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Até o final da década de 1960, Anna Bella Geiger voltou-se,

principalmente, à gravura em metal. Com Fayga Ostrower, inicia a prática da

gravura figurativa, assim como sua formação teórica. Ao tomar como referência

a gramática visual de sua professora, Anna Bella passa pela figuração abstrata

antes de desenvolver o abstracionismo informal que marcou sua produção

de gravuras. Este, por sua vez, manifestou-se por linhas e formas quase

“dinâmicas”, remetendo a uma noção de movimento.

À medida que sua carreira evolui, implicações ideológicas do universo

das artes e do contexto político vão sendo colocadas mais enfaticamente

em discussão. A artista tem seu trabalho marcado por questões relativas à

identidade e cultura nacional, à constituição da arte no Brasil e ao local do artista

na sociedade. A preocupação de Anna Bella com o papel do artista e da arte

atua como uma espécie de “rito de passagem” de sua produção moderna para

a arte contemporânea. A artista, “talvez por vir da abstração informal, mergulha

na autorreflexão”1, sendo seus vídeos da série Passagens considerados o marco

inicial da videoarte brasileira.

Anna Bella GeigerRio de Janeiro, 1933

1 COCHIARALLE, Fernando. Disponível em: http://www.istoe.com.br/reportagens/30986_RITO+DE+PASSAGEM.

Para pensarAo observar as duas gravuras de Anna Bella

Geiger, você diria que se trata de imagens estáticas

ou dinâmicas? Busque justificar sua resposta

destacando elementos formais das obras.

sem título, 1961gravura em metal36,4 x 25 cmdoação da artistacol. Museu de Arte Moderna, Rio de Janeirofoto: Vicente de Mello

Ana Bella Geigersem título, 1963gravura em metal41 x 60,5 cmdoação da artistacol. Museu de Arte Moderna, Rio de Janeirofoto: Vicente de Mello

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Ainda que em uma linha mais figurativa, Edith Behring tem o começo

de sua carreira fortemente marcado pela poética abstrata. A composição

está na base de seu conceito de abstração, desenvolvido a partir de uma

reflexão cuidadosamente conduzida. As cores e formas presentes em suas

obras retratam a visão de uma artista que sempre se posicionou contra a

representação ou transposição fiel da realidade. Seu fazer artístico, pautado

pela subjetividade, explora uma ideia de imagem muito mais baseada na

interpretação do que na reprodução.

A preocupação com o aprendizado artístico foi constante durante sua

carreira. Para Edith, que também foi professora, o aperfeiçoamento técnico é

fundamental, pois é esse domínio preciso que permite ao artista inovar. O modo

como utiliza água-tinta e água-forte1 para produzir linhas e cores que dão

movimento à imagem, bem como o trabalho realizado sobre matrizes2 com

cortes, fragmentações e ranhuras – provavelmente influência do tempo em

que estudou com Johnny Friedlaender – são alguns exemplos das técnicas que

marcaram a produção da artista.

Edith BehringRio de Janeiro, 1916 – 1996

1 Água-tinta e água-forte são técnicas utilizadas para a produção de gravura em metal. A primeira permite que sejam obtidos diferentes tons na imagem gravada, os quais variam de acordo com o tempo de corrosão do ácido na matriz. Já a água-forte permite apenas traçar linhas, ou seja, contornos de imagens. Acima, podemos ver uma gravura de Iberê Camargo que se vale de ambas as técnicas. Já a obra de Edith Behring utiliza apenas a água-forte.

2 Superfície plana na qual o artista grava, por meio de diversas técnicas, a imagem a ser impressa em papel. A matriz, na gravura em metal, pode ser feita de placas de cobre, zinco ou latão.

Para pensarA composição está na base do conceito de abstração de

Edith Behring e de Iberê Camargo. Ao tomar como exemplo os

trabalhos reproduzidos na prancha, como você justificaria a afirmação

anterior? O que você entende por “composição”?

A partir de imagens publicitárias, tiradas de revistas e jornais, discuta

com os alunos quais as que apresentam uma “melhor” composição

dos elementos.

sem título, 1957gravura em metal51 x 66 cmdoação da artistacol. Museu de Arte Moderna, Rio de Janeirofoto: Vicente de Mello

Iberê CamargoEstrutura em movimento, 1961 água-forte e água-tinta sobre papel12,9 x 17,7 cmcol. Maria Coussirat CamargoFundação Iberê Camargo, Porto Alegrefoto: Fábio Del Re

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Fayga Ostrower inicia sua carreira artística logo depois da Segunda

Guerra Mundial, o que fez com que o contexto social do período reverberasse no

seu modo de lidar com a arte. A artista encontrará afinidades no expressionismo

alemão, “e não apenas por razões de origem ou por sua primeira identidade

linguística e cultural”.1 Em razão de seus conceitos éticos – a arte vista como

protesto social e forma de resistência, sobretudo após um período de intensa

turbulência mundial –, o expressionismo configurava-se não somente como

movimento artístico, mas como atitude em relação à incidência da arte nas

questões sociais. Dentre os questionamentos trazidos pelo movimento, estava a

própria escolha dos meios gráficos para a produção da obra. Por essa razão, a

xilogravura e a gravura em metal foram meios muito utilizados no período, uma

vez que, segundo Fayga, seu caráter multiplicador é o que “dá sentido e torna

a arte da gravura acessível a um grande número de pessoas”.2

No entanto, em meados da década de 1950, a artista percebe que a

arte, “ao abordar problemas sociais, sob a forma de crítica social ou política

[...], estava fora de seu alcance e intenção”.3 Desde então, a utilização conjunta

de geometria e de gesto passa a preponderar no trabalho da artista, algo

que também marcou a obra de Iberê Camargo. Entre os artistas, temos uma

afinidade gestual no que diz respeito à autoexpressão, ligada, de certa maneira,

à filosofia existencialista do pós-guerra.

Fayga OstrowerLotz, Polônia, 1920 – Rio de Janeiro, 2001

1 GEIGER, Anna Bella. Os caminhos de Fayga Ostrower. Rio de Janeiro: Instituto Fayga Ostrower, 2006, p.11.

2 Depoimento de Fayga Ostrower. In: COCCHIARALE, Fernando e GEIGER, Anna Bella. Abstracionismo geométrico e informal: vanguarda brasileira nos anos 50. Rio de Janeiro: Funarte, 1987.

3 Idem Nota 1.

Para pensarSegundo Fayga, o caráter multiplicador da gravura a torna acessível a um

grande número de pessoas. A partir dessa afirmação, podemos considerar

a gravura um meio de democratização da arte? Por quê?

O preço de venda de uma gravura em edições é sempre menor do que

o preço de um desenho, por exemplo. Em sua opinião, a afirmativa vale

para qualquer gravura ou desenho?

Aqui, sugere-se discutir com os alunos a questão da reprodução na arte e

sua implicação no valor da obra.

sem título, 1958xilogravura sobre papel41 x 59,5 cmdoação da artistacol. Museu de Arte Moderna, Rio de Janeirofoto: Vicente de Mello

Iberê Camargosem título, c.1960nanquim sobre papel 20,5 x 26 cm col. Maria Coussirat CamargoFundação Iberê Camargo, Porto Alegre foto: Fábio Del Re

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Reduzir Iberê Camargo a um estilo artístico específico mostra-se, quase

sempre, uma tentativa inglória, sobretudo pelo fato de o artista ter sempre negado

qualquer tipo de rotulação ou vínculo a um movimento artístico determinado.

No entanto, ainda que avesso a classificações, Iberê, em especial na década de

1950, quando formou uma geração de gravuristas abstratos no Brasil, teve

sua obra marcada pelo informalismo abstrato que tomou conta da época.

Seu gesto, porém, nascia de uma lógica fundada na livre marcha do próprio

processo, distinguindo-se dos métodos teóricos concretistas ou tachistas.1

Porém, embora imerso em uma poética abstrata, sempre houve na obra

de Iberê uma estrutura, uma organização geométrica. No caso de Construção, a

deformação é a própria expressividade da forma. “O objeto pintado é pintura, não

é mais objeto. Ele já se transmutou. Ele perde a referência”.2 Como ensina Marcuse,

a arte “desafia o monopólio da realidade que o existente possui e o faz criando um

mundo fictício que, no entanto, é mais real do que a própria realidade”.3

Iberê CamargoRestinga Seca, RS, 1914 – Porto Alegre, 1994

1 O concretismo e o tachismo devem ser entendidos como parte do movimento abstrato moderno. Enquanto o primeiro propõe um afastamento entre a arte e qualquer conotação lírica ou simbólica de representação, o segundo procura definir um novo estilo de pintura, que recusa a formalização ao sugerir o rompimento com técnicas e modelos artísticos já estabelecidos.

2 CAMARGO, Iberê. In: LAGNADO, Lisette. Conversações com Iberê Camargo. São Paulo: Iluminuras, 1994.

3 MARCUSE, Herbert. A dimensão estética. Lisboa: Edições 70, 1977, p. 29.

Para pensarIberê sempre recusou qualquer vínculo a um movimento artístico

específico. As classificações, sugeridas por grande parte dos historiadores,

críticos e estudiosos da arte, não lhe agradavam. E na sua opinião, essas

classificações são importantes? Por quê?

Aqui, sugere-se discutir com os alunos acerca de classificações e

movimentos artísticos em outras áreas, como a da música, por exemplo.

Construção, 1962óleo sobre tela93 x 150 cmcol. João Sattamini,comodante Museu de Arte Contemporânea de Niteróifoto: Vicente de Mello

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A imagem do carretel é recorrente no trabalho de Iberê Camargo. A partir

de 1959, aproximadamente, devido às restrições físicas impostas por uma

hérnia de disco, o artista passa a trabalhar quase que exclusivamente em seu

ateliê. É nessa época que o outrora brinquedo de infância torna-se vital para

sua obra. Postos em equilíbrio, em movimento ou em expansão, os carretéis

foram a chave com a qual Iberê acessou o abstracionismo. Além da memória

afetiva, os carretéis relacionam-se com o geometrismo que tomou conta da

arte brasileira nas décadas de 1950 e 1960. Enquanto Hélio Oiticica propunha

seus Mestaesquemas e o neoconcretismo consolidava-se como vanguarda

nacional, Iberê encontrou na forma do carretel, como ele mesmo disse, tema e

personagem de seu drama pictórico.1

Em Estrutura de carretéis, Iberê constrói uma representação que destoa

das imagens anteriores de seu nostálgico personagem. Antes concebido de

maneira mais verossímil ao mundo concreto, os carretéis têm, nesta obra, um

predomínio gestual em relação à perspectiva geométrica clássica. Ligados por

uma espécie de cadeia única, parecem dialogar entre si, em uma dependência

ditada pelo caos, que os empareda na moldura.

Iberê CamargoRestinga Seca, RS, 1914 – Porto Alegre, 1994

1 Ver mais em: http://www.iberecamargo.org.br/content/acervo/carreteis.asp.

Para pensar“Sempre tive como ponto de partida um elemento do real. Sempre tive

a realidade como marco zero. Mas o real é a pista de onde decola a

fantasia”. Iberê escreveu e falou muito sobre seu processo artístico, como

vemos no trecho da entrevista dada ao jornal Folha de S. Paulo, em 20 de

setembro de 1992.

Para o artista, o carretel foi o elemento real que o permitiu decolar para

a fantasia. E para você, que objeto você escolheria como elemento-

chave na construção de sua biografia? Aproveite e conte sua história aos

colegas a partir do objeto escolhido.

Estrutura de carretéis, 1963óleo sobre tela62,3 x 100 cmcol. João Sattamini,comodante Museu de Arte Contemporânea de Niteróifoto: Vicente de Mello

foto: Acervo Documental Fundação Iberê Camargo

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Logo depois da Segunda Guerra Mundial, estabeleceu-se, no meio artístico

brasileiro, uma crescente discussão acerca da representação na arte. As vertentes

construtivas buscavam uma “[...] arte não-representativa, não-metafórica”1, que

convergisse com o processo de modernização pelo qual passava o país. lberê

Camargo, porém, “mesmo iniciando uma pesquisa que expressa um certo

afastamento da realidade objetiva”2, privilegia as próprias escolhas, mantendo

a linguagem gestual e incisiva da sua pintura. Ao incorporar grossas camadas às

telas, produz uma força cada vez maior diante da cor e do movimento, em uma

atmosfera não-figurativa que valoriza a matéria pictórica da pintura.

No início dos anos 60, os carretéis, figuras emblemáticas da obra de Iberê,

começam a deixar as mesas sobre as quais repousavam e a projetar-se no espaço.

Nos anos 1963 e 1964, eles tendem a formar um espaço revolto e, em 1965 e

1966, passam a remeter a uma ideia de explosão. Tal ideia, por sua vez, dá-se a

partir de um núcleo que alcança as margens da mancha; um núcleo em expansão.

Iberê CamargoRestinga Seca, RS, 1914 – Porto Alegre, 1994

1 ZIELINSKY, Mônica. In: ZIELINSKY, Mônica e SALZESTEIN, Sônia. Iberê Camargo – moderno limite 1914-1994. Porto Alegre: Fundação Iberê Camargo, 2008, p. 16.

2 Idem.

Para pensarO que você entende por uma arte “não-representativa, não-metafórica”?

Nesta lâmina, temos a reprodução de uma pintura de Iberê. Depois de

visitar a exposição, discuta quais as principais “perdas” que suas pinturas

têm ao serem reproduzidas em papel.

Núcleo em expansão I, 1965óleo sobre tela150 x 212 cmAcervo Instituto Moreira Salles foto: Leonid Streliaev

Iberê CamargoNúcleo, 1965água-tinta (processo do açúcar) sobre papel24,7 x 36,4 cmcol. Maria Coussirat CamargoFundação Iberê Camargo, Porto Alegre foto: Fábio Del Re

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A produção de Iberê Camargo foi marcada pela incidência de fortes

gestos, tanto nas pinturas e gravuras, como também em seus desenhos, esboços

e estudos. A exposição “Iberê Camargo e o ambiente cultural brasileiro do pós-

guerra” traz, entre outras obras, alguns desses desenhos feitos de forma quase

obsessiva pelo artista. Neles, além da observação de cenas cotidianas, vemos,

também, a recorrência de alguns temas; caso dos carretéis. No estudo de 1965,

ainda que não reconheçamos a forma do carretel, ele aparece, possivelmente,

como uma síntese geométrica, ratificando a afirmação de Iberê de que nunca

abandonara a figuração: “Eu trabalho com impetuosidade. O gesto coloca a cor.

Cria o tom, estabelece relações novas, inesperadas. As metamorfoses se sucedem,

os contrastes se acentuam, a composição adquire uma estrutura. Eu busco a

dinâmica e o equilíbrio em figuras que se abrem e se dispersam”.1

O estudo para o painel que viria a ser pintado, em 1966, na sede da

Organização Mundial de Saúde, em Genebra, trata justamente dessa dispersão

de figuras. O desenho está traçado em escalas, estabelecendo diversas cotas

sobre uma quadrícula que, posteriormente, seriam transpassadas ao painel de

madeira. Na Suíça, “partindo do esquema que tinha levado, Iberê começou

a brincar livremente com as formas, e o resultado final, após sete meses de

trabalho, conserva as linhas gerais do projeto [...]”.2 Formas de pássaros,

carretéis e dados são liberadas, estabelecendo “relações novas e inesperadas”,

como sugeriu Iberê.

Iberê CamargoRestinga Seca, RS, 1914 – Porto Alegre, 1994

1 BORSA CATANI, Icléia. In: SALZSTEIN, Sônia (org.). Diálogos com Iberê Camargo. São Paulo: Cosac Naify, 2003, p. 81.

2 HERRERA, María José. Iberê Camargo – um ensaio visual. Porto Alegre: Fundação Iberê Camargo, 2009, p. 24.

Para pensar“O gesto coloca a cor”, disse Iberê Camargo.

A referência ao “gesto” dos artistas é algo

frequente nos textos sobre arte. Como você

definiria o gesto de Iberê? Um gesto intimista?

Virtuoso? Visceral? Sutil?

Você reconhece o gesto do artista ainda que se

trate de um desenho de estudo?

sem título, 1965caneta tinteiro sobre papel40,5 x 42,5 cmcol. Maria Coussirat CamargoFundação Iberê Camargo, Porto Alegrefoto: Fábio Del Re

Painel da Organização Mundial de SaúdeGenebra, 1966700 x 700 cmfoto: Acervo Documental Fundação Iberê Camargo

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Inicialmente, a pintura do jovem Luiz Sacilotto filiava-se a uma corrente

expressionista. Foi Waldemar Cordeiro quem incentivou o artista a explorar

a abstração construtiva e a geometrização de fundos e figuras. A partir de

1954, Sacilotto passa a chamar de Concreção as pinturas, relevos e esculturas

que produzirá durante o restante de sua carreira. São obras nas quais o artista

utiliza linhas e formas geométricas para criar ilusões visuais. Em Concreção

6048, as figuras triangulares ressaltam a contraposição e a relação entre

positivo e negativo. Sobrepostos a um fundo colorido, esses triângulos claros

e escuros relacionam-se com o tom rosado e criam um efeito óptico no qual a

cor adquire papel fundamental, uma vez que cabe a ela o poder de suavizar ou

destacar a geometria.

Além de provocar uma leitura ambígua entre as relações de cheio-

vazio, côncavo-convexo, positivo-negativo e figura-fundo, o trabalho do artista

também se caracteriza pelo uso de materiais não convencionais como matéria-

prima. Na escultura Concreção 5730 (1957), por exemplo, ao trabalhar sobre

um quadrado de alumínio, Sacilotto cria, por meio de recortes simétricos e

dobraduras, um apoio que permite à peça ficar em pé sem a necessidade de uma

base. “Embora o artista nunca tenha previsto mecanismos nem engrenagens

para movimentar suas formas, elas se movem. Impelidas por um sofisticado

motor virtual que Sacilotto instala em nossas retinas no instante mesmo em que

nos colocamos diante de um desses trabalhos”.1

Luiz SacilottoSão Paulo, 1934 – 2003

1 MORAES, Angélica de. Disponível em http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=artistas_criticas&cd_verbete=914&cd_item=15&cd_idioma=28555.

Para pensar“Gosto de quando a pessoa vem olhar o quadro, vê uma coisa e, de

repente, vê outra. É uma provocação”, disse Luiz Sacilotto em entrevista

ao jornal Folha de S. Paulo, em 1995. Qual sua primeira impressão ao

observar Concreção 6048? Você percebe algum jogo óptico na referida

obra do artista?

Concreção 6048, 1960 óleo sobre tela60 x 120 cmAcervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo/BrasilAquisição Governo do Estado de São Paulo, 1977foto: Isabella Matheus

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O rigor geométrico esteve marcadamente presente nas obras de

Waldemar Cordeiro durante a década de 1950. Em Ideia visível, a partir do

conceito matemático da Espiral de Arquimedes1, o artista explora relações entre

círculos sobrepostos e deslocados do centro que, à primeira vista, pouco lembram

formas circulares, tamanha a “deformação” proposta pelo artista. Por meio da

angulação das linhas pretas e vermelhas, cria-se um efeito óptico que permite

ao olhar perceber a presença de curvas invisíveis, em um processo no qual “a

representação transcende o plano, mas não é perspectiva, é movimento”.2

Ideia visível, assim como outras obras do artista desse mesmo período,

pode ser compreendida como uma experiência no campo das ilusões visuais.

Trata-se, também, de uma tentativa de repensar o espaço bidimensional da

pintura através de conceitos lógicos e racionais, a exemplo do uso da matemática.

Waldemar CordeiroRoma, 1925 – São Paulo, 1973

1 Espiral de Arquimedes é uma curva descrita por um ponto que se desloca com uma velocidade uniforme ao longo de uma reta em torno da origem.

2 CORDEIRO, Waldemar. O objeto. AD – Arquitetura e Decoração, n. 20 (não paginado). São Paulo, nov./dez., 1956.

Para pensar“Quem sabe se a arte é um complemento, ou um

suplemento necessário da ciência”?, questionou,

certa vez, o filósofo alemão Friedrich Nietzsche.

Ao tomar como exemplo a obra de Waldemar

Cordeiro, que se vale do rigor geométrico ao propor

Ideia visível, discuta com os alunos a respeito das

relações entre ciência e arte.

Até que ponto uma é influenciada, “tocada”, pela

outra? Estamos falando de um diálogo frequente

nos dias de hoje?

Ideia visível, 1957têmpera sobre aglomerado100 x 100 cmAcervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo/BrasilAquisição Governo do Estado de São Paulo, 1977foto: Isabella Matheus

Espiral de Arquimedes

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A série Metaesquemas (1957 e 1958) de Oiticica é um dos marcos da

abstração geométrica no Brasil. Trata-se da investigação de uma nova estrutura

espacial, na qual quadriláteros irregulares, aparentemente ajustados a uma

grade imaginária, fogem à rigidez dos ângulos retos. Como resultado, temos “o

movimento das figuras que, ao invés de seguirem um padrão previsível, parecem

dançar livremente sobre o plano”.1 Segundo o artista, um Metaesquema é

“uma coisa que fica entre; que não é nem pintura nem desenho, mas na

realidade uma evolução da pintura, como se fosse um programa determinado

dentro da pintura [...]”.2

Considerada o ponto de partida para uma “pintura depois do quadro”,

a série dá início aos estudos que, mais tarde, permitiriam a Oiticica “liberar” as

formas do papel e posicioná-las no espaço, suspensas apenas por fios. Dessa

forma, o artista questiona e desafia a disciplina das linhas, figuras e sólidos nos

limites da pintura e do desenho de caráter figurativo.

Hélio OiticicaRio de Janeiro, 1937 – 1980

1 Disponível em: http://mam.org.br/obras_comentadas/ver/helio-oiticica-i-metaesquema-i-1958.

2 FAVARETTO, Celso. A invenção de Hélio Oiticica. São Paulo: Edusp/Fapesp, 1992, p. 51.

Para pensarMuitas vezes os artistas optam por não dar nome à determinada(s) obra(s).

Trata-se daqueles trabalhos conhecidos como “sem título”, que vemos

frequentemente nas exposições de arte. No caso da série Metaesquemas, o

título é importante para a compreensão da obra? Por quê?

Sugere-se, aqui, discutir com os alunos o significado da palavra “esquema”.

Hélio Oiticica é um artista conhecido por ter “liberado a pintura da

parede”. Que características de Metaesquema 101 você apontaria como

ponto de partida para essa liberação?

Metaesquema 101, 1958guache sobre cartão55 x 63,5 cmcol. César e Cláudio Oiticica foto: Vicente de Mello

Hélio Oiticicasem título (relevos espaciais), 1959, reconstrução 1991acrílico sobre compensado104 x 118 x 12,7cmcol. Patrícia Phelps de Cisnerosfoto: Gregg Stanger© 2010 Projeto Hélio Oiticica