universidade tuiuti do paranÁ sheila almeida...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
SHEILA ALMEIDA SANTOS
A REPARAÇÃO E OQUANTUM INDENIZATÓRIO EM DANOS
MORAIS
CURITIBA
2017
SHEILA ALMEIDA SANTOS FRANCO
A REPARAÇÃO E O QUANTUM INDENIZATÓRIO EM DANOS
MORAIS
Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade Jurídica da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Clayton Reis
CURITIBA
2017
TERMO DE APROVAÇÃO
SHEILA ALMEIDA SANTOS FRANCO
A REPARAÇÃO E O QUANTUM INDENIZATÓRIO EM DANOS
MORAIS
Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná
Curitiba, de de 2017
Prof. Dr. PhD Eduardo de Oliveira Leite Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
Orientador: Professor Dr. Clayton Reis Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito
Professor: Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito
Professor: Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, sem Ele nada seria possível.
Agradeço a minha família, por estarem sempre ao meu lado, nos momentos
mais difíceis, agradeço por ter conhecido e convivido com professores maravilhosos,
éticos, que não mediram esforços, para nos trazer ao mundo jurídico, onde o
conhecimento nunca se esgota, ao meu orientador, a quem muito admiro.
Dedico este trabalho, aos meus
familiares, meu companheiro, mas
principalmente a minha mãe (in
memoriam), que foi minha grande
incentivadora, dizia acreditar em mim e
essa lembrança nunca me fez desistir.
RESUMO
O código civil de 1916 previa algumas hipóteses de reparação do dano moral, como quando a lesão corporal acarretasse deformidade ou quando atingisse mulher solteira ou viúva ainda capaz de casar (art. 1538); quando ocorresse ofensa à honra da mulher por defloramento, sedução, promessa de casamento ou rapto (art. 1548); ofensa à liberdade pessoal (art. 1550); calúnia, difamação, injúria 9 ART. 1547). Em todos os casos o valor era prefixado e calculado com base na multa criminal prevista para a hipótese. A Constituição Federal de 1988 no título “Dos direitos e garantias fundamentais” (art. 5º), assegura o direito de resposta ao agravo, além da indenização, por dano material, moral ou à imagem; e declara invioláveis “a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (inciso x). Tem prevalecido, o entendimento de que a reparação pecuniária pelo dano moral tem duplo caráter: compensatório para a vítima e punitivo para o ofensor, atenuando o sofrimento da ofendida e servindo de desestímulo para o ofensor, para que tal fato não volte a ocorrer.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Dano moral. Indenização.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................... 7
CAPÍTULO I - CONCEITOS HISTÓRICOS DA REPARAÇÃO DE DANOS........ 9
1.1 - HISTÓRICO.................................................................................................. 9
1.2 - CONCEITO DE DANO MORAL.................................................................... 16
CAPÍTULO II – OS VALORES FUNDAMENTAIS DA PESSOA HUMANA......... 20
2.1 - O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA............................... 20
2.2 - O DIREITO À INTIMIDADE........................................................................... 21
2.3 - O DIREITO À PRIVACIDADE........................................................................ 22
2.4 - O PRINCÍPIO DO NOME E DA HONRA....................................................... 23
CAPÍTULO III - CONCEITO E PRESSUPOSTOS FORMAIS DA
RESPONSABILIDADE CIVIL...............................................................................
26
3.1 - CONCEITO................................................................................................... 26
3.2 - CULPA........................................................................................................... 27
3.3 - DANO............................................................................................................ 28
3.4 - NEXO DE CAUSALIDADE............................................................................ 30
CAPÍTULO IV - OS DANOS DECORRENTES DAS VIOLAÇÕES AOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS DA PESSOA..........................................................
32
4.1 - OFENSA AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE........................................ 32
4.2 - DANOS À IMAGEM, NOME E HONRA........................................................ 33
4.3 - DANOS NÃO PATRIMONIAIS....................................................................... 35
CAPÍTULO V - VALORAÇÃO DOS DANOS MORAIS......................................... 36
5.1 - OS CRITÉRIOS PREVISTOS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002........................ 36
5.2 - PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS ADOTADOS PELO STF E STJ
(RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE)...................................................
37
5.3 - FORMA DE AVALIAÇÃO DO “ARBITRIUM BONI VIRI”................................ 38
5.4 - PRINCÍPIOS PREVISTOS NO ARTIGO 884 E 944 DO CÓDIGO CIVIL DE
2002.......................................................................................................................
45
CONCLUSÃO....................................................................................................... 47
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 48
7
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por finalidade tentar esclarecer alguns pontos
controversos da temática sobre a Quantificação Indenizatória em Danos Morais,
trata-se de um tema complexo em que não há outra maneira de repara-lo, se não
por arbitragem judicial, cabe ao juiz decidir, contando com seu prudente arbítrio.
Uma das objeções que se fazia à reparabilidade do dano moral, era a
dificuldade de se apurar este valor, quantificar esse dano.
Antes da Constituição de 1988, vários dispositivos legais estabeleciam
critérios para a quantificação do dano moral. Os tribunais adotavam o critério
previsto no artigo 84, § 1º do Código Brasileiro de Telecomunicações, que manda
fixar a indenização entre 5 e 100 salários mínimos para as hipóteses de calúnia,
difamação ou injúria.
A Lei da Imprensa, por seu turno (Lei nº 5.250\ 67), em seus artigos 51 e 52,
limitava a determinados números de salários mínimos a responsabilidade civil do
jornalista profissional e da empresa que explora o meio de informação ou
divulgação.
A Constituição de 1988 assegurou os direitos da personalidade, direitos
subjetivos privados, ou ainda, direitos relativos à integridade moral, nos incisos V e X
do art. 5º, assegurando o direito de resposta e declarando ser invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra, a imagem das pessoas, garantindo o direito a
indenização por dano material ou moral decorrente da sua violação.
Apesar de estar consagrado na Constituição Federal, na Doutrina e na
Jurisprudência, a questão indenizatória ainda é muito complexa, em virtude de não
se encontrar uma quantia que corresponda com exatidão ao dano moral, sofrido pela
vítima, como mensurar uma dor, vexame, sofrimento ou humilhação, que interfira
diretamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições,
angústias e desequilíbrio do seu bem estar.
O Código Civil de 2002 previu a reparação do dano moral, porém não previu
a reparação desse dano, tornando essa lacuna, um grande desafio para nossos
magistrados, que tem se empenhado arduamente nesta missão, utilizando-se da sua
experiência, de critérios subjetivos, como a extensão do dano, o grau de culpa das
partes, as condições sociais da vítima, e fundamentados em doutrinas e
jurisprudências.
8
No desenvolvimento deste trabalho, será analisado as questões de
reparação e quantificação indenizatórias em danos morais, estudadas nas doutrinas,
e o relevante papel do magistrado nessa missão de reparar e valorar o bem mais
precioso que são os bens extrapatrimoniais.
9
CAPÍTULO I - CONCEITOS HISTÓRICOS DA REPARAÇÃO DE DANOS
1.1 HISTÓRICO
Historicamente, antes mesmo do direito romano, as mais antigas
codificações já previam a noção de reparação de dano. Para grande parte dos
historiadores a primeira noção de que se tem conhecimento acerca do dano e sua
reparação, através de um sistema codificado de leis, surgiu, na Mesopotâmia,
através de Hamurabi, rei da Babilônia (o Código de Hamurabi).
A ideia de responsabilidade encontra-se presente desde os primórdios da
civilização. A preocupação fundamental dos monarcas era de reprimir os atos
ofensivos e lesivos a outrem, de forma a manter o equilíbrio social perturbado pelas
ações ilícitas de terceiros. O sentimento que predominava no espírito do legislador
desse período da história, certamente não era humanitário, mas tão somente
alicerçado na ideia de que a dor se paga com a dor, de acordo com os princípios
constantes na Lei de Talião
A primeira noção de que se tem conhecimento na história da civilização
acerca do dano e sua reparação, através do sistema codificado de leis, surgiu no
Império Babilônico na Mesopotâmia, através de Hamurabi, rei da Babilônia (2067-
2025 a.C.).
O Código de Hamurabi, gravado em uma estela de diorito negro, que se
acha conservado no museu do Louvre em Paris, é constituído por um sistema de leis
sumérias e acadianas, que foram revistas, adaptadas e ampliadas por Hamurabi.
A noção de reparação do dano encontra-se claramente definida no Código
de Hamurabi. As ofensas pessoais eram reparadas na mesma classe social, à custa
de ofensas idênticas. Todavia, o Código incluía, também a reparação do dano à
custa de pagamento de um valor pecuniário.
A ideia, hoje vigente, da reparação do dano por um valor monetário tinha
como objetivo repor as coisas lesadas ao seu status quo ante ou, ainda, conferir à
vítima, o direito a uma compensação monetária proporcional em virtude do
sofrimento experimentado. Portanto a imposição de uma pena econômica consistia,
10
sem dúvida, em uma forma de, à custa da diminuição do patrimônio do lesionador,
proporcionar à vítima uma satisfação compensatória.1
O CÓDIGO DE MANU- Manu, na mitologia hinduísta, foi o homem que
sistematizou as leis sociais e religiosas do Hinduísmo. Estas leis antigas são
chamadas de Código de Manu e até hoje interferem na vida social e religiosa da
Índia, onde o Hinduísmo é a principal religião.
O aspecto que diferencia o Código de Hamurabi e o de Manu consiste no
fato de que, enquanto, no primeiro, a vítima ressarcia-se à custa de outra lesão
levada a efeito sobre o lesionador, no de Manu, o ressarcimento se operava ás
expensas de um determinado valor pecuniário, arbitrado pelo legislador, portanto
pode notar a evolução entre os dois sistemas, um na reparação de uma ofensa por
outra, no primeiro, e a reparação de um ato lesivo pelo pagamento de uma
importância, no segundo.
Dessa forma, suprimiu-se a violência física, que estimulava nova reprimenda
igualmente física, gerando daí um ciclo vicioso sem limites, substituindo-a por um
valor pecuniário para atender à satisfação da vítima.
Assim, o aspecto diferenciativo entre o Código de Hamurabi, e o Código de
Manu era o de que, enquanto no primeiro a vítima ressarcia-se á custa de outra
lesão levada a efeito no lesionador, no Código de Manu o era às expensas de um
certo valor pecuniário, arbitrado pelo lesionador.2
Percebe-se assim que já havia desde a Antiguidade, pressupostos de
aceitação do dano moral, adequado as condições e cultura do povo da época.
Todavia, o Professor Noah Kramer, da Universidade da Pensilvânia, EUA,
descobriu o código remoto de Ur-Nammu, o primitivo fundador da 31ª dinastia de Ur,
do país dos Sumerianos, que continham conceitos normativos anteriores aos
Códigos de Hamurabi
No Código de Ur-Nammu, semelhante à Lei das XII Tábuas, uma
preocupação do monarca da época em reprimir a violência e a vingança, em seu
texto encontram-se importantes noções acerca da reparação do dano:
1 Para Veit Valentim, História universal. 61. ed. São Paulo: Martins Editora, 1964,T.i, p. 81: “O
Código de Hamurabi foi o primeiro da história em que predominaram ideias claras sobre o direito e economia”. 2 SILVA, Wilson Melo da. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 67.
11
„Se ( um homem, a outro homem, com um instrumento.....) Geshpu...o pé se cortou: 10 ciclos de prata deverá pagar”. “Se um homem, a um outro homem, com uma arma, os ossos de ...tiver quebrado: 1 mina de prata deverá pagar”. Se um homem, a um outro homem, com instrumento Geshpu, houve decepado o nariz, 2/3 de uma mina de prata deverá pagar”.
3
A base das codificações modernas, foram inspiradas nesses códigos
antigos, que para a época traziam o efeito desejado, que era diminuir os conflitos
entre as pessoas, reprimindo a violência e o número de homicídios. A reparação do
dano passou a ser uma obrigatoriedade, com indenizações pecuniárias, sendo
afetado o patrimônio do causador do dano, eis uma forma de reprimir ações danosas
ao seu semelhantes.
A reparação do dano moral já era com conhecida na Roma antiga. A própria
Lei das XII Tábuas estabelecia a necessidade de indenização, imputada entre outros
casos, àquele que avariasse um membro de outro, sem entrar posteriormente em
acordo. Com o tempo passou-se a aceitar a reparação pecuniária, para os casos de
injúria, por se entender que ela atingia em bem extrapatrimonial do ofendido.
Nesse sentido, Silva:
Como vimos, a vítima perante o juízo colegiado, para obter uma certa soma em satisfação ou reparação de injúrias, em sentido estrito, cometidas contra si, dispunha da ação pretoriana a que se denominava actio de injuriisaestimandis.
4
Superada a época da vingança privada, a noção de reparação pecuniária de
danos era algo extremamente presente entre os romanos, pelo que todo ato
considerado lesivo ao patrimônio ou à honra de alguém deveria implicar uma
consequente reparação.5
3 Antônio Chaves, em sua obra Tratado de Direito Civil: responsabilidade civil. p. 604, ao refere-se à
civilização grega, séculos após a assíria e a suméria, cita fatos notórios da história que bem demonstraram a constante preocupação do homem com o aprimoramento espiritual: “ Na Grécia, a Odisseia de Homero pinta os gritos retumbantes de Hefesto, o marido enganado, que surpreendera no próprio leito a infiel Afrodite e o formoso Ares, a provocar uma assembleia de deuses, que, atendendo aos reclamos do coxo ferreiro, decretaram a seu favor, o pagamento, por Ares, de pesada multa .Manifesta assim , claramente, um caso de reparação de danos morais resultantes de adultério. Éschines repreendeu publicamente Demóstenes por ter recebido de Mídias uma certa porção em dinheiro, em pagamento de uma bofetada”. 4 SILVA, Wilson de Melo da. Op. cit., p. 79.
5 Saliente-se que a responsabilidade civil no Direito Romano pode ser visualizada em 3 etapas: em
primeiro lugar cronologicamente, a Lei das XII Tábuas( no ano 452 a.C.); depois, a Lex Aquilia (a partir de 286 a.C); e, finalmente, a Legislação Justiniana (528/534 a.C), que, por seu modo, subdividia-senasInstitutas, O CodexJustinianus e o Digesto ou Pandectas.
12
A preocupação com a honra era profunda, traduzindo-se no brocardo
honesta fama est alteriumpatrimonium (a fama honesta é outro patrimônio), o que
demonstra a possibilidade de reparação, ainda que pecuniária, da lesão à boa
conduta, há mais de 2000 anos.
A civilização grega assumiu um papel importantíssimo na história do homem.
As leis gregas outorgavam ao cidadão e aos seus respectivos bens a necessidade
de proteção jurídica, além de fixarem que a reparação dos danos a eles causados
assumiria sempre um caráter pecuniário, afastando a vingança física e pessoal
como forma de satisfação ao lesado.
Sobre a matéria, Júlio Bernardo do Carmo nos informa que ”Demóstenes
recebera de Mídias uma porção de dinheiro, no que fora reprovado por Eschine,
porque referia a uma bofetada com que aquele tinha sido atingido”. grega assumiu
um papel importantíssimo na história do homem. As leis gregas outorgavam ao
cidadão e aos seus respectivos bens a necessidade de proteção jurídica, além de
fixarem que a reparação dos danos a eles causados assumiria sempre um caráter
pecuniário, afastando a vingança física e pessoal como forma de satisfação ao
lesado.
Sem qualquer dúvida, “a influência cultural dessa civilização foi marcante, na
medida em que propiciaram o surgimento de legislações de grande conteúdo
político-filosófico, como aconteceu na antiga Roma.6
O Direito Comparado sempre teve um papel importante para nossa doutrina.
No Brasil, durante muito tempo não se aceitava a reparação por dano
exclusivamente moral. Com a influência dos países europeus, principalmente França
e Alemanha, fortaleceu nossa doutrina ao reconhecimento da reparação ao dano
moral.
Na França, o artigo 1382 do Código Civil, preceitua que: “Todo fato oriundo
de qualquer pessoa, que cause a outrem um dano, obriga a este pela falta cometida
a reparar”.7 Na doutrina e jurisprudência francesas, interpreta-se o dispositivo legal
de forma abrangente, reparando-se tanto os danos materiais, como também os
danos morais, uma vez que o legislador não estabeleceu nenhuma limitação em
6 REIS, Clayton. Dano Moral. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 16.
7 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017.
13
relação ao tipo de dano a ser ressarcido. Portanto no ordenamento jurídico francês
está consolidado os danos morais.
Na Alemanha, a partir de 1815, como consequência do Congresso de Viena,
surgiu a Confederação Alemã e, por conseguinte, a unificação da Alemanha.
Entretanto somente após 1871, foi fundado o império e, através de seu legislativo
federal, iniciaram-se a aplicação das leis civis.
Para Wilson Melo da Silva8, antes do BGB e já nesses vários Códigos
regionais da Alemanha, e mesmo no Gemeines Rechet dos países sem codificação,
encontramos uma adesão franca â doutrina da reparação, dos danos morais.
Após a vigência do BGB- Código Civil Alemão- os delitos causadores de
danos passaram a ser reparados de forma precisa e unificada, particularmente, no
caso de danos morais.
Na Itália as raízes históricas da obrigação no antigo direito romano, admitiam
que a vítima perseguisse o ofensor no caso de delictaprivata- um delito contra o
indivíduo, sua família ou patrimônio. Neste caso o ofensor estaria exposto à
vingança da vítima.
Posteriormente, esse direito ser resgatado, mediante o oferecimento de
pecúnia.
O direito italiano admite, hoje, tanto no seu Código Civil, como no Penal, a
reparação de um dano através de um pagamento equivalente a lesão sofrida.
O direito italiano admite, hoje, tanto no seu Código Civil, como no Penal, a
reparação de um dano através de um pagamento equivalente a lesão sofrida.
No Ordenamento Jurídico Brasileiro, durante a vigência das Ordenações do
Reino de Portugal, não existia qualquer regra expressa sobre o ressarcimento do
dano moral e sua reparação, sendo totalmente questionável essa possibilidade.
Com o advento do 1º Código Civil Brasileiro (Lei nº 3071, de 1º de janeiro de
1916, com vigor a partir de 1º de janeiro de 1917), os artigos 76 parágrafo único, dos
artigos 79 e 159, norteou as primeiras possibilidades de reparabilidade do dano
moral, conforme segue:
Art. 76. Para propor, ou contestar uma ação, é necessário, ter legítimo interesse econômico ou moral. Parágrafo único. O interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao autor, ou à sua família.
8 SILVA, Wilson Melo da. Op. Cit. p. 52.
14
Art.79. Se a coisa perecer por fato alheio à vontade do dono, terá este ação, pelos prejuízos contra o culpado. Art.159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.
9
Neste sentido o autor do projeto do Código Civil de 1916, CLÓVIS
BEVILÁQUA preleciona:
Em meu sentir, o sistema do Código Civil, nas suas linhas gerais, relativamente ao ponto questionado, é o seguinte: a) Todo dano seja patrimonial ou não, deve ser ressarcido, por quem o causou, salvante a escusa de força maior que, aliás, algumas vezes não aproveita, por vir precedida de culpa. É regra geral sujeita a excepção; b) Com razão mais forte, deve ser reparado o dano proveniente de ato ilícito (art. 159 e 1518); c) Para a reparação do dano moral, aquele que se sente lesado dispõe de ação adequada (artigo 76, parágrafo único); d) Mas o dano moral, nem sempre, é ressarcível, não somente por não se poder dar-lhe o valor econômico, por não se poder apreça-lo em dinheiro, como ainda, porque essa insuficiência dos nossos recursos abre a porta a especulações desonestas, acobertadas pelo manto (...) de sentimentos afetivos. Por isso o Código Civil afastou as considerações de ordem exclusivamente moral, nos casos de morte e de lesões corpóreas não deformantes (artigos 1537 e 1538); e) Atendeu, porém, a essas considerações no caso de ferimentos, que produzem aleijões ou deformidades (artigo 1538, parágrafos 1 º e 2º); tomou em consideração o valor da afeição providenciando, entretanto, para impedir o arbítrio, o desvirtuamento (artigo 1543); as ofensas à honra, à dignidade e a liberdade são outras tantas formas de dano moral, cuja indemnização o Código disciplina; f) Além dos casos especialmente capitulados no Código Civil, como de dano moral ressarcível outros existem que ele remete para o arbitramento, no artigo 1553, que se refere, irrecusavelmente, a qualquer modalidade de dano, seja patrimonial ou meramente pessoal. (...). Ao contrário, a irreparabilidade do dano moral aparece no Código como excepção, imposta por considerações de ordem ética e mental. A reparação é a regra para o Dano, seja moral, seja material. A irreparabilidade é excepção.
10
Mediante a previsão expressa em recepcionar somente o dano patrimonial,
bem como a argumentação do artigo 76 que só se refere a dispositivo de ordem
processual, os pedidos de indenização por danos morais eram indeferidos, por não
haver na época, dispositivo expresso legal a respeito de pleitear danos
extrapatrimoniais.
Porém sobrevieram leis especiais regulando especificamente o assunto, dos
quais podemos citar: O Código Brasileiro de Telecomunicações, de 27 de agosto de
1962 (Lei nº 4.117); o Código Eleitoral, de 15 de julho de 1965 (Lei nº 4.737); a Lei
9 BRASIL. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L3071impressao.htm>. Acesso em 20 mai. 2017. 10
BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estado Unidos do Brasil. 5. ed. São Paulo: Francisco Alves, 1943, p. 319.
15
de Imprensa, de 9 de fevereiro de 1967 (Lei nº 5.250 revogada); a Lei dos Direitos
Autorais, de 14 de dezembro de 1973 (Lei nº 5.988); e, depois da promulgação da
Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990); o Código de Defesa do Consumidor , de 11 de setembro de
1990 (Lei nº 8078), todas elas contendo dispositivos específicos sobre a reparação
dos danos extrapatrimoniais.11
Sendo assim, os pedidos de indenização por danos extrapatrimoniais só
eram recepcionados somente quando expressos em lei, uma espécie de rol taxativo,
não existindo tal lei que regulasse a hipótese de dano moral, o mesmo era
indeferido.
A acepção aos danos morais só se tornou pacífica, com a promulgação da
Constituição Federal de 1988, a importância desse instituto era tanta que foi descrita
expressamente entre Direitos e Garantias Fundamentais no título II da atual Carta
Magna, que foi proclamada como a Constituição Cidadã, que se preocupa
fundamentalmente com a pessoa humana, sendo assim o dano moral tornou-se uma
possibilidade real para os cidadãos vítimas de agressões.
Apesar do grande avanço, não restaram definidos critérios para a
quantificação indenizatória, tarefa essa que coube ao Superior Tribunal de Justiça,
definir tais parâmetros. Sendo essa uma tarefa extremamente difícil, em virtude das
inúmeras considerações de ordem subjetiva. Considerando todas essas dificuldades
as Cortes de Justiça, vem, demonstrando, a inexistência de critérios uniformes em
nosso ordenamento jurídico para os efeitos do quantum debeatur.
De qualquer forma, a Constituição Federal de 1988, representa um marco
em nosso ordenamento jurídico, sobre a questão danos morais, que foi elevada ao
status “Direitos e Garantias Fundamentais.”
Sobre a questão ensina CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA:
A Constituição Federal de 1988 veio pôr uma pá de cal na resistência à reparação do dano moral. (...) Destarte, o argumento baseado na ausência de um princípio geral desaparece. E assim, a reparação do dano moral integra-se definitivamente em nosso direito positivo. (...) Com as duas disposições contidas na Constituição Federal de 1988 o princípio da reparação do dano moral encontrou o batismo que a inseriu em a
11
Mesmo antes do Código Civil, o Decreto nº 2.681, de 7-12-1912, que regula a responsabilidade civil nas estradas de ferro, estabeleceu que a lesão corpórea ou deformidade ensejam uma indenização conveniente arbitrada pelo juiz (art. 21). Também a reparação em caso de morte foi ampliada, comportando alimentos, auxílio ou educação a que uma pessoa se veja privada em função do evento, ao arbítrio do juiz (art. 22).
16
canonicidade de nosso direito positivo. Agora, pela palavra mais firme e mais alta da norma constitucional, tronou-se princípio de natureza cogente o que estabelece a reparação por dano moral em nosso direito. Obrigatório para o legislador e para o juiz”.
12
A partir do atual Código Civil Brasileiro de 2002 se reconhece
expressamente em seu artigo 186, o instituto do dano moral e por força do artigo
927 a sua reparabilidade, segue assim o texto:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
13
O instituto está presente hoje também no Código de Defesa do Consumidor
que, no artigo 6º, nos seus incisos VI e VII, aos consumidores, como direito básico,
“a efetiva prevenção e reparação dos danos patrimoniais e morais” e ” o acesso aos
órgãos judiciários e administrativos com vista à prevenção ou reparação de danos
patrimoniais.
1.2 CONCEITO DE DANO MORAL
O dano moral consiste na lesão de direitos cujo conteúdo não é pecuniário,
nem comercialmente redutível a dinheiro. Em outras palavras, podemos afirmar que
o dano moral é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa (seus direitos
da personalidade), violando por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e
imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente.14
O dano pode apresentar-se independentemente da sua natureza, tratando-
se de um bem patrimonial ou extrapatrimonial, esse último integra a personalidade
12
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 9. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 58. 13
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017. 14
“Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, á igualdade, à segurança e á propriedade, nos termos seguintes:” [...] “X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
17
da pessoa, são ofensas causadas que ferem a Dignidade Humana, princípio este
elencado na Constituição Federal de 1988, era grande a discussão acerca da
indenização ou não para a compensação do dano moral, desde então, tal instituto,
encontrou-se amparado por texto legal, descritos no artigo 5º, incisos V e X da
Constituição Federal Brasileira, e posteriormente no Código Civil, em seu artigo 186.
Assim sendo, a promulgação da Constituição Federal de 1988 colocou fim a
controvérsia acerca da reparação do dano moral, passando a admitir de forma
ampla e irrestrita, uma vez que está inserido na categoria de fundamento do Estado
Democrático de Direito, a dignidade da pessoa humana, que representa um acervo
de valores ideais que qualificam o ser humano, passou-se a considerar o dano moral
como ofensa ao princípio da dignidade da pessoa.15
O dano moral é aquele onde o ofendido experimenta uma intensa dor, uma
situação vexatória, uma humilhação ou algum sofrimento, em medidas
desproporcionais as da normalidade, interferindo, portanto, severamente na vida do
indivíduo, afetando não só sua saúde psicológica, mas também sua moral e o seu
intelecto.
Nesse sentido o conceito de João Maria de Matos Antunes Varela é preciso,
quando conceitua com acentuada clareza a verdadeira finalidade dos danos não
patrimoniais. Para tanto, aponta o professor Varela, da Universidade de Lisboa e
Coimbra, que:
[...] ao lado destes danos pecuniariamente avaliáveis, há outros prejuízos como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o patrimônio do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação (Genugtuung) do que uma indenização. A estes danos dá-se usualmente o nome de danos morais.
16
15
Maria Celina Bodin Moraes, em sua obra Danos á pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro:Renovar, 2003, p. 131, nesse aspecto, preleciona, recentemente, afirmou-se que o dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é que a violação ao direito à dignidade. Se não se está de acordo, todavia, com a criação de um direito subjetivo à dignidade, como sugerido, é efetivamente o princípio da dignidade humana, princípio fundante do nosso Estado Democrático de Direito, que institui e encima como visto, a cláusula geral de tutela da personalidade humana, segundo a qual as situações jurídicas subjetivas não patrimoniais merecem proteção especial no ordenamento nacional, seja através de prevenção, seja mediante reparação, a mais ampla possível, dos danos a ela causados”. 16
João de Matos Antunes Varela. Op. cit., p. 595.
18
Quando a lesão afeta um bem jurídico intangível, aquele no qual se agride a
pessoa do ofendido em sua individualidade, se resta configurado o dano moral e por
respeito jurídico à dignidade da pessoa humana e dos direitos da personalidade,
devem ser reparados.
Na definição de Maria Helena Diniz, dano moral “vem a ser a lesão de
interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada por ato lesivo”.17
Para a citada jurista:
Qualquer lesão que alguém sofra no objeto de seu direito repercutirá, necessariamente, em seu interesse; por isso quando se distingue o dano patrimonial do moral, o critério de distinção não poderá ater-se à natureza ou índole do direito subjetivo atingido, mas ao interesse , que é pressuposto desse direito, ou ao efeito da lesão jurídica, isto é, o caráter de sua repercussão sobre o lesado, pois somente deste modo se poderia falar em dano moral, oriundo de uma ofensa a um bem material, ou em dano patrimonial indireto, que ocorre de evento que lesa direito extrapatrimonial.
18
A diferença desses danos, qualquer que seja patrimonial ou extrapatrimonial
ensejam em reparação, no caso bem patrimonial tem como finalidade repor o que foi
lesionado ao seu statu quo ante ou aquisição de outro bem semelhante,
diferentemente do dano extrapatrimonial, onde é impossível se repor o que perdeu,
o que há é uma forma compensatória, geralmente essa forma é de cunho
pecuniário,
Wilson Melo da Silva19 acentua danos morais como sendo: “ Lesões sofridas
pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, em
contraposição ao material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor
econômico”.
Os diversos conceitos ao dano moral servem para ilustrar a magnitude do
tema, tanto quanto o enorme espaço aberto pela tutela jurídica dos direitos
fundamentais da pessoa humana, que consagram em nosso ordenamento jurídico.
Assim qualquer ofensa jurídica a esses valores, faculta, à vítima o direito de defesa,
causando um número excessivo de ações indenizatórias por danos morais que
tramitam nos tribunais, demonstrando de forma inequívoca a importância desse
instituto jurídico utilizado pelas pessoas lesadas em seus direitos fundamentais.
17
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 84. 18
Idem. 19
Silva, Wilson de Melo da. Op. cit., p.1.
19
Assim nos explica, Venosa:
Não é também qualquer dissabor comezinho da vida que pode acarretar a indenização. Aqui, também é importante o critério objetivo do homem médio, o bônus pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do homem excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem o homem de pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino.
20
Diante desse entendimento dois princípios estão intrinsecamente
relacionados, o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, pois um mero
aborrecimento, dissabores, mágoa ou irritação do cotidiano não são figuras capazes
de configurar dano moral. O dano moral deve ser claro e efetivo, não podendo
enquadrar-se em uma pequena contrariedade à qual todos estão sujeitos no dia a
dia.
O dano moral ainda pode ser classificado como direto e indireto.
O dano moral direto consiste na lesão a um interesse, que visa a satisfação
ou gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade
(como a vida, a integridade corporal e psíquica, a liberdade, a honra, o decoro, a
intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem) ou nos atributos da pessoa
(como o nome, a capacidade, o estado de família). Abrange, ainda a lesão à
dignidade da pessoa humana.
O dano moral indireto consiste na lesão a um interesse, tendente à
satisfação ou gozo de bens jurídicos patrimoniais, que produz um menoscabo a um
bem extrapatrimonial, é aquele que provoca prejuízo a qualquer interesse não
patrimonial, devido a uma lesão a um bem patrimonial da vítima. 21
20
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 49. 21
Esta é a lição de Zannoni,op. cit., p. 239-240. Vide Código Civil, art. 11 e s. “Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral da tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, III, da Constituição Federal Princípio da Dignidade Humana. Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação” (Enunciado nº 274 do CJF, aprovado na IV Jornada de Direito Civil).
20
CAPÍTULO II - OS VALORES FUNDAMENTAIS DA PESSOA HUMANA
2.1 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O estudo do dano moral, está diretamente correlacionado com o princípio da
dignidade humana, tendo em vista o seu fundamento na Constituição Federal de
1988, em seu art.1º, III.22
Nesse sentindo, ensina Carla Pinheiro que além de declarar a dignidade
constitui fundamento do Estado Democrático de Direito, o legislador constituinte quis
expressar de modo a não deixar dúvidas que a normativa do art. 1º, III, da
Constituição Federal de 1988 não se trata de simples declaração de direito, pois
estabeleceu no artigo 5º, §§ 1º e 2º quais são as condições materiais para uma
efetiva implementação da dignidade da pessoa humana.23
O reconhecimento do valor da Dignidade da Pessoa Humana vem de uma
evolução histórica, pela qual passou a humanidade. Após algumas experiências
negativas, tais como o totalitarismo24 assistido na Alemanha e na Itália, o mundo
vem gradualmente admitindo na Pessoa Humana o centro e a razão de ser da
própria vida, e, por esta razão, a vida de todos deve ser digna.
A dignidade da pessoa humana é trazida em um conceito de Sarlet, de que:
[...] qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida.
25
22
Art. 1º A Republica Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Munícipios e DO Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana. 23
PINHEIRO, Carla. Direito Internacional e Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2001, p. 72. 24
Segundo Nicola Abbagnannp, a categoria totalitarismo corresponde à teoria ou prática do Estado totalitário, vale dizer, do Estado que pretende identificar-se com a vida dos seus cidadãos. Esse termo foi cunhado para designar o fascismo italiano e o nazismo alemão. Ás vezes também é usado para designar qualquer doutrina absolutista, em qualquer campo a que se refira. (AGGAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 2003, p. 963). 25
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9. ed. rev.atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 73.
21
Portando a Dignidade Humana não se desvincula dos direitos fundamentais,
esse princípio é uma cláusula geral para dos direitos da personalidade, ficando claro
que a Dignidade é reconhecida como um atributo que caracteriza a Pessoa Humana.
A partir do reconhecimento de que se trata de um valor moral inerente à Pessoa
Humana é possível afirmar que tem a característica da irrenunciabilidade
2.2 O DIREITO À INTIMIDADE
De Plácido e Silva conceitua intimidade como derivado do termo latino
“intimus” ( o mais profundo, estreito e íntimo), indica a qualidade ou caráter das
coisas e dos fatos”.26 De Cupis define intimidade como o modo de ser da pessoa
que consiste na exclusão do conhecimento de outros daquilo referente à pessoa.
O direito à intimidade é provavelmente o mais exclusivo direito da
personalidade, para Monica Castro “[...] a reserva da intimidade consiste no bem
mais restrito, no sentido de maior amplitude da exclusão do outro”.27
A intimidade pode ser vista como um valor supremo dos indivíduos. Trata-se
de um direito essencial, inalienável, possui caráter exclusivista e individualista.
Para Carlos Alberto Bittar:
O direito à intimidade distingue-se dos demais por possuir núcleo próprio. Situa-se entre os direitos de cunho psíquico, divisando-se da proteção à privacidade na exata medida de elisão de qualquer atentado a aspectos particulares ou íntimos, que envolvam um circuito próprio, compreendendo o
lar, a família e a correspondência.28
Com a modernidade vieram os avanços tecnológicos e a facilidade de
comunicação, mas essa evolução, tem cada vez mais violado o direito a intimidade,
as pessoas ficaram mais expostas.
Essa realidade acarretou a necessidade de cada vez mais efetivar a
reparação do dano moral, como forma de satisfação pela violação dos direitos da
personalidade, especialmente à intimidade, que é a esfera mais íntima do ser
humano.
26
SILVA, De Plácido e. Op. cit., 2007, p. 768. 27
CASTRO, Mônica Neves de Aguiar da Silva. Honra, imagem, Vida Privada e Intimidade,em Colisão com outros Direitos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 44. 28
BITTAR, Eduardo C.B. Curso de ética jurídica. 11. ed. rev., atual e modificada. São Paulo: Saraiva 2014, p. 111.
22
2.3 O DIREITO À PRIVACIDADE
Trata-se de um direito inviolável pelo inciso X do art. 5º da CF, a vida privada
é entendida como a vida particular da pessoa natural trata-se também de um direito
da personalidade, cuja tutela jurídica, está consagrada no art. 21 do Código Civil
Brasileiro de 2002, a saber:
Art. 21 A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.
29
Mas a elaboração de um conceito de privacidade ou respeito à vida privada,
ainda parece ser tarefa de incipiente desenvolvimento. Os países da Europa
Ocidental, através do Conselho da Europa e de outros mecanismos internacionais,
na tentativa de formular normas de proteção à esfera íntima da pessoa, chegaram à
conclusão de que:
[...] o direito à vida privada consiste essencialmente em poder se levar sua vida como se entende com o mínimo de ingerências. Ele diz respeito à vida privada, à vida familiar e à vida do lar, à integridade física e moral, à honra e à reputação, ao fato de não ser apresentado sob um falso aspecto, à não divulgação de fatos inúteis e embaraçosos, à publicação sem autorização de fotografias privadas, à proteção contra espionagem e às indiscrições injustificáveis ou inadmissíveis, à proteção contra a utilização abusiva de comunicações privadas, à proteção contra a divulgação de informações comunicadas ou recebidas confidencialmente por um particular. Não podem se prevalecer do direito à proteção de sua vida privada as pessoas que, por suas próprias atitudes, encorajaram indiscrições das quais elas venham a se queixar posteriormente. O respeito à vida privada de uma pessoa ligada à vida pública levanta um problema particular. A fórmula „a vida privada para onde começa a vida pública‟ não basta para resolver este problema. As pessoas que representam um papel na vida pública têm direito à proteção da vida privada, salvonos casos em queesta possa ter incidência sobre a vida pública. O fato de que o indivíduo ocupe um lugar de destaque na atualidade, não o priva do direito ao respeito de sua vida privada.
30
De maneira geral, o direito à privacidade consiste na pretensão de estar
separado de grupos, mantendo o indivíduo livre de ingerências externas e da
29
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017. 30
SZANIAWSKI, Elimar. Op. cit. p. 289-290. Conforme o referido autor, o conceito encontra-se disposto na Res. 428 de 23.01.1970, no § “c”, alíneas 2 e 3 da Assembleia Consultiva Conselho da Europa.
23
observação de outras pessoas, pois “no âmago do direito à privacidade está o
controle de informações sobre si mesmo.31
Pontes de Miranda, ao tratar do direito a velar a intimidade, abordando a
questão da correspondência, presta esclarecimento suficiente à compreensão dos
motivos que levaram à superação da idéia de “expectativa de um direito” como
condição de violação da privacidade. Refere, pois, que:
[...] o direito ao sigilo da correspondência fechada, ainda quando não resulta de intimização (confidencialidade), existe como direito absoluto. O escrito, a carta, ou a obra, se está em sobrecarta, ainda não se separou suficientemente da pessoa ou não se concebeu como separável, de modo que se tem como irradiação da personalidade; e está “in transitu” para outra pessoa. É direito de personalidade: não pode ser alienado, nem é renunciável.
32
Diante desta breve explanação sobre direito à privacidade, é possível
concluir que a privacidade abarca todos os eflúvios do indivíduo que não devem ser
levados ao conhecimento de outrem, a não ser pela sua própria vontade.
2.4 O PRINCÍPIO DO NOME E DA HONRA
O nome é a representação da pessoa humana, parte integrante da
personalidade, sinal exterior pelo qual se designa, se individualiza e se reconhece a
pessoa no seio familiar e da sociedade. Deste modo revela-se um dos requisitos
básicos de nossa existência social. Consagrado enquanto um direito personalíssimo
e fundamental, que é dever do Estado Democrático de Direito tutelar, todo indivíduo
tem direito ao nome civil desde o seu nascimento, conforme previsto no Código Civil
de 2002 e na Lei de Registros Públicos.
Nas palavras de Adriano de Cupis33 o nome é um “sinal verbal que identifica
imediatamente, e com clareza, a pessoa a quem se refere”. Assim o nome se
incorpora naquilo que distingue a pessoa no seio social, naquilo que a torna única,
que faz da pessoa um ser inigualável, e, entre tantos traços de distinções, o nome é
um deles, trazendo à pessoa uma identidade própria. Mas a identidade não se
31
MENDES, Gilmar. Curso de direito constitucional. 3. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 379. 32
MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado: parte especial. 3. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970-1973, Tomo VII, p. 129. 33
DE CUPIS, Adriano. Op. cit. p. 179
24
concretiza tão somente pelo nome, este na verdade é um elemento daquela, é um
componente a mais que faz individualizar ainda mais a pessoa. A identidade é algo
mais amplo, podendo se desdobrar em inúmeras facetas, hodiernamente se fala até
em identidade genética.
O nome é um direito personalíssimo, portanto sua utilização é um direito
exclusivo do seu titular, mas esse direito pode ser relativizado, e em algum momento
o detentor do nome pode autorizar que outrem o utilize, seja de forma graciosa, seja
de forma onerosa.
A honra é um dos direitos da personalidade, associado à natureza humana.
Poderá ser de forma objetiva e subjetiva, na forma objetiva corresponde à
reputação das pessoas, compreendendo o seu bom nome e a fama que desfruta na
sociedade, na forma subjetiva corresponde ao sentimento pessoal de estima ou a
consciência da própria dignidade.
A honra deve ser vista como atributos reunidos e adquiridos pela pessoa na
sua vida pessoal, familiar, profissional, ou seja, dentro do aspecto como é vista em
sociedade. Dentro deste contexto a imagem, como dito alhures, descrita como
imagem atributo, é um dos bens mais preciosos que são conquistados durante a
vida e mesmo após esta.
Pelo divulgado, a honra está relacionada ao aspecto moral de que é um bem
inerente à própria pessoa.
Na doutrina de Sidney César Silva Guerra, então diz:
O direito à honra está intimamente relacionado aos valores mais importantes da pessoa, de poder andar de cabeça erguida, de ter um nome, das pessoas terem uma boa referência desta pessoa, enfim de poder se olhar no espelho e verificar, que, de fato trata-se de um homem honrado. No direito à honra, a pessoa é tomada, frente á sociedade, em função do valor que possui dentro daquele contexto social. Ocorrendo então a lesão da honra, de imediato a pessoa cujo direito foi violado se sente diminuída, desprestigiada, humilhada, constrangida, tendo perdas enormes tanto no aspecto financeiro, como no aspecto moral, pois a lesão se reflete de imediato na opinião pública, que logo adota uma postura negativa contra a pessoa implicando nestas perdas mencionadas.
34
O que se verifica na atualidade é o número de pessoas, das mais variadas
classes sociais com seus nomes incluídos em cadastro restritivos de crédito, ou
34
GUERRA, Sidney César Silva. A liberdade de imprensa e o direito à imagem. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 172.
25
mesmo recebendo ameaças de órgãos financeiros, inegavelmente se verifica um
ataque à sua honra.
26
CAPÍTULO III - CONCEITO E PRESSUPOSTOS FORMAIS DA
RESPONSABILIDADE CIVIL
3.1 CONCEITO
O Vocábulo “responsabilidade” é oriundo do verbo latino respondere,
designando o fato de ter alguém se constituído garantidor de algo. Poder-se à definir
responsabilidade civil como aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar
dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato próprio imputado, de
pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou,
ainda, de simples imposição legal35. Definição esta que guarda em sua estrutura, a
ideia de culpa quando se cogita da existência do ilícito (responsabilidade subjetiva),
e a do risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa (responsabilidade objetiva).36
Ainda sobre o conceito de Responsabilidade Civil, temos várias
significações, advindas de mestres doutrinadores que irão nos ajudar a entender
esse instituto.
Segundo Silvio Rodrigues “A responsabilidade civil é a obrigação que pode
incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por
fato de pessoas ou coisas que dela dependam”.37
A ideia de responsabilidade civil está relacionada à noção de não prejudicar
outro. A responsabilidade pode ser definida como a aplicação de medidas que
obriguem alguém reparar o dano causado a outrem em razão de sua ação ou
omissão. Nas palavras de Rui Stoco:38
A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social
35
Concepção baseada nas ideias de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello. Conceito de responsabilidade e Responsabilidade civil, RD Publ, São Paulo, v. 3, item 23, 1968; Francisco dos Santos Amaral Neto, Responsabilidade civil II, in Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 65, p. 347, e Carlos Alberto Bittar, Responsabilidade civil nas atividades nucleares, tese apresentada no concurso de livre docência em direito civil na Faculdade de Direito da USP, 1982, p. 24 36
AZEVEDO, Alváro Villaça. Responsabilidade civil. in Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 65, p. 336 37
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. Saraiva: 2003, p. 6. 38
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil: doutrina e jurisprudência. 7 ed. São Paulo Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 114.
27
estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana”.
39
A responsabilidade civil assume importante papel na vida social e demonstra
o dever de indenizar os danos produzidos pelo sujeito ofensor da lei, a convivência e
harmonia social, exigem respeito as normas de Direito
3.2 CULPA
Nesse sentido, para que haja obrigação de indenizar, não basta que o autor
do dano tenha procedido ilicitamente. É essencial que ele tenha agido com culpa:
por ação ou omissão voluntária, por negligência ou imprudência, como está
expresso no artigo 186 do Código Civil, que se materializara se o comportamento for
culposo. Neste artigo está presente a culpa lato sensu, que acerca tanto o dolo
quanto a culpa em sentido estrito. Dolo entende-se a intenção do agente como
consciente, ele deseja o resultado ou assume o risco de produzi-lo.
Na culpa strictu sensu não existe a intenção de lesar. A conduta é voluntária,
a inobservância do cuidado é revelado pela imprudência, negligência.
Nas palavras de Rui Stocco sobre o conceito de culpa,
Quando existe a intenção deliberada de ofender o direito, ou de ocasionar prejuízo a outrem, há o dolo, isto é, o pleno conhecimento do mal e o direto propósito de o praticar. Se não houvesse esse intento deliberado, proposital, mas o prejuízo veio surgir, por imprudência ou negligência, existe a culpa (strictu sensu).
40
Então crê-se que a presença da culpa na conduta é imprescindível para a
caracterização da responsabilidade, pois se a conduta do agente não for reprovada
pelo ordenamento jurídico, não há em qualquer hipótese o dever de indenizar, já que
o sujeito agiu dentro dos seus limites, não atingindo a esfera de outrem.
Com relação aos graus, a culpa pode ser grave, leve ou levíssima. A culpa
grave consiste em não prever o que todos preveem, omitir os cuidados mais
elementares ou descuidar da diligência mais evidente, é decorrente de uma violação
mais séria, do dever de diligência que se exige do homem mediano.
39
Idem. 40
Idem.
28
A culpa será leve quando a falta puder ser evitada com atenção ordinária, a
doutrina a ela se refere como a falta de diligência própria do bom pai de família.
A culpa é levíssima é a falta só evitável com atenção extraordinária, com
extrema cautela. Esta é a distinção que faz Teixeira de Freitas mencionado por
Washington de Barros Monteiro.
O Código Civil Brasileiro não faz nenhuma distinção entre dolo e culpa, nem
entre os graus de culpa, para fins de reparação de dano. Tenha o agente agido com
dolo ou culpa levíssima sempre existirá a obrigação de indenizar, a obrigação está
que será calculada exclusivamente sobre a extensão do dano. Em outras palavras
mede-se a indenização pela extensão do dano e não pelo grau de culpa. Adotou o
legislador a norma romana, segundo a qual a culpa, ainda que levíssima, obriga a
indenizar (in lege Aquilia et levíssima culpa venit).
3.3 DANO
O dano é o grande vilão da Responsabilidade Civil, sem ele não haveria que
se falar em indenização, nem em ressarcimento. Pode haver responsabilidade sem
culpa, mas não responsabilidade sem dano. O dever de reparar só ocorre quando
alguém pratica ato ilícito e causa dano a outrem. A obrigação de indenizar
pressupõe o dano e sem ele não há indenização devida. É necessário, uma
consequência concreta, o artigo 927 do Código Civil Brasileiro é expresso nesse
sentido: “Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187 causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.41
Indenização sem dano importaria em enriquecimento ilícito; enriquecimento
sem causa para quem o recebesse e pena para quem o pagasse, sendo que o
objetivo é reparar o dano sofrido pela vítima, reintegrá-lo ao estado que se
encontrava antes do ilícito.
Agostinho Alvim42 legou à nossa doutrina a mais correta definição de dano
ao dizer “que dano, em sentido amplo, vem a ser a lesão de qualquer bem jurídico”.
O acerto desta definição está em concentrar sobre o bem ou interesse atingido,
sobre o objeto da lesão, e não sobre as consequências. Portanto é correto,
41
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017. 42
ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 44.
29
conceituar o dano como sendo lesão a um bem ou interesse juridicamente tutelado,
qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial, quer se trate
de um bem integrante da personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a
liberdade. Dano é a lesão tanto de um bem jurídico, patrimonial como moral, vindo
daí a sua divisão. Portanto o dano divide-se em dano patrimonial ou material e dano
extrapatrimonial ou moral.
Neste tocante, afirma Clayton Reis:
A concepção normalmente aceita a respeito do dano na teoria da responsabilidade civil envolve uma diminuição do patrimônio de alguém, em decorrência de ato ilícito praticado por outrem. A conceituação prevista no Código Civil, nesse particular, é genérica. O Estatuto Civil não se refere, como é notório, a qual patrimônio atingido, se material ou imaterial, em que se consumou a ofensa ao bem jurídico violado.
43
O dano patrimonial, é aquele causado no bem jurídico material, ou seja, é o
prejuízo que afeta o patrimônio da vítima, sendo ele a perda ou deterioração dos
bens materiais de sua propriedade.
O dano patrimonial, se subdivide em dano emergente e lucro cessante, o
dano emergente, também chamado positivo, este, sim, importa efetiva e imediata
diminuição do patrimônio da vítima, em razão do ilícito, sendo caracterizado como
sendo aquilo que a vítima efetivamente perdeu. O lucro cessante consiste na perda
do ganho esperável, na frustração da expectativa de lucro, na diminuição potencial
do patrimônio da víitma. Pode não só decorrer da paralisação da atividade lucrativa
ou produtiva da vítima, como por exemplo a cessação dos rendimentos que alguém
já vinha obtendo da sua profissão, como também, da frustração daquilo que era
razoavelmente esperado. Nesse sentido a lição de José Aguiar Dias:
Em regra, os efeitos do ato danoso incidem no patrimônio atual, cuja diminuição ele acarreta. Pode suceder, contudo, que esses efeitos se produzam em relação ao futuro, impedido ou diminuindo o benefício patrimonial a ser deferido à vítima, aí estão identificados o dano positivo ou damnumemergense o lucro frustrado ou lucrumcessans. As duas modalidades do dano podem, todavia, coincidir, assim como podem ocorrer distinta e insuladamente, conforme o caso concreto”.
44
43
REIS, Clayton. Dano Moral. 5 ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2010, p. 2. 44
DIAS, José Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1973, p. 347.
30
3.4 NEXO DE CAUSALIDADE
Além de pressuposto, o nexo causal tem também a função de estabelecer
medida para a obrigação de indenizar o dano que é consequência do ato ilícito. Para
Caio Mário, é o mais delicado dos elementos da responsabilidade civil e o mais difícil
de ser determinado.45
A rigor, é a primeira questão a ser enfrentada na solução de qualquer caso
envolvendo responsabilidade civil. Antes de se verificar se o agente agiu ou não com
culpa, tem que se apurar se ele deu causa ao resultado. O Código Penal, tem norma
expressa sobre nexo causal (art. 13), é muito claro ao dizer: “O resultado de que
depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa”.46
A relação causal não se confunde com a culpabilidade. Tem se no primeiro
caso uma imputação objetiva, se a conduta do agente deu causa ao resultado
(dano), independentemente de qualquer elemento subjetivo da conduta. No segundo
caso, culpabilidade tem se uma imputação subjetiva. Apurado que a conduta do
agente deu causa ao resultado.
Carlos Roberto Gonçalves é enfático ao afirmar que:
Das várias teorias sobre o nexo causal, o nosso Código adotou, indiscutivelmente, a do dano direto imediato, como está expresso no art. 403; e das várias escolas que explicam o dano direto e imediato, a mais autorizada é a que se reporta à consequência necessária.
47
Não basta, portando que ao agente tenha praticado uma conduta ilícita;
tampouco que a vítima tenha sofrido um dano. É preciso que esse dano tenha sido
causado pela conduta ilícita dos agentes, que exista entre ambos uma necessidade
de causa e efeito.
Pode-se afirmar que o nexo de causalidade é elemento indispensável em
qualquer espécie de responsabilidade civil. Pode haver responsabilidade sem culpa,
mas não pode haver responsabilidade sem nexo causal.
O artigo 403 do Código Civil Brasileiro, trata do nexo de causalidade e só há
dever de indenizar, se houve dano, e se há a vinculação entre dano e ato ou
45
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p. 76. 46
BRASIL. Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm>. Acesso em: 20 mai. 2017. 47
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 524.
31
atividade praticada. O nexo de causalidade, em sua pesquisa encontra dificuldade,
tendo em vista a busca da verdadeira causa do dano, e, ainda a possibilidade de
concausa que podem ser sucessivas ou concomitantes.
32
CAPÍTULO IV - OS DANOS RECORRENTES DAS VIOLAÇOES AOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS DA PESSOA
4.1 OFENSA AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE
A personalidade da pessoa natural começa do nascimento com vida, e os
direitos relativos a essa personalidade são objetos de proteção jurídica, estão
expressos na Constituição Federal, no Código Civil e em outras leis. Podem ser
sintetizados no direito à vida, à liberdade, ao nome, ao próprio corpo, à imagem e a
honra.
Tais direitos qualificam-se como intransmissíveis e irrenunciáveis,
inalienáveis e imprescritíveis.
A sanção á ofensa ao direito da personalidade tem sua matriz nas cláusulas
constitucionais que asseguram o direito a indenização pelo dano material ou mora,
decorrente da violação de tais direitos.
O homem possui o direito de proteger-se de todo e qualquer atentado
dirigido à sua personalidade, desde que através de atos indispensáveis para esta
defesa, o Código Civil Brasileiro arrola três modalidades de autotutela de direito da
personalidade, que são a legítima defesa e o exercício regular do direito ou no
estado de necessidade, o artigo 180 do Código Civil estabelece que não haverá
necessidade de reparar o dano pelo ofensor, já que praticou o ato num estado de
necessidade, portanto, um fato da natureza ou de terceiros:
A tutela de direito de personalidade pode dar-se mediante diversos meios de proteção diante de atentados praticados contra a personalidade humana. Todo o indivíduo possui o direito de proteger-se contra atentados dirigidos à sua personalidade através de atos de legítima defesa, [...]. No entanto, se na legítima defesa, no exercício regular de direito ou no estado de necessidade, o ofendido causar dano a outrem, não terá aquele a obrigação de ressarci-lo porque seu ato, segundo o disposto no art. 180 do Código civil considerado ilícito. [...].
48
Quando a violação já foi praticada contra a vítima, produzindo efeitos
danosos, e tendo seus direitos a personalidade violados, será reparado, desde que
devidamente configuradas pelos dispositivos legais inseridos na Constituição
Federal de 1988, art, 5º, inciso X e Código Civil, artigos 12, 186, 927.
48
Idem.
33
No que toca aos danos morais relativamente à reparação pela ofensa dos
direitos da personalidade, esta possui uma dúplice finalidade, quais sejam, a
preventiva e a sancionadora, atenuando-se o sofrimento, já que o dano é irreversível
Para Washington de Barros Monteiro:
Os danos recorrentes de ofensa aos direitos da personalidade dispensam comprovação, tão evidente em geral a sua ocorrência. A dor moral tem caréter eminentemente subjetivo, presumindo-se tenha efetivamente ocorrido em face das circunstâncias verificadas e invocadas, não sendo de desconsiderar as condições pessoais do ofendido. No caso de óbito, perda de ente querido, se provocada por terceiro, impõe-se a compensação pecuniária, para que de forma mais reconfortante possam os familiares reverenciar a memória do falecido e mais facilmente mitigar a dor sofrida.
49
O Ordenamento jurídico brasileiro em consonância com as conquistas
humanas universais, consagram o direito a dignidade humana, criando mecanismos
de tutela e proteção, no sentindo da preservação dos valores fundamentais.
4.2 DANOS À IMAGEM, NOME E HONRA
A imagem é a representação física das pessoas, com o um todo ou em
partes, desde que identificáveis.
O titular da imagem tem o direito de aparecer se, quando e como quiser,
dando para tanto, seu consentimento, e também tem o direito de impedir a
reprodução, exposição e divulgação de sua imagem e ainda, o de receber
indenização por tal ato desautorizado. E, uma vez dado o consentimento nada obsta
a que a pessoa se retrate, revogando aquela permissão, desde que responda pelos
danos que, com tal atitude, causar.
É inato o direito à própria imagem, que constitui um bem jurídico autônomo.
Havendo violação desse direito quando é feita a reprodução pública de imagem sem
autorização do seu titular, surge a obrigação de indenizar.50
Retratar uma pessoa sem que ela saiba ou contra a sua vontade é um ato
ilícito, ofensivo ao direito à própria imagem. É imprescindível o consentimento do
49
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 201. 5050
Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias á admissão da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra , boa fama ou a respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais. (Vide ADIN 4815). Parágrafo único. Em se tratanto de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os ascendentes.
34
retratado, por ter ele o direito de impedir que não se use, a líbito, a sua imagem.
Está proibida a exibição e divulgação pública se relacionar com fins científicos,
didáticos, isto é, culturais, ou com eventos de interesse público. Protege-se assim
não só o interesse jurídico do fotografado, mas também a propriedade intelectual do
fotógrafo como autor.
Doutrina e jurisprudência sustentam, uniformemente, que o valor da
indenização pela indevida utilização da imagem não deve ser o mesmo que
normalmente se obteria pela utilização autorizada. “A indenização deve
corresponder à quantia que a autora receberia se tivesse autorizado a publicação,
mais um percentual pela ausência de autorização, apurada em liquidação por
arbitramento”.51
O nome integra a personalidade por ser sinal exterior pelo qual se designa,
individualiza e se reconhece a pessoa no seio da família e da sociedade. A pessoa
tem o direito de usá-lo e de defende-lo de quem o usurpar, reprimindo abusos
cometidos por terceiros que exponham ao desprezo público ou ao ridículo, ante o
fato de que se deve respeitar a pessoa humana. A violação, á respeitabilidade de
outrem deverá acarretar dano moral ou material sucetível de reparação, e que
deverá, portanto, ser indenizado pelo lesante. Toda usurpação ou impugnação de
nome, dolosa ou culposa, que acarrete prejuízo material ou moral autoriza o lesado
a pleitear reparação, mediante supressão do uso impróprio do nome ou indenização
pecuniária (CC, arts. 16 a 18). Essa proteção jurídica cabe também aos
pseudônimos de literatos e artistas, dada a importância que goza, por identificá-los
no mundo das letras e das artes (CC, art. 19).52
A honra é um dos elementos integrantes aos direitos da personalidade, está
inserido no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988, estabelece que são
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação.
Na doutrina costuma-se dividir em honra subjetiva e honra objetiva, a
primeira trata do juízo valorativo que a pessoa faz de si mesmo e a segunda, diz
51
TJRJ, 1º C., Ap.Cível 4.371/97, rel. Des. Martinho Campos. 52
FRANÇA, Limongi. Ação de responsabilidade fundada na ofensa ao nome civil. In: Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 3, p. 91-7; Zannoni, op. cit., p. 330-6; Maria Helena Diniz, cit. v. 1, p. 96
35
respeito à reputação que a coletividade dedica à alguém, a violação de qualquer
uma delas, enseja em reparação, se violada.
Uadi Lammêgo Bulos, define a honra como “um bem imaterial de pessoas
físicas e jurídicas protegidas pela Carta de 1988”.53
4.3 DANOS NÃO PATRIMONIAIS
O dano patrimonial, vincula a noção de lesão ao conceito de patrimônio. O
patrimônio é uma universalidade jurídica constituída pelo conjunto de bens de uma
pessoa, sendo, portanto, um dos atributos da personalidade e como tal intangível.54
O dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse
relativo ao patrimônio da vítima, consiste na perda ou deterioração, total ou parcial
dos bens materiais que lhe pertencem, senso suscetível de avaliação pecuniária e
de indenização pelo responsável.55
O dano patrimonial é avaliado em dinheiro e aferido pelo critério diferencial.
Mas às vezes, não se faz necessário tal cálculo, se for possível a restituição ao statu
que ante, por meio de uma reconstituição natural.56
O dano patrimonial abrange, como se infere do disposto no Código Civil,
artigos 402 e 403, não só o dano emergente, o que o lesado efetivamente perdeu,
mas também o lucro cessante, o aumento que seu patrimônio teria, mas deixou de
ter, em razão de evento danoso.
53
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. atul. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 463 54
ZANNONI, op. cit., p., 33 Aguiar Dias, op. cit., v.2, p.398. 55
Conceito baseado em: Antunes Varela, Dano Indireto, cit., v.22, p. 241-3; Zannoni, op. cit. 56
FISCHER, op. cit., p. Aguiar Dias, op. cit., v. 2, p. 400.
36
CAPÍTULO V - VALORAÇÃO DOS DANOS MORAIS
5.1 OS CRITÉRIOS PREVISTOS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
O Código Civil de 2002, de forma discreta, prescreveu a identidade do dano
moral, ao consignar, no caput do artigo 186, em sua parte final, a frase “aquele que
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, cometer ato
ilícito”.57 Toda a evolução a respeito da dimensão existencial da pessoa humana,
não foi destacada no Código Civil, colocando o direito a reparação no dano moral,
somente na parte final do artigo.
Neste sentido Carlos Alberto Menezes e Sergio Cavalieri Filho proclamaram
que:
o dano moral, o grande vilão da responsabilidade civil, recebeu singela referência no artigo 186 do Código, não obstante o enorme prestígio que mereceu na Constituição, conforme já ressaltado. Perdeu-se a oportunidade de disciplinar melhor questões relevantes a seu respeito, que estão sendo enfrentadas pela jurisprudência, tais como os princípios a serem observados no seu arbitramento e a legitimação para pleitear o dano moral no caso de indeterminação de ofendidos.
58
A preocupação dos doutrinadores no que se refere a pouca atenção do
legislador a um avanço tão importante na evolução da sociedade.
Essa preocupação foi igualmente destacada por Rui Stoco ao apontar que: Segundo o nosso entendimento, o novo Código Civil padece, também de um Capítulo, Seção ou preceito, ainda que isolado, que estabeleça critérios para a fixação da compensação por dano moral, coerente aliás, com a ausência de disciplina específica nesta área, como acima enfatizado. O estabelecimento de valores para compensar as ofensas morais admitidas em juízo constitui atualmente uma questão angustiante, pois fica no exclusivo poder discricionário do julgador, através de critérios subjetivos e aleatórios.
59
Por sua vez Arnaldo Rizzardo60 adverte que “não existe uma previsão na lei
sobre a quantia a ser fixada ou arbitrada”. Portanto, impera nesta área de
57
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017. 58
CAVALIERI FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 35. 59
STOCO, Rui. Op. cit. p., 1670. 60
RIZZARDO, Arnaldo. Op. cit. p. 261.
37
arbitramento do dano moral uma incerteza angustiante para os magistrados
brasileiros, uma vez que não possuem qualquer parâmetro legislativo.
Essa ausência de parâmetro legal, se agravou com a edição da Súmula 281
do STJ ao proclamar que “a indenização por dano moral não está sujeita à tarifação
prevista na Lei de Imprensa”,61 entendo ser inadmissível a aplicação de 5 a 200
salários mínimos sugeridos pela Lei de Imprensa nos processos de indenização por
danos morais.
O STJ assumiu a postura de Corte moderadora, afim de controlar
indenizações vultuosas ou insignificantes, justificando assim, a sua excepcional
intervenção para rever o quantum indenizatório.
5.2 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS ADOTADOS PELO STF E STJ
(RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE)
As indenizações devem sempre atender ao princípio da razoabilidade e
proporcionalidade, segundo reiteradas decisões prolatadas pelo STJ nessa direção.
Por outro lado, o princípio da restitutio in integrum impõe que as indenizações sejam
completas, não sendo admissível que o quantum indenizatório seja parcial ou
incompleto. Para atingir este desiderato, o propósito STJ editou a Súmula 37,
admitindo a cumulação dos danos materiais com os danos morais.
Aplicação do Princípio da Razoabilidade e da Proporcionalidade na fixação
do quantum indenizatório dos danos morais.
EMENTA: Processo Civil. Agravo de Instrumento. Ação de conhecimento. Invalidez. Seguro. Danos Morais. Fixação. Redução. Princípios da proporcionalidade e razoabilidade observados.- o valor fixado a título de indenização por dano moral pode ser revisto pelo STJ apenas se apresentar evidente desproporção com o prejuízo sofrido. Agravo no agravo de instrumento a que se nega provimento.
62
O princípio da razoabilidade é uma diretriz do senso comum, ou mais
exatamente, de bom senso, aplicada ao Direito. Esse bom senso jurídico se faz
necessário à medida que as exigências formais que decorrem do princípio da
61
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Súmula 281. Disponível em: <https://www.legjur.com/sumula/busca?tri=stj&num=281>. Acesso em: 20 mai. 2017. 62
STJ – Registro 200301562732- AGAI N. 546723/DF – Julgamento em 23.03.2004 – 3ª Turma – Relator: Ministra: NANCY ANDRIGHI.
38
legalidade tendem reforçar mais o texto das normas, a palavra da lei, que o seu
espírito.
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL, AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL.NULIDADE. PRINCÍPIO PROCESSUAL DA INSTRUMENTALIDADE DAS DAS FORMAS.NULIDADE.OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO.AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.SÚMULA 282 E 356/STF.CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL.REEXAME DAS PROVAS SÚMULA 7/STJ.QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO COM RAZOABILIDADE – o descumprimento do conteúdo normativo doa art. 17 da Lei 9.656/98, no caso, causou dano moral aos autores. A intervenção do STJ destinada afirmar interpretação geral do Direito Federal , no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível, quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cumprindo duplo grau de jurisdição, se mostre teratológico, por irrisório ou abusivo, incoerência de teratologia no caso concreto, em que, para o dano decorrente da falta de aviso aos segurados dos descredenciamentos médico e o não oferecimento de especialista análogo, impedido a continuidade de atendimento médico, foi fixado valor de indenização de R$ 10..........
63
A razoabilidade e proporcionalidade são princípios inerentes ao instituto do
dano moral, como forma de dever de harmonização no Direito.
5.3 FORMA DE AVALIAÇÃO DO “ARBITRIUM BONI VIRI”
Em se tratando de lesão extrapatrimonial, ou seja aquela que atinge a sua
dignidade, honra, há de se falar em ressarcimento, instituto esse de tamanha
importância que está expressamente contido na Constituição Federal de 1988 em
seu artigo 5º incisos V e X, em proteção a dignidade humana, portanto passível de
reparação.
A tarefa de quantificar o valor de uma indenização extrapatrimonial, não é
das mais fáceis, uma vez que em nosso ordenamento jurídico, não se dispõe
valores, se tratando de subjetividade. Por mais árdua que seja essa tarefa, não
justifica que o dano fique sem a consequente reparação.
O magistrado desempenha papel relevante nesse processo de aferição dos
indicativos para o estabelecimento do quantum indenizatório, nasce para o
magistrado uma grande responsabilidade.
O destaque para a função do juiz na fixação do quantum a ser indenizado é
consequência da sua discricionariedade, bem como da sua técnica de aferição de
63
STJ – AGRAVO REGIMENTAL NOAGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Ag Rg no AREsp 216648 MA 2012/0167500-8. Data da Publicação 07.11.2012.
39
valores. O artigo 955, parágrafo único do Código Civil Brasileiro, dispôs
acertadamente nossa ótica que: “se este não puder provar prejuízo material, caberá
ao juiz fixar, equitativamente, o valor da indenização, de conformidade com as
circunstâncias do caso”.64
Muito tem se falado na doutrina sobre o livre arbítrio do magistrado nas
ações referentes a danos morais, mas seu papel vai além do simples livre arbítrio
posto que, essa importante prerrogativa não o isenta de uma profunda e detalhada
análise das provas, condições e condutas dos envolvidos.
É possível afirmar então que o magistrado, utilizando-se da sua experiência,
conhecimento e sensibilidade, sempre considerando a legislação, doutrina e
jurisprudência pertinentes, e o enquadramento no caso concreto, formará seu livre
arbítrio e convencimento, jamais agindo coma refutada arbitrariedade.
Em consonância com o afirmado Clayton Reis, assevera:
A ideia prevalente do livre arbítrio do Magistrado ganha corpo na doutrina e jurisprudência na medida em que transfere para o juiz o poder de aferir, com seu livre convencimento e tirocínio, a extensão da lesão e o valor da reparação correspondente.
65
E referindo-se a importância do julgamento pelo livre arbítrio do juiz,
principalmente porque não se verificam parâmetros legais, para a quantificação dos
danos morais, professa:
No entanto, ainda que inexistam parâmetros legais fixados, o melhor critério é o de confiar no arbítrio dos juízes, para a fixação do quantum indenizatório. Afinal o magistrado, no seu mister diário de julgar e valer-se do seu bom senso e sentido de equidade, é quem determina o cumprimento da lei, procurando sempre restabelecer o equilíbrio social, rompido pela ação de agentes, na prática de atos ilícitos.
66
O magistrado para formar seu convencimento, analisará vários aspectos de
ordem subjetiva e objetiva, capazes de auxiliá-lo no arbitramento.
Carlos Alberto Bittar nesse sentido, ao delinear amplos poderes ao juiz,
ensina:
64
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017. 65
REIS, Clayton. Op. cit., p. 90. 66
Ibidem, p. 103.
40
Admite-se ainda a cumulação de reparação pecuniária e pessoal. Descrevem-se, então, como parâmetros, certas linhas diretivas, retiradas da análise fática, tais como o comportamento das partes, as correspondentes posições econômicas, a intensidade do dano e fatores outros que, apontados na doutrina, encontram guarida em certas codificações, como a portuguesa.
67
Tem-se, pois, como regra geral, em matéria de determinação da reparação a outorga ao juiz de poderes amplos, contando ele, no respectivo exercício, com certas fórmulas, engendradas na vivência prática, que lhe servem de apoio para a ministração da justiça.
68
Clayton Reis corroborando as elucidações acima, salienta:
Dentre alguns desses elementos que poderão motivar a decisão do juiz, poderão ser destacados, através de uma análise singela nesta oportunidade, a representação do ilícito no meio social, a intensidade da angústia experimentada pela vítima (que depende da análise dos fatores culturais, sociais e espirituais do lesado), bem como a situação patrimonial do agente lesionador e da vítima.
69
Diante de questões que suscitam controvérsias doutrinárias e
jurisprudenciais na atualidade, o quantum indenizatório em danos morais, esbarram
com fatores em que predominam a subjetividade, o ordenamento jurídico brasileiro
não fixou valores tabelados para o arbitramento dos danos morais. Desta forma, a
valoração da indenização dependerá de alguns critérios utilizados pelo magistrado,
para auxilia-lo na quantum debeatur, que são as condições econômicas do autor e
da vítima, condutas dos agentes, nexo de causalidade entre o ato e a culpa do autor,
a intensidade e duração da lesão, condições pessoais do ofendido, bem como
orientação jurisprudencial e doutrinária, conjugados com os critérios da
razoabilidade e proporcionalidade proclamados no Superior Tribunal de Justiça.
Quando se trata de danos morais, tem por obstáculo a falta de
regulamentação específica no nosso ordenamento jurídico, trazendo a difícil tarefa
de arbitrar uma quantificação indenizatória, que compense ou amenize o dano
sofrido.
Nas palavras de Clayton Reis,
Dentre as questões que suscitam controvérsias de natureza doutrinária e jurisprudencial na atualidade, deparamo-nos com aquela, referente, ao valor da causa nas ações em que há pedido de indenização por danos morais.
67
De fato, no Código de Portugal se indicam os aspectos que podem influenciar a definição da responsabilidade no caso concreto (art. 494). 68
BITTAR, Carlos Alberto. Op. cit., p. 220. 69
REIS, Clayton. Op. cit., p. 103.
41
Afinal de contas, o quantum indenizatório, quando se trata de danos morais, esbarra com fatores em que predominam a subjetividade, bem como o arbitriumboni viri do magistrado na fixação do quantum debeatur. Os critérios adotados pelos tribunais têm sido extremamente aleatórios, considerando a natureza dos bens que são objeto de valoração pelo julgador. É natural, portanto, que predomine, nessa esfera do direito, certos critérios imprecisos. Ademais, o Brasil não adotou padrões tabelados para o arbitramento dos danos morais. Neste sentido, observamos que os parâmetros são abertos, consoante prescrição inserta no artigo 5º, inciso V, da CF/88, e que são atualmente delineados pela Súmula 281 do STJ, ao não admitir o tabelamento previsto na Lei de Imprensa. Desta forma, a valoração do magistrado, em sua liberdade de julgar, estará atrelada aos padrões de razoabilidade e proporcionalidade proclamados pelo Superior tribunal de Justiça.
70
Mesmo existindo parâmetros, não há garantia que o valor estipulado atenda,
caso a caso individualmente, o ser humano é dotado de particularidades, fatores
íntimos atrelados a sua personalidade, portanto longe de ser uma padronização, o
magistrado terá a incumbência de avaliar esse dano e tentar, diante de alguns
critérios baseados em razoabilidade e proporcionalidade, aliviar esse dano de forma
compensatória.
Neste sentido observa, Venosa:
Embora possam ser estabelecidos padrões ou faixas indenizatórias para algumas classes de danos, a indenização por dano moral representa um estudo particular de cada vítima e de cada ofensor envolvidos, estados sociais, emocionais, culturais, psicológicos, comportamentais, traduzidos por vivências as mais diversas. Os valores arbitrados deverão ser então individuais, não podendo ser admitidos padrões de comportamento em pessoas diferentes, pois cada ser humano é um universo único.
71
O magistrado com base na doutrina e jurisprudência, diante da liberdade de
arbitramento, deverá analisar os diferentes fatores que ocorreram na esfera íntima
das pessoas, colocando em análise o perfil cultural e social, psicológico das partes
envolvidas, não poderá se valer somente dos fatos, correrá o risco de tomar uma
decisão injusta tanto para o ofendido como para o ofensor.
O Superior Tribunal de Justiça, pacificou o entendimento, no sentido de não
aceitação do tarifamento em danos morais, ao promulgar a súmula 281 que
preceitua: “a indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei
de Imprensa”.72
70
Ibidem, p. 372. 71
VENOSA, Sílvio de Salvo. Op. cit., p. 345. 72
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Súmula 281. Disponível em: <https://www.legjur.com/sumula/busca?tri=stj&num=281>. Acesso em: 20 mai. 2017.
42
Em posição de crítica à tarifação do valor das condenações por danos
morais, Venosa explica:
A falta de legislação específica nessa problemática tem gerado, todavia, decisões díspares e incongruentes. De qualquer modo, em princípio, a tarifação ou qualquer outro estudo matemático não é critério adequado para danos morais em geral, porque amordaça a distribuição da Justiça: como ainda é nova a disseminação dessa modalidade de indenização em nossos tribunais, chegar-se-á, certamente em breve tempo, o balizamento razoável imposto pela própria jurisprudência.
73
Clayton Reis, aceita com reservas a tarifação em nosso país ao descrever:
Nesses textos, os autores da média de casos individuais na jurisprudência
francesa, para estabelecer um ponto médio para as situações concretas.
Não seria difícil no Brasil adotar semelhante procedimento, se considerarmos a imensa diversidade dos critérios utilizados pelos nossos tribunais. É certo que a nossa realidade cultural, social e econômica é imensamente diversa da francesa, quer em decorrência da extensão do território nacional, quer em virtude da diversificada realidade econômica, cultural, histórica existente em nosso estado.
74
No mesmo sentido, o autor defende a estipulação de pisos uniformizadores
de critérios valorativos: “assim, a construção de uma equação pode ser capaz de
sugerir uma ideia básica, que servirá de partida para a uniformização dos critérios de
avaliação”.75
E após citar os critérios mínimos adotados pela Lei 4.117/62, artigo 84
(Código Brasileiro de Telecomunicações) e Lei nº 5.250/67, artigo 52 (Lei de
Imprensa), em contraponto com a Carta Magna, obtempera:
Todavia, entendemos que a Constituição Federal de 1988 (art. V e X), não fixou limites para a reparação dos danos extrapatrimoniais, encontrando-se expressamente revogadas as disposições limitativas impostas pelas citadas leis.
76
A Constituição Federal, em seu artigo 7º inciso IV, veda a vinculação do
salário mínimo, como parâmetro para a fixação de qualquer valor. Desta forma,
mesmo quando estipulado como referência para a indenização do dano moral, n o
73
VENOSA, Sílvio de Salvo. Op. cit., p. 209. 74
REIS, Clayton, p. 97. 75
Ibidem, p. 98. 76
Idem.
43
arbitramento da sentença, deve ser transformado para um valor fixo em moeda da
época, passará a ser corrigido monetariamente, consoante súmula 7 do Superior
Tribunal de Justiça.
Uma das diversas formas de indenização é a in natura, ou seja, aquela que
de alguma maneira tenta restabelecer a condição anterior ao dano, restritiva de
direitos, através de serviços prestados à comunidade, e, se por isso não for possível,
deverá quantifica-lo de forma pecuniária.
Carlos Alberto Bittar, admitindo novas formas de reparação, precede seu
posicionamento, enfatizando a principal:
Tradicionalmente, a reparação civil por danos perfaz-se através do pagamento de indenização em dinheiro, diante do princípio geral da responsabilidade patrimonial, introduzindo, ainda, à época romana, na técnica jurídica para substituir a antiga submissão da pessoa do agente às sanções cabíveis.
7778
Orlando Gomes assevera:
Nos casos de reparação pecuniária, a primeira dificuldade é a determinação do quantum. Muitas vezes há elementos concretos para fixá-los mas, frequentemente, não existem, na sua falta, a indenização há de ser calculada pro aproximação, mediante arbitramento. Não faltam aliás, elementos para a avaliação, até quando se trata da estimação de um bem como a vida humana.
79
Sobre as formas de indenização in naturado dano moral Clayton Reis
ensina: “admite-se, portanto, no campo dos danos extrapatrimoniais, a retratação
como sendo uma maneira de indenização in natura”.80
Continuando seu raciocínio, ao citar as formas de reparação: do
agravamento da honra da mulher, pelo casamento ou dote, o desmentido, a
retificação da notícia injuriosa nos mesmos termos, a divulgação imediata de
resposta, a republicação de material como indicação do nome do autor, a
contrapropaganda e a publicação gratuita de sentença condenatória, assevera:
77
Em nosso sistema, está consagrado o princípio nos artigos 1518 do C. Civil (em cujo parágrafo único se acha definida a solidariedade entre os agentes, em caso de haver mais de um responsável pelo dano) e 591 et. Seq. do CPC. 78
BITTAR, Carlos Alberto. Op. cit., p. 227. 79
GOMES, Orlando. Op. cit., p. 377. 80
REIS, Clayton. Op. cit., p. 99.
44
Todas essas situações demonstram de forma patente, outras formas de reparação que não a pecuniária, e que produzem efeitos de grande repercussão, especialmente quando se trata de fatos que foram objeto de divulgação perante a opinião pública. Neste caso, a retratação do ofensor assume papel de imensa satisfação para o lesionado, preocupado em recompor a sua dignidade social perdida.
81
Quando não for possível reparar o dano moral pela forma in natura, o
magistrado definirá dentro de seu livre convencimento, depois de analisados os
demais critérios objetivos e subjetivos, o valor pecuniário que melhor se amolde à
situação, de forma que venha a punir o ofensor e recompensar o ofendido.
Nesse sentido Clayton Reis, assim descreve: “assim, nos casos que a
indenização in natura é impossível de ser obtida, como por exemplo, a perda de um
membro ou a morte de um filho, não há outra alternativa, senão a reparação
pecuniária”.82
Mais adiante Sergio Severo, citado pelo mesmo autor, define o modo
pecuniário, como o mais utilizado, em se tratando de danos morais, assim descreve:
De qualquer modo, deve-se reconhecer que a reparação in natura é uma situação excepcional, reservada a alguns casos de ofensa aos direitos da personalidade, pois os danos extrapatrimoniais na maioria das situações demonstram-se impassíveis de reposição por bem idêntico ou por neutralização total dos efeitos lesivos.
83
O magistrado dispõe de três formas de reparação de danos morais, o in
natura que consiste em desfazer a lesão, buscando devolver o status quo ante, a
restritiva de direitos, mais especificamente na forma de prestação de serviços à
sociedade e, finalmente a mais utilizada, que é a estimação do dano moral na forma
pecuniária. O magistrado, analisará os fatos, provas, ancorado na doutrina e
jurisprudência, para melhor se adequar ao caso concreto, de maneira a se fazer
justiça.
O que prevalece é o critério do arbitramento, no qual confere ao magistrado
a prerrogativa de fixação segundo seu livre entendimento, que deverá estar sempre
atrelado aos princípios da equidade, proporcionalidade e razoabilidade quando do
momento do arbitramento do quantum indenizatório, de modo a evitar que a
81
Ibidem, p. 119. 82
Ibidem, p. 120. 83
SEVERO, Sérgio, apud Tasca, 2000, p. 224.
45
repercussão da indenização se converta em enriquecimento ilícito de uma das
partes, ou ainda um valor tão ínfimo, que se torne inexpressivo.
5.4 PRINCÍPIOS PREVISTOS NO ARTIGO 884 E 944 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002
O Código Civil de 2002 enuncia no seu título VII, capítulo IV, suas
disposições sobre o Enriquecimento Sem Causa, a saber:
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.
84
A norma do artigo 884 do Código Civil de 2002, apresenta-se como um
princípio, por meio do qual se institui uma fonte genérica das obrigações, segundo a
qual o enriquecido fica obrigado a restituir o empobrecido o benefício que
injustificadamente obteve à custa dele. A colocação do enriquecimento sem causa
entre as fontes das obrigações constitui uma das importantes inovações no Código
Civil Brasileiro.
O enriquecimento sem causa era previsto no Direito Romano: lure
naturaeaequumest neminem cum alterius detrimento et iniuria fieri locupletiorem(é
justo, por direito natural, que ninguém se enriqueça em detrimento ou prejuízo de
outrem”; D.50.17.206).
O Código Civil de 2002, por sua vez, veio a alterar esse quadro revelando a
influência do direito germânico, italiano e português. O artigo 884 ao dispor que
“Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a
restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários”, acaba
por positivar o princípio de direito que condena o enriquecimento sem causa às
custas do patrimônio alheio. Em assim procedendo, o direito brasileiro acompanhou
a tendência das codificações modernas abrindo espaço para a consagração de uma
cláusula geral que acolhe o enriquecimento sem causa.
Esta inserção do enriquecimento sem causa no novo Código Civil foi muito
louvada pela doutrina.85 ademais porque foi feita por meio de uma cláusula geral
84
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017.
46
cuja finalidade é trazer para o fenômeno jurídico aquilo que foi denominado “válvula
para exigências ético-sociais”. Assim permite-se que a evolução da sociedade seja
acompanhada pelo direito porque confere ao intérprete e ao aplicador da lei uma
maior flexibilidade para adaptar a norma às situações de fato.86
O artigo 944 do Código Civil Brasileiro de 2002 dispõe: “A indenização
mede-se pela extensão do dano”,87 essa disposição não existia no Código Civil de
1916.
É o princípio da restitutio in integrum, a própria razão de ser da indenização.
Busca-se com ela recolocar a vítima, tanto quanto possível na situação anterior à
lesão. A indenização é proporcional ao dano sofrido, limitar essa indenização é
impor à vítima que suporte o resto dos prejuízos não indenizados.
Na prática, entretanto, ocorrem situações de excessiva desproporção entre a
conduta e o dano. Um atropelamento com culpa leve pode produzir um efeito
gravíssimo – a vítima fica tetraplégica ou morre, - ensejando para o agente uma
sanção muito mais severa do que tivesse praticado uma conduta dolosa, por
exemplo uma tentativa de homicídio sem resultado grave. Para se estabelecer uma
certa equidade nestas situações, o parágrafo único do citado art. 944 dispõe: “ Se
houver excessiva desproporção de gravidade, da culpa e do dano, poderá o juiz,
reduzir, equitativamente, a indenização”.88 Trata-se ,portanto de mais um artigo do
Código que não prevê a forma de indenização, transferindo para o magistrado toda a
responsabilidade.89
85
Luiz Edson Fachin, O „aggiornamento‟ do direito civil brasileiro e a confiança negocial, in Repensando fundamentos do direito civil contemporâneo, p. 129, enaltece a previsão de um capítulo dedicado ao enriquecimento ilícito sem causa pelo Projeto do Código Civil, ressalvando reputar injustificável o caráter subsidiário a ele atribuído. Ruy Rosado de Aguiar Junior, Projeto do Código Civil: as obrigações e os contratos. Revista dos Tribunais, v.775, p. 29, também aplaude a consagração legislativa do enriquecimento sem causa. O art. 884 veio dispor expressamente sobre o enriquecimento sem causa, preenchendo uma lacuna do nosso ordenamento. Trata-se de cláusula geral que terá grande efeito no foro, porque permitirá reparar todas as situações de vantagem indevida”. 86
Luiz Edson Fachin. Op. cit., p. 305 87
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017. 88
Idem. 89
CAVALIERI FILHO, Sergio. Op. cit., p. 299.
47
CONCLUSÃO
O presente trabalho buscou estudar a evolução da reparação indenizatória
em danos morais e consequentemente a sua quantificação, o que se percebe é que
o ordenamento jurídico comprou essa briga, não deixando o cidadão desamparado
em suas perdas, angústias, trazendo um forma de compensação. Um dano a
moralidade não afeta somente o sujeito ofendido e sim toda uma sociedade, uma
vez que provoca uma desestruturação em sua organização social.
Historicamente o dano moral, já existia bem antes de Cristo, onde as
ofensas eram tratadas de forma igualitária, sobrevindo muitas mortes e mutilações.
No Brasil, o instituto da reparação civil passou por diversos momentos,
inicialmente era só admitido o dano material, pois era considerado uma to imoral a
pretensão de se obter uma quantia pecuniária em função da dor sentida, com a
evolução do pensamento doutrinário, passou-se a aceitar o dano moral não mais
como uma forma de equiparar o sofrimento, mas na forma de punir o ofensor para
que ele não reincida mais no ato ilícito, e proporcionar ao ofendido alguns atos
lenitivos, somente obtidos com recursos financeiros.
A Constituição de 1988 trouxe expressamente em seu texto constitucional, a
reparabilidade ao dano moral, em seu artigo 5º, inciso V e X, representando um
grande avanço no que diz a proteção da Dignidade Humana, tanto que é conhecida
como a “Constituição Cidadã”.
Porém, ficaram algumas lacunas, como a quantificação indenizatória a esses
danos morais, usava-se como parâmetro a Lei nº 4.117 de 1962 do Código Brasileiro
de Telecomunicações, sendo vedada, pela Súmula 281 do STF.
Diante da problemática, a responsabilidade recaiu sobre os magistrados,
que adotando alguns critérios, como o princípio da proporcionalidade, razoabilidade,
características do ofensor e do ofendido, capacidade financeira do agente, nível
sócio cultural, experiência jurídica e bom senso, conseguem chegar a uma decisão
que seja ponderada, equitativa.
48
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGGAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 2003. ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. São Paulo: Saraiva, 1980. AZEVEDO, Alváro Villaça. Responsabilidade civil. in Enciclopédia Saraiva do Direito. BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estado Unidos do Brasil. 5. ed. São Paulo: Francisco Alves, 1943. BRASIL. Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm>. Acesso em: 20 mai. 2017. _____. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L3071impressao.htm>. Acesso em 20 mai. 2017. _____. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 02 mai. 2017. BITTAR, Eduardo C.B. Curso de ética jurídica. 11. ed. rev., atual e modificada. São Paulo: Saraiva, 2014. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. atul. São Paulo: Saraiva, 2009. CASTRO, Mônica Neves de Aguiar da Silva. Honra, imagem, Vida Privada e Intimidade, em Colisão com outros Direitos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. CAVALIERI FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. _____. Programa de Responsabilidade Civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014. DIAS, José Aguiar. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1973. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º volume: Responsabilidade Civil. 22. ed. ver., atual. e ampl. De acordo com a reforma do CPC e com o Projeto de Lei nº 276/2007. São Paulo: Saraiva, 2008. GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil, volume III: Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume IV: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2007.
49
GUERRA, Sidney César Silva. A liberdade de imprensa e o direito à imagem. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. MENDES, Gilmar. Curso de direito constitucional. 3. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado: parte especial. 3. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970-1973, Tomo VII. MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2007. PEGINI, Adriana Regina Barcellos. Direito e pessoa humana. Maringá: Vivens, 2014. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 9. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001. PINHEIRO, Carla. Direito Internacional e Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2001. REIS, Clayton. Dano Moral. Rio de Janeiro: Forense, 1998. _____. Avaliação do Dano Moral. Rio de Janeiro: Forense, 2002. _____. Dano Moral. 5. ed. Rio de Janeiro, 2010. RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. Saraiva: 2003. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9. ed. rev.atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. SILVA, Wilson Melo da. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1999. STJ – AGRAVO REGIMENTAL NOAGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Ag Rg no AREsp 216648 MA 2012/0167500-8. Data da Publicação 07.11.2012. _____. Registro 200301562732- AGAI N. 546723/DF – Julgamento em 23.03.2004 – 3ª Turma – Relator: Ministra: NANCY ANDRIGHI. TJRJ - 1º C., Ap.Cível 4.371/97, rel. Des. Martinho Campos. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Súmula 281. Disponível em: <https://www.legjur.com/sumula/busca?tri=stj&num=281>. Acesso em: 20 mai. 2017. STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. VEIT, Valentim. História universal. 61. ed. São Paulo: Martins Editora, 1964.
50
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.