14.10.13 qual a viga mestra da ginastica geral
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QUAL É A VIGA MESTRA DA GINÁSTICA GERAL?1
Profa. Eliana de Toledo
Mestranda em Educação Física
Fac. de Educação Física – Unicamp
Realizou-se no dia 25 de maio de 1996, na Faculdade de Educação Física da
Unicamp, o Encontro de Ginástica Geral, que contou com a participação de
professores comprometidos em discutir a conceituação e a área de aplicação da
Ginástica Geral.
Baseados numa bibliografia específica, na bagagem e atuação profissional de
cada participante, ocorreram debates, primeiramente em pequenos grupos e,
posteriormente, num único grupo, no intuito de trocar conhecimentos e sistematizar, a
partir de um consenso, uma possível conceituação para a Ginástica Geral.
Muitas foram as questões levantadas e pouco pode-se concluir, talvez porque, na
qualidade de primeiro encontro sobre este tema, muitas sugestões e informações foram
trocadas, o que é muito relevante, pois sem elas não poderíamos construir novas
reflexões.
A análise de como ela se apresenta atualmente, em festivais e encontros, é
importante para que possamos detectar o que dessa realidade desejamos mudar e/ou
manter, assim como levantar suas características principais e sua finalidade, para melhor
delimitarmos sua conceituação. No entanto, a dificuldade em sintetizar e organizar estas
informações sobre a Ginástica Geral numa conceituação poderia talvez ter sido
facilitada se discutíssemos qual é a viga mestra, o eixo, a base que a estrutura como tal.
Existe um fio condutor que deve unir todos esses dados e, talvez por isso, seja
interessante antes de determinarmos suas formas e características, desvendarmos qual é
esse fio condutor, para que se estabeleça uma coerência entre todos estes dados.
1 Este texto foi publicado na Coletânea ENCONTRO DE GINÁSTICA GERAL, cuja citação seria:
TOLEDO, Eliana. Qual é a Viga Mestra da Ginástica Geral? In: GALLARDO et alli. Coletânea
ENCONTRO DE GINÁSTICA GERAL. Campinas: Gráfica da Unicamp, 1997. p.63-70.
Nesse pensamento, se ela for tratada como uma manifestação da cultura
corporal, cuja viga é a Ginástica, far-se-á necessário levantar quais são os fundamentos
da Ginástica, um pouco de sua história (desde sua conceituação na Antiguidade até suas
denominações, oriundas das escolas de Ginástica), quais os fundamentos que
caracterizam uma ação corporal de ação gímnica, para analisarmos se realmente é esse o
caminho que desejamos seguir.
Uma vez vinculada à Ginástica, sua prática justifica-se na Escola, segundo
COLETIVO DE AUTORES (apud TOLEDO, 1995), pois:
“... a presença da ginástica no programa se faz
legítima na medida em que permite ao aluno a
interpretação subjetiva das atividades ginásticas,
através de um espaço amplo de liberdade para
vivenciar as próprias ações corporais, auxiliando a
compreensão das relações através das exercitações
só possíveis em grupo, caracterizando a ‘co-
educação’.” (p.20)
A partir deste eixo, a Ginástica Geral pode apropriar-se ou utilizar-se de outras
manifestações, como as modalidades esportivas, danças folclóricas, ballet, jazz etc.,
desde que as ações gímnicas estejam presentes, como, por exemplo, a coreografia da
delegação de Portugal na X Gymnaestrada Mundial, que combinava os fundamentos do
basquetebol (drible, passe, arremesso e rebote) com saltos no trampolim acrobático.
Assim, a manifestação pura ou idêntica dessas atividades citadas anteriormente não
seria considerada Ginástica Geral, posto que cada uma delas já possui um campo de
atuação próprio, pré-estabelecido, não havendo “respeito” ao vínculo com os
fundamentos da Ginástica.
Se a viga mestra for a Educação Física Formativa, aquela que se preocupa,
fundamentalmente, com a formação do indivíduo, será necessário abarcar o conteúdo
desta área e sua respectiva fundamentação, a partir de uma análise histórica e atual de
suas características e denominações. Neste caso, a Ginástica Geral deveria receber
outro nomenclatura, posto que não mais estará, “obrigatoriamente”, vinculada à
Ginástica, permitindo, assim, a diversidade de manifestações da cultura corporal, sejam
elas “puras” ou combinadas. Neste caso, a apresentação da fundamentação teórica da
Educação Física Formativa pode ser um fator decisivo para que não corramos o risco de
fundir algumas manifestações entre si, como o ballet, o jazz e a ginástica, os quais
possuem algumas características em comum, ou mesmo de abranger diversas
manifestações da cultura corporal de forma tão extensa que dificultaria sua
conceituação e, portanto, sua compreensão.
No âmbito escolar, ambas as propostas constituem-se conteúdos da Educação
Física, pois, segundo COLETIVO DE AUTORES (1992),”os conteúdos da Educação
Física Escolar são: jogo, esporte, ginástica e dança, assim como demais manifestações
que estejam relacionadas com a cultura corporal...” (p. 77).
Já REZENDE (mimeo) remete-se à capacitação como fio condutor, sem no
entanto, desvincular-se da Ginástica,
“Assim, os treinos de GG podem ser organizados
diferentemente de outras modalidades, onde a
capacitação é decisiva,,definindo o contexto de
desenvolvimento da atividade. É possível por
exemplo: 1) realizar treinamentos com grupos
maiores, mistos, heterogêneos; 2) praticar em
qualquer idade; 3) compor grupos sem exclusão
dos menos habilidosos; 4) motivar a capacitação...
Esses princípios de organização expressam uma
maneira de tratar a capacitação e, é isso que define
a Ginástica Geral.”
Será possível encontrar um meio termo entre essas propostas? Ou mesmo partir
de outro paradigma? Talvez sim, pois, tratando-se de elaboração de um conceito,
muitas possibilidades devem ser lançadas e refletidas.
Provavelmente, partindo de uma viga mestra sólida, as demais questões podem
ser melhor definidas. Com relação à caracterização da Ginástica Geral, o fator não
competitivo atribuído a ela destaca-se das demais e parece ser, por enquanto, um ponto
de consenso.
A questão da utilização de material alternativo, ou materiais tradicionais,
também é muito presente e relevante e, segundo SAUR (s.d.),
“O uso do aparelho manual destina-se, de modo
geral, a facilitar a aquisição do sentido pelo
movimento, a levar à execução fluente do
movimento orgânico e sua completa desinibição, a
favorecer a educação rítmica, a cooperar na
formação corporal e a ampliar as possibilidades de
associações e composições de movimento.” (p.27)
As demais características levantadas, como a participação, criatividade, ênfase
no processo de elaboração, socialização etc., devem ser cuidadosamente propostas, pos
estas são encontradas em muitas modalidades esportivas competitivas ou encontram-se
vinculadas à metodologia utilizada por professores, em outras propostas escolares.
Assim, nessa questão sobre a caracterização da Ginástica Geral, o conhecimento dessa
viga mestra seria um fator delimitador.
Outro ponto fundamental, que se beneficiaria com este conhecimento, é a
finalidade da Ginástica Geral. Seria a vivência das atividades propostas? Seria o
processo de elaboração da coreografia? Seria o produto final dessa composição? Seriam
essas quatro possibilidades? Considero a última proposta a mais coerente, pois valoriza
a apropriação do conhecimento pelo aluno em aula, o processo democrático de escolha,
seleção e elaboração dos movimentos e materiais que serão utilizados na aula ou na
coreografia, viabiliza a compreensão e elaboração de uma coreografia (passos, ritmo,
formações, movimentos de ligação, noções de conjunto etc.), possibilita aos
participantes vivenciarem a exposição de um trabalho de forma organizada (escolha do
uniforme, posicionamento antes e depois da apresentação, tratamento com o público,
expressão, etc.), ou seja, abrange todas as instâncias que permeiam uma coreografia,
possibilitando a participação de todos nesses momentos.
A esse respeito é ilustrativa a citação de uma professora que, ao longo de trinta
anos de magistério, segundo WITTER E SOMÔNACO (1984),
“... teve diversas oportunidades de verificar que,
quando os alunos partilhavam da definição, não
apenas dos objetivos, mas também de outros
aspectos do processo ensino-aprendizagem, o nível
de empenho nas tarefas, de motivação para a
aprendizagem, crescia.” (p.44)
Esse processo de definição conceitual acerca da Ginástica Geral que estamos
vivenciando já ocorreu com relação à Ginástica, aproximadamente na década de
cinqüenta, na Europa, e são interessantes os seguintes depoimentos:
El estúdio de toda ciência comienza por la
terminología. Sin embargo, si generalmente en los
términos tecnicos están definidos, en los estudios
relativos a la gimnasia nada hay”
Dijo Lucien DEHOUX apud LANGLADE e
LANGLADE (s.d, p. 422)
“La imprecisión y los vaivenes, y anún una cierta
liviandad en la literatura especializada, son um
hecho peligroso que, de manera general, prejudica
el desarrollo de los ejercícios físicos. Pero en el
dominio de la sistemática, la falta de una
terminologia neta, es fatal por sus concuencias.”
Hans GROLL apud LANGLADE e LANGLADE
(s.d., p.422)
GROLL apresentou sua inquietação com relação à terminologia da Ginástica no
III Congresso Mundial de Educação Física, em Estambul, em 1953, coincidentemente a
data em que se realizou a I Gymanestrada Mundial.
Muitas são as questões a serem debatidas acerca da Ginástica Geral e, a nós
professores de Educação Física, que valorizamos esta nova manifestação corporal, cabe
o empenho e a dedicação para organizá-la.
Referências Bibliográficas
COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo:
Cortez, 1992.
LANGLADE, Alberto, LANGLADE, Nelly. Teoria General de la Gimnasia. Buenos
Aires: Editorial Stadium, s.d.
REZENDE, Carlos R. A. A Capacitação na Ginástica Geral. (mímeo).
SAUR, Érika. Ginástica Rítmica Escolar. Rio de Janeiro: Tecnoprint, s.d.
TOLEDO, Eliana de. A Ginástica Geral como uma possibilidade de ensino de Ginástica
nas aulas de Educação Física. Monografia (Licenciatura em Educação Física) –
Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas, 1995.
WITTER, Geraldina Porto, SOMÔNACO, J.F.B. Psicologia da Aprendizagem. São
Paulo: EPV, 1984.