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UNIVESIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO VEZ DO MESTRE A ARTE DE SER UM CONTADOR DE HISTÓRIAS PARA CRIANÇAS POR: JACQUELINE DE ALMEIDA FERREIRA ORIENTADORA: MARY SUE PEREIRA RIO DE JANEIRO / 2005

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UNIVESIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO VEZ DO MESTRE

A ARTE DE SER UM CONTADOR DE HISTÓRIAS PARA CRIANÇAS

POR: JACQUELINE DE ALMEIDA FERREIRA

ORIENTADORA: MARY SUE PEREIRA

RIO DE JANEIRO / 2005

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UNIVESIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

A ARTE DE SER UM CONTADOR DE HISTÓRIAS PARA CRIANÇAS

Apresentação de monografia à Universidade Cândido Mendes, como condição prévia para a conclusão do curso de pós-graduação “Lato Sensu” em Educação Infantil e Desenvolvimento por Jacqueline de Almeida Ferreira.

RIO DE JANEIRO / 2005

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DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia a minha mãe Hedi-Lamar e ao meu pai Nilton por tanto carinho que sempre me dedicaram.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, meu Pai celestial e melhor amigo, aos meus pais, ao amigo Hebert Quaresma pelo tempo disponível e a minha querida professora Mary Sue, que me fez amar o maravilhoso mundo dos contadores de histórias .

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HINO À CRIANÇA

Criança é luz, é alegria é vida, é inocência, é amor, é da existência o sorriso, é canto,é pureza, é flor.

Crianças de todo tipo, crianças de toda cor... A todas devemos dar muito carinho e amor.

Crianças vivas, travessas, de palácios ou de palhoças

Amemos a todas elas, pois todas elas são nossas!

Crianças que alegres brincam

de roda, de cirandinha, de cavalo, nas vassouras, de bonecas, de fadinhas...

Crianças de nossa terra,

crianças do mundo inteiro... Um lugar tendes na vida:

é sempre, sempre o primeiro.

Criança é graça divina que nos deu a natureza

Façamos, pois, dessa graça um prelúdio de Beleza!

CARVALHO, Bárbara Vasconcelos de. Compêndio de Literatura Infantil. São Paulo, IBEP, s.d. p. 102

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RESUMO

Esta monografia tem como objetivo, a recuperação do estatuto da liberdade e do prazer

da leitura no âmbito das escolas, permitir à criança ser sujeito em sua leituras, oportunizar

à criança o contato não apenas com autores diferentes, mas com vário livros do mesmo

autor em épocas diferentes de sua vida propiciado à criança a construção de um novo texto

e por fim, orientar a possibilidade de a sociedade brasileira organizar um programa

permanente de propaganda da leitura e da narração de histórias para crianças.

Já em relação a arte de contar histórias, o contador de histórias de hoje precisa de outra

fonte para se nutrir, e com isso tem à sua disposição um enorme arsenal de contos escritos,

propriamente literários ou de tradução oral copilados. Ele lê, escolher o conto, a história

que quer contar, tarefa nem sempre fácil, já que muitos,por variados motivos, não se não se

adequam à comunicação oral, Depois de escolhido o conto, ele o prepara com o objetivo de

trazer naturalidade para uma história que não sendo sua, sob um certo ponto de vista passa

a sê- lo, já que muitas vezes a escolha envolveu um desejo pessoal de contar aquele canto e

com isso, acaba despertando nas crianças a gosto pela leitura, estimulando a imaginação

através da construção de imagens interiores.

Outro ponto destacado, são os aspectos teóricos sobre a oralidade e a escritura,onde é

preciso entender que a oralidade não despreza a escrita, mas uma forma enriquece a

outra,portanto a leitura deve seguir o sentido tanto mais plural possível. A narração de

histórias por meio da oralidade como pela escrita podem facilitar a emergência de uma

criança mas conhecedora de si e do outro, plenamente capaz de se reconhecer nos textos,

como também criar outros universos a partir das portas que se abrem durante a

escuta/leitura.

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No capítulo IV, enfatizo a poesia para crianças, pois esta deve ser lida em voz alta,

podendo provocar as mais agradáveis emoções À criança. A linguagem poética é

considerada um instrumento didático por facultar o aprendizado de como se comunicar

eficazmente com os outros. Ela enriquece a intuição da criança, fazendo-a perceber as

coisas subjacentes nas aparências. Por isso, a poesia deve ser apresentada como algo

possível de provocar prazer e alegria, pela liberdade que a criança tem quanto a explorar o

jogo de palavras e o encadeamento sonoro,onde estimula o seu gosto pela poesia.

Em relação a metodologia,procure realizar em estudo exploratório nas obras de alguns

autores que abordam em suas obras a importância das histórias para criança, sobre o

contador de histórias e a importância da poesia para os pequeninos.

Além do estado exploratório, tentei colocar em palavras minha pouca experiência como

contadora de história onde vivenciam uma relação afetiva tanto com a história como com a

criança, pois é um momento de pura interação e fonte de todo encantamento, no qual,

sinto-me mero instrumento e, com isso, despertar nas crianças o gosto pela leitura.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 9

CAPÍTULO I..................................................................................................................... 10

CONTAR HISTÓRIAS: UMA HISTÓRIA MILENAR.................................................... 11

CAPÍTULO II ................................................................................................................... 15

DA ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS.............................................................................. 16

CAPÍTULO III.................................................................................................................. 19

A ORALIDADE E A ESCRITA NA LITERATURA INFANTIL.................................... 20

3.1) A oralidade e a escritura ...................................................................................... 21 3.2) Os narradores de historia ..................................................................................... 22 3.3) Os contos de fadas ............................................................................................... 23

3.4) Literatura infantil brasileira contemporânea.........................................................25

CAPÍTULO IV .................................................................................................................. 28

A POESIA PARA CRIANÇAS.......................................................................................... 29

CONCLUSÃO .................................................................................................................... 34

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................ 36

ATIVIDADES CULTURAIS..............................................................................................37 ÍNDICE................................................................................................................................38

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I- INTRODUÇÃO

O direito de ler, assim como o da cidadania é inalienável e deve ser aprendido através

de uma prática atraente e prazerosa. Em tempos passados, o rito familiar possibilitaria o

clima intimista na celação entre as gerações nas sessões de contação de histórias. A figura

do avô ou da avó, era símbolo do faz-de-conta, agente de introspecção imaginativa das

crianças e jovens. Via de regra, brincadeiras entre crianças reproduziam e ampliavam as

simbologias dos momentos mágicos extraídos dos livros.

Os tempos mudaram e a relação intimista entre as gerações fica prejudicada pelo

acelerado dos ritos sociais modernos, e a nova figura do contador de histórias passa a ser

monitor de TV. As brincadeiras, antes essencialmente coletivos (sem desperdiçar

momentos de introspecção), assumem caráter de um isolamento ou nos momentos

coletivos, reproduzem imagens prontos de uma trama estereotipada. Em um mundo sem

tempo, torna-se necessário o resgate do instante mágico da contação de histórias e da

leitura em suas várias formas.

O contador de histórias, guia a entrada nos caminhos do livro, até o momento em que

de forma apaixonada, se estabelece o “hábito da leitura”. Não é por acaso que o grande

escritor Monteiro Lobato atinge sucesso com a figura de Dona Benta, a imagem parte do

que deve ser um contador de história. Precisamos de um batalhão de “Donas Bentas” para

vencer a batalha da conquista ao direito do cidadão- leitor.

Portanto, o bom educador deverá reconhecer o valor da literatura na formação da

criança e sempre estar atento para inovar com atividades que chamem a atenção da criança,

que sejam realmente prazerosas. Por isso é preciso estar sempre inovando, sugerindo e

ouvindo sugestões.

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CAPÍTULO I Contar Histórias: Uma História Milenar

“A leitura abre espaços de interrogação, de meditação,

de exame crítico, isto é, de liberdade”. (Ítalo Calvino).

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CONTAR HISTÓRIAS: UMA HISTÓRIA MILENAR

O homem é por natureza e essência sujeito da narrativa, portanto, um contador de

histórias. A natureza humana mergulha na mais absurda complexidade no momento em

que se banha no universo da linguagem. Daí para frente, tudo nos ´pe encarregado e

permanentemente transformado pela palavra sagrada, que aprisiona, impressiona, descola e

encanta, enquanto outros vão cantar suas histórias, mas sem o manto da magia que recobre

os verdadeiros contadores de história.

Muitas instituições têm-se incumbido de não deixarem morrer a arte de contar um

conto e assim, oferecem os mais variados cursos de formação nos quais se desenvolvem

técnicas de como narrar histórias. Quando alguém se interessa por tal coisa é porque de

alguma forma já está envolvido pelo desejo de se tornar contador. Mas, evidentemente, que

o contador de história é alguém que possui dentro de si o poder de encantar pessoas pela

voa que surge da alma.

O bom contador de histórias é aquele que nasce guiado por uma infinita capacidade

de doação e por isso, esteja onde estiver em qualquer espaço e tempo, ele estará envolto

pela magia de contar histórias.

O percurso histórico dos contadores é vasto. Sabe-se que na maioria das vezes

nossos contos mais prediletos nasceram no meio do povo, entre as mulheres fiandeiras, que

teciam nas rocas os fios de lã junto com pedaços de vida, retalhos de memória. Assim,

parece que a tradição da contação de histórias está intimamente associada à produção de

trabalhos. Enquanto lavaria se a roupa, ou se cozia alimentos, uma mulher “paria” muitas

existências á beira da água ou do fogo.

No entendimento de muitos pesquisadores, sejam da Antropologia, Sociologia,

Literatura ou Psicanálise, existe um consenso no que diz respeito à importância da

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contação de história no universo familiar, devendo este desenvolver o gasto pela leitura de

forma espontânea e afetiva, em que a princípio o único compromisso estabelecido deva ser

com o sentido do prazer, no qual, existe um desdobramento entre fantasia e realidade

concretizado pela busca e encontro dos mais diversos sentimentos.

A importância da família na formação do lutar é imensa, visto que os primeiros anos

da infância são marcados pelas relações desenvolvidas entre as pequenas e as grandes,

pertencentes ao mesmo grupo de parentesco. È na família que se vai adquirir os primeiros

hábitos, os valores e os gostos. Além da relação de dependência social que a criança tem

com os familiares, existe também algo de essencial que somente é experimentado pelas

vivências afetivas proporcionadas no ambiente familiar. Assim, desde muito cedo, mesmo

antes de chegar ao mundo, já existe um conjunto de expectativas em torno desse ser que

em breve fará parte da história dos grupos familiares e sociais. Portanto, existe, mesmo

anteriormente ao nascimento da criança algo que é da ordem do desejo daqueles que a

esperam e que funcionará com as marcas iniciais da história de vida da mesma. Dessa

forma, a narrativa das histórias em que se entrelaçam na história de vida do próprio sujeito.

Pois, para a criança Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, A Bela e a Fera,

O Gato de Botas e tantas outras narrativas têm sentido porque dizem respeito aos diversos

aspectos e conteúdos experimentados simbolicamente. De fato, qualquer narrativa tem

como ponto de partida a própria história de vida do leitor.

É muito freqüente pais e professores se referirem ao fato de que suas crianças têm em

interesse muito particular por ouvir as histórias quando elas são inseridas no contexto das

narrativas. Embora isso não seja necessário para provocar o gozo dos pequenos leitores,

pois, as boas histórias são capazes de provocar, por meio das representações simbólicas,

os processos de identificação e projeção, conforme nos aponta a psicanalista Melanie Klein

em vários dos seus escritos.

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Diante disso, não é difícil imaginar que a criança é introduzida no mundo da leitura

desde o seu primeiro olhar para o mundo, que em qual dirige-se a imagem materna.

Assim, uma criança acalentada e embalada pela voz e pelo olhar morno e desejoso da mãe

que conta as canções de ninar, como também reproduz versinhos e lengalengas exercitando

a linguagem do afeto e da cultura, tem uma grande possibilidade de ser alguém

potencialmente estimulado o universo da leitura.

Sabemos que desde muito cedo os contos de fadas são narrados para os pequenos e que

os mesmos demonstram interesse ímpar por escutar e contar histórias. A hora do canto,

geralmente a narração acontece à noite, no momento que antecede ao sono e aqueles são

preparados para dormir nos “braços de Morfeu”, mergulhar no mundo dos sonhos e

mistérios acompanhados pela entrega confiante e aconchego da família.

Em relação a escola, esta assume um novo papel, embora bastante perdida no que diz

respeito aos seus vários conceitos. Imaginem que sendo a escola um espaço utilizado para

a valorização da repetição e conservação de ideologias dominantes, como pode atuar

coerentemente para a formação de leitores simbólicos. È mesmo função da escola ensinar o

prazer pela leitura ou isso tem que ficar restrito a família, já que se aprende a gostar de ler,

também um processo de identificação com o modelo familiar.

Essas são questões que nos servirão de base para algumas reflexões que surgem a

seguir. O fato é que se queremos construir um novo conceito de leitura e de leitor,

necessitamos espiar intencionalmente o padrão escolar que temos a oferecer para as nossas

crianças de hoje. Olhar a escola não somente no sentido cognitivo e lugar de produção do

conhecimento, mas também no sentido de quem lá está. Pois, o principal motivo da escola

passa pela ação de formar pessoas, construir identidade cultural, desenvolver o sentido de

cidadania e cooperação, promover relações interpessoais, apoiar e estimular o espírito de

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mundo ampliadas, entre outras coisas. Mas, tudo isso não deve apenas dizer respeito ao

estudante, mas principalmente ao professor.

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CAPÍTULO II

Da arte de contar histórias ao contador de histórias de hoje

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DA ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS AO CONTADOR DE HISTÓRIAS DE HOJE

A narração oral remonta as origens da sociedade como uma das primeiras

manifestações culturais do homem. Antes da linguagem escrita, foi ela a responsável pela

preservação das tradições de um povo, ao mesmo tempo em que veiculava toda uma forma

de percepção do mundo onde o elemento maravilhoso tinha o seu lugar.

Correspondendo a faculdade básica humana de trocar experiências, a narração oral

pôde encontrar maior ou menor espaço ao longo dos séculos da história humana. O velho

hábito, até então espontâneo de contar histórias foi perdendo seu vigor no decorrer da era

informatizada, dando aos poucos, lugar á informação. A partir do final do século passado,

surge a preocupação de resgatar essa arte milenar reconduzindo textos escritos-populares

ou propriamente literários, ao universo as narração oral.

O narrador, esse incansável “entregar de imagens”, concentra-se nos poucos, porém

inesgotáveis, recursos da voz, e do olhar e dos gestos. E justamente nessa economia de

recursos reside a força da narração oral. Diferente do conto lido, o canto ou história

contada conta com a participação decisiva do elemento vivo, o contador, em uma viva

inter-relação com o ouvinte. Alguém que, naquele momento, empresta-se em voz. com

todas as suas nuances de entonação, timbre e ritmo, em olhar, “janelando” a alma, um

movimento e gestos que sustentam e acompanham as palavras.

Enquanto arte, o contar história se mantém fiel ao seu primeiro e maior compromisso

com a beleza, o prazer e a diversão. Já o narrador ou contador de histórias contemporâneo

nasce, se desenvolve e se impõe como profissional das artes cênicas trazendo no bojo da

sua atividade uma diferença básica do contador de história tradicional. Diferente desse

último, ele não conta histórias, mas por ouvir contar e nem poderia fazê-lo, pois, como

bem aponta Walter Benjamim em seu texto “O Narrador”, o velho hábito de troca de

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experiência e história entre as pessoas, tão comum como antigamente, vem se

desvanecendo há muito. O contador de histórias de hoje precisa de outra fonte para se

nutrir e com isso, tem a sua disposição um enorme arsenal de contos escritos, propriamente

literários ou de tradição oral copilados. Ele lê, escolhe o canto, a história que quer cantar,

tarefa nem sempre fácil, já que muitos por variados motivos não se adequam à

comunicação oral. Uma vez escolhido o conto, ele o prepara com os nossos objetivos de

trazer naturalidade para uma história que não sendo sua, sob um certo ponto de vista passa

a sê-lo, já que muitas vezes a escolha envolveu um desejo pessoal de contar aquele canto.

Apesar dessa diferença inicial básica do contador moderno em relação ao contador

tradicional no que diz respeito “a fonte” de suas histórias, a performance do contador

moderno, principalmente, ao narrar um conto de tradição oral, ande ele realmente ser

natural, em muitos momentos se aproximar do conto tradicional.

O contador de histórias, ao preparar e contar um conto literário, conduz em primeira

mão, ao universo da oralidade, uma história que foi escrita inicialmente na grande maioria

das vezes, para se lida, e ao ser cantada, torna-se viva através da voz, olhar, gestos e

emoção do narrador que nesse processo, ousa descortinar para o ouvinte aspectos da obra

muitas vezes encobertas para o leitor. Pode ser também, através de dinâmicas e vivências,

despertar o contador de histórias que existe em cada um, estimular através de técnicas

elaboradas, a faceta sensível e poética inerente ao ser humano, aprimorar sua capacidade

expressiva e criativa, valorizar a relação com o livro de contos populares e autorais como

fonte de inspiração na busca de disseminar, pela prática, o direito de formar leitores.

Depois de escolhidas dentro de um tema, de acordo com a faixa etária e o interesse do

grupo, as histórias se destacam pelo seu aspecto lúdico a essência do trabalho. A diversão

é uma característica forte, permeia todas as ações. Divertindo, a contação de histórias

desperta o interesse pela leitura e estimula a imaginação através da construção de imagens

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interiores, e com isso, o aspecto lúdico é direcionado para despertar o contador de histórias

amante do livro, esse gigante adormecido no coração de cada avô, pai, tio, professor, se

humano que existe em cada um.

A melhor técnica para narrar histórias de maneira sedutora, prazerosa e envolvente para

as crianças é, em primeiro lugar, ser um contador absolutamente apaixonado pelo mundo

do “faz-de-conta”. Estar envolvido afetivamente com a narrativa é ponto fundamental. A

história tem que ser narrada com paixão, sentimento, entrega, partilha. Evidentemente, é na

escola que o resgate do contador de histórias tem surgido com mais força, visto que cada

vez mais o espaço escolar tem sido utilizado para a experiência lúdica e afetiva. Assim,

muitos professores têm-se tornado contadores de histórias. Contudo, nem sempre o

professor tem as características necessárias ao bom narrador e então, em vez de encantar,

desencanta.

Portanto, ao contar histórias, ler poemas em voa alta, é o resgate da oralidade e um dos

mais gostosos incentivos a leitura. Um bom contador de histórias deve seguir algumas

condutas básicas, como:

ü Escolha uma história que você goste muito e deseja contar;

ü Leia essa história muitas vezes;

ü Feche os olhos e imagine o cenário, as personagens, o tempo...;

ü Escolha a voz para o narrador e para as personagens da história;

ü Na hora de contar, olhe para todos: o olhar diz muita coisa;

ü Seja natural, deixe falar o seu coração e seduza o ouvinte para que ele deseje

ouvir novamente.

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CAPÍTULO III

A oralidade e a escrita na literatura infantil

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A ORALIDADE E A ESCRITA NA LITERATURA INFANTIL

Apesar de persistir a polêmica oralidade/escritura na atualidade o mundo acadêmico já

considera também literatura o que tenha sido guardado pela memória coletiva. Cumpre

ressaltar que a literatura percorre o trajeto da oralidade à escritura e a literatura destinada

às crianças percorre idêntico caminho.

Assim, parte-se do pressuposto que literatura é, ao mesmo tempo, voz e letra. A voz se

faz letra,a letra carrega a voz,que convida à leitura que cativa o leitor e nesse percurso,

narrador, autor, leitor e ouvinte pervertem a realidade e adentram no mundo ficcional em

que o imaginário é experimentado como forma de articulação entre a real e o irreal. A

narração e a leitura proporcionam apropriação da realidade do texto escrito em uma forma

de entender o mundo.

É muito expressivo o pensamento de Eric Havelock, um estudioso moderno da questão

oralidade / escritura no argumentar que “o ser humano natural não é escritor ou leitor,mas

falante e ouvinte” e a “escrita é [...] um produto da cultura escrita para a criança passe pela

instrução nas artes orais, incluindo canções, danças e recitações, pois, bons leitores surgem

a partir de licens falantes, capazes de recitar” (HAVELOCK, 1995, p.28).

Já Cecília Meireles, lembra que não se pode pensar numa infância a começar logo

com gramática e retórica: narrativas orais cercam a criança da antiguidade, como as de

hoje. Assim, “mitos, fábulas, lendas, teagonias, aventuras, poesia,teatro, festas populares,

jogos, representações várias” ocuparam, “no passado, o lugar que hoje concedemos ao

livro infantil”. E acrescenta: “quase se lamenta menos a criança de outrora, sem leituras

especializadas, que as de hoje, sem os contadores de história”. (MEIRELES, 1984, pg. 55).

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3.1) A oralidade e a escritura

Necessário de torna distinguir duas espécies de texto literário: o oral e o escrito. A

literatura oral implica na dualidade de sujeitos, de um lado o autor/contador e do outro, o

leitor/ouvinte. A literatura escrita inscreve três elementos: a escritura, o texto e a leitura.

Ao trabalhar com a oralidade, Paul Zumthor (1979) destaca que tanto no presente como

no passado existe uma poética da voz e tal poética se manifesta por diversas funções

sociais ritualizadas pela palavra. Assim existe a tradição da oralidade em vários aspectos

da vida cotidiana, entre eles o ensino, o testemunho judiciário e a consulta médica. a

transmissão oral ou a escritura da poesia oferecem problemas complexos e de natureza

diversa. A poesia oral, por exemplo, não apresenta uniformidade e homogeneidade de

tempo e espaço, em suas representações. A transmissão oral, mesmo quando repousa em

um texto escrito, dá primazia ao ritmo sobre o sentido e à ação sobre a representação.

A oralidade e, portanto, dinâmica, pois ao preservar o mito ela tem de ser adaptar as

novas circunstâncias, como fator de transmissão cultural e de valores. A Oralidade é

movimento.

Outros teóricos afirmam que as literaturas orais se baseiam em fórmulas, os temas são

tradicionais e a estrutura é uniforme. Tal afirmativa pode passar a idéia de que a oralidade

é estática e conservadora o que não corresponde a verdade. Assim, bastaria ao narrador

conhecer a fórmula e usar de improvisação para adaptações necessárias, seja ao público,

seja a região, não prescindindo dos gestos, fator essencial da comunicação oral. Na

realidade, o narrador ao liberar sua imaginação, inova e recria velhos contos e/ou relatos. O

narrador cativa seu público que está presente e é visível.

Portanto, entre a escritura e a leitura há o distanciamento e a liberdade do leitor ao

fazer uso da interpretação para completar o texto. O discurso oral, por sua vez, apresenta o

distanciamento em menor grau, uma vez que o narrador pela entonação da voz, pelos

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gestos e pela forma de conduzir a narrativa, condiciona o ouvinte ao entendimento do

narrado. Em contrapartida, o texto oral é sempre aberto à participação do ouvinte porque

essa é a essência da oralidade. O texto geral pode ser diferente e cada vez que for

narrado,pois a recriação e a invenção fazem parte dele.

3.2) Os Narradores de História

O escritor de textos literários para crianças ocupa, atualmente, o lugar dos contadores

de história dos primórdios da humanidade e da Idade Meda, período marcado, sobretudo,

pela oralidade, pela sedução das palavras e pela fruição dos sons encantantórios.

Cecília Meireles tem razão quando diz que “a gosto de contar é idêntico ao de

escrever”, “os primeiros narradores são os antepassados anônimos de todos os escritores” e

o “gosto de ouvir é como o gosto de ler”.

Sabe-se que nas sociedades primitivas, os contadores de história eram muito

respeitados, pois se reputavam como a memória da comunidade. Assim atuariam também

os jograis, na idade média,informadores em potencial.

Através dos jograis a palavra poética era vocalmente transmitida, “reatualizada,

reescutada, mais e melhor do que teria podido a escrita” e favorecia “ a migração de mitos,

de temas narrativos, de formas de linguagem, de estilos, de modas, sobre áreas às vezes

imensas”.Os jograis afetaram profundamente a sensibilidade e as capacidades inventivas

de populações, que, de outro modo, nada teria aproximado.

Para o autor Walter Benjamim, ele afirma que a arte de narrar está morrendo, contudo,

pode-se dizer que essa tradição está sendo resgata quando bibliotecários realizam a hora do

conto, pois, ao dizer um texto em voz alta, assumindo assim o papel das fiandeiras e dos

jograis.

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O contador de histórias resgata a tradição oral e ao mesmo tempo estimula a

imaginação do ouvinte. A mensagem é auditiva e não visual. Contar histórias é uma arte: é

necessário captar o ritmo e a cadência dos contos, fazer as pausas no momento certo, não

entrar em descrições cheias de detalhes, criar um clima de envolvimento e de encanto, e,

acima de tudo, usar todas as modalidades e possibilidades da voz sussurrar, imitar os

ruídos, as vozes dos animais, as inflexões que indicam suspense e clímax. A narração se

inicia com a senha mágica, que indica a saída do mundo real para o mundo ficcional: Era

uma vez..., e deve acabar com um refrão que indica o retorno à realidade: E assim acabou a

história. Entrou por uma porta, saiu por outra. Quem quiser que conte outra.

A narração implica em uma química entre aquele que narra e o que escuta. O narrador

conduz a narrativa, encaminha o ouvinte a um universo encantado elabora sua história

dependendo do público. Nenhuma história,portanto, é igual ao modelo, posto que é

reformulada a cada narração. Não existe mais a pureza do relato oral original, pois o

material dos contos de fadas se vincula ao texto impresso e se modifica a cada narração.

Voz e letra se entrelaçam para seduzir o ouvinte e o leitor.

A oralidade e a escritura convivem lado a lado no lar, na escola e no laser. Assim,

“contação” e leitura se completam para estimular o gosto pelo literário. Devemos lembrar

que estamos vivendo na terceira fase na história da moderna teoria literária: a da

preocupação com o leitor, pois é ele quem dá sentido ao texto escrito e não mais interpreta

o texto, mas o recria.

3.3) Os contos de fadas

Segundo Walter Benjamim, “o primeiro narrador é e continua sendo o narrador dos

contos de fadas”. Já Marina Warner completa esse pensamento ao dizer que os narradores

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dos contos de fadas sabem que um conto, para cativar, deve levar os ouvintes ao prazer, ao

riso ou as lágrimas, pois, “se falharem, ninguém mais irá querer ouvir suas histórias”.

Os contos de fadas são sempre atuais, muito embora estejam atreladas à realidade

sócio-econômica da Europa medieval e satisfazem porque mapeiam impulsos e temores

conscientes e inconscientes e delineiam experiências reais. Lidam com problemas

universais, atacam idéias preconcebidas e defendem causas perdidas. Já a curiosidade,

embora castigada, é incentivada e com isso, abrem espaço para a comunicação e idéias. Os

contos de fadas ao mesmo tempo que defendem aspirações tradicionais, minam estes

ensinamentos convencionais e com isso, desafiam idéias estabelecidas e levantam questões

na mente do público. Apresentam uma justiça poética: o filho mais novo, mais tolo, mais

desvalorizado pela família e pela comunidade é quem se casa com a princesa. Os contos de

fadas falam de medos, de amor, da dificuldade de ser criança, de carências, de

autodescobertas, de perdas e buscas, da vida e da morte e alia-se a isso o fato de que os

significados mudam de acordo com a necessidade ou o desejo do leitor. São sempre atuais,

também porque se envolvem no maravilhoso e partem de uma situação real, onde lidam

com emoções, passam-se e vivenciam situações diferentes e resolvem conflitos nos quais

buscam a cumplicidade da criança através do imaginário em que bruxas e fadas atuam

como elementos mágicos.

De acordo com Marina Warner (1999, p. 311), “o conto de fadas enquanto forma, lida

com limites e tais limites são muitas vezes impostos pelo medo e um de seus temas

fundamentais trata de um protagonista que parte para descobrir o desconhecido e assim

vencer seus temores”.

Os contos de fadas são as mais indicadas para ajudar as crianças a encontrar um

significado na vida, pois, ao estimular a imaginação, desenvolver o intelecto, harmonizar-

se com suas ansiedades e tornar claras suas emoções, são enriquecedoras, satisfatórios e

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ajudam a aliviar as pressões conscientes e inconscientes. A partir dos cinco anos, a criança

percebe que os contos de fadas não fazem parte da realidade externa, mas se deixa seduzir

por eles porque se harmonizam com sua realidade interna. Ela sabe que “a verdade dos

contos de fadas é a verdade de nossa imaginação”. Quando tais contos são lidos em sala de

aula, pouco contribui para as crianças porque logo dão lugar a outra atividade, diluindo-se,

dessa forma a impressão que as crianças mergulhem na história e passam meditar sobre

ela. A audição cria uma atmosfera de intimidade que favorece a conversação

posterior,levando a reflexão e oferecendo possibilidades de enriquecimento emocional e

intelectual.

Portanto, a hora do conto, serve para explorar o catártico no maravilhoso e favorecer o

desenvolvimento da sensibilidade artística da criança,pois os contos de fadas são, na

verdade, “um presente de amor”.

3.4) Literatura Infantil brasileira contemporânea

Atualmente, a literatura direcionada á criança, conta, além dos clássicos de textos ditos

realistas, conquanto se querem diferentes dos clássicos ao substituir fadas, bruxas e

fantasias por pessoas e fatos do cotidiano, também seduzem porque comunicam as

vivências das crianças em uma mensagem essencialmente artística. Não ficam imunes à

crítica literária, contudo, se os contos de fadas são consideradas alienantes, os contos

realistas são denominados projetos educativos, pois tratam dos problemas da sociedade tais

como morte, divórcio e ecologia. Fica enriquecido o fato de que a conscientização da

compreensão da realidade pode acontecer pelas vias do realismo e da fantasia onde os

textos moralizantes suscitam emoções e conduzem a aprendizagens éticas e estéticas.

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Tanto os contos de fadas quanto os contos realistas falam de sofrimento e angústia,

pois a dar tem a idade do homem e não há nada mais atual do que a dar. Se a partir dos

anos setenta no Brasil, a literatura infantil passa a ser criadora e não se posiciona na cauda

da literatura para adultos, preocupa-se cada vez mais com a competência estética do

receptor. Ao inserir o protagonista criança na narrativa, provoca no leitor reações de

assombros e estímulos à ação e nos contos de fadas, o herói nada faz para mudar a

situação, sempre é socorrido por um poder mágico. Já nos contos realistas, o herói criança

está sempre em ação,onde questiona refuta e age.

Parte da atual produção literária para as crianças, vale-se do humor como forma de

subverter padrões da moralidade explicitada nos contos tradicionais. Assim, a paródia, tão

comum na arte contemporânea, processa, no campo literário, a inversão dos padrões

narrativos clássicos para expressar, pelo riso e pelo beijo, a dessacralização dos valores

éticos tradicionais da sociedade humana. Ao subverter padrões de comportamento social, a

narrativa contemporânea inverte o ethos das personagens e repõe a oralidade das narrativas

antigas na escritura carnavalizada. Nesse universo às avessas, o imaginário dos contos de

fadas é substituído pelo compromisso com a verossimilhança nas histórias infantis da

atualidade que valorizam o cotidiano. Apesar da inversão, o poder de encantamento dessas

narrativas permanece.

Tais textos contemporâneos renovadores conduzem a uma visão crítica da brasilidade.

Discutem a relação de poder através do recurso as paródias e do humor, quando

apresentam um autoritarismo às avessas, como as histórias narradas por Ruth Rocha e Ana

Maria Machado. Visto que o poder permeia todas as relações humanas, na narrativa

contemporânea o poder está sempre presente porque pressiona e incomoda.

Se os contos realistas não permitem escorregar muitas fantasias mo texto literário,

permitem por seu turno, o espaço para fluir a imaginação da criança e existem muitas

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coisas além do que a visão muitas coisas além do que a visão alcança e só é possível

chegar até elas pelas vias do imaginário.

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CAPÍTULO IV

A poesia para crianças

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A POESIA PARA CRIANÇAS

A poesia trabalha com o caráter lúdico da linguagem. Não organiza as ações em

seqüência, mas brinca com os sons, com as rima, evoca imagens, desafia o leitor a

descobrir seu significado. Engana-se quem pensa que poesia é algo muito difícil para ser

trabalhado na educação infantil. Há muitos livros com lindas poesias curtas e fáceis de

serem entendidas por crianças pequenas. O poeta transmite uma visão de mundo subjetiva,

levando o leitor (e o ouvinte) a observar acontecimentos e objetos de diferentes pontos de

vistas, habilidade fundamental para o indivíduo lidar criativamente com as mais diversas

situações. A poesia fala diretamente ao sentimento.

No percurso deste itinerário poético buscando relevar o inatismo poético do homem,

percebemos que a criança, na sua fase pré-escolar, imita intimidade e,sem perceber,

interioriza a fonologia e a gramática da poesia oral. A poesia coletiva das tradicionais

cantigas de ninar, correspondentes ao “estado inicial” do “infans”, preparou o caminho

para o pleno exercício de repetição e imitação das sonoridades, na criança que começa a

ensaiar os primeiros sons. Esta fase corresponderia, cronologicamente, ao estado

intermediário que, segundo James Deese, é estágio caracterizado por “(...) Estruturas

sintáticas binárias, pares de palavras, geradas por uma gramática muito simples, de poucas

regras”.

No percurso do “infans” pela via da linguagem poética, podemos incluir neste segundo

estágio, a riqueza das cantigas de roda. Na roda cantada,o fogo sonoro amplia-se, não

apenas pelo fator social em que se realiza, mas pelas ligações de ordem espacial, corporal e

emocional.

As cantigas de roda, na sua maioria regida pela autonomia sonora – ritmo, rima, risos,

repetições e estribilhos e pela sua estrutura gramatical simples, são convidativas à

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repetição e imitação por parte das crianças: “Palma, palma, pé, pé, pé, roda, roda, roda,

caranguejo peixe é”. A imitação implica o exercício de múltiplas estruturas rítmicas,

respiratórias, acentuais e melódicas, como a diferenciação entre sílabas fortes e fracas, ou o

efeito das sílabas constituídas por vogais longas e breves. As combinações de todas essas

possibilidades sonoras, assim como o léxico, são infinitas.

Imitando e repetindo versos, alterações e sonoridades, a criança se nutre dos elementos

melódicos da poesia. O bater das palmas, dos pés,os estalos dos dedos, o movimento do

corpo se exteriorizam num conjunto de coordenações integradas. Podemos dizer que nesta

fase, a criança observa e se manifesta em linguagem de maneira integral.

Tanta a imitação como a repetição não têm de maneira alguma, o caráter normativo ou

reducionista que essas palavras normalmente encerram. A criança é tentada a imitar

(cantigas de rodas populares, palavrões, poemas) pelo apelo sonoro e contagiante dos sons:

atirei o pau no gato-to-to, mas o gato-to-to, não morreu-reu-reu...” Com a repetição, a

criança ensaia prazerosamente o modelo fonético aprendido. Esta infância musical,pela

amplitude de sons que encerra e pela atenção que presta ao mundo sonoro que a circunda,

de forma espontânea e livre, pertence a uma fase especial do seu percurso poético.

Na roda na rua, acriança explode em sons e se comunica também com a ajuda do corpo

dos gestos. Poderíamos afirmar que ela encena o ritual mito-poético com toda a carga

efetiva e emocional provinda do seu jogo sonoro e gestual. Sobre o encantamento das

cantigas de roda, Fanny Abramovich, oferece-nos deliciosas rememorações:

Ó Ciranda, cirandinha vamos todos cirandar, uma volta meia volta, volta e meia vamos dar....Quem não se lembra de quando era pequenino,de ter dado as mãos pra muitas outras crianças,ter formado uma imensa roda e de ter brincado, cantado e dançado por horas? Quem pode esquecer a hora do recreio na escola, do chamado da turma da rua ou do prédio,pra cantarolar a “Terezinha de Jesus”, aquela que de uma queda foi ao chão e que acudiram três cavalheiros,todos eles com o chapéu na mão.

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O apelo sonoro, afetivo, emotivo das cantigas de roda é um convite ao saboreio das

palavras entre tantos outros saboreios. A cantiga de roda como a cantiga de ninar nutrem-

se de elementos narrativas e poéticos. Além das cantigas de rodas, a criança, nos seus

primeiros anos de vida, relaciona-se de maneira lúdica, espontânea e afetiva com a

linguagem nos mais variados jogos verbais: adivinhas, rimas e palavras que puxam

palavras, entre tantas outras.

As palavras, no contato com a criança, ganham concretude e a experiência lúdica, em

geral, é a experiência com a palavra, um particular, é característica humana segundo

Huizinga em seu livro “Homo Ludens”, mas é na fase pré-escolar que esta é mais evidente,

diminuindo ou se atrofiando com o começo da escolarização. Freud destaca a acentuada e

impressionante confissão das lembranças infantis nas obras dos poetas. Ele acredita que

esta insistência surge da hipótese de que a poesia, como um sonho diurno, é na forma de

continuar ou substituir os jogos infantis.

A criança à maneira do poeta, cria um mundo próprio, um mundo supra-real onde

investe energia na construção, extensão e realização dos seus desejos. Ela tem consciência

do seu “faz-de-conta”, sabe diferenciar o real do imaginário, mas transmita naturalmente

entre os dois, valendo-se do “pensamento por complexos”, unindo não apenas as

impressões subjetivas dos objetos isolados, mas também entendendo e associando as

relações existentes entre esses objetos, dotando-as de uma animicidade significativa.

O poeta cria também um mundo à parte no trabalho ficcional e se vale de componentes

artístico, nem sempre conscientes, para exteriorizar uma pretensão estética. A criança,

dentro da escola hierárquica familiar, ocupa o último lugar ocupa o último lugar. No jogo,

ela manipula seu objeto-brinquedo com ampla liberdade. Torna-se adâmica,nomeando as

coisas e inventando e transformando pessoas. Ensaia assim, uma práxis lúdica no momento

da criação, tendo poder e oferecendo poder ao universo que rodeia ela como o divino

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adivinhador, no ato de nomear, domina o nomeado. Desvela o velado suplementado pelo

seu imaginário.

Por isso, vimos aqui,outro dado analógico entre poeta e criança no ponto convergente

do “poietes”, palavra grega que significa “aquele que faz”. Nesse caso, criança e poeta

fazem linguagem, linguagem esta que há muito tempo causa estranheza, mistério e

encantamento. Portanto, o professor deverá estar aberto a receber, com toda a

atenção/emoção que merecem todos os poemas selecionados de autores estrangeiros ou

brasileiros de todos os tempos. No Brasil, desde a poesia e Cecília Meireles até a poesia

atual de José Paulo Paes, Roseana Murray, Sérgio Caparelli, sem deixar de mencionar a

prosa poética de Bartolomeu Campos Queirós e sempre e para toda hora a poesia de

Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Mário Quintana, entre outros. Temos

muitos e excelentes poetas que também podem ser lidos por crianças. Basta, reler e

selecionar. O professor receberá a poesia com o mesmo encantamento e admiração

próprias de crianças e poetas após a recuperação e constatação de sua oralidade infantil

através de rememoração.

Compreender, amar e conhecer a poesia são fragmentos do mesmo todo que compõe o

ser poético e isto é também condição prioritária e essencial para o professor que procura o

equilíbrio racional e imaginativo ente seus alunos. O professor, aquele que facilitará a

reunião entre a criança e a poesia, saberá de maneira intuitiva ou de maneira re-adquirida,

prestar atenção também a função poética da linguagem. Função há tanto tempo relegada

pelo professor do desencanto. Este professor deverá ser um catador de poesia. Saberá dar

continuidade, em sala de aula, à oralidade rica em sons e imagens da criança pré-escolar,

através da seleção e apresentação de poemas-semente, saboreados, como sabe saborear a

criança, até o caroço da palavra. Desta forma, estará prevendo o humanismo total, amplo,

dinâmico e circularizante da criança que atualmente se inicia como escolar.

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Portanto, a medida que escuta um poema, a criança trabalha com a imaginação,

tentando formar uma imagem mental do texto e ao tentar decifrar o que está sendo

dito,procurando encontrar o real sentido das palavras, ela trabalha raciocínio lógico e a

agilidade mental e, principalmente, amplia o vocábulo e desenvolve o gosto pela literatura,

fundamental para formar leitores.

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CONCLUSÃO

Através de dinâmicas e vivências, despertar o contador de histórias que existe em cada

um, estimular através de técnicas elaboradas,a faceta sensível e poética inerente ao ser

humano,aprimorando sua capacidade expressiva e criativa, valorizando assim, a relação

com o livro de contos populares e autorais como fonte de inspiração na busca de

disseminar, pela prática, o direito de formar leitores.

Ler não deve ser apenas uma habilidade ou uma forma de se adquirir conhecimento,

pois o ato da leitura deve ser ampliado no sentido de remeter o indivíduo para múltiplos

significados, trabalhar com literatura infantil precisamente tocar no universo da

representação, mundo do simbólico e do poético.

Quanto mais a criança for provocada na sua capacidade de ser e sentir, mais

probabilidade ela terá de se tornar um adulto feliz e transformador. Olhar para a criança é,

de certa forma, preparar-se para receber o adulto,daí ser tão essencial que o educador seja

alguém com boa dose de generosidade. Colaborar para que alguém desenrole o novelo da

vida e teça seu próprio caminho é assumir diante da existÊncia ema postura comprometida

com a evolução afetiva e intelectual da espécie humana. É dignificar a existência.

Vivendo as histórias, convivendo com as personagens e suas aventuras, seus

sentimentos, as crianças devem ser convidadas para um aprendizado prazeroso e

significativo. Os contos de fadas, histórias de bichos e fábulas são uma porta de entrada

para o mundo da fantasia e, com isso, também uma porta de saída para a vida real.

Portanto a literatura estando no contexto do processo educativo desde a educação

infantil e sendo utilizado de forma provocativa pelo educador, leva a criança questionar,

levantar hipóteses, argumentar, comparar o conteúdo das histórias com os de sua vivência,

ajudando assim na construção de um indivíduo autônomo e confiante em si, acima de tudo,

vivendo sua infância de forma natural. O bom educador deverá reconhecer o valor da

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literatura na formação da criança e sempre estar atento para inovar com atividades que

chamem a atenção da criança, que sejam realmente prazerosas.

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BIBLIOGRAFIA

ABRAMOVICK, Fanny. Literatura Infantil: gostosuras e bobices. São Paulo – SP.

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BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos Contos de fadas. Rio de Janeiro – RJ. Paz e

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BOOTH, Wayne. A retórica da ficção. Lisboa. Arcádia. 1980.

COELHO, Nelly Novaes. Literatura infantil: Teoria-Análise-Didática. 7ª Edição. São

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CUNHA, Maria Antonieta. Literatura Infantil: Teoria e Prática. 18ª Edição. São Paulo –

SP. Editora Ática. 2003.

HAVELOCK, Eric. A equação oralidade-escritura: uma fórmula para a mente moderna.

São Paulo – SP. Editora Ática. 1995.

MEIRELES, Cecília. Problemas da Literatura Infantil. 3ª Edição. Rio de Janeiro – RJ.

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WARNER, Marina. Da Fera à loira. sobre contos de fadas e seus narradores. São Paulo –

SP. Companhia das Letras. 1993.

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ATIVIDADES CULTURAIS

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ÍNDICE FOLHA DE ROSTO .............................................................................................................II

DEDICATÓRIA ................................................................................................................. III

AGRADECIMENTOS ....................................................................................................... IV

HINO À CRIANÇA............................................................................................................. V

RESUMO.............................................................................................................................. 6

SUMÁRIO ............................................................................................................................ 8

I- INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 9

CAPÍTULO I..................................................................................................................... 10

CONTAR HISTÓRIAS: UMA HISTÓRIA MILENAR.................................................... 11

CAPÍTULO II ................................................................................................................... 15

DA ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS.............................................................................. 16

CAPÍTULO III.................................................................................................................. 19

A ORALIDADE E A ESCRITA NA LITERATURA INFANTIL.................................... 20

3.1) A oralidade e a escritura ...................................................................................... 21 3.2) Os narradores de histórias.....................................................................................22

3.3) Os contos de fadas ............................................................................................... 23 3.4) Literatura Infantil brasileira contemporânea ....................................................... 25

CAPÍTULO IV .................................................................................................................. 28

A POESIA PARA CRIANÇAS.......................................................................................... 29

CONCLUSÃO .................................................................................................................... 34

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................ 36

ATIVIDADES CULTURAIS..............................................................................................37 ÍNDICE................................................................................................................................38

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FOLHA DE APROVAÇÃO

UNIVESIDADE CÂNDIDO MENDES

AUTOR: Jacqueline de Almeida de Ferreira TÍTULO: A arte de ser um contador de histórias para crianças DATA DA ENTREGA: Analisado por: Conceito: ______________________________________________ _____________ ______________________________________________ _____________ ______________________________________________ _____________ CONCEITO FINAL: ____________________ Observação: