio o avalia eacute determinante para que se torne mais permeaacutevel agraves palavras deste Assim o orador investe no ethos - o seu caraacuteter sua imagem - jaacute que conquistaraacute com mais facilidade o auditoacuterio se for considerado honesto educado e tambeacutem no logos - na forma como enuncia os argumentos

Como exemplo de eufemismo destaca-se a criacutetica publicada no jorshynal O Estado de S Paulo do ministro Marco Aureacutelio agrave forma como o mishynistro Joaquim Barbosa reagiu ao voto do ministro Ricardo Lewandowski revisor da Accedilatildeo Penal 470 favoraacutevel ao desmembramento do processo - o envio das denuacutencias contra os que natildeo tecircm prerrogativa de foro agrave primeira instacircncia nos primeiros dias do julgamento da Accedilatildeo Penal 4708

Consultor Juriacutedico 4 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lt httpwwwconjurcom br2012-ago-04marco-aurelio-temer-joaquim-barbosa-presidencia-supremogt Acesso em 02 set 2012

172 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 173

Natildeo gostei pela falta de urbanidade do relator Precisamos discutir ideias natildeo deixando descambar para o lado pessoal Mc assusta o que podemos ter apoacutes novembro (quando Joaquim Barbosa assumiraacute a preshysidecircncia do STF) Costumo dizer que o presidente (do STF) tem de ser um algodatildeo entre cristais natildeo pode ser metal entre cristais

Observa-se a preocupaccedilatildeo do ministro Marco Aureacutelio em escolher as palavras a fim de proteger a sua imagem e de atenuar o impacto de sua criacutetica sem no entanto expressar o quanto desaprova a atitude do colega Destaque-se que o ministro Marco Aureacutelio preferiu dizer que houve ldquo falta de urbanidaderdquo em vez de dizer que o ministro Joaquim Barbosa teria sido grosseiro Em seguida utilizou uma metaacutefora insinuando possivelmente que o colega seria comparaacutevel a um ldquo metal entre cristaisrdquo Embora tenha utilizado um eufemismo contido na metaacutefora a enunciaccedilatildeo reforccedila a deshysaprovaccedilatildeo

dade privada como espaccedilo de liberdade individual e tendencialmente absoluta do titular do domiacutenio9 (grifo nosso)

Com efeito a Constituiccedilatildeo da Reptiblica Federativa do Brasil de 1988 passou a priorizar o coletivo em detrimento ao individual Dessa forma o aparente paradoxo se desfaz jaacute que a noccedilatildeo individualista de propriedade natildeo mais corresponde ao ideal constitucional

7326 Antiacutetese

A antiacutetese estabelece oposiccedilotildees de termos ou de temas num determishynado contexto Como figura retoacuterica objetiva enaltecer um dos termos ou tema que se opotildee ao outro Tal objetivo se observa no seguinte trecho de Fachin

7325 Paradoxo

E muito comum unir termos de sentido contraditoacuterio na mesma unishydade de sentido a fim de demonstrar algum conflito existente Essa estrateacuteshygia argumentativa provoca um estranhamento no auditoacuterio exigindo que se detenha na anaacutelise do contraditoacuterio e extraia desse conflito uma conclusatildeo isto eacute uma tese Um exemplo disso foi a assertiva de Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber extraiacuteda do artigo A garantia de propriedade no direito brasileiro em que fazem referecircncia agrave ultrapassada concepccedilatildeo de propriedade privada Destacam que se adotada tal concepccedilatildeo seria contrashyditoacuterio o artigo 170 da Constituiccedilatildeo Federal que dispotildee

Art 170 A ordem econocircmica fundada na valorizaccedilatildeo do trabalho humano e na livre iniciativa tem por fim assegurar a todos existecircncia digna conforshyme os ditames da justiccedila social observados os seguintes princiacutepiosII - propriedade privada

III - funccedilatildeo social da propriedade (grifo nosso)

Assim se posicionam os juristas sobre o tema

1- Transitar10Resta enfrentar sem delongas nomeadamente agora com o novo Coacutedishygo Civil brasileiro o desafio que consiste em trocar praacuteticas de medievo pelos saberes construiacutedos agraves portas do terceiro milecircnio Este eacute apenas o singelo ponto de partidaPrograma para arguir questionando-se numa esperanccedila interrogativa aberta natildeo cadastrada pelo dogmatismo juriacutedico endereccedilando-se para todos os niacuteveis que se proponham novos no porvir contiacutenuo de um proshyjeto em permanente edificaccedilatildeo Um novo Direito Civil a partir de seus pilares fundamentais o contrato o projeto parental e as titularidades eacute a proposta do tempo que se faz agora siacutentese do passado que restou e do futuro ainda por se estabelecer Os sinos dobram para reconhecer o fim da concepccedilatildeo insular do ser humano e o liame indissociaacutevel entre Direishyto e criacutetica na releitura de estatutos fundamentais do Direito PrivadoNo horizonte a vencer o que se diz eacute tatildeo relevante quanto como se diz Daiacute a perspectiva inadiaacutevel de revirar a praxe didaacutetica Sair da clausura dos saberes postos agrave reproduccedilatildeo e ir aleacutem das restriccedilotildees que o molde deforma A produccedilatildeo das regras de direito como ato de nascimento da vida e natildeo certidatildeo de oacutebito a ser estampada no museu das praxes

A referecircncia corriqueira agrave ldquofunccedilatildeo social da propriedade privadardquo exshyplica-se pelo fato de que eacute neste acircmbito que a funcionalizaccedilatildeo opera de forma mais revolucionaacuteria afastando a tradicional noccedilatildeo da proprie-

9 Disponiacutevel em lthttpwwwfdcbrArquivosMestradoRevistasRevista06Docen- te04pdfgt Acesso em 02 set 2012

10 FACHIN Luiz Edson Teoria criacutetica do direito civil agrave luz do novo Coacutedigo Civil Brasileiro 2 ed rev e atual Rio de Janeiro Renovar 2003 p 6-8

174 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

O texto acima repousa na antiacutetese isto eacute na oposiccedilatildeo entre os pilares do antigo Coacutedigo Civil e os do novo Coacutedigo Observa-se que ao antigo coacutedigo satildeo atribuiacutedas ideias com sentido negativo jaacute ao novo coacutedigo o sentido eacute positivo Tem-se a seguinte oposiccedilatildeo

COacuteDIGO CIVIL DE 1916 COacuteDIGO CIVIL DE 2002

Praacuteticas de medievo Saberes construiacutedos agraves portas do terceiro milecircnioDogmatismo juriacutedico Projeto em permanente edificaccedilatildeoPassado FuturoClausura dos saberes postos agrave reproduccedilatildeo

Ir aleacutem das restriccedilotildees que o molde deforma

Certidatildeo de oacutebito Ato de nascimento da vida

Como se pode concluir a antiacutetese representa uma estrateacutegia argu- mentativa muito produtiva chegando a constituir o fio condutor do texto

7327 Personificaccedilatildeo

A personificaccedilatildeo transfere para seres irracionais ou inanimados accedilotildees ou atributos restritos aos seres humanos Tal estrateacutegia argumentativa aleacutem de atrair a atenccedilatildeo do auditoacuterio transfere responsabilidades exclusivas do homem agravequeles que por natureza satildeo incapazes de possuiacute-las Dessa forshyma ao atribuir por exemplo responsabilidades a uma empresa comercial considerando-a ldquo pessoardquo juriacutedica personifica-se essa empresa e conseshyquentemente torna-a suscetiacutevel de direitos e deveres

Em muitos textos argumentativos eacute possiacutevel extrair exemplos que ilusshytram a personificaccedilatildeo Eis um deles utilizado por Luiz Edson Fachin11

2 Porque os Ventos Sopram do Direito Civil Exilado no Inadiaacutevel FuturoTem-se como objeto desse exame o modelo que inspirou os sistemas latinos a forjar uma ldquoconstruccedilatildeo do homem privadordquo e a rejeitar no laissez-faire a verdadeira dimensatildeo da equidade que supotildee simultaneashymente igualdade e diferenciaccedilatildeo E o legado desse sistema que teima em recusar a travessia do indiviacuteduo sujeito e do sujeito agrave cidadania Explicitar essa demarcaccedilatildeo dos fatos reconhecer a teia de relaccedilotildees nem

11 FACHIN Luiz Edson Teoria criacutetica do direito civil agrave luz do novo Coacutedigo Civil Brasileiro 2 ed rev e atual Rio de Janeiro Renovar 2003 p 11

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 175

sempre inoxidaacutevel e expor a caracteriacutestica construtiva das relaccedilotildees bem pode embalar um projeto e um desafio (grifo nosso)

Na personificaccedilatildeo destacada atribui-se ao sistema latino uma accedilatildeo proacutepria dos seres humanos teimar Eacute uma forma de direcionar o foco da alenccedilatildeo daqueles que se utilizam do sistema transferindo-a para o proacuteprio sistema objeto de estudo e de atualizaccedilatildeo

733 Figuras de construccedilatildeo

As figuras de construccedilatildeo tambeacutem denominadas figuras de sintaxe representam alteraccedilotildees que se promovem na estrutura do periacuteodo a fim de ulcanccedilar determinado efeito persuasivo Isso ocorre mediante a inversatildeo dos elementos da omissatildeo de algum termo ou da sua repeticcedilatildeo

7331 Inversatildeo

A ordem direta dos termos no periacuteodo segue a seguinte sequecircncia sushyjeito verbo complementos adjuntos adverbiais A alteraccedilatildeo dessa ordem convencional desperta maior atenccedilatildeo do auditoacuterio para o termo deslocado no periacuteodo Geralmente quando o orador desloca um termo para o iniacutecio do periacuteodo deseja atribuir-lhe mais destaque enfatizar o seu sentido Isso se verifica no seguinte trecho extraiacutedo do voto do ex-Ministro Ayres Britto no julgamento da ADI n 4277 e da DPF n 132

Realmente em tema do concreto uso do sexo nas trecircs citadas funccedilotildees de estimulaccedilatildeo eroacutetica conjunccedilatildeo carnal e reproduccedilatildeo bioloacutegica a Consshytituiccedilatildeo brasileira opera por um intencional silecircncio Que jaacute eacute um modo de atuar mediante o saque da kelseniana norma geral negativa ()

O citado trecho inicia-se com um adjunto adverbial de afirmaccedilatildeo (realmente) em seguida outro adjunto adverbial de assunto (em tema do concreto uso do sexo nas trecircs citadas funccedilotildees de estimulaccedilatildeo eroacutetica conshyjunccedilatildeo carnal e reproduccedilatildeo bioloacutegica) Soacute depois dos adjuntos adverbiais registrou-se o sujeito (Constituiccedilatildeo brasileira) A inversatildeo se justifica em funccedilatildeo da intenccedilatildeo do orador de enfatizar o silecircncio sobre esses temas pela Constituiccedilatildeo brasileira Destacar tal silecircncio demonstra ser o mais imporshytante para o orador a fim de associaacute-lo ao conceito de ldquonorma geral negashytivardquo elemento essencial para a sua tese

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

7332 Quiasmo

Quiasmo eacute uma inversatildeo com repeticcedilatildeo dos termos invertidos Seshygundo Rcboul essa figura retoacuterica segue a combinaccedilatildeo AB-BA A invershysatildeo associada agrave repeticcedilatildeo acentua a implicaccedilatildeo de sentido entre os termos Aleacutem disso permuta entre eles a funccedilatildeo de tema do enunciado

O quiasmo foi utilizado no seguinte trecho da Accedilatildeo Direta de Tncons- titucionalidade proposta pelo entatildeo Procurador-Geral da Repuacuteblica Dr Claacuteudio Lemos Fonteles tendo por alvo o art 5 o da Lei Federal 11105 (ldquo Lei da Biosseguranccedilardquo ) de 24 de marccedilo de 2005 de quem foi relator o Ministro Ayres Britto

Convenhamos Deus fecunda a madrugada para o parto diaacuterio do sol mas nem a madrugada eacute o sol nem o sol eacute a madrugada Natildeo haacute processo judicial contencioso sem um pedido inicial de prolaccedilatildeo de sentenccedila ou acoacuterdatildeo mas nenhum acoacuterdatildeo ou sentenccedila judicial se confunde com aquele originaacuterio pedido Cada coisa tem o seu momenshyto ou a sua etapa de ser exclusivamente ela no acircmbito de um processo que o Direito pode valorar por um modo tal que o respectivo cliacutemax (no caso a pessoa humana) apareccedila como substante em si mesmo Esshypeacutecie de efeito sem causa normativamente falando ou positivaccedilatildeo de uma fundamental dicotomia entre dois planos de realidade o da vida humana intrauterina e o da vida para aleacutem dos escaninhos do uacutetero materno tudo perfeitamente de acordo com a festejada proposiccedilatildeo kelseniana de que o Direito tem propriedade de construir suas proacuteprias realidades (grifo nosso)

Observe-se que com a inversatildeo de termos repetidos demonstra-se a impossibilidade de considerar um idecircntico ao outro embora haja uma imshyplicaccedilatildeo de sentido entre eles Assim reforccedila a ideia de que o ser enquanto se encontra na vida intrauterina estaacute em um plano completamente distinto daquele que jaacute nasceu

7333 Reticecircncias

Conforme Reboul

para incitar o outro a retomaacute-lo por sua conta a preencher por sua conta os trecircs pontos de suspensatildeo

Com efeito observa-se que no trccho a seguir a suspensatildeo do disshycurso teve por objetivo evitar conflito mas deixou para o auditoacuterio a funshyccedilatildeo de concluir o que natildeo foi dito O exemplo que se segue refere-se agrave criacutetica do Ministro Joaquim Barbosa relator do processo do ldquomensalatildeordquo no Supremo Tribunal Federal (STF) aos advogados que ldquo o acusaram de atuar com parcialidade na conduccedilatildeo da accedilatildeo penal O ministro tambeacutem se indispocircs com os proacuteprios colegas que natildeo acataram a proposta de retaliashyccedilatildeo a esses advogados sugerida por elerdquo 12 Seguem os trechos que expotildee a suspensatildeo do discurso

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA

O posicionamento da maioria da Corte desagradou o relator que disse que a honra do Tribunal foi atacada e natildeo apenas a sua ldquo Cada paiacutes tem o modelo de Justiccedila que merece Se [a Justiccedila] se deixa agredir se deixa ameaccedilar por uma guilda profissional nunca se sabe qual eacute o fim que lhe eacute reservadordquoO ministro Marco Aureacutelio respondeu ao colega que natildeo se sentiu atashycado pelas ofensas o que provocou nova reaccedilatildeo de Barbosa ldquoFossa Excelecircncia talvez faccedila parte rdquo disse o ministro sem concluir o racioshyciacutenio (grifo nosso)

7334 Repeticcedilatildeo

Geralmente orienta-se o aprendiz na arte de escrever que evite repeshyticcedilatildeo de palavras Entretanto haacute ocasiotildees em que a repeticcedilatildeo tem objetivo retoacuterico Segundo Perelman e Olbrechts-Tyteca a repeticcedilatildeo reforccedila o conshyteuacutedo enunciado provocando um efeito de presenccedila e sugerindo distinccedilotildees Provoca-se o efeito de presenccedila quando o objeto do discurso eacute assimilado pela consciecircncia do auditoacuterio levando-o a refletir e reter a ideia do orador Quanto agrave sugestatildeo de distinccedilotildees tal efeito se opera em razatildeo de o segundo elemento enunciado do termo ter seu sentido intensificado e adquirir um valor distinto do primeiro

A aposiopese ou reticecircncias interrompe a frase para passar ao auditoacuteshyrio a tarefa de complementaacute-la figura por excelecircncia da insinuaccedilatildeo do despudor da caluacutenia mas tambeacutem do pudor da admiraccedilatildeo do amor sua forccedila argumentativa adveacutem do fato de retirar o argumento do debate

Mateacuteria disponiacutevel em lthttpagenciabrasilebccombrnoticia2012-08-15joa- quim-barbosa-se-indispoe-com-advogados-e-ministros-do-stf-apos-acusacao-de- parcialidade-no-mensalagt Acesso em 20 ago 2012

178 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Notam-se tais efeitos no seguinte trecho de uma sentenccedila13 em que o juiz atribui aos oacutergatildeos puacuteblicos e agrave comunidade a responsabilidade de o reacuteu um deficiente auditivo ter cometido atos iliacutecitos

O Judiciaacuterio o encaminhou para todos os oacutergatildeos e instituiccedilotildees possiacuteveis ameaccedilou prender Diretoras de Escolas que natildeo o aceitavam mas tamshybeacutem natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquo Mudinhordquo

A comunidade natildeo fez nada por ele

O Municiacutepio natildeo fez nada por eleO Estado Brasileiro natildeo fe z nada por eleHoje BSS tem 21 anos eacute maior de idade e pratica crimes contra o patrimocircshynio dos membros de uma comunidade que natildeo cuidou dele (grifo nosso)

Como se pode observar a repeticcedilatildeo fixa na mente do auditoacuterio o deshysamparo a que ficou exposto o reacuteu Aleacutem disso a cada repeticcedilatildeo se torna mais grave a omissatildeo daqueles que tinham a obrigaccedilatildeo de zelar pelo jovem especialmente por se tratar de um deficiente auditivo responsabilizando-os pelos atos praticados por ele

7335 Gradaccedilatildeo

Na gradaccedilatildeo apresentam-se ldquo as palavras na ordem crescente de extenshysatildeo ou importacircnciardquo (Reboul) ou na ordem decrescente conforme a intenshyccedilatildeo do orador conduzindo o auditoacuterio paulatinamente no sentido evolutivo ou regressivo conforme os fatos atos ou omissotildees tenham gerado No exemshyplo anterior observa-se aleacutem da repeticcedilatildeo a gradaccedilatildeo Isso porque o juiz registra de forma crescente a ausecircncia da ldquo comunidaderdquo do ldquo Municiacutepiordquo do ldquo Estadordquo levando o auditoacuterio a concluir que ningueacutem fez algo pelo reacuteu

734 Figuras de pensamento

Considera-se figura de pensamento aquela que extrai do discurso como um todo a intenccedilatildeo daquele que produz o enunciado Portanto equishyvale agrave enunciaccedilatildeo

13 BRASIL Processo n 1863657-42008 Autor Ministeacuterio Puacuteblico Estadual Reacuteu BSS Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr200810juiz_condena_acusado_ furto_procurar_empregogt

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 179

7341 Ironia

A ironia consiste em afirmar algo no enunciado e negar na enunciashyccedilatildeo isto eacute aquilo que o orador diz eacute o oposto do que pretende fazer acreshyditar Na verdade o auditoacuterio pode interpretar literalmente o enunciado e natildeo perceber a intenccedilatildeo do orador Cabe ao orador entatildeo fornecer pistas que orientem o auditoacuterio a decifrar sua real intenccedilatildeo Mas para que isso ocorra eacute preciso que ele seja perspicaz a ponto de deduzir a competecircncia do auditoacuterio para perceber a criacutetica ou a denuacutencia dissimulada no discurso Na verdade a ironia fina deixa ao inteacuterprete sempre alguma duacutevida sobre a real intenccedilatildeo do orador

Ademais a ironia ldquo denuncia a falsa seriedade em nome de uma seshyriedade superior - a da razatildeo do bom senso da moral - o que coloca o ironista bem acima daquilo que ele criticardquo 14 como se observa na resposta do ex-Ministro Carlos Ayres Britto ao Ministro Ricardo Lewandowski no julgamento em que se discutia se a ex-companheira de um homem casado tinha direito agrave metade da pensatildeo que a viuacuteva recebia No Acoacuterdatildeo do STF- RE 397762-8 o Ministro Lewandowski natildeo reconhecia como uniatildeo esshytaacutevel a relaccedilatildeo mantida entre o de ciijus e a autora Assim pronunciou-se Lewandowski

() eacute uma comunhatildeo de leitos ao passo que a uniatildeo estaacutevel eacute uma comunhatildeo de vidas eacute uma parceria eacute um companheirismo Quer me parecer eminente Ministro Carlos Ayres Brito que quem manteacutem duas famiacutelias uma legal e outra na clandestinidade natildeo estaraacute dando publishycidade a essa segunda famiacutelia

Resposta do ex-Ministro Ayres Britto

Vossa Excelecircncia me permite Sempre fico mimoseado presenteado com intervenccedilotildees e votos tatildeo brilhantes mas digo simplesmente que a definiccedilatildeo de concubinato como mero ldquo dormir juntosrdquo natildeo se aplica a quem dormiu junto durante trinta anos E segundo eacute impossiacutevel manter uma relaccedilatildeo de trinta anos agraves escondidas clandestinamente Certamente essa uniatildeo era puacuteblica e notoacuteria De qualquer forma rendo minhas hoshymenagens a Vossas Excelecircncias em conjunto

14 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Benedetti Satildeo Paulo Martins Fontes 2000 p 133

180 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Com efeito o ex-Ministro Ayres Britto no iniacutecio de sua reacuteplica enalshytece o discurso do seu opositor Em seguida por meio de fatos demonstra o quatildeo incoerentes foram os argumentos usados pelo colega No desfecho volta a enaltecer natildeo apenas ao Ministro Lewandowski mas tambeacutem aos demais que se opotildeem a ele Nota-se a ironia pelo exagero dos elogios seguidos de afirmaccedilotildees que comprovam o oposto do que afirmara Tais afirmaccedilotildees denotam bom senso que deveria prevalecer acima do que diz o artigo 226 da CRFB

A famiacutelia base da sociedade tem especial proteccedilatildeo do Estado sect 3deg Para efeito da proteccedilatildeo do Estado eacute reconhecida a uniatildeo estaacutevel entreo homem e a mulher como entidade familiar devendo a lei facilitar sua conversatildeo em casamento

No caso citado a maioria dos ministros entendeu que em razatildeo de o falecido conviver com a esposa e com aquela que jamais poderia assumir como esposa esta soacute poderia ser reconhecida como concubina natildeo sendo admitida como companheira em uniatildeo estaacutevel conforme o art 1727 ldquoAs relaccedilotildees natildeo eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar constituem concubinatordquo

7342 Pretericcedilatildeo

Em determinadas situaccedilotildees o orador simula que natildeo iraacute dizer algo procurando proteger a sua imagem ou surpreender o auditoacuterio captando a sua atenccedilatildeo Isso ocorre em especial quando o auditoacuterio natildeo demonstra muita afinidade com a tese do orador

Pode-se verificar o uso de tal recurso retoacuterico pelo advogado de deshyfesa de Joseacute Dirceu Dr Joseacute Luiacutes Oliveira Lima no dia 07082012 na Accedilatildeo Penal 470 Ele afirmou

Natildeo vim pedir absolviccedilatildeo de Joseacute Dirceu pela sua histoacuteria ou passado de 40 anos de vida puacuteblica sem qualquer maacutecula ou mancha Natildeo peccedilo porque aqui natildeo eacute a casa para isso natildeo estou no Congresso Nacional Peccedilo absolviccedilatildeo de Joseacute Dirceu com base na prova dos autos e no devishydo processo legal

Ciente de que a opiniatildeo puacuteblica estaacute contra seu cliente e que a acusashyccedilatildeo foi incisiva ao avaliaacute-lo recorre ao argumento de fuga sem contudo dizer que o faraacute Diz que natildeo mencionaraacute o passado de Joseacute Dirceu mas o

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 181

faz Assim consegue que o auditoacuterio avesso aos seus argumentos se tome permeaacutevel agraves suas palavras

7343 Prolepse

Como jaacute dito anteriormente soacute existe argumentaccedilatildeo quando haacute conshyflito de ideias e de interesses E importante pois que o orador lenha ciecircncia da tese que se opotildee agrave sua e dos argumentos que a fundamentam Por essa razatildeo encontra-se presente em todo texto argumentativo a prolepse tamshybeacutem conhecida como figura de argumento jaacute que manteacutem um viacutenculo entre estilo e argumentaccedilatildeo Tal recurso consiste em antecipar o argumento (real ou fictiacutecio) do opositor para voltaacute-lo contra ele Dessa forma o orador surpreende o seu opositor intui um possiacutevel argumento e desarticula o seu discurso obrigando-o a rever suas estrateacutegias como no trecho a seguir

Algueacutem diraacute que nessa busca da verdade real ele pode prejudicar o reacuteu Ora essa A verdade quando procurada pelo juiz interessado em natildeo errar natildeo eacute condicionada para de antematildeo beneficiar ou prejushydicar E natildeo prejudica realmente quando desfavoraacutevel ao reacuteu porque juntada essa prova aos autos o defensor do acusado pode impugnaacute-la mostrando sua fragilidade ou anexando prova contraacuteria O contraditoacuterio na prova eacute sagrado e nenhum juiz normal se atreve a afrontar esse prinshyciacutepio (grifo nosso)15

Na reacuteplica poreacutem em que o orador conhece o argumento do seu oposhysitor e tem como objetivo refutaacute-lo tambeacutem parte desse argumento para expor com maior consistecircncia seu ponto de vista No exemplo a seguir referente agrave Accedilatildeo Penal 470 o trecho da defesa do ex-ministro dos Transshyportes Anderson Adauto acusado de ter recebido R$ 950 mil do esquema de Marcos Valeacuterio utiliza tal estrateacutegia Expocircs o advogado Roberto Pa- gliuso

O Ministeacuterio Puacuteblico para tentar imputar o crime de lavagem de dishynheiro a Anderson faz uma suposiccedilatildeo na denuacutencia de que ele tinha pleno conhecimento de todos os crimes praticados pelos integrantes da quadrilha E no paraacutegrafo seguinte o Ministeacuterio Puacuteblico enfatiza natildeo apenas pleno conhecimento mas profundo conhecimento Eu li atentashy

15 RODRIGUES Francisco Cesar Pinheiro O juiz deve ser um apaacutetico espectador ou buscar a verdade real Disponiacutevel em lthttpjusvicomartigos43355gt Acesshyso em 02 set 2012

182 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

mente o voto do ministro Joaquim Barbosa quando recebeu a denuacutencia Ele afirmava que existe prova miacutenima que viabiliza o iniacutecio da accedilatildeo penal Para condenar eacute necessaacuteria a existecircncia de prova maacutexima que decirc seguranccedila ao magistrado que garante a sua formaccedilatildeo de convicccedilatildeo - disse o advogado () (grifo nosso)

Como se observou no trecho transcrito o advogado de defesa reshygistrou o argumento de acusaccedilatildeo - sublinhado no trecho - para estruturar a defesa da sua tese sobre aquilo que considerou falho nessa acusaccedilatildeo a existecircncia de prova miacutenima

Capiacutetulo VIII

PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

O Parecer eacute uma peccedila textual de aspecto formal proacuteprio redigida por autoridade competente que emite uma opiniatildeo de teor natildeo vinculativo sobre o assunto consultado A autoridade a que nos referimos pode ser por exemplo na esfera privada um advogado com notoacuterio conhecimento juriacutedico na esfera puacuteblica um membro do Ministeacuterio Puacuteblico

Acrescente-se que o conteuacutedo de um parecer ldquo diz respeito a probleshymas juriacutedicos teacutecnicos ou administrativosrdquo 1 Tal peccedila tem como uacutenico obshyjetivo manifestar uma opiniatildeo em razatildeo de uma provocaccedilatildeo isto eacute de uma consulta Para que cumpra esse objetivo eacute importante a produccedilatildeo de uma peccedila em que se adote uma estrutura formal tiacutepica

81 A ESTRUTURA DE UM PARECER JURIacuteDICO TEacuteCNICO- -FORMAL

Natildeo existe forma definida por qualquer dispositivo legal para apreshysentaccedilatildeo de um parecer [] A CRFB art 129 V III e a Lei Orgacircnica Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico (Lei n 862593 conhecida pela sigla LONMP) recomendam (art 43 III) que eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico sempre indicar os fundamentos juriacutedicos em seus pronunciamentos processhysuais Aliaacutes ressalte-se nenhum parecer pode deixar de ter fundamentos2

Assim entendemos que a praacutetica reiterada na produccedilatildeo do parecer com uma determinada estrutura serve de orientaccedilatildeo aos que pretendem emitir

1 DURAtildeO Pedro Teacutecnica de parecer Como fazer um diciacuteamen juriacutedico Curitiba Juruaacute 2012 p 27REVISTA REDACcedilAtildeO JURIacuteDICA a palavra do advogado Rio de Janeiro Edipa Ltda ndeg 8 2004

184 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Ademais a semelhanccedila de estrutura com a do acoacuterdatildeo eacute justificada por um dos seus objetivos orientar uma decisatildeo de instacircncia superior como fazem os Procuradores de Justiccedila

0 parecer segue na maioria das vezes formato semelhante ao do acoacuterdatildeo pois constitui-se de preacircmbulo ementa relatoacuterio fundamentashyccedilatildeo conclusatildeo e parte autenticativa Sucintamente cada parte apresenta as seguintes caracteriacutesticas

1 - Preacircmbulo eacute a parte em que se identificam a central idade da questatildeo as partes o nuacutemero da peccedila

2 - Ementa como lembra Campestrini ementa tem origem latina emeniscor cujo significado eacute ldquo apontamentordquo ldquo ideiardquo ldquo instrumento breve de lembranccedila ou pensamentordquo 3 enfim eacute a siacutentese relevante da peccedila Ao ler a ementa tem-se conhecimento da questatildeo central (fato) dos nexos de referecircncia da fundamentaccedilatildeo e do entendimento (conclusatildeo do parecer)

3 - Relatoacuterio eacute a narrativa sucinta e imparcial dos fatos Devem ser registrados os fatos as circunstacircncias que os esclarecem e todas as inforshymaccedilotildees determinantes ocorridas durante a anaacutelise da questatildeo

4 - Fundamentaccedilatildeo eacute um texto argumentativo em que se analisam os fatos narrados as provas as alegaccedilotildees dos envolvidos na questatildeo com o objetivo de extrair dessa anaacutelise conclusotildees devidamente justificadas por meio dos princiacutepios das regras da jurisprudecircncia dos costumes entre oushytras fontes Na fundamentaccedilatildeo utilizam-se as teacutecnicas argumentativas e estrateacutegias discursivas a fim de convencer sobre o ponto de vista que seraacute exposto na conclusatildeo

5 - Conclusatildeo eacute a apresentaccedilatildeo da opiniatildeo para a composiccedilatildeo da questatildeo analisada

6 - Parte autenticativa eacute a identificaccedilatildeo daquele que emitiu o pashyrecer considerando que assume uma responsabilidade civil pelo seu opi- namento Assim dataraacute assinaraacute e indicaraacute o nuacutemero da carteira de idenshytidade profissional

Especificadas as partes que compotildeem o parecer vamos nos deter em cada uma delas Para isso leiamos o parecer do Procurador de Justiccedila hoje aposentado Paulo Cezar Pinheiro Carneiro4

3 CAMPESTRINI H Como redigir ementas Satildeo Paulo Saraiva 1994 pl4 CARNEIRO Paulo Cezar Pinheiro A atuaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico na aacuterea ciacutevel

Temas diversos Pareceres 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2001 p 245-248

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICOJURIacuteDICO 185

5a Cacircmara Ciacutevel Accedilatildeo InventaacuterioAgravo de Instrumento ndeg 194894 Agravante ERCSAgravado Juiacutezo da 9a Vara de Oacuterfatildeos e Sucessotildees

TESTAMENTO - Herdeiro universal - Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar -Imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade impe- nhorabilidade (ateacute 50 anos) e incomunicabilidade (vitaliacutecia) - Herdeiro instituiacutedo portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado- Possibilidade de autorizaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem depositando-se0 produto da venda em caderneta de poupanccedila liberando-se os valores gradativamente para custeio do tratamento Inteligecircncia do art 1676 do Coacutedigo Civil Atendimento agrave real vontade da testadora Interpretashyccedilatildeo sistemaacutetica dos dispositivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie Provimento do recurso5

Relatoacuterio

1 - O agravante constitui-se no uacutenico herdeiro instituiacutedo por testamenshyto de ICC tomando parte do inventaacuterio tatildeo somente um bem imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade e impenhorabilidade temposhyraacuteria (ateacute que o herdeiro atingisse 50 anos) assim como incomunicabishylidade vitaliacutecia2 - Em sendo o agravante portador do viacuterus da A IDS e estando jaacute a esta altura comprovadamente em precaacuterio estado de sauacutede ocasionado pelo reduzido niacutevel de resistecircncia do seu sistema imunoloacutegico postulou autorizaccedilatildeo para venda do bem inventariado com o fito exclusivo de possibilitar a continuidade do seu tratamento3 - 0 oacutergatildeo julgador de primeiro grau indeferiu a pretensatildeo do agravanshyte ao argumento de que o art 1676 do Coacutedigo Civil eiva de nulidade qualquer ato judicial que intente dispensar a claacuteusula de inalienabili-

Esta ementa foi produzida por membro do Ministeacuterio Puacuteblico e observa as orientaccedilotildees institucionais desse oacutergatildeo A fim de adaptaacute-la agrave funccedilatildeo acadecircmica que pretendemos nesta publicaccedilatildeo sugerimos uma reescritura apenas nos aspectos teacutecnico-formais Considere o texto como se estivesse organizado agrave margem direita da lauda TESTAMENTO - Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar - Imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade impenhorabilidade (ateacute 50 anos) e incomunicashybilidade (vitaliacutecia) - Herdeiro universal portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado - Pedido de autorizaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem com depoacutesito do produto da venda em caderneta de poupanccedila e liberaccedilatildeo gradativa dos valores -Atendimento agrave real vontade da testadora com interpretaccedilatildeo sistemaacutetica dos disposhysitivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie - Parecer favoraacutevel ao provimento do recurso

186 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dade conquanto lamentasse a ilustre julgadora o estado de sauacutede do herdeiro4-0 primeiro membro do oacutergatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico a quo a se proshynunciar no feito opinou pelo deferimento do pedido formulado pela ora agravante Jaacute o segundo membro do parquet a manifestar-se nos autos apoacutes juiacutezo de retrataccedilatildeo alinhou-se com o entendimento da Julgadora monocraacutetica5 - Mantida a decisatildeo sobem os autos a esta Egreacutegia Cacircmara para reashypreciaccedilatildeo da mateacuteria em comentoE o relatoacuterio

Fundamentaccedilatildeo

6 - Mais do que analisar de forma isolada um dispositivo do Coacutedigo Cishyvil importa para se determinar o verdadeiro alcance de uma norma Juriacuteshydica encetar interpretaccedilotildees sistemaacuteticas do texto legislativo sob exame7 - As interpretaccedilotildees fornecidas pela ilustre julgadora de primeiro grau membro do Ministeacuterio Puacuteblico que oficiou nos autos pecam por conshycentrar a anaacutelise da questatildeo em um uacutenico dispositivo legal8 - Ao pretender vasculhar os preceitos aplicaacuteveis ao caso concreto o aplicador do Direito deve mais do que se ater agrave literalidade do texto em anaacutelise atender e procurar a mens legis situar os dispositivos em uma estrutura de significaccedilotildees e enfim adequar sua compreensatildeo agraves novas valoraccedilotildees sociais exsurgidas9 - Mais que tudo isto eacute a proacutepria Lei de Introduccedilatildeo ao Coacutedigo Civil no seu artigo 5deg que fornece a diretriz a ser aplicada pelo julgador na interpretaccedilatildeo da norma legalldquoNa aplicaccedilatildeo da lei o juiz atenderaacute aos fins sociais a que ela se dirige e agraves exigecircncias do bem comumrdquo10 - Em se tratando de sucessatildeo testamenlaacuteria impende investigar pre- cipuamente a vontade do testador buscando a sua essecircncia de forma a condicionar a interpretaccedilatildeo das disposiccedilotildees testamentaacuterias e adequar os preceitos legais incidentes agrave hipoacutetese11 - Neste caso a testadora natildeo possuindo herdeiros necessaacuterios noshymeou seu sobrinho o ora agravante entatildeo com apenas 13 anos seu herdeiro universal gravando os bens imoacuteveis com jaacute mencionadas claacuteushysulas Visava ela concomitantemente a beneficiar o herdeiro instituiacutedo e protegecirc-lo intentando garantir-lhe teto seguro ateacute idade madura (de 50 anos) isolando-o das vicissitudes da vida moderna12 - Natildeo poderia a testadora imaginar jamais agravequela altura que este terriacutevel mal chamado AIDS iria apossar-se do herdeiro que certamente

Cap V III - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 187

com muito carinho acabara de instituir relegando-o a uma gradual e sofrida morte prematura13 - Decerto que a vontade da testadora natildeo se coaduna com a atual sishytuaccedilatildeo do agravante este embora possua o domiacutenio de um bem imoacutevel natildeo pode usaacute-lo nem fruiacute-lo eis que se encontra em constante tratamenshyto de sauacutede e pior natildeo pode empregar o valor do patrimocircnio transmishytido em prol da tentativa de prolongar sua existecircncia Ora onde estaacute a prevalecircncia da vontade do testador essencial no cumprimento das disshyposiccedilotildees testamentaacuterias diante destas circunstacircnciasA interpretaccedilatildeo da norma estaria levando em conta os fins sociais e as exigecircncias do bem comum a que ela se destina14 - Nem a doutrina nem a jurisprudecircncia nem o legislador permaneceshyram estancados no tempo logrando a evoluccedilatildeo interpretativa adequar o dispositivo contido no art 1676 do Coacutedigo Civil agraves novas facetas da vida abrandando o seu rigor15 - De fato jaacute em 1944 atraveacutes do Decreto-lei 6777 permitiu-se a alienaccedilatildeo de imoacuteveis gravados substituindo-os por outros imoacuteveis ou tiacutetulos da diacutevida puacuteblica permanecendo sobre estes os gravames16 - Nesta linha os doutrinadores assim como os tribunais passaram a admitir a alienaccedilatildeo do bem gravado com autorizaccedilatildeo judicial por necessidade ou conveniecircncia manifesta do titular ocorrendo a sub-ro- gaccedilatildeo em outro bem17 - No caso em tela nada impede o produto poupanccedila agrave disposiccedilatildeo do juiacutezo utilizando-se o seu saldo no custeio do tratamento do agravante18 - Argumenta-se para sustentar o entendimento contraacuterio que o bem substituto (valor depositado em poupanccedila) iria pouco a pouco se esshygotando acabando por exercer o herdeiro poder de disposiccedilatildeo sobre o imoacutevel herdado justamente o que pretendeu vedar a testadora e assegushyrar o preceito do Coacutedigo Civil19-0 que se verifica contudo eacute que relegar o herdeiro agrave morte enshyquanto o bem recebido permanece absolutamente inoacutexio pois sequer rende frutos isto sim significa afrontar a vontade da testadora e o proacuteshyprio alcance teleoloacutegico da lei desfigurando por completo o proacuteprio ato de liberalidade20 - Vale mencionar neste sentido trecho de acoacuterdatildeo unacircnime profeshyrido pela 6a Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila do Rio de Janeiro no agravo em que foi relator o Desembargador Laerson Mauro

Se pela imposiccedilatildeo das claacuteusulas de inalienabilidade incomunicabili- dade e impenhorabilidade vitaliacutecia sobre bens de heranccedila da legiacutetima como da disponiacutevel abrangendo natildeo soacute o principal como os frutos e

188 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

rendimentos a liberalidade perder toda a sua utilidade chegando messhymo a descaracterizar-se juriacutedica e economicamente eacute imperioso que se apliquem tantas regras exegeacuteticas quantas caibam na espeacutecie para evitar-se a inocuidade da deixa preservando assim agrave herdeira algum beneficio em vida Agravo provido

21 - Desta forma deve o uacutenico bem inventariado conquanto gravado com as claacuteusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade ser alienado conforme requerido depositando-se o produto da venda em caderneta de poupanccedila agrave disposiccedilatildeo do juiacutezo a fim de que libere gradativamente as quantias necessaacuterias ao tratamento de sauacutede do herdeiro universal posiccedilatildeo esta que se afina com o mais atual entendimento doutrinaacuterio e jurisprudencial intentando ainda alcanccedilar o verdadeiro fim dos disposhysitivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie (atender agrave vontade do testador e ao messhymo tempo atender aos fins sociais compreendidos no caso em exame) interpretando-os sistematicamenteConclusatildeo

Assim opina o Ministeacuterio Puacuteblico pela reforma da decisatildeo a quo pershymitindo-se a alienaccedilatildeo do bem gravado atendidas as exigecircncias contishydas no item 20 supraE o parecer

Rio de Janeiro 1deg de fevereiro de 1995

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (Procurador de Justiccedila)

Como se pode observar neste parecer o Ministeacuterio Puacuteblico foi proshyvocado a se pronunciar a respeito do pedido de alienaccedilatildeo de um imoacutevel formulado pelo uacutenico herdeiro desse bem gravado com claacuteusula de inalieshynabilidade e de impenhorabilidade temporaacuteria (ateacute que o herdeiro atingisse 50 anos) assim como incomunicabilidade vitaliacutecia Tal pedido foi negado em decisatildeo de primeira instacircncia na qual se alinhou um dos membros do Ministeacuterio Puacuteblico enquanto o outro discordou da decisatildeo a quo Assim caberaacute a um colegiado decidir se defere ou natildeo o pedido Antes entretanto a questatildeo seraacute avaliada pelo Procurador de Justiccedila que opinaraacute a respeito

82 EMENTAApoacutes o preacircmbulo o parecer analisado iniciou a parte textual com

a ementa Seu conteuacutedo revelou de forma concisa o fato central quem o

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

quecirc e por que se pleiteia algo o argumento que se opocircs ao pedido e os dois argumentos em que se baseou o procurador para decidir como decidiu

Esclarecendo

Fato central TestamentoQuem Herdeiro universal0 quecirc Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar sendo imoacutevel

gravado com claacuteusula de inalienabilidade impenhora- bilidade (ateacute 50 anos) e incomunicabilidade (vitaliacutecia)

Por quecirc Herdeiro instituiacutedo portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado Possibilidade de autorishyzaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem depositando-se o produshyto da venda em caderneta de poupanccedila liberando-se os valores gradativamente para custeio do tratamento

Argumento que se opocircs ao pedido

Inteligecircncia do art 1676 do Coacutedigo Civil

Argumentos do procurador Atendimento agrave real vontade da testadora Interpretaccedilatildeo sistemaacutetica dos dispositivos aplicaacuteveis

Conclusatildeo do parecer Provimento do recurso

Note-se que essa ementa oferece informaccedilotildees contidas em todas as partes da peccedila Ela visa apenas ao entendimento do caso concreto numa oacutetica simplificada Por isso devem ser delineados somente o fato gerador do conflito os nexos de referecircncia (trecircs a cinco) e o entendimento do caso concreto Quanto aos nexos de referecircncia esses satildeo um importante auxiacutelio para a construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo representam um verdadeiro fio conshydutor das ideias a serem discutidas na parte argumentativa do documento isto eacute na fundamentaccedilatildeo

Considerando o objetivo didaacutetico desta obra registremos sucintashymente como produzir uma ementa e o conteuacutedo que ela deve conter

QUANTO Agrave FORMA QUANTO AO CONTEUacuteDOEscreva a ementa a partir do centro da foshylha no topo direito justificado

Registre o fato juriacutedico ou o tipo de accedilatildeo ou instrumento juriacutedico proposto

Utilize caixa-alta para a primeira informashyccedilatildeo oferecida

Em seguida se possiacutevel faccedila uma alushysatildeo agraves partes sem nomeaacute-las

Natildeo registre o nome proacuteprio das partes Selecione duas ou trecircs informaccedilotildees exshytraiacutedas do relatoacuterio que possam ser usashydas como argumento

190 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

QUANTO Agrave FORMA QUANTO AO CONTEUacuteDO

Produza frases nominais e palavras-chave Evite adjetivos e conjunccedilotildees Use linguashygem denotativa

Os nexos de referecircncia podem ser funshydamentos de fato ou de direito

Inicie com letra maiuacutescula cada item regisshytrado e separe-os com travessatildeo

Registre seus dois ou trecircs argumentos mais fortes Lembre-se de buscaacute-los nas fontes do Direito

Utilize no maacuteximo 8 linhas Por fim registre o seu entendimento

Talvez vocecirc esteja se perguntando como escrever frases nominais Inicialmente esclarecemos que uma frase nominal eacute um enunciado sem verbo conjugado no presente preteacuterito e futuro Registre-se que as formas nominais (infinitivo particiacutepio e geruacutendio) podem ser usadas em frases noshyminais Entretanto caso seja possiacutevel evite-as especialmente o infinitivo e o geruacutendio Para produzir frases nominais sugerimos uma estrateacutegia penshyse no verbo que deseja usar e em seguida no substantivo derivado desse verbo Observe como eacute faacutecil

VerboSubstantivo deverbal (derivado do verbo)

Abdicar A abdicaccedilatildeoAbster-se A abstenccedilatildeoAcordar O acordoAgravar O agravoAtender 0 atendimentoApreender A apreensatildeoConcorrer A concorrecircnciaCompreender A compreensatildeoCombater 0 combateDelinquir A delinquecircnciaEnfatizar A ecircnfaseMorrer A morteNascer 0 nascimento

Assim em vez de o procurador escrever na ementa Deve-se atender agrave real vontade da testadora ele escreveu ldquo Atendimento agrave real vontade da testadorardquo

Cap VIII - PARECER TEacuteCNIC0-JURIacuteDIC0 191

a) Importa ainda registrar que a ementa deve possuir algumas qualishydades quais sejam seleccedilatildeo cuidadosa dos registros

b) clarezac) coerecircnciad) obediecircncia agrave sequecircncia cronoloacutegica e loacutegicae) concisatildeof) objetividadeg) uso do registro cultoh) macrocompreensatildeo

Por fim nunca eacute demais registrar que as partes do parecer (ementa relatoacuterio fundamentaccedilatildeo conclusatildeo) devem estar em constante comunishycaccedilatildeo Assim a primeira informaccedilatildeo da ementa deve conferir com a do relatoacuterio Ademais soacute registre na ementa aquilo que estiver contido no reshylatoacuterio na fundamentaccedilatildeo e na conclusatildeo

O conteuacutedo extraiacutedo do relatoacuterio e da fundamentaccedilatildeo deve indicar os nexos de referecircncia utilizados na anaacutelise do caso concreto e que foram devidamente ponderados pelo parecerista Observe que representam uma sequecircncia loacutegica de palavras

A seleccedilatildeo desses nexos de referecircncia deve ser portanto bem planejashyda a fim de oferecer ao leitor uma ideia geral mas bem clara e objetiva do caso concreto da forma como ele foi valorado e da tese que o parecerista defende

83 RELATOacuteRIO

Voltemos ao parecer do Procurador Paulo Cezar de Pinheiro Carneishyro Apoacutes a ementa foram relatados os fatos que compotildeem o conflito Obshyservam-se algumas caracteriacutesticas desse relato que o distinguem de outras narrativas como a da peticcedilatildeo inicial Certamente a objetividade com que as informaccedilotildees foram expostas permite afirmar que a narrativa dos fatos do parccer deve ser simples isto eacute natildeo valorada Assim foram evitados modalizadores que tomariam o texto tendencioso Ademais os fatos foram dispostos conforme a sequecircncia cronoloacutegica em que ocorreram objetivanshydo facilitar a compreensatildeo da questatildeo Destaque-se ainda o uso da paraacuteshyfrase caracterizando a polifonia ao se registrar a pretensatildeo do agravante eo argumento da juiacuteza

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Podemos sintetizar o relatoacuterio com o seguinte quadro

ELEMENTOS DO RELATOacuteRIO INFORMACcedilOtildeES RELATIVAS AOS ELEMENTOS

Questatildeo central e partes envolvidas 1- Um bem imoacutevel gravado com claacuteusulas um herdeiro e uma testadora

Problematizaccedilatildeo 2- Herdeiro portador do viacuterus da AIDS postulou a quebra das claacuteusulas

Como foi decidido o problema 3- 0 oacutergatildeo julgador de primeira instacircncia indeshyferiu o pedido4- Pronunciamento do MP Empate de decisatildeo

Por isso 5- Impotildee-se que a questatildeo seja decidida em instacircncia superior mas antes seraacute avaliada pelo Procurador de Justiccedila

Eacute evidente que a variedade dos tipos de questotildees a demandar um entendimento eacute muito grande Assim torna-se necessaacuterio estabelecer um criteacuterio para a escritura do relatoacuterio de um parecer teacutecnico-formal Comoo nosso objetivo principal eacute didaacutetico-pedagoacutegico oferecemos instruccedilotildees a respeito do conteuacutedo e da forma que podem ser aplicaacuteveis na maioria dos casos concretos

Dessa maneira entendemos que o conteuacutedo do relatoacuterio de um pareshycer deve satisfazer agraves seguintes questotildees

ELEMENTOS DA NARRATIVA FORENSE

O quecirc - fato juriacutedico central ou questatildeo juriacutedica centralQuem - as partes devidamente nomeadas e caracterizadas nacionalidade estado civil profissatildeo residecircncia educaccedilatildeo qualitativa e quantitativa representatividade soshycial aspectos fiacutesicos e psicoloacutegicos etc

Quando - tempo cronoloacutegico e psicoloacutegicoOnde - lugar fiacutesico e socialComo - registro das principais ocorrecircncias da forma como o fato juriacutedico aconteceu

Por quecirc - registro da(s) razatildeo(otildees) que deu(deram) origem ao fato juriacutedicoPor isso - registro da(s) consequecircncia(s) advinda(s) do fato juriacutedico

Acrescente-se que as informaccedilotildees registradas no relatoacuterio do parecer teacutecnico-juriacutedico cumprem uma funccedilatildeo argumentativa (narrativa a serviccedilo da argumentaccedilatildeo) Portanto soacute se devem registrar fatos provas e questotildees

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 193

processuais que seratildeo utilizados na fundamentaccedilatildeo a fim de servirem de base para argumentos ou para serem contestados Com efeito natildeo se justishyfica selecionar informaccedilatildeo desconsiderada na fundamentaccedilatildeo Lembramos que as partes do parecer estatildeo em iacutentima comunicaccedilatildeo e devem compor a peccedila de forma coesa e coerente

Quanto agrave forma sugerimos adotar os seguintes criteacuterios

a) Inicie o primeiro paraacutegrafo esclarecendo a centralidade da questatildeo Caso natildeo haja cabeccedilalho no seu parecer inclua tambeacutem os noshymes das pessoas diretamente envolvidas devidamente qualificadas Acrescente quando e onde ocorreu a questatildeo em apreccedilo

b) A partir do segundo paraacutegrafo inicie a narrativa dos fatos provas obedecendo agrave cronologia linear

c) Use o tempo preteacuterito jaacute que os fatos ocorreram anteriormente ao relato

d) A fim de manter a imparcialidade no relato utilize a 3a pessoa do singular recorra agrave polifonia e evite modalizadores

e) Use paraacutegrafos para organizar as ideiasf) Seja sucintog) Siga a norma cultah) Apoacutes encerrar o relato pule uma linha e registre ldquo Eacute o relatoacuteriordquo 6

84 FUNDAMENTACcedilAtildeO

Em capiacutetulos anteriores orientamos natildeo apenas a respeito do processo que antecede a produccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo isto eacute ao seu planejamento como tambeacutem a maneira de produzi-la Resta-nos apenas destacar alguns pontos que deixamos para este momento

Como se pode observar na fundamentaccedilatildeo do parecer do Procurador Paulo Cezar Pinheiro Carneiro durante todo o texto argumentativo ele se ateve a uma linha de raciociacutenio e foi fiel a ela o interesse da testadora era proteger o herdeiro e o direito deve ser interpretado de forma sistemaacutetica Criou portanto objetivos a alcanccedilar mediante a argumentaccedilatildeo isto eacute levar

6 Para aprofundar o estudo da narrativa tanto a simples quanto agrave valorada sugere-se recorrer agrave obra dos mesmos autores publicada por esta mesma editora Liccedilotildees de Narrativa Juriacutedica

T194 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 195

a crer que a real vontade da testadora era ldquobeneficiar o herdeiro instituiacutedo e protegecirc-lo intentando garantir-lhe teto seguro ateacute idade madura (de 50 anos) isolando-o das vicissitudes da vida modernardquo e que a interpretaccedilatildeo da norma deve considerar os fins sociais e as exigecircncias do bem comum a que ela se destina Observe que tais objetivos jaacute estatildeo claros na ementa Isso representa dizer que existe relaccedilatildeo de sentido entre ementa e fundashymentaccedilatildeo

Assim traccedilado o percurso restou-lhe planejar os argumentos e organizaacute-los no texto Certamente natildeo dispensou nada do que foi regisshytrado no relatoacuterio iniciando sua fundamentaccedilatildeo pelo que ele considerou ter sido uma falha na avaliaccedilatildeo da juiacuteza ater-se a um uacutenico dispositivo legal demonstrando atitude que natildeo caberia agrave moderna hermenecircutica juriacutedica

Em sua fundamentaccedilatildeo o ilustre Procurador de Justiccedila nos oferece uma aula de como interpretar o Direito flexibiliza a interpretaccedilatildeo do art 1676 do Coacutedigo Civil utiliza-se do art 5deg da Lei de Introduccedilatildeo ao Coacutedigo Civil a fim de lhe fornecer sustentaccedilatildeo para a aplicaccedilatildeo da Loacutegica do Rashyzoaacutevel e contrariar a regra em que se assentou a decisatildeo de primeiro grau cita a doutrina e a jurisprudecircncia de forma a adequar a regra agraves peculiarishydades do caso concreto e ao contexto situacional real

Observa-se assim que a fundamentaccedilatildeo destina-se a sedimentar a conclusatildeo que se registraraacute ao teacutermino da explanaccedilatildeo dos argumentos

85 CONCLUSAtildeO

Natildeo se pode perder de vista que a conclusatildeo de uma peccedila depende do seu objetivo Com efeito na peticcedilatildeo inicial cujo fim eacute provocar o judishyciaacuterio para lhe encaminhar um pedido isto eacute a pretensatildeo do autor em sua conclusatildeo se revelaraacute tal pedido

Jaacute no parecer a conclusatildeo como parte integrante da peccedila deve represhysentar a siacutentese da opiniatildeo daquele que a produziu ou melhor expressar o entendimento alcanccedilado apoacutes anaacutelise ponderada de todos os fatos provas indiacutecios argumentos das partes e principalmente das fontes do direito Essa parte da peccedila deve estar em consonacircncia com a ementa em que se apresentou o entendimento pela expressatildeo ldquo Parecer favoraacutevel a ()rdquo Natildeo acrescente informaccedilatildeo nova na conclusatildeo Responda objetivamente agrave conshysulta formulada utilizando-se do verbo ldquo opinarrdquo

A autenticaccedilatildeo consiste apenas em datar e assinar a peccedila

Retomando a conclusatildeo do parecer analisado eacute possiacutevel verificar a praacutetica dessa breve explanaccedilatildeo teoacuterica

II - Conclusatildeo

Assim opina o Ministeacuterio Puacuteblico pela reforma da decisatildeo a quo pershymitindo-se a alienaccedilatildeo do bem gravado atendidas as exigecircncias contishydas no item 20 supraE o parecer

Rio de Janeiro 1deg de fevereiro de 1995

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (Procurador de Justiccedila)

86 EXEMPLO DE PARECER TECNICO-JURIDICO

Muitos graduandos do curso de Direito solicitam aos seus professoshyres que apresentem exemplos de textos produzidos por pessoas com recoshynhecido saber juriacutedico Essa solicitaccedilatildeo jaacute foi atendida nesta obra com a apresentaccedilatildeo e anaacutelise do parecer do ilustre Procurador de Justiccedila Paulo Cezar Pinheiro Carneiro Entretanto entendemos ser importante tambeacutem oferecer um parecer escrito em sala de aula com sugestotildees dos alunos e do professor da turma de Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica

DISPUTA PELA GUARDA DE M ENOR - Separaccedilatildeo litigiosa - Guarshyda provisoacuteria com a avoacute paterna - Alegaccedilatildeo da matildee de melhor condiccedilatildeo de assistecircncia agrave filha mdash Decisatildeo pela guarda alternada - Apelaccedilatildeo dos pais contra a guarda alternada - Avaliaccedilatildeo da assistecircncia social favoshyraacutevel ao pai - Bem-estar do menor - Inteligecircncia do artigo 1584 CC- Parecer favoraacutevel ao pai

Relatoacuterio

Trata-se da disputa da guarda de PLD quatro anos entre Regina Duarte 35 anos divorciada comerciaacuteria e Ivanildo Peixoto Vieira 38 anos divorciashydo O fato teve iniacutecio em 12 de setembro de 2005 no Rio de JaneiroSegundo Ivanildo apoacutes sete anos de casamento separou-se judishycialmente de sua esposa Como ela natildeo tinha condiccedilotildees financei-

196 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ras de educar a crianccedila e garantir a sua manutenccedilatildeo aleacutem de estar passando por um periacuteodo de instabilidade emocional a guarda de fato da menor lhe foi concedida Afirmou que natildeo manteacutem um bom relacionamento com a mulher jaacute que ela nunca admitiu a separaccedilatildeo e frequentemente promove cenas de ciuacutemes quando se encontram Relatou que a crianccedila frequenta a creche e que quando vai para o curso de Enfermagem agrave noite ela fica sob os cuidados da avoacute patershyna Requereu assistecircncia judiciaacuteria gratuita a guarda provisoacuteria da filha e a procedecircncia da accedilatildeoFrustrada a tentativa de conciliaccedilatildeo o juiz deferiu a guarda provisoacuteshyria agrave avoacute paterna Regina contestou afirmando serem mentirosas as afirmaccedilotildees constantes da peticcedilatildeo inicial e que os litigantes de coshymum acordo deixaram a filha sob a responsabilidade da avoacute patershyna a quem deram a guarda de fato Entretanto entende que o autor natildeo tem condiccedilotildees de cuidar de PLDV porque natildeo trabalha e recebe apenas uma bolsa do Hospital Satildeo Francisco no valor de R$ 20000 mensais Ademais aleacutem de passar todas as manhatildes nesse hospital o autor frequenta o curso de Enfermagem noturno Disse que quando deixou a filha aos cuidados da avoacute natildeo tinha condiccedilotildees de sustentaacute- -la situaccedilatildeo jaacute superada pois trabalha na XXXX recebendo salaacuterio de R$ 41650 mensais Requereu a assistecircncia judiciaacuteria gratuita a improcedecircncia da demanda e o deferimento da guarda de PLDV em seu favorO estudo social foi apresentado a f 2329 Nele registrou-se que ldquosob a guarda do pai P estaacute convivendo em ambiente salutar propiacutecio ao seu desenvolvimento natildeo havendo razotildees plausiacuteveis neste momento que justifiquem uma mudanccedilardquo (f 28) E ainda ldquoassim a partir da situaccedilatildeo apresentada das consideraccedilotildees pertinentes e de acordo com a percepshyccedilatildeo de sentimentos e emoccedilotildees expressados do ponto de vista social neste momento somos de parecer favoraacutevel agrave permanecircncia de PLDV sob a guarda do genitor Sr IPVrdquo (f 29)Em audiecircncia realizou-se a oitiva das testemunhas (f 4851) que relashytaram ser o pai extremamente dedicado e que a crianccedila demonstra estar muito feliz em sua companhiaO MM Juiz de Direito julgou procedente em parte o pedido deferindo a ambos os genitores a guarda alternada de PLDV (f 5871)Regina apelou dizendo que a guarda alternada traraacute prejuiacutezos ao deshysenvolvimento psiacutequico da crianccedila que conta apenas quatro anos de idade sendo ela matildee a que reuacutene melhores condiccedilotildees para cuidar da filha Afirmou ainda que natildeo criaraacute dificuldades para que o pai visite a menina e requereu a guarda definitiva de PLDVIvanildo tambeacutem apelou afirmando que a guarda alternada prejudicaraacute

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICOJURIacuteDICO 197

o desenvolvimento emocional de PLDV pois os litigantes natildeo se relashycionam de forma harmoniosa Salientou ter melhores condiccedilotildees para educar e cuidar da filha jaacute que Regina deixou de priorizar a crianccedila para tratar de interesses pessoais logo apoacutes a separaccedilatildeo do casal Ademais aduziu estar com a guarda de fato da filha inexistindo motivos que justifiquem a mudanccedila na rotina de PLDVRequereu a concessatildeo do efeito suspensivo ao recurso e o deferimento da guarda da filha em seu favorE o Relatoacuterio

Fundamentaccedilatildeo

As constantes alteraccedilotildees e a forma de conviacutevio no mundo contemposhyracircneo deixam cicatrizes profundas para as geraccedilotildees futuras Conviveshymos com um crescente clima de separaccedilotildees A famiacutelia considerada a ceacutelula mater da sociedade rompe-se com a mesma facilidade com que se cria O resultado deste rompimento por vezes eacute o fruto desshyta cisatildeo virar objeto dc contenda Cabe ao judiciaacuterio interferir como matildeo mais forte e garantir a este inocente a melhor condiccedilatildeo para o seu desenvolvimentoRessalte-se que conforme consta dos autos tal condiccedilatildeo estaacute presente no conviacutevio atual da crianccedila com seu pai porque o ambiente em que se encontra eacute salutar Tambeacutem foram verificadas as condiccedilotildees propiacutecias para o seu desenvolvimento natildeo havendo portanto razotildees que justifishyquem a alteraccedilatildeo Aleacutem disso Ivanildo tem demonstrado preocupaccedilatildeo em oferecer estabilidade emocional agrave crianccedila porquanto nos momenshytos em que se empenha em progredir na vida com os estudos noturnos deixa-a aos cuidados zelosos de sua matildeeNatildeo podemos esquecer que a inteligecircncia do artigo 1584 do Coacutedigo Cishyvil institui que a partir da separaccedilatildeo judicial a guarda dos filhos deveraacute ser atribuiacuteda a quem revelar melhores condiccedilotildees de assumi-la Dessa forma confirma-se mediante os fatos anteriormente enunciados que a situaccedilatildeo deve ser mantida em seu status quoE importante ressaltar que embora a matildee argumente que tem condiccedilotildees de sustentar a crianccedila esta possibilidade natildeo remete diretamente ao interesse ou bem-estar da menina visto que nas condiccedilotildees aluais esta e outras necessidades estatildeo plenamente preenchidas Assim a melhor condiccedilatildeo para a menor natildeo seria a alteraccedilatildeo da guarda transformando um desenvolvimento encaminhado numa aposta vatildeEm relaccedilatildeo agrave guarda compartilhada anteriormente deferida fica clara a sua impossibilidade devido agraves contendas entre os litigantes o que iria

198 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

prejudicar o desenvolvimento da crianccedila que seria colocada em linha de confronto Tal entendimento eacute reforccedilado pela decisatildeo proferida no Rio Grande do Sul pela 7a Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila nos autos de Agravo interno n 70010991990 de que foi relatora a Desemshybargadora Maria Berenice ldquoDescabido impor a guarda compartilhada que soacute obteacutem sucesso quando existe harmonia e convivecircncia paciacutefica entre os genitoresrdquoDessa forma por considerar que o bem-estar da crianccedila deva prevalecer acima de qualquer outro interesse e por reconhecer que na presente data o pai desfruta de melhores condiccedilotildees de asseguraacute-lo a posse e guarda deveratildeo ser concedidas ao progenitor

ConclusatildeoEm face do exposto opina-se que a posse e a guarda da crianccedila sejam deferidas ao pai

E o parecer

Rio de Janeiro 4 de dezembro de 2008

x x x x x x x x x x x

87 ESQUEMA DA DISPOSICcedilAtildeO DAS PARTES DO PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

PARECERPular 2 linhas

EMENTA1 linha

2 linhas

R ELA T Oacute R IOI linha

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

1 linhaEacute O RELATOacuteRIO

2 linhasFUNDAM ENTACcedilAtildeO

I linha

2 linhasCO N CLUSAtildeO

1 linha

2 linhasE o parecer

2 linhasLocal e data

Assinatura N deg da Carteira funcional do Especialista

Capiacutetulo IX

EXERCIacuteCIOS

Uma das maneiras mais eficientes de fixar um conteuacutedo lido na doushytrina eacute praticar por meio de exerciacutecios Temos convicccedilatildeo de que no meio acadecircmico essa atividade mostra-se indispensaacutevel especialmente porque a Metodologia do Caso Concreto consolidou o meacutetodo misto (indutivo- -dedutivo) como o mais eficiente para o ensino juriacutedico no Brasil

Este capiacutetulo pretende oferecer aos leitores a oportunidade de fixashyccedilatildeo do conteuacutedo relativo agrave argumentaccedilatildeo juriacutedica Ainda que natildeo esteja mapeado todo o conteuacutedo do livro o leitor encontraraacute aqui excelente oporshytunidade de consolidar o que aprendeu na disciplina por meio de questotildees objetivas e discursivas

Esclarecemos que algumas questotildees visam agrave simples memorishyzaccedilatildeo e reproduccedilatildeo de conceitos e caracteriacutesticas Outras pretendem ivaliar a capacidade de compreender e aplicar os institutos desenvolvishydos ao longo dos capiacutetulos Outros ainda tecircm como objetivo avaliar a capacidade de refletir e aplicar esse conteuacutedo a situaccedilotildees profissionais especiacuteficas

Ao final oferecemos ainda uma pequena coletacircnea de textos com a finalidade de oferecer ao professor material adequado aacute praacutetica de fundashymentaccedilotildees juriacutedicas Nesses textos certamente o docente encontraraacute farto material para desenvolver as propostas que eventualmente natildeo tenham sido abordadas nas demais questotildees

Leia com cuidado os enunciados e atenccedilatildeo na escolha das opccedilotildees Sugerimos somente resolver os exerciacutecios apoacutes a leitura do capiacutetulo corshyrespondente

202 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 1 - Marque a opccedilatildeo INCORRETAa) A demonstraccedilatildeo eacute procedimento caracteriacutestico de ciecircncias loacutegico-dedutivas como

a Matemaacutetica e a Fiacutesicab) O caraacuteter abstrato das disciplinas exatas permite que o raciociacutenio formal se exershy

ccedila de modo vaacutelido independentemente da realidade circundantec) Como na argumentaccedilatildeo parte-se de proposiccedilotildees discutiacuteveis para tornar-se conshy

sistente haacute que procurar as premissas no campo das verdades absolutasd) A argumentaccedilatildeo aplica-se especialmente a situaccedilotildees concretas da vida Entra

nos domiacutenios das ciecircncias sociais e humanas como a Poliacutetica e o Direito

Questatildeo 2 - Marque a opccedilatildeo CORRETAa) A demonstraccedilatildeo considera o contexto em que se desenvolve devido ao seu cashy

raacuteter pessoal implica um raciociacutenio loacutegico-dedutivo cujo tracircnsito eacute sensiacutevel agraves necessidades e circunstacircncias de tempo e de espaccedilo

b) No Direito a demonstraccedilatildeo estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo porque esta se sershyve daquela a fim de produzir os meios de prova de que necessita

c) A linguagem de que deve se servir a argumentaccedilatildeo eacute a artificial razatildeo pela qual o natildeo iniciado no Direito tem extrema dificuldade de compreender o significado de seus textos

d) Na demonstraccedilatildeo os receptores da mensagem satildeo o ldquoauditoacuterio particularrdquo pois todos que falam se dirigem necessariamente a algueacutem

Questatildeo 3 - Leia o quadro adiante

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

I Premissas Proposiccedilotildeesindiscutiacuteveis

Proposiccedilotildeesdiscutiacuteveis

II Tipo de raciociacutenio Formal Flexiacutevel

III Tipo de linguagem Natural e simples Simboacutelica e artificial

IV Relaccedilatildeo com o contexto Independente do contexto Contextualizada

V Relaccedilatildeo com o auditoacuterio Pessoal Impessoal

Marque os itens cujas informaccedilotildees completam de maneira CORRETA a tabeshyla associando sem equiacutevoco as caracteriacutesticas relativas agrave demonstraccedilatildeo e agrave argumentaccedilatildeoa) I II e IVb) I III e Vc) II III e Vd) II IV e V

-

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 203

Questatildeo 4 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoA demonstraccedilatildeo parte de proposiccedilotildees indiscutiacuteveis independenteshymente de se tratar de afirmaccedilotildees objetivamente verdadeiras ou hipoacuteteshyses admitidas por convenccedilatildeo Os fundamentos a demonstrar subtraem a qualquer tipo de controveacutersia () Ao contraacuterio na argumentaccedilatildeo parte-se de proposiccedilotildees discutiacuteveis Haacute que se procurar as premissas no campo das verdades comuns dos princiacutepios e das opiniotildees correnshytes naquilo que eacute aceito pelos interlocutores Essas verdadesrdquo natildeo satildeo absolutas satildeo relativas a dados contextos culturais em determishynados momentos da histoacuteriardquo

a) As ldquoproposiccedilotildees indiscutiacuteveisrdquo a que recorre a demonstraccedilatildeo satildeo os axiomasb) O contexto especiacutefico em que se desenvolve a argumentaccedilatildeo considera o auditoacuteshy

rio universal como mais importante que o auditoacuterio particularc) Como os fundamentos de que se serve a demonstraccedilatildeo ldquosubtraem a qualquer

tipo de controveacutersiardquo pode-se dizer que utiliza a loacutegica formal e natildeo a loacutegica do razoaacutevel

d) Natildeo haacute ldquoverdadesrdquo na argumentaccedilatildeo porque suas premissas satildeo prioritariamente valores

Questatildeo 5 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoUma deduccedilatildeo eacute um argumento que dadas certas coisas algo aleacutem dessas coisas necessariamente se segue delas Eacute uma demonstrashyccedilatildeo quando as premissas das quais a deduccedilatildeo parte satildeo verdadeiras e primitivas ou satildeo tais que o nosso conhecimento delas teve origishynalmente origem em premissas que satildeo primitivas e verdadeiras e eacute uma deduccedilatildeo dialeacutectica se raciocina a partir de opiniotildees respeitaacuteveisrdquo (Aristoacuteteles)

a) Deduccedilatildeo eacute um tipo de organizaccedilatildeo silogiacutestica do raciociacuteniob) Induccedilatildeo eacute um tipo de organizaccedilatildeo silogiacutestica do raciociacutenioc) Deduccedilatildeo (PM + Pm = C) Induccedilatildeo (Pm + PM = C)d) A demonstraccedilatildeo eacute essencialmente indutiva enquanto a argumentaccedilatildeo eacute essenshy

cialmente dedutiva

Questatildeo 6 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

Todos os mamiacuteferos tecircm pulmotildeesAs baleias satildeo mamiacuteferosLogo todas as baleias tecircm pulmotildees

a) Trata-se de um silogismob) O raciociacutenio desenvolvido leva a uma conclusatildeo iloacutegicac) O raciociacutenio desenvolvido leva a uma conclusatildeo incoerented) A primeira assertiva funciona como premissa maior (PM) do argumento

204 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 7 - Todos os itens constituem eficientes recursos disponiacuteveis aoargumentador para a defesa de seus pontos de vista EXCETOa) Formulaccedilatildeo de hipoacutetesesb) Diaacutelogo polifocircnicoc) Estrateacutegias modalizadorasd) Axiomas

Questatildeo 8 - Acerca da argumentaccedilatildeo juriacutedica marque a opccedilatildeo INCORRETAa) A argumentaccedilatildeo juriacutedica como produccedilatildeo intelectual do campo do direito deve

seguir a legislaccedilatildeo como paracircmetro necessaacuterio sob pena de natildeo ser acatada no meio acadecircmico

b) As questotildees psicoloacutegicas devem ser consideradas como elemento relevante da aceitaccedilatildeo da tese pelo auditoacuterio

c) ChaTm Perelman propocircs ampliar o campo da razatildeo para aleacutem dos confins das ciecircncias dedutivas e das ciecircncias empiacutericas pois o que mais interessa a Perelshyman eacute a estrutura da argumentaccedilatildeo e a sua loacutegica

d) A teoria da argumentaccedilatildeo juriacutedica preocupa-se com a produccedilatildeo de razotildees e de argumentos para o cumprimento da funccedilatildeo de solucionar conflitos

Questatildeo 9 - Leia o fragmento que segue

ldquoDepois que a Escola da Exegese com Napoleatildeo agrave frente proclamou no seacuteculo XIX que o direito se identifica com a ldquolei escritardquo depois que Hans Kelsen disse que o direito natildeo eacute ldquoleirdquo mas eacute ldquonormardquo e depois que Herbert Hart negou que o direito fosse ldquonormardquo para proclamar que ele eacute ldquoregrardquo a teoria contemporacircnea veio a concluir que o direito natildeo eacute lei nem norma e nem regra ele eacute um conjunto de ldquoregrasrdquo e ldquoprinshyciacutepiosrdquo Nessa direccedilatildeo um teoacuterico contemporacircneo Ronaldo Dworkin escreveu dois artigos muito citados nos uacuteltimos tempos cujos tiacutetulos satildeo exatamente Modelo de regras e Princiacutepios I e II E para a aplicaccedilatildeo de princiacutepios e regras diz a nova teoria do direito eacute preciso utilizar o mecanismo da argumentaccedilatildeo isto eacute o discurso persuasivo que realishyza a mediaccedilatildeo concretizadora justificando quais as regras e quais os princiacutepios deveratildeo prevalecer nos casos concretos sobretudo quando entre as regras e os princiacutepios aplicaacuteveis houver alguma colisatildeordquo (Anshytocircnio Alberto Machado)

Com base no que sustenta o texto NAtildeO eacute possiacutevel afirmar quea) O direito natildeo cabe apenas na leib) A argumentaccedilatildeo soacute passou a ser valorizada no direito com Dworkinc) Regras e princiacutepios natildeo satildeo a mesma coisa mas se completamd) A argumentaccedilatildeo pelos princiacutepios pode ser tatildeo eficiente quanto a argumentaccedilatildeo

sustentada na norma positivada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 205

Questatildeo 10 - Para os autores a modalizaccedilatildeo eacute ldquoum fenocircmeno complexo que testemunha o modo como o sujeito argumentador se apropria da liacutengua para organizaacute-la em discurso e expressar sua opiniatildeo acerca de dado tema ou fatordquo Todas as opccedilotildees adiante indicam palavras ou expressotildees modalizadoras relativas agrave temaacutetica do abandono afetivo dos filhos EXCEshyTO uma Marque essa opccedilatildeoa) Ato covardeb) Descumprimento do dever legal de cuidarc) Violaccedilatildeo de direitos da personalidaded) Direito agrave filiaccedilatildeo

Questatildeo 11 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau sobre o aborto do feto anencefaacutelico ldquoPalavras bem arranjadas natildeo bastam para ocultar em quantos fazem praccedila do aborto de anenceacutefalos inexoraacutevel despreshyzo pela vida de quem poderia escapar com resquiacutecios de existecircncia- e produzindo consequecircncias juriacutedicas marcantes - do ventre queo abrigou Matar ou deixar morrer o pequeno ser que foi parido natildeo eacute diferente da interrupccedilatildeo da sua gestaccedilatildeordquo (ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo)

a) O fragmento menciona o recurso da polifonia como instrumento de argumentashyccedilatildeo

b) O fragmento aponta a modalizaccedilatildeo pela seleccedilatildeo vocabular como instrumento de argumentaccedilatildeo

c) O fragmento indica a intertextualidade como instrumento de argumentaccedilatildeod) O fragmento revela a linearidade expositiva como estrateacutegia de persuasatildeo

Questatildeo 12 - Adiante transcriccedilatildeo de um fragmento do texto ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo de autoria do Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau sobre o aborto do feto anencefaacutelico

ldquoDe mais a mais a certeza do diagnoacutestico meacutedico da anencefalia natildeo eacute absoluta de modo que a prevenccedilatildeo do erro mesmo culposo natildeo seraacute sempre possiacutevel O que dizer entatildeo do erro doloso A quantas natildeo chegaria entatildeo em seu dinamismordquo

O fragmento expressa a existecircncia do argumento de autoridade amparado pelo(a)

a) Demonstraccedilatildeo que se sustenta no diagnoacutestico do meacutedico (opiniatildeo teacutecnica funshydamentada)

b) Positivismo que se desenvolve com base na premissa de que o dolo eacute mais grave que a culpa

c) Demonstraccedilatildeo que se opotildee agrave argumentaccedilatildeo com a qual natildeo se relacionad) Exposiccedilatildeo que quase sempre eacute sinocircnimo de ldquoinjunccedilatildeordquo

206 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 13 - Marque a opccedilatildeo ERRADA acerca da argumentaccedilatildeoa) Aplica-se a situaccedilotildees concretas da vida Entra nos domiacutenios das ciecircncias sociais

e humanas ou seja a Economia a Poliacutetica e o Direitob) Eacute utilizada em casos que natildeo podem ser solucionados pelo rigor matemaacutetico mas

sim por via persuasivac) Trabalha com verdades a priacuteori a fim de convencer o auditoacuteriod) Haacute que procurar as premissas no campo das verdades comuns dos princiacutepios

opiniotildees e valores correntes ou seja naquilo que eacute tido como verdade pelos interlocutores

Questatildeo 14 - Leia as assertivas abaixo e marque a opccedilatildeo CORRETAI - A proposta positivista consistiu na explicaccedilatildeo do fenocircmeno juriacutedico a partir do

estudo das normas postas pela autoridade soberana de determinada sociedadeII - Na argumentaccedilatildeo a adesatildeo do auditoacuterio depende do esforccedilo do argumentador para atingir os valores que lhe satildeo mais aceitosIII - A loacutegica do razoaacutevel trabalha com a adesatildeo enquanto a loacutegica formal com a

demonstraccedilatildeo

a) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIIc) Estatildeo corretas as assertivas II e IIId) Estatildeo corretas as assertivas I II e III

Questatildeo 15 - Marque a opccedilatildeo CORRETA acerca do raciociacutenio indutivoa) Sua forma mais clara de apresentaccedilatildeo eacute o silogismo claacutessicob) Pensamento no qual a afirmaccedilatildeo denominada ldquopremissa menor dispara o racioshy

ciacutenio que leva a uma conclusatildeoc) Eacute aquele que parte do geral para o especiacutefico sendo este a proacutepria normad) A conclusatildeo normalmente depende das premissas mas haacute casos em que decorre

de informaccedilatildeo cientiacutefica o que favorece seja desvinculada das duas premissas que lhe datildeo sustentaccedilatildeo

Questatildeo 16 - Leia as assertivas que seguem e marque a opccedilatildeo CORRETAI - ldquoA partir do exame de uma seacuterie de elementos concretos extrai-se um princiacutepio

de ordem geneacutericardquo - procedimento indutivoII - Quando haacute omissatildeo legislativa eacute liacutecito recorrer agrave analogia fonte geral do direitoIII - O procedimento indutivo eacute muito eficiente quando se observa a omissatildeo legisshy

lativa acerca da mateacuteria em anaacuteliseIV - Para o positivismo a fonte legal deve ser aplicada por subsunccedilatildeo ao caso

concretoa) Estatildeo corretas as assertivas I II e IIIb) Estatildeo corretas as assertivas II III e IVc) Estatildeo corretas as assertivas I e IVd) Estatildeo corretas as assertivas I II III e IV

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 207

Questatildeo 17 - A caracterizaccedilatildeo do asseacutedio moral natildeo se daacute precipuamente pelo Direito mas pela Psicologia que tem os instrumentos teacutecnicos e metodoloacutegicos adequados para diagnosticar essa patologia social Eacute por essa razatildeo que podemos dizer sobre o estudo do tema que

a) A demonstraccedilatildeo natildeo eacute possiacutevel porque a Psicologia natildeo eacute ciecircncia exatab) A demonstraccedilatildeo soacute estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo na aacuterea trabalhista no exame

admissionalc) A demonstraccedilatildeo estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo que leva agrave condenaccedilatildeo do inshy

fratord) A Psicologia natildeo tem a precisatildeo cientiacutefica necessaacuteria para conseguir produzir

provas admitidas em direito

Questatildeo 18 - Com a superaccedilatildeo do Positivismo Juriacutedico novos valores passashyram a ser considerados como verdadeiros norteadores da interpretaccedilatildeodas regras juriacutedicas Soacute natildeo pode ser considerado um valor poacutes-positi-vista

a) Boa-feacute nas relaccedilotildees de consumob) Funccedilatildeo social da propriedadec) Dignidade da pessoa humanad) Legalidade

Questatildeo 19 - Marque a opccedilatildeo INCORRETAa) Aleacutem da defesa eficiente da tese o Judiciaacuterio pode promover a alteraccedilatildeo legislatishy

va como estrateacutegia de soluccedilatildeo para os casos difiacuteceis e polecircmicos que natildeo tinham decisatildeo justa com base no direito positivado

b) A ponderaccedilatildeo das circunstacircncias do caso concreto foge agrave previsibilidade de um sistema formal previamente concebido com precisatildeo absoluta

c) Por meio dos princiacutepios do direito eacute mais faacutecil argumentar a favor de teses de receptividade minoritaacuteria no ordenamento juriacutedico paacutetrio

d) A argumentaccedilatildeo deve considerar o contexto em que se deram os fatos as inshyfluecircncias que o motivaram bem como o estado psicoloacutegico de quem praticou a conduta

Questatildeo 20 - o Direito eacute uma ciecircncia dinacircmica que progride conforme a exishygecircncia social Nesse contexto novos ramos do Direito foram vislumbrashydos a fim de sistematizar os conhecimentos contemporacircneos que careshycem de tratamento juriacutedico Com base nessa afirmativa indique qual a uacutenica opccedilatildeo que NAtildeO constitui um novo ramo do Direito

a) Biodireitob) Direito dos homoafetivosc) Direito da informaccedilatildeod) Direito espacial

208 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 21 - Leia o fragmento que segue

ldquoO maior problema juriacutedico criado pelas poliacuteticas de cotas que incidem nos concursos puacuteblicos especialmente nos concursos vestibulares relaciona-se diretamente agrave violaccedilatildeo de princiacutepios do serviccedilo puacuteblico como a impessoalidade a eficiecircncia a legalidade e a moralidade (toshydos violados pela existecircncia de tais privileacutegios) Na verdade a funccedilatildeo dos concursos puacuteblicos natildeo eacute o de distribuir benesses ou meramenshyte selecionar aquele que merece receber um salaacuterio ou frequentar uma faculdade puacuteblica Os oacutergatildeos puacuteblicos tecircm funccedilotildees puacuteblicas e tais concursos visam a selecionar os que tecircm melhores condiccedilotildees ou competecircncias para ocupar as funccedilotildees essenciais ao cumprimento das obrigaccedilotildees dos respectivos oacutergatildeosrdquo (Renato Amoedo Rodrigues)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute CORRETOa) O paraacutegrafo eacute predominantemente narrativo porque enumera os princiacutepios da administraccedilatildeo puacuteblicab) O paraacutegrafo eacute predominantemente narrativo porque informa a poliacutetica nacional de

cotas para negros em universidades puacuteblicasc) O paraacutegrafo eacute predominantemente argumentativo porque trata de um ldquoproblema

juriacutedicordquo (primeira linha) e toda lide soacute eacute exposta por meio de textos puramente argumentativos

d) O paraacutegrafo eacute predominantemente argumentativo porque recorre a princiacutepios constitucionais para sustentar sua tese

Questatildeo 22 - Leia o fragmento que segue

ldquoEm 1937 eles foram presos sob a acusaccedilatildeo de ter matado o soacutecio e primo Benedito Pereira Caetano que desapareceu sem deixar rastro levando 90 contos de reacuteis hoje o equivalente a 270 mil reais O Deleshygado chegou agrave conclusatildeo de que os irmatildeos mataram o primo para ficar com o dinheiro A poliacutecia torturou ateacute familiares para descobrir o esconshyderijo do dinheiro conseguindo dessa forma a confissatildeo dos presos que levados a juacuteri foram absolvidos a acusaccedilatildeo natildeo se conteve e reshycorreu os jurados mantiveram a absolviccedilatildeo Como na eacutepoca o juacuteri natildeo tinha soberania o Tribunal de Justiccedila reformou a decisatildeo e condenou Joaquim e Sebastiatildeo a 16 anos e seis meses de reclusatildeo Oito anos depois tiveram livramento condicional Joaquim pouco depois morreu como indigente e Sebastiatildeo encontrou o primo vivo em julho de 1952 constatando assim a inexistecircncia do homiciacutedio o acerto dos jurados com a decisatildeo de absolviccedilatildeo e o grande erro do Tribunal A descobershyta provocou accedilatildeo de revisatildeo criminal que concluiu por inocentar os irmatildeos em 1953 e em 1960 o Judiciaacuterio concedeu indenizaccedilatildeo aos herdeirosrdquo (wwwJusnavigandicombr)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute INCORRETOa) O fragmento eacute predominantemente narrativob) A narrativa do fragmento eacute valorada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 209

c) A narrativa apresenta todos os seus elementos constitutivos ldquoo quecirc quem onde quando como porquecirc por issordquo

d) Haacute no fragmento a descriccedilatildeo a serviccedilo da narrativa

Questatildeo 23 - Leia o fragmento que segue

Marcos Mariano da Silva mecacircnico pernambucano casado e pai de filhos foi preso em 1976 porque foi confundido com o homicida que tinha o mesmo nome Em 1992 durante uma rebeliatildeo policiais inshyvadiram o presiacutedio e Marcos foi atingido por estilhaccedilos de granada causando-lhe a perda da visatildeo passou 19 anos na cadeia perdeu a sauacutede o emprego a mulher os filhos e morreu de infarto jaacute em libershydade Seis anos depois o verdadeiro criminoso apareceu e foi preso mas natildeo serviu para reparar o erro cometido contra Marcos O Estado de Pernambuco foi reconhecido como responsaacutevel pelos danos sofrishydos pelo mecacircnico e terminou condenado a pagar indenizaccedilatildeo de R$2 milhotildeesrdquo (wwwJusnavigandicombr)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute INCORRETOa) O fragmento eacute predominantemente narrativob) O fragmento eacute predominantemente argumentativoc) A narrativa apresenta todos os seus elementos constitutivos ldquoo quecirc quem onde

quando como por quecirc por issordquod) O fragmento eacute marcado pela presenccedila de modalizadores

Questatildeo 24 - A respeito da tipologia textual na produccedilatildeo do texto juriacutedicoNAtildeO eacute possiacutevel afirmar quea) A narraccedilatildeo e descriccedilatildeo podem estar a serviccedilo da argumentaccedilatildeob) A descriccedilatildeo consiste em enumerar os fatos e as caracteriacutesticas que decorrem na

linha do tempo para constituir um enredoc) A Fundamentaccedilatildeo de um determinado ponto de vista exige do argumentador

muitas vezes que alguns fatos motivadores de sua tese sejam narradosd) Narraccedilatildeo descriccedilatildeo e dissertaccedilatildeo podem compor juntas um soacute texto e sua seshy

paraccedilatildeo soacute se justifica por razotildees acadecircmicas

Questatildeo 25 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSAa) A produccedilatildeo de argumentos eacute procedimento abstrato que exige do argumentador

sensibilidade e consistecircncia na abordagem de uma seacuterie de temas socialmente relevantes

b) A fundamentaccedilatildeo eacute texto de tipo injuntivo e visa a comprovar que o magistrado estaacute equivocado nas suas convicccedilotildees

c) A fundamentaccedilatildeo consiste em persuadir o auditoacuterio acerca de um ponto de vista que se pretende sustentar

210 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

d) O sucesso da argumentaccedilatildeo eacute influenciado pela qualidade da narraccedilatildeo anterior quando todos os fatos juridicamente importantes do caso concreto satildeo organizashydos em ordem cronoloacutegica

e) Uma fundamentaccedilatildeo deve recorrer a diversificadas estrateacutegias argumentativas a fim de potencializar as chances de aceitaccedilatildeo daquilo que se sustenta

Questatildeo 2 6 - 0 fragmento transcrito revela a presenccedila de

ldquoDe acordo com as conclusotildees do Parecer Teacutecnico exarado pelo corpo teacutecnico da Fundaccedilatildeo Municipal do Meio Ambiente nas plantas e proshyjetos do empreendimento natildeo foi respeitado o afastamento legal de 30 metros das margens dos canais existentes no terreno onde se pretenshyde edificar aacutereas essas consideradas pela legislaccedilatildeo paacutetria como de Preservaccedilatildeo Permanenterdquo

a) Argumentaccedilatildeo purab) Descriccedilatildeo predominantec) Demonstraccedilatildeo a serviccedilo da argumentaccedilatildeod) Demonstraccedilatildeo pura

Questatildeo 27 - Todas as assertivas abaixo tratam do ingresso em universidashydes por meio da poliacutetica de cotas Leia as opccedilotildees e identifique aquela que revela uma tese sobre essa questatildeo

a) Os ministros do Supremo Tribunal Federal trouxeram em seus votos profundo estudo sobre accedilotildees afirmativas e sua legitimidade constitucional

b) O Supremo Tribunal Federal posiciona-se pela legitimidade constitucional das cotasc) A discussatildeo acerca das cotas nas universidades trouxe para o Ensino Superior

mais visibilidade que o Ensino Meacutediod) Para o correto tratamento do tema o Supremo Tribunal Federal precisa ter clashy

reza e meacutetodo para definir o criteacuterio ldquoetniardquo a fim de evitar a denominada discrishyminaccedilatildeo inversa

Questatildeo 2 8 - 0 fragmento que segue trata das limitaccedilotildees de uso das vagas em condomiacutenios ediliacutecios

Se um automoacutevel estranho ou seja de uma pessoa estranha ao edifiacuteshycio entra na nossa garagem - por conta de a sua vaga ter sido vendishyda ou alugada para algueacutem estranho ao edifiacutecio - todas as normas de seguranccedila adotadas pelo condomiacutenio ficariam fragilizadas

Com relaccedilatildeo ao planejamento da argumentaccedilatildeo juriacutedica pode-se dizer que o fragmento eacute classificado CORRETAMENTE comoa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacuteteses

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 211

Questatildeo 29 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoChamam atenccedilatildeo os casos de chargeback (cancelamento de uma venda feita com cartatildeo de deacutebito ou creacutedito que pode acontecer por dois motivos um deles eacute o natildeo reconhecimento da compra por parte do titular do cartatildeo - algum tipo de fraude e o outro pode se dar pelo fato de a transaccedilatildeo natildeo obedecer agraves regulamentaccedilotildees previstas nos contratos termos aditivos e manuais editados pelas administradoras Ou seja o lojista vende e depois descobre que o valor da venda natildeo seraacute creditado porque a compra foi considerada invaacutelida)

()

Jaacute que ocorreu o chargeback os riscos entre o comerciante e a adshyministradora de cartotildees de creacutedito ou deacutebito deveriam ser repartidos entre esses dois sujeitos os quais atuam no mercado de consumo asshysumindo os riscos do empreendimento (wwwjusnavigandicombr)

O segundo paraacutegrafo do fragmento transcrito com relaccedilatildeo aos elementos constitutivos do planejamento argumentativo refere-se aa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacuteteses

Questatildeo 30 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoMuito se tem falado recentemente sobre a necessidade a legalidade e a constitucionalidade do Exame de Ordem A questatildeo chegou ao Sushypremo Tribunal Federal onde por meio do Recurso Extraordinaacuterio n 603583 sob relatoria do Ministro Marco Aureacutelio discutiu-se a constitushycionalidade do Estatuto da OAB (Lei n 890694) e a possibilidade de inscriccedilatildeo na Ordem dos Advogados do Brasil sem a devida aprovaccedilatildeo no referido examerdquo

a) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute constitucional e legal ainda que desnecessaacuterio

b) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute constitucional mas ilegal e desnecessaacuterio

c) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute inconstitucional e ilegal mas necessaacuterio

d) O fragmento natildeo deixa clara uma tese

Questatildeo 31 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoA corrupccedilatildeo em sentido amplo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil eacute em si um mal e representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da po-

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

puiaccedilatildeo do Brasil Sem deixar de reconhecer que a corrupccedilatildeo em um paiacutes estaacute intimamente ligada a fatores como a cultura e a educaccedilatildeo de seu povo sendo inclusive no Brasil diagnosticaacutevel como um estado de anomia social mostra contudo que ela sempre recua sua incidecircnshycia quando o controle preventivo e o repressivo satildeo ampliados Eacute por essa razatildeo que a atuaccedilatildeo eficaz do Ministeacuterio Puacuteblico tem proporcioshynado a diminuiccedilatildeo da anomia social no que diz respeito agrave poliacutetica e agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica no Brasilrdquo (Marco Aureacutelio Lustosa Caminha)

a) A tese do paraacutegrafo estaacute resumida em ldquoa corrupccedilatildeo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da populaccedilatildeo do Brasil

b) Ao mencionar que ldquosem deixar de reconhecer que a corrupccedilatildeo em um paiacutes estaacute intimamente ligada a fatores como a cultura e a educaccedilatildeo de seu povordquo o argu- mentador natildeo reconhece o elemento valores como motivador da corrupccedilatildeo

c) O trecho ldquoeacute por essa razatildeo que a atuaccedilatildeo eficaz do Ministeacuterio Puacuteblico tem proporshycionado a diminuiccedilatildeo da anomia social no que diz respeito agrave poliacutetica e agrave Adminisshytraccedilatildeo Puacuteblica no Brasilrdquo natildeo eacute modalizado

d) No trecho ldquoa corrupccedilatildeo em sentido amplo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil eacute em si um mal e representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da populaccedilatildeo do Brasilrdquo a palashyvra ldquotalvezrdquo sugere que a corrupccedilatildeo pode natildeo ser um problema

Questatildeo 32 - Com base no fragmento que segue marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoA superpopulaccedilatildeo dos presiacutedios eacute fato incontestaacutevel o pior entretanto eacute que esse descaso com a liberdade alheia ocorre em funccedilatildeo de erros despreparo e corrupccedilatildeo da maacutequina burocraacutetica do Estado Muitos cishydadatildeos satildeo jogados na cadeia sem terem sido julgados outros estatildeo presos porque furtaram uma lata de oacuteleo um pacote de bolachaTais agressotildees agrave liberdade do cidadatildeo ou tais erros provocam uma seacuterie de questionamentos acerca da confianccedila no sistema e da seguranccedila juriacutedica porque inocentes satildeo condenados a ficarem atraacutes das grades e deixa-se de prender grande nuacutemero de criminosos bem conhecidos Ademais mostra o sucateamento da maacutequina penitenciaacuteria o despreshyparo dos agentes puacuteblicos A culpa por tais equiacutevocos poderia ateacute recair na fragilidade dos inqueacuteritos policiais porque a poliacutecia apressa-se no afatilde de desvendar o crime natildeo se pode desconsiderar tambeacutem que a confissatildeo obtida por meio de tortura implantada desde 1964 ainda eacute usada ateacute hoje pela poliacuteciardquo () (wwwJusnavigandicombr)

a) A tese defendida no fragmento eacute a de que os erros judiciais que levam aacute prisatildeo inocentes decorre do descaso na prestaccedilatildeo da jurisdiccedilatildeo

b) O argumentador aponta como causa dos erros judiciais a investigaccedilatildeo mal realishyzada pela poliacutecia

c) O sucateamento da maacutequina penitenciaacuteria e o despreparo dos agentes puacuteblicos satildeo fatos (contextualizaccedilatildeo do real) que reforccedilam a tese

d) Haacute no fragmento a redaccedilatildeo de uma hipoacutetese argumentativa

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 213

Questatildeo 33 - Marque a opccedilatildeo INCORRETA

a) A situaccedilatildeo de conflito consiste na apresentaccedilatildeo em paraacutegrafo curto das seguinshytes informaccedilotildees o quecirc Quem Quando Onde

b) Atese eacute o ponto de vista que se pretende defender em um texto argumentativoc) A contextualizaccedilatildeo do real consiste na seleccedilatildeo dos fatos importantes do conflito

organizados em toacutepicos com vistas agrave defesa da tesed) As hipoacuteteses natildeo guardam relaccedilatildeo com a tese pois satildeo apenas argumentos

virtuais que podem natildeo ser utilizados na fundamentaccedilatildeo

Questatildeo 34 - As duas informaccedilotildees que compotildeem o fragmento adiante devem ser lidas como dois periacuteodos consecutivos que formam um uacutenico paraacuteshygrafo Marque a opccedilatildeo CORRETA

1a informaccedilatildeo Uma boa tese na aacuterea juriacutedica deve buscar amparo na norma e ter coerecircncia com os fatos selecionados para a contextuashylizaccedilatildeo do real2a informaccedilatildeo O argumentador pode se valer de toda a construccedilatildeo jaacute realizada pela dogmaacutetica juriacutedica para validar seus raciociacutenios

a) A primeira informaccedilatildeo eacute verdadeira e a segunda informaccedilatildeo eacute falsa Natildeo existe relaccedilatildeo entre as duas informaccedilotildees

b) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo verdadeiras mas as duas natildeo possuem relaccedilatildeo entre si

c) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo falsas mas ambas se relacionamd) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo verdadeiras e a segunda continua o

raciociacutenio iniciado na primeira

Questatildeo 35 - Leia o fragmento que segue

ldquoSe o franqueador eacute um beneficiaacuterio do serviccedilo prestado por todo aquele sob sua franquia natildeo estaria ele coobrigado pelos deacutebitos trashybalhistas de seus franqueadosrdquo

Quanto aos itens do planejamento do texto argumentativo pode-se dizer que o fragmento deve ser identificado comoa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacutetese

Questatildeo 36 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoA recentiacutessima Lei 12607 sancionada no dia 04042012 ao alterar o sect 1deg do art 1331 do Coacutedigo Civil determina que lsquo(bullbullbull) os abrigos para veiacuteculos () natildeo poderatildeo ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomiacutenio salvo autorizaccedilatildeo expressa na convenccedilatildeo de condomiacuteniorsquo Natildeo eacute preciso fazer-se grandes exerciacutecios mentais de

214 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

investigaccedilatildeo para se concluir que eacute clara eacute cristalina a preocupaccedilatildeo maior que motivou esse meritoacuterio aperfeiccediloamento da legislaccedilatildeo con- dominial a seguranccedila Todos quantos vivemos ou viveram em granshydes cidades sabemos das peculiaridades desse problema especiacutefico da nossa sociedade e que tem evoluiacutedo no mesmo compasso que a realidade econocircmica do nosso paiacutes e do nosso povo

O paraacutegrafo foi produzido a partir de proposta de um introito do tipoa) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 37 - Leia o paraacutegrafo que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoCom o gradual enchimento das nossas cidades mais e mais edishyfiacutecios foram tomando o lugar das casas - poreacutem o nuacutemero meacutedio de automoacuteveis por apartamento jaacute haacute bastante tempo tem crescido a uma progressatildeo bem maior Acresccedila-se a isso que os bons venshytos que tecircm soprado ultimamente sobre a economia brasileira aceshyleraram ainda mais dramaticamente essa carecircncia por vagas por conta da realizaccedilatildeo do antigo sonho de consumo do nosso povoo automoacutevel proacuteprio Consequecircncia direta desse fenocircmeno foi que as ruas das cidades meacutedias e grandes viraram imensos estacionashymentos mormente agrave noite Eacute esse o contexto que inspirou a proishybiccedilatildeo de alienaccedilatildeo ou locaccedilatildeo de vagas em condomiacutenio pela Lei 126072012rdquo

O argumento foi redigido com base em que tipo de argumentoa) Argumento de autoridadeb) Argumento de senso comumc) Argumento de causa e efeitod) Argumento a fortiori

Questatildeo 38 - Leia o fragmento adiante

ldquoQuanto ao cumprimento da oferta nas compras coletivas realizadas pela internet podem-se visualizar duas situaccedilotildees distintas e de notaacuteshyvel importacircncia praacutetica1 Simples desistecircncia de um ou alguns consumidores em prosseguir na contrataccedilatildeo2 Ocorrecircncia de chargeback (cancelamento da compra por cartatildeo sem pagamento pelo valor da compra)Na primeira situaccedilatildeo entendemos que natildeo haveraacute de fato a possibishylidade de os consumidores que jaacute haviam aderido agrave oferta exigir-lhe o cumprimento forccedilado pois estes jaacute sabiam da condiccedilatildeo estabelecida

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 215

pelos fornecedores no sentido do cancelamento da oferta por insushyficiecircncia de consumidores aderentes Nesse caso sequer haveraacute a emissatildeo dos cupons uma vez que o numeraacuterio necessaacuterio a viabilizar o preccedilo mais baixo por parte do fornecedor natildeo seraacute alcanccedilado Assim a oferta poderaacute ser legitimamente canceladaContudo no caso de chargeback a depender do caso pensamos que os consumidores remanescentes poderatildeo exigir o cumprimento forccedilashydo da oferta nos termos do inciso I do art 35 do CDC porque haacute que se respeitar a boa-feacute desses consumidores

O fragmento anterior revela a existecircncia de todos os argumentos indicados EXCETO um Marque essa opccedilatildeoa) Argumento proacute-teseb) Argumento de oposiccedilatildeoc) Argumento de causa e efeitod) Argumento de autoridade

Questatildeo 39 - Leia as assertivas abaixo acerca do argumento de autoridade e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - No argumento de autoridade a conclusatildeo se sustenta pela citaccedilatildeo de umafonte confiaacutevel que pode ser uma estatiacutestica pesquisa cientiacutefica a proacutepria lei ou o direito natural

II - O argumento de autoridade pode ter como fonte uma frase dita por liacuteder poliacuteticoartista famoso ou algum pensador enfim uma autoridade no assunto abordado na argumentaccedilatildeo

III - A citaccedilatildeo de uma fonte pode auxiliar no convencimento mas eacute importante relashycionar a validade e a consistecircncia da fonte ao caso concreto a fim de aumentar a persuasatildeoa) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIc) Estaacute correta apenas a assertiva IIId) Estatildeo corretas as assertivas II e III

Questatildeo 40 - Leia as assertivas abaixo acerca do argumento de causa e efeito e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - O argumento de causa e efeito para comprovar uma tese busca os nexos queligam dois eventos relevantes do conflito

II - Para o Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho (Livro ldquoPrograma de Responshysabilidade Civilrdquo) ldquocausardquo e ldquofatorrdquo satildeo fenocircmenos idecircnticos sem qualquer distinccedilatildeo

216 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

III - qualquer relaccedilatildeo de causa e efeito caracteriza um argumento de causa e efeito independente de o efeito ser faacutetico ou juriacutedicoa) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIc) Estaacute correta apenas a assertiva IIId) Estatildeo corretas as assertivas II e III

Questatildeo 41 - Leia o fragmento abaixo e identifique o tipo de argumento preshydominante

ldquoAo se desesperar num congestionamento em Satildeo Paulo daqueles em que o automoacutevel natildeo se move nem quando o sinal estaacute verde o indiviacuteduo deve saber que por traacutes de sua irritaccedilatildeo crocircnica e cotidiana estaacute uma monumental ignoracircncia histoacuterica pois Satildeo Paulo soacute chegou

a esse caos porque um seleto grupo de dirigentes decidiu no iniacutecio do seacuteculo que natildeo deveriacuteamos ter metrocircrdquo (Adaptado de Folha de S Paulo 01102000)

a) Argumento de causa e efeitob) Argumento de analogiac) Argumento de autoridaded) Argumento proacute-tese

Questatildeo 42 - Leia as assertivas abaixo sobre o argumento proacute-tese e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - ao empregar o argumento proacute-tese busca-se a sustentaccedilatildeo da tese com basenos fatos da contextualizaccedilatildeo do real

II - Os fatos selecionados da contextualizaccedilatildeo do real satildeo informaccedilotildees concretasextraiacutedas da narrativa juriacutedica

III - A ausecircncia dos conectores ldquoporque ldquoe tambeacutem e ldquoaleacutem dissordquo pode tornaro texto narrativo em decorrecircncia do encadeamento sistemaacutetico de fatos sem motivaccedilatildeo argumentativaa) Estatildeo corretas as assertivas I e IIIb) Estatildeo corretas as assertivas I e IIc) Estatildeo corretas as assertivas II e IIId) Estatildeo corretas as assertivas I II e III

Questatildeo 43 - A afirmaccedilatildeo ldquocontra fatos natildeo haacute argumentosrdquo daacute ecircnfase agrave fonte do argumentoa) De autoridadeb) De senso comumc) Proacute-tesed) De oposiccedilatildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 217

Questatildeo 4 4 - 0 argumento de causa e efeito eacute aquele que visa a estabelecer nexo causal entre dois eventos ou seja aquele que pretende relacionar uma conduta agraves consequecircncias juriacutedicas dela decorrentes a fim de resshyponsabilizar seu causador Identifique qual eacute a causa (e natildeo consequecircnshycia) do asseacutedio moral no ambiente de trabalhoa) baixa autoestimab) depressatildeoc) desejo claro de humilhar e denegrird) sede de vinganccedila

Questatildeo 45 - Leia o fragmento que segue

ldquoQualquer cidadatildeo pode ser viacutetima de erro judiciaacuterio mas a histoacuteria mostra que a grande maioria dos casos envolve pessoas carentes negras e sem escolaridade que natildeo possuem a miacutenima condiccedilatildeo para custear as despesas com advogados necessitando do trabalho dos defensores puacuteblicos em muito pouco nuacutemero no Judiciaacuterio brasileirordquo (wwwJusnavigandicombr)

Trata-se de um argumentoa) de autoridadeb) de analogiac) de causa e efeitod) de oposiccedilatildeo

Questatildeo 46 - No fragmento adiante encontram-se todos os argumentos listashydos nas alternativas EXCETO um Marque essa opccedilatildeo

ldquoNatildeo poderiacuteamos falar simplesmente da responsabilizaccedilatildeo civil pelo dano esteacutetico sem deixar de observar brevemente a tipificaccedilatildeo penal da ofensa agrave integridade fiacutesica ou agrave sauacutede da pessoa pois do entrelaccedilashymento de ambos os institutos eacute que se extraiacutera a base de uma exegese sistemaacutetica mais seguraO crime de lesatildeo corporal consistente em qualquer ofensa ocasionada por algueacutem sem vontade de matar agrave integridade fiacutesica ou sauacutede (fisioshyloacutegica ou mental) de outrem Natildeo se trata como seria possiacutevel supor apenas do mal infligido agrave inteireza anatocircmica da pessoaComo bem defendeu o saudoso mestre Nelson Hungria a lesatildeo corporal compreende toda e qualquer ofensa ocasionada agrave norshymalidade funcional do corpo ou organismo humano seja do ponto de vista anatocircmico seja do ponto de vista fisioloacutegico ou psiacutequico Mesmo a desintegraccedilatildeo da sauacutede mental eacute lesatildeo corporal pois a inteligecircncia a vontade ou a memoacuteria dizem com a atividade funcioshynal do ceacuterebro que eacute um dos mais importantes oacutergatildeos do corpo Natildeo se concebe uma perturbaccedilatildeo mental sem um dano agrave sauacutede e eacute inconcebiacutevel um dano agrave sauacutede sem um mal corpoacutereo ou uma alteraccedilatildeo do corpo

218 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Quer como alteraccedilatildeo da integridade fiacutesica quer como perturbaccedilatildeo do equiliacutebrio funcional do organismo (sauacutede) a lesatildeo corporal resulta sempre de uma violecircncia exercida sobre a pessoardquo (wwwJusnavigan- dicombr)

a) de autoridadeb) de senso comumc) de analogiad) de causa e efeito

Questatildeo 4 7 - 0 argumento predominante no fragmento eacute

ldquo() Afora a responsabilidade penal nos casos supramencionados temos a civil que como sabido em regra natildeo se confundem e satildeo independentes - embora em verdade sejam interdependentes - poshydendo tramitar accedilotildees concomitantemente salvo havendo incidentes de prejudicialidade externa evidente Ademais a sentenccedila penal (con- denatoacuteria ou absolutoacuteria) poderaacute influenciar na sentenccedila civil embora a reciacuteproca natildeo seja verdadeirardquo (wwwJusnavigandicombr)

a) de oposiccedilatildeob) de autoridadec) de analogiad) de causa e efeito

Questatildeo 48 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

A responsabilidade meacutedica eacute mateacuteria que vem sendo atualmente vastamente debatida seja no campo civil penal ou mesmo eacutetico Obshyservamos no entanto tratar-se essa discussatildeo principalmente na aacuterea da responsabilizaccedilatildeo civil de verdadeira renascenccedila da temaacutetica em torno da atuaccedilatildeo do profissional meacutedico (ou odontoloacutegico) talvez deflagrada por ocasiatildeo do surgimento e aplicaccedilatildeo das normas consshytantes do Coacutedigo de Defesa do Consumidor (CDC) pois que outrora esse assunto jaacute foi motivo de calorosos embates como atesta a primoshyrosa obra do Prof Hermes Rodrigues de Alcacircntara lsquoResponsabilishydade Meacutedicarsquo lanccedilada em 1971 A responsabilidade civil meacutedica portanto nada mais eacute do que a obrigaccedilatildeo do meacutedico ou da cliacuteshynica responsaacutevel de arcar com os prejuiacutezos causados a outrem quando houver a comprovaccedilatildeo de danos decorrentes da atuaccedilatildeo desses profissionaisrdquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Observa-se um breve introito com localizaccedilatildeo da questatildeo discutida no tempo e no espaccedilo

b) O argumentador recorre agrave autoridade do jurista para reforccedilar sua tesec) Observa-se um argumento de causa e efeito para reforccedilar a tesed) O argumentador estabelece uma relaccedilatildeo analoacutegica comparativa para reforccedilar

sua tese

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 219

Questatildeo 49 - Com base no que afirma o fragmento a opccedilatildeo que NAtildeO apreshysenta uma causa excludente da responsabilidade civil eacute

ldquoSendo contratada uma cliacutenica meacutedica (fornecedor de serviccedilo) e natildeo meacutedico (profissional liberal - art 14 sect4deg do CDC) impotildee-se portanto em caso de dano decorrente de cirurgia aplicar-se a responsabilizashyccedilatildeo objetiva bastando dessa feita estar comprovado o dano e o nexo de causalidade entre aquele e a atuaccedilatildeo da cliacutenica bem como inexisshytecircncia de caso fortuito forccedila maior ou culpa exclusiva do consumidor ou de terceirordquo

a) Caso fortuito e forccedila maiorb) Culpa exclusiva do consumidorc) A prestaccedilatildeo do serviccedilo dar-se por um profissional liberald) Culpa exclusiva de terceiro

Questatildeo 50 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento proacute-tese

a) O ideal eacute que cada fato relevante do caso concreto seja introduzido por conectoshyres sintaacuteticos como ldquoporquerdquo ldquoe tambeacutemrdquo e ldquoaleacutem dissordquo

b) Esse argumento tem como fonte principal trecircs fatos relevantes do caso concreto encadeados de forma loacutegica e persuasiva

c) A ordem dos fatos nesse argumento natildeo eacute relevante importante eacute associar as informaccedilotildees de modo a demonstrar que a tese da parte oposta natildeo tem fundashymento

d) Esse argumento eacute adequado para iniciar a fundamentaccedilatildeo simples

Questatildeo 51 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de oposiccedilatildeo

a) Argumento de oposiccedilatildeo restritiva eacute aquele que recorre a conjunccedilotildees coordenatishyvas restritivas como ldquoemborardquo ldquoainda querdquo ldquomasrdquo e ldquoporeacutemrdquo

b) Argumento que tem como finalidade a quebra de expectativas como estrateacutegia discursiva apoiada no uso dos operadores argumentativos de concessatildeo e de adversidade

c) Argumento que se caracteriza pela introduccedilatildeo de uma perspectiva oposta ao ponshyto de vista defendido pelo argumentador admitindo-o como uma possibilidade de conclusatildeo para depois apresentar como argumento decisivo a perspectiva contraacuteria

d) Argumento que permite antecipar as possiacuteveis manobras discursivas que formaratildeo a argumentaccedilatildeo da outra parte durante a busca de soluccedilatildeo jurisdicional para o conflito enfraquecendo assim os fundamentos mais fortes da parte oposta

Questatildeo 52 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de causa e efeito

a) Visa a estabelecer nexo causal entre uma conduta juridicamente importante e a consequecircncia juriacutedica danosa para a parte argumentadora

220 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

b) Necessita apresentar o efeito decorrente de certo comportamento ou conduta independente da orientaccedilatildeo da lei cujo uso soacute se faz devido no argumento de autoridade

c) Eacute adequado usar esse argumento quando se pretende por exemplo responsashybilizar civilmente empresa prestadora de serviccedilos de transporte em virtude de negligecircncia praticada por um de seus prepostos

d) a relaccedilatildeo entre a causa e o efeito pode ser introduzida por conectores sintaacuteticos como ldquoporquerdquo ldquopoisrdquo ldquoporquantordquo e ldquojaacute querdquo

Questatildeo 53 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de autoridadea) Eacute considerada fonte desse argumento a doutrinab) Eacute considerada fonte desse argumento a legislaccedilatildeoc) Uma de suas fontes eacute a analogia caso observado na hipoacutetese de haver lacuna

nadegislaccedilatildeod) Eacute considerada fonte desse argumento a opiniatildeo fundamentada de especiashy

listas

Questatildeo 54 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de senso comuma) Busca o encadeamento de seus raciociacutenios por meio da razoabilidadeb) Pode decorrer de costumes do direito natural e do direito positivoc) Tem como uma de suas fontes possiacuteveis o bom sensod) Possui forccedila persuasiva tal que no Tribunal do Juacuteri por exemplo pode suplantar

a orientaccedilatildeo da proacutepria norma positivada

Questatildeo 55 - Marque a opccedilatildeo que apresenta apenas argumentos utilizados no texto argumentativo adiante

Eacute recorrente a polecircmica sobre a constitucionalidade da realizaccedilatildeo de provas de concursos puacuteblicos em dia de saacutebado A controveacutersia existe porque certas pessoas por princiacutepio religioso natildeo realizam atividades seculares entre o pocircr do sol de sexta-feira e o pocircr do sol de saacutebado Para esses o art 5o VIII da CRFB garante a natildeo realizaccedilatildeo de provas nesse diaPor outro lado haacute quem entenda que oferecer condiccedilotildees especiais de prova aos sabatistas feriria a isonomia porque colocaria esse grupo em vantagem frente aos demais concorrentes Nessa linha argumenshyta-se que o Estado seria laico e portanto indiferente a qualquer opccedilatildeo religiosaInicialmente cumpre apontar que a Administraccedilatildeo Puacuteblica tem discri- cionariedade para escolher o modo como realizar as provas de conshycurso puacuteblico Atarefa do Administrador Puacuteblico como eacute evidente conshysiste em prover as necessidades puacuteblicas previstas no ordenamento juriacutedico utilizando-se para tanto dos recursos puacuteblicos humanos e

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 221

instrumentos juriacutedicos de que dispotildee com razoabilidade respeito e equidade

a) Argumento de autoridade argumento de causa e efeito e argumento de senso comum

b) Argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e argumento de causa e efeitoc) Argumento de autoridade argumento ad hominem e argumento de causa e efeitod) Argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e argumento de senso comum

Questatildeo 56 - Leia a argumentaccedilatildeo que segue e indique qual o uacutenico argumenshyto que NAtildeO estaacute contemplado no texto

No dia 02022011 acompanhamos com perplexidade o caso envolshyvendo a eliminaccedilatildeo de candidatos a professores da rede puacuteblica do Estado de Satildeo Paulo ocorrida durante a realizaccedilatildeo dos exames de sauacutede e motivada pela obesidade que os acomete Em siacutentese a conshyduta da administraccedilatildeo eacute inconstitucional porque os referidos candidashytos no momento da avaliaccedilatildeo de sauacutede foram vetados pelo setor de periacutecias meacutedicas responsaacutevel pelos exames ao argumento de que a obesidade eacute oficialmente uma doenccedila e por isso os portadores desse mal natildeo estariam aptos a integrar o funcionalismo puacuteblicoAleacutem disso no caso dos professores eliminados do certame o Poshyder Puacuteblico encontra-se totalmente divorciado das diretrizes trashyccediladas pelo Estado Democraacutetico de Direito Dispotildee o art 5o da Lei 81121990 que o legislador ordinaacuterio cumprindo o comando constishytucional estabeleceu criteacuterios objetivos para o ingresso no funcionashylismo puacuteblico sendo que em relaccedilatildeo agrave aptidatildeo fiacutesica e mental (inciso VI) em homenagem aos princiacutepios que regem nosso ordenamento constitucional tal requisito deve ser avaliado de acordo com cada caso especiacutefico isto eacute observando-se a natureza da funccedilatildeo a ser exercida pelo candidato eventualmente aprovado de modo que natildeo haja distorccedilotildees na aplicaccedilatildeo desse criteacuterio e consequentemente inshyjusticcedilas para os candidatosUm dos traccedilos de maior destaque nos concursos puacuteblicos eacute a garantia de igualdade entre os participantes do certame sendo que somente a lei pode estabelecer restriccedilotildees de acesso a determinados cargos e mesmo assim soacute nos casos em que determinadas caracteriacutesticas inerentes ao candidato forem incompatiacuteveis com a natureza da funccedilatildeo a ser desempenhada Tal decorre do princiacutepio da isonomia o qual estaacute expliacutecito no art 5o caput e impliacutecito no art 3o IV ambos da Constituishyccedilatildeo Federal e que proiacutebe consoante esse uacuteltimo preceptivo quaisquer formas de discriminaccedilatildeo expressatildeo essa que adverte-nos que o rol de elementos discriminatoacuterios rechaccedilados pela Constituiccedilatildeo Federal natildeo eacute exaustivo mas meramente exemplificativo

a) Argumento de autoridadeb) Argumento a fortioric) Argumento de senso comumd) Argumento de causa e efeito

222 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 57 - Complete o argumento________________eacute um tipo de argushymento loacutegico no qual algueacutem assume uma ou mais hipoacuteteses e a partir dessas deriva uma consequecircncia incoerente e entatildeo conclui que a suposhysiccedilatildeo original deve estar erradaa) Por absurdob) Ad hominemc) De senso comumd) A fortiori

Questatildeo 58 - Complete o argumento__________ eacute uma falaacutecia identificadaquando algueacutem procura negar uma proposiccedilatildeo com uma criacutetica ao seu autor e natildeo ao seu conteuacutedo Apesar de natildeo possuir bases loacutegicas esse argumento eacute uma forte arma retoacutericaa) qor absurdob) ad hominemc) de senso comumd) a fortiori

Questatildeo 59 - Complete o argumento_______________eacute produzido a partirdas fontes de maior prestiacutegio no Direito

a) de autoridadeb) ad hominemc) a fortiorid) de senso comum

Questatildeo 6 0 - 0 paraacutegrafo a seguir pode ser classificado quanto ao tipo de argumento e quanto agrave forma de organizaccedilatildeo como

ldquoNesse contexto tambeacutem configura atribuiccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico no exerciacutecio de suas atribuiccedilotildees institucionais na defesa dos direitos assegurados na Magna Carta Constitucional emitir recomendaccedilotildees dirigidas ao Poder Puacuteblico aos oacutergatildeos da Administraccedilatildeo Puacuteblica direshyta ou indireta aos concessionaacuterios e permissionaacuterios de serviccedilo puacuteblishyco e agraves entidades que exerccedilam funccedilatildeo puacuteblica delegada ou executem serviccedilo de relevacircncia puacuteblica (art 27 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei 86251993) nos termos das disposiccedilotildees no art 55 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei Complementar Estadual 0572006 bem como do artishygo 27 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei 86251993 cc art 6deg inciso XX da Lei Complementar Federal 751993 (em anaacutelise sistecircmica aplishycado ao Parquet Estadual)rdquo (wwwjusnavigandicombr)

a) De autoridade por induccedilatildeob) De autoridade por deduccedilatildeoc) De analogia por induccedilatildeod) De analogia por deduccedilatildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 223

Questatildeo 6 1 - 0 paraacutegrafo a seguir pode ser classificado quanto ao tipo deargumento como

ldquoEmbora a resoluccedilatildeo n 56 do CNMP natildeo traga a previsatildeo expressa da adoccedilatildeo do criteacuterio do autorreconhecimento natildeo podemos olvidar que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica veda todo e qualquer entendimento juriacutedishyco de forma direta ou indireta na tese jaacute superada da superioridade cultural da sociedade dita majoritaacuteriardquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Ad hominemb) De oposiccedilatildeoc) De analogiad) Por absurdo

Questatildeo 62 - Leia o fragmento a seguir

ldquoNas uacuteltimas deacutecadas o criteacuterio da autoidentificaccedilatildeo eacutetnica vem senshydo o mais amplamente aceito pelos estudiosos da temaacutetica indiacutegena Na deacutecada de 50 o antropoacutelogo brasileiro Darcy Ribeiro baseou-se na definiccedilatildeo elaborada pelos participantes do II Congresso Indige- nista Interamericano no Peru em 1949 para assim definir no texto lsquoCulturas e liacutenguas indiacutegenas do Brasilrsquo o indiacutegena como lsquo(bullbull) aquela parcela da populaccedilatildeo brasileira que apresenta problemas de inadapshytaccedilatildeo agrave sociedade brasileira motivados pela conservaccedilatildeo de cosshytumes haacutebitos ou meras lealdades que a vinculam a uma tradiccedilatildeo preacute-colombiana Ou ainda mais amplamente iacutendio eacute todo o indiviacuteduo reconhecido como membro por uma comunidade preacute-colombiana que se identifica etnicamente diversa da nacional e eacute considerada indiacutegena pela populaccedilatildeo brasileira com quem estaacute em contatorsquo Uma definiccedilatildeo muito semelhante foi adotada pelo Estatuto do iacutendio (Lei 6001 de 19121973) que norteou as relaccedilotildees do Estado brasileiro com as populaccedilotildees indiacutegenas ateacute a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988rdquo (wwwjusnavigandicombr)

Qual o tipo de argumento predominante no paraacutegrafoa) Argumento de oposiccedilatildeo restritivab) Argumento de causa e efeitoc) Argumento de senso comumd) A rgum ento de autoridade

Questatildeo 63 - Leia o paraacutegrafo a seguir

ldquoProcurou seu advogado sensibilizar e convencer o colegiado de deshysembargadores que a indenizaccedilatildeo de 4000 salaacuterios miacutenimos (atualshymente R$ 60000000) extrapolava o limite do razoaacutevel dando ecircnfase que tal valor excede por exemplo ao salaacuterio que o Presidente da Reshypuacuteblica perceberia em seus quatro anos de mandato e que o receshybimento dessa importacircncia pela atriz significaria seu enriquecimento de forma injusta e agraves custas tatildeo somente de lsquouma uacutenica frase de

224 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

uma pequena seccedilatildeorsquo da Revista VEJA bem diferente por exemplo se fosse divulgada atraveacutes de uma reportagem de paacutegina inteira com fotos etcrdquo

Um paraacutegrafo argumentative pode recorrer a diversas fontes argumentativas aomesmo tempo para produzir as ideias necessaacuterias agrave defesa de sua tese Qualo tipo de argumento PREDOMINANTE na produccedilatildeo escritaa) Senso comumb) Autoridadec) Analogiad) Causa e efeito

Questatildeo 64 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA de acordocom o texto

ldquoO Laudo eacute o parecer teacutecnico resultante do trabalho realizado pelo peshyrito via de regra escrito Deve ser redigido pelo proacuteprio perito mesmo quando existem Assistentes Teacutecnicos Os colegas devem receber a oportunidade de examinar o texto e emitir suas opiniotildees Essa tarefa deve ser realizada em conjunto de preferecircncia O perito ganha tempo e reduz os debates infrutiacuteferos dessa forma A maioria dos trabalhos resolve-se dentro do campo teacutecnico sem margem para opiniotildees pesshysoaisUm laudo pericial eacute uma forma de prova cuja produccedilatildeo exige coshynhecimentos teacutecnicos e cientiacuteficos e que se destina a estabelecer na medida do possiacutevel uma certeza a respeito de determinados fatos e de seus efeitos O perito fala somente sobre os efeitos teacutecnicos e cientiacuteficos O Juiz declara os efeitos juriacutedicos desses fatos referidos pelo perito e das conclusotildees desse O perito esclarece os efeitos de fato O Juiz fixa os efeitos de direitordquo (httpulcpericiacombrnoticias phpid=6)

a) A periacutecia funciona como prova admitida em direito De natureza demonstrativa estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

b) Se eacute o Juiz quem ldquofixa os efeitos de direitordquo enquanto ao perito cabe apenas ldquoesclarecer os efeitos de fatordquo o parecer tem reduzida forccedila persuasiva no texto argumentativo

c) A opiniatildeo pessoal do profissional da aacuterea teacutecnica da periacutecia importa ao argumen- tador pois foi ele quem esteve no local onde o corpo de delito foi analisado

d) Laudos satildeo pareceres teacutecnico-formais produzidos por profissionais da aacuterea juriacuteshydica

Questatildeo 6 5 - 0 texto adaptado que segue eacute a sinopse de propaganda de uma obra sobre como redigir periacutecias judiciais Observe

ldquoA periacutecia judicial de engenharia eacute aqui apresentada com todas as fashyses do aspecto processual revelando o comportamento praacutetico e eacutetico

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 225

profissional do perito A exposiccedilatildeo deteacutem-se sobretudo na redaccedilatildeo do laudo estudando a sua estrutura formal e o raciociacutenio loacutegico-dialeacutetico que permite ao magistrado aplicar o direito com seguranccedila e pocircr fim ao conflito entre as partes A obra destina-se preferencialmente aos iniciantes pois sugere diversas maneiras de como utilizar os subsiacutedios concretos fornecidos pela periacutecia para o pleno exerciacutecio da atividade advocatiacuteciardquo (Recebido por e-mail)

Quando o texto afirma que a obra ldquosugere diversas maneiras de como utilizar os subsiacutedios concretos fornecidos pela periacutecia para o pleno exerciacutecio da atividade advocatiacutecia sugere que a periacutecia estaacute a serviccedilo daa) Polifoniab) Induccedilatildeoc) Argumentaccedilatildeod) Deduccedilatildeo

Questatildeo 6 6 - 0 paraacutegrafo adiante eacute o introito de um texto argumentativo Tenshydo em vista a classificaccedilatildeo proposta pelos autores indique aquela que melhor identifica o paraacutegrafo

ldquoA Lei 12654 publicada em 28 de maio de 2012 ainda natildeo entrou em vigor mas jaacute eacute possiacutevel observar que as alteraccedilotildees que traraacute para o processo penal brasileiro embora significativas satildeo tambeacutem polecircmicasrdquo

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 6 7 - 0 paraacutegrafo adiante eacute o introito da motivaccedilatildeo de um acoacuterdatildeo Tendo em vista a classificaccedilatildeo proposta pelos autores indique aquela que melhor identifica o paraacutegrafo

ldquoAto juriacutedico perfeito direito adquirido direito a termo expectativa de direito ato administrativo negociai ato-condiccedilatildeo contribuiccedilatildeo parafisshycal relaccedilatildeo juriacutedica estatutaacuteria enriquecimento sem causa etc satildeo as teses sustentadas pelos protagonistas deste processo em busca de uma soluccedilatildeo para a lide Antes de se acolher qualquer delas entretanshyto cumpre identificar a real relaccedilatildeo juriacutedica existente entre o autor e o reacuteu e analisar os efeitos dela decorrentesrdquo

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

226 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 68 - Os dois paraacutegrafos adiante formam um introito Marque a opccedilatildeoque melhor identifica os paraacutegrafos

ldquoA dinacircmica do mercado de consumo nos dias atuais tem motivado o surgimento de formas alternativas de produccedilatildeo contrataccedilatildeo e prestashyccedilatildeo de serviccedilos A chamada terceirizaccedilatildeo eacute sem duvida a mais coshynhecida e possivelmente a mais praticada Busca-se ao tomar esse tipo de serviccedilo maximizar a produccedilatildeo pela especializaccedilatildeo dos agenshytes nela envolvidos estando a cargo do tomador dos serviccedilos somente a sua atividade-fim atividade vedada a terceirosTambeacutem como forma alternativa de maximizaccedilatildeo da produccedilatildeo e conshysequentemente dos lucros tem-se a oferta de contratos de franquias de um determinado produto marca ou serviccedilo A oferta de contrato de franquia permite ao franqueador expandir suas atividades consolidar e conquistar mercados se beneficiar da parceria de terceiro isto eacute do franqueado e por via de consequecircncia beneficiar-se dos empregados deste haja vista estarem sob um mesmo signo uma mesma bandeishyra ou seja a franquiardquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 69 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETAldquoAtualmente a identificaccedilatildeo criminal no Brasil eacute realizada atraveacutes da identificaccedilatildeo datiloscoacutepica (impressotildees digitais) e da identifishycaccedilatildeo fotograacutefica cumulativamente Em regra o indiciado que se identifica civilmente atraveacutes da apresentaccedilatildeo de documentos vaacutelishydos natildeo eacute submetido agrave identificaccedilatildeo criminal salvo nas hipoacuteteses previstas em lei conforme disposto no artigo 1deg e seguintes da Lei 120372009Ocorre que tanto a identificaccedilatildeo fotograacutefica quanto a datiloscoacutepica ainda que em menor proporccedilatildeo podem ser falhas enquanto a identishyficaccedilatildeo pelo perfil geneacutetico ostenta as vantagens da estabilidade quiacuteshymica do DNA mesmo que decorrido longo periacuteodo de tempo e de sua ocorrecircncia em todas as ceacutelulas nucleadas do corpo humano o que permite a identificaccedilatildeo por meio de um uacutenico fio de cabelo gota de sangue saliva e demais meacutetodos faacuteceis e indoloresrdquo (wwwjusnavi- gandicombr)

A estrutura que melhor identifica a redaccedilatildeo do fragmento eacutea) Introito + argumento de causa e efeito + senso comumb) Argumento proacute-tese + argumento de autoridade + argumento de oposiccedilatildeoc) Introito + argumento de autoridade + causa e efeitod) Argumento de senso comum + argumento proacute-tese + argumento de causa e

efeito

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 227

Questatildeo 70 - Leia o fragmento que segue

ldquoA advocacia antigamente era desenvolver raciociacutenio teacutecnico para conshyvencer o juiz de suas teses e vencer o processo para o cliente Hoje aleacutem disso - que continua a ser uma exigecircncia para a atuaccedilatildeo dos advogados - precisamos gerenciar o nosso escritoacuterio gerenciar os processos do cliente de forma a lhe informar nuacutemeros e dados estrashyteacutegicos Enfim temos que gerir muito mais do que apenas o processo e suas decisotildeesAtualmente os escritoacuterios e ateacute mesmo profissionais liberais que natildeo gerenciam a si mesmos estatildeo fadados a terem poucos clientes e deishyxar de crescer de maneira ordenada e corretaGestatildeo eacute mais do que apenas dar ordens e achar que tudo vai ficar bem porque um problema foi solucionado Gestatildeo eacute criticar o modo atual de organizaccedilatildeo Eacute pensar em maneiras alternativas de controlar e fazer funcionar bem o escritoacuterio Eacute realmente lsquopensarrsquo o seu negoacuteciordquo

De acordo com o texto marque a opccedilatildeo INCORRETAa) O advogado da atualidade deve ser competente (tecnicamente) e empreendedorb) O advogado da atualidade deve reunir as caracteriacutesticas de um bom argumenta-

dor e de um bom administradorc) O advogado da atualidade deve ser completamente diferente do advogado de

antigamented) O advogado da atualidade mesmo sendo competente na atuaccedilatildeo em audiecircncia

pode natildeo ter sucesso profissional

Questatildeo 71 - Satildeo providecircncias adequadas ao argumento de analogia

I Mostrar na argumentaccedilatildeo como se aproveita a decisatildeo por analogia no casoconcreto em anaacutelise

II Quando se tratar de jurisprudecircncia utilizada como paradigma para recursos esshypecial ou extraordinaacuterio aleacutem de mencionar o repertoacuterio autorizado fazer a comparaccedilatildeo analiacutetica

III Se ocorrer citaccedilatildeo de fragmentos marcar o trecho entre aspas

IV Natildeo exagerar na quantidade de citaccedilotildees diretas

V Ao citar o dispositivo que supre uma lacuna normativa justificar a semelhanccedilaque motiva a aplicaccedilatildeo analoacutegica

Satildeo verdadeiras as assertivasa) I II III e Vb) I III IV e Vc) II III e Vd) Todas as assertivas

228 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 72 - Marque a opccedilatildeo que melhor identifica o tipo de argumento deshysenvolvido no fragmento

ldquoNa visatildeo positivista do direito proposta por Kelsen Hart e Bobbio conshysagrou-se uma teoria juriacutedica que reduz o direito agrave regra e agrave sistemaacutetica do seu ordenamento normativo Essa concepccedilatildeo eacute tradicionalmente noshymeada de juspositivismo e natildeo considera a conexatildeo entre a norma e a realidade social Todavia a mudanccedila paradigmaacutetica do seacuteculo XX trouxa agrave baila uma nova forma de compreender o direito deixando de lado a conshycepccedilatildeo de norma como regra positiva Essa nova percepccedilatildeo denominashyda neoconstitucionalismo nas palavras de Juacutelio Ceacutesar Marcellino Juacutenior ldquocompreendeu a inserccedilatildeo de uma nova espeacutecie normativa o princiacutepiordquo

Trata-se dea) Argumento de oposiccedilatildeo

b) Argumento de causa e efeitoc) Argumento de senso comumd) Argumento por absurdo

Questatildeo 73 - Marque a opccedilatildeo que melhor identifica o tipo de argumento deshysenvolvido no fragmento

ldquoO valor normativo supremo da Constituiccedilatildeo natildeo surge bem se vecirc de pronto como uma verdade autoevidente mas eacute resultado de reshyflexotildees propiciadas pelo desenvolvimento da Histoacuteria e pelo empenho em aperfeiccediloar os meios de controle do poder em prol do aprimoshyramento dos suportes da convivecircncia social e poliacutetica Na verdade hoje eacute possiacutevel falar em um momento de constitucionalismo que se caracteriza pela supremacia do Parlamento porque o instante atual eacute marcado pela superioridade da Constituiccedilatildeo a que se subordinam toshydos os poderes por ela constituiacutedos - garantida por mecanismos juris- dicionaiacutes de controle de constitucionalidade - e tambeacutem a Constituiccedilatildeo se caracteriza pela absorccedilatildeo de valores morais e poliacuteticos (fenocircmeno por vezes designado como materializaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo) sobretudo em um sistema de direitos fundamentais autoaplicaacuteveis Aleacutem disso eacute preciso considerar que o poder deriva do povo que se manifesta ordinariamente por seus representantes

Trata-se dea) Argumento proacute-teseb) Argumento de causa e efeitoc) Argumento a fortiorid) Argumento de autoridade

Questatildeo 74 - Leia o fragmento adiante

ldquoOs fetos anencefaacutelicos satildeo seres humanos que podem receber doaccedilotildees [art 542 do Coacutedigo Civil] figurar em disposiccedilotildees testamen-

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 229

taacuterias [art1799 do Coacutedigo Civil] e mesmo ser adotados [art 1621 do Coacutedigo Civil]rdquo (fragmento do texto ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo de autoria do Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau)

O trecho recorre a qual tipo de argumentoa) Argumento de analogiab) Argumento proacute-tesec) Argumento de autoridaded) Argumento ad hominem

Questatildeo 75 - No fragmento que segue identifique a eventual presenccedila de modalizadores e comente o efeito valorativo que se pretende com esse recurso linguiacutestico

ldquoFabiano Ferreira Russi foi preso depois que duas mulheres assaltashydas em Taboatildeo da Serra Satildeo Paulo reconheceram-no como um dos criminosos em um aacutelbum fotograacutefico da poliacutecia O preso estava sozinho no reconhecimento e natildeo tinha antecedentes criminais mas para sua infelicidade foi fotografado depois que o Delegado determinou identishyficaccedilatildeo de todos os torcedores em batida policial Fabiano trabalhava em hotel quatro estrelas da regiatildeo da Vila Madalena Satildeo Paulo e ateacute trinta minutos depois do assalto continuava no trabalho Condenado em 2005 permaneceu preso por quatro anos Busca agora - apoacutes ser inocentado perder emprego e arruinar sua vida - indenizaccedilatildeo pelos danos que a decisatildeo judicial lhe causourdquo (wwwJusnavigandicombr)

Questatildeo 76 - A loacutegica do razoaacutevel exige do profissional do Direito a pondeshyraccedilatildeo de valores relativos a uma seacuterie de circunstacircncias observadas no caso concreto seja em relaccedilatildeo agravequeles que participam da lide seja em relaccedilatildeo ao lugar e ao tempo em que ocorreram os fatos

Com base nos conceitos de Loacutegica do Razoaacutevel e Loacutegica Formal exshyplique de que maneira a adoccedilatildeo por homoafetivos pode ser viabilizada no ordenamento juriacutedico brasileiro

Questatildeo 77 - Os elementos da narrativa forense (centralidade caracteriacutesticas dos personagens social moral fiacutesica psicoloacutegica profissional religioshysa familiar etc educaccedilatildeo quantitativa e qualitativa representatividade social espaccedilo fiacutesico e social tempo cronoloacutegico e psicoloacutegico) contrishybuem para uma argumentaccedilatildeo mais completa e consistente mostrando- -se de grande valor persuasivo

O trecho abaixo publicado na revista Veja em 09022009 eacute referente agrave acusaccedilatildeo de abuso sexual de pacientes feita contra renomado meacutedico

Dono da mais conhecida e bem-sucedida cliacutenica de reproduccedilatildeo asshysistida do paiacutes o meacutedico Roger Abdelmassih 65 anos de Satildeo Paushylo eacute objeto haacute quatro meses de um inqueacuterito policial por suspeita de

230 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

abuso sexual de pacientes Quando a investigaccedilatildeo foi revelada pelo jornal Folha de S Paulo no dia 9 nove mulheres haviam prestashydo depoimento contra Abdelmassih uma semana depois o nuacutemero tinha aumentado para 33 se incluiacutedo um testemunho que estava sendo colhido na sexta-feira ldquoOs relatos se parecem em diversos aspectosMuitas repetem as mesmas expressotildees usadas pelo meacutedicordquo diz Joseacute Reinaldo Carneiro um dos trecircs promotores responsaacuteveis pelo caso no Ministeacuterio Puacuteblico Abdelmassih que ainda natildeo foi ouvido no inqueacuterito em declaraccedilotildees a VE JA negou terminantemente as acusaccedilotildees ldquoNatildeo fiz nada Quando eu for agrave delegacia depor natildeo vou levar uma ou duas testemunhas vou levar um caminhatildeo de pessoas que me conhecem De preferecircncia pessoas de aparecircncia muito bonita que foram minhas clientes para contar se por acaso eu tive qualquer comportamento indevidordquo disse o meacutedico bem reshylacionado e querido por pacientes famosos a quem proporcionou a felicidade de ter filhos

(Disponiacutevel em httpvejaabrilcombr210109p_074shtml)

Indique pelo menos trecircs elementos da narrativa (centralidade caracteriacutesticas dos personagens social moral fiacutesica psicoloacutegica profissional religiosa familiar etc educaccedilatildeo quantitativa e qualitativa representatividade social espaccedilo fiacutesico e soshycial tempo cronoloacutegico e psicoloacutegico) e sua relevacircncia para o texto argumentative Justifique sua resposta com elementos do texto

Questatildeo 78 - Leia o texto adiante e responda ao que se pede

Bandido da Luz Vermelha discurso do jurista Neacutelson Hungria

Cari Chessman conhecido como o Bandido da Luz Vermelha foi um criminoso americano que estuprou e matou duas mulheres em 1960 na Califoacuternia nos Estados Unidos O acusado foi condenado agrave morte pelo juacuteri de Los Angeles e durante doze (12) anos seguidos conseguiu adiar sua execuccedilatildeo e nesse espaccedilo de tempo estudou intensamente na prisatildeo de San Quentin na Califoacuternia Estados Unidos lendo livros de Direito e tambeacutem de idiomas Tendo inclusive aprendido a Liacutengua PortuguesaMesmo preso no corredor da morte o Bandido da Luz Vermelha cheshygou a escrever quatro livros sobre sua causa A cela da morte (2455a) A face da justiccedila A Lei quer que eu morra e Garoto era um assassino O drama de Cari Chessman dominou todo o mundo e surgiram vaacuteshyrias manifestaccedilotildees no sentido de impedir sua execuccedilatildeo na cacircmara de gaacutesO grande jurista brasileiro Neacutelson Hungria Holffbauer liderou um moshyvimento internacional contra a pena de morte usando argumentaccedilatildeo juriacutedica por meio de discursos entrevistas manifestos e sobretudo em cartas dirigidas pessoalmente ao entatildeo Governador da Califoacuternia a quem cabia decidir sobre o Bandido da Luz Vermelha

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 231

Nelson Hungria abraccedilou essa campanha no Brasil com argumentos teacutecnicos e de psicologia juriacutedica para que o preso natildeo mais fosse leshyvado agrave cacircmara de gaacutes uma vez que ao tempo em que permaneceu preso recuperou-se pela dedicaccedilatildeo ao estudo do Direito e tambeacutem de idiomas Neacutelson Hungria que redigia com eloquecircncia clareza e muita convicccedilatildeo colocava seu argumento nos fragmentos a seguir em deshyfesa do Bandido da Luz VermelhaTrata-se de um singulariacutessimo exemplar humano [] vivendo sem tibiezas ou soluccedilotildees de continuidade no seu inexauriacutevel amor agrave vida e o que eacute assombroso tendo conseguido transformar o seu aparenshytemente irremediaacutevel fracasso como homo socialis numa estupenda vitoacuteria sobre si mesmo [] Chessman naquela maleborge dantesa sob o tremendo impacto de seu confinamento na estreita e sombria cela que precede agrave cacircmara de gases toacutexicos em San Quentin pocircde achar-se a si mesmo e do mais profundo do seu ser desvencilhanshydo da empolgadura e cativeiro de sua proacutepria natureza psicopaacutetica que o arrastara gradativamente a mais imprudente e grosseira anishymalidade surgiu um outro homem ateacute entatildeo desconhecido para ele mesmo Aquele Chessman de 27 anos que o juacuteri de Los Angeles condenou-o agrave morte eacute tatildeo diferente do Chessman atual como um carvatildeo difere do diamante Seraacute que Chessman depois de padecero acabrunhante castigo de onze anos de angustiosa expectativa nesshysa cittaacute dolente nesse exasperante purgatoacuterio que eacute o corredor da morte de San Quentin natildeo teraacute conquistado um autecircntico direito de comutaccedilatildeo da pena para continuar a viver Seraacute que o prosseguishymento da vida de Chessman natildeo poderaacute ser a continuidade de um exemplo edificante para os conscritos do crime A pena de morte natildeo traduz mais que o comodismo da administraccedilatildeo da justiccedila que para esquivar-se agrave tarefa de recuperaccedilatildeo de delinquentes perigosos preshyfere eliminaacute-los sem maior trabalho como a catildees danados (Redaccedilatildeo juriacutedica A palavra do advogado n 082004)

Com base no discurso proferido por Neacutelson Hungria produza um argumento deoposiccedilatildeo agrave tese defendida no texto

Questatildeo 79 - Leia o caso concreto adiante consulte as fontes disponiacuteveis e redija a fundamentaccedilatildeo juriacutedica com pelo menos um argumento proacuteshytese um argumento de autoridade e um argumento de oposiccedilatildeo

Considerando que a viacutetima perdeu sua vida de forma brutal a caminho do trabalho realizando pois o mais elementar direito de cidadania qual seja o de ir e vir direito esse tutelado pela norma constitucional soberana e cuja defesa eacute funccedilatildeo principal da autoridade policial Considerando que o agente autoridade policial armada cujo principal dever de ofiacutecio eacute dar proteccedilatildeo e amparo aos cidadatildeos em tempo inshytegral encontrava-se agrave paisana em estado de embriaguez e iniciou violentamente constrangimento agrave viacutetima para conjunccedilatildeo carnal ou ato libidinoso em veiacuteculo de transporte de passageiros demonstrando natildeo possuir o equiliacutebrio necessaacuterio esperado de um homem da lei

232 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Considerando a impertinecircncia ostensiva do agente que ignorou as constantes represaacutelias da viacutetima e o modo frio e covarde com que executou os disparos sem permitir qualquer reaccedilatildeoConsiderando serem necessaacuterias todas as medidas que impeccedilam o processo de banalizaccedilatildeo da vida (ou da morte) humana que todos vivenciamos em nossos dias especialmente por parte daqueles que a deveriam protegerOpina-se pela sumaacuteria expulsatildeo do agressor do efetivo da Poliacutecia Militar sem prejuiacutezo das sanccedilotildees militares legais e que seja acashytada denuacutencia pelo Ministeacuterio Puacuteblico requerendo sua condenaccedilatildeo em rito sumaacuterio (prisatildeo em flagrante) agraves penas previstas no art 121 sect 2deg II do Coacutedigo Penal homiciacutedio doloso qualificado por motivo fuacutetil

Fontes

Homiciacutedio simples Art 121 - Matar algueacutemPena - reclusatildeo de 6 (seis) a 20 (vinte) anos

Homiciacutedio qualificado sect 2o Se o homiciacutedio eacute cometidoI - mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpeII - por motivo fuacutetilIII - com emprego de veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comumIV - agrave traiccedilatildeo de emboscada ou mediante dissimulaccedilatildeo ou outro reshycurso que dificulte ou torne impossiacutevel a defesa do ofendidoV - para assegurar a execuccedilatildeo a ocultaccedilatildeo a impunidade ou vantashygem de outro crimePena - reclusatildeo de 12 (doze) a 30 (trinta) anos

Questatildeo 80 - Leia a sentenccedila citada na parte teoacuterica do capiacutetulo relativo agraves figuras de retoacuterica referente ao Processo n 1863657-42008 (autor Minisshyteacuterio Puacuteblico Estadual reacuteu BSS) Procure identificar as figuras de retoacuteshyrica utilizadas nesta sentenccedila e o efeito persuasivo que possivelmente possam acarretar

Autor Ministeacuterio Puacuteblico Estadual Reacuteu BSSBSS eacute surdo e mudo tem 21 anos e eacute conhecido em Coiteacute como ldquoMudinhordquo

Quando crianccedila entrava nas casas alheias para merendar jogar video-game para trocar de roupa para trocar de tecircnis e depois de algum tempo tambeacutem para levar algum dinheiro ou objeto Conseguia

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 233

abrir facilmente qualquer porta janela grade fechadura ou cadeado Domou os catildees mais ferozes tornando-se amigo deles Abria tambeacutem a porta de carros e dormia candidamente em seus bancos Era motivo de admiraccedilatildeo espanto e medoO Ministeacuterio Puacuteblico ofereceu dezenas de Representaccedilotildees contra o entatildeo adolescente BSS pela praacutetica de ldquoatos infracionaisrdquo dos mais diversos O Promotor de Justiccedila Dr Joseacute Vicente quase o adotou e ateacute o levou para brincar com seus filhos dando-lhe carinho e afeto mas natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquoMudinhordquoO Judiciaacuterio o encaminhou para todos os oacutergatildeos e instituiccedilotildees posshysiacuteveis ameaccedilou prender Diretoras de Escolas que natildeo o aceitavam mas tambeacutem natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquoMudinhordquoA comunidade natildeo fez nada por eleO Municiacutepio natildeo fez nada por eleO Estado Brasileiro natildeo fez nada por eleHoje BSS tem 21 anos eacute maior de idade e pratica crimes conshytra o patrimocircnio dos membros de uma comunidade que natildeo cuidou deleFoi condenado na vizinha Comarca de Valente como ldquoincurso nas sanccedilotildees do art 155 caput por duas vezes art 155 sect 4o inciso IV por duas vezes e no art 155 sect 4o inciso IV cc art 14 inciso IIrdquo a pena de dois anos e quatro meses de reclusatildeoPor falta de estabelecimento adequado cumpria pena em regime aberto nesta cidade de CoiteacuteAqui sem escolaridade sem profissatildeo sem apoio da comunidade sem famiacutelia presente sozinho agraves trecircs e meia da manhatilde entrou em uma marmoraria e foi preso em flagrante Por que uma marmora- riaFoi entatildeo denunciado pelo Ministeacuterio Puacuteblico pela praacutetica do crime previsto no artigo 155 sect4deg incisos II e IV cc o artigo 14 II do Coacutedigo Penal ou seja crime de furto qualificado cuja pena eacute de dois a oito anos de reclusatildeoFoi um crime tentado Natildeo levou nadaPor intermeacutedio de sua matildee foi interrogado e disse que ldquotoma remeacutedio controlado e bebeu cachaccedila oferecida por amigos que ficou completashymente desnorteado e entatildeo pulou o muro e entrou no estabelecimento da viacutetima quando foi surpreendido e preso pela poliacuteciardquoEm alegaccedilotildees finais a ilustre Promotora de Justiccedila requereu sua condenaccedilatildeo ldquopela praacutetica do crime de furto qualificado pela escashyladardquoBSS tem peacutessimos antecedentes e natildeo eacute mais primaacuterio Sua ficha contando os casos da adolescecircncia tem mais de metroO que deve fazer um magistrado neste caso Aplicar a Lei simplesshymente Condenar BSS agrave pena maacutexima em regime fechadoO futuro de BSS estava escrito Se natildeo fosse morto por um ldquoproprieshytaacuteriordquo ou pela poliacutecia seria bandido Todos sabiam e comentavam isso na cidade

234 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Hoje o Ministeacuterio Puacuteblico quer sua prisatildeo e a cidade espera por isso Ningueacutem quer o ldquoMudinhordquo solto por aiacute Deve ser preso Precisa ser retirado do seio da sociedade Levado para a lixeira humana que eacute a penitenciaacuteria Laacute eacute seu lugar Infelizmente a Lei eacute dura mas eacute a Lei O Juiz de sua vez deve ser a ldquoboca da LeirdquoSeraacute O Juiz natildeo faz parte de sua comunidade Natildeo pensa Natildeo eacute um ser humanoDe outro lado seraacute que o Direito eacute somente a Lei E a Justiccedila o que seraacutePoderiacuteamos como jaacute fizeram tantos outros escrever mais de um livro sobre esses temasNesse momento no entanto temos que resolver o caso concreto de BSS O que fazer com eleNenhuma satilde consciecircncia pode afirmar que a soluccedilatildeo para BSS seja a penitenciaacuteria Sendo como ela eacute a penitenciaacuteria vai oferecer a BSS tudo o que lhe foi negado na vida escola acompanhamento especial afeto e compreensatildeo Natildeo Com certeza natildeoEacute o Juiz entre a cruz e a espada De um lado a consciecircncia a feacute cristatilde a compreensatildeo do mundo a utopia da Justiccedila Do outro lado a Lei (metoniacutemia)Neste caso prefiro a Justiccedila agrave LeiAssim BSS apesar da Lei natildeo vou lhe mandar para a Penitenciaacuteria Tambeacutem natildeo vou lhe absolverVou lhe mandar prestar um serviccedilo agrave comunidadeVou mandar que vocecirc pessoalmente em companhia de Oficial de Justiccedila desse Juiacutezo e de sua matildee entregue uma coacutepia dessa decishysatildeo colhendo o ldquorecebidordquo a todos os oacutergatildeos puacuteblicos dessa cidade- Prefeitura Cacircmara e Secretarias Municipais a todas as associashyccedilotildees civis dessa cidade - ONGs clubes sindicatos CDL e maccedilonashyria a todas as Igrejas dessa cidade de todas as confissotildees ao Deshylegado de Poliacutecia ao Comandante da Poliacutecia Militar e ao Presidente do Conselho de Seguranccedila a todos os oacutergatildeos de imprensa dessa cidade e a quem mais vocecirc quiserAproveite e peccedila a eles um emprego uma vaga na escola para adultos e um acompanhamento especial Depois apresente ao Juiz a comshyprovaccedilatildeo do cumprimento de sua pena e natildeo roubes maisExpeccedila-se o Alvaraacute de SolturaConceiccedilatildeo do Coiteacute-Ba 07 de agosto de 2008 ano vinte da Constituiccedilatildeo Federal de 1988

Bei Gerivaldo Alves Neiva Juiz de Direito

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 235

Coletacircnea de textos para exerciacuteciosTexto 1O M IN ISTEacuteRIO PUacuteBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

por meio do Promotor de Justiccedila infra-assinado em esteio de suas atribuishyccedilotildees constitucionais e consoante o disposto no art 220 da Carta Federal e o artigo 149 da Lei 80691990 - Estatuto da Crianccedila e do Adolescente - vem atraveacutes do presente na defesa de interesse difuso afeto aos adolescentes narshyrar os fatos adiante aduzidos para posteriormente requerer o seguinte

1) O Requerente eacute Titular da T Promotoria de Justiccedila da Infacircncia e da Juventude da Comarca da Capital Oacutergatildeo de Execuccedilatildeo com atribuiccedilatildeo para o processamento dos adolescentes envolvidos em praacuteticas infracionais no Rio de Janeiro e concorrentemente com atribuiccedilatildeo para oficiar perante a Justiccedila da Infacircncia e da Juventude

2) Como eacute por demais sabido diferentemente do que ocorre em outras Comarcas do Paiacutes no Rio de Janeiro haacute uma caracteriacutestica peculiar cerca de 70 (setenta por cento) das apreensotildees de adolescentes infratores refeshyrem-se a traacutefico de substacircncias entorpecentes (art 33 da Lei 113432006) aumentando ainda mais esse percentual quando independentemente do tipo de ato infracional perpetrado a sua origem se daacute natildeo soacute por envolvishymento mas tambeacutem o uso (artigos 20 a 26 da Lei 113432006) de substacircnshycias entorpecentes ou que causam dependecircncia fiacutesica ou psiacutequica

3) No uacuteltimo dia 16 de marccedilo do corrente ano entrou em circuito o filme ldquo Trafficrdquo dirigido por Steven Soderbergh recomendado nacionalshymente pela Coordenadoria-Geral de Classificaccedilatildeo Tiacutetulos e Qualificaccedilatildeo da Secretaria Nacional de Justiccedila para ldquo maiores de 18 anos de idaderdquo imshypossibilitando dessa forma que os adolescentes habitantes desta Cidade do Rio de Janeiro possam sozinhos assistir agrave referida produccedilatildeo

4) O filme em questatildeo retrata o submundo do narcotraacutefico nos Estashydos Unidos e mostra uma realidade muito proacutexima da que ocorre no Rio de Janeiro onde os adolescentes que satildeo apreendidos e chegam agrave Justiccedila da Infacircncia e da Juventude tecircm como motivo principal o envolvimento no mundo das drogas

5) Em reportagem veiculada hoje pela Imprensa (em anexo) especiashylistas em drogas puderam emitir suas opiniotildees e parecem concordar com o Ministeacuterio Puacuteblico quando priorizam a educaccedilatildeo na difiacutecil tarefa de comshybater o traacutefico de drogas Segundo Maria Thereza de Aquino Diretora do NEPAD o filme ldquo tem o meacuterito de tratar a questatildeo sem preconceito ou falsos moralismos Saiacutedas Haacute sim Elas dependem de noacutesrdquo

236 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

6 EX POSIT1S pelas razotildees aduzidas requer o Ministeacuterio Puacuteblico seja autorizada judicialmente mediante Alvaraacute a entrada de adolescenshytes desacompanhados dos pais ou responsaacutevel a partir de 16 anos nos estuacutedios de exibiccedilatildeo da Cidade do Rio de Janeiro intimando-se a direccedilatildeo da Europa Filmes Distribuidora do Filme ldquoTrqfficrdquo e o Departamento de Classificaccedilatildeo Indicativa do Ministeacuterio da Justiccedila para a ciecircncia e demais providecircncias cabiacuteveis

(Extraiacutedo da Internet Fonte desconhecida)

Se desejar recorra agraves seguintes fontesAlt 220 da CRFB A manifestaccedilatildeo do pensamento a criaccedilatildeo a expresshysatildeo e a informaccedilatildeo sob qualquer forma processo ou veiacuteculo natildeo sofreshyratildeo qualquer restriccedilatildeo observado o disposto nesta ConstituiccedilatildeoArt 149 I ldquo erdquo do ECA Compete agrave autoridade judiciaacuteria disciplinar atraveacutes de portaria ou autorizar mediante alvaraacute a entrada e permanecircnshycia de crianccedila ou adolescente desacompanhado dos pais ou responsaacuteshyvel em estuacutedios cinematograacuteficos de teatro raacutedio e televisatildeoArt 33 da Lei 113432006 Importar exportar remeter preparar proshyduzir fabricar adquirir vender expor agrave venda oferecer ter em depoacutesishyto transportar trazer consigo guardar prescrever ministrar entregar a consumo ou fornecer drogas ainda que gratuitamente sem autorizaccedilatildeo ou em desacordo com determinaccedilatildeo legal ou regulamentar Pena mdash reshyclusatildeo de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1500 (mil e quinhentos) dias-multaArt 20 da Lei 113432006 Constituem atividades de atenccedilatildeo ao usuaacuteshyrio e dependente de drogas e respectivos familiares para efeito desta Lei aquelas que visem agrave melhoria da qualidade de vida e agrave reduccedilatildeo dos riscos e dos danos associados ao uso de drogas

Texto 2Em uma cidade do interior do Paranaacute trecircs meninos ficaram oacuterfatildeos e

como toda a famiacutelia dos pais era muito pobre nenhum parente quis assumir a guarda deles Os menores tecircm nove onze e doze anos satildeo negros - soshymente o mais velho frequentou a escola ateacute a terceira seacuterie do ensino fundashymental - e estatildeo provisoriamente numa instituiccedilatildeo religiosa da cidade

Haacute dois anos o Juizado da Infacircncia e Juventude procura em todo o Brasil uma famiacutelia que os adote Um casal homoafetivo Joseacute e Joatildeo interessou-se pelos meninos Apoacutes uma sequecircncia de visitas Joseacute ingresshysou com um pedido de adoccedilatildeo dos trecircs meninos e a guarda provisoacuteria que foi desde logo concedida

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 237

O casal tem excelente condiccedilatildeo econocircmica formaccedilatildeo universitaacuteria e a sua opccedilatildeo eacute aceita pelas famiacutelias de ambos e pela comunidade local em que vivem Os laudos apresentados pelos assistentes sociais indicaram que Joseacute tinha condiccedilotildees de adoccedilatildeo e que a opccedilatildeo sexual de Joseacute podeshyria representar dificuldades para os irmatildeos mas que durante o periacuteodo de convivecircncia os trecircs meninos demonstravam gostar da companhia de Joseacute e seu companheiro

O juiz em sua sentenccedila negou o pedido de adoccedilatildeo tendo em vista o art 226 da CRFB com base no entendimento de que a entidade familiar eacute constituiacuteda pela uniatildeo de homem e mulher e que o bem-estar das crianccedilas natildeo poderia ser garantido Acrescentou que o referido artigo se sobrepotildee ao ECA que natildeo estabelece restriccedilatildeo para o solteiro adotar uma crianccedila

Texto 3Roberto Pires contratou os serviccedilos da cliacutenica de Esteacutetica Beleza

Eterna para uma depilaccedilatildeo a laser na regiatildeo da barba e do pescoccedilo por R$ 257600 Ele foi submetido a uma entrevista preliminar com um teacutecnico de esteacutetica - natildeo por um meacutedico - e chegou a informar que tinha foliculite

Logo apoacutes a primeira aplicaccedilatildeo do laser ele apresentou uma graviacutesshysima reaccedilatildeo aleacutergica O consumidor afirma que a aplicaccedilatildeo tambeacutem lhe causou dores de cabeccedila e nos olhos aleacutem de acnes que lhe deixaram com uma aparecircncia horriacutevel Por ser recepcionista de uma grande empresa na aacuterea de comeacutercio exterior ele foi afastado do trabalho e posteriormente perdeu o emprego

Roberto Pires propocircs accedilatildeo indenizatoacuteria em que pediu reparaccedilatildeo pelos danos morais esteacuteticos e materiais Argumenta que todas as provishydecircncias adotadas pela empresa natildeo foram suficientes para anular os efeitos dos danos causados Na Peticcedilatildeo Inicial a viacutetima contou que natildeo realizou exames preacutevios necessaacuterios ao tratamento e em razatildeo dos problemas apreshysentados ficou deprimido teve seu trabalho prejudicado e manteve distanshyciamento do meio social

Sustenta o autor que ldquo a indenizaccedilatildeo deve ser compatiacutevel com a repro- vabilidade da conduta iliacutecita a intensidade e duraccedilatildeo do sofrimento expeshyrimentado pela viacutetima a capacidade econocircmica do causador do dano e as condiccedilotildees sociais do ofendidordquo A reacute afirma que natildeo foi responsaacutevel pelos danos causados ao recepcionista Ao contraacuterio enfatiza que tomou todas as providecircncias posteriores necessaacuterias agrave reparaccedilatildeo do dano mesmo natildeo sendo por ele responsaacutevel

238 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Apoacutes a compreensatildeo do conflito e a leitura das fontes primaacuterias e secundaacuterias que auxiliam a soluccedilatildeo da lide desenvolva uma ementa e uma fundamentaccedilatildeo para o caso concreto Sua fundamentaccedilatildeo deveraacute apresenshytar pelo menos trecircs paraacutegrafos argumentativos diferentes

Texto 4Mariacircngela Gomes de Almeida psicoacuteloga eacute casada com Patriacutecio Goshy

mes de Moura piloto desde marccedilo de 1977 O casamento eacute regido pela comunhatildeo universal dos bens O casal tem duas filhas uma de 18 e outra de 20 anos de idade Os cocircnjuges acumularam um patrimocircnio de cerca de 700 mil reais composto por uma casa de 400 mil reais onde mora o casal dois carros avaliados em 50 mil reais cada e uma casa de praia de 200 mil

Em virtude de sua profissatildeo Patriacutecio realiza frequentes viagens pelo Brasil e natildeo eventualmente passa longos periacuteodos longe de casa Mariacircnshygela e suas filhas jaacute se acostumaram a essa rotina irregular de trabalho Essa eacute uma famiacutelia feliz Todos os parentes e amigos afirmam que Patriacutecio nunca deixou faltar nada para sua famiacutelia nem do ponto de vista financeiro nem moral

Em janeiro de 2005 Patriacutecio morreu e durante seu veloacuterio se descoshybriu que o piloto vivia com Gorete Alves sambista haacute cerca de nove anos Com ela o falecido teve trecircs filhos Ricardo Gomes de Moura Alves (5 anos) Alvina Gomes de Moura Alves (3 anos) e Patriacutecio Gomes de Moura Juacutenior (10 meses de idade) todos devidamente registrados Diante do caishyxatildeo de seu amado Gorete fez questatildeo de exibir fotos do companheiro com ela e os filhos

No uacuteltimo Natal ambos tiveram uma viagem inesqueciacutevel para Buenos Aires Havia tambeacutem fotos tiradas no Dia dos Pais e na Paacutescoa Depois de criar grande estardalhaccedilo no veloacuterio Gorete entregou agrave Mashyriacircngela a fatura do cartatildeo de creacutedito de Patriacutecio que era haacute dois anos remetida para a residecircncia daquela Afirmou a companheira que natildeo pashygaria aquelas despesas porque todas se referiam a gastos feitos com a famiacutelia da esposa

Somente entatildeo Mariacircngela descobriu que Patriacutecio utilizava seu trabashylho como desculpa para dividir o tempo entre as duas famiacutelias Afirma que nunca poderia imaginar que um marido tatildeo zeloso poderia traiacute-la por tanto tempo Gorete ingressa com accedilatildeo judicial visando ao reconhecimento da uniatildeo estaacutevel e pretende se habilitar agrave heranccedila deixada pelo de cujus

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 239

Garante que natildeo apenas seus filhos mas lambeacutem ela tecircm direitos a serem tutelados pois sua uniatildeo com Patriacutecio era puacuteblica duradoura e sem duacutevida tinha por objetivo constituir famiacutelia nos termos da Lei de Uniatildeo Estaacutevel Mariacircngela contesta a accedilatildeo alegando que natildeo pode haver concomitacircncia de dois casamentos assim como de casamento com uniatildeo estaacutevel Essa praacutetica alega atenta contra a moral e os bons costumes Seria precedente perigoso um juiz reconhecer esse tipo de relaccedilatildeo

Texto 5Juiz obriga empresa a fornecer remeacutedio para o estadoDecisatildeo da Justiccedila Federal do Rio Grande do Norte obriga a empresa

Elfa Medicamentos Ltda a fornecer ao governo do Estado potiguar remeacuteshydios para o tratamento de esquizofrenia

A empresa ganhou a licitaccedilatildeo feita pela Secretaria Estadual de Sauacutede para fornecimento dos remeacutedios No entanto como o governo tem deacutebitos acumulados com a empresa ela se negou a fornecer medicamento para o qual concorreu e venceu o pregatildeo A decisatildeo foi do Juiz Federal Janilson Bezerra titular da 4a Vara

ldquo A conduta perpetrada pela empresa demandada natildeo se justifica tenshydo em vista a existecircncia de meios proacuteprios para a cobranccedila de creacuteditos em desfavor do Estado natildeo se mostrando a suspensatildeo do fornecimento do medicamento objeto do presente litiacutegio meio liacutecito para tanto

Assim observa-se que ao deixar de fornecer o medicamento Olan- zapina nas versotildees de 5 e 10 mg a empresa Elfa Medicamentos Ltda estaacute descumprindo as disposiccedilotildees contratuais decorrentes da Ata de Registro de Preccedilos 612010 colocando em risco a sauacutede dos portadores de esquizofreshynia do Estado do RN e de seus familiaresrdquo escreveu o juiz na liminar

Pela decisatildeo a Elfa Medicamentos Ltda tem prazo de 48 horas para fornecer os medicamentos descritos na nota de empenho assinada pelo seshycretaacuterio estadual de Sauacutede

QuestatildeoEm ldquoAssim observa-se que ao deixar de fornecer o medicamento

Olanzapina nas versotildees de 5 e 10 mg a empresa Elfa Medicamentos Ltda estaacute descumprindo as disposiccedilotildees contratuais decorrentes da Ata de Reshygistro de Preccedilos 612010 colocando em risco a sauacutede dos portadores de esquizofrenia do Estado do RN e de seus familiaresrdquo o juiz da liminar fez uso do raciociacutenio dedutivo ou indutivo Justifique

240 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Texto 6Presa em dezembro de 2005 sob acusaccedilatildeo de comandar ataque a um

ocircnibus da linha 350 no bairro da Penha Circular Zona Norte do Rio de Jashyneiro Maria Aparecida Mendonccedila entrou com accedilatildeo indenizatoacuteria em Face do Estado do Rio de Janeiro na 3a Vara de Fazenda Puacuteblica

Depois de ser detida em casa e passar 28 dias na prisatildeo a Poliacutecia Civil admitiu publicamente o equiacutevoco e a soltou A Defensoria Puacuteblica fluminense que a representa estaacute pleiteando R$ 700 mil a tiacutetulo de danos morais aleacutem de uma pensatildeo alimentiacutecia de R$ 35000 mensais

ldquoA jovem foi exposta agrave miacutedia pelas autoridades e natildeo haacute como negar que isso a prejudicou em diversos aspectos inclusive fazendo com que perdesse o emprego de animadora de festas infantisrdquo declarou um dos deshyfensores que atua no processo Maria Aparecida na ocasiatildeo do crime foi identificada por meio de foto por uma garota de 13 anos

Posteriormente natildeo foi reconhecida por trecircs testemunhas como a mulher que teria mandado colocar fogo no coletivo o que provocou a morshyte de cinco pessoas inocentes inclusive um bebecirc de um ano e um mecircs O delito ocorreu na noite de 29 de novembro de 2005 no subuacuterbio do Rio de Janeiro e comoveu o paiacutes Apoacutes lembrarem que a prisatildeo por mais de trecircs semanas impediu a ex-animadora de trabalhar os defensores enfatizaram o fato de sua assistida ter corrido risco de morte jaacute que trecircs coautores do atentado foram assassinados por encomenda de facccedilotildees criminosas irritashydas com a repercussatildeo do caso

A acusaccedilatildeo sustenta que a atitude dos agentes puacuteblicos que invadiram a residecircncia da autora e a deixaram 28 dias presa sem terem provas consisshytentes para tal fez com que Maria Aparecida ficasse arrasada

ldquoO papel deles eacute proteger as pessoas e natildeo violar direitos constitushycionais de cidadatildeos de bemrdquo disse o Defensor O Defensor afirmou ainda que natildeo considera que o valor pedido seja elevado e prefere destacar que o Estado pode evitar pleitos futuros caso selecione melhor seus agentes policiais

ldquoO pleito tem caraacuteter compensatoacuterio para a viacutetima e feiccedilatildeo punitiva para o causador do dano Esta duplicidade baseia-se no dever geral de absshytenccedilatildeo residente no fato de que natildeo eacute liacutecito a ningueacutem causar dano a outrem A condenaccedilatildeo do causador do dano tem funccedilatildeo tambeacutem preventiva desesti- mulando a reiteraccedilatildeo de situaccedilotildees correlatasrdquo afirmou por fim o Defensor

Em resposta o Estado sustenta que tem o direito-dever de investigar e apurar a responsabilidade sobre fato de natureza criminosa em especial

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 241

quando esse ganha repercussatildeo em todo o paiacutes Alega ainda que a autora natildeo teve sua integridade fiacutesica violada durante o tempo em que permaneceu sob sua responsabilidade

Texto 7Lavrador eacute preso por raspar casca de aacutervoreEle usava a casca de aacutervore para fazer chaacute para sua mulher que estaacute

doenteO ministro Joseacute Samey Filho (Meio Ambiente) e as entidades amshy

bientalistas Greenpeace e ISA (Instituto Socioambiental) criticaram a prishysatildeo em flagrante do lavrador Joseacute dos Anjos 58 anos que durante dois anos raspou a casca de uma aacutervore para fazer chaacute para sua mulher que estaacute doente Joseacute raspava a casca de uma aacutervore chamada almesca em uma aacuterea de preservaccedilatildeo permanente que fica agraves margens do coacuterrego Pindaiacuteba em Planaltina (a 44 km de Brasiacutelia)

O lavrador disse que usava a casca para fazer chaacute para a mulher Helena dos Anjos Ela tem Doenccedila de Chagas Joseacute conta que soube que o chaacute melhorava as condiccedilotildees dos acometidos pela doenccedila Em 20 de junho de 2000 Joseacute foi surpreendido com um tiro para o alto dado por soldados da Poliacutecia Florestal quando raspava a almesca Preso em flagrante delito algemado e levado para a delegacia o lavrador foi enquadrado na Lei do Meio Ambiente (Lei 9605 de 1998)

Segundo o delegado Ivanilson Severino de Melo Joseacute provocou ldquo dashynos diretos ao patrimocircnio ambientalrdquo crime previsto no artigo 40 da lei O delito inafianccedilaacutevel eacute punido com 1 a 5 anos de prisatildeo Joseacute foi colocado numa cela com outros cinco presos acusados de homiciacutedio e roubo

Texto 8Municiacutepio teraacute que indenizar idosa agredida por meacutedicoFonte TJM TO municiacutepio de Vaacuterzea Grande foi condenado a pagar R$ 152 mil a

tiacutetulo de danos morais a uma idosa que foi agredida fiacutesica e verbalmente por um meacutedico na policliacutenica do bairro Parque do Lago A decisatildeo eacute do juiz Rodrigo Roberto Curvo da Terceira Vara Especializada da Fazenda Puacuteblica de Vaacuterzea Grande (processo 2152005)

A autora da accedilatildeo eacute procuradora de um portador de esquizofrenia No dia 19 de novembro de 2003 quando tinha 73 anos ela levou o paciente agrave

242 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

policliacutenica para consulta e obtenccedilatildeo de novo laudo meacutedico que daria conshytinuidade ao recebimento do auxiacutelio-doenccedila No entanto segundo a idosa ao ser atendida pelo meacutedico ele se recusou a expedir o documento mesmo tendo ciecircncia de que o paciente eacute portador de doenccedila mental

Ela lembrou ao meacutedico que o paciente tinha o direito de ser atendishydo Ainda segundo a idosa a reclamaccedilatildeo deixou o meacutedico transtornado Ele passou a bater na mesa gritando palavras de baixo calatildeo e ameaccedilanshydo agredi-la fisicamente O meacutedico teria dito tambeacutem que iria localizar o endereccedilo da idosa para mandar prendecirc-la Conforme relatos contidos no processo o meacutedico soacute natildeo espancou a idosa porque o paciente interveio e se colocou na sua frente Em seguida ele teria empurrado a idosa e o paciente para fora de seu consultoacuterio na policliacutenica do Parque do Lago empregando forccedila fiacutesica e humilhando os dois diante dos demais pacientes qLie aguardavam atendimento no local

Na sentenccedila o magistrado observou que eacute obrigaccedilatildeo de qualquer sershyvidor puacuteblico atender com urbanidade e cortesia sobretudo em se tratando de idoso pois o Estatuto do Idoso (Lei 107412003) assegura no artigo 4deg que ldquonenhum idoso seraacute objeto de qualquer tipo de negligecircncia discrishyminaccedilatildeo violecircncia crueldade ou opressatildeo e todo atentado aos seus direishytos por accedilatildeo ou omissatildeo seraacute punido na forma da leirdquo Desta forma cabe agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica indenizar a idosa pelo sofrimento e humilhaccedilatildeo aos quais foi submetida ldquo Desde que a Administraccedilatildeo defere ou possibilita ao seu servidor a realizaccedilatildeo de certa atividade administrativa a guarda de um bem ou a conduccedilatildeo de uma viatura assume o risco de sua execuccedilatildeo e resshyponde civilmente pelos danos que esse agente venha a causar injustamente a terceirosrdquo observou o juiz

Texto 9O siacutendico de um edifiacutecio residencial no Recreio dos Bandeirantes Jaime

Adelino Machado estaacute sendo acusado de racismo por tentar impedir a circushylaccedilatildeo de um morador negro nas dependecircncias do preacutedio A moradora Maria das Graccedilas Santos recebeu uma carta do administrador com a determinaccedilatildeo de que seu filho de criaccedilatildeo Juacutelio Costa Ribeiro de 24 anos teria a circulaccedilatildeo no preacutedio limitada agrave lixeira e agrave caixa de correio Ela ficou indignada e resolveu procurar a 16 DP (Barra da Tijuca) que comeccedilou a investigar o caso

Juacutelio que mora haacute um ano no preacutedio contou que ateacute jaacute discutiu com o siacutendico

- E muito humilhante E muito triste tudo isso Natildeo queria estar vishyvendo essa situaccedilatildeo - disse o rapaz

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 243

Maria da Penha tambeacutem natildeo se conforma com o caso e natildeo tem duacuteshyvidas de que se trata de racismo

- Isso eacute evidente Natildeo concordo com issoO delegado que estaacute cuidando do caso intimou o siacutendico a depor Jaishy

me explicou que somente proibiu a circulaccedilatildeo do rapaz no preacutedio porque ele natildeo eacute morador e por isso natildeo poderia usufruir dos demais serviccedilos queo condomiacutenio manteacutem salvo se estivesse acompanhado da moradora

- Um siacutendico natildeo pode impedir um filho de criaccedilatildeo de um morador de ter acesso a todo o condomiacutenio disse a moradora que observou mais uma vez tratar-se de racismo

FontesPreacircmbulo da Constituiccedilatildeo Brasileira Noacutes representantes do povo brashysileiro reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democraacutetico destinado a assegurar o exerciacutecio dos direitos soshyciais e individuais a liberdade a seguranccedila o bem-estar o desenvolvishymento a igualdade e a justiccedila como valores supremos de uma sociedade fraterna pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional com a soluccedilatildeo paciacutefishyca das controveacutersias promulgamos sob a proteccedilatildeo de Deus a seguinte CONSTITUICcedilAtildeO DA REPUacuteBLICA FEDERATIVA DO BRASILArt 3deg IV da CRFB Constituem objetivos fundamentais da Repuacuteblica Federativa do Brasil promover o bem de todos sem preconceitos de origem raccedila sexo cor idade e quaisquer outras formas de discrimishynaccedilatildeoArt 20 da Lei 77161989 (Define os crimes resultantes de preconceito de raccedila ou de cor) Praticar induzir ou incitar a discriminaccedilatildeo ou preshyconceito de raccedila cor etnia religiatildeo ou procedecircncia nacional Art 1deg da Lei 74371985 (Lei Afonso Arinos) Constitui contravenccedilatildeo punida nos termos desta lei a praacutetica de atos resultantes de preconceito de raccedila de cor de sexo ou de estado civilArt 2deg da Lei 74371985 (Lei Afonso Arinos) Seraacute considerado agenshyte de contravenccedilatildeo o diretor gerente ou empregado do estabelecimento que incidir na praacutetica referida no artigo 1deg desta lei

Texto 10A estudante Liacutegia Lara Santos de 20 anos foi presa em 08 de marccedilo

de 2011 apoacutes confessar o assassinato do pai o pedreiro Lauro Joaquim da Silva de 48 anos Ela contou agrave poliacutecia que o pai se tornava agressivo quanshydo bebia e a ameaccedilava de morte

244 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

Disse ainda que cansada das agressotildees pediu ajuda ao namorado Ricardo Cardoso da Silva 18 anos com quem se relacionava haacute oito meshyses para se livrar do pai

A estudante que se mostrou calma durante todo o depoimento disse que o relacionamento familiar sempre foi ruim e que a matildee estaacute presa por traacutefico de drogas

O casal foi coincidentemente abordado pela poliacutecia porque os polishyciais suspeitaram de que os dois estivessem levando produto de roubo

O crime ocorreu por volta das 3h da manhatilde quando o pedreiro deshypois de passar a noite em um bar voltava para casa no bairro de Cangaiacuteba na Zona Leste de Satildeo Paulo Ao entrar foi surpreendido pela filha e o nashymorado Enquanto o rapaz segurava o pedreiro Liacutegia o atingiu com cerca de 30 facadas

O corpo foi amarrado com pedaccedilos de corda de varal Embrulhado em lenccediloacuteis cobertor tapete e saco plaacutestico preto e posto em um carrinho do tipo utilizado para transportar bagagem A ideia segundo a estudante era jogar o corpo num coacuterrego proacuteximo Antes de deixar a casa os criminosos ainda trocaram de roupa

Na rua a dupla foi abordada por policiais da 3a Companhia do 8deg Bashytalhatildeo da Poliacutecia Militar que desconfiaram de que o casal estivesse transshyportando mercadoria roubada Percebendo a aproximaccedilatildeo da PM Ricardo fugiu mas Liacutegia foi presa

FontesHomiciacutedio simples Alt 121 - Matar algueacutemPena - reclusatildeo de 6 (seis) a 20 (vinte) anosHomiciacutedio qualificado sect 2o - Se o homiciacutedio eacute cometidoI - mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpeII - por motivo fuacutetilIII - com emprego de veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comumIV - agrave traiccedilatildeo de emboscada ou mediante dissimulaccedilatildeo ou outro recurshyso que dificulte ou tome impossiacutevel a defesa do ofendidoV - para assegurar a execuccedilatildeo a ocultaccedilatildeo a impunidade ou vantagem de outro crimePena - reclusatildeo de 12 (doze) a 30 (trinta) anosExclusatildeo de ilicitude

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 245

Art 23 - Natildeo haacute crime quando o agente pratica o fatoI - em estado de necessidadeII - em legiacutetima defesaIII - em estrito cumprimento de dever legal ou no exerciacutecio regular dedireito

Texto 11Matildee diz que natildeo abandonou o menino que caiuMoradora do Barramares onde filho morreu em queda do 26deg andar

achou que ele seria vigiado pelo irmatildeo mais velhoO sono pesado de Fernando Moraes Juacutenior de 3 anos deu agrave matildee

dele Rosana Rosa Cavalcanti da Silva a certeza de que poderia ir sem problemas ateacute a farmaacutecia de propriedade da famiacutelia num pequeno shopping embaixo do apartamento onde mora no 26deg andar de um dos preacutedios do Condomiacutenio Barramares na Barra da Tijuca

Segundo Rosana contou a parentes mesmo assim pediu para o filho mais velho de 8 anos ficar em casa ateacute que ela voltasse Mas o menino recebeu um telefonema de um vizinho e saiu para jogar bola Fernando acordou sozinho abriu a porta do quarto e levou uma cadeira ateacute a varanshyda - que estava com a porta de correr aberta Fernando subiu na cadeira apoiou-se no parapeito sem grade desequilibrou-se e caiu de uma altura de pouco mais de 80 metros agraves 20h40m de 6 de maio de 1999 Ele morreu no local e foi enterrado no Cemiteacuterio Satildeo Joatildeo Batista em Botafogo

A matildee foi avisada e encaminhou-se para o local Em estado de choquc sentou e chorou ao lado do corpo do filho por mais de duas horas Segundo testemunhas antes de cair no chatildeo o corpo ainda bateu num coqueiro na frente do edifiacutecio o que amorteceu a queda e evitou que ele tivesse muitas escoriaccedilotildees O menino ainda teria respirado por alguns instantes mas natildeo resistiu Policiais militares cobriram o corpo com um plaacutestico preto

- Natildeo haacute duacutevidas de que foi uma fatalidade Ela sempre foi uma excelente matildee cuidadosa carinhosa com os filhos Natildeo foi negligecircncia - afirmou Gisela Moraes Zepeta irmatilde de Fernando Moraes pai do menino

A morte foi registrada na 16a DP (Barra) como fato a ser investigado O perito Antocircnio Carlos Alcoforado disse que encontrou uma cadeira na sacada do apartamento no 26deg andar Segundo ele o parapeito tinha 120 metros e soacute com a cadeira o menino poderia ter ultrapassado

O delegado titular disse que vai esperar alguns dias ateacute que a famiacutelia esteja mais tranquila para tomar os depoimentos Segundo ele caso seja

246 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

apurada negligecircncia na atenccedilatildeo ao menor o responsaacutevel poderaacute ser indiciashydo por homiciacutedio culposo

- Natildeo podemos poreacutem falar de um caso assim porque a famiacutelia jaacute estaacute sofrendo muito Temos que esperar pelas provas teacutecnicas - disse o delegado

Segundo Gisela Rosana contou que foi ateacute a Fannaacutecia Barramares 2000 que eacute administrada pelo marido Fernando pegar remeacutedios e um panfleto para fazer no computador de casa A matildee contou ainda que o menino estava cansashydo depois de brincar na creche que frequentava desde o iniacutecio do ano dentro do condomiacutenio Depois de tomar banho e jantar ele dormia profundamente segundo a matildee que aproveitou para descer Segundo Gisela Rosana teria deshymorado fora de casa cerca de cinco minutos ateacute o momento do acidente

FontesArt 133 do CP Abandonar pessoa que estaacute sob seu cuidado guarda vigilacircncia ou autoridade e por qualquer motivo incapaz de defender- -se dos riscos resultantes do abandonoPena - detenccedilatildeo de 6 (seis) meses a 3 (trecircs) anossect 1deg Se do abandono resulta lesatildeo corporal de natureza gravePena - reclusatildeo de 1 (um) a 5 (cinco) anossect 2deg Se resulta a mortePena - reclusatildeo de 4 (quatro) a 12 (doze) anosO instituto do perdatildeo judicial somente pode alcanccedilar o acusado que se mostrar suficientemente punido pelo sofrimento que o ato praticado causou na sua proacutepria vidaArt 121 sect 5deg do CP Na hipoacutetese de homiciacutedio culposo o juiz poderaacute deixar de aplicar a pena se as consequecircncias da infraccedilatildeo atingirem o proacuteprio agente de forma tatildeo grave que a sanccedilatildeo penal se torne desneshycessaacuteriaArt 107 IX do CP Extingue-se a punibilidade pelo perdatildeo judicial nos casos previstos em lei

Texto 12

Maitecirc ganha indenizaccedilatildeo da Shering

A induacutestria quiacutemica Schering do Brasil foi acionada judicialmente pela atriz Maitecirc Proenccedila que pediu oitocentos mil reais a tiacutetulo de indeshynizaccedilatildeo por danos morais De acordo com a accedilatildeo movida pela atriz ao promover o anticoncepcional Microvlar ela teve sua imagem profissional arranhada porque algumas carteias do produto natildeo continham o nuacutemero de piacutelulas discriminadas pela embalagem o que gerou diversas reclamaccedilotildees

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 247

O advogado de Maitecirc Paulo Ceacutesar Pinheiro Carneiro afirmou que o valor da indenizaccedilatildeo deve ser proporcional ao poder econocircmico do ofen- sor ldquo O laboratoacuterio faturava mensalmente R$ 16 milhatildeo com a venda dos anticoncepcionais Acho que a metade disso seria um valor razoaacutevel a ser pagordquo

Jaacute o advogado da Schering Cid Scartezzine Filho qualificou como absurdo o valor do pedido Para ele natildeo houve qualquer tipo de abalo agrave imagem da autora ldquo Ela apenas aparecia anunciando a nova embalagem do produto e o fato de ter havido problemas com algumas carteias do Microvlar natildeo justificaria uma accedilatildeo judicial por parte da atrizrdquo disse

Vale lembrar que a atriz participou da campanha publicitaacuteria para resgatar o confianccedila das mulheres no anticoncepcional Microvlar cujas vendas despencaram depois da denuacutencia de que muitos comprimidos coloshycados agrave venda no mercado eram feitos de farinha de trigo

A campanha publicitaacuteria deveria ser veiculada por trecircs meses mas acabou sendo retirada do ar porque novas irregularidades foram descobershytas

Aleacutem da indenizaccedilatildeo o advogado pediu que o laboratoacuterio fizesse uma retrataccedilatildeo puacuteblica pois a empresa reacute escolheu a autora jaacute que ela tinha reputaccedilatildeo seriedade e simpatia junto ao puacuteblico feminino

FontesArt 927 do CC Aquele que por ato iliacutecito (art 186 e 187) causar dano a outrem fica obrigado a reparaacute-loParaacutegrafo uacutenico Flaveraacute obrigaccedilatildeo de reparar o dano independenteshymente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureshyza risco para os direitos de outremArt 186 Aquele que por accedilatildeo ou omissatildeo voluntaacuteria negligecircncia ou imprudecircncia violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusishyvamente moral comete ato iliacutecitoArt 187 Tambeacutem comete ato iliacutecito o titular de um direito que ao exercecirc- -lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econocircmico ou social pela boa-feacute ou pelos bons costumesArt 5deg X da CRFB Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros resishydentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdashyde agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito a indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

248 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Texto 13Fumante desde os 13 anos Joatildeo Jorge teve o cacircncer detectado em

2009 e hoje estaacute aposentado por invalidez Os laudos de dois dos maiores especialistas de Alagoas o cardiologista Joseacute Wanderley Neto (pioneiro de transplantes no Estado) e a pneumologista e oncologista Andreacutea Albuquershyque atestam que o cacircncer foi causado pelo tabagismo

O autor pediu tutela antecipada para que a reacute fosse condenada a cusshytear o tratamento do autor Apresentou provas teacutecnicas laudos meacutedicos e dados da Organizaccedilatildeo Mundial de Sauacutede (OM S) e do Instituto Brasileishyro de Geografia e Estatiacutestica (IBG E) que comprovam que o cigarro mata mais que a Aids cocaiacutena aacutelcool suiciacutedio e tracircnsito juntos

Joatildeo Jorge que faz quimioterapia na Santa Casa de Misericoacuterdia de Maceioacute disse que tentou parar de fumar diversas vezes mas natildeo conseshyguiu Na accedilatildeo ele quer que a Souza Cruz lhe pague indenizaccedilatildeo de R$ 3 milhotildees por danos materiais e fiacutesicos e R$ 15 milhatildeo por danos morais

FontesArt 6degdo CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor I mdash a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no forshynecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivosIII mdash Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a informaccedilatildeo adequada e clashyra sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem V I mdash a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosArt 8deg do CDC Os produtos e serviccedilos colocados no mercado de conshysumo natildeo acarretaratildeo riscos agrave sauacutede ou seguranccedila dos consumidores exceto os considerados normais e previsiacuteveis em decorrecircncia de sua natureza e fruiccedilatildeo obrigando-se os fornecedores em qualquer hipoacutetese a dar as informaccedilotildees necessaacuterias e adequadas a seu respeitoDoutrina e Jurisprudecircncia dentre as decisotildees favoraacuteveis ou parcialmente favoraacuteveis em I a instacircncia (jurisprudecircncia) tem-se (1) R$ 1 milhatildeo o valor da indenizaccedilatildeo a tiacutetulo de danos morais agrave viacutetima (TJMG) (2) R$ 600 mil agrave viacutetima a tiacutetulo de danos morais e mais danos materiais e lucros cessantes a serem apurados em liquidaccedilatildeo de sentenccedila (TJSP) (3) RS 500 mil a tiacutetulo de danos morais agrave viacutetima posteriormente substituiacuteda pelos herdeiros em razatildeo do seu falecimento (TJPR) (4) condenaccedilatildeo em R$ 500 mil agrave viacutetima a tiacutetulo de danos morais (TJRS) (5) R$ 13 mil a tiacutetulo de danos morais pela morte de esposa (TJRJ) (6) condenaccedilatildeo da Souza Cruz e da Philip Morris por danos materiais e morais coletivos aleacutem do dever de informar correshytamente nas embalagens e publicidade (TJSP) A uacuteltima sentenccedila indicada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 249

diz respeito agrave uacutenica accedilatildeo coletiva do universo pesquisado a accedilatildeo intentada pela ADESF em 2004 cujo recurso foi apreciado pelo TJSP no periacuteodo de abrangecircncia da pesquisa No Tribunal Paulista a sentenccedila foi anulada

Texto 14Trata-se de indenizaccedilatildeo por danos morais de EVATERESIN H A S IL shy

VA DA ROSA em face de M ANZOLI SA INDUacuteSTRIA E COMEacuteRCIO A violaccedilatildeo da imagem ocorreu na loja Manlec n 12 Rio Grande do Sul no dia 16 de fevereiro do ano de 2011

Alega a autora que esteve em uma das lojas da empresa requerida na ocasiatildeo em que comprou uma televisatildeo marca Baysinic aleacutem de outros objetos No mesmo dia foi filmada de forma imperceptiacutevel e depois sua imagem passou a aparecer diariamente com destaque entre outras pessoas na RBS canal 12 em propaganda promocional da loja Por um periacuteodo de trinta dias a gravaccedilatildeo produzida era transmitida em sua velocidade normal e depois passou a ser apresentada com maior velocidade o que tomou as cenas jocosas Tudo acontecendo muito rapidamente fez com que os gesshytos e o caminhar das pessoas tornassem-se caricatos Aduziu a requerente que aleacutem da exploraccedilatildeo clandestina de sua imagem a demandante passou a enfrentar o ridiacuteculo da gozaccedilatildeo de pessoas suas conhecidas e dos colegas da reparticcedilatildeo puacuteblica onde trabalha

Carlos Alberto Correcirca Machado colega da autora no Hospital Sanshyta Casa ouviu de sua esposa que Eva estava aparecendo na televisatildeo por diversas vezes entre a novela das sete e a novela das oito e teve curiosishydade assistiu ao comercial umas duas ou trecircs vezes e efetivamente viu Eva carregando uma caixa de televisatildeo O depoente soacute assistiu aos colegas brincarem com Eva dizendo que ela estava famosa Jaqueline Camargo Domingues relatou que tambeacutem foi colega da autora na Santa Casa e tem certeza que viu a propaganda no horaacuterio das novelas e que natildeo era reporshytagem jornaliacutestica era propaganda mesmo Jaqueline tem certeza porque chegava ao serviccedilo e todos os dias ldquomexiamrdquo com ela chamando-a de gashyrota propaganda da Manlec e ateacute chegou a dizer que parecia uma louquinha correndo com aquela caixa Na Santa Casa eram gerais as brincadeiras com ela todos dizendo que a viram na televisatildeo

FontesArt 6deg do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidorIV - a proteccedilatildeo contra a publicidade enganosa e abusiva meacutetodos coshymerciais coercitivos ou desleais bem como contra praacuteticas e claacuteusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviccedilos

250 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

VI - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosAlt 5deg V da CRFB eacute assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo aleacutem da indenizaccedilatildeo por dano material moral ou agrave imagem Art 5deg X da CRFB satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito a indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeoArt 5deg X X V III da CRFB satildeo assegurados nos termos da lei a) a proteccedilatildeo agraves participaccedilotildees individuais em obras coletivas e agrave reshyproduccedilatildeo da imagem e voz humanas inclusive nas atividades desporshytivas

Texto 15Trata-se de negativaccedilatildeo indevida do nome de conhecida senhora da

sociedade carioca Marininha Cavalcante Pessoa Jordatildeo residente em Te- resoacutepolis Rio de Janeiro

Ao tentar renovar contrato de creacutedito de cheque especial junto ao Banco no qual titulariza conta-corrente em dezessete de julho do ano de mil novecentos e noventa e sete foi surpreendida diante da negativa do Banco em fazecirc-lo sob o argumento de que seu nome encontrava-se inscrito em cadastro de inadimplentes (SER AS A) bem como havia um tiacutetulo proshytestado em funccedilatildeo da devoluccedilatildeo de cheque por insuficiecircncia de fundos

A senhora Jordatildeo desconhecia tais fatos e ao proceder agrave investigaccedilatildeo junto agrave empresa Argentina Veiacuteculos terminou por descobrir que terceira pessoa de nome diverso do seu havia utilizado o nuacutemero de seu CPF para adquirir um veiacuteculo junto agrave citada concessionaacuteria mediante financiamento concedido pela financeira Financial Now ao qual inadimpliu gerando o protesto do tiacutetulo e a inscriccedilatildeo do CPF da senhora Marininha em oacutergatildeo de restriccedilatildeo ao creacutedito

Apoacutes inuacutemeras tentativas junto agrave concessionaacuteria de veiacuteculos para que retirasse a restriccedilatildeo de seu nome bem como suspendesse o protesto do tiacutetulo sem sucesso terminou por recorrer ao judiciaacuterio pleiteando a exclusatildeo de tais restriccedilotildees bem como indenizaccedilatildeo por danos morais em virtude dos constrangimentos experimentados ante a negativa de creacutedito e aos aborrecimentos gerados

FontesArt 17 do CDC Para os efeitos desta Seccedilatildeo equiparam-se aos consushymidores todas as viacutetimas do evento

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 251

Art 6deg I do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no forshynecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivos Art 6deg V III do CDC a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossufi- ciente segundo as regras ordinaacuterias de experiecircncias

Texto 16Trata-se do caso de acusaccedilatildeo de injuacuteria com ofensa agrave dignidade e ao

decoro em face da loja Mappin localizada no bairro paulistano do Itaim em Satildeo Paulo As viacutetimas foram identificadas como Acircngela de Moraes 25 anos Andreacutea de Moraes 28 anos irmatildes e jogadoras profissionais de vocirclei e Zilma de Moraes 57 anos matildee das moccedilas O fato ocorreu no dia 13 de outubro de 2011 agrave tarde na loja Mappin localizada em Itaim Satildeo Paulo

Zilma e suas duas filhas Angela e Andreacutea foram agrave loja Mappin fazer compras Ao entrarem no provador feminino da loja as jogadoras foram confundidas com travestis por Nilda vendedora encarregada de vigiar o provador que chamou o departamento de seguranccedila do estabelecimento

Com o acionamento da vendedora Flaacutevio um dos seguranccedilas foi verificaro que estava acontecendo e ele causou um mal entendido ao afirmar para Zilma matildee das atletas que as duas pessoas que estavam no provador eram travestis

Ao perceberem o que estava acontecendo Angela natildeo teve reaccedilatildeo por causa do seu nervosismo poreacutem Andreacutea pegou seu telefone celular e ligou para a advogada Therezinha da Silva Carvalho

A matildee e as duas atletas saiacuteram do estabelecimento e foram para uma delegacia de poliacutecia registrar queixa para abertura de inqueacuterito

Segundo Nilda vendedora encarregada de vigiar o provador ela soacute chamou a seguranccedila porque imaginou que as duas irmatildes devido as suas musculaturas fossem travestis

A referida funcionaacuteria alegou mais tarde que foi alertada da presenccedila dos supostos travestis por uma cliente que tambeacutem estava no provador

A advogada das jogadoras de vocirclei iraacute mover uma accedilatildeo por violaccedilatildeo do artigo 140 do Coacutedigo Penal que caracteriza a injuacuteria com ofensa agrave dignidade e ao decoro e moveraacute tambeacutem uma accedilatildeo indenizatoacuteria por danos morais

FontesArt 140 - Injuriar algueacutem ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro Pena - detenccedilatildeo de um a seis meses ou multa

252 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Art 6deg VI do CDC satildeo direitos baacutesicos do consumidor a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusos

Texto 17Trata-se do caso de agressatildeo moral sofrida por Manoela Henriques

59 anos brasileira viuacuteva residente na Rua Visconde de Pirajaacute 1565 apto 601 Ipanema Rio de Janeiro O acusado eacute Gerald Thomas diretor de teashytro O fato aconteceu em agosto de dois mil e trecircs no dia da estreia da peccedila ldquo Tristatildeo e Isoldardquo no Teatro Municipal Rio de Janeiro

Durante a apresentaccedilatildeo a peccedila foi vaiada pelo puacuteblico O diretor enshytatildeo subiu ao palco e repentinamente virou de costas para a plateia e abaixou as calccedilas exibindo as naacutedegas No final do uacuteltimo ato houve mais vaias Vaacuterias reportagens e artigos sobre o assunto foram publicados na miacutedia

Fernando Costa e Manoela Henriques espectadores afirmaram que o ato foi uma agressatildeo a todos os presentes no teatro

Aureacutelia Barroso soprano por sua vez declarou que todo o elenco foi submetido a constrangimento e que ao contraacuterio do que disse o acusado o ato natildeo fazia parte do espetaacuteculo e nunca foi ensaiado

Manoela Henriques entrou na Justiccedila com pedido de Indenizaccedilatildeo por Dano Moral com base na lei do consumidor

FontesArt 6deg Satildeo direitos baacutesicos do consumidorI - a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no fornecimento de produtos e serviccedilos considerados perishygosos ou nocivosIII - a informaccedilatildeo adequada e clara sobre os diferentes produtos e servishyccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composishyccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentemV I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosV III - a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossuficiente segunshydo as regras ordinaacuterias de experiecircncias

Texto 18No dia 15032012 aproximadamente agraves 16 horas o Requerente dishy

rigindo o seu veiacuteculo marca Gol ano 2010 Placa ABC 1234 pela Rua das

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 253

Ameacutelias sentido Barra-Recreio agrave altura da Empresa Gigante foi abalroado pelo veiacuteculo marca Palio placa ZYW8910 certificado em nome da primeishyra Requerida e dirigido pelo segundo e que seguia no sentido contraacuterio

Conforme croquis e Boletim de Ocorrecircncias inclusos o veiacuteculo dos Requeridos ao tentar ultrapassar um carro parado na pista invadiu a pista contraacuteria vindo a abalroar o veiacuteculo do Requerente que vinha em sua matildeo de direccedilatildeo e teve a sua lateral esquerda danificada sendo posteriormente jogado agrave direita do acostamento causando ferimentos no condutor e danos materiais de grande monta no veiacuteculo do uacuteltimo conforme foto anexa

Os croquis do local do acidente demonstram claramente que o ponto de impacto ocorreu na matildeo de direccedilatildeo do veiacuteculo do Requerente

O fato referido ocasionou um prejuiacutezo para o Requerente na ordem de R$ 2300000 (vinte e trecircs mil reais) perda total conforme orccedilamentos e notas anexos cujo pagamento ora eacute cobrado

FontesArt 927 do CC Aquele que por ato iliacutecito (art 186 e 187) causar dano a outrem fica obrigado a reparaacute-loParaacutegrafo uacutenico Haveraacute obrigaccedilatildeo de reparar o dano independenteshymente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureshyza risco para os direitos de outremArt 186 do CC Aquele que por accedilatildeo ou omissatildeo voluntaacuteria negligecircnshycia ou imprudecircncia violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusivamente moral comete ato iliacutecitoArt 187 do CC Tambeacutem comete ato iliacutecito o titular de um direito que ao exercecirc-lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econocircmico ou social pela boa-feacute ou pelos bons costumesArt 175 Inciso II do RCNT ldquo Eacute dever de todo condutor de veiacuteculo conservar o veiacuteculo na matildeo de direccedilatildeo e na faixa proacutepriardquo Art 181 V I e XV I do RCTN ldquo Eacute proibido a todo condutor de veiacuteculoV I - Transitar pela contramatildeo dc direccedilatildeoX V I - Transitar em velocidade superior agrave permitida para localrdquo

Texto 19Maria Guilhermina Dias foi lanchar no dia 23 de fevereiro na lanshy

chonete Coma Bem em Bonsucesso A jovem de 25 anos disse que levou o maior susto quando viu uma barata grudada no patildeo do hambuacuterguer Fishycou com muito nojo e repugnacircncia porque jaacute tinha inclusive comeccedilado a

254 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

comer seu lanche Afirmou que procurou o gerente da loja para reclamar Como nada foi feito tirou uma foto e recorreu agrave justiccedila

Guilhermina destacou na Inicial que houve tambeacutem ldquo violaccedilatildeo ao princiacutepio da confianccedila outro norte a ser perseguido nas relaccedilotildees de consushymordquo No pedido alegou que tal situaccedilatildeo criou um grande constrangimento de natureza moral

O Coma Bem alegou que o Juizado natildeo poderia processar a questatildeo porque era necessaacuteria prova pericial e que tal requisito se toma incompashytiacutevel com a Lei 90991995 que dispotildee sobre a competecircncia dos Juizados Especiais Ciacuteveis e Criminais

O reacuteu sustentou ainda que natildeo existe a menor possibilidade de haver qualquer tipo de corpo estranho nos lanches da empresa e que natildeo haacute que se falar em qualquer tipo de indenizaccedilatildeo

FontesArt 6deg do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor 1 - a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no fornecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivos III - Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a informaccedilatildeo adeshyquada e clara sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especifishycaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem V I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo dc danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosArt 8deg do CDC Os produtos e serviccedilos colocados no mercado de consumo natildeo acarretaratildeo riscos agrave sauacutede ou seguranccedila dos consumishydores exceto os considerados normais e previsiacuteveis em decorrecircncia de sua natureza e fruiccedilatildeo obrigando-se os fornecedores em qualshyquer hipoacutetese a dar as informaccedilotildees necessaacuterias e adequadas a seu respeito

Texto 20Eduardo e Mocircnica estavam casados haacute quase trecircs anos No iniacutecio

do casamento Mocircnica adotou como meacutetodo contraceptivo o uso de piacutelushylas mas problemas de natureza hormonal e vascular levaram a mulher a procurar um meacutedico que a aconselhou a adotar outras formas de evitar a gravidez Sugeriu que o casal fizesse uso de preservativos

Pensando na sauacutede e no bem-estar da mulher Eduardo natildeo se opocircs agrave utilizaccedilatildeo do preservativo ainda que segundo afirmou na eacutepoca natildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 255

gostasse muito da ideia de continuar a usar preservativos mesmo depois de casado

A partir de entatildeo o casal passou a adquirir regularmente camisinhas da empresa Johnson e Johnson Induacutestria e Comeacutercio Ltda O produto comshyprado foi Jontex lubrificado adquirido na Farmaacutecia Vida Longa Em 20 de abril de 2007 durante uma relaccedilatildeo sexual a camisinha rompeu e cerca de quarenta dias depois Mocircnica descobriu que estava graacutevida

O casal ajuizou accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por danos morais e pedido de pensatildeo mensal pelo periacuteodo de 20 anos em face da empresa sob a alegaccedilatildeo de que o produto que utilizava apresentou defeito e isso trouxe graves alterashyccedilotildees na dinacircmica conjugal bem como desistecircncia de seus sonhos Mocircnica e Eduardo juntavam dinheiro para a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria e faziam um curshyso de poacutes-graduaccedilatildeo visando melhora salarial e aprimoramento profissional Segundo os autores todos esses projetos foram desfeitos de uma soacute vez

ldquoNatildeo eacute que natildeo quiseacutessemos filhos mas somente pensaacutevamos nisso a daqui uns cinco ou sete anos ateacute laacute muita coisa precisava ser preparada Natildeo sei como vamos nos virarrdquo disse Mocircnica

A empresa em contestaccedilatildeo afirmou que a gravidez de uma mulher casada em decorrecircncia do rompimento do preservativo durante a relaccedilatildeo sexual enquadra-se nos limites do perigo assumido ao utilizar como meacutetoshydo contraceptivo ldquoum produto que natildeo eacute cem por cento eficazrdquo

O InmetroRS o InmetroRJ a Cientec o Instituto Nacional de Tecshynologia a Fundaccedilatildeo Carlos Vanzolini o instituto Falcatildeo Bauer de Qualishydade e o Instituto Betontec de Avaliaccedilatildeo da Conformidade informaram natildeo ser possiacutevel a realizaccedilatildeo da periacutecia em preservativo jaacute utilizado

A fabricante apontou ainda que ldquo outras questotildees podem interferir diretamente no desempenho da camisinha a experiecircncia do usuaacuterio no uso de preservativo tempo e tipo de relaccedilatildeo sexual e tamanho do pecircnisrdquo

FontesDe acordo com o advogado Marcos Rosembauer o rompimento de camishysinhas eacute ldquocaso fortuito que exclui a responsabilidade do fabricanterdquoArt 393 CC O devedor natildeo responde pelos prejuiacutezos resultantes de caso fortuito ou forccedila maior se expressamente natildeo se houver por eles responsabilizadoParaacutegrafo uacutenico O caso fortuito ou de forccedila maior verifica-se no fato necessaacuterio cujos efeitos natildeo era possiacutevel evitar ou impedirEm caso anaacutelogo a Juiacuteza da 2a Vara Ciacutevel de Porto Alegre dispocircs que ldquo em situaccedilotildees como essa o risco eacute inerente ao produto tomando-se impossiacutevel

256 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

falar em responsabilidade decorrente da falta de informaccedilatildeo porquanto a proacutepria bula traz as informaccedilotildees razatildeo pela qual fica claro que a situaccedilatildeo narrada pelos autores caracteriza-se como caso fortuitordquo 0 Desembargador Pedro Kretzmann admitiu que ldquo sendo a reacute a fabricanshyte do produto objeto da presente controveacutersia e os autores destinataacuterios finais do bem a relaccedilatildeo havida entre as partes se amolda ao conceito de relaccedilatildeo de consumo estando sujeita pois agrave tutela especial do sistema consumeristardquo O Magistrado defendeu tambeacutem que em casos de romshypimento de camisinha ldquo a responsabilidade da empresa ante a alegaccedilatildeo de viacutecio do produto eacute objetiva bastando a comprovaccedilatildeo do dano e do nexo de causalidade natildeo se discutindo sequer a culpardquo Art 12 CDC o fabricante o produtor o construtor nacional ou estranshygeiro e o importador respondem independentemente da existecircncia de culpa pela reparaccedilatildeo dos danos causados aos consumidores por defei-

tos decorrentes de projeto fabricaccedilatildeo construccedilatildeo montagem foacutermushylas manipulaccedilatildeo apresentaccedilatildeo ou acondicionamento de seus produtos bem como por informaccedilotildees insuficientes ou inadequadas sobre sua utishylizaccedilatildeo e riscossect I o O produto eacute defeituoso quando natildeo oferece a seguranccedila que dele legitimamente se espera levando-se em consideraccedilatildeo as circunstacircncias relevantes entre as quais1 - sua apresentaccedilatildeol l- o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperamIII - a eacutepoca em que foi colocada em circulaccedilatildeoArt 6deg CDC satildeo direitos baacutesicos do consumidorV I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosV III - a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossuficiente segunshydo as regras ordinaacuterias de experiecircncia

Texto 21 Cuidado com o e-mailCarolina BrigidoUma decisatildeo ineacutedita do Tribunal Superior do Trabalho (TST) estabeshy

leceu que o patratildeo tem o direito de fiscalizar mensagens enviadas e recebishydas pela caixa de correio eletrocircnico que a empresa oferece ao funcionaacuterio desde que ldquode forma moderada generalizada e impessoalrdquo O procedimenshyto foi autorizado como meacutetodo de obtenccedilatildeo de provas para justificar uma

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 257

demissatildeo feita pela HSBC Seguros Brasil S A A partir do rastreamento do e-mail de um funcionaacuterio descobriu-se que um dos integrantes da filial de Brasiacutelia utilizava o correio corporativo para fins pornograacuteficos

O empregado costumava enviar aos colegas fotos de mulheres nuas Em sua defesa alegou que ao rastrear o e-mail a empresa violou sua inshytimidade e privacidade Tambeacutem argumentou que a prova para justificar sua demissatildeo foi obtida de forma iliacutecita Os motivos natildeo foram aceitos peshylos magistrados Por unanimidade a Primeira Turma do TST decidiu que como o equipamento e a tecnologia foram entregues pela empresa para fins de trabalho natildeo seria permitida a utilizaccedilatildeo pessoal

ldquoNatildeo haveria qualquer intimidade a ser preservada posto que o e-mail natildeo poderia ser utilizado para fins particularesrdquo explicou o relator do caso ministro Joatildeo Oreste Dalazen

Ele esclareceu ainda que a senha para acesso ao sistema natildeo pode ser interpretada como uma forma de proteccedilatildeo para evitar que o empregador tenha acesso ao conteuacutedo das mensagens como argumentou o empregado demitido Segundo o magistrado a senha serve apenas para que o empreshygador evite o acesso de terceiros agraves informaccedilotildees da empresa

O funcionaacuterio foi demitido em maio de 2000 e chegou a conseguir a anulaccedilatildeo da justa causa em primeira instacircncia alegando a garantia constishytucional de inviolabilidade da correspondecircncia O trabalhador conseguiu o direito de receber a multa rescisoacuteria No entanto a seguradora recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Distrito Federal e saiu vitoriosa O TST manteve essa decisatildeo - que pode ainda ser contestada no plenaacuterio do proacuteprio TST e no Supremo Tribunal Federal (STF)

No Brasil assim que foram instituiacutedos os e-mails corporativos os juizes consideravam as mensagens dos funcionaacuterios inviolaacuteveis Julgavam os casos por analogia agrave inviolabilidade das correspondecircncias Nos uacuteltimos anos esse entendimento foi modificado pelos tribunais trabalhistas estashyduais Ontem foi a primeira vez que o TST analisou o assunto A decisatildeo serviraacute de paracircmetro para outras accedilotildees semelhantes

Dalazen enfatizou que os direitos do cidadatildeo agrave privacidade e ao sigilo de correspondecircncia assegurados pela Constituiccedilatildeo Federal dizem respeito apenas agrave comunicaccedilatildeo estritamente pessoal e natildeo agraves mensagens enviadas e recebidas em nome da empresa A opiniatildeo eacute a mesma de um ministro do STF consultado pelo Globo

- A situaccedilatildeo eacute ambiacutegua mas eacute muito difiacutecil configurar a quebra da privacidade porque o trabalhador estava usando um bem da empresa para fins diferentes do trabalho

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O advogado Renato Opice Blum especialista em direito eletrocircnico concordou com a decisatildeo do TST Ele disse que conforme o artigo 932 do Coacutedigo Civil os atos do empregado durante sua jornada de trabalho podem gerar responsabilidade conjunta da empresa Portanto se um trabalhador envia um e-mail ofensivo a empresa tambeacutem pode ser responsabilizada

A advogada Nadia Demoliner Lacerda especialista em direito do trabalho tambeacutem concordou com a decisatildeo do TST Poreacutem ela ponderou que como natildeo existe legislaccedilatildeo para disciplinar o tema seria saudaacutevel que as empresas deixassem claro ao admitir um funcionaacuterio que podem rastrear o e-mail corporativo

A Forccedila Sindical poreacutem discordou dos especialistas Em nota a enshytidade repudiou a decisatildeo do TST e considerou a permissatildeo agraves empresas ldquo uma agressatildeo agrave liberdade individual que guardadas as devidas proporshyccedilotildees eacute semelhante agrave revista iacutentima feita pelo empregador no horaacuterio de saiacuteda dos funcionaacuteriosrdquo

Segundo o secretaacuterio nacional de Comunicaccedilatildeo da Central Uacutenica dos Trabalhadores (CUT) Antonio Carlos Spis a entidade eacute contra o rastrea- mento indiscriminado pelas empresas dos e-mails de seus funcionaacuterios

- As empresas podem desviar esse tipo de rastreamento para uma vigilacircncia de caraacuteter ideoloacutegico

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Satildeo Paulo 1979aPAULIUKONIS M A L ldquoComparaccedilatildeo e argumentaccedilatildeordquo In SANTOS Leo-nor Wer-

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Livro Teacutecnico 1978TOLEDO Marleine Paula Marcondes e Ferreira de NADOacuteLSKIS Hecircndricas Comushy

nicaccedilatildeo Juriacutedica 4 ed Satildeo Paulo Sugestotildees Literaacuterias 2002TRAVAGLIA Luiz Carlos A coerecircncia textual Satildeo Paulo Contexto 1993VOESE Ingo Argumentaccedilatildeo juriacutedica teoria teacutecnicas estrateacutegias Curitiba Juruaacute

2002XAVIER R C Portuguecircs no Direito 9 ed Rio de Janeiro Forense 1991ZVEITER Seacutergio ldquo Entrevistardquo In O Globo Rio de Janeiro 05 de marccedilo de 1992

I

ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Da Teoria agrave Praacutetica

Esta obra destina-se a todos aqueles que desejam por meio da argumentaccedilatildeo juriacutedica alcanccedilar a adesatildeo do auditoacuterio agrave sua tese Para tal eacute importante que se compreenda em que contexto espacial e temporal identificou-se a necessidade de uma Teoria da ArgumentaccedilatildeoOs elementos constitutivos da argumentaccedilatildeo juriacutedica estatildeo didaticamente apresentados seguindo uma sequecircncia que fornece uma estrutura soacutelida agrave produccedilatildeo textualCasos concretos peccedilas processuais e esquemas satildeo uma constante em toda a obra permitindo uma compreensatildeo precisa do conteuacutedo abordado e o acesso agrave realidade de onde surgem os conflitos que exigem valoraccedilatildeo e soluccedilatildeo juriacutedica Por fim exerciacutecios com sugestatildeo de correccedilatildeo estatildeo ao alcance do leitor a fim de que tenha a oportunidade de fixar o conhecimento mediante a praacutetica

LICcedilOtildeES DE

Com base nas novas molduras e demandas que circunscrevem a complexidade da escrita e da argumentaccedilatildeo dos profissionais da aacuterea juriacutedica um novo (re)encontro com a teoria da argumentaccedilatildeo eacute fundamentalSabendo das especificidades da produccedilatildeo de peccedilas processuais os autores reapresentam aqui a teoria da argumentaccedilatildeo de maneira didaacutetica acessiacutevelNessa perspectiva parabenizo os autores por mais este livro que daacute continuidade agraves Liccedilotildees de gramaacutetica aplicadas ao texto juriacutedico por estabelecerem outro acordo com o estudo da produccedilatildeo dos textos juriacutedicos com vistas a uma dinamizaccedilatildeo de suas orientaccedilotildees e prescriccedilotildees de modo a tornar a redaccedilatildeo do texto juriacutedico mais consistente e em conformidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito que pressupotildee aleacutem da capacitaccedilatildeo teacutecnica a habilidade de tornar comunicaacutevel a sua accedilatildeo profissional

Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho

Page 2: LIÇÕES DE ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA...1« oi ia e Prática da Narrativa Jurídica, Teoria e Prática da Argumentação luririica e Teoria e Prática da Redação Jurídica, no curso

Este livro representa uma parcela da vivecircncia da pesquisa e da paishyxatildeo dos autores pelo discurso jushy

riacutedico especificamente pela argumenshytaccedilatildeo juriacutedica Em razatildeo do progresso de seus alunos apoacutes a praacutetica de estrashyteacutegias de produccedilatildeo textual exaustivashymente desenvolvidas em sala de aula revelou-se necessaacuterio organizaacute-las e oferecer um conteuacutedo teoacuterico que fundamentasse tais estrateacutegias

Os trecircs autores jaacute possuem obras pushyblicadas a respeito do mesmo tema e colaboram na produccedilatildeo do material didaacutetico utilizado pelos alunos do Curshyso de Direito da Universidade Estaacutecio de SaacuteAssim eacute este livro instrumento dashyqueles que desejam mergulhar na fascinante arte de redigir uma argushymentaccedilatildeo juriacutedica

w w w e d i t o r a f o r e n s e c o m b r

LICcedilOtildeES DEARGUMENTACcedilAtildeOJURIacuteDICADa Teoria agrave Praacutetica

abdr^iacutejireito si(ora

GrupoEditorial ---------------------------------------------------------------------------------------------Nacional

0 GEN | Grupo Editorial Nacional reuacutene as editoras Guanabara Koogan Santos Roca AC Farmacecircutica Forense Meacutetodo LTC EPU e Forense Universitaacuteria que publicam nas aacutereas cientiacutefica teacutecnica e profissional

Essas empresas respeitadas no mercado editorial construiacuteram cataacutelogos inigualaacuteveis laquoltgtin obras que tecircm sido decisivas na formaccedilatildeo acadecircmica e no aperfeiccediloamento de v 1 1 iin I1oraccedilotildees de profissionais e de estudantes de Administraccedilatildeo Direito Enferma- (raquo1 ui I Hfeu liaria Fisioterapia Medicina Odontologia Educaccedilatildeo Fiacutesica e muitas outras igt iilt ir luido se tornado sinocircnimo de seriedade e respeito

v io eacute prover o melhor conteuacutedo cientiacutefico e distribuiacute-lo de maneira flexiacutevel e1 nurim iiic i preccedilos justos gerando benefiacutecios e servindo a autores docentes livrei- III Iiiik ioiiii ios colaboradores e acionistas

I Jovo comportamento oacutetico incondicional e nossa responsabilidade social e ambiental ugt iclorccedilados pela natureza educacional de nossa atividade sem comprometer o cres- i imento contiacutenuo e a rentabilidade do grupo

Alda da Graccedila Marques Valverde Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner

Nelson Carlos Tavares Junior

LICcedilOtildeES DEARGUMENTACcedilAtildeOJURIacuteDICADa Teoria agrave Praacutetica

CoordenadoraNeacuteli Luiza Cavalieri Fetzner

2o ediccedilatildeorevista atualizada

e ampliada

Rio de Janeiro

OCc 33amp33

A EDITORA FORENSE se responsabiliza pelos viacutecios do produto no que concerne agrave sua ediccedilatildeo aiacute compreendidas a impressatildeo e a apresentaccedilatildeo a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseaacute-lo e lecirc-lo Os viacutecios relacionados atilde atualizaccedilatildeo da obra aos conceitos doutrinaacuterios agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas e referecircncias indevidas satildeo de responsabilidade do autor eou atualizadorAs reclamaccedilotildees devem ser feitas ateacute noventa dias a partir da compra e venda com nota fiscal (interpretaccedilatildeo do art 26 da Lei n 8078 de 11091990)

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O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida divulgada ou de qualquer forma utilizada poderaacute requerer a apreensatildeo dos exemplares reproduzidos ou a suspensatildeo da divulgaccedilatildeo sem prejuiacutezo da indenizaccedilatildeo cabiacutevel (art 102 da Lei n 9610 de 19021998)Quem vender expuser agrave venda ocultar adquirir distribuir tiver em depoacutesito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude com a finalidade de vender obter ganho vantagem proveito lucro direto ou indireto para si ou para outrem seraacute solidariamente responsaacutevel com o contrafator nos termos dos artigos precedentes respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reproduccedilatildeo no exterior (art 104 da Lei n 961098)

Liccedilotildees de argumentaccedilatildeo juriacutedica da teoria agrave praacutetica coordenadora Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner autores Alda da Graccedila Marques Valverde Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner Nelson Carlos Tavares Junior - Rio de Janeiro Forense 2013

Inclui bibliografia ISBN 978-85-309-4538-1

1 Direito - Linguagem 2 Linguagem e loacutegica 3 Redaccedilatildeo forense 4 Praacutetica forense I Fetzner Neacuteli Luiza Cavalieri 1948- II Valverde Alda da Graccedila Marques III Tavares Junior Nelson Carlos 1977-

07-3431 CDD 34014

Capa Danilo Oliveira2-WAuml-7A)3

L679

CDU 340113

COORDENADORA E AUTORA

Neacuteli Luiz Cavalieri Fetzner eacute mestre em Educaccedilatildeo pela Universidade I iraquocio de Saacute Doutoranda em Anaacutelise de Discurso Psicopedagoga Ex- holessora da PUC Professora da Escola da Magistratura do Estado do

llt Kgt (Ir Janeiro (EM ER J) Coordenadora de Metodologia da Pesquisa e Di-bull Lii ii i da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro (EM ER J) Orientadora ltI pesquisas cientiacuteficas na UNES e na EM ER J Coordenadora de Oficinas I- I citura para professores do curso de Direito na Universidade Estaacutecio de -i I -professora do ensino meacutedio e de vestibular na rede particular de en- iiio I lx-professora do Curso de Letras da UNESA Membro da Comissatildeo

Ir Oiialiiacuteicaccedilatildeo e Apoio Didaacutetico-Pedagoacutegico na Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Coordenadora-geral e Professora Titular das disciplinas 1laquo oi ia e Praacutetica da Narrativa Juriacutedica Teoria e Praacutetica da Argumentaccedilatildeo luririica e Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica no curso de Direito daI NI SA Possui artigos publicados em revistas juriacutedicas e eletrocircnicas so- Ihv Anaacutelise de Discurso Liacutengua Portuguesa Teorias da Interpretaccedilatildeo e Ar- rumentaccedilatildeo Juriacutedica E autora de vaacuterias obras de Liacutengua Portuguesa e de Ifoi ii da Argumentaccedilatildeo Juriacutedica

1

AUTORES

A Ida da Graccedila Marques Valverde Graduada e licenciada em Letras I In I inivcrsidade Santa Uacutersula (USU) Especialista em Liacutengua Portuguesa I l i I Inivorsidade do Estado do Rio de Janeiro (U ER J) Mestre em Liacutengua li Iiipursn pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Ex-coordenadorabull I I iiipua Portuguesa do Coleacutegio Santa Rosa de Lima Ex-professora do tniMiio limdamental do Coleacutegio Santo Amaro Ex-corretora das bancas de s IiluI n da Universidade Federal do Rio de Janeiro (U FR J) e da Univer- nldiulr do Rio de Janeiro (UN IRIO ) Professora de Portuguecircs Juriacutedico daI bull I iacutei da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J) Professorabull In bull uio dc Direito da Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) onde lecionabull bull lifit iplinas de Teoria e Praacutetica da Narrativa Juriacutedica Teoria e Praacutetica da iiiimrntaccediluumliacuteo Juriacutedica e Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica Coautora i ii ui mi ii dc outros livros da aacuterea juriacutedica

Nelson Carlos Tavares Junior graduado e licenciado em Letras l lii I Inivcrsidade Federal do Rio de Janeiro (UFR J) Mestre em LetrasI I i iir Vernaacuteculas) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFR J) Mm lu irl em Direito pela Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Graduan- i bull m Ivdagogia pela Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Ex-professorbull In firinos fundamental e meacutedio Atualmente eacute professor da UNESAbull lii I m ola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J) da Poacutes- riiitlimccedillo em Direito e de diversos cursos preparatoacuterios para concursos

bull bulliiii-ioi das bancas de vestibular do ENEM do ENADE e de concursos liililiroN Dedica-se a questotildees inerentes agrave linguagem juriacutedica e agrave formaccedilatildeobull I 1111gt11 sores do Curso de Direito Ministra as disciplinas Liacutengua Portu- |ibull i Niacuteirrativa Juriacutedica Argumentaccedilatildeo Juriacutedica Redaccedilatildeo Juriacutedica Me- iHilnlii|-ia da Pesquisa e Didaacutetica do Ensino Superior Possui vaacuterios artigos piililn idos Coautor tambeacutem dos livros Liccedilotildees de Gramaacutetica Aplicadas ao Ulsquola luridico Interpretaccedilatildeo e Produccedilatildeo de Textos Aplicadas ao Direito e iiiiiIi i c Espiritismo assuntos atuais e questotildees polecircmicas Atualizador llr 1ortuyjiecircs no Direito

APRESENTACcedilAtildeO

Sabemos que argumentar representa para a aacuterea juriacutedica uma exishygecircncia profissional especiacutefica Argumentar constitui um preacute-requisito funshydamental para o processo de formaccedilatildeo em qualquer das carreiras juriacutedicas O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo em documento referente ao desenvolvishymento das habilidades necessaacuterias agrave formaccedilatildeo juriacutedica destaca como prioshyridade a leitura criacutetica a interpretaccedilatildeo e a escrita

Participamos de um movimento dentro e fora do Poder Judiciaacuterio que vem estabelecendo como mais um fator decisivo da melhor prestashyccedilatildeo jurisdicional o que aqui eacute chamado de habilidade para ldquo saber dizer o Direitordquo uma demanda extensiva a advogados defensores procuradores promotores juizes e desembargadores

Em outras palavras hoje a Liacutengua Portuguesa de uso juriacutedico estaacute posshyta em questatildeo por seus proacuteprios usuaacuterios Muitos deles - por sua vez - tecircm procurado conferir a essa modalidade de uso uma nova expressividade que recusa entre outros aspectos a retoacuterica vazia o vocabulaacuterio erudito e tortuoshyso agrave inteligibilidade ou o emprego de jargotildees e clichecircs envelhecidos e sem qualquer funccedilatildeo a natildeo ser eacute claro a de acumular a poeira do tempo

Com base nessas novas molduras e demandas que circunscrevem a complexidade da escrita e da argumentaccedilatildeo dos profissionais da aacuterea juriacuteshydica um novo (re)encontro com a teoria da argumentaccedilatildeo eacute fundamental Um texto consequente como deve ser o juriacutedico exige do seu redator aleacutem da observacircncia dos aspectos teacutecnicos proacuteprios de cada peccedila redacio- nal - peticcedilatildeo inicial contestaccedilatildeo agravo de instrumento sentenccedila acoacuterdatildeo

o domiacutenio das ferramentas linguiacutesticas que datildeo forma e comunicabilida- de aos conteuacutedos Natildeo haacute texto bem produzido sem o manejo consciente dos instrumentos que a liacutengua disponibiliza

Sabendo das especificidades da produccedilatildeo de peccedilas processuais os autores reapresentam aqui a teoria da argumentaccedilatildeo de maneira didaacutetica acessiacutevel

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Nessa perspectiva parabenizo os autores por mais este livro que daacute continuidade agraves Liccedilotildees de gramaacutetica aplicadas ao texto juriacutedico por estabelecerem outro acordo com o estudo da produccedilatildeo dos textos juriacutedishycos com vistas a uma dinamizaccedilatildeo de suas orientaccedilotildees e prescriccedilotildees de modo a tornar a redaccedilatildeo do texto juriacutedico mais consistente e em conforshymidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito que presshysupotildee aleacutem da capacitaccedilatildeo teacutecnica a habilidade de tornar comunicaacutevel a sua accedilatildeo profissional

Desembargador Seacutergio Cavalieri FilhoEx-Presidente do Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro

Ex-Diretor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de JaneiroProcurador-Geral do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro

PREFAacuteCIO

Oportuna e relevante eacute a publicaccedilatildeo destas Liccedilotildees de argumentaccedilatildeo juriacutedica da teoria agrave praacutetica sobretudo porque realizada por um grupo de professores que haacute alguns anos se dedica agrave formaccedilatildeo de futuros profissioshynais do Direito Trata-se pois de uma obra cuja autoridade nasce da praacutexis e da sensibilidade pedagoacutegica de seus autores

Sem qualquer reducionismo a simplicidade da abordagem e a orgashynizaccedilatildeo teoacuterica didaticamente acessiacutevel atestam natildeo apenas a propriedade dos autores no tratamento da mateacuteria mas tambeacutem a pertinecircncia de seu estudo como preacute-requisito fundamental a qualquer das carreiras juriacutedicas

Que estas Liccedilotildees representem o anuacutencio e a promessa de novas e sempre necessaacuterias liccedilotildees destinadas agrave construccedilatildeo da qualidade dos texshytos juriacutedicos

Dr Andreacute Cleoacutefas Uchocirca CavalcantiJuiz de Direito

Nota da Editora o Acordo Ortograacutefico foi aplicado integralmente nesta obra

SUMAacuteRIO

INTRODUCcedilAtildeO 1

CAPIacuteTULO I - TEO RIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTONO ESPACcedilO E NO T EM PO 3

11 A proposta positivista 412 Criacuteticas agrave loacutegica formal e agrave doutrina positivista 813 Demonstraccedilatildeo e argumentaccedilatildeo 914 A relevacircncia da argumentaccedilatildeo para o Direito 13

CAPIacuteTULO II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTO S A SER shyVICcedilO DA ARGUM ENTACcedilAtildeO 17

21 A contribuiccedilatildeo do texto narrativo para a argumentaccedilatildeo 2022 A contribuiccedilatildeo do texto descritivo para a argumentaccedilatildeo 2423 O texto dissertativo 28

CAPIacuteTULO I I I - ALGUM AS Q UESTOtildeES TEOacute RICAS SO BRE AARGUM ENTACcedilAtildeO 31

31 A argumentaccedilatildeo e a retoacuterica claacutessica 3132 As noccedilotildees de auditoacuterio polifonia e intertextualidade 3233 A argumentaccedilatildeo e o processo de produccedilatildeo de textos juriacutedicos 3434 Gramaacutetica e produccedilatildeo do texto argumentative 4235 Argumentaccedilatildeo e Teoria Tridimensional do Direito 45

XIV LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

CAPIacuteTULO IV - PLAN EJAM EN TO DO TEXTO ARGUMENTA- TIVO JU R IacuteD IC O 51

41 Situaccedilatildeo de conflito 5242 Tese 5643 A contextualizaccedilatildeo do real 5844 Hipoacuteteses 6345 Anaacutelise desse planejamento em sentenccedila e acoacuterdatildeo 64

451 Sentenccedila 65452 Acoacuterdatildeo 73

CAPIacuteTULO V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 85

51 Seleccedilatildeo e organizaccedilatildeo das ideias argumentativas 8552 Fundamentaccedilatildeo simples e fundamentaccedilatildeo complexa 9553 Tipos de argumento 97

531 Introito100532 Argumento proacute-tese103533 Argumento de autoridade106534 Argumento de oposiccedilatildeo113535 Argumento de analogia115536 Argumento de causa e efeito122537 Argumento de senso comum126538 Argumento a d ho minem128539 Argumento a fortiori 1305310 Argumento por absurdo1325311 Argumento de fuga133

54 O uso da deduccedilatildeo e induccedilatildeo na produccedilatildeo dos argumentos134

CAPIacuteTULO V I - PR IN C IacutePIO S G ERA IS DO D IREITO E A FORshyM ULACcedilAtildeO DOS ARGUM EN TO S 147

61 Princiacutepios gerais do direito e regras147611 Os valores morais147

SUMAacuteRIO XV

612 Os valores eacuteticos 148613 Diferenccedilas entre princiacutepios e regras149

62 A relevacircncia norteadora dos princiacutepios agrave formulaccedilatildeo dos argumentos 15163 Organizaccedilatildeo hieraacuterquica de algumas fontes do Direito na estrutura ar-

gumentativa razoabilidade princiacutepios lei doutrina e jurisprudecircncia 156631 Proposta 157632 Comentaacuterio159

CAPIacuteTULO V II - FIGURAS DE RETOacute R IC A 16171 Por que o estudo das figuras retoacutericas 16172 O efeito persuasivo das figuras de retoacuterica16373 Figuras retoacutericas muito utilizadas no discurso juriacutedico165

731 Figuras de palavras1657311 Figuras de ritmo e de som1657312 A etimologia 167

732 Figuras de sentido1677321 Metoniacutemia1687322 Metaacutefora1707323 Hipeacuterbole1707324 Eufemismo1717325 Paradoxo1727326 Antiacutetese 1737327 Personificaccedilatildeo174

733 Figuras de construccedilatildeo 1757331 Inversatildeo1757332 Quiasmo1767333 Reticecircncias1767334 Repeticcedilatildeo1777335 Gradaccedilatildeo178

734 Figuras de pensamento 1787341 Ironia 179

XVI LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

7342 Pretericcedilatildeo1807343 Prolepse 181

CAPIacuteTULO V III - PA REC ER TEacuteCN ICO -JUR IacuteD ICO 183

81 A estrutura de um parecer juriacutedico teacutecnico-formal 18382 Ementa 18883 Relatoacuterio 19184 Fundamentaccedilatildeo 19385 Conclusatildeo 19486 Exemplo de parecer teacutecnico-juriacutedico19587 Esquema da disposiccedilatildeo das partes do parecer teacutecnico-juriacutedico 198

CAPIacuteTULO IX - EX ER C IacuteC IO S 201

B IBL IO G R A FIA 259

INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que a disciplina Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou nos uacuteltimos anos contornos cada vez mais claros Os Cursos de Direito no paiacutes inteiro comeccedilaram a inserir em seus curriacuteculos uma disciplina de fundamento cuja finalidade eacute aprofundar o estudo das teacutecnicas e das estrateacutegias de pershysuasatildeo agrave disposiccedilatildeo de quem lida com a produccedilatildeo das peccedilas processuais- de peticcedilotildees iniciais a sentenccedilas

O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e Cultura (M EC) e a Associaccedilatildeo dos Magistrados do Brasil (A M B) tecircm incentivado a implementaccedilatildeo dessa disciplina no iniacutecio do Curso de maneira a favorecer uma melhor formashyccedilatildeo humaniacutestica e reflexiva aos estudantes de Direito acerca das temaacuteticas que essa disciplina enfrenta cotidianamente o que de fato tem se observashydo em vaacuterios cursos de Direito e nas escolas de formaccedilatildeo como na Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J)

Portanto natildeo haacute duacutevidas de que a argumentaccedilatildeo deixou de exercer papel secundaacuterio e hoje funciona como premissa fundamental de todo aquele que pretende obter sucesso nas lides em que atua Por essa razatildeo debruccedilamo-nos agrave busca de meacutetodos que didaticamente organizados ofeshyreccedilam teacutecnicas e estrateacutegias para a produccedilatildeo de um texto argumentativo competente natildeo apenas do ponto de vista da persuasatildeo mas tambeacutem do domiacutenio de estruturas de raciociacutenio loacutegico coeso e coerente

Enfatiza-se tambeacutem a relevacircncia do conhecimento conceituai ofereshycido na primeira parte da obra sobre a teoria da argumentaccedilatildeo a fim de que se possa instrumentalizar os profissionais da aacuterea juriacutedica Lembramos as ideias de Aristoacuteteles que tatildeo bem sinalizam nossos sentimentos Segundo ele a linguagem juriacutedica eacute a arte de convencer e comover atraveacutes de proshyvas fatos e argumentos

Capiacutetulo I

TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

A proposta dos autores deste livro eacute oferecer aos graduandos e aos profissionais do Direito um instrumento de qualificaccedilatildeo da atividade que desenvolvem Aos alunos dos periacuteodos iniciais do Curso de Direito entreshygamos uma obra didaacutetica de leitura acessiacutevel pois um dos entraves que enfrentam na leitura inicial das obras que tratam de importantes teorias da sua aacuterea - tal como ocorre com a Teoria da Argumentaccedilatildeo - eacute a falta de reshypertoacuterio que gabarite uma reflexatildeo ampla e natildeo ingecircnua desses conteuacutedos

Aos formandos dessa mesma aacuterea e aos jaacute advogados promotores defensores juizes procuradores esperamos auxiliar na qualificaccedilatildeo e na reflexatildeo criacutetica sobre a produccedilatildeo de sentido nas peccedilas redigidas Sabemos que mesmo sendo detentores de enorme repertoacuterio juriacutedico muitos satildeo levados agrave reproduccedilatildeo de valores e de ideias jaacute cristalizados pela ciecircncia juriacutedica

O profissional que deseja manter-se em sintonia com a tendecircncia contemporacircnea de consolidaccedilatildeo dos direitos fundamentais pela via princi- pioloacutegica por exemplo necessita para argumentar a favor de novas teses- sem descurar da teacutecnica e da consistecircncia persuasiva - de raciociacutenio juriacutedico coesatildeo e coerecircncia entre as ideias que constituem o texto domiacuteshynio de estrateacutegias inteligentes de convencimento e adaptaccedilatildeo aos diversos auditoacuterios a que se dirigem tais profissionais

Enfim para adotar um novo posicionamento juriacutedico diante de quesshytotildees ineacuteditas ou de temas jaacute aparentemente consolidados eacute necessaacuterio reushynir mais do que vontade torna-se imprescindiacutevel ter fluecircncia no manejo de todas essas ferramentas linguiacutesticas e discursivas que favorecem alcanccedilar os objetivos pretendidos

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Sabemos que essa eacute uma demanda a qual constatamos tanto na grashyduaccedilatildeo quanto nos cursos preparatoacuterios e nas escolas de formaccedilatildeo

A sistematizaccedilatildeo do estudo da Teoria da Argumentaccedilatildeo foi apresenshytada inicialmente por Chaim Perelman e L Olbrechts-Tyteca em 1958 na obra La Nouvelle Rheacutetorique Traiteacute de 1rsquoArgumentation Os autores sustentaram que eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo de uma praacutetica da razatildeo agraves ciecircncias sociais e humanas das quais se pode citar o Direito Para isso apoiaram-se principalmente em autores como Aristoacuteteles Ciacutecero e Quintiliano

Antes de enfocar a proposta perelmaniana propriamente dita faz-se necessaacuterio compreender um pouco do contexto cultural histoacuterico e poliacutetico que a motivou e lhe serviu de berccedilo Natildeo pretendemos esgotar a reflexatildeo necessaacuteria a essa tarefa mas apenas sugerir algumas informaccedilotildees que facishylitem a compreensatildeo dos natildeo iniciados no tema

Comecemos pela afirmaccedilatildeo de que o ensino de Direito no Brasil funshydou suas raiacutezes em forte influecircncia do chamado Positivismo juriacutedico1 Por essa razatildeo antes de iniciar uma abordagem sobre a argumentaccedilatildeo faz-se necessaacuterio investigar com mais cuidado o que representa esse sistema deshynominado Positivismo que se mostra superado mas que tatildeo intensamente influenciou as bases da Teoria da Argumentaccedilatildeo

11 A PRO PO STA PO S IT IV IST A

Historicamente situada a doutrina positivista ganhou forccedila a partir da segunda metade do seacuteculo X IX Suas bases desenvolveram-se na conshyfianccedila de que o progresso somente seria possiacutevel se pautado na teacutecnica e na ciecircncia Assim sendo propunham os positivistas uma reforma completa da sociedade de maneira a que a ordem fosse alcanccedilada soberanamente

Assinala Maria Helena Diniz que ldquoo Positivismo socioloacutegico adveio da teoria de Augusto Comte que pretendeu realizar por meio da ciecircncia uma reforma social afirmando que a uacutenica ciecircncia capaz de reformar a sociedade eacute a sociologia () que era a ciecircncia positiva dos fatos sociais () Emile Durkheim continuando a obra de Comte pretendeu tambeacutem substituir a filosofia moral ou direito natural consishyderado aprioriacutestico e anti-histoacuterico pela ciecircncia positiva da origem e evoluccedilatildeo dos costumes sociais Logo a pressatildeo social seria a causa dos fenocircmenos humanos () O direito como fato social natildeo eacute simples produto da consciecircncia individual mas o resultado da consciecircncia coletiva O direito portanto por ser um fato social deve ser estudado pelo meacutetodo socioloacutegicordquo (DINIZ Maria Helena Compecircndio de introduccedilatildeo agrave ciecircncia do Direito Satildeo Paulo Saraiva 1988 p 92-93)

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 5

No campo do Direito acreditou-se que a ordem e a seguranccedila somenshyte seriam garantidas se a teacutecnica cooperasse na elaboraccedilatildeo de leis gerais cashypazes de antever os acontecimentos sociais sobre os quais o Estado deveria atuar Essa proposta prosperou porque a ciecircncia e seu rigor metodoloacutegico mostravam-se extremamente promissores nas soluccedilotildees de problemas que impediam o progresso

Com base nesses pressupostos eacute importante entender que para a dogmaacutetica juriacutedica tradicional os profissionais que atuam na soluccedilatildeo de conflitos levados ao Judiciaacuterio - em especial o juiz - deveriam encontrar o sentido do direito no sistema de normas escritas que regulam a vida social de um determinado povo em um dado momento histoacuterico

Essa crenccedila reforccedilava tambeacutem a ideia de seguranccedila juriacutedica uma vez que se as normas criadas pelo Estado eram conhecidas pela sociedade o seu descumprimento - em certas circunstacircncias - por um determinado sushyjeito que natildeo observou a conduta descrita deveria ser punido pelo Estado que lhe imporia uma sanccedilatildeo por tal descumprimento Ora como se acredishytava ter um sistema juriacutedico perfeito estava reforccedilada a tese de que havia plena seguranccedila juriacutedica

De acordo com os adeptos dessa teoria portanto a praacutetica juriacutedica deveria limitar-se agrave aplicaccedilatildeo objetiva das normas vigentes ao caso conshycreto que se pretendia analisar por meio de um meacutetodo previamente deshyterminado Esse meacutetodo caracterizava-se por uma operaccedilatildeo loacutegica em que competia ao juiz amoldar os acontecimentos da vida cotidiana ao suporte normativo eleito pelo Estado

Mas como essa operaccedilatildeo loacutegica era realizada Para a proposta poshysitivista caberia ao juiz desenvolver um raciociacutenio silogiacutestico para poder ldquodizer adequadamente o direitordquo Consiste o silogismo em apresentar trecircs proposiccedilotildees - premissa maior premissa menor e conclusatildeo - que se disshypotildeem de tal forma que a conclusatildeo deriva de maneira loacutegica das duas preshymissas anteriores como se exemplifica a seguir

O enunciado ldquomatar algueacutem pena de 6 a 20 anos de reclusatildeordquo foi previamente determinado pelo Estado como uma norma a ser seguida Esse fundamento legal deve ser encarado pois como uma premissa maior (PM ) Ao observar o caso concreto verifica o juiz que ldquo Joatildeo Alberto ma- tou Patriacutecio Mottardquo Essa segunda proposiccedilatildeo seraacute a premissa menor (Pm) do silogismo Ora se matar algueacutem gera como sanccedilatildeo o cumprimento da pena de reclusatildeo e se Joatildeo matou Patriacutecio chega-se agrave conclusatildeo (C) loacutegica de que deveraacute o acusado cumprir pena fixada pelo juiz dentro dos limites legais estabelecidos

Esquematicamente estruturado o silogismo pode ser assim representado

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Premissa Maior (PM) (= fundamento juriacutedico)

lt iacute = ^ gt

Premissa menor (Pm) (=fato do caso

concreto)

ldquoMatar algueacutemJoatildeo matou Patriacutecio

Conclusatildeo (C)

O reacuteu deve cumprir pena fixada pelo juiz

Resumidamente a aspiraccedilatildeo dos positivistas foi a de construir um sistema racional incontestaacutevel inspirado no meacutetodo utilizado por ciecircncias como a Matemaacutetica a Fiacutesica e a Astronomia Na matemaacutetica por exemshyplo eacute possiacutevel alcanccedilar conclusotildees verdadeiras ou previsiacuteveis a partir de premissas assumidas como tal pois a validade dessas eacute que determina a validade das conclusotildees desde que observadas as regras delimitadas pelo meacutetodo utilizado

Esse raciociacutenio parece bastante adequado mas natildeo se pode supor que todos os acontecimentos da vida social com repercussatildeo no mundo juriacutedico conseguiriam ser previstos com exatidatildeo pelo legislador ou mesmo que todos os casos em que um ato semelhante fosse praticado teriam necessashyriamente as mesmas consequecircncias juriacutedicas

Recentemente valores como ldquo funccedilatildeo socialrdquo ldquo dignidade da pessoa humanardquo ldquo boa-feacuterdquo entre outros reforccedilam que ldquo cada caso eacute um casordquo e portanto natildeo se pode dar tratamento sistemaacutetico paradigmaacutetico a situashyccedilotildees aparentemente semelhantes

A tiacutetulo de exemplo nem sempre que uma pessoa constroacutei sua resishydecircncia em terreno alheio estaacute de maacute-feacute E possiacutevel que a construccedilatildeo irreshygular tenha sido motivada por um equiacutevoco de quem executou a obra ou por uma leitura imprecisa da planta do terreno Enfim muitas justificativas podem ser aventadas para explicar a motivaccedilatildeo da praacutetica de uma conduta vedada pelo ordenamento juriacutedico Se assim o eacute natildeo seria justo que uma mesma conduta praticada por pessoas diferentes em contextos distintos fosse avaliada da mesma maneira pelo juiz

E paciacutefico hoje ser impossiacutevel criar um sistema juriacutedico perfeito infaliacutevel que preveja com exatidatildeo as especificidades que cada caso con-

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

ereto pode apresentar Tal maneira de conceber o Direito faz dele o que na realidade natildeo eacute uma ciecircncia estaacutetica imobilizada por um nuacutemero deshyterminado de regras que natildeo datildeo conta de organizar a conduta humana e viabilizar a paz social

Eacute fundamental - e isso tambeacutem eacute paciacutefico - que o contexto em que se deram os fatos as influecircncias que o motivaram o estado psicoloacutegico de quem praticou a conduta etc sejam tambeacutem considerados A ponderaccedilatildeo de tais situaccedilotildees portanto foge agrave previsibilidade de um sistema formal previamente concebido com precisatildeo absoluta Natildeo haacute enfim como transshypor as certezas matemaacuteticas para as ciecircncias de natureza humana e social tal como propunha Descartes2

Todas essas questotildees abordadas sugerem ser fundamental ao operashydor do direito ter condiccedilotildees de argumentar a favor de teses de receptividade minoritaacuteria no ordenamento juriacutedico paacutetrio

A fim de ilustrar tal raciociacutenio podemos citar a recente autorizaccedilatildeo do STF com o advento da ADPF n 54 para a realizaccedilatildeo do aborto de feto anencefaacutelico Como se sabe qualquer hipoacutetese diferente daquelas previsshytas no Coacutedigo Penal (feto concebido em decorrecircncia de estupro e perigo iminente de morte para a gestante) era rejeitada de pronto Se natildeo fosse a perseveranccedila de inuacutemeros advogados ao longo de tantos anos talvez a tese de antecipaccedilatildeo terapecircutica do parto em respeito agrave liberdade da mulher natildeo fosse aceita ateacute hoje

No mesmo sentido podem ser citados diversos outros temas tais como a aprovaccedilatildeo da uniatildeo entre pessoas do mesmo sexo e a proteccedilatildeo das minorias Existem ainda diversas situaccedilotildees juriacutedicas em que a tutela de direito ainda natildeo eacute reconhecida no Brasil A uacutenica saiacuteda para buscar a aplicaccedilatildeo justa da lei no sentido mais pleno exceto a alteraccedilatildeo legislatishyva - o que natildeo depende do Judiciaacuterio eacute a defesa eficiente de teses cuja argumentaccedilatildeo lhe serve de fundamento

Sustentamos que essa concepccedilatildeo de interpretaccedilatildeo da norma baseada apenas na leitura gramatical da letra da lei era adequada ao contexto hisshytoacuterico em que se desenvolveram o Positivismo Juriacutedico e a loacutegica formal Atualmente essa proposta natildeo mais pode ser aceita uma vez que se mostra insuficiente do ponto de vista filosoacutefico e metodoloacutegico para dar conta da praacutetica juriacutedica

A respeito veja DESCARTES Reneacute Discurso sobre o meacutetodo Traduccedilatildeo de Maacutershycio Pugliesi et alii Satildeo Paulo Hemus 1978

12 C R IacuteT IC A S Agrave LOacute G IC A FO RM AL E Agrave DO UTRINA PO SIT IV ISTA

Vimos que o cenaacuterio em que se desenvolveu a doutrina positivista era fruto do momento poliacutetico em que prevalecia forte tendecircncia autorishytaacuteria Exemplos dessa tendecircncia na poliacutetica eram o nazismo o fascismo as demais formas de autoritarismo e a poliacutetica de guerra-fria Por todas essas barbaridades cometidas a sociedade natildeo mais aceitou a intoleracircncia predominante

Relevante se faz ressaltar que essa transformaccedilatildeo no campo da poshyliacutetica estendeu-se tambeacutem para a Filosofia O uso cartesiano da razatildeo e uma loacutegica excessivamente matematizante precisavam dar lugar a outra postura a abertura para o diaacutelogo e a ponderaccedilatildeo das controveacutersias inerenshytes a todo fato social requisitos fundamentais dos Estados democraacuteticos emergentes

E importante salientar que a atmosfera de decepccedilatildeo com a loacutegica formal3 e a doutrina positivista impulsionou as pesquisas na aacuterea da argushymentaccedilatildeo na segunda metade do seacuteculo XX

A partir da proposta de mudanccedila de paradigma de razatildeo Chaiacutem Pe- relman4 insurge-se contra a ditadura cartesiana da evidecircncia o dogmatismo das ciecircncias e as reduccedilotildees positivistas Propotildee a Teoria da Argumentaccedilatildeo como alternativa entre a Loacutegica ateacute entatildeo vigente e a metodologia das Ciecircncias Humanas tidas como subjetivas e imprecisas

Perelman propocircs uma metodologia mais afinada com o tratamento dos problemas concretos trazidos ao Judiciaacuterio cm que a ponderaccedilatildeo dos valores- ateacute entatildeo relegada ao plano do irracional e da imprecisatildeo - possibilitava uma nova concepccedilatildeo de razatildeo que natildeo a formal mas a razatildeo praacutetica

Realmente tendo em vista o dinamismo dos eventos sociais obsershyva-se um permanente descompasso entre a norma e a realidade social Mais

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

3 Aristoacuteteles eacute considerado um dos principais precursores da loacutegica formal contrishybuiu para o desenvolvimento de uma teoria da demonstraccedilatildeo e do uso do silogisshymo

4 Participaram ainda dessa tendecircncia de revisatildeo da Epistemologia contemporacircnea autores como Bachelard Gadamer Lenk Ricoeur Habermas e muitos outros Resshypeitadas as diferentes orientaccedilotildees metodoloacutegicas a meta comum eacute a ampliaccedilatildeo do conceito de razatildeo As escolas hermenecircuticas alematilde italiana e francesa asseguraram agrave razatildeo ampliada um lugar importante na praacutetica filosoacutefica () Mais especificashymente no territoacuterio da Teoria da Argumentaccedilatildeo aleacutem de Perelman tambeacutem Toul- min Johnstone e Viehweg A semioacutetica tambeacutem ocupa lugar de destaque nesse processo na medida em que valoriza o aspecto pragmaacutetico da linguagem

um exemplo dessa realidade satildeo as sanccedilotildees a serem criadas para coibir os crimes ligados ao mau uso da internet

Enfim ressaltamos a importacircncia do estudo da Teoria da Argumentashyccedilatildeo sob o enfoque da proposta perelmaniana pois ela possibilitou uma mushydanccedila que nos parece fundamental ao passo em que o projeto cartesiano buscava a verdade ancorada na ideia de evidecircncia e na coerccedilatildeo Perelman propocircs alcanccedilar o verossiacutemil por meio da adesatildeo e do diaacutelogo O que o meacuteshytodo cartesiano demonstrativo formal faz pela coerccedilatildeo e pela violecircncia a argumentaccedilatildeo permite que se faccedila pela adesatildeo e pela democracia Anteveshymos o futuro do direito calcado em valores de fraternidade paz e justiccedila sem os quais o homem natildeo encontraraacute eco para a plenitude que almeja

Para melhor entender a proposta da Teoria da Argumentaccedilatildeo de Chaim Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca eacute importante contrapor a arshygumentaccedilatildeo agrave demonstraccedilatildeo tal como o fizeram os autores no Tratado da Argumentaccedilatildeo a Nova Retoacuterica5 Realizaremos semelhante tarefa no proacuteximo capiacutetulo

13 D EM O N STRACcedilAtildeO E ARG UM EN TACcedil AtildeO

Em primeiro lugar entendamos que demonstraccedilatildeo e argumentaccedilatildeo natildeo se ocupam de propostas distintas mas de procedimentos que se completam

Enquanto a demonstraccedilatildeo busca a verdade a argumentaccedilatildeo preocushypa-se com a adesatildeo do auditoacuterio ou seja a argumentaccedilatildeo eacute uma atividade praacutetica que tem por objeto o ldquoestudo das teacutecnicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentamrdquo 6 nas mais variadas atividades humanas

A demonstraccedilatildeo por outro lado eacute um meio de prova fundado na proposta de uma racionalidade matemaacutetica que visa a delimitar os passos a serem percorridos - isto eacute o meacutetodo si logiacutestico - para deduzir premissas de outras jaacute existentes desde que siga rigorosamente as regras estabelecishydas por um sistema formalizado

Assim a demonstraccedilatildeo opera-se por axiomas - premissas considerashydas evidentes e que por isso natildeo precisam ser comprovadas a argumenta-

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

Os autores tratam deste tema no sect 1 da obra PERELM AN Chaim Tratado da argushymentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 15-17

PERELM AN Chaim Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 4

10 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ccedilatildeo natildeo recorre aos axiomas mas agraves teses - proposiccedilotildees que precisam ser sustentadas pelo orador e cuja aceitaccedilatildeo dependeraacute de sua maior capacishydade de persuasatildeo7 - o que faz com que a Teoria da Argumentaccedilatildeo guarde dependecircncia mais evidente com a experiecircncia faacutetica

O que isso representa Bom se a demonstraccedilatildeo possibilita que alshygueacutem formalize um sistema cujas regras satildeo previamente delimitadas e controladas natildeo importaraacute em que contexto seja ele aplicado o resultado almejado sempre seraacute tido como verdade independente do momento histoacuteshyrico e do lugar em que for empregado

De maneira distinta o argumentador para alcanccedilar a adesatildeo de seu auditoacuterio natildeo pode desconsiderar a historicidade e a temporalidade em que se inserem seus destinataacuterios pois o contexto em que atua eacute determinante de quais valores prevalecem e de quais estrateacutegias satildeo acatadas com mais facilidade para alcanccedilar a permeabilidade com o auditoacuterio

A esse respeito pode-se dizer enfim que a demonstraccedilatildeo eacute impesshysoal e independe do meio em que eacute desenvolvida Isso natildeo ocorre com a argumentaccedilatildeo pois eacute exatamente o ldquo contato entre os espiacuteritosrdquo que legitishyma seu exerciacutecio

Eacute importante frisar que natildeo se pode depreender do que ateacute aqui foi dito que a demonstraccedilatildeo eacute um procedimento adstrito agraves ciecircncias exatas e naturais como a Matemaacutetica e a Fiacutesica E verdade que eacute nessa aacuterea do conhecimento que a demonstraccedilatildeo se desenvolve com mais propriedade mas haacute tambeacutem espaccedilo para o uso da demonstraccedilatildeo nas ciecircncias humanas e sociais

Perelman em nenhum momento nega a relevacircncia da racionalidade caracteriacutestica das ciecircncias exatas e naturais para a sua teoria O que ele sustenta eacute que o modelo de racionalidade promovido por esses ramos do conhecimento mostra-se insuficiente e redutor se aplicado agraves ciecircncias hushymanas e sociais Propotildee entatildeo que nessas aacutereas - tal como ocorre com o Direito - a demonstraccedilatildeo seja utilizada juntamente com a argumentaccedilatildeo

O que se pretende mostrar eacute que o argumentador para sustentar sua tese inuacutemeras vezes necessita de um conjunto de informaccedilotildees preacutevias (base probatoacuteria miacutenima) a partir do qual produziraacute seus argumentos Ou seja a demonstraccedilatildeo poderaacute ser utilizada a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

Imagine a situaccedilatildeo em que um advogado necessite comprovar o nexo de causalidade entre a conduta de uma construtora - que eacute acusada de agir

7 Para este trabalho natildeo importa discutir a distinccedilatildeo entre convencimento e persuashysatildeo A respeito veja PERELM AN Chaiacutem OLBRECIITS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 29

com negligecircncia na utilizaccedilatildeo de materiais considerados de baixa qualidashyde - e o desabamento de um edifiacutecio evento em que morreram vaacuterios moshyradores Natildeo haacute duacutevidas de que o argumentador soacute conseguiraacute convencer o julgador de que existe a responsabilidade civil do construtor se recorrer por exemplo a laudos produzidos por profissionais de aacutereas especiacuteficas da construccedilatildeo civil (engenharia de caacutelculo estrutural estudo do solo projeto arquitetocircnico etc)

Nesse sentido a argumentaccedilatildeo se serviraacute de pareceres de especialisshytas que demonstrem por exemplo que o ferro utilizado na sustentaccedilatildeo das colunas natildeo era adequado para suportar o peso esperado Repetimos que neste caso a demonstraccedilatildeo eacute necessaacuteria mas natildeo suficiente para evidenciar a culpa ela se coloca portanto a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

Veja que sem a evidecircncia da inadequaccedilatildeo do material natildeo haacute que se falar em responsabilidade civil ou em culpa por negligecircncia Por outro lado a mera produccedilatildeo da prova demonstrativa natildeo garante a condenaccedilatildeo do reacuteu Outras questotildees devem ainda ser discutidas existe algum fato sushyperveniente que alterou a condiccedilatildeo em que os caacutelculos iniciais foram realishyzados Isso deveria ser previsto pelos engenheiros e arquitetos que fizeram o projeto A execuccedilatildeo da obra pelos operaacuterios ocorreu conforme suas deshyterminaccedilotildees Outros pontos precisam ainda ser enfim investigados

Natildeo eacute por outra razatildeo que Perelman entende que a Teoria da Deshymonstraccedilatildeo deve ser completada pela Teoria da Argumentaccedilatildeo que estuda os raciociacutenios dialeacuteticos

Na verdade para formular uma teoria da argumentaccedilatildeo que admitisse o uso da razatildeo a fim de dirigir a proacutepria accedilatildeo e influenciar a dos outros foi necessaacuterio desconsiderar a ideia de evidecircncia como caracteriacutestica da razatildeo siacutembolo da teoria cartesiana Essa ideia segundo a qual toda prova seria reduccedilatildeo agrave evidecircncia e o que eacute evidente natildeo teria necessidade alguma de prova impunha uma limitaccedilatildeo agrave loacutegica

Perelman levou em conta a teoria da demonstraccedilatildeo cujo desenvolvishymento seguiu o pensamento de Leibniz - o qual considerava que mesmo o evidente necessitava de alguma prova Estabeleceu-se assim uma relaccedilatildeo direta com a teoria da argumentaccedilatildeo que soacute poderia desenvolver-se se a prova natildeo fosse concebida como reduccedilatildeo agrave evidecircncia

Como consequecircncia dessa visatildeo o objeto da teoria do autor eacute o estushydo das teacutecnicas discursivas que possibilitam provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentam agrave sua aprovaccedilatildeo Por outro lado o que caracteriza a adesatildeo dos espiacuteritos eacute a variabilidade de sua intensidade haacute diferentes graus de adesatildeo

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

12 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Paulo Roberto Soares Mendonccedila8 ao abordar as diferenccedilas entre a demonstraccedilatildeo e a argumentaccedilatildeo ressalta que o argumentador tem de ldquoneshygociarrdquo com seu auditoacuterio certas normas comuns que balizem uma boa argumentaccedilatildeo Ele natildeo estaacute falando necessariamente de normas vigentes mas de conteuacutedos que fazem parte do cotidiano do homem meacutedio e que satildeo implicitamente aceitos por todos (auditoacuterio universal) apesar de natildeo expressamente formuladas

Outro cuidado que o orador deve ter eacute com a utilizaccedilatildeo de uma linshyguagem comum ao longo de sua exposiccedilatildeo ela deve ser compreensiacutevel por todos os membros do auditoacuterio de maneira a favorecer um entendimento claro e objetivo do que se diz Quanto mais se exigem preacute-requisitos do interlocutor para entender o conteuacutedo da mensagem transmitida maiores satildeo as chances de natildeo se fazer entender O uso de uma linguagem simples objetiva acessiacutevel eacute fundamental a um argumentador que se dirige a um auditoacuterio universal Mas palavras de Chaiacutem Perelman ldquo o miacutenimo indisshypensaacutevel agrave argumentaccedilatildeo parece ser a existecircncia de uma linguagem em comum de uma teacutecnica que possibilite a comunicaccedilatildeordquo 9

O mesmo natildeo se pode dizer da demonstraccedilatildeo porque quem recorre a um raciociacutenio baseado na loacutegica formal tem a garantia de que seus interlocutores dominam a linguagem teacutecnica sobre a qual se desenvolveu pois a verdade construiacuteda utilizou-se de uma liacutengua artificial que lhe confere autoridade

Como vocecirc pocircde perceber adotamos o meacutetodo comparativo para mostrar as semelhanccedilas e distinccedilotildees entre a demonstraccedilatildeo e a argumenshytaccedilatildeo por acreditarmos que assim fique bastante claro quais satildeo as suas principais caracteriacutesticas Adiante temos as principais caracteriacutesticas de ambas esquematicamente organizadas

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

Meio de prova fundado na proposta de uma racionalidade matemaacutetica que visa

a delimitar os passos a serem percorridos (silogismo) para deduzir premissas de

outras jaacute existentes

Atividade que objetiva o ldquoestudo das teacutecshynicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves

teses que se apresentamrdquo

8 MENDONCcedilA Paulo Roberto Soares A argumentaccedilatildeo nas decisotildees judiciais Rio de Janeiro Renovar 2001

9 PERELM AN Chaiacutem OLBRECHTS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 17

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 13

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

Estabelece regras imutaacuteveis proacuteprias das ciecircncias exatas e naturais raciociacutenios

matemaacuteticos e analiacuteticos

Adota procedimentos flexiacuteveis proacuteshyprios das ciecircncias humanas e sociais

raciociacutenios dialeacuteticos - mais de uma tese - valores

Orador x auditoacuterioLoacutegica formal

Meacutetodo dedutivo (geral para o particular)

Loacutegica do razoaacutevel Meacutetodo indutivo

(particular para o geral)

Opera-se por axiomas Recorre agraves teses

Na aacuterea juriacutedica pode estar a serviccedilo da argumentaccedilatildeo - premissas

verdadeiras

Busca a adesatildeo dos espiacuteritos agrave tese apresentada - premissas verossiacutemeis

Silogismo loacutegico Premissa maior (PM) - norma Premissa menor (Pm) - fato

Conclusatildeo (C)

Entimema (tipo de silogismo dialeacutetico) Premissa menor (Pm) - fato

Premissa maior (PM) - norma Conclusatildeo (C)

Atemporal Histoacuterica e temporalUtiliza uma linguagem artificial teacutecnica Recorre a uma linguagem comum simshy

ples acessiacutevel que facilite a persuasatildeo

Natildeo haacute duacutevidas de que a argumentaccedilatildeo veio ocupar em determinashydas aacutereas do conhecimento o lugar que anteriormente foi preenchido pela demonstraccedilatildeo Mas ainda hoje a argumentaccedilatildeo exerce o mesmo papel de relevacircncia para o Direito

14 A R ELE V Acirc N C IA DA ARG UM EN TACcedilAtildeO PARA O D IR E IT O

Uma vez conhecidas as diferenccedilas entre Demonstraccedilatildeo e Argumenshytaccedilatildeo e suas implicaccedilotildees na produccedilatildeo do conhecimento nas diversas aacutereas um proacuteximo passo necessaacuterio seria verificar a relevacircncia da argumentaccedilatildeo como ferramenta de trabalho para o operador do Direito

Vivemos atualmente um paradoxo De um lado eacute fato que a discishyplina Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou nos uacuteltimos anos contornos cada vez mais claros Os Cursos de Direito no paiacutes inteiro comeccedilaram com maior ou menor rapidez a inserir em seus curriacuteculos uma disciplina autocircnoma cuja finalidade era aprofundar o estudo das teacutecnicas e das estrateacutegias de persuasatildeo agrave disposiccedilatildeo de quem lida com a produccedilatildeo das peccedilas processuais

14 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e Cultura (M EC ) e a Associaccedilatildeo dos Magistrados do Brasil (AM B) tecircm incentivado a implementaccedilatildeo dessa disciplina no iniacutecio do Curso de maneira a favorecer uma melhor formashyccedilatildeo humaniacutestica e reflexiva aos estudantes de Direito acerca das temaacuteticas que essa disciplina enfrenta cotidianamente

De outro lado eacute inquestionaacutevel que o advento da informaacutetica e a necessidade crescente de uma produccedilatildeo cada vez mais volumosa de peshyccedilas potencializaram o cenaacuterio em que a reproduccedilatildeo (e natildeo a produccedilatildeo) de conteuacutedos e de conhecimento se opere sem que haja a preocupaccedilatildeo com a utilizaccedilatildeo consciente da linguagem e de seus recursos argumentativos

Uma das importantes criacuteticas que se costuma fazer aos advogados na praacutetica forense aliaacutes eacute a redaccedilatildeo de peticcedilotildees iniciais extremamente longas com diversas citaccedilotildees de pertinecircncia duvidosa que apenas repetem desneshycessariamente um mesmo conteuacutedo acessado pela internet e largamente reshyproduzido Natildeo haacute na maioria das peccedilas produzidas uma seleccedilatildeo apurada e criteriosa de fontes que estejam a serviccedilo de uma proposta argumentativa

Os recursos ldquo recortarcopiarrdquo e ldquo colarrdquo oferecidos pelo editor de texto estimulam os estagiaacuterios de Direito a reproduzirem em suas peccedilas longos trechos de outras sem a preocupaccedilatildeo com a autenticidade e com as peculiaridades do caso sobre o qual se debruccedilam

Chega-se agrave situaccedilatildeo absurda de muitos profissionais terem uma coleshytacircnea de modelos armazenada em seu computador - peticcedilatildeo inicial sobre descumprimento de contrato sobre indenizaccedilatildeo por danos morais etc - que seraacute mecanicamente utilizada em qualquer outra situaccedilatildeo

Veja que a criacutetica aqui natildeo se dirige agrave proposta de usar o ldquo modelordquo como metodologia de ensino para o acadecircmico de Direito Esse procedishymento se faz muitas vezes necessaacuterio e quase sempre muito eficiente para algueacutem que ainda natildeo possui nenhuma referecircncia visual para uma peccedila de que somente ouviu falar e com a qual nunca travou qualquer contato

Ressalte-se tambeacutem que existem excelentes advogados que utilizam com propriedade a linguagem e que se recusam agrave simples subsunccedilatildeo do fato agrave norma positivada Com isso desenvolvem de maneira brilhante suas teses para o caso decidendo

A questatildeo aqui desenvolvida defende a concepccedilatildeo de que o ldquo modelordquo deva apenas servir como referecircncia para outras produccedilotildees autocircnomas em que o conteuacutedo acumulado pelo aluno seraacute utilizado de maneira consciente Isso ajudaraacute a entender que para produzir uma peticcedilatildeo inicial eacute necessaacuterio utilizar o conteuacutedo trabalhado em Direito Civil em Introduccedilatildeo ao Direito em Argumentaccedilatildeo Juriacutedica e em Processo Civil por exemplo

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 15

A coacutepia natildeo faraacute certamente com que consiga essa visatildeo orgacircnishyca e interdisciplinar que a ciecircncia juriacutedica exige de seus profissionais Ao contraacuterio estimula a percepccedilatildeo fragmentada e esteacuteril do direito Por essa razatildeo eacute que entendemos que natildeo haacute motivaccedilatildeo suficiente para a citaccedilatildeo de longos trechos de doutrina e de dezenas de fontes jurisprudenciais salvo sc se fizerem absolutamente necessaacuterias agrave sustentaccedilatildeo que o proacuteprio caso concreto exige para a persuasatildeo do magistrado

Outro fator acadecircmico relevante a considerar eacute a reduzida aprovashyccedilatildeo dos Bachareacuteis em Direito no Exame da Ordem O crescente rigor das bancas avaliadoras e a necessidade de frear o crecimento exponencial das Instituiccedilotildees de Ensino Superior tecircm sido fator determinante para que as Fashyculdades de Direito natildeo abram matildeo da qualidade de formaccedilatildeo acadecircmica e profissional de seus alunos

Portanto o paradoxo a que nos referimos anteriormente pode ser reshysumido da seguinte maneira ao mesmo tempo em que a Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou o status de disciplina autocircnoma e indispensaacutevel agrave formashyccedilatildeo do acadecircmico de Direito a modernidade impulsiona - por meio dos recursos computacionais - o redator agrave reproduccedilatildeo de um discurso pronto irrefletido e ineficiente do ponto de vista argumentativo

Em que pese a aparente contradiccedilatildeo natildeo haacute duacutevidas de que a arshygumentaccedilatildeo deixou de exercer papel secundaacuterio e hoje funciona como requisito fundamental de todo aquele que pretende obter sucesso nas lides cm que atua E ela um elemento diferencial entre os profissionais de qualishydade - altamente requisitados no mercado - e os que se limitam a sustentar apenas teses de menor complexidade

O reconhecimento da importacircncia da argumentaccedilatildeo para o Direito natildeo eacute recente jaacute em 1958 Perelman e L Olbrechts-Tyteca afirmavam na introduccedilatildeo do Tratado da Argumentaccedilatildeo que durante seacuteculos a argumenshytaccedilatildeo foi relegada a segundo plano porque as decisotildees judiciais natildeo precishysavam de fundamentaccedilatildeo A atividade jurisdicional do magistrado consistia na busca da decisatildeo justa para cada caso a ele apresentado Os criteacuterios que determinavam tal decisatildeo eram quase sempre imprecisos e subjetivos muitas vezes se confundiam com valores morais sem vinculaccedilatildeo necessashyriamente juriacutedica

No mesmo sentido Viacutetor Gabriel10 assinala que com o advento da necessidade de fundamentaccedilatildeo das decisotildees judiciais decorrente inclusive

111 RODRIacuteGUEZ Viacutetor Gabriel Argumentaccedilatildeo juriacutedica teacutecnicas de persuasatildeo e loacuteshygica informal 4 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2005 p 09

16 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

da separaccedilatildeo dos poderes e da possibilidade de muacutetuo ldquo controlerdquo entre eles passou-se a privilegiar mais intensamente ldquo a necessidade de construshyccedilatildeo do discurso dos processos escritos e da racionalizaccedilatildeo do processo de construccedilatildeo do Direitordquo

No iniacutecio de 1970 Chaim Perelman inseriu um curso de Argumenshytaccedilatildeo na Universidade de Bruxelas onde lecionou Essa proximidade hisshytoacuterica talvez ainda nos dificulte perceber a relevacircncia fundamental que a argumentaccedilatildeo tem para a atividade jurisdicional de um Estado Democraacutetishyco de Direito mas o tempo continuaraacute se encarregando de trazer os esclareshycimentos necessaacuterios agrave valorizaccedilatildeo adequada da teoria da argumentaccedilatildeo

Capiacutetulo II

NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

Em geral classificam-se os textos quanto agrave tipologia sob trecircs noshymenclaturas texto narrativo texto descritivo e texto dissertativo1

A primeira observaccedilatildeo relevante a fazer eacute que apesar de a classifishycaccedilatildeo ser didaticamente uacutetil raramente satildeo produzidos textos puramente narrativos descritivos ou dissertativos O que ocorre na verdade eacute uma classificaccedilatildeo que considera a predominacircncia das caracteriacutesticas de um tipo de produccedilatildeo textual em detrimento das demais menos evidentes mas natildeo menos importantes

Na praacutetica redacional de todo texto eacute extremamente comum por exemplo que uma narrativa seja permeada por trechos descritivos certas caracteriacutesticas descritas de uma cena de um objeto ou de uma pessoa enrishyquecem de detalhes de forma inquestionaacutevel os fatos narrados e fornecem material precioso para que essa narrativa possa ser valorada a partir dos interesses de quem conta a histoacuteria

1 Charaudeau (1983 e 1992) propotildee uma classificaccedilatildeo distinta O autor faz distinccedilatildeo entre tipos de textos e modos de organizaccedilatildeo do discurso Os primeiros vistos como um resultado satildeo o publicitaacuterio o noticioso o didaacutetico o cientiacutefico o juriacutedico etc os segundos encarados como um processo satildeo o descritivo o narrativo o argumentativo e o enunciativo Segundo ele as duas noccedilotildees natildeo devem ser confundidas pois embora haja em alguns casos certa relaccedilatildeo entre tipo de texto e determinado modo de orgashynizaccedilatildeo discursiva (vejam-se os editoriais e o modo argumentativo) cada tipo textual pode organizar-se discursivamente por meio de qualquer um dos modos E o que ocorre com textos didaacuteticos que se organizam de maneira tanto descritiva quanto argumenta- tiva ou com os textos de imprensa que dependendo do gecircnero privilegiam os modos descritivo e narrativo vindo o argumentativo somente como contraponto

18 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Da mesma maneira fundamentar um determinado ponto de vista exishyge do argumentador muitas vezes que alguns fatos motivadores de sua tese sejam narrados A descriccedilatildeo de determinadas condutas pode igualmenshyte colaborar para justificar a tese sustentada A uacutenica certeza enfim eacute que narraccedilatildeo descriccedilatildeo e dissertaccedilatildeo podem compor juntas um soacute texto e sua separaccedilatildeo soacute se justifica natildeo raro por razotildees acadecircmicas

Enquanto narrar consiste em evidenciar fatos experienciados e deshysenvolvidos em um determinado tempo e espaccedilo descrever caracteriza-se por deitar sobre o mundo um olhar estaacutetico localizando os elementos da descriccedilatildeo e atribuindo-lhes qualidades que os singularizam Apesar de se oporem (narraccedilatildeo e descriccedilatildeo) satildeo estritamente ligados pois as accedilotildees soshymente tecircm sentido com relaccedilatildeo agraves identidades e agraves qualificaccedilotildees de seus agentes E mais o modo descritivo natildeo apenas completa o narrativo - ou o dissertativo - mas daacute-lhes sentido

Para que essa relaccedilatildeo entre os textos fique mais clara observe um fragmento do relatoacuterio de um Recurso Especial2 ao Superior Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro Os nomes das partes foram alterados

RELATOacute RIO

O Exmo Sr Ministro Ceacutesar Marciacutelio Rocha Luiz Ignaacutecio da Costa Filho ora recorrido ajuizou accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por danos morais em face do Flospital Satildeo Miguel objetivando o recebimento de quantia equivalente a 2000 (dois mil) salaacuterios miacutenimos ldquo tendo em vista todo o sofrimento experimentado pelo autor desde o iniacutecio do sofrimento de seu filho advindo da malsucedida cirurgia que culminou na hemorrashygia interna causadora da morte do menorrdquo (f 05)O MM Juiacutezo Monocraacutetico julgou parcialmente procedente o pedido inishycial e condenou a reacute ao pagamento da importacircncia equivalente a 1000 (hum mil) salaacuterios miacutenimos agrave eacutepoca do efetivo desembolso Irresignados o Hospital Satildeo Miguel e a Associaccedilatildeo Satildeo Miguel instituiccedilatildeo filantroacutepica e sua mantenedora apelaram ao Eg Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro o qual por maioria negou provimento ao apelo ()

Sabe-se que o relatoacuterio eacute a parte da peccedila processual em que satildeo narshyrados cronologicamente todos os fatos juridicamente importantes do caso concreto em anaacutelise Isso quer dizer que esse texto deve ser puramente narshyrativo Jaacute indicamos que a ideia de ldquo texto purordquo quanto agrave tipologia textual eacute praticamente impossiacutevel e que o mais comum eacute a utilizaccedilatildeo de um tipo de

2 Texto adaptado Os nomes foram alterados por razotildees eacuteticas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 19

lexto para compor um outro que c predominante Eacute exatamente isso que ocorre no fragmento anteriormente lido

Observe que o trecho entre aspas extraiacutedo do relatoacuterio do RecursoI special acima eacute dissertativo ldquo tendo em vista todo o sofrimento expeshyrimentado pelo autor desde o iniacutecio do sofrimento de seu filho advindo da malsucedida cirurgia que culminou na hemorragia interna causadora da morte do menorrdquo O ponto de vista sustentado entretanto mostra-se extremamente necessaacuterio agrave narraccedilatildeo de uma peccedila em que o autor ajuiacuteza uma accedilatildeo objetivando receber indenizaccedilatildeo por danos morais Em outras palavras a motivaccedilatildeo da indenizaccedilatildeo pleiteada depende da valoraccedilatildeo (texshyto argumentativo) de alguns acontecimentos narrados

Natildeo soacute encontramos dificuldade em separar com clareza os trechos narrativos descritivos ou dissertativos do texto que compomos como tamshybeacutem desenvolvemos com esforccedilo a redaccedilatildeo de uma narraccedilatildeo imparcial sem sustentar - tenuamente que seja - uma opiniatildeo ou enfatizar uma cashyracteriacutestica descrita por concebecirc-la mais relevante

Na verdade nada impede afirmar por exemplo que a descriccedilatildeo do estado psicoloacutegico de uma pessoa cujo filho morreu por conta de negligecircnshycia meacutedica seja o recurso utilizado para persuadir o interlocutor de que o autor de uma accedilatildeo faz jus agrave indenizaccedilatildeo Essa interdependecircncia entre osI ipos de texto pode ocorrer na produccedilatildeo dos textos juriacutedicos como tambeacutem em qualquer outra produccedilatildeo escrita

Garantido o entendimento de que natildeo existe ldquo texto purordquo e que a classificaccedilatildeo dc alguns segmentos honestamente dependeraacute de criteacuterios muitas vezes subjetivos passemos agrave identificaccedilatildeo das principais caracteshyriacutesticas dos textos narrativo descritivo e dissertativo

Ressaltamos que nosso objetivo neste livro natildeo eacute esgotar o tema tiposhylogia textual sequer pretendemos fazer uma exposiccedilatildeo longa e complexa sobre o tema mas precisamos traccedilar linhas gerais que caracterizem algumas especificidades de cada tipo textual para que o profissional do Direito tenha subsiacutedios miacutenimos que colaborem na sua produccedilatildeo textual argumentativa Importante tambeacutem que se adquira a compreensatildeo de como a narraccedilatildeo e a descriccedilatildeo fornecem elementos relevantes para que se defenda uma tese mediante o texto argumentativo

Antes de passarmos agrave contribuiccedilatildeo dos textos narrativo e descritivo agrave produccedilatildeo da argumentaccedilatildeo nosso objeto principal de estudo oferecemos exemplos de textos em que predomina cada uma das tipologias tradicionais (narraccedilatildeo descriccedilatildeo e argumentaccedilatildeo) a fim de facilitar a compreensatildeo dishydaacutetica pelo aluno

20 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Exemplo de texto narrativo predominante

A inicial que foi recebida por despacho de 28 de abril de 1997 veio acompanhada do inqueacuterito policial instaurado na la Delegacia Policial Do caderno informativo constam de relevantes o auto de prisatildeo em flashygrante de f 08 a 22 os boletins de vida pregressa de f 43 a 45 e o relatoacuterio final de f 131 a 134 Posteriormente vieram aos autos o laudo cadaveacuterico de f 146 e seguintes o laudo de exame de local e de veiacuteculo de f 172 a 185 o exame em substacircncia combustiacutevel de f 186 a 191 o termo de restishytuiccedilatildeo de f 247 e a continuaccedilatildeo do laudo cadaveacuterico que estaacute na f 509O Ministeacuterio Puacuteblico requereu a prisatildeo preventiva dos indiciados A prisatildeo em flagrante foi relaxada natildeo configurada a hipoacutetese de quase flagracircncia por natildeo ter havido perseguiccedilatildeo tendo sido os reacuteus localizashydos em virtude de diligecircncias policiais []

Exemplo de texto descritivo predominante

Um estudo da Nasa revelou que 2005 foi o ano mais quente desde que a temperatura global comeccedilou a ser medida no fim do seacuteculo XX A mediccedilatildeo feita por sateacutelites e estaccedilotildees meteoroloacutegicas instaladas na terra e no mar mostrou que os termocircmetros apresentaram as maiores elevaccedilotildees nos poios e nas regiotildees mais altas do Hemisfeacuterio Norte como o Alasca a Sibeacuteria e a Groelacircndia O ano mais quente na Terra havia sido 1998 quandoo El Nino deixou um rastro de anomalias climaacuteticas no mundo inteiro

Exemplo de texto argumentativo predominante

O princiacutepio do estado de inocecircncia ou como preferem da presunccedilatildeo de inocecircncia previsto na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 (art 5deg LV II) detershymina antes de a sentenccedila condenatoacuteria transitar em julgado a impossibishylidade de se impor ao acusado de um crime qualquer medida de coaccedilatildeo pessoal ao seu direito de liberdade que se revista de caracteriacutestica de execuccedilatildeo de pena Proibe-se a denominada ldquopena antecipadardquo exceccedilatildeo agraves providecircncias de natureza cautelar (prisatildeo em flagrante preventiva e temporaacuteria) Nesse sentido TJSP HC n 79434 (Damaacutesio de Jesus)

21 A C O N TR IBU ICcedil Atilde O DO T EXTO N ARRAT IVO PARA A ARG UM EN TACcedil AtildeO

A narraccedilatildeo eacute a modalidade de texto que se caracteriza pelo sequencia- mento damp fatos ao longo do tempo Trata-se na verdade de contar uma histoacute-

i ia com todos os seus eventos por meio dc um narrador3 O primeiro passo eacute exatamente escolher se esse narrador participaraacute ou natildeo da histoacuteria contada (gtu seja se a narraccedilatildeo seraacute em Ia ou em 3a pessoa4 Feito isso o narrador contaraacutei mi dado fato que se passou em determinado tempo e lugar Soma-se a isso que soacute existe fato soacute haacute accedilatildeo se praticada por determinados personagens

Narrar eacute portanto uma atividade posterior agrave existecircncia de uma reashylidade que se daacute necessariamente como passada (daiacute ser adequada a utilishyzaccedilatildeo do verbo no preteacuterito para narrar os fatos em qualquer peccedila processhysual) Aleacutem disso eacute ao mesmo tempo uma atividade que tem a faculdade dc fazer nascer de todas as partes um universo narrado que se apoia sobre outra realidade a qual soacute existe por meio desse universo

Soma-se a isso que eacute importante para a produccedilatildeo de uma narrativa clara completa que tambeacutem sejam apresentadas as causas motivadoras das accedilotildees dos personagens e as possiacuteveis consequecircncias geradas por esse acontecimento Todo esse conjunto de informaccedilotildees indicaraacute como a hisshytoacuteria se desenrolou e faraacute com que o leitor desse texto entenda com mais clareza o que efetivamente aconteceu

Assim sendo os elementos do texto narrativo tradicional satildeo os seshyguintes

bull fato - o que se vai narrar os acontecimentos e as accedilotildees propriashymente ditos

bull personagem - aquele ou aqueles que participaram da histoacuteria ou observaram os fatos ocorridos

bull lugar - onde se passa a histoacuteriabull tempo - quando o fato ocorreubull enredo - a sequecircncia encadeada e articulada dos fatos que comshy

potildeem o conteuacutedo da histoacuteria

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

1 Charaudeau diz que narrar natildeo eacute somente descrever uma seacuterie de fatos ou aconteshycimentos Para que essa atividade ocorra eacute necessaacuterio um narrador (escritor tesshytemunha advogado) que esteja munido de uma intencionalidade isto eacute de umavontade de transmitir alguma coisa (uma certa representaccedilatildeo da experiecircncia do mundo) a algueacutem (auditoacuterio particular ou universal) dentro de um contexto

4 A respeito do uso da pessoa gramatical nas formas verbais do texto juriacutedico re- comenda-se a utilizaccedilatildeo da terceira pessoa marcada pela impessoalidade porque mesmo que a narrativa dos fatos esteja sendo feita pelo proacuteprio titular do direito subjetivo de accedilatildeo - oportunidade em que exerce autonomamente a capacidade pos- tulatoacuteria - deve esse narrador posicionar-se como parte e natildeo como personagem

22 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

bull causa - o motivo que determinou a ocorrecircnciabull consequecircncia ~ o que decorreu das accedilotildees praticadasbull modo - como ocorreram os eventos

Imprescindiacutevel eacute esclarecer ao acadecircmico do Curso de Direito a relevacircnshycia do texto narrativo para a sustentaccedilatildeo de uma tese juriacutedica Vejamos entatildeo

Sustentar teses eacute por certo a atividade mais complexa no cotidiano de qualquer profissional da aacuterea juriacutedica Os filmes hollywoodianos apreshysentam com frequecircncia o estereoacutetipo do advogado audacioso que defende com brilhantismo causas aparentemente perdidas O espectador tende a se sentir atraiacutedo pelas habilidades de um profissional que contrariando todas as expectativas consegue convencer os outros do impossiacutevel Satildeo igualshymente sedutores a capacidade de dominar a arte oratoacuteria e os recursos mais sutis da linguagem E com base nesse modelo de atuaccedilatildeo profissional que muitos jovens escolhem a carreira que seguiratildeo

Assim mostrada no cinema a atividade profissional dos advogadoso leigo deixa de dimensionar uma importante tarefa desse profissional a saber antes de argumentar deve-se narrar os fatos ocorridos no caso conshycreto de maneira a contextualizar para todos os envolvidos na atividade jurisdicional o que ocorreu no caso em anaacutelise

Entretanto parece claro que nenhum juiz pode apreciar um pedido sem conhecer os fatos que lhe servem de fundamento Dessa forma a narshyraccedilatildeo ganha status de maior relevacircncia porque serve de requisito essencial agrave produccedilatildeo de uma argumentaccedilatildeo eficiente

Soma-se a isso que o princiacutepio da igualdade processual das partes exishyge que cada um tome ciecircncia das informaccedilotildees trazidas aos autos pela parte adversa para que tenha condiccedilotildees de exercer em plenitude a sua defesa

Por todas essas razotildees a narrativa deve ser vista dentro da peccedila proshycessual como parte fundamental da construccedilatildeo persuasiva do raciociacutenio

Leia a seguir um fragmento dos fatos e fundamentos de uma peticcedilatildeo inicial5 e observe nele as caracteriacutesticas do texto narrativo

FATOS E FUNDAM ENTOS

A autora matriculou sua filha na Instituiccedilatildeo de Ensino da reacute em 1999 para cursar o Jardim I Desde entatildeo a jovem permanece estudando na

5 Adaptaccedilatildeo de trecho de peticcedilatildeo inicial redigida por Taiacutes dc Jesus de Sousa Tavares Os nomes das partes foram alterados por razotildees eacuteticas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 23

mesma Instituiccedilatildeo onde cursa atualmente com 7 anos a I a seacuterie do Ensino FundamentalNo iniacutecio do ano letivo de 2003 a escola contratou os serviccedilos dc uma empresa particular especializada que ministra aulas de informaacutetica e de inglecircs para seus alunos nas dependecircncias da instituiccedilatildeo durante o horaacuteshyrio regular de aulas conforme paraacutegrafo primeiro da claacuteusula quinta do contrato de prestaccedilatildeo de serviccedilos educacionais firmado entre a autora e a reacute para o ano letivo de 2003Alegando que no iniacutecio do segundo semestre de 2003 passou a haver muita inadimplecircncia no pagamento das mensalidades a Diretora da Instishytuiccedilatildeo Neide Ana P Ramos e a Coordenadora Pedagoacutegica Raquel Les- sa passaram a adotar corno estrateacutegia meses depois reiteradas visitas agraves salas de aula para cobrar das crianccedilas que avisassem a seus pais que as aulas de informaacutetica e de inglecircs seriam canceladas se a escola natildeo conseshyguisse honrar o pagamento das empresas terceirizadas contratadasPor vaacuterias vezes as filhas da autora chegaram agrave sua casa dizendo que as aulas seriam canceladas se os pais natildeo efetuassem em dia o pagamento das mensalidades o que passou a preocupar a autora pelo comportashymento inadequado de fazer comunicados considerando que tal recurso era dirigido a crianccedilas de apenas quatro e sete anos sem condiccedilotildees porshytanto de discernir se seus pais estavam entre os inadimplentes ou natildeo Reitera-se que tais comunicados natildeo foram feitos por circulares como se espera de uma instituiccedilatildeo de ensino mas verbalmente para as crianshyccedilas que deveriam transmitir o recado para seus pais A filha mais nova da autora perguntou-Ihc por vaacuterias vezes se natildeo poderia mais assistir agraves aulas porque ela natildeo havia pago a mensalidade quando a autora explicou agrave filha de apenas quatro anos que a matildee havia pago sim a menshysalidade do coleacutegio ()

Acompanhe a sequecircncia cronoloacutegica dos principais eventos

A autora fez a 1a

matriacutecula da sua filha na

escola

Aumentou a inadimplecircncia no pagamento

das mensalidades

A autora foi impedida de assistir

agraves aulas

1999 20031deg sem 20032deg sem Meses despois ()

O elemento tempo talvez seja o que melhor caracterize a narraccedilatildeo E a sucessatildeo de eventos no tempo que denuncia a existecircncia de um enredo a ser contado Uma seacuterie de adjuntos adverbiais pode ser observada na narshyraccedilatildeo da peccedila inicial tal como foi destacado em negrito

24 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A seguir algumas das marcas temporais mais utilizadas na indicaccedilatildeo do tempo segundo proposta de KOCH Ingedore G Villaccedila Argumentashyccedilatildeo e linguagem Satildeo Paulo Cortez 2000

MARCAS TEMPORAIS UTILIZADAS NA NARRACcedilAtildeOEm relaccedilatildeo ao

momento da falaEm relaccedilatildeo ao marco

temporal

Concomitacircncia

AgoraHojeNeste momento Nesta altura

EntatildeoNo mesmo dia

Anterioridade

Haacute pouco Ontem Anteontem Haacute semanas Haacute meses No mecircs passado No ano passado

Na veacutespera No dia anterior No mecircs anterior Um ano atraacutes Uma semana antes Um mecircs antes Por vaacuterias vezes

Posterioridade

Daqui a poucoLogoAmanhatildeDepois de amanhatilde Em dois meses Duas semanas No proacuteximo dia

No dia seguinte Uma semana depois Um ano depois Um dia depois Daiacute uma(s) hora(s) Daiacute um(ns) dia(s)

Natildeo apenas o texto narrativo contribui para a produccedilatildeo de uma boa argumentaccedilatildeo O texto descritivo eacute tambcm uma importante ferramenta para a construccedilatildeo de textos em que se sustentam pontos de vista Vamos a essa questatildeo

22 A C O N T R IB U ICcedil Atilde O DO T EX T O D E S C R IT IV O PA R A A A R G U M EN T A Ccedil Atilde O

A descriccedilatildeo eacute marcada pela enumeraccedilatildeo de caracteriacutesticas de um obshyjeto de um ambiente de uma pessoa A descriccedilatildeo realiza uma espeacutecie de ldquo recorterdquo das imagens disponiacuteveis e enumera as caracteriacutesticas observadas em um determinado momento e em pontos especiacuteficos

Ademais uma boa descriccedilatildeo de uma pessoa por exemplo deve levar em conta senatildeo todos pelo menos grande parte das caracteriacutesticas fiacutesicas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 25

(altura peso cor da pele e dos cabelos idade traccedilos do rosto voz modo de sc vestir etc - descriccedilatildeo objetiva) e das caracteriacutesticas psicoloacutegicas do iiuliviacuteduo (personalidade temperamento caraacuteter preferecircncias e aptidotildees dentre outros - descriccedilatildeo subjetiva)

Diferente do que se pensa essas caracteriacutesticas natildeo satildeo importantes apenas para a redaccedilatildeo de narrativas literaacuterias em que o autor gasta longas paacuteginas nessa tarefa Tambeacutem nas argumentaccedilotildees e nas narrativas forenshyses a descriccedilatildeo das caracteriacutesticas subjetivas das partes exerce importante papel A esse respeito observe o art 59 do CP em que o legislador detershyminou orientaccedilotildees para a fixaccedilatildeo da pena

Art 59 O juiz atendendo agrave culpabilidade aos antecedentes agrave conduta soshycial agrave personalidade do agente aos motivos agraves circunstacircncias e consequecircnshycias do crime bem como ao comportamento da viacutetima estabeleceraacute con- foirne seja necessaacuterio e suficiente para reprovaccedilatildeo e prevenccedilatildeo do crimeI - as penas aplicaacuteveis dentre as cominadasII - a quantidade de pena aplicaacutevel dentro dos limites previstosIII - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdadeIV - a substituiccedilatildeo da pena privativa da liberdade aplicada por outra espeacutecie de pena se cabiacutevel

Veja que elementos como ldquo conduta socialrdquo ldquo personalidade do agen- lerdquo e ldquo comportamento da viacutetimardquo podem ateacute ser depreendidos dos fatos narrados em um relatoacuterio mas satildeo principalmente verificaacuteveis por meio da descriccedilatildeo de certas caracteriacutesticas do agente ou da viacutetima

Outro exemplo de texto predominantemente descritivo eacute apresentado adiante

Uma pessoa trafegava com sua moto em alta velocidade por uma aveshynida a mais ou menos 100 kmh Essa avenida fica dentro de um bairro movimentado e cheio de sinais O condutor estava drogado e totalmente alcoolizado sem qualquer condiccedilatildeo de discernir e reagir a eventos que ocorressem na pista

Observe o caraacuteter estaacutetico das informaccedilotildees natildeo haacute uma linha do tempo em que os fatos ocorrem sucessivamente como na narraccedilatildeo Mesmo havendo referecircncia aos anos 1998 e 2005 o objetivo da repoacuterter foi o de estabelecer uma comparaccedilatildeo qualitativa e natildeo necessariamente um espaccedilo de tempo em que fatos se desenvolvem Soma-se a isso que o texto natildeo eacute rico em elementos gramaticais que indiquem progressatildeo temporal como ocorre na narraccedilatildeo

26 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O trecho eacute tambeacutem farto em expressotildees adjetivas que caracterizam e qualificam o objeto do texto descritivo ldquo o ano mais quenterdquo ldquoos termocircmeshytros apresentaram as maiores elevaccedilotildees nos poiosrdquo e ldquo regiotildees mais altas do Hemisfeacuterio Norte como o Alasca a Sibeacuteria e a Groclacircndiardquo

Caracteriacutesticas semelhantes ocorrem no trecho a seguir em que as partes sacirco qualificadas em uma peticcedilatildeo inicial6

Simone da Rocha Silva casada gerente bancaacuteria portadora da carshyteira de identidade ndeg 123456789-00 e inscrita no CPFMF sob o ndeg 444777123-77 domiciliada na Rua Maacuterio Costa 180 casa 9 Madu- reira Rio de Janeiro CEP 21221-221 por seu advogado com procurashyccedilatildeo infra-assinada propotildee

Accedilatildeo de Reparaccedilatildeo de Danos Morais pelo rito sumaacuterioEm face de Odaleia Melo brasileira solteira autocircnoma portadora da carteira de identidade ndeg 123456789-55 inscrita no CPFMF sob o ndeg 123456789-33 domiciliada na Rua Adolfo Luiz 171 apto 200 Engeshynho de Dentro Rio de Janeiro CEP 21221-00 pelos motivos de fato e de direito expostos a seguir

Observe que em ambos os casos ilustrados a descriccedilatildeo feita - seja no texto jornaliacutestico seja no texto juriacutedico - eacute objetiva pois enumera caracshyteriacutesticas concretamente observadas sem que seja necessaacuteria a percepccedilatildeo subjetiva dos sujeitos No segundo exemplo as caracteriacutesticas necessaacuterias agrave qualificaccedilatildeo das partes satildeo objetivamente determinadas pelo Coacutedigo de Processo Civil no art 282 inciso II Haacute situaccedilotildees tambeacutem em que a desshycriccedilatildeo subjetiva serviraacute de estrateacutegia modalizadora7 de grande importacircncia para a argumentaccedilatildeo do ponto de vista defendido8

Suponha a hipoacutetese em que esteja sendo apreciado um pedido de inshydenizaccedilatildeo por danos materiais decorrentes de uma colisatildeo de automoacuteveis A extensatildeo dos danos provocados seraacute aferida pelo orccedilamento meacutedio de

6 Adaptaccedilatildeo de trecho de peticcedilatildeo inicial redigida pela estagiaacuteria Taiacutes de Jesus de Sousa Tavares

7 A modalizaccedilatildeo consiste na atitude do falante com relaccedilatildeo ao conteuacutedo objetivo de sua fala Um dos elementos discursivos mais empregados na dissertaccedilatildeo argumen- tativa refere-se agrave conveniente seleccedilatildeo lexical De fato em muitos casos uma messhyma realidade pode ser apresentada por vocaacutebulos positivos neutros ou negativos tal como ocorre em sacrificarmatarassassinar - comporescreverrabiscar

8 Charaudeau diz o seguinte enquanto argumentar consiste em levar em conta operashyccedilotildees abstratas de ordem loacutegica destinadas a explicar os laccedilos de causalidade entre fatos ou acontecimentos descrever consiste em identificar os seres no mundo classishyficando-os sem estabelecer necessariamente entre eles uma relaccedilatildeo de causalidade

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 27

oficinas mecacircnicas que realizam reparos dessa natureza Mas o que confere credibilidade ao orccedilamento juntado aos autos do processo Certamente poderia ajudar nessa tarefa a descriccedilatildeo minuciosa dos estragos na lataria do automoacutevel causados pela colisatildeo que serviria de fundamento na exposishyccedilatildeo da narrativa dos fatos ao pedido do polo ativo Ajuntada de fotografias lambeacutem seria providecircncia desejaacutevel

Veja a seguir um caso publicado no JB9 em que se discute a ocorshyrecircncia de superfaturamento no contrato para locaccedilatildeo de um prcdio pelal undaccedilatildeo Nacional de Sauacutede (Funasa) Leia a reportagem

MP ACUSA ESTEVAtildeO DE SUPERFATURARBR A SIacuteL IA O Ministeacuterio Puacuteblico Federal aponta indiacutecios de superfatushyramento no contrato para locaccedilatildeo de um preacutedio no centro de Brasiacutelia firshymado sem concorrecircncia puacuteblica entre a Fundaccedilatildeo Nacional de Sauacutede (Funasa) e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio Construccedilotildees e Projetos que pertence ao ex-senador Luiz Carvalho Responsaacutevel pela investigaccedilatildeo o procurador da Repuacuteblica Luiz Fernando de Souza disse que o aluguel de R$ 170 mil acordado entre a Funasa e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio com base em avaliashyccedilatildeo da Caixa Econocircmica Federal estaacute acima dos preccedilos de mercado Para Luiz Carvalho o valor do aluguel natildeo poderia ultrapassar R$ 120 mil ldquo O valor do imoacutevel foi avaliado pela Caixa Econocircmica ()rdquo O preacutedio alugado tem o nome do pai de Luiz Carvalho Lino Carvalho Pinto e pertence ao grupo JK SA cujos donos satildeo o ex-senador e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio Na semana passada depois que as denuacutencias foram divulgadas o ex-senador disse que comprou a Fundaccedilatildeo AbiacutelioLuiz Francisco tambeacutem estranhou o fato dc a Funasa ter alugado um preacutedio menor do que o exigido previamente No edital que divulgou a Funasa pedia um imoacutevel com aacuterea uacutetil miacutenima de oito mil metros quadrados para escritoacuterios Segundo a documentaccedilatildeo do contrato o edifiacutecio tem 17160 metros quadrados mas apenas 727282 metros quadrados satildeo destinados a escritoacuterios ldquo Essa exigecircncia publicada vincula a administraccedilatildeo e serve unishycamente para afastar outras possiacuteveis empresasrdquo afirmou o procurador em carta enviada ontem ao presidente da Funasa Mauriacutecio Ribeiro Marcos

Observe como a descriccedilatildeo do imoacutevel e de seu contrato de locaccedilatildeo eacute de grande relevacircncia para a apreciaccedilatildeo da questatildeo juriacutedica discutida Por esse motivo na narraccedilatildeo dos fatos da peccedila acusatoacuteria deveraacute o MP descreshyver tais caracteriacutesticas como fundamento juriacutedico de sua acusaccedilatildeo

Publicaccedilatildeo de quinta-feira 12 de julho de 2012 Consultado em lthttpjbonIineter- racombrjbpapelbrasi12012071 ljorbra20010711014htmlgt Acesso em 11 ago 2012 Texto adaptado para preservar os envolvidos

28 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Da mesma maneira vaacuterios outros exemplos podem ser encontrados nas mais variadas peccedilas processuais

23 O TEXTO D1SSERTATIVO

A dissertaccedilatildeo estaacute presente no cotidiano de todas as pessoas que a todo o momento precisam sustentar opiniotildees posicionarem-se em relaccedilatildeo aos acontecimentos que ocorrem agrave sua volta

A tradicional classificaccedilatildeo do texto dissertativo costuma apresentar uma proposta bipartida distingue-se a dissertaccedilatildeo expositiva da dissertashyccedilatildeo argument ativa

Dissertaccedilatildeo expositiva eacute a maneira como a maior parte dos autores deshysigna a dissertaccedilatildeo em que se expressam ideias sobre determinado tema sem a preocupaccedilatildeo poreacutem de persuadir o auditoacuterio acerca da tese defendida

Nesse tipo de texto natildeo se faz necessaacuterio profundo conhecimento a respeito da questatildeo abordada pois natildeo eacute necessaacuterio posicionar-se diante da problemaacutetica investigada O objetivo eacute passar um conjunto de informaccedilotildees relevantes que possam contribuir com o esclarecimento do auditoacuterio acerca de um assunto especiacutefico para que ele o conheccedila melhor

Dissertaccedilatildeo argumentativa eacute aquela que implica defesa de uma tese com a finalidade de tentar persuadir algueacutem de que este eacute o ponto de vista mais adequado a adotar em determinada circunstacircncia Eacute importante seleshycionar um conjunto consistente de fatos (provas ou indiacutecios) por meio dos quais se pretende demonstrar a superioridade da tese defendida

Dessa forma a dissertaccedilatildeo argumentativa em que predomina a funshyccedilatildeo conativa ou apelativa da linguagem tem por objetivo sustentar a supeshyrioridade de uma tese em detrimento de outra seu discurso eacute extremamente carregado de ideologias A dissertaccedilatildeo expositiva por outro lado natildeo preshytende convencer o interlocutor a respeito de coisa alguma eacute um discurso neutro apenas expondo informaccedilotildees a respeito de um dado assunto

Essa postura de distinguir dois tipos de dissertaccedilatildeo tem sido muito criticada em estudos recentes porquanto se acredite que a neutralidade na construccedilatildeo de um discurso seja impossiacutevel Assinala Ingedore Koch10 queo discurso que se pretende neutro ingecircnuo ao assim se colocar jaacute tomou uma posiccedilatildeo em detrimento de vaacuterias outras possiacuteveis estrateacutegias de cons-

10 KOCH Ingedore G Villaccedila Argumentaccedilatildeo e linguagem 2 ed Satildeo Paulo Cortez 1987 p 09

liiiccedilatildeo de seu conteuacutedo Em outras palavras a dissertaccedilatildeo que se pretende meramente expositiva tambeacutem conteacutem uma ideologia

Ademais a proacutepria seleccedilatildeo de informaccedilotildees que poderiam ser impor-l antes para a dissertativa expositiva jaacute caracteriza certas escolhas dentro de uma hierarquia abstrata de valores que aquele que escreve tem de fazerI )n mesma maneira a ordem em que os fatos seratildeo apresentados na exposhysiccedilatildeo eacute outro fator que determina ser impossiacutevel fazer uma exposiccedilatildeo neu- ira sobre determinado tema Natildeo haacute portanto como produzir um discurso verdadeiramente neutro

O modo dissertativo-argumentativo efetivamente se configura quanshydo existe a defesa de uma tese O texto argumentativo particularmente apresenta

a) uma proposta sobre o mundo que provoque um questionamento quanto agrave sua legitimidade

b) um sujeito que se engaje com relaccedilatildeo a esse questionamento e deshysenvolva um raciociacutenio para tentar estabelecer uma verdade (que seja proacutepria ou universal que se trate de uma simples aceitabilidashyde ou de uma legitimidade) sobre essa proposta

c) um outro sujeito que relacionado agrave mesma proposta questionamenshyto e verdade constitua-se no alvo da argumentaccedilatildeo (pessoa a que se dirige o sujeito arguinentador)

Ainda que a distinccedilatildeo entre as duas propostas de dissertaccedilatildeo seja uacutetil apenas do ponto de vista didaacutetico observe-se que no Direito desenvolshyvem-se textos dissertativos muito mais elaborados que em algumas outras aacutereas profissionais por conta da proacutepria natureza da atividade

Para que o receacutem-iniciado na praacutetica argumentativa se sinta habilitado a produzir textos tatildeo complexos assinala Toledo satildeo necessaacuterios alguns requisitos certo amadurecimento no assunto sobre o qual discorreraacute coshynhecimento da mateacuteria raciociacutenio loacutegico e dialeacutetico capacidade de anaacutelise e siacutentese domiacutenio da norma culta e conhecimento teoacuterico-refiexivo consisshytente que decirc bases soacutelidas para o desenvolvimento de um bom texto

Pela complexidade inerente agrave argumentaccedilatildeo juriacutedica o profissional do Direito precisa aleacutem dos requisitos jaacute destacados desenvolver as seshyguintes habilidades adquirir um repertoacuterio vasto dominar tipos diferentes

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

TOLEDO Marleine Paula Marcondes e Ferreira de NADOacuteLSKIS Hecircndricas Coshymunicaccedilatildeo Juriacutedica 4 ed Satildeo Paulo Sugestotildees Literaacuterias 2002

30 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

de argumentos e de estrateacutegias argumentativas avaliar a aceitabilidade do auditoacuterio perante os seus argumentos e as suas estrateacutegias argumentativas operar juiacutezos e reflexotildees complexas por meio dos quais se deseja encamishynhar o raciociacutenio do aLiditoacuterio

Quanto ao conteuacutedo teoacuterico desenvolvido por autores consagrados acerca da argumentaccedilatildeo ressaltamos inicialmente que eacute extremamente vasto mas ainda assim trataremos adiante das questotildees que nos pareceram mais importantes

Capiacutetulo III

ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

No que diz respeito agrave relaccedilatildeo do tratado da argumentaccedilatildeo com os aushytores gregos e latinos Perelman destaca em sua obra algumas motivaccedilotildees a seguir expostas

U A ARG UM EN TACcedilAtildeO E A R ET Oacute R IC A C LAacute SS IC A

Os loacutegicos e filoacutesofos modernos natildeo tratavam a argumentaccedilatildeo como ciecircncia autocircnoma relegando-a simplesmente ao estudo da arte de persuashydir e convencer como a teacutecnica da deliberaccedilatildeo e da discussatildeo Destaca-se aqui Aristoacuteteles com as provas que chama de dialeacuteticas cuja utilizaccedilatildeo mostra na Retoacuterica Daiacute aliaacutes a denominaccedilatildeo Nova Retoacuterica agrave proposta perelmaniana

Outra razatildeo mais importante entretanto conduziu-o a forma com que a Antiguidade se ocupou da dialeacutetica e da retoacuterica O raciociacutenio diashyleacutetico eacute considerado paralelo ao raciociacutenio analiacutetico mas trata do verossiacuteshymil em vez de lidar com proposiccedilotildees necessaacuterias Aleacutem disso a ideia de adesatildeo e de espiacuteritos a quem se dirige um discurso eacute essencial a todas as teorias antigas da retoacuterica A aproximaccedilatildeo do autor em relaccedilatildeo agrave retoacuterica visa a enfatizar que eacute em funccedilatildeo de uni auditoacuterio que qualquer argumento se desenvolve

Vale destacar ainda que em alguns aspectos o Tratado de Argushymentaccedilatildeo de Perelman ultrapassa os limites da retoacuterica antiga ao mesmo tempo em que deixa outros de lado

Um dos aspectos destacados se refere agrave distinccedilatildeo de metas entre a reshytoacuterica antiga e a nova retoacuterica Enquanto aquela valorizava a argumentaccedilatildeo oral esta daacute ecircnfase aos textos escritos A preocupaccedilatildeo de Perelman (e aqui

32 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ele se espelha em Aristoacuteteles) eacute compreender o mecanismo do pensamento e estudar a estrutura da argumentaccedilatildeo Aleacutem disso enfatiza que a discusshysatildeo com um uacutenico interlocutor ou mesmo a deliberaccedilatildeo iacutentima dependem igualmente de uma teoria geral da argumentaccedilatildeo Em tal aspecto foi aleacutem dos limites da retoacuterica antiga

Perelman e L Olbrechts-Tyteca em seu Tratado da Argumentaccedilatildeo vinculado agrave tradiccedilatildeo da retoacuterica e da dialeacutetica gregas definem argumentashyccedilatildeo como o ato de provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentam ao seu assentimento

Charaudeau (1992) em sua Grammaire du Sens et de I rsquoExpression diz que argumentaccedilatildeo eacute uma atividade discursiva que encarada do ponto do vista do sujeito argumentador participa de uma dupla busca 1deg) uma busca de rashycionalidade que tende a um ideal de verdade quanto agrave explicaccedilatildeo de fenocircmenos do universo 2deg) uma busca de influecircncia que tende a um ideal de persuasatildeo o qual consiste em fazer dividir com outro (interlocutor ou destinataacuterio) um certo universo do discurso a ponto de levaacute-lo a ter as mesmas propostas

A primeira pelo fato de nenhum sujeito ser ingecircnuo torna-se uma busca do verossiacutemil de um verossiacutemil que depende das representaccedilotildees so- cioculturais divididas pelos membros de um dado grupo em nome da exshyperiecircncia ou do conhecimento A segunda eacute um pouco ambiacutegua na medida em que se apresenta como fazendo parte de um processo racional e loacutegico quando a divisatildeo da proacutepria convicccedilatildeo com o outro pode ser obtida por meios diferentes daquele do raciociacutenio por intermeacutedio por exemplo da seduccedilatildeo que tambeacutem se vale de outros modos de organizaccedilatildeo do discurso (Descritivo e Narrativo)

Enfim seja considerando o fenocircmeno do ponto de vista da busca de adesatildeo seja considerando do ponto de vista da busca do verossiacutemil e da influecircncia que tende a um ideal de persuasatildeo seja ainda levando em conta ambas as visotildees sua importacircncia para o estudo da argumentaccedilatildeo eacute inegaacutevel

32 AS NO CcedilOtilde ES D E A U D ITOacute R IO PO L IFO N IA E IN T ER T EX T U A L ID A D E

Outro ponto importante da proposta de Perelman eacute a noccedilatildeo de auditoacuteshyrio Segundo o autor para que uma argumentaccedilatildeo se desenvolva eacute preciso que aqueles a quem ela se destina lhe prestem atenccedilatildeo Por seu turno para isso ocorrer eacute indispensaacutevel prender o interesse do puacuteblico condiccedilatildeo funshydamental para o andamento de qualquer argumentaccedilatildeo

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 33

Destaque-se que tal puacuteblico cuja adesatildeo agrave argumentaccedilatildeo visa a obter constitui portanto o que Perelman chama de auditoacuterio No niacutevel da retoacuteshyrica ele define auditoacuterio como o conjunto de pessoas que o orador quer influenciar com sua argumentaccedilatildeo

Por outro lado como o importante na argumentaccedilatildeo natildeo eacute saber o que o proacuteprio orador considera verdadeiro ou probatoacuterio mas qual eacute o parecer daqueles a quem ela se dirige ele registra e trabalha com duas espeacutecies de auditoacuterio o universal e o particular

O auditoacuterio universal eacute constituiacutedo pela humanidade inteira ou pelo menos por todos os homens adultos e normais O particular divide-se em dois tipos o formado no diaacutelogo somente pelo interlocutor a quem se dirige o constituiacutedo pelo proacuteprio sujeito quando ele delibera ou apresenta as razoes de seus atos Opondo-se a argumentaccedilatildeo agrave demonstraccedilatildeo o disshycurso argumentativo destina-se a auditoacuterios particulares embora vise com IVequecircncia ao universal

Insta salientar neste ponto a noccedilatildeo de polifonia Esse conceito possishybilita a expressatildeo e a percepccedilatildeo de vozes simboacutelicas no interior dos enunshyciados que representam as artes do dizer e as diferentes possibilidades do sentir por meio de siacutembolos e mitos

O conceito de polifonia noccedilatildeo elaborada por Ducrot em 1983 signishyfica a incorporaccedilatildeo ao discurso do locutor de asserccedilotildees emitidas por terceishyros sejam eles seus interlocutores a opiniatildeo puacuteblica ou outras fontes Esse aspecto eacute retomado por Angelim em 1996 que assinala ser a polifonia um recurso de persuasatildeo no processo argumentativo

A autora citada presta importante esclarecimento ao estabelecer a dishyferenccedila entre polifonia e intertextualidade Segundo seu ponto de vista a polifonia implica o reportar de falas alheias como recurso e reforccedilo agrave linha argumentativa ao passo que intertextualidade decorre de repeticcedilatildeo de falas de outros emissores com quaisquer outras intenccedilotildees A polifonia eacute definida como ldquoa incorporaccedilatildeo que o locutor faz ao seu discurso de assershyccedilotildees atribuiacutedas a outros enunciadores ou personagens discursivos - ao(s) interlocutor(es) ou agrave opiniatildeo puacuteblica em geralrdquo (Koch 1996 p 142)

Entende-se que a polifonia eacute um fato constante no discurso que ofeshyrece ao locutor a possibilidade de tirar consequecircncias de uma asserccedilatildeo cuja responsabilidade natildeo assume diretamente pois a atribui a enunciador estranho A condiccedilatildeo para que haja polifonia eacute portanto que o locutor seja diferente do enunciador o locutor faz com que outro personagem diga algo no interior do seu proacuteprio discurso

34 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Koch (1996 p 149) afirma que a autoridade polifocircnica constitui o proacuteprio fundamento do encadeamento discursivo Nesse caso o locutor introduz no seu discurso uma voz responsaacutevel pela asserccedilatildeo de uma detershyminada informaccedilatildeo Com isso essa asserccedilatildeo eacute apenas representada e sobre ela encadeia uma segunda relativa a outra proposiccedilatildeo como faria sobre a proacutepria proposiccedilatildeo considerada como verdade

Conforme o estudo da autora referida na argumentaccedilatildeo o recurso agrave autoridade polifocircnica permite ao locutor

a) natildeo se portar de modo ditatorial (discurso autoritaacuterio)b) prever os argumentos possiacuteveis do adversaacuterio e reconhecer-lhes

certa validade incorporando-os ao proacuteprio discurso (argumento de lsquooposiccedilatildeo)

c) dotar o seu discurso de maior poder de persuasatildeo desarmando o seu adversaacuterio porque natildeo pode ser contestado porque permite antecipar-se a ele introduzindo no proacuteprio discurso os argumentos possiacuteveis

E interessante salientar que segundo Ducrot (1984) por meio da iroshynia procuramos mostrar a falsidade de uma tese utilizando em seu favor argumentos absurdos atribuiacutedos aos defensores dessa tese de tal modo que o absurdo de suas palavras possa fazer parecer o absurdo da tese As posiccedilotildees de ambos mostram ser bem plausiacutevel tratar a ironia como um fenocircmeno polifocircnico visto que ela pode ser considerada como recurso linshyguiacutestico que possibilita ao locutor sugerir pelo contexto ou pela entoaccedilatildeo o contraacuterio do que o enunciado parece exprimir

33 A ARG UM EN TACcedil AtildeO E O PRO C ESSO DE PRO DUCcedilAtildeO DE TEXTO S JU R IacuteD IC O S

Argumentar como jaacute foi destacado anteriormente exige que se deshysenvolvam vaacuterias competecircncias dentre elas que se adote uma postura criacuteshytica perante o texto lido e o texto que se pretende redigir

Esse enfoque ao processo comunicativo e expressivo permite que se problematize a aprendizagem da leitura e da escrita Segundo Osakabe (1979)

Aprender a ler e escrever natildeo corresponde simplesmente agrave aquisiccedilatildeo de um novo coacutedigo ou muito menos ao simples desenvolvimento de um

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 35

tipo de percepccedilatildeo atraveacutes do acreacutescimo de uma nova habilidade Aprenshyder a ler eacute tambeacutem ter acesso a um mundo distinto daquele em que a oralidade se instala e organiza o mundo da escrita

De acordo com esse autor a produccedilatildeo escrita deve permitir ao argu- mentador reconhecer sua identidade seu lugar social as tensotildees simboacutelicas e imaginaacuterias que animam o contexto em que se insere a questatildeo discutida sempre questionando e compreendendo as vozes dos seus sentidos no real em que a proacutepria argumentaccedilatildeo se insere

Osakabe destaca ainda a importacircncia da leitura como instrumento de reforccedilo ao poder argumentativo e portanto de desenvolvimento do potencial de expressatildeo escrita que algumas pessoas definem como ldquobem escreverrdquo

Na accedilatildeo discursiva a coesatildeo e a coerecircncia satildeo elementos de granshyde importacircncia porque aquela estabelece relaccedilotildees de sentido conectando na superfiacutecie do texto as palavras as sentenccedilas e os paraacutegrafos esta diz respeito agrave possibilidade de um texto fazer sentido para os usuaacuterios encon- tra-se no niacutevel profundo do texto Sendo assim fica demonstrado que o argumentador deveraacute trabalhar o planejamento e execuccedilatildeo de seu texto em funccedilatildeo desses aspectos

Esse pensamento encontra respaldo em Perelmann amp Olbrechts-Tyteca (1996) precursores de uma teoria da argumentaccedilatildeo em que se apoiam muitos estudiosos do discurso na atualidade O trabalho desses autores baseia-se na retoacuterica greco-latina mas ultrapassou os seus limites ao deshyli nir como argumentativa toda a atividade discursiva oral ou escrita com finalidade persuasiva A Retoacuterica Claacutessica que era considerada uma arte oratoacuteria restringia-se ao discurso oral proferido diante de uma multidatildeo com objetivos persuasivos

Numa breve retrospectiva histoacuterica destacamos que Aristoacuteteles (384- 322 aC) tem grande importacircncia para o estudo da teoria da argumentaccedilatildeo pois abordou temas que deram origem a duas vertentes dessa teoria nos Toacutepicos (1967) ele tratou do assunto sob o acircngulo do raciociacutenio isto eacute do ponto de vista loacutegico Na Retoacuterica (1967) ele se concentrou em aspectos relativos agrave persuasatildeo do auditoacuterio privilegiando fatores sociais

Jaacute na Idade Moderna com Descartes (1946) e a busca da verdade objetiva a retoacuterica perdeu espaccedilo no acircmbito do discurso cientiacutefico Nesse periacuteodo ficou vinculada predominantemente ao estilo literaacuterio sendo conshysiderada como ornamento A argumentaccedilatildeo por sua vez assumiu caraacuteter de demonstraccedilatildeo pois a proposta cartesiana buscava demonstrar racionalshymente o caraacuteter universal das coisas

36 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Identificamos novos rumos no estudo da argumentaccedilatildeo apenas na seshygunda metade do seacuteculo XX com o desenvolvimento da Psicologia Cognishytiva das Teorias da Enunciaccedilatildeo e da Pragmaacutetica Na sequecircncia desta seccedilatildeo apresentamos as contribuiccedilotildees de alguns estudiosos das questotildees referentes agrave argumentaccedilatildeo tendo em vista obter suporte teoacuterico para esta obra

Como jaacute registrado anteriormente Perelman amp Olbrechts-Tyteca (1996) ultrapassaram os limites da Retoacuterica Claacutessica ao definir como ar- gumentativa toda atividade discursiva oral ou escrita com finalidade pershysuasiva

Seu trabalho auxilia-nos a repensar o paradigma claacutessico de estudo das ciecircncias humanas e sociais particularmente no que se refere aos seus fundamentos calcados na loacutegica matemaacutetica de fundo demonstrativo Peshyrelman propotildee que se substitua o citado paradigma por um novo tipo de loacutegica embasado no que designa como o processo de argumentaccedilatildeo

Na perspectiva de Perelman o conhecimento possui uma dimensatildeo diashyleacutetica e por meio da teoria da argumentaccedilatildeo toma-se possiacutevel ao estudioso natildeo apenas lanccedilar matildeo da razatildeo (como fazem os formal istas) mas tambeacutem utilizaacute-la para obter a adesatildeo das demais pessoas para determinada tese

Decorre daiacute que a praacutetica da argumentaccedilatildeo natildeo eacute um exerciacutecio esshypeculativo nem se confunde com a simples descriccedilatildeo de um objeto ou a narraccedilatildeo de um acontecimento eacute um encaminhamento pelo qual uma pesshysoa visa a exercer influecircncia sobre outra Para atingir esse objetivo o coshynhecimento natildeo eacute suficiente eacute necessaacuterio saber valorizaacute-lo e fazecirc-lo aceito pelo interlocutor seja ele uma pessoa ou um grupo isto eacute o auditoacuterio que possui inteligecircncia e vontade proacutepria

Aleacutem disso a praacutetica argumentativa envolve o raciociacutenio e a loacutegica jaacute que o argumentador deve elaborar provas para defender sua tese Enfim argumentar na realidade implica a tentativa de convencer o auditoacuterio agrave luz de um raciociacutenio coerente e consciente mediante a apresentaccedilatildeo de razotildees em face da compatibilidade das provas com as demonstraccedilotildees

Entende-se entatildeo que eacute em funccedilatildeo da influecircncia que se deseja exershycer sobre um auditoacuterio que se desenvolve toda uma argumentaccedilatildeo Nessa linha de pensamento verificamos que o sentido de um enunciado comporshyta como elemento constitutivo essa forma de influecircncia a qual denominashymos forccedila argumentativa

Desse modo a liacutengua ao mesmo tempo em que contribui primeirashymente para determinar o sentido dos enunciados eacute um dos lugares privileshygiados em que a argumentaccedilatildeo eacute elaborada

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 37

Tais enunciados obedecem a uma orientaccedilatildeo argumentativa quando seu conteuacutedo visa a fazer admitir outros enunciados

Importa destacar a avaliaccedilatildeo de Koch (1996) a respeito da argumenshytaccedilatildeo como o ato mais importante da linguagem que busca a persuasatildeo e procura atingir a adesatildeo e a vontade do interlocutor Acrescenta relevantes aspectos para a anaacutelise da argumentaccedilatildeo quando esclarece que a linguashygem eacute uma forma de accedilatildeo dotada de intencionalidade o que implica sishymultaneamente a caracteriacutestica de ser veiacuteculo de ideologia que se expresshysa mediante a argumentaccedilatildeo

Vai (1994) auxilia na anaacutelise desse fenocircmeno ao dizer que a ideoshylogia dominante quer fazer crer que haacute sempre um jeito certo de fazer as coisas um jeito certo de enxergar e interpretar a realidade um jeito certo de pensar

A compreensatildeo desse aspecto torna-se mais evidente considerando- se o posicionamento de Benveniste (1966) ao afirmar que o sujeito se

apropria da linguagem num momento individual todavia ele o faz sob determinadas condiccedilotildees sociais culturais e ideoloacutegicas Focalizando-se a questatildeo do discurso sob esse acircngulo podemos dizer que pela consideraccedilatildeo fundamental das condiccedilotildees de produccedilatildeo na Anaacutelise do Discurso natildeo eacute o sujeito (argumentador) que se apropria da linguagem O que existe eacute uma forma social de apropriaccedilatildeo da linguagem em que estaacute refletida a ilusatildeo do sujeito isto eacute sua interpelaccedilatildeo feita pela ideologia E nesse jogo do lugar social e dos sentidos estabelecidos que estaacute representada a determinaccedilatildeo histoacuterico-social do discurso

Orlandi (1996) menciona que de forma geral podemos dizer que o argumentador natildeo eacute um sujeito-em-si mas tal como existe socialmente A apropriaccedilatildeo da linguagem eacute um ato social Com respeito agrave relaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo discursiva e a formaccedilatildeo ideoloacutegica resta-nos especificar que a interaccedilatildeo entre argumentador e auditoacuterio estaacute marcada por essa relaccedilatildeo Isso porque o lugar que os interlocutores ocupam numa formaccedilatildeo social e na sua relaccedilatildeo com a ideologia eacute constitutivo de seu discurso isto eacute daacute substacircncia agravequilo que este significa

Assim a relaccedilatildeo entre argumentador e auditoacuterio pode variar desde a maior harmonia ateacute a maior incompatibilidade ideoloacutegica o que vai inshyterferir na compreensatildeo do texto uma vez que como vimos a leitura eacute produzida socialmente Cabe lembrar que esse processo estaacute marcado no e pelo funcionamento discursivo Platatildeo amp Fiorin (1996) satildeo coerentes com os pontos de vista citados pois apresentam o discurso como resultado de

38 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

criaccedilatildeo ideoloacutegica coletiva a voz de seu produtor se manifesta ao lado de um coro de outras vozes que jaacute trataram do mesmo tema e com as quais se potildee em acordo ou desacordo

Diante do exposto nesta seccedilatildeo podemos inferir que no discurso haacute grande engajamento daquele que argumenta Conforme a anaacutelise de Pinto (1996) esse viacutenculo eacute explicitado por meio de algumas marcas formais entre as quais podemos destacar

bull Status da mensagem que corresponde ao papel exercido pelo EU no discurso

bull Sujeitos enunciadores (argumentador) e receptores (auditoacuterio) Enten- da-se como sujeito algueacutem que se apropria de uma linguagem constishytuiacuteda socialmente e que estaacute mergulhado no social que o envolve Parshytindo desse pressuposto a pesquisadora citada acrescenta que o sujeito eacute preso agrave contradiccedilatildeo que o constitui Charaudeau (1992) refere-se ao sujeito argumentador que natildeo eacute o produtor empiacuterico de todas as falas do discurso ele eacute o responsaacutevel por uma estrutura argumentativa

bull Marcas formais do EU que estabelecem os elos coesivos de primeishyra pessoa e mostram o grau do engajamento do EU ao discurso

bull Momento e lugar da enunciaccedilatildeo que se referem agraves condiccedilotildees conshyjunturais mais precisamente ao momento e ao lugar social em que ocorre o ato da emissatildeo do discurso

bull Modalizadores que satildeo todos os elementos linguiacutesticos diretamenshyte ligados ao evento da produccedilatildeo do enunciado e que funcionam como indicadores das intenccedilotildees sentimentos e atitudes do locutor com relaccedilatildeo ao seu discurso

Encontramos tambeacutem na contribuiccedilatildeo de Pinto (1996) referecircncia agraves seguintes formas de abordagem do discurso a situacional a lexicoloacutegica a pragmaacutetica a enunciativa e a textual

Abordagem situacional leva em conta elementos pertinentes agrave situashyccedilatildeo identificados por perguntas que podem ser aparentemente ldquobanaisrdquo como quem fala Onde Quando De quecirc Como Para quecirc

Abordagem pragmaacutetica procura descrever as unidades miacutenimas de comunicaccedilatildeo e as intenccedilotildees de comunicaccedilatildeo dos participantes atos de fala e valores ilocutoacuterios dos enunciados

Abordagem enunciativa estuda os traccedilos que caracterizam a enunshyciaccedilatildeo ou seja o ato de produccedilatildeo do enunciado presente no discurso

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 39

( omo operaccedilotildees enunciativas caracteriacutesticas destacam-se os enunciadores (marcas pessoais) a retomada do referencial do lugar e do momento da enunciaccedilatildeo (emprego de decirciticos tempos verbais indicadores espaccedilo-tem- porais) as relaccedilotildees que os enunciadores estabelecem com seus enunciados (tematizaccedilatildeo modalidades) e as relaccedilotildees que os enunciadores estabelecem entre eles (modalidades marcas pessoais) (Orlandi 1988)

Abordagem textual visa a descrever os modelos textuais que refle- icm a competecircncia linguiacutestica e os modelos discursivos que mostram a eompetecircncia discursiva O texto eacute definido como qualquer unidade discurshysiva (Orlandi 1988)

Abordagem lexicoloacutegica considera o campo lexical de um corpus como uma seacuterie de termos ligados a uma mesma realidade ou a um mesmo conceito Aponta a seleccedilatildeo lexical como a responsaacutevel pelas oposiccedilotildees os jogos de palavras as metaacuteforas o paralelismo riacutetmico entre outras Nessa abordagem ressalte-se a existecircncia de palavras que colocadas estrategicashymente no texto trazem consigo uma carga poderosa de impliacutecitos (Orlandi 1994)

Ainda tentando buscar subsiacutedios agrave compreensatildeo do processo argu- mentativo cabe mencionar que segundo Angelim (1996) haacute diferentes tipos de argumentaccedilatildeo

a) argumentaccedilatildeo simples - quando se apresentam provas naturais verdades comprovadas ou exemplos de conhecimento aprioriacutestico geral para fundamentar a tese

b) argumentaccedilatildeo ad hominem - quando o emissor se dirige a interloshycutor especiacutefico para refutar-lhe o ponto de vista

c) argumentaccedilatildeo disjuntiva - quando se levantam diferentes hipoacuteteses explicativas do fenocircmeno para ao final selecionar uma e buscar comprovaacute-la por meio de procedimentos similares aos da argushymentaccedilatildeo simples

d) argumentaccedilatildeo mediante dilema - quando se estabelecem duas hipoacuteshyteses uacutenicas para provar que a soluccedilatildeo eacute relativa pois depende do ponto de vista do emissor que a defende

e) argumentaccedilatildeo pelos contraacuterios - quando se refuta uma tese proshyvando que os fatos a contradizem

iacute) argumentaccedilatildeo pelo absurdo - quando a defesa da tese ocorre pela via indireta iniciando-se pela tentativa de provar a falsidade de contradishyccedilatildeo da tese para fundamentar os argumentos favoraacuteveis a ela

40 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Mendonccedila (1997) refere-se a duas teacutecnicas baacutesicas de estruturaccedilatildeo dos argumentos para convencer um auditoacuterio a associaccedilatildeo de ideias e a dissociaccedilatildeo de ideias No primeiro caso menciona que os processos poshydem ser agrupados em trecircs classes principais a dos argumentos quase loacuteshygicos dos argumentos fundados na estrutura do real e dos argumentos que fundam a estrutura do real Ao abordar a ldquodissociaccedilatildeo de ideiasrdquo o autor referido (Mendonccedila 1997) afirma que esta ocorre ldquo quando se pretende dar uma nova abordagem a um determinado fato tomando-se em consideraccedilatildeo as suas dimensotildees real e abstratardquo

Com relaccedilatildeo aos constituintes de um texto eacute inegaacutevel a contribuiccedilatildeo de Charaudeau (1992) ao esclarecer que o texto argumentativo eacute composto dos seguintes elementos proposta proposiccedilatildeo epersuasatildeo Todavia nos casos em que a argumentaccedilatildeo eacute predominantemente justificativa segundo Pinto (1996) citando Mirabail (1994) a proposta pode coincidir com a proposiccedilatildeo

Outro ponto a assinalar tomando como referecircncia as contribuiccedilotildees de Ducrot (1984) eacute que a argumentaccedilatildeo natildeo pode ser entendida na persshypectiva da transparecircncia imediata nem da visatildeo loacutegico-matemaacutetica Isso porque na argumentaccedilatildeo haacute um lugar destacado para o impliacutecito para o natildeo dito que tambeacutem comunica Entre outros aspectos interessantiacutessimos esse pesquisador estudou particularmente o papel do pressuposto fenocircmeshyno linguiacutestico que ele considera como ato de fala

Importa ainda compreender a distinccedilatildeo entre pressuposto e subentenshydido O subentendido estaacute situado num segundo niacutevel de interpretaccedilatildeo ao qual o destinataacuterio tem acesso E o caso da litote ou da ironia que aceitam duplo sentido O pressuposto por sua vez eacute parte integrante do enunciado eacute considerado como algo previamente estabelecido mesmo sem ser forshymulado explicitamente Por isso o destinataacuterio natildeo encontra espaccedilo para colocaacute-lo em questatildeo

Para esclarecer tal ponto de vista podemos citar o exemplo Pedro parou de fumar que expressa aleacutem do que eacute dito verbalmente o pressushyposto de que Pedro fumava Esse exemplo leva-nos agrave inferecircncia de que no uso cotidiano da liacutengua existem mecanismos os quais embora natildeo explishycitados formalmente satildeo pressupostos na interaccedilatildeo entre os sujeitos do discurso Eles satildeo verdadeiros atos de fala na medida em que permitem ao destinataacuterio chegar agrave conclusatildeo pretendida pelo emissor

Pela anaacutelise semiolinguiacutestica do discurso o ato de linguagem deve ser concebido como o resultado de uma relaccedilatildeo do impliacutecito com o expliacutecito enshytre dois processos um de produccedilatildeo e outro de interpretaccedilatildeo Nesse contexto situa-se a argumentaccedilatildeo como um dos modos de organizaccedilatildeo do discurso

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 41

Na mesma linha de raciociacutenio Patrick Charaudeau (1992) trata do dispositivo argumentativordquo de um texto e aborda a tese e a(s) prova(s) preshysentes numa argumentaccedilatildeo Ele esclarece que nesse dispositivo haacute trecircs pon- los importantes o Propoacutesito - em que se explicita um ponto de vista enunshyciativo do sujeito falante ou de outrem a Proposiccedilatildeo - por meio da qual o mi jeito argumentador se coloca (contra ou a favor) em relaccedilatildeo ao Propoacutesito e a Persuasatildeo - em que se enquadram as diversas funccedilotildees das proposiccedilotildees destacaacuteveis no texto dentro do ldquoquadro de raciociacutenio persuasivordquo

Segundo Charaudeau (1983) a proposiccedilatildeo coloca em causa a validashyde da proposta ou seja ela depende da tomada de posiccedilatildeo do argumentashydor em relaccedilatildeo agrave proposta o que eacute fundamental para a definiccedilatildeo do camishynho a seguir no desenvolvimento da argumentaccedilatildeo Em outras palavras ugt colocar em causa a proposta o argumentador pode mostrar-se favoraacutevel ou desfavoraacutevel a ela ou ainda natildeo apresentar uma tomada de posiccedilatildeo A proposiccedilatildeo segundo a formulaccedilatildeo de Charaudeau corresponde ao que Mirabail (1994) citado por Pinto (1996) denominou ideia de tomada de posiccedilatildeo ou ao que Perelman amp Olbrechts-Tyteca (1996) designaram como tese A proposiccedilatildeo pode ser secundaacuteria ou principal de acordo com seu jrau de importacircncia no universo textual

Acrescenta-se que perante uma proposiccedilatildeo o sujeito argumentador adota atitudes tais como a refutaccedilatildeo a justificaccedilatildeo e a ponderaccedilatildeo e a eontra-argumentaccedilatildeo orientadas de um quadro de raciociacutenio e manifestashydas no texto argumentaccedilatildeo

Nessa linha de pensamento lembramos ainda que para expressar- se o sujeito utiliza procedimentos argumentativos de natureza semacircntica

discursiva e de composiccedilatildeo Os primeiros estatildeo relacionados ao valor dos argumentos os seguintes recorrem a categorias linguiacutesticas para produzir eleitos discursivos e os uacuteltimos contribuem para o conjunto de argumentashyccedilatildeo Tendo em vista que o propoacutesito eacute definido como a meta da comunicashyccedilatildeo argumentativa ele pode confundir-se com a tese que como apresentashymos anteriormente se caracteriza pela explicitaccedilatildeo da posiccedilatildeo (verdadeira ou falsa) do sujeito argumentador em relaccedilatildeo ao tema para convencer o auditoacuterio

Um texto caracteriza-se tambeacutem pelo assunto pelo seu conteuacutedo Dentre os procedimentos discursivos com apoio em Charaudeau (1983) destacamos seis tipos a definiccedilatildeo a comparaccedilatildeo a citaccedilatildeo a descriccedilatildeo narrativa a acumulaccedilatildeo e o questionamento

a) Definiccedilatildeo - eacute uma atividade linguiacutestica que consiste em descrever os traccedilos semacircnticos de uma palavra num contexto Ela tem finalidades

42 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

estrateacutegicas e visa a produzir um eteacuteito de evidecircncia e de saber pelo sujeito que argumenta

b) Comparaccedilatildeo - eacute um procedimento que utiliza duas categorias da liacutengua a quantificaccedilatildeo e a qualificaccedilatildeo De acordo com a primeira as cashyracteriacutesticas dos seres e dos comportamentos satildeo expostas para marcar a semelhanccedila ou a diferenccedila A segunda estaacute presente quando haacute um paraleshylo ou uma gradaccedilatildeo entre as qualidades Na argumentaccedilatildeo a comparaccedilatildeo produz efeitos diversos um efeito pedagoacutegico de caraacuteter objetivo (quando ela eacute utilizada como ilustraccedilatildeo ou para fazer compreender melhor um conshyceito) ou um efeito de ldquo cegamentordquo (quando ela desvia a atenccedilatildeo do intershylocutor para fato anaacutelogo o que estrategicamente o impede de identificar a verdadeira intenccedilatildeo do autor) Se a comparaccedilatildeo for objetiva ela eacute verishyficaacutevel lsquomas se for subjetiva seraacute preferencialmente sugerida e costuma despertar a evidecircncia no plano do imaginaacuterio do interlocutor

c) Citaccedilatildeo - consiste em reportar da maneira mais fielmente possiacuteshyvel propostas escritas ou orais de um locutor diferente daquele que fala o que provoca um efeito de autenticidade ao que eacute transmitido A citaccedilatildeo assume conotaccedilatildeo de argumento de autoridade na medida em que atribui autenticidade ao texto e pode testemunhar um dito uma experiecircncia ou um saber

d) Descriccedilatildeo narrativa - este procedimento se assemelha agrave comparashyccedilatildeo pois pode ser utilizado tanto para descrever um fato quanto para conshytar uma histoacuteria Sua finalidade eacute todavia diferente a descriccedilatildeo narrativa produz um efeito de exemplificaccedilatildeo

e) Acumulaccedilatildeo - consiste no emprego de vaacuterios argumentos para fundamentar uma mesma prova

f) Questionamento - trata-se de um procedimento voltado a instigar o interlocutor em relaccedilatildeo agrave proposta Ele tem vaacuterios objetivos incitar o interlocutor a fazer algo propor uma escolha verificar um saber provocar ou denegar

34 G RA M Aacute T IC A E PRO DUCcedilAtildeO DO T EXT O ARG U M EN TA TIVO

O sentido produzido pelo profissional do Direito no texto argumen- tativo natildeo se daacute apenas pelas ideias organizadas sucessivamente A proacutepria frase o encadeamento das estruturas linguiacutesticas dos enunciados as figuras de linguagem a que se recorre a seleccedilatildeo vocabular entre outros fatores satildeo tatildeo responsaacuteveis pelo conteuacutedo final do texto quanto as informaccedilotildees que nele estatildeo contidas

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 43

O domiacutenio da norma culta portanto deixou haacute muito de ser item acesshysoacuterio na formaccedilatildeo do acadecircmico de Direito Liacutengua e discurso argumentativo integram-se de tal maneira que a eficiecircncia das peccedilas processuais depende luinbeacutem da construccedilatildeo de paraacutegrafos simples claros objetivos e concisos

A coesatildeo entre os paraacutegrafos ou seja a ldquoamarradurardquo entre as ideias deve constituir preocupaccedilatildeo do argumentador tanto quanto a proacutepria sele- ccedilatildeo das ideias a serem incluiacutedas no texto Ora essa coesatildeo se daacute essencialshymente pelos elementos linguiacutesticos

A argumentatividade assim considerada natildeo constitui apenas algo nerescentado ao uso linguiacutestico mas ao contraacuterio eacute um atributo da liacutengua tslo eacute o uso da linguagem eacute inerentemente argumentativo Nesse sentido i significaccedilatildeo de uma frase eacute vista como o conjunto de instruccedilotildees concershynentes agraves estrateacutegias a serem usadas na decodificaccedilatildeo dos enunciados pelos quais esta frase se atualiza

As instruccedilotildees contidas na significaccedilatildeo dessas frases determinam a intenccedilatildeo argumentativa a ser atribuiacuteda a seus enunciados Os enunciados portanto satildeo empregados com a finalidade de orientar o auditoacuterio para certos tipos de conclusatildeo com exclusatildeo de outras Esse processo em que o enunciado serve de argumento para dadas conclusotildees chama-se orientashyccedilatildeo discursiva

Na gramaacutetica de cada liacutengua haacute uma seacuterie de vocaacutebulos responsaacuteshyveis por esse tipo de relaccedilatildeo os chamados operadores argumentativos ou discursivos Na liacutengua portuguesa estatildeo entre eles os que a NGB (Norshyma Gramatical Brasileira) enquadrou como denotadores de inclusatildeo - ateacute mesmo tambeacutem inclusive - ou exclusatildeo -soacute somente apenas e os que a gramaacutetica tradicional considera elementos meramente relacionais - conecshytores como jaacute que pois mas poreacutem embora etc

Quando pensamos em procedimentos argumentativos merecem ainda destaque os conectores argumentativos cuja funccedilatildeo eacute operar como instrushymentos que fornecem ao discurso uma orientaccedilatildeo argumentativa A partir de sua anaacutelise podemos inferir que eles servem para ligar duas unidades semacircnshyticas e conferir um papel argumentativo agraves unidades que eles relacionam ( )s conectores servem tambeacutem para articular duas proposiccedilotildees orientadas a conclusotildees diversas que pertenceriam a dois enunciadores diferentes

No processo da construccedilatildeo argumentativa Charaudeau (1992) apreshysenta a modalizaccedilatildeo e a enunciaccedilatildeo como fenocircmeno complexo que testeshymunha o modo como o sujeito argumentador se apropria da liacutengua para organizaacute-la em discurso Esse estudioso considera a modalizaccedilatildeo como uma categoria conceituai que se refere ao grau de certeza ou de possi-

44 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

bilidade ou verossimilhanccedila de um sujeito em relaccedilatildeo a uma realizaccedilatildeo assertiva Quando aborda a modalizaccedilatildeo lembra que a tradiccedilatildeo gramatical natildeo lhe reconhece existecircncia proacutepria visto que os fatos de modalizaccedilotildees satildeo distribuiacutedos em vaacuterias categorias na liacutengua

Angelim (1996) inclui nas modalizaccedilotildees os operadores argumenta- tivos os conectores selecionados pelo sujeito argumentador Koch (1996) considera que os operadores argumentativos determinam o valor argu- mentativo dos enunciados constituindo-se pois em marcas linguiacutesticas importantes da enunciaccedilatildeo Conforme o ponto de vista de Pinto (1996) os conectores argumentativos satildeo marcas linguiacutesticas que estabelecem a progressatildeo textual

Da mesma forma Angelim (1996) afirma que os conectores explishycitam linguisticamente uma relaccedilatildeo de dependecircncia entre as proposiccedilotildees Oliveira (1996) informa que os conectores mais importantes no texto argu- mentativo satildeo os conclusivos introdutores de tese os explicativos introshydutores de argumentos os concessivos que introduzem concessotildees e os adversativos que introduzem restriccedilotildees

Muitas vezes os iniciantes na praacutetica argumentativa queixam-se por natildeo ter um repertoacuterio vocabular suficiente que faculte iniciar frases ou pashyraacutegrafos de maneira criativa ou pelo menos natildeo repetitiva na utilizaccedilatildeo dos elos coesivos entre enunciados A seguir algumas expressotildees que poshydem ser utilizadas na redaccedilatildeo de textos juriacutedico-argumentativos

A primeira observaccedilatildeo a fazer No que se refereInicialmente cabe lembrar Os itens arroladosQuanto aos fatos Remontando aEacute preciso observar que Em primeiro (2deg) lugarTodavia No entantoCom muito mais razatildeo SeguramenteEste caso apenas ilustra 0 exemplo deconfirmaEacute certo que Aleacutem do maisEacute de se verificar que Como se pode notarConveacutem ressaltar Cumpre observarEm virtude das consideraccedilotildees Necessaacuterio eacute lembrarOutra questatildeo relevante consiste em Na verdade o objetivo da lei eacuteNatildeo eacute despiciendo observar que Nessa linha de posicionamento

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

Percebe-se Configura-seConstata-se Sabe-seEacute indiscutiacutevel que Valecumpre ratificar queUm dado a acrescentar Como professaPassemos a Pelas razotildees aduzidasPor uacuteltimo Pertinente eacute a colocaccedilatildeo do professorContudo Cumpre antes de mais nadaConsidere-se o caso de Tem-seIncontestavelmente Nota-sePode ser que

35 ARG UM EN TACcedil AtildeO E T EO R IA T R ID IM EN S IO N A L DO D IR E IT O

Antes de entrarmos no planejamento propriamente dito do texto ar- gumentativo precisamos compreender qual a sua importacircncia para a proshyduccedilatildeo da peccedila processual Muitos graduandos neoacutefitos na produccedilatildeo desse texto ignoram a relevacircncia dessa parte da peccedila para o processo e a relaccedilatildeo que a argumentaccedilatildeo tem com as demais partes do texto juriacutedico

Peticcedilotildees contestaccedilotildees contrarrazotildees sentenccedilas pareceres habeas corpus apelaccedilotildees e inuacutemeras outras peccedilas contecircm em sua estrutura uma parte argumentativa

Para melhor compreender essa importacircncia recorreremos agrave Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale Essa teoria eacute responsaacutevel pela orientaccedilatildeo sobre como os profissionais do Direito da atualidade devem enshycarar o fenocircmeno juriacutedico para serem eficientes na atividade advocatiacutecia

Miguel Reale1 sustenta que para existir um fenocircmeno juriacutedico deve haver sempre um fato social e histoacuterico relevante sobre o qual deveraacute atuar a praacutetica juriacutedica

Esse fato para representar algo de significativo ou relevante para a ciecircncia juriacutedica deve receber certa significaccedilatildeo que o valore de maneira a contextualizaacute-lo como adequadoinadequado justoinjusto nocivobeneacutefishyco agraves finalidades pretendidas pela sociedade

1 REALE Miguel Liccedilotildees preliminares de Direito 25 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 pp 64-68

46 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim haveraacute uma norma ou uma regra que integre a relaccedilatildeo entre o fato e o valor a ele atribuiacutedo

Essas trecircs dimensotildees - fato valor e norma - satildeo fundamentais para que o Direito possa ser entendido tal como o eacute atualmente2 Qual a relaccedilatildeo entatildeo da Teoria Tridimensional do Direito com a estrutura do raciociacutenio argumentativo que os operadores do Direito devem desenvolver

Ora se argumentar eacute conseguir aumentar a intensidade de adesatildeo do ouvinte a uma tese de maneira que desencadeie nele a accedilatildeo pretendida (accedilatildeo positiva ou abstenccedilatildeo) ou ao menos a disposiccedilatildeo para accedilatildeo e se o Direito soacute se efetiva sob as trecircs dimensotildees jaacute tratadas natildeo haacute como persuashydir um auditoacuterio acerca da adequaccedilatildeo de uma tese se o argumentador natildeo buscar no conjunto probatoacuterio agrave sua disposiccedilatildeo fatos a serem valorados de maneira tal que a aplicaccedilatildeo de uma norma possa parecer adequada e convincente

O argumentador necessita na argumentaccedilatildeo desenvolver raciociacutenios dedutivos e indutivos a partir dos fatos selecionados da narrativa redigida antes da fundamentaccedilatildeo

A atribuiccedilatildeo de valores a esses fatos eacute complexa e as escolhas realishyzadas podem ser determinantes do sucesso persuasivo pretendido pelo adshyvogado Tal valoraccedilatildeo se daacute por meio de uma exposiccedilatildeo clara dos motivos fundamentos que sustentam essa interpretaccedilatildeo Veja a tabela a seguir com a correlaccedilatildeo de cada dimensatildeo da Teoria Tridimensional com as partes das peccedilas processuais

PECcedilAS PROCESSUAISDIMENSOtildeES DA TEORIA TRIDIM

DIREITO

peticcedilatildeoinicial

sentenccedila acoacuterdatildeo parecer

FATO Essa dimensatildeo consiste na narshy

rativa de todos os fatos importantes do caso concreto

analisado

Dos fatos(versatildeo do autor sobre os fatos)

Relatoacuterio(fatos reshylevantes

do conflito e do proshycesso)

Relatoacuterio(fatos

relevanshytes do

conflito e do proshycesso)

Relatoacuterio3(fatos

relevantes do conflito e do proshycesso)

2 Jaacute se fala hoje em teoria quadridimensional do Direito3 Dependendo do tipo de parecer produzido podemos ter uma narrativa valorada ou

natildeo valorada

Cap Ill - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

PECcedilAS PROCESSUAISVALOR Essa dimensatildeo

consiste na valo- raccedilatildeo dos fatos

narrados ou seja o ponto de vista

defendido depenshyde da maneira

como os fatos satildeo interpretados

Do direito Motivashyccedilatildeo

Motivashyccedilatildeo

Fundashymentaccedilatildeo

NORMA Essa dimensatildeo consiste na aplicaccedilatildeo de

uma norma como consequecircncia

de um raciociacutenio argumentativo anteriormente desenvolvido

Do pedido Disposishytivo

Disposishytivo

Conclushysatildeo

Ressalte-se que assim como ocorre com as peccedilas indicadas todas as demais peccedilas processuais complexas seguem uma estrutura loacutegica de construccedilatildeo descriccedilatildeo das partes envolvidas no litiacutegio narrativa dos fatos relevantes da lide fundamentaccedilatildeo de um ponto de vista e conclusatildeo (na forma de pedido decisatildeo opiniatildeo fundamentada etc)

Nesse sentido Viacutetor Gabriel Rodriacuteguez4 assinala que o conhecimento propriamente dito da doutrina da jurisprudecircncia e da proacutepria legislaccedilatildeo reshypresenta apenas uma seacuterie de informaccedilotildees que se encontram agrave disposiccedilatildeo do argumentador mas elas por si mesmas natildeo garantem a capacidade de persuasatildeo

Isoladas puras diz ainda o autor natildeo produzem sentido natildeo conshyvencem ningueacutem de que haacute coerecircncia no raciociacutenio desenvolvido ldquoa natildeo ser que estejam intencionalmente dirigidas articuladas para persuadir alshygueacutem a respeito de algordquo Assim a folha de antecedentes criminais do reacuteu juntada aos autos eacute apenas uma informaccedilatildeo que soacute alteraraacute o resultado de um processo se for intencionalmente invocada para sustentar o raciociacutenio de que isso eacute motivo suficiente para fixar a pena no maacuteximo legal (e essa eacute apenas uma das leituras possiacuteveis para essa informaccedilatildeo)

4 RODRIacuteGUEZ Viacutetor Gabriel Argumentaccedilatildeo juriacutedica teacutecnicas de persuasatildeo e loacutegica informal 4 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2005 p 06

48 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim tambeacutem ajuntada de um contrato aos autos natildeo evidencia necessariamente a obrigaccedilatildeo do contratado em face do contratante O ideal nessa hipoacutetese eacute que o argumentador desenvolva o raciociacutenio de que o doshycumento gera um viacutenculo juriacutedico entre as partes e que a doutrina sustenta que todo viacutenculo de natureza juriacutedica eacute marcado por direitos e obrigaccedilotildees muacutetuos entre os sujeitos de direito

Posto isso um mesmo fato (o conteuacutedo de uma folha de antecedentes criminais ou um contrato - primeira dimensatildeo apontada por Reale) pode ter inuacutemeras leituras pode significar muitas coisas (valoraccedilatildeo dada aos fashytos - segunda dimensatildeo da Teoria Tridimensional) mas as hipoacuteteses inter- pretativas daiacute derivadas seratildeo clarificadas como mais ou menos pertinentes quando contextualizadas por um raciociacutenio que natildeo se pode esperar que seja coqstruiacutedo apenas pelo juiz Cabe ao advogado trilhar os caminhos interpretativos adequados para sustentar sua tese (aplicaccedilatildeo da norma ao caso concreto - terceira dimensatildeo)

Sustentamos que o Direito como atividade social natildeo tem condiccedilotildees de ser articulado sozinho Ele somente pode existir concretamente por meio de argumentos que atribuem a determinados fatos a relevacircncia e o signifishycado possibilitados pelo contexto em que satildeo produzidos e inteipretados

A doutrina e a proacutepria legislaccedilatildeo satildeo a priori ldquo esteacutereisrdquo constituem simples informaccedilatildeo disponiacutevel para que o argumentador possa delas se apropriar e construir um raciociacutenio aceito como razoaacutevel

A pertinecircncia da Teoria Tridimensional do Direito no estudo da argushymentaccedilatildeo eacute reforccedilada tambeacutem por meio da proacutepria produccedilatildeo legislativa Tome como exemplo alguns dispositivos do Coacutedigo Penal esse diploma legal prevecirc logo no iniacutecio da parte especial os crimes de homiciacutedio e de infanticiacutedio sob tipos penais distintos Este foi capitulado no art 123 e aquele no art 121 do Coacutedigo Penal O que levou o legislador a criar dois tipos penais distintos se uma mesma conduta - ldquomatar algueacutemrdquo - estaacute senshydo reprovada nos dois crimes

Fica evidente que o legislador entendeu que apesar de o fato ser basishycamente o mesmo a maneira de valoraacute-los de interpretaacute-los natildeo pode ser idecircntica em decorrecircncia das especificidades - princiacutepio da especialidade- que o infanticiacutedio apresenta em face do homiciacutedio Isso implica dizer que cabe ao argumentador perceber as peculiaridades que guarda cada norma para que sua fundamentaccedilatildeo possa dar conta dessas tecircnues distinccedilotildees

Dessa forma o advogado ao produzir sua argumentaccedilatildeo natildeo pode deishyxar de realizar a ponderaccedilatildeo dos valores subjacentes agrave norma que evoca sob pena de ser pouco teacutecnico na capitulaccedilatildeo das condutas imputadas ao reacuteu

Resumidamente o argumentador deve em primeiro lugar expor os latos importantes do caso concreto para que as partes e o proacuteprio magistrado possam ter condiccedilotildees de apreciarponderarvalorar os aconshytecimentos A exposiccedilatildeo desses fatos importantes seraacute feita predominanshytemente por meio de uma narraccedilatildeo Uma vez conhecidos os fatos sua viiloraccedilatildeo deveraacute ser feita em seguida na peccedila processual por meio de uma argumentaccedilatildeo

Desenvolvida a sustentaccedilatildeo argumentativa de um ponto de vista - lese - que pareccedila adequado eacute hora de o operador do Direito manifestar-se quanto agrave aplicaccedilatildeo da norma adequada ao caso em anaacutelise

Para melhor compreender o raciociacutenio desenvolvido neste capiacutetulo observe uma frase dita por Julio Clemente - teacutecnico do Athletic Bilbao - e publicada na seccedilatildeo ldquoVeja essardquo da Revista Veja ldquoCuspir eacute um compor- liacuteiinento feio Eu acho que esse eacute o tipo de coisa que soacute quem acabou de descer das aacutervores fazrdquo

Assim descontextualizada a fala de Julio tem bastante pertinecircncia Quando diz que ldquoesse eacute o tipo de coisa que soacute quem acabou de descer das arvores fazrdquo imaginamos que ele estaacute qualificando o ato de cuspir como uma conduta social pouco adequada agraves expectativas atuais de um ldquoestaacutegio de evoluccedilatildeo mais avanccedilado do ser humanordquo Quanto a isso natildeo haacute aparenshytemente nenhum problema

Entretanto quando contextualizada a situaccedilatildeo em que pronunciou tal IVase - segundo a revista ldquo referiu-se ao atacante africano Samir Atono do Barcelona que cuspiu no rosto de um jogador catalatildeordquo - o enunciado ganha novas possibilidades interpretativas

Deriva dessa discussatildeo a necessidade de entender como se daacute o comshyportamento anocircmico - ou de desvio - em uma sociedade O Desembargashydor Seacutergio Cavai ieri Filho na obra Programa de sociologia juriacutedica vocecirc conhece realiza didaacutetica e completa exposiccedilatildeo a respeito das causas do comportamento anocircmico aleacutem de fazer breve siacutentese a respeito das proshypostas de conhecidos filoacutesofos sobre o assunto6

Sozinhas as informaccedilotildees natildeo dizem muito mas a possibilidade de associaccedilatildeo semacircntica das palavras e expressotildees ldquo cuspirrdquo ldquodescer da aacutershyvorerdquo e ldquojogador africanordquo facultam o desenvolvimento de um raciociacutenio que leva agrave conclusatildeo de que o teacutecnico agiu de maneira preconceituosa pra-

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

Revista Veja p 44 Seccedilatildeo ldquoVeja essardquo Ediccedilatildeo do dia 25 de janeiro de 2006 h Sobre o assunto consulte CAVALIER1 FILHO Seacutergio Programa de sociologia

juriacutedica (vocecirc conhece) 10 ed Rio de Janeiro Forense 2002 p 199

50 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ticando conduta prevista na legislaccedilatildeo brasileira Lei 74371985 a qual dispotildee no art 1deg que ldquoconstitui contravenccedilatildeo a praacutetica de atos resultantes de preconceito de raccedila de cor de sexo ou de estado civilrdquo

Capiacutetulo IV

PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURlDICO

Compor conflitos de interesse por meio judicial eacute uma das funccedilotildees primordiais do Direito Tais conflitos advecircm de divergentes formas de se interpretar um determinado fato juriacutedico E nessa instacircncia que se legitimao texto argumentativo

A argumentaccedilatildeo juriacutedica caracteriza-se especialmente por servir de instrumento para expressar a interpretaccedilatildeo sobre uma questatildeo do Direito que se desenvolve em um determinado contexto espacial e temporal Ao operar a interpretaccedilatildeo impotildee-se considerar esses contextos ater-se aos fashytos agraves provas e aos indiacutecios extraiacutedos do caso concreto e sustentaacute-la nos limites impostos pelas fontes do Direito Forccediloso tambeacutem eacute considerar a interpretaccedilatildeo e o discurso do opositor a fim de neutralizaacute-los jaacute que na argumentaccedilatildeo o discurso do orador se constroacutei cm concordacircncia com alshyguns discursos e em oposiccedilatildeo a outros Concluiacuteda a interpretaccedilatildeo o orador deve entatildeo estar convicto da posiccedilatildeo que adotaraacute perante o caso concreto e a tese que defenderaacute sem menosprezar aquela que lhe eacute adversa

Consciente dessas preliminares aleacutem de interpretar os sentidos expliacuteshycitos que compotildeem o caso concreto eacute preciso apreender os que se enconshytram impliacutecitos subjacentes aos fatos Em seguida importa dimensionar cada fato extraindo-lhe as circunstacircncias especiacuteficas jaacute que essas podem acarretar natildeo soacute como afirma Reale (1995) ldquo uma consequecircncia de direito por assim estar previsto na normardquo mas tambeacutem inspirar uma conclusatildeo sustentada no que eacute justo e razoaacutevel para o indiviacuteduo e para a sociedade Imprescindiacutevel ainda eacute a seleccedilatildeo das provas - meio persuasivo eficaz - e dos indiacutecios que suscitam inferecircncias complementares aos fatos

Cumpridas essas etapas eacute chegado o momento de organizar no papel um caminho coeso e coerente que serviraacute de alicerce ao texto que se deseja

52 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

elaborar Com esse procedimento o orador teraacute clareza de cada etapa a ser vencida da pertinecircncia e da consistecircncia de cada uma na composiccedilatildeo da argumentaccedilatildeo e assim da melhor forma de alcanccedilar o seu objetivo persuashydir o auditoacuterio a assumir a sua tese como a mais verossiacutemil para a soluccedilatildeo do conflito Para tal analisemos os elementos que estruturam a composiccedilatildeo da argumentaccedilatildeo juriacutedica

41 SITUA CcedilAtildeO DE C O N FLITO

Registrar a situaccedilatildeo de conflito eacute fundamental para delimitar a quesshytatildeo sobre a qual se argumentaraacute Isso porque seratildeo fornecidos os elementos indispensaacuteveis para compor o caso concreto e inseri-lo no contexto juriacutedico Nesfa parte do planejamento o orador definiraacute a centraidade da questatildeo juriacutedica que estaraacute sob apreciaccedilatildeo isto eacute o fato juriacutedico Em seguida idenshytificaraacute as partes envolvidas na lide devidamente descritas determinando aquele que em tese representa o sujeito passivo e o que seraacute considerado sujeito ativo Por fim estabeleceraacute quando e onde o fato ocorreu

Eacute importante definir as partes que compotildeem a lide uma vez que soshybre uma recairaacute um direito subjetivo e sobre a outra um dever juriacutedico Ora em algumas situaccedilotildees atribui-se um dever a uma parte que na verdade natildeo lhe cabe A tiacutetulo de exemplo suponhamos que X vendedora da loja Y conclui que a cliente Z tenha subtraiacutedo uma peccedila de roupa que X havia deixado sobre o balcatildeo e laacute natildeo se encontrava mais Dirigiu-se a Z e de forma ofensiva mandou que esvaziasse a bolsa e mostrasse o que havia em seu interior A cliente muito nervosa comeccedilou a chorar e negou-se a abrir a bolsa Nesse momento o seguranccedila da loja segurou-lhe o braccedilo retirou sua bolsa e abriu-a na frente dos demais clientes Constatou que natildeo havia nada da loja na bolsa de Z A cliente perante o constrangimento vivencia- do decidiu mover uma accedilatildeo de reparaccedilatildeo pelos danos morais sofridos em face daqueles que lhe impuseram tal constrangimento Orientada por um advogado foi-lhe esclarecido que embora a vendedora e o seguranccedila teshynham promovido o constrangimento a responsabilidade civil pelo evento seraacute da empresa onde o fato ocorreu jaacute que aqueles profissionais satildeo seus prepostos e suas condutas satildeo responsabilidade da pessoa juriacutedica que os contratou Portanto a accedilatildeo deve ser proposta em face da empresa e natildeo de seus funcionaacuterios

Com relaccedilatildeo agrave caracterizaccedilatildeo das partes quando couber importa que sejam objetivamente descritas suas caracteriacutesticas fiacutesicas psicoloacutegicas sociais e econocircmicas uma vez que essas informaccedilotildees podem servir de ar-

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 53

l-mnento na defesa de uma tese Importa considerar que por estarmos lidando com a valoraccedilatildeo de certos atributos particulares de cada parte eacute necessaacuterio justificar a interpretaccedilatildeo operada a respeito destes Por exemshyplo digamos que um liacuteder comunitaacuterio homem de 35 anos enfermeiro lenha atraiacutedo ateacute a sua casa uma jovem de 13 anos moradora da mesma comunidade e ali estupra-a Seu ato assume uma proporccedilatildeo maior de culshypabilidade do que se igualmente fosse protagonizado por um rapaz de 18 anos colega de 7a seacuterie da menina Dimensionando os atributos de ambos os acusados imputariacuteamos ao primeiro maior discernimento para o ato pra- licado uma vez que se pressupotildee ser mais experiente do que o segundo e ainda saber avaliar melhor as consequecircncias dos seus atos Aleacutem disso era uma pessoa que inspirava a confianccedila dos moradores da comunidade que liderava Usou portanto de abuso de confianccedila para atrair a jovem e alcanccedilar o seu intento

Observamos agora a importacircncia de definir o espaccedilo e tempo em que ocorre o fato juriacutedico Haacute enfoques importantes a serem observados quanto agrave precisatildeo de situaacute-los

Ressalta-se inicialmente a forma como eacute dimensionado o fato juriacutedi- eo mediante essas duas circunstacircncias espaccedilo e tempo Tal avaliaccedilatildeo estaacute situada no plano objetivo e no plano subjetivo

Quanto ao plano objetivo analisemos a questatildeo sob o acircngulo proshycessual De acordo com o art 69 inciso I do Coacutedigo de Processo Penal determinaraacute a competecircncia jurisdicional o lugar da infraccedilatildeo Dessa forma eacute incontestaacutevel a necessidade de sermos expliacutecitos quanto ao local em que sc produziu o fato

Com relaccedilatildeo ao tempo em que se deu o fato juriacutedico haacute implicaccedilotildees legais que orientam a forma como essa informaccedilatildeo deve ser avaliada senshydo portanto imprescindiacutevel defini-lo Fixemo-nos no art 4deg do Coacutedigo Penal ldquoConsidera-se praticado o crime no momento da accedilatildeo ou omissatildeo ainda que outro seja o momento do resultadordquo Quais as possiacuteveis conseshyquecircncias dessa norma Uma delas eacute a definiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave lei que deveraacute orientar o julgador no caso de haver entrado em vigecircncia uma lei nova Imaginemos que a nova seja mais rigorosa do que a anterior Nesse caso como no Direito Penal uma lei soacute retroage em benefiacutecio do reacuteu esse seraacute julgado segundo a lei vigente no tempo em que se produziu o ato iliacutecito

No plano subjetivo haacute questotildees relativas ao tempo e ao espaccedilo que devem ser destacadas Isso porque a valoraccedilatildeo de um fato juriacutedico estaacute sushyjeita tambeacutem agrave eacutepoca e ao local onde ele se desenvolve quanto mais proacuteshyximo dos grandes centros urbanos estiver o local onde se produziu o fato

54 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

juriacutedico e quanto mais contemporacircneo for esse fato maior a expectativa de que as partes envolvidas estejam mais conscientes quanto agraves consequecircncias juriacutedicas dos seus atos

Por essa razatildeo mais tolerante seraacute a nossa avaliaccedilatildeo por exemplo com o marido que no interior de Pernambuco em 1970 forccedila sua esposhysa agrave praacutetica sexual do que o mesmo ato praticado no municiacutepio do Rio de Janeiro em 2013 Isso porque no interior de determinados estados do Brasil ainda se considera a mulher como objeto de posse por quesshytotildees culturais distintas das que predominam em outras localidades Natildeo se trata de julgar adequada a conduta do marido que estupra a mulher somente porque estatildeo no interior mas de apurar com coerecircncia a culpashybilidade do agente a partir da informaccedilatildeo referente ao espaccedilo geograacutefico porquanto o elemento ldquo costumerdquo nunca deve ser afastado da apuraccedilatildeo do iliacutecito penal

Quando fazemos referecircncia ao ldquo costumerdquo como elemento relevante para a apuraccedilatildeo do evento juriacutedico em anaacutelise partimos do pressuposto de que o Brasil eacute um paiacutes plural e nas regiotildees mais afastadas ainda hoje o marido entende ter direitos sobre a mulher que lhe deve obediecircncia Jaacute nas capitais com a crescente inserccedilatildeo da mulher no mercado de trabalho com a sua conscientizaccedilatildeo quanto aos seus direitos e com a liberdade sexual mediante o uso de anticonceptivos a mulher passou a se ver e a ser vista como um ser capaz de decidir sobre a disposiccedilatildeo do seu corpo Nesse conshytexto o ato sexual imposto pelo marido sem a concordacircncia da mulher eacute estupro nos termos do art 213 do CP

Esperamos que tenha ficado claro que todas essas informaccedilotildees (o quecirc quem onde e quando) iratildeo compor um contexto que seraacute explorado na construccedilatildeo do texto argumentativo

Como elaborar a situaccedilatildeo de conflito para o seguinte caso concreto

Caso concreto com adaptaccedilotildees

Crianccedila entrou no hospital para fazer cirurgia corriqueira e morreu por ruptura no estocircmago

24052012 - Gazeta do Povo

Jaacute estaacute marcada a exumaccedilatildeo do corpo de Joatildeo Victor da Silva 4 anos que morreu depois de uma cirurgia em 03 de maio de 2012 em Ponta Grossa nos Campos Gerais O pedido foi feito pela famiacutelia

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 55

e autorizado pela Justiccedila para averiguar a hipoacutetese de erro meacutedico O atestado de oacutebito indica que o menino morreu por conta de ruptura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas Os pais estatildeo inconformados com o desfeshycho traacutegico do que era para ser uma corriqueira cirurgia nas amiacutedalas e na adenoacuteideJoatildeo Victor foi internado agraves 6h30min do dia 3 de maio e a operaccedilatildeo deshyveria durar entre 15 e 30 minutos Quando retomou ao quarto por volta de 8 horas os pais notaram que o abdocircmen do menino estava inchado Foi feita a pulsatildeo mas o quadro continuou se agravando ateacute que foi internado na unidade de terapia intensiva (UTL) com sangramento pela boca e pelo narizJoatildeo foi operado porque tinha crises de amidalite frequentesA advogada Liciane Silva e o engenheiro civil Rozenildo Torres Silva pais do garoto afirmam que nenhum meacutedico prestou qualquer esclashyrecimento sobre o que estava acontecendo Eles insistiram em vatildeo para que Joatildeo Victor fosse operado para encontrar a causa das comshyplicaccedilotildeesSoacute depois das 22 horas e apoacutes a intervenccedilatildeo de dois meacutedicos eacute que o cirurgiatildeo pediaacutetrico do hospital aceitou fazer a operaccedilatildeo exploratoacuteria A cirurgia comprovou a perfuraccedilatildeo no estocircmago mas natildeo conseguiu salvar o menino que morreu uma hora depois O inqueacuterito aberto indica a possibilidade de imperiacutecia durante a entubaccedilatildeo e de negligecircncia pela demora na realizaccedilatildeo da cirurgia corretivaO cirurgiatildeo pediaacutetrico Augusto Nunes nega qualquer responsabilidade na morte de Joatildeo Victor Ele afirma que apenas tratou os sintomas de um problema causado anteriormente ldquoA causa morte da crianccedila natildeo eacute pelo meu procedimentordquo destaca Ele reforccedilou que espera uma apuraccedilatildeo rishygorosa do caso para entender o que aconteceu0 anestesista Nilton Pereira tambeacutem natildeo sabe explicar o que causou as complicaccedilotildees que resultaram na morte do menino Ele assegura que dushyrante a operaccedilatildeo tudo transcorreu normalmente e discorda do atestado de oacutebito que aponta problemas anesteacutesicos1 - Situaccedilatildeo de conflito (pequeno paraacutegrafo redigido sem juiacutezo de valor que conteacutem as seguintes informaccedilotildees o quecirc Quem Quando Onde)

Sugestatildeo Augusto Nunes cirurgiatildeo pediaacutetrico e Nilton Pereira anestesista satildeo acusados de terem causado a morte de Joatildeo Vitor 4 anos representado por seus pais - Liciane Silva advogada e Rozenildo Torres Silva engenheiro civil - quando da realizaccedilatildeo de uma cirurgia em 3 de maio de 2012 em Ponta Grossa nos Campos Gerais

56 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

42 T ESE

Entendemos como tese uma interpretaccedilatildeo que se extrai de um conshytexto a fim de se alcanccedilar um determinado fim que se espera ver agasashylhado pelo Direito e que seraacute submetida a um julgamento A tese eacute aquilo que se precisa provar objetivando persuadir o auditoacuterio acerca da sua veshyrossimilhanccedila Natildeo haacute expectativa de que ela assuma o status de verdade jaacute que nas Ciecircncias Humanas a tese eacute subjetiva adstrita a valores sendo portanto discutiacutevel

Considerando que o orador deseja persuadir um auditoacuterio eacute imporshytante tambeacutem que a sua tese natildeo contrarie as presunccedilotildees desse auditoacuterio particular e muito menos do auditoacuterio universal Isso porque soacute haveraacute adesatildeo aos argumentos enunciados se esses estiverem em conformidade com os valores desses auditoacuterios A tese por isso triunfaraacute se houver inteshyraccedilatildeo entre orador e auditoacuterio e se for empreendida uma argumentaccedilatildeo com base em argumentos loacutegicos e razoaacuteveis

Tendo em vista que a norma (lei doutrina princiacutepios jurisprudecircncia etc) eacute acolhida como premissa aceitaacutevel pelo auditoacuterio universal e consishyderando ainda que a tese deve preferencialmente natildeo contrariar as preshysunccedilotildees do auditoacuterio entendemos que a tese para ter maior probabilidade de ser aceita pelo auditoacuterio particular deve buscar amparo na norma

A tese que sustenta a possibilidade de realizaccedilatildeo da eutanaacutesia em doentes terminais por exemplo dificilmente seria aceita hoje ein qualquer tribunal ou corte superior brasileira pois atualmente natildeo existem no ordeshynamento juriacutedico paacutetrio fundamentos para sustentaacute-la

E por essa razatildeo que dissemos que a tese tem ldquomais chancerdquo de ser acolhida quando encontra amparo na norma Veja que natildeo dissemos que a tese sem amparo na norma deixaraacute de ser acolhida Muitos direitos hoje gashyrantidos foram fruto da insistecircncia de advogados promotores e defensores que natildeo se acomodaram diante das dificuldades Decorrente desse esforccedilo muitas teses minoritaacuterias ou inicialmente isoladas passaram a ser acolhidas no judiciaacuterio brasileiro

Consideram-se loacutegicos os argumentos que tecircm como elemento gerashydor uma tese coerente com o ponto de referecircncia a que essa se associou isto eacute a uma premissa maior legitimada pelo Direito Portanto natildeo se pode negar que o sistema juriacutedico impotildee fontes especiacuteficas do Direito que lishymitam a arbitrariedade e oferecem seguranccedila ao procedimento juriacutedico Quando se deseja defender algueacutem que se arroga senhor de um direito subshyjetivo eacute necessaacuterio verificar o que tais fontes de fato lhe conferem e com base nessa afericcedilatildeo construir a tese que se pretende defender

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 57

Como exemplo pode-se citar o caso concreto publicado pelo jornal () (1obo em janeiro de 2004 de um cidadatildeo 27 anos desempregado com fome que invadiu o Campo de Santana Rio de Janeiro de madrugada e estrangulou um pavatildeo branco de aproximadamente 39 quilos A ave vivia no parque haacute 14 anos Esse cidadatildeo foi perseguido por travestis da Praccedila da Repuacuteblica que o agrediram com socos e com pontapeacutes Ao fugir tentou pular de volta para o Campo de Santana e ficou preso pelo braccedilo esquerdo nas grades de ferro do campo Foi resgatado por bombeiros encaminhado ao hospital e em seguida preso Sabe-se que a norma condena o ato prati- eado por esse cidadatildeo prescrevendo pena de prisatildeo jaacute que o pavatildeo branco e um animal protegido pelo Ibama

O orador caso esteja na situaccedilatildeo de defensor do reacuteu deve estar cons- eiente de que a norma dispotildee tal ato como iliacutecito Entretanto caso assumaii tese de estado de necessidade - hipoacutetese prevista pela norma - e tendo sucesso em comprovaacute-la estaraacute extinta a ilicitude do ato cometido pelo seu cliente A questatildeo entatildeo seraacute provar que segundo as circunstacircncias que envolvem esse caso especiacutefico eacute possiacutevel admitir tal tese

Dessa forma adotando como premissa maior a norma dever-se-atildeo reunir os fatos as provas e os indiacutecios estabelecer uma interseccedilatildeo entre eles de forma a extrair um ponto comum em que se possa inferir o estado de necessidade Nesse caso o melhor raciociacutenio a ser desenvolvido eacute o indutivo jaacute que reunimos premissas menores dimensionamos tais premisshysas - praacutetica subjetiva em que a emoccedilatildeo ocupa preponderante funccedilatildeo - e aplicamos o criteacuterio da razoabilidade a fim de persuadir acerca da mais justa forma de solucionar o conflito

Como vimos quando elaboramos uma tese precisamos ter consciecircnshycia de que ela se encontra limitada pelas possibilidades de soluccedilotildees adshymitidas pelas normas pela interpretaccedilatildeo que se opera em relaccedilatildeo a essas normas visando adaptaacute-las ao nosso tempo ao nosso espaccedilo e agraves circunsshytacircncias do caso concreto e pelas circunstacircncias em que ocorre Na verdashyde sua elaboraccedilatildeo depende de um movimento equilibrado entre razatildeo e emoccedilatildeo

Voltando ao caso concreto registrado referente agrave morte do menino Joatildeo Victor que tese os advogados dos pais da crianccedila poderiam defender

Uma sugestatildeo

Tese (Expressatildeo do juiacutezo de valor deve registrar a presunccedilatildeo do direito e o que se precisa provar para alcanccedilar tal objetivo) Sugestatildeo

58 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Os meacutedicos devem indenizar a famiacutelia por ter havido imperiacutecia e neshygligecircncia

43 A C O N TEXTU A LIZA Ccedil Atilde O DO R E A L

A argumentaccedilatildeo juriacutedica difere especialmente de outros tipos de arshygumentaccedilatildeo por algumas razotildees dentre elas destacam-se a) estaacute limitada por um sistema normativo b) embora limitada por esse sistema admite a assunccedilatildeo do criteacuterio de razoabilidade c) baseia-se em provas fatos e indiacuteshycios Relativamente a esse uacuteltimo aspecto fixar-nos-emos agora

Um propagado princiacutepio do Direito eacute ldquo cada caso eacute um casordquo Ora entendemos que na verdade satildeo as peculiaridades de cada caso concreto que determinam o caminho a ser adotado em uma argumentaccedilatildeo e que hashyveratildeo de lhe dar sustentaccedilatildeo Daiacute a validade do brocardo juriacutedico ldquodaacute-me os fatos que eu te darei o direitordquo

Insistimos que tal caminho deva estar legitimado pelas fontes do Direito Dessa forma torna-se necessaacuterio extrair do caso concreto todas as informaccedilotildees que expliacutecita ou implicitamente concorram para a comshyprovaccedilatildeo da tese Compreender o caso concreto interpretar todas as suas sutilezas valoraacute-las apreender os diversos sentidos que um mesmo fato prova ou indiacutecio promovem eacute fundamental para a produccedilatildeo de um texshyto argumentativo consistente Observa-se pois que natildeo basta identificar tais informaccedilotildees eacute necessaacuterio dimensionaacute-las de forma a utilizaacute-las com mestria

Acrescente-se que eacute fundamental se antecipar ao seu opositor e destashycar todas as informaccedilotildees que possam fragilizar a sua tese Assim iraacute elaboshyrar estrateacutegias que demonstrem os pontos fracos dos argumentos contraacuterios aos seus

Importa que se reveja o que vem a ser fato prova e presunccedilatildeo ou indiacutecio e em que proporccedilatildeo um ou outro exerce um poder de persuasatildeo maior ou menor no discurso juriacutedico Ao nos referirmos a fato desejamos expressar uma ocorrecircncia baseada em uma realidade objetiva logo aferida Segundo De Plaacutecido e Silva (1975) muitas acepccedilotildees se extraem do termo fato A noacutes interessaraacute natildeo soacute aquela que indica a ldquoexistecircncia de evento ou coisa que veio ou foi feita () materialidade ou a demonstraccedilatildeo concreta do acontecimento ou da accedilatildeo sem interferecircncia do direito () a realidade do que aconteceu ou estaacute acontecendordquo mas tambeacutem accedilotildees negativas isto eacute consequecircncia do que deveria ter sido feito e natildeo foi a omissatildeo

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 59

O fato pode ser um acontecimento natural natildeo volitivo como uma Icmpestade que ldquo pode trazer consequecircncias de direito uma inundaccedilatildeo pode transportar porccedilotildees de terra de uma para a outra margem de um rio alterando relaccedilotildees de propriedaderdquo (Miguel Realc) ou acontecimento reshysultante da vontade humana considerado ato comportamento ao qual ldquoa norma juriacutedica confere consequecircncias de direito tais como as de constituir modificar ou extinguir uma lsquorelaccedilatildeo juriacutedicarsquo ou mais amplamente uma lsquosituaccedilatildeo juriacutedicarsquordquo (Miguel Reale) Enfim podemos observar que o ato juriacutedico eacute uma espeacutecie de fato Entretanto como nossa finalidade eacute levan- larmos informaccedilotildees que correspondam agrave realidade faacutetica natildeo nos prendeshyremos a essa distinccedilatildeo entre ldquo fatordquo e ldquo atordquo O fundamental eacute que estejamos conscientes de que os fatos tecircm grande poder persuasivo jaacute que raramente podem ser contrariados

Quanto agraves provas importa registrar o que ensina De Plaacutecido e Silva cm seu Dicionaacuterio Juriacutedico

Do latim proba de probare (demonstrar reconhecer formar juiacutezo de) entende-se assim no sentido juriacutedico a denominaccedilatildeo que se faz pelos meios legais da existecircncia ou veracidade de um fato material ou de um ato juriacutedico em virtude da qual se conclui por sua existecircncia do fato ou do ato demonstradoA prova consiste pois na demonstraccedilatildeo de existecircncia ou da veracidade daquilo que se alega como fundamento do direito que se defende ou que se contestaE nesta razatildeo no sentido processual designa tambeacutem os meios indicashydos em lei para realizaccedilatildeo dessa demonstraccedilatildeo isto eacute a soma de meios para constituiccedilatildeo da proacutepria prova ou seja para conclusatildeo ou produccedilatildeo de certeza

A prova pode fundar-se na afirmaccedilatildeo ou na negaccedilatildeo de fatos sobre que se pretende tenha nascido ou originado direito Assim orienta-se na afirmaccedilatildeo positiva ou na afirmaccedilatildeo negativa do fato contestado de cuja demonstraccedilatildeo decorreraacute a certeza da afirmaccedilatildeo

A prova por isso constitui em mateacuteria processual a proacutepria alma do processo ou a luz que vem esclarecer a duacutevida a respeito dos direitos disputadosMas tomada num duplo sentido objetivo e subjetivo natildeo se mostra somente a demonstraccedilatildeo material revelada pelo conjunto de meios utishylizados para a demonstraccedilatildeo da existecircncia dos fatos (sentido objetivo) como tambeacutem a proacutepria certeza ou convicccedilatildeo a respeito da veracidade da afirmaccedilatildeo feita (sentido subjetivo)

60 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

E assim sendo juridicamente compreendida a prova eacute a proacutepria conshyvicccedilatildeo acerca da existecircncia dos fatos alegados nos quais se fundam os proacuteprios direitos objetos da discussatildeo ou do litiacutegio Em consequecircncia somente haacute provas quando pela demonstraccedilatildeo se produz uma luz sushyficiente para achar a verdade ou quando os elementos componentes da demonstraccedilatildeo estabeleceram uma forccedila suficiente para produzir certeza ou convicccedilatildeo

Na busca por essa ldquo luz suficiente para achar a verdaderdquo pode-se reshycorrer basicamente agrave prova testemunhal agrave prova pericial e agrave prova docushymental

Com relaccedilatildeo agrave prova testemunhal aquela formulada mediante deshypoimentos ou declaraccedilotildees de pessoas que tiveram conhecimento direto ou indireto dos fatos em causa importa destacar que sua eficaacutecia se restringe especialmente a dois aspectos 1) grau de idoneidade da testemunha de envolvimento com as partes e o de firmeza de sua declaraccedilatildeo acerca do fato ou fatos depostos 2) o nuacutemero de testemunhas normalmente uma uacutenica testemunha costuma ser insuficiente para a produccedilatildeo de uma prova perfeita e plena Acrescenta-se que esse tipo de prova somente eacute admitido de acordo com a regra legal quando for produzida diante do juiz e com o conhecimento da parte contraacuteria Ela representa enfim a reconstituiccedilatildeo do fato tal qual existiu no passado

A prova documental eacute representada ldquopor documento ou pela demonsshytraccedilatildeo do fato alegado por meio de documento isto eacute um papel escrito onde o mesmo se mostra materializadordquo (De Plaacutecido e Silva) Aleacutem disso conforme o art 383 do Coacutedigo de Processo Civil acerca da prova docushymental ldquo qualquer reproduccedilatildeo mecacircnica como a fotograacutefica cinematograacuteshyfica fonograacutefica ou de outra espeacutecie faz prova dos fatos ou das coisas representadas se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conforshymidaderdquo Tal prova visa a representar o fato e surtiraacute o efeito desejado de acordo com a sua autenticidade a sua legitimidade e o seu conteuacutedo Destaca-se ainda o valor permanente que a prova documental possui dishyferentemente da prova testemunhal que eacute transeunte

A prova pericial se concretiza mediante o trabalho de um perito ou por meio de exames vistorias arbitramentos Ela descreve a forma atual dos fatos Dessa maneira exige a presenccedila de pessoas com incontestaacutevel idoneidade e com formaccedilatildeo teacutecnica referente agrave especificidade que cada caso a fim de contemplar os seguintes objetivos 1) cumprir uma ldquo inspeccedilatildeo determinada judicialmente para a verificaccedilatildeo de qualquer circunstacircncia ou fato alegado por uma das partes cuja veracidade natildeo pode ser comprovada

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURlDICO 61

sem ser por esse meio ()rdquo De Plaacutecido e Silva) Nesse caso denomina-se lal procedimento de exame que pode incidir sobre coisas fatos animais c pessoas Caso o exame seja ocular e incida sobre a realidade material dos fatos ligados agrave coisa chamar-se-aacute vistoria Seu objetivo eacute verificar a existecircncia da coisa sua realidade sua situaccedilatildeo e seu estado 2) ldquo apreciar o valor de determinados fatos ou coisas de que natildeo se tecircm elementos certos de avaliaccedilatildeordquo De Plaacutecido e Silva) Nesse caso deseja-se uma orientaccedilatildeo teacutecnica que promova a estimaccedilatildeo judicial dos fatos ou coisas a fim de se estipular um valor equivalente em dinheiro

As provas periciais representam importante instrumento persuasivo uma vez que procedimentos cientiacuteficos norteiam a sua execuccedilatildeo e por essa razatildeo utilizam-se de meacutetodo de teacutecnica satildeo sistemaacuteticos e estatildeo sujeitos agrave comprovaccedilatildeo Evidentemente que natildeo eacute apenas com um laudo teacutecnico que se persuade o auditoacuterio mas esse eacute um expediente eficaz e deve-se sempre que possiacutevel utilizaacute-lo

Por fim destacam-se os indiacutecios O valor probante desses se equivale aos tipos de prova jaacute destacados Entretanto difere dos demais porque

() natildeo se prestam a anaacutelises nem a classificaccedilotildees Natildeo se trata aqui de fatos representativos nos quais por sua proacutepria natureza a funshyccedilatildeo probatoacuteria eacute meramente essencial senatildeo de fatos autocircnomos cuja funccedilatildeo probatoacuteria c meramente acidental e surge pela eventualidade de uma relaccedilatildeo sua indefiniacutevel a priori com o fato a provar Por conseguinte natildeo cabe mais destacar o caraacuteter essencialmente relativo dos indiacutecios uni fato natildeo eacute indiacutecio em si senatildeo que se converte em tal quando uma regra de experiecircncia o potildee com o fato a provar em uma relaccedilatildeo loacutegica que permita deduzir a existecircncia ou natildeo existecircncia deste (CARN ELUTTI)

E possiacutevel entatildeo compreender o indiacutecio como um sinal um vestiacutegio um rastro extraiacutedo de um fato que proporciona a criaccedilatildeo de provas cirshycunstanciais conciliaacuteveis ou conexas para que se torne evidente o fato que se quer demonstrar Essa operaccedilatildeo depende da experiecircncia de quem execushyta o processo e da sua habilidade em dimensionar o fato e em estabelecer relaccedilotildees Tomemos como exemplo um assalto a uma mansatildeo onde soshymente o quarto da dona da casa estava revirado e de laacute foi levada uma caixa de joias valiosas Digamos que se deseja provar que o assalto foi praticado por algueacutem que conhecia a intimidade da casa Destaca-se portanto queo fato de a atenccedilatildeo do assaltante ter-se fixado apenas no quarto da dona da casa e de ter subtraiacutedo somente o porta-joias serviriam como indiacutecios de que o assaltante sabia exatamente o que deveria ser levado Admitidas

62 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

tais circunstacircncias eacute possiacutevel presumir que o assalto foi praticado por um empregado ou ateacute um morador da residecircncia Observemos que o procedishymento executado leva-nos a conceber um fato de presunccedilatildeo que embora seja autocircnomo do fato principal (o assalto) serve para a deduccedilatildeo do fato a provar uma vez que seguiu uma sequecircncia que manteacutem entre seus passos e tambeacutem com a realidade uma relaccedilatildeo loacutegica

Vamos retomar o caso concreto de Joatildeo Victor e destacar fatos e proshyvas que permitam comprovar a imperiacutecia e a negligecircncia por parte dos meacutedicos Aleacutem disso registrar as alegaccedilotildees que o seu opositor utiliza para contrariar a sua tese

Esse levantamento deve ser criterioso a fim de selecionar as informashyccedilotildees em que se assenta a sua tese Lembre-se de se manter fiel aos fatos e agraves provas natildeo eacute o momento de se registrarem impressotildees pessoais

Sugestatildeo de contextualizaccedilatildeo do real

Fatos favoraacuteveis agrave tese

1 - Apoacutes a cirurgia o abdocircmen do menino estava inchado Foi feita apulsatildeo mas o quadro continuou sc agravando ateacute que foi internado na unidade de terapia intensiva (UTI) com sangramento pela boca e pelo nariz

2 - Os pais afirmam que os meacutedicos natildeo esclareceram o que estavaocorrendo Tambeacutem registraram que insistiram para que o menino fosse novamente operado para que se encontrassem as causas das complicaccedilotildees

3 - Apoacutes a intervenccedilatildeo de dois meacutedicos o cirurgiatildeo pediaacutetrico do hosshypital realizou a operaccedilatildeo exploratoacuteria que comprovou a perfuraccedilatildeo no estocircmago

4 - 0 atestado de oacutebito revelou que o menino morreu por conta de rupshytura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas

Fatos contraacuterios agrave tese

1 - O cirurgiatildeo pediaacutetrico Augusto Nunes afirmou ldquoA causa morte da crianccedila natildeo eacute pelo meu procedimentordquo

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 63

2 - 0 anestesista Nilton Pereira tambeacutem assegurou que durante a opeshyraccedilatildeo tudo transcorreu normal mente e discordou do atestado de oacutebito que aponta problemas anesteacutesicos

44 H IPOacute T ESES

Importa inicialmente entender o significado da palavra hipoacutetese Seshygundo o Dicionaacuterio Eletrocircnico de Liacutengua Portuguesa de Antonio Houaiss dentre outros significados estes estatildeo registrados

1) proposiccedilatildeo que se admite independentemente do fato de ser verdashydeira ou falsa mas unicamente a tiacutetulo de um princiacutepio a partir do qual se pode deduzir um determinado conjunto de consequecircncias suposiccedilatildeo conjectura

2) suposiccedilatildeo conjectura pela qual a imaginaccedilatildeo antecipa o conhecishymento com o fim de explicar ou prever a possiacutevel realizaccedilatildeo de um fato e deduzir-lhe as consequecircncias pressuposiccedilatildeo presunccedilatildeo

Na argumentaccedilatildeo juriacutedica as hipoacuteteses satildeo proposiccedilotildees formuladas com base nos fatos elencados na contextualizaccedilatildeo do real que fornecem as suposiccedilotildees necessaacuterias para que se possa presumir a verossimilhanccedila da tese com o fato a provar Sendo assim as hipoacuteteses mantecircm uma relaccedilatildeo de coeshyrecircncia entre si jaacute que todas se dirigem a um mesmo ponto Isso natildeo represenshyta dizer que as possibilidades formuladas seratildeo iguais mas estaratildeo em uma relaccedilatildeo de interseccedilatildeo grosso modo satildeo caminhos autocircnomos que orientam o raciociacutenio para um mesmo ponto por terem algo em comum Nesse moshymento adota-se o raciociacutenio indutivo jaacute que se concebem hipoacuteteses como premissas menores que encaminharatildeo a uma uacutenica conclusatildeo a tese

Com base nas hipoacuteteses todas relacionadas pelo mesmo objetivo estru- turar-se-aacute o texto Nesse as suposiccedilotildees se transformaratildeo em afirmaccedilotildees isto eacute em inferecircncias das quais natildeo se tem duacutevida Tais afirmaccedilotildees ainda deveratildeo estar acompanhadas das justificativas que representaratildeo como se processou a conexatildeo entre elas e a conclusatildeo que se extraiu a partir dessa conexatildeo

Natildeo se pode perder de vista que sendo um texto argumentativo eacute indisshypensaacutevel que se registrem proposiccedilotildees que contenham argumentos de oposishyccedilatildeo Para tal eacute preciso o conhecimento e o uso dos conectores argumentativos de oposiccedilatildeo restritiva (adversativos) e contraste (concessivos) para que os argumentos de oposiccedilatildeo do orador sejam ilididos A estrutura do argumento de oposiccedilatildeo seraacute estudada no capiacutetulo referente aos tipos de argumento

eduardodasilvaramos
Highlight

64 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Como elaborar hipoacuteteses que visem agrave defesa da tese proposta no caso de Joatildeo Victor

Estrutura da hipoacutetese

Conector + Informaccedilatildeo extraiacuteda da contextualizaccedilatildeo do real + Inferecircncia extraiacuteda da

informaccedilatildeo anterior

Observaccedilatildeo Utilize na inferecircncia um verbo no futuro do preteacuterishyto (desinecircncia modo-temporal -ria) para indicar uma possibilidade

Sugestatildeo de hipoacuteteses

bull 1 - Jaacute que apoacutes uma cirurgia de amiacutedalas e adenoacuteide o abdocircmen da crianca apresentou inchaccedilo teria havido falha durante o proshycedimento ciruacutergico

2 - Uma vez que os pais afirmam que os meacutedicos natildeo esclareceramo que estava ocorrendo e que registraram que insistiram para que o menino fosse novamente operado a fim de encontrar as causas das complicaccedilotildees estaria comprovada a negligecircncia no atendimento agrave crianccedila

3 - Tendo em vista que o atestado de oacutebito revelou que o meninomorreu por conta de ruptura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas esshytaria comprovada a imperiacutecia meacutedica durante a cirurgia

Observaccedilatildeo Reserve as alegaccedilotildees dos meacutedicos para produzir arshygumentos de oposiccedilatildeo no Capiacutetulo 5

45 A N Aacute L ISE D ESSE PLA N EJA M EN T O EM SEN TEN CcedilA E ACOacuteRDAtildeO

A teoria desenvolvida nos capiacutetulos anteriores formou o alicerce soshybre o qual se pretende estruturar um texto argumentativo juriacutedico Com a intenccedilatildeo de demonstrar como tais conhecimentos auxiliam nessa tarefa propomos a anaacutelise da fundamentaccedilatildeo de uma sentenccedila e de um acoacuterdatildeo a fim de se percorrer o caminho inverso sugere-se uma possiacutevel estrutura que pode ser adotada como a expressatildeo da sequecircncia loacutegica do raciociacutenio exposto nas peccedilas E importante enfatizar que haacute outras possibilidades de se registrar o conteuacutedo da estrutura oferecida

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 65

451 Sentenccedila

Neste passo agrave luz da teoria do discurso e da teoria da argumentaccedilatildeo juriacutedica perscrutar-se-aacute o caminho adotado pelo juiz ao elaborar a fundashymentaccedilatildeo de sua sentenccedila Para tal foi preciso analisar compreender e construir o percurso seguido pelo magistrado Reafirme-se que se operou uma praacutetica inversa do texto para uma possiacutevel estrutura

Poder JudiciaacuterioEstado do Rio de JaneiroComarca de Volta RedondaJuiacutezo de Direito da 3a Vara CiacutevelProcesso ndeg 15386SENTENCcedilAVistos etcTrata-se de Accedilatildeo Ordinaacuteria de Responsabilidade Civil ajuizada por Eva Azevedo de Paula por si e representando seus filhos menores impuacutebeshyres Pedro Henrique de Paula e Carlos Henrique de Paula em face da autarquia municipal denominada Serviccedilo Autocircnomo HospitalarAlegam os autores como causa de pedir em siacutentese que1) O marido da autora foi atingido por disparo acidental de arma de fogo tendo sido encaminhado ao Hospital Satildeo Joatildeo Batista adminisshytrado pelo reacuteu onde se constatou a necessidade de imediata internaccedilatildeo ciruacutergica a fim de estancar hemorragia interna2) Ocorre que o mencionado hospital natildeo dispunha de meacutedico anesshytesista de plantatildeo em que pese contar com meacutedico cirurgiatildeo para tal operaccedilatildeo (f 03)3) Em vez de providenciar a remoccedilatildeo imediata da viacutetima para outro hosshypital o responsaacutevel ldquo limitou-se a tentar conseguir meacutedico anestesista por meio de telefonemasrdquo (f 03)4) Finalmente quase duas horas depois a viacutetima deu entrada no Hospishytal da CSN com o seu estado de sauacutede agravado ldquo por falta de socorro adequado e imediatordquo (f 03)5) Aguardam portanto a condenaccedilatildeo do reacuteu no pagamento de indeshynizaccedilatildeo consistente nos danos morais e materiais que especifica nas folhas 0607Inicial instruiacuteda com os documentos de f 0829O reacuteu apresentou a contestaccedilatildeo de f 3639 arguindo em resumo que o socorro imediato foi prestado pela equipe do Hospital Satildeo Joatildeo Batista

66 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dentro das normas teacutecnicas natildeo havendo que se ldquo falar em omissatildeo eou negligecircncia uma vez que natildeo se transfere paciente para outro serviccedilo aleatoriamente razatildeo dos procedimentos adotados pela equipe meacutedica para garantir as condiccedilotildees baacutesicas de vidardquo (f 37)Quanto aos contatos telefocircnicos alega o reacuteu ter cumprido o que estabeshylece a resoluccedilatildeo n 1787 do C REM ERJ em seu art 9deg sendo que ao chegar agrave Casa de Sauacutede Santa Margarida foi informado de que ela natildeo dispunha de CTI razatildeo pela qual foi recusada a internaccedilatildeo da viacutetima que foi entatildeo encaminhada ao Hospital da CSNAssim ldquo a se falar em negligecircncia meacutedica para a ocorrecircncia de culpa deveraacute ela ser atribuiacuteda agrave Casa de Sauacutede Santa Margaridardquo (f 38)Por fim alega que a responsabilidade do meacutedico natildeo eacute de resultado mas de meio razatildeo pela qual aguarda a improcedecircncia do pedidoReacuteplica de f 4749 reiterando os termos da inicial instruiacuteda com coacutepia do Registro de ocorrecircnciaEm provas os autores protestaram pela oitiva das testemunhas arrolashydas a f 55 e o reacuteu pelas arroladas a f 60Realizada a audiecircncia de instruccedilatildeo e julgamento de f 7078 na qual foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas foi proferida a sentenccedila de f 8892 tendo posteriormente o processo sido anulado a partir de f 58 por forccedila do acoacuterdatildeo de f 115116Realizada a audiecircncia de conciliaccedilatildeo de f 122 essa terminou frustrashydaFrustrada a realizaccedilatildeo da audiecircncia de instruccedilatildeo e julgamento de f 133 face agrave ausecircncia de 2 testemunhas essa veio a realizar-se consoante ata de f 140 na qual foram ouvidas 4 testemunhas conforme termos de fls 141146As partes apresentaram suas alegaccedilotildees finais por meio dos memoriais de f 148152 e 154155O Ministeacuterio Puacuteblico ofereceu denuacutencia de f 157158 opinando pela procedecircncia do pedidoEacute o relatoacuterio decido

Os autores fundamentam a presente accedilatildeo com o art 37 paraacutegrafo 6deg da Constituiccedilatildeo Federal que estabelece a responsabilidade objetiva das pessoas juriacutedicas de direito puacuteblico prestadoras de serviccedilo puacuteblico tenshydo em vista a natureza autaacuterquica do reacuteu a quem cabe administrar o Hospital Satildeo Joatildeo Batista ex vi do Decreto n 520A e 521 de f 1524O Ministeacuterio Puacuteblico por sua vez reitera a responsabilidade objetiva do reacuteu com fundamento entretanto na Lei 80781990 - Coacutedigo do

Consumidor jaacute que se trata de serviccedilos meacutedicos prestados por hospital como fornecedor de serviccedilosDe fato a responsabilidade do reacuteu na hipoacutetese deve scr apurada no campo da responsabilidade objetivaApesar da controveacutersia existente na doutrina no que se refere agrave resshyponsabilidade civil dos hospitais se objetiva ou subjetiva a verdade eacute que no caso trata-se dc hospital puacuteblico administrado pelo reacuteu aushytarquia municipal devendo portanto responder objetivamente pelas falhas na prestaccedilatildeo do serviccedilo hospitalar seja pela regra geral previsshyta no art 37 paraacutegrafo 6deg da CRFB ou mesmo pelo disposto no art 22 paraacutegrafo uacutenico combinado com art 14 do Coacutedigo de Proteccedilatildeo e Defesa do ConsumidorCom efeito o referido Coacutedigo prevecirc em seu art 4deg os objetivos e a Poliacutetica Nacional das Relaccedilotildees de Consumo estabelecendo no seu inshyciso V II o princiacutepio da

ldquo V II - racionalizaccedilatildeo e melhoria dos serviccedilos puacuteblicosrdquo

Em seguida no art 6deg satildeo previstos os direitos baacutesicos do consumidor entre os quais eacute exigido

ldquo X - A adequada e eficaz prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos em geralrdquo

Finalmente o art 22 e seu paraacutegrafo uacutenico da Lei 80781990 que dispotildee

Os oacutergatildeos puacuteblicos por si ou suas empresas concessionaacuterias permis- sionaacuterias ou sob qualquer outra forma de empreendimento satildeo obrishygadas a fornecer serviccedilos adequados eficientes seguros e quanto aos essenciais contiacutenuosParaacutegrafo uacutenico Nos casos de descumprimento total ou parcial das obrigaccedilotildees referidas neste artigo seratildeo as pessoas juriacutedicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados na forma prevista neste Coacutedigo

Portanto constata-se que para o Coacutedigo de Defesa do Consumidor as entidades puacuteblicas e privadas que prestam serviccedilos puacuteblicos tecircm tratashymento igualitaacuterio conforme doutrina Maria D rsquoAssunccedilatildeo Merecello in Direito do Consumidor RT ndeg 19 p 233) respondendo assim objetishyvamente pelos danos causados aos consumidoresO Des Seacutergio Cavai ieri por sua vez em Programa de Responsabilidashyde Civil ressalta que a responsabilidade das instituiccedilotildees hospitalares como prestadoras de serviccedilos eacute objetiva in verbis

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO

68 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A responsabilidade do hospital embora natildeo vaacute ao ponto de garantir a vida ou assegurar a cura do paciente inclui um dever de incolumidade na medida em que tem de resguardar o paciente de quaisquer conseshyquecircncias que um bom serviccedilo poderia evitar Tem obrigaccedilatildeo natildeo soacute de prestar assistecircncia medica mas tambeacutem como hospedeiro respondenshydo pelas consequecircncias da violaccedilatildeo de quaisquer dos seus deveres conshysoante o art 1521 IV do Coacutedigo Civil Como prestadores de serviccedilos a responsabilidade das instituiccedilotildees hospitalares eacute objetiva pois enquashydra-se tambeacutem no art 14 do Coacutedigo do Consumidor (grifo nosso)

Com efeito em se tratando de estabelecimento puacuteblico administrado por autarquia municipal eacute de se impor o enquadramento da hipoacutetese no campo da responsabilidade objetiva repita-se seja por forccedila do art 37 paraacutegrafo 6deg da CRFB ou o mesmo disposto no art 22 paraacutegrafo uacutenico cc art 14 do Coacutedigo de Defesa do ConsumidorCumpre verificar portanto se houve ou natildeo na hipoacutetese defeito na prestaccedilatildeo do serviccedilo desempenhado pelo hospital em razatildeo da ausecircncia do meacutedico anestesista do hospital o qual se encontrava de sobreaviso e natildeo foi encontrado quando da emergecircncia impedindo a realizaccedilatildeo da intervenccedilatildeo ciruacutergica bem como se existe nexo de causalidade entre o aludido fato e a morte da viacutetimaO exame dos autos revela que realmente existiu falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo emergencial Isso porque um hospital que realiza atendimento de emergecircncia deve dispor dos equipamentos miacutenimos e da equipe neshycessaacuteria para ocorrendo a emergecircncia prestar o pronto atendimento ao paciente seja ele ciruacutergico ou natildeo o que natildeo ocorreu no casoOra na hipoacutetese constata-se que a viacutetima frise-se chegou ao Hospital administrado pelo reacuteu com vida ainda luacutecida e caminhando conforme declarou a testemunha de f 76 em depoimento ratificado a f 144Assim prestados os primeiros socorros pelo cirurgiatildeo plantonista este concluiu ser indispensaacutevel a intervenccedilatildeo ciruacutergica a fim de conter a hemorragia do paciente a qual natildeo pocircde ser efetivada face agrave ausecircncia do meacutedico anestesista que se encontrava em regime de sobreaviso e natildeo pocircde ser encontradoCom isso o paciente teve de ser transferido para outro hospital qual seja o da Companhia Sideruacutergica Nacional em que deu entrada cerca de duas horas depois face agraves dificuldades da transferecircncia ldquo em estado grave apresentando choque hipovolecircnico e hemotoacuterax agrave direitardquo (f 45)A prova testemunhal revela claramente que houve falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo na medida em que a intervenccedilatildeo ciruacutergica que se fazia neshycessaacuteria para aumentar as chances de sobrevivecircncia do paciente natildeo foi realizada devido agrave ausecircncia do anestesista fato que agravou o estado

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 69

de sauacutede da viacutetima que teve de ser removida para outro hospital aonde chegou cerca de duas horas depois repita-se jaacute em estado criacuteticoEacute o que se colhe do depoimento de f 7475 (ratificado a f 146 e f 7778 e f 141) in verbis

ldquo () que em medicina para se salvar o paciente eacute necessaacuterio que o atenshydimento seja o mais imediato possiacutevel salientando-se que o paciente com o quadro hemorraacutegico como ocorrido nesta hipoacutetese em exame soacute teria chance de sobrevivecircncia no caso de socorro imediato sendo por conseguinte o retardo terapecircutico determinante de extrema piora prognostica() que diante do quadro apresentado pelo paciente o ideal eacute que tivesse sido operado no primeiro hospital que deu entrada() a cirurgia naquele momento era imprescindiacutevel ateacute para conter a hemorragia do paciente() se houvesse anestesista no hospital no dia dos fatos afirma o depoenshyte que teria realizado a cirurgiardquo

Constatara-se portanto ter havido evidente falha na prestaccedilatildeo do servishyccedilo em questatildeo considerando que se trata de atendimento emergencial que deixou se ser prestado adequadamente face agrave ausecircncia do anesteshysista o que impossibilitou a realizaccedilatildeo da cirurgia privando a viacutetima de um direito baacutesico que eacute a ldquo adequada e eficaz prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicosrdquo Assim conforme a doutrina jaacute citada embora a responsabilidade do hospital natildeo vaacute ao ponto de garantir a vida ou assegurar a cura ele tem o dever de resguardar o paciente de quaisquer consequecircncias que um serviccedilo adequado poderia evitar e o serviccedilo na hipoacutetese soacute o seria se realizada a cirurgia de emergecircnciaCumpre ressaltar ad argumentandum tantum que a gravidade da lesatildeo apresentada no momento da internaccedilatildeo natildeo afasta a obrigaccedilatildeo do hosshypital em prestar o serviccedilo de forma adequada e eficaz o que significa dizer completo natildeo se podendo admitir que uma cirurgia deixe dc ser realizada por ausecircncia de meacutedico anestesistaHouve portanto negligecircncia por parte da direccedilatildeo do hospital o qual elegeu arriscado sistema de sobreaviso para o meacutedico anestesista assushymindo assim o risco de ele natildeo ser encontrado fato que na hipoacutetese impediu a realizaccedilatildeo da cirurgia e consequentemente agravou o estado de sauacutede da viacutetima devendo se impor a obrigaccedilatildeo de indenizarConstatada a obrigaccedilatildeo de indenizar cumpre fixar as verbas indenizaacute- veis a comeccedilar pelos danos materiais

70 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Os autores requereram a condenaccedilatildeo da Reacute ao pagamento de ldquo pensatildeo progressiva a ser arbitrada por esse Juiacutezo seguindo o salaacuterio baacutesico para os empregados em construccedilatildeo civil em que exercia o de cujus sua ativishydade vincenda e vencidardquo (f 07 com a constituiccedilatildeo de capital durante o periacuteodo de sobrevida provaacutevel da viacutetima)A alegaccedilatildeo de que a viacutetima agrave eacutepoca dos fatos trabalhava na construccedilatildeo civil aleacutem de natildeo impugnada pela reacute (art 30 do CPC) encontra respaldo nos documentos de f 1228 e 29 razatildeo pela qual sendo os autores cocircnjuge e filhos menores da viacutetima tem-se entendido que a dependecircncia econocircmica eacute presumida evidenciando assim o dano qual seja o lucro cessanteO pensionamento pretendido entatildeo eacute devido acrescido de 13deg salaacuterio o qual integra a remuneraccedilatildeo do trabalhador e portanto independe de pedido sendo que a jurisprudecircncia dos tribunais brasileiros eacute no sentido de fixaacute-la em 23 dos ganhos da viacutetima jaacute que 13 equivaleria aos seus gastos pessoais devidos ateacute a data em que completaria 65 anos a qual reflete a sobrevida provaacutevel tranquilamente aceita pela jurisprudecircnciaNo entanto inexistindo nos autos prova do quantum da remuneraccedilatildeo percebida pela viacutetima a pensatildeo deveraacute ser fixada em quantia equivalenshyte a 23 dos ganhos da viacutetima valor esse que deveraacute ser convertido em salaacuterio miacutenimo vigente na eacutepoca do fato conforme suacutemula 490 do STF tudo a ser apurado em liquidaccedilatildeo de sentenccedilaA pensatildeo devida aos filhos menores apesar de a reacute natildeo impugnar natildeo pode se estender pelo resto de suas vidas Deve ela perdurar por tempo que lhes permita educar-se e buscar seus caminhos proacuteprios o que jaacute eacute praxe dura ateacute os 24 (vinte e quatro) anosEste o limite o termo final do pensionamento dos filhos da viacutetimaQuanto agrave reversatildeo da pensatildeo dos filhos para a I a autora entendo deva ser deferida apesar de inexistir pedido expresso nesse sentido Isso porshyque o pedido dos autores eacute abrangente pois natildeo fixa termo ad quem para a pensatildeo dos menores devendo ser portanto deferida a reversatildeo no momento em que estes completarem 24 anos sem o que haveraacute por parte da reacute enriquecimento iliacutecitoO dano moral por sua vez tambeacutem existe na hipoacutetese e deve ser concedidoApesar de inexistirem paracircmetros fixos a serem observados para a fishyxaccedilatildeo destes a verdade eacute que alguns princiacutepios devem ser observados especialmente aquele que atribui ao dano moral a natureza de pena prishyvada conforme sustentado pelo eminente Min Moreira AlvesAssim o caraacuteter punitivo no caso deve ser suficiente para desestimular a repeticcedilatildeo de fatos semelhantes de forma que a administraccedilatildeo puacuteblica tenha mais zelo na prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos essenciais como no caso da sauacutede em que satildeo noticiados frequentemente casos como o presente

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 71

Deve-se considerar ainda o sofrimento do ofendido que se apresenta na hipoacutetese sem seu grau maacuteximo considerando a morte da viacutetima cocircnshyjuge e pai dos autoresPortanto norteado pelos paracircmetros em apreccedilo acolho o pedido inicial e fixo os danos morais em R$ 3500000 (trinta e cinco mil reais)Posto isso JULGO PRO CED ENTE o pedido para condenar a parte reacute a pagar aos autores1) Pensotildees vencidas e vincendas desde a eacutepoca do evento (23101993) no valor mensal de 23 dos ganhos da viacutetima na proporccedilatildeo de 13 para cada um devidamente corrigido nos termos da suacutemula 490 do STF a ser apurado em liquidaccedilatildeo de sentenccedila2) Durando a pensatildeo para os filhos menores ateacute a data em que completashyrem 24 anos momento em que deveraacute ser revertida agrave primeira autora3) Indenizaccedilatildeo por danos morais em valor equivalente a R$ 3500000 (trinta e cinco mil reais) a ser dividido pelos autores na proporccedilatildeo de 13 para cada um a ser paga direta e imediatamente a representante legal dos menores quanto agraves respectivas partes4) Juros simples desde a data do evento ateacute a do efetivo pagamento (Suacutemula ndeg 54 STJ)5) Despesas com o processo e honoraacuterios de advogados na base de 15 (quinze por cento) sobre as prestaccedilotildees vencidas e 12 vincendas incluindo o valor referente aos danos moraisPor fim no que se refere agrave constituiccedilatildeo de capital considerando a idoshyneidade econocircmica da reacute deveraacute ele providenciar o pagamento da penshysatildeo mediante a inclusatildeo dos autores em folha de pagamento na forma do art 20 paraacutegrafo 5deg do Coacutedigo de Processo Civil

PRIVolta Redonda 23 de maio de 1997

Gustavo Bandeira da Rocha Oliveira

Juiz de Direito

Com o objetivo de delinear um provaacutevel rumo seguido pelo raciociacuteshynio do magistrado destacam-se os elementos constitutivos da argumentashyccedilatildeo juriacutedica

1) Situaccedilatildeo de conflitoEva Azevedo de Paula por si e representando seus filhos menores

impuacuteberes Pedro Henrique de Paula e Carlos Henrique de Paula acusa a

72 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

autarquia municipal denominada Serviccedilo Autocircnomo Hospitalar de falha no atendimento a seu marido causa provaacutevel de sua morte no dia 23 de oushytubro de 1993 no Hospital da Companhia Sideruacutergica Nacional em Volta Redonda para onde fora transferido

2) TeseA Autarquia Municipal Serviccedilo Autocircnomo deve indenizar por danos

morais e pagar pensatildeo agrave viuacuteva e a seus dois filhos por ter sido negligente na prestaccedilatildeo do atendimento agrave viacutetima

3) Contextualizaccedilatildeo do real

Proacute-tese1) A viacutetima atingida por um tiro acidental chegou ao Hospital Satildeo

Joatildeo Batista luacutecida e caminhando com hemorragia interna conforme tesshytemunho de f 76

2) De acordo com o cirurgiatildeo plantonista que prestou os primeiros s o c o it o s era indispensaacutevel uma intervenccedilatildeo ciruacutergica para conter a hemorshyragia (f 7475) e por ausecircncia dessa seu estado agravou-se

3) Segundo consta nos autos o meacutedico anestesista natildeo estava no hosshypital encontrava-se de sobreaviso e natildeo foi localizado

4) De acordo com o Hospital da CSN (f 45) em face das dificuldades de transferecircncia o paciente chegou ao referido hospital ldquo em estado grave apresentando choque hipovolecircnico e hemotoacuterax agrave direitardquo

Contraacuterio agrave tese1) Segundo consta nos autos a parte reacute afirma que o paciente jaacute cheshy

gou ao hospital em estado grave e recebeu socorro imediato2) De acordo com os autos a parte reacute entende que a responsabilidade

do meacutedico natildeo eacute de resultado mas de meio

4) HipoacutetesesIa) Jaacute que a viacutetima atingida por um tiro acidental chegou ao hospishy

tal luacutecida e caminhando haveria como salvar-lhe a vida prestando-lhe o devido atendimento

2a) Uma vez que de acordo com o cirurgiatildeo plantonista que prestou os primeiros socorros era indispensaacutevel uma intervenccedilatildeo ciruacutergica para conter a hemorragia (f 7475) e por ausecircncia desse procedimento seu estado agravou-se teria havido falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo

3a) Tendo em vista que segundo consta nos autos o meacutedico anesshytesista natildeo estava no hospital (encontrava-se de sobreaviso mas natildeo foi localizado) a autarquia teria assumido o risco de prestar um atendimento inadequado

4a) Jaacute que de acordo com o Hospital da CSN (f 45) face agraves dificulshydades de transferecircncia o paciente chegou ao referido hospital ldquoem estado rrave apresentando choque hipovolecircmico e hemotoacuterax agrave direitardquo seu estashydo teria se agravado pela negligecircncia do Hospital Satildeo Joatildeo Batista

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO

152 Acoacuterdatildeo

O acoacuterdatildeo oferecido a seguir constitui um pronunciamento exemplar quanto ao conteuacutedo juriacutedico e quanto agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua portuguesa Por essa razatildeo demonstra-se oportuna a sua leitura assim como a tentativa de recuperar o modo pelo qual o julgador ordenou o seu raciociacutenio para identishyficar a questatildeo a ser decidida avaliar as particularidades do caso concreto a serem valoradas analisar os argumentos dos litigantes definir-se a respeito da norma e dos princiacutepios incidentes e a aplicabilidade desses Para tal larefa recorreremos mais uma vez ao levantamento dos elementos cons- litutivos da argumentaccedilatildeo juriacutedica

ACOacuteRDAtildeO 2a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel no 76096 Relator Des Seacutergio Cavalieri FilhoRESPO N SA BIL ID AD E C IV IL DE EM PRESA JORNALIacuteST ICA Pushyblicaccedilatildeo OfensivaI L IBER D A D E C IV IL DE INFORMACcedilAtildeO VERSUS IN V IO LA B IL IshyDADE DA V ID A PRIVADA Princiacutepio da Unidade ConstitucionalNa temaacutetica dos direitos e garantias fundamentais dois princiacutepios consshytitucionais se confrontam e devem ser conciliados De um lado a livre expressatildeo da atividade intelectual artiacutestica cientiacutefica e de comunicaccedilatildeo independentemente de censura ou licenccedila de outro lado a inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem das pessoasSempre que princiacutepios constitucionais aparentam colidir deve o inteacutershyprete procurar as reciacuteprocas implicaccedilotildees existentes entre eles ateacute chegar a uma inteligecircncia harmoniosa porquanto em face do princiacutepio da unishydade constitucional a Constituiccedilatildeo natildeo pode estar em conflito consigo mesma natildeo obstante a diversidade de normas e princiacutepios que conteacutem

74 H l LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim se ao direito agrave livre expressatildeo da atividade intelectual e de comushynicaccedilatildeo contrapotildee-se o direito agrave inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem segue-se como consequecircncia loacutegica que este uacuteltimo condiciona o exerciacutecio do primeiro atuando como limite estabelecido pela proacutepria Lei Maior para impedir excessos e abusosII DANO MORAL ConfiguraccedilatildeoNa tormentosa questatildeo de saber o que configura o dano moral cumpre ao juiz seguir a trilha da loacutegica do razoaacutevel em busca da sensibilidade eacutetico-social normal Deve tomar por paradigma o cidadatildeo que se coloca a igual distacircncia do homem frio insensiacutevel e o homem de extremashyda sensibilidade Nessa linha de princiacutepio soacute deve ser reputado como dano moral a dor vexame sofrimento ou humilhaccedilatildeo que fugindo agrave normalidade interfira intensamente no comportamento psicoloacutegico do indiviacuteduo causando-lhe afliccedilatildeo angustia e desequiliacutebrio em seu bem estar natildeo bastando mero dissabor aborrecimento maacutegoa irritaccedilatildeo ou sensibilidade exacerbada Agrave luz desse contexto ningueacutem pode negar que fere a sensibilidade do homem normal e configura humilhaccedilatildeo doshylorosa divulgar em revista de grande circulaccedilatildeo que conhecida artista de novela teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou a elas comparecer alcoolizadaIII ARBITRAM ENTO DO DANO MORAL Princiacutepio da Razoabili- dadeO arbitramento judicial eacute o mais eficiente meio para se fixar o dano moral E embora nessa penosa tarefa natildeo esteja o juiz subordinado a nenhum limite legal nem a qualquer tabela prefixada deve todavia atentando para o princiacutepio da razoabilidade estimar uma quantia comshypatiacutevel com a reprovabilidade da conduta iliacutecita e a gravidade do dano por ela produzido Se a reparaccedilatildeo deve ser a mais ampla possiacutevel natildeo pode o dano transformar-se em fonte de lucro Entre esses dois limites devem se situar a prudecircncia e o bom senso do julgadorReforma parcial de sentenccedilaVistos relatados e discutidos estes autos de Apelaccedilatildeo Ciacutevel no 76096 em que eacute Ia apelante Editora Abril SA 2a apelante Maria Zilda Bethelm Vieira e apelados os mesmosAcordam os Desembargadores que integram a 2a Cacircmara Ciacutevel do Trishybunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro por unanimidade em dar provimento parcial agrave apelaccedilatildeo a fim de reduzir a indenizaccedilatildeo para 500 (quinhentos) salaacuterios miacutenimos e negar provimento ao recurso adesivo confirmando-se no mais a brilhante sentenccedila da lavra do eminente Juiz Dr Luiz FuxReporto-me ao relatoacuterio de f 407409 aduzindo que se trata de accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por dano moral decorrente de publicaccedilatildeo em revista

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 75

de grande vendagem e repercussatildeo ofensiva agrave honra e agrave intimidade da autora Postulou indenizaccedilatildeo compatiacutevel com o grau dc culpa a intensishydade do sofrimento do ofendido e o caraacuteter punitivo da indenizaccedilatildeoA sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido condenando a reacute a pagar agrave autora a quantia equivalente a quatro mil salaacuterios miacutenimos a tiacutetulo de indenizaccedilatildeo por dano moral e verba honoraacuteria de 20 sobre o valor da condenaccedilatildeoApela primeiramente a reacute (f 420439) alegando ter a sentenccedila legado ao obliacutevio todas as disposiccedilotildees da Lei de Imprensa e da Constituiccedilatildeo Federal no livre direitodever de informar Sustenta em siacutentese que a) o julgador de primeiro grau tratou desigualmente as partes na anaacutelise da instruccedilatildeo processual b) a apelante procurou mostrar nas provas docushymentais que trouxe aos autos as caracteriacutesticas da apelada o que natildeo foi considerado pelo julgador de primeiro grau c) a revista Veja atuou em absoluta conformidade com a Carta Magna informando seus leitores a respeito de fato de interesse puacuteblico como lhe asseguram os artigos 5deg incisos IV e IX e 220 sectsect 1deg e 2deg d) nada se imputou agrave pessoa da apelada tendo a notiacutecia sido dada na forma condicional como mandam todos os manuais de imprensa e) a sentenccedila incorre em engano quando afasta a aplicaccedilatildeo da Lei de Imprensa no presente caso trazendo agrave colashyccedilatildeo acoacuterdatildeo do STJ 0 a condenaccedilatildeo imposta agrave apelante viola qualquer princiacutepio que possa ser aplicado ao montante razoaacutevel da indenizaccedilatildeo eis que o proacuteprio Presidente da Repuacuteblica natildeo ganharia essa importacircnshycia em todo o seu mandato g) a indenizaccedilatildeo no valor em que foi arshybitrada importa em enriquecimento sem causa Traz agrave colaccedilatildeo vaacuterios arestos deste Tribunal no sentido de que a indenizaccedilatildeo pelo dano moral deve respeitar os limites estabelecidos na Lei de Imprensa Pede a total reforma da sentenccedila para o fim de ser julgado improcedente o pedido ou alternativamente que a condenaccedilatildeo seja reduzida aos limites da lei especial que rege a mateacuteriaRecorre adesivamente a autora (f 473484) postulando que a indenizashyccedilatildeo seja elevada para importacircncia correspondente a pelo menos 20 do valor total da tiragem da Revista Veja ou seja 632115 salaacuterios miacutenimos e que os juros moratoacuterios sejam computados a partir do ato iliacutecitoOs recursos foram respondidos (f 443471 e 488493) cada parte pugshynando pela manutenccedilatildeo da sentenccedila no ponto em que lhe foi favoraacutevel Haacute preliminar de descabimento do recurso adesivo por natildeo ter havido sucumbecircncia reciacuteprocaE o relatoacuterioEnsejou a presente accedilatildeo mateacuteria jornaliacutestica publicada na seccedilatildeo ldquo Genterdquo da Revista Veja noticiando que a autora quando estava sendo transmi-

tida a novela ldquo Olho por Olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada O fato aleacutem de natildeo contestado estaacute comprovado com um exemplar da revista trazida aos autos resta pois a anaacutelise de suas consequecircncias juriacutedicasColocadas em ordem loacutegica as questotildees levantadas nos recursos cumpre apreciar em primeiro lugar a que diz respeito agrave liberdade de informaccedilatildeo garantida pela Constituiccedilatildeo na qual se escuda a apelante para justificar a sua conduta Em seu entender teria agido em absoluta conformidade com a Carta Magna informando seus leitores a respeito de fato de inteshyresse puacuteblico pelo que natildeo teria praticado ato iliacutecitoNingueacutem questiona que a Constituiccedilatildeo garante o direito de livre exshypressatildeo agrave atividade intelectual artiacutestica cientiacutefica e de comunicaccedilatildeo independentemente de censura ou licenccedila (arts 5deg inc IX e 220 sectsect 1deg e 2deg) Essa mesma Constituiccedilatildeo todavia logo no inciso seguinte (no X) dispotildee que ldquosatildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeordquo Como se vecirc na temaacutetica atinente aos direitos e garantias fundamenshytais esses dois princiacutepios constitucionais se confrontam e devem ser conciliados Eacute tarefa do inteacuterprete encontrar o ponto de equiliacutebrio entre os princiacutepios constitucionais em aparente conflito porquanto em face do princiacutepio da unidade constitucional a Constituiccedilatildeo natildeo pode estar em conflito consigo mesma natildeo obstante a diversidade de normas e princiacutepios que conteacutem a fim de evitar contradiccedilotildees antagonismos e antinomiasEm outras palavras natildeo eacute possiacutevel analisar-se uma disposiccedilatildeo consshytitucional isoladamente fora do conjunto harmocircnico em que deve ser situada princiacutepios aparentemente contraditoacuterios podem harmonizar-se desde que se abdique da pretensatildeo de interpretaacute-los de forma isolada e absolutaCelso Ribeiro Bastos citando Willoughby diz que ldquo a Constituiccedilatildeo corshyresponde a um todo loacutegico onde cada provisatildeo eacute parte integrante do conjunto sendo assim logicamente adequado senatildeo imperativo intershypretar uma parte agrave luz das previsotildees de todas as demais partesrdquo (Curso de Direito Constitucional 15 ed Saraiva p 204)Agrave luz desses princiacutepios eacute forccediloso concluir que sempre que direitos consshytitucionais satildeo colocados em confronto um condiciona o outro atushyando como limites estabelecidos pela proacutepria Lei Maior para impedir excessos e arbiacutetrios Assim se ao direito agrave livre expressatildeo da atividade intelectual e de comunicaccedilatildeo contrapotildee-se o direito agrave inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem segue-se como conshysequecircncia loacutegica que este uacuteltimo condiciona o exerciacutecio do primeiro

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 77

Pondera o insigne Carlos Alberto Bittar que na divulgaccedilatildeo da imagem eacute vedada qualquer accedilatildeo que importe em lesatildeo agrave honra agrave reputaccedilatildeo ao decoro (ou agrave chamada imagem moral ou conceituai) agrave intimidade e a outros valores da pessoa (uso torpe) Natildeo satildeo permitidas pois quaisshyquer operaccedilotildees que redundem em sacrifiacutecio desses valores que receberatildeo sancionamento em conformidade com bem violado e nos niacuteveis possiacuteveis (Os direitos da personalidade Forense Universitaacuteria 1988 p 90-91)Leandro Konder por sua vez explica que a vida privada eacute uma conquisshyta relativamente recente da humanidade e que mesmo se entendendo que pessoas puacuteblicas tecircm o seu cotidiano naturalmente mais devassado eacute preciso que alguma liberdade lhes sobre Uma sociedade eacute feita de indiviacuteduos livres Acredito prossegue o citado autor que a revelaccedilatildeo de verdades da vida privada capazes de causar transtornos soacute se justifica se isso for essencial para se entender um fenocircmeno histoacuterico Se natildeo vira artifiacutecio sensacionalista o que eacute eticamente condenaacutevel e politicamente perigosoEm conclusatildeo os direitos individuais conquanto previstos na Constishytuiccedilatildeo natildeo podem ser considerados ilimitados e absolutos em face da natural restriccedilatildeo resultante do princiacutepio da conveniecircncia das liberdashydes pelo que natildeo se permite que qualquer deles seja exercido de modo danoso agrave ordem puacuteblica e agraves liberdades alheias Fala-se hoje natildeo mais em direitos individuais mas em direitos do homem inserido na sociedashyde de tal modo que natildeo mais exclusivamente com relaccedilatildeo ao indiviacuteduo mas com enfoque de sua inserccedilatildeo na sociedade que se justificam no estado social de direito tanto os direitos como as suas limitaccedilotildeesSempre que haacute invasatildeo da disciplina constitucional e consequente vioshylaccedilatildeo ou ameaccedila de violaccedilatildeo de direito de outrem o Judiciaacuterio eacute convoshycado a prestar a jurisdiccedilatildeo natildeo como censor da liberdade de pensamento do cidadatildeo mas para que possamos conviver democraticamente como magistralmente colocou o eminente Desembargador Carlos Alberto Dishyreito um dos luminares desta Corte em brilhante voto prolatado na Apelaccedilatildeo ndeg 631893 da I a Cacircmara Ciacutevel O reacuteu eacute livre para manifestar o seu pensamento prossegue o erudito voto mas por ele eacute responsaacutevel Cada cidadatildeo sabe que a Constituiccedilatildeo exclui da liberdade de manifestashyccedilatildeo do pensamento a ofensa aos direitos subjetivos privados de outrem Natildeo cabe ao Poder Judiciaacuterio limitar o vocabulaacuterio do cidadatildeo Pode e deve impedir que um juiacutezo seja exteriorizado se e quando provocado previamente para coibir a ameaccedila de violaccedilatildeo de direitos nunca para censurarAssentados os limites do direito de expressatildeo e informaccedilatildeo em face da inviolabilidade da vida privada cumpre agora perquirir se a apelante ao veicular a notiacutecia que deu causa a esta accedilatildeo invadiu a esfera iacutentima da autora causando-lhe dano moral

78 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Na falta de criteacuterios objetivos para a configuraccedilatildeo do dano moral a questatildeo vem se tornando tormentosa na doutrina e na jurisprudecircncia levando o julgador a situaccedilatildeo dc perplexidade Ultrapassadas as fases de irreparabilidade do dano moral e da sua inacumulabilidade com o dano material corremos agora o risco de ingressarmos na fase da sua industrializaccedilatildeo onde o aborrecimento banal ou mera sensibilidade satildeo apresentados como dano moral em busca de indenizaccedilotildees milionaacuteriasTenho entendido que na soluccedilatildeo dessa questatildeo cumpre ao juiz seguir a trilha da loacutegico do razoaacutevel em busca da sensibilidade eacutetico-social norshymal Deve tomar por paradigma o cidadatildeo que se coloca a igual distacircnshycia do homem frio insensiacutevel e o homem de extremada sensibilidadeNessa linha de princiacutepio soacute deve ser reputado como dano moral a dor vexame sofrimento ou humilhaccedilatildeo que fugindo agrave normalidade interfira intensamente no comportamento psicoloacutegico do indiviacuteduo causando-lhe afliccedilotildees anguacutestia e desequiliacutebrio em seu bem-estar Mero dissabor aborrecimento maacutegoa irritaccedilatildeo ou sensibilidade exacerbada estatildeo fora da oacuterbita do dano moral porquanto aleacutem de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia no trabalho no tracircnsito entre os amigos e ateacute no ambiente familiar tais situaccedilotildees natildeo satildeo intensas e duradouras a ponto de romper o equiliacutebrio psicoloacutegico do indiviacuteduo Se assim natildeo se entender acabaremos por banalizar o dano moral ensejando accedilotildees judiciais em busca de indenizaccedilotildees pelos mais triviais aborrecimentosTomando-se com o paradigma o homem normal parece-me que ninshygueacutem pode negar que fere a sensibilidade do profissional seacuterio comshypetente responsaacutevel e configura humilhaccedilatildeo dolorosa ser tachado de relapso faltoso e alcooacutelatra em notiacutecia publicada em revista de grande circulaccedilatildeo E a autora natildeo eacute detentora desses defeitos pois caso contraacuteshyrio natildeo teria chegado aonde chegouA notiacutecia pelo que se infere das reportagens de f 168177 natildeo era verdadeira eis que a apelada durante a gravaccedilatildeo da novela ldquo De corpo e Almardquo natildeo faltou aos seus compromissos profissionais nem quando fraturou uma pema (f 169) pelo que foi considerada um exemplo de profissionalismoMesmo que assim natildeo fosse natildeo havia justificativa para a divulgaccedilatildeo de um fato da vida privada da autora que se verdadeiro fosse seria do exclusivo interesse do seu empregador O direito agrave privacidade segunshydo a doutrina da Suprema Corte dos Estados Unidos universalmente aceita eacute o direito que toda pessoa tem de estar soacute de ser deixada em paz e de tomar sozinha as decisotildees na esfera de sua privacidade O ponto nodal desse direito na precisa liccedilatildeo do jaacute citado Carlos Alberto Bittar encontra-se na exigecircncia de que o isolamento mental insista no psishyquismo humano que leva a pessoa a natildeo desejar que certos aspectos de sua personalidade e de sua vida cheguem ao conhecimento de terceiros

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 79

Limila-se com esse direito o quanto possiacutevel a inserccedilatildeo dc estranho na esfera privada ou iacutentima da pessoa Satildeo elementos a vida privada o lar a famiacutelia etc No campo do direito agrave intimidade satildeo protegidos dentre outros os seguintes bens confidecircncias informes de ordem pesshysoal recordaccedilotildees pessoais memoacuterias relaccedilotildees familiares vida amorosa ou conjugal sauacutede fiacutesica ou mental afeiccedilotildees atividades domeacutesticas etc Esse direito conclui reveste-se das conotaccedilotildees fundamentais dos direitos da personalidade devendo-se enfatizar a sua condiccedilatildeo de dishyreito negativo ou seja expresso exatamente pela natildeo exposiccedilatildeo a coshynhecimento de terceiro de elementos particulares da esfera reservada do titular Nesse sentido pode-se acentuar que consiste no direito de impedir o acesso a terceiros nos domiacutenios da confidencialidade (obra citada p 103-104)Costuma-se ressalvar no tocante agrave inviolabilidade da intimidade a pesshysoa dotada de notoriedade principalmente quando exerce vida puacutebica Fala-se entatildeo nos chamados ldquo direito agrave informaccedilatildeo e direito agrave histoacuteriardquo a tiacutetulo de justificar a revelaccedilatildeo de fatos de interesse puacuteblico independenshytemente da anuecircncia da pessoa envolvida Entende-se que nesse caso existe reduccedilatildeo espontacircnea dos limites da privacidade (como ocorre com os poliacuteticos atletas artistas e outros que se mantecircm em contato com o puacuteblico) Mas o limite da confidencialidade persiste preservado sobre fatos iacutentimos sobre a vida familiar etc natildeo eacute liacutecita a divulgaccedilatildeo sem o consentimento do interessadoE assim eacute segundo essa mesma doutrina porque a vida dessas pessoas compreende um aspecto voltado para o exterior e outro voltado para o interior A vida exterior que envolve a pessoa nas relaccedilotildees sociais e nas atividades puacuteblicas pode ser objeto das pesquisas c das divulgaccedilotildees de terceiros porque eacute puacuteblica A vida interior todavia que se debruccedila sobre a mesma pessoa sobre os membros de sua famiacutelia sobre seus amigos integra o conceito de vida privada inviolaacutevel nos termos da ConstituiccedilatildeoPelo que ateacute aqui ficou exposto a sentenccedila natildeo merece nenhum reparo nos pontos jaacute examinados O mesmo natildeo ocorre todavia no que respeishyta ao quantum da indenizaccedilatildeo fixada pelo eminente Juiz sentenciante natildeo obstante dos mais cultos e talentosos da magistratura fluminenseO arbitramento do valor da indenizaccedilatildeo pelo dano moral eacute outra questatildeo que deve merecer a atenccedilatildeo do julgador para natildeo nos tornarmos imitashydores do direito norte-americano onde as indenizaccedilotildees pelo dano moral atingem somas milionaacuterias vultosiacutessimas sem qualquer base cientiacutefica ou juriacutedicaLembro que os primeiros julgados concedendo reparaccedilatildeo pelo dano moral falavam em uma compensaccedilatildeo pela dor pelo sofrimento algo que pudesse substituir a tristeza pela alegria como uma televisatildeo um

80 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

aparelho de som (entre as classes mais humildes) uma viagem de feacuterias (para as pessoas mais abastadas) etc Hoje jaacute temos notiacutecias de decisotildees concedendo indenizaccedilotildees astronocircmicas centenas e agraves vezes ateacute mesmo milhares de salaacuterios miacutenimos a tiacutetulo de dano moral sem qualquer crishyteacuterio loacutegico ou juriacutedicoEstou convencido de que o arbitramento judicial continua sendo o meio mais eficiente para se fixar o dano moral e que nessa penosa tarefa natildeo estaacute o Juiz subordinado a nenhum limite legal nem a qualquer tabela prefixada mormente apoacutes a Constituiccedilatildeo de 88 Em vaacuterios julgamenshytos anteriores (Ap Ciacutevel n 348592 6a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel n 324194 8a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel n 521394 2a Cacircmara Ciacutevel) tive a oportunidade de manifestar o meu entendimento a este respeito e que agora reiteroNatildeo se questiona a natureza especial da Lei de Imprensa nem o prinshyciacutepio segundo o qual a lei especial afasta a incidecircncia da geral Quesshytiona-se apenas otilde poder que alguns querem atribuir agrave Lei de Imprensa a ponto de poder limitar restringir e ateacute de tornar inoacutecuos direitos que foram consagrados pela nova ordem constitucional posterior e supeshyrior agravequela Lei infraconstitucional alguma eacute de todos sabido subsiste agrave ordem juriacutedica estabelecida por uma nova Constituiccedilatildeo naquilo que com ela for incompatiacutevel ou restritiva Importa dizer que se a Constishytuiccedilatildeo confere direitos subjetivos que antes eram vedados ou limitados pela lei ordinaacuteria tal lei perde imediatamente a sua eficaacutecia Seria um contrassenso pretender que norma superior nascesse limitada por lei inshyferiorA liccedilatildeo dos insignes Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins vem bem ao casoEacute loacutegico que a regra eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo pode ser interpretada a partir da legislaccedilatildeo infraconstitucional Trata-se de particularidade proacuteshypria da Lei Maior o natildeo poder ela tomar por referencial interpretativo outras normas do sistema Tal fenocircmeno dejlui do seu caraacuteter inicial e inovador A Constituiccedilatildeo eacute o marco a partir do qual se erige a ordem juriacutedica Seria um contrassenso admitir-se que o que lhe vem abaixo (diriacuteamos noacutes tambeacutem antes) - devendo portanto sofrer o seu influxo - viesse de repente a insurgir-se contra esta ordem loacutegica fornecendo criteacuterios para a inteligecircncia do proacuteprio preceito que lhe serve de fundashymento de validade (Com agrave Constituiccedilatildeo do Brasil Ed Saraiva 1988 Io volume p 349-350)Recorde-se entatildeo que antes da Constituiccedilatildeo de 1988 havia grande disshycussatildeo doutrinaacuteria e jurispaidencial em torno de reparabilidade do dano moral Numa primeira fase entendeu-se que ele natildeo era indenizaacutevel passando-se jaacute na segunda fase a admitir a indenizaccedilatildeo desde que natildeo acumulada com o dano material Foi nesse quadro que veio a lume a

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 81

Lei de Imprensa em fevereiro de 1967 dando um passo no sentido da reparaccedilatildeo do dano moral tiacutemido todavia posto que soacute para os casos de crimes contra a honra No momento em que nova Constituiccedilatildeo atenshydendo os reclamos da realidade social moderna consagrou amplamente a reparabilidade do dano moral tal como se fez no seu artigo 5deg incisos V X e outros mais tornou-se inconcebiacutevel data venia negar essa repashyrabilidade ou restringi-la pelo enfoque de leis ordinaacuterias anteriores o que constituiria uma total inversatildeo de princiacutepios e valoresNesse sentido o brilhante acoacuterdatildeo da Ia Cacircmara Ciacutevel deste Tribunal de Justiccedila no julgamento da Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg526091 do qual foi relator o eminente Desembargador Carlos Alberto Direito A ementa desse v acoacuterdatildeo na parte relativa ao tema em debate diz assimA indenizaccedilatildeo por dano moral com a Constituiccedilatildeo de 1998 eacute igual para todos inaplicaacutevel o privileacutegio de limitar o valor da indenizaccedilatildeo para a empresa que explora o meio de informaccedilatildeo e divulgaccedilatildeo (Lei de Imshyprensa) mesmo porque a natureza da regra constitucional eacute mais ampla indo aleacutem das estipulaccedilotildees da lei de imprensaMas estou igualmente convencido de que se o juiz natildeo fixar com prushydecircncia e bom senso a indenizaccedilatildeo pelo dano moral vamos tomaacute-lo inshyjusto c insuportaacutevel como de resto jaacute vem ocorrendo em alguns paiacuteses comprometendo a imagem da justiccedilaO princiacutepio da razoabilidade inserto no artigo 1059 do Coacutedigo Civil para a fixaccedilatildeo do lucro cessante pode e deve ser adotado pelo juiz no arbitramento do dano moral Razoaacutevel eacute aquilo que eacute sensato comedishydo moderado que guarda certa proporcionalidade Importa dizer que o juiz ao valorar o dano moral deve arbitrar uma quantia que de acordo com o seu prudente arbiacutetrio seja compatiacutevel com a reprovabilidade da conduta iliacutecita e a gravidade do dano por ela produzido Deve-lhe tamshybeacutem servir de norte aquele outro princiacutepio que veda que o dano se transshyforme em fonte de lucro Se a reparaccedilatildeo deve ser a mais ampla possiacutevel a indenizaccedilatildeo natildeo se destina a enriquecer a viacutetima Entre esses dois limites deve se situar o bom senso do julgador Qualquer quantia a mais do que a necessaacuteria agrave reparaccedilatildeo do dano importaraacute em enriquecimento sem causa ensejador de novo danoNa liccedilatildeo do insigne Caio Maacuterio dois motivos ou duas causas estatildeo conjugados na reparaccedilatildeo por dano moral 1) puniccedilatildeo ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem juriacutedico da viacutetima posto que imaterial 2) pocircr nas matildeos do ofendido uma soma que natildeo eacute o pretium doloris poreacutem o meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfaccedilatildeo de qualquer espeacutecie seja de ordem intelectual ou moral seja mesmo de cunho material o que pode ser obtido no fato de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa Recomenda todavia o mestre fazendo referecircncia ao seu anteprojeto de obrigaccedilotildees que esse

82 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

arbitramento deve ser moderado e equitativo para que se natildeo converta o sofrimento em moacutevel de captaccedilatildeo de lucro (o lucro capiendo) (Responshysabilidade Civil Forense p 315-316)Em suma o bom senso deve nortear o juiz no exame do caso concreto concedendo e graduando a indenizaccedilatildeo pelo dano moral de acordo com a reprovabilidade da conduta iliacutecita a intensidade e duraccedilatildeo do sofrishymento experimentado pela viacutetima a capacidade econocircmica do causador do dano as condiccedilotildees pessoais do ofendido etcEsta Cacircmara em inuacutemeros julgamentos anteriores tem procurado arbishytrar o dano moral com razoabilidade e moderaccedilatildeo motivo pelo qual afishygura-se-me absolutamente excessiva fora da realidade socioeconocircmica brasileira uma indenizaccedilatildeo de 4 mil salaacuterios miacutenimos hoje equivalente a quatrocentos mil reais Eacute quantia que algueacutem que ganhe cerca de cem mil reais por ano correspondente ao mais elevado salaacuterio pago pela administraccedilatildeo puacuteblica levaria mais de 4 anos para amealharParece-me que uma indenizaccedilatildeo de 500 salaacuterios miacutenimos equivalente a 50 mil reais eacute mais do que suficiente para servir de lenitivo para o dissashybor experimentado pela autora e de puniccedilatildeo para a reacute sem chegarmos ao extremo de transformar o dano moral em fonte de enriquecimento sem causaDestarte o meu voto eacute no sentido de dar provimento parcial agrave apelaccedilatildeo para o fim de reduzir a indenizaccedilatildeo para 500 salaacuterios miacutenimosQuanto ao recurso adesivo da autora deve ser conhecido porque em tese foi parcialmente vencida porquanto recebeu menos do que pleishyteou Contudo em face do que jaacute ficou exposto deve ser-lhe negado provimento na parte em que pede a elevaccedilatildeo do quantum indenizatoacuterio bem como no respeitante aos juros de mora a partir do evento A norma do artigo 962 do C Civil soacute eacute aplicaacutevel nos casos de obrigaccedilatildeo proveshyniente de delito assim entendido o iliacutecito penal e natildeo mero iliacutecito civil como no caso dos autosPor todo o exposto salvo quanto ao valor da indenizaccedilatildeo reduzida para 500 (quinhentos) salaacuterios miacutenimos a sentenccedila deve ser mantida por seus juriacutedicos fundamentosRio de Janeiro 23 de abril de 1996

DES THIAGO R IBA S FILHO PRESIDENTE

DES SEacuteRG IO CAVALIERI FILHO RELATOR

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 83

1) Situaccedilatildeo de conflitoMaria Zilda Bethelm Vieira acusa a Editora Abril SA de publicaccedilatildeo

ofensiva agrave sua honra e agrave sua intimidade por publicar na Revista Veja na seccedilatildeo Gente que a atriz durante as gravaccedilotildees da novela ldquo Olho por olhordquo leria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada

2) TeseA Revista Veja ofendeu a honra e invadiu a intimidade da atriz Por

essa razatildeo deve-lhe indenizar por danos morais com valor compatiacutevel com o grau de reprovaccedilatildeo da conduta iliacutecita e com a gravidade do dano produshyzido

3) Contextualizaccedilatildeo do real

Fatos favoraacuteveis agrave tese1) Segundo consta nos autos (f 168177) estaacute comprovado medianshy

te um exemplar da Veja que ela publicou que a autora durante a gravaccedilatildeo da novela ldquo Olho por olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada

2) A atriz segundo consta nos autos (f 169) eacute considerada um exemshyplo de profissionalismo por nunca ter faltado agrave gravaccedilatildeo da novela ldquoDe corpo e almardquo mesmo quando fraturou uma perna

3) De acordo com os autos a vendagem da Revista Veja e conseshyquentemente a repercussatildeo dos fatos noticiados eacute expressiva

4) A sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido da autora e condenou a reacute a pagar quatro mil salaacuterios miacutenimos

Fatos desfavoraacuteveis agrave teseSegundo consta dos autos f 4204391) A notiacutecia foi publicada com os verbos na forma condicional como

mandam todos os manuais de imprensa2) A sentenccedila incorre em engano quando afasta a aplicaccedilatildeo da Lei de

Imprensa no presente caso trazendo agrave colaccedilatildeo acoacuterdatildeo do STJ

4) Hipoacuteteses1) Jaacute que segundo consta nos autos (f 168177) estaacute comprovado

mediante um exemplar da Veja que ela publicou que a autora durante a gravaccedilatildeo da novela ldquoOlho por olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

chegar alcoolizada teriam sido divulgadas informaccedilotildees que natildeo pertencem agrave vida externa de Maria Zilda mas agrave sua esfera iacutentima

2) Uma vez que a atriz segundo consta nos autos (f 169) eacute consishyderada um exemplo de profissionalismo por nunca ter faltado agrave gravaccedilatildeo da novela ldquo De corpo e almardquo mesmo quando fraturou uma perna teria sido ofendida natildeo soacute em sua honra objetiva mas tambeacutem em sua honra subjetiva

3) Tendo em vista que a sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido da autora e condenou a reacute a pagar quatro mil salaacuterios miacutenimos teria interpretado com acerto a Constituiccedilatildeo salvo quanto ao valor por ela arbitrado

Capiacutetulo V

FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Fundamentar conforme visto anteriormente eacute condiccedilatildeo de validade de toda decisatildeo judicial (arts 165 e 458 do CPC) Mas natildeo apenas o juiz tem a obrigaccedilatildeo de fundamentar suas decisotildees Tambeacutem os advogados quando formulam suas teses devem fundamentaacute-las consistentemente de modo que natildeo sejam tidas como natildeo razoaacuteveis

Mas se a simples subsunccedilatildeo do fato agrave norma natildeo caracteriza a proshyposta argumentativa - e sim apenas um procedimento demonstrativo - o que deve fazer o operador do Direito para dar a seu discurso status de arshygumentaccedilatildeo Quais procedimentos devem ser adotados e qual metodologia de construccedilatildeo de sentido deve ser operacionalizada para que se sustente efetivamente uma tese persuasiva Como enfim pocircr em praacutetica o que Perelman apontou como argumentaccedilatildeo juriacutedica

51 SELECcedil Atilde O E ORGANIZACcedilAtildeO DAS ID EIA S ARGUM ENTATIVAS

A produccedilatildeo do texto juriacutedico-argumentativo tal como a de qualquer texto natildeo pode ser fruto da improvisaccedilatildeo e do amadorismo Selecionar e organizar as ideias a serem desenvolvidas eacute imprescindiacutevel para a eficiecircnshycia do resultado final Aquele que conta com a fluecircncia do pensamento e com o meacutetodo frequentemente denominado brainstorming (tempestade de ideias) corre uma seacuterie de riscos que leva quase inevitavelmente a uma proshyduccedilatildeo truncada pouco criativa inconsistente e natildeo raro com problemas de coesatildeo e de coerecircncia

Apenas o profissional muito qualificado em termos redacionais e basshytante conhecedor da temaacutetica em pauta pode se arriscar a produzir um texto sem planejamento redacional e argumentativo Mesmo assim repare que

86 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

estamos falando em ldquo se arriscarrdquo pois sem duacutevidas o mais aconselhaacutevel eacute planejar cuidadosamente a produccedilatildeo textual que seraacute redigida

Quando falamos em planejamento cuidadoso natildeo estamos necessashyriamente dizendo planejamento minucioso O momento da redaccedilatildeo propriashymente dito deve ser relativamente livre a fim de que o argumentador natildeo fique limitado ao mero encadeamento de palavras ou trechos Poreacutem se o planejamento foi feito com cuidado e esmero se a organizaccedilatildeo de sentidos eacute loacutegica e razoaacutevel o momento da escrita torna-se um fluir prazeroso de ideias que promovem um resultado final simples claro e muito inteligente

Qualquer texto de qualidade precisa portanto passar pela fase do planejamento mas o texto juriacutedico-argumentativo apresenta ainda mais uma demanda especiacutefica a necessidade de que a argumentaccedilatildeo seja persuasiva a tal ponto que o seu auditoacuterio acolha a tese sem restriccedilotildees de valores ou sem questionamentos de ordem teacutecnico-profissional

Em outras palavras um texto pode estar bem organizado em termos de paraacutegrafo as partes denominadas introduccedilatildeo desenvolvimento e conshyclusatildeo podem ser adequadamente observadas eventualmente natildeo enconshytramos sequer desvios de norma culta poreacutem nada disso garante que a argumentaccedilatildeo seja eficiente e persuasiva

Em sala de aula quando avaliamos e comentamos paraacutegrafo a paraacuteshygrafo o texto de nossos alunos pode ocorrer que natildeo haja qualquer criacutetica aos argumentos desenvolvidos nem mesmo do ponto de vista da estrutura sugerida a cada um deles Curiosamente ao teacutermino da leitura podemos ficar com a sensaccedilatildeo de que o texto natildeo eacute consistente

Eacute difiacutecil explicar que o texto ldquonatildeo estaacute bomrdquo se natildeo conseguimos apontar o dedo em um paraacutegrafo ou trecho e justiccedilar a ineficiecircncia daquela produccedilatildeo com a caneta vermelha em riste circulando fragmentos e corrishygindo frases

O convencimento e a eficiecircncia argumentativa na peccedila processual satildeo tratados portanto em um ldquoplano mais complexordquo isto eacute a justificativa para a sua revisatildeo extrapola a mera tessitura coesiva das frases e das oraccedilotildees

Para ilustrar o que estamos defendendo recorreremos a um caso conshycreto Inicialmente vamos enfrentar as situaccedilotildees cada vez mais frequenshytes em que o advogado se depara com um caso criminal que tecnicamente falando natildeo deixa margem de duacutevida quanto agrave aplicaccedilatildeo da lei positivada no entanto o clamor popular e a influecircncia midiaacutetica forccedilam decisatildeo judishycial contraacuteria agrave aplicaccedilatildeo dos dispositivos legais pertinentes por entender que nesses casos a norma tomar-se-ia injusta

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Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 87

O caso adiante eacute impactante mas se presta agraves necessidades deste moshymento

Maria do Carmo de 31 anos matou Robson seu vizinho de 15 anos depois que o adolescente violentou seu filho de apenas trecircs anos de idade O crime aconteceu dentro da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Satildeo Carlos enquanto era registrada a ocorrecircncia da agressatildeo sexual agrave crianccedilaSebastiatildeo Terteluano de 35 anos surpreendeu o filho caccedilula sendo vioshylentado pelo vizinho num bambuzal do distrito de Santa Eudoacutexia na zona rural de Satildeo Carlos O rapaz fugiu A poliacutecia foi acionada e ele foi preso em casaO adolescente e os pais da crianccedila foram levados agrave Delegacia de Defesa da Mulher para o registro de ocorrecircncia Por volta das 13h a crianccedila foi encaminhada ao Pronto-Socorro para exame de corpo de delito para confirmar a violecircncia sexual em companhia do pai e de um policial militar Maria do Carmo Robson e outro PM permaneceram ali De repente Maria do Carmo atacou Robson cravando-lhe um a faca de coshyzinha no pescoccedilo O adolescente morreu no localO autor do crime jaacute tinha passagens pela poliacutecia por furto e havia cumshyprido medida socioeducativa junto ao Nuacutecleo de Atendimento Integrado (NAI) que atende menores infratores na cidadeMaria do Carmo foi presa em flagrante e levada agrave Cadeia Feminina de Ribeiratildeo Bonito deixando com o marido seus seis filhos com idades entre 3 e 13 anos Segundo o delegado Mauriacutecio Dotta da Delegacia de Investigaccedilotildees Gerais (DIG) de Satildeo Carlos a matildee da crianccedila violentada disse que matou o adolescente porque ele a teria provocado afirmando que por ser menor natildeo ficaria presoldquo Estou tatildeo surpresa quanto os senhores (jornalistas) TNunca imaginei que ela fosse praticar esse atordquo declarou a delegada E lelze Martins que atendia a ocorrecircncia na hora do crime A policial destacou que Maria do Carmo retirou uma faca debaixo da blusa Como a mulher era viacutetima do crime a Poliacutecia Militar natildeo efetuou uma revista detalhada nela para apurar se ela estava armada ou natildeo dentro da delegacia- A Delegacia de Investigaccedilotildees Gerais (D IG ) vai apurar agora onde a m ulher conseguiu a facaO advogado da mulher disse que a sua cliente mulher humilde analshyfabeta matildee de famiacutelia estava transtornada ldquo Eacute d ifiacutec il uma matildee que tem um filho de 3 anos violentado natildeo ficar emocionalmente deseshyquilibradardquo disse Ele deveraacute entrar com pedido de relaxamento da prisatildeo

Para o delegado Mauriacutecio Dotta a mulher contou que encontrou a faca dentro da garagem da DDM Depois contou que trouxe o objeto de casa O menino de 3 anos estaacute sob os cuidados do Conselho Tutelar Ele deveraacute ser submetido a uma cirurgia no acircnus para recompor o oacutergatildeo

(Adaptado da Internet Fonte desconhecida)

Natildeo haacute duacutevida quanto agrave aplicaccedilatildeo do artigo 121 do Coacutedigo Penal segundo o qual matar eacute crime puniacutevel com reclusatildeo Natildeo entraremos na discussatildeo sobre a aplicaccedilatildeo de possiacuteveis qualificadoras Tambeacutem natildeo preshytendemos apreciar a possibilidade juriacutedica de diminuir a pena com base na violenta emoccedilatildeo Partimos do pressuposto de que doloso ou culposo qualificado ou privilegiado houve homiciacutedio e a reacute seraacute condenada Isso eacute certo natildeo eacute mesmo

Pois bem No caso narrado o Tribunal do Juacuteri em Satildeo Carlos absolveu a reacute pela segunda vez em 07 de fevereiro de 2006 A tese que motivou a sentenccedila foi a da legiacutetima defesa Ora qualquer estudante de Direito que jaacute passou pelo estudo da parte geral do Coacutedigo Penal brasileiro sabe que essa tese eacute incompatiacutevel com o caso concreto Seria essa uma oportunidade em que os jurados por falta de motivaccedilatildeo mais apropriada para absolver uma matildee e fazer o que ele entende por justiccedila ldquo aplicam mal a leirdquo Trata-se de impropriedade teacutecnica decorrente de serem os jurados ldquo homens do povordquo Arriscamos dizer que o juiz togado responsaacutevel por lavrar a sentenccedila talvez decidisse monocraticamente naquele contexto da mesma maneira

O advogado que defende os interesses da reacute - matildee do menino viacutetima de violecircncia sexual - precisaria ter a sensibilidade humana de perceber que aquele contexto favorecia o pedido de absolviccedilatildeo (tese da legiacutetima defesa) e natildeo apenas a pena mais branda (tese de homiciacutedio privilegiado pela vioshylenta emoccedilatildeo)

Um caso concreto com esse teor apelativo quando potildee de um lado uma excludente de ilicitude (legiacutetima defesa) e de outro uma causa de diminuishyccedilatildeo de pena (violenta emoccedilatildeo apoacutes a injusta provocaccedilatildeo do ofendido) leva o advogado a refletir muito aleacutem da aplicaccedilatildeo deste ou daquele dispositivo O que estaacute em jogo aqui satildeo os valores sociais dominantes que condenam ou natildeo matildees que vingam seus filhos quase bebecircs viacutetimas de violecircncia sexual contra adolescentes infratores com histoacuterico de violecircncia

Perceba que natildeo estamos sustentando nem a condenaccedilatildeo nem a abshysolviccedilatildeo mas ignorar essa problcmatizaccedilatildeo do caso concreto eacute mostrar-se um advogado ineficiente

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 89

Se pretendemos a condenaccedilatildeo com pena mais branda eacute preciso enshyfrentar cuidadosamente a necessidade de respeito agraves normas juriacutedicas sob pena de violar os princiacutepios mais baacutesicos de um Estado Democraacutetico de Direito Precisariacuteamos sustentar que a absolviccedilatildeo da reacute eacute uma maneira deshyturpada de fazer justiccedila pois o mal provocado seria muito pior que o da proacutepria condenaccedilatildeo pois toda a sociedade sofreria com as consequecircncias ilessa decisatildeo natildeo teacutecnica

Caso optemos por sustentar a absolviccedilatildeo pela tese da legiacutetima defesa como desenvolver essa fundamentaccedilatildeo Certamente o argumento de autoshyridade natildeo seria o mais adequado por falta de fontes - na lei na doutrina c na jurisprudecircncia - que sustentem com consistecircncia a validade desse rashyciociacutenio

Outros desdobramentos de difiacutecil soluccedilatildeo o senso comum sozinho poderia motivar uma decisatildeo judicial especialmente quando manifestashymente contraacuterio agrave lei A conduta de trazer a faca de casa (premeditaccedilatildeo) afasta logicamente a violenta emoccedilatildeo (fruto de ato impensado impulsivo) ou premeditaccedilatildeo e violenta emoccedilatildeo seriam conciliaacuteveis

Lembremos que natildeo estamos aqui para dar aula de Direito Penal mas a motivaccedilatildeo condutora de nossa reflexatildeo eacute uma argumentaccedilatildeo juriacutedica seraacute eficiente se natildeo resolver essas questotildees

Sustentamos que definida a tese (que pode ser de acusaccedilatildeo ou de defesa) o enfrentamento argumentativo do caso pode seguir caminhos absolutamente diferentes Os problemas a resolver satildeo determinados por essas escolhas e cada ponto da argumentaccedilatildeo recorreraacute aos argumentos mais eficientes Esta seraacute outra questatildeo tormentosa a qual(is) argumento(s) recorrer em cada ponto da argumentaccedilatildeo

Por ora continuemos a questionar o Tribunal do Juacuteri de Satildeo Carlos (interior de Satildeo Paulo) possui peculiaridades distintas das observadas no Tribunal do Juacuteri do Rio de Janeiro Seraacute que essa decisatildeo que data de 2006 seria a mesma hoje Se fosse o pai da crianccedila a matar o adolescente agressor de seu filho e natildeo a matildee seraacute que a decisatildeo seria a mesma Jaacute que a reacute tinha seis filhos os jurados consideraram a situaccedilatildeo das crianccedilas sem a presenccedila da matildee encarcerada E se natildeo houvessem outras crianccedilas

Enfim iniciamos esse capiacutetulo apenas chamando a atenccedilatildeo do leitor para a importacircncia argumentativa das questotildees natildeo propriamente teacutecnicas do direito material Esperamos suscitar o gosto pela discussatildeo de teor absshytrato com caraacuteter reflexivo-argumentativo a fim de qualificar as produccedilotildees que hoje na maioria primam pela repeticcedilatildeo e pela mesmice na contramatildeo do que a modernidade parece estar vislumbrando

90 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Nos capiacutetulos anteriores vimos que o sucesso na defesa de uma tese depende de um raciociacutenio fundamentado por meio de uma seacuterie de assoshyciaccedilotildees a serem feitas pelo argumentador A maneira como o operador do Direito deve direcionar o raciociacutenio para a tese depende portanto de plashynejamento adequado do texto e da seleccedilatildeo apurada de informaccedilotildees

Na produccedilatildeo das peccedilas processuais o prejuiacutezo pela falta de organizashyccedilatildeo de um plano textual talvez fique mais evidente porque a persuasatildeo do magistrado e o consequente sucesso na demanda satildeo favorecidos por esse encadeamento

A coerecircncia e a validade de determinados institutos juriacutedicos depenshydem natildeo raro da ordem em que satildeo apresentados Exemplificando essa questatildeo pensemos na situaccedilatildeo de uma consumidora cujos cabelos caiacuteram quando da utilizaccedilatildeo de uma tintura capilar Pretende a lesada indenizaccedilatildeo por danos morais e materiais em virtude do ldquo fato do produtordquo 1

E certo que a indenizaccedilatildeo constitui o objetivo final do argumentashydor Devemos comeccedilar entatildeo pela sustentaccedilatildeo minuciosa das razotildees que demonstram a existecircncia do dano Sugerimos que natildeo O dano eacute fruto de outros pontos relevantes que natildeo podem ser ignorados na sequecircncia argu- mentativa

Para esclarecer vamos lembrar que a indenizaccedilatildeo eacute uma forma de compensar e de ressarcir o lesado Em contrapartida sanciona quem violou o direito e atua pedagogicamente para que tais situaccedilotildees deixem de continuar ocorrendo Assim o dano eacute fruto da violaccedilatildeo de uma obrigaccedilatildeo juriacutedica

Se assim o eacute como fundamentar minuciosamente o direito agrave indenishyzaccedilatildeo se o magistrado sequer conhece qual obrigaccedilatildeo foi descumprida O dever juriacutedico violado pode ser a necessidade de informar eventuais efeitos colaterais (princiacutepio da informaccedilatildeo - art 6deg III e art 9deg do CDC) ou a proteccedilatildeo da sauacutede do consumidor (art 6deg I do CDC) por exemplo

ldquo Ftiacuteo do produto e fato do serviccedilo satildeo institutos juriacutedicos Necessaacuteria eacute a distinccedilatildeo preliminar entre viacutecio e defeito Em ambos o produto desenvolve comportamento atiacutepico sendo que quando a anomalia resulta apenas em deficiecircncia no funcionashymento do produto ou serviccedilo mas natildeo coloca em risco a sauacutede ou seguranccedila do consumidor natildeo se fala em defeito mas eni viacutecio Portanto fato do produto ou serviccedilo estaacute ligado a defeito que por sua vez estaacute ligado a dano Desse modo temos a noccedilatildeo de fato do produto tambeacutem chamado de acidente de consumo que eacute o evento danoso verificado pela utilizaccedilatildeo de produto eivado de defeitordquo (QUEIshyROZ Ricardo Canguccedilu Barroso de Responsabilidade pelo fato do produto e do serviccedilo e responsabilidade pelo viacutecio do produto e do serviccedilo -paralelo Disponiacuteshyvel em lthttpwwwujgoiascombrgt Acesso em 01 jun 2002)

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Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 91

As obrigaccedilotildees das partes em uma relaccedilatildeo juriacutedica (neste caso relaccedilatildeo de consumo) servem de fundamento para suscitar a existecircncia da responshysabilidade civil de onde emana o dever de indenizar Esquematicamente poderiacuteamos assim representar a relaccedilatildeo entre os institutos de que precisashymos para argumentar

Obrigaccedilotildees juriacutedicas

estabelecidascm uma relaccedilatildeo de

consumo

O descump ri mento desse dever pela reacute gerou danos

agrave consumidora (nexo causal entre conduta e

resultado)

pound

A responsabilidade civil pelo evento

enseja o direito agrave indenizaccedilatildeo

a) obrigaccedilatildeo de informar K laquo r - - o M s A r v i d a o r - Indenizaccedilatildeo por

b) obrigaccedilatildeo de E3 sect gt CIVIL bull J3 l a danosmoraiserespeitara sauacutede do OBJETIVA H j f l l l p j materiais

consumidor I

Em siacutentese a argumentaccedilatildeo que pretende sustentar o direito agrave indeshynizaccedilatildeo por danos morais e materiais em decorrecircncia do fato do produto (queda do cabelo) deve em primeiro lugar sustentar que a reacute tinha uma obrigaccedilatildeo - ou mais de uma - fruto da relaccedilatildeo de consumo a(s) qual(is) deixou de observar Em seguida mostrar que a violaccedilatildeo desse dever juriacutedishyco gerou danos para a autora-consumidora e responsabilidade civil para a reacute-empresa A indenizaccedilatildeo eacute fruto desse percurso loacutegico

Ainda que muitos profissionais comccem o texto argumentativo jaacute estabelecendo relaccedilatildeo entre o direito de indenizaccedilatildeo e os danos sofridos subverter a ordem proposta eacute produzir uma fundamentaccedilatildeo apartada da coerecircncia e da consistecircncia

E certo que nossa intenccedilatildeo com o exemplo analisado natildeo eacute tratar da mateacuteria juriacutedica relativa ao Direito do Consumidor mas mostrar que a loacuteshygica argumentativa no Direito natildeo eacute apenas gramatical ou textual depende tambeacutem do domiacutenio baacutesico dos raciociacutenios proacuteprios dessa ciecircncia

Conheccedila mais um caso concreto a seguir a partir do qual seratildeo desenshyvolvidos indutivamente os passos para a estruturaccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo de uma peccedila juriacutedica2

2 Essa metodologia de trabalho eacute endossada pela proposta da Professora Harriet Chrisshytiane Zitscher (ZITSCHER Harriet Christiane Metodologia do ensino juriacutedico com casos teoria e praacutetica Belo Horizonte Del Rey 2004)

92 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

CASO CONCRETOApoacutes relacionamento de um ano e meio Maria e Joatildeo tiveram um filho Gustavo Cinco meses apoacutes o nascimento da crianccedila Joatildeo pocircs fim ao relacionamento com Maria e voltou a morar com seus pais Maria e Gustavo passam por graves problemas financeiros A matildee tem dificulshydade ateacute mesmo de comprar comida para a crianccedila Diante da negatishyva de prestar auxiacutelio financeiro ao filho eacute ajuizada accedilatildeo de alimentos em face do pai Joatildeo o qual alega impossibilidade dc cumprir com tal obrigaccedilatildeo na medida em que estaacute desempregado e tem vaacuterias diacutevidas a serem pagas Maria afirma que apesar do desemprego o requerido manteacutem elevado padratildeo de vida pois eacute sustentado pelos avoacutes paternos do menino que possuem vaacuterios imoacuteveis alugados como fonte de renda aleacutem de aposentadoria no valor de RS 680000O que diz a legislaccedilatildeo sobre esse assunto

Lei 10406 de 1001200 (Coacutedigo Civil brasileiro)Subtiacutetulo III

Dos Alimentos

Art 1694 Podem os parentes os cocircnjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compashytiacutevel com a sua condiccedilatildeo social inclusive para atender agraves necessidades de sua educaccedilatildeosect I o Os alimentos devem ser fixados na proporccedilatildeo das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigadasect 2o Os alimentos seratildeo apenas os indispensaacuteveis agrave subsistecircncia quando a situaccedilatildeo de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteiaArt 1695 Satildeo devidos os alimentos quando quem os pretende natildeo tem bens suficientes nem pode prover pelo seu trabalho agrave proacutepria manten- ccedila e aquele de quem se reclamam pode fornececirc-los sem desfalque do necessaacuterio ao seu sustentoArt 1696 O direito agrave prestaccedilatildeo de alimentos eacute reciacuteproco entre pais e filhos e extensivo a todos os ascendentes recaindo a obrigaccedilatildeo nos mais proacuteximos em grau uns em falta de outrosArt 1697 Na falta dos ascendentes cabe a obrigaccedilatildeo aos descendentes guardada a ordem de sucessatildeo e faltando estes aos irmatildeos assim gershymanos como unilateraisArt 1698 Se o parente que deve alimentos em primeiro lugar natildeo estiver em condiccedilotildees de suportar totalmente o encargo seratildeo chamados a concorrer os de grau imediato sendo vaacuterias as pessoas obrigadas a prestar alimentos todas devem concorrer na proporccedilatildeo dos respectivos recursos e intentada accedilatildeo contra uma delas poderatildeo as demais ser chashymadas a integrar a lide

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 93

Art 1699 Se fixados os alimentos sobrevier mudanccedila na situaccedilatildeo financeira de quem os supre ou na de quem os recebe poderaacute o interesshysado reclamar ao juiz conforme as circunstacircncias exoneraccedilatildeo reduccedilatildeo ou majoraccedilatildeo do encargoArt 1700 A obrigaccedilatildeo dc prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor na forma do art 1694

Diante de tal situaccedilatildeo quais as questotildees que um profissional do direi- lo precisa abordar para alcanccedilar a persuasatildeo do juiz quanto agrave procedecircncia do pedido de alimentos em face dos avoacutes Eacute possiacutevel associar de pronto as ideias de que a crianccedila precisa alimentar-se e os avoacutes podem pagar uma penshysatildeo ou eacute preciso percorrer um caminho relativamente longo ateacute que tal obrishygaccedilatildeo recaia sobre eles Essas satildeo questotildees que um bom argumentador preshycisa enfrentar antes mesmo de comeccedilar o seu texto natildeo por uma exigecircncia de ordem processual material ou doutrinaacuteria mas por ser necessaacuteria a coerecircncia na linearidade do raciociacutenio que leva agrave conclusatildeo da fundamentaccedilatildeo

E imprescindiacutevel perceber que antes mesmo de escolher que tipos de argumento utilizar na construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo deve-se ter em mente a estrateacutegia argumentativa que seraacute utilizada ou seja qual o caminho a ser percorrido ateacute ser possiacutevel afirmar com convicccedilatildeo que um dado pedido eacute procedente por tal ou qual motivo

Para o caso concreto em questatildeo a construccedilatildeo do raciociacutenio seguiria os seguintes passos

___ IUumlEIacute2reg

i39 p^deg

A filiaccedilatildeo enseja o direito subjetivo a

alimentos

Paraacutegrafo sem maior complexidade basta

relacionaro caso ao art do U

A crianccedila e a matildeenecessitam de dinheiro para suprir suas

necessidades baacutesicas

lldquoV Questatildeo a enfrentar

quaisas necessidades da crianccedila

Impossibilidade paterna de prestar

os alimentos

Questatildeo a enfrentar desemprego representa

impossibilidade de alimentar

Diante da impossibilidade a obrigaccedilatildeo paterna pode ser estendida

aos avoacutes

OQuestatildeo a enfrentar se 0 pai eacute 0 devedor os avoacutes

paternos devem substituiacute- lo antes dos avoacutes

matemosOs avoacutes podem

prestar alimentos sem prejuiacutezo da

proacutepria subsistecircncia

Paraacutegrafo sem maior complexidade basta

relacionaro caso ao art 1696 do CC

O lazer estaacute entre essas necessidades

Tem direito a plano de sauacutede e a escola

particularA eventual existecircncia de nova famiacutelia pode reduziro padratildeode vida a oferecer ao

alimentado

94 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Natildeo queremos o falso entendimento de que em decorrecircncia do fato de haver previsatildeo legal ou doutrinaacuteria - argumento de autoridade conforshyme seraacute mostrado adiante - para todas as questotildees que seratildeo abordadas ao longo dessa fundamentaccedilatildeo deve o operador do direito ignorar ou minorar o efeito das demais fontes na produccedilatildeo do texto argumentativo

Muitas vezes o fundamento legal natildeo garante sozinho o convencimento Haacute situaccedilotildees em que a aplicaccedilatildeo da norma positivada natildeo se mostra adequada agrave soluccedilatildeo do conflito nessas oportunidades outras fontes seratildeo consideradas para que o juiz firme seu livre-convencimento Haacute casos ainda em que o mashygistrado pode interpretar a norma de diferentes maneiras A presenccedila de outras fontes que reforcem um desses entendimentos como o mais adequado seria tambeacutem desejaacutevel Natildeo faltam igualmente as questotildees atuais e polecircmicas em que o legislador ainda natildeo teve tempo suficiente para atualizar a norma posishytivada a qual estaacute em dissonacircncia com o sentimento de justiccedila Enfim satildeo dishyversas as situaccedilotildees em que apenas a lei natildeo garante a persuasatildeo do magistrado e outras fontes tomam-se inevitaacuteveis na fundamentaccedilatildeo de uma tese

Na construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo importa entatildeo que um fato conshycreto colhido da realidade circundante em que se materializa a situaccedilatildeo de conflito possa ser avaliado segundo muacuteltiplas possibilidades argumentati- vas dependendo da valoraccedilatildeo que se queira atribuir a tal fato Natildeo se pode dizer que um argumento eacute mais importante que o outro mas que possui maior capacidade persuasiva em um determinado contexto

Dessa forma admite-se por exemplo que o princiacutepio do ldquodever de alishymentarrdquo pode ser sustentado no caso analisado como conclusatildeo da observacircnshycia do fato de que ldquoos pais devem proteger os filhosrdquo (Direito Natural) ou como consequecircncia da determinaccedilatildeo objetiva do Coacutedigo Civil art 1696 ldquoO direito agrave prestaccedilatildeo de alimentos eacute reciacuteproco entre pais e filhosrdquo (Direito Positivo)

Dispositivos legais satildeo fontes tal como a jurisprudecircncia a doutrina os princiacutepios a razoabilidade entre outros A argumentaccedilatildeo desenvolve-se e sustenta-se em fundamentos juriacutedicos Um mesmo fundamento pode ser sustentado por meio de diversas fontes

Essa questatildeo nos parece importante porque eacute muito comum vermos advogados que citam inuacutemeros artigos de determinados diplomas legais- apenas isso - e julgam que com esse procedimento desenvolveram uma argumentaccedilatildeo O ideal eacute que cada questatildeo abordada seja devidamente valoshyrada e consistentemente justificada por variadas fontes que se completam

O nosso proacuteximo passo seraacute investigar alguns dos tipos de argumento que estatildeo agrave disposiccedilatildeo dos operadores do direito para que seja possiacutevel concretizar a proposta argumentativa ateacute aqui desenvolvida

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 95

52 FUNDAMENTACcedilAtildeO SIMPLES E FUNDAMENTACcedilAtildeO COMPLEXA

A argumentaccedilatildeo conforme estudamos em capiacutetulo anterior eacute um tipo de texto que se materializa em todas as peccedilas processuais Como na maioshyria das vezes natildeo nos referimos especificamente a esta ou agravequela peccedila deshynominamos esta parte argumentativa genericamente de ldquo fundamentaccedilatildeordquo

Fazemos a distinccedilatildeo entre fundamentaccedilatildeo simples e complexa por ser didaticamente uacutetil A doutrina juriacutedica endossa amplamente essa distinccedilatildeo quando classifica os casos concretos como casos simples e casos difiacuteceis (ou complexos) A relaccedilatildeo eacute bastante clara quando temos de enfrentar um caso concreto simples a fundamentaccedilatildeo para ele desenvolvida seraacute simshyples quando o caso for difiacutecil a fundamentaccedilatildeo complexa

As diferenccedilas essenciais entre os dois tipos de fundamentaccedilatildeo estatildeo em trecircs criteacuterios a) temaacutetica juriacutedica a ser enfrentada b) tipos de argumen- to a que se recorre para alcanccedilar os objetivos pretendidos pelo operador do direito e consequentemente c) a extensatildeo do texto argumentativo

Quanto agrave temaacutetica juriacutedica sobre a qual o argumentador se debrushyccedilaraacute podemos dizer que os casos concretos simples satildeo aqueles em que o profissional do direito jaacute possui estruturado no ordenamento juriacutedico paacutetrio todo o repertoacuterio a que necessitaraacute recorrer na fundamentaccedilatildeo a legislaccedilatildeo regula de maneira clara especiacutefica e natildeo controvertida a mateacuteria a dogmaacuteshytica juriacutedica natildeo levanta problemas no tratamento do tema a jurisprudecircncia mostra-se uniformizada quanto agrave soluccedilatildeo mais adequada acerca das quesshytotildees relativas ao assunto

Por tudo isso os casos concretos simples satildeo resolvidos pela mera aplicaccedilatildeo das regras entatildeo vigentes suscitando do argumentador esforccedilo argumentativo reduzido

Com relaccedilatildeo aos tipos de argumento os casos simples exigem a proshyduccedilatildeo de uma estrutura bastante simplificada que consiste em introito argumento proacute-tese argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e conclusatildeo nesta ordem

Seraacute explicada minuciosamente toda essa estrutura no toacutepico 53 mas por ora faremos uma breve siacutentese a fim de facilitar a compreensatildeo do leitor

O introito tem as funccedilotildees de apresentar e contextualizar a questatildeo juriacutedica a um soacute tempo Existem muitas estrateacutegias para introduzir a funshydamentaccedilatildeo simples

O argumento proacute-tese recorre ao que haacute de mais essencial na defesa de um ponto de vista - o encadeamento consistente de fatos com os quais

96 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

seraacute possiacutevel a defesa da tese A organizaccedilatildeo sintaacutetica do paraacutegrafo que se estrutura a partir de elos coesivos bem marcados eacute uma evidecircncia desse argumento Sugerimos o uso dos conectores porque e tambeacutem aleacutem disso para introduzir cada uma das razotildees relevantes que validam a tese

O argumento de autoridade de grande prestiacutegio evidencia que a norshyma positivada acolhe a tese sustentada pelo argumentador o que faz de seu ponto de vista mais que uma opiniatildeo porque valida a soluccedilatildeo proposta como uma maneira prevista no ordenamento juriacutedico como correta e aceitaacutevel

O argumento de oposiccedilatildeo arremata a fundamentaccedilatildeo simples exshycluindo qualquer oacutebice que se possa fazer agrave tese do argumentador pois os eventuais pontos fraacutegeis apontados pela parte contraacuteria satildeo dirimidos por fatos ainda mais significativos levantados pelo argumentador

Aconclusatildeo se daacute pela retomada da tese de forma sinteacutetica objetiva e clara

Como se percebeu a extensatildeo da fundamentaccedilatildeo simples eacute reduzishyda pois carece de apenas cinco paraacutegrafos Parece pouco mas precisamos lembrar que a proacutepria OAB em diversas oportunidades sustentou que uma boa peticcedilatildeo inicial em toda a sua estrutura para os casos simples natildeo deshymanda mais que duas ou trecircs laudas

Proporcionalmente a argumentaccedilatildeo (ldquo Do direitordquo na peticcedilatildeo inicial) teria aproximadamente 20 a 30 linhas quase uma lauda plena Temos como paracircmetro essa extensatildeo pois um paraacutegrafo costuma ter em meacutedia 6 linhas

Vale ressaltar ainda que os casos concretos simples ocorrem em nuacuteshymero reduzido

L Estrutura da Fundamentaccedilatildeo Simples

Introito

Argumento proacute-tese

Argumento de autoridade

Argumento de oposiccedilatildeo

Conclusatildeo

A fundamentaccedilatildeo simples eacute aquela usada para casos

concretos simples em que a

subsunccedilacirco do fato agrave norma eacute

suficiente para resolver o conflito

juriacutedico

Os casos concretos difiacuteceis ou complexos natildeo cabem nas soluccedilotildees pronshytas emolduradas previsiacuteveis que a dogmaacutetica juriacutedica preparou para operar a subsunccedilacirco do fato agrave norma Natildeo precisam ser ineacuteditos mas a complexidade do

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 97

fenocircmeno juriacutedico exige o olhar sempre atento do argumentador cuja sensibishylidade vislumbra detalhes que merecem enfrentamento mais acurado

Haacute desdobramentos que necessitam ser encarados como circunstacircncias que desestabilizam a tese defendida se natildeo forem enfrentados por meio dos princiacutepios do direito Satildeo os princiacutepios que orientaratildeo em primeiro plano o adequado tratamento a ser dispensado agrave questatildeo complexa enfrentada na arshygumentaccedilatildeo Em um segundo momento os demais tipos de argumento comshyplementaratildeo o raciociacutenio e daratildeo consistecircncia aos raciociacutenios propostos

Natildeo se trata de propor uma nova estrutura para a fundamentaccedilatildeo complexa mas de partir daquela apresentada para a fundamentaccedilatildeo simshyples (introito + proacute-tese + autoridade + oposiccedilatildeo) e agregar outros tipos de argumento em nuacutemero variedade e sequecircncia sempre imprevisiacuteveis dependendo de cada caso concreto

Apenas para reforccedilar o que expomos citamos um trecho de Lenio Luiz Streck

Autores como Albert Calsamiglia3 consideram que a preocupaccedilatildeo das teorias poacutes-positivistas eacute com a indeterminaccedilatildeo do direito nos casos dishyfiacuteceis ou seja para os poacutes-positivistas o centro de atuaccedilatildeo se haacute desshylocado em direccedilatildeo da soluccedilatildeo dos casos indeterminados (mais ainda os casos difiacuteceis natildeo mais satildeo vistos como excepcionais) Afinal os casos simples eram resolvidos pelo positivismo com recurso agraves decisotildees passadas e agraves regras vigentes Jaacute nos casos difiacuteceis se estava em face de uma ldquo terra inoacutespitardquo

Reforccedilamos que a classificaccedilatildeo ldquo fundamentaccedilatildeo simplesrdquo e ldquo fundashymentaccedilatildeo complexardquo natildeo constitui uma demanda para o aluno saber quanshytos paraacutegrafos seratildeo usados na produccedilatildeo do texto argumentativo Trata-se somente de recurso didaacutetico facilitador da atividade docente na redaccedilatildeo desta parte da peccedila processual

53 TIPOS DE ARGUMENTO

A busca da persuasatildeo do auditoacuterio como vimos pode ser alcanccedilada por meio de vaacuterios tipos distintos de argumento Nesta oportunidade trashy

3 CALSAM IGLIA Albert apud STRECK Lenio Luiz Hermenecircutica Neoconsti- tucionalismo e ldquoo problema da discricionariedade dos ju izesrdquo Disponiacutevel em lthttpwwwanima-opetcombrprimeira_edicaoartigo_Lenio_Luiz Streckher- meneuticapdiacuteX Acesso em 17 jul 2012

98 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

taremos de nove tipos diferentes de argumento a) argumento proacute-tese b) argumento de autoridade c) argumento de oposiccedilatildeo d) argumento de anashylogia e) argumento de causa e efeito f) argumento de senso comum g) arshygumento ad hominem h) argumento a fortiori e i) argumento por absurdo

A classificaccedilatildeo dos argumentos natildeo segue na doutrina da aacuterea uma regularidade Eventualmente uma mesma estrateacutegia recebe de autores disshytintos nomenclaturas diferentes Como o mais importante natildeo eacute o nome que o argumento recebe mas o conhecimento de sua estrutura de seu conteuacutedo e da sua eficiecircncia em determinados contextos adotamos a classificaccedilatildeo mais simples possiacutevel tendo em vista principalmente o caraacuteter didaacutetico desta obra

Considerando que Perelman e L Olbrechts-Tyteca foram precursores na sistematizaccedilatildeo da teoria da argumentaccedilatildeo entendemos adequada breve apreshysentaccedilatildeo da classificaccedilatildeo proposta pelos autores no Tratado da Argumentaccedilatildeo

Com base na associaccedilatildeo de ideias - teacutecnica de estruturaccedilatildeo dos argushymentos que buscam o convencimento do auditoacuterio os autores destacam os argumentos quase loacutegicos os fundados na estrutura do real e os que fundamentam a estrutura do real

Os argumentos quaseloacutegicos apresentam-se como comparaacuteveis a rashyciociacutenios formais loacutegicos ou matemaacuteticos embora tenham traccedilos peculiashyres ao campo da argumentaccedilatildeo Identificam-se com as demonstraccedilotildees forshymais justamente pelo esforccedilo de reduccedilatildeo ou precisatildeo de uma caracteriacutestica natildeo formal

O argumento por definiccedilatildeo assim como outros pertence ao grupo dos quase loacutegicos Constitui o procedimento mais caracteriacutestico de identishyficaccedilatildeo completa de diversos elementos que satildeo o objeto do discurso

Veja-se o que apresenta Perelman ldquo Spinoza no iniacutecio de sua Eacutetica define a causa de si mesmo como lsquoaquilo cuja essecircncia envolve a existecircncia ou aquilo cuja natureza soacute pode ser conhecida como existentersquordquo

Ele define substacircncia ldquoO que estaacute em si e eacute concebido por si isto eacute aquishylo cujo conceito pode ser formado sem necessitar do conceito de outra coisardquo

Os argumentos fundados na estrutura do real valem-se da realidade para estabelecer um elo entre os juiacutezos admitidos e outros que se procura proshymover Vale dizer como na argumentaccedilatildeo eacute indispensaacutevel a interaccedilatildeo entre o orador e o auditoacuterio os argumentos satildeo obtidos da proacutepria realidade desse auditoacuterio ligando a tese do orador aos valores predominantes do puacuteblico

Como exemplo desse tipo tem-se o argumento pragmaacutetico e o argushymento por autoridade entre outros

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 99

O argumento pragmaacutetico eacute aquele que permite apreciar um ato ou um acontecimento consoante suas consequecircncias favoraacuteveis ou desfavoraacuteveis presentes ou futuras

Perelman expotildee o seguinte

Para apreciar um acontecimento cumpre reportar-se a seus efeitos E a esses efeitos que Locke se refere para criticar o poder espiritual dos priacutencipesldquo Jamais se poderaacute estabelecer ou salvaguardar nem a paz nem a segushyranccedila nem sequer a simples amizade entre homens enquanto prevaleshycer a opiniatildeo de que o poder eacute fundamentado sobre a Graccedila e de que a religiatildeo deve ser propagada pela forccedila das armasrdquo

O argumento por autoridade como seraacute adiante tratado eacute aquele cujo alcance eacute totalmente condicionado pelo prestiacutegio Constitui-se dos atos ou juiacutezos de uma pessoa ou de um grupo de pessoas como meio de prova a fashyvor de uma tese Quanto mais importante eacute a autoridade mais indiscutiacuteveis parecem suas palavras No limite a autoridade divina sobrepuja todos os obstaacuteculos que a razatildeo poderia opor-lhe

Os argumentos que fundamentam a estrutura do real constituem-se de exemplos ilustraccedilotildees modelos ou ainda analogias que refletem as lishygaccedilotildees da realidade com o caso particular

A argumentaccedilatildeo pelo exemplo caracteriza-se pela passagem de um caso particular a outro sucessivamente com a finalidade de consolidar uma regra geral aplicaacutevel a todos os casos O caso particular utilizado como exemplo permitiraacute uma generalizaccedilatildeo

Nesta passagem de Berkeley retirada de Perelman encontra-se a arshygumentaccedilatildeo pelo exemplo

Observo ademais que o pecado ou a torpeza moral natildeo consiste na accedilatildeo fiacutesica exterior ou no movimento mas estaacute no afastamento interior da vontade com relaccedilatildeo agraves leis da razatildeo e da religiatildeo Isso eacute claro pois matar um inimigo na batalha e condenar legalmente agrave morte um crimishynoso natildeo eacute considerado pecado contudo o ato exterior eacute exatamente o mesmo que no caso do assassiacutenio

A argumentaccedilatildeo por ilustraccedilatildeo a contraparte pelo exemplo daacute-se a partir da utilizaccedilatildeo de um caso concreto a fim de consagrar uma regra jaacute existente O caso particular que desempenha o papel de ilustraccedilatildeo estearaacute uma regularidade jaacute estabelecida

100 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A ilustraccedilatildeo nesta passagem de Leibniz apresentada por Perelman tem a funccedilatildeo de facilitar a compreensatildeo da regra por meio de um caso de aplicaccedilatildeo discutiacutevel

() cumpre que ele [o mal moral] soacute seja admitido ou permitido na medida em que eacute visto como uma consequecircncia certa de um dever indisshypensaacutevel de sorte que aquele que natildeo quisesse permitir o pecado alheio faltaria ele proacuteprio ao seu dever como se um oficial que deve guardar um posto importante o largasse sobretudo em tempo de perigo para impedir uma briga na cidade entre dois soldados da guarniccedilatildeo prestes a se matarem mutuamente

A argumentaccedilatildeo pelo modelo constitui-se a partir de um agir ideal na crjaccedilatildeo de um padratildeo de conduta que deveraacute ser seguido por todos O caso particular como modelo incentivaraacute a imitaccedilatildeo

Perelman mostra a argumentaccedilatildeo pelo modelo no seguinte trecho em que Montesquieu faz Usbek dizer

Assim mesmo que natildeo houvesse Deus deveriacuteamos sempre amar a jusshyticcedila ou seja empenharmo-nos para nos parecer com esse ser de quem temos uma ideia tatildeo bela e que se existisse seria necessariamente justo

A argumentaccedilatildeo pela analogia caracteriza-se pela busca de uma equishyparaccedilatildeo do tratamento atribuiacutedo a situaccedilotildees em realidades diferentes toshymando como referecircncia seus pontos comuns

Perelman oferece um exemplo bastante simples e tiacutepico de analogia tirado de Aristoacuteteles ldquo Assim como os olhos dos morcegos satildeo ofuscados pela luz do dia a inteligecircncia de nossa alma eacute ofuscada pelas coisas mais naturalmente evidentesrdquo

531 Introito

Em primeiro lugar precisamos lembrar que o introito natildeo eacute propriashymente um tipo de argumento mas um paraacutegrafo com a funccedilatildeo de iniciar o texto argumentativo Essa introduccedilatildeo natildeo eacute mera formalidade porque possui o papel bem marcado de facilitar a aceitaccedilatildeo dos argumentos que viratildeo em seguida

A utilizaccedilatildeo de introitos na estrutura argumentativa complexa apesar de natildeo ser obrigatoacuteria mostra-se bastante eficiente Os ceacutelebres sermotildees do

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 101

Padre Antoacutenio Vieira utilizavam com frequecircncia esse recurso A estrutura dos sermotildees desse ilustre orador era regularmente a seguinte

a) introito - momento em que o orador expunha o assunto e as ideias que defenderia ou o assunto e as ideias agraves quais se oporia cm seguida As frases de efeito a que recorria eram normalmente extraiacutedas da Biacuteblia e tinham a funccedilatildeo principal de captar a atenccedilatildeo do auditoacuterio

b) invocaccedilatildeo - momento em que o orador invocava o auxiacutelio de Deus para expor com clareza suas ideias

c) argumentaccedilatildeo propriamente dita - o orador desenvolvia o tema inicialmente apresentado por meio de diversos recursos retoacutericos linguiacutesticos e argumentativos Com isso levava o auditoacuterio a agir sob a forccedila de seus argumentos (persuasatildeo)

d) peroraccedilatildeo - o orador retomando as ideias principais jaacute desenvolshyvidas recorria a novas frases de efeito com o objetivo de trazer um desfecho vibrante que estabelecesse viacutenculos afetivos com o auditoacuterio de modo que se sentisse motivado a pocircr em praacutetica os valores pregados

E certo que no texto juriacutedico tal estrutura argumentativa natildeo pode ser usada na iacutentegra mas agregar ao texto juriacutedico e ao discurso do advogashydo alguns desses artifiacutecios retoacutericos ceacutelebres pode ser de grande valia para o sucesso dos profissionais do direito

Os tipos de introito mais comuns no Direito satildeo os que seguem locashylizaccedilatildeo do fato no tempo e no espaccedilo explanaccedilatildeo de ideia inicial enumeshyraccedilatildeo e retomada histoacuterica

A escolha de um desses tipos depende da temaacutetica enfrentada pelo argumentador e da tese selecionada pelo profissional Para exemplificar suponha que o autor pretenda buscar a revisatildeo de cobranccedilas indevidas prashyticadas por uma empresa de telefonia que eacute tida haacute muito como prestadora de um serviccedilo de maacute qualidade

Nessa situaccedilatildeo faacutetica entendemos que a localizaccedilatildeo do fato no tempo e no espaccedilo eacute a proposta de introito mais eficiente Todos sabem que as emshypresas de telefonia em geral - e esta em especial no Rio de Janeiro mdash satildeo as campeatildes de violaccedilatildeo dos direitos dos consumidores E paciacutefico ainda que a reacute estaacute entre as empresas que mais figuram no polo passivo da demanda nos Juizados Especiais Ciacuteveis fluminenses Essas informaccedilotildees contribuem para a compreensatildeo de que as praacuteticas comerciais da reacute satildeo reprovaacuteveis e isso facilita a aceitaccedilatildeo da tese sustentada pelo argumentador

102 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

No introito intitulado explanaccedilatildeo de ideia inicial o paraacutegrafo tem a funccedilatildeo de apresentar em linhas gerais o tema a ser debatido Quando o insshytituto em pauta eacute bastante conhecido talvez natildeo haja funccedilatildeo argumentativa em realizar essa explanaccedilatildeo mas quando ele eacute relativamente recente no orshydenamento juriacutedico ou quando o argumentador pretende dar novo enfoque ou tratamento a tema jaacute difundido do direito essa estrateacutegia de introduzir o texto argumentativo pode ser bem eficiente

Pense na cobranccedila das verbas rescisoacuterias praticada pelo empregado conshytra seu empregador quando de sua demissatildeo E paciacutefico que o empregado tem direito a receber tudo que a legislaccedilatildeo trabalhista lhe garante A proacutepria natureshyza alimentar dessas verbas daacute a elas status de grande relevacircncia Atualmente poreacutem os Tribunais Superiores vecircm ponderando que a execuccedilatildeo da sentenccedila que garante ao trabalhador o recebimento desses valores deve ser feita de mashyneira a considerar a funccedilatildeo social da empresa isto eacute seria pouco razoaacutevel para tutelar o direito violado do trabalhador levar um bem da empresa a leilatildeo e inviabilizar a proacutepria atividade empresarial Isso prejudicaria inuacutemeros funcioshynaacuterios a fim de garantir a proteccedilatildeo do direito de apenas um

Natildeo se trata de minorar os direitos individuais mas de sopesaacute-los agrave luz de um bem maior Esse raciociacutenio natildeo vigorou desde sempre no direishyto brasileiro ao contraacuterio ele eacute relativamente recente Daiacute a necessidade eventual de apresentar ao auditoacuterio - por explanaccedilatildeo de ideia inicial - em que consiste a execuccedilatildeo de um bem que pode representar o fim da ativishydade realizada pela reacute enfatizando a ldquo funccedilatildeo social da empresardquo naquele contexto Talvez esse instituto natildeo esteja suficientemente difundido para nortear e validar a tese da inexecuccedilatildeo do bem ainda que inegaacutevel o direito de o empregado receber as verbas rescisoacuterias

A proposta de introduzir a argumentaccedilatildeo por enumeraccedilatildeo eacute uma das mais tradicionais Tendo em vista que esse tipo de texto deve aleacutem de apresentar um ponto de vista defendecirc-lo por meio de argumentos a introshyduccedilatildeo pode ter o papel de apresentar em siacutentese esses fatosraciociacutenios e desenvolver cada um deles pormenorizadamente em seguida

Exemplificando essa estrateacutegia observe a introduccedilatildeo de uma motivashyccedilatildeo da lavra do Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho

Ato juriacutedico perfeito direito adquirido direito a tenno expectativa de direito ato administrativo negociai ato-condiccedilatildeo contribuiccedilatildeo parafisshycal relaccedilatildeo juriacutedica estatutaacuteria enriquecimento de causa etc Satildeo as teses sustentadas pelos protagonistas deste processo em busca de uma soluccedilatildeo para a lide Antes de acolher qualquer delas entretanto cumpre identificar a real relaccedilatildeo juriacutedica existente entre o autor e o reacuteu e analishysar os efeitos dela decorrentes

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 103

A retomada histoacuterica eacute outra forma de introduzir as fundamentaccedilotildees juriacutedicas Para um texto de tamanho relativamente curto como eacute o caso da fundamentaccedilatildeo simples natildeo cabe a exposiccedilatildeo minuciosa de um histoacuterico Sugerimos que seja realizada apenas uma relaccedilatildeo analoacutegica entre um eleshymento do passado e um do presente

De maneira alguma ldquo chuterdquo fatos histoacutericos ou estatiacutesticos dos quais natildeo haja certeza absoluta (cientiacutefica) sob pena de a estrateacutegia ser frustrada

Um tema para o qual esse tipo de introito seria bastante eficiente eacute a autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo do aborto terapecircutico O Brasil jaacute teve embates anteriores sobre esse tema e as consequecircncias advindas das escolhas feitas no passado estatildeo presentes hoje para serem avaliadas e iluminar o futuro

532 Argumento proacute-tese

Se levarmos ao peacute da letra a nomenclatura ldquo argumento proacute-teserdquo deshyvemos entender que essa eacute a estrateacutegia argumentativa que desenvolve um raciociacutenio a favor da tese defendida Mas isso natildeo eacute muito esclarecedor

Todo argumentador quando desenvolve seu discurso pretende pershysuadir seu auditoacuterio de que sua tese eacute adequada coerente justa O contraacuterio seria absurdo Dizer portanto que um argumento eacute a favor da tese natildeo chega a ser esclarecedor

Sabemos que cada tipo de argumento se caracteriza pela utilizaccedilatildeo de uma estrateacutegia especiacutefica que lhe garante certos contornos de atuaccedilatildeo O argumento de autoridade por exemplo recorre agrave legislaccedilatildeo agrave doutrina e agrave opiniatildeo fundamentada de especialistas o argumento de analogia baseia-se em uma seacuterie de procedimentos que tecircm na comparaccedilatildeo e na semelhanccedila sua estrateacutegia para defender um ponto de vista

Disso se depreende que necessariamente todo argumento eacute a favor da tese escolhida pelo argumentador e a defesa desse ponto de vista recorre a uma estrateacutegia marcada por algum artifiacutecio especiacutefico O argumento proacuteshytese eacute aquele que utiliza a razoabilidade e a coerecircncia do encadeamento sistematizado de fatos-razotildees como fundamento de validade ou seja o argumento proacute-tese eacute aquele que desenvolve uma explicaccedilatildeo razoaacutevel para determinada questatildeo relevante do raciociacutenio argumentativo

A questatildeo relevante a que nos referimos estaacute expressa na tese refere-se agravequilo que se precisa provar (levar a crer convencer) para se alcanccedilar um ldquodever serrdquo ou melhor levar a fazer (persuadir)Esse argumento eacute bastante recorrente na produccedilatildeo das peccedilas processuais mas muitas vezes o argumen-

104 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

tador apresenta dificuldades de montar um projeto de argumentaccedilatildeo para seu texto em que os argumentos proacute-tese sejam utilizados de forma eficiente

Conheccedila o caso concreto a seguir a partir do qual foi proposto um argumento proacute-tese

AacuteGUA DE HEM ODIAacuteLISE CONTAMINADASecretaria interdita hospital em Recife

Duas mortes satildeo investigadas(O Globo)

REC IFE Cinco anos apoacutes a trageacutedia da hemodiaacutelise - que matou 44 pacientes e intoxicou 100 no Instituto de Doenccedilas Renais de Caruaru- a Secretaria de Sauacutede de Pernambuco interditou parte da central de hemodiaacutelise do Hospital Real Portuguecircs em Recife O motivo foi a contaminaccedilatildeo por bacteacuterias da aacutegua usada no atendimento aos doentes Duas mortes estatildeo sendo investigadasO hospital atende a 312 pacientes renais e o serviccedilo eacute de referecircncia do Norte-Nordeste Foi o hospital que constatou a contaminaccedilatildeo ao invesshytigar calafrios nos doentes No dia 20 anaacutelises indicaram concentraccedilatildeo de 6800 bacteacuterias heterotroacuteficas por mililitro de aacutegua quantidade 23 vezes maior do que a tolerada pelas autoridades sanitaacuteriasAs bacteacuterias heterotroacuteficas (que natildeo produzem o proacuteprio alimento) natildeo satildeo perigosas como as da trageacutedia em Caruaru mas em grande quantishydade podem causar infecccedilatildeo segundo o chefe da Vigilacircncia Sanitaacuteria Jaime Brito Ele acredita que a contaminaccedilatildeo pode estar ocorrendo no sistema de filtragemSegundo o chefe do Setor de Hemodiaacutelise do hospital William Stan- ford quando o problema foi constatado a direccedilatildeo chamou um teacutecnico de Curitiba para revisatildeo e limpeza do sistema de tratamento O niacutevel de contaminaccedilatildeo foi reduzido mas as bacteacuterias continuaram em concenshytraccedilatildeo maior que a permitida - 1100 por mililitro Os pacientes contishynuaram se queixando de calafriosO hospital natildeo comunicou o fato agrave secretaria que soube do problema por denuacutencia anocircnima Depois de inspeccedilatildeo a Vigilacircncia Sanitaacuteria lashycrou as salas A e C do Setor de Hemodiaacutelise Cem doentes foram transshyferidos para o Hospital Baratildeo de LucenaO secretaacuterio-adjunto de Sauacutede Liacutevio de Barros tranquilizou os 2100 pacientes pela televisatildeo Ele disse que o problema natildeo eacute tatildeo grave quanshyto o registrado em 1996 em Caruaru- Em Recife natildeo encontramos algas cianofiacutecias (azuis) na aacutegua mas bacteacuterias que respondem bem a antibioacuteticos Mas eacute necessaacuterio que esteshyjamos alerta Estamos tomando como medida cautelar o monitoramento das maacutequinas - disse

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 105

A media mensal de calafrios estava assustadora Segundo a secretaria em circunstacircncias normais os casos chegavam a sete por mecircs No pico da contaminaccedilatildeo da aacutegua foram 20 queixas em dois dias

Registremos inicialmente a tese que se pode assumir neste caso ldquoo hospital deve indenizar os pacientes que receberam a hemodiaacutelise e as fashymiacutelias dos pacientes que faleceram em razatildeo desse procedimento porque foi negligenterdquo

No argumento proacute-tese ter-se-aacute a oportunidade de demonstrar por meio dos fatos a negligecircncia do hospital

O paraacutegrafo argumentativo proacute-tese - cuja estrutura eacute ldquo tese + porque (fato l) + e tambeacutem (fato 2)+ aleacutem disso(fato 3)rdquo -pode ser assim redigishydo O hospital foi negligente porque utilizou aacutegua contaminada no tratashymento de hemodiaacutelise de pacientes renais e tambeacutem natildeo comunicou o fato agrave secretaria de sauacutede Aleacutem disso mesmo apoacutes ter conhecimento do alto iacutendice de contaminaccedilatildeo por bacteacuterias continuou a utilizaacute-la colocando pois em perigo iminente a vida dos pacientes

Sugestatildeo de esquema para argumentar

Argumento proacute-tese (Tese + porque + e tambeacutem + aleacutem disso)

O hospital foi negligente porque utilizou aacutegua contaminada no tratamento de hemodiaacuteshylise de pacientes renais e tambeacutem natildeo comunicou o fato agrave secretaria de sauacutede Aleacutem disso mesmo apoacutes ter conhecimento do alto iacutendice de contaminaccedilatildeo por bacteacuterias continuou a utilizaacute-la colocando pois em perigo iminente a vida dos pacientes

Demais paraacutegrafos

Proposta 1

bull ldquoEacute bem verdaderdquo deve comeccedilar o 2o paraacutegrafoldquoAteacute porquerdquo deve iniciar a 2a frase do 2o paraacutegrafobull ldquoPor outro ladordquo ou ldquoEm contrapartidardquo deve comeccedilar o 3o paraacutegrafobull ldquoPor conseguinterdquo (conclusivo) deve comeccedilar o 4o paraacutegrafo

Proposta 2

bull ldquoHaacute quem digardquo deve comeccedilar o 2o paraacutegrafoldquoAliaacutesrdquo deve iniciar a 2a frase do 2o paraacutegrafobull ldquoDesse modordquo deve comeccedilar o 3o paraacutegrafoldquoEmborardquo deve estar no 3o paraacutegrafobull ldquoAssim sendordquo deve comeccedilar o 4o paraacutegrafo (conclusivo)

106 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Para ampliar o repertoacuterio do nosso leitor propomos mais alguns pashyraacutegrafos exemplificativos Cada um trata de um tema diferente e seria utishylizado logo apoacutes o introito

Tema importacircncia do Coacutedigo de Defesa do Consumidor para o ordeshynamento juriacutedico paacutetrioO Coacutedigo de Defesa do Consumidor criou uma sobre-estrutura juriacutedishyca multidisciplinar aplicaacutevel a toda e qualquer aacuterea do Direito em que ocorrer relaccedilatildeo de consumo porque esse diploma legal possui princiacuteshypios proacuteprios e autonomia sistecircmica e tambeacutem porque permeia a sua disciplina tanto pelo direito puacuteblico quanto pelo privado nas relaccedilotildees contratuais e extracontratuais materiais e processuais Aleacutem disso tudo tem a ver com o consumidor - a sauacutede a seguranccedila os transportes a alimentaccedilatildeo os medicamentos a moradia

Tema reduccedilatildeo da maioridade penal no BrasilA reduccedilatildeo da maioridade penal no Brasil ajudaria a resolver a violecircncia endecircmica que vivemos na sociedade atual porque os ladrotildees e assassishynos que praticam seus atos a sangue frio podem ser menores de idade como no caso de Joatildeo Heacutelio menino de 6 anos morto apoacutes ser arrastado por quilocircmetros nas mas do Rio de Janeiro por um adolescente e dois adultos Soma-se a esse fato (semanticamente igual a ldquoe tambeacutemrdquo) que muitos menores satildeo aliciados por bandidos e conduzidos agrave praacutetica de atos iliacutecitos sob a proteccedilatildeo da menoridade penal Ademais (semanshyticamente igual a ldquoaleacutem dissordquo) alguns jovens assumem a autoria de atos delituosos a fim de proteger criminosos adultos

Repare que neste uacuteltimo exemplo o conector ldquo e tambeacutemrdquo foi substituiacuteshydo por ldquo soma-se a esse fatordquo de mesmo valor semacircntico por questotildees coesishyvas isto eacute como o periacuteodo jaacute estava bastante longo preferiu o argumentador recorrer a um ponto e reiniciar a estrutura tal como vimos sugerindo

A seguir outro tipo de argumento de grande valor para os profissioshynais do Direito o argumento de autoridade

533 Argumento de autoridade

O argumento de autoridade como a proacutepria nomenclatura sugere eacute aquele que invoca o prestiacutegio dos atos ou juiacutezos de uma determinada pesshysoa ou grupo a partir do qual a afirmaccedilatildeo ganha relevacircncia

A primeira observaccedilatildeo a fazer acerca desse argumento eacute que por longo tempo ele foi atacado sob a alegaccedilatildeo de que nenhuma autoridade eacute

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 107

infaliacutevel em suas opiniotildees e por isso mesmo essa estrateacutegia possibilita o uso coercitivo de uma opiniatildeo sem garantias objetivas de sua adequaccedilatildeo

Ressalte-se que atualmente essa preocupaccedilatildeo natildeo mais existe porque a proacutepria natureza da argumentaccedilatildeo pressupotildee certo grau de subjetividade na recepccedilatildeo dos valores que deveratildeo ser compartilhados pelo auditoacuterio

Importante sim seria identificar quem satildeo as pessoas ou os grupos de onde proveacutem a fala da autoridade Natildeo haacute duacutevidas de que a liccedilatildeo de um profissional conhecido e reconhecido em determinada disciplina - um psicoacutelogo para tratar de questotildees ligadas agrave personalidade um meacutedico para opinar sobre uma patologia um historiador para avaliar as consequecircncias de um dado evento de grande relevacircncia para a sociedade de uma eacutepoca etc - possui grande valor

Mas apenas a qualificaccedilatildeo teacutecnico-profissional do indiviacuteduo natildeo lhe garante necessariamente status suficiente para que seja reconhecido como autoridade Satildeo ainda necessaacuterios outros requisitos para que enfim sua opiniatildeo tenha grande relevacircncia argumentativa

E fundamental por exemplo que a autoridade consiga manter o disshytanciamento e a imparcialidade necessaacuterios a que nenhum outro fator ex- lerno agrave questatildeo avaliada possa interferir em demasia na sua avaliaccedilatildeo Para licar mais claro imagine a situaccedilatildeo em que um meacutedico queira utilizar a sua autoridade de profissional da medicina para opinar acerca da ocorrecircncia de erro meacutedico cometido contra um irmatildeo seu E claro que o grau de parenshytesco poderaacute interferir na sua avaliaccedilatildeo e mesmo que isso natildeo ocorra sua opiniatildeo ficaraacute sempre sob suspeiccedilatildeo

Uma pista interessante para determinar se haacute imparcialidade c distanshyciamento de quem opina eacute saber se satildeo observadas as hipoacuteteses de impedishymento (art 134 do CPC e art 252 do CPP) e de suspeiccedilatildeo (art 135 do CPC e art 254 do CPP) listadas pelos Coacutedigos de Processo

Algumas das hipoacuteteses previstas nos referidos artigos do Coacutedigo de Processo Civil satildeo

Art 134 CPC Eacute defeso ao juiz exercer as suas funccedilotildees no processo contencioso ou voluntaacuterioI - de que for parteII - em que interveio como mandataacuterio da parte oficiou como perito funcionou como oacutergatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou prestou depoimento como testemunhaIII - que conheceu em primeiro grau de jurisdiccedilatildeo tendo-lhe proferido sentenccedila ou decisatildeo

108 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

IV - quando nele estiver postulando como advogado da parte o seu cocircnjuge ou qualquer parente seu consanguiacuteneo ou afim em linha reta ou na linha colateral ateacute o segundo grauV - quando cocircnjuge parente consanguiacuteneo ou afim de alguma das partes em linha reta ou na colateral ateacute o terceiro grauV I - quando for oacutergatildeo de direccedilatildeo ou de administraccedilatildeo de pessoa juriacutedishyca parte na causaArt 135 CPC Rcputa-sc fundada a suspeiccedilatildeo de parcialidade do juiz quandoI - amigo iacutentimo ou inimigo capital de qualquer das partesII - alguma das partes for credora ou devedora do juiz de seu cocircnjuge ou de parentes destes em linha reta ou na colateral ateacute o terceiro grauIII - herdeiro presuntivo donataacuterio ou empregador de alguma das partesIV - receber daacutedivas antes ou depois de iniciado o processo aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou subministrar meios para atender agraves despesas do litiacutegioV - interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes Paraacutegrafo uacutenico Poderaacute ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo iacutentimo

Outro requisito importante para que uma pessoa seja considerada uma autoridade eacute o preenchimento do lugar da legitimidade tatildeo caro agrave ciecircncia juriacutedica Isso quer dizer que mesmo uma pessoa sendo meacutedico com ampla experiecircncia em cliacutenica geral se natildeo estiver cadastrado como meacutedico autorizado pelo Ministeacuterio do Trabalho um atestado por ele proferido natildeo teraacute validade para fins de exame admissional exigecircncia perioacutedica de toda empresa a seus empregados

Veja que mesmo que o referido profissional tenha preenchido toshydos os requisitos teacutecnicos de formaccedilatildeo acadecircmica e natildeo esteja impedido nem seja suspeito isso natildeo lhe garante a autoridade necessaacuteria para exercer dada atividade juriacutedica Faltou-lhe legitimidade Por essa razatildeo pode-se afirmar que o Direito cria regras proacuteprias que determinam quem ocupa ou natildeo o aqui denominado ldquo lugar da autoridaderdquo

Do ponto de vista praacutetico interessa ressaltar que um contador por exemplo pode preencher todos os requisitos que deem validade a um deshyterminado caacutelculo por ele realizado Na praacutetica forense entretanto eacute faculshytado agraves partes discutirem a autoridade que tem esse profissional e esse proshycedimento eacute utilizado como recurso para procrastinar o fim do processo

Mais uma vez ressaltamos que a melhor decisatildeo eacute a parte requerer que um contador judicial ou perito juramentado realize as tarefas atinentes

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 109

u esses profissionais pois isso dificulta que o adversaacuterio utilize a natildeo auto-i u liide ou a inobservacircncia da feacute puacuteblica como estrateacutegia de desmerecimen- lo da autoridade que se manifesta

Natildeo se pode deixar de assinalar tambeacutem que mesmo natildeo tendo forshymaccedilatildeo acadecircmica em aacuterea alguma um indiviacuteduo pode exercer o papel de uitoridade Provavelmente um agricultor teraacute os conhecimentos necessaacute-i ms para saber se o solo de uma propriedade eacute ou natildeo adequado ao plantio ilc uma determinada safra mesmo natildeo sendo agrocircnomo talvez tenha conshydiccedilotildees de avaliar as possibilidades de chuva mesmo natildeo tendo formaccedilatildeo meteoroloacutegica Os iacutendios de nosso paiacutes por exemplo dominam conhecishymentos ainda pouco explorados por botacircnicos e quiacutemicos

Muitas vezes basta que a opiniatildeo de quem fala seja sustentada pela icpresentatividade social4Um liacuteder comunitaacuterio um pastor uma missioshynaacuteria ou um cantor dependendo do tema tratado podem ser reconhecidos como autoridade Com relaccedilatildeo ao referendo sobre o desarmamento natildeo raro as campanhas utilizavam artistas muacutesicos religiosos e pessoas viacute- innas da violecircncia para convencer o puacuteblico em geral a votar a favor ou contra a proibiccedilatildeo de venda de armas e municcedilatildeo

Outro exemplo recente eacute a participaccedilatildeo de cadeirantes na blitz da Lei Scca A condiccedilatildeo de viacutetima do mal que se pretende evitar (e fiscalizar) eacute altamente persuasiva As empresas de propaganda conhecem bastante bem a eficiecircncia que tais discursos podem alcanccedilar quando dirigidos ao grande puacuteblico razatildeo pela qual contratam artistas para promover suas marcas e produtos mesmo que ele natildeo tenha qualquer autoridade teacutecnica para opishynar sobre o produto da propaganda Reiteramos que o lugar da autoridade deriva da representatividade social que essa pessoa possui

A utilizaccedilatildeo da hermenecircutica polifocircnica no discurso juriacutedico tem por objetivo fortalecer o processo da persuasatildeo por meio da incorporaccedilatildeo no discurso do sujeito de informaccedilotildees de asserccedilotildees de outros enunciadores como da opiniatildeo puacuteblica (conhecida como senso comum) da norma da jurisprudecircncia da miacutedia da Igreja da famiacutelia enfim vozes de diversos campos culturais que reforccedilam a posiccedilatildeo do sujeito-enunciador

Reiteramos portanto que a opiniatildeo de um indiviacuteduo ou de um grupo c apenas uma das fontes a que o argumentador pode recorrer para desenshyvolver um argumento de autoridade

1 A Representatividade Social eacute a relaccedilatildeo do personagem com o contexto social eacute o que ele representa para a sociedade

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Perelman nos ensina5 a respeito das fontes que constituem a autorishydade na produccedilatildeo de argumentos que elas satildeo muito variadas ldquo o parecer unacircnimerdquo ldquo a opiniatildeo comumrdquo e ldquo certas opiniotildees de cientistas filoacutesofos religiosos e profetasrdquo Por vezes a autoridade poderaacute emanar tambeacutem de uma fonte impessoal ldquo as leis da fiacutesicardquo ldquoa legislaccedilatildeo positivada de um ordenamento juriacutedicordquo ldquo a doutrina juriacutedicardquo ldquo a religiatildeordquo e ldquo a Biacutebliardquo

Portanto a doutrina a opiniatildeo fundamentada de especialistas em geshyral e a legislaccedilatildeo podem ser utilizadas como fundamentos relevantes na redaccedilatildeo de argumentos de autoridade

Eacute fundamental tomar cuidado entretanto com uma posUira cada vez mais comum na praacutetica forense alguns operadores do Direito se iludem com a ideia de que a simples referecircncia a um dispositivo legal jaacute caracteriza a funshydamentaccedilatildeo de uma tese pelo argumento de autoridade Isso natildeo eacute verdade

Como jaacute dissemos eacute possiacutevel que a um mesmo caso concreto possam ser aplicados diversos dispositivos igualmente relevantes Essa eacute uma das muitas razotildees por que se exige que o argumentador aleacutem de fazer refeshyrecircncia agrave fonte legal a que recorre sustente por meio de uma justificativa coerente que a aplicaccedilatildeo daquela norma eacute pertinente ao caso e que natildeo gera qualquer situaccedilatildeo conflituosa ou incoerente

Natildeo bastaria portanto em dada fundamentaccedilatildeo dizer que ldquoo que se verifica no caso em anaacutelise eacute a verificaccedilatildeo da carecircncia de accedilatildeo por parte do ente puacuteblico-autor conforme determina o art 301 X do CPCrdquo Fica evidente que haacute uma tese aqui sustentada mas natildeo haacute argumentos que garantam a existecircncia da ldquo carecircncia de accedilatildeordquo Melhor seria se o paraacutegrafo argumentativo por autoridade fosse assim redigido

O que se comprova no caso em anaacutelise eacute a verificaccedilatildeo da carecircncia de accedilatildeo (art 267 V I e 301 X do CPC) por parte do ente puacuteblico-autor em virtude da ausecircncia do chamado interesse de agir condiccedilatildeo indispenshysaacutevel para o regular exerciacutecio do direito de accedilatildeo uma vez que o autor nunca teve a posse efetiva da aacuterea objeto do litiacutegio Isso impede que o seu pedido seja possessoacuterio

Veja que no paraacutegrafo anterior a legislaccedilatildeo reforccedila o que o argumenshytador sustenta por meio dos fatos

Para exemplificarmos a utilizaccedilatildeo do argumento de autoridade lereshymos dois fragmentos um em que o argumento de autoridade - com base na doutrina - estaacute mal utilizado e outro em que foi adequadamente utilizado

O fragmento a seguir foi retirado de uma sentenccedila e natildeo recorre agrave doutrina de maneira a aproveitar sua autoridade para reforccedilar a tese que estaacute sendo defendida pelo argumentador6

()O comportamento indicado agrave re eacute gerador de dano extrapatrimonial cuja existecircncia independe de prova de efetivos prejuiacutezos morais Acresshyccedila-se que ldquona prova do dano moral c das circunstacircncias que influem na determinaccedilatildeo do quantitativo a arbitrar os juizes teratildeo de recorrer agraves regras de experiecircncia comum subministradas pela observaccedilatildeo do que ordinariamente acontece referidas no art 335 do Coacutedigo de Processo C ivilrdquo (THEODORO JR Humberto Curso de Direito Processual Cishyvil 39 ed Rio de Janeiro Forense p 179)()

Perceba que se o argumentador sustentou no iniacutecio do paraacutegrafo que o dano extrapatrimonial natildeo depende de prova de efetivos prejuiacutezos moshyrais por que entatildeo citou o doutrinador para discutir a maneira como se arbitra a indenizaccedilatildeo por dano moral

O papel da doutrina eacute exatamente o de trazer legitimidade ao que se estaacute defendendo E uma maneira de se dizer que algum jurista cuja autorishydade jaacute foi reconhecida pela maioria pensa como vocecirc e que por isso sua tese deve ser acolhida

Deveria o operador do Direito ter trazido no fragmento anterior algum trecho da doutrina que reforccedila a ideia de que a existecircncia do dano extrapatrishymonial independe de prova de prejuiacutezos morais mas isso natildeo foi feito

De maneira diversa o fragmento abaixo retirado de uma fundamentaccedilatildeo de um agravo julgado pelo Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro7 reshycorre agrave doutrina adequadamente para construir seu argumento de autoridade

Certamente o sistema judiciaacuterio deve ser remunerado sob pena de inshycentivar-se a litigacircncia irresponsaacutevel em detrimento do interesse puacuteblishyco existente na prestaccedilatildeo jurisdicional Natildeo obstante referida atividade natildeo pode ser fonte de enriquecimento sem causa para o EstadoO valor da causa corresponde segundo D1NAMARCO agrave ldquo expressatildeo monetaacuteria do significado econocircmico dos benefiacutecios procurados pelo aushytor atraveacutes do processordquo (D INAM ARCO Instituiccedilotildees de Direito Proshycessual Civil v III 3a ed Satildeo Paulo Malheiros 2003 p 370) Como

5 PERELM AN Chaim amp OLBRECHTS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 350

6 Por razotildees eacuteticas natildeo seraacute indicada a fonte do trecho criticado7 Processo ndeg 1979804 Fl 83

112 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

nota o insigne processualista por natildeo se dispor a prestar gratuitamente o serviccedilo jurisdicional o Estado distribui entre os usuaacuterios as despesas que suporta em tal mister fazendo-o na proporccedilatildeo do interesse econocircshymico que cada um pretende satisfazer por meio do processo (ob cit pp 271-272) Em outras palavras o valor da causa haacute que observar o proveito econocircmico pretendido e obtido pelo demandanteIn casu o processo de conhecimento versou acerca da reparaccedilatildeo de danos materiais e morais tendo o autor formulado pedido geneacuterico E cediccedilo que em nosso direito a fixaccedilatildeo da indenizaccedilatildeo por dano moral ficou entregue ao prudente arbiacutetrio judicial

Perceba que a tese exposta no primeiro paraacutegrafo do fragmento - ldquoa prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo pode ser fonte de enriquecimento sem causa para o Estadordquo - foi defendida com base nas liccedilotildees de um ilustre doutri- nador Dinamarco cuja citaccedilatildeo foi contextuaiizada ao caso concreto disshycutido Tsso representa dizer que a citaccedilatildeo da legislaccedilatildeo da doutrina ou do especialista deve estar claramente relacionada com o caso concreto

Eacute importante frisar que apesar de muito persuasivo o argumento de autoridade deve ser exposto de maneira a que se comprove seu percurso loacutegico Ele natildeo vale apenas porque estaacute amparado pela legislaccedilatildeo ou pela doutrina espera-se que o ponto de vista sustentado seja tambeacutem coerente e razoaacutevel Por isso esteja atento natildeo faccedila de sua argumentaccedilatildeo um amonshytoado de citaccedilotildees8 Use-as apropriadamente

Quanto agrave citaccedilatildeo de doutrina recomendamos que o argumentador avalie com cautela quais e quantos autores seratildeo citados Existe uma relashyccedilatildeo diretamente proporcional entre a credibilidade de que goza um doutri- nador e a forccedila persuasiva da citaccedilatildeo de suas liccedilotildees Por isso eacute sempre mais interessante buscar autores e obras de referecircncia (satildeo eles fontes primaacuterias e fontes da atualidade) para cada mateacuteria tratada

A maioria dos autores cita a jurisprudecircncia como fonte de argumento de autoridade A esse respeito faremos alguns comentaacuterios quando trabashylharmos o argumento de analogia

Sabe-se que polifonia satildeo vozes que se incorporam ao texto do sujeito argumentashydor juriacutedico para dar consistecircncia agrave sua fala Existem basicamente duas maneiras de utilizar a polifonia por meio da paraacutefrase e da citaccedilatildeo A paraacutefrase consiste em reproduzir o conteuacutedo de uma fala com um discurso autocircnomo sem copiar o texto original Eacute importante contudo que a paraacutefrase seja fiel ao conteuacutedo original Citaccedilatildeo eacute o procedimento por meio do qual aquele que escreve copia textualmente a fala de outrem Para marcar que a autoria do texto natildeo eacute daquele que escreve usam-se as aspas para trechos de ateacute trecircs linhas ou recuo apropriado para trechos maiores A indicaccedilatildeo da fonte entretanto eacute adequada agraves duas fonnas de polifonia

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

s J4 Argumento de oposiccedilatildeo

Inicialmente ressaltemos que todo profissional do Direito quando argumenta sabe que seu ponto de vista seraacute contraposto por outro pro- Irsional que atua no polo adverso O contraditoacuterio eacute uma realidade a ser i-iifrentada pelo argumentador na praacutetica forense

Nesse sentido tentar prever alguns valores ou argumentos a serem nlilixados pela outra parte ao longo da busca da soluccedilatildeo jurisdicional para o conflito pode ser uma estrateacutegia discursiva bastante uacutetil pois ao mesmo u-inpo em que o advogado argumenta a favor de sua tese jaacute conseguiria lambeacutem mostrar que outra possibilidade de compreender os fatos - a do seu adversaacuterio - seria incompatiacutevel com a razoabilidade

Eacute justamente por essas razotildees que a oposiccedilatildeo se mostra um tipo de argumento eficiente para a redaccedilatildeo de uma boa fundamentaccedilatildeo juriacutedica Seguem assim os princiacutepios teoacutericos apresentados sobretudo por Ducrot ao longo de sua obra acerca da determinaccedilatildeo fraacutesica da argumentatividade por intermeacutedio de operadores argumentativos do tipo mas e embora que caracterizam esse tipo de argumento

Eacute comum que seja feita a distinccedilatildeo entre a oposiccedilatildeo restritiva - que utiliza os conectores coordenativos adversativos mas poreacutem entretanto contudo todavia - e a oposiccedilatildeo concessiva construiacuteda com as conjunccedilotildees Mibordinativas concessivas embora ainda que apesar de

Os autores ao longo dos anos vecircm se dedicando ao estudo do fenocircshymeno da concessatildeo veiculado sobretudo por estruturas com operadores argumentativos do tipo mas Eventualmente eles tratam da concessatildeo em estruturas com operadores do tipo embora

Ducrot diz que a expressatildeo [X mas Y ] pressupotildee que a afirmaccedilatildeo de X possa servir de argumento para uma certa conclusatildeo e que a proposiccedilatildeoY seja um argumento que anule essa conclusatildeo

Veja a construccedilatildeo a seguir

X0 motorista atropelou vaacuterias pesshysoas quando subiu na calccedilada mas9

Ypercebeu que aleacutem dos feridos as pesshysoas do lugar tambeacutem queriam linchaacute-lo

A conduta esperada para o caso de um motorista atropelar vaacuterias pessoas na calccedilada eacute que ele pare o automoacutevel e lhes preste socorro

A informaccedilatildeo de que as proacuteprias viacutetimas e outras pessoas do lugar queriam linchar o condutor do veiacuteculo eacute um argumento que anula a expectativa criada pela primeira proposiccedilatildeo e justifica a aushysecircncia de prestaccedilatildeo de socorro

9 Aleacutem do conector mas outras conjunccedilotildees poderiam ser utilizadas para unir os dois periacuteodos entretanto as relaccedilotildees semacircnticas estabelecidas seriam outras

114 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

No periacuteodo redigido ldquo o motorista atropelou vaacuterias pessoas quando subiu na calccedilada (X ) mas percebeu que aleacutem dos feridos as pessoas do lugar tambeacutem queriam linchaacute-lo (Y )rdquo atropelar as viacutetimas e linchamento conduzem a conclusotildees contraacuterias O emprego do mas entretanto natildeo imshyplica uma contradiccedilatildeo entre os dois conceitos X e Y satildeo duas informaccedilotildees que se opotildeem com relaccedilatildeo apenas ao movimento argumentativo colocado em evidecircncia pela conclusatildeo

Destaque-se que a conclusatildeo esperada para a primeira proposiccedilatildeo podeshyria ser algo como ldquo logo o motorista parou para lhes prestar socorrordquo e a conshyclusatildeo contraacuteria seria ldquo logo o motorista natildeo parou para lhes prestar socorrordquo

Trata-se do mas restritivo A afirmaccedilatildeo que precede o mas aparece como uma coisa que se concede que se reconhece e que a afirmaccedilatildeo seshyguinte vai ultrapassar sem anular Natildeo anula no sentido de que a manteacutem no niacutevel dos fatos mas a ultrapassa no sentido de que a desqualifica do ponto de vista argumentativo

A concessatildeo eacute uma estrateacutegia discursiva Se natildeo o fosse por que um locutor buscando fazer admitir alguma coisa concederia razatildeo a outrem sobre a existecircncia de objeccedilotildees agravequilo que ele mesmo afirma

O autor diz que assinalando objeccedilotildees agrave sua proacutepria tese daacute-se uma aparecircncia de objetividade e imparcialidade O indiviacuteduo apresenta-se como sendo capaz de considerar outros pontos de vista que natildeo o seu valoriza a opiniatildeo do outro e essa valorizaccedilatildeo parece um esforccedilo de clarividecircncia de honestidade e natildeo de propoacutesito

Como se pode constatar o autor ao estudar o mas com valor de resshytriccedilatildeo identifica o fenocircmeno da oposiccedilatildeo na oraccedilatildeo que o precede

Em Provar e Dizer (1981) ao falar da conjunccedilatildeo mas e das construshyccedilotildees de oposiccedilatildeo Ducrot explica que ao se dizer ldquo O tempo estaacute bom mas eu estou cansadordquo se reconhece que o bom tempo poderia levar o auditoacuterio a conclusotildees do tipo ldquo estou contenterdquo ou ldquoquero sairrdquo mas acrescenta-se a segunda proposiccedilatildeo a fim de dar uma razatildeo para recusar a conclusatildeo razatildeo que parece sobrepujar a inversa apresentada na primeira proposiccedilatildeo

No caso das concessivas introduzidas por operadores do tipo embora- ldquo Ele eacute forte embora seja pequenordquo Ducrot mostra a possibilidade de se argumentar por meio do que eacute dito na oraccedilatildeo subordinada ldquo Ele eacute pequenordquo contra o que afirma a principal ldquo Ele eacute forterdquo Haacute entretanto uma recusa de se seguir essa virtLialidade argumentativa e afirma-se a principal

O autor diz que escolheu o verbo reconhecer no que concerne a esses exemplos para assinalar que o argumentador natildeo somente atribui ao audi-

toacuterio uma tendecircncia a concluir ldquo a ausecircncia de forccedila da pequenezrdquo ou ldquoa sashytisfaccedilatildeo a partir do bom tempordquo mas tambeacutem admite a legitimidade dessa tendecircncia que ele reconhece por assim dizer como se fosse tambeacutem sua

Verifica-se entatildeo em Provar e Dizer o processo da concessatildeo sendo registrado por intermeacutedio de estruturas com mas e com embora A oposishyccedilatildeo eacute percebida e explicada por meio do verbo reconhecer no sentido de conceder

A estrutura que sugerimos para operacionalizar o uso deste tipo de argumento eacute a seguinte

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Embora proposiccedilatildeo acei- Apesar de ta como possiacute-Ainda que rnas Que se

quer negarEm que pese

tese

jaacute que _1 w proposiccedilatildeo queuma vez Se sobrepotildee agraveque anterior anulan-porque do ou minorando

os seus efeitosporquanto

Embora seja obrigaccedilatildeo do condushytor de um veiacuteculo socorrer as viacutetishymas de um acidente de tracircnsito

o motorista que deixou de parar para socorrer os feridos natildeo pratishycou omissatildeo de socorro

porque a lei natildeo pode exigir de algueacutem que ponha sua proacuteshypria vida ou sua integridade fiacutesica em risco para socorrer outrem

535 Argumento de analogia

Antes de apreciarmos como a analogia pode ser utilizada como esshytrateacutegia argumentativa e como se caracteriza esse tipo de argumento eacute imshyportante que se entenda o significado desse termo e quais as implicaccedilotildees de sua utilizaccedilatildeo

Segundo Miguel Reale10 a analogia consiste em sua essecircncia no preenchimento da lacuna verificada na lei graccedilas a um raciociacutenio fundado em razotildees de similitude ou ainda na correspondecircncia entre certas notas caracteriacutesticas do caso regulado e as daquele que natildeo o eacute

Assinala tambeacutem o doutrinador que o recurso agrave analogia natildeo impeshyde que lancemos matildeo concomitantemente dos costumes e dos princiacutepios gerais do Direito mesmo porque todo raciociacutenio analoacutegico pressupotildee a

10 REALE Miguel Liccedilotildees preliminares de Direito 25 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 p 317

116 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

apontada correspondecircncia entre duas modalidades do real confrontadas e conduz de maneira natural ao plano dos princiacutepios

Analogia portanto eacute o procedimento por meio do qual se pode esshytabelecer uma relaccedilatildeo de semelhanccedila entre coisas diversas Recorrer agrave analogia significa fazer uma espeacutecie de comparaccedilatildeo entre os termos em questatildeo

Ensina-se jaacute no Ensino Meacutedio uma figura de linguagem denominada metaacutefora que eacute na verdade uma forma de expressatildeo da analogia Em que ela consiste A metaacutefora caracteriza-se pelo emprego de uma palavra em sentido diferente do proacuteprio em decorrecircncia de uma relaccedilatildeo por semelhanshyccedila vislumbrada entre os termos comparados

E o que ocorre na frase ldquo O Estatuto da Crianccedila e do Adolescente (ECA ) eacute uma matildeerdquo Veja que foi estabelecida uma relaccedilatildeo associativa entre os termos ldquoEstatuto da Crianccedila e do Adolescenterdquo e ldquomatildeerdquo Quais caracteshyriacutesticas em comum guardam as duas expressotildees A metaacutefora sugere que o ECA seja protetivo acolhedor complacente compreensivo e vise ao bem estar das crianccedilas e dos adolescentes

O raciociacutenio eacute o seguinte

Estatuto da Crianccedila e do Adolescente Matildee

Legislaccedilatildeo Humana

Defensor da condiccedilatildeo de ldquoser em desenshyvolvimentordquo dos menores Compreensiva com os defeitos dos filhos

Tutela de maneira quase incondicional os direitos das crianccedilas Protetora incondicional de seus filhos

Considerado demasiadamente protecioshynista por alguns Acolhedora e carinhosa

Visa ao bem estar das pessoas cujos dishyreitos deve proteger Visa ao bem estar e agrave felicidade dos filhos

Assim o ECA assemelha-se agrave MAtildeEPerceba que soacute foi possiacutevel a associaccedilatildeo metafoacuterica entre os entes

porque ambos guardavam entre si alguns elementos em comum O mesmo ocorre em contextos como ldquomeu vizinho eacute um cavalordquo ldquo a prova foi mamatildeo com accediluacutecarrdquo etc

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 117

O argumentador aproveita-se do conhecimento preacutevio do auditoacuterio para que um dado conteuacutedo posto a esse grupo particular possa ser aplicashydo por semelhanccedila a outra situaccedilatildeo nova que se pretende sustentar Essa ideia reforccedila o entendimento de Miguel Reale de que todo raciociacutenio anashyloacutegico pressupotildee a apontada correspondecircncia entre duas modalidades do real confrontadas

Observe tambeacutem o raciociacutenio usado no paraacutegrafo abaixo quando se quer por exemplo sustentar que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil exerce sobre seus cidadatildeos poder soberano

A Constituiccedilatildeo protege os direitos fundamentais dos seus cidadatildeos e estabelece as normas de estruturaccedilatildeo e organizaccedilatildeo do Estado assim como a Biacuteblia reuacutene as orientaccedilotildees de Deus ao homem para que este viva em paz e seja feliz

Situaccedilatildeo conhecida pelo auditoacuterio

Conhecimento a ser alcanccedilado

Biacuteblia Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

orientaccedilotildees de Deus aos homens

orientaccedilotildees do Estado aos seus cidadatildeos

Ora se as orientaccedilotildees da Biacuteblia satildeo soberanas em decorrecircncia de quem as inspirou por analogia essa caracteriacutestica - soberania - passa agrave Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica por consequecircncia da aproximaccedilatildeo sugerida na argumentaccedilatildeo

Natildeo eacute adequado nesta hipoacutetese falar-se em lacuna mas ainda assim a analogia mostra-se eficiente pois eacute por meio dela que se podem transshymitir caracteriacutesticas conhecidas - garantidas pelo conhecimento preacutevio do auditoacuterio - a situaccedilotildees novas produzindo conhecimento novo

Importante eacute que ao estabelecer uma analogia entre dois ou mais tershymos - seja por meio de uma metaacutefora de uma gradaccedilatildeo ou de uma compara-

11 Como vimos o auditoacuterio desempenha um papel predominante na Teoria da Argumenshytaccedilatildeo de Perelman amp Tyteca e eacute definido como o conjunto de todos aqueles em que o orador quer influir com sua argumentaccedilatildeo Por isso a classificaccedilatildeo de maior vulto de tipos de argumentaccedilatildeo feita por Perelman amp Tyteca baseia-se na distinccedilatildeo entre a argumentaccedilatildeo que ocorre diante do auditoacuterio universal a argumentaccedilatildeo diante de um uacutenico ouvinte (o diaacutelogo) e a deliberaccedilatildeo consigo mesmo (Atiema 2000 p 86)

118 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ccedilacirco12 - uma consequecircncia decorre desse procedimento caracteriacutesticas de um ser passam a fazer parte do conjunto de traccedilos que compotildeem o significado do seu anaacutelogo em decorrecircncia da relaccedilatildeo loacutegica existente entre eles

Perelman13 tambeacutem distingue o argumento de analogia do argumento por comparaccedilatildeo Nas palavras do autor ldquo os argumentos de comparaccedilatildeo deveratildeo ser distinguidos tanto dos argumentos de identificaccedilatildeo quanto do raciociacutenio por analogiardquo Entretanto os criteacuterios a que Perelman recorre para mostrar essa diferenccedila satildeo de natureza subjetiva Ele afirma que a comparaccedilatildeo eacute um procedimento muito mais suscetiacutevel de prova que a anashylogia ou a semelhanccedila

Ainda segundo o autor eacute importante avaliar tambeacutem qual a vantashygem de se recorrer a esse procedimento como estrateacutegia relevante de arshygumentaccedilatildeo se os pensadores empiacutericos por exemplo sustentavam que ldquo seu uacutenico valor seria possibilitar a formulaccedilatildeo de uma hipoacutetese que seria verificada por induccedilatildeordquo 14

O legislador no artigo 4deg da Lei de Introduccedilatildeo agraves normas do Dishyreito Brasileiro facultou ao julgador a utilizaccedilatildeo da analogia como fonte do Direito O dispositivo legal prevecirc textualmente que ldquoQuando a lei for omissa o juiz decidiraacute o caso de acordo com a analogia os costumes e os princiacutepios gerais de direitordquo Essa faculdade dada pelo legislador ao aplicador do Direito esclarccc que a analogia ocupa um papel muito mais

12 Autores como Ulisses Infante - veja Curso de Gramaacutetica Aplicada aos Textos Satildeo Paulo Scipione 2001 p 595 - e Faraco e Moura - veja Gramaacutetica Satildeo Paulo Aacutetishyca 2002 p 578 - estabelecem a seguinte distinccedilatildeo a comparaccedilatildeo eacute operacionalizada na frase por meio de um tenno de valor comparativo - ldquocomordquo ldquo tal comordquo ldquo feitordquo ldquoque nemrdquo ldquo semelhante ardquo ldquocomo se fosserdquo etc - enquanto a metaacutefora permite a substituiccedilatildeo de um termo pelo outro e recorre ao verbo de ligaccedilatildeo ldquoserrdquo Assim no enunciado ldquo Essa dificuldade de falar em puacuteblico eacute uma pedra no meu caminhordquo veshyrifica-se uma metaacutefora diferente seria se a frase fosse ldquoEssa dificuldade de falar em puacuteblico eacute como uma pedra no meu caminhordquo em que ocorre uma comparaccedilatildeo Esse natildeo eacute poreacutem um criteacuterio absoluto pois Perelman amp Tyteca usam como exemplo de ocorrecircncia da analogia exatamente o que seria uma comparaccedilatildeo para esses autores ldquoAssim como os olhos dos morcegos satildeo ofuscados pela luz do dia a inteligecircncia de nossa alma eacute ofuscada pelas coisas mais naturalmente evidentesrdquo Entendemos que essa distinccedilatildeo natildeo se mostra relevante para a praacutetica argumentativa desenvolvida nos textos juriacutedicos Por argumento de analogia entenderemos aquele que recorre tanto agrave comparaccedilatildeo quanto agrave gradaccedilatildeo agrave semelhanccedila e a analogia propriamente dita

13 PERELM AN ChaTm Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 274

14 PERELM AN ChaTm Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 423

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 119

importante que o de ldquopossibilitar a formulaccedilatildeo de uma hipoacuteteserdquo Em todos os casos em que houver lacuna na lei para o tratamento de uma determinashyda mateacuteria o magistrado natildeo precisaraacute declinar de sua jurisdiccedilatildeo poderaacute julgar com base na analogia

Isso ocorre com muito mais frequecircncia do que se pode imaginar Atualmente o tema dos direitos civis dos homoafetivos requer a argumenshytaccedilatildeo por analogia para alcanccedilar a tutela desses direitos tendo em vista a ausecircncia de legislaccedilatildeo que trate do assunto apesar das inuacutemeras decisotildees laacutevoraacuteveis a essa minoria especialmente as recentes decisotildees do Superior Tribunal Federal Leia a reportagem abaixo

LACcedilOS AFETIVOS15ST J julga se homoafetivo pode ser beneficiaacuterio de plano de sauacutedeHomossexuais tecircm levado a melhor no processo em que se examina o direito de o companheiro ser beneficiaacuterio de plano de sauacutede Por enshyquanto o julgamento estaacute em trecircs a dois pela inclusatildeo na Terceira Turshyma do Superior Tribunal de Justiccedila O pedido de vista do Ministro Carshylos Antocircnio interrompeu o julgamento A informaccedilatildeo eacute do site do STJOs Ministros analisam se o companheiro homossexual Paulo Motta do funcionaacuterio da Caixa Econocircmica Federal de Porto Alegre Joatildeo Abreu pode ser beneficiaacuterio no plano de sauacutede O posicionamento final da Turma pode repercutir tanto nos movimentos homoafetivos no Brasil quanto nos planos de previdecircncia e de sauacutedeO Recurso Especial que estaacute em segredo de Justiccedila eacute da Caixa Econocircshymica Federal O relator eacute o Ministro Maacuterio Gomes Houve tambeacutem um recurso da Funcef - Fundaccedilatildeo dos Economiaacuterios Federais - mas por questotildees processuais natildeo foi admitidoA Caixa questiona acoacuterdatildeo do Tribunal Regional Federal da 4a Regiatildeo A segunda instacircncia reconheceu o direito de o autor da accedilatildeo incluir seu companheiro como beneficiaacuterio no plano de sauacutede dos economiaacuterios O TRF-4 no entanto afastou o reconhecimento de uniatildeo estaacutevel do casalDe acordo com o processo os dois moram juntos haacute sete anos dividem despesas da casa e ambos satildeo portadores do viacuterus HIV Por causa da doenccedila o autor da accedilatildeo teve de se aposentar e pediu a inclusatildeo do comshypanheiro em seu plano de sauacutede A CEF negou o pedidoA primeira instacircncia tambeacutem reconheceu o direito de admitir o compashynheiro no Plano de Assistecircncia Meacutedica Supletiva (PAM S) e na Funcef na condiccedilatildeo de dependente do autor da accedilatildeo O juiz federal da 10a Vara

15 Texto Adaptado da Revista Consultor Juriacutedico de 26 de abril de 2005

120 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

do Rio Grande do Sul Rogeacuterio Raul entretanto concluiu pela impossishybilidade de se reconhecer a uniatildeo estaacutevel por falta de amparo legalA relatora no TRF-4 Margarida Sampaio argumentou que a recusa das empresas em incluir o companheiro foi motivada pela orientaccedilatildeo sexual dos autores da accedilatildeo atitude que viola o princiacutepio constitucional da igualshydade

O caso em apreccedilo avalia a possibilidade de os homoafetivos terem direito agrave inclusatildeo de seu ldquocompanheirordquo 16 como dependente no plano de sauacutede A problemaacutetica central da questatildeo como jaacute apontado antes das deshycisotildees das Cortes Superiores passava pela suposta ausecircncia de previsatildeo expressa para reconhecer tal direito Muitas das vezes os argumentadores precisam recorrer a princiacutepios gerais como a dignidade da pessoa humana ou a igualdade de todos perante a lei para ter condiccedilotildees de se posicionar quanto ao conflito Hoje a preferecircncia tem sido pela analogia com a Lei de Uniatildeo Estaacutevel Sem o amparo da analogia portanto a tutela dos direitos do homoafetivo neste caso nunca seria garantida

Para se poder fundamentar adequadamente veja o raciociacutenio analoacuteshygico desenvolvido

1deg) A Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica pretende proteger a famiacutelia

Art 226 CRFB88 A famiacutelia base da sociedade tem especial proteccedilatildeo do Estadosect 3o Para efeito da proteccedilatildeo do Estado eacute reconhecida a uniatildeo estaacutevel entre o homem e a mulher como entidade familiar devendo a lei facilitar sua conversatildeo em casamento

2deg) Todos satildeo iguais perante a lei

Art 5o CRFB88 Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros reshysidentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualshydade agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes1 - homens e mulheres satildeo iguais em direitos e obrigaccedilotildees nos tershymos desta Constituiccedilatildeo

16 Discute-se a possibilidade de os homoafetivos serem reconhecidos como companheishyros Essa nomenclatura somente eacute paciacutefica quando aplicada aos relacionamentos heteshyrossexuais previstos na chamada Lei de Uniatildeo Estaacutevel

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 121

3deg) A proteccedilatildeo agrave entidade familiar deve se estender aos homoafetivos por analogia agrave entidade familiar composta entre o homem e a mulher seja no casamento seja na uniatildeo estaacutevel Eacute necessaacuterio poreacutem justificar fundamenta- damente por qual motivo a proteccedilatildeo de um caso se estende ao outro

Ao resumir esse raciociacutenio em um enunciado teriacuteamos o seguinte assim como a entidade familiar composta por homem e mulher estaacute amshyparada pela Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica a uniatildeo entre dois homens ou duas mulheres - jaacute que todos satildeo iguais perante a lei - deve ser tambeacutem ampashyrada pelo Estado

Uma vez entendida a analogia como recurso argumentativo de granshyde importacircncia eacute uacutetil mencionar que o Direito Penal tem a lei como uacutenica fonte para determinar se uma conduta eacute ou natildeo iliacutecita Isso ocorre por conta do princiacutepio da legalidade Por essa razatildeo eacute que natildeo cabe o recurso agrave analoshygia - analogia in malam partem - bem como agrave interpretaccedilatildeo integrativa ou ampliativa17 para imputar um crime ao reacuteu Somente eacute possiacutevel a analogia in bonampartem ou seja a favor do reacuteu

Em capiacutetulo anterior mencionamos que fariacuteamos nesta oportunidade uma reflexatildeo sobre a possibilidade de a jurisprudecircncia ser encarada como motivadora do argumento de analogia Na verdade a postura que adota a maioria dos autores eacute a de sugerir que a jurisprudecircncia daacute origem a um argumento de autoridade

Antes de enfrentar qualquer questatildeo poreacutem tomemos como conceito de jurisprudecircncia em sentido estrito o conjunto de decisotildees uniformes sobre uma determinada questatildeo juriacutedica prolatadas pelos oacutergatildeos do Poder Judiciaacuterio

O proacuteprio conceito atribuiacutedo agrave fonte aqui discutida sugere que sua autoridade adveacutem do oacutergatildeo que a profere Isso eacute inegaacutevel O que se quesshytiona eacute que independentemente da autoridade que a reveste o que faculta verdadeiramente seu uso - e a torna eficiente - eacute a proximidade do caso analisado com os outros cujas decisotildees satildeo tomadas como referecircncia

Isso implica dizer que em uacuteltima instacircncia o que faz do uso da jurisshyprudecircncia uma estrateacutegia interessante para a argumentaccedilatildeo eacute o raciociacutenio de que casos semelhantes devem receber tratamentos anaacutelogos por parte do Judiciaacuterio para que natildeo sejam observadas injusticcedilas ou inseguranccedila juriacutedica E a semelhanccedila entre o caso concreto analisado e o processo jaacute transitado em julgado que autoriza o uso da jurisprudecircncia

17 A respeito veja M IRABETE Julio Fabbrini Coacutedigo Penal Interpretado 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2003 p 98

122 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Tanto eacute assim que se ambos os conflitos versarem sobre direito pos- sessoacuterio por exemplo mas as circunstacircncias em que cada um deles ocorshyreu natildeo forem as mesmas a simples proximidade temaacutetica natildeo autoriza o uso da jurisprudecircncia pela autoridade de que eacute revestida Por essa razatildeo preferimos elencar as decisotildees judiciais reiteradas como motivadoras de argumentos por analogia

As suacutemulas representam uma discussatildeo agrave paite Quando o argumentador recorre a uma suacutemula vinculante sabe que ela tem ldquo forccedila de leirdquo e por isso mesmo essa fonte caracteriza na essecircncia um argumento de autoridade

Se a suacutemula natildeo eacute vinculante tem a mesma natureza juriacutedica que a jurisprudecircncia e portanto eacute fonte que caracteriza o uso do argumento de analogia pelas razotildees jaacute expostas

Lembramos poreacutem que para o acadecircmico de Direito importa muishytas vezes mais o domiacutenio das estrateacutegias argumentativas e dos tipos de argumento do ponto de vista praacutetico que a sua proacutepria classificaccedilatildeo pois essa eacute uma preocupaccedilatildeo prioritariamente didaacutetica

536 Argumento de causa e efeito

Causa e efeito - ou causa e consequecircncia - satildeo como duas faces de uma moeda pois para que haja um efeito naturalmente deve ter havido uma causa que o motivasse Assim tambeacutem um fato soacute pode ser visto como causa de algo se houver outros eventos que deles derivaram Enfim causa e consequecircncia satildeo quase indissociaacuteveis dependentes entre si

De acordo com as razotildees que deram origem a um determinado fato eacute possiacutevel que o Direito se importe mais com a causa do que com o dano propriamente dito Quando se fala em aumento no nuacutemero de atos infra- cionais cometidos por crianccedilas e adolescentes na cidade do Rio de Janeiro pode-se estar querendo discutir quais as causas de tal fenocircmeno Qual seria a relaccedilatildeo entre a praacutetica desses ldquodelitosrdquo e a pobreza por exemplo ou o grau de escolaridade desses menores ou o traacutefico iliacutecito de entorpecentes Somente seraacute possiacutevel avaliar adequadamente como coibir as consequecircnshycias desse fenocircmeno ao localizar a sua causa

A esse respeito o Desembargador Seacutergio Cavaiieri Filho assinala a necessidade de distinguir causa de fator comumente confundidos Nas pashylavras do autor

Antes de mais nada entretanto eacute necessaacuterio distinguir causa de fator coisas diferentes mas que por muitos satildeo confundidas Por causa enten-

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 123

de-se aquilo que determina a experiecircncia de uma coisa a circunstacircncia sem a qual o fenocircmeno natildeo existe E pois o agente causador do fenocircshymeno social sua origem princiacutepio motivo ou razatildeo de ser Eliminada a causa o fenocircmeno haveraacute de desaparecerJaacute o fator embora natildeo decirc causa ao fenocircmeno concorre para a sua maior ou menor incidecircncia Eacute a circunstacircncia que de qualquer forma concorshyre para o resultado Pode-se dizer por exemplo que a pobreza a miseacuteshyria eacute um fator de criminalidade porque segundo as estatiacutesticas 90 ou mais da populaccedilatildeo carceraacuteria satildeo constituiacutedas de pessoas provenientes de classes sociais mais humildes Mas natildeo eacute certamente a causa do crishyme porque haacute um nuacutemero muito grande de pobres que natildeo delinquem Pode-se dizer igualmente que o analfabetismo a ignoracircncia eacute outro fator da criminalidade ()18

Para a ciecircncia do Direito o nexo causal19 existente entre dois eventos tem grande relevacircncia porque todo indiviacuteduo tem direitos e obrigaccedilotildees decorrentes dos atos que pratica em face das demais pessoas que vivem sob as regras de um mesmo ordenamento juriacutedico Isso implica dizer que se um consumidor contrata uma empresa para reformar seu escritoacuterio e dushyrante a prestaccedilatildeo de serviccedilo um dos pedreiros causa um buraco na parede do escritoacuterio vizinho sua conduta gera como consequecircncia a responsabilishydade pelos danos materiais causados

Se houve o dano mas sua causa natildeo estaacute relacionada ao comportashymento do agente inexiste a relaccedilatildeo de causalidade e tambeacutem a obrigaccedilatildeo de indenizar Mesmo havendo nexo de causalidade poreacutem natildeo se podem desprezar as excludentes da responsabilidade civil como a culpa exclusiva da viacutetima ou de terceiro o caso fortuito e a forccedila maior20

Analisemos o caso concreto a seguir para melhor esclarecer a imshyportacircncia do nexo de causalidade e do argumento a que daacute origem para a atribuiccedilatildeo de responsabilidades na ordem civil

18 CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de sociologia juriacutedica (Vocecirc Conhece) 10 ed Rio de Janeiro Forense 2002

19 Para GRECO Rogeacuterio Curso de Direito Penal parte geral 4 d Rio de Janeiro Impetus 2004 p 232 ldquonexo causal ou relaccedilatildeo de causalidade eacute aquele elo necesshysaacuterio que une a conduta praticada pelo agente ao resultado por ela produzido Se natildeo houver esse viacutenculo que liga o resultado agrave conduta levada a efeito pelo agente natildeo se pode falar em relaccedilatildeo de causalidade e assim tal resultado natildeo poderaacute ser atribuiacutedo ao agente haja vista natildeo ter sido ele o seu causadorrdquo

20 A respeito consulte CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de responsabilidade civil 6 ed Satildeo Paulo Malheiros 2005

124 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Certa vez um soldado do Exeacutercito Marco Aureacutelio colocou sobre um armaacuterio do quartel um colchonete e acima dele um aspirador de poacute Quanshydo o soldado Joatildeo Ameacuterico foi puxar o colchonete dias depois foi atingido pelo pesado aparelho de aspirar poacute que natildeo havia conseguido visualizar

Seraacute que a conduta de guardar esse objeto no referido lugar eacute um comshyportamento esperado para aquele contexto ou Marco Aureacutelio agiu de maneira imprudente Na verdade o que perguntamos eacute existe nexo de causalidade entre a conduta de Marco Aureacutelio (deixar o aspirador de poacute sobre um colchoshynete) e o resultado (os ferimentos causados em Joatildeo Ameacuterico)

Aquele que entende que a conduta de Marco Aureacutelio foi adequada e previsiacutevel provavelmente entende que Joatildeo Ameacuterico deveria ter tido mais cautela ao puxar o colchonete pois ningueacutem puxa algo de cima de um armaacuterio sem o cuidado de se proteger de coisas que possam cair junto com o objeto puxado

Ao contraacuterio aqueles que entendem que Marco Aureacutelio foi quem adotou uma conduta imprudente ao colocar o aspirador de poacute onde natildeo se poderia vecirc-lo atribuiratildeo a ele a responsabilidade pelos ferimentos causashydos em Joatildeo Ameacuterico

A argumentaccedilatildeo acerca da relaccedilatildeo de causa e efeito nesta hipoacutetese passa pela discussatildeo sobre se a conduta adotada por Marco Aureacutelio eacute ou natildeo a causa dos ferimentos de Joatildeo Ameacuterico Eacute necessaacuterio contar portanto com certo grau de subjetividade sobre o que o auditoacuterio entende por conduta adequada (dever de cuidado) ou imprudente para soacute entatildeo discutir seus efeitos

Perelman assinala que ldquoessa argumentaccedilatildeo para ser eficaz reshyquer um acordo entre os interlocutores sobre os motivos de accedilatildeo e sua hierarquizaccedilatildeordquo 21 Exemplifica que se um jogador ganha sucessivas vezes no jogo de azar torna-se menos verossiacutemil que a causa de seu sucesso seja a sorte a tendecircncia eacute julgar que ele estaacute trapaceando Da mesma maneira se natildeo haacute contradiccedilatildeo entre a fala de testemunhas supotildee-se que a causa de tal coincidecircncia de explicaccedilotildees seja a veracidade de suas falas

Examinemos outro caso concreto se uma pessoa contrata um hospital para fazer uma cirurgia e em decorrecircncia da conduta imperita adotada pelo meacutedico durante a realizaccedilatildeo do procedimento ciruacutergico o paciente passa por problemas graves a responsabilidade pelos danos causados agrave sauacutede do consushymidor eacute da contratada Perceba que o viacutenculo causal entre a conduta adotada e o resultado alcanccedilado gera a obrigaccedilatildeo juriacutedica de indenizar E fato portanto

21 PERELM AN Chaiacutem Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 pp 301-302

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 125

que a relaccedilatildeo de causa e consequecircncia entre dois eventos eacute de grande importacircnshycia por exemplo para a atribuiccedilatildeo da responsabilidade de indenizar

Se tomarmos o viacutenculo causal entre dois eventos como elemento es- truturante de um raciociacutenio argumentativo trecircs possibilidades satildeo inicialshymente vislumbradas Perelman22 as enumera da seguinte maneira

a) A argumentaccedilatildeo facilita a relaccedilatildeo entre dois acontecimentos sucessivos por meio de um viacutenculo causalb) A argumentaccedilatildeo seleciona um acontecimento e busca descoshybrir qual a causa que pode tecirc-lo determinadoc) A argumentaccedilatildeo analisa um acontecimento e tenta evidenciar quais os efeitos que dele devem resultar

A tendecircncia natural do homem eacute na verdade a de sempre tentar racionalizar os acontecimentos e tentar entender o porquecirc dos fatos que observa Sempre se quer saber a causa ou o motivo que impeliu algueacutem a adotar certo comportamento pois eacute por meio da causa que se consegue estabelecer uma interpretaccedilatildeo coerente da conduta do indiviacuteduo

A relaccedilatildeo de causa e efeito entre dois eventos muitas das vezes aproshyxima-se do proacuteprio problema que a argumentaccedilatildeo precisa enfrentar Leia o relatoacuterio a seguir

2 Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg 121793Relator Des Seacutergio Cavalieri FilhoVistos relatados e discutidos estes autos de Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg 117296 em que eacute apelante Casa de Sauacutede Santa Helena Ltda e apelado Hamilshyton da Paixatildeo Amaratildeo e sua mulherAcordam os Desembargadores que integram a 2a Cacircmara Ciacutevel do Trishybunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro por maioria em dar proshyvimento parcial ao recurso para restringir a indenizaccedilatildeo ao dano moral e despesas com funeral vencido o Des Joatildeo Wehhi Dib que julgava a accedilatildeo improcedenteAccedilatildeo de responsabilidade civil pelo rito sumariacutessimo em razatildeo da morte de crianccedila receacutem-nascida Apontou-se como fato gerador da resshyponsabilidade da reacute o fato de ter sido dado alta hospitalar ao filho dos

22 PERELM AN Chaiacutem Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 299-300

126 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

autores logo apoacutes o seu nascimento quando ainda natildeo tinha condiccedilotildees fiacutesicas para tal A sentenccedila (f 3035) acolhendo parcialmente o pedido condenou a reacute a pagar aos autores indenizaccedilatildeo por dano moral - 100 salaacuterios miacutenimos - despesas com funeral e pensotildees vincendas a serem apuradas em liquidaccedilatildeo durante nove anos compreendidos entre os 16 e os 25 anos do filho dos autoresRecorre a vencida (f 3741) sustentando que natildeo existe nos autos proshyva da culpa da apelante natildeo podendo esta ser presumida mormente em se tratando de crianccedila nascida de matildee desnutrida e fumante Assim prossegue culpar a apelante pelo infeliz acontecimento importa em imputar-lhe responsabilidade pelo procedimento dos proacuteprios pais que sem condiccedilotildees resolveram ter mais um filho Aduz natildeo ter a sentenshyccedila considerado a baixa situaccedilatildeo social-fiacutenanceira dos apelados causa principal da mortalidade infantil e que a introduccedilatildeo da sonda natildeo foi a causa mortis da crianccedila Pede a reforma da sentenccedilaAo responder o recurso (f 4647) pugnam os apelados pelo seu des- provimentoEacute o relatoacuterio

Repare como a problematizaccedilatildeo do caso concreto coincide exatamenshyte com a relaccedilatildeo de causalidade entre a conduta do meacutedico que autorizou a alta hospitalar e o evento morte o problema seria de que maneira poder- -se-aacute comprovar que Alan Marques Amaral faleceu em decorrecircncia da alta hospitalar prematura e natildeo em decorrecircncia de seu fraacutegil estado de sauacutede

Por fim reforccedilamos que nenhuma relaccedilatildeo de causa e consequecircncia deve ficar sem uma explicaccedilatildeo coerente para justificar que o agente deveshyria adotar conduta diversa para evitar os resultados a ele imputados Mera relaccedilatildeo entre dois eventos (fato e consequecircncia) sem essa explicaccedilatildeo do argumentador natildeo passa de narraccedilatildeo de fatos insuficiente portanto para a fundamentaccedilatildeo de uma tese

537 Argumento de senso comum

Jaacute conhecemos a importacircncia das fontes formais do direito para a argumentaccedilatildeo Sabemos que a lei em especial em virtude do Positivismo Juriacutedico gozou sempre de tamanha credibilidade que certos profissionais julgam que podem argumentar apenas com base nessa fonte Nesse contexshyto o senso comum ficaria relegado a segundo plano porque fruto de um conhecimento vulgar (oposto a conhecimento cientiacutefico) aparentemente pouco valorizado no meio juriacutedico

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 127

Vimos poreacutem que o poacutes-positivismo proporcionou um novo panoshyrama para o tratamento das questotildees juriacutedicas relevantes que interferem na decisatildeo do processo Exemplificamos oportunamente que existem casos concretos em que a lei positivada deixa de ser aplicada em nome do sentishymento de justiccedila haacute ainda casos que necessitam do amparo da analogia pois a norma eacute lacunosa na regulaccedilatildeo do tema especiacutefico em debate

Em virtude dessa nova perspectiva poacutes-positivista houve uma rearrushymaccedilatildeo do prestiacutegio que todas essas fontes possuem diante do julgador e dos pensadores do direito O papel cada vez mais relevante da miacutedia nas decisotildees judiciais por exemplo eacute tema de diversos livros da atualidade E certo que a denominada ldquomiacutediardquo eacute fonte de argumento de autoridade mas o que os espeshycialistas vecircm apontando eacute a iacutentima relaccedilatildeo dos veiacuteculos midiaacuteticos e o senso comum pois aqueles promovem ou asseveram os sentimentos predominanshytes na coletividade denominada com frequecircncia ldquohomem meacutediordquo

Artur Ceacutesar de Souza23 lembra que quando os meios de comunicaccedilatildeo de massa determinam quais seratildeo as questotildees e os problemas de primeira relevacircncia fazem com que as pessoas direcionem toda a sua atenccedilatildeo para essa agenda ou ordem do dia

Quando essa agenda tem por finalidade as provas contidas num proshycesso judicial os meios de comunicaccedilatildeo aleacutem de informar tambeacutem reashylizam um ldquojulgamento paralelordquo desencadeando na opiniatildeo puacuteblica um complexo conjunto de sentimentos como por exemplo perplexidade oacutedio vinganccedila sensaccedilatildeo de impunidade etc

Enfim por todas as razotildees apresentadas o senso comum eacute hoje fonshyte de prestiacutegio cada vez maior no meio juriacutedico

O profissional do direito que recorre a essa fonte aproveita-se de uma afirmaccedilatildeo que goza de consenso geral e estaacute amplamente difundida na soshyciedade para validar seus raciociacutenios

O senso comum natildeo precisa estar necessariamente afastado do senso criacutetico Ainda que assistemaacutetico natildeo deve se afastar do bom senso sob pena de natildeo ser validado pela coletividade e perder o status de ldquoconsenso geralrdquo

Este argumento eacute muito bem recebido quando funciona como reforshyccedilo de outros argumentos Existe uma questatildeo importante que precisamos enfrentar com cuidado acerca desse assunto A validade da norma juriacutedica depende de vigecircncia e de eficaacutecia

23 SOUZA Artur Ceacutesar de A decisatildeo do juiz e a influecircncia da miacutedia Rio de Janeiro RT 2012 sinopse

128 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Por ter sido criada pelo processo legislativo proacuteprio a norma apreshysenta vigecircncia - forccedila que tem a norma para cumprir com sua finalidade regular condutas gerar efeitos sobre os eventos tatildeo logo ocorram no acircmshybito dos fatos

Mesmo em plena vigecircncia se a norma natildeo for acolhida como justa e capaz de resolver de maneira adequada o conflito seraacute letra morta Daiacute exisshytirem no Brasil as ldquo leis que pegamrdquo e as ldquo leis que natildeo pegamrdquo isto eacute normas que nunca saem do papel por natildeo gerarem os efeitos que dela se esperam

Se a coletividade representada pelo senso comum valida a aplicaccedilatildeo de uma norma se o sentimento social predominante eacute de que a norma alcanccedila os fins pretendidos ela passa a gozar tanto de vigecircncia quanto de eficaacutecia

E por essa razatildeo que sugerimos associar na abordagem dos temas polecircmicocircs o argumento de autoridade e o argumento de senso comum Os dois juntos promovem a condiccedilatildeo de validade desejada para a norma (vigecircncia + eficaacutecia) Haacute ainda casos em que a responsabilidade civil fica pouco clara na relaccedilatildeo juriacutedica A noccedilatildeo de dever de cuidado tatildeo bem exshyplicada pelo Desembargador Seacutergio Cavaiieri Filho24 seria portanto bem argumentada pela causa e efeito e reforccedilada pelo senso comum que valida a conduta cuidadosa e responsaacutevel a ser adotada pelo homem meacutedio

Oferecemos exemplos em que o argumento de senso comum reforccedila os argumentos de autoridade e de causa e efeito mas ele pode ser tambeacutem associado a qualquer outro dando-lhe completude e validade

538 Argumento ad hominem

Vimos que o argumento de autoridade invoca o prestiacutegio de uma deshyterminada pessoa ou grupo a partir do qual sua afirmaccedilatildeo ganha relevacircncia O argumento ad hominem de forma diametralmente oposta consiste no ataque a uma pessoa cujas ideias argumentos ou depoimentos pretende desqualificar Ao inveacutes de se enfrentar o argumento do adversaacuterio ataca-se a pessoa do adversaacuterio Ataca-se o homem e natildeo a ideia

O argumento ad hominem possui como organizaccedilatildeo baacutesica de racioshyciacutenio a seguinte estrutura

24 CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de responsabilidade civil 12 ed Satildeo Paushylo Atlas 2012

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 129

1 A considera B verdadeiro2A c pessoa contra quem pesam acusaccedilotildees graves jaacute comprovadas3 Entatildeo B eacute falso

Sabemos que a verossimilhanccedila e a aceitaccedilatildeo de urna assertiva estatildeo muito mais na sua razoabilidade e na loacutegica que somente na autoridade daquele que a enuncia Apesar de natildeo possuir bases loacutegicas este argumento constitui uma forte arma retoacuterica

O ataque agrave pessoa pode ocorrer por duas diferentes estrateacutegiasa) ataque direto agrave pessoa (argumento ad hominem abusivo) quando

coloca seu caraacuteter e seus valores morais em duacutevida e portanto a validade de sua argumentaccedilatildeo porque eivada de descredibilidade

Dois exemplos desse argumento estatildeo adiante sugeridosa 1) As afirmaccedilotildees de Richard Nixon a respeito da poliacutetica de relaccedilotildees

externas em relaccedilatildeo aacute China natildeo satildeo confiaacuteveis pois ele foi forccedilado a abshydicar durante o escacircndalo de Watergate

a2) O Ministro Joaquim Barbosa em sessatildeo no Supremo atacou o Ministro Gilmar Mendes quando disse que ele natildeo tem condiccedilotildees de lhe dar liccedilotildees de moral jaacute que conquistou sua condiccedilatildeo de prestiacutegio usando capangas cm sua cidade de origem e fazendo uso poliacutetico da miacutedia o que estava destruindo a credibilidade do STF Fecha seu raciociacutenio recorrendo ao senso comum ldquo Saia agrave rua Ministro Gilmar e constate o que as pessoas dizem a vosso respeitordquo A quem interessar sugerimos assistir agrave cena em que o debate argumentativo ocorre O acesso estaacute disponiacutevel em http wwwyoutubecomwatchv=Z 1 yOqrD 1 BTs

b) ataque agraves circunstacircncias em que o adversaacuterio realiza certa afirshymaccedilatildeo (argumento ad hominem circunstancial) que ocorre quando a pesshysoa natildeo por seu valores morais ou pessoais mas pelo contexto mostra-se incapaz de fazer certas afirmaccedilotildees

E esse o caso da desqualificaccedilatildeo da chamada ldquo testemunha ocularrdquo pelas condiccedilotildees em que assistiu aos fatos sobre os quais testemunha

b l) Em um processo criminal no qual se imputava o crime de hoshymiciacutedio a um policial militar o defensor puacuteblico questionava agrave uacutenica tesshytemunha do crime uma senhora de 72 anos o seguinte como a senhora- que tem 65 graus de miopia - pode garantir que foi o reacuteu quem matou se acabou de afirmar que levantou de madrugada com o barulho do tiro e olhou pela janela A senhora dorme de oacuteculos ou sua miopia natildeo a impede de reconhecer um rosto agrave noite a quase oitenta metros de distacircncia

130 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

b2) A disse - Foi este o homem que vi roubando aqriele carroB respondeu - Como pode afirmar isso se vocecirc estava becircbado

Perceba que o argumento ad hominem circunstancial pode ser muishyto eficiente quando a instruccedilatildeo do processo ainda estaacute em curso ou seja quando a produccedilatildeo das provas depende da maior ou menor credibilidade de quem a oferece

539 Argumento a fortiori

O argumento a fortiori - com mais razatildeo - eacute aquele que estabelece uma relaccedilatildeo entre dois eventos de maneira a orientar a conduta de um bashyseada no paracircmetro estabelecido pelo outro

O argumento a fortiori pode sempre ser resumido numa foacutermula como esta se a soluccedilatildeo X eacute adequada para o caso Y com maior razatildeo deve ser tambeacutem adequada para o caso Z que eacute uma forma mais grave (ou mais evidente ou mais ampla ou mais intensa ou maior) de X

Em virtLide disso eacute comum recorrer-se agrave noccedilatildeo de proporcionalidade que no direito tem natureza juriacutedica de princiacutepio O princiacutepio da proporcioshynalidade tem o objetivo de coibir excessos desarrazoados por meio da afeshyriccedilatildeo da compatibilidade entre os meios utilizados e os fins pretendidos a fim de evitar restriccedilotildees desnecessaacuterias ou abusivas Celso Ribeiro Bastos25 entende que a proporcionalidade natildeo eacute um princiacutepio mas um paracircmetro interpretativo do direito

Com base na proporcionalidade prevalece o entendimento de que natildeo eacute liacutecito valer-se de medidas restritivas aplicar penas ou formular exishygecircncias aleacutem daquilo que for estritamente necessaacuterio para a realizaccedilatildeo da finalidade almejada

A tiacutetulo de esclarecimento pensemos no artigo 213 do CP o qual prevecirc o crime de estupro A pena abstrata prevista para essa conduta iliacutecita eacute reclusatildeo de 6 a 10 anos Perceba como a proporcionalidade pode auxiliar na discussatildeo sobre a aplicaccedilatildeo da pena

A atual redaccedilatildeo do dispositivo eacute a seguinte ldquo art 213 do CP - consshytranger algueacutem mediante violecircncia ou grave ameaccedila a ter conjunccedilatildeo carshynal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinosordquo

25 BASTOS Celso Ribeiro apud TAVARES Andreacute Ramos Curso de direito constishytucional Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 551

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 131

Dessa forma o bandido que ficou conhecido como ldquomaniacuteaco do parshyquerdquo praticou o mesmo crime que um rapaz o qual encosta propositalmente em algueacutem dentro do ocircnibus a fim de se excitar O primeiro praticou meshydiante violecircncia a conduta prevista na parte inicial do dispositivo (conjunshyccedilatildeo carnal) o segundo com ameaccedila velada a conduta prevista na parte linal (ato libidinoso)

Ambos praticaram certamente condutas moralmente reprovaacuteveis mas seria justa a aplicaccedilatildeo da pena de 6 anos (miacutenimo legal) agravequele que se dedicou ao ato obsceno A severidade da sanccedilatildeo deve corresponder agrave maior ou menor gravidade da infraccedilatildeo penal Quanto mais grave o iliacutecito mais severa deve ser a pena

Muitos profissionais vecircm sustentando que o legislador perdeu excelenshyte oportunidade quando da alteraccedilatildeo da lei penal de propor uma pena proshyporcional agraves diversas condutas inclusas na tipicidade do crime de estupro

Alberto Marques dos Santos26 reuacutene alguns outros exemplos elucishydativos

Do menor se deduz o maior do menos evidente se deduz o mais evidenshyte Assim se a negligecircncia deve ser punida afortiori deve ser punido o ato premeditado [Ferraz] Se a prova testemunhal foi aceita afortiori deve tambeacutem ser aceita a prova documental [Nunes] Se a oferta de contestaccedilatildeo na data da audiecircncia do procedimento sumaacuterio afasta a reshyvelia a fortiori a entrega da contestaccedilatildeo em cartoacuterio antes dessa data tambeacutem a afasta

E liacutecito dizer da mesma maneira que o argumento a fortiori deriva do brocardo ldquoquem pode o mais pode o menosrdquo Quando o argumenta- dor recorre a essa estrateacutegia seu objetivo eacute conseguir uma aplicaccedilatildeo mais extensiva da lei para que se aplique agrave situaccedilatildeo faacutetica que nela natildeo estaacute expliacutecita

Um exemplo que ilustra essa explicaccedilatildeo se a lei exige dos Promoshytores de Justiccedila que nas denuacutencias discriminem as accedilotildees de cada um dos acusados com mais razatildeo se deve exigir que o Magistrado as individualize na sentenccedila

26 SANTOS Alberto Marques dos Argumentaccedilatildeo juriacutedica os melhores e os piores argumentos na retoacuterica forense Disponiacutevel em lthttpalbertodossantosword- presscomartigos-juridicosargumentacao-forensegt Acesso em 18jul 2012

132 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

5310 Argumento por absurdo

O argumento por absurdo eacute aquele que natildeo apenas mostra que o ar- gumentador estaacute certo mas tambeacutem que o advogado da parte contraacuteria estaacute errado

Consiste portanto em demonstrar a natildeo validade de uma tese Para isso eacute necessaacuterio apenas pressupor que ela seja verdadeira mas mostrar dividindo sua explicaccedilatildeo em pedaccedilos que sua aplicaccedilatildeo leva a resultados contraditoacuterios e inadmissiacuteveis ou seja absurdos

Trata-se de demonstrar a falsidade de uma afirmaccedilatildeo ou a invalidade de uma ideia evidenciando que seus efeitos ou desdobramentos contrashydizem essa mesma ideia ou conduzem ao impossiacutevel ao inadmissiacutevel Portanto o argumento pelo absurdo aceita provisoriamente a tese que se quer combater e desenvolve-a ateacute conseguir demonstrar seus efeitos absurdos

No campo hermenecircutico27 usa-se o argumento por absurdo para mosshytrar que a aceitaccedilatildeo de uma interpretaccedilatildeo da norma levaria a) a contrariar o fim visado pela mesma norma b) a contradizer norma hierarquicamente superior c) agrave antinomia entre a norma interpretada e o sistema em que estaacute inserida ou d) a uma inconstitucionalidade

Adiante citamos dois exemplos desse tipo de argumentos disponibishylizados tambeacutem internet28 No primeiro deles a prevalecer a tese da defesa de que sem periacutecia de prestabilidade natildeo se reconhece a qualificadora do art 157 sect 2W 1 do CP a referida qualificadora jamais seraacute aplicada E que semelhante entendimento coloca nas matildeos do assaltante a escolha entre querer responder por roubo qualificado ou por roubo simples Bastaraacute ao meliante esconder a arma e jamais a qualificadora seraacute aplicada Assim a tese da defesa deixa a incidecircncia da qualificadora ao arbiacutetrio do marginal e faz letra morta do art 157 sect 2o I

Outro exemplo se a eliminaccedilatildeo do prejuiacutezo pela recuperaccedilatildeo da res apoacutes a consumaccedilatildeo justificasse a aplicaccedilatildeo do privileacutegio do art 155 sect I o entatildeo todo furto tentado seria privilegiado jaacute que nele sempre a res eacute recuperada

27 REDUCcedilAtildeO ao absurdo Disponiacutevel em lthttpgrandeaboboracom reducao-ao- absurdohtmlgt Acesso em 18 jul 2012

28 Ibidem

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO m

5311 Argumento de fuga

Argumento de fuga eacute o argumento de que se vale o advogado para escapar agrave discussatildeo central em que seus argumentos provavelmente natildeo prevaleceriam Apela-se em regra para a subjetividade

Eacute o argumento por exemplo que o advogado utiliza quando enalteshyce o caraacuteter do acusado lembrando tratar-se de pai de famiacutelia de pessoa responsaacutevel de reacuteu primaacuterio quando haacute acusaccedilatildeo por exemplo de lesotildees corporais ou homiciacutedio culposo na direccedilatildeo de veiacuteculo automotor

Perceba que qualquer pessoa ldquode bemrdquo pode em algum momento praticar um crime culposo Se a autoria a materialidade e a culpabilidade desse crime forem inegaacuteveis resta ao advogado apenas enaltecer suas quashylidades a fim de conseguir a fixaccedilatildeo de uma pena branda ou - quem sabe- desqualificar o crime a ele imputado

Um caso de grande repercussatildeo em que esse argumento foi utilizado diversas vezes foi o do goleiro Bruno O primeiro advogado que lhe reshypresentou insistiu imensamente na ideia de que a viacutetima Eliza Samudio estava viva e pressionou os jurados com a possibilidade de condenar um inocente jaacute que natildeo foi encontrado seu corpo Levantou a possibilidade de que uma foto desfocada e de longe seria da suposta viacutetima que estava na Europa afirmou que estivesse filmando uma produccedilatildeo eroacutetica em oushytro estado e aventou ateacute mesmo uma conspiraccedilatildeo contra seu cliente entre outras coisas

Enfim todas essas afirmaccedilotildees sem qualquer verossimilhanccedila trazishydas pelo advogado apenas tumultuaram o processo e deixaram os jurados confusos Trata-se de verdadeiros argumentos de fuga

Esse argumento somente eacute recomendado quando natildeo houver como se opor aos argumentos da parte contraacuteria O ideal eacute sempre enfrentar as quesshytotildees relevantes do conflito de maneira clara objetiva concisa e consistente No entanto existem situaccedilotildees em que o advogado natildeo tem muito a fazer pois o processo eacute francamente desfavoraacutevel a seu cliente

Natildeo seraacute exercida a defesa Claro que sim A saiacuteda eacute evitar o reforccedilo exagerado das questotildees tormentosas e enfocar outras em que as eventuais qualidades pessoais ou morais do reacuteu possam ser destacadas

Caso o profissional esteja patrocinando o autor natildeo eacute adequando o uso do argumento de fuga Para ajuizar a accedilatildeo o advogado deve no miacuteshynimo ter um bom conjunto probatoacuterio uma adequada causa de pedir e consistentes argumentos que sustentem a tese Caso contraacuterio o melhor eacute desistir da demanda por absoluta falta de fundamento juriacutedico

134 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Outra observaccedilatildeo que se mostra pertinente eacute que o argumento de fuga causa menos prejuiacutezos ao argumentador quando desenvolvido em situaccedilatildeo de fala durante audiecircncias nas sustentaccedilotildees orais em debates na tribuna quando discursa etc

No discurso oral o uso de estrateacutegias argumentativas menos qualifishycadas pode ser minimizado por outros recursos retoacutericos como a utilizaccedilatildeo competente da voz preenchimento adequado do ldquo espaccedilo cecircnicordquo frases de efeito bem colocadas entre outros

Nas peccedilas processuais e no texto escrito em geral a possibilidade de manusear a argumentaccedilatildeo e estudaacute-la com cuidado fragiliza-a em demasia quando se recorre a argumentos como o de fuga pois repetimos trata-se de estrateacutegia liltima para minimizar as consequecircncias nocivas de um proshycesso difiacutecil para a parte reacute

54 O USO DA DEDUCcedilAtildeO E INDUCcedilAtildeO NA PRODUCcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

Ao longo do capiacutetulo anterior vocecirc estudou diversos tipos de argushymento disponiacuteveis para convencer o auditoacuterio da validade da tese que se pretende sustentar Passaremos agora agrave compreensatildeo de que o desenvolshyvimento de tais raciociacutenios argumentativos pode se dar tanto pelo meacutetodo dedutivo quanto pelo meacutetodo indutivo Ambos estatildeo agrave disposiccedilatildeo do profisshysional do direito para facilitar a persuasatildeo de seu interlocutor

Em primeiro lugar vamos conhecer melhor o processo dedutivo de construccedilatildeo dos argumentos Para isso eacute necessaacuterio defini-lo A deduccedilatildeo eacute uma inferecircncia que parte do universal para o particular Considera-se que um raciociacutenio eacute dedutivo quando a partir de determinadas afirmaccedilotildees (premissas) aceitas como verdadeiras o advogado chega a uma conclusatildeo loacutegica sobre uma dada questatildeo discutida no processo

Dito em outras palavras a deduccedilatildeo parte de uma verdade geral (preshymissa maior) previamente aceita para afirmaccedilotildees particulares (premissas menores) A aceitaccedilatildeo da conclusatildeo depende das premissas se elas forem consideradas verdadeiras a conclusatildeo seraacute tambeacutem aceita Por isso todo conteuacutedo da conclusatildeo deve estar contido pelo menos implicitamente nas premissas

Ainda que jaacute se tenha compreendido o que caracteriza o processo dedutivo o leitor deve estar se perguntando como na praacutetica se redige

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 135

um paraacutegrafo argumentative que recorre a esse meacutetodo Para cumprir essa tarefa vamos conhecer o caso concreto adiante

Socircnia pouco antes de entrar em trabalho de parto foi internada na C liacuteshynica Nova Iguaccedilu Dor no Rio de Janeiro Necessitando de cuidados especiais o meacutedico plantonista recomendou a sua remoccedilatildeo para outro hospital Autorizada a saiacuteda da paciente ela foi conduzida por uma das enfermeiras ateacute o veiacuteculo da remoccedilatildeo um fusca Durante o trajeto deu- -se o parto vindo a morrer a parturiente e seus dois filhosEm accedilatildeo indenizatoacuteria a autora pleiteia indenizaccedilatildeo por danos morais Alega que a morte de sua filha e netos decorreu de negligecircncia da C liacuteshynicaEm contestaccedilatildeo sustenta a reacute que natildeo haacute relaccedilatildeo de causalidade entre a conduta da cliacutenica e os oacutebitos pois a autora foi informada de que a ambulacircncia estaria agrave sua disposiccedilatildeo em 2 horas e a transferecircncia soacute foi realizada antes em virtude da impaciecircncia da autora e de seus familiashyres que providenciaram a remoccedilatildeo em veiacuteculo particular

Retomemos brevemente o que o caso discute a autora ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria em face da cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor porque sua filha e netos faleceram apoacutes a realizaccedilatildeo de um parto dentro de um fusca quando eram transferidos para outro hospital jaacute que um meacutedico da cliacutenica (portanto preposto da prestadora de serviccedilos) entendeu que a parturiente necessitava de cuidados especiais o que natildeo conseguiria naquele estabelecimento em que foi atendida inicialmente

O que levou a autora a crer que faz jus ao ressarcimento por danos morais Provavelmente ela assim raciocinou

PREMISSA MAIOR (norma)

PREMISSA MENOR (fato)

CONCLUSAtildeO (junccedilatildeo das premissas)

0 Coacutedigo de Defesa do Conshysumidor estabelece em seu art 14 que ldquoo fornecedor de serviccedilos responde indepenshydentemente da existecircncia de culpa pela reparaccedilatildeo dos dashynos causados aos consumishydores por defeitos relativos agrave prestaccedilatildeo dos serviccedilosrdquo

A cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor natildeo tinha disponiacuteveis os reshycursos necessaacuterios para reashylizar o parto de minha filha e a remoccedilatildeo para outro hosshypital seria excessivamente demorada

A cliacutenica tem a responshysabilidade de me indeshynizar mesmo que natildeo tenha agido com culpa porque houve defeito na prestaccedilatildeo de seus serviccedilos

136 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Se assim ocorreu seu raciociacutenio para desenvolver o argumento de autoridade foi dedutivo Repare como a partir de uma afirmaccedilatildeo geral abstrata decorrente da norma foi possiacutevel apreciar os fatos do caso conshycreto e assim chegar agrave conclusatildeo desejada

Eacute importante ainda compreender como a empresa reacute prestadora de serviccedilos Cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor teria desenvolvido um argumento de sua contestaccedilatildeo por meio do procedimento dedutivo

Lembremos que a autora sustenta a tese de que houve prestaccedilatildeo deshyfeituosa do serviccedilo Por serviccedilo defeituoso nos termos do art 14 sect 1deg I do CDC entende-se aquele que natildeo fornece a seguranccedila que o consumidor dele pode esperar levando-se em consideraccedilatildeo as circunstacircncias relevanshytes entre as quais o modo de seu fornecimento

Ora se o meacutetodo dedutivo eacute uma inferecircncia que parte do geral (norshyma) para o particular (fato) eacute fundamental buscar amparo na norma - preshyferencialmente no proacuteprio Coacutedigo de Defesa do Consumidor - para dizer que natildeo haacute obrigaccedilatildeo de indenizar

Com esse propoacutesito veja o que dispotildee o art 14 sect 3o II do CDC o fornecedor de serviccedilos soacute natildeo seraacute responsabilizado quando provar a culpa exchisiva do consumidor ou de terceiro Poreacutem seraacute que existe algum fato que demonstre ter sido a culpa da morte da parturiente e de seus dois filhos decorrente de culpa de terceiro Lendo novamente o caso concreto seraacute possiacutevel atentar para o fato de que a paciente foi removida em veiacuteculo particular por seus proacuteprios familiares em vez de esperar a remoccedilatildeo adequada (por ambulacircncia) o que na visatildeo da empresa prestadora de serviccedilos foi determinante para que as mortes ocorressem

O argumento de autoridade produzido pela empresa reacute pelo meacutetodo dedutivo ficaria assim estruturado

PREMISSA MAIOR (norma)

PREMISSA MENOR(fato)

CONCLUSAtildeO (junccedilatildeo das premissas)

0 Coacutedigo de Defesa do Consumidor estabelece em seu art 14 sect 3o II que ldquoo fornecedor de sershyviccedilos soacute natildeo seraacute responshysabilizado quando provar a culpa exclusiva do conshysumidor ou de terceirordquo

Autorizada a saiacuteda da paciente ela foi conduzida ateacute o veiacuteculo da remoccedilatildeo um fusca A transshyferecircncia soacute foi realizada antes em virtude da impaciecircncia da autora e de seus familiares que providenciaram a remoccedilatildeo em veiacuteculo particular

A remoccedilatildeo inadequada da paciente foi motivo sushyficiente para causar-lhe a morte A culpa eacute exclushysiva de terceiros - seus familiares

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 137

Vocecirc deve ter percebido que houve uma busca pelos fatos que se ldquo encaixassemrdquo agrave norma ldquoadequadardquo para defender a tese escolhida Esse procedimento eacute dedutivo e se caracteriza pela subsunccedilatildeo do fato agrave norma

Por tudo o que se viu eacute indiscutiacutevel a importacircncia do raciociacutenio deshydutivo para o Direito no Brasil Jaacute mencionamos que para a dogmaacutetica juriacutedica tradicional os profissionais que atuam na soluccedilatildeo de conflitos leshyvados ao Judiciaacuterio deveriam encontrar o sentido do direito preferencialshymente no sistema de normas escritas que regulam a vida social de um determinado povo (direito positivo)

Isso implica dizer que tradicionalmente o meacutetodo dedutivo tem sido privilegiado na praacutetica juriacutedica Existem situaccedilotildees em que a pretensatildeo da parte eacute acolhida de forma quase inequiacutevoca pela norma o dispositivo legal natildeo tem interpretaccedilotildees ambiacuteguas ou diacutespares Tanto a doutrina quanto a jurisprudecircncia jaacute fixaram entendimento favoraacutevel ao interesse da parte En- lim em lides com esse perfil recorrer agrave norma e realizar a subsunccedilatildeo dos fatos a ela (meacutetodo dedutivo manifestado pelo silogismo) eacute com certeza a melhor opccedilatildeo

Mas seraacute que o meacutetodo dedutivo eacute sempre o mais apropriado para redigir paraacutegrafos argumentativos

Haacute momentos em que a norma dispotildee de forma muito geneacuterica como devem proceder as pessoas na vida social Haacute ainda casos em que a aplicaccedilatildeo fria da lei toma-se indiscutivelmente pouco razoaacutevel Ou seja natildeo satildeo poucos os contextos em que partir da norma em abstrato para solushycionar conflitos juriacutedicos seraacute uma escolha pouco produtiva

A recomendaccedilatildeo entatildeo eacute observar os acontecimentos do conflito em discussatildeo e comparar esses fatos com os de outros casos e daiacute extrair certas regularidades de conduta e de valor Isso que dizer que a norma a ser aplicada e a interpretaccedilatildeo a ela cabiacutevel satildeo extraiacutedas a partir da observaccedilatildeo dos fatos O raciociacutenio vai do particular para o geral

E importante assinalar tambeacutem que eacute um equiacutevoco pensar que indushyccedilatildeo e deduccedilatildeo satildeo procedimentos essencialmente argumentativos Vaacuterias outras ciecircncias recorrem a esse meacutetodo para produzir seus conhecimentos especiacuteficos

Em uma pesquisa eleitoral por exemplo a estatiacutestica utiliza com freshyquecircncia a induccedilatildeo Por meio de amostragem de eleitores realiza-se a pesquishysa que seraacute utilizada para encontrar o percentual de votos que cada um dos candidatos receberaacute no dia da votaccedilatildeo E claro que a validade dos resultados depende da representatividade da amostra de eleitores escolhidos

138 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Contudo o que nos interessa eacute como a induccedilatildeo pode ajudar os opeshyradores do direito a alcanccedilar seus objetivos em situaccedilatildeo de argumentaccedilatildeo Observe o raciociacutenio que se desenvolve adiante um advogado pretende sustentar em juiacutezo no ano de 2002 que seu cliente - com 75 anos de idade e com grau de escolaridade elevado - foi ludibriado ao assinar um contrato de concessatildeo de creacutedito em um banco que faz propagandas na televisatildeo oferecendo altas taxas de juros mas muitas outras facilidades para os aposhysentados Pretende o advogado conseguir a anulaccedilatildeo do contrato sem o pagamento dos juros pactuados no momento da assinatura do contrato

Por que deve o negoacutecio juriacutedico ser desfeito Que tipo de viacutecio foi observado A proposta argumentativa do advogado eacute sustentar que em deshycorrecircncia da idade do contratante ele era mais vulneraacutevel que outra pessoa rfiais jovem ainda que possuiacutesse alto grau de escolaridade Seria facilmente acolhida essa tese naquele ano Lembre que o Estatuto do idoso29 somente foi sancionado pelo Presidente da Repuacuteblica em outubro de 2003

Ainda assim em 2002 o advogado poderia afirmar - por induccedilatildeo- que seu cliente por ser idoso deve receber tratamento mais favoraacutevel da lei porque o Estado protege o mais fraco A argumentaccedilatildeo seguiria o seguinte raciociacutenio

REFLEXAtildeO CONCLUSAtildeO

Ainda que homens e mulheres sejam iguais em direitos e obrigaccedilotildees (art 5o I da CRFB) a mulher recebeu da Carta Magna direitos de proteccedilatildeo mais amplos que os hoshymens no mercado de trabalho Leia o art 7o XX da CRFB ldquosatildeo direitos dos trabalhadores urbanos e rurais aleacutem de outros que visem agrave melhoria de sua condiccedilatildeo social proteccedilatildeo do mercado de trabalho da mulher mediante incentivos especiacuteficos nos termos da leirdquo

Homens e mulheres satildeo iguais perante a lei mas quando um fica em situaccedilatildeo de desvantashygem em relaccedilatildeo ao outro o leshygislador originaacuterio tenta proteger o hipossuficiente e restabelecer a igualdade

29 Apoacutes sete anos tramitando no Congresso o Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e sancionado pelo presidente da Repuacuteblica no mecircs seguinte ampliando os direitos dos cidadatildeos com idade acima de 60 anos Mais abrangente que a Poliacutetica Nacional do Idoso lei de 1994 que dava garantias agrave terceira idade o estatuto institui penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadatildeos da terceira idade Disponiacutevel em lthttpwwwserasacombrguiaidoso20htmgt Acesso em 3 fev 2008

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 139

REFLEXAtildeO CONCLUSAtildeO

No art 170 da CRFB lecirc-se que ldquoa ordem ecoshynocircmica fundada na valorizaccedilatildeo do trabalho humano e na livre iniciativa tem por fim asshysegurar a todos existecircncia digna conforme os ditames da justiccedila socialrdquo Entretanto o incisoV do mesmo artigo assinala que apesar desshysa liberdade a defesa do consumidor deve ser promovida

As relaccedilotildees econocircmicas no Brashysil satildeo regidas pela liberdade mas o consumidor deve receber tutelas especiacuteficas em relaccedilatildeo agraves empresas porque nessa relaccedilatildeo tendem a ser hipossu- ficientes

O Coacutedigo Penal brasileiro prevecirc vaacuterias conshydutas tiacutepicas que seratildeo punidas caso alguma pessoa resolva praticaacute-las Em geral qualquer um independente de sexo condiccedilatildeo social profissatildeo etc estaraacute sujeito agraves sanccedilotildees ali previstas mas a crianccedila e o adolescente - que satildeo seres ainda em desenvolvimento- receberam amparo de legislaccedilatildeo especiacuteshyfica (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente)

Todos satildeo iguais perante a lei mas crianccedilas e adolescentes por sua condiccedilatildeo peculiar de seres em formaccedilatildeo ou seja por serem hipossuficientes satildeo protegidos com maior amplitude pelo Estado

Observe o esquema

0 Estado protege de maneirapeculiar as mulheres nas relaccedilotildeesde trabalho porque haacute situaccedilotildeesespeciacuteficas em que elas estatildeo

em desvantagem em relaccedilatildeo aoshomens

O Estado protege de maneira peculiar as crianccedilas e os

adolescentes porque satildeo mais fracos que os adultos

0 Estado protege de maneirapaculiar os consumidores nas

relaccedilotildees de consumo porque haacutesituaccedilatildeo especiacutefica em que eles

estatildeo em desvantagem em ralaccedilatildeoas empresas

J

O Estado deve proteger o

hipossuficiente tal como o satildeo os

idosos

140 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Para melhor ilustrar esse procedimento vejamos mais um caso concreto

Roberto Veloso ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria em face de Agecircncia de Viashygens Solimar Ltda e Hotel Fazenda Cruzeiro pretendendo o ressarcishymento pelos danos sofridos em acidente que lhe causou tetraplegia O autor afirma haver contratado com a primeira reacute pacote de turismo com excursatildeo para Serra Negra em Satildeo Paulo onde se hospedou nas instalaccedilotildees da segunda reacute por volta das 22hNa mesma noite ao dar um mergulho em uma das piscinas do hotel o autor bateu violentamente no piso da piscina que estava vazia Susshytentou inexistir qualquer aviso nem mesmo um obstaacuteculo ou uma coshybertura que impedisse o acesso dos hoacutespedes agravequele local Postula o ressarcimento a tiacutetulo de dano proveniente de relaccedilatildeo de consumo que o deixou tetrapleacutegico aos 21 anos de idadeEm contestaccedilatildeo a segunda reacute aduz que o autor apoacutes ingerir bebidas alcooacutelicas resolveu por volta das 3h usar a piscina existente no hotel na qual jaacute se banhavam alguns amigos seus o que evidencia natildeo se encontrar completamente vaziaEsclarece ainda que o autor utilizou a piscina apoacutes o horaacuterio de seu regular funcionamento e ao fazer uso de um escorregador para crianshyccedilas mergulhou de cabeccedila em local onde a profundidade era de 110 m Sustenta haver culpa exclusiva da viacutetima

Retomando as questotildees de maior relevacircncia deve ficar evidente que o autor Roberto Veloso deseja ser indenizado porque ficou tetrapleacutegico em acidente motivado pela falta de informaccedilatildeo do hotel em que se hospeshydou sobre os riscos que a piscina e seus acessoacuterios podiam oferecer

Uma das questotildees importantes a serem enfrentadas no caso concreto eacute se foi respeitado o princiacutepio da informaccedilatildeo que rege as relaccedilotildees de conshysumo Perceba que natildeo haacute duacutevidas de que o direito agrave informaccedilatildeo natildeo pode ser negado agrave parte hipossuficiente dessa relaccedilatildeo juriacutedica ou seja o autor consumidor

O que estaacute em discussatildeo portanto natildeo eacute a existecircncia do direito mas como ele deveria ser observado no caso em anaacutelise Em outras palashyvras estaacute em discussatildeo quais procedimentos deveria ter adotado a empreshysa neste caso concreto para que o direito agrave informaccedilatildeo fosse adequado e claro

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

O QUE DETERMINA A LEGISLACcedilAtildeO

O autor sustenta com base no art 6o III do CDC que eacute um direito baacutesico do consushymidor a informaccedilatildeo adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem

a) Existia aviso no local do fato que indicava o horaacuterio de funcionamento daqueshyle serviccedilo oferecido pelo hotel

b) Os hoacutespedes deveriam receber folhetos informativos no momento do check in sobre o horaacuterio de todos os serviccedilos que satildeo oferecidos

c) Apenas informar o horaacuterio de funcionamento eacute suficiente ou algum outro procedimento seria indispensaacutevel

d) O desrespeito pelo consumidor das orientaccedilotildees sobre o horaacuterio de funcioshynamento da piscina exime a empresa de qualquer responsabilidade

e) Seria necessaacuterio tambeacutem disponibilizar um funcionaacuterio por tempo integral para guardar aquele local por se tratar de aacuterea de potencial risco para os hoacutespedes Isso seria razoaacutevel

f) A piscina deveria estar pelo menos cercada para evitar o afogamento de crianccedilas muito pequenas ou mesmo animais

g) Seria necessaacuterio ainda cobrir a piscina

h) Cobrir a piscina natildeo traria mais riscos que vantagens conforme se pocircde verificar nos inuacutemeros casos de afogamento de crianccedilas que caiacuteram por pequenas brechas nas bordas se afogaram sem que qualquer pessoa pudesse imaginar que estavam sob a lona

i) O hotel teve comportamento imprudente ou negligente nessas tarefas

j) Quaisquer dessas providecircncias se adotadas pela empresa impediriam que um jovem de 21 anos alcoolizado que pretendesse efetivamente entrar na piscina conseguisse fazecirc-lo de qualquer forma

k) Natildeo parece claro que um escorregador para crianccedilas localiza-se na parte mais rasa da piscina e por isso natildeo deve ser usado por adultos

Mas o que era nessa hipoacutetese dar informaccedilatildeo adequada para que o acidente natildeo ocorresse

ALGUNS DOS QUESTIONAMENTOS POSSIacuteVEIS

142 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Pelo esquema acima deve ter ficado claro que natildeo haacute como realizar pura subsunccedilacirco dos fatos agrave norma porque por sua proacutepria natureza a inshyterpretaccedilatildeo mais adequada da norma deve ser ainda discutida

A comparaccedilatildeo com outras situaccedilotildees tambeacutem pode ajudar a estabeleshycer o que se deve entender no caso analisado por ldquo direito agrave informaccedilatildeordquo

COMPARACcedilAtildeO COM ALGUMAS OUTRAS SITUACcedilOtildeES FAacuteTICAS

a) Existe diferenccedila entre o caso do autor e o de uma consumidora que escorreshyga dentro de um supermercado porque o piso estava molhado

b) Avisar que o piso estaacute escorregadio com um pequeno cavalete amarelo onde se lecirc ldquocuidado Piso molhadordquo eacute suficiente para excluir a responsabilidade de um sushypermercado Esse entendimento seria semelhante ao que deveria ter sido adotado para o escorregador na aacuterea da piscina

c) Se o mesmo acidente ocorrido com o autor se desse sem a suspeita de a viacutetima estar alcoolizada a situaccedilatildeo se alteraria

d) Se o acidente natildeo ocorresse em uma propriedade particular mas em uma praccedila a obrigaccedilatildeo do Estado teria natureza juriacutedica diferente ou ainda estaria caracshyterizada a responsabilidade civil objetiva

Enfim para responder agrave questatildeo principal (direito de informaccedilatildeo) e solucionar esse caso concreto o meacutetodo dedutivo mostra-se ineficiente pois a aplicaccedilatildeo objetiva da norma via subsunccedilacirco natildeo permite esclarecer as inuacutemeras dificuldades que lhe peculiarizam Mais produtivo seria forshymular um argumento pelo meacutetodo indutivo o qual consiste em um movishymento que parte de casos particulares para concluir uma verdade geral

No caso concreto em anaacutelise portanto natildeo basta reconhecer o direito do autor a ter informaccedilotildees claras sobre o serviccedilo que lhe eacute prestado eacute neshycessaacuterio ainda compreender - por induccedilatildeo - o que significa esse direito e quais obrigaccedilotildees gera para a prestadora de serviccedilo

Com esse propoacutesito o argumentador precisaria recorrer a situaccedilotildees anaacutelogas para delas extrair uma ldquo regularidaderdquo o que o ajudaria a detershyminar uma interpretaccedilatildeo especiacutefica e eficiente da ldquonormardquo para o caso anashylisado Pode-se dizer entatildeo que na induccedilatildeo a conclusatildeo enuncia algo que supera a informaccedilatildeo contida nas premissas possibilitando ampliar os conhecimentos

Muitos acadecircmicos de Direito podem em especial no iniacutecio de sua formaccedilatildeo teacutecnico-profissional natildeo dimensionar com exatidatildeo a dificuldade

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 143

ile se delimitar o que seria ldquo informaccedilatildeo adequada e clarardquo em casos como o de Roberto Veloso Alguns diriam ser absurdo um jovem de 21 anos descer por um escorregador de crianccedila e natildeo perceber que a piscina estava vazia (ou quase vazia) e acreditam de imediato na alegaccedilatildeo da reacute quando afirma que a viacutetima estava alcoolizada

Para demonstrar a relevacircncia dessa discussatildeo enriqueceremos essa explicaccedilatildeo com um caso publicado na Revista Eacutepoca30 em que se denunshycia a falta de seguranccedila de um dispositivo do carro Fox da montadora Volkswagen Usado para rebater o banco traseiro isto eacute para aumentar o tamanho da mala deitando o banco traseiro o usuaacuterio (consumidor) deshyveria utilizar um dispositivo em forma de argola O problema eacute que essa argola quando acionada de forma errada decepou parte do dedo de oito donos dessa marca de automoacutevel somente no Brasil

A questatildeo veio a puacuteblico quando um dos consumidores buscou auxiacuteshylio no Procon para ajuizar accedilatildeo em face da Volkswagen e ser indenizado Alega natildeo ter sido informado de forma adequada e suficiente sobre os risshycos que o dispositivo pode oferecer A montadora nega que haja informashyccedilatildeo insuficiente ou inadequada e que o mecanismo eacute seguro razatildeo pela qual natildeo haacute necessidade de realizar recall3I

Oportuno eacute ressaltar que os especialistas na aacuterea divergem quanto agrave seguranccedila do dispositivo e a necessidade de alertas mais especiacuteficos ao consumidor ao realizar o procedimento de rebater o banco traseiro Mas o leitor deve estar se perguntando como afinal a empresa orientou seus consumidores a realizarem esse procedimento

30 MACHADO Flaacutevio A armadilha do Fox In Caderno Sociedade Ediccedilatildeo ndeg 507 de 31 de janeiro de 2008 Disponiacutevel tambeacutem em lthttprevistaepocaglobocomRevista Epoca0bdquoEDG81441-601400htmlgt Acesso em 07 fev 2008

31 Um recall (do inglecircs ldquochamar de voltardquo ldquochamamentordquo ) ou recolha de produto eacute uma solicitaccedilatildeo de devoluccedilatildeo de um lote ou de uma linha inteira de produtos feita pelo fabricante do mesmo Geralmente isso ocorre pela descoberta de problemas relativos agrave seguranccedila do produto O recall eacute uma tentativa de limitar a responsabishylidade por negligecircncia corporativa (a qual pode motivar severas puniccedilotildees legais) e aprimorar ou evitar danos agrave publicidade da empresa Os recalls custam caro para as empresas porque frequentemente envolvem a substituiccedilatildeo do produto recolhido ou o pagamento pelos danos causados pelo seu uso embora possivelmente custem menos do que os custos indiretos que se seguem aos danos agrave imagem da empresa e agrave perda de confianccedila no fabricante Recalls satildeo comuns na induacutestria automobishyliacutestica poreacutem jaacute haacute alguns anos tecircm sido estendidos a outros tipos de produtos como medicamentos e brinquedos Disponiacutevel em lthttpptwikipediaorgwiki Recallgt Acesso em 07 fev 2008

144 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Haacute dois momentos em que a empresa ensina a rebater o banco traseishyro e em ambos alerta para o risco de ldquo acidentesrdquo no manual do usuaacuterio e em um adesivo colado atraacutes do banco bem ao lado do dispositivo em questatildeo Entenda o problema que o mecanismo apresenta

ARGOLA DESLEALEntenda o erro que pode decepar um dedo

O manual do Volkswagen Fox orienta o proprietaacuteshyrio a fazer o rebatimento do banco pela traseira do carro com a porta do porta-malas aberta

O primeiro passo para rebater o banco eacute destrashyvar o encosto Para isso basta puxar uma alccedila flexiacutevel que fica presa numa argola de metal

Acidentes ocorrem quando a pessoa instintivamente coloca o dedo na argola de metal Destravado o meshycanismo puxa a argola com forccedila o que pode decepar a ponta do dedo

(Disponiacutevel em lthttprevistaepocaglobocomRevistaEpoca0bdquoEDG81441-6014-50700 htmlgt Acesso em 02 set 2012)

Essas duas oportunidades (manual do usuaacuterio e adesivo colado ao lado do dispositivo) representam informaccedilatildeo clara e suficiente para o consumidor O engenheiro Maacutercio Montesani diretor do Nuacutecleo de Periacutecias Teacutecnicas de Satildeo Paulo analisou o rebatimento do Fox e entende que natildeo o satildeo Especialista em periacutecias automotivas ele critica o sistema e o manual ldquoHaacute erro de projeto O dispositivo induz o usuaacuterio a colocar o dedo instintivamente na argola o que pode resultar em mutilaccedilatildeo O manual deveria prevenir sobre falhas na operaccedilatildeo e dizer como proceder na ausecircncia da alccedilardquo

Se existe portanto qualquer oportunidade de induzir o consumidor- parte hipossuficiente da relaccedilatildeo juriacutedica - a erro e causar-lhe dano a inshyformaccedilatildeo natildeo pode ser dita suficiente e clara Trata-se de conduta culposa motivadora de dano com o qual guarda nexo de causalidade

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 145

Por fim para facilitar a compreensatildeo do tema deste capiacutetulo estashybeleceremos uma comparaccedilatildeo esquemaacutetica entre os meacutetodos dedutivo e indutivo Observe a seguir

MEacuteTODO DEDUTIVO MEacuteTODO INDUTIVOParte de uma verdade geral para cheshygar a afirmaccedilotildees particulares

Parte de casos particulares para conshycluir uma verdade geral

A aceitaccedilatildeo da conclusatildeo depende das premissas se as premissas forem vershydadeiras a conclusatildeo eacute verdadeira

A conclusatildeo enuncia algo que supera a informaccedilatildeo contida nas premissas posshysibilitando ampliar os conhecimentos

Frequentemente operacionaliza-se por meio do silogismo Premissa Maior + Premissa Menor = Conclusatildeo

Frequentemente recorre agrave comparashyccedilatildeo para reconhecer uma regularidade entre os fatos avaliados e dali extrair os valores juridicamente adequados ao caso concreto

Capiacutetulo VI

PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

Inicialmente precisamos justificar a abordagem que adotamos para o tema neste capiacutetulo Natildeo caberia aprofundar conceitos doutrinaacuterios relashytivos agrave distinccedilatildeo entre os princiacutepios gerais do direito e as regras juriacutedicas por meio da abordagem de correntes tampouco classificar de forma sisteshymaacutetica os princiacutepios distribuiacutedos por aacutereas do direito e estabelecer regras hermenecircuticas para seu campo de atuaccedilatildeo Esse natildeo eacute o nosso objetivo

Pretendemos esclarecer isso sim como tais normas podem ser utilizadas para compor o texto argumenlativo juriacutedico e qual o efeito que se extrai desse procedimento dada a relevacircncia atual atribuiacuteda a essa fonte do direito de nashytureza estruturante de todo o sistema

61 PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E REGRAS

Considerando que os princiacutepios refletem valores eacuteticos e morais de uma determinada sociedade bem como garantias miacutenimas de um Estado Democraacutetico de Direito eacute fundamental que se compreenda o significado de ldquovalores moraisrdquo e ldquo valores eacuteticosrdquo De forma breve vamos esclarecer esses conceitos

611 Os valores morais

Ao falarmos de valor vecircm agrave nossa mente a utilidade a beleza a bonshydade a justiccedila o respeito a confianccedila etc O homem ser histoacuterico-social atribui esses valores a coisas a seres agrave conduta humana Tal atribuiccedilatildeo deriva portanto da cultura e da relaccedilatildeo social Assim algo que se consishy

148 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dera ura valor em determinada eacutepoca pode deixar de secirc-lo em outra Por exemplo conforme evolui a tecnologia determinados objetos perdem sua utilidade sendo substituiacutedos por outros mais modernos assim tambeacutem satildeo os valores para o homem

E quando o valor eacute atribuiacutedo agrave conduta humana A conduta humana realizada de forma consciente e voluntaacuteria encarna valores morais Assim podem-se qualificar moralmente os atos dos indiviacuteduos ou de grupos soshyciais as intenccedilotildees desses atos os resultados as consequecircncias etc Satildeo os valores morais que direcionam a conduta humana Por exemplo quando uma mulher graacutevida em uma entrevista de emprego decide consciente e voluntariamente omitir sua gravidez tal decisatildeo foi guiada pelos valores morais adquiridos em sua formaccedilatildeo Da mesma maneira quando um casal de mepdigos encontra uma expressiva quantia em dinheiro e a devolve ao seu respectivo dono demonstra possuir um valor moral que estaacute acima da necessidade evidente dessa quantia

Haacute determinados valores morais considerados universais outros dishyzem respeito a uma determinada comunidade em um tempo e espaccedilo defishynidos A caridade por exemplo eacute um valor moral universal Espera-se que norteie o agir de qualquer pessoa em qualquer lugar e em qualquer eacutepoca Entretanto a fidelidade considerada no seu aspecto especiacutefico de relaccedilatildeo conjugal pode constituir um valor moral ou natildeo dependendo do costume da sociedade jaacute que para algumas a bigamia eacute praacutetica corrente

612 Os valores eacuteticos

Natildeo resta duacutevida de que o homem eacute dotado de uma consciecircncia moral- formada por valores universais e pelos especiacuteficos do seu ldquo aquirdquo e ldquo agoshyrardquo - geradora de regras que guiam seus juiacutezos e suas accedilotildees Certamente haacute uma conduta social esperada do ser humano em conformidade com essa consciecircncia moral A eacutetica seria essa conduta social geradora de conshysequecircncias que possibilitam a correta convivecircncia entre os homens com fulcro na preservaccedilatildeo da dignidade humana

A eacutetica fundamenta-se em uma seacuterie de praacuteticas morais essenciais que emergem da necessidade que todo indiviacuteduo possui de contribuir com a coletividade em prol do bem comum

Observa-se que a eacutetica adquire uma perspectiva social porquanto se considera que cada pessoa deva ser responsabilizada pelo seu agir consciente e pelas consequecircncias de suas escolhas no seio da sociedade Ora cada um tem uma ideia daquilo que deve ser feito Configura-se assim um viacutenculo entre eacuteti-

ca e Direito jaacute que essa convicccedilatildeo pode servir de criteacuterio para que se expresse um juiacutezo e se avalie ser justa ou natildeo uma conduta nas relaccedilotildees interpessoais

Com efeito um profissional liberal mesmo consciente de que natildeo tem condiccedilotildees de fornecer um serviccedilo mas se dispotildee a prestaacute-lo demonstra estar ferindo um valor que se espera estar presente nesse tipo de relaccedilatildeo a boa-feacute O homem a princiacutepio idealiza que seus semelhantes sejam dignos de confianccedila bem que se deseja preservar para que as relaccedilotildees humanas transcorram de forma harmocircnica Entretanto ao constatar que a conduta do fornecedor em vez de estar solidificada na boa-feacute demonstrou estar fincada na maacute-feacute ou na desiacutedia gera o repuacutedio da sociedade por considerar que feriu um valor moral e eacutetico

Com a crise do positivismo juriacutedico que natildeo se mostrou apto agrave consshytruccedilatildeo de uma sociedade harmocircnica e juridicamente justa a eacutetica e a moral ganharam novamente forccedila sobre o Direito ocorrendo a aproximaccedilatildeo entre direito e moral estreitando-se os viacutenculos entre eacutetica e Direito

Com o poacutes-positivismo1 e com o estabelecimento de valores como base constitucional impocircs-se um dever de fazer em que se concretizam os valores eacuteticos e morais - essecircncia dos princiacutepios antes apenas considerashydos como elementos externos agrave ciecircncia do direito Observemos entatildeo de que maneira esses valores eacuteticos e morais compotildeem os princiacutepios

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

613 Diferenccedilas entre princiacutepios e regras

O Direito se concretiza mediante normas que se constituem em prinshyciacutepios e regras Os princiacutepios satildeo compostos por valores morais e eacuteticos

ldquoA dicotomia entre direito e moral foi um dos traccedilos caracteriacutesticos do positivismo juriacutedico que veio a desmoronar ante a constataccedilatildeo de que um ordenamento juriacutedico positivo pode encarnar contornos crueacuteis aos ideais de justiccedila que se pretende das normas juriacutedicas o que levou ao questionamento da tese positivista quando do estabelecimento do Estado de Direito pondo em questionamento tambeacutem as relashyccedilotildees entre o direito a moral e a eacutetica o que exigiu a reformulaccedilatildeo de alguns conshyceitos como a superaccedilatildeo da riacutegida distinccedilatildeo entre direito e moral e agrave consequente abertura do debate filosoacutefico-juriacutedico contemporacircneo aos valores eacutetico-poliacuteticosrdquo (SANTOS Karina Alves Teixeira A relaccedilatildeo entre o Direito e a Moral e suas conshysequecircncias no Poacutes-Positivismo Disponiacutevel em lthttpAvwwconteudojuridico combrartigo a-relacao-entre-o-direito-e-a-moral-suas-consequencias-no-pos-po- sitivismo38077htmlgt Acesso em 02 set 2012)

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

que servem de alicerce para todo o ordenamento juriacutedico Segundo Luiacutes Roberto Barroso2

O novo seacuteculo se inicia fundado na percepccedilatildeo de que o Direito eacute um sistema aberto de valores A Constituiccedilatildeo por sua vez eacute um conjunto de princiacutepios e regras destinados a realizaacute-los a despeito de se recoshynhecer nos valores uma dimensatildeo suprapositiva A ideia de abertura se comunica com a Constituiccedilatildeo e traduz a sua permeabilidade a eleshymentos externos e a renuacutencia agrave pretensatildeo de disciplinar por meio de reshygras especiacuteficas o infinito conjunto de possibilidades apresentadas pelo mundo real Por ser o principal canal de comunicaccedilatildeo entre o sistema de valores e o sistema juriacutedico os princiacutepios natildeo comportam enumeraccedilatildeo taxativa mas naturalmente existe um amplo espaccedilo de consenso em que tecircm lugar alguns dos protagonistas da discussatildeo poliacutetica filosoacutefica e juriacutedica do seacuteculo que se encerrou Estado de direito democraacutetico liberdade igualdade justiccedila

De fato os princiacutepios normatizam um nuacutemero ilimitado de situaccedilotildees cujas previsotildees legais podem estar ou natildeo positivadas pelas regras Aliaacutes como o sentido de justiccedila nem sempre se associa agrave aplicaccedilatildeo de uma reshygra ao caso concreto vale-se o Direito dos princiacutepios jaacute que conforme a citaccedilatildeo de Luiacutes Roberto Barroso esses sustentam a preservaccedilatildeo de valoshyres essenciais como Estado de direito democraacutetico liberdade igualdade e justiccedila

Quanto agraves regras essas tecircm caraacuteter especiacutefico incidem sobre uma determinada conduta Conforme sustenta o Desembargador Seacutergio Cava- lieri Filho3

Regras satildeo proposiccedilotildees normativas que contecircm relatos objetivos desshycritivos de determinadas condutas aplicaacuteveis a hipoacuteteses bem definidas perfeitamente caracterizadas sob a forma de tudo ou nada Ocorrendo a hipoacutetese prevista no seu relato a regra deve incidir de modo direto e automaacutetico pelo mecanismo da subsunccedilatildeo O comando eacute objetivo e natildeo daacute margem a elaboraccedilotildees mais sofisticadas acerca da sua incidecircncia A aposentadoria compulsoacuteria aos 70 anos eacute um bom exemplo de regra que incide automaticamente quando o servidor atinge essa idade

Sintetizando as noccedilotildees ateacute aqui registradas observe o esquema

Registre-se ainda a importacircncia da Loacutegica do Razoaacutevel na aplicaccedilatildeo dos princiacutepios uma vez que essa loacutegica tem como fundamento a ponderashyccedilatildeo o equiliacutebrio a busca do justo com fulcro nos valores emanados desses princiacutepios Ademais uma conclusatildeo alcanccedilada por meio dessa loacutegica poderaacute substituir outra subsumida de uma operaccedilatildeo dedutiva Representa dizer que uma decisatildeo judicial pode estar em desconformidade com a regra mas jashymais em desacordo com os princiacutepios que balizam o ordenamento juriacutedico

Tal desacordo eacute fruto do inteacuterprete do Direito - ser histoacuterico e social- que natildeo apenas associa o caso concreto agrave regra e dessa operaccedilatildeo extrai a conclusatildeo contida na proacutepria regra (subsunccedilatildeo) seguindo a loacutegica formal mas principalmente analisa as peculiaridades do caso concreto valoranshydo-as conforme a sua eacutepoca e o seu espaccedilo e simultaneamente interpreta as fontes do Direito de forma sistemaacutetica Tal interpretaccedilatildeo visa a capturar o espiacuterito dessas fontes seu real alcance isto eacute pretende entender como poderatildeo proporcionar o bem-estar social E esse um exerciacutecio de ponderashyccedilatildeo que somente a loacutegica do razoaacutevel permite executar

62 A RELEVANCIA NORTEADORA DOS PRTNCIPIOS A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

A partir da anaacutelise de um caso concreto avaliaremos a relevacircncia dos princiacutepios e da loacutegica do razoaacutevel na formulaccedilatildeo dos argumentos Para tal tambeacutem mencionaremos uma regra especiacutefica cabiacutevel ao caso concreto

BARROSO Luis Robero Fundamentos teoacutericos e filosoacuteficos do novo Direito Constishytucional brasileiro Jus Navigandi Teresina ano 7 n 59 1 out 2002 Disponiacutevel em lthttpjuscombrrevistatexto3208gt Acesso em 27 ago 2012CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de Direito do Consumidor 3 ed Satildeo Paushylo Atlas 2011 p 25

JL

Estado do Rio daacute a religiosos direito de recusar transfusatildeoMatheus Leitatildeo

O Estado do Rio vai reconhecer o direito dos fieacuteis da igreja Testemushynhas de Jeovaacute de recusar transfusatildeo de sangue por motivos religiosos

152 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A decisatildeo se refere ao caso de uma praticante de 21 anos que foi intershynada com doenccedila pulmonar grave e se negou a receber o tratamento o que gerou uma consulta do hospital envolvido agrave Procuradoria-Geral do Estado O caso ficou cm estudo por quatro mesesNesta semana a procuradora-geral Lucia Lea Guimaratildees Tavares resshyponderaacute que se trata de ldquoexerciacutecio de liberdade religiosardquo Segundo o parecer ao qual a Folha teve acesso esse eacute ldquoum direito fundamental emanado da dignidade da pessoa humana que assegura a todos o direito de fazer suas escolhas existenciaisrdquoldquoA minha convicccedilatildeo eacute que a pessoa tem direito a escolher desde que seja maior e esteja consciente Natildeo eacute um tema muito simples manter a vida de um paciente mas desrespeitando aquilo em que ele mais acreditardquo disse a ProcuradoraA Folha apurou que o governador Seacutergio Cabral acataraacute o parecer transformando-o numa norma estadual no Rio com poder de deshycretoA determinaccedilatildeo contraria parecer do Conselho Federal de Medicina que diz ldquoSe houver iminente perigo de vida o meacutedico praticaraacute a transshyfusatildeo de sangue independente do consentimento do paciente ou de seus responsaacuteveisrdquo A Procuradora do Rio vai entrar com uma Accedilatildeo Direta de Inconstitu- cionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal) para discutir a consti- tucionalidade do parecer dos meacutedicosSe o precedente aberto no Rio for acatado pelo STF os cristatildeos da ldquoTesshytemunhas de Jeovaacuterdquo teratildeo amparo legal para a manutenccedilatildeo do que conshysideram seus direitos

Divergecircncias

O assunto eacute tatildeo polecircmico que houve inicialmente divergecircncia dentro da Procuradoria do Estado do Rio Diante disso a procuradora-geral Lucia Lea pediu um estudo sobre o tema ao constitucionalista Luis Roberto BarrosoldquoA liberdade religiosa eacute um direito fundamental Pode o Estado proteger um indiviacuteduo em face de si proacuteprio para impedir que o exerciacutecio de lishyberdade religiosa lhe cause dano irreversiacutevel ou fatal A indagaccedilatildeo natildeo comporta resposta juridicamente simples nem moralmente baratardquo diz Barroso no estudoNo fim das 42 paacuteginas o texto conclui pelo reconhecimento do direito das testemunhas de Jeovaacute com a seguinte cautela ldquoA gravidade da reshycusa de tratamento sobretudo quando presente o risco de morte ou de

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 153

grave lesatildeo exige que o consentimento seja genuiacuteno o que significa dizer vaacutelido inequiacutevoco livre informadordquo 4

Algumas questotildees referentes ao caso concreto e aos posicionamentos registrados merecem anaacutelise

Com relaccedilatildeo ao caso concreto destacam-se os seguintes fatos a seshyrem valorados

a) Quem Jovem de 21 anos portanto de maioridade isto eacute ldquo idade legal em que uma pessoa eacute reconhecida como plenamente capaz e responsaacutevelrdquo (Dicionaacuterio Eletrocircnico Houaiss)

b) Por quecirc E Testemunha de Jeovaacute cuja religiatildeo proiacutebe a transfusatildeo de sangue

c) Doenccedila pulmonar grave risco de morted) Consultada a paciente se negou a ser submetida a transfusatildeoe) Anaacutelise do caso pela Procuradoria-Geral do Estado posicionamenshy

to favoraacutevel agrave liberdade de religiatildeo com imposiccedilatildeo de condiccedilotildeesf) Parecer contraacuterio do Conselho Regional de Medicina intervenccedilotildees

necessaacuterias sem o consentimento do paciente se houver risco de morte

g) Divergecircncia de opiniotildees na Procuradoria-Geral do Estado questatildeo complexa

h) Solicitaccedilatildeo de parecer sobre a questatildeo a constitucionalista renomado necessidade de aprofundar a anaacutelise devido agrave sua complexidade

i) Decisatildeo da Procuradoria favoraacutevel agrave vontade da paciente ressalvashydas algumas condiccedilotildees

Interessa-nos analisar as justificativas dessa decisatildeo Segundo a pro- curadora-geral Lucia Lea Guimaratildees Tavares deveraacute prevalecer o ldquo exerciacuteshycio de liberdade religiosardquo jaacute que esse eacute ldquo um direito fundamental emanado da dignidade da pessoa humana que assegura a todos o direito de fazer suas escolhas existenciaisrdquo

4 LEITAtildeO Matheus Estado do Rio de Janeiro daacute a religiosos direito de recusar transshyfusatildeo Folha de Satildeo Paulo Sucursal de Brasiacutelia 27 abr 2012 Disponiacutevel em lthttp wwwnoticiasjwbrothersorgrio-dc-janeiro-reconhece-o-direito-das-testemunhas- de-jeova-recusar-sanguegt Acesso em 27 ago 2012

154 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Observa-se a prevalecircncia do princiacutepio da dignidade humana que gashyrante a todas as pessoas liberdade religiosa acima da preservaccedilatildeo da vida que conforme o parecer meacutedico estaacute em risco em razatildeo de doenccedila pulshymonar grave Entretanto condiciona-se essa liberdade de escolha agrave idade e agrave consciecircncia das consequecircncias que essa opccedilatildeo acarreta

Como se pode observar pelo texto transcrito o posicionamento da Procuradora natildeo se coaduna com o parecer do Conselho Federal de Meshydicina que diz ldquo Se houver iminente perigo de vida o meacutedico praticaraacute a transfusatildeo de sangue independente do consentimento do paciente ou de seus responsaacuteveisrdquo Tambeacutem na proacutepria Procuradoria opiniotildees divergiram da conclusatildeo da procuradora-geral Por essa razatildeo foi solicitado um estudo a respeito do tema ao constitucionalista Luis Roberto Barroso

As questotildees que o constitucionalista propotildee expressam claramente a adoccedilatildeo da loacutegica do razoaacutevel em que pondera o que deve prevalecer o poder do Estado de proteger o indiviacuteduo de si mesmo ou o poder do indiviacuteshyduo de exercer sua liberdade religiosa e escolher o seu destino Conforme o proacuteprio autor sustenta natildeo eacute uma anaacutelise faacutecil mas decidiu adotar o mesmo entendimento da Procuradora-Geral apenas especificando o que ela certamente quis dizer com ldquo conscienterdquo isto eacute uma decisatildeo inequiacuteshyvoca livre e informada Ora mas em que se baseou o parecer do Conselho Federal de Medicina para emitir tal entendimento contrariando a posiccedilatildeo da procuradora-geral Possivelmente para o Conselho prevalece o prinshyciacutepio do direito agrave vida acima do direito de liberdade religiosa No entanto conforme Schreiber5

[] a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica coloca a liberdade de religiatildeo e o direishyto agrave vida no mesmiacutessimo patamar Aqui como em outros campos natildeo pode o inteacuterprete correr o risco de se agarrar agrave regra mais especiacutefica esquecendo os princiacutepios que lhe servem de fundamento de validade e que podem ser diretamente aplicados ao caso concreto A vontade do paciente deve ser respeitada porque assim determina a tutela da dignishydade humana valor fundamental do ordenamento juriacutedico brasileiro

A que regra especiacutefica estaria se referindo o doutrinador Destaqueshymos uma a que pode ser subsumida a hipoacutetese em exame art 146 do Coacuteshydigo Penal - ldquoConstranger algueacutem mediante violecircncia ou grave ameaccedila ou depois de lhe haver reduzido por qualquer outro meio a capacidade de resistecircncia a natildeo fazer o que a lei permite ou a fazer o que ela natildeo mandardquo

5 SCHREIBER Anderson Direitos da personalidade Satildeo Paulo Atlas 2011 p 52

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 155

O paraacutegrafo 3deg do referido dispositivo acentua ldquoNagraveo se compreendem na disposiccedilatildeo deste artigo 1 - a intervenccedilatildeo meacutedica ou ciruacutergica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal se justificada por iminente perigo de vida II - a coaccedilatildeo exercida para impedir suiciacutediordquo

De acordo com o artigo mencionado de fato o meacutedico estaria autorishyzado a contrariar a vontade do paciente caso sua intervenccedilatildeo possibilite a manutenccedilatildeo da vida do paciente Aleacutem disso estaria impedindo o paciente de se suicidar Mas a opccedilatildeo por natildeo se submeter a transfusatildeo de sangue poderia ser considerada suiciacutedio Pensamos que natildeo

Se assim o fosse tambeacutem seria suiciacutedio algueacutem se negar a tratamento quimioteraacutepico sendo esse o uacutenico recurso para prolongar sua vida mas esse paciente jamais foi denominado um suicida Tambeacutem o proacuteprio Conshyselho Federal de Medicina vem adotando o entendimento de que o paciente tem o direito de escolher se quer se submeter a tratamentos como esse

Portanto apesar de essa lei salvaguardar a intervenccedilatildeo do meacutedico alheia agrave vontade expressa do paciente a praacutetica vem demonstrando que se busca uma autorizaccedilatildeo judicial nesses casos Eacute cediccedilo que aleacutem da regra especiacutefica muitos julgadores apoiam-se no princiacutepio do direito agrave vida a fim de fundamentar sua decisatildeo de contrariar a vontade do paciente Para esses o direito agrave vida se sobrepotildee ao direito agrave liberdade religiosa conforme se verificaraacute no proacuteximo caso concreto6

Em fevereiro de 2009 o Hospital das Cliacutenicas da Universidade Fedeshyral de Goiaacutes conseguiu autorizaccedilatildeo da Justiccedila para fazer transfusatildeo de sangue em um paciente da religiatildeo Testemunha de Jeovaacute Em liminar o desembargador federal Fagundes de Deus do Tribunal Regional Federal da la Regiatildeo registrou que no confronto entre os princiacutepios constitucionais do direito agrave vida e do direito agrave crenccedila religiosa importa considerar que atitudes de repuacutedio ao direito agrave proacutepria vida vatildeo de enshycontro agrave ordem constitucional Para exemplificar lembrou que a legisshylaccedilatildeo infraconstitucional natildeo admite a praacutetica de eutanaacutesia e reprime o induzimento ou auxiacutelio ao suiciacutedioNa accedilatildeo a Universidade Federal de Goiaacutes autarquia responsaacutevel pelo Hospital das Cliacutenicas argumentou que o estado do paciente era grave e pedia com urgecircncia a transfusatildeo de sangue Explicou que o hospital eacute obrigado a respeitar o direito de autodeterminaccedilatildeo da pessoa humana reconhecido pela ordem juriacutedica nada podendo fazer sem autorizaccedilatildeo

6 MARTINS Geiza Fiel tem direito de recusar transfusatildeo de sangue Consultor Juriacutedico 8 mai 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2010-mai-08 legitimo-recusar-tratamento-saude-crenca-religiosagt Acesso em 26 ago 2012

156 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

da Justiccedila Aleacutem disso o hospital sustentou na accedilatildeo que o direito agrave vida eacute um bem indisponiacutevel cuja proteccedilatildeo incumbe ao Estado e que no caso concreto a transfusatildeo sanguiacutenea eacute a uacutenica forma de efetivaccedilatildeo de tal direitoPara o desembargador Fagundes de Deus ldquoo direito agrave vida porquanto o direito de nascer crescer e prolongar a sua existecircncia adveacutem do proacuteprio direito natural inerente aos seres humanos sendo este sem sombra de duacutevida primaacuterio e antecedente a todos os demais direitosrdquo Com isso autorizou a transfusatildeo

Como se pode constatar os princiacutepios ao mesmo tempo em que lishymitam a vontade subjetiva do aplicador do direito contecircm um grau de abstraccedilatildeo e de generalidade amplo que lhe permite exercer seu senso de razoabilidade de forma plena e consequentemente fazer a justiccedila do caso concreto

63 ORGANIZACcedilAtildeO HIERAacuteRQUICA DE ALGUMAS FONTES DO DIREITO NA ESTRUTURA ARGUMENTATIVA RAZOABILI- DADE PRINCIacutePIOS LEI DOUTRINA E JURISPRUDEcircNCIA

Embora natildeo se tenha nesta obra a intenccedilatildeo de abordar as diversas concepccedilotildees doutrinaacuterias sobre o tema ldquo fontes do direitordquo impotildee-se inishycialmente determinar o significado do termo ldquo fonterdquo que tem duas definishyccedilotildees especiacuteficas

Conforme Nunes fonte eacute a nascente da aacutegua e especialmente eacute a bica donde verte aacutegua potaacutevel para uso humano De forma figuratishyva entatildeo o termo fonte designa a origem a procedecircncia de alguma coisaEm Gusmatildeo fonte como metaacutefora significa a origem do direito ou seja de onde ele proveacutem7

Dessa forma em sentido amplo poder-se-ia dizer que fonte indica a origem de algo Jaacute associando o termo ao direito consideraremos ldquo fonte do direitordquo como o nascedouro de normas juriacutedicas que compotildeem esse sistema Muito embora se faccedila a distinccedilatildeo entre fontes materiais e fontes

7 Fontes do direito Disponiacutevel em lthttpwwwwebartigoscomartigosfontes-do- direito4192gt Acesso em 15 set 2012

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 157

formais fontes imediatas e fontes mediatas8 preferimos adotar o seguinte entendimento

O conceito-chave eacute o de ato juriacutedico enquanto condutas que positivam o direito e que satildeo executadas por diferentes centros emanadores dotashydos do poder juriacutedico de fazecirc-lo como o Estado e seus oacutergatildeos a proacutepria sociedade os indiviacuteduos autonomamente considerados etc O direito afirma-se emana desses atos que passam a ser considerados9

Assim conforme a origem e a forccedila com que se impotildeem esses atos assumem a hierarquizaccedilatildeo que determina sua aplicabilidade como elemenshytos norteadores na produccedilatildeo e na defesa de teses juriacutedicas Alguns desses atos resultam em leis decretos sentenccedilas contratos etc

Mais uma vez reforccedilamos que o nosso objetivo eacute pragmaacutetico isto eacute a aplicaccedilatildeo no texto de algumas fontes juriacutedicas a fim de que se avalie sua forccedila argumentativa Por essa razatildeo sugerimos a anaacutelise de um caso concreto e a possibilidade de produccedilatildeo textual em que se buscou utilizar algumas fontes do direito de forma hierarquizada Passemos ao caso conshycreto

Suponha que um menino de 9 anos pertencente atilde religiatildeo Testemunhas de Jeovaacute sofra de leucemia grave e segundo o meacutedico que o acomshypanha necessita urgentemente de transfusatildeo de sangue Os pais natildeo autorizaram a transfusatildeo Segundo eles o sangue eacute como se fosse uma digital algo inerente a cada pessoa que natildeo pode doar nem receber de ningueacutem No lugar da transfusatildeo pedem que sejam adotados tratamenshytos alternativosO meacutedico recorreu agrave justiccedila para obter autorizaccedilatildeo a fim de realizar a transfusatildeo

631 Proposta

Como utilizar as fontes do Direito em uma argumentaccedilatildeo que defenshyda a tese do meacutedico Oferecemos uma possibilidade de construccedilatildeo do texto

8 Sugere-se a leitura de CAVALIacuteERI FILHO Sergio Programa de sociologia juriacuteshydica Vocecirc conhece 8 ed Rio de Janeiro Forense 2000

9 FERRAZ JR Tercio Sampaio Introduccedilatildeo ao estudo do direito Teacutecnica decisatildeo dominaccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2001 p 221

158 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

e em seguida uma anaacutelise da utilizaccedilatildeo dos princiacutepios regra doutrina e jurisprudecircncia

O presente caso exige ponderaccedilatildeo cuidadosa entre dois princiacutepios o dishyreito agrave vida assegurado no artigo 5deg caput da Constituiccedilatildeo e o direito agrave liberdade religiosa no mesmo artigo inciso VI Tal cuidado se justifica em razatildeo de na hipoacutetese em anaacutelise estar em risco a vida (sofre de leucemia grave um menor impuacutebere portanto sem capacidade civil para optar entre esses dois direitos)

Seria pois razoaacutevel deixar a cargo de seus pais tal decisatildeo Estes lhe deram a vida mas conforme o ordenamento juriacutedico brasileiro nenhuma lei lhes confere o direito de tiraacute-la mas sim de preservaacute-la Destaque-se do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente o art 4deg que dispotildee dentre outros deveres da famiacutelia a efetivaccedilatildeo dos direitos referentes agrave vida e agrave sauacutede bens indisponiacuteveis

Acrescente-se ainda a orientaccedilatildeo fornecida por Luiz Roberto Barroso de que a ldquogravidade da recusa de tratamento sobretudo quando presente o risco de morte ou de grave lesatildeo exige que o consentimento seja genuiacuteno o que significa dizer vaacutelido inequiacutevoco livre informadordquo Ora no presente caso mesmo que o menor se manifestasse sua opccedilatildeo natildeo teria valor juriacutedico uma vez que o art 3deg do Coacutedigo Civil eiva dc nulidade a expressatildeo de sua vontade sobre a disposiccedilatildeo de sua vida Conforme o referido artigo ldquo satildeo absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vidardquo

Ademais em um paiacutes laico como o nosso natildeo deve o julgador deshycidir se determinado preceito biacuteblico eacute vaacutelido e se pode ser desobedecido Para aquele que tem feacute ir de encontro agraves suas crenccedilas e viver com a maacutecula de ter transgredido os dogmas da sua religiatildeo pode significar a morte em vida Entretanto seraacute que uma crianccedila estaria convicta de que a transfusatildeo de sangue lhe causaria algum dano O que estaacute em jogo a sauacutede fiacutesica c mental da crianccedila ou a consciecircncia dos pais Qual o dever do Estado A todas essas perguntas muito bem ponderadas soacute se pode chegar a uma resposta proteger a vida da pessoa que quando adulta e consciente das consequecircncias que seus atos iratildeo lhe impor poderaacute exercer com plenitude o direito agrave liberdade de religiatildeo

Por fim registre-se a decisatildeo da Juiacuteza Federal Dra Vacircnia Hack de Almeida em caso anaacutelogo no processo AC 155 RS 20037102000155-6 desfavoraacutevel agrave adoccedilatildeo de procedimentos alternativos agrave transfusatildeo de sangue quando esta se apresentava indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da vida de menor impuacutebere Como se observa no caso em qLiestatildeo o fato de o pa-

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 159

ciente ser um menor impuacutebere justifica a preponderacircncia do direito agrave vida em detrimento do direito agrave liberdade de escolha Sem duacutevida o pedido do meacutedico deve ser deferido jaacute que natildeo seria razoaacutevel natildeo proporcionar a esse menor a oportunidade de exercer todos os outros direitos agasalhados no ordenamento juriacutedico

632 Comentaacuterio

Natildeo haacute regra que determine em que ordem as fontes do direito devem ser utilizadas em um texto argumentativo Entretanto devemos considerar que

Sobretudo depois do advento do neoconstitucionalismo (que ganhou forccedila inusitada a partir dos julgamentos de Nuremberg em 1945-1946 jaacute que eles enfatizaram com toda clareza a distinccedilatildeo entre a lei e o direito) jaacute natildeo haacute como negar a forccedila normativa (cogente imperiosa e civilizacional) dos princiacutepios dentro do direito (ou seja na ciecircncia do direito)10

Com efeito natildeo haacute como ignorar a forccedila argumentativa que conteacutem um princiacutepio uma vez que ele fornece as diretrizes gerais do ordenamento juriacutedico Assim antes de se pensar qual regra deve ser aplicada ao caso concreto entendemos que seja fundamental definir o princiacutepio juriacutedico que norteia a soluccedilatildeo justa e razoaacutevel para a hipoacutetese em anaacutelise Essa estrateacuteshygia foi adotada no texto apresentada no item 631 ao se ponderarem dois princiacutepios constitucionais direito agrave vida e direito agrave liberdade religiosa amshybos contidos no art 5deg da Constituiccedilatildeo Natildeo houve muito embora possa parecer conflito de princiacutepios mas uma colisatildeo que exige ponderaccedilatildeo das circunstacircncias atinentes ao caso concreto a fim de estabelecer que princiacuteshypio prevaleceraacute

Em seguida adotou-se como argumento de autoridade a regra isto eacute o art 4deg do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente que explicitamente proclama valores resguardados pelos princiacutepios que se aplicam ao caso em anaacutelise direito agrave vida e agrave sauacutede Como se observa a utilizaccedilatildeo desse artigo reforccedila a conclusatildeo extraiacuteda apoacutes a ponderaccedilatildeo dos princiacutepios O

10 GOMES Luiz Flaacutevio Normas regras e princiacutepios conceitos e distinccedilotildees (parte 1) Extraiacutedo de rede de ensino Luiz Flaacutevio Gomes 3 fev 2010 Disponiacutevel em lthttplfgjusbrasilcombrnoticias2074820normas-regras-e-principios-concei- tos-e-distincoes-parte-lgt Acesso em 14 set 2012

160 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

texto segue portanto uma linha de raciociacutenio estruturada com base em um princiacutepio constitucional direito agrave vida

No terceiro paraacutegrafo evoca-se o reconhecido saber do constitushycional ista Luiz Roberto Barroso manifestando-se a voz da doutrina que se alinha ao art 3deg do Coacutedigo Civil Fica estabelecido o viacutenculo entre a doutrina e a lei reforccedilando a tese defendida no texto Aliaacutes a doutrina ao interpretar o direito contribui para o seu aprimoramento De fato algumas leis se alteram em virtude da atualizaccedilatildeo de sua interpretaccedilatildeo promovida pelos doutrinadores

Em sequecircncia a loacutegica do razoaacutevel se apresenta com maior ecircnfase por meio da ponderaccedilatildeo de valores As perguntas retoacutericas expressam essa ponderaccedilatildeo compartilhada com o auditoacuterio Dessa forma adota-se uma cumplicidade com esse auditoacuterio na busca de fazecirc-lo refletir sobre o que deve preponderar os argumentos dos pais ou o do orador Promove-se nesse momento espaccedilo para o argumento de oposiccedilatildeo a fim de demonstrar sua fragilidade perante os argumentos defendidos pelo orador

Por fim recorreu-se agrave jurisprudecircncia com o objetivo de estabelecer uma aproximaccedilatildeo entre o caso em apreccedilo e outro semelhante jaacute julgado Essa praacutetica eacute muito comum na fundamentaccedilatildeo de teses por se reconhecer a relevacircncia juriacutedica de uma decisatildeo de meacuterito em face de sua natureza cientiacutefica Portanto serve de fonte para orientar na soluccedilatildeo de questatildeo ainshyda natildeo positivada ou para aprimorar alguma regra existente Da mesma forma que a doutrina a jurisprudecircncia tem ainda a funccedilatildeo de atualizar no tempo e no espaccedilo conforme os costumes determinada regra e ateacute suscitar a criaccedilatildeo de outras regras Presta pois relevante serviccedilo na busca pelo justo pelo razoaacutevel

11 Sugere-se a leitura de FERRAZ JR Tercio Sampaio Introduccedilatildeo ao estudo do dishyreito Teacutecnica decisatildeo dominaccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2001 p 237-242 para ampliar o conhecimento relativo aos costumes e agrave jurisprudecircncia

Capiacutetulo VII

FIGURAS DE RETOacuteRICA

A linguagem do Direito haacute de conformar-se aos rigores da teacutecnica jushyriacutedica Mas sem desprezo agrave clareza agrave transparecircncia agrave elegacircncia e ao ritmo melodioso da poesia As palavras para o professor para o advoshygado para os operadores do Direito em geral satildeo feitas para persuadir demover incentivar Natildeo basta sintaxe E preciso paixatildeo (Luiacutes Roberto Barroso)

A citaccedilatildeo registrada destaca a importacircncia da linguagem verbal parao profissional do Direito no desempenho de suas funccedilotildees Observa-se que Luis Roberto Barroso enfatizou o uso de uma linguagem clara objetiva precisa em que a razatildeo direcione o discurso a ser produzido a fim de que se alcance o principal objetivo no discurso juriacutedico a persuasatildeo Entretanshyto com destaque exaltou um componente indispensaacutevel a ser associado agrave razatildeo a emoccedilatildeo Ora o orador deve envolver emocionar apaixonar o seu auditoacuterio a fim de que este adira com maior rapidez suas teses E como utilizar a linguagem com paixatildeo Uma das estrateacutegias para atingir esse objetivo eacute usar figuras de retoacuterica

71 POR QUE O ESTUDO DAS FIGURAS RETOacuteRICAS

Inicialmente importa compreender o sentido dos termos ldquo figurardquo e ldquo retoacutericardquo a fim de justificar tal estudo neste livro Retoacuterica conforme Reboul1 ldquo eacute a arte de persuadir por meio do discursordquo Adotaremos dentre algumas definiccedilotildees de discurso a seguinte produccedilatildeo verbal oral ou escrita formulada por meio de palavras frases paraacutegrafos que se conectam em

1 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Bencdetti Satildeo Paushylo Martins Fontes 2000 p XIV

162 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

sequecircncia foimando uma unidade de senlido Tal arte eacute exercida ldquo em sishytuaccedilotildees de incerteza e conflito em que a verdade natildeo eacute dada e talvez jamais seja alcanccedilada senatildeo sob a forma de verossimilhanccedilardquo 2 Com efeito em tais situaccedilotildees o embate de teses exige do orador um verdadeiro exerciacutecio criativo mas planejado Esse planejamento visa agrave produccedilatildeo de uma estrashyteacutegia que oriente o orador no embate com seu opositor

Estrateacutegia eficaz pode se estear na teoria de Aristoacuteteles (384-322 aC) Segundo ele a retoacuterica se estrutura em quatro fases que permitem a ordenaccedilatildeo do discurso de maneira a garantir-lhe consistecircncia coerecircncia e clareza Tais fases satildeo assim denominadas a) invenccedilatildeo (reuniatildeo de todos os argumentos e quaisquer meios de persuasatildeo relativos ao tema do disshycurso) b) disposiccedilatildeo (seleccedilatildeo e organizaccedilatildeo dos argumentos) c) elocuccedilatildeo (produccedilatildeo escrita do discurso escolha do estilo da forma como se iraacute comshypor o discurso) d) accedilatildeo (profericcedilatildeo do discurso com o conteuacutedo revestido por determinada forma e auxiliado por recursos de oratoacuteria)

Em capiacutetulos anteriores estudamos estas duas fases invenccedilatildeo e disposiccedilatildeo Neste capiacutetulo abordaremos a elocuccedilatildeo portanto ao estilo agrave forma do dizer mais precisamente a um dos seus aspectos as figuras de retoacuterica Certamente sem o domiacutenio do vernaacuteculo torna-se difiacutecil persuadir um auditoacuterio Isso significa adotar um vocabulaacuterio usual sem arcaiacutesmos ou neologismos Aleacutem disso na busca da clareza e da precisatildeo eacute fundamental ater-se agrave gramaacutetica normativa da liacutengua Entretanto satildeo as figuras que forshynecem um sentido extra ao discurso Dessa forma adornam o estilo com construccedilotildees inesperadas portanto mais aderentes ao auditoacuterio e condenshysam o argumento sintetizando as justificativas das valoraccedilotildees produzidas Segundo Reboul3

A figura eficaz pode ser definida como algo que se desvia da expressatildeo banal mas precisamente por ser mais rica mais expressiva mais eloshyquente mais adaptada numa palavra justa do que tudo que a poderia substituir

Por fim eacute preciso frisar que nem todas as figuras satildeo retoacutericas cujo objetivo eacute funcional jaacute que visam a persuadir um auditoacuterio Haacute aquelas cujo objetivo eacute produzir prazer ou humor etc Vamos portanto nos deter nas figuras retoacutericas analisando seu efeito persuasivo e sua utilizaccedilatildeo no discurso juriacutedico

2 Ibidem p 393 Ibidem p 66

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 163

72 O EFEITO PERSUASIVO DAS FIGURAS DE RETOacuteRICA

Especialmente no texto argumentativo em que o primeiro objetivo do orador eacute estabelecer um viacutenculo com o auditoacuterio deve aquele consshytruir o seu discurso de forma a tornaacute-lo acessiacutevel e atraente Assim aleacutem de planejar o texto escolher os tipos de argumento e elaboraacute-los torna-se imprescindiacutevel utilizar a palavra - ldquoguia de toda accedilatildeo e de todo o pensashymentordquo (Isoacutecrates 439-388 aC) mdash a seu favor explorando-lhe todas as facetas

Para tal tarefa as figuras de retoacuterica segundo Reboul4 desempenham um papel persuasivo isto eacute satildeo mecanismos de que se vale o orador para encaminhar o raciociacutenio do auditoacuterio surpreendendo-o com construccedilotildees criativas numa linguagem viacutevida ou melhor que foge ao comum Obsershyve-se que tal expediente tem ainda por objetivo promover um apelo emoshycional ou motivacional Dessa forma o auditoacuterio receberaacute com surpresa e aguccedilaraacute a sua atenccedilatildeo para as palavras do orador

Natildeo se pode aferir agrave figura retoacuterica a uacutenica funccedilatildeo de evocar prazer ou emocionar o auditoacuterio mas especialmente condensar um argumento que se constitui no proacuteprio enredo No exemplo que se segue isso ficaraacute bem claro O Ministro Ayres Britto ao proferir seu voto sobre a possibilishydade de autorizaccedilatildeo do aborto do feto anenceacutefalo disse ldquoO anenceacutefalo eacute uma crisaacutelida que jamais se transformaraacute em borboletardquo 5

Observe-se que ao comparar o anenceacutefalo a uma crisaacutelida - terceiro estado do ciclo de vida da borboleta em que ainda eacute uma lagarta mas pronta para se transformar em borboleta - objetivou situaacute-lo no mesmo niacutevel de um ser em formaccedilatildeo que se encontra em um estaacutegio intermediaacuterio de vida plena

Entretanto algo os distingue enquanto a crisaacutelida jaacute estaacute madura e completamente formada para se tornar uma borboleta o anenceacutefalo natildeo se formou nem teraacute a possibilidade de se formar plenamente Portanto mais do que evidenciar o que haacute em comum entre ambos (anenceacutefalo e crisaacutelida) desejou o ilustre ministro explicitar aquilo que distingue os dois elementos com o objetivo de persuadir o auditoacuterio sobre a incapacidade de um anenceacutefalo atingir o estaacutegio final de desenvolvimento

4 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Benedetti Satildeo Paushylo Martins Fontes 2000

5 Julgamento da ADPF 54 pelo Supremo Tribunal Federal em 12 de abril de 2012

164 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A ilustraccedilatildeo poderaacute explicitar ainda melhor o que foi dito

Anenceacutefalo sempossibilidade de vida apoacutes deixar o uacutetero materno jaacute que tem ausecircncia parcial ou total de enceacutefalo

possibilidade de vida apoacutes deixar o casulo

jaacute quedesenvolveu-se

plenamente

Crisaacutelida com

Como se observa a aproximaccedilatildeo desses dois elementos aparenteshymente sem algo em comum favoreceu a tese do ex-Ministro Ayres Britto de que o anenceacutefalo eacute um ser fadado agrave morte mesmo que nasccedila com vida Com a figura retoacuterica atenuou-se a dramaticidade do tema ocorrendo o que A BREU (2000 p 74) chama de esfriamento do texto sem no entanshyto atenuar a sua relevacircncia Ademais utilizou-se um repertoacuterio conhecido pelo auditoacuterio universal cuja imagem remete a um ser fraacutegil (borboleta) poreacutem de reconhecida beleza que natildeo alcanccedilaraacute o anenceacutefalo condenashydo prematuramente agrave morte Dessa aproximaccedilatildeo (anenceacutefalo crisaacutelida borboleta) extrai-se uma conclusatildeo incompatiacutevel com a vida condensou- se a tese do orador Certamente o efeito persuasivo obtido com o uso da metaacutefora foi mais intenso do que se o ex-Ministro Ayres Britto tivesse dito apenas o anenceacutefalo eacute um embriatildeo sem expectativa de vida

Pode-se ainda demonstrar como uma figura retoacuterica auxilia a defesa de uma tese encaminhando o raciociacutenio do auditoacuterio na direccedilatildeo determinada pelo orador por meio da prolepse Esse efeito consiste em antecipar um arshygumento do opositor para afirmar sua fragilidade Tal figura eacute muito utilizashyda pelo profissional do direito jaacute que natildeo existe argumentaccedilatildeo se natildeo houver controveacutersia Ademais se o orador estiver atento antevendo os possiacuteveis arshygumentos do seu opositor e voltando-os contra ele surpreenderaacute e o forccedilaraacute a reformular os seus argumentos Um bom exemplo de prolepse foi utilizado por Schreiber ao defender a tese de que seria possiacutevel ampliar a interpretaccedilatildeo do art 953 do Coacutedigo Civil a fim de possibilitar ao magistrado quantificar as indenizaccedilotildees por danos patrimoniais difiacuteceis de serem mensuradas Eis o trecho em comento em que se sublinhou a prolepse

Um observador atento argumentaraacute que a hipoacutetese eacute ainda assim lishymitada agrave conduta que ataquem a honra rdquo da pessoa juriacutedica tema de que trata o caput do art 953 Eacute verdade mas nada impede sua aplicaccedilatildeo analoacutegica aos danos derivados de outras condutas que agridam a pessoa

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 165

juriacutedica como a violaccedilatildeo de segredo industrial O paraacutegrafo uacutenico do art 953 deixaria assim a absoluta inutilidade para assumir o papel de norma oxigenadora da quantificaccedilatildeo das indenizaccedilotildees permitindo ao magistrado arbitrar por si mesmo os danos patrimoniais cuja prova nushymeacuterica se mostrasse extremamente dificultosa (grifo nosso)

Certamente vocecirc deve tecirc-la associado ao argumento de oposiccedilatildeo De fato a prolepse se inclui nesse tipo de argumento Sua particularidade reside no fato de a parte contraacuteria poder ser uma pessoa real ou fictiacutecia Voltaremos agrave anaacutelise do uso e do efeito da prolepse no item 7343

Enfim conforme defende Reboul eacute fundamental conhecer as figushyras retoacutericas e compreender o efeito favoraacutevel ou desfavoraacutevel que podem produzir agrave defesa das nossas teses a fim de interpretaacute-las e utilizaacute-las nas nossas argumentaccedilotildees

73 FIGURAS RETOacuteRICAS MUITO UTILIZADAS NO DISCURSO JURIacuteDICO

E fato que o discurso juriacutedico se utiliza de figuras retoacutericas Dessa forshyma apresentamos algumas dessas figuras sem a pretensatildeo de esgotar o tema mas objetivando a identificaccedilatildeo e os efeitos que elas provocam Destacamos a funccedilatildeo argumentativa das figuras de retoacuterica mais utilizadas no discurso juriacutedico Para tal analisaremos aquelas que se inserem nas figuras de palashyvras figuras de sentido figuras de construccedilatildeo figuras dc pensamento

731 Figuras de palavras

As figuras de palavras referem-se aos significantes que as represenshytam isto eacute aos sons e grafemas pelos quais as identificamos e as distinguishymos umas das outras Ao explorar essa parte fiacutesica das palavras em que o ritmo e o som satildeo destacados pode-se atrair a atenccedilatildeo do auditoacuterio e este receber e aderir ao argumento com mais facilidade

7311 Figuras de ritmo e de som

O ritmo confere musicalidade ao discurso (Reboul) Sabe-se que nos textos destinados agrave propaganda investe-se muito na musicalidade Tal ca-

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA

decircncia pode ser marcada por exemplo pelas siacutelabas tocircnicas e pela extenshysatildeo das siacutelabas das palavras

Aleacutem do ritmo a escolha e a combinaccedilatildeo de sons das palavras tecircm tambeacutem o objetivo de produzir prazer ao puacuteblico a que se destina isto eacute ao consumidor induzindo-o a comprar o produto Seraacute que no discurso juriacutedico caberiam tais estrateacutegias para se conseguir a adesatildeo do auditoacuterio agrave tese do orador O trecho a seguir extraiacutedo do Voto de Ayres Brito refeshyrente ao julgamento da Accedilatildeo Direta de Inconstitucionalidade (A D I) n 4277 e a Arguiccedilatildeo de Descumprimento de Preceito Fundamental (DPF) n 132 que reconheceu a uniatildeo estaacutevel para casais do mesmo sexo responderaacute agrave pergunta

Ayres Britto relator das accedilotildees em reforccedilo agrave sua tese citou Max Scheler6 ldquoO ser humano antes de um ser pensante ou volitivo eacute um ser amanterdquo7

Se quisermos marcar o ritmo destacando a tonicidade do enunciado teriacuteamos o seguinte

O ser humano antes de um ser pensante ou volitivo eacute um ser amanterdquo (3+3+3+3)

Aleacutem do ritmo a musicalidade se manifesta pela rima em ldquoantes pensanteamanterdquo

O argumento de autoridade utilizado pelo ex-Ministro Ayres Britto reforccedila a tese de que a vocaccedilatildeo para amar encontra-se em estado latenshyte no ser humano antes mesmo de adquirir a capacidade de raciocinar Aproveitou-se assim de um argumento em que a mensagem embalada pela harmonia do som das palavras e pelo ritmo da sentenccedila penetra deshylicadamente na consciecircncia do auditoacuterio e reforccedila o significado Segundo Reboul (2000) ldquo as figuras de palavras instauram uma harmonia aparente poreacutem incisiva sugerindo que se os sons se assemelham provavelmente natildeo eacute por acasordquo

ldquo Max Scheler 22 de agosto de 1874 Munique-l9 de maio de 1928 Frankfurt am Main) foi um filoacutesofo alematildeo conhecido por seu trabalho sobre fenomenologia eacutetica e antropologia filosoacutefica O centro de seu pensamento era a sua teoria do valor segundo a qual o ser-valor de um objeto precede a percepccedilatildeo A realidade axioloacutegica dos valores eacute anterior a sua existecircncia Os valores e seus correspondenshytes opostos existem em um ordem objetivardquo (Disponiacutevel em lthttpptwikipedia orgwikiMax_Schelergt Acesso em 02 set 2012)Textos recolhidos de ensaio escrito por Seacutergio da Silva Mendes e a ser publicado no X X Compedi com o nome de ldquoUnidos pelo afeto separados por um paraacutegrashyfordquo a propoacutesito justamente da questatildeo homoafetiva perante o sect 3deg do art 226 da CRFB

7312 A etimologia

Destaque-se ainda que a etimologia eacute considerada figura de palashyvra isto eacute a definiccedilatildeo de um termo com base na sua origem A etimologia representa um argumento retoacuterico Isso porque quando o orador define o sentido de uma palavra objetiva impor esse sentido ao auditoacuterio Foi exashytamente o que fez o ex-Ministro Ayres Britto em trecho do seu voto no julgamento da ADI 4277 e da DPF 132

Vida em comunidade portanto sabido que comunidade vem de lsquolsquocoshymum unidade E como toda comunidade tanto a famiacutelia como a soshyciedade civil satildeo usinas de comportamentos assecuratoacuterios da sobreshyvivecircncia equiliacutebrio e evoluccedilatildeo do Todo e de cada uma de suas partes (grifo nosso)

Observe-se que ao expor a origem da palavra explorando-lhe os sentidos fortaleceu sua tese de que a famiacutelia assim como a sociedade criam comportamentos comuns aos seus membros assegurando a sobrevivecircnciao equiliacutebrio e a evoluccedilatildeo do Todo (sociedade) e daqueles que a compotildeem Com efeito a etimologia foi utilizada com um objetivo funcional valorizar a funccedilatildeo da ceacutelula familiar

732 Figuras de sentido

As figuras de sentido dizem respeito ao significado que uma palavra adota fora do seu uso habitual a fim de enriquecer essa ideia ou ateacute criar outro significado Como o utilizado por exemplo no art 5deg XI da Consshytituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil

A casa eacute asilo inviolaacutevel do indiviacuteduo ningueacutem nela podendo penetrar sem consentimento do morador salvo em caso de flagrante delito ou desastre ou para prestar socorro ou durante o dia por determinaccedilatildeo judicial

Conforme o dicionaacuterio eletrocircnico Houaiss a palavra asilo significa

1 instituiccedilatildeo de assistecircncia social onde satildeo abrigados para sustento eou educaccedilatildeo crianccedilas mendigos doentes mentais idosos etc

2 Derivaccedilatildeo por extensatildeo de sentido proteccedilatildeo amparo seguranccedila Ex depois do divoacutercio buscou a na casa dos pais

168 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Depreende-se que o sentido que se quis dar ao termo ldquo asilordquo conshyforme o dicionaacuterio vai aleacutem daquele atribuiacutedo originariamente agrave palavra Destaque-se que no mesmo dicionaacuterio no verbete destinado agrave palavra ldquocasardquo haacute 27 acepccedilotildees para esse termo mas em nenhuma delas consta o sentido ldquoasilordquo Portanto pode-se considerar que tenha ocorrido uma figura de sentido especificamente uma metoniacutemia Utilizou-se ldquoasilordquo para destashycar uma caracteriacutestica de casa lugar seguro que oferece amparo proteccedilatildeo Justifica-se portanto a proibiccedilatildeo de algueacutem entrar na casa de outrem sem permissatildeo jaacute que tal ato poderia expor ao perigo aquele que se abriga em casa Analisemos algumas dessas figuras

7321 Metoniacutemia

O dicionaacuterio eletrocircnico Houaiss assim define metoniacutemia

Rubrica estiliacutestica linguiacutestica retoacuterica1 figura de retoacuterica que consiste no uso de uma palavra fora do seu contexto semacircntico normal por ter uma significaccedilatildeo que tenha reshylaccedilatildeo objetiva de contiguidade material ou conceituai com o conteuacutedo ou o referente ocasionalmente pensado [Natildeo se trata de relaccedilatildeo compashyrativa como no caso da metaacutefora]Obs cf metalepse antonomaacutesia sineacutedoque

11 relaccedilatildeo metoniacutemica de tipo qualitativo (causa efeito esfera etc) mateacuteria por objeto ouro por lsquodinheirorsquo pessoa por coisa autor por obra adora Portinari por lsquoa obra de Portinarirsquo divindade esfera dc suas funccedilotildees proprietaacuterio por propriedade vamos hoje ao Venacircncio por lsquoao restaurante do Venacircnciorsquo morador por morada continente pelo conteuacutedo bebeu uma garrafa de aguardente por lsquoa aguardente de uma garrafarsquo consequecircncia pela causa respeite os meus cabelos brancos por lsquoa minha velhicersquo a qualidade pelo qualificado praticar a caridade por ldquo atos de caridaderdquo etc

Considere-se portanto haver metoniacutemia quando se substitui palavra por outra por se perceber entre ambas uma semelhanccedila objetiva concreta de contiguidade Tal semelhanccedila permite associar com facilidade a palashyvra utilizada pela que foi substituiacuteda Com efeito quando Gustavo Tepedi- no registrou ldquo com a entrada em vigor do Coacutedigo Civil de 2002 debruccedila- -se a doutrina na tarefa de construccedilatildeo de novos modelos interpretativosrdquo pretendia se referir aos ldquodoutrinadoresrdquo termo facilmente detectaacutevel pela

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 169

leitura Ora mas por que preferiu a palavra doutrina Certamente por preshytender evidenciar o produto do esforccedilo interpretativo de juristas e filoacutesofos do direito que objetivam esclarecer conceitos propor novos paracircmetros e caminhos para soluccedilotildees razoaacuteveis e justas

Observe-se o uso retoacuterico da metoniacutemia neste trecho do julgamento da AD I 4277 e da DPF 132 em que o ex-Ministro Ayres Britto objetiva persuadir o auditoacuterio acerca da importacircncia da famiacutelia independentemente do sexo de seus membros para a formaccedilatildeo de valores morais da pessoa com ecircnfase na toleracircncia concepccedilatildeo reforccedilada no final do trecho

Afinal eacute no regaccedilo da famiacutelia que desabrocham com muito mais viccedilo as virtudes subjetivas da toleracircncia sacrifiacutecio e renuacutencia adensadas por um tipo de compreensatildeo que certamente esteve presente na proposiccedilatildeo spnozista de que ldquo nas coisas ditas humanas natildeo haacute o que crucificar ou ridicularizar Haacute soacute o que compreenderrdquo (grifo nosso)

Conforme o dicionaacuterio Houaiss ldquo regaccedilordquo significa

Substantivo masculino1 parte do corpo que vai da cintura aos joelhos na posiccedilatildeo sentada colo2 concavidade formada pela saia ou avental que se suspende para coshylocar algo3 Derivaccedilatildeo sentido figurado espaccedilo meacutedio interior4 Derivaccedilatildeo sentido figurado lugar em que se repousa ou que serve de abrigo

Certamente no trecho destacado do voto o sentido 4 do verbete foi o pretendido Isso porque considerando-se a famiacutelia como um abrigo onde a pessoa encontra proteccedilatildeo suficiente para desenvolver valores esta deve ser reconhecida e valorizada

Quanto agrave segunda metoniacutemia destacada ldquo crucificarrdquo note-se que o verbo remete agrave cruz siacutembolo do sacrifiacutecio de Cristo Com o uso desse verbo destaca-se o siacutembolo natildeo a accedilatildeo de prender algueacutem em uma cruz Certamente esta segunda compreensatildeo natildeo seria a esperada de um leitor atento Entende-se pois que o orador desejou evidenciar o sentido ldquo estigshymatizarrdquo contido no verbo crucificar Assim objetivou persuadir o auditoacuterio de que essa atitude demonstra extrema falta de sentimento de compaixatildeo A forccedila argumentativa da metoniacutemia encontra-se na simbologia da palavra

170 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

empregada em substituiccedilatildeo agravequela que representa Conforme Reboul ldquoa metoniacutemia cria siacutembolos como por exemplo a foice e o martelo a rosa e a cruz Nesse sentido condensa um argumento fortiacutessimordquo

7322 Metaacutefora

Na metaacutefora associam-se dois termos completamente distintos compashyram-se ambos e se extrai algo em comum entre eles Estabelecido o viacutenculo um termo substitui o outro Observe-se que a identificaccedilatildeo dessa semelhanccedila eacute subjetiva isto eacute depende exclusivamente da interpretaccedilatildeo daquele que esshytabelece a aproximaccedilatildeo Por conseguinte a criatividade eacute uma caracteriacutestica marcante da metaacutefora E justamente essa criatividade que conforme Reboul ldquo permite entender o poder argumentativo da metaacuteforardquo Com efeito em senshytenccedila referente ao Processo n 2003001050626-8 em que ajuiacuteza critica a forshyma como o autor dispocircs seus argumentos considerando-os preconceituosos observa-se que a utilizaccedilatildeo da metaacutefora expressa claramente sua indignaccedilatildeo

Esses poreacutem e infelizmente satildeo os momentos mais comedidos do aushytor quando comparados a outros em que as suas erupccedilotildees discriminatoacuteshyrias assumem contornos de bravatas histeacutericas e francamente ofensivas (grifo nosso)

O sentido da palavra ldquo erupccedilatildeordquo adapta-se perfeitamente agrave avaliaccedilatildeo da juiacuteza ao excesso cometido pelo autor em sua peticcedilatildeo inicial Certamente o auditoacuterio reconheceraacute que o termo estaacute ligado agrave geologia isto eacute significa a emissatildeo de materiais magmaacuteticos por um vulcatildeo Entretanto considerando todo o processo discursivo natildeo estranharaacute o seu uso Ademais o termo meshytafoacuterico sintetiza o argumento da juiacuteza da falta de controle do autor sob suas emoccedilotildees da mesma forma que natildeo se controla a larva de um vulcatildeo

7323 Hipeacuterbole

Conforme Reboul ldquo a hipeacuterbole eacute a figura do exagerordquo Sua utilizaccedilatildeo objetiva intensificar o que se diz a fim de se atenuar o que se tem a intenshyccedilatildeo de dizer Nas palavras de Fiorin ldquo quando se intensifica no enunciado e se atenua na enunciaccedilatildeordquo Entenda-se enunciado como aquilo que se diz o material concreto do discurso Enunciaccedilatildeo diz respeito ao como se diz ao significado que o autor do discurso deseja transmitir isto eacute agrave intenccedilatildeo comunicativa do orador

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 171

Assim quando o juiz Joatildeo Baptista Herkenhoiacutef no despacho de 09081978 no Processo ndeg 3775 da la Vara Criminal de Vila Velha (ES) registrou ldquoeste Juiz renegaria todo o seu credo rasgaria todos os seus prinshyciacutepios trairia a memoacuteria de sua matildee se permitisse sair Edna deste Foacuterum sob prisatildeordquo sem duacutevida exagerou ao enunciar que ldquo renegaria todo o seu creshydordquo que ldquo rasgaria todos os seus princiacutepiosrdquo e que ldquo renegaria a memoacuteria de sua matildeerdquo jaacute que sua intenccedilatildeo natildeo alcanccedila tal amplitude Na verdade deseja angariar a adesatildeo do auditoacuterio agrave tese de absolviccedilatildeo da reacute mesmo existindo provas contra Para atingir tal objetivo registra o quatildeo fora de propoacutesito eacute a condenaccedilatildeo da mesma forma que seria um excesso praticar as accedilotildees por ele enunciadas Dessa maneira o auditoacuterio eacute induzido a admitir sua tese

Enfim a hipeacuterbole tem por objetivo ldquo levar agrave proacutepria verdade e de lixar atraveacutes do que ela diz de incriacutevel aquilo que eacute realmente preciso crerrdquo (Reboul)

7324 Eufemismo

O eufemismo eacute o oposto da hipeacuterbole jaacute que o orador procura atenuar aquilo que a enunciaccedilatildeo enfatiza Buscam-se palavras que amenizem o que estaacute sendo enunciado ldquo simulando moderaccedilatildeo para afirmar de maneira enshyfaacuteticardquo (Fiorin) Com essa estrateacutegia argumentativa o orador dissimula aquilo que realmente deseja fazer crer

Acrescente-se que tal dissimulaccedilatildeo demonstra a preocupaccedilatildeo do orashydor de transmitir ao auditoacuterio uma imagem de polidez sensibilidade Natildeo se pode olvidar que a forma como o auditoacuterio o avalia eacute determinante para que se torne mais permeaacutevel agraves palavras deste Assim o orador investe no ethos - o seu caraacuteter sua imagem - jaacute que conquistaraacute com mais facilidade o auditoacuterio se for considerado honesto educado e tambeacutem no logos - na forma como enuncia os argumentos

Como exemplo de eufemismo destaca-se a criacutetica publicada no jorshynal O Estado de S Paulo do ministro Marco Aureacutelio agrave forma como o mishynistro Joaquim Barbosa reagiu ao voto do ministro Ricardo Lewandowski revisor da Accedilatildeo Penal 470 favoraacutevel ao desmembramento do processo - o envio das denuacutencias contra os que natildeo tecircm prerrogativa de foro agrave primeira instacircncia nos primeiros dias do julgamento da Accedilatildeo Penal 4708

Consultor Juriacutedico 4 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lt httpwwwconjurcom br2012-ago-04marco-aurelio-temer-joaquim-barbosa-presidencia-supremogt Acesso em 02 set 2012

172 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 173

Natildeo gostei pela falta de urbanidade do relator Precisamos discutir ideias natildeo deixando descambar para o lado pessoal Mc assusta o que podemos ter apoacutes novembro (quando Joaquim Barbosa assumiraacute a preshysidecircncia do STF) Costumo dizer que o presidente (do STF) tem de ser um algodatildeo entre cristais natildeo pode ser metal entre cristais

Observa-se a preocupaccedilatildeo do ministro Marco Aureacutelio em escolher as palavras a fim de proteger a sua imagem e de atenuar o impacto de sua criacutetica sem no entanto expressar o quanto desaprova a atitude do colega Destaque-se que o ministro Marco Aureacutelio preferiu dizer que houve ldquo falta de urbanidaderdquo em vez de dizer que o ministro Joaquim Barbosa teria sido grosseiro Em seguida utilizou uma metaacutefora insinuando possivelmente que o colega seria comparaacutevel a um ldquo metal entre cristaisrdquo Embora tenha utilizado um eufemismo contido na metaacutefora a enunciaccedilatildeo reforccedila a deshysaprovaccedilatildeo

dade privada como espaccedilo de liberdade individual e tendencialmente absoluta do titular do domiacutenio9 (grifo nosso)

Com efeito a Constituiccedilatildeo da Reptiblica Federativa do Brasil de 1988 passou a priorizar o coletivo em detrimento ao individual Dessa forma o aparente paradoxo se desfaz jaacute que a noccedilatildeo individualista de propriedade natildeo mais corresponde ao ideal constitucional

7326 Antiacutetese

A antiacutetese estabelece oposiccedilotildees de termos ou de temas num determishynado contexto Como figura retoacuterica objetiva enaltecer um dos termos ou tema que se opotildee ao outro Tal objetivo se observa no seguinte trecho de Fachin

7325 Paradoxo

E muito comum unir termos de sentido contraditoacuterio na mesma unishydade de sentido a fim de demonstrar algum conflito existente Essa estrateacuteshygia argumentativa provoca um estranhamento no auditoacuterio exigindo que se detenha na anaacutelise do contraditoacuterio e extraia desse conflito uma conclusatildeo isto eacute uma tese Um exemplo disso foi a assertiva de Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber extraiacuteda do artigo A garantia de propriedade no direito brasileiro em que fazem referecircncia agrave ultrapassada concepccedilatildeo de propriedade privada Destacam que se adotada tal concepccedilatildeo seria contrashyditoacuterio o artigo 170 da Constituiccedilatildeo Federal que dispotildee

Art 170 A ordem econocircmica fundada na valorizaccedilatildeo do trabalho humano e na livre iniciativa tem por fim assegurar a todos existecircncia digna conforshyme os ditames da justiccedila social observados os seguintes princiacutepiosII - propriedade privada

III - funccedilatildeo social da propriedade (grifo nosso)

Assim se posicionam os juristas sobre o tema

1- Transitar10Resta enfrentar sem delongas nomeadamente agora com o novo Coacutedishygo Civil brasileiro o desafio que consiste em trocar praacuteticas de medievo pelos saberes construiacutedos agraves portas do terceiro milecircnio Este eacute apenas o singelo ponto de partidaPrograma para arguir questionando-se numa esperanccedila interrogativa aberta natildeo cadastrada pelo dogmatismo juriacutedico endereccedilando-se para todos os niacuteveis que se proponham novos no porvir contiacutenuo de um proshyjeto em permanente edificaccedilatildeo Um novo Direito Civil a partir de seus pilares fundamentais o contrato o projeto parental e as titularidades eacute a proposta do tempo que se faz agora siacutentese do passado que restou e do futuro ainda por se estabelecer Os sinos dobram para reconhecer o fim da concepccedilatildeo insular do ser humano e o liame indissociaacutevel entre Direishyto e criacutetica na releitura de estatutos fundamentais do Direito PrivadoNo horizonte a vencer o que se diz eacute tatildeo relevante quanto como se diz Daiacute a perspectiva inadiaacutevel de revirar a praxe didaacutetica Sair da clausura dos saberes postos agrave reproduccedilatildeo e ir aleacutem das restriccedilotildees que o molde deforma A produccedilatildeo das regras de direito como ato de nascimento da vida e natildeo certidatildeo de oacutebito a ser estampada no museu das praxes

A referecircncia corriqueira agrave ldquofunccedilatildeo social da propriedade privadardquo exshyplica-se pelo fato de que eacute neste acircmbito que a funcionalizaccedilatildeo opera de forma mais revolucionaacuteria afastando a tradicional noccedilatildeo da proprie-

9 Disponiacutevel em lthttpwwwfdcbrArquivosMestradoRevistasRevista06Docen- te04pdfgt Acesso em 02 set 2012

10 FACHIN Luiz Edson Teoria criacutetica do direito civil agrave luz do novo Coacutedigo Civil Brasileiro 2 ed rev e atual Rio de Janeiro Renovar 2003 p 6-8

174 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

O texto acima repousa na antiacutetese isto eacute na oposiccedilatildeo entre os pilares do antigo Coacutedigo Civil e os do novo Coacutedigo Observa-se que ao antigo coacutedigo satildeo atribuiacutedas ideias com sentido negativo jaacute ao novo coacutedigo o sentido eacute positivo Tem-se a seguinte oposiccedilatildeo

COacuteDIGO CIVIL DE 1916 COacuteDIGO CIVIL DE 2002

Praacuteticas de medievo Saberes construiacutedos agraves portas do terceiro milecircnioDogmatismo juriacutedico Projeto em permanente edificaccedilatildeoPassado FuturoClausura dos saberes postos agrave reproduccedilatildeo

Ir aleacutem das restriccedilotildees que o molde deforma

Certidatildeo de oacutebito Ato de nascimento da vida

Como se pode concluir a antiacutetese representa uma estrateacutegia argu- mentativa muito produtiva chegando a constituir o fio condutor do texto

7327 Personificaccedilatildeo

A personificaccedilatildeo transfere para seres irracionais ou inanimados accedilotildees ou atributos restritos aos seres humanos Tal estrateacutegia argumentativa aleacutem de atrair a atenccedilatildeo do auditoacuterio transfere responsabilidades exclusivas do homem agravequeles que por natureza satildeo incapazes de possuiacute-las Dessa forshyma ao atribuir por exemplo responsabilidades a uma empresa comercial considerando-a ldquo pessoardquo juriacutedica personifica-se essa empresa e conseshyquentemente torna-a suscetiacutevel de direitos e deveres

Em muitos textos argumentativos eacute possiacutevel extrair exemplos que ilusshytram a personificaccedilatildeo Eis um deles utilizado por Luiz Edson Fachin11

2 Porque os Ventos Sopram do Direito Civil Exilado no Inadiaacutevel FuturoTem-se como objeto desse exame o modelo que inspirou os sistemas latinos a forjar uma ldquoconstruccedilatildeo do homem privadordquo e a rejeitar no laissez-faire a verdadeira dimensatildeo da equidade que supotildee simultaneashymente igualdade e diferenciaccedilatildeo E o legado desse sistema que teima em recusar a travessia do indiviacuteduo sujeito e do sujeito agrave cidadania Explicitar essa demarcaccedilatildeo dos fatos reconhecer a teia de relaccedilotildees nem

11 FACHIN Luiz Edson Teoria criacutetica do direito civil agrave luz do novo Coacutedigo Civil Brasileiro 2 ed rev e atual Rio de Janeiro Renovar 2003 p 11

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 175

sempre inoxidaacutevel e expor a caracteriacutestica construtiva das relaccedilotildees bem pode embalar um projeto e um desafio (grifo nosso)

Na personificaccedilatildeo destacada atribui-se ao sistema latino uma accedilatildeo proacutepria dos seres humanos teimar Eacute uma forma de direcionar o foco da alenccedilatildeo daqueles que se utilizam do sistema transferindo-a para o proacuteprio sistema objeto de estudo e de atualizaccedilatildeo

733 Figuras de construccedilatildeo

As figuras de construccedilatildeo tambeacutem denominadas figuras de sintaxe representam alteraccedilotildees que se promovem na estrutura do periacuteodo a fim de ulcanccedilar determinado efeito persuasivo Isso ocorre mediante a inversatildeo dos elementos da omissatildeo de algum termo ou da sua repeticcedilatildeo

7331 Inversatildeo

A ordem direta dos termos no periacuteodo segue a seguinte sequecircncia sushyjeito verbo complementos adjuntos adverbiais A alteraccedilatildeo dessa ordem convencional desperta maior atenccedilatildeo do auditoacuterio para o termo deslocado no periacuteodo Geralmente quando o orador desloca um termo para o iniacutecio do periacuteodo deseja atribuir-lhe mais destaque enfatizar o seu sentido Isso se verifica no seguinte trecho extraiacutedo do voto do ex-Ministro Ayres Britto no julgamento da ADI n 4277 e da DPF n 132

Realmente em tema do concreto uso do sexo nas trecircs citadas funccedilotildees de estimulaccedilatildeo eroacutetica conjunccedilatildeo carnal e reproduccedilatildeo bioloacutegica a Consshytituiccedilatildeo brasileira opera por um intencional silecircncio Que jaacute eacute um modo de atuar mediante o saque da kelseniana norma geral negativa ()

O citado trecho inicia-se com um adjunto adverbial de afirmaccedilatildeo (realmente) em seguida outro adjunto adverbial de assunto (em tema do concreto uso do sexo nas trecircs citadas funccedilotildees de estimulaccedilatildeo eroacutetica conshyjunccedilatildeo carnal e reproduccedilatildeo bioloacutegica) Soacute depois dos adjuntos adverbiais registrou-se o sujeito (Constituiccedilatildeo brasileira) A inversatildeo se justifica em funccedilatildeo da intenccedilatildeo do orador de enfatizar o silecircncio sobre esses temas pela Constituiccedilatildeo brasileira Destacar tal silecircncio demonstra ser o mais imporshytante para o orador a fim de associaacute-lo ao conceito de ldquonorma geral negashytivardquo elemento essencial para a sua tese

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

7332 Quiasmo

Quiasmo eacute uma inversatildeo com repeticcedilatildeo dos termos invertidos Seshygundo Rcboul essa figura retoacuterica segue a combinaccedilatildeo AB-BA A invershysatildeo associada agrave repeticcedilatildeo acentua a implicaccedilatildeo de sentido entre os termos Aleacutem disso permuta entre eles a funccedilatildeo de tema do enunciado

O quiasmo foi utilizado no seguinte trecho da Accedilatildeo Direta de Tncons- titucionalidade proposta pelo entatildeo Procurador-Geral da Repuacuteblica Dr Claacuteudio Lemos Fonteles tendo por alvo o art 5 o da Lei Federal 11105 (ldquo Lei da Biosseguranccedilardquo ) de 24 de marccedilo de 2005 de quem foi relator o Ministro Ayres Britto

Convenhamos Deus fecunda a madrugada para o parto diaacuterio do sol mas nem a madrugada eacute o sol nem o sol eacute a madrugada Natildeo haacute processo judicial contencioso sem um pedido inicial de prolaccedilatildeo de sentenccedila ou acoacuterdatildeo mas nenhum acoacuterdatildeo ou sentenccedila judicial se confunde com aquele originaacuterio pedido Cada coisa tem o seu momenshyto ou a sua etapa de ser exclusivamente ela no acircmbito de um processo que o Direito pode valorar por um modo tal que o respectivo cliacutemax (no caso a pessoa humana) apareccedila como substante em si mesmo Esshypeacutecie de efeito sem causa normativamente falando ou positivaccedilatildeo de uma fundamental dicotomia entre dois planos de realidade o da vida humana intrauterina e o da vida para aleacutem dos escaninhos do uacutetero materno tudo perfeitamente de acordo com a festejada proposiccedilatildeo kelseniana de que o Direito tem propriedade de construir suas proacuteprias realidades (grifo nosso)

Observe-se que com a inversatildeo de termos repetidos demonstra-se a impossibilidade de considerar um idecircntico ao outro embora haja uma imshyplicaccedilatildeo de sentido entre eles Assim reforccedila a ideia de que o ser enquanto se encontra na vida intrauterina estaacute em um plano completamente distinto daquele que jaacute nasceu

7333 Reticecircncias

Conforme Reboul

para incitar o outro a retomaacute-lo por sua conta a preencher por sua conta os trecircs pontos de suspensatildeo

Com efeito observa-se que no trccho a seguir a suspensatildeo do disshycurso teve por objetivo evitar conflito mas deixou para o auditoacuterio a funshyccedilatildeo de concluir o que natildeo foi dito O exemplo que se segue refere-se agrave criacutetica do Ministro Joaquim Barbosa relator do processo do ldquomensalatildeordquo no Supremo Tribunal Federal (STF) aos advogados que ldquo o acusaram de atuar com parcialidade na conduccedilatildeo da accedilatildeo penal O ministro tambeacutem se indispocircs com os proacuteprios colegas que natildeo acataram a proposta de retaliashyccedilatildeo a esses advogados sugerida por elerdquo 12 Seguem os trechos que expotildee a suspensatildeo do discurso

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA

O posicionamento da maioria da Corte desagradou o relator que disse que a honra do Tribunal foi atacada e natildeo apenas a sua ldquo Cada paiacutes tem o modelo de Justiccedila que merece Se [a Justiccedila] se deixa agredir se deixa ameaccedilar por uma guilda profissional nunca se sabe qual eacute o fim que lhe eacute reservadordquoO ministro Marco Aureacutelio respondeu ao colega que natildeo se sentiu atashycado pelas ofensas o que provocou nova reaccedilatildeo de Barbosa ldquoFossa Excelecircncia talvez faccedila parte rdquo disse o ministro sem concluir o racioshyciacutenio (grifo nosso)

7334 Repeticcedilatildeo

Geralmente orienta-se o aprendiz na arte de escrever que evite repeshyticcedilatildeo de palavras Entretanto haacute ocasiotildees em que a repeticcedilatildeo tem objetivo retoacuterico Segundo Perelman e Olbrechts-Tyteca a repeticcedilatildeo reforccedila o conshyteuacutedo enunciado provocando um efeito de presenccedila e sugerindo distinccedilotildees Provoca-se o efeito de presenccedila quando o objeto do discurso eacute assimilado pela consciecircncia do auditoacuterio levando-o a refletir e reter a ideia do orador Quanto agrave sugestatildeo de distinccedilotildees tal efeito se opera em razatildeo de o segundo elemento enunciado do termo ter seu sentido intensificado e adquirir um valor distinto do primeiro

A aposiopese ou reticecircncias interrompe a frase para passar ao auditoacuteshyrio a tarefa de complementaacute-la figura por excelecircncia da insinuaccedilatildeo do despudor da caluacutenia mas tambeacutem do pudor da admiraccedilatildeo do amor sua forccedila argumentativa adveacutem do fato de retirar o argumento do debate

Mateacuteria disponiacutevel em lthttpagenciabrasilebccombrnoticia2012-08-15joa- quim-barbosa-se-indispoe-com-advogados-e-ministros-do-stf-apos-acusacao-de- parcialidade-no-mensalagt Acesso em 20 ago 2012

178 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Notam-se tais efeitos no seguinte trecho de uma sentenccedila13 em que o juiz atribui aos oacutergatildeos puacuteblicos e agrave comunidade a responsabilidade de o reacuteu um deficiente auditivo ter cometido atos iliacutecitos

O Judiciaacuterio o encaminhou para todos os oacutergatildeos e instituiccedilotildees possiacuteveis ameaccedilou prender Diretoras de Escolas que natildeo o aceitavam mas tamshybeacutem natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquo Mudinhordquo

A comunidade natildeo fez nada por ele

O Municiacutepio natildeo fez nada por eleO Estado Brasileiro natildeo fe z nada por eleHoje BSS tem 21 anos eacute maior de idade e pratica crimes contra o patrimocircshynio dos membros de uma comunidade que natildeo cuidou dele (grifo nosso)

Como se pode observar a repeticcedilatildeo fixa na mente do auditoacuterio o deshysamparo a que ficou exposto o reacuteu Aleacutem disso a cada repeticcedilatildeo se torna mais grave a omissatildeo daqueles que tinham a obrigaccedilatildeo de zelar pelo jovem especialmente por se tratar de um deficiente auditivo responsabilizando-os pelos atos praticados por ele

7335 Gradaccedilatildeo

Na gradaccedilatildeo apresentam-se ldquo as palavras na ordem crescente de extenshysatildeo ou importacircnciardquo (Reboul) ou na ordem decrescente conforme a intenshyccedilatildeo do orador conduzindo o auditoacuterio paulatinamente no sentido evolutivo ou regressivo conforme os fatos atos ou omissotildees tenham gerado No exemshyplo anterior observa-se aleacutem da repeticcedilatildeo a gradaccedilatildeo Isso porque o juiz registra de forma crescente a ausecircncia da ldquo comunidaderdquo do ldquo Municiacutepiordquo do ldquo Estadordquo levando o auditoacuterio a concluir que ningueacutem fez algo pelo reacuteu

734 Figuras de pensamento

Considera-se figura de pensamento aquela que extrai do discurso como um todo a intenccedilatildeo daquele que produz o enunciado Portanto equishyvale agrave enunciaccedilatildeo

13 BRASIL Processo n 1863657-42008 Autor Ministeacuterio Puacuteblico Estadual Reacuteu BSS Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr200810juiz_condena_acusado_ furto_procurar_empregogt

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 179

7341 Ironia

A ironia consiste em afirmar algo no enunciado e negar na enunciashyccedilatildeo isto eacute aquilo que o orador diz eacute o oposto do que pretende fazer acreshyditar Na verdade o auditoacuterio pode interpretar literalmente o enunciado e natildeo perceber a intenccedilatildeo do orador Cabe ao orador entatildeo fornecer pistas que orientem o auditoacuterio a decifrar sua real intenccedilatildeo Mas para que isso ocorra eacute preciso que ele seja perspicaz a ponto de deduzir a competecircncia do auditoacuterio para perceber a criacutetica ou a denuacutencia dissimulada no discurso Na verdade a ironia fina deixa ao inteacuterprete sempre alguma duacutevida sobre a real intenccedilatildeo do orador

Ademais a ironia ldquo denuncia a falsa seriedade em nome de uma seshyriedade superior - a da razatildeo do bom senso da moral - o que coloca o ironista bem acima daquilo que ele criticardquo 14 como se observa na resposta do ex-Ministro Carlos Ayres Britto ao Ministro Ricardo Lewandowski no julgamento em que se discutia se a ex-companheira de um homem casado tinha direito agrave metade da pensatildeo que a viuacuteva recebia No Acoacuterdatildeo do STF- RE 397762-8 o Ministro Lewandowski natildeo reconhecia como uniatildeo esshytaacutevel a relaccedilatildeo mantida entre o de ciijus e a autora Assim pronunciou-se Lewandowski

() eacute uma comunhatildeo de leitos ao passo que a uniatildeo estaacutevel eacute uma comunhatildeo de vidas eacute uma parceria eacute um companheirismo Quer me parecer eminente Ministro Carlos Ayres Brito que quem manteacutem duas famiacutelias uma legal e outra na clandestinidade natildeo estaraacute dando publishycidade a essa segunda famiacutelia

Resposta do ex-Ministro Ayres Britto

Vossa Excelecircncia me permite Sempre fico mimoseado presenteado com intervenccedilotildees e votos tatildeo brilhantes mas digo simplesmente que a definiccedilatildeo de concubinato como mero ldquo dormir juntosrdquo natildeo se aplica a quem dormiu junto durante trinta anos E segundo eacute impossiacutevel manter uma relaccedilatildeo de trinta anos agraves escondidas clandestinamente Certamente essa uniatildeo era puacuteblica e notoacuteria De qualquer forma rendo minhas hoshymenagens a Vossas Excelecircncias em conjunto

14 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Benedetti Satildeo Paulo Martins Fontes 2000 p 133

180 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Com efeito o ex-Ministro Ayres Britto no iniacutecio de sua reacuteplica enalshytece o discurso do seu opositor Em seguida por meio de fatos demonstra o quatildeo incoerentes foram os argumentos usados pelo colega No desfecho volta a enaltecer natildeo apenas ao Ministro Lewandowski mas tambeacutem aos demais que se opotildeem a ele Nota-se a ironia pelo exagero dos elogios seguidos de afirmaccedilotildees que comprovam o oposto do que afirmara Tais afirmaccedilotildees denotam bom senso que deveria prevalecer acima do que diz o artigo 226 da CRFB

A famiacutelia base da sociedade tem especial proteccedilatildeo do Estado sect 3deg Para efeito da proteccedilatildeo do Estado eacute reconhecida a uniatildeo estaacutevel entreo homem e a mulher como entidade familiar devendo a lei facilitar sua conversatildeo em casamento

No caso citado a maioria dos ministros entendeu que em razatildeo de o falecido conviver com a esposa e com aquela que jamais poderia assumir como esposa esta soacute poderia ser reconhecida como concubina natildeo sendo admitida como companheira em uniatildeo estaacutevel conforme o art 1727 ldquoAs relaccedilotildees natildeo eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar constituem concubinatordquo

7342 Pretericcedilatildeo

Em determinadas situaccedilotildees o orador simula que natildeo iraacute dizer algo procurando proteger a sua imagem ou surpreender o auditoacuterio captando a sua atenccedilatildeo Isso ocorre em especial quando o auditoacuterio natildeo demonstra muita afinidade com a tese do orador

Pode-se verificar o uso de tal recurso retoacuterico pelo advogado de deshyfesa de Joseacute Dirceu Dr Joseacute Luiacutes Oliveira Lima no dia 07082012 na Accedilatildeo Penal 470 Ele afirmou

Natildeo vim pedir absolviccedilatildeo de Joseacute Dirceu pela sua histoacuteria ou passado de 40 anos de vida puacuteblica sem qualquer maacutecula ou mancha Natildeo peccedilo porque aqui natildeo eacute a casa para isso natildeo estou no Congresso Nacional Peccedilo absolviccedilatildeo de Joseacute Dirceu com base na prova dos autos e no devishydo processo legal

Ciente de que a opiniatildeo puacuteblica estaacute contra seu cliente e que a acusashyccedilatildeo foi incisiva ao avaliaacute-lo recorre ao argumento de fuga sem contudo dizer que o faraacute Diz que natildeo mencionaraacute o passado de Joseacute Dirceu mas o

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 181

faz Assim consegue que o auditoacuterio avesso aos seus argumentos se tome permeaacutevel agraves suas palavras

7343 Prolepse

Como jaacute dito anteriormente soacute existe argumentaccedilatildeo quando haacute conshyflito de ideias e de interesses E importante pois que o orador lenha ciecircncia da tese que se opotildee agrave sua e dos argumentos que a fundamentam Por essa razatildeo encontra-se presente em todo texto argumentativo a prolepse tamshybeacutem conhecida como figura de argumento jaacute que manteacutem um viacutenculo entre estilo e argumentaccedilatildeo Tal recurso consiste em antecipar o argumento (real ou fictiacutecio) do opositor para voltaacute-lo contra ele Dessa forma o orador surpreende o seu opositor intui um possiacutevel argumento e desarticula o seu discurso obrigando-o a rever suas estrateacutegias como no trecho a seguir

Algueacutem diraacute que nessa busca da verdade real ele pode prejudicar o reacuteu Ora essa A verdade quando procurada pelo juiz interessado em natildeo errar natildeo eacute condicionada para de antematildeo beneficiar ou prejushydicar E natildeo prejudica realmente quando desfavoraacutevel ao reacuteu porque juntada essa prova aos autos o defensor do acusado pode impugnaacute-la mostrando sua fragilidade ou anexando prova contraacuteria O contraditoacuterio na prova eacute sagrado e nenhum juiz normal se atreve a afrontar esse prinshyciacutepio (grifo nosso)15

Na reacuteplica poreacutem em que o orador conhece o argumento do seu oposhysitor e tem como objetivo refutaacute-lo tambeacutem parte desse argumento para expor com maior consistecircncia seu ponto de vista No exemplo a seguir referente agrave Accedilatildeo Penal 470 o trecho da defesa do ex-ministro dos Transshyportes Anderson Adauto acusado de ter recebido R$ 950 mil do esquema de Marcos Valeacuterio utiliza tal estrateacutegia Expocircs o advogado Roberto Pa- gliuso

O Ministeacuterio Puacuteblico para tentar imputar o crime de lavagem de dishynheiro a Anderson faz uma suposiccedilatildeo na denuacutencia de que ele tinha pleno conhecimento de todos os crimes praticados pelos integrantes da quadrilha E no paraacutegrafo seguinte o Ministeacuterio Puacuteblico enfatiza natildeo apenas pleno conhecimento mas profundo conhecimento Eu li atentashy

15 RODRIGUES Francisco Cesar Pinheiro O juiz deve ser um apaacutetico espectador ou buscar a verdade real Disponiacutevel em lthttpjusvicomartigos43355gt Acesshyso em 02 set 2012

182 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

mente o voto do ministro Joaquim Barbosa quando recebeu a denuacutencia Ele afirmava que existe prova miacutenima que viabiliza o iniacutecio da accedilatildeo penal Para condenar eacute necessaacuteria a existecircncia de prova maacutexima que decirc seguranccedila ao magistrado que garante a sua formaccedilatildeo de convicccedilatildeo - disse o advogado () (grifo nosso)

Como se observou no trecho transcrito o advogado de defesa reshygistrou o argumento de acusaccedilatildeo - sublinhado no trecho - para estruturar a defesa da sua tese sobre aquilo que considerou falho nessa acusaccedilatildeo a existecircncia de prova miacutenima

Capiacutetulo VIII

PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

O Parecer eacute uma peccedila textual de aspecto formal proacuteprio redigida por autoridade competente que emite uma opiniatildeo de teor natildeo vinculativo sobre o assunto consultado A autoridade a que nos referimos pode ser por exemplo na esfera privada um advogado com notoacuterio conhecimento juriacutedico na esfera puacuteblica um membro do Ministeacuterio Puacuteblico

Acrescente-se que o conteuacutedo de um parecer ldquo diz respeito a probleshymas juriacutedicos teacutecnicos ou administrativosrdquo 1 Tal peccedila tem como uacutenico obshyjetivo manifestar uma opiniatildeo em razatildeo de uma provocaccedilatildeo isto eacute de uma consulta Para que cumpra esse objetivo eacute importante a produccedilatildeo de uma peccedila em que se adote uma estrutura formal tiacutepica

81 A ESTRUTURA DE UM PARECER JURIacuteDICO TEacuteCNICO- -FORMAL

Natildeo existe forma definida por qualquer dispositivo legal para apreshysentaccedilatildeo de um parecer [] A CRFB art 129 V III e a Lei Orgacircnica Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico (Lei n 862593 conhecida pela sigla LONMP) recomendam (art 43 III) que eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico sempre indicar os fundamentos juriacutedicos em seus pronunciamentos processhysuais Aliaacutes ressalte-se nenhum parecer pode deixar de ter fundamentos2

Assim entendemos que a praacutetica reiterada na produccedilatildeo do parecer com uma determinada estrutura serve de orientaccedilatildeo aos que pretendem emitir

1 DURAtildeO Pedro Teacutecnica de parecer Como fazer um diciacuteamen juriacutedico Curitiba Juruaacute 2012 p 27REVISTA REDACcedilAtildeO JURIacuteDICA a palavra do advogado Rio de Janeiro Edipa Ltda ndeg 8 2004

184 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Ademais a semelhanccedila de estrutura com a do acoacuterdatildeo eacute justificada por um dos seus objetivos orientar uma decisatildeo de instacircncia superior como fazem os Procuradores de Justiccedila

0 parecer segue na maioria das vezes formato semelhante ao do acoacuterdatildeo pois constitui-se de preacircmbulo ementa relatoacuterio fundamentashyccedilatildeo conclusatildeo e parte autenticativa Sucintamente cada parte apresenta as seguintes caracteriacutesticas

1 - Preacircmbulo eacute a parte em que se identificam a central idade da questatildeo as partes o nuacutemero da peccedila

2 - Ementa como lembra Campestrini ementa tem origem latina emeniscor cujo significado eacute ldquo apontamentordquo ldquo ideiardquo ldquo instrumento breve de lembranccedila ou pensamentordquo 3 enfim eacute a siacutentese relevante da peccedila Ao ler a ementa tem-se conhecimento da questatildeo central (fato) dos nexos de referecircncia da fundamentaccedilatildeo e do entendimento (conclusatildeo do parecer)

3 - Relatoacuterio eacute a narrativa sucinta e imparcial dos fatos Devem ser registrados os fatos as circunstacircncias que os esclarecem e todas as inforshymaccedilotildees determinantes ocorridas durante a anaacutelise da questatildeo

4 - Fundamentaccedilatildeo eacute um texto argumentativo em que se analisam os fatos narrados as provas as alegaccedilotildees dos envolvidos na questatildeo com o objetivo de extrair dessa anaacutelise conclusotildees devidamente justificadas por meio dos princiacutepios das regras da jurisprudecircncia dos costumes entre oushytras fontes Na fundamentaccedilatildeo utilizam-se as teacutecnicas argumentativas e estrateacutegias discursivas a fim de convencer sobre o ponto de vista que seraacute exposto na conclusatildeo

5 - Conclusatildeo eacute a apresentaccedilatildeo da opiniatildeo para a composiccedilatildeo da questatildeo analisada

6 - Parte autenticativa eacute a identificaccedilatildeo daquele que emitiu o pashyrecer considerando que assume uma responsabilidade civil pelo seu opi- namento Assim dataraacute assinaraacute e indicaraacute o nuacutemero da carteira de idenshytidade profissional

Especificadas as partes que compotildeem o parecer vamos nos deter em cada uma delas Para isso leiamos o parecer do Procurador de Justiccedila hoje aposentado Paulo Cezar Pinheiro Carneiro4

3 CAMPESTRINI H Como redigir ementas Satildeo Paulo Saraiva 1994 pl4 CARNEIRO Paulo Cezar Pinheiro A atuaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico na aacuterea ciacutevel

Temas diversos Pareceres 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2001 p 245-248

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICOJURIacuteDICO 185

5a Cacircmara Ciacutevel Accedilatildeo InventaacuterioAgravo de Instrumento ndeg 194894 Agravante ERCSAgravado Juiacutezo da 9a Vara de Oacuterfatildeos e Sucessotildees

TESTAMENTO - Herdeiro universal - Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar -Imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade impe- nhorabilidade (ateacute 50 anos) e incomunicabilidade (vitaliacutecia) - Herdeiro instituiacutedo portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado- Possibilidade de autorizaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem depositando-se0 produto da venda em caderneta de poupanccedila liberando-se os valores gradativamente para custeio do tratamento Inteligecircncia do art 1676 do Coacutedigo Civil Atendimento agrave real vontade da testadora Interpretashyccedilatildeo sistemaacutetica dos dispositivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie Provimento do recurso5

Relatoacuterio

1 - O agravante constitui-se no uacutenico herdeiro instituiacutedo por testamenshyto de ICC tomando parte do inventaacuterio tatildeo somente um bem imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade e impenhorabilidade temposhyraacuteria (ateacute que o herdeiro atingisse 50 anos) assim como incomunicabishylidade vitaliacutecia2 - Em sendo o agravante portador do viacuterus da A IDS e estando jaacute a esta altura comprovadamente em precaacuterio estado de sauacutede ocasionado pelo reduzido niacutevel de resistecircncia do seu sistema imunoloacutegico postulou autorizaccedilatildeo para venda do bem inventariado com o fito exclusivo de possibilitar a continuidade do seu tratamento3 - 0 oacutergatildeo julgador de primeiro grau indeferiu a pretensatildeo do agravanshyte ao argumento de que o art 1676 do Coacutedigo Civil eiva de nulidade qualquer ato judicial que intente dispensar a claacuteusula de inalienabili-

Esta ementa foi produzida por membro do Ministeacuterio Puacuteblico e observa as orientaccedilotildees institucionais desse oacutergatildeo A fim de adaptaacute-la agrave funccedilatildeo acadecircmica que pretendemos nesta publicaccedilatildeo sugerimos uma reescritura apenas nos aspectos teacutecnico-formais Considere o texto como se estivesse organizado agrave margem direita da lauda TESTAMENTO - Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar - Imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade impenhorabilidade (ateacute 50 anos) e incomunicashybilidade (vitaliacutecia) - Herdeiro universal portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado - Pedido de autorizaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem com depoacutesito do produto da venda em caderneta de poupanccedila e liberaccedilatildeo gradativa dos valores -Atendimento agrave real vontade da testadora com interpretaccedilatildeo sistemaacutetica dos disposhysitivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie - Parecer favoraacutevel ao provimento do recurso

186 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dade conquanto lamentasse a ilustre julgadora o estado de sauacutede do herdeiro4-0 primeiro membro do oacutergatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico a quo a se proshynunciar no feito opinou pelo deferimento do pedido formulado pela ora agravante Jaacute o segundo membro do parquet a manifestar-se nos autos apoacutes juiacutezo de retrataccedilatildeo alinhou-se com o entendimento da Julgadora monocraacutetica5 - Mantida a decisatildeo sobem os autos a esta Egreacutegia Cacircmara para reashypreciaccedilatildeo da mateacuteria em comentoE o relatoacuterio

Fundamentaccedilatildeo

6 - Mais do que analisar de forma isolada um dispositivo do Coacutedigo Cishyvil importa para se determinar o verdadeiro alcance de uma norma Juriacuteshydica encetar interpretaccedilotildees sistemaacuteticas do texto legislativo sob exame7 - As interpretaccedilotildees fornecidas pela ilustre julgadora de primeiro grau membro do Ministeacuterio Puacuteblico que oficiou nos autos pecam por conshycentrar a anaacutelise da questatildeo em um uacutenico dispositivo legal8 - Ao pretender vasculhar os preceitos aplicaacuteveis ao caso concreto o aplicador do Direito deve mais do que se ater agrave literalidade do texto em anaacutelise atender e procurar a mens legis situar os dispositivos em uma estrutura de significaccedilotildees e enfim adequar sua compreensatildeo agraves novas valoraccedilotildees sociais exsurgidas9 - Mais que tudo isto eacute a proacutepria Lei de Introduccedilatildeo ao Coacutedigo Civil no seu artigo 5deg que fornece a diretriz a ser aplicada pelo julgador na interpretaccedilatildeo da norma legalldquoNa aplicaccedilatildeo da lei o juiz atenderaacute aos fins sociais a que ela se dirige e agraves exigecircncias do bem comumrdquo10 - Em se tratando de sucessatildeo testamenlaacuteria impende investigar pre- cipuamente a vontade do testador buscando a sua essecircncia de forma a condicionar a interpretaccedilatildeo das disposiccedilotildees testamentaacuterias e adequar os preceitos legais incidentes agrave hipoacutetese11 - Neste caso a testadora natildeo possuindo herdeiros necessaacuterios noshymeou seu sobrinho o ora agravante entatildeo com apenas 13 anos seu herdeiro universal gravando os bens imoacuteveis com jaacute mencionadas claacuteushysulas Visava ela concomitantemente a beneficiar o herdeiro instituiacutedo e protegecirc-lo intentando garantir-lhe teto seguro ateacute idade madura (de 50 anos) isolando-o das vicissitudes da vida moderna12 - Natildeo poderia a testadora imaginar jamais agravequela altura que este terriacutevel mal chamado AIDS iria apossar-se do herdeiro que certamente

Cap V III - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 187

com muito carinho acabara de instituir relegando-o a uma gradual e sofrida morte prematura13 - Decerto que a vontade da testadora natildeo se coaduna com a atual sishytuaccedilatildeo do agravante este embora possua o domiacutenio de um bem imoacutevel natildeo pode usaacute-lo nem fruiacute-lo eis que se encontra em constante tratamenshyto de sauacutede e pior natildeo pode empregar o valor do patrimocircnio transmishytido em prol da tentativa de prolongar sua existecircncia Ora onde estaacute a prevalecircncia da vontade do testador essencial no cumprimento das disshyposiccedilotildees testamentaacuterias diante destas circunstacircnciasA interpretaccedilatildeo da norma estaria levando em conta os fins sociais e as exigecircncias do bem comum a que ela se destina14 - Nem a doutrina nem a jurisprudecircncia nem o legislador permaneceshyram estancados no tempo logrando a evoluccedilatildeo interpretativa adequar o dispositivo contido no art 1676 do Coacutedigo Civil agraves novas facetas da vida abrandando o seu rigor15 - De fato jaacute em 1944 atraveacutes do Decreto-lei 6777 permitiu-se a alienaccedilatildeo de imoacuteveis gravados substituindo-os por outros imoacuteveis ou tiacutetulos da diacutevida puacuteblica permanecendo sobre estes os gravames16 - Nesta linha os doutrinadores assim como os tribunais passaram a admitir a alienaccedilatildeo do bem gravado com autorizaccedilatildeo judicial por necessidade ou conveniecircncia manifesta do titular ocorrendo a sub-ro- gaccedilatildeo em outro bem17 - No caso em tela nada impede o produto poupanccedila agrave disposiccedilatildeo do juiacutezo utilizando-se o seu saldo no custeio do tratamento do agravante18 - Argumenta-se para sustentar o entendimento contraacuterio que o bem substituto (valor depositado em poupanccedila) iria pouco a pouco se esshygotando acabando por exercer o herdeiro poder de disposiccedilatildeo sobre o imoacutevel herdado justamente o que pretendeu vedar a testadora e assegushyrar o preceito do Coacutedigo Civil19-0 que se verifica contudo eacute que relegar o herdeiro agrave morte enshyquanto o bem recebido permanece absolutamente inoacutexio pois sequer rende frutos isto sim significa afrontar a vontade da testadora e o proacuteshyprio alcance teleoloacutegico da lei desfigurando por completo o proacuteprio ato de liberalidade20 - Vale mencionar neste sentido trecho de acoacuterdatildeo unacircnime profeshyrido pela 6a Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila do Rio de Janeiro no agravo em que foi relator o Desembargador Laerson Mauro

Se pela imposiccedilatildeo das claacuteusulas de inalienabilidade incomunicabili- dade e impenhorabilidade vitaliacutecia sobre bens de heranccedila da legiacutetima como da disponiacutevel abrangendo natildeo soacute o principal como os frutos e

188 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

rendimentos a liberalidade perder toda a sua utilidade chegando messhymo a descaracterizar-se juriacutedica e economicamente eacute imperioso que se apliquem tantas regras exegeacuteticas quantas caibam na espeacutecie para evitar-se a inocuidade da deixa preservando assim agrave herdeira algum beneficio em vida Agravo provido

21 - Desta forma deve o uacutenico bem inventariado conquanto gravado com as claacuteusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade ser alienado conforme requerido depositando-se o produto da venda em caderneta de poupanccedila agrave disposiccedilatildeo do juiacutezo a fim de que libere gradativamente as quantias necessaacuterias ao tratamento de sauacutede do herdeiro universal posiccedilatildeo esta que se afina com o mais atual entendimento doutrinaacuterio e jurisprudencial intentando ainda alcanccedilar o verdadeiro fim dos disposhysitivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie (atender agrave vontade do testador e ao messhymo tempo atender aos fins sociais compreendidos no caso em exame) interpretando-os sistematicamenteConclusatildeo

Assim opina o Ministeacuterio Puacuteblico pela reforma da decisatildeo a quo pershymitindo-se a alienaccedilatildeo do bem gravado atendidas as exigecircncias contishydas no item 20 supraE o parecer

Rio de Janeiro 1deg de fevereiro de 1995

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (Procurador de Justiccedila)

Como se pode observar neste parecer o Ministeacuterio Puacuteblico foi proshyvocado a se pronunciar a respeito do pedido de alienaccedilatildeo de um imoacutevel formulado pelo uacutenico herdeiro desse bem gravado com claacuteusula de inalieshynabilidade e de impenhorabilidade temporaacuteria (ateacute que o herdeiro atingisse 50 anos) assim como incomunicabilidade vitaliacutecia Tal pedido foi negado em decisatildeo de primeira instacircncia na qual se alinhou um dos membros do Ministeacuterio Puacuteblico enquanto o outro discordou da decisatildeo a quo Assim caberaacute a um colegiado decidir se defere ou natildeo o pedido Antes entretanto a questatildeo seraacute avaliada pelo Procurador de Justiccedila que opinaraacute a respeito

82 EMENTAApoacutes o preacircmbulo o parecer analisado iniciou a parte textual com

a ementa Seu conteuacutedo revelou de forma concisa o fato central quem o

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

quecirc e por que se pleiteia algo o argumento que se opocircs ao pedido e os dois argumentos em que se baseou o procurador para decidir como decidiu

Esclarecendo

Fato central TestamentoQuem Herdeiro universal0 quecirc Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar sendo imoacutevel

gravado com claacuteusula de inalienabilidade impenhora- bilidade (ateacute 50 anos) e incomunicabilidade (vitaliacutecia)

Por quecirc Herdeiro instituiacutedo portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado Possibilidade de autorishyzaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem depositando-se o produshyto da venda em caderneta de poupanccedila liberando-se os valores gradativamente para custeio do tratamento

Argumento que se opocircs ao pedido

Inteligecircncia do art 1676 do Coacutedigo Civil

Argumentos do procurador Atendimento agrave real vontade da testadora Interpretaccedilatildeo sistemaacutetica dos dispositivos aplicaacuteveis

Conclusatildeo do parecer Provimento do recurso

Note-se que essa ementa oferece informaccedilotildees contidas em todas as partes da peccedila Ela visa apenas ao entendimento do caso concreto numa oacutetica simplificada Por isso devem ser delineados somente o fato gerador do conflito os nexos de referecircncia (trecircs a cinco) e o entendimento do caso concreto Quanto aos nexos de referecircncia esses satildeo um importante auxiacutelio para a construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo representam um verdadeiro fio conshydutor das ideias a serem discutidas na parte argumentativa do documento isto eacute na fundamentaccedilatildeo

Considerando o objetivo didaacutetico desta obra registremos sucintashymente como produzir uma ementa e o conteuacutedo que ela deve conter

QUANTO Agrave FORMA QUANTO AO CONTEUacuteDOEscreva a ementa a partir do centro da foshylha no topo direito justificado

Registre o fato juriacutedico ou o tipo de accedilatildeo ou instrumento juriacutedico proposto

Utilize caixa-alta para a primeira informashyccedilatildeo oferecida

Em seguida se possiacutevel faccedila uma alushysatildeo agraves partes sem nomeaacute-las

Natildeo registre o nome proacuteprio das partes Selecione duas ou trecircs informaccedilotildees exshytraiacutedas do relatoacuterio que possam ser usashydas como argumento

190 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

QUANTO Agrave FORMA QUANTO AO CONTEUacuteDO

Produza frases nominais e palavras-chave Evite adjetivos e conjunccedilotildees Use linguashygem denotativa

Os nexos de referecircncia podem ser funshydamentos de fato ou de direito

Inicie com letra maiuacutescula cada item regisshytrado e separe-os com travessatildeo

Registre seus dois ou trecircs argumentos mais fortes Lembre-se de buscaacute-los nas fontes do Direito

Utilize no maacuteximo 8 linhas Por fim registre o seu entendimento

Talvez vocecirc esteja se perguntando como escrever frases nominais Inicialmente esclarecemos que uma frase nominal eacute um enunciado sem verbo conjugado no presente preteacuterito e futuro Registre-se que as formas nominais (infinitivo particiacutepio e geruacutendio) podem ser usadas em frases noshyminais Entretanto caso seja possiacutevel evite-as especialmente o infinitivo e o geruacutendio Para produzir frases nominais sugerimos uma estrateacutegia penshyse no verbo que deseja usar e em seguida no substantivo derivado desse verbo Observe como eacute faacutecil

VerboSubstantivo deverbal (derivado do verbo)

Abdicar A abdicaccedilatildeoAbster-se A abstenccedilatildeoAcordar O acordoAgravar O agravoAtender 0 atendimentoApreender A apreensatildeoConcorrer A concorrecircnciaCompreender A compreensatildeoCombater 0 combateDelinquir A delinquecircnciaEnfatizar A ecircnfaseMorrer A morteNascer 0 nascimento

Assim em vez de o procurador escrever na ementa Deve-se atender agrave real vontade da testadora ele escreveu ldquo Atendimento agrave real vontade da testadorardquo

Cap VIII - PARECER TEacuteCNIC0-JURIacuteDIC0 191

a) Importa ainda registrar que a ementa deve possuir algumas qualishydades quais sejam seleccedilatildeo cuidadosa dos registros

b) clarezac) coerecircnciad) obediecircncia agrave sequecircncia cronoloacutegica e loacutegicae) concisatildeof) objetividadeg) uso do registro cultoh) macrocompreensatildeo

Por fim nunca eacute demais registrar que as partes do parecer (ementa relatoacuterio fundamentaccedilatildeo conclusatildeo) devem estar em constante comunishycaccedilatildeo Assim a primeira informaccedilatildeo da ementa deve conferir com a do relatoacuterio Ademais soacute registre na ementa aquilo que estiver contido no reshylatoacuterio na fundamentaccedilatildeo e na conclusatildeo

O conteuacutedo extraiacutedo do relatoacuterio e da fundamentaccedilatildeo deve indicar os nexos de referecircncia utilizados na anaacutelise do caso concreto e que foram devidamente ponderados pelo parecerista Observe que representam uma sequecircncia loacutegica de palavras

A seleccedilatildeo desses nexos de referecircncia deve ser portanto bem planejashyda a fim de oferecer ao leitor uma ideia geral mas bem clara e objetiva do caso concreto da forma como ele foi valorado e da tese que o parecerista defende

83 RELATOacuteRIO

Voltemos ao parecer do Procurador Paulo Cezar de Pinheiro Carneishyro Apoacutes a ementa foram relatados os fatos que compotildeem o conflito Obshyservam-se algumas caracteriacutesticas desse relato que o distinguem de outras narrativas como a da peticcedilatildeo inicial Certamente a objetividade com que as informaccedilotildees foram expostas permite afirmar que a narrativa dos fatos do parccer deve ser simples isto eacute natildeo valorada Assim foram evitados modalizadores que tomariam o texto tendencioso Ademais os fatos foram dispostos conforme a sequecircncia cronoloacutegica em que ocorreram objetivanshydo facilitar a compreensatildeo da questatildeo Destaque-se ainda o uso da paraacuteshyfrase caracterizando a polifonia ao se registrar a pretensatildeo do agravante eo argumento da juiacuteza

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Podemos sintetizar o relatoacuterio com o seguinte quadro

ELEMENTOS DO RELATOacuteRIO INFORMACcedilOtildeES RELATIVAS AOS ELEMENTOS

Questatildeo central e partes envolvidas 1- Um bem imoacutevel gravado com claacuteusulas um herdeiro e uma testadora

Problematizaccedilatildeo 2- Herdeiro portador do viacuterus da AIDS postulou a quebra das claacuteusulas

Como foi decidido o problema 3- 0 oacutergatildeo julgador de primeira instacircncia indeshyferiu o pedido4- Pronunciamento do MP Empate de decisatildeo

Por isso 5- Impotildee-se que a questatildeo seja decidida em instacircncia superior mas antes seraacute avaliada pelo Procurador de Justiccedila

Eacute evidente que a variedade dos tipos de questotildees a demandar um entendimento eacute muito grande Assim torna-se necessaacuterio estabelecer um criteacuterio para a escritura do relatoacuterio de um parecer teacutecnico-formal Comoo nosso objetivo principal eacute didaacutetico-pedagoacutegico oferecemos instruccedilotildees a respeito do conteuacutedo e da forma que podem ser aplicaacuteveis na maioria dos casos concretos

Dessa maneira entendemos que o conteuacutedo do relatoacuterio de um pareshycer deve satisfazer agraves seguintes questotildees

ELEMENTOS DA NARRATIVA FORENSE

O quecirc - fato juriacutedico central ou questatildeo juriacutedica centralQuem - as partes devidamente nomeadas e caracterizadas nacionalidade estado civil profissatildeo residecircncia educaccedilatildeo qualitativa e quantitativa representatividade soshycial aspectos fiacutesicos e psicoloacutegicos etc

Quando - tempo cronoloacutegico e psicoloacutegicoOnde - lugar fiacutesico e socialComo - registro das principais ocorrecircncias da forma como o fato juriacutedico aconteceu

Por quecirc - registro da(s) razatildeo(otildees) que deu(deram) origem ao fato juriacutedicoPor isso - registro da(s) consequecircncia(s) advinda(s) do fato juriacutedico

Acrescente-se que as informaccedilotildees registradas no relatoacuterio do parecer teacutecnico-juriacutedico cumprem uma funccedilatildeo argumentativa (narrativa a serviccedilo da argumentaccedilatildeo) Portanto soacute se devem registrar fatos provas e questotildees

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 193

processuais que seratildeo utilizados na fundamentaccedilatildeo a fim de servirem de base para argumentos ou para serem contestados Com efeito natildeo se justishyfica selecionar informaccedilatildeo desconsiderada na fundamentaccedilatildeo Lembramos que as partes do parecer estatildeo em iacutentima comunicaccedilatildeo e devem compor a peccedila de forma coesa e coerente

Quanto agrave forma sugerimos adotar os seguintes criteacuterios

a) Inicie o primeiro paraacutegrafo esclarecendo a centralidade da questatildeo Caso natildeo haja cabeccedilalho no seu parecer inclua tambeacutem os noshymes das pessoas diretamente envolvidas devidamente qualificadas Acrescente quando e onde ocorreu a questatildeo em apreccedilo

b) A partir do segundo paraacutegrafo inicie a narrativa dos fatos provas obedecendo agrave cronologia linear

c) Use o tempo preteacuterito jaacute que os fatos ocorreram anteriormente ao relato

d) A fim de manter a imparcialidade no relato utilize a 3a pessoa do singular recorra agrave polifonia e evite modalizadores

e) Use paraacutegrafos para organizar as ideiasf) Seja sucintog) Siga a norma cultah) Apoacutes encerrar o relato pule uma linha e registre ldquo Eacute o relatoacuteriordquo 6

84 FUNDAMENTACcedilAtildeO

Em capiacutetulos anteriores orientamos natildeo apenas a respeito do processo que antecede a produccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo isto eacute ao seu planejamento como tambeacutem a maneira de produzi-la Resta-nos apenas destacar alguns pontos que deixamos para este momento

Como se pode observar na fundamentaccedilatildeo do parecer do Procurador Paulo Cezar Pinheiro Carneiro durante todo o texto argumentativo ele se ateve a uma linha de raciociacutenio e foi fiel a ela o interesse da testadora era proteger o herdeiro e o direito deve ser interpretado de forma sistemaacutetica Criou portanto objetivos a alcanccedilar mediante a argumentaccedilatildeo isto eacute levar

6 Para aprofundar o estudo da narrativa tanto a simples quanto agrave valorada sugere-se recorrer agrave obra dos mesmos autores publicada por esta mesma editora Liccedilotildees de Narrativa Juriacutedica

T194 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 195

a crer que a real vontade da testadora era ldquobeneficiar o herdeiro instituiacutedo e protegecirc-lo intentando garantir-lhe teto seguro ateacute idade madura (de 50 anos) isolando-o das vicissitudes da vida modernardquo e que a interpretaccedilatildeo da norma deve considerar os fins sociais e as exigecircncias do bem comum a que ela se destina Observe que tais objetivos jaacute estatildeo claros na ementa Isso representa dizer que existe relaccedilatildeo de sentido entre ementa e fundashymentaccedilatildeo

Assim traccedilado o percurso restou-lhe planejar os argumentos e organizaacute-los no texto Certamente natildeo dispensou nada do que foi regisshytrado no relatoacuterio iniciando sua fundamentaccedilatildeo pelo que ele considerou ter sido uma falha na avaliaccedilatildeo da juiacuteza ater-se a um uacutenico dispositivo legal demonstrando atitude que natildeo caberia agrave moderna hermenecircutica juriacutedica

Em sua fundamentaccedilatildeo o ilustre Procurador de Justiccedila nos oferece uma aula de como interpretar o Direito flexibiliza a interpretaccedilatildeo do art 1676 do Coacutedigo Civil utiliza-se do art 5deg da Lei de Introduccedilatildeo ao Coacutedigo Civil a fim de lhe fornecer sustentaccedilatildeo para a aplicaccedilatildeo da Loacutegica do Rashyzoaacutevel e contrariar a regra em que se assentou a decisatildeo de primeiro grau cita a doutrina e a jurisprudecircncia de forma a adequar a regra agraves peculiarishydades do caso concreto e ao contexto situacional real

Observa-se assim que a fundamentaccedilatildeo destina-se a sedimentar a conclusatildeo que se registraraacute ao teacutermino da explanaccedilatildeo dos argumentos

85 CONCLUSAtildeO

Natildeo se pode perder de vista que a conclusatildeo de uma peccedila depende do seu objetivo Com efeito na peticcedilatildeo inicial cujo fim eacute provocar o judishyciaacuterio para lhe encaminhar um pedido isto eacute a pretensatildeo do autor em sua conclusatildeo se revelaraacute tal pedido

Jaacute no parecer a conclusatildeo como parte integrante da peccedila deve represhysentar a siacutentese da opiniatildeo daquele que a produziu ou melhor expressar o entendimento alcanccedilado apoacutes anaacutelise ponderada de todos os fatos provas indiacutecios argumentos das partes e principalmente das fontes do direito Essa parte da peccedila deve estar em consonacircncia com a ementa em que se apresentou o entendimento pela expressatildeo ldquo Parecer favoraacutevel a ()rdquo Natildeo acrescente informaccedilatildeo nova na conclusatildeo Responda objetivamente agrave conshysulta formulada utilizando-se do verbo ldquo opinarrdquo

A autenticaccedilatildeo consiste apenas em datar e assinar a peccedila

Retomando a conclusatildeo do parecer analisado eacute possiacutevel verificar a praacutetica dessa breve explanaccedilatildeo teoacuterica

II - Conclusatildeo

Assim opina o Ministeacuterio Puacuteblico pela reforma da decisatildeo a quo pershymitindo-se a alienaccedilatildeo do bem gravado atendidas as exigecircncias contishydas no item 20 supraE o parecer

Rio de Janeiro 1deg de fevereiro de 1995

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (Procurador de Justiccedila)

86 EXEMPLO DE PARECER TECNICO-JURIDICO

Muitos graduandos do curso de Direito solicitam aos seus professoshyres que apresentem exemplos de textos produzidos por pessoas com recoshynhecido saber juriacutedico Essa solicitaccedilatildeo jaacute foi atendida nesta obra com a apresentaccedilatildeo e anaacutelise do parecer do ilustre Procurador de Justiccedila Paulo Cezar Pinheiro Carneiro Entretanto entendemos ser importante tambeacutem oferecer um parecer escrito em sala de aula com sugestotildees dos alunos e do professor da turma de Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica

DISPUTA PELA GUARDA DE M ENOR - Separaccedilatildeo litigiosa - Guarshyda provisoacuteria com a avoacute paterna - Alegaccedilatildeo da matildee de melhor condiccedilatildeo de assistecircncia agrave filha mdash Decisatildeo pela guarda alternada - Apelaccedilatildeo dos pais contra a guarda alternada - Avaliaccedilatildeo da assistecircncia social favoshyraacutevel ao pai - Bem-estar do menor - Inteligecircncia do artigo 1584 CC- Parecer favoraacutevel ao pai

Relatoacuterio

Trata-se da disputa da guarda de PLD quatro anos entre Regina Duarte 35 anos divorciada comerciaacuteria e Ivanildo Peixoto Vieira 38 anos divorciashydo O fato teve iniacutecio em 12 de setembro de 2005 no Rio de JaneiroSegundo Ivanildo apoacutes sete anos de casamento separou-se judishycialmente de sua esposa Como ela natildeo tinha condiccedilotildees financei-

196 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ras de educar a crianccedila e garantir a sua manutenccedilatildeo aleacutem de estar passando por um periacuteodo de instabilidade emocional a guarda de fato da menor lhe foi concedida Afirmou que natildeo manteacutem um bom relacionamento com a mulher jaacute que ela nunca admitiu a separaccedilatildeo e frequentemente promove cenas de ciuacutemes quando se encontram Relatou que a crianccedila frequenta a creche e que quando vai para o curso de Enfermagem agrave noite ela fica sob os cuidados da avoacute patershyna Requereu assistecircncia judiciaacuteria gratuita a guarda provisoacuteria da filha e a procedecircncia da accedilatildeoFrustrada a tentativa de conciliaccedilatildeo o juiz deferiu a guarda provisoacuteshyria agrave avoacute paterna Regina contestou afirmando serem mentirosas as afirmaccedilotildees constantes da peticcedilatildeo inicial e que os litigantes de coshymum acordo deixaram a filha sob a responsabilidade da avoacute patershyna a quem deram a guarda de fato Entretanto entende que o autor natildeo tem condiccedilotildees de cuidar de PLDV porque natildeo trabalha e recebe apenas uma bolsa do Hospital Satildeo Francisco no valor de R$ 20000 mensais Ademais aleacutem de passar todas as manhatildes nesse hospital o autor frequenta o curso de Enfermagem noturno Disse que quando deixou a filha aos cuidados da avoacute natildeo tinha condiccedilotildees de sustentaacute- -la situaccedilatildeo jaacute superada pois trabalha na XXXX recebendo salaacuterio de R$ 41650 mensais Requereu a assistecircncia judiciaacuteria gratuita a improcedecircncia da demanda e o deferimento da guarda de PLDV em seu favorO estudo social foi apresentado a f 2329 Nele registrou-se que ldquosob a guarda do pai P estaacute convivendo em ambiente salutar propiacutecio ao seu desenvolvimento natildeo havendo razotildees plausiacuteveis neste momento que justifiquem uma mudanccedilardquo (f 28) E ainda ldquoassim a partir da situaccedilatildeo apresentada das consideraccedilotildees pertinentes e de acordo com a percepshyccedilatildeo de sentimentos e emoccedilotildees expressados do ponto de vista social neste momento somos de parecer favoraacutevel agrave permanecircncia de PLDV sob a guarda do genitor Sr IPVrdquo (f 29)Em audiecircncia realizou-se a oitiva das testemunhas (f 4851) que relashytaram ser o pai extremamente dedicado e que a crianccedila demonstra estar muito feliz em sua companhiaO MM Juiz de Direito julgou procedente em parte o pedido deferindo a ambos os genitores a guarda alternada de PLDV (f 5871)Regina apelou dizendo que a guarda alternada traraacute prejuiacutezos ao deshysenvolvimento psiacutequico da crianccedila que conta apenas quatro anos de idade sendo ela matildee a que reuacutene melhores condiccedilotildees para cuidar da filha Afirmou ainda que natildeo criaraacute dificuldades para que o pai visite a menina e requereu a guarda definitiva de PLDVIvanildo tambeacutem apelou afirmando que a guarda alternada prejudicaraacute

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICOJURIacuteDICO 197

o desenvolvimento emocional de PLDV pois os litigantes natildeo se relashycionam de forma harmoniosa Salientou ter melhores condiccedilotildees para educar e cuidar da filha jaacute que Regina deixou de priorizar a crianccedila para tratar de interesses pessoais logo apoacutes a separaccedilatildeo do casal Ademais aduziu estar com a guarda de fato da filha inexistindo motivos que justifiquem a mudanccedila na rotina de PLDVRequereu a concessatildeo do efeito suspensivo ao recurso e o deferimento da guarda da filha em seu favorE o Relatoacuterio

Fundamentaccedilatildeo

As constantes alteraccedilotildees e a forma de conviacutevio no mundo contemposhyracircneo deixam cicatrizes profundas para as geraccedilotildees futuras Conviveshymos com um crescente clima de separaccedilotildees A famiacutelia considerada a ceacutelula mater da sociedade rompe-se com a mesma facilidade com que se cria O resultado deste rompimento por vezes eacute o fruto desshyta cisatildeo virar objeto dc contenda Cabe ao judiciaacuterio interferir como matildeo mais forte e garantir a este inocente a melhor condiccedilatildeo para o seu desenvolvimentoRessalte-se que conforme consta dos autos tal condiccedilatildeo estaacute presente no conviacutevio atual da crianccedila com seu pai porque o ambiente em que se encontra eacute salutar Tambeacutem foram verificadas as condiccedilotildees propiacutecias para o seu desenvolvimento natildeo havendo portanto razotildees que justifishyquem a alteraccedilatildeo Aleacutem disso Ivanildo tem demonstrado preocupaccedilatildeo em oferecer estabilidade emocional agrave crianccedila porquanto nos momenshytos em que se empenha em progredir na vida com os estudos noturnos deixa-a aos cuidados zelosos de sua matildeeNatildeo podemos esquecer que a inteligecircncia do artigo 1584 do Coacutedigo Cishyvil institui que a partir da separaccedilatildeo judicial a guarda dos filhos deveraacute ser atribuiacuteda a quem revelar melhores condiccedilotildees de assumi-la Dessa forma confirma-se mediante os fatos anteriormente enunciados que a situaccedilatildeo deve ser mantida em seu status quoE importante ressaltar que embora a matildee argumente que tem condiccedilotildees de sustentar a crianccedila esta possibilidade natildeo remete diretamente ao interesse ou bem-estar da menina visto que nas condiccedilotildees aluais esta e outras necessidades estatildeo plenamente preenchidas Assim a melhor condiccedilatildeo para a menor natildeo seria a alteraccedilatildeo da guarda transformando um desenvolvimento encaminhado numa aposta vatildeEm relaccedilatildeo agrave guarda compartilhada anteriormente deferida fica clara a sua impossibilidade devido agraves contendas entre os litigantes o que iria

198 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

prejudicar o desenvolvimento da crianccedila que seria colocada em linha de confronto Tal entendimento eacute reforccedilado pela decisatildeo proferida no Rio Grande do Sul pela 7a Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila nos autos de Agravo interno n 70010991990 de que foi relatora a Desemshybargadora Maria Berenice ldquoDescabido impor a guarda compartilhada que soacute obteacutem sucesso quando existe harmonia e convivecircncia paciacutefica entre os genitoresrdquoDessa forma por considerar que o bem-estar da crianccedila deva prevalecer acima de qualquer outro interesse e por reconhecer que na presente data o pai desfruta de melhores condiccedilotildees de asseguraacute-lo a posse e guarda deveratildeo ser concedidas ao progenitor

ConclusatildeoEm face do exposto opina-se que a posse e a guarda da crianccedila sejam deferidas ao pai

E o parecer

Rio de Janeiro 4 de dezembro de 2008

x x x x x x x x x x x

87 ESQUEMA DA DISPOSICcedilAtildeO DAS PARTES DO PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

PARECERPular 2 linhas

EMENTA1 linha

2 linhas

R ELA T Oacute R IOI linha

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

1 linhaEacute O RELATOacuteRIO

2 linhasFUNDAM ENTACcedilAtildeO

I linha

2 linhasCO N CLUSAtildeO

1 linha

2 linhasE o parecer

2 linhasLocal e data

Assinatura N deg da Carteira funcional do Especialista

Capiacutetulo IX

EXERCIacuteCIOS

Uma das maneiras mais eficientes de fixar um conteuacutedo lido na doushytrina eacute praticar por meio de exerciacutecios Temos convicccedilatildeo de que no meio acadecircmico essa atividade mostra-se indispensaacutevel especialmente porque a Metodologia do Caso Concreto consolidou o meacutetodo misto (indutivo- -dedutivo) como o mais eficiente para o ensino juriacutedico no Brasil

Este capiacutetulo pretende oferecer aos leitores a oportunidade de fixashyccedilatildeo do conteuacutedo relativo agrave argumentaccedilatildeo juriacutedica Ainda que natildeo esteja mapeado todo o conteuacutedo do livro o leitor encontraraacute aqui excelente oporshytunidade de consolidar o que aprendeu na disciplina por meio de questotildees objetivas e discursivas

Esclarecemos que algumas questotildees visam agrave simples memorishyzaccedilatildeo e reproduccedilatildeo de conceitos e caracteriacutesticas Outras pretendem ivaliar a capacidade de compreender e aplicar os institutos desenvolvishydos ao longo dos capiacutetulos Outros ainda tecircm como objetivo avaliar a capacidade de refletir e aplicar esse conteuacutedo a situaccedilotildees profissionais especiacuteficas

Ao final oferecemos ainda uma pequena coletacircnea de textos com a finalidade de oferecer ao professor material adequado aacute praacutetica de fundashymentaccedilotildees juriacutedicas Nesses textos certamente o docente encontraraacute farto material para desenvolver as propostas que eventualmente natildeo tenham sido abordadas nas demais questotildees

Leia com cuidado os enunciados e atenccedilatildeo na escolha das opccedilotildees Sugerimos somente resolver os exerciacutecios apoacutes a leitura do capiacutetulo corshyrespondente

202 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 1 - Marque a opccedilatildeo INCORRETAa) A demonstraccedilatildeo eacute procedimento caracteriacutestico de ciecircncias loacutegico-dedutivas como

a Matemaacutetica e a Fiacutesicab) O caraacuteter abstrato das disciplinas exatas permite que o raciociacutenio formal se exershy

ccedila de modo vaacutelido independentemente da realidade circundantec) Como na argumentaccedilatildeo parte-se de proposiccedilotildees discutiacuteveis para tornar-se conshy

sistente haacute que procurar as premissas no campo das verdades absolutasd) A argumentaccedilatildeo aplica-se especialmente a situaccedilotildees concretas da vida Entra

nos domiacutenios das ciecircncias sociais e humanas como a Poliacutetica e o Direito

Questatildeo 2 - Marque a opccedilatildeo CORRETAa) A demonstraccedilatildeo considera o contexto em que se desenvolve devido ao seu cashy

raacuteter pessoal implica um raciociacutenio loacutegico-dedutivo cujo tracircnsito eacute sensiacutevel agraves necessidades e circunstacircncias de tempo e de espaccedilo

b) No Direito a demonstraccedilatildeo estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo porque esta se sershyve daquela a fim de produzir os meios de prova de que necessita

c) A linguagem de que deve se servir a argumentaccedilatildeo eacute a artificial razatildeo pela qual o natildeo iniciado no Direito tem extrema dificuldade de compreender o significado de seus textos

d) Na demonstraccedilatildeo os receptores da mensagem satildeo o ldquoauditoacuterio particularrdquo pois todos que falam se dirigem necessariamente a algueacutem

Questatildeo 3 - Leia o quadro adiante

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

I Premissas Proposiccedilotildeesindiscutiacuteveis

Proposiccedilotildeesdiscutiacuteveis

II Tipo de raciociacutenio Formal Flexiacutevel

III Tipo de linguagem Natural e simples Simboacutelica e artificial

IV Relaccedilatildeo com o contexto Independente do contexto Contextualizada

V Relaccedilatildeo com o auditoacuterio Pessoal Impessoal

Marque os itens cujas informaccedilotildees completam de maneira CORRETA a tabeshyla associando sem equiacutevoco as caracteriacutesticas relativas agrave demonstraccedilatildeo e agrave argumentaccedilatildeoa) I II e IVb) I III e Vc) II III e Vd) II IV e V

-

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 203

Questatildeo 4 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoA demonstraccedilatildeo parte de proposiccedilotildees indiscutiacuteveis independenteshymente de se tratar de afirmaccedilotildees objetivamente verdadeiras ou hipoacuteteshyses admitidas por convenccedilatildeo Os fundamentos a demonstrar subtraem a qualquer tipo de controveacutersia () Ao contraacuterio na argumentaccedilatildeo parte-se de proposiccedilotildees discutiacuteveis Haacute que se procurar as premissas no campo das verdades comuns dos princiacutepios e das opiniotildees correnshytes naquilo que eacute aceito pelos interlocutores Essas verdadesrdquo natildeo satildeo absolutas satildeo relativas a dados contextos culturais em determishynados momentos da histoacuteriardquo

a) As ldquoproposiccedilotildees indiscutiacuteveisrdquo a que recorre a demonstraccedilatildeo satildeo os axiomasb) O contexto especiacutefico em que se desenvolve a argumentaccedilatildeo considera o auditoacuteshy

rio universal como mais importante que o auditoacuterio particularc) Como os fundamentos de que se serve a demonstraccedilatildeo ldquosubtraem a qualquer

tipo de controveacutersiardquo pode-se dizer que utiliza a loacutegica formal e natildeo a loacutegica do razoaacutevel

d) Natildeo haacute ldquoverdadesrdquo na argumentaccedilatildeo porque suas premissas satildeo prioritariamente valores

Questatildeo 5 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoUma deduccedilatildeo eacute um argumento que dadas certas coisas algo aleacutem dessas coisas necessariamente se segue delas Eacute uma demonstrashyccedilatildeo quando as premissas das quais a deduccedilatildeo parte satildeo verdadeiras e primitivas ou satildeo tais que o nosso conhecimento delas teve origishynalmente origem em premissas que satildeo primitivas e verdadeiras e eacute uma deduccedilatildeo dialeacutectica se raciocina a partir de opiniotildees respeitaacuteveisrdquo (Aristoacuteteles)

a) Deduccedilatildeo eacute um tipo de organizaccedilatildeo silogiacutestica do raciociacuteniob) Induccedilatildeo eacute um tipo de organizaccedilatildeo silogiacutestica do raciociacutenioc) Deduccedilatildeo (PM + Pm = C) Induccedilatildeo (Pm + PM = C)d) A demonstraccedilatildeo eacute essencialmente indutiva enquanto a argumentaccedilatildeo eacute essenshy

cialmente dedutiva

Questatildeo 6 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

Todos os mamiacuteferos tecircm pulmotildeesAs baleias satildeo mamiacuteferosLogo todas as baleias tecircm pulmotildees

a) Trata-se de um silogismob) O raciociacutenio desenvolvido leva a uma conclusatildeo iloacutegicac) O raciociacutenio desenvolvido leva a uma conclusatildeo incoerented) A primeira assertiva funciona como premissa maior (PM) do argumento

204 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 7 - Todos os itens constituem eficientes recursos disponiacuteveis aoargumentador para a defesa de seus pontos de vista EXCETOa) Formulaccedilatildeo de hipoacutetesesb) Diaacutelogo polifocircnicoc) Estrateacutegias modalizadorasd) Axiomas

Questatildeo 8 - Acerca da argumentaccedilatildeo juriacutedica marque a opccedilatildeo INCORRETAa) A argumentaccedilatildeo juriacutedica como produccedilatildeo intelectual do campo do direito deve

seguir a legislaccedilatildeo como paracircmetro necessaacuterio sob pena de natildeo ser acatada no meio acadecircmico

b) As questotildees psicoloacutegicas devem ser consideradas como elemento relevante da aceitaccedilatildeo da tese pelo auditoacuterio

c) ChaTm Perelman propocircs ampliar o campo da razatildeo para aleacutem dos confins das ciecircncias dedutivas e das ciecircncias empiacutericas pois o que mais interessa a Perelshyman eacute a estrutura da argumentaccedilatildeo e a sua loacutegica

d) A teoria da argumentaccedilatildeo juriacutedica preocupa-se com a produccedilatildeo de razotildees e de argumentos para o cumprimento da funccedilatildeo de solucionar conflitos

Questatildeo 9 - Leia o fragmento que segue

ldquoDepois que a Escola da Exegese com Napoleatildeo agrave frente proclamou no seacuteculo XIX que o direito se identifica com a ldquolei escritardquo depois que Hans Kelsen disse que o direito natildeo eacute ldquoleirdquo mas eacute ldquonormardquo e depois que Herbert Hart negou que o direito fosse ldquonormardquo para proclamar que ele eacute ldquoregrardquo a teoria contemporacircnea veio a concluir que o direito natildeo eacute lei nem norma e nem regra ele eacute um conjunto de ldquoregrasrdquo e ldquoprinshyciacutepiosrdquo Nessa direccedilatildeo um teoacuterico contemporacircneo Ronaldo Dworkin escreveu dois artigos muito citados nos uacuteltimos tempos cujos tiacutetulos satildeo exatamente Modelo de regras e Princiacutepios I e II E para a aplicaccedilatildeo de princiacutepios e regras diz a nova teoria do direito eacute preciso utilizar o mecanismo da argumentaccedilatildeo isto eacute o discurso persuasivo que realishyza a mediaccedilatildeo concretizadora justificando quais as regras e quais os princiacutepios deveratildeo prevalecer nos casos concretos sobretudo quando entre as regras e os princiacutepios aplicaacuteveis houver alguma colisatildeordquo (Anshytocircnio Alberto Machado)

Com base no que sustenta o texto NAtildeO eacute possiacutevel afirmar quea) O direito natildeo cabe apenas na leib) A argumentaccedilatildeo soacute passou a ser valorizada no direito com Dworkinc) Regras e princiacutepios natildeo satildeo a mesma coisa mas se completamd) A argumentaccedilatildeo pelos princiacutepios pode ser tatildeo eficiente quanto a argumentaccedilatildeo

sustentada na norma positivada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 205

Questatildeo 10 - Para os autores a modalizaccedilatildeo eacute ldquoum fenocircmeno complexo que testemunha o modo como o sujeito argumentador se apropria da liacutengua para organizaacute-la em discurso e expressar sua opiniatildeo acerca de dado tema ou fatordquo Todas as opccedilotildees adiante indicam palavras ou expressotildees modalizadoras relativas agrave temaacutetica do abandono afetivo dos filhos EXCEshyTO uma Marque essa opccedilatildeoa) Ato covardeb) Descumprimento do dever legal de cuidarc) Violaccedilatildeo de direitos da personalidaded) Direito agrave filiaccedilatildeo

Questatildeo 11 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau sobre o aborto do feto anencefaacutelico ldquoPalavras bem arranjadas natildeo bastam para ocultar em quantos fazem praccedila do aborto de anenceacutefalos inexoraacutevel despreshyzo pela vida de quem poderia escapar com resquiacutecios de existecircncia- e produzindo consequecircncias juriacutedicas marcantes - do ventre queo abrigou Matar ou deixar morrer o pequeno ser que foi parido natildeo eacute diferente da interrupccedilatildeo da sua gestaccedilatildeordquo (ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo)

a) O fragmento menciona o recurso da polifonia como instrumento de argumentashyccedilatildeo

b) O fragmento aponta a modalizaccedilatildeo pela seleccedilatildeo vocabular como instrumento de argumentaccedilatildeo

c) O fragmento indica a intertextualidade como instrumento de argumentaccedilatildeod) O fragmento revela a linearidade expositiva como estrateacutegia de persuasatildeo

Questatildeo 12 - Adiante transcriccedilatildeo de um fragmento do texto ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo de autoria do Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau sobre o aborto do feto anencefaacutelico

ldquoDe mais a mais a certeza do diagnoacutestico meacutedico da anencefalia natildeo eacute absoluta de modo que a prevenccedilatildeo do erro mesmo culposo natildeo seraacute sempre possiacutevel O que dizer entatildeo do erro doloso A quantas natildeo chegaria entatildeo em seu dinamismordquo

O fragmento expressa a existecircncia do argumento de autoridade amparado pelo(a)

a) Demonstraccedilatildeo que se sustenta no diagnoacutestico do meacutedico (opiniatildeo teacutecnica funshydamentada)

b) Positivismo que se desenvolve com base na premissa de que o dolo eacute mais grave que a culpa

c) Demonstraccedilatildeo que se opotildee agrave argumentaccedilatildeo com a qual natildeo se relacionad) Exposiccedilatildeo que quase sempre eacute sinocircnimo de ldquoinjunccedilatildeordquo

206 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 13 - Marque a opccedilatildeo ERRADA acerca da argumentaccedilatildeoa) Aplica-se a situaccedilotildees concretas da vida Entra nos domiacutenios das ciecircncias sociais

e humanas ou seja a Economia a Poliacutetica e o Direitob) Eacute utilizada em casos que natildeo podem ser solucionados pelo rigor matemaacutetico mas

sim por via persuasivac) Trabalha com verdades a priacuteori a fim de convencer o auditoacuteriod) Haacute que procurar as premissas no campo das verdades comuns dos princiacutepios

opiniotildees e valores correntes ou seja naquilo que eacute tido como verdade pelos interlocutores

Questatildeo 14 - Leia as assertivas abaixo e marque a opccedilatildeo CORRETAI - A proposta positivista consistiu na explicaccedilatildeo do fenocircmeno juriacutedico a partir do

estudo das normas postas pela autoridade soberana de determinada sociedadeII - Na argumentaccedilatildeo a adesatildeo do auditoacuterio depende do esforccedilo do argumentador para atingir os valores que lhe satildeo mais aceitosIII - A loacutegica do razoaacutevel trabalha com a adesatildeo enquanto a loacutegica formal com a

demonstraccedilatildeo

a) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIIc) Estatildeo corretas as assertivas II e IIId) Estatildeo corretas as assertivas I II e III

Questatildeo 15 - Marque a opccedilatildeo CORRETA acerca do raciociacutenio indutivoa) Sua forma mais clara de apresentaccedilatildeo eacute o silogismo claacutessicob) Pensamento no qual a afirmaccedilatildeo denominada ldquopremissa menor dispara o racioshy

ciacutenio que leva a uma conclusatildeoc) Eacute aquele que parte do geral para o especiacutefico sendo este a proacutepria normad) A conclusatildeo normalmente depende das premissas mas haacute casos em que decorre

de informaccedilatildeo cientiacutefica o que favorece seja desvinculada das duas premissas que lhe datildeo sustentaccedilatildeo

Questatildeo 16 - Leia as assertivas que seguem e marque a opccedilatildeo CORRETAI - ldquoA partir do exame de uma seacuterie de elementos concretos extrai-se um princiacutepio

de ordem geneacutericardquo - procedimento indutivoII - Quando haacute omissatildeo legislativa eacute liacutecito recorrer agrave analogia fonte geral do direitoIII - O procedimento indutivo eacute muito eficiente quando se observa a omissatildeo legisshy

lativa acerca da mateacuteria em anaacuteliseIV - Para o positivismo a fonte legal deve ser aplicada por subsunccedilatildeo ao caso

concretoa) Estatildeo corretas as assertivas I II e IIIb) Estatildeo corretas as assertivas II III e IVc) Estatildeo corretas as assertivas I e IVd) Estatildeo corretas as assertivas I II III e IV

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 207

Questatildeo 17 - A caracterizaccedilatildeo do asseacutedio moral natildeo se daacute precipuamente pelo Direito mas pela Psicologia que tem os instrumentos teacutecnicos e metodoloacutegicos adequados para diagnosticar essa patologia social Eacute por essa razatildeo que podemos dizer sobre o estudo do tema que

a) A demonstraccedilatildeo natildeo eacute possiacutevel porque a Psicologia natildeo eacute ciecircncia exatab) A demonstraccedilatildeo soacute estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo na aacuterea trabalhista no exame

admissionalc) A demonstraccedilatildeo estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo que leva agrave condenaccedilatildeo do inshy

fratord) A Psicologia natildeo tem a precisatildeo cientiacutefica necessaacuteria para conseguir produzir

provas admitidas em direito

Questatildeo 18 - Com a superaccedilatildeo do Positivismo Juriacutedico novos valores passashyram a ser considerados como verdadeiros norteadores da interpretaccedilatildeodas regras juriacutedicas Soacute natildeo pode ser considerado um valor poacutes-positi-vista

a) Boa-feacute nas relaccedilotildees de consumob) Funccedilatildeo social da propriedadec) Dignidade da pessoa humanad) Legalidade

Questatildeo 19 - Marque a opccedilatildeo INCORRETAa) Aleacutem da defesa eficiente da tese o Judiciaacuterio pode promover a alteraccedilatildeo legislatishy

va como estrateacutegia de soluccedilatildeo para os casos difiacuteceis e polecircmicos que natildeo tinham decisatildeo justa com base no direito positivado

b) A ponderaccedilatildeo das circunstacircncias do caso concreto foge agrave previsibilidade de um sistema formal previamente concebido com precisatildeo absoluta

c) Por meio dos princiacutepios do direito eacute mais faacutecil argumentar a favor de teses de receptividade minoritaacuteria no ordenamento juriacutedico paacutetrio

d) A argumentaccedilatildeo deve considerar o contexto em que se deram os fatos as inshyfluecircncias que o motivaram bem como o estado psicoloacutegico de quem praticou a conduta

Questatildeo 20 - o Direito eacute uma ciecircncia dinacircmica que progride conforme a exishygecircncia social Nesse contexto novos ramos do Direito foram vislumbrashydos a fim de sistematizar os conhecimentos contemporacircneos que careshycem de tratamento juriacutedico Com base nessa afirmativa indique qual a uacutenica opccedilatildeo que NAtildeO constitui um novo ramo do Direito

a) Biodireitob) Direito dos homoafetivosc) Direito da informaccedilatildeod) Direito espacial

208 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 21 - Leia o fragmento que segue

ldquoO maior problema juriacutedico criado pelas poliacuteticas de cotas que incidem nos concursos puacuteblicos especialmente nos concursos vestibulares relaciona-se diretamente agrave violaccedilatildeo de princiacutepios do serviccedilo puacuteblico como a impessoalidade a eficiecircncia a legalidade e a moralidade (toshydos violados pela existecircncia de tais privileacutegios) Na verdade a funccedilatildeo dos concursos puacuteblicos natildeo eacute o de distribuir benesses ou meramenshyte selecionar aquele que merece receber um salaacuterio ou frequentar uma faculdade puacuteblica Os oacutergatildeos puacuteblicos tecircm funccedilotildees puacuteblicas e tais concursos visam a selecionar os que tecircm melhores condiccedilotildees ou competecircncias para ocupar as funccedilotildees essenciais ao cumprimento das obrigaccedilotildees dos respectivos oacutergatildeosrdquo (Renato Amoedo Rodrigues)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute CORRETOa) O paraacutegrafo eacute predominantemente narrativo porque enumera os princiacutepios da administraccedilatildeo puacuteblicab) O paraacutegrafo eacute predominantemente narrativo porque informa a poliacutetica nacional de

cotas para negros em universidades puacuteblicasc) O paraacutegrafo eacute predominantemente argumentativo porque trata de um ldquoproblema

juriacutedicordquo (primeira linha) e toda lide soacute eacute exposta por meio de textos puramente argumentativos

d) O paraacutegrafo eacute predominantemente argumentativo porque recorre a princiacutepios constitucionais para sustentar sua tese

Questatildeo 22 - Leia o fragmento que segue

ldquoEm 1937 eles foram presos sob a acusaccedilatildeo de ter matado o soacutecio e primo Benedito Pereira Caetano que desapareceu sem deixar rastro levando 90 contos de reacuteis hoje o equivalente a 270 mil reais O Deleshygado chegou agrave conclusatildeo de que os irmatildeos mataram o primo para ficar com o dinheiro A poliacutecia torturou ateacute familiares para descobrir o esconshyderijo do dinheiro conseguindo dessa forma a confissatildeo dos presos que levados a juacuteri foram absolvidos a acusaccedilatildeo natildeo se conteve e reshycorreu os jurados mantiveram a absolviccedilatildeo Como na eacutepoca o juacuteri natildeo tinha soberania o Tribunal de Justiccedila reformou a decisatildeo e condenou Joaquim e Sebastiatildeo a 16 anos e seis meses de reclusatildeo Oito anos depois tiveram livramento condicional Joaquim pouco depois morreu como indigente e Sebastiatildeo encontrou o primo vivo em julho de 1952 constatando assim a inexistecircncia do homiciacutedio o acerto dos jurados com a decisatildeo de absolviccedilatildeo e o grande erro do Tribunal A descobershyta provocou accedilatildeo de revisatildeo criminal que concluiu por inocentar os irmatildeos em 1953 e em 1960 o Judiciaacuterio concedeu indenizaccedilatildeo aos herdeirosrdquo (wwwJusnavigandicombr)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute INCORRETOa) O fragmento eacute predominantemente narrativob) A narrativa do fragmento eacute valorada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 209

c) A narrativa apresenta todos os seus elementos constitutivos ldquoo quecirc quem onde quando como porquecirc por issordquo

d) Haacute no fragmento a descriccedilatildeo a serviccedilo da narrativa

Questatildeo 23 - Leia o fragmento que segue

Marcos Mariano da Silva mecacircnico pernambucano casado e pai de filhos foi preso em 1976 porque foi confundido com o homicida que tinha o mesmo nome Em 1992 durante uma rebeliatildeo policiais inshyvadiram o presiacutedio e Marcos foi atingido por estilhaccedilos de granada causando-lhe a perda da visatildeo passou 19 anos na cadeia perdeu a sauacutede o emprego a mulher os filhos e morreu de infarto jaacute em libershydade Seis anos depois o verdadeiro criminoso apareceu e foi preso mas natildeo serviu para reparar o erro cometido contra Marcos O Estado de Pernambuco foi reconhecido como responsaacutevel pelos danos sofrishydos pelo mecacircnico e terminou condenado a pagar indenizaccedilatildeo de R$2 milhotildeesrdquo (wwwJusnavigandicombr)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute INCORRETOa) O fragmento eacute predominantemente narrativob) O fragmento eacute predominantemente argumentativoc) A narrativa apresenta todos os seus elementos constitutivos ldquoo quecirc quem onde

quando como por quecirc por issordquod) O fragmento eacute marcado pela presenccedila de modalizadores

Questatildeo 24 - A respeito da tipologia textual na produccedilatildeo do texto juriacutedicoNAtildeO eacute possiacutevel afirmar quea) A narraccedilatildeo e descriccedilatildeo podem estar a serviccedilo da argumentaccedilatildeob) A descriccedilatildeo consiste em enumerar os fatos e as caracteriacutesticas que decorrem na

linha do tempo para constituir um enredoc) A Fundamentaccedilatildeo de um determinado ponto de vista exige do argumentador

muitas vezes que alguns fatos motivadores de sua tese sejam narradosd) Narraccedilatildeo descriccedilatildeo e dissertaccedilatildeo podem compor juntas um soacute texto e sua seshy

paraccedilatildeo soacute se justifica por razotildees acadecircmicas

Questatildeo 25 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSAa) A produccedilatildeo de argumentos eacute procedimento abstrato que exige do argumentador

sensibilidade e consistecircncia na abordagem de uma seacuterie de temas socialmente relevantes

b) A fundamentaccedilatildeo eacute texto de tipo injuntivo e visa a comprovar que o magistrado estaacute equivocado nas suas convicccedilotildees

c) A fundamentaccedilatildeo consiste em persuadir o auditoacuterio acerca de um ponto de vista que se pretende sustentar

210 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

d) O sucesso da argumentaccedilatildeo eacute influenciado pela qualidade da narraccedilatildeo anterior quando todos os fatos juridicamente importantes do caso concreto satildeo organizashydos em ordem cronoloacutegica

e) Uma fundamentaccedilatildeo deve recorrer a diversificadas estrateacutegias argumentativas a fim de potencializar as chances de aceitaccedilatildeo daquilo que se sustenta

Questatildeo 2 6 - 0 fragmento transcrito revela a presenccedila de

ldquoDe acordo com as conclusotildees do Parecer Teacutecnico exarado pelo corpo teacutecnico da Fundaccedilatildeo Municipal do Meio Ambiente nas plantas e proshyjetos do empreendimento natildeo foi respeitado o afastamento legal de 30 metros das margens dos canais existentes no terreno onde se pretenshyde edificar aacutereas essas consideradas pela legislaccedilatildeo paacutetria como de Preservaccedilatildeo Permanenterdquo

a) Argumentaccedilatildeo purab) Descriccedilatildeo predominantec) Demonstraccedilatildeo a serviccedilo da argumentaccedilatildeod) Demonstraccedilatildeo pura

Questatildeo 27 - Todas as assertivas abaixo tratam do ingresso em universidashydes por meio da poliacutetica de cotas Leia as opccedilotildees e identifique aquela que revela uma tese sobre essa questatildeo

a) Os ministros do Supremo Tribunal Federal trouxeram em seus votos profundo estudo sobre accedilotildees afirmativas e sua legitimidade constitucional

b) O Supremo Tribunal Federal posiciona-se pela legitimidade constitucional das cotasc) A discussatildeo acerca das cotas nas universidades trouxe para o Ensino Superior

mais visibilidade que o Ensino Meacutediod) Para o correto tratamento do tema o Supremo Tribunal Federal precisa ter clashy

reza e meacutetodo para definir o criteacuterio ldquoetniardquo a fim de evitar a denominada discrishyminaccedilatildeo inversa

Questatildeo 2 8 - 0 fragmento que segue trata das limitaccedilotildees de uso das vagas em condomiacutenios ediliacutecios

Se um automoacutevel estranho ou seja de uma pessoa estranha ao edifiacuteshycio entra na nossa garagem - por conta de a sua vaga ter sido vendishyda ou alugada para algueacutem estranho ao edifiacutecio - todas as normas de seguranccedila adotadas pelo condomiacutenio ficariam fragilizadas

Com relaccedilatildeo ao planejamento da argumentaccedilatildeo juriacutedica pode-se dizer que o fragmento eacute classificado CORRETAMENTE comoa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacuteteses

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 211

Questatildeo 29 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoChamam atenccedilatildeo os casos de chargeback (cancelamento de uma venda feita com cartatildeo de deacutebito ou creacutedito que pode acontecer por dois motivos um deles eacute o natildeo reconhecimento da compra por parte do titular do cartatildeo - algum tipo de fraude e o outro pode se dar pelo fato de a transaccedilatildeo natildeo obedecer agraves regulamentaccedilotildees previstas nos contratos termos aditivos e manuais editados pelas administradoras Ou seja o lojista vende e depois descobre que o valor da venda natildeo seraacute creditado porque a compra foi considerada invaacutelida)

()

Jaacute que ocorreu o chargeback os riscos entre o comerciante e a adshyministradora de cartotildees de creacutedito ou deacutebito deveriam ser repartidos entre esses dois sujeitos os quais atuam no mercado de consumo asshysumindo os riscos do empreendimento (wwwjusnavigandicombr)

O segundo paraacutegrafo do fragmento transcrito com relaccedilatildeo aos elementos constitutivos do planejamento argumentativo refere-se aa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacuteteses

Questatildeo 30 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoMuito se tem falado recentemente sobre a necessidade a legalidade e a constitucionalidade do Exame de Ordem A questatildeo chegou ao Sushypremo Tribunal Federal onde por meio do Recurso Extraordinaacuterio n 603583 sob relatoria do Ministro Marco Aureacutelio discutiu-se a constitushycionalidade do Estatuto da OAB (Lei n 890694) e a possibilidade de inscriccedilatildeo na Ordem dos Advogados do Brasil sem a devida aprovaccedilatildeo no referido examerdquo

a) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute constitucional e legal ainda que desnecessaacuterio

b) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute constitucional mas ilegal e desnecessaacuterio

c) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute inconstitucional e ilegal mas necessaacuterio

d) O fragmento natildeo deixa clara uma tese

Questatildeo 31 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoA corrupccedilatildeo em sentido amplo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil eacute em si um mal e representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da po-

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

puiaccedilatildeo do Brasil Sem deixar de reconhecer que a corrupccedilatildeo em um paiacutes estaacute intimamente ligada a fatores como a cultura e a educaccedilatildeo de seu povo sendo inclusive no Brasil diagnosticaacutevel como um estado de anomia social mostra contudo que ela sempre recua sua incidecircnshycia quando o controle preventivo e o repressivo satildeo ampliados Eacute por essa razatildeo que a atuaccedilatildeo eficaz do Ministeacuterio Puacuteblico tem proporcioshynado a diminuiccedilatildeo da anomia social no que diz respeito agrave poliacutetica e agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica no Brasilrdquo (Marco Aureacutelio Lustosa Caminha)

a) A tese do paraacutegrafo estaacute resumida em ldquoa corrupccedilatildeo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da populaccedilatildeo do Brasil

b) Ao mencionar que ldquosem deixar de reconhecer que a corrupccedilatildeo em um paiacutes estaacute intimamente ligada a fatores como a cultura e a educaccedilatildeo de seu povordquo o argu- mentador natildeo reconhece o elemento valores como motivador da corrupccedilatildeo

c) O trecho ldquoeacute por essa razatildeo que a atuaccedilatildeo eficaz do Ministeacuterio Puacuteblico tem proporshycionado a diminuiccedilatildeo da anomia social no que diz respeito agrave poliacutetica e agrave Adminisshytraccedilatildeo Puacuteblica no Brasilrdquo natildeo eacute modalizado

d) No trecho ldquoa corrupccedilatildeo em sentido amplo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil eacute em si um mal e representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da populaccedilatildeo do Brasilrdquo a palashyvra ldquotalvezrdquo sugere que a corrupccedilatildeo pode natildeo ser um problema

Questatildeo 32 - Com base no fragmento que segue marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoA superpopulaccedilatildeo dos presiacutedios eacute fato incontestaacutevel o pior entretanto eacute que esse descaso com a liberdade alheia ocorre em funccedilatildeo de erros despreparo e corrupccedilatildeo da maacutequina burocraacutetica do Estado Muitos cishydadatildeos satildeo jogados na cadeia sem terem sido julgados outros estatildeo presos porque furtaram uma lata de oacuteleo um pacote de bolachaTais agressotildees agrave liberdade do cidadatildeo ou tais erros provocam uma seacuterie de questionamentos acerca da confianccedila no sistema e da seguranccedila juriacutedica porque inocentes satildeo condenados a ficarem atraacutes das grades e deixa-se de prender grande nuacutemero de criminosos bem conhecidos Ademais mostra o sucateamento da maacutequina penitenciaacuteria o despreshyparo dos agentes puacuteblicos A culpa por tais equiacutevocos poderia ateacute recair na fragilidade dos inqueacuteritos policiais porque a poliacutecia apressa-se no afatilde de desvendar o crime natildeo se pode desconsiderar tambeacutem que a confissatildeo obtida por meio de tortura implantada desde 1964 ainda eacute usada ateacute hoje pela poliacuteciardquo () (wwwJusnavigandicombr)

a) A tese defendida no fragmento eacute a de que os erros judiciais que levam aacute prisatildeo inocentes decorre do descaso na prestaccedilatildeo da jurisdiccedilatildeo

b) O argumentador aponta como causa dos erros judiciais a investigaccedilatildeo mal realishyzada pela poliacutecia

c) O sucateamento da maacutequina penitenciaacuteria e o despreparo dos agentes puacuteblicos satildeo fatos (contextualizaccedilatildeo do real) que reforccedilam a tese

d) Haacute no fragmento a redaccedilatildeo de uma hipoacutetese argumentativa

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 213

Questatildeo 33 - Marque a opccedilatildeo INCORRETA

a) A situaccedilatildeo de conflito consiste na apresentaccedilatildeo em paraacutegrafo curto das seguinshytes informaccedilotildees o quecirc Quem Quando Onde

b) Atese eacute o ponto de vista que se pretende defender em um texto argumentativoc) A contextualizaccedilatildeo do real consiste na seleccedilatildeo dos fatos importantes do conflito

organizados em toacutepicos com vistas agrave defesa da tesed) As hipoacuteteses natildeo guardam relaccedilatildeo com a tese pois satildeo apenas argumentos

virtuais que podem natildeo ser utilizados na fundamentaccedilatildeo

Questatildeo 34 - As duas informaccedilotildees que compotildeem o fragmento adiante devem ser lidas como dois periacuteodos consecutivos que formam um uacutenico paraacuteshygrafo Marque a opccedilatildeo CORRETA

1a informaccedilatildeo Uma boa tese na aacuterea juriacutedica deve buscar amparo na norma e ter coerecircncia com os fatos selecionados para a contextuashylizaccedilatildeo do real2a informaccedilatildeo O argumentador pode se valer de toda a construccedilatildeo jaacute realizada pela dogmaacutetica juriacutedica para validar seus raciociacutenios

a) A primeira informaccedilatildeo eacute verdadeira e a segunda informaccedilatildeo eacute falsa Natildeo existe relaccedilatildeo entre as duas informaccedilotildees

b) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo verdadeiras mas as duas natildeo possuem relaccedilatildeo entre si

c) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo falsas mas ambas se relacionamd) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo verdadeiras e a segunda continua o

raciociacutenio iniciado na primeira

Questatildeo 35 - Leia o fragmento que segue

ldquoSe o franqueador eacute um beneficiaacuterio do serviccedilo prestado por todo aquele sob sua franquia natildeo estaria ele coobrigado pelos deacutebitos trashybalhistas de seus franqueadosrdquo

Quanto aos itens do planejamento do texto argumentativo pode-se dizer que o fragmento deve ser identificado comoa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacutetese

Questatildeo 36 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoA recentiacutessima Lei 12607 sancionada no dia 04042012 ao alterar o sect 1deg do art 1331 do Coacutedigo Civil determina que lsquo(bullbullbull) os abrigos para veiacuteculos () natildeo poderatildeo ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomiacutenio salvo autorizaccedilatildeo expressa na convenccedilatildeo de condomiacuteniorsquo Natildeo eacute preciso fazer-se grandes exerciacutecios mentais de

214 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

investigaccedilatildeo para se concluir que eacute clara eacute cristalina a preocupaccedilatildeo maior que motivou esse meritoacuterio aperfeiccediloamento da legislaccedilatildeo con- dominial a seguranccedila Todos quantos vivemos ou viveram em granshydes cidades sabemos das peculiaridades desse problema especiacutefico da nossa sociedade e que tem evoluiacutedo no mesmo compasso que a realidade econocircmica do nosso paiacutes e do nosso povo

O paraacutegrafo foi produzido a partir de proposta de um introito do tipoa) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 37 - Leia o paraacutegrafo que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoCom o gradual enchimento das nossas cidades mais e mais edishyfiacutecios foram tomando o lugar das casas - poreacutem o nuacutemero meacutedio de automoacuteveis por apartamento jaacute haacute bastante tempo tem crescido a uma progressatildeo bem maior Acresccedila-se a isso que os bons venshytos que tecircm soprado ultimamente sobre a economia brasileira aceshyleraram ainda mais dramaticamente essa carecircncia por vagas por conta da realizaccedilatildeo do antigo sonho de consumo do nosso povoo automoacutevel proacuteprio Consequecircncia direta desse fenocircmeno foi que as ruas das cidades meacutedias e grandes viraram imensos estacionashymentos mormente agrave noite Eacute esse o contexto que inspirou a proishybiccedilatildeo de alienaccedilatildeo ou locaccedilatildeo de vagas em condomiacutenio pela Lei 126072012rdquo

O argumento foi redigido com base em que tipo de argumentoa) Argumento de autoridadeb) Argumento de senso comumc) Argumento de causa e efeitod) Argumento a fortiori

Questatildeo 38 - Leia o fragmento adiante

ldquoQuanto ao cumprimento da oferta nas compras coletivas realizadas pela internet podem-se visualizar duas situaccedilotildees distintas e de notaacuteshyvel importacircncia praacutetica1 Simples desistecircncia de um ou alguns consumidores em prosseguir na contrataccedilatildeo2 Ocorrecircncia de chargeback (cancelamento da compra por cartatildeo sem pagamento pelo valor da compra)Na primeira situaccedilatildeo entendemos que natildeo haveraacute de fato a possibishylidade de os consumidores que jaacute haviam aderido agrave oferta exigir-lhe o cumprimento forccedilado pois estes jaacute sabiam da condiccedilatildeo estabelecida

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 215

pelos fornecedores no sentido do cancelamento da oferta por insushyficiecircncia de consumidores aderentes Nesse caso sequer haveraacute a emissatildeo dos cupons uma vez que o numeraacuterio necessaacuterio a viabilizar o preccedilo mais baixo por parte do fornecedor natildeo seraacute alcanccedilado Assim a oferta poderaacute ser legitimamente canceladaContudo no caso de chargeback a depender do caso pensamos que os consumidores remanescentes poderatildeo exigir o cumprimento forccedilashydo da oferta nos termos do inciso I do art 35 do CDC porque haacute que se respeitar a boa-feacute desses consumidores

O fragmento anterior revela a existecircncia de todos os argumentos indicados EXCETO um Marque essa opccedilatildeoa) Argumento proacute-teseb) Argumento de oposiccedilatildeoc) Argumento de causa e efeitod) Argumento de autoridade

Questatildeo 39 - Leia as assertivas abaixo acerca do argumento de autoridade e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - No argumento de autoridade a conclusatildeo se sustenta pela citaccedilatildeo de umafonte confiaacutevel que pode ser uma estatiacutestica pesquisa cientiacutefica a proacutepria lei ou o direito natural

II - O argumento de autoridade pode ter como fonte uma frase dita por liacuteder poliacuteticoartista famoso ou algum pensador enfim uma autoridade no assunto abordado na argumentaccedilatildeo

III - A citaccedilatildeo de uma fonte pode auxiliar no convencimento mas eacute importante relashycionar a validade e a consistecircncia da fonte ao caso concreto a fim de aumentar a persuasatildeoa) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIc) Estaacute correta apenas a assertiva IIId) Estatildeo corretas as assertivas II e III

Questatildeo 40 - Leia as assertivas abaixo acerca do argumento de causa e efeito e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - O argumento de causa e efeito para comprovar uma tese busca os nexos queligam dois eventos relevantes do conflito

II - Para o Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho (Livro ldquoPrograma de Responshysabilidade Civilrdquo) ldquocausardquo e ldquofatorrdquo satildeo fenocircmenos idecircnticos sem qualquer distinccedilatildeo

216 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

III - qualquer relaccedilatildeo de causa e efeito caracteriza um argumento de causa e efeito independente de o efeito ser faacutetico ou juriacutedicoa) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIc) Estaacute correta apenas a assertiva IIId) Estatildeo corretas as assertivas II e III

Questatildeo 41 - Leia o fragmento abaixo e identifique o tipo de argumento preshydominante

ldquoAo se desesperar num congestionamento em Satildeo Paulo daqueles em que o automoacutevel natildeo se move nem quando o sinal estaacute verde o indiviacuteduo deve saber que por traacutes de sua irritaccedilatildeo crocircnica e cotidiana estaacute uma monumental ignoracircncia histoacuterica pois Satildeo Paulo soacute chegou

a esse caos porque um seleto grupo de dirigentes decidiu no iniacutecio do seacuteculo que natildeo deveriacuteamos ter metrocircrdquo (Adaptado de Folha de S Paulo 01102000)

a) Argumento de causa e efeitob) Argumento de analogiac) Argumento de autoridaded) Argumento proacute-tese

Questatildeo 42 - Leia as assertivas abaixo sobre o argumento proacute-tese e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - ao empregar o argumento proacute-tese busca-se a sustentaccedilatildeo da tese com basenos fatos da contextualizaccedilatildeo do real

II - Os fatos selecionados da contextualizaccedilatildeo do real satildeo informaccedilotildees concretasextraiacutedas da narrativa juriacutedica

III - A ausecircncia dos conectores ldquoporque ldquoe tambeacutem e ldquoaleacutem dissordquo pode tornaro texto narrativo em decorrecircncia do encadeamento sistemaacutetico de fatos sem motivaccedilatildeo argumentativaa) Estatildeo corretas as assertivas I e IIIb) Estatildeo corretas as assertivas I e IIc) Estatildeo corretas as assertivas II e IIId) Estatildeo corretas as assertivas I II e III

Questatildeo 43 - A afirmaccedilatildeo ldquocontra fatos natildeo haacute argumentosrdquo daacute ecircnfase agrave fonte do argumentoa) De autoridadeb) De senso comumc) Proacute-tesed) De oposiccedilatildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 217

Questatildeo 4 4 - 0 argumento de causa e efeito eacute aquele que visa a estabelecer nexo causal entre dois eventos ou seja aquele que pretende relacionar uma conduta agraves consequecircncias juriacutedicas dela decorrentes a fim de resshyponsabilizar seu causador Identifique qual eacute a causa (e natildeo consequecircnshycia) do asseacutedio moral no ambiente de trabalhoa) baixa autoestimab) depressatildeoc) desejo claro de humilhar e denegrird) sede de vinganccedila

Questatildeo 45 - Leia o fragmento que segue

ldquoQualquer cidadatildeo pode ser viacutetima de erro judiciaacuterio mas a histoacuteria mostra que a grande maioria dos casos envolve pessoas carentes negras e sem escolaridade que natildeo possuem a miacutenima condiccedilatildeo para custear as despesas com advogados necessitando do trabalho dos defensores puacuteblicos em muito pouco nuacutemero no Judiciaacuterio brasileirordquo (wwwJusnavigandicombr)

Trata-se de um argumentoa) de autoridadeb) de analogiac) de causa e efeitod) de oposiccedilatildeo

Questatildeo 46 - No fragmento adiante encontram-se todos os argumentos listashydos nas alternativas EXCETO um Marque essa opccedilatildeo

ldquoNatildeo poderiacuteamos falar simplesmente da responsabilizaccedilatildeo civil pelo dano esteacutetico sem deixar de observar brevemente a tipificaccedilatildeo penal da ofensa agrave integridade fiacutesica ou agrave sauacutede da pessoa pois do entrelaccedilashymento de ambos os institutos eacute que se extraiacutera a base de uma exegese sistemaacutetica mais seguraO crime de lesatildeo corporal consistente em qualquer ofensa ocasionada por algueacutem sem vontade de matar agrave integridade fiacutesica ou sauacutede (fisioshyloacutegica ou mental) de outrem Natildeo se trata como seria possiacutevel supor apenas do mal infligido agrave inteireza anatocircmica da pessoaComo bem defendeu o saudoso mestre Nelson Hungria a lesatildeo corporal compreende toda e qualquer ofensa ocasionada agrave norshymalidade funcional do corpo ou organismo humano seja do ponto de vista anatocircmico seja do ponto de vista fisioloacutegico ou psiacutequico Mesmo a desintegraccedilatildeo da sauacutede mental eacute lesatildeo corporal pois a inteligecircncia a vontade ou a memoacuteria dizem com a atividade funcioshynal do ceacuterebro que eacute um dos mais importantes oacutergatildeos do corpo Natildeo se concebe uma perturbaccedilatildeo mental sem um dano agrave sauacutede e eacute inconcebiacutevel um dano agrave sauacutede sem um mal corpoacutereo ou uma alteraccedilatildeo do corpo

218 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Quer como alteraccedilatildeo da integridade fiacutesica quer como perturbaccedilatildeo do equiliacutebrio funcional do organismo (sauacutede) a lesatildeo corporal resulta sempre de uma violecircncia exercida sobre a pessoardquo (wwwJusnavigan- dicombr)

a) de autoridadeb) de senso comumc) de analogiad) de causa e efeito

Questatildeo 4 7 - 0 argumento predominante no fragmento eacute

ldquo() Afora a responsabilidade penal nos casos supramencionados temos a civil que como sabido em regra natildeo se confundem e satildeo independentes - embora em verdade sejam interdependentes - poshydendo tramitar accedilotildees concomitantemente salvo havendo incidentes de prejudicialidade externa evidente Ademais a sentenccedila penal (con- denatoacuteria ou absolutoacuteria) poderaacute influenciar na sentenccedila civil embora a reciacuteproca natildeo seja verdadeirardquo (wwwJusnavigandicombr)

a) de oposiccedilatildeob) de autoridadec) de analogiad) de causa e efeito

Questatildeo 48 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

A responsabilidade meacutedica eacute mateacuteria que vem sendo atualmente vastamente debatida seja no campo civil penal ou mesmo eacutetico Obshyservamos no entanto tratar-se essa discussatildeo principalmente na aacuterea da responsabilizaccedilatildeo civil de verdadeira renascenccedila da temaacutetica em torno da atuaccedilatildeo do profissional meacutedico (ou odontoloacutegico) talvez deflagrada por ocasiatildeo do surgimento e aplicaccedilatildeo das normas consshytantes do Coacutedigo de Defesa do Consumidor (CDC) pois que outrora esse assunto jaacute foi motivo de calorosos embates como atesta a primoshyrosa obra do Prof Hermes Rodrigues de Alcacircntara lsquoResponsabilishydade Meacutedicarsquo lanccedilada em 1971 A responsabilidade civil meacutedica portanto nada mais eacute do que a obrigaccedilatildeo do meacutedico ou da cliacuteshynica responsaacutevel de arcar com os prejuiacutezos causados a outrem quando houver a comprovaccedilatildeo de danos decorrentes da atuaccedilatildeo desses profissionaisrdquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Observa-se um breve introito com localizaccedilatildeo da questatildeo discutida no tempo e no espaccedilo

b) O argumentador recorre agrave autoridade do jurista para reforccedilar sua tesec) Observa-se um argumento de causa e efeito para reforccedilar a tesed) O argumentador estabelece uma relaccedilatildeo analoacutegica comparativa para reforccedilar

sua tese

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 219

Questatildeo 49 - Com base no que afirma o fragmento a opccedilatildeo que NAtildeO apreshysenta uma causa excludente da responsabilidade civil eacute

ldquoSendo contratada uma cliacutenica meacutedica (fornecedor de serviccedilo) e natildeo meacutedico (profissional liberal - art 14 sect4deg do CDC) impotildee-se portanto em caso de dano decorrente de cirurgia aplicar-se a responsabilizashyccedilatildeo objetiva bastando dessa feita estar comprovado o dano e o nexo de causalidade entre aquele e a atuaccedilatildeo da cliacutenica bem como inexisshytecircncia de caso fortuito forccedila maior ou culpa exclusiva do consumidor ou de terceirordquo

a) Caso fortuito e forccedila maiorb) Culpa exclusiva do consumidorc) A prestaccedilatildeo do serviccedilo dar-se por um profissional liberald) Culpa exclusiva de terceiro

Questatildeo 50 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento proacute-tese

a) O ideal eacute que cada fato relevante do caso concreto seja introduzido por conectoshyres sintaacuteticos como ldquoporquerdquo ldquoe tambeacutemrdquo e ldquoaleacutem dissordquo

b) Esse argumento tem como fonte principal trecircs fatos relevantes do caso concreto encadeados de forma loacutegica e persuasiva

c) A ordem dos fatos nesse argumento natildeo eacute relevante importante eacute associar as informaccedilotildees de modo a demonstrar que a tese da parte oposta natildeo tem fundashymento

d) Esse argumento eacute adequado para iniciar a fundamentaccedilatildeo simples

Questatildeo 51 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de oposiccedilatildeo

a) Argumento de oposiccedilatildeo restritiva eacute aquele que recorre a conjunccedilotildees coordenatishyvas restritivas como ldquoemborardquo ldquoainda querdquo ldquomasrdquo e ldquoporeacutemrdquo

b) Argumento que tem como finalidade a quebra de expectativas como estrateacutegia discursiva apoiada no uso dos operadores argumentativos de concessatildeo e de adversidade

c) Argumento que se caracteriza pela introduccedilatildeo de uma perspectiva oposta ao ponshyto de vista defendido pelo argumentador admitindo-o como uma possibilidade de conclusatildeo para depois apresentar como argumento decisivo a perspectiva contraacuteria

d) Argumento que permite antecipar as possiacuteveis manobras discursivas que formaratildeo a argumentaccedilatildeo da outra parte durante a busca de soluccedilatildeo jurisdicional para o conflito enfraquecendo assim os fundamentos mais fortes da parte oposta

Questatildeo 52 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de causa e efeito

a) Visa a estabelecer nexo causal entre uma conduta juridicamente importante e a consequecircncia juriacutedica danosa para a parte argumentadora

220 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

b) Necessita apresentar o efeito decorrente de certo comportamento ou conduta independente da orientaccedilatildeo da lei cujo uso soacute se faz devido no argumento de autoridade

c) Eacute adequado usar esse argumento quando se pretende por exemplo responsashybilizar civilmente empresa prestadora de serviccedilos de transporte em virtude de negligecircncia praticada por um de seus prepostos

d) a relaccedilatildeo entre a causa e o efeito pode ser introduzida por conectores sintaacuteticos como ldquoporquerdquo ldquopoisrdquo ldquoporquantordquo e ldquojaacute querdquo

Questatildeo 53 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de autoridadea) Eacute considerada fonte desse argumento a doutrinab) Eacute considerada fonte desse argumento a legislaccedilatildeoc) Uma de suas fontes eacute a analogia caso observado na hipoacutetese de haver lacuna

nadegislaccedilatildeod) Eacute considerada fonte desse argumento a opiniatildeo fundamentada de especiashy

listas

Questatildeo 54 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de senso comuma) Busca o encadeamento de seus raciociacutenios por meio da razoabilidadeb) Pode decorrer de costumes do direito natural e do direito positivoc) Tem como uma de suas fontes possiacuteveis o bom sensod) Possui forccedila persuasiva tal que no Tribunal do Juacuteri por exemplo pode suplantar

a orientaccedilatildeo da proacutepria norma positivada

Questatildeo 55 - Marque a opccedilatildeo que apresenta apenas argumentos utilizados no texto argumentativo adiante

Eacute recorrente a polecircmica sobre a constitucionalidade da realizaccedilatildeo de provas de concursos puacuteblicos em dia de saacutebado A controveacutersia existe porque certas pessoas por princiacutepio religioso natildeo realizam atividades seculares entre o pocircr do sol de sexta-feira e o pocircr do sol de saacutebado Para esses o art 5o VIII da CRFB garante a natildeo realizaccedilatildeo de provas nesse diaPor outro lado haacute quem entenda que oferecer condiccedilotildees especiais de prova aos sabatistas feriria a isonomia porque colocaria esse grupo em vantagem frente aos demais concorrentes Nessa linha argumenshyta-se que o Estado seria laico e portanto indiferente a qualquer opccedilatildeo religiosaInicialmente cumpre apontar que a Administraccedilatildeo Puacuteblica tem discri- cionariedade para escolher o modo como realizar as provas de conshycurso puacuteblico Atarefa do Administrador Puacuteblico como eacute evidente conshysiste em prover as necessidades puacuteblicas previstas no ordenamento juriacutedico utilizando-se para tanto dos recursos puacuteblicos humanos e

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 221

instrumentos juriacutedicos de que dispotildee com razoabilidade respeito e equidade

a) Argumento de autoridade argumento de causa e efeito e argumento de senso comum

b) Argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e argumento de causa e efeitoc) Argumento de autoridade argumento ad hominem e argumento de causa e efeitod) Argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e argumento de senso comum

Questatildeo 56 - Leia a argumentaccedilatildeo que segue e indique qual o uacutenico argumenshyto que NAtildeO estaacute contemplado no texto

No dia 02022011 acompanhamos com perplexidade o caso envolshyvendo a eliminaccedilatildeo de candidatos a professores da rede puacuteblica do Estado de Satildeo Paulo ocorrida durante a realizaccedilatildeo dos exames de sauacutede e motivada pela obesidade que os acomete Em siacutentese a conshyduta da administraccedilatildeo eacute inconstitucional porque os referidos candidashytos no momento da avaliaccedilatildeo de sauacutede foram vetados pelo setor de periacutecias meacutedicas responsaacutevel pelos exames ao argumento de que a obesidade eacute oficialmente uma doenccedila e por isso os portadores desse mal natildeo estariam aptos a integrar o funcionalismo puacuteblicoAleacutem disso no caso dos professores eliminados do certame o Poshyder Puacuteblico encontra-se totalmente divorciado das diretrizes trashyccediladas pelo Estado Democraacutetico de Direito Dispotildee o art 5o da Lei 81121990 que o legislador ordinaacuterio cumprindo o comando constishytucional estabeleceu criteacuterios objetivos para o ingresso no funcionashylismo puacuteblico sendo que em relaccedilatildeo agrave aptidatildeo fiacutesica e mental (inciso VI) em homenagem aos princiacutepios que regem nosso ordenamento constitucional tal requisito deve ser avaliado de acordo com cada caso especiacutefico isto eacute observando-se a natureza da funccedilatildeo a ser exercida pelo candidato eventualmente aprovado de modo que natildeo haja distorccedilotildees na aplicaccedilatildeo desse criteacuterio e consequentemente inshyjusticcedilas para os candidatosUm dos traccedilos de maior destaque nos concursos puacuteblicos eacute a garantia de igualdade entre os participantes do certame sendo que somente a lei pode estabelecer restriccedilotildees de acesso a determinados cargos e mesmo assim soacute nos casos em que determinadas caracteriacutesticas inerentes ao candidato forem incompatiacuteveis com a natureza da funccedilatildeo a ser desempenhada Tal decorre do princiacutepio da isonomia o qual estaacute expliacutecito no art 5o caput e impliacutecito no art 3o IV ambos da Constituishyccedilatildeo Federal e que proiacutebe consoante esse uacuteltimo preceptivo quaisquer formas de discriminaccedilatildeo expressatildeo essa que adverte-nos que o rol de elementos discriminatoacuterios rechaccedilados pela Constituiccedilatildeo Federal natildeo eacute exaustivo mas meramente exemplificativo

a) Argumento de autoridadeb) Argumento a fortioric) Argumento de senso comumd) Argumento de causa e efeito

222 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 57 - Complete o argumento________________eacute um tipo de argushymento loacutegico no qual algueacutem assume uma ou mais hipoacuteteses e a partir dessas deriva uma consequecircncia incoerente e entatildeo conclui que a suposhysiccedilatildeo original deve estar erradaa) Por absurdob) Ad hominemc) De senso comumd) A fortiori

Questatildeo 58 - Complete o argumento__________ eacute uma falaacutecia identificadaquando algueacutem procura negar uma proposiccedilatildeo com uma criacutetica ao seu autor e natildeo ao seu conteuacutedo Apesar de natildeo possuir bases loacutegicas esse argumento eacute uma forte arma retoacutericaa) qor absurdob) ad hominemc) de senso comumd) a fortiori

Questatildeo 59 - Complete o argumento_______________eacute produzido a partirdas fontes de maior prestiacutegio no Direito

a) de autoridadeb) ad hominemc) a fortiorid) de senso comum

Questatildeo 6 0 - 0 paraacutegrafo a seguir pode ser classificado quanto ao tipo de argumento e quanto agrave forma de organizaccedilatildeo como

ldquoNesse contexto tambeacutem configura atribuiccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico no exerciacutecio de suas atribuiccedilotildees institucionais na defesa dos direitos assegurados na Magna Carta Constitucional emitir recomendaccedilotildees dirigidas ao Poder Puacuteblico aos oacutergatildeos da Administraccedilatildeo Puacuteblica direshyta ou indireta aos concessionaacuterios e permissionaacuterios de serviccedilo puacuteblishyco e agraves entidades que exerccedilam funccedilatildeo puacuteblica delegada ou executem serviccedilo de relevacircncia puacuteblica (art 27 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei 86251993) nos termos das disposiccedilotildees no art 55 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei Complementar Estadual 0572006 bem como do artishygo 27 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei 86251993 cc art 6deg inciso XX da Lei Complementar Federal 751993 (em anaacutelise sistecircmica aplishycado ao Parquet Estadual)rdquo (wwwjusnavigandicombr)

a) De autoridade por induccedilatildeob) De autoridade por deduccedilatildeoc) De analogia por induccedilatildeod) De analogia por deduccedilatildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 223

Questatildeo 6 1 - 0 paraacutegrafo a seguir pode ser classificado quanto ao tipo deargumento como

ldquoEmbora a resoluccedilatildeo n 56 do CNMP natildeo traga a previsatildeo expressa da adoccedilatildeo do criteacuterio do autorreconhecimento natildeo podemos olvidar que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica veda todo e qualquer entendimento juriacutedishyco de forma direta ou indireta na tese jaacute superada da superioridade cultural da sociedade dita majoritaacuteriardquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Ad hominemb) De oposiccedilatildeoc) De analogiad) Por absurdo

Questatildeo 62 - Leia o fragmento a seguir

ldquoNas uacuteltimas deacutecadas o criteacuterio da autoidentificaccedilatildeo eacutetnica vem senshydo o mais amplamente aceito pelos estudiosos da temaacutetica indiacutegena Na deacutecada de 50 o antropoacutelogo brasileiro Darcy Ribeiro baseou-se na definiccedilatildeo elaborada pelos participantes do II Congresso Indige- nista Interamericano no Peru em 1949 para assim definir no texto lsquoCulturas e liacutenguas indiacutegenas do Brasilrsquo o indiacutegena como lsquo(bullbull) aquela parcela da populaccedilatildeo brasileira que apresenta problemas de inadapshytaccedilatildeo agrave sociedade brasileira motivados pela conservaccedilatildeo de cosshytumes haacutebitos ou meras lealdades que a vinculam a uma tradiccedilatildeo preacute-colombiana Ou ainda mais amplamente iacutendio eacute todo o indiviacuteduo reconhecido como membro por uma comunidade preacute-colombiana que se identifica etnicamente diversa da nacional e eacute considerada indiacutegena pela populaccedilatildeo brasileira com quem estaacute em contatorsquo Uma definiccedilatildeo muito semelhante foi adotada pelo Estatuto do iacutendio (Lei 6001 de 19121973) que norteou as relaccedilotildees do Estado brasileiro com as populaccedilotildees indiacutegenas ateacute a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988rdquo (wwwjusnavigandicombr)

Qual o tipo de argumento predominante no paraacutegrafoa) Argumento de oposiccedilatildeo restritivab) Argumento de causa e efeitoc) Argumento de senso comumd) A rgum ento de autoridade

Questatildeo 63 - Leia o paraacutegrafo a seguir

ldquoProcurou seu advogado sensibilizar e convencer o colegiado de deshysembargadores que a indenizaccedilatildeo de 4000 salaacuterios miacutenimos (atualshymente R$ 60000000) extrapolava o limite do razoaacutevel dando ecircnfase que tal valor excede por exemplo ao salaacuterio que o Presidente da Reshypuacuteblica perceberia em seus quatro anos de mandato e que o receshybimento dessa importacircncia pela atriz significaria seu enriquecimento de forma injusta e agraves custas tatildeo somente de lsquouma uacutenica frase de

224 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

uma pequena seccedilatildeorsquo da Revista VEJA bem diferente por exemplo se fosse divulgada atraveacutes de uma reportagem de paacutegina inteira com fotos etcrdquo

Um paraacutegrafo argumentative pode recorrer a diversas fontes argumentativas aomesmo tempo para produzir as ideias necessaacuterias agrave defesa de sua tese Qualo tipo de argumento PREDOMINANTE na produccedilatildeo escritaa) Senso comumb) Autoridadec) Analogiad) Causa e efeito

Questatildeo 64 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA de acordocom o texto

ldquoO Laudo eacute o parecer teacutecnico resultante do trabalho realizado pelo peshyrito via de regra escrito Deve ser redigido pelo proacuteprio perito mesmo quando existem Assistentes Teacutecnicos Os colegas devem receber a oportunidade de examinar o texto e emitir suas opiniotildees Essa tarefa deve ser realizada em conjunto de preferecircncia O perito ganha tempo e reduz os debates infrutiacuteferos dessa forma A maioria dos trabalhos resolve-se dentro do campo teacutecnico sem margem para opiniotildees pesshysoaisUm laudo pericial eacute uma forma de prova cuja produccedilatildeo exige coshynhecimentos teacutecnicos e cientiacuteficos e que se destina a estabelecer na medida do possiacutevel uma certeza a respeito de determinados fatos e de seus efeitos O perito fala somente sobre os efeitos teacutecnicos e cientiacuteficos O Juiz declara os efeitos juriacutedicos desses fatos referidos pelo perito e das conclusotildees desse O perito esclarece os efeitos de fato O Juiz fixa os efeitos de direitordquo (httpulcpericiacombrnoticias phpid=6)

a) A periacutecia funciona como prova admitida em direito De natureza demonstrativa estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

b) Se eacute o Juiz quem ldquofixa os efeitos de direitordquo enquanto ao perito cabe apenas ldquoesclarecer os efeitos de fatordquo o parecer tem reduzida forccedila persuasiva no texto argumentativo

c) A opiniatildeo pessoal do profissional da aacuterea teacutecnica da periacutecia importa ao argumen- tador pois foi ele quem esteve no local onde o corpo de delito foi analisado

d) Laudos satildeo pareceres teacutecnico-formais produzidos por profissionais da aacuterea juriacuteshydica

Questatildeo 6 5 - 0 texto adaptado que segue eacute a sinopse de propaganda de uma obra sobre como redigir periacutecias judiciais Observe

ldquoA periacutecia judicial de engenharia eacute aqui apresentada com todas as fashyses do aspecto processual revelando o comportamento praacutetico e eacutetico

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 225

profissional do perito A exposiccedilatildeo deteacutem-se sobretudo na redaccedilatildeo do laudo estudando a sua estrutura formal e o raciociacutenio loacutegico-dialeacutetico que permite ao magistrado aplicar o direito com seguranccedila e pocircr fim ao conflito entre as partes A obra destina-se preferencialmente aos iniciantes pois sugere diversas maneiras de como utilizar os subsiacutedios concretos fornecidos pela periacutecia para o pleno exerciacutecio da atividade advocatiacuteciardquo (Recebido por e-mail)

Quando o texto afirma que a obra ldquosugere diversas maneiras de como utilizar os subsiacutedios concretos fornecidos pela periacutecia para o pleno exerciacutecio da atividade advocatiacutecia sugere que a periacutecia estaacute a serviccedilo daa) Polifoniab) Induccedilatildeoc) Argumentaccedilatildeod) Deduccedilatildeo

Questatildeo 6 6 - 0 paraacutegrafo adiante eacute o introito de um texto argumentativo Tenshydo em vista a classificaccedilatildeo proposta pelos autores indique aquela que melhor identifica o paraacutegrafo

ldquoA Lei 12654 publicada em 28 de maio de 2012 ainda natildeo entrou em vigor mas jaacute eacute possiacutevel observar que as alteraccedilotildees que traraacute para o processo penal brasileiro embora significativas satildeo tambeacutem polecircmicasrdquo

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 6 7 - 0 paraacutegrafo adiante eacute o introito da motivaccedilatildeo de um acoacuterdatildeo Tendo em vista a classificaccedilatildeo proposta pelos autores indique aquela que melhor identifica o paraacutegrafo

ldquoAto juriacutedico perfeito direito adquirido direito a termo expectativa de direito ato administrativo negociai ato-condiccedilatildeo contribuiccedilatildeo parafisshycal relaccedilatildeo juriacutedica estatutaacuteria enriquecimento sem causa etc satildeo as teses sustentadas pelos protagonistas deste processo em busca de uma soluccedilatildeo para a lide Antes de se acolher qualquer delas entretanshyto cumpre identificar a real relaccedilatildeo juriacutedica existente entre o autor e o reacuteu e analisar os efeitos dela decorrentesrdquo

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

226 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 68 - Os dois paraacutegrafos adiante formam um introito Marque a opccedilatildeoque melhor identifica os paraacutegrafos

ldquoA dinacircmica do mercado de consumo nos dias atuais tem motivado o surgimento de formas alternativas de produccedilatildeo contrataccedilatildeo e prestashyccedilatildeo de serviccedilos A chamada terceirizaccedilatildeo eacute sem duvida a mais coshynhecida e possivelmente a mais praticada Busca-se ao tomar esse tipo de serviccedilo maximizar a produccedilatildeo pela especializaccedilatildeo dos agenshytes nela envolvidos estando a cargo do tomador dos serviccedilos somente a sua atividade-fim atividade vedada a terceirosTambeacutem como forma alternativa de maximizaccedilatildeo da produccedilatildeo e conshysequentemente dos lucros tem-se a oferta de contratos de franquias de um determinado produto marca ou serviccedilo A oferta de contrato de franquia permite ao franqueador expandir suas atividades consolidar e conquistar mercados se beneficiar da parceria de terceiro isto eacute do franqueado e por via de consequecircncia beneficiar-se dos empregados deste haja vista estarem sob um mesmo signo uma mesma bandeishyra ou seja a franquiardquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 69 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETAldquoAtualmente a identificaccedilatildeo criminal no Brasil eacute realizada atraveacutes da identificaccedilatildeo datiloscoacutepica (impressotildees digitais) e da identifishycaccedilatildeo fotograacutefica cumulativamente Em regra o indiciado que se identifica civilmente atraveacutes da apresentaccedilatildeo de documentos vaacutelishydos natildeo eacute submetido agrave identificaccedilatildeo criminal salvo nas hipoacuteteses previstas em lei conforme disposto no artigo 1deg e seguintes da Lei 120372009Ocorre que tanto a identificaccedilatildeo fotograacutefica quanto a datiloscoacutepica ainda que em menor proporccedilatildeo podem ser falhas enquanto a identishyficaccedilatildeo pelo perfil geneacutetico ostenta as vantagens da estabilidade quiacuteshymica do DNA mesmo que decorrido longo periacuteodo de tempo e de sua ocorrecircncia em todas as ceacutelulas nucleadas do corpo humano o que permite a identificaccedilatildeo por meio de um uacutenico fio de cabelo gota de sangue saliva e demais meacutetodos faacuteceis e indoloresrdquo (wwwjusnavi- gandicombr)

A estrutura que melhor identifica a redaccedilatildeo do fragmento eacutea) Introito + argumento de causa e efeito + senso comumb) Argumento proacute-tese + argumento de autoridade + argumento de oposiccedilatildeoc) Introito + argumento de autoridade + causa e efeitod) Argumento de senso comum + argumento proacute-tese + argumento de causa e

efeito

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 227

Questatildeo 70 - Leia o fragmento que segue

ldquoA advocacia antigamente era desenvolver raciociacutenio teacutecnico para conshyvencer o juiz de suas teses e vencer o processo para o cliente Hoje aleacutem disso - que continua a ser uma exigecircncia para a atuaccedilatildeo dos advogados - precisamos gerenciar o nosso escritoacuterio gerenciar os processos do cliente de forma a lhe informar nuacutemeros e dados estrashyteacutegicos Enfim temos que gerir muito mais do que apenas o processo e suas decisotildeesAtualmente os escritoacuterios e ateacute mesmo profissionais liberais que natildeo gerenciam a si mesmos estatildeo fadados a terem poucos clientes e deishyxar de crescer de maneira ordenada e corretaGestatildeo eacute mais do que apenas dar ordens e achar que tudo vai ficar bem porque um problema foi solucionado Gestatildeo eacute criticar o modo atual de organizaccedilatildeo Eacute pensar em maneiras alternativas de controlar e fazer funcionar bem o escritoacuterio Eacute realmente lsquopensarrsquo o seu negoacuteciordquo

De acordo com o texto marque a opccedilatildeo INCORRETAa) O advogado da atualidade deve ser competente (tecnicamente) e empreendedorb) O advogado da atualidade deve reunir as caracteriacutesticas de um bom argumenta-

dor e de um bom administradorc) O advogado da atualidade deve ser completamente diferente do advogado de

antigamented) O advogado da atualidade mesmo sendo competente na atuaccedilatildeo em audiecircncia

pode natildeo ter sucesso profissional

Questatildeo 71 - Satildeo providecircncias adequadas ao argumento de analogia

I Mostrar na argumentaccedilatildeo como se aproveita a decisatildeo por analogia no casoconcreto em anaacutelise

II Quando se tratar de jurisprudecircncia utilizada como paradigma para recursos esshypecial ou extraordinaacuterio aleacutem de mencionar o repertoacuterio autorizado fazer a comparaccedilatildeo analiacutetica

III Se ocorrer citaccedilatildeo de fragmentos marcar o trecho entre aspas

IV Natildeo exagerar na quantidade de citaccedilotildees diretas

V Ao citar o dispositivo que supre uma lacuna normativa justificar a semelhanccedilaque motiva a aplicaccedilatildeo analoacutegica

Satildeo verdadeiras as assertivasa) I II III e Vb) I III IV e Vc) II III e Vd) Todas as assertivas

228 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 72 - Marque a opccedilatildeo que melhor identifica o tipo de argumento deshysenvolvido no fragmento

ldquoNa visatildeo positivista do direito proposta por Kelsen Hart e Bobbio conshysagrou-se uma teoria juriacutedica que reduz o direito agrave regra e agrave sistemaacutetica do seu ordenamento normativo Essa concepccedilatildeo eacute tradicionalmente noshymeada de juspositivismo e natildeo considera a conexatildeo entre a norma e a realidade social Todavia a mudanccedila paradigmaacutetica do seacuteculo XX trouxa agrave baila uma nova forma de compreender o direito deixando de lado a conshycepccedilatildeo de norma como regra positiva Essa nova percepccedilatildeo denominashyda neoconstitucionalismo nas palavras de Juacutelio Ceacutesar Marcellino Juacutenior ldquocompreendeu a inserccedilatildeo de uma nova espeacutecie normativa o princiacutepiordquo

Trata-se dea) Argumento de oposiccedilatildeo

b) Argumento de causa e efeitoc) Argumento de senso comumd) Argumento por absurdo

Questatildeo 73 - Marque a opccedilatildeo que melhor identifica o tipo de argumento deshysenvolvido no fragmento

ldquoO valor normativo supremo da Constituiccedilatildeo natildeo surge bem se vecirc de pronto como uma verdade autoevidente mas eacute resultado de reshyflexotildees propiciadas pelo desenvolvimento da Histoacuteria e pelo empenho em aperfeiccediloar os meios de controle do poder em prol do aprimoshyramento dos suportes da convivecircncia social e poliacutetica Na verdade hoje eacute possiacutevel falar em um momento de constitucionalismo que se caracteriza pela supremacia do Parlamento porque o instante atual eacute marcado pela superioridade da Constituiccedilatildeo a que se subordinam toshydos os poderes por ela constituiacutedos - garantida por mecanismos juris- dicionaiacutes de controle de constitucionalidade - e tambeacutem a Constituiccedilatildeo se caracteriza pela absorccedilatildeo de valores morais e poliacuteticos (fenocircmeno por vezes designado como materializaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo) sobretudo em um sistema de direitos fundamentais autoaplicaacuteveis Aleacutem disso eacute preciso considerar que o poder deriva do povo que se manifesta ordinariamente por seus representantes

Trata-se dea) Argumento proacute-teseb) Argumento de causa e efeitoc) Argumento a fortiorid) Argumento de autoridade

Questatildeo 74 - Leia o fragmento adiante

ldquoOs fetos anencefaacutelicos satildeo seres humanos que podem receber doaccedilotildees [art 542 do Coacutedigo Civil] figurar em disposiccedilotildees testamen-

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 229

taacuterias [art1799 do Coacutedigo Civil] e mesmo ser adotados [art 1621 do Coacutedigo Civil]rdquo (fragmento do texto ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo de autoria do Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau)

O trecho recorre a qual tipo de argumentoa) Argumento de analogiab) Argumento proacute-tesec) Argumento de autoridaded) Argumento ad hominem

Questatildeo 75 - No fragmento que segue identifique a eventual presenccedila de modalizadores e comente o efeito valorativo que se pretende com esse recurso linguiacutestico

ldquoFabiano Ferreira Russi foi preso depois que duas mulheres assaltashydas em Taboatildeo da Serra Satildeo Paulo reconheceram-no como um dos criminosos em um aacutelbum fotograacutefico da poliacutecia O preso estava sozinho no reconhecimento e natildeo tinha antecedentes criminais mas para sua infelicidade foi fotografado depois que o Delegado determinou identishyficaccedilatildeo de todos os torcedores em batida policial Fabiano trabalhava em hotel quatro estrelas da regiatildeo da Vila Madalena Satildeo Paulo e ateacute trinta minutos depois do assalto continuava no trabalho Condenado em 2005 permaneceu preso por quatro anos Busca agora - apoacutes ser inocentado perder emprego e arruinar sua vida - indenizaccedilatildeo pelos danos que a decisatildeo judicial lhe causourdquo (wwwJusnavigandicombr)

Questatildeo 76 - A loacutegica do razoaacutevel exige do profissional do Direito a pondeshyraccedilatildeo de valores relativos a uma seacuterie de circunstacircncias observadas no caso concreto seja em relaccedilatildeo agravequeles que participam da lide seja em relaccedilatildeo ao lugar e ao tempo em que ocorreram os fatos

Com base nos conceitos de Loacutegica do Razoaacutevel e Loacutegica Formal exshyplique de que maneira a adoccedilatildeo por homoafetivos pode ser viabilizada no ordenamento juriacutedico brasileiro

Questatildeo 77 - Os elementos da narrativa forense (centralidade caracteriacutesticas dos personagens social moral fiacutesica psicoloacutegica profissional religioshysa familiar etc educaccedilatildeo quantitativa e qualitativa representatividade social espaccedilo fiacutesico e social tempo cronoloacutegico e psicoloacutegico) contrishybuem para uma argumentaccedilatildeo mais completa e consistente mostrando- -se de grande valor persuasivo

O trecho abaixo publicado na revista Veja em 09022009 eacute referente agrave acusaccedilatildeo de abuso sexual de pacientes feita contra renomado meacutedico

Dono da mais conhecida e bem-sucedida cliacutenica de reproduccedilatildeo asshysistida do paiacutes o meacutedico Roger Abdelmassih 65 anos de Satildeo Paushylo eacute objeto haacute quatro meses de um inqueacuterito policial por suspeita de

230 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

abuso sexual de pacientes Quando a investigaccedilatildeo foi revelada pelo jornal Folha de S Paulo no dia 9 nove mulheres haviam prestashydo depoimento contra Abdelmassih uma semana depois o nuacutemero tinha aumentado para 33 se incluiacutedo um testemunho que estava sendo colhido na sexta-feira ldquoOs relatos se parecem em diversos aspectosMuitas repetem as mesmas expressotildees usadas pelo meacutedicordquo diz Joseacute Reinaldo Carneiro um dos trecircs promotores responsaacuteveis pelo caso no Ministeacuterio Puacuteblico Abdelmassih que ainda natildeo foi ouvido no inqueacuterito em declaraccedilotildees a VE JA negou terminantemente as acusaccedilotildees ldquoNatildeo fiz nada Quando eu for agrave delegacia depor natildeo vou levar uma ou duas testemunhas vou levar um caminhatildeo de pessoas que me conhecem De preferecircncia pessoas de aparecircncia muito bonita que foram minhas clientes para contar se por acaso eu tive qualquer comportamento indevidordquo disse o meacutedico bem reshylacionado e querido por pacientes famosos a quem proporcionou a felicidade de ter filhos

(Disponiacutevel em httpvejaabrilcombr210109p_074shtml)

Indique pelo menos trecircs elementos da narrativa (centralidade caracteriacutesticas dos personagens social moral fiacutesica psicoloacutegica profissional religiosa familiar etc educaccedilatildeo quantitativa e qualitativa representatividade social espaccedilo fiacutesico e soshycial tempo cronoloacutegico e psicoloacutegico) e sua relevacircncia para o texto argumentative Justifique sua resposta com elementos do texto

Questatildeo 78 - Leia o texto adiante e responda ao que se pede

Bandido da Luz Vermelha discurso do jurista Neacutelson Hungria

Cari Chessman conhecido como o Bandido da Luz Vermelha foi um criminoso americano que estuprou e matou duas mulheres em 1960 na Califoacuternia nos Estados Unidos O acusado foi condenado agrave morte pelo juacuteri de Los Angeles e durante doze (12) anos seguidos conseguiu adiar sua execuccedilatildeo e nesse espaccedilo de tempo estudou intensamente na prisatildeo de San Quentin na Califoacuternia Estados Unidos lendo livros de Direito e tambeacutem de idiomas Tendo inclusive aprendido a Liacutengua PortuguesaMesmo preso no corredor da morte o Bandido da Luz Vermelha cheshygou a escrever quatro livros sobre sua causa A cela da morte (2455a) A face da justiccedila A Lei quer que eu morra e Garoto era um assassino O drama de Cari Chessman dominou todo o mundo e surgiram vaacuteshyrias manifestaccedilotildees no sentido de impedir sua execuccedilatildeo na cacircmara de gaacutesO grande jurista brasileiro Neacutelson Hungria Holffbauer liderou um moshyvimento internacional contra a pena de morte usando argumentaccedilatildeo juriacutedica por meio de discursos entrevistas manifestos e sobretudo em cartas dirigidas pessoalmente ao entatildeo Governador da Califoacuternia a quem cabia decidir sobre o Bandido da Luz Vermelha

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 231

Nelson Hungria abraccedilou essa campanha no Brasil com argumentos teacutecnicos e de psicologia juriacutedica para que o preso natildeo mais fosse leshyvado agrave cacircmara de gaacutes uma vez que ao tempo em que permaneceu preso recuperou-se pela dedicaccedilatildeo ao estudo do Direito e tambeacutem de idiomas Neacutelson Hungria que redigia com eloquecircncia clareza e muita convicccedilatildeo colocava seu argumento nos fragmentos a seguir em deshyfesa do Bandido da Luz VermelhaTrata-se de um singulariacutessimo exemplar humano [] vivendo sem tibiezas ou soluccedilotildees de continuidade no seu inexauriacutevel amor agrave vida e o que eacute assombroso tendo conseguido transformar o seu aparenshytemente irremediaacutevel fracasso como homo socialis numa estupenda vitoacuteria sobre si mesmo [] Chessman naquela maleborge dantesa sob o tremendo impacto de seu confinamento na estreita e sombria cela que precede agrave cacircmara de gases toacutexicos em San Quentin pocircde achar-se a si mesmo e do mais profundo do seu ser desvencilhanshydo da empolgadura e cativeiro de sua proacutepria natureza psicopaacutetica que o arrastara gradativamente a mais imprudente e grosseira anishymalidade surgiu um outro homem ateacute entatildeo desconhecido para ele mesmo Aquele Chessman de 27 anos que o juacuteri de Los Angeles condenou-o agrave morte eacute tatildeo diferente do Chessman atual como um carvatildeo difere do diamante Seraacute que Chessman depois de padecero acabrunhante castigo de onze anos de angustiosa expectativa nesshysa cittaacute dolente nesse exasperante purgatoacuterio que eacute o corredor da morte de San Quentin natildeo teraacute conquistado um autecircntico direito de comutaccedilatildeo da pena para continuar a viver Seraacute que o prosseguishymento da vida de Chessman natildeo poderaacute ser a continuidade de um exemplo edificante para os conscritos do crime A pena de morte natildeo traduz mais que o comodismo da administraccedilatildeo da justiccedila que para esquivar-se agrave tarefa de recuperaccedilatildeo de delinquentes perigosos preshyfere eliminaacute-los sem maior trabalho como a catildees danados (Redaccedilatildeo juriacutedica A palavra do advogado n 082004)

Com base no discurso proferido por Neacutelson Hungria produza um argumento deoposiccedilatildeo agrave tese defendida no texto

Questatildeo 79 - Leia o caso concreto adiante consulte as fontes disponiacuteveis e redija a fundamentaccedilatildeo juriacutedica com pelo menos um argumento proacuteshytese um argumento de autoridade e um argumento de oposiccedilatildeo

Considerando que a viacutetima perdeu sua vida de forma brutal a caminho do trabalho realizando pois o mais elementar direito de cidadania qual seja o de ir e vir direito esse tutelado pela norma constitucional soberana e cuja defesa eacute funccedilatildeo principal da autoridade policial Considerando que o agente autoridade policial armada cujo principal dever de ofiacutecio eacute dar proteccedilatildeo e amparo aos cidadatildeos em tempo inshytegral encontrava-se agrave paisana em estado de embriaguez e iniciou violentamente constrangimento agrave viacutetima para conjunccedilatildeo carnal ou ato libidinoso em veiacuteculo de transporte de passageiros demonstrando natildeo possuir o equiliacutebrio necessaacuterio esperado de um homem da lei

232 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Considerando a impertinecircncia ostensiva do agente que ignorou as constantes represaacutelias da viacutetima e o modo frio e covarde com que executou os disparos sem permitir qualquer reaccedilatildeoConsiderando serem necessaacuterias todas as medidas que impeccedilam o processo de banalizaccedilatildeo da vida (ou da morte) humana que todos vivenciamos em nossos dias especialmente por parte daqueles que a deveriam protegerOpina-se pela sumaacuteria expulsatildeo do agressor do efetivo da Poliacutecia Militar sem prejuiacutezo das sanccedilotildees militares legais e que seja acashytada denuacutencia pelo Ministeacuterio Puacuteblico requerendo sua condenaccedilatildeo em rito sumaacuterio (prisatildeo em flagrante) agraves penas previstas no art 121 sect 2deg II do Coacutedigo Penal homiciacutedio doloso qualificado por motivo fuacutetil

Fontes

Homiciacutedio simples Art 121 - Matar algueacutemPena - reclusatildeo de 6 (seis) a 20 (vinte) anos

Homiciacutedio qualificado sect 2o Se o homiciacutedio eacute cometidoI - mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpeII - por motivo fuacutetilIII - com emprego de veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comumIV - agrave traiccedilatildeo de emboscada ou mediante dissimulaccedilatildeo ou outro reshycurso que dificulte ou torne impossiacutevel a defesa do ofendidoV - para assegurar a execuccedilatildeo a ocultaccedilatildeo a impunidade ou vantashygem de outro crimePena - reclusatildeo de 12 (doze) a 30 (trinta) anos

Questatildeo 80 - Leia a sentenccedila citada na parte teoacuterica do capiacutetulo relativo agraves figuras de retoacuterica referente ao Processo n 1863657-42008 (autor Minisshyteacuterio Puacuteblico Estadual reacuteu BSS) Procure identificar as figuras de retoacuteshyrica utilizadas nesta sentenccedila e o efeito persuasivo que possivelmente possam acarretar

Autor Ministeacuterio Puacuteblico Estadual Reacuteu BSSBSS eacute surdo e mudo tem 21 anos e eacute conhecido em Coiteacute como ldquoMudinhordquo

Quando crianccedila entrava nas casas alheias para merendar jogar video-game para trocar de roupa para trocar de tecircnis e depois de algum tempo tambeacutem para levar algum dinheiro ou objeto Conseguia

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 233

abrir facilmente qualquer porta janela grade fechadura ou cadeado Domou os catildees mais ferozes tornando-se amigo deles Abria tambeacutem a porta de carros e dormia candidamente em seus bancos Era motivo de admiraccedilatildeo espanto e medoO Ministeacuterio Puacuteblico ofereceu dezenas de Representaccedilotildees contra o entatildeo adolescente BSS pela praacutetica de ldquoatos infracionaisrdquo dos mais diversos O Promotor de Justiccedila Dr Joseacute Vicente quase o adotou e ateacute o levou para brincar com seus filhos dando-lhe carinho e afeto mas natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquoMudinhordquoO Judiciaacuterio o encaminhou para todos os oacutergatildeos e instituiccedilotildees posshysiacuteveis ameaccedilou prender Diretoras de Escolas que natildeo o aceitavam mas tambeacutem natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquoMudinhordquoA comunidade natildeo fez nada por eleO Municiacutepio natildeo fez nada por eleO Estado Brasileiro natildeo fez nada por eleHoje BSS tem 21 anos eacute maior de idade e pratica crimes conshytra o patrimocircnio dos membros de uma comunidade que natildeo cuidou deleFoi condenado na vizinha Comarca de Valente como ldquoincurso nas sanccedilotildees do art 155 caput por duas vezes art 155 sect 4o inciso IV por duas vezes e no art 155 sect 4o inciso IV cc art 14 inciso IIrdquo a pena de dois anos e quatro meses de reclusatildeoPor falta de estabelecimento adequado cumpria pena em regime aberto nesta cidade de CoiteacuteAqui sem escolaridade sem profissatildeo sem apoio da comunidade sem famiacutelia presente sozinho agraves trecircs e meia da manhatilde entrou em uma marmoraria e foi preso em flagrante Por que uma marmora- riaFoi entatildeo denunciado pelo Ministeacuterio Puacuteblico pela praacutetica do crime previsto no artigo 155 sect4deg incisos II e IV cc o artigo 14 II do Coacutedigo Penal ou seja crime de furto qualificado cuja pena eacute de dois a oito anos de reclusatildeoFoi um crime tentado Natildeo levou nadaPor intermeacutedio de sua matildee foi interrogado e disse que ldquotoma remeacutedio controlado e bebeu cachaccedila oferecida por amigos que ficou completashymente desnorteado e entatildeo pulou o muro e entrou no estabelecimento da viacutetima quando foi surpreendido e preso pela poliacuteciardquoEm alegaccedilotildees finais a ilustre Promotora de Justiccedila requereu sua condenaccedilatildeo ldquopela praacutetica do crime de furto qualificado pela escashyladardquoBSS tem peacutessimos antecedentes e natildeo eacute mais primaacuterio Sua ficha contando os casos da adolescecircncia tem mais de metroO que deve fazer um magistrado neste caso Aplicar a Lei simplesshymente Condenar BSS agrave pena maacutexima em regime fechadoO futuro de BSS estava escrito Se natildeo fosse morto por um ldquoproprieshytaacuteriordquo ou pela poliacutecia seria bandido Todos sabiam e comentavam isso na cidade

234 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Hoje o Ministeacuterio Puacuteblico quer sua prisatildeo e a cidade espera por isso Ningueacutem quer o ldquoMudinhordquo solto por aiacute Deve ser preso Precisa ser retirado do seio da sociedade Levado para a lixeira humana que eacute a penitenciaacuteria Laacute eacute seu lugar Infelizmente a Lei eacute dura mas eacute a Lei O Juiz de sua vez deve ser a ldquoboca da LeirdquoSeraacute O Juiz natildeo faz parte de sua comunidade Natildeo pensa Natildeo eacute um ser humanoDe outro lado seraacute que o Direito eacute somente a Lei E a Justiccedila o que seraacutePoderiacuteamos como jaacute fizeram tantos outros escrever mais de um livro sobre esses temasNesse momento no entanto temos que resolver o caso concreto de BSS O que fazer com eleNenhuma satilde consciecircncia pode afirmar que a soluccedilatildeo para BSS seja a penitenciaacuteria Sendo como ela eacute a penitenciaacuteria vai oferecer a BSS tudo o que lhe foi negado na vida escola acompanhamento especial afeto e compreensatildeo Natildeo Com certeza natildeoEacute o Juiz entre a cruz e a espada De um lado a consciecircncia a feacute cristatilde a compreensatildeo do mundo a utopia da Justiccedila Do outro lado a Lei (metoniacutemia)Neste caso prefiro a Justiccedila agrave LeiAssim BSS apesar da Lei natildeo vou lhe mandar para a Penitenciaacuteria Tambeacutem natildeo vou lhe absolverVou lhe mandar prestar um serviccedilo agrave comunidadeVou mandar que vocecirc pessoalmente em companhia de Oficial de Justiccedila desse Juiacutezo e de sua matildee entregue uma coacutepia dessa decishysatildeo colhendo o ldquorecebidordquo a todos os oacutergatildeos puacuteblicos dessa cidade- Prefeitura Cacircmara e Secretarias Municipais a todas as associashyccedilotildees civis dessa cidade - ONGs clubes sindicatos CDL e maccedilonashyria a todas as Igrejas dessa cidade de todas as confissotildees ao Deshylegado de Poliacutecia ao Comandante da Poliacutecia Militar e ao Presidente do Conselho de Seguranccedila a todos os oacutergatildeos de imprensa dessa cidade e a quem mais vocecirc quiserAproveite e peccedila a eles um emprego uma vaga na escola para adultos e um acompanhamento especial Depois apresente ao Juiz a comshyprovaccedilatildeo do cumprimento de sua pena e natildeo roubes maisExpeccedila-se o Alvaraacute de SolturaConceiccedilatildeo do Coiteacute-Ba 07 de agosto de 2008 ano vinte da Constituiccedilatildeo Federal de 1988

Bei Gerivaldo Alves Neiva Juiz de Direito

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 235

Coletacircnea de textos para exerciacuteciosTexto 1O M IN ISTEacuteRIO PUacuteBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

por meio do Promotor de Justiccedila infra-assinado em esteio de suas atribuishyccedilotildees constitucionais e consoante o disposto no art 220 da Carta Federal e o artigo 149 da Lei 80691990 - Estatuto da Crianccedila e do Adolescente - vem atraveacutes do presente na defesa de interesse difuso afeto aos adolescentes narshyrar os fatos adiante aduzidos para posteriormente requerer o seguinte

1) O Requerente eacute Titular da T Promotoria de Justiccedila da Infacircncia e da Juventude da Comarca da Capital Oacutergatildeo de Execuccedilatildeo com atribuiccedilatildeo para o processamento dos adolescentes envolvidos em praacuteticas infracionais no Rio de Janeiro e concorrentemente com atribuiccedilatildeo para oficiar perante a Justiccedila da Infacircncia e da Juventude

2) Como eacute por demais sabido diferentemente do que ocorre em outras Comarcas do Paiacutes no Rio de Janeiro haacute uma caracteriacutestica peculiar cerca de 70 (setenta por cento) das apreensotildees de adolescentes infratores refeshyrem-se a traacutefico de substacircncias entorpecentes (art 33 da Lei 113432006) aumentando ainda mais esse percentual quando independentemente do tipo de ato infracional perpetrado a sua origem se daacute natildeo soacute por envolvishymento mas tambeacutem o uso (artigos 20 a 26 da Lei 113432006) de substacircnshycias entorpecentes ou que causam dependecircncia fiacutesica ou psiacutequica

3) No uacuteltimo dia 16 de marccedilo do corrente ano entrou em circuito o filme ldquo Trafficrdquo dirigido por Steven Soderbergh recomendado nacionalshymente pela Coordenadoria-Geral de Classificaccedilatildeo Tiacutetulos e Qualificaccedilatildeo da Secretaria Nacional de Justiccedila para ldquo maiores de 18 anos de idaderdquo imshypossibilitando dessa forma que os adolescentes habitantes desta Cidade do Rio de Janeiro possam sozinhos assistir agrave referida produccedilatildeo

4) O filme em questatildeo retrata o submundo do narcotraacutefico nos Estashydos Unidos e mostra uma realidade muito proacutexima da que ocorre no Rio de Janeiro onde os adolescentes que satildeo apreendidos e chegam agrave Justiccedila da Infacircncia e da Juventude tecircm como motivo principal o envolvimento no mundo das drogas

5) Em reportagem veiculada hoje pela Imprensa (em anexo) especiashylistas em drogas puderam emitir suas opiniotildees e parecem concordar com o Ministeacuterio Puacuteblico quando priorizam a educaccedilatildeo na difiacutecil tarefa de comshybater o traacutefico de drogas Segundo Maria Thereza de Aquino Diretora do NEPAD o filme ldquo tem o meacuterito de tratar a questatildeo sem preconceito ou falsos moralismos Saiacutedas Haacute sim Elas dependem de noacutesrdquo

236 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

6 EX POSIT1S pelas razotildees aduzidas requer o Ministeacuterio Puacuteblico seja autorizada judicialmente mediante Alvaraacute a entrada de adolescenshytes desacompanhados dos pais ou responsaacutevel a partir de 16 anos nos estuacutedios de exibiccedilatildeo da Cidade do Rio de Janeiro intimando-se a direccedilatildeo da Europa Filmes Distribuidora do Filme ldquoTrqfficrdquo e o Departamento de Classificaccedilatildeo Indicativa do Ministeacuterio da Justiccedila para a ciecircncia e demais providecircncias cabiacuteveis

(Extraiacutedo da Internet Fonte desconhecida)

Se desejar recorra agraves seguintes fontesAlt 220 da CRFB A manifestaccedilatildeo do pensamento a criaccedilatildeo a expresshysatildeo e a informaccedilatildeo sob qualquer forma processo ou veiacuteculo natildeo sofreshyratildeo qualquer restriccedilatildeo observado o disposto nesta ConstituiccedilatildeoArt 149 I ldquo erdquo do ECA Compete agrave autoridade judiciaacuteria disciplinar atraveacutes de portaria ou autorizar mediante alvaraacute a entrada e permanecircnshycia de crianccedila ou adolescente desacompanhado dos pais ou responsaacuteshyvel em estuacutedios cinematograacuteficos de teatro raacutedio e televisatildeoArt 33 da Lei 113432006 Importar exportar remeter preparar proshyduzir fabricar adquirir vender expor agrave venda oferecer ter em depoacutesishyto transportar trazer consigo guardar prescrever ministrar entregar a consumo ou fornecer drogas ainda que gratuitamente sem autorizaccedilatildeo ou em desacordo com determinaccedilatildeo legal ou regulamentar Pena mdash reshyclusatildeo de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1500 (mil e quinhentos) dias-multaArt 20 da Lei 113432006 Constituem atividades de atenccedilatildeo ao usuaacuteshyrio e dependente de drogas e respectivos familiares para efeito desta Lei aquelas que visem agrave melhoria da qualidade de vida e agrave reduccedilatildeo dos riscos e dos danos associados ao uso de drogas

Texto 2Em uma cidade do interior do Paranaacute trecircs meninos ficaram oacuterfatildeos e

como toda a famiacutelia dos pais era muito pobre nenhum parente quis assumir a guarda deles Os menores tecircm nove onze e doze anos satildeo negros - soshymente o mais velho frequentou a escola ateacute a terceira seacuterie do ensino fundashymental - e estatildeo provisoriamente numa instituiccedilatildeo religiosa da cidade

Haacute dois anos o Juizado da Infacircncia e Juventude procura em todo o Brasil uma famiacutelia que os adote Um casal homoafetivo Joseacute e Joatildeo interessou-se pelos meninos Apoacutes uma sequecircncia de visitas Joseacute ingresshysou com um pedido de adoccedilatildeo dos trecircs meninos e a guarda provisoacuteria que foi desde logo concedida

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 237

O casal tem excelente condiccedilatildeo econocircmica formaccedilatildeo universitaacuteria e a sua opccedilatildeo eacute aceita pelas famiacutelias de ambos e pela comunidade local em que vivem Os laudos apresentados pelos assistentes sociais indicaram que Joseacute tinha condiccedilotildees de adoccedilatildeo e que a opccedilatildeo sexual de Joseacute podeshyria representar dificuldades para os irmatildeos mas que durante o periacuteodo de convivecircncia os trecircs meninos demonstravam gostar da companhia de Joseacute e seu companheiro

O juiz em sua sentenccedila negou o pedido de adoccedilatildeo tendo em vista o art 226 da CRFB com base no entendimento de que a entidade familiar eacute constituiacuteda pela uniatildeo de homem e mulher e que o bem-estar das crianccedilas natildeo poderia ser garantido Acrescentou que o referido artigo se sobrepotildee ao ECA que natildeo estabelece restriccedilatildeo para o solteiro adotar uma crianccedila

Texto 3Roberto Pires contratou os serviccedilos da cliacutenica de Esteacutetica Beleza

Eterna para uma depilaccedilatildeo a laser na regiatildeo da barba e do pescoccedilo por R$ 257600 Ele foi submetido a uma entrevista preliminar com um teacutecnico de esteacutetica - natildeo por um meacutedico - e chegou a informar que tinha foliculite

Logo apoacutes a primeira aplicaccedilatildeo do laser ele apresentou uma graviacutesshysima reaccedilatildeo aleacutergica O consumidor afirma que a aplicaccedilatildeo tambeacutem lhe causou dores de cabeccedila e nos olhos aleacutem de acnes que lhe deixaram com uma aparecircncia horriacutevel Por ser recepcionista de uma grande empresa na aacuterea de comeacutercio exterior ele foi afastado do trabalho e posteriormente perdeu o emprego

Roberto Pires propocircs accedilatildeo indenizatoacuteria em que pediu reparaccedilatildeo pelos danos morais esteacuteticos e materiais Argumenta que todas as provishydecircncias adotadas pela empresa natildeo foram suficientes para anular os efeitos dos danos causados Na Peticcedilatildeo Inicial a viacutetima contou que natildeo realizou exames preacutevios necessaacuterios ao tratamento e em razatildeo dos problemas apreshysentados ficou deprimido teve seu trabalho prejudicado e manteve distanshyciamento do meio social

Sustenta o autor que ldquo a indenizaccedilatildeo deve ser compatiacutevel com a repro- vabilidade da conduta iliacutecita a intensidade e duraccedilatildeo do sofrimento expeshyrimentado pela viacutetima a capacidade econocircmica do causador do dano e as condiccedilotildees sociais do ofendidordquo A reacute afirma que natildeo foi responsaacutevel pelos danos causados ao recepcionista Ao contraacuterio enfatiza que tomou todas as providecircncias posteriores necessaacuterias agrave reparaccedilatildeo do dano mesmo natildeo sendo por ele responsaacutevel

238 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Apoacutes a compreensatildeo do conflito e a leitura das fontes primaacuterias e secundaacuterias que auxiliam a soluccedilatildeo da lide desenvolva uma ementa e uma fundamentaccedilatildeo para o caso concreto Sua fundamentaccedilatildeo deveraacute apresenshytar pelo menos trecircs paraacutegrafos argumentativos diferentes

Texto 4Mariacircngela Gomes de Almeida psicoacuteloga eacute casada com Patriacutecio Goshy

mes de Moura piloto desde marccedilo de 1977 O casamento eacute regido pela comunhatildeo universal dos bens O casal tem duas filhas uma de 18 e outra de 20 anos de idade Os cocircnjuges acumularam um patrimocircnio de cerca de 700 mil reais composto por uma casa de 400 mil reais onde mora o casal dois carros avaliados em 50 mil reais cada e uma casa de praia de 200 mil

Em virtude de sua profissatildeo Patriacutecio realiza frequentes viagens pelo Brasil e natildeo eventualmente passa longos periacuteodos longe de casa Mariacircnshygela e suas filhas jaacute se acostumaram a essa rotina irregular de trabalho Essa eacute uma famiacutelia feliz Todos os parentes e amigos afirmam que Patriacutecio nunca deixou faltar nada para sua famiacutelia nem do ponto de vista financeiro nem moral

Em janeiro de 2005 Patriacutecio morreu e durante seu veloacuterio se descoshybriu que o piloto vivia com Gorete Alves sambista haacute cerca de nove anos Com ela o falecido teve trecircs filhos Ricardo Gomes de Moura Alves (5 anos) Alvina Gomes de Moura Alves (3 anos) e Patriacutecio Gomes de Moura Juacutenior (10 meses de idade) todos devidamente registrados Diante do caishyxatildeo de seu amado Gorete fez questatildeo de exibir fotos do companheiro com ela e os filhos

No uacuteltimo Natal ambos tiveram uma viagem inesqueciacutevel para Buenos Aires Havia tambeacutem fotos tiradas no Dia dos Pais e na Paacutescoa Depois de criar grande estardalhaccedilo no veloacuterio Gorete entregou agrave Mashyriacircngela a fatura do cartatildeo de creacutedito de Patriacutecio que era haacute dois anos remetida para a residecircncia daquela Afirmou a companheira que natildeo pashygaria aquelas despesas porque todas se referiam a gastos feitos com a famiacutelia da esposa

Somente entatildeo Mariacircngela descobriu que Patriacutecio utilizava seu trabashylho como desculpa para dividir o tempo entre as duas famiacutelias Afirma que nunca poderia imaginar que um marido tatildeo zeloso poderia traiacute-la por tanto tempo Gorete ingressa com accedilatildeo judicial visando ao reconhecimento da uniatildeo estaacutevel e pretende se habilitar agrave heranccedila deixada pelo de cujus

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 239

Garante que natildeo apenas seus filhos mas lambeacutem ela tecircm direitos a serem tutelados pois sua uniatildeo com Patriacutecio era puacuteblica duradoura e sem duacutevida tinha por objetivo constituir famiacutelia nos termos da Lei de Uniatildeo Estaacutevel Mariacircngela contesta a accedilatildeo alegando que natildeo pode haver concomitacircncia de dois casamentos assim como de casamento com uniatildeo estaacutevel Essa praacutetica alega atenta contra a moral e os bons costumes Seria precedente perigoso um juiz reconhecer esse tipo de relaccedilatildeo

Texto 5Juiz obriga empresa a fornecer remeacutedio para o estadoDecisatildeo da Justiccedila Federal do Rio Grande do Norte obriga a empresa

Elfa Medicamentos Ltda a fornecer ao governo do Estado potiguar remeacuteshydios para o tratamento de esquizofrenia

A empresa ganhou a licitaccedilatildeo feita pela Secretaria Estadual de Sauacutede para fornecimento dos remeacutedios No entanto como o governo tem deacutebitos acumulados com a empresa ela se negou a fornecer medicamento para o qual concorreu e venceu o pregatildeo A decisatildeo foi do Juiz Federal Janilson Bezerra titular da 4a Vara

ldquo A conduta perpetrada pela empresa demandada natildeo se justifica tenshydo em vista a existecircncia de meios proacuteprios para a cobranccedila de creacuteditos em desfavor do Estado natildeo se mostrando a suspensatildeo do fornecimento do medicamento objeto do presente litiacutegio meio liacutecito para tanto

Assim observa-se que ao deixar de fornecer o medicamento Olan- zapina nas versotildees de 5 e 10 mg a empresa Elfa Medicamentos Ltda estaacute descumprindo as disposiccedilotildees contratuais decorrentes da Ata de Registro de Preccedilos 612010 colocando em risco a sauacutede dos portadores de esquizofreshynia do Estado do RN e de seus familiaresrdquo escreveu o juiz na liminar

Pela decisatildeo a Elfa Medicamentos Ltda tem prazo de 48 horas para fornecer os medicamentos descritos na nota de empenho assinada pelo seshycretaacuterio estadual de Sauacutede

QuestatildeoEm ldquoAssim observa-se que ao deixar de fornecer o medicamento

Olanzapina nas versotildees de 5 e 10 mg a empresa Elfa Medicamentos Ltda estaacute descumprindo as disposiccedilotildees contratuais decorrentes da Ata de Reshygistro de Preccedilos 612010 colocando em risco a sauacutede dos portadores de esquizofrenia do Estado do RN e de seus familiaresrdquo o juiz da liminar fez uso do raciociacutenio dedutivo ou indutivo Justifique

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Texto 6Presa em dezembro de 2005 sob acusaccedilatildeo de comandar ataque a um

ocircnibus da linha 350 no bairro da Penha Circular Zona Norte do Rio de Jashyneiro Maria Aparecida Mendonccedila entrou com accedilatildeo indenizatoacuteria em Face do Estado do Rio de Janeiro na 3a Vara de Fazenda Puacuteblica

Depois de ser detida em casa e passar 28 dias na prisatildeo a Poliacutecia Civil admitiu publicamente o equiacutevoco e a soltou A Defensoria Puacuteblica fluminense que a representa estaacute pleiteando R$ 700 mil a tiacutetulo de danos morais aleacutem de uma pensatildeo alimentiacutecia de R$ 35000 mensais

ldquoA jovem foi exposta agrave miacutedia pelas autoridades e natildeo haacute como negar que isso a prejudicou em diversos aspectos inclusive fazendo com que perdesse o emprego de animadora de festas infantisrdquo declarou um dos deshyfensores que atua no processo Maria Aparecida na ocasiatildeo do crime foi identificada por meio de foto por uma garota de 13 anos

Posteriormente natildeo foi reconhecida por trecircs testemunhas como a mulher que teria mandado colocar fogo no coletivo o que provocou a morshyte de cinco pessoas inocentes inclusive um bebecirc de um ano e um mecircs O delito ocorreu na noite de 29 de novembro de 2005 no subuacuterbio do Rio de Janeiro e comoveu o paiacutes Apoacutes lembrarem que a prisatildeo por mais de trecircs semanas impediu a ex-animadora de trabalhar os defensores enfatizaram o fato de sua assistida ter corrido risco de morte jaacute que trecircs coautores do atentado foram assassinados por encomenda de facccedilotildees criminosas irritashydas com a repercussatildeo do caso

A acusaccedilatildeo sustenta que a atitude dos agentes puacuteblicos que invadiram a residecircncia da autora e a deixaram 28 dias presa sem terem provas consisshytentes para tal fez com que Maria Aparecida ficasse arrasada

ldquoO papel deles eacute proteger as pessoas e natildeo violar direitos constitushycionais de cidadatildeos de bemrdquo disse o Defensor O Defensor afirmou ainda que natildeo considera que o valor pedido seja elevado e prefere destacar que o Estado pode evitar pleitos futuros caso selecione melhor seus agentes policiais

ldquoO pleito tem caraacuteter compensatoacuterio para a viacutetima e feiccedilatildeo punitiva para o causador do dano Esta duplicidade baseia-se no dever geral de absshytenccedilatildeo residente no fato de que natildeo eacute liacutecito a ningueacutem causar dano a outrem A condenaccedilatildeo do causador do dano tem funccedilatildeo tambeacutem preventiva desesti- mulando a reiteraccedilatildeo de situaccedilotildees correlatasrdquo afirmou por fim o Defensor

Em resposta o Estado sustenta que tem o direito-dever de investigar e apurar a responsabilidade sobre fato de natureza criminosa em especial

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 241

quando esse ganha repercussatildeo em todo o paiacutes Alega ainda que a autora natildeo teve sua integridade fiacutesica violada durante o tempo em que permaneceu sob sua responsabilidade

Texto 7Lavrador eacute preso por raspar casca de aacutervoreEle usava a casca de aacutervore para fazer chaacute para sua mulher que estaacute

doenteO ministro Joseacute Samey Filho (Meio Ambiente) e as entidades amshy

bientalistas Greenpeace e ISA (Instituto Socioambiental) criticaram a prishysatildeo em flagrante do lavrador Joseacute dos Anjos 58 anos que durante dois anos raspou a casca de uma aacutervore para fazer chaacute para sua mulher que estaacute doente Joseacute raspava a casca de uma aacutervore chamada almesca em uma aacuterea de preservaccedilatildeo permanente que fica agraves margens do coacuterrego Pindaiacuteba em Planaltina (a 44 km de Brasiacutelia)

O lavrador disse que usava a casca para fazer chaacute para a mulher Helena dos Anjos Ela tem Doenccedila de Chagas Joseacute conta que soube que o chaacute melhorava as condiccedilotildees dos acometidos pela doenccedila Em 20 de junho de 2000 Joseacute foi surpreendido com um tiro para o alto dado por soldados da Poliacutecia Florestal quando raspava a almesca Preso em flagrante delito algemado e levado para a delegacia o lavrador foi enquadrado na Lei do Meio Ambiente (Lei 9605 de 1998)

Segundo o delegado Ivanilson Severino de Melo Joseacute provocou ldquo dashynos diretos ao patrimocircnio ambientalrdquo crime previsto no artigo 40 da lei O delito inafianccedilaacutevel eacute punido com 1 a 5 anos de prisatildeo Joseacute foi colocado numa cela com outros cinco presos acusados de homiciacutedio e roubo

Texto 8Municiacutepio teraacute que indenizar idosa agredida por meacutedicoFonte TJM TO municiacutepio de Vaacuterzea Grande foi condenado a pagar R$ 152 mil a

tiacutetulo de danos morais a uma idosa que foi agredida fiacutesica e verbalmente por um meacutedico na policliacutenica do bairro Parque do Lago A decisatildeo eacute do juiz Rodrigo Roberto Curvo da Terceira Vara Especializada da Fazenda Puacuteblica de Vaacuterzea Grande (processo 2152005)

A autora da accedilatildeo eacute procuradora de um portador de esquizofrenia No dia 19 de novembro de 2003 quando tinha 73 anos ela levou o paciente agrave

242 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

policliacutenica para consulta e obtenccedilatildeo de novo laudo meacutedico que daria conshytinuidade ao recebimento do auxiacutelio-doenccedila No entanto segundo a idosa ao ser atendida pelo meacutedico ele se recusou a expedir o documento mesmo tendo ciecircncia de que o paciente eacute portador de doenccedila mental

Ela lembrou ao meacutedico que o paciente tinha o direito de ser atendishydo Ainda segundo a idosa a reclamaccedilatildeo deixou o meacutedico transtornado Ele passou a bater na mesa gritando palavras de baixo calatildeo e ameaccedilanshydo agredi-la fisicamente O meacutedico teria dito tambeacutem que iria localizar o endereccedilo da idosa para mandar prendecirc-la Conforme relatos contidos no processo o meacutedico soacute natildeo espancou a idosa porque o paciente interveio e se colocou na sua frente Em seguida ele teria empurrado a idosa e o paciente para fora de seu consultoacuterio na policliacutenica do Parque do Lago empregando forccedila fiacutesica e humilhando os dois diante dos demais pacientes qLie aguardavam atendimento no local

Na sentenccedila o magistrado observou que eacute obrigaccedilatildeo de qualquer sershyvidor puacuteblico atender com urbanidade e cortesia sobretudo em se tratando de idoso pois o Estatuto do Idoso (Lei 107412003) assegura no artigo 4deg que ldquonenhum idoso seraacute objeto de qualquer tipo de negligecircncia discrishyminaccedilatildeo violecircncia crueldade ou opressatildeo e todo atentado aos seus direishytos por accedilatildeo ou omissatildeo seraacute punido na forma da leirdquo Desta forma cabe agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica indenizar a idosa pelo sofrimento e humilhaccedilatildeo aos quais foi submetida ldquo Desde que a Administraccedilatildeo defere ou possibilita ao seu servidor a realizaccedilatildeo de certa atividade administrativa a guarda de um bem ou a conduccedilatildeo de uma viatura assume o risco de sua execuccedilatildeo e resshyponde civilmente pelos danos que esse agente venha a causar injustamente a terceirosrdquo observou o juiz

Texto 9O siacutendico de um edifiacutecio residencial no Recreio dos Bandeirantes Jaime

Adelino Machado estaacute sendo acusado de racismo por tentar impedir a circushylaccedilatildeo de um morador negro nas dependecircncias do preacutedio A moradora Maria das Graccedilas Santos recebeu uma carta do administrador com a determinaccedilatildeo de que seu filho de criaccedilatildeo Juacutelio Costa Ribeiro de 24 anos teria a circulaccedilatildeo no preacutedio limitada agrave lixeira e agrave caixa de correio Ela ficou indignada e resolveu procurar a 16 DP (Barra da Tijuca) que comeccedilou a investigar o caso

Juacutelio que mora haacute um ano no preacutedio contou que ateacute jaacute discutiu com o siacutendico

- E muito humilhante E muito triste tudo isso Natildeo queria estar vishyvendo essa situaccedilatildeo - disse o rapaz

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 243

Maria da Penha tambeacutem natildeo se conforma com o caso e natildeo tem duacuteshyvidas de que se trata de racismo

- Isso eacute evidente Natildeo concordo com issoO delegado que estaacute cuidando do caso intimou o siacutendico a depor Jaishy

me explicou que somente proibiu a circulaccedilatildeo do rapaz no preacutedio porque ele natildeo eacute morador e por isso natildeo poderia usufruir dos demais serviccedilos queo condomiacutenio manteacutem salvo se estivesse acompanhado da moradora

- Um siacutendico natildeo pode impedir um filho de criaccedilatildeo de um morador de ter acesso a todo o condomiacutenio disse a moradora que observou mais uma vez tratar-se de racismo

FontesPreacircmbulo da Constituiccedilatildeo Brasileira Noacutes representantes do povo brashysileiro reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democraacutetico destinado a assegurar o exerciacutecio dos direitos soshyciais e individuais a liberdade a seguranccedila o bem-estar o desenvolvishymento a igualdade e a justiccedila como valores supremos de uma sociedade fraterna pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional com a soluccedilatildeo paciacutefishyca das controveacutersias promulgamos sob a proteccedilatildeo de Deus a seguinte CONSTITUICcedilAtildeO DA REPUacuteBLICA FEDERATIVA DO BRASILArt 3deg IV da CRFB Constituem objetivos fundamentais da Repuacuteblica Federativa do Brasil promover o bem de todos sem preconceitos de origem raccedila sexo cor idade e quaisquer outras formas de discrimishynaccedilatildeoArt 20 da Lei 77161989 (Define os crimes resultantes de preconceito de raccedila ou de cor) Praticar induzir ou incitar a discriminaccedilatildeo ou preshyconceito de raccedila cor etnia religiatildeo ou procedecircncia nacional Art 1deg da Lei 74371985 (Lei Afonso Arinos) Constitui contravenccedilatildeo punida nos termos desta lei a praacutetica de atos resultantes de preconceito de raccedila de cor de sexo ou de estado civilArt 2deg da Lei 74371985 (Lei Afonso Arinos) Seraacute considerado agenshyte de contravenccedilatildeo o diretor gerente ou empregado do estabelecimento que incidir na praacutetica referida no artigo 1deg desta lei

Texto 10A estudante Liacutegia Lara Santos de 20 anos foi presa em 08 de marccedilo

de 2011 apoacutes confessar o assassinato do pai o pedreiro Lauro Joaquim da Silva de 48 anos Ela contou agrave poliacutecia que o pai se tornava agressivo quanshydo bebia e a ameaccedilava de morte

244 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

Disse ainda que cansada das agressotildees pediu ajuda ao namorado Ricardo Cardoso da Silva 18 anos com quem se relacionava haacute oito meshyses para se livrar do pai

A estudante que se mostrou calma durante todo o depoimento disse que o relacionamento familiar sempre foi ruim e que a matildee estaacute presa por traacutefico de drogas

O casal foi coincidentemente abordado pela poliacutecia porque os polishyciais suspeitaram de que os dois estivessem levando produto de roubo

O crime ocorreu por volta das 3h da manhatilde quando o pedreiro deshypois de passar a noite em um bar voltava para casa no bairro de Cangaiacuteba na Zona Leste de Satildeo Paulo Ao entrar foi surpreendido pela filha e o nashymorado Enquanto o rapaz segurava o pedreiro Liacutegia o atingiu com cerca de 30 facadas

O corpo foi amarrado com pedaccedilos de corda de varal Embrulhado em lenccediloacuteis cobertor tapete e saco plaacutestico preto e posto em um carrinho do tipo utilizado para transportar bagagem A ideia segundo a estudante era jogar o corpo num coacuterrego proacuteximo Antes de deixar a casa os criminosos ainda trocaram de roupa

Na rua a dupla foi abordada por policiais da 3a Companhia do 8deg Bashytalhatildeo da Poliacutecia Militar que desconfiaram de que o casal estivesse transshyportando mercadoria roubada Percebendo a aproximaccedilatildeo da PM Ricardo fugiu mas Liacutegia foi presa

FontesHomiciacutedio simples Alt 121 - Matar algueacutemPena - reclusatildeo de 6 (seis) a 20 (vinte) anosHomiciacutedio qualificado sect 2o - Se o homiciacutedio eacute cometidoI - mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpeII - por motivo fuacutetilIII - com emprego de veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comumIV - agrave traiccedilatildeo de emboscada ou mediante dissimulaccedilatildeo ou outro recurshyso que dificulte ou tome impossiacutevel a defesa do ofendidoV - para assegurar a execuccedilatildeo a ocultaccedilatildeo a impunidade ou vantagem de outro crimePena - reclusatildeo de 12 (doze) a 30 (trinta) anosExclusatildeo de ilicitude

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 245

Art 23 - Natildeo haacute crime quando o agente pratica o fatoI - em estado de necessidadeII - em legiacutetima defesaIII - em estrito cumprimento de dever legal ou no exerciacutecio regular dedireito

Texto 11Matildee diz que natildeo abandonou o menino que caiuMoradora do Barramares onde filho morreu em queda do 26deg andar

achou que ele seria vigiado pelo irmatildeo mais velhoO sono pesado de Fernando Moraes Juacutenior de 3 anos deu agrave matildee

dele Rosana Rosa Cavalcanti da Silva a certeza de que poderia ir sem problemas ateacute a farmaacutecia de propriedade da famiacutelia num pequeno shopping embaixo do apartamento onde mora no 26deg andar de um dos preacutedios do Condomiacutenio Barramares na Barra da Tijuca

Segundo Rosana contou a parentes mesmo assim pediu para o filho mais velho de 8 anos ficar em casa ateacute que ela voltasse Mas o menino recebeu um telefonema de um vizinho e saiu para jogar bola Fernando acordou sozinho abriu a porta do quarto e levou uma cadeira ateacute a varanshyda - que estava com a porta de correr aberta Fernando subiu na cadeira apoiou-se no parapeito sem grade desequilibrou-se e caiu de uma altura de pouco mais de 80 metros agraves 20h40m de 6 de maio de 1999 Ele morreu no local e foi enterrado no Cemiteacuterio Satildeo Joatildeo Batista em Botafogo

A matildee foi avisada e encaminhou-se para o local Em estado de choquc sentou e chorou ao lado do corpo do filho por mais de duas horas Segundo testemunhas antes de cair no chatildeo o corpo ainda bateu num coqueiro na frente do edifiacutecio o que amorteceu a queda e evitou que ele tivesse muitas escoriaccedilotildees O menino ainda teria respirado por alguns instantes mas natildeo resistiu Policiais militares cobriram o corpo com um plaacutestico preto

- Natildeo haacute duacutevidas de que foi uma fatalidade Ela sempre foi uma excelente matildee cuidadosa carinhosa com os filhos Natildeo foi negligecircncia - afirmou Gisela Moraes Zepeta irmatilde de Fernando Moraes pai do menino

A morte foi registrada na 16a DP (Barra) como fato a ser investigado O perito Antocircnio Carlos Alcoforado disse que encontrou uma cadeira na sacada do apartamento no 26deg andar Segundo ele o parapeito tinha 120 metros e soacute com a cadeira o menino poderia ter ultrapassado

O delegado titular disse que vai esperar alguns dias ateacute que a famiacutelia esteja mais tranquila para tomar os depoimentos Segundo ele caso seja

246 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

apurada negligecircncia na atenccedilatildeo ao menor o responsaacutevel poderaacute ser indiciashydo por homiciacutedio culposo

- Natildeo podemos poreacutem falar de um caso assim porque a famiacutelia jaacute estaacute sofrendo muito Temos que esperar pelas provas teacutecnicas - disse o delegado

Segundo Gisela Rosana contou que foi ateacute a Fannaacutecia Barramares 2000 que eacute administrada pelo marido Fernando pegar remeacutedios e um panfleto para fazer no computador de casa A matildee contou ainda que o menino estava cansashydo depois de brincar na creche que frequentava desde o iniacutecio do ano dentro do condomiacutenio Depois de tomar banho e jantar ele dormia profundamente segundo a matildee que aproveitou para descer Segundo Gisela Rosana teria deshymorado fora de casa cerca de cinco minutos ateacute o momento do acidente

FontesArt 133 do CP Abandonar pessoa que estaacute sob seu cuidado guarda vigilacircncia ou autoridade e por qualquer motivo incapaz de defender- -se dos riscos resultantes do abandonoPena - detenccedilatildeo de 6 (seis) meses a 3 (trecircs) anossect 1deg Se do abandono resulta lesatildeo corporal de natureza gravePena - reclusatildeo de 1 (um) a 5 (cinco) anossect 2deg Se resulta a mortePena - reclusatildeo de 4 (quatro) a 12 (doze) anosO instituto do perdatildeo judicial somente pode alcanccedilar o acusado que se mostrar suficientemente punido pelo sofrimento que o ato praticado causou na sua proacutepria vidaArt 121 sect 5deg do CP Na hipoacutetese de homiciacutedio culposo o juiz poderaacute deixar de aplicar a pena se as consequecircncias da infraccedilatildeo atingirem o proacuteprio agente de forma tatildeo grave que a sanccedilatildeo penal se torne desneshycessaacuteriaArt 107 IX do CP Extingue-se a punibilidade pelo perdatildeo judicial nos casos previstos em lei

Texto 12

Maitecirc ganha indenizaccedilatildeo da Shering

A induacutestria quiacutemica Schering do Brasil foi acionada judicialmente pela atriz Maitecirc Proenccedila que pediu oitocentos mil reais a tiacutetulo de indeshynizaccedilatildeo por danos morais De acordo com a accedilatildeo movida pela atriz ao promover o anticoncepcional Microvlar ela teve sua imagem profissional arranhada porque algumas carteias do produto natildeo continham o nuacutemero de piacutelulas discriminadas pela embalagem o que gerou diversas reclamaccedilotildees

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 247

O advogado de Maitecirc Paulo Ceacutesar Pinheiro Carneiro afirmou que o valor da indenizaccedilatildeo deve ser proporcional ao poder econocircmico do ofen- sor ldquo O laboratoacuterio faturava mensalmente R$ 16 milhatildeo com a venda dos anticoncepcionais Acho que a metade disso seria um valor razoaacutevel a ser pagordquo

Jaacute o advogado da Schering Cid Scartezzine Filho qualificou como absurdo o valor do pedido Para ele natildeo houve qualquer tipo de abalo agrave imagem da autora ldquo Ela apenas aparecia anunciando a nova embalagem do produto e o fato de ter havido problemas com algumas carteias do Microvlar natildeo justificaria uma accedilatildeo judicial por parte da atrizrdquo disse

Vale lembrar que a atriz participou da campanha publicitaacuteria para resgatar o confianccedila das mulheres no anticoncepcional Microvlar cujas vendas despencaram depois da denuacutencia de que muitos comprimidos coloshycados agrave venda no mercado eram feitos de farinha de trigo

A campanha publicitaacuteria deveria ser veiculada por trecircs meses mas acabou sendo retirada do ar porque novas irregularidades foram descobershytas

Aleacutem da indenizaccedilatildeo o advogado pediu que o laboratoacuterio fizesse uma retrataccedilatildeo puacuteblica pois a empresa reacute escolheu a autora jaacute que ela tinha reputaccedilatildeo seriedade e simpatia junto ao puacuteblico feminino

FontesArt 927 do CC Aquele que por ato iliacutecito (art 186 e 187) causar dano a outrem fica obrigado a reparaacute-loParaacutegrafo uacutenico Flaveraacute obrigaccedilatildeo de reparar o dano independenteshymente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureshyza risco para os direitos de outremArt 186 Aquele que por accedilatildeo ou omissatildeo voluntaacuteria negligecircncia ou imprudecircncia violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusishyvamente moral comete ato iliacutecitoArt 187 Tambeacutem comete ato iliacutecito o titular de um direito que ao exercecirc- -lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econocircmico ou social pela boa-feacute ou pelos bons costumesArt 5deg X da CRFB Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros resishydentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdashyde agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito a indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

248 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Texto 13Fumante desde os 13 anos Joatildeo Jorge teve o cacircncer detectado em

2009 e hoje estaacute aposentado por invalidez Os laudos de dois dos maiores especialistas de Alagoas o cardiologista Joseacute Wanderley Neto (pioneiro de transplantes no Estado) e a pneumologista e oncologista Andreacutea Albuquershyque atestam que o cacircncer foi causado pelo tabagismo

O autor pediu tutela antecipada para que a reacute fosse condenada a cusshytear o tratamento do autor Apresentou provas teacutecnicas laudos meacutedicos e dados da Organizaccedilatildeo Mundial de Sauacutede (OM S) e do Instituto Brasileishyro de Geografia e Estatiacutestica (IBG E) que comprovam que o cigarro mata mais que a Aids cocaiacutena aacutelcool suiciacutedio e tracircnsito juntos

Joatildeo Jorge que faz quimioterapia na Santa Casa de Misericoacuterdia de Maceioacute disse que tentou parar de fumar diversas vezes mas natildeo conseshyguiu Na accedilatildeo ele quer que a Souza Cruz lhe pague indenizaccedilatildeo de R$ 3 milhotildees por danos materiais e fiacutesicos e R$ 15 milhatildeo por danos morais

FontesArt 6degdo CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor I mdash a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no forshynecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivosIII mdash Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a informaccedilatildeo adequada e clashyra sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem V I mdash a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosArt 8deg do CDC Os produtos e serviccedilos colocados no mercado de conshysumo natildeo acarretaratildeo riscos agrave sauacutede ou seguranccedila dos consumidores exceto os considerados normais e previsiacuteveis em decorrecircncia de sua natureza e fruiccedilatildeo obrigando-se os fornecedores em qualquer hipoacutetese a dar as informaccedilotildees necessaacuterias e adequadas a seu respeitoDoutrina e Jurisprudecircncia dentre as decisotildees favoraacuteveis ou parcialmente favoraacuteveis em I a instacircncia (jurisprudecircncia) tem-se (1) R$ 1 milhatildeo o valor da indenizaccedilatildeo a tiacutetulo de danos morais agrave viacutetima (TJMG) (2) R$ 600 mil agrave viacutetima a tiacutetulo de danos morais e mais danos materiais e lucros cessantes a serem apurados em liquidaccedilatildeo de sentenccedila (TJSP) (3) RS 500 mil a tiacutetulo de danos morais agrave viacutetima posteriormente substituiacuteda pelos herdeiros em razatildeo do seu falecimento (TJPR) (4) condenaccedilatildeo em R$ 500 mil agrave viacutetima a tiacutetulo de danos morais (TJRS) (5) R$ 13 mil a tiacutetulo de danos morais pela morte de esposa (TJRJ) (6) condenaccedilatildeo da Souza Cruz e da Philip Morris por danos materiais e morais coletivos aleacutem do dever de informar correshytamente nas embalagens e publicidade (TJSP) A uacuteltima sentenccedila indicada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 249

diz respeito agrave uacutenica accedilatildeo coletiva do universo pesquisado a accedilatildeo intentada pela ADESF em 2004 cujo recurso foi apreciado pelo TJSP no periacuteodo de abrangecircncia da pesquisa No Tribunal Paulista a sentenccedila foi anulada

Texto 14Trata-se de indenizaccedilatildeo por danos morais de EVATERESIN H A S IL shy

VA DA ROSA em face de M ANZOLI SA INDUacuteSTRIA E COMEacuteRCIO A violaccedilatildeo da imagem ocorreu na loja Manlec n 12 Rio Grande do Sul no dia 16 de fevereiro do ano de 2011

Alega a autora que esteve em uma das lojas da empresa requerida na ocasiatildeo em que comprou uma televisatildeo marca Baysinic aleacutem de outros objetos No mesmo dia foi filmada de forma imperceptiacutevel e depois sua imagem passou a aparecer diariamente com destaque entre outras pessoas na RBS canal 12 em propaganda promocional da loja Por um periacuteodo de trinta dias a gravaccedilatildeo produzida era transmitida em sua velocidade normal e depois passou a ser apresentada com maior velocidade o que tomou as cenas jocosas Tudo acontecendo muito rapidamente fez com que os gesshytos e o caminhar das pessoas tornassem-se caricatos Aduziu a requerente que aleacutem da exploraccedilatildeo clandestina de sua imagem a demandante passou a enfrentar o ridiacuteculo da gozaccedilatildeo de pessoas suas conhecidas e dos colegas da reparticcedilatildeo puacuteblica onde trabalha

Carlos Alberto Correcirca Machado colega da autora no Hospital Sanshyta Casa ouviu de sua esposa que Eva estava aparecendo na televisatildeo por diversas vezes entre a novela das sete e a novela das oito e teve curiosishydade assistiu ao comercial umas duas ou trecircs vezes e efetivamente viu Eva carregando uma caixa de televisatildeo O depoente soacute assistiu aos colegas brincarem com Eva dizendo que ela estava famosa Jaqueline Camargo Domingues relatou que tambeacutem foi colega da autora na Santa Casa e tem certeza que viu a propaganda no horaacuterio das novelas e que natildeo era reporshytagem jornaliacutestica era propaganda mesmo Jaqueline tem certeza porque chegava ao serviccedilo e todos os dias ldquomexiamrdquo com ela chamando-a de gashyrota propaganda da Manlec e ateacute chegou a dizer que parecia uma louquinha correndo com aquela caixa Na Santa Casa eram gerais as brincadeiras com ela todos dizendo que a viram na televisatildeo

FontesArt 6deg do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidorIV - a proteccedilatildeo contra a publicidade enganosa e abusiva meacutetodos coshymerciais coercitivos ou desleais bem como contra praacuteticas e claacuteusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviccedilos

250 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

VI - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosAlt 5deg V da CRFB eacute assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo aleacutem da indenizaccedilatildeo por dano material moral ou agrave imagem Art 5deg X da CRFB satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito a indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeoArt 5deg X X V III da CRFB satildeo assegurados nos termos da lei a) a proteccedilatildeo agraves participaccedilotildees individuais em obras coletivas e agrave reshyproduccedilatildeo da imagem e voz humanas inclusive nas atividades desporshytivas

Texto 15Trata-se de negativaccedilatildeo indevida do nome de conhecida senhora da

sociedade carioca Marininha Cavalcante Pessoa Jordatildeo residente em Te- resoacutepolis Rio de Janeiro

Ao tentar renovar contrato de creacutedito de cheque especial junto ao Banco no qual titulariza conta-corrente em dezessete de julho do ano de mil novecentos e noventa e sete foi surpreendida diante da negativa do Banco em fazecirc-lo sob o argumento de que seu nome encontrava-se inscrito em cadastro de inadimplentes (SER AS A) bem como havia um tiacutetulo proshytestado em funccedilatildeo da devoluccedilatildeo de cheque por insuficiecircncia de fundos

A senhora Jordatildeo desconhecia tais fatos e ao proceder agrave investigaccedilatildeo junto agrave empresa Argentina Veiacuteculos terminou por descobrir que terceira pessoa de nome diverso do seu havia utilizado o nuacutemero de seu CPF para adquirir um veiacuteculo junto agrave citada concessionaacuteria mediante financiamento concedido pela financeira Financial Now ao qual inadimpliu gerando o protesto do tiacutetulo e a inscriccedilatildeo do CPF da senhora Marininha em oacutergatildeo de restriccedilatildeo ao creacutedito

Apoacutes inuacutemeras tentativas junto agrave concessionaacuteria de veiacuteculos para que retirasse a restriccedilatildeo de seu nome bem como suspendesse o protesto do tiacutetulo sem sucesso terminou por recorrer ao judiciaacuterio pleiteando a exclusatildeo de tais restriccedilotildees bem como indenizaccedilatildeo por danos morais em virtude dos constrangimentos experimentados ante a negativa de creacutedito e aos aborrecimentos gerados

FontesArt 17 do CDC Para os efeitos desta Seccedilatildeo equiparam-se aos consushymidores todas as viacutetimas do evento

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 251

Art 6deg I do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no forshynecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivos Art 6deg V III do CDC a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossufi- ciente segundo as regras ordinaacuterias de experiecircncias

Texto 16Trata-se do caso de acusaccedilatildeo de injuacuteria com ofensa agrave dignidade e ao

decoro em face da loja Mappin localizada no bairro paulistano do Itaim em Satildeo Paulo As viacutetimas foram identificadas como Acircngela de Moraes 25 anos Andreacutea de Moraes 28 anos irmatildes e jogadoras profissionais de vocirclei e Zilma de Moraes 57 anos matildee das moccedilas O fato ocorreu no dia 13 de outubro de 2011 agrave tarde na loja Mappin localizada em Itaim Satildeo Paulo

Zilma e suas duas filhas Angela e Andreacutea foram agrave loja Mappin fazer compras Ao entrarem no provador feminino da loja as jogadoras foram confundidas com travestis por Nilda vendedora encarregada de vigiar o provador que chamou o departamento de seguranccedila do estabelecimento

Com o acionamento da vendedora Flaacutevio um dos seguranccedilas foi verificaro que estava acontecendo e ele causou um mal entendido ao afirmar para Zilma matildee das atletas que as duas pessoas que estavam no provador eram travestis

Ao perceberem o que estava acontecendo Angela natildeo teve reaccedilatildeo por causa do seu nervosismo poreacutem Andreacutea pegou seu telefone celular e ligou para a advogada Therezinha da Silva Carvalho

A matildee e as duas atletas saiacuteram do estabelecimento e foram para uma delegacia de poliacutecia registrar queixa para abertura de inqueacuterito

Segundo Nilda vendedora encarregada de vigiar o provador ela soacute chamou a seguranccedila porque imaginou que as duas irmatildes devido as suas musculaturas fossem travestis

A referida funcionaacuteria alegou mais tarde que foi alertada da presenccedila dos supostos travestis por uma cliente que tambeacutem estava no provador

A advogada das jogadoras de vocirclei iraacute mover uma accedilatildeo por violaccedilatildeo do artigo 140 do Coacutedigo Penal que caracteriza a injuacuteria com ofensa agrave dignidade e ao decoro e moveraacute tambeacutem uma accedilatildeo indenizatoacuteria por danos morais

FontesArt 140 - Injuriar algueacutem ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro Pena - detenccedilatildeo de um a seis meses ou multa

252 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Art 6deg VI do CDC satildeo direitos baacutesicos do consumidor a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusos

Texto 17Trata-se do caso de agressatildeo moral sofrida por Manoela Henriques

59 anos brasileira viuacuteva residente na Rua Visconde de Pirajaacute 1565 apto 601 Ipanema Rio de Janeiro O acusado eacute Gerald Thomas diretor de teashytro O fato aconteceu em agosto de dois mil e trecircs no dia da estreia da peccedila ldquo Tristatildeo e Isoldardquo no Teatro Municipal Rio de Janeiro

Durante a apresentaccedilatildeo a peccedila foi vaiada pelo puacuteblico O diretor enshytatildeo subiu ao palco e repentinamente virou de costas para a plateia e abaixou as calccedilas exibindo as naacutedegas No final do uacuteltimo ato houve mais vaias Vaacuterias reportagens e artigos sobre o assunto foram publicados na miacutedia

Fernando Costa e Manoela Henriques espectadores afirmaram que o ato foi uma agressatildeo a todos os presentes no teatro

Aureacutelia Barroso soprano por sua vez declarou que todo o elenco foi submetido a constrangimento e que ao contraacuterio do que disse o acusado o ato natildeo fazia parte do espetaacuteculo e nunca foi ensaiado

Manoela Henriques entrou na Justiccedila com pedido de Indenizaccedilatildeo por Dano Moral com base na lei do consumidor

FontesArt 6deg Satildeo direitos baacutesicos do consumidorI - a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no fornecimento de produtos e serviccedilos considerados perishygosos ou nocivosIII - a informaccedilatildeo adequada e clara sobre os diferentes produtos e servishyccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composishyccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentemV I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosV III - a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossuficiente segunshydo as regras ordinaacuterias de experiecircncias

Texto 18No dia 15032012 aproximadamente agraves 16 horas o Requerente dishy

rigindo o seu veiacuteculo marca Gol ano 2010 Placa ABC 1234 pela Rua das

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 253

Ameacutelias sentido Barra-Recreio agrave altura da Empresa Gigante foi abalroado pelo veiacuteculo marca Palio placa ZYW8910 certificado em nome da primeishyra Requerida e dirigido pelo segundo e que seguia no sentido contraacuterio

Conforme croquis e Boletim de Ocorrecircncias inclusos o veiacuteculo dos Requeridos ao tentar ultrapassar um carro parado na pista invadiu a pista contraacuteria vindo a abalroar o veiacuteculo do Requerente que vinha em sua matildeo de direccedilatildeo e teve a sua lateral esquerda danificada sendo posteriormente jogado agrave direita do acostamento causando ferimentos no condutor e danos materiais de grande monta no veiacuteculo do uacuteltimo conforme foto anexa

Os croquis do local do acidente demonstram claramente que o ponto de impacto ocorreu na matildeo de direccedilatildeo do veiacuteculo do Requerente

O fato referido ocasionou um prejuiacutezo para o Requerente na ordem de R$ 2300000 (vinte e trecircs mil reais) perda total conforme orccedilamentos e notas anexos cujo pagamento ora eacute cobrado

FontesArt 927 do CC Aquele que por ato iliacutecito (art 186 e 187) causar dano a outrem fica obrigado a reparaacute-loParaacutegrafo uacutenico Haveraacute obrigaccedilatildeo de reparar o dano independenteshymente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureshyza risco para os direitos de outremArt 186 do CC Aquele que por accedilatildeo ou omissatildeo voluntaacuteria negligecircnshycia ou imprudecircncia violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusivamente moral comete ato iliacutecitoArt 187 do CC Tambeacutem comete ato iliacutecito o titular de um direito que ao exercecirc-lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econocircmico ou social pela boa-feacute ou pelos bons costumesArt 175 Inciso II do RCNT ldquo Eacute dever de todo condutor de veiacuteculo conservar o veiacuteculo na matildeo de direccedilatildeo e na faixa proacutepriardquo Art 181 V I e XV I do RCTN ldquo Eacute proibido a todo condutor de veiacuteculoV I - Transitar pela contramatildeo dc direccedilatildeoX V I - Transitar em velocidade superior agrave permitida para localrdquo

Texto 19Maria Guilhermina Dias foi lanchar no dia 23 de fevereiro na lanshy

chonete Coma Bem em Bonsucesso A jovem de 25 anos disse que levou o maior susto quando viu uma barata grudada no patildeo do hambuacuterguer Fishycou com muito nojo e repugnacircncia porque jaacute tinha inclusive comeccedilado a

254 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

comer seu lanche Afirmou que procurou o gerente da loja para reclamar Como nada foi feito tirou uma foto e recorreu agrave justiccedila

Guilhermina destacou na Inicial que houve tambeacutem ldquo violaccedilatildeo ao princiacutepio da confianccedila outro norte a ser perseguido nas relaccedilotildees de consushymordquo No pedido alegou que tal situaccedilatildeo criou um grande constrangimento de natureza moral

O Coma Bem alegou que o Juizado natildeo poderia processar a questatildeo porque era necessaacuteria prova pericial e que tal requisito se toma incompashytiacutevel com a Lei 90991995 que dispotildee sobre a competecircncia dos Juizados Especiais Ciacuteveis e Criminais

O reacuteu sustentou ainda que natildeo existe a menor possibilidade de haver qualquer tipo de corpo estranho nos lanches da empresa e que natildeo haacute que se falar em qualquer tipo de indenizaccedilatildeo

FontesArt 6deg do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor 1 - a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no fornecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivos III - Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a informaccedilatildeo adeshyquada e clara sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especifishycaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem V I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo dc danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosArt 8deg do CDC Os produtos e serviccedilos colocados no mercado de consumo natildeo acarretaratildeo riscos agrave sauacutede ou seguranccedila dos consumishydores exceto os considerados normais e previsiacuteveis em decorrecircncia de sua natureza e fruiccedilatildeo obrigando-se os fornecedores em qualshyquer hipoacutetese a dar as informaccedilotildees necessaacuterias e adequadas a seu respeito

Texto 20Eduardo e Mocircnica estavam casados haacute quase trecircs anos No iniacutecio

do casamento Mocircnica adotou como meacutetodo contraceptivo o uso de piacutelushylas mas problemas de natureza hormonal e vascular levaram a mulher a procurar um meacutedico que a aconselhou a adotar outras formas de evitar a gravidez Sugeriu que o casal fizesse uso de preservativos

Pensando na sauacutede e no bem-estar da mulher Eduardo natildeo se opocircs agrave utilizaccedilatildeo do preservativo ainda que segundo afirmou na eacutepoca natildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 255

gostasse muito da ideia de continuar a usar preservativos mesmo depois de casado

A partir de entatildeo o casal passou a adquirir regularmente camisinhas da empresa Johnson e Johnson Induacutestria e Comeacutercio Ltda O produto comshyprado foi Jontex lubrificado adquirido na Farmaacutecia Vida Longa Em 20 de abril de 2007 durante uma relaccedilatildeo sexual a camisinha rompeu e cerca de quarenta dias depois Mocircnica descobriu que estava graacutevida

O casal ajuizou accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por danos morais e pedido de pensatildeo mensal pelo periacuteodo de 20 anos em face da empresa sob a alegaccedilatildeo de que o produto que utilizava apresentou defeito e isso trouxe graves alterashyccedilotildees na dinacircmica conjugal bem como desistecircncia de seus sonhos Mocircnica e Eduardo juntavam dinheiro para a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria e faziam um curshyso de poacutes-graduaccedilatildeo visando melhora salarial e aprimoramento profissional Segundo os autores todos esses projetos foram desfeitos de uma soacute vez

ldquoNatildeo eacute que natildeo quiseacutessemos filhos mas somente pensaacutevamos nisso a daqui uns cinco ou sete anos ateacute laacute muita coisa precisava ser preparada Natildeo sei como vamos nos virarrdquo disse Mocircnica

A empresa em contestaccedilatildeo afirmou que a gravidez de uma mulher casada em decorrecircncia do rompimento do preservativo durante a relaccedilatildeo sexual enquadra-se nos limites do perigo assumido ao utilizar como meacutetoshydo contraceptivo ldquoum produto que natildeo eacute cem por cento eficazrdquo

O InmetroRS o InmetroRJ a Cientec o Instituto Nacional de Tecshynologia a Fundaccedilatildeo Carlos Vanzolini o instituto Falcatildeo Bauer de Qualishydade e o Instituto Betontec de Avaliaccedilatildeo da Conformidade informaram natildeo ser possiacutevel a realizaccedilatildeo da periacutecia em preservativo jaacute utilizado

A fabricante apontou ainda que ldquo outras questotildees podem interferir diretamente no desempenho da camisinha a experiecircncia do usuaacuterio no uso de preservativo tempo e tipo de relaccedilatildeo sexual e tamanho do pecircnisrdquo

FontesDe acordo com o advogado Marcos Rosembauer o rompimento de camishysinhas eacute ldquocaso fortuito que exclui a responsabilidade do fabricanterdquoArt 393 CC O devedor natildeo responde pelos prejuiacutezos resultantes de caso fortuito ou forccedila maior se expressamente natildeo se houver por eles responsabilizadoParaacutegrafo uacutenico O caso fortuito ou de forccedila maior verifica-se no fato necessaacuterio cujos efeitos natildeo era possiacutevel evitar ou impedirEm caso anaacutelogo a Juiacuteza da 2a Vara Ciacutevel de Porto Alegre dispocircs que ldquo em situaccedilotildees como essa o risco eacute inerente ao produto tomando-se impossiacutevel

256 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

falar em responsabilidade decorrente da falta de informaccedilatildeo porquanto a proacutepria bula traz as informaccedilotildees razatildeo pela qual fica claro que a situaccedilatildeo narrada pelos autores caracteriza-se como caso fortuitordquo 0 Desembargador Pedro Kretzmann admitiu que ldquo sendo a reacute a fabricanshyte do produto objeto da presente controveacutersia e os autores destinataacuterios finais do bem a relaccedilatildeo havida entre as partes se amolda ao conceito de relaccedilatildeo de consumo estando sujeita pois agrave tutela especial do sistema consumeristardquo O Magistrado defendeu tambeacutem que em casos de romshypimento de camisinha ldquo a responsabilidade da empresa ante a alegaccedilatildeo de viacutecio do produto eacute objetiva bastando a comprovaccedilatildeo do dano e do nexo de causalidade natildeo se discutindo sequer a culpardquo Art 12 CDC o fabricante o produtor o construtor nacional ou estranshygeiro e o importador respondem independentemente da existecircncia de culpa pela reparaccedilatildeo dos danos causados aos consumidores por defei-

tos decorrentes de projeto fabricaccedilatildeo construccedilatildeo montagem foacutermushylas manipulaccedilatildeo apresentaccedilatildeo ou acondicionamento de seus produtos bem como por informaccedilotildees insuficientes ou inadequadas sobre sua utishylizaccedilatildeo e riscossect I o O produto eacute defeituoso quando natildeo oferece a seguranccedila que dele legitimamente se espera levando-se em consideraccedilatildeo as circunstacircncias relevantes entre as quais1 - sua apresentaccedilatildeol l- o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperamIII - a eacutepoca em que foi colocada em circulaccedilatildeoArt 6deg CDC satildeo direitos baacutesicos do consumidorV I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosV III - a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossuficiente segunshydo as regras ordinaacuterias de experiecircncia

Texto 21 Cuidado com o e-mailCarolina BrigidoUma decisatildeo ineacutedita do Tribunal Superior do Trabalho (TST) estabeshy

leceu que o patratildeo tem o direito de fiscalizar mensagens enviadas e recebishydas pela caixa de correio eletrocircnico que a empresa oferece ao funcionaacuterio desde que ldquode forma moderada generalizada e impessoalrdquo O procedimenshyto foi autorizado como meacutetodo de obtenccedilatildeo de provas para justificar uma

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 257

demissatildeo feita pela HSBC Seguros Brasil S A A partir do rastreamento do e-mail de um funcionaacuterio descobriu-se que um dos integrantes da filial de Brasiacutelia utilizava o correio corporativo para fins pornograacuteficos

O empregado costumava enviar aos colegas fotos de mulheres nuas Em sua defesa alegou que ao rastrear o e-mail a empresa violou sua inshytimidade e privacidade Tambeacutem argumentou que a prova para justificar sua demissatildeo foi obtida de forma iliacutecita Os motivos natildeo foram aceitos peshylos magistrados Por unanimidade a Primeira Turma do TST decidiu que como o equipamento e a tecnologia foram entregues pela empresa para fins de trabalho natildeo seria permitida a utilizaccedilatildeo pessoal

ldquoNatildeo haveria qualquer intimidade a ser preservada posto que o e-mail natildeo poderia ser utilizado para fins particularesrdquo explicou o relator do caso ministro Joatildeo Oreste Dalazen

Ele esclareceu ainda que a senha para acesso ao sistema natildeo pode ser interpretada como uma forma de proteccedilatildeo para evitar que o empregador tenha acesso ao conteuacutedo das mensagens como argumentou o empregado demitido Segundo o magistrado a senha serve apenas para que o empreshygador evite o acesso de terceiros agraves informaccedilotildees da empresa

O funcionaacuterio foi demitido em maio de 2000 e chegou a conseguir a anulaccedilatildeo da justa causa em primeira instacircncia alegando a garantia constishytucional de inviolabilidade da correspondecircncia O trabalhador conseguiu o direito de receber a multa rescisoacuteria No entanto a seguradora recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Distrito Federal e saiu vitoriosa O TST manteve essa decisatildeo - que pode ainda ser contestada no plenaacuterio do proacuteprio TST e no Supremo Tribunal Federal (STF)

No Brasil assim que foram instituiacutedos os e-mails corporativos os juizes consideravam as mensagens dos funcionaacuterios inviolaacuteveis Julgavam os casos por analogia agrave inviolabilidade das correspondecircncias Nos uacuteltimos anos esse entendimento foi modificado pelos tribunais trabalhistas estashyduais Ontem foi a primeira vez que o TST analisou o assunto A decisatildeo serviraacute de paracircmetro para outras accedilotildees semelhantes

Dalazen enfatizou que os direitos do cidadatildeo agrave privacidade e ao sigilo de correspondecircncia assegurados pela Constituiccedilatildeo Federal dizem respeito apenas agrave comunicaccedilatildeo estritamente pessoal e natildeo agraves mensagens enviadas e recebidas em nome da empresa A opiniatildeo eacute a mesma de um ministro do STF consultado pelo Globo

- A situaccedilatildeo eacute ambiacutegua mas eacute muito difiacutecil configurar a quebra da privacidade porque o trabalhador estava usando um bem da empresa para fins diferentes do trabalho

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O advogado Renato Opice Blum especialista em direito eletrocircnico concordou com a decisatildeo do TST Ele disse que conforme o artigo 932 do Coacutedigo Civil os atos do empregado durante sua jornada de trabalho podem gerar responsabilidade conjunta da empresa Portanto se um trabalhador envia um e-mail ofensivo a empresa tambeacutem pode ser responsabilizada

A advogada Nadia Demoliner Lacerda especialista em direito do trabalho tambeacutem concordou com a decisatildeo do TST Poreacutem ela ponderou que como natildeo existe legislaccedilatildeo para disciplinar o tema seria saudaacutevel que as empresas deixassem claro ao admitir um funcionaacuterio que podem rastrear o e-mail corporativo

A Forccedila Sindical poreacutem discordou dos especialistas Em nota a enshytidade repudiou a decisatildeo do TST e considerou a permissatildeo agraves empresas ldquo uma agressatildeo agrave liberdade individual que guardadas as devidas proporshyccedilotildees eacute semelhante agrave revista iacutentima feita pelo empregador no horaacuterio de saiacuteda dos funcionaacuteriosrdquo

Segundo o secretaacuterio nacional de Comunicaccedilatildeo da Central Uacutenica dos Trabalhadores (CUT) Antonio Carlos Spis a entidade eacute contra o rastrea- mento indiscriminado pelas empresas dos e-mails de seus funcionaacuterios

- As empresas podem desviar esse tipo de rastreamento para uma vigilacircncia de caraacuteter ideoloacutegico

BIBLIOGRAFIA

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ccedilatildeo inicial Satildeo Paulo Saraiva 2009CARNELUTTI Francesco A prova civil Trad Lisa Party Scarpa 4 ed Campinas

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2002XAVIER R C Portuguecircs no Direito 9 ed Rio de Janeiro Forense 1991ZVEITER Seacutergio ldquo Entrevistardquo In O Globo Rio de Janeiro 05 de marccedilo de 1992

I

ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Da Teoria agrave Praacutetica

Esta obra destina-se a todos aqueles que desejam por meio da argumentaccedilatildeo juriacutedica alcanccedilar a adesatildeo do auditoacuterio agrave sua tese Para tal eacute importante que se compreenda em que contexto espacial e temporal identificou-se a necessidade de uma Teoria da ArgumentaccedilatildeoOs elementos constitutivos da argumentaccedilatildeo juriacutedica estatildeo didaticamente apresentados seguindo uma sequecircncia que fornece uma estrutura soacutelida agrave produccedilatildeo textualCasos concretos peccedilas processuais e esquemas satildeo uma constante em toda a obra permitindo uma compreensatildeo precisa do conteuacutedo abordado e o acesso agrave realidade de onde surgem os conflitos que exigem valoraccedilatildeo e soluccedilatildeo juriacutedica Por fim exerciacutecios com sugestatildeo de correccedilatildeo estatildeo ao alcance do leitor a fim de que tenha a oportunidade de fixar o conhecimento mediante a praacutetica

LICcedilOtildeES DE

Com base nas novas molduras e demandas que circunscrevem a complexidade da escrita e da argumentaccedilatildeo dos profissionais da aacuterea juriacutedica um novo (re)encontro com a teoria da argumentaccedilatildeo eacute fundamentalSabendo das especificidades da produccedilatildeo de peccedilas processuais os autores reapresentam aqui a teoria da argumentaccedilatildeo de maneira didaacutetica acessiacutevelNessa perspectiva parabenizo os autores por mais este livro que daacute continuidade agraves Liccedilotildees de gramaacutetica aplicadas ao texto juriacutedico por estabelecerem outro acordo com o estudo da produccedilatildeo dos textos juriacutedicos com vistas a uma dinamizaccedilatildeo de suas orientaccedilotildees e prescriccedilotildees de modo a tornar a redaccedilatildeo do texto juriacutedico mais consistente e em conformidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito que pressupotildee aleacutem da capacitaccedilatildeo teacutecnica a habilidade de tornar comunicaacutevel a sua accedilatildeo profissional

Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho

Page 3: LIÇÕES DE ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA...1« oi ia e Prática da Narrativa Jurídica, Teoria e Prática da Argumentação luririica e Teoria e Prática da Redação Jurídica, no curso

LICcedilOtildeES DEARGUMENTACcedilAtildeOJURIacuteDICADa Teoria agrave Praacutetica

abdr^iacutejireito si(ora

GrupoEditorial ---------------------------------------------------------------------------------------------Nacional

0 GEN | Grupo Editorial Nacional reuacutene as editoras Guanabara Koogan Santos Roca AC Farmacecircutica Forense Meacutetodo LTC EPU e Forense Universitaacuteria que publicam nas aacutereas cientiacutefica teacutecnica e profissional

Essas empresas respeitadas no mercado editorial construiacuteram cataacutelogos inigualaacuteveis laquoltgtin obras que tecircm sido decisivas na formaccedilatildeo acadecircmica e no aperfeiccediloamento de v 1 1 iin I1oraccedilotildees de profissionais e de estudantes de Administraccedilatildeo Direito Enferma- (raquo1 ui I Hfeu liaria Fisioterapia Medicina Odontologia Educaccedilatildeo Fiacutesica e muitas outras igt iilt ir luido se tornado sinocircnimo de seriedade e respeito

v io eacute prover o melhor conteuacutedo cientiacutefico e distribuiacute-lo de maneira flexiacutevel e1 nurim iiic i preccedilos justos gerando benefiacutecios e servindo a autores docentes livrei- III Iiiik ioiiii ios colaboradores e acionistas

I Jovo comportamento oacutetico incondicional e nossa responsabilidade social e ambiental ugt iclorccedilados pela natureza educacional de nossa atividade sem comprometer o cres- i imento contiacutenuo e a rentabilidade do grupo

Alda da Graccedila Marques Valverde Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner

Nelson Carlos Tavares Junior

LICcedilOtildeES DEARGUMENTACcedilAtildeOJURIacuteDICADa Teoria agrave Praacutetica

CoordenadoraNeacuteli Luiza Cavalieri Fetzner

2o ediccedilatildeorevista atualizada

e ampliada

Rio de Janeiro

OCc 33amp33

A EDITORA FORENSE se responsabiliza pelos viacutecios do produto no que concerne agrave sua ediccedilatildeo aiacute compreendidas a impressatildeo e a apresentaccedilatildeo a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseaacute-lo e lecirc-lo Os viacutecios relacionados atilde atualizaccedilatildeo da obra aos conceitos doutrinaacuterios agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas e referecircncias indevidas satildeo de responsabilidade do autor eou atualizadorAs reclamaccedilotildees devem ser feitas ateacute noventa dias a partir da compra e venda com nota fiscal (interpretaccedilatildeo do art 26 da Lei n 8078 de 11091990)

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O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida divulgada ou de qualquer forma utilizada poderaacute requerer a apreensatildeo dos exemplares reproduzidos ou a suspensatildeo da divulgaccedilatildeo sem prejuiacutezo da indenizaccedilatildeo cabiacutevel (art 102 da Lei n 9610 de 19021998)Quem vender expuser agrave venda ocultar adquirir distribuir tiver em depoacutesito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude com a finalidade de vender obter ganho vantagem proveito lucro direto ou indireto para si ou para outrem seraacute solidariamente responsaacutevel com o contrafator nos termos dos artigos precedentes respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reproduccedilatildeo no exterior (art 104 da Lei n 961098)

Liccedilotildees de argumentaccedilatildeo juriacutedica da teoria agrave praacutetica coordenadora Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner autores Alda da Graccedila Marques Valverde Neacuteli Luiza Cavalieri Fetzner Nelson Carlos Tavares Junior - Rio de Janeiro Forense 2013

Inclui bibliografia ISBN 978-85-309-4538-1

1 Direito - Linguagem 2 Linguagem e loacutegica 3 Redaccedilatildeo forense 4 Praacutetica forense I Fetzner Neacuteli Luiza Cavalieri 1948- II Valverde Alda da Graccedila Marques III Tavares Junior Nelson Carlos 1977-

07-3431 CDD 34014

Capa Danilo Oliveira2-WAuml-7A)3

L679

CDU 340113

COORDENADORA E AUTORA

Neacuteli Luiz Cavalieri Fetzner eacute mestre em Educaccedilatildeo pela Universidade I iraquocio de Saacute Doutoranda em Anaacutelise de Discurso Psicopedagoga Ex- holessora da PUC Professora da Escola da Magistratura do Estado do

llt Kgt (Ir Janeiro (EM ER J) Coordenadora de Metodologia da Pesquisa e Di-bull Lii ii i da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro (EM ER J) Orientadora ltI pesquisas cientiacuteficas na UNES e na EM ER J Coordenadora de Oficinas I- I citura para professores do curso de Direito na Universidade Estaacutecio de -i I -professora do ensino meacutedio e de vestibular na rede particular de en- iiio I lx-professora do Curso de Letras da UNESA Membro da Comissatildeo

Ir Oiialiiacuteicaccedilatildeo e Apoio Didaacutetico-Pedagoacutegico na Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Coordenadora-geral e Professora Titular das disciplinas 1laquo oi ia e Praacutetica da Narrativa Juriacutedica Teoria e Praacutetica da Argumentaccedilatildeo luririica e Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica no curso de Direito daI NI SA Possui artigos publicados em revistas juriacutedicas e eletrocircnicas so- Ihv Anaacutelise de Discurso Liacutengua Portuguesa Teorias da Interpretaccedilatildeo e Ar- rumentaccedilatildeo Juriacutedica E autora de vaacuterias obras de Liacutengua Portuguesa e de Ifoi ii da Argumentaccedilatildeo Juriacutedica

1

AUTORES

A Ida da Graccedila Marques Valverde Graduada e licenciada em Letras I In I inivcrsidade Santa Uacutersula (USU) Especialista em Liacutengua Portuguesa I l i I Inivorsidade do Estado do Rio de Janeiro (U ER J) Mestre em Liacutengua li Iiipursn pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Ex-coordenadorabull I I iiipua Portuguesa do Coleacutegio Santa Rosa de Lima Ex-professora do tniMiio limdamental do Coleacutegio Santo Amaro Ex-corretora das bancas de s IiluI n da Universidade Federal do Rio de Janeiro (U FR J) e da Univer- nldiulr do Rio de Janeiro (UN IRIO ) Professora de Portuguecircs Juriacutedico daI bull I iacutei da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J) Professorabull In bull uio dc Direito da Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) onde lecionabull bull lifit iplinas de Teoria e Praacutetica da Narrativa Juriacutedica Teoria e Praacutetica da iiiimrntaccediluumliacuteo Juriacutedica e Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica Coautora i ii ui mi ii dc outros livros da aacuterea juriacutedica

Nelson Carlos Tavares Junior graduado e licenciado em Letras l lii I Inivcrsidade Federal do Rio de Janeiro (UFR J) Mestre em LetrasI I i iir Vernaacuteculas) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFR J) Mm lu irl em Direito pela Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Graduan- i bull m Ivdagogia pela Universidade Estaacutecio de Saacute (UNESA) Ex-professorbull In firinos fundamental e meacutedio Atualmente eacute professor da UNESAbull lii I m ola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J) da Poacutes- riiitlimccedillo em Direito e de diversos cursos preparatoacuterios para concursos

bull bulliiii-ioi das bancas de vestibular do ENEM do ENADE e de concursos liililiroN Dedica-se a questotildees inerentes agrave linguagem juriacutedica e agrave formaccedilatildeobull I 1111gt11 sores do Curso de Direito Ministra as disciplinas Liacutengua Portu- |ibull i Niacuteirrativa Juriacutedica Argumentaccedilatildeo Juriacutedica Redaccedilatildeo Juriacutedica Me- iHilnlii|-ia da Pesquisa e Didaacutetica do Ensino Superior Possui vaacuterios artigos piililn idos Coautor tambeacutem dos livros Liccedilotildees de Gramaacutetica Aplicadas ao Ulsquola luridico Interpretaccedilatildeo e Produccedilatildeo de Textos Aplicadas ao Direito e iiiiiIi i c Espiritismo assuntos atuais e questotildees polecircmicas Atualizador llr 1ortuyjiecircs no Direito

APRESENTACcedilAtildeO

Sabemos que argumentar representa para a aacuterea juriacutedica uma exishygecircncia profissional especiacutefica Argumentar constitui um preacute-requisito funshydamental para o processo de formaccedilatildeo em qualquer das carreiras juriacutedicas O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo em documento referente ao desenvolvishymento das habilidades necessaacuterias agrave formaccedilatildeo juriacutedica destaca como prioshyridade a leitura criacutetica a interpretaccedilatildeo e a escrita

Participamos de um movimento dentro e fora do Poder Judiciaacuterio que vem estabelecendo como mais um fator decisivo da melhor prestashyccedilatildeo jurisdicional o que aqui eacute chamado de habilidade para ldquo saber dizer o Direitordquo uma demanda extensiva a advogados defensores procuradores promotores juizes e desembargadores

Em outras palavras hoje a Liacutengua Portuguesa de uso juriacutedico estaacute posshyta em questatildeo por seus proacuteprios usuaacuterios Muitos deles - por sua vez - tecircm procurado conferir a essa modalidade de uso uma nova expressividade que recusa entre outros aspectos a retoacuterica vazia o vocabulaacuterio erudito e tortuoshyso agrave inteligibilidade ou o emprego de jargotildees e clichecircs envelhecidos e sem qualquer funccedilatildeo a natildeo ser eacute claro a de acumular a poeira do tempo

Com base nessas novas molduras e demandas que circunscrevem a complexidade da escrita e da argumentaccedilatildeo dos profissionais da aacuterea juriacuteshydica um novo (re)encontro com a teoria da argumentaccedilatildeo eacute fundamental Um texto consequente como deve ser o juriacutedico exige do seu redator aleacutem da observacircncia dos aspectos teacutecnicos proacuteprios de cada peccedila redacio- nal - peticcedilatildeo inicial contestaccedilatildeo agravo de instrumento sentenccedila acoacuterdatildeo

o domiacutenio das ferramentas linguiacutesticas que datildeo forma e comunicabilida- de aos conteuacutedos Natildeo haacute texto bem produzido sem o manejo consciente dos instrumentos que a liacutengua disponibiliza

Sabendo das especificidades da produccedilatildeo de peccedilas processuais os autores reapresentam aqui a teoria da argumentaccedilatildeo de maneira didaacutetica acessiacutevel

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Nessa perspectiva parabenizo os autores por mais este livro que daacute continuidade agraves Liccedilotildees de gramaacutetica aplicadas ao texto juriacutedico por estabelecerem outro acordo com o estudo da produccedilatildeo dos textos juriacutedishycos com vistas a uma dinamizaccedilatildeo de suas orientaccedilotildees e prescriccedilotildees de modo a tornar a redaccedilatildeo do texto juriacutedico mais consistente e em conforshymidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito que presshysupotildee aleacutem da capacitaccedilatildeo teacutecnica a habilidade de tornar comunicaacutevel a sua accedilatildeo profissional

Desembargador Seacutergio Cavalieri FilhoEx-Presidente do Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro

Ex-Diretor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de JaneiroProcurador-Geral do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro

PREFAacuteCIO

Oportuna e relevante eacute a publicaccedilatildeo destas Liccedilotildees de argumentaccedilatildeo juriacutedica da teoria agrave praacutetica sobretudo porque realizada por um grupo de professores que haacute alguns anos se dedica agrave formaccedilatildeo de futuros profissioshynais do Direito Trata-se pois de uma obra cuja autoridade nasce da praacutexis e da sensibilidade pedagoacutegica de seus autores

Sem qualquer reducionismo a simplicidade da abordagem e a orgashynizaccedilatildeo teoacuterica didaticamente acessiacutevel atestam natildeo apenas a propriedade dos autores no tratamento da mateacuteria mas tambeacutem a pertinecircncia de seu estudo como preacute-requisito fundamental a qualquer das carreiras juriacutedicas

Que estas Liccedilotildees representem o anuacutencio e a promessa de novas e sempre necessaacuterias liccedilotildees destinadas agrave construccedilatildeo da qualidade dos texshytos juriacutedicos

Dr Andreacute Cleoacutefas Uchocirca CavalcantiJuiz de Direito

Nota da Editora o Acordo Ortograacutefico foi aplicado integralmente nesta obra

SUMAacuteRIO

INTRODUCcedilAtildeO 1

CAPIacuteTULO I - TEO RIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTONO ESPACcedilO E NO T EM PO 3

11 A proposta positivista 412 Criacuteticas agrave loacutegica formal e agrave doutrina positivista 813 Demonstraccedilatildeo e argumentaccedilatildeo 914 A relevacircncia da argumentaccedilatildeo para o Direito 13

CAPIacuteTULO II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTO S A SER shyVICcedilO DA ARGUM ENTACcedilAtildeO 17

21 A contribuiccedilatildeo do texto narrativo para a argumentaccedilatildeo 2022 A contribuiccedilatildeo do texto descritivo para a argumentaccedilatildeo 2423 O texto dissertativo 28

CAPIacuteTULO I I I - ALGUM AS Q UESTOtildeES TEOacute RICAS SO BRE AARGUM ENTACcedilAtildeO 31

31 A argumentaccedilatildeo e a retoacuterica claacutessica 3132 As noccedilotildees de auditoacuterio polifonia e intertextualidade 3233 A argumentaccedilatildeo e o processo de produccedilatildeo de textos juriacutedicos 3434 Gramaacutetica e produccedilatildeo do texto argumentative 4235 Argumentaccedilatildeo e Teoria Tridimensional do Direito 45

XIV LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

CAPIacuteTULO IV - PLAN EJAM EN TO DO TEXTO ARGUMENTA- TIVO JU R IacuteD IC O 51

41 Situaccedilatildeo de conflito 5242 Tese 5643 A contextualizaccedilatildeo do real 5844 Hipoacuteteses 6345 Anaacutelise desse planejamento em sentenccedila e acoacuterdatildeo 64

451 Sentenccedila 65452 Acoacuterdatildeo 73

CAPIacuteTULO V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 85

51 Seleccedilatildeo e organizaccedilatildeo das ideias argumentativas 8552 Fundamentaccedilatildeo simples e fundamentaccedilatildeo complexa 9553 Tipos de argumento 97

531 Introito100532 Argumento proacute-tese103533 Argumento de autoridade106534 Argumento de oposiccedilatildeo113535 Argumento de analogia115536 Argumento de causa e efeito122537 Argumento de senso comum126538 Argumento a d ho minem128539 Argumento a fortiori 1305310 Argumento por absurdo1325311 Argumento de fuga133

54 O uso da deduccedilatildeo e induccedilatildeo na produccedilatildeo dos argumentos134

CAPIacuteTULO V I - PR IN C IacutePIO S G ERA IS DO D IREITO E A FORshyM ULACcedilAtildeO DOS ARGUM EN TO S 147

61 Princiacutepios gerais do direito e regras147611 Os valores morais147

SUMAacuteRIO XV

612 Os valores eacuteticos 148613 Diferenccedilas entre princiacutepios e regras149

62 A relevacircncia norteadora dos princiacutepios agrave formulaccedilatildeo dos argumentos 15163 Organizaccedilatildeo hieraacuterquica de algumas fontes do Direito na estrutura ar-

gumentativa razoabilidade princiacutepios lei doutrina e jurisprudecircncia 156631 Proposta 157632 Comentaacuterio159

CAPIacuteTULO V II - FIGURAS DE RETOacute R IC A 16171 Por que o estudo das figuras retoacutericas 16172 O efeito persuasivo das figuras de retoacuterica16373 Figuras retoacutericas muito utilizadas no discurso juriacutedico165

731 Figuras de palavras1657311 Figuras de ritmo e de som1657312 A etimologia 167

732 Figuras de sentido1677321 Metoniacutemia1687322 Metaacutefora1707323 Hipeacuterbole1707324 Eufemismo1717325 Paradoxo1727326 Antiacutetese 1737327 Personificaccedilatildeo174

733 Figuras de construccedilatildeo 1757331 Inversatildeo1757332 Quiasmo1767333 Reticecircncias1767334 Repeticcedilatildeo1777335 Gradaccedilatildeo178

734 Figuras de pensamento 1787341 Ironia 179

XVI LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

7342 Pretericcedilatildeo1807343 Prolepse 181

CAPIacuteTULO V III - PA REC ER TEacuteCN ICO -JUR IacuteD ICO 183

81 A estrutura de um parecer juriacutedico teacutecnico-formal 18382 Ementa 18883 Relatoacuterio 19184 Fundamentaccedilatildeo 19385 Conclusatildeo 19486 Exemplo de parecer teacutecnico-juriacutedico19587 Esquema da disposiccedilatildeo das partes do parecer teacutecnico-juriacutedico 198

CAPIacuteTULO IX - EX ER C IacuteC IO S 201

B IBL IO G R A FIA 259

INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que a disciplina Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou nos uacuteltimos anos contornos cada vez mais claros Os Cursos de Direito no paiacutes inteiro comeccedilaram a inserir em seus curriacuteculos uma disciplina de fundamento cuja finalidade eacute aprofundar o estudo das teacutecnicas e das estrateacutegias de pershysuasatildeo agrave disposiccedilatildeo de quem lida com a produccedilatildeo das peccedilas processuais- de peticcedilotildees iniciais a sentenccedilas

O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e Cultura (M EC) e a Associaccedilatildeo dos Magistrados do Brasil (A M B) tecircm incentivado a implementaccedilatildeo dessa disciplina no iniacutecio do Curso de maneira a favorecer uma melhor formashyccedilatildeo humaniacutestica e reflexiva aos estudantes de Direito acerca das temaacuteticas que essa disciplina enfrenta cotidianamente o que de fato tem se observashydo em vaacuterios cursos de Direito e nas escolas de formaccedilatildeo como na Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EM ER J)

Portanto natildeo haacute duacutevidas de que a argumentaccedilatildeo deixou de exercer papel secundaacuterio e hoje funciona como premissa fundamental de todo aquele que pretende obter sucesso nas lides em que atua Por essa razatildeo debruccedilamo-nos agrave busca de meacutetodos que didaticamente organizados ofeshyreccedilam teacutecnicas e estrateacutegias para a produccedilatildeo de um texto argumentativo competente natildeo apenas do ponto de vista da persuasatildeo mas tambeacutem do domiacutenio de estruturas de raciociacutenio loacutegico coeso e coerente

Enfatiza-se tambeacutem a relevacircncia do conhecimento conceituai ofereshycido na primeira parte da obra sobre a teoria da argumentaccedilatildeo a fim de que se possa instrumentalizar os profissionais da aacuterea juriacutedica Lembramos as ideias de Aristoacuteteles que tatildeo bem sinalizam nossos sentimentos Segundo ele a linguagem juriacutedica eacute a arte de convencer e comover atraveacutes de proshyvas fatos e argumentos

Capiacutetulo I

TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

A proposta dos autores deste livro eacute oferecer aos graduandos e aos profissionais do Direito um instrumento de qualificaccedilatildeo da atividade que desenvolvem Aos alunos dos periacuteodos iniciais do Curso de Direito entreshygamos uma obra didaacutetica de leitura acessiacutevel pois um dos entraves que enfrentam na leitura inicial das obras que tratam de importantes teorias da sua aacuterea - tal como ocorre com a Teoria da Argumentaccedilatildeo - eacute a falta de reshypertoacuterio que gabarite uma reflexatildeo ampla e natildeo ingecircnua desses conteuacutedos

Aos formandos dessa mesma aacuterea e aos jaacute advogados promotores defensores juizes procuradores esperamos auxiliar na qualificaccedilatildeo e na reflexatildeo criacutetica sobre a produccedilatildeo de sentido nas peccedilas redigidas Sabemos que mesmo sendo detentores de enorme repertoacuterio juriacutedico muitos satildeo levados agrave reproduccedilatildeo de valores e de ideias jaacute cristalizados pela ciecircncia juriacutedica

O profissional que deseja manter-se em sintonia com a tendecircncia contemporacircnea de consolidaccedilatildeo dos direitos fundamentais pela via princi- pioloacutegica por exemplo necessita para argumentar a favor de novas teses- sem descurar da teacutecnica e da consistecircncia persuasiva - de raciociacutenio juriacutedico coesatildeo e coerecircncia entre as ideias que constituem o texto domiacuteshynio de estrateacutegias inteligentes de convencimento e adaptaccedilatildeo aos diversos auditoacuterios a que se dirigem tais profissionais

Enfim para adotar um novo posicionamento juriacutedico diante de quesshytotildees ineacuteditas ou de temas jaacute aparentemente consolidados eacute necessaacuterio reushynir mais do que vontade torna-se imprescindiacutevel ter fluecircncia no manejo de todas essas ferramentas linguiacutesticas e discursivas que favorecem alcanccedilar os objetivos pretendidos

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Sabemos que essa eacute uma demanda a qual constatamos tanto na grashyduaccedilatildeo quanto nos cursos preparatoacuterios e nas escolas de formaccedilatildeo

A sistematizaccedilatildeo do estudo da Teoria da Argumentaccedilatildeo foi apresenshytada inicialmente por Chaim Perelman e L Olbrechts-Tyteca em 1958 na obra La Nouvelle Rheacutetorique Traiteacute de 1rsquoArgumentation Os autores sustentaram que eacute possiacutevel a aplicaccedilatildeo de uma praacutetica da razatildeo agraves ciecircncias sociais e humanas das quais se pode citar o Direito Para isso apoiaram-se principalmente em autores como Aristoacuteteles Ciacutecero e Quintiliano

Antes de enfocar a proposta perelmaniana propriamente dita faz-se necessaacuterio compreender um pouco do contexto cultural histoacuterico e poliacutetico que a motivou e lhe serviu de berccedilo Natildeo pretendemos esgotar a reflexatildeo necessaacuteria a essa tarefa mas apenas sugerir algumas informaccedilotildees que facishylitem a compreensatildeo dos natildeo iniciados no tema

Comecemos pela afirmaccedilatildeo de que o ensino de Direito no Brasil funshydou suas raiacutezes em forte influecircncia do chamado Positivismo juriacutedico1 Por essa razatildeo antes de iniciar uma abordagem sobre a argumentaccedilatildeo faz-se necessaacuterio investigar com mais cuidado o que representa esse sistema deshynominado Positivismo que se mostra superado mas que tatildeo intensamente influenciou as bases da Teoria da Argumentaccedilatildeo

11 A PRO PO STA PO S IT IV IST A

Historicamente situada a doutrina positivista ganhou forccedila a partir da segunda metade do seacuteculo X IX Suas bases desenvolveram-se na conshyfianccedila de que o progresso somente seria possiacutevel se pautado na teacutecnica e na ciecircncia Assim sendo propunham os positivistas uma reforma completa da sociedade de maneira a que a ordem fosse alcanccedilada soberanamente

Assinala Maria Helena Diniz que ldquoo Positivismo socioloacutegico adveio da teoria de Augusto Comte que pretendeu realizar por meio da ciecircncia uma reforma social afirmando que a uacutenica ciecircncia capaz de reformar a sociedade eacute a sociologia () que era a ciecircncia positiva dos fatos sociais () Emile Durkheim continuando a obra de Comte pretendeu tambeacutem substituir a filosofia moral ou direito natural consishyderado aprioriacutestico e anti-histoacuterico pela ciecircncia positiva da origem e evoluccedilatildeo dos costumes sociais Logo a pressatildeo social seria a causa dos fenocircmenos humanos () O direito como fato social natildeo eacute simples produto da consciecircncia individual mas o resultado da consciecircncia coletiva O direito portanto por ser um fato social deve ser estudado pelo meacutetodo socioloacutegicordquo (DINIZ Maria Helena Compecircndio de introduccedilatildeo agrave ciecircncia do Direito Satildeo Paulo Saraiva 1988 p 92-93)

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 5

No campo do Direito acreditou-se que a ordem e a seguranccedila somenshyte seriam garantidas se a teacutecnica cooperasse na elaboraccedilatildeo de leis gerais cashypazes de antever os acontecimentos sociais sobre os quais o Estado deveria atuar Essa proposta prosperou porque a ciecircncia e seu rigor metodoloacutegico mostravam-se extremamente promissores nas soluccedilotildees de problemas que impediam o progresso

Com base nesses pressupostos eacute importante entender que para a dogmaacutetica juriacutedica tradicional os profissionais que atuam na soluccedilatildeo de conflitos levados ao Judiciaacuterio - em especial o juiz - deveriam encontrar o sentido do direito no sistema de normas escritas que regulam a vida social de um determinado povo em um dado momento histoacuterico

Essa crenccedila reforccedilava tambeacutem a ideia de seguranccedila juriacutedica uma vez que se as normas criadas pelo Estado eram conhecidas pela sociedade o seu descumprimento - em certas circunstacircncias - por um determinado sushyjeito que natildeo observou a conduta descrita deveria ser punido pelo Estado que lhe imporia uma sanccedilatildeo por tal descumprimento Ora como se acredishytava ter um sistema juriacutedico perfeito estava reforccedilada a tese de que havia plena seguranccedila juriacutedica

De acordo com os adeptos dessa teoria portanto a praacutetica juriacutedica deveria limitar-se agrave aplicaccedilatildeo objetiva das normas vigentes ao caso conshycreto que se pretendia analisar por meio de um meacutetodo previamente deshyterminado Esse meacutetodo caracterizava-se por uma operaccedilatildeo loacutegica em que competia ao juiz amoldar os acontecimentos da vida cotidiana ao suporte normativo eleito pelo Estado

Mas como essa operaccedilatildeo loacutegica era realizada Para a proposta poshysitivista caberia ao juiz desenvolver um raciociacutenio silogiacutestico para poder ldquodizer adequadamente o direitordquo Consiste o silogismo em apresentar trecircs proposiccedilotildees - premissa maior premissa menor e conclusatildeo - que se disshypotildeem de tal forma que a conclusatildeo deriva de maneira loacutegica das duas preshymissas anteriores como se exemplifica a seguir

O enunciado ldquomatar algueacutem pena de 6 a 20 anos de reclusatildeordquo foi previamente determinado pelo Estado como uma norma a ser seguida Esse fundamento legal deve ser encarado pois como uma premissa maior (PM ) Ao observar o caso concreto verifica o juiz que ldquo Joatildeo Alberto ma- tou Patriacutecio Mottardquo Essa segunda proposiccedilatildeo seraacute a premissa menor (Pm) do silogismo Ora se matar algueacutem gera como sanccedilatildeo o cumprimento da pena de reclusatildeo e se Joatildeo matou Patriacutecio chega-se agrave conclusatildeo (C) loacutegica de que deveraacute o acusado cumprir pena fixada pelo juiz dentro dos limites legais estabelecidos

Esquematicamente estruturado o silogismo pode ser assim representado

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Premissa Maior (PM) (= fundamento juriacutedico)

lt iacute = ^ gt

Premissa menor (Pm) (=fato do caso

concreto)

ldquoMatar algueacutemJoatildeo matou Patriacutecio

Conclusatildeo (C)

O reacuteu deve cumprir pena fixada pelo juiz

Resumidamente a aspiraccedilatildeo dos positivistas foi a de construir um sistema racional incontestaacutevel inspirado no meacutetodo utilizado por ciecircncias como a Matemaacutetica a Fiacutesica e a Astronomia Na matemaacutetica por exemshyplo eacute possiacutevel alcanccedilar conclusotildees verdadeiras ou previsiacuteveis a partir de premissas assumidas como tal pois a validade dessas eacute que determina a validade das conclusotildees desde que observadas as regras delimitadas pelo meacutetodo utilizado

Esse raciociacutenio parece bastante adequado mas natildeo se pode supor que todos os acontecimentos da vida social com repercussatildeo no mundo juriacutedico conseguiriam ser previstos com exatidatildeo pelo legislador ou mesmo que todos os casos em que um ato semelhante fosse praticado teriam necessashyriamente as mesmas consequecircncias juriacutedicas

Recentemente valores como ldquo funccedilatildeo socialrdquo ldquo dignidade da pessoa humanardquo ldquo boa-feacuterdquo entre outros reforccedilam que ldquo cada caso eacute um casordquo e portanto natildeo se pode dar tratamento sistemaacutetico paradigmaacutetico a situashyccedilotildees aparentemente semelhantes

A tiacutetulo de exemplo nem sempre que uma pessoa constroacutei sua resishydecircncia em terreno alheio estaacute de maacute-feacute E possiacutevel que a construccedilatildeo irreshygular tenha sido motivada por um equiacutevoco de quem executou a obra ou por uma leitura imprecisa da planta do terreno Enfim muitas justificativas podem ser aventadas para explicar a motivaccedilatildeo da praacutetica de uma conduta vedada pelo ordenamento juriacutedico Se assim o eacute natildeo seria justo que uma mesma conduta praticada por pessoas diferentes em contextos distintos fosse avaliada da mesma maneira pelo juiz

E paciacutefico hoje ser impossiacutevel criar um sistema juriacutedico perfeito infaliacutevel que preveja com exatidatildeo as especificidades que cada caso con-

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

ereto pode apresentar Tal maneira de conceber o Direito faz dele o que na realidade natildeo eacute uma ciecircncia estaacutetica imobilizada por um nuacutemero deshyterminado de regras que natildeo datildeo conta de organizar a conduta humana e viabilizar a paz social

Eacute fundamental - e isso tambeacutem eacute paciacutefico - que o contexto em que se deram os fatos as influecircncias que o motivaram o estado psicoloacutegico de quem praticou a conduta etc sejam tambeacutem considerados A ponderaccedilatildeo de tais situaccedilotildees portanto foge agrave previsibilidade de um sistema formal previamente concebido com precisatildeo absoluta Natildeo haacute enfim como transshypor as certezas matemaacuteticas para as ciecircncias de natureza humana e social tal como propunha Descartes2

Todas essas questotildees abordadas sugerem ser fundamental ao operashydor do direito ter condiccedilotildees de argumentar a favor de teses de receptividade minoritaacuteria no ordenamento juriacutedico paacutetrio

A fim de ilustrar tal raciociacutenio podemos citar a recente autorizaccedilatildeo do STF com o advento da ADPF n 54 para a realizaccedilatildeo do aborto de feto anencefaacutelico Como se sabe qualquer hipoacutetese diferente daquelas previsshytas no Coacutedigo Penal (feto concebido em decorrecircncia de estupro e perigo iminente de morte para a gestante) era rejeitada de pronto Se natildeo fosse a perseveranccedila de inuacutemeros advogados ao longo de tantos anos talvez a tese de antecipaccedilatildeo terapecircutica do parto em respeito agrave liberdade da mulher natildeo fosse aceita ateacute hoje

No mesmo sentido podem ser citados diversos outros temas tais como a aprovaccedilatildeo da uniatildeo entre pessoas do mesmo sexo e a proteccedilatildeo das minorias Existem ainda diversas situaccedilotildees juriacutedicas em que a tutela de direito ainda natildeo eacute reconhecida no Brasil A uacutenica saiacuteda para buscar a aplicaccedilatildeo justa da lei no sentido mais pleno exceto a alteraccedilatildeo legislatishyva - o que natildeo depende do Judiciaacuterio eacute a defesa eficiente de teses cuja argumentaccedilatildeo lhe serve de fundamento

Sustentamos que essa concepccedilatildeo de interpretaccedilatildeo da norma baseada apenas na leitura gramatical da letra da lei era adequada ao contexto hisshytoacuterico em que se desenvolveram o Positivismo Juriacutedico e a loacutegica formal Atualmente essa proposta natildeo mais pode ser aceita uma vez que se mostra insuficiente do ponto de vista filosoacutefico e metodoloacutegico para dar conta da praacutetica juriacutedica

A respeito veja DESCARTES Reneacute Discurso sobre o meacutetodo Traduccedilatildeo de Maacutershycio Pugliesi et alii Satildeo Paulo Hemus 1978

12 C R IacuteT IC A S Agrave LOacute G IC A FO RM AL E Agrave DO UTRINA PO SIT IV ISTA

Vimos que o cenaacuterio em que se desenvolveu a doutrina positivista era fruto do momento poliacutetico em que prevalecia forte tendecircncia autorishytaacuteria Exemplos dessa tendecircncia na poliacutetica eram o nazismo o fascismo as demais formas de autoritarismo e a poliacutetica de guerra-fria Por todas essas barbaridades cometidas a sociedade natildeo mais aceitou a intoleracircncia predominante

Relevante se faz ressaltar que essa transformaccedilatildeo no campo da poshyliacutetica estendeu-se tambeacutem para a Filosofia O uso cartesiano da razatildeo e uma loacutegica excessivamente matematizante precisavam dar lugar a outra postura a abertura para o diaacutelogo e a ponderaccedilatildeo das controveacutersias inerenshytes a todo fato social requisitos fundamentais dos Estados democraacuteticos emergentes

E importante salientar que a atmosfera de decepccedilatildeo com a loacutegica formal3 e a doutrina positivista impulsionou as pesquisas na aacuterea da argushymentaccedilatildeo na segunda metade do seacuteculo XX

A partir da proposta de mudanccedila de paradigma de razatildeo Chaiacutem Pe- relman4 insurge-se contra a ditadura cartesiana da evidecircncia o dogmatismo das ciecircncias e as reduccedilotildees positivistas Propotildee a Teoria da Argumentaccedilatildeo como alternativa entre a Loacutegica ateacute entatildeo vigente e a metodologia das Ciecircncias Humanas tidas como subjetivas e imprecisas

Perelman propocircs uma metodologia mais afinada com o tratamento dos problemas concretos trazidos ao Judiciaacuterio cm que a ponderaccedilatildeo dos valores- ateacute entatildeo relegada ao plano do irracional e da imprecisatildeo - possibilitava uma nova concepccedilatildeo de razatildeo que natildeo a formal mas a razatildeo praacutetica

Realmente tendo em vista o dinamismo dos eventos sociais obsershyva-se um permanente descompasso entre a norma e a realidade social Mais

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

3 Aristoacuteteles eacute considerado um dos principais precursores da loacutegica formal contrishybuiu para o desenvolvimento de uma teoria da demonstraccedilatildeo e do uso do silogisshymo

4 Participaram ainda dessa tendecircncia de revisatildeo da Epistemologia contemporacircnea autores como Bachelard Gadamer Lenk Ricoeur Habermas e muitos outros Resshypeitadas as diferentes orientaccedilotildees metodoloacutegicas a meta comum eacute a ampliaccedilatildeo do conceito de razatildeo As escolas hermenecircuticas alematilde italiana e francesa asseguraram agrave razatildeo ampliada um lugar importante na praacutetica filosoacutefica () Mais especificashymente no territoacuterio da Teoria da Argumentaccedilatildeo aleacutem de Perelman tambeacutem Toul- min Johnstone e Viehweg A semioacutetica tambeacutem ocupa lugar de destaque nesse processo na medida em que valoriza o aspecto pragmaacutetico da linguagem

um exemplo dessa realidade satildeo as sanccedilotildees a serem criadas para coibir os crimes ligados ao mau uso da internet

Enfim ressaltamos a importacircncia do estudo da Teoria da Argumentashyccedilatildeo sob o enfoque da proposta perelmaniana pois ela possibilitou uma mushydanccedila que nos parece fundamental ao passo em que o projeto cartesiano buscava a verdade ancorada na ideia de evidecircncia e na coerccedilatildeo Perelman propocircs alcanccedilar o verossiacutemil por meio da adesatildeo e do diaacutelogo O que o meacuteshytodo cartesiano demonstrativo formal faz pela coerccedilatildeo e pela violecircncia a argumentaccedilatildeo permite que se faccedila pela adesatildeo e pela democracia Anteveshymos o futuro do direito calcado em valores de fraternidade paz e justiccedila sem os quais o homem natildeo encontraraacute eco para a plenitude que almeja

Para melhor entender a proposta da Teoria da Argumentaccedilatildeo de Chaim Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca eacute importante contrapor a arshygumentaccedilatildeo agrave demonstraccedilatildeo tal como o fizeram os autores no Tratado da Argumentaccedilatildeo a Nova Retoacuterica5 Realizaremos semelhante tarefa no proacuteximo capiacutetulo

13 D EM O N STRACcedilAtildeO E ARG UM EN TACcedil AtildeO

Em primeiro lugar entendamos que demonstraccedilatildeo e argumentaccedilatildeo natildeo se ocupam de propostas distintas mas de procedimentos que se completam

Enquanto a demonstraccedilatildeo busca a verdade a argumentaccedilatildeo preocushypa-se com a adesatildeo do auditoacuterio ou seja a argumentaccedilatildeo eacute uma atividade praacutetica que tem por objeto o ldquoestudo das teacutecnicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentamrdquo 6 nas mais variadas atividades humanas

A demonstraccedilatildeo por outro lado eacute um meio de prova fundado na proposta de uma racionalidade matemaacutetica que visa a delimitar os passos a serem percorridos - isto eacute o meacutetodo si logiacutestico - para deduzir premissas de outras jaacute existentes desde que siga rigorosamente as regras estabelecishydas por um sistema formalizado

Assim a demonstraccedilatildeo opera-se por axiomas - premissas considerashydas evidentes e que por isso natildeo precisam ser comprovadas a argumenta-

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

Os autores tratam deste tema no sect 1 da obra PERELM AN Chaim Tratado da argushymentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 15-17

PERELM AN Chaim Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 4

10 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ccedilatildeo natildeo recorre aos axiomas mas agraves teses - proposiccedilotildees que precisam ser sustentadas pelo orador e cuja aceitaccedilatildeo dependeraacute de sua maior capacishydade de persuasatildeo7 - o que faz com que a Teoria da Argumentaccedilatildeo guarde dependecircncia mais evidente com a experiecircncia faacutetica

O que isso representa Bom se a demonstraccedilatildeo possibilita que alshygueacutem formalize um sistema cujas regras satildeo previamente delimitadas e controladas natildeo importaraacute em que contexto seja ele aplicado o resultado almejado sempre seraacute tido como verdade independente do momento histoacuteshyrico e do lugar em que for empregado

De maneira distinta o argumentador para alcanccedilar a adesatildeo de seu auditoacuterio natildeo pode desconsiderar a historicidade e a temporalidade em que se inserem seus destinataacuterios pois o contexto em que atua eacute determinante de quais valores prevalecem e de quais estrateacutegias satildeo acatadas com mais facilidade para alcanccedilar a permeabilidade com o auditoacuterio

A esse respeito pode-se dizer enfim que a demonstraccedilatildeo eacute impesshysoal e independe do meio em que eacute desenvolvida Isso natildeo ocorre com a argumentaccedilatildeo pois eacute exatamente o ldquo contato entre os espiacuteritosrdquo que legitishyma seu exerciacutecio

Eacute importante frisar que natildeo se pode depreender do que ateacute aqui foi dito que a demonstraccedilatildeo eacute um procedimento adstrito agraves ciecircncias exatas e naturais como a Matemaacutetica e a Fiacutesica E verdade que eacute nessa aacuterea do conhecimento que a demonstraccedilatildeo se desenvolve com mais propriedade mas haacute tambeacutem espaccedilo para o uso da demonstraccedilatildeo nas ciecircncias humanas e sociais

Perelman em nenhum momento nega a relevacircncia da racionalidade caracteriacutestica das ciecircncias exatas e naturais para a sua teoria O que ele sustenta eacute que o modelo de racionalidade promovido por esses ramos do conhecimento mostra-se insuficiente e redutor se aplicado agraves ciecircncias hushymanas e sociais Propotildee entatildeo que nessas aacutereas - tal como ocorre com o Direito - a demonstraccedilatildeo seja utilizada juntamente com a argumentaccedilatildeo

O que se pretende mostrar eacute que o argumentador para sustentar sua tese inuacutemeras vezes necessita de um conjunto de informaccedilotildees preacutevias (base probatoacuteria miacutenima) a partir do qual produziraacute seus argumentos Ou seja a demonstraccedilatildeo poderaacute ser utilizada a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

Imagine a situaccedilatildeo em que um advogado necessite comprovar o nexo de causalidade entre a conduta de uma construtora - que eacute acusada de agir

7 Para este trabalho natildeo importa discutir a distinccedilatildeo entre convencimento e persuashysatildeo A respeito veja PERELM AN Chaiacutem OLBRECIITS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 29

com negligecircncia na utilizaccedilatildeo de materiais considerados de baixa qualidashyde - e o desabamento de um edifiacutecio evento em que morreram vaacuterios moshyradores Natildeo haacute duacutevidas de que o argumentador soacute conseguiraacute convencer o julgador de que existe a responsabilidade civil do construtor se recorrer por exemplo a laudos produzidos por profissionais de aacutereas especiacuteficas da construccedilatildeo civil (engenharia de caacutelculo estrutural estudo do solo projeto arquitetocircnico etc)

Nesse sentido a argumentaccedilatildeo se serviraacute de pareceres de especialisshytas que demonstrem por exemplo que o ferro utilizado na sustentaccedilatildeo das colunas natildeo era adequado para suportar o peso esperado Repetimos que neste caso a demonstraccedilatildeo eacute necessaacuteria mas natildeo suficiente para evidenciar a culpa ela se coloca portanto a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

Veja que sem a evidecircncia da inadequaccedilatildeo do material natildeo haacute que se falar em responsabilidade civil ou em culpa por negligecircncia Por outro lado a mera produccedilatildeo da prova demonstrativa natildeo garante a condenaccedilatildeo do reacuteu Outras questotildees devem ainda ser discutidas existe algum fato sushyperveniente que alterou a condiccedilatildeo em que os caacutelculos iniciais foram realishyzados Isso deveria ser previsto pelos engenheiros e arquitetos que fizeram o projeto A execuccedilatildeo da obra pelos operaacuterios ocorreu conforme suas deshyterminaccedilotildees Outros pontos precisam ainda ser enfim investigados

Natildeo eacute por outra razatildeo que Perelman entende que a Teoria da Deshymonstraccedilatildeo deve ser completada pela Teoria da Argumentaccedilatildeo que estuda os raciociacutenios dialeacuteticos

Na verdade para formular uma teoria da argumentaccedilatildeo que admitisse o uso da razatildeo a fim de dirigir a proacutepria accedilatildeo e influenciar a dos outros foi necessaacuterio desconsiderar a ideia de evidecircncia como caracteriacutestica da razatildeo siacutembolo da teoria cartesiana Essa ideia segundo a qual toda prova seria reduccedilatildeo agrave evidecircncia e o que eacute evidente natildeo teria necessidade alguma de prova impunha uma limitaccedilatildeo agrave loacutegica

Perelman levou em conta a teoria da demonstraccedilatildeo cujo desenvolvishymento seguiu o pensamento de Leibniz - o qual considerava que mesmo o evidente necessitava de alguma prova Estabeleceu-se assim uma relaccedilatildeo direta com a teoria da argumentaccedilatildeo que soacute poderia desenvolver-se se a prova natildeo fosse concebida como reduccedilatildeo agrave evidecircncia

Como consequecircncia dessa visatildeo o objeto da teoria do autor eacute o estushydo das teacutecnicas discursivas que possibilitam provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentam agrave sua aprovaccedilatildeo Por outro lado o que caracteriza a adesatildeo dos espiacuteritos eacute a variabilidade de sua intensidade haacute diferentes graus de adesatildeo

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO

12 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Paulo Roberto Soares Mendonccedila8 ao abordar as diferenccedilas entre a demonstraccedilatildeo e a argumentaccedilatildeo ressalta que o argumentador tem de ldquoneshygociarrdquo com seu auditoacuterio certas normas comuns que balizem uma boa argumentaccedilatildeo Ele natildeo estaacute falando necessariamente de normas vigentes mas de conteuacutedos que fazem parte do cotidiano do homem meacutedio e que satildeo implicitamente aceitos por todos (auditoacuterio universal) apesar de natildeo expressamente formuladas

Outro cuidado que o orador deve ter eacute com a utilizaccedilatildeo de uma linshyguagem comum ao longo de sua exposiccedilatildeo ela deve ser compreensiacutevel por todos os membros do auditoacuterio de maneira a favorecer um entendimento claro e objetivo do que se diz Quanto mais se exigem preacute-requisitos do interlocutor para entender o conteuacutedo da mensagem transmitida maiores satildeo as chances de natildeo se fazer entender O uso de uma linguagem simples objetiva acessiacutevel eacute fundamental a um argumentador que se dirige a um auditoacuterio universal Mas palavras de Chaiacutem Perelman ldquo o miacutenimo indisshypensaacutevel agrave argumentaccedilatildeo parece ser a existecircncia de uma linguagem em comum de uma teacutecnica que possibilite a comunicaccedilatildeordquo 9

O mesmo natildeo se pode dizer da demonstraccedilatildeo porque quem recorre a um raciociacutenio baseado na loacutegica formal tem a garantia de que seus interlocutores dominam a linguagem teacutecnica sobre a qual se desenvolveu pois a verdade construiacuteda utilizou-se de uma liacutengua artificial que lhe confere autoridade

Como vocecirc pocircde perceber adotamos o meacutetodo comparativo para mostrar as semelhanccedilas e distinccedilotildees entre a demonstraccedilatildeo e a argumenshytaccedilatildeo por acreditarmos que assim fique bastante claro quais satildeo as suas principais caracteriacutesticas Adiante temos as principais caracteriacutesticas de ambas esquematicamente organizadas

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

Meio de prova fundado na proposta de uma racionalidade matemaacutetica que visa

a delimitar os passos a serem percorridos (silogismo) para deduzir premissas de

outras jaacute existentes

Atividade que objetiva o ldquoestudo das teacutecshynicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves

teses que se apresentamrdquo

8 MENDONCcedilA Paulo Roberto Soares A argumentaccedilatildeo nas decisotildees judiciais Rio de Janeiro Renovar 2001

9 PERELM AN Chaiacutem OLBRECHTS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 17

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 13

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

Estabelece regras imutaacuteveis proacuteprias das ciecircncias exatas e naturais raciociacutenios

matemaacuteticos e analiacuteticos

Adota procedimentos flexiacuteveis proacuteshyprios das ciecircncias humanas e sociais

raciociacutenios dialeacuteticos - mais de uma tese - valores

Orador x auditoacuterioLoacutegica formal

Meacutetodo dedutivo (geral para o particular)

Loacutegica do razoaacutevel Meacutetodo indutivo

(particular para o geral)

Opera-se por axiomas Recorre agraves teses

Na aacuterea juriacutedica pode estar a serviccedilo da argumentaccedilatildeo - premissas

verdadeiras

Busca a adesatildeo dos espiacuteritos agrave tese apresentada - premissas verossiacutemeis

Silogismo loacutegico Premissa maior (PM) - norma Premissa menor (Pm) - fato

Conclusatildeo (C)

Entimema (tipo de silogismo dialeacutetico) Premissa menor (Pm) - fato

Premissa maior (PM) - norma Conclusatildeo (C)

Atemporal Histoacuterica e temporalUtiliza uma linguagem artificial teacutecnica Recorre a uma linguagem comum simshy

ples acessiacutevel que facilite a persuasatildeo

Natildeo haacute duacutevidas de que a argumentaccedilatildeo veio ocupar em determinashydas aacutereas do conhecimento o lugar que anteriormente foi preenchido pela demonstraccedilatildeo Mas ainda hoje a argumentaccedilatildeo exerce o mesmo papel de relevacircncia para o Direito

14 A R ELE V Acirc N C IA DA ARG UM EN TACcedilAtildeO PARA O D IR E IT O

Uma vez conhecidas as diferenccedilas entre Demonstraccedilatildeo e Argumenshytaccedilatildeo e suas implicaccedilotildees na produccedilatildeo do conhecimento nas diversas aacutereas um proacuteximo passo necessaacuterio seria verificar a relevacircncia da argumentaccedilatildeo como ferramenta de trabalho para o operador do Direito

Vivemos atualmente um paradoxo De um lado eacute fato que a discishyplina Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou nos uacuteltimos anos contornos cada vez mais claros Os Cursos de Direito no paiacutes inteiro comeccedilaram com maior ou menor rapidez a inserir em seus curriacuteculos uma disciplina autocircnoma cuja finalidade era aprofundar o estudo das teacutecnicas e das estrateacutegias de persuasatildeo agrave disposiccedilatildeo de quem lida com a produccedilatildeo das peccedilas processuais

14 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O proacuteprio Ministeacuterio da Educaccedilatildeo e Cultura (M EC ) e a Associaccedilatildeo dos Magistrados do Brasil (AM B) tecircm incentivado a implementaccedilatildeo dessa disciplina no iniacutecio do Curso de maneira a favorecer uma melhor formashyccedilatildeo humaniacutestica e reflexiva aos estudantes de Direito acerca das temaacuteticas que essa disciplina enfrenta cotidianamente

De outro lado eacute inquestionaacutevel que o advento da informaacutetica e a necessidade crescente de uma produccedilatildeo cada vez mais volumosa de peshyccedilas potencializaram o cenaacuterio em que a reproduccedilatildeo (e natildeo a produccedilatildeo) de conteuacutedos e de conhecimento se opere sem que haja a preocupaccedilatildeo com a utilizaccedilatildeo consciente da linguagem e de seus recursos argumentativos

Uma das importantes criacuteticas que se costuma fazer aos advogados na praacutetica forense aliaacutes eacute a redaccedilatildeo de peticcedilotildees iniciais extremamente longas com diversas citaccedilotildees de pertinecircncia duvidosa que apenas repetem desneshycessariamente um mesmo conteuacutedo acessado pela internet e largamente reshyproduzido Natildeo haacute na maioria das peccedilas produzidas uma seleccedilatildeo apurada e criteriosa de fontes que estejam a serviccedilo de uma proposta argumentativa

Os recursos ldquo recortarcopiarrdquo e ldquo colarrdquo oferecidos pelo editor de texto estimulam os estagiaacuterios de Direito a reproduzirem em suas peccedilas longos trechos de outras sem a preocupaccedilatildeo com a autenticidade e com as peculiaridades do caso sobre o qual se debruccedilam

Chega-se agrave situaccedilatildeo absurda de muitos profissionais terem uma coleshytacircnea de modelos armazenada em seu computador - peticcedilatildeo inicial sobre descumprimento de contrato sobre indenizaccedilatildeo por danos morais etc - que seraacute mecanicamente utilizada em qualquer outra situaccedilatildeo

Veja que a criacutetica aqui natildeo se dirige agrave proposta de usar o ldquo modelordquo como metodologia de ensino para o acadecircmico de Direito Esse procedishymento se faz muitas vezes necessaacuterio e quase sempre muito eficiente para algueacutem que ainda natildeo possui nenhuma referecircncia visual para uma peccedila de que somente ouviu falar e com a qual nunca travou qualquer contato

Ressalte-se tambeacutem que existem excelentes advogados que utilizam com propriedade a linguagem e que se recusam agrave simples subsunccedilatildeo do fato agrave norma positivada Com isso desenvolvem de maneira brilhante suas teses para o caso decidendo

A questatildeo aqui desenvolvida defende a concepccedilatildeo de que o ldquo modelordquo deva apenas servir como referecircncia para outras produccedilotildees autocircnomas em que o conteuacutedo acumulado pelo aluno seraacute utilizado de maneira consciente Isso ajudaraacute a entender que para produzir uma peticcedilatildeo inicial eacute necessaacuterio utilizar o conteuacutedo trabalhado em Direito Civil em Introduccedilatildeo ao Direito em Argumentaccedilatildeo Juriacutedica e em Processo Civil por exemplo

Cap I - TEORIA DA ARGUMENTACcedilAtildeO SEU CONTEXTO NO ESPACcedilO E NO TEMPO 15

A coacutepia natildeo faraacute certamente com que consiga essa visatildeo orgacircnishyca e interdisciplinar que a ciecircncia juriacutedica exige de seus profissionais Ao contraacuterio estimula a percepccedilatildeo fragmentada e esteacuteril do direito Por essa razatildeo eacute que entendemos que natildeo haacute motivaccedilatildeo suficiente para a citaccedilatildeo de longos trechos de doutrina e de dezenas de fontes jurisprudenciais salvo sc se fizerem absolutamente necessaacuterias agrave sustentaccedilatildeo que o proacuteprio caso concreto exige para a persuasatildeo do magistrado

Outro fator acadecircmico relevante a considerar eacute a reduzida aprovashyccedilatildeo dos Bachareacuteis em Direito no Exame da Ordem O crescente rigor das bancas avaliadoras e a necessidade de frear o crecimento exponencial das Instituiccedilotildees de Ensino Superior tecircm sido fator determinante para que as Fashyculdades de Direito natildeo abram matildeo da qualidade de formaccedilatildeo acadecircmica e profissional de seus alunos

Portanto o paradoxo a que nos referimos anteriormente pode ser reshysumido da seguinte maneira ao mesmo tempo em que a Argumentaccedilatildeo Juriacutedica ganhou o status de disciplina autocircnoma e indispensaacutevel agrave formashyccedilatildeo do acadecircmico de Direito a modernidade impulsiona - por meio dos recursos computacionais - o redator agrave reproduccedilatildeo de um discurso pronto irrefletido e ineficiente do ponto de vista argumentativo

Em que pese a aparente contradiccedilatildeo natildeo haacute duacutevidas de que a arshygumentaccedilatildeo deixou de exercer papel secundaacuterio e hoje funciona como requisito fundamental de todo aquele que pretende obter sucesso nas lides cm que atua E ela um elemento diferencial entre os profissionais de qualishydade - altamente requisitados no mercado - e os que se limitam a sustentar apenas teses de menor complexidade

O reconhecimento da importacircncia da argumentaccedilatildeo para o Direito natildeo eacute recente jaacute em 1958 Perelman e L Olbrechts-Tyteca afirmavam na introduccedilatildeo do Tratado da Argumentaccedilatildeo que durante seacuteculos a argumenshytaccedilatildeo foi relegada a segundo plano porque as decisotildees judiciais natildeo precishysavam de fundamentaccedilatildeo A atividade jurisdicional do magistrado consistia na busca da decisatildeo justa para cada caso a ele apresentado Os criteacuterios que determinavam tal decisatildeo eram quase sempre imprecisos e subjetivos muitas vezes se confundiam com valores morais sem vinculaccedilatildeo necessashyriamente juriacutedica

No mesmo sentido Viacutetor Gabriel10 assinala que com o advento da necessidade de fundamentaccedilatildeo das decisotildees judiciais decorrente inclusive

111 RODRIacuteGUEZ Viacutetor Gabriel Argumentaccedilatildeo juriacutedica teacutecnicas de persuasatildeo e loacuteshygica informal 4 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2005 p 09

16 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

da separaccedilatildeo dos poderes e da possibilidade de muacutetuo ldquo controlerdquo entre eles passou-se a privilegiar mais intensamente ldquo a necessidade de construshyccedilatildeo do discurso dos processos escritos e da racionalizaccedilatildeo do processo de construccedilatildeo do Direitordquo

No iniacutecio de 1970 Chaim Perelman inseriu um curso de Argumenshytaccedilatildeo na Universidade de Bruxelas onde lecionou Essa proximidade hisshytoacuterica talvez ainda nos dificulte perceber a relevacircncia fundamental que a argumentaccedilatildeo tem para a atividade jurisdicional de um Estado Democraacutetishyco de Direito mas o tempo continuaraacute se encarregando de trazer os esclareshycimentos necessaacuterios agrave valorizaccedilatildeo adequada da teoria da argumentaccedilatildeo

Capiacutetulo II

NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

Em geral classificam-se os textos quanto agrave tipologia sob trecircs noshymenclaturas texto narrativo texto descritivo e texto dissertativo1

A primeira observaccedilatildeo relevante a fazer eacute que apesar de a classifishycaccedilatildeo ser didaticamente uacutetil raramente satildeo produzidos textos puramente narrativos descritivos ou dissertativos O que ocorre na verdade eacute uma classificaccedilatildeo que considera a predominacircncia das caracteriacutesticas de um tipo de produccedilatildeo textual em detrimento das demais menos evidentes mas natildeo menos importantes

Na praacutetica redacional de todo texto eacute extremamente comum por exemplo que uma narrativa seja permeada por trechos descritivos certas caracteriacutesticas descritas de uma cena de um objeto ou de uma pessoa enrishyquecem de detalhes de forma inquestionaacutevel os fatos narrados e fornecem material precioso para que essa narrativa possa ser valorada a partir dos interesses de quem conta a histoacuteria

1 Charaudeau (1983 e 1992) propotildee uma classificaccedilatildeo distinta O autor faz distinccedilatildeo entre tipos de textos e modos de organizaccedilatildeo do discurso Os primeiros vistos como um resultado satildeo o publicitaacuterio o noticioso o didaacutetico o cientiacutefico o juriacutedico etc os segundos encarados como um processo satildeo o descritivo o narrativo o argumentativo e o enunciativo Segundo ele as duas noccedilotildees natildeo devem ser confundidas pois embora haja em alguns casos certa relaccedilatildeo entre tipo de texto e determinado modo de orgashynizaccedilatildeo discursiva (vejam-se os editoriais e o modo argumentativo) cada tipo textual pode organizar-se discursivamente por meio de qualquer um dos modos E o que ocorre com textos didaacuteticos que se organizam de maneira tanto descritiva quanto argumenta- tiva ou com os textos de imprensa que dependendo do gecircnero privilegiam os modos descritivo e narrativo vindo o argumentativo somente como contraponto

18 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Da mesma maneira fundamentar um determinado ponto de vista exishyge do argumentador muitas vezes que alguns fatos motivadores de sua tese sejam narrados A descriccedilatildeo de determinadas condutas pode igualmenshyte colaborar para justificar a tese sustentada A uacutenica certeza enfim eacute que narraccedilatildeo descriccedilatildeo e dissertaccedilatildeo podem compor juntas um soacute texto e sua separaccedilatildeo soacute se justifica natildeo raro por razotildees acadecircmicas

Enquanto narrar consiste em evidenciar fatos experienciados e deshysenvolvidos em um determinado tempo e espaccedilo descrever caracteriza-se por deitar sobre o mundo um olhar estaacutetico localizando os elementos da descriccedilatildeo e atribuindo-lhes qualidades que os singularizam Apesar de se oporem (narraccedilatildeo e descriccedilatildeo) satildeo estritamente ligados pois as accedilotildees soshymente tecircm sentido com relaccedilatildeo agraves identidades e agraves qualificaccedilotildees de seus agentes E mais o modo descritivo natildeo apenas completa o narrativo - ou o dissertativo - mas daacute-lhes sentido

Para que essa relaccedilatildeo entre os textos fique mais clara observe um fragmento do relatoacuterio de um Recurso Especial2 ao Superior Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro Os nomes das partes foram alterados

RELATOacute RIO

O Exmo Sr Ministro Ceacutesar Marciacutelio Rocha Luiz Ignaacutecio da Costa Filho ora recorrido ajuizou accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por danos morais em face do Flospital Satildeo Miguel objetivando o recebimento de quantia equivalente a 2000 (dois mil) salaacuterios miacutenimos ldquo tendo em vista todo o sofrimento experimentado pelo autor desde o iniacutecio do sofrimento de seu filho advindo da malsucedida cirurgia que culminou na hemorrashygia interna causadora da morte do menorrdquo (f 05)O MM Juiacutezo Monocraacutetico julgou parcialmente procedente o pedido inishycial e condenou a reacute ao pagamento da importacircncia equivalente a 1000 (hum mil) salaacuterios miacutenimos agrave eacutepoca do efetivo desembolso Irresignados o Hospital Satildeo Miguel e a Associaccedilatildeo Satildeo Miguel instituiccedilatildeo filantroacutepica e sua mantenedora apelaram ao Eg Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro o qual por maioria negou provimento ao apelo ()

Sabe-se que o relatoacuterio eacute a parte da peccedila processual em que satildeo narshyrados cronologicamente todos os fatos juridicamente importantes do caso concreto em anaacutelise Isso quer dizer que esse texto deve ser puramente narshyrativo Jaacute indicamos que a ideia de ldquo texto purordquo quanto agrave tipologia textual eacute praticamente impossiacutevel e que o mais comum eacute a utilizaccedilatildeo de um tipo de

2 Texto adaptado Os nomes foram alterados por razotildees eacuteticas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 19

lexto para compor um outro que c predominante Eacute exatamente isso que ocorre no fragmento anteriormente lido

Observe que o trecho entre aspas extraiacutedo do relatoacuterio do RecursoI special acima eacute dissertativo ldquo tendo em vista todo o sofrimento expeshyrimentado pelo autor desde o iniacutecio do sofrimento de seu filho advindo da malsucedida cirurgia que culminou na hemorragia interna causadora da morte do menorrdquo O ponto de vista sustentado entretanto mostra-se extremamente necessaacuterio agrave narraccedilatildeo de uma peccedila em que o autor ajuiacuteza uma accedilatildeo objetivando receber indenizaccedilatildeo por danos morais Em outras palavras a motivaccedilatildeo da indenizaccedilatildeo pleiteada depende da valoraccedilatildeo (texshyto argumentativo) de alguns acontecimentos narrados

Natildeo soacute encontramos dificuldade em separar com clareza os trechos narrativos descritivos ou dissertativos do texto que compomos como tamshybeacutem desenvolvemos com esforccedilo a redaccedilatildeo de uma narraccedilatildeo imparcial sem sustentar - tenuamente que seja - uma opiniatildeo ou enfatizar uma cashyracteriacutestica descrita por concebecirc-la mais relevante

Na verdade nada impede afirmar por exemplo que a descriccedilatildeo do estado psicoloacutegico de uma pessoa cujo filho morreu por conta de negligecircnshycia meacutedica seja o recurso utilizado para persuadir o interlocutor de que o autor de uma accedilatildeo faz jus agrave indenizaccedilatildeo Essa interdependecircncia entre osI ipos de texto pode ocorrer na produccedilatildeo dos textos juriacutedicos como tambeacutem em qualquer outra produccedilatildeo escrita

Garantido o entendimento de que natildeo existe ldquo texto purordquo e que a classificaccedilatildeo dc alguns segmentos honestamente dependeraacute de criteacuterios muitas vezes subjetivos passemos agrave identificaccedilatildeo das principais caracteshyriacutesticas dos textos narrativo descritivo e dissertativo

Ressaltamos que nosso objetivo neste livro natildeo eacute esgotar o tema tiposhylogia textual sequer pretendemos fazer uma exposiccedilatildeo longa e complexa sobre o tema mas precisamos traccedilar linhas gerais que caracterizem algumas especificidades de cada tipo textual para que o profissional do Direito tenha subsiacutedios miacutenimos que colaborem na sua produccedilatildeo textual argumentativa Importante tambeacutem que se adquira a compreensatildeo de como a narraccedilatildeo e a descriccedilatildeo fornecem elementos relevantes para que se defenda uma tese mediante o texto argumentativo

Antes de passarmos agrave contribuiccedilatildeo dos textos narrativo e descritivo agrave produccedilatildeo da argumentaccedilatildeo nosso objeto principal de estudo oferecemos exemplos de textos em que predomina cada uma das tipologias tradicionais (narraccedilatildeo descriccedilatildeo e argumentaccedilatildeo) a fim de facilitar a compreensatildeo dishydaacutetica pelo aluno

20 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Exemplo de texto narrativo predominante

A inicial que foi recebida por despacho de 28 de abril de 1997 veio acompanhada do inqueacuterito policial instaurado na la Delegacia Policial Do caderno informativo constam de relevantes o auto de prisatildeo em flashygrante de f 08 a 22 os boletins de vida pregressa de f 43 a 45 e o relatoacuterio final de f 131 a 134 Posteriormente vieram aos autos o laudo cadaveacuterico de f 146 e seguintes o laudo de exame de local e de veiacuteculo de f 172 a 185 o exame em substacircncia combustiacutevel de f 186 a 191 o termo de restishytuiccedilatildeo de f 247 e a continuaccedilatildeo do laudo cadaveacuterico que estaacute na f 509O Ministeacuterio Puacuteblico requereu a prisatildeo preventiva dos indiciados A prisatildeo em flagrante foi relaxada natildeo configurada a hipoacutetese de quase flagracircncia por natildeo ter havido perseguiccedilatildeo tendo sido os reacuteus localizashydos em virtude de diligecircncias policiais []

Exemplo de texto descritivo predominante

Um estudo da Nasa revelou que 2005 foi o ano mais quente desde que a temperatura global comeccedilou a ser medida no fim do seacuteculo XX A mediccedilatildeo feita por sateacutelites e estaccedilotildees meteoroloacutegicas instaladas na terra e no mar mostrou que os termocircmetros apresentaram as maiores elevaccedilotildees nos poios e nas regiotildees mais altas do Hemisfeacuterio Norte como o Alasca a Sibeacuteria e a Groelacircndia O ano mais quente na Terra havia sido 1998 quandoo El Nino deixou um rastro de anomalias climaacuteticas no mundo inteiro

Exemplo de texto argumentativo predominante

O princiacutepio do estado de inocecircncia ou como preferem da presunccedilatildeo de inocecircncia previsto na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 (art 5deg LV II) detershymina antes de a sentenccedila condenatoacuteria transitar em julgado a impossibishylidade de se impor ao acusado de um crime qualquer medida de coaccedilatildeo pessoal ao seu direito de liberdade que se revista de caracteriacutestica de execuccedilatildeo de pena Proibe-se a denominada ldquopena antecipadardquo exceccedilatildeo agraves providecircncias de natureza cautelar (prisatildeo em flagrante preventiva e temporaacuteria) Nesse sentido TJSP HC n 79434 (Damaacutesio de Jesus)

21 A C O N TR IBU ICcedil Atilde O DO T EXTO N ARRAT IVO PARA A ARG UM EN TACcedil AtildeO

A narraccedilatildeo eacute a modalidade de texto que se caracteriza pelo sequencia- mento damp fatos ao longo do tempo Trata-se na verdade de contar uma histoacute-

i ia com todos os seus eventos por meio dc um narrador3 O primeiro passo eacute exatamente escolher se esse narrador participaraacute ou natildeo da histoacuteria contada (gtu seja se a narraccedilatildeo seraacute em Ia ou em 3a pessoa4 Feito isso o narrador contaraacutei mi dado fato que se passou em determinado tempo e lugar Soma-se a isso que soacute existe fato soacute haacute accedilatildeo se praticada por determinados personagens

Narrar eacute portanto uma atividade posterior agrave existecircncia de uma reashylidade que se daacute necessariamente como passada (daiacute ser adequada a utilishyzaccedilatildeo do verbo no preteacuterito para narrar os fatos em qualquer peccedila processhysual) Aleacutem disso eacute ao mesmo tempo uma atividade que tem a faculdade dc fazer nascer de todas as partes um universo narrado que se apoia sobre outra realidade a qual soacute existe por meio desse universo

Soma-se a isso que eacute importante para a produccedilatildeo de uma narrativa clara completa que tambeacutem sejam apresentadas as causas motivadoras das accedilotildees dos personagens e as possiacuteveis consequecircncias geradas por esse acontecimento Todo esse conjunto de informaccedilotildees indicaraacute como a hisshytoacuteria se desenrolou e faraacute com que o leitor desse texto entenda com mais clareza o que efetivamente aconteceu

Assim sendo os elementos do texto narrativo tradicional satildeo os seshyguintes

bull fato - o que se vai narrar os acontecimentos e as accedilotildees propriashymente ditos

bull personagem - aquele ou aqueles que participaram da histoacuteria ou observaram os fatos ocorridos

bull lugar - onde se passa a histoacuteriabull tempo - quando o fato ocorreubull enredo - a sequecircncia encadeada e articulada dos fatos que comshy

potildeem o conteuacutedo da histoacuteria

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

1 Charaudeau diz que narrar natildeo eacute somente descrever uma seacuterie de fatos ou aconteshycimentos Para que essa atividade ocorra eacute necessaacuterio um narrador (escritor tesshytemunha advogado) que esteja munido de uma intencionalidade isto eacute de umavontade de transmitir alguma coisa (uma certa representaccedilatildeo da experiecircncia do mundo) a algueacutem (auditoacuterio particular ou universal) dentro de um contexto

4 A respeito do uso da pessoa gramatical nas formas verbais do texto juriacutedico re- comenda-se a utilizaccedilatildeo da terceira pessoa marcada pela impessoalidade porque mesmo que a narrativa dos fatos esteja sendo feita pelo proacuteprio titular do direito subjetivo de accedilatildeo - oportunidade em que exerce autonomamente a capacidade pos- tulatoacuteria - deve esse narrador posicionar-se como parte e natildeo como personagem

22 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

bull causa - o motivo que determinou a ocorrecircnciabull consequecircncia ~ o que decorreu das accedilotildees praticadasbull modo - como ocorreram os eventos

Imprescindiacutevel eacute esclarecer ao acadecircmico do Curso de Direito a relevacircnshycia do texto narrativo para a sustentaccedilatildeo de uma tese juriacutedica Vejamos entatildeo

Sustentar teses eacute por certo a atividade mais complexa no cotidiano de qualquer profissional da aacuterea juriacutedica Os filmes hollywoodianos apreshysentam com frequecircncia o estereoacutetipo do advogado audacioso que defende com brilhantismo causas aparentemente perdidas O espectador tende a se sentir atraiacutedo pelas habilidades de um profissional que contrariando todas as expectativas consegue convencer os outros do impossiacutevel Satildeo igualshymente sedutores a capacidade de dominar a arte oratoacuteria e os recursos mais sutis da linguagem E com base nesse modelo de atuaccedilatildeo profissional que muitos jovens escolhem a carreira que seguiratildeo

Assim mostrada no cinema a atividade profissional dos advogadoso leigo deixa de dimensionar uma importante tarefa desse profissional a saber antes de argumentar deve-se narrar os fatos ocorridos no caso conshycreto de maneira a contextualizar para todos os envolvidos na atividade jurisdicional o que ocorreu no caso em anaacutelise

Entretanto parece claro que nenhum juiz pode apreciar um pedido sem conhecer os fatos que lhe servem de fundamento Dessa forma a narshyraccedilatildeo ganha status de maior relevacircncia porque serve de requisito essencial agrave produccedilatildeo de uma argumentaccedilatildeo eficiente

Soma-se a isso que o princiacutepio da igualdade processual das partes exishyge que cada um tome ciecircncia das informaccedilotildees trazidas aos autos pela parte adversa para que tenha condiccedilotildees de exercer em plenitude a sua defesa

Por todas essas razotildees a narrativa deve ser vista dentro da peccedila proshycessual como parte fundamental da construccedilatildeo persuasiva do raciociacutenio

Leia a seguir um fragmento dos fatos e fundamentos de uma peticcedilatildeo inicial5 e observe nele as caracteriacutesticas do texto narrativo

FATOS E FUNDAM ENTOS

A autora matriculou sua filha na Instituiccedilatildeo de Ensino da reacute em 1999 para cursar o Jardim I Desde entatildeo a jovem permanece estudando na

5 Adaptaccedilatildeo de trecho de peticcedilatildeo inicial redigida por Taiacutes dc Jesus de Sousa Tavares Os nomes das partes foram alterados por razotildees eacuteticas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 23

mesma Instituiccedilatildeo onde cursa atualmente com 7 anos a I a seacuterie do Ensino FundamentalNo iniacutecio do ano letivo de 2003 a escola contratou os serviccedilos dc uma empresa particular especializada que ministra aulas de informaacutetica e de inglecircs para seus alunos nas dependecircncias da instituiccedilatildeo durante o horaacuteshyrio regular de aulas conforme paraacutegrafo primeiro da claacuteusula quinta do contrato de prestaccedilatildeo de serviccedilos educacionais firmado entre a autora e a reacute para o ano letivo de 2003Alegando que no iniacutecio do segundo semestre de 2003 passou a haver muita inadimplecircncia no pagamento das mensalidades a Diretora da Instishytuiccedilatildeo Neide Ana P Ramos e a Coordenadora Pedagoacutegica Raquel Les- sa passaram a adotar corno estrateacutegia meses depois reiteradas visitas agraves salas de aula para cobrar das crianccedilas que avisassem a seus pais que as aulas de informaacutetica e de inglecircs seriam canceladas se a escola natildeo conseshyguisse honrar o pagamento das empresas terceirizadas contratadasPor vaacuterias vezes as filhas da autora chegaram agrave sua casa dizendo que as aulas seriam canceladas se os pais natildeo efetuassem em dia o pagamento das mensalidades o que passou a preocupar a autora pelo comportashymento inadequado de fazer comunicados considerando que tal recurso era dirigido a crianccedilas de apenas quatro e sete anos sem condiccedilotildees porshytanto de discernir se seus pais estavam entre os inadimplentes ou natildeo Reitera-se que tais comunicados natildeo foram feitos por circulares como se espera de uma instituiccedilatildeo de ensino mas verbalmente para as crianshyccedilas que deveriam transmitir o recado para seus pais A filha mais nova da autora perguntou-Ihc por vaacuterias vezes se natildeo poderia mais assistir agraves aulas porque ela natildeo havia pago a mensalidade quando a autora explicou agrave filha de apenas quatro anos que a matildee havia pago sim a menshysalidade do coleacutegio ()

Acompanhe a sequecircncia cronoloacutegica dos principais eventos

A autora fez a 1a

matriacutecula da sua filha na

escola

Aumentou a inadimplecircncia no pagamento

das mensalidades

A autora foi impedida de assistir

agraves aulas

1999 20031deg sem 20032deg sem Meses despois ()

O elemento tempo talvez seja o que melhor caracterize a narraccedilatildeo E a sucessatildeo de eventos no tempo que denuncia a existecircncia de um enredo a ser contado Uma seacuterie de adjuntos adverbiais pode ser observada na narshyraccedilatildeo da peccedila inicial tal como foi destacado em negrito

24 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A seguir algumas das marcas temporais mais utilizadas na indicaccedilatildeo do tempo segundo proposta de KOCH Ingedore G Villaccedila Argumentashyccedilatildeo e linguagem Satildeo Paulo Cortez 2000

MARCAS TEMPORAIS UTILIZADAS NA NARRACcedilAtildeOEm relaccedilatildeo ao

momento da falaEm relaccedilatildeo ao marco

temporal

Concomitacircncia

AgoraHojeNeste momento Nesta altura

EntatildeoNo mesmo dia

Anterioridade

Haacute pouco Ontem Anteontem Haacute semanas Haacute meses No mecircs passado No ano passado

Na veacutespera No dia anterior No mecircs anterior Um ano atraacutes Uma semana antes Um mecircs antes Por vaacuterias vezes

Posterioridade

Daqui a poucoLogoAmanhatildeDepois de amanhatilde Em dois meses Duas semanas No proacuteximo dia

No dia seguinte Uma semana depois Um ano depois Um dia depois Daiacute uma(s) hora(s) Daiacute um(ns) dia(s)

Natildeo apenas o texto narrativo contribui para a produccedilatildeo de uma boa argumentaccedilatildeo O texto descritivo eacute tambcm uma importante ferramenta para a construccedilatildeo de textos em que se sustentam pontos de vista Vamos a essa questatildeo

22 A C O N T R IB U ICcedil Atilde O DO T EX T O D E S C R IT IV O PA R A A A R G U M EN T A Ccedil Atilde O

A descriccedilatildeo eacute marcada pela enumeraccedilatildeo de caracteriacutesticas de um obshyjeto de um ambiente de uma pessoa A descriccedilatildeo realiza uma espeacutecie de ldquo recorterdquo das imagens disponiacuteveis e enumera as caracteriacutesticas observadas em um determinado momento e em pontos especiacuteficos

Ademais uma boa descriccedilatildeo de uma pessoa por exemplo deve levar em conta senatildeo todos pelo menos grande parte das caracteriacutesticas fiacutesicas

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 25

(altura peso cor da pele e dos cabelos idade traccedilos do rosto voz modo de sc vestir etc - descriccedilatildeo objetiva) e das caracteriacutesticas psicoloacutegicas do iiuliviacuteduo (personalidade temperamento caraacuteter preferecircncias e aptidotildees dentre outros - descriccedilatildeo subjetiva)

Diferente do que se pensa essas caracteriacutesticas natildeo satildeo importantes apenas para a redaccedilatildeo de narrativas literaacuterias em que o autor gasta longas paacuteginas nessa tarefa Tambeacutem nas argumentaccedilotildees e nas narrativas forenshyses a descriccedilatildeo das caracteriacutesticas subjetivas das partes exerce importante papel A esse respeito observe o art 59 do CP em que o legislador detershyminou orientaccedilotildees para a fixaccedilatildeo da pena

Art 59 O juiz atendendo agrave culpabilidade aos antecedentes agrave conduta soshycial agrave personalidade do agente aos motivos agraves circunstacircncias e consequecircnshycias do crime bem como ao comportamento da viacutetima estabeleceraacute con- foirne seja necessaacuterio e suficiente para reprovaccedilatildeo e prevenccedilatildeo do crimeI - as penas aplicaacuteveis dentre as cominadasII - a quantidade de pena aplicaacutevel dentro dos limites previstosIII - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdadeIV - a substituiccedilatildeo da pena privativa da liberdade aplicada por outra espeacutecie de pena se cabiacutevel

Veja que elementos como ldquo conduta socialrdquo ldquo personalidade do agen- lerdquo e ldquo comportamento da viacutetimardquo podem ateacute ser depreendidos dos fatos narrados em um relatoacuterio mas satildeo principalmente verificaacuteveis por meio da descriccedilatildeo de certas caracteriacutesticas do agente ou da viacutetima

Outro exemplo de texto predominantemente descritivo eacute apresentado adiante

Uma pessoa trafegava com sua moto em alta velocidade por uma aveshynida a mais ou menos 100 kmh Essa avenida fica dentro de um bairro movimentado e cheio de sinais O condutor estava drogado e totalmente alcoolizado sem qualquer condiccedilatildeo de discernir e reagir a eventos que ocorressem na pista

Observe o caraacuteter estaacutetico das informaccedilotildees natildeo haacute uma linha do tempo em que os fatos ocorrem sucessivamente como na narraccedilatildeo Mesmo havendo referecircncia aos anos 1998 e 2005 o objetivo da repoacuterter foi o de estabelecer uma comparaccedilatildeo qualitativa e natildeo necessariamente um espaccedilo de tempo em que fatos se desenvolvem Soma-se a isso que o texto natildeo eacute rico em elementos gramaticais que indiquem progressatildeo temporal como ocorre na narraccedilatildeo

26 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O trecho eacute tambeacutem farto em expressotildees adjetivas que caracterizam e qualificam o objeto do texto descritivo ldquo o ano mais quenterdquo ldquoos termocircmeshytros apresentaram as maiores elevaccedilotildees nos poiosrdquo e ldquo regiotildees mais altas do Hemisfeacuterio Norte como o Alasca a Sibeacuteria e a Groclacircndiardquo

Caracteriacutesticas semelhantes ocorrem no trecho a seguir em que as partes sacirco qualificadas em uma peticcedilatildeo inicial6

Simone da Rocha Silva casada gerente bancaacuteria portadora da carshyteira de identidade ndeg 123456789-00 e inscrita no CPFMF sob o ndeg 444777123-77 domiciliada na Rua Maacuterio Costa 180 casa 9 Madu- reira Rio de Janeiro CEP 21221-221 por seu advogado com procurashyccedilatildeo infra-assinada propotildee

Accedilatildeo de Reparaccedilatildeo de Danos Morais pelo rito sumaacuterioEm face de Odaleia Melo brasileira solteira autocircnoma portadora da carteira de identidade ndeg 123456789-55 inscrita no CPFMF sob o ndeg 123456789-33 domiciliada na Rua Adolfo Luiz 171 apto 200 Engeshynho de Dentro Rio de Janeiro CEP 21221-00 pelos motivos de fato e de direito expostos a seguir

Observe que em ambos os casos ilustrados a descriccedilatildeo feita - seja no texto jornaliacutestico seja no texto juriacutedico - eacute objetiva pois enumera caracshyteriacutesticas concretamente observadas sem que seja necessaacuteria a percepccedilatildeo subjetiva dos sujeitos No segundo exemplo as caracteriacutesticas necessaacuterias agrave qualificaccedilatildeo das partes satildeo objetivamente determinadas pelo Coacutedigo de Processo Civil no art 282 inciso II Haacute situaccedilotildees tambeacutem em que a desshycriccedilatildeo subjetiva serviraacute de estrateacutegia modalizadora7 de grande importacircncia para a argumentaccedilatildeo do ponto de vista defendido8

Suponha a hipoacutetese em que esteja sendo apreciado um pedido de inshydenizaccedilatildeo por danos materiais decorrentes de uma colisatildeo de automoacuteveis A extensatildeo dos danos provocados seraacute aferida pelo orccedilamento meacutedio de

6 Adaptaccedilatildeo de trecho de peticcedilatildeo inicial redigida pela estagiaacuteria Taiacutes de Jesus de Sousa Tavares

7 A modalizaccedilatildeo consiste na atitude do falante com relaccedilatildeo ao conteuacutedo objetivo de sua fala Um dos elementos discursivos mais empregados na dissertaccedilatildeo argumen- tativa refere-se agrave conveniente seleccedilatildeo lexical De fato em muitos casos uma messhyma realidade pode ser apresentada por vocaacutebulos positivos neutros ou negativos tal como ocorre em sacrificarmatarassassinar - comporescreverrabiscar

8 Charaudeau diz o seguinte enquanto argumentar consiste em levar em conta operashyccedilotildees abstratas de ordem loacutegica destinadas a explicar os laccedilos de causalidade entre fatos ou acontecimentos descrever consiste em identificar os seres no mundo classishyficando-os sem estabelecer necessariamente entre eles uma relaccedilatildeo de causalidade

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO 27

oficinas mecacircnicas que realizam reparos dessa natureza Mas o que confere credibilidade ao orccedilamento juntado aos autos do processo Certamente poderia ajudar nessa tarefa a descriccedilatildeo minuciosa dos estragos na lataria do automoacutevel causados pela colisatildeo que serviria de fundamento na exposishyccedilatildeo da narrativa dos fatos ao pedido do polo ativo Ajuntada de fotografias lambeacutem seria providecircncia desejaacutevel

Veja a seguir um caso publicado no JB9 em que se discute a ocorshyrecircncia de superfaturamento no contrato para locaccedilatildeo de um prcdio pelal undaccedilatildeo Nacional de Sauacutede (Funasa) Leia a reportagem

MP ACUSA ESTEVAtildeO DE SUPERFATURARBR A SIacuteL IA O Ministeacuterio Puacuteblico Federal aponta indiacutecios de superfatushyramento no contrato para locaccedilatildeo de um preacutedio no centro de Brasiacutelia firshymado sem concorrecircncia puacuteblica entre a Fundaccedilatildeo Nacional de Sauacutede (Funasa) e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio Construccedilotildees e Projetos que pertence ao ex-senador Luiz Carvalho Responsaacutevel pela investigaccedilatildeo o procurador da Repuacuteblica Luiz Fernando de Souza disse que o aluguel de R$ 170 mil acordado entre a Funasa e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio com base em avaliashyccedilatildeo da Caixa Econocircmica Federal estaacute acima dos preccedilos de mercado Para Luiz Carvalho o valor do aluguel natildeo poderia ultrapassar R$ 120 mil ldquo O valor do imoacutevel foi avaliado pela Caixa Econocircmica ()rdquo O preacutedio alugado tem o nome do pai de Luiz Carvalho Lino Carvalho Pinto e pertence ao grupo JK SA cujos donos satildeo o ex-senador e a Fundaccedilatildeo Abiacutelio Na semana passada depois que as denuacutencias foram divulgadas o ex-senador disse que comprou a Fundaccedilatildeo AbiacutelioLuiz Francisco tambeacutem estranhou o fato dc a Funasa ter alugado um preacutedio menor do que o exigido previamente No edital que divulgou a Funasa pedia um imoacutevel com aacuterea uacutetil miacutenima de oito mil metros quadrados para escritoacuterios Segundo a documentaccedilatildeo do contrato o edifiacutecio tem 17160 metros quadrados mas apenas 727282 metros quadrados satildeo destinados a escritoacuterios ldquo Essa exigecircncia publicada vincula a administraccedilatildeo e serve unishycamente para afastar outras possiacuteveis empresasrdquo afirmou o procurador em carta enviada ontem ao presidente da Funasa Mauriacutecio Ribeiro Marcos

Observe como a descriccedilatildeo do imoacutevel e de seu contrato de locaccedilatildeo eacute de grande relevacircncia para a apreciaccedilatildeo da questatildeo juriacutedica discutida Por esse motivo na narraccedilatildeo dos fatos da peccedila acusatoacuteria deveraacute o MP descreshyver tais caracteriacutesticas como fundamento juriacutedico de sua acusaccedilatildeo

Publicaccedilatildeo de quinta-feira 12 de julho de 2012 Consultado em lthttpjbonIineter- racombrjbpapelbrasi12012071 ljorbra20010711014htmlgt Acesso em 11 ago 2012 Texto adaptado para preservar os envolvidos

28 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Da mesma maneira vaacuterios outros exemplos podem ser encontrados nas mais variadas peccedilas processuais

23 O TEXTO D1SSERTATIVO

A dissertaccedilatildeo estaacute presente no cotidiano de todas as pessoas que a todo o momento precisam sustentar opiniotildees posicionarem-se em relaccedilatildeo aos acontecimentos que ocorrem agrave sua volta

A tradicional classificaccedilatildeo do texto dissertativo costuma apresentar uma proposta bipartida distingue-se a dissertaccedilatildeo expositiva da dissertashyccedilatildeo argument ativa

Dissertaccedilatildeo expositiva eacute a maneira como a maior parte dos autores deshysigna a dissertaccedilatildeo em que se expressam ideias sobre determinado tema sem a preocupaccedilatildeo poreacutem de persuadir o auditoacuterio acerca da tese defendida

Nesse tipo de texto natildeo se faz necessaacuterio profundo conhecimento a respeito da questatildeo abordada pois natildeo eacute necessaacuterio posicionar-se diante da problemaacutetica investigada O objetivo eacute passar um conjunto de informaccedilotildees relevantes que possam contribuir com o esclarecimento do auditoacuterio acerca de um assunto especiacutefico para que ele o conheccedila melhor

Dissertaccedilatildeo argumentativa eacute aquela que implica defesa de uma tese com a finalidade de tentar persuadir algueacutem de que este eacute o ponto de vista mais adequado a adotar em determinada circunstacircncia Eacute importante seleshycionar um conjunto consistente de fatos (provas ou indiacutecios) por meio dos quais se pretende demonstrar a superioridade da tese defendida

Dessa forma a dissertaccedilatildeo argumentativa em que predomina a funshyccedilatildeo conativa ou apelativa da linguagem tem por objetivo sustentar a supeshyrioridade de uma tese em detrimento de outra seu discurso eacute extremamente carregado de ideologias A dissertaccedilatildeo expositiva por outro lado natildeo preshytende convencer o interlocutor a respeito de coisa alguma eacute um discurso neutro apenas expondo informaccedilotildees a respeito de um dado assunto

Essa postura de distinguir dois tipos de dissertaccedilatildeo tem sido muito criticada em estudos recentes porquanto se acredite que a neutralidade na construccedilatildeo de um discurso seja impossiacutevel Assinala Ingedore Koch10 queo discurso que se pretende neutro ingecircnuo ao assim se colocar jaacute tomou uma posiccedilatildeo em detrimento de vaacuterias outras possiacuteveis estrateacutegias de cons-

10 KOCH Ingedore G Villaccedila Argumentaccedilatildeo e linguagem 2 ed Satildeo Paulo Cortez 1987 p 09

liiiccedilatildeo de seu conteuacutedo Em outras palavras a dissertaccedilatildeo que se pretende meramente expositiva tambeacutem conteacutem uma ideologia

Ademais a proacutepria seleccedilatildeo de informaccedilotildees que poderiam ser impor-l antes para a dissertativa expositiva jaacute caracteriza certas escolhas dentro de uma hierarquia abstrata de valores que aquele que escreve tem de fazerI )n mesma maneira a ordem em que os fatos seratildeo apresentados na exposhysiccedilatildeo eacute outro fator que determina ser impossiacutevel fazer uma exposiccedilatildeo neu- ira sobre determinado tema Natildeo haacute portanto como produzir um discurso verdadeiramente neutro

O modo dissertativo-argumentativo efetivamente se configura quanshydo existe a defesa de uma tese O texto argumentativo particularmente apresenta

a) uma proposta sobre o mundo que provoque um questionamento quanto agrave sua legitimidade

b) um sujeito que se engaje com relaccedilatildeo a esse questionamento e deshysenvolva um raciociacutenio para tentar estabelecer uma verdade (que seja proacutepria ou universal que se trate de uma simples aceitabilidashyde ou de uma legitimidade) sobre essa proposta

c) um outro sujeito que relacionado agrave mesma proposta questionamenshyto e verdade constitua-se no alvo da argumentaccedilatildeo (pessoa a que se dirige o sujeito arguinentador)

Ainda que a distinccedilatildeo entre as duas propostas de dissertaccedilatildeo seja uacutetil apenas do ponto de vista didaacutetico observe-se que no Direito desenvolshyvem-se textos dissertativos muito mais elaborados que em algumas outras aacutereas profissionais por conta da proacutepria natureza da atividade

Para que o receacutem-iniciado na praacutetica argumentativa se sinta habilitado a produzir textos tatildeo complexos assinala Toledo satildeo necessaacuterios alguns requisitos certo amadurecimento no assunto sobre o qual discorreraacute coshynhecimento da mateacuteria raciociacutenio loacutegico e dialeacutetico capacidade de anaacutelise e siacutentese domiacutenio da norma culta e conhecimento teoacuterico-refiexivo consisshytente que decirc bases soacutelidas para o desenvolvimento de um bom texto

Pela complexidade inerente agrave argumentaccedilatildeo juriacutedica o profissional do Direito precisa aleacutem dos requisitos jaacute destacados desenvolver as seshyguintes habilidades adquirir um repertoacuterio vasto dominar tipos diferentes

Cap II - NARRACcedilAtildeO E DESCRICcedilAtildeO TEXTOS A SERVICcedilO DA ARGUMENTACcedilAtildeO

TOLEDO Marleine Paula Marcondes e Ferreira de NADOacuteLSKIS Hecircndricas Coshymunicaccedilatildeo Juriacutedica 4 ed Satildeo Paulo Sugestotildees Literaacuterias 2002

30 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

de argumentos e de estrateacutegias argumentativas avaliar a aceitabilidade do auditoacuterio perante os seus argumentos e as suas estrateacutegias argumentativas operar juiacutezos e reflexotildees complexas por meio dos quais se deseja encamishynhar o raciociacutenio do aLiditoacuterio

Quanto ao conteuacutedo teoacuterico desenvolvido por autores consagrados acerca da argumentaccedilatildeo ressaltamos inicialmente que eacute extremamente vasto mas ainda assim trataremos adiante das questotildees que nos pareceram mais importantes

Capiacutetulo III

ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

No que diz respeito agrave relaccedilatildeo do tratado da argumentaccedilatildeo com os aushytores gregos e latinos Perelman destaca em sua obra algumas motivaccedilotildees a seguir expostas

U A ARG UM EN TACcedilAtildeO E A R ET Oacute R IC A C LAacute SS IC A

Os loacutegicos e filoacutesofos modernos natildeo tratavam a argumentaccedilatildeo como ciecircncia autocircnoma relegando-a simplesmente ao estudo da arte de persuashydir e convencer como a teacutecnica da deliberaccedilatildeo e da discussatildeo Destaca-se aqui Aristoacuteteles com as provas que chama de dialeacuteticas cuja utilizaccedilatildeo mostra na Retoacuterica Daiacute aliaacutes a denominaccedilatildeo Nova Retoacuterica agrave proposta perelmaniana

Outra razatildeo mais importante entretanto conduziu-o a forma com que a Antiguidade se ocupou da dialeacutetica e da retoacuterica O raciociacutenio diashyleacutetico eacute considerado paralelo ao raciociacutenio analiacutetico mas trata do verossiacuteshymil em vez de lidar com proposiccedilotildees necessaacuterias Aleacutem disso a ideia de adesatildeo e de espiacuteritos a quem se dirige um discurso eacute essencial a todas as teorias antigas da retoacuterica A aproximaccedilatildeo do autor em relaccedilatildeo agrave retoacuterica visa a enfatizar que eacute em funccedilatildeo de uni auditoacuterio que qualquer argumento se desenvolve

Vale destacar ainda que em alguns aspectos o Tratado de Argushymentaccedilatildeo de Perelman ultrapassa os limites da retoacuterica antiga ao mesmo tempo em que deixa outros de lado

Um dos aspectos destacados se refere agrave distinccedilatildeo de metas entre a reshytoacuterica antiga e a nova retoacuterica Enquanto aquela valorizava a argumentaccedilatildeo oral esta daacute ecircnfase aos textos escritos A preocupaccedilatildeo de Perelman (e aqui

32 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ele se espelha em Aristoacuteteles) eacute compreender o mecanismo do pensamento e estudar a estrutura da argumentaccedilatildeo Aleacutem disso enfatiza que a discusshysatildeo com um uacutenico interlocutor ou mesmo a deliberaccedilatildeo iacutentima dependem igualmente de uma teoria geral da argumentaccedilatildeo Em tal aspecto foi aleacutem dos limites da retoacuterica antiga

Perelman e L Olbrechts-Tyteca em seu Tratado da Argumentaccedilatildeo vinculado agrave tradiccedilatildeo da retoacuterica e da dialeacutetica gregas definem argumentashyccedilatildeo como o ato de provocar ou aumentar a adesatildeo dos espiacuteritos agraves teses que se apresentam ao seu assentimento

Charaudeau (1992) em sua Grammaire du Sens et de I rsquoExpression diz que argumentaccedilatildeo eacute uma atividade discursiva que encarada do ponto do vista do sujeito argumentador participa de uma dupla busca 1deg) uma busca de rashycionalidade que tende a um ideal de verdade quanto agrave explicaccedilatildeo de fenocircmenos do universo 2deg) uma busca de influecircncia que tende a um ideal de persuasatildeo o qual consiste em fazer dividir com outro (interlocutor ou destinataacuterio) um certo universo do discurso a ponto de levaacute-lo a ter as mesmas propostas

A primeira pelo fato de nenhum sujeito ser ingecircnuo torna-se uma busca do verossiacutemil de um verossiacutemil que depende das representaccedilotildees so- cioculturais divididas pelos membros de um dado grupo em nome da exshyperiecircncia ou do conhecimento A segunda eacute um pouco ambiacutegua na medida em que se apresenta como fazendo parte de um processo racional e loacutegico quando a divisatildeo da proacutepria convicccedilatildeo com o outro pode ser obtida por meios diferentes daquele do raciociacutenio por intermeacutedio por exemplo da seduccedilatildeo que tambeacutem se vale de outros modos de organizaccedilatildeo do discurso (Descritivo e Narrativo)

Enfim seja considerando o fenocircmeno do ponto de vista da busca de adesatildeo seja considerando do ponto de vista da busca do verossiacutemil e da influecircncia que tende a um ideal de persuasatildeo seja ainda levando em conta ambas as visotildees sua importacircncia para o estudo da argumentaccedilatildeo eacute inegaacutevel

32 AS NO CcedilOtilde ES D E A U D ITOacute R IO PO L IFO N IA E IN T ER T EX T U A L ID A D E

Outro ponto importante da proposta de Perelman eacute a noccedilatildeo de auditoacuteshyrio Segundo o autor para que uma argumentaccedilatildeo se desenvolva eacute preciso que aqueles a quem ela se destina lhe prestem atenccedilatildeo Por seu turno para isso ocorrer eacute indispensaacutevel prender o interesse do puacuteblico condiccedilatildeo funshydamental para o andamento de qualquer argumentaccedilatildeo

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 33

Destaque-se que tal puacuteblico cuja adesatildeo agrave argumentaccedilatildeo visa a obter constitui portanto o que Perelman chama de auditoacuterio No niacutevel da retoacuteshyrica ele define auditoacuterio como o conjunto de pessoas que o orador quer influenciar com sua argumentaccedilatildeo

Por outro lado como o importante na argumentaccedilatildeo natildeo eacute saber o que o proacuteprio orador considera verdadeiro ou probatoacuterio mas qual eacute o parecer daqueles a quem ela se dirige ele registra e trabalha com duas espeacutecies de auditoacuterio o universal e o particular

O auditoacuterio universal eacute constituiacutedo pela humanidade inteira ou pelo menos por todos os homens adultos e normais O particular divide-se em dois tipos o formado no diaacutelogo somente pelo interlocutor a quem se dirige o constituiacutedo pelo proacuteprio sujeito quando ele delibera ou apresenta as razoes de seus atos Opondo-se a argumentaccedilatildeo agrave demonstraccedilatildeo o disshycurso argumentativo destina-se a auditoacuterios particulares embora vise com IVequecircncia ao universal

Insta salientar neste ponto a noccedilatildeo de polifonia Esse conceito possishybilita a expressatildeo e a percepccedilatildeo de vozes simboacutelicas no interior dos enunshyciados que representam as artes do dizer e as diferentes possibilidades do sentir por meio de siacutembolos e mitos

O conceito de polifonia noccedilatildeo elaborada por Ducrot em 1983 signishyfica a incorporaccedilatildeo ao discurso do locutor de asserccedilotildees emitidas por terceishyros sejam eles seus interlocutores a opiniatildeo puacuteblica ou outras fontes Esse aspecto eacute retomado por Angelim em 1996 que assinala ser a polifonia um recurso de persuasatildeo no processo argumentativo

A autora citada presta importante esclarecimento ao estabelecer a dishyferenccedila entre polifonia e intertextualidade Segundo seu ponto de vista a polifonia implica o reportar de falas alheias como recurso e reforccedilo agrave linha argumentativa ao passo que intertextualidade decorre de repeticcedilatildeo de falas de outros emissores com quaisquer outras intenccedilotildees A polifonia eacute definida como ldquoa incorporaccedilatildeo que o locutor faz ao seu discurso de assershyccedilotildees atribuiacutedas a outros enunciadores ou personagens discursivos - ao(s) interlocutor(es) ou agrave opiniatildeo puacuteblica em geralrdquo (Koch 1996 p 142)

Entende-se que a polifonia eacute um fato constante no discurso que ofeshyrece ao locutor a possibilidade de tirar consequecircncias de uma asserccedilatildeo cuja responsabilidade natildeo assume diretamente pois a atribui a enunciador estranho A condiccedilatildeo para que haja polifonia eacute portanto que o locutor seja diferente do enunciador o locutor faz com que outro personagem diga algo no interior do seu proacuteprio discurso

34 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Koch (1996 p 149) afirma que a autoridade polifocircnica constitui o proacuteprio fundamento do encadeamento discursivo Nesse caso o locutor introduz no seu discurso uma voz responsaacutevel pela asserccedilatildeo de uma detershyminada informaccedilatildeo Com isso essa asserccedilatildeo eacute apenas representada e sobre ela encadeia uma segunda relativa a outra proposiccedilatildeo como faria sobre a proacutepria proposiccedilatildeo considerada como verdade

Conforme o estudo da autora referida na argumentaccedilatildeo o recurso agrave autoridade polifocircnica permite ao locutor

a) natildeo se portar de modo ditatorial (discurso autoritaacuterio)b) prever os argumentos possiacuteveis do adversaacuterio e reconhecer-lhes

certa validade incorporando-os ao proacuteprio discurso (argumento de lsquooposiccedilatildeo)

c) dotar o seu discurso de maior poder de persuasatildeo desarmando o seu adversaacuterio porque natildeo pode ser contestado porque permite antecipar-se a ele introduzindo no proacuteprio discurso os argumentos possiacuteveis

E interessante salientar que segundo Ducrot (1984) por meio da iroshynia procuramos mostrar a falsidade de uma tese utilizando em seu favor argumentos absurdos atribuiacutedos aos defensores dessa tese de tal modo que o absurdo de suas palavras possa fazer parecer o absurdo da tese As posiccedilotildees de ambos mostram ser bem plausiacutevel tratar a ironia como um fenocircmeno polifocircnico visto que ela pode ser considerada como recurso linshyguiacutestico que possibilita ao locutor sugerir pelo contexto ou pela entoaccedilatildeo o contraacuterio do que o enunciado parece exprimir

33 A ARG UM EN TACcedil AtildeO E O PRO C ESSO DE PRO DUCcedilAtildeO DE TEXTO S JU R IacuteD IC O S

Argumentar como jaacute foi destacado anteriormente exige que se deshysenvolvam vaacuterias competecircncias dentre elas que se adote uma postura criacuteshytica perante o texto lido e o texto que se pretende redigir

Esse enfoque ao processo comunicativo e expressivo permite que se problematize a aprendizagem da leitura e da escrita Segundo Osakabe (1979)

Aprender a ler e escrever natildeo corresponde simplesmente agrave aquisiccedilatildeo de um novo coacutedigo ou muito menos ao simples desenvolvimento de um

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 35

tipo de percepccedilatildeo atraveacutes do acreacutescimo de uma nova habilidade Aprenshyder a ler eacute tambeacutem ter acesso a um mundo distinto daquele em que a oralidade se instala e organiza o mundo da escrita

De acordo com esse autor a produccedilatildeo escrita deve permitir ao argu- mentador reconhecer sua identidade seu lugar social as tensotildees simboacutelicas e imaginaacuterias que animam o contexto em que se insere a questatildeo discutida sempre questionando e compreendendo as vozes dos seus sentidos no real em que a proacutepria argumentaccedilatildeo se insere

Osakabe destaca ainda a importacircncia da leitura como instrumento de reforccedilo ao poder argumentativo e portanto de desenvolvimento do potencial de expressatildeo escrita que algumas pessoas definem como ldquobem escreverrdquo

Na accedilatildeo discursiva a coesatildeo e a coerecircncia satildeo elementos de granshyde importacircncia porque aquela estabelece relaccedilotildees de sentido conectando na superfiacutecie do texto as palavras as sentenccedilas e os paraacutegrafos esta diz respeito agrave possibilidade de um texto fazer sentido para os usuaacuterios encon- tra-se no niacutevel profundo do texto Sendo assim fica demonstrado que o argumentador deveraacute trabalhar o planejamento e execuccedilatildeo de seu texto em funccedilatildeo desses aspectos

Esse pensamento encontra respaldo em Perelmann amp Olbrechts-Tyteca (1996) precursores de uma teoria da argumentaccedilatildeo em que se apoiam muitos estudiosos do discurso na atualidade O trabalho desses autores baseia-se na retoacuterica greco-latina mas ultrapassou os seus limites ao deshyli nir como argumentativa toda a atividade discursiva oral ou escrita com finalidade persuasiva A Retoacuterica Claacutessica que era considerada uma arte oratoacuteria restringia-se ao discurso oral proferido diante de uma multidatildeo com objetivos persuasivos

Numa breve retrospectiva histoacuterica destacamos que Aristoacuteteles (384- 322 aC) tem grande importacircncia para o estudo da teoria da argumentaccedilatildeo pois abordou temas que deram origem a duas vertentes dessa teoria nos Toacutepicos (1967) ele tratou do assunto sob o acircngulo do raciociacutenio isto eacute do ponto de vista loacutegico Na Retoacuterica (1967) ele se concentrou em aspectos relativos agrave persuasatildeo do auditoacuterio privilegiando fatores sociais

Jaacute na Idade Moderna com Descartes (1946) e a busca da verdade objetiva a retoacuterica perdeu espaccedilo no acircmbito do discurso cientiacutefico Nesse periacuteodo ficou vinculada predominantemente ao estilo literaacuterio sendo conshysiderada como ornamento A argumentaccedilatildeo por sua vez assumiu caraacuteter de demonstraccedilatildeo pois a proposta cartesiana buscava demonstrar racionalshymente o caraacuteter universal das coisas

36 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Identificamos novos rumos no estudo da argumentaccedilatildeo apenas na seshygunda metade do seacuteculo XX com o desenvolvimento da Psicologia Cognishytiva das Teorias da Enunciaccedilatildeo e da Pragmaacutetica Na sequecircncia desta seccedilatildeo apresentamos as contribuiccedilotildees de alguns estudiosos das questotildees referentes agrave argumentaccedilatildeo tendo em vista obter suporte teoacuterico para esta obra

Como jaacute registrado anteriormente Perelman amp Olbrechts-Tyteca (1996) ultrapassaram os limites da Retoacuterica Claacutessica ao definir como ar- gumentativa toda atividade discursiva oral ou escrita com finalidade pershysuasiva

Seu trabalho auxilia-nos a repensar o paradigma claacutessico de estudo das ciecircncias humanas e sociais particularmente no que se refere aos seus fundamentos calcados na loacutegica matemaacutetica de fundo demonstrativo Peshyrelman propotildee que se substitua o citado paradigma por um novo tipo de loacutegica embasado no que designa como o processo de argumentaccedilatildeo

Na perspectiva de Perelman o conhecimento possui uma dimensatildeo diashyleacutetica e por meio da teoria da argumentaccedilatildeo toma-se possiacutevel ao estudioso natildeo apenas lanccedilar matildeo da razatildeo (como fazem os formal istas) mas tambeacutem utilizaacute-la para obter a adesatildeo das demais pessoas para determinada tese

Decorre daiacute que a praacutetica da argumentaccedilatildeo natildeo eacute um exerciacutecio esshypeculativo nem se confunde com a simples descriccedilatildeo de um objeto ou a narraccedilatildeo de um acontecimento eacute um encaminhamento pelo qual uma pesshysoa visa a exercer influecircncia sobre outra Para atingir esse objetivo o coshynhecimento natildeo eacute suficiente eacute necessaacuterio saber valorizaacute-lo e fazecirc-lo aceito pelo interlocutor seja ele uma pessoa ou um grupo isto eacute o auditoacuterio que possui inteligecircncia e vontade proacutepria

Aleacutem disso a praacutetica argumentativa envolve o raciociacutenio e a loacutegica jaacute que o argumentador deve elaborar provas para defender sua tese Enfim argumentar na realidade implica a tentativa de convencer o auditoacuterio agrave luz de um raciociacutenio coerente e consciente mediante a apresentaccedilatildeo de razotildees em face da compatibilidade das provas com as demonstraccedilotildees

Entende-se entatildeo que eacute em funccedilatildeo da influecircncia que se deseja exershycer sobre um auditoacuterio que se desenvolve toda uma argumentaccedilatildeo Nessa linha de pensamento verificamos que o sentido de um enunciado comporshyta como elemento constitutivo essa forma de influecircncia a qual denominashymos forccedila argumentativa

Desse modo a liacutengua ao mesmo tempo em que contribui primeirashymente para determinar o sentido dos enunciados eacute um dos lugares privileshygiados em que a argumentaccedilatildeo eacute elaborada

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 37

Tais enunciados obedecem a uma orientaccedilatildeo argumentativa quando seu conteuacutedo visa a fazer admitir outros enunciados

Importa destacar a avaliaccedilatildeo de Koch (1996) a respeito da argumenshytaccedilatildeo como o ato mais importante da linguagem que busca a persuasatildeo e procura atingir a adesatildeo e a vontade do interlocutor Acrescenta relevantes aspectos para a anaacutelise da argumentaccedilatildeo quando esclarece que a linguashygem eacute uma forma de accedilatildeo dotada de intencionalidade o que implica sishymultaneamente a caracteriacutestica de ser veiacuteculo de ideologia que se expresshysa mediante a argumentaccedilatildeo

Vai (1994) auxilia na anaacutelise desse fenocircmeno ao dizer que a ideoshylogia dominante quer fazer crer que haacute sempre um jeito certo de fazer as coisas um jeito certo de enxergar e interpretar a realidade um jeito certo de pensar

A compreensatildeo desse aspecto torna-se mais evidente considerando- se o posicionamento de Benveniste (1966) ao afirmar que o sujeito se

apropria da linguagem num momento individual todavia ele o faz sob determinadas condiccedilotildees sociais culturais e ideoloacutegicas Focalizando-se a questatildeo do discurso sob esse acircngulo podemos dizer que pela consideraccedilatildeo fundamental das condiccedilotildees de produccedilatildeo na Anaacutelise do Discurso natildeo eacute o sujeito (argumentador) que se apropria da linguagem O que existe eacute uma forma social de apropriaccedilatildeo da linguagem em que estaacute refletida a ilusatildeo do sujeito isto eacute sua interpelaccedilatildeo feita pela ideologia E nesse jogo do lugar social e dos sentidos estabelecidos que estaacute representada a determinaccedilatildeo histoacuterico-social do discurso

Orlandi (1996) menciona que de forma geral podemos dizer que o argumentador natildeo eacute um sujeito-em-si mas tal como existe socialmente A apropriaccedilatildeo da linguagem eacute um ato social Com respeito agrave relaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo discursiva e a formaccedilatildeo ideoloacutegica resta-nos especificar que a interaccedilatildeo entre argumentador e auditoacuterio estaacute marcada por essa relaccedilatildeo Isso porque o lugar que os interlocutores ocupam numa formaccedilatildeo social e na sua relaccedilatildeo com a ideologia eacute constitutivo de seu discurso isto eacute daacute substacircncia agravequilo que este significa

Assim a relaccedilatildeo entre argumentador e auditoacuterio pode variar desde a maior harmonia ateacute a maior incompatibilidade ideoloacutegica o que vai inshyterferir na compreensatildeo do texto uma vez que como vimos a leitura eacute produzida socialmente Cabe lembrar que esse processo estaacute marcado no e pelo funcionamento discursivo Platatildeo amp Fiorin (1996) satildeo coerentes com os pontos de vista citados pois apresentam o discurso como resultado de

38 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

criaccedilatildeo ideoloacutegica coletiva a voz de seu produtor se manifesta ao lado de um coro de outras vozes que jaacute trataram do mesmo tema e com as quais se potildee em acordo ou desacordo

Diante do exposto nesta seccedilatildeo podemos inferir que no discurso haacute grande engajamento daquele que argumenta Conforme a anaacutelise de Pinto (1996) esse viacutenculo eacute explicitado por meio de algumas marcas formais entre as quais podemos destacar

bull Status da mensagem que corresponde ao papel exercido pelo EU no discurso

bull Sujeitos enunciadores (argumentador) e receptores (auditoacuterio) Enten- da-se como sujeito algueacutem que se apropria de uma linguagem constishytuiacuteda socialmente e que estaacute mergulhado no social que o envolve Parshytindo desse pressuposto a pesquisadora citada acrescenta que o sujeito eacute preso agrave contradiccedilatildeo que o constitui Charaudeau (1992) refere-se ao sujeito argumentador que natildeo eacute o produtor empiacuterico de todas as falas do discurso ele eacute o responsaacutevel por uma estrutura argumentativa

bull Marcas formais do EU que estabelecem os elos coesivos de primeishyra pessoa e mostram o grau do engajamento do EU ao discurso

bull Momento e lugar da enunciaccedilatildeo que se referem agraves condiccedilotildees conshyjunturais mais precisamente ao momento e ao lugar social em que ocorre o ato da emissatildeo do discurso

bull Modalizadores que satildeo todos os elementos linguiacutesticos diretamenshyte ligados ao evento da produccedilatildeo do enunciado e que funcionam como indicadores das intenccedilotildees sentimentos e atitudes do locutor com relaccedilatildeo ao seu discurso

Encontramos tambeacutem na contribuiccedilatildeo de Pinto (1996) referecircncia agraves seguintes formas de abordagem do discurso a situacional a lexicoloacutegica a pragmaacutetica a enunciativa e a textual

Abordagem situacional leva em conta elementos pertinentes agrave situashyccedilatildeo identificados por perguntas que podem ser aparentemente ldquobanaisrdquo como quem fala Onde Quando De quecirc Como Para quecirc

Abordagem pragmaacutetica procura descrever as unidades miacutenimas de comunicaccedilatildeo e as intenccedilotildees de comunicaccedilatildeo dos participantes atos de fala e valores ilocutoacuterios dos enunciados

Abordagem enunciativa estuda os traccedilos que caracterizam a enunshyciaccedilatildeo ou seja o ato de produccedilatildeo do enunciado presente no discurso

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 39

( omo operaccedilotildees enunciativas caracteriacutesticas destacam-se os enunciadores (marcas pessoais) a retomada do referencial do lugar e do momento da enunciaccedilatildeo (emprego de decirciticos tempos verbais indicadores espaccedilo-tem- porais) as relaccedilotildees que os enunciadores estabelecem com seus enunciados (tematizaccedilatildeo modalidades) e as relaccedilotildees que os enunciadores estabelecem entre eles (modalidades marcas pessoais) (Orlandi 1988)

Abordagem textual visa a descrever os modelos textuais que refle- icm a competecircncia linguiacutestica e os modelos discursivos que mostram a eompetecircncia discursiva O texto eacute definido como qualquer unidade discurshysiva (Orlandi 1988)

Abordagem lexicoloacutegica considera o campo lexical de um corpus como uma seacuterie de termos ligados a uma mesma realidade ou a um mesmo conceito Aponta a seleccedilatildeo lexical como a responsaacutevel pelas oposiccedilotildees os jogos de palavras as metaacuteforas o paralelismo riacutetmico entre outras Nessa abordagem ressalte-se a existecircncia de palavras que colocadas estrategicashymente no texto trazem consigo uma carga poderosa de impliacutecitos (Orlandi 1994)

Ainda tentando buscar subsiacutedios agrave compreensatildeo do processo argu- mentativo cabe mencionar que segundo Angelim (1996) haacute diferentes tipos de argumentaccedilatildeo

a) argumentaccedilatildeo simples - quando se apresentam provas naturais verdades comprovadas ou exemplos de conhecimento aprioriacutestico geral para fundamentar a tese

b) argumentaccedilatildeo ad hominem - quando o emissor se dirige a interloshycutor especiacutefico para refutar-lhe o ponto de vista

c) argumentaccedilatildeo disjuntiva - quando se levantam diferentes hipoacuteteses explicativas do fenocircmeno para ao final selecionar uma e buscar comprovaacute-la por meio de procedimentos similares aos da argushymentaccedilatildeo simples

d) argumentaccedilatildeo mediante dilema - quando se estabelecem duas hipoacuteshyteses uacutenicas para provar que a soluccedilatildeo eacute relativa pois depende do ponto de vista do emissor que a defende

e) argumentaccedilatildeo pelos contraacuterios - quando se refuta uma tese proshyvando que os fatos a contradizem

iacute) argumentaccedilatildeo pelo absurdo - quando a defesa da tese ocorre pela via indireta iniciando-se pela tentativa de provar a falsidade de contradishyccedilatildeo da tese para fundamentar os argumentos favoraacuteveis a ela

40 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Mendonccedila (1997) refere-se a duas teacutecnicas baacutesicas de estruturaccedilatildeo dos argumentos para convencer um auditoacuterio a associaccedilatildeo de ideias e a dissociaccedilatildeo de ideias No primeiro caso menciona que os processos poshydem ser agrupados em trecircs classes principais a dos argumentos quase loacuteshygicos dos argumentos fundados na estrutura do real e dos argumentos que fundam a estrutura do real Ao abordar a ldquodissociaccedilatildeo de ideiasrdquo o autor referido (Mendonccedila 1997) afirma que esta ocorre ldquo quando se pretende dar uma nova abordagem a um determinado fato tomando-se em consideraccedilatildeo as suas dimensotildees real e abstratardquo

Com relaccedilatildeo aos constituintes de um texto eacute inegaacutevel a contribuiccedilatildeo de Charaudeau (1992) ao esclarecer que o texto argumentativo eacute composto dos seguintes elementos proposta proposiccedilatildeo epersuasatildeo Todavia nos casos em que a argumentaccedilatildeo eacute predominantemente justificativa segundo Pinto (1996) citando Mirabail (1994) a proposta pode coincidir com a proposiccedilatildeo

Outro ponto a assinalar tomando como referecircncia as contribuiccedilotildees de Ducrot (1984) eacute que a argumentaccedilatildeo natildeo pode ser entendida na persshypectiva da transparecircncia imediata nem da visatildeo loacutegico-matemaacutetica Isso porque na argumentaccedilatildeo haacute um lugar destacado para o impliacutecito para o natildeo dito que tambeacutem comunica Entre outros aspectos interessantiacutessimos esse pesquisador estudou particularmente o papel do pressuposto fenocircmeshyno linguiacutestico que ele considera como ato de fala

Importa ainda compreender a distinccedilatildeo entre pressuposto e subentenshydido O subentendido estaacute situado num segundo niacutevel de interpretaccedilatildeo ao qual o destinataacuterio tem acesso E o caso da litote ou da ironia que aceitam duplo sentido O pressuposto por sua vez eacute parte integrante do enunciado eacute considerado como algo previamente estabelecido mesmo sem ser forshymulado explicitamente Por isso o destinataacuterio natildeo encontra espaccedilo para colocaacute-lo em questatildeo

Para esclarecer tal ponto de vista podemos citar o exemplo Pedro parou de fumar que expressa aleacutem do que eacute dito verbalmente o pressushyposto de que Pedro fumava Esse exemplo leva-nos agrave inferecircncia de que no uso cotidiano da liacutengua existem mecanismos os quais embora natildeo explishycitados formalmente satildeo pressupostos na interaccedilatildeo entre os sujeitos do discurso Eles satildeo verdadeiros atos de fala na medida em que permitem ao destinataacuterio chegar agrave conclusatildeo pretendida pelo emissor

Pela anaacutelise semiolinguiacutestica do discurso o ato de linguagem deve ser concebido como o resultado de uma relaccedilatildeo do impliacutecito com o expliacutecito enshytre dois processos um de produccedilatildeo e outro de interpretaccedilatildeo Nesse contexto situa-se a argumentaccedilatildeo como um dos modos de organizaccedilatildeo do discurso

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 41

Na mesma linha de raciociacutenio Patrick Charaudeau (1992) trata do dispositivo argumentativordquo de um texto e aborda a tese e a(s) prova(s) preshysentes numa argumentaccedilatildeo Ele esclarece que nesse dispositivo haacute trecircs pon- los importantes o Propoacutesito - em que se explicita um ponto de vista enunshyciativo do sujeito falante ou de outrem a Proposiccedilatildeo - por meio da qual o mi jeito argumentador se coloca (contra ou a favor) em relaccedilatildeo ao Propoacutesito e a Persuasatildeo - em que se enquadram as diversas funccedilotildees das proposiccedilotildees destacaacuteveis no texto dentro do ldquoquadro de raciociacutenio persuasivordquo

Segundo Charaudeau (1983) a proposiccedilatildeo coloca em causa a validashyde da proposta ou seja ela depende da tomada de posiccedilatildeo do argumentashydor em relaccedilatildeo agrave proposta o que eacute fundamental para a definiccedilatildeo do camishynho a seguir no desenvolvimento da argumentaccedilatildeo Em outras palavras ugt colocar em causa a proposta o argumentador pode mostrar-se favoraacutevel ou desfavoraacutevel a ela ou ainda natildeo apresentar uma tomada de posiccedilatildeo A proposiccedilatildeo segundo a formulaccedilatildeo de Charaudeau corresponde ao que Mirabail (1994) citado por Pinto (1996) denominou ideia de tomada de posiccedilatildeo ou ao que Perelman amp Olbrechts-Tyteca (1996) designaram como tese A proposiccedilatildeo pode ser secundaacuteria ou principal de acordo com seu jrau de importacircncia no universo textual

Acrescenta-se que perante uma proposiccedilatildeo o sujeito argumentador adota atitudes tais como a refutaccedilatildeo a justificaccedilatildeo e a ponderaccedilatildeo e a eontra-argumentaccedilatildeo orientadas de um quadro de raciociacutenio e manifestashydas no texto argumentaccedilatildeo

Nessa linha de pensamento lembramos ainda que para expressar- se o sujeito utiliza procedimentos argumentativos de natureza semacircntica

discursiva e de composiccedilatildeo Os primeiros estatildeo relacionados ao valor dos argumentos os seguintes recorrem a categorias linguiacutesticas para produzir eleitos discursivos e os uacuteltimos contribuem para o conjunto de argumentashyccedilatildeo Tendo em vista que o propoacutesito eacute definido como a meta da comunicashyccedilatildeo argumentativa ele pode confundir-se com a tese que como apresentashymos anteriormente se caracteriza pela explicitaccedilatildeo da posiccedilatildeo (verdadeira ou falsa) do sujeito argumentador em relaccedilatildeo ao tema para convencer o auditoacuterio

Um texto caracteriza-se tambeacutem pelo assunto pelo seu conteuacutedo Dentre os procedimentos discursivos com apoio em Charaudeau (1983) destacamos seis tipos a definiccedilatildeo a comparaccedilatildeo a citaccedilatildeo a descriccedilatildeo narrativa a acumulaccedilatildeo e o questionamento

a) Definiccedilatildeo - eacute uma atividade linguiacutestica que consiste em descrever os traccedilos semacircnticos de uma palavra num contexto Ela tem finalidades

42 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

estrateacutegicas e visa a produzir um eteacuteito de evidecircncia e de saber pelo sujeito que argumenta

b) Comparaccedilatildeo - eacute um procedimento que utiliza duas categorias da liacutengua a quantificaccedilatildeo e a qualificaccedilatildeo De acordo com a primeira as cashyracteriacutesticas dos seres e dos comportamentos satildeo expostas para marcar a semelhanccedila ou a diferenccedila A segunda estaacute presente quando haacute um paraleshylo ou uma gradaccedilatildeo entre as qualidades Na argumentaccedilatildeo a comparaccedilatildeo produz efeitos diversos um efeito pedagoacutegico de caraacuteter objetivo (quando ela eacute utilizada como ilustraccedilatildeo ou para fazer compreender melhor um conshyceito) ou um efeito de ldquo cegamentordquo (quando ela desvia a atenccedilatildeo do intershylocutor para fato anaacutelogo o que estrategicamente o impede de identificar a verdadeira intenccedilatildeo do autor) Se a comparaccedilatildeo for objetiva ela eacute verishyficaacutevel lsquomas se for subjetiva seraacute preferencialmente sugerida e costuma despertar a evidecircncia no plano do imaginaacuterio do interlocutor

c) Citaccedilatildeo - consiste em reportar da maneira mais fielmente possiacuteshyvel propostas escritas ou orais de um locutor diferente daquele que fala o que provoca um efeito de autenticidade ao que eacute transmitido A citaccedilatildeo assume conotaccedilatildeo de argumento de autoridade na medida em que atribui autenticidade ao texto e pode testemunhar um dito uma experiecircncia ou um saber

d) Descriccedilatildeo narrativa - este procedimento se assemelha agrave comparashyccedilatildeo pois pode ser utilizado tanto para descrever um fato quanto para conshytar uma histoacuteria Sua finalidade eacute todavia diferente a descriccedilatildeo narrativa produz um efeito de exemplificaccedilatildeo

e) Acumulaccedilatildeo - consiste no emprego de vaacuterios argumentos para fundamentar uma mesma prova

f) Questionamento - trata-se de um procedimento voltado a instigar o interlocutor em relaccedilatildeo agrave proposta Ele tem vaacuterios objetivos incitar o interlocutor a fazer algo propor uma escolha verificar um saber provocar ou denegar

34 G RA M Aacute T IC A E PRO DUCcedilAtildeO DO T EXT O ARG U M EN TA TIVO

O sentido produzido pelo profissional do Direito no texto argumen- tativo natildeo se daacute apenas pelas ideias organizadas sucessivamente A proacutepria frase o encadeamento das estruturas linguiacutesticas dos enunciados as figuras de linguagem a que se recorre a seleccedilatildeo vocabular entre outros fatores satildeo tatildeo responsaacuteveis pelo conteuacutedo final do texto quanto as informaccedilotildees que nele estatildeo contidas

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO 43

O domiacutenio da norma culta portanto deixou haacute muito de ser item acesshysoacuterio na formaccedilatildeo do acadecircmico de Direito Liacutengua e discurso argumentativo integram-se de tal maneira que a eficiecircncia das peccedilas processuais depende luinbeacutem da construccedilatildeo de paraacutegrafos simples claros objetivos e concisos

A coesatildeo entre os paraacutegrafos ou seja a ldquoamarradurardquo entre as ideias deve constituir preocupaccedilatildeo do argumentador tanto quanto a proacutepria sele- ccedilatildeo das ideias a serem incluiacutedas no texto Ora essa coesatildeo se daacute essencialshymente pelos elementos linguiacutesticos

A argumentatividade assim considerada natildeo constitui apenas algo nerescentado ao uso linguiacutestico mas ao contraacuterio eacute um atributo da liacutengua tslo eacute o uso da linguagem eacute inerentemente argumentativo Nesse sentido i significaccedilatildeo de uma frase eacute vista como o conjunto de instruccedilotildees concershynentes agraves estrateacutegias a serem usadas na decodificaccedilatildeo dos enunciados pelos quais esta frase se atualiza

As instruccedilotildees contidas na significaccedilatildeo dessas frases determinam a intenccedilatildeo argumentativa a ser atribuiacuteda a seus enunciados Os enunciados portanto satildeo empregados com a finalidade de orientar o auditoacuterio para certos tipos de conclusatildeo com exclusatildeo de outras Esse processo em que o enunciado serve de argumento para dadas conclusotildees chama-se orientashyccedilatildeo discursiva

Na gramaacutetica de cada liacutengua haacute uma seacuterie de vocaacutebulos responsaacuteshyveis por esse tipo de relaccedilatildeo os chamados operadores argumentativos ou discursivos Na liacutengua portuguesa estatildeo entre eles os que a NGB (Norshyma Gramatical Brasileira) enquadrou como denotadores de inclusatildeo - ateacute mesmo tambeacutem inclusive - ou exclusatildeo -soacute somente apenas e os que a gramaacutetica tradicional considera elementos meramente relacionais - conecshytores como jaacute que pois mas poreacutem embora etc

Quando pensamos em procedimentos argumentativos merecem ainda destaque os conectores argumentativos cuja funccedilatildeo eacute operar como instrushymentos que fornecem ao discurso uma orientaccedilatildeo argumentativa A partir de sua anaacutelise podemos inferir que eles servem para ligar duas unidades semacircnshyticas e conferir um papel argumentativo agraves unidades que eles relacionam ( )s conectores servem tambeacutem para articular duas proposiccedilotildees orientadas a conclusotildees diversas que pertenceriam a dois enunciadores diferentes

No processo da construccedilatildeo argumentativa Charaudeau (1992) apreshysenta a modalizaccedilatildeo e a enunciaccedilatildeo como fenocircmeno complexo que testeshymunha o modo como o sujeito argumentador se apropria da liacutengua para organizaacute-la em discurso Esse estudioso considera a modalizaccedilatildeo como uma categoria conceituai que se refere ao grau de certeza ou de possi-

44 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

bilidade ou verossimilhanccedila de um sujeito em relaccedilatildeo a uma realizaccedilatildeo assertiva Quando aborda a modalizaccedilatildeo lembra que a tradiccedilatildeo gramatical natildeo lhe reconhece existecircncia proacutepria visto que os fatos de modalizaccedilotildees satildeo distribuiacutedos em vaacuterias categorias na liacutengua

Angelim (1996) inclui nas modalizaccedilotildees os operadores argumenta- tivos os conectores selecionados pelo sujeito argumentador Koch (1996) considera que os operadores argumentativos determinam o valor argu- mentativo dos enunciados constituindo-se pois em marcas linguiacutesticas importantes da enunciaccedilatildeo Conforme o ponto de vista de Pinto (1996) os conectores argumentativos satildeo marcas linguiacutesticas que estabelecem a progressatildeo textual

Da mesma forma Angelim (1996) afirma que os conectores explishycitam linguisticamente uma relaccedilatildeo de dependecircncia entre as proposiccedilotildees Oliveira (1996) informa que os conectores mais importantes no texto argu- mentativo satildeo os conclusivos introdutores de tese os explicativos introshydutores de argumentos os concessivos que introduzem concessotildees e os adversativos que introduzem restriccedilotildees

Muitas vezes os iniciantes na praacutetica argumentativa queixam-se por natildeo ter um repertoacuterio vocabular suficiente que faculte iniciar frases ou pashyraacutegrafos de maneira criativa ou pelo menos natildeo repetitiva na utilizaccedilatildeo dos elos coesivos entre enunciados A seguir algumas expressotildees que poshydem ser utilizadas na redaccedilatildeo de textos juriacutedico-argumentativos

A primeira observaccedilatildeo a fazer No que se refereInicialmente cabe lembrar Os itens arroladosQuanto aos fatos Remontando aEacute preciso observar que Em primeiro (2deg) lugarTodavia No entantoCom muito mais razatildeo SeguramenteEste caso apenas ilustra 0 exemplo deconfirmaEacute certo que Aleacutem do maisEacute de se verificar que Como se pode notarConveacutem ressaltar Cumpre observarEm virtude das consideraccedilotildees Necessaacuterio eacute lembrarOutra questatildeo relevante consiste em Na verdade o objetivo da lei eacuteNatildeo eacute despiciendo observar que Nessa linha de posicionamento

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

Percebe-se Configura-seConstata-se Sabe-seEacute indiscutiacutevel que Valecumpre ratificar queUm dado a acrescentar Como professaPassemos a Pelas razotildees aduzidasPor uacuteltimo Pertinente eacute a colocaccedilatildeo do professorContudo Cumpre antes de mais nadaConsidere-se o caso de Tem-seIncontestavelmente Nota-sePode ser que

35 ARG UM EN TACcedil AtildeO E T EO R IA T R ID IM EN S IO N A L DO D IR E IT O

Antes de entrarmos no planejamento propriamente dito do texto ar- gumentativo precisamos compreender qual a sua importacircncia para a proshyduccedilatildeo da peccedila processual Muitos graduandos neoacutefitos na produccedilatildeo desse texto ignoram a relevacircncia dessa parte da peccedila para o processo e a relaccedilatildeo que a argumentaccedilatildeo tem com as demais partes do texto juriacutedico

Peticcedilotildees contestaccedilotildees contrarrazotildees sentenccedilas pareceres habeas corpus apelaccedilotildees e inuacutemeras outras peccedilas contecircm em sua estrutura uma parte argumentativa

Para melhor compreender essa importacircncia recorreremos agrave Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale Essa teoria eacute responsaacutevel pela orientaccedilatildeo sobre como os profissionais do Direito da atualidade devem enshycarar o fenocircmeno juriacutedico para serem eficientes na atividade advocatiacutecia

Miguel Reale1 sustenta que para existir um fenocircmeno juriacutedico deve haver sempre um fato social e histoacuterico relevante sobre o qual deveraacute atuar a praacutetica juriacutedica

Esse fato para representar algo de significativo ou relevante para a ciecircncia juriacutedica deve receber certa significaccedilatildeo que o valore de maneira a contextualizaacute-lo como adequadoinadequado justoinjusto nocivobeneacutefishyco agraves finalidades pretendidas pela sociedade

1 REALE Miguel Liccedilotildees preliminares de Direito 25 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 pp 64-68

46 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim haveraacute uma norma ou uma regra que integre a relaccedilatildeo entre o fato e o valor a ele atribuiacutedo

Essas trecircs dimensotildees - fato valor e norma - satildeo fundamentais para que o Direito possa ser entendido tal como o eacute atualmente2 Qual a relaccedilatildeo entatildeo da Teoria Tridimensional do Direito com a estrutura do raciociacutenio argumentativo que os operadores do Direito devem desenvolver

Ora se argumentar eacute conseguir aumentar a intensidade de adesatildeo do ouvinte a uma tese de maneira que desencadeie nele a accedilatildeo pretendida (accedilatildeo positiva ou abstenccedilatildeo) ou ao menos a disposiccedilatildeo para accedilatildeo e se o Direito soacute se efetiva sob as trecircs dimensotildees jaacute tratadas natildeo haacute como persuashydir um auditoacuterio acerca da adequaccedilatildeo de uma tese se o argumentador natildeo buscar no conjunto probatoacuterio agrave sua disposiccedilatildeo fatos a serem valorados de maneira tal que a aplicaccedilatildeo de uma norma possa parecer adequada e convincente

O argumentador necessita na argumentaccedilatildeo desenvolver raciociacutenios dedutivos e indutivos a partir dos fatos selecionados da narrativa redigida antes da fundamentaccedilatildeo

A atribuiccedilatildeo de valores a esses fatos eacute complexa e as escolhas realishyzadas podem ser determinantes do sucesso persuasivo pretendido pelo adshyvogado Tal valoraccedilatildeo se daacute por meio de uma exposiccedilatildeo clara dos motivos fundamentos que sustentam essa interpretaccedilatildeo Veja a tabela a seguir com a correlaccedilatildeo de cada dimensatildeo da Teoria Tridimensional com as partes das peccedilas processuais

PECcedilAS PROCESSUAISDIMENSOtildeES DA TEORIA TRIDIM

DIREITO

peticcedilatildeoinicial

sentenccedila acoacuterdatildeo parecer

FATO Essa dimensatildeo consiste na narshy

rativa de todos os fatos importantes do caso concreto

analisado

Dos fatos(versatildeo do autor sobre os fatos)

Relatoacuterio(fatos reshylevantes

do conflito e do proshycesso)

Relatoacuterio(fatos

relevanshytes do

conflito e do proshycesso)

Relatoacuterio3(fatos

relevantes do conflito e do proshycesso)

2 Jaacute se fala hoje em teoria quadridimensional do Direito3 Dependendo do tipo de parecer produzido podemos ter uma narrativa valorada ou

natildeo valorada

Cap Ill - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

PECcedilAS PROCESSUAISVALOR Essa dimensatildeo

consiste na valo- raccedilatildeo dos fatos

narrados ou seja o ponto de vista

defendido depenshyde da maneira

como os fatos satildeo interpretados

Do direito Motivashyccedilatildeo

Motivashyccedilatildeo

Fundashymentaccedilatildeo

NORMA Essa dimensatildeo consiste na aplicaccedilatildeo de

uma norma como consequecircncia

de um raciociacutenio argumentativo anteriormente desenvolvido

Do pedido Disposishytivo

Disposishytivo

Conclushysatildeo

Ressalte-se que assim como ocorre com as peccedilas indicadas todas as demais peccedilas processuais complexas seguem uma estrutura loacutegica de construccedilatildeo descriccedilatildeo das partes envolvidas no litiacutegio narrativa dos fatos relevantes da lide fundamentaccedilatildeo de um ponto de vista e conclusatildeo (na forma de pedido decisatildeo opiniatildeo fundamentada etc)

Nesse sentido Viacutetor Gabriel Rodriacuteguez4 assinala que o conhecimento propriamente dito da doutrina da jurisprudecircncia e da proacutepria legislaccedilatildeo reshypresenta apenas uma seacuterie de informaccedilotildees que se encontram agrave disposiccedilatildeo do argumentador mas elas por si mesmas natildeo garantem a capacidade de persuasatildeo

Isoladas puras diz ainda o autor natildeo produzem sentido natildeo conshyvencem ningueacutem de que haacute coerecircncia no raciociacutenio desenvolvido ldquoa natildeo ser que estejam intencionalmente dirigidas articuladas para persuadir alshygueacutem a respeito de algordquo Assim a folha de antecedentes criminais do reacuteu juntada aos autos eacute apenas uma informaccedilatildeo que soacute alteraraacute o resultado de um processo se for intencionalmente invocada para sustentar o raciociacutenio de que isso eacute motivo suficiente para fixar a pena no maacuteximo legal (e essa eacute apenas uma das leituras possiacuteveis para essa informaccedilatildeo)

4 RODRIacuteGUEZ Viacutetor Gabriel Argumentaccedilatildeo juriacutedica teacutecnicas de persuasatildeo e loacutegica informal 4 ed Satildeo Paulo Martins Fontes 2005 p 06

48 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim tambeacutem ajuntada de um contrato aos autos natildeo evidencia necessariamente a obrigaccedilatildeo do contratado em face do contratante O ideal nessa hipoacutetese eacute que o argumentador desenvolva o raciociacutenio de que o doshycumento gera um viacutenculo juriacutedico entre as partes e que a doutrina sustenta que todo viacutenculo de natureza juriacutedica eacute marcado por direitos e obrigaccedilotildees muacutetuos entre os sujeitos de direito

Posto isso um mesmo fato (o conteuacutedo de uma folha de antecedentes criminais ou um contrato - primeira dimensatildeo apontada por Reale) pode ter inuacutemeras leituras pode significar muitas coisas (valoraccedilatildeo dada aos fashytos - segunda dimensatildeo da Teoria Tridimensional) mas as hipoacuteteses inter- pretativas daiacute derivadas seratildeo clarificadas como mais ou menos pertinentes quando contextualizadas por um raciociacutenio que natildeo se pode esperar que seja coqstruiacutedo apenas pelo juiz Cabe ao advogado trilhar os caminhos interpretativos adequados para sustentar sua tese (aplicaccedilatildeo da norma ao caso concreto - terceira dimensatildeo)

Sustentamos que o Direito como atividade social natildeo tem condiccedilotildees de ser articulado sozinho Ele somente pode existir concretamente por meio de argumentos que atribuem a determinados fatos a relevacircncia e o signifishycado possibilitados pelo contexto em que satildeo produzidos e inteipretados

A doutrina e a proacutepria legislaccedilatildeo satildeo a priori ldquo esteacutereisrdquo constituem simples informaccedilatildeo disponiacutevel para que o argumentador possa delas se apropriar e construir um raciociacutenio aceito como razoaacutevel

A pertinecircncia da Teoria Tridimensional do Direito no estudo da argushymentaccedilatildeo eacute reforccedilada tambeacutem por meio da proacutepria produccedilatildeo legislativa Tome como exemplo alguns dispositivos do Coacutedigo Penal esse diploma legal prevecirc logo no iniacutecio da parte especial os crimes de homiciacutedio e de infanticiacutedio sob tipos penais distintos Este foi capitulado no art 123 e aquele no art 121 do Coacutedigo Penal O que levou o legislador a criar dois tipos penais distintos se uma mesma conduta - ldquomatar algueacutemrdquo - estaacute senshydo reprovada nos dois crimes

Fica evidente que o legislador entendeu que apesar de o fato ser basishycamente o mesmo a maneira de valoraacute-los de interpretaacute-los natildeo pode ser idecircntica em decorrecircncia das especificidades - princiacutepio da especialidade- que o infanticiacutedio apresenta em face do homiciacutedio Isso implica dizer que cabe ao argumentador perceber as peculiaridades que guarda cada norma para que sua fundamentaccedilatildeo possa dar conta dessas tecircnues distinccedilotildees

Dessa forma o advogado ao produzir sua argumentaccedilatildeo natildeo pode deishyxar de realizar a ponderaccedilatildeo dos valores subjacentes agrave norma que evoca sob pena de ser pouco teacutecnico na capitulaccedilatildeo das condutas imputadas ao reacuteu

Resumidamente o argumentador deve em primeiro lugar expor os latos importantes do caso concreto para que as partes e o proacuteprio magistrado possam ter condiccedilotildees de apreciarponderarvalorar os aconshytecimentos A exposiccedilatildeo desses fatos importantes seraacute feita predominanshytemente por meio de uma narraccedilatildeo Uma vez conhecidos os fatos sua viiloraccedilatildeo deveraacute ser feita em seguida na peccedila processual por meio de uma argumentaccedilatildeo

Desenvolvida a sustentaccedilatildeo argumentativa de um ponto de vista - lese - que pareccedila adequado eacute hora de o operador do Direito manifestar-se quanto agrave aplicaccedilatildeo da norma adequada ao caso em anaacutelise

Para melhor compreender o raciociacutenio desenvolvido neste capiacutetulo observe uma frase dita por Julio Clemente - teacutecnico do Athletic Bilbao - e publicada na seccedilatildeo ldquoVeja essardquo da Revista Veja ldquoCuspir eacute um compor- liacuteiinento feio Eu acho que esse eacute o tipo de coisa que soacute quem acabou de descer das aacutervores fazrdquo

Assim descontextualizada a fala de Julio tem bastante pertinecircncia Quando diz que ldquoesse eacute o tipo de coisa que soacute quem acabou de descer das arvores fazrdquo imaginamos que ele estaacute qualificando o ato de cuspir como uma conduta social pouco adequada agraves expectativas atuais de um ldquoestaacutegio de evoluccedilatildeo mais avanccedilado do ser humanordquo Quanto a isso natildeo haacute aparenshytemente nenhum problema

Entretanto quando contextualizada a situaccedilatildeo em que pronunciou tal IVase - segundo a revista ldquo referiu-se ao atacante africano Samir Atono do Barcelona que cuspiu no rosto de um jogador catalatildeordquo - o enunciado ganha novas possibilidades interpretativas

Deriva dessa discussatildeo a necessidade de entender como se daacute o comshyportamento anocircmico - ou de desvio - em uma sociedade O Desembargashydor Seacutergio Cavai ieri Filho na obra Programa de sociologia juriacutedica vocecirc conhece realiza didaacutetica e completa exposiccedilatildeo a respeito das causas do comportamento anocircmico aleacutem de fazer breve siacutentese a respeito das proshypostas de conhecidos filoacutesofos sobre o assunto6

Sozinhas as informaccedilotildees natildeo dizem muito mas a possibilidade de associaccedilatildeo semacircntica das palavras e expressotildees ldquo cuspirrdquo ldquodescer da aacutershyvorerdquo e ldquojogador africanordquo facultam o desenvolvimento de um raciociacutenio que leva agrave conclusatildeo de que o teacutecnico agiu de maneira preconceituosa pra-

Cap III - ALGUMAS QUESTOtildeES TEOacuteRICAS SOBRE A ARGUMENTACcedilAtildeO

Revista Veja p 44 Seccedilatildeo ldquoVeja essardquo Ediccedilatildeo do dia 25 de janeiro de 2006 h Sobre o assunto consulte CAVALIER1 FILHO Seacutergio Programa de sociologia

juriacutedica (vocecirc conhece) 10 ed Rio de Janeiro Forense 2002 p 199

50 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ticando conduta prevista na legislaccedilatildeo brasileira Lei 74371985 a qual dispotildee no art 1deg que ldquoconstitui contravenccedilatildeo a praacutetica de atos resultantes de preconceito de raccedila de cor de sexo ou de estado civilrdquo

Capiacutetulo IV

PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURlDICO

Compor conflitos de interesse por meio judicial eacute uma das funccedilotildees primordiais do Direito Tais conflitos advecircm de divergentes formas de se interpretar um determinado fato juriacutedico E nessa instacircncia que se legitimao texto argumentativo

A argumentaccedilatildeo juriacutedica caracteriza-se especialmente por servir de instrumento para expressar a interpretaccedilatildeo sobre uma questatildeo do Direito que se desenvolve em um determinado contexto espacial e temporal Ao operar a interpretaccedilatildeo impotildee-se considerar esses contextos ater-se aos fashytos agraves provas e aos indiacutecios extraiacutedos do caso concreto e sustentaacute-la nos limites impostos pelas fontes do Direito Forccediloso tambeacutem eacute considerar a interpretaccedilatildeo e o discurso do opositor a fim de neutralizaacute-los jaacute que na argumentaccedilatildeo o discurso do orador se constroacutei cm concordacircncia com alshyguns discursos e em oposiccedilatildeo a outros Concluiacuteda a interpretaccedilatildeo o orador deve entatildeo estar convicto da posiccedilatildeo que adotaraacute perante o caso concreto e a tese que defenderaacute sem menosprezar aquela que lhe eacute adversa

Consciente dessas preliminares aleacutem de interpretar os sentidos expliacuteshycitos que compotildeem o caso concreto eacute preciso apreender os que se enconshytram impliacutecitos subjacentes aos fatos Em seguida importa dimensionar cada fato extraindo-lhe as circunstacircncias especiacuteficas jaacute que essas podem acarretar natildeo soacute como afirma Reale (1995) ldquo uma consequecircncia de direito por assim estar previsto na normardquo mas tambeacutem inspirar uma conclusatildeo sustentada no que eacute justo e razoaacutevel para o indiviacuteduo e para a sociedade Imprescindiacutevel ainda eacute a seleccedilatildeo das provas - meio persuasivo eficaz - e dos indiacutecios que suscitam inferecircncias complementares aos fatos

Cumpridas essas etapas eacute chegado o momento de organizar no papel um caminho coeso e coerente que serviraacute de alicerce ao texto que se deseja

52 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

elaborar Com esse procedimento o orador teraacute clareza de cada etapa a ser vencida da pertinecircncia e da consistecircncia de cada uma na composiccedilatildeo da argumentaccedilatildeo e assim da melhor forma de alcanccedilar o seu objetivo persuashydir o auditoacuterio a assumir a sua tese como a mais verossiacutemil para a soluccedilatildeo do conflito Para tal analisemos os elementos que estruturam a composiccedilatildeo da argumentaccedilatildeo juriacutedica

41 SITUA CcedilAtildeO DE C O N FLITO

Registrar a situaccedilatildeo de conflito eacute fundamental para delimitar a quesshytatildeo sobre a qual se argumentaraacute Isso porque seratildeo fornecidos os elementos indispensaacuteveis para compor o caso concreto e inseri-lo no contexto juriacutedico Nesfa parte do planejamento o orador definiraacute a centraidade da questatildeo juriacutedica que estaraacute sob apreciaccedilatildeo isto eacute o fato juriacutedico Em seguida idenshytificaraacute as partes envolvidas na lide devidamente descritas determinando aquele que em tese representa o sujeito passivo e o que seraacute considerado sujeito ativo Por fim estabeleceraacute quando e onde o fato ocorreu

Eacute importante definir as partes que compotildeem a lide uma vez que soshybre uma recairaacute um direito subjetivo e sobre a outra um dever juriacutedico Ora em algumas situaccedilotildees atribui-se um dever a uma parte que na verdade natildeo lhe cabe A tiacutetulo de exemplo suponhamos que X vendedora da loja Y conclui que a cliente Z tenha subtraiacutedo uma peccedila de roupa que X havia deixado sobre o balcatildeo e laacute natildeo se encontrava mais Dirigiu-se a Z e de forma ofensiva mandou que esvaziasse a bolsa e mostrasse o que havia em seu interior A cliente muito nervosa comeccedilou a chorar e negou-se a abrir a bolsa Nesse momento o seguranccedila da loja segurou-lhe o braccedilo retirou sua bolsa e abriu-a na frente dos demais clientes Constatou que natildeo havia nada da loja na bolsa de Z A cliente perante o constrangimento vivencia- do decidiu mover uma accedilatildeo de reparaccedilatildeo pelos danos morais sofridos em face daqueles que lhe impuseram tal constrangimento Orientada por um advogado foi-lhe esclarecido que embora a vendedora e o seguranccedila teshynham promovido o constrangimento a responsabilidade civil pelo evento seraacute da empresa onde o fato ocorreu jaacute que aqueles profissionais satildeo seus prepostos e suas condutas satildeo responsabilidade da pessoa juriacutedica que os contratou Portanto a accedilatildeo deve ser proposta em face da empresa e natildeo de seus funcionaacuterios

Com relaccedilatildeo agrave caracterizaccedilatildeo das partes quando couber importa que sejam objetivamente descritas suas caracteriacutesticas fiacutesicas psicoloacutegicas sociais e econocircmicas uma vez que essas informaccedilotildees podem servir de ar-

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 53

l-mnento na defesa de uma tese Importa considerar que por estarmos lidando com a valoraccedilatildeo de certos atributos particulares de cada parte eacute necessaacuterio justificar a interpretaccedilatildeo operada a respeito destes Por exemshyplo digamos que um liacuteder comunitaacuterio homem de 35 anos enfermeiro lenha atraiacutedo ateacute a sua casa uma jovem de 13 anos moradora da mesma comunidade e ali estupra-a Seu ato assume uma proporccedilatildeo maior de culshypabilidade do que se igualmente fosse protagonizado por um rapaz de 18 anos colega de 7a seacuterie da menina Dimensionando os atributos de ambos os acusados imputariacuteamos ao primeiro maior discernimento para o ato pra- licado uma vez que se pressupotildee ser mais experiente do que o segundo e ainda saber avaliar melhor as consequecircncias dos seus atos Aleacutem disso era uma pessoa que inspirava a confianccedila dos moradores da comunidade que liderava Usou portanto de abuso de confianccedila para atrair a jovem e alcanccedilar o seu intento

Observamos agora a importacircncia de definir o espaccedilo e tempo em que ocorre o fato juriacutedico Haacute enfoques importantes a serem observados quanto agrave precisatildeo de situaacute-los

Ressalta-se inicialmente a forma como eacute dimensionado o fato juriacutedi- eo mediante essas duas circunstacircncias espaccedilo e tempo Tal avaliaccedilatildeo estaacute situada no plano objetivo e no plano subjetivo

Quanto ao plano objetivo analisemos a questatildeo sob o acircngulo proshycessual De acordo com o art 69 inciso I do Coacutedigo de Processo Penal determinaraacute a competecircncia jurisdicional o lugar da infraccedilatildeo Dessa forma eacute incontestaacutevel a necessidade de sermos expliacutecitos quanto ao local em que sc produziu o fato

Com relaccedilatildeo ao tempo em que se deu o fato juriacutedico haacute implicaccedilotildees legais que orientam a forma como essa informaccedilatildeo deve ser avaliada senshydo portanto imprescindiacutevel defini-lo Fixemo-nos no art 4deg do Coacutedigo Penal ldquoConsidera-se praticado o crime no momento da accedilatildeo ou omissatildeo ainda que outro seja o momento do resultadordquo Quais as possiacuteveis conseshyquecircncias dessa norma Uma delas eacute a definiccedilatildeo em relaccedilatildeo agrave lei que deveraacute orientar o julgador no caso de haver entrado em vigecircncia uma lei nova Imaginemos que a nova seja mais rigorosa do que a anterior Nesse caso como no Direito Penal uma lei soacute retroage em benefiacutecio do reacuteu esse seraacute julgado segundo a lei vigente no tempo em que se produziu o ato iliacutecito

No plano subjetivo haacute questotildees relativas ao tempo e ao espaccedilo que devem ser destacadas Isso porque a valoraccedilatildeo de um fato juriacutedico estaacute sushyjeita tambeacutem agrave eacutepoca e ao local onde ele se desenvolve quanto mais proacuteshyximo dos grandes centros urbanos estiver o local onde se produziu o fato

54 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

juriacutedico e quanto mais contemporacircneo for esse fato maior a expectativa de que as partes envolvidas estejam mais conscientes quanto agraves consequecircncias juriacutedicas dos seus atos

Por essa razatildeo mais tolerante seraacute a nossa avaliaccedilatildeo por exemplo com o marido que no interior de Pernambuco em 1970 forccedila sua esposhysa agrave praacutetica sexual do que o mesmo ato praticado no municiacutepio do Rio de Janeiro em 2013 Isso porque no interior de determinados estados do Brasil ainda se considera a mulher como objeto de posse por quesshytotildees culturais distintas das que predominam em outras localidades Natildeo se trata de julgar adequada a conduta do marido que estupra a mulher somente porque estatildeo no interior mas de apurar com coerecircncia a culpashybilidade do agente a partir da informaccedilatildeo referente ao espaccedilo geograacutefico porquanto o elemento ldquo costumerdquo nunca deve ser afastado da apuraccedilatildeo do iliacutecito penal

Quando fazemos referecircncia ao ldquo costumerdquo como elemento relevante para a apuraccedilatildeo do evento juriacutedico em anaacutelise partimos do pressuposto de que o Brasil eacute um paiacutes plural e nas regiotildees mais afastadas ainda hoje o marido entende ter direitos sobre a mulher que lhe deve obediecircncia Jaacute nas capitais com a crescente inserccedilatildeo da mulher no mercado de trabalho com a sua conscientizaccedilatildeo quanto aos seus direitos e com a liberdade sexual mediante o uso de anticonceptivos a mulher passou a se ver e a ser vista como um ser capaz de decidir sobre a disposiccedilatildeo do seu corpo Nesse conshytexto o ato sexual imposto pelo marido sem a concordacircncia da mulher eacute estupro nos termos do art 213 do CP

Esperamos que tenha ficado claro que todas essas informaccedilotildees (o quecirc quem onde e quando) iratildeo compor um contexto que seraacute explorado na construccedilatildeo do texto argumentativo

Como elaborar a situaccedilatildeo de conflito para o seguinte caso concreto

Caso concreto com adaptaccedilotildees

Crianccedila entrou no hospital para fazer cirurgia corriqueira e morreu por ruptura no estocircmago

24052012 - Gazeta do Povo

Jaacute estaacute marcada a exumaccedilatildeo do corpo de Joatildeo Victor da Silva 4 anos que morreu depois de uma cirurgia em 03 de maio de 2012 em Ponta Grossa nos Campos Gerais O pedido foi feito pela famiacutelia

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e autorizado pela Justiccedila para averiguar a hipoacutetese de erro meacutedico O atestado de oacutebito indica que o menino morreu por conta de ruptura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas Os pais estatildeo inconformados com o desfeshycho traacutegico do que era para ser uma corriqueira cirurgia nas amiacutedalas e na adenoacuteideJoatildeo Victor foi internado agraves 6h30min do dia 3 de maio e a operaccedilatildeo deshyveria durar entre 15 e 30 minutos Quando retomou ao quarto por volta de 8 horas os pais notaram que o abdocircmen do menino estava inchado Foi feita a pulsatildeo mas o quadro continuou se agravando ateacute que foi internado na unidade de terapia intensiva (UTL) com sangramento pela boca e pelo narizJoatildeo foi operado porque tinha crises de amidalite frequentesA advogada Liciane Silva e o engenheiro civil Rozenildo Torres Silva pais do garoto afirmam que nenhum meacutedico prestou qualquer esclashyrecimento sobre o que estava acontecendo Eles insistiram em vatildeo para que Joatildeo Victor fosse operado para encontrar a causa das comshyplicaccedilotildeesSoacute depois das 22 horas e apoacutes a intervenccedilatildeo de dois meacutedicos eacute que o cirurgiatildeo pediaacutetrico do hospital aceitou fazer a operaccedilatildeo exploratoacuteria A cirurgia comprovou a perfuraccedilatildeo no estocircmago mas natildeo conseguiu salvar o menino que morreu uma hora depois O inqueacuterito aberto indica a possibilidade de imperiacutecia durante a entubaccedilatildeo e de negligecircncia pela demora na realizaccedilatildeo da cirurgia corretivaO cirurgiatildeo pediaacutetrico Augusto Nunes nega qualquer responsabilidade na morte de Joatildeo Victor Ele afirma que apenas tratou os sintomas de um problema causado anteriormente ldquoA causa morte da crianccedila natildeo eacute pelo meu procedimentordquo destaca Ele reforccedilou que espera uma apuraccedilatildeo rishygorosa do caso para entender o que aconteceu0 anestesista Nilton Pereira tambeacutem natildeo sabe explicar o que causou as complicaccedilotildees que resultaram na morte do menino Ele assegura que dushyrante a operaccedilatildeo tudo transcorreu normalmente e discorda do atestado de oacutebito que aponta problemas anesteacutesicos1 - Situaccedilatildeo de conflito (pequeno paraacutegrafo redigido sem juiacutezo de valor que conteacutem as seguintes informaccedilotildees o quecirc Quem Quando Onde)

Sugestatildeo Augusto Nunes cirurgiatildeo pediaacutetrico e Nilton Pereira anestesista satildeo acusados de terem causado a morte de Joatildeo Vitor 4 anos representado por seus pais - Liciane Silva advogada e Rozenildo Torres Silva engenheiro civil - quando da realizaccedilatildeo de uma cirurgia em 3 de maio de 2012 em Ponta Grossa nos Campos Gerais

56 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

42 T ESE

Entendemos como tese uma interpretaccedilatildeo que se extrai de um conshytexto a fim de se alcanccedilar um determinado fim que se espera ver agasashylhado pelo Direito e que seraacute submetida a um julgamento A tese eacute aquilo que se precisa provar objetivando persuadir o auditoacuterio acerca da sua veshyrossimilhanccedila Natildeo haacute expectativa de que ela assuma o status de verdade jaacute que nas Ciecircncias Humanas a tese eacute subjetiva adstrita a valores sendo portanto discutiacutevel

Considerando que o orador deseja persuadir um auditoacuterio eacute imporshytante tambeacutem que a sua tese natildeo contrarie as presunccedilotildees desse auditoacuterio particular e muito menos do auditoacuterio universal Isso porque soacute haveraacute adesatildeo aos argumentos enunciados se esses estiverem em conformidade com os valores desses auditoacuterios A tese por isso triunfaraacute se houver inteshyraccedilatildeo entre orador e auditoacuterio e se for empreendida uma argumentaccedilatildeo com base em argumentos loacutegicos e razoaacuteveis

Tendo em vista que a norma (lei doutrina princiacutepios jurisprudecircncia etc) eacute acolhida como premissa aceitaacutevel pelo auditoacuterio universal e consishyderando ainda que a tese deve preferencialmente natildeo contrariar as preshysunccedilotildees do auditoacuterio entendemos que a tese para ter maior probabilidade de ser aceita pelo auditoacuterio particular deve buscar amparo na norma

A tese que sustenta a possibilidade de realizaccedilatildeo da eutanaacutesia em doentes terminais por exemplo dificilmente seria aceita hoje ein qualquer tribunal ou corte superior brasileira pois atualmente natildeo existem no ordeshynamento juriacutedico paacutetrio fundamentos para sustentaacute-la

E por essa razatildeo que dissemos que a tese tem ldquomais chancerdquo de ser acolhida quando encontra amparo na norma Veja que natildeo dissemos que a tese sem amparo na norma deixaraacute de ser acolhida Muitos direitos hoje gashyrantidos foram fruto da insistecircncia de advogados promotores e defensores que natildeo se acomodaram diante das dificuldades Decorrente desse esforccedilo muitas teses minoritaacuterias ou inicialmente isoladas passaram a ser acolhidas no judiciaacuterio brasileiro

Consideram-se loacutegicos os argumentos que tecircm como elemento gerashydor uma tese coerente com o ponto de referecircncia a que essa se associou isto eacute a uma premissa maior legitimada pelo Direito Portanto natildeo se pode negar que o sistema juriacutedico impotildee fontes especiacuteficas do Direito que lishymitam a arbitrariedade e oferecem seguranccedila ao procedimento juriacutedico Quando se deseja defender algueacutem que se arroga senhor de um direito subshyjetivo eacute necessaacuterio verificar o que tais fontes de fato lhe conferem e com base nessa afericcedilatildeo construir a tese que se pretende defender

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Como exemplo pode-se citar o caso concreto publicado pelo jornal () (1obo em janeiro de 2004 de um cidadatildeo 27 anos desempregado com fome que invadiu o Campo de Santana Rio de Janeiro de madrugada e estrangulou um pavatildeo branco de aproximadamente 39 quilos A ave vivia no parque haacute 14 anos Esse cidadatildeo foi perseguido por travestis da Praccedila da Repuacuteblica que o agrediram com socos e com pontapeacutes Ao fugir tentou pular de volta para o Campo de Santana e ficou preso pelo braccedilo esquerdo nas grades de ferro do campo Foi resgatado por bombeiros encaminhado ao hospital e em seguida preso Sabe-se que a norma condena o ato prati- eado por esse cidadatildeo prescrevendo pena de prisatildeo jaacute que o pavatildeo branco e um animal protegido pelo Ibama

O orador caso esteja na situaccedilatildeo de defensor do reacuteu deve estar cons- eiente de que a norma dispotildee tal ato como iliacutecito Entretanto caso assumaii tese de estado de necessidade - hipoacutetese prevista pela norma - e tendo sucesso em comprovaacute-la estaraacute extinta a ilicitude do ato cometido pelo seu cliente A questatildeo entatildeo seraacute provar que segundo as circunstacircncias que envolvem esse caso especiacutefico eacute possiacutevel admitir tal tese

Dessa forma adotando como premissa maior a norma dever-se-atildeo reunir os fatos as provas e os indiacutecios estabelecer uma interseccedilatildeo entre eles de forma a extrair um ponto comum em que se possa inferir o estado de necessidade Nesse caso o melhor raciociacutenio a ser desenvolvido eacute o indutivo jaacute que reunimos premissas menores dimensionamos tais premisshysas - praacutetica subjetiva em que a emoccedilatildeo ocupa preponderante funccedilatildeo - e aplicamos o criteacuterio da razoabilidade a fim de persuadir acerca da mais justa forma de solucionar o conflito

Como vimos quando elaboramos uma tese precisamos ter consciecircnshycia de que ela se encontra limitada pelas possibilidades de soluccedilotildees adshymitidas pelas normas pela interpretaccedilatildeo que se opera em relaccedilatildeo a essas normas visando adaptaacute-las ao nosso tempo ao nosso espaccedilo e agraves circunsshytacircncias do caso concreto e pelas circunstacircncias em que ocorre Na verdashyde sua elaboraccedilatildeo depende de um movimento equilibrado entre razatildeo e emoccedilatildeo

Voltando ao caso concreto registrado referente agrave morte do menino Joatildeo Victor que tese os advogados dos pais da crianccedila poderiam defender

Uma sugestatildeo

Tese (Expressatildeo do juiacutezo de valor deve registrar a presunccedilatildeo do direito e o que se precisa provar para alcanccedilar tal objetivo) Sugestatildeo

58 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Os meacutedicos devem indenizar a famiacutelia por ter havido imperiacutecia e neshygligecircncia

43 A C O N TEXTU A LIZA Ccedil Atilde O DO R E A L

A argumentaccedilatildeo juriacutedica difere especialmente de outros tipos de arshygumentaccedilatildeo por algumas razotildees dentre elas destacam-se a) estaacute limitada por um sistema normativo b) embora limitada por esse sistema admite a assunccedilatildeo do criteacuterio de razoabilidade c) baseia-se em provas fatos e indiacuteshycios Relativamente a esse uacuteltimo aspecto fixar-nos-emos agora

Um propagado princiacutepio do Direito eacute ldquo cada caso eacute um casordquo Ora entendemos que na verdade satildeo as peculiaridades de cada caso concreto que determinam o caminho a ser adotado em uma argumentaccedilatildeo e que hashyveratildeo de lhe dar sustentaccedilatildeo Daiacute a validade do brocardo juriacutedico ldquodaacute-me os fatos que eu te darei o direitordquo

Insistimos que tal caminho deva estar legitimado pelas fontes do Direito Dessa forma torna-se necessaacuterio extrair do caso concreto todas as informaccedilotildees que expliacutecita ou implicitamente concorram para a comshyprovaccedilatildeo da tese Compreender o caso concreto interpretar todas as suas sutilezas valoraacute-las apreender os diversos sentidos que um mesmo fato prova ou indiacutecio promovem eacute fundamental para a produccedilatildeo de um texshyto argumentativo consistente Observa-se pois que natildeo basta identificar tais informaccedilotildees eacute necessaacuterio dimensionaacute-las de forma a utilizaacute-las com mestria

Acrescente-se que eacute fundamental se antecipar ao seu opositor e destashycar todas as informaccedilotildees que possam fragilizar a sua tese Assim iraacute elaboshyrar estrateacutegias que demonstrem os pontos fracos dos argumentos contraacuterios aos seus

Importa que se reveja o que vem a ser fato prova e presunccedilatildeo ou indiacutecio e em que proporccedilatildeo um ou outro exerce um poder de persuasatildeo maior ou menor no discurso juriacutedico Ao nos referirmos a fato desejamos expressar uma ocorrecircncia baseada em uma realidade objetiva logo aferida Segundo De Plaacutecido e Silva (1975) muitas acepccedilotildees se extraem do termo fato A noacutes interessaraacute natildeo soacute aquela que indica a ldquoexistecircncia de evento ou coisa que veio ou foi feita () materialidade ou a demonstraccedilatildeo concreta do acontecimento ou da accedilatildeo sem interferecircncia do direito () a realidade do que aconteceu ou estaacute acontecendordquo mas tambeacutem accedilotildees negativas isto eacute consequecircncia do que deveria ter sido feito e natildeo foi a omissatildeo

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 59

O fato pode ser um acontecimento natural natildeo volitivo como uma Icmpestade que ldquo pode trazer consequecircncias de direito uma inundaccedilatildeo pode transportar porccedilotildees de terra de uma para a outra margem de um rio alterando relaccedilotildees de propriedaderdquo (Miguel Realc) ou acontecimento reshysultante da vontade humana considerado ato comportamento ao qual ldquoa norma juriacutedica confere consequecircncias de direito tais como as de constituir modificar ou extinguir uma lsquorelaccedilatildeo juriacutedicarsquo ou mais amplamente uma lsquosituaccedilatildeo juriacutedicarsquordquo (Miguel Reale) Enfim podemos observar que o ato juriacutedico eacute uma espeacutecie de fato Entretanto como nossa finalidade eacute levan- larmos informaccedilotildees que correspondam agrave realidade faacutetica natildeo nos prendeshyremos a essa distinccedilatildeo entre ldquo fatordquo e ldquo atordquo O fundamental eacute que estejamos conscientes de que os fatos tecircm grande poder persuasivo jaacute que raramente podem ser contrariados

Quanto agraves provas importa registrar o que ensina De Plaacutecido e Silva cm seu Dicionaacuterio Juriacutedico

Do latim proba de probare (demonstrar reconhecer formar juiacutezo de) entende-se assim no sentido juriacutedico a denominaccedilatildeo que se faz pelos meios legais da existecircncia ou veracidade de um fato material ou de um ato juriacutedico em virtude da qual se conclui por sua existecircncia do fato ou do ato demonstradoA prova consiste pois na demonstraccedilatildeo de existecircncia ou da veracidade daquilo que se alega como fundamento do direito que se defende ou que se contestaE nesta razatildeo no sentido processual designa tambeacutem os meios indicashydos em lei para realizaccedilatildeo dessa demonstraccedilatildeo isto eacute a soma de meios para constituiccedilatildeo da proacutepria prova ou seja para conclusatildeo ou produccedilatildeo de certeza

A prova pode fundar-se na afirmaccedilatildeo ou na negaccedilatildeo de fatos sobre que se pretende tenha nascido ou originado direito Assim orienta-se na afirmaccedilatildeo positiva ou na afirmaccedilatildeo negativa do fato contestado de cuja demonstraccedilatildeo decorreraacute a certeza da afirmaccedilatildeo

A prova por isso constitui em mateacuteria processual a proacutepria alma do processo ou a luz que vem esclarecer a duacutevida a respeito dos direitos disputadosMas tomada num duplo sentido objetivo e subjetivo natildeo se mostra somente a demonstraccedilatildeo material revelada pelo conjunto de meios utishylizados para a demonstraccedilatildeo da existecircncia dos fatos (sentido objetivo) como tambeacutem a proacutepria certeza ou convicccedilatildeo a respeito da veracidade da afirmaccedilatildeo feita (sentido subjetivo)

60 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

E assim sendo juridicamente compreendida a prova eacute a proacutepria conshyvicccedilatildeo acerca da existecircncia dos fatos alegados nos quais se fundam os proacuteprios direitos objetos da discussatildeo ou do litiacutegio Em consequecircncia somente haacute provas quando pela demonstraccedilatildeo se produz uma luz sushyficiente para achar a verdade ou quando os elementos componentes da demonstraccedilatildeo estabeleceram uma forccedila suficiente para produzir certeza ou convicccedilatildeo

Na busca por essa ldquo luz suficiente para achar a verdaderdquo pode-se reshycorrer basicamente agrave prova testemunhal agrave prova pericial e agrave prova docushymental

Com relaccedilatildeo agrave prova testemunhal aquela formulada mediante deshypoimentos ou declaraccedilotildees de pessoas que tiveram conhecimento direto ou indireto dos fatos em causa importa destacar que sua eficaacutecia se restringe especialmente a dois aspectos 1) grau de idoneidade da testemunha de envolvimento com as partes e o de firmeza de sua declaraccedilatildeo acerca do fato ou fatos depostos 2) o nuacutemero de testemunhas normalmente uma uacutenica testemunha costuma ser insuficiente para a produccedilatildeo de uma prova perfeita e plena Acrescenta-se que esse tipo de prova somente eacute admitido de acordo com a regra legal quando for produzida diante do juiz e com o conhecimento da parte contraacuteria Ela representa enfim a reconstituiccedilatildeo do fato tal qual existiu no passado

A prova documental eacute representada ldquopor documento ou pela demonsshytraccedilatildeo do fato alegado por meio de documento isto eacute um papel escrito onde o mesmo se mostra materializadordquo (De Plaacutecido e Silva) Aleacutem disso conforme o art 383 do Coacutedigo de Processo Civil acerca da prova docushymental ldquo qualquer reproduccedilatildeo mecacircnica como a fotograacutefica cinematograacuteshyfica fonograacutefica ou de outra espeacutecie faz prova dos fatos ou das coisas representadas se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conforshymidaderdquo Tal prova visa a representar o fato e surtiraacute o efeito desejado de acordo com a sua autenticidade a sua legitimidade e o seu conteuacutedo Destaca-se ainda o valor permanente que a prova documental possui dishyferentemente da prova testemunhal que eacute transeunte

A prova pericial se concretiza mediante o trabalho de um perito ou por meio de exames vistorias arbitramentos Ela descreve a forma atual dos fatos Dessa maneira exige a presenccedila de pessoas com incontestaacutevel idoneidade e com formaccedilatildeo teacutecnica referente agrave especificidade que cada caso a fim de contemplar os seguintes objetivos 1) cumprir uma ldquo inspeccedilatildeo determinada judicialmente para a verificaccedilatildeo de qualquer circunstacircncia ou fato alegado por uma das partes cuja veracidade natildeo pode ser comprovada

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURlDICO 61

sem ser por esse meio ()rdquo De Plaacutecido e Silva) Nesse caso denomina-se lal procedimento de exame que pode incidir sobre coisas fatos animais c pessoas Caso o exame seja ocular e incida sobre a realidade material dos fatos ligados agrave coisa chamar-se-aacute vistoria Seu objetivo eacute verificar a existecircncia da coisa sua realidade sua situaccedilatildeo e seu estado 2) ldquo apreciar o valor de determinados fatos ou coisas de que natildeo se tecircm elementos certos de avaliaccedilatildeordquo De Plaacutecido e Silva) Nesse caso deseja-se uma orientaccedilatildeo teacutecnica que promova a estimaccedilatildeo judicial dos fatos ou coisas a fim de se estipular um valor equivalente em dinheiro

As provas periciais representam importante instrumento persuasivo uma vez que procedimentos cientiacuteficos norteiam a sua execuccedilatildeo e por essa razatildeo utilizam-se de meacutetodo de teacutecnica satildeo sistemaacuteticos e estatildeo sujeitos agrave comprovaccedilatildeo Evidentemente que natildeo eacute apenas com um laudo teacutecnico que se persuade o auditoacuterio mas esse eacute um expediente eficaz e deve-se sempre que possiacutevel utilizaacute-lo

Por fim destacam-se os indiacutecios O valor probante desses se equivale aos tipos de prova jaacute destacados Entretanto difere dos demais porque

() natildeo se prestam a anaacutelises nem a classificaccedilotildees Natildeo se trata aqui de fatos representativos nos quais por sua proacutepria natureza a funshyccedilatildeo probatoacuteria eacute meramente essencial senatildeo de fatos autocircnomos cuja funccedilatildeo probatoacuteria c meramente acidental e surge pela eventualidade de uma relaccedilatildeo sua indefiniacutevel a priori com o fato a provar Por conseguinte natildeo cabe mais destacar o caraacuteter essencialmente relativo dos indiacutecios uni fato natildeo eacute indiacutecio em si senatildeo que se converte em tal quando uma regra de experiecircncia o potildee com o fato a provar em uma relaccedilatildeo loacutegica que permita deduzir a existecircncia ou natildeo existecircncia deste (CARN ELUTTI)

E possiacutevel entatildeo compreender o indiacutecio como um sinal um vestiacutegio um rastro extraiacutedo de um fato que proporciona a criaccedilatildeo de provas cirshycunstanciais conciliaacuteveis ou conexas para que se torne evidente o fato que se quer demonstrar Essa operaccedilatildeo depende da experiecircncia de quem execushyta o processo e da sua habilidade em dimensionar o fato e em estabelecer relaccedilotildees Tomemos como exemplo um assalto a uma mansatildeo onde soshymente o quarto da dona da casa estava revirado e de laacute foi levada uma caixa de joias valiosas Digamos que se deseja provar que o assalto foi praticado por algueacutem que conhecia a intimidade da casa Destaca-se portanto queo fato de a atenccedilatildeo do assaltante ter-se fixado apenas no quarto da dona da casa e de ter subtraiacutedo somente o porta-joias serviriam como indiacutecios de que o assaltante sabia exatamente o que deveria ser levado Admitidas

62 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

tais circunstacircncias eacute possiacutevel presumir que o assalto foi praticado por um empregado ou ateacute um morador da residecircncia Observemos que o procedishymento executado leva-nos a conceber um fato de presunccedilatildeo que embora seja autocircnomo do fato principal (o assalto) serve para a deduccedilatildeo do fato a provar uma vez que seguiu uma sequecircncia que manteacutem entre seus passos e tambeacutem com a realidade uma relaccedilatildeo loacutegica

Vamos retomar o caso concreto de Joatildeo Victor e destacar fatos e proshyvas que permitam comprovar a imperiacutecia e a negligecircncia por parte dos meacutedicos Aleacutem disso registrar as alegaccedilotildees que o seu opositor utiliza para contrariar a sua tese

Esse levantamento deve ser criterioso a fim de selecionar as informashyccedilotildees em que se assenta a sua tese Lembre-se de se manter fiel aos fatos e agraves provas natildeo eacute o momento de se registrarem impressotildees pessoais

Sugestatildeo de contextualizaccedilatildeo do real

Fatos favoraacuteveis agrave tese

1 - Apoacutes a cirurgia o abdocircmen do menino estava inchado Foi feita apulsatildeo mas o quadro continuou sc agravando ateacute que foi internado na unidade de terapia intensiva (UTI) com sangramento pela boca e pelo nariz

2 - Os pais afirmam que os meacutedicos natildeo esclareceram o que estavaocorrendo Tambeacutem registraram que insistiram para que o menino fosse novamente operado para que se encontrassem as causas das complicaccedilotildees

3 - Apoacutes a intervenccedilatildeo de dois meacutedicos o cirurgiatildeo pediaacutetrico do hosshypital realizou a operaccedilatildeo exploratoacuteria que comprovou a perfuraccedilatildeo no estocircmago

4 - 0 atestado de oacutebito revelou que o menino morreu por conta de rupshytura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas

Fatos contraacuterios agrave tese

1 - O cirurgiatildeo pediaacutetrico Augusto Nunes afirmou ldquoA causa morte da crianccedila natildeo eacute pelo meu procedimentordquo

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 63

2 - 0 anestesista Nilton Pereira tambeacutem assegurou que durante a opeshyraccedilatildeo tudo transcorreu normal mente e discordou do atestado de oacutebito que aponta problemas anesteacutesicos

44 H IPOacute T ESES

Importa inicialmente entender o significado da palavra hipoacutetese Seshygundo o Dicionaacuterio Eletrocircnico de Liacutengua Portuguesa de Antonio Houaiss dentre outros significados estes estatildeo registrados

1) proposiccedilatildeo que se admite independentemente do fato de ser verdashydeira ou falsa mas unicamente a tiacutetulo de um princiacutepio a partir do qual se pode deduzir um determinado conjunto de consequecircncias suposiccedilatildeo conjectura

2) suposiccedilatildeo conjectura pela qual a imaginaccedilatildeo antecipa o conhecishymento com o fim de explicar ou prever a possiacutevel realizaccedilatildeo de um fato e deduzir-lhe as consequecircncias pressuposiccedilatildeo presunccedilatildeo

Na argumentaccedilatildeo juriacutedica as hipoacuteteses satildeo proposiccedilotildees formuladas com base nos fatos elencados na contextualizaccedilatildeo do real que fornecem as suposiccedilotildees necessaacuterias para que se possa presumir a verossimilhanccedila da tese com o fato a provar Sendo assim as hipoacuteteses mantecircm uma relaccedilatildeo de coeshyrecircncia entre si jaacute que todas se dirigem a um mesmo ponto Isso natildeo represenshyta dizer que as possibilidades formuladas seratildeo iguais mas estaratildeo em uma relaccedilatildeo de interseccedilatildeo grosso modo satildeo caminhos autocircnomos que orientam o raciociacutenio para um mesmo ponto por terem algo em comum Nesse moshymento adota-se o raciociacutenio indutivo jaacute que se concebem hipoacuteteses como premissas menores que encaminharatildeo a uma uacutenica conclusatildeo a tese

Com base nas hipoacuteteses todas relacionadas pelo mesmo objetivo estru- turar-se-aacute o texto Nesse as suposiccedilotildees se transformaratildeo em afirmaccedilotildees isto eacute em inferecircncias das quais natildeo se tem duacutevida Tais afirmaccedilotildees ainda deveratildeo estar acompanhadas das justificativas que representaratildeo como se processou a conexatildeo entre elas e a conclusatildeo que se extraiu a partir dessa conexatildeo

Natildeo se pode perder de vista que sendo um texto argumentativo eacute indisshypensaacutevel que se registrem proposiccedilotildees que contenham argumentos de oposishyccedilatildeo Para tal eacute preciso o conhecimento e o uso dos conectores argumentativos de oposiccedilatildeo restritiva (adversativos) e contraste (concessivos) para que os argumentos de oposiccedilatildeo do orador sejam ilididos A estrutura do argumento de oposiccedilatildeo seraacute estudada no capiacutetulo referente aos tipos de argumento

eduardodasilvaramos
Highlight

64 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Como elaborar hipoacuteteses que visem agrave defesa da tese proposta no caso de Joatildeo Victor

Estrutura da hipoacutetese

Conector + Informaccedilatildeo extraiacuteda da contextualizaccedilatildeo do real + Inferecircncia extraiacuteda da

informaccedilatildeo anterior

Observaccedilatildeo Utilize na inferecircncia um verbo no futuro do preteacuterishyto (desinecircncia modo-temporal -ria) para indicar uma possibilidade

Sugestatildeo de hipoacuteteses

bull 1 - Jaacute que apoacutes uma cirurgia de amiacutedalas e adenoacuteide o abdocircmen da crianca apresentou inchaccedilo teria havido falha durante o proshycedimento ciruacutergico

2 - Uma vez que os pais afirmam que os meacutedicos natildeo esclareceramo que estava ocorrendo e que registraram que insistiram para que o menino fosse novamente operado a fim de encontrar as causas das complicaccedilotildees estaria comprovada a negligecircncia no atendimento agrave crianccedila

3 - Tendo em vista que o atestado de oacutebito revelou que o meninomorreu por conta de ruptura no estocircmago presenccedila de ar no peritocircnio e na cavidade pleural e complicaccedilotildees anesteacutesicas esshytaria comprovada a imperiacutecia meacutedica durante a cirurgia

Observaccedilatildeo Reserve as alegaccedilotildees dos meacutedicos para produzir arshygumentos de oposiccedilatildeo no Capiacutetulo 5

45 A N Aacute L ISE D ESSE PLA N EJA M EN T O EM SEN TEN CcedilA E ACOacuteRDAtildeO

A teoria desenvolvida nos capiacutetulos anteriores formou o alicerce soshybre o qual se pretende estruturar um texto argumentativo juriacutedico Com a intenccedilatildeo de demonstrar como tais conhecimentos auxiliam nessa tarefa propomos a anaacutelise da fundamentaccedilatildeo de uma sentenccedila e de um acoacuterdatildeo a fim de se percorrer o caminho inverso sugere-se uma possiacutevel estrutura que pode ser adotada como a expressatildeo da sequecircncia loacutegica do raciociacutenio exposto nas peccedilas E importante enfatizar que haacute outras possibilidades de se registrar o conteuacutedo da estrutura oferecida

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 65

451 Sentenccedila

Neste passo agrave luz da teoria do discurso e da teoria da argumentaccedilatildeo juriacutedica perscrutar-se-aacute o caminho adotado pelo juiz ao elaborar a fundashymentaccedilatildeo de sua sentenccedila Para tal foi preciso analisar compreender e construir o percurso seguido pelo magistrado Reafirme-se que se operou uma praacutetica inversa do texto para uma possiacutevel estrutura

Poder JudiciaacuterioEstado do Rio de JaneiroComarca de Volta RedondaJuiacutezo de Direito da 3a Vara CiacutevelProcesso ndeg 15386SENTENCcedilAVistos etcTrata-se de Accedilatildeo Ordinaacuteria de Responsabilidade Civil ajuizada por Eva Azevedo de Paula por si e representando seus filhos menores impuacutebeshyres Pedro Henrique de Paula e Carlos Henrique de Paula em face da autarquia municipal denominada Serviccedilo Autocircnomo HospitalarAlegam os autores como causa de pedir em siacutentese que1) O marido da autora foi atingido por disparo acidental de arma de fogo tendo sido encaminhado ao Hospital Satildeo Joatildeo Batista adminisshytrado pelo reacuteu onde se constatou a necessidade de imediata internaccedilatildeo ciruacutergica a fim de estancar hemorragia interna2) Ocorre que o mencionado hospital natildeo dispunha de meacutedico anesshytesista de plantatildeo em que pese contar com meacutedico cirurgiatildeo para tal operaccedilatildeo (f 03)3) Em vez de providenciar a remoccedilatildeo imediata da viacutetima para outro hosshypital o responsaacutevel ldquo limitou-se a tentar conseguir meacutedico anestesista por meio de telefonemasrdquo (f 03)4) Finalmente quase duas horas depois a viacutetima deu entrada no Hospishytal da CSN com o seu estado de sauacutede agravado ldquo por falta de socorro adequado e imediatordquo (f 03)5) Aguardam portanto a condenaccedilatildeo do reacuteu no pagamento de indeshynizaccedilatildeo consistente nos danos morais e materiais que especifica nas folhas 0607Inicial instruiacuteda com os documentos de f 0829O reacuteu apresentou a contestaccedilatildeo de f 3639 arguindo em resumo que o socorro imediato foi prestado pela equipe do Hospital Satildeo Joatildeo Batista

66 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dentro das normas teacutecnicas natildeo havendo que se ldquo falar em omissatildeo eou negligecircncia uma vez que natildeo se transfere paciente para outro serviccedilo aleatoriamente razatildeo dos procedimentos adotados pela equipe meacutedica para garantir as condiccedilotildees baacutesicas de vidardquo (f 37)Quanto aos contatos telefocircnicos alega o reacuteu ter cumprido o que estabeshylece a resoluccedilatildeo n 1787 do C REM ERJ em seu art 9deg sendo que ao chegar agrave Casa de Sauacutede Santa Margarida foi informado de que ela natildeo dispunha de CTI razatildeo pela qual foi recusada a internaccedilatildeo da viacutetima que foi entatildeo encaminhada ao Hospital da CSNAssim ldquo a se falar em negligecircncia meacutedica para a ocorrecircncia de culpa deveraacute ela ser atribuiacuteda agrave Casa de Sauacutede Santa Margaridardquo (f 38)Por fim alega que a responsabilidade do meacutedico natildeo eacute de resultado mas de meio razatildeo pela qual aguarda a improcedecircncia do pedidoReacuteplica de f 4749 reiterando os termos da inicial instruiacuteda com coacutepia do Registro de ocorrecircnciaEm provas os autores protestaram pela oitiva das testemunhas arrolashydas a f 55 e o reacuteu pelas arroladas a f 60Realizada a audiecircncia de instruccedilatildeo e julgamento de f 7078 na qual foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas foi proferida a sentenccedila de f 8892 tendo posteriormente o processo sido anulado a partir de f 58 por forccedila do acoacuterdatildeo de f 115116Realizada a audiecircncia de conciliaccedilatildeo de f 122 essa terminou frustrashydaFrustrada a realizaccedilatildeo da audiecircncia de instruccedilatildeo e julgamento de f 133 face agrave ausecircncia de 2 testemunhas essa veio a realizar-se consoante ata de f 140 na qual foram ouvidas 4 testemunhas conforme termos de fls 141146As partes apresentaram suas alegaccedilotildees finais por meio dos memoriais de f 148152 e 154155O Ministeacuterio Puacuteblico ofereceu denuacutencia de f 157158 opinando pela procedecircncia do pedidoEacute o relatoacuterio decido

Os autores fundamentam a presente accedilatildeo com o art 37 paraacutegrafo 6deg da Constituiccedilatildeo Federal que estabelece a responsabilidade objetiva das pessoas juriacutedicas de direito puacuteblico prestadoras de serviccedilo puacuteblico tenshydo em vista a natureza autaacuterquica do reacuteu a quem cabe administrar o Hospital Satildeo Joatildeo Batista ex vi do Decreto n 520A e 521 de f 1524O Ministeacuterio Puacuteblico por sua vez reitera a responsabilidade objetiva do reacuteu com fundamento entretanto na Lei 80781990 - Coacutedigo do

Consumidor jaacute que se trata de serviccedilos meacutedicos prestados por hospital como fornecedor de serviccedilosDe fato a responsabilidade do reacuteu na hipoacutetese deve scr apurada no campo da responsabilidade objetivaApesar da controveacutersia existente na doutrina no que se refere agrave resshyponsabilidade civil dos hospitais se objetiva ou subjetiva a verdade eacute que no caso trata-se dc hospital puacuteblico administrado pelo reacuteu aushytarquia municipal devendo portanto responder objetivamente pelas falhas na prestaccedilatildeo do serviccedilo hospitalar seja pela regra geral previsshyta no art 37 paraacutegrafo 6deg da CRFB ou mesmo pelo disposto no art 22 paraacutegrafo uacutenico combinado com art 14 do Coacutedigo de Proteccedilatildeo e Defesa do ConsumidorCom efeito o referido Coacutedigo prevecirc em seu art 4deg os objetivos e a Poliacutetica Nacional das Relaccedilotildees de Consumo estabelecendo no seu inshyciso V II o princiacutepio da

ldquo V II - racionalizaccedilatildeo e melhoria dos serviccedilos puacuteblicosrdquo

Em seguida no art 6deg satildeo previstos os direitos baacutesicos do consumidor entre os quais eacute exigido

ldquo X - A adequada e eficaz prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicos em geralrdquo

Finalmente o art 22 e seu paraacutegrafo uacutenico da Lei 80781990 que dispotildee

Os oacutergatildeos puacuteblicos por si ou suas empresas concessionaacuterias permis- sionaacuterias ou sob qualquer outra forma de empreendimento satildeo obrishygadas a fornecer serviccedilos adequados eficientes seguros e quanto aos essenciais contiacutenuosParaacutegrafo uacutenico Nos casos de descumprimento total ou parcial das obrigaccedilotildees referidas neste artigo seratildeo as pessoas juriacutedicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados na forma prevista neste Coacutedigo

Portanto constata-se que para o Coacutedigo de Defesa do Consumidor as entidades puacuteblicas e privadas que prestam serviccedilos puacuteblicos tecircm tratashymento igualitaacuterio conforme doutrina Maria D rsquoAssunccedilatildeo Merecello in Direito do Consumidor RT ndeg 19 p 233) respondendo assim objetishyvamente pelos danos causados aos consumidoresO Des Seacutergio Cavai ieri por sua vez em Programa de Responsabilidashyde Civil ressalta que a responsabilidade das instituiccedilotildees hospitalares como prestadoras de serviccedilos eacute objetiva in verbis

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO

68 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A responsabilidade do hospital embora natildeo vaacute ao ponto de garantir a vida ou assegurar a cura do paciente inclui um dever de incolumidade na medida em que tem de resguardar o paciente de quaisquer conseshyquecircncias que um bom serviccedilo poderia evitar Tem obrigaccedilatildeo natildeo soacute de prestar assistecircncia medica mas tambeacutem como hospedeiro respondenshydo pelas consequecircncias da violaccedilatildeo de quaisquer dos seus deveres conshysoante o art 1521 IV do Coacutedigo Civil Como prestadores de serviccedilos a responsabilidade das instituiccedilotildees hospitalares eacute objetiva pois enquashydra-se tambeacutem no art 14 do Coacutedigo do Consumidor (grifo nosso)

Com efeito em se tratando de estabelecimento puacuteblico administrado por autarquia municipal eacute de se impor o enquadramento da hipoacutetese no campo da responsabilidade objetiva repita-se seja por forccedila do art 37 paraacutegrafo 6deg da CRFB ou o mesmo disposto no art 22 paraacutegrafo uacutenico cc art 14 do Coacutedigo de Defesa do ConsumidorCumpre verificar portanto se houve ou natildeo na hipoacutetese defeito na prestaccedilatildeo do serviccedilo desempenhado pelo hospital em razatildeo da ausecircncia do meacutedico anestesista do hospital o qual se encontrava de sobreaviso e natildeo foi encontrado quando da emergecircncia impedindo a realizaccedilatildeo da intervenccedilatildeo ciruacutergica bem como se existe nexo de causalidade entre o aludido fato e a morte da viacutetimaO exame dos autos revela que realmente existiu falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo emergencial Isso porque um hospital que realiza atendimento de emergecircncia deve dispor dos equipamentos miacutenimos e da equipe neshycessaacuteria para ocorrendo a emergecircncia prestar o pronto atendimento ao paciente seja ele ciruacutergico ou natildeo o que natildeo ocorreu no casoOra na hipoacutetese constata-se que a viacutetima frise-se chegou ao Hospital administrado pelo reacuteu com vida ainda luacutecida e caminhando conforme declarou a testemunha de f 76 em depoimento ratificado a f 144Assim prestados os primeiros socorros pelo cirurgiatildeo plantonista este concluiu ser indispensaacutevel a intervenccedilatildeo ciruacutergica a fim de conter a hemorragia do paciente a qual natildeo pocircde ser efetivada face agrave ausecircncia do meacutedico anestesista que se encontrava em regime de sobreaviso e natildeo pocircde ser encontradoCom isso o paciente teve de ser transferido para outro hospital qual seja o da Companhia Sideruacutergica Nacional em que deu entrada cerca de duas horas depois face agraves dificuldades da transferecircncia ldquo em estado grave apresentando choque hipovolecircnico e hemotoacuterax agrave direitardquo (f 45)A prova testemunhal revela claramente que houve falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo na medida em que a intervenccedilatildeo ciruacutergica que se fazia neshycessaacuteria para aumentar as chances de sobrevivecircncia do paciente natildeo foi realizada devido agrave ausecircncia do anestesista fato que agravou o estado

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 69

de sauacutede da viacutetima que teve de ser removida para outro hospital aonde chegou cerca de duas horas depois repita-se jaacute em estado criacuteticoEacute o que se colhe do depoimento de f 7475 (ratificado a f 146 e f 7778 e f 141) in verbis

ldquo () que em medicina para se salvar o paciente eacute necessaacuterio que o atenshydimento seja o mais imediato possiacutevel salientando-se que o paciente com o quadro hemorraacutegico como ocorrido nesta hipoacutetese em exame soacute teria chance de sobrevivecircncia no caso de socorro imediato sendo por conseguinte o retardo terapecircutico determinante de extrema piora prognostica() que diante do quadro apresentado pelo paciente o ideal eacute que tivesse sido operado no primeiro hospital que deu entrada() a cirurgia naquele momento era imprescindiacutevel ateacute para conter a hemorragia do paciente() se houvesse anestesista no hospital no dia dos fatos afirma o depoenshyte que teria realizado a cirurgiardquo

Constatara-se portanto ter havido evidente falha na prestaccedilatildeo do servishyccedilo em questatildeo considerando que se trata de atendimento emergencial que deixou se ser prestado adequadamente face agrave ausecircncia do anesteshysista o que impossibilitou a realizaccedilatildeo da cirurgia privando a viacutetima de um direito baacutesico que eacute a ldquo adequada e eficaz prestaccedilatildeo dos serviccedilos puacuteblicosrdquo Assim conforme a doutrina jaacute citada embora a responsabilidade do hospital natildeo vaacute ao ponto de garantir a vida ou assegurar a cura ele tem o dever de resguardar o paciente de quaisquer consequecircncias que um serviccedilo adequado poderia evitar e o serviccedilo na hipoacutetese soacute o seria se realizada a cirurgia de emergecircnciaCumpre ressaltar ad argumentandum tantum que a gravidade da lesatildeo apresentada no momento da internaccedilatildeo natildeo afasta a obrigaccedilatildeo do hosshypital em prestar o serviccedilo de forma adequada e eficaz o que significa dizer completo natildeo se podendo admitir que uma cirurgia deixe dc ser realizada por ausecircncia de meacutedico anestesistaHouve portanto negligecircncia por parte da direccedilatildeo do hospital o qual elegeu arriscado sistema de sobreaviso para o meacutedico anestesista assushymindo assim o risco de ele natildeo ser encontrado fato que na hipoacutetese impediu a realizaccedilatildeo da cirurgia e consequentemente agravou o estado de sauacutede da viacutetima devendo se impor a obrigaccedilatildeo de indenizarConstatada a obrigaccedilatildeo de indenizar cumpre fixar as verbas indenizaacute- veis a comeccedilar pelos danos materiais

70 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Os autores requereram a condenaccedilatildeo da Reacute ao pagamento de ldquo pensatildeo progressiva a ser arbitrada por esse Juiacutezo seguindo o salaacuterio baacutesico para os empregados em construccedilatildeo civil em que exercia o de cujus sua ativishydade vincenda e vencidardquo (f 07 com a constituiccedilatildeo de capital durante o periacuteodo de sobrevida provaacutevel da viacutetima)A alegaccedilatildeo de que a viacutetima agrave eacutepoca dos fatos trabalhava na construccedilatildeo civil aleacutem de natildeo impugnada pela reacute (art 30 do CPC) encontra respaldo nos documentos de f 1228 e 29 razatildeo pela qual sendo os autores cocircnjuge e filhos menores da viacutetima tem-se entendido que a dependecircncia econocircmica eacute presumida evidenciando assim o dano qual seja o lucro cessanteO pensionamento pretendido entatildeo eacute devido acrescido de 13deg salaacuterio o qual integra a remuneraccedilatildeo do trabalhador e portanto independe de pedido sendo que a jurisprudecircncia dos tribunais brasileiros eacute no sentido de fixaacute-la em 23 dos ganhos da viacutetima jaacute que 13 equivaleria aos seus gastos pessoais devidos ateacute a data em que completaria 65 anos a qual reflete a sobrevida provaacutevel tranquilamente aceita pela jurisprudecircnciaNo entanto inexistindo nos autos prova do quantum da remuneraccedilatildeo percebida pela viacutetima a pensatildeo deveraacute ser fixada em quantia equivalenshyte a 23 dos ganhos da viacutetima valor esse que deveraacute ser convertido em salaacuterio miacutenimo vigente na eacutepoca do fato conforme suacutemula 490 do STF tudo a ser apurado em liquidaccedilatildeo de sentenccedilaA pensatildeo devida aos filhos menores apesar de a reacute natildeo impugnar natildeo pode se estender pelo resto de suas vidas Deve ela perdurar por tempo que lhes permita educar-se e buscar seus caminhos proacuteprios o que jaacute eacute praxe dura ateacute os 24 (vinte e quatro) anosEste o limite o termo final do pensionamento dos filhos da viacutetimaQuanto agrave reversatildeo da pensatildeo dos filhos para a I a autora entendo deva ser deferida apesar de inexistir pedido expresso nesse sentido Isso porshyque o pedido dos autores eacute abrangente pois natildeo fixa termo ad quem para a pensatildeo dos menores devendo ser portanto deferida a reversatildeo no momento em que estes completarem 24 anos sem o que haveraacute por parte da reacute enriquecimento iliacutecitoO dano moral por sua vez tambeacutem existe na hipoacutetese e deve ser concedidoApesar de inexistirem paracircmetros fixos a serem observados para a fishyxaccedilatildeo destes a verdade eacute que alguns princiacutepios devem ser observados especialmente aquele que atribui ao dano moral a natureza de pena prishyvada conforme sustentado pelo eminente Min Moreira AlvesAssim o caraacuteter punitivo no caso deve ser suficiente para desestimular a repeticcedilatildeo de fatos semelhantes de forma que a administraccedilatildeo puacuteblica tenha mais zelo na prestaccedilatildeo de serviccedilos puacuteblicos essenciais como no caso da sauacutede em que satildeo noticiados frequentemente casos como o presente

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 71

Deve-se considerar ainda o sofrimento do ofendido que se apresenta na hipoacutetese sem seu grau maacuteximo considerando a morte da viacutetima cocircnshyjuge e pai dos autoresPortanto norteado pelos paracircmetros em apreccedilo acolho o pedido inicial e fixo os danos morais em R$ 3500000 (trinta e cinco mil reais)Posto isso JULGO PRO CED ENTE o pedido para condenar a parte reacute a pagar aos autores1) Pensotildees vencidas e vincendas desde a eacutepoca do evento (23101993) no valor mensal de 23 dos ganhos da viacutetima na proporccedilatildeo de 13 para cada um devidamente corrigido nos termos da suacutemula 490 do STF a ser apurado em liquidaccedilatildeo de sentenccedila2) Durando a pensatildeo para os filhos menores ateacute a data em que completashyrem 24 anos momento em que deveraacute ser revertida agrave primeira autora3) Indenizaccedilatildeo por danos morais em valor equivalente a R$ 3500000 (trinta e cinco mil reais) a ser dividido pelos autores na proporccedilatildeo de 13 para cada um a ser paga direta e imediatamente a representante legal dos menores quanto agraves respectivas partes4) Juros simples desde a data do evento ateacute a do efetivo pagamento (Suacutemula ndeg 54 STJ)5) Despesas com o processo e honoraacuterios de advogados na base de 15 (quinze por cento) sobre as prestaccedilotildees vencidas e 12 vincendas incluindo o valor referente aos danos moraisPor fim no que se refere agrave constituiccedilatildeo de capital considerando a idoshyneidade econocircmica da reacute deveraacute ele providenciar o pagamento da penshysatildeo mediante a inclusatildeo dos autores em folha de pagamento na forma do art 20 paraacutegrafo 5deg do Coacutedigo de Processo Civil

PRIVolta Redonda 23 de maio de 1997

Gustavo Bandeira da Rocha Oliveira

Juiz de Direito

Com o objetivo de delinear um provaacutevel rumo seguido pelo raciociacuteshynio do magistrado destacam-se os elementos constitutivos da argumentashyccedilatildeo juriacutedica

1) Situaccedilatildeo de conflitoEva Azevedo de Paula por si e representando seus filhos menores

impuacuteberes Pedro Henrique de Paula e Carlos Henrique de Paula acusa a

72 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

autarquia municipal denominada Serviccedilo Autocircnomo Hospitalar de falha no atendimento a seu marido causa provaacutevel de sua morte no dia 23 de oushytubro de 1993 no Hospital da Companhia Sideruacutergica Nacional em Volta Redonda para onde fora transferido

2) TeseA Autarquia Municipal Serviccedilo Autocircnomo deve indenizar por danos

morais e pagar pensatildeo agrave viuacuteva e a seus dois filhos por ter sido negligente na prestaccedilatildeo do atendimento agrave viacutetima

3) Contextualizaccedilatildeo do real

Proacute-tese1) A viacutetima atingida por um tiro acidental chegou ao Hospital Satildeo

Joatildeo Batista luacutecida e caminhando com hemorragia interna conforme tesshytemunho de f 76

2) De acordo com o cirurgiatildeo plantonista que prestou os primeiros s o c o it o s era indispensaacutevel uma intervenccedilatildeo ciruacutergica para conter a hemorshyragia (f 7475) e por ausecircncia dessa seu estado agravou-se

3) Segundo consta nos autos o meacutedico anestesista natildeo estava no hosshypital encontrava-se de sobreaviso e natildeo foi localizado

4) De acordo com o Hospital da CSN (f 45) em face das dificuldades de transferecircncia o paciente chegou ao referido hospital ldquo em estado grave apresentando choque hipovolecircnico e hemotoacuterax agrave direitardquo

Contraacuterio agrave tese1) Segundo consta nos autos a parte reacute afirma que o paciente jaacute cheshy

gou ao hospital em estado grave e recebeu socorro imediato2) De acordo com os autos a parte reacute entende que a responsabilidade

do meacutedico natildeo eacute de resultado mas de meio

4) HipoacutetesesIa) Jaacute que a viacutetima atingida por um tiro acidental chegou ao hospishy

tal luacutecida e caminhando haveria como salvar-lhe a vida prestando-lhe o devido atendimento

2a) Uma vez que de acordo com o cirurgiatildeo plantonista que prestou os primeiros socorros era indispensaacutevel uma intervenccedilatildeo ciruacutergica para conter a hemorragia (f 7475) e por ausecircncia desse procedimento seu estado agravou-se teria havido falha na prestaccedilatildeo do serviccedilo

3a) Tendo em vista que segundo consta nos autos o meacutedico anesshytesista natildeo estava no hospital (encontrava-se de sobreaviso mas natildeo foi localizado) a autarquia teria assumido o risco de prestar um atendimento inadequado

4a) Jaacute que de acordo com o Hospital da CSN (f 45) face agraves dificulshydades de transferecircncia o paciente chegou ao referido hospital ldquoem estado rrave apresentando choque hipovolecircmico e hemotoacuterax agrave direitardquo seu estashydo teria se agravado pela negligecircncia do Hospital Satildeo Joatildeo Batista

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO

152 Acoacuterdatildeo

O acoacuterdatildeo oferecido a seguir constitui um pronunciamento exemplar quanto ao conteuacutedo juriacutedico e quanto agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua portuguesa Por essa razatildeo demonstra-se oportuna a sua leitura assim como a tentativa de recuperar o modo pelo qual o julgador ordenou o seu raciociacutenio para identishyficar a questatildeo a ser decidida avaliar as particularidades do caso concreto a serem valoradas analisar os argumentos dos litigantes definir-se a respeito da norma e dos princiacutepios incidentes e a aplicabilidade desses Para tal larefa recorreremos mais uma vez ao levantamento dos elementos cons- litutivos da argumentaccedilatildeo juriacutedica

ACOacuteRDAtildeO 2a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel no 76096 Relator Des Seacutergio Cavalieri FilhoRESPO N SA BIL ID AD E C IV IL DE EM PRESA JORNALIacuteST ICA Pushyblicaccedilatildeo OfensivaI L IBER D A D E C IV IL DE INFORMACcedilAtildeO VERSUS IN V IO LA B IL IshyDADE DA V ID A PRIVADA Princiacutepio da Unidade ConstitucionalNa temaacutetica dos direitos e garantias fundamentais dois princiacutepios consshytitucionais se confrontam e devem ser conciliados De um lado a livre expressatildeo da atividade intelectual artiacutestica cientiacutefica e de comunicaccedilatildeo independentemente de censura ou licenccedila de outro lado a inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem das pessoasSempre que princiacutepios constitucionais aparentam colidir deve o inteacutershyprete procurar as reciacuteprocas implicaccedilotildees existentes entre eles ateacute chegar a uma inteligecircncia harmoniosa porquanto em face do princiacutepio da unishydade constitucional a Constituiccedilatildeo natildeo pode estar em conflito consigo mesma natildeo obstante a diversidade de normas e princiacutepios que conteacutem

74 H l LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Assim se ao direito agrave livre expressatildeo da atividade intelectual e de comushynicaccedilatildeo contrapotildee-se o direito agrave inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem segue-se como consequecircncia loacutegica que este uacuteltimo condiciona o exerciacutecio do primeiro atuando como limite estabelecido pela proacutepria Lei Maior para impedir excessos e abusosII DANO MORAL ConfiguraccedilatildeoNa tormentosa questatildeo de saber o que configura o dano moral cumpre ao juiz seguir a trilha da loacutegica do razoaacutevel em busca da sensibilidade eacutetico-social normal Deve tomar por paradigma o cidadatildeo que se coloca a igual distacircncia do homem frio insensiacutevel e o homem de extremashyda sensibilidade Nessa linha de princiacutepio soacute deve ser reputado como dano moral a dor vexame sofrimento ou humilhaccedilatildeo que fugindo agrave normalidade interfira intensamente no comportamento psicoloacutegico do indiviacuteduo causando-lhe afliccedilatildeo angustia e desequiliacutebrio em seu bem estar natildeo bastando mero dissabor aborrecimento maacutegoa irritaccedilatildeo ou sensibilidade exacerbada Agrave luz desse contexto ningueacutem pode negar que fere a sensibilidade do homem normal e configura humilhaccedilatildeo doshylorosa divulgar em revista de grande circulaccedilatildeo que conhecida artista de novela teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou a elas comparecer alcoolizadaIII ARBITRAM ENTO DO DANO MORAL Princiacutepio da Razoabili- dadeO arbitramento judicial eacute o mais eficiente meio para se fixar o dano moral E embora nessa penosa tarefa natildeo esteja o juiz subordinado a nenhum limite legal nem a qualquer tabela prefixada deve todavia atentando para o princiacutepio da razoabilidade estimar uma quantia comshypatiacutevel com a reprovabilidade da conduta iliacutecita e a gravidade do dano por ela produzido Se a reparaccedilatildeo deve ser a mais ampla possiacutevel natildeo pode o dano transformar-se em fonte de lucro Entre esses dois limites devem se situar a prudecircncia e o bom senso do julgadorReforma parcial de sentenccedilaVistos relatados e discutidos estes autos de Apelaccedilatildeo Ciacutevel no 76096 em que eacute Ia apelante Editora Abril SA 2a apelante Maria Zilda Bethelm Vieira e apelados os mesmosAcordam os Desembargadores que integram a 2a Cacircmara Ciacutevel do Trishybunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro por unanimidade em dar provimento parcial agrave apelaccedilatildeo a fim de reduzir a indenizaccedilatildeo para 500 (quinhentos) salaacuterios miacutenimos e negar provimento ao recurso adesivo confirmando-se no mais a brilhante sentenccedila da lavra do eminente Juiz Dr Luiz FuxReporto-me ao relatoacuterio de f 407409 aduzindo que se trata de accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por dano moral decorrente de publicaccedilatildeo em revista

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 75

de grande vendagem e repercussatildeo ofensiva agrave honra e agrave intimidade da autora Postulou indenizaccedilatildeo compatiacutevel com o grau dc culpa a intensishydade do sofrimento do ofendido e o caraacuteter punitivo da indenizaccedilatildeoA sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido condenando a reacute a pagar agrave autora a quantia equivalente a quatro mil salaacuterios miacutenimos a tiacutetulo de indenizaccedilatildeo por dano moral e verba honoraacuteria de 20 sobre o valor da condenaccedilatildeoApela primeiramente a reacute (f 420439) alegando ter a sentenccedila legado ao obliacutevio todas as disposiccedilotildees da Lei de Imprensa e da Constituiccedilatildeo Federal no livre direitodever de informar Sustenta em siacutentese que a) o julgador de primeiro grau tratou desigualmente as partes na anaacutelise da instruccedilatildeo processual b) a apelante procurou mostrar nas provas docushymentais que trouxe aos autos as caracteriacutesticas da apelada o que natildeo foi considerado pelo julgador de primeiro grau c) a revista Veja atuou em absoluta conformidade com a Carta Magna informando seus leitores a respeito de fato de interesse puacuteblico como lhe asseguram os artigos 5deg incisos IV e IX e 220 sectsect 1deg e 2deg d) nada se imputou agrave pessoa da apelada tendo a notiacutecia sido dada na forma condicional como mandam todos os manuais de imprensa e) a sentenccedila incorre em engano quando afasta a aplicaccedilatildeo da Lei de Imprensa no presente caso trazendo agrave colashyccedilatildeo acoacuterdatildeo do STJ 0 a condenaccedilatildeo imposta agrave apelante viola qualquer princiacutepio que possa ser aplicado ao montante razoaacutevel da indenizaccedilatildeo eis que o proacuteprio Presidente da Repuacuteblica natildeo ganharia essa importacircnshycia em todo o seu mandato g) a indenizaccedilatildeo no valor em que foi arshybitrada importa em enriquecimento sem causa Traz agrave colaccedilatildeo vaacuterios arestos deste Tribunal no sentido de que a indenizaccedilatildeo pelo dano moral deve respeitar os limites estabelecidos na Lei de Imprensa Pede a total reforma da sentenccedila para o fim de ser julgado improcedente o pedido ou alternativamente que a condenaccedilatildeo seja reduzida aos limites da lei especial que rege a mateacuteriaRecorre adesivamente a autora (f 473484) postulando que a indenizashyccedilatildeo seja elevada para importacircncia correspondente a pelo menos 20 do valor total da tiragem da Revista Veja ou seja 632115 salaacuterios miacutenimos e que os juros moratoacuterios sejam computados a partir do ato iliacutecitoOs recursos foram respondidos (f 443471 e 488493) cada parte pugshynando pela manutenccedilatildeo da sentenccedila no ponto em que lhe foi favoraacutevel Haacute preliminar de descabimento do recurso adesivo por natildeo ter havido sucumbecircncia reciacuteprocaE o relatoacuterioEnsejou a presente accedilatildeo mateacuteria jornaliacutestica publicada na seccedilatildeo ldquo Genterdquo da Revista Veja noticiando que a autora quando estava sendo transmi-

tida a novela ldquo Olho por Olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada O fato aleacutem de natildeo contestado estaacute comprovado com um exemplar da revista trazida aos autos resta pois a anaacutelise de suas consequecircncias juriacutedicasColocadas em ordem loacutegica as questotildees levantadas nos recursos cumpre apreciar em primeiro lugar a que diz respeito agrave liberdade de informaccedilatildeo garantida pela Constituiccedilatildeo na qual se escuda a apelante para justificar a sua conduta Em seu entender teria agido em absoluta conformidade com a Carta Magna informando seus leitores a respeito de fato de inteshyresse puacuteblico pelo que natildeo teria praticado ato iliacutecitoNingueacutem questiona que a Constituiccedilatildeo garante o direito de livre exshypressatildeo agrave atividade intelectual artiacutestica cientiacutefica e de comunicaccedilatildeo independentemente de censura ou licenccedila (arts 5deg inc IX e 220 sectsect 1deg e 2deg) Essa mesma Constituiccedilatildeo todavia logo no inciso seguinte (no X) dispotildee que ldquosatildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito agrave indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeordquo Como se vecirc na temaacutetica atinente aos direitos e garantias fundamenshytais esses dois princiacutepios constitucionais se confrontam e devem ser conciliados Eacute tarefa do inteacuterprete encontrar o ponto de equiliacutebrio entre os princiacutepios constitucionais em aparente conflito porquanto em face do princiacutepio da unidade constitucional a Constituiccedilatildeo natildeo pode estar em conflito consigo mesma natildeo obstante a diversidade de normas e princiacutepios que conteacutem a fim de evitar contradiccedilotildees antagonismos e antinomiasEm outras palavras natildeo eacute possiacutevel analisar-se uma disposiccedilatildeo consshytitucional isoladamente fora do conjunto harmocircnico em que deve ser situada princiacutepios aparentemente contraditoacuterios podem harmonizar-se desde que se abdique da pretensatildeo de interpretaacute-los de forma isolada e absolutaCelso Ribeiro Bastos citando Willoughby diz que ldquo a Constituiccedilatildeo corshyresponde a um todo loacutegico onde cada provisatildeo eacute parte integrante do conjunto sendo assim logicamente adequado senatildeo imperativo intershypretar uma parte agrave luz das previsotildees de todas as demais partesrdquo (Curso de Direito Constitucional 15 ed Saraiva p 204)Agrave luz desses princiacutepios eacute forccediloso concluir que sempre que direitos consshytitucionais satildeo colocados em confronto um condiciona o outro atushyando como limites estabelecidos pela proacutepria Lei Maior para impedir excessos e arbiacutetrios Assim se ao direito agrave livre expressatildeo da atividade intelectual e de comunicaccedilatildeo contrapotildee-se o direito agrave inviolabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem segue-se como conshysequecircncia loacutegica que este uacuteltimo condiciona o exerciacutecio do primeiro

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 77

Pondera o insigne Carlos Alberto Bittar que na divulgaccedilatildeo da imagem eacute vedada qualquer accedilatildeo que importe em lesatildeo agrave honra agrave reputaccedilatildeo ao decoro (ou agrave chamada imagem moral ou conceituai) agrave intimidade e a outros valores da pessoa (uso torpe) Natildeo satildeo permitidas pois quaisshyquer operaccedilotildees que redundem em sacrifiacutecio desses valores que receberatildeo sancionamento em conformidade com bem violado e nos niacuteveis possiacuteveis (Os direitos da personalidade Forense Universitaacuteria 1988 p 90-91)Leandro Konder por sua vez explica que a vida privada eacute uma conquisshyta relativamente recente da humanidade e que mesmo se entendendo que pessoas puacuteblicas tecircm o seu cotidiano naturalmente mais devassado eacute preciso que alguma liberdade lhes sobre Uma sociedade eacute feita de indiviacuteduos livres Acredito prossegue o citado autor que a revelaccedilatildeo de verdades da vida privada capazes de causar transtornos soacute se justifica se isso for essencial para se entender um fenocircmeno histoacuterico Se natildeo vira artifiacutecio sensacionalista o que eacute eticamente condenaacutevel e politicamente perigosoEm conclusatildeo os direitos individuais conquanto previstos na Constishytuiccedilatildeo natildeo podem ser considerados ilimitados e absolutos em face da natural restriccedilatildeo resultante do princiacutepio da conveniecircncia das liberdashydes pelo que natildeo se permite que qualquer deles seja exercido de modo danoso agrave ordem puacuteblica e agraves liberdades alheias Fala-se hoje natildeo mais em direitos individuais mas em direitos do homem inserido na sociedashyde de tal modo que natildeo mais exclusivamente com relaccedilatildeo ao indiviacuteduo mas com enfoque de sua inserccedilatildeo na sociedade que se justificam no estado social de direito tanto os direitos como as suas limitaccedilotildeesSempre que haacute invasatildeo da disciplina constitucional e consequente vioshylaccedilatildeo ou ameaccedila de violaccedilatildeo de direito de outrem o Judiciaacuterio eacute convoshycado a prestar a jurisdiccedilatildeo natildeo como censor da liberdade de pensamento do cidadatildeo mas para que possamos conviver democraticamente como magistralmente colocou o eminente Desembargador Carlos Alberto Dishyreito um dos luminares desta Corte em brilhante voto prolatado na Apelaccedilatildeo ndeg 631893 da I a Cacircmara Ciacutevel O reacuteu eacute livre para manifestar o seu pensamento prossegue o erudito voto mas por ele eacute responsaacutevel Cada cidadatildeo sabe que a Constituiccedilatildeo exclui da liberdade de manifestashyccedilatildeo do pensamento a ofensa aos direitos subjetivos privados de outrem Natildeo cabe ao Poder Judiciaacuterio limitar o vocabulaacuterio do cidadatildeo Pode e deve impedir que um juiacutezo seja exteriorizado se e quando provocado previamente para coibir a ameaccedila de violaccedilatildeo de direitos nunca para censurarAssentados os limites do direito de expressatildeo e informaccedilatildeo em face da inviolabilidade da vida privada cumpre agora perquirir se a apelante ao veicular a notiacutecia que deu causa a esta accedilatildeo invadiu a esfera iacutentima da autora causando-lhe dano moral

78 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Na falta de criteacuterios objetivos para a configuraccedilatildeo do dano moral a questatildeo vem se tornando tormentosa na doutrina e na jurisprudecircncia levando o julgador a situaccedilatildeo dc perplexidade Ultrapassadas as fases de irreparabilidade do dano moral e da sua inacumulabilidade com o dano material corremos agora o risco de ingressarmos na fase da sua industrializaccedilatildeo onde o aborrecimento banal ou mera sensibilidade satildeo apresentados como dano moral em busca de indenizaccedilotildees milionaacuteriasTenho entendido que na soluccedilatildeo dessa questatildeo cumpre ao juiz seguir a trilha da loacutegico do razoaacutevel em busca da sensibilidade eacutetico-social norshymal Deve tomar por paradigma o cidadatildeo que se coloca a igual distacircnshycia do homem frio insensiacutevel e o homem de extremada sensibilidadeNessa linha de princiacutepio soacute deve ser reputado como dano moral a dor vexame sofrimento ou humilhaccedilatildeo que fugindo agrave normalidade interfira intensamente no comportamento psicoloacutegico do indiviacuteduo causando-lhe afliccedilotildees anguacutestia e desequiliacutebrio em seu bem-estar Mero dissabor aborrecimento maacutegoa irritaccedilatildeo ou sensibilidade exacerbada estatildeo fora da oacuterbita do dano moral porquanto aleacutem de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia no trabalho no tracircnsito entre os amigos e ateacute no ambiente familiar tais situaccedilotildees natildeo satildeo intensas e duradouras a ponto de romper o equiliacutebrio psicoloacutegico do indiviacuteduo Se assim natildeo se entender acabaremos por banalizar o dano moral ensejando accedilotildees judiciais em busca de indenizaccedilotildees pelos mais triviais aborrecimentosTomando-se com o paradigma o homem normal parece-me que ninshygueacutem pode negar que fere a sensibilidade do profissional seacuterio comshypetente responsaacutevel e configura humilhaccedilatildeo dolorosa ser tachado de relapso faltoso e alcooacutelatra em notiacutecia publicada em revista de grande circulaccedilatildeo E a autora natildeo eacute detentora desses defeitos pois caso contraacuteshyrio natildeo teria chegado aonde chegouA notiacutecia pelo que se infere das reportagens de f 168177 natildeo era verdadeira eis que a apelada durante a gravaccedilatildeo da novela ldquo De corpo e Almardquo natildeo faltou aos seus compromissos profissionais nem quando fraturou uma pema (f 169) pelo que foi considerada um exemplo de profissionalismoMesmo que assim natildeo fosse natildeo havia justificativa para a divulgaccedilatildeo de um fato da vida privada da autora que se verdadeiro fosse seria do exclusivo interesse do seu empregador O direito agrave privacidade segunshydo a doutrina da Suprema Corte dos Estados Unidos universalmente aceita eacute o direito que toda pessoa tem de estar soacute de ser deixada em paz e de tomar sozinha as decisotildees na esfera de sua privacidade O ponto nodal desse direito na precisa liccedilatildeo do jaacute citado Carlos Alberto Bittar encontra-se na exigecircncia de que o isolamento mental insista no psishyquismo humano que leva a pessoa a natildeo desejar que certos aspectos de sua personalidade e de sua vida cheguem ao conhecimento de terceiros

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 79

Limila-se com esse direito o quanto possiacutevel a inserccedilatildeo dc estranho na esfera privada ou iacutentima da pessoa Satildeo elementos a vida privada o lar a famiacutelia etc No campo do direito agrave intimidade satildeo protegidos dentre outros os seguintes bens confidecircncias informes de ordem pesshysoal recordaccedilotildees pessoais memoacuterias relaccedilotildees familiares vida amorosa ou conjugal sauacutede fiacutesica ou mental afeiccedilotildees atividades domeacutesticas etc Esse direito conclui reveste-se das conotaccedilotildees fundamentais dos direitos da personalidade devendo-se enfatizar a sua condiccedilatildeo de dishyreito negativo ou seja expresso exatamente pela natildeo exposiccedilatildeo a coshynhecimento de terceiro de elementos particulares da esfera reservada do titular Nesse sentido pode-se acentuar que consiste no direito de impedir o acesso a terceiros nos domiacutenios da confidencialidade (obra citada p 103-104)Costuma-se ressalvar no tocante agrave inviolabilidade da intimidade a pesshysoa dotada de notoriedade principalmente quando exerce vida puacutebica Fala-se entatildeo nos chamados ldquo direito agrave informaccedilatildeo e direito agrave histoacuteriardquo a tiacutetulo de justificar a revelaccedilatildeo de fatos de interesse puacuteblico independenshytemente da anuecircncia da pessoa envolvida Entende-se que nesse caso existe reduccedilatildeo espontacircnea dos limites da privacidade (como ocorre com os poliacuteticos atletas artistas e outros que se mantecircm em contato com o puacuteblico) Mas o limite da confidencialidade persiste preservado sobre fatos iacutentimos sobre a vida familiar etc natildeo eacute liacutecita a divulgaccedilatildeo sem o consentimento do interessadoE assim eacute segundo essa mesma doutrina porque a vida dessas pessoas compreende um aspecto voltado para o exterior e outro voltado para o interior A vida exterior que envolve a pessoa nas relaccedilotildees sociais e nas atividades puacuteblicas pode ser objeto das pesquisas c das divulgaccedilotildees de terceiros porque eacute puacuteblica A vida interior todavia que se debruccedila sobre a mesma pessoa sobre os membros de sua famiacutelia sobre seus amigos integra o conceito de vida privada inviolaacutevel nos termos da ConstituiccedilatildeoPelo que ateacute aqui ficou exposto a sentenccedila natildeo merece nenhum reparo nos pontos jaacute examinados O mesmo natildeo ocorre todavia no que respeishyta ao quantum da indenizaccedilatildeo fixada pelo eminente Juiz sentenciante natildeo obstante dos mais cultos e talentosos da magistratura fluminenseO arbitramento do valor da indenizaccedilatildeo pelo dano moral eacute outra questatildeo que deve merecer a atenccedilatildeo do julgador para natildeo nos tornarmos imitashydores do direito norte-americano onde as indenizaccedilotildees pelo dano moral atingem somas milionaacuterias vultosiacutessimas sem qualquer base cientiacutefica ou juriacutedicaLembro que os primeiros julgados concedendo reparaccedilatildeo pelo dano moral falavam em uma compensaccedilatildeo pela dor pelo sofrimento algo que pudesse substituir a tristeza pela alegria como uma televisatildeo um

80 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

aparelho de som (entre as classes mais humildes) uma viagem de feacuterias (para as pessoas mais abastadas) etc Hoje jaacute temos notiacutecias de decisotildees concedendo indenizaccedilotildees astronocircmicas centenas e agraves vezes ateacute mesmo milhares de salaacuterios miacutenimos a tiacutetulo de dano moral sem qualquer crishyteacuterio loacutegico ou juriacutedicoEstou convencido de que o arbitramento judicial continua sendo o meio mais eficiente para se fixar o dano moral e que nessa penosa tarefa natildeo estaacute o Juiz subordinado a nenhum limite legal nem a qualquer tabela prefixada mormente apoacutes a Constituiccedilatildeo de 88 Em vaacuterios julgamenshytos anteriores (Ap Ciacutevel n 348592 6a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel n 324194 8a Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel n 521394 2a Cacircmara Ciacutevel) tive a oportunidade de manifestar o meu entendimento a este respeito e que agora reiteroNatildeo se questiona a natureza especial da Lei de Imprensa nem o prinshyciacutepio segundo o qual a lei especial afasta a incidecircncia da geral Quesshytiona-se apenas otilde poder que alguns querem atribuir agrave Lei de Imprensa a ponto de poder limitar restringir e ateacute de tornar inoacutecuos direitos que foram consagrados pela nova ordem constitucional posterior e supeshyrior agravequela Lei infraconstitucional alguma eacute de todos sabido subsiste agrave ordem juriacutedica estabelecida por uma nova Constituiccedilatildeo naquilo que com ela for incompatiacutevel ou restritiva Importa dizer que se a Constishytuiccedilatildeo confere direitos subjetivos que antes eram vedados ou limitados pela lei ordinaacuteria tal lei perde imediatamente a sua eficaacutecia Seria um contrassenso pretender que norma superior nascesse limitada por lei inshyferiorA liccedilatildeo dos insignes Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins vem bem ao casoEacute loacutegico que a regra eacute que a Constituiccedilatildeo natildeo pode ser interpretada a partir da legislaccedilatildeo infraconstitucional Trata-se de particularidade proacuteshypria da Lei Maior o natildeo poder ela tomar por referencial interpretativo outras normas do sistema Tal fenocircmeno dejlui do seu caraacuteter inicial e inovador A Constituiccedilatildeo eacute o marco a partir do qual se erige a ordem juriacutedica Seria um contrassenso admitir-se que o que lhe vem abaixo (diriacuteamos noacutes tambeacutem antes) - devendo portanto sofrer o seu influxo - viesse de repente a insurgir-se contra esta ordem loacutegica fornecendo criteacuterios para a inteligecircncia do proacuteprio preceito que lhe serve de fundashymento de validade (Com agrave Constituiccedilatildeo do Brasil Ed Saraiva 1988 Io volume p 349-350)Recorde-se entatildeo que antes da Constituiccedilatildeo de 1988 havia grande disshycussatildeo doutrinaacuteria e jurispaidencial em torno de reparabilidade do dano moral Numa primeira fase entendeu-se que ele natildeo era indenizaacutevel passando-se jaacute na segunda fase a admitir a indenizaccedilatildeo desde que natildeo acumulada com o dano material Foi nesse quadro que veio a lume a

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 81

Lei de Imprensa em fevereiro de 1967 dando um passo no sentido da reparaccedilatildeo do dano moral tiacutemido todavia posto que soacute para os casos de crimes contra a honra No momento em que nova Constituiccedilatildeo atenshydendo os reclamos da realidade social moderna consagrou amplamente a reparabilidade do dano moral tal como se fez no seu artigo 5deg incisos V X e outros mais tornou-se inconcebiacutevel data venia negar essa repashyrabilidade ou restringi-la pelo enfoque de leis ordinaacuterias anteriores o que constituiria uma total inversatildeo de princiacutepios e valoresNesse sentido o brilhante acoacuterdatildeo da Ia Cacircmara Ciacutevel deste Tribunal de Justiccedila no julgamento da Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg526091 do qual foi relator o eminente Desembargador Carlos Alberto Direito A ementa desse v acoacuterdatildeo na parte relativa ao tema em debate diz assimA indenizaccedilatildeo por dano moral com a Constituiccedilatildeo de 1998 eacute igual para todos inaplicaacutevel o privileacutegio de limitar o valor da indenizaccedilatildeo para a empresa que explora o meio de informaccedilatildeo e divulgaccedilatildeo (Lei de Imshyprensa) mesmo porque a natureza da regra constitucional eacute mais ampla indo aleacutem das estipulaccedilotildees da lei de imprensaMas estou igualmente convencido de que se o juiz natildeo fixar com prushydecircncia e bom senso a indenizaccedilatildeo pelo dano moral vamos tomaacute-lo inshyjusto c insuportaacutevel como de resto jaacute vem ocorrendo em alguns paiacuteses comprometendo a imagem da justiccedilaO princiacutepio da razoabilidade inserto no artigo 1059 do Coacutedigo Civil para a fixaccedilatildeo do lucro cessante pode e deve ser adotado pelo juiz no arbitramento do dano moral Razoaacutevel eacute aquilo que eacute sensato comedishydo moderado que guarda certa proporcionalidade Importa dizer que o juiz ao valorar o dano moral deve arbitrar uma quantia que de acordo com o seu prudente arbiacutetrio seja compatiacutevel com a reprovabilidade da conduta iliacutecita e a gravidade do dano por ela produzido Deve-lhe tamshybeacutem servir de norte aquele outro princiacutepio que veda que o dano se transshyforme em fonte de lucro Se a reparaccedilatildeo deve ser a mais ampla possiacutevel a indenizaccedilatildeo natildeo se destina a enriquecer a viacutetima Entre esses dois limites deve se situar o bom senso do julgador Qualquer quantia a mais do que a necessaacuteria agrave reparaccedilatildeo do dano importaraacute em enriquecimento sem causa ensejador de novo danoNa liccedilatildeo do insigne Caio Maacuterio dois motivos ou duas causas estatildeo conjugados na reparaccedilatildeo por dano moral 1) puniccedilatildeo ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem juriacutedico da viacutetima posto que imaterial 2) pocircr nas matildeos do ofendido uma soma que natildeo eacute o pretium doloris poreacutem o meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfaccedilatildeo de qualquer espeacutecie seja de ordem intelectual ou moral seja mesmo de cunho material o que pode ser obtido no fato de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa Recomenda todavia o mestre fazendo referecircncia ao seu anteprojeto de obrigaccedilotildees que esse

82 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

arbitramento deve ser moderado e equitativo para que se natildeo converta o sofrimento em moacutevel de captaccedilatildeo de lucro (o lucro capiendo) (Responshysabilidade Civil Forense p 315-316)Em suma o bom senso deve nortear o juiz no exame do caso concreto concedendo e graduando a indenizaccedilatildeo pelo dano moral de acordo com a reprovabilidade da conduta iliacutecita a intensidade e duraccedilatildeo do sofrishymento experimentado pela viacutetima a capacidade econocircmica do causador do dano as condiccedilotildees pessoais do ofendido etcEsta Cacircmara em inuacutemeros julgamentos anteriores tem procurado arbishytrar o dano moral com razoabilidade e moderaccedilatildeo motivo pelo qual afishygura-se-me absolutamente excessiva fora da realidade socioeconocircmica brasileira uma indenizaccedilatildeo de 4 mil salaacuterios miacutenimos hoje equivalente a quatrocentos mil reais Eacute quantia que algueacutem que ganhe cerca de cem mil reais por ano correspondente ao mais elevado salaacuterio pago pela administraccedilatildeo puacuteblica levaria mais de 4 anos para amealharParece-me que uma indenizaccedilatildeo de 500 salaacuterios miacutenimos equivalente a 50 mil reais eacute mais do que suficiente para servir de lenitivo para o dissashybor experimentado pela autora e de puniccedilatildeo para a reacute sem chegarmos ao extremo de transformar o dano moral em fonte de enriquecimento sem causaDestarte o meu voto eacute no sentido de dar provimento parcial agrave apelaccedilatildeo para o fim de reduzir a indenizaccedilatildeo para 500 salaacuterios miacutenimosQuanto ao recurso adesivo da autora deve ser conhecido porque em tese foi parcialmente vencida porquanto recebeu menos do que pleishyteou Contudo em face do que jaacute ficou exposto deve ser-lhe negado provimento na parte em que pede a elevaccedilatildeo do quantum indenizatoacuterio bem como no respeitante aos juros de mora a partir do evento A norma do artigo 962 do C Civil soacute eacute aplicaacutevel nos casos de obrigaccedilatildeo proveshyniente de delito assim entendido o iliacutecito penal e natildeo mero iliacutecito civil como no caso dos autosPor todo o exposto salvo quanto ao valor da indenizaccedilatildeo reduzida para 500 (quinhentos) salaacuterios miacutenimos a sentenccedila deve ser mantida por seus juriacutedicos fundamentosRio de Janeiro 23 de abril de 1996

DES THIAGO R IBA S FILHO PRESIDENTE

DES SEacuteRG IO CAVALIERI FILHO RELATOR

Cap IV - PLANEJAMENTO DO TEXTO ARGUMENTATIVO JURIacuteDICO 83

1) Situaccedilatildeo de conflitoMaria Zilda Bethelm Vieira acusa a Editora Abril SA de publicaccedilatildeo

ofensiva agrave sua honra e agrave sua intimidade por publicar na Revista Veja na seccedilatildeo Gente que a atriz durante as gravaccedilotildees da novela ldquo Olho por olhordquo leria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada

2) TeseA Revista Veja ofendeu a honra e invadiu a intimidade da atriz Por

essa razatildeo deve-lhe indenizar por danos morais com valor compatiacutevel com o grau de reprovaccedilatildeo da conduta iliacutecita e com a gravidade do dano produshyzido

3) Contextualizaccedilatildeo do real

Fatos favoraacuteveis agrave tese1) Segundo consta nos autos (f 168177) estaacute comprovado medianshy

te um exemplar da Veja que ela publicou que a autora durante a gravaccedilatildeo da novela ldquo Olho por olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou chegar alcoolizada

2) A atriz segundo consta nos autos (f 169) eacute considerada um exemshyplo de profissionalismo por nunca ter faltado agrave gravaccedilatildeo da novela ldquoDe corpo e almardquo mesmo quando fraturou uma perna

3) De acordo com os autos a vendagem da Revista Veja e conseshyquentemente a repercussatildeo dos fatos noticiados eacute expressiva

4) A sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido da autora e condenou a reacute a pagar quatro mil salaacuterios miacutenimos

Fatos desfavoraacuteveis agrave teseSegundo consta dos autos f 4204391) A notiacutecia foi publicada com os verbos na forma condicional como

mandam todos os manuais de imprensa2) A sentenccedila incorre em engano quando afasta a aplicaccedilatildeo da Lei de

Imprensa no presente caso trazendo agrave colaccedilatildeo acoacuterdatildeo do STJ

4) Hipoacuteteses1) Jaacute que segundo consta nos autos (f 168177) estaacute comprovado

mediante um exemplar da Veja que ela publicou que a autora durante a gravaccedilatildeo da novela ldquoOlho por olhordquo teria o haacutebito de faltar agraves gravaccedilotildees ou

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

chegar alcoolizada teriam sido divulgadas informaccedilotildees que natildeo pertencem agrave vida externa de Maria Zilda mas agrave sua esfera iacutentima

2) Uma vez que a atriz segundo consta nos autos (f 169) eacute consishyderada um exemplo de profissionalismo por nunca ter faltado agrave gravaccedilatildeo da novela ldquo De corpo e almardquo mesmo quando fraturou uma perna teria sido ofendida natildeo soacute em sua honra objetiva mas tambeacutem em sua honra subjetiva

3) Tendo em vista que a sentenccedila (f 407416) julgou procedente o pedido da autora e condenou a reacute a pagar quatro mil salaacuterios miacutenimos teria interpretado com acerto a Constituiccedilatildeo salvo quanto ao valor por ela arbitrado

Capiacutetulo V

FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Fundamentar conforme visto anteriormente eacute condiccedilatildeo de validade de toda decisatildeo judicial (arts 165 e 458 do CPC) Mas natildeo apenas o juiz tem a obrigaccedilatildeo de fundamentar suas decisotildees Tambeacutem os advogados quando formulam suas teses devem fundamentaacute-las consistentemente de modo que natildeo sejam tidas como natildeo razoaacuteveis

Mas se a simples subsunccedilatildeo do fato agrave norma natildeo caracteriza a proshyposta argumentativa - e sim apenas um procedimento demonstrativo - o que deve fazer o operador do Direito para dar a seu discurso status de arshygumentaccedilatildeo Quais procedimentos devem ser adotados e qual metodologia de construccedilatildeo de sentido deve ser operacionalizada para que se sustente efetivamente uma tese persuasiva Como enfim pocircr em praacutetica o que Perelman apontou como argumentaccedilatildeo juriacutedica

51 SELECcedil Atilde O E ORGANIZACcedilAtildeO DAS ID EIA S ARGUM ENTATIVAS

A produccedilatildeo do texto juriacutedico-argumentativo tal como a de qualquer texto natildeo pode ser fruto da improvisaccedilatildeo e do amadorismo Selecionar e organizar as ideias a serem desenvolvidas eacute imprescindiacutevel para a eficiecircnshycia do resultado final Aquele que conta com a fluecircncia do pensamento e com o meacutetodo frequentemente denominado brainstorming (tempestade de ideias) corre uma seacuterie de riscos que leva quase inevitavelmente a uma proshyduccedilatildeo truncada pouco criativa inconsistente e natildeo raro com problemas de coesatildeo e de coerecircncia

Apenas o profissional muito qualificado em termos redacionais e basshytante conhecedor da temaacutetica em pauta pode se arriscar a produzir um texto sem planejamento redacional e argumentativo Mesmo assim repare que

86 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

estamos falando em ldquo se arriscarrdquo pois sem duacutevidas o mais aconselhaacutevel eacute planejar cuidadosamente a produccedilatildeo textual que seraacute redigida

Quando falamos em planejamento cuidadoso natildeo estamos necessashyriamente dizendo planejamento minucioso O momento da redaccedilatildeo propriashymente dito deve ser relativamente livre a fim de que o argumentador natildeo fique limitado ao mero encadeamento de palavras ou trechos Poreacutem se o planejamento foi feito com cuidado e esmero se a organizaccedilatildeo de sentidos eacute loacutegica e razoaacutevel o momento da escrita torna-se um fluir prazeroso de ideias que promovem um resultado final simples claro e muito inteligente

Qualquer texto de qualidade precisa portanto passar pela fase do planejamento mas o texto juriacutedico-argumentativo apresenta ainda mais uma demanda especiacutefica a necessidade de que a argumentaccedilatildeo seja persuasiva a tal ponto que o seu auditoacuterio acolha a tese sem restriccedilotildees de valores ou sem questionamentos de ordem teacutecnico-profissional

Em outras palavras um texto pode estar bem organizado em termos de paraacutegrafo as partes denominadas introduccedilatildeo desenvolvimento e conshyclusatildeo podem ser adequadamente observadas eventualmente natildeo enconshytramos sequer desvios de norma culta poreacutem nada disso garante que a argumentaccedilatildeo seja eficiente e persuasiva

Em sala de aula quando avaliamos e comentamos paraacutegrafo a paraacuteshygrafo o texto de nossos alunos pode ocorrer que natildeo haja qualquer criacutetica aos argumentos desenvolvidos nem mesmo do ponto de vista da estrutura sugerida a cada um deles Curiosamente ao teacutermino da leitura podemos ficar com a sensaccedilatildeo de que o texto natildeo eacute consistente

Eacute difiacutecil explicar que o texto ldquonatildeo estaacute bomrdquo se natildeo conseguimos apontar o dedo em um paraacutegrafo ou trecho e justiccedilar a ineficiecircncia daquela produccedilatildeo com a caneta vermelha em riste circulando fragmentos e corrishygindo frases

O convencimento e a eficiecircncia argumentativa na peccedila processual satildeo tratados portanto em um ldquoplano mais complexordquo isto eacute a justificativa para a sua revisatildeo extrapola a mera tessitura coesiva das frases e das oraccedilotildees

Para ilustrar o que estamos defendendo recorreremos a um caso conshycreto Inicialmente vamos enfrentar as situaccedilotildees cada vez mais frequenshytes em que o advogado se depara com um caso criminal que tecnicamente falando natildeo deixa margem de duacutevida quanto agrave aplicaccedilatildeo da lei positivada no entanto o clamor popular e a influecircncia midiaacutetica forccedilam decisatildeo judishycial contraacuteria agrave aplicaccedilatildeo dos dispositivos legais pertinentes por entender que nesses casos a norma tomar-se-ia injusta

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Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 87

O caso adiante eacute impactante mas se presta agraves necessidades deste moshymento

Maria do Carmo de 31 anos matou Robson seu vizinho de 15 anos depois que o adolescente violentou seu filho de apenas trecircs anos de idade O crime aconteceu dentro da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Satildeo Carlos enquanto era registrada a ocorrecircncia da agressatildeo sexual agrave crianccedilaSebastiatildeo Terteluano de 35 anos surpreendeu o filho caccedilula sendo vioshylentado pelo vizinho num bambuzal do distrito de Santa Eudoacutexia na zona rural de Satildeo Carlos O rapaz fugiu A poliacutecia foi acionada e ele foi preso em casaO adolescente e os pais da crianccedila foram levados agrave Delegacia de Defesa da Mulher para o registro de ocorrecircncia Por volta das 13h a crianccedila foi encaminhada ao Pronto-Socorro para exame de corpo de delito para confirmar a violecircncia sexual em companhia do pai e de um policial militar Maria do Carmo Robson e outro PM permaneceram ali De repente Maria do Carmo atacou Robson cravando-lhe um a faca de coshyzinha no pescoccedilo O adolescente morreu no localO autor do crime jaacute tinha passagens pela poliacutecia por furto e havia cumshyprido medida socioeducativa junto ao Nuacutecleo de Atendimento Integrado (NAI) que atende menores infratores na cidadeMaria do Carmo foi presa em flagrante e levada agrave Cadeia Feminina de Ribeiratildeo Bonito deixando com o marido seus seis filhos com idades entre 3 e 13 anos Segundo o delegado Mauriacutecio Dotta da Delegacia de Investigaccedilotildees Gerais (DIG) de Satildeo Carlos a matildee da crianccedila violentada disse que matou o adolescente porque ele a teria provocado afirmando que por ser menor natildeo ficaria presoldquo Estou tatildeo surpresa quanto os senhores (jornalistas) TNunca imaginei que ela fosse praticar esse atordquo declarou a delegada E lelze Martins que atendia a ocorrecircncia na hora do crime A policial destacou que Maria do Carmo retirou uma faca debaixo da blusa Como a mulher era viacutetima do crime a Poliacutecia Militar natildeo efetuou uma revista detalhada nela para apurar se ela estava armada ou natildeo dentro da delegacia- A Delegacia de Investigaccedilotildees Gerais (D IG ) vai apurar agora onde a m ulher conseguiu a facaO advogado da mulher disse que a sua cliente mulher humilde analshyfabeta matildee de famiacutelia estava transtornada ldquo Eacute d ifiacutec il uma matildee que tem um filho de 3 anos violentado natildeo ficar emocionalmente deseshyquilibradardquo disse Ele deveraacute entrar com pedido de relaxamento da prisatildeo

Para o delegado Mauriacutecio Dotta a mulher contou que encontrou a faca dentro da garagem da DDM Depois contou que trouxe o objeto de casa O menino de 3 anos estaacute sob os cuidados do Conselho Tutelar Ele deveraacute ser submetido a uma cirurgia no acircnus para recompor o oacutergatildeo

(Adaptado da Internet Fonte desconhecida)

Natildeo haacute duacutevida quanto agrave aplicaccedilatildeo do artigo 121 do Coacutedigo Penal segundo o qual matar eacute crime puniacutevel com reclusatildeo Natildeo entraremos na discussatildeo sobre a aplicaccedilatildeo de possiacuteveis qualificadoras Tambeacutem natildeo preshytendemos apreciar a possibilidade juriacutedica de diminuir a pena com base na violenta emoccedilatildeo Partimos do pressuposto de que doloso ou culposo qualificado ou privilegiado houve homiciacutedio e a reacute seraacute condenada Isso eacute certo natildeo eacute mesmo

Pois bem No caso narrado o Tribunal do Juacuteri em Satildeo Carlos absolveu a reacute pela segunda vez em 07 de fevereiro de 2006 A tese que motivou a sentenccedila foi a da legiacutetima defesa Ora qualquer estudante de Direito que jaacute passou pelo estudo da parte geral do Coacutedigo Penal brasileiro sabe que essa tese eacute incompatiacutevel com o caso concreto Seria essa uma oportunidade em que os jurados por falta de motivaccedilatildeo mais apropriada para absolver uma matildee e fazer o que ele entende por justiccedila ldquo aplicam mal a leirdquo Trata-se de impropriedade teacutecnica decorrente de serem os jurados ldquo homens do povordquo Arriscamos dizer que o juiz togado responsaacutevel por lavrar a sentenccedila talvez decidisse monocraticamente naquele contexto da mesma maneira

O advogado que defende os interesses da reacute - matildee do menino viacutetima de violecircncia sexual - precisaria ter a sensibilidade humana de perceber que aquele contexto favorecia o pedido de absolviccedilatildeo (tese da legiacutetima defesa) e natildeo apenas a pena mais branda (tese de homiciacutedio privilegiado pela vioshylenta emoccedilatildeo)

Um caso concreto com esse teor apelativo quando potildee de um lado uma excludente de ilicitude (legiacutetima defesa) e de outro uma causa de diminuishyccedilatildeo de pena (violenta emoccedilatildeo apoacutes a injusta provocaccedilatildeo do ofendido) leva o advogado a refletir muito aleacutem da aplicaccedilatildeo deste ou daquele dispositivo O que estaacute em jogo aqui satildeo os valores sociais dominantes que condenam ou natildeo matildees que vingam seus filhos quase bebecircs viacutetimas de violecircncia sexual contra adolescentes infratores com histoacuterico de violecircncia

Perceba que natildeo estamos sustentando nem a condenaccedilatildeo nem a abshysolviccedilatildeo mas ignorar essa problcmatizaccedilatildeo do caso concreto eacute mostrar-se um advogado ineficiente

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 89

Se pretendemos a condenaccedilatildeo com pena mais branda eacute preciso enshyfrentar cuidadosamente a necessidade de respeito agraves normas juriacutedicas sob pena de violar os princiacutepios mais baacutesicos de um Estado Democraacutetico de Direito Precisariacuteamos sustentar que a absolviccedilatildeo da reacute eacute uma maneira deshyturpada de fazer justiccedila pois o mal provocado seria muito pior que o da proacutepria condenaccedilatildeo pois toda a sociedade sofreria com as consequecircncias ilessa decisatildeo natildeo teacutecnica

Caso optemos por sustentar a absolviccedilatildeo pela tese da legiacutetima defesa como desenvolver essa fundamentaccedilatildeo Certamente o argumento de autoshyridade natildeo seria o mais adequado por falta de fontes - na lei na doutrina c na jurisprudecircncia - que sustentem com consistecircncia a validade desse rashyciociacutenio

Outros desdobramentos de difiacutecil soluccedilatildeo o senso comum sozinho poderia motivar uma decisatildeo judicial especialmente quando manifestashymente contraacuterio agrave lei A conduta de trazer a faca de casa (premeditaccedilatildeo) afasta logicamente a violenta emoccedilatildeo (fruto de ato impensado impulsivo) ou premeditaccedilatildeo e violenta emoccedilatildeo seriam conciliaacuteveis

Lembremos que natildeo estamos aqui para dar aula de Direito Penal mas a motivaccedilatildeo condutora de nossa reflexatildeo eacute uma argumentaccedilatildeo juriacutedica seraacute eficiente se natildeo resolver essas questotildees

Sustentamos que definida a tese (que pode ser de acusaccedilatildeo ou de defesa) o enfrentamento argumentativo do caso pode seguir caminhos absolutamente diferentes Os problemas a resolver satildeo determinados por essas escolhas e cada ponto da argumentaccedilatildeo recorreraacute aos argumentos mais eficientes Esta seraacute outra questatildeo tormentosa a qual(is) argumento(s) recorrer em cada ponto da argumentaccedilatildeo

Por ora continuemos a questionar o Tribunal do Juacuteri de Satildeo Carlos (interior de Satildeo Paulo) possui peculiaridades distintas das observadas no Tribunal do Juacuteri do Rio de Janeiro Seraacute que essa decisatildeo que data de 2006 seria a mesma hoje Se fosse o pai da crianccedila a matar o adolescente agressor de seu filho e natildeo a matildee seraacute que a decisatildeo seria a mesma Jaacute que a reacute tinha seis filhos os jurados consideraram a situaccedilatildeo das crianccedilas sem a presenccedila da matildee encarcerada E se natildeo houvessem outras crianccedilas

Enfim iniciamos esse capiacutetulo apenas chamando a atenccedilatildeo do leitor para a importacircncia argumentativa das questotildees natildeo propriamente teacutecnicas do direito material Esperamos suscitar o gosto pela discussatildeo de teor absshytrato com caraacuteter reflexivo-argumentativo a fim de qualificar as produccedilotildees que hoje na maioria primam pela repeticcedilatildeo e pela mesmice na contramatildeo do que a modernidade parece estar vislumbrando

90 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Nos capiacutetulos anteriores vimos que o sucesso na defesa de uma tese depende de um raciociacutenio fundamentado por meio de uma seacuterie de assoshyciaccedilotildees a serem feitas pelo argumentador A maneira como o operador do Direito deve direcionar o raciociacutenio para a tese depende portanto de plashynejamento adequado do texto e da seleccedilatildeo apurada de informaccedilotildees

Na produccedilatildeo das peccedilas processuais o prejuiacutezo pela falta de organizashyccedilatildeo de um plano textual talvez fique mais evidente porque a persuasatildeo do magistrado e o consequente sucesso na demanda satildeo favorecidos por esse encadeamento

A coerecircncia e a validade de determinados institutos juriacutedicos depenshydem natildeo raro da ordem em que satildeo apresentados Exemplificando essa questatildeo pensemos na situaccedilatildeo de uma consumidora cujos cabelos caiacuteram quando da utilizaccedilatildeo de uma tintura capilar Pretende a lesada indenizaccedilatildeo por danos morais e materiais em virtude do ldquo fato do produtordquo 1

E certo que a indenizaccedilatildeo constitui o objetivo final do argumentashydor Devemos comeccedilar entatildeo pela sustentaccedilatildeo minuciosa das razotildees que demonstram a existecircncia do dano Sugerimos que natildeo O dano eacute fruto de outros pontos relevantes que natildeo podem ser ignorados na sequecircncia argu- mentativa

Para esclarecer vamos lembrar que a indenizaccedilatildeo eacute uma forma de compensar e de ressarcir o lesado Em contrapartida sanciona quem violou o direito e atua pedagogicamente para que tais situaccedilotildees deixem de continuar ocorrendo Assim o dano eacute fruto da violaccedilatildeo de uma obrigaccedilatildeo juriacutedica

Se assim o eacute como fundamentar minuciosamente o direito agrave indenishyzaccedilatildeo se o magistrado sequer conhece qual obrigaccedilatildeo foi descumprida O dever juriacutedico violado pode ser a necessidade de informar eventuais efeitos colaterais (princiacutepio da informaccedilatildeo - art 6deg III e art 9deg do CDC) ou a proteccedilatildeo da sauacutede do consumidor (art 6deg I do CDC) por exemplo

ldquo Ftiacuteo do produto e fato do serviccedilo satildeo institutos juriacutedicos Necessaacuteria eacute a distinccedilatildeo preliminar entre viacutecio e defeito Em ambos o produto desenvolve comportamento atiacutepico sendo que quando a anomalia resulta apenas em deficiecircncia no funcionashymento do produto ou serviccedilo mas natildeo coloca em risco a sauacutede ou seguranccedila do consumidor natildeo se fala em defeito mas eni viacutecio Portanto fato do produto ou serviccedilo estaacute ligado a defeito que por sua vez estaacute ligado a dano Desse modo temos a noccedilatildeo de fato do produto tambeacutem chamado de acidente de consumo que eacute o evento danoso verificado pela utilizaccedilatildeo de produto eivado de defeitordquo (QUEIshyROZ Ricardo Canguccedilu Barroso de Responsabilidade pelo fato do produto e do serviccedilo e responsabilidade pelo viacutecio do produto e do serviccedilo -paralelo Disponiacuteshyvel em lthttpwwwujgoiascombrgt Acesso em 01 jun 2002)

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Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 91

As obrigaccedilotildees das partes em uma relaccedilatildeo juriacutedica (neste caso relaccedilatildeo de consumo) servem de fundamento para suscitar a existecircncia da responshysabilidade civil de onde emana o dever de indenizar Esquematicamente poderiacuteamos assim representar a relaccedilatildeo entre os institutos de que precisashymos para argumentar

Obrigaccedilotildees juriacutedicas

estabelecidascm uma relaccedilatildeo de

consumo

O descump ri mento desse dever pela reacute gerou danos

agrave consumidora (nexo causal entre conduta e

resultado)

pound

A responsabilidade civil pelo evento

enseja o direito agrave indenizaccedilatildeo

a) obrigaccedilatildeo de informar K laquo r - - o M s A r v i d a o r - Indenizaccedilatildeo por

b) obrigaccedilatildeo de E3 sect gt CIVIL bull J3 l a danosmoraiserespeitara sauacutede do OBJETIVA H j f l l l p j materiais

consumidor I

Em siacutentese a argumentaccedilatildeo que pretende sustentar o direito agrave indeshynizaccedilatildeo por danos morais e materiais em decorrecircncia do fato do produto (queda do cabelo) deve em primeiro lugar sustentar que a reacute tinha uma obrigaccedilatildeo - ou mais de uma - fruto da relaccedilatildeo de consumo a(s) qual(is) deixou de observar Em seguida mostrar que a violaccedilatildeo desse dever juriacutedishyco gerou danos para a autora-consumidora e responsabilidade civil para a reacute-empresa A indenizaccedilatildeo eacute fruto desse percurso loacutegico

Ainda que muitos profissionais comccem o texto argumentativo jaacute estabelecendo relaccedilatildeo entre o direito de indenizaccedilatildeo e os danos sofridos subverter a ordem proposta eacute produzir uma fundamentaccedilatildeo apartada da coerecircncia e da consistecircncia

E certo que nossa intenccedilatildeo com o exemplo analisado natildeo eacute tratar da mateacuteria juriacutedica relativa ao Direito do Consumidor mas mostrar que a loacuteshygica argumentativa no Direito natildeo eacute apenas gramatical ou textual depende tambeacutem do domiacutenio baacutesico dos raciociacutenios proacuteprios dessa ciecircncia

Conheccedila mais um caso concreto a seguir a partir do qual seratildeo desenshyvolvidos indutivamente os passos para a estruturaccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo de uma peccedila juriacutedica2

2 Essa metodologia de trabalho eacute endossada pela proposta da Professora Harriet Chrisshytiane Zitscher (ZITSCHER Harriet Christiane Metodologia do ensino juriacutedico com casos teoria e praacutetica Belo Horizonte Del Rey 2004)

92 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

CASO CONCRETOApoacutes relacionamento de um ano e meio Maria e Joatildeo tiveram um filho Gustavo Cinco meses apoacutes o nascimento da crianccedila Joatildeo pocircs fim ao relacionamento com Maria e voltou a morar com seus pais Maria e Gustavo passam por graves problemas financeiros A matildee tem dificulshydade ateacute mesmo de comprar comida para a crianccedila Diante da negatishyva de prestar auxiacutelio financeiro ao filho eacute ajuizada accedilatildeo de alimentos em face do pai Joatildeo o qual alega impossibilidade dc cumprir com tal obrigaccedilatildeo na medida em que estaacute desempregado e tem vaacuterias diacutevidas a serem pagas Maria afirma que apesar do desemprego o requerido manteacutem elevado padratildeo de vida pois eacute sustentado pelos avoacutes paternos do menino que possuem vaacuterios imoacuteveis alugados como fonte de renda aleacutem de aposentadoria no valor de RS 680000O que diz a legislaccedilatildeo sobre esse assunto

Lei 10406 de 1001200 (Coacutedigo Civil brasileiro)Subtiacutetulo III

Dos Alimentos

Art 1694 Podem os parentes os cocircnjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compashytiacutevel com a sua condiccedilatildeo social inclusive para atender agraves necessidades de sua educaccedilatildeosect I o Os alimentos devem ser fixados na proporccedilatildeo das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigadasect 2o Os alimentos seratildeo apenas os indispensaacuteveis agrave subsistecircncia quando a situaccedilatildeo de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteiaArt 1695 Satildeo devidos os alimentos quando quem os pretende natildeo tem bens suficientes nem pode prover pelo seu trabalho agrave proacutepria manten- ccedila e aquele de quem se reclamam pode fornececirc-los sem desfalque do necessaacuterio ao seu sustentoArt 1696 O direito agrave prestaccedilatildeo de alimentos eacute reciacuteproco entre pais e filhos e extensivo a todos os ascendentes recaindo a obrigaccedilatildeo nos mais proacuteximos em grau uns em falta de outrosArt 1697 Na falta dos ascendentes cabe a obrigaccedilatildeo aos descendentes guardada a ordem de sucessatildeo e faltando estes aos irmatildeos assim gershymanos como unilateraisArt 1698 Se o parente que deve alimentos em primeiro lugar natildeo estiver em condiccedilotildees de suportar totalmente o encargo seratildeo chamados a concorrer os de grau imediato sendo vaacuterias as pessoas obrigadas a prestar alimentos todas devem concorrer na proporccedilatildeo dos respectivos recursos e intentada accedilatildeo contra uma delas poderatildeo as demais ser chashymadas a integrar a lide

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 93

Art 1699 Se fixados os alimentos sobrevier mudanccedila na situaccedilatildeo financeira de quem os supre ou na de quem os recebe poderaacute o interesshysado reclamar ao juiz conforme as circunstacircncias exoneraccedilatildeo reduccedilatildeo ou majoraccedilatildeo do encargoArt 1700 A obrigaccedilatildeo dc prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor na forma do art 1694

Diante de tal situaccedilatildeo quais as questotildees que um profissional do direi- lo precisa abordar para alcanccedilar a persuasatildeo do juiz quanto agrave procedecircncia do pedido de alimentos em face dos avoacutes Eacute possiacutevel associar de pronto as ideias de que a crianccedila precisa alimentar-se e os avoacutes podem pagar uma penshysatildeo ou eacute preciso percorrer um caminho relativamente longo ateacute que tal obrishygaccedilatildeo recaia sobre eles Essas satildeo questotildees que um bom argumentador preshycisa enfrentar antes mesmo de comeccedilar o seu texto natildeo por uma exigecircncia de ordem processual material ou doutrinaacuteria mas por ser necessaacuteria a coerecircncia na linearidade do raciociacutenio que leva agrave conclusatildeo da fundamentaccedilatildeo

E imprescindiacutevel perceber que antes mesmo de escolher que tipos de argumento utilizar na construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo deve-se ter em mente a estrateacutegia argumentativa que seraacute utilizada ou seja qual o caminho a ser percorrido ateacute ser possiacutevel afirmar com convicccedilatildeo que um dado pedido eacute procedente por tal ou qual motivo

Para o caso concreto em questatildeo a construccedilatildeo do raciociacutenio seguiria os seguintes passos

___ IUumlEIacute2reg

i39 p^deg

A filiaccedilatildeo enseja o direito subjetivo a

alimentos

Paraacutegrafo sem maior complexidade basta

relacionaro caso ao art do U

A crianccedila e a matildeenecessitam de dinheiro para suprir suas

necessidades baacutesicas

lldquoV Questatildeo a enfrentar

quaisas necessidades da crianccedila

Impossibilidade paterna de prestar

os alimentos

Questatildeo a enfrentar desemprego representa

impossibilidade de alimentar

Diante da impossibilidade a obrigaccedilatildeo paterna pode ser estendida

aos avoacutes

OQuestatildeo a enfrentar se 0 pai eacute 0 devedor os avoacutes

paternos devem substituiacute- lo antes dos avoacutes

matemosOs avoacutes podem

prestar alimentos sem prejuiacutezo da

proacutepria subsistecircncia

Paraacutegrafo sem maior complexidade basta

relacionaro caso ao art 1696 do CC

O lazer estaacute entre essas necessidades

Tem direito a plano de sauacutede e a escola

particularA eventual existecircncia de nova famiacutelia pode reduziro padratildeode vida a oferecer ao

alimentado

94 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Natildeo queremos o falso entendimento de que em decorrecircncia do fato de haver previsatildeo legal ou doutrinaacuteria - argumento de autoridade conforshyme seraacute mostrado adiante - para todas as questotildees que seratildeo abordadas ao longo dessa fundamentaccedilatildeo deve o operador do direito ignorar ou minorar o efeito das demais fontes na produccedilatildeo do texto argumentativo

Muitas vezes o fundamento legal natildeo garante sozinho o convencimento Haacute situaccedilotildees em que a aplicaccedilatildeo da norma positivada natildeo se mostra adequada agrave soluccedilatildeo do conflito nessas oportunidades outras fontes seratildeo consideradas para que o juiz firme seu livre-convencimento Haacute casos ainda em que o mashygistrado pode interpretar a norma de diferentes maneiras A presenccedila de outras fontes que reforcem um desses entendimentos como o mais adequado seria tambeacutem desejaacutevel Natildeo faltam igualmente as questotildees atuais e polecircmicas em que o legislador ainda natildeo teve tempo suficiente para atualizar a norma posishytivada a qual estaacute em dissonacircncia com o sentimento de justiccedila Enfim satildeo dishyversas as situaccedilotildees em que apenas a lei natildeo garante a persuasatildeo do magistrado e outras fontes tomam-se inevitaacuteveis na fundamentaccedilatildeo de uma tese

Na construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo importa entatildeo que um fato conshycreto colhido da realidade circundante em que se materializa a situaccedilatildeo de conflito possa ser avaliado segundo muacuteltiplas possibilidades argumentati- vas dependendo da valoraccedilatildeo que se queira atribuir a tal fato Natildeo se pode dizer que um argumento eacute mais importante que o outro mas que possui maior capacidade persuasiva em um determinado contexto

Dessa forma admite-se por exemplo que o princiacutepio do ldquodever de alishymentarrdquo pode ser sustentado no caso analisado como conclusatildeo da observacircnshycia do fato de que ldquoos pais devem proteger os filhosrdquo (Direito Natural) ou como consequecircncia da determinaccedilatildeo objetiva do Coacutedigo Civil art 1696 ldquoO direito agrave prestaccedilatildeo de alimentos eacute reciacuteproco entre pais e filhosrdquo (Direito Positivo)

Dispositivos legais satildeo fontes tal como a jurisprudecircncia a doutrina os princiacutepios a razoabilidade entre outros A argumentaccedilatildeo desenvolve-se e sustenta-se em fundamentos juriacutedicos Um mesmo fundamento pode ser sustentado por meio de diversas fontes

Essa questatildeo nos parece importante porque eacute muito comum vermos advogados que citam inuacutemeros artigos de determinados diplomas legais- apenas isso - e julgam que com esse procedimento desenvolveram uma argumentaccedilatildeo O ideal eacute que cada questatildeo abordada seja devidamente valoshyrada e consistentemente justificada por variadas fontes que se completam

O nosso proacuteximo passo seraacute investigar alguns dos tipos de argumento que estatildeo agrave disposiccedilatildeo dos operadores do direito para que seja possiacutevel concretizar a proposta argumentativa ateacute aqui desenvolvida

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 95

52 FUNDAMENTACcedilAtildeO SIMPLES E FUNDAMENTACcedilAtildeO COMPLEXA

A argumentaccedilatildeo conforme estudamos em capiacutetulo anterior eacute um tipo de texto que se materializa em todas as peccedilas processuais Como na maioshyria das vezes natildeo nos referimos especificamente a esta ou agravequela peccedila deshynominamos esta parte argumentativa genericamente de ldquo fundamentaccedilatildeordquo

Fazemos a distinccedilatildeo entre fundamentaccedilatildeo simples e complexa por ser didaticamente uacutetil A doutrina juriacutedica endossa amplamente essa distinccedilatildeo quando classifica os casos concretos como casos simples e casos difiacuteceis (ou complexos) A relaccedilatildeo eacute bastante clara quando temos de enfrentar um caso concreto simples a fundamentaccedilatildeo para ele desenvolvida seraacute simshyples quando o caso for difiacutecil a fundamentaccedilatildeo complexa

As diferenccedilas essenciais entre os dois tipos de fundamentaccedilatildeo estatildeo em trecircs criteacuterios a) temaacutetica juriacutedica a ser enfrentada b) tipos de argumen- to a que se recorre para alcanccedilar os objetivos pretendidos pelo operador do direito e consequentemente c) a extensatildeo do texto argumentativo

Quanto agrave temaacutetica juriacutedica sobre a qual o argumentador se debrushyccedilaraacute podemos dizer que os casos concretos simples satildeo aqueles em que o profissional do direito jaacute possui estruturado no ordenamento juriacutedico paacutetrio todo o repertoacuterio a que necessitaraacute recorrer na fundamentaccedilatildeo a legislaccedilatildeo regula de maneira clara especiacutefica e natildeo controvertida a mateacuteria a dogmaacuteshytica juriacutedica natildeo levanta problemas no tratamento do tema a jurisprudecircncia mostra-se uniformizada quanto agrave soluccedilatildeo mais adequada acerca das quesshytotildees relativas ao assunto

Por tudo isso os casos concretos simples satildeo resolvidos pela mera aplicaccedilatildeo das regras entatildeo vigentes suscitando do argumentador esforccedilo argumentativo reduzido

Com relaccedilatildeo aos tipos de argumento os casos simples exigem a proshyduccedilatildeo de uma estrutura bastante simplificada que consiste em introito argumento proacute-tese argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e conclusatildeo nesta ordem

Seraacute explicada minuciosamente toda essa estrutura no toacutepico 53 mas por ora faremos uma breve siacutentese a fim de facilitar a compreensatildeo do leitor

O introito tem as funccedilotildees de apresentar e contextualizar a questatildeo juriacutedica a um soacute tempo Existem muitas estrateacutegias para introduzir a funshydamentaccedilatildeo simples

O argumento proacute-tese recorre ao que haacute de mais essencial na defesa de um ponto de vista - o encadeamento consistente de fatos com os quais

96 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

seraacute possiacutevel a defesa da tese A organizaccedilatildeo sintaacutetica do paraacutegrafo que se estrutura a partir de elos coesivos bem marcados eacute uma evidecircncia desse argumento Sugerimos o uso dos conectores porque e tambeacutem aleacutem disso para introduzir cada uma das razotildees relevantes que validam a tese

O argumento de autoridade de grande prestiacutegio evidencia que a norshyma positivada acolhe a tese sustentada pelo argumentador o que faz de seu ponto de vista mais que uma opiniatildeo porque valida a soluccedilatildeo proposta como uma maneira prevista no ordenamento juriacutedico como correta e aceitaacutevel

O argumento de oposiccedilatildeo arremata a fundamentaccedilatildeo simples exshycluindo qualquer oacutebice que se possa fazer agrave tese do argumentador pois os eventuais pontos fraacutegeis apontados pela parte contraacuteria satildeo dirimidos por fatos ainda mais significativos levantados pelo argumentador

Aconclusatildeo se daacute pela retomada da tese de forma sinteacutetica objetiva e clara

Como se percebeu a extensatildeo da fundamentaccedilatildeo simples eacute reduzishyda pois carece de apenas cinco paraacutegrafos Parece pouco mas precisamos lembrar que a proacutepria OAB em diversas oportunidades sustentou que uma boa peticcedilatildeo inicial em toda a sua estrutura para os casos simples natildeo deshymanda mais que duas ou trecircs laudas

Proporcionalmente a argumentaccedilatildeo (ldquo Do direitordquo na peticcedilatildeo inicial) teria aproximadamente 20 a 30 linhas quase uma lauda plena Temos como paracircmetro essa extensatildeo pois um paraacutegrafo costuma ter em meacutedia 6 linhas

Vale ressaltar ainda que os casos concretos simples ocorrem em nuacuteshymero reduzido

L Estrutura da Fundamentaccedilatildeo Simples

Introito

Argumento proacute-tese

Argumento de autoridade

Argumento de oposiccedilatildeo

Conclusatildeo

A fundamentaccedilatildeo simples eacute aquela usada para casos

concretos simples em que a

subsunccedilacirco do fato agrave norma eacute

suficiente para resolver o conflito

juriacutedico

Os casos concretos difiacuteceis ou complexos natildeo cabem nas soluccedilotildees pronshytas emolduradas previsiacuteveis que a dogmaacutetica juriacutedica preparou para operar a subsunccedilacirco do fato agrave norma Natildeo precisam ser ineacuteditos mas a complexidade do

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 97

fenocircmeno juriacutedico exige o olhar sempre atento do argumentador cuja sensibishylidade vislumbra detalhes que merecem enfrentamento mais acurado

Haacute desdobramentos que necessitam ser encarados como circunstacircncias que desestabilizam a tese defendida se natildeo forem enfrentados por meio dos princiacutepios do direito Satildeo os princiacutepios que orientaratildeo em primeiro plano o adequado tratamento a ser dispensado agrave questatildeo complexa enfrentada na arshygumentaccedilatildeo Em um segundo momento os demais tipos de argumento comshyplementaratildeo o raciociacutenio e daratildeo consistecircncia aos raciociacutenios propostos

Natildeo se trata de propor uma nova estrutura para a fundamentaccedilatildeo complexa mas de partir daquela apresentada para a fundamentaccedilatildeo simshyples (introito + proacute-tese + autoridade + oposiccedilatildeo) e agregar outros tipos de argumento em nuacutemero variedade e sequecircncia sempre imprevisiacuteveis dependendo de cada caso concreto

Apenas para reforccedilar o que expomos citamos um trecho de Lenio Luiz Streck

Autores como Albert Calsamiglia3 consideram que a preocupaccedilatildeo das teorias poacutes-positivistas eacute com a indeterminaccedilatildeo do direito nos casos dishyfiacuteceis ou seja para os poacutes-positivistas o centro de atuaccedilatildeo se haacute desshylocado em direccedilatildeo da soluccedilatildeo dos casos indeterminados (mais ainda os casos difiacuteceis natildeo mais satildeo vistos como excepcionais) Afinal os casos simples eram resolvidos pelo positivismo com recurso agraves decisotildees passadas e agraves regras vigentes Jaacute nos casos difiacuteceis se estava em face de uma ldquo terra inoacutespitardquo

Reforccedilamos que a classificaccedilatildeo ldquo fundamentaccedilatildeo simplesrdquo e ldquo fundashymentaccedilatildeo complexardquo natildeo constitui uma demanda para o aluno saber quanshytos paraacutegrafos seratildeo usados na produccedilatildeo do texto argumentativo Trata-se somente de recurso didaacutetico facilitador da atividade docente na redaccedilatildeo desta parte da peccedila processual

53 TIPOS DE ARGUMENTO

A busca da persuasatildeo do auditoacuterio como vimos pode ser alcanccedilada por meio de vaacuterios tipos distintos de argumento Nesta oportunidade trashy

3 CALSAM IGLIA Albert apud STRECK Lenio Luiz Hermenecircutica Neoconsti- tucionalismo e ldquoo problema da discricionariedade dos ju izesrdquo Disponiacutevel em lthttpwwwanima-opetcombrprimeira_edicaoartigo_Lenio_Luiz Streckher- meneuticapdiacuteX Acesso em 17 jul 2012

98 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

taremos de nove tipos diferentes de argumento a) argumento proacute-tese b) argumento de autoridade c) argumento de oposiccedilatildeo d) argumento de anashylogia e) argumento de causa e efeito f) argumento de senso comum g) arshygumento ad hominem h) argumento a fortiori e i) argumento por absurdo

A classificaccedilatildeo dos argumentos natildeo segue na doutrina da aacuterea uma regularidade Eventualmente uma mesma estrateacutegia recebe de autores disshytintos nomenclaturas diferentes Como o mais importante natildeo eacute o nome que o argumento recebe mas o conhecimento de sua estrutura de seu conteuacutedo e da sua eficiecircncia em determinados contextos adotamos a classificaccedilatildeo mais simples possiacutevel tendo em vista principalmente o caraacuteter didaacutetico desta obra

Considerando que Perelman e L Olbrechts-Tyteca foram precursores na sistematizaccedilatildeo da teoria da argumentaccedilatildeo entendemos adequada breve apreshysentaccedilatildeo da classificaccedilatildeo proposta pelos autores no Tratado da Argumentaccedilatildeo

Com base na associaccedilatildeo de ideias - teacutecnica de estruturaccedilatildeo dos argushymentos que buscam o convencimento do auditoacuterio os autores destacam os argumentos quase loacutegicos os fundados na estrutura do real e os que fundamentam a estrutura do real

Os argumentos quaseloacutegicos apresentam-se como comparaacuteveis a rashyciociacutenios formais loacutegicos ou matemaacuteticos embora tenham traccedilos peculiashyres ao campo da argumentaccedilatildeo Identificam-se com as demonstraccedilotildees forshymais justamente pelo esforccedilo de reduccedilatildeo ou precisatildeo de uma caracteriacutestica natildeo formal

O argumento por definiccedilatildeo assim como outros pertence ao grupo dos quase loacutegicos Constitui o procedimento mais caracteriacutestico de identishyficaccedilatildeo completa de diversos elementos que satildeo o objeto do discurso

Veja-se o que apresenta Perelman ldquo Spinoza no iniacutecio de sua Eacutetica define a causa de si mesmo como lsquoaquilo cuja essecircncia envolve a existecircncia ou aquilo cuja natureza soacute pode ser conhecida como existentersquordquo

Ele define substacircncia ldquoO que estaacute em si e eacute concebido por si isto eacute aquishylo cujo conceito pode ser formado sem necessitar do conceito de outra coisardquo

Os argumentos fundados na estrutura do real valem-se da realidade para estabelecer um elo entre os juiacutezos admitidos e outros que se procura proshymover Vale dizer como na argumentaccedilatildeo eacute indispensaacutevel a interaccedilatildeo entre o orador e o auditoacuterio os argumentos satildeo obtidos da proacutepria realidade desse auditoacuterio ligando a tese do orador aos valores predominantes do puacuteblico

Como exemplo desse tipo tem-se o argumento pragmaacutetico e o argushymento por autoridade entre outros

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 99

O argumento pragmaacutetico eacute aquele que permite apreciar um ato ou um acontecimento consoante suas consequecircncias favoraacuteveis ou desfavoraacuteveis presentes ou futuras

Perelman expotildee o seguinte

Para apreciar um acontecimento cumpre reportar-se a seus efeitos E a esses efeitos que Locke se refere para criticar o poder espiritual dos priacutencipesldquo Jamais se poderaacute estabelecer ou salvaguardar nem a paz nem a segushyranccedila nem sequer a simples amizade entre homens enquanto prevaleshycer a opiniatildeo de que o poder eacute fundamentado sobre a Graccedila e de que a religiatildeo deve ser propagada pela forccedila das armasrdquo

O argumento por autoridade como seraacute adiante tratado eacute aquele cujo alcance eacute totalmente condicionado pelo prestiacutegio Constitui-se dos atos ou juiacutezos de uma pessoa ou de um grupo de pessoas como meio de prova a fashyvor de uma tese Quanto mais importante eacute a autoridade mais indiscutiacuteveis parecem suas palavras No limite a autoridade divina sobrepuja todos os obstaacuteculos que a razatildeo poderia opor-lhe

Os argumentos que fundamentam a estrutura do real constituem-se de exemplos ilustraccedilotildees modelos ou ainda analogias que refletem as lishygaccedilotildees da realidade com o caso particular

A argumentaccedilatildeo pelo exemplo caracteriza-se pela passagem de um caso particular a outro sucessivamente com a finalidade de consolidar uma regra geral aplicaacutevel a todos os casos O caso particular utilizado como exemplo permitiraacute uma generalizaccedilatildeo

Nesta passagem de Berkeley retirada de Perelman encontra-se a arshygumentaccedilatildeo pelo exemplo

Observo ademais que o pecado ou a torpeza moral natildeo consiste na accedilatildeo fiacutesica exterior ou no movimento mas estaacute no afastamento interior da vontade com relaccedilatildeo agraves leis da razatildeo e da religiatildeo Isso eacute claro pois matar um inimigo na batalha e condenar legalmente agrave morte um crimishynoso natildeo eacute considerado pecado contudo o ato exterior eacute exatamente o mesmo que no caso do assassiacutenio

A argumentaccedilatildeo por ilustraccedilatildeo a contraparte pelo exemplo daacute-se a partir da utilizaccedilatildeo de um caso concreto a fim de consagrar uma regra jaacute existente O caso particular que desempenha o papel de ilustraccedilatildeo estearaacute uma regularidade jaacute estabelecida

100 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A ilustraccedilatildeo nesta passagem de Leibniz apresentada por Perelman tem a funccedilatildeo de facilitar a compreensatildeo da regra por meio de um caso de aplicaccedilatildeo discutiacutevel

() cumpre que ele [o mal moral] soacute seja admitido ou permitido na medida em que eacute visto como uma consequecircncia certa de um dever indisshypensaacutevel de sorte que aquele que natildeo quisesse permitir o pecado alheio faltaria ele proacuteprio ao seu dever como se um oficial que deve guardar um posto importante o largasse sobretudo em tempo de perigo para impedir uma briga na cidade entre dois soldados da guarniccedilatildeo prestes a se matarem mutuamente

A argumentaccedilatildeo pelo modelo constitui-se a partir de um agir ideal na crjaccedilatildeo de um padratildeo de conduta que deveraacute ser seguido por todos O caso particular como modelo incentivaraacute a imitaccedilatildeo

Perelman mostra a argumentaccedilatildeo pelo modelo no seguinte trecho em que Montesquieu faz Usbek dizer

Assim mesmo que natildeo houvesse Deus deveriacuteamos sempre amar a jusshyticcedila ou seja empenharmo-nos para nos parecer com esse ser de quem temos uma ideia tatildeo bela e que se existisse seria necessariamente justo

A argumentaccedilatildeo pela analogia caracteriza-se pela busca de uma equishyparaccedilatildeo do tratamento atribuiacutedo a situaccedilotildees em realidades diferentes toshymando como referecircncia seus pontos comuns

Perelman oferece um exemplo bastante simples e tiacutepico de analogia tirado de Aristoacuteteles ldquo Assim como os olhos dos morcegos satildeo ofuscados pela luz do dia a inteligecircncia de nossa alma eacute ofuscada pelas coisas mais naturalmente evidentesrdquo

531 Introito

Em primeiro lugar precisamos lembrar que o introito natildeo eacute propriashymente um tipo de argumento mas um paraacutegrafo com a funccedilatildeo de iniciar o texto argumentativo Essa introduccedilatildeo natildeo eacute mera formalidade porque possui o papel bem marcado de facilitar a aceitaccedilatildeo dos argumentos que viratildeo em seguida

A utilizaccedilatildeo de introitos na estrutura argumentativa complexa apesar de natildeo ser obrigatoacuteria mostra-se bastante eficiente Os ceacutelebres sermotildees do

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 101

Padre Antoacutenio Vieira utilizavam com frequecircncia esse recurso A estrutura dos sermotildees desse ilustre orador era regularmente a seguinte

a) introito - momento em que o orador expunha o assunto e as ideias que defenderia ou o assunto e as ideias agraves quais se oporia cm seguida As frases de efeito a que recorria eram normalmente extraiacutedas da Biacuteblia e tinham a funccedilatildeo principal de captar a atenccedilatildeo do auditoacuterio

b) invocaccedilatildeo - momento em que o orador invocava o auxiacutelio de Deus para expor com clareza suas ideias

c) argumentaccedilatildeo propriamente dita - o orador desenvolvia o tema inicialmente apresentado por meio de diversos recursos retoacutericos linguiacutesticos e argumentativos Com isso levava o auditoacuterio a agir sob a forccedila de seus argumentos (persuasatildeo)

d) peroraccedilatildeo - o orador retomando as ideias principais jaacute desenvolshyvidas recorria a novas frases de efeito com o objetivo de trazer um desfecho vibrante que estabelecesse viacutenculos afetivos com o auditoacuterio de modo que se sentisse motivado a pocircr em praacutetica os valores pregados

E certo que no texto juriacutedico tal estrutura argumentativa natildeo pode ser usada na iacutentegra mas agregar ao texto juriacutedico e ao discurso do advogashydo alguns desses artifiacutecios retoacutericos ceacutelebres pode ser de grande valia para o sucesso dos profissionais do direito

Os tipos de introito mais comuns no Direito satildeo os que seguem locashylizaccedilatildeo do fato no tempo e no espaccedilo explanaccedilatildeo de ideia inicial enumeshyraccedilatildeo e retomada histoacuterica

A escolha de um desses tipos depende da temaacutetica enfrentada pelo argumentador e da tese selecionada pelo profissional Para exemplificar suponha que o autor pretenda buscar a revisatildeo de cobranccedilas indevidas prashyticadas por uma empresa de telefonia que eacute tida haacute muito como prestadora de um serviccedilo de maacute qualidade

Nessa situaccedilatildeo faacutetica entendemos que a localizaccedilatildeo do fato no tempo e no espaccedilo eacute a proposta de introito mais eficiente Todos sabem que as emshypresas de telefonia em geral - e esta em especial no Rio de Janeiro mdash satildeo as campeatildes de violaccedilatildeo dos direitos dos consumidores E paciacutefico ainda que a reacute estaacute entre as empresas que mais figuram no polo passivo da demanda nos Juizados Especiais Ciacuteveis fluminenses Essas informaccedilotildees contribuem para a compreensatildeo de que as praacuteticas comerciais da reacute satildeo reprovaacuteveis e isso facilita a aceitaccedilatildeo da tese sustentada pelo argumentador

102 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

No introito intitulado explanaccedilatildeo de ideia inicial o paraacutegrafo tem a funccedilatildeo de apresentar em linhas gerais o tema a ser debatido Quando o insshytituto em pauta eacute bastante conhecido talvez natildeo haja funccedilatildeo argumentativa em realizar essa explanaccedilatildeo mas quando ele eacute relativamente recente no orshydenamento juriacutedico ou quando o argumentador pretende dar novo enfoque ou tratamento a tema jaacute difundido do direito essa estrateacutegia de introduzir o texto argumentativo pode ser bem eficiente

Pense na cobranccedila das verbas rescisoacuterias praticada pelo empregado conshytra seu empregador quando de sua demissatildeo E paciacutefico que o empregado tem direito a receber tudo que a legislaccedilatildeo trabalhista lhe garante A proacutepria natureshyza alimentar dessas verbas daacute a elas status de grande relevacircncia Atualmente poreacutem os Tribunais Superiores vecircm ponderando que a execuccedilatildeo da sentenccedila que garante ao trabalhador o recebimento desses valores deve ser feita de mashyneira a considerar a funccedilatildeo social da empresa isto eacute seria pouco razoaacutevel para tutelar o direito violado do trabalhador levar um bem da empresa a leilatildeo e inviabilizar a proacutepria atividade empresarial Isso prejudicaria inuacutemeros funcioshynaacuterios a fim de garantir a proteccedilatildeo do direito de apenas um

Natildeo se trata de minorar os direitos individuais mas de sopesaacute-los agrave luz de um bem maior Esse raciociacutenio natildeo vigorou desde sempre no direishyto brasileiro ao contraacuterio ele eacute relativamente recente Daiacute a necessidade eventual de apresentar ao auditoacuterio - por explanaccedilatildeo de ideia inicial - em que consiste a execuccedilatildeo de um bem que pode representar o fim da ativishydade realizada pela reacute enfatizando a ldquo funccedilatildeo social da empresardquo naquele contexto Talvez esse instituto natildeo esteja suficientemente difundido para nortear e validar a tese da inexecuccedilatildeo do bem ainda que inegaacutevel o direito de o empregado receber as verbas rescisoacuterias

A proposta de introduzir a argumentaccedilatildeo por enumeraccedilatildeo eacute uma das mais tradicionais Tendo em vista que esse tipo de texto deve aleacutem de apresentar um ponto de vista defendecirc-lo por meio de argumentos a introshyduccedilatildeo pode ter o papel de apresentar em siacutentese esses fatosraciociacutenios e desenvolver cada um deles pormenorizadamente em seguida

Exemplificando essa estrateacutegia observe a introduccedilatildeo de uma motivashyccedilatildeo da lavra do Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho

Ato juriacutedico perfeito direito adquirido direito a tenno expectativa de direito ato administrativo negociai ato-condiccedilatildeo contribuiccedilatildeo parafisshycal relaccedilatildeo juriacutedica estatutaacuteria enriquecimento de causa etc Satildeo as teses sustentadas pelos protagonistas deste processo em busca de uma soluccedilatildeo para a lide Antes de acolher qualquer delas entretanto cumpre identificar a real relaccedilatildeo juriacutedica existente entre o autor e o reacuteu e analishysar os efeitos dela decorrentes

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 103

A retomada histoacuterica eacute outra forma de introduzir as fundamentaccedilotildees juriacutedicas Para um texto de tamanho relativamente curto como eacute o caso da fundamentaccedilatildeo simples natildeo cabe a exposiccedilatildeo minuciosa de um histoacuterico Sugerimos que seja realizada apenas uma relaccedilatildeo analoacutegica entre um eleshymento do passado e um do presente

De maneira alguma ldquo chuterdquo fatos histoacutericos ou estatiacutesticos dos quais natildeo haja certeza absoluta (cientiacutefica) sob pena de a estrateacutegia ser frustrada

Um tema para o qual esse tipo de introito seria bastante eficiente eacute a autorizaccedilatildeo para a realizaccedilatildeo do aborto terapecircutico O Brasil jaacute teve embates anteriores sobre esse tema e as consequecircncias advindas das escolhas feitas no passado estatildeo presentes hoje para serem avaliadas e iluminar o futuro

532 Argumento proacute-tese

Se levarmos ao peacute da letra a nomenclatura ldquo argumento proacute-teserdquo deshyvemos entender que essa eacute a estrateacutegia argumentativa que desenvolve um raciociacutenio a favor da tese defendida Mas isso natildeo eacute muito esclarecedor

Todo argumentador quando desenvolve seu discurso pretende pershysuadir seu auditoacuterio de que sua tese eacute adequada coerente justa O contraacuterio seria absurdo Dizer portanto que um argumento eacute a favor da tese natildeo chega a ser esclarecedor

Sabemos que cada tipo de argumento se caracteriza pela utilizaccedilatildeo de uma estrateacutegia especiacutefica que lhe garante certos contornos de atuaccedilatildeo O argumento de autoridade por exemplo recorre agrave legislaccedilatildeo agrave doutrina e agrave opiniatildeo fundamentada de especialistas o argumento de analogia baseia-se em uma seacuterie de procedimentos que tecircm na comparaccedilatildeo e na semelhanccedila sua estrateacutegia para defender um ponto de vista

Disso se depreende que necessariamente todo argumento eacute a favor da tese escolhida pelo argumentador e a defesa desse ponto de vista recorre a uma estrateacutegia marcada por algum artifiacutecio especiacutefico O argumento proacuteshytese eacute aquele que utiliza a razoabilidade e a coerecircncia do encadeamento sistematizado de fatos-razotildees como fundamento de validade ou seja o argumento proacute-tese eacute aquele que desenvolve uma explicaccedilatildeo razoaacutevel para determinada questatildeo relevante do raciociacutenio argumentativo

A questatildeo relevante a que nos referimos estaacute expressa na tese refere-se agravequilo que se precisa provar (levar a crer convencer) para se alcanccedilar um ldquodever serrdquo ou melhor levar a fazer (persuadir)Esse argumento eacute bastante recorrente na produccedilatildeo das peccedilas processuais mas muitas vezes o argumen-

104 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

tador apresenta dificuldades de montar um projeto de argumentaccedilatildeo para seu texto em que os argumentos proacute-tese sejam utilizados de forma eficiente

Conheccedila o caso concreto a seguir a partir do qual foi proposto um argumento proacute-tese

AacuteGUA DE HEM ODIAacuteLISE CONTAMINADASecretaria interdita hospital em Recife

Duas mortes satildeo investigadas(O Globo)

REC IFE Cinco anos apoacutes a trageacutedia da hemodiaacutelise - que matou 44 pacientes e intoxicou 100 no Instituto de Doenccedilas Renais de Caruaru- a Secretaria de Sauacutede de Pernambuco interditou parte da central de hemodiaacutelise do Hospital Real Portuguecircs em Recife O motivo foi a contaminaccedilatildeo por bacteacuterias da aacutegua usada no atendimento aos doentes Duas mortes estatildeo sendo investigadasO hospital atende a 312 pacientes renais e o serviccedilo eacute de referecircncia do Norte-Nordeste Foi o hospital que constatou a contaminaccedilatildeo ao invesshytigar calafrios nos doentes No dia 20 anaacutelises indicaram concentraccedilatildeo de 6800 bacteacuterias heterotroacuteficas por mililitro de aacutegua quantidade 23 vezes maior do que a tolerada pelas autoridades sanitaacuteriasAs bacteacuterias heterotroacuteficas (que natildeo produzem o proacuteprio alimento) natildeo satildeo perigosas como as da trageacutedia em Caruaru mas em grande quantishydade podem causar infecccedilatildeo segundo o chefe da Vigilacircncia Sanitaacuteria Jaime Brito Ele acredita que a contaminaccedilatildeo pode estar ocorrendo no sistema de filtragemSegundo o chefe do Setor de Hemodiaacutelise do hospital William Stan- ford quando o problema foi constatado a direccedilatildeo chamou um teacutecnico de Curitiba para revisatildeo e limpeza do sistema de tratamento O niacutevel de contaminaccedilatildeo foi reduzido mas as bacteacuterias continuaram em concenshytraccedilatildeo maior que a permitida - 1100 por mililitro Os pacientes contishynuaram se queixando de calafriosO hospital natildeo comunicou o fato agrave secretaria que soube do problema por denuacutencia anocircnima Depois de inspeccedilatildeo a Vigilacircncia Sanitaacuteria lashycrou as salas A e C do Setor de Hemodiaacutelise Cem doentes foram transshyferidos para o Hospital Baratildeo de LucenaO secretaacuterio-adjunto de Sauacutede Liacutevio de Barros tranquilizou os 2100 pacientes pela televisatildeo Ele disse que o problema natildeo eacute tatildeo grave quanshyto o registrado em 1996 em Caruaru- Em Recife natildeo encontramos algas cianofiacutecias (azuis) na aacutegua mas bacteacuterias que respondem bem a antibioacuteticos Mas eacute necessaacuterio que esteshyjamos alerta Estamos tomando como medida cautelar o monitoramento das maacutequinas - disse

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 105

A media mensal de calafrios estava assustadora Segundo a secretaria em circunstacircncias normais os casos chegavam a sete por mecircs No pico da contaminaccedilatildeo da aacutegua foram 20 queixas em dois dias

Registremos inicialmente a tese que se pode assumir neste caso ldquoo hospital deve indenizar os pacientes que receberam a hemodiaacutelise e as fashymiacutelias dos pacientes que faleceram em razatildeo desse procedimento porque foi negligenterdquo

No argumento proacute-tese ter-se-aacute a oportunidade de demonstrar por meio dos fatos a negligecircncia do hospital

O paraacutegrafo argumentativo proacute-tese - cuja estrutura eacute ldquo tese + porque (fato l) + e tambeacutem (fato 2)+ aleacutem disso(fato 3)rdquo -pode ser assim redigishydo O hospital foi negligente porque utilizou aacutegua contaminada no tratashymento de hemodiaacutelise de pacientes renais e tambeacutem natildeo comunicou o fato agrave secretaria de sauacutede Aleacutem disso mesmo apoacutes ter conhecimento do alto iacutendice de contaminaccedilatildeo por bacteacuterias continuou a utilizaacute-la colocando pois em perigo iminente a vida dos pacientes

Sugestatildeo de esquema para argumentar

Argumento proacute-tese (Tese + porque + e tambeacutem + aleacutem disso)

O hospital foi negligente porque utilizou aacutegua contaminada no tratamento de hemodiaacuteshylise de pacientes renais e tambeacutem natildeo comunicou o fato agrave secretaria de sauacutede Aleacutem disso mesmo apoacutes ter conhecimento do alto iacutendice de contaminaccedilatildeo por bacteacuterias continuou a utilizaacute-la colocando pois em perigo iminente a vida dos pacientes

Demais paraacutegrafos

Proposta 1

bull ldquoEacute bem verdaderdquo deve comeccedilar o 2o paraacutegrafoldquoAteacute porquerdquo deve iniciar a 2a frase do 2o paraacutegrafobull ldquoPor outro ladordquo ou ldquoEm contrapartidardquo deve comeccedilar o 3o paraacutegrafobull ldquoPor conseguinterdquo (conclusivo) deve comeccedilar o 4o paraacutegrafo

Proposta 2

bull ldquoHaacute quem digardquo deve comeccedilar o 2o paraacutegrafoldquoAliaacutesrdquo deve iniciar a 2a frase do 2o paraacutegrafobull ldquoDesse modordquo deve comeccedilar o 3o paraacutegrafoldquoEmborardquo deve estar no 3o paraacutegrafobull ldquoAssim sendordquo deve comeccedilar o 4o paraacutegrafo (conclusivo)

106 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Para ampliar o repertoacuterio do nosso leitor propomos mais alguns pashyraacutegrafos exemplificativos Cada um trata de um tema diferente e seria utishylizado logo apoacutes o introito

Tema importacircncia do Coacutedigo de Defesa do Consumidor para o ordeshynamento juriacutedico paacutetrioO Coacutedigo de Defesa do Consumidor criou uma sobre-estrutura juriacutedishyca multidisciplinar aplicaacutevel a toda e qualquer aacuterea do Direito em que ocorrer relaccedilatildeo de consumo porque esse diploma legal possui princiacuteshypios proacuteprios e autonomia sistecircmica e tambeacutem porque permeia a sua disciplina tanto pelo direito puacuteblico quanto pelo privado nas relaccedilotildees contratuais e extracontratuais materiais e processuais Aleacutem disso tudo tem a ver com o consumidor - a sauacutede a seguranccedila os transportes a alimentaccedilatildeo os medicamentos a moradia

Tema reduccedilatildeo da maioridade penal no BrasilA reduccedilatildeo da maioridade penal no Brasil ajudaria a resolver a violecircncia endecircmica que vivemos na sociedade atual porque os ladrotildees e assassishynos que praticam seus atos a sangue frio podem ser menores de idade como no caso de Joatildeo Heacutelio menino de 6 anos morto apoacutes ser arrastado por quilocircmetros nas mas do Rio de Janeiro por um adolescente e dois adultos Soma-se a esse fato (semanticamente igual a ldquoe tambeacutemrdquo) que muitos menores satildeo aliciados por bandidos e conduzidos agrave praacutetica de atos iliacutecitos sob a proteccedilatildeo da menoridade penal Ademais (semanshyticamente igual a ldquoaleacutem dissordquo) alguns jovens assumem a autoria de atos delituosos a fim de proteger criminosos adultos

Repare que neste uacuteltimo exemplo o conector ldquo e tambeacutemrdquo foi substituiacuteshydo por ldquo soma-se a esse fatordquo de mesmo valor semacircntico por questotildees coesishyvas isto eacute como o periacuteodo jaacute estava bastante longo preferiu o argumentador recorrer a um ponto e reiniciar a estrutura tal como vimos sugerindo

A seguir outro tipo de argumento de grande valor para os profissioshynais do Direito o argumento de autoridade

533 Argumento de autoridade

O argumento de autoridade como a proacutepria nomenclatura sugere eacute aquele que invoca o prestiacutegio dos atos ou juiacutezos de uma determinada pesshysoa ou grupo a partir do qual a afirmaccedilatildeo ganha relevacircncia

A primeira observaccedilatildeo a fazer acerca desse argumento eacute que por longo tempo ele foi atacado sob a alegaccedilatildeo de que nenhuma autoridade eacute

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 107

infaliacutevel em suas opiniotildees e por isso mesmo essa estrateacutegia possibilita o uso coercitivo de uma opiniatildeo sem garantias objetivas de sua adequaccedilatildeo

Ressalte-se que atualmente essa preocupaccedilatildeo natildeo mais existe porque a proacutepria natureza da argumentaccedilatildeo pressupotildee certo grau de subjetividade na recepccedilatildeo dos valores que deveratildeo ser compartilhados pelo auditoacuterio

Importante sim seria identificar quem satildeo as pessoas ou os grupos de onde proveacutem a fala da autoridade Natildeo haacute duacutevidas de que a liccedilatildeo de um profissional conhecido e reconhecido em determinada disciplina - um psicoacutelogo para tratar de questotildees ligadas agrave personalidade um meacutedico para opinar sobre uma patologia um historiador para avaliar as consequecircncias de um dado evento de grande relevacircncia para a sociedade de uma eacutepoca etc - possui grande valor

Mas apenas a qualificaccedilatildeo teacutecnico-profissional do indiviacuteduo natildeo lhe garante necessariamente status suficiente para que seja reconhecido como autoridade Satildeo ainda necessaacuterios outros requisitos para que enfim sua opiniatildeo tenha grande relevacircncia argumentativa

E fundamental por exemplo que a autoridade consiga manter o disshytanciamento e a imparcialidade necessaacuterios a que nenhum outro fator ex- lerno agrave questatildeo avaliada possa interferir em demasia na sua avaliaccedilatildeo Para licar mais claro imagine a situaccedilatildeo em que um meacutedico queira utilizar a sua autoridade de profissional da medicina para opinar acerca da ocorrecircncia de erro meacutedico cometido contra um irmatildeo seu E claro que o grau de parenshytesco poderaacute interferir na sua avaliaccedilatildeo e mesmo que isso natildeo ocorra sua opiniatildeo ficaraacute sempre sob suspeiccedilatildeo

Uma pista interessante para determinar se haacute imparcialidade c distanshyciamento de quem opina eacute saber se satildeo observadas as hipoacuteteses de impedishymento (art 134 do CPC e art 252 do CPP) e de suspeiccedilatildeo (art 135 do CPC e art 254 do CPP) listadas pelos Coacutedigos de Processo

Algumas das hipoacuteteses previstas nos referidos artigos do Coacutedigo de Processo Civil satildeo

Art 134 CPC Eacute defeso ao juiz exercer as suas funccedilotildees no processo contencioso ou voluntaacuterioI - de que for parteII - em que interveio como mandataacuterio da parte oficiou como perito funcionou como oacutergatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico ou prestou depoimento como testemunhaIII - que conheceu em primeiro grau de jurisdiccedilatildeo tendo-lhe proferido sentenccedila ou decisatildeo

108 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

IV - quando nele estiver postulando como advogado da parte o seu cocircnjuge ou qualquer parente seu consanguiacuteneo ou afim em linha reta ou na linha colateral ateacute o segundo grauV - quando cocircnjuge parente consanguiacuteneo ou afim de alguma das partes em linha reta ou na colateral ateacute o terceiro grauV I - quando for oacutergatildeo de direccedilatildeo ou de administraccedilatildeo de pessoa juriacutedishyca parte na causaArt 135 CPC Rcputa-sc fundada a suspeiccedilatildeo de parcialidade do juiz quandoI - amigo iacutentimo ou inimigo capital de qualquer das partesII - alguma das partes for credora ou devedora do juiz de seu cocircnjuge ou de parentes destes em linha reta ou na colateral ateacute o terceiro grauIII - herdeiro presuntivo donataacuterio ou empregador de alguma das partesIV - receber daacutedivas antes ou depois de iniciado o processo aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou subministrar meios para atender agraves despesas do litiacutegioV - interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes Paraacutegrafo uacutenico Poderaacute ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo iacutentimo

Outro requisito importante para que uma pessoa seja considerada uma autoridade eacute o preenchimento do lugar da legitimidade tatildeo caro agrave ciecircncia juriacutedica Isso quer dizer que mesmo uma pessoa sendo meacutedico com ampla experiecircncia em cliacutenica geral se natildeo estiver cadastrado como meacutedico autorizado pelo Ministeacuterio do Trabalho um atestado por ele proferido natildeo teraacute validade para fins de exame admissional exigecircncia perioacutedica de toda empresa a seus empregados

Veja que mesmo que o referido profissional tenha preenchido toshydos os requisitos teacutecnicos de formaccedilatildeo acadecircmica e natildeo esteja impedido nem seja suspeito isso natildeo lhe garante a autoridade necessaacuteria para exercer dada atividade juriacutedica Faltou-lhe legitimidade Por essa razatildeo pode-se afirmar que o Direito cria regras proacuteprias que determinam quem ocupa ou natildeo o aqui denominado ldquo lugar da autoridaderdquo

Do ponto de vista praacutetico interessa ressaltar que um contador por exemplo pode preencher todos os requisitos que deem validade a um deshyterminado caacutelculo por ele realizado Na praacutetica forense entretanto eacute faculshytado agraves partes discutirem a autoridade que tem esse profissional e esse proshycedimento eacute utilizado como recurso para procrastinar o fim do processo

Mais uma vez ressaltamos que a melhor decisatildeo eacute a parte requerer que um contador judicial ou perito juramentado realize as tarefas atinentes

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 109

u esses profissionais pois isso dificulta que o adversaacuterio utilize a natildeo auto-i u liide ou a inobservacircncia da feacute puacuteblica como estrateacutegia de desmerecimen- lo da autoridade que se manifesta

Natildeo se pode deixar de assinalar tambeacutem que mesmo natildeo tendo forshymaccedilatildeo acadecircmica em aacuterea alguma um indiviacuteduo pode exercer o papel de uitoridade Provavelmente um agricultor teraacute os conhecimentos necessaacute-i ms para saber se o solo de uma propriedade eacute ou natildeo adequado ao plantio ilc uma determinada safra mesmo natildeo sendo agrocircnomo talvez tenha conshydiccedilotildees de avaliar as possibilidades de chuva mesmo natildeo tendo formaccedilatildeo meteoroloacutegica Os iacutendios de nosso paiacutes por exemplo dominam conhecishymentos ainda pouco explorados por botacircnicos e quiacutemicos

Muitas vezes basta que a opiniatildeo de quem fala seja sustentada pela icpresentatividade social4Um liacuteder comunitaacuterio um pastor uma missioshynaacuteria ou um cantor dependendo do tema tratado podem ser reconhecidos como autoridade Com relaccedilatildeo ao referendo sobre o desarmamento natildeo raro as campanhas utilizavam artistas muacutesicos religiosos e pessoas viacute- innas da violecircncia para convencer o puacuteblico em geral a votar a favor ou contra a proibiccedilatildeo de venda de armas e municcedilatildeo

Outro exemplo recente eacute a participaccedilatildeo de cadeirantes na blitz da Lei Scca A condiccedilatildeo de viacutetima do mal que se pretende evitar (e fiscalizar) eacute altamente persuasiva As empresas de propaganda conhecem bastante bem a eficiecircncia que tais discursos podem alcanccedilar quando dirigidos ao grande puacuteblico razatildeo pela qual contratam artistas para promover suas marcas e produtos mesmo que ele natildeo tenha qualquer autoridade teacutecnica para opishynar sobre o produto da propaganda Reiteramos que o lugar da autoridade deriva da representatividade social que essa pessoa possui

A utilizaccedilatildeo da hermenecircutica polifocircnica no discurso juriacutedico tem por objetivo fortalecer o processo da persuasatildeo por meio da incorporaccedilatildeo no discurso do sujeito de informaccedilotildees de asserccedilotildees de outros enunciadores como da opiniatildeo puacuteblica (conhecida como senso comum) da norma da jurisprudecircncia da miacutedia da Igreja da famiacutelia enfim vozes de diversos campos culturais que reforccedilam a posiccedilatildeo do sujeito-enunciador

Reiteramos portanto que a opiniatildeo de um indiviacuteduo ou de um grupo c apenas uma das fontes a que o argumentador pode recorrer para desenshyvolver um argumento de autoridade

1 A Representatividade Social eacute a relaccedilatildeo do personagem com o contexto social eacute o que ele representa para a sociedade

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Perelman nos ensina5 a respeito das fontes que constituem a autorishydade na produccedilatildeo de argumentos que elas satildeo muito variadas ldquo o parecer unacircnimerdquo ldquo a opiniatildeo comumrdquo e ldquo certas opiniotildees de cientistas filoacutesofos religiosos e profetasrdquo Por vezes a autoridade poderaacute emanar tambeacutem de uma fonte impessoal ldquo as leis da fiacutesicardquo ldquoa legislaccedilatildeo positivada de um ordenamento juriacutedicordquo ldquo a doutrina juriacutedicardquo ldquo a religiatildeordquo e ldquo a Biacutebliardquo

Portanto a doutrina a opiniatildeo fundamentada de especialistas em geshyral e a legislaccedilatildeo podem ser utilizadas como fundamentos relevantes na redaccedilatildeo de argumentos de autoridade

Eacute fundamental tomar cuidado entretanto com uma posUira cada vez mais comum na praacutetica forense alguns operadores do Direito se iludem com a ideia de que a simples referecircncia a um dispositivo legal jaacute caracteriza a funshydamentaccedilatildeo de uma tese pelo argumento de autoridade Isso natildeo eacute verdade

Como jaacute dissemos eacute possiacutevel que a um mesmo caso concreto possam ser aplicados diversos dispositivos igualmente relevantes Essa eacute uma das muitas razotildees por que se exige que o argumentador aleacutem de fazer refeshyrecircncia agrave fonte legal a que recorre sustente por meio de uma justificativa coerente que a aplicaccedilatildeo daquela norma eacute pertinente ao caso e que natildeo gera qualquer situaccedilatildeo conflituosa ou incoerente

Natildeo bastaria portanto em dada fundamentaccedilatildeo dizer que ldquoo que se verifica no caso em anaacutelise eacute a verificaccedilatildeo da carecircncia de accedilatildeo por parte do ente puacuteblico-autor conforme determina o art 301 X do CPCrdquo Fica evidente que haacute uma tese aqui sustentada mas natildeo haacute argumentos que garantam a existecircncia da ldquo carecircncia de accedilatildeordquo Melhor seria se o paraacutegrafo argumentativo por autoridade fosse assim redigido

O que se comprova no caso em anaacutelise eacute a verificaccedilatildeo da carecircncia de accedilatildeo (art 267 V I e 301 X do CPC) por parte do ente puacuteblico-autor em virtude da ausecircncia do chamado interesse de agir condiccedilatildeo indispenshysaacutevel para o regular exerciacutecio do direito de accedilatildeo uma vez que o autor nunca teve a posse efetiva da aacuterea objeto do litiacutegio Isso impede que o seu pedido seja possessoacuterio

Veja que no paraacutegrafo anterior a legislaccedilatildeo reforccedila o que o argumenshytador sustenta por meio dos fatos

Para exemplificarmos a utilizaccedilatildeo do argumento de autoridade lereshymos dois fragmentos um em que o argumento de autoridade - com base na doutrina - estaacute mal utilizado e outro em que foi adequadamente utilizado

O fragmento a seguir foi retirado de uma sentenccedila e natildeo recorre agrave doutrina de maneira a aproveitar sua autoridade para reforccedilar a tese que estaacute sendo defendida pelo argumentador6

()O comportamento indicado agrave re eacute gerador de dano extrapatrimonial cuja existecircncia independe de prova de efetivos prejuiacutezos morais Acresshyccedila-se que ldquona prova do dano moral c das circunstacircncias que influem na determinaccedilatildeo do quantitativo a arbitrar os juizes teratildeo de recorrer agraves regras de experiecircncia comum subministradas pela observaccedilatildeo do que ordinariamente acontece referidas no art 335 do Coacutedigo de Processo C ivilrdquo (THEODORO JR Humberto Curso de Direito Processual Cishyvil 39 ed Rio de Janeiro Forense p 179)()

Perceba que se o argumentador sustentou no iniacutecio do paraacutegrafo que o dano extrapatrimonial natildeo depende de prova de efetivos prejuiacutezos moshyrais por que entatildeo citou o doutrinador para discutir a maneira como se arbitra a indenizaccedilatildeo por dano moral

O papel da doutrina eacute exatamente o de trazer legitimidade ao que se estaacute defendendo E uma maneira de se dizer que algum jurista cuja autorishydade jaacute foi reconhecida pela maioria pensa como vocecirc e que por isso sua tese deve ser acolhida

Deveria o operador do Direito ter trazido no fragmento anterior algum trecho da doutrina que reforccedila a ideia de que a existecircncia do dano extrapatrishymonial independe de prova de prejuiacutezos morais mas isso natildeo foi feito

De maneira diversa o fragmento abaixo retirado de uma fundamentaccedilatildeo de um agravo julgado pelo Tribunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro7 reshycorre agrave doutrina adequadamente para construir seu argumento de autoridade

Certamente o sistema judiciaacuterio deve ser remunerado sob pena de inshycentivar-se a litigacircncia irresponsaacutevel em detrimento do interesse puacuteblishyco existente na prestaccedilatildeo jurisdicional Natildeo obstante referida atividade natildeo pode ser fonte de enriquecimento sem causa para o EstadoO valor da causa corresponde segundo D1NAMARCO agrave ldquo expressatildeo monetaacuteria do significado econocircmico dos benefiacutecios procurados pelo aushytor atraveacutes do processordquo (D INAM ARCO Instituiccedilotildees de Direito Proshycessual Civil v III 3a ed Satildeo Paulo Malheiros 2003 p 370) Como

5 PERELM AN Chaim amp OLBRECHTS-TYTECA L Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Martins Fontes 2002 p 350

6 Por razotildees eacuteticas natildeo seraacute indicada a fonte do trecho criticado7 Processo ndeg 1979804 Fl 83

112 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

nota o insigne processualista por natildeo se dispor a prestar gratuitamente o serviccedilo jurisdicional o Estado distribui entre os usuaacuterios as despesas que suporta em tal mister fazendo-o na proporccedilatildeo do interesse econocircshymico que cada um pretende satisfazer por meio do processo (ob cit pp 271-272) Em outras palavras o valor da causa haacute que observar o proveito econocircmico pretendido e obtido pelo demandanteIn casu o processo de conhecimento versou acerca da reparaccedilatildeo de danos materiais e morais tendo o autor formulado pedido geneacuterico E cediccedilo que em nosso direito a fixaccedilatildeo da indenizaccedilatildeo por dano moral ficou entregue ao prudente arbiacutetrio judicial

Perceba que a tese exposta no primeiro paraacutegrafo do fragmento - ldquoa prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo pode ser fonte de enriquecimento sem causa para o Estadordquo - foi defendida com base nas liccedilotildees de um ilustre doutri- nador Dinamarco cuja citaccedilatildeo foi contextuaiizada ao caso concreto disshycutido Tsso representa dizer que a citaccedilatildeo da legislaccedilatildeo da doutrina ou do especialista deve estar claramente relacionada com o caso concreto

Eacute importante frisar que apesar de muito persuasivo o argumento de autoridade deve ser exposto de maneira a que se comprove seu percurso loacutegico Ele natildeo vale apenas porque estaacute amparado pela legislaccedilatildeo ou pela doutrina espera-se que o ponto de vista sustentado seja tambeacutem coerente e razoaacutevel Por isso esteja atento natildeo faccedila de sua argumentaccedilatildeo um amonshytoado de citaccedilotildees8 Use-as apropriadamente

Quanto agrave citaccedilatildeo de doutrina recomendamos que o argumentador avalie com cautela quais e quantos autores seratildeo citados Existe uma relashyccedilatildeo diretamente proporcional entre a credibilidade de que goza um doutri- nador e a forccedila persuasiva da citaccedilatildeo de suas liccedilotildees Por isso eacute sempre mais interessante buscar autores e obras de referecircncia (satildeo eles fontes primaacuterias e fontes da atualidade) para cada mateacuteria tratada

A maioria dos autores cita a jurisprudecircncia como fonte de argumento de autoridade A esse respeito faremos alguns comentaacuterios quando trabashylharmos o argumento de analogia

Sabe-se que polifonia satildeo vozes que se incorporam ao texto do sujeito argumentashydor juriacutedico para dar consistecircncia agrave sua fala Existem basicamente duas maneiras de utilizar a polifonia por meio da paraacutefrase e da citaccedilatildeo A paraacutefrase consiste em reproduzir o conteuacutedo de uma fala com um discurso autocircnomo sem copiar o texto original Eacute importante contudo que a paraacutefrase seja fiel ao conteuacutedo original Citaccedilatildeo eacute o procedimento por meio do qual aquele que escreve copia textualmente a fala de outrem Para marcar que a autoria do texto natildeo eacute daquele que escreve usam-se as aspas para trechos de ateacute trecircs linhas ou recuo apropriado para trechos maiores A indicaccedilatildeo da fonte entretanto eacute adequada agraves duas fonnas de polifonia

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

s J4 Argumento de oposiccedilatildeo

Inicialmente ressaltemos que todo profissional do Direito quando argumenta sabe que seu ponto de vista seraacute contraposto por outro pro- Irsional que atua no polo adverso O contraditoacuterio eacute uma realidade a ser i-iifrentada pelo argumentador na praacutetica forense

Nesse sentido tentar prever alguns valores ou argumentos a serem nlilixados pela outra parte ao longo da busca da soluccedilatildeo jurisdicional para o conflito pode ser uma estrateacutegia discursiva bastante uacutetil pois ao mesmo u-inpo em que o advogado argumenta a favor de sua tese jaacute conseguiria lambeacutem mostrar que outra possibilidade de compreender os fatos - a do seu adversaacuterio - seria incompatiacutevel com a razoabilidade

Eacute justamente por essas razotildees que a oposiccedilatildeo se mostra um tipo de argumento eficiente para a redaccedilatildeo de uma boa fundamentaccedilatildeo juriacutedica Seguem assim os princiacutepios teoacutericos apresentados sobretudo por Ducrot ao longo de sua obra acerca da determinaccedilatildeo fraacutesica da argumentatividade por intermeacutedio de operadores argumentativos do tipo mas e embora que caracterizam esse tipo de argumento

Eacute comum que seja feita a distinccedilatildeo entre a oposiccedilatildeo restritiva - que utiliza os conectores coordenativos adversativos mas poreacutem entretanto contudo todavia - e a oposiccedilatildeo concessiva construiacuteda com as conjunccedilotildees Mibordinativas concessivas embora ainda que apesar de

Os autores ao longo dos anos vecircm se dedicando ao estudo do fenocircshymeno da concessatildeo veiculado sobretudo por estruturas com operadores argumentativos do tipo mas Eventualmente eles tratam da concessatildeo em estruturas com operadores do tipo embora

Ducrot diz que a expressatildeo [X mas Y ] pressupotildee que a afirmaccedilatildeo de X possa servir de argumento para uma certa conclusatildeo e que a proposiccedilatildeoY seja um argumento que anule essa conclusatildeo

Veja a construccedilatildeo a seguir

X0 motorista atropelou vaacuterias pesshysoas quando subiu na calccedilada mas9

Ypercebeu que aleacutem dos feridos as pesshysoas do lugar tambeacutem queriam linchaacute-lo

A conduta esperada para o caso de um motorista atropelar vaacuterias pessoas na calccedilada eacute que ele pare o automoacutevel e lhes preste socorro

A informaccedilatildeo de que as proacuteprias viacutetimas e outras pessoas do lugar queriam linchar o condutor do veiacuteculo eacute um argumento que anula a expectativa criada pela primeira proposiccedilatildeo e justifica a aushysecircncia de prestaccedilatildeo de socorro

9 Aleacutem do conector mas outras conjunccedilotildees poderiam ser utilizadas para unir os dois periacuteodos entretanto as relaccedilotildees semacircnticas estabelecidas seriam outras

114 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

No periacuteodo redigido ldquo o motorista atropelou vaacuterias pessoas quando subiu na calccedilada (X ) mas percebeu que aleacutem dos feridos as pessoas do lugar tambeacutem queriam linchaacute-lo (Y )rdquo atropelar as viacutetimas e linchamento conduzem a conclusotildees contraacuterias O emprego do mas entretanto natildeo imshyplica uma contradiccedilatildeo entre os dois conceitos X e Y satildeo duas informaccedilotildees que se opotildeem com relaccedilatildeo apenas ao movimento argumentativo colocado em evidecircncia pela conclusatildeo

Destaque-se que a conclusatildeo esperada para a primeira proposiccedilatildeo podeshyria ser algo como ldquo logo o motorista parou para lhes prestar socorrordquo e a conshyclusatildeo contraacuteria seria ldquo logo o motorista natildeo parou para lhes prestar socorrordquo

Trata-se do mas restritivo A afirmaccedilatildeo que precede o mas aparece como uma coisa que se concede que se reconhece e que a afirmaccedilatildeo seshyguinte vai ultrapassar sem anular Natildeo anula no sentido de que a manteacutem no niacutevel dos fatos mas a ultrapassa no sentido de que a desqualifica do ponto de vista argumentativo

A concessatildeo eacute uma estrateacutegia discursiva Se natildeo o fosse por que um locutor buscando fazer admitir alguma coisa concederia razatildeo a outrem sobre a existecircncia de objeccedilotildees agravequilo que ele mesmo afirma

O autor diz que assinalando objeccedilotildees agrave sua proacutepria tese daacute-se uma aparecircncia de objetividade e imparcialidade O indiviacuteduo apresenta-se como sendo capaz de considerar outros pontos de vista que natildeo o seu valoriza a opiniatildeo do outro e essa valorizaccedilatildeo parece um esforccedilo de clarividecircncia de honestidade e natildeo de propoacutesito

Como se pode constatar o autor ao estudar o mas com valor de resshytriccedilatildeo identifica o fenocircmeno da oposiccedilatildeo na oraccedilatildeo que o precede

Em Provar e Dizer (1981) ao falar da conjunccedilatildeo mas e das construshyccedilotildees de oposiccedilatildeo Ducrot explica que ao se dizer ldquo O tempo estaacute bom mas eu estou cansadordquo se reconhece que o bom tempo poderia levar o auditoacuterio a conclusotildees do tipo ldquo estou contenterdquo ou ldquoquero sairrdquo mas acrescenta-se a segunda proposiccedilatildeo a fim de dar uma razatildeo para recusar a conclusatildeo razatildeo que parece sobrepujar a inversa apresentada na primeira proposiccedilatildeo

No caso das concessivas introduzidas por operadores do tipo embora- ldquo Ele eacute forte embora seja pequenordquo Ducrot mostra a possibilidade de se argumentar por meio do que eacute dito na oraccedilatildeo subordinada ldquo Ele eacute pequenordquo contra o que afirma a principal ldquo Ele eacute forterdquo Haacute entretanto uma recusa de se seguir essa virtLialidade argumentativa e afirma-se a principal

O autor diz que escolheu o verbo reconhecer no que concerne a esses exemplos para assinalar que o argumentador natildeo somente atribui ao audi-

toacuterio uma tendecircncia a concluir ldquo a ausecircncia de forccedila da pequenezrdquo ou ldquoa sashytisfaccedilatildeo a partir do bom tempordquo mas tambeacutem admite a legitimidade dessa tendecircncia que ele reconhece por assim dizer como se fosse tambeacutem sua

Verifica-se entatildeo em Provar e Dizer o processo da concessatildeo sendo registrado por intermeacutedio de estruturas com mas e com embora A oposishyccedilatildeo eacute percebida e explicada por meio do verbo reconhecer no sentido de conceder

A estrutura que sugerimos para operacionalizar o uso deste tipo de argumento eacute a seguinte

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

Embora proposiccedilatildeo acei- Apesar de ta como possiacute-Ainda que rnas Que se

quer negarEm que pese

tese

jaacute que _1 w proposiccedilatildeo queuma vez Se sobrepotildee agraveque anterior anulan-porque do ou minorando

os seus efeitosporquanto

Embora seja obrigaccedilatildeo do condushytor de um veiacuteculo socorrer as viacutetishymas de um acidente de tracircnsito

o motorista que deixou de parar para socorrer os feridos natildeo pratishycou omissatildeo de socorro

porque a lei natildeo pode exigir de algueacutem que ponha sua proacuteshypria vida ou sua integridade fiacutesica em risco para socorrer outrem

535 Argumento de analogia

Antes de apreciarmos como a analogia pode ser utilizada como esshytrateacutegia argumentativa e como se caracteriza esse tipo de argumento eacute imshyportante que se entenda o significado desse termo e quais as implicaccedilotildees de sua utilizaccedilatildeo

Segundo Miguel Reale10 a analogia consiste em sua essecircncia no preenchimento da lacuna verificada na lei graccedilas a um raciociacutenio fundado em razotildees de similitude ou ainda na correspondecircncia entre certas notas caracteriacutesticas do caso regulado e as daquele que natildeo o eacute

Assinala tambeacutem o doutrinador que o recurso agrave analogia natildeo impeshyde que lancemos matildeo concomitantemente dos costumes e dos princiacutepios gerais do Direito mesmo porque todo raciociacutenio analoacutegico pressupotildee a

10 REALE Miguel Liccedilotildees preliminares de Direito 25 ed Satildeo Paulo Saraiva 2000 p 317

116 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

apontada correspondecircncia entre duas modalidades do real confrontadas e conduz de maneira natural ao plano dos princiacutepios

Analogia portanto eacute o procedimento por meio do qual se pode esshytabelecer uma relaccedilatildeo de semelhanccedila entre coisas diversas Recorrer agrave analogia significa fazer uma espeacutecie de comparaccedilatildeo entre os termos em questatildeo

Ensina-se jaacute no Ensino Meacutedio uma figura de linguagem denominada metaacutefora que eacute na verdade uma forma de expressatildeo da analogia Em que ela consiste A metaacutefora caracteriza-se pelo emprego de uma palavra em sentido diferente do proacuteprio em decorrecircncia de uma relaccedilatildeo por semelhanshyccedila vislumbrada entre os termos comparados

E o que ocorre na frase ldquo O Estatuto da Crianccedila e do Adolescente (ECA ) eacute uma matildeerdquo Veja que foi estabelecida uma relaccedilatildeo associativa entre os termos ldquoEstatuto da Crianccedila e do Adolescenterdquo e ldquomatildeerdquo Quais caracteshyriacutesticas em comum guardam as duas expressotildees A metaacutefora sugere que o ECA seja protetivo acolhedor complacente compreensivo e vise ao bem estar das crianccedilas e dos adolescentes

O raciociacutenio eacute o seguinte

Estatuto da Crianccedila e do Adolescente Matildee

Legislaccedilatildeo Humana

Defensor da condiccedilatildeo de ldquoser em desenshyvolvimentordquo dos menores Compreensiva com os defeitos dos filhos

Tutela de maneira quase incondicional os direitos das crianccedilas Protetora incondicional de seus filhos

Considerado demasiadamente protecioshynista por alguns Acolhedora e carinhosa

Visa ao bem estar das pessoas cujos dishyreitos deve proteger Visa ao bem estar e agrave felicidade dos filhos

Assim o ECA assemelha-se agrave MAtildeEPerceba que soacute foi possiacutevel a associaccedilatildeo metafoacuterica entre os entes

porque ambos guardavam entre si alguns elementos em comum O mesmo ocorre em contextos como ldquomeu vizinho eacute um cavalordquo ldquo a prova foi mamatildeo com accediluacutecarrdquo etc

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 117

O argumentador aproveita-se do conhecimento preacutevio do auditoacuterio para que um dado conteuacutedo posto a esse grupo particular possa ser aplicashydo por semelhanccedila a outra situaccedilatildeo nova que se pretende sustentar Essa ideia reforccedila o entendimento de Miguel Reale de que todo raciociacutenio anashyloacutegico pressupotildee a apontada correspondecircncia entre duas modalidades do real confrontadas

Observe tambeacutem o raciociacutenio usado no paraacutegrafo abaixo quando se quer por exemplo sustentar que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil exerce sobre seus cidadatildeos poder soberano

A Constituiccedilatildeo protege os direitos fundamentais dos seus cidadatildeos e estabelece as normas de estruturaccedilatildeo e organizaccedilatildeo do Estado assim como a Biacuteblia reuacutene as orientaccedilotildees de Deus ao homem para que este viva em paz e seja feliz

Situaccedilatildeo conhecida pelo auditoacuterio

Conhecimento a ser alcanccedilado

Biacuteblia Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

orientaccedilotildees de Deus aos homens

orientaccedilotildees do Estado aos seus cidadatildeos

Ora se as orientaccedilotildees da Biacuteblia satildeo soberanas em decorrecircncia de quem as inspirou por analogia essa caracteriacutestica - soberania - passa agrave Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica por consequecircncia da aproximaccedilatildeo sugerida na argumentaccedilatildeo

Natildeo eacute adequado nesta hipoacutetese falar-se em lacuna mas ainda assim a analogia mostra-se eficiente pois eacute por meio dela que se podem transshymitir caracteriacutesticas conhecidas - garantidas pelo conhecimento preacutevio do auditoacuterio - a situaccedilotildees novas produzindo conhecimento novo

Importante eacute que ao estabelecer uma analogia entre dois ou mais tershymos - seja por meio de uma metaacutefora de uma gradaccedilatildeo ou de uma compara-

11 Como vimos o auditoacuterio desempenha um papel predominante na Teoria da Argumenshytaccedilatildeo de Perelman amp Tyteca e eacute definido como o conjunto de todos aqueles em que o orador quer influir com sua argumentaccedilatildeo Por isso a classificaccedilatildeo de maior vulto de tipos de argumentaccedilatildeo feita por Perelman amp Tyteca baseia-se na distinccedilatildeo entre a argumentaccedilatildeo que ocorre diante do auditoacuterio universal a argumentaccedilatildeo diante de um uacutenico ouvinte (o diaacutelogo) e a deliberaccedilatildeo consigo mesmo (Atiema 2000 p 86)

118 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ccedilacirco12 - uma consequecircncia decorre desse procedimento caracteriacutesticas de um ser passam a fazer parte do conjunto de traccedilos que compotildeem o significado do seu anaacutelogo em decorrecircncia da relaccedilatildeo loacutegica existente entre eles

Perelman13 tambeacutem distingue o argumento de analogia do argumento por comparaccedilatildeo Nas palavras do autor ldquo os argumentos de comparaccedilatildeo deveratildeo ser distinguidos tanto dos argumentos de identificaccedilatildeo quanto do raciociacutenio por analogiardquo Entretanto os criteacuterios a que Perelman recorre para mostrar essa diferenccedila satildeo de natureza subjetiva Ele afirma que a comparaccedilatildeo eacute um procedimento muito mais suscetiacutevel de prova que a anashylogia ou a semelhanccedila

Ainda segundo o autor eacute importante avaliar tambeacutem qual a vantashygem de se recorrer a esse procedimento como estrateacutegia relevante de arshygumentaccedilatildeo se os pensadores empiacutericos por exemplo sustentavam que ldquo seu uacutenico valor seria possibilitar a formulaccedilatildeo de uma hipoacutetese que seria verificada por induccedilatildeordquo 14

O legislador no artigo 4deg da Lei de Introduccedilatildeo agraves normas do Dishyreito Brasileiro facultou ao julgador a utilizaccedilatildeo da analogia como fonte do Direito O dispositivo legal prevecirc textualmente que ldquoQuando a lei for omissa o juiz decidiraacute o caso de acordo com a analogia os costumes e os princiacutepios gerais de direitordquo Essa faculdade dada pelo legislador ao aplicador do Direito esclarccc que a analogia ocupa um papel muito mais

12 Autores como Ulisses Infante - veja Curso de Gramaacutetica Aplicada aos Textos Satildeo Paulo Scipione 2001 p 595 - e Faraco e Moura - veja Gramaacutetica Satildeo Paulo Aacutetishyca 2002 p 578 - estabelecem a seguinte distinccedilatildeo a comparaccedilatildeo eacute operacionalizada na frase por meio de um tenno de valor comparativo - ldquocomordquo ldquo tal comordquo ldquo feitordquo ldquoque nemrdquo ldquo semelhante ardquo ldquocomo se fosserdquo etc - enquanto a metaacutefora permite a substituiccedilatildeo de um termo pelo outro e recorre ao verbo de ligaccedilatildeo ldquoserrdquo Assim no enunciado ldquo Essa dificuldade de falar em puacuteblico eacute uma pedra no meu caminhordquo veshyrifica-se uma metaacutefora diferente seria se a frase fosse ldquoEssa dificuldade de falar em puacuteblico eacute como uma pedra no meu caminhordquo em que ocorre uma comparaccedilatildeo Esse natildeo eacute poreacutem um criteacuterio absoluto pois Perelman amp Tyteca usam como exemplo de ocorrecircncia da analogia exatamente o que seria uma comparaccedilatildeo para esses autores ldquoAssim como os olhos dos morcegos satildeo ofuscados pela luz do dia a inteligecircncia de nossa alma eacute ofuscada pelas coisas mais naturalmente evidentesrdquo Entendemos que essa distinccedilatildeo natildeo se mostra relevante para a praacutetica argumentativa desenvolvida nos textos juriacutedicos Por argumento de analogia entenderemos aquele que recorre tanto agrave comparaccedilatildeo quanto agrave gradaccedilatildeo agrave semelhanccedila e a analogia propriamente dita

13 PERELM AN ChaTm Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 274

14 PERELM AN ChaTm Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 423

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 119

importante que o de ldquopossibilitar a formulaccedilatildeo de uma hipoacuteteserdquo Em todos os casos em que houver lacuna na lei para o tratamento de uma determinashyda mateacuteria o magistrado natildeo precisaraacute declinar de sua jurisdiccedilatildeo poderaacute julgar com base na analogia

Isso ocorre com muito mais frequecircncia do que se pode imaginar Atualmente o tema dos direitos civis dos homoafetivos requer a argumenshytaccedilatildeo por analogia para alcanccedilar a tutela desses direitos tendo em vista a ausecircncia de legislaccedilatildeo que trate do assunto apesar das inuacutemeras decisotildees laacutevoraacuteveis a essa minoria especialmente as recentes decisotildees do Superior Tribunal Federal Leia a reportagem abaixo

LACcedilOS AFETIVOS15ST J julga se homoafetivo pode ser beneficiaacuterio de plano de sauacutedeHomossexuais tecircm levado a melhor no processo em que se examina o direito de o companheiro ser beneficiaacuterio de plano de sauacutede Por enshyquanto o julgamento estaacute em trecircs a dois pela inclusatildeo na Terceira Turshyma do Superior Tribunal de Justiccedila O pedido de vista do Ministro Carshylos Antocircnio interrompeu o julgamento A informaccedilatildeo eacute do site do STJOs Ministros analisam se o companheiro homossexual Paulo Motta do funcionaacuterio da Caixa Econocircmica Federal de Porto Alegre Joatildeo Abreu pode ser beneficiaacuterio no plano de sauacutede O posicionamento final da Turma pode repercutir tanto nos movimentos homoafetivos no Brasil quanto nos planos de previdecircncia e de sauacutedeO Recurso Especial que estaacute em segredo de Justiccedila eacute da Caixa Econocircshymica Federal O relator eacute o Ministro Maacuterio Gomes Houve tambeacutem um recurso da Funcef - Fundaccedilatildeo dos Economiaacuterios Federais - mas por questotildees processuais natildeo foi admitidoA Caixa questiona acoacuterdatildeo do Tribunal Regional Federal da 4a Regiatildeo A segunda instacircncia reconheceu o direito de o autor da accedilatildeo incluir seu companheiro como beneficiaacuterio no plano de sauacutede dos economiaacuterios O TRF-4 no entanto afastou o reconhecimento de uniatildeo estaacutevel do casalDe acordo com o processo os dois moram juntos haacute sete anos dividem despesas da casa e ambos satildeo portadores do viacuterus HIV Por causa da doenccedila o autor da accedilatildeo teve de se aposentar e pediu a inclusatildeo do comshypanheiro em seu plano de sauacutede A CEF negou o pedidoA primeira instacircncia tambeacutem reconheceu o direito de admitir o compashynheiro no Plano de Assistecircncia Meacutedica Supletiva (PAM S) e na Funcef na condiccedilatildeo de dependente do autor da accedilatildeo O juiz federal da 10a Vara

15 Texto Adaptado da Revista Consultor Juriacutedico de 26 de abril de 2005

120 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

do Rio Grande do Sul Rogeacuterio Raul entretanto concluiu pela impossishybilidade de se reconhecer a uniatildeo estaacutevel por falta de amparo legalA relatora no TRF-4 Margarida Sampaio argumentou que a recusa das empresas em incluir o companheiro foi motivada pela orientaccedilatildeo sexual dos autores da accedilatildeo atitude que viola o princiacutepio constitucional da igualshydade

O caso em apreccedilo avalia a possibilidade de os homoafetivos terem direito agrave inclusatildeo de seu ldquocompanheirordquo 16 como dependente no plano de sauacutede A problemaacutetica central da questatildeo como jaacute apontado antes das deshycisotildees das Cortes Superiores passava pela suposta ausecircncia de previsatildeo expressa para reconhecer tal direito Muitas das vezes os argumentadores precisam recorrer a princiacutepios gerais como a dignidade da pessoa humana ou a igualdade de todos perante a lei para ter condiccedilotildees de se posicionar quanto ao conflito Hoje a preferecircncia tem sido pela analogia com a Lei de Uniatildeo Estaacutevel Sem o amparo da analogia portanto a tutela dos direitos do homoafetivo neste caso nunca seria garantida

Para se poder fundamentar adequadamente veja o raciociacutenio analoacuteshygico desenvolvido

1deg) A Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica pretende proteger a famiacutelia

Art 226 CRFB88 A famiacutelia base da sociedade tem especial proteccedilatildeo do Estadosect 3o Para efeito da proteccedilatildeo do Estado eacute reconhecida a uniatildeo estaacutevel entre o homem e a mulher como entidade familiar devendo a lei facilitar sua conversatildeo em casamento

2deg) Todos satildeo iguais perante a lei

Art 5o CRFB88 Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros reshysidentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualshydade agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes1 - homens e mulheres satildeo iguais em direitos e obrigaccedilotildees nos tershymos desta Constituiccedilatildeo

16 Discute-se a possibilidade de os homoafetivos serem reconhecidos como companheishyros Essa nomenclatura somente eacute paciacutefica quando aplicada aos relacionamentos heteshyrossexuais previstos na chamada Lei de Uniatildeo Estaacutevel

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 121

3deg) A proteccedilatildeo agrave entidade familiar deve se estender aos homoafetivos por analogia agrave entidade familiar composta entre o homem e a mulher seja no casamento seja na uniatildeo estaacutevel Eacute necessaacuterio poreacutem justificar fundamenta- damente por qual motivo a proteccedilatildeo de um caso se estende ao outro

Ao resumir esse raciociacutenio em um enunciado teriacuteamos o seguinte assim como a entidade familiar composta por homem e mulher estaacute amshyparada pela Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica a uniatildeo entre dois homens ou duas mulheres - jaacute que todos satildeo iguais perante a lei - deve ser tambeacutem ampashyrada pelo Estado

Uma vez entendida a analogia como recurso argumentativo de granshyde importacircncia eacute uacutetil mencionar que o Direito Penal tem a lei como uacutenica fonte para determinar se uma conduta eacute ou natildeo iliacutecita Isso ocorre por conta do princiacutepio da legalidade Por essa razatildeo eacute que natildeo cabe o recurso agrave analoshygia - analogia in malam partem - bem como agrave interpretaccedilatildeo integrativa ou ampliativa17 para imputar um crime ao reacuteu Somente eacute possiacutevel a analogia in bonampartem ou seja a favor do reacuteu

Em capiacutetulo anterior mencionamos que fariacuteamos nesta oportunidade uma reflexatildeo sobre a possibilidade de a jurisprudecircncia ser encarada como motivadora do argumento de analogia Na verdade a postura que adota a maioria dos autores eacute a de sugerir que a jurisprudecircncia daacute origem a um argumento de autoridade

Antes de enfrentar qualquer questatildeo poreacutem tomemos como conceito de jurisprudecircncia em sentido estrito o conjunto de decisotildees uniformes sobre uma determinada questatildeo juriacutedica prolatadas pelos oacutergatildeos do Poder Judiciaacuterio

O proacuteprio conceito atribuiacutedo agrave fonte aqui discutida sugere que sua autoridade adveacutem do oacutergatildeo que a profere Isso eacute inegaacutevel O que se quesshytiona eacute que independentemente da autoridade que a reveste o que faculta verdadeiramente seu uso - e a torna eficiente - eacute a proximidade do caso analisado com os outros cujas decisotildees satildeo tomadas como referecircncia

Isso implica dizer que em uacuteltima instacircncia o que faz do uso da jurisshyprudecircncia uma estrateacutegia interessante para a argumentaccedilatildeo eacute o raciociacutenio de que casos semelhantes devem receber tratamentos anaacutelogos por parte do Judiciaacuterio para que natildeo sejam observadas injusticcedilas ou inseguranccedila juriacutedica E a semelhanccedila entre o caso concreto analisado e o processo jaacute transitado em julgado que autoriza o uso da jurisprudecircncia

17 A respeito veja M IRABETE Julio Fabbrini Coacutedigo Penal Interpretado 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2003 p 98

122 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Tanto eacute assim que se ambos os conflitos versarem sobre direito pos- sessoacuterio por exemplo mas as circunstacircncias em que cada um deles ocorshyreu natildeo forem as mesmas a simples proximidade temaacutetica natildeo autoriza o uso da jurisprudecircncia pela autoridade de que eacute revestida Por essa razatildeo preferimos elencar as decisotildees judiciais reiteradas como motivadoras de argumentos por analogia

As suacutemulas representam uma discussatildeo agrave paite Quando o argumentador recorre a uma suacutemula vinculante sabe que ela tem ldquo forccedila de leirdquo e por isso mesmo essa fonte caracteriza na essecircncia um argumento de autoridade

Se a suacutemula natildeo eacute vinculante tem a mesma natureza juriacutedica que a jurisprudecircncia e portanto eacute fonte que caracteriza o uso do argumento de analogia pelas razotildees jaacute expostas

Lembramos poreacutem que para o acadecircmico de Direito importa muishytas vezes mais o domiacutenio das estrateacutegias argumentativas e dos tipos de argumento do ponto de vista praacutetico que a sua proacutepria classificaccedilatildeo pois essa eacute uma preocupaccedilatildeo prioritariamente didaacutetica

536 Argumento de causa e efeito

Causa e efeito - ou causa e consequecircncia - satildeo como duas faces de uma moeda pois para que haja um efeito naturalmente deve ter havido uma causa que o motivasse Assim tambeacutem um fato soacute pode ser visto como causa de algo se houver outros eventos que deles derivaram Enfim causa e consequecircncia satildeo quase indissociaacuteveis dependentes entre si

De acordo com as razotildees que deram origem a um determinado fato eacute possiacutevel que o Direito se importe mais com a causa do que com o dano propriamente dito Quando se fala em aumento no nuacutemero de atos infra- cionais cometidos por crianccedilas e adolescentes na cidade do Rio de Janeiro pode-se estar querendo discutir quais as causas de tal fenocircmeno Qual seria a relaccedilatildeo entre a praacutetica desses ldquodelitosrdquo e a pobreza por exemplo ou o grau de escolaridade desses menores ou o traacutefico iliacutecito de entorpecentes Somente seraacute possiacutevel avaliar adequadamente como coibir as consequecircnshycias desse fenocircmeno ao localizar a sua causa

A esse respeito o Desembargador Seacutergio Cavaiieri Filho assinala a necessidade de distinguir causa de fator comumente confundidos Nas pashylavras do autor

Antes de mais nada entretanto eacute necessaacuterio distinguir causa de fator coisas diferentes mas que por muitos satildeo confundidas Por causa enten-

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 123

de-se aquilo que determina a experiecircncia de uma coisa a circunstacircncia sem a qual o fenocircmeno natildeo existe E pois o agente causador do fenocircshymeno social sua origem princiacutepio motivo ou razatildeo de ser Eliminada a causa o fenocircmeno haveraacute de desaparecerJaacute o fator embora natildeo decirc causa ao fenocircmeno concorre para a sua maior ou menor incidecircncia Eacute a circunstacircncia que de qualquer forma concorshyre para o resultado Pode-se dizer por exemplo que a pobreza a miseacuteshyria eacute um fator de criminalidade porque segundo as estatiacutesticas 90 ou mais da populaccedilatildeo carceraacuteria satildeo constituiacutedas de pessoas provenientes de classes sociais mais humildes Mas natildeo eacute certamente a causa do crishyme porque haacute um nuacutemero muito grande de pobres que natildeo delinquem Pode-se dizer igualmente que o analfabetismo a ignoracircncia eacute outro fator da criminalidade ()18

Para a ciecircncia do Direito o nexo causal19 existente entre dois eventos tem grande relevacircncia porque todo indiviacuteduo tem direitos e obrigaccedilotildees decorrentes dos atos que pratica em face das demais pessoas que vivem sob as regras de um mesmo ordenamento juriacutedico Isso implica dizer que se um consumidor contrata uma empresa para reformar seu escritoacuterio e dushyrante a prestaccedilatildeo de serviccedilo um dos pedreiros causa um buraco na parede do escritoacuterio vizinho sua conduta gera como consequecircncia a responsabilishydade pelos danos materiais causados

Se houve o dano mas sua causa natildeo estaacute relacionada ao comportashymento do agente inexiste a relaccedilatildeo de causalidade e tambeacutem a obrigaccedilatildeo de indenizar Mesmo havendo nexo de causalidade poreacutem natildeo se podem desprezar as excludentes da responsabilidade civil como a culpa exclusiva da viacutetima ou de terceiro o caso fortuito e a forccedila maior20

Analisemos o caso concreto a seguir para melhor esclarecer a imshyportacircncia do nexo de causalidade e do argumento a que daacute origem para a atribuiccedilatildeo de responsabilidades na ordem civil

18 CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de sociologia juriacutedica (Vocecirc Conhece) 10 ed Rio de Janeiro Forense 2002

19 Para GRECO Rogeacuterio Curso de Direito Penal parte geral 4 d Rio de Janeiro Impetus 2004 p 232 ldquonexo causal ou relaccedilatildeo de causalidade eacute aquele elo necesshysaacuterio que une a conduta praticada pelo agente ao resultado por ela produzido Se natildeo houver esse viacutenculo que liga o resultado agrave conduta levada a efeito pelo agente natildeo se pode falar em relaccedilatildeo de causalidade e assim tal resultado natildeo poderaacute ser atribuiacutedo ao agente haja vista natildeo ter sido ele o seu causadorrdquo

20 A respeito consulte CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de responsabilidade civil 6 ed Satildeo Paulo Malheiros 2005

124 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Certa vez um soldado do Exeacutercito Marco Aureacutelio colocou sobre um armaacuterio do quartel um colchonete e acima dele um aspirador de poacute Quanshydo o soldado Joatildeo Ameacuterico foi puxar o colchonete dias depois foi atingido pelo pesado aparelho de aspirar poacute que natildeo havia conseguido visualizar

Seraacute que a conduta de guardar esse objeto no referido lugar eacute um comshyportamento esperado para aquele contexto ou Marco Aureacutelio agiu de maneira imprudente Na verdade o que perguntamos eacute existe nexo de causalidade entre a conduta de Marco Aureacutelio (deixar o aspirador de poacute sobre um colchoshynete) e o resultado (os ferimentos causados em Joatildeo Ameacuterico)

Aquele que entende que a conduta de Marco Aureacutelio foi adequada e previsiacutevel provavelmente entende que Joatildeo Ameacuterico deveria ter tido mais cautela ao puxar o colchonete pois ningueacutem puxa algo de cima de um armaacuterio sem o cuidado de se proteger de coisas que possam cair junto com o objeto puxado

Ao contraacuterio aqueles que entendem que Marco Aureacutelio foi quem adotou uma conduta imprudente ao colocar o aspirador de poacute onde natildeo se poderia vecirc-lo atribuiratildeo a ele a responsabilidade pelos ferimentos causashydos em Joatildeo Ameacuterico

A argumentaccedilatildeo acerca da relaccedilatildeo de causa e efeito nesta hipoacutetese passa pela discussatildeo sobre se a conduta adotada por Marco Aureacutelio eacute ou natildeo a causa dos ferimentos de Joatildeo Ameacuterico Eacute necessaacuterio contar portanto com certo grau de subjetividade sobre o que o auditoacuterio entende por conduta adequada (dever de cuidado) ou imprudente para soacute entatildeo discutir seus efeitos

Perelman assinala que ldquoessa argumentaccedilatildeo para ser eficaz reshyquer um acordo entre os interlocutores sobre os motivos de accedilatildeo e sua hierarquizaccedilatildeordquo 21 Exemplifica que se um jogador ganha sucessivas vezes no jogo de azar torna-se menos verossiacutemil que a causa de seu sucesso seja a sorte a tendecircncia eacute julgar que ele estaacute trapaceando Da mesma maneira se natildeo haacute contradiccedilatildeo entre a fala de testemunhas supotildee-se que a causa de tal coincidecircncia de explicaccedilotildees seja a veracidade de suas falas

Examinemos outro caso concreto se uma pessoa contrata um hospital para fazer uma cirurgia e em decorrecircncia da conduta imperita adotada pelo meacutedico durante a realizaccedilatildeo do procedimento ciruacutergico o paciente passa por problemas graves a responsabilidade pelos danos causados agrave sauacutede do consushymidor eacute da contratada Perceba que o viacutenculo causal entre a conduta adotada e o resultado alcanccedilado gera a obrigaccedilatildeo juriacutedica de indenizar E fato portanto

21 PERELM AN Chaiacutem Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 pp 301-302

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 125

que a relaccedilatildeo de causa e consequecircncia entre dois eventos eacute de grande importacircnshycia por exemplo para a atribuiccedilatildeo da responsabilidade de indenizar

Se tomarmos o viacutenculo causal entre dois eventos como elemento es- truturante de um raciociacutenio argumentativo trecircs possibilidades satildeo inicialshymente vislumbradas Perelman22 as enumera da seguinte maneira

a) A argumentaccedilatildeo facilita a relaccedilatildeo entre dois acontecimentos sucessivos por meio de um viacutenculo causalb) A argumentaccedilatildeo seleciona um acontecimento e busca descoshybrir qual a causa que pode tecirc-lo determinadoc) A argumentaccedilatildeo analisa um acontecimento e tenta evidenciar quais os efeitos que dele devem resultar

A tendecircncia natural do homem eacute na verdade a de sempre tentar racionalizar os acontecimentos e tentar entender o porquecirc dos fatos que observa Sempre se quer saber a causa ou o motivo que impeliu algueacutem a adotar certo comportamento pois eacute por meio da causa que se consegue estabelecer uma interpretaccedilatildeo coerente da conduta do indiviacuteduo

A relaccedilatildeo de causa e efeito entre dois eventos muitas das vezes aproshyxima-se do proacuteprio problema que a argumentaccedilatildeo precisa enfrentar Leia o relatoacuterio a seguir

2 Cacircmara Ciacutevel Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg 121793Relator Des Seacutergio Cavalieri FilhoVistos relatados e discutidos estes autos de Apelaccedilatildeo Ciacutevel ndeg 117296 em que eacute apelante Casa de Sauacutede Santa Helena Ltda e apelado Hamilshyton da Paixatildeo Amaratildeo e sua mulherAcordam os Desembargadores que integram a 2a Cacircmara Ciacutevel do Trishybunal de Justiccedila do Estado do Rio de Janeiro por maioria em dar proshyvimento parcial ao recurso para restringir a indenizaccedilatildeo ao dano moral e despesas com funeral vencido o Des Joatildeo Wehhi Dib que julgava a accedilatildeo improcedenteAccedilatildeo de responsabilidade civil pelo rito sumariacutessimo em razatildeo da morte de crianccedila receacutem-nascida Apontou-se como fato gerador da resshyponsabilidade da reacute o fato de ter sido dado alta hospitalar ao filho dos

22 PERELM AN Chaiacutem Tratado da argumentaccedilatildeo a nova retoacuterica Satildeo Paulo Marshytins Fontes 2002 p 299-300

126 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

autores logo apoacutes o seu nascimento quando ainda natildeo tinha condiccedilotildees fiacutesicas para tal A sentenccedila (f 3035) acolhendo parcialmente o pedido condenou a reacute a pagar aos autores indenizaccedilatildeo por dano moral - 100 salaacuterios miacutenimos - despesas com funeral e pensotildees vincendas a serem apuradas em liquidaccedilatildeo durante nove anos compreendidos entre os 16 e os 25 anos do filho dos autoresRecorre a vencida (f 3741) sustentando que natildeo existe nos autos proshyva da culpa da apelante natildeo podendo esta ser presumida mormente em se tratando de crianccedila nascida de matildee desnutrida e fumante Assim prossegue culpar a apelante pelo infeliz acontecimento importa em imputar-lhe responsabilidade pelo procedimento dos proacuteprios pais que sem condiccedilotildees resolveram ter mais um filho Aduz natildeo ter a sentenshyccedila considerado a baixa situaccedilatildeo social-fiacutenanceira dos apelados causa principal da mortalidade infantil e que a introduccedilatildeo da sonda natildeo foi a causa mortis da crianccedila Pede a reforma da sentenccedilaAo responder o recurso (f 4647) pugnam os apelados pelo seu des- provimentoEacute o relatoacuterio

Repare como a problematizaccedilatildeo do caso concreto coincide exatamenshyte com a relaccedilatildeo de causalidade entre a conduta do meacutedico que autorizou a alta hospitalar e o evento morte o problema seria de que maneira poder- -se-aacute comprovar que Alan Marques Amaral faleceu em decorrecircncia da alta hospitalar prematura e natildeo em decorrecircncia de seu fraacutegil estado de sauacutede

Por fim reforccedilamos que nenhuma relaccedilatildeo de causa e consequecircncia deve ficar sem uma explicaccedilatildeo coerente para justificar que o agente deveshyria adotar conduta diversa para evitar os resultados a ele imputados Mera relaccedilatildeo entre dois eventos (fato e consequecircncia) sem essa explicaccedilatildeo do argumentador natildeo passa de narraccedilatildeo de fatos insuficiente portanto para a fundamentaccedilatildeo de uma tese

537 Argumento de senso comum

Jaacute conhecemos a importacircncia das fontes formais do direito para a argumentaccedilatildeo Sabemos que a lei em especial em virtude do Positivismo Juriacutedico gozou sempre de tamanha credibilidade que certos profissionais julgam que podem argumentar apenas com base nessa fonte Nesse contexshyto o senso comum ficaria relegado a segundo plano porque fruto de um conhecimento vulgar (oposto a conhecimento cientiacutefico) aparentemente pouco valorizado no meio juriacutedico

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 127

Vimos poreacutem que o poacutes-positivismo proporcionou um novo panoshyrama para o tratamento das questotildees juriacutedicas relevantes que interferem na decisatildeo do processo Exemplificamos oportunamente que existem casos concretos em que a lei positivada deixa de ser aplicada em nome do sentishymento de justiccedila haacute ainda casos que necessitam do amparo da analogia pois a norma eacute lacunosa na regulaccedilatildeo do tema especiacutefico em debate

Em virtude dessa nova perspectiva poacutes-positivista houve uma rearrushymaccedilatildeo do prestiacutegio que todas essas fontes possuem diante do julgador e dos pensadores do direito O papel cada vez mais relevante da miacutedia nas decisotildees judiciais por exemplo eacute tema de diversos livros da atualidade E certo que a denominada ldquomiacutediardquo eacute fonte de argumento de autoridade mas o que os espeshycialistas vecircm apontando eacute a iacutentima relaccedilatildeo dos veiacuteculos midiaacuteticos e o senso comum pois aqueles promovem ou asseveram os sentimentos predominanshytes na coletividade denominada com frequecircncia ldquohomem meacutediordquo

Artur Ceacutesar de Souza23 lembra que quando os meios de comunicaccedilatildeo de massa determinam quais seratildeo as questotildees e os problemas de primeira relevacircncia fazem com que as pessoas direcionem toda a sua atenccedilatildeo para essa agenda ou ordem do dia

Quando essa agenda tem por finalidade as provas contidas num proshycesso judicial os meios de comunicaccedilatildeo aleacutem de informar tambeacutem reashylizam um ldquojulgamento paralelordquo desencadeando na opiniatildeo puacuteblica um complexo conjunto de sentimentos como por exemplo perplexidade oacutedio vinganccedila sensaccedilatildeo de impunidade etc

Enfim por todas as razotildees apresentadas o senso comum eacute hoje fonshyte de prestiacutegio cada vez maior no meio juriacutedico

O profissional do direito que recorre a essa fonte aproveita-se de uma afirmaccedilatildeo que goza de consenso geral e estaacute amplamente difundida na soshyciedade para validar seus raciociacutenios

O senso comum natildeo precisa estar necessariamente afastado do senso criacutetico Ainda que assistemaacutetico natildeo deve se afastar do bom senso sob pena de natildeo ser validado pela coletividade e perder o status de ldquoconsenso geralrdquo

Este argumento eacute muito bem recebido quando funciona como reforshyccedilo de outros argumentos Existe uma questatildeo importante que precisamos enfrentar com cuidado acerca desse assunto A validade da norma juriacutedica depende de vigecircncia e de eficaacutecia

23 SOUZA Artur Ceacutesar de A decisatildeo do juiz e a influecircncia da miacutedia Rio de Janeiro RT 2012 sinopse

128 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Por ter sido criada pelo processo legislativo proacuteprio a norma apreshysenta vigecircncia - forccedila que tem a norma para cumprir com sua finalidade regular condutas gerar efeitos sobre os eventos tatildeo logo ocorram no acircmshybito dos fatos

Mesmo em plena vigecircncia se a norma natildeo for acolhida como justa e capaz de resolver de maneira adequada o conflito seraacute letra morta Daiacute exisshytirem no Brasil as ldquo leis que pegamrdquo e as ldquo leis que natildeo pegamrdquo isto eacute normas que nunca saem do papel por natildeo gerarem os efeitos que dela se esperam

Se a coletividade representada pelo senso comum valida a aplicaccedilatildeo de uma norma se o sentimento social predominante eacute de que a norma alcanccedila os fins pretendidos ela passa a gozar tanto de vigecircncia quanto de eficaacutecia

E por essa razatildeo que sugerimos associar na abordagem dos temas polecircmicocircs o argumento de autoridade e o argumento de senso comum Os dois juntos promovem a condiccedilatildeo de validade desejada para a norma (vigecircncia + eficaacutecia) Haacute ainda casos em que a responsabilidade civil fica pouco clara na relaccedilatildeo juriacutedica A noccedilatildeo de dever de cuidado tatildeo bem exshyplicada pelo Desembargador Seacutergio Cavaiieri Filho24 seria portanto bem argumentada pela causa e efeito e reforccedilada pelo senso comum que valida a conduta cuidadosa e responsaacutevel a ser adotada pelo homem meacutedio

Oferecemos exemplos em que o argumento de senso comum reforccedila os argumentos de autoridade e de causa e efeito mas ele pode ser tambeacutem associado a qualquer outro dando-lhe completude e validade

538 Argumento ad hominem

Vimos que o argumento de autoridade invoca o prestiacutegio de uma deshyterminada pessoa ou grupo a partir do qual sua afirmaccedilatildeo ganha relevacircncia O argumento ad hominem de forma diametralmente oposta consiste no ataque a uma pessoa cujas ideias argumentos ou depoimentos pretende desqualificar Ao inveacutes de se enfrentar o argumento do adversaacuterio ataca-se a pessoa do adversaacuterio Ataca-se o homem e natildeo a ideia

O argumento ad hominem possui como organizaccedilatildeo baacutesica de racioshyciacutenio a seguinte estrutura

24 CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de responsabilidade civil 12 ed Satildeo Paushylo Atlas 2012

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 129

1 A considera B verdadeiro2A c pessoa contra quem pesam acusaccedilotildees graves jaacute comprovadas3 Entatildeo B eacute falso

Sabemos que a verossimilhanccedila e a aceitaccedilatildeo de urna assertiva estatildeo muito mais na sua razoabilidade e na loacutegica que somente na autoridade daquele que a enuncia Apesar de natildeo possuir bases loacutegicas este argumento constitui uma forte arma retoacuterica

O ataque agrave pessoa pode ocorrer por duas diferentes estrateacutegiasa) ataque direto agrave pessoa (argumento ad hominem abusivo) quando

coloca seu caraacuteter e seus valores morais em duacutevida e portanto a validade de sua argumentaccedilatildeo porque eivada de descredibilidade

Dois exemplos desse argumento estatildeo adiante sugeridosa 1) As afirmaccedilotildees de Richard Nixon a respeito da poliacutetica de relaccedilotildees

externas em relaccedilatildeo aacute China natildeo satildeo confiaacuteveis pois ele foi forccedilado a abshydicar durante o escacircndalo de Watergate

a2) O Ministro Joaquim Barbosa em sessatildeo no Supremo atacou o Ministro Gilmar Mendes quando disse que ele natildeo tem condiccedilotildees de lhe dar liccedilotildees de moral jaacute que conquistou sua condiccedilatildeo de prestiacutegio usando capangas cm sua cidade de origem e fazendo uso poliacutetico da miacutedia o que estava destruindo a credibilidade do STF Fecha seu raciociacutenio recorrendo ao senso comum ldquo Saia agrave rua Ministro Gilmar e constate o que as pessoas dizem a vosso respeitordquo A quem interessar sugerimos assistir agrave cena em que o debate argumentativo ocorre O acesso estaacute disponiacutevel em http wwwyoutubecomwatchv=Z 1 yOqrD 1 BTs

b) ataque agraves circunstacircncias em que o adversaacuterio realiza certa afirshymaccedilatildeo (argumento ad hominem circunstancial) que ocorre quando a pesshysoa natildeo por seu valores morais ou pessoais mas pelo contexto mostra-se incapaz de fazer certas afirmaccedilotildees

E esse o caso da desqualificaccedilatildeo da chamada ldquo testemunha ocularrdquo pelas condiccedilotildees em que assistiu aos fatos sobre os quais testemunha

b l) Em um processo criminal no qual se imputava o crime de hoshymiciacutedio a um policial militar o defensor puacuteblico questionava agrave uacutenica tesshytemunha do crime uma senhora de 72 anos o seguinte como a senhora- que tem 65 graus de miopia - pode garantir que foi o reacuteu quem matou se acabou de afirmar que levantou de madrugada com o barulho do tiro e olhou pela janela A senhora dorme de oacuteculos ou sua miopia natildeo a impede de reconhecer um rosto agrave noite a quase oitenta metros de distacircncia

130 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

b2) A disse - Foi este o homem que vi roubando aqriele carroB respondeu - Como pode afirmar isso se vocecirc estava becircbado

Perceba que o argumento ad hominem circunstancial pode ser muishyto eficiente quando a instruccedilatildeo do processo ainda estaacute em curso ou seja quando a produccedilatildeo das provas depende da maior ou menor credibilidade de quem a oferece

539 Argumento a fortiori

O argumento a fortiori - com mais razatildeo - eacute aquele que estabelece uma relaccedilatildeo entre dois eventos de maneira a orientar a conduta de um bashyseada no paracircmetro estabelecido pelo outro

O argumento a fortiori pode sempre ser resumido numa foacutermula como esta se a soluccedilatildeo X eacute adequada para o caso Y com maior razatildeo deve ser tambeacutem adequada para o caso Z que eacute uma forma mais grave (ou mais evidente ou mais ampla ou mais intensa ou maior) de X

Em virtLide disso eacute comum recorrer-se agrave noccedilatildeo de proporcionalidade que no direito tem natureza juriacutedica de princiacutepio O princiacutepio da proporcioshynalidade tem o objetivo de coibir excessos desarrazoados por meio da afeshyriccedilatildeo da compatibilidade entre os meios utilizados e os fins pretendidos a fim de evitar restriccedilotildees desnecessaacuterias ou abusivas Celso Ribeiro Bastos25 entende que a proporcionalidade natildeo eacute um princiacutepio mas um paracircmetro interpretativo do direito

Com base na proporcionalidade prevalece o entendimento de que natildeo eacute liacutecito valer-se de medidas restritivas aplicar penas ou formular exishygecircncias aleacutem daquilo que for estritamente necessaacuterio para a realizaccedilatildeo da finalidade almejada

A tiacutetulo de esclarecimento pensemos no artigo 213 do CP o qual prevecirc o crime de estupro A pena abstrata prevista para essa conduta iliacutecita eacute reclusatildeo de 6 a 10 anos Perceba como a proporcionalidade pode auxiliar na discussatildeo sobre a aplicaccedilatildeo da pena

A atual redaccedilatildeo do dispositivo eacute a seguinte ldquo art 213 do CP - consshytranger algueacutem mediante violecircncia ou grave ameaccedila a ter conjunccedilatildeo carshynal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinosordquo

25 BASTOS Celso Ribeiro apud TAVARES Andreacute Ramos Curso de direito constishytucional Satildeo Paulo Saraiva 2002 p 551

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 131

Dessa forma o bandido que ficou conhecido como ldquomaniacuteaco do parshyquerdquo praticou o mesmo crime que um rapaz o qual encosta propositalmente em algueacutem dentro do ocircnibus a fim de se excitar O primeiro praticou meshydiante violecircncia a conduta prevista na parte inicial do dispositivo (conjunshyccedilatildeo carnal) o segundo com ameaccedila velada a conduta prevista na parte linal (ato libidinoso)

Ambos praticaram certamente condutas moralmente reprovaacuteveis mas seria justa a aplicaccedilatildeo da pena de 6 anos (miacutenimo legal) agravequele que se dedicou ao ato obsceno A severidade da sanccedilatildeo deve corresponder agrave maior ou menor gravidade da infraccedilatildeo penal Quanto mais grave o iliacutecito mais severa deve ser a pena

Muitos profissionais vecircm sustentando que o legislador perdeu excelenshyte oportunidade quando da alteraccedilatildeo da lei penal de propor uma pena proshyporcional agraves diversas condutas inclusas na tipicidade do crime de estupro

Alberto Marques dos Santos26 reuacutene alguns outros exemplos elucishydativos

Do menor se deduz o maior do menos evidente se deduz o mais evidenshyte Assim se a negligecircncia deve ser punida afortiori deve ser punido o ato premeditado [Ferraz] Se a prova testemunhal foi aceita afortiori deve tambeacutem ser aceita a prova documental [Nunes] Se a oferta de contestaccedilatildeo na data da audiecircncia do procedimento sumaacuterio afasta a reshyvelia a fortiori a entrega da contestaccedilatildeo em cartoacuterio antes dessa data tambeacutem a afasta

E liacutecito dizer da mesma maneira que o argumento a fortiori deriva do brocardo ldquoquem pode o mais pode o menosrdquo Quando o argumenta- dor recorre a essa estrateacutegia seu objetivo eacute conseguir uma aplicaccedilatildeo mais extensiva da lei para que se aplique agrave situaccedilatildeo faacutetica que nela natildeo estaacute expliacutecita

Um exemplo que ilustra essa explicaccedilatildeo se a lei exige dos Promoshytores de Justiccedila que nas denuacutencias discriminem as accedilotildees de cada um dos acusados com mais razatildeo se deve exigir que o Magistrado as individualize na sentenccedila

26 SANTOS Alberto Marques dos Argumentaccedilatildeo juriacutedica os melhores e os piores argumentos na retoacuterica forense Disponiacutevel em lthttpalbertodossantosword- presscomartigos-juridicosargumentacao-forensegt Acesso em 18jul 2012

132 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

5310 Argumento por absurdo

O argumento por absurdo eacute aquele que natildeo apenas mostra que o ar- gumentador estaacute certo mas tambeacutem que o advogado da parte contraacuteria estaacute errado

Consiste portanto em demonstrar a natildeo validade de uma tese Para isso eacute necessaacuterio apenas pressupor que ela seja verdadeira mas mostrar dividindo sua explicaccedilatildeo em pedaccedilos que sua aplicaccedilatildeo leva a resultados contraditoacuterios e inadmissiacuteveis ou seja absurdos

Trata-se de demonstrar a falsidade de uma afirmaccedilatildeo ou a invalidade de uma ideia evidenciando que seus efeitos ou desdobramentos contrashydizem essa mesma ideia ou conduzem ao impossiacutevel ao inadmissiacutevel Portanto o argumento pelo absurdo aceita provisoriamente a tese que se quer combater e desenvolve-a ateacute conseguir demonstrar seus efeitos absurdos

No campo hermenecircutico27 usa-se o argumento por absurdo para mosshytrar que a aceitaccedilatildeo de uma interpretaccedilatildeo da norma levaria a) a contrariar o fim visado pela mesma norma b) a contradizer norma hierarquicamente superior c) agrave antinomia entre a norma interpretada e o sistema em que estaacute inserida ou d) a uma inconstitucionalidade

Adiante citamos dois exemplos desse tipo de argumentos disponibishylizados tambeacutem internet28 No primeiro deles a prevalecer a tese da defesa de que sem periacutecia de prestabilidade natildeo se reconhece a qualificadora do art 157 sect 2W 1 do CP a referida qualificadora jamais seraacute aplicada E que semelhante entendimento coloca nas matildeos do assaltante a escolha entre querer responder por roubo qualificado ou por roubo simples Bastaraacute ao meliante esconder a arma e jamais a qualificadora seraacute aplicada Assim a tese da defesa deixa a incidecircncia da qualificadora ao arbiacutetrio do marginal e faz letra morta do art 157 sect 2o I

Outro exemplo se a eliminaccedilatildeo do prejuiacutezo pela recuperaccedilatildeo da res apoacutes a consumaccedilatildeo justificasse a aplicaccedilatildeo do privileacutegio do art 155 sect I o entatildeo todo furto tentado seria privilegiado jaacute que nele sempre a res eacute recuperada

27 REDUCcedilAtildeO ao absurdo Disponiacutevel em lthttpgrandeaboboracom reducao-ao- absurdohtmlgt Acesso em 18 jul 2012

28 Ibidem

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO m

5311 Argumento de fuga

Argumento de fuga eacute o argumento de que se vale o advogado para escapar agrave discussatildeo central em que seus argumentos provavelmente natildeo prevaleceriam Apela-se em regra para a subjetividade

Eacute o argumento por exemplo que o advogado utiliza quando enalteshyce o caraacuteter do acusado lembrando tratar-se de pai de famiacutelia de pessoa responsaacutevel de reacuteu primaacuterio quando haacute acusaccedilatildeo por exemplo de lesotildees corporais ou homiciacutedio culposo na direccedilatildeo de veiacuteculo automotor

Perceba que qualquer pessoa ldquode bemrdquo pode em algum momento praticar um crime culposo Se a autoria a materialidade e a culpabilidade desse crime forem inegaacuteveis resta ao advogado apenas enaltecer suas quashylidades a fim de conseguir a fixaccedilatildeo de uma pena branda ou - quem sabe- desqualificar o crime a ele imputado

Um caso de grande repercussatildeo em que esse argumento foi utilizado diversas vezes foi o do goleiro Bruno O primeiro advogado que lhe reshypresentou insistiu imensamente na ideia de que a viacutetima Eliza Samudio estava viva e pressionou os jurados com a possibilidade de condenar um inocente jaacute que natildeo foi encontrado seu corpo Levantou a possibilidade de que uma foto desfocada e de longe seria da suposta viacutetima que estava na Europa afirmou que estivesse filmando uma produccedilatildeo eroacutetica em oushytro estado e aventou ateacute mesmo uma conspiraccedilatildeo contra seu cliente entre outras coisas

Enfim todas essas afirmaccedilotildees sem qualquer verossimilhanccedila trazishydas pelo advogado apenas tumultuaram o processo e deixaram os jurados confusos Trata-se de verdadeiros argumentos de fuga

Esse argumento somente eacute recomendado quando natildeo houver como se opor aos argumentos da parte contraacuteria O ideal eacute sempre enfrentar as quesshytotildees relevantes do conflito de maneira clara objetiva concisa e consistente No entanto existem situaccedilotildees em que o advogado natildeo tem muito a fazer pois o processo eacute francamente desfavoraacutevel a seu cliente

Natildeo seraacute exercida a defesa Claro que sim A saiacuteda eacute evitar o reforccedilo exagerado das questotildees tormentosas e enfocar outras em que as eventuais qualidades pessoais ou morais do reacuteu possam ser destacadas

Caso o profissional esteja patrocinando o autor natildeo eacute adequando o uso do argumento de fuga Para ajuizar a accedilatildeo o advogado deve no miacuteshynimo ter um bom conjunto probatoacuterio uma adequada causa de pedir e consistentes argumentos que sustentem a tese Caso contraacuterio o melhor eacute desistir da demanda por absoluta falta de fundamento juriacutedico

134 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Outra observaccedilatildeo que se mostra pertinente eacute que o argumento de fuga causa menos prejuiacutezos ao argumentador quando desenvolvido em situaccedilatildeo de fala durante audiecircncias nas sustentaccedilotildees orais em debates na tribuna quando discursa etc

No discurso oral o uso de estrateacutegias argumentativas menos qualifishycadas pode ser minimizado por outros recursos retoacutericos como a utilizaccedilatildeo competente da voz preenchimento adequado do ldquo espaccedilo cecircnicordquo frases de efeito bem colocadas entre outros

Nas peccedilas processuais e no texto escrito em geral a possibilidade de manusear a argumentaccedilatildeo e estudaacute-la com cuidado fragiliza-a em demasia quando se recorre a argumentos como o de fuga pois repetimos trata-se de estrateacutegia liltima para minimizar as consequecircncias nocivas de um proshycesso difiacutecil para a parte reacute

54 O USO DA DEDUCcedilAtildeO E INDUCcedilAtildeO NA PRODUCcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

Ao longo do capiacutetulo anterior vocecirc estudou diversos tipos de argushymento disponiacuteveis para convencer o auditoacuterio da validade da tese que se pretende sustentar Passaremos agora agrave compreensatildeo de que o desenvolshyvimento de tais raciociacutenios argumentativos pode se dar tanto pelo meacutetodo dedutivo quanto pelo meacutetodo indutivo Ambos estatildeo agrave disposiccedilatildeo do profisshysional do direito para facilitar a persuasatildeo de seu interlocutor

Em primeiro lugar vamos conhecer melhor o processo dedutivo de construccedilatildeo dos argumentos Para isso eacute necessaacuterio defini-lo A deduccedilatildeo eacute uma inferecircncia que parte do universal para o particular Considera-se que um raciociacutenio eacute dedutivo quando a partir de determinadas afirmaccedilotildees (premissas) aceitas como verdadeiras o advogado chega a uma conclusatildeo loacutegica sobre uma dada questatildeo discutida no processo

Dito em outras palavras a deduccedilatildeo parte de uma verdade geral (preshymissa maior) previamente aceita para afirmaccedilotildees particulares (premissas menores) A aceitaccedilatildeo da conclusatildeo depende das premissas se elas forem consideradas verdadeiras a conclusatildeo seraacute tambeacutem aceita Por isso todo conteuacutedo da conclusatildeo deve estar contido pelo menos implicitamente nas premissas

Ainda que jaacute se tenha compreendido o que caracteriza o processo dedutivo o leitor deve estar se perguntando como na praacutetica se redige

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 135

um paraacutegrafo argumentative que recorre a esse meacutetodo Para cumprir essa tarefa vamos conhecer o caso concreto adiante

Socircnia pouco antes de entrar em trabalho de parto foi internada na C liacuteshynica Nova Iguaccedilu Dor no Rio de Janeiro Necessitando de cuidados especiais o meacutedico plantonista recomendou a sua remoccedilatildeo para outro hospital Autorizada a saiacuteda da paciente ela foi conduzida por uma das enfermeiras ateacute o veiacuteculo da remoccedilatildeo um fusca Durante o trajeto deu- -se o parto vindo a morrer a parturiente e seus dois filhosEm accedilatildeo indenizatoacuteria a autora pleiteia indenizaccedilatildeo por danos morais Alega que a morte de sua filha e netos decorreu de negligecircncia da C liacuteshynicaEm contestaccedilatildeo sustenta a reacute que natildeo haacute relaccedilatildeo de causalidade entre a conduta da cliacutenica e os oacutebitos pois a autora foi informada de que a ambulacircncia estaria agrave sua disposiccedilatildeo em 2 horas e a transferecircncia soacute foi realizada antes em virtude da impaciecircncia da autora e de seus familiashyres que providenciaram a remoccedilatildeo em veiacuteculo particular

Retomemos brevemente o que o caso discute a autora ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria em face da cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor porque sua filha e netos faleceram apoacutes a realizaccedilatildeo de um parto dentro de um fusca quando eram transferidos para outro hospital jaacute que um meacutedico da cliacutenica (portanto preposto da prestadora de serviccedilos) entendeu que a parturiente necessitava de cuidados especiais o que natildeo conseguiria naquele estabelecimento em que foi atendida inicialmente

O que levou a autora a crer que faz jus ao ressarcimento por danos morais Provavelmente ela assim raciocinou

PREMISSA MAIOR (norma)

PREMISSA MENOR (fato)

CONCLUSAtildeO (junccedilatildeo das premissas)

0 Coacutedigo de Defesa do Conshysumidor estabelece em seu art 14 que ldquoo fornecedor de serviccedilos responde indepenshydentemente da existecircncia de culpa pela reparaccedilatildeo dos dashynos causados aos consumishydores por defeitos relativos agrave prestaccedilatildeo dos serviccedilosrdquo

A cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor natildeo tinha disponiacuteveis os reshycursos necessaacuterios para reashylizar o parto de minha filha e a remoccedilatildeo para outro hosshypital seria excessivamente demorada

A cliacutenica tem a responshysabilidade de me indeshynizar mesmo que natildeo tenha agido com culpa porque houve defeito na prestaccedilatildeo de seus serviccedilos

136 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Se assim ocorreu seu raciociacutenio para desenvolver o argumento de autoridade foi dedutivo Repare como a partir de uma afirmaccedilatildeo geral abstrata decorrente da norma foi possiacutevel apreciar os fatos do caso conshycreto e assim chegar agrave conclusatildeo desejada

Eacute importante ainda compreender como a empresa reacute prestadora de serviccedilos Cliacutenica Nova Iguaccedilu Dor teria desenvolvido um argumento de sua contestaccedilatildeo por meio do procedimento dedutivo

Lembremos que a autora sustenta a tese de que houve prestaccedilatildeo deshyfeituosa do serviccedilo Por serviccedilo defeituoso nos termos do art 14 sect 1deg I do CDC entende-se aquele que natildeo fornece a seguranccedila que o consumidor dele pode esperar levando-se em consideraccedilatildeo as circunstacircncias relevanshytes entre as quais o modo de seu fornecimento

Ora se o meacutetodo dedutivo eacute uma inferecircncia que parte do geral (norshyma) para o particular (fato) eacute fundamental buscar amparo na norma - preshyferencialmente no proacuteprio Coacutedigo de Defesa do Consumidor - para dizer que natildeo haacute obrigaccedilatildeo de indenizar

Com esse propoacutesito veja o que dispotildee o art 14 sect 3o II do CDC o fornecedor de serviccedilos soacute natildeo seraacute responsabilizado quando provar a culpa exchisiva do consumidor ou de terceiro Poreacutem seraacute que existe algum fato que demonstre ter sido a culpa da morte da parturiente e de seus dois filhos decorrente de culpa de terceiro Lendo novamente o caso concreto seraacute possiacutevel atentar para o fato de que a paciente foi removida em veiacuteculo particular por seus proacuteprios familiares em vez de esperar a remoccedilatildeo adequada (por ambulacircncia) o que na visatildeo da empresa prestadora de serviccedilos foi determinante para que as mortes ocorressem

O argumento de autoridade produzido pela empresa reacute pelo meacutetodo dedutivo ficaria assim estruturado

PREMISSA MAIOR (norma)

PREMISSA MENOR(fato)

CONCLUSAtildeO (junccedilatildeo das premissas)

0 Coacutedigo de Defesa do Consumidor estabelece em seu art 14 sect 3o II que ldquoo fornecedor de sershyviccedilos soacute natildeo seraacute responshysabilizado quando provar a culpa exclusiva do conshysumidor ou de terceirordquo

Autorizada a saiacuteda da paciente ela foi conduzida ateacute o veiacuteculo da remoccedilatildeo um fusca A transshyferecircncia soacute foi realizada antes em virtude da impaciecircncia da autora e de seus familiares que providenciaram a remoccedilatildeo em veiacuteculo particular

A remoccedilatildeo inadequada da paciente foi motivo sushyficiente para causar-lhe a morte A culpa eacute exclushysiva de terceiros - seus familiares

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 137

Vocecirc deve ter percebido que houve uma busca pelos fatos que se ldquo encaixassemrdquo agrave norma ldquoadequadardquo para defender a tese escolhida Esse procedimento eacute dedutivo e se caracteriza pela subsunccedilatildeo do fato agrave norma

Por tudo o que se viu eacute indiscutiacutevel a importacircncia do raciociacutenio deshydutivo para o Direito no Brasil Jaacute mencionamos que para a dogmaacutetica juriacutedica tradicional os profissionais que atuam na soluccedilatildeo de conflitos leshyvados ao Judiciaacuterio deveriam encontrar o sentido do direito preferencialshymente no sistema de normas escritas que regulam a vida social de um determinado povo (direito positivo)

Isso implica dizer que tradicionalmente o meacutetodo dedutivo tem sido privilegiado na praacutetica juriacutedica Existem situaccedilotildees em que a pretensatildeo da parte eacute acolhida de forma quase inequiacutevoca pela norma o dispositivo legal natildeo tem interpretaccedilotildees ambiacuteguas ou diacutespares Tanto a doutrina quanto a jurisprudecircncia jaacute fixaram entendimento favoraacutevel ao interesse da parte En- lim em lides com esse perfil recorrer agrave norma e realizar a subsunccedilatildeo dos fatos a ela (meacutetodo dedutivo manifestado pelo silogismo) eacute com certeza a melhor opccedilatildeo

Mas seraacute que o meacutetodo dedutivo eacute sempre o mais apropriado para redigir paraacutegrafos argumentativos

Haacute momentos em que a norma dispotildee de forma muito geneacuterica como devem proceder as pessoas na vida social Haacute ainda casos em que a aplicaccedilatildeo fria da lei toma-se indiscutivelmente pouco razoaacutevel Ou seja natildeo satildeo poucos os contextos em que partir da norma em abstrato para solushycionar conflitos juriacutedicos seraacute uma escolha pouco produtiva

A recomendaccedilatildeo entatildeo eacute observar os acontecimentos do conflito em discussatildeo e comparar esses fatos com os de outros casos e daiacute extrair certas regularidades de conduta e de valor Isso que dizer que a norma a ser aplicada e a interpretaccedilatildeo a ela cabiacutevel satildeo extraiacutedas a partir da observaccedilatildeo dos fatos O raciociacutenio vai do particular para o geral

E importante assinalar tambeacutem que eacute um equiacutevoco pensar que indushyccedilatildeo e deduccedilatildeo satildeo procedimentos essencialmente argumentativos Vaacuterias outras ciecircncias recorrem a esse meacutetodo para produzir seus conhecimentos especiacuteficos

Em uma pesquisa eleitoral por exemplo a estatiacutestica utiliza com freshyquecircncia a induccedilatildeo Por meio de amostragem de eleitores realiza-se a pesquishysa que seraacute utilizada para encontrar o percentual de votos que cada um dos candidatos receberaacute no dia da votaccedilatildeo E claro que a validade dos resultados depende da representatividade da amostra de eleitores escolhidos

138 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Contudo o que nos interessa eacute como a induccedilatildeo pode ajudar os opeshyradores do direito a alcanccedilar seus objetivos em situaccedilatildeo de argumentaccedilatildeo Observe o raciociacutenio que se desenvolve adiante um advogado pretende sustentar em juiacutezo no ano de 2002 que seu cliente - com 75 anos de idade e com grau de escolaridade elevado - foi ludibriado ao assinar um contrato de concessatildeo de creacutedito em um banco que faz propagandas na televisatildeo oferecendo altas taxas de juros mas muitas outras facilidades para os aposhysentados Pretende o advogado conseguir a anulaccedilatildeo do contrato sem o pagamento dos juros pactuados no momento da assinatura do contrato

Por que deve o negoacutecio juriacutedico ser desfeito Que tipo de viacutecio foi observado A proposta argumentativa do advogado eacute sustentar que em deshycorrecircncia da idade do contratante ele era mais vulneraacutevel que outra pessoa rfiais jovem ainda que possuiacutesse alto grau de escolaridade Seria facilmente acolhida essa tese naquele ano Lembre que o Estatuto do idoso29 somente foi sancionado pelo Presidente da Repuacuteblica em outubro de 2003

Ainda assim em 2002 o advogado poderia afirmar - por induccedilatildeo- que seu cliente por ser idoso deve receber tratamento mais favoraacutevel da lei porque o Estado protege o mais fraco A argumentaccedilatildeo seguiria o seguinte raciociacutenio

REFLEXAtildeO CONCLUSAtildeO

Ainda que homens e mulheres sejam iguais em direitos e obrigaccedilotildees (art 5o I da CRFB) a mulher recebeu da Carta Magna direitos de proteccedilatildeo mais amplos que os hoshymens no mercado de trabalho Leia o art 7o XX da CRFB ldquosatildeo direitos dos trabalhadores urbanos e rurais aleacutem de outros que visem agrave melhoria de sua condiccedilatildeo social proteccedilatildeo do mercado de trabalho da mulher mediante incentivos especiacuteficos nos termos da leirdquo

Homens e mulheres satildeo iguais perante a lei mas quando um fica em situaccedilatildeo de desvantashygem em relaccedilatildeo ao outro o leshygislador originaacuterio tenta proteger o hipossuficiente e restabelecer a igualdade

29 Apoacutes sete anos tramitando no Congresso o Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e sancionado pelo presidente da Repuacuteblica no mecircs seguinte ampliando os direitos dos cidadatildeos com idade acima de 60 anos Mais abrangente que a Poliacutetica Nacional do Idoso lei de 1994 que dava garantias agrave terceira idade o estatuto institui penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadatildeos da terceira idade Disponiacutevel em lthttpwwwserasacombrguiaidoso20htmgt Acesso em 3 fev 2008

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 139

REFLEXAtildeO CONCLUSAtildeO

No art 170 da CRFB lecirc-se que ldquoa ordem ecoshynocircmica fundada na valorizaccedilatildeo do trabalho humano e na livre iniciativa tem por fim asshysegurar a todos existecircncia digna conforme os ditames da justiccedila socialrdquo Entretanto o incisoV do mesmo artigo assinala que apesar desshysa liberdade a defesa do consumidor deve ser promovida

As relaccedilotildees econocircmicas no Brashysil satildeo regidas pela liberdade mas o consumidor deve receber tutelas especiacuteficas em relaccedilatildeo agraves empresas porque nessa relaccedilatildeo tendem a ser hipossu- ficientes

O Coacutedigo Penal brasileiro prevecirc vaacuterias conshydutas tiacutepicas que seratildeo punidas caso alguma pessoa resolva praticaacute-las Em geral qualquer um independente de sexo condiccedilatildeo social profissatildeo etc estaraacute sujeito agraves sanccedilotildees ali previstas mas a crianccedila e o adolescente - que satildeo seres ainda em desenvolvimento- receberam amparo de legislaccedilatildeo especiacuteshyfica (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente)

Todos satildeo iguais perante a lei mas crianccedilas e adolescentes por sua condiccedilatildeo peculiar de seres em formaccedilatildeo ou seja por serem hipossuficientes satildeo protegidos com maior amplitude pelo Estado

Observe o esquema

0 Estado protege de maneirapeculiar as mulheres nas relaccedilotildeesde trabalho porque haacute situaccedilotildeesespeciacuteficas em que elas estatildeo

em desvantagem em relaccedilatildeo aoshomens

O Estado protege de maneira peculiar as crianccedilas e os

adolescentes porque satildeo mais fracos que os adultos

0 Estado protege de maneirapaculiar os consumidores nas

relaccedilotildees de consumo porque haacutesituaccedilatildeo especiacutefica em que eles

estatildeo em desvantagem em ralaccedilatildeoas empresas

J

O Estado deve proteger o

hipossuficiente tal como o satildeo os

idosos

140 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Para melhor ilustrar esse procedimento vejamos mais um caso concreto

Roberto Veloso ajuizou accedilatildeo indenizatoacuteria em face de Agecircncia de Viashygens Solimar Ltda e Hotel Fazenda Cruzeiro pretendendo o ressarcishymento pelos danos sofridos em acidente que lhe causou tetraplegia O autor afirma haver contratado com a primeira reacute pacote de turismo com excursatildeo para Serra Negra em Satildeo Paulo onde se hospedou nas instalaccedilotildees da segunda reacute por volta das 22hNa mesma noite ao dar um mergulho em uma das piscinas do hotel o autor bateu violentamente no piso da piscina que estava vazia Susshytentou inexistir qualquer aviso nem mesmo um obstaacuteculo ou uma coshybertura que impedisse o acesso dos hoacutespedes agravequele local Postula o ressarcimento a tiacutetulo de dano proveniente de relaccedilatildeo de consumo que o deixou tetrapleacutegico aos 21 anos de idadeEm contestaccedilatildeo a segunda reacute aduz que o autor apoacutes ingerir bebidas alcooacutelicas resolveu por volta das 3h usar a piscina existente no hotel na qual jaacute se banhavam alguns amigos seus o que evidencia natildeo se encontrar completamente vaziaEsclarece ainda que o autor utilizou a piscina apoacutes o horaacuterio de seu regular funcionamento e ao fazer uso de um escorregador para crianshyccedilas mergulhou de cabeccedila em local onde a profundidade era de 110 m Sustenta haver culpa exclusiva da viacutetima

Retomando as questotildees de maior relevacircncia deve ficar evidente que o autor Roberto Veloso deseja ser indenizado porque ficou tetrapleacutegico em acidente motivado pela falta de informaccedilatildeo do hotel em que se hospeshydou sobre os riscos que a piscina e seus acessoacuterios podiam oferecer

Uma das questotildees importantes a serem enfrentadas no caso concreto eacute se foi respeitado o princiacutepio da informaccedilatildeo que rege as relaccedilotildees de conshysumo Perceba que natildeo haacute duacutevidas de que o direito agrave informaccedilatildeo natildeo pode ser negado agrave parte hipossuficiente dessa relaccedilatildeo juriacutedica ou seja o autor consumidor

O que estaacute em discussatildeo portanto natildeo eacute a existecircncia do direito mas como ele deveria ser observado no caso em anaacutelise Em outras palashyvras estaacute em discussatildeo quais procedimentos deveria ter adotado a empreshysa neste caso concreto para que o direito agrave informaccedilatildeo fosse adequado e claro

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO

O QUE DETERMINA A LEGISLACcedilAtildeO

O autor sustenta com base no art 6o III do CDC que eacute um direito baacutesico do consushymidor a informaccedilatildeo adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem

a) Existia aviso no local do fato que indicava o horaacuterio de funcionamento daqueshyle serviccedilo oferecido pelo hotel

b) Os hoacutespedes deveriam receber folhetos informativos no momento do check in sobre o horaacuterio de todos os serviccedilos que satildeo oferecidos

c) Apenas informar o horaacuterio de funcionamento eacute suficiente ou algum outro procedimento seria indispensaacutevel

d) O desrespeito pelo consumidor das orientaccedilotildees sobre o horaacuterio de funcioshynamento da piscina exime a empresa de qualquer responsabilidade

e) Seria necessaacuterio tambeacutem disponibilizar um funcionaacuterio por tempo integral para guardar aquele local por se tratar de aacuterea de potencial risco para os hoacutespedes Isso seria razoaacutevel

f) A piscina deveria estar pelo menos cercada para evitar o afogamento de crianccedilas muito pequenas ou mesmo animais

g) Seria necessaacuterio ainda cobrir a piscina

h) Cobrir a piscina natildeo traria mais riscos que vantagens conforme se pocircde verificar nos inuacutemeros casos de afogamento de crianccedilas que caiacuteram por pequenas brechas nas bordas se afogaram sem que qualquer pessoa pudesse imaginar que estavam sob a lona

i) O hotel teve comportamento imprudente ou negligente nessas tarefas

j) Quaisquer dessas providecircncias se adotadas pela empresa impediriam que um jovem de 21 anos alcoolizado que pretendesse efetivamente entrar na piscina conseguisse fazecirc-lo de qualquer forma

k) Natildeo parece claro que um escorregador para crianccedilas localiza-se na parte mais rasa da piscina e por isso natildeo deve ser usado por adultos

Mas o que era nessa hipoacutetese dar informaccedilatildeo adequada para que o acidente natildeo ocorresse

ALGUNS DOS QUESTIONAMENTOS POSSIacuteVEIS

142 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Pelo esquema acima deve ter ficado claro que natildeo haacute como realizar pura subsunccedilacirco dos fatos agrave norma porque por sua proacutepria natureza a inshyterpretaccedilatildeo mais adequada da norma deve ser ainda discutida

A comparaccedilatildeo com outras situaccedilotildees tambeacutem pode ajudar a estabeleshycer o que se deve entender no caso analisado por ldquo direito agrave informaccedilatildeordquo

COMPARACcedilAtildeO COM ALGUMAS OUTRAS SITUACcedilOtildeES FAacuteTICAS

a) Existe diferenccedila entre o caso do autor e o de uma consumidora que escorreshyga dentro de um supermercado porque o piso estava molhado

b) Avisar que o piso estaacute escorregadio com um pequeno cavalete amarelo onde se lecirc ldquocuidado Piso molhadordquo eacute suficiente para excluir a responsabilidade de um sushypermercado Esse entendimento seria semelhante ao que deveria ter sido adotado para o escorregador na aacuterea da piscina

c) Se o mesmo acidente ocorrido com o autor se desse sem a suspeita de a viacutetima estar alcoolizada a situaccedilatildeo se alteraria

d) Se o acidente natildeo ocorresse em uma propriedade particular mas em uma praccedila a obrigaccedilatildeo do Estado teria natureza juriacutedica diferente ou ainda estaria caracshyterizada a responsabilidade civil objetiva

Enfim para responder agrave questatildeo principal (direito de informaccedilatildeo) e solucionar esse caso concreto o meacutetodo dedutivo mostra-se ineficiente pois a aplicaccedilatildeo objetiva da norma via subsunccedilacirco natildeo permite esclarecer as inuacutemeras dificuldades que lhe peculiarizam Mais produtivo seria forshymular um argumento pelo meacutetodo indutivo o qual consiste em um movishymento que parte de casos particulares para concluir uma verdade geral

No caso concreto em anaacutelise portanto natildeo basta reconhecer o direito do autor a ter informaccedilotildees claras sobre o serviccedilo que lhe eacute prestado eacute neshycessaacuterio ainda compreender - por induccedilatildeo - o que significa esse direito e quais obrigaccedilotildees gera para a prestadora de serviccedilo

Com esse propoacutesito o argumentador precisaria recorrer a situaccedilotildees anaacutelogas para delas extrair uma ldquo regularidaderdquo o que o ajudaria a detershyminar uma interpretaccedilatildeo especiacutefica e eficiente da ldquonormardquo para o caso anashylisado Pode-se dizer entatildeo que na induccedilatildeo a conclusatildeo enuncia algo que supera a informaccedilatildeo contida nas premissas possibilitando ampliar os conhecimentos

Muitos acadecircmicos de Direito podem em especial no iniacutecio de sua formaccedilatildeo teacutecnico-profissional natildeo dimensionar com exatidatildeo a dificuldade

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 143

ile se delimitar o que seria ldquo informaccedilatildeo adequada e clarardquo em casos como o de Roberto Veloso Alguns diriam ser absurdo um jovem de 21 anos descer por um escorregador de crianccedila e natildeo perceber que a piscina estava vazia (ou quase vazia) e acreditam de imediato na alegaccedilatildeo da reacute quando afirma que a viacutetima estava alcoolizada

Para demonstrar a relevacircncia dessa discussatildeo enriqueceremos essa explicaccedilatildeo com um caso publicado na Revista Eacutepoca30 em que se denunshycia a falta de seguranccedila de um dispositivo do carro Fox da montadora Volkswagen Usado para rebater o banco traseiro isto eacute para aumentar o tamanho da mala deitando o banco traseiro o usuaacuterio (consumidor) deshyveria utilizar um dispositivo em forma de argola O problema eacute que essa argola quando acionada de forma errada decepou parte do dedo de oito donos dessa marca de automoacutevel somente no Brasil

A questatildeo veio a puacuteblico quando um dos consumidores buscou auxiacuteshylio no Procon para ajuizar accedilatildeo em face da Volkswagen e ser indenizado Alega natildeo ter sido informado de forma adequada e suficiente sobre os risshycos que o dispositivo pode oferecer A montadora nega que haja informashyccedilatildeo insuficiente ou inadequada e que o mecanismo eacute seguro razatildeo pela qual natildeo haacute necessidade de realizar recall3I

Oportuno eacute ressaltar que os especialistas na aacuterea divergem quanto agrave seguranccedila do dispositivo e a necessidade de alertas mais especiacuteficos ao consumidor ao realizar o procedimento de rebater o banco traseiro Mas o leitor deve estar se perguntando como afinal a empresa orientou seus consumidores a realizarem esse procedimento

30 MACHADO Flaacutevio A armadilha do Fox In Caderno Sociedade Ediccedilatildeo ndeg 507 de 31 de janeiro de 2008 Disponiacutevel tambeacutem em lthttprevistaepocaglobocomRevista Epoca0bdquoEDG81441-601400htmlgt Acesso em 07 fev 2008

31 Um recall (do inglecircs ldquochamar de voltardquo ldquochamamentordquo ) ou recolha de produto eacute uma solicitaccedilatildeo de devoluccedilatildeo de um lote ou de uma linha inteira de produtos feita pelo fabricante do mesmo Geralmente isso ocorre pela descoberta de problemas relativos agrave seguranccedila do produto O recall eacute uma tentativa de limitar a responsabishylidade por negligecircncia corporativa (a qual pode motivar severas puniccedilotildees legais) e aprimorar ou evitar danos agrave publicidade da empresa Os recalls custam caro para as empresas porque frequentemente envolvem a substituiccedilatildeo do produto recolhido ou o pagamento pelos danos causados pelo seu uso embora possivelmente custem menos do que os custos indiretos que se seguem aos danos agrave imagem da empresa e agrave perda de confianccedila no fabricante Recalls satildeo comuns na induacutestria automobishyliacutestica poreacutem jaacute haacute alguns anos tecircm sido estendidos a outros tipos de produtos como medicamentos e brinquedos Disponiacutevel em lthttpptwikipediaorgwiki Recallgt Acesso em 07 fev 2008

144 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Haacute dois momentos em que a empresa ensina a rebater o banco traseishyro e em ambos alerta para o risco de ldquo acidentesrdquo no manual do usuaacuterio e em um adesivo colado atraacutes do banco bem ao lado do dispositivo em questatildeo Entenda o problema que o mecanismo apresenta

ARGOLA DESLEALEntenda o erro que pode decepar um dedo

O manual do Volkswagen Fox orienta o proprietaacuteshyrio a fazer o rebatimento do banco pela traseira do carro com a porta do porta-malas aberta

O primeiro passo para rebater o banco eacute destrashyvar o encosto Para isso basta puxar uma alccedila flexiacutevel que fica presa numa argola de metal

Acidentes ocorrem quando a pessoa instintivamente coloca o dedo na argola de metal Destravado o meshycanismo puxa a argola com forccedila o que pode decepar a ponta do dedo

(Disponiacutevel em lthttprevistaepocaglobocomRevistaEpoca0bdquoEDG81441-6014-50700 htmlgt Acesso em 02 set 2012)

Essas duas oportunidades (manual do usuaacuterio e adesivo colado ao lado do dispositivo) representam informaccedilatildeo clara e suficiente para o consumidor O engenheiro Maacutercio Montesani diretor do Nuacutecleo de Periacutecias Teacutecnicas de Satildeo Paulo analisou o rebatimento do Fox e entende que natildeo o satildeo Especialista em periacutecias automotivas ele critica o sistema e o manual ldquoHaacute erro de projeto O dispositivo induz o usuaacuterio a colocar o dedo instintivamente na argola o que pode resultar em mutilaccedilatildeo O manual deveria prevenir sobre falhas na operaccedilatildeo e dizer como proceder na ausecircncia da alccedilardquo

Se existe portanto qualquer oportunidade de induzir o consumidor- parte hipossuficiente da relaccedilatildeo juriacutedica - a erro e causar-lhe dano a inshyformaccedilatildeo natildeo pode ser dita suficiente e clara Trata-se de conduta culposa motivadora de dano com o qual guarda nexo de causalidade

Cap V - FUNDAMENTACcedilAtildeO E TIPOS DE ARGUMENTO 145

Por fim para facilitar a compreensatildeo do tema deste capiacutetulo estashybeleceremos uma comparaccedilatildeo esquemaacutetica entre os meacutetodos dedutivo e indutivo Observe a seguir

MEacuteTODO DEDUTIVO MEacuteTODO INDUTIVOParte de uma verdade geral para cheshygar a afirmaccedilotildees particulares

Parte de casos particulares para conshycluir uma verdade geral

A aceitaccedilatildeo da conclusatildeo depende das premissas se as premissas forem vershydadeiras a conclusatildeo eacute verdadeira

A conclusatildeo enuncia algo que supera a informaccedilatildeo contida nas premissas posshysibilitando ampliar os conhecimentos

Frequentemente operacionaliza-se por meio do silogismo Premissa Maior + Premissa Menor = Conclusatildeo

Frequentemente recorre agrave comparashyccedilatildeo para reconhecer uma regularidade entre os fatos avaliados e dali extrair os valores juridicamente adequados ao caso concreto

Capiacutetulo VI

PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

Inicialmente precisamos justificar a abordagem que adotamos para o tema neste capiacutetulo Natildeo caberia aprofundar conceitos doutrinaacuterios relashytivos agrave distinccedilatildeo entre os princiacutepios gerais do direito e as regras juriacutedicas por meio da abordagem de correntes tampouco classificar de forma sisteshymaacutetica os princiacutepios distribuiacutedos por aacutereas do direito e estabelecer regras hermenecircuticas para seu campo de atuaccedilatildeo Esse natildeo eacute o nosso objetivo

Pretendemos esclarecer isso sim como tais normas podem ser utilizadas para compor o texto argumenlativo juriacutedico e qual o efeito que se extrai desse procedimento dada a relevacircncia atual atribuiacuteda a essa fonte do direito de nashytureza estruturante de todo o sistema

61 PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E REGRAS

Considerando que os princiacutepios refletem valores eacuteticos e morais de uma determinada sociedade bem como garantias miacutenimas de um Estado Democraacutetico de Direito eacute fundamental que se compreenda o significado de ldquovalores moraisrdquo e ldquo valores eacuteticosrdquo De forma breve vamos esclarecer esses conceitos

611 Os valores morais

Ao falarmos de valor vecircm agrave nossa mente a utilidade a beleza a bonshydade a justiccedila o respeito a confianccedila etc O homem ser histoacuterico-social atribui esses valores a coisas a seres agrave conduta humana Tal atribuiccedilatildeo deriva portanto da cultura e da relaccedilatildeo social Assim algo que se consishy

148 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dera ura valor em determinada eacutepoca pode deixar de secirc-lo em outra Por exemplo conforme evolui a tecnologia determinados objetos perdem sua utilidade sendo substituiacutedos por outros mais modernos assim tambeacutem satildeo os valores para o homem

E quando o valor eacute atribuiacutedo agrave conduta humana A conduta humana realizada de forma consciente e voluntaacuteria encarna valores morais Assim podem-se qualificar moralmente os atos dos indiviacuteduos ou de grupos soshyciais as intenccedilotildees desses atos os resultados as consequecircncias etc Satildeo os valores morais que direcionam a conduta humana Por exemplo quando uma mulher graacutevida em uma entrevista de emprego decide consciente e voluntariamente omitir sua gravidez tal decisatildeo foi guiada pelos valores morais adquiridos em sua formaccedilatildeo Da mesma maneira quando um casal de mepdigos encontra uma expressiva quantia em dinheiro e a devolve ao seu respectivo dono demonstra possuir um valor moral que estaacute acima da necessidade evidente dessa quantia

Haacute determinados valores morais considerados universais outros dishyzem respeito a uma determinada comunidade em um tempo e espaccedilo defishynidos A caridade por exemplo eacute um valor moral universal Espera-se que norteie o agir de qualquer pessoa em qualquer lugar e em qualquer eacutepoca Entretanto a fidelidade considerada no seu aspecto especiacutefico de relaccedilatildeo conjugal pode constituir um valor moral ou natildeo dependendo do costume da sociedade jaacute que para algumas a bigamia eacute praacutetica corrente

612 Os valores eacuteticos

Natildeo resta duacutevida de que o homem eacute dotado de uma consciecircncia moral- formada por valores universais e pelos especiacuteficos do seu ldquo aquirdquo e ldquo agoshyrardquo - geradora de regras que guiam seus juiacutezos e suas accedilotildees Certamente haacute uma conduta social esperada do ser humano em conformidade com essa consciecircncia moral A eacutetica seria essa conduta social geradora de conshysequecircncias que possibilitam a correta convivecircncia entre os homens com fulcro na preservaccedilatildeo da dignidade humana

A eacutetica fundamenta-se em uma seacuterie de praacuteticas morais essenciais que emergem da necessidade que todo indiviacuteduo possui de contribuir com a coletividade em prol do bem comum

Observa-se que a eacutetica adquire uma perspectiva social porquanto se considera que cada pessoa deva ser responsabilizada pelo seu agir consciente e pelas consequecircncias de suas escolhas no seio da sociedade Ora cada um tem uma ideia daquilo que deve ser feito Configura-se assim um viacutenculo entre eacuteti-

ca e Direito jaacute que essa convicccedilatildeo pode servir de criteacuterio para que se expresse um juiacutezo e se avalie ser justa ou natildeo uma conduta nas relaccedilotildees interpessoais

Com efeito um profissional liberal mesmo consciente de que natildeo tem condiccedilotildees de fornecer um serviccedilo mas se dispotildee a prestaacute-lo demonstra estar ferindo um valor que se espera estar presente nesse tipo de relaccedilatildeo a boa-feacute O homem a princiacutepio idealiza que seus semelhantes sejam dignos de confianccedila bem que se deseja preservar para que as relaccedilotildees humanas transcorram de forma harmocircnica Entretanto ao constatar que a conduta do fornecedor em vez de estar solidificada na boa-feacute demonstrou estar fincada na maacute-feacute ou na desiacutedia gera o repuacutedio da sociedade por considerar que feriu um valor moral e eacutetico

Com a crise do positivismo juriacutedico que natildeo se mostrou apto agrave consshytruccedilatildeo de uma sociedade harmocircnica e juridicamente justa a eacutetica e a moral ganharam novamente forccedila sobre o Direito ocorrendo a aproximaccedilatildeo entre direito e moral estreitando-se os viacutenculos entre eacutetica e Direito

Com o poacutes-positivismo1 e com o estabelecimento de valores como base constitucional impocircs-se um dever de fazer em que se concretizam os valores eacuteticos e morais - essecircncia dos princiacutepios antes apenas considerashydos como elementos externos agrave ciecircncia do direito Observemos entatildeo de que maneira esses valores eacuteticos e morais compotildeem os princiacutepios

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

613 Diferenccedilas entre princiacutepios e regras

O Direito se concretiza mediante normas que se constituem em prinshyciacutepios e regras Os princiacutepios satildeo compostos por valores morais e eacuteticos

ldquoA dicotomia entre direito e moral foi um dos traccedilos caracteriacutesticos do positivismo juriacutedico que veio a desmoronar ante a constataccedilatildeo de que um ordenamento juriacutedico positivo pode encarnar contornos crueacuteis aos ideais de justiccedila que se pretende das normas juriacutedicas o que levou ao questionamento da tese positivista quando do estabelecimento do Estado de Direito pondo em questionamento tambeacutem as relashyccedilotildees entre o direito a moral e a eacutetica o que exigiu a reformulaccedilatildeo de alguns conshyceitos como a superaccedilatildeo da riacutegida distinccedilatildeo entre direito e moral e agrave consequente abertura do debate filosoacutefico-juriacutedico contemporacircneo aos valores eacutetico-poliacuteticosrdquo (SANTOS Karina Alves Teixeira A relaccedilatildeo entre o Direito e a Moral e suas conshysequecircncias no Poacutes-Positivismo Disponiacutevel em lthttpAvwwconteudojuridico combrartigo a-relacao-entre-o-direito-e-a-moral-suas-consequencias-no-pos-po- sitivismo38077htmlgt Acesso em 02 set 2012)

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

que servem de alicerce para todo o ordenamento juriacutedico Segundo Luiacutes Roberto Barroso2

O novo seacuteculo se inicia fundado na percepccedilatildeo de que o Direito eacute um sistema aberto de valores A Constituiccedilatildeo por sua vez eacute um conjunto de princiacutepios e regras destinados a realizaacute-los a despeito de se recoshynhecer nos valores uma dimensatildeo suprapositiva A ideia de abertura se comunica com a Constituiccedilatildeo e traduz a sua permeabilidade a eleshymentos externos e a renuacutencia agrave pretensatildeo de disciplinar por meio de reshygras especiacuteficas o infinito conjunto de possibilidades apresentadas pelo mundo real Por ser o principal canal de comunicaccedilatildeo entre o sistema de valores e o sistema juriacutedico os princiacutepios natildeo comportam enumeraccedilatildeo taxativa mas naturalmente existe um amplo espaccedilo de consenso em que tecircm lugar alguns dos protagonistas da discussatildeo poliacutetica filosoacutefica e juriacutedica do seacuteculo que se encerrou Estado de direito democraacutetico liberdade igualdade justiccedila

De fato os princiacutepios normatizam um nuacutemero ilimitado de situaccedilotildees cujas previsotildees legais podem estar ou natildeo positivadas pelas regras Aliaacutes como o sentido de justiccedila nem sempre se associa agrave aplicaccedilatildeo de uma reshygra ao caso concreto vale-se o Direito dos princiacutepios jaacute que conforme a citaccedilatildeo de Luiacutes Roberto Barroso esses sustentam a preservaccedilatildeo de valoshyres essenciais como Estado de direito democraacutetico liberdade igualdade e justiccedila

Quanto agraves regras essas tecircm caraacuteter especiacutefico incidem sobre uma determinada conduta Conforme sustenta o Desembargador Seacutergio Cava- lieri Filho3

Regras satildeo proposiccedilotildees normativas que contecircm relatos objetivos desshycritivos de determinadas condutas aplicaacuteveis a hipoacuteteses bem definidas perfeitamente caracterizadas sob a forma de tudo ou nada Ocorrendo a hipoacutetese prevista no seu relato a regra deve incidir de modo direto e automaacutetico pelo mecanismo da subsunccedilatildeo O comando eacute objetivo e natildeo daacute margem a elaboraccedilotildees mais sofisticadas acerca da sua incidecircncia A aposentadoria compulsoacuteria aos 70 anos eacute um bom exemplo de regra que incide automaticamente quando o servidor atinge essa idade

Sintetizando as noccedilotildees ateacute aqui registradas observe o esquema

Registre-se ainda a importacircncia da Loacutegica do Razoaacutevel na aplicaccedilatildeo dos princiacutepios uma vez que essa loacutegica tem como fundamento a ponderashyccedilatildeo o equiliacutebrio a busca do justo com fulcro nos valores emanados desses princiacutepios Ademais uma conclusatildeo alcanccedilada por meio dessa loacutegica poderaacute substituir outra subsumida de uma operaccedilatildeo dedutiva Representa dizer que uma decisatildeo judicial pode estar em desconformidade com a regra mas jashymais em desacordo com os princiacutepios que balizam o ordenamento juriacutedico

Tal desacordo eacute fruto do inteacuterprete do Direito - ser histoacuterico e social- que natildeo apenas associa o caso concreto agrave regra e dessa operaccedilatildeo extrai a conclusatildeo contida na proacutepria regra (subsunccedilatildeo) seguindo a loacutegica formal mas principalmente analisa as peculiaridades do caso concreto valoranshydo-as conforme a sua eacutepoca e o seu espaccedilo e simultaneamente interpreta as fontes do Direito de forma sistemaacutetica Tal interpretaccedilatildeo visa a capturar o espiacuterito dessas fontes seu real alcance isto eacute pretende entender como poderatildeo proporcionar o bem-estar social E esse um exerciacutecio de ponderashyccedilatildeo que somente a loacutegica do razoaacutevel permite executar

62 A RELEVANCIA NORTEADORA DOS PRTNCIPIOS A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS

A partir da anaacutelise de um caso concreto avaliaremos a relevacircncia dos princiacutepios e da loacutegica do razoaacutevel na formulaccedilatildeo dos argumentos Para tal tambeacutem mencionaremos uma regra especiacutefica cabiacutevel ao caso concreto

BARROSO Luis Robero Fundamentos teoacutericos e filosoacuteficos do novo Direito Constishytucional brasileiro Jus Navigandi Teresina ano 7 n 59 1 out 2002 Disponiacutevel em lthttpjuscombrrevistatexto3208gt Acesso em 27 ago 2012CAVALIERI FILHO Seacutergio Programa de Direito do Consumidor 3 ed Satildeo Paushylo Atlas 2011 p 25

JL

Estado do Rio daacute a religiosos direito de recusar transfusatildeoMatheus Leitatildeo

O Estado do Rio vai reconhecer o direito dos fieacuteis da igreja Testemushynhas de Jeovaacute de recusar transfusatildeo de sangue por motivos religiosos

152 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A decisatildeo se refere ao caso de uma praticante de 21 anos que foi intershynada com doenccedila pulmonar grave e se negou a receber o tratamento o que gerou uma consulta do hospital envolvido agrave Procuradoria-Geral do Estado O caso ficou cm estudo por quatro mesesNesta semana a procuradora-geral Lucia Lea Guimaratildees Tavares resshyponderaacute que se trata de ldquoexerciacutecio de liberdade religiosardquo Segundo o parecer ao qual a Folha teve acesso esse eacute ldquoum direito fundamental emanado da dignidade da pessoa humana que assegura a todos o direito de fazer suas escolhas existenciaisrdquoldquoA minha convicccedilatildeo eacute que a pessoa tem direito a escolher desde que seja maior e esteja consciente Natildeo eacute um tema muito simples manter a vida de um paciente mas desrespeitando aquilo em que ele mais acreditardquo disse a ProcuradoraA Folha apurou que o governador Seacutergio Cabral acataraacute o parecer transformando-o numa norma estadual no Rio com poder de deshycretoA determinaccedilatildeo contraria parecer do Conselho Federal de Medicina que diz ldquoSe houver iminente perigo de vida o meacutedico praticaraacute a transshyfusatildeo de sangue independente do consentimento do paciente ou de seus responsaacuteveisrdquo A Procuradora do Rio vai entrar com uma Accedilatildeo Direta de Inconstitu- cionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal) para discutir a consti- tucionalidade do parecer dos meacutedicosSe o precedente aberto no Rio for acatado pelo STF os cristatildeos da ldquoTesshytemunhas de Jeovaacuterdquo teratildeo amparo legal para a manutenccedilatildeo do que conshysideram seus direitos

Divergecircncias

O assunto eacute tatildeo polecircmico que houve inicialmente divergecircncia dentro da Procuradoria do Estado do Rio Diante disso a procuradora-geral Lucia Lea pediu um estudo sobre o tema ao constitucionalista Luis Roberto BarrosoldquoA liberdade religiosa eacute um direito fundamental Pode o Estado proteger um indiviacuteduo em face de si proacuteprio para impedir que o exerciacutecio de lishyberdade religiosa lhe cause dano irreversiacutevel ou fatal A indagaccedilatildeo natildeo comporta resposta juridicamente simples nem moralmente baratardquo diz Barroso no estudoNo fim das 42 paacuteginas o texto conclui pelo reconhecimento do direito das testemunhas de Jeovaacute com a seguinte cautela ldquoA gravidade da reshycusa de tratamento sobretudo quando presente o risco de morte ou de

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 153

grave lesatildeo exige que o consentimento seja genuiacuteno o que significa dizer vaacutelido inequiacutevoco livre informadordquo 4

Algumas questotildees referentes ao caso concreto e aos posicionamentos registrados merecem anaacutelise

Com relaccedilatildeo ao caso concreto destacam-se os seguintes fatos a seshyrem valorados

a) Quem Jovem de 21 anos portanto de maioridade isto eacute ldquo idade legal em que uma pessoa eacute reconhecida como plenamente capaz e responsaacutevelrdquo (Dicionaacuterio Eletrocircnico Houaiss)

b) Por quecirc E Testemunha de Jeovaacute cuja religiatildeo proiacutebe a transfusatildeo de sangue

c) Doenccedila pulmonar grave risco de morted) Consultada a paciente se negou a ser submetida a transfusatildeoe) Anaacutelise do caso pela Procuradoria-Geral do Estado posicionamenshy

to favoraacutevel agrave liberdade de religiatildeo com imposiccedilatildeo de condiccedilotildeesf) Parecer contraacuterio do Conselho Regional de Medicina intervenccedilotildees

necessaacuterias sem o consentimento do paciente se houver risco de morte

g) Divergecircncia de opiniotildees na Procuradoria-Geral do Estado questatildeo complexa

h) Solicitaccedilatildeo de parecer sobre a questatildeo a constitucionalista renomado necessidade de aprofundar a anaacutelise devido agrave sua complexidade

i) Decisatildeo da Procuradoria favoraacutevel agrave vontade da paciente ressalvashydas algumas condiccedilotildees

Interessa-nos analisar as justificativas dessa decisatildeo Segundo a pro- curadora-geral Lucia Lea Guimaratildees Tavares deveraacute prevalecer o ldquo exerciacuteshycio de liberdade religiosardquo jaacute que esse eacute ldquo um direito fundamental emanado da dignidade da pessoa humana que assegura a todos o direito de fazer suas escolhas existenciaisrdquo

4 LEITAtildeO Matheus Estado do Rio de Janeiro daacute a religiosos direito de recusar transshyfusatildeo Folha de Satildeo Paulo Sucursal de Brasiacutelia 27 abr 2012 Disponiacutevel em lthttp wwwnoticiasjwbrothersorgrio-dc-janeiro-reconhece-o-direito-das-testemunhas- de-jeova-recusar-sanguegt Acesso em 27 ago 2012

154 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Observa-se a prevalecircncia do princiacutepio da dignidade humana que gashyrante a todas as pessoas liberdade religiosa acima da preservaccedilatildeo da vida que conforme o parecer meacutedico estaacute em risco em razatildeo de doenccedila pulshymonar grave Entretanto condiciona-se essa liberdade de escolha agrave idade e agrave consciecircncia das consequecircncias que essa opccedilatildeo acarreta

Como se pode observar pelo texto transcrito o posicionamento da Procuradora natildeo se coaduna com o parecer do Conselho Federal de Meshydicina que diz ldquo Se houver iminente perigo de vida o meacutedico praticaraacute a transfusatildeo de sangue independente do consentimento do paciente ou de seus responsaacuteveisrdquo Tambeacutem na proacutepria Procuradoria opiniotildees divergiram da conclusatildeo da procuradora-geral Por essa razatildeo foi solicitado um estudo a respeito do tema ao constitucionalista Luis Roberto Barroso

As questotildees que o constitucionalista propotildee expressam claramente a adoccedilatildeo da loacutegica do razoaacutevel em que pondera o que deve prevalecer o poder do Estado de proteger o indiviacuteduo de si mesmo ou o poder do indiviacuteshyduo de exercer sua liberdade religiosa e escolher o seu destino Conforme o proacuteprio autor sustenta natildeo eacute uma anaacutelise faacutecil mas decidiu adotar o mesmo entendimento da Procuradora-Geral apenas especificando o que ela certamente quis dizer com ldquo conscienterdquo isto eacute uma decisatildeo inequiacuteshyvoca livre e informada Ora mas em que se baseou o parecer do Conselho Federal de Medicina para emitir tal entendimento contrariando a posiccedilatildeo da procuradora-geral Possivelmente para o Conselho prevalece o prinshyciacutepio do direito agrave vida acima do direito de liberdade religiosa No entanto conforme Schreiber5

[] a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica coloca a liberdade de religiatildeo e o direishyto agrave vida no mesmiacutessimo patamar Aqui como em outros campos natildeo pode o inteacuterprete correr o risco de se agarrar agrave regra mais especiacutefica esquecendo os princiacutepios que lhe servem de fundamento de validade e que podem ser diretamente aplicados ao caso concreto A vontade do paciente deve ser respeitada porque assim determina a tutela da dignishydade humana valor fundamental do ordenamento juriacutedico brasileiro

A que regra especiacutefica estaria se referindo o doutrinador Destaqueshymos uma a que pode ser subsumida a hipoacutetese em exame art 146 do Coacuteshydigo Penal - ldquoConstranger algueacutem mediante violecircncia ou grave ameaccedila ou depois de lhe haver reduzido por qualquer outro meio a capacidade de resistecircncia a natildeo fazer o que a lei permite ou a fazer o que ela natildeo mandardquo

5 SCHREIBER Anderson Direitos da personalidade Satildeo Paulo Atlas 2011 p 52

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 155

O paraacutegrafo 3deg do referido dispositivo acentua ldquoNagraveo se compreendem na disposiccedilatildeo deste artigo 1 - a intervenccedilatildeo meacutedica ou ciruacutergica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal se justificada por iminente perigo de vida II - a coaccedilatildeo exercida para impedir suiciacutediordquo

De acordo com o artigo mencionado de fato o meacutedico estaria autorishyzado a contrariar a vontade do paciente caso sua intervenccedilatildeo possibilite a manutenccedilatildeo da vida do paciente Aleacutem disso estaria impedindo o paciente de se suicidar Mas a opccedilatildeo por natildeo se submeter a transfusatildeo de sangue poderia ser considerada suiciacutedio Pensamos que natildeo

Se assim o fosse tambeacutem seria suiciacutedio algueacutem se negar a tratamento quimioteraacutepico sendo esse o uacutenico recurso para prolongar sua vida mas esse paciente jamais foi denominado um suicida Tambeacutem o proacuteprio Conshyselho Federal de Medicina vem adotando o entendimento de que o paciente tem o direito de escolher se quer se submeter a tratamentos como esse

Portanto apesar de essa lei salvaguardar a intervenccedilatildeo do meacutedico alheia agrave vontade expressa do paciente a praacutetica vem demonstrando que se busca uma autorizaccedilatildeo judicial nesses casos Eacute cediccedilo que aleacutem da regra especiacutefica muitos julgadores apoiam-se no princiacutepio do direito agrave vida a fim de fundamentar sua decisatildeo de contrariar a vontade do paciente Para esses o direito agrave vida se sobrepotildee ao direito agrave liberdade religiosa conforme se verificaraacute no proacuteximo caso concreto6

Em fevereiro de 2009 o Hospital das Cliacutenicas da Universidade Fedeshyral de Goiaacutes conseguiu autorizaccedilatildeo da Justiccedila para fazer transfusatildeo de sangue em um paciente da religiatildeo Testemunha de Jeovaacute Em liminar o desembargador federal Fagundes de Deus do Tribunal Regional Federal da la Regiatildeo registrou que no confronto entre os princiacutepios constitucionais do direito agrave vida e do direito agrave crenccedila religiosa importa considerar que atitudes de repuacutedio ao direito agrave proacutepria vida vatildeo de enshycontro agrave ordem constitucional Para exemplificar lembrou que a legisshylaccedilatildeo infraconstitucional natildeo admite a praacutetica de eutanaacutesia e reprime o induzimento ou auxiacutelio ao suiciacutedioNa accedilatildeo a Universidade Federal de Goiaacutes autarquia responsaacutevel pelo Hospital das Cliacutenicas argumentou que o estado do paciente era grave e pedia com urgecircncia a transfusatildeo de sangue Explicou que o hospital eacute obrigado a respeitar o direito de autodeterminaccedilatildeo da pessoa humana reconhecido pela ordem juriacutedica nada podendo fazer sem autorizaccedilatildeo

6 MARTINS Geiza Fiel tem direito de recusar transfusatildeo de sangue Consultor Juriacutedico 8 mai 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2010-mai-08 legitimo-recusar-tratamento-saude-crenca-religiosagt Acesso em 26 ago 2012

156 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

da Justiccedila Aleacutem disso o hospital sustentou na accedilatildeo que o direito agrave vida eacute um bem indisponiacutevel cuja proteccedilatildeo incumbe ao Estado e que no caso concreto a transfusatildeo sanguiacutenea eacute a uacutenica forma de efetivaccedilatildeo de tal direitoPara o desembargador Fagundes de Deus ldquoo direito agrave vida porquanto o direito de nascer crescer e prolongar a sua existecircncia adveacutem do proacuteprio direito natural inerente aos seres humanos sendo este sem sombra de duacutevida primaacuterio e antecedente a todos os demais direitosrdquo Com isso autorizou a transfusatildeo

Como se pode constatar os princiacutepios ao mesmo tempo em que lishymitam a vontade subjetiva do aplicador do direito contecircm um grau de abstraccedilatildeo e de generalidade amplo que lhe permite exercer seu senso de razoabilidade de forma plena e consequentemente fazer a justiccedila do caso concreto

63 ORGANIZACcedilAtildeO HIERAacuteRQUICA DE ALGUMAS FONTES DO DIREITO NA ESTRUTURA ARGUMENTATIVA RAZOABILI- DADE PRINCIacutePIOS LEI DOUTRINA E JURISPRUDEcircNCIA

Embora natildeo se tenha nesta obra a intenccedilatildeo de abordar as diversas concepccedilotildees doutrinaacuterias sobre o tema ldquo fontes do direitordquo impotildee-se inishycialmente determinar o significado do termo ldquo fonterdquo que tem duas definishyccedilotildees especiacuteficas

Conforme Nunes fonte eacute a nascente da aacutegua e especialmente eacute a bica donde verte aacutegua potaacutevel para uso humano De forma figuratishyva entatildeo o termo fonte designa a origem a procedecircncia de alguma coisaEm Gusmatildeo fonte como metaacutefora significa a origem do direito ou seja de onde ele proveacutem7

Dessa forma em sentido amplo poder-se-ia dizer que fonte indica a origem de algo Jaacute associando o termo ao direito consideraremos ldquo fonte do direitordquo como o nascedouro de normas juriacutedicas que compotildeem esse sistema Muito embora se faccedila a distinccedilatildeo entre fontes materiais e fontes

7 Fontes do direito Disponiacutevel em lthttpwwwwebartigoscomartigosfontes-do- direito4192gt Acesso em 15 set 2012

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 157

formais fontes imediatas e fontes mediatas8 preferimos adotar o seguinte entendimento

O conceito-chave eacute o de ato juriacutedico enquanto condutas que positivam o direito e que satildeo executadas por diferentes centros emanadores dotashydos do poder juriacutedico de fazecirc-lo como o Estado e seus oacutergatildeos a proacutepria sociedade os indiviacuteduos autonomamente considerados etc O direito afirma-se emana desses atos que passam a ser considerados9

Assim conforme a origem e a forccedila com que se impotildeem esses atos assumem a hierarquizaccedilatildeo que determina sua aplicabilidade como elemenshytos norteadores na produccedilatildeo e na defesa de teses juriacutedicas Alguns desses atos resultam em leis decretos sentenccedilas contratos etc

Mais uma vez reforccedilamos que o nosso objetivo eacute pragmaacutetico isto eacute a aplicaccedilatildeo no texto de algumas fontes juriacutedicas a fim de que se avalie sua forccedila argumentativa Por essa razatildeo sugerimos a anaacutelise de um caso concreto e a possibilidade de produccedilatildeo textual em que se buscou utilizar algumas fontes do direito de forma hierarquizada Passemos ao caso conshycreto

Suponha que um menino de 9 anos pertencente atilde religiatildeo Testemunhas de Jeovaacute sofra de leucemia grave e segundo o meacutedico que o acomshypanha necessita urgentemente de transfusatildeo de sangue Os pais natildeo autorizaram a transfusatildeo Segundo eles o sangue eacute como se fosse uma digital algo inerente a cada pessoa que natildeo pode doar nem receber de ningueacutem No lugar da transfusatildeo pedem que sejam adotados tratamenshytos alternativosO meacutedico recorreu agrave justiccedila para obter autorizaccedilatildeo a fim de realizar a transfusatildeo

631 Proposta

Como utilizar as fontes do Direito em uma argumentaccedilatildeo que defenshyda a tese do meacutedico Oferecemos uma possibilidade de construccedilatildeo do texto

8 Sugere-se a leitura de CAVALIacuteERI FILHO Sergio Programa de sociologia juriacuteshydica Vocecirc conhece 8 ed Rio de Janeiro Forense 2000

9 FERRAZ JR Tercio Sampaio Introduccedilatildeo ao estudo do direito Teacutecnica decisatildeo dominaccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2001 p 221

158 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

e em seguida uma anaacutelise da utilizaccedilatildeo dos princiacutepios regra doutrina e jurisprudecircncia

O presente caso exige ponderaccedilatildeo cuidadosa entre dois princiacutepios o dishyreito agrave vida assegurado no artigo 5deg caput da Constituiccedilatildeo e o direito agrave liberdade religiosa no mesmo artigo inciso VI Tal cuidado se justifica em razatildeo de na hipoacutetese em anaacutelise estar em risco a vida (sofre de leucemia grave um menor impuacutebere portanto sem capacidade civil para optar entre esses dois direitos)

Seria pois razoaacutevel deixar a cargo de seus pais tal decisatildeo Estes lhe deram a vida mas conforme o ordenamento juriacutedico brasileiro nenhuma lei lhes confere o direito de tiraacute-la mas sim de preservaacute-la Destaque-se do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente o art 4deg que dispotildee dentre outros deveres da famiacutelia a efetivaccedilatildeo dos direitos referentes agrave vida e agrave sauacutede bens indisponiacuteveis

Acrescente-se ainda a orientaccedilatildeo fornecida por Luiz Roberto Barroso de que a ldquogravidade da recusa de tratamento sobretudo quando presente o risco de morte ou de grave lesatildeo exige que o consentimento seja genuiacuteno o que significa dizer vaacutelido inequiacutevoco livre informadordquo Ora no presente caso mesmo que o menor se manifestasse sua opccedilatildeo natildeo teria valor juriacutedico uma vez que o art 3deg do Coacutedigo Civil eiva dc nulidade a expressatildeo de sua vontade sobre a disposiccedilatildeo de sua vida Conforme o referido artigo ldquo satildeo absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vidardquo

Ademais em um paiacutes laico como o nosso natildeo deve o julgador deshycidir se determinado preceito biacuteblico eacute vaacutelido e se pode ser desobedecido Para aquele que tem feacute ir de encontro agraves suas crenccedilas e viver com a maacutecula de ter transgredido os dogmas da sua religiatildeo pode significar a morte em vida Entretanto seraacute que uma crianccedila estaria convicta de que a transfusatildeo de sangue lhe causaria algum dano O que estaacute em jogo a sauacutede fiacutesica c mental da crianccedila ou a consciecircncia dos pais Qual o dever do Estado A todas essas perguntas muito bem ponderadas soacute se pode chegar a uma resposta proteger a vida da pessoa que quando adulta e consciente das consequecircncias que seus atos iratildeo lhe impor poderaacute exercer com plenitude o direito agrave liberdade de religiatildeo

Por fim registre-se a decisatildeo da Juiacuteza Federal Dra Vacircnia Hack de Almeida em caso anaacutelogo no processo AC 155 RS 20037102000155-6 desfavoraacutevel agrave adoccedilatildeo de procedimentos alternativos agrave transfusatildeo de sangue quando esta se apresentava indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da vida de menor impuacutebere Como se observa no caso em qLiestatildeo o fato de o pa-

Cap VI - PRINCIacutePIOS GERAIS DO DIREITO E A FORMULACcedilAtildeO DOS ARGUMENTOS 159

ciente ser um menor impuacutebere justifica a preponderacircncia do direito agrave vida em detrimento do direito agrave liberdade de escolha Sem duacutevida o pedido do meacutedico deve ser deferido jaacute que natildeo seria razoaacutevel natildeo proporcionar a esse menor a oportunidade de exercer todos os outros direitos agasalhados no ordenamento juriacutedico

632 Comentaacuterio

Natildeo haacute regra que determine em que ordem as fontes do direito devem ser utilizadas em um texto argumentativo Entretanto devemos considerar que

Sobretudo depois do advento do neoconstitucionalismo (que ganhou forccedila inusitada a partir dos julgamentos de Nuremberg em 1945-1946 jaacute que eles enfatizaram com toda clareza a distinccedilatildeo entre a lei e o direito) jaacute natildeo haacute como negar a forccedila normativa (cogente imperiosa e civilizacional) dos princiacutepios dentro do direito (ou seja na ciecircncia do direito)10

Com efeito natildeo haacute como ignorar a forccedila argumentativa que conteacutem um princiacutepio uma vez que ele fornece as diretrizes gerais do ordenamento juriacutedico Assim antes de se pensar qual regra deve ser aplicada ao caso concreto entendemos que seja fundamental definir o princiacutepio juriacutedico que norteia a soluccedilatildeo justa e razoaacutevel para a hipoacutetese em anaacutelise Essa estrateacuteshygia foi adotada no texto apresentada no item 631 ao se ponderarem dois princiacutepios constitucionais direito agrave vida e direito agrave liberdade religiosa amshybos contidos no art 5deg da Constituiccedilatildeo Natildeo houve muito embora possa parecer conflito de princiacutepios mas uma colisatildeo que exige ponderaccedilatildeo das circunstacircncias atinentes ao caso concreto a fim de estabelecer que princiacuteshypio prevaleceraacute

Em seguida adotou-se como argumento de autoridade a regra isto eacute o art 4deg do Estatuto da Crianccedila e do Adolescente que explicitamente proclama valores resguardados pelos princiacutepios que se aplicam ao caso em anaacutelise direito agrave vida e agrave sauacutede Como se observa a utilizaccedilatildeo desse artigo reforccedila a conclusatildeo extraiacuteda apoacutes a ponderaccedilatildeo dos princiacutepios O

10 GOMES Luiz Flaacutevio Normas regras e princiacutepios conceitos e distinccedilotildees (parte 1) Extraiacutedo de rede de ensino Luiz Flaacutevio Gomes 3 fev 2010 Disponiacutevel em lthttplfgjusbrasilcombrnoticias2074820normas-regras-e-principios-concei- tos-e-distincoes-parte-lgt Acesso em 14 set 2012

160 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

texto segue portanto uma linha de raciociacutenio estruturada com base em um princiacutepio constitucional direito agrave vida

No terceiro paraacutegrafo evoca-se o reconhecido saber do constitushycional ista Luiz Roberto Barroso manifestando-se a voz da doutrina que se alinha ao art 3deg do Coacutedigo Civil Fica estabelecido o viacutenculo entre a doutrina e a lei reforccedilando a tese defendida no texto Aliaacutes a doutrina ao interpretar o direito contribui para o seu aprimoramento De fato algumas leis se alteram em virtude da atualizaccedilatildeo de sua interpretaccedilatildeo promovida pelos doutrinadores

Em sequecircncia a loacutegica do razoaacutevel se apresenta com maior ecircnfase por meio da ponderaccedilatildeo de valores As perguntas retoacutericas expressam essa ponderaccedilatildeo compartilhada com o auditoacuterio Dessa forma adota-se uma cumplicidade com esse auditoacuterio na busca de fazecirc-lo refletir sobre o que deve preponderar os argumentos dos pais ou o do orador Promove-se nesse momento espaccedilo para o argumento de oposiccedilatildeo a fim de demonstrar sua fragilidade perante os argumentos defendidos pelo orador

Por fim recorreu-se agrave jurisprudecircncia com o objetivo de estabelecer uma aproximaccedilatildeo entre o caso em apreccedilo e outro semelhante jaacute julgado Essa praacutetica eacute muito comum na fundamentaccedilatildeo de teses por se reconhecer a relevacircncia juriacutedica de uma decisatildeo de meacuterito em face de sua natureza cientiacutefica Portanto serve de fonte para orientar na soluccedilatildeo de questatildeo ainshyda natildeo positivada ou para aprimorar alguma regra existente Da mesma forma que a doutrina a jurisprudecircncia tem ainda a funccedilatildeo de atualizar no tempo e no espaccedilo conforme os costumes determinada regra e ateacute suscitar a criaccedilatildeo de outras regras Presta pois relevante serviccedilo na busca pelo justo pelo razoaacutevel

11 Sugere-se a leitura de FERRAZ JR Tercio Sampaio Introduccedilatildeo ao estudo do dishyreito Teacutecnica decisatildeo dominaccedilatildeo 3 ed Satildeo Paulo Atlas 2001 p 237-242 para ampliar o conhecimento relativo aos costumes e agrave jurisprudecircncia

Capiacutetulo VII

FIGURAS DE RETOacuteRICA

A linguagem do Direito haacute de conformar-se aos rigores da teacutecnica jushyriacutedica Mas sem desprezo agrave clareza agrave transparecircncia agrave elegacircncia e ao ritmo melodioso da poesia As palavras para o professor para o advoshygado para os operadores do Direito em geral satildeo feitas para persuadir demover incentivar Natildeo basta sintaxe E preciso paixatildeo (Luiacutes Roberto Barroso)

A citaccedilatildeo registrada destaca a importacircncia da linguagem verbal parao profissional do Direito no desempenho de suas funccedilotildees Observa-se que Luis Roberto Barroso enfatizou o uso de uma linguagem clara objetiva precisa em que a razatildeo direcione o discurso a ser produzido a fim de que se alcance o principal objetivo no discurso juriacutedico a persuasatildeo Entretanshyto com destaque exaltou um componente indispensaacutevel a ser associado agrave razatildeo a emoccedilatildeo Ora o orador deve envolver emocionar apaixonar o seu auditoacuterio a fim de que este adira com maior rapidez suas teses E como utilizar a linguagem com paixatildeo Uma das estrateacutegias para atingir esse objetivo eacute usar figuras de retoacuterica

71 POR QUE O ESTUDO DAS FIGURAS RETOacuteRICAS

Inicialmente importa compreender o sentido dos termos ldquo figurardquo e ldquo retoacutericardquo a fim de justificar tal estudo neste livro Retoacuterica conforme Reboul1 ldquo eacute a arte de persuadir por meio do discursordquo Adotaremos dentre algumas definiccedilotildees de discurso a seguinte produccedilatildeo verbal oral ou escrita formulada por meio de palavras frases paraacutegrafos que se conectam em

1 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Bencdetti Satildeo Paushylo Martins Fontes 2000 p XIV

162 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

sequecircncia foimando uma unidade de senlido Tal arte eacute exercida ldquo em sishytuaccedilotildees de incerteza e conflito em que a verdade natildeo eacute dada e talvez jamais seja alcanccedilada senatildeo sob a forma de verossimilhanccedilardquo 2 Com efeito em tais situaccedilotildees o embate de teses exige do orador um verdadeiro exerciacutecio criativo mas planejado Esse planejamento visa agrave produccedilatildeo de uma estrashyteacutegia que oriente o orador no embate com seu opositor

Estrateacutegia eficaz pode se estear na teoria de Aristoacuteteles (384-322 aC) Segundo ele a retoacuterica se estrutura em quatro fases que permitem a ordenaccedilatildeo do discurso de maneira a garantir-lhe consistecircncia coerecircncia e clareza Tais fases satildeo assim denominadas a) invenccedilatildeo (reuniatildeo de todos os argumentos e quaisquer meios de persuasatildeo relativos ao tema do disshycurso) b) disposiccedilatildeo (seleccedilatildeo e organizaccedilatildeo dos argumentos) c) elocuccedilatildeo (produccedilatildeo escrita do discurso escolha do estilo da forma como se iraacute comshypor o discurso) d) accedilatildeo (profericcedilatildeo do discurso com o conteuacutedo revestido por determinada forma e auxiliado por recursos de oratoacuteria)

Em capiacutetulos anteriores estudamos estas duas fases invenccedilatildeo e disposiccedilatildeo Neste capiacutetulo abordaremos a elocuccedilatildeo portanto ao estilo agrave forma do dizer mais precisamente a um dos seus aspectos as figuras de retoacuterica Certamente sem o domiacutenio do vernaacuteculo torna-se difiacutecil persuadir um auditoacuterio Isso significa adotar um vocabulaacuterio usual sem arcaiacutesmos ou neologismos Aleacutem disso na busca da clareza e da precisatildeo eacute fundamental ater-se agrave gramaacutetica normativa da liacutengua Entretanto satildeo as figuras que forshynecem um sentido extra ao discurso Dessa forma adornam o estilo com construccedilotildees inesperadas portanto mais aderentes ao auditoacuterio e condenshysam o argumento sintetizando as justificativas das valoraccedilotildees produzidas Segundo Reboul3

A figura eficaz pode ser definida como algo que se desvia da expressatildeo banal mas precisamente por ser mais rica mais expressiva mais eloshyquente mais adaptada numa palavra justa do que tudo que a poderia substituir

Por fim eacute preciso frisar que nem todas as figuras satildeo retoacutericas cujo objetivo eacute funcional jaacute que visam a persuadir um auditoacuterio Haacute aquelas cujo objetivo eacute produzir prazer ou humor etc Vamos portanto nos deter nas figuras retoacutericas analisando seu efeito persuasivo e sua utilizaccedilatildeo no discurso juriacutedico

2 Ibidem p 393 Ibidem p 66

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 163

72 O EFEITO PERSUASIVO DAS FIGURAS DE RETOacuteRICA

Especialmente no texto argumentativo em que o primeiro objetivo do orador eacute estabelecer um viacutenculo com o auditoacuterio deve aquele consshytruir o seu discurso de forma a tornaacute-lo acessiacutevel e atraente Assim aleacutem de planejar o texto escolher os tipos de argumento e elaboraacute-los torna-se imprescindiacutevel utilizar a palavra - ldquoguia de toda accedilatildeo e de todo o pensashymentordquo (Isoacutecrates 439-388 aC) mdash a seu favor explorando-lhe todas as facetas

Para tal tarefa as figuras de retoacuterica segundo Reboul4 desempenham um papel persuasivo isto eacute satildeo mecanismos de que se vale o orador para encaminhar o raciociacutenio do auditoacuterio surpreendendo-o com construccedilotildees criativas numa linguagem viacutevida ou melhor que foge ao comum Obsershyve-se que tal expediente tem ainda por objetivo promover um apelo emoshycional ou motivacional Dessa forma o auditoacuterio receberaacute com surpresa e aguccedilaraacute a sua atenccedilatildeo para as palavras do orador

Natildeo se pode aferir agrave figura retoacuterica a uacutenica funccedilatildeo de evocar prazer ou emocionar o auditoacuterio mas especialmente condensar um argumento que se constitui no proacuteprio enredo No exemplo que se segue isso ficaraacute bem claro O Ministro Ayres Britto ao proferir seu voto sobre a possibilishydade de autorizaccedilatildeo do aborto do feto anenceacutefalo disse ldquoO anenceacutefalo eacute uma crisaacutelida que jamais se transformaraacute em borboletardquo 5

Observe-se que ao comparar o anenceacutefalo a uma crisaacutelida - terceiro estado do ciclo de vida da borboleta em que ainda eacute uma lagarta mas pronta para se transformar em borboleta - objetivou situaacute-lo no mesmo niacutevel de um ser em formaccedilatildeo que se encontra em um estaacutegio intermediaacuterio de vida plena

Entretanto algo os distingue enquanto a crisaacutelida jaacute estaacute madura e completamente formada para se tornar uma borboleta o anenceacutefalo natildeo se formou nem teraacute a possibilidade de se formar plenamente Portanto mais do que evidenciar o que haacute em comum entre ambos (anenceacutefalo e crisaacutelida) desejou o ilustre ministro explicitar aquilo que distingue os dois elementos com o objetivo de persuadir o auditoacuterio sobre a incapacidade de um anenceacutefalo atingir o estaacutegio final de desenvolvimento

4 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Benedetti Satildeo Paushylo Martins Fontes 2000

5 Julgamento da ADPF 54 pelo Supremo Tribunal Federal em 12 de abril de 2012

164 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

A ilustraccedilatildeo poderaacute explicitar ainda melhor o que foi dito

Anenceacutefalo sempossibilidade de vida apoacutes deixar o uacutetero materno jaacute que tem ausecircncia parcial ou total de enceacutefalo

possibilidade de vida apoacutes deixar o casulo

jaacute quedesenvolveu-se

plenamente

Crisaacutelida com

Como se observa a aproximaccedilatildeo desses dois elementos aparenteshymente sem algo em comum favoreceu a tese do ex-Ministro Ayres Britto de que o anenceacutefalo eacute um ser fadado agrave morte mesmo que nasccedila com vida Com a figura retoacuterica atenuou-se a dramaticidade do tema ocorrendo o que A BREU (2000 p 74) chama de esfriamento do texto sem no entanshyto atenuar a sua relevacircncia Ademais utilizou-se um repertoacuterio conhecido pelo auditoacuterio universal cuja imagem remete a um ser fraacutegil (borboleta) poreacutem de reconhecida beleza que natildeo alcanccedilaraacute o anenceacutefalo condenashydo prematuramente agrave morte Dessa aproximaccedilatildeo (anenceacutefalo crisaacutelida borboleta) extrai-se uma conclusatildeo incompatiacutevel com a vida condensou- se a tese do orador Certamente o efeito persuasivo obtido com o uso da metaacutefora foi mais intenso do que se o ex-Ministro Ayres Britto tivesse dito apenas o anenceacutefalo eacute um embriatildeo sem expectativa de vida

Pode-se ainda demonstrar como uma figura retoacuterica auxilia a defesa de uma tese encaminhando o raciociacutenio do auditoacuterio na direccedilatildeo determinada pelo orador por meio da prolepse Esse efeito consiste em antecipar um arshygumento do opositor para afirmar sua fragilidade Tal figura eacute muito utilizashyda pelo profissional do direito jaacute que natildeo existe argumentaccedilatildeo se natildeo houver controveacutersia Ademais se o orador estiver atento antevendo os possiacuteveis arshygumentos do seu opositor e voltando-os contra ele surpreenderaacute e o forccedilaraacute a reformular os seus argumentos Um bom exemplo de prolepse foi utilizado por Schreiber ao defender a tese de que seria possiacutevel ampliar a interpretaccedilatildeo do art 953 do Coacutedigo Civil a fim de possibilitar ao magistrado quantificar as indenizaccedilotildees por danos patrimoniais difiacuteceis de serem mensuradas Eis o trecho em comento em que se sublinhou a prolepse

Um observador atento argumentaraacute que a hipoacutetese eacute ainda assim lishymitada agrave conduta que ataquem a honra rdquo da pessoa juriacutedica tema de que trata o caput do art 953 Eacute verdade mas nada impede sua aplicaccedilatildeo analoacutegica aos danos derivados de outras condutas que agridam a pessoa

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 165

juriacutedica como a violaccedilatildeo de segredo industrial O paraacutegrafo uacutenico do art 953 deixaria assim a absoluta inutilidade para assumir o papel de norma oxigenadora da quantificaccedilatildeo das indenizaccedilotildees permitindo ao magistrado arbitrar por si mesmo os danos patrimoniais cuja prova nushymeacuterica se mostrasse extremamente dificultosa (grifo nosso)

Certamente vocecirc deve tecirc-la associado ao argumento de oposiccedilatildeo De fato a prolepse se inclui nesse tipo de argumento Sua particularidade reside no fato de a parte contraacuteria poder ser uma pessoa real ou fictiacutecia Voltaremos agrave anaacutelise do uso e do efeito da prolepse no item 7343

Enfim conforme defende Reboul eacute fundamental conhecer as figushyras retoacutericas e compreender o efeito favoraacutevel ou desfavoraacutevel que podem produzir agrave defesa das nossas teses a fim de interpretaacute-las e utilizaacute-las nas nossas argumentaccedilotildees

73 FIGURAS RETOacuteRICAS MUITO UTILIZADAS NO DISCURSO JURIacuteDICO

E fato que o discurso juriacutedico se utiliza de figuras retoacutericas Dessa forshyma apresentamos algumas dessas figuras sem a pretensatildeo de esgotar o tema mas objetivando a identificaccedilatildeo e os efeitos que elas provocam Destacamos a funccedilatildeo argumentativa das figuras de retoacuterica mais utilizadas no discurso juriacutedico Para tal analisaremos aquelas que se inserem nas figuras de palashyvras figuras de sentido figuras de construccedilatildeo figuras dc pensamento

731 Figuras de palavras

As figuras de palavras referem-se aos significantes que as represenshytam isto eacute aos sons e grafemas pelos quais as identificamos e as distinguishymos umas das outras Ao explorar essa parte fiacutesica das palavras em que o ritmo e o som satildeo destacados pode-se atrair a atenccedilatildeo do auditoacuterio e este receber e aderir ao argumento com mais facilidade

7311 Figuras de ritmo e de som

O ritmo confere musicalidade ao discurso (Reboul) Sabe-se que nos textos destinados agrave propaganda investe-se muito na musicalidade Tal ca-

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA

decircncia pode ser marcada por exemplo pelas siacutelabas tocircnicas e pela extenshysatildeo das siacutelabas das palavras

Aleacutem do ritmo a escolha e a combinaccedilatildeo de sons das palavras tecircm tambeacutem o objetivo de produzir prazer ao puacuteblico a que se destina isto eacute ao consumidor induzindo-o a comprar o produto Seraacute que no discurso juriacutedico caberiam tais estrateacutegias para se conseguir a adesatildeo do auditoacuterio agrave tese do orador O trecho a seguir extraiacutedo do Voto de Ayres Brito refeshyrente ao julgamento da Accedilatildeo Direta de Inconstitucionalidade (A D I) n 4277 e a Arguiccedilatildeo de Descumprimento de Preceito Fundamental (DPF) n 132 que reconheceu a uniatildeo estaacutevel para casais do mesmo sexo responderaacute agrave pergunta

Ayres Britto relator das accedilotildees em reforccedilo agrave sua tese citou Max Scheler6 ldquoO ser humano antes de um ser pensante ou volitivo eacute um ser amanterdquo7

Se quisermos marcar o ritmo destacando a tonicidade do enunciado teriacuteamos o seguinte

O ser humano antes de um ser pensante ou volitivo eacute um ser amanterdquo (3+3+3+3)

Aleacutem do ritmo a musicalidade se manifesta pela rima em ldquoantes pensanteamanterdquo

O argumento de autoridade utilizado pelo ex-Ministro Ayres Britto reforccedila a tese de que a vocaccedilatildeo para amar encontra-se em estado latenshyte no ser humano antes mesmo de adquirir a capacidade de raciocinar Aproveitou-se assim de um argumento em que a mensagem embalada pela harmonia do som das palavras e pelo ritmo da sentenccedila penetra deshylicadamente na consciecircncia do auditoacuterio e reforccedila o significado Segundo Reboul (2000) ldquo as figuras de palavras instauram uma harmonia aparente poreacutem incisiva sugerindo que se os sons se assemelham provavelmente natildeo eacute por acasordquo

ldquo Max Scheler 22 de agosto de 1874 Munique-l9 de maio de 1928 Frankfurt am Main) foi um filoacutesofo alematildeo conhecido por seu trabalho sobre fenomenologia eacutetica e antropologia filosoacutefica O centro de seu pensamento era a sua teoria do valor segundo a qual o ser-valor de um objeto precede a percepccedilatildeo A realidade axioloacutegica dos valores eacute anterior a sua existecircncia Os valores e seus correspondenshytes opostos existem em um ordem objetivardquo (Disponiacutevel em lthttpptwikipedia orgwikiMax_Schelergt Acesso em 02 set 2012)Textos recolhidos de ensaio escrito por Seacutergio da Silva Mendes e a ser publicado no X X Compedi com o nome de ldquoUnidos pelo afeto separados por um paraacutegrashyfordquo a propoacutesito justamente da questatildeo homoafetiva perante o sect 3deg do art 226 da CRFB

7312 A etimologia

Destaque-se ainda que a etimologia eacute considerada figura de palashyvra isto eacute a definiccedilatildeo de um termo com base na sua origem A etimologia representa um argumento retoacuterico Isso porque quando o orador define o sentido de uma palavra objetiva impor esse sentido ao auditoacuterio Foi exashytamente o que fez o ex-Ministro Ayres Britto em trecho do seu voto no julgamento da ADI 4277 e da DPF 132

Vida em comunidade portanto sabido que comunidade vem de lsquolsquocoshymum unidade E como toda comunidade tanto a famiacutelia como a soshyciedade civil satildeo usinas de comportamentos assecuratoacuterios da sobreshyvivecircncia equiliacutebrio e evoluccedilatildeo do Todo e de cada uma de suas partes (grifo nosso)

Observe-se que ao expor a origem da palavra explorando-lhe os sentidos fortaleceu sua tese de que a famiacutelia assim como a sociedade criam comportamentos comuns aos seus membros assegurando a sobrevivecircnciao equiliacutebrio e a evoluccedilatildeo do Todo (sociedade) e daqueles que a compotildeem Com efeito a etimologia foi utilizada com um objetivo funcional valorizar a funccedilatildeo da ceacutelula familiar

732 Figuras de sentido

As figuras de sentido dizem respeito ao significado que uma palavra adota fora do seu uso habitual a fim de enriquecer essa ideia ou ateacute criar outro significado Como o utilizado por exemplo no art 5deg XI da Consshytituiccedilatildeo da Repuacuteblica Federativa do Brasil

A casa eacute asilo inviolaacutevel do indiviacuteduo ningueacutem nela podendo penetrar sem consentimento do morador salvo em caso de flagrante delito ou desastre ou para prestar socorro ou durante o dia por determinaccedilatildeo judicial

Conforme o dicionaacuterio eletrocircnico Houaiss a palavra asilo significa

1 instituiccedilatildeo de assistecircncia social onde satildeo abrigados para sustento eou educaccedilatildeo crianccedilas mendigos doentes mentais idosos etc

2 Derivaccedilatildeo por extensatildeo de sentido proteccedilatildeo amparo seguranccedila Ex depois do divoacutercio buscou a na casa dos pais

168 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Depreende-se que o sentido que se quis dar ao termo ldquo asilordquo conshyforme o dicionaacuterio vai aleacutem daquele atribuiacutedo originariamente agrave palavra Destaque-se que no mesmo dicionaacuterio no verbete destinado agrave palavra ldquocasardquo haacute 27 acepccedilotildees para esse termo mas em nenhuma delas consta o sentido ldquoasilordquo Portanto pode-se considerar que tenha ocorrido uma figura de sentido especificamente uma metoniacutemia Utilizou-se ldquoasilordquo para destashycar uma caracteriacutestica de casa lugar seguro que oferece amparo proteccedilatildeo Justifica-se portanto a proibiccedilatildeo de algueacutem entrar na casa de outrem sem permissatildeo jaacute que tal ato poderia expor ao perigo aquele que se abriga em casa Analisemos algumas dessas figuras

7321 Metoniacutemia

O dicionaacuterio eletrocircnico Houaiss assim define metoniacutemia

Rubrica estiliacutestica linguiacutestica retoacuterica1 figura de retoacuterica que consiste no uso de uma palavra fora do seu contexto semacircntico normal por ter uma significaccedilatildeo que tenha reshylaccedilatildeo objetiva de contiguidade material ou conceituai com o conteuacutedo ou o referente ocasionalmente pensado [Natildeo se trata de relaccedilatildeo compashyrativa como no caso da metaacutefora]Obs cf metalepse antonomaacutesia sineacutedoque

11 relaccedilatildeo metoniacutemica de tipo qualitativo (causa efeito esfera etc) mateacuteria por objeto ouro por lsquodinheirorsquo pessoa por coisa autor por obra adora Portinari por lsquoa obra de Portinarirsquo divindade esfera dc suas funccedilotildees proprietaacuterio por propriedade vamos hoje ao Venacircncio por lsquoao restaurante do Venacircnciorsquo morador por morada continente pelo conteuacutedo bebeu uma garrafa de aguardente por lsquoa aguardente de uma garrafarsquo consequecircncia pela causa respeite os meus cabelos brancos por lsquoa minha velhicersquo a qualidade pelo qualificado praticar a caridade por ldquo atos de caridaderdquo etc

Considere-se portanto haver metoniacutemia quando se substitui palavra por outra por se perceber entre ambas uma semelhanccedila objetiva concreta de contiguidade Tal semelhanccedila permite associar com facilidade a palashyvra utilizada pela que foi substituiacuteda Com efeito quando Gustavo Tepedi- no registrou ldquo com a entrada em vigor do Coacutedigo Civil de 2002 debruccedila- -se a doutrina na tarefa de construccedilatildeo de novos modelos interpretativosrdquo pretendia se referir aos ldquodoutrinadoresrdquo termo facilmente detectaacutevel pela

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 169

leitura Ora mas por que preferiu a palavra doutrina Certamente por preshytender evidenciar o produto do esforccedilo interpretativo de juristas e filoacutesofos do direito que objetivam esclarecer conceitos propor novos paracircmetros e caminhos para soluccedilotildees razoaacuteveis e justas

Observe-se o uso retoacuterico da metoniacutemia neste trecho do julgamento da AD I 4277 e da DPF 132 em que o ex-Ministro Ayres Britto objetiva persuadir o auditoacuterio acerca da importacircncia da famiacutelia independentemente do sexo de seus membros para a formaccedilatildeo de valores morais da pessoa com ecircnfase na toleracircncia concepccedilatildeo reforccedilada no final do trecho

Afinal eacute no regaccedilo da famiacutelia que desabrocham com muito mais viccedilo as virtudes subjetivas da toleracircncia sacrifiacutecio e renuacutencia adensadas por um tipo de compreensatildeo que certamente esteve presente na proposiccedilatildeo spnozista de que ldquo nas coisas ditas humanas natildeo haacute o que crucificar ou ridicularizar Haacute soacute o que compreenderrdquo (grifo nosso)

Conforme o dicionaacuterio Houaiss ldquo regaccedilordquo significa

Substantivo masculino1 parte do corpo que vai da cintura aos joelhos na posiccedilatildeo sentada colo2 concavidade formada pela saia ou avental que se suspende para coshylocar algo3 Derivaccedilatildeo sentido figurado espaccedilo meacutedio interior4 Derivaccedilatildeo sentido figurado lugar em que se repousa ou que serve de abrigo

Certamente no trecho destacado do voto o sentido 4 do verbete foi o pretendido Isso porque considerando-se a famiacutelia como um abrigo onde a pessoa encontra proteccedilatildeo suficiente para desenvolver valores esta deve ser reconhecida e valorizada

Quanto agrave segunda metoniacutemia destacada ldquo crucificarrdquo note-se que o verbo remete agrave cruz siacutembolo do sacrifiacutecio de Cristo Com o uso desse verbo destaca-se o siacutembolo natildeo a accedilatildeo de prender algueacutem em uma cruz Certamente esta segunda compreensatildeo natildeo seria a esperada de um leitor atento Entende-se pois que o orador desejou evidenciar o sentido ldquo estigshymatizarrdquo contido no verbo crucificar Assim objetivou persuadir o auditoacuterio de que essa atitude demonstra extrema falta de sentimento de compaixatildeo A forccedila argumentativa da metoniacutemia encontra-se na simbologia da palavra

170 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

empregada em substituiccedilatildeo agravequela que representa Conforme Reboul ldquoa metoniacutemia cria siacutembolos como por exemplo a foice e o martelo a rosa e a cruz Nesse sentido condensa um argumento fortiacutessimordquo

7322 Metaacutefora

Na metaacutefora associam-se dois termos completamente distintos compashyram-se ambos e se extrai algo em comum entre eles Estabelecido o viacutenculo um termo substitui o outro Observe-se que a identificaccedilatildeo dessa semelhanccedila eacute subjetiva isto eacute depende exclusivamente da interpretaccedilatildeo daquele que esshytabelece a aproximaccedilatildeo Por conseguinte a criatividade eacute uma caracteriacutestica marcante da metaacutefora E justamente essa criatividade que conforme Reboul ldquo permite entender o poder argumentativo da metaacuteforardquo Com efeito em senshytenccedila referente ao Processo n 2003001050626-8 em que ajuiacuteza critica a forshyma como o autor dispocircs seus argumentos considerando-os preconceituosos observa-se que a utilizaccedilatildeo da metaacutefora expressa claramente sua indignaccedilatildeo

Esses poreacutem e infelizmente satildeo os momentos mais comedidos do aushytor quando comparados a outros em que as suas erupccedilotildees discriminatoacuteshyrias assumem contornos de bravatas histeacutericas e francamente ofensivas (grifo nosso)

O sentido da palavra ldquo erupccedilatildeordquo adapta-se perfeitamente agrave avaliaccedilatildeo da juiacuteza ao excesso cometido pelo autor em sua peticcedilatildeo inicial Certamente o auditoacuterio reconheceraacute que o termo estaacute ligado agrave geologia isto eacute significa a emissatildeo de materiais magmaacuteticos por um vulcatildeo Entretanto considerando todo o processo discursivo natildeo estranharaacute o seu uso Ademais o termo meshytafoacuterico sintetiza o argumento da juiacuteza da falta de controle do autor sob suas emoccedilotildees da mesma forma que natildeo se controla a larva de um vulcatildeo

7323 Hipeacuterbole

Conforme Reboul ldquo a hipeacuterbole eacute a figura do exagerordquo Sua utilizaccedilatildeo objetiva intensificar o que se diz a fim de se atenuar o que se tem a intenshyccedilatildeo de dizer Nas palavras de Fiorin ldquo quando se intensifica no enunciado e se atenua na enunciaccedilatildeordquo Entenda-se enunciado como aquilo que se diz o material concreto do discurso Enunciaccedilatildeo diz respeito ao como se diz ao significado que o autor do discurso deseja transmitir isto eacute agrave intenccedilatildeo comunicativa do orador

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 171

Assim quando o juiz Joatildeo Baptista Herkenhoiacutef no despacho de 09081978 no Processo ndeg 3775 da la Vara Criminal de Vila Velha (ES) registrou ldquoeste Juiz renegaria todo o seu credo rasgaria todos os seus prinshyciacutepios trairia a memoacuteria de sua matildee se permitisse sair Edna deste Foacuterum sob prisatildeordquo sem duacutevida exagerou ao enunciar que ldquo renegaria todo o seu creshydordquo que ldquo rasgaria todos os seus princiacutepiosrdquo e que ldquo renegaria a memoacuteria de sua matildeerdquo jaacute que sua intenccedilatildeo natildeo alcanccedila tal amplitude Na verdade deseja angariar a adesatildeo do auditoacuterio agrave tese de absolviccedilatildeo da reacute mesmo existindo provas contra Para atingir tal objetivo registra o quatildeo fora de propoacutesito eacute a condenaccedilatildeo da mesma forma que seria um excesso praticar as accedilotildees por ele enunciadas Dessa maneira o auditoacuterio eacute induzido a admitir sua tese

Enfim a hipeacuterbole tem por objetivo ldquo levar agrave proacutepria verdade e de lixar atraveacutes do que ela diz de incriacutevel aquilo que eacute realmente preciso crerrdquo (Reboul)

7324 Eufemismo

O eufemismo eacute o oposto da hipeacuterbole jaacute que o orador procura atenuar aquilo que a enunciaccedilatildeo enfatiza Buscam-se palavras que amenizem o que estaacute sendo enunciado ldquo simulando moderaccedilatildeo para afirmar de maneira enshyfaacuteticardquo (Fiorin) Com essa estrateacutegia argumentativa o orador dissimula aquilo que realmente deseja fazer crer

Acrescente-se que tal dissimulaccedilatildeo demonstra a preocupaccedilatildeo do orashydor de transmitir ao auditoacuterio uma imagem de polidez sensibilidade Natildeo se pode olvidar que a forma como o auditoacuterio o avalia eacute determinante para que se torne mais permeaacutevel agraves palavras deste Assim o orador investe no ethos - o seu caraacuteter sua imagem - jaacute que conquistaraacute com mais facilidade o auditoacuterio se for considerado honesto educado e tambeacutem no logos - na forma como enuncia os argumentos

Como exemplo de eufemismo destaca-se a criacutetica publicada no jorshynal O Estado de S Paulo do ministro Marco Aureacutelio agrave forma como o mishynistro Joaquim Barbosa reagiu ao voto do ministro Ricardo Lewandowski revisor da Accedilatildeo Penal 470 favoraacutevel ao desmembramento do processo - o envio das denuacutencias contra os que natildeo tecircm prerrogativa de foro agrave primeira instacircncia nos primeiros dias do julgamento da Accedilatildeo Penal 4708

Consultor Juriacutedico 4 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lt httpwwwconjurcom br2012-ago-04marco-aurelio-temer-joaquim-barbosa-presidencia-supremogt Acesso em 02 set 2012

172 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 173

Natildeo gostei pela falta de urbanidade do relator Precisamos discutir ideias natildeo deixando descambar para o lado pessoal Mc assusta o que podemos ter apoacutes novembro (quando Joaquim Barbosa assumiraacute a preshysidecircncia do STF) Costumo dizer que o presidente (do STF) tem de ser um algodatildeo entre cristais natildeo pode ser metal entre cristais

Observa-se a preocupaccedilatildeo do ministro Marco Aureacutelio em escolher as palavras a fim de proteger a sua imagem e de atenuar o impacto de sua criacutetica sem no entanto expressar o quanto desaprova a atitude do colega Destaque-se que o ministro Marco Aureacutelio preferiu dizer que houve ldquo falta de urbanidaderdquo em vez de dizer que o ministro Joaquim Barbosa teria sido grosseiro Em seguida utilizou uma metaacutefora insinuando possivelmente que o colega seria comparaacutevel a um ldquo metal entre cristaisrdquo Embora tenha utilizado um eufemismo contido na metaacutefora a enunciaccedilatildeo reforccedila a deshysaprovaccedilatildeo

dade privada como espaccedilo de liberdade individual e tendencialmente absoluta do titular do domiacutenio9 (grifo nosso)

Com efeito a Constituiccedilatildeo da Reptiblica Federativa do Brasil de 1988 passou a priorizar o coletivo em detrimento ao individual Dessa forma o aparente paradoxo se desfaz jaacute que a noccedilatildeo individualista de propriedade natildeo mais corresponde ao ideal constitucional

7326 Antiacutetese

A antiacutetese estabelece oposiccedilotildees de termos ou de temas num determishynado contexto Como figura retoacuterica objetiva enaltecer um dos termos ou tema que se opotildee ao outro Tal objetivo se observa no seguinte trecho de Fachin

7325 Paradoxo

E muito comum unir termos de sentido contraditoacuterio na mesma unishydade de sentido a fim de demonstrar algum conflito existente Essa estrateacuteshygia argumentativa provoca um estranhamento no auditoacuterio exigindo que se detenha na anaacutelise do contraditoacuterio e extraia desse conflito uma conclusatildeo isto eacute uma tese Um exemplo disso foi a assertiva de Gustavo Tepedino e Anderson Schreiber extraiacuteda do artigo A garantia de propriedade no direito brasileiro em que fazem referecircncia agrave ultrapassada concepccedilatildeo de propriedade privada Destacam que se adotada tal concepccedilatildeo seria contrashyditoacuterio o artigo 170 da Constituiccedilatildeo Federal que dispotildee

Art 170 A ordem econocircmica fundada na valorizaccedilatildeo do trabalho humano e na livre iniciativa tem por fim assegurar a todos existecircncia digna conforshyme os ditames da justiccedila social observados os seguintes princiacutepiosII - propriedade privada

III - funccedilatildeo social da propriedade (grifo nosso)

Assim se posicionam os juristas sobre o tema

1- Transitar10Resta enfrentar sem delongas nomeadamente agora com o novo Coacutedishygo Civil brasileiro o desafio que consiste em trocar praacuteticas de medievo pelos saberes construiacutedos agraves portas do terceiro milecircnio Este eacute apenas o singelo ponto de partidaPrograma para arguir questionando-se numa esperanccedila interrogativa aberta natildeo cadastrada pelo dogmatismo juriacutedico endereccedilando-se para todos os niacuteveis que se proponham novos no porvir contiacutenuo de um proshyjeto em permanente edificaccedilatildeo Um novo Direito Civil a partir de seus pilares fundamentais o contrato o projeto parental e as titularidades eacute a proposta do tempo que se faz agora siacutentese do passado que restou e do futuro ainda por se estabelecer Os sinos dobram para reconhecer o fim da concepccedilatildeo insular do ser humano e o liame indissociaacutevel entre Direishyto e criacutetica na releitura de estatutos fundamentais do Direito PrivadoNo horizonte a vencer o que se diz eacute tatildeo relevante quanto como se diz Daiacute a perspectiva inadiaacutevel de revirar a praxe didaacutetica Sair da clausura dos saberes postos agrave reproduccedilatildeo e ir aleacutem das restriccedilotildees que o molde deforma A produccedilatildeo das regras de direito como ato de nascimento da vida e natildeo certidatildeo de oacutebito a ser estampada no museu das praxes

A referecircncia corriqueira agrave ldquofunccedilatildeo social da propriedade privadardquo exshyplica-se pelo fato de que eacute neste acircmbito que a funcionalizaccedilatildeo opera de forma mais revolucionaacuteria afastando a tradicional noccedilatildeo da proprie-

9 Disponiacutevel em lthttpwwwfdcbrArquivosMestradoRevistasRevista06Docen- te04pdfgt Acesso em 02 set 2012

10 FACHIN Luiz Edson Teoria criacutetica do direito civil agrave luz do novo Coacutedigo Civil Brasileiro 2 ed rev e atual Rio de Janeiro Renovar 2003 p 6-8

174 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

O texto acima repousa na antiacutetese isto eacute na oposiccedilatildeo entre os pilares do antigo Coacutedigo Civil e os do novo Coacutedigo Observa-se que ao antigo coacutedigo satildeo atribuiacutedas ideias com sentido negativo jaacute ao novo coacutedigo o sentido eacute positivo Tem-se a seguinte oposiccedilatildeo

COacuteDIGO CIVIL DE 1916 COacuteDIGO CIVIL DE 2002

Praacuteticas de medievo Saberes construiacutedos agraves portas do terceiro milecircnioDogmatismo juriacutedico Projeto em permanente edificaccedilatildeoPassado FuturoClausura dos saberes postos agrave reproduccedilatildeo

Ir aleacutem das restriccedilotildees que o molde deforma

Certidatildeo de oacutebito Ato de nascimento da vida

Como se pode concluir a antiacutetese representa uma estrateacutegia argu- mentativa muito produtiva chegando a constituir o fio condutor do texto

7327 Personificaccedilatildeo

A personificaccedilatildeo transfere para seres irracionais ou inanimados accedilotildees ou atributos restritos aos seres humanos Tal estrateacutegia argumentativa aleacutem de atrair a atenccedilatildeo do auditoacuterio transfere responsabilidades exclusivas do homem agravequeles que por natureza satildeo incapazes de possuiacute-las Dessa forshyma ao atribuir por exemplo responsabilidades a uma empresa comercial considerando-a ldquo pessoardquo juriacutedica personifica-se essa empresa e conseshyquentemente torna-a suscetiacutevel de direitos e deveres

Em muitos textos argumentativos eacute possiacutevel extrair exemplos que ilusshytram a personificaccedilatildeo Eis um deles utilizado por Luiz Edson Fachin11

2 Porque os Ventos Sopram do Direito Civil Exilado no Inadiaacutevel FuturoTem-se como objeto desse exame o modelo que inspirou os sistemas latinos a forjar uma ldquoconstruccedilatildeo do homem privadordquo e a rejeitar no laissez-faire a verdadeira dimensatildeo da equidade que supotildee simultaneashymente igualdade e diferenciaccedilatildeo E o legado desse sistema que teima em recusar a travessia do indiviacuteduo sujeito e do sujeito agrave cidadania Explicitar essa demarcaccedilatildeo dos fatos reconhecer a teia de relaccedilotildees nem

11 FACHIN Luiz Edson Teoria criacutetica do direito civil agrave luz do novo Coacutedigo Civil Brasileiro 2 ed rev e atual Rio de Janeiro Renovar 2003 p 11

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 175

sempre inoxidaacutevel e expor a caracteriacutestica construtiva das relaccedilotildees bem pode embalar um projeto e um desafio (grifo nosso)

Na personificaccedilatildeo destacada atribui-se ao sistema latino uma accedilatildeo proacutepria dos seres humanos teimar Eacute uma forma de direcionar o foco da alenccedilatildeo daqueles que se utilizam do sistema transferindo-a para o proacuteprio sistema objeto de estudo e de atualizaccedilatildeo

733 Figuras de construccedilatildeo

As figuras de construccedilatildeo tambeacutem denominadas figuras de sintaxe representam alteraccedilotildees que se promovem na estrutura do periacuteodo a fim de ulcanccedilar determinado efeito persuasivo Isso ocorre mediante a inversatildeo dos elementos da omissatildeo de algum termo ou da sua repeticcedilatildeo

7331 Inversatildeo

A ordem direta dos termos no periacuteodo segue a seguinte sequecircncia sushyjeito verbo complementos adjuntos adverbiais A alteraccedilatildeo dessa ordem convencional desperta maior atenccedilatildeo do auditoacuterio para o termo deslocado no periacuteodo Geralmente quando o orador desloca um termo para o iniacutecio do periacuteodo deseja atribuir-lhe mais destaque enfatizar o seu sentido Isso se verifica no seguinte trecho extraiacutedo do voto do ex-Ministro Ayres Britto no julgamento da ADI n 4277 e da DPF n 132

Realmente em tema do concreto uso do sexo nas trecircs citadas funccedilotildees de estimulaccedilatildeo eroacutetica conjunccedilatildeo carnal e reproduccedilatildeo bioloacutegica a Consshytituiccedilatildeo brasileira opera por um intencional silecircncio Que jaacute eacute um modo de atuar mediante o saque da kelseniana norma geral negativa ()

O citado trecho inicia-se com um adjunto adverbial de afirmaccedilatildeo (realmente) em seguida outro adjunto adverbial de assunto (em tema do concreto uso do sexo nas trecircs citadas funccedilotildees de estimulaccedilatildeo eroacutetica conshyjunccedilatildeo carnal e reproduccedilatildeo bioloacutegica) Soacute depois dos adjuntos adverbiais registrou-se o sujeito (Constituiccedilatildeo brasileira) A inversatildeo se justifica em funccedilatildeo da intenccedilatildeo do orador de enfatizar o silecircncio sobre esses temas pela Constituiccedilatildeo brasileira Destacar tal silecircncio demonstra ser o mais imporshytante para o orador a fim de associaacute-lo ao conceito de ldquonorma geral negashytivardquo elemento essencial para a sua tese

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

7332 Quiasmo

Quiasmo eacute uma inversatildeo com repeticcedilatildeo dos termos invertidos Seshygundo Rcboul essa figura retoacuterica segue a combinaccedilatildeo AB-BA A invershysatildeo associada agrave repeticcedilatildeo acentua a implicaccedilatildeo de sentido entre os termos Aleacutem disso permuta entre eles a funccedilatildeo de tema do enunciado

O quiasmo foi utilizado no seguinte trecho da Accedilatildeo Direta de Tncons- titucionalidade proposta pelo entatildeo Procurador-Geral da Repuacuteblica Dr Claacuteudio Lemos Fonteles tendo por alvo o art 5 o da Lei Federal 11105 (ldquo Lei da Biosseguranccedilardquo ) de 24 de marccedilo de 2005 de quem foi relator o Ministro Ayres Britto

Convenhamos Deus fecunda a madrugada para o parto diaacuterio do sol mas nem a madrugada eacute o sol nem o sol eacute a madrugada Natildeo haacute processo judicial contencioso sem um pedido inicial de prolaccedilatildeo de sentenccedila ou acoacuterdatildeo mas nenhum acoacuterdatildeo ou sentenccedila judicial se confunde com aquele originaacuterio pedido Cada coisa tem o seu momenshyto ou a sua etapa de ser exclusivamente ela no acircmbito de um processo que o Direito pode valorar por um modo tal que o respectivo cliacutemax (no caso a pessoa humana) apareccedila como substante em si mesmo Esshypeacutecie de efeito sem causa normativamente falando ou positivaccedilatildeo de uma fundamental dicotomia entre dois planos de realidade o da vida humana intrauterina e o da vida para aleacutem dos escaninhos do uacutetero materno tudo perfeitamente de acordo com a festejada proposiccedilatildeo kelseniana de que o Direito tem propriedade de construir suas proacuteprias realidades (grifo nosso)

Observe-se que com a inversatildeo de termos repetidos demonstra-se a impossibilidade de considerar um idecircntico ao outro embora haja uma imshyplicaccedilatildeo de sentido entre eles Assim reforccedila a ideia de que o ser enquanto se encontra na vida intrauterina estaacute em um plano completamente distinto daquele que jaacute nasceu

7333 Reticecircncias

Conforme Reboul

para incitar o outro a retomaacute-lo por sua conta a preencher por sua conta os trecircs pontos de suspensatildeo

Com efeito observa-se que no trccho a seguir a suspensatildeo do disshycurso teve por objetivo evitar conflito mas deixou para o auditoacuterio a funshyccedilatildeo de concluir o que natildeo foi dito O exemplo que se segue refere-se agrave criacutetica do Ministro Joaquim Barbosa relator do processo do ldquomensalatildeordquo no Supremo Tribunal Federal (STF) aos advogados que ldquo o acusaram de atuar com parcialidade na conduccedilatildeo da accedilatildeo penal O ministro tambeacutem se indispocircs com os proacuteprios colegas que natildeo acataram a proposta de retaliashyccedilatildeo a esses advogados sugerida por elerdquo 12 Seguem os trechos que expotildee a suspensatildeo do discurso

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA

O posicionamento da maioria da Corte desagradou o relator que disse que a honra do Tribunal foi atacada e natildeo apenas a sua ldquo Cada paiacutes tem o modelo de Justiccedila que merece Se [a Justiccedila] se deixa agredir se deixa ameaccedilar por uma guilda profissional nunca se sabe qual eacute o fim que lhe eacute reservadordquoO ministro Marco Aureacutelio respondeu ao colega que natildeo se sentiu atashycado pelas ofensas o que provocou nova reaccedilatildeo de Barbosa ldquoFossa Excelecircncia talvez faccedila parte rdquo disse o ministro sem concluir o racioshyciacutenio (grifo nosso)

7334 Repeticcedilatildeo

Geralmente orienta-se o aprendiz na arte de escrever que evite repeshyticcedilatildeo de palavras Entretanto haacute ocasiotildees em que a repeticcedilatildeo tem objetivo retoacuterico Segundo Perelman e Olbrechts-Tyteca a repeticcedilatildeo reforccedila o conshyteuacutedo enunciado provocando um efeito de presenccedila e sugerindo distinccedilotildees Provoca-se o efeito de presenccedila quando o objeto do discurso eacute assimilado pela consciecircncia do auditoacuterio levando-o a refletir e reter a ideia do orador Quanto agrave sugestatildeo de distinccedilotildees tal efeito se opera em razatildeo de o segundo elemento enunciado do termo ter seu sentido intensificado e adquirir um valor distinto do primeiro

A aposiopese ou reticecircncias interrompe a frase para passar ao auditoacuteshyrio a tarefa de complementaacute-la figura por excelecircncia da insinuaccedilatildeo do despudor da caluacutenia mas tambeacutem do pudor da admiraccedilatildeo do amor sua forccedila argumentativa adveacutem do fato de retirar o argumento do debate

Mateacuteria disponiacutevel em lthttpagenciabrasilebccombrnoticia2012-08-15joa- quim-barbosa-se-indispoe-com-advogados-e-ministros-do-stf-apos-acusacao-de- parcialidade-no-mensalagt Acesso em 20 ago 2012

178 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Notam-se tais efeitos no seguinte trecho de uma sentenccedila13 em que o juiz atribui aos oacutergatildeos puacuteblicos e agrave comunidade a responsabilidade de o reacuteu um deficiente auditivo ter cometido atos iliacutecitos

O Judiciaacuterio o encaminhou para todos os oacutergatildeos e instituiccedilotildees possiacuteveis ameaccedilou prender Diretoras de Escolas que natildeo o aceitavam mas tamshybeacutem natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquo Mudinhordquo

A comunidade natildeo fez nada por ele

O Municiacutepio natildeo fez nada por eleO Estado Brasileiro natildeo fe z nada por eleHoje BSS tem 21 anos eacute maior de idade e pratica crimes contra o patrimocircshynio dos membros de uma comunidade que natildeo cuidou dele (grifo nosso)

Como se pode observar a repeticcedilatildeo fixa na mente do auditoacuterio o deshysamparo a que ficou exposto o reacuteu Aleacutem disso a cada repeticcedilatildeo se torna mais grave a omissatildeo daqueles que tinham a obrigaccedilatildeo de zelar pelo jovem especialmente por se tratar de um deficiente auditivo responsabilizando-os pelos atos praticados por ele

7335 Gradaccedilatildeo

Na gradaccedilatildeo apresentam-se ldquo as palavras na ordem crescente de extenshysatildeo ou importacircnciardquo (Reboul) ou na ordem decrescente conforme a intenshyccedilatildeo do orador conduzindo o auditoacuterio paulatinamente no sentido evolutivo ou regressivo conforme os fatos atos ou omissotildees tenham gerado No exemshyplo anterior observa-se aleacutem da repeticcedilatildeo a gradaccedilatildeo Isso porque o juiz registra de forma crescente a ausecircncia da ldquo comunidaderdquo do ldquo Municiacutepiordquo do ldquo Estadordquo levando o auditoacuterio a concluir que ningueacutem fez algo pelo reacuteu

734 Figuras de pensamento

Considera-se figura de pensamento aquela que extrai do discurso como um todo a intenccedilatildeo daquele que produz o enunciado Portanto equishyvale agrave enunciaccedilatildeo

13 BRASIL Processo n 1863657-42008 Autor Ministeacuterio Puacuteblico Estadual Reacuteu BSS Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr200810juiz_condena_acusado_ furto_procurar_empregogt

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 179

7341 Ironia

A ironia consiste em afirmar algo no enunciado e negar na enunciashyccedilatildeo isto eacute aquilo que o orador diz eacute o oposto do que pretende fazer acreshyditar Na verdade o auditoacuterio pode interpretar literalmente o enunciado e natildeo perceber a intenccedilatildeo do orador Cabe ao orador entatildeo fornecer pistas que orientem o auditoacuterio a decifrar sua real intenccedilatildeo Mas para que isso ocorra eacute preciso que ele seja perspicaz a ponto de deduzir a competecircncia do auditoacuterio para perceber a criacutetica ou a denuacutencia dissimulada no discurso Na verdade a ironia fina deixa ao inteacuterprete sempre alguma duacutevida sobre a real intenccedilatildeo do orador

Ademais a ironia ldquo denuncia a falsa seriedade em nome de uma seshyriedade superior - a da razatildeo do bom senso da moral - o que coloca o ironista bem acima daquilo que ele criticardquo 14 como se observa na resposta do ex-Ministro Carlos Ayres Britto ao Ministro Ricardo Lewandowski no julgamento em que se discutia se a ex-companheira de um homem casado tinha direito agrave metade da pensatildeo que a viuacuteva recebia No Acoacuterdatildeo do STF- RE 397762-8 o Ministro Lewandowski natildeo reconhecia como uniatildeo esshytaacutevel a relaccedilatildeo mantida entre o de ciijus e a autora Assim pronunciou-se Lewandowski

() eacute uma comunhatildeo de leitos ao passo que a uniatildeo estaacutevel eacute uma comunhatildeo de vidas eacute uma parceria eacute um companheirismo Quer me parecer eminente Ministro Carlos Ayres Brito que quem manteacutem duas famiacutelias uma legal e outra na clandestinidade natildeo estaraacute dando publishycidade a essa segunda famiacutelia

Resposta do ex-Ministro Ayres Britto

Vossa Excelecircncia me permite Sempre fico mimoseado presenteado com intervenccedilotildees e votos tatildeo brilhantes mas digo simplesmente que a definiccedilatildeo de concubinato como mero ldquo dormir juntosrdquo natildeo se aplica a quem dormiu junto durante trinta anos E segundo eacute impossiacutevel manter uma relaccedilatildeo de trinta anos agraves escondidas clandestinamente Certamente essa uniatildeo era puacuteblica e notoacuteria De qualquer forma rendo minhas hoshymenagens a Vossas Excelecircncias em conjunto

14 REBOUL Olivier Introduccedilatildeo agrave retoacuterica Trad Ivone Castilho Benedetti Satildeo Paulo Martins Fontes 2000 p 133

180 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Com efeito o ex-Ministro Ayres Britto no iniacutecio de sua reacuteplica enalshytece o discurso do seu opositor Em seguida por meio de fatos demonstra o quatildeo incoerentes foram os argumentos usados pelo colega No desfecho volta a enaltecer natildeo apenas ao Ministro Lewandowski mas tambeacutem aos demais que se opotildeem a ele Nota-se a ironia pelo exagero dos elogios seguidos de afirmaccedilotildees que comprovam o oposto do que afirmara Tais afirmaccedilotildees denotam bom senso que deveria prevalecer acima do que diz o artigo 226 da CRFB

A famiacutelia base da sociedade tem especial proteccedilatildeo do Estado sect 3deg Para efeito da proteccedilatildeo do Estado eacute reconhecida a uniatildeo estaacutevel entreo homem e a mulher como entidade familiar devendo a lei facilitar sua conversatildeo em casamento

No caso citado a maioria dos ministros entendeu que em razatildeo de o falecido conviver com a esposa e com aquela que jamais poderia assumir como esposa esta soacute poderia ser reconhecida como concubina natildeo sendo admitida como companheira em uniatildeo estaacutevel conforme o art 1727 ldquoAs relaccedilotildees natildeo eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar constituem concubinatordquo

7342 Pretericcedilatildeo

Em determinadas situaccedilotildees o orador simula que natildeo iraacute dizer algo procurando proteger a sua imagem ou surpreender o auditoacuterio captando a sua atenccedilatildeo Isso ocorre em especial quando o auditoacuterio natildeo demonstra muita afinidade com a tese do orador

Pode-se verificar o uso de tal recurso retoacuterico pelo advogado de deshyfesa de Joseacute Dirceu Dr Joseacute Luiacutes Oliveira Lima no dia 07082012 na Accedilatildeo Penal 470 Ele afirmou

Natildeo vim pedir absolviccedilatildeo de Joseacute Dirceu pela sua histoacuteria ou passado de 40 anos de vida puacuteblica sem qualquer maacutecula ou mancha Natildeo peccedilo porque aqui natildeo eacute a casa para isso natildeo estou no Congresso Nacional Peccedilo absolviccedilatildeo de Joseacute Dirceu com base na prova dos autos e no devishydo processo legal

Ciente de que a opiniatildeo puacuteblica estaacute contra seu cliente e que a acusashyccedilatildeo foi incisiva ao avaliaacute-lo recorre ao argumento de fuga sem contudo dizer que o faraacute Diz que natildeo mencionaraacute o passado de Joseacute Dirceu mas o

Cap VII - FIGURAS DE RETOacuteRICA 181

faz Assim consegue que o auditoacuterio avesso aos seus argumentos se tome permeaacutevel agraves suas palavras

7343 Prolepse

Como jaacute dito anteriormente soacute existe argumentaccedilatildeo quando haacute conshyflito de ideias e de interesses E importante pois que o orador lenha ciecircncia da tese que se opotildee agrave sua e dos argumentos que a fundamentam Por essa razatildeo encontra-se presente em todo texto argumentativo a prolepse tamshybeacutem conhecida como figura de argumento jaacute que manteacutem um viacutenculo entre estilo e argumentaccedilatildeo Tal recurso consiste em antecipar o argumento (real ou fictiacutecio) do opositor para voltaacute-lo contra ele Dessa forma o orador surpreende o seu opositor intui um possiacutevel argumento e desarticula o seu discurso obrigando-o a rever suas estrateacutegias como no trecho a seguir

Algueacutem diraacute que nessa busca da verdade real ele pode prejudicar o reacuteu Ora essa A verdade quando procurada pelo juiz interessado em natildeo errar natildeo eacute condicionada para de antematildeo beneficiar ou prejushydicar E natildeo prejudica realmente quando desfavoraacutevel ao reacuteu porque juntada essa prova aos autos o defensor do acusado pode impugnaacute-la mostrando sua fragilidade ou anexando prova contraacuteria O contraditoacuterio na prova eacute sagrado e nenhum juiz normal se atreve a afrontar esse prinshyciacutepio (grifo nosso)15

Na reacuteplica poreacutem em que o orador conhece o argumento do seu oposhysitor e tem como objetivo refutaacute-lo tambeacutem parte desse argumento para expor com maior consistecircncia seu ponto de vista No exemplo a seguir referente agrave Accedilatildeo Penal 470 o trecho da defesa do ex-ministro dos Transshyportes Anderson Adauto acusado de ter recebido R$ 950 mil do esquema de Marcos Valeacuterio utiliza tal estrateacutegia Expocircs o advogado Roberto Pa- gliuso

O Ministeacuterio Puacuteblico para tentar imputar o crime de lavagem de dishynheiro a Anderson faz uma suposiccedilatildeo na denuacutencia de que ele tinha pleno conhecimento de todos os crimes praticados pelos integrantes da quadrilha E no paraacutegrafo seguinte o Ministeacuterio Puacuteblico enfatiza natildeo apenas pleno conhecimento mas profundo conhecimento Eu li atentashy

15 RODRIGUES Francisco Cesar Pinheiro O juiz deve ser um apaacutetico espectador ou buscar a verdade real Disponiacutevel em lthttpjusvicomartigos43355gt Acesshyso em 02 set 2012

182 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

mente o voto do ministro Joaquim Barbosa quando recebeu a denuacutencia Ele afirmava que existe prova miacutenima que viabiliza o iniacutecio da accedilatildeo penal Para condenar eacute necessaacuteria a existecircncia de prova maacutexima que decirc seguranccedila ao magistrado que garante a sua formaccedilatildeo de convicccedilatildeo - disse o advogado () (grifo nosso)

Como se observou no trecho transcrito o advogado de defesa reshygistrou o argumento de acusaccedilatildeo - sublinhado no trecho - para estruturar a defesa da sua tese sobre aquilo que considerou falho nessa acusaccedilatildeo a existecircncia de prova miacutenima

Capiacutetulo VIII

PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

O Parecer eacute uma peccedila textual de aspecto formal proacuteprio redigida por autoridade competente que emite uma opiniatildeo de teor natildeo vinculativo sobre o assunto consultado A autoridade a que nos referimos pode ser por exemplo na esfera privada um advogado com notoacuterio conhecimento juriacutedico na esfera puacuteblica um membro do Ministeacuterio Puacuteblico

Acrescente-se que o conteuacutedo de um parecer ldquo diz respeito a probleshymas juriacutedicos teacutecnicos ou administrativosrdquo 1 Tal peccedila tem como uacutenico obshyjetivo manifestar uma opiniatildeo em razatildeo de uma provocaccedilatildeo isto eacute de uma consulta Para que cumpra esse objetivo eacute importante a produccedilatildeo de uma peccedila em que se adote uma estrutura formal tiacutepica

81 A ESTRUTURA DE UM PARECER JURIacuteDICO TEacuteCNICO- -FORMAL

Natildeo existe forma definida por qualquer dispositivo legal para apreshysentaccedilatildeo de um parecer [] A CRFB art 129 V III e a Lei Orgacircnica Nacional do Ministeacuterio Puacuteblico (Lei n 862593 conhecida pela sigla LONMP) recomendam (art 43 III) que eacute dever do Ministeacuterio Puacuteblico sempre indicar os fundamentos juriacutedicos em seus pronunciamentos processhysuais Aliaacutes ressalte-se nenhum parecer pode deixar de ter fundamentos2

Assim entendemos que a praacutetica reiterada na produccedilatildeo do parecer com uma determinada estrutura serve de orientaccedilatildeo aos que pretendem emitir

1 DURAtildeO Pedro Teacutecnica de parecer Como fazer um diciacuteamen juriacutedico Curitiba Juruaacute 2012 p 27REVISTA REDACcedilAtildeO JURIacuteDICA a palavra do advogado Rio de Janeiro Edipa Ltda ndeg 8 2004

184 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Ademais a semelhanccedila de estrutura com a do acoacuterdatildeo eacute justificada por um dos seus objetivos orientar uma decisatildeo de instacircncia superior como fazem os Procuradores de Justiccedila

0 parecer segue na maioria das vezes formato semelhante ao do acoacuterdatildeo pois constitui-se de preacircmbulo ementa relatoacuterio fundamentashyccedilatildeo conclusatildeo e parte autenticativa Sucintamente cada parte apresenta as seguintes caracteriacutesticas

1 - Preacircmbulo eacute a parte em que se identificam a central idade da questatildeo as partes o nuacutemero da peccedila

2 - Ementa como lembra Campestrini ementa tem origem latina emeniscor cujo significado eacute ldquo apontamentordquo ldquo ideiardquo ldquo instrumento breve de lembranccedila ou pensamentordquo 3 enfim eacute a siacutentese relevante da peccedila Ao ler a ementa tem-se conhecimento da questatildeo central (fato) dos nexos de referecircncia da fundamentaccedilatildeo e do entendimento (conclusatildeo do parecer)

3 - Relatoacuterio eacute a narrativa sucinta e imparcial dos fatos Devem ser registrados os fatos as circunstacircncias que os esclarecem e todas as inforshymaccedilotildees determinantes ocorridas durante a anaacutelise da questatildeo

4 - Fundamentaccedilatildeo eacute um texto argumentativo em que se analisam os fatos narrados as provas as alegaccedilotildees dos envolvidos na questatildeo com o objetivo de extrair dessa anaacutelise conclusotildees devidamente justificadas por meio dos princiacutepios das regras da jurisprudecircncia dos costumes entre oushytras fontes Na fundamentaccedilatildeo utilizam-se as teacutecnicas argumentativas e estrateacutegias discursivas a fim de convencer sobre o ponto de vista que seraacute exposto na conclusatildeo

5 - Conclusatildeo eacute a apresentaccedilatildeo da opiniatildeo para a composiccedilatildeo da questatildeo analisada

6 - Parte autenticativa eacute a identificaccedilatildeo daquele que emitiu o pashyrecer considerando que assume uma responsabilidade civil pelo seu opi- namento Assim dataraacute assinaraacute e indicaraacute o nuacutemero da carteira de idenshytidade profissional

Especificadas as partes que compotildeem o parecer vamos nos deter em cada uma delas Para isso leiamos o parecer do Procurador de Justiccedila hoje aposentado Paulo Cezar Pinheiro Carneiro4

3 CAMPESTRINI H Como redigir ementas Satildeo Paulo Saraiva 1994 pl4 CARNEIRO Paulo Cezar Pinheiro A atuaccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico na aacuterea ciacutevel

Temas diversos Pareceres 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2001 p 245-248

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICOJURIacuteDICO 185

5a Cacircmara Ciacutevel Accedilatildeo InventaacuterioAgravo de Instrumento ndeg 194894 Agravante ERCSAgravado Juiacutezo da 9a Vara de Oacuterfatildeos e Sucessotildees

TESTAMENTO - Herdeiro universal - Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar -Imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade impe- nhorabilidade (ateacute 50 anos) e incomunicabilidade (vitaliacutecia) - Herdeiro instituiacutedo portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado- Possibilidade de autorizaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem depositando-se0 produto da venda em caderneta de poupanccedila liberando-se os valores gradativamente para custeio do tratamento Inteligecircncia do art 1676 do Coacutedigo Civil Atendimento agrave real vontade da testadora Interpretashyccedilatildeo sistemaacutetica dos dispositivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie Provimento do recurso5

Relatoacuterio

1 - O agravante constitui-se no uacutenico herdeiro instituiacutedo por testamenshyto de ICC tomando parte do inventaacuterio tatildeo somente um bem imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade e impenhorabilidade temposhyraacuteria (ateacute que o herdeiro atingisse 50 anos) assim como incomunicabishylidade vitaliacutecia2 - Em sendo o agravante portador do viacuterus da A IDS e estando jaacute a esta altura comprovadamente em precaacuterio estado de sauacutede ocasionado pelo reduzido niacutevel de resistecircncia do seu sistema imunoloacutegico postulou autorizaccedilatildeo para venda do bem inventariado com o fito exclusivo de possibilitar a continuidade do seu tratamento3 - 0 oacutergatildeo julgador de primeiro grau indeferiu a pretensatildeo do agravanshyte ao argumento de que o art 1676 do Coacutedigo Civil eiva de nulidade qualquer ato judicial que intente dispensar a claacuteusula de inalienabili-

Esta ementa foi produzida por membro do Ministeacuterio Puacuteblico e observa as orientaccedilotildees institucionais desse oacutergatildeo A fim de adaptaacute-la agrave funccedilatildeo acadecircmica que pretendemos nesta publicaccedilatildeo sugerimos uma reescritura apenas nos aspectos teacutecnico-formais Considere o texto como se estivesse organizado agrave margem direita da lauda TESTAMENTO - Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar - Imoacutevel gravado com claacuteusula de inalienabilidade impenhorabilidade (ateacute 50 anos) e incomunicashybilidade (vitaliacutecia) - Herdeiro universal portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado - Pedido de autorizaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem com depoacutesito do produto da venda em caderneta de poupanccedila e liberaccedilatildeo gradativa dos valores -Atendimento agrave real vontade da testadora com interpretaccedilatildeo sistemaacutetica dos disposhysitivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie - Parecer favoraacutevel ao provimento do recurso

186 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

dade conquanto lamentasse a ilustre julgadora o estado de sauacutede do herdeiro4-0 primeiro membro do oacutergatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico a quo a se proshynunciar no feito opinou pelo deferimento do pedido formulado pela ora agravante Jaacute o segundo membro do parquet a manifestar-se nos autos apoacutes juiacutezo de retrataccedilatildeo alinhou-se com o entendimento da Julgadora monocraacutetica5 - Mantida a decisatildeo sobem os autos a esta Egreacutegia Cacircmara para reashypreciaccedilatildeo da mateacuteria em comentoE o relatoacuterio

Fundamentaccedilatildeo

6 - Mais do que analisar de forma isolada um dispositivo do Coacutedigo Cishyvil importa para se determinar o verdadeiro alcance de uma norma Juriacuteshydica encetar interpretaccedilotildees sistemaacuteticas do texto legislativo sob exame7 - As interpretaccedilotildees fornecidas pela ilustre julgadora de primeiro grau membro do Ministeacuterio Puacuteblico que oficiou nos autos pecam por conshycentrar a anaacutelise da questatildeo em um uacutenico dispositivo legal8 - Ao pretender vasculhar os preceitos aplicaacuteveis ao caso concreto o aplicador do Direito deve mais do que se ater agrave literalidade do texto em anaacutelise atender e procurar a mens legis situar os dispositivos em uma estrutura de significaccedilotildees e enfim adequar sua compreensatildeo agraves novas valoraccedilotildees sociais exsurgidas9 - Mais que tudo isto eacute a proacutepria Lei de Introduccedilatildeo ao Coacutedigo Civil no seu artigo 5deg que fornece a diretriz a ser aplicada pelo julgador na interpretaccedilatildeo da norma legalldquoNa aplicaccedilatildeo da lei o juiz atenderaacute aos fins sociais a que ela se dirige e agraves exigecircncias do bem comumrdquo10 - Em se tratando de sucessatildeo testamenlaacuteria impende investigar pre- cipuamente a vontade do testador buscando a sua essecircncia de forma a condicionar a interpretaccedilatildeo das disposiccedilotildees testamentaacuterias e adequar os preceitos legais incidentes agrave hipoacutetese11 - Neste caso a testadora natildeo possuindo herdeiros necessaacuterios noshymeou seu sobrinho o ora agravante entatildeo com apenas 13 anos seu herdeiro universal gravando os bens imoacuteveis com jaacute mencionadas claacuteushysulas Visava ela concomitantemente a beneficiar o herdeiro instituiacutedo e protegecirc-lo intentando garantir-lhe teto seguro ateacute idade madura (de 50 anos) isolando-o das vicissitudes da vida moderna12 - Natildeo poderia a testadora imaginar jamais agravequela altura que este terriacutevel mal chamado AIDS iria apossar-se do herdeiro que certamente

Cap V III - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 187

com muito carinho acabara de instituir relegando-o a uma gradual e sofrida morte prematura13 - Decerto que a vontade da testadora natildeo se coaduna com a atual sishytuaccedilatildeo do agravante este embora possua o domiacutenio de um bem imoacutevel natildeo pode usaacute-lo nem fruiacute-lo eis que se encontra em constante tratamenshyto de sauacutede e pior natildeo pode empregar o valor do patrimocircnio transmishytido em prol da tentativa de prolongar sua existecircncia Ora onde estaacute a prevalecircncia da vontade do testador essencial no cumprimento das disshyposiccedilotildees testamentaacuterias diante destas circunstacircnciasA interpretaccedilatildeo da norma estaria levando em conta os fins sociais e as exigecircncias do bem comum a que ela se destina14 - Nem a doutrina nem a jurisprudecircncia nem o legislador permaneceshyram estancados no tempo logrando a evoluccedilatildeo interpretativa adequar o dispositivo contido no art 1676 do Coacutedigo Civil agraves novas facetas da vida abrandando o seu rigor15 - De fato jaacute em 1944 atraveacutes do Decreto-lei 6777 permitiu-se a alienaccedilatildeo de imoacuteveis gravados substituindo-os por outros imoacuteveis ou tiacutetulos da diacutevida puacuteblica permanecendo sobre estes os gravames16 - Nesta linha os doutrinadores assim como os tribunais passaram a admitir a alienaccedilatildeo do bem gravado com autorizaccedilatildeo judicial por necessidade ou conveniecircncia manifesta do titular ocorrendo a sub-ro- gaccedilatildeo em outro bem17 - No caso em tela nada impede o produto poupanccedila agrave disposiccedilatildeo do juiacutezo utilizando-se o seu saldo no custeio do tratamento do agravante18 - Argumenta-se para sustentar o entendimento contraacuterio que o bem substituto (valor depositado em poupanccedila) iria pouco a pouco se esshygotando acabando por exercer o herdeiro poder de disposiccedilatildeo sobre o imoacutevel herdado justamente o que pretendeu vedar a testadora e assegushyrar o preceito do Coacutedigo Civil19-0 que se verifica contudo eacute que relegar o herdeiro agrave morte enshyquanto o bem recebido permanece absolutamente inoacutexio pois sequer rende frutos isto sim significa afrontar a vontade da testadora e o proacuteshyprio alcance teleoloacutegico da lei desfigurando por completo o proacuteprio ato de liberalidade20 - Vale mencionar neste sentido trecho de acoacuterdatildeo unacircnime profeshyrido pela 6a Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila do Rio de Janeiro no agravo em que foi relator o Desembargador Laerson Mauro

Se pela imposiccedilatildeo das claacuteusulas de inalienabilidade incomunicabili- dade e impenhorabilidade vitaliacutecia sobre bens de heranccedila da legiacutetima como da disponiacutevel abrangendo natildeo soacute o principal como os frutos e

188 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

rendimentos a liberalidade perder toda a sua utilidade chegando messhymo a descaracterizar-se juriacutedica e economicamente eacute imperioso que se apliquem tantas regras exegeacuteticas quantas caibam na espeacutecie para evitar-se a inocuidade da deixa preservando assim agrave herdeira algum beneficio em vida Agravo provido

21 - Desta forma deve o uacutenico bem inventariado conquanto gravado com as claacuteusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade ser alienado conforme requerido depositando-se o produto da venda em caderneta de poupanccedila agrave disposiccedilatildeo do juiacutezo a fim de que libere gradativamente as quantias necessaacuterias ao tratamento de sauacutede do herdeiro universal posiccedilatildeo esta que se afina com o mais atual entendimento doutrinaacuterio e jurisprudencial intentando ainda alcanccedilar o verdadeiro fim dos disposhysitivos aplicaacuteveis agrave espeacutecie (atender agrave vontade do testador e ao messhymo tempo atender aos fins sociais compreendidos no caso em exame) interpretando-os sistematicamenteConclusatildeo

Assim opina o Ministeacuterio Puacuteblico pela reforma da decisatildeo a quo pershymitindo-se a alienaccedilatildeo do bem gravado atendidas as exigecircncias contishydas no item 20 supraE o parecer

Rio de Janeiro 1deg de fevereiro de 1995

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (Procurador de Justiccedila)

Como se pode observar neste parecer o Ministeacuterio Puacuteblico foi proshyvocado a se pronunciar a respeito do pedido de alienaccedilatildeo de um imoacutevel formulado pelo uacutenico herdeiro desse bem gravado com claacuteusula de inalieshynabilidade e de impenhorabilidade temporaacuteria (ateacute que o herdeiro atingisse 50 anos) assim como incomunicabilidade vitaliacutecia Tal pedido foi negado em decisatildeo de primeira instacircncia na qual se alinhou um dos membros do Ministeacuterio Puacuteblico enquanto o outro discordou da decisatildeo a quo Assim caberaacute a um colegiado decidir se defere ou natildeo o pedido Antes entretanto a questatildeo seraacute avaliada pelo Procurador de Justiccedila que opinaraacute a respeito

82 EMENTAApoacutes o preacircmbulo o parecer analisado iniciou a parte textual com

a ementa Seu conteuacutedo revelou de forma concisa o fato central quem o

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

quecirc e por que se pleiteia algo o argumento que se opocircs ao pedido e os dois argumentos em que se baseou o procurador para decidir como decidiu

Esclarecendo

Fato central TestamentoQuem Herdeiro universal0 quecirc Existecircncia de um uacutenico bem a inventariar sendo imoacutevel

gravado com claacuteusula de inalienabilidade impenhora- bilidade (ateacute 50 anos) e incomunicabilidade (vitaliacutecia)

Por quecirc Herdeiro instituiacutedo portador do viacuterus da AIDS com doenccedila em estaacutegio avanccedilado Possibilidade de autorishyzaccedilatildeo para alienaccedilatildeo do bem depositando-se o produshyto da venda em caderneta de poupanccedila liberando-se os valores gradativamente para custeio do tratamento

Argumento que se opocircs ao pedido

Inteligecircncia do art 1676 do Coacutedigo Civil

Argumentos do procurador Atendimento agrave real vontade da testadora Interpretaccedilatildeo sistemaacutetica dos dispositivos aplicaacuteveis

Conclusatildeo do parecer Provimento do recurso

Note-se que essa ementa oferece informaccedilotildees contidas em todas as partes da peccedila Ela visa apenas ao entendimento do caso concreto numa oacutetica simplificada Por isso devem ser delineados somente o fato gerador do conflito os nexos de referecircncia (trecircs a cinco) e o entendimento do caso concreto Quanto aos nexos de referecircncia esses satildeo um importante auxiacutelio para a construccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo representam um verdadeiro fio conshydutor das ideias a serem discutidas na parte argumentativa do documento isto eacute na fundamentaccedilatildeo

Considerando o objetivo didaacutetico desta obra registremos sucintashymente como produzir uma ementa e o conteuacutedo que ela deve conter

QUANTO Agrave FORMA QUANTO AO CONTEUacuteDOEscreva a ementa a partir do centro da foshylha no topo direito justificado

Registre o fato juriacutedico ou o tipo de accedilatildeo ou instrumento juriacutedico proposto

Utilize caixa-alta para a primeira informashyccedilatildeo oferecida

Em seguida se possiacutevel faccedila uma alushysatildeo agraves partes sem nomeaacute-las

Natildeo registre o nome proacuteprio das partes Selecione duas ou trecircs informaccedilotildees exshytraiacutedas do relatoacuterio que possam ser usashydas como argumento

190 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

QUANTO Agrave FORMA QUANTO AO CONTEUacuteDO

Produza frases nominais e palavras-chave Evite adjetivos e conjunccedilotildees Use linguashygem denotativa

Os nexos de referecircncia podem ser funshydamentos de fato ou de direito

Inicie com letra maiuacutescula cada item regisshytrado e separe-os com travessatildeo

Registre seus dois ou trecircs argumentos mais fortes Lembre-se de buscaacute-los nas fontes do Direito

Utilize no maacuteximo 8 linhas Por fim registre o seu entendimento

Talvez vocecirc esteja se perguntando como escrever frases nominais Inicialmente esclarecemos que uma frase nominal eacute um enunciado sem verbo conjugado no presente preteacuterito e futuro Registre-se que as formas nominais (infinitivo particiacutepio e geruacutendio) podem ser usadas em frases noshyminais Entretanto caso seja possiacutevel evite-as especialmente o infinitivo e o geruacutendio Para produzir frases nominais sugerimos uma estrateacutegia penshyse no verbo que deseja usar e em seguida no substantivo derivado desse verbo Observe como eacute faacutecil

VerboSubstantivo deverbal (derivado do verbo)

Abdicar A abdicaccedilatildeoAbster-se A abstenccedilatildeoAcordar O acordoAgravar O agravoAtender 0 atendimentoApreender A apreensatildeoConcorrer A concorrecircnciaCompreender A compreensatildeoCombater 0 combateDelinquir A delinquecircnciaEnfatizar A ecircnfaseMorrer A morteNascer 0 nascimento

Assim em vez de o procurador escrever na ementa Deve-se atender agrave real vontade da testadora ele escreveu ldquo Atendimento agrave real vontade da testadorardquo

Cap VIII - PARECER TEacuteCNIC0-JURIacuteDIC0 191

a) Importa ainda registrar que a ementa deve possuir algumas qualishydades quais sejam seleccedilatildeo cuidadosa dos registros

b) clarezac) coerecircnciad) obediecircncia agrave sequecircncia cronoloacutegica e loacutegicae) concisatildeof) objetividadeg) uso do registro cultoh) macrocompreensatildeo

Por fim nunca eacute demais registrar que as partes do parecer (ementa relatoacuterio fundamentaccedilatildeo conclusatildeo) devem estar em constante comunishycaccedilatildeo Assim a primeira informaccedilatildeo da ementa deve conferir com a do relatoacuterio Ademais soacute registre na ementa aquilo que estiver contido no reshylatoacuterio na fundamentaccedilatildeo e na conclusatildeo

O conteuacutedo extraiacutedo do relatoacuterio e da fundamentaccedilatildeo deve indicar os nexos de referecircncia utilizados na anaacutelise do caso concreto e que foram devidamente ponderados pelo parecerista Observe que representam uma sequecircncia loacutegica de palavras

A seleccedilatildeo desses nexos de referecircncia deve ser portanto bem planejashyda a fim de oferecer ao leitor uma ideia geral mas bem clara e objetiva do caso concreto da forma como ele foi valorado e da tese que o parecerista defende

83 RELATOacuteRIO

Voltemos ao parecer do Procurador Paulo Cezar de Pinheiro Carneishyro Apoacutes a ementa foram relatados os fatos que compotildeem o conflito Obshyservam-se algumas caracteriacutesticas desse relato que o distinguem de outras narrativas como a da peticcedilatildeo inicial Certamente a objetividade com que as informaccedilotildees foram expostas permite afirmar que a narrativa dos fatos do parccer deve ser simples isto eacute natildeo valorada Assim foram evitados modalizadores que tomariam o texto tendencioso Ademais os fatos foram dispostos conforme a sequecircncia cronoloacutegica em que ocorreram objetivanshydo facilitar a compreensatildeo da questatildeo Destaque-se ainda o uso da paraacuteshyfrase caracterizando a polifonia ao se registrar a pretensatildeo do agravante eo argumento da juiacuteza

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Podemos sintetizar o relatoacuterio com o seguinte quadro

ELEMENTOS DO RELATOacuteRIO INFORMACcedilOtildeES RELATIVAS AOS ELEMENTOS

Questatildeo central e partes envolvidas 1- Um bem imoacutevel gravado com claacuteusulas um herdeiro e uma testadora

Problematizaccedilatildeo 2- Herdeiro portador do viacuterus da AIDS postulou a quebra das claacuteusulas

Como foi decidido o problema 3- 0 oacutergatildeo julgador de primeira instacircncia indeshyferiu o pedido4- Pronunciamento do MP Empate de decisatildeo

Por isso 5- Impotildee-se que a questatildeo seja decidida em instacircncia superior mas antes seraacute avaliada pelo Procurador de Justiccedila

Eacute evidente que a variedade dos tipos de questotildees a demandar um entendimento eacute muito grande Assim torna-se necessaacuterio estabelecer um criteacuterio para a escritura do relatoacuterio de um parecer teacutecnico-formal Comoo nosso objetivo principal eacute didaacutetico-pedagoacutegico oferecemos instruccedilotildees a respeito do conteuacutedo e da forma que podem ser aplicaacuteveis na maioria dos casos concretos

Dessa maneira entendemos que o conteuacutedo do relatoacuterio de um pareshycer deve satisfazer agraves seguintes questotildees

ELEMENTOS DA NARRATIVA FORENSE

O quecirc - fato juriacutedico central ou questatildeo juriacutedica centralQuem - as partes devidamente nomeadas e caracterizadas nacionalidade estado civil profissatildeo residecircncia educaccedilatildeo qualitativa e quantitativa representatividade soshycial aspectos fiacutesicos e psicoloacutegicos etc

Quando - tempo cronoloacutegico e psicoloacutegicoOnde - lugar fiacutesico e socialComo - registro das principais ocorrecircncias da forma como o fato juriacutedico aconteceu

Por quecirc - registro da(s) razatildeo(otildees) que deu(deram) origem ao fato juriacutedicoPor isso - registro da(s) consequecircncia(s) advinda(s) do fato juriacutedico

Acrescente-se que as informaccedilotildees registradas no relatoacuterio do parecer teacutecnico-juriacutedico cumprem uma funccedilatildeo argumentativa (narrativa a serviccedilo da argumentaccedilatildeo) Portanto soacute se devem registrar fatos provas e questotildees

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 193

processuais que seratildeo utilizados na fundamentaccedilatildeo a fim de servirem de base para argumentos ou para serem contestados Com efeito natildeo se justishyfica selecionar informaccedilatildeo desconsiderada na fundamentaccedilatildeo Lembramos que as partes do parecer estatildeo em iacutentima comunicaccedilatildeo e devem compor a peccedila de forma coesa e coerente

Quanto agrave forma sugerimos adotar os seguintes criteacuterios

a) Inicie o primeiro paraacutegrafo esclarecendo a centralidade da questatildeo Caso natildeo haja cabeccedilalho no seu parecer inclua tambeacutem os noshymes das pessoas diretamente envolvidas devidamente qualificadas Acrescente quando e onde ocorreu a questatildeo em apreccedilo

b) A partir do segundo paraacutegrafo inicie a narrativa dos fatos provas obedecendo agrave cronologia linear

c) Use o tempo preteacuterito jaacute que os fatos ocorreram anteriormente ao relato

d) A fim de manter a imparcialidade no relato utilize a 3a pessoa do singular recorra agrave polifonia e evite modalizadores

e) Use paraacutegrafos para organizar as ideiasf) Seja sucintog) Siga a norma cultah) Apoacutes encerrar o relato pule uma linha e registre ldquo Eacute o relatoacuteriordquo 6

84 FUNDAMENTACcedilAtildeO

Em capiacutetulos anteriores orientamos natildeo apenas a respeito do processo que antecede a produccedilatildeo da fundamentaccedilatildeo isto eacute ao seu planejamento como tambeacutem a maneira de produzi-la Resta-nos apenas destacar alguns pontos que deixamos para este momento

Como se pode observar na fundamentaccedilatildeo do parecer do Procurador Paulo Cezar Pinheiro Carneiro durante todo o texto argumentativo ele se ateve a uma linha de raciociacutenio e foi fiel a ela o interesse da testadora era proteger o herdeiro e o direito deve ser interpretado de forma sistemaacutetica Criou portanto objetivos a alcanccedilar mediante a argumentaccedilatildeo isto eacute levar

6 Para aprofundar o estudo da narrativa tanto a simples quanto agrave valorada sugere-se recorrer agrave obra dos mesmos autores publicada por esta mesma editora Liccedilotildees de Narrativa Juriacutedica

T194 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO 195

a crer que a real vontade da testadora era ldquobeneficiar o herdeiro instituiacutedo e protegecirc-lo intentando garantir-lhe teto seguro ateacute idade madura (de 50 anos) isolando-o das vicissitudes da vida modernardquo e que a interpretaccedilatildeo da norma deve considerar os fins sociais e as exigecircncias do bem comum a que ela se destina Observe que tais objetivos jaacute estatildeo claros na ementa Isso representa dizer que existe relaccedilatildeo de sentido entre ementa e fundashymentaccedilatildeo

Assim traccedilado o percurso restou-lhe planejar os argumentos e organizaacute-los no texto Certamente natildeo dispensou nada do que foi regisshytrado no relatoacuterio iniciando sua fundamentaccedilatildeo pelo que ele considerou ter sido uma falha na avaliaccedilatildeo da juiacuteza ater-se a um uacutenico dispositivo legal demonstrando atitude que natildeo caberia agrave moderna hermenecircutica juriacutedica

Em sua fundamentaccedilatildeo o ilustre Procurador de Justiccedila nos oferece uma aula de como interpretar o Direito flexibiliza a interpretaccedilatildeo do art 1676 do Coacutedigo Civil utiliza-se do art 5deg da Lei de Introduccedilatildeo ao Coacutedigo Civil a fim de lhe fornecer sustentaccedilatildeo para a aplicaccedilatildeo da Loacutegica do Rashyzoaacutevel e contrariar a regra em que se assentou a decisatildeo de primeiro grau cita a doutrina e a jurisprudecircncia de forma a adequar a regra agraves peculiarishydades do caso concreto e ao contexto situacional real

Observa-se assim que a fundamentaccedilatildeo destina-se a sedimentar a conclusatildeo que se registraraacute ao teacutermino da explanaccedilatildeo dos argumentos

85 CONCLUSAtildeO

Natildeo se pode perder de vista que a conclusatildeo de uma peccedila depende do seu objetivo Com efeito na peticcedilatildeo inicial cujo fim eacute provocar o judishyciaacuterio para lhe encaminhar um pedido isto eacute a pretensatildeo do autor em sua conclusatildeo se revelaraacute tal pedido

Jaacute no parecer a conclusatildeo como parte integrante da peccedila deve represhysentar a siacutentese da opiniatildeo daquele que a produziu ou melhor expressar o entendimento alcanccedilado apoacutes anaacutelise ponderada de todos os fatos provas indiacutecios argumentos das partes e principalmente das fontes do direito Essa parte da peccedila deve estar em consonacircncia com a ementa em que se apresentou o entendimento pela expressatildeo ldquo Parecer favoraacutevel a ()rdquo Natildeo acrescente informaccedilatildeo nova na conclusatildeo Responda objetivamente agrave conshysulta formulada utilizando-se do verbo ldquo opinarrdquo

A autenticaccedilatildeo consiste apenas em datar e assinar a peccedila

Retomando a conclusatildeo do parecer analisado eacute possiacutevel verificar a praacutetica dessa breve explanaccedilatildeo teoacuterica

II - Conclusatildeo

Assim opina o Ministeacuterio Puacuteblico pela reforma da decisatildeo a quo pershymitindo-se a alienaccedilatildeo do bem gravado atendidas as exigecircncias contishydas no item 20 supraE o parecer

Rio de Janeiro 1deg de fevereiro de 1995

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (Procurador de Justiccedila)

86 EXEMPLO DE PARECER TECNICO-JURIDICO

Muitos graduandos do curso de Direito solicitam aos seus professoshyres que apresentem exemplos de textos produzidos por pessoas com recoshynhecido saber juriacutedico Essa solicitaccedilatildeo jaacute foi atendida nesta obra com a apresentaccedilatildeo e anaacutelise do parecer do ilustre Procurador de Justiccedila Paulo Cezar Pinheiro Carneiro Entretanto entendemos ser importante tambeacutem oferecer um parecer escrito em sala de aula com sugestotildees dos alunos e do professor da turma de Teoria e Praacutetica da Redaccedilatildeo Juriacutedica

DISPUTA PELA GUARDA DE M ENOR - Separaccedilatildeo litigiosa - Guarshyda provisoacuteria com a avoacute paterna - Alegaccedilatildeo da matildee de melhor condiccedilatildeo de assistecircncia agrave filha mdash Decisatildeo pela guarda alternada - Apelaccedilatildeo dos pais contra a guarda alternada - Avaliaccedilatildeo da assistecircncia social favoshyraacutevel ao pai - Bem-estar do menor - Inteligecircncia do artigo 1584 CC- Parecer favoraacutevel ao pai

Relatoacuterio

Trata-se da disputa da guarda de PLD quatro anos entre Regina Duarte 35 anos divorciada comerciaacuteria e Ivanildo Peixoto Vieira 38 anos divorciashydo O fato teve iniacutecio em 12 de setembro de 2005 no Rio de JaneiroSegundo Ivanildo apoacutes sete anos de casamento separou-se judishycialmente de sua esposa Como ela natildeo tinha condiccedilotildees financei-

196 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

ras de educar a crianccedila e garantir a sua manutenccedilatildeo aleacutem de estar passando por um periacuteodo de instabilidade emocional a guarda de fato da menor lhe foi concedida Afirmou que natildeo manteacutem um bom relacionamento com a mulher jaacute que ela nunca admitiu a separaccedilatildeo e frequentemente promove cenas de ciuacutemes quando se encontram Relatou que a crianccedila frequenta a creche e que quando vai para o curso de Enfermagem agrave noite ela fica sob os cuidados da avoacute patershyna Requereu assistecircncia judiciaacuteria gratuita a guarda provisoacuteria da filha e a procedecircncia da accedilatildeoFrustrada a tentativa de conciliaccedilatildeo o juiz deferiu a guarda provisoacuteshyria agrave avoacute paterna Regina contestou afirmando serem mentirosas as afirmaccedilotildees constantes da peticcedilatildeo inicial e que os litigantes de coshymum acordo deixaram a filha sob a responsabilidade da avoacute patershyna a quem deram a guarda de fato Entretanto entende que o autor natildeo tem condiccedilotildees de cuidar de PLDV porque natildeo trabalha e recebe apenas uma bolsa do Hospital Satildeo Francisco no valor de R$ 20000 mensais Ademais aleacutem de passar todas as manhatildes nesse hospital o autor frequenta o curso de Enfermagem noturno Disse que quando deixou a filha aos cuidados da avoacute natildeo tinha condiccedilotildees de sustentaacute- -la situaccedilatildeo jaacute superada pois trabalha na XXXX recebendo salaacuterio de R$ 41650 mensais Requereu a assistecircncia judiciaacuteria gratuita a improcedecircncia da demanda e o deferimento da guarda de PLDV em seu favorO estudo social foi apresentado a f 2329 Nele registrou-se que ldquosob a guarda do pai P estaacute convivendo em ambiente salutar propiacutecio ao seu desenvolvimento natildeo havendo razotildees plausiacuteveis neste momento que justifiquem uma mudanccedilardquo (f 28) E ainda ldquoassim a partir da situaccedilatildeo apresentada das consideraccedilotildees pertinentes e de acordo com a percepshyccedilatildeo de sentimentos e emoccedilotildees expressados do ponto de vista social neste momento somos de parecer favoraacutevel agrave permanecircncia de PLDV sob a guarda do genitor Sr IPVrdquo (f 29)Em audiecircncia realizou-se a oitiva das testemunhas (f 4851) que relashytaram ser o pai extremamente dedicado e que a crianccedila demonstra estar muito feliz em sua companhiaO MM Juiz de Direito julgou procedente em parte o pedido deferindo a ambos os genitores a guarda alternada de PLDV (f 5871)Regina apelou dizendo que a guarda alternada traraacute prejuiacutezos ao deshysenvolvimento psiacutequico da crianccedila que conta apenas quatro anos de idade sendo ela matildee a que reuacutene melhores condiccedilotildees para cuidar da filha Afirmou ainda que natildeo criaraacute dificuldades para que o pai visite a menina e requereu a guarda definitiva de PLDVIvanildo tambeacutem apelou afirmando que a guarda alternada prejudicaraacute

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICOJURIacuteDICO 197

o desenvolvimento emocional de PLDV pois os litigantes natildeo se relashycionam de forma harmoniosa Salientou ter melhores condiccedilotildees para educar e cuidar da filha jaacute que Regina deixou de priorizar a crianccedila para tratar de interesses pessoais logo apoacutes a separaccedilatildeo do casal Ademais aduziu estar com a guarda de fato da filha inexistindo motivos que justifiquem a mudanccedila na rotina de PLDVRequereu a concessatildeo do efeito suspensivo ao recurso e o deferimento da guarda da filha em seu favorE o Relatoacuterio

Fundamentaccedilatildeo

As constantes alteraccedilotildees e a forma de conviacutevio no mundo contemposhyracircneo deixam cicatrizes profundas para as geraccedilotildees futuras Conviveshymos com um crescente clima de separaccedilotildees A famiacutelia considerada a ceacutelula mater da sociedade rompe-se com a mesma facilidade com que se cria O resultado deste rompimento por vezes eacute o fruto desshyta cisatildeo virar objeto dc contenda Cabe ao judiciaacuterio interferir como matildeo mais forte e garantir a este inocente a melhor condiccedilatildeo para o seu desenvolvimentoRessalte-se que conforme consta dos autos tal condiccedilatildeo estaacute presente no conviacutevio atual da crianccedila com seu pai porque o ambiente em que se encontra eacute salutar Tambeacutem foram verificadas as condiccedilotildees propiacutecias para o seu desenvolvimento natildeo havendo portanto razotildees que justifishyquem a alteraccedilatildeo Aleacutem disso Ivanildo tem demonstrado preocupaccedilatildeo em oferecer estabilidade emocional agrave crianccedila porquanto nos momenshytos em que se empenha em progredir na vida com os estudos noturnos deixa-a aos cuidados zelosos de sua matildeeNatildeo podemos esquecer que a inteligecircncia do artigo 1584 do Coacutedigo Cishyvil institui que a partir da separaccedilatildeo judicial a guarda dos filhos deveraacute ser atribuiacuteda a quem revelar melhores condiccedilotildees de assumi-la Dessa forma confirma-se mediante os fatos anteriormente enunciados que a situaccedilatildeo deve ser mantida em seu status quoE importante ressaltar que embora a matildee argumente que tem condiccedilotildees de sustentar a crianccedila esta possibilidade natildeo remete diretamente ao interesse ou bem-estar da menina visto que nas condiccedilotildees aluais esta e outras necessidades estatildeo plenamente preenchidas Assim a melhor condiccedilatildeo para a menor natildeo seria a alteraccedilatildeo da guarda transformando um desenvolvimento encaminhado numa aposta vatildeEm relaccedilatildeo agrave guarda compartilhada anteriormente deferida fica clara a sua impossibilidade devido agraves contendas entre os litigantes o que iria

198 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

prejudicar o desenvolvimento da crianccedila que seria colocada em linha de confronto Tal entendimento eacute reforccedilado pela decisatildeo proferida no Rio Grande do Sul pela 7a Cacircmara Ciacutevel do Tribunal de Justiccedila nos autos de Agravo interno n 70010991990 de que foi relatora a Desemshybargadora Maria Berenice ldquoDescabido impor a guarda compartilhada que soacute obteacutem sucesso quando existe harmonia e convivecircncia paciacutefica entre os genitoresrdquoDessa forma por considerar que o bem-estar da crianccedila deva prevalecer acima de qualquer outro interesse e por reconhecer que na presente data o pai desfruta de melhores condiccedilotildees de asseguraacute-lo a posse e guarda deveratildeo ser concedidas ao progenitor

ConclusatildeoEm face do exposto opina-se que a posse e a guarda da crianccedila sejam deferidas ao pai

E o parecer

Rio de Janeiro 4 de dezembro de 2008

x x x x x x x x x x x

87 ESQUEMA DA DISPOSICcedilAtildeO DAS PARTES DO PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

PARECERPular 2 linhas

EMENTA1 linha

2 linhas

R ELA T Oacute R IOI linha

Cap VIII - PARECER TEacuteCNICO-JURIacuteDICO

1 linhaEacute O RELATOacuteRIO

2 linhasFUNDAM ENTACcedilAtildeO

I linha

2 linhasCO N CLUSAtildeO

1 linha

2 linhasE o parecer

2 linhasLocal e data

Assinatura N deg da Carteira funcional do Especialista

Capiacutetulo IX

EXERCIacuteCIOS

Uma das maneiras mais eficientes de fixar um conteuacutedo lido na doushytrina eacute praticar por meio de exerciacutecios Temos convicccedilatildeo de que no meio acadecircmico essa atividade mostra-se indispensaacutevel especialmente porque a Metodologia do Caso Concreto consolidou o meacutetodo misto (indutivo- -dedutivo) como o mais eficiente para o ensino juriacutedico no Brasil

Este capiacutetulo pretende oferecer aos leitores a oportunidade de fixashyccedilatildeo do conteuacutedo relativo agrave argumentaccedilatildeo juriacutedica Ainda que natildeo esteja mapeado todo o conteuacutedo do livro o leitor encontraraacute aqui excelente oporshytunidade de consolidar o que aprendeu na disciplina por meio de questotildees objetivas e discursivas

Esclarecemos que algumas questotildees visam agrave simples memorishyzaccedilatildeo e reproduccedilatildeo de conceitos e caracteriacutesticas Outras pretendem ivaliar a capacidade de compreender e aplicar os institutos desenvolvishydos ao longo dos capiacutetulos Outros ainda tecircm como objetivo avaliar a capacidade de refletir e aplicar esse conteuacutedo a situaccedilotildees profissionais especiacuteficas

Ao final oferecemos ainda uma pequena coletacircnea de textos com a finalidade de oferecer ao professor material adequado aacute praacutetica de fundashymentaccedilotildees juriacutedicas Nesses textos certamente o docente encontraraacute farto material para desenvolver as propostas que eventualmente natildeo tenham sido abordadas nas demais questotildees

Leia com cuidado os enunciados e atenccedilatildeo na escolha das opccedilotildees Sugerimos somente resolver os exerciacutecios apoacutes a leitura do capiacutetulo corshyrespondente

202 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 1 - Marque a opccedilatildeo INCORRETAa) A demonstraccedilatildeo eacute procedimento caracteriacutestico de ciecircncias loacutegico-dedutivas como

a Matemaacutetica e a Fiacutesicab) O caraacuteter abstrato das disciplinas exatas permite que o raciociacutenio formal se exershy

ccedila de modo vaacutelido independentemente da realidade circundantec) Como na argumentaccedilatildeo parte-se de proposiccedilotildees discutiacuteveis para tornar-se conshy

sistente haacute que procurar as premissas no campo das verdades absolutasd) A argumentaccedilatildeo aplica-se especialmente a situaccedilotildees concretas da vida Entra

nos domiacutenios das ciecircncias sociais e humanas como a Poliacutetica e o Direito

Questatildeo 2 - Marque a opccedilatildeo CORRETAa) A demonstraccedilatildeo considera o contexto em que se desenvolve devido ao seu cashy

raacuteter pessoal implica um raciociacutenio loacutegico-dedutivo cujo tracircnsito eacute sensiacutevel agraves necessidades e circunstacircncias de tempo e de espaccedilo

b) No Direito a demonstraccedilatildeo estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo porque esta se sershyve daquela a fim de produzir os meios de prova de que necessita

c) A linguagem de que deve se servir a argumentaccedilatildeo eacute a artificial razatildeo pela qual o natildeo iniciado no Direito tem extrema dificuldade de compreender o significado de seus textos

d) Na demonstraccedilatildeo os receptores da mensagem satildeo o ldquoauditoacuterio particularrdquo pois todos que falam se dirigem necessariamente a algueacutem

Questatildeo 3 - Leia o quadro adiante

DEMONSTRACcedilAtildeO ARGUMENTACcedilAtildeO

I Premissas Proposiccedilotildeesindiscutiacuteveis

Proposiccedilotildeesdiscutiacuteveis

II Tipo de raciociacutenio Formal Flexiacutevel

III Tipo de linguagem Natural e simples Simboacutelica e artificial

IV Relaccedilatildeo com o contexto Independente do contexto Contextualizada

V Relaccedilatildeo com o auditoacuterio Pessoal Impessoal

Marque os itens cujas informaccedilotildees completam de maneira CORRETA a tabeshyla associando sem equiacutevoco as caracteriacutesticas relativas agrave demonstraccedilatildeo e agrave argumentaccedilatildeoa) I II e IVb) I III e Vc) II III e Vd) II IV e V

-

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 203

Questatildeo 4 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoA demonstraccedilatildeo parte de proposiccedilotildees indiscutiacuteveis independenteshymente de se tratar de afirmaccedilotildees objetivamente verdadeiras ou hipoacuteteshyses admitidas por convenccedilatildeo Os fundamentos a demonstrar subtraem a qualquer tipo de controveacutersia () Ao contraacuterio na argumentaccedilatildeo parte-se de proposiccedilotildees discutiacuteveis Haacute que se procurar as premissas no campo das verdades comuns dos princiacutepios e das opiniotildees correnshytes naquilo que eacute aceito pelos interlocutores Essas verdadesrdquo natildeo satildeo absolutas satildeo relativas a dados contextos culturais em determishynados momentos da histoacuteriardquo

a) As ldquoproposiccedilotildees indiscutiacuteveisrdquo a que recorre a demonstraccedilatildeo satildeo os axiomasb) O contexto especiacutefico em que se desenvolve a argumentaccedilatildeo considera o auditoacuteshy

rio universal como mais importante que o auditoacuterio particularc) Como os fundamentos de que se serve a demonstraccedilatildeo ldquosubtraem a qualquer

tipo de controveacutersiardquo pode-se dizer que utiliza a loacutegica formal e natildeo a loacutegica do razoaacutevel

d) Natildeo haacute ldquoverdadesrdquo na argumentaccedilatildeo porque suas premissas satildeo prioritariamente valores

Questatildeo 5 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoUma deduccedilatildeo eacute um argumento que dadas certas coisas algo aleacutem dessas coisas necessariamente se segue delas Eacute uma demonstrashyccedilatildeo quando as premissas das quais a deduccedilatildeo parte satildeo verdadeiras e primitivas ou satildeo tais que o nosso conhecimento delas teve origishynalmente origem em premissas que satildeo primitivas e verdadeiras e eacute uma deduccedilatildeo dialeacutectica se raciocina a partir de opiniotildees respeitaacuteveisrdquo (Aristoacuteteles)

a) Deduccedilatildeo eacute um tipo de organizaccedilatildeo silogiacutestica do raciociacuteniob) Induccedilatildeo eacute um tipo de organizaccedilatildeo silogiacutestica do raciociacutenioc) Deduccedilatildeo (PM + Pm = C) Induccedilatildeo (Pm + PM = C)d) A demonstraccedilatildeo eacute essencialmente indutiva enquanto a argumentaccedilatildeo eacute essenshy

cialmente dedutiva

Questatildeo 6 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

Todos os mamiacuteferos tecircm pulmotildeesAs baleias satildeo mamiacuteferosLogo todas as baleias tecircm pulmotildees

a) Trata-se de um silogismob) O raciociacutenio desenvolvido leva a uma conclusatildeo iloacutegicac) O raciociacutenio desenvolvido leva a uma conclusatildeo incoerented) A primeira assertiva funciona como premissa maior (PM) do argumento

204 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 7 - Todos os itens constituem eficientes recursos disponiacuteveis aoargumentador para a defesa de seus pontos de vista EXCETOa) Formulaccedilatildeo de hipoacutetesesb) Diaacutelogo polifocircnicoc) Estrateacutegias modalizadorasd) Axiomas

Questatildeo 8 - Acerca da argumentaccedilatildeo juriacutedica marque a opccedilatildeo INCORRETAa) A argumentaccedilatildeo juriacutedica como produccedilatildeo intelectual do campo do direito deve

seguir a legislaccedilatildeo como paracircmetro necessaacuterio sob pena de natildeo ser acatada no meio acadecircmico

b) As questotildees psicoloacutegicas devem ser consideradas como elemento relevante da aceitaccedilatildeo da tese pelo auditoacuterio

c) ChaTm Perelman propocircs ampliar o campo da razatildeo para aleacutem dos confins das ciecircncias dedutivas e das ciecircncias empiacutericas pois o que mais interessa a Perelshyman eacute a estrutura da argumentaccedilatildeo e a sua loacutegica

d) A teoria da argumentaccedilatildeo juriacutedica preocupa-se com a produccedilatildeo de razotildees e de argumentos para o cumprimento da funccedilatildeo de solucionar conflitos

Questatildeo 9 - Leia o fragmento que segue

ldquoDepois que a Escola da Exegese com Napoleatildeo agrave frente proclamou no seacuteculo XIX que o direito se identifica com a ldquolei escritardquo depois que Hans Kelsen disse que o direito natildeo eacute ldquoleirdquo mas eacute ldquonormardquo e depois que Herbert Hart negou que o direito fosse ldquonormardquo para proclamar que ele eacute ldquoregrardquo a teoria contemporacircnea veio a concluir que o direito natildeo eacute lei nem norma e nem regra ele eacute um conjunto de ldquoregrasrdquo e ldquoprinshyciacutepiosrdquo Nessa direccedilatildeo um teoacuterico contemporacircneo Ronaldo Dworkin escreveu dois artigos muito citados nos uacuteltimos tempos cujos tiacutetulos satildeo exatamente Modelo de regras e Princiacutepios I e II E para a aplicaccedilatildeo de princiacutepios e regras diz a nova teoria do direito eacute preciso utilizar o mecanismo da argumentaccedilatildeo isto eacute o discurso persuasivo que realishyza a mediaccedilatildeo concretizadora justificando quais as regras e quais os princiacutepios deveratildeo prevalecer nos casos concretos sobretudo quando entre as regras e os princiacutepios aplicaacuteveis houver alguma colisatildeordquo (Anshytocircnio Alberto Machado)

Com base no que sustenta o texto NAtildeO eacute possiacutevel afirmar quea) O direito natildeo cabe apenas na leib) A argumentaccedilatildeo soacute passou a ser valorizada no direito com Dworkinc) Regras e princiacutepios natildeo satildeo a mesma coisa mas se completamd) A argumentaccedilatildeo pelos princiacutepios pode ser tatildeo eficiente quanto a argumentaccedilatildeo

sustentada na norma positivada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 205

Questatildeo 10 - Para os autores a modalizaccedilatildeo eacute ldquoum fenocircmeno complexo que testemunha o modo como o sujeito argumentador se apropria da liacutengua para organizaacute-la em discurso e expressar sua opiniatildeo acerca de dado tema ou fatordquo Todas as opccedilotildees adiante indicam palavras ou expressotildees modalizadoras relativas agrave temaacutetica do abandono afetivo dos filhos EXCEshyTO uma Marque essa opccedilatildeoa) Ato covardeb) Descumprimento do dever legal de cuidarc) Violaccedilatildeo de direitos da personalidaded) Direito agrave filiaccedilatildeo

Questatildeo 11 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau sobre o aborto do feto anencefaacutelico ldquoPalavras bem arranjadas natildeo bastam para ocultar em quantos fazem praccedila do aborto de anenceacutefalos inexoraacutevel despreshyzo pela vida de quem poderia escapar com resquiacutecios de existecircncia- e produzindo consequecircncias juriacutedicas marcantes - do ventre queo abrigou Matar ou deixar morrer o pequeno ser que foi parido natildeo eacute diferente da interrupccedilatildeo da sua gestaccedilatildeordquo (ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo)

a) O fragmento menciona o recurso da polifonia como instrumento de argumentashyccedilatildeo

b) O fragmento aponta a modalizaccedilatildeo pela seleccedilatildeo vocabular como instrumento de argumentaccedilatildeo

c) O fragmento indica a intertextualidade como instrumento de argumentaccedilatildeod) O fragmento revela a linearidade expositiva como estrateacutegia de persuasatildeo

Questatildeo 12 - Adiante transcriccedilatildeo de um fragmento do texto ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo de autoria do Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau sobre o aborto do feto anencefaacutelico

ldquoDe mais a mais a certeza do diagnoacutestico meacutedico da anencefalia natildeo eacute absoluta de modo que a prevenccedilatildeo do erro mesmo culposo natildeo seraacute sempre possiacutevel O que dizer entatildeo do erro doloso A quantas natildeo chegaria entatildeo em seu dinamismordquo

O fragmento expressa a existecircncia do argumento de autoridade amparado pelo(a)

a) Demonstraccedilatildeo que se sustenta no diagnoacutestico do meacutedico (opiniatildeo teacutecnica funshydamentada)

b) Positivismo que se desenvolve com base na premissa de que o dolo eacute mais grave que a culpa

c) Demonstraccedilatildeo que se opotildee agrave argumentaccedilatildeo com a qual natildeo se relacionad) Exposiccedilatildeo que quase sempre eacute sinocircnimo de ldquoinjunccedilatildeordquo

206 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 13 - Marque a opccedilatildeo ERRADA acerca da argumentaccedilatildeoa) Aplica-se a situaccedilotildees concretas da vida Entra nos domiacutenios das ciecircncias sociais

e humanas ou seja a Economia a Poliacutetica e o Direitob) Eacute utilizada em casos que natildeo podem ser solucionados pelo rigor matemaacutetico mas

sim por via persuasivac) Trabalha com verdades a priacuteori a fim de convencer o auditoacuteriod) Haacute que procurar as premissas no campo das verdades comuns dos princiacutepios

opiniotildees e valores correntes ou seja naquilo que eacute tido como verdade pelos interlocutores

Questatildeo 14 - Leia as assertivas abaixo e marque a opccedilatildeo CORRETAI - A proposta positivista consistiu na explicaccedilatildeo do fenocircmeno juriacutedico a partir do

estudo das normas postas pela autoridade soberana de determinada sociedadeII - Na argumentaccedilatildeo a adesatildeo do auditoacuterio depende do esforccedilo do argumentador para atingir os valores que lhe satildeo mais aceitosIII - A loacutegica do razoaacutevel trabalha com a adesatildeo enquanto a loacutegica formal com a

demonstraccedilatildeo

a) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIIc) Estatildeo corretas as assertivas II e IIId) Estatildeo corretas as assertivas I II e III

Questatildeo 15 - Marque a opccedilatildeo CORRETA acerca do raciociacutenio indutivoa) Sua forma mais clara de apresentaccedilatildeo eacute o silogismo claacutessicob) Pensamento no qual a afirmaccedilatildeo denominada ldquopremissa menor dispara o racioshy

ciacutenio que leva a uma conclusatildeoc) Eacute aquele que parte do geral para o especiacutefico sendo este a proacutepria normad) A conclusatildeo normalmente depende das premissas mas haacute casos em que decorre

de informaccedilatildeo cientiacutefica o que favorece seja desvinculada das duas premissas que lhe datildeo sustentaccedilatildeo

Questatildeo 16 - Leia as assertivas que seguem e marque a opccedilatildeo CORRETAI - ldquoA partir do exame de uma seacuterie de elementos concretos extrai-se um princiacutepio

de ordem geneacutericardquo - procedimento indutivoII - Quando haacute omissatildeo legislativa eacute liacutecito recorrer agrave analogia fonte geral do direitoIII - O procedimento indutivo eacute muito eficiente quando se observa a omissatildeo legisshy

lativa acerca da mateacuteria em anaacuteliseIV - Para o positivismo a fonte legal deve ser aplicada por subsunccedilatildeo ao caso

concretoa) Estatildeo corretas as assertivas I II e IIIb) Estatildeo corretas as assertivas II III e IVc) Estatildeo corretas as assertivas I e IVd) Estatildeo corretas as assertivas I II III e IV

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 207

Questatildeo 17 - A caracterizaccedilatildeo do asseacutedio moral natildeo se daacute precipuamente pelo Direito mas pela Psicologia que tem os instrumentos teacutecnicos e metodoloacutegicos adequados para diagnosticar essa patologia social Eacute por essa razatildeo que podemos dizer sobre o estudo do tema que

a) A demonstraccedilatildeo natildeo eacute possiacutevel porque a Psicologia natildeo eacute ciecircncia exatab) A demonstraccedilatildeo soacute estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo na aacuterea trabalhista no exame

admissionalc) A demonstraccedilatildeo estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo que leva agrave condenaccedilatildeo do inshy

fratord) A Psicologia natildeo tem a precisatildeo cientiacutefica necessaacuteria para conseguir produzir

provas admitidas em direito

Questatildeo 18 - Com a superaccedilatildeo do Positivismo Juriacutedico novos valores passashyram a ser considerados como verdadeiros norteadores da interpretaccedilatildeodas regras juriacutedicas Soacute natildeo pode ser considerado um valor poacutes-positi-vista

a) Boa-feacute nas relaccedilotildees de consumob) Funccedilatildeo social da propriedadec) Dignidade da pessoa humanad) Legalidade

Questatildeo 19 - Marque a opccedilatildeo INCORRETAa) Aleacutem da defesa eficiente da tese o Judiciaacuterio pode promover a alteraccedilatildeo legislatishy

va como estrateacutegia de soluccedilatildeo para os casos difiacuteceis e polecircmicos que natildeo tinham decisatildeo justa com base no direito positivado

b) A ponderaccedilatildeo das circunstacircncias do caso concreto foge agrave previsibilidade de um sistema formal previamente concebido com precisatildeo absoluta

c) Por meio dos princiacutepios do direito eacute mais faacutecil argumentar a favor de teses de receptividade minoritaacuteria no ordenamento juriacutedico paacutetrio

d) A argumentaccedilatildeo deve considerar o contexto em que se deram os fatos as inshyfluecircncias que o motivaram bem como o estado psicoloacutegico de quem praticou a conduta

Questatildeo 20 - o Direito eacute uma ciecircncia dinacircmica que progride conforme a exishygecircncia social Nesse contexto novos ramos do Direito foram vislumbrashydos a fim de sistematizar os conhecimentos contemporacircneos que careshycem de tratamento juriacutedico Com base nessa afirmativa indique qual a uacutenica opccedilatildeo que NAtildeO constitui um novo ramo do Direito

a) Biodireitob) Direito dos homoafetivosc) Direito da informaccedilatildeod) Direito espacial

208 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 21 - Leia o fragmento que segue

ldquoO maior problema juriacutedico criado pelas poliacuteticas de cotas que incidem nos concursos puacuteblicos especialmente nos concursos vestibulares relaciona-se diretamente agrave violaccedilatildeo de princiacutepios do serviccedilo puacuteblico como a impessoalidade a eficiecircncia a legalidade e a moralidade (toshydos violados pela existecircncia de tais privileacutegios) Na verdade a funccedilatildeo dos concursos puacuteblicos natildeo eacute o de distribuir benesses ou meramenshyte selecionar aquele que merece receber um salaacuterio ou frequentar uma faculdade puacuteblica Os oacutergatildeos puacuteblicos tecircm funccedilotildees puacuteblicas e tais concursos visam a selecionar os que tecircm melhores condiccedilotildees ou competecircncias para ocupar as funccedilotildees essenciais ao cumprimento das obrigaccedilotildees dos respectivos oacutergatildeosrdquo (Renato Amoedo Rodrigues)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute CORRETOa) O paraacutegrafo eacute predominantemente narrativo porque enumera os princiacutepios da administraccedilatildeo puacuteblicab) O paraacutegrafo eacute predominantemente narrativo porque informa a poliacutetica nacional de

cotas para negros em universidades puacuteblicasc) O paraacutegrafo eacute predominantemente argumentativo porque trata de um ldquoproblema

juriacutedicordquo (primeira linha) e toda lide soacute eacute exposta por meio de textos puramente argumentativos

d) O paraacutegrafo eacute predominantemente argumentativo porque recorre a princiacutepios constitucionais para sustentar sua tese

Questatildeo 22 - Leia o fragmento que segue

ldquoEm 1937 eles foram presos sob a acusaccedilatildeo de ter matado o soacutecio e primo Benedito Pereira Caetano que desapareceu sem deixar rastro levando 90 contos de reacuteis hoje o equivalente a 270 mil reais O Deleshygado chegou agrave conclusatildeo de que os irmatildeos mataram o primo para ficar com o dinheiro A poliacutecia torturou ateacute familiares para descobrir o esconshyderijo do dinheiro conseguindo dessa forma a confissatildeo dos presos que levados a juacuteri foram absolvidos a acusaccedilatildeo natildeo se conteve e reshycorreu os jurados mantiveram a absolviccedilatildeo Como na eacutepoca o juacuteri natildeo tinha soberania o Tribunal de Justiccedila reformou a decisatildeo e condenou Joaquim e Sebastiatildeo a 16 anos e seis meses de reclusatildeo Oito anos depois tiveram livramento condicional Joaquim pouco depois morreu como indigente e Sebastiatildeo encontrou o primo vivo em julho de 1952 constatando assim a inexistecircncia do homiciacutedio o acerto dos jurados com a decisatildeo de absolviccedilatildeo e o grande erro do Tribunal A descobershyta provocou accedilatildeo de revisatildeo criminal que concluiu por inocentar os irmatildeos em 1953 e em 1960 o Judiciaacuterio concedeu indenizaccedilatildeo aos herdeirosrdquo (wwwJusnavigandicombr)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute INCORRETOa) O fragmento eacute predominantemente narrativob) A narrativa do fragmento eacute valorada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 209

c) A narrativa apresenta todos os seus elementos constitutivos ldquoo quecirc quem onde quando como porquecirc por issordquo

d) Haacute no fragmento a descriccedilatildeo a serviccedilo da narrativa

Questatildeo 23 - Leia o fragmento que segue

Marcos Mariano da Silva mecacircnico pernambucano casado e pai de filhos foi preso em 1976 porque foi confundido com o homicida que tinha o mesmo nome Em 1992 durante uma rebeliatildeo policiais inshyvadiram o presiacutedio e Marcos foi atingido por estilhaccedilos de granada causando-lhe a perda da visatildeo passou 19 anos na cadeia perdeu a sauacutede o emprego a mulher os filhos e morreu de infarto jaacute em libershydade Seis anos depois o verdadeiro criminoso apareceu e foi preso mas natildeo serviu para reparar o erro cometido contra Marcos O Estado de Pernambuco foi reconhecido como responsaacutevel pelos danos sofrishydos pelo mecacircnico e terminou condenado a pagar indenizaccedilatildeo de R$2 milhotildeesrdquo (wwwJusnavigandicombr)

Marque a opccedilatildeo cujo comentaacuterio estaacute INCORRETOa) O fragmento eacute predominantemente narrativob) O fragmento eacute predominantemente argumentativoc) A narrativa apresenta todos os seus elementos constitutivos ldquoo quecirc quem onde

quando como por quecirc por issordquod) O fragmento eacute marcado pela presenccedila de modalizadores

Questatildeo 24 - A respeito da tipologia textual na produccedilatildeo do texto juriacutedicoNAtildeO eacute possiacutevel afirmar quea) A narraccedilatildeo e descriccedilatildeo podem estar a serviccedilo da argumentaccedilatildeob) A descriccedilatildeo consiste em enumerar os fatos e as caracteriacutesticas que decorrem na

linha do tempo para constituir um enredoc) A Fundamentaccedilatildeo de um determinado ponto de vista exige do argumentador

muitas vezes que alguns fatos motivadores de sua tese sejam narradosd) Narraccedilatildeo descriccedilatildeo e dissertaccedilatildeo podem compor juntas um soacute texto e sua seshy

paraccedilatildeo soacute se justifica por razotildees acadecircmicas

Questatildeo 25 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSAa) A produccedilatildeo de argumentos eacute procedimento abstrato que exige do argumentador

sensibilidade e consistecircncia na abordagem de uma seacuterie de temas socialmente relevantes

b) A fundamentaccedilatildeo eacute texto de tipo injuntivo e visa a comprovar que o magistrado estaacute equivocado nas suas convicccedilotildees

c) A fundamentaccedilatildeo consiste em persuadir o auditoacuterio acerca de um ponto de vista que se pretende sustentar

210 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

d) O sucesso da argumentaccedilatildeo eacute influenciado pela qualidade da narraccedilatildeo anterior quando todos os fatos juridicamente importantes do caso concreto satildeo organizashydos em ordem cronoloacutegica

e) Uma fundamentaccedilatildeo deve recorrer a diversificadas estrateacutegias argumentativas a fim de potencializar as chances de aceitaccedilatildeo daquilo que se sustenta

Questatildeo 2 6 - 0 fragmento transcrito revela a presenccedila de

ldquoDe acordo com as conclusotildees do Parecer Teacutecnico exarado pelo corpo teacutecnico da Fundaccedilatildeo Municipal do Meio Ambiente nas plantas e proshyjetos do empreendimento natildeo foi respeitado o afastamento legal de 30 metros das margens dos canais existentes no terreno onde se pretenshyde edificar aacutereas essas consideradas pela legislaccedilatildeo paacutetria como de Preservaccedilatildeo Permanenterdquo

a) Argumentaccedilatildeo purab) Descriccedilatildeo predominantec) Demonstraccedilatildeo a serviccedilo da argumentaccedilatildeod) Demonstraccedilatildeo pura

Questatildeo 27 - Todas as assertivas abaixo tratam do ingresso em universidashydes por meio da poliacutetica de cotas Leia as opccedilotildees e identifique aquela que revela uma tese sobre essa questatildeo

a) Os ministros do Supremo Tribunal Federal trouxeram em seus votos profundo estudo sobre accedilotildees afirmativas e sua legitimidade constitucional

b) O Supremo Tribunal Federal posiciona-se pela legitimidade constitucional das cotasc) A discussatildeo acerca das cotas nas universidades trouxe para o Ensino Superior

mais visibilidade que o Ensino Meacutediod) Para o correto tratamento do tema o Supremo Tribunal Federal precisa ter clashy

reza e meacutetodo para definir o criteacuterio ldquoetniardquo a fim de evitar a denominada discrishyminaccedilatildeo inversa

Questatildeo 2 8 - 0 fragmento que segue trata das limitaccedilotildees de uso das vagas em condomiacutenios ediliacutecios

Se um automoacutevel estranho ou seja de uma pessoa estranha ao edifiacuteshycio entra na nossa garagem - por conta de a sua vaga ter sido vendishyda ou alugada para algueacutem estranho ao edifiacutecio - todas as normas de seguranccedila adotadas pelo condomiacutenio ficariam fragilizadas

Com relaccedilatildeo ao planejamento da argumentaccedilatildeo juriacutedica pode-se dizer que o fragmento eacute classificado CORRETAMENTE comoa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacuteteses

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 211

Questatildeo 29 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoChamam atenccedilatildeo os casos de chargeback (cancelamento de uma venda feita com cartatildeo de deacutebito ou creacutedito que pode acontecer por dois motivos um deles eacute o natildeo reconhecimento da compra por parte do titular do cartatildeo - algum tipo de fraude e o outro pode se dar pelo fato de a transaccedilatildeo natildeo obedecer agraves regulamentaccedilotildees previstas nos contratos termos aditivos e manuais editados pelas administradoras Ou seja o lojista vende e depois descobre que o valor da venda natildeo seraacute creditado porque a compra foi considerada invaacutelida)

()

Jaacute que ocorreu o chargeback os riscos entre o comerciante e a adshyministradora de cartotildees de creacutedito ou deacutebito deveriam ser repartidos entre esses dois sujeitos os quais atuam no mercado de consumo asshysumindo os riscos do empreendimento (wwwjusnavigandicombr)

O segundo paraacutegrafo do fragmento transcrito com relaccedilatildeo aos elementos constitutivos do planejamento argumentativo refere-se aa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacuteteses

Questatildeo 30 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoMuito se tem falado recentemente sobre a necessidade a legalidade e a constitucionalidade do Exame de Ordem A questatildeo chegou ao Sushypremo Tribunal Federal onde por meio do Recurso Extraordinaacuterio n 603583 sob relatoria do Ministro Marco Aureacutelio discutiu-se a constitushycionalidade do Estatuto da OAB (Lei n 890694) e a possibilidade de inscriccedilatildeo na Ordem dos Advogados do Brasil sem a devida aprovaccedilatildeo no referido examerdquo

a) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute constitucional e legal ainda que desnecessaacuterio

b) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute constitucional mas ilegal e desnecessaacuterio

c) O fragmento apresenta a tese de que o Exame da Ordem eacute inconstitucional e ilegal mas necessaacuterio

d) O fragmento natildeo deixa clara uma tese

Questatildeo 31 - Leia o fragmento que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoA corrupccedilatildeo em sentido amplo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil eacute em si um mal e representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da po-

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

puiaccedilatildeo do Brasil Sem deixar de reconhecer que a corrupccedilatildeo em um paiacutes estaacute intimamente ligada a fatores como a cultura e a educaccedilatildeo de seu povo sendo inclusive no Brasil diagnosticaacutevel como um estado de anomia social mostra contudo que ela sempre recua sua incidecircnshycia quando o controle preventivo e o repressivo satildeo ampliados Eacute por essa razatildeo que a atuaccedilatildeo eficaz do Ministeacuterio Puacuteblico tem proporcioshynado a diminuiccedilatildeo da anomia social no que diz respeito agrave poliacutetica e agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica no Brasilrdquo (Marco Aureacutelio Lustosa Caminha)

a) A tese do paraacutegrafo estaacute resumida em ldquoa corrupccedilatildeo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da populaccedilatildeo do Brasil

b) Ao mencionar que ldquosem deixar de reconhecer que a corrupccedilatildeo em um paiacutes estaacute intimamente ligada a fatores como a cultura e a educaccedilatildeo de seu povordquo o argu- mentador natildeo reconhece o elemento valores como motivador da corrupccedilatildeo

c) O trecho ldquoeacute por essa razatildeo que a atuaccedilatildeo eficaz do Ministeacuterio Puacuteblico tem proporshycionado a diminuiccedilatildeo da anomia social no que diz respeito agrave poliacutetica e agrave Adminisshytraccedilatildeo Puacuteblica no Brasilrdquo natildeo eacute modalizado

d) No trecho ldquoa corrupccedilatildeo em sentido amplo na Administraccedilatildeo Puacuteblica do Brasil eacute em si um mal e representa talvez uma das principais causas das desigualdades sociais e da miseacuteria que afetam a maior parcela da populaccedilatildeo do Brasilrdquo a palashyvra ldquotalvezrdquo sugere que a corrupccedilatildeo pode natildeo ser um problema

Questatildeo 32 - Com base no fragmento que segue marque a opccedilatildeo INCORRETA

ldquoA superpopulaccedilatildeo dos presiacutedios eacute fato incontestaacutevel o pior entretanto eacute que esse descaso com a liberdade alheia ocorre em funccedilatildeo de erros despreparo e corrupccedilatildeo da maacutequina burocraacutetica do Estado Muitos cishydadatildeos satildeo jogados na cadeia sem terem sido julgados outros estatildeo presos porque furtaram uma lata de oacuteleo um pacote de bolachaTais agressotildees agrave liberdade do cidadatildeo ou tais erros provocam uma seacuterie de questionamentos acerca da confianccedila no sistema e da seguranccedila juriacutedica porque inocentes satildeo condenados a ficarem atraacutes das grades e deixa-se de prender grande nuacutemero de criminosos bem conhecidos Ademais mostra o sucateamento da maacutequina penitenciaacuteria o despreshyparo dos agentes puacuteblicos A culpa por tais equiacutevocos poderia ateacute recair na fragilidade dos inqueacuteritos policiais porque a poliacutecia apressa-se no afatilde de desvendar o crime natildeo se pode desconsiderar tambeacutem que a confissatildeo obtida por meio de tortura implantada desde 1964 ainda eacute usada ateacute hoje pela poliacuteciardquo () (wwwJusnavigandicombr)

a) A tese defendida no fragmento eacute a de que os erros judiciais que levam aacute prisatildeo inocentes decorre do descaso na prestaccedilatildeo da jurisdiccedilatildeo

b) O argumentador aponta como causa dos erros judiciais a investigaccedilatildeo mal realishyzada pela poliacutecia

c) O sucateamento da maacutequina penitenciaacuteria e o despreparo dos agentes puacuteblicos satildeo fatos (contextualizaccedilatildeo do real) que reforccedilam a tese

d) Haacute no fragmento a redaccedilatildeo de uma hipoacutetese argumentativa

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 213

Questatildeo 33 - Marque a opccedilatildeo INCORRETA

a) A situaccedilatildeo de conflito consiste na apresentaccedilatildeo em paraacutegrafo curto das seguinshytes informaccedilotildees o quecirc Quem Quando Onde

b) Atese eacute o ponto de vista que se pretende defender em um texto argumentativoc) A contextualizaccedilatildeo do real consiste na seleccedilatildeo dos fatos importantes do conflito

organizados em toacutepicos com vistas agrave defesa da tesed) As hipoacuteteses natildeo guardam relaccedilatildeo com a tese pois satildeo apenas argumentos

virtuais que podem natildeo ser utilizados na fundamentaccedilatildeo

Questatildeo 34 - As duas informaccedilotildees que compotildeem o fragmento adiante devem ser lidas como dois periacuteodos consecutivos que formam um uacutenico paraacuteshygrafo Marque a opccedilatildeo CORRETA

1a informaccedilatildeo Uma boa tese na aacuterea juriacutedica deve buscar amparo na norma e ter coerecircncia com os fatos selecionados para a contextuashylizaccedilatildeo do real2a informaccedilatildeo O argumentador pode se valer de toda a construccedilatildeo jaacute realizada pela dogmaacutetica juriacutedica para validar seus raciociacutenios

a) A primeira informaccedilatildeo eacute verdadeira e a segunda informaccedilatildeo eacute falsa Natildeo existe relaccedilatildeo entre as duas informaccedilotildees

b) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo verdadeiras mas as duas natildeo possuem relaccedilatildeo entre si

c) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo falsas mas ambas se relacionamd) A primeira e a segunda informaccedilotildees satildeo verdadeiras e a segunda continua o

raciociacutenio iniciado na primeira

Questatildeo 35 - Leia o fragmento que segue

ldquoSe o franqueador eacute um beneficiaacuterio do serviccedilo prestado por todo aquele sob sua franquia natildeo estaria ele coobrigado pelos deacutebitos trashybalhistas de seus franqueadosrdquo

Quanto aos itens do planejamento do texto argumentativo pode-se dizer que o fragmento deve ser identificado comoa) Situaccedilatildeo de conflitob) Tesec) Contextualizaccedilatildeo do reald) Hipoacutetese

Questatildeo 36 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoA recentiacutessima Lei 12607 sancionada no dia 04042012 ao alterar o sect 1deg do art 1331 do Coacutedigo Civil determina que lsquo(bullbullbull) os abrigos para veiacuteculos () natildeo poderatildeo ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomiacutenio salvo autorizaccedilatildeo expressa na convenccedilatildeo de condomiacuteniorsquo Natildeo eacute preciso fazer-se grandes exerciacutecios mentais de

214 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

investigaccedilatildeo para se concluir que eacute clara eacute cristalina a preocupaccedilatildeo maior que motivou esse meritoacuterio aperfeiccediloamento da legislaccedilatildeo con- dominial a seguranccedila Todos quantos vivemos ou viveram em granshydes cidades sabemos das peculiaridades desse problema especiacutefico da nossa sociedade e que tem evoluiacutedo no mesmo compasso que a realidade econocircmica do nosso paiacutes e do nosso povo

O paraacutegrafo foi produzido a partir de proposta de um introito do tipoa) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 37 - Leia o paraacutegrafo que segue e marque a opccedilatildeo CORRETA

ldquoCom o gradual enchimento das nossas cidades mais e mais edishyfiacutecios foram tomando o lugar das casas - poreacutem o nuacutemero meacutedio de automoacuteveis por apartamento jaacute haacute bastante tempo tem crescido a uma progressatildeo bem maior Acresccedila-se a isso que os bons venshytos que tecircm soprado ultimamente sobre a economia brasileira aceshyleraram ainda mais dramaticamente essa carecircncia por vagas por conta da realizaccedilatildeo do antigo sonho de consumo do nosso povoo automoacutevel proacuteprio Consequecircncia direta desse fenocircmeno foi que as ruas das cidades meacutedias e grandes viraram imensos estacionashymentos mormente agrave noite Eacute esse o contexto que inspirou a proishybiccedilatildeo de alienaccedilatildeo ou locaccedilatildeo de vagas em condomiacutenio pela Lei 126072012rdquo

O argumento foi redigido com base em que tipo de argumentoa) Argumento de autoridadeb) Argumento de senso comumc) Argumento de causa e efeitod) Argumento a fortiori

Questatildeo 38 - Leia o fragmento adiante

ldquoQuanto ao cumprimento da oferta nas compras coletivas realizadas pela internet podem-se visualizar duas situaccedilotildees distintas e de notaacuteshyvel importacircncia praacutetica1 Simples desistecircncia de um ou alguns consumidores em prosseguir na contrataccedilatildeo2 Ocorrecircncia de chargeback (cancelamento da compra por cartatildeo sem pagamento pelo valor da compra)Na primeira situaccedilatildeo entendemos que natildeo haveraacute de fato a possibishylidade de os consumidores que jaacute haviam aderido agrave oferta exigir-lhe o cumprimento forccedilado pois estes jaacute sabiam da condiccedilatildeo estabelecida

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 215

pelos fornecedores no sentido do cancelamento da oferta por insushyficiecircncia de consumidores aderentes Nesse caso sequer haveraacute a emissatildeo dos cupons uma vez que o numeraacuterio necessaacuterio a viabilizar o preccedilo mais baixo por parte do fornecedor natildeo seraacute alcanccedilado Assim a oferta poderaacute ser legitimamente canceladaContudo no caso de chargeback a depender do caso pensamos que os consumidores remanescentes poderatildeo exigir o cumprimento forccedilashydo da oferta nos termos do inciso I do art 35 do CDC porque haacute que se respeitar a boa-feacute desses consumidores

O fragmento anterior revela a existecircncia de todos os argumentos indicados EXCETO um Marque essa opccedilatildeoa) Argumento proacute-teseb) Argumento de oposiccedilatildeoc) Argumento de causa e efeitod) Argumento de autoridade

Questatildeo 39 - Leia as assertivas abaixo acerca do argumento de autoridade e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - No argumento de autoridade a conclusatildeo se sustenta pela citaccedilatildeo de umafonte confiaacutevel que pode ser uma estatiacutestica pesquisa cientiacutefica a proacutepria lei ou o direito natural

II - O argumento de autoridade pode ter como fonte uma frase dita por liacuteder poliacuteticoartista famoso ou algum pensador enfim uma autoridade no assunto abordado na argumentaccedilatildeo

III - A citaccedilatildeo de uma fonte pode auxiliar no convencimento mas eacute importante relashycionar a validade e a consistecircncia da fonte ao caso concreto a fim de aumentar a persuasatildeoa) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIc) Estaacute correta apenas a assertiva IIId) Estatildeo corretas as assertivas II e III

Questatildeo 40 - Leia as assertivas abaixo acerca do argumento de causa e efeito e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - O argumento de causa e efeito para comprovar uma tese busca os nexos queligam dois eventos relevantes do conflito

II - Para o Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho (Livro ldquoPrograma de Responshysabilidade Civilrdquo) ldquocausardquo e ldquofatorrdquo satildeo fenocircmenos idecircnticos sem qualquer distinccedilatildeo

216 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

III - qualquer relaccedilatildeo de causa e efeito caracteriza um argumento de causa e efeito independente de o efeito ser faacutetico ou juriacutedicoa) Estaacute correta apenas a assertiva Ib) Estaacute correta apenas a assertiva IIc) Estaacute correta apenas a assertiva IIId) Estatildeo corretas as assertivas II e III

Questatildeo 41 - Leia o fragmento abaixo e identifique o tipo de argumento preshydominante

ldquoAo se desesperar num congestionamento em Satildeo Paulo daqueles em que o automoacutevel natildeo se move nem quando o sinal estaacute verde o indiviacuteduo deve saber que por traacutes de sua irritaccedilatildeo crocircnica e cotidiana estaacute uma monumental ignoracircncia histoacuterica pois Satildeo Paulo soacute chegou

a esse caos porque um seleto grupo de dirigentes decidiu no iniacutecio do seacuteculo que natildeo deveriacuteamos ter metrocircrdquo (Adaptado de Folha de S Paulo 01102000)

a) Argumento de causa e efeitob) Argumento de analogiac) Argumento de autoridaded) Argumento proacute-tese

Questatildeo 42 - Leia as assertivas abaixo sobre o argumento proacute-tese e marque a opccedilatildeo CORRETA

I - ao empregar o argumento proacute-tese busca-se a sustentaccedilatildeo da tese com basenos fatos da contextualizaccedilatildeo do real

II - Os fatos selecionados da contextualizaccedilatildeo do real satildeo informaccedilotildees concretasextraiacutedas da narrativa juriacutedica

III - A ausecircncia dos conectores ldquoporque ldquoe tambeacutem e ldquoaleacutem dissordquo pode tornaro texto narrativo em decorrecircncia do encadeamento sistemaacutetico de fatos sem motivaccedilatildeo argumentativaa) Estatildeo corretas as assertivas I e IIIb) Estatildeo corretas as assertivas I e IIc) Estatildeo corretas as assertivas II e IIId) Estatildeo corretas as assertivas I II e III

Questatildeo 43 - A afirmaccedilatildeo ldquocontra fatos natildeo haacute argumentosrdquo daacute ecircnfase agrave fonte do argumentoa) De autoridadeb) De senso comumc) Proacute-tesed) De oposiccedilatildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 217

Questatildeo 4 4 - 0 argumento de causa e efeito eacute aquele que visa a estabelecer nexo causal entre dois eventos ou seja aquele que pretende relacionar uma conduta agraves consequecircncias juriacutedicas dela decorrentes a fim de resshyponsabilizar seu causador Identifique qual eacute a causa (e natildeo consequecircnshycia) do asseacutedio moral no ambiente de trabalhoa) baixa autoestimab) depressatildeoc) desejo claro de humilhar e denegrird) sede de vinganccedila

Questatildeo 45 - Leia o fragmento que segue

ldquoQualquer cidadatildeo pode ser viacutetima de erro judiciaacuterio mas a histoacuteria mostra que a grande maioria dos casos envolve pessoas carentes negras e sem escolaridade que natildeo possuem a miacutenima condiccedilatildeo para custear as despesas com advogados necessitando do trabalho dos defensores puacuteblicos em muito pouco nuacutemero no Judiciaacuterio brasileirordquo (wwwJusnavigandicombr)

Trata-se de um argumentoa) de autoridadeb) de analogiac) de causa e efeitod) de oposiccedilatildeo

Questatildeo 46 - No fragmento adiante encontram-se todos os argumentos listashydos nas alternativas EXCETO um Marque essa opccedilatildeo

ldquoNatildeo poderiacuteamos falar simplesmente da responsabilizaccedilatildeo civil pelo dano esteacutetico sem deixar de observar brevemente a tipificaccedilatildeo penal da ofensa agrave integridade fiacutesica ou agrave sauacutede da pessoa pois do entrelaccedilashymento de ambos os institutos eacute que se extraiacutera a base de uma exegese sistemaacutetica mais seguraO crime de lesatildeo corporal consistente em qualquer ofensa ocasionada por algueacutem sem vontade de matar agrave integridade fiacutesica ou sauacutede (fisioshyloacutegica ou mental) de outrem Natildeo se trata como seria possiacutevel supor apenas do mal infligido agrave inteireza anatocircmica da pessoaComo bem defendeu o saudoso mestre Nelson Hungria a lesatildeo corporal compreende toda e qualquer ofensa ocasionada agrave norshymalidade funcional do corpo ou organismo humano seja do ponto de vista anatocircmico seja do ponto de vista fisioloacutegico ou psiacutequico Mesmo a desintegraccedilatildeo da sauacutede mental eacute lesatildeo corporal pois a inteligecircncia a vontade ou a memoacuteria dizem com a atividade funcioshynal do ceacuterebro que eacute um dos mais importantes oacutergatildeos do corpo Natildeo se concebe uma perturbaccedilatildeo mental sem um dano agrave sauacutede e eacute inconcebiacutevel um dano agrave sauacutede sem um mal corpoacutereo ou uma alteraccedilatildeo do corpo

218 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Quer como alteraccedilatildeo da integridade fiacutesica quer como perturbaccedilatildeo do equiliacutebrio funcional do organismo (sauacutede) a lesatildeo corporal resulta sempre de uma violecircncia exercida sobre a pessoardquo (wwwJusnavigan- dicombr)

a) de autoridadeb) de senso comumc) de analogiad) de causa e efeito

Questatildeo 4 7 - 0 argumento predominante no fragmento eacute

ldquo() Afora a responsabilidade penal nos casos supramencionados temos a civil que como sabido em regra natildeo se confundem e satildeo independentes - embora em verdade sejam interdependentes - poshydendo tramitar accedilotildees concomitantemente salvo havendo incidentes de prejudicialidade externa evidente Ademais a sentenccedila penal (con- denatoacuteria ou absolutoacuteria) poderaacute influenciar na sentenccedila civil embora a reciacuteproca natildeo seja verdadeirardquo (wwwJusnavigandicombr)

a) de oposiccedilatildeob) de autoridadec) de analogiad) de causa e efeito

Questatildeo 48 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo INCORRETA

A responsabilidade meacutedica eacute mateacuteria que vem sendo atualmente vastamente debatida seja no campo civil penal ou mesmo eacutetico Obshyservamos no entanto tratar-se essa discussatildeo principalmente na aacuterea da responsabilizaccedilatildeo civil de verdadeira renascenccedila da temaacutetica em torno da atuaccedilatildeo do profissional meacutedico (ou odontoloacutegico) talvez deflagrada por ocasiatildeo do surgimento e aplicaccedilatildeo das normas consshytantes do Coacutedigo de Defesa do Consumidor (CDC) pois que outrora esse assunto jaacute foi motivo de calorosos embates como atesta a primoshyrosa obra do Prof Hermes Rodrigues de Alcacircntara lsquoResponsabilishydade Meacutedicarsquo lanccedilada em 1971 A responsabilidade civil meacutedica portanto nada mais eacute do que a obrigaccedilatildeo do meacutedico ou da cliacuteshynica responsaacutevel de arcar com os prejuiacutezos causados a outrem quando houver a comprovaccedilatildeo de danos decorrentes da atuaccedilatildeo desses profissionaisrdquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Observa-se um breve introito com localizaccedilatildeo da questatildeo discutida no tempo e no espaccedilo

b) O argumentador recorre agrave autoridade do jurista para reforccedilar sua tesec) Observa-se um argumento de causa e efeito para reforccedilar a tesed) O argumentador estabelece uma relaccedilatildeo analoacutegica comparativa para reforccedilar

sua tese

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 219

Questatildeo 49 - Com base no que afirma o fragmento a opccedilatildeo que NAtildeO apreshysenta uma causa excludente da responsabilidade civil eacute

ldquoSendo contratada uma cliacutenica meacutedica (fornecedor de serviccedilo) e natildeo meacutedico (profissional liberal - art 14 sect4deg do CDC) impotildee-se portanto em caso de dano decorrente de cirurgia aplicar-se a responsabilizashyccedilatildeo objetiva bastando dessa feita estar comprovado o dano e o nexo de causalidade entre aquele e a atuaccedilatildeo da cliacutenica bem como inexisshytecircncia de caso fortuito forccedila maior ou culpa exclusiva do consumidor ou de terceirordquo

a) Caso fortuito e forccedila maiorb) Culpa exclusiva do consumidorc) A prestaccedilatildeo do serviccedilo dar-se por um profissional liberald) Culpa exclusiva de terceiro

Questatildeo 50 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento proacute-tese

a) O ideal eacute que cada fato relevante do caso concreto seja introduzido por conectoshyres sintaacuteticos como ldquoporquerdquo ldquoe tambeacutemrdquo e ldquoaleacutem dissordquo

b) Esse argumento tem como fonte principal trecircs fatos relevantes do caso concreto encadeados de forma loacutegica e persuasiva

c) A ordem dos fatos nesse argumento natildeo eacute relevante importante eacute associar as informaccedilotildees de modo a demonstrar que a tese da parte oposta natildeo tem fundashymento

d) Esse argumento eacute adequado para iniciar a fundamentaccedilatildeo simples

Questatildeo 51 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de oposiccedilatildeo

a) Argumento de oposiccedilatildeo restritiva eacute aquele que recorre a conjunccedilotildees coordenatishyvas restritivas como ldquoemborardquo ldquoainda querdquo ldquomasrdquo e ldquoporeacutemrdquo

b) Argumento que tem como finalidade a quebra de expectativas como estrateacutegia discursiva apoiada no uso dos operadores argumentativos de concessatildeo e de adversidade

c) Argumento que se caracteriza pela introduccedilatildeo de uma perspectiva oposta ao ponshyto de vista defendido pelo argumentador admitindo-o como uma possibilidade de conclusatildeo para depois apresentar como argumento decisivo a perspectiva contraacuteria

d) Argumento que permite antecipar as possiacuteveis manobras discursivas que formaratildeo a argumentaccedilatildeo da outra parte durante a busca de soluccedilatildeo jurisdicional para o conflito enfraquecendo assim os fundamentos mais fortes da parte oposta

Questatildeo 52 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de causa e efeito

a) Visa a estabelecer nexo causal entre uma conduta juridicamente importante e a consequecircncia juriacutedica danosa para a parte argumentadora

220 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

b) Necessita apresentar o efeito decorrente de certo comportamento ou conduta independente da orientaccedilatildeo da lei cujo uso soacute se faz devido no argumento de autoridade

c) Eacute adequado usar esse argumento quando se pretende por exemplo responsashybilizar civilmente empresa prestadora de serviccedilos de transporte em virtude de negligecircncia praticada por um de seus prepostos

d) a relaccedilatildeo entre a causa e o efeito pode ser introduzida por conectores sintaacuteticos como ldquoporquerdquo ldquopoisrdquo ldquoporquantordquo e ldquojaacute querdquo

Questatildeo 53 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de autoridadea) Eacute considerada fonte desse argumento a doutrinab) Eacute considerada fonte desse argumento a legislaccedilatildeoc) Uma de suas fontes eacute a analogia caso observado na hipoacutetese de haver lacuna

nadegislaccedilatildeod) Eacute considerada fonte desse argumento a opiniatildeo fundamentada de especiashy

listas

Questatildeo 54 - Marque a alternativa cuja afirmaccedilatildeo eacute FALSA sobre o argumento de senso comuma) Busca o encadeamento de seus raciociacutenios por meio da razoabilidadeb) Pode decorrer de costumes do direito natural e do direito positivoc) Tem como uma de suas fontes possiacuteveis o bom sensod) Possui forccedila persuasiva tal que no Tribunal do Juacuteri por exemplo pode suplantar

a orientaccedilatildeo da proacutepria norma positivada

Questatildeo 55 - Marque a opccedilatildeo que apresenta apenas argumentos utilizados no texto argumentativo adiante

Eacute recorrente a polecircmica sobre a constitucionalidade da realizaccedilatildeo de provas de concursos puacuteblicos em dia de saacutebado A controveacutersia existe porque certas pessoas por princiacutepio religioso natildeo realizam atividades seculares entre o pocircr do sol de sexta-feira e o pocircr do sol de saacutebado Para esses o art 5o VIII da CRFB garante a natildeo realizaccedilatildeo de provas nesse diaPor outro lado haacute quem entenda que oferecer condiccedilotildees especiais de prova aos sabatistas feriria a isonomia porque colocaria esse grupo em vantagem frente aos demais concorrentes Nessa linha argumenshyta-se que o Estado seria laico e portanto indiferente a qualquer opccedilatildeo religiosaInicialmente cumpre apontar que a Administraccedilatildeo Puacuteblica tem discri- cionariedade para escolher o modo como realizar as provas de conshycurso puacuteblico Atarefa do Administrador Puacuteblico como eacute evidente conshysiste em prover as necessidades puacuteblicas previstas no ordenamento juriacutedico utilizando-se para tanto dos recursos puacuteblicos humanos e

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 221

instrumentos juriacutedicos de que dispotildee com razoabilidade respeito e equidade

a) Argumento de autoridade argumento de causa e efeito e argumento de senso comum

b) Argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e argumento de causa e efeitoc) Argumento de autoridade argumento ad hominem e argumento de causa e efeitod) Argumento de autoridade argumento de oposiccedilatildeo e argumento de senso comum

Questatildeo 56 - Leia a argumentaccedilatildeo que segue e indique qual o uacutenico argumenshyto que NAtildeO estaacute contemplado no texto

No dia 02022011 acompanhamos com perplexidade o caso envolshyvendo a eliminaccedilatildeo de candidatos a professores da rede puacuteblica do Estado de Satildeo Paulo ocorrida durante a realizaccedilatildeo dos exames de sauacutede e motivada pela obesidade que os acomete Em siacutentese a conshyduta da administraccedilatildeo eacute inconstitucional porque os referidos candidashytos no momento da avaliaccedilatildeo de sauacutede foram vetados pelo setor de periacutecias meacutedicas responsaacutevel pelos exames ao argumento de que a obesidade eacute oficialmente uma doenccedila e por isso os portadores desse mal natildeo estariam aptos a integrar o funcionalismo puacuteblicoAleacutem disso no caso dos professores eliminados do certame o Poshyder Puacuteblico encontra-se totalmente divorciado das diretrizes trashyccediladas pelo Estado Democraacutetico de Direito Dispotildee o art 5o da Lei 81121990 que o legislador ordinaacuterio cumprindo o comando constishytucional estabeleceu criteacuterios objetivos para o ingresso no funcionashylismo puacuteblico sendo que em relaccedilatildeo agrave aptidatildeo fiacutesica e mental (inciso VI) em homenagem aos princiacutepios que regem nosso ordenamento constitucional tal requisito deve ser avaliado de acordo com cada caso especiacutefico isto eacute observando-se a natureza da funccedilatildeo a ser exercida pelo candidato eventualmente aprovado de modo que natildeo haja distorccedilotildees na aplicaccedilatildeo desse criteacuterio e consequentemente inshyjusticcedilas para os candidatosUm dos traccedilos de maior destaque nos concursos puacuteblicos eacute a garantia de igualdade entre os participantes do certame sendo que somente a lei pode estabelecer restriccedilotildees de acesso a determinados cargos e mesmo assim soacute nos casos em que determinadas caracteriacutesticas inerentes ao candidato forem incompatiacuteveis com a natureza da funccedilatildeo a ser desempenhada Tal decorre do princiacutepio da isonomia o qual estaacute expliacutecito no art 5o caput e impliacutecito no art 3o IV ambos da Constituishyccedilatildeo Federal e que proiacutebe consoante esse uacuteltimo preceptivo quaisquer formas de discriminaccedilatildeo expressatildeo essa que adverte-nos que o rol de elementos discriminatoacuterios rechaccedilados pela Constituiccedilatildeo Federal natildeo eacute exaustivo mas meramente exemplificativo

a) Argumento de autoridadeb) Argumento a fortioric) Argumento de senso comumd) Argumento de causa e efeito

222 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 57 - Complete o argumento________________eacute um tipo de argushymento loacutegico no qual algueacutem assume uma ou mais hipoacuteteses e a partir dessas deriva uma consequecircncia incoerente e entatildeo conclui que a suposhysiccedilatildeo original deve estar erradaa) Por absurdob) Ad hominemc) De senso comumd) A fortiori

Questatildeo 58 - Complete o argumento__________ eacute uma falaacutecia identificadaquando algueacutem procura negar uma proposiccedilatildeo com uma criacutetica ao seu autor e natildeo ao seu conteuacutedo Apesar de natildeo possuir bases loacutegicas esse argumento eacute uma forte arma retoacutericaa) qor absurdob) ad hominemc) de senso comumd) a fortiori

Questatildeo 59 - Complete o argumento_______________eacute produzido a partirdas fontes de maior prestiacutegio no Direito

a) de autoridadeb) ad hominemc) a fortiorid) de senso comum

Questatildeo 6 0 - 0 paraacutegrafo a seguir pode ser classificado quanto ao tipo de argumento e quanto agrave forma de organizaccedilatildeo como

ldquoNesse contexto tambeacutem configura atribuiccedilatildeo do Ministeacuterio Puacuteblico no exerciacutecio de suas atribuiccedilotildees institucionais na defesa dos direitos assegurados na Magna Carta Constitucional emitir recomendaccedilotildees dirigidas ao Poder Puacuteblico aos oacutergatildeos da Administraccedilatildeo Puacuteblica direshyta ou indireta aos concessionaacuterios e permissionaacuterios de serviccedilo puacuteblishyco e agraves entidades que exerccedilam funccedilatildeo puacuteblica delegada ou executem serviccedilo de relevacircncia puacuteblica (art 27 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei 86251993) nos termos das disposiccedilotildees no art 55 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei Complementar Estadual 0572006 bem como do artishygo 27 paraacutegrafo uacutenico inciso IV da Lei 86251993 cc art 6deg inciso XX da Lei Complementar Federal 751993 (em anaacutelise sistecircmica aplishycado ao Parquet Estadual)rdquo (wwwjusnavigandicombr)

a) De autoridade por induccedilatildeob) De autoridade por deduccedilatildeoc) De analogia por induccedilatildeod) De analogia por deduccedilatildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 223

Questatildeo 6 1 - 0 paraacutegrafo a seguir pode ser classificado quanto ao tipo deargumento como

ldquoEmbora a resoluccedilatildeo n 56 do CNMP natildeo traga a previsatildeo expressa da adoccedilatildeo do criteacuterio do autorreconhecimento natildeo podemos olvidar que a Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica veda todo e qualquer entendimento juriacutedishyco de forma direta ou indireta na tese jaacute superada da superioridade cultural da sociedade dita majoritaacuteriardquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Ad hominemb) De oposiccedilatildeoc) De analogiad) Por absurdo

Questatildeo 62 - Leia o fragmento a seguir

ldquoNas uacuteltimas deacutecadas o criteacuterio da autoidentificaccedilatildeo eacutetnica vem senshydo o mais amplamente aceito pelos estudiosos da temaacutetica indiacutegena Na deacutecada de 50 o antropoacutelogo brasileiro Darcy Ribeiro baseou-se na definiccedilatildeo elaborada pelos participantes do II Congresso Indige- nista Interamericano no Peru em 1949 para assim definir no texto lsquoCulturas e liacutenguas indiacutegenas do Brasilrsquo o indiacutegena como lsquo(bullbull) aquela parcela da populaccedilatildeo brasileira que apresenta problemas de inadapshytaccedilatildeo agrave sociedade brasileira motivados pela conservaccedilatildeo de cosshytumes haacutebitos ou meras lealdades que a vinculam a uma tradiccedilatildeo preacute-colombiana Ou ainda mais amplamente iacutendio eacute todo o indiviacuteduo reconhecido como membro por uma comunidade preacute-colombiana que se identifica etnicamente diversa da nacional e eacute considerada indiacutegena pela populaccedilatildeo brasileira com quem estaacute em contatorsquo Uma definiccedilatildeo muito semelhante foi adotada pelo Estatuto do iacutendio (Lei 6001 de 19121973) que norteou as relaccedilotildees do Estado brasileiro com as populaccedilotildees indiacutegenas ateacute a promulgaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo de 1988rdquo (wwwjusnavigandicombr)

Qual o tipo de argumento predominante no paraacutegrafoa) Argumento de oposiccedilatildeo restritivab) Argumento de causa e efeitoc) Argumento de senso comumd) A rgum ento de autoridade

Questatildeo 63 - Leia o paraacutegrafo a seguir

ldquoProcurou seu advogado sensibilizar e convencer o colegiado de deshysembargadores que a indenizaccedilatildeo de 4000 salaacuterios miacutenimos (atualshymente R$ 60000000) extrapolava o limite do razoaacutevel dando ecircnfase que tal valor excede por exemplo ao salaacuterio que o Presidente da Reshypuacuteblica perceberia em seus quatro anos de mandato e que o receshybimento dessa importacircncia pela atriz significaria seu enriquecimento de forma injusta e agraves custas tatildeo somente de lsquouma uacutenica frase de

224 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

uma pequena seccedilatildeorsquo da Revista VEJA bem diferente por exemplo se fosse divulgada atraveacutes de uma reportagem de paacutegina inteira com fotos etcrdquo

Um paraacutegrafo argumentative pode recorrer a diversas fontes argumentativas aomesmo tempo para produzir as ideias necessaacuterias agrave defesa de sua tese Qualo tipo de argumento PREDOMINANTE na produccedilatildeo escritaa) Senso comumb) Autoridadec) Analogiad) Causa e efeito

Questatildeo 64 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETA de acordocom o texto

ldquoO Laudo eacute o parecer teacutecnico resultante do trabalho realizado pelo peshyrito via de regra escrito Deve ser redigido pelo proacuteprio perito mesmo quando existem Assistentes Teacutecnicos Os colegas devem receber a oportunidade de examinar o texto e emitir suas opiniotildees Essa tarefa deve ser realizada em conjunto de preferecircncia O perito ganha tempo e reduz os debates infrutiacuteferos dessa forma A maioria dos trabalhos resolve-se dentro do campo teacutecnico sem margem para opiniotildees pesshysoaisUm laudo pericial eacute uma forma de prova cuja produccedilatildeo exige coshynhecimentos teacutecnicos e cientiacuteficos e que se destina a estabelecer na medida do possiacutevel uma certeza a respeito de determinados fatos e de seus efeitos O perito fala somente sobre os efeitos teacutecnicos e cientiacuteficos O Juiz declara os efeitos juriacutedicos desses fatos referidos pelo perito e das conclusotildees desse O perito esclarece os efeitos de fato O Juiz fixa os efeitos de direitordquo (httpulcpericiacombrnoticias phpid=6)

a) A periacutecia funciona como prova admitida em direito De natureza demonstrativa estaacute a serviccedilo da argumentaccedilatildeo

b) Se eacute o Juiz quem ldquofixa os efeitos de direitordquo enquanto ao perito cabe apenas ldquoesclarecer os efeitos de fatordquo o parecer tem reduzida forccedila persuasiva no texto argumentativo

c) A opiniatildeo pessoal do profissional da aacuterea teacutecnica da periacutecia importa ao argumen- tador pois foi ele quem esteve no local onde o corpo de delito foi analisado

d) Laudos satildeo pareceres teacutecnico-formais produzidos por profissionais da aacuterea juriacuteshydica

Questatildeo 6 5 - 0 texto adaptado que segue eacute a sinopse de propaganda de uma obra sobre como redigir periacutecias judiciais Observe

ldquoA periacutecia judicial de engenharia eacute aqui apresentada com todas as fashyses do aspecto processual revelando o comportamento praacutetico e eacutetico

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 225

profissional do perito A exposiccedilatildeo deteacutem-se sobretudo na redaccedilatildeo do laudo estudando a sua estrutura formal e o raciociacutenio loacutegico-dialeacutetico que permite ao magistrado aplicar o direito com seguranccedila e pocircr fim ao conflito entre as partes A obra destina-se preferencialmente aos iniciantes pois sugere diversas maneiras de como utilizar os subsiacutedios concretos fornecidos pela periacutecia para o pleno exerciacutecio da atividade advocatiacuteciardquo (Recebido por e-mail)

Quando o texto afirma que a obra ldquosugere diversas maneiras de como utilizar os subsiacutedios concretos fornecidos pela periacutecia para o pleno exerciacutecio da atividade advocatiacutecia sugere que a periacutecia estaacute a serviccedilo daa) Polifoniab) Induccedilatildeoc) Argumentaccedilatildeod) Deduccedilatildeo

Questatildeo 6 6 - 0 paraacutegrafo adiante eacute o introito de um texto argumentativo Tenshydo em vista a classificaccedilatildeo proposta pelos autores indique aquela que melhor identifica o paraacutegrafo

ldquoA Lei 12654 publicada em 28 de maio de 2012 ainda natildeo entrou em vigor mas jaacute eacute possiacutevel observar que as alteraccedilotildees que traraacute para o processo penal brasileiro embora significativas satildeo tambeacutem polecircmicasrdquo

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 6 7 - 0 paraacutegrafo adiante eacute o introito da motivaccedilatildeo de um acoacuterdatildeo Tendo em vista a classificaccedilatildeo proposta pelos autores indique aquela que melhor identifica o paraacutegrafo

ldquoAto juriacutedico perfeito direito adquirido direito a termo expectativa de direito ato administrativo negociai ato-condiccedilatildeo contribuiccedilatildeo parafisshycal relaccedilatildeo juriacutedica estatutaacuteria enriquecimento sem causa etc satildeo as teses sustentadas pelos protagonistas deste processo em busca de uma soluccedilatildeo para a lide Antes de se acolher qualquer delas entretanshyto cumpre identificar a real relaccedilatildeo juriacutedica existente entre o autor e o reacuteu e analisar os efeitos dela decorrentesrdquo

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

226 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 68 - Os dois paraacutegrafos adiante formam um introito Marque a opccedilatildeoque melhor identifica os paraacutegrafos

ldquoA dinacircmica do mercado de consumo nos dias atuais tem motivado o surgimento de formas alternativas de produccedilatildeo contrataccedilatildeo e prestashyccedilatildeo de serviccedilos A chamada terceirizaccedilatildeo eacute sem duvida a mais coshynhecida e possivelmente a mais praticada Busca-se ao tomar esse tipo de serviccedilo maximizar a produccedilatildeo pela especializaccedilatildeo dos agenshytes nela envolvidos estando a cargo do tomador dos serviccedilos somente a sua atividade-fim atividade vedada a terceirosTambeacutem como forma alternativa de maximizaccedilatildeo da produccedilatildeo e conshysequentemente dos lucros tem-se a oferta de contratos de franquias de um determinado produto marca ou serviccedilo A oferta de contrato de franquia permite ao franqueador expandir suas atividades consolidar e conquistar mercados se beneficiar da parceria de terceiro isto eacute do franqueado e por via de consequecircncia beneficiar-se dos empregados deste haja vista estarem sob um mesmo signo uma mesma bandeishyra ou seja a franquiardquo (wwwjusnavigandicombr)

a) Alusatildeo histoacutericab) Contextualizaccedilatildeo no tempo e no espaccediloc) Enumeraccedilatildeod) Definiccedilatildeo

Questatildeo 69 - Leia o fragmento adiante e marque a opccedilatildeo CORRETAldquoAtualmente a identificaccedilatildeo criminal no Brasil eacute realizada atraveacutes da identificaccedilatildeo datiloscoacutepica (impressotildees digitais) e da identifishycaccedilatildeo fotograacutefica cumulativamente Em regra o indiciado que se identifica civilmente atraveacutes da apresentaccedilatildeo de documentos vaacutelishydos natildeo eacute submetido agrave identificaccedilatildeo criminal salvo nas hipoacuteteses previstas em lei conforme disposto no artigo 1deg e seguintes da Lei 120372009Ocorre que tanto a identificaccedilatildeo fotograacutefica quanto a datiloscoacutepica ainda que em menor proporccedilatildeo podem ser falhas enquanto a identishyficaccedilatildeo pelo perfil geneacutetico ostenta as vantagens da estabilidade quiacuteshymica do DNA mesmo que decorrido longo periacuteodo de tempo e de sua ocorrecircncia em todas as ceacutelulas nucleadas do corpo humano o que permite a identificaccedilatildeo por meio de um uacutenico fio de cabelo gota de sangue saliva e demais meacutetodos faacuteceis e indoloresrdquo (wwwjusnavi- gandicombr)

A estrutura que melhor identifica a redaccedilatildeo do fragmento eacutea) Introito + argumento de causa e efeito + senso comumb) Argumento proacute-tese + argumento de autoridade + argumento de oposiccedilatildeoc) Introito + argumento de autoridade + causa e efeitod) Argumento de senso comum + argumento proacute-tese + argumento de causa e

efeito

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 227

Questatildeo 70 - Leia o fragmento que segue

ldquoA advocacia antigamente era desenvolver raciociacutenio teacutecnico para conshyvencer o juiz de suas teses e vencer o processo para o cliente Hoje aleacutem disso - que continua a ser uma exigecircncia para a atuaccedilatildeo dos advogados - precisamos gerenciar o nosso escritoacuterio gerenciar os processos do cliente de forma a lhe informar nuacutemeros e dados estrashyteacutegicos Enfim temos que gerir muito mais do que apenas o processo e suas decisotildeesAtualmente os escritoacuterios e ateacute mesmo profissionais liberais que natildeo gerenciam a si mesmos estatildeo fadados a terem poucos clientes e deishyxar de crescer de maneira ordenada e corretaGestatildeo eacute mais do que apenas dar ordens e achar que tudo vai ficar bem porque um problema foi solucionado Gestatildeo eacute criticar o modo atual de organizaccedilatildeo Eacute pensar em maneiras alternativas de controlar e fazer funcionar bem o escritoacuterio Eacute realmente lsquopensarrsquo o seu negoacuteciordquo

De acordo com o texto marque a opccedilatildeo INCORRETAa) O advogado da atualidade deve ser competente (tecnicamente) e empreendedorb) O advogado da atualidade deve reunir as caracteriacutesticas de um bom argumenta-

dor e de um bom administradorc) O advogado da atualidade deve ser completamente diferente do advogado de

antigamented) O advogado da atualidade mesmo sendo competente na atuaccedilatildeo em audiecircncia

pode natildeo ter sucesso profissional

Questatildeo 71 - Satildeo providecircncias adequadas ao argumento de analogia

I Mostrar na argumentaccedilatildeo como se aproveita a decisatildeo por analogia no casoconcreto em anaacutelise

II Quando se tratar de jurisprudecircncia utilizada como paradigma para recursos esshypecial ou extraordinaacuterio aleacutem de mencionar o repertoacuterio autorizado fazer a comparaccedilatildeo analiacutetica

III Se ocorrer citaccedilatildeo de fragmentos marcar o trecho entre aspas

IV Natildeo exagerar na quantidade de citaccedilotildees diretas

V Ao citar o dispositivo que supre uma lacuna normativa justificar a semelhanccedilaque motiva a aplicaccedilatildeo analoacutegica

Satildeo verdadeiras as assertivasa) I II III e Vb) I III IV e Vc) II III e Vd) Todas as assertivas

228 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Questatildeo 72 - Marque a opccedilatildeo que melhor identifica o tipo de argumento deshysenvolvido no fragmento

ldquoNa visatildeo positivista do direito proposta por Kelsen Hart e Bobbio conshysagrou-se uma teoria juriacutedica que reduz o direito agrave regra e agrave sistemaacutetica do seu ordenamento normativo Essa concepccedilatildeo eacute tradicionalmente noshymeada de juspositivismo e natildeo considera a conexatildeo entre a norma e a realidade social Todavia a mudanccedila paradigmaacutetica do seacuteculo XX trouxa agrave baila uma nova forma de compreender o direito deixando de lado a conshycepccedilatildeo de norma como regra positiva Essa nova percepccedilatildeo denominashyda neoconstitucionalismo nas palavras de Juacutelio Ceacutesar Marcellino Juacutenior ldquocompreendeu a inserccedilatildeo de uma nova espeacutecie normativa o princiacutepiordquo

Trata-se dea) Argumento de oposiccedilatildeo

b) Argumento de causa e efeitoc) Argumento de senso comumd) Argumento por absurdo

Questatildeo 73 - Marque a opccedilatildeo que melhor identifica o tipo de argumento deshysenvolvido no fragmento

ldquoO valor normativo supremo da Constituiccedilatildeo natildeo surge bem se vecirc de pronto como uma verdade autoevidente mas eacute resultado de reshyflexotildees propiciadas pelo desenvolvimento da Histoacuteria e pelo empenho em aperfeiccediloar os meios de controle do poder em prol do aprimoshyramento dos suportes da convivecircncia social e poliacutetica Na verdade hoje eacute possiacutevel falar em um momento de constitucionalismo que se caracteriza pela supremacia do Parlamento porque o instante atual eacute marcado pela superioridade da Constituiccedilatildeo a que se subordinam toshydos os poderes por ela constituiacutedos - garantida por mecanismos juris- dicionaiacutes de controle de constitucionalidade - e tambeacutem a Constituiccedilatildeo se caracteriza pela absorccedilatildeo de valores morais e poliacuteticos (fenocircmeno por vezes designado como materializaccedilatildeo da Constituiccedilatildeo) sobretudo em um sistema de direitos fundamentais autoaplicaacuteveis Aleacutem disso eacute preciso considerar que o poder deriva do povo que se manifesta ordinariamente por seus representantes

Trata-se dea) Argumento proacute-teseb) Argumento de causa e efeitoc) Argumento a fortiorid) Argumento de autoridade

Questatildeo 74 - Leia o fragmento adiante

ldquoOs fetos anencefaacutelicos satildeo seres humanos que podem receber doaccedilotildees [art 542 do Coacutedigo Civil] figurar em disposiccedilotildees testamen-

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 229

taacuterias [art1799 do Coacutedigo Civil] e mesmo ser adotados [art 1621 do Coacutedigo Civil]rdquo (fragmento do texto ldquoPequena nota sobre o direito a viverrdquo de autoria do Ministro aposentado do STF Eros Roberto Grau)

O trecho recorre a qual tipo de argumentoa) Argumento de analogiab) Argumento proacute-tesec) Argumento de autoridaded) Argumento ad hominem

Questatildeo 75 - No fragmento que segue identifique a eventual presenccedila de modalizadores e comente o efeito valorativo que se pretende com esse recurso linguiacutestico

ldquoFabiano Ferreira Russi foi preso depois que duas mulheres assaltashydas em Taboatildeo da Serra Satildeo Paulo reconheceram-no como um dos criminosos em um aacutelbum fotograacutefico da poliacutecia O preso estava sozinho no reconhecimento e natildeo tinha antecedentes criminais mas para sua infelicidade foi fotografado depois que o Delegado determinou identishyficaccedilatildeo de todos os torcedores em batida policial Fabiano trabalhava em hotel quatro estrelas da regiatildeo da Vila Madalena Satildeo Paulo e ateacute trinta minutos depois do assalto continuava no trabalho Condenado em 2005 permaneceu preso por quatro anos Busca agora - apoacutes ser inocentado perder emprego e arruinar sua vida - indenizaccedilatildeo pelos danos que a decisatildeo judicial lhe causourdquo (wwwJusnavigandicombr)

Questatildeo 76 - A loacutegica do razoaacutevel exige do profissional do Direito a pondeshyraccedilatildeo de valores relativos a uma seacuterie de circunstacircncias observadas no caso concreto seja em relaccedilatildeo agravequeles que participam da lide seja em relaccedilatildeo ao lugar e ao tempo em que ocorreram os fatos

Com base nos conceitos de Loacutegica do Razoaacutevel e Loacutegica Formal exshyplique de que maneira a adoccedilatildeo por homoafetivos pode ser viabilizada no ordenamento juriacutedico brasileiro

Questatildeo 77 - Os elementos da narrativa forense (centralidade caracteriacutesticas dos personagens social moral fiacutesica psicoloacutegica profissional religioshysa familiar etc educaccedilatildeo quantitativa e qualitativa representatividade social espaccedilo fiacutesico e social tempo cronoloacutegico e psicoloacutegico) contrishybuem para uma argumentaccedilatildeo mais completa e consistente mostrando- -se de grande valor persuasivo

O trecho abaixo publicado na revista Veja em 09022009 eacute referente agrave acusaccedilatildeo de abuso sexual de pacientes feita contra renomado meacutedico

Dono da mais conhecida e bem-sucedida cliacutenica de reproduccedilatildeo asshysistida do paiacutes o meacutedico Roger Abdelmassih 65 anos de Satildeo Paushylo eacute objeto haacute quatro meses de um inqueacuterito policial por suspeita de

230 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

abuso sexual de pacientes Quando a investigaccedilatildeo foi revelada pelo jornal Folha de S Paulo no dia 9 nove mulheres haviam prestashydo depoimento contra Abdelmassih uma semana depois o nuacutemero tinha aumentado para 33 se incluiacutedo um testemunho que estava sendo colhido na sexta-feira ldquoOs relatos se parecem em diversos aspectosMuitas repetem as mesmas expressotildees usadas pelo meacutedicordquo diz Joseacute Reinaldo Carneiro um dos trecircs promotores responsaacuteveis pelo caso no Ministeacuterio Puacuteblico Abdelmassih que ainda natildeo foi ouvido no inqueacuterito em declaraccedilotildees a VE JA negou terminantemente as acusaccedilotildees ldquoNatildeo fiz nada Quando eu for agrave delegacia depor natildeo vou levar uma ou duas testemunhas vou levar um caminhatildeo de pessoas que me conhecem De preferecircncia pessoas de aparecircncia muito bonita que foram minhas clientes para contar se por acaso eu tive qualquer comportamento indevidordquo disse o meacutedico bem reshylacionado e querido por pacientes famosos a quem proporcionou a felicidade de ter filhos

(Disponiacutevel em httpvejaabrilcombr210109p_074shtml)

Indique pelo menos trecircs elementos da narrativa (centralidade caracteriacutesticas dos personagens social moral fiacutesica psicoloacutegica profissional religiosa familiar etc educaccedilatildeo quantitativa e qualitativa representatividade social espaccedilo fiacutesico e soshycial tempo cronoloacutegico e psicoloacutegico) e sua relevacircncia para o texto argumentative Justifique sua resposta com elementos do texto

Questatildeo 78 - Leia o texto adiante e responda ao que se pede

Bandido da Luz Vermelha discurso do jurista Neacutelson Hungria

Cari Chessman conhecido como o Bandido da Luz Vermelha foi um criminoso americano que estuprou e matou duas mulheres em 1960 na Califoacuternia nos Estados Unidos O acusado foi condenado agrave morte pelo juacuteri de Los Angeles e durante doze (12) anos seguidos conseguiu adiar sua execuccedilatildeo e nesse espaccedilo de tempo estudou intensamente na prisatildeo de San Quentin na Califoacuternia Estados Unidos lendo livros de Direito e tambeacutem de idiomas Tendo inclusive aprendido a Liacutengua PortuguesaMesmo preso no corredor da morte o Bandido da Luz Vermelha cheshygou a escrever quatro livros sobre sua causa A cela da morte (2455a) A face da justiccedila A Lei quer que eu morra e Garoto era um assassino O drama de Cari Chessman dominou todo o mundo e surgiram vaacuteshyrias manifestaccedilotildees no sentido de impedir sua execuccedilatildeo na cacircmara de gaacutesO grande jurista brasileiro Neacutelson Hungria Holffbauer liderou um moshyvimento internacional contra a pena de morte usando argumentaccedilatildeo juriacutedica por meio de discursos entrevistas manifestos e sobretudo em cartas dirigidas pessoalmente ao entatildeo Governador da Califoacuternia a quem cabia decidir sobre o Bandido da Luz Vermelha

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 231

Nelson Hungria abraccedilou essa campanha no Brasil com argumentos teacutecnicos e de psicologia juriacutedica para que o preso natildeo mais fosse leshyvado agrave cacircmara de gaacutes uma vez que ao tempo em que permaneceu preso recuperou-se pela dedicaccedilatildeo ao estudo do Direito e tambeacutem de idiomas Neacutelson Hungria que redigia com eloquecircncia clareza e muita convicccedilatildeo colocava seu argumento nos fragmentos a seguir em deshyfesa do Bandido da Luz VermelhaTrata-se de um singulariacutessimo exemplar humano [] vivendo sem tibiezas ou soluccedilotildees de continuidade no seu inexauriacutevel amor agrave vida e o que eacute assombroso tendo conseguido transformar o seu aparenshytemente irremediaacutevel fracasso como homo socialis numa estupenda vitoacuteria sobre si mesmo [] Chessman naquela maleborge dantesa sob o tremendo impacto de seu confinamento na estreita e sombria cela que precede agrave cacircmara de gases toacutexicos em San Quentin pocircde achar-se a si mesmo e do mais profundo do seu ser desvencilhanshydo da empolgadura e cativeiro de sua proacutepria natureza psicopaacutetica que o arrastara gradativamente a mais imprudente e grosseira anishymalidade surgiu um outro homem ateacute entatildeo desconhecido para ele mesmo Aquele Chessman de 27 anos que o juacuteri de Los Angeles condenou-o agrave morte eacute tatildeo diferente do Chessman atual como um carvatildeo difere do diamante Seraacute que Chessman depois de padecero acabrunhante castigo de onze anos de angustiosa expectativa nesshysa cittaacute dolente nesse exasperante purgatoacuterio que eacute o corredor da morte de San Quentin natildeo teraacute conquistado um autecircntico direito de comutaccedilatildeo da pena para continuar a viver Seraacute que o prosseguishymento da vida de Chessman natildeo poderaacute ser a continuidade de um exemplo edificante para os conscritos do crime A pena de morte natildeo traduz mais que o comodismo da administraccedilatildeo da justiccedila que para esquivar-se agrave tarefa de recuperaccedilatildeo de delinquentes perigosos preshyfere eliminaacute-los sem maior trabalho como a catildees danados (Redaccedilatildeo juriacutedica A palavra do advogado n 082004)

Com base no discurso proferido por Neacutelson Hungria produza um argumento deoposiccedilatildeo agrave tese defendida no texto

Questatildeo 79 - Leia o caso concreto adiante consulte as fontes disponiacuteveis e redija a fundamentaccedilatildeo juriacutedica com pelo menos um argumento proacuteshytese um argumento de autoridade e um argumento de oposiccedilatildeo

Considerando que a viacutetima perdeu sua vida de forma brutal a caminho do trabalho realizando pois o mais elementar direito de cidadania qual seja o de ir e vir direito esse tutelado pela norma constitucional soberana e cuja defesa eacute funccedilatildeo principal da autoridade policial Considerando que o agente autoridade policial armada cujo principal dever de ofiacutecio eacute dar proteccedilatildeo e amparo aos cidadatildeos em tempo inshytegral encontrava-se agrave paisana em estado de embriaguez e iniciou violentamente constrangimento agrave viacutetima para conjunccedilatildeo carnal ou ato libidinoso em veiacuteculo de transporte de passageiros demonstrando natildeo possuir o equiliacutebrio necessaacuterio esperado de um homem da lei

232 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Considerando a impertinecircncia ostensiva do agente que ignorou as constantes represaacutelias da viacutetima e o modo frio e covarde com que executou os disparos sem permitir qualquer reaccedilatildeoConsiderando serem necessaacuterias todas as medidas que impeccedilam o processo de banalizaccedilatildeo da vida (ou da morte) humana que todos vivenciamos em nossos dias especialmente por parte daqueles que a deveriam protegerOpina-se pela sumaacuteria expulsatildeo do agressor do efetivo da Poliacutecia Militar sem prejuiacutezo das sanccedilotildees militares legais e que seja acashytada denuacutencia pelo Ministeacuterio Puacuteblico requerendo sua condenaccedilatildeo em rito sumaacuterio (prisatildeo em flagrante) agraves penas previstas no art 121 sect 2deg II do Coacutedigo Penal homiciacutedio doloso qualificado por motivo fuacutetil

Fontes

Homiciacutedio simples Art 121 - Matar algueacutemPena - reclusatildeo de 6 (seis) a 20 (vinte) anos

Homiciacutedio qualificado sect 2o Se o homiciacutedio eacute cometidoI - mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpeII - por motivo fuacutetilIII - com emprego de veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comumIV - agrave traiccedilatildeo de emboscada ou mediante dissimulaccedilatildeo ou outro reshycurso que dificulte ou torne impossiacutevel a defesa do ofendidoV - para assegurar a execuccedilatildeo a ocultaccedilatildeo a impunidade ou vantashygem de outro crimePena - reclusatildeo de 12 (doze) a 30 (trinta) anos

Questatildeo 80 - Leia a sentenccedila citada na parte teoacuterica do capiacutetulo relativo agraves figuras de retoacuterica referente ao Processo n 1863657-42008 (autor Minisshyteacuterio Puacuteblico Estadual reacuteu BSS) Procure identificar as figuras de retoacuteshyrica utilizadas nesta sentenccedila e o efeito persuasivo que possivelmente possam acarretar

Autor Ministeacuterio Puacuteblico Estadual Reacuteu BSSBSS eacute surdo e mudo tem 21 anos e eacute conhecido em Coiteacute como ldquoMudinhordquo

Quando crianccedila entrava nas casas alheias para merendar jogar video-game para trocar de roupa para trocar de tecircnis e depois de algum tempo tambeacutem para levar algum dinheiro ou objeto Conseguia

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 233

abrir facilmente qualquer porta janela grade fechadura ou cadeado Domou os catildees mais ferozes tornando-se amigo deles Abria tambeacutem a porta de carros e dormia candidamente em seus bancos Era motivo de admiraccedilatildeo espanto e medoO Ministeacuterio Puacuteblico ofereceu dezenas de Representaccedilotildees contra o entatildeo adolescente BSS pela praacutetica de ldquoatos infracionaisrdquo dos mais diversos O Promotor de Justiccedila Dr Joseacute Vicente quase o adotou e ateacute o levou para brincar com seus filhos dando-lhe carinho e afeto mas natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquoMudinhordquoO Judiciaacuterio o encaminhou para todos os oacutergatildeos e instituiccedilotildees posshysiacuteveis ameaccedilou prender Diretoras de Escolas que natildeo o aceitavam mas tambeacutem natildeo teve condiccedilotildees de cuidar do ldquoMudinhordquoA comunidade natildeo fez nada por eleO Municiacutepio natildeo fez nada por eleO Estado Brasileiro natildeo fez nada por eleHoje BSS tem 21 anos eacute maior de idade e pratica crimes conshytra o patrimocircnio dos membros de uma comunidade que natildeo cuidou deleFoi condenado na vizinha Comarca de Valente como ldquoincurso nas sanccedilotildees do art 155 caput por duas vezes art 155 sect 4o inciso IV por duas vezes e no art 155 sect 4o inciso IV cc art 14 inciso IIrdquo a pena de dois anos e quatro meses de reclusatildeoPor falta de estabelecimento adequado cumpria pena em regime aberto nesta cidade de CoiteacuteAqui sem escolaridade sem profissatildeo sem apoio da comunidade sem famiacutelia presente sozinho agraves trecircs e meia da manhatilde entrou em uma marmoraria e foi preso em flagrante Por que uma marmora- riaFoi entatildeo denunciado pelo Ministeacuterio Puacuteblico pela praacutetica do crime previsto no artigo 155 sect4deg incisos II e IV cc o artigo 14 II do Coacutedigo Penal ou seja crime de furto qualificado cuja pena eacute de dois a oito anos de reclusatildeoFoi um crime tentado Natildeo levou nadaPor intermeacutedio de sua matildee foi interrogado e disse que ldquotoma remeacutedio controlado e bebeu cachaccedila oferecida por amigos que ficou completashymente desnorteado e entatildeo pulou o muro e entrou no estabelecimento da viacutetima quando foi surpreendido e preso pela poliacuteciardquoEm alegaccedilotildees finais a ilustre Promotora de Justiccedila requereu sua condenaccedilatildeo ldquopela praacutetica do crime de furto qualificado pela escashyladardquoBSS tem peacutessimos antecedentes e natildeo eacute mais primaacuterio Sua ficha contando os casos da adolescecircncia tem mais de metroO que deve fazer um magistrado neste caso Aplicar a Lei simplesshymente Condenar BSS agrave pena maacutexima em regime fechadoO futuro de BSS estava escrito Se natildeo fosse morto por um ldquoproprieshytaacuteriordquo ou pela poliacutecia seria bandido Todos sabiam e comentavam isso na cidade

234 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Hoje o Ministeacuterio Puacuteblico quer sua prisatildeo e a cidade espera por isso Ningueacutem quer o ldquoMudinhordquo solto por aiacute Deve ser preso Precisa ser retirado do seio da sociedade Levado para a lixeira humana que eacute a penitenciaacuteria Laacute eacute seu lugar Infelizmente a Lei eacute dura mas eacute a Lei O Juiz de sua vez deve ser a ldquoboca da LeirdquoSeraacute O Juiz natildeo faz parte de sua comunidade Natildeo pensa Natildeo eacute um ser humanoDe outro lado seraacute que o Direito eacute somente a Lei E a Justiccedila o que seraacutePoderiacuteamos como jaacute fizeram tantos outros escrever mais de um livro sobre esses temasNesse momento no entanto temos que resolver o caso concreto de BSS O que fazer com eleNenhuma satilde consciecircncia pode afirmar que a soluccedilatildeo para BSS seja a penitenciaacuteria Sendo como ela eacute a penitenciaacuteria vai oferecer a BSS tudo o que lhe foi negado na vida escola acompanhamento especial afeto e compreensatildeo Natildeo Com certeza natildeoEacute o Juiz entre a cruz e a espada De um lado a consciecircncia a feacute cristatilde a compreensatildeo do mundo a utopia da Justiccedila Do outro lado a Lei (metoniacutemia)Neste caso prefiro a Justiccedila agrave LeiAssim BSS apesar da Lei natildeo vou lhe mandar para a Penitenciaacuteria Tambeacutem natildeo vou lhe absolverVou lhe mandar prestar um serviccedilo agrave comunidadeVou mandar que vocecirc pessoalmente em companhia de Oficial de Justiccedila desse Juiacutezo e de sua matildee entregue uma coacutepia dessa decishysatildeo colhendo o ldquorecebidordquo a todos os oacutergatildeos puacuteblicos dessa cidade- Prefeitura Cacircmara e Secretarias Municipais a todas as associashyccedilotildees civis dessa cidade - ONGs clubes sindicatos CDL e maccedilonashyria a todas as Igrejas dessa cidade de todas as confissotildees ao Deshylegado de Poliacutecia ao Comandante da Poliacutecia Militar e ao Presidente do Conselho de Seguranccedila a todos os oacutergatildeos de imprensa dessa cidade e a quem mais vocecirc quiserAproveite e peccedila a eles um emprego uma vaga na escola para adultos e um acompanhamento especial Depois apresente ao Juiz a comshyprovaccedilatildeo do cumprimento de sua pena e natildeo roubes maisExpeccedila-se o Alvaraacute de SolturaConceiccedilatildeo do Coiteacute-Ba 07 de agosto de 2008 ano vinte da Constituiccedilatildeo Federal de 1988

Bei Gerivaldo Alves Neiva Juiz de Direito

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 235

Coletacircnea de textos para exerciacuteciosTexto 1O M IN ISTEacuteRIO PUacuteBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

por meio do Promotor de Justiccedila infra-assinado em esteio de suas atribuishyccedilotildees constitucionais e consoante o disposto no art 220 da Carta Federal e o artigo 149 da Lei 80691990 - Estatuto da Crianccedila e do Adolescente - vem atraveacutes do presente na defesa de interesse difuso afeto aos adolescentes narshyrar os fatos adiante aduzidos para posteriormente requerer o seguinte

1) O Requerente eacute Titular da T Promotoria de Justiccedila da Infacircncia e da Juventude da Comarca da Capital Oacutergatildeo de Execuccedilatildeo com atribuiccedilatildeo para o processamento dos adolescentes envolvidos em praacuteticas infracionais no Rio de Janeiro e concorrentemente com atribuiccedilatildeo para oficiar perante a Justiccedila da Infacircncia e da Juventude

2) Como eacute por demais sabido diferentemente do que ocorre em outras Comarcas do Paiacutes no Rio de Janeiro haacute uma caracteriacutestica peculiar cerca de 70 (setenta por cento) das apreensotildees de adolescentes infratores refeshyrem-se a traacutefico de substacircncias entorpecentes (art 33 da Lei 113432006) aumentando ainda mais esse percentual quando independentemente do tipo de ato infracional perpetrado a sua origem se daacute natildeo soacute por envolvishymento mas tambeacutem o uso (artigos 20 a 26 da Lei 113432006) de substacircnshycias entorpecentes ou que causam dependecircncia fiacutesica ou psiacutequica

3) No uacuteltimo dia 16 de marccedilo do corrente ano entrou em circuito o filme ldquo Trafficrdquo dirigido por Steven Soderbergh recomendado nacionalshymente pela Coordenadoria-Geral de Classificaccedilatildeo Tiacutetulos e Qualificaccedilatildeo da Secretaria Nacional de Justiccedila para ldquo maiores de 18 anos de idaderdquo imshypossibilitando dessa forma que os adolescentes habitantes desta Cidade do Rio de Janeiro possam sozinhos assistir agrave referida produccedilatildeo

4) O filme em questatildeo retrata o submundo do narcotraacutefico nos Estashydos Unidos e mostra uma realidade muito proacutexima da que ocorre no Rio de Janeiro onde os adolescentes que satildeo apreendidos e chegam agrave Justiccedila da Infacircncia e da Juventude tecircm como motivo principal o envolvimento no mundo das drogas

5) Em reportagem veiculada hoje pela Imprensa (em anexo) especiashylistas em drogas puderam emitir suas opiniotildees e parecem concordar com o Ministeacuterio Puacuteblico quando priorizam a educaccedilatildeo na difiacutecil tarefa de comshybater o traacutefico de drogas Segundo Maria Thereza de Aquino Diretora do NEPAD o filme ldquo tem o meacuterito de tratar a questatildeo sem preconceito ou falsos moralismos Saiacutedas Haacute sim Elas dependem de noacutesrdquo

236 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

6 EX POSIT1S pelas razotildees aduzidas requer o Ministeacuterio Puacuteblico seja autorizada judicialmente mediante Alvaraacute a entrada de adolescenshytes desacompanhados dos pais ou responsaacutevel a partir de 16 anos nos estuacutedios de exibiccedilatildeo da Cidade do Rio de Janeiro intimando-se a direccedilatildeo da Europa Filmes Distribuidora do Filme ldquoTrqfficrdquo e o Departamento de Classificaccedilatildeo Indicativa do Ministeacuterio da Justiccedila para a ciecircncia e demais providecircncias cabiacuteveis

(Extraiacutedo da Internet Fonte desconhecida)

Se desejar recorra agraves seguintes fontesAlt 220 da CRFB A manifestaccedilatildeo do pensamento a criaccedilatildeo a expresshysatildeo e a informaccedilatildeo sob qualquer forma processo ou veiacuteculo natildeo sofreshyratildeo qualquer restriccedilatildeo observado o disposto nesta ConstituiccedilatildeoArt 149 I ldquo erdquo do ECA Compete agrave autoridade judiciaacuteria disciplinar atraveacutes de portaria ou autorizar mediante alvaraacute a entrada e permanecircnshycia de crianccedila ou adolescente desacompanhado dos pais ou responsaacuteshyvel em estuacutedios cinematograacuteficos de teatro raacutedio e televisatildeoArt 33 da Lei 113432006 Importar exportar remeter preparar proshyduzir fabricar adquirir vender expor agrave venda oferecer ter em depoacutesishyto transportar trazer consigo guardar prescrever ministrar entregar a consumo ou fornecer drogas ainda que gratuitamente sem autorizaccedilatildeo ou em desacordo com determinaccedilatildeo legal ou regulamentar Pena mdash reshyclusatildeo de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1500 (mil e quinhentos) dias-multaArt 20 da Lei 113432006 Constituem atividades de atenccedilatildeo ao usuaacuteshyrio e dependente de drogas e respectivos familiares para efeito desta Lei aquelas que visem agrave melhoria da qualidade de vida e agrave reduccedilatildeo dos riscos e dos danos associados ao uso de drogas

Texto 2Em uma cidade do interior do Paranaacute trecircs meninos ficaram oacuterfatildeos e

como toda a famiacutelia dos pais era muito pobre nenhum parente quis assumir a guarda deles Os menores tecircm nove onze e doze anos satildeo negros - soshymente o mais velho frequentou a escola ateacute a terceira seacuterie do ensino fundashymental - e estatildeo provisoriamente numa instituiccedilatildeo religiosa da cidade

Haacute dois anos o Juizado da Infacircncia e Juventude procura em todo o Brasil uma famiacutelia que os adote Um casal homoafetivo Joseacute e Joatildeo interessou-se pelos meninos Apoacutes uma sequecircncia de visitas Joseacute ingresshysou com um pedido de adoccedilatildeo dos trecircs meninos e a guarda provisoacuteria que foi desde logo concedida

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 237

O casal tem excelente condiccedilatildeo econocircmica formaccedilatildeo universitaacuteria e a sua opccedilatildeo eacute aceita pelas famiacutelias de ambos e pela comunidade local em que vivem Os laudos apresentados pelos assistentes sociais indicaram que Joseacute tinha condiccedilotildees de adoccedilatildeo e que a opccedilatildeo sexual de Joseacute podeshyria representar dificuldades para os irmatildeos mas que durante o periacuteodo de convivecircncia os trecircs meninos demonstravam gostar da companhia de Joseacute e seu companheiro

O juiz em sua sentenccedila negou o pedido de adoccedilatildeo tendo em vista o art 226 da CRFB com base no entendimento de que a entidade familiar eacute constituiacuteda pela uniatildeo de homem e mulher e que o bem-estar das crianccedilas natildeo poderia ser garantido Acrescentou que o referido artigo se sobrepotildee ao ECA que natildeo estabelece restriccedilatildeo para o solteiro adotar uma crianccedila

Texto 3Roberto Pires contratou os serviccedilos da cliacutenica de Esteacutetica Beleza

Eterna para uma depilaccedilatildeo a laser na regiatildeo da barba e do pescoccedilo por R$ 257600 Ele foi submetido a uma entrevista preliminar com um teacutecnico de esteacutetica - natildeo por um meacutedico - e chegou a informar que tinha foliculite

Logo apoacutes a primeira aplicaccedilatildeo do laser ele apresentou uma graviacutesshysima reaccedilatildeo aleacutergica O consumidor afirma que a aplicaccedilatildeo tambeacutem lhe causou dores de cabeccedila e nos olhos aleacutem de acnes que lhe deixaram com uma aparecircncia horriacutevel Por ser recepcionista de uma grande empresa na aacuterea de comeacutercio exterior ele foi afastado do trabalho e posteriormente perdeu o emprego

Roberto Pires propocircs accedilatildeo indenizatoacuteria em que pediu reparaccedilatildeo pelos danos morais esteacuteticos e materiais Argumenta que todas as provishydecircncias adotadas pela empresa natildeo foram suficientes para anular os efeitos dos danos causados Na Peticcedilatildeo Inicial a viacutetima contou que natildeo realizou exames preacutevios necessaacuterios ao tratamento e em razatildeo dos problemas apreshysentados ficou deprimido teve seu trabalho prejudicado e manteve distanshyciamento do meio social

Sustenta o autor que ldquo a indenizaccedilatildeo deve ser compatiacutevel com a repro- vabilidade da conduta iliacutecita a intensidade e duraccedilatildeo do sofrimento expeshyrimentado pela viacutetima a capacidade econocircmica do causador do dano e as condiccedilotildees sociais do ofendidordquo A reacute afirma que natildeo foi responsaacutevel pelos danos causados ao recepcionista Ao contraacuterio enfatiza que tomou todas as providecircncias posteriores necessaacuterias agrave reparaccedilatildeo do dano mesmo natildeo sendo por ele responsaacutevel

238 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Apoacutes a compreensatildeo do conflito e a leitura das fontes primaacuterias e secundaacuterias que auxiliam a soluccedilatildeo da lide desenvolva uma ementa e uma fundamentaccedilatildeo para o caso concreto Sua fundamentaccedilatildeo deveraacute apresenshytar pelo menos trecircs paraacutegrafos argumentativos diferentes

Texto 4Mariacircngela Gomes de Almeida psicoacuteloga eacute casada com Patriacutecio Goshy

mes de Moura piloto desde marccedilo de 1977 O casamento eacute regido pela comunhatildeo universal dos bens O casal tem duas filhas uma de 18 e outra de 20 anos de idade Os cocircnjuges acumularam um patrimocircnio de cerca de 700 mil reais composto por uma casa de 400 mil reais onde mora o casal dois carros avaliados em 50 mil reais cada e uma casa de praia de 200 mil

Em virtude de sua profissatildeo Patriacutecio realiza frequentes viagens pelo Brasil e natildeo eventualmente passa longos periacuteodos longe de casa Mariacircnshygela e suas filhas jaacute se acostumaram a essa rotina irregular de trabalho Essa eacute uma famiacutelia feliz Todos os parentes e amigos afirmam que Patriacutecio nunca deixou faltar nada para sua famiacutelia nem do ponto de vista financeiro nem moral

Em janeiro de 2005 Patriacutecio morreu e durante seu veloacuterio se descoshybriu que o piloto vivia com Gorete Alves sambista haacute cerca de nove anos Com ela o falecido teve trecircs filhos Ricardo Gomes de Moura Alves (5 anos) Alvina Gomes de Moura Alves (3 anos) e Patriacutecio Gomes de Moura Juacutenior (10 meses de idade) todos devidamente registrados Diante do caishyxatildeo de seu amado Gorete fez questatildeo de exibir fotos do companheiro com ela e os filhos

No uacuteltimo Natal ambos tiveram uma viagem inesqueciacutevel para Buenos Aires Havia tambeacutem fotos tiradas no Dia dos Pais e na Paacutescoa Depois de criar grande estardalhaccedilo no veloacuterio Gorete entregou agrave Mashyriacircngela a fatura do cartatildeo de creacutedito de Patriacutecio que era haacute dois anos remetida para a residecircncia daquela Afirmou a companheira que natildeo pashygaria aquelas despesas porque todas se referiam a gastos feitos com a famiacutelia da esposa

Somente entatildeo Mariacircngela descobriu que Patriacutecio utilizava seu trabashylho como desculpa para dividir o tempo entre as duas famiacutelias Afirma que nunca poderia imaginar que um marido tatildeo zeloso poderia traiacute-la por tanto tempo Gorete ingressa com accedilatildeo judicial visando ao reconhecimento da uniatildeo estaacutevel e pretende se habilitar agrave heranccedila deixada pelo de cujus

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 239

Garante que natildeo apenas seus filhos mas lambeacutem ela tecircm direitos a serem tutelados pois sua uniatildeo com Patriacutecio era puacuteblica duradoura e sem duacutevida tinha por objetivo constituir famiacutelia nos termos da Lei de Uniatildeo Estaacutevel Mariacircngela contesta a accedilatildeo alegando que natildeo pode haver concomitacircncia de dois casamentos assim como de casamento com uniatildeo estaacutevel Essa praacutetica alega atenta contra a moral e os bons costumes Seria precedente perigoso um juiz reconhecer esse tipo de relaccedilatildeo

Texto 5Juiz obriga empresa a fornecer remeacutedio para o estadoDecisatildeo da Justiccedila Federal do Rio Grande do Norte obriga a empresa

Elfa Medicamentos Ltda a fornecer ao governo do Estado potiguar remeacuteshydios para o tratamento de esquizofrenia

A empresa ganhou a licitaccedilatildeo feita pela Secretaria Estadual de Sauacutede para fornecimento dos remeacutedios No entanto como o governo tem deacutebitos acumulados com a empresa ela se negou a fornecer medicamento para o qual concorreu e venceu o pregatildeo A decisatildeo foi do Juiz Federal Janilson Bezerra titular da 4a Vara

ldquo A conduta perpetrada pela empresa demandada natildeo se justifica tenshydo em vista a existecircncia de meios proacuteprios para a cobranccedila de creacuteditos em desfavor do Estado natildeo se mostrando a suspensatildeo do fornecimento do medicamento objeto do presente litiacutegio meio liacutecito para tanto

Assim observa-se que ao deixar de fornecer o medicamento Olan- zapina nas versotildees de 5 e 10 mg a empresa Elfa Medicamentos Ltda estaacute descumprindo as disposiccedilotildees contratuais decorrentes da Ata de Registro de Preccedilos 612010 colocando em risco a sauacutede dos portadores de esquizofreshynia do Estado do RN e de seus familiaresrdquo escreveu o juiz na liminar

Pela decisatildeo a Elfa Medicamentos Ltda tem prazo de 48 horas para fornecer os medicamentos descritos na nota de empenho assinada pelo seshycretaacuterio estadual de Sauacutede

QuestatildeoEm ldquoAssim observa-se que ao deixar de fornecer o medicamento

Olanzapina nas versotildees de 5 e 10 mg a empresa Elfa Medicamentos Ltda estaacute descumprindo as disposiccedilotildees contratuais decorrentes da Ata de Reshygistro de Preccedilos 612010 colocando em risco a sauacutede dos portadores de esquizofrenia do Estado do RN e de seus familiaresrdquo o juiz da liminar fez uso do raciociacutenio dedutivo ou indutivo Justifique

240 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Texto 6Presa em dezembro de 2005 sob acusaccedilatildeo de comandar ataque a um

ocircnibus da linha 350 no bairro da Penha Circular Zona Norte do Rio de Jashyneiro Maria Aparecida Mendonccedila entrou com accedilatildeo indenizatoacuteria em Face do Estado do Rio de Janeiro na 3a Vara de Fazenda Puacuteblica

Depois de ser detida em casa e passar 28 dias na prisatildeo a Poliacutecia Civil admitiu publicamente o equiacutevoco e a soltou A Defensoria Puacuteblica fluminense que a representa estaacute pleiteando R$ 700 mil a tiacutetulo de danos morais aleacutem de uma pensatildeo alimentiacutecia de R$ 35000 mensais

ldquoA jovem foi exposta agrave miacutedia pelas autoridades e natildeo haacute como negar que isso a prejudicou em diversos aspectos inclusive fazendo com que perdesse o emprego de animadora de festas infantisrdquo declarou um dos deshyfensores que atua no processo Maria Aparecida na ocasiatildeo do crime foi identificada por meio de foto por uma garota de 13 anos

Posteriormente natildeo foi reconhecida por trecircs testemunhas como a mulher que teria mandado colocar fogo no coletivo o que provocou a morshyte de cinco pessoas inocentes inclusive um bebecirc de um ano e um mecircs O delito ocorreu na noite de 29 de novembro de 2005 no subuacuterbio do Rio de Janeiro e comoveu o paiacutes Apoacutes lembrarem que a prisatildeo por mais de trecircs semanas impediu a ex-animadora de trabalhar os defensores enfatizaram o fato de sua assistida ter corrido risco de morte jaacute que trecircs coautores do atentado foram assassinados por encomenda de facccedilotildees criminosas irritashydas com a repercussatildeo do caso

A acusaccedilatildeo sustenta que a atitude dos agentes puacuteblicos que invadiram a residecircncia da autora e a deixaram 28 dias presa sem terem provas consisshytentes para tal fez com que Maria Aparecida ficasse arrasada

ldquoO papel deles eacute proteger as pessoas e natildeo violar direitos constitushycionais de cidadatildeos de bemrdquo disse o Defensor O Defensor afirmou ainda que natildeo considera que o valor pedido seja elevado e prefere destacar que o Estado pode evitar pleitos futuros caso selecione melhor seus agentes policiais

ldquoO pleito tem caraacuteter compensatoacuterio para a viacutetima e feiccedilatildeo punitiva para o causador do dano Esta duplicidade baseia-se no dever geral de absshytenccedilatildeo residente no fato de que natildeo eacute liacutecito a ningueacutem causar dano a outrem A condenaccedilatildeo do causador do dano tem funccedilatildeo tambeacutem preventiva desesti- mulando a reiteraccedilatildeo de situaccedilotildees correlatasrdquo afirmou por fim o Defensor

Em resposta o Estado sustenta que tem o direito-dever de investigar e apurar a responsabilidade sobre fato de natureza criminosa em especial

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 241

quando esse ganha repercussatildeo em todo o paiacutes Alega ainda que a autora natildeo teve sua integridade fiacutesica violada durante o tempo em que permaneceu sob sua responsabilidade

Texto 7Lavrador eacute preso por raspar casca de aacutervoreEle usava a casca de aacutervore para fazer chaacute para sua mulher que estaacute

doenteO ministro Joseacute Samey Filho (Meio Ambiente) e as entidades amshy

bientalistas Greenpeace e ISA (Instituto Socioambiental) criticaram a prishysatildeo em flagrante do lavrador Joseacute dos Anjos 58 anos que durante dois anos raspou a casca de uma aacutervore para fazer chaacute para sua mulher que estaacute doente Joseacute raspava a casca de uma aacutervore chamada almesca em uma aacuterea de preservaccedilatildeo permanente que fica agraves margens do coacuterrego Pindaiacuteba em Planaltina (a 44 km de Brasiacutelia)

O lavrador disse que usava a casca para fazer chaacute para a mulher Helena dos Anjos Ela tem Doenccedila de Chagas Joseacute conta que soube que o chaacute melhorava as condiccedilotildees dos acometidos pela doenccedila Em 20 de junho de 2000 Joseacute foi surpreendido com um tiro para o alto dado por soldados da Poliacutecia Florestal quando raspava a almesca Preso em flagrante delito algemado e levado para a delegacia o lavrador foi enquadrado na Lei do Meio Ambiente (Lei 9605 de 1998)

Segundo o delegado Ivanilson Severino de Melo Joseacute provocou ldquo dashynos diretos ao patrimocircnio ambientalrdquo crime previsto no artigo 40 da lei O delito inafianccedilaacutevel eacute punido com 1 a 5 anos de prisatildeo Joseacute foi colocado numa cela com outros cinco presos acusados de homiciacutedio e roubo

Texto 8Municiacutepio teraacute que indenizar idosa agredida por meacutedicoFonte TJM TO municiacutepio de Vaacuterzea Grande foi condenado a pagar R$ 152 mil a

tiacutetulo de danos morais a uma idosa que foi agredida fiacutesica e verbalmente por um meacutedico na policliacutenica do bairro Parque do Lago A decisatildeo eacute do juiz Rodrigo Roberto Curvo da Terceira Vara Especializada da Fazenda Puacuteblica de Vaacuterzea Grande (processo 2152005)

A autora da accedilatildeo eacute procuradora de um portador de esquizofrenia No dia 19 de novembro de 2003 quando tinha 73 anos ela levou o paciente agrave

242 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

policliacutenica para consulta e obtenccedilatildeo de novo laudo meacutedico que daria conshytinuidade ao recebimento do auxiacutelio-doenccedila No entanto segundo a idosa ao ser atendida pelo meacutedico ele se recusou a expedir o documento mesmo tendo ciecircncia de que o paciente eacute portador de doenccedila mental

Ela lembrou ao meacutedico que o paciente tinha o direito de ser atendishydo Ainda segundo a idosa a reclamaccedilatildeo deixou o meacutedico transtornado Ele passou a bater na mesa gritando palavras de baixo calatildeo e ameaccedilanshydo agredi-la fisicamente O meacutedico teria dito tambeacutem que iria localizar o endereccedilo da idosa para mandar prendecirc-la Conforme relatos contidos no processo o meacutedico soacute natildeo espancou a idosa porque o paciente interveio e se colocou na sua frente Em seguida ele teria empurrado a idosa e o paciente para fora de seu consultoacuterio na policliacutenica do Parque do Lago empregando forccedila fiacutesica e humilhando os dois diante dos demais pacientes qLie aguardavam atendimento no local

Na sentenccedila o magistrado observou que eacute obrigaccedilatildeo de qualquer sershyvidor puacuteblico atender com urbanidade e cortesia sobretudo em se tratando de idoso pois o Estatuto do Idoso (Lei 107412003) assegura no artigo 4deg que ldquonenhum idoso seraacute objeto de qualquer tipo de negligecircncia discrishyminaccedilatildeo violecircncia crueldade ou opressatildeo e todo atentado aos seus direishytos por accedilatildeo ou omissatildeo seraacute punido na forma da leirdquo Desta forma cabe agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica indenizar a idosa pelo sofrimento e humilhaccedilatildeo aos quais foi submetida ldquo Desde que a Administraccedilatildeo defere ou possibilita ao seu servidor a realizaccedilatildeo de certa atividade administrativa a guarda de um bem ou a conduccedilatildeo de uma viatura assume o risco de sua execuccedilatildeo e resshyponde civilmente pelos danos que esse agente venha a causar injustamente a terceirosrdquo observou o juiz

Texto 9O siacutendico de um edifiacutecio residencial no Recreio dos Bandeirantes Jaime

Adelino Machado estaacute sendo acusado de racismo por tentar impedir a circushylaccedilatildeo de um morador negro nas dependecircncias do preacutedio A moradora Maria das Graccedilas Santos recebeu uma carta do administrador com a determinaccedilatildeo de que seu filho de criaccedilatildeo Juacutelio Costa Ribeiro de 24 anos teria a circulaccedilatildeo no preacutedio limitada agrave lixeira e agrave caixa de correio Ela ficou indignada e resolveu procurar a 16 DP (Barra da Tijuca) que comeccedilou a investigar o caso

Juacutelio que mora haacute um ano no preacutedio contou que ateacute jaacute discutiu com o siacutendico

- E muito humilhante E muito triste tudo isso Natildeo queria estar vishyvendo essa situaccedilatildeo - disse o rapaz

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 243

Maria da Penha tambeacutem natildeo se conforma com o caso e natildeo tem duacuteshyvidas de que se trata de racismo

- Isso eacute evidente Natildeo concordo com issoO delegado que estaacute cuidando do caso intimou o siacutendico a depor Jaishy

me explicou que somente proibiu a circulaccedilatildeo do rapaz no preacutedio porque ele natildeo eacute morador e por isso natildeo poderia usufruir dos demais serviccedilos queo condomiacutenio manteacutem salvo se estivesse acompanhado da moradora

- Um siacutendico natildeo pode impedir um filho de criaccedilatildeo de um morador de ter acesso a todo o condomiacutenio disse a moradora que observou mais uma vez tratar-se de racismo

FontesPreacircmbulo da Constituiccedilatildeo Brasileira Noacutes representantes do povo brashysileiro reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democraacutetico destinado a assegurar o exerciacutecio dos direitos soshyciais e individuais a liberdade a seguranccedila o bem-estar o desenvolvishymento a igualdade e a justiccedila como valores supremos de uma sociedade fraterna pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional com a soluccedilatildeo paciacutefishyca das controveacutersias promulgamos sob a proteccedilatildeo de Deus a seguinte CONSTITUICcedilAtildeO DA REPUacuteBLICA FEDERATIVA DO BRASILArt 3deg IV da CRFB Constituem objetivos fundamentais da Repuacuteblica Federativa do Brasil promover o bem de todos sem preconceitos de origem raccedila sexo cor idade e quaisquer outras formas de discrimishynaccedilatildeoArt 20 da Lei 77161989 (Define os crimes resultantes de preconceito de raccedila ou de cor) Praticar induzir ou incitar a discriminaccedilatildeo ou preshyconceito de raccedila cor etnia religiatildeo ou procedecircncia nacional Art 1deg da Lei 74371985 (Lei Afonso Arinos) Constitui contravenccedilatildeo punida nos termos desta lei a praacutetica de atos resultantes de preconceito de raccedila de cor de sexo ou de estado civilArt 2deg da Lei 74371985 (Lei Afonso Arinos) Seraacute considerado agenshyte de contravenccedilatildeo o diretor gerente ou empregado do estabelecimento que incidir na praacutetica referida no artigo 1deg desta lei

Texto 10A estudante Liacutegia Lara Santos de 20 anos foi presa em 08 de marccedilo

de 2011 apoacutes confessar o assassinato do pai o pedreiro Lauro Joaquim da Silva de 48 anos Ela contou agrave poliacutecia que o pai se tornava agressivo quanshydo bebia e a ameaccedilava de morte

244 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURlDICA

Disse ainda que cansada das agressotildees pediu ajuda ao namorado Ricardo Cardoso da Silva 18 anos com quem se relacionava haacute oito meshyses para se livrar do pai

A estudante que se mostrou calma durante todo o depoimento disse que o relacionamento familiar sempre foi ruim e que a matildee estaacute presa por traacutefico de drogas

O casal foi coincidentemente abordado pela poliacutecia porque os polishyciais suspeitaram de que os dois estivessem levando produto de roubo

O crime ocorreu por volta das 3h da manhatilde quando o pedreiro deshypois de passar a noite em um bar voltava para casa no bairro de Cangaiacuteba na Zona Leste de Satildeo Paulo Ao entrar foi surpreendido pela filha e o nashymorado Enquanto o rapaz segurava o pedreiro Liacutegia o atingiu com cerca de 30 facadas

O corpo foi amarrado com pedaccedilos de corda de varal Embrulhado em lenccediloacuteis cobertor tapete e saco plaacutestico preto e posto em um carrinho do tipo utilizado para transportar bagagem A ideia segundo a estudante era jogar o corpo num coacuterrego proacuteximo Antes de deixar a casa os criminosos ainda trocaram de roupa

Na rua a dupla foi abordada por policiais da 3a Companhia do 8deg Bashytalhatildeo da Poliacutecia Militar que desconfiaram de que o casal estivesse transshyportando mercadoria roubada Percebendo a aproximaccedilatildeo da PM Ricardo fugiu mas Liacutegia foi presa

FontesHomiciacutedio simples Alt 121 - Matar algueacutemPena - reclusatildeo de 6 (seis) a 20 (vinte) anosHomiciacutedio qualificado sect 2o - Se o homiciacutedio eacute cometidoI - mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpeII - por motivo fuacutetilIII - com emprego de veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comumIV - agrave traiccedilatildeo de emboscada ou mediante dissimulaccedilatildeo ou outro recurshyso que dificulte ou tome impossiacutevel a defesa do ofendidoV - para assegurar a execuccedilatildeo a ocultaccedilatildeo a impunidade ou vantagem de outro crimePena - reclusatildeo de 12 (doze) a 30 (trinta) anosExclusatildeo de ilicitude

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 245

Art 23 - Natildeo haacute crime quando o agente pratica o fatoI - em estado de necessidadeII - em legiacutetima defesaIII - em estrito cumprimento de dever legal ou no exerciacutecio regular dedireito

Texto 11Matildee diz que natildeo abandonou o menino que caiuMoradora do Barramares onde filho morreu em queda do 26deg andar

achou que ele seria vigiado pelo irmatildeo mais velhoO sono pesado de Fernando Moraes Juacutenior de 3 anos deu agrave matildee

dele Rosana Rosa Cavalcanti da Silva a certeza de que poderia ir sem problemas ateacute a farmaacutecia de propriedade da famiacutelia num pequeno shopping embaixo do apartamento onde mora no 26deg andar de um dos preacutedios do Condomiacutenio Barramares na Barra da Tijuca

Segundo Rosana contou a parentes mesmo assim pediu para o filho mais velho de 8 anos ficar em casa ateacute que ela voltasse Mas o menino recebeu um telefonema de um vizinho e saiu para jogar bola Fernando acordou sozinho abriu a porta do quarto e levou uma cadeira ateacute a varanshyda - que estava com a porta de correr aberta Fernando subiu na cadeira apoiou-se no parapeito sem grade desequilibrou-se e caiu de uma altura de pouco mais de 80 metros agraves 20h40m de 6 de maio de 1999 Ele morreu no local e foi enterrado no Cemiteacuterio Satildeo Joatildeo Batista em Botafogo

A matildee foi avisada e encaminhou-se para o local Em estado de choquc sentou e chorou ao lado do corpo do filho por mais de duas horas Segundo testemunhas antes de cair no chatildeo o corpo ainda bateu num coqueiro na frente do edifiacutecio o que amorteceu a queda e evitou que ele tivesse muitas escoriaccedilotildees O menino ainda teria respirado por alguns instantes mas natildeo resistiu Policiais militares cobriram o corpo com um plaacutestico preto

- Natildeo haacute duacutevidas de que foi uma fatalidade Ela sempre foi uma excelente matildee cuidadosa carinhosa com os filhos Natildeo foi negligecircncia - afirmou Gisela Moraes Zepeta irmatilde de Fernando Moraes pai do menino

A morte foi registrada na 16a DP (Barra) como fato a ser investigado O perito Antocircnio Carlos Alcoforado disse que encontrou uma cadeira na sacada do apartamento no 26deg andar Segundo ele o parapeito tinha 120 metros e soacute com a cadeira o menino poderia ter ultrapassado

O delegado titular disse que vai esperar alguns dias ateacute que a famiacutelia esteja mais tranquila para tomar os depoimentos Segundo ele caso seja

246 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

apurada negligecircncia na atenccedilatildeo ao menor o responsaacutevel poderaacute ser indiciashydo por homiciacutedio culposo

- Natildeo podemos poreacutem falar de um caso assim porque a famiacutelia jaacute estaacute sofrendo muito Temos que esperar pelas provas teacutecnicas - disse o delegado

Segundo Gisela Rosana contou que foi ateacute a Fannaacutecia Barramares 2000 que eacute administrada pelo marido Fernando pegar remeacutedios e um panfleto para fazer no computador de casa A matildee contou ainda que o menino estava cansashydo depois de brincar na creche que frequentava desde o iniacutecio do ano dentro do condomiacutenio Depois de tomar banho e jantar ele dormia profundamente segundo a matildee que aproveitou para descer Segundo Gisela Rosana teria deshymorado fora de casa cerca de cinco minutos ateacute o momento do acidente

FontesArt 133 do CP Abandonar pessoa que estaacute sob seu cuidado guarda vigilacircncia ou autoridade e por qualquer motivo incapaz de defender- -se dos riscos resultantes do abandonoPena - detenccedilatildeo de 6 (seis) meses a 3 (trecircs) anossect 1deg Se do abandono resulta lesatildeo corporal de natureza gravePena - reclusatildeo de 1 (um) a 5 (cinco) anossect 2deg Se resulta a mortePena - reclusatildeo de 4 (quatro) a 12 (doze) anosO instituto do perdatildeo judicial somente pode alcanccedilar o acusado que se mostrar suficientemente punido pelo sofrimento que o ato praticado causou na sua proacutepria vidaArt 121 sect 5deg do CP Na hipoacutetese de homiciacutedio culposo o juiz poderaacute deixar de aplicar a pena se as consequecircncias da infraccedilatildeo atingirem o proacuteprio agente de forma tatildeo grave que a sanccedilatildeo penal se torne desneshycessaacuteriaArt 107 IX do CP Extingue-se a punibilidade pelo perdatildeo judicial nos casos previstos em lei

Texto 12

Maitecirc ganha indenizaccedilatildeo da Shering

A induacutestria quiacutemica Schering do Brasil foi acionada judicialmente pela atriz Maitecirc Proenccedila que pediu oitocentos mil reais a tiacutetulo de indeshynizaccedilatildeo por danos morais De acordo com a accedilatildeo movida pela atriz ao promover o anticoncepcional Microvlar ela teve sua imagem profissional arranhada porque algumas carteias do produto natildeo continham o nuacutemero de piacutelulas discriminadas pela embalagem o que gerou diversas reclamaccedilotildees

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 247

O advogado de Maitecirc Paulo Ceacutesar Pinheiro Carneiro afirmou que o valor da indenizaccedilatildeo deve ser proporcional ao poder econocircmico do ofen- sor ldquo O laboratoacuterio faturava mensalmente R$ 16 milhatildeo com a venda dos anticoncepcionais Acho que a metade disso seria um valor razoaacutevel a ser pagordquo

Jaacute o advogado da Schering Cid Scartezzine Filho qualificou como absurdo o valor do pedido Para ele natildeo houve qualquer tipo de abalo agrave imagem da autora ldquo Ela apenas aparecia anunciando a nova embalagem do produto e o fato de ter havido problemas com algumas carteias do Microvlar natildeo justificaria uma accedilatildeo judicial por parte da atrizrdquo disse

Vale lembrar que a atriz participou da campanha publicitaacuteria para resgatar o confianccedila das mulheres no anticoncepcional Microvlar cujas vendas despencaram depois da denuacutencia de que muitos comprimidos coloshycados agrave venda no mercado eram feitos de farinha de trigo

A campanha publicitaacuteria deveria ser veiculada por trecircs meses mas acabou sendo retirada do ar porque novas irregularidades foram descobershytas

Aleacutem da indenizaccedilatildeo o advogado pediu que o laboratoacuterio fizesse uma retrataccedilatildeo puacuteblica pois a empresa reacute escolheu a autora jaacute que ela tinha reputaccedilatildeo seriedade e simpatia junto ao puacuteblico feminino

FontesArt 927 do CC Aquele que por ato iliacutecito (art 186 e 187) causar dano a outrem fica obrigado a reparaacute-loParaacutegrafo uacutenico Flaveraacute obrigaccedilatildeo de reparar o dano independenteshymente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureshyza risco para os direitos de outremArt 186 Aquele que por accedilatildeo ou omissatildeo voluntaacuteria negligecircncia ou imprudecircncia violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusishyvamente moral comete ato iliacutecitoArt 187 Tambeacutem comete ato iliacutecito o titular de um direito que ao exercecirc- -lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econocircmico ou social pela boa-feacute ou pelos bons costumesArt 5deg X da CRFB Todos satildeo iguais perante a lei sem distinccedilatildeo de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros resishydentes no Paiacutes a inviolabilidade do direito agrave vida agrave liberdade agrave igualdashyde agrave seguranccedila e agrave propriedade nos termos seguintes satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito a indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeo

248 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Texto 13Fumante desde os 13 anos Joatildeo Jorge teve o cacircncer detectado em

2009 e hoje estaacute aposentado por invalidez Os laudos de dois dos maiores especialistas de Alagoas o cardiologista Joseacute Wanderley Neto (pioneiro de transplantes no Estado) e a pneumologista e oncologista Andreacutea Albuquershyque atestam que o cacircncer foi causado pelo tabagismo

O autor pediu tutela antecipada para que a reacute fosse condenada a cusshytear o tratamento do autor Apresentou provas teacutecnicas laudos meacutedicos e dados da Organizaccedilatildeo Mundial de Sauacutede (OM S) e do Instituto Brasileishyro de Geografia e Estatiacutestica (IBG E) que comprovam que o cigarro mata mais que a Aids cocaiacutena aacutelcool suiciacutedio e tracircnsito juntos

Joatildeo Jorge que faz quimioterapia na Santa Casa de Misericoacuterdia de Maceioacute disse que tentou parar de fumar diversas vezes mas natildeo conseshyguiu Na accedilatildeo ele quer que a Souza Cruz lhe pague indenizaccedilatildeo de R$ 3 milhotildees por danos materiais e fiacutesicos e R$ 15 milhatildeo por danos morais

FontesArt 6degdo CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor I mdash a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no forshynecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivosIII mdash Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a informaccedilatildeo adequada e clashyra sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem V I mdash a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosArt 8deg do CDC Os produtos e serviccedilos colocados no mercado de conshysumo natildeo acarretaratildeo riscos agrave sauacutede ou seguranccedila dos consumidores exceto os considerados normais e previsiacuteveis em decorrecircncia de sua natureza e fruiccedilatildeo obrigando-se os fornecedores em qualquer hipoacutetese a dar as informaccedilotildees necessaacuterias e adequadas a seu respeitoDoutrina e Jurisprudecircncia dentre as decisotildees favoraacuteveis ou parcialmente favoraacuteveis em I a instacircncia (jurisprudecircncia) tem-se (1) R$ 1 milhatildeo o valor da indenizaccedilatildeo a tiacutetulo de danos morais agrave viacutetima (TJMG) (2) R$ 600 mil agrave viacutetima a tiacutetulo de danos morais e mais danos materiais e lucros cessantes a serem apurados em liquidaccedilatildeo de sentenccedila (TJSP) (3) RS 500 mil a tiacutetulo de danos morais agrave viacutetima posteriormente substituiacuteda pelos herdeiros em razatildeo do seu falecimento (TJPR) (4) condenaccedilatildeo em R$ 500 mil agrave viacutetima a tiacutetulo de danos morais (TJRS) (5) R$ 13 mil a tiacutetulo de danos morais pela morte de esposa (TJRJ) (6) condenaccedilatildeo da Souza Cruz e da Philip Morris por danos materiais e morais coletivos aleacutem do dever de informar correshytamente nas embalagens e publicidade (TJSP) A uacuteltima sentenccedila indicada

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 249

diz respeito agrave uacutenica accedilatildeo coletiva do universo pesquisado a accedilatildeo intentada pela ADESF em 2004 cujo recurso foi apreciado pelo TJSP no periacuteodo de abrangecircncia da pesquisa No Tribunal Paulista a sentenccedila foi anulada

Texto 14Trata-se de indenizaccedilatildeo por danos morais de EVATERESIN H A S IL shy

VA DA ROSA em face de M ANZOLI SA INDUacuteSTRIA E COMEacuteRCIO A violaccedilatildeo da imagem ocorreu na loja Manlec n 12 Rio Grande do Sul no dia 16 de fevereiro do ano de 2011

Alega a autora que esteve em uma das lojas da empresa requerida na ocasiatildeo em que comprou uma televisatildeo marca Baysinic aleacutem de outros objetos No mesmo dia foi filmada de forma imperceptiacutevel e depois sua imagem passou a aparecer diariamente com destaque entre outras pessoas na RBS canal 12 em propaganda promocional da loja Por um periacuteodo de trinta dias a gravaccedilatildeo produzida era transmitida em sua velocidade normal e depois passou a ser apresentada com maior velocidade o que tomou as cenas jocosas Tudo acontecendo muito rapidamente fez com que os gesshytos e o caminhar das pessoas tornassem-se caricatos Aduziu a requerente que aleacutem da exploraccedilatildeo clandestina de sua imagem a demandante passou a enfrentar o ridiacuteculo da gozaccedilatildeo de pessoas suas conhecidas e dos colegas da reparticcedilatildeo puacuteblica onde trabalha

Carlos Alberto Correcirca Machado colega da autora no Hospital Sanshyta Casa ouviu de sua esposa que Eva estava aparecendo na televisatildeo por diversas vezes entre a novela das sete e a novela das oito e teve curiosishydade assistiu ao comercial umas duas ou trecircs vezes e efetivamente viu Eva carregando uma caixa de televisatildeo O depoente soacute assistiu aos colegas brincarem com Eva dizendo que ela estava famosa Jaqueline Camargo Domingues relatou que tambeacutem foi colega da autora na Santa Casa e tem certeza que viu a propaganda no horaacuterio das novelas e que natildeo era reporshytagem jornaliacutestica era propaganda mesmo Jaqueline tem certeza porque chegava ao serviccedilo e todos os dias ldquomexiamrdquo com ela chamando-a de gashyrota propaganda da Manlec e ateacute chegou a dizer que parecia uma louquinha correndo com aquela caixa Na Santa Casa eram gerais as brincadeiras com ela todos dizendo que a viram na televisatildeo

FontesArt 6deg do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidorIV - a proteccedilatildeo contra a publicidade enganosa e abusiva meacutetodos coshymerciais coercitivos ou desleais bem como contra praacuteticas e claacuteusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviccedilos

250 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

VI - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosAlt 5deg V da CRFB eacute assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo aleacutem da indenizaccedilatildeo por dano material moral ou agrave imagem Art 5deg X da CRFB satildeo inviolaacuteveis a intimidade a vida privada a honra e a imagem das pessoas assegurado o direito a indenizaccedilatildeo pelo dano material ou moral decorrente de sua violaccedilatildeoArt 5deg X X V III da CRFB satildeo assegurados nos termos da lei a) a proteccedilatildeo agraves participaccedilotildees individuais em obras coletivas e agrave reshyproduccedilatildeo da imagem e voz humanas inclusive nas atividades desporshytivas

Texto 15Trata-se de negativaccedilatildeo indevida do nome de conhecida senhora da

sociedade carioca Marininha Cavalcante Pessoa Jordatildeo residente em Te- resoacutepolis Rio de Janeiro

Ao tentar renovar contrato de creacutedito de cheque especial junto ao Banco no qual titulariza conta-corrente em dezessete de julho do ano de mil novecentos e noventa e sete foi surpreendida diante da negativa do Banco em fazecirc-lo sob o argumento de que seu nome encontrava-se inscrito em cadastro de inadimplentes (SER AS A) bem como havia um tiacutetulo proshytestado em funccedilatildeo da devoluccedilatildeo de cheque por insuficiecircncia de fundos

A senhora Jordatildeo desconhecia tais fatos e ao proceder agrave investigaccedilatildeo junto agrave empresa Argentina Veiacuteculos terminou por descobrir que terceira pessoa de nome diverso do seu havia utilizado o nuacutemero de seu CPF para adquirir um veiacuteculo junto agrave citada concessionaacuteria mediante financiamento concedido pela financeira Financial Now ao qual inadimpliu gerando o protesto do tiacutetulo e a inscriccedilatildeo do CPF da senhora Marininha em oacutergatildeo de restriccedilatildeo ao creacutedito

Apoacutes inuacutemeras tentativas junto agrave concessionaacuteria de veiacuteculos para que retirasse a restriccedilatildeo de seu nome bem como suspendesse o protesto do tiacutetulo sem sucesso terminou por recorrer ao judiciaacuterio pleiteando a exclusatildeo de tais restriccedilotildees bem como indenizaccedilatildeo por danos morais em virtude dos constrangimentos experimentados ante a negativa de creacutedito e aos aborrecimentos gerados

FontesArt 17 do CDC Para os efeitos desta Seccedilatildeo equiparam-se aos consushymidores todas as viacutetimas do evento

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 251

Art 6deg I do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no forshynecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivos Art 6deg V III do CDC a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossufi- ciente segundo as regras ordinaacuterias de experiecircncias

Texto 16Trata-se do caso de acusaccedilatildeo de injuacuteria com ofensa agrave dignidade e ao

decoro em face da loja Mappin localizada no bairro paulistano do Itaim em Satildeo Paulo As viacutetimas foram identificadas como Acircngela de Moraes 25 anos Andreacutea de Moraes 28 anos irmatildes e jogadoras profissionais de vocirclei e Zilma de Moraes 57 anos matildee das moccedilas O fato ocorreu no dia 13 de outubro de 2011 agrave tarde na loja Mappin localizada em Itaim Satildeo Paulo

Zilma e suas duas filhas Angela e Andreacutea foram agrave loja Mappin fazer compras Ao entrarem no provador feminino da loja as jogadoras foram confundidas com travestis por Nilda vendedora encarregada de vigiar o provador que chamou o departamento de seguranccedila do estabelecimento

Com o acionamento da vendedora Flaacutevio um dos seguranccedilas foi verificaro que estava acontecendo e ele causou um mal entendido ao afirmar para Zilma matildee das atletas que as duas pessoas que estavam no provador eram travestis

Ao perceberem o que estava acontecendo Angela natildeo teve reaccedilatildeo por causa do seu nervosismo poreacutem Andreacutea pegou seu telefone celular e ligou para a advogada Therezinha da Silva Carvalho

A matildee e as duas atletas saiacuteram do estabelecimento e foram para uma delegacia de poliacutecia registrar queixa para abertura de inqueacuterito

Segundo Nilda vendedora encarregada de vigiar o provador ela soacute chamou a seguranccedila porque imaginou que as duas irmatildes devido as suas musculaturas fossem travestis

A referida funcionaacuteria alegou mais tarde que foi alertada da presenccedila dos supostos travestis por uma cliente que tambeacutem estava no provador

A advogada das jogadoras de vocirclei iraacute mover uma accedilatildeo por violaccedilatildeo do artigo 140 do Coacutedigo Penal que caracteriza a injuacuteria com ofensa agrave dignidade e ao decoro e moveraacute tambeacutem uma accedilatildeo indenizatoacuteria por danos morais

FontesArt 140 - Injuriar algueacutem ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro Pena - detenccedilatildeo de um a seis meses ou multa

252 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

Art 6deg VI do CDC satildeo direitos baacutesicos do consumidor a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusos

Texto 17Trata-se do caso de agressatildeo moral sofrida por Manoela Henriques

59 anos brasileira viuacuteva residente na Rua Visconde de Pirajaacute 1565 apto 601 Ipanema Rio de Janeiro O acusado eacute Gerald Thomas diretor de teashytro O fato aconteceu em agosto de dois mil e trecircs no dia da estreia da peccedila ldquo Tristatildeo e Isoldardquo no Teatro Municipal Rio de Janeiro

Durante a apresentaccedilatildeo a peccedila foi vaiada pelo puacuteblico O diretor enshytatildeo subiu ao palco e repentinamente virou de costas para a plateia e abaixou as calccedilas exibindo as naacutedegas No final do uacuteltimo ato houve mais vaias Vaacuterias reportagens e artigos sobre o assunto foram publicados na miacutedia

Fernando Costa e Manoela Henriques espectadores afirmaram que o ato foi uma agressatildeo a todos os presentes no teatro

Aureacutelia Barroso soprano por sua vez declarou que todo o elenco foi submetido a constrangimento e que ao contraacuterio do que disse o acusado o ato natildeo fazia parte do espetaacuteculo e nunca foi ensaiado

Manoela Henriques entrou na Justiccedila com pedido de Indenizaccedilatildeo por Dano Moral com base na lei do consumidor

FontesArt 6deg Satildeo direitos baacutesicos do consumidorI - a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no fornecimento de produtos e serviccedilos considerados perishygosos ou nocivosIII - a informaccedilatildeo adequada e clara sobre os diferentes produtos e servishyccedilos com especificaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composishyccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentemV I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosV III - a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossuficiente segunshydo as regras ordinaacuterias de experiecircncias

Texto 18No dia 15032012 aproximadamente agraves 16 horas o Requerente dishy

rigindo o seu veiacuteculo marca Gol ano 2010 Placa ABC 1234 pela Rua das

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 253

Ameacutelias sentido Barra-Recreio agrave altura da Empresa Gigante foi abalroado pelo veiacuteculo marca Palio placa ZYW8910 certificado em nome da primeishyra Requerida e dirigido pelo segundo e que seguia no sentido contraacuterio

Conforme croquis e Boletim de Ocorrecircncias inclusos o veiacuteculo dos Requeridos ao tentar ultrapassar um carro parado na pista invadiu a pista contraacuteria vindo a abalroar o veiacuteculo do Requerente que vinha em sua matildeo de direccedilatildeo e teve a sua lateral esquerda danificada sendo posteriormente jogado agrave direita do acostamento causando ferimentos no condutor e danos materiais de grande monta no veiacuteculo do uacuteltimo conforme foto anexa

Os croquis do local do acidente demonstram claramente que o ponto de impacto ocorreu na matildeo de direccedilatildeo do veiacuteculo do Requerente

O fato referido ocasionou um prejuiacutezo para o Requerente na ordem de R$ 2300000 (vinte e trecircs mil reais) perda total conforme orccedilamentos e notas anexos cujo pagamento ora eacute cobrado

FontesArt 927 do CC Aquele que por ato iliacutecito (art 186 e 187) causar dano a outrem fica obrigado a reparaacute-loParaacutegrafo uacutenico Haveraacute obrigaccedilatildeo de reparar o dano independenteshymente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureshyza risco para os direitos de outremArt 186 do CC Aquele que por accedilatildeo ou omissatildeo voluntaacuteria negligecircnshycia ou imprudecircncia violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusivamente moral comete ato iliacutecitoArt 187 do CC Tambeacutem comete ato iliacutecito o titular de um direito que ao exercecirc-lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econocircmico ou social pela boa-feacute ou pelos bons costumesArt 175 Inciso II do RCNT ldquo Eacute dever de todo condutor de veiacuteculo conservar o veiacuteculo na matildeo de direccedilatildeo e na faixa proacutepriardquo Art 181 V I e XV I do RCTN ldquo Eacute proibido a todo condutor de veiacuteculoV I - Transitar pela contramatildeo dc direccedilatildeoX V I - Transitar em velocidade superior agrave permitida para localrdquo

Texto 19Maria Guilhermina Dias foi lanchar no dia 23 de fevereiro na lanshy

chonete Coma Bem em Bonsucesso A jovem de 25 anos disse que levou o maior susto quando viu uma barata grudada no patildeo do hambuacuterguer Fishycou com muito nojo e repugnacircncia porque jaacute tinha inclusive comeccedilado a

254 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

comer seu lanche Afirmou que procurou o gerente da loja para reclamar Como nada foi feito tirou uma foto e recorreu agrave justiccedila

Guilhermina destacou na Inicial que houve tambeacutem ldquo violaccedilatildeo ao princiacutepio da confianccedila outro norte a ser perseguido nas relaccedilotildees de consushymordquo No pedido alegou que tal situaccedilatildeo criou um grande constrangimento de natureza moral

O Coma Bem alegou que o Juizado natildeo poderia processar a questatildeo porque era necessaacuteria prova pericial e que tal requisito se toma incompashytiacutevel com a Lei 90991995 que dispotildee sobre a competecircncia dos Juizados Especiais Ciacuteveis e Criminais

O reacuteu sustentou ainda que natildeo existe a menor possibilidade de haver qualquer tipo de corpo estranho nos lanches da empresa e que natildeo haacute que se falar em qualquer tipo de indenizaccedilatildeo

FontesArt 6deg do CDC Satildeo direitos baacutesicos do consumidor 1 - a proteccedilatildeo da vida sauacutede e seguranccedila contra os riscos provocados por praacuteticas no fornecimento de produtos e serviccedilos considerados perigosos ou nocivos III - Satildeo direitos baacutesicos do consumidor a informaccedilatildeo adeshyquada e clara sobre os diferentes produtos e serviccedilos com especifishycaccedilatildeo correta de quantidade caracteriacutesticas composiccedilatildeo qualidade e preccedilo bem como sobre os riscos que apresentem V I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo dc danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosArt 8deg do CDC Os produtos e serviccedilos colocados no mercado de consumo natildeo acarretaratildeo riscos agrave sauacutede ou seguranccedila dos consumishydores exceto os considerados normais e previsiacuteveis em decorrecircncia de sua natureza e fruiccedilatildeo obrigando-se os fornecedores em qualshyquer hipoacutetese a dar as informaccedilotildees necessaacuterias e adequadas a seu respeito

Texto 20Eduardo e Mocircnica estavam casados haacute quase trecircs anos No iniacutecio

do casamento Mocircnica adotou como meacutetodo contraceptivo o uso de piacutelushylas mas problemas de natureza hormonal e vascular levaram a mulher a procurar um meacutedico que a aconselhou a adotar outras formas de evitar a gravidez Sugeriu que o casal fizesse uso de preservativos

Pensando na sauacutede e no bem-estar da mulher Eduardo natildeo se opocircs agrave utilizaccedilatildeo do preservativo ainda que segundo afirmou na eacutepoca natildeo

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 255

gostasse muito da ideia de continuar a usar preservativos mesmo depois de casado

A partir de entatildeo o casal passou a adquirir regularmente camisinhas da empresa Johnson e Johnson Induacutestria e Comeacutercio Ltda O produto comshyprado foi Jontex lubrificado adquirido na Farmaacutecia Vida Longa Em 20 de abril de 2007 durante uma relaccedilatildeo sexual a camisinha rompeu e cerca de quarenta dias depois Mocircnica descobriu que estava graacutevida

O casal ajuizou accedilatildeo de indenizaccedilatildeo por danos morais e pedido de pensatildeo mensal pelo periacuteodo de 20 anos em face da empresa sob a alegaccedilatildeo de que o produto que utilizava apresentou defeito e isso trouxe graves alterashyccedilotildees na dinacircmica conjugal bem como desistecircncia de seus sonhos Mocircnica e Eduardo juntavam dinheiro para a aquisiccedilatildeo da casa proacutepria e faziam um curshyso de poacutes-graduaccedilatildeo visando melhora salarial e aprimoramento profissional Segundo os autores todos esses projetos foram desfeitos de uma soacute vez

ldquoNatildeo eacute que natildeo quiseacutessemos filhos mas somente pensaacutevamos nisso a daqui uns cinco ou sete anos ateacute laacute muita coisa precisava ser preparada Natildeo sei como vamos nos virarrdquo disse Mocircnica

A empresa em contestaccedilatildeo afirmou que a gravidez de uma mulher casada em decorrecircncia do rompimento do preservativo durante a relaccedilatildeo sexual enquadra-se nos limites do perigo assumido ao utilizar como meacutetoshydo contraceptivo ldquoum produto que natildeo eacute cem por cento eficazrdquo

O InmetroRS o InmetroRJ a Cientec o Instituto Nacional de Tecshynologia a Fundaccedilatildeo Carlos Vanzolini o instituto Falcatildeo Bauer de Qualishydade e o Instituto Betontec de Avaliaccedilatildeo da Conformidade informaram natildeo ser possiacutevel a realizaccedilatildeo da periacutecia em preservativo jaacute utilizado

A fabricante apontou ainda que ldquo outras questotildees podem interferir diretamente no desempenho da camisinha a experiecircncia do usuaacuterio no uso de preservativo tempo e tipo de relaccedilatildeo sexual e tamanho do pecircnisrdquo

FontesDe acordo com o advogado Marcos Rosembauer o rompimento de camishysinhas eacute ldquocaso fortuito que exclui a responsabilidade do fabricanterdquoArt 393 CC O devedor natildeo responde pelos prejuiacutezos resultantes de caso fortuito ou forccedila maior se expressamente natildeo se houver por eles responsabilizadoParaacutegrafo uacutenico O caso fortuito ou de forccedila maior verifica-se no fato necessaacuterio cujos efeitos natildeo era possiacutevel evitar ou impedirEm caso anaacutelogo a Juiacuteza da 2a Vara Ciacutevel de Porto Alegre dispocircs que ldquo em situaccedilotildees como essa o risco eacute inerente ao produto tomando-se impossiacutevel

256 LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

falar em responsabilidade decorrente da falta de informaccedilatildeo porquanto a proacutepria bula traz as informaccedilotildees razatildeo pela qual fica claro que a situaccedilatildeo narrada pelos autores caracteriza-se como caso fortuitordquo 0 Desembargador Pedro Kretzmann admitiu que ldquo sendo a reacute a fabricanshyte do produto objeto da presente controveacutersia e os autores destinataacuterios finais do bem a relaccedilatildeo havida entre as partes se amolda ao conceito de relaccedilatildeo de consumo estando sujeita pois agrave tutela especial do sistema consumeristardquo O Magistrado defendeu tambeacutem que em casos de romshypimento de camisinha ldquo a responsabilidade da empresa ante a alegaccedilatildeo de viacutecio do produto eacute objetiva bastando a comprovaccedilatildeo do dano e do nexo de causalidade natildeo se discutindo sequer a culpardquo Art 12 CDC o fabricante o produtor o construtor nacional ou estranshygeiro e o importador respondem independentemente da existecircncia de culpa pela reparaccedilatildeo dos danos causados aos consumidores por defei-

tos decorrentes de projeto fabricaccedilatildeo construccedilatildeo montagem foacutermushylas manipulaccedilatildeo apresentaccedilatildeo ou acondicionamento de seus produtos bem como por informaccedilotildees insuficientes ou inadequadas sobre sua utishylizaccedilatildeo e riscossect I o O produto eacute defeituoso quando natildeo oferece a seguranccedila que dele legitimamente se espera levando-se em consideraccedilatildeo as circunstacircncias relevantes entre as quais1 - sua apresentaccedilatildeol l- o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperamIII - a eacutepoca em que foi colocada em circulaccedilatildeoArt 6deg CDC satildeo direitos baacutesicos do consumidorV I - a efetiva prevenccedilatildeo e reparaccedilatildeo de danos patrimoniais e morais individuais coletivos e difusosV III - a facilitaccedilatildeo da defesa de seus direitos inclusive com a inversatildeo do ocircnus da prova a seu favor no processo civil quando a criteacuterio do juiz for verossiacutemil a alegaccedilatildeo ou quando for ele hipossuficiente segunshydo as regras ordinaacuterias de experiecircncia

Texto 21 Cuidado com o e-mailCarolina BrigidoUma decisatildeo ineacutedita do Tribunal Superior do Trabalho (TST) estabeshy

leceu que o patratildeo tem o direito de fiscalizar mensagens enviadas e recebishydas pela caixa de correio eletrocircnico que a empresa oferece ao funcionaacuterio desde que ldquode forma moderada generalizada e impessoalrdquo O procedimenshyto foi autorizado como meacutetodo de obtenccedilatildeo de provas para justificar uma

Cap IX - EXERCIacuteCIOS 257

demissatildeo feita pela HSBC Seguros Brasil S A A partir do rastreamento do e-mail de um funcionaacuterio descobriu-se que um dos integrantes da filial de Brasiacutelia utilizava o correio corporativo para fins pornograacuteficos

O empregado costumava enviar aos colegas fotos de mulheres nuas Em sua defesa alegou que ao rastrear o e-mail a empresa violou sua inshytimidade e privacidade Tambeacutem argumentou que a prova para justificar sua demissatildeo foi obtida de forma iliacutecita Os motivos natildeo foram aceitos peshylos magistrados Por unanimidade a Primeira Turma do TST decidiu que como o equipamento e a tecnologia foram entregues pela empresa para fins de trabalho natildeo seria permitida a utilizaccedilatildeo pessoal

ldquoNatildeo haveria qualquer intimidade a ser preservada posto que o e-mail natildeo poderia ser utilizado para fins particularesrdquo explicou o relator do caso ministro Joatildeo Oreste Dalazen

Ele esclareceu ainda que a senha para acesso ao sistema natildeo pode ser interpretada como uma forma de proteccedilatildeo para evitar que o empregador tenha acesso ao conteuacutedo das mensagens como argumentou o empregado demitido Segundo o magistrado a senha serve apenas para que o empreshygador evite o acesso de terceiros agraves informaccedilotildees da empresa

O funcionaacuterio foi demitido em maio de 2000 e chegou a conseguir a anulaccedilatildeo da justa causa em primeira instacircncia alegando a garantia constishytucional de inviolabilidade da correspondecircncia O trabalhador conseguiu o direito de receber a multa rescisoacuteria No entanto a seguradora recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Distrito Federal e saiu vitoriosa O TST manteve essa decisatildeo - que pode ainda ser contestada no plenaacuterio do proacuteprio TST e no Supremo Tribunal Federal (STF)

No Brasil assim que foram instituiacutedos os e-mails corporativos os juizes consideravam as mensagens dos funcionaacuterios inviolaacuteveis Julgavam os casos por analogia agrave inviolabilidade das correspondecircncias Nos uacuteltimos anos esse entendimento foi modificado pelos tribunais trabalhistas estashyduais Ontem foi a primeira vez que o TST analisou o assunto A decisatildeo serviraacute de paracircmetro para outras accedilotildees semelhantes

Dalazen enfatizou que os direitos do cidadatildeo agrave privacidade e ao sigilo de correspondecircncia assegurados pela Constituiccedilatildeo Federal dizem respeito apenas agrave comunicaccedilatildeo estritamente pessoal e natildeo agraves mensagens enviadas e recebidas em nome da empresa A opiniatildeo eacute a mesma de um ministro do STF consultado pelo Globo

- A situaccedilatildeo eacute ambiacutegua mas eacute muito difiacutecil configurar a quebra da privacidade porque o trabalhador estava usando um bem da empresa para fins diferentes do trabalho

LICcedilOtildeES DE ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA

O advogado Renato Opice Blum especialista em direito eletrocircnico concordou com a decisatildeo do TST Ele disse que conforme o artigo 932 do Coacutedigo Civil os atos do empregado durante sua jornada de trabalho podem gerar responsabilidade conjunta da empresa Portanto se um trabalhador envia um e-mail ofensivo a empresa tambeacutem pode ser responsabilizada

A advogada Nadia Demoliner Lacerda especialista em direito do trabalho tambeacutem concordou com a decisatildeo do TST Poreacutem ela ponderou que como natildeo existe legislaccedilatildeo para disciplinar o tema seria saudaacutevel que as empresas deixassem claro ao admitir um funcionaacuterio que podem rastrear o e-mail corporativo

A Forccedila Sindical poreacutem discordou dos especialistas Em nota a enshytidade repudiou a decisatildeo do TST e considerou a permissatildeo agraves empresas ldquo uma agressatildeo agrave liberdade individual que guardadas as devidas proporshyccedilotildees eacute semelhante agrave revista iacutentima feita pelo empregador no horaacuterio de saiacuteda dos funcionaacuteriosrdquo

Segundo o secretaacuterio nacional de Comunicaccedilatildeo da Central Uacutenica dos Trabalhadores (CUT) Antonio Carlos Spis a entidade eacute contra o rastrea- mento indiscriminado pelas empresas dos e-mails de seus funcionaacuterios

- As empresas podem desviar esse tipo de rastreamento para uma vigilacircncia de caraacuteter ideoloacutegico

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I

ARGUMENTACcedilAtildeO JURIacuteDICA Da Teoria agrave Praacutetica

Esta obra destina-se a todos aqueles que desejam por meio da argumentaccedilatildeo juriacutedica alcanccedilar a adesatildeo do auditoacuterio agrave sua tese Para tal eacute importante que se compreenda em que contexto espacial e temporal identificou-se a necessidade de uma Teoria da ArgumentaccedilatildeoOs elementos constitutivos da argumentaccedilatildeo juriacutedica estatildeo didaticamente apresentados seguindo uma sequecircncia que fornece uma estrutura soacutelida agrave produccedilatildeo textualCasos concretos peccedilas processuais e esquemas satildeo uma constante em toda a obra permitindo uma compreensatildeo precisa do conteuacutedo abordado e o acesso agrave realidade de onde surgem os conflitos que exigem valoraccedilatildeo e soluccedilatildeo juriacutedica Por fim exerciacutecios com sugestatildeo de correccedilatildeo estatildeo ao alcance do leitor a fim de que tenha a oportunidade de fixar o conhecimento mediante a praacutetica

LICcedilOtildeES DE

Com base nas novas molduras e demandas que circunscrevem a complexidade da escrita e da argumentaccedilatildeo dos profissionais da aacuterea juriacutedica um novo (re)encontro com a teoria da argumentaccedilatildeo eacute fundamentalSabendo das especificidades da produccedilatildeo de peccedilas processuais os autores reapresentam aqui a teoria da argumentaccedilatildeo de maneira didaacutetica acessiacutevelNessa perspectiva parabenizo os autores por mais este livro que daacute continuidade agraves Liccedilotildees de gramaacutetica aplicadas ao texto juriacutedico por estabelecerem outro acordo com o estudo da produccedilatildeo dos textos juriacutedicos com vistas a uma dinamizaccedilatildeo de suas orientaccedilotildees e prescriccedilotildees de modo a tornar a redaccedilatildeo do texto juriacutedico mais consistente e em conformidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito que pressupotildee aleacutem da capacitaccedilatildeo teacutecnica a habilidade de tornar comunicaacutevel a sua accedilatildeo profissional

Desembargador Seacutergio Cavalieri Filho

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