sentença - caso camará - processo nº 0007725-29.2005.4.05.8200

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S E N T E N Ç A R E L A T Ó R I O O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propôs a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA contra o ESTADO DA PARAÍBA, C.R.E. ENGENHARIA LTDA., ANDRADE E GALVÃO ENGENHARIA LTDA. e HOLANDA ENGENHARIA LTDA., em razão do rompimento da Barragem Camará, construída no Município de Alagoa Nova, neste Estado, com aporte de recursos dos Governos Federal e Estadual. Narra, em apertada síntese, que no dia 22 de junho de 2004, instaurou-se no âmbito do Ministério Público Federal e Estadual um procedimento denominado de Inquérito Civil Público - ICP, para averiguar as causas do rompimento da mencionada Barragem, ocorrido em 17 de junho de 2004, causando morte de várias pessoas e inundações nos municípios localizados a jusante da barragem. Segundo o autor, o relatório final do ICP, concluiu que problemas havidos durante a construção da obra, a cargo das rés, pessoas jurídicas de direito privado - construção pelas empresas CRE Engenharia e Galvão Engenharia e o detalhamento do projeto executivo e controle de qualidade do concreto pela Holanda Engenharia -, associados à omissão do Estado da Paraíba, no tocante à fiscalização, monitoramento e manutenção da referida barragem, causaram o rompimento daquela represa. Expõe que estudo geotecnológico realizado em 1997 pela Associação Técnico-Científica Ernesto Luiz de Oliveira Júnior - ATECEL, no local onde seria edificada a citada obra, concluiu que se poderia construir uma barragem de enrocamento ou de concreto compactado com rolo, condicionado, em qualquer caso, à remoção dos blocos soltos para estabilidade das ombreiras. Naquele mesmo estudo geotecnológico, alertou-se que valores elevados de perda d'água haviam sido verificados na ombreira esquerda, carecendo tal local de maior atenção quando da realização de estudos mais aprofundados e na execução da obra. Revela que quando da execução da Barragem, o primeiro registro referente ao problema na obreira esquerda foi feito no dia 1º de fevereiro de 2001. Em face disso, no dia 14.02.2001, o geólogo Alexandre Sagnori, contratado pelo consórcio construtor, para auxiliar na solução do problema, compareceu ao canteiro de obra para uma inspeção e elaboração de procedimento para tratamento da falha, emitindo esse profissional, em março de 2001, relatório contemplando as impressões e cinco soluções de engenharia e geologia, que acabaram sendo sugeridas pela Holanda Engenharia para a supressão do problema. Das cinco sugestões daquele geólogo, houve a adoção das sugestões de itens 'b" e "c", pois a solução mais objetiva, que seria a retirada do material complementada pelo desmonte da cunha instável acima desta zona, já indicada no estudo geotecnológico da ATECEL,

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Sentença completa do caso da Barragem de Camará, na qual houve a exclusão da responsabilidade das construturas (Defesa de Marques Galvão Advogados) e responsabilização exclusiva do Estado da Paraíba.Consulta no site www.jfpb.jus.br às 19h de 25 de maio de 2011.

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Page 1: Sentença - Caso Camará - Processo nº 0007725-29.2005.4.05.8200

S E N T E N Ç A

R E L A T Ó R I O

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propôs a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA contra o ESTADO DA PARAÍBA, C.R.E. ENGENHARIA

LTDA., ANDRADE E GALVÃO ENGENHARIA LTDA. e HOLANDA ENGENHARIA LTDA., em razão do rompimento da Barragem Camará,

construída no Município de Alagoa Nova, neste Estado, com aporte de recursos dos Governos Federal e Estadual.

Narra, em apertada síntese, que no dia 22 de junho de 2004, instaurou-se no âmbito do Ministério Público Federal e Estadual um

procedimento denominado de Inquérito Civil Público - ICP, para averiguar as causas do rompimento da mencionada Barragem,

ocorrido em 17 de junho de 2004, causando morte de várias pessoas e inundações nos municípios localizados a jusante da barragem.

Segundo o autor, o relatório final do ICP, concluiu que problemas havidos durante a construção da obra, a cargo das rés,

pessoas jurídicas de direito privado - construção pelas empresas CRE

Engenharia e Galvão Engenharia e o detalhamento do projeto executivo e controle de qualidade do concreto pela Holanda

Engenharia -, associados à omissão do Estado da Paraíba, no tocante à fiscalização, monitoramento e manutenção da referida barragem,

causaram o rompimento daquela represa. Expõe que estudo geotecnológico realizado em 1997 pela

Associação Técnico-Científica Ernesto Luiz de Oliveira Júnior - ATECEL, no local onde seria edificada a citada obra, concluiu que se

poderia construir uma barragem de enrocamento ou de concreto compactado com rolo, condicionado, em qualquer caso, à remoção

dos blocos soltos para estabilidade das ombreiras. Naquele mesmo estudo geotecnológico, alertou-se que valores

elevados de perda d'água haviam sido verificados na ombreira esquerda, carecendo tal local de maior atenção quando da realização

de estudos mais aprofundados e na execução da obra.

Revela que quando da execução da Barragem, o primeiro registro referente ao problema na obreira esquerda foi feito no dia 1º

de fevereiro de 2001. Em face disso, no dia 14.02.2001, o geólogo Alexandre Sagnori, contratado pelo consórcio construtor, para auxiliar

na solução do problema, compareceu ao canteiro de obra para uma inspeção e elaboração de procedimento para tratamento da falha,

emitindo esse profissional, em março de 2001, relatório contemplando as impressões e cinco soluções de engenharia e

geologia, que acabaram sendo sugeridas pela Holanda Engenharia para a supressão do problema.

Das cinco sugestões daquele geólogo, houve a adoção das sugestões de itens 'b" e "c", pois a solução mais objetiva, que seria a

retirada do material complementada pelo desmonte da cunha instável acima desta zona, já indicada no estudo geotecnológico da ATECEL,

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apresentaria riscos operacionais e de segurança, comprometendo,

ainda, o cronograma da obra. De acordo com o parquet, em virtude daquela opção, a obra foi

assentada em blocos praticamente soltos não removidos, fator

determinante para o colapso da barragem. A ausência de manutenção da referida barragem, por parte do proprietário, o

Estado da Paraíba, consistiu também causa de seu rompimento. Alega que a Secretaria Estadual de Recursos Hídricos e Meio

Ambiente - SEMARH tinha conhecimento dos defeitos ocorridos anteriormente ao rompimento da barragem, entretanto, deixou de

monitorar o primeiro enchimento daquela empresa, conforme recomendado.

Requereu em antecipação da tutela o seguinte: " 1) Compelir as rés C.R.E. ENGENHARIA LTDA, ANDRADE

GALVÃO ENGENHARIA LTDA e HOLANDA ENGENHARIA LTDA. em obrigação de fazer consistente na reconstrução da Barragem Camará,

cujos estudos devem começar imediatamente após a concessão da tutela antecipada, e conclusão no prazo de um ano após esta data,

sob pena de aplicação de multa diária no valor de R$ 100.000,00

(cem mil reais), por cada dia de atraso. 2) Compelir o ESTADO DA PARAÍBA a:

a) concluir o pagamento das indenizações de valores iguais ou inferiores a R$ 20.000,00 (vinte mil reais) no prazo máximo de

sessenta dias da concessão da liminar, informando ao juízo os pagamentos realizados e beneficiários;

b) Apresentar ao juízo informação completa sobre os pagamentos já efetuados e beneficiários, bem como indenizações

pendentes, independentemente do valor; c) Apresentar ao juízo, no prazo máximo de 30 (trinta) dias,

critérios objetivos para o pagamento das indenizações pendentes (incluindo negócios informais e ressarcimento de reparos

emergenciais realizados pelos próprios moradores, às suas expensas, com vistas à reconstrução de suas vivendas ou negócios), bem como

para a destinação das casas que no momento estão sendo

reconstruídas; d) Apresentar ao juízo, no prazo máximo de trinta dias contados

da concessão da liminar, cronograma de atividades contemplando as necessidades das famílias atingidas, em especial a capacitação da

comunidade, recriação de atividades produtivas que venha gerar emprego e renda, e reimplantação dos serviços públicos destruídos;

e) Assegurar a participação de representantes legitimamente escolhidos pela população atingida em todas as etapas do processo

de indenização e de reconstrução, no prazo máximo de 30 (trinta) dias após a concessão da liminar, informando ao juízo, no mesmo

prazo, as providências adotadas para tanto; f) abster-se de contratar as empresas CRE ENGENHARIA LTDA,

ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA e HOLANDA ENGENHARIA

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LTDA enquanto não concluída a reconstrução da barragem Camará

por estas, nos termos do item '1'. Tocante ao pedido definitivo, requereu nos seguintes termos:

a) que sejam mantidos os provimentos de cognição sumária

especificados nos itens 1 e 2, condenando-se os réus, em caráter solidário, à obrigação de reconstruir a Barragem de Câmara e de

indenizar todos os danos materiais e morais, de natureza coletiva ou individuais homogêneos das vítimas, causados pelo rompimento; na

hipótese de não reconstrução, por qualquer motivo, sejam as rés construtoras obrigadas a devolver aos cofres públicos estadual e

federal todo o valor repassado para a construção da obra, devidamente corrigido e com juros;

b) que sejam todos os réus condenados, em caráter solidário, ao pagamento de indenização no valor de R$ 10.000.000,00 (dez

milhões de reais), ou maior valor, se vier a ser apurado, pelos danos materiais coletivos de natureza difusa, consistindo em danos

emergentes, representado pelo prejuízo causado à infra-estrutura da região (estradas, pontes, etc.), e que deve ser aplicado em obras de

melhoramentos estruturais na área afetada pelo desastre (Alagoa

Nova, Alagoa Grande, Areia, Guarabira e Mulungu); e c) que sejam todos os réus condenados, em caráter solidário,

ao pagamento de indenização no valor de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), em razão do dano material coletivo de natureza

difusa, consistente em lucros cessantes, isso é, os benefícios econômicos que adviriam para a região da existência do reservatório,

pois este é um equipamento social que foi construído para incrementar a qualidade de vida e a economia da região (adutoras,

irrigação, psicultura, etc.), indenização a ser aplicada em projetos de desenvolvimento sustentável em todos os municípios afetados pelo

desastre; d) a condenação dos réus, em caráter solidário, ao pagamento

de indenização por danos morais coletivos, sendo tal valor arbitrado por este Juízo, e encaminhado ao fundo de reconstituição dos

interesses supraindividuais lesados, criado pelo art. 13, da Lei

7.347/85. Pede, ainda, a aplicação do art. 28, do Código de Defesa do

Consumidor, para que seja desconsiderada a personalidade jurídica, no momento de aplicação da condenação, se houver necessidade.

Instruiu a petição inicial com os documentos de fls. 66/2.435 (9º Volume).

Despacho ordenando a intimação dos réus para se manifestarem sobre o pedido de liminar, como também, da União,

esta para dizer de seu interesse em integrar a lide (fl. 2.438). Em sua manifestação (fls. 2.489/2.540), o Estado da Paraíba

manifestou-se pelo indeferimento do pedido de antecipação da tutela. Sustentou, preliminarmente: a) incompetência da Justiça Federal,

uma vez que, com a conclusão da Barragem Camará, houve incorporação ao seu patrimônio; b) a ilegitimidade do Ministério

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Público para promover ação onde se discute tutela de interesses

individuais disponíveis e diversos da relação de consumo; c) a inadequação da via da ação civil pública para compelir o Poder

Executivo a praticar ato sujeito a exame de conveniência de

oportunidade. No que tange às providências adotadas, diz que vem

desenvolvendo ações efetivas em benefício da população atingida, em conjunto as próprias vítimas, o Ministério Público Estadual, mediante

a disponibilização, dentro de suas condições, de recursos necessários às indenizações cabíveis e à reconstrução dos imóveis danificados.

A Holanda Engenharia Ltda no que tange à antecipação da tutela, defendeu sua incompatibilidade, in casu, com o princípio do

contraditório, posto que implica em pré-julgamento do feito e irreversibilidade da medida, a inexistência de prova inequívoca e de

perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, pugnando, ao final, pela denegação do pedido antecipatório (fls. 2542/2553).

A C.R.E. Engenharia Ltda, por sua vez, afirmou, em suma, não haver prova inequívoca nem verossimilhança da alegação de culpa

das construtoras pelo rompimento da mencionada barragem,

necessitando de novos estudos mediante perícia judicial, eis que "os elementos coligados, até esta data, não permitem aferir qual ou quais

fatores determinantes e exclusivos do rompimento da ombreira esquerda da Barragem Barra de Câmara". Concluiu sustentando a

impossibilidade de reconstrução imediata da Barragem Câmara, como pretendido pelo MPF, em virtude de dependência de novos estudos e

elaboração de projeto básico/executivo. Daí o descabimento do pedido de antecipação da tutela (fls. 2.576/3.024 - 10º/11º

Volumes). Intimada, a UNIÃO requereu o ingresso na lide, na qualidade de

assistente simples do autor (fls. 3.030/3.031 - 11º Volume). Por último, a empresa Andrade Galvão Engenharia também

revelou seu inconformismo contra o pedido de antecipação da tutela, porque entendeu descaracterizados os seus requisitos ensejadores:

prova inequívoca e verossimilhança das alegações do MPF, bem como

o fundado receio de dano irreparável, na medida em que a questão é complexa, havendo contradições entre as alegações das partes. De

outro lado, não anteviu a inexistência de reversibilidade do pedido formulado, de tal sorte a justificar o indeferimento do pedido de

antecipação da tutela (fls. 3.040/3.068 - 12 º Volume). Despacho do então MM. Juiz Federal Substituto desta Vara,

determinando a realização de audiência de conciliação - fls. 3.072/3.073. Iniciada esta, restou acertada a formação de comissão

multidisciplinar, com representantes de cada um dos litigantes, a fim de definir a viabilidade ou não de reconstrução da Barragem de

Camará, no mesmo local e com a mesma técnica inicialmente empregada - Concreto Compactado com Rolo - CCR, com

apresentação posterior de relatório a este Juízo, inclusive, quanto à solução técnica possível e seu respectivo custo.

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Apresentado o relatório da Comissão (fls. 3.285/3.384 - 13º

Volume), que contou com a participação de representante do Ministério da Integração Nacional, no sentido da viabilidade da

reconstrução da citada barragem, pela mesma técnica e no mesmo

local, com total segurança. Referindo-se à citada peça, o MPF solicitou a intimação do

Estado da Paraíba para se manifestar sobre a solução proposta pela Comissão ou apresentar outra solução (fls. 3.386/3.387).

As empresas rés peticionaram às fls. 3.397/3.399 e 3.417/3.418, concordando com a conclusão do mencionado Relatório,

solicitando a continuidade da audiência de conciliação, para que fosse concluído o acordo acenado na audiência de 30.08.2005 e, em caso

contrário, o indeferimento da liminar, diante das evidências técnicas constantes nos autos, demonstrando que as promovidas não

concorreram para o rompimento da barragem. O Estado da Paraíba alegou que a construção de barragem de

terra, a montante da barragem atual, revela-se mais adequada, devido ao custo inferior (35%) ao da reconstrução de uma barragem

em concreto convencional, com envelopamento parcial, solução

proposta pelas empresas rés. Com sua petição, o Estado da Paraíba trouxe cópia do relatório

enviado por técnicos da Agência Executiva de Gestão de Águas do Estado da Paraíba - AESA ao Exmº. Governador do Estado, sugerindo

a construção de tal barragem de terra, ao invés daquela apontada pela Comissão Interdisciplinar (fls. 3.401/3.413).

A União anuiu com o teor do relatório da Comissão Multidisciplinar (fl. 3.445).

Em face de terem sido apresentadas duas soluções técnicas possíveis para a reconstrução da represa em apreço, designou-se

data para continuação da audiência de conciliação iniciada em 30.08.2005, entretanto, as partes não chegaram a um consenso,

diante do que, esta julgadora proferiu a decisão de fls. 3.498/3.515 (14º Volume), rejeitando a preliminar de incompetência da Justiça

Federal suscitada pelo Estado da Paraíba, indeferindo o pedido de

antecipação dos efeitos da tutela formulado em face das rés privadas e os constantes nas alíneas "a", "b", primeira parte da alínea "c", "e"e

"f", declinados contra o Estado da Paraíba. Contestação do ESTADO DA PARAIBA suscitando, mais uma

vez, a incompetência do Juízo; a ilegitimidade ativa do MPF, no tocante ao pedido de indenização; inépcia da inicial, eis que não

demonstrado o dano material (lucros cessantes e danos emergentes) a qualquer bem de natureza difusa, mas tão-somente a sujeitos

perfeitamente identificados, nem tampouco, o dano moral coletivo, pugnando, no mérito, pela improcedência da ação (fls. 3.538/3.589).

O MPF agravou da decisão que indeferiu o pedido de tutela (fls. 3.614/3.630).

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Na decisão de fls. 3.639/3.640, esta julgadora julgou

prejudicado o pedido de tutela formulado contra o ente público na parte final do item "d".

Contestação da ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA (fls.

3.694/3.739 - 15º Volume), acompanhada de cinco volumes apensos aos presentes autos, argüindo a inepcia do pedido; impossibilidade

jurídica do pedido de devolução das quantias recebidas pela obra e do pedido de indenização de lucros cessantes de dano material difuso; a

ilegitimidade ativa do MPF, eis que o patrimônio lesado, a Barragem de Câmara, pertence ao Estado, situação que não se modifica com o

fato da União ter aportado recurso financeiro para sua construção, por meio de convênio.

No mérito, pugna pela improcedência da ação, alegando, em suma, que não tem responsabilidade alguma pelo evento danoso, que

atribui a fato da natureza e falha da Administração Estadual, que não fez o monitoramento do primeiro enchimento da barragem, mesmo

tendo sido advertida em diversas oportunidades sobre o descaso, abandono e do comportamento anômalo dos drenos da galeria, que

estavam a revelar uma situação geológica imprevista e imprevisível,

além da feição geológica no momento da construção. A C.R.E. ENGENHARIA LTDA apresentou defesa às fls.

3.740/3.792, suscitando a preliminar de ilegitimidade ativa, alegando, quanto ao mérito, que a falha geológica da ombreira

esquerda, motivadora do rompimento da barragem, era do conhecimento das partes envolvidas (Estado, construtoras e

projetista) desde o início, já que fora detectada nos estudos preliminares realizados pela ATECEL, ainda no ano de 1997, para

elaboração do Projeto Básico da barragem. Aduz que a falha ocorreu em cota abaixo da cota da sondagem

rotativa efetuada pela ATECEL, logo, é incorreta a afirmação do autor de que tal falha já teria sido indicada no trabalho da ATECEL.

Rechaça a alegação do MPF no sentido de que a obra foi assentada em blocos praticamente soltos não removidos, pois todas

as sugestões do relatório elaborado pelo geólogo Alexandre Sagnori e

pela empresa Holanda Engenharia para tratamento da falha da ombreira esquerda foram executadas, conforme registrado às fls. 556

e 557 dos autos, sustentando que a solução adotada era compatível com a boa engenharia e com os melhores tratamentos técnicos.

Por fim, assevera que se tivesse havido, por parte do Estado da Paraíba, a devida manutenção da barragem, nos termos de regras

nacionais de prevenção, conforme orientação do Manual de Segurança e Inspeção de Barragem do Ministério da Integração

Regional, e o rebaixamento do lago, sugerida antes do rompimento, com promoção de estudos sobre o problema e adoção de solução de

engenharia, o rompimento teria sido evitado. A HOLANDA ENGENHARIA LTDA apresentou contestação às fls.

3.793/3.869, argüindo a decadência do direito de ação com relação a si; ilegitimidade passiva; inépcia dos pedidos de devolução do valor

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pago e quanto aos pedidos de indenização por danos morais e

materiais coletivos, estes porque o autor não explicitou de onde surgiram os valores requeridos.

No que concerne ao mérito da causa, afirma que lhe coube o

Detalhamento do Projeto Executivo e a Proposta de Execução do Controle e Qualidade de Concreto (CCR e CCV), e não a fiscalização

da obra da Barragem de Câmara; que a ATECEL se responsabilizou pela realização dos estudos geológicos, dos estudos geotécnicos e

topográficos, dentre outros, consistindo os estudos geotécnicos em levantamento feito no local onde seria construída a barragem, com a

finalidade de identificar a constituição geológica dos eixos, boqueirão, sangradouro do barramento projetado, em todos os seus aspectos,

principalmente da litologia e tectônica que são os fatores que mais influenciam na resistência dos maciços rochosos aos esforços de

tração e de cisalhamento exercidos pelo corpo da barragem e pelo peso do volume d'água retido, sendo também analisadas as

condições de estabilidade e estanqueidade do futuro barramento. Comenta que apesar dos estudos realizados pela ATECEL terem

sido dirigidos à construção de uma barragem de terra,

expressamente se fez menção ao seu aproveitamento mesmo em caso de construção de barragem de enrocamento ou concreto

compactado a rolo, e que como os dados e conclusões apresentados pela referida empresa eram absolutamente verossímeis, não se fez

necessária a repetição daqueles estudos. Quanto às observações lançadas pela ATECEL naquele estudo,

diz que o trecho correspondente aos quatro primeiros metros de maior permeabilidade foi completamente removido, consistindo de

solos de cobertura e de rocha alterada, sem condição de suporte com material de fundação para CCR.

No que respeita à ombreira esquerda, a ATECEL já havia identificado problemas nela, fazendo recomendações acerca das

soluções para corrigi-la, as quais foram devidamente observadas, inclusive, com a contratação do geólogo Alexandre Sagnori, que após

inspeção local, elaborou um plano que continha soluções possíveis

para sanar o defeito daquela ombreira. Sobre a alegação do MPF de que a solução mais objetiva e

aconselhável não foi realizada, ou seja, a retirada do material complementada pelo desmonte da cunha instável acima desta zona,

já indicado no trabalho realizado pela ATECEL, assevera que tal solução foi descartada em razão dos altos índices operacionais e de

segurança. Sustenta que o rompimento da barragem ocorreu por culpa

exclusiva do Estado da Paraíba, pois caso tivesse procedido ao correto monitoramento das cheias e das condições daquela barragem,

seria possível tomar atitudes para reduzir a pressão exercida pela água acumulada, evitando o acidente. Além de evitar o acidente,

também seria possível fazer as intervenções necessárias na represa, preservando a obra e o patrimônio público.

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Por fim, aduz que as atividades de projeto executivo e controle

de qualidade de materiais não representam risco potencial, assim não pode ser considerada para embasar a hipótese de responsabilidade

objetiva.

O e. TRF da 5ª Região negou efeito suspensivo ativo ao AGTR interposto pelo autor (fls. 3.877/3.879 deste volume).

Observada a impugnação às contestações (fls. 3.880/3.890). Intimadas as partes para especificarem as provas que

pretendiam produzir, o MPF, a União, o Estado da Paraíba, a C.R.E. Engenharia Ltda e a Andrade Galvão Engenharia Ltda se deram por

satisfeitas com as provas já produzidas (fls. 3.912, 3.914, 3.917, 3.920/3.923, 3.924/3.930, respectivamente), requerendo a última,

caso esta julgadora entenda necessária, a realização de perícia. A Holanda Engenharia Ltda manteve-se silente (certidão de fl. 3.931).

Em decisão às fls. 3.936/3.942 (16º Volume), esta julgadora

ordenou a realização de perícia, a cargo de Geólogo, a fim de esclarecer se a falha geológica que ocasionou o rompimento era

imprevista e imprevisível, como sustentam as empresas rés, ou se

estudos complementares poderiam levar à sua correta interpretação e/ou à adoção de medidas adequadas para tratamento da falha e/ou

à certeza da eficácia dos tratamentos realizados na ombreira esquerda.

Na audiência realizada em 14 de agosto de 2009 (vide ata de fls. 4.032/4,035), esta magistrada determinou que se oficiasse ao

Ministério da Integração Nacional e ao Instituto de Pesquisas Tecnológicas - IPT, para que indicassem expert nas áreas de Geologia

e Geotécnica.

O Estado da Paraíba formulou quesitos e indicou assistente técnico às fls. 4.068/4.072 (16º Volume).

A Andrade Galvão Engenharia Ltda, a CRE Engenharia Ltda e a Holanda Engenharia Ltda indicaram assistentes técnicos e formularam

quesitos às fls. 4.076/4.087 (17º Volume).

A União, ante a possibilidade de a perícia vir a ser realizada por servidor pertencente aos quadros do Ministério da Integração,

reservou-se a apresentar quesitos e indicar assistente técnico em momento posterior à nomeação do perito (fls. 4.329).

O ministério da Integração Nacional e o Instituto de Pesquisas

Tecnológicas informaram que não possuíam, em seus quadros, profissional apto a realizar a perícia (fls. 4.333/4334 e 4.337,

respectivamente) Certificado à fl. 4.339 que o MPF não indicou assistente técnico

nem formulou quesitos.

Em decisão às fls. 4.340/4.345, esta julgadora indeferiu os quesitos de nºs. 01, 02, 03, 09 e 101, apresentados pelo Estado da

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Paraíba, e os de nºs. 05 a 152, formulados pelas rés ANDRADE

GALVÃO ENGENHARIA LTDA, CRE ENGENHARIA LTDA e HOLANDA ENGENHARIA LTDA, nomeando o Geólogo AKIRA USSAMI, para atuar

como perito judicial.

Inconformado, o Estado da Paraíba interpôs agravo retido

contra a decisão que indeferiu seus quesitos (fls. 4.354/4364). A ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA e a C.R.E ENGENHARIA LTDA

agravaram de instrumento (fls. 4.366/4390 e 4.399/4.425, respectivamente), tendo o e. TRF da 5ª Região improvido ambos

recursos, conforme consulta formulada por esta no site do TRF/5º Região, quanto a recurso da empresa Andrade Galvão (AGTR 101719-

PB) e decisões juntadas às fls. 4.585/4.691, relativo ao recurso da C.R.E. (AGTR 101991-PB).

O MPF e a UNIÃO indicaram NORMANDO PERAZZO BARBOSA e

SARITA DE PAULA PEREIRA CAVALCANTE, respectivamente, como assistentes técnicos, abstendo-se de formular quesitos (fls.

4.393/4.394 e 4.437/4.438).

Quesitos deste Juízo às fls. 4.440/447. Antes, porém, de formulá-los esta Magistrada fez um breve resumo dos fatos.

Às fls. 4507/4508, deferi a participação do Geólogo Marcelo Ferreira da Silva na realização da perícia conjuntamente do

Geotécnico Akira Ussami já nomeado por este Juízo, intimando as partes desse fato.

Entrega do laudo, o qual se encontra às fls. 4599/4559,

contendo uma via por meio digital (CD-ROON).

Manifestação das partes sobre o laudo: ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, acompanhado do laudo do assistente técnico (fls.

4610/4625 e 4627/4635), CRE ENGENHARIA LTDA (laudo do assistente técnico às fls. 4638/4643), ESTADO DA PARAÍBA (laudo do

assistente técnico às fls. 4703/4727), MPF (fl. 4731) e UNIÃO (fl.

4736).

Alegações finais: MPF (fls. 4739/4760), UNIÃO (fl. 4757), HOLANDA ENGENHARIA LTDA (fls. 4765/4781), ESTADO DA PARAÍBA

(fls. 4782/4806), ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA (fls. 4807/4830) e C R E ENGENHARIA LTDA (fls. 4833/4856).

Vieram-me conclusos os autos para julgamento.

É o que importa relatar. Decido.

F U N D A M E N T A Ç Ã O

1. Das preliminares suscitadas pelos contestantes

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O Estado da Paraíba levantou as preliminares de incompetência

absoluta do Juízo; inadequação da via eleita; ilegitimidade ativa quanto ao pedido de indenização dos prejuízos causados aos

particulares; inépcia da inicial, quanto ao pedido de indenização de

dano moral coletivo e dano material a bem de natureza difusa. As preliminares de incompetência do juízo, inadequação da via

eleita e ilegitimidade ativa já foram objeto de apreciação e rejeição por ocasião da decisão às fls. 3.498/3.515, revelando-se

desnecessário novo pronunciamento sobre elas.

A respeito da aventada decadência, sem maiores digressões sobre o tema, deve ser aplicada a regra do art. 1.245, do anterior

Código Civil, devendo o construtor garantir a obra por cinco anos, "pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais,

como do solo". As rés privadas também suscitaram preliminares, que por

economia processual e para resolver de uma vez a questão, acelerando o julgamento da lide (elencada dentre os processos da

Meta 2 do CNJ), somente serão apreciadas, se necessário, após a

análise da causa ou causas que levaram ao rompimento do maciço rochoso que compunha a fundação da ombreira esquerda da

Barragem de Camará, até porque se confundem com o próprio meritum causae. Passo, de logo, as provas

2. Do rompimento da Barragem de Camará

A Barragem de Camará rompeu no dia 17 de junho de 2004, causando inundações em municípios próximos e a morte de várias

pessoas. O MPF responsabiliza o Estado da Paraíba, proprietário da

represa, e as empresas construtoras pelo desastre ocorrido. Cada parte apresentou laudo/parecer técnico, objetivando

explicar o(s) motivo (s) que levou (aram) à ruptura daquela barragem, dando-se por satisfeitas com o material ofertado,

informando a este Juízo não ter outras provas a produzir. Diante

disso, à luz da prova produzida, passemos à análise do pedido. A pedido do MPF, o Prof. Milton Assis Kanji, Consultor em

Geologia, Geotecnia e Mecânica das Rochas, emitiu o parecer técnico de fls. 2.216/2.258 - 8º Volume, concluindo o seguinte:

"Dos dados e considerações acima apresentadas, chega-se às conclusões a seguir apresentadas:

O histórico da barragem apresenta uma sucessão de julgamentos inadequados, que superpostos uns ao outros causaram a ruptura da

barragem. Não se pode imputar o lamentável evento da ruptura a uma só causa.

8.1 Não houve qualquer tipo de seguimento e observação sistemática do comportamento da barragem durante o enchimento da represa,

exceto por algumas visitas de inspeção esporádicas, a despeito das solicitações da Projetista para que fosse realizado monitoramento das

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vazões dos drenos de alívio, verificação por corantes da comunicação

com o reservatório de infiltrações por trincas na galeria da barragem, verificação do carreamento de solo pelos drenos e ocorrência de

artesianismo por vários dos drenos de alívio, dentre outras

observações. 8.2. Entendemos que a monitoração e a observação do

comportamento da barragem é de responsabilidade direta da Proprietária ou da parte a quem seja delegada essa função,

delegação essa que não houve. Trata-se de atividade corrente em engenharia e manutenção de barragens.

8.3 Não houve atitudes e decisões da Proprietária ou de seus delegados sobre providências para investigação das causas e

condições das observações de ocorrências, nem quanto às recomendações para o rebaixamento do nível d'água da represa.

8.4 Caso em maio de 2004 tivesse sido tomada a decisão de rebaixamento da represa, o que ocorreria em cerca de 1 mês, a

ruptura não teria ocorrido. Ainda que a decisão tivesse sido tomada em início de junho, o rebaixamento teria sido suficiente para

determinar as causas das anomalias observadas, caso em que

certamente as deficiências teriam sido identificadas e sanadas, salvando a barragem. (grifo nosso)

8.5. A laje da rocha remanescente na ombreira esquerda a jusante da barragem, apresenta-se sem fraturas em larga extensão, fato

incomum em tal rocha metamórfica com vários eventos tectônicos. Esse fato, aparentemente favorável geologicamente, contribuiu para

a ruptura da barragem. 8.6 É também aspecto incomum o solo de preenchimento da falha

apresentar-se com tal teor de mica biotita, auferindo baixa resistência ao cisalhamento. Essa resistência teria sido ainda mais

diminuída por pequenos deslocamentos (imperceptíveis a olho nu e na escala da obra) devidos ao alívio de tensões pelas escavações,

aproximando-se ou atingindo valores de resistência residual. (...)

8.13. Houve julgamento inadequado da interpretação geológica da

extensão da falha. Pelas investigações por furos de roto-percussão se concluiu que o "bolsão" de solo se estendia apenas cerca de 3m para

o interior do maciço. O julgamento inadequado pode ser explicado no aspecto que agora se conhece, pela exposição ampla da superfície de

ruptura, de que a mesma apresenta ondulações ("amêndoas)", fazendo com que o preenchimento apresente grande variação na sua

espessura, inclusive com espessura não detectável por algumas das perfurações feitas. Isso levou a crer que haviam removido todo o solo

de preenchimento e que a fratura não se estendia mais para o interior do maciço. Foram realizados tratamentos consistindo de

remoção do solo, substituição por concreto, injeções de contacto com caldas de cimento, e construção de muro de gravidade".

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O Prof. Carlos Manoel Nieble, também por iniciativa do MPF,

emitiu o parecer de fls. 2261/2339 do 8º Volume, chegando à seguinte conclusão:

"A barragem de Camará rompeu, na ombreira esquerda, devido a:

* não ter sido observada e monitorada após a construção, conforme recomendado pelos diversos organismos internacionais e pelo Manual

de Segurança e Inspeção de Barragem do Ministério de Integração Nacional. A barragem emitiu, após a construção, vários sinais das

deficiências de sua fundação que, devido à inexistência dessa monitoração e observação sistemática, não puderam ser

interpretados corretamente e, assim, tomadas as medidas necessárias para sanear ou minimizar o problema.

* ter sido apoiada em maciço rochoso que, após a ruptura, se mostrou de qualidade questionável, evidenciando uma interpretação

geológica deficiente das condições de sua fundação. O modelo geológico-geomecânico é bastante complexo, conforme interpretado

à luz do conhecimento atual, e difere bastante daquele assumido na época do projeto e construção.

Em conseqüência, os tratamentos recomendados e aplicação na

fundação (injeção, drenagem e outros) não foram adequados para as reais condições geológicas do maciço, nas zonas onde compareciam

os solos residuais nas camadas/lentes de materiais alterados". Ainda por iniciativa do MPF, professores da UFPB emitiram o

Relatório de fls. 2.120/2.214- 8º Volume, cujo preâmbulo menciona: "...

Os Ministérios Públicos Federal e Estadual promoveram uma investigação. Um grupo de Engenheiros da Universidade Federal da

Paraíba foi encarregado de analisar o projeto e verificar o que se passou durante a construção da obra, como também calcular o tempo

de esvaziamento do lago. Dois outros Geólogos de São Paulo, Drs. Milton Kanji e Carlos Nieble, encarregaram-se de analisar e geologia e

como aconteceu o acidente. A análise da documentação mostrou: que o acidente ocorreu por

conta de uma má interpretação de um problema geológico que se

tentou sem sucesso corrigir; que a barragem foi construída por firmas consorciadas que, pela legislação não poderiam fazê-lo; que houve

indefinição de responsabilidades com o Proprietário omitindo-se completamente da fiscalização; que mais de 8 mil metros cúbicos de

concretos lançados foram dosados com pá carregadeira; que ao final da construção não se tinha ensaios suficientes para uma análise

estatística consistente das resistências dos concretos; que o paramento de montante apresentou-se muito permeável; que a

barragem antes mesmo de ser entregue já apresentou defeitos; que com a subida da água no lago evidenciou-se o mal (sic)

funcionamento da barragem; que o Proprietário não se mobilizou para acompanhar o primeiro enchimento e foi muito lento em tomar

as providências para correção das patologias; que se a tubulação de

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800 mm tivesse sido aberta a tempo a água poderia não ter atingido

o nível que provocou a ruptura. Por tudo isto e pelo que é apresentado nos relatórios técnicos que

fazem parte do inquérito do Ministério Público, pode-se dizer que a

Barragem de Camará não foi construída segundo os bons princípios da engenharia, tão pouco foi considerada após sua entrega como

uma obra importante que deveria ser acompanhada no seu primeiro enchimento".

Os Professores da UFPB teceram as seguintes considerações finais:

"Considerando que a Barragem de Camará foi construída: * Pelas empresas CRE e Andrade Galvão, que oficialmente não

poderiam fazê-lo, a primeira sem acervo técnico para construir em CCR, a segunda por não ter participado da licitação e sendo vedada a

formação de consórcio; * Com preços de projeto e de controle tecnológico aviltados;

* Com uma absurda indefinição de responsabilidades; * Com ausência completa de fiscalização por parte do proprietário;

* Com engenheiro do Estado designado para fiscalizar a construção

sendo engenheiro residente em outras obras; * Com avaliação errônea de um problema geológico;

* Com oito mil e quinhentos m de concreto dosados com pá carregadeira e sem aditivos;

* Com ausência de engenheiro oficial da consultoria na obra; * Com as funções de projeto e consultoria de controle dos materiais

(e fiscalização) exercida pela mesma empresa; * Com concreto de face de montante de baixa resistência, de

pequena e variável espessura, com defeitos localizados e permeável; * Com inúmeros concretos ao final da construção com resultados de

ensaios insuficientes para uma avaliação estatística consistente; * Com visitas esporádicas do responsável pelo controle dos materiais

que terminou sendo realizado à distancia, sem correção das não conformidades quanto detectadas;

* Com "enxugamento" excessivo de parâmetros de resistência e

espessura do parâmetro do montante já apresentou defeitos antes mesmo de ser entregue, pode-se afirmar que a Barragem de Camará

não foi construída conforme os bons princípios da Engenharia. O desprezo a ela dedicado após a construção vai de encontro aos

princípios básicos daquela ciência" (g.n.)

O Estado da Paraíba, proprietário do bem em pauta, trouxe o Relatório Técnico de fls. 869/965 (4º Volume), emitido por membros

da Comissão constituída por ele com o fito de apurar as causas daquele rompimento, a qual teceu as seguintes considerações finais:

"O tratamento das fundações, previsto no projeto executivo e

relatórios, bem como suas modificações, foram insuficientes e não

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atenderam aos requisitos básicos mínimos que poderiam oferecer a

esperada segurança da obra. Nas condições geoestruturais encontradas na área, a remoção pura e

simplesmente da camada superficial da rocha alterada e fraturada

não seria suficiente para oferecer a segurança do maciço. A avaliação correta dos problemas detectados na fundação e seu

devido tratamento teriam evitado o acidente."

O consórcio construtor contratou uma Comissão de especialistas, que chegou ao seguinte diagnóstico (10º Volume, fls.

2597/3024):

"A Barragem de Camará se situa em área de geologia complexa e relativamente controversa. O nível de exposição do substrato

conforme hoje se apresenta demonstra esta complexidade; é importante ressaltar que tal nível de exposição não existia durante as

investigações de projeto e as decisões de obra. Os dados disponíveis, incluindo relatórios e fotografias, indicam que a

barragem foi assente em maciço compatível com os requisitos e

especificações de projeto, tratados segundo rotinas estabelecidas, e complementadas durante as obras visando adequá-lo às condições

geológicas e respectivas peculiaridades típicas de cada obra. A ruptura da fundação da barragem de Camará se deu em função da

desarticulação e erosão hidráulica do maciço rochoso ao longo da ombreira esquerda, decorrente dos efeitos do longo período de

chuvas associados ao fluxo sob a barragem. Iniciou-se a jusante do barramento, evoluindo retrogressiva e rapidamente para a região sob

a barragem. Inspeções à barragem durante o 1º semestre de 2004 detectaram

sinais do comportamento adverso e relacionado com a ocorrência de erosão hidráulica; o agravamento do acidente está relacionado à falta

de ações remediadoras e mitigadoras em tempo hábil. Não houve ruptura do maciço de concreto no dia 17 de junho de

2004. Somente 11 dias depois, em 28 de junho, ocorreu o

desabamento do arco de concreto formado quando do deslizamento do maciço rochoso, decorrente da falta de apoio e da conseqüente

instalação de esforços que não são previstos para este tipo de estrutura.

Os dados e relatórios existentes permitem considerar que o controle tecnológico, as especificações, os equipamentos e os processos

construtivos estão em conformidade com as boas técnicas da engenharia. A resistência do maciço de concreto é compatível com o

projeto, caso contrário o desabamento do arco remanescente ocorreria instantaneamente ou em questão de horas após a ruptura

do maciço rochoso. Os ensaios de laboratório realizados em testemunhos extraídos do

corpo da barragem, atestam sua compatibilidade com aqueles obtidos

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no controle tecnológico da obra, estando de acordo com as

especificações de projeto. Não houve equipe de operação e monitoramento, devidamente

treinada e experiente para o acompanhamento do primeiro

enchimento e da vida útil da Barragem de Camará. As anomalias detectadas a partir de fevereiro de 2004 indicavam à

Proprietária a necessidade de conduzir investigações e intervenções abrangentes.

A simulação cronológica de diversos cenários mostrou que seria possível obter rebaixamentos significativos da carga hidrostática do

reservatório em tempo hábil. Com a adoção destes procedimentos em um primeiro momento seria evitado o acidente e, naturalmente, suas

conseqüências; caso adotados em momentos posteriores levariam à redução considerável do risco e de seus efeitos.

O acompanhamento e o monitoramento cuidadoso de barragens possibilitam a tomada de medidas que podem evitar ou minimizar os

riscos de acidentes. Na Barragem de Camará, o pronto atendimento às recomendações da Projetista, emitidas em julho/2002 e ratificadas

em março de 2004 permitiriam à Proprietária identificar a gravidade

das anomalias durante o primeiro enchimento e orientar as ações necessárias (g.n).

À idêntica conclusão chegaram os Professores Francisco J.

Sarmento e Pedro A. Molinas, ambos Mestres em Recursos Hídricos, em artigo técnico-científico apresentado no VII Simpósio de Recursos

Hídricos do Nordeste, o qual encontra-se encartado às fls. 1.823/1.834 (7º Volume), verbis:

"CONCLUSÕES No presente artigo, com base na cronologia documental, englobando

o período desde a constatação do problema na ombreira esquerda da barragem Camará em Alagoa Nova - PB, através da galeria de

inspeção e drenagem em 10/02/2004 até o desastre ocorrido em 17/06/2004, fica demonstrado tecnicamente que uma simples

manobra de desmonte da válvula dispersora e a utilização da

tubulação de descarga da própria barragem para esgotar a mesma, poderia ter reduzido o nível de armazenamento evitando, certamente,

além da perda de vidas humanas e grandes prejuízos econômicos em Alagoa Grande e Mulungu, a preservação da própria ombreira e,

consequentemente, da barragem, permitindo assim um estudo, em condições não emergenciais, para orientar correções ou reforços na

zona geológica vulnerável, detectável durante o monitoramento do enchimento da barragem.

(...)"

Como se vê, os laudos emitidos pelos Profs. Milton Assis Kanji e Carlos Manoel Nieble e o apresentado pelo consórcio construtor

reconhecem que a Barragem de Camará apresentava problemas em sua estrutura, salientando, porém, que tais defeitos poderiam ser

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sanados se o Estado tivesse procedido ao rebaixamento do nível do

reservatório. Registre-se que o Relatório Técnico emitido pela Comissão

Estadual (fls. 869/965 - 4º Volume) detém-se unicamente a analisar

aspectos técnicos da construção da barragem, passando ao largo da questão relativa ao não acompanhamento do primeiro enchimento do

reservatório. Documentos constantes nos autos demonstram que os

problemas da Barragem de Camará se tornaram aparentes no início de 2004, em face do aumento do volume de chuvas na região.

Acompanhemos os eventos: A mencionada obra foi recebida no dia 20 dezembro de 2002

(fl. 245 - 1º Volume), por Comissão Especial composta pelos seguintes Engenheiros Civis Estaduais: Gilmar Ferreira da Silva, ex-

Coordenador de Obras da Secretaria Extraordinária do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e Minerais, Antônio Soares da Silva,

com atuação na mesma Secretaria por aproximadamente vinte anos, conforme revelado no depoimento de fls. 440/448 (2º Volume);

Josivaldo Brasileiro de Figueiredo e Haroldo Sobreira Vanderlei.

Antes disso, em julho/2002, a HOLANDA ENGENHARIA LTDA, após realizar visita de inspeção da qual também participaram

diversos engenheiros da COGERH/SEMARH, emitiu o relatório de Consultoria - Inspeção da Estrutura de Concreto (CCR e CCV), com as

seguintes conclusões e recomendações (fls. 253/258 - 1º Volume):

"Inicialmente vale ressaltar que a estrutura poderá ter o seu aceite final com base nas inspeções efetuadas.

Apenas deve ser considerado que nova inspeção mais definitiva deverá ser feita após o próximo período de chuva na região quando

muito provavelmente a altura do reservatório indicará um real comportamento da barragem.

No interior da galeria da tomada d'água e descarregador de fundo, os pontos de percolação de água deverão ser injetados. O trecho a ser

injetado na colagem do tampão conforme orientação de Projeto tem

prioridade na orientação para injeções, sendo mais conveniente nesta etapa, em que a altura da lâmina d'água de montante ainda é

pequena. Recomenda-se que se realize a medição do quadro de vazões dos

drenos para a condição atual de funcionamento dos drenos, anotando-se a cota do reservatório correspondente a data das

medições. No futuro, considerando o período chuvoso e o ganho de água no reservatório, novas medidas de vazão deverão ser

conduzidas, de modo a permitir estudos comparativos de comportamento".

FRANCISCO LEUNAM HOLANDA LINS, engenheiro civil da

SEMARH, afirmou que as recomendações acima foram cumpridas (fls. 779/785 - 3º Volume):

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"... que tem conhecimento de um relatório feito pela Holanda

Engenharia, no mês de julho de 2002; que esse relatório foi redigido pelo Consultor Francisco Holanda, sob visita de inspeção realizada na

obra, com a participação do depoente, da engenheira Chelen Alonso,

do engenheiro Flávio Cota, do engenheiro Ovídio, do engenheiro Gilmar e do engenheiro Antonio Soares; que tem conhecimento dos

problemas relatados pela Holanda Engenharia, em julho de 2002, constantes às f. 191/192 do volume inicial, afirmando o depoente

que, com relação à colocação do pó xadrez, tal serviço foi realizado; que apesar das recomendações indicadas pela Holanda Engenharia no

referido relatório terem sido feitas, o depoente não acompanhou a execução dessas recomendações; "

Durante o ano de 2003, a barragem permaneceu vazia (vide

depoimento de FRANCISCO JÁCOME SARMENTO, ex-Secretário Estadual de Recursos Hídricos - fls. 430/438 - 2º Volume).

A partir de janeiro de 2004, porém, passou a chover forte na região, elevando o nível de água do reservatório. No dia 09 de março

de 2004, o engenheiro FRANCISCO LEUNAM HOLANDA LINS

comunicou ao Coordenador da COGERH que a galeria de drenagem da Barragem de Camará apresentava uma lâmina d'água de 0,60 cm

de altura e que os drenos não estavam dando vencimento para dar vazão à água acumulada. No mesmo expediente, aquele engenheiro

informou que o açude já acumulara cerca de 60% da sua capacidade total (fl. 786 - 3º Volume).

Em 26 de março de 2004, a CRE Engenharia Ltda encaminhou à COGERH, relatório de duas visitas que realizou naquela represa,

acompanhada de equipe daquela Coordenação (fls. 1.417/1.435 - 5º Volume).

Segundo consta no citado relatório, as visitas à barragem foram realizadas nos dias 10 de fevereiro de 2004, quando a represa estava

com aproximadamente 36% de seu volume, e no dia 10 de março de 2004, quando o volume se aproximava dos 50% . Em ambas as

visitas, foram tiradas fotografias, sobre as quais o Engenheiro Ovídio

Trindade, da CRE Engenharia Ltda/Andrade Galvão, emitiu comentários, enviando-as ao Engenheiro Francisco Gladston Holanda,

da Holanda Engenharia, responsável pelo projeto e acompanhamento da barragem, que expôs suas impressões acerca do conteúdo de cada

foto, em itálico. Ressalto que o citado relatório foi recebido pelo Engenheiro

Antônio Soares da Silva, da COGERH, no dia 29 de março de 2004 (fl. 1.417).

Na fotografia realizada nº 06, de 10.02.2004 (fl. 1.421), os Engenheiros Ovídio Trindade e Francisco Gladston Holanda trocam as

seguintes considerações: "Vista do vertedouro, mais para a ombreira esquerda, aparecendo um

pequeno pedaço do bloco de ancoragem sobreposta a falha

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Junto ao pé do muro esquerdo, a mancha de umidade é importante

de ser verificada por estar na região da falha na fundação naquela região".

Quanto à foto nº 07, também tirada no dia 10.02.2004, aqueles Engenheiros consignaram:

"Vista interna do teto da galeria de drenagem, ombreira direita, em gotejamento. (na vista posterior este lugar permanece molhado,

porém sem mais este gotejamento). O fato significa que a origem da percolação está ativa e em função da

elevação do reservatório. Seria desejável monitorar a atividade em função do enchimento do lago".

Foto nº 10, tirada no dia 10.02.2004 (fl. 1.423):

"Vista interna da galeria de drenagem na ombreira direita, com infiltrações provocando gotejamento. (na visita posterior este lugar

permanecia molhado, porém sem mais o gotejamento) O fato significa que a origem da percolação está ativa e em função da

elevação do reservatório. Seria desejável monitorar a atividade em

função do enchimento do lago".

Foto nº 12, também tirada naquele dia (fl. 1.424): "Vista da parte plana da galeria, em sua cota mais baixa, com

acúmulo de material sobre a laje É importante determinar a origem deste matéria".

Foto nº 13, idem (fl. 1.425):

"Vista da junção do bloco de ancoragem, na ombreira esquerda com o maciço natural (área da falha existente)

Aparentemente a atividade de percolação nesta área não é expressiva".

Foto nº 14, idem (fl. 1.425): "Vista das tubulações de esgotamento da galeria de drenagem,

percebendo-se o funcionamento irregular da tubulação de cota

inferior; Duas coisas chamam a atenção nesta foto:

- A coloração da água (turva) do dreno à esquerda; - A pouca eficiência do dreno da direita que certamente está

parcialmente obstruído. É primordial que os drenos sejam mantidos livres para o escoamento da água".

Foto nº 15, idem (fl. 1.426):

"Vista de morador da região tentando desobstruir a tubulação Considera-se que o proprietário da barragem deveria estar fazendo

rotineiramente este serviço, sempre que necessário".

Foto nº 16, tirada em 10 de março de 2004 (fl. 1.426): "Vista do lago em formação

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Sem comentários. Observa-se que seria interessante fazer as

anotações de mudanças de comportamento da percolação da galeria em função do enchimento gradual do reservatório. Observo que a

barragem do Camará é uma barragem de grande porte e que carece,

dentro dos padrões internacionais que seja feito um monitoramento de seu primeiro enchimento" (g.n.).

Foto nº 27, tirada no mesmo dia (fl. 1.432):

"Vista da galeria de drenagem da ombreira esquerda com destaque para o dreno vertical de fundação e o dreno da junta de dilatação. O

dreno da junta de dilatação esta em funcional normal (na minha impressão). Porém a um funcionamento do dreno vertical com vazão

diferente e a maior dos demais drenos (na minha impressão); De fato este dreno vertical tem funcionamento fora dos padrões

usuais. Há de se pensar em fazer algum tipo de intervenção. Na minha opinião este é o ponto de maior atenção dentre todos

levantados anteriormente".

Foto nº 28, idem (fl. 1.432):

Vista frontal do local anterior destacando que não há contribuição de furos de drenagens superiores e este furo (furo de drenagem D 05)

está surgindo com vazão diferente dos demais furos. Pela localização e revendo o "as built" acredito que este furo não se encontra sobre a

falha inferior e sim sobre a falha superior na mesma ombreira (na minha impressão).

Idem comentário anterior.

Foto nº 14, idem (fl. 1.433): Vista das tubulações de esgotamento da galeria de drenagem,

percebendo-se que o funcionamento da tubulação de cota inferior continua deficiente

Como já sugerido anteriormente, seria muito importante fazer o controle de vazões por estas saídas.

No dia 03 de maio de 2004, ANTONIO SOARES DA SILVA expediu ofício ao Secretário da SEMARH, solicitando-lhe que enviasse

correspondência à CRE ENGENHARIA, para que esta solicitasse, com a maior brevidade possível, à HOLANDA ENGENHARIA LTDA, a

elaboração de relatório técnico específico do primeiro enchimento da barragem, diante dos problemas ocorridos (fl. 1.532 - 6º Volume).

Naquele mesmo dia, o ofício foi expedido (fl. 1.531 - 6º Volume). No dia 21 de maio de 2004, o engenheiro Francisco Leunam

Holanda Lins, da COGERH, encaminhou o memorando nº 083/2004 ao Engenheiro Antônio Soares da Silva, noticiando-lhe o seguinte (fl.

452 - fl. 2º Volume):

"Faço ciência a V. Sa. que a BARRAGEM CAMARÁ, localizada no município de Alagoa Nova, está apresentando sérios problemas no

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seu maciço, detectados a partir do primeiro enchimento do lago e,

portanto, necessitando urgentemente de serviços de correção. Ao fazermos visita de inspeção na Galeria de Drenagem, constatamos

a existência de um vazamento com surgência a partir do paramento

montante com vazão preocupante, além de infiltrações nas paredes e teto da galeria. Verificamos também, que mais da metade dos drenos

de alívio estão obstruídos e há incidência de altas vazões nos poucos drenos que estão funcionando, contribuindo, dessa forma, para

aumentar o acúmulo de grande quantidade de água no interior da galeria, uma vez que, dos dois drenos de saída da galeria, apenas um

está funcionando de maneira satisfatória enquanto que o segundo está parcialmente obstruído. O nível da água acumulada na galeria já

está no cota 430 (com altura de 5 m) inundando toda a parte plana sob o vertedouro e atingindo os primeiros degraus. O volume de água

armazenada no açude já supera 15.000.000 m³ - cerca de 60% da capacidade total - e a tendência é aumentar ainda mais o seu volume

pois continua chovendo forte na região, aumentando também a gravidade dos problemas se não foram tomadas providências

imediatas.

No dia 24 de maio de 2004, o Coordenador da COGERH, Antônio

Soares da Silva, realizou inspeção técnica na aludida Barragem, produzindo o Relatório de fls. 453/467 (2º Volume), o qual

encaminhou em 28 de maio de 2004 ao Secretário da SEMARH, junto com o Memorando nº 083/2004, solicitando fosse remetida

correspondência à Construtora CRE Engenharia, requerendo a correção dos problemas surgidos (fl. 451). Naquele relatório, o

Coordenador ANTONIO SOARES DA SILVA recomenda o seguinte:

2 - RECOMENDAÇÕES E SUGESTÕES PARA CORREÇÕES DAS ANOMALIAS

2.1 - Para os casos onde existe percolação do maciço para a galeria,

pelo contrato maciço rocha e pela rocha de apoio da ombreira direita,

recomendamos: * A desobstrução dos drenos de saída da Galeria e verificar se esta

medida é suficiente para o esgotamento da galeria; * Abrir uma janela de 1,00 m x 1,00m na parede de interligação da

Galeria de Drenagem e a Galeria da tomada d'água para facilitar acesso e auxiliar no esgotamento da Galeria de Drenagem;

* Após o esgotamento da Galeria de Drenagem, contratar empresa especializada para reforço das injeções de consolidação.

O Relatório de Consultoria em Tecnologia do Concreto assinado

por SEBASTIÃO BATISTA DOS SANTOS em maio de 2004 sobre o estado físico das obras do açude Barra de Camará (fls. 612/616 - 3º

Volume):

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2.2 - OMBREIRA ESQUERDA

A foto-07 mostra um ponto de percolação no contato do maciço com a rocha, localizado a uma altura de 21 metros em relação ao nível da

bacia de dissipação distante de 32 metros do murro (sic) do

vertedouro nesta mesma cota e, a foto-08 mostra o escoamento superficial da água oriundo do domesmo (sic).

2.3 - OMBREIRA DIREITA

A foto-09 mostra um ponto de percolação pela rocha fora do OFF-SET, localizado a uma altura de 21 metros em relação ao nível da

bacia de dissipação e distante de 32 metros a partir do corrimão de subida que dá acesso a entrada da galeria de drenagem.

Esta percolação pode ser proveniente de uma possível fendilação ocorrida no interior do maciço rochoso que apóia esta ombreira, a

qual pode não ter sido observada quando no ato da execução dos serviços de consolidação desta ombreira. A foto-10 mostra o

escoamento superficial oriundo deste ponto de percolação. 2.4 - GALERIA DE DRENAGEM

2.4.1 - Parede de Montante

Observou-se ao longo desta parede, que entre as camadas de sua estrutura, tanto na ombreira direito quanto na esquerda, existe um

certo grau de saturação e de carbonatação, como mostram as fotos 11 e 12, o que é normal para este tipo de obra.

Na cota 434 da ombreira direita detectou-se um ponto de percolação muito acentuada, como mostra a foto 16. Este fato nos deixa muito

preocupado. Na ombreira esquerda, na cota 442, foi observado um outro ponto de percolação porém de menor intensidade como mostra

a foto-17. Isto também é preocupante, pois este pequeno fluxo pode se transformar em pouco tempo, no mesmo fluxo detectado na cota

434, da ombreira direita. 2.4.2 - Teto

O teto desta galeria foi executado com blocos pré-moldados de concreto, que pode dificultar a percolação da água do maciço, quando

da sua saturação, para a galeria, pois não foram projetados nenhum

dreno que ultrapassagem os mesmos. Esta afirmativa é nitidamente observada nas fotos 13 e 14m as quais mostram percolações

acentuadas devido o descolamento horizontal e vertical destes pré-moldados.

3 - RECOMENDAÇÕES E SUGESTÕES PARA CORREÇÕES DAS ANOMALIAS

3.1 - Para os casos onde existem percolação do maciço para a galeria, pelo contato maciço rocha e pela rocha de apoio da ombreira

direita, recomendamos contratar os serviços de uma empresa especializada em tal assunto, de preferência aquele que for munida

de equipamentos do tipo TPR, para executar os mageamentos necessários.

(...)".

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No dia 31 de maio de 2004, a Procuradoria da SEMARH expediu

ofícios para a CRE Engenharia Ltda e para a Andrade Galvão Engenharia Ltda, instando-as a comparecerem àquela Procuradoria,

para esclarecimentos escritos sobre as providências tomadas para

corrigir os defeitos técnicos constatados nas obras da barragem de Camará (fls. 469/470).

Colhe-se dos autos que a CRE e a Andrade Galvão acusaram o recebimento da citada convocação, esclarecendo à Procuradoria da

SEMARH quanto à necessidade do comparecimento do geólogo ALEXANDRE SAGNORI ao local, para elaborar relatório conclusivo

sobre as providências a serem tomadas (fl. 1.627-6º Volume). O citado geólogo chegou à barragem no dia 07 de junho de

2004, reunindo-se no dia seguinte com o engenheiro Antônio Soares da Silva, da COGERH, oportunidade em que lhe sugeriu que

procedesse ao rebaixamento do nível da água do reservatório, enquanto se definia quais os procedimentos a serem adotados.

Disse o citado geólogo ALEXANDRE SAGNORI no depoimento de fls. 805/811 - 3º Volume:

"...que a ação do depoente limitou-se a dar sugestões para o

tratamento das falhas surgidas na ombreira esquerda, sendo que, na sua segunda visita, em setembro, esses procedimentos ainda

estavam sendo implementados, razão pela qual não poderia, em hipótese alguma, atestar, àquele momento, a plena execução das

medidas sugeridas; que com o retorno do depoente à Goiânia, apenas ficou recebendo, por e-mail, os resultados das injeções nas

fundações, o que, aparentemente, demonstrava a execução dos trabalhos, pelo depoente sugeridos, executados com critério e

qualidade; que dentre esses e-mails, recebeu informações sobre alguns resultados com ensaios de perda d'água, que requereram a

sua complementação; que em nenhum momento foi o depoente chamado para novamente visitar a obra e atestar a completa

execução por ele realizadas; que mostradas ao depoente fotografias sobre a situação do maciço rochoso na ombreira esquerda, tiradas

após a tragédia do dia 17 de junho, entende o depoente que não é

possível, com base em fotografias, dar qualquer resposta definitiva sobre a persistência de camadas intempéricas; que foi chamado

especificamente para analisar a situação da zona de preenchimento na ombreira esquerda, embora tenha sido consultado, no local da

obra, sobre outras considerações de ordem geológica, incluindo as injeções na formação; que o depoente não teve nenhuma

participação no projeto executivo da HOLANDA, sabendo que foi da responsabilidade dessa empresa a apresentação desse projeto, não

podendo entrar em considerações sobre eventuais reduções no número de furos para injeção nas fundações; ...que não foi levado ao

conhecimento do depoente a detecção, em 02/10/2001, consoante indica um boletim de ocorrência elaborado, de que haveria sido

detectada na região da bacia de dissipação, próximo à ombreira esquerda, um trecho onde a rocha estava fraturada e, em seguida,

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após a remoção desse material fraturado, sido verificado a ocorrência

de um "bolsão" de rocha decomposta; que esse "bolsão" de rocha decomposta tem feição óbvia geológica; que, observando a

mensagem eletrônica datada de 16/10/2001, dirigida pela Holanda

Engenharia à Barragem de Camará, com cópia para o depoente, o que consta do Anexo 20, pode informar que trata-se de e-mail que

menciona atividades próximas da conclusão para a substituição do material escavado na zona de preenchimento da ombreira esquerda;

que o depoente não teve qualquer participação na confecção do "relatório da instrução de campo, datado de 29/10/2001, que trata

do muro esquerdo da bacia de dissipação, também acostado ao Anexo 20; que em nenhum momento foi o depoente consultado sobre

a projeção e conformação do muro esquerdo da bacia de dissipação; ... que em razão dessa visita do dia 07, houve uma reunião no dia

subseqüente, na SEMARH, que contou com a presença do depoente, do engenheiro Ovídio, do engenheiro Antonio Soares; que foi uma

reunião relativamente rápida, onde o depoente expôs que havia observado, manifestando a sua opinião quanto a importância de

reduzir a pressão de água do reservatório, tendo em vista as

surgências que haviam sido detectadas na barragem de Camará; que a sua sugestão foi no sentido da abertura ou desmonte da válvula

dispersora; que foi comentado por Antônio Soares que ele teria alguma dificuldade para cumprir essa medida, não tendo alegado

nada entretanto; que ouviu falar que essa mesma medida já havia sido sugerida pelo projetista Francisco Holanda, em visita realizada

anteriormente à visita do depoente;..." FRANCISCO GLADSTON HOLANDA, responsável pelo

detalhamento do projeto de execução da Barragem de Camará, também revelou ter sugerido ao Coordenador da COGERH, Antonio

Soares da Silva, rebaixar o nível da barragem (fls. 401/410 - 2º volume):

"... que o depoente apresentou sim, por ocasião da conclusão da obra, em julho de 2002, um relatório datado do dia 19 daquele mês;

... que nesse relatório de julho de 2002, cuja íntegra apresenta neste

ato, gostaria de destacar que houve recomendação para o monitoramento da barragem, em especial a medição dos quadros de

vazão dos drenos e a evolução da cota do reservatório; que o depoente entendeu que por se tratar a SEMARH um órgão que tinha

sob sua operação diversas barragens, seria natural que viesse a adotar os procedimentos necessários para o bom acompanhamento

do enchimento do lago de qualquer barragem; que apesar da obra haver sido entregue por volta de junho de 2002 e não configurar sob

responsabilidade da Holanda o acompanhamento do enchimento do lago do reservatório, orientou à SEMARH, em comentários realizados

sob fotografias que lhes foram enviadas pelo consórcio construtor, que monitorasse essas ocorrências; que no início de 2004, recebeu

solicitação das construtoras para participar de uma inspeção naquela barragem, juntamente com técnicos da SEMARH; que desde julho de

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2002, quando apresentou o relatório referido, não tinha ido mais ao

local da barragem, apenas tendo lá comparecido, consoante já afirmado, em maio de 2004; que pode constatar que o aspecto da

barragem era de completo abandono, sendo que a inspeção ficou

bastante prejudicada, uma vez que os dados que deveriam ser monitorados pela SEMARH, durante o enchimento, conforme

recomendações constantes do relatório final da obra (BAR-012), não haviam sido colhidos; que nessa inspeção constatou que a galeria de

drenagem estava inundada em seu trecho central, com aproximadamente seis metros de lâmina d'água, decorrente do

entupimento dos tubos de escoamento das águas provenientes dos furos de alívio; que apenas no intuito de orientar, o depoente

recomendou ao preposto da SEMARH que se esgotasse a galeria, desobstruindo os drenos; que orientou, ainda, que se convocasse o

geólogo para análise do problema e, por último, sugeriu que fosse controlado o nível do reservatório, com a abertura dos dispositivos de

tomada d´água; que foi ao local da obra no dia 17 de maio e no dia subseqüente, 18, houve uma reunião na CRE, que contou com a

presença do depoente, do Sr Ovídio e do engenheiro Antonio Soares,

da SEMARH, para tratar do assunto, ocasião em que foi sugerido pelo depoente que a SEMARH controlasse o nível do reservatório,

mediante abertura dos dispositivos da tomada d'água; que essa recomendação foi verbal; que pela sugestão do depoente, a válvula

dispersora poderia ser, inclusive, desmontada para aumentar a vazão da água do reservatório; que não houve resposta na hora por parte

de Antônio Soares, tendo o depoente, entretanto, sentido a sua preocupação de que a adoção das medidas sugeridas pelo depoente

poderiam causar perda significativa de água no reservatório, além de aumento do quadro de vazão da jusante da barragem, agravado pelo

período chuvoso se atravessava;...

O próprio ANTONIO SOARES DA SILVA, ex-Coordenador da COGERH, admitiu ter recebido sugestão para esvaziar a represa em

pauta (fls. 440/448 - 2º Volume):

"... que, visando a acompanhar o primeiro enchimento da barragem

de Camará, em razão das chuvas que caíram no início de 2004, a SEMARH procedeu, desde janeiro de 2004, ao monitoramento desse

enchimento, caracterizado pela presença de engenheiros de seus quadros, de uma a duas vezes por mês no local da obra; que essas

visitas foram sempre acompanhadas por um representante da empresa CRE, sendo que tais dados de monitoramento eram

repassados à Holanda Engenharia, via e-mail, para análise e pronunciamento; que nessas visitas iniciais nos primeiros meses de

2004, não houve confecção de relatórios, apenas tendo sido tiradas fotografias que eram posteriormente encaminhadas, conforme já

noticiado, ao Dr. Francisco Holanda; que a partir do mês de março do corrente ano, pôde constatar a existência de problemas nos

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drenos de saída da galeria de inspeção, que estava inundada na parte

de fundo; que nos meses de março e abril começaram, em razão dessa constatação, a ser adotadas providências que visassem à

correção desses problemas, no caso, o desentupimento dos referidos

drenos; que, a partir de maio de 2004, foram constatados problemas de ordem mais grave, os quais se encontram narrados no ofício que

foi dirigido ao depoente, em 21/05/2004, pelo engenheiro Francisco Leunam; que, em razão do teor desse ofício, levou o fato

formalmente ao conhecimento do Secretário de Recursos Hídricos; que a intenção desse ofício de Francisco Leunam foi a de formalizar a

constatação dos referidos problemas, o que já havia sido presenciado pelo depoente, pessoalmente, no dia 03/05/2004, quando esteve na

barragem acompanhado do Dr. Francisco Holanda e do engenheiro Ovídio, da CRE; que dessa visita realizada surgiu o relatório subscrito

pelo depoente, em 24/05/2004, cuja íntegra apresenta neste ato, acompanhado de registros fotográficos e de anotações abaixo dessas

fotografias de autoria do próprio depoente; que no dia 18/05/2004 o depoente foi chamado para comparecer à CRE, onde já se

encontravam os engenheiros Francisco Holanda e Ovídio, além de

Flávio Cota, ao que se lembra, ocasião em que trataram desses problemas surgidos na barragem; que naquela ocasião ficou decidido

que a CRE traria alguém para realizar a abertura do concreto em uma janela de um metro por um metro, visando a esgotar a água no fundo

da galeria, o que foi feito sem acompanhamento da SEMARH naquele momento; que nessa reunião não houve sugestão, por parte de quem

quer que seja, da abertura da válvula dispersora para, a partir do controle de vazão do reservatório, poderem ser realizados os

tratamentos devidos na fundação, caso fosse necessário; que essa hipótese de abertura da válvula dispersora, incluindo o seu demonste

(sic), foi aventada pelo Dr. Francisco Holanda, como uma possibilidade, tendo o depoente dito na ocasião que estaria

aguardando o relatório que seria elaborado pela Holanda Engenharia para que pudesse analisar o assunto, o que se daria a partir da

inspeção in loco por parte do geólogo Alexandre Sagnori; que quando

Alexandre Sagnori esteve na barragem, em 07 ou 08 de junho, foi acompanhado apenas pelo engenheiro da CRE de nome Ovídio Catão,

visita que não teve o acompanhamento de qualquer técnico da SEMARH; que na volta dessa visita Alexandre Sagnori e Ovídio

passaram na COGERH, ocasião em que conversaram com o depoente, tendo o geólogo referido indagado ao depoente por que não se podia,

desde aquele momento, fazer o controle do nível da barragem para facilitar o tratamento de fundação, no que respondeu que a barragem

estava apenas com 64% (sessenta e quatro por cento) da sua capacidade, o inverno estava no fim e que para perder a água

preferia perdê-la utilizando-a (grifei); que tomou conhecimento que, no dia 31/05/2004, a Procuradoria da SEMARH cobrou das empresas

uma solução urgente para os problemas detectados, no que houve resposta que deu entrada na SEMARH no dia 07/06/2004; que

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quando ocorreu a tragédia do dia 17/06/2004, o depoente e demais

engenheiros da SEMARH estavam no aguardo do relatório da Holanda Engenharia sobre as providências que seriam adotadas;... que a

responsabilidade pela manutenção das barragens paraibanas é da

SEMARH; ...que a função dos drenos de alívio é colher água que, por excesso, pode entrar por entre as rochas de fundação, as quais são

coletadas através do dreno para dar alívio às supressões existentes na fundação; que isso tudo é dimensionado pelo projetista de acordo

com os parâmetros por ele definidos; que o excesso de captação de água pelos drenos de alívio poderia sinalizar, em tese, que o

tratamento adotado nas fundações não surtira o efeito desejado, razão pela qual o depoente repassou o problema para o projetista

analisar o assunto e opinar a respeito; ... que o depoente reconhece ter recebido, em 29/03/2004, da CRE Engenharia, fotografias

remetidas pela Holanda com anotações a respeito dos registros ali mencionados; que dentre essas anotações, há uma que evidencia

que, junto ao pé do muro esquerdo, haveria a presença de mancha de umidade que precisaria ser verificada por estar na região da falha

detectada na ombreira esquerda; que o depoente não detectou maior

relevância nesse registro uma vez que houve presença sua pessoal no local da obra, além de outros engenheiros da SEMARH, bem como

do próprio Francisco Holanda, e nenhum registro adicional a respeito foi feito; que não saberia dizer, neste ato, quantos drenos de alívio

existem na barragem de Camará; que haviam em torno de quatro drenos de alívio obstruídos na barragem, segundo constatado in loco,

apesar do engenheiro Francisco Leunam ter feito, no memorando nº 083/2004, menção de que mais da metade dos drenos de alívio

estariam obstruídos, apenas tendo sido constatado posteriormente, quando do esvaziamento da galeria, aquele número inicial de quatro

sem funcionamento; que apenas uma parte dos drenos de alívio estava coberta por água nas galerias; que esses drenos de alívio

submersos não permitiam a visualização de existência de obstrução, por parte de quem quer que seja, sendo exatamente essa a razão

pela qual o Dr. Francisco Leunam considerou como em não

funcionamento, já que ele perde a sua eficiência; que, supõe, em razão do nível do reservatório, que esses drenos submersos seriam

um pouco superiores à metade do total; que com a inundação não havia possibilidade de desobstrução dos drenos de alívio; ..."

GILMAR FERREIRA DA SILVA, ex-Coordenador de Obras da

SEMARH, afirmou o seguinte (fls. 602/607 - 3º Volume):

"... que não tem lembrança de ter recebido das empresas o manual de monitoramento do primeiro enchimento, considerando ser de

conhecimento público como se deve fazê-lo; que apresenta a esta Comissão, neste ato, cópia do manual de segurança e inspeção de

barragens, elaborado pelos técnicos do Ministério de Integração Nacional, datado de julho de 2002; que, dentre outros pontos, há

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informações nesse relatório sobre como deve ser monitorado o

primeiro enchimento das barragens, bem como subseqüentes; que a SEMARH recebeu, à época, cópia desse manual, ainda quando o

depoente se encontrava como coordenador da COGERH; ..." (g.n.).

O descaso do Estado da Paraíba com a manutenção da

Barragem de Camará está sobejamente provado, conforme visto acima.

Os elementos de convicção, até agora colhidos, leva-me a proclamar a responsabilidade do Estado da Paraíba pelo evento

danoso. O Estado da Paraíba quando firmou o Convênio 199/2000, para

receber parte considerável de recursos federais destinados à construção da barragem se responsabilizou perante a União pela boa

execução da obra e fiscalização e objeto do contrato, nos termos art. 112 da Lei nº 8.666/93, de seguinte teor:

"Art. 112. Quando o objeto do contrato interessar a mais de uma entidade pública, caberá ao órgão contratante, perante a entidade

interessada, responder por sua boa execução, fiscalização e

pagamento.

O Manual de Segurança e Inspeção de Barragens expedido em julho/2002 pela Secretaria de Infra-Estrutura Hídrica do Ministério da

Integração Regional (fls. 634/772 - 3º Volume), diz, no que interessa:

"[...] 3. DEFINIÇÕES, CONCEITOS E RESPONSABILIDADES.

O presente trabalho descreve os principais desafios que se apresentam para as equipes de operação e manutenção de segurança

de barragens e estrutura associadas. Pouco adianta a leitura e análise de dados na instrumentação, à exceção de inspeções periódicas e à

manutenção de arquivos com dados históricos de cada estrutura, se as medidas corretivas que se fizeram necessárias para restabelecer

as condições de segurança não forem implementadas.

3.1. Geral O proprietário (e o concessionário, quando designado) é o

responsável pela segurança da barragem em todas as fases, isto é, construção, comissionamento, operação e eventual abandono,

respondendo pela consequências de eventuais incidentes e acidentes. Todas as barragens devem ser classificadas quanto às consequências

de uma ruptura ou dano em potencial, em que devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores:

* Aspectos Sociais * Aspectos Ambientais

* Aspectos Estruturais * Aspectos Econômicos

Todas as barragens devem ser inspecionadas periodicamente para detectar eventuais deteriorações e recomendar ações remendiáveis:

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* Inspeções de Rotina

* Inspeções Formais * Inspeções de Especialistas

* Inspeções de Emergência

Toda barragem deve ser instrumentada de acordo com seu porte e riscos associados e ter os dados analisados periodicamente com a

realização de leituras. Todos os instrumentos devem ser dotados de valores de controle ou limites.

Todas as barragens devem ser submetidas periodicamente a uma reavaliação de suas condições de segurança, segundo sua

classificação quanto às consequências de ruptura. As eventuais obras de reparo ou de manutenção a recomendadas nas

inspeções, deverão ser implementadas com a máxima brevidade possível, bem como, as providências e recomendações devem ser

registradas.

As equipes de operação e manutenção das barragens devem ser treinadas e dispor de um plano de procedimentos de emergência para

orientação em casos extremos - tais como a passagem de cheias

excepcionais - que contemple, pelo menos:

- Como proceder em resposta aos alertas da instrumentação; - O que fazer para manter a população mobilizada;

- Quais as providências a serem tomadas contra danos patrimoniais e ambientais.

As barragens deverão ser dotadas de um plano de emergência,

objetivando a segurança das pessoas residentes a jusante, em caso de acidente.

Este Manual não pretende substituir especificações, projetos de

reabilitação ou construção, ele não deve compartilhar responsabilidade com as designações de

projeto, dos construtores e montadores, e nem deve ser

utilizado como manual de instrução para pessoas não atuantes no ramo da Engenharia Civil.

O uso de critérios diferentes dos aqui indicados podem

eventualmente ser apropriados ou mesmo necessários, conforme condições específicas de alguns empreendimentos e

visando, muitas vezes, à aplicação de novos conhecimentos, de técnicas melhoradas de projeto, construção e de avaliação da

segurança de barragens.

A responsabilidade quanto à interpretação apropriada, à verificação e aplicação deste Manual é dos engenheiros empenhados no

gerenciamento de segurança de barragens e das organizações ou empresas que os empregam ou contratam.

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E, continua:

4. GENERALIDADES

4.1 Introdução

Uma barragem segura é aquela cujo desempenho satisfaça as

exigências de comportamento necessárias para evitar incidentes e acidentes que se referem a aspectos estruturais, econômicos,

ambientais e sociais.

A segurança das barragens existentes deve ser avaliada regularmente pelas reavaliações de segurança de todas as estruturas

e instalações. A segurança de uma barragem pode ser garantida por:

l Correção de qualquer deficiência prevista ou constatada; l Operação segura, continuada, manutenção e inspeção (item 6);

l Preparação adequada para emergências (item 7).

4.2 Aplicabilidade do Manual de Segurança de Barragens

Os requisitos técnicos e as diretrizes aqui apresentadas são direcionados para barragens em que as conseqüências da ruptura

incluem a possível perda de vidas ou danos adicionais aos domínios do proprietário. Deve-se prever reavaliações regulares das

conseqüências de uma ruptura de barragem, na medida em que as conseqüências da ruptura possam mudar, por exemplo, devido a

alterações no uso de terras a jusante.

Este Manual deve ser utilizado obrigatoriamente para barragens destinadas a reter e/ou represar água ou rejeitos,

independentemente do material com que foram ou serão construídas, e que tenham:

l Altura superior a 15 (quinze) metros, do ponto mais baixo da fundação à crista; ou

l capacidade total de acumulação do reservatório igual ou maior que 1 (um) milhão de metros cúbicos.

Este Manual pode também ser aplicado em barragens que não se

enquadrem na definição acima, mas que possam provocar danos em caso de ruptura ou acidente.

Ainda sobre a responsabilidade pela segurança da barragem o

referido manual dispõe:

4.3 Responsabilidade pela Segurança da Barragem

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CONDIÇÃO RELEVANTE: A responsabilidade por todos os aspectos

relacionados à segurança de barragens deve ser claramente definida.

O proprietário da barragem tem, em última instância, a

responsabilidade por todos os aspectos relacionados a sua segurança. O proprietário deve assegurar que a operação da

barragem e a sua manutenção sejam executadas por pessoas que tenham conhecimento e habilitação para tal. Iniciativas apropriadas

devem ser tomadas com relação ao treinamento do quadro de pessoal.

O proprietário da barragem deve assegurar que as reavaliações de

segurança da barragem, bem como os aperfeiçoamentos, sejam conduzidos sob a direção de engenheiros qualificados para tal. Todas

as reavaliações de segurança da barragem, investigações, análises e melhorias devem utilizar métodos que sejam compatíveis com os

requisitos exigidos por este Manual.

CONDIÇÃO RELEVANTE: Quando a posse de uma barragem for

transferida, as partes devem coletar e reunir toda a documentação técnica existente, especialmente aquela contendo os dados e

eventuais preocupações concernentes à sua segurança. A responsabilidade pela continuidade ou criação da supervisão das

condições de segurança da barragem deve ser claramente definida.

A transferência de documentação deve incluir as seguintes informações, caso disponíveis:

* l Resultados de investigações das fundações;

* l Detalhes de projeto e plantas de "como construído"; * l Registros da fase construtiva;

* l Manuais de operação; * l Registros da instrumentação;

* Relatórios de inspeção;

* l Relatórios de segurança; * l Relatórios ambientais;

* l Estudos de inundação e planos para situações de emergência.

Quanto aos procedimentos de emergência, preconiza o mencionado manual:

7. PROCEDIMENTOS DE EMERGÊNCIA

7.1 Geral

CONDIÇÕES RELEVANTES: Emergências potenciais em uma

barragem devem ser identificadas e avaliadas, levando em

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consideração as conseqüências da ruptura, de modo que ações

apropriadas, corretivas ou preventivas possam ser empreendidas. O Plano de Ação Emergencial (PAE) deve ser preparado, verificado,

divulgado e mantido para qualquer barragem, cuja ruptura possa

ensejar como resultado a perda de vidas, bem como para qualquer barragem para a qual um alerta antecipado possa reduzir os danos a

montante ou jusante. Um processo notificativo deve ser iniciado, imediatamente, ao se

encontrar uma condição insegura, que poderia conduzir a uma brecha na barragem, ou quando se descubrir uma erosão em progresso,

como especificado no PAE. O proprietário da barragem ou o operador deve avaliar se a

população das áreas imediatamente à jusante da barragem deve ser avisada da condição de brecha na barragem, devido ao curto espaço

de tempo antes da chegada antecipada da onda de cheia provocada pela ruptura.

Ações preventivas devem ser iniciadas de maneira apropriada, para evitar a ruptura ou para limitar danos onde a ruptura for inevitável.

O proprietário da barragem tem a responsabilidade de prevenir a população quanto a uma situação perigosa, porém esses alertas

devem basear-se nas informações prestadas pelo proprietário ou pelo operador da barragem. Esses últimos são responsáveis pela conexão

apropriada da observação da barragem (ver item 6.4 do capítulo 6) com os procedimentos de resposta a situações de emergência.

A falta de regulamentos não isenta o proprietário da barragem da

responsabilidade em elaborar, atualizar e seguir o Plano de Ação Emergencial (PAE).

[...]".

No entanto, à toda evidência, nem um mínino do que o Manual prevê foi seguido pelo proprietário da obra. Não consta que o Estado

da Paraíba manteve equipe de monitoração e observação do

comportamento da reservatório durante o seu enchimento, pelo contrário, abandonou à sua própria sorte o destino da represa, em

que pese a constatação de anomalias que sinalizavam uma ruptura. Para se ter uma idéia do total abandono da Barragem Camará por

parte proprietário cito as declarações de Eugênio Parceli Quirino, simples morador de Lagoa Nova/PB, prestadas ao MPF (fls. 159/160):

"...que verificou pessoalmente a três meses atrás, que havia

vazamento generalizado de água, por entre as rochas localizadas na Barragem; que antes disso já havia comentários dos moradores da

Região a respeito desses vazamentos; que pelo que sabe, a única pessoa "que tomava conta da Barragem era o conhecido por ZÉ

PREÁ, havendo comentários que ele recebia R$ 100,00 por mês para prestar esse serviço, não sabendo o DECLARANTE dizer se isso era

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verdade e quem pagava esse dinheiro, mas que ele estava todos os

dias na Barragem o DECLARANTE pode comprovar; que em razão desse constantes vazamentos ZÉ PREÁ já tinha alertado a população

local que "a Barragem iria embora...".

No mesmo sentido as declarações do morador local, Rivelino de

Lima Carneiro (fls.163/164):

"...que todos na região sabiam desse vazamento, inclusive um prestador de serviços da CAGEPA conhecido por ZÉ PREÁ, que ZÉ

PREÁ visitava a Barragem diariamente e anunciava a todos em Alagoa Nova que se não fossem tomadas providências "a Barragem

iria embora... que ao ver o constante vazamento o DECLARANTE sempre pensou que deveriam abrir as comportas para que se

pudessem tapar os vazamento...".

Do depoimento dado pelo Engenheiro Flávio José Cota Silva, lider da obra de janeiro/2001 a julho/2002, lê-se:

"...que nas duas visitas que realizou a barragem Camará neste ano, não encontrou nenhum funcionário da SEMARH lá na barragem; que

quem possuía as chaves da barragem era um morador vizinho a barragem; que o estado geral da barragem era de completo

abandono; que "José Preá" era o morador vizinho da barragem, que guardava as chaves das galerias"

Finalmente, o depoimento de José Avelino, o referido "ZÉ PREÁ", prestado à Promotoria de Justiça de Alagoa Grande/PB:

"...que desde janeiro do corrente ano a água da barragem estava

minando em drenos da galeria; que informou à Secretaria de Recursos Hídricos do Estado da Paraíba, da irregularidade por ele

constatada; que ora informava ao Dr. Soares, cujo telefone é

2185048, ora avisa ao Senhor conhecido como Leonan, com esta contatando pelo telefone 93031016; que ambos, Dr. Soares e

Leonan, foram até o local, mas não tomaram nenhuma providência; que em fevereiro ou março do corrente ano um representante da

Cagepa esteve na barragem, verificou que minava água dos drenos da galeria, mas não tomou nenhuma providência...;que não fazia

trabalho de vigilância, que nunca houve vigilante na barragem, que nunca falou para a população local que "a barragem iria embora"...;

que, antes da parede da barragem romper, ligou às 16:00 h para o Sr Leonan, avisando que estava tudo normal e que os drenos

estavam funcionando. Que furtaram todos os fios que margeavam a escada da parede da barragem; que a SAELPA interrompeu o

fornecimento de energia elétrica da barragem em janeiro; que os fios

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foram furtados nessa ocasião; que qualquer pessoa entrava e saía a

hora que quisesse da barragem ".

Disso decorre que nunca houve o monitoramento do primeiro

enchimento do reservatório.

3. Da responsabilidade das construtoras

Visando justamente aferir a acusação dirigida às construtoras - de que a Barragem Camará foi assentada em blocos praticamente

soltos, existentes ao longo da ombreira esquerda, os quais não teriam sido removidos durante a construção, e outras dúvidas,

sobretudo se a dita "falha" que provocou o rompimento da ombreira esquerda era imprevista e imprevisível, foi determinada a realização

de perícia geológica, qual veio aos autos em fls. 4559/4583. Quanto a esses pontos, mister se faz transcrever trechos do

laudo pericial, primeiramente, em relação aos quesitos formulados pela construtoras rés, no que pertine, a saber:

"PERGUNTA 01: A feição (falha) geológica considerada no acidente da

barragem é a relatada no relatório técnico mensal da obra, datado de dezembro de 2000 bem como no Diário de Obras de 18 de janeiro de

2001 (página 349 do 1° volume do processo), ou é o bolsão de rocha decomposta na região da bacia de dissipação, de que trata o Diário

de Obra de 02 de outubro de 2001 (página 312 do 1° volume do processo)?

Resposta:

Sim, a feição geológica considerada no acidente da barragem é a

relatada no relatório técnico mensal da obra, datado de dezembro de 2000 e em cota abaixo da cota da sondagem da ATECEL bem como

no Diário de Obras de 18 de janeiro de 2001 (folhas 349 do 1° volume do processo), conforme transcrito:

'As escavações da fundação da galeria deverão continuar. Após definição de projeto pela Holanda Consultoria, e aprovado pela

COGERH. Com o surgimento da camada de rocha decomposta, em cota abaixo do perfil de sondagem executado pela ATECEL, solicito'

Esta feição geológica da ombreira esquerda, não tem nenhuma

relação com o bolsão de rocha decomposta encontrado na bacia de dissipação, de que trata o Diário de Obras de 02 de outubro de 2001

(página 312 do 1° volume do processo), conforme transcrito:

'Nesta data foi detectada na região da bacia de dissipação, próximo à ombreira esquerda, um trecho onde a rocha estava fraturada. Após a

remoção deste material fraturado verificou-se a ocorrência de um

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bolsão de rocha decomposta. O material decomposto será totalmente

removido até encontrar rocha sã. Posteriormente o 'bolsão' será preenchido com concreto de

regularização'.

Este bolsão nada tem com o comportamento da ombreira esquerda,

situava-se no fundo do vale e somente foi feita uma referência a sua proximidade com a ombreira esquerda para fins de localização. Ou

seja, situava-se no fundo do vale, não no centro ou à direita, mas à esquerda. Este foi limpo e concretado conforme Relatório Técnico de

Obra do mês de outubro de 2001.

De acordo com os estudos realizados e apresentados nos autos a feição geológica na ombreira esquerda é a correlacionada com o

acidente e não atinge a estrutura da laje da bacia de dissipação, onde estava situado este bolsão citado acima".

"PERGUNTA 04: Após as escavações efetuadas, pelas empresas, na

ombreira esquerda, em cota abaixo da cota da sondagem rotativa da

ATECEL, foi identificada a presença de rocha decomposta, conforme descrito no Diário de Obra do Dia 18 de janeiro de 2001 (página 349

do 1º volume do processo). O comportamento da ombreira, após o tratamento efetuado, era previsível?

Resposta:

Não. Após o tratamento efetuado na ombreira não havia previsão de que pudesse ocorrer o mecanismo do acidente sendo que interpreta-

se que este não tem origem na região específica da fundação da barragem, e que possivelmente poderia ter sido evitado caso ações

tivessem sido tomadas pela operação do reservatório. Tendo sido tomadas todas as providências indicadas pelo geólogo

Alexandre Sagnori não havia como prever o comportamento da

ombreira que levou ao acidente. Cabe ressaltar que na ocasião o geólogo Alexandre Sagnori, além de ter acesso visual a toda

superfície da rocha da fundação, acompanhou a execução de quatro furos com perfuratriz ("rock drill") na região do tratamento para

orientação de suas recomendações, sendo posteriormente executados mais três furos de rotativa (conforme Relatório BARC 010 -R0

elaborado pela Holanda Engenharia sobre as ponderações técnicas da visita do geólogo Alexandre Sagnori - folhas 832 a 845 do 3° volume

do processo (mesmo relatório presente no Relatório Técnico da Obra do mês de marco de 2001);

Também em sua segunda visita à obra em 19 de setembro de 2001 foi determinado um furo com 60° de inclinação com a horizontal

sobre a zona de preenchimento próximo ao contato onde foi executado um ensaio de injeção de calda de cimento para simular o

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comportamento da injeção do material alterado. Determinou também

a injeção de 8 furos de consolidação, denominados F1 a F8 procurando aumentar a resistência e a estanqueidade da zona de

preenchimento próximo ao paramento (conforme Relatório Geológico

Geotécnico Segunda Visita presente no relatório técnico da Obra de Novembro de 2001 e de Outubro de 2001 - fotos dos furos F1 a F8).

Conclui-se, portanto, a favor das boas condições de suporte do local. Conseqüentemente o comportamento verificado alguns anos depois

foi considerado imprevisto e, perante os dados coligidos, imprevisível".

"PERGUNTA 17: O andamento da obra, com a escavação para

limpeza da fundação e assentamento da barragem na ombreira esquerda da Barragem de Camará, restringiu-se ao recomendado no

projeto da ATECEL, ou foi além, mais específicas e profundas do que o previsto em projeto, se cercando de cuidados especiais conforme a

boa prática da engenharia?

Resposta:

Os dados disponibilizados e tratados permitem colocar que as escavações da limpeza da fundação foram realizadas além dos limites

previstos no projeto da ATECEL, resultando inclusive no acréscimo da extensão da barragem de 59,990m (passou de 236,00m para

295,99m). Conforme folhas 4086 a 4327 do 17° e 18° volumes do processo, projeto ATECEL 02/09 e projeto as built BC-HOL-E-001

respectivamente. A comprovação de que esta escavação se deu em cota abaixo do

limite da sondagem rotativa da ATECEL pode ser feita através do cotejamento entre o perfil da sondagem furo n° 03 na estaca 4, com

o projeto as built acima. O acompanhamento das escavações teria levado os profissionais que

a acompanhavam a definir seu aprofundamento até o material

considerado aceitável. (conforme Projeto "as built" Projeto de escavação - planta e perfil longitudinal, Documentos do Projeto

Executivo, Apenso IV do Processo)".

PERGUNTA 22: Qual era a função do geólogo Alexandre Sagnori na construção da Barragem? Foram por ele adotadas técnicas de

protocolos convencionais para barragens em questão nas pesquisas realizadas para investigar a descontinuidade da feição geológica

(maciço rochoso) que se apresentou na Ombreira Esquerda? A adoção de tais técnicas de investigação permitiria propor soluções

para a mitigação do problema que veio a ocorrer? Esta solução foi adequadamente executada?

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Resposta:

"A função desempenhada pelo geólogo Alexandre Sagnori na

construção da barragem foi de consultor, conforme relatório BAR 01 -

R0 Março 01 da Holanda Engenharia sobre ponderações técnicas elaboradas pelo próprio engenheiro geotécnico Alexandre Sagnori;

seu objetivo seria de analisar a zona de preenchimento com solo residual na ombreira esquerda, avaliar os riscos e propor sugestões

para o tratamento (folhas 832 a 845 do 3° volume do processo e mesmo relatório presente no Relatório Técnico de Obra do mês de

março de 2001). Segundo o Relatório da Segunda Visita (conforme Relatório Geológico

Geotécnico Segunda Visita presente no Relatório Técnico da Obra de novembro de 2001) o próprio Alexandre Sagnori descreve:

'Este relatório inclui ainda o período posterior à visita, até o final de outubro, durante o qual foram executadas injeções

complementares e ensaios de perda d'água, tanto no eixo como na zona de preenchimento da ombreira esquerda.

Estão abordados aqui os seguintes assuntos:

* Resultados parciais e finais das injeções da fundação; * Material instável próximo ao paramento de montante na ombreira

esquerda; * Segunda avaliação e sugestões para o tratamento da zona de

preenchimento da ombreira esquerda.'

Segundo o Termo de Depoimento prestado junto ao Ministério Público Federal (folhas 805 a 811 do 3° volume do processo) o geólogo

Alexandre Sagnori afirma que 'foi convidado para fazer uma avaliação do problema da descontinuidade do maciço rochoso e, em seguida,

apontar sugestões para a sua correção; que exerceu, para assim dizer, trabalhos de consultoria.'

Em resumo a função desempenhada pelo geólogo Alexandre Sagnori foi como consultor responsável por fazer uma análise, avaliar os

riscos e propor sugestões para o tratamento.

Sim. Foram adotadas pelo geólogo técnicas de protocolos convencionais para barragens em questão. Os serviços por ele

executados ao fazer um levantamento geológico da superfície, examinar as investigações já disponíveis e acompanhar a realização

de novos furos são os procedimentos usuais, adotados correntemente pelos profissionais da sua área, em sintonia com a boa prática

brasileira.

Sim. As técnica de investigação são as usualmente utilizadas e permitiriam propor soluções para a mitigação do problema.

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As técnicas de investigação empregadas incluíram quatro furos de

investigação por roto-percussão, acompanhadas durante a perfuração por um geólogo, de três furos complementares de sondagem rotativa,

ensaios de perda d'água e injeções experimentais juntamente com o

mapeamento de toda a superfície da rocha de fundação exposta pela escavação de trincheira, que, conjuntamente com a análise das

investigações realizadas por ocasião do projeto da ATECEL, orientaram as medidas de correção do problema detectado.

O geólogo no seu depoimento ao Ministério Público Federal (folha 805 a 811 do 3° volume do processo) afima que:

'que o depoente entendeu suficiente/adequadas essas cinco medidas indicadas para tratar de forma eficaz aquela descontinuidade e,

portanto, dar seguimento à execução da obra; que o depoente entendeu, de acordo com os dados disponíveis, que as três

sondagens adicionais foram suficientes para basear as sugestões técnicas apresentadas em março de 2000; que além dessas três

sondagens, nenhuma outra, ou estudo complementar, foi feito a respeito para basear as sugestões técnicas apresentadas.'

Sim. As ações sugeridas para solução teriam sido adequadamente executadas, conforme Relatório Técnico de Obra de abril de 2001

(furos de sondagens rotativas sendo executadas); Relatório de maio de 2001 (execução do muro de contenção); Relatório de

setembro/2001 (limpeza da feição geológica da ombreira esquerda); Relatório de outubro/2001 (Furos adicionais para injeções F1 a F8,

concretagem da falha, tubos para injeção da feição geológica).

"PERGUNTA 23: É verdade que, segundo o perito do Ministério Público Federal, Milton Assis Kanji, o julgamento inadequado pode ser

explicado, após exposição ampla da superfície de ruptura ondulada, permitindo constatar tardiamente que o preenchimento de solo

apresentava-se intermitente, anastomasado e localmente ausente,

com espessuras locais não detectáveis por sondagem ou pela perfuração executada?

Resposta:

Em todos os relatórios examinados é consenso dos profissionais

envolvidos a caracterização da geologia do local como complexa. Considerando este aspecto, está correta a análise do Professor Kanji.

A inspeção a posteriori deve ser diferenciada do julgamento feito em obra, sem o conhecimento do comportamento adverso ocorrido".

"PERGUNTA 26: Por ocasião da elaboração do projeto e no decorrer

da execução da obra, houve algum indício da necessidade de estudos complementares, além dos já efetuados e disponíveis que nortearam

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os trabalhos? Os estudos realizados foram além daqueles previstos no

projeto básico da ATECEL?

Resposta: O modelo geológico assumido no projeto básico, foi baseado na

premissa de uma geologia relativamente simples, não tendo induzido a necessidade de maiores investigações além das que foram

programadas e executadas. Com a identificação da feição geológica, durante a escavação da

ombreira esquerda, foram executados quatro furos com perfuratriz ('rock drill'), indicados e acompanhados pelo geólogo Alexandre

Sagnori, posteriormente mais três furos de sondagem rotativa, ensaio de injeção de cimento e ensaio de perda d'água, que foram

considerados suficientes para orientar as medidas de correção do problema detectado. Estes estudos complementaram aqueles

constantes no projeto básico da ATECEL. (folhas 4089 a 4273 do 17° volume do processo)".

"PERGUNTA 31: Durante a fase de projeto ou no decorrer da obra, tendo em conta a prática corrente de engenharia de barragens,

poderiam ter sido identificadas as condições do maciço de fundação e previsto o desenvolvimento dos possíveis processos que levaram a

ruptura da barragem?

Resposta:

Conforme exposto ao longo das respostas às outras perguntas, a boa prática da engenharia de barragens brasileiras prevaleceu durante

todo o projeto e andamento da obra. A particular feição geológica da obra foi identificada e tratada durante as escavações de obra.

Levando-se em conta a boa prática corrente, a melhor fase para identificação e mitigação dos processos que levaram à ruptura da

fundação da barragem seria durante o seu primeiro enchimento, com

um criterioso acompanhamento e monitoramento, conforme previsto no Manual de Segurança e Inspeção de Barragens, da Secretaria de

Infra Estrutura Hídrica do Ministério da Integração Nacional e também das conclusões dos Relatórios dos peritos do Ministério

Público Federal". (realcei)

"PERGUNTA 32: Há registro que o bolsão de rocha decomposta na região da bacia de dissipação, a que se refere a anotação do Diário de

Obra do dia 02 de outubro (folha 312 do 1° volume do processo), foi retirado e preenchido com concreto de regularização?

Resposta:

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Sim. No Relatório Técnico da Obra referente ao mês de outubro de

2001, constam duas fotos com as legendas: 'Escavações do bloco de rocha decomposta a Jusante" e

"Concretagem do Bolsão de rocha de jusante'.

Estes serviços estão coerentes com a recomendação contida na anotação do Diário de Obra do dia 02 de outubro, de que este fosse

totalmente removido até encontrar rocha sã e depois preenchido com concreto de regularização.

Como já mencionado em perguntas acima, este bolsão não tem relação com a feição geológica (zona de cisalhamento dúctil/rúptil) da

ombreira esquerda". (realcei)

PERGUNTA 37: Nas causas do acidente da barragem de Camará, apresentadas nos três trabalhos anexos ao processo, consta

afirmação, ou mesmo comentário que a barragem foi assentada em blocos praticamente soltos e que este foi fato determinante para o

colapso da barragem?

Resposta:

Não, nas causas do acidente da barragem de Camará, apresentadas

nos três trabalhos anexos ao processo, cujos profissionais detêm conhecimento específico da disciplina de geologia/geotecnia, não

constam afirmação, ou mesmo comentário que a barragem foi assentada em blocos praticamente soltos e que este foi fato

determinante para o colapso da barragem. Trabalho 01 - Parecer Técnico sobre as Causas da Ruptura da

Barragem de Camará", nas folhas 2.216 a 2.258 do 8° volume do Processo, de autoria do Perito do Ministério Público Federal Milton

Assis Kanji; Trabalho 02 - Relatório de Diagnóstico do Sinistro da Barragem de

Camará CAM 141104, de autoria do Perito do Ministério Público Federal Eng. Carlos Manuel Nieble, nas folhas 2.259 a 2.339 do 8º

volume do Processo;

Trabalho 03 - Relatório de investigação e diagnóstico das causas que levaram à ruptura da fundação da barragem de Camará (Apenso

Volume I de IV do processo) de autoria dos profissionais Professor Doutor Georg Robert Sadowski e Luiz Guilherme Francisco Soares de

Mello - item II.2 Modelo geológico. (realcei)

Respostas aos quesitos formulados pelo ESTADO DA PARAÍBA:

"QUESITO Nº 05

Que outro profissional, além daqueles que estavam diretamente na obra, foi chamado para analisar a falha geológica e oferecer solução

técnica demandada pela fiscalização do Estado? Que investigação foi promovida por este profissional? As providências adotadas pelo

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profissional podem ser enquadradas como "boa prática" da

engenharia, para a obra e a situação encontrada?

Resposta:

Foi contratado o Geólogo Alexandre Sagnori para, como consultor, fazer uma avaliação do problema da feição exposta no maciço

rochoso, avaliar os riscos e apontar sugestões para sua correção. As investigações promovidas por este profissional e as providências

adotadas foram apresentadas na resposta ao Quesito nº 04 do Governo do Estado da Paraíba.

Sim, as providências adotadas pelo profissional podem ser enquadradas como 'boa prática' da engenharia'".

"QUESITO Nº 06

Segundo o relatório BARC 010 - R0 elaborado pela Holanda Engenharia sobre as ponderações técnicas da visita do geólogo

Alexandre Sagnori (folhas 832 a 845, 3º volume) qual a solução apresentada para tratar a falha geológica encontrada na obreira

esquerda?

Resposta:

As medidas recomendadas pelo Geólogo Alexandre Sagnori para tratamento da feição geológica detectada na ombreira esquerda

durante a obra foram: A. Limpeza e proteção da superfície da OE com ênfase para os planos

de xistosidade perpendiculares ao eixo da barragem com preenchimento de +/- 30 cm. Sugere-se concreto varrido ou similar.

B. Proteção da zona de preenchimento da OE para posterior execução

do plano de injeções adensado e com controle específicos. Sugere-se muro de concreto ou concreto projetado.

C. Retirada do material de preenchimento e sua substituição por concreto. Sugere-se a retirada de seções de 3 de comprimento por

desmonte hidráulico e preenchimento com concreto projetado em trechos sucessivos ou alternados.

D. Ênfase em todo plano de injeções e drenagem ao longo do eixo da barragem, com adensamento da malha na zona de preenchimento.

Complementação com linha perpendicular à primária, ao longo do preenchimento no sentido de jusante, com controle rigoroso e teste

de permeabilidade. Sugere-se diferentes traços de calda. E. Proteção à montante da barragem na intersecção da zona de

preenchimento com apoio do maciço em CCR. Sugere-se solo ou

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concreto projetado. (Relatório BAR 010 R0 as folhas 832 a 845 do 3°

volume do processo)

Em seu depoimento o Geólogo Alexandre Sagnori confirma que estas

medidas foram executadas. (depoimento as folhas 805 a 811 do 3° volume do processo)".

"QUESITO Nº 07

O Sr. Perito concorda com a afirmação contida no trabalho do perito do Ministério Público Federal, Milton Assis Kanji, no item 8.13 do seu

resumo executivo, segundo o qual houve julgamento inadequado da equipe da obra (das construtoras e de seus consultores, contratados

para dar solução ao problema), mas que, somente é possível constatar tal inadequabilidade após a exposição ampla da superfície

de ruptura?

Resposta:

Sim. O Prof. Kanji posiciona o que é amplamente sabido na prática profissional: após a ocorrência de algum comportamento adverso

parece fácil tê-lo identificado anteriormente, o que não o é, com os dados disponíveis no momento em que as decisões tem que ser

tomadas. O conhecimento da ocorrência de comportamento adverso leva a interpretações já focadas e dirigidas para o próprio evento.

Porém cabe posicionar que este julgamento inadequado não levaria ao acidente. Todos os trabalhos técnicos apresentados no processo

comprovaram que havia possibilidade real do proprietário deplecionar o reservatório, investigar as causas do processo que se apresentou

desde fevereiro de 2004 (correspondência da CRE Engenharia com comentários do projetista Francisco Holanda sobre fotos realizadas

em fevereiro e março de 2004, as folhas 1393 a 1412 do 5° volume

do processo), e promover a sua correção. Esta afirmação é também compartilhada pelo próprio perito do

Ministério Público Federal Milton Assis Kanji, onde afirma em suas conclusões (página 2216 a 2258 do 8° volume do processo):

' PARECER TÉCNICO SOBRE AS CAUSAS DA RUPTURA DA

BARRAGEM CAMARÁ RESUMO EXECUTIVO 8.1 Não houve qualquer tipo de segmento e observação sistemática

do comportamento da barragem durante o enchimento da represa, exceto por algumas visitas de inspeção esporádicas, a despeito das

solicitações da Projetista para que fosse realizado monitoramento das vazões dos drenos de alívio,verificação por corantes da comunicação

com o reservatório de infiltração por trincas na galeria da barragem, verificação do carreamento de solo pelos drenos e ocorrência de

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artesianismo por vários dos drenos de alívio, entre outras

observações. 8.2 Entendemos que as monitorações e a observação do

comportamento da barragem é de responsabilidade direta da

Proprietária ou de parte a quem seja delegada essa função, delegação essa que não houve. Trata-se de atividade corrente em

engenharia e manutenção de barragens. 8.3 Não houve atitudes e decisões da Proprietária ou de seus

delegados sobre providencias para investigação das causas e condições das observações de ocorrências, nem quanto às

recomendações para o rebaixamento do nível d'água da represa. 8.4 Caso em maio de 2004 tivesse sido tomada a decisão de

rebaixamento da represa, o que ocorreria em cerca de 1 mês, a ruptura não teria ocorrido. Ainda que a decisão tivesse sido tomada

em início de junho, o rebaixamento teria sido suficiente para evitar a ruptura. Haveria então oportunidade para investigações detalhadas

para determinar as causas das anomalias observadas, caso em que certamente as deficiências teriam sido identificadas e sanadas,

salvando a barragem.'" (realcei)

"QUESITO N° 08

O Sr. Perito concorda com a afirmação contida no trabalho do Ministério Público Federal através do seu perito, Carlos Manoel Nieble,

segundo o qual, o modelo geológico-geomecânico do local é bastante complexo, e que, tal complexidade somente revela-se à luz do

conhecimento atual (pós-ruptura)?

Resposta:

Sim, a interpretação das informações coletadas pós-ruptura permite

concluir pela complexidade da geologia local, estando correta opinião

do perito do Ministério Público Federal, Carlos Nieble, que afirma em seu relatório: 'O modelo geológico-geomecânico é bastante

complexo, conforme interpretado à luz do conhecimento atual, e difere bastante daquele assumido na época do projeto e construção'.

Este perito do Ministério Público Federal, Carlos Manoel Nieble também afirma que a causa do acidente foi provocada pelo fato do

enchimento inicial não ter sido observado e monitorado pelo proprietário, conforme resumo das conclusões do Relatório deste

perito, as folhas 2259 a 2339 do 8° do volume do processo).

'BARRAGEM DE CAMARÁ

RELATÓRIO DE DIAGNÓSTICO DO SINISTRO

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DA BARRAGEM DE CAMARÁ

CAM141104

Resumo das Conclusões

A barragem de Camará rompeu, na ombreira esquerda,

devido a:

* ter sido apoiado em maciço rochoso que se mostrou de má

qualidade, após a ruptura, evidenciando uma interpretação geológica deficiente das condições de sua fundação. O modelo geológico-

geomecânico é bastante complexo, conforme interpretado à luz do conhecimento atual, e difere bastante daquele assumido na época do

projeto e construção. Em conseqüência, os tratamentos aplicados na fundação (injeção,

drenagem e outros) não foram adequados para as reais condições geológicas do maciço.

* não ter sido observada e monitorada após a construção, conforme

recomendado pelos diversos organismos internacionais e pelo Manual de Segurança e Inspeção de Barragem do Ministério de Integração

Nacional. A barragem emitiu, após a construção, vários sinais das deficiências de sua fundação que, devido à inexistência dessa

monitoração e observação sistemática, não puderam ser interpretados corretamente e, assim, tomadas as medidas

necessárias para sanear ou minimizar o problema.'"

Quanto aos quesitos formulados por este Juízo, assim se pronunciou o expert:

"QUESITO JUIZA

QUESTÃO 01 - A fratura e o "bolsão" de rocha decomposta detectados na ombreira esquerda, em cota abaixo do perfil de

sondagem executado pela ATECEL, já não indicavam que os estudos realizados por esta não eram suficientes para garantir a segurança da

barragem, havendo necessidade de completá-los, ao menos na área que não fora abrangida naquele estudo prévio? Justificar.

Resposta:

Inicialmente é preciso esclarecer que "a fratura e o bolsão" de rocha decomposta conforme descrito nos textos constantes do processo são

elementos distintos e independentes, citados no processo como tendo

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sido detectados em locais e em momentos diferentes no decorrer da

construção. A fratura que deve ser referida como zona de cisalhamento

rúptil/dúctil e apresentou-se parcialmente decomposta na face

rochosa exposta pela escavação da ombreira esquerda. O descobrimento desta feição geológica referida no Diário de Obra do

dia 18 de janeiro de 2001, abaixo do nível investigado no decorrer do projeto pela ATECEL levou à contratação do geólogo Alexandre

Sagnori para, como consultor, fazer uma avaliação do problema da descontinuidade do maciço rochoso e apontar sugestões para sua

correção. (Diário de Obras 18 de janeiro de 2001 - página 349 do 1° volume do processo).

Por outro lado, "bolsão" de rocha decomposta citado no processo foi localizado na região da bacia de dissipação, conforme a anotação do

diário de obra do dia 02 de outubro (folha 312 do 1° volume do processo), ou seja, no fundo do vale. Este bolsão que situava-se no

fundo do vale e somente foi feita um referência a sua proximidade com a ombreira esquerda para fins de localização. Ou seja, situava-se

no fundo do vale, não no centro ou à direita, mas à esquerda. (Diário

de Obras de 02 de outubro de 2001 - página 312 do 1° volume do processo).

Ainda, conforme este registro, o bolsão de rocha decomposta na região da bacia de dissipação, foi retirado e preenchido com concreto

de regularização, conforme recomendado nas especificações e indicado no Desenho BC-HOL-E-003 do projeto. Esta é uma prática

comum na engenharia de barragens, nada tendo de extraordinário. O encontro de situações como esta e as providencias tomadas são

rotineiras, e pode-se notar no desenho citado acima, esquemas mostrando a solução a ser adotada. Finalmente, cabe ressaltar que o

"bolsão", devidamente tratado, não contribuiu com o acidente e está até hoje sob a laje da bacia de dissipação, que por sua vez nada

sofreu com a ruptura da barragem. (Relatório Técnico da Obra do Mês de Outubro de 2001).

Agora, voltando à referida "fratura" que tecnicamente é referida como

uma zona de cisalhamento dúctil/rúptil. O encontro desta feição geológica caracterizou uma situação excepcional e como tal foi

tratada, levando, como já foi dito, à contratação do geólogo Alexandre Sagnori para, como consultor, fazer uma avaliação do

problema e apontar sugestões para sua correção. O mesmo compareceu à obra onde realizou um levantamento

geológico de superfície, examinou as investigações já disponíveis, acompanhou a execução de quatro furos com perfuratriz ("rock drill")

e solicitou a execução de mais três furos de rotativa. O exame da rocha exposta pelas escavações mais esta quantidade de furos em

uma área relativamente pequena, complementaram as investigações realizadas por ocasião do projeto e foram suficientes para obtenção

do conhecimento necessário às recomendações de tratamento do

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problema detectado, conforme informou em seu depoimento.

(depoimento página 805 a 811 do 3° volume do processo). Como conclusão, concordamos que a presença de uma zona de

cisalhamento dúctil/rúptil, na face rochosa exposta pela escavação da

ombreira esquerda, não tem correlação com o bolsão de rocha decomposta mencionado no Diário de Obras, e que tal condição

encontrada na obra em outubro de 2001, aparentemente não tem também correlação com o acidente ocorrido". (realcei)

"QUESTÃO 02 - O geólogo Alexandre Sagnori afirmou não ter sido informado sobre as ocorrências mencionadas na parte inicial do inciso

anterior. Essa omissão por parte das construtoras foi relevante ou irrelevante? Em tendo sido relevante, contribui de algum modo para o

sinistro? Justificar.

Resposta:

De fato, o geólogo Alexandre Sagnori afirmou não ter sido informado

sobre a ocorrência do bolsão de rocha decomposta na região da bacia de dissipação, que foi retirado e preenchido com concreto de

regularização. No entanto, cabe reafirmar o constante na resposta do quesito anterior. O encontro de situações como esta e as providências

tomadas são rotineiras, não havendo na época nada que justificasse a comunicação do fato e não se caracteriza uma omissão. De todo

modo, a não comunicação foi irrelevante, uma vez que o "bolsão", devidamente tratado, parece não ter contribuído com o acidente e

está até hoje sob a laje da bacia de dissipação, que por sua vez não sofreu com a ruptura da barragem. (realcei)

Conforme se pode verificar através do projeto "as built" BC-HOL-E-003 - Limpeza e tratamento de fundação (constante do Apenso IV do

Processo), especificamente onde trata de "TRATAMENTO DE FUNDAÇÃO MUITO IRREGULAR EM ROCHA" que já era previsto o

tratamento de "Buracos e depressões com profundidade de 15cm ou

mais são preenchidos com concreto dental". O fato foi anotado no Diário de obras de 02 de outubro de 2001

(página 312 do 1° volume do processo): "Nesta data foi detectado na região da bacia de dissipação, próximo à ombreira esquerda, um

trecho onde a rocha estava fraturada. Após a remoção deste material fraturado, verificou-se a ocorrência de um "bolsão" de rocha

decomposta. O material decomposto será totalmente removido até encontrar rocha sã. Posteriormente o "bolsão" será preenchido com

concreto de regularização". A execução deste procedimento está documentado no Relatório

Técnico da Obra de Outubro de 2001. No entanto, a falta de previsão da feição geológica da ombreira

esquerda, no projeto da ATECEL, por estar abaixo da cota investigada nos relatórios de sondagem, torna-se irrelevante a partir do momento

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que, após as escavações, tal feição foi visualizada, registrada no

Diário de Obras, estudada, propostas soluções e estas executadas. A escavação se deu até as cotas abaixo da perfurada pela sondagem

rotativa (conforme anotação no Diário de Obra do dia 18 de janeiro

de 2001-folhas 349 do volume 01 do processo e projeto "As Built" Projeto de escavação - planta e perfil longitudinal, Documentos do

Projeto Executivo, Apenso IV do Processo.); adicionalmente as sondagens rotativas FURO 03, FURO 04 e FURO 05 do projeto da

ATECEL demonstravam rocha sã na sua porção final. Em face do pronunciamento da Juíza Federal da 3º Vara do Estado da

Paraíba, Dra. Cristina Maria Costa Garcez, é de suma importância no contexto do processo de Camará conceituar as diferenças contidas na

definição do significado das palavras "imprevisível" e "imprevisto".

"É o que importa relatar. Decido. [...] Paira dúvida, porém, se a falha geológica era imprevista e imprevisível, como sustentam as empresas

rés, ou se estudos complementares poderiam levar à sua correta interpretação e/ou à adoção de medidas adequadas para tratamento

da falha e/ou à certeza da eficácia dos tratamentos realizados na

ombreira esquerda. ...[...]."(grifos nossos)

A juíza em sua última decisão coloca esta questão como crucial para emissão de seu pronunciamento e decisão final.

Acreditamos que se faz necessária a análise cronológica a partir do momento zero (elaboração do Projeto Básico / Projeto Executivo

ATECEL), até os estudos elaborados pelas varias comissões (pós acidente).

Na fase do Projeto Básico e do desenvolvimento inicial do Projeto Executivo as informações disponíveis através dos estudos realizados

eram suficientes e não havia naquele cenário nenhum indicativo que merecesse maior aprofundamento dos estudos e a ocorrência de

qualquer problema era imprevisível. Durante a execução da obra foi encontrada na Ombreira Esquerda,

numa cota inferior ao limite da sondagem mais próxima, uma camada

de rocha decomposta, demonstrando, deste modo, que até então todos os estudos realizados indicavam um modelo geológico cuja

interpretação era difícil, a respaldar sua característica como imprevisível.

A questão foi discutida. O projetista juntamente com o geólogo contratado, apresentaram soluções.

'[...] a) Limpeza e proteção da OE com ênfase para os planos de xistosidade perpendiculares ao eixo da barragem com preenchimento

de +- 30cm. Sugere-se concreto varrido ou similar.; b) Proteção da zona de preenchimento da OE para posterior execução do plano de

injeções adensado e com controle especifico.; c) Retirada do material de preenchimento e substituição por concreto. Sugere-se a retirada

de seções de 3 m de comprimento por desmonte hidráulico e preenchimento com concreto projetado em trechos sucessivos ou

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alternados.; d) Ênfase em todo plano de injeções e drenagem ao

longo do eixo da barragem, com adensamento da malha da zona de preenchimento. Complementação com linha perpendicular à primaria,

ao longo do preenchimento no sentido jusante, com controle rigoroso

e testes de permeabilidade. Sugere-se diferentes traços de calda.; e) Proteção à montante da barragem na interseção da zona de

preenchimento com apoio no maciço em CCR. Sugere-se solo ou concreto projetado [...]'

Concluída aquela fase da obra, onde tudo o que foi proposto foi

implementado, o cenário era de imprevisibilidade de que algum evento pudesse ocorrer a partir do que foi detectado e devidamente

tratado. Claramente, a situação até então existente era afeita ao imprevisível,

pois o modelo geológico encontrado no decorrer da obra que demandava correções só foi devidamente verificado após o inicio das

escavações, devidamente tratado pela técnica recomendada para esta situação, e, ainda assim, no demonstrava que outros problemas

poderiam surgir.

Vale sublinhar que apesar da constatação ter ocorrido em cota inferior ao limite da sondagem, a partir daí a questão da localização

perde relevância porque qualquer que seja a avaliação, o que ficou evidente é o modelo complexo do terreno que até então se mostrava

rígido. Neste sentido, até então não era possível a detecção da possível ocorrência de outros problemas.

Até a ocorrência das anomalias de comportamento da fundação pós entrega da barragem, não havia situação de previsibilidade de outra

feição geológica problemática e seu possível comportamento, de modo que não há que se falar que esta nova situação geológica seria

imprevista, já que todos os cuidados necessários para a verificação geológica e tratamento do que fora encontrado parecem devidamente

tomados e executados pelos construtores. A obra foi concluída e entregue em 2002. Em 2004, a projetista, a

partir de constatações verificadas em relatórios de fevereiro e março

daquele mesmo ano, notificou o proprietário sobre o abandono da obra, sobre a falta de monitoramento do enchimento da barragem e o

comportamento anormal de determinados dreno e da detecção das águas turvas oriundas dos referidos drenos e da deposição de

materiais no fundo da galeria. Desde então, fica caracterizada a necessidade da intervenção do

proprietário que deveria promover as verificações necessárias para identificar e mitigar as ações e soluções do problema, até então

desconhecido, imprevisível. Assim, a situação do imprevisto começa a se caracterizar a partir

deste alerta e aí sim, o proprietário não insere na sua avaliação o risco de um acidente potencial e nem sequer promoveu o

esvaziamento do reservatório, que seria em qualquer situação, a única alternativa que evitaria a ruptura das fundações da barragem e

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suas danosas conseqüências, conforme o MM. Juízo Federal já deixou

consignado na r.. Decisão saneadora. Vale dizer, até a ocorrência dos problemas verificados após a entrega

da barragem, o modelo geológico e seu comportamento eram

imprevisíveis, pois não apareceram nas sondagens no local que fora localizado, e em escavações em profundidade inferior à cota de tais

sondagens, de sorte que o que foi possível ser detectado teve as correções necessárias devidamente realizadas, sendo que não havia,

até então, nenhum indicativo da necessidade de outras investigações, justamente pelo complicado modelo geológico ali presente,

imprevisível. A partir do momento em que os problemas com a barragem se

mostraram existentes, a situação "de imprevisível" tornou-se "de imprevista", pois o proprietário da obra, sabendo de anomalias

existentes na fundação e possivelmente de novos problemas no modelo geológico até então imprevisível, na opinião dos peritos

houve negligência dos proprietários da obra em verificar o problema que se mostrou possivelmente detectável.

Após o acidente, agora já com as fundações expostas, é que os

técnicos consultores em geologia e geotecnia que atuaram pelo Ministério Público e pelas construtoras, puderam avaliar a

complexibilidade da geologia local e constataram a partir daquela exposição que houvera uma interpretação equivocada do modelo

geológico adotado, não foi o mais apropriado para aquela situação especial.

Vejamos que estas avaliações foram possíveis a partir do acidente com a exposição total da superfície, o que equivale a uma "autópsia",

situação que antes, durante a fase construtiva da obra, não era possível de ser avaliada em sua extensão" (grifei).

Cediço que as conclusões do expert oficial, como terceiro

auxiliar do juiz e com posição equidistante das partes em litígio, gozam da presunção de veracidade.

Efetivamente, a prova pericial, digna de louvor, demonstra a

saciedade, o fato de que a ruptura da Barragem de Camará foi ocasionada pela omissão injustificada do proprietário da obra, que

não adotou as medidas emergenciais necessárias, quando ela apresentou sinais de graves anomalias, não possuindo nenhuma

relação com o assentamento da barragem em blocos soltos e com falta de tratamento adequados e suficientes, nem com a não

implementação de tudo o que foi proposto pelo Geólogo consultor para tratamento da ombreira esquerda ou da não observação das

boas técnicas de engenharia, como queria fazer crer o MPF. A propósito, não compartilho da ótica do MPF ao vislumbrar

ocorrência de tamanho descalabro. Não havia outra forma de se avaliar e adotar a medida corretiva

pelo proprietário da obra, senão através do rebaixamento do nível da barragem. Trata-se de fator a ser constatado posteriormente ao

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recebimento da obra, quando a barragem já tivesse recebido água

suficiente. O princípio da prevenção impunha a adoção de tal medida.

Não é possível, portanto, atribuir a responsabilidade às

construtoras conjuntamente com o proprietário, eis que o abandono da obra pelo Estado da Paraíba possuiu aptidão para, por si só,

causar a ruína desta.

Não bastassem todas essas razões, a decisão de seguir os procedimentos técnicos recomendados pelo geólogo Alexandre

Sagnori partiu da fiscalização da SEMARH, contratante da obra, por força da cláusula VII, letra "c", do instrumento contratual, a qual

estabelece:

"Cláusula VII - A FISCALIZAÇÃO terá poderes para supervisionar a execução dos serviços e especialmente para:

[...] c) Decidir, por parte da CONTRATANTE, todas as questões que se

levantarem no campo durante o andamento das obras;

[...]"

A propósito, no Diário da Obra do dia 14/02/01, consta a seguinte determinação, assinada pela Fiscalização da obra:

"- Foi aprovado o procedimento já discutido anteriormente em obra, e

será emitido parecer técnico pelo geólogo Alexandre Sagnori".

Deveras, voltando novamente a atenção ao depoimento de Flávio José Cota Silva, engenheiro líder da obra, acerca do poder decisório

da SEMARH sobre os fatos relevantes desta - fls. 552/559 - destaco o seguinte trecho:

"... que era consenso a existência de feição geológica da ombreira

esquerda; que também, havia necessidade de uma análise

especializada para determinação dos procedimentos; que na reunião do dia 1º de fevereiro onde participaram os engenheiros Antonio

Soares, Gilmar Ferreira, Francisco Holanda, Ovídio Catão, Silmar Paiva, Flávio Cota Shelen Alonso, que nesta Reunião ficou acertado

que seria da Holanda Engenharia Ltda que iria indicar um geólogo para analisar a feição geológica da ombreira esquerda; que não sabe

informar se o geólogo Alexandre Signori já havia trabalhado para Andrade Galvão, nem para Construtora Holanda Engenharia; que, se

houvessem explosões no período de 15 de fevereiro, poderia comprometer a concretagem já realizada, mas as quantidades

aplicadas não eram significativas; que o relatório conclusivo de Alexandre Signori fazia duas opções: a primeira seria o desmonte da

rocha com o uso de explosivos; e a outra opção, envolvia cinco procedimentos técnicos, consignados em seu relatório; que a solução

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escolhida pela SEMARH foi a utilização de cinco procedimentos, ou

seja a opção dois do geólogo; Que a decisão foi tomada pela SEMARH; que está escrito no relatório de ocorrência da obra que a

decisão foi tomada por Antonio Soares; que se a decisão partiu

apenas dele, não sabe informar; que, fica claro, que a consultoria emitiu sugestão dos cinco procedimentos, a SEMARH aprovou, e o

consórcio executou; que a decisão de atender ao procedimento aceito dentro do parecer do geólogo Alexandre Signori foi da SEMARH; que

não sabe informar, o depoente, qual essa razão, uma vez que as decisões tomadas pela SEMARH e consórcio, todas foram com base

contratual; que é previsto contratualmente que as decisões da obra ser da SEMARH; que a CRE/ANDRADE GALVÃO, não tiveram

nenhuma participação nesta decisão porque as empresas trabalham por preço unitário, e qualquer que fosse a decisão, economicamente,

não haveria nenhuma repercussão financeira; que, se fosse sugerido alguma proposta que contrariasse as boas normas de engenharia, é

obrigação de qualquer um contestar; que a CRE/ANDRADE GALVÃO, considerou a proposta sugerida pelo Geólogo como correta, por isso

operacionalizou, que a segunda proposta apresentada pelo geólogo,

não contraria a boa norma de engenharia;..."

Nesse ponto, releva observar que, muito embora o Ministério Público Federal tenha sido enfático sobre a responsabilidade objetiva

do construtor; no presente caso, contudo, essa regra não se aplica às construtoras, que apenas operacionalizaram as ordens do dono da

obra, e não executaram o serviço em desacordo com os padrões da engenharia.

Nesse passo, o Estado da Paraíba, enquanto proprietário da obra, responde objetivamente pelos danos que resultaram do

desabamento da construção. Nesse sentido, dispõe o Código Civil atual:

"Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja

necessidade fosse manifesta".

Desta forma, deve ser julgada improcedente a pretensão inicial, com a apreciação da lide com resolução do mérito (art. 269, inciso I,

do CPC), em relação às rés C.R.E. Engenharia Ltda, Andrade Galvão Engenharia Ltda e Holanda Engenharia Ltda.

Firmada a responsabilidade do Estado da Paraíba pelo rompimento da Barragem de Camará, em virtude de ter se omitido

injustificadamente em baixar o nível do reservatório, permitindo a realização dos serviços necessários, emerge daí sua responsabilidade

pela reconstrução da represa e pelos prejuízos causados a terceiros, ressalvado o direito de regresso contra o responsável nos casos de

culpa ou dolo (artigo 37, §6º1, , da CF/88).

Analisando o aludido artigo da Constituição Federal, vê-se que o Constituinte adotou a teoria da responsabilidade civil objetiva,

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determinando que o Estado se responsabiliza pelos danos causados

pelos seus agentes. Diferentemente da responsabilidade civil subjetiva, a

responsabilidade objetiva torna irrelevante a análise do elemento

volitivo na conduta do ofensor, debruçando-se unicamente sobre a relação causa-efeito existente entre a conduta e o dano. É dizer: A

responsabilidade estatal pode advir tanto de ato lícito, quanto de ato ilícito, bastando, para tanto, a ocorrência de um dano provocado pelo

Estado e suportado pelo particular. Dessa maneira, para a configuração da responsabilidade objetiva

do Estado a presença de três requisitos torna-se obrigatória, quais sejam: conduta de agente público, no uso de suas atribuições,

vinculado à Administração direta ou à Administração indireta, desde que prestadora de serviço público; dano e nexo de causalidade entre

aquela e este. É preciso, contudo, ressaltar que, nos casos referentes à

omissão do Estado, a jurisprudência vem se posicionando no sentido de não se aplicar a responsabilidade objetiva do Estado mediante a

teoria do risco administrativo, mas sim a teoria da culpa no serviço,

necessitando, portanto, a vítima do dano demonstrar que o serviço não fora prestado ou fora mal prestado. Neste sentido, precedente do

STF: "EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: DETENTO FERIDO POR OUTRO DETENTO.

RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º. I. - Tratando-se de ato omissivo do

poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três

vertentes -- a negligência, a imperícia ou a imprudência -- não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída

ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. - A falta do serviço -- faute du service dos franceses -- não dispensa o

requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre

ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro. III. - Detento ferido por outro detento: responsabilidade civil do

Estado: ocorrência da falta do serviço, com a culpa genérica do serviço público, por isso que o Estado deve zelar pela integridade

física do preso. IV. - RE conhecido e provido" (RE 382054, Rel. Min. Carlos Velloso, p. 01/10/2004).

Sobre o tema, assim pontua Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de Direito Administrativo, págs. 895/896):

"Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou

ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente,

ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido

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responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar

ao evento lesivo". Entretanto, a questão ainda não é pacífica, colhendo-se recentes

julgados do STF que imputam responsabilidade ao Estado,

objetivamente, mesmo nos casos de atos omissivos: "O Tribunal, por maioria, deu provimento a agravo regimental

interposto em suspensão de tutela antecipada para manter decisão interlocutória proferida por desembargador do Tribunal de Justiça do

Estado de Pernambuco, que concedera parcialmente pedido formulado em ação de indenização por perdas e danos morais e

materiais para determinar que o mencionado Estado-membro pagasse todas as despesas necessárias à realização de cirurgia de

implante de Marcapasso Diafragmático Muscular - MDM no agravante, com o profissional por este requerido. Na espécie, o agravante, que

teria ficado tetraplégico em decorrência de assalto ocorrido em via pública, ajuizara a ação indenizatória, em que objetiva a

responsabilização do Estado de Pernambuco pelo custo decorrente da referida cirurgia, 'que devolverá ao autor a condição de respirar sem

a dependência do respirador mecânico'. Entendeu-se que restaria

configurada uma grave omissão, permanente e reiterada, por parte do Estado de Pernambuco, por intermédio de suas corporações

militares, notadamente por parte da polícia militar, em prestar o adequado serviço de policiamento ostensivo, nos locais notoriamente

passíveis de práticas criminosas violentas, o que também ocorreria em diversos outros Estados da Federação. Em razão disso, o cidadão

teria o direito de exigir do Estado, o qual não poderia se demitir das conseqüências que resultariam do cumprimento do seu dever

constitucional de prover segurança pública, a contraprestação da falta desse serviço. Ressaltou-se que situações configuradoras de falta de

serviço podem acarretar a responsabilidade civil objetiva do Poder Público, considerado o dever de prestação pelo Estado, a necessária

existência de causa e efeito, ou seja, a omissão administrativa e o dano sofrido pela vítima, e que, no caso, estariam presentes todos os

elementos que compõem a estrutura dessa responsabilidade. (...)"

(STF 223-AgR, Rel. p/ o ac. Min. Celso de Mello, julgamento em 14-4-08, Informativo 502).

"Responsabilidade civil do Estado. Artigo 37, § 6º, da Constituição do Brasil. Latrocínio cometido por foragido. Nexo de causalidade

configurado. Precedente. A negligência estatal na vigilância do criminoso, a inércia das autoridades policiais diante da terceira fuga e

o curto espaço de tempo que se seguiu antes do crime são suficientes para caracterizar o nexo de causalidade. Ato omissivo do Estado que

enseja a responsabilidade objetiva nos termos do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição do Brasil" (RE 573.595-AgR, Rel. Min. Eros

Grau, julgamento em 24-6-08, DJE de 15-8-08). Seguindo a linha de orientação mais recente do STF - ou seja,

uma vez fixado o caráter objetivo da responsabilidade civil do Estado, mesmo em casos de falha do serviço - para resultar no dever de

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indenizar, é necessária e suficiente a comprovação do dano e do nexo

de causalidade entre a conduta da ré e o dano sofrido pelo autor. Nos casos de culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior

rompe-se o nexo causal entre conduta/omissão estatal e dano, não

havendo, portanto, dever de indenizar. Mesmo que se admita a subjetivação no caso de conduta

omissiva, não é necessária imputação de culpa estrito senso - nas modalidades imperícia, imprudência ou negligência - a um agente em

especial, bastando a demonstração do mau funcionamento do serviço prestado pelo Estado, propiciando o surgimento de dano em

detrimento de outrem. Do apanhado probatório, portanto, emerge que o fato danoso

ocorreu. Isso é incontroverso. Nexo Causal - falha do serviço - falta de monitoramento do

primeiro enchimento do reservatório, que, como já vimos, era obrigação do proprietário da obra.

4. Dos demais pedidos.

Quanto a tornar definitivos os pedidos formulados em sede de antecipação dos efeitos da tutela constantes nas alíneas "a", "b'" "c"

e 'd", todos relacionados com o pagamento das indenizações devidas em face do rompimento da Barragem de Camará; entendo que , de

fato, falece legitimidade ao MPF para propor a presente ação civil pública.

Os lesados pelo rompimento da aludida Barragem (contribuintes, agricultores e moradores das cidades circunvizinhas)

são perfeitamente identificáveis, a maioria, aliás, já o foi, inclusive, com definição do valor das indenizações devidas, várias delas

saldadas desde antes do ajuizamento desta ação (9º volume, págs. 2.496/2520).

O direito às indenizações não atinge a coletividade como um todo. Apesar de seu aspecto de interesse social, cuida-se de direito

individual, disponível e divisível, e não difuso insusceptível de ser

defendido por meio de ação civil pública, cabendo àquele que ainda não recebeu a respectiva indenização ou não concordar com o valor

oferecido pelo Estado da Paraíba ajuizar, de forma individual ou coletiva, ação visando ao ressarcimento do dano. É o que dizem os

precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, assim ementados:

"EMENTA: MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PUBLICA. TAXA DE

ILUMINAÇÃO PÚBLICA NO MUNICIPIO DE RIO NOVO-MG. EXIGIBILIDADE IMPUGNADA POR MEIO DE AÇÃO PÚBLICA, SOB

ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ACÓRDÃO QUE CONCLUIU PELO SEU NÃO-CABIMENTO, SOB INVOCAÇÃO DOS ARTS. 12, I, a, E

125, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO.

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Ausência de legitimação do Ministério Público para ações da espécie,

por não configurada, no caso, a hipótese de interesses difusos, como tais considerados os pertencentes concomitantemente a todos e a

cada um dos membros da sociedade, como um bem não

individualizável ou divisível, mas, ao revés, interesses de grupo ou classe de pessoas, sujeitos passivos de uma exigência tributária cuja

impugnação, por isso, só pode ser promovida por eles próprios, de forma individual ou coletiva. Recurso não conhecido" (RE

213.631/MG. STF, rel. Min. Ilmar Galvão, DJU 07.04.2000).

"EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGENCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA,

BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. INEXISTENCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. MINISTÉRIO PÚBLICO.

ILEGITIMIDADE AD CAUSAM. 1. Tratando-se de benefício previdenciário, em que não há interesse

individual indisponível, mas sim, direito patrimonial disponível, suscetível de renúncia pelo respectivo titular, bem como não sendo

relação de consumo, o Ministério Público não detém legitimidade

ativa ad causam para propor ação civil pública em defesa de tal direito. Precedentes das Turmas que compõem esta Terceira Seção.

2. Embargos rejeitados"(EREsp 448.684/RS. STJ, rel. Min. Laurita Vaz, j. 28.06.2006, DJU 02.08.2006).

'EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA

INDENIZATÓRIA. ILEGITIMIDADE ATIVA. COMPROMISSOS DE COMPRO E VENDA DE IMÓVEIS. ATRASO NA ENTREGA DE

APARTAMENTOS EM CONSTRUÇÃO. INICIAL INDEFERIDA. PROCESSO EXTINTO.

1. A falta de configuração de real interesse coletivo afasta a legitimidade do Ministério Público para promover ação civil pública

objetivando o recebimento de indenização pelo atraso na entrega da obra de imóveis compromissados à venda, mormente quando se

identifica verdadeira hipótese de invasão da seara da advocacia

particular e, inobstante o limitado grupo de possíveis interessados, de fácil identificação, a instrução da inicial traz à colação apenas dois

contratos, sem esforço prévio relevante para a congregação do todo ou de um número mais expressivo, ensejando interpretação de que,

na espécie, a lide foi proposta para atender alguns descontentes. 2. Recurso especial não conhecido "(REsp 236.161/DF. STJ, rel. Min.

Aldir Passarinho Júnior, j. 06.04.2006, DJU 02.05.2006.). Também pede o MPF que o Estado da Paraíba apresente a este

Juízo, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, critérios objetivos para a destinação das casas que no momento estão sendo reconstruídas,

além de cronograma de atividades contemplando as necessidades das famílias atingidas; em especial, a capacitação da comunidade e

recriação de atividades produtivas que venham gerar emprego e renda.

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O Estado da Paraíba conta com diversos programas na área de

agricultura e desenvolvimento, a exemplo do Empreender-Pb e Cooperar, de sorte que está aberta a possibilidade de inserção das

famílias atingidas dentro das políticas públicas já existentes, inclusive

aquelas em parceria com o Governo Federal, sem que isso configure ingerência indevida do Poder Judiciário na atuação do Executivo

Estadual, razão pela qual procede o pedido. O MPF sustenta serem devidos danos materiais coletivos de

natureza difusa, consistentes em danos emergentes e lucros cessantes no valor de 10.000.000,00 (dez milhões de reais) para

cada um. O primeiro, em razão do prejuízo causado à infra-estrutura da região. O segundo, em razão dos benefícios que adviriam para a

região pela existência do reservatório. Pede que a indenização seja revertida para aplicação em projetos de desenvolvimento

sustentáveis em todos os municípios afetados pelo desastre. Postula, também, a condenação ao pagamento de danos morais coletivos, a

serem arbitrados por este Juízo. Conforme ressaltado anteriormente, os danos verificados são

mais individuais do que propriamente sociais, não sendo razoável

impingir mais ônus ao pobre Estado da Paraiba, mediante mais uma condenação tão vultosa, desta feita em dano emergente, lucro

cessante e dano moral coletivos, reparações civis impropriamente importadas do direito ambiental e consumerista para o direito de

natureza administrativa, como é o caso em apreço. Assim, caberá a qualquer lesionado, inclusive aos municípios

atingidos pelo rompimento da barragem, propor ações individuais ou coletivas, com individualização e comprovação dos danos

emergentes, lucros cessantes e danos morais passíveis de reparação. Dessa feita, improcede o pleito de reparação civil coletiva.

No tocante ao pedido para que o Estado da Paraíba apresente cronograma de reimplantação dos serviços públicos, constata-se do

documento de fls. 2496/2498 (9º volume) que o desmoronamento da Barragem em tela passou a exigir a realização dos seguintes

serviços:

I) Reconstrução da ponte sobre o rio Mamanguape; II) Restauração da PB -079;

III) Restauração da PB -075; IV) Recuperação das estradas vicinais de Alagoa Grande;

V) Reconstrução da passagem molhada de São José do Miranda;

VI) Recuperação das casas semi-destruídas na zona urbana de Alagoa Grande;

VII) Reconstrução de uma escola na zona rural de Alagoa Nova; VIII) Reconstrução de muros, calçadas e pavimentação de ruas

e, IX) reconstrução das casas destruídas na zona urbana de

Alagoa Grande e na zona rural de Alagoa Nova, Areia e Mulungu.

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O mesmo documento de fls. 2.496/2.498 informa que desde 09

de abril de 2005, a grande maioria dos serviços afetados já estava em fase de reconstrução/restauração/recuperação, restando dar

início apenas à reconstrução de muros, calçadas e pavimentação de

ruas, já licitados à época, pelo que o cumprimento desse pedido de reimplantação dos serviços públicos deverá ser objeto de liquidação

de sentença.

Fica o Estado da Paraíba, desde já, autorizado a dar início ao processo de reconstrução da Barragem Camará.

D I S P O S I T I V O

Ante o exposto:

a) JULGO IMPROCEDENTES os pedidos, em relação às rés C R E Engenharia Ltda, Andrade Galvão Engenharia Ltda e Holanda

Engenharia Ltda; b) JULGO PROCEDENTES, EM PARTE, os pedidos iniciais, para

condenar o Estado da Paraíba nas seguintes obrigações:

1) reconstrução da Barragem Barra de Camará; 2) inserção das famílias atingidas dentro das políticas públicas já

existentes, em especial naquelas voltadas à capacitação das comunidades e recriação de atividades produtivas que venham gerar

emprego e renda; 3) reimplantação dos serviços públicos afetados pelo

desmoronamento da barragem, listados no documento acostado à fl. 2.498, quais sejam:

I) Reconstrução da ponte sobre o rio Mamanguape; II) Restauração da PB -079;

III) Restauração da PB -075; IV) Recuperação das estradas vicinais de Alagoa Grande;

V) Reconstrução da passagem molhada de São José do Miranda; VI) Recuperação das casas semi-destruídas na zona urbana de Alagoa

Grande;

VII) Reconstrução de uma escola na zona rural de Alagoa Nova; VIII) Reconstrução de muros, calçadas e pavimentação de ruas e,

IX) reconstrução das casas destruídas na zona urbana de Alagoa Grande e na zona rural de Alagoa Nova, Areia e Mulungu

O cumprimento das obrigações acima (I a IX) deverá ser demonstrado em liquidação de sentença.

Diante da sucumbência, caberá ao Estado da Paraíba ressarcir as construtoras rés dos honorários periciais por estas adiantados.

Pelo mesmo motivo acima exposto, condeno o Estado da Paraíba a pagar honorários advocatícios, em favor das construtoras rés, que

arbitro em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para cada uma, considerando que a causa, diante de sua complexidade, exigiu um

maior esforço dos advogados, em especial, durante a dilação probatória e nos incidentes processuais verificados.

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Sem condenação da União (MPF) em honorários em favor das

construtoras, nem do Estado da Paraíba em favor da MPF; seja porque não diviso má-fé do MPF no ajuizamento da ação; seja porque

os membros do MPF são impedidos de perceberem honorários de

sucumbência. Oficie-se à MM. Juíza de Direito da Comarca de Alagoa Grande,

instruindo o expediente com cópia desta sentença. Expeça-se alvará para levantamento dos honorários periciais.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

João Pessoa, 13 de maio de 2011.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZ Juíza Federal da 3ª Vara

1 "§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras

de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,

causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos

casos de dolo ou culpa."

PODER JUDICIÁRIO/ JUSTIÇA FEDERAL DE 1º GRAU / SEÇÃO

JUDICIÁRIA DA PARAÍBA /3ª VARA Processo nº 0007725-29.2005.4.05.8200

Cristina Maria Costa Garcez Juíza Federal da 3ª Vara