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DIAGNÓSTICO DE LEPTOSPIROSE EM CÃO APRESENTANDO NECROSE DE LÍNGUA - RELATO DE CASO Autor(es): JORGE, Sérgio; BITTENCOURT, Carolina Sallis; DIAS, Lúcia Pereira; SILVA, Fábio da Silva; XAVIER, Fernanda da Silva; RECUERO, Rebeca da Cunha; RECUERO, Ana Lúcia Coelho; STONE, Simone Cardozo; FERNANDES, Cláudia Pinho Hartleben; BROD, Claudiomar Soares Apresentador: Sérgio Jorge Orientador: Claudiomar Soares Brod Revisor 1: Alexandre da Rocha Gonçalves Revisor 2: Marta Fernanda Fehlberg Instituição: Universidade Federal de Pelotas DIAGNÓSTICO DE LEPTOSPIROSE EM CÃO APRESENTANDO NECROSE DE LÍNGUA - RELATO DE CASO JORGE, Sérgio 1 ; BITTENCOURT, Carolina Sallis 3 ; DIAS, Lúcia Pereira 1 ; SILVA, Fábio da Silva 2 ; XAVIER, Fernanda da Silva 2 ; RECUERO, Rebeca da Cunha 1 ; RECUERO, Ana Lúcia Coelho 1 ; STONE, Simone Cardozo 1 ; FERNANDES, Cláudia Pinho Hartleben 1 ; BROD, Claudiomar Soares 1 . 1 Faculdade de Veterinária – Centro de Controle de Zoonoses – UFPel – (53) 3275-7424 2 Hospital de Clínicas Veterinário – UFPel – (53) 3275-7292 3 Consultório Veterinário Cachorraria – tel: (53) 3227-3823 1. INTRODUÇÃO Leptospirose é uma doença infecciosa causada por bactérias patogênicas do gênero Leptospira, são transmitidas direta ou indiretamente dos animais para o homem. A leptospirose ocorre no mundo todo, mas é mais comum em países tropicais e subtropicais com alta pluviosidade (I.L.S., 2003). As leptospiras são espiroquetas móveis e filamentosas, de 0,1 a 0,2 μm de largura por 6 a 12 μm de comprimento (COUTO; NELSON, 2001). A leptospirose canina é conhecida como enfermidade de Stuttgard desde 1898, sendo os cães, depois dos roedores, considerados como a segunda principal fonte de infecção para o homem (I.L.S., 2003) e se apresenta com uma variedade de manifestações de sinais clínicos (Greene, 2006). Esses sinais ocorrem depois do período de incubação (Faine, et al., 1999). A maioria dos cães com doença clínica superaguda normalmente apresentam anorexia, depressão, taquipnéia e vômitos.

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DIAGNÓSTICO DE LEPTOSPIROSE EM CÃO APRESENTANDO NECROSE DE LÍNGUA - RELATO DE CASO

Autor(es):

JORGE, Sérgio; BITTENCOURT, Carolina Sallis; DIAS, Lúcia Pereira;

SILVA, Fábio da Silva; XAVIER, Fernanda da Silva; RECUERO, Rebeca

da Cunha; RECUERO, Ana Lúcia Coelho; STONE, Simone Cardozo;

FERNANDES, Cláudia Pinho Hartleben; BROD, Claudiomar Soares

Apresentador: Sérgio Jorge

Orientador: Claudiomar Soares Brod

Revisor 1: Alexandre da Rocha Gonçalves

Revisor 2: Marta Fernanda Fehlberg

Instituição: Universidade Federal de Pelotas

DIAGNÓSTICO DE LEPTOSPIROSE EM CÃO APRESENTANDO NECROSE DE LÍNGUA - RELATO DE CASO

JORGE, Sérgio1; BITTENCOURT, Carolina Sallis3; DIAS, Lúcia Pereira1; SILVA, Fábio da Silva2; XAVIER, Fernanda da Silva2; RECUERO, Rebeca da Cunha1;

RECUERO, Ana Lúcia Coelho1; STONE, Simone Cardozo1; FERNANDES, Cláudia Pinho Hartleben1; BROD, Claudiomar Soares1.

1Faculdade de Veterinária – Centro de Controle de Zoonoses – UFPel – (53) 3275-7424

2Hospital de Clínicas Veterinário – UFPel – (53) 3275-7292 3Consultório Veterinário Cachorraria – tel: (53) 3227-3823

1. INTRODUÇÃO

Leptospirose é uma doença infecciosa causada por bactérias patogênicas do gênero Leptospira, são transmitidas direta ou indiretamente dos animais para o homem. A leptospirose ocorre no mundo todo, mas é mais comum em países tropicais e subtropicais com alta pluviosidade (I.L.S., 2003).

As leptospiras são espiroquetas móveis e filamentosas, de 0,1 a 0,2 µm de largura por 6 a 12 µm de comprimento (COUTO; NELSON, 2001).

A leptospirose canina é conhecida como enfermidade de Stuttgard desde 1898, sendo os cães, depois dos roedores, considerados como a segunda principal fonte de infecção para o homem (I.L.S., 2003) e se apresenta com uma variedade de

manifestações de sinais clínicos (Greene, 2006). Esses sinais ocorrem depois do período de incubação (Faine, et al., 1999). A maioria dos cães com doença clínica superaguda normalmente apresentam anorexia, depressão, taquipnéia e vômitos.

Febre, mucosas pálidas e taquicardia normalmente estão presentes. Petéquias, equimoses, melenas e epistaxe ocorrem frequentemente por trombocitopenia e coagulação intravascular disseminada (COUTO; NELSON, 2001).

Uma comparação dos anticorpos anti-leptospíricos com a ausência de sinais clínicos indica que as infecções subclinicas são relativamente comuns nos cães. Estes cães freqüentemente desenvolvem infecções crônicas (Faine, et al., 1999). Depois da primeira semana de leptospiremia, as leptospiras são eliminadas do organismo por via urinária e contaminam o meio ambiente (Acha; Szifres, 1986). Alguns destes cães eventualmente desenvolvem doença renal crônica (FAINE, et al., 1999).

A transmissão também ocorre por feridas de mordida; contato venéreo; via transplacentária ingestão de tecidos, solo, água, panos de cama, alimentos contaminados e leite (COUTO; NELSON, 2001).

Os sorovares predominantes nos cães são Canicola e Icterohaemorrhagiae. Porém na América Latina e Caribe foram isolados os sorovares pyogenes, paidjan e tarassovi (Acha; Szifres, 1986). No RGS, no ano de 2005, um sorovar local de L. interrogans foi isolado e recebeu a denominação de Tande (Brod, et al., 2005). A forma mais grave é a hemorrágica, que se instala repentinamente com febre por 3 a 4 dias, seguida por rigidez e mialgias dos membros posteriores, hemorragias na cavidade bucal com tendência a necrose e faringite (ACHA; SZIFRES, 1986).

Uma análise dos sinais clínicos associados com os dados epidemiológicos encontrados na anamnese e com os resultados laboratoriais foram utilizados para o diagnóstico definitivo e a associação da antibiótico terapia são objeto de estudo deste trabalho.

2. MATERIAL E MÉTODOS Caso Clínico.Um cão, raça poodle, de nome Bob, macho, 3 anos de idade,

pesando 3,8 Kg, com dados da anamnese indicando que havia presença de roedores no local em quem vivia. Este cão foi atendido no HCV-UFPel, onde a queixa do proprietário referia-se a um quadro de prostração, anorexia e odor pútrido na cavidade oral percebido aproximadamente ha 4 dias.

No exame físico constatou-se que o animal possuía temperatura retal de 37,2°C, mucosas pálidas, magro, apático e com necrose na porção distal da língua.

Mediante esses achados foram solicitados hemograma completo, urinálise, bioquímica sérica, (Ureía, Creatinina, Transaminase pirúvica e Fosfatase alcalina) e diagnóstico laboratorial para leptospirose utilizando a técnica de detecção de anticorpos anti-leptospira por soroaglutinação microscópica por antígenos vivos (MAT) e pesquisa direta de espiroquetas no sangue e urina, realizado no Centro de Controle de Zoonoses da UFPel.

Pesquisa direta de espiroquetas no soro, em microscopia de campo escuro (BDFM). Foi realizada a pesquisa de espiroquetas no soro, após centrifugação do sangue total a 3.000 rpm por 5 minutos. Foram então pipetados 5 µl do soro em uma lâmina simples de microscópio cobrindo-o então com uma lamínula. Para tentativa de visualização das espiroquetas foram utilizadas lentes objetivas de 40X e ocular de 15X e condensador de campo escuro a seco.

Pesquisa direta de espiroquetas na urina, em microscopia de campo escuro (UDFM). A amostra de urina foi coletada com sonda uretral, e centrifugada a 15.000 rpm, a 4°C por 20 minutos. O sobrenadante foi desprezado e juntamente

com o pellet formado foram adicionados 100 µl de PBS e agitados. Novamente foram examinados 5 µl entre lâmina e lamínula.

Soroaglutinação microscópica com antígenos vivos (MAT). Para o diagnóstico sorológico foram utilizados todos os 52 sorovares mantidos vivos na cultura de antígenos, incluindo os isolados locais. A diluição inicial foi de 1:50, onde o resultado foi considerado positivo quando o antígeno aglutinado fosse igual ou maior a 50% ou se a densidade do antígeno livre fosse menor que 50% (quando comparados com o controle).

Exame comum de urina. Foram analisados 40 ml de urina, onde foi realizado o exame físico, exame químico e exame do sedimento.

Bioquímica sérica. Para a verificação das funções hepáticas e renais foram analisados os níveis de Transaminase pirúvica, Fosfatase alcalina, Uréia e Creatinina.

Hemograma. Foi realizado hemograma completo, onde foram analisadas as séries branca, vermelha e PPT.

O cão foi internado para tratamento ,onde este foi baseado em fluidoterapia e antibióticoterapia: Ringer Lactato, 50 ml/Kg/dia, I.V. por 4 dias, associação comercial de antibióticos Benzilpenicilina benzatina, benzilpenicilina procaína, benzilpenicilina potássica, sulfato de dihidroestreptomicina e sulfato de estreptomicina 40.000 UI/kg, IM, SID, durante um dia e após Enrofloxacina 5 mg/kg, IM, S.I.D., durante sete dias.

No quarto dia de internamento, o animal passou a receber ração enlatada por via oral duas vezes ao dia.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caso Clínico. No exame direto em microscopia de campo escuro, encontrou-

se espiroquetas no soro e ausência das mesmas na urina. Na técnica de soroaglutinação microscópica com antígenos vivos foi obtido resultado positivo, com títulos elevados para os sorovares Tande, Canicola e Icterohaemorrhagiae (tabela 1). Os valores de Uréia, Creatinina e Transaminase Pirúvica encontram-se acima dos valores de referência para a espécie indicando comprometimento renal e hepático (tabela 2). No hemograma completo não foram encontradas alterações significativas e os níveis de proteínas plasmáticas totais indicavam desidratação. No exame comum de urina as alterações foram significativas (tabela 3).

Após o período de tratamento e a associação de tratamento antimicrobiano e terapia de suporte, o animal apresentou progressiva melhora do quadro geral, houve necrose da extremidade distal da língua com perda desta porção, não comprometendo as funções. O animal obteve alta após 7 dias de internamento.

Tabela 1. Soroaglutinação microscópica com antígenos vivos (MAT)

Sorovares Título de anticorpos

100 200 400 800 1600 3200

Canicola X

Icterohaemorrhagiae X

Bataviae (Van Tienem) X

Bataviae (Swart) X

Australis X

Tande X

Tabela 2. Bioquímica sérica

Valores de referência

Uréia 299 15 a 30 mg/dl

Creatinina 1,8 0,5 a 1,5 mg/dl

Transaminase Pirúvica 71 5,3 a 19,8 UI

Fosfatase Alcalina 30 8,5 a 60,6 UI

Tabela 3. Exame comum de urina

Exame físico Exame Químico

Volume 40 ml Reação ácida pH 6,0

Cor âmbar-claro Proteínas †

Aspecto turvo Pig. Biliares ††

Densidade 1041

Exame do sedimento

Presença de células epiteliais de descamação

Presença de espermatozóides

Piúria: 30/cga

Hemáceas: 1/cga

Bacteriúria moderada

Cilindros granulares: 2/cga

4. CONCLUSÕES

A análise dos dados da anamnese (epidemiológicos), associados aos achados clínicos e o diagnóstico laboratorial oferece uma diagnóstico de certeza para leptospirose canina. O comprometimento renal e hepático sugere colonização leptospiral nesses órgãos. O títulos de anticorpos detectados na MAT mostram um quadro de infecção aguda e a titulação alta para o sorovar Tande é compatível com o achado clínico de necrose de língua. A associação de antibióticos - penicilinas e quinolonas - mostrou-se eficiente no controle da infecção.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] ACHA, P. N.; SZYFRES, B.; Zoonosis y enfermedades communes al hombre y a los animals, 2° edicion, Organización Panamericana de la Salud, Washington, U.S.A., 1986. [2] BROD, C. S.; ALEIXO, J. A. G.; et al; Evidência do cão como reservatório da leptospirose humana: isolamento de um sorovar, caracterização molecular e utilização em inquérito sorológico, Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 38(4), 2005. [3] COUTO, C.G.; NELSON, R.W.; Leptospirose in Medicina Interna de Pequenos Animais, Rio de Janeiro, 2001. Ed. Guanabara Koogan S.A. [4] FAINE, S; ADLER B; BOLIN, C.A.; PEROLAT. Leptospira and leptospirosis, 2° edition, MedSci, Melbourne, Vic Australia, 1999. [5] GREENE, C. E.; Infectious Diseases of the Dog and Cat, 3° edition, Saunders Elsevier, St. Louis, Missouri, U.S.A., 2006.

[6] I.L.S. Human leptospirosis: Guidance for diagnosis, surveillance and control. World Health Organization; International Leptospirosis Society, 2003