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Informativo 944-STF (19/06/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 944-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processos ainda não comentados porque houve pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que forem julgados: HC 164593; MS 34057/DF; HC 168052/SP; HC 156583/RS. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE É cabível ADI contra decreto autônomo que extingue colegiados da administração pública. DIREITO ADMINISTRATIVO ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA Decreto não pode extinguir colegiado previsto em lei. DIREITO PENAL CRIMES DE RESPONSABILIDADE DOS PREFEITOS Prefeito que utiliza dinheiro destinado a um programa de saúde para pagamento de dívidas da Secretaria de Saúde com a previdência municipal pratica o crime do art. 1º, III, do DL 201/67. RACISMO A Lei nº 7.716/89 pode ser aplicada para punir as condutas homofóbicas e transfóbicas. DIREITO PROCESSUAL PENAL NULIDADE É nulo o interrogatório travestido de entrevista realizado pela autoridade policial com o investigado, durante a busca e apreensão em sua residência, sem assistência de advogado e sem a comunicação de seus direitos. DIREITO CONSTITUCIONAL CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE É cabível ADI contra decreto autônomo que extingue colegiados da Administração Pública É cabível ADI contra decreto presidencial que, com fundamento no art. 84, VI, “a”, da CF/88, extingue colegiados da Administração Pública federal. Isso porque se trata de decreto autônomo, que retira fundamento de validade diretamente da Constituição Federal e, portanto, é dotado de generalidade e abstração. STF. Plenário. ADI 6121 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12 e 13/6/2019 (Info 944). A situação concreta foi a seguinte: O Presidente Jair Bolsonaro editou o Decreto nº 9.759/2019 extinguindo uma série de colegiados existentes na Administração Pública federal.

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Informativo 944-STF (19/06/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 944-STF

Márcio André Lopes Cavalcante Processos ainda não comentados porque houve pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que forem julgados: HC 164593; MS 34057/DF; HC 168052/SP; HC 156583/RS.

ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE É cabível ADI contra decreto autônomo que extingue colegiados da administração pública.

DIREITO ADMINISTRATIVO

ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA Decreto não pode extinguir colegiado previsto em lei.

DIREITO PENAL

CRIMES DE RESPONSABILIDADE DOS PREFEITOS Prefeito que utiliza dinheiro destinado a um programa de saúde para pagamento de dívidas da Secretaria de Saúde

com a previdência municipal pratica o crime do art. 1º, III, do DL 201/67. RACISMO A Lei nº 7.716/89 pode ser aplicada para punir as condutas homofóbicas e transfóbicas.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

NULIDADE É nulo o interrogatório travestido de entrevista realizado pela autoridade policial com o investigado, durante a

busca e apreensão em sua residência, sem assistência de advogado e sem a comunicação de seus direitos.

DIREITO CONSTITUCIONAL

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE É cabível ADI contra decreto autônomo que extingue colegiados da Administração Pública

É cabível ADI contra decreto presidencial que, com fundamento no art. 84, VI, “a”, da CF/88, extingue colegiados da Administração Pública federal. Isso porque se trata de decreto autônomo, que retira fundamento de validade diretamente da Constituição Federal e, portanto, é dotado de generalidade e abstração.

STF. Plenário. ADI 6121 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12 e 13/6/2019 (Info 944).

A situação concreta foi a seguinte: O Presidente Jair Bolsonaro editou o Decreto nº 9.759/2019 extinguindo uma série de colegiados existentes na Administração Pública federal.

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Informativo 944-STF (19/06/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 2

ADI O Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra esse Decreto nº 9.759/2019. A legenda alega que a extinção dos conselhos que têm participação da sociedade civil viola os princípios republicano, democrático e da participação popular estabelecidos na Constituição Federal e que a supressão de colegiados expressamente instituídos por lei por meio de decreto é indevida, tendo em vista a reserva legal. Houve também, segundo o PT, usurpação de iniciativa reservada ao Congresso Nacional, pois o decreto não poderia revogar disposições legais que tratam do funcionamento de colegiados da administração pública – nos quais se incluem conselhos, comitês, comissões, grupos, juntas, equipes, mesas, fóruns e salas. Cabe ADI neste caso, mesmo sendo contra um Decreto? SIM. Isso porque o Decreto nº 9.759/2019 é considerado um decreto autônomo, tendo sido editado com base no art. 84, VI, “a”, da CF/88:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; (Incluída pela EC nº 32/2001)

A Emenda Constitucional 32/2001, que alterou a redação do inciso VI do art. 84, reintroduziu na ordem constitucional a figura jurídica do decreto autônomo, espécie normativa distinta dos chamados decretos regulamentadores (que têm como objetivo apenas garantir a fiel execução da lei em sentido formal). Os decretos autônomos são aqueles que “veiculam normas que estabelecem proibições, mandamentos ou permissões que não estavam previstos no ordenamento jurídico. Cuida-se de atos que buscam validade diretamente da Constituição, como se fossem normas primárias.” (BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito Constitucional. Tomo II. 8ª ed. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 515). Os decretos autônomos retiram fundamento diretamente da Constituição Federal (art. 84, VI) e, portanto, são dotados de generalidade e abstração. Por essa razão, podem ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade. Nesse sentido: STF. Plenário. ADI 3664, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 01/06/2011. Em suma:

É cabível ADI contra decreto presidencial que, com fundamento no art. 84, VI, “a”, da CF/88, extingue colegiados da Administração Pública federal. Isso porque se trata de decreto autônomo, que retira fundamento de validade diretamente da Constituição Federal e, portanto, é dotado de generalidade e abstração. STF. Plenário. ADI 6121 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12 e 13/6/2019 (Info 944).

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DIREITO ADMINISTRATIVO

ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA Decreto não pode extinguir colegiado previsto em lei

É proibida a extinção, por ato unilateralmente editado pelo chefe do Poder Executivo, de colegiado cuja existência encontre menção em lei em sentido formal, ainda que ausente a expressa referência “sobre a competência ou a composição”.

Caso concreto: o Presidente da República editou o Decreto nº 9.759/2019 extinguindo uma série de colegiados existentes na Administração Pública federal. O art. 1º, § 2º deste Decreto previu que ficariam extintos os colegiados que sejam mencionados em lei, mas sem que esta tenha definido a competência ou a composição. O STF, em medida cautelar, declarou a inconstitucionalidade dessa previsão, considerando que a extinção desses colegiados mencionados em lei somente poderia ocorrer também mediante lei (e não por decreto).

STF. Plenário. ADI 6121 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12 e 13/6/2019 (Info 944).

A situação concreta foi a seguinte: O Presidente Jair Bolsonaro editou o Decreto nº 9.759/2019 extinguindo uma série de colegiados existentes na Administração Pública federal. Segundo a exposição de motivos do Decreto, haveria mais de 300 colegiados na Administração federal. Veja a redação do caput e do § 1º do art. 1º do Decreto:

Art. 1º Este Decreto extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. § 1º A aplicação deste Decreto abrange os colegiados instituídos por: I - decreto; II - ato normativo inferior a decreto; e III - ato de outro colegiado.

Até aqui, tudo bem. Sem polêmicas. Se o colegiado foi criado por meio de Decreto ou por um ato hierarquicamente inferior, não há qualquer problema que ele seja extinto por Decreto. O ponto polêmico residiu no § 2º do art. 1º. Isso porque esse dispositivo do Decreto previu que também ficariam extintos os colegiados que sejam mencionados em lei, mas sem que esta tenha definido a competência ou a composição. Veja a redação:

Art. 1º (...) § 2º Aplica-se o disposto no § 1º aos colegiados instituídos por ato infralegal, cuja lei em que são mencionados nada conste sobre a competência ou a composição.

Exemplo hipotético da situação descrita no art. 1º, § 2º: A lei “X” previu o seguinte: “fica criado o conselho de políticas socioambientais, sendo sua competência e composição definidas em regulamento”. Foi editado, então, um decreto instituindo esse conselho de políticas socioambientais e estabelecendo a sua competência e composição. O objetivo do art. 1º, § 2º do Decreto nº 9.759/2019 seria extinguir também esse hipotético conselho de políticas socioambientais e todos os demais que se enquadram nesta mesma situação.

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O que abrange a expressão colegiados?

Art. 2º Para os fins do disposto neste Decreto, inclui-se no conceito de colegiado: I - conselhos; II - comitês; III - comissões; IV - grupos; V - juntas; VI - equipes; VII - mesas; VIII - fóruns; IX - salas; e X - qualquer outra denominação dada ao colegiado.

ADI O Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra esse Decreto nº 9.759/2019. A legenda alega que a extinção dos conselhos que têm participação da sociedade civil viola os princípios republicano, democrático e da participação popular estabelecidos na Constituição Federal e que a supressão de colegiados expressamente instituídos por lei por meio de decreto é indevida, tendo em vista a reserva legal. Houve também, segundo o PT, usurpação de iniciativa reservada ao Congresso Nacional, pois o decreto não poderia revogar disposições legais que tratam do funcionamento de colegiados da Administração Pública – nos quais se incluem conselhos, comitês, comissões, grupos, juntas, equipes, mesas, fóruns e salas. Primeira pergunta: cabe ADI neste caso, mesmo sendo contra um Decreto? SIM. Isso porque o Decreto nº 9.759/2019 é considerado um decreto autônomo, tendo sido editado com base no art. 84, VI, “a”, da CF/88:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; (Incluída pela EC nº 32/2001)

A Emenda Constitucional 32/2001, que alterou a redação do inciso VI do art. 84, reintroduziu na ordem constitucional a figura jurídica do decreto autônomo, espécie normativa distinta dos chamados decretos regulamentadores (que têm como objetivo apenas garantir a fiel execução da lei em sentido formal). Os decretos autônomos são aqueles que “veiculam normas que estabelecem proibições, mandamentos ou permissões que não estavam previstos no ordenamento jurídico. Cuida-se de atos que buscam validade diretamente da Constituição, como se fossem normas primárias.” (BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito Constitucional. Tomo II. 8ª ed. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 515). Os decretos autônomos retiram fundamento diretamente da Constituição Federal (art. 84, VI) e, portanto, são dotados de generalidade e abstração. Por essa razão, podem ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade. Nesse sentido: STF. Plenário. ADI 3664, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 01/06/2011. Superada a questão do conhecimento, o que decidiu o STF? O Plenário do STF, por maioria, deferiu parcialmente medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade para suspender a eficácia apenas do § 2º do art. 1º do Decreto nº 9.759/2019.

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O STF afirmou também que, até o exame definitivo da ADI, não é possível haver a extinção, por ato unilateralmente editado pelo chefe do Executivo, de colegiado cuja existência encontre menção em lei em sentido formal, ainda que ausente expressa referência “sobre a competência ou a composição”. Democracia participativa Ao prever, na lei, a existência de colegiados, o objetivo do Parlamento é o de promover, sob o influxo dos ares democráticos da Carta de 1988, a atuação de diversos grupos representativos da sociedade civil organizada na tomada de decisões importantes da vida nacional. Trata-se, portanto, de um instrumento de democracia participativa. Vale ressaltar que a democracia participativa não se limita aos projetos de lei de iniciativa popular e aos institutos do referendo e do plebiscito, que estão previstos expressamente no art. 14 da CF/88. Democracia participativa é toda e qualquer forma legal de controle, pela sociedade, dos atos da Administração, considerada a influência da atuação popular na formulação das decisões políticas e na gestão da coisa pública, fornecendo-lhes a necessária legitimidade democrática. Participação direta na gestão pública A existência dos colegiados na Administração Pública é um mecanismo representativo que está de acordo com o princípio da participação direta na gestão pública, princípio esse que é dotado de inequívoca força normativa e que em decorrência dele promoveu a emergência de diversos institutos alusivos à gestão ou à fiscalização de políticas públicas. Instrumentos de democracia representativa devem ser discutidos com a participação do Parlamento O Parlamento é a arena preferencial de deliberação no âmbito da democracia representativa, de modo que, ao prever, em sede legal, a existência de determinado colegiado como mecanismo de participação direta da sociedade civil na gestão da coisa pública, acaba por fornecer, mediante a institucionalização de espaços de participação social, concretude ao que se poderia denominar “espírito de 1988” – a ser levado em conta, linear e indistintamente, por todos os Poderes da República. Desse modo, é razoável exigir que a extinção dos órgãos colegiados com assento legal seja feita somente após prévia chancela parlamentar. Interpretação em sentido diverso esvaziaria importante espaço institucional de diálogo entre os Poderes, o que não se confunde com eventual tentativa de manietar o Executivo com a supressão ou limitação das atribuições essenciais do chefe do Poder no desempenho da função de gestor superior da Administração. Para o STF, o Decreto nº 9.759/2019 foi uma tentativa de escantear (“colocar de lado”) o Legislativo de tal processo. Redução de gastos não pode ser feita com inobservância da lei A louvável preocupação com a racionalização do funcionamento da máquina pública e a economia de recursos públicos, traduzida na redação dos incisos do art. 6º do Decreto 9.759/2019 e citada na exposição de motivos do Decreto não legitima atalhos à margem do figurino legal. Em suma: Assim, para o STF, a conclusão constitucionalmente mais adequada, em sede precária e efêmera, consiste em suspender, até o exame definitivo da controvérsia, a extinção, por ato unilateralmente editado pelo chefe do Executivo, de órgão colegiado que, contando com assento legal, viabilize a participação popular na condução das políticas públicas – mesmo quando ausente expressa “indicação de suas competências ou dos membros que o compõem”.

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É proibida a extinção, por ato unilateralmente editado pelo chefe do Poder Executivo, de colegiado cuja existência encontre menção em lei em sentido formal, ainda que ausente a expressa referência “sobre a competência ou a composição”. STF. Plenário. ADI 6121 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12 e 13/6/2019 (Info 944).

DIREITO PENAL

CRIMES DE RESPONSABILIDADE DOS PREFEITOS Prefeito que utiliza dinheiro destinado a um programa de saúde para pagamento de dívidas da

Secretaria de Saúde com a previdência municipal pratica o crime do art. 1º, III, do DL 201/67

Configura o crime do art. 1º, III, do DL 201/67, a conduta do Prefeito que utiliza verbas oriundas do Fundo Nacional de Saúde (vinculadas a determinado programa de saúde) para o pagamento de débitos da Secretaria Municipal de Saúde junto ao instituto de previdência do Município.

O delito previsto no art. 1º, III, do DL 201/1967 consiste em o administrador público aplicar verba pública em destinação diversa da prevista em lei. Não se trata, portanto, de desviar em proveito próprio.

Para a configuração deste crime, é irrelevante verificar se houve, ou não, efetivo prejuízo para a Administração Pública.

STF. 1ª Turma. AP 984/AP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 11/6/2019 (Info 944).

A situação concreta, segundo a denúncia do MP, foi a seguinte: Em 2011, Roberto Góes, então Prefeito de Macapá (AP), e dois de seus Secretários Municipais, aplicaram indevidamente verbas públicas no montante de R$ 858 mil, oriundas do Fundo Nacional de Saúde (vinculadas ao Programa DST/AIDS), para pagamento de débitos da Secretaria Municipal de Saúde junto à Macapá Previdência (Macaprev). Em outras palavras, as verbas que seriam para um programa de saúde foram utilizadas para pagamento de dívidas da Secretaria com o instituto de previdência do Município. Qual foi o crime, em tese, praticado pelo Prefeito e os Secretários? O delito previsto no art. 1º, III, do Decreto-Lei 201/67:

Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: (...) III - desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas; (...) §1º Os crimes definidos nêste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos.

O Decreto-Lei 201/67 é um ato normativo com status de lei ordinária e que prevê, em seu art. 1º, uma lista de crimes cometidos por Prefeitos no exercício de suas funções. O DL 201/67 traz também regras de processo penal que deverão ser aplicadas quando ocorrerem os crimes ali previstos.

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Vale ressaltar, mais uma vez, que o DL 201/67 foi recepcionado pela CF/88 como lei ordinária (Súmula 496 do STF). O que são crimes de responsabilidade? Tecnicamente falando, crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas praticadas por pessoas que ocupam determinados cargos públicos. Caso o agente seja condenado por crime de responsabilidade, ele não receberá sanções penais (prisão ou multa), mas sim sanções político-administrativas (perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública). O art. 1º prevê realmente crimes de responsabilidade? NÃO. O art. 1º afirma que os delitos nele elencados são “crimes de responsabilidade”. Apesar de ser utilizada essa nomenclatura, a doutrina e a jurisprudência “corrigem” o legislador e afirmam que, na verdade, esses delitos são crimes comuns, ou seja, infrações penais iguais àquelas tipificadas no Código Penal e em outras leis penais. Desse modo, o que o art. 1º traz são crimes funcionais cometidos por Prefeitos. Vale ressaltar que os crimes de responsabilidade (em sentido estrito) dos Prefeitos estão previstos no art. 4º do DL 201/67. É nesse dispositivo que estão definidas as infrações político-administrativas dos alcaides. Nesse sentido: STF. Plenário. HC 70671, Rel. Min. Carlos Velloso, julgado em 13/04/1994. Os crimes funcionais dos Prefeitos estão previstos exclusivamente no art. 1º do DL 201/67? NÃO. Os Prefeitos poderão responder também pelos crimes funcionais previstos no Código Penal, na Lei

de Licitações (Lei n. 8.666/93) e em outras leis penais, desde que tais condutas não estejam descritas no art. 1º do DL 201/67. Os crimes tipificados nas demais leis somente incidirão para os Prefeitos se não estiverem previstos no DL 201/67, que é norma específica. Bem jurídico protegido pelos tipos do art. 1º O patrimônio da Administração Pública e a moralidade administrativa. Sujeito ativo Trata-se de crime próprio, uma vez que somente pode ser praticado pelo Prefeito (ou por quem esteja no exercício desse cargo, como o Vice-Prefeito ou o Presidente da Câmara de Vereadores). É possível a coautoria e a participação? SIM. O crime do art. 1º é próprio, somente podendo ser praticado por Prefeito, mas é possível que ocorram as figuras da coautoria e da participação, nos termos do art. 29 do CP. Em outras palavras, além do Prefeito, outras pessoas podem responder pelo delito como coautores ou partícipes. Exs: um Secretário Municipal, um contador, um assessor etc. Se o sujeito comete o crime do art. 1º do DL 201/67, mas termina seu mandato sem que ele seja denunciado, é possível que ele responda pelo delito mesmo não sendo mais Prefeito? Claro que sim. Existem dois enunciados afirmando isso: Súmula 164-STJ: O prefeito municipal, após a extinção do mandato, continua sujeito a processo por crime previsto no art. 1º do Dec. lei n. 201, de 27/02/67. Súmula 703-STF: A extinção do mandato do Prefeito não impede a instauração de processo pela prática dos crimes previstos no art. 1º do DL 201/67. Julgamento pelo STF Roberto Góes deixou a prefeitura e assumiu o cargo de Deputado Federal em 2015.

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O Ministério Público ofereceu denúncia contra Roberto Góes pelo delito acima explicado e, em 2016, o STF recebeu a peça acusatória do Parquet. Por que a denúncia foi recebida pelo STF? Porque, nesta época, Roberto Góes já havia deixado o cargo de Prefeito e tinha sido eleito Deputado Federal (art. 102, I, “b”, da CF/88). Com isso, o STF recebeu a denúncia e passou a realizar a instrução do processo. Decisão do STF restringindo o foro por prerrogativa de função Ocorre que, em maio de 2018, o STF decidiu restringir o foro por prerrogativa apenas para os crimes cometidos durante o exercício do mandato e que tenham relação com ele. Foi fixada a seguinte tese:

O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018 (Info 900).

Essa tese foi definida na sessão de julgamento do dia 03/05/2018. Ocorre que havia centenas de inquéritos e processos criminais tramitando no STF envolvendo autoridades com foro por prerrogativa de função. Um desses processos era o de Roberto Góes. Daí surgiu a dúvida: essa tese já se aplica imediatamente para esses processos? SIM. O STF decidiu que essa tese interpretativa deveria ser aplicada imediatamente aos inquéritos e processos em curso. O que significou isso, na prática? A assessoria dos Ministros fez o levantamento de todos os inquéritos e processos envolvendo autoridades e que estavam tramitando no Tribunal. Em seguida, foram analisados se os crimes imputados às autoridades estavam ou não relacionados com as suas funções. • Se o processo estivesse relacionado com as funções e a autoridade ainda estivesse no cargo: o feito permanecia no STF para ser julgado pelo Tribunal. Ex: processo envolvendo um Senador que teria recebido vantagem indevida para votar de acordo com os interesses de um grupo econômico. Isso porque, neste caso, a situação se amolda à tese fixada pelo STF. • Se o processo não estivesse relacionado com as funções ou a autoridade não mais estivesse no cargo: neste caso, o feito foi remetido para ser julgado pelo juízo de 1ª instância. Ex: processo envolvendo um Deputado Federal que teria praticado crime funcional na época em que era Prefeito. Essa situação não se amolda à tese fixada porque o crime não está relacionado com as funções de Deputado Federal. Logo, não existe aqui foro por prerrogativa de função, devendo o réu ser julgado em 1ª instância. O processo de Roberto foi, então, remetido para a 1ª instância? NÃO. Ele continuou no STF. Explico o motivo. Na sessão do dia 03/05/2018, o STF, além da restrição acima explicada, também fixou uma segunda tese, dizendo o seguinte:

Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo. STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018.

Como no processo de Roberto o MP e a defesa já haviam apresentado alegações finais, a instrução já tinha se encerrado e o STF entendeu que não havia motivo para enviar o processo para a 1ª instância, sendo mais razoável concluir o julgamento na Corte.

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Podemos resumir o tema da seguinte maneira: • Com a decisão proferida pelo STF, em 03/05/2018, na AP 937 QO/RJ, todos os inquéritos e processos criminais que estavam tramitando no Supremo envolvendo crimes não relacionados com o cargo ou com a função desempenhada pela autoridade, foram remetidos para serem julgados em 1ª instância. Isso porque o STF definiu, como 1ª tese, que “o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas”. • O entendimento acima não se aplica caso a instrução já tenha se encerrado. Em outras palavras, se a instrução processual já havia terminado, mantém-se a competência do STF para o julgamento de detentores de foro por prerrogativa de função, ainda que o processo apure um crime que não está relacionado com o cargo ou com a função desempenhada. Isso porque o STF definiu, como 2ª tese, que “após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo.” Nesse mesmo sentido: STF. 1ª Turma. AP 962/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 16/10/2018 (Info 920). Ok. Entendi por que o STF julgou o crime mesmo ele tendo sido praticado antes do mandato de Deputado Federal. Mas agora quero saber o que o STF decidiu quanto ao mérito. O réu foi condenado? SIM. Por maioria de votos, a 1ª Turma do STF condenou o réu pelo delito do art. 1º, III, do Decreto-Lei 201/67. Apesar disso, ficou constatada a prescrição em razão do tempo transcorrido entre a aceitação da denúncia e a condenação. Conduta narrada subsome-se ao crime do art. 1º, III, do DL 201/67 A conduta narrada na denúncia se amolda, com precisão, ao tipo previsto no inciso III do art. 1º do DL 201/1967. Para o STF, os elementos probatórios produzidos na instrução processual demonstram que o réu, com plena consciência da ilicitude dos seus atos, atuou na forma descrita na peça acusatória, ausentes as causas de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade. Crime do art. 1º, III, do DL 201/67 não envolve desviar recursos em proveito próprio O crime previsto no art. 1º, III, do DL 201/1967 consiste em o administrador público aplicar verba pública em destinação diversa da prevista em lei. Não se trata, portanto, de desviar em proveito próprio. Para a configuração deste crime, é irrelevante verificar se houve, ou não, efetivo prejuízo para a Administração Pública. Dolo O STF entendeu que era evidente o conhecimento do fato pelo ex-Prefeito, que assinou a ordem de pagamento para a transferência, a demonstrar domínio do fato e o poder de gestão dos recursos efetivamente empregados em finalidade diversa da estabelecida por lei. Observou que, na véspera da referida transferência, houve uma reunião com os corréus na qual foi decidida a destinação das verbas. Ressalte-se que um deles até mesmo declarou que o parlamentar sabia da operação ilegal descrita na denúncia. Ademais, no mesmo dia da citada reunião, foi enviado ofício do Gabinete da Secretaria Municipal de Saúde, que fez remissão à “determinação superior” e encaminhou à Secretaria Municipal de Finanças a relação das contas referentes às transferências “fundo a fundo”, para que fosse processada a imediata centralização dessas contas em uma única conta.

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Em suma:

Configura o crime do art. 1º, III, do DL 201/67, a conduta do Prefeito que utiliza verbas oriundas do Fundo Nacional de Saúde (vinculadas a determinado programa de saúde) para o pagamento de débitos da Secretaria Municipal de Saúde junto ao instituto de previdência do Município. O delito previsto no art. 1º, III, do DL 201/1967 consiste em o administrador público aplicar verba pública em destinação diversa da prevista em lei. Não se trata, portanto, de desviar em proveito próprio. Para a configuração deste crime, é irrelevante verificar se houve, ou não, efetivo prejuízo para a Administração Pública. STF. 1ª Turma. AP 984/AP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 11/6/2019 (Info 944).

RACISMO A Lei nº 7.716/89 pode ser aplicada para punir as condutas homofóbicas e transfóbicas

Importante!!!

1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”);

2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero;

3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito.

STF. Plenário. ADO 26/DF, Rel. Min. Celso de Mello; MI 4733/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em em 13/6/2019 (Info 944).

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Lei nº 7.716/89 A Lei nº 7.716/89 prevê os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. O art. 20 da Lei nº 7.716/89, por exemplo, trata sobre o crime de racismo:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa.

Além dele, existem outros delitos tipificados pela Lei nº 7.716/89, como, por exemplo, os arts. 5º e 13:

Art. 5º Recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador. Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 13. Impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das Forças Armadas. Pena: reclusão de dois a quatro anos.

O grande ponto, contudo, da Lei nº 7.716/89 é que ela prevê que a punição para essas condutas ocorre se o preconceito manifestado for em razão da raça ou da cor da vítima. O art. 20 fala também em preconceito relacionado com a etnia, religião e procedência nacional. Preconceito É o pensamento que existe em determinados indivíduos no sentido de que certas pessoas ou grupos sociais são inferiores, nocivos, prejudiciais. “O preconceito é subjetivo, interior, está no intelecto da pessoa, configura um pré-julgamento negativo com relação a outro indivíduo ou grupo.” (LAURIA, Mariano Paganini. Leis Penais Especiais comentadas artigo por artigo. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 534). Discriminação É a exteriorização do preconceito por meio da prática de atos materiais. Raça O conceito de “raça” é amplo e não está limitado a uma definição biológica. Em outras palavras, o conceito de raça não exige que as pessoas possuam as mesmas características genéticas, tais como cor do cabelo, dos olhos e da pele (LAURIA, Mariano Paganini. ob. cit., p. 534). “A divisão dos seres humanos em raças resulta de um processo de conteúdo meramente político-social.” (Min. Maurílio Correia no HC 82424, julgado pelo STF em 17/09/2003). Assim, por exemplo, os judeus são uma raça, mesmo que os indivíduos que componham essa coletividade possuam características genéticas distintas entre si. Cor É a cor que a pessoa possui. É tonalidade, a pigmentação da pele. Etnia São os grupos humanos que apresentam aspectos comuns, tais como língua, religião e maneiras de agir. Trata-se do “conceito mais adotado e recomendado pela sociologia hodiernamente para designar o que antes era entendido por ‘raça’”. (LAURIA, Mariano Paganini. ob. cit., p. 507). Exemplos: índios, árabes, judeus, quilombolas.

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Religião “Religião pode ser conceituada como conjunto de crenças relacionadas ao divino e sagrado, permeada por uma série de rituais e códigos morais derivados de tais convicções. Não se inclui o ateísmo (ausência de crença religiosa), prevalecendo o entendimento de que este é justamente a negação da crença na existência de uma divindade superior, motivo pelo qual não poderia ser equiparado à religião, constituindo-se em espécie de doutrina filosófica. A discriminação por ateísmo seria, assim, fato atípico.” (LAURIA, Mariano Paganini. ob. cit., p. 508). Procedência nacional É o lugar de onde a pessoa veio, ou seja, o lugar onde ela nasceu ou morava. Interessante ressaltar que, segundo a doutrina, este conceito abrange tanto os estrangeiros (ex: venezuelanos, haitianos) como também os nacionais que se deslocam dentro do país (exs: nortistas, nordestinos, sulistas etc.). A Lei nº 7.716/89 previu, expressamente, que os crimes nela tipificados podem ser aplicados em caso de manifestações de preconceito relacionadas com orientação sexual? A Lei nº 7.716/89 prevê, expressamente, punição para condutas homofóbicas e transfóbicas? NÃO. A Lei nº 7.716/89 não traz, expressamente, previsão para punição de condutas homofóbicas e transfóbicas. A doutrina e a jurisprudência, por sua vez, afirmavam que o rol de elementos de preconceito e discriminação do art. 20 era taxativo. Nesse sentido: STF. 1ª Turma. Inq 3590/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/8/2014. Projetos de lei Tramitavam no Congresso Nacional alguns projetos de lei buscando incluir, expressamente, na Lei nº 7.716/89, como crime, as condutas homofóbicas e tansfóbicas. Contudo, sempre se observou uma resistência muito grande de certos setores da sociedade com a punição de tais condutas e, em razão disso, esses projetos nunca foram aprovados. Mandado de injunção Diante do cenário acima descrito, em 2012, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) impetrou mandado de injunção no STF no qual pediu o reconhecimento de que a homofobia e a transfobia se enquadrassem no conceito de racismo ou, subsidiariamente, que fossem entendidas como discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais. Com fundamento nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição Federal, a ABGLT sustentou que a demora do Congresso Nacional é inconstitucional, tendo em vista o dever de editar legislação criminal sobre a matéria. O Min. Edson Fachin foi sorteado relator deste mandado de injunção. ADO Cerca de um ano depois, em 2013, o Partido Popular Socialista (PPS) ajuizou ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO), na qual pediu que o STF declarasse a omissão do Congresso Nacional por não ter votado projeto de lei que criminaliza atos de homofobia. A ação foi proposta a fim de que seja imposto ao Poder Legislativo o dever de elaborar legislação criminal que puna a homofobia e a transfobia como espécies do gênero “racismo”. A criminalização específica, conforme o partido, decorre da ordem constitucional de legislar relativa ao racismo - crime previsto no art. 5º, XLII, da Constituição Federal - ou, subsidiariamente, às discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais (art. 5º, XLI) ou, ainda, também subsidiariamente, ao princípio da proporcionalidade na acepção de proibição de proteção deficiente (art. 5º, LIV).

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De acordo com o partido, o Congresso Nacional tem se recusado a votar o projeto de lei que visa efetivar tal criminalização. O Min. Celso de Mello foi designado como relator da ADO. Síntese dos argumentos As duas ações desenvolveram a seguinte linha de raciocínio: • a CF/88 possui mandados de criminalização, ou seja, “ordens” dadas pelo legislador constituinte ao legislador infraconstitucional (Congresso Nacional) no sentido de que ele deveria editar lei punindo criminalmente condutas que configurem discriminação e racismo. Esses mandados de criminalização estão em dois dispositivos constitucionais:

Art. 5º (...) XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

• o Congresso Nacional já puniu diversas condutas discriminatórias na Lei nº 7.716/89, mas continua sendo omisso no que tange à homofobia e transfobia. Logo, essa omissão precisa ser corrigida; • a Lei nº 7.716/89 pune condutas racistas. Enquanto não se edita uma lei específica para se punir as condutas homofóbicas e transfóbicas, deve-se aplicar os crimes previstos na Lei nº 7.716/89 para tais condutas. Isso porque o conceito de racismo é amplo, não ficando limitado a uma definição biológica. Depois de muitas sessões de discussão, o que decidiu o STF? O STF concordou com as ações propostas? SIM.

Quanto ao MI: O STF, por maioria, julgou procedente o mandado de injunção para: a) reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e; b) aplicar, com efeitos prospectivos, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei nº 7.716/89 a fim de estender a tipificação prevista para os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero. Quanto à ADO: O STF, também por maioria, julgou a ADO procedente, com eficácia geral e efeito vinculante, para: a) reconhecer o estado de mora inconstitucional do Congresso Nacional na implementação da prestação legislativa destinada a cumprir o mandado de incriminação a que se referem os incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição, para efeito de proteção penal aos integrantes do grupo LGBT; b) declarar, em consequência, a existência de omissão normativa inconstitucional do Poder Legislativo da União; c) cientificar o Congresso Nacional, para os fins e efeitos a que se refere o art. 103, § 2º, da Constituição c/c o art. 12-H, caput, da Lei nº 9.868/99:

Art. 103 (...) § 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

Da Decisão na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

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Art. 12-H. Declarada a inconstitucionalidade por omissão, com observância do disposto no art. 22, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias.

d) dar interpretação conforme à Constituição, em face dos mandados constitucionais de incriminação inscritos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Carta Política, para enquadrar a homofobia e a transfobia, qualquer que seja a forma de sua manifestação, nos diversos tipos penais definidos na Lei nº 7.716/89, até que sobrevenha legislação autônoma, editada pelo Congresso Nacional, por dois motivos: d.1) porque as práticas homotransfóbicas qualificam-se como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento plenário do HC 82.424/RS (caso Ellwanger), na medida em que tais condutas importam em atos de segregação que inferiorizam membros integrantes do grupo LGBT, em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero; d.2) porque tais comportamentos de homotransfobia ajustam-se ao conceito de atos de discriminação e de ofensa a direitos e liberdades fundamentais daqueles que compõem o grupo vulnerável em questão; e) declarar que os efeitos da interpretação conforme a que se refere a alínea “d” somente se aplicarão a partir da data em que se concluir o presente julgamento. O tema é extremamente amplo e irei fazer um breve resumo dos principais argumentos apresentados pelos Ministros Min. Celso de Mello

Ausência de proteção estatal a condutas homofóbicas e transfóbicas O gênero e a orientação sexual constituem elementos essenciais e estruturantes da própria identidade da pessoa humana e integram uma das mais íntimas e profundas dimensões de sua personalidade. No entanto, devido à ausência de adequada proteção estatal, especialmente em razão da controvérsia gerada pela denominada “ideologia de gênero”, os integrantes da comunidade LGBT acham-se expostos a ações de caráter segregacionista, com caráter homofóbico, que têm por objetivo limitar ou suprimir prerrogativas essenciais de gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transgêneros e intersexuais, entre outros. Tais práticas culminam no tratamento dessas pessoas como indivíduos destituídos de respeito e consideração, degradados ao nível de quem não tem nem sequer direito a ter direitos, por lhes ser negado, mediante discursos autoritários e excludentes, o reconhecimento da legitimidade de sua própria existência. Essa visão de mundo, fundada na ideia artificialmente construída de que as diferenças biológicas entre o homem e a mulher devem determinar os seus papéis sociais, impõe uma inaceitável restrição às suas liberdades fundamentais, com a submissão dessas pessoas a um padrão existencial heteronormativo, incompatível com a diversidade e o pluralismo que caracterizam uma sociedade democrática, e, ainda, a imposição da observância de valores que, além de conflitarem com sua própria vocação afetiva, conduzem à frustração de seus projetos pessoais de vida. Existe um dever imposto pela CF/88 ao Congresso Nacional para que se crie normas de punição das condutas discriminatórias A Constituição Federal possui dois mandados de incriminação para condutas discriminatórias: art. 5º, incisos XLI e XLII. Assim, é possível concluir que a omissão do Congresso Nacional em produzir normas legais de proteção penal à comunidade LGBT traduz situação configuradora de ilicitude, em afronta ao texto da CF/88.

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Há descumprimento, por inércia estatal, de norma impositiva de comportamento atribuído ao Parlamento Na tipologia das situações inconstitucionais, estamos diante do descumprimento, por inércia estatal, de uma norma impositiva de determinado comportamento atribuído ao poder público pela própria Constituição. Trata-se, portanto, de omissão abusiva no adimplemento da prestação legislativa. Há uma imposição constitucional de legislar e um estado de mora do legislador, mora essa que já superou, de forma excessiva, qualquer prazo razoável, considerando que a Constituição Federal foi editada em 1988. Esse cenário faz com que se chegue à conclusão de que estão presentes os requisitos para a declaração de inconstitucionalidade por omissão. ADO como instrumento de concretização das cláusulas constitucionais frustradas A ação direta de inconstitucionalidade por omissão deve ser vista como instrumento de concretização das cláusulas constitucionais frustradas pela inaceitável omissão do poder público. Isso porque as imposições feitas pela Constituição não podem ficar na inadmissível condição subalterna de um estatuto subordinado à vontade ordinária do legislador comum. Possibilidade diante do reconhecimento da omissão Pois bem. Ficou reconhecido que há uma mora imputável ao Congresso Nacional. O Min. Celso de Mello afirmou que haveria duas possibilidades de o STF agir diante disso: a) apenas cientificar o Congresso Nacional para que ele adote, em prazo razoável, as medidas necessárias à efetivação da norma constitucional (art. 103, § 2º, c/c art. 12-H da Lei nº 9.868/99); ou b) reconhecer, imediatamente, que a homofobia e a transfobia enquadram-se, mediante interpretação conforme à Constituição, na noção conceitual de racismo prevista na Lei nº 7.716/89. Mero apelo ao legislador não tem sido eficaz Para o Min. Celso de Mello, o mero apelo ao legislador não tem se mostrado uma solução eficaz, em razão da indiferença do Poder Legislativo que, em determinadas decisões anteriormente emanadas do STF, tem persistido em permanecer em estado de inadimplemento da prestação legislativa que lhe incumbe promover. Diante disso, o STF, ao longo dos últimos trinta anos, evoluiu no plano jurisprudencial em busca da construção de soluções que pudessem fazer cessar esse estado de inconstitucional omissão normativa. Isso se deu, por exemplo, no caso do direito de greve por servidores públicos, no qual o STF determinou que, diante da ausência da lei prevista no art. 37, VII, da CF/88, os servidores públicos podem fazer greve, devendo ser aplicadas as leis que regulamentam a greve para os trabalhadores da iniciativa privada (Lei nº 7.701/88 e Lei nº 7.783/89): STF. Plenário. MI 708, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 25/10/2007. Esse exercício de interpretação não significa legislar (não se está usurpando a competência do CN) Para o Ministro, essa postura adotada no caso da greve – que não se limita a cientificar o Congresso da mora, fornecendo, desde logo, uma solução jurídica para o caso – é um procedimento hermenêutico realizado pelo Poder Judiciário para extrair a necessária interpretação dos diversos diplomas legais. Segundo o Ministro, isso não se confunde com o processo de elaboração legislativa, ou seja, não se pode dizer que o STF esteja legislando. O processo de interpretação dos textos legais e da Constituição não importa em usurpação das atribuições normativas dos demais poderes da República.

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Conceito de “raça” O conceito de “raça” que compõe a estrutura normativa dos tipos penais incriminadores previstos na Lei nº 7.716/89 tem merecido múltiplas interpretações, revestindo-se, por isso, de inegável conteúdo polissêmico (algo que tem muitos significados). Um exemplo disso foi o célebre julgamento do “caso Ellwanger” (HC 82424), em setembro de 2003, quando o STF manteve a condenação imposta ao escritor gaúcho Siegfried Ellwanger por crime de racismo contra os judeus. Naquela ocasião, o STF afastou a alegação da defesa de que os “judeus” não seriam uma “raça”. Pode-se dizer, portanto, que o STF adotou uma espécie de conceito “social” de raça.

(...) 3. Raça humana. Subdivisão. Inexistência. Com a definição e o mapeamento do genoma humano, cientificamente não existem distinções entre os homens, seja pela segmentação da pele, formato dos olhos, altura, pêlos ou por quaisquer outras características físicas, visto que todos se qualificam como espécie humana. Não há diferenças biológicas entre os seres humanos. Na essência são todos iguais. 4. Raça e racismo. A divisão dos seres humanos em raças resulta de um processo de conteúdo meramente político-social. Desse pressuposto origina-se o racismo que, por sua vez, gera a discriminação e o preconceito segregacionista. (...) STF. Plenário. HC 82424, Relator p/ Acórdão Min. Maurício Corrêa, julgado em 17/09/2003.

Racismo é um conceito aberto que abrange preconceitos contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero Assim, a noção de racismo – para efeito de configuração típica dos delitos previstos na Lei nº 7.716/89 – não se resume a um conceito de ordem estritamente antropológica ou biológica. Projeta-se, ao contrário, numa dimensão abertamente cultural e sociológica, a abranger até mesmo situações de agressão injusta resultantes de discriminação ou de preconceito contra pessoas por sua orientação sexual ou sua identidade de gênero. Atos homofóbicos e transfóbicos são formas contemporâneas de racismo A configuração de atos homofóbicos e transfóbicos como formas contemporâneas do racismo objetiva preservar a incolumidade dos direitos da personalidade, como a essencial dignidade da pessoa humana. Busca inibir, desse modo, comportamentos abusivos que possam, impulsionados por motivações subalternas, disseminar criminosamente o ódio público contra outras pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero. Interpretação conforme Vale ressaltar que a aplicação da Lei nº 7.716/89 para condutas homofóbicas e transfóbicas resulta da aplicação do método da interpretação conforme. Assim, fazendo-se uma intepretação conforme do conceito de “raça”, previsto na Lei nº 7.716/89, chega-se à conclusão de que ele pode abranger também orientação sexual e identidade de gênero. Nas exatas palavras do Min. Celso de Mello: “A constatação da existência de múltiplas expressões semiológicas propiciadas pelo conteúdo normativo da ideia de “raça” permite reconhecer como plenamente adequado o emprego, na presente hipótese, da técnica de decisão e de controle de constitucionalidade fundada no método da interpretação conforme à Constituição.” Não se trata de analogia Atenção. Para o Min. Celso de Mello, a construção que foi feita, ou seja, a aplicação da Lei nº 7.716/89 às condutas homofóbicas e transfóbicas, não é aplicação analógica. Para ele, houve apenas interpretação conforme a Constituição. Confira:

“A solução propugnada não sugere a aplicação analógica das normas penais previstas na Lei 7.716/1989 nem implica a formulação de tipos criminais ou cominação de sanções penais.

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É certo que, considerado o princípio constitucional da reserva absoluta de lei formal, o tema pertinente à definição de tipo penal e à cominação de sanção penal subsume-se ao âmbito das normas de direito material, de natureza eminentemente penal, regendo-se, em consequência, pelo postulado da reserva de parlamento. Assim, inviável, em controle abstrato de constitucionalidade, colmatar, mediante decisão desta Corte Suprema, a omissão denunciada pelo autor da ação direta, procedendo-se à tipificação penal de condutas atentatórias aos direitos e liberdades fundamentais dos integrantes da comunidade LGBT. Na verdade, a solução ora proposta limita-se à mera subsunção de condutas homotransfóbicas aos diversos preceitos primários de incriminação definidos em legislação penal já existente (Lei 7.716/1989), pois os atos de homofobia e de transfobia constituem concretas manifestações de racismo, compreendido em sua dimensão social, ou seja, o denominado racismo social.”

Não há ofensa à liberdade religiosa É necessário destacar que a decisão, no presente caso, não implica a ocorrência de qualquer ofensa ou dano potencial à liberdade religiosa, qualquer que seja a dimensão em que aquela se projete. A liberdade religiosa faz parte do regime democrático e não pode nem deve ser impedida pelo poder público nem submetida a ilícitas interferências do Estado. A adoção pelo Estado de meios destinados a impedir condutas homofóbicas e transfóbicas em hipótese alguma poderá restringir ou suprimir a liberdade de consciência e de crença, nem autorizar qualquer medida que interfira nas celebrações litúrgicas ou que importe em cerceamento à liberdade de palavra, seja como instrumento de pregação da mensagem religiosa, seja, ainda, como forma de exercer o proselitismo em matéria confessional em espaços públicos ou privados. Há que se preservar, portanto, a possibilidade de os líderes e membros das religiões exporem suas narrativas, conselhos, lições ou orientações constantes de seus livros sagrados, seja qual for a religião (como a Bíblia, a Torah, o Alcorão, a Codificação Espírita, os Vedas hindus e o Dhammapada budista). Essas práticas não configuram delitos contra a honra, porque veiculados com o intuito de divulgar o pensamento resultante do magistério teológico e da filosofia espiritual que são próprios de cada uma dessas denominações confessionais. Tal circunstância descaracteriza, por si só, o intuito doloso dos delitos contra a honra, a tornar legítimos o discurso e a pregação como expressões dos postulados de fé dessas religiões. Em caso de insultos, ofensas ou estimulo à violência, poderá haver crime Por outro lado, o direito de dissentir deixa de ser legítimo quando a sua exteriorização ofender valores e bens jurídicos igualmente protegidos pela ordem constitucional, como sucede com o direito de terceiros à incolumidade de seu patrimônio moral. Assim, pronunciamentos de índole religiosa que extravasem (extrapolem) os limites da livre manifestação de ideias, constituindo-se em insultos, ofensas ou em estímulo à intolerância e ao ódio público contra os integrantes da comunidade LGBT, não merecem proteção constitucional e não podem ser considerados liberdade de expressão. Em tais situações, haverá crime. Função contramajoritária do STF Para o Min. Celso de Mello, este julgamento reflete a função contramajoritária que o STF possui de, no Estado Democrático de Direito, conferir efetiva proteção às minorias. É uma função exercida no plano da jurisdição das liberdades. Nesse sentido, o STF desempenha o papel de órgão investido do poder e da responsabilidade institucional de proteger as minorias contra eventuais excessos da maioria ou contra omissões que se tornem lesivas, diante da inércia do Estado, aos direitos daqueles que sofrem os efeitos perversos do preconceito, da discriminação e da exclusão jurídica.

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Assim, para que o regime democrático não se reduza a uma categoria político-jurídica meramente conceitual ou simplesmente formal, torna-se necessário assegurar às minorias a plenitude de meios que lhes permitam exercer, de modo efetivo, os direitos fundamentais assegurados a todos. Ninguém se sobrepõe, nem mesmo os grupos majoritários, aos princípios superiores consagrados pela Constituição da República. Min. Edson Fachin A CF/88 impõe um dever estatal de legislar (mandado de criminalização contra a discriminação homofóbica e transfóbica) em seu art. 5º, XLI, da CF/88. O trâmite de projetos de lei sobre a matéria no Congresso Nacional não obsta o conhecimento do mandado de injunção, haja vista jurisprudência do STF no sentido de que esse fato não serve para afastar o reconhecimento da omissão inconstitucional. Há um quadro de violações sistemáticas aos direitos da população LGBTI, constatado também pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. No mérito, o Ministro consignou que o direito constante do art. 5º, XLI, efetivamente contém mandado de criminalização contra a discriminação homofóbica e transfóbica. Ante a mora do Congresso Nacional, essa ordem comporta, até que seja suprida, a colmatação pelo STF por meio de interpretação conforme da legislação de combate à discriminação. A seu ver, conforme o inciso XLI, qualquer espécie de discriminação é atentatória ao Estado Democrático de Direito, inclusive a que se fundamenta na orientação sexual das pessoas ou na sua identidade de gênero. Vale ressaltar que na ADI 4275 o STF consignou que o direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero e a orientação sexual. Ademais, no âmbito internacional, o posicionamento é na mesma direção. O princípio da proporcionalidade, na modalidade de proibição de proteção insuficiente, é o fundamento pelo qual o STF tem reconhecido que o Direito Penal pode ser um instrumento adequado para a proteção dos bens jurídicos expressamente indicados pelo texto constitucional. Os tratados internacionais de que a República brasileira é parte também contêm mecanismos de proteção proporcional. À luz desses tratados, dessume-se da leitura da CF/1988 um mandado constitucional de criminalização no tocante a toda e qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais, incluída a de orientação sexual e de identidade de gênero. O mandado de injunção é a garantia para a efetividade do direito protegido pelo mandado de criminalização e que o STF compreendeu ser cabível ao Poder Judiciário atuar nas hipóteses de inatividade ou omissão do Legislativo. No caso, além da falta de norma que proteja o público LGBT, verifica-se também uma situação de ofensa ao princípio da igualdade. Isso porque condutas igualmente reprováveis recebem tratamento jurídico distinto. Ex: impedir ou obstar acesso a órgão da Administração Pública, ou negar emprego em empresa privada, por preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional são condutas típicas, nos termos da Lei nº 7.716/89. Se as mesmas condutas fossem praticadas com preconceito a homossexual ou transgênero, não haveria crime. Dessa maneira, a omissão legislativa em tipificar a discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero ofende um sentido mínimo de justiça ao sinalizar a tolerância à violência dirigida a pessoa, como se não fosse digna de viver em igualdade. Toda pessoa deve ser protegida contra qualquer ato que atinja sua dignidade. É preciso dar sentido e concretude ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que se torna passível de aplicação direta à situação em análise, por ter sido seu conteúdo nitidamente violado. É certo que não pode o STF substituir o legislador, mas aqui há comando constitucional para regulamentar situações concretas. Lei específica sobre o tema deveria ter sido editada, porque o legislador constituinte

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originário, desde 1988, vinculou o legislador derivado. A falta de norma inviabiliza o exercício de direitos, e o texto constitucional não exclui o mandado de injunção de qualquer seara específica de incidência. O Min. Fachin também sustentou que o STF não está fazendo analogia in malam partem ao aplicar a Lei nº 7.716/89 para manifestações homofóbicas ou transfóbicas. A CF contém expresso comando de punição penal para a discriminação homofóbica e a extensão prospectiva da lei de discriminação racial, até a edição específica de norma pelo Poder Legislativo, não viola o princípio da anterioridade da lei penal. Min. Alexandre de Moraes O Min. Alexandre de Moraes também acompanhou os relatores pela procedência das ações. Em seu voto, reconheceu a inconstitucionalidade por omissão do Congresso Nacional em editar norma protetiva à comunidade LGBTI. Segundo ele, a atuação do Congresso Nacional em relação a grupos tradicionalmente vulneráveis foi sempre no sentido de que a ampla proteção depende de lei penal. O Congresso atuou dessa forma em relação às crianças e aos adolescentes, aos idosos, às pessoas com deficiência, às mulheres e até aos consumidores, No entanto, passados 30 anos da Constituição Federal, só a discriminação homofóbica e transfóbica permanece sem nenhum tipo de aprovação. O único caso em que o próprio Congresso não seguiu o seu padrão. A compreensão de que as práticas homofóbicas configuram racismo social, segundo o Ministro, não ofendem a liberdade religiosa, que é consagrada constitucionalmente. Min. Roberto Barroso O Min. Luís Roberto Barroso também reconheceu a omissão legislativa. Ele observou que é papel do STF, no entanto, estabelecer diálogo respeitoso com o Congresso e também com a sociedade. “Se o Congresso atuou, a sua vontade deve prevalecer. Se não atuou e havia um mandamento constitucional nesse sentido, que o Supremo atue para fazer valer o que está previsto na Constituição”. A regra geral, afirmou, é a de autocontenção, deixando o maior espaço possível para a atuação do Legislativo. “Porém, quando estão em jogo direitos fundamentais ou a preservação das regras do jogo democrático, se justifica uma postura mais proativa do STF”. Esse é o caso dos autos. Barroso explicou que a punição para atos de homofobia e transfobia deve ser de natureza criminal por três razões: a relevância do bem jurídico tutelado e a sistematicidade de violação a este direito, o fato de que outras discriminações são punidas pelo direito penal e a circunstância de que a punição administrativa não é suficiente, uma vez que não coíbe de maneira relevante as violências homofóbicas. “Deixar de criminalizar a homofobia seria tipicamente uma hipótese de proteção deficiente”. Afirmou que a solução dada (aplicar a Lei do Racismo) não configura analogia nem interpretação extensiva. Isso porque no conceito de racismo firmado pelo STF estão colhidas as situações tipificadas na lei. Por fim, o Ministro também acolheu o pedido para interpretar o Código Penal conforme a Constituição para fixar que, se a motivação de homicídio for a homofobia, estará caracterizado o motivo fútil ou torpe, constituindo circunstância agravante ou qualificadora. Min. Cármen Lúcia A Min. Cármen Lúcia acompanhou os relatores pela procedência dos pedidos. Ela avaliou que, após tantas mortes, ódio e incitação contra homossexuais, não há como desconhecer a inércia do legislador brasileiro e afirmou que tal omissão é inconstitucional. Min. Gilmar Mendes O Min. Gilmar Mendes acompanhou a maioria dos votos pela procedência das ações. Além de identificar a inércia do Congresso Nacional, ele entendeu que a interpretação apresentada pelos relatores de que a Lei do Racismo também pode alcançar os integrantes da comunidade LGBT é compatível com a Constituição Federal.

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Min. Ricardo Lewandowski (vencido) O Min. Ricardo Lewandowski reconheceu a mora legislativa e a necessidade de dar ciência dela ao Congresso Nacional a fim de que seja produzida lei sobre o tema. No entanto, entendeu que a homofobia e a transfobia não se enquadram na Lei do Racismo. É indispensável a existência de lei para que seja viável a punição penal de determinada conduta. “A extensão do tipo penal para abarcar situações não especificamente tipificadas pela norma incriminadora parece-me atentar contra o princípio da reserva legal, que constitui uma garantia fundamental dos cidadãos que promove a segurança jurídica de todos”. Min. Marco Aurélio (vencido) Para o Min. Marco Aurélio, a Lei do Racismo não pode ser ampliada em razão da taxatividade dos delitos expressamente nela previstos. Ele considerou que a sinalização do STF para a necessária proteção das minorias e dos grupos socialmente vulneráveis, por si só, contribui para uma cultura livre de todo e qualquer preconceito e discriminação, preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em termos penais. Min. Dias Toffoli (vencido) O Min. Dias Toffoli acompanhou o ministro Ricardo Lewandowski pela procedência parcial dos pedidos, com a mera notificação do Congresso Nacional acerca da mora. Teses fixadas pelo STF:

1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”); 2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero; 3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência

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de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito. STF. Plenário. ADO 26/DF, Rel. Min. Celso de Mello; MI 4733/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em em 13/6/2019 (Info 944).

DIREITO PROCESSUAL PENAL

NULIDADE É nulo o interrogatório travestido de entrevista realizado pela autoridade policial com o

investigado, durante a busca e apreensão em sua residência, sem assistência de advogado e sem a comunicação de seus direitos

É nula a “entrevista” realizada pela autoridade policial com o investigado, durante a busca e apreensão em sua residência, sem que tenha sido assegurado ao investigado o direito à prévia consulta a seu advogado e sem que ele tenha sido comunicado sobre seu direito ao silêncio e de não produzir provas contra si mesmo.

Trata-se de um “interrogatório travestido de entrevista”, havendo violação do direito ao silêncio e à não autoincriminação.

STF. 2ª Turma. Rcl 33711/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/6/2019 (Info 944).

Imagine a seguinte situação hipotética: O juiz autorizou a realização de busca e apreensão na residência de João, investigado pela prática de determinados crimes. O Delegado e os agentes de polícia foram até o local para cumprir o mandado. Durante a diligência, o Delegado realizou uma “entrevista” com João, tendo sido feitas a ele algumas perguntas a respeito dos crimes que estavam sendo investigados. Essa “entrevista” foi documentada e utilizada, posteriormente, como elemento informativo (“prova”) para subsidiar a denúncia. Vale ressaltar que essa “entrevista” foi feita de modo informal e João não estava acompanhado de advogado. Diante disso, indaga-se: esse interrogatório do investigado, chamado de “entrevista”, foi válido? NÃO. O STF entendeu que essa entrevista foi um verdadeiro interrogatório, tendo decidido anular este ato. Violação ao direito ao silêncio e à não autoincriminação

Houve violação do direito ao silêncio e à não autoincriminação na realização desse “interrogatório travestido de entrevista”. Não se assegurou ao investigado o direito à prévia consulta a seu advogado. Além disso, ele não foi comunicado sobre seu direito ao silêncio e de não produzir provas contra si mesmo. STF. 2ª Turma. Rcl 33711/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/6/2019 (Info 944).

Para o STF, houve uma espécie de interrogatório “forçado”, o que violou o entendimento firmado pela Corte no julgamento das ADPFs 395 e 444. Ao julgar essas ações, o STF decidiu que a condução coercitiva para interrogatório é inconstitucional. Neste caso concreto, o raciocínio seria o mesmo porque o investigado foi praticamente obrigado a falar, sem defesa e sem a observância das garantias processuais do interrogatório.

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Para o Min. Gilmar Mendes, houve uma “evidente tentativa de contornar a proibição estabelecida pelo STF em favor dos direitos e garantias fundamentais das pessoas investigadas”. O investigado foi interrogado em ambiente intimidatório, durante a realização de busca e apreensão domiciliar, o que diminuiu seu direito à não incriminação. Além disso, na entrevista formalmente documentada, não se oportunizou ao sujeito da diligência o direito à prévia consulta a advogado, tampouco certificou-se, no respectivo termo, o direito ao silêncio e à não produção de provas contra si mesmo. Direito de ser informado do direito de ficar calado Vale ressaltar que a CF/88 determina que as autoridades estatais informem os presos que eles possuem o direito de permanecer em silêncio:

Art. 5º (...) LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

A cláusula constitucional do direito ao silêncio guarda semelhanças com o “aviso de Miranda” (Miranda warning) do direito norte-americano. Miranda warning Conforme explicam Klaus Negri Costa e Fábio Roque Araújo:

“É relevante, ademais, mencionar o chamado aviso de Miranda (advertência de Miranda, Miranda warning ou Miranda rights), originado do julgamento Miranda vs. Arizona, onde a Suprema Corte dos Estados Unidos (384 U.S 436, de 1966), pelo voto do juiz Earl Warren, absolveu o réu confesso Ernesto Miranda, acusado de estupro, sequestro e roubo, pois a polícia não havia lhe informado o direito de ser assistido por um advogado e de não produzir prova contra si. Desde então, toda pessoa presa nos EUA tem os seguintes direitos: (i) de permanecer calado; (ii) de ser alertado de que tudo o que disser poderá ser usado contra si; e (iii) à assistência de um advogado ou, na impossibilidade, um defensor público custeado pelo Estado. No Brasil, não há uma regra explícita a esse respeito, isto é, de os policiais dizerem referida frase; todavia, a Constituição da República, no art. 5º, LXIII, assim dispõe: o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado. Além do mais, serão consideradas ilícitas as provas obtidas a partir de declarações do preso sem prévia e formal advertência quanto ao direito ao silêncio (art. 157, CPP).” (COSTA, Klaus Negri; ARAÚJO, Fábio Roque. Processo Penal didático. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 65-66)

Validade da apreensão do celular Por outro lado, o STF considerou válida a apreensão do celular do investigado. Isso porque, apesar de na decisão judicial não constar a expressão “autorizo a apreensão do aparelho celular”, havia, no ato decisório, a autorização para que a autoridade policial pudesse acessar, explorar e copiar o conteúdo de mídias, dispositivos e dados armazenados em nuvem.

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EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) É cabível ADI contra decreto presidencial que, com fundamento no art. 84, VI, “a”, da CF/88, extingue

colegiados da Administração Pública federal. ( ) 2) (DPE-RN 2015 CESPE) No exercício do poder regulamentar, é conferida à administração pública a

prerrogativa de editar atos gerais para complementar a lei, em conformidade com seu conteúdo e limites, não podendo ela, portanto, criar direitos e impor obrigações, salvo as excepcionais hipóteses autorizativas de edição de decreto autônomo. ( )

3) É proibida a extinção, por ato unilateralmente editado pelo chefe do Poder Executivo, de colegiado cuja existência encontre menção em lei em sentido formal, ainda que ausente a expressa referência “sobre a competência ou a composição”. ( )

4) Para a configuração do crime do art. 1º, III, do DL 201/67 é relevante verificar se houve, ou não, efetivo prejuízo para a Administração Pública. ( )

5) Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”). ( )

6) É nula a entrevista realizada pela autoridade policial com o investigado, durante a busca e apreensão em sua residência, sem que tenha sido assegurado ao investigado o direito à prévia consulta a seu advogado e sem que ele tenha sido comunicado sobre seu direito ao silêncio e de não produzir provas contra si mesmo. ( )

Gabarito

1. C 2. C 3. C 4. E 5. C 6. C