universidade metodista de sÃo paulo programa de...
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UNIVERSIDADE METODISTA DE SO PAULO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ADMINISTRAO
FACULDADE DE ADMINISTRAO E ECONOMIA
CARLOS AUGUSTO BARBOSA DA SILVA
O PAPEL DA CMARA TCNICA DE PESCA DO COMIT DE BACIA HIDROGRFICA LAGOS SO JOO NA GESTO DA
PESCA ARTESANAL NA LAGOA DE ARARUAMA
SO BERNARDO DO CAMPO
2014
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CARLOS AUGUSTO BARBOSA DA SILVA
O PAPEL DA CMARA TCNICA DE PESCA DO COMIT DE BACIA HIDROGRFICA LAGOS SO JOO NA GESTO DA
PESCA ARTESANAL NA LAGOA DE ARARUAMA
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade Metodista de So Paulo, como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre.
rea de Concentrao: Gesto de Organizaes.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Roberto Alves
SO BERNARDO DO CAMPO
2014
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FICHA CATALOGRFICA
Si38p Silva, Carlos Augusto Barbosa da
O papel da cmara tcnica de pesca do comit de bacia hidrogrfica lagos So Joo na gesto da pesca artesanal na lagoa de Araruama / Carlos Augusto Barbosa da Silva. 2014.
237 p.
Dissertao (mestrado em Administrao) --Faculdade de Administrao e Economia da Universidade Metodista de So
Paulo, So Bernardo do Campo, 2014.
Orientao: Luiz Roberto Alves
1. Polticas pblicas 2. Pesca artesanal 3. Mediao de conflitos Gesto da pesca I.Ttulo.
CDD 658
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A dissertao de mestrado sob o ttulo O PAPEL DA CMARA TCNICA DE PESCA DO COMIT DE BACIA HIDROGRFICA LAGOS SO JOO NA GESTO DA PESCA ARTESANAL NA LAGOA DE ARARUAMA, elaborada por Carlos Augusto Barbosa da Silva, foi apresentada e aprovada em 29 de Abril de 2014, perante banca examinadora composta por Prof. Dr. Luiz Roberto Alves (Presidente/UMESP), Prof. Dr. Almir Martins Vieira (Titular/UMESP) e Profa. Dra. Dagmar Silva Pinto de Castro (Titular/UNIMEP).
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Prof. Dr. Luiz Roberto Alves
Orientador e Presidente da Banca Examinadora
__________________________________________
Prof. Dr. Almir Martins Vieira
Coordenador do Programa de Ps-Graduao
Programa: Ps-Graduao em Administrao
rea de Concentrao: Gesto de Organizaes
Linha de Pesquisa: Gesto de Pessoas e Organizaes
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DEDICATRIA
A minha filha Larissa, a minha me Umbelina, a minha esposa Lcia, aos meus irmos e irms.
Ao meu amigo e irmo Rodrigo, pelo incentivo ao meu desenvolvimento pessoal.
A Fernanda Moraes pelo carinho, considerao, f e oportunidade.
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AGRADECIMENTOS
A Universidade Metodista de So Paulo, pela acolhida no programa de Ps-
Graduao em Administrao.
A Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior - CAPES,
por proporcionar o financiamento de parte do meu investimento.
Ao meu orientador Prof. Dr. Luiz Roberto Alves, pelo privilgio de ter recebido
as suas observaes, direcionamentos, crticas e dicas to necessrias.
Aos professores e colegas do PPGA pela parceria durante a jornada do
mestrado.
A toda equipe da Universidade Metodista de So Paulo nos seus atendimentos
to solcitos, disponveis e eficientes.
As colaboradoras do PPGA Sra. Esmria e Sra. Vanete por atender as nossas
necessidades com muita clareza e dedicao.
A minha esposa, pelo cuidado, carinho, pacincia e incentivo durante o perodo
do curso.
MUITO OBRIGADO!!!
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RESUMO Este trabalho apresenta um estudo de caso sobre o papel da Cmara Tcnica de Pesca (CTP) do Consrcio Intermunicipal Lagos So Joo (CILSJ) na mediao de conflitos de gesto da pesca artesanal na regio da Lagoa de Araruama (LA). A CTP gerida pelas prioridades da Poltica Nacional de Recursos Hdricos (PNRH), preservacionista, em oposio a Poltica Nacional de Desenvolvimento Sustentvel da Atividade Pesqueira (PNDSAP), com fins de explorao econmica. Na Bacia Hidrogrfica Lagos So Joo, o CILSJ, prioriza as aes de conservao e manuteno dos corpos de gua para o abastecimento, deixando em segundo plano a recuperao dos esturios em que lana o esgoto tratado e o no tratado, justamente os locais onde ocorre a pesca. O sujeito da pesquisa foi a representao dos pescadores, que so os presidentes das colnias. O levantamento de dados ocorreu por meio de entrevistas, observao direta, observao participante, documentos, filmes, fotografias, depoimentos, considerando tambm os atores da gesto pblica da pesca local, estadual e federal. As entrevistas foram examinadas com base em anlise textual. A abordagem da pesquisa qualitativa. A pesca artesanal praticada na localidade de pequena escala, se utiliza de embarcaes midas, o trabalho ocorre em regime de companha e/ou familiar. O co-manejo a metodologia de gesto dos recursos comuns mais utilizadas na atualidade na pesca artesanal. Os dados revelaram que o modelo de co-manejo da CTP no o mais adequado para mediar os conflitos da pesca na localidade. Este estudo constatou que existe a unio das colnias por meio da CTP, mas mesmo assim, o mecanismo CTP, no permite que maiores conquistas sejam alcanadas pelos pescadores, tendo em vista que o modelo de co-manejo apenas consultivo, em que o poder pblico consulta, mas toma a deciso de forma autnoma sem compartilhar o poder de gesto, desse modo no h o empoderamento por parte dos pescadores. Assim, se faz urgente a substituio do sistema de co-manejo exercido pela CTP, por outro que possibilite maior participao dos pescadores e no s das suas representaes; autonomia de gesto dos pescadores; possibilidade de financiamento alm das atividades de preservao, mas tambm de desenvolvimento econmico da pesca. Outros modelos de co-gesto passveis de substituir a CTP so a Reserva Extrativista (RESEX), a Reserva de Desenvolvimento Sustentvel ou Frum de Pesca tendo em vista serem esses os modelos de co-manejo mais bem sucedidos no pas e inclusive em parte da regio, a RESEX de Arraial do Cabo. A constatao desta pesquisa do papel exercido pela CTP no que tange o co-manejo na LA compatvel com as deficincias dos modelos de co-manejo da pesca no Brasil, com menor empoderamento dos pescadores diante do poder pblico e da prpria submisso da gesto pblica da pesca diante da gesto pblica do ambiente. Apesar de haver certa produo acadmica sobre a pesca, a literatura sobre a gesto da pesca na localidade da LA escassa, o que dificulta o desenvolvimento da sustentabilidade pesqueira e da aplicao de qualquer plano de manejo e indica a urgncia do desenvolvimento de maiores investigaes, no que este trabalho procura oferecer alguma contribuio. Palavras-Chave: Polticas Pblicas, Pesca Artesanal, Mediao de Conflitos, Gesto da Pesca.
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ABSTRACT
This work presents a case study on the role of the Technical Chamber of Fishing (CTP) of the Intermunicipal Consortium Lagos So Joo (CILSJ) in mediating conflicts management of artisanal fisheries in the Araruama Lake (LA) region. The CTP is managed by the priorities of the National Water Resources Policy (PNRH), preservationist, as opposed to National Policy for the Sustainable Development of Fishing Activity (PNDSAP), for purposes of profiteering. The management of the Lagos So Joo River Basin by, CILSJ, prioritizes actions for the conservation and maintenance of water bodies for supplies, leaving in low priority the recovery of estuaries that launches the treated sewage and still untreated, precisely the places where it occurs fishing. The research subject was the representation of fishermen, who are the presidents of the colonies. Data collection occurred through interviews, direct observation, participant observation, documents, films, photographs, testimonials, also considering the actors in public management of local, state and federal fishing. The interviews were examined based on textual analysis. The research approach is qualitative. Artisanal fishing is practiced in the locality of small scale, using the fine craft, work occurs in communion and / or family. The co-management is a methodology for managing common resources most used nowadays in artisanal fisheries. The data revealed that the model of co-management of TCC is not adequate to mediate conflicts fishery in the locality. This study found that there is a union of the colonies through the CTP, but even so, the CTP mechanism does not allow greatest accomplishments are achieved by fishermen, given that the model of co-management is advisory only, where power public consultation, but makes the decision independently without sharing power management, thus no empowerment by fishermen. Thus, it is urgent to replace the co-management system exercised by the CTP, by a better one that allows greater participation of fishermen and not only their representations, management autonomy for fishermen, possibility of funding beyond preservation activities, but also to economic development of fisheries. Other models of co-management can substitute the CTP are the Extractive Reserve (RESEX), the Sustainable Development Reserve or Fishing Forum considering that these are the most successful models of co-management in the country and even in part of region, RESEX Arraial do Cabo. The confirmation of this study of the role played by the CTP regarding the co-management in LA is compatible with the shortcomings of the models the co-management of fisheries in Brazil, with less empowerment of fishermen against government and own submission and public fisheries management on public management environment. Although there is some academic research on fisheries, the literature on fisheries management in the city of LA is scarce, hampering the development of fisheries sustainability and the application of any management plan and indicates the urgency of the development of further investigation, in this work seeks to provide some contribution.
Keywords: Public Policy, Artisan Fishing, Conflict Mediation, Fisheries Management.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Regio das Baixadas Litorneas................................................ 20 Figura 2 - Municpios do entorno da Lagoa de Araruama.......................... 21 Figura 3 - Fases Institucionais da Gesto dos Recursos Pesqueiros do Brasil............................................................................................................
33
Figura 4 - Sub Bacias da BH do rio So Joo............................................ 74 Figura 5 - Mtodo do Estudo de Caso.................................................. 84 Figura 6 - Municpio de Araruama............................................................... 98 Figura 7 - Reserva Extrativista de Arraial do Cabo..................................... 103 Figura 8 - Municpio de Arraial do Cabo..................................................... 104 Figura 9 - Municpio de Cabo Frio............................................................... 109 Figura 10 - Municpio de Iguaba Grande.................................................... 116 Figura 11 - Municpio de So Pedro da Aldeia........................................... 122 Figura 12 - Municpio de Saquarema.......................................................... 128
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Contas Regionais do Brasil. Participao das Grandes Regies e Estados no Produto Interno Bruto do Brasil: 2000 2011 (%)...
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Tabela 2 - Populao Estabelecida no Entorno da Lagoa de Araruama Baixada Litornea Rio de Janeiro IBGE Censo de 2000 e 2010........
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Agrupamento de respostas....................................................... 90 Quadro 2 - Objetivos de pesquisa............................................................... 91 Quadro 3 - Relatrio Cruzado Resumo.................................................... 92 Quadro 4 - Agrupamento das Respostas Sobre o Relatrio de Casos Mltiplos.......................................................................................................
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Quadro 5 - Relatrio de Casos Cruzados Resumo.................................. 132
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LISTA DE SIGLAS
ABRH - Associao Brasileira de Recursos Hdricos
AMEAS - Associao das Mulheres Empreendedoras Acontecendo em
Saquarema
ANEEL - Agncia Nacional de Energia Eltrica
ANTAQ - Agncia Nacional de Transportes Aquavirios
APAREIA - Associao das Empresas Produtoras de Areia de Silva Jardim
APNRJ - Associao Patrimnio Natural do Rio de Janeiro
AREMAC - Associao da Reserva Extrativista de Arraial do Cabo
ASAERLA - Associao de Arquitetos e Engenheiros da Regio dos Lagos
ATER - Assistncia Tcnica e Extenso Rural
BB Banco do Brasil (BB)
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social
CBH - Comit de Bacia Hidrogrfica
CBHLSJ - Comit de Bacias Hidrogrficas Lagos So Joo
CEB - Comunidades Eclesiais de Base
CEDAE - Companhia Estadual de guas e Esgotos
CEPERJ - Fundao Centro Estadual de Estatsticas, Pesquisas e Formao
de Servidores Pblicos do Rio de Janeiro
CERH - Conselho Estadual de Recursos Hdricos
CILSJ - Consrcio Intermunicipal Lagos So Joo
CIRM - Conselho Interministerial dos Recursos do Mar
CLEAN - Centro de Logstica e Apoio a Natureza
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
CNRH - Conselho Nacional de Recursos Hdricos
CP - Carteira de Pescador
CPP - Conselho Pastoral dos Pescadores
CREA - Conselho Regional de Engenharia e Agronomia
CT - Cmaras Tcnicas
CTP - Cmara Tcnica de Pesca
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DAP - Declarao de Aptido ao PRONAF
DECEX Departamento do Comrcio Exterior
DNOS - Departamento Nacional de Obras
DRM - Departamento de Recursos Minerais do Estado do Rio de Janeiro
EMATER - Empresa de Assistncia Tcnica e Extenso Rural
FAPERJ - Fundao de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro
FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador
FEEMA - Fundao Estadual de Engenharia do Meio Ambiente
FEPERJ - Federao de Pescadores do Estado do Rio de Janeiro
FIPAC - Fundao Instituto de Pesca de Arraial do Cabo
FIPERJ Fundao Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro
FIRJAN - Federao das Indstrias do Estado do Rio de Janeiro
FLP - Frum de Pesca da Lagoa dos Patos
FMI - Fundo Monetrio Internacional
FP - Fruns de Pesca
FUNDRHI - Fundo Estadual de Recursos Hdricos
GEMA - Grupo de Educao para o Meio Ambiente
IBAMA - Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renovveis
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade
INEA - Instituto Estadual do Ambiente
IPEDS - Instituto de Pesquisas e Educao para o Desenvolvimento
Sustentvel
LA - Lagoa de Araruama
MD - Ministrio da Defesa
MDA - Ministrio do Desenvolvimento Agrrio
MDS&CF - Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate a Fome
MEC - Ministrio da Educao
MF - Ministrio da Fazenda
MIN - Ministrio da Integrao Nacional
MMA - Ministrio do Meio Ambiente
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MME - Ministrio de Minas e Energia
MOMIG - Movimento das Mulheres de Iguaba Grande
MPA - Ministrio da Pesca e Aquicultura
MT - Ministrio dos Transportes
MT&E - Ministrio do Trabalho e Emprego
OADS - Organizao Ambiental para o Desenvolvimento Sustentvel
ONU - Organizao das Naes Unidas
PERH - Poltica Estadual de Recursos Hdricos
PESPA - Projeto de Integrao Social da Pesca Artesanal, de Saquarema
PETROBRS - Petrleo Brasileiro S.A.
PIB - Produto Interno Bruto
PNDP - Plano Nacional do Desenvolvimento da Pesca
PNDSPA - Poltica Nacional de Desenvolvimento Sustentvel da Pesca e da
Aquicultura
PNGC - Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro
PNRH - Poltica Nacional de Recursos Hdricos
PNRM - Plano Nacional para os Recursos do Mar
PPI - Poltica Pblica Integrada
PPL - Programa Pescando Letras
PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
RDS - Reserva de Desenvolvimento Sustentvel
RESEX - Reservas Extrativistas
RGP - Registro Geral da Pesca
SAPERJ - Sindicato dos Armadores de Pesca do Estado do Rio de Janeiro
SEA - Secretaria de Estado do Ambiente
SEAP/PR - Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca vinculada a Presidncia
da Repblica
SEDRAP - Secretaria de Desenvolvimento Regional, Abastecimento e Pesca
SEMA - Secretaria do Meio Ambiente
SEPLAG - Secretaria de Planejamento do Estado do Rio de Janeiro
SERLA - Secretaria Estadual de Rios e Lagos
SESI - Servio Social da Indstria
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SFPA - Superintendncia Federal para a Pesca e Aquicultura
SIF - Servio de Inspeo Federal
SIGIL - Sociedade Industrial de Granitos Ltda
SIPA - Secretaria de Inspeo de Produto Animal
SNGRH - Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hdricos
SUDEPE - Superintendncia de Desenvolvimento da Pesca
TCT - Termo de Cooperao Tcnica
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SUMRIO
1 CONSIDERAES INICIAIS ................................................................. 18 1.1 Tema e Problema de Pesquisa .................................................................. 23
1.2 Objetivo Geral e Objetivos Especficos ...................................................... 24
1.3 Justificativa ................................................................................................. 24
1.4 Delimitao do Estudo ............................................................................... 28
2 AS POLTICAS PBLICAS PARA A PESCA NO BRASIL ...................... 29 2.1 A Trajetria da Pesca ................................................................................. 29
2.2 A Regio das Baixadas Litorneas e o seu Contexto Econmico e Social Crise & Fragilidade Social ................................................................................ 33
2.2.1 Produto Interno Bruto - Regies do Pas e a Regio Sudeste e Estados da Regio Sudeste, 2000 a 2011 ..................................................................... 33
2.2.2 Dados Econmicos dos Municpios da Baixada Litornea: ..................... 35
3 AS DIFERENTES INSTNCIAS DE PODER NA GESTO DA PESCA ... 41 3.1 No mbito Federal ..................................................................................... 43
3.2 No mbito Estadual .................................................................................... 53
3.3 Polticas Pblicas para a Pesca e o Poder Local Regional ........................ 56
3.4 A Gesto da Pesca no Entorno da Lagoa de Araruama ............................ 69
4 METODOLOGIA .................................................................................... 80 4.1 ABORDAGEM - PESQUISA QUALITATIVA .................................................... 81 4.2 Protocolo .................................................................................................... 81
4.2.1 Introduo ao estudo de caso e ao estudo de casos mltiplos ............... 81
4.2.2 Proposies para o Estudo de Casos Mltiplos ...................................... 84
4.2.3 Estrutura Terica para o Estudo de Casos Mltiplos .............................. 85
4.2.4 A Funo do Protocolo ............................................................................ 86
4.3 Procedimentos para a Coleta de Dados ..................................................... 86
4.3.1 Delimitao dos Sujeitos de Pesquisa..................................................... 86
4.3.2 Plano de Coleta de Dados ....................................................................... 88
4.3.3 Instrumentos de Coleta de Dados ........................................................... 91
4.4 Resultados ................................................................................................. 91
4.4.1 Relatrio de Caso I Colnia de Pescadores de Araruama Z 28 ........ 92
4.4.2. Relatrio de Caso II Colnia de Pescadores de Arraial do Cabo Z -5 . 98
4.4.3 Relatrio de Caso III Colnia de Pescadores de Cabo Frio Z - 4 .... 104
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4.4.4 Relatrio de Caso IV Colnia de Pescadores de Iguaba Grande Z 29 ....................................................................................................................... 110
4.4.5 Relatrio de Caso V Colnia de Pescadores de So Pedro da Aldeia Z 06. ............................................................................................................ 117
4.4.6 Relatrio de Caso VI Colnia de Pescadores de Saquarema Z 24 ....................................................................................................................... 122
4.4.7 Relatrio de Casos Cruzados As Colnias de Pescadores do Entorno da Lagoa de Araruama ................................................................................... 132
5 ANLISE DOS RESULTADOS............................................................ 135 CONSIDERAES FINAIS .................................................................... 143 REFERNCIAS ...................................................................................... 149 ANEXO A - ROTEIRO PARA ENTREVISTA ............................................ 155 ANEXO B QUESTIONRIOS ............................................................... 156 APNDICE A TRANSCRIES ........................................................... 174
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1 CONSIDERAES INICIAIS
A laguna conhecida por Lagoa de Araruama um ecossistema de gua
salgada ligada ao mar, localizada na Regio dos Lagos, Rio de Janeiro.
Propicia e a princpio favorece o estabelecimento e manuteno de grande
concentrao de pessoas, as quais se utilizam do ambiente para diversos fins
de recreao, navegao, atividade turstica e pesca.
Convm esclarecer que esse trabalho se relaciona com a problemtica
da pesca artesanal costeira de pequena escala A pesca artesanal local
praticada por pescadores autnomos para fins comerciais, para tanto
necessrio que a gua da laguna esteja sempre em um padro mnimo para
que os peixes no morram ou migrem da regio, afetando assim, diretamente o
sustento das famlias dos pescadores. Desde o ano 2000, alm da reduo dos
peixes por conta do excesso de pesca, as condies da laguna se modificaram
por motivo do lanamento de esgoto com e sem tratamento, ao ponto de a
pesca tornar-se invivel perodo.
Atualmente, todo esgoto coletado despejado na laguna. O tratado
corresponde a 75% e o no tratado a 25%. Alm do problema do contnuo
despejo de esgoto no tratado, o esgoto tratado corresponde a um excesso de
gua doce lanado no ecossistema alterando suas caractersticas naturais e a
sua ictiofauna (espcies de peixes).
Para resolver os problemas de abastecimento de gua e tratamento do
esgoto, criou-se em 1999 o Consrcio Intermunicipal Lagos So Joo
doravante nomeado por CILSJ, estabelecido para gerir a bacia hidrogrfica do
Rio So Joo onde se localiza a represa de Juturnaba que fornece gua
potvel para todos os municpios da bacia hidrogrfica: Araruama, Arraial do
Cabo, Armao de Bzios, Cachoeiras de Macacu, Casimiro de Abreu, Cabo
Frio, Iguaba Grande, Rio Bonito, Rio das Ostras, Saquarema, Silva Jardim, So
Pedro da Aldeia e Maric.
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Figura 1 - Regio das Baixadas Litorneas Fonte: CEPERJ(2013)1.
Entretanto, desses treze municpios somente seis esto no entorno na
Lagoa de Araruama que so: Saquarema, Araruama, Iguaba Grande, So
Pedro da Aldeia, Cabo Frio e Arraial do Cabo. Desses seis, somente trs
dependem da pesca exclusivamente na laguna: Araruama (possui acesso ao
mar, mas desabrigado), Iguaba Grande e So Pedro da Aldeia. O mapa da
pgina seguinte ilustra a disposio das cidades no entorno da Lagoa de
Araruama.
1 Diviso poltico-administrativa, segundo Regies de Governo, Municpios e Distritos da Regio das Baixadas Litorneas. Disponvel em: http://www.ceperj.rj.gov.br/ceep/info_territorios/divis_politico_administrativo.html. Acesso em: 29/12/2013.
http://www.ceperj.rj.gov.br/ceep/info_territorios/divis_politico_administrativo.html
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Figura 2 - Municpios do entorno da Lagoa de Araruama Fonte: FIPERJ/CILSJ(2013)2.
O CILSJ foi uma soluo adotada pelos municpios situados dentro da
bacia hidrogrfica para resolver os seus problemas comuns de abastecimento
de gua, portanto, um consrcio ambiental destinado a gerir os recursos
hdricos e no um consrcio para gerir a pesca. O consrcio de recursos
hdricos fruto da articulao entre o Estado e os poderes municipais da regio
para compartilhar os recursos e tornar possvel o gerenciamento eficiente do
bem pblico de dimenses regionais, a gua e o esgoto.
Antes da existncia da CILSJ, o abastecimento de gua estava em crise
e o tratamento de esgoto no existia. A barragem da represa de Juturnaba
estava mal conservada e o rio So Joo estava parcialmente assoreado e
poludo. A rede de distribuio estava obsoleta e estruturalmente era a mesma
desde a dcada de 1960, momento em que a populao da regio era a
metade da atual.
A Poltica Nacional de Recursos Hdricos (PNRH) estabelece a bacia
hidrogrfica como uma unidade administrativa indivisvel e assim, gerida pelo
poder local regional de modo descentralizado, determina as diretrizes e as 2 Disponvel Em: http://www.lagossaojoao.org.br/estatisticapesqueira/Boletim-Trimestral-
monitoramento-pesca.pdf. Acesso em: 15/03/2014.
http://www.lagossaojoao.org.br/estatisticapesqueira/Boletim-Trimestral-monitoramento-pesca.pdfhttp://www.lagossaojoao.org.br/estatisticapesqueira/Boletim-Trimestral-monitoramento-pesca.pdf
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regras para tanto. O modelo de organizao do Conselho Nacional de
Recursos Hdricos (CNRH) replicado nas instncias inferiores, estadual e
regional.
Esse modelo constitudo de comits com a participao do poder
pblico: Unio, Estado e Municpio; dos usurios: empresas que se utilizam da
gua e da sociedade civil organizada. Entre os usurios dos recursos hdricos,
est o pescador artesanal por desenvolver no recurso hdrico a sua atividade
econmica.
Esse comit assessorado por diferentes cmaras tcnicas constitudas
para cada assunto importante na gesto da bacia. Entre essas cmaras
tcnicas est a Cmara Tcnica de Pesca (CTP), composta pela representao
dos pescadores artesanais e os rgos do ambiente, basicamente.
Existem diferentes instncias para a gesto da pesca no poder pblico:
na Unio, no Ministrio da Pesca e Aquicultura (MPA); no Estado a Secretaria
de Desenvolvimento Regional, Abastecimento e Pesca (SEDRAP) por meio da
Fundao Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ); nos
municpios a pesca gerida por Secretarias de Agricultura, Abastecimento e
Pesca, de Meio Ambiente e mais recentemente tambm por Secretaria de
Pesca e Aquicultura.
O pescador faz parte das Populaes Tradicionais e existe uma poltica
pblica para a manuteno e a permanncia dessas populaes nas suas
comunidades onde devero continuar vivendo e desenvolvendo as suas
atividades econmicas no meio ambiente, reorientadas para a sustentabilidade.
Essa lei reconhecida pelo ordenamento pesqueiro que orienta a elaborao
da poltica de pesca de modo a tambm reconhecer essa importncia e dar
suporte para o pescador continuar existindo com dignidade.
As metas estabelecidas para a no emisso de esgoto sem tratamento
na lagoa deveriam ter sido alcanadas em 2010. Mas, at o momento, o ndice
de esgoto tratado est em torno dos 75%. Assim a Lagoa de Araruama beira
ao colapso ambiental, em especial nas pocas de chuva, quando a enxurrada
traz para dentro da laguna todo o esgoto acumulado em rios e crregos, alm
da poluio das ruas. Nessa mesma poca, a populao est duplicada pelo
turismo de veraneio, dobrando as emisses de esgoto locais.
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Com a presena das diferentes instncias de poder dentro do Comit de
Bacias Hidrogrficas (CBH) que o rgo deliberativo de gesto, como o MPA,
a SEDRAP e FIPERJ, as Secretarias Municipais responsveis pela pesca e
mais as Colnias de Pescadores de todos os municpios do entorno da laguna,
a pesca no prospera. A CTP no parece reunir e articular para compor uma
frente da pesca em defesa da Lagoa de Araruama e dos prprios pescadores e
de suas comunidades.
Havendo tantas instncias responsveis por gerir a pesca torna-se
inquietador observar o pescador beira da praia continuar a viver as
dificuldades do seu labor para alcanar o sustento da sua famlia com a essa
profisso. Principalmente aps haver o colapso da Lagoa de Araruama entre os
anos de 2000 a 2004 quando da eutrofizao (excesso de algas), tornou um
fazer que j era difcil, naquele momento impossvel, devido contaminao do
pescado e o risco para a sade do pescador.
Dessa maneira, a pesca artesanal na Lagoa de Araruama est em risco
constante, assim como o sustento de milhares de famlias marginalizadas que
vivem dela.
Diante da situao do pescador artesanal que depende da Lagoa de
Araruama para subsistir e das polticas pblicas criadas com a inteno de
oferecer uma condio sustentvel para esse trabalhador, porque ainda os
benefcios dessas polticas pblicas no o alcanam?
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1.1 Tema e Problema de Pesquisa
A pesca artesanal costeira pode contribuir de modo significativo na
alocao de mo-de-obra, na preservao dos recursos pesqueiros e na
gerao de renda para as famlias dos pescadores artesanais. No entanto, ela
no a nica opo de atividade econmica para incluir pessoas na sociedade
de consumo local regional. Existe a necessidade de se pensar na pesca
artesanal de modo sustentvel, portanto ambiental e economicamente limitada.
Ao observar as estruturas: Municipal, Estadual e Federal, possvel
visualizar organismos administrativos que podem contribuir no desenvolvimento
das atividades econmicas da produo pesqueira em todas as suas
variaes, a pesca industrial, a pesca artesanal, a pesca continental, a
aquicultura, a maricultura e ainda a ranicultura. Assim, o setor da pesca
artesanal em nvel local deveria ser atendido por todas as esferas de poder.
Alm do que, h uma instncia regional para dirimir e mediar os conflitos entre
as diferentes instncias, a Cmara Tcnica de Pesca do Subcomit de Bacias
Hidrogrficas das Lagunas de Saquarema e Araruama pertencentes ao Comit
de Bacia Hidrogrfica Lagos So Joo. Esta pesquisa estudou como ocorre o
gerenciamento da pesca local e como se desenvolve o papel mediador desta
cmara.
A discusso acadmica sobre poltica pblica, consorcialidade, gesto
da pesca e desenvolvimento socioeconmico local se faz necessria. A
atividade econmica da pesca retornou a poltica em 2003 quando da criao
da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca vinculada a Presidncia da
Repblica (SEAP/PR), em 2009, foi transformada em Ministrio da Pesca e
Aquicultura (MPA). Em 2011, a Secretaria de Desenvolvimento regional,
Abastecimento, Agricultura e Pesca do Estado do Rio de Janeiro foi
desmembrada e surgiu a Secretaria de Desenvolvimento Regional,
Abastecimento e Pesca 3, para dar dinamismo s atividades pesqueiras no
Estado. A gesto da pesca j se situa h dcadas na estrutura organizacional
das prefeituras do entorno da Lagoa de Araruama.
3 Dirio Oficial do Estado do Rio de Janeiro. Decreto: 42.777 de 3012/2010. Disponvel em: http://www.imprensaoficial.rj.gov.br/portal/modules/conteudoonline/view_pdf.php?ie=MTEyMDk=&ip=MQ==&s=YmMyYmU4MzRlYWM3ZmNiOWNkOTE4NTZmNjIyZmE5NzU=. Acesso em: 14/02/2014.
http://www.imprensaoficial.rj.gov.br/portal/modules/conteudoonline/view_pdf.php?ie=MTEyMDk=&ip=MQ==&s=YmMyYmU4MzRlYWM3ZmNiOWNkOTE4NTZmNjIyZmE5NzUhttp://www.imprensaoficial.rj.gov.br/portal/modules/conteudoonline/view_pdf.php?ie=MTEyMDk=&ip=MQ==&s=YmMyYmU4MzRlYWM3ZmNiOWNkOTE4NTZmNjIyZmE5NzU
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Assim, a questo compreender como se do os conflitos em torno da
gesto pesca na referida localidade, e qual tem sido o papel da Cmara
Tcnica de Pesca do Comit de Bacia Hidrogrfica Lagos So Joo na sua
mediao para desenvolver estratgias para tornar mais efetiva ao dos
programas de pesca voltados para a pesca artesanal.
1.2 Objetivo Geral e Objetivos Especficos
Este trabalho tem como objetivo geral descrever como ocorre o processo
da mediao de conflitos local-regional relacionados a gesto da pesca
artesanal na Lagoa de Araruama.
Para atingir o Objetivo Geral proposto, este estudo visa explorar e atingir
os seguintes objetivos especficos:
a) Identificar as polticas sobre a gesto da pesca artesanal nas esferas federativas sobre a Lagoa de Araruama, documental;
b) Analisar e descrever a contribuio da CTP do CBHLSJ/CILSJ como entidade mediadora dos conflitos estabelecidos na gesto da pesca
artesanal na Lagoa de Araruama, por meio da arguio dos envolvidos
diretamente no processo.
1.3 Justificativa
O esforo do Governo Federal para o desenvolvimento socioeconmico
do pas tem ocorrido em muitas frentes, uma delas o incentivo ao
desenvolvimento das atividades econmicas da produo pesqueira em todas
as suas vertentes4 de modo sustentvel. Entre essas vertentes est a pesca
artesanal costeira, em que a figura do pescador artesanal o principal
operador, representa uma comunidade de pessoas a margem da pobreza que
4 Ministrio da Pesca e Aquicultura. Planejamento 2012 2015. Disponvel em: http://www.mpa.gov.br/index.php/planos-e-politicasmpa/planejamento-2012. Acesso em: 14/02/2014.
http://www.mpa.gov.br/index.php/planos-e-politicasmpa/planejamento-2012
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por meio da atividade profissional deveria conquistar a sua dignidade, incluso
social e econmica. No entanto, para que haja suporte e ocorram os programas
da pesca artesanal na localidade em que se encontram as comunidades, faz-se
necessrio, uma conjuno de aes de governana entre as diferentes
instncias federativas, Federal, Estadual e Municipal, alm da prpria
organizao dos trabalhadores em colnias, sociedade civil. No que tange ao
bem comum, a Lagoa de Araruama, est subdividida aos seis municpios do
seu entorno. Alm de todas as esferas pblicas, as organizaes da sociedade
civil envolvidas no processo de gesto local regional da pesca so as
colnias de pescadores. At certo ponto, as colnias esto reunidas sob uma
instncia de gesto participativa regional, a Cmara Tcnica de Pesca,
mediadora dos conflitos para a gesto dos recursos pesqueiros e para o
desenvolvimento dos processos entre as esferas de poder no que tange a
pesca. Assim sendo, o atendimento das necessidades desse grupo de
pessoas, os pescadores artesanais, por meio da CTP, tornar-se-ia possvel.
A participao dos pescadores artesanais importante na composio
da produo de pescado, pois capturam peixes, moluscos e crustceos,
aproveitando-os quase que integralmente, ao contrrio da pesca industrial, cujo
interesse restrito a espcies dirigidas ao mercado externo ou aquelas com
grandes volumes para industrializao em atender o mercado interno. Isso leva
predao de alguns recursos, pois descartado o pescado de menor valor
comercial, que acompanha certas pescarias como, por exemplo, a do camaro.
(GIULIETTI e ASSUMPO, 2005, p.99 e 100). Fischer (1992) afirma ser o local, um espao geogrfico antagnico, no
sentido de que um espao fsico delimitado onde sobre ele se do relaes
entre grupos sociais que excedem o limite dessa geografia fsica estendendo o
espao local. Assim, as relaes dadas em funo da pesca artesanal em
determinadas localidades estaro conectadas a outras instncias de poder, no
s local, mas, regional e nacional, e entre essas organizaes existiro foras
de cooperao e conflitos. Alves (2013) destaca que, para haver uma
construo poltica no sentido Aristotlico de res pblica e bem comum se faz
necessrio estarem relacionados o poder pblico, empresas e empresrios e a
sociedade civil organizada em interaes integradoras em rede. Assim, as
organizaes para o desenvolvimento da atividade pesqueira, estaro em
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cooperao e conflitos. As instncias administrativas da gesto pblica da
pesca e as colnias de pescadores necessitaro de um ente intermedirio para
mediar esses conflitos e alcanar um resultado razovel, negociado, para os
pescadores.
Para Vasconcelos, Diegues e Sales (2007), a pesca artesanal costeira
uma atividade econmica que aloca em suas operaes cerca de dois milhes
de pessoas e responsvel por empregar as camadas sociais mais pobres.
Assim,o desenvolvimento sustentvel da pesca artesanal, alm de contribuir
para a perpetuao das espcies de peixes e crustceos, ainda prestar uma
significativa contribuio para combater a pobreza e a excluso social.
Ademais, devido o aumento da classe mdia e o aumento populacional, torna-
se imprescindvel aumentar a oferta de alimentos com valor nutricional, caso do
pescado. Sendo essa populao, segundo os autores, responsvel por suprir
cerca de 50% do pescado consumido no pas (VASCONCELOS, DIEGUES e
SALES, 2007).
Para Oliveira (2001), pensar o desenvolvimento local , em primeiro
lugar, pensar a cidadania para alcanar o desenvolvimento e a melhoria do
bem estar da populao. Lembra o autor a importncia do seu fortalecimento,
em um processo de desenvolvimento da autonomia individual e do grupo, com
pensamento crtico e reflexivo para contribuir em uma nova ordem voltada para
o social. Ser esta conscincia de cidadania a responsvel por gerar a
condio de conquistar o bem estar e o desenvolvimento local e no o
contrrio. Da a necessidade de os trabalhadores da pesca artesanal
desenvolverem organizaes e articularem polticas de classe para, junto
instncia mediadora, demonstrar a importncia da sua atividade econmica e
reivindicar os programas e aes j definidos para a atividade, ainda no
desfrutados por essa coletividade.
Arretche (2004) destaca ter havido excessiva delegao de poderes ao
ente municipal, por conta da descentralizao do Estado brasileiro na
constituio de 1988, sem o devido respaldo oramentrio gerando uma srie
de dificuldades e impossibilidades para o alcance da satisfao das
necessidades da municipalidade. Cruz (2001), ao considerar as dificuldades
encontradas pelos municpios paulistas na dcada de 80 refaz o histrico do
artifcio criado pelos prefeitos por meio da articulao e cooperao local de um
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municpio com aqueles do seu entorno, transformando um problema at ento
local em soluo regional. Fortaleceu-se o estabelecimento e popularizou-se o
consrcio intermunicipal para dar respaldo s necessidades de municpios de
uma mesma regio envoltos em uma mesma problemtica. Da para diante se
multiplica exponencialmente o uso desse ente por todo o Brasil, sendo os
consrcios de sade os mais bem sucedidos no seu desiderato. Esses
consrcios alm das caractersticas operacionais constituem-se de comits
deliberativos em que o poder pblico, as empresas e a sociedade civil se
renem para discutir as questes locais regionais e encontrar solues comuns
(CRUZ, 2001).
Caldas (2008) afirma que, para o consrcio intermunicipal lograr xito,
necessita possuir um empreendedor poltico capaz, algum com prestgio e
influncia para levar as demandas locais para as outras esferas de poder, e
encontrar ali solues, alm do seu prprio poder de articulao e persuaso
para atingir consensos locais e definir as demandas (GIL, 2008).
Os consrcios intermunicipais so regidos pelas deliberaes dos
comits, formados por instncias do poder pblico, empresas e pela sociedade
civil organizada. Os comits so assessorados por cmaras tcnicas
responsveis por analisar situaes especficas. As Cmaras Tcnicas (CT)
desenvolvem uma soluo internamente, descrita em um parecer e o levam ao
plenrio do comit de bacias que ir votar e decidir os rumos a se tomar sobre
dada questo.
Dessa forma, o exerccio da atividade da CT se d na articulao de
questes para um frum de cidadania que est tecnicamente predisposta a
conduzir as discusses, destacar as implicaes e responder pelas demandas
de uma classe de pessoas e trabalhadores, ao qual o seu assunto diz respeito,
e a quem as consequncias das decises implicaro diretamente com ganhos
ou perdas.
Dessa maneira, os pescadores artesanais da Lagoa de Araruama, esto
de algum modo ligados a este mecanismo para desenvolver aes que visem
demonstrar o valor e as possibilidades do seu trabalho, reivindicar melhor
acesso e prioridade nos programas pblicos para a pesca artesanal, j
estabelecidos e estruturados, porm ainda no completamente disponibilizados
e/ou desfrutados.
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As definies das necessidades dos pescadores e solues das
deficincias de certos programas por no atingir o que de fato necessrio
para o desenvolvimento da atividade econmica da pesca, no deveriam ser
determinadas por quem as desconhece, mas por quem as desenvolve todos os
dias, os prprios pescadores.
1.4 Delimitao do Estudo
Este estudo se pauta essencialmente na atuao da gesto da pesca
artesanal de modo consorcial, ou seja, na governana regional do entorno da
Lagoa de Araruama, na Regio das Baixadas Litorneas do Estado do Rio de
Janeiro.
A discusso do tema pesca artesanal atrelado forma de mediao do
desenvolvimento econmico da atividade por meio de um frum consorcial ,
acima de tudo, uma forma de construir dignidade e incluso social para uma
categoria de pessoas margem da sociedade e carente de iniciativas de
incluso reais. Trata-se de estudo da gesto da pesca e economia, assim no
h como discutir a pesca artesanal sem observar a sua contribuio na
economia local regional. Os municpios selecionados para a realizao deste
estudo so: Saquarema, Araruama, Iguaba Grande, So Pedro da Aldeia,
Cabo Frio e Arraial do Cabo, todos situados no entorno da Lagoa de Araruama,
onde ser realizada a investigao, no que tange o desenvolvimento da pesca
artesanal costeira.
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2 AS POLTICAS PBLICAS PARA A PESCA NO BRASIL 2.1 A Trajetria da Pesca
A pesca no Brasil j era realizada a cerca de 2000 a 4000 anos
(DEBLASIS et. al., 2007). No Brasil colnia, Caio Prado Jr. (2012) afirma ter
ocorrido a pesca de modo muito significativo na Regio Norte e ainda ter
sido esta atividade a dar estabilidade ao assentamento de populaes
nessa regio, na Regio Sudeste relatou a pesca da Baleia em Cabo Frio.
Para Giulietti e Assunpo (1995), a pesca artesanal no levada
em conta, mesmo que suas atividades tenham se desenvolvido no
pasdesde os ancestrais da humanidade, para os autores a atividade
pesqueira no Brasil sempre esteve ligada indstria, pois comeou no
Territrio Nacional com a pesca da baleia, cujo principal produto o leo, que
industrializado. (p.1).
Para Diegues (1983), at dcada de 1960, a pesca se limitava s
atividades dos pescadores artesanais, mesmo na Regio Sudeste onde a
atividade era mais desenvolvida. Havia poucos armadores, traineiras, linheiros
e assemelhados, cujo interesse estava nos cardumes de sardinha, farto at
ento. A capacidade de carga das embarcaes era de dezenas de toneladas,
enquanto os atuneiros japoneses j presentes na costa, possuam capacidade
para centenas de toneladas.
As empresas de pescado eram raras e voltadas para o pescado fresco
ou enlatado. Somente no Nordeste, havia uma indstria mais organizada em
torno da Lagosta (DIEGUES, 1893).
Muniz (2005) afirma que a industrializao da pesca no Nordeste
aconteceu a partir da dcada de 1950.
Giulietti e Assunpo (1995) discorrem sobre a organizao histrica
da pesca no pas desdobrando-a em trs fases.
A primeira fase chamam os autores de Artesanal ou Pr-Industrial,
vai do sculo XVIII at 1962, quando da formao da Superintentendncia
de Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE). A segunda fase se inicia quando o
governo Joo Goulart (61 a 63) criou a SUDEPE vinculada ao Ministrio da
Agricultura, uma autarquia. Essa fase marcada pela falta de parmetros
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tcnicos, econmicos e sociais no processo de planejamento, execuo,
controle e avaliao dos projetos aprovados, levando no realizao dos
resultados, ainda do mau dimensionamento exagerado da capacidade
produtiva da indstria e do estoque de pescado, caracterizando uma
ociosidade tanto das embarcaes quanto das fbricas, essa fase durou at
1974. A terceira fase, no governo Mdici/Geisel foi marcada pela aprendizagem
com erros e fracassos e que ocorre a reformulao das estruturas de
financiamento e da reduo do tempo de implantao dos projetos com o
objetivo de reduo de custos (GIULIETTI e ASSUMPO, 1995).
Considerando os fracassos dos planos para a indstria pesqueira, algumas
modificaes foram realizadas, a baixa do custo de captao de recursos e o
prazo de implantao dos projetos foram atacados, visando a reduo dos
custos dos projetos. A SUDEPE representou, segundo os autores, uma
contribuio para a indstria pesqueira, especialmente nos levantamentos
estatsticos: A SUDEPE, apesar da falha na sua estrutura operacional e de sua instabilidade administrativa, desde que foi criada em 1962, at sua dissoluo em 1990, contribuiu para a atividade pesqueira no Pas. Mesmo no conseguindo implementar totalmente seus diversos Planos Nacionais do Desenvolvimento da Pesca (PNDP), estes serviram como indicativos atividade. A atuao da SUDEPE nas reas de pesquisa, administrao pesqueira, fiscalizao, levantamentos estatsticos e outras, apesar de no ter sido, em algumas delas, plenamente satisfatria, conseguiu resultados positivos. Na rea de levantamentos estatsticos, por exemplo, inexistem hoje dados confiveis que permitam estudos e anlises da pesca no Brasil, sendo que somente os dados de exportao e importao de produtos pesqueiros, levantados pelo Departamento do Comrcio Exterior (DECEX), do Banco do Brasil, so satisfatrios. (GIULIETTI e ASSUMPO, 1995, p. 98 e 99).
Os autores ainda acrescentam ter havido uma grande contribuio da
Secretaria de Inspeo de Produto Animal (SIPA), do Ministrio da Agricultura,
realizada por meio do Servio de Inspeo Federal (SIF). Entre as suas
atribuies estava realizao do levantamento sobre a produo do pescado
produzido em estabelecimentos fiscalizados pelo rgo, cujos resultados eram
publicados, foram inviabilizados aps a reforma administrativa do governo. Os
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31
autores reforam o fato de as atividades da SUDEPE terem sido repassadas ao
Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis
(IBAMA) e Secretaria do Meio Ambiente (SEMA) em 1990. Ainda, apontam a
incapacidade desses rgos, dadas as complexidades de atuao no ambiente
para a conservao, oferecerem a pesca, uma atividade econmica extrativista,
um atendimento capaz de desenvolver a sua capacidade produtiva, tanto na
pesca extrativa quanto no cultivo. (GIULIETTI e ASSUMPO, 1995).
Oliveira e Silva (2012), desenvolvem um olhar sobre as atividades da
pesca, se voltam no para a pesca dentro de um modelo industrial, como
fazem Giulietti e Assumpo (1995), mas, observam a pesca artesanal e
afirmam haver uma contradio entre o conceito jurdico-legal de pesca
artesanal no Brasil e a prtica social dessa atividade produtiva.
Assim propuseram-se a conhecer os seus efeitos. Afirmam as autoras
haver uma questo ideolgica do industrialismo nas polticas estatais advinda
ainda do perodo de 64 a 85 da ditadura cvico-militar, no havendo uma
conexo entre produo, sob uma lgica forada, e a comercializao, com o
desenvolvimento social. Assim, segundo o arranjo institucional brasileiro,
democrtico, estaria vinculado mesma lgica de um estado totalitrio. Essas
atividades da pesca industrial no eram estveis o suficiente para gerar lucro
para reinvestimento na pesca (OLIVEIRA e SILVA, 2012). A atividade produtiva pesqueira foi regulamentada no Brasil, nas ltimas cinco dcadas, pelo Decreto-Lei n. 221/1967 (Cdigo de Pesca) e pela Lei de Pesca n. 11.959/2009. A regulao jurdica do setor pesqueiro no Brasil promoveu e continua estimulando a sua industrializao. (...) as consequncias das polticas pblicas industrialistas do setor pesqueiro sobre a pesca artesanal. (OLIVEIRA & SILVA, 2012, p. 330).
Na primeira metade do sculo XX, em 1920 se d a criao da
Confederao Nacional dos Pescadores. Um estatuto nico para as colnias
de pescadores aprovado em 1923, todos os envolvidos na pesca passaram a
fazer parte dessa instituio (MUNIZ, 2005). Dessa maneira, a instituio
colnia de pescadores no seria representativa dos pescadores artesanais
somente, mas de fabricantes de barcos, peixeiros, armadores e assemelhados.
Diegues (1983) afirma existir uma questo muito particular no que tange ao
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estatuto das colnias em que as empresas de pesca so parte integrante, no
podendo haver a organizao da classe trabalhadora dos pescadores
artesanais, j que o seu rgo de classe no seria capaz de defender os seus
interesses ou mesmo representa-los exclusivamente como qualquer outra
categoria profissional. Segundo Muniz (2000) em 1968 surgiram as
Comunidades Eclesiais de Base (CEB) e dentro desse processo de
organizao de foras foi criado o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP),
em 1970. Esse foi o primeiro movimento de massa a reunir os pescadores sem
a tutela do estado, tendo em vista que a construo da cidadania estava
atrelada prtica de cidadania tutelada da qual fala Oliveira (2001) em
relao s conquistas trabalhistas concedidas por Getlio Vargas e no como
resultado de mobilizao dos trabalhadores da pesca reivindicando esses
direitos.
Segundo Giulietti e Assumpo (1995), apesar de o governo federal ter
criado em 1962 a SUDEPE, foi a partir do ano de 1967, em um impulso
industrializante, por meio do Cdigo da Pesca que foi permitido e estimulado
desenvolver a atividade de modo empresarial. Assim, a SUDEPE privilegiava
as relaes com as grandes empresas e concedia as isenes tributrias
previstas nos termos da lei (OLIVEIRA e SILVA, 2012).
Figura 3 - Fases Institucionais da Gesto dos Recursos Pesqueiros do
Brasil5 Fonte: Contato (2012, p.15).
5Disponvel em: file:///C:/Users/aspire/Downloads/dissertacao%20maria%20carolina%20contato.pdf. Acesso em: 28/03/2014.
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2.2 A Regio das Baixadas Litorneas e o seu Contexto Econmico e Social Crise & Fragilidade Social
A Regio das Baixadas Litorneas, especificamente nas cidades do
entorno da Lagoa de Araruama, traz consigo um revs dos acontecimentos
histricos, econmicos, sociais e demogrficos 6 . Aumento populacional
caracterizado como fenmeno e em decorrncia infraestrutura urbana
desordenada; baixa oferta de empregos; baixos salrios para aqueles que
esto empregados; elevado ndice de pobreza e o declnio das atividades
econmicas tradicionais. Assim, est estabelecido um quadro de crise.
Dessa forma, toda oportunidade de incluir pessoas por meio do trabalho
com bases locais deveriam ser utilizadas para mitigar esse quadro de crise
estabelecido e propiciar algum desenvolvimento local, principalmente para
aquelas atividades em que existem polticas pblicas especficas em todas as
esferas federativas. Da decorre a importncia de a gesto da atividade
pesqueira artesanal se desenvolver de modo efetivo, ambientalmente
sustentvel e socioeconomicamente inclusivo na localidade da Lagoa de
Araruama.
Considerando os ltimos dados de sries histricas regionais do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) pode-se observar melhor a
problemtica com o impacto da queda do PIB mais acentuado na Regio
Sudeste.
2.2.1 Produto Interno Bruto - Regies do Pas e a Regio Sudeste e Estados da Regio Sudeste, 2000 a 2011
Com base na tabela a seguir observa-se a Regio Sudeste com um
desempenho frente ao Produto Interno Bruto (PIB) Nacional, tendo
desenvolvido um perfil de queda e recuperao mais lento entre todas as
regies do pas. Houve queda em trs perodos seguidos e manuteno da
posio no perodo seguinte, 2004, 2005 e em 2006 volta a recuperar, mas,
6 Disponvel em: http://www.ibam.org.br/media/arquivos/estudos/royalties_rjaneiro.pdf. 12/02/2014.
http://www.ibam.org.br/media/arquivos/estudos/royalties_rjaneiro.pdf
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no o suficiente para chegar ao valor inicial do intervalo de 58,3%. Em 2007,
2008 e 2009 sua participao tem novas quedas e chega em 2010 com 55,4%
de participao no PIB Nacional. Este valor inferior ao inicial em 2,9 pontos
percentuais.
A Tabela 1 mostra a participao das regies em uma comparao do
IBGE entre os anos de 2000 a 2011:
Tabela 1 - Contas Regionais do Brasil. Participao das Grandes Regies e Estados no Produto Interno Bruto do Brasil: 2000 2011 (%)
Contas Regionais do Brasil Participao das Grandes Regies e Estados no Produto Interno Bruto do Brasil
Brasil: 2000 - 2011 (%)
Regies / Estados
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010* 2011*
NORTE 4,4 4,5 4,7 4,8 4,9 5,0 5,1 5,0 5,1 5,0 5,3 5,4 NORDESTE 12,4 12,6 13,0 12,8 12,7 13,1 13,1 13,1 13,1 13,5 13,5 13,4 SUDESTE 58,3 57,7 56,7 55,8 55,8 56,5 56,8 56,4 56,0 55,3 55,4 55,4 Minas Gerais 8,5 8,5 8,6 8,8 9,1 9,0 9,1 9,1 9,3 8,9 9,3 9,3 Esprito Santo 2,0 1,9 1,8 1,8 2,1 2,2 2,2 2,3 2,3 2,1 2,2 2,4 Rio de Janeiro 11,8 11,7 11,6 11,1 11,5 11,5 11,6 11,2 11,3 10,9 10,8 11,2 So Paulo 36,0 35,6 34,6 34,1 33,1 33,9 33,9 33,9 33,1 33,5 33,1 32,6 SUL 16,5 16,7 16,9 17,7 17,4 16,6 16,3 16,6 16,6 16,5 16,5 16,2 CENTRO-OESTE 8,4 8,5 8,8 9,0 9,1 8,9 8,7 8,9 9,2 9,6 9,3 9,6
BRASIL 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100
Fonte: Superintendncia de Estudos Econmicos e Sociais da Bahia, baseado em CONAC/DPE/IBGE, com os (*) Dados ajustados com as contas nacionais trimestrais7.
Assim, a economia fluminense impactada pela diminuio da atividade
econmica regional entre 2000 e 2011, causou maior desemprego, menor nvel
de investimentos pblico e privado, menor nvel de consumo da populao e
queda nas vendas do varejo e da indstria.
7Disponvel em:
http://www.sei.ba.gov.br/images/pib/xls/nacional/pib_nacio_part_grandes_regioes.xls. Acesso
em: 04/01/2014. Editado pelo autor.
http://www.sei.ba.gov.br/images/pib/xls/nacional/pib_nacio_part_grandes_regioes.xls
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2.2.2 Dados Econmicos dos Municpios da Baixada Litornea:
a) O PIB dos Municpios Fluminenses
A ltima anlise do PIB dos Municpios do Estado realizada pela
Fundao Centro Estadual de Estatsticas, Pesquisas e Formao de
Servidores Pblicos do Rio de Janeiro (CEPERJ,) em parceria com o IBGE, e
com outros rgos de estatsticas e planejamento do Estado no ano de 2011
apontam uma dependncia das atividades petrolferas e dos royalties
decorrentes dela.
A atividade pesqueira, a princpio, se enquadraria na atividade extrativa
com pouca representatividade na economia fluminense refletida no PIB
Estadual em termos gerais, porm existem estudos especficos que
comprovam certa importncia da pesca artesanal e industrial8. Ainda assim,
para as localidades litorneas, a pesca artesanal representa ocupao
profissional e subsistncia em todo o litoral brasileiro, inclusive na Regio das
Baixadas Litorneas e no entorno da Lagoa de Araruama.
A participao da agricultura tambm demonstrou ser de percentual
inferior a meio por cento, destacando sua pouca importncia nos resultados
econmicos do estado9.
Segundo o Censo do IBGE 2010, a Regio das Baixadas Litorneas
possui treze municpios com aproximadamente um milho de habitantes no
total, mas em apenas dois deles existe uma participao no PIB Regional maior
do que 10% e apenas um desses dois est no entorno da Lagoa de Araruama,
Cabo Frio, com um PIB Municipal de 32,35% seguido por Rio das Ostras com
32,08%, esses dois municpios recebem os royalties dos hidrocarbonetos por
haver explorao de petrleo e gs em suas reas territoriais e ainda se
beneficiam pela proximidade geogrfica com a Regio Norte Fluminense.
O entorno da Lagoa de Araruama, no se caracteriza por cidade-regio
conforme afirma Klink (2001), um polo regional onde o capital internacional 8Disponvel em: http://www.querodiscutiromeuestado.rj.gov.br/CMS/uploads/publicacoes/09.08.13-09.37.56-diagnostico_pesca_maritima_comercial_rio_de_janeiro.pdf. Acesso em: 04/01/2014. 9 Disponvel em: http://www.ceperj.rj.gov.br/ceep/pib/Texto%20%20%20%20%20%20anltico%20do%20PIB%20dos%20municpios%20RJ%202011%20V.doc. Acesso em: 01/01/2014.
http://www.querodiscutiromeuestado.rj.gov.br/CMS/uploads/publicacoes/09.08.13-09.37.56-diagnostico_pesca_maritima_comercial_rio_de_janeiro.pdfhttp://www.querodiscutiromeuestado.rj.gov.br/CMS/uploads/publicacoes/09.08.13-09.37.56-diagnostico_pesca_maritima_comercial_rio_de_janeiro.pdfhttp://www.ceperj.rj.gov.br/ceep/pib/Texto%20%20%20%20%20%20anltico%20do%20PIB%20dos%20municpios%20RJ%202011%20V.dochttp://www.ceperj.rj.gov.br/ceep/pib/Texto%20%20%20%20%20%20anltico%20do%20PIB%20dos%20municpios%20RJ%202011%20V.doc
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tem interesse em se estabelecer, dadas as caractersticas atrativas da locao
para o empreendimento e para os trabalhadores, unindo menor arrecadao
de impostos e maior capacidade de fornecimento de mais servios pblicos e
com maior qualidade. Portanto, a localidade do entorno da Lagoa de Araruama
est margem do processo de desenvolvimento econmico com interesse de
capitais globais.
No entorno da Lagoa de Araruama existem aproximadamente 500 mil
habitantes (a metade da concentrao de uma cidade-regio), a localidade no
usufrui de vantagem logstica ou agrcola, ainda que a BR 101 (Rio Vitria)
seja prxima e que existam terras agricultveis em sua rea territorial, no atrai
capital para desenvolver-se economicamente e gerar trabalho e renda para a
sua populao. Assim, no so muitas as iniciativas para incluir as pessoas a
margem da pobreza.
Uma das poucas iniciativas para estimular e desenvolver a economia
solidria na regio como a I Conferncia Regional de Economia Solidria da
Baixada Litornea do Rio10, ocorrida em 30 de outubro de 2010, entre os temas
abordados esteve pesca artesanal, entretanto no se conseguiu alcanar
resultados ou sequncia das atividades.
Dessa maneira seria o processo de reestruturao produtiva e territorial
carecedor de iniciativas locais em linha Regional a partir de dentro da regio
para a potencializao das suas atividades para gerar trabalho, emprego,
renda e incluso social. nesse esforo que se enquadra o desenvolvimento
sustentvel da pesca artesanal local, para dar conta de incluir os pescadores
no processo socioeconmico de modo mais efetivo e significativo.
b) Pessoal Ocupado Assalariado e no Assalariado
Outra considerao importante sobre os dados relativos organizao
da economia da Regio das Baixadas Litorneas, alm do PIB, diz respeito
renda (pessoal ocupado: assalariado e no assalariado).
Com relao ao pessoal ocupado assalariado, segundo o Censo IBGE
2010, o municpio de Cabo Frio possui a maior representatividade, 43%. O
municpio de Araruama o segundo com 20%, seguido por Saquarema, em
10 Evento promovido pela Secretaria de Bem Estar Social da Prefeitura de Rio das Ostras. Disponvel em: http://www.agenciario.com/materia.asp?cod=77525. Acesso em: 28/12/2013.
http://www.agenciario.com/materia.asp?cod=77525
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terceiro lugar, com 16,5%. So Pedro da Aldeia, em quarto lugar, com 13%.
Arraial do Cabo com 5%. Por fim Iguaba Grande com 2,5% da massa de
trabalhadores assalariados da regio.
J como pessoal ocupado no assalariado, a situao demonstrada
diferente. Em primeiro lugar est o municpio de Saquarema, com 42%. Em
segundo lugar vem Cabo Frio, com 31%. Araruama vem em terceiro, com 13%.
Em quarto lugar, So Pedro da Aldeia com 8%. Arraial do Cabo possui 4% e
Iguaba Grande 2%.
c) Salrio Mdio
De acordo com os dados do IBGE 2010, em relao ao rendimento
mdio nota-se uma diferena significativa ao comparar a Regio das Baixadas
Litorneas com a Regio Metropolitana do Rio de Janeiro, considerando como
base o salrio mnimo do ano de 201011(R$ 510,00), perodo do ltimo Censo
IBGE.
O rendimento mdio do conjunto dessas cidades da Regio da Baixada
Litornea no ultrapassa 2,12 salrios mnimos enquanto que no mesmo
perodo o rendimento mdio da Regio Metropolitana do Rio de Janeiro foi
maior do que 10 salrios mnimos, uma diferena muito significativa na
remunerao mdia do trabalhador. Assim, das cidades do entorno da Lagoa
de Araruama, alm de haver menores oportunidades de ocupao laboral
remunerada, ainda, a remunerao mdia corresponde a 20% da remunerao
mdia dos trabalhadores da Regio Metropolitana do Rio de Janeiro regio
limtrofe as Baixadas Litorneas.
O rendimento mdio na Regio Metropolitana do Rio de Janeiro
aproximadamente dez vezes maior do que o salrio mdio das cidades do
entorno da Lagoa de Araruama, com exceo do municpio de So Pedro da
Aldeia com rendimento mdio de 2,9 salrios mnimos, fato atribudo a
presena da Base Area da Marinha do Brasil sediada no municpio onde
residem grande parte dos funcionrios federais.
11 Salrio Mnimo para o ano de 2010. Disponvel em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12255.htm. Acesso em: 01/01/2014.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12255.htm
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Apesar de Cabo Frio possuir a maior renda mensal em circulao o
municpio de Saquarema possui um nmero de empresas maior, reflexo do
efeito dos incentivos governamentais e fiscais da localidade para atrair
empresas e aumentar a arrecadao municipal. Mas, ainda assim a
arrecadao de impostos de Cabo Frio muito superior arrecadao de
Saquarema, alm da verificao da renda per capta, a de Cabo Frio quatro
vezes superior. Fato constatado na verificao do PIB Municipal dos municpios
do entorno da Lagoa de Araruama.
d) Possibilidades da Economia do Turismo
O turismo possui um forte apelo local/regional tendo em vista as belezas
naturais da regio, em maior ou menor grau para cada cidade, porm generosa
com todas. Esta atividade econmica se desenvolve operacionalmente dentro
de um perfil de sazonalidade, em especial as frias escolares. As
oportunidades seriam limitadas aos perodos de frias de vero principalmente.
As frias de julho seriam menos representativas, tendo em vista serem frias
de inverno. Ainda que o maior patrimnio regional para atrair o turismo est em
declnio ambiental no que a balneabilidade.
e) Royalties do Petrleo
Segundo a Secretaria de Planejamento do Estado do Rio de Janeiro
(SEPLAG)12com relao participao dos Royalties na receita dos municpios
das Baixadas Litorneas, percebe-se uma distribuio em que alguns
municpios se beneficiam de modo mais expressivo do que outros.
Das cidades do entorno da Lagoa de Araruama, a tabela a seguir
demonstra a participao, em especial, dos Royalties, na Receita Corrente
Lquida. Essas cidades possuem as menores participaes no financiamento
municipal desse tipo de recurso exceo de Cabo Frio cuja participao
muito significativa, 46,41% como tambm a participao de Arraial do Cabo,
16,80%, um percentual bastante inferior ao de Cabo Frio, porm maior do que
12 Municpios em Dados, setembro de 2010. Disponvel em: http://download.rj.gov.br/documentos/10112/378073/DLFE-23926.pdf/municipios_dados_I.pdf. Acesso em: 01/01/2014.
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o dobro da participao dos outros municpios do entorno da Lagoa de
Araruama, esto entre 7% e 8%.
A transformao econmica da Regio das Baixadas Litorneas, aludida
por tantos autores, dada em funo dos Royalties dos hidrocarbonetos no se
aplicaria diretamente sobre a maioria das cidades do entorno da Lagoa de
Araruama, tendo essas cidades de buscar outras maneiras para desenvolver
uma economia local satisfatria.
f) Demografia
A Regio das Baixadas Litorneas, baseada no Censo IBGE de 2000 e
2010, a segunda maior densidade demogrfica do estado, perdendo apenas
para a regio metropolitana. Um estudo preliminar do Censo 2010 realizado
pelo Observatrio das Metrpoles do Instituto Nacional de Cincia e Tecnologia
revelou um acentuado crescimento demogrfico/populacional da Regio das
Baixadas Litorneas, em mdia 4% ao ano entre os perodos de 2000 a 201013.
13Estudo disponvel no stio do Observatrio das Metrpolis do Instituto Nacional de Cincia e Tecnologia. O observatrio das Metrpolis funciona como um instituto virtual, reunindo hoje 159 pesquisadores (dos quais 97 principais) e 59 instituies dos campos universitrio (programas de ps-graduao), governamental (fundaes estaduais e prefeitura) e no-governamental, sob a coordenao geral do IPPUR - Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Texto extrado da Apresentao no stio do OM. http://www.observatoriodasmetropoles.net/download/documento01_censo2010RJ.pdf. Acesso em: 29/12/2013.
http://www.observatoriodasmetropoles.net/download/documento01_censo2010RJ.pdf
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Tabela 2 - Populao Estabelecida no Entorno da Lagoa de Araruama Baixada Litornea Rio de Janeiro IBGE Censo de 2000 e 2010
Populao Estabelecida no Entorno da Lagoa de Araruama Baixada Litornea Rio de Janeiro IBGE Censo de 2000 e 2010.
Cidade 2000 % 2010 % 2013* % % Araruama 82803 23% 112.008 22% 118.964 22% 35,3%
Arraial do Cabo 23877 7% 27.715 5% 28.627 5% 16,1%
Cabo Frio 126828 35% 186.227 36% 200.380 37% 46,8%
Iguaba Grande 15089 4% 22.851 5% 24.788 5% 51,4%
So Pedro da Aldeia 63227 17% 87.875 17% 93.659 17% 39,0%
Saquarema 52461 14% 74.234 15% 79.421 15% 41,5% Total 366285 100,0% 510.910 100,00% 545.839 100,00% 39,5%
Fonte: IBGE14, Censo de 2000 e 2010 - *Estimativa - Tabela elaborada pelo autor.
14 CIDADES@, O Cidades uma ferramenta do IBGE para se obter informaes sobre todos os municpios do Brasil num mesmo lugar. Nele so encontrados grficos, tabelas, histricos e mapas que traam um perfil completo de cada uma das cidades Brasileiras. Disponvel em: http://cidades.ibge.gov.br/xtras/uf.php?lang=&coduf=33&search=rio-de-janeiro. Acesso em 15/11/2013.
http://cidades.ibge.gov.br/xtras/uf.php?lang=&coduf=33&search=rio-de-janeiro
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3 AS DIFERENTES INSTNCIAS DE PODER NA GESTO DA PESCA
As polticas pblicas para a gesto da pesca, historicamente, se
estabelecem por meio do aparato burocrtico do Estado, da Unio, dos
Estados e dos Municpios. A forma organizacional hoje estabelecida para
cuidar dos negcios da pesca regida por um modelo advindo das estruturas
industriais a partir do sculo XVIII. Esse modelo passa a integrar a forma de
gerir das instituies, inclusive as pblicas. Assim a capacidade de organizao
do trabalho ocorre por meio de processos racionais, configurao de cargos
com tarefas especficas e a gerao de profisses e carreiras estabelecidas
dentro de uma hierarquia de comando, obedecidas por fora da lei,
legitimando, tanto a ao dos indivduos, na posio de comando, quanto o
estabelecimento da obedincia sobre os comandados. As pessoas do comando
tambm esto submetidas base legal, comum a todos (WEBER, 2004). A burocracia est sob a regncia de reas de jurisdio fixas e oficiais, ordenadas por leis e normas administrativas. Ela estabelece relaes de autoridade, delimitada por normas relativas aos meios de coero e de consenso. Uma relao hierrquica se estabelece, definindo postos e nveis de autoridades, alm de um sistema de mando e subordinao com gerncia das atividades e tarefas delegadas por autoridade. (FARIA e MENEGUETI, 2011, p. 426).
Cohn (2006) destaca que a base legal da legitimidade se evidencia no
estatuto, ao garantir quem dever obedecer a quem, at que ponto, sem
considerar as caractersticas pessoais, porm o cargo que ocupa. Aquele que
manda tambm obedece, todos esto sujeitos ao estatuto. Todos que ocupam
cargos na organizao so denominados profissionais por possurem as
competncias para o cargo tanto para a fbrica, quanto para a administrao,
da o surgimento da administrao profissional, por isso os cargos e as
carreiras ocorrem tanto na fbrica quanto na administrao. A burocracia
analisada por Weber aquela que contribui com o modo de organizar o Estado
moderno, possuindo as mesmas caractersticas daquela que organiza a
empresa moderna (WEBER, 1980).
Faria e Meneguetti (2011) realam o fato e criticam essa burocracia de
estado no sentido desta desenvolver os seus prprios interesses atrelados aos
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interesses de uma elite dominante, seja da prpria burocracia seja do setor
econmico. Sendo assim, ao invs da realizao do bem comum, o que vai se
realizar ser o fruto dessa lgica, independente do que as prioridades das
polticas estabeleceram para ser feito, dos seus programas, projetos e aes.
Motta, Vasconcellos e Wood Jr. (1993), destacam o papel do controle
social da organizao, empresa e tambm do Estado, que passa a ter o seu
modus operandi legitimado cada vez mais cedo desde a escola, onde prepara
indivduos para ocupar papeis dentro dessa estrutura e lgica organizacional,
reproduzindo e perpetuando o vis. Os autores destacam que a temtica do
controle social dentro das organizaes importante, na medida em que, as
organizaes esto a servio de sistemas sociais maiores e tambm das foras
hegemnicas.
A organizao o sistema social mais formalizado da sociedade, sendo, portanto, um sistema de significativas condutas institucionalizadas. As organizaes, de h muito, so as principais responsveis pelas formas de conduta dos atores sociais. As empresas so centrais, no s porque produzem bens e servios, mas tambm porque produzem formas de comportamento e formas de raciocnio. As escolas, cada vez mais cedo, preparam os indivduos para determinados papis no sistema produtivo, com tendncia a legitimar as organizaes de forma habitual. As elites organizacionais, por sua vez, tm nesses mecanismos a sua prpria lgica. Velhas e novas geraes de elites podem adotar novas atitudes quanto a prticas polticas, administrativas etc. Agem, porm, segundo a lgica da organizao, enquanto instncia de produo e controle social. (MOTTA; VASCONCELLOS e WOOD JR., 1993, p. 69 e 70).
As organizaes pblicas para a gesto da pesca na atualidade esto
caracterizadas pelos elementos burocrticos com suas virtudes e vcios. Dessa
forma, ora contribuiro para se atingir os objetivos propostos, ora contribuiro
para os seus prprios interesses e para os interesses elitistas e do capital,
exercendo um papel de controle social presente em todas as instituies: A estrutura burocrtica concentra os meios materiais de administrao nas mos das elites detentoras do capital, mediante o desenvolvimento das grandes empresas capitalistas. Quando a burocracia se estabelece plenamente, ela se situa entre as estruturas sociais mais difceis de serem destrudas, configurando-se um meio de transformar ao comum em ao societria, racionalmente ordenada. Dessa forma, constitui um instrumento de poder, de dominao, pois,
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ningum pode ser superior estrutura burocrtica de uma sociedade (FARIA e MENEGUETTI, 2011, p. 427).
3.1 No mbito Federal
O ordenamento pesqueiro nacional, a Lei da Pesca, por meio dos seus
princpios e diretrizes, incentiva e regula a atividade econmica da pesca de
modo sustentvel com a preocupao no desenvolvimento socioeconmico
daqueles que tiram o sustento das suas famlias dessa atividade, tendo em
vista os impactos para a degradao do ambiente e a degradao do recurso
pesqueiro evidenciadas na histria da pesca desde antes da Revoluo
Industrial. (DIEGUES, 1983).
As instncias de poder federativo no territrio nacional, Unio, Estados e
Municpios, possuem alguma estrutura/rea: ministrio, secretaria ou
departamento, para desenvolver a governana sobre a pesca e a burocracia
pblica. Alves (2013) evidencia em sua elaborao substantiva do termo
Poltica, a presena intrnseca de dois elementos: planos e programas.
O plano no pode escapar da planta e do design, valores etimolgicos. A expresso latino-italiana e os antigos registros nos dicionrios ingleses do sculo XVIII sugerem os desgnios, os desenhos no espao territorial, a extenso de um intento. (...) O programa proclama, edita, escreve publicamente (prographein), sugere atividades organizadas. (ALVES, 2013, p. 17).
O autor afirma que o Brasil sem Misria um bom exemplo de Poltica
Pblica Integrada (PPI). Em sua anlise, essa PPI aparece como um plano se
expandindo entre programas, aes, pactos e compromissos em instncias
horizontais do governo federal, outros ministrios e dentro desses ministrios,
bem como dentro das parcerias pblico-privadas. Para o autor, o
desenvolvimento desse plano possui um desenho abrangente com o objetivo
de incluir pessoas, dada a realidade de excluso social historicamente
estabelecida no pas. So milhes de brasileiros, em todas as cinco regies, de
Norte a Sul e de Leste a Oeste vivendo na pobreza extrema. Poltica Pblica,
no igual a Plano, sendo a primeira a instncia a dar as diretrizes e as bases,
como faz na rea da educao. O conflito evidenciado nos enunciados em que
se utilizam o termo poltica, para Alves (2013), ser o mesmo vivido na
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administrao diminuindo a sua eficincia no que tange construo de um
processo democrtico mais consistente e amadurecido construindo o bem
comum, assim sendo pode-se inferir que a gesto pblica da pesca coopera
com o Plano Brasil sem Misria como um dos atores integrantes do esforo
verificado no stio eletrnico do plano.
Uma PPI de pesca deveria conseguir retirar os pescadores artesanais da
misria, tendo em vista haver dentro do Plano Nacional de Desenvolvimento
Sustentvel para a Pesca, programas, aes, pactos e compromissos para
auxiliar o desenvolvimento das atividades e alcance dos objetivos.
O financiamento da pesca ocorre por meio do Ministrio da Fazenda
(MF) via Banco do Brasil (BB) e Banco Nacional de Desenvolvimento
Econmico e Social (BNDES) para o Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (PRONAF) em vrias linhas de crdito. Ainda, por meio
do Termo de Cooperao Tcnica (TCT) com o Ministrio do Desenvolvimento
Agrrio (MDA) que fornecida a devida Assistncia Tcnica e Extenso Rural
(ATER), utilizada para desenvolver a adequao econmica e a elaborao
dos projetos de pesca dos pescadores para captar o financiamento dentro das
possibilidades de suprimento de recursos com que desenvolvida a sua
atividade e que beneficia o pescador artesanal, desde a alfabetizao at
cursos tcnicos e de nvel superior para capacit-los dentro das necessidades
do setor pesqueiro. Assim como tambm a formao de extensionistas,
pesquisadores e professores em toda a rede pblica de ensino federal
tecnolgico do pas fomentando uma rede de cooperao nacional e
internacional
Alves (2013), em uma das suas observaes das expresses utilizadas
nos documentos do governo, enfatiza que o termo Poltica envolve as aes de
governana, planejamento, programao, objetivos determinados, instrumentos
de controle e transparncia, aes estratgicas e acrescenta interaes
integradoras que sero desenvolvidas pelos entes determinados, pblicos ou
pblico-privados:
(...) uma poltica ser um conjunto de aes de governana, planificado e programtico, com alvos determinados, sistema de controle transparente e desdobramento de aes estratgicas trabalhada por atores pblicos ou pblico-privados determinados. Seria, no mnimo, um caminho para a
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substantivao da poltica, notadamente se trabalhada em rede e por interaes integradoras. (ALVES, 2013, p. 17).
Dessa maneira, a poltica nacional para a pesca na atualidade ocorreu a
partir da Medida Provisria n 103 de 1 de janeiro de 2003 15 , criando a
Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca (SEAP/PR), lei 10.683, de 28 de
maio. Passados cinco anos, em 2009, o Poder Executivo federal props a
Medida Provisria n 437 de 200816 em julho para criar o Ministrio da Pesca e
Aquicultura (MPA), lei 11.958 de 26 de junho de 200917.
A funo deste ente desenvolver a Poltica Nacional de
Desenvolvimento Sustentvel da Pesca e da Aquicultura (PNDSPA). Assim, a
unio planeja em nvel nacional e tambm em nvel regional por meio da Lei da
Pesca, 11.959 de 2009, aprovada na mesma data de criao do MPA.
O MPA planeja, normatiza, cria estmulos e fiscaliza por meio dos
planos, programas e aes no que tange ao aspecto da atividade econmica
com responsabilidade sustentvel e, por meio do Ministrio do Meio Ambiente
(MMA) e seus rgos, em especial o IBAMA e o Instituto Chico Mendes de
Conservao da Biodiversidade (ICMBio) no que tange ao aspecto ambiental
da atividade com responsabilidade de uso econmico, alm de outros
ministrios e rgos j mencionados. Desse modo, no Brasil o estabelecimento
da poltica nacional de pesca uma prerrogativa do MPA, a autoridade de
maior status sobre a gesto da pesca. No entanto, por conta de o pas ser
divido politicamente por meio do pacto federativo, as instncias estaduais e
municipais, tambm podero desenvolver suas polticas de pesca.
A misso do MPA diante do Plano Brasil sem Misria estabelecer a
univocidade do discurso em mbito nacional e desenvolv-la com os outros
ministrios e com as outras esferas de poder da atividade da pesca artesanal
15Medida Provisria n 103 de 1 de janeiro de 2003, destinada a criar a Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca, vinculada a Presidncia da Repblica com status de ministrio. Disponvel em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/mpv/antigas_2003/103.htm. Acesso em: 05/03/2014. 16 Medida Provisria n 437 de 2008, destinada a transformar a Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca, vinculada a Presidncia da Repblica no Ministrio da Pesca e Aquicultura. Disponvel em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/Mpv/437.htm. 05/03/2014. 17Projeto de lei apresentado para substituir a MP n 437 de 2008, criando na forma lei o Ministrio da Pesca e Aquicultura. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11958.htm. Acesso em: 05/03/2014.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/mpv/antigas_2003/103.htmhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/Mpv/437.htmhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/Mpv/437.htmhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11958.htmhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11958.htm
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para retirar milhes de pescadores artesanais da extrema pobreza. a sua
responsabilidade em primeiro lugar, antes dos demais entes federados.
Arretche (2004) ao discorrer sobre o federalismo no Brasil e sua relao
com as polticas sociais, tendo em vista os problemas de coordenao das
polticas, afirma que o estado federativo, em relao ao estado centralizado,
seria menos propenso ao gasto social e tambm, desenvolvedor de programas
sociais com menor alcance dentro do plano nacional, portanto, mais restrito. A
autora, afirma ainda, que a maior dificuldade dos problemas de coordenao
para alcanar os objetivos lanados pela poltica, seriam as reas comuns
sobrepostas nas diferentes esferas de governo, gerando assim autoridade
poltica sobre a mesma rea em pontos diversos. Essa caracterstica, por conta
dos muitos ns, intra governo e inter governos, gera vrios pontos onde podem
ocorrer impasses e vetos. Assim, para a autora, as polticas nacionais deveriam
ter como caracterstica consensos.
A autora destaca que a distribuio de poder para a autoridade poltica
no homognea e a sua variao se relaciona diretamente em como esto
estabelecidas as relaes entre os poderes Executivo e Legislativo dentro da
esfera Federal e, ainda, a distribuio de funes polticas entre os diferentes
nveis de Governo, Unio, Estados e Municpios. O enfoque da autora na tarefa
de anlise est em demonstrar que existe uma desproporcionalidade de
distribuio de poder poltico entre as polticas particulares dadas em funo do
enquadramento no arcabouo governamental. Como exemplo, as polticas de
sade receberiam maior poder poltico do que as polticas voltadas para o
esporte, esse poder se materializaria em ltima instncia em disponibilidade de
oramento e de autonomia na sua aplicao. A tendncia que destaca para as
polticas sociais no estado Brasileiro, em funo da descentralizao e da
dependncia dos repasses, de sempre legar ao governo federal o
direcionamento das polticas sociais. (ARRETCHE, 2004).
Arretche (2004) se refere a comparaes de estruturas de pases
centralizados em relao aos federados. Quanto ao primeiro ponto de
comparao, destaca ser uma tendncia de estados federados possurem
gastos sociais menores do que do que os estados centralizados. Entre as
crticas que sofre o atual governo justamente a elevao dos gastos sociais,
tendo em vista o pas ter assinado o acordo do Consenso de
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Washington/Fundo Monetrio Internacional (FMI) para, entre outras metas,
exercer o controle fiscal exigindo a reduo de gastos entre estes com polticas
sociais (NBREGA, 2012).
O ponto de estabelecimento da reduo do gasto social como indicador
econmico demonstrado por Ug (2004 e 2008). A autora declara ser ele
injustificado tendo por base estar embutido ao conceito de cidadania nas
conquistas dos direitos civis, polticos e tambm os direitos sociais para todos
os cidados e no somente para uma parcela da populao margem da
misria. Assim, desenvolvendo a existncia do Estado de bem estar social para
todos os cidados, o que ocorreu logo aps a II Guerra Mundial at os anos 70,
a Era de Ouro, em alguns pases desenvolvidos como os EUA e a Frana.
Ug (2004) afirma ser esta uma nova teoria social para estabelecer outro
tipo de estado. A constatao da autora foi verificada por meio de sua pesquisa
de anlise documental no Banco Mundial nos anos 90 e em 2000 em especial
nos documentos relacionados ao Consenso de Washington. Antunes (2009)
demonstra que mesmo nos pases em que essa cidadania foi alcanada - cita
a Inglaterra - a fora do capital a corrompeu e no prprio movimento do partido
trabalhista ingls, encabeado por Blair, contribuiu para a sua desestruturao
ao retirar do ncleo do partido os sindicatos dos trabalhadores, dando
continuidade s reformas liberalizantes de Thatcher. Alm disso,na avaliao
sobre o perodo do nacional desenvolvimentismo se destaca o no
desenvolvimento do estado de bem estar no Brasil, mas a cesso de direitos
trabalhistas pelo governo. (ANTUNES, 2009).
Mesmo com a tendncia para a reduo de gastos sociais, como ficou
demonstrado, no que tange aos gastos do MPA desde a sua criao, na
prestao de contas ao Congresso Nacional em 2008, j citado, o aumento da
dotao oramentria tem se dado ano a ano de modo expressivo, mesmo
sendo o MPA o ministrio com o menor oramento at o momento.
Diferentemente de governos nos dois ltimos perodos anteriores, desde o
governo empossado em 10 de janeiro de 2003, reeleito e reempossado em 10
de janeiro de 2007, at o governo subsequente iniciado em primeiro de janeiro
de 2011, a poltica para a gesto da pesca de mbito nacional vem se
modificando de modo significativo e sendo includa no processo de polticas
pblicas e no mbito social inclusive.
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A Safra da Pesca18, um plano para desenvolver as atividades de pesca e
aquicultura foi lanado com uma previso oramentria de cerca R$ 4,1 bilhes
para viabilizar crditos e investimentos nos planos, programas, projetos e
aes sobre a atividade pesqueira em todo o territrio nacional. O foco desse
plano est na atividade aqucola devido o seu potencial de crescimento e o
modelo de apoio tcnico j estruturado para o pequeno produtor rural, mas, a
Pesca Artesanal tambm se beneficia desse plano.
O segundo ponto que destaca Arretche (2004) sobre as caractersticas
do estado federalista a sobreposio de reas de governo. Esse um fato
que se nota no desenvolvimento da atividade da gesto da pesca no Brasil. A
unio planeja em nvel nacional e regional, assim o Ministrio da Pesca e
Aquicultura est estabelecido diretamente dentro dos Est