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A AGROECOLOGIA COMO ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL FRENTE A MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURA – UM ESTUDO NO MUNICÍPIO DE
CORONEL VIVIDA - PR
Ana Paula Stasiak UNIOESTE –Francisco Beltrão.
Resumo A pesquisa tem por objetivo geral analisar a produção agroecológica no município de Coronel Vivida como alternativa sustentável frente ao processo de modernização da agricultura, e compreender os diferentes territórios formados pelas duas categorias. A pesquisa a ser realizada é de caráter empírico e bibliográfico, pois, a mesma apresentará uma revisão bibliográfica sobre a modernização da agricultura, e sobre a Agroecologia como alternativa sustentável por parte dos agricultores familiares brasileiros, estendendo-se para o município. Para caracterizar a produção Agroecológica serão efetuadas entrevistas pré-estruturadas com os agricultores agroecológicos do município, além disso, entrevistas com alguns produtores que já praticaram esse tipo de agricultura e abandonaram a mesma, para averiguar quais as dificuldades da implantação da agroecologia no município, e vantagens e desvantagens em ambas. Palavras chave: Agroecologia. Sustentabilidade. Modernização. Agricultura. Território
Introdução
O município de Coronel Vivida – PR, fez parte do processo de modernização da agricultura
adotado pelo governo brasileiro. O município assim como todo o país adotou um padrão
agrícola voltado ao mercado nacional e internacional, privilegiando o cultivo de grãos
como a soja e o milho, que juntos correspondem a 89% da produção agrícola do município
(SEAB/ DERAL).
No entanto, segundo dados da EMATER (2011) o município apresenta uma estrutura
fundiária com predominância de pequenas e médias propriedades, sendo que, 2078
propriedades pertencem a agricultores familiares, 34 são propriedades indígenas, e apenas
195 propriedades pertencem à agricultura empresarial. Muitos não possuem mecanização
própria para o cultivo, sendo que, apenas 377 estabelecimentos do município possuíam
tratores em 2006 segundo o Censo agropecuário do IBGE.
Sabendo que a modernização da agricultura ao mesmo tempo, que trouxe um aumento da
produtividade agrícola, gerou um aprofundamento das desigualdades sociais no campo e a
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degradação dos recursos naturais, assim como, prejuízos para a saúde humana e
contaminação dos alimentos através dos agrotóxicos e insumos presentes na agricultura
convencional. É viável estabelecer alternativas sustentáveis para a agricultura com a
preservação ambiental e a sustentabilidade econômica e social da agricultura familiar nas
áreas rurais.
Através da Agroecologia que é definida por Altieri (1995 apud Hespanhol, 2008, p.127 e
128) “como ciência ou disciplina científica que apresenta uma série de princípios, conceitos
e metodologias para estudar, analisar, dirigir e avaliar agroecossistemas, com o objetivo de
favorecer a implantação e o desenvolvimento de sistemas de produção com maiores níveis
de sustentabilidade”, poderia ser proporcionado aos agricultores familiares do município
uma alternativa, que vise melhorar as condições de vida desses produtores através da
diversificação da sua produção e maior autonomia local no processo de produção, além de
contribuir para a preservação ambiental.
Desenvolvimento e metodologia
A agricultura passou por diversas transformações a partir da inserção de técnicas industriais
no seu processo produtivo. A denominada modernização da agricultura com a adoção do
pacote tecnológico da “revolução verde”, fez com que houvesse um aumento da
produtividade na agricultura, mas por outro lado, provocou mudanças significativas nas
estruturas sociais das áreas rurais, aumentando a concentração fundiária e as desigualdades
sociais. Ainda trouxe sérios problemas ambientais com a utilização de agrotóxicos, plantas
geneticamente modificadas e o cultivo de monoculturas.
O Brasil passou a adotar essas tecnologias a partir de meados da década de 1960. Ao
mesmo tempo em que vivia o seu auge da modernização da agricultura em meados da
década de 1970, já surgiam movimentos que defendiam práticas alternativas ao chamado
pacote tecnológico da “revolução verde”, nesse contexto a Agroecologia é proposta como
alternativa sustentável em relação à modernização da agricultura.
A modernização da agricultura brasileira concentradora e excludente não atende às
necessidades dos pequenos produtores que se utilizam de mão-de-obra familiar, os
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denominados agricultores familiares. Por isso vê se necessário a adoção de técnicas
alternativas e sustentáveis que atendam as necessidades ambientais, sociais e econômicas
dos mesmos.
O município de Coronel Vivida localizado no sudoeste do Paraná possui, assim como, a
mesorregião mais de 40% de seu PIB vindo da agropecuária, ou seja, 46% do PIB do
município correspondem à agropecuária. Além disso, cerca de 90% das propriedades rurais
do município são classificadas como pertencentes a agricultores familiares, no entanto,
verifica-se que a grande maioria das propriedades rurais do município pratica a agricultura
convencional, sendo que, atualmente apenas três propriedades praticam a denominada
agricultura agroecológica em suas propriedades (IBGE, 2006).
Tal dificuldade da implantação de sistemas agroecológicos por parte dos agricultores no
município é um dos objetivos da pesquisa, que visa analisar a produção agroecológica no
município de Coronel Vivida como alternativa sustentável frente ao processo de
modernização da agricultura e compreender os diferentes territórios formados pelas duas
categorias.
A pesquisa a ser realizada é de caráter empírico e bibliográfica, pois, a mesma será
realizada através de uma revisão bibliográfica sobre a modernização da agricultura e sobre
a Agroecologia como alternativa sustentável por parte dos agricultores familiares
brasileiros, estendendo-se para o município de Coronel Vivida.
Além disso, serão feitos levantamentos de dados de órgãos como o IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estátisticas), IPARDES (Instituto Paranaense de
Desenvolvimento Econômico e Social), EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária), SEAB/DERAL (Secretária de Estado da Agricultura e Abastecimento/
Departamento e Economia Rural) e EMATER, sindicatos dos trabalhadores rurais e
secretaria da agricultura da prefeitura do município de Coronel Vivida.
Para caracterizar a produção agroecológica serão efetuadas entrevistas pré-estruturadas com
os agricultores agroecológicos do município, além disso, entrevistas com alguns produtores
que já praticaram esse tipo de agricultura e abandonaram a prática, para averiguar quais as
dificuldades da implantação da Agroecologia no município e vantagens e desvantagens em
ambas.
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Por fim, delimitar os diferentes territórios criados pela agricultura convencional, e a
Agroecologia através do mapeamento dessas duas categorias, e as redes de produção e
comercialização das mesmas.
Dessa forma, tal pesquisa se justifica através da necessidade de uma análise da produção,
comercialização e atuação dos agricultores agroecológicos do município, assim como,
verificar as dificuldades e falta de apoio político e técnico necessário para a adoção de tal
prática por parte de mais agricultores do município. Ainda verificar as condições que
levaram a produtores a abandonar a prática da Agroecologia e voltar à agricultura
convencional.
A modernização da agricultura
É consenso entre diversos autores, considerar a modernização da agricultura como a
inserção de técnicas industriais na produção agropecuária. A utilização de máquinas em
substituição ao trabalho manual, a quimificação e até mesmo a utilização de crédito rural
concedido pelo governo para incentivar a aquisição de tais produtos industriais por parte
dos agricultores.
Para Delgado (1985), a agricultura brasileira se industrializou no contexto da urbanização e
industrialização brasileira, então, era viável incentivar o aumento da produção agropecuária
para atender a nova demanda urbano-industrial. Da mesma forma, de acordo com Silva
(1998), era viável incentivar o consumo industrial nacional e substituir a importação de
máquinas e insumos para a agricultura, os quais somente se internalizaram no período de
1965 a 1975.
A internalização da produção de máquinas e insumos (indústria a montante) para a
agricultura, junto com a modernização da indústria a jusante (processamento de produtos
agrícolas), segundo Silva (1998) vai se constituir na formação de um Complexo
Agroindustrial (CAI). Assim, de acordo com Delgado (1985), a agricultura se moderniza
sobe o influxo dos incentivos do Estado e induzida tecnologicamente pela indústria.
Para Delgado (1985), a política de crédito rural desenvolvida pelo Estado a partir de 1965,
com a criação do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR), o qual oferecia subsídios
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com taxas de juros diferenciadas e pré-fixadas, prazos e carência de pagamento
favoreceram a modernização da agricultura brasileira. De acordo com Santos e Silveira
(2001) aumentaram os financiamentos a produtores e cooperativas 2,3 vezes entre 1970 e
1980, sendo que este número conhece certo declínio nos anos 1990 (em 1995 os
financiamentos foram 3,8 vezes menores que em 1980).
Segundo Oliveira (2005), houve sim uma forte integração entre a indústria e a agricultura
brasileira, mas, no entanto, não se deve generalizar o processo de modernização da
agricultura, pois, existem muitos estabelecimentos agropecuários, que não se utilizam de
fertilizantes ou até mesmo máquinas na sua produção. Então segundo o autor a agricultura
brasileira apresenta uma modernização concentrada, tanto em nível espacial como em nível
setorial.
Para comprovar tais fenômenos Oliveira (2005) apresenta alguns dados retirados de censos
agropecuários. No que diz respeito ao uso de fertilizantes químicos o consumo aumentou de
12,6% dos estabelecimentos agropecuários em 1970 para 31,9% dos estabelecimentos em
1995/96. Embora tendo um aumento considerável o autor reflete que mais da metade, ou
seja, cerca de 60% dos estabelecimentos não empregavam nenhum tipo de fertilizantes.
Assim, a grande maioria dos estabelecimentos, que caracterizam a agricultura brasileira não
se utilizava desse produto.
Concordamos com as idéias de Oliveira, pois, na questão de máquinas agrícolas os dados
também demonstram que esse produto não está generalizado, sendo que, no censo
agropecuário de 1995/96 somente 30% dos estabelecimentos utilizavam-se desse recurso,
os demais (70%) ainda utilizava-se em seus trabalhos força animal ou humana. Quanto ao
número de tratores nos estabelecimentos agropecuários de 1995/96, apenas 10% possuíam
qualquer tipo de trator. Se esses dados forem comparados por regiões e setores agrícolas a
concentração será ainda maior, como exemplo, nos estabelecimentos produtores de soja
95% utilizavam-se de fertilizantes segundo o censo de 1995/96, e como mostra a tabela a
seguir a concentração regional e nacional de tratores ainda permanece, sendo que, ainda são
apenas cerca de 10% dos estabelecimentos que possuem tratores. Dos quais, as regiões que
mais possuem tratores por estabelecimentos, são respectivamente sul (24%), centro-oeste
(18%) e sudeste (16%).
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Tabela.1- Tratores existentes nos estabelecimentos agropecuários segundo grandes regiões Regiões Total de estabelecimentos Tratores existentes Estabelecimentos/ % Total Norte 479.158 16.657 3% 25.923 Nordeste 2.469.070 41.493 1% 58.736 Sudeste 925.613 150.775 16% 241.690 Sul 1.010.335 249.700 24% 341.811 Centro-Oeste 319.954 60.677 18% 119.893 Brasil 5.204.130 519.302 9,9% 788.053 Fonte: IBGE, Censo Agropecuário, 2006
Ao analisarmos esses dados percebe-se que o pacote da chamada revolução verde iniciada
com a modernização da agricultura nos anos de 1970 privilegiou a agricultura comercial
excluindo desse processo a maioria dos pequenos proprietários, ou seja, a agricultura
camponesa.
De acordo com Santos e Silveira (2008,p.120),
Hoje, tanto os cinturões, quanto as frentes pioneiras revelam que o território brasileiro tem incorporado muitas das características da chamada revolução agrícola, mas especialmente nas culturas de exportação, aquelas que consolidam a divisão do trabalho mundial. Assim, esses produtos acabaram por invadir, com velocidade cada vez maior, áreas antes destinadas a produções domésticas. Houve uma desvalorização das agriculturas alimentares básicas e de tradição nacional (como arroz, feijão e mandioca), e isto se dá com a colaboração do crédito público, da informação, da propaganda, e dos novos consumos... a produção de soja, milho, cana-de-açúcar e laranja vêem crescer rapidamente as suas produções depois de 1960.
Percebe-se que a modernização da agricultura além de se caracterizar concentradora, ela
também acabou por privilegiar alguns setores, principalmente aqueles destinados ao
mercado externo em detrimento aos destinados ao mercado interno. Nesse processo de
modernização agrícola e redirecionamento dos setores produtivos, a agricultura comercial
realizada em grandes propriedades é responsável pela maioria da produção para exportação,
enquanto a agricultura familiar, de acordo com Santos e Silveira (2008) é responsável por
30% do volume da produção agropecuária, e produz principalmente para o mercado
interno.
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No entanto segundo Oliveira (2005), os financiamentos agrícolas ficam concentrados nas
mãos de latifundiários, enquanto a agricultura camponesa recebe uma pequena parte de
todo o crédito destinado, sendo que, “... no ano de 1995/96, a obtenção de crédito estava
dirigida socialmente, pois 3,5% do total chegou aos estabelecimentos com menos de 10 ha;
26,5% aos 10 a 100 ha, e os restantes 70% foram destinados às propriedades de mais de
100 ha” (p.474).
Esse fato continua acontecendo em nível de valores percentuais concedidos para
agricultores familiares e não familiares, sendo que, estes últimos continuam com a maior
percentagem em valores. De acordo com valores retirados do BACEN (Banco Central do
Brasil), do total de crédito rural concedido a produtores e cooperativas em 2010 no Brasil,
67% dos contratos realizados foram para a agricultura familiar, através do PRONAFi, no
entanto, apenas 14% do valor destinado para crédito rural ficou com essa classe. O
PRONAF representou uma grande conquista por parte da agricultura familiar, que passou a
participar de uma forma mais ativa na aquisição de crédito para sua produção. Ainda é
necessário aumentar o percentual em valores, mesmo que esse tenha aumentado
consideravelmente nos últimos anos, como mostra os gráficos a seguir:
Graf.1 - valores disponibilizados para o Pronaf e taxa de financiamentos realizados
Fonte: MDA/SAF disponível em http://www.mda.gov.br/portal/saf/programas/pronaf/2259286-acessado em 31/01/2011. *Valor disponibilizado refere-se a bilhões de reais.
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Graf.2 – valores de financiamento realizados pelo Pronaf e sua evolução
Fonte: MDA/SAF disponível em http://www.mda.gov.br/portal/saf/programas/pronaf/2259286-acessado em 31/01/2011. *Valor realizado refere-se a bilhões de reais.
Ao analisarmos os gráficos podemos tirar algumas conclusões. Uma delas é de que, como
demonstra o primeiro gráfico, nem todo o valor disponibilizado para o PRONAF por parte
do governo foi adquirido pelos agricultores familiares. De acordo com o
Censo/Agropecuário de 2006 realizado pelo IBGE, cerca de 3,5 milhões de
estabelecimentos da agricultura familiar não obtiveram financiamento, especialmente por
que “não precisaram” ou por “medo de contrair dívidas”. De acordo com o gráfico no ano
safra de 2005/06 somente 85% do valor disponibilizado para financiamento foi realizado,
em 2006/07 essa taxa caiu para 84% e em 2007/08 o percentual realizado foi de 75%.
Ao mesmo tempo, que essa taxa de financiamentos realizados em relação ao dinheiro
disponibilizado diminuiu, o valor disponibilizado aumentou, assim como, o valor de
financiamentos realizados aumentou significativamente, tendo uma evolução de 319% dos
anos de 1999/2000 até 2007/2008.
As políticas públicas destinadas à agricultura familiar como a questão do PRONAF, não
estão sendo suficientes para atender as necessidades dessa classe, pois de acordo com
Hespanhol (2008,p.86) “se fazem necessárias a disponibilização de serviços de assistência
técnica e extensão rural públicos de qualidades e a criação de canais preferenciais para a
comercialização de produtos gerados por tais produtores”.
De acordo com o Censo Agropecuário de 2006, o Brasil ainda possui uma grande
concentração de terra, em relação aos estabelecimentos da agricultura familiariii e os
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agricultores não familiares, segundo o censo a agricultura familiar corresponde a 84,4% dos
estabelecimentos brasileiros, sendo que, isso corresponde a apenas 80,25 milhões de
hectares, ou seja, 24,3% da área ocupada pelos estabelecimentos brasileiros. Já os
estabelecimentos não familiares, apesar de representarem apenas 15,6% do total de
estabelecimentos, ocupavam 75,7% da área ocupada.
Assim, ao analisarmos esses dados, verifica-se que a agricultura familiar predomina no
Brasil em comparação a não familiar, sendo que, a agricultura familiar abrange uma menor
percentagem na área ocupada do país, assim como, nos financiamentos rurais e nos espaços
para produção de commodities. Podemos perceber que a modernização da agricultura esta
concentrada nas mãos de poucos e em algumas regiões do país.
Existem várias polêmicas em relação ao processo de modernização agrícola, tanto na
questão sócio-cultural de concentração de terra, expulsão dos trabalhadores através da
mecanização; quanto em questões econômicas como a modernização conservadora, na qual
conserva as estruturas fundiárias e privilegia algumas regiões em detrimento a outras;
questões políticas, onde políticas creditícias abrangem uma pequena parte dos produtores
rurais e concentra os maiores recursos nas mãos de médios e grandes proprietários de terra,
além, do redirecionamento setorial que acabou priorizando as culturas destinadas ao
mercado externo.
O que se percebe é que tanto por parte das empresas globais como por parte do Estado, o
que vêm sendo priorizado é a agricultura comercial e a agricultura “modernizada”, que
abrangem pequena parte dos agricultores brasileiros. A grande maioria que é composta por
agricultores familiares ( 84,4 % das propriedades segundo Censo Agropecuário - IBGE,
2006) estão sendo obrigados a se ajustar a essas novas tecnologias, mesmo que, as mesmas
não sejam adequadas ao porte de suas propriedades e condições socioeconômicos. Faz-se
necessário uma política para o desenvolvimento de tecnologias agroecológicas para o
fortalecimento da agricultura familiar e a permanência dos mesmos nas áreas rurais.
A Agroecologia como alternativa sustentável frente à modernização da agricultura
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Foi a partir da Segunda Revolução Industrial no final do século XIX e início do XX, que a
agricultura começou a implantar técnicas industriais no seu processo de produção, como: o
melhoramento genético; utilização de fertilizantes químicos e mecanização das atividades
agrícolas. Essas inovações tecnológicas permitiram uma grande elevação da produtividade
e a sua dependência em relação à indústria (Hespanhol, 2008).
No entanto, segundo Hespanhol (2008) essas modificações tecnológicas não trouxeram
somente benefícios como o aumento da produtividade, principalmente no que se refere às
culturas de exportação, mas provocaram diversos problemas sociais (aprofundamento das
desigualdades sociais e estruturas fundiárias; intenso êxodo rural e endividamento de
pequenos agricultores) e problemas ambientais (erosão e compactação do solo;
contaminação dos recursos hídricos, dos alimentos, do homem e animais; perdas da
biodiversidade) entre outros.
Portanto é importante o incentivo de práticas alternativas visando à melhora de qualidade
de vida e proteção ambiental, além disso, práticas que atendam as necessidades
socioeconômicas dos agricultores familiares. Para Gliessman (2001, p.54) “a Agroecologia
proporciona o conhecimento e metodologia necessários para desenvolver uma agricultura
que é ambientalmente consistente, altamente produtiva e economicamente viável”.
Como afirma o autor se faz necessária a “valorização do conhecimento local e empírico dos
agricultores, a socialização desse conhecimento e sua aplicação ao objetivo comum da
sustentabilidade” (p.54). Essa característica da Agroecologia se contrapõe a agricultura
convencional, a qual incentiva a industrialização da agricultura e a privatização do
conhecimento, além disso, uma agricultura sustentável garantiria o controle local sobre os
recursos, garantindo a igualdade de acesso às práticas, conhecimento e tecnologias
agrícolas.
De acordo com Guterres (2006), a transição da agricultura convencional para uma
agricultura agroecológica não é algo simples, mas sim um processo longo que necessita
entre outros fatores de um planejamento de ações, com base nos grupos e comunidades
rurais, buscando a articulação das dimensões econômicas, política, tecnológica, social,
cultural e ambiental; as decisões tomadas devem ser executadas com um constante
monitoramento, avaliação e replanejamento; os movimentos sociais da Via Campesina
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devem articular-se com instituições de assistência técnica, ensino, pesquisa, buscando a
participação das famílias dos agricultores para a definição de tecnologias apropriadas; e
assim fortalecer as iniciativas educacionais apropriadas para agricultura camponesa,
baseado na pedagogia da alternância, estabelecendo uma estreita relação entre a teoria e
prática, propiciando a construção coletiva de saberes.
A transição para a agricultura agroecológica requer organização por parte dos agricultores
e incentivos por parte do Estado para o desenvolvimento de tecnologias adequadas, que
promovam a sustentabilidade da agricultura. De acordo com Alves (2008) a agricultura
sustentável pode ser definida como um processo de mudanças nos sistemas rurais de
produção, afetando-os de forma multidimensional, esse processo, envolve diversas áreas
como o desenvolvimento econômico, as condições sociais, assim como, a conservação de
valores naturais e valores culturais.
Nessa perspectiva observa-se que a agricultura sustentável abrange diversas dimensões e
como o próprio autor cita, ela não pode obedecer a uma classificação homogênea, pois,
cada comunidade rural possui suas características culturais e históricas. Além disso, a
agricultura deve ser sustentável ecologicamente, economicamente e socialmente, pois, ela
deve apresentar alternativas ambientais viáveis, além de possibilitar a permanência e
sobrevivência do agricultor familiar nas áreas rurais.
Assim, concordamos com Hespanhol (2008), quando o mesmo afirma que a agricultura
praticada por pequenos produtores devem ser pensadas além do mercado, pois, o mesmo
não tem oferecido boas alternativas de renda para a agricultura familiar, sendo que, o que
vêm sendo priorizada são os complexos da soja e sucroalcooleiro. A melhor alternativa para
a agricultura familiar, que não consegue concorrer ao grande aparato tecnológico da
revolução verde, seria a diversificação produtiva.
Como se sabe a modernização agrícola foi responsável pela expulsão de grande parte de
pequenos agricultores que não conseguem acompanhar as tendências do mercado, além do
endividamento de muitos por tentarem adotar o pacote tecnológico da “revolução verde”,
além disso, verifica-se o aumento da concentração fundiária no campo. Dessa forma, a
diversificação da produção e a adoção de técnicas ecologicamente corretas contribuiriam
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para a permanência do agricultor familiar nas áreas rurais e a sustentabilidade dos recursos
naturais
Altieri (2004) propõe a Agroecologia como estratégia para o desenvolvimento que possa ao
mesmo tempo: melhorar a qualidade de vida dos camponeses; aumentar a produtividade da
terra de agricultores através de tecnologias de baixo uso de insumos externos para reduzir
os custos da produção; e gerar renda através da produção e processamento de alimentos
com tecnologias apropriadas às condições do agricultor.
Assim, para o autor a agricultura sustentável requer uma mínima utilização de recursos
externos, maximizando o uso de recursos locais e a diversificação na produção. Para isso,
seriam necessárias políticas voltadas à pesquisa e desenvolvimento de tecnologias
apropriadas às realidades locais, além de incentivos governamentais para produção e
pesquisa, e a divulgação de dados que revelem a depreciação ambiental causadas por
práticas inapropriadas da agricultura convencional.
Para Caporal e Costabeber (2007), os principios da Agroecologia que é vista como uma
ciência que abarca contribuições de diversas disciplinas científicas, além do conhecimento
local, é capaz de promover o desenvolvimento sustentável rural, que está alicerçado em seis
dimensões: a ecológica, econômica e social em primeiro nível; cultural e política num
segundo nível; e em terceiro nível a ética.
Para os autores a Agroecologia apresenta os princípios que direcionam a agricultura para a
sustentabilidade, pois, busca conciliar a multidimensionalidade do território, valorizando as
condições sociais, naturais e econômicas, diferentemente da agricultura convencional que
concentra seus interesses na dimensão econômica. Assim:
Como resultado da aplicação dos princípios, conceitos e metodologias da Agroecologia, podemos alcançar estilos de agricultura de base ecológica e, assim, obter produtos de qualidade biológica superior. Mas, para respeitar aqueles princípios, esta agricultura deve atender requisitos sociais, considerar aspectos culturais, preservar recursos ambientais, apoiar a participação política dos seus atores e permitir a obtenção de resultados econômicos favoráveis ao conjunto da sociedade, numa perspectiva temporal ao longo prazo que inclua tanto a presente como as futuras gerações (ética de solidariedade) (CAPORAL E COSTABEBER, 2007, P.116).
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Assim, se faz necessário uma mudança estrutural no processo de produção agrícola, que
vai além da simples troca de insumos químicos por insumos orgânicos, busca-se um
desenvolvimento territorial baseado nas condições sociais e locais. A Agroecologia é uma
alternativa, em contrapartida a homogeneização da produção proposta pela agricultura
convencional, pois, engloba as especificidades locais e territoriais, valorizando o
conhecimento tradicional e os recursos disponíveis no território, em oposição à aquisição
de recursos externos.
Conclusão
A busca pelo desenvolvimento rural sustentável é um desafio a ser superado pela
agricultura brasileira como um todo. As maiores dificuldades se encontram nos valores
impostos pelo sistema capitalista na sociedade como um todo, onde, a maior preocupação
esta no crescimento econômico, desvinculado da equidade social e preservação ambiental.
O campo brasileiro, se tornou uma extensão da indústria, estando subordinado às demandas
do mercado externo e interno, sendo que, as condições socioeconômicas dos agricultores
familiares não é prioridade nesse contexto, e muito menos a preservação do meio ambiente.
As propriedades agrícolas do município de Coronel Vividas caracterizam-se pela grande
representatividade da agricultura familiar, assim como, em todo o sudoeste paranaense. No
entanto, a maior parte das propriedades agrícolas do município pratica a agricultura
convencional, através da utilização de mecanização e agroquímicos, mesmo, sendo a
maioria das propriedades desprovidas de mecanização própria, sendo que, dos 2037
estabelecimentos rurais, apenas 377 possuíam tratores. Assim, a maioria dos
estabelecimentos dependem de mecanização de terceiros para produção, aumentando os
custos de produção e diminuindo suas rendas.
Mesmo assim, a agricultura convencional predomina entre os estabelecimentos rurais do
município, pois, apenas 3 estabelecimentos se consideram produtores agroecológicos,
sendo que no passado esse número já foi maior. Assim, buscamos entender quais as
dificuldades encontradas pelos agricultores familiares em desenvolver uma agricultura
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alternativa, como é o caso da Agroecologia, e as vantagens que os mesmos vêem em adotar
uma forma diferenciada de produção.
Nossa pesquisa esta apenas em estagio inicial, sendo que, as principais hipóteses para a
pouca representatividade da Agroecologia no município, seja a falta de incentivos políticos,
a falta de mão-de-obra, auxilio técnico, tecnologia adequada e conscientização por parte
dos produtores e consumidores.
Assim, percebe-se a necessidade de planejamento para o desenvolvimento local, visando o
desenvolvimento rural sustentável adequado às condições socioeconômicas e ambientais do
município.
Notas
iO PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – iniciou suas atividades em 1996, no governo de Fernando Henrique Cardoso. De acordo com o documento de criação do programa o seu objetivo principal é “propiciar condições para o aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria da renda, contribuindo para a melhora da qualidade de vida e a ampliação da cidadania por parte dos agricultores familiares”(MDA/SAF). ii De acordo com a lei 11.326, de 24 de julho de 2006, que estabelece as diretrizes para a formulação da política nacional da agricultura familiar e empreendimentos familiares, considera agricultor familiar aquele que: não tenha a qualquer título, área maior que quatro módulos fiscais; utilize mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas no seu estabelecimento; tenha renda familiar originada do seu estabelecimento ou empreendimento; e dirija seu estabelecimento ou empreendimento com a própria família.
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