sistema de seguranÇa portuÁria - cÓdigo...
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Universidade Federal do Rio de Janeiro
SISTEMA DE SEGURANÇA PORTUÁRIA - CÓDIGO ISPS
Diogo Araujo de Lima
Rio de Janeiro
2019
ii
SISTEMA DE SEGURANÇA PORTUÁRIA - CÓDIGO ISPS
Diogo Araujo de Lima
Projeto de Graduação apresentado ao Curso
de Engenharia Naval e Oceânica da Escola
Politécnica, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos necessários
à obtenção do título de Engenheiro.
Orientador: Marta Cecilia Tapia Reyes
Rio de Janeiro
Maio 2019
iii
Sistema de segurança portuária - Código ISPS
Diogo Araujo de Lima
PROJETO DE GRADUAÇÃO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO
CURSO DE ENGENHARIA NAVAL E OCEÂNICA DA ESCOLA POLITÉCNICA
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS
REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE
ENGENHEIRO NAVAL E OCEÂNICO.
Examinado por:
Orientador:
_______________________________________________________
_______________________________________________________
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RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL
Maio de 2019
iv
RESUMO
LIMA, D. A. DE. Sistema de segurança portuária - Código ISPS. 2019.
Projeto de Graduação. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro.
Após os ataques terroristas ocorridos em 11 de setembro de 2001, nos
Estados Unidos, a Organização Marítima Internacional (IMO) consultou os
Governos Membros quanto à necessidade de revisar as medidas já adotadas
pela própria IMO para combater atos de violência e crime no mar. Dentre as
medidas adotadas, o Código Internacional para Proteção de Navios e
Instalações Portuárias (Código ISPS) assumiu posição de destaque em relação
aos procedimentos de proteção abordo dos navios e nas instalações portuárias.
O Brasil se comprometeu internacionalmente a aderir às novas medidas
de proteção marítima, com o objetivo de estar preparado para fazer frente às
ameaças ao transporte marítimo internacional, principalmente levando em conta
que a troca comercial através dos mares corresponde a uma grande parte das
exportações e importações do país.
O presente trabalho inicialmente discute o conceito de “proteção”,
apresenta o histórico das medidas internacionais de proteção, destacando a
correlação entre os tratados e convenções internacionais e a correspondente
internalização na legislação e regulamentação nacional. Em seguida, o Código
ISPS é apresentado em paralelo às medidas decorrentes tomadas pelo Estado
brasileiro, com foco no impacto das novas práticas impostas pelo Código ISPS
sobre o desenvolvimento do comércio internacional brasileiro.
Diogo Araujo de Lima
Maio/2019
Orientador: Marta Cecilia Tapia Reyes
Curso: Engenharia Naval e Oceânica
Palavras chave: Código ISPS, Proteção e Segurança Marítima, Transporte
Marítimo Internacional
v
ABSTRACT
LIMA, D. A. DE. Port facility security system - ISPS Code. 2019. Graduation
Project. Federal University of Rio de Janeiro. Rio de Janeiro.
After the terrorist attacks on September 11th, 2001, in the United States of
America, the International Maritime Organization (IMO) consulted the Member
States about the need of reviewing the measures already adopted, created by
IMO itself, to combat acts of violence and crime at sea. Among the adopted
measures, the International Ship and Port Facility Security Code (ISPS Code)
had taken the lead in security procedures on board of ships and at port facilities.
Brazil internationally committed to adhere the new measures of maritime
security, aiming to be prepared to deal with the threats in international maritime
transportation, considering that the commercial trade by the sea corresponds to
a significant part of the country’s importations and exportations.
This work initially discusses the concept of “security”, presents the history
of the international security measures highlighting the correlation of the
international treaties and conventions with the corresponding internalization on
Brazilian legislation and regulation. Then, the ISPS Code is presented alongside
the following measures taken by the Brazilian state, focusing on the impact of the
new practices imposed by the ISPS Code on the Brazilian international trade
development.
Diogo Araujo de Lima
May/2019
Advisor: Marta Cecilia Tapia Reyes
Graduation: Oceanic and Naval Engineering
Keywords: ISPS Code, Maritime Security, International Maritime Transportation
vi
Lista de Figuras
Figura 1 - Piratas na Somália ............................................................................ 4
Figura 2 - Drogas colocadas em contêineres no Porto de Santos ..................... 6
Figura 3 - Clandestino sobre o leme de um navio .............................................. 7
Figura 4 - Contêiner com lacre .......................................................................... 7
Figura 5 - Detonação de explosivos .................................................................. 8
Figura 6 - N/M Santa Maria ............................................................................... 9
Figura 7 - N/M Anzoátegui ............................................................................... 10
Figura 8 - N/M Columbia Eagle ....................................................................... 10
Figura 9 - N/M Achille Lauro ............................................................................ 11
Figura 10 - N/M Avrasya .................................................................................. 12
Figura 11 - N/M Alondra Rainbow .................................................................... 13
Figura 12 - USS Cole ...................................................................................... 14
Figura 13 - N/T Limburg .................................................................................. 16
Figura 14 - Superferry 14................................................................................. 16
Figura 15 - VLCC M Star ................................................................................. 17
Figura 16 - Sede da IMO em Londres ............................................................. 18
Figura 17 - Resolução A.584(14) ..................................................................... 20
Figura 18 - MSC/Circ.443 ................................................................................ 20
Figura 19 - Convenção SUA ............................................................................ 21
Figura 20 - Resolução A.924(22) ..................................................................... 22
Figura 21 - Convenção SOLAS ....................................................................... 23
Figura 22 – Movimentação portuária total (em toneladas). .............................. 26
Figura 23 – Histórico de apreensão de cocaína no Porto de Santos. .............. 28
Figura 24 - Código ISPS .................................................................................. 29
Lista de Quadros
Quadro 1 – Comércio internacional de mercadorias do Brasil (milhões de
dólares)....................................................................................................................... 26
Quadro 2 – Histórico de incidentes de proteção no Brasil................................ 27
vii
Lista de siglas e abreviações
AIS Automatic Identification System
AJB Águas Jurisdicionais Brasileiras
ANTAQ Agência Nacional de Transportes Aquaviários
CCA Comissão Coordenadora dos Assuntos da Organização Marítima Internacional
CESPORTOS Comissões Estaduais de Segurança Pública nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis
CONPORTOS Comissão Nacional de Segurança Pública nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis
CSO Company Security Officer
CSR Registro contínuo de dados
DoS Declaration of Security
ICC International Chamber of Commerce
ILO International Labour Organization
IMB International Maritime Bureau
IMCO Inter-Governmental Maritime Consultative Organization
IMO International Maritime Organization
ISPS International Ship and Port Facility Security
MSC Maritime Safety Committee
NORMAM Normas da Autoridade Marítima
ONU Organização das Nações Unidas
PFSA Port Facility Security Assessment
PFSO Port Facility Security Officer
PFSP Port Facility Security Plan
ROIP Registro de Ocorrência de Incidente de Proteção
RPB Representação Permanente do Brasil
RSO Recognized Security Organizations
SEC Secretaria Executiva da Comissão
SOLAS Safety of Life at Sea
SSO Ship Security Officer
SUA Suppression of Unlawful Acts
UNCLOS United Nations Convention on the Law of the Sea
UNCTAD United Nations Conference on Trade and Development
viii
Sumário 1. Introdução ................................................................................................... 1
2. Conceitos .................................................................................................... 3
2.1. Segurança e Proteção ......................................................................... 3
2.2. Ameaças à proteção marítima.............................................................. 3
2.2.1. Pirataria e roubo armado contra navios .......................................... 4
2.2.2. Terrorismo ...................................................................................... 4
2.2.3. Pirataria e terrorismo ...................................................................... 5
2.2.4. Contrabando ou descaminho .......................................................... 5
2.2.5. Clandestinos e refugiados............................................................... 6
2.2.6. Roubo de carga .............................................................................. 7
2.2.7. Danos colaterais ............................................................................. 7
3. Histórico de incidentes da proteção marítima .............................................. 9
3.1. Santa Maria (1961) .............................................................................. 9
3.2. Anzoátegui (1963) ................................................................................ 9
3.3. Columbia Eagle (1970) ...................................................................... 10
3.4. Achille Lauro (1985) ........................................................................... 11
3.5. Avrasya (1996) ................................................................................... 11
3.6. Petro Ranger (1998) .......................................................................... 12
3.7. Alondra Rainbow (1999)..................................................................... 13
3.8. USS Cole (2000) ................................................................................ 13
3.9. Inabukwa (2001) ................................................................................ 14
3.10. Han Wei (2002) .............................................................................. 15
3.11. Limburg (2002) ............................................................................... 15
3.12. Superferry 14 (2004)....................................................................... 16
3.13. M Star (2010).................................................................................. 16
4. Organização Marítima Internacional .......................................................... 18
4.1. Reação da IMO aos incidentes de proteção marítima ........................ 19
4.1.1. A Conferência Diplomática SOLAS 2002 ...................................... 22
5. Segurança e proteção do transporte marítimo no Brasil ............................ 25
5.1. Internalização ..................................................................................... 25
5.2. Relevância do transporte marítimo para o Brasil ................................ 26
5.3. Incidentes de proteção no Brasil ........................................................ 27
6. O Código ISPS .......................................................................................... 29
6.1. Responsabilidades dos Governos Contratantes ................................. 29
6.1.1. Autoridade Marítima ...................................................................... 30
6.1.2. Autoridade Designada .................................................................. 30
ix
6.1.3. Organização de Segurança (RSO) ............................................... 31
6.1.4. Estabelecimento de Níveis de proteção ........................................ 31
6.1.5. Declaração de Cumprimento ........................................................ 32
6.2. Responsabilidades das Instalações Portuárias .................................. 33
6.2.1. Responsabilidades do Supervisor de Segurança Portuária (PFSO)
33
6.2.2. Estudo de Avaliação de Risco das Instalações Portuárias (PFSA) 34
6.2.3. Plano de Segurança Portuária (PFSP).......................................... 35
6.2.4. Registro de Ocorrência de Incidente de Proteção (ROIP) ............. 36
6.3. Declaração de Proteção (DoS) ........................................................... 36
6.4. Declaração de Ciência ....................................................................... 37
6.5. Medidas típicas de proteção para instalações portuárias ................... 37
6.5.1. Acesso às instalações portuárias .................................................. 37
6.5.2. Áreas de acesso restrito dentro das instalações portuárias .......... 38
6.5.3. Manuseio de cargas...................................................................... 38
6.5.4. Entrega das provisões de navios .................................................. 38
6.5.5. Manuseio de bagagens desacompanhadas .................................. 38
6.5.6. Monitoramento da proteção das instalações portuárias ................ 38
7. Conclusão ................................................................................................. 40
8. Bibliografia ................................................................................................ 43
1
1. Introdução
A indústria marítima é responsável por mais de 80% do comércio global para
pessoas e comunidades ao redor do mundo. A navegação é o método internacional de
transporte mais eficiente e de melhor viabilidade econômica para a maioria dos bens.
Confiável, de baixo custo, facilita o comércio e ajuda a gerar prosperidade entre as
nações.
Porém, historicamente, as indústrias portuária e de navegação têm
experimentado altos níveis de atividade criminosa, particularmente contrabando, roubos
e furtos, que tem impedido o desenvolvimento de uma cultura positiva a favor da
proteção em indústrias marítimas.
A conscientização relativa à proteção marítima e o contínuo desenvolvimento de
uma cultura de proteção através das indústrias portuária e de navegação permanecem
um desafio constante para todos aqueles envolvidos na proteção de portos e navios.
Para tornar comércio e viagem pelo mar os mais seguros e protegidos possível,
no âmbito mundial, foram criadas exigências que estabeleceram novos paradigmas de
proteção para os navios e as instalações portuárias, disseminados pela Organização
Marítima Internacional (IMO) por meio do Código Internacional de Proteção para Navios
e Instalações Portuárias (Código ISPS).
O transporte marítimo tem grande influência na economia brasileira, pois a maior
parte das importações e exportações ocorre por via marítima, movimentando 375
bilhões de dólares, cerca de 18% do Produto Interno Bruto nacional.
Visando ampliar a participação no comércio exterior, o sistema portuário
brasileiro passou por mudanças. O Brasil, país Membro da IMO, internalizou e
implementou as medidas de proteção do Código ISPS para melhorar a operação
portuária e tornar seus portos mais competitivos e seguros.
É pertinente o estudo do tema da proteção marítima de uma maneira geral para
um maior entendimento do assunto. A análise da situação de proteção no Brasil se torna
relevante uma vez que o país busca expansão da economia nacional. O aprimoramento
da proteção portuária nacional é primordial para determinação pontos de melhoria e
possibilidades de expandir a atuação brasileira no transporte marítimo mundial, que,
consequentemente, aumentaria os números relativos às exportações e importações.
Assim sendo, o capítulo 2 expõe os conceitos de “proteção” e “segurança”, e
enumera as ameaças de proteção a serem combatidas no ambiente marítimo.
Em seguida, o capítulo 3 apresenta o histórico dos incidentes de proteção
marítima mais relevantes a nível mundial em ordem cronológica. Os eventos criminosos
2
relatados desencadearam a reação da comunidade internacional e criação das medidas
de proteção abordadas no capítulo 4.
O capítulo 5 explica o processo de internalização na legislação e
regulamentação nacional dos tratados e acordos internacionais. Também é discutida a
relevância do transporte marítimo para o Brasil e a situação nacional no contexto de
proteção marítima.
Em seguida, no capítulo 6, o Código ISPS é apresentado em paralelo às medidas
decorrentes tomadas pelo Estado brasileiro. Com foco no impacto das novas práticas
exigidas pelo Código ISPS sobre o desenvolvimento do comércio internacional
brasileiro, o capítulo 7, conclui com a necessidade de implementação efetiva das
Medidas de Proteção para o país.
O trabalho é finalizado com uma proposta de melhoria da metodologia do Estudo
de Avaliação de Risco das instalações portuárias.
3
2. Conceitos
2.1. Segurança e Proteção
Há dois termos em particular, “safety” (do latim salvus) e “security” (do latim
securus), que carregam significados claramente distintos no idioma inglês, mas que na
maioria das línguas neolatinas têm como tradução comum uma mesma palavra, que em
português é “segurança”, em francês “securité” e em espanhol “seguridad”.
Segundo o dicionário britânico “Cambridge Dictionary” [1] o significado de
“safety” é “a state in which or a place where you are safe and not in danger or at risk”.
Em tradução livre: um estado em que, ou um lugar onde, se está seguro e não em perigo
ou em risco. O significado de “security” segundo o mesmo dicionário é: “the protection
of people, organizations, countries, etc. against a possible attack or other crime”. Em
tradução livre: a proteção de pessoas, organizações, países, etc. contra um possível
ataque ou outro crime.
Segundo o dicionário norte-americano “Merriam-Webster” [2], o significado de
“safety” é: “the condition of being safe from undergoing or causing hurt, injury, or loss”.
Em tradução livre: a condição de estar livre de sofrer ou causar ferimento, lesão ou
perda. O significado de “security” é: “measures taken to guard against espionage or
sabotage, crime, attack, or escape”. Em tradução livre: medidas tomadas para proteção
contra espionagem, sabotagem, crime, ataque ou fuga.
Nas traduções oficiais do Código ISPS elaboradas pela Organização Marítima
Internacional (IMO) para os idiomas espanhol e francês, “safety" foi traduzido
respectivamente como “seguridad” e “securité”, enquanto “security” foi traduzido como
“protección” e “protection”. Seguindo a mesma linha, a Secretaria Executiva da
Comissão Coordenadora dos Assuntos da Organização Marítima Internacional do Brasil
(SEC-IMO) empregou na tradução do Código ISPS para o português, o termo
“segurança” na acepção de “safety” e o termo “proteção” na acepção de “security”.
Neste trabalho os termos “segurança” e “proteção” serão utilizados na mesma
acepção com que foram empregados pela SEC-IMO.
2.2. Ameaças à proteção marítima
No caso particular do Brasil, além da necessidade da percepção sobre a
realidade das questões atuais relativas às ameaças típicas à proteção marítima
(pirataria e roubo armado, terrorismo, contrabando ou descaminho, clandestinos e
refugiados, roubo de carga e danos colaterais), é importante continuamente reforçar a
conscientização dos perigos de uma atitude mental que coloque o problema da proteção
4
marítima no passado ou em algum outro lugar remoto do mundo em que estas ameaças
pareçam distantes ou irrelevantes para o país.
2.2.1. Pirataria e roubo armado contra navios
Pirataria e roubo armado contra navios ainda são ameaças presentes. Em linhas
gerais o que os diferencia é se ocorrem em águas internacionais ou territoriais.
“Pirataria” (Figura 1) foi definida pela Convenção das Nações Unidas sobre o
Direito do Mar, de 1982, (United Nations Convention on the Law of the Sea - UNCLOS),
artigo 101 [8], como algum dos seguintes atos:
– Atos ilegais de violência ou detenção ou qualquer ato de depredação cometido para
fins privados pela tripulação ou passageiros de uma embarcação privada ou
aeronave privada e conduzido em alto mar contra outra embarcação ou aeronave
ou contra pessoas ou propriedades a bordo de tal embarcação ou aeronave.
– Atos contra uma embarcação, aeronave, pessoa ou propriedade em um local fora
da jurisdição de qualquer Estado.
Figura 1 - Piratas na Somália
“Roubo armado contra navios” foi definido mais recentemente pelo Code of Practice for
the Investigation of the Crimes of Piracy and Armed Robbery Against Ships, adotado
pela Assembleia da IMO pela Resolução A.1025(26) [9], de 2009, como qualquer dos
seguintes atos:
– Qualquer ato ilegal de violência ou de detenção ou qualquer ato de depredação, ou
ameaça, que não seja um ato de pirataria, para fins privados, e dirigidos contra um
navio ou contra pessoas ou propriedade a bordo desses navios, dentro de águas
interiores de um Estado, águas arquipelágicas e no mar territorial;
– Qualquer ato de incitar ou facilitar intencionalmente a um ato descrito acima.
2.2.2. Terrorismo
A Organização das Nações Unidas (ONU) descreve terrorismo como “qualquer
ação que tem a intenção de causar morte ou sérios danos físicos a civis ou não-
combatentes, quando intuito de tal ato, por sua natureza ou contexto, é intimidar uma
5
população ou obrigar um Governo ou uma organização internacional a fazer ou se
abster de algum ato.”
Terrorismo normalmente envolve violência ou a ameaça de violência por parte
de grupos extremistas que procuram atingir objetivos políticos por outros meios que não
os democráticos.
Os métodos mais empregados por esses grupos para chamar atenção para suas
causas são: sequestro, uso de bombas ou ameaças de bombas. De modo crescente,
terroristas estão agindo em conexão com seitas religiosas que promovem
comportamento suicida.
2.2.3. Pirataria e terrorismo
A pirataria marítima torna-se atrativa para grupos terroristas porque navios
mercantes e suas cargas proporcionam uma fonte de recursos fácil, altamente lucrativa,
e à margem de esforços internacionais existentes para congelar as finanças do
terrorismo. Pouca regulamentação intergovernamental, quase ausência de capacidade
efetiva de policiamento naval, e a necessária adesão dos navios mercantes às rotas
marítimas internacionais propiciam um ambiente favorável à operação de piratas e
terroristas.
Navios mercantes são vulneráveis em áreas costeiras, quanto fundeados
próximo a instalações portuárias e quando atravessando canais e vias navegáveis em
baixa velocidade. Em áreas litorâneas, teoricamente, seriam mais fáceis de proteger,
uma vez que a maioria dos países assolados por piratas dispõem apenas de Marinhas
de águas rasas. Porém, a maioria desses governos não é capaz de competir com piratas
mais bem equipados, que possam dispor de lanchas mais modernas, armas
automáticas e comunicação sofisticada.
O vínculo entre a pirataria e o terrorismo proporciona aos grupos terroristas um
fluxo de caixa lucrativo, acesso a cargas perigosas, e meio de lançar ataques com
potencial para devastar a economia global. Esta aliança representa uma ameaça
assustadora nos mais diversos níveis à proteção mundial [3].
2.2.4. Contrabando ou descaminho
Contrabando, uma atividade criminosa, pode resultar em grande perda financeira
para o proprietário da embarcação que estiver sendo utilizada pelos contrabandistas.
Geralmente drogas são a mercadoria sendo contrabandeada e elas podem ser
trazidas para bordo de várias maneiras engenhosas tais como na bagagem, em
gêneros, sobre ou dentro do próprio corpo de uma pessoa ou em equipamentos
eletrônicos (Figura 2).
6
Armas também são itens frequentemente associados ao contrabando. Como as
drogas, armas também encontram seu caminho até a bordo de maneiras engenhosas,
tais como em contêineres de carga.
Figura 2 - Drogas colocadas em contêineres no Porto de Santos
2.2.5. Clandestinos e refugiados
Comandantes, proprietários (incluindo quaisquer pessoas ou partes agindo em
nome do proprietário da embarcação), autoridades portuárias, administrações
nacionais, e outras entidades incluindo operadores de proteção, todos têm
responsabilidade de cooperar para evitar o acesso ilegal a uma embarcação enquanto
estiver no porto.
Contudo, não importa quão eficaz sejam as rotinas de proteção do porto e da
embarcação, haverá ocasiões em que clandestinos terão acesso a embarcações, quer
estejam ocultos na carga, quer seja por embarque furtivo (Figura 3).
Um clandestino é definido como uma pessoa que está oculta em uma
embarcação ou na carga que será subsequentemente embarcada, sem o
consentimento do proprietário da embarcação, do comandante, ou qualquer outra
pessoa responsável, e que é detectada a bordo após a embarcação ter partido de um
porto e reportada pelo comandante às autoridades apropriadas como um clandestino.
Clandestinos chegando ou entrando em um país sem os documentos requeridos
são, em geral, migrantes ilegais.
Em circunstâncias normais, clandestinos devem, assim que for possível, ser
removidos da embarcação e devolvidos ao país de nacionalidade/cidadania, ou ao porto
de embarque, ou a qualquer outro país que os aceite.
7
Figura 3 - Clandestino sobre o leme de um navio
2.2.6. Roubo de carga
Roubo de carga, um problema muito antigo, continua a assolar a indústria
marítima e causa perdas financeiras em valores descomunais (Figura 4). Prevenção é
normalmente o método mais eficaz de se lidar com esta ameaça à proteção. Apesar de
poder não haver violência ou questões políticas envolvidas na maioria dos casos de
roubo de carga, este tema permanece no alto da lista de ameaças à proteção. A
associação entre roubo de carga e financiamento do terrorismo deve ser discutida. O
roubo de carga é apenas uma das várias ameaças à proteção da carga.
Figura 4 - Contêiner com lacre
2.2.7. Danos colaterais
Se define como dano colateral quando um incêndio, explosão (Figura 5) ou
ataque nas proximidades causa dano, mesmo que não-intencional, à embarcação ou
instalação portuária. Mesmo que algumas vezes os danos não sejam intencionais, os
prejuízos, não obstante, são reais. Há medidas que podem ajudar a minimizar as
consequências deste tipo de ameaça.
8
Figura 5 - Detonação de explosivos
9
3. Histórico de incidentes da proteção marítima
A história oferece uma clara ilustração do interesse de criminosos e terroristas
em alvos marítimos. A seguir serão apresentados incidentes notáveis que ajudam a ter
noção da seriedade e magnitude do problema de proteção em geral e da proteção em
ambiente marítimo, em particular.
3.1. Santa Maria (1961)
Em 23 de janeiro de 1961 o navio de cruzeiro português “Santa Maria” (Figura
6), levando passageiros que eram em sua maioria turistas norte-americanos, foi tomado
em La Guaira (Venezuela) por oposicionistas ao governo salazarista [3]. Os
revolucionários pretendiam dirigir-se a Benguela, a fim de ali se juntar à oposição
angolana e portuguesa, para proclamar a partir de Angola, um governo português no
exílio. Localizado por um avião de patrulha dos EUA, ao norte das Guianas, o Santa
Maria acabou por fundear no porto do Recife, onde todos os ocupantes foram
desembarcados. Os revolucionários negociaram a entrega do Santa Maria em troca de
asilo político em território brasileiro.
Este foi o primeiro incidente deste tipo e introduziu a prática, depois muito
difundida internacionalmente, de sequestrar navios e aviões com fins políticos.
Figura 6 - N/M Santa Maria
3.2. Anzoátegui (1963)
O cargueiro venezuelano “Anzoátegui” (Figura 7) com trinta e seis tripulantes foi
tomado ao largo da costa venezuelana, em fevereiro de 1963, por oito membros das
Forças Armadas Venezuelanas para Liberação Nacional, introduzidos a bordo pelo
segundo oficial de náutica.
Uma porta-voz em terra retransmitiu mensagens supostamente recebidas do
navio, nas quais os rebeldes ameaçavam explodir o navio caso sofressem qualquer
interferência.
10
Após sete dias o navio entrou no porto de Belém e os sequestradores receberam
asilo do Governo Brasileiro, citando como precedente o “Santa Maria”.
Figura 7 - N/M Anzoátegui
3.3. Columbia Eagle (1970)
O cargueiro “Columbia Eagle” (Figura 8), de bandeira norte-americana, foi
tomado por dois tripulantes durante uma viagem para a Tailândia com uma carga de
munições. Os dois tripulantes deram o alarme falso de que a espoleta de uma bomba
havia sido ativada para explodir, e vinte e quatro tripulantes abandonaram o navio.
Os treze restantes, incluindo o comandante e o operador rádio, foram separados
dos tripulantes em fuga e forçados sob mira de armas a desviar o navio para o Camboja.
O navio foi devolvido posteriormente, mas a ambos os amotinados foi dado asilo
no Camboja.
A tomada do navio não foi conduzida visando qualquer ganho financeiro privado
e, portanto, não pode ser corretamente denominada pirataria. A motivação foi
vagamente política, neste caso em oposição ao envolvimento dos EUA na guerra do
Vietnã.
Figura 8 - N/M Columbia Eagle
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3.4. Achille Lauro (1985)
Em outubro de 1985 o “Achille Lauro” (Figura 9) deveria atracar em Alexandria
(Egito) para que parte de seus passageiros fosse ao Cairo, e depois reembarcasse em
Port Said (Egito). Cerca de metade dos passageiros baixou terra.
Durante a viagem de Alexandria para Port Said, o navio foi tomado por cinco
terroristas palestinos em resposta a um ataque israelense ao quartel-general da OLP na
Tunísia.
Os terroristas executaram um idoso, americano, e o jogaram pela borda com sua
cadeira de rodas.
As autoridades egípcias deram permissão aos sequestradores para deixarem a
área sem serem incomodados, e o “Achille Lauro” logo chegou a Port Said. Os
sequestradores deixaram o navio, passaram a um rebocador e finalmente partiram
vitoriosos em um avião. Sobre a Sicília o avião foi interceptado por aeronaves
americanas e forçado a pousar.
O governo egípcio reteve o navio, em retaliação, por oito dias.
Figura 9 - N/M Achille Lauro
3.5. Avrasya (1996)
O ferry de passageiros “Avrasya” (Figura 10), de bandeira panamenha, foi
sequestrado no porto de Trabzon (Turquia) por nove homens em apoio a seus
camaradas chechenos envolvidos em combate em Pervomayskoye.
O ferry estava se preparando para partir em sua rotineira viagem noturna para
Sochi (Rússia) com uma lista de passageiros predominantemente de russos quando
homens, com armas e granadas, forçaram sua entrada a bordo, conduziram os
passageiros para o refeitório e o navio foi forçado a seguir para o mar. Os
sequestradores mantiveram o navio em águas territoriais turcas e não em alto-mar onde
seria provável uma retaliação armada russa.
12
O navio seguiu lentamente ao longo da costa turca do Mar Negro em direção a
Istambul, onde os homens armados ameaçaram destruir o navio com explosivos caso a
Rússia não levantasse o cerco aos 250 chechenos presos na vila de Pervomayskoye,
no Daguestão.
No final, o navio ficou sem comida e água e os sequestradores foram forçados a
ancorar próximo a Istambul onde quatro deles se renderam. Os cinco restantes foram
encontrados escondidos no navio.
Figura 10 - N/M Avrasya
3.6. Petro Ranger (1998)
Em abril de 1998, o navio-tanque “Petro Ranger”, bandeira de Cingapura,
suspendeu carregando óleo diesel e querosene de aviação, para entrega no Vietnã.
Além das águas territoriais de Cingapura, o comandante viu-se cercado no
passadiço por homens armados. Uma dúzia de piratas havia abordado o navio-tanque,
aparentemente a partir de uma pequena embarcação que a tripulação não viu.
Os piratas forçaram o pessoal de máquinas a mostrar-lhes como operar e
descarregar o navio. Eles ordenaram ao mestre que pintasse um novo nome sobre o
nome “Petro Ranger” e substituísse a bandeira de Cingapura pela de Honduras.
Dois navios-tanque chegaram na tarde seguinte, embarcaram a carga, e
partiram.
A guarda costeira chinesa interceptou o navio para uma inspeção de rotina. Os
chineses reuniram a tripulação no convés, mas nenhum deles falava inglês. Depois da
meia-noite, o comandante e um tripulante que falava um pouco de chinês conseguiram
chegar ao passadiço e explicaram aos guardas chineses que parte da tripulação e o
assim chamado comandante tinham sequestrado o navio.
Na manhã seguinte, um pequeno grupo da polícia chinesa abordou o navio para
prender os piratas e a tripulação.
13
A tripulação permaneceu sob custódia dos chineses por um mês, até que lhes
foi permitido partir. Os chineses confiscaram o que restou da carga – cerca de metade
de todo o combustível a bordo.
3.7. Alondra Rainbow (1999)
Em outubro de 1999 o navio de bandeira japonesa “Alondra Rainbow” (Figura
11), com uma tripulação de 15 filipinos e 2 japoneses, levando uma carga de lingotes
de alumínio, suspendeu do porto de Kualaí Tanjong (Indonésia) com destino ao Japão.
Em viagem, o navio foi atacado e abordado a força por piratas portando armas
de fogo. A tripulação foi vendada e deixada à deriva em uma balsa aberta. Por puro
acaso, após onze dias no mar, estes homens foram encontrados, por uma embarcação
tailandesa de pesca.
Foi disseminada uma mensagem referente ao navio desaparecido, suspeito de
ter sido vítima de pirataria, que poderia ter tido mudadas sua cor, nome e bandeira.
Em novembro, forças de superfície da Índia aproximaram-se do navio que, em
fuga, foi forçado a parar após ter sido engajado com armamento. O navio tivera o nome
alterado para “Mega Rama”, com a bandeira de Belize, e total transformação de suas
cores. Uma equipe de vistoria e inspeção da Guarda Costeira embarcou no navio para
verificar documentos, carga e identificação do pessoal a bordo.
Os piratas iniciaram um incêndio a bordo, que foi debelado, e ainda tentaram
afundar o navio com a abertura das válvulas da caixa do mar, mas foi percebida a
substancial entrada de água na praça de máquinas.
Figura 11 - N/M Alondra Rainbow
3.8. USS Cole (2000)
O contratorpedeiro USS Cole (Figura 12) tinha vindo para Aden, na ponta sul da
Península Arábica para reabastecer no caminho para se juntar a navios de guerra norte-
americanos que foram responsáveis pela execução das sanções comerciais contra o
14
Iraque. Foi programado para permanecer no porto por apenas quatro horas, indicando
que os terroristas tinham informações precisas sobre a visita não anunciada do navio
norte-americano ao posto de abastecimento de Aden.
Em 10 de junho de 2000, um bote de borracha motorizado carregado com
explosivos deflagrou uma enorme explosão que rasgou o costado de bombordo do Cole,
danificando compartimentos de máquinas, de recreação e alojamentos. Cerca de 17
marinheiros americanos foram mortos e 38 feridos no ataque.
O ataque foi realizado por dois terroristas suicidas alegadamente membros da
rede terrorista Al Qaeda.
Figura 12 - USS Cole
3.9. Inabukwa (2001)
Em março de 2001 o cargueiro “Inabukwa”, de bandeira japonesa, transitava por
águas da Indonésia com um carregamento de lingotes de estanho, zinco e pimenta
branca.
Pouco depois do crepúsculo, uma pequena lancha de madeira começou a seguir
o “Inabukwa”, sobre a esteira do cargueiro, no ponto cego do seu sistema radar.
A lancha emparelhou por bombordo do cargueiro, uma dúzia de homens subiu a
bordo e tomou de assalto o passadiço e o camarote do comandante.
O líder dos piratas ordenou que a tripulação do “Inabukwa” fosse deixada apenas
com as roupas de baixo e fosse vendada.
A tripulação foi deixada à noite sobre um recife de coral a poucos metros de uma
faixa desabitada de areia não muito maior que um campo de futebol, sem qualquer
vegetação além de alguns coqueiros.
O cargueiro seguiu para Salomague (Filipinas) uma remota vila de pescadores,
conhecida por ser um local apreciado por contrabandistas para desembarque de
motocicletas e produtos eletrônicos, para atracar e preparar para transferir a carga para
outro navio que estava aguardando fora do porto.
15
Quando o navio entrou no porto, a guarda costeira das Filipinas decidiu conduzir
uma inspeção de rotina e logo ficaram desconfiados. O novo nome “Chungsin” estava
grosseiramente escrito em tinta branca sobre o casco, enquanto que o nome em relevo
“Inabukwa” parecia ter sido apressadamente pintado por cima. O navio foi colocado sob
custódia e a tripulação foi presa.
3.10. Han Wei (2002)
Em março de 2002, O navio-tanque “Han Wei”, registrado em Belize,
transportando gasóleo marítimo com destino a Myanmar, desapareceu dois dias após
partir de Cingapura.
Os tripulantes a bordo do navio, onze indonésios e dois taiwaneses, deixados
em um bote, foram resgatados por barcos de pesca em águas da Indonésia, próximo ao
norte de Sumatra, e conseguiram chegar à terra logo após o sequestro.
O navio foi encontrado no Golfo da Tailândia, a cerca de 50 milhas de Bangkok,
abandonado, vazio e sem nenhum tripulante a bordo.
A polícia marítima, com apoio aéreo de um helicóptero da Marinha abordou o
navio, a equipe de buscas não encontrou qualquer evidência de violência, mas o navio
originalmente branco e preto fora repintado e renomeado “Phae Tan”.
3.11. Limburg (2002)
Em outubro de 2002, o navio-tanque “Limburg” (Figura 13), de bandeira francesa,
um navio novo, de casco duplo, afretado pela empresa petrolífera Petronas, carregando
cerca de 400.000 barris de óleo cru do Irã para a Malásia, estava no Golfo de Aden ao
largo do Iêmen para receber outro carregamento de óleo.
Enquanto o “Limburg” estava recebendo o prático para guiá-lo até o terminal,
uma pequena embarcação em alta velocidade, carregada de explosivos, abalroou o
casco por boreste do navio e detonou.
O navio pegou fogo e aproximadamente 90,000 barris de óleo vazaram para o
Golfo de Aden. Incapaz de controlar o fogo, a tripulação abandonou o navio. Um
tripulante morreu e 12 tripulantes ficaram feridos.
16
Figura 13 - N/T Limburg
3.12. Superferry 14 (2004)
Em 27 de fevereiro de 2004, o ferry de passageiros Superferry 14 (Figura 14)
suspendeu de Manila em direção à cidade de Cagayan de Oro, nas Filipinas. Uma hora
depois de sua saída do porto, ocorreu uma explosão no interior da embarcação iniciando
um incêndio que veio a afundar o navio de passageiros. O comandante deu ordem de
abandonar o navio, e à medida que o fogo se espalhou, sobreviventes pularam ao mar
ou embarcaram em botes salva-vidas.
O ataque ao SuperFerry 14 contabilizou 116 vítimas fatais, o mais mortal ataque
terrorista no mar.
Figura 14 - Superferry 14
3.13. M Star (2010)
Ataque ao superpetroleiro M Star (Figura 15) ocorreu com uma explosão em 27
de julho de 2010 enquanto a embarcação seguia em direção ao Estreito de Ormuz.
17
A explosão deixou uma enorme mossa no casco da embarcação, danificou
corredores e dormitórios. Não houve vazamento de petróleo da embarcação e apensar
um tripulante ficou levemente ferido.
Um grupo militante ligado ao grupo Al-Qaeda assumiu responsabilidade pelo
ataque, justificando-o como vingança à prisão, nos Estados Unidos, de Omar Abdel
Rahman, um líder religioso condenado por conspiração e ataques de bombardeios.
Figura 15 - VLCC M Star
18
4. Organização Marítima Internacional
A Organização Marítima Internacional (International Maritime Organization –
IMO), é a agência especializada da Organização das Nações Unidas (ONU) responsável
pela proteção, segurança e eficiência da navegação e prevenção da poluição marinha
por navios. A IMO tem por missão implementar a regulamentação adequada a garantir
um transporte marítimo seguro, protegido e eficiente sobre oceanos cada vez mais
limpos.
Figura 16 - Sede da IMO em Londres
Devido à natureza internacional da indústria marítima, sempre se soube que
reforçar a segurança no mar através do desenvolvimento de regulamentações a nível
internacional a serem seguidas por todas as nações navegadoras seria mais eficaz do
que medidas individuais de países agindo unilateralmente e sem coordenação.
Nesse contexto, em 1948, uma conferência internacional em Genebra adotou
uma convenção que estabeleceu formalmente o primeiro órgão internacional voltado
exclusivamente às questões marítimas, sob o nome de Organização Consultiva
Marítima Intergovernamental (Inter-Governmental Maritime Consultative Organization –
IMCO). Em 1982 seu nome foi modificado para Organização Marítima Internacional
(IMO) que permanece até os dias de hoje.
No período de 10 anos entre a adoção da convenção e sua entrada em vigor,
em 1958, outros problemas relacionados à segurança chamaram atenção da IMO.
Desde seu começo, a melhoria da segurança marítima e a prevenção da poluição
marinha têm sido os seus objetivos mais importantes. No início dos anos 2000, proteção
marítima se tornou outro grande foco para a Organização.
A primeira tarefa da IMO quando de sua criação, foi atualizar a Convenção
Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (Safety of Life at Sea –
19
SOLAS Convention) o primeiro e, até hoje, o mais importante tratado internacional
relacionado à segurança marítima.
A IMO mantem em seu propósito fazer as trocas comerciais e as viagens através
dos mares o mais seguro e protegido possível. Para gerenciar e mitigar qualquer
ameaça com o potencial de comprometer a proteção marítima a IMO desenvolveu
regulamentações e orientações apropriados.
Muitos outros instrumentos foram adotados para desenvolver uma estrutura
específica de modo a permitir a colaboração de partes interessadas, países recipientes,
organizações regionais e outros para assegurar a segurança e proteção de portos,
ancoradouros e instalações offshore; e para enfrentar a pirataria, o roubo armado contra
navios e outras atividades ilícitas.
A IMO é uma organização técnica e a maior parte de seu trabalho é cumprido
por seus comitês e subcomitês. O Comitê de Segurança Marítima (Maritime Safety
Committee – MSC) é um dos principais órgãos, juntamente com a Assembleia da IMO
e o Conselho, criados na convenção em 1948. Atualmente, o MSC lida com todas as
questões relativas à segurança da navegação, bem como aborda assuntos de proteção
marítima, pirataria e roubo armado contra navios.
Com sede em Londres (Figura 16), o inglês é o idioma de trabalho predominante
na IMO, além do inglês são também idiomas de trabalho da IMO o espanhol e o francês.
Todos os documentos da IMO são traduzidos para os três idiomas de trabalho. Os
idiomas oficiais da IMO, no entanto, são seis: além do inglês, espanhol e francês,
também o árabe, o chinês, e o russo. Todos os relatórios dos Comitês, as Resoluções
de Assembleia e as Decisões do Conselho são traduzidas para todos estes seis idiomas.
4.1. Reação da IMO aos incidentes de proteção marítima
Em 1985, cerca de um mês após o incidente com o Achille Lauro, a Assembleia
da IMO adotou a Resolução A.584(14) [4] “Measures to prevent unlawful acts which
threaten the safety of ships and the security of their passengers and crews” (Medidas
para impedir atos ilícitos que ameacem a segurança de navios e a proteção de seus
passageiros e tripulantes) (Figura 17). A Resolução determinava que o Comitê de
Segurança Marítima da IMO (Maritime Safety Committee – MSC) desenvolvesse,
baseado em prioridades, medidas técnicas que fossem detalhadas e práticas, tanto a
bordo quanto em terra, para assegurar a proteção de passageiros e tripulantes em
navios.
20
Figura 17 - Resolução A.584(14)
Assim em 1986, levando também em consideração o pedido da Assembleia
Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) para estudar o problema do terrorismo
a bordo de navios e fazer recomendações de medidas apropriadas, o Comitê de
Segurança Marítima emitiu a Circular MSC/Circ.443 “Measures to prevent unlawful acts
against passengers and crews on board ships” [5] (Medidas para impedir atos ilícitos
contra passageiros e tripulantes a bordo de navios) (Figura 18) que estabelece que
Governos, autoridades portuárias, administrações, proprietários, comandantes e
tripulantes devem tomar medidas apropriadas para impedir atos ilícitos que possam
ameaçar passageiros e tripulantes.
Figura 18 - MSC/Circ.443
Em março de 1988 foi realizada em Roma uma Conferência Diplomática que
adotou a Convenção para a Supressão de Atos Ilícitos Contra a Segurança da
Navegação Marítima (Suppression of Unlawful Acts – SUA) (Figura 19). O propósito
21
principal da Convenção SUA é assegurar que sejam tomadas ações apropriadas contra
pessoas que cometam atos ilícitos contra navios. Estes incluem a tomada a força de
navios; atos de violência contra as pessoas a bordo de navios; e a colocação a bordo
de um navio de dispositivos passíveis de destruí-lo ou danificá-lo. A Convenção SUA
entrou em vigor em 1992 e passou a obrigar os Governos contratantes a extraditar ou
processar os supostos transgressores. Em outubro de 2005 teve lugar uma nova
Conferência Diplomática que revisou e atualizou a Convenção SUA.
Figura 19 - Convenção SUA
Após os eventos de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, governos ao
redor do mundo rapidamente começaram a avaliar suas vulnerabilidades frente a grupos
terroristas altamente organizados, desejosos de sacrificar milhares de vidas para
alcançar seus objetivos. O risco do mega-terrorismo repentinamente tornou-se bastante
real, e aos olhos das agências de proteção (security) de todo o mundo o sistema de
transporte marítimo se destacou como um possível alvo principal e/ou como vetor da
atividade terrorista. Nesta mesma linha, em novembro de 2001, a Assembleia da IMO
adotou a Resolução A.924(22) “Review of measures and procedures to prevent acts of
terrorism which threaten the security of passengers and crews and the safety of ships”
[6] (Revisão das medidas e procedimentos para evitar atos de terrorismo que afetem a
proteção de passageiros e tripulantes e a segurança de navios) (Figura 20) que
conclamava a uma revisão das medidas legais e técnicas internacionais existentes para
impedir e suprimir atos terroristas contra navios no mar e no porto, e para aperfeiçoar a
proteção (security) a bordo e em terra. O objetivo era reduzir riscos para embarcações
e sua carga, passageiros, tripulantes, pessoal portuário a bordo de navios e em áreas
do porto, e também para intensificar a proteção geral dos navios e nos portos, de modo
a gerir e minimizar a possibilidade de o transporte marítimo se tornar um alvo do
terrorismo internacional.
22
Figura 20 - Resolução A.924(22)
4.1.1. A Conferência Diplomática SOLAS 2002
Como resultado da adoção da Resolução A.924(22), uma Conferência
Diplomática sobre Proteção Marítima (Conferência SOLAS 2002) foi realizada na sede
da IMO, em Londres, em dezembro de 2002.
A primeira versão da Convenção SOLAS foi adotada em 1914, em resposta ao
desastre do Titanic, a segunda em 1929, a terceira em 1948 e uma quarta em 1960. A
rapidez dos avanços tecnológicos na indústria marítima passou a demandar maior
agilidade na atualização da Convenção SOLAS. Com esta finalidade a versão de 1974
incluiu o chamado “procedimento de aceitação tácita”. Ele estabelece que uma emenda
à Convenção deverá entrar em vigor em uma data específica a menos que, antes dessa
data, objeções à emenda sejam recebidas de um número pré-estabelecido de países
membros.
A Convenção SOLAS (Figura 21) desde sua origem foi voltada exclusivamente
para a segurança (safety) de navios: estabelecimento dos padrões mínimos para sua
construção, para a dotação de equipamentos de segurança (safety), para os
procedimentos de emergência e para as inspeções e emissão de certificados para
navios.
23
Figura 21 - Convenção SOLAS
A Conferência Diplomática de 2002 além de adotar diversas emendas à
Convenção SOLAS na área de segurança (safety) desenvolveu um novo e abrangente
regime de proteção marítima (security) para navegação internacional.
Indo mais além, foi acordada a extensão da cobertura pela Convenção SOLAS
às instalações portuárias com base no fato de que, devido ao procedimento de aceitação
tácita de emendas, a Convenção SOLAS oferecia o meio mais rápido de garantir que
as medidas necessárias de proteção (security) entrassem em vigor e tivessem efeito
rapidamente. No entanto, também foi acordado na Conferência Diplomática que as
disposições da Convenção SOLAS relativas às instalações portuárias deveriam aplicar-
se somente à interface navio/porto.
Sob a Resolução 1 da Conferência Diplomática foram adotadas emendas à
Convenção SOLAS, incluindo disposições adicionais relativas à segurança (safety):
– Capítulo V – Segurança da navegação
Regra 19: Sistema Automático de Identificação (AIS)
– Capítulo XI – Medidas especiais para intensificar a segurança marítima (renumerado
para XI-1 após a revisão)
Regra 3: Número de identificação do navio
Regra 5: Registro contínuo de dados (CSR)
Um novo Capítulo foi acrescentado tratando exclusivamente de proteção (security):
– Capítulo XI-2 – Medidas especiais para intensificar a proteção marítima.
Ele introduziu o International Ship and Port Facility Security (ISPS) Code (Código
Internacional para a Proteção de Navios e Instalações Portuárias) [7] adotado pela
Resolução 2 da mesma Conferência Diplomática.
Essas Medidas de Proteção Marítima foram desenvolvidas em resposta à
percepção de ameaças terroristas. Contudo, em diferentes níveis, as medidas são
24
aplicáveis para fazer frente a outras formas de ameaças à proteção, notadamente
pirataria e roubo armado em águas internacionais e territoriais, e atividades ilícitas tais
como contrabando e tráfico de drogas nos portos.
25
5. Segurança e proteção do transporte marítimo no
Brasil
O Brasil é um país membro da IMO e junto a ela mantém uma Representação
Permanente sediada em Londres, a Representação Permanente do Brasil - RPB-IMO.
A estrutura governamental brasileira conta com uma Comissão Coordenadora dos
Assuntos da Organização Marítima Internacional (CCA-IMO), criada em razão da
necessidade de internalização na legislação brasileira das normas regulamentadoras
internacionais adotadas pela IMO. A CCA-IMO faz parte da organização administrativa
do Comando da Marinha e é apoiada técnica e administrativamente pela Secretaria
Executiva da Comissão Coordenadora dos Assuntos da Organização Marítima
Internacional (SEC-IMO), sediada no Rio de Janeiro.
5.1. Internalização
Internalização é a adoção no ordenamento jurídico brasileiro de um tratado ou
acordo internacional firmado pelo Brasil e se processa da seguinte forma:
– O Presidente da República, ou um Ministro de Estado com poderes
plenipotenciários, firma o tratado internacional.
– Posteriormente o Congresso Nacional aprecia o tratado ou acordo, pois detém
competência exclusiva para tanto. No Congresso, cada uma das Casas discute e
vota o documento e, caso aprovado, é editado um Decreto Legislativo.
– Editado o Decreto Legislativo, o Presidente da República pode ratificar perante o
outro país signatário ou órgão internacional aquele tratado ou acordo inicial. A partir
deste momento o Brasil se obriga internacionalmente.
– Internamente, o tratado ou acordo internacional só gerará efeitos a partir da
expedição de um Decreto Presidencial. Tratados ou acordos internacionais têm
natureza jurídica de lei ordinária e estão posicionados hierarquicamente abaixo da
Constituição Federal, no mesmo patamar das Leis Complementares, Leis
Delegadas e Medidas Provisórias.
No caso das Convenções e Protocolos da IMO e suas Emendas, para que
possam ser apreciadas no Congresso Nacional, é elaborada pela SEC-IMO uma
sugestão de tradução para o português. A íntegra do texto, normalmente técnica, é
disponibilizada na página internet da SEC-IMO e publicada no Diário Oficial da União.
Como os Códigos contêm inúmeros termos em outros idiomas, para os quais não
existem traduções oficiais, por vezes esses termos são mantidos em inglês, ou mantidos
nos dois idiomas.
26
5.2. Relevância do transporte marítimo para o Brasil
O comércio mundial é dependente do transporte marítimo e grandes avanços
foram feitos ao longo dos anos para tornar este sistema tão aberto e sem pontos de
atrito quanto possível, de modo a incentivar um crescimento econômico cada vez maior.
Segundo o Handbook of Statistics 2018 [21] publicado pela Conferência das
Nações Unidas sobre o Comércio e o Desenvolvimento (United Nations Conference on
Trade and Development – UNCTAD), o transporte marítimo mundial movimentou 10,7
bilhões de toneladas em 2017. Um crescimento de 1,5 bilhões de toneladas desde 2012.
No caso específico do Brasil, as exportações por mar corresponderam a 83,5%
do total das vendas e as importações representaram 73,6% do total das compras
realizadas pelo país. De acordo com a UNCTAD [22], a movimentação brasileira
relacionada ao transporte marítimo de mercadorias em 2017 foi de mais de 375 bilhões
de dólares, o equivalente a 18% do PIB nacional daquele ano.
2005 2010 2015 2017
Exportação 118.529 201.915 191.134 217.756
Importação 77.628 191.537 178.832 157.502
Quadro 1 – Comércio internacional de mercadorias do Brasil (milhões de dólares).
Segundo dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), os resultados
da movimentação portuária, chegaram a mais de 1 bilhão de toneladas em 2018, como
mostrado na Figura 22.
Figura 22 – Movimentação portuária total (em toneladas).
0
200.000.000
400.000.000
600.000.000
800.000.000
1.000.000.000
1.200.000.000
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018
To
ne
lad
as
Movimentação portuária total
27
Os mesmos fatores que permitiram ao transporte marítimo internacional
contribuir para a prosperidade econômica também o tornam singularmente vulnerável à
exploração por grupos criminosos e/ou terroristas.
5.3. Incidentes de proteção no Brasil
Em sua grande maioria, os incidentes de proteção ocorridos em instalações
portuárias no Brasil não se refletem nas estatísticas das agências internacionais. Por
algum motivo incidentes de proteção, em geral fartamente divulgados na imprensa
nacional, aparentemente não chegam à Organização Marítima Internacional (IMO).
Geralmente, os eventos reportados são somente aqueles relativos a incidentes de
proteção ocorridos em navios quando ainda fundeados. Nessa situação os Oficiais de
Proteção do navio (SSO) são os responsáveis por reportar o ocorrido às suas
Administrações de Bandeira e à IMO.
De acordo com o International Maritime Bureau (IMB) [19], o histórico de
incidentes de proteção reportados em Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB) desde
2014 é mostrado no Quadro 2:
Quadro 2 – Histórico de incidentes de proteção no Brasil.
Os incidentes de proteção reportados para a IMO mais recentemente consistiram
em ataques armados contra navios no norte do país.
Outra grande preocupação é o tráfico internacional de drogas. Devido à
localização e fragilidade na implementação de medidas de proteção efetivas, os portos
brasileiros se tornaram grandes pontos de envio de drogas, principalmente cocaína
advinda de países vizinhos [20].
O Brasil, na dinâmica dos cartéis sul-americanos, tem simples função logística
de transporte e escoamento. Com isso, os portos brasileiros se tornaram vias
importantes para o tráfico de drogas para o México, os Estados Unidos, Europa, Ásia e
Número de incidentes
2010 9
2011 3
2012 1
2013 1
2014 1
2015 0
2016 0
2017 0
2018 4
28
África. Como o país tem grandes extensões de faixa de fronteira e monitoramento
precário, as drogas entram pela floresta Amazônica e seguem para os portos e assim,
são enviadas para os grandes centros de diferentes regiões do planeta.
De acordo com autoridades da Polícia Federal, da Receita Federal e do
Ministério Público, a principal rota do tráfico da cocaína que passa pelo Brasil começa
na fronteira do Peru com a Bolívia, então cruza o Paraguai e entra no Brasil pela
fronteira. De lá, segue escondida em veículos por rodovias brasileiras até pontos de
armazenagem ou portos importantes, como Santos (Estado de São Paulo), Itajaí
(Estado de Santa Catarina) e Paranaguá (Estado do Paraná).
Apesar falta de fiscalização nos portos brasileiros devido à grande quantidade
de carga que entra e sai do país diariamente, o aumento dos esforços da Polícia Federal
tem alavancado a quantidade de drogas apreendidas nos portos, como mostrado na
Figura 23.
Figura 23 – Histórico de apreensão de cocaína no Porto de Santos.
1,6
0,51
10,611,5
14
0
2
4
6
8
10
12
14
16
2013 2014 2015 2016 2017 2018
Cocaín
a (
em
tonela
das)
Apreensões no Porto de Santos
29
6. O Código ISPS
O Código ISPS (Figura 24) foi elaborado em pouco mais de um ano pelo Comitê
de Segurança Marítima (Maritime Safety Committee – MSC) da IMO e seu grupo de
trabalho sobre proteção marítima. O Código contém requisitos relativos à proteção para
Governos, Autoridades Portuárias e Companhias de navegação detalhados em uma
seção mandatória (Parte A), juntamente com uma série de diretrizes sobre como
satisfazer esses requisitos em uma segunda seção, não-mandatória (Parte B).
Devido à necessidade urgente da aplicação das medidas de proteção, o Código
ISPS entrou em vigor em 1º de julho de 2004, apenas 18 meses após sua adoção. A
partir de 2009, com o recrudescimento de outras ameaças, o foco da IMO começou a
migrar do terrorismo para abranger outras questões de proteção também prementes
(notadamente pirataria e roubo armado contra navios).
Assim, nos dias de hoje, o propósito fundamental do Código ISPS pode ser
considerado sendo a redução da vulnerabilidade da indústria marítima às ameaças à
proteção, independentemente de sua natureza.
O Código ISPS se aplica a navios de passageiros; a navios de carga, incluindo
embarcações de alta velocidade, a partir de 500 de arqueação bruta; a unidades móveis
de perfuração ao largo da costa (offshore); e às instalações portuárias que servem tais
embarcações envolvidas em viagens internacionais.
Figura 24 - Código ISPS
6.1. Responsabilidades dos Governos Contratantes
Um Governo Contratante significa um Governo que, tal como o Brasil, se
comprometeu a cumprir a Convenção SOLAS.
A maioria dos Governos teve que promulgar legislação nacional garantir pleno
efeito ao Capítulo XI-2 da Convenção SOLAS, “Medidas especiais para intensificar a
30
proteção marítima”, e ao Código ISPS, partes A e B (neste trabalho referidos em
conjunto como Medidas de Proteção Marítima). No caso do Brasil, o Decreto nº
6.869/2009 [10] estabelece a coordenação dos órgãos federais e a articulação com os
demais órgãos intervenientes, na adoção de medidas de prevenção e de resposta contra
possíveis incidentes de proteção envolvendo navios e instalações portuárias.
Os Governos têm autonomia para estender as provisões das Medidas de
Proteção Marítima a navios e instalações portuárias aos quais elas a princípio não se
aplicariam. Por outro lado, os Governos não podem adotar provisões legislativas cujo
efeito seja reduzir os requisitos impostos aos navios e instalações portuárias pelas
Medidas de Proteção Marítima.
6.1.1. Autoridade Marítima
No Brasil a Autoridade Marítima é exercida pelo Comando da Marinha (Lei nº
9.537/1997) [11]. Cabe à Autoridade Marítima promover a segurança do tráfego
aquaviário em águas sob jurisdição nacional, responsável, dentre outras atribuições,
pelo ordenamento e regulamentação das atividades da Marinha Mercante. Também é
responsável pela análise e aprovação dos planos de proteção dos navios de bandeira
brasileira.
As Normas da Autoridade Marítima (NORMAM-01/DPC) [12], capítulo 16,
estabelecem que o Código ISPS passou a ser aplicável também às embarcações que
operem na navegação de cabotagem e de apoio marítimo nas águas jurisdicionais
brasileiras (AJB) a partir de 31 de julho de 2009.
6.1.2. Autoridade Designada
Autoridade Designada significa a organização ou Administração, dentro do da
estrutura do Governo Contratante, identificada como responsável por assegurar a
implementação, sob ponto de vista da instalação portuária, das provisões das Medidas
de Proteção Marítima relativas à proteção das instalações portuárias e da interface
navio/porto. No ILO/IMO Code of Practice on Security in Ports (Código ILO/IMO de
Proteção Portuária) [13], o termo é usado para descrever a organização dentro do
Governo responsável pela proteção portuária.
No Brasil a Autoridade Designada é Comissão Nacional de Segurança Pública
nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis – CONPORTOS [14], vinculada ao Ministério
da Justiça e Segurança Pública. É apoiada a nível estadual pelas Comissões Estaduais
de Segurança Pública nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis (CESPORTOS).
Por sua origem vinculada à estrutura governamental de Segurança Pública, na
documentação da CONPORTOS não é observada a distinção entre “segurança” e
31
“proteção”, sendo o termo “segurança” utilizado indistintamente. Neste trabalho, para
melhor entendimento, sempre que isto ocorrer será citado entre parênteses o termo
“security”, ou a nomenclatura original correspondente em inglês grafada em itálico.
6.1.3. Organização de Segurança (RSO)
Em um número limitado de circunstâncias sob as Medidas de Proteção Marítima,
a Autoridade Designada pode autorizar Organizações de Proteção Reconhecida
(Recognized Security Organizations – RSO) para desempenhar algumas de suas
tarefas no âmbito da proteção em instalações portuárias.
Organização de Proteção Reconhecida significa uma organização com a
competência apropriada em questões de proteção e com o conhecimento pertinente em
operações de navio e porto que é autorizada a realizar, no caso de instalações
portuárias, uma avaliação de proteção ou preparar um plano de proteção.
No Brasil as RSO são denominadas Organizações de Segurança (Resolução
CONPORTOS nº 52/2018) [15]. São empresas credenciadas pela CONPORTOS para
elaborar Estudos de Avaliação de Risco e Planos de Segurança Portuária dos Portos
Organizados e instalações portuárias
6.1.4. Estabelecimento de Níveis de proteção
As Medidas de Proteção Marítima requerem que os Governos Contratantes
reúnam e avaliem informações relativas a ameaças à proteção que possam ocorrer em
uma instalação portuária, a bordo, ou contra um navio SOLAS. Este processo é
essencial para permitir às autoridades nacionais estabelecerem o nível de proteção
apropriado a ser aplicado em suas instalações portuárias e nos navios que arvoram
suas bandeiras.
O termo “nível de proteção” se refere ao grau de risco de um incidente de
proteção ocorrer ou ser tentado. As Medidas de Proteção Marítima identificam três
níveis de risco que são usados internacionalmente. No Brasil os níveis de proteção
estão definidos no Decreto nº 6.869/2009 [10].
Nível um de proteção significa o nível para o qual medidas mínimas adequadas
de proteção deverão ser mantidas durante todo o tempo.
Nível dois de proteção significa o nível para o qual medidas adicionais
adequadas de proteção deverão ser mantidas por período de tempo como resultado de
um risco mais elevado de um incidente de proteção. Compete aos Coordenadores das
CESPORTOS elevar para o nível dois o nível de proteção das instalações portuárias
em seus respectivos estados. Compete à Marinha do Brasil elevar para o nível dois de
proteção dos navios de bandeira brasileira, quando necessário.
32
Nível três de proteção significa o nível para o qual medidas adicionais específicas
de proteção deverão ser mantidas por período limitado de tempo quando um incidente
de proteção for provável ou iminente, embora possa não ser possível identificar o alvo
específico. Compete ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da
República determinar a alteração para o nível três de proteção dos navios de bandeira
brasileira e das instalações portuárias, quando julgar necessário.
No Brasil, de acordo com a Resolução CONPORTOS nº 52/2018 [14], cabe ao
Coordenador de cada CESPORTOS notificar, formalmente, os Supervisores de
Segurança Portuária (PFSO) sobre quaisquer mudanças nos níveis de proteção,
utilizando os meios de comunicação mais ágeis.
Cabe aos Supervisores de Segurança Portuária (PFSO) informar aos navios, de
acordo com as diretrizes do Coordenador das CESPORTOS, qualquer mudança
subsequente nas medidas de segurança, no nível de segurança da instalação portuária
à qual se destina o navio, bem como transmitir quaisquer informações relevantes
relativas à proteção.
6.1.5. Declaração de Cumprimento
Apesar de não ser mandatória sob as Medidas de Proteção Marítimas, a
Autoridade Designada pode emitir uma Declaração de Cumprimento (Statement of
Compliance) para uma instalação portuária [16].
Uma Declaração de Cumprimento não deve ser emitida a não ser que a
Autoridade Designada confirme que:
– A instalação portuária tem o Estudo de Avaliação de Riscos (PFSA) realizado, ou
aprovada, pela Autoridade Designada;
– A instalação portuária tem um Plano de Segurança Portuária (PFSP) devida e
formalmente aprovada pela Autoridade Designada;
– Os funcionários da Unidade de Segurança da instalação portuária receberam
treinamento necessário e podem implementar os procedimentos contidos no Plano
de Segurança Portuária (PFSP) aprovado, e;
– Todo equipamento de proteção especificado no Plano de Segurança Portuária
(PFSP) está instalado e efetivamente operando.
No Brasil, de acordo com a Resolução CONPORTOS nº 52/2018, a Declaração
de Cumprimento é o documento por meio do qual o Governo Brasileiro certifica que a
instalação portuária cumpre as disposições do Capítulo XI-2 e da Parte A do Código
ISPS e o previsto no seu Plano de Segurança Portuária (PFSP) aprovado pela
CONPORTOS.
33
Ainda de acordo com a Resolução CONPORTOS nº 52/2018, somente uma
instalação portuária que possua a Declaração de Cumprimento poderá expedir, quando
solicitada por um navio, uma Declaração de Proteção (DoS).
6.2. Responsabilidades das Instalações Portuárias
Um dos fatores fundamentais para implementação bem-sucedida das Medidas
de Proteção Marítima é a identificação pela Autoridade Designada de quais instalações
portuárias estão sujeitas às Medidas de Proteção Marítima e até que ponto elas aplicam
às instalações que ocasionalmente servem navios em viagens internacionais [16].
No Brasil, o Decreto nº 6.869/2009 define "instalação portuária" como sendo um
local, como estabelecido pela Autoridade Designada, em que ocorre a interface
navio/porto, abrangendo áreas como fundeadouros, fundeadouros de espera e vias de
acesso provenientes do mar, como for adequado.
O Decreto também define a "interface navio/porto" como sendo as interações
que ocorrem quando um navio é afetado direta e imediatamente por ações que
envolvam a movimentação de pessoas ou de mercadorias para o navio ou dele
proveniente, ou a prestação de serviços portuários ao navio.
A Resolução CONPORTOS nº 52/2018 estabelece que todas as instalações
portuárias que servem a embarcações envolvidas em viagens internacionais e às quais
se aplica o Código ISPS, são obrigadas a designar um Supervisor de Segurança
Portuária (PFSO).
A CONPORTOS também pode determinar, mediante parecer de forma
fundamentada, que outras instalações portuárias sejam obrigadas a designar um
Supervisor de Segurança Portuária (PFSO).
6.2.1. Responsabilidades do Supervisor de Segurança Portuária (PFSO)
Supervisores de Segurança Portuária (Port Facility Security Officer – PFSO) são
nomeados e respondem à administração da instalação portuária, tendo um papel
essencial no estabelecimento e manutenção da proteção da instalação. Suas
responsabilidades abrangem a manutenção de comunicação eficaz sobre questões de
proteção com os Coordenadores de Proteção das Companhias de navegação
(Company Security Officers – CSO) e os Oficiais de Proteção (Ship Security Officers –
SSO) dos navios que estão utilizando, ou que pretendem utilizar, a instalação portuária
[17].
Supervisor de Segurança Portuária (PFSO) também é o responsável pela
implementação do Plano de Segurança Portuária (PFSP).
34
No Brasil, a Resolução CONPORTOS nº 52/2018 estabelece que apenas um
profissional devidamente capacitado conforme o Curso de Formação de Supervisor de
Segurança Portuária (ministrado exclusivamente pela própria CONPORTOS) está
habilitado a exercer as atribuições de Supervisor de Segurança Portuária, para executar
as tarefas e assumir as responsabilidades previstas no Código ISPS e nas Resoluções
da CONPORTOS.
6.2.2. Estudo de Avaliação de Risco das Instalações Portuárias (PFSA)
Os Governos, normalmente através de suas Autoridades Designadas, são
responsáveis por realizar Estudos de Avaliação de Risco das instalações portuárias
(Port Facility Security Assessment – PFSA) ou autorizar Organizações de Segurança
Reconhecidas (RSO) para executá-las em seu lugar. Na prática, a condução de um
Estudo de Avaliação de Risco requer o envolvimento dos Supervisores de Segurança
Portuária (PFSO) devido ao seu profundo conhecimento dos ativos da instalação
portuária, infraestrutura, vulnerabilidades e incidentes de proteção passados [16].
O Estudo de Avaliação de Risco (PFSA) pode ser considerado uma análise de
risco de todos os aspectos da operação da instalação portuária para determinar quais
partes são mais suscetíveis e com maior probabilidade de ser vulnerável.
O Estudo de Avaliação de Risco das instalações portuárias (PFSA) fornece
subsídios que permitem estabelecer medidas preventivas de proteção, que irão constar
dos Planos de Segurança Portuária (PFSP) e ser adotadas pelas Unidades de
Segurança para resguardar a instalação portuária, navios atracados ou fundeados em
áreas sob responsabilidade do porto organizado ou da instalação portuária, bem como
as pessoas contra incidentes de proteção, ilícitos e outras ameaças que coloquem em
risco a sua integridade física.
A aprovação dos Estudos de Avaliação de Risco das instalações portuárias
(PFSA) e posteriores emendas à avaliação aprovada é responsabilidade dos Governos
e não pode ser delegada.
No Brasil, o Estudo de Avaliação de Risco das instalações portuárias (PFSA) é
submetido diretamente à análise da CESPORTOS com jurisdição sobre a instalação
portuária, para análise da Comissão. Quando aprovado é encaminhado para a
homologação pela CONPORTOS.
O Estudo de Avaliação de Risco (PFSA) é parte integral e essencial do
desenvolvimento ou atualização do Plano de Segurança Portuária (PFSP).
35
6.2.3. Plano de Segurança Portuária (PFSP)
O Plano de Segurança Portuária (Port Facility Security Plan – PFSP) é
desenvolvido e mantido com base nos resultados aprovados dos Estudo de Avaliação
de Risco (PFSA) conduzidos em cada instalação portuária [16].
O Plano de Segurança Portuária (PFSP) deve conter medidas e procedimentos
de proteção abrangendo em detalhe:
– Organização e desempenho dos deveres relativos à proteção da instalação
portuária;
– Acesso à instalação portuária;
– Áreas de acesso restrito dentro da instalação portuária;
– Manuseio de cargas;
– Entrega das provisões dos navios;
– Manuseio de bagagens desacompanhadas;
– Monitoramento da proteção da instalação portuária;
– Diferentes níveis de proteção (se a instalação portuária estiver operando em um
nível de proteção mais baixo que o nível aplicável a um navio).
O Plano de Segurança Portuária (PFSP) é desenvolvido pelos Supervisores de
Segurança Portuária (PFSO) ou por Organizações de Segurança (RSO) em seu nome.
Mesmo quando Organizações de Segurança (RSO) estão agindo em seu nome, os
Supervisores de Segurança Portuária (PFSO) continuam sendo responsáveis por
assegurar que os Planos de Segurança Portuária (PFSP) sejam devidamente
preparados.
A aprovação do Plano de Segurança Portuária (PFSP) e posteriores emendas
ao plano aprovado é de responsabilidade dos Governos e não pode ser delegada a
Organizações de Segurança (RSO).
No Brasil, o Decreto nº 6.869/2009 [10] define Plano de Segurança das
instalações portuárias como sendo o plano elaborado para garantir a aplicação de
medidas criadas para proteger instalações portuárias e navios, pessoas, cargas,
unidades de transporte de cargas e provisões do navio dentro da instalação portuária
dos riscos de incidente de proteção.
De acordo com a Resolução CONPORTOS nº 52/2018 [15], o Plano de
Segurança Portuária (PFSP) tem por objetivo documentar a forma de aplicação das
medidas propostas para proteger instalações portuárias e navios, pessoas, cargas,
unidades de transporte de cargas e provisões do navio dentro da instalação portuária,
dos riscos de um incidente de proteção assinalados no Estudo de Avaliação de Risco
(PFSA), conforme definido no Código ISPS.
36
O Plano de Segurança Portuária (PFSP) deverá ser atualizado sempre que
houver atualização do Estudo de Avaliação de Risco (PFSA) ou recomendação formal
do Supervisor de Segurança Portuária, obedecendo ao trâmite de aprovação perante
as CESPORTOS e CONPORTOS.
Antes de sua aprovação e envio à CONPORTOS, as CESPORTOS deverão
fiscalizar in loco a implementação, eficiência e eficácia dos Planos de Segurança
Portuária (PFSP) das instalações portuárias de sua área de jurisdição.
6.2.4. Registro de Ocorrência de Incidente de Proteção (ROIP)
O Registro de Ocorrência de Incidente de Proteção (ROIP) é um documento que
não faz parte das Medidas de Proteção Marítimas internacionais.
No Brasil, o Decreto nº 6.869/2009 define incidente de proteção como sendo
qualquer ato suspeito ou situação que ameace a proteção de um navio, inclusive de
uma unidade móvel de perfuração “offshore”, de uma embarcação de alta velocidade,
de uma instalação portuária, de qualquer interface navio/porto, ou de qualquer atividade
de navio para navio.
A Resolução CONPORTOS nº 52/2018 estabelece que todos os incidentes de
proteção que interfiram diretamente nas operações portuárias ou ponham em risco a
estrutura da instalação, navio ou a integridade das pessoas deverão ser informados pelo
Supervisor de Segurança Portuária (PFSO) da instalação à CESPORTOS e à
CONPORTOS por meio de um Registro de Ocorrência de Incidente de Proteção (ROIP),
enviado por meio eletrônico.
Mesmo que não se configurem ilícitos penais, os incidentes de proteção,
incluindo as ocorrências com clandestinos, devem ser sempre registrados pela
instalação portuária através de ROIP.
6.3. Declaração de Proteção (DoS)
Uma Declaração de Proteção (Declaration of Security – DoS) é um acordo
celebrado entre uma instalação portuária e um navio visitando aquela instalação a
respeito de suas respectivas responsabilidades de proteção durante a visita. Os
requisitos para uma instalação portuária iniciar, preencher e reter uma Declaração de
Proteção (DoS) são estabelecidos pela Autoridade Designada e incluem as condições
sob as quais navios e instalações portuárias podem solicitar uma Declaração de
Proteção (DoS).
No caso do Brasil, é o documento por meio do qual uma instalação portuária e
um navio acordam as medidas de proteção, incluindo as adicionais, à luz do Código
37
ISPS e do previsto no Plano de Segurança Portuária (PFSP) da instalação portuária
aprovado pela CONPORTOS.
A Declaração de Proteção deverá conter os requisitos de segurança cujo
cumprimento poderá ser partilhado entre a instalação portuária e o navio, observado o
disposto no Capítulo XI-2 e na Parte A do Código ISPS [7].
A expedição da Declaração de Proteção pela instalação portuária é atribuição
exclusiva do Supervisor de Segurança Portuária (PFSO) quando a instalação possuir a
Declaração de Cumprimento válida e em vigor.
6.4. Declaração de Ciência
A Declaração de Ciência é um outro documento que não faz parte das Medidas
de Proteção Marítimas internacionais. É previsto na Resolução CONPORTOS nº
52/2018, e por meio dele o Comandante ou o Oficial de Proteção do navio (SSO) fica
ciente de que deverá adotar medidas formais no caso de constatar a prática de atos
ilícitos ou danos contra o navio, tripulantes ou passageiros e seus pertences ou carga
embarcada, quando de sua permanência no porto organizado e na instalação portuária.
O registro dos atos ilícitos ou danos constatados deverá ocorrer em território nacional
perante as autoridades brasileiras competentes.
6.5. Medidas típicas de proteção para instalações portuárias
As Medidas de Proteção são função das circunstâncias particulares da
instalação portuária. O Estudo de Avaliação de Riscos das Instalações Portuárias
(PFSA) terá identificado as características particulares da instalação portuária e os
riscos potenciais de proteção.
Esta seção trata especificamente de medidas de proteção específicas para
instalações portuárias.
6.5.1. Acesso às instalações portuárias
É necessário estabelecer meios de identificação para permitir o acesso à
instalação portuária e para que indivíduos possam ficar nas instalações sem serem
questionados.
Para entrada na instalação portuária, pessoas, objetos pessoais e veículos
devem ser revistados. Os passageiros dos navios devem provar a sua identidade
através de cartões de embarque, mas não devem ter permissão para o acesso a áreas
de acesso restrito.
Aqueles que não queiram ou não possam provar sua identidade e/ou confirmar
o propósito de sua visita, não devem ter permissão para o acesso às instalações
38
portuárias e sua tentativa de obter acesso deve ser reportada às autoridades
responsáveis por questões de proteção.
6.5.2. Áreas de acesso restrito dentro das instalações portuárias
Deve-se identificar as áreas de acesso restrito dentro das instalações portuárias.
Elas devem ser claramente marcadas, indicando que o acesso àquela área é restrito e
que a presença de pessoas não autorizadas constitui uma violação de proteção.
As medidas de proteção devem ser tomadas para controlar o acesso a elas e as
atividades dentro dela. Dispositivos automáticos de detecção de intrusos instalados
devem alertar um centro de controle que possa responder ao acionamento de um
alarme.
6.5.3. Manuseio de cargas
Para prevenir adulteração e armazenamento de cargas suspeitas, a carga deve
ser identificada como tendo sido verificada e aceita para o carregamento a bordo do
navio ou para o armazenamento temporário em uma área restrita enquanto aguarda o
carregamento. Também pode ser apropriado restringir a entrada de cargas que não
possuam uma data confirmada para o seu carregamento.
6.5.4. Entrega das provisões de navios
Para assegurar a integridade das provisões dos navios atracados na instalação
portuária, pode ser apropriado estabelecer procedimentos envolvendo o navio e os
fornecedores dos mantimentos.
A ciência dos horários das entregas e documentação podem auxiliar a confirmar
que as provisões apresentadas para a entrega foram realmente encomendadas pelo
navio.
6.5.5. Manuseio de bagagens desacompanhadas
Medidas de proteção devem garantir que bagagens desacompanhadas sejam
identificadas e revistadas antes de receberem permissão para entrar na instalação
portuária, e antes de serem transferidas entre o porto e o navio.
6.5.6. Monitoramento da proteção das instalações portuárias
É importante ter capacidade de monitoramento da instalação portuária e de suas
vizinhanças, em terra e na água, constantemente, incluindo períodos de baixa
visibilidade, assim como das áreas de acesso restrito, dos navios que estiverem no porto
e áreas ao redor do navio. Tal monitoramento pode incluir o uso de iluminação, vigias a
39
pé, motorizados e em barcos, e dispositivos automáticos de detecção de intrusos e
equipamentos de vigilância.
40
7. Conclusão
Dados estatísticos atualizados da CONPORTOS não estão no momento
disponíveis ao público em geral. Com base em incidentes de proteção relatados pela
imprensa, as ameaças à proteção marítima no âmbito das instalações portuárias
brasileiras são fundamentalmente aquelas relacionadas com o furto, o roubo e o
contrabando de mercadorias, com o tráfico de drogas ilícitas e com a introdução e o
trânsito de clandestinos. Também é percebida como uma ameaça relevante o acesso
não autorizado a navios e cargas, que propicia o tráfico e a introdução de armas e outros
artefatos utilizados no crime, no terrorismo e em sabotagem às instalações portuárias e
navios.
Segundo a Organização Marítima Internacional (IMO), em termos qualitativos a
nível mundial, desde a entrada em vigor das Medidas de Proteção Marítima, um número
significativo de instalações portuárias reportou redução tanto em incidentes de proteção
envolvendo roubo de cargas como no número de acidentes em áreas que passaram a
ser consideradas restritas devido às medidas de proteção. Além disso, também houve
uma redução significativa no número global de clandestinos [16].
Como em outros aspectos da navegação regulamentados através de tratados
multilaterais, a efetividade dos requisitos é dependente do grau no qual a provisão
relevante é universalmente implementada e aplicada. Portanto, assim como no resto do
mundo, o sucesso das Medidas de Proteção Marítima no Brasil está nas mãos das
agências governamentais envolvidas e das indústrias de navegação e portuária.
Quando as Medidas de Proteção Marítima são implementadas e aplicadas
proporcional (assegurando que a ação tomada seja condizente com a gravidade da
ameaça) e eficazmente, elas têm se provado bem-sucedidas na proteção de navios e
instalações portuárias contra atos ilícitos.
Nesta mesma linha, uma implementação eficaz das Medidas de Proteção
Marítima dá aos usuários das instalações portuárias e dos navios maior confiança que
suas cargas chegarão intactas e sem adulteração. Isto resulta em benefícios
econômicos para aquelas instalações portuárias que conseguem implementar e manter
um alto padrão de proteção marítima.
O oposto também resulta verdadeiro. A notória vulnerabilidade de uma
instalação portuária pode trazer danos econômicos e sociais. Um exemplo foi o ocorrido
em sequência ao ataque terrorista ao navio-tanque S/S “Limburg”, próximo à costa do
Iêmen. Em outubro de 2003, imediatamente após o incidente, o valor do seguro triplicou
para aqueles navios que contemplassem paradas em portos iemenitas. Isto fez com que
companhias de navegação excluíssem o Iêmen de suas rotas, preferindo atracar em
41
países vizinhos. Os terminais portuários iemenitas viram suas receitas despencarem,
sendo obrigados a demitir funcionários. O Governo do Iêmen calculou que na época
houve uma perda de renda de 3,8 milhões de dólares por mês [23]. Fontes locais
estimaram que cerca de 3.000 pessoas perderam seus empregos em decorrência disso
[24].
No caso do Brasil, não implementar as Medidas de Proteção Marítima não é uma
opção. Em decorrência do processo de internalização, a Convenção SOLAS foi
promulgada pelo Decreto nº 87.186/1982 [25] e passou a ter no país o status de norma
infraconstitucional, na mesma hierarquia de uma lei federal ordinária, cujo cumprimento
é obrigatório.
No âmbito da fiscalização da prestação dos serviços portuários, a Resolução
ANTAQ nº 3.274/2014 [26] estabelece que a Autoridade Portuária, o arrendatário, o
autorizatário e o operador portuário devem observar permanentemente condições
mínimas de segurança (security) por meio de cumprimento das determinações da
CONPORTOS e do controle de acesso e sistema de segurança (security) nas áreas
interna e externa conforme requisitos do Código ISPS (alíneas “d” e “e” do inciso IV do
art. 3º). A norma ainda estabelece que negligenciar a segurança (security) portuária,
constitui infração administrativa sujeita a multa de até 100 mil reais (inciso XXII do art.
32).
Além dos possíveis prejuízos com a perda da atracação de navios engajados no
comércio exterior e de multa por parte dos órgãos reguladores nacionais, uma instalação
portuária que opte por não implementar e manter medidas eficazes de proteção,
juntamente com peculiaridades de localização e acesso, tende a se tornar cada vez
mais vulnerável nos vários cenários de ameaça à proteção.
Concluindo, deve-se esperar que a importância para o Brasil do comércio
exterior por via marítima seja o catalizador de um processo de manutenção e
aprimoramento da aplicação das Medidas de Proteção nas instalações portuárias
brasileiras, sob o risco de os produtores nacionais perderem mercados importantes, e o
Brasil, consequentemente, divisas essenciais para o seu desenvolvimento.
Mesmo não tendo sido atingido diretamente pelo flagelo do terrorismo
internacional, o país tem a necessidade de manter e ampliar a sua condição de global
trader, comerciando uma grande variedade de produtos e serviços com o maior número
possível de países.
A implementação efetiva do Código ISPS nas instalações portuárias brasileiras
contribui para tornar o Brasil vez mais competitivo na economia e menos vulnerável à
ocorrência de incidentes de proteção que prejudiquem sua imagem a nível internacional.
42
Para maior credibilidade a nível internacional, faz-se altamente desejável a
aplicação de uma Metodologia de Análise de Riscos que seja auditável segundo
padrões aceitos internacionalmente. A atividade de auditoria seria uma importante
ferramenta para os sistemas de proteção portuária, destinada a avaliar a eficácia e
eficiência das medidas de proteção adotadas, assegurar que as ameaças foram
devidamente mitigadas, consequências minimizadas e ainda analisar criticamente todo
o sistema de proteção da instalação portuária para identificar possíveis pontos de
melhoria.
Uma metodologia auditável estabeleceria requisitos documentais, criados para
assegurar que o processo usado no desempenho da condução de uma avaliação de
proteção em uma instalação portuária marítima e no desenvolvimento de um plano de
proteção seja registrado de forma a permitir a verificação independente por uma agência
qualificada e autorizada.
Dada a natural diversidade entre as instalações portuárias, a IMO teve o cuidado
de não limitar qual a metodologia de Análise de risco a ser utilizada nas instalações
portuárias.
43
8. Bibliografia
[1] CAMBRIDGE ENGLISH DICTIONARY.
Disponível em: https://dictionary.cambridge.org/dictionary/english
[2] MERRIAM-WEBSTER DICTIONARY.
Disponível em: https://www.merriam-webster.com/dictionary
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de Coordenador de Proteção (CSO), Guia do aluno (2008)
[4] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. Resolução A.584(14),
“Measures to prevent unlawful acts which threaten the safety of ships and the
security of their passengers and crews”, de 20 de novembro de 1985. Disponível em:
http://www.imo.org/en/OurWork/Security/Guide_to_Maritime_Security/Guidance/Do
cuments/Resolution%20A.584(14).pdf
[5] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. MSC/Circ.443, “Measures to
prevent unlawful acts against passengers and crews on board ships”, de 26 de
setembro de 1986.
[6] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. Resolução A.924(22)
“Review of measures and procedures to prevent acts of terrorism which threaten the
security of passengers and crews and the safety of ships”, de 20 de novembro de
2001.Disponível em:
http://www.imo.org/en/OurWork/Security/Guide_to_Maritime_Security/Guidance/Do
cuments/A.924(22).pdf
[7] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. “Consideration and adoption
of the International Ship and Port facility Security (ISPS) Code”, 17 de dezembro de
2002.
[8] UNITED NATIONS CONVENTION ON THE LAW OF THE SEA – UNCLOS. Seção
VIII, Artigo 101: Conceito de Pirataria. 10 de dezembro de 1982.
[9] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. Resolução A.1025(26) “Code
of practice for the investigation of the crimes of piracy and armed robbery against
ships”, de 2 de dezembro de 2009
[10] BRASIL. Decreto nº 6.869, de 4 de junho de 2009. Dispõe sobre a coordenação
e articulação dos órgãos federais, bem como sobre os níveis de proteção dos navios
e das instalações portuárias, da adoção de medidas de proteção aos navios e
44
instalações portuárias, e institui a Rede de Alarme e Controle dos Níveis de Proteção
de Navios e Instalações Portuárias, e dá outras providências.
[11] BRASIL. Lei nº 9.537, de 11 de dezembro de 1997. Dispõe sobre a segurança
do tráfego aquaviário em águas sob jurisdição nacional e dá outras providências
(LESTA).
[12] MARINHA DO BRASIL – DIRETORIA DE PORTOS E COSTAS – DPC. Normas
da Autoridade Marítima. NORMAM 01/DPC – Embarcações empregadas na
navegação em mar aberto. Disponível em:
https://www.marinha.mil.br/dpc/normas/normam
[13] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL / ORGANIZAÇÃO
INTERNACIONAL DO TRABALHO – IMO/ILO. Code of practice on security in ports
(2003)
[14] BRASIL. Decreto nº 1.507, de 30 de maio de 1995. Cria a Comissão Nacional de
Segurança Pública nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis, e dá outras
providências.
[15] CONPORTOS. Resolução nº 052, de 20 de dezembro de 2018. Dispõe acerca
da consolidação e atualização das Resoluções da Comissão Nacional de Segurança
Pública nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis – CONPORTOS, conforme
normas do Código Internacional para a Proteção de Navios e Instalações Portuárias
– Código ISPS, e dá outras providências.
[16] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. Guide to maritime
security and the ISPS Code (ed. 2012)
[17] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. Model Course 3.24
Security awareness training for port facility personnel with designated security duties
(ed. 2011)
[18] ORGANIZAÇÃO MARÍTIMA INTERNACIONAL – IMO. Model Course 3.21 Port
Facility Security Officer (ed. 2015)
[19] INTERNATIONAL CHAMBER OF COMMERCE. International Maritime Bureau
(IMB). Piracy and armed robbery against ships report for 2014-2018.
[20] LAVIERI, F. E VILARDAGA, V. Os novos piratas de santos. Istoé. 2018.
Disponível em: https://istoe.com.br/os-novos-piratas-de-santos/
45
[21] UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT –
UNCTAD. Handbook of Statistics 2018. Disponível em:
https://unctad.org/en/pages/PublicationWebflyer.aspx?publicationid=2297
[22] UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT –
UNCTAD. UNCTADSTAT – Maritime profile: Brazil. 2017.
[23] U.S. DEPARTMENT OF STATE. Yemen: The Economic Cost of Terrorism. 8 de
novembro de 2002.
[24] ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT
(OECD). MARITIME TRANSPORT COMMITTEE. Security in maritime transport:
Risk factors and economic impact. França, 2003.
[25] BRASIL. Decreto nº 87.186, de 18 de maio de 1982. Promulga a Convenção
Internacional para Salvaguarda da Vida Humana no Mar, 1974.
[26] AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES AQUAVIÁRIOS – ANTAQ.
Resolução nº 3.274, de 6 de fevereiro de 2017. Aprova a norma que dispõe sobre a
fiscalização da prestação dos serviços portuários e estabelece infrações
administrativas.
[27] ESTEVES, Cmt. R. Z. Repercussões da contenção da ameaça do terrorismo
internacional na economia brasileira. Revista brasileira de inteligência. Brasília:
ABIN, 4 de setembro de 2007.