wuchereria bancrofti - cap. 35

10
~chereria bancrofti /) Filariose ~infática Gilberto Fontes Eliana Maria Maurício da Rocha A ordem Spimrida apresenta grande número de espé- cies, parasitando mamíferos, inclusive humanos, além de aves, anfíbios e répteis, com algumas características co- muns: são todos vermes finos e delicados, encontrados nos vasos linfáticos, vasos sanguíneos, tecido subcutâneo, ca- vidade peritoneal ou mesentério, e necessitam de um hos- pedeiro invertebrado. Das espécies encontradas no Brasil parasitando humanos, apenas uma é autóctone das Améri- cas, a Mansonella ozzardi, sendo as demais originárias da Asia e Áfnca. Suspeita-se que para aqui chegaram durante o tráfico de escravos e se adaptaram, em vista da presença de um bom hospedeiro invertebrado (artrópodes) e seme- ihança com a região de origem. A ordem Spininda possui vá- rias famílias, das quais duas têm interesse médico: Oncho- cercidae e Dracunculidae. A Tabela 35.1 mostra as espéci- es que podem parasitar o ser humano. Dessas nove espécies, três são encontradas no Brasil parasitando humanos: Wuchereria bancrofti (Cobbold, 1877), Onchocerca volvulus (Leuckart, 1893) e Mansonella ozzardi (Manson, 1897). A Dirofilaria immitis (Leidy, 1856) é encontrada naturalmente parasitando cães, mas em alguns países, inclusive no Brasil, foram assinalados casos hu- manos (hospedeiros acidentais). As cinco espécies restan- tes (Brugia malayi, Brugia timori, Mansonella perstans, Loa Zoa, Dracunculus medinensis) não são encontradas em nosso país. Neste capítulo e no próximo serão apresentadas cada uma dessas espécies. WUCHERERIA BANCROFTI - FILARIOSE LINFÁTICA A filariose linfática humana é causada por helmintos Nematoda das espécies Wuchereria bancrofti, Brugia ;nalayi e B. timori. Essa enfermidade é endêmica em várias regiões de, muita pobreza e com clima tropical ou subtropical na Asia, Afnca e Américas, sendo sério problema de saúde pública em países, como China, Índia, Indonésia e partes les- te, central e oeste da Áfnca. E estimada em 1 bilhão a popu- lação que vive em áreas de risco de contrair a infecção e em 120 milhões o número de parasitados. Destes, aproximada- mente 112 milhões são portadores de K bancrofii e oito mi- lhões são portadores de B. malayi ou B. timori (minoria). A Famílias Subfamilias Gêneros Espécies Wuchereria W bancrofti Brugia 6. malayi Onchocercidae B. timori Fimeas 2 a 4 vezes Onchocercinae Maiores que os machos e apresentando Onchocerca O. volvulus vulva Mansonella M. ozzardi M. perstans Dirofilarinae [-filaria D. immitis L. loa L Dracunculidae Fêmeas sem vulva e muito maiores [~racunculinae que o macho [ Dracunculus D. medinensis Capitulo 35

Upload: fernando-guarnieri

Post on 24-Jul-2015

263 views

Category:

Education


8 download

TRANSCRIPT

Page 1: Wuchereria bancrofti - cap. 35

~ c h e r e r i a bancrofti /) Filariose ~ in fá t i ca

Gilberto Fontes Eliana Maria Maurício da Rocha

A ordem Spimrida apresenta grande número de espé- cies, parasitando mamíferos, inclusive humanos, além de aves, anfíbios e répteis, com algumas características co- muns: são todos vermes finos e delicados, encontrados nos vasos linfáticos, vasos sanguíneos, tecido subcutâneo, ca- vidade peritoneal ou mesentério, e necessitam de um hos- pedeiro invertebrado. Das espécies encontradas no Brasil parasitando humanos, apenas uma é autóctone das Améri- cas, a Mansonella ozzardi, sendo as demais originárias da Asia e Áfnca. Suspeita-se que para aqui chegaram durante o tráfico de escravos e se adaptaram, em vista da presença de um bom hospedeiro invertebrado (artrópodes) e seme- ihança com a região de origem. A ordem Spininda possui vá- rias famílias, das quais duas têm interesse médico: Oncho- cercidae e Dracunculidae. A Tabela 35.1 mostra as espéci- es que podem parasitar o ser humano.

Dessas nove espécies, três são encontradas no Brasil parasitando humanos: Wuchereria bancrofti (Cobbold, 1877), Onchocerca volvulus (Leuckart, 1893) e Mansonella ozzardi (Manson, 1897). A Dirofilaria immitis (Leidy, 1856) é encontrada naturalmente parasitando cães, mas em alguns

países, inclusive no Brasil, já foram assinalados casos hu- manos (hospedeiros acidentais). As cinco espécies restan- tes (Brugia malayi, Brugia timori, Mansonella perstans, Loa Zoa, Dracunculus medinensis) não são encontradas em nosso país. Neste capítulo e no próximo serão apresentadas cada uma dessas espécies.

WUCHERERIA BANCROFTI - FILARIOSE LINFÁTICA

A filariose linfática humana é causada por helmintos Nematoda das espécies Wuchereria bancrofti, Brugia ;nalayi e B. timori. Essa enfermidade é endêmica em várias regiões de, muita pobreza e com clima tropical ou subtropical na Asia, Afnca e Américas, sendo sério problema de saúde pública em países, como China, Índia, Indonésia e partes les- te, central e oeste da Áfnca. E estimada em 1 bilhão a popu- lação que vive em áreas de risco de contrair a infecção e em 120 milhões o número de parasitados. Destes, aproximada- mente 112 milhões são portadores de K bancrofii e oito mi- lhões são portadores de B. malayi ou B. timori (minoria). A

Famílias Subfamilias Gêneros Espécies

Wuchereria W bancrofti Brugia 6. malayi

Onchocercidae B. timori Fimeas 2 a 4 vezes Onchocercinae Maiores que os machos e apresentando Onchocerca O. volvulus vulva Mansonella M. ozzardi

M. perstans Dirofilarinae [-filaria D. immitis

L. loa

L

Dracunculidae Fêmeas sem vulva e muito maiores [~racunculinae que o macho

[ Dracunculus D. medinensis

Capitulo 35

Page 2: Wuchereria bancrofti - cap. 35

3

k<l ,

filariose l i n h c a no continente americano é causada exclu- sivamente pela R! bancmfti, sendo também conhecida como &Edntiase, em urna de suas manifestações na fase crônica.

I Wuchemria :.;T3 . bancmffi -0 ,. - ,.L.?.

- Loa loa ..

A 8: bancrofti possui diferentes formas evolutivas nos hospedeiros vertebrados (humanos) e invertebrados (mos- quitos vetares).

Verme adulto macho. Corpo delgado e branco-leitoso. Mede de 3,5 a 4cm de comprimento e 0,lmrn de diâmetro. Ex- tremidade anterior afilada e posterior enrolada ventralmente. ,:-v-* S. Dipetalonema e .

perstans - O - .-'-a-'" a

.., -.-.--.-. -9. -,---3 , . Verme adulto fêmea. Corpo delgado e branco-leitoso. Mede de 7 a 10cm de comprimento e 0,3mm de diâmetro. Possui órgãos genitais duplos, com exceção da vagina, que é única e se exterioriza em urna vulva localizada próximo à extremidade anterior.

c - - Mansonella e =. .sh.~~~-,~. -- -- ozzardi 1 7 % -.??L--.-.-- ....

Microführia. Esta forma também é conhecida como em- brião. A fêmea grávida faz a postura de microfilárias, que possuem uma membrana extremamente delicada e que fun- ciona como uma flexível". A rnimflária mede de 250 a 3 0 0 p de comprimento e se movimenta ativamente na cor- rente sanguínea do hospedeiro. A bainha cuticular lisa é apoiada sobre numerosas células subcuticulares (que irão formar a hipoderme e a musculatura do helminto adulto) e células somáticas (que irão formar o tubo digestivo e Ór- gãos). A presença da bainha é importante, pois alguns filarídeos encontrados no sangue não possuem tal estrutu- ra, sendo este um dos critérios morfológicos para o diagnós- tico diferencial (Figs. 35.1 e 35.2).

Dipetalonema

Fls. 35.2 - Diferenciecão das microfi1c)rias de diferentes es~bcies. base nas extremidades interiores (direita) e posteriores (esqhm'a). Notar 4 a distnbuiç8o dos núcleos e a presença ou aus6ncia da bainha (Original da Markell, EK & Voge, M.: Medica1 Parasitology, 5. ed., WB Saunders Compeny, 1981).

I

Larvas. São encontradas no inseto vetor. A larva de pri- meiro estádio (L,) mede em torno de 3 0 0 p de comprimen- to e é originária da transformação da microfilária. Essa lar-

va se diferencia em larva de segundo estádio (L,), duas a três vezes maior, e sofie nova muda originando a larva in- fectante (L,), que tem entre 1,5 e 2 , O p de comprimento (Fig,

Hhbitat. Vermes adultos machos e Emeas permanecem, juntos nos vasos e gânglios linfáticos humanos, vivendo, em média, quatro a oito anos. As regiões do corpo humanq,

Fig. 35.1 - Micmfilárias encontradas em humanos: A) W. bancroíti, coh- pleta, mostrando a bainha; 6) detalhe da cauda da micmfilhna de W. bancmfti mostrando núcleos irregulares, não atingindo a extremidade, e com bainha; C) M, ouardi, núcleos regularmente dispostos, não atingindo a extremida- de caudal, que 6 fina (encontrada no sengue); D) 0. volvuius, núcleos i m - gulares, não atingindo a extremidade caudal, que 6 dobrada em gancho (en- contrada em retalho cutaneo - ver Capltulo 36 - Diagnóstico).

Fig. 35.3 - Larva infectante de Wuchereria bancrofti saindo da probós de Culex quinquefasciatus (Original dos Pmfs. Gilberto Fontes e Eliana & M. da Rocha)

Page 3: Wuchereria bancrofti - cap. 35

Horários de coleta de sangue

Pacientes positivos

Microfilarernia

Fig. 35.4 - Periodicidade de microfilárias de Wuchereria bancrofti: porcentagem de microfilaremia média e porcentagem de exames positivos com base na contagem de microfilárias em amostras de 60mm3 de sangue periférico, colhidas em diferentes horários de 49 parasitados de Maceió-A1 (Profs. Eliana M.M. da Rocha 8 Gilberto Fontes, 1991).

que normalmente abrigam as formas adultas são: pélvica (atingindo pernas e escroto), mamas e braços (mais raramen- te). São frequentemente localizados nos vasos linfaticos do cordão espermático, causando aumento e dano escrotal. As microfilárias eliminadas pela fêmea grávida saem dos ductos linfáticos e ganham a circulação sangüínea do hospedeiro.

Periodicidade. Uma característica peculiar deste parasi- to, verificada na maioria das regiões onde é encontrado, é a periodicidade noturna de suas microfilárias no sangue pe- riférico do hospedeiro humano; durante o dia, essas formas se localizam nos capilares profundos, principalmente nos pulmões, e, durante a noite, aparecem no sangue periférico, apresentando o pico da microfilaremia em tomo da meia-noi- te, decrescendõ novamente no final da madrugada (Rig. 35.4). Os mecanismos e estímulos responsáveis por essa periodicidade não são claros, embora existam investigações que procuram relacionar a periodicidade noturna com fato- res químicos.

O pico da microfilaremia periférica coincide, na maioria das regiões endêmicas, com o horário preferencial de hematofagismo do principal inseto transmissor, o Czrlex quinquejasciatus (Say, 1823). Nas regiões do Pacífico Sul e sudeste da Ásia, onde o principal transmissor é um mosqui- to que exerce a hematofagia durante o dia (Aedes polyne- siensis), as microfilárias podem ser detectadas no sangue periférico humano a qualquer hora, com maior concentração

no final da tarde (em tomo das 16 horas), sendo conside- radas aperiódicas ou subperiódicas diurnas (também exis- te a forma periódica noturna nestas regiões). Apesar des- sa coincidência (hematofagia do vetor e microfilaremia pe- riférica), nenhuma das diversas hipóteses levantadas conseguiu ainda explicar essa periodicidade, a não ser a necessidade biológica do encontro da microfilária com o mosquito vetor.

Ciclo biológico. É do tipo heteroxênico. A fêmea do Culex quinquefasciatzrs, ao exercer o hematofagismo em pessoas parasitadas, ingere microfilárias que no estômago do mosquito, após poucas horas, perdem a bainha, atraves- sam a parede do estômago do inseto, caem na cavidade ge- ral e migram para o tórax, onde se alojam nos músculos to- rácicos e transformam-se em uma larva, a larva salsichóide ou L,. Seis a dez dias após o repasto infectante, ocorre a pri- meira muda originando a L,.

Esta cresce muito e, 10-15 dias depois, sofre a segunda muda transformando-se em larva infectante (L,), medindo aproximadamente 2mm, que migra pelo inseto até alcançar a probóscida (aparelho picador), concentrando-se no lábio do mosquito. O ciclo no hospedeiro invertebrado é de 15 a 20 dias em temperatura de 20-25°C mas, em temperaturas mais elevadas, pode ocorrer em menor penodo. Em condições de laboratório, este ciclo ocorre em 12-15 dias. Quando o inse- to vetor vai fazer novo repasto sanguíneo, as larvas L, es-

Capitulo 35 Asçociar;áo de Escolas Rcunidas -- A S S E R -

Leonel
Carimbo
Page 4: Wuchereria bancrofti - cap. 35

3-5' I Ciclo da Wuchereria bancroftr 1 L

O mosquito ingere Os vermes adultos fémeas

micmfiláfias quando se produzem microfilánas que alimenta de sangue de atinge o sangue

uma pessoa infectada

t 1 As larvas L3 migram para os vasos

linfáticos e linfonodos, onde crescem e atingem maturidade sexual

desenvolvem at6 o estágio de larvas

t O mosquito deposita larvas ?.!

infectantes (L3) - infectantes (L3) no momento

no mosquito do repasto sanguíneo 2 L3

Flg. 35.5 - Ciclo biológico da Wuchereria bancmffi. 1) Microfilhria sem bainha no intestino mbdio do mosquito; 2) Larvas de primeiro (salsichóide), segundc e terceiro (infectante) esthdios em desenvolvimento no inseto vetor; 3) Larva infectante saindo da probbscida do inseto vetor; 4) microfilhria com bainha nc sangue do indivlduo infectado.

capam do lábio, penetram pela solução de continuidade da pele do hospedeiro (não são inoculadas pelos mosquitos), migram para os vasos linfáticos, tornam-se vermes adultos e, sete a oito meses depois, as fêmeas grávidas produzem as primeiras microfilárias (período pré-patente longo) (Fig. 35.5).

TLansmissão. Unicamente pela picada do inseto vetor (fêmea de C. quinquefasciahrs) e deposição das larvas in- fectantes na pele lesada das pessoas. Parece que o estímu- lo que provoca a saída das larvas da probóscida do mosqui- to é o calor emanado do corpo humano. A pele, estando úmida (suor e alta umidade do ar), permite a progressão e penetração das larvas. É importante ~alientar~que a vida mé- dia de um mosquito do gênero Culex é de aproximadamen- te um mês e o ciclo biológico do parasito no interior deste vetor (de microfilária ingerida até larva L,) ocorre em torno de 20 dias. Assim, é curto o período de tempo no qual o vetor pode estar transmitindo o parasito ao ser humano.

A parasitose se caracteriza por uma variedade de mani- festações clínicas que podem ser devidas aos vermes adul- tos no sistema linfático ou a resposta imunelinflamatória do hospedeiro contra microfilárias.

As quatro principais formas clínicas da filariose linfáti- ca são: assintomática ou doença subclínica; manifestações agudas; manifestações crônicas; e eosinofilia pulmonar tro- pical (EPT). Indivíduos assintomáticos são aqueles com mi- crofilárias no sangue e sem sintomatologia aparente. Mas, com o uso da linfocintigrafia e ultra-sonografia, tem-se veri-

. . ficado que esses assintomáticos, na realidade, apresentam -' doença subclínica com danos nos vasos linfáticos (dilatação

- 'e proliferação do endotélio) ou no sistema renal (hematúria mimdpica) , merecendo atenção médica precoce. As m"

302

festações agudas são principalmente: linfangite retrógrada localizada principalmente nos membros e adenite, associadas a febre e mal-estar. As linfangites agudas têm curta duração e evoluem no sentido da raiz do membro para a extremidade. As adenites aparecem principalmente nas regiões inguinal, axilar e epitrocleana. As manifestações crônicas são: linfedema, hidrocele, quilúria e elefantíase, e iniciam-se, em geral, alguns anos após o início dos ataques agudos em mo- radores de áreas endêmicas. A hidrocele é a mais comum des- tas manifesqões crônicas e Erequentemente desenvolve na ausência de reações inflamatórias prévias. Pacientes com hidrocele podem apresentar rnicrofilárias no sangue periféri- co. A elefantíase geralmente se localiza nos membros inferio- res e na região escrotal, e está associada a episódios inflama- tórios recorrentes. A incidência e gravidade das manifesta- ções aumentam com a idade e lesões crônicas podem tornar- se irreversíveis. Alguns pacientes também podem apresentair comprometimento renal (quilúria). A eosinofilia pulmonar úo- pical (EPT) é uma síndrome caracterizada por sintomas de asma brônquica, sendo uma manifestação relativamente rara.

É importante distinguir os casos de infecção (presença de vermes e microfilárias sem sintomatologia aparente) d a casos de doença. Os pacientes assintomáticos ou com ma- nifestações discretas podem apresentar alta microfilaremia, e os pacientes com elefantíase ou outras manifestações crô- nicas não apresentam microfilaremia periférica ou esta $ bastante reduzida. Algumas manifestações, especialmenk as imunoinflamatórias, se devem as microfilárias, e o u m L aos vermes adultos. As alterações provocadas por essas últimas formas são mais conhecidas, sendo de decurso lon- go, e podem apresentar desde uma pequena estase linfáti- ca até a elefantíase. As lesões podem ser de origem inflama-

Capitulo 35

Page 5: Wuchereria bancrofti - cap. 35

Fig. 35.6 - Wuchereria bancroíli provocando alterações: A) mulher apresentando elefantiase (edema linfático e queratinizaçáo cutânea) das pernas e ma- mas; E) homem apresentando elefantiase do escroto e edema linfhtico da perna esquerda (segundo Mackie T., Hunter, G & Worth, E); C) elefantiase de pernas; 0) hidrocele com inicio de elefantiase de escroto (Originais dos Profs. Eliana M.M. da Rocha 8 Gilberto Fontes, 1994).

tória ou não e são devidas a dois fatores principais: mecâ- nicos e irritativos.

Ação mecânica. A presença de vermes adultos dentro de um vaso linfático pode provocar os seguintes distúrbios:

estase linfática com linfangiectasia (dilatação dos va- sos linfáticos); derramamento linfático ou linforragia.

Esse derramamento, ocorrendo nos tecidos, provocará o edema linfático (por exemplo, nas pernas). Ocorrendo na ca- vidade abdominal, teremos a ascite linfática e na túnica escrotal, a linfocele. Pode também ocorrer derramamento de linfa nas vias urinárias (linfúrialquilúria).

Ação irritativa. A presença dos vermes adultos dentro dos vasos linfáticos, bem como dos produtos oriundos do seu metabolismo ou de sua desintegração após a morte, pro- voca fenômenos inflamatórios. Como conseqüência, tere- mos a linfangite retrógrada (inflamação dos vasos) e adeni- te (inflamação e hipertrofia dos gânglios linfáticos). Fre- quentemente aparecem fenômenos alérgicos, como urticárias e edemas extrafocais.

Além das ações mecânica e irritativa, fenômenos imuno- lógicos, especialmente os alérgicos, induzem a patogenia. Exemplo típico é o quadro conhecido como eosinofilia pul- monar tropical (EPT), no qual o paciente apresenta hiper-res- posta imunológica a antígenos filariais, com aumento de IgE e hipereosinofilia, levando ao aparecimento de abscessos eosinofilicos com microfilárias e posterior aparecimento de fibrose intersticial crônica nos pulmões, comprometendo a função do órgão. A síndrome denominada elefantíase pode aparecer em alguns casos crônicos com até mais de dez anos de parasitismo. Esta síndrome pode ter outras causas que não a H! bancrofti (hanseníase, estafilococcias ou outra causa que perturbe o fluxo linfático). A elefantíase é carac- terizada por um processo de inflamação e fibrose crônica do órgão atingido, com hipertrofia do tecido conjuntivo, dila- tação dos vasos linfáticos e edema linfático. Inicialmente, há hipertrofia da derme, porém a epiderme é normal. Com a pro- gressão da doença, há esclerose da derme e hipertrofia da epiderme, dando a aparência típica da elefantíase: aumento exagerado do volume do órgão com queratinização e rugosidade da pele (Fig. 35.6). Em geral, a seqüência dos

Capitulo 35 303

Page 6: Wuchereria bancrofti - cap. 35

Fig. 35.7 - A) Microfilária de W . bancrofti em gota espessa de sangue, mostrando sua bainha característica (foto gentilmente cedida por Saunders Co., A Manual of Tropical Medicine, 1946). B) Microfilária de W . bancrofti em gota espessa de sangue, mostrando sua bainha característica (Original dos Profs. Gilberto Fontes & Eliana M.M. da Rocha, 1995).

eventos nos casos de elefantíase é a seguinte: linfangite, adenite, linfangiectasia (dilatação e varizes linfáticas), linforragia (extravasamento de linfa), linfedema (edema lin- fático), esclerose da derme, hiperhofia da epiderme e aumen- to do volume do órgão (principalmente pernas, escroto, ou mamas). Infecções bacterianas ou fúngicas secundárias agravam o quadro de elefantíase.

Clínico

É difícil devido à semelhança das alterações provocadas pela M! bancrofti com aquelas produzidas por outros agen- tes etiológicos com efeitos parecidos. Numa área endêmica, a história clínica de febre recorrente associada adenolin- fangite pode ser indicativo de infecção filaria]. Paciente com alteração pulmonar, eosinofilia sanguínea e altos níveis de IgE total no soro leva 2i suspeita de EPT.

Laboratorial

A pesquisa de microfilárias no sangue periférico é feita por diferentes métodos parasitológicos. Entre as técnicas disponíveis, a mais utilizada é a gota espessa preparada com 20 a 100uL de sangue colhido por punção capilar digital, entre as 22-24 horas. Após 12- 15 horas do preparo das 1â- minas com sangue, faz-se a desemoglobinização, cora-se pelo Giemsa (Capítulo 55) e examina-se ao microscópio para verificar a presença de microfilárias (Figs. 35.7A e B). A gota espessa tem boa sensibilidade quando a parasitemia se en- contra acima de 10 microfiláriastml de sangue. Para aumen- tar a sensibilidade desta técnica recomenda-se preparar mais de uma lâmina de um mesmo paciente, obedecendo ao ho- rário noturno para a colheita de sangue para evitar resulta- dos falso-negativos (observar na Fig. 35.4 que, em sangue colhido às 15 horas, 71% dos exames são falso-negativos). A gota espessa é utilizada em inqukritos epidemiológicos por ser prática, rápida e econômica para obtenção de amos- tras de sangue colhidas a noite. Também se utilizam técni-

cas de concentração, como a filtração de sangue em mem- brana de policarbonato com 3 ou 5mm de porosidade, na qual amostras com até 10ml podem ser analisadas. E uma téc- nica bastante sensível e normalmente utilizada para diagnós- ticos de casos individuais ou no controle pós-tratamento, pois é capaz de detectar baixas parasitemias. Outra técnica de concentração, alternativa na falta de membrana, é a des- crita por Knott (1939). Consiste em diluir 5 rnl de sangue na proporção de 1: 10 com formo1 a 2% e centrifugar. As micro- filárias estarão no sedimento, que será analisado após pre- paro de gotas espessas e coloração com Giemsa. Esta téc- nica tem menor sensibilidade que a filtração em membrana de policarbonato, pois as microfilárias ficam misturadas a um sedimento viscoso que dificulta a análise.

Microfilárias podem estar ausentes no sangue, mas pre- sentes na urina (quilúria e hematúria) ou líquidos da hidrocele. Nestes casos, o material obtido deve ser analisa- do usando técnicas de concentração.

Os testes sorológicos para pesquisa de anticorpos não são adequados para bancroftose, pois não permitem distin- guir indivíduos parasitados daqueles já curados ou aqueles não-infectados, mas constantemente expostos a antígenos do parasito na área endêmica. Outro problema são as rea- ções cruzadas com anticorpos presentes no soro de pacien- tes infectados com outros helmintos, comuns em áreas en- dêmicas de bancroftose. Devido a sua baixa sensibilidade e especificidade, a detecção de anticorpos circulantes não é recomendada para o diagnóstico da bancroftose, sendo substituída pela pesquisa de antígenos circulantes de M! bancrofti, utilizando anticorpos monoclonais. A pesquisa de antígenos circulantes é feita pela técnica imunoenzimática (ELISA) com soro (resultado semiquantitativo), ou por imu- nocromatografia rápida (ICT) com resultado qualitativo (po- sitivotnegativo) usando sangue ou soro do paciente. Am- bas as técnicas já foram padronizadas e estão disponíveis comercialmente. Uma vantagem da detecção de antígenos é que, como seus níveis permanecem constantes na circula- ção, o sangue para o diagnóstico pode ser colhido durante

304 Capitulo 35

Page 7: Wuchereria bancrofti - cap. 35

Filariasis Filariasis A linfocintigrafia não diagnostica a intècção filarial e sim

alterações anatômicas e funcionais dos vasos .linfáticos, sendo utilizada, principalmente, em pacientes com linfederna. É recomendada para análise de vasos linfhticos dos mem- bros superiores e inferiores do paciente.

1 1 4 ~ ~ & 7 ' ~ ~ 1 . '

í l t - l b d .,, Diagnóstico da Infecpio no Vetor ,. :ir~uJ dd L ,,

Fig. 35.8 - Imunocromatografia rhpida em cartáo (ICT card test BINAP). A. Teste positivo. 6 . Teste negativo. (original dos Profs. Gilberfo Fontes/ EIiana M. M. da Rocha).

o dia. Além disso, um teste positivo indica infecção ativa, uma vez que os anticorpos monoclonais reconhecem antíge- nos de vermes adultos, mesmo na ausência de microfilárias.

A técnica de ELISA foi desenvolvida a partir da produ- ção de um anticorpo monoclonal anti-Onchocerca gibsoni, filarídeo de bovinos, denominado Og4C3, que se mostrou específico para captura de antígeno circulante de FK bancrofti no soro humano. Este teste não apresenta boa sensibilidade para indivíduos com baixa microfilaremia ou amicrofilarêmicos (70% a 75%), no entanto apresenta alta especificidade (98% a 100%). Já a técnica de imunocroma- tografia, realizada em um cartão (Fig. 35.8), utiliza o anticor- po monoclonal AD12, para deteqão de antígenos circulan- tes de vermes adultos de K bancrofti. O exame é simples e pode ser feito tanto na clínica quanto no campo. O teste por imunocromatografia é especialmente rápido, tem alta espe- cificidade (98,6% a 100%), sendo sua maior desvantagem o custo elevado.

Pesquisa de DNA

Estudos recentes têm mostrado que a reação em cadeia & polimerase (PCR) é bastante sensível para detectar DNA de K bancrofti no sangue, na urina e até na saliva de pa- cientes. Sua aplicação para o diagnóstico parece ser bastan- te promissora para os diversos líquidos biológicos, uma vez que é capaz de detectar DNA em amostras coletadas no pe- ríodo diurno, e diagnosticar especificamente infecções pela R! bancmjii em áreas onde co-existem outros filarídeos.

Pesquisa de Vermes Adultos

Um avanço no diagnóstico da parasitose é o uso da ultra-sonografia para detectar a presença e localização de vermes adultos vivos, principalmente nos vasos linfáticos escrotais de pacientes microfilarêmicos assintomhticos. E uma técnica não-invasiva, útil para detectar infecção antes do aparecimento de manifestações clínicas e para verificar a eficácia da terapêutica pelo acompanhamento da perda de motilidade dos vermes.

Em pacientes com linfadenopatia, a biópsia pode detec- tar vermes adultos, mas esse procedimento raramente é uti- lizado como diagnóstico.

O diagnóstico da infecção dos insetos vetares é uma ferramenta complementar importante em áreas onde progra- mas de eliminação da bancrdftose estão sendo implementa- dos, pois permite, juntamente com a determinação das taxas de prevalência da infecção humana, monitorar a eficácia & estratégias de controle adotadas.

A dissecção dos mosquitos permite a identificação es- pecífica das larvas encontradas, assim como a determinação e quantificação de cada um dos diferentes estágios larvários. A partir desses dados é possível calcular o índice de infec- ção (porcentagem de mosquitos infectados por qualquer estágio larvário) e de infectividade (porcentagem de mosqui- tos albergando larvas infectantes-L,). No entanto, a dissec- ção é um método laborioso, apresentando por vezes resul- tados duvidosos, uma vez que a distinção específica das lar- vas encontradas se torna difícil em áreas onde outras espé- cies de filarídeos, inclusive de animais, são prevalentes.

A dissecção vem sendo substituída pela técnica de PCR, sensível a ponto de detectar DNA proveniente de uma úni- ca larva de FY bancrojii em amostras contendo até 100 mos- quitos.

Estima-se que cerca de 112 milhões de pessoas estão in- fectadas pela B! bancrofti, em pelo menos 80 países. Des- tes, cerca de um terço dos pacientes vive na fndia, um ter- ço na Aftica, e o restante no Sudeste Asiático, ilhas a oes- te do Pacífico e Américas.

Nas Américas, os focos de maior prevalência da infec- ção, atualmente, se encontram no Haiti, República Domini- cana, Guiana e Brasil. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que a interrupção da transmissão ainda tem que ser confirmada na Costa Rica, Suriname e Trinidad '

e Tobago, áreas endêmicas no passado. No Brasil, na década de 1950, foi realizado um inquérito

nacional e a transmissão autóctone da filariose bancroftiana foi detectada nas seguintes cidades: Manaus (AM), Belém (PA), São Luis (MA), Recife (PE), Maceió (AL), Salvador e Castro Alves (BA), Florianópolis, São José da Ponta Gros- sa e Barra de Laguna (SC) e Porto Alegre (RS). A p&r de$& conhecimento, foram desencadeadas ações de controle da bancroftose, empreendidas primeiramente pelo Serviço Na- cional de Malária que veio a se tomar Departamento Nacio- nal de Endemias Rurais (DNERu) e, depois de 1970, pela 6iw- perintendência de Campanhas de Saúde Pública ( S U O , com base no tratamento dos doentes e no combaa: ao iase- to vetor. Com estas medidas, atualmente, no Brasil, a parasitose apresenta distribuição urbana e focali sendo de- tectada em Recife e cidades da região metropolitana (PE), Maceió (AL) e Belém (PA), conforme mostmio rn Fig. 35.9. Na região metropolitana de Recife (PE), especialmente linda, Jaboatão e Paulista, a parasitose está em expansão

.,Li- I ' ' .ii\

Page 8: Wuchereria bancrofti - cap. 35

* Focos extintos de W. bancrofii

O Focos de W. bacrofii ativos

O Focos de Onchocerca volvulus

Localidades positivas para M. ozzard

Fig. 35.9 - Mapa da distribuição geográfica atualizada das filarioses humanas no Brasil (2003)

Olinda

com índices de microfilarêmicos variando de 2% até 15%. em comunidades de baixo nível socioeconômico. Em Maceió, onde no passado (1953) foi detectada a parasitose (0,3%), le- vantamento realizado em 1995 mostrou uma distribuição niti- damente focal, com apenas três bairros centrais e contíguos (Feitosa, Jacintinho e Pitanguinha) concentrando praticamen- te todos os casos e prevalência de até 5,3% na população de um dos bairros. No entanto. nos últimos anos. tem-se verifi- cado uma redução significativa da porcentagem de micro- filarêrnicos na área endêmica de Maceió: em 1999,0,74%; em 2000,0,54%; em 2001,0,49%; em 2002,0,10% e, em 2003, 0,07%. Provavelmente, esta diminuição na prevalência se deve implementação de um programa de controle com detecção e tratamento de parasitados. Em Belém (PA), o índice de lâmi- nas positivas continua em declínio (9,8% em 195 1,4,3% em 1962, 0,O 1 % em 1993 e, O,OO/o em 22003). Assim, a situação em Belém deve ser analisada por critérios definidos pela OMS, para verifi- cação da interrupção da hammissão da parasitose no município.

Nas diferentes áreas endêmicas, a grande maioria dos parasitados não têm sintomatologia aparente, porém funcio- nam como fonte de infecção (microfilarêmicos assintomáti- cos) e, do ponto de vista epidemiológico, necessitam de atenção para evitar a dispersão da parasitose.

Os principais fatores que interferem na epidemiologia da W bancrqfti são:

presença do mosquito doméstico Culex quinquefaciatus, conhecido como pemilongo, muriçoca ou carapanã: so- mente as fêmeas são hematófagas obrigatórias (em nos- so meio, Aedes aegypti é refratário a transmissão); o ser humano como única fonte de infecção (ausência de animais reservatórios); temperatura ambiente elevada (25 a 30°C); umidade relativa do ar alta (80% a 90%): importante para o desenvolvimento das larvas nos mosquitos e penetração das mesmas na pele do hospedeiro humano; pluviosidade mínima de 1 .300rnrn3 por ano; altitude baixa (quase sempre ao nível do mar); tempo de residência na área endêmica; taxa de infectividade dos mosquitos vetores.

Não existe um medicamento profilático para quem se en- contra em áreas endêmicas, mesmo que por pequeno perío- do de tempo. Deve ser evitado o contato humano-vetor. O controle tem com base principalmente três pontos básicos: tratamento de todas as pessoas parasitadas, combate ao in- seto vetor e melhoria sanitária.

A primeira medida consegue-se com a ação do medica- mento dietilcarbamazina. Em algumas áreas endêmicas, o

306 Capitulo 35

Page 9: Wuchereria bancrofti - cap. 35

tratamento em massa conseguiu reduzir sensivelmente essa parasitose, com a administração de uma dose do medicamento de seis em seis meses ou anualmente a toda a população, sem se fazer previamente exames para indicação dos parasitados. Uma alternativa para o controle da filariose linfática é o uso de dietilcarbamazina associada ao sal de cozinha. O uso desta associacão em comunidades endêmicas na Ásia e África tem levado a uma grande redução na microfilaremia, sem que a população apresente reações adversas aparentes.

O controle do inseto é dificil, mas, dependendo da re- gião, pode-se tentar exterminar as larvas e os adultos. Há necessidade de colaboração da população, pois apesar dos insetos voarem até dois a três quilômetros, a maioria dos criadouros é de águas poluídas peridomiciliares. Contra as larvas podem-se usar larvicidas químicos, como organofos- forados ou, no caso de resistência, carbamatos e piretróides. Também pode-se usar larvicidas biológicos, como Bacillus sphaericus ou B. thuringiensis. O uso desse tipo de larvicida deve ser incentivado, pois não provoca efeitos in- desejáveis ao meio ambiente. Essas bactérias, após ingeridas pelas larvas, liberam uma toxina que afeta o tubo digestivo das mesmas, causando infecção generalizada e morte. Ou- tra vantagem é que são seletivas, atuando apenas contra larvas de Culex e Anopheles. Já contra os insetos adultos, que se tomaram resistentes aos inseticidas de ação residual, usa-se o malathion e piretróides. Para proteção individual, devem-se usar repelentes, dormir sob mosquiteiros ou telar as janelas e portas das residências. Em algumas regiões, uti- lizam-se mosquiteiros impregnados com inseticida para au- mentar a proteção. No Capítulo 43 - Culicidae, são dados mais detalhes sobre o transmissor, e no Capitulo 53, sobre o controle.

Devemos ter em mente que a educação e o saneamento ambienta1 constituem elementos importantes e permanentes para a redução desses insetos vetores, como também redu- ção de várias parasitoses nas áreas urbanas.

É expectativa da OMS, a eliminação da filariose linfática como problema de saúde pública no mundo até o ano de 2020, com base em programas regionais e multissetoriais que vêm sendo desenvolvidos nos países endêmicos. Nas Américas, a natureza focal da infecção sugere que essa meta possa ser atingida antes da proposta global.

O tratamento da filariose bancroftiana é feito tendo-se três objetivos: 1) reduzir ou prevenir a morbidade em indi- víduos com infecção ativa; 2) correção das alterações pro- venientes do parasitismo (edema, hidrocele); e 3) impedir a transmissão a novos hospedeiros.

Contra o parasito, o medicamento utilizado é o citrato de dietilcarbamazina (DEC). A dose usual recomendada pela OMS para tratamento individual é ómglkgldia, via oral, du- rante 12 dias. Esse tratamento poderá ser repetido várias vezes, se necessário, até o desaparecimento da parasitemia. No tratamento em massa, realizado em áreas com elevada endemicidade, esse medicamento é usado em dose única de 6mgkg de seis em seis meses ou anualmente. A DEC é ra- pidamente absorvida pelo trato gastrointestinal, atingindo pico sérico 1 ou duas horas após administração oral, mas seu mecanismo de ação ainda é desconhecido. Durante o

tratamento, principalmente nos três primeiros dias, o pacien- te pode apresentar reações adversas devidas a desintegra- ção dos parasitos (febre, cefaléia, dores no corpo e nas ar- ticulações, mal-estar, hematúria transitória), e reações locais, como linfangite, funiculite, orquite. Todas essas manifesta- ções tendem a desaparecer espontaneamente, não sendo ne- cessária a interrupção do tratamento. O fármaco leva a um rápido e marcante desaparecimento das microfilárias da cir- culação sanguínea, e o efeito é observado já nas primeiras horas após o início do tratamento. A DEC também possui considerável ação sobre os vermes adultos. Evidências di- retas foram obtidas de pacientes que, após o tratamento, apresentavam reações nodulares locais nos linfáticos, onde foram encontrados vermes adultos mortos. Evidência indi- reta da ação sobre o verme adulto é o desaparecimento das microfilárias pós-tratamento. No entanto, as vezes nem to- dos os vermes são mortos, mesmo após repetidos tratamen- tos. A DEC também é o medicamento de escolha para os ca- sos de eosinofilia pulmonar tropical, na qual acentuada me- lhora clínica ocorre poucos dias apos o início do tratamen- to e a função pulmonar retoma ao normal se os danos no órgão não foram extensos. O uso da DEC diminui significa- tivamente os quadros agudos e reduz o desenvolvimento de lesões obstrutivas (quando em fase inicial), mas pacientes com intensa hidrocele ou elefantíase não apresentam melho- ra após o tratamento. Tem-se tentado novos fármacos para o tratamento da parasitose. A ivermectina, um antibiótico semi-sintético de largo espectro, tem sido utilizado em dife- rentes regiões endêmicas. Esse medicamento é muito eficaz na redução da microfilaremia em dose única de 200-400pgl kg, mas não atua sobre os vermes adultos, não curando completamente a infecção. Tem-se observado que, meses apos o tratamento com ivermectina, a microfilaremia reapa- rece em um grande número de pacientes. Outro medicamento que tem sido estudado para este fim, o albendazol, não tem efeito microfilaricida em curto prazo quando administrado em dose única. Mas, segundo a OMS, doses elevadas repeti- das de albendazol ~ o d e m matar vermes adultos de W. bancrofti, no entanto, mais estudos ainda são necessários. O albendazol pode não apresentar efeito filaricida mas é im- portante seu uso associado a DEC, devido ao seu amplo espectro de ação no combate as enteroparasitoses, tão pre- sentes no meio em que se encontram os pacientes vitimados pela bancroftose (baixo nível socioeconômico e carência em saneamento básico). Ultimamente a OMS tem recomendado o tratamento do hospedeiro com duas drogas simultanea- mente (DEC + ivermectina ou albendazol).

Para o tratamento do linfedema, recomenda-se intensiva higiene local, com uso de água, sabão e, quando necessá- rio, administração de antibióticos, para combater infecções bacterianas que agravam o quadro. A higiene do membro afetado, fisioterapia ativa, drenagem postural, e uso de com- pressas leva a melhora do linfedema, mesmo aqueles avan- çados, diminuindo as chances de evolução para elefantíase. Deve-se regularmente exercitar o membro afetado, para pro- move1 o fluxo da linfa. Também se recomenda o uso de mei- as elásticas que, por compressão externa, ajudarão a redu- zir o edema. O tratamento da hidrocele e quilocele deve ser feito cirurgicamente. Nos casos avançados de elefantíase de membros, escroto ou mama, a cirurgia plástica reconstmto- ra é indicada formalmente, mas o resultado em geral é insatisfatório.

Page 10: Wuchereria bancrofti - cap. 35