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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 986-STF Márcio André Lopes Cavalcante Julgamento que ainda não foi concluído em virtude de adiamento. Será comentado assim que chegar ao fim: ADC 58/DF. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS Critérios para que o parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99 seja compatível com a Constituição Federal. TRIBUNAIS DE CONTAS Compete aos Tribunais de Contas dos Estados, com exclusividade, a iniciativa legislativa de norma que disponha sobre sua organização e funcionamento. DIREITO ADMINISTRATIVO CONCURSO PÚBLICO Estado responde subsidiariamente caso a prova do concurso público seja suspensa ou cancelada por indícios de fraude; a responsabilidade direta é da instituição organizadora. DIREITO PENAL LEI DE DROGAS O autor da conduta do art. 28 da LD deve ser encaminhado diretamente ao juiz, que irá lavrar o termo circunstanciado e fará a requisição dos exames e perícias; somente se não houver juiz é que tais providências serão tomadas pela autoridade policial; essa previsão é constitucional. DIREITO CONSTITUCIONAL DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS Critérios para que o parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99 seja compatível com a Constituição Federal Importante!!! O parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99 prevê que os órgãos que compõem o SISBIN deverão fornecer informações para a ABIN: Art. 4º (...) Parágrafo único. Os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência fornecerão à ABIN, nos termos e condições a serem aprovados mediante ato presidencial, para fins de integração, dados e conhecimentos específicos relacionados com a defesa das instituições e dos interesses nacionais. O Plenário do STF afirmou que esse dispositivo é constitucional desde que seja interpretado com base em quatro critérios definidos pela Corte. Assim, o STF conferiu interpretação conforme à Constituição Federal ao parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99, para estabelecer que:

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 986-STF

Márcio André Lopes Cavalcante Julgamento que ainda não foi concluído em virtude de adiamento. Será comentado assim que chegar ao fim: ADC 58/DF.

ÍNDICE

DIREITO CONSTITUCIONAL

DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS ▪ Critérios para que o parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99 seja compatível com a Constituição Federal.

TRIBUNAIS DE CONTAS ▪ Compete aos Tribunais de Contas dos Estados, com exclusividade, a iniciativa legislativa de norma que disponha

sobre sua organização e funcionamento.

DIREITO ADMINISTRATIVO

CONCURSO PÚBLICO ▪ Estado responde subsidiariamente caso a prova do concurso público seja suspensa ou cancelada por indícios de

fraude; a responsabilidade direta é da instituição organizadora.

DIREITO PENAL

LEI DE DROGAS ▪ O autor da conduta do art. 28 da LD deve ser encaminhado diretamente ao juiz, que irá lavrar o termo

circunstanciado e fará a requisição dos exames e perícias; somente se não houver juiz é que tais providências serão tomadas pela autoridade policial; essa previsão é constitucional.

DIREITO CONSTITUCIONAL

DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS Critérios para que o parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99

seja compatível com a Constituição Federal

Importante!!!

O parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99 prevê que os órgãos que compõem o SISBIN deverão fornecer informações para a ABIN:

Art. 4º (...) Parágrafo único. Os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência fornecerão à ABIN, nos termos e condições a serem aprovados mediante ato presidencial, para fins de integração, dados e conhecimentos específicos relacionados com a defesa das instituições e dos interesses nacionais.

O Plenário do STF afirmou que esse dispositivo é constitucional desde que seja interpretado com base em quatro critérios definidos pela Corte. Assim, o STF conferiu interpretação conforme à Constituição Federal ao parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99, para estabelecer que:

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 2

a) os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin) somente podem fornecer dados e conhecimentos específicos à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) quando comprovado o interesse público da medida, afastada qualquer possibilidade de esses dados atenderem interesses pessoais ou privados;

b) toda e qualquer decisão que solicitar os dados deverá ser devidamente motivada para eventual controle de legalidade pelo Poder Judiciário;

c) mesmo quando presente o interesse público, os dados referentes a comunicações telefônicas ou dados sujeitos à reserva de jurisdição não podem ser compartilhados na forma do dispositivo em razão daquela limitação, decorrente do respeito aos direitos fundamentais; e

d) nas hipóteses cabíveis de fornecimento de informações e dados à Abin, é imprescindível procedimento formalmente instaurado e existência de sistemas eletrônicos de segurança e registro de acesso, inclusive para efeito de responsabilização, em caso de eventuais omissões, desvios ou abusos.

STF. Plenário. ADI 6529 MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 13/8/2020 (Info 986).

Lei nº 9.883/99 A Lei nº 9.883/99 tratou sobre dois assuntos: • instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligência e • criou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin) Sistema Brasileiro de Inteligência é o conjunto de ações para o planejamento e a execução das atividades de inteligência do País. O objetivo é fornecer subsídios ao Presidente da República a respeito de assuntos de interesse nacional. Inteligência e contrainteligência É a atividade voltada para a obtenção, análise e disseminação de conhecimentos sobre fatos e situações que possam influenciar no processo decisório e na ação governamental e na segurança da sociedade e do Estado. Entende-se como contrainteligência a atividade que objetiva neutralizar a inteligência adversa. Quem compõe o Sistema Brasileiro de Inteligência O caput do art. 2º da Lei n. 9.883/99 prevê que compõem o Sisbin os órgãos e entidades da Administração Pública Federal que, direta ou indiretamente, possam produzir conhecimentos de interesse das atividades de inteligência, em especial aqueles responsáveis pela defesa externa, segurança interna e relações exteriores. A matéria é regulamentada pelo Decreto nº 4.376/2002, que, em seu art. 4º, lista os órgãos que compõem o Sisbin: Casa Civil, Abin, Ministério da Justiça, Ministério da Defesa, Ministério do Meio Ambiente, AGU, entre outros. ABIN A Abin é um órgão da Presidência da República e tem por objetivo planejar, executar, coordenar, supervisionar e controlar as atividades de inteligência do País. O caput do art. 4º elenca as competências da Abin: I - planejar e executar ações, inclusive sigilosas, relativas à obtenção e análise de dados para a produção de conhecimentos destinados a assessorar o Presidente da República; II - planejar e executar a proteção de conhecimentos sensíveis, relativos aos interesses e à segurança do Estado e da sociedade; III - avaliar as ameaças, internas e externas, à ordem constitucional;

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IV - promover o desenvolvimento de recursos humanos e da doutrina de inteligência, e realizar estudos e pesquisas para o exercício e aprimoramento da atividade de inteligência. Parágrafo único do art. 4º O parágrafo único do art. 4º prevê que os órgãos que compõem o SISBIN deverão fornecer informações para a ABIN, nos termos do que for definido em Decreto presidencial:

Art. 4º (...) Parágrafo único. Os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência fornecerão à ABIN, nos termos e condições a serem aprovados mediante ato presidencial, para fins de integração, dados e conhecimentos específicos relacionados com a defesa das instituições e dos interesses nacionais.

Com base nesse dispositivo, o § 3º do art. 1º do Anexo I do Decreto presidencial nº 10.445/2020 prevê o seguinte:

Art. 1º (...) § 3º Os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência fornecerão à Abin, sempre que solicitados, nos termos do disposto no Decreto nº 4.376, de 13 de setembro de 2002, e na legislação correlata, para fins de integração, dados e conhecimentos específicos relacionados à defesa das instituições e dos interesses nacionais.

ADI A Rede Sustentabilidade e o Partido Socialista Brasileiro (PSB) ajuizaram Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6529) contra o parágrafo único do art. 4º da Lei nº 9.883/99. Segundo os autores, com base nesse dispositivo, a Abin tem o poder de requisitar dados de investigações sigilosas, sigilo fiscal, relatórios do Coaf e dados de sigilo telefônico, “dentre tantas outras informações absolutamente sensíveis e sigilosas”. Assim, para os requerentes, esse dispositivo possibilita o desvirtuamento de finalidade da Agência e atenta contra direitos e garantias fundamentais. Medida cautelar

O Plenário, por maioria, deferiu, em parte, o pedido de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, a fim de conferir interpretação conforme à Constituição Federal ao parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99 para estabelecer que: a) os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin) somente podem fornecer dados e conhecimentos específicos à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) quando comprovado o interesse público da medida, afastada qualquer possibilidade de esses dados atenderem interesses pessoais ou privados; b) toda e qualquer decisão que solicitar os dados deverá ser devidamente motivada para eventual controle de legalidade pelo Poder Judiciário; c) mesmo quando presente o interesse público, os dados referentes a comunicações telefônicas ou dados sujeitos à reserva de jurisdição não podem ser compartilhados na forma do dispositivo em razão daquela limitação, decorrente do respeito aos direitos fundamentais; e d) nas hipóteses cabíveis de fornecimento de informações e dados à Abin, é imprescindível procedimento formalmente instaurado e existência de sistemas eletrônicos de segurança e registro de acesso, inclusive para efeito de responsabilização, em caso de eventuais omissões, desvios ou abusos. STF. Plenário. ADI 6529 MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 13/8/2020 (Info 986).

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 4

a) Comprovação do interesse público da medida É imprescindível que os dados e os conhecimentos específicos a serem fornecidos estejam vinculados ao interesse público objetivamente comprovado e com motivação específica. Inteligência é atividade sensível e grave do Estado. É uma atividade necessária e autorizada pela lei. Vale ressaltar, no entanto, que atividade de inteligência é diferente de “arapongagem”. “Arapongagem” não é direito, e sim crime. Quando praticada pelo Estado, é ilícito ainda mais grave. Assim, comete crime o agente que adotar prática de solicitação e obtenção de dados e conhecimentos específicos sobre quem quer que seja fora dos estritos limites da legalidade. O fornecimento de dados pelos órgãos componentes do Sisbin à Abin tem a finalidade de tornar eficiente “a defesa das instituições e dos interesses nacionais”. Logo, somente dados e conhecimentos específicos relacionados a estas finalidades são legalmente admitidas e compatibilizam-se com a CF. Qualquer outra interpretação é inválida. Isso significa que compartilhamento de informações que estejam relacionadas com interesse privado do órgão ou do agente público não é juridicamente admitido, caracterizando-se desvio de finalidade e abuso de direito. Esse fornecimento não pode se tornar subterfúgio (manobra) para atendimento de interesses particulares ou pessoais, especialmente daqueles que têm acesso aos dados. É atitude ditatorial, que contrasta com o Estado democrático de direito, o abuso da máquina estatal para atendimento a objetivos pessoais, mais ainda quando sejam criminosos como são aqueles que se voltam a obter dados sobre pessoas para a elas impor restrições inconstitucionais, agressões ilícitas, medos e exposição de imagem. Comprovado o descumprimento dos princípios constitucionais, há de ser declarado ilegítimo pelo Poder Judiciário. b) Solicitação dos dados deve ser motivada É imprescindível que os atos administrativos, incluídos aqueles relativos às atividades de inteligência, sejam motivados, para que haja a possibilidade de serem eventualmente contrastados. A legitimidade dos atos da Administração Pública não pode ser averiguada pelos cidadãos e pelo Poder Judiciário se não houver a comprovação de sua devida motivação. Ademais, a obrigatoriedade de motivação dos atos administrativos está expressa no art. 50 da Lei do Processo Administrativo Federal (Lei nº 9.784/99):

Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; (...)

Para o STF, mesmo que as atividade de inteligência se desenvolvam em regime de sigilo ou de restrição de publicidade, ainda assim será necessária a motivação porque esses atos podem importar acesso a dados e informações sensíveis dos cidadãos, e podem comprometer ou limitar direitos fundamentais à privacidade e à intimidade. Desse modo, como existe uma potencial limitação de direitos fundamentais, deve-se exigir que as solicitações pela Abin sejam acompanhadas de motivação demonstrativa da necessidade dos dados pretendidos e a adequação da solicitação às finalidades legais. Isso é indispensável para que, se provocado, o Poder Judiciário realize o controle de constitucionalidade e de legalidade, examinando sua conformidade aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e precipuamente garantindo os direitos fundamentais.

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c) Comunicações telefônicas ou dados sujeitos à reserva de jurisdição não podem ser compartilhados O ordenamento jurídico nacional prevê situações nas quais se impõe a necessidade de análise e autorização prévia do Poder Judiciário. Isso se dá, por exemplo, nos casos de interceptações em dispositivos e dados telemáticos. A esse respeito, a CF estabeleceu ser essencial a intervenção e autorização prévia do Estado-juiz, sem o que qualquer ação de autoridade estatal será ilegítima. Dessa maneira, deve-se interpretar o art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.883/99 no sentido de que se deve respeitar a reserva de jurisdição. O sistema constitucional garante o direito à privacidade das pessoas, nele incluído o segredo dos dados e de comunicações telemáticas e telefônicas, entendido, o último, como o não compartilhamento das informações sem prévia autorização judicial. d) necessidade de procedimento formal e de sistemas eletrônicos de segurança e registro de acesso O Ministro Dias Toffoli reforçou a importância de a Administração Pública trabalhar na formalidade, com protocolos, até para possibilitar eventual responsabilização em casos de omissões e abusos na defesa do Estado. Voto vencido Vencido o ministro Marco Aurélio, que indeferiu a liminar pleiteada. A seu ver, o parágrafo único do art. 4º prevê apenas um diálogo entre os órgãos de inteligência e não surge conflitante com o texto constitucional. Além disso, o ministro não entreviu o risco, inexistente até hoje, de se manter hígido o citado dispositivo. Para ele, não existe sequer ambiguidade que pudesse merecer interpretação.

TRIBUNAIS DE CONTAS Compete aos Tribunais de Contas dos Estados, com exclusividade, a iniciativa legislativa

de norma que disponha sobre sua organização e funcionamento

É inconstitucional lei estadual, de origem (iniciativa) parlamentar, que discipline a organização e o funcionamento do Tribunal de Contas estadual (TCE).

Isso porque os Tribunais de Contas possuem reserva de iniciativa (competência privativa) para apresentar os projetos de lei que tenham por objetivo tratar sobre a sua organização ou o seu funcionamento (art. 96, II c/c arts. 73 e 75 da CF/88).

Os Tribunais de Contas, conforme reconhecido pela CF/88 e pelo STF, gozam das prerrogativas da autonomia e do autogoverno, o que inclui, essencialmente, a iniciativa privativa para instaurar processo legislativo que pretenda alterar sua organização e funcionamento.

STF. Plenário. ADI 4191, Rel. Roberto Barroso, julgado em 22/05/2020 (Info 986 – clipping).

Imagine a seguinte situação: Foi editada, no Rio de Janeiro, uma Lei Complementar estadual tratando sobre a organização e o funcionamento do Tribunal de Contas estadual (TCE/RJ). Ocorre que essa lei foi fruto de um projeto de iniciativa parlamentar, ou seja, foi um Deputado Estadual quem apresentou o projeto aprovado. Diante disso, indaga-se: há algum vício neste caso pelo fato de a lei ser de origem parlamentar? SIM. Há, no presente caso, inconstitucionalidade FORMAL, por vício de iniciativa. A Constituição Federal confere aos Tribunais de Contas as prerrogativas da autonomia e do autogoverno, o que inclui a iniciativa reservada para iniciar os projetos de lei que tratem sobre sua organização e funcionamento. Isso se encontra previsto no art. 96, II, “d”, da CF/88:

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Art. 96. Compete privativamente: (...) II - ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169: (...) d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;

A referida lei estadual tratou sobre a organização e o funcionamento do Tribunal de Contas estadual sem que o processo legislativo tenha sido iniciado pela Corte de Contas, o que viola, portanto, o art. 96, “d”, da CF/88. Mas esse art. 96 da CF/88 aplica-se aos Tribunais de Contas? SIM. Por força de expressa remissão feita pelo art. 73 da CF/88:

Art. 73. O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, exercendo, no que couber, as atribuições previstas no art. 96.

Desse modo, os Tribunais de Contas, assim como o Poder Judiciário, possuem competência privativa para iniciar o processo legislativo relativamente às matérias previstas no art. 96, II, da Constituição Federal. Logo, esta emenda constitucional aprovada pela ALE/RN, de iniciativa parlamentar, ao tratar sobre as competências do Tribunal de Contas, violou a reserva de iniciativa legislativa privativa do próprio Tribunal de Contas. O art. 73 fala que o art. 96 é aplicado para o Tribunal de Contas da União... Ele pode ser utilizado também para os Tribunais de Contas dos Estados? SIM. Os Tribunais de Contas dos Estados são organizados pelas Constituições Estaduais. Contudo, por força do princípio da simetria, as regras do TCU também são aplicadas, no que couber, aos TCE’s, conforme determina o art. 75 da CF:

Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios. Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.

Assim, o art. 96 da CF/88, que se aplica ao TCU (por força do art. 73) também vale para os TCE´s, com base no art. 75. Em suma:

É inconstitucional lei estadual, de origem (iniciativa) parlamentar, que discipline sobre a organização e o funcionamento do Tribunal de Contas estadual (TCE). Isso porque os Tribunais de Contas possuem reserva de iniciativa (competência privativa) para apresentar os projetos de lei que tenham por objetivo tratar sobre a sua organização ou o seu funcionamento (art. 96, II c/c arts. 73 e 75 da CF/88). Os Tribunais de Contas, conforme reconhecido pela CF/88 e pelo STF, gozam das prerrogativas da autonomia e do autogoverno, o que inclui, essencialmente, a iniciativa privativa para instaurar processo legislativo que pretenda alterar sua organização e funcionamento. STF. Plenário. ADI 4191, Rel. Roberto Barroso, julgado em 22/05/2020 (Info 986 – clipping).

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A violação a essa prerrogativa de instaurar o processo legislativo privativo traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente concretizado. Em outras palavras, é inconstitucional a lei estadual tratando sobre a organização e funcionamento do TCE que não tenha sido iniciada pelo próprio TCE. Esse mesmo raciocínio acima explicado vale para uma emenda constitucional? Se os Deputados Estaduais tivessem apresentado uma proposta de emenda constitucional tratando sobre a organização e o funcionamento do TCE e esta proposição fosse aprovada, ela também seria inconstitucional? SIM. No modelo federativo, a autonomia dos Estados não é plena, uma vez balizada pela Constituição Federal. Assim, o poder constituinte reformador nos Estados não ostenta a mesma amplitude do poder constituinte reformador da Constituição Federal. Desse modo, as regras de reserva de iniciativa previstas na Constituição Federal não podem ser burladas pelo poder constituinte reformador dos Estados. Em virtude disso, não é possível que uma emenda à Constituição Estadual, de iniciativa parlamentar, trate sobre os assuntos previstos no art. 96, II, da CF/88. Foi o que decidiu recentemente o STF:

Os Tribunais de Contas possuem reserva de iniciativa (competência privativa) para deflagrar o processo legislativo que tenha por objeto alterar a sua organização ou o seu funcionamento (art. 96, II c/c arts. 73 e 75 da CF/88). Trata-se de uma prerrogativa que decorre da independência e autonomia asseguradas às Cortes de Contas. Assim, é inconstitucional lei estadual ou mesmo emenda à Constituição do Estado, de iniciativa parlamentar, que trate sobre organização ou funcionamento do TCE. A promulgação de emenda à Constituição Estadual não constitui meio apto para contornar (burlar) a cláusula de iniciativa reservada. STF. Plenário. ADI 5323/RN, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 11/4/2019 (Info 937).

DIREITO ADMINISTRATIVO

CONCURSO PÚBLICO Estado responde subsidiariamente caso a prova do concurso público seja suspensa ou cancelada

por indícios de fraude; a responsabilidade direta é da instituição organizadora

Importante!!!

O Estado responde subsidiariamente por danos materiais causados a candidatos em concurso público organizado por pessoa jurídica de direito privado (art. 37, § 6º, da CRFB/88), quando os exames são cancelados por indícios de fraude.

STF. Plenário. RE 662405, Rel. Luiz Fux, julgado em 29/06/2020 (Repercussão Geral – Tema 512) (Info 986 – clipping).

A situação, com adaptações, foi a seguinte: Em 2007, foi aberto concurso para o cargo de Policial Rodoviário Federal, com vagas apenas para os Estados do Pará e Mato Grosso. Como se sabe, o Departamento de Polícia Rodoviária Federal é um órgão da União. No entanto, não era a União quem estava executando diretamente o concurso. Como sempre acontece na prática, a União

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 8

contratou uma instituição para executar as etapas do concurso (receber as inscrições, elaborar as questões, aplicar as provas, corrigir, classificar etc.). A instituição contratada foi a Fundação Universitária José Bonifácio (FUJB), pessoa jurídica de direito privado ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). As provas estavam marcadas para o dia 08/12/2007, domingo. Ocorre que, na sexta-feira anterior, dia 06/12/2007, uma pessoa foi detida em São João de Meriti, baixada fluminense, com cópia das questões do concurso que ainda iria acontecer. Segundo restou apurado, o suspeito estaria cobrando R$ 40 mil pelo gabarito da prova. Diante desse fato, no sábado, véspera da prova, o concurso foi suspenso. Situação específica de João João, que morava em Alagoas, se inscreveu no concurso concorrendo para uma vaga no Pará. Ele comprou uma passagem de Maceió (AL) para Belém (PA), chegando na sexta à noite na capital paraense. De lá seguiu para o hotel que havia reservado. No domingo, dia da prova, quando estava tomando café, João ficou sabendo que o concurso havia sido suspenso em razão da suspeita de fraude. Depois de voltar para casa, ele ajuizou ação de indenização por danos materiais contra a União e contra a Fundação Universitária José Bonifácio pedindo o ressarcimento pelas despesas com a inscrição no concurso, passagem aérea, transporte terrestre e hospedagem. A União contestou a demanda arguindo, dentre outros argumentos, que contratou uma instituição para a realização das provas e que, portanto, essa entidade é que seria a única responsável pelos danos causados aos candidatos em virtude da quebra contratual de sigilo na elaboração das provas. Vale ressaltar que o contrato firmado entre a União e a fundação previa que a responsabilidade pelos danos causados em virtude da anulação das provas seria da instituição contratada: “Compete à CONTRATADA: (...) 3.1.24 – arcar com os prejuízos decorrentes de anulações de provas, ou de avaliações já realizadas ou de alterações de datas de suas aplicações, quando os motivos ensejadores desses fatos forem de responsabilidade exclusiva da CONTRATADA. (…) 3.1.30 – assegurar absoluto sigilo quanto ao conteúdo das provas até o momento de sua aplicação, sendo de sua plena e inteira responsabilidade a adoção dos atos e medidas necessárias para a apuração de responsabilidade quanto ao possível vazamento de informações confidenciais, arcando inclusive com todos e quaisquer ônus e despesas decorrentes da quebra de sigilo, desde que haja culpa exclusiva da CONTRATADA, conforme obrigações contratuais desta cláusula”. A Fundação contratada para a execução do concurso terá responsabilidade civil neste caso? Considerando que a Fundação em tela é uma pessoa jurídica de direito privado, a responsabilidade será subjetiva ou objetiva? SIM. A Fundação contratada terá responsabilidade civil objetiva. Isso porque a fundação estava desempenhando um serviço público. O contrato administrativo firmado entre a Administração e a instituição organizadora tinha por objeto a realização de um serviço público, consistente na elaboração e condução de concurso público. Logo, deve-se aplicar o art. 37, § 6º, da Constituição Federal:

Art. 37 (...) § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 9

A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva e decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. E o Estado que contratou a instituição, também terá responsabilidade? O Estado deve responder civilmente pelos danos materiais causados aos candidatos em concurso público relacionados com as despesas de inscrição e de deslocamento para cidades diversas daquelas em que mantenham domicílio, quando a prova é cancelada por ato da própria Administração Pública em virtude da existência de indícios de fraude no certame? SIM. No entanto, a responsabilidade principal é da instituição contratada e o Poder Público responde apenas de forma subsidiária. Como consequência, para o Estado ser condenado a indenizar, deve haver a comprovação de que a instituição organizadora se tornou insolvente. Pessoa jurídica de direito privado possui autonomia e age por sua conta e risco A pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público responde diretamente por danos causados a terceiros, considerando que possui personalidade jurídica, patrimônio e capacidade próprios. Essa é uma entidade distinta do Estado e age por sua conta e risco, devendo arcar com suas próprias obrigações. O ente estatal, nessas hipóteses, responderá apenas de forma subsidiária, quando a entidade de direito privado se torna insolvente. O STF afirmou que deveria ser aplicado o mesmo raciocínio utilizado para as concessionárias de serviço público. Nesse sentido:

“Essas entidades de Direito Privado, prestadoras de serviços públicos, respondem em nome próprio, com seu patrimônio, e não o Estado por elas e nem com elas. E assim é pelas seguintes razões: 1) o objetivo da norma constitucional, como visto, foi estender aos prestadores de serviços públicos a responsabilidade objetiva idêntica a do Estado, atendendo reclamo da doutrina ainda sob o regime constitucional anterior. Quem tem os bônus deve suportar os ônus; 2) as pessoas jurídicas prestadoras de serviços públicos têm personalidade jurídica, patrimônio e capacidade próprios. São seres distintos do Estado, sujeitos de direitos e obrigações, pelo que agem por sua conta e risco, devendo responder por suas próprias obrigações; 3) nem mesmo de responsabilidade solidária é possível falar neste caso, porque a solidariedade só pode advir da lei ou do contrato, inexistindo norma legal atribuindo solidariedade ao Estado com os prestadores de serviços públicos. Antes pelo contrário, o art. 25 da Lei n.º 8.927/1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, estabelece responsabilidade direta e pessoal da concessionária por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros; 4) no máximo, poder-se-ia falar em responsabilidade subsidiária do Estado, uma vez exauridos os recursos da entidade prestadora de serviços públicos. Se o Estado escolheu mal aquele a quem atribuiu a execução de serviços públicos, deve responder subsidiariamente caso o mesmo se torne insolvente.” (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 305-306)

Repetindo: Quando o concurso público é organizado por pessoa jurídica de direito privado, a entidade organizadora do certame possui responsabilidade DIRETA pelos danos causados aos candidatos inscritos, consistentes nas despesas efetuadas com a inscrição no certame, passagem aérea e transporte terrestre. Ao Estado caberá somente a responsabilidade SUBSIDIÁRIA, caso a instituição organizadora venha a se tornar insolvente. Não se deve penalizar diretamente o Poder Público por fraude em certame organizado por pessoa jurídica de direito privado, que, por cláusula contratual, estava obrigada a preservar o conteúdo dos exames aplicados.

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10

Tese fixada

O Estado responde subsidiariamente por danos materiais causados a candidatos em concurso público organizado por pessoa jurídica de direito privado (art. 37, § 6º, da CRFB/88), quando os exames são cancelados por indícios de fraude. STF. Plenário. RE 662405, Rel. Luiz Fux, julgado em 29/06/2020 (Repercussão Geral – Tema 512) (Info 986 – clipping).

Votos vencidos O placar acima foi bem apertado e ficaram vencidos os Ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que entendiam que o Estado, nesses casos, não tem responsabilidade nem mesmo subsidiária.

DIREITO PENAL

LEI DE DROGAS O autor da conduta do art. 28 da LD deve ser encaminhado diretamente ao juiz, que irá lavrar o termo circunstanciado e fará a requisição dos exames e perícias; somente se não houver juiz é

que tais providências serão tomadas pela autoridade policial; essa previsão é constitucional

Importante!!!

O STF, interpretando os §§ 2º e 3º do art. 48 da Lei nº 11.343/2006, afirmou que o autor do crime previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006 deve ser encaminhado imediatamente ao juiz e o próprio magistrado irá lavrar o termo circunstanciado e requisitar os exames e perícias necessários.

Se não houver disponibilidade do juízo competente, deve o autor ser encaminhado à autoridade policial, que então adotará essas providências (termo circunstanciado e requisição).

Não há qualquer inconstitucionalidade nessa previsão. Isso porque a lavratura de termo circunstanciado e a requisição de exames e perícias não são atividades de investigação.

Considerando-se que o termo circunstanciado não é procedimento investigativo, mas sim uma mera peça informativa com descrição detalhada do fato e as declarações do condutor do flagrante e do autor do fato, deve-se reconhecer que a possibilidade de sua lavratura pela autoridade judicial (magistrado) não ofende os §§ 1º e 4º do art. 144 da Constituição, nem interfere na imparcialidade do julgador.

As normas dos §§ 2º e 3º do art. 48 da Lei nº 11.343/2006 foram editadas em benefício do usuário de drogas, visando afastá-lo do ambiente policial, quando possível, e evitar que seja indevidamente detido pela autoridade policial.

STF. Plenário. ADI 3807, Rel. Cármen Lúcia, julgado em 29/06/2020 (Info 986 – clipping).

Porte de droga para consumo pessoal A Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) prevê o crime de posse/porte de droga para consumo pessoal nos seguintes termos:

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Tese de que o art. 28 não seria crime Assim que essa Lei foi editada, o saudoso Luiz Flávio Gomes defendeu a tese de que o porte/posse de droga para consumo pessoal havia deixado de ser crime. Em outras palavras, LFG sustentou que o art. 28 não traria a definição de crime, já que ele não prevê pena privativa de liberdade nem multa. Logo, estaria “fora” do conceito de crime trazido pela Lei de Introdução ao Código Penal (DL 3.914/1941):

Art. 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

O STF aceitou essa tese? NÃO. O STF decidiu que o art. 28 da Lei de Drogas, mesmo sem prever pena privativa de liberdade, continua definindo conduta criminosa. Assim, não houve uma descriminalização da conduta (abolitio criminis), mas sim uma despenalização. A despenalização ocorre quando o legislador prevê sanções alternativas para o crime que não sejam penas privativas de liberdade. Nesse sentido: STF. 1ª Turma. RE 430105 QO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 13/02/2007. Assim, não há dúvidas de que o art. 28 da Lei de Drogas possui natureza jurídica de CRIME, mas não enseja, em nenhuma hipótese, a aplicação de pena privativa de liberdade. Procedimento no caso do crime do art. 28 O crime do art. 28 da LD é infração de menor potencial ofensivo. Em razão disso, o § 1º do art. 48 da Lei nº 11.343/2006 determina que se aplica o rito dos juizados especiais, com algumas peculiaridades previstas nos §§ 2º a 5º do mesmo artigo:

Art. 48. O procedimento relativo aos processos por crimes definidos neste Título rege-se pelo disposto neste Capítulo, aplicando-se, subsidiariamente, as disposições do Código de Processo Penal e da Lei de Execução Penal. § 1º O agente de qualquer das condutas previstas no art. 28 desta Lei, salvo se houver concurso com os crimes previstos nos arts. 33 a 37 desta Lei, será processado e julgado na forma dos arts. 60 e seguintes da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Criminais. (...)

Não haverá prisão em flagrante, devendo o usuário ser levado imediatamente para audiência judicial Um ponto importante sobre o tema é que, no caso do art. 28 da LD, não haverá prisão em flagrante, devendo o autor do fato que foi encontrado com a droga ser encaminhado imediatamente ao juízo competente. E o que acontece se não for possível encaminhar o usuário imediatamente para a presença do juiz? Na falta do juiz competente, o indivíduo deverá ser levado para a autoridade policial que irá: • lavrar um termo circunstanciado de ocorrência (TCO); • requisitar os exames e perícias necessárias (inclusive exame de corpo de delito);

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12

• colher do autor do fato o compromisso (assinatura) de que ele irá comparecer à audiência judicial quando esta for designada.

Isso está previsto nos §§ 2º e 3º do art. 48 da Lei nº 11.343/2006:

Art. 48 (...) § 2º Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários. § 3º Se ausente a autoridade judicial, as providências previstas no § 2º deste artigo serão tomadas de imediato pela autoridade policial, no local em que se encontrar, vedada a detenção do agente.

Depois de encerradas as providências previstas no § 2º, o agente deverá ser submetido a exame de corpo de delito, se assim requerer ou se a autoridade policial entender conveniente, e, em seguida, ser liberado:

Art. 48 (...) § 4º Concluídos os procedimentos de que trata o § 2º deste artigo, o agente será submetido a exame de corpo de delito, se o requerer ou se a autoridade de polícia judiciária entender conveniente, e em seguida liberado.

Agora que você entendeu o panorama geral, vamos voltar um pouco para o momento em que o usuário de droga é encaminhado ao juiz (§ 2º). O que o magistrado irá fazer ao receber o autor do fato? É o juiz que deverá tomar as providências previstas no § 2º do art. 48 (lavrar termo circunstanciado, requisitar perícia etc.) ou isso é uma atribuição do Delegado? Sobre o tema, surgiram duas correntes:

Posse/porte de drogas para consumo pessoal e encaminhamento do autor do fato ao juiz Qual é o papel da autoridade judicial no caso dos §§ 2º e 3º do art. 48 da Lei nº 11.343/2006?

O juiz que irá lavrar o termo circunstanciado e requisitará os exames e perícias?

1ª corrente: NÃO 2ª corrente: SIM

Cabe sempre à autoridade POLICIAL (e não ao juiz) a lavratura do termo circunstanciado e a requisição dos exames e perícias pertinentes.

O autor da conduta do art. 28 deve ser encaminhado diretamente à autoridade judicial, que irá lavrar o termo circunstanciado e fará a requisição dos exames e perícias necessários. Somente se não houver juiz é que tais providências serão tomadas pelo Delegado de Polícia.

“Encontrado com droga, [o autor] deve ser levado à presença da autoridade policial, pois a esta caberá avaliar, em primeiro lugar, se é consumo pessoal ou tráfico. Entendendo tratar-se de consumo, deve ser lavrado termo circunstanciado, direcionando o usuário ao Juizado Especial Criminal, onde poderá, transacionando, receber advertência ou ser obrigado a cumprir prestação de serviço à comunidade ou frequentar cursos e programas educativos. Inexistindo JECRIM disponível na localidade ou no momento da detenção do agente, lavra-se termo circunstanciado e providencia-se os demais

“Normalmente, o agente que se encontra em posse de droga para consumo pessoal acaba sendo capturado por agente militar ou civil (ou federal). (...) Concretizada a captura do agente (e feita a apreensão da droga ou da planta tóxica) cabe ao condutor (pessoa que efetuou a captura) levar o autor do fato (imediatamente) ao juízo competente. (...) A nova Lei de Drogas priorizou o “juízo competente”, em detrimento da autoridade policial. Ou seja: do usuário de droga não deve se ocupar a polícia (em regra). Esse assunto configura uma questão de saúde pessoal e pública, logo, não

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13

exames e perícias. O autor da infração, segundo a lei, deve assumir o compromisso de comparecer ao JECRIM, quando chamado.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 5ª ed. São Paulo: RT, 2010, p. 401)

é um fato do qual deve cuidar a autoridade policial. A lógica da Lei nova pressupõe Juizados (ou juízes) de plantão, vinte e quatro horas. Isso seria o ideal. Sabemos, entretanto, que na prática nem sempre haverá juiz (ou Juizado) de plantão. (...) Se não existe autoridade judicial de plantão, uma vez capturado o agente do fato (com drogas ou planta tóxica), será ele conduzido à presença da autoridade policial (...) que tomará as providências indicadas no § 2º” (GOMES, Luiz Flávio. Lei de Drogas comentada. 6ª ed. São Paulo: RT, 2014).

Qual foi a corrente adotada pelo STF? A segunda. Para a Min. Cármen Lúcia, essa segunda interpretação é a que melhor atende à finalidade dos arts. 28 e 48 da Lei nº 11.343/2006, que buscaram a despenalização do usuário de drogas. Assim, havendo disponibilidade do juízo competente, o autor do crime previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006 deve ser até ele encaminhado imediatamente, para lavratura do termo circunstanciado e requisição dos exames e perícias necessários. Se não houver disponibilidade do juízo competente, deve o autor ser encaminhado à autoridade policial, que então adotará as providências previstas no § 2º do art. 48 da Lei n. 11.343/2006. Com a determinação de encaminhamento imediato do usuário de drogas ao juízo competente, afasta-se qualquer possibilidade de que o usuário de drogas seja preso em flagrante ou detido indevidamente pela autoridade policial. STF. Plenário. ADI 3807, Rel. Cármen Lúcia, julgado em 29/06/2020 (Info 986 – clipping).

Essa previsão (e interpretação) dos §§ 2º e 3º do art. 48 da Lei de Drogas possui alguma inconstitucionalidade? A previsão viola de algum modo o papel do juiz no sistema acusatório considerando que ele estaria praticando atos de investigação? NÃO. Isso porque a lavratura de termo circunstanciado e a requisição de exames e perícias não são atividades de investigação. Logo, os §§ 2º e 3º do art. 48 da Lei nº 11.343/2006 não atribuíram ao órgão judicial competências de polícia judiciária, considerando que a lavratura de termo circunstanciado de ocorrência NÃO configura, repito, ato de investigação. Embora substitua o inquérito policial como principal peça informativa dos processos penais que tramitam nos juizados especiais, o termo circunstanciado não é procedimento investigativo. Segundo explica Ada Pellegrini Grinover, “o termo circunstanciado (…) nada mais é do que um boletim de ocorrência mais detalhado” (GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Juizados especiais criminais: comentários à Lei 9.099, de 26.09.1995. 5ª ed. São Paulo: RT, 2005, p. 118).

Considerando-se que o termo circunstanciado não é procedimento investigativo, mas sim uma mera peça informativa com descrição detalhada do fato e as declarações do condutor do flagrante e do autor do fato, deve-se reconhecer que a possibilidade de sua lavratura pela autoridade judicial (magistrado) não ofende os §§ 1º e 4º do art. 144 da Constituição, nem interfere na imparcialidade do julgador. As normas dos §§ 2º e 3º do art. 48 da Lei nº 11.343/2006 foram editadas em benefício do usuário de drogas, visando afastá-lo do ambiente policial quando possível e evitar que seja indevidamente detido pela autoridade policial. STF. Plenário. ADI 3807, Rel. Cármen Lúcia, julgado em 29/06/2020 (Info 986 – clipping).

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) O STF decidiu que é inconstitucional o parágrafo único do art. 4º da Lei 9.883/99, que prevê que os órgãos

que compõem o Sisbin deverão fornecer à Abin dados e conhecimentos específicos relacionados com a defesa das instituições e dos interesses nacionais. ( )

2) Compete à Assembleia Legislativa a iniciativa legislativa de norma que disponha sobre sua organização e funcionamento do Tribunal de Contas do Estado. ( )

3) O Estado responde subsidiariamente por danos materiais causados a candidatos em concurso público organizado por pessoa jurídica de direito privado (art. 37, § 6º, da CRFB/88), quando os exames são cancelados por indícios de fraude. ( )

4) Havendo disponibilidade do juízo competente, o autor do crime previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006 deve ser até ele encaminhado imediatamente, para lavratura do termo circunstanciado e requisição dos exames e perícias necessários. Se não houver disponibilidade do juízo competente, deve o autor ser encaminhado à autoridade policial, que então adotará as providências previstas no § 2º do art. 48 da Lei n. 11.343/2006. ( )

5) A lavratura de termo circunstanciado é atividade de investigação, sendo atribuição exclusiva da autoridade policial. ( )

Gabarito

1. E 2. E 3. C 4. C 5. E

OUTRAS INFORMAÇÕES

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos Julgamentos por meio

eletrônico*

Em curso Finalizados

Pleno 12.08.2020 13.08.2020 4 1 178

1ª Turma — — — — 333

2ª Turma — — — — 128

* Emenda Regimental 52/2019-STF. Sessão virtual de 7 a 17 de agosto de 2020.

CLIPPING DAS SESSÕES VIRTUAIS DJE DE 10 A 14 DE AGOSTO DE 2020

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.191

RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, julgou procedente o pedido formulado na ação direta para declarar a

inconstitucionalidade da Lei Complementar Estadual nº 124, de 16 de janeiro de 2009, do Estado do Rio de Janeiro, e,

por conseguinte, a nova redação conferida à Lei Complementar nº 63/1990, nos termos do voto do Relator. Plenário,

Sessão Virtual de 15.5.2020 a 21.5.2020.

NORMA DE INICIATIVA PARLAMENTAR QUE MODIFICA A LEI ORGÂNICA DO TRIBUNAL DE CONTAS

DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Compete aos Tribunais de Contas dos Estados,

com exclusividade, a iniciativa legislativa de norma que disponha sobre sua organização e funcionamento (CF, arts. 73,

75 e 96, II, d). Precedentes: ADI 3.223, rel. Min. Dias Toffoli; ADI 4.643, rel. Min. Luiz Fux; ADI 4.418, rel. Min. Dias

Toffoli. 2. Os Tribunais de Contas estaduais gozam das prerrogativas constitucionais de autonomia e autogoverno. Não

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Informativo comentado

Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15

se submetem às Assembleias Legislativas (CF, arts. 73 e 75). Precedentes: ADI 119, rel. Min. Dias Toffoli; ADI 4.190-

MC, rel. Min. Celso de Mello. 3. Ação julgada procedente.

AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 3.337

RELATOR: MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, julgou procedente o pedido formulado na ação para determinar à União que se

abstenha de restringir, com base na Lei nº 9.717/1998, bem como nas regulamentações constantes no Decreto nº

3.788/1998 e nas Portarias MPS nº 204/2008 e nº 403/2008, a emissão do Certificado de Regularidade Previdenciária

(CRP) ao Estado do Pará, em relação à possível inobservância da Lei nº 9.717/1998, em decorrência da alteração

promovida pela Lei Complementar Estadual nº 115/2017, e condenou a União ao pagamento de honorários

sucumbenciais, arbitrados em R$ 4.000,00 (quatro mil reais), com fundamento no art. 85, § 8º, do CPC/2015, nos termos

do voto do Relator. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

EMENTA: AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. EMISSÃO DE CERTIFICADO DE REGULARIDADE

PREVIDENCIÁRIA. LEI 9.717/1998. DECRETO 3.788/2001. PORTARIAS DO MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA

SOCIAL 204/2008 E 403/2008. COMPETÊNCIA CONCORRENTE DA UNIÃO, DOS ESTADOS E DO DISTRITO

FEDERAL PARA LEGISLAR SOBRE MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA. COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA

ESTABELECER NORMAS GERAIS. ART. 24, XII, DA CF/88. ARTIGOS 7º, I A III, E 9º DA LEI FEDERAL

9.717/1998. EXTRAVASAMENTO DO CAMPO ALUSIVO A NORMAS GERAIS. INCOMPATIBILIDADE COM A

CONSTITUIÇÃO. PRECEDENTES. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE. PEDIDO

DE SOBRESTAMENTO. INDEFERIMENTO.AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA JULGADA PROCEDENTE. 1 - Pedido

de renovação do Certificado de Regularidade Previdenciário bloqueado, pela União, em face de supostas irregularidades

na edição da Lei Estadual 115/2017. 2 - A União, os Estados e o Distrito Federal são competentes, de forma concorrente,

para legislar sobre previdência social, nos termos do disposto no art. 24 da Constituição Federal. A competência da União

deverá limitar-se ao estabelecimento de normas gerais, nos termos do parágrafo primeiro do mesmo diploma legal. 3 -

Incabível o pedido de sobrestamento dos autos até o julgamento, pelo Plenário da CORTE, do mérito de repercussão geral

reconhecida, considerando que a suspensão prevista no artigo 1.035, § 5º, do CPC/2015, não alcança as ações originárias

da própria CORTE, em razão da urgência e relevância dos temas. 4 - Ação Cível Originária julgada PROCEDENTE, para

determinar à União que se abstenha de restringir, com base na Lei 9.717/1998, bem como nas regulamentações constantes

no Decreto 3788/1998 e nas Portarias MPS 204/2008 e 403/2008, a emissão do Certificado de Regularidade

Previdenciária (CRP) ao Estado do Pará, em relação à possível inobservância da Lei 9.717/1998, em decorrência da

alteração promovida pela Lei Complementar Estadual 115/2017. Honorários sucumbenciais, fixados, em desfavor da

União, em R$ 4.000,00 (quatro mil reais), com fundamento no art. 85, § 8º, do CPC/2015.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.807

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado na ação direta, nos termos do voto da Relatora,

vencido o Ministro Marco Aurélio. Os Ministros Roberto Barroso e Gilmar Mendes acompanharam a Relatora com

ressalvas. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 3º DO ART. 48 DA LEI N. 11.343/2006.

PROCESSAMENTO DO CRIME PREVISTO NO ART. 28 DA LEI N. 11.343/2006. ATRIBUIÇÃO À AUTORIDADE

JUDICIAL DE LAVRATURA DE TERMO CIRCUNSTANCIADO E REQUISIÇÃO DOS EXAMES E PERÍCIAS

NECESSÁRIOS. CONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE ATO DE INVESTIGAÇÃO. INOCORRÊNCIA

DE ATRIBUIÇÃO DE FUNÇÃO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA AO PODER JUDICIÁRIO. AÇÃO DIRETA JULGADA

IMPROCEDENTE.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.159

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

Decisão: O Tribunal, por maioria, rejeitou o aditamento formulado pelo Autor em seu parecer oferecido após as

informações prestadas no caso, julgou o pedido prejudicado quanto ao art. 17 da Lei Complementar catarinense nº

339/2006 e improcedente quanto aos demais dispositivos, nos termos do voto da Relatora, vencido o Ministro Marco

Aurélio. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DISPOSITIVOS DA LEI COMPLEMENTAR N.

339/2006, DE SANTA CATARINA. PEDIDO DE ADITAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. ALTERAÇÃO

SUBSTANCIAL DO ART. 17 DA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N. 339/2006. PEDIDO PREJUDICADO EM

PARTE. DIVISÃO E ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIAS EM SANTA CATARINA. ATUAÇÃO DO TRIBUNAL DE

JUSTIÇA NA DEFINIÇÃO DE UNIDADES DE DIVISÃO JUDICIÁRIA, DE SUBSEÇÕES, REGIÕES E

CIRCUNSCRIÇÕES JUDICIÁRIAS E NA INSTALAÇÃO DE COMARCAS. AUTONOMIA ADMINISTRATIVA

DO PODER JUDICIÁRIO. PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À AL. D DO INC. I E À AL. D DO INC.

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Informativo comentado

Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16

II DO ART. 96 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AÇÃO DIRETA PREJUDICADA QUANTO AO ART. 17

DA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N. 339/2006 E IMPROCEDENTE QUANTO AOS DEMAIS

DISPOSITIVOS.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.212

RELATORA: MIN. ROSA WEBER

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, julgou improcedente o pedido formulado na ação direta, nos termos do voto da

Relatora. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

EMENTA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO ADMINISTRATIVO. LEGITIMIDADE

ATIVA AD CAUSAM. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. ART. 103, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO ART. 107 DA LEI FEDERAL Nº 9.503/1997

(CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO – CTB) E DO ART. 2º, IV E SEUS PARÁGRAFOS, DO DECRETO Nº

44.035 DO ESTADO DE MINAS GERAIS, COM AS MODIFICAÇÕES REALIZADAS PELOS DECRETOS

ESTADUAIS Nº 44.081, Nº 44.604 E Nº 44.990. AUSÊNCIA DE ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL. TRANSPORTE

INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS. PODER DE POLÍCIA. TEMPO MÁXIMO DE USO. OFENSA À

COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. INOCORRÊNCIA. PRECEDENTES DESTA CORTE QUE ASSENTAM

A CONSTITUCIONALIDADE DA FIXAÇÃO DE NORMAS REGULAMENTARES PELOS ESTADOS COMO

DECORRÊNCIA DO RESPECTIVO PODER DE POLÍCIA EM RELAÇÃO À SEGURANÇA DO TRANSPORTE

INTERMUNICIPAL DE PASSAGEIROS. IMPROCEDÊNCIA. 1. Legitimidade ativa ad causam da Associação

Nacional dos Transportadores de Passageiros – ANTPAS (art. 103, IX, da Constituição da República). Associação que

congrega pessoas físicas e jurídicas dedicadas à exploração econômica de transporte de passageiros, na condição de

transportadora, locadora, agenciadora e serviços similares. Reconhecimento da pertinência temática com o objeto da

demanda. 2. Alegação de inconstitucionalidade material do art. 107 da Lei Federal nº 9.503/1997 (Código de Trânsito

Brasileiro – CTB) e do art. 2º, inciso IV e seus parágrafos, do Decreto nº 44.035 do Estado de Minas Gerais, com as

modificações posteriores realizadas pelos Decreto Estaduais nº 44.081, nº 44.604 e nº 44.990, que dispõem,

respectivamente, sobre as exigências em relação a veículos destinados ao transporte individual ou coletivo de passageiros;

e a autorização para a prestação de serviço fretado de transporte rodoviário intermunicipal de pessoas. 3. O art. 107 da

Lei Federal nº 9.503/1997 – Código de Trânsito Brasileiro – confere a possibilidade de o poder competente regular as

condições técnicas e de segurança de acordo com as peculiaridades relativas a cada ente. Não se trata de autorização para

legislar, nos termos do art. 22, parágrafo único, da Constituição Federal, que permanece incólume, mas de possibilidade

de regulamentação por meio do estabelecimento de normas técnicas, de higiene, de conforto e de segurança a serem

atendidas para a exploração da atividade de transporte individual ou coletivo de passageiros por veículos de aluguel.

Desnecessária a utilização da via da lei complementar, uma vez que não se está a falar de competência legislativa sobre

trânsito e transporte a ser exercida pelo Estado-membro. 5. Exercício do poder de polícia administrativa sobre os serviços

de transporte intermunicipal. Compete à União organizar as diretrizes básicas sobre a política nacional de transporte. Por

outro lado, cabe ao Estado-membro dispor sobre o transporte estadual e intermunicipal, ao passo que ao Município

incumbem as regras de interesse local. O Decreto Estadual nº 44.035/2005 e suas modificações posteriores têm nítida

natureza regulamentar, considerando que o CTB atribuiu aos poderes competentes a faculdade de regulamentar a matéria,

sem configuração de transferência aos Estados qualquer tipo de poder legiferante. Houve o disciplinamento de aspectos

da segurança do transporte intermunicipal de pessoas como exercício do poder de polícia do Estado de forma

proporcional, em todas as suas dimensões, mediante alterações progressivamente adotadas. Inexistência de

inconstitucionalidade. 6. Pedido julgado improcedente.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.288

RELATOR: MIN. EDSON FACHIN

REDATOR DO ACÓRDÃO: MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou procedente o pedido formulado na ação direta para declarar a

inconstitucionalidade da Lei nº 12.257/2006 do Estado de São Paulo, nos termos do voto do Ministro Alexandre de

Moraes, Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Edson Fachin (Relator), Cármen Lúcia e Dias Toffoli (Presidente).

Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 12.257/2006, DO ESTADO DE SÃO PAULO.

POLÍTICA DE REESTRUTURAÇÃO DAS SANTAS CASAS E HOSPITAIS FILANTRÓPICOS. INICIATIVA

PARLAMENTAR. INOBSERVÂNCIA DA EXCLUSIVIDADE DE INICIATIVA DO CHEFE DO PODER

EXECUTIVO. ATRIBUIÇÃO DE ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DESTINAÇÃO DE RECEITAS

PÚBLICAS. RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO. PEDIDO PROCEDENTE. 1. A Lei Estadual 12.257/2006, de

iniciativa parlamentar, dispõe sobre política pública a ser executada pela Secretaria de Estado da Saúde, com repercussão

direta nas atribuições desse órgão, que passa a assumir a responsabilidade pela qualificação técnica de hospitais

filantrópicos, e com previsão de repasse de recursos do Fundo Estadual de Saúde (art. 2º). 2. Inconstitucionalidade formal.

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Informativo comentado

Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17

Processo legislativo iniciado por parlamentar, quando a Constituição Federal (art. 61, § 1º, II, c e e) reserva ao chefe do

Poder Executivo a iniciativa de leis que tratem do regime jurídico de servidores desse Poder ou que modifiquem a

competência e o funcionamento de órgãos administrativos. 3. Ação Direta julgada procedente.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.410

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu da ação direta de inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido

formulado, nos termos do voto da Relatora. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. RESOLUÇÃO N. 71, DE 2009, DO CONSELHO

NACIONAL DE JUSTIÇA. DISCIPLINA SOBRE O PLANTÃO JUDICIÁRIO EM PRIMEIRO E SEGUNDO GRAUS

DE JURISDIÇÃO. ALEGADA INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 1º, 7º E 11. CONTROLE

ADMINISTRATIVO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA: COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL:

PRECEDENTES. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA PRIVATIVA DA UNIÃO (INC. I DO ART. 22 DA

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA): INOCORRÊNCIA DE OFENSA. CONCRETIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA

EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA. NORMAS PROCEDIMENTAIS DE NATUREZA ADMINISTRATIVA:

AUSÊNCIA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA CONCORRENTE PREVISTA NO INC. IX DO ART. 24 DA

CONSTITUIÇÃO. INOCORRÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA: DISTINTAS ATRIBUIÇÕES

DE TRIBUNAIS SUPERIORES E ÓRGÃOS JUDICIAIS. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

JULGADA IMPROCEDENTE.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.977

RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

Decisão: O Tribunal, por maioria, rejeitou as preliminares e julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação

direta, para declarar a inconstitucionalidade do art. 3º da Lei Estadual nº 16.784/2018 e a nulidade parcial, sem redução

de texto, do art. 1º da mesma lei, com o fim de excluir de sua incidência a coleta de animais nocivos por pessoas físicas

ou jurídicas, mediante licença da autoridade competente, e daquelas destinadas a fins científicos, previstas

respectivamente no art. 3º, § 2º, e art. 14, ambos da Lei nº 5.197/1967, nos termos do voto Relator, vencidos os Ministros

Marco Aurélio e Celso de Mello, que julgavam improcedente a ação. Falou, pelo amicus curiae Organização Não

Governamental Olhar Animal, o Dr. Ivan Fernandes da Silva Ramos. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEIO AMBIENTE. PROTEÇÃO DA FAUNA. LEI

16.784/2018 DO ESTADO DE SÃO PAULO. PROIBIÇÃO DA CAÇA SOB QUALQUER PRETEXTO.

PRELIMINAR. OFENSA DIRETA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MÉRITO. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

CONCORRENTE PARA DISPOR SOBRE CAÇA (CF, ART. 24, VI). RESTRIÇÃO DA CAÇA DE CONTROLE.

VEDAÇÃO DA CAÇA CIENTÍFICA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO

PEDIDO. I – A controvérsia não envolve mera afronta à legislação federal. O que está em debate é a possível invasão da

competência legislativa da União, em hipótese concorrente com os Estados-membros e o Distrito Federal (art. 24, V e

XII, da CF), a ensejar a análise de eventual e direta ofensa às regras constitucionais de repartição da iniciativa para projetos

de lei. II- Verificam-se, na hipótese, dois pontos de conflito entre a legislação do Estado de São Paulo e as regras

estabelecidas na CF no que: (i) envolve a prática de caça de controle (art. 3º da Lei 16.784/2018), que não é vedada em

absoluto na norma estadual, mas há exigência de que ela seja feita exclusivamente por órgãos públicos, sem a participação

de particulares; (ii) envolve a proibição da caça científica (art. 1º da Lei 16.784/2018). III- A norma impugnada padece

de vício parcial de inconstitucionalidade, por não se submeter, em sua integralidade, às regras de repartição de

competências legislativas, especialmente àquela cabível à União, a quem incumbe a estipulação de normas gerais para o

estabelecimento de diretrizes nacionais a este respeito, restando aos Estados-membros e ao Distrito Federal editar normas

particularizantes para aplicá-las em seus respectivos âmbitos políticos, e de acordo com suas realidades regionais. IV -

Preliminares rejeitadas e ação julgada parcialmente procedente, para declarar a inconstitucionalidade do art. 3º da Lei

Estadual 16.784/2018 e a nulidade parcial, sem redução de texto, do art. 1º da mesma lei, com o fim de excluir de sua

incidência a coleta de animais nocivos por pessoas físicas ou jurídicas, mediante licença da autoridade competente, e

daquelas destinadas a fins científicos, previstas respectivamente no art. 3º, § 2º, e art. 14, ambos da Lei 5.197/1967.

REFERENDO NA MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 6.308

RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO

Decisão: O Tribunal, por maioria, referendou a liminar concedida, para que, até o julgamento definitivo da ação, as

previsões dos §§ 3º, 3º-A, 4º, 6º, 7º, 8º e 9º do art. 113 da Constituição do Estado de Roraima, acrescidos pelas Emendas

Constitucionais nº 41/2014 e nº 61/2019, dos §§ 1º, 2º, 4º, 5º e 6º do art. 24 da Lei nº 1.327/2019 (Lei de Diretrizes

Orçamentárias), e do art. 8º da Lei nº 1.371/2020 (Lei Orçamentária Anual, para o exercício de 2020), ambas do Estado

de Roraima, observem os limites impostos pela Constituição Federal para as emendas parlamentares impositivas,

individuais e coletivas, com as alterações introduzidas pelas Emendas Constitucionais nº 86/2015 e nº 100/2019 (art. 166,

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Informativo comentado

Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18

§§ 9º e 12, da CF, combinados com o art. 2º da EC nº 100/2019), e, a fim de garantir o proveito prático da providência

determinada, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei nº 9.868/1999, o termo inicial de produção dos efeitos da presente medida

cautelar deve ser fixado no dia 1º de agosto de 2019, data de entrada em vigor da Lei nº 1.327/2019 (Lei de Diretrizes

Orçamentárias) do Estado de Roraima, nos termos do voto do Relator, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio,

que divergia do Relator apenas no que projeta a eficácia do pronunciamento referente à incompatibilidade com a

Constituição Federal. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

Ementa: DIREITO COSTITUCIONAL E FINANCEIRO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.

REFERENDO EM MEDIDA CAUTELAR. NORMAS ESTADUAIS QUE TRATAM DE EMENDAS

PARLAMENTARES IMPOSITIVAS EM MATÉRIA ORÇAMENTÁRIA. 1. Ação direta de inconstitucionalidade

contra dispositivos da Constituição do Estado de Roraima, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei Orçamentária

Anual (para o exercício de 2020) desse mesmo ente federado. As normas impugnadas estabelecem, em síntese, limites

para aprovação de emendas parlamentares impositivas em patamar diferente do imposto pelo art. 166, §§ 9º e 12, da

CF/1988, com a redação dada pelas Emendas Constitucionais nº 86/2015 e nº 100/2019, e pelo art. 2º da EC nº 100/2019.

2. Caracterização do perigo na demora. Riscos à gestão e ao planejamento públicos, que são agravados pelo quadro de

calamidade em saúde pública gerado pela pandemia de COVID-19. 3. Plausibilidade do direito alegado. Competência da

União para editar normas gerais de direito financeiro (art. 24, I, e § 1º, da CF/1988). Reserva de lei complementar federal

para a edição de normas gerais sobre elaboração da lei orçamentária anual, gestão financeira e critérios para execução das

programações de caráter obrigatório (art. 165, § 9º, da CF/1988). 4. A figura das emendas parlamentares impositivas em

matéria de orçamento público, tanto individuais como coletivas, foi introduzida no Estado de Roraima antes de sua

previsão no plano federal, que só ocorreu com as ECs nº 86/2015 e 100/2019. Legislação estadual que dispôs em sentido

contrário às normas gerais federais então existentes sobre o tema, o que não é admitido na seara das competências

concorrentes. Inexistência de constitucionalidade superveniente no Direito brasileiro. 5. Não bastasse isso, apesar de a

Constituição Federal ter passado a prever as emendas parlamentares impositivas em matéria orçamentária, fixou limites

diferentes daqueles que haviam sido adotados pelo Estado de Roraima. As normas da CF/1988 sobre o processo legislativo

das leis orçamentárias são de reprodução obrigatória pelo constituinte estadual. Aplicabilidade do princípio da simetria

na espécie. Precedentes. 6. Medida cautelar deferida, para que, até o julgamento definitivo da presente ação direta, as

previsões constantes dos §§ 3º, 3º-A, 4º, 6º, 7º, 8º e 9º, do art. 113, da Constituição do Estado de Roraima, acrescidos

pelas Emendas Constitucionais nº 41/2014 e nº 61/2019, dos §§ 1º, 2º, 4º, 5º e 6º, do art. 24, da Lei nº 1.327/2019 (Lei de

Diretrizes Orçamentárias), e do art. 8º da Lei nº 1.371/2020 (Lei Orçamentária Anual, para o exercício de 2020), ambas

do Estado de Roraima, observem os limites impostos pela Constituição Federal para as emendas parlamentares

impositivas, individuais e coletivas, com as alterações introduzidas pelas Emendas Constitucionais nº 86/2015 e nº

100/2019 (art. 166, §§ 9º e 12, da CF/1988, e art. 2º da EC nº 100/2019). 7. Aplicação do art. 11, § 1º, da Lei nº 9.868/1999,

para fixar como termo inicial de produção dos efeitos da presente medida cautelar o dia 1º de agosto de 2019, data de

entrada em vigor da Lei nº 1.327/2019 (Lei de Diretrizes Orçamentárias), do Estado de Roraima.

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 460

RELATOR: MIN. LUIZ FUX

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu da arguição de descumprimento de preceito fundamental e julgou

procedente o pedido formulado para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 6.496/2015

do Município de Cascavel/PR, nos termos do voto do Relator. Falaram: pelo amicus curiae Associação Nacional das

Defensoras e dos Defensores Públicos – ANADEP, o Dr. Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho; pelo amicus

curiae Instituto Mais Cidadania, o Dr. Roosevelt Arraes; e, pelo amicus curiae Associação Nacional dos Juristas

Evangélicos – ANAJURE, a Dra. Raíssa Paula Martins. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ARTIGO 2º, PARÁGRAFO

ÚNICO, DA LEI 6.496/2015 DO MUNICÍPIO DE CASCAVEL - PR. VEDAÇÃO DE “POLÍTICAS DE ENSINO QUE

TENDAM A APLICAR A IDEOLOGIA DE GÊNERO, O TERMO ‘GÊNERO’ OU ‘ORIENTAÇÃO SEXUAL’”.

USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE DIRETRIZES E BASES

DA EDUCAÇÃO. A PROIBIÇÃO GENÉRICA DE DETERMINADO CONTEÚDO, SUPOSTAMENTE

DOUTRINADOR OU PROSELITISTA, DESVALORIZA O PROFESSOR, GERA PERSEGUIÇÕES NO AMBIENTE

ESCOLAR, COMPROMETE O PLURALISMO DE IDEIAS, ESFRIA O DEBATE DEMOCRÁTICO E PRESTIGIA

PERSPECTIVAS HEGEMÔNICAS POR VEZES SECTÁRIAS. A CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE

SOLIDÁRIA, LIVRE E JUSTA PERPASSA A CRIAÇÃO DE UM AMBIENTE DE TOLERÂNCIA, A

VALORIZAÇÃO DA DIVERSIDADE E A CONVIVÊNCIA COM DIFERENTES VISÕES DE MUNDO.

PRECEDENTES ARGUIÇÃO CONHECIDA E JULGADO PROCEDENTE O PEDIDO. 1. A competência privativa da

União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional (artigo 22, XXIV, da Constituição Federal) impede que

leis estaduais, distritais e municipais estabeleçam princípios e regras gerais sobre ensino e educação, cabendo-lhes

somente editar regras e condições específicas para a adequação da lei nacional à realidade local (artigos 24, §§ 1º e 2º, e

30, I e II, CRFB). Precedentes: ADPF 457, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, julgado em 24/4/2020; ADPF 526,

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Informativo comentado

Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19

Rel. Min. Cármen Lúcia, Plenário, julgado em 8/5/2020; e ADPF 467, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, julgado em

28/5/2020. 2. A vedação da abordagem dos temas de “gênero” e de “orientação sexual” no âmbito escolar viola os

princípios da liberdade, enquanto pressuposto para a cidadania; da liberdade de ensinar e aprender; da valorização dos

profissionais da educação escolar; da gestão democrática do ensino; do padrão de qualidade social do ensino; da livre

manifestação do pensamento; e da livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,

independentemente de censura ou licença (artigos 1º, II e V; 5º, IV e IX; e 206, II, V, VI e VII, da Constituição Federal).

3. A cidadania, fundamento da República Federativa do Brasil assim como o pluralismo político, está consagrada na

Constituição ao lado de objetivos fundamentais de construção de uma sociedade livre, justa e solidária e de combate à

discriminação (artigos 1º, II e V; e 3º, I e IV, CRFB), sendo certo que o sistema político se funda na representação dos

diversos setores da sociedade, todos com liberdade para alcançar o poder por meio de processo político livre e democrático

e com educação que os habilite a exercer essa liberdade. 4. A neutralidade ideológica ou política pretendida pelo legislador

municipal, ao vedar a abordagem dos temas de “gênero” e “orientação sexual”, esteriliza a participação social decorrente

dos ensinamentos plurais adquiridos em âmbito escolar, mostrando-se não apenas inconstitucional, mas também

incompatível com o nosso ordenamento jurídico. 5. Os artigos 205 e 206 da Constituição Federal e os Parâmetros

Curriculares Nacionais do Ensino Médio, previstos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e em atos dos

demais agentes públicos especializados consubstanciam o arcabouço normativo que se alinha harmoniosamente para a

formação política do estudante, habilitando-o a exercer sua cidadania. 6. A renovação de ideias e perspectivas é um

elemento caro à democracia política, consoante consta do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e

Culturais, promulgado pelo Decreto 591, de 6 de julho de 1992, e no Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre

Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de São Salvador), promulgado pelo

Decreto 3.321, de 30 de dezembro de 1999, revelando exemplo de educação democrática. 7. O pluralismo de ideias, posto

integrar o conceito de educação, constitui dever também da família, cabendo-lhe zelar pela liberdade de aprendizado e

divulgação do pensamento, da arte e do saber, ao invés de condicionar à sua prévia concordância quanto ao conteúdo

acadêmico, sob pena de esvaziar a capacidade de inovação, a oportunidade de o estudante construir um caminho próprio,

diverso ou coincidente com o de seus pais ou professores. 8. A Constituição, para além do preparo para o exercício da

cidadania, estabelece que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, visa ao pleno desenvolvimento da

pessoa (artigo 205, CRFB). 9. A capacidade institucional da comunidade de especialistas em pedagogia, psicologia e

educação, responsável pelo desenho de políticas públicas no setor, impõe a virtude passiva e a deferência do Poder

Judiciário. Precedentes: RE 888.815, Relator p/ o acórdão Min. Alexandre de Moraes, Plenário, DJe de 21/3/2019; ADPF

292, Rel. Min. Luiz Fux, Plenário, julgado em 1º/8/2018; ADC 17, Relator p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, Plenário,

julgado em 1º/8/2018. 10. A escola assegura o olhar profissional sob as crianças e adolescentes, vez que professores,

pedagogos e psicólogos aliam a expertise com a impessoalidade, necessárias para assegurar uma formação mais ampla

do aluno. Não à toa, a Constituição previu a valorização dos profissionais da educação escolar como um dos princípios

do ensino (artigo 206, V, CRFB). 11. A Constituição Federal de 1988 erigiu a liberdade acadêmica à condição de direito

fundamental, notadamente por sua relação intrínseca e substancial com a liberdade de expressão, com o direito

fundamental à educação e com o princípio democrático. No mesmo sentido, destaca o Comitê dos Direitos Econômicos,

Sociais e Culturais das Nações Unidas, criado para avaliar o cumprimento da Declaração Universal dos Direitos Humanos

pelos países signatários. 12. A “gestão democrática do ensino público”, princípio previsto no artigo 206, VI, da CRFB,

exige redobrada cautela quando se refere ao conteúdo programático da escola, vez que, ao permitir que as entidades

religiosas e familiares ditem o conteúdo do ensino, o Estado legitimaria que as perspectivas hegemônicas se sobreponham

às demais. 13. A liberdade dos pais de fazer que filhos recebam educação religiosa e moral de acordo com suas convicções,

prevista no artigo 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos, encontra limites nos princípios constitucionais que

conformam o direito fundamental à educação, entre os quais se destacam a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e

divulgar o pensamento, a arte e o saber e o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas (artigo 206, II e III, CRFB).

14. O Tribunal Constitucional Alemão, ao apreciar se a introdução da disciplina Educação Sexual em escolas públicas do

ensino fundamental violaria norma da Lei Fundamental alemã que assegura aos pais direito natural de assistir e educar os

filhos, assentou que, contanto que não haja proselitismo, a educação sexual integra o dever do Estado que não pode ser

obstado pela vontade dos pais (BverfGE 47, 46, 21 de dezembro de 1977). 15. A “Pesquisa Nacional sobre o Ambiente

Educacional no Brasil: as experiências de adolescentes e jovens lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais em

nossos ambientes educacionais” (2016) revela um cenário ainda bastante opressor: os expressivos casos de agressão verbal

ou física por causa da orientação sexual e identidade de gênero provocam insegurança na escola, o que repercute na

assiduidade do aluno e na evasão escolar. 16. É vedada a discriminação em razão do sexo, gênero ou orientação sexual.

“Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade

sexual”. Precedente: ADI 4.277, Rel. Min. Ayres Britto, Plenário, DJe de 14/10/2011. 17. A escola, sob a dimensão

negativa das obrigações estatais, vocaciona-se a ser locus da pluralidade, cabendo ao poder público, sob a dimensão

positiva das liberdades individuais, ensinar tais valores e combater perspectivas sectárias e discriminatórias, o que se

concretiza também por meio do convívio social com o diferente. 18. In casu, o parágrafo único do artigo 2º da Lei

6.496/2015 do Município de Cascavel - PR, que veda a adoção de “políticas de ensino que tendam a aplicar a ideologia

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Informativo comentado

Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20

de gênero, o termo ‘gênero’ ou ‘orientação sexual’”, viola a Constituição Federal, vez que (i) o estabelecimento de regras

sobre o conteúdo didático e a forma de ensino usurpa competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases

da educação; e que (ii) a proibição genérica de determinado conteúdo, supostamente doutrinador ou proselitista,

desvaloriza o professor, gera perseguições no ambiente escolar, compromete o pluralismo de ideias, esfria o debate

democrático e prestigia perspectivas hegemônicas por vezes sectárias. 19. Arguição de descumprimento de preceito

fundamental conhecida e julgado procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo

2º da Lei 6.496/2015 do Município de Cascavel – PR.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 662.405

RELATOR: MIN. LUIZ FUX

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 512 da repercussão geral, deu provimento ao recurso

extraordinário, para reformar o acórdão lavrado pela Turma Recursal da Seção Judiciária do Estado de Alagoas e assentar

que a União Federal responde apenas subsidiariamente pelos danos materiais, relativos às despesas com taxa de inscrição

e deslocamento, causados ao recorrido em razão do cancelamento de exames para o provimento de cargos na Polícia

Rodoviária Federal (Edital nº 1/2007) por indícios de fraude, e fixou a seguinte tese: "O Estado responde

subsidiariamente por danos materiais causados a candidatos em concurso público organizado por pessoa jurídica

de direito privado (art. 37, § 6º, da CRFB/88), quando os exames são cancelados por indícios de fraude", nos termos

do voto do Relator, vencidos os Ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli

(Presidente) e Gilmar Mendes. Falou, pelo recorrido, o Dr. Romulo Coelho da Silva. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020

a 26.6.2020.

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO

ESTADO. ANULAÇÃO DO CONCURSO POR ATO DA PRÓPRIA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, EM FACE DE

INDÍCIOS DE FRAUDE NO CERTAME. DIREITO À INDENIZAÇÃO DE CANDIDATO PELOS DANOS

MATERIAIS RELATIVOS ÀS DESPESAS DE INSCRIÇÃO E DESLOCAMENTO. APLICABILIDADE DO ART.

37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RESPONSABILIDADE DIRETA DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO

PRIVADO ORGANIZADORA DO CERTAME. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ENTE PÚBLICO.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. 1. A responsabilidade civil do Estado subsume-se à teoria do risco

administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, na forma do artigo 37, § 6º, da

Constituição Federal. 2. O Estado e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos respondem

pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causem a terceiros, quando comprovado o nexo de causalidade entre a

conduta e o dano sofrido pelo particular. 3. A pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público responde

de forma primária e objetiva por danos causados a terceiros, visto possuir personalidade jurídica, patrimônio e capacidade

próprios. 4. O cancelamento de provas de concurso público em virtude de indícios de fraude gera a responsabilidade direta

da entidade privada organizadora do certame de restituir aos candidatos as despesas com taxa de inscrição e deslocamento

para cidades diversas daquelas em que mantenham domicílio. Ao Estado, cabe somente a responsabilidade subsidiária,

no caso de a instituição organizadora do certame se tornar insolvente. 5. Ex positis, voto no sentido de, no caso concreto,

dar provimento ao recurso extraordinário interposto pela União Federal, para reformar o acórdão lavrado pela Turma

Recursal da Seção Judiciária do Estado de Alagoas e assentar que a União Federal responde apenas subsidiariamente

pelos danos materiais, relativos às despesas com taxa de inscrição e deslocamento, causados ao recorrido em razão do

cancelamento de exames para o provimento de cargos na Polícia Rodoviária Federal (Edital 1/2007) por indícios de

fraude. Quanto à tese da repercussão geral, voto pela sua consolidação nos seguintes termos: “O Estado responde

subsidiariamente por danos materiais causados a candidatos em concurso público organizado por pessoa jurídica

de direito privado (art. 37, § 6º, da CRFB/88), quando os exames são cancelados por indícios de fraude”.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 698.531

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 707 da repercussão geral, negou provimento ao recurso

extraordinário, nos termos do voto do Relator. Foi fixada a seguinte tese: “Revela-se constitucional o artigo 3º, § 3º,

incisos I e II, da Lei nº 10.637/2003, no que veda o creditamento da contribuição para o Programa de Integração

Social, no regime não cumulativo, em relação às operações com pessoas jurídicas domiciliadas no exterior”.

Falaram: pela recorrente, o Dr. Francisco Carlos Rosas Giardina; e, pela recorrida, o Dr. Paulo Mendes, Procurador da

Fazenda Nacional. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

PIS – REGIME NÃO CUMULATIVO – OPERAÇÃO COM PESSOA JURÍDICA DOMICILIADA NO EXTERIOR –

CREDITAMENTO – LIMITAÇÃO – LEI Nº 10.637/2003. Revela-se constitucional o artigo 3º § 3º, incisos I e II, da Lei

nº 10.637/2003, no que veda o creditamento da contribuição para o Programa de Integração Social, no regime não

cumulativo, em relação a operações com pessoas jurídicas domiciliadas no exterior.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.623

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Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 21

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou procedente o pedido formulado na ação direta para declarar a

inconstitucionalidade do § 6º do art. 25 da Lei nº 7.098, de 30.12.1998, do Estado de Mato Grosso, nos termos do voto

da Relatora, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Rosa Weber, que assentavam a perda de objeto da ação. Falou, pela

requerente, a Dra. Tatiana Junger de Carvalho Abdounur. Impedido o Ministro Roberto Barroso. Plenário, Sessão Virtual

de 5.6.2020 a 15.6.2020.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 6º DO ART. 25 DA LEI N. 7.098/1998 DE MATO

GROSSO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. CONSTITUCIONALIDADE DA QUESTÃO REFERENTE À

OBSERVÂNCIA DA EQUAÇÃO CRÉDITO/DÉBITO NAS OPERAÇÕES COM ICMS. PRINCÍPIO DA NÃO

CUMULATIVIDADE. CONFIGURAÇÃO NACIONAL DO IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE

MERCADORIAS E SERVIÇOS – ICMS. COMPETÊNCIA CONCORRENTE PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO

TRIBUTÁRIO. PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DE DIFERENCIAÇÃO DE BENS E SERVIÇOS QUANTO À

PROCEDÊNCIA OU AO DESTINO. INCONSTITUCIONALIDADE DE RETALIAÇÃO TRIBUTÁRIA A

BENEFÍCIO FISCAL CONCEDIDO POR OUTRA UNIDADE DA FEDERAÇÃO. ICMS. OPERAÇÃO

INTERESTADUAL. APLICAÇÃO DE ALÍQUOTA INTERESTADUAL E ALÍQUOTA INTERNA DO ESTADO DE

DESTINO. REPARTIÇÃO DOS VALORES OBTIDOS. JUSTIÇA TRIBUTÁRIA. AÇÃO DIRETA DE

INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. 1. Ao reconhecer a possibilidade de legítima explicitação

do conteúdo do inc. I do § 2º do art. 155 da Constituição da República pela Lei Complementar n. 87/1996, com as

alterações das Leis Complementares ns. 92/1997, 99/1999 e 102/2000, este Supremo Tribunal assentou advir da

Constituição da República a necessidade de observância da equação crédito/ débito referente ao Imposto sobre Circulação

de Mercadorias e sobre prestações de Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – ICMS. 2.

As determinações do art. 146 e do inc. I do § 2º do art. 155 da Constituição da República direcionam-se à lei complementar

nacional, na qual devem ser estabelecidas diretrizes básicas para regulamentação geral do Imposto sobre Circulação de

Mercadorias e Serviços – ICMS, o qual, apesar de dever ser instituído no exercício de competência estadual, tem

configuração nacional. 3. Nos termos do inc. I do art. 24 da Constituição da República, é concorrente a competência para

legislar sobre direito tributário, inclusive sobre o regime de compensação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e

sobre prestações de Serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – ICMS. 4. Nos termos do

art. 152 da Constituição da República, não se pode reconhecer a validade constitucional do § 6º do art. 25 da Lei n.

7.098/1998, de Mato Grosso, no qual se confere desvantagem econômica às operações interestaduais realizadas pelos

contribuintes do ICMS sediados em Mato Grosso ou que tenham como Estado de destino aquela unidade da Federação.

5. Este Supremo Tribunal tem negado validade constitucional à retaliação tributária como meio de combate a benefício

fiscal unilateral concedido por Estado-membro em descompasso com a al. g do inc. XII do § 2º do art. 155 da Constituição

da República. 6. Ao impossibilitar-se o crédito do valor referente à parcela resultante da aplicação do diferencial de

alíquota, pelo § 6º do art. 25 da Lei mato-grossense n. 7.098/1998, promove-se a desfiguração de uma das características

mais significativas do ICMS: a incidência real sobre o valor agregado em cada operação. Essa prática conduz à eliminação,

ainda que parcial, do princípio da não cumulatividade, previsto no inc. I do § 2º do art. 155 da Constituição da República,

o que se revela constitucionalmente inaceitável, excetuadas as situações previstas no inc. II do § 2º do art. 155 da

Constituição da República. 7. Nos termos do inc. VII do § 2º do art. 155 da Constituição da República, em operações

interestaduais nas quais se destinem bens a consumidor final, incide a alíquota interestadual em favor do Estado de origem,

apurando-se o valor do imposto, que seguirá destacado na nota fiscal, cabendo ao Estado de destino calcular a diferença

entre a alíquota interna e a alíquota cobrada pelo Estado de origem, incidindo esse diferencial de alíquota sobre o valor

da operação, calculando-se assim o montante do imposto a ser recolhido para o Estado de destino. Esse regime não conduz

à diferenciação de lançamentos e autonomia de etapas, revelando-se meio de repartição do valor recolhido de imposto

entre os Estados de origem e de destino, como medida de justiça tributária. 8. Ação direta de inconstitucionalidade julgada

procedente para reconhecer a inconstitucionalidade do § 6º do art. 25 da Lei n. 7.098, de 30.12.1998, de Mato Grosso.

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS

10 A 14 DE AGOSTO DE 2020

Lei nº 14.035, de 11.8.2020 - Altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para dispor sobre procedimentos para a

aquisição ou contratação de bens, serviços e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de

importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.

Lei nº 14.036, de 13.8.2020 - Altera a Lei nº 14.017, de 29 de junho de 2020, para estabelecer a forma de repasse pela

União dos valores a serem aplicados pelos Poderes Executivos locais em ações emergenciais de apoio ao setor cultural

durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e as regras

para a restituição ou a suplementação dos valores por meio de outras fontes próprias de recursos pelos Estados, pelos

Municípios ou pelo Distrito Federal.

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Informativo comentado

Informativo 986-STF (20/08/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 22

OUTRAS INFORMAÇÕES

10 A 14 DE AGOSTO DE 2020

Resolução STF 697, de 6.8.2020 - Dispõe sobre a criação do Centro de Mediação e Conciliação, responsável pela busca

e implementação de soluções consensuais no Supremo Tribunal Federal.

Resolução STF 699, de 10.8.2020 - Prorroga a suspensão de prazos de processos físicos no Supremo Tribunal Federal.

Emenda Regimental 55, de 12.8.2020 - Dá nova redação a dispositivo do Regimento Interno do Supremo Tribunal

Federal.

Emenda Regimental 56, de 12.8.2020 - Dá nova redação a dispositivo do Regimento Interno do Supremo Tribunal

Federal.

Resolução STF 700, de 13.8.2020 - Altera o formato do Diário de Justiça eletrônico do Supremo Tribunal Federal,

disciplina os procedimentos de divulgação e publicação automáticas e dá outras providências.

Supremo Tribunal Federal – STF

Secretaria de Documentação

Coordenadoria de Divulgação de Jurisprudência

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