rudolf laban 2 domínio do movimento

138
DOMiNIO DO MOVIMENTO, a primeira obra que se publica no Brasil com os estudos de Rudolf Laban, vem ã público para elucidar, explicar e sedimentar a Arte do Movimento. A obra foi organizada em sua edição original por Lisa Ullmann, que em sua estada no Brasil retocou os últimos detalhes desta edição. Este livro éa demonstração exata do pensamento de Laban, que, certo de que o movimento . humano é sempre constituido dos mesmos elementos, seja na arte, seja no trabalho, seja na vida cotidiana, empreendeu um estudo exaustivo sobre estes elementos constitutivos e sua utilização, dando ênfase tanto à parte fisiológica quanto à parte psiquica que levam o homem a se movimentar. O livro contém ainda numerosos exercícios e uma seleção de cenas mimicas que, além de se destinarem à sensibilização intelectual, emocional e física, proporcionam ao leitor a oportunidade de colocar em prática seu crescente conhecimento da do Movimento. 1111111111 PALMAS 128879 s;: OJ' » 2 RUDOLF LABAN DOMíNIO DO MOVIMENTO ediçãporganizada por Lisa Ullmann l summus editorial

Upload: others

Post on 28-Jun-2022

20 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

DOMiNIO DO MOVIMENTO, a primeira obraque se publica no Brasil com os estudos de Rudolf

Laban, vem ã público para elucidar, explicare sedimentar a Arte do Movimento. A obra foi

organizada em sua edição original porLisa Ullmann, que em sua estada no Brasilretocou os últimos detalhes desta edição.

Este livro é a demonstração exata do pensamentode Laban, que, certo de que o movimento .

humano é sempre constituido dos mesmos elementos,seja na arte, seja no trabalho, seja na vida cotidiana,

empreendeu um estudo exaustivo sobre esteselementos constitutivos e sua utilização,

dando ênfase tanto à parte fisiológica quanto à partepsiquica que levam o homem a se movimentar.

O livro contém ainda numerosos exercícios e umaseleção de cenas mimicas que, além de se

destinarem à sensibilização intelectual, emocionale física, proporcionam ao leitor a oportunidade

de colocar em prática seu crescente conhecimentoda Ar~e do Movimento.

IIIII~1111111111~I~ IIIIII~ ~II ~IIPALMAS 128879

s;:OJ'»2

RUDOLF LABAN

DOMíNIODO

MOVIMENTOediçãporganizada por Lisa Ullmann

lsummuseditorial

Page 2: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Laban, Rudolf 1879-1958.L114d Domínio do movimento / Rudolf laban; ed. orga-

nizada por Lisa Ullmann [tradução: Anna Maria BarrosDe Vecchi e Maria Sílvia Mourão Netto; revisão técni­ca: Anna Maria Barros De Vecchi]. - São Paulo: Summus,1978.

Título original: The mastery of movement.IS8N 85-323-0017-0

1. Danças - Marcação 2. Movimento (Representa­ção teatral) r. UlLmann, Lisa. II. Titulo. Domínio do movimento

78-1287

CDD-793.32-792.028

Índices para catálogo sistemático:RUDOLF LABAN

1. Arte do movimento: Marcação: Dança2. Movimentos : Artes da representação3. Movimentos: Marcação : Dança4. Notação: Movimentos do corpo : Dança

793.32792.028793.32793.32

Edição organizada por Lisa Ullmann

A~'~~lr.:::::.-::::::

, Compre em lugar de fotocopiar.Cada real que você dá por um livro recompensa seus autores

e os convida a produzir mais sobre o tema;'incentiva "seus editores a encomendar, traduzir e publicar

t - ....-eoutras obras sobre o assunto;e paga aos livreiros por estocar e levar até você Livros

para a sua informação e o seu entretenimento.Cada real que você dá pela fotocópia não autorizada de um livro

finanda o crimee ajuda a matar a produção intelectual de seu país.

A

Campus Universitário de PalmasUFT

BIBLIOTECA

summuseditorial

Page 3: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

:I

w........... ~c.. 1& /I.~ Po~Iet;;6e...

.~ r:.fltelv tLevez,~1- It.e.~f t1f~v~~f M- ~fic.'2.A:L.

-tv.~~~

Que seja bem-vinda a tradução deste livro para o português. E que se mostre fértilpropiciando maior desenvolvimento da arte do movimento no Brasil.

Lisa Ullmann

Page 4: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Do original em língua inglesalHE MASlERY OFMOVEMENT

Copyright© 1971 by MacDonald & Evans LimitedDireitos desta tradução adquiridos por Summus Editorial

Organização da edição original: Lisa UllmannTradução: Anna Maria Barros De Vecchi

Maria Sílvia Mourão NettoRevisão técnica: Anna Maria Barros De Vecchi

Fundal;ao Universidade Federal doTocantins 1ClJmp!J~ Univarsitério de Palmas '.

BIBLIOTECA fReg. J rlf38 't'9 Rub. .Data ",)4 I 03 ,JJOk:/Doe. c:rm~ JR" . ~

íNDICE

APRESENTAÇÃO DA EDIÇÃO BRASILEIRA

SOBRE O AUTOR •••.••••.•..•.•••••••.•••••••.•••.. . ••.

PREFÁCIO A PRI~IRA EDIÇÃO

PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO

PREFÁCIO À TERCEIRA EDIÇÃO

Capítulos

1. INTRODUÇÃO o •••••••••••••••••••••••••••••••

2. MOVIMENTO E CORPO (PARTE 1) o •••••••••

ANÁLISE DE AÇÕES CORPORAIS SIMPLES

7

9

11

14:=17

19

47

Summus EditorialDepartamento editorial:

Rua Itapícuru, 613 - 72 andar05006-000 - São Paulo - SP

Fone: (11) 3872-3322Fax: (11) 3872-7476

http://www.summus.com.bre-mail: [email protected]

Atendimento ao consumidor:Summus Editorial

Fone: (11) 3865-9890

Vendas por atacado:Fone: (11) 3873-8638Fax: (11) 3873-7085

e-mail: [email protected]

Impresso no Brasil

3. MOVIMENTO E CORPO (PARTE II) ........ 88ANÁLISE DE AÇÕES CORPORAIS COMPLEXAS

MOVI~NTOSRELACIONADOS A PESSOAS E OBJETOS

CORRELAÇÃO ENTRE AÇÕES CORPORAIS E ESFORÇO

4. O SIGNIFICADO DO MOVIMENTO o ••••••••• 132

5. RAÍZES DA MÍMICA o......................... 155

6. O ESTUDO DA EXPRESSÃO DO MOVIMENTO 194PRODUÇÃO DE CENAS GRUPAIS

CENAS SIMBÓLICAS

7. TRÊS PEÇAS MÍMICAS 234A BUSCA DE TAMINO

A DANÇA DOS SETE VÉUS

O XALE DOURADO

Page 5: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

LISTA DE TABELASAPRESENTAÇÃO DA EDIÇÃO

BRASILEIRA

CENAS PARA ESTUDO

Seis Exemplos de Seqüências de Movimentos 55

Seis Exemplos de Cenas de Movimento 89Cena de Caráter Emocional '201

Cenas em Ambientes Inusitados '.............. 201

Cenas Contendo Ações Práticas 202Diálogos-Mímicos .... '........................... 202

Cenas Relativas. a Movimentos e Costumes 203

Outras Fontes de Estilização do Movimento 204

Outras Quinze Cenas para Estudo 214-221

Tabela

IIIIIIIVV

VIVIIVIIIIX

o CORPO •...•.••••.••••.••.••••••••.•.•.••••

ESPAÇO

TEMPO .•.••••••••••.•••.•••..•••.••••.•••••

PESO .•••...••.••..•..•••.....•••.•.•••.••••

FLUÊNCIA ....•....••...........•.•.•.•••••.

ESFORÇO

FATORES DO MOVIMENTO .•.•••••••••••••••••• ,

o DEMÔNIO •••••••••.•••••.••••. ,., •••••••••

A DEUSA .•••......•...•..••••.•. , .••••••••••

5773

76

79

86

126186188

191

ESTA tradução brasileira vem de encontro à necessida­de cada vez maior de fundamentar e abrir ao crescentenúmero de interessados, os processos e a linguagem nãoverbal do movimento humano, segundo as idéias deRudolf Laban.

É muito amplo o conjunto dos campos em que oconhecimento deste processo e o domínio desta lingua­gem tem se mostrado de grande utilidade: Educação,Psicologia, Assistência Social, Psiquiatria, Fonoaudio­logia, Antropologia, Sociologia, Comunicação. Estes sãoapenas alguns exemplos onde hoje, no Brasil, gruposjá formados nas técnicas da Arte do Movimentoatuam.. sem contar, com outros campos diretamenterelacionados com as artes cênicas como dança profis­sional, TV, coreografia, teatro e cinema.

Hoje, em um país como o Brasil onde a coexistên­cia de grupos étnico-culturais tão divergentes, que vãodo índio ao mais perfeito tecnocrata, do mais eruditointelectual ao habitante da favela, constantementecolocados em confronto, a Arte do Movimento tem con­dições para, a partir das raízes genuínas, comuns atodos os homens, participar da pr'ocura do equilíbrioentre todos.

Espero que este livro sirva a futuras gerações deprofessores, na formação de alunos, e a todos os quevenham ii procurar informação sobre a Arte do Movi­mento, esperando que a esta tradução se sigam muitasoutras da rica literatura sobre e de Rudolf Laban.

MARIA DUSCHENES

7

Page 6: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

r

SOBRE O AUTOR

RUDOLF Laban nasceu na Bratislava, então pertencenteà Hungria, em 1879.

Por não aceitar o vazio existente nas peças de tea­tro e dança dessa época, trouxe para seu trabalho oresultado das próprias paixões e lutas interiores esociais, representadas por personagens simbólicas ouestados de espírito puros, vividos através do movimen­to, utilizado de maneira mais espontânea e semprecomo resultado consciente da união corpo-espírito.

Criou vários centros de pesquisa buscando o retornoaos movimentos naturais na sua espontaneidade eriqueza, e na plena vivência consciente de cada umdeles, a acarretar um desenvolvimento amplo e profun­do em quem o pratica.

Certo de que o movimento humano é sempre cons­tituído dos mesmos elementos, seja na arte, no trabalho,na vida cotidiana, empreendeu um estudo exaustivosobre estes elementos constitutivos e sua utilização,dando ênfase tanto à parte fisiológica, quanto à partepsíquica que levam o homem a se movimentar.

Desenvolveu uma notação de movimento capaz deregistrar qualquer um de seus tipos, a "KinetographyLaban"; conhecida nos EUA como Labanotation.

Bailarino, autor de várias coreografias famosas,renovador da dança e de seu enfoque teatral, comgrupos'profissionais de onde saíram os mais importan­tes nomes da dança expressiva européia, diretor demovimento da ópera Estadual de Berlim e outras, diri­giu seu trabalho principalmente para a dança, comomeio de educação.

9

Page 7: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Com centros na Alemanha, Suíça e outros países,foi encontrar acolhida, durante a Segunda Guerra Mun­dial, na Inglaterra, para seus ideais de harmonia elibertação através da vivência criativa do movimento.

Nesse país empreende, juntamente com Lawrenceum industrial, uma pesquisa sobre como a fluência domovimento, o ritmo natural de cada pessoa, torna-amais apta a lidar com determinados ímplementos, dissosurgindo uma metodologia para análise, treino e nota­ção do "Esforço" - parte do movimento que tem suaorigem interna - aplicada primeiramente na seleção etreino de operários durante a guerra. .

Trabalhou com um grande número de pessoas (até1.000) em danças conjuntas, empenhadas numa vivênciacomum através do movimento: Danca Coral.

Sua pesquisa e metodologia sobre o uso do movi­mento humano, pela profundidade e extensão, são hojebase para uma melhor compreensão do homem pormeio do movimento, modernamente utilizada nos maisdiversos ramos da arte e da ciência: dança, teatro,educação, trabalho, psicologia, antropologia, etc.

LISA ULLMANN

Lisa Ullmann foi estreita colaboradora de Labandurante seus últimos 20 anos, auxiliando-o no treina­mento de ateres, operários, no desenvolvimento da"Kinetography" e da dança educativa e sua aceitaçãonas escolas.

Revisou e ampliou vários livros de Rudolf Laban,e em 1946 criou o Art oi Movement Studio em Manches­ter para o treinamento de bailarinos e professores,baseados na Arte do Movimento de Laban e incorpo­rado em 1954 ao Laban Art of Movement Center Trustem Anddlestone, Surrey, do qual foi diretora até 1973.

Dedica-se atualmente a difundir a Arte do Movi­mento em cursos na Inglaterra e outros países.

ANNA MARIA BARROS DE VECCHI

10

r

PREFÁCIO À L" EDIÇAü

o LEITOR talvez já tenha ouvido falar da famosa estóriachinesa da centopéia que, ficando imobilizada, morreude inanição, porque lhe era ordenado que sempremovesse em primeiro lugar seu 78.0 pé e, em seguida,que usasse suas outras patas numa determinada ordemnumérica. Cita-se freqüentemente a estorinha comoum aviso para aqueles que pretendem tentar uma' expli­cação racional do movimento. Está claro, porém, queo infeliz inseto foi vítima de regulamentações pura­mente mecânicas, coisa que pouco tem a ver com o livrefluir da arte do movimento.

A fonte da qual devem brotar a perfeição e o domí­nio final do movimento é a compreensão daquela parteda vida interior do homem de onde se originam o movi­mento e a ação. Tal compreensão aprofunda o fluirespontâneo do movimento, garantindo uma eficaz agili­dade. A premência interior do ser humano para omovimento tem que ser assimilada na aquisição dahabilidade externa para o movimento.

Existe uma relação quase que matemática entre amotivação interior para o movimento e as funções docorpo; e o único meio que pode promover a liberdadee a espontaneidade da pessoa que se move é ter umacerta orientação quanto ao saber e quanto à aplicaçãodos princípios gerais de impulso e função.

É evidente que se trata de uma tarefa espinhosaorientar uma pessoa qualquer até que atinja o domíniototal de uma atividade prática por intermédio de umtexto, e isto se torna muito mais difícil quando se tratade um tema como o que ora estamos abordando. Tra-

11

Page 8: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

balhar com o palco - espelho da existência física, men­tal e espiritual do homem - levanta vários problemas.Indubitavelmente, deparamo-nos aqui com algumas dasrazões pelas quais a abordagem do presente tema tãopoucas vezes foi empreendida. Mas deve-se tentarnovamente e nossa expectativa é a de que este tratadovenha a ser um incentivo a outras pesquisas nestecampo tão importante.

O leitor não deve aguardar a adoção, neste livro,de um elegante estilo literário, nem tampouco de umaexposição facilmente assimilável dos problemas enfo­cados, uma vez que pouco têm a ver entre si movimentoe literatura. A Arte do Movimento é uma disciplinaquase que autocontida, que fala por si mesma e princí­p.almente se valendo de sua própria terminologia. Pra­ticamente todas as sentenças deste texto são destinadasa promover a mobilidade pessoal, de modo que o leitordeve estar preparado para fazer uso desses incen­tivos. Espera-se que a própria leitura do texto indiquecomo efetuar o que realmente é um tipo flexível deleitura. Os que preferem permanecer confortavelmentesentados em suas poltronas, enquanto lêem, terão quepular algumas partes do livro' não obstante há consolo. "ate para estes, pois é um de nossos propósitos o estudodeste tema tão interessante, qual seja raciocinar emtermos de movimento. Considerar que leitura flexívelimplica simplesmente umas tantas cambalhotas nomundo das idéias é um erro tão grande quanto admitirque a arte do movimento no palco se restringe exclusi­vamente ao balé. O movimento também é um meioessenc~al de expressão artística no drama e na ópera,sendo Igualmente um modo de satisfacão e de confortoem situações de trabalho, posto que o movimento,q~ando cientificamente determinado, constitui o deno­mmador comum à arte e à indústria.

Acrescentamos aos exemplos dados nos últimoscapítulos uma seleção de cenas de mímica. A medidaem que for tentando executar partes dessas cenas,o

12

leitor poderá colocar em prática seu crescente conhe­cimento da arte do movimento:

Este livro engloba a prática e as experiências detoda uma vida, mas eu não poderia tê-lo escrito sem aconstante troca de opiniões com amigos e alunos. Tra­ta-se, conseqüentemente, de um sumário de palestrase diálogos mantidos com muitos e muitos de meus cola­boradores, alguns dos quais reconhecidos internacio­nalmente. Meus agradecimentos, portanto, a todosaqueles que compartilharam de meu trabalho no palcoe nas pesquisas que realizei no campo da Arte do Movi­mento. São eles por demais numerosos para que ospossa mencionar individualmente; e destacar apenasuns poucos dentre eles seria injusto, desde que todos,na medida de suas possibilidades, lutaram ardente­mente para que revivessem e se enriquecessem as anti­gas informações sobre a Arte do Movimento, procuran­do aplicar essas informações na vida de todo dia. Todosesses parceiros, porém, estavam presentes em minhamente enquanto eu escrevia, e a eles dedico com grati­dão o que escrevi.

Vi-me compelido, neste manual para o palco (e,eventualmente, para a indústria). a me orientar segun­do meu próprio estilo pessoal. A razão dessa neces­sidade se revelará pelo estudo do texto.

R. LABAN

Manchester, 18 de janeíro, 1950

13

Page 9: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

PREFÁCIO À 2.a EDIÇAü

COMPARANDO-SE a riqueza de evidências que RudolfLaban coligiu durante toda sua vida referentes ao movi­mento humano e considerando-se a profunda compre­ensão que demonstrava de seu significado para a vidaindividual e comunitária, pouco foi o que ele publicoude seus achados. Preferia orientar pessoalmente osindivíduos no mundo do movimento; e foi um guia estu­pendo, pois também tinha um entendimento profundodas pessoas bem como a percepção de suas necessida­des. . Agora que não mais temos a possibilidade deaproveitar a orientação pessoal de Laban, seus livrosbem como seus muitos apontamentos e manuscritosconstituem, daqui para a frente, a única fonte de inspi­ração e informações sobre suas idéias e descobertas.

A primeira edição deste livro se esgotou pouco antesda morte de Laban, em julho de 1958. Era sua intençãorevisar o texto para a reimpressão e havia discutidocomigo as correções que desejara fazer. Contudo, nãocoube a ele empreender as mudanças; a tarefa recaiusobre mim. Tenho plena consciência da grande respon­sabilidade que assumi ao tentar rever este livro e certa­mente teria me sentido ainda mais intranqüila a esserespeito, não tivesse eu conhecimento dos planos deLaban para a nova edição.

Reescrevi os capítulos sobre "Movimento e Corpo",embora tendo basicamente seguido o esquema anterior.Em várias passagens, no entanto, tive que ampliar oconteúdo, especialmente no trecho referente a "Correla­ção entre Ações Corporais e Esforço". Enquanto Laban,em seu livro original, deu apenas leves indicações de

14

alguns de seus achados relativos ao movimento e aoesforço nos homens, tendo introduzido o leitor a apenaspoucos elementos gerais de sua teoria, tentei apresen­tar explanações mais específicas desses tópicos.

Este livro foi publicado originalmente como TheMastery of Movement on the Staçe (O Domínio do Movi­mento no Palco) mas, embora suas referências fossemendereçadas ao palco do teatro, Laban empregou-oextensamente como uma tribuna para apresentar suasidéias sobre o movimento em relação ao palco da vidahumana. Refere-se ele, nesse livro, à ação dramáticado teatro como "a intensificação artística da açãohumana". Seguramente ficará bem claro ao leitor queessa intensificação artística nada mais é do que umincremento à arte de viver, quando se aprende a domi­nar o movimento. Em virtude desse fato, arrisquei-mea omitir, no título ora apresentado, o complemento "noPalco"; espero não apenas que o tema seja atraentepara os que lidam com o teatro, como também que aabordagem adotada seja igualmente estimulante paraos que buscam entender o movimento como forca devi~. -

A terminologia empregada nesta área de estudo, eque evoluiu a partir da análise de movimento de Laban,foi desenvolvida por ele e seus colaboradores no decur­LO de prolongados experimentos práticos e debates commuitos indivíduos ao longo de vários anos. Emboratenha sido alcançado um certo grau de clareza com ocrescente conhecimento e maior experiência no assun­to, devem-se esperar algumas modificações da termino­logia. Tendo isto em mente, nos casos em que julgueinecessário acrescentei uma definição dos termos. Apro­veitei o ensejo para melhorar a composição gráfica,bem como a apresentação toda do livro, na tentativa defacilitar o seu estudo.

Gostaria, por último, de agradecer a ajuda pres­tada por meus alunos, que com tão boa vontade assis­tiram-me em vários de meus "experimentos" práticos.

15

Page 10: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Em particular, não sei como agradecer aos meus ami­gos e colegas que leram o texto e fizeram sugestõesextremamente valiosas, tendo assim me auxiliado demodo tão generoso.

Sinceramente, espero que o leitor compartilhe comi­go de meu desejo de pesquisar ainda mais profunda­mente.este fascinante fenômeno do movimento, desejoque fOI bastante estimulado quando revi este livro.

LISA ULLMANN

Addlestone, Surreu,outubro de 1960

PREFACIO À 3: EDIÇAü

FAZ, neste momento, onze anos desde a última revisãodo texto deste livro e me é bem-vinda a oportunidadede uma nova edição para que emendas e ampliaçõespossam ser introduzidas. Reintroduzi alguns parágra­fos extraídos da versão original de Laban do The Mas­tery of Movement on the Stage (O Domínio do Movi­mento no Palco); outros derivam de suas anotaçõespessoais sobre o tema e eu reescrevi partes do capí­tulo 5. Houve t.ambém um certo número de correçõesque tiveram que ser feitas. Espero ter contribuído,com todos esses acréscimos, a um maior esclarecimen­to do assunto, embora com total convicção de que aindaresta muito a ser feito. O que continua sendo um desa-fio para mim. .

LISA ULLMANN

Addlestone.maio de 1971

17

Page 11: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

liI

I\

I

II

CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO

o HOMEM se movimenta a fim de satisfazer uma neces­sidade. Com sua movimentação, tem por objetivo atingiralgo que lhe é valioso. É fácil perceber o objetivo domovimento de uma pessoa, se é dirigido para algumobjeto tangível. Entretanto, há também valores intan­gíveis que inspiram movimentos.

Eva, nossa primeira mãe, ao colher a maçã daárvore do conhecimento, executou um movimento ditadotanto por um objetivo tangível, como por um intangível.Desejava ter a maçã para comê-la, mas não apenaspara satisfazer seu apetite por comida. O tentador lhehavia dito que, comendo a maçã, ela alcançaria o máxi­mo do conhecimento: era esta sabedoria o valor funda­mental a: que ela aspirava.

Conseguiria uma atriz representar Eva colhendouma maçã de uma árvore, de modo tal que um espec­tador totalmente ignorante da história bíblica ficassea par de seus dois objetivos, o tangível e o intangível?Talvez não de todo convincentemente, mas a artistainterpretando o papel de Eva pode colher a maçã devárias maneiras, usando movimentos de variada expres­sividade. Pode fazê-lo ávida e rapidamente ou lângui­da e sensualmente. Pode também colhê-la com umaexpressão destacada no braço estendido e na mão. cris­pada, em seu rosto e em seu corpo. Muitas outrassão as formas de ação, cada uma delas podendo sercaracterizada por um tipo diferente de movimento.

Ao definir o tipo de movimento como voraz, sensualou destacado, não se define apenas aquilo que se viu deconcreto. Aquilo que o espectador observou pode ter sido

19

Page 12: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

apenas um peculiar sacudir rápido, ou talvez um lentodeslizar do braço. A impressão de voracidade ou sen­sualidade é a interpretação pessoal do espectador,conferida ao estado de espírito de Eva numa situaçãopeculiar. Se o espectador pudesse observar em Eva orápido movimento de agarrar no ar, quer dizer, se elevisse o mesmo movimento executado sem o objetivo con­creto, provavelmente não seria levado a cogitar nemdo objeto, nem do motivo. Perceberia um movimentorápido de agarrar sem compreender seu significadodramático.

Ê óbvio que poderá ocorrer ao espectador indagarse acaso este movimento, aparentemente sem propósitoobjetivo, não teria sido executado no intuito de revelaralguns traços do estado de espírito de Eva, ou de seucaráter. Ê pouco provável que um movimento consi­ga traduzir mais do que uma impressão superficial,pois jamais conseguiria oferecer um retrato definitivode seu caráter. Por outro lado, vários outros movi­mentos concordantes, como por exemplo, os que in­cluíssem a postura e o modo de andar de Eva, antesdo gesto de arrancar, ofereceriam indicações adicio­nais e mais claras de sua personalidade. Mas, mesmoem tais circunstâncias, a conduta de Eva no ato decolher a maçã seria menos característica de sua perso­nalidade do que sua momentânea avidez naquele dadocontexto. Em outras ocasiões, ela pode desenvolverritmos e formas de movimento marcadamente diferen­tes que, comportando várias ações, a revelariam comouma pessoa sob uma luz inteiramente diferente.

O movimento, portanto, revela evidentemente mui­tas coisas diferentes. Ê o resultado, ou da busca de umobjeto dotado de valor, ou de uma condição mental.Suas formas e ritmos mostram a atitude da pessoa quese move numa determinada situação. Pode tanto carac­terizar um estado de espírito e uma reação, como atri­butos mais constantes da personalidade. O movimentopode ser influenciado pelo meio ambiente do ser que

20

se move. Ê assim que, por e~emplo, .0 meio no qU,:1ocorre uma ação dará um colorido I?artlcu~arda.0fs motVI-

entos de um ator ou de uma atnz; serao 1 eren esno papel de Eva no paraíso, ou no de uma mulher dasociedade num salão do século XVIII, ou no de ur~a

moça no balcão de um bar J:.1a favela. Todas as tre.smulheres podem ter personalidades ~e~elhantes ~ eXI­bir quase que as mesmas característícas gerais demovimento, mas elas adaptariam seus comportamentos, atmosfera da época ou ao lugar em que estivessem.a Um caráter, uma' atmosfera, um est,:d.o de espí­rito ou uma situação não podem ser eficientementerep~esentadosno palco s~m o movimento e sua. iner~nteexpressividade. Os movIme~tos ?O .co~po, l!~clu.md?movimentos das cordas vocais, sao indispensáveis aatuacão no palco.

Há ainda um outro aspecto do movimento que é decapital importância paraa atuação dramática. Quandodois ou mais artistas vão se encontrar, no palco, d~vementrar em cena, aproximar-se um d~ o~tro (seja .setocando ou mantendo uma certa dístãncía entre SI) ,para depois se separarem e se retirarem de cena.

O agrupamento dos ato~~~ no pa~co se dá atravé.sdo movimento, cuja expressívídade difere da do mOVI­mento individual. Os membros de um grupo se movema fim de demonstrar seu desejo de entrar em contatouns com os outros. O objetivo ostensivo do encontropoderá ser lutar, abraçar, dançar ou simplesmenteconversar. Há, porém, propósitos intangíveis, tais cc;>moa atracão entre indivíduos que simpatizam entre SI oua repulsa sentida por pessoas ou grupos antipáticos unspara com os outros. ., .

Os movimentos grupaís podem ser VIVOS, rápidos ecarregados da ameaça de agressividade, ou suaves esinuosos como o movimento da água num lago sereno.As pessoas podem agrupar-se à semelhança de r<;>chasde montanha, ásperas e esparsas, ou como um ~:acho

que flui lentamente na planície. As nuvens frequente-

21

Page 13: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

mente se agrupam em formas bastante interessantesde efeito dramático bem estranho. Os movimentos gru~pais no palco lembram de certo modo as mutáveisnuvens, das quais tanto pode se formar uma tempestadecomo irromper o sol.°ator individual empregará por vezes a sua movi­mentação como se seus membros fossem os componen­tes de um grupo e esta é provavelmente a solução doenigma intrínseco à expressividade da gesticulação. Aocolher a maçã, voraz ou langüídarnente, Eva expres­sará sua atitude através dos movimentos de partes deseu corpo; na avidez, seus braços ou até mesmo todoo seu corpo poderão rápida e ardentemente se atirarpara a frente, completamente voltada em direcão aoobjeto ambicionado. A aproximação lânguida poderáser caracterizada por um lento e despreocupado levan­tar de um braço, enquanto o resto do corpo permanecepreguiçosamente curvado, distante do objeto. Quase setrata de um movimento de dança, no qual a ação exter­na está subordinada à sensação interna. Não há neces­sidade de palavras para transmitir essa sensacão aoespectador. •

0. gesto de Eva procurando pegar a maçã ainda nãoconstituí uma cena dramática. O drama se inicia no mo­mento em que ela a oferece a Adão. O drama sempre sedá ent,re duas ou mais. pessoas e é nesse contexto queo movimento grupal atinge seu nível de maior proprie­dade. ~esmo um solilóquio e um solo de dança são,na realidade, um diálogo entre dois pólos de uma índí­viduali~ade mobilizada por reflexões pessoais ou poralteraçoes de humor. A dualidade dos pólos se tornavisível nos movimentos, os quais exibem as tensõesinternas.

Em cenas de amor e combate a dualidade das emo­ções fica incorporada em duas peasoas, Eva oferece aAdão o fruto proibido. Seu gesto de ofertar e o dele deaceitar constituem mais do que um movimento utili­.r.ário, por meio do qual a maçã passa de um para o

22

TIIi

. ,

!

outro. É a formação de uma tempestade iminente quepressagia nuvens trovejantes, carregadas com o destinoda raça humana. Os gestos serão menos notáveis emenos expressivos se a tempestade que se avizinha forcondensada num diálogo verbal. A estória do frutoproibido representada numa dança-mímica terá umnível maior de expressividade em sua elaborada gesti­culação do que se for acompanhada de palavras.

A dança pura não possui uma estória descritível.Freqüentemente é impossível esquematizar o conteúdode uma dança em palavras, embora sempre se possadescrever o movimento. Na dança pura o espectadornão poderia saber que um movimento de agarrar rapi­damente no ar estaria expressando avidez ou qualqueroutra emoção relativa à maçã; veria simplesmente oagarrar rápido e experienciaria seu significado porintermédio do ínterjogo de ritmos e formas que, na'dança, contam sua própria estória, acontecimento fre­qüente num mundo de valores e desejos não definidoslogicamente.

O movimento, em dança pura, não necessita adap­tar-se aos caracteres, às ações, às épocas e às situa­cões mas o faz na danca-mímica que, virtualmente, éuma' açâo sem palavraa, embora muitas vezes apoiadanum fundo musical. A execução no palco de dançassociais características de um período histórico, dostatus social do povo, da ocasião e localidade da dançanão pode ser considerada como dança pura. Nesta, oimpulso interior para o movimento cria seus própriospadrões de estilo e de busca de valores intangíveis ebasicamente indescritíveis.

A arte do movimento no palco incorpora a totali­dade das expressões corporais, incluindo o falar, arepresentação, a mímica, a dança e mesmo um acom­panhamento musical.

O drama falado e a danca musical são, contudo,florações tardias da civilização humana. O movimentosempre foi empregado com dois propósitos distintos:

23

Page 14: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

ARTE DO MOVIMENTODANCA.MlMICA

Nunca sabemos se o homem se considera como par­ticipante de uma tragédia ou de um';l c,om~dia da qualele é o protagonista no drama da oxístência, e a .Natl;l­reza formando o coro. Não obstante, é u~ fato mega­vel que o extraordinário poder de raciocímo e d: açaodo homem levou-o a ocupar uma posição pe<?uliar noque tange ao seu relacionamento com o meio que ocircunda.

O homem tenta representar os conflitos que surg~m

do solitário papel de sua raça. O público vê, refletidono espelho da tragicomédia, um personagem que ~u!ae que se encaminha inexoravelmente para a destruíçãoou para o ridículo. Parecem ser igualmente reconfor­tantes as lágrimas e o riso do público, para c~da <;aso,como reações à representação das aventuras íntertorese exteriores do personagem.

Esta não é uma explicação utilitarista ou uma des­culpa para a ação dramática. Há mais coisas s?b omanto da cooperação audiência-atores do que o ~r~7e:­timento proporcionado pela contemplação da rmseriae da loucura humanas, um dos olhos rindo, o outro cho­rando. O teatro espelha mais do que nosso cotidianode sofrimentos e alegrias. O teatro dá um "insight"na oficina na qual o poder de reflexão e de ação dohomem é gerado. Esse "ínsíght" proporciona mais do

25

LITURGIA /"----'C

24

a consecução de valores tangíveis em todos os tipos detrabalho e a abordagem a valores intangíveis na precee na adoração. Ocorrem os mesmos movimentos cor­porais tanto no trabalho quanto na veneração religiosa,conquanto difira a sua significação em ambas as instân­cias. O estender de um braço e o segurar e manejar deum objeto devem ser feitos segundo uma ordem lógica afim de se alcançar os objetivos práticos do trabalho.Isso não se dá na adoração. Neste contexto, os gestosse seguem uns aos outros de acordo com uma seqüên­cia completamente irracional, apesar de cada um dosgestos usados na adoração poder ser também encaixa­do num plano de ação de trabalho. O estender de umbraço no ar pode expressar o desejo por alguma coisaque não se pode apanhar com a mão. O balançar dosbraços e do corpo. que eventualmente lembrem o empu­nhar de um objeto, podem significar uma luta internae se tornarem a expressão de uma prece para libera­ção de uma confusão interna.

O europeu perdeu o hábito e a capacidade de orarcom movimentos. As genuflexões dos religiosos, emnossas igrejas, são os vestígios de preces com movi­mento. Os movimentos rituais de outras raças sãomuito mais ricos em gama e em expressividade. Ascivilizações contemporâneas se limitaram às oraçõesfaladas, nas quais os movimentos das cordas vocais setornaram mais importantes do que os corporais. Ofalar, então, freqüentemente é levado a se transformarem canto.

Entretanto, é provável que a prece litúrgica e adança ritual tenham coexistido há muito tempo atrás;sendo assim, é provável também que o drama falado

. e a dança musical tenham ambas se originado na ado­ração religiosa: de um lado, na liturgia, e de outro noritual.

A complexidade total da expressividade humana,enquanto abrangida pela arte do movimento, é repre­sentada no seguinte diagrama.

Page 15: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

que uma compreensão mais rica da vida: oferece aexperiência inspiradora de uma realidade que trans­cende a nossa, feita de medos e satisfações.

O que realmente acontece no teatro não se dá ape­nas no palco ou na platéia, mas no âmbito de uma cor­rente magnética entre esses dois pólos. Os atores nopalco, constituindo o pólo ativo desse circuito magné­tico, são responsáveis pela integridade d» propósitosegundo o qual está sendo encenada a peça. Dependedisto a qualidade da corrente estimulante entre palcoe audiência.

É inegável o encanto da perfeição mecânica ine­rente aos movimentos da fala e da gesticulação. É umprazer enorme ouvir uma fala com boa dicção e presen­ciar gestos apropriados, nos quais parece ser completaa vitória do espírito sobre a matéria.

O ator individual que atinge esse nível de fascíniona representação se coloca num grau elevado da escalade perfeição. Surge, no entanto, uma questão: seriaeste o degrau mais alto? Um virtuose desse gêneroemprega os movimentos do corpo bem como das cordasvocais, à semelhança do mais habilidoso artesão e seusinstrumentos. A grande economia de esforço que carac­teriza a habilidade é comum ao artesão e ao virtuose.Quanto maior a economia de esforço, menos aparenteé a fadiga. Uma grande economia de esforço faz comque o movimento pareça ocorrer quase que sem esforçoalgum. Isto também se aplica aos movimentos quegeram a voz, ouvidos mas não vistos. Os detalhesexpressivos permanecem quase que acidentais nestetipo de movimento executado porque todo o esforço estáconcentrado na realização suave das ações necessáriasao trabalho. O ofício do artesão é trabalhar com obje­tos materiais, o do ator é trabalhar com seu própriocorpo e voz, empregando-os de tal modo que fiquemeficientemente caracterizados a personalidade humanae seu comportamento, variável segundo as diversassituações. Tanto o trabalho do artesão como o do ator

26

podem ser executados habilidosamente com uma agra­dável e útil economia de esforço. Mas,. no caso do ~to~,requer-se mais: ele tem que se comunicar com o públí­co. Ele tem que estabelecer aquele contato entre palcoe platéia que foi aci;n~ c<?mparado ~ .u~a corre~t~magnética bipolar. E ObVIO que a exibição de habI1~­

dades num dado movimento pode criar alguma n:;o~alI­dade de contato, por vezes até um contato mais íntimoe gratificante.

Aqui surge o problema da qualidade do cont~to.

A integridade do propósito que postulamos anterior­mente pode ser considerada como uma questão d~ ?osto.O artista que prefere utilizar movimentos .habilidosa­mente executados situa-se certamente mais alto naescala da perfeição. -Em sua representação, ~ t.eatro setorna puro entretenimento, espelhando a felIcIdad~ ... aloucura e a miséria humanas, situação na qual a audiên­cia pode encontrar conforto e alivio do seu penarcotidiano.

Suponhamos que fosse verdadeiro o contrário. Asconclusões que seriam então tiradas têm muit? de in~e­ressante e fundamentam-se no exemplo de muitos artís­tas de primeira classe que não são virtuoses. O atorque tenta fazer mais do que representar a vida, de modohabilidoso, usa os movimentos de seu corpo e das cor­das vocais com o interesse centrado naquele ponto quedeseja transmitir para sua platéia e menos nas formase ritmos externos de suas ações. Este tipo de artistaconcentra-se na atuação dos impulsos internos da con­duta, que precedem aos seus movimentos, ~a~d~ poucaatencão, em princípio, à habilidade necessa~Ia a a~re­

sentácão. Resulta, deste modo, uma quahdade.dife­rente - de contato com o público, quando é anf'atízadaa participação interna ao invés da habilidade.

É evidente que o virtuose se verá facilmente ten­tado a restringir o número de seus movimentos àque­les que sejam mais adequados à sua habilida?e. O outrotipo de ator estará inclinado a rejeitar todo tipo de sele-

27

Page 16: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

ção e, para ele, quase todos os exercícios de formas sim­ples de movimento constituem mera acrobacia. Em suatentativa de manter fluindo livremente sua movimen­tação espontânea, freqüentemente apresentar-se-á maisirregular e impulsivo do que o virtuose.

De um modo geral, pode-se dizer que essas duasperspectivas contrastantes se aplicam ao movimentocom dois diferentes objetivos: de um lado, para a repre­sentação dos aspectos mais exteriores da vida e, deoutro, para um espelhamento dos processos ocultos doser interior.

O atar que está se esforçando para o segundo destesobjetivos tem uma inclinação mais profunda e umachance maior de penetrar nos .mais remotos recessosdaquilo que vimos denominando oficina de pensamentoe ação. Ao situarmos este atar - dado que seja per­feito em seu próprio gênero - numa colocação superiorda escala dos valores teatrais, está-se dando preferên­cia a formas menos primitivas, e portanto mais com­plexas, de mentalidade e gosto. Poder-se-ia atualmen­te justificar até certo ponto essa preferência, porqueparece que o homem contemporâneo tem necessidadede uma profunda penetração nos mais íntimos recessosda vida e da existência humana que, se trazidos à tona,poderiam ajudá-lo a recuperar algumas de suas quali­dades essenciais perdidas. As pessoas que' parecemter crescido demais para a veneração da pura habili­dade de movimento buscam novos alvos para seu desejoadmirativo. Muita coisa depende dos dramaturgos ecoreógrafos e do tipo de peça teatral e balé que apre­sentam, embora seja um fato que atares ou bailarinosque possuem um sentido realmente criativo de apresen­tação cênica tenham a capacidade de conferir a umapeça medíocre aquele aspecto revelador que lança luzsobre os recantos mais obscuros da natureza humana.Uma representação vital quase sempre decorre do reco­nhecimento do fato de que os meios visíveis e audíveis

28

da expressão do artista são exc1usivamente compostospor movimentos. .

Os movimentos utilizados em trabalhos esc::Itospara o teatro são os corporais, os das cor?as vocars .e,pode-se acrescentar, os executados pelos ínstrumentís­tas da orquestra. O movimento humano com todas assuas implicações mentais, emocionais e físicas é o.d~~o­

minador comum à arte dinâmica do teatro. As Ideiase sentimentos são expressos pelo flui:: d? movi~e~to ese tornam visíveis nos gestos, ou audíveis na musica enas palavras. A arte de: teatro é dinâmic~, porquecada fase da representaçao some quase que Imed~a~a­

mente após ter aparecido. Nada permanece estáticoe é impossível realizar-se um exame demorado do~ de~a­

lhes. Na música, um som sucede ao outro e o prrmerromorre antes que seja ouvido o seguinte. As falas dosatares e os movimentos dos dançarinos estão todosnum fluxo dinâmico contínuo, interrompido apenas porpausas breves, até que finalmente cesse de todo aoterminar o espetáculo.

As tendências controvertidas do pensamento e ~o

sentimento dos vários personagens representados saoexpressas tanto em palavras como em, ayões na atu_a­ção teatral, qu~ é o desempe~ho ~r~Ist~co da açaohumana. Na mímica e no bale, a dínãmíca de pensa-.mentos e emoções é expressa numa forma purament~

visual. Por assim dizer, são escritas no ar pelos mov~­

mentos do corpo do artista. A parte audível de um bai­lado que é a música, contribui para a dança, em parteacedtuando os componentes .rítmicos dos r,noviment.oscorporais e em parte, traduzindo seu conteudo emocio­nal em ondas sonoras. Na ópera, a fala é substituídapelo canto, daí o papel proeminente conferido ~ músi::a.O movimento e sua vasta gama de mamfestaçoesvisuais e auditivas não só oferece um denominadorcomum a todo o trabalho de palco, como também asse­gura os fundamentos do entusiasmo comum a todos osque participaram de sua criação.

29

Page 17: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

A fluida transitoriedade dos trabalhos das artesdinâmicas tem que ser contrastada com a sólida dura­bilidade dos trabalhos das artes plásticas e estáticas- arquitetura, escultura e pintura - embora deva-seter em mente que as últimas contribuem para o cenárioe para o guarda-roupa. Mas a dinâmica da ação e dadanca é facilmente eliminada se forem excessivamenteaceI;tuados os elementos estáticos da representação, asaber, cenário e guarda-roupa. O teatro francamentepictórico negligencia o atrtbuto- essencial do trabalhoteatral que é o movimento. Este ponto fica melhorentendido se se considera a natureza intrínseca da arteestática.

Vários objetos agrupados podem suscitar num pin­tor, devido às suas características de forma, cor e dis­posição espacial, o desejo de criar uma natureza morta.Esse quadro poderá sobreviver muitos séculos ao cria­dor e ao objeto inspirador da criação. Um trabalhoartístico desse teor, no qual o artista traduziu sua idéiapara uma forma estática e, conseqüentemente, perma­nente, preserva aquilo que de outro modo teria sido umaimpressão passageira. A arquitetura pode semelhante­mente sobreviver ao projetista. O arquiteto tem umavisão repentina, uma idéia intuitiva e dá-lhe corpo sóli­do e permanente em pedra. Igualmente, uma estátuaerigida, por exemplo, num jardim, permanecerá comotestemunha da beleza que uma vez inspirou o cinzel doescultor, embora tanto este quanto seu modelo tenhamfalecido há vários séculos.

Os trabalhos artísticos estáticos compreendem osquadros, as esculturas e edifícios de belíssima ar-quite­tura, aos quais podemos acrescentar objetos funcional­mente úteis que levam o traço inegável do impulsogenial da criação. Nessas modalidades de arte, opoder dinâmico do criador transcende na forma de seutrabalho. Os movimentos que usou para desenhar, pin­tar ou modelar caracterizaram suas criações e conti­nuam imobilizados nos traços ainda visíveis de seu

30

I

II. ,

\!

!)

t

lápis, pincelou cinzel. Sua atividade mental se revelana forma que conferiu ao objeto trabalhado. .

O artista estático cria trabalhos que podem servistos como um todo e percebidos numa só olhada, aoobservar-se os desenhos, quadros, esculturas e edifíciosque seu gênio produziu. As gerações se sucedem e cadauma delas .admira a mesma tela, o mesmo vaso, a mes­ma estátua ou edifício ao qual o artista atribuiu formaindividual praticamente imperecível.

O efeito que um trabalho de arte estático produzsobre o espectador é genuinamente diferente daqueleproduzido por uma representação teatral. Frente a umquadro a mente do observador é convidada a seguir umcaminho próprio. As recordações e associações deidéias conduzem a um estado de espírito contemplativoe a uma atividade interior de meditação. A platéiade um teatro, de uma mímica ou de um balé não temoportunidade para contemplação. A mente do espec­tador vê-se inexoravelmente subjugada pela fluência deacontecimentos que mudam a todo instante os quais,dada uma verdadeira participação interna de sua par­te não deixam tempo disponível para a cogitação ernedit.ação elaboradas, ambas naturais e possíveis quan­do se aprecia, por exemplo, um quadro ou alguma cenade beleza natural. Representações teatrais onde oselementos pictóricos do cenário e as naturezas-mortassão superenfatizados tendem a enfraquecer o interessee a atencão do espectador ao acontecimento dinâmico,que é o elemento todo-poderoso. Essa superênfase doselementos pictóricos e arquiteturais pode não apenasser um perigo, cr também um excessivo raciocínioanalítico nos trec -liálogo pode destruir a unidadeessencial do drs '<) dramático intelectualizadoé ineficiente n -nsamento analítico tendeà formacão de ' e a um excesso de medi-tacão. Quanr ie raciocínio que preva-Ieee numa r ir característico do diá-logo drarná e a ação dos elementos

Page 18: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

33

controvertidos vêem-se prejudicados. A mímica, elabo­rada com base em movimentos tanto ao nível do con­teúdo quanto ao de forma, é a arte básica do teatro. Osesforços" conflitantes do homem em sua busca de valo­res revelam-se com maior veracidade na mímica.Excesso de palavras e excesso de música tendem aofuscar a verdade dessa manifestação de esforço, namedida em que se torna aparente por meio das açõescorporais do artista.

A mímica pura atualmente é quase que desconhe­cida e sua perda é algo irreparável. A arte da mímicafloresceu durante os primeiros tempos da civilizaçãohumana, na adolescência da humanidade. Há valorestais como a juventude, a ingenuidade e a inocência quepodem ser perdidas pelas pessoas e pelas raças e ja­mais poderão ser recuperadas. O mesmo acontece comcertas formas de felicidade, de alegria, de inofensivi­dade e, até certo ponto, com a beleza, a elegância e agraça, todos caracteres naturais da juventude e da ino­cência. A luta contínua por tais valores, que não se podetentar ganhar nem voltar a ter, é ridícula, no cotidiano.

O milagre da recuperação desses valores que se en­contram perdidos para sempre na vida diária é possí­vel no palco. Por quê? Porque o ator ou mímico temcondições de representar um personagem e suas cir­cunstâncias, se souber o suficiente de suas caracterís­ticas intrínsecas de esforço. A juventude, a ingenui­dade, a inofensividade, a beleza, a elegância e a graçadependem de atitudes internas e o ator pode conscien­temente reproduzi-las. Isto parece ser um paradoxo masnão o é no palco, onde os valores não têm necessariamen­te de ser possuídos, mas configurados, o que é feito atra­vés de uma escolha e de uma formulação de qualida­des adequadas de esforço. Pouco importa quem irá exe­cutar essa caracterização, contanto que seja de maneiraeficaz. Vêem-se atrizes de meia-idade desempenhando

* Os i!Upulsos internos a partir dos quais se origina o movimento, nesta e emoutras publicações do autor são denominadas "esfor5~" (vide também página 51).

32

:' 1~_.-:- .._~.~ -

excelentemente os papéis de mocinhas e sendo capa­zes de nos transmitir a verdade a respeito da juven­tude e seu destino, da maneira a mais comovente. Ajuventude interior freqüentemente coincide com aquiloque se denomina virtude; o vício é incompatível coma inocência; não obstante, os componentes das quali­dades de esforço demonstrados por uma pessoa virtuo­sa e por outra, viciada, são os mesmos, incluindo osmesmos elementos de movimento. A disposição dos im­pulsos internos que criam o movimento mostra, porém,diferencas de ritmo e tensão.

Uma das produções primitivas mais característicasde dança-mímica consiste em imitações de movimentosde animais. Os espíritos malevolentes ou benevolentes- viciados ou virtuosos - que governam o destino hu­mano são representados como animais venerados oudetestados pelos membros das tribos primitivas. Ê útilque o atar-bailarino considere e compare os ritmos tí­picos de movimento de vários seres vivos, animais ehomens, a fim de chegar a algum entendimento da se­leção de qualidades de esforço, ou do tipo de impulsosinternos apropriados aos vários personagens, situaçõese circunstâncias representados na mímica primitiva.

Parece que as características de esforço dos ho­mens são muito mais variadas e variáveis do que asdos animais. Encontram-se pessoas com movimentossemelhantes aos de um gato, doninha ou cavalo, masnunca ninguém viu um cavalo, uma doninha ou um gatoexibindo movimentos semelhantes aos humanos. O reinoanimal é rico em manifestações de esforço, mas cada es­pécie animal é restrita a uma gama relativamente peque­na de qualidades típicas. Os animais são perfeitos quan­to ao uso eficiente dos hábitos de esforço restritos quepossuem, enquanto o homem é menos eficiente no usode modalidades de esforço mais numerosas que poten­cialmente estão à sua disposição. Não seria de sur­preender que surgissem conflitos em maior número eintensidade nos seres humanos, dotados que são da ca-

Campus Universitário de PalmasUFT

BIBLIOTECA

Page 19: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

pacidade de combinar inúmeras - e freqüentementecontraditórias - combinações de qualidades de esforço.

Os hábitos de movimentação dos mamíferos semdúvida são os que mais de perto se aproximam aos doshomens, se comparados com os de animais de grau in­ferior de organização. Os hábitos humanos de movi­mento são mais freqüentemente comparados aos de ma­míferos e talvez também aos de aves do que aos depeixes, répteis ou insetos.

Pode-se admitir que uma rua lotada de pessoasnuma grande cidade sugira uma colméia ou um formi­gueiro, contanto que não se distingam as peculiarida­des dos esforços de cada um dos indivíduos dessa ruacongestionada. Não é impossível ver, num formigueiro,certas formigas dotadas de características de esforçoespeciais, sendo algumas mais agitadas e enérgicas doque outras. Numa rua movimentada, entretanto, pode­se distinguir mais facilmente indivíduos mais agitadose enérgicos do que outros, bem como aqueles que lem­bram em suas manifestações de esforço, tanto no modode andar quanto na gesticulação, uma centena de dife­rentes animais. Quando se olham as expressões faciaise os movimentos das pessoas numa multidão, distin­guem-se facilmente as características pessoais de es­forço dos indivíduos. A multidão faz com que nos lem­bremos de uma reunião colorida com animais de todosos tipos. De modo algum podemos comparar uma talreunião a um enxame de formigas, porque estas poucoou nada se diferenciam em seus movimentos.

As faces e as mãos dos seres humanos e as cabeçase patas dos animais são muitas vezes usadas como in­dicativas da similaridade entre humanos e animais. Asfaces e as mãos dos adultos humanos podem ser con­sideradas como tendo sido moldadas por seus hábitosde esforço. A forma de seus corpos, incluindo a da ca­beça e a das extremidades, significa talvez uma dis­posição natural de esforço e pode ser vista como ma­nifestações de esforço "congeladas". As formas de na-

34

tureza constitucional, porém, são muito menos revela­doras do que os movimentos, principalmente aquelesque se denominam movimentos de sombra. Estes sãomovimentos musculares minúsculos, tais como o erguerde uma sobrancelha, uma sacudidela de mão ou umrápido pisotear do pé, os quais apenas têITl; valor ex­pressivo. São em geral execu~ados lI?-consclentementee muitas vezes acompanham, a maneira de uma som­bra os movimentos da ação com objetivo, daí a deno­miu'acão escolhida. -Os movimentos faciais oferecemfreqUentes e fortes contrastes às formas dos rostos.Feições bem moldadas podem se tornar altamente r~­pelentes quando fazem um.a careta, e as pessoas m~Is

feias podem assumir a mais agradável das expressoesquando sorriem. Não há quem desconheça o, fato de asexpressões espelharem os conflitos interiores.

Voltando novamente às manifestações simples dosesforcos em animais, pode-se dizer que cada uma desuas -ordens parece ter selecionado algumas dentre osmilhões de possíveis combinações de esforço e manti­do as escolhidas ao longo de muitas e muitas gerações.Essas séries restritas de combinações de esforço po­dem ter moldado as formas corporais típicas, bemcomo os hábitos de movimento de várias espécies.

Algumas pessoas exibem qualidades de esforço tí­picas de animais, embora não se restrinjam apenas aestes em seus movimentos. Em certas ocasiões, ou porintermédio de treinamento, podem deixar de lado suasfixações mais típicas e facilmente empregarem com­binacões de esforços impossíveis de serem realizadaspelos animais a que se assemelham. A verdadeira es­sência da mimica consiste na habilidade da pessoa dealterar a qualidade do esforço, ou seja, o modo segundoo qual é liberada a energia nervosa, pela variação dacomposição e da seqüência de seus componentes, bemcomo para levar em conta as reações dos outros a essasmudanças. Mímica é o tipo de drama no qual são imi­tadas cenas da vida, sendo uma atividade que apenas

35

Page 20: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

o ser humano é capaz de executar.Os movimentos de um gato ou felino qualquer são,

na maior parte do tempo, caracterizados por uma fluên­cia livre, o que se verifica em detrimento de movimen­tos mais restritos, não particularmente peculiares aosgatos. Ninguém ainda viu um gato assumir aquele an­dar emproado dos cavalos. Um homem que se pareçacom um gato, porém, pode às vezes andar como umcavalo se o desejar e, ao fazê-lo, poderá provocar ouadmiração ou ridículo.

Não é só a fluência que marca os movimentos deum gato. Quando salta, o gato também se mostrará re­laxado e flexível. Um cavalo ou um veado saltarãomagnificamente no ar, mas o corpo deles estará tensoe concentrado durante o salto. O corpo-mente humanoproduz muitas qualidades diferentes' ele tem condicõesde pular como um veado e, se o quiser', como um gato.

Os componentes constituintes das diferencas nasqualidades de esforço resultam de uma atitude -interior(consciente ou inconsciente) relativa aos seguintes fa­tores de movimento: Peso, Espaço, Tempo e Fluência.

A atitude referente a estes fatores difere segundocada espécie. É proverbial tanto a preguiça, quer di­zer, uma indulgência exagerada de tempo do bicho­preguiça, quanto a pressa, ou uma corrida exageradacontra o tempo, de uma doninha. Nada no homem émais trágico do que a preguiça indiscriminada ou aeterna pressa.

As principais características das atitudes de esfor­ço de um ser vivo são evidentemente suas seqüênciasde esforço mais completas e não sua atitude frente aum único fator de movimento. Uma investigação exaus­tiva das seqüências típicas das qualidades de esforcoem animais seria estudo para uma vida inteira. Áspoucas e rudimentares indicações aqui adiantadas sópodem servir ao propósito de chamar a atenção paraa escala real de complexidade dos esforços. O homemse coloca no topo desta escala pois tem condições para

36

usar todas as modalidades de esforço de que um ani­mal pode fazer uso e, como veremos mais tarde, mui­tas outras de sua própria criação, a saber, as combina­ções especiais de esforço humanas e humanitárias quepodem causar, como efetivamente o fazem, reaçõesmais terríveis do que o consegue qualquer um dosanimais.

Deve-se mencionar um outro aspecto interessante.Os animais e os seres humanos mais jovens têm à suadisposição uma escala de capacidade de esforço muitomais variada que a de seus pais. Um cachorrinho, umgatinho e, em certos aspectos, um bebê, têm maiormobilidade que um cachorro, um gato ou um ser hu­mano adultos. As características típicas de esforço doindivíduo e da espécie ainda não estão plenamente de­senvolvidas no jovem. A seleção restritiva continuaapós o nascimento, embora a gama total de tendênciastípicas de esforço tenha sido herdada e vá sofrendo umprocesso contínuo de desenvolvimento.

A influência da história de vida e do meio ambientedurante o período seletivo do início da juventude tor­na-se claramente visível em certas modalidades das ca­racterísticas finais de esforço do indivíduo amadure­cido. Novamente, essas modalidades são muito maisdiversificadas no homem do que nos animais, excetoos mamíferos em determinados pontos. Um animal do­mesticado, por exemplo, desenvolverá modalidades di­ferentes de configurações de esforço das desenvolvidaspor um animal selvagem do mesmo gênero. A neces­sidade de uma luta contínua para preservar sua exis­tência tornaria os esforços de um animal selvagemmais ricos em certo sentido, embora mais restritos emoutros, do que os de um animal domesticado. Duranteseu período de crescimento, os humanos são confronta­dos com uma luta pela vida diferente da enfrentadapelos animais e, conseqüentemente, o desenvolvimentode seus hábitos de esforço assume formas diferentes.A capacidade herdada de um indivíduo para resistir a

37

Page 21: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

influências retardatárias desempenha um papel rele­vante no resultado final.

Mas os humanos, sejam eles primitivos ou civiliza­dos, pobres ou ricos, conseguem instituir complicadasredes de qualidades cambiantes de esforços que repre­sentam os múltiplos meios de liberar a energia nervosaque lhes é inerente. O homem tem a capacidade decompreender a natureza das qualidades e de reconhe­cer os ritmos e as estruturas de suas seqüências. Tem apossibilidade e a vantagem do treinamento consciente,que lhe permite alterar e enriquecer seus hábitos deesforço até mesmo sob condições externas desfavorá­veis. Os animais domésticos estão perdidos se foremexpostos aos rigores dos incidentes da vida na nature­za livre. Animais adultos selvagens jamais poderãotornar-se inteiramente domesticados. Têm eles peque­na capacidade para modificar suas condutas de esfor­ço, mas os humanos, mesmo quando cresceram emmeios primitivos, podem" refinar seus hábitos de movi­mento se surgir a necessidade. Jovens mimados podemse transformar em homens ferozes na guerra ou emoutras situações de perigo. Tais pessoas adquirem há­bitos de esforço inteiramente novos e, em situações maisfáceis, são capazes de voltar aos antigos e mais suaves,se assim o decidirem. Em qualquer um dos casos, restapouca dúvida de que as possibilidades de esforço dohomem são tanto mais variadas quanto mais variáveisdo que as dos animais e que é esta riqueza a fonte prin­cipal da dramaticidade de sua conduta. Poderíamoselaborar uma escala que contivesse muitos graus, ondese esboçariam as capacidades de esforço mais restri­tas e fixas dos animais primitivos lado a lado às ati­tudes de esforço potencialmente mais complexas emutáveis do homem civilizado.

Além da riqueza comparativa da capacidade de es­forço humana, pode-se notar nela uma especialidadeque cabe ser denominada de esforço humanitário. Nãopretendo fazer nenhum julgamento moral com esta afir-

38

TI!

macão. O esforço humanitário pode ser descrito comoaqti'ele capaz de resistir à influência de capacidadesherdadas ou adquiridas. Graças a esse esforço huma­nitário o homem tem condições de controlar hábitosnegati~os e desenvolver qualidades e Ain~linações quelhe possam beneficiar, apesar de infhrências adversas.A luta daí decorrente está cheia de implicações dra­máticas.

Ficamos comovidos pela sugestão de esforços qua­se humanitários de devoção, sacrifício ou renuncia queos animais exibem, o que pode ou não estar .fundamen­tado em fatos concretos. Mas o que assurmmos comocerto é que todo homem é capaz, e quase que obrigad~,a fomentar esses tipos de esforço. O esforço humaní­tário é considerado de perto quando se trata do estudoe do treinamento de movimentos. Não obstante, é m~­nifestacão das mais importantes e talvez mesmo a pro­pria fonte da possibilidade da educação do movimento,o que é da mais capital importância não soment~ parao atar-bailarino, como também para o desenvolvImentopessoal de todo indivíduo.

Não há dúvida de que os instintos comunitários dohomem desenvolveram características que diferem ex­tensamente dos instintos simplesmente herdados dosanimais. Se se investigar o crescimento do senso comu­nitário no homem, descobrír-se-á que na base ~o seudesenvolvimento histórico existe um tipo especial detreinamento de esforço do qual os animais são incapa­zes. Esses estranhos hábitos do homem, que não podemser inteiramente explicados como adaptação às circuns­tâncias e ao meio ambiente, são o resultado de um re­finamento consciente do esforço. Os animais fazem umaescolha instintiva de qual esforço manifestar em res­posta ao seu impulso inato para assegurar sua vidaindividual e racial. A seleção que o homem faz das suasseqüências de esforço não mais parece ser totalmenteinconsciente; ele tem a capacidade de coordenar u~agama de possibilidades de esforço vastamente maior

39

Page 22: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

do que a de qualquer outro animal e esta gama ultra­passa as necessidades da mera sobrevivência.

No palco, o homem expressa sua atitude mentalpeculiar escolhendo com cuidado as configurações deesforço adequadas e realiza uma espécie de ritual co­munitário na apresentação de conflitos que decorremde diferenças nestas atitudes internas. Ao domesticaros animais, o homem aprendeu como lidar com o es­forço e como alterar os hábitos de esforço dos seresvivos. Na aplicação dos princípios de domesticação dosanimais a ele mesmo, estendeu o raio de ação de trei­namento do esforço até a criação de trabalhos de artedinâmica. O homem tem condições de domesticar o seusemelhante não apenas na condição de escravo, mastambém na de um companheiro feliz; por último, apren­deu a se domesticar, treinando e desenvolvendo seuspróprios hábitos pessoais de esforço, tanto engrande­cendo-os quantitativamente, quanto dirigindo-os quali­tativamente cada vez mais no sentido de se tornaremesforços humanitár-ios específicos. É deveras impres­sionante o modo pelo qual o homem alcançou esse tipode educação do esforço, tendo seu paralelo na evolu­ção dos hábitos de esforço animais.

Os animais jovens aprendem, conquanto indepen­dentemente de um controle consciente, a selecionar edesenvolver suas qualidades de esforço por meio dasbrincadeiras. Ao brincarem, os animais simulam todosos tipos de ações que lembram de maneira muito mar­cante as ações reais que terão necessidade de praticarquando tiverem que se sustentar no futuro. Caçar, lu­tar e morder parecem estar indicados em seus movi­mentos, mas eles não caçam, nem lutam ou mordemde fato, ou, pelo menos, não com o propósito de obtercomida. Nos animaizinhos jovens e em crianças deno­minamos tal atitude de brinquedo e, nos indivíduos adul­tos, dança e representação. Na brincadeira, experimen­tam-se, selecíonam-se e escolhem-se as seqüências deesforço que melhor se ajustem, por exemplo, a uma

40

luta ou caca bem-sucedidas. O animal jovem, bem comoa crianca,- experimenta todas as situações imagináveis:ataque,- defesa, tocaia, ardil, vôo, medo, e .sempre acoragem é exibida. Acompanha estes expenmentos abusca das melhores combinações possíveis de esforço,para cada ocasião. O corp~-mente fi~a trei~ado parareagir de imediato, por meio de configurações de es­forco cada vez mais aprimoradas, a todas as demandasdas- várias situações, até que se automatize a adoçãoda melhor delas. Os métodos de luta e caça de um gatoadulto não se encontram plenamente desenvolvidos numgatinho pequeno, mas ? impulso p:;ra lá chegar. já édiscernível desde os primeiros movimentos do animal­zinho. É o que ocorre também com um cachorro pe~ue­

no, com um cordeirinho ou com qualquer outro amm~ljovem. A brincadeira é de grande valia para o .cres_cI­mento da capacidade de esforço e para sua.organ:zaçao.

Nada nos impediria de rotular essas hrincadeiras deatuação dramática acrobática, não estivess,:~ ~s pala­vras atuacão e drama reservadas para a eXIbIçao, cons­ciente do homem, no palco, de situações da vida. Ha ta~­bém uma diferença aí, no sentido de que a r-spresentacãono palco exige um espectador a quem poss?- o ator se ~hn­gír, ao passo que ao brincarem, o cachorn~ho, o gatmhoe a criança não têm qualquer preocupaçao <?om. a pre­senca ou não de platéia. O brinquedo dos ammais maisjovens, desta maneira, aproxima-se mais da dança queda representação, posto que a dança nem sempre exigepúblico. Se as crianças ~.?S ~dultos dançam, <!uer dizer,se executam certas sequenctas de combmaçoe~ ~e es­forço para seu próprio prazer, não é neces~~na a~­diência. Nesse sentido, a dança é um cxercicio maisgenuíno de esforço do que a representação. A dança,ou pelo menos aquilo que hoje em dia ?,hamamos dedança, é porém diferente da representaçao e nem porisso, em si mesma, é uma arte teatral.

Na danca não fica tão evidente a semelhança comos conflitos- da vida. A dança é o jogo estilizado que

41

Page 23: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

não se relaciona diretamente com a conduta de esforcodramática. Alguns animais dançam, o que quer diz~rque aprenderam a estilizar seus jogos do mesmo modoque o homem. Se estudamos as descrições exaustivasdos movimentos de aves e macacos, observados peloscientistas, ficamos surpresos diante da semelhanca des­tes movimentos com a dança humana. Enquanto queno decorrer das brincadeiras as qualidades de esforçodessas criaturas estão misturadas de maneira quaseque irregular e casual, nas danças humanas encontram­se graciosamente escolhidas, trabalhadas e separadas.Repetições regulares de seqüências de esforço formamfrases rítmicas que são repetidas com exatidão. Aquiloque pr'etendern os animais que dançam permaneceriaum enigma se não assumíssemos que a atividade todatoma a forma de uma seleção e treinamento de esfor­ços mais ou menos conscientes.

É um fato bem conhecido que as brincadeiras edanças das tribos primitivas originaram-se de tentati­vas de torná-las, por si mesmos, mais conscientes decertas combinações escolhidas de esforcos. Além datomada de consciência, ou melhor, combi~ada com ela,está a fixação, na memóría e nos hábitos de movimentoda combinação de esforços escolhida. Trata-se de urnaconstrução muito singular de idéias acerca das qualí­da~es .dos .movimentos e de seu uso. Talvez não sejamuito ínusitado introduzir aqui a idéia de se pensar emtermos de movimento, em oposição a se pensar em pa­lavras. O pensar por movimentos poderia ser conside­rado como um conjunto de impressões de acontecimen­tos na mente de uma pessoa, conjunto para o qual faltauma nomenclatura adequada. Este tipo de pensamentonão se presta à orientação no mundo exterior, como ofaz o pensamento através das palavras mas, antes,aperfeiçoa a orientação do homem em seu mundo in­terior, onde continuamente os impulsos surgem e bus­cam uma válvula de escape no fazer, no representare no dançar.

42

ç

O desejo que o homem acalenta de orientar-se nolabirinto de seus impulsos resulta em ritmos de esforçodefinidos, tais como os praticados na dança e na mí­mica. As danças regionais e nacionais são criadas p~la

repetição destas configurações de esforços, na medidaem que são características da comuni~ade. Essas dan­ças mostram a gama de esforços cul~lvada pe~o~ gru­pos sociais que vivem num meio a~blente definido. Alânguida e onírica dança de uma oriental, a orgulhosae apaixonada dança de uma espanhola, a dança tem­peramental de uma italiana do sul, a bem-medida dançaem círculos dos anglo-saxões são exemplos das mam­festacões de esforço selecionadas e aprimoradas du­rante-largos períodos da história até que finalment~ ~etornaram expressivas da mentalidade de grupos SOCiaISparticulares. Um obs~rva~or de da~lças regionais e na­cionais pode obter muitas m~ormaçoesquanto ao e~tadode espírito ou traços de carater prefendos e desejadospor uma comunidade em particular. ~m tempos .bemantigos, estas danças eram um dos meIOS J?r~nC1pals deensinar ao jovem como adaptar-se aos hábitos e cos­tumes de seus antepassados. Neste sentido, estão emíntima conexão tanto com a educação quanto com oculto e religião ancestrais.

A imperiosa necessidade de brincar e dançar expan­diu-se, em conseqüência, numa variedade estonteantede tradicões de movimentos, em todos os campos daatívidade humana. A dança tem sido empregada comoum agradável estímulo ao trabalho, principalmente emtrabalhos rítmicos de equipe, tendo se transformado emacessório da luta, da caça, do amor e de muito maisatividades. Foi na dança, ou pensamento por movimen­tos, que o homem a princípio se apercebeu da existên­cia de uma certa ordem em suas aspirações superiorespor uma vida espiritual. Inconscientemente, aprendeuquais eram os fatores contraditórios e de equilibrio desuas acões, mas não sabia como usá-los, nem tampoucocontrolá-los.

43

Page 24: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Nas danças religiosas, o homem representava essespoderes sobre-humanos os quais, segundo entendia, di­rrgiam os acontecimentos da natureza, e determinavamo seu destino pessoal bem como o de sua tribo. A seguir,o homem conferiu uma expressão física a certas quali­dades por ele observadas nesses poderes sobre-humanose, ao elaborar essas personificações das ações de es­forço, o homem primitivo descobriu a harmonizacão dorum? dos acontecimentos; através de seu pensamento­movimento, caracterizou então o poder subjacente a tudo?omo ulIl: deus de gesticulação deslizante. Deslizar*e, essencíalmente, um movimento sustentado e direto,com o toque leve. Ao deslizarem, o homem e sua divin­dade envolvem-se. na experiência da infinitude dote,?po e da cessação do peso da gravidade, embora es­tejarn ambos atentos para a clareza dimensional de seusmov:i~entos. Muitas danças dos aborígenes da África,da ASI~, da Polinésia e da América exibem este aspectode deslizar em suas danças rituais e as pinturas e está­tu~ de seus deuses são representadas por figuras quees~ao fazen?o gestos de deslizar. Deuses que flutuama:Im~ d~s. aguas demonstram no ritual, ou representa­çao pictórica, uma atitude complacente em relacão aosfato~e~ de: Tempo, Peso e Espaço no movimento. Flu­tuar e um movimento leve e flexível que espelha umestado de espírito de semelhante conteúdo.. Os malignos deuses da morte e da violência são

figuras representadas com acões de esforco como soco*perfuração e compressão, sendo que to·d~s se trata~de movimentos firmes e diretos que ocorrem, ora subi­tamente, ora gradualmente.

As ~esplandecentes divindades da alegria e da sur­presa s~o freqüentemente caracterizadas, nas danças,por movímentos de sacudir* e fremir. Aqui, a sensação~e l~veza. se casa a uma indulgência com espaço, quee evidencíaría na flexibilidade e na plasticidade dos mo-

. ~ N. da !. - O significado desses termos é explicado depois (N. do A.),Glíding, Floatmg e Tbrustíng, respectivamente, no original.

44

vimentos. Aparições e desaparições súbitas conferemaos movimentos de sacudir e fremir a sua luminosidade.

Segundo a concepção do homem primitivo, os deu­ses eram os iniciadores e também os incitadores do es­forco em todas as suas configurações. E, além disso,eram os símbolos das várias ações de esforço. 'Haviadanças que representavam deuses que torciam*, cujosmovimentos eram flexíveis e falavam da gradual pas­sagem do tempo, e apesar disso eles eram fortes e fir­mes. Havia deuses que talhavam*, que lutavam contrao tempo e contra o peso com ligeireza e poderosa resis­tência e, não obstante, eram flexíveis no espaço, ou

. seja, facilmente se adaptavam às mudanças da fo~ma.

Os espíritos e gnomos, cujos movimentos se Ima­gina serem súbitos e diretos, mas também gentis, sãomuitas vezes caracterizados em danças pontuantes*.

A estranha poesia do movimento, que acabou sendoexpressa na dança sacra, capacitou o homem a orga­nizar suas ações de esforço segundo uma ordem que,em última instância, é válida e compreensível aindahoje. Somente o homem tornou-se consciente da exis­tência dos deuses, quer dizer, o homem é o único servivo que tem consciência de suas ações e é responsá­vel por elas; deste modo, tornou-se o rei das criaturase o senhor da Terra. As convenções das várias formasde ordem política e econômica, na sociedade humana,surgiram da percepção do esforço nas danças regionaise nacionais. Ao ensinar suas crianças e ao iniciar osadolescentes, o homem primitivo tentou transmitir pa­drões morais e éticos, por intermédio do desenvolvi­mento do raciocínio em termos de esforço, na dança.Nessa época tão remota a introdução do jovem aoesforço humanitário constituiu a base de toda a ci­vilização.

Contudo, durante um longo período o homem nãofoi capaz de descobrir a conexão entre seu pensamento-

* N. da T. - O significado desses termos' é explicado depois (N. do A.).Rlickíng, Wringing, Slashing e Dabbing, respectivamente. no original.

45

Page 25: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

movimento e sua palavra-pensamento. As descriçõesverbais do pensamento-movimento encontraram suapossibilidade de expressão apenas na simbologia poé­tica. A poesia, descrevendo os acontecimentos de deu­ses e ancestrais, foi substituída pela simples expressãodo esforço, na dança. A era científica do homem in­dustrial ainda tem que descobrir os modos e meios quenos capacitem a penetrar no domínio da tradução men­tal do esforço e da ação, a fim de que as linhas comunsdas duas modalidades de raciocínio consigam finalmen­te reintegrar-se em uma nova forma. Os velhos méto-,dos de conscientização e treinamento do esforço certa­mente auxiliarão a investigar os movimentos dos atores.Deve-se esperar que a mímica, enquanto atividade ex­pressiva do esforço, além de uma atividade criadorafundamental do homem, volte novamente a ser um fatorimportante do progresso civilizado, após o longo perío­do em que foi negligenciada, quando seu sentido e sig­nificado verdadeiros tiverem sido readquiridos. O valorde uma caracterização por intermédio de movimentosde mímica semelhantes à dança reside no evitar-se asimples imitação das peculiaridades dos movimentosexternos, pois uma imitação deste teor não penetra nosmais remotos recantos do esforço interior do homem.Temos necessidade de um símbolo autêntico da visãointerna que efetue contato com o público e ele só é atin­gido quando se aprendeu a raciocinar em termos demovimento. O problema fundamental do teatro é apren­der como usar esse tipo de pensamento com o propó­sito de atingir o domínio do movimento,

46

CAPíTULO 2

MOVIMENTO E CORPO

Parte I

A FLUÉNCIA do movimento é francamente influenciadapela ordem em que são acionadas as diferentes partesdo corpo. Podemos distinguir uma "fluência desem­baraçada ou livre" de uma "fluência 'embaraçada oucontrolada" .

Os movimentos que se originam do tronco, do centrodo corpo, e depois fluem gradualmente em direção dasextremidades dos braços e pernas são em geral maislivremente fluentes do que aqueles nos quais o cen­tro do corpo permanece imóvel quando os membros co­meçam a se movimentar. Algumas ações elementarestêm uma tendência natural para a "fluência livre"; porexemplo, taLhar* C"sLashing"), na qual a fluência do mo­vimento é liberada, repentina e energicamente. Outrosmovimentos como, por exemplo, a pressão C"pressing"),exige um controle da fluência de modo a que o movi­mento possa ser parado a qualquer momento dado.Deve-se notar principalmente que um movimento detalhar das extremidades superiores se origina no cen­tro do tronco, seguindo então para os ombros, partesuperior dos braços, terminando nos antebraços e mãos,ao passo que a fluência controlada da pressão se ini­cia nas mãos, a tensão associada à ação de pressionarse espalha para o interior do corpo, primeiramente para

* N. da T. - Talhar, Slasbing, no original. Todos os termos referentes às 8dinâmicas ou esforços básicos foram traduzidos por palavras aproximadas em por­tuguês. Não existe, contudo, em nenhuma língua, uma palavra que traduza O se~hdoexato do movimento, pois, para cada pessoa a palavra que traduz a ação va~ terum sentido diverso. Talhar pode ser chicotear, quando se tem em mepte o C~l.:otCcomprido de urn domador; já o chicote curto vai ocasionar um movimento duetoe o talhar é flexível.

47

Page 26: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

os pulsos e antebraços e, em seguida, para a partesuperior dos braços, ombros e, finalmente, para o cen­tro do corpo e tronco. Mesmo num leve sacudir dasmãos no qual o centro do corpo parece manter-se pas­sivo, a energia flui para fora dos antebraços, para ospulsos, mãos e, por último, aos dedos; enquanto queuma leve pressão deslizada dos dedos sobre uma su­perfície será primeiramente percebida na ponta dosdedos e, depois, seguindo por dentro das mãos, passan­do pelos pulsos até os antebraços.

O controle da fluência do movimento, portanto, estáintimamente relacionado ao controle dos movimentosdas partes do corpo. Os movimentos do corpo podemser divididos aproximadamente em passos, gestos dosbraços e mãos, e expressões faciais. Os passos abran­gem pulos, giros e corridas. Os gestos das extremida­des da parte superior do corpo compreendem movi­mentos de esvaziar, de recolher e de espalhar, disper­sar. As expressões faciais relacionam-se aos movimen­tos da cabeça, que servem para dirigir os olhos, ouvi­dos, boca e narinas na direção de objetos dos quais seespera ter impressões sensoriais. A coluna os bracose as pernas são articulados, isto é, subdivididos ~mjuntas articuladas; a articulação da coluna é mais com­plexa que a dos braços e pernas.

Ê relativamente fácil observar um movimento flu­indo livremente numa direção exterior, a partir do cen­tro do corpo em direção das articulações. A fluênciado movimento é controlada quando o sentido dele tomaum rumo para dentro, que se inicia nas terminaçõesdas extremidades, progredindo em direcão ao centro docorpo. Existe, porém, todo um labirinto-de cornbinacõesque não pode ser demonstrado em poucas palavras, -tor­nando-se, portanto, necessário efetuarmos um examesistemático dos principais tipos de ações corporais.

A extraordinária estrutura do corpo, bem como assurpreendentes ações que é capaz de executar, são al­guns dos maiores milagres da existência. Cada fase

do movimento, cada mínima transferência de peso, ca­da simples gesto de qualquer parte do corpo revela umaspecto de nossa vida interior. Cada um dos movimen­tos se origina de uma excitação interna dos nervos, pro­vocada tanto por uma impressão sensorial imediataquanto por uma complexa cadeia de impressões sen-­soriais previamente experimentadas e arquivadas namemória. Essa excitação tem por resultado o esforçointerno, voluntário ou involuntário, ou impulso para omovimento.

As explicações racionalistas insistem no fato de queos movimentos do corpo humano estão submetidos àsleis do movimento inanimado. O peso do corpo seguea lei da gravidade. O esqueleto do corpo pode ser com­parado a um sistema de alavancas que faz com quese alcancem, no espaço, as distâncias e se sigam as di­reções. Estas alavancas são acionadas pelos nervos emúsculos que providenciam a força necessária parasuperarmos o peso das partes do corpo que se movem.A fluência do movimento é controlada por centros ner­vosos que reagem aos estímulos internos e externos.Os movimentos se processam durante algum tempo, epodem ser medidos com exatidão. A força propulsorado movimento é a energia desenvolvida por um proces­so de combustão no interior dos órgãos corporais. Ocombustível consumido neste processo é o alimento.Não resta dúvida quanto ao aspecto puramente físicoda produção de energia e da sua transformação emmovimento.

O ligar e desligar da corrente energética e a regu­lação da fluência do movimento, segundo a intensida­de do instinto de preservação da vida, também poderá ­ser meramente mecânico, mas aqui ocorre um proble­ma na nossa perspectiva racionalista.

O movimento de uma pedra que cai é interrompidoquando esta atinge o solo ou -outro ponto de apoio. Sãoconstantes tanto a aceleração de sua velocidade de que­da como seu trajeto no espaço e ambas podem ser me-

49

Page 27: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

didas exatamente. o movimento de um braço caindo,porém, pode ser detido a qualquer instante pelo meca­nismo de controle da máquina corporal. A parada é efe­tivada por meios exclusivamente mecânicos, a saber,pela utilização de um músculo antagonista que mante­nha o braço suspenso no ar. A causa dessa parada,entretanto, é menos fácil de explicar. O braço que caíapode ter sido imobilizado porque a pessoa que o mo­vimenta percebeu um objeto perigoso no caminho des­crito pelo seu braço e o instinto, ou a reflexão, ordenouque se evitasse um ferimento e, por conseguinte, ocor­reu o bloqueio do movimento. O indivíduo já tem acumu­ladas algumas experiências de situações e objetos queeventualmente provocam dor 04 dano e que, portanto,ele busca evitar. Fica difícil atribuir a lembranca detais experiências e a imediata reacão a elas a um me­canismo puramente físico ou mesmo paícológico. Têm­se proposto teorias mecanicistas para explicar tais pe­culiaridades do comportamento dos seres vivos, maselas não têm se mostrado convincentes. De qualquermodo, é certo que uma pedra rolará direto até o fogo,mas, um ser humano que se mover na mesma direçãotentará evitá-lo com o concurso de um controle maisou menos consciente de suas ações corporais.

Trata-se de um fato mecânico que o peso do corpo,ou de qualquer uma de suas partes, pode ser erguidoe transportado numa determinada direção do espaço eque este processo leva um certo tempo; dependente darazão da velocidade. As mesmas condicões mecânicastambém podem ser observadas em qualquer contrapu­xão que regule a fluência do movimento. O uso do mo­vimento para um propósito definido, seja como instru­mento para um trabalho externo, seja para refletir de­terminadas atitudes e estados de espírito, deriva de umpoder que até os dias de hoje não foi explicado em suanatureza. Por outro lado, não se pode dizer que este sejaum poder desconhecido. já que somos capazes de obser­vá-lo em vários níveis, onde quer que haja vida.

50

"III

III

O que podemos ver claramente é o seguinte: essepoder nos habilita a escolher entre uma atitude hostil,contida, constrita, de resistência, por um lado, e outrade complacência. de aceitação, tolerância e oenevolên­cia em relação aos "fatores de movimento" de Peso,Espaço e Tempo, aos quais os objetos inanimados estãosubmetidos. de vez que são acidentes naturais. Essaliberdade de escolha não é sempre consciente ou volun­taríamente exercitada, sendo muitas vezes aplicada demaneira automática. sem o concurso de uma vontadeconsciente. Podemos, porém, observar conscientementea função de selecionar movimentos apropriados às si­tuações; isto quer dizer que temos condições de nosconscientizarmos de nossas opções, podendo investigarpar que fizemos uma tal escolha. Podemos observar seas pessoas se entregam ou não às forças acidentais depeso. espaço e tempo, bem como à fluência natural domovimento, no sentido de terem uma sensação corpo­ral delas. ou se lutam contra um ou mais desses fatorespor meio de uma resistência ativa a eles.

A variabilidade do caráter humano deriva da mul­tiplicidade de atitudes possíveis frente aos fatores demovimento e aí é que certas tendências poderão tornarese habituais, no indivíduo. É da maior importância parao ater-dançarino que ele identifique o fato de que taisatitudes interiores habituais são as indicações básicasdaquilo que chamamos de caráter e temperamento.

A fim de discernirmos a mecânica motora intrín­seca ao movimento vivo, no qual opera o controle in­tencional do acontecimento físico, é útil denominarmosa função interior que dá origem a tal movimento. Apalavra empregada aqui com esse sentido é esforço*.Todos os movimentos humanos estão indissoluvelmenteligados a um esforço o qual, na realidade, é seu pontode origem e aspecto interior. O esforço e a ação deleresultante podem ambos ser inconscientes e involuntá-

* Vide nota de rodapé à página 32.

51

Page 28: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

rios, mas estão sempre presentes em qualquer movi­mento corporal; se fosse de outro modo, não poderiamser percebidos pelos outros nem se tornar eficazes nomeio ambiente da pessoa em movimento. O esforço évisível nos movimentos de um trabalhador, de um bai­larino e é audível no canto e discursos. Se se ouve umagargalhada ou um grito de desespero, pode-se visuali­zar, na imaginação, o movimento que acompanha o es­forço audível. O fato de o esforço e suas várias moda­lidades não apenas poderem ser vistos e ouvidos, mastambém imaginados, é de muita importância para suarepresentação tanto visível como audível, pelo ator-dan­çaríno. Este se inspira nas descrições de movimentosque despertam sua imaginação.

Nas descrições históricas de movimento, que vêmdesde o século XIV, enfatizam-se na representação tea­

.tral os seguintes aspectos: o exato dimensionamento dotempo, a exata recordação de detalhes, gestos e passos;a coordenação harmoniosa dos movimentos dos braços ecorpo, as regras de comportamento, a variabilidade ima­ginosa de certos detalhes e, por último, e igualmenteimportante, a significação de padrões coreográficos se­gundo os quais se movimenta o bailarino.

O modo ou estilo de movimento empregado pelodançarino ou ator esclarece um aspecto particular daexpressão corporal que talvez seja mais importantepara a arte da dança do que para a mímica ou para odrama. O corpo do bailarino segue direções definidasno espaço. Essas direções configuram formas e dese­nhos no espaço. Na verdade, a dança pode ser consi­derada como a poesia das ações corporais no espaço.Na dança selecionam-se poucas mas significativasações corporais que compõem os modelos caracterís­ticos de uma dança em particular. Os modelos da dançapodem ter, mas não necessariamente; um conteúdo mí­mico perceptível. Sua significação não é sempre de ma­tiz dramático; na realidade, é freqüentemente musicale sofre influências do conteúdo emocional e da estrutura

52

. - -"'--=0--.,,", _~_ .. _...._~ ". _

d música que a acompanha. Por conseguinte, os mo­~entos visíveis do corpo na assim chaJ:.:1ada dança

. ada engendram no espectador, reaçoes ao nívelmUSIC '. áti r ítde sensação. A dança de coriteú~o drama H:;O so ICI a artícipação do espectador na açao, na reaçao e na solu­

pao do conflito Os desenhos visíveis da dança podem serÇd

aritos em ~alavras mas seu significado mais pro-esc .. • I

fundo é verbalmente meXprllll1Ve .Muitas criações na dança desapareceram porque era

impossível descrevê-las em palavras e temos um co­nhecimento muito precário de como eram. apresentadasas danças de épocas mais remotas. Se se tivesse tent.adousar de tais descrições, como de fa~o o foram,. seriamapenas superficiais e inadequadas. E neste sentido: queas descobertas do homem industrial talvez ~onslgam

ajudar o bailarino. Os trab~lhos_ cor:tempora~e~s. deanálise bem como sua notação nao diferem significa­tivamente dos exigidos para descrever qualquer mOVI­mento expressivo. Alguns ,palés modern.os, p~r exeJ?­plo, criações dos Balés Jooss e Bala,;chme, sao regis­trados segundo um modelo de notação que se desen­volveu de tentativas mais antigas de comunicar as da~­

ças por intermédio de símbolos escritos e que se baseiana observação e na análise de movimentos, no espaçoe no tempo. • . .

Uma literatura da dança e da mll;l1.ca escrIt~. emsímbolos de movimentos é tão necessaria e ~eseJavel

como os registres históricos da poesia, na escrita, e damúsica, na notação musical. _ .

A seguinte descrição de açoes corpor~Is tem porobjetivo proporcionar ao estudante de mO';Imento umaintroducão aos exercícios destinados a tremar o corp~

para s;r um instrumento de expressão. Para .t~nto, eimportante não apenas tornar-se CIente das varias ~r­

ticulacões do corpo e de seu uso na criação de padroesespaciais e rítmicos, como também aperceber-se do es­tado de espírito e da atitude interna produzidas pelaacão corporal. Algumas vezes será indicado no texto

53

Page 29: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

como treinar a imaginação, ao mesmo tempo. O leitorque se der ao trabalho de refinar e experienciar osmovimentos descritos através de uma execução corpo­ral, no entanto, descobrirá que sua imaginação é es­timulada pela atividade.

Embora houvesse sido desejável escrever os exer­cícios por intermédio de meios cínesíográficos, ou seja,usando símbolos de movimentos, foram empregadasdescrições verbais para o presente texto, por motívos :óbvios. O leitor, porém, deverá eventualmente se recor­dar da inadequação dessas descrições e, a fim de não

.nos divorciarmos do objetivo principal, a saber, o dedesenvolver uma precisão na observação e na análisede ações corporais, tentou-se realizar o que ora propo­mos por meio de um modo de descrever que talvez ve­nha a facilitar o pensar em termos de movimentos*.

ANÁLISE DE AÇÕES CORPORAIS SIMPLES

Antes de tentar uma análise de ações corporais,talvez seja útil considerar várias seqüências que conte­nham idéias de movimentos típicos. Em relação a estasidéias, as ações do corpo, que são um instrumento extre­mamente versátil de expressão, poderão tornar-se maiscompreensíveis.

Cada um dos seis exemplos seguintes contém umestado de espírito característico de ação que pode ser

* "Cinesiografia" é um método de escrita do movimento desenvolvido peloautor, Em seu livro Principies oi Movement and Dance Notation, também pu­blicado por Macdonald & Evans, ele explica o sistema que. em _seu objetivo, temuma certa semelhança com o universalmente aceito modo de escrita musical, noqual sequências inteiras de movimentos e danças podem ser registradas e relidas.Balés, danças folclóricas, qualquer movimento no palco, bem como operaçõesindustriais escritas desse modo, podem ser totalmente reconstruídos por qualquerpessoa, apesar de jamais ter visto os movimentos originais, desde que ela conheçaos princípios da cinesiografia.

O resumo mais abrangente de cinesiografia já aparecido é o trabalho de A1~brecht Knust, ex-aluno e colega do autor, atualmente renomado estudioso e pro­fessor do campo. Publicou o Handbook of Kinetography Laban, onde apresentainformações concisas sobre as muitas possibilidades de ações corporais e camaanotá-Ias. Ann Hutchinson, do Dance Notation Bureau (Serviço de Notações daDança) de Nova Iorque, também publicou um manual com o título de Labanototion,no qual são introduzidos e explicitados os símbolos originais da cinesíografia.

54

T

lírica, solene, dramática, cômica, grotesca, serra ou se­melhante. É tarefa para a imaginação do próprio leitoro modo de interpretar as seqüências. Deve ser ditoapenas que as ações-estados de espírito criados tornar­se-âo manifestos:

a) Por meio do modo peculiar de uso do instrumentoque é o corpo;

b) por meio das direções tomadas pelos movimen­tos e pelas formas assim criadas;

c) por meio do desenvolvimento rítmico de toda aseqüência e do tempo na qual é executada;

d) por meio da colocação de acentos e da organi­zação de frases.

SEIS EXEMPLOS DE SEQúÉNCIAS DE MOVIMENTOS

1. correr _. sacudir - agachar rodopiarparar.

2. arquear-se - levantar _. fechar - abrir.3. balançar - circular espalhar - plainar.4. tremer - encolher - precipitar-se - espar­

ramar-se.5. ondular - desfalecer - dar um bote - precipi­

tar-se -. arrastar-se.6. andar - reclinar - virar - pular - empinar.

As ações corporais produzem alterações na posiçãodo corpo ou em partes dele, no espaço que o rodeia.Cada uma dessas alterações leva um certo tempo erequer uma certa dose de energia muscular.

É possível determinar e descrever qualquer açãocorporal respondendo-se às quatro questões seguintes:

(1) Qual é a parte do corpo que se move?(2) Em que direção ou direções do espaço o mOVI­

mento se realiza?(3) Qual a velocidade em que se processa o movi­

mento?

55

Page 30: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

(4) Que grau de energia muscular é gasto no mo­vimento?

Tabela I

A POSIÇÃO

A posição é O local onde uma ~u ambas as_pernasque suportam o peso do corpo se SItuam no chao.

1. Permanecendo em pé, com as pernas juntas;conscientize-se da linha central do corpo, come­çando nos pés, passando pela coluna até chegarao topo da cabeça.

Troncoparte inferior

(centro de gravidade)Quadril Quadril

Joelho JoelhoTornozeloTornozelo Pé

P'e ) (artelhos)(artelhos

CabeçaOmbro Ombro

Cotovelo CotoveloPulso Pulso

M- Mãoao(dedos) (dedos)

Troncoparte superior

(centro de leveza)

Suponhamos que as respostas a estas quatro questõessejam:

a) A parte do corpo que se move é: a perna direita.b) A região do espaço para a qual o movimento se

dirige é à frente. O movimento é: direto.c) A energia muscular gasta no movimento é rela­

tivamente grande. O movimento é: forte.d) A velocidade do movimento é rápida. O anda­

mento relativo é: rápido.

Entender-se-á que o movimento descrito acima nãoé um passo, mas um súbito chute dado com ímpeto pelaperna direita, à frente do corpo.

É evidente que, a fim de executarmos observaçõestão exatas quanto seja possível, deve-se usar algumassubdivisões do corpo (vide Tabela I, pág. 57) juntamen­te com certos aspectos dos fatores de movimento Tem­po, Peso e Espaço. Entretanto, o movimento é mais doque a soma destes fatores. Deve ser experimentado ecompreendido como uma totalidade. Damos aqui oseguinte conselho: invente seqüências curtas de movi­mentos, ou cenas de mímica, nas quais os movimentosdescritos possam ser reconhecidos. Esta é uma manei­ra de treinar não apenas a observação mas tambéma imaginação de movimentos, e de descobrir a conexãoimediata do movimento imaginado com a sua aplicaçãoprática, na execução física, em termos de expressãoartística.

Prossigamos agora estudando os fatores das açõescorporais, enquanto distintos dos das funções e mecâ­nicas corporais. Espera-se com isso que se amplie eaprofunde, por intermédio desta abordagem, a aprecia­ção e compreensão da significação do movimentohumano,

f

I

Subdivisões

Articulações dolado esquerdo

O CORPO

Básicas Necessárias à Observaçãode Ações Corporais

Articulações dolado direito

56 57

Page 31: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

2. De pé com uma perna de cada lado, acentue acomposição sira,étrica direito-esquerda do corpo,tensÍl;>nando ligeiramente as mãos e pés, forado eIXo central. Mantenha a cabeça 'erguida.

TRANSFERÊNCIA DE PESO OU PASSOS

Cada passo cria uma nova posição.

3. Dê uma passada ampla com sua perna direita,dê outra com a esquerda, novamente com adireita e depois com a esquerda.

Execute o exercício energicamente como seestivesse "conquistando", a cada vez a novaposição. Cuide para que o peso do corpo sejatotalmente transferido a cada passo, deixando aoutra perna livremente suspensa no ar.

DIREÇÕES E PLANOS* DOS PASSOS

A direção espacial de um passo é relativa à posiçãoimediatamente precedente. •

4. Começando com o peso distribuído nas duas per-nas, execute os seguintes passos:

à frente, com o pé esquerdoà frente, com o pé direitoagora mantenha o peso no direito (isto é, aação do movimento da perna direita· estásustida) e dê um passo com o pé esquerdopara junto do direito, para que o peso final­mente volte para as duas pernas.Você executou um "passo modelo" que pode

ser repetido:a) com o mesmo lado ou com o outro;b) em outras direções, tais como para trás.

5. De pé sobre a perna direita, a esquerda mantidapara trás e mantida fora do chão. Agora dê osseguintes passos:

pé esquerdo d [rentepé direito junto do esquerdo(cuide para que a perna esquerda cantinue

+. N. da T. - Foi traduzido como plano no sentido de nível.

58

---T-

sua ação até que finalmente esteja fora dochão e fechada perto da outra perna)pé esquerdo à frente.

Completou-se outro "passo modelo" que podeser diretamente repetido, prescindindo de quais­quer movimentos de transição:

a) com o outro lado;b) em outras direções, tais como de lado.

De pé na perna direita, mantenha a perna es­querda do seu lado esquerdo fora do chão, exe­cute o seguinte passo:

com a perna esquerda para o lado esquerdo,com a perna direita junto a ela(observe a completa transferência de peso),com a perna esquerda para o lado esquerdo.

Repita este passo modelo para a direita sem mu­dança transicional.

A postura e os passos normais são de planomédio; os passos baixos são executados dobran­do-se os joelhos tanto quanto possível, enquantoo pé inteiro permanece no chão. Passos altossão dados na ponta do pé, estando o joelho esten-dido normalmente. .

Explore as características dos passos altose dos baixos, os quais dão a sensação de afun­dar no chão assim como a de subir acima dele.

No exercício a. seguir J você experimentaráum movimento de ascensão gradual, seguido deuma mudança brusca para baixo, do qual a fasede subir novamente se inicia, a cada vez numadireção diferente.

6. De pé em ambas as pernas, passo nas direçõesdireita - frente cam a perna direita-baixodireita - frente com a perna esquerda-médiadireita - frente com a perna direita-altoesquerda - trás com a perna esquerda-baixoesquerda - trás com a perna direita-médioesquerda - trás com a perna esquerda-altodireita - trás cam a perna direita-baixodireita - trás com a perna esquerda-médiodireita - trás com a perna direita-altoesquerda - frente com a perna esquerda-

baixo

59

Page 32: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

esquerda - frente com a perna direita-médioesquerda - frente com a perna esquerda-alto

Complete baixando o peso na perna esquerda noplano médio, ao mesmo tempo dando um passocom a perna direita para perto dela, de modoque a posição inicial seja atingida novamente.

Este exercicio pode ser inteiramente repetido;a) exatamente igual;b) do mesmo modo, mas começando em qual-

quer outra das três direções diagonaisà esquerda e para frenteà esquerda e para trás, ,à direita e para trás;

c) invertendo o plano dos passos, começandoalto - médio - baixo;

d) variando os planos de algum outro modo,

_ Quando der passos na diagonal, preste aten­çao para que a frente do corpo não se alterequer dízer, os quadris devem permanecer ems::a posição original, para que ocorram as posí­çoes aberta e cruzada das pernas, o que permitea experienciação de um modo de andar livrecomo de um modo de andar obstruido a passoslargos.

GESTOS COM AÇÕES SUCESSIVAS

OS gestos são ações das extremidades, que nãoenvolvem nem transferência nem suporte do peso. Po­dem dar-se em direção do corpo, para longe dele, ouao seu redor e podem também ser executados com açõessucessivas das várias partes de um membro.

7. Esticar o braço direito para longe de seu corpo.Dobre-o em direção de seu peito.

Enquanto você realiza esse movimento pres­te atenção às diferentes articulações d'e seubraço: ao esticar o braço na sua totalidade parare:omar a posição ínícial, certifique-se de que suamao e os dedos também estão estendidos. Movaagora, primeiro apenas a mão, no sentido de seucorpo; depois o pulso seguido do cotovelo efinalmente, o ombro, Deste modo, você execu-

60

tará um movimento sucessivo de seu braço díreí­to, com início na ponta dos dedos que movi­mentam a mão, seguido do punho que movimen­ta o antebraço, depois do cotovelo que move obraco e finalmente do ombro que movimenta aescápula direita, completando desta forma ummovimento de dobrar em direção à linha cen­tral de seu corpo.a) Inverta a ação para estender, movendo su­

cessivamente para fora da linha central epara longe dele:

ombro - afetando a escápulacotovelo - afetando o braçopulso - afetando o antebraçodedos - afetando a mão.

b) Repetir dobrando e estendendo com ·0 braçoesquerdo.

c) Dobre e estenda ambos os braços, atentandopara uma sucessão bem-feita na ação dasvárias articulações de seus braços, ao alteraras suas posições.

d) Dobre e estenda um ou ambos os braços, fa­zendo seqüências diferentes de sucessão demovimentos, das várias articulações do braço;por exemplo, estique o braço para longe docorpo. Em seguida, dobre-o em direçãodo corpo com uma sucessão irregular: pri­meiro o ombro, depois a mão, cotovelo e,finalmente, O pulso.

Observe o efeito mais harmonioso de dobrare estender o braço quando a ação é realizadacom uma sucessão regular das articulações dobraço, como descrito acima, não importando seo início se dá com as articulações internas ouexternas comparado ao efeito mais desarmonio­so, até mesmo grotesco, que apresenta a suces­são irregular, como no exercício 7-â.

8. Dobre e estique uma perna. Quando o peso écolocado em uma das pernas, a outra está libe­rada para realizar gestos. Estenda uma daspernas no ar, para longe do corpo. Execute ummovimento de dobrar sucessivo. como se segue:

quadril - inclinando a pélvisjoelho - movendo a coxa

61

Page 33: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

tornozelo - movendo a pernaartelhos - movendo todo o pé

concluindo desta maneira um movimento de do­brar a perna em direção à linha central docorpo.

a) Inverta essa sucessão para estender, ini­ciando com os artelhos e terminando com oquadriL

b) Dobre, começando da ponta dos artelhos.

c) Estenda, iniciando do quadril.

d) Execute movimentos de dobrar e estenderem sucessão irregular das partes da perna.

GESTOS COM AÇÕES SIMULTÂNEAS

Diversamente dos exercícios anteriores, OS, movi­mentos das extremidades em direção ao corpo e paralonge dele podem também ser realizados com acõessimultâneas de suas várias articulações.' Observe que,desta forma, os movimentos da mão, antebraço, bracoescapula ou os do pé, perna, coxa e pélvis são inicia~dos e finalizados ao mesmo tempo.

9. Repita o exercício 7, mas ao invés de comple­tar o movimento de cada segmento do braçoantes de iniciar o do seguinte, todos os quatroentram simultaneamente em ação, do começoao fim.

Compare as experiências dos movimentos si­multâneos e sucessivos." Você observará que afluência da ação sucessiva promove a cons­cientização do- processo de dobrar e esticar, aopasso que na ação simultânea é a realizaçãode cada estágio que parece ter importância.

10. Experimente dobrar e esticar os braços e per­nas sucessiva e simuLtaneamente, usando apenasduas ou três articulações, por exemplo, ombroe pulso, ou joelho e tornozelo.a) Mova ambos os braços e uma perna ao mes­

mo tempo, variando ações, simultâneas e su­cessivas com cada membro.

(i2

I

b) Dobre ou estique um membro após o outro,variando entre ações sucessivas e simul­tâneas.

DIREÇÕES E PLANOS DOS GESTOS

As direções e os planos dos gestos do braço e daperna são relativos à articulação na qual ocorre omovimento.

O plano médio de um gesto da perna ocorre na alturado quadril, o plano médio de um gesto do braço é daaltura do ombro. Os movimentos realizados acima des-:sas articulações são altos e os realizados abaixo sãobaixos.

Os gestos dirigfdos para a linha vertical baixocima; ou perto das juntas do membro em movimentosão baixos, altos ou médios, respectivamente.

Os braços pendendo verticalmente dos ombros,como na postura normal, são "baixos". Uma pernapendendo, próxima à outra que suporta o peso do corpoé "baixo".

Os braços erguidos verticalmente, acima dos om­bros, são "altos"; as pernas erguidas verticalmente,acima dos quadris, como na posição apoiada nas mãos("como plantar bananeira") são "altas".

Braços ou pernas dobrados bem próximos dosombros ou quadris, respectivamente, estão num planomédio.

Os planos e dírcções específicas das partes emseparado, tanto do braço quanto da perna, relacionam­se às articulações nas quais se dá o movimento. Porexemplo, um movimento médio, para a frente-médio,do joelho, traz a coxa para a frente, ao plano do qua­dril; este é um movimento simultâneo, para trás-baixo,do tornozelo, ou seja, do pé para trás-baixo, a partir daarticulação do joelho, trazendo-o para perto do joelhoda perna de apoio.

11. De pé sobre a perna direita, estenda a pernaesquerda para trás-baixo. Ação de toda a perna

63

Page 34: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

c) Inverta a seqüência começando com o gestoda perna esquerda: para a direita, para afrente-baixo ou para a esquerda. para afrente-baixo.

Estes são gestos percebidos como resultado de umpasso, como por exemplo, após um passo à esquerda,para trás-baixo, a perna direita executa um movimentode dobrar pelo joelho esquerdo.

Os gestos das pernas podem também ocorrer inde­pendentemente, em cujo caso é acidental qualquertransferência de peso decorrente. Veja os exemplos11 e 12 ou o seguinte.

15. De pé. na perna esquerda-baixo.(i) jGesto da perna direita:

Joelho para o lado direito-médioTornozelo para o lado esquerdo-baixo(trazendo. o calcanhar direito para per­to do joelho esquerdo)Artelhos para o lado direito·médio

{

Mudança de plano da perna-suporte(ii) para 11iédio

Gesto da perna direita para o ladodireito-médio

(As chaves indicam ações simultâneas).

Os gestos podem ser executados como preparaçãopara uma transferência de peso. Execute o exemploseguinte:

14. Posição inici.al com os dois pés juntos; planomédio.Gesto da perna direita:

lado direito-baixo; para a frente-baixo.Passo da perna direita;

do lado esquerdo. baixo.A seguir, mude para o plano médio, enquantodá um passo com o pé esquerdo perto do direi­to, também em plano médio. Repita com o outrolado.

os GESTOS DAS PERNAS PODEM SE SEGUIR A UM PASSO

os GESTOS DAS PERNAS PODEM PRECEDER O PASSO

baixo

alto

baixo

alto

baixopara a esquerda, àfrente-médio

a) Repita a seqüência toda com o outro lado.b) Repita a seqüência, começando com o gc:sto

da. pern~ es'!uerda: para a esquerda, paratras, baiXO (isto é, numa posição aberta dia­gonal para trás).

para a esquerda, àfrente-baixo(com toque no chão)

via médio

para a direita,para tr ás-baixo(com toque no chão)

via médio

esquerda:baixopara a [rente-baixobaixopara trás-baixo

Pratique o mesmo exercício com a outra perna.

12. De pé sobre a perna direita, estenda a pernaesquerda para trás-baixo. Ação de toda a pernaesquerda:

médiopara a frente-baixomédiopara trás-baixo.

Pratique o mesmo exercício com a outra perna.

Enquanto a perna livre executa os gestos, aque suporta o peso pode mudar de plano.

13. De pé sobre a perna direita, baixo, estenda aesquerda para trás diagonalmente através dadireita, para trás-baixo tocando o ~hão com osdedos, não carregando peso algum. Ao mesmotempo, faça os seguintes gestos com a perna:

Gestos com a perna Perna direita naesquerda: posição:

via médio alto

6465

Page 35: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

17. Braço direito:

18. Faça os gestos de ambos os braços ao mesmotempo:

a) Repita várias vezes.b) Repita com a outra perna.

OS GESTOS EM VÁRIAS DIREÇÕES CONSTITUEM

FORMAS DEFINIDAS DE MOVIMENTO

11iià frente, médio

baixolado direito­médio

à frente, médiobaixolado esquerdo­médio

19. Posição inicial: peso na perna direita-baixo,braço direito médio. Execute os movimentos debraço e perna ao mesmo tempo.

Ocorre uma forma torcida quando a linha demovimentos, em suas direções gradualmente mo­dificadas, contém dois centros. Neste exemplo,o braço esquerdo vira em redor dos centros:

direito, à frente-baixo eesquerda, à f'rente-baixo.

Enquanto que o braço direito vira em redor:

esquerda, à frente-baixo edireita, à frente-baixo.

MOVIMENTOS DE BRAÇO E PERNA COMBINADOS

O corpo é nosso instrumento de expressão por viado movimento. O corpo age como uma orquestra, naqual cada seção está relacionada com qualquer umadas outras e é uma parte do todo. As várias partespodem se combinar para uma ação em concerto ouuma delas poderá executar sozinha um certo movimen­to como "solista", enquanto as outras descansam.Também há a possibilidade de que uma ou várias par­tes encabecem e as demais acompanhem o movimento.Este é um ponto importante de se ter em mente aoestudar os exercícios deste capítulo. Cada ação de umaparte particular do corpo deve ser entendida em rela­ção ao todo que sempre deverá ser afetado, seja poruma participação harmoniosa, por uma contraposiçãodeliberada, ou por uma pausa.

As formas circulares, angulares e torcidas. pedemuma execução corporal clara. Observe como as fun­ções do corpo, a saber, o dobrar, o esticar, o torcer esuas combinações operam na execução dessas formas.

Iri

II

,II:

Gesto do braço di­reito:

lado esquerdo­médio

Gesto do braço es­querdo:

lado direito­médio

lado direito-baixoesquerdo-para frente-baixolado direito-médioesquerdo-para a frente-altolado direito-alto

Esta seqüêncía de direções, mudando abrup­tamenta, produz uma espécie de desenho emziguezague com formas angulares. -

16. Gesto do braço esquerdo:

de direita-para frente-médiopara a frente-baixopara esquerda-para frente-médiopara a frente-alto, voltepara direita-para frente-médio

_ Esta seq~ência, que envolve apenas altera­çoes graduaís de direção, cria um desenho ouforma quase que circular, empregando Comoponto central a direção à frente.

Os gestos dos braços e pernas deveriam sere:,~cutados com facilidade e não com qualquerr igidez de SUas várias articulações.

. pen~re as formas espaciais de movimento podemosdistinguir- as formas circulares, angulares e torcidascomo formas básicas. .

6667

Page 36: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

1I

A mudança de plano pode ocorrer durante umaúnica ação do corpo ou de suas partes. No exercícioanterior, a transferência de peso nos movimentos depassos se completa apenas quando o joelho - apósdobrado - novamente se estica. Isto produz um suavemovimento de pisar, diferente do seguinte:

21. Gesto do braço direito:

esquerda, para a frente, baixoesquerda, para a frente, altodireita, para trás, altodireJta, para trás-baixo

Treine sua habilidade de apreciar a diferençaentre as mudanças de planos durante cada ação,bem como as mudanças de direção provocadaspelas diversas ações corporais.

20. Passo esquerdo: para frente, baixo-médioPasso direito: para trás, alto-baixo.

Pratique uma completa transferência de pesocom o passo à frente baixo e após uma pausaquase que imperceptível, estique o joelho queestá suportando o peso.

Pratique semelhantemente uma completatransferência' de peso para o pé direito, paratrás e alto, e após uma pausa quase que imper­ceptível, abaixe o calcanhar e dobre o joelho.

Os gestos de braços no Exercício 19, quemudam de plano enquanto se movem esquerda- para frente e depois direita para trás e paraa direita, também produzem curvas suaves dife­rentes das do exercício seguinte, no qual cadadireção é alcançada segundo uma ação própria:

MUDANÇA DE PLANO

22. Braço direito de médio para estreito frente­baixo (estreito ou próximo ao corpo significaque o braço não estará completamente esten­dido), para largo, frente-para o alto.Execute esse gesto curvo:

* Vide Modern Educatlonal Dance por Rudolf Laban.

b) determinando-se a manter a posição originala qualquer custo. Isto terá por resultadouma extensão extrema do braço e uma sen­sação de limitação e de controle.

a) com um movimento livre e fluente, rapida­mente, de modo que sua extensão além ·de .fácil alcance, faça o corpo todo desequili­brar, provoque a necessidade de um passo oudois para recuperar o equilíbrio eventualmen­te perdido;

o alcance normal de nossos membros quando seesticam ao máximo para longe de nosso corpo, sem quese altere a posição, determina os limites naturais doespaço pessoal ou cnesjera, no seio da qual nos movi­mentamos. Esta cnesjera se mantém constante emrelação ao corpo, mesmo quando nos movemos paralonge da posição original, viajando com o corpo noespaço geral".

Os gestos podem estender-se para longe do corpoou próximo a ele, ou deslocando-se entre perto e longe.São, por vezes, contidos e perto; em outras ocasiões,estendidos e amplos, envolvendo movimentos de todo otronco, o que provoca na cnesjera um encolhimento eum crescimento respectivos.

Os gestos que ligam extensões diferentes da cnes­fera são freqüentemente controlados e estáticos emdemasia ou tendem a estar carregados de qualidadesdinâmicas que muitas vezes provocam a locomoção.

EXTENSÃO DOS GESTOSBraço direito:gesto: esquerda paraa frente.(via baixo para alto)gesto: direito paratrás(via alto para baixo)

àPernas:esquerdo:passo

frente(via baixo para médio)passo direito: paratrás(via alto para baixo)

68 69

..~....;; n" r ... T .

Page 37: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

70

23. Explore as possibilidCfdes_ de gestos do braçoque levem a outras direções e níveis da cneeje­ra, estendida, tais como:a) alto, faz::ndo com que ou o pé saia livremen­

te do chão ou se agarre a ele na tentativa dec~ntrapor o puchão para uma esfera esten­dida;

b) direita, para trás-baixo, chegando ou à quedaou ao controle do equillbrio.

24. Gesto do braço esquerdo:

do lado esquetdo-médio (amplo)para lado direito-médio (normal)para lado esquerdo-médio (estreito)para médio.

Esta seqüência de movimentos cria Um des­locamento balanceado que gradualmente levaa parada. Adapte a posição de seus pés de talf'0d~ que possa ser claramente percebida a ex­ensao decrescente do gesto do braço.

25. Invente gestos com os braços, criando formascurvas ou angulares de movimentos, enquantos~ locomovendo em uma das diferentes exien­soes da cnesjera; ou entre elas, como porexemplo:Gesto do braço direito:

de para frente-médiopara lado direito-médio (amplo)para baixo (estreito)para trás-médio (amplo)

Ou

Gesto do braço esquerdo:d? lado direito-alto (estreito)vw frente-alto (estreito) e

alto (estreito)para frente-baixo (amplo)para direito-trás-médio.

Ajude a execução das extensões variãveisddo gesto de Seu braço cam movimentos apropria­

os de suas pernas e de seu torso._ Observe o modo como a mudança de exten­

sao no _espaço pede uma crescente sensibilidadenas açoes corporais.

26. Experimente semelhantemente, com as pernas,os gestos descritos acima para os braços.

EXTENSÃO DOS PASSOS

Conforme já indicamos anteriormente, os gestos depernas podem ser executados por si mesmos ou associa­dos a um passo, seja precedendo-o, seja seguindo-o.Também os passos podem ser estreitos e largos, oumelhor, pequenos e grandes, conquanto nem aumentemnem diminuam a cnesfera, fazendo porém com que oespaço pessoal entre no geral.

27. Dê alguns passos à frente, começando com pas­sos bem pequenos e pouco a pouco aumentando·-os até que sejam estendidos e bem amplos.

28. Comece com passos bem grandes n frente e ter­mine com bem pequenos.

Enquanto realiza os Exercicios 27 e 28 pro­cure notar se ocorrem, em alguns deles, mu­danças de tempo e do uso de sua força. Emcaso positivo, tente o seguinte:

a) restrinja-se quanto a mudanças e trabalhe nosentido de adquirir um controle regular desuas ações 'corporais;

b) inverta ou varie as alterações que vocêobservou, sem perturbar o aumento ou dimi­nuição gradual da extensão do espaço.

29. De pé sobre a perna direita, baixo.

Gesto da perna esquerda:

de baixo (estreito), ou seja, pé esquerdoperto do joelho direitopara direito-trás-baixo (amplo)para esquerda-trás-baixo (amplo)

seguido de um passo bem pequeno do pé es­querdo para trás, médio.

71

E

Page 38: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

30. Execute as seguintes ações com as pernas, aomesmo tempo: Tabela II

direita frentedireita

direita trás

frente

trás

ESPAÇO

esquerda frenteesquerda

esquerda trás

elementares necessários para observaçãode ações corporais

Aspectos

Direções:

pausa

médio

Perna direita:Passo: lado direito,

baixo(muito amplo)

Perna esquerda:

Gesto:trás~ baixo }(com um toque no chão)à frente, baixo(com um toque no chão)do lado direito, baixo

(estreito)Passo para posição, médio

Note como as ações simultâneas de partesdiferentes do corpo, que variam em suas exten­sões, criam um conteúdo expressivo que sepoderia chamar de problemático, isto é, taisações não sugerem uma solução direta.

31. Invente seqUências de movimentos de pernascom gestos estreitos e amplos, precedendo ousucedendo passos pequenos ou grandes, em vá­rias direções.

Experienciamos coisas mais interessantes apartir de gestos dos braços e das pernas, quediferem em seu grau de extensão, do. passos queque os acompanham, por exemplo: Dê trêspassos pequenos para trás, alto, enquanto queos dois braços tendo começado em médio, gra­dualmente estendem-se à frente, médio, muitoamplo. O!L, de pé sobre o pé direito, baixo,enquanto a perna esquerda está estendida paratrás-baixo, tocando o chão com o dedão do pé.Execute agora os gestos de ambos os braços aomesmo tempo;

VELOCIDADE

A média que permitimos a um movimento sucedera outro é a velocidade com a qual agimos. O passo donosso andar normal pode ser considerado como sendode velocidade média. Podemos atribuir a cada passouma unidade que possa corresponder a cada batida denosso pulso.

Um passo que ocupa várias batidas é percebidocomo vagaroso; vários passos em uma só batida sãorápidos (vide Tabela III).

32. Dê alguns passos em qualquer direção qu~ voc.êdeseje, à média aproximada de seu pulso, isto e,velocidade média ou "normal":

Gesto do braçoesquerdo:

para o lado esquerdo,alto

(muito amplo)

Gesto do braçodireito:

para a direita, frente,médio

(muito estreito)

Planos:

Extensões:

Caminho:

perto

pequena

direto

altomédiobaixo

normal

normal

angular

longe

grande

curvo

.7273

Page 39: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

"1-

33. Enquanto transfere seu peso de um pé para ooutro, deixe que passem várias batidas em seupulso, dando assim um passo "lento".

34. Tente dar vários passos entre duas batidas deseu pulso, agindo "rapidamente".

36. Execute as seqüências de movimento que v?~êcriou empregando os ritmos dados no exerC'l.C10

35 em tempos diferentes:a)' médio; b) .lento; c) rápido. _O Exercício 35 (1), expresso em notaçoes musi­cais, seria lido do seguinte modo:

(a) ,J• .t J.(b) d. J d.(c) r. ~ r.

Escolha qualquer posição inicial; mod~ique-?segundo uma ação corporal que dure tres batl­das de seu pulso (ou três contagens regulares);imobilize seu movimento por uma pausa de duasunidades de tempo, seja qual for a posição emque você tiver chegado, conscientizando-se. danatureza desta nova posição. Volte, em segu,da,à original dentro de uma unidade de tempo e,sem pausa, comece uma frase completa outravez.

. a) Comece por uma pausa, na posição inic~al.com três unidades de tempo deduraçao;mude para outra posição (predeterminada)durante duas unidades de tempo e mude destapara a original em uma unidade de tempo.

b) Mude uma posição inicial em três unidadesde tempo. Troque a posiçélo mais recente ?oruma inteiramente nova, durante duas umda­des de tempo e mantenha esta última poruma unidade. Repita este ritmo produzindo, decada vez, ações em partes diferentes do corpoe para diferentes direções e planos.

38. Invente seqüências de a,<ões corporais uséadn?ovariações de velocidades rápida, lenta e m ,a,co-m e sem:

PAUSA

Qualquer ação corporal pode seryarada e retiradapor um período de tempo. A duraçao da 'pau~a 'podeser medida por unidades de tempo proporcionais a dosmovimentos que introduzem e concluem o período deparada.

37.

35. Crie desenhos de passo usando os seguintes rit­mos várias vezes seguidas:

(I) J.,J' J. (2) d J J (3) J J d (4),J' J ,J'a) Compare os desenhos dos passos que oocê

criou uns com os outros e acentue as açõescorporais características de cada um.

/» Produza variações de cada desenho de passointroduzindo gestos de pernas sem alterar oritmo original.

c) Invente seqüências de gestos de braços emcada ritmo, com o uso claro das diversasarticulações (ombro, cotovelo, punho e de­dos), tanto simultlinea quanto sucessiva­mente.

d) Observe mudanças de direçães e planos emrelação a cada ritmo e produza variaçõesfazendo trocas de cada um pelo seu oposto, OUseja, o ir à frente é substituído pelo ir paratrás; para cima é trocado por para baixo, etc.

Esses exercícios não apenas promoverão aprecisão como também a habilidade para inven­tar ações corporais.

TEMPO-RITMO

O tempo-ritmo de uma serre de movimentos con­siste na combinação de durações iguais ou diferentesde unidades de tempo. Estas podem ser sepresentadaspelas notações musicais de valores de tempo.

TEMPO

Os tempos-ritmos são independentes do tempo detoda a seqüência de movimentos. O mesmo ritmo podeser executado em tempos diferentes, sem alterar aduração proporcional de cada unidade de tempo.

74 75

Page 40: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

43.

42.

a) deter úma ação,b) deter-se numa pausa após uma ação com­

!,leta para uma posição nova, durante uminteroalo de tempo claramente proporcionalao da. açãa,

MOVIMENTOS VIBRATÓRIOS SACUDIDOS

, Consistem ~s!es em mudanças muito rápidas de umndumtero de posiçoes produzidas dentro de uma unidade

e empoo .

39. Produza um movimento vibratório sacudidoa) por intermédio de mudanças muito rápidas

de duas posições alternadasb) por i,n~ermédil; _de mudanç~s muito rápidas

de vanas pos,çoes diferentes.~icará bastante claro que as posições desses

mOVl.mentos sacudidos sítuar-se-ão próximas en­tre si, no espaço; por exemplo seu braço direitoque está esticado à frente erd todo seu compri­mento move-se rapidamente algumas vezes numapequena distância entre um ponto acima e outroab~'xo, n~ transcorrer de uma unidade de tem­po. ou os Joelhos se mexem muito depressa paradentro e para fora durante um intervalo detem iJiJ. .

Tabela III

TEMPO

Aspectos Elementares Necessários à Observaçãode Açães Corporais

Velocidade: rápida normal lenta

(Unidades de ~ ~. J' J'. .I .I. d d.tempo)

C>1 1% 2 3 4 6 8 12 16

Tempo: presto moderato lento(relativo àsseqüênciasde movimento)

76

USO DA ENERGIA OU FORÇA MUSCULAR

A fim de efetuar alguma modificação em nossaposição corporal usamos a ener-gia mus~ular. O dis­pêndio de força e seus graus e proporcIOnal ao pesocarregado ou à resistência que se lhe oponha. O pesopode tanto ser:

1) o da parte do corpo que está sendo movida, como2) o de um objeto a ser movido.A resistência pode originar-se ou1) do interior do próprio corpo da pessoa, pelos

músculos antagonistas, ou2) do exterior, em objetos e/ou pessoas.A resistência pode envolver uma tensão muscular

normal, forte ou fraca.40. Dê uma série de passos em uma direção:

a) Empregando· uma resistência uniformementeforte contra o solo;

b) com força crescente;

c) com força decrescente;e invente variações de tempo-ritmos.

41. Execute u:ma seqüência de três passos, onde oprimeiro deverá ser dado com forte tensão muS­cular, o segundo com tensão normal e o terceirocom tensão fraca. Repita várias vezes. Crie umou vários passos repetitivos de dança, atribuin­do a cada passo uma direção e um nível parti­culares.

Invente ações corporais isoladas, tais como asque ocorrer"- no desdobrar de um braço, naflexão dos joelhos. etc., e experimente em cadauma a execução com tensão muscular variandoentre forte, normal e fraca.

Faça um gesto contínuo de braço, partindo dolado esquerdo-médio, para alto, para lado direi­to-médio, para a frente-médio, no qual o mov~­menta tem uma tensão muscular forte na prs­meira direção, normal na segunda e fraca naterceira.

77

Page 41: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

PESO

Tabela IV

Aspectos Elementares Necessários à Observaçãode Ações Corporais

46. Realize os Exercícios 44 (a) e (b) com uma per­cepção bem-focalizada para o momento em quevocê se dirige para o passo enfatizado ou se, aocontrário, você começa por ele e acaba a frasecom uma tensão menor. Varie o uso de direçõese de planos.

fracaV. : 1

neutrorelaxado

oua

normal1 : 1

forte2 : 1

ênfasetensão

VOLTAS OU MUDANÇAS DA FRENTE

Nos exemplos que até o momento se apresentaram,a frente de seu corpo permaneceu inalterada, no quediz respeito à direção. Agora você passará à prática devoltar com a frente de seu corpo, para diferentes dire­cões. A fim de atingir um julgamento bem-fundamen­tado do grau de volta, você terá que se ver livre danecessidade de fitar certos objetos ap seu redor; osnovos parâmetros deverão ser encontrados no seu pró­prio corpo. Fique de pé, apoiado em seus dois pés;talvez seja melhor manter os olhos fechados; tentetraçar uma imagem bem-definida das relações de seucorpo com as seguintes direções espaciais:

frente: estando na frente do corpotrás: estando atrás do corpolado direito: estando à direita do corpolado esquerdo: estando à esquerda do corpo

Acentos:Graus de tensão:

Energia ou força muscularusada na resistência ao peso:

ACENTO

Uma tensão que surja abrupta ou gradualmentepoderá eventualmente se constituir numa ênfase ouacento de um movimento ritmicamente importante.

44. Execute uma série de movimentos de passos,acentuando:

a) cada quarto passo;b) cada segundo passo.

É interessante notar que a ênfase unilateraldo corpo, ou seja, a acentuação que a cada vezSe dá na mesma perna, proporciona tanto umasensação de desajeito ou de animação, confor­me o caso, e principalmente no exemplo (b).O fato pode ser atribuído à alternação homogê­nea das pernas, bem como à ênfase não-ênfase,enquanto que no exemplo (a), o intervalo nãoacentuado acontece com vãrios passos, o que con­fere à ação um melhor equilíbrio.

Em contraste com isso, observe que a ênfaseespecial colocada em cada terceiro passo, noExercicio 41, acontece em pernas alternadas,produzindo uma sensação confortável ou talvezde complacência, Essa nuance se torna particu­larmente notória quando os três passos são exe­cutados com velocidade, como numa valsacadenciada.

45. Varie a colocação do acento numa seqüência detrês passos, da seguinte maneira:

a) no primeiro passo;b) no segundo passo;c) no terceiro passo;a principio, repetir cada exemplo quatro vezes;depois, estabelecer frases mais longas misturan­do os exemplos.

Podemos distinguir, por exemplo, as duaspossibilidades seguintes de elaboração de umafrase, na alternância de movimentos com e semênfase:

(i) a parte não acentuada precede o acentoe abre caminho para este último;

(ii) a parte não acentuada segue o acento e,por assim dizer, dissolve-o.

78 79

Page 42: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

48.

e não .com o local onde estão as janelas, as portas oua lareira da sala. '

Por~ant?, quando você mudar a sua frente paraoutra dIreçao, por exemplo, para trás, aí será o localonde aII!es estavam as suas costas, o que significaque voce. de~ uma meia-volta. Após a realização davolta" a díreção antiga atrás se transformou na díreçãonova a frente. Isto será elucidado no seguinte exercícío i

47. Dê um passo à frente com o pé direito, agoracom o esquerdo e novamente com o direito; pau­sa ~ procure perceber que a perna esquerdaeste3': conservada atrás - [aça com que o dedãodo pe toque o solo - agora volte para a SUaesquerda,. sem tirar o dedão do pé esquerdo dolugar, ate que a perna esquerda esteja à frentedo corpo.

Você terá completado uma meia-volta e aper!'la esquerda está agora em posição de re­petir a seqüência e refazer o trajeto original

. ~bserve; que no final do movimento a pern~díreíta esta atrás, os dedos tocando o chão eque, para poder repetir toda a seqüência desdeo começo. vo.cê deverá dar outra meia-volta, maspara a dírefta desta vez.

Dê Um pa.ss~ para o lado direito primeiro coma perna d~re'ta e a seguir com a esquerda (cru­-zando). V're-se agora para a sua direita até quea s'!a. [rente esteja voltada para a direção quede tnzc'lo, se colocava à esquerda de seu corpo'Isto significa dar 3/4 de volta para a direita:

DIREÇÕES DE VOLTAS

d A mudança-da frente, ou volta numa nova direçãopo e ser concretizada de duas maneiras: '

a) fr~~~ a direita, ou seja, o ombro direito vai para

b) para a esquerda, ou seja, o ombro esquerdo vaipara trás.-'-

80

MOTIVOS PARA VOLTAS

As voltas são freqüentemente dadas:a) seja para efetuar uma mudança deliberada de

direção, como no Exercício 47 e 48;b) seja para gozar a ação ligeira de girar em torno

de um eixo que é usualmente iniciada por ges­tos de braços ou pernas, como por exemplo:

49. Balance sua perna esquerda do lado esquerdo,via frente, para o lado direito, permitindo queseu corpo seja girado até onde o impulso do ba­lanço da perna levar você. Dê, a seguir, trêspassos para trás.

Note que aqui "para trás" se refere à novafrente obtida após a volta.

Esta volta é chamada volta "para dentro",pois o gesto que a inicia cruza a frente do corpoe proporciona uma sensação de cercar. O casooposto ocorre quando o gesto vem da frente docorpo e se abre para trás, como ocorre no exer­cício seguinte.

50. Faça um círculo com sua perna direita rapida­mente ao redor da esquerda, que suportao peso, começando na frente, via lado direito,por trás, para o lado esquerdo; deixe o corpogirar.

Essa é uma volta "para fora" e a sensaçãode abertura pode ser acentuada por um gestoconcomitante de abertura dos braços. Concluaa volta dando um ou dois passos de sua escolha.

COLOCAÇÃO DE VOLTAS

As voltas podem ocorrer também entre passos, ediferentes qualidades expressivas podem ser causadas,se as colocarmos como se segue:

a) volta precedendo um passo;b) volta enquanto se dá a transferência de peso;c) volta em seguida a um passo.

81

Page 43: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

51. Faça experiências cam os exercícios anteriores,introduzindo:

a) mudanças de planos;b) mudanças de velocidades.

MUDANÇAS DE FRENTE ENQUANTO PROGREDINDO ATRAVÉS DO ESPAÇO

~ mudança da frente pode ser efetuada ao longode varios passos.

52. Dê vários passos para trás e continue mudandoa sua frente, voltando-se para a esquerda atéque você encare a âireção que estava às suascostas inicialmente. V.ocê terá executado ummeio-círculo.

Experimente mudanças similares da frentedo corpo, usando uma outra direção constantede andar.

PULOS

Uma das ações corporais mais excitantes é a ele­vação do corpo acima do solo, ou seja, o momento emque ambos os pés deixam o chão num pulo e você ficaverdadeiramente suspenso no ar por um momento.

Pular requer um certo grau de ações rápidas efortes das pernas para que o corpo seja lançado ao ar.

53. Faça experimentos de pulos e você descobriráque há cinco possibilidades básicas:

a) dos dois pés para os dois pés;

b) dos dois pés para um dos pés;

c) de Um pé para o mesmo pé;

d) de Um pé para o outro pé;

e) de um dos pés para os dois pés.

Embora estas variações sejam muito natu­rais e toda criança delas se utilize ao brincarde amarelinha, no balé clássico são executadassegundo um estilo particular e denominadas:

82

a) sauté; b) sissonne; c) levé; d) jeté; e) as­semblé*.

Ao sair do chão com ambos os pés ao mesmotempo, como em (a) e (b), a elevação é obtidaapenas pelas ações dos pés e dos joelhos.

54. Explore diferentes modos de saltar com ambosos pés. considerando:

a) planos de permanência;b) posição aberta ou fechada, quer dizer, pés

fechados ou um pouco separados;c) graus de energia;d) velocidade de ação.

Quando o salto é iniciado com uma perna,como em 53 (c), (d) e (e), a outra perna podeajudar na elevação, dando ao pulo o impulsode um vigoroso gesto para o alto, conforme su­blinhado em 55.

55. Dê um passo à frente com a perna direita eimediatamente lance o joelho esquerdo para afrente-alto, de modo que o pé direito seja for­çado a sair do chão momentaneamente; a seguir,deixe que o peso caia sobre ele. Repita com ooutro lado e continue com esse movimento de"pular" (" skipping" )** várias vezes.

a) Dê passos em diferentes direções;b) Mude sua frente com uma volta no ar.

56. Fique de pé sobre uma das pernas e mantenhaa outra para trás-baixo, pronta para lançá-la àfrente e pular com ela. Continue esse movimentode "saltar" de uma perna para a outra.

Varie estes saltos usando extensões diferentes:

a) na transferência de peso, isto é, perto oubem longe;

b) nos gestos das pernas, isto é, joelhos dobra­dos ou esticados.

* N. da T. - Em francês, no original, de a a e.** N. da T. - "Skipplng" movimento de pular corda.

83

Page 44: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

DURAÇÃO DA ELEVAÇÃO

Pulos altos e largos requerem mais tempo do quepulos baixos e perto. O correr consiste de uma serrede pulos baixos e não particularmente largos. A velo­cidade é relativamente rápida.

57, Prepare-se para dar um pula com um pé alto,no ar, partindo de um pé, por meio de uma pe­quena corrida e caia sobre ambos os pés, baixo.Use uma unidade de tempo para cada passo cor­rido e duas para o pulo e a elevação no ar,

58. Experimente dar vários tipos de pulos, obser­vando principalmente ações de perna rápidas elentas:a) com ou sem volta;b) com ou Sem gestos de perna em especial;c) no mesmo lugar ou saindo dele;d) antes ou depois de uma corrida;e) com a ação das pernas sendo detida durante

o vôo, quer dizer, as pernas são mantidas nu­ma posição particular quando no ar,

COMBINAÇÕES DAS INDICAÇÕES DE CORPO, TEMPO, ESPAÇO E FORÇA

Pode-se compreender qualquer ação corporal comousando uma das várias combinações possíveis de corpo. 'tempo, espaço e energia muscular que já foram ante­riormente mencionadas.

O número bastante alto destas combinacões cor­r~sp,onde às possibilidades de atos de movimento, pas­SIveIS de serem.registrados segundo um modelo lógico.A ordem exi,bida em tais combinações é melhor obser­vada. nos movimentos usados na dança. posto que sãorelatIvamente grandes e claros e, conseqüentemente demais -f'ácil reconhecimento. A análise das ações cor­porais no esporte, na brincadeira, na representaçãoteatral, no trabalho e na conduta cotidiana é baseadano mesmo "pensar em termos de movimentos" que seaplica à análise dos movimentos da dança.

84

-~i"'-'.

Deve-se ressalvar que não existe, à base da ordemlógica da observação do moviment?, qualquer métodoou estilo especial de dança. Os bailarinos de todos ostempos e em todos os países pensaram e aind~ pensamusando as indicações de movimento: essencialmente,espaço, tempo e energia.

Por exemplo: todas as posições, passos e gestosdo balé clássico podem ser descritos em termos de movi­mentos, sem que se faça menção aos nomes que con­vencionalmente lhe são atribuídos. Constituem umaforma estilizada e específica do vasto tesouro de movi­mentos possíveis ao corpo humano, o que é válido tam­bém para qualquer outra forma de 'estilos de dançanacional, de época ou histórica, incluindo aqui as dançasexóticas. Cada estilo representa uma seleção especialde movimentos originados em características de épocassociais, raciais e outras. Os movimentos livres do artis­ta de teatro contemporâneo abarcam quaisquer daspossíveis combinações de ações corporais.

59. Observe as ações corporals:

a) de uma pessoa em seu cotidiano;b) de uma pessoa representando um persona­

gem numa cena d? mímica;c) de um bailarino executando uma determinada

dança de época ou nacional.

Analise-as dos seguintes pontos de vista:

a) quanto aos modos de ~tilizar o corpo: part~

superior ou parte inierior do corpo, iodos d.­reito ou esquerdo do corpo, no chão ou foradele J simétrica ou assimetricamente, movi­mentos sucessivos ou simultâneos em um ouambos os membros;

b) quanto ao espaço: direções e planos dos pas­sos e dos gestos, mudanças de frente, exten­são dos passos e gestos, forma dos gestos;

c) quanto ao tempo: o rápido e lento dos passose gestos; repetição de um ritmo; tempo deum ritmo;

85

Page 45: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

d) quanto ao peso: tensão forte ou fraca, colo­cação de acentos, elaboração de frases apartir de períodos com ênfase e sem ênfase.

60. Pode-se observar e analisar outras peculiarida-des do movimento, tais como: .

a) Várias partes do corpo podem executar atosde movimento diferentes ou semelhantes, si­multaneamente. Vários bailarinos dançandojuntos podem também executar atos de movi­mento diferentes ou semelhantes, simultanea­mente.

b) O movimento pode resultar num toque ouagarrar. Os pés, as mãos e outras partes docorpo podem tocar objetos ou pessoas. Asmãos podem agarrar.

A fim de aumentarmos a nossa capacidade deeconhecer as ações corporais, será necessário que nos~amiliarizemos com mais variações do uso do corpo ede suas partes em conjunção c~m os componentes ~oespaco tempo e peso. Isto sera apresentado no pro­ximo- ~apítulo, que abordará mais detal~adam~~t~ oquarto fator de movimento-fluência o qual e subdivididoem seus aspectos elementares na Tabela V.

A lógica exigida para se pensar em termos de movi­mento deveria, em primeiro lugar ser desenvolvida apartir da observação e da descrição de movimentossimples, nos quais não surgem nem a simultaneidade,nem alguma outra correlação de membros, tais comoo toque ou o agarrar. O único toque que pode ser objetode consideração, desde o início, é aquele que ocorrequando primeiramente um pé e depois o outro tocamo solo antes ou depois de um passo.

Tabela V

FLUÊNCIA

Aspectos Elementares Necessários à Observaçãode Ações Corporais

87

-'s -- r _

B6

Fluxo: indo interrompendo detendo

Ação: contínua aos trancos parada

Controle: normal intermitente completo

Corpo: movimento séries de posiçãoposições

I!

_-........---iíIiIIIIiiIIlII--j--------~=

Page 46: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

.'

zt".'

CAPíTULO 3

MOVIMENTO E CORPO

Parte II

Ao_ ENTRARMOS. na sep:unda fase de nosso exame dasaçoes corporaIs, o leitor deverá estar lembrado de queestas !epresentam apenas uma dentre as várias consi­de~açoes q?e participam da arte do movimento. Talvezseja ~ mais Importante, pois o corpo é o instrumentoatraves do .~ual. o homem se comunica e se expressa.Em c0J.lse9uencla, qualquer um que cultive esta artemas p.r~nclpalmenteo artista de palco, tem de adquiri;?- ha~IlIdade para manifestar ações corporais nítidasIsto e, u~ar o. ?orpo e suas articulações com clarez~tanto na ImobIlIdade quanto em movimento. Os movi­mentos de cada parte do corpo relacionam-se aos dequ~lquer outra parte ou partes, por intermédio de pro­pnedades temporais, espaciais e tensionais

Np .capítulo anterior, o leitor foi introduzido comos varies aspectos elementares destes movimentostendo sid~ levado a reconhecer como ações corporai~as alteraçoes ocorridas nas posições do corpo ou de suaspartes, alterações que duram um certo tempo ocorremno espaço ~ empregam alguma força. Um~ análiseque se baseie nos fatores do movimento propicia opensar e::n termos de movimento, ao passo que umaex!?lanaçao do funcionamento do corpo, como dobrarestIc.ar.. torcer, ,tende a enfatizar um conheciment~mecamco ao rnves de um expressivo.

Em. relação a ~sto. far-se-ão referências ao fluxodo mo_vlmento; que e um aspecto do fator de movimento- fluência (víde Tabela V). O fluxo é continuação nor­mal do movimento, como a de uma corrente fluentepodendo ser mais ou menos controlado. .

88

Se se pára completamente o fluxo das ações corpo­rais, resulta uma posição. Se o fluxo for interrompidointermitentemente, produz-se um tipo trêmulo de movi­mento. Muitos dos exercícios do capítulo anterior pediamuma sucessão contínua de ações corporais. Seria aconse­lhável que o leitor retomasse umas poucas seqüências demovimentos, aplicando um controle consciente de seufluxo normal.

a) Interrompendo-as intermitentemente, oub) parando por completo.

SEIS EXEMPLOS DE CENAS DE MOVIMENTO

As próximas descrições de situações. estados deânimo e ações poderão eventualmente estimular o leitora criar cenas de movimento para uma representaçãodramática, para mimica ou para dança, conforme ocaso. Após tê-lo feito, poderá averiguar suas açõescorporais segundo os pontos de vista previamente dis­cutidos. Logo descobrirá, contudo, que ainda nãoforam dadas orientações adequadas para os movimen­tos do tronco, cabeça e mãos, bem como ainda nãoforam abordadas outras posições além da de pé. asaber, ajoelhado, sentado, deitado, nem tampouco asrelativas ao centro de gravidade. Também importanteé o estabelecimento de uma norma, segundo a qual sepossam reconhecer as relações espaciais com pessoase objetos. Todavia, o leitor será encorajado a realizarsuas próprias descobertas.

1. Ao entrar na sala escura, o homem ouviu umrangido bem baixinho que o fez vibrar.

2. Após a colheita, as pessoas se reuniram napraça para se regozijarem. cantando e dançando,

3. Ela estava cansada e sentou-se para descansar.Pela primeira vez, tinha a oportunidade de calmamenterever a situação e, quando compreendeu que todosesperavam que ela assumisse a liderança. senti~ forçae determinação inundando todo o seu ser, estimulan­do-a a continuar em seu caminho com ímpeto redobrado.

89

Page 47: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

4. O ritmo vigoroso da musica fazia com que sa­cudissem seus corpos para cá e para lá, enquanto seuspés carregavam-nos pelo chão afora, traçando no soloos desenhos mais esquisitos.

5. Ele se sentia excitado naquela vasta imensidãode espaço e estirou-se ao máximo para tocar os confinsdo mundo. Mas quando lhe pareceu que não seria capazde manter esse contato, voltou-se para o ponto ondeestava em pé, agarrando-se a este, pois aí seria o localonde ergueria sua morada.

6. Somente em sonhos é que ela se mostrava capazde voar e ela se lembrava da bênção que era sentir seucorpo ser transportado e suspenso no ar e depois sergentilmente depositado no chão. O levantar e o baixaralternavam-se numa repetição infindável, como as ondasdo mar.

ANÁLISE DE AÇõES CORPORAIS COMPLEXAS

Nas descrições dos exercícios que ora se propõem,faz-se referência principalmente aos movimentos docorpo no espaço. Lembramos ao leitor, porém, que sea expectativa é de que as ações corporais revelem ­tanto para quem as executa quanto para quem asaprecia - aspectos da vida interior, os fatores tempoe peso do movimento também devem contribuir a seumodo. Conseqüentemente, é da maior importância queo leitor' devote cuidadosa atenção aos desenhos rítmi­cos-dinâmicos que deverá desenvolver por si mesmo.

TRONCO

O tronco é aquela parte do corpo que inclui tantoa pélvis como as escápulas, sendo movimentado pelasarticulações dos quadris. Suas ações são definidaspelos movimentos da coluna, que demonstram ser degrande versatilidade. Previamente, a cabeça será igual­mente considerada como parte do tronco.

Há dois aspectos principais que poderão mostrar­se úteis na observação das ações do tronco:

90

uT

a) Postura. A maneira normal de se carregar opróprio corpo é a ereta, ou seja, o tronco está "alto"e acima das articulações dos quadris. A postura tembasicamente a ver com a posição do tronco, o qual podesofrer um número bem extenso de variações.

b) Movimento. O tronco pode acompanhar, co~­

trapor-se ou substituir gestos dos membros, em partí­cular os dos braços.

Em ambos os casos as ações do tronco dependem deque parte da coluna que participa, seja.de modo suces:sivo, seja simultâneo, de como a _energIa empregada edistribuída, com que velocidade sao executadas e como

são realizadas, fluente ou intermitentemente.

61. ExpIar'! as possibilidades de movimentos direcio­nais do tronco (incluindo a cabeça), partindoda posição ereta. A coluna deve ser mantidaimóvel.

Você perceberá que:

a) o exercício é mais facilmente executado,para a área à frente do corpo, dobrando­se em ângulo na articulação dos quadris,ao passo que,

b) para as áreas de trás, as pernas deverãoparticipar da ação pelo menos até os joe­lhos, os quais estarão dobrados em ângulo;

c) nas áreas imediatamente laterais, é prová­vel que uma perna erga-se do chão.

62. Explore as possibilidades de movimentos direcio­nais de partes do tronco.

Você descobrirá aspectos muito interessantesque são governados por alguns dos seguintesfatores:a) pequenas partes da coluna têm a capacidade

de se moverem em diferentes direções, po­rém, sem mudança de planos;

b) as duas extremidades da coluna - o topo(incluindo ou excluindo a cabeça) e a zonapélvica - podem igualmente se mexer emdireções diferentes.

91

Page 48: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

PEITO "OLHANDO"

A observação e a análise das ações corporais ser~

muito simplificada se compreendermos que os mOVI­mentos de algumas das partes do corpo são r_ealizados,consciente ou inconscientemente, em relação a umobjeto externo ou ponto de interesse. .

Este fato se evidencia com total clareza nos m~v~­

mentos da cabeça, que muitas vezes resultam em dírí­girmos nosso rosto para alguma coisa que. d:seja­mos olhar. Neste sentido, podemos nos referir Igual­mente às palmas de nossas mãos e às solas de nosso~

pés como "olhando" na direção do objeto que deveraser aproximado, tocado, agarrado, chutado. _

Podemos atribuir semelhantemente a função de"olhar" à frente do peito, tendo o esterno como seucentro, o que facilita a análise daquelas ações do tron­co que levam a um torcer.

Todas as partes da coluna podem se movi­mentar:i) separadamente, enquanto outras partes estão

imóveis, ouii) em conjunto com outras partes, cada uma

se movimentando de modo diferente.

PRINCÍPIOS DE MOVIMENTO DO TRONCO

Se separarmos OS resultados das varias ações quedescobrimos nos dois últimos exercícios, poderemosagrupá-los sob os seguintes títulos:

a) como circunferência, movendo num ângulo dasjuntas dos quadris;

b) como tenaz, ondulando a partir de uma ou ambasas extremidades do tronco;

c) como bojo deslocando a área central do troncofora de sua posição normal.

As combinações destes princípios fundamentaispodem ser observadas nas múltiplas ações do tronco- tanto em repouso, quanto no movimento -, ocorrendofreqüentemente numa extensão espacial bem-reduzidae envolvendo um uso sutil de diferenciações de energiae tempo. Será de grande valia redobrar a atençãodada às partes superior e inferior do tronco, na medidaem que cada uma delas colabora com um conjuntodiferente de membros.

Uma vez que todos os nossos movimentos e, princi­palmente, a postura corporal s':H1 influenciados pela leifísica da gravidade, referir-nos-emos nesse sentido tam­bém ao "centro de gravidade" que, no corpo humano,está situado na zona pélvica e, na modalidade nor­mal da postura, está situado acima do ponto de suporte.

A postura ereta do ser humano coloca em destaqueas ações do peito e, neste caso, apercebemo-nos emespecial do esterno, ao qual podemos nos referir como"centro de leveza".

Os ombros podem movimentar-se ao redor da colu­na, do centro de leveza e entre si com bastante inde­pendência e também independentemente um do outro.

92

63.

64.

65.

Execute um movimento trêmulo com os ombros,ou seja uma série de rápidas ações que nãoenvolva;" o tronco e parem finalmente de mod?tenso, tendo como conseqüência um porte ass?'­métrico ("assimétrico" quer dizer que as colo­cações direcionais dos ombros diferem uma daoutra). Depois de uma p,;,usa, traqa. len~a-n;e"!teos seus ombros de volta a sua pos'çao s,metrwanormal, erguendo a cabeça alto. Repita algumasvezes.

Execute a mesma seqüência de movimentos doExercício 63, envolvendo agora uma ação defi­nida:a) da parte superior do tronco;b) da parte inferior do tronco;c) de todo o tronco.

d "lh"Fique de pé, com as pernas separa as e o ecom o esterno uma vez, à direita-frente e outravez, à esquerda-frente. Cuide para que a parteinferior do tronco ou região pélvica permaneçaem sua posição original.

93

Page 49: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

66. Execute o mesmo movimento do Exercício 65,mas enquanto o peito se vira para:

i) direita-frente, a parte superior do tronco,inclusive a cabeça, se volta para trás-alto;

ii) esquerda-frente, a parte superior do tronco,inclusive a cabeça, se move para a frente­baixo.

Repita esta ação várias vezes e deixe que aspernas e braços allXiliem o movimento a Se tor­nar fluente.

PÉLVIS "APONTANDO"

A parte inferior do tronco é muito menos móveldo que o peito e, por conseguinte, seguirá normalmenteos movimentos do quadril, o qual "aponta" ou move-senuma determinada direção, à semelhança de todas asoutras articulações.

67. Mantenha os pés juntos; puxe o quadril direitopara a direita-frente, enquanto que o esquerdovai para a esquerda-trás; a seguir, jogue oquadril esquerdo para a esquerda-frente e o di­reito para a direita-trás. Faça este movimentovárias vezes em rápida sucessêo, terminandocom o quadril direito para adireita-frente.Repetir, começando com o quadril esquerdopara a esquerda-frente. Faça com que o peitose mantenha na posição original.

68. Faça os meSmos movimentos de quadril doExercício 67, mas, no momento em que o quadrildireito vem à frente pela primeira vez, a partesuperior do tronco, incluindo a cabeça, é impe­lida para a frente-cima. Deverá permanecernesta posição durante o resto da seqüência.A parte superior do tronco é lançada para trás­alto no primeiro movimento da repetição e,novamente, deverá permanecer nessa posiçãoaté o término da seqüência.

69. Invente uma seqüência com contrastes rítmicos,combinando as ações do tronco, conforme esbo­çado nos Exercícios 65 e 67_

94

Uma vez que é possível considerarmos que oesterno esteja "olhando" em díreções tais comoà frente-baixo e frente-alto, será um estudo inte­ressante descobrir a diferenciação entre estasações e aquelas às quais nos referimos comomovimentos da parte superior do tronco diri­gindo-se ou "apontando" .para uma certa direção.

De qualquer modo, a pessoa deve ter umaconsciência bastante clara, de que áreas da co­luna, peito e abdome:

a) estão envolvidas na ação ;b) pausando em sua posição original;c) foram sustentadas passivamente, como no

caso das mudanças de posições do peito,quando toda a parte superior de tronco édeslocada de sua posição natural acimada pélvis.

OUTRAS PARTES DO CORPO "OLHANTES"*

Embora as mãos, os pés e a cabeça tenham atéaqui sido considerados como integrantes das ações dosmembros e tronco, respectivamente, eles podem tam­bém ter uma orientação própria.

Conforme mencionado anteriormente, em casosassim, as palmas das mãos, as solas dos. pés e a facetransformam-se nas áreas que se relacionam a umadireção do espaço para a qual "olham".

70. Experimente fazer com que uma das palmasde suas mãos olhe

para baixopara cimapara a frentepara tráspara a direitapara a esquerdaou em qualquer outra direção.

71. Repita o Exercício 70, usando a sola de umdos pés.

A realização deste exercício compreenderáequilibr-ar o corpo, em várias situações ..

---,----,---.,.-* N. da T. _ "Lookíng" aqui foi traduzido por "olhentes", para dar o sen­

tido especialmente forte que no original é ressaltado por aspas.

95

Page 50: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

75.

72. Olhe com seu rosto em algumas direções.Você .perceberá que, em muitas ocasiões, o

tronco tem que ajudar na execução desta instru­ção, por exemplo, quando for olhar para trás.

As palmas das mãos, as solas dos pés, o rostoe o esterno "olhantea" provocam muitas torçõesdos braços, pernas e tronco. O domínio dasações corporais é grandemente auxiliado por umaconsciência aguda do grau de torção, bem comodas possibilidades de sua extensão pelo envolvi­mento de áreas corporais vizinhas.

VOLTAS COM PARTES "OLHANTES" DO CORPO

Além de "olhantes", as palmas das mãos, as solasdos pés, o rosto e o esterno podem também girar. Oeixo ao redor do qual giram relaciona-se com a dire­ção do "olhante", No caso da cabeça e do peito, oponto de referência giratório é o centro da área emmovimento, enquanto que os pés giram em torno dostornozelos e as mãos em redor dos pulsos (ou mesmocotovelos). Esta idéia pode demandar uma certa adap­tação inicial do leitor, uma vez que certos movimentosaos quais comumente nos referimos, como "dobrar",são de fato voltas. Por exemplo:

73. O rosto olha para a frente, voltando-se alter­nadamente para a frente no sentido horário eno sentido anti-horário, tão longe quanto lhe forpassivei.

Isto quer dizer que as orelhas direita e es­querda aproximam-se, cada uma por sua vez,dos ombros direito e esquerdo, respectivamente.

74. O rosto olha para o lado direito com um giro nosentido horário (a orelha direita aproxima-se dascostas).Rosto olhando para cima, ainda mantendo avolta no sentido horário, ou mesmo aumentan­do-a de acordo com a possibilidade conferidapela nova posição (o que traz a orelha direitapara a frente).Rosto olhando para o lado esquerdo e susten­tando ainda a volta no sentido horário, tão longe

96

l

quanto passivei (a orelha direita aproxima-sedo esterno).Enquanto o rosto vai sendo aos poucos movidoà frente, a cabeça se volta no sen,tido anti-horá­rio (a orelha esquerda se aproXIma do ombroesquerdo).

Faça experimentos semelhantes com as palmasde suas mãos, começando do seguinte modo:

ambos os braços estreitos e para a frentepalma da mão direita olha para o lado es-querdo; .palma da mão esquerda olha para o lado*~~ . ,.ambas as mãos são giradas no sent,do horarw(isto fará. com que as pontas dos dedos damão esquerda cheguem perto do esterno e osda direita afastem-se dele).

Embora freqüentemente atribuamos, um~

proeminência expressiva às mãos, aos pes e acabeca no sentido de que parecem "olhar" nestaou n~~uela direção, em outras ocasiões estessegmentos corporais apenas acompanham pas­sivamente os movimentos daquela parte do c_ar­po à qual pertencem. Nestes casos, as maosparticipam das ações do antebraço ou do braço,os pés, das ações das pernas, e a cabeça dasacões do peito ou tronco, não apresentando qual­quer orientação própria.

TORÇÕES DAS PARTES "APONTANTES"* DO CORPO

Além das torções do tronco (que já foram discuti~as

quando dos Exercícios 6? a 69), podem ocorrer .torç~es

também nos membros, mdependentemente da mfluen­cia de mãos e pés "olhantes".

Será interessante que se considerem os seguintesmovimentos como rotações:

a) para dentro, quando o lado do polegar ou d?dedão do pé de cada um dos membros, respecti­vamente, é virado em direção ao eixo centraldo corp.o;

* N. da T. - "Pointing" - Apontante, ver nota anterior.

97

Page 51: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

b) para fora, quando se viram para longe do eixocentral.

O melhor meio para se iniciar tais movimentos épartir da posição normal dos membros.

Essas torções podem ser, por exemplo, observadasnos gestos dos braços e das pernas, quando estes mem­bros executam um movimento contínuo na forma de um8, ou na de uma curva em S, tal como se verifica noExercício 18.

76. Repita o Exercício 18 com movimentos bemdefinidos de torção dos braços, combinando asposições iniciais de ambos os braços numa mes­ma rotação interna. Faça a rotação para foraao se movimentar via frente para baixo. Acom­panhe este movimento com uma rotação internaconcomitante ao abrir de ambos os braços, cadaqual para seu lado.Execute esta seqüência de maneira sucessiva,começando pelos ombros e concluindo com asmãos, assegurando-se de que o movimento con­tinua fluente e flexivelmente.

PECULIARIDADE DAS TORÇÕES DOS BRAÇOS

As torções dos braços podem ser executadas suces­siva e simultaneamente; a rotação pode ser iniciada ounos ombros ou nas mãos. Ao mover-se de maneirasucessiva, o braço todo vai se envolvendo apenas gra­dualmente na torção, ao passo que na ação simultâneaa torção no braço todo se realiza de uma só vez.

77. Explore as várias possibilidades de torções nosgestos de braços, usando extensões diferentesdo espaço e criando formas definidas. Em rela­ção a isto, olhe mais uma vez os Exercícios 22e 25.

PECULIARIDADE DAS TORÇÕES DAS PERNAS

As torções das pernas podem ser feitas exclusiva­mente de maneira simultânea, o que significa que aperna como um todo é girada interna ou externamente.

98

Somente os pés é que têm condições de uma rotaçãoisolada. Quando as pernas são empregadas para darapoio, decorrem várias possibilidades quanto aos estilosde ficar em pé e de dar passos.

POSIÇÕES DOS PÉs

Quando o peso do corpo é carregado por ambas aspernas, faz-se em geral uma distribuição entre as posi­ções aberta e fechada: a posição fechada é aquela naqual as pernas estão juntas, a aberta ocorre quando aspernas estão separadas.

Várias formas podem ser observadas em cada umdos casos acima, as quais se baseiam nas várias rela­ções espaciais das pernas, bem como no fato de queestas podem girar até certo ponto.

Presume-se que o leitor conheça as cinco posiçõesbásicas de pés que no balé clássico, são executadascom uma rotação máxima das pernas para fora, enquan­to que na dança contemporânea e em muitos estilos dedanças nacionais a rotação externa é menos pronun­ciada.

. A primeira, a terceira e a quinta posições são fecha­das. Cada uma por sua vez confere às pernas umasensação e uma aparência cada vez maiores de estaremligadas uma na outra, configurando uma só. Isto sedeve ao fato de a partir de uma posição calcanhar comcalcanhar, chegar-se a uma posição, calcanhar comdedos do pé, cruzando-se uma perna à frente da outra.

A segunda e a quarta posições são ambas abertas;uma delas acentua a simetria corporal direita-esquer­da, conferindo ao corpo um apoio estável; a outra,uma postura frente-trás, representa uma posição maisaberta a partir da qual pode-se dar início à locomoção.

Numa posição aberta, o centro de gravidade estálocalizado acima de um ponto no solo, entre as duaspernas. Se uma das pernas erguer-se, o centro é trans­ferido para uma posição acima da outra perna.

99

Page 52: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

101Campus Universitário de Palmas

UFTBIBLIOTECA

completos dá uma expressão de liberdade.Muitos passos de dança são combinações

destes dois, proporcionando uma ampla possibi­lidade de expressão, em movimentos de deslocar.

Observe os Exercícios 4 e 5, os quais ofe­recem dois· padrões básicos de "passos". OExercício 4 consiste de: meio-passo, passo com­pleto, meio-passo; o Exercício 5: passo comple­to, meio-passo, meio-passo.

De pé sobre o pé esquerdo; a perna direita estádo lado direito-baixo, tocando o chão com odedão. Deslize rapidamente o pé direito parauma posição fechada, batendo o pé esquerdopara longe de seu ponto-base original e transfe­rindo o peso para a perna direita.Nesse ínterim, a perna esquerda se movimentoupara o lado esquerdo-baixo, tocando o solo como dedão.Repita a ação com o outro lado; a seguir, alter­ne os lados, observando para que o centro degravidade mantenha-se no mesmo local duranteo tempo todo:

82.

MOVIMENTOS DO CENTRO DE GRAVIDADE

Conforme já assinalado anteriormente, o centro degravidade na postura ereta normal do ser humanoestá situado acima do ponto de suporte.

Na realidade, quando o corpo encontra-se. numequilíbrio estável, o centro de gravidade está Iocalizadonuma linha vertical em relação ao ponto de suporte.Quando se está de pé sobre os. pés ou s?bre as maos, ocentro de gravidade está acima do apoio: quando aga­chado, ambos os pontos estão no mesmo plano e quandoestá suspenso, por exemplo, em uma barra, ocentro degravidade fica abaixo do ponto de suporte.

83. Movimente o centro de gravidade entre o planomédio (ou seja, quando as nádegas estão pró-ximas ao pé que suporta o peso) e o plano a!to,à medida que você dá passos largos e estreitosem diferentes direções . Introduza, nestas se­qüências, pausas em posições abertas ou [e­chadas..

l78. Invente seqüências de passos nas quais ocorram.pausas em diferentes posições.

Observe que você deverá deslocar seu centrode gravidade após ter feito uma pausa sobreambos os pés, antes de dar o próximo passo.

79. Combine gestos, passos e posições usando tiposdiferentes de rotações das pernas.

Note que podem ser estabelecidas muitas po­sições abertas além das duas acima citadas, aose empregarem tipos diferentes de relações espa­ciais entre as pernas, por exemplo, uma direçãodiagonal ou lateral cruzada.

São igualmente possíveis posições abertas efechadas nas quais o peso é carregado por umadas pernas enquanto a outra poderá estar tocan­do o chão.

80. Explore modalidades diferentes de aterrissarnum só pé, enquanto o outro toca o chão, após opulo. Chegue semelhantemente após gestos daspernas, passos ou voltas levando de, via e paraposições abertas e fechadas.

Preste atenção para usar, às vezes, rotaçõesdas pernas para dentro e às vezes para fora,até pés "olhantes" e "girantes".

PASSOS COMPLETOS E MEIOS-PASSOS

Podemos mencionar aqui que é possível distinguirpassos completos de meios-passos.

Nosso modo comum de andar consiste de passoscompletos, ou seja, uma perna de cada vez ultrapassaa lmha central do corpo, ao se movimentar de tráspara a frente.

. Um passo completo pode ser dividido em doismeIOs-passos.

81. De pé sobre o pé direito, o esquerdo está colo­cado para trás-baixo, tocando o chão.

Passo: pé esquerdo para posição média;depois, o pé direito para frente-médio.

Repetir algumas vezes.Note como esta seqüência de meios-passos

provoca uma certa sensação de. controle e impe­dilnento" enquanto que uma seqüêncía de passos

100

Page 53: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

lll. '!,ib:,j:.;..'.,O,

to'<';'.."

l"iii;

Observe que passos baixos, quer dizer, pas­sos dados com os joelhos dobrados, conformeexplicado por ocasião do Exercício 5, bem comopassos altos, causam apenas leves alterações deplano do centro de gravidade. Estas alteraçõesfazem parte da natureza dos passos, não consti­tuindo movimentos deliberados do centro degravidade. O mesmo se aplica à elevação nor­mal acima do solo e às paradas de mão, quandoos ombros são baixados em díreção ao solo.

84. Faça o Exércício 82, tendo o centro de gravi­dade no plano médio, ou seja, próximo ao pé desuporte. Este movimento se assemelha a umpasso Russo, numa posição agachada.

EQUILÍBRIO INSTÁVEL*Até aqui, em nossas considerações sobre ações cor­

porais, vimos trabalhando principalmente com o equi­líbrio estável. No domínio do movimento. o equilíbrioinstável desempenha importante papel. Este tipo deequilíbrio acontece quando o centro de gravidade tendea alterar sua relação vertical normal com o ponto desuporte.

Podem-se observar freqüentemente coordenaçõesespeciais de ações corporais, no ser humano, com afinalidade de contrabalançar a perda do equilíbrio oude recuperá-lo.

Podemos distinguir duas maneiras principais deprovocar a perda do equilíbrio:

a) o centro de gravidade é deslocado numa deter­minada díreção do espaço, ao passo que a partedo corpo que suporta seu peso está inativa, ou

b) o apoio do corpo é removido sem que o centrode gravidade seja deslocado para'qualquer dire­ção do espaço.

Caso o corpo não execute algum movimento adequadopara contrabalançar as situações, resultará uma que­da em ambas as instâncias.

+. N. da T. - "Labíle" - Foi sempre traduzido por instável.

102

i

II,

85. Tente executar algumas quedas, iniciando-as pormeio de movimentos do centro de gravidade.a) para a frente; neste caso, você cairá de cheio

à sua frente. .... ...b) para trás; terá como consequenc,a a possçco

sentada.

86. Faça o mesmo do Exercício 85 (a) e (b), masimpeça a queda dando alguns passos.

Isto conferirá aos passos um caráter especí­fico de precipitação.

87. Dê alguns passos rápidos e bem pequenos à fredn­

te sem deslocar seU centro de gravidade; quan ov~cê estiver exatamente a ponto de perder oequilíbrio, reverta rapidamente os passos paratrás (atrás da linha de gravidade). ,

Repita esta seqüência algumas vezes, ate ex­perimentar unia sensação de que as pernasforam varridas por debaixo.

88. Invente suas próprias seqüências de ações,a:nando como quiser entre o equilíbrio estave einstável, envolvendo diferentes planos do centrode gravidade.

Observe o efeito disto sobre o controle dafluência do movimento e sobre o tipo de ener­gia empregada.

89. Faça experiências com movimentos de .vola.r e ddecair, impelindo-se num salto do solo.e ,nc man oo corpo obliquamente. Tente aternssar de umtal jeito que o centro de gravidade, não fiqueverticalmente colocado sobre seus peso

Se você não estiver contrabalançando essainstabilidade de algum modo, você irá cair nochão e provavelmente rolará um pouco antes

~parar. . . t· IO corpo se encontra em seu mais ~ns av~

estado de ação quando o seu centro de. gravi­dade é impelido diagonalmente para clma. ouquando cai numa direção diagonal pa;a baixo,estando fora de alinhamento em relação ao seuapoio normal.

O corpo está em seu mais estável e;stado d~ação quando o centro de gravidade esta em. alí­nhamento vertical acima do ponto de apoie.

103

Page 54: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Note que as direções para trás ou meio p~:trás levam a posições sentadas, ao passo q

das as demais produzem alguma forma de po­~~ ão deitada. A fimde chegar a estas, es~ando

.ç lh do deve-se primeiramente transferír umaJ~co~O peso para uma das mãos, antes d~ ser~~ssível dar continuidade à ação do quadril.

- o que levem a dife-Execute a~o:s codm.td~~rpUse várias direçõesrentes. pos,ç".es 'p:l'::ente' para a transferênc!aespacuus, prrnci ._ d ombros os qumsde peso para a reg1,ao os . 't· r nos

t laci onados ao apcno an erro ,devem es ar re

quadris. t sferirmos oVerifique que s,,-mente ba o J~~to-frente ou

eso para os quadrIs e om ros . - . nop. t" ue caímos de cheío no chão;dn: eto:a ras e q b o abdome e no segundo,prtmeiro caso, so re ,sobre as costas.

Comece pela posição ajoelhada e transfira tOpeso para o torso ou para partes .dele,. enquan of uma pausa com os joelhos, isto e, enquan­t~Zpermanece sobre eles. Poderão resultar tor-ções do tronco. ,

É interessante notar as várias formas de .pos­tura que o corpo pode assumir nas s'J~~n~e:situações: de pé, ajoelhado, sentado: ei a. '

Estas posições são profundamente mnuene:a­das por fatores corporais de estrutura e funçao,tais como: "lh »> ,

a) a coluna e sua extensão de agu a ,b) a simetria direito-esquerda do corpo e sua

superfície lide muro"; .,... dc) os membros, e suas respectivas reg10es o

tronco enrolando-se e curvando em for-, "mas Hde bola :d) ombro cintura e pélvis eontoreendo-se

uns contra os outros à maneira de um"ssaraiuso" .

.... ,. ....,.'['~iu.

"'tlo

""' '/',~5 ,.t:

",.tO:>'i~;)

'.~~E,

.'(JI,

."

SUPORTE DE PESO SOBRE VÁRIAS PARTES DO CORPO

As ações corporais envolvidas em suportar e emtransferir o peso para várias partes do corpo, tais comojoelhos, quadris, tronco, ombros, cabeça, cotovelos emãos, serão aqui mencionadas apenas porque poderãotalvez acrescentar alguns aspectos novos e importantesde observação e de análise".

As principais posições nas quais o Corpo se detémou está em repouso, além da ereta são:

ajoelhada - sentada - deitada.

POSIÇÕES SENTADA E DE JOELHOS

Entre as posições de ficar em pé, na vertical, e dedeitar, na horizontal, encontramos as de ficar de joelhose as de sentar; estas últimas podem funcionar comoestágios transicionais durante uma mudança gradualentre as duas situacões extremas. Evidentemente,podem ocorrer enquanto posições por si mesmas, cadaqual apresentando sua própria gama característica deexpressões corporais.

90. Explore as possibilidades de ajoelhar sobre osdois joelhos. Observe a relação espacial dosjoelhos:a) em posições fechadas;b) em posições abertas.

91. Ajoelhe-se 'íalio'", 'íméâio' e ttbaixo", ou seja,quadris acima dos joelhos, quadris meio baixos,quadris nos calcanhares.

92. Explore quais as âireções de que você pode seutilizar quando transferir o peso da posição empé para um ou ambos os joelhos:a) ao mesmo tempo;b) um após o outro.

93. Explore se há ou não alguma limitação direcio­nal na transferência de peso para um ou ambosos quadris a partir da posição ajoelhada.

* Juntamente com outras, são explicadas com muitos detalhes no livroHandbook of Kinetography Laban (Manual de Cínesiograiia Laban), de AlbrechtKnusr.

1i

POSIÇÕES DEITADAS

O peso, nestas posições, é apoiado noenvolvendo semelhantemente as regiõese dos ombros .

94.

95.

tronco todo,dos quadris

104 105

Page 55: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

,,)

: 1~ t, ,

i~5'"5.E"'UI.."

Em suas experiências com o suporte do pesocorporal em vár-ias situações, aperceba-se dapostura particular assumida pelo corpo e suaforma.

Nem sempre é fácil descobrir os nossos parâ­m':.tros dírecíonaís, quando estamos deitados nochão ou virados de ponta-cabeça. Cabe aquirelembrar que a gravidade sempre atua vertical­me'2te para a Terra e que nosso sentido de di­r~çao ,está relacionado a este fato, ou seja paraclm'7 e seffil?re para cima, seja lá o que for queesteja em erma, a cabeça ou as pernas.

.Quando você estiver deitado sobre seu qua­dril ': ombro direitos, por exemplo, seu peito~~~ara olhando para a frente, as pernas esten­

I as para o lado esquerdo e o braço esquerdopoderá ser erguido para cima.

96. Invente transferência detes do corpo: peso para várias par-

a) simultaneamente,b) Sucessivamente.

Faça. de modo tal que o peso seja totalmentetransferido em cada uma das ações, ou sejaa(s) parte(s) do corpo que está(ão) suportand~s,:u_peso, ,em dado momento, no próximo pode­rá Cão) sair do chão.

97. Comece em ~o~ição ereta, sobre um dos pés etoco o E,xerczcw 96 (9); após cada transferên_Cia, porem, o suporte é conservado' (pausa)E'fe.cutado deste modo, o exercício fará com qU~varws segmentos corporais, além do pé originalcarreguem finalmente o peso do corpo. Retom~

~os poucos a posição inicial, realizando gestose cada uma das partes que está levando o peso

sucessívamente, liberando-as de suas cargas'. 'übser."e que o centro de gravidade deverá

ser ê erguídn em alguma ocasião, caso contráriovoe permanecerá agachado sobre uma dpernas. as

FORMAs DE LOCOMOÇÃO

Há várias possibilidades de locomocão se utilizarmos outras partes do corpo além dos pés, ou em con=

106

kiJf" •. ,

junto com eles. Os pontos seguintes oferecem um rápi­do apanhado de como se pode realizar uma progressãoatravés do espaço:

a) através de um contato contínuo com o chão, demaneira direcional;

b) liberando-se do contato com o chão e movendo-seem várias direções, independentemente deste;

c) através de algumas modalidades de voltas com­binadas com díreções espaciais. As rotações serelacionam aos três eixos do corpo:

i) cabeça-pés,ii) frente-trás,

iii) lado-lado.98. Investigue os seguintes movimentos no que se

refere aos seus 'eixos em rotação e às díreçõesde sua progressão através do espaço:

fazer uma "estrela" (cartwheeling)dar cambalhota (somersauting)rolar (roHing).

DESENHOS DE SOLO

OS desenhos de solo são produzidos pela locomoção,ou seja; i) pela orientação deliberada, nas várias for­mas de locomoção, ou ü) quanto à decorrência de des­locamentos ocasionais de peso, resultantes, estes dasvárias ações do corpo, principalmente das que visamestimular a progressão através do espaço, como é o casodos movimentos instáveis e de ampla extensão.

O domínio do movimento exige uma nitidez total dodesenho, em cada caso. Os tipos de desenhos que serãoproduzidos dependerão do uso:

a) de direções espaciais particulares, com ou semmudanças da frente, através de giro em tornode um eixo, e

b) ou de direções espaciais particulares concomi­tantes à mudança de frente que aconteça gra­dualmente, no decurso de algumas transferên-

107

Page 56: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

108

dcia s de peso como, por exemplo numa série

e passos. '

99. Pa~o,!ear, saltar, engatinhar, arremessar-se eTas ejar, usando a mesma direção para cadauma

td(as transferências de peso para alguma(s)

par e s) do corpo.u S';füências de transferências de peso para

ma íreção configuram caminhos em linha reta.

100. çF:::çado.fmesmo que no exerdcio 99, mas use dire­oes "l erentes,

Seqüê . d_ ncaas e transferências de peso em dire-ço~s qu~ mudam abruptamente de uma ' paraou ra erram caminhos angulares.

101. Produza um des h h-letr . en.o no c ao na forma de uma

)a Z, por intermédio de alguns passos:

a sem mudança de frente;~bserve.asdireções de seus pés em cada fase

b o mOVimento.) mudando de frente, dando passos para o lado

esquerdo durante o tempo todo.

. • Observe: (i) o local, no chão, onde o desenhor1 ap::recer em relação à sua posição inicial e11 q';'ao longe você terá que girar em redor de

um eIXO em cada c t f'd d ao o, a nn de continuaran o passos para a esquerda.

102. Dd

ê fPassos nas seguintes direções, sem mudançae rente:

f':ente-direita, direita, direita-trás, trás, trás-es­'fe_d~~:it::.sqUerda, esquerda-frente, frente, [ren-

• V~Cê terá completado uma curva, criado umCITCU o. ?bserve que o valor direcional de cadaPeadssotexibe apenas uma leve alteração do pre­c en e.

t Ca?,inhos curvos podem também acontecera raves de uma gradual mudança da frente do

dc or p o, enquanto é mantida a mesma dírecão

os passos. ~

?lhe mais uma vez o exercicio 52, no ual;~c~ realízou~ meio-circulo dando passos iara

dr.a s =to centro disso está localizado ao seu ladoirer o.

103. Produza uJl1. desenho no chão na forma de umacurva em S; esta consiste de uma curva dupladobrada com dois centros diferentes. Durantetodo o tempo, mantenha sua frente voltada pri­meiro para um deles e depois para o outro.

Comece o exercicio de tal modo que, durantea mudança gradual de frente, na primeiracurva, você dê os passos para o lado direitoe que, na segunda curva, os passos sejam dadospara a esquerda. No entanto, você deverá inseriruma mudança de frente (meia-volta) entre asduas curvas, a fim de fazer isso e olhar parao centro de cada uma.

MOVIMENTOS RELACIONADOS A PESSOASE OBJETOS

Quando nos movimentamos, nós criamos relaciona­mentos mutáveis com alguma coisa. Esta alguma coisapoderá ser um objeto, uma pessoa ou mesmo partes denosso próprio corpo, podendo ser estabelecido um can­tata físico com qualquer um destes.

Neste sentido, podemos distinguir três fases princi­pais que são realizadas pelos movimentos corporaisadequados:

. a) preparação,b) cantata propriamente dito;c) soltar.O rosto e as mãos desempenham um papel rele­

vante nesta seqüência. O rosto, como principal sedede nossos sentidos, terá maior destaque na fase pre­paratória, ao passo que as mãos - instrumentos natu­rais de apreensão - irão sobressair na fase do cantatapropriamente dito. .

Podemos observar nitidamente quando os olhos ououvidos estão voltados para um ponto de interesse, ouquando as narinas se alargam para perceber um odorreal ou imaginário, bem como o momento em que alíngua lambe os beijos na antecipação de um sabor.

As mãos dos seres humanos são instrumentosmagníficos, capazes de executar movimentos os mais

109

Page 57: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

segurando

transferindoo pesocarregando

ii:J:J

ii I.• 1i~ ." .:>i~:)

'.JO.E.

.'(';1.--

~om~lexfos'd Conquanto seja possível reduzi-los à su

c~~~a~mu~osa:~~~ale~er~!:~r~ra~~~h.~irb as ações d:

~~~ão aos.obje~os e pessoas, conduze~ ae~~~~~r~':segund~fa~~~uaçoes, particularmente relevantes n~

~onsiderem?s mais detalhadamente as três fasetaí ertencem a fase preparatória ações de "olhar'~'ais como para a face mã " ,

resultado iI ,a~s, pes e peito, Isto tem por" aqu o que podenamos denominar de "end

~~:rdir~c~onto de interesse, o que pode ocorrer e:. o.

de .~odemos, em seguida, "aproximarmo-nos" do pontotrá_~,~res~e e ":,ncontrá-Io", ou "rodeá-lo", ou "pene­tili . Ainda na~ se efetuou contato algum e pode-se

u zar qual~uer direção espacial.A aproxImação, que envolve tanto a locomocão

ci~:fto gestos, ou ambos, pode ser efetuada a partir d~

Nquer um dos lados do objeto em questão

o encont ., .localização do~O'suje~:;o~tante_a relaç~o espacial dalib d d di a açao, e exista uma totalsiter ~)e OIrecional (evidentemente, no contexto da

uaçao .. rodear demanda o em re d •.~~rte~ do corpo circundando o alvo, i pa~~ir Je ~:~~:;

eçoes, .enquanto que a penetração sígnT .ponto de mteresse a partir de uma única ili:~;ã~~ ao

O contato propriamente dito pode ser efetuado:tocando a partir de qualquer direcãoresvalando ao longo de .qualquer di;eção da

superfície do objetode cima do objeto

por debaixo do objeto que descansasobre alguma parte do corpo

em qualquer lado doobjeto, rodean-A - do-o com várias partes do corpo

s açoes corporais que provocam a liberação d~

no

contato podem assumir uma díreção qualquer, desdeque levem a díreção contrária ao objeto com o qual seefetuou o contato.

Ao relacionarmos nossos movimentos às pessoas eobjetos, não há evidentemente qualquer necessidade decontato físico. O auge destes movimentos, por conse­guinte, deve ser nos momentos de encontrar, de con­frontar, de ultrapassar, de pular sobre ou de rodear,de rastejar ou de mergulhar, de abraçar, de penetra­ção e outros semelhantes.

Tanto os parceiros quanto os objetos podem serestáticos ou móveis.

Os objetos móveis como, por exemplo, uma bolabatendo no chão, ou um arco girando no solo, atraves­sam o espaço segundo um trajeto definido. Peças deroupas, véus, xales, etc., que são vestidos e despidospodem ser igualmente considerados como objetos mó­veis; cordas, palcos giratórios, cenários e outras maqui­narias teatrais que são movimentadas, podem tambémser descritas quanto à sua relação espacial referentea pessoas e coisas.

Embora esses fatores mensuráveis de velocidade,força, direção e extensão sejam comuns tanto às pes­soas quanto aos objetos em movimento, é bem evidenteque os movimentos do corpo humano, são amplamentediferentes dos das máquinas. Até mesmo nas ocasiõesem que o homem faz um trabalho e que as ações deseu corpo têm que cumprir com requisitos da funçãoprática, distinguem-se os seus movimentos segundo suaexpressão pessoal. Em algumas oportunidades, contu­do, podem ser executados sem a participação interior,o que lhes confere conseqüentemente um caráter mecâ­nico. Noutras vezes, porém, modulam-se ricamenteconforme modelos peculiares de esforço que não têmqualquer serventia funcional. Uma vez que todos essesse originam das próprias raízes da personalidade, po­dem criar expressões características que se tornamvisíveis na ação corporal.

111

Page 58: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

.'.'E'~j1.

"tl()

~~ .'.~~ I,l~ o'

til ":>'i:.,..".g~E.'l..:'....... '

CORRELAÇÃO ENTRE AÇõES CORPORAISE ESFORÇO

Conforme já mencionamos anteriormente, o esforçose manifesta nas ações corporais através dos elementosde Peso, Tempo, Espaço e Fluência. Não são todosestes fatores do movimento que são sempre significa­tivos e, conforme o modo de se combinarem, produzemgraduações particulares de ação.

O .Peso, o Tempo e o Espaço foram quase queexclusivamente usados nas considerações anteriores .Isto ocorreu porque estávamos estudando um impulsoparticular de movimento do ser humano, a saber, aAção. O impulso para a ação é caracterizado pelaexecução de uma função de efeito concreto no espaçoe no tempo, por intermédio do uso da energia ou forçamuscular.

Num ser humano, tais ações sempre comportamelementos expressivos, o que significa não poderem elasser determinadas pelo raciocínio lógico, nem tampoucoapreendidas apenas por meio de fatores mensuráveisEstão totalmente entremeadas por elementos que tr'a­zem à tona a qualidade e os atributos daquela espécieem particular.

Enquanto que os movimentos dos animais são ins­tintivos e basicamente realizados em resposta à esti­mulação exterior, os do homem encontram-se caracteri­zados por. qualidades humanas; por intermédio deleso homem se expressa e comunica algo de seu ser Inte­rior. Tem ele a faculdade de tomar consciência dospadrões que seus impulsos criam e de aprender adesenvolvê-los, remodelá-los e usá-los.

O ator, o bailarino e o mímico, cujo trabalho é ode apresentar pensamentos, sentimentos/sensacões eexperiências, de modo conciso, através de ações cor­porais, devem não somente deter o domínio dessespadrões, como também entender seus significados.Deste modo, enriquece-se a imaginação e aprimora-sea expressão.

112

A seguinte seqüência de movimentos servirá comointrodução aos termos básicos d~ uma <;tnálise de movi­mentos necessária à sompreensao t;l~IS profunda domovimento, que não e apenas a matena-pnma do ator­bailarino, mas também se constitui num fenômeno fun­damental à vida.

Num corpo humano inerte, a única movimentaçãoobservável resulta da respiração. O levantar e o abai­xar alternados do peso do peito ocorre no espaço. Tam­bém podemos ouvir essa respiração nos suspiros. Tantoo levantar quanto o abaixar do peito, como os sons darespiração, têm uma certa duraç;ão ~e tempo.. O movi­mento todo que aí se observa esta flumdo contmuamen­te não havendo qualquer interrupção perceptível. Sese~tirmos o pulso, ou se colocarmos o ouvido no peitode um corpo em repouso, detectaremos um outro mOVI­mento contínuo: os batimentos cardíacos. Ao erguer­se, o corpo exibe um estado de movimento cr~scente.A respiração era até então apenas um leve movImento;agora, porém, que aumentou o peso a ser levantado;há maior tensão muscular enquanto o corpo todo eerguido e esticado verticalmente.

O esforço feito para levantarmos, no entanto, nãoé apenas composto por tensões musculares fortes oufracas; é também constituído de formas espaciais va­riadas. No primeiro movimento - o de erguer-se -, ocorpo se dobra e torce, apresentando conseqüentementeflexibilidade de todas as suas articulações; o segundomovimento - o de esticar-se - é direto. Os movimen­tos flexíveis se valem de várias direções espaciaissimultâneas, enquanto que o de esticar-se para cimaemprega menor número delas até usar apenas umadireção: para cima. A duração do ato de se levantarpode ser curta ou longa: pode tratar-se de um pulosúbito para o alto ou de um movimento s~stentado,n?sentido de pôr-se na posição ereta. O movImento rap~·do não leva mais do que uma respiração ou um bati­mento cardíaco; já o controlado soerguer do corpo

113

Page 59: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

uma pressão forte e direta,um torcer forte e flexível.

Sendo mais fraca a resistência, poderão acontecer:um deslizar leve e díreto,um flutuar leve e flexível.

Os movimentos seguintes podem ser consideradoscomo derivações das ações básicas:

As ações nas quais estejam quase que completamenteausentes, ou fracamente marcados, um ou dois doselementos Tempo, Espaço e Peso, são tidas como açõeselementares incompletas.

Nos movimentos causais que não sejam sustentadose nem súbitos, o elemento tempo não tem importânciafísica; tais movimentos parecem compor-se apenasdos elementos Peso e Espaço. Isto significa que nãohá, por parte da pessoa que se move, uma atitude defi­nida referente ao fator tempo. São ações elementaresincompletas que freqüentemente podem ser considera­das como modalidades de transição entre ações bási­cas. Por exemplo, uma pessoa erguendo um saco muitopesado para os seus ombros iniciará um movimentocom uma espécie de talhar que se transformará nummovimento de torção. Pode-se observar, entre o talharsúbito e o torcer sustentado, uma fase de transiçãodurante a qual mantêm-se os dois elementos do esforçoque são comuns tanto no talhar quanto no torcer, a

"

"

ocupa mais !empo, duraz:te muitas respirações ou bati­~entos cardíacos. O fluir do movimento todo pode s1 V • - erI re como na r.espIraçao regular, ou intermitente, como

se a pessoa estivesse sem fôlego.Peso, Espaço, Tempo e Fluência são os fatores de

movIme~t~ perante os quais a pessoa adota uma ati­tude defIn~da. O conjunto das várias atitudes poderiaser o seguinte:

- uma atitude relaxada ou uma atitude enérgicaquanto ao peso; ,

- uma atitude linear ou uma atitude flexível, noespaço;

- uma atitude curta ou uma atitude prolongadafrente ao tempo; ,

- uma atitude liberta ou uma atitude controladaem relação à fluência. '

. E~ todas ~s.ações observamos uma combinaçãoesp~cIflca de varres destes oito elementos da movímen­tacão: esta combinação particular é mais evidente nasaSSIm chamadas ações básicas, nas quais os fatoresESP8;ço, Tempo e Peso discerníveis são principalmenteconstderadng,

São quatro as ações que usamos em geral, quandode uma pronta reação de nossa parte a um estímuloexterno:

um soco* forte e díreto,um talhar* forte e flexível,um pontuar* leve e direto,um sacudir* leve e flexível.

.No 5as? de haver resistência externa, ou de ocorrerhesitação Interna,.. a ação será retardada e mantida,ass~ffilndo consequentemente as' quatro seguintes mo­dalIdades:

cilm * tN . ';1aJ" -dsoCOou bote, como já mencionamosJessas ações básicas são difi­e~ e s~ rca as por uma palavra (com?, bote de um animal).* ~' da ~r- Tpalhar, movimento de chicotear com chicote de domador

. a . - antuar, é uma batidinha muito leve. .'* _N.da T. - Sacudir leve, também pode ser agitar.

Ação básica

socotalharpontuarsacudirpressãotorcerdeslizarflutuar

Ação derivada

empurrar, chutar, cutucarbater, atirar, chicotear ou açoitarpalmadinha, pancadinha, abanarroçar, agitar, trancoprensar, partir, apertararrancar, colher, esticaralisar, lambuzar, borrarespalhar, mexer, braçada (remada)

114

p

11~

Page 60: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

(I~~_ ...'[

'iiiu,

"·tlo

"\: ~,~,0110 r

t ,l: I), l~ ~ i

tb ~ i

,;~

i ~5,",Q.

E'01

(JI",,,.'" i

1·-

saber, forpa e flexibilidade,. ao passo que desaparecequal.q1;ler enfase que a qualIdade de tempo Possa ter,sígnifícando Isto que não se percebe nem a subitansj.dade, nem a sustentação do movimento. A torção quevai se transformando em talhar, como é possível obser­v:armos num gesto vigoroso de rasgar, produz o mesmotipo intermediário de esforço. Esses movimentos ínter­n:e~iários são descr-itos como ficando entre duas açõesbasIcas. Em relação ao exemplo acima, as ações inter­mediárias recairão entre "torcer e talhar", ou descri­tas resumidamente como "torcer-talhar" .

.. Há mais três ações incompletas que surgem fre­quentemente no cotidiano:

O pontuar-deslizar é um esforço transicional queoco~re nos casos em que o pontuar se desenvolve emde~hzar como, por, exemplo, quando se escova umo?}e~o leve. Podera acontecer o mesmo tipo interme­diárío de esforço quando o deslizar desenvolve-se empontuar como ao fecharmos uma pequena gaveta ouquando introduzimos uma ficha num arquivo.

. S;u:,udir-f1utuar acompanhará pequenos movimentosgIratOrIoS, como os que ocorrem quando ficamos giran­do os dedos, ou quando jogamos longe pequenos objetos.

O Soco-pressão, que acontece quando o soco se de­senv.olve em pressão, pode muitas vezes ser visto emmovimentos de reunir ou de modelar.

Estas ~ções incompletas podem aparecer não somen­te na qua~Idade de degraus entre duas ações básicas,mas também como movimentos cardiaís, Por exemplo'pequenos movimentos que acompanham a fala muita~vezes são esforços incompletos nos quais é neutra a ati­tude relativa a um ou outro dos fatores de movimento Sealguém diz "Ah, não tem importância", o ator poder-áacompanhar suas palavras com um gesto diminuto queprovav~lmente será circular (flexível) e súbito. Deve­se, porem, acrescentar que há' duas formas de movi-

116

mentos súbitos e flexíveis: um deles talhar, que é forte;o outro, sacudir, que é leve, O pequeno gesto que acom­panha as palavras"Ah, não tem importân.cia". dificil­mente será um talhar forte, ou um sacudir bem leve,mas alguma coisa entre os dois movimentos. Essaalguma coisa poderá ser descrita como "entre talhar esacudir", ou mais resumidamente, como "tal?ar-sacu­dir" o que significa que o elemento peso mantem-se emsegu'ndo plano ou, na terminologia técnica, sem ênfase.

Vejamos a seguir rapidamente as oito açõe~ bási­cas de esforço* e depois as ações elementares mcom­pletas, bem como os impulsos para o movimento. ~ec?­

nheceremos em todos eles os componentes mensuráveisque já vêm sendo amplamente considerados ao longo

.do texto. E vamos agora, também, prestar um poucode atenção àqueles elementos humanc:s sempre ineren-tes a qualquer arranjo de esforço, nao Importando seeste serve ou não a propósitos práticos, ou se suanatureza é expressiva.

AÇÕES BÁSICAS DE ES~ORÇO

As oito ações básicas de esforço representam umaordenação dentre as combinações possíveis dos elemen­tos Peso, Tempo e Espaço, a qual é estabelecida deacordo com duas atitudes mentais principais que envol­vem, por um lado, uma função objetíva e, por outro, asensação do movimento. Embora nenhuma delas sedê na total ausência da outra, devido à unidade deesforço, cada uma delas pode tornar-se tão dominanteque, por motivos de ordem prática, cabe considerá-lasem separado. As duas atitudes foram anteriormentedenominadas de "lutantes" ou "resistentes" e como"indulgente" ou "complacente".

* Estas são explicadas detalhadamente em Modem Eâucatíonal Dance deR. Laban (1948) e em Elfort de R. Laban e F. C. Lawrence (1947), ambospublicados por MacDonald & Evans.

1170

Page 61: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

I t T mpo ocorrerá aSe substituirmos seu e emen o e ,seguinte modificação:

(

um soco "sustentado" ou espre­r- mer, prensar, abarrotar, ou- I como normalmente se fala,

pressão.

E trocando-se o seu elemento Espaço:

~ (

um soco "flexível ou chicotea~,açoitar, arrebatar ou como VI-

- mos denominando-o talhar.

- e talhar configuram um grupo dePontuar, pressao . tímamente relacionado comações básicas de esforço ln Isoco (vide [A] a seguir').

A ação básica decorrente de uma atitude de luta é:

toque suave ou leve,sustentado flexível, à semelhança do que se dá nosmovimentos de flutuar, de agitar levemente, de voar,de arrastar, de despertar, etc.

Cada uma das duas ações de esforço anterioresformam um centro ao qual, três das outras seis ações,.estão estreitamente relacionadas. Quando substituí­mos um elemento de cada 'Vez por outro diferente, ouseja, por um que se origina de outra atitude, a açãooriginal modifica-se. Neste sentido,

soco* F pode se transformar,

PONTUAR

(A)

PRESSAO

(B)________-;, FLUTUAR

DESLIZAR *

SACUDIR

substituindo o seu elemento Peso, no seguinte:IL: ... TALHAR

SOCOTORCER

flutuar

I .u,

{

um "gentil" empurrão ou panca­dinha, beijocas ou bicar (pás­saros) carícia de tapinhas ou, co-mo geralmente se fala, pontuar.

* N. da T. - Thrusting .e punchíng foram traduzidos como soco. Por moti­vos de terminologia técnica, õ autor usou os dois como sinónimos; poderia sertambém «bote" (de animal) ou estocada (de arma),

118

di e deslizar estãoNo outro grupo, torcer, sacu Ir ., "s a flutuar e remexer (VIde [B]) e desen-muito proxImo. ,

volvem-se da seguinte maneira:

o pode tornar-se:

119

Page 62: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

pela substituicão (de seu elementoPeso: -

1Espaço: O elemento de esforço "direto" consiste de

uma linha reta quanto à direção e da sen­sação do movimento como uma linha es­tendida no espaço, ou sentimento de es­treiteza.

O elemento de esforço "flexível" consistede uma linha ondulante quanto à direçãoe da sensação de movimento de uma ex­tensão flexível no espaço, ou sensação deestar em toda parte.

Tendo em vista os propósitos da análise das açõescorporais, é útil examinarmos concisamente as varia­das qualidades da experiência psicossomática. Estaspodem ser coligidas e organizadas de modo semelhanteao que se usou com as oito ações básicas e referir-nos­emos a elas como as oito sensações básicas dos movi-mentos.

Enquanto que nas ações funcionais a sensação domovimento não passa de um fator secundário, nassituações expressivas, onde a experiência psicossomá­tica é da maior importância, sua relevância cresce.Em tais situações, temos condições de observar mudan­ças de ênfase dentro dos fatores Peso, Tempo e Espaçodas ações corporais. Aparece também todo um conjuntode aspectos além dos de Resistência, Velocidade e Di­reção, o qual se torna particularmente importante paraas sensações dos movimentos. São os seguintes osaspectos pertinentes:

do Fator Peso é o de Pesado ou Leveza.do Fator Tempo é o de Duração ou Passagem.do Fator Espaço é o de Expansão ou Plasticidade.

o elemento. "!ir~e" do esforço consiste deuma resistêncía forte ao peso dsensa - d' "., e e uma_ çao e mOVImento, pesada ousaçao de peso. ' sen-

O elemento "toque suave" ou "1 "desforç . t d eve oo consis e e uma resistência fracafO peso e de,u~a sensação de movimentoeve, ou ausencia de peso.

O elemento de esforco "súbito" ist dum 1 'd· consis e e_ a ve OCI ade rápida e de umçao de movi t a sensa­d t ovirnen o, de um espaço curto

e ernpo, ou sensação de instantaneidade.O elemento de esforço "sustentado" .

te d_e uma velocidade lenta e de u consis­saçao d' ma sen­o movimento de longa dura -ou sensação sem fim. çao,

ANÁLISE DOS ELEMENTOS DO ESFORÇO

Podemos definir os vá' 1seguinte modo, na tentativ~l~~e en:~n,.t~s do ~sforço doum deles dois componente ana isa- os: ha em cadaoperativo e mensurável ob í s; sendo que um deles ée classificável: Ietívamenn, e o outro, pessoal

Peso:

Tempo:

120 121

Page 63: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

-r,

SENSAÇÕES DOS MOVIMENTOS

As duas fundamentais são:

I I isto como uma ação de esforço, trata-sel) do flutuar e a sensação do movimento

que lhe é inerente é aquela que pode­ríamos chamar de suspensa.

No movimento acima, a experiência psicosso­mática:

da leveza é leve, como se se estivesse boi­ando em cima,

da duração é longa, como se se estivesseexistindo num tempo interminável,

da "expansão é flexível, como se se esti­vesse enrugada no espaço.

Neste caso, estão todas diminuídas as experiên­cias psicossomáticas acima mencionadas:

a de leveza se torna pesada, como sefosse arrastada para baixo;

a de duração se torna curta, como se seestivesse existindo num único ins­tante;

a da extensão se torna filifarme, comose fosse conduzida através de umaabertura longa e uniforme noespaço.

nesta, a sensação do Tempo se alte­rou e tornou-se longa; por conseguin­te, seus três componentes são:

pesado - filiforme - longo.

nesta, a sensação do Espaço se alte­rou e tornou-se flexível; por conse­guinte, seus três componentes são:

pesado - flexível - curto.

nesta, a sensação de Peso se alteroue tornou-se leve; por conseguinte,seus três componentes são:

leve - filiforme - curto.

nesta, a sensação do Espaço se alterou etornou-se filifarme; por conseguinte, seustrês componentes são:

leve - filiforme -longo.

nesta a sensação do Tempo se alterou etornou-se curta; por conseguinte, seus trêscomponentes são:

leve - flexível - curto.

desmoronando:

afundando:

estimulada:

As outras três sensações que se relacionam intima­mente à sensação "deixar cair" são as seguintes:

e1ffórica:

excitada:

relaxada:

As três sensações básicas dos movimentos quemais de perto se relacionam à sensação "suspensa"podem ser descritas do seguinte modo:

nesta a sensação de Peso se alterou e tor­nou-s~ pesada; por conseguinte, seus trêscomponentes são:

pesado - flexível - longo.

enquanto ação de esforço é soco, cujasensação de movimento que lhe é intrín­seca é a que se pode chamar de deixarcair.

Fb)

a)

122 123

Page 64: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

As sensações de movimentos que propIcIam expe­riências psicossomáticas são passíveis de observaçãonas ações corporais. São destituídas de propriedadesobjetivamente mensuráveis e podem tão-somente serclassificadas no tocante às suas qualidades, às suasintensidades e seus ritmos de desenvolvimento. São esta­dos de espírito ou de humor que conferem às açõescorporais um colorido especial.

o FATOR DE MOVIMENTO-FLUÊNCIA

Consideremos agora, com mais minúcia, o fator demovimento-fluência. Desempenha este um papel bas­tante importante em toda a expressão pelo movimento,pois que estabelece relacionamentos e entra em comuni­cação por via de sua corrente interna e externa. O flu­xo tem principalmente a ver com o grau de liberaçãoproduzido no movimento, não importando se este é con­siderado do ponto de vista de sua dualidade subjetiva­objetiva ou dos contrastes de ser "livre na" _ "livreda" fluência do movimento. Ao descrevermos a fluênciaincluímos na sua caracterização a sua negativa total:a parada ou pausa. A fluência* ainda comporta os.movi­mentos de resistência e de contra-movimento; cada umdestes é diferente em estado de espírito, e em signifi­cado, não se referindo ambos nem à direção, nem àvelocidade, nem à força.

Consideramos mais atrás a propriedade básica domovimento, que é seu fluxo natural. E observamos entãoque, num de seus extremos, a fluência pode ser contí­nua, ou absolutamente parada. Agora que vamos tentardefinir o fator de movimento-fluência, bem como seuselementos "livre" e "controlada", devemos levar igual­mente em consideração a sensação de fluir do movi­mento.

Esta sensação se relaciona à facilidade de rnudan-

* N. da T. - Flow e fluency foram traduzidos por fluência sempre que aterminologia de movimento assim o exigiu.

124

e ocorre no movimento de uma SUt:s-ca, tal como a qu d . sendo atenuada a sensaçaor: . fl'd Quan o vaitãncía . m. a. d fl ir ode-se falar talvez de umada contmmdade o u 'bPmos ainda a continuidade,"pausa", na qual perce eembora já mais controlada.

O elemento de esforço de fluência "con-t I d " ou obstruída, consiste na pron­ro a a fl o normaltidão para se interromper o ux

e na sensação de movimento de pausa.

. - o algo difícil. Pode-Esta talve~ seja uma ~~~~;~~s que a sensação de

rá, contudo, ajudar Ste Pder

er carregada não cessa na., sentimen o e s ,f'luêncía. o , controlada ao extremo.pausa, ~en~o, pore~, d ortanto, quando associada a

FluencIa contro a a, p t is como o forte e o direto,outros elementos. do e:for;~li~ade de restringir. Origí­confere ao movi~f~ã~ interna para parar a açâo ana-se numa pro d d A fluência parece flmr para

I uer momento a o. . d _quaq. di - o contrária a a açao.trás, ou seja, numa ireça

O elemento de esforço de fluência "li­" consiste num fluxo libertado e navre . to

- de fluidez do mOVimen .sensaçao

. A • r ão deve-A qualidade de esforço da fluência rvre nsacão de. , ser confundida com a mera sen _

na, porem, . to Esta sensação é uma expres-ti ar no movimen .con mu ti dela libertacão do fluxo, que,são de esforço alva \f d misso;a auxilia o fluirdotado de uma. capaci a ~ e caract~rística da fluên­para fora, ou seja, progressivo,

cia livre. , , I t bular os quatro fatores doAgora já sera pOSSlVe aelementos de esforço, além. t bem como seus

movimen o, tld s em cada fator, o quede enumerar os aspectos con 1 oaparece na Tabela VI.

125

Page 65: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

.~.

Tabela VI

ESFORÇO

Verificação dos Aspectos de Peso Tempo Espae Fluência Nec ,., ' , Çúessartos a Compreensão do Esforço

-Esforço 1!:nfase no Informando

Incompleto Movimento sobre

f)~J--Espaço e Tempo Onde e Quando

(b)+ Fluência e Peso Como e O quê

r~ Espaço e Fluência Onde e Como

2 (b)-r-

Peso e. TempoO quê e Quando

AÇÕES ELEMENTARES INCOMPLETAS

Como já dissemos antes, podemos freqüentementefazer a inusitada observação, no estudo das ações cor­porais, de que um dos fatores de movimento pode estartotalmente negligenciado e apenas dois deles parecemconferir-lhe forma. Em casos tais, fala-se de "esforçoincompleto". Uma outra situD.ção igualmente comum éa de que O fator de movimento fluência assumiu o iu­gar de um dos outros três, o qual pcrülanece latente,deixando ainda que três fatores se mant<:mham em ati­vidade. Nestes casos, as ações corporais S5.L' revestidasde uma qualidade francamente diferente que decorrede ímpetos de movimentos diferentes dos da Ação. Istotudo significa que as forças propulsoras que levam àatividade podem ser compostas por outros fatores alémapenas dos de Peso, Tempo t ESt)açú.

Os esforços incomp1P.to,; e os diferentes Impetosfazem também parte do movime..ico expressivo, quersejam deliberados, quer sejam inconsciente'S, comoocorre com os movimentos de sombra.

As ações corporais que manifestam a participaçãode esforços incompletos expressam toda uma variedadede atitudes internas.' Dentre elas aprendemos a distin­guir seis em particular, que se agrupam em três paresde opostos; podem ser ilustradas como se segue:

127

FlEX(VEL

SÚBITO

í:. DIRETO

CONTROl.ADA

FIRME

TOQUE LEVEP •

T---SUSTENTADO

F LIVRE

GRÁFICO DO ESFORÇORepresentando os qua­tro Fatores de Movi­mento, cada um dosquais com seus doisElementos(P = Peso; E = Es­paço; F = Fluência'T = Tempo), .

126

FatoresElementos do Aspectos Aspectos

de movi-Esforço mensuráveis classificáveis

menta (tutantes) (compla-(funções (sensação do

centes)objetivas) movimento)

Peso firmeResistência Leveza

suave forte (ou leve (ou grausgraus menores menores atéaté fraco) pesado)

Tempo súbitoVelocidade Duração

susten- rápida (ou (longo outado graus menores graus menores

até lento) até curto)

Espaço direto flexívelDireção Expansãodireta (ou flexível (ougraus menores graus menoresaté ondulante) até filiforme)

Fluência centro- livreControle Fluêncía

ladaparado (ou fluida (ougraus menores graus menoresaté libertado) até parando)

'---0_-·-· ..----.----.-----_.--_._.~.

Page 66: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

128

P = Peso

E = Espaço

T = Tempo

Ep

T--

129

Gráfico representando o ímpeto de Ação

Quando a fluência substitui, seja com uma ou comambas as suas qualidades (controlada ou livre), asqualidades do Peso, o ímpeto torna-se "como visão"*,porque agora não é mais suportado por um esforçoativo de peso, tendo reduzido conseqüentemente o seusignificado corporal.

* N. da T . .,- V ision-lilee - Visão no sentido imaginativo.

Estas atitudes muito freqüentemente aparecemcomo transições entre ações essenciais tendo, muitasvezes, a função de recuperação. Desempenham elas umimportante papel na configuração dos elementos e dosfatores de movimento, os quais se constituem de agru­pamentos e não apenas de meras somas. Tais confi­gurações constróem unidades individuais em que os ele­mentos constituintes isolados submergem inteiramente.O todo adquire, desta maneira, um significado, umaimportância e uma função novos a cada vez e nenhumdos elementos isolados pode, por si só, pretender pos­suí-los ou preenchê-los por si próprio.

Ao considerarmos a combinação dos três fatores demovimento, chegamos a um conjunto básico de novasvariações que, em geral, são notadas quando a expres­são é mais intensa, mais pronunciada ou mais comuni­cativa do que na manifestação de atitudes internas.

Numa ação de esforço básica, a fluência se mantémlatente e apenas os fatores Peso, Tempo e Espaço éque operam. Quando isto acontece, falamos de um"Ímpeto de Ação",

1I

I

,I

{ is.to . é, inconsc~e~J.te, que tanto pode serdIfuso quanto nltído, triste como exaltado.

{is to é, de. desta,u~, que pode incluir focona atençao proprra ou universal juntocom controle ou abandono. '

I~to é, ~e presença, que pode ser dotadae Um Impacto caloroso ou de uma cuí.

ldadosa consid,:raç~o: ou pode expressarou um:,- !orte Iígação afetiva ou um toqueSuperfICIal.

Iisto é, de constância, que tanto podeapre!,,:ntar-se resoluta quanto teimosa, ousensItIv~~ente receptiva. Pode Igualmen,te s~r sólida e poderosa ou delicadamentepontIlhada.

{is to é: ~e adaptabilidade, que tanto podeser fácí! quando tenaz, estabelecendo-segradualmente ou mudando de súbito.

(a) estável

Esforço E:nfase no InformandoIncompleto Movimento sobre

.c:t Espaço e Peso Onde e O quê

Tempo e Fluência Quando e Como. , .

(b) móvel

1I(o) acordado

(b) oníríeo

2 f(a) remoto

Lb) Perto

3

inco:gt:~~~l ~~~~buirl no.mes a tai~ variaç~:s de esforçospressão . re actonam-sn a expenencia e à ex­balho d do movímentn puro. Se O leitor se der ao tra­fatores ed~x~ut~r algtumas ações corporais com os daisI ovirnen o mencionados, mas usando u

~o~r:;:;to apena~ de cada, por vez, talvez venha a co:que as atItudes têm as seguintes características:

fisto é, consciente, certo ou incerto quepode surgir súbita ou gradualme~te eque tanto pode ser contido quanto con­centrado.

Page 67: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Gráfi-co representando o ímpeto de Visão

Quando Fluência substitui o Tempo,quer dizer,quando deixa de existir alguma qualidade considerávelde tempo, a expressão transforma-se naquilo que po­deríamos denominar de "encantada". Repousa a atitu­de interna relativa ao tempo e o movimento irradia umaqualidade de fascínio.

Gráfico representando o ímpeto de Encanto

E

F----'~-­

T--

pE

F---"'---

E = Espaço

F = Fluência

T = Tempo

P = Peso

E= Espaço

F = Fluência

ser humano é capaz de produzir se espelham nas açõesdo corpo. Contudo, as ações corporais que forem exe­cutadas com uma consciência imaginativa estimularãoe enriquecerão a vida interior. O domínio do movimento,por conseguinte,. não tem. valor apenas para o artistade palco, mas para todos nós, na medida em que todosnos vemos a braços, consciente ou inconscientemente,com a percepção e com a expressão. O indivíduo queaprendeu a relacionar-se com o Espaço, dominando-ofisicamente, tem Atenção. Aquele que detém o domíniode sua relação com o fator de esforço-Peso tem Inten­ção; e quando a pessoa se ajustou no Tempo, temDecisão.

Atenção, Intenção e Decisão são estágios de prepa­ração interior de uma ação corporal externa. Esta seatualiza quando o esforço, através da fluência do movi­mento, encontra sua expressão concreta no corpo.

Quando a Fluência substitui o Espaço, não se esbo­çando nenhuma atitude particular referente à forma,ou seja, quando se acham adormecidas as qualidadesespaciais, as ações corporais tornam-se particularmen­te expressivas da emoção e dos sentimentos. Falamos,nestas circunstâncias, de um "Ímpeto de Paixão".

Gráfico representando o ímpeto de Paixãop

F---lIC--­T--

P = Peso

F = Fluência

T = Tempo

Podemos novamente colocar, para concluir, que oesforço e todas as suas múltiplas nuances das quais o

130 131

_.m.Tn.--·.----------------------~

Page 68: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

CAPíTULO 4

o SIGNIFICADO DO MOVIMENTO

O~ VIAJAN:E~ que já estiveram em países habitados portribos prnmtIvas voltam relatando estórias estranhasde telegrafia por meio de ritmos de tambores, edecomoa notícia da passagem da caravana do explorador porperto de alguma aldeia é transmitida, em grandes deta­lhes e a uma velocidade incrível, aos mais afastadosrecantos do país, através de sinais rítmicos emitidospor batidas de tambores e tan-tans. Poder-se-ia tecerum paralelo com o sistema telegráfico Morse, no qualc~:r:tas combinações de vibrações curtas e longas síg­nífícam letras que podem ser agrupadas para formarpalavras e. frases; as tribos primitivas, contudo, falame~ geral línguas bastante diferentes e freqüentementenao tem qualquer conhecimento de outra combinaçãode. s0':ls e de ritmo de palavras além daquelas de suaproprra g~~te. Destarte, o ritmo deve conter algumou~ro stgníficado que, a despeito das prolongadas pes­quisas, amda constitui uma incógnita para os investiga­dores europeus. O ritmo parece ser uma linguagem àparte, enquanto que a linguagem rítmica transmitealguns aignificados, sem palavras. Os povos europeuscontemporaneos parecem estar totalmente destituídos de~nteligência no sentido de apreender o significado sub­Jacente aos movimentos rítmicos primitivos.

Os investigadores estavam se debatendo com esteproblema já há vários anos, até que um nativo afri­c~no lhes deu uma pista bastante útil: a recepção dosr~tmo~ do~ tambores ou tan-tans é acompanhada pelavtsualízação .dos movimentos daquele que está tocandoe e esta movímentaçãn, um tipo de dança, que é o ele-

132

mento visualizado e compreendido. O método se aproxi­ma bastante do de uma ciência e é guardado por socie­dades secretas com zelo incomum. A sensibilidade paraa observacão do movimento entre esses povos primitivostransformou-se numa espécie de língua nativa interna­cional, por intermédio da qual a comunicação. podecruzar todo um continente, de leste a oeste da Afríca,por exemplo, o que significa milhares de quilômetros,a uma velocidade inacreditável.

Esta linguagem poderia ser comparada ao Espe­ranto e outras construções semelhantes, não houvesse adiferença de que tais construções são artificialmenteelaboradas, ao passo que a linguagem dos tambores,que é uma modalidade de comunicação de esforços,nasceu, cresceu e aprimorou-se através dos te~pos, apartir do próprio instinto rítmico do.Homem. Nos p~~­demos esta linguagem corporal e ha pouca probabilt­dade de que a possamos redescobrir ou: pelo menos,torná-la praticável em trabalhos teatrais. A aborda­gem da Natureza e da vida que presentemente adota­mos difere total e fundamentalmente daquela usada pornossos ancestrais, que se movimentavam segundo oritmo dos tambores. Há, não obstante, um atual recru­descer do senso do ritmo e do elemento mímico no tea­tro. Ultrapassaria os objetivos deste livro a apresenta­ção de um quadro geral e ~etalhado da pesquisa sobreo movimento, embora o aqui exposto esteja baseado emsistemáticas investigações. Foram incluídos, no entant~,uns poucos aspectos da classificação histórica e ana:l­tica dos movimentos, na medida em que talvez se revis­tam de algum interesse para o leitor.

Descobriu-se que as atitudes corporais, durante omovimento, são determinadas por duas formas princi­pais de acão. Uma destas formas flui do centro do corpopara fora, enquanto que a outra vem da periferia doespaço que circunda o corpo, em direção ao cent~o docorpo. As duas ações que fundamentam estes movimen­tos são as de "recolher" e de "espalhar". O recolher

133

Page 69: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

ocorre em movimentos de trazer alguma coisa para ocentro do corpo, ao passo que o espalhar pode ser ob­servado ao empurrar-se algo para longe do centro docorpo. O recolher é um movimento mais flexível que ode espalhar, o qual é uma ação mais direta. A curvado movimento numa ação de recolher vem precedidade um movimento para fora, semelhante ao de espalharpara longe do centro do corpo. Este movimento prepa­ratório, porém, tem menos ênfase do que o seguintepara dentro, de recolher, que justamente se constituino propósito principal da ação,

Os nossos membros, trabalhando independentemen­te, podem efetuar muitas combinações destas duasações, É possível, por exemplo, que um braco recolhaenquanto o outro espalhe e até mesmo no próprio braconão é impossível que a parte superior espalhe enquantoo antebraço e mão executam um movimento de recolher.O oposto é verdadeiro quando se trata de uma ação deespalhar; o afastar para longe do corpo constitui seuobjetivo primordial e qualquer abordagem de aproxi­mação preparatória perto do corpo não é enfatizada,sendo de importância secundária.

Num passo em que o peso do corpo é transferidopara uma das pernas e em que a outra encontra-selivre, esta pode ou dar o passo seguinte ou executaruma ação que consista de um movimento de recolherou de um de espalhar. É possível afastar com o calca­nhar enquanto os artelhos recolhem. Assim como obraço e a mão têm condições de executar acões con­trastantes, as pernas e pés podem igualmente fazero mesmo, bem como quaisquer outras duas partes docorpo. Certas combinações de movimentos de espalhare recolher são características de épocas determinadasda história e de lugares determinados do mundo.

O modo mais natural de se movimentar é o estilodo movimento harmonioso, comum às antigas culturasgrega e romanas. Pequenos desvios deste ideal harmo­nioso não chegam jamais a deformar o movimento a

134

ponto de transformar ~ atitude. numa .de.s~rmonia..Oshábitos de movimentaçao das tribos prímítívas, porem,parecem aos olhos e à mente do europeu como grotescosou desarmoniosos. As formas grotescas das dançasmouras foram introduzidas na época das Cruzadas, massua tortuosidade assimétrica foi ultrapassada por mo­das de movimento que ainda podem ser .VISt?~nas escul­turas que ornamentam nossas catedr-ais gotlca.s. Cons­titui mero acidente o fato de essas obras-prIm::s daarquitetura terem sido associadas, em det~rmmadaépoca aos bárbaros godos. Nessas representaçoes, cadamembro do corpo, cada dedo da mão ou do pé, pareceestar simultaneamente recolhendo e. espalhando.e~ di­ferentes direções do espaço, produzmdo uma ahv~dadeprópria. Por outro lado, temos aqui, uma mentahdadeextensamente distante da de seus predecessores, a sa­ber, a mentalidade greco-romana, que exyressava com­binacões harmoniosas de formas de açao de recolhere de· espalhar.

Embora não pretendamos oferecer sequer um es-boco da história do movimento, pode-se adiantar queem: certas épocas, em partes definidas do m';'Il;do, emcertas ocupações, nos apreciados credos estetlc.os ouem habilidades com fim utilitário, algumas a~~~ud~scorporais são preferidas e usadas com J:?alS ~r:equenc:aque outras. Qualquer indivíduo pode ldentlflcar .naoapenas o ideal greco-romano de mo~imento,.que ~mdacaracterizou as danças da corte da epoca ehsa?etlan::,como também as atitudes primitivas de um es~ilo mal;grotesco que persistiam nas jigas da mesma ep?ca. Efácil compreender como a seleção e o est~bele~lmentode preferências de certas atitudes corporais criam u~estilo; apesar disso, devemos recordar-nos de que ~nas transicões de uma posição para outra que se verr­fica uma ~dequadamudança de expressão, o q,;e de~er­mina a criação de um estilo d~ movimentos dinamíca­mente coerente. Podemos aSSOCiar as atitudes corporaIsa movimentos de transição tanto grotescos quanto har-

135

Page 70: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

,.. •..

moniosos. Ê devido a uma peculiaridade do instinto daraça humana o fato de que qualquer desvio da moda ouestilo preferenciais de uma época seja consideradocomo anormal ou sem estilo, bem como o de qUe taisdesvios sejam inclusive considerados feios ou errados.As comunidades parecem entender que é indispensávelà manutenção da estabilidade do seu espírito comuni­tário uma determinada uniformidade no comportamentoem movimentos. Tendem igualmente a enfatizar umideal comum de beleza, muito freqüentemente associa­do a um valor utilitário, apreciado de modo especialpela comunidade de uma época específica. Vemos assimcomo é que as atitudes de guerreiros ou caçadores pode­rosos, de eruditos ou sacerdotes, de artesãos e artistas,bem como as dos preguiçosos parasitas da sociedade,nesta ou naquela época, são consideradas como as úni­cas atitudes belas e de estilo correto.

Os estilos de movimento foram úteis de algumaforma, em certo período ou em dado país, segundo asprincipais necessidades da civilização. As concepçõesutilitárias e estéticas parciais que levam as pessoas adizerem que este ou aquele jogador de tênis, esquiador,batedor de beisebol ou artista de cinema "têm estilo",podem freqüentemente provir de detalhes mínimos dehábitos de movimentação. A pequena diferença de posi­ções do pé, no recolher ou espalhar, por exemplo, pode­rá fomentar uma opinião favorável ou desfavorávelquanto ao estilo de um atleta campeão ou de uma estre­la de cinema. Quase todo mundo pratica essa avalia­ção subconsciente dos movimentos das pessoas. O ar­tista, entretanto, tem que representar mais do que osestilos típicos ou a beleza típica. Seu interesse abarcatodos os desvios e todas as variações do movimento.A representação da fealdade ou da falta de graça, oumelhor, daquilo que assim é chamado em determinadasépocas da história por diferentes povos, pertence tantoao campo da arte de atar quanto aos ideais em vogado que sejam movimentos típicos. As combinações extra-136

Tj

. , . vimentos muitas vezes estabelecem ?Sordmayas ?ed:~m conflito dramático. As nuances maispontos ocaI.s - m reendidas só após um estudo~u~~h~d~s~~o::~~~~~ rhmico das atitude~.nas_qU~Sf~ram empregadas séries definidas de com maçoes e

esfo~Ç~~adicão do balé preservou uma grande (uanti­

dade de modalidades fundamenta~~:Se:~~~~~~s~sT~~:podem ser consideradas como }_O b es" e "attitu­modalidades sã~, por exemt P~o'rai~r~ s~Sg;~ficado de taisd ,,* Se pesquisarmos a e a íd _

n~~ndes ~e movimento, desci~~~t~~O~u~uI~::~: ~~~a pose f'ínal , mas nos mov .nT ta se entre bailarinos primitivos e crianças pelqhue-

ra - , , . ento de reco er,nas, da fluência/~exIveld:t~:u:O~~';to.Este gesto depor mei.? do qua st apreen de repelir, que é um movi­possessao contras a com o O derar-se ementa direto de espalhar ou ~mpJrrar~tai:PoNa dancao repelir são necessidades un a~e d' osturástradicional, essas .ações estã~ P~trIfI~ ~~~r:: ~ireta éou poses corporais car~~terIsi~~~~el "attitude". Evi­denominada "arabestqUe l';saa alguma' dos movimentost t e não res ou cm . .den emen, h d alhar que exprrmiam res-originais de recol er:. e esp ulsa' dado que no balépe,ctiyamente possess~o ~-~isublimados na suave re­c1asslCto a~b~s ~~C~~t~~o de espírito satisfeito. Apesarpresen açao e s "arabesques" e "attitudes" dosde~;e ~ato, ~~~~~::~~~de uma expressiva seme~han?abai arI~os uais se originaram, conquanto nao SIg­com açoes das q . balizem os esforços internosn~milfi9-uem mEams pa~~~~pSioSI~m símbolo não significa coisaSI ares. '. t d r toda umad f" .d mas suscita no espec a o .alg,;,mdadeed~IU:~gens. As necessidades f'undamentaísvarre a I (soco) que se ex­de possuir çag~rratr) e tde r:ae:o~tnentação primitiva,pressam mais díre amen e

* N. da. T. - Em francês no texto.

137

..........·PIhZr.'••• ........",==,

Page 71: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

no balé, acham-se dissolvidas numa ampla escala deformas harmoniosas que possuem tão-somente um cará­ter evocativo.

As ações comuns do dia-a-dia, que se evidenciamclaramente nos movimentos do trabalho, constituem umdos estratos do mundo do movimento. Além deste, en­contra-se um outro estrato nas piscadas, meneios decabeça e exclamações comunicados no decorrer da fala.Aqui, os movimentos convencionais são substituídos porpalavras. As artes dinâmicas da atuação teatral, docanto e da dança representam um terceiro estrato daexpressão de esforços. Os movimentos executados nobalé perderam a tal ponto sua conexão com os impulsosprimitivos do homem para a ação que os relegamos aum domínio aparentado ao estado onírico. Nos nossossonhos. embora possam ter alguma relação com nos­sas ações cotidianas, os movimentos são fantásticos.Os pesadelos, por exemplo, estão repletos de expressõesde esforço aglomeradas caoticamente. exibindo algumasemelhança com os impulsos fundamentais de posse erepulsa. Nos sonhos harmoniosos. todo o medo que de­corre da luta pela sobrevivência apresenta-se dissolvi­do num fluir suave de esforços, tal como ocorre naelevação ao ar. no flutuar ou no voar.

Se analisarmos as duas formas sublimadas do agar­rar e do repelir. descobriremos que as poses chamadasde "attitudes" enchem o espaço muito mais do que os"arabesques". As "attitudes" evidenciam seu relacío­namento com todas as dimensões: cima. baixo. direita,esquerda, frente e trás. É como se o espaço todo secomprimisse numa única e abrangente dimensão. ofe­recendo uma impressão estética semelhante à de umaorquídea, cujas curvas entrelaçadas criam uma uni­dade perfeita. As "attitudes" são poses finais que nãopodem ser mais desenvolvidas. Já os "arabesques" sãode um caráter totalmente diverso. Não preenchem oespaço, mas irradiam-se do centro do corpo em díre­ções definidas, não sendo também tão autocontidos138

uanto as "attitudes". Os arabesques _endereçam-seq algum ponto do mundo externo, nao sendo posesrf~m? apedem a continuacão do movimento numa dire­mais. - t t çã do espaço_ laramente indicada. Es a pene ra o ,

çao ct

' tica de um ".arabesque", contrasta com a con-carac ens .,'tida centralidade da "atütude .

A sensacão do movimento, nestas duas p~s:s, con-centra-se nó simbolismo que as formas espaCIaIS A reve­lam às pessoas sensíveis a impressões desse genero.Num estado de atenção interna c~n~entrada~quase todomundo tem sensibilidade para tais ímpressoes- !'.expe-

oA • do conteúdo simbólico e de sua slgmflcaçaonencla - . ediata dadeve ser deixada a cargo <:Ia compreensao lf? _

essoa que assiste ao mOVImento. Qua}quer mterpreta~ão verbal dessa sensação Interna sera sempre algu~:éoisa como converter uma poesia em prosa, perr;tacendo continuamente insatisfatória no todo. Mas_ e pos­sível e desejável ao ator-bailarino uma .obser;:.açao C~?­creta do movimento, baseada em conslderaçoes re~ Irtas da conduta do homem no tempo e no espaço, e IS otambém serve para outras pessoas interessadas na arte

do teatro. . h' ltí a aA forma de arte na qual ainda oje se cu IVexpressão visível do movimento é a dança de palcO'tqueinclui a dança pura, por um lado, e as, forma,s ~ea r:l~da dança. por outro, tais como o ba~e. a ffilmlc~drama-dança. Todas elas são aconteCImentos r~als, n.amedida que envolvam ações reais d.e corp?s reais. ~als

ímentos exibem uma forma mais esühzada na a~­~°'Jo que na representação. Nesta, bem como na mi­mica os movimentos lembram mais o comportamentocotidiano. Um selvagem ou uma criança. que nada so~­bessem sobre teatro poderiam confundIr ?S aconte~:mentos de uma peça teatral com os da vl~a real. ana dança isto não aconteceria, pois os mov:men~os do.sbailarinos mostram. no geral, transformaç~es ta~ om­ricas das ações e condutas cot~dianas que nao po e se:­confundido seu caráter simbóhco. A dança usa o movi-

139

Page 72: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

menta como linguagem poética, ao passo que a mímícacria a prosa do movimento. É o arranjo das expressõesde esforços da vida cotidiana em ritmos e seqüênciaslógicos e não obstante reveladores, que conferem aodesempenho teatral sua peculiaridade.

É interessante considerar-se o objetívo da trans­formação que constitui o balé. Um mundo profundodemais para ser traduzido em palavras, o mundo silen­cioso da ação simbólica, claramente revelado no balé,é a resposta a uma necessidade interna do Homem. Senão houvesse em nós nada que pudesse responder a esteestranho mundo, ninguém jamais conseguiria assistir aum balé ou dança. O interesse pelo balé torna-se maiscompreensível se percebermos que os momentos de mo­vimento mais profundamente emocionantes de nossasvidas, em geral, nos deixam sem palavras e que, em taismomentos, nossa postura corporal pode bem ter a capa­cidade de expressar algo que seria inexprimível deoutro modo. Apesar disso, hoje em dia não está na modaconsiderar que a mímica e o balé sejam mensageiros decoisas tão inefáveis; as pessoas de tipo mais sofisticadoe cínico não têm muita chance de experimentar o tipode vibração interior que as deixariam mudas. O baléhoje em dia tende a ser encarado principalmente comouma exibição de graciosos movimentos e belos corpos.Não obstante, o interesse mais profundo por este mundodo silêncio não pode ser tido como totalmente adorme­cido ou morto. Há muitas pessoas, talvez em númerocada vez maior, que sentem serem nossas horas devigília tão repletas de ações simbólicas quanto o sãonossos sonhos e que também se faz necessário algummeio através do qual as ações dessa natureza possamexprimir-se a nível estético. Evidentemente, esse meiodeverá ser encontrado na área dos movimentos quedenominamos dança e mímica.

Mas o que são ações simbólicas? Certamente nãose trata de meras limitações ou representações dasações comuns da vida cotidiana. Executar movimentos

140

"

. d braçar ou ameaçar alguém pou-de serrar madeira, e a dadeiro simbolismo do movi-co tem a ver ~0I? o_ver atos do dia-a-dia podemmento. E~sa:s. lIlll;taçoes ~~snão são simbólicas, O 1:;0,ser até SIg~fIcatIVa~, ~ilenciosos movimentos, cheiosmem, por Via daque es t r movimentos estranhos quede emoção, pod~ra,~:xec:ã~ ou pelo menos, aparente­parece~ se~ ~Ig~ icaç cu~ios~, contudo, é que ele semente mexplicaveIs, O s acões por ele emprega­move de acordo com as mesm~ertãr amontoar ou fazerdas para serrar, car~ega~, coneracõ~s cotidianas; taisqualquer u:na das em~ sO:qüêrÍcias específicas dota­ações, porem. surfgem próprias. As palavras que ex­das de ritmos e ormas ões emoções ou certos

. timentos sensaco ,prImem sen 1 , .: ão são capazes de fazerestados espirituais e ~e~~~~ ~~uperfície das respost~smais do que arranhar e itmos das ações corporaisinteriores que as formas e r movimento em sua brevi­têm condiçõe~de ev?car. C? d que páginas e páginasdade, pode dizer m,:Ito mais ode descrições verbais. , tos podem ser denominados

Entretanto, os movimen onseguem ler tais descri­e descritos e a~ pesso~ queh~gar a perceber os estadosções e reproduzI-las po em c Os movimentos isoladosde espírito por eles expresso:~elhantesàs palavras ousão evidentement~apenas s d ndo nenhuma impressãoàs letras de uma língua, nao fl~ir coerente de idéias, Adefinida, ne~ ,t.ampouco um x ressa em sentenças. Asfluência de idéiase:se:: oec~mo as sentencas da fala,seqüências de dmovm~en ~e~sagens emergentes do mun­as reais porta oras a~ . daí emerge é a seguinte:do do silêncio, A questao que d nacão compreensíveIPode-se encontrar alguma or 'le :oso? Em caso afir-

- d nmverso SI encI, , .nestas emanaçoes ? onhecimento de pr-incípiosmativo, seria vantaJosobes~e~ o assim como ao padrãoorganizadores, ao ato~- a .arm , al ogeral da arte do movimento n? Ps ~o 'desempenho audí­

A arte teatral tem suas raI~e to por intermédio devel e visível do esforço, mam es

141

Page 73: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

ações corporais do ator-dançarino. Este. ao executartodos os tipos de movimentos implement.ais ou não im,plementais*, é, na verdade, uma pessoa real às voltascom ações c0,rpor?-is reais; o silencioso mundo das idéiase agItaçoes ínteríores jaz à espreita de ser concebidode_acordo com uma forma coerente, no seio destasaçoes, ° executante acentua algumas destas formas es­t,ranhas emergentes do mundo do silêncio e da imobi­lidade; e, conquanto faça uso dos mesmos movimentosq.ue um trabalhador qualquer emprega, organiza-os emr~tmos e seqüências que simbolizam as idéias que o íns.prraram..0 ator comum relutará em admitir que o públí­C? aprecio sua arte com base numa análise subcons.CIente de seus movimentos, ° fato é, não obstante, queo espectador deriva sua experiência a partir dos movi­mentos do ator. A sua própria maneira o observadordepura o materísj apresentado, conqu~nto aja destaforma basícamenta de modo inconsciente. A formade apresentação do artista efetivamente sugere algunsrumos aos quais possa seguir o processo de depuraçãodo espectador, embora não determine este processo emsua to~alidade. Apesar de serem poucos os movimentosdo a~tIsta que tenham adquirido uma significação con­venclO~al, Isto nao altera o fato de que o significado étraduzIdo pelos movimentos. ° uso exclusivo de movi-

. mentos com um significado fixo jamais resultará numtrabalho de arte,. pois é precisamente a combinaçãomcomum, d~ movImentos que os torna interessantespara o público,

A palavra inspiração deveria ser menos enigmáticado que o era no passado, já que aparentemente a hu­ma~idade está. aos poucos aprendendo a penetrar emmaior profundIdade no saudável mundo do silêncio. °trabalh<;> d~ palco,não sofisticado, comum, torna-se cadavez mars mtoleravel. Shakespeare mostra. em muitasde suas peças, o contraste entre ações que resultampor um lado, de uma penetração no mundo do silêncio',* N. da T. - Diz-se Implemental quando se usa qualquer objeto para o movimento.

142

e, por outro, as que resultam de uma imitação pura_esimples da realidade. Parece que nos encontramos naoapenas a ponto de descobrir uma nova modalidade derepresentar, como també':ll. que deve~os recuperar oterreno perdido e readquir-ir o conhecimento possuídopor nossos ancestrais há tant?s séculos 17trás.. ,° foco de interesse do artista no movimento so temcondições de ser claramente discernido se tentarmosavaliar no que consiste realmente o trabalho de atuarou dançar. Este é um trabalho que não difere tão exten­samente de qualquer outra atividade humana..0. traba­lho de um operário é lidar com objetos materiais, sen­do-lhe imprescindivel saber o que fazer co~ eles. °trabalhador poderá tanto valer-se de suas maos nuas,quanto de um conjunto de ferram~ntas. De fato, asmãos não passam de ferramentas Iigadas .a noss?s cor­pos, instrumentos vivos. °manuseI~ de objetos e mst;~­

mentos envolve movimentos que tem res.ult~dos pratI­coso A diferença, em relação a,o .ator:bal1armo, e queele trabalha com apenas um umco mstrumento: seucorpo. Os materiais de que eventualmente venha. afazer uso não se constituem em ferramentas nemobje­tos reais, sendo, isto sim, acessórios ~e s~a movimen­tação. °uso dos movimentos do corpo incluí, tanto parao ator quanto para o cantor, o uso ~e. suas. cordasvocais. ° artista de palco tem que eXI\;Jlr movimentosque caracterizem a conduta e o <;rescImento .de u~a

personalidade humana, numa variedade de situaçõesem mudanca. Ele deve saber como é que se espelhamnos gestos,·na voz e na fala tanto a per~onalidade quan­to o caráter. Ao utilizar-se desses movimentos, tem elede comunicar para a platéia as idéias do dramaturgoou do coreógrafo. Tem que saber como entrar em" con­tato com o espectador. Deve ajudar o grupo todo detrabalho levando a si mesmo e aos demais atores aestabelecerem a corrente magnética entre os dois pólos- palco e platéia; tem ainda de treinar e contro~ar

seus hábitos de movimentação pessoal, procurando atin-

143

Page 74: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

"I'o

'I,

gir na mesma medida, um domínio geral de seu corpoe das cordas vocais. O atar-dançarino deverá ser capazde observar seus próprios atas de movimentação, assimcomo os de seus companheiros. O estudo dos movimen_tos efetuado por um atar é uma atividade artística enão um mecanismo para descobrir fatos. Tentará estecondensar, por via de seus estudos, as fases do esforçoem ritmos e formas definidas. A semelhança entre osseus atos de movimento e os da personalidade repre­sentada pode diferir em exatidão do mesmo modo quedifere qualquer outra modalidade de retrato ou des­crição. Um retrato nunca é igual ao seu modelo. O mo­delo do ator é freqüentemente imaginário, mas seusatributos característicos só podem ser extraídos daobservação da realidade.

A conduta em movimentos das pessoas pode serobservada sistematicamente e é útil ao ator de teatroaprender um pouco do que seja o melhor método deobservação. A avaliação intencional da movimentacãode um individuo deveria iniciar-se no momento mesmoem que ele é primeiramente avistado. O modo comoa pessoa entra porta a dentro, como é seu andar até oinstante em que se detém pela primeira vez, a suapostura de pé, quando sentada ou em qualquer outra po­sição podem ser todos dados de grande significação.Trata-se da tarefa do artista, ao criar uma caracteri­zação lúcida e sutil, não apenas fazer aflorar os hábitostípicos de movimentos como também as capacidadeslatentes, a partir das quais possa originar-se o desen­volvimento definitivo da personalidade. O artista deveperceber que a própria caracterização que faz dos mo­vimentos é que se constitui nos fundamentos sobre osquais deve construir seu trabalho. O controle e o desen­volvimento de seus hábitos pessoais de movimento pes­soal conferir-Ihe-ão a chave do místério da significa­ção do movimento.

Diz-nos a ciência que a mudança é um elementoessencial da existência. As estrelas que vagueiam pelo

144

céu nascem e morrem. Crescem e desaparecem, coli­dem umas com as outras, ou ainda destroe~-se pelofogo. A mudança está em toda parte.. Este mces~anl­

t ovimento ao largo de um espaço mcomensuraveee : um tempo indeterminável tem seu paral':,lo nosmovimentos mais diminutos ~ de menor. duração .queocorrem em nossa Terra. Ate m~smo coisas maruma­das como cristais, rios, nuvens e ilhas crescem e desa­parecem, aumentam e quebram, aparecem e desa-

parecem. . t seresA mudança se transforma em movimen o ;nos .

. dotados de uma necessidade interna ímperiosaVIVOS, lt - ocorrem node empregar o tempo e as a eraçoes quetempo para seus propósitos pessoais: ~e~env?lve~-seem seres caracterizados por traços índíviduaís sejameles plantas, animais ou home~s: Levado por suas ~e­cessidades espirituais e materíaís, o homem cultivarelacionamentos pessoais com se~s semelhantes. Emtodas essas necessidades, o movm~ent? tem o pap_elcentral. Vemos os movimentos dos animara quando estãoconstruindo suas moradias, arrumando comida ou «;nxo­tando intrusos. Vemos danças religiosas na~ quais osseres humanos oram para seus deuses. OUVImos t<;tm­bém os movimentos de suas línguas, gargantas e peitosao produzirem sons, nas palavras faladas e nos salmose hinos cantados. ..

Os movimentos internos do sentimento e do pensa­mento se refletem nos olhos dos homens, bem como n~

expressão de seus rostos e mãos. A ar~e do palC? orr­ginou-se da mímica, que é a representação de movun~~­

tos internos por intermédio de mudanças exter~~s VISI­veis. A mímica é o tronco da árvore que se ra~f~counadança e no drama. A dança se acompanha d.e ~usIca, en­quanto que o drama o é por palavras. A mUSICa e a falasão ambas produzidas por movimentos que_se tornaramaudíveis. O som musical suscita as emoçoes: as pala­vras faladas exprimem pensamentos. A qualidade mu­sical das palavras, porém. também colore as palavras

145

Page 75: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

"I'.,'II

'.

,

com emoção. Por exemplo, quando um namorado dizà su:: namorada:. "Olhe que campo!", esta tomará co­nhecimento, partindo da entonação expressa nas pala­vras, de uma emoção inteiramente diferente daquelaque um camponês expressaria quando usasse exata­mente as mesmas palavras: "Olhe que campo!", tendoem men.te seu trabalho. Além disso, a fala é muito maisexpressiva quando colorida por gesticulação mímicaque. a acompar:.ha. Na realidade, porém, não há fala des­tItUlda. de tensao corporal. Esta tensão é movimento empotencíal, revelando mais aspectos das necessidades in­ternas do índivídun, às vezes, do que suas próprias pa­lavras. O .movímento permeia a mímica, a dança, a re­prese.ntaçao teatral e o canto. Trata-se da vida, tal co­mo nos_a !?onhecemos. Também se encontra presente naex;e!?uçao mstrumental, na pintura de quadros em todaatIv~dade art!stic,?- .afinal. Em cada um deste~ casos, omovImen~o ~1l;0 so e um fato físico, como também é umfato de ~IgmflCação variada em suas sempre mutantesexpressoes.

As raízes da mímica são o trabalho e a oração. Otrabalho assegura nossa existência material, enquantoque a pre~~ ga.rante nosso crescimento e desenvolvi­men~o espírítuaís. O trabalho aproxima-se bastante dao!açao quando é realizado não exclusivamente com ofito ,!-e. mant~r a VIda, mas quando inclui também umproposIto mais elevado. A representação artística tea­tral que expõe algum ideal pode, conseqüentementeaprO~lffiar-se bastante da oração. Esta tem condiçõe~~e altar-se bem de perto ao trabalho. A elaboração deídeats, como ocorre tantas vezes no devoto fervorosopode ser um trabalho tão pesado, ou até mesmo matspesado, do que o trabalho braçal. Poderá envolver ouso completo de todas as nossas energias. Os conflitosque s?r~em no trabalho 'e na oração são representadosna ~Imica, ?~ drama e na dança. Na antigüidade, apoesia dramatIca e a dança associada à música origi­naram-se da adoração; ainda hoje em dia é a verdadeira

146

T··"..,~, -

t,,I

ordem de desenvolvimentos. No alvorecer do pensamen­to filosófico, todas as formas de arte compunham umaunidade; atualmente, constituem disciplinas separadas.Mas mesmo hoje em dia o drama às vezes se asseme­lha à dança e esta àquele, noutras oportunidades. Aspalavras podem estar repletas de música e movimento,ao passo que a dança e a música estão muitas vezes car­regadas com as idéias que as palavras traduzem. En­contram-se vestígios da mímica, na era contemporânea,nó teatro de marionetes, nas cenas de palhaços de circoe nas pantomimas, mas, além dessas modalidades deteatro, há ainda material suficiente para estudar-se omovimento visível no drama e no balé.

Verdade é que os movimentos de um ator ou de umcantor são raramente observados pelo público atual. Éponto pacífico o fato de o atar ou cantor ter de se des­locar de um lugar para outro, vendo-se obrigado àsvezes a sentar-se ou levantar-se, ou ainda cair no chãoou nos braços do parceiro, ou em outras situações, exi­bir gestos expressivos de seus sentimentos. Se os mo­vimentos e gestos do ator não forem muito desajeita­dos, pouca atenção consciente lhes dará O público. Háquem considere o movimento muito menos importantena representação teatral; para tais pessoas, o cenário,a cor, a iluminação e o guarda-roupa significam muitomais. A falta de estilo no cenário e no guarda-roupa écriticada com severidade muito maior do que o é a faltade estilo na movimentação. O colorido bizarro e atraentedo pano de fundo obscurece a inexpressiva rigidez doator ou cantor, o qual, não obstante, tem a obrigação deobservar uma meticulosa discrição quanto aos seus mo­vimentos corporais, para ser eficaz. Seria altamente be­néfico para alguns artistas de teatro, além de vantajosopara largas camadas de público, que todos eles reconhe­cessem o fato de que a expressividade efieiente e o con­trole de movimentos é uma arte que pode ser dominadaapenas pelos indivíduos que aprenderam o modo de darlivre curso de expressão aos seus movimentos.

147

Page 76: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

o di~logo, no drama, e a letra de uma música po­dem explicar- todo acontecimento, sentimento, sensaçãoe emoçao; a palavra falada pode ser eficientementecomunicada pelo rádio. As pessoas apreciam o dramaradiofónico e poucos são os que deixam de assistir aosdramalhõ~s apresentados de modo bem visível seja nopalco, seja nos filmes. Sem dúvida, o ouvinte de umprograma de rádio é o que menos sente falta do mo­vimento visível, pois encontra-se perfeitamente feliz emescutar os movimentos audíveis das cordas vocais doartista e em ouvir as palavras. O movimento audíveldas cordas vocais torna-se quase que uma danca noc~nto. A semelhança da dança, arte extremamente 'mu­sIc~l, o canto apela mais à emoção do que ao intelecto.EVldenteme';lte, o balé não tem condições de dispensaro desenvolvimemo total de movimentos corporais vísí­veis. Conquanto a música seja parte essencial do baléa músic::a de balé quando transmitida pelo rádio nã~prOp?r~lOna o m~smo prazer de se ver o balé no palco.A I!lusIca de bale de boa qualidade, que por si mesmasatisfaz o ouvinte, aproxima-se ao máximo da músicapuramente orquestrada, na qual as impressões visuaisdo movimento são desnecessárias. A música orquestra­da e a de concerto, em geral, não pertencem às artesteatrais, apesar de a música desempenhar um papel fun­damenta! ~a ópera. É interessante observarmos, porém,que a rnusrca orquestral é produzida pelos movimentos,?orporais os mais precisos, por parte dos músicos. Nãoe tao importante vê-los, conquanto muitas pessoas te­nham forte satisfação estética com as gesticulacões deseus maestros prediletos e com os movimentos dos ins­trumentistas. Entretanto, os movimentos dos músicossão, em geral, tidos como movimentos de trabalho nosquais a habilidade é mais importante do que o de~em­penho estético.

Segundo já mencionamos acima, a arte teatral damímica é aquela em que o movimento corporal é todo­poderoso. A mímica é uma forma de arte quase desce-

148

nhecida no mundo contemporâneo. A abordagem maispróxima da mímica era o cinema mudo, antes dos "f~­

lados". Quando a música ?e acomp~~ha!llento combi­na-se intimamente aos movIme~to~ vIsIveIs,n? palco outela, pode-se falar de dança-mImIca, que e rntrlIl.se~a­mente diferente da dança, num cer~o pont? A ~rmcase vale de uma linguagem gestual diferenciada, língua­gem que pode ser rel~t~va~entebem-traduzida em ,p~­lavras. Diálogos e solilóquios transpostos para a mirm­ca podem ser entendidos e descritos verb~l!llent~: pelomenos quanto aos seus elementos eSS~nCIaIs. Diálogoscomo tais são raros na dança, onde a srnuosa beleza domovimento, com sua música de acomp~nham,en~o, seconstituem no principal meio de expressao artística. Éda mesma dificuldade descrever uma dança em pala­vras e interpretar verbalmente ?ma mUSICa..

As tentativas de se descobr.ir um denormnador co­mum para o significado dos movimentos no drama fala­do e na dança, já provocaram muitas dores de cabeça.Não faz assim tanto tempo que a moda de rep:esent~rde modo abrupto se transformou de uma gestIculaçaopomposa num naturalismo destituído de toda e qualquermovimentacão expressiva. Os dramaturgos, atores eprodutores-cansaram-se da exagerada e d~nçada mo­dalidade de representação teatral de uma epoca satu­rada do sentimentalismo melodramático e se voltarampara a imitação, no palco, ~a vida do dia-.a-d!~. ~oram,porém, incapazes de apreciar os quase ,rnVlsIveIs mo­vimentos da mais sutil tensão inerente a conversa ?eduas pessoas no cot~di.ano, o que re.s?ltou n~~ estilomorto de atuação, orígínado da ímobíltdade cemca poreles cultivada. Essas tentativas de se comportarem d~modo naturalístico resultou num teatro vazio d~, ~OVI­mentos. Dado que essa passividade não consegum rnte­ressar o público, declinou a procura pelos teatros. ~splatéias se desapontavam porq~e a cOl~a ,que ?eseJa­vam ver lhes era recusada. Desejava o publIco. n.ao ape­nas ouvir, mas também ver a expressao dos varres con-

149

Page 77: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

P5

flitos decorrentes da busca humana por valores espiri­tuais, emocionais e materiais; e acontece que est~s con­flitos expressam-se o mais claramente possível no movi-mento. '

Uma vez que nem o velho e falso melodramatísmo,nem tampouco o novo e aborrecido naturalismo conse­guiam satisfazer a justificada expectativa do públicoos artistas mais experientes tentaram retomar as fonte~da expressão teatral. Uma das idéias centrais era a deque um ator jamais chegaria a uma organização de per­sonalidade, tal comoa que é necessária para a represen­tação teatral, sem haver anteriormente experimentado oabandono total frente à necessidade apaixonada do serhumano de movimentar-se como o atestam a mímica ea dança. A tensão interior, característica da arte tea­tral, foi tida como útil no sentido de conferir vitalidadeao movimento morto do balé tradicional. Em ambos oscasos - na nova arte da dança e na nova arte de re­presentação - voltaram a ocupar o lugar de honra asregras fundamentais da antiga arte da mímica. O teatroestá morto quando neglícencia-se a mímica e com elaa significação dos movimentos.

As pesquisas preliminares e os sucessos desta novaatitude perante o domínio do movimento no palco teriampermanecido problemáticas se um í'ator novo não tives­se contribuído na ampliação dos horizontes, no mo­mento adequado. Surpreendente quanto possa ser, onovo fator é o movimento que se observa na indústria.Este fato talvez torne-se menos estranho se considerar­mos que, ao longo de toda a história, o movimento nopalco inspirou-se nas ações ocupacionais da parte maisnumerosa da população: os operários. Falando em ter­mos gerais, houve bem no começo da História, a ins­piração que o ator e o dançarino derivavam de rituaisreligiosos, para sua movimentação. A seguir, o cerimo­nial das cortes imperiais e os exercícios de cavalariaderam o modelo das danças, bem como forneceram en­redos e estilo de movimentos para o drama. E, atual-

150

mente, a revolução industrial ofereceu todo um conjun­to de novos conceitos estéticos de beleza. para as artesem geral, pois o recém-adquirido conhecímento da mo­vimentação do operariado levou o pessoal de teatro paraum novo tipo de domínio do movimento. Os process?sde treinamento da habilidade e eficiência na ind~strIamostram muitos aspectos paralelos aos novos A metodosde treinamento do artista de teatro conteml?oraneo.

Aqui há um fator de capital ímportãncía: a, ~esco­berta dos elementos do movimento. Seja o P!Oposlto ~~movimento o trabalho ou a arte, isto não Importa, ja

que os elementos são invariavelme.nte os mesmos. Aabsoluta congruência entre os movimentos do homemno trabalho e nos seus movimentos expreSSIVOS se cons­titui numa revelação impressionante. .

Os movimentos de um ser vivo servem-lhe, em prr­meiro plano, para que assegure o cumprimento das s,:asnecessidades vitais. Esta atividade pode ser resu:md~por completo em um único vocábulo: trabalho. Nao soos homens mas os animais todos trabalham ~m busc?­de comida e de abrigo, na caça, na co?,struçao de n~­nhose no cuidado dispensado à prole e as. suas necessi­dades pessoais. O trabalho envolve conflitos: Os seresvivos lutam com seu meio ambiente, cO,m ~OlS~S J?ate­riais com outros seres e com seus propraos ms~mtos,capa'cidades e estados de espírito; a estes co?~hto~, ohomens acrescentou a luta pelos valores eSPITIt,:aIs emorais. O teatro é a tribuna na qual. a.luta no seio dosvalores humanos é representada arbsb~~m~nte.

Na arte da mímica, os movimentos vIsIve:s do C;orp?são usados como os únicos meios de expressao; e e ~~­dente que as ações de trabalho repres~entad::s,~a mirm­ca sempre se constituem em expressao de idéias, des­tituída de qualquer propósito prático real. Um ator podeacender fogo a fim de transmitir a idéia de que o apo­sento no qual está representando está frio. Ele poderaestar representando num belo dia de verão, no qualfaz-se desnecessário o aquecimento pelo fogo; ele, con-

151

Page 78: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

tudo, o faz sob a determinação do dramaturgo, com ointuito de mostrar que está com frio. Seus movimentosconsistem de ações corporais, como o pegar achas delenha, talvez quebrando-as, jogá-las na Iareír-a. Ele tre­me, sacode os ombros, bate em seu corpo com os própriosbraços, para aumentar a circulação sangüínoa, tudo istoao nivel do faz-de-conta. Na realidade, ele até poderáestar suando e talvez preferisse recostar-se para di­minuir sua palpitação do que continuar a acelerá-la comos exercícios. Os movimentos naturais de trabalho numacena assim são uma óbvia imitação de ações de tododia, tais como as que se usam para acender um fogo.O fato surpreendente, porém, é que esses mesmos, mo­vimentos podem ser empregados COmo movimentos ex­pressivos.* Os movimentos executados quebrando ma­deira são golpes repetidos, usando os antebraços. Élógico que executamos movimentos semelhantes comoresultado de uma excitação interna, sem o machado ea madeira, para significar o desejo de extinguir a causada excitação, como alguém tentaria exterminar um ini­migo. A ação de lançar ao fogo a lenha pode ser repe­tida com exatidão e destituida dos acessórios materiais,num gesto expressivo de rejeição de uma idéia ou pro­posta desagradável. Um movimento parecido ao riscarde um fósforo pode exprimir uma decisão mental pre­cisa e súbita.

São incontáveis os exemplos de movimentos da vidacotidiana que podem ser aplicados à expressão de es­tados mentais e emocionais; há, porém, uns poucos(pressão, soco, torcer, talhar, deslizar, pontuar, sacudire flutuar) que são ações básicas de um operário e, aomesmo tempo, movimentos fundamentais à expressãomental e emocional. Os sons e palavras são formadospelos movimentos das cordas vocais, os quais origínam-

*Aconselhamos o leitor a executar os movimentos descritos neste capítuloe nos seguintes. O domínio do movimento só pode ser alcançado através daexperiência corporal (exercícios nos quais as ações são experimentadas repe­tidamente). Não é necessário o uso de objetos ou materiais, já que estes podemser imaginados. A ênfase principal sempre recai na ação corporal.

152

acões básicas. Os sons podem ser pro­se das mesmaa aç co ou outros movimentos das cor-~~~ie~~~~rePi:~~~~~~~arem acentos de PJessão, \so~~Tais acentos são expressivos do estado e esprri oterno da pessoa que fala. . . t r ro-

A título de experiência, o leitor poderia ten a r .. I ra "não" com o objetivo de exprrmrr

nl;1n~Iar a pa aVd e significado; facilmente reconheceravarras nuances ode dizer "não" dos seguintes modos,o fato de que p . d lidade de som e uma ex-cada qual produzm o uma qua .pressão diferente: .

"não" com "pressão": firme, sustentado e di;eto."não" com "sacudir": leve, rápido e flex~vel.

"não" com "torcer": firme, sustentado e ~lexIveI.

" - o" com "pontuar": leve, rápido e.direto."rião" com "soco": firme, rápido e direto. ,"não" com "flutuar": leve; sust~n~adoe flex~veI.

- " "talhar'" firme rápido e flexível."não com ., . t- "não" com "deslizar": leve, sustentado e díre o.

Ao acompanhar cada uma destas expres~õe~ s~noras

st dotado da qualidade de açao índícada,c~:t~~o~~~i~ntizar-se-áda associação entre movimen-o ., .tos audiveis e VISIveIS. . _

A descoberta de elementos de movimento _que sao

idênticos ta~to no ~rab~h~i:i~~t~ç~~e::r:~~fn::~~~uma nova .u;-: ~o re O '<t',· r e o bailarino certa­audiveis e VISIveIS no teatrovC a o. . d ta-mente beneficiar-se-ão com o cOJ:~hecn~ento ~:~~zi: oslhado dos movimentos, o que osajudará a rep do que o

ens conflitantes. Mas, do mesmo mo .

~r~~~;~rnda ~ãf é ::~~;~ ~ed~~6~~fna:::r~0 ~~;~~i~~=çao de su~ pa e a, m mero esboço das ações básicas e

~: ~~a~~~~:S~f~~~~~S' ~ art~;:S~ã~ b~~:::~~e~:~n~~i~:o~~t~~~od~o:~v'f~~~toed~xque nu~a análise conscien­te do mesmo.

153

Page 79: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

.'

o.'

A observação e a assimilação das característicasde movimento de uma pessoa são análogas ao relem­brar de um tema musical. Se a pessoa tem condições derecordar uma ária, sendo capaz de reproduzi-la men­talmente, será mais tarde capaz de discernir tonalida­des e ritmos isolados, detalhadamente. Será capaz, semdistorcer as proporções de força, de duração, do COm­primento e de outras peculiaridades da fluência da mú­sica, através de uma memória musical herdada ou bemadquirida, de escrever, discutir e analisar a ária. Ahabilidade para observar e compreender o movimentoé como um dom mas, como na música, também é umahabilidade que pode ser adquirida e aperfeiçoada pormeio de exercícios.

É essencial àqueles que estudam o movimento nopalco cultivarem a faculdade de observação, o que é demuito mais fácil consecução do que geralmente se acre­dita. Os atores, bailarinos e professores de dança usual­mente possuem tal capacidade como dom natural, aqual, no entanto, pode ser refinada a tal ponto que setorne inestimável para os objetivos da representaçãoartística, É óbvio que o procedimento do artista ao ob­servar e analisar o movimento e depois ao aplicar seuconhecimento difere em vários aspectos do procedimen­to do cientista. Mas é muitíssimo desejável que se dêuma síntese das observações artística e científica domovimento já que, de outro modo, a pesquisa sobre omovimento do artista tende a especializar-se tanto nu­ma só direção quanto a do cientista em outra, Somentequando o cientista aprender com o artista o modo deadquirir a necessária. sensibilidade para o significadodo movimento, e quando o artista aprender com o cien­tista como organizar' sua própria percepção visionáriado significado interno no movimento, é que haverá con­dições de ser criado um todo equilibrado.

154

CAPíTULO 5

.RAÍZES DA MÍMICA

A tal como é vivida e refletida m,. espelho X~VIDA, • te de uma cadeia de acontecimentos, -

P~~sod~~~~~~ da cadeia, situações ou ações específicas,~ão mais importantes que o,utros: Os dramaturgo.~~ ~~reógrafos selecion:;~ as sltuaço~s e at~frii~;d~ s;breser os mais necessarios aos seus emas, , em

.. tlight" do palco. Isto tudo quer dizer que,eles o spo 1 1 r dades do mo­termos de ações corporais e fa a, as qua 1. 1 dinâmica

. ento dotadas de uma estrutura espaciai, 1.

Vl~ mica são de importância especial, na ~edlda eme nt, . t rmédio que a representaçao torna-~equ~ e por seu m ~ arte criativa do trabalho do artis-~:tl~~~~td~::~eemalívida ser adaptada ao ~o~teú?o ~~peça ou, pelo me~o~, acompanhar um e ermma.. ript" ou composlçao. _ tse O público tem necessidade de~ta articulaçao endr~nsamento sentimento e acontecimento. Trata-se. a

~~ilo que a platéia deseja essencialmente ver e eXJ?:ne~~' osto ue o curso da vida nem sempre perrm e-n~:~'e~plarqa origem e as conseqÜênC~~s,~~ t~~o:~:t~O:~sos atos Desta forma, temos uma lVlara co~ o dramaturgo e para com os atores q~e espe­

fham para n6s estes acontecimentos. Vamos ao cl~emateao teatro para vermos á vida human~, confortave r:::~~

sentados em preguiçosa co~t~mplaçaot~ ~:::t~vidade

~~OSSo~t~t~~v=~~~~t~,a~~~é~,~~~~e~~~ intensificaçãour~ e simples do movimento expressrvo. Os exageros

~a intensidade podem provocar uma r~presentaçaeocfs~~çada e isto deve ser naturalmente evitado. A pr

155

.iit.iiii•• .l.. ........="==='

Page 80: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

I~,

,.,,,'

e a clareza d<;t for~a do movimento são mais importan­tes do que a Intensidada da representação teatral.

O home~ demonstra, por intermédio de seus movi­X"?entos e açoes, o de;sejo de atingir, certos fins e obje­tivos. Podemos referir-nos a estes ultimos como sendovalores, tanto de natureza material quanto espiritual.O espectado: de teatro, consciente ou inconscientemen­te, busca orientar-se quanto aos v:alores pelos quais ohomem lu~a em vária.s situações. Ver, no palco, a re­presen~açaodas lutas mternas do homem é um processoeduc;atl:ro para todos os que não são completamente ín­sen~lVeI~ as condições da vida e do destino humanos.Se IS~O e verdade para o espectador, certamente o étambem. p!'ra o ar~ista. Este deve saber como espelharas condições da vId~, bem como seu resultado prová­vel, por meI~ de atltudes corporais selecionadas e" dealgumas qualidades de movimento; não fosse assim, osvalores que ele deseja transmitir permaneceriam irre­conhecíveis. O artista tem que aprender a ler e a de­monst:-ar o comportamento das pessoas que encontra.~eve .:gualmente ser capaz de imaginá-los "em váriasaituacões. devendo ainda adquirir a arte de expressara busca humana de valores, através "do movimento.O~ enr7dos_de peças e coreografias podem estimulara imagmaçao do ator ao lhe apontar situações e confli­tos: mas é o própr-io artista quem deve selecionar e en­fatizar. ~s movrmentoa capazes de colocar os valoresesse~cIaIs numa adequada perspectiva. -Tudo o que aci­ma dissemos pouco tem a ver com a psícolegía tal comose a entend.e eX"? geral. O estudo das lutas humanas ul­trapassa o ~mbIto da. análise psicológica. A representa­çao por mel(~ <:le movimentos é uma síntese, ou seja, umprocesso. unIfIcador que culmina na compreensão dapersonalidarín apreendida no sempre-mutante fluir exis­tencial,

Aquelas pessoas que passam ao largo dos outros ho­men,s, Ign?r~n?o ~eus conflitos, sofrimentos e alegrias,peruern sígnífícatíva parcela do sentido da vida e do

156

que ela oferece. Perdem a oport~n~dad~ de e~perienciaraquilo que se oculta sob a superfície exístencial, tenden­do a ignorar o teatro, no qual são reveladas essas cama­das mais profundas. Estas pessoas não percebem a sig­nificacão dos indivíduos e das situações, e para elas omundo freqüentemente não passa de um amontoado deacontecimentos sem sentido. O ator-bailarino não traba­lha para este tipo de pessoa e, por seu turno, deve acau­telar-se para não se deixar cair na mesma indiferença. Apessoa que não se interessa pelas lutas interiores de seuscompanheiros não é um ator, talvez não seja nem umser humano. O vácuo existencial que resulta de umatal falta de interesse e de simpatia significa a cegueirafrente aos mais importantes valores da existência hu­mana. Os cegos estão, em grande parte, afastados davida que os circunda e de boa parte de seu significado.Estes infelizes não têm condições de apreciar a con­tento a grande variedade que o fluir da vida e seus va­lores têm a proporcionar. Apesar de imersos nela, a par­te que os que não vêem desempenham na vida circu,ns­creve-se à sua limitada capacidade. Devemos, porem,acrescentar, que os cegos freqüentemente desenvolvemoutras faculdades muito surpreendentes, quevservem aeles e à comunidade. Os indivíduos de visão interior têmconsciência do fluir da vida, a que podem emprestaruma contribuição criativa. São pessoas ávidas para as­sistir, no teatro, à demonstração dos eventos da vida queenriquecem sua compreensão das situações, dos perso­nagens todos e dos relacionamentos.

Não há acão humana destituída de conseqüências.Um ato realizado uma vez perpetua-se ao infinito numacadeia de eventos que jamais teriam ocorrido não fos­se por sua responsabilidade. "As coisas são o que sãoe as conseqüências serão o que serão", conforme já di­zia Butler, o grande escritor inglês. O homem vai crian­do o seu destino mais ou menos conscientemente, masos atos e omissões de seus companheiros interferem emodificam a luta criativa particular do indivíduo. O

157

Page 81: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

choque de personalidades em determinadas circunstân­cias traça um desenho extremamente complexo, cujocontorno altera-se continuamente. Paixões em conflitoternuras que conquistam, parcialidades violentas e he­sitações ansiosas criam um labirinto de relacionamen­tos que não tem condições de ser completamente dese­'!laranhado ou entendido apenas pela análise intelectual.E um privilégio da arte teatral auxiliar o espectadora compreender os atas vitais em sua complexa pleni­tude, despertando nele a capacidade de associar estelabirinto de ações ao seudesejo inconsciente de valores.As pessoas lançam-se em busca de algo que lhes sejavalioso. Esse valor pode ser material, moral ou espiri­tual mas é sempre um valor. O desejo dos valores geraconflitos tanto ao nível da vida interior do indivíduoquanto no mundo externo, entre pessoas que cultivamvalores diferentes e incompatíveis.

O dramaturgo e o artista, o músico e o bailarino, con­frontam o espectador com situações e ações nas quaisa grandiosidade ou pequenez da luta pelos valores, bemcomo a qualidade dos valores pelos quais se luta, evo­cam a participação de outros parceiros. O espectadoradota uma atitude interna com relação àquilo que vêe ouve. Em casos extremos, chega a amar ou odiar (ou,talvez até mantenha-se indiferente), não o ator ou o per­sonagem por ele representado, mas todo o complexo devalores envolvidos na seqüência dramática. Mesmo emsituações cômicas que suscitam divertimento, emergemfortes tais atitudes internas decisivas, referentes aos va­lores. Os movimentos do corpo e os sons vistos e ouvidosno palco mexem com a imaginação e provocam o desejode olhar com olhos abertos aquele mundo vagamentediscernível dos valores humanos. Eis aí a razão para oteatro: o desejo de travar relações com o universo dosvalores. A pergunta à qual o dramaturgo e o ator devemresponder, porém, não é: "o que é valioso no transcur­so da vida?" mas, sim a seguinte: "como é que a buscade valores, responsável pela elaboração de modelos de

158

imentos da ação. interferem e se misturam nos des-mOV • ivid .?"tinos coletivos e índiví uais : • -

Por sua natureza, o teatro e um espelho e nao uma. tituicão passível de julgamento moral. O valor do tea­~~~ con~istenão em proclamar regras de conduta para osseres humanos, mas em sua habilidade para de~p.ertar

t. do espelhamento da vida, a responsabIlIdadea raves· _

essoal e a liberdade de açao.p A nossa forma atual de civilização tem talvez .umanecessidade maior do que qua~quer m;na _das anterioresde ser despertada em relação a apreclaçao dos valores.A velocidade da vida moderna não s~ mostra-se P5lu~oadequada a uma tranqüila contemplaçao, ~omo o proprio

nso dos valores parece estar se atrofIando constan­~:mente. Muitas das antigas instituições que se empe­nharam em guardar o tesouro moral dos valores ~asleis eclesiásticas e civis estão atualmen~e de~acredIt':l.­das fazendo com que o indivíduo se veja mais e marsaba'ndonado às suas próprias decisões.. para trabalharo desenvolvimento de sua responsabilIdade pessoal:

A arte teatral emprega os movimentos corpo:ai~ edas cordas vocais com o fito de espelhar a~ tendencIa~

relacão aos valores, bem como os conflItos que d.ai~:orrem. O anseio pelos valores é revelado p~lo artis­ta no palco segundo a movimentação expressIva, querdi~er, por ~eio dos movimentos corporai~ e me~taIs:Aquilo que o movimento deve esclarecer e o segumte.

1) os caracteres das pessoas representadas;

2) o tipo de valores pelos quais elas lutam;

3) as situações que se desenvolvem desta luta.

Relativamente ao primeiro item, pode-se dizer qu~ acaracterização pode ser menos re~inad~, ~presentan .0­se tí ica da massa, e também mais sO~lsticada, r-olacío­nanJ'o-sea um único indivíduo. A cobiça e o. n:odo fur­tivo de um ladrão, por exen:plo, podem ser tiPlCamero~~representadas por mãos Crispadas, com dedos na

159

Page 82: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

t

"'-~I,

~"

C:,.,.

"I:'"

... '

ma de garras, enquanto os braços e o restante do cor­po mostrar-se-iam contraídos, de maneira sustentada etorcida. Este quadro contrastaria, então," com a movi­me-?tação leve e livre da vítima, o homem inocente, quesena apresentado de modo mais típico, com uma pos­tura corporal direta e descontraída.

É evidente que pode ser mostrado um trecho qual­quer da história da vida de uma pessoa, através deênfases deste tipo ou de tipo muito mais característico.Variam ao infinito as circunstâncias e a disposição in­terna que levam um homem, ou uma mulher, a roubar.a atar-bailarino deverá fazer um minucioso levantamen­to das particularidades do personagem por ele repre­sentado, formulando as seqüências de esforço e o en­redo dramático de conformidade com elas. Em termosde raciocínio por movimentos, a cobiça do ladrão, queacima caracterizamos superficialmente pelos punhos,garras e movimentos de torção, pode decorrer de qual­quer padrão de combinação de esforços. Pode, porexemplo, evoluir de uma atitude fundamental na qualse evidencie a luta contra- o Peso e o Espaço, sugerindoconseqüentemente um tipo de apatia e teimosia à guisade disposição geral. Através do ritmo particular de re­petidas ocorrências e variações do caráter do esforçobásico, bem como através de afastamentos deste esfor­ço básico, a personalidade do ladrão ganha profundida­de em termos de seu esboço, sendo possível indicar-seo seu desenvolvimento. A imaginação de movimento doator-bailarino poderá descobrir múltiplas combinaçõese seqüências de expressões de esforço diferentes, a fimde retratar a natureza específica de vários indivíduosdesonestos.

"Uma caracterízação mais complexa do homem ho­nesto conterá eventualmente características de esforçoscompatíveis com a facilitação e até o encorajamentodo esquema necessário à caracterização do ladrão. Arepetida ocorrência, nos esforços do homem honesto, deuma fluência progressíva, de uma maneira vagarosa

160

T"',.-".-.

Idireta poderá facilmente levar o ladrão a desen:rolver

racterísticas opostas que acentuem a sua f'alsídade.~~r seu turno, reagindo à desonestidade: o ho~em ho­

sto pode muito bem ser levado a mamfestar Ira: as­~i~ transformando seu movimento direto para o firmeenroscar de uma ação de torcer, e espremer.

a segundo item, relatívo ao tipo ~~ valor~s peloqual a pessoa luta, nos compele a classIfIc~r tais valo­res. Em primeiro lugar, cabe uma orde~a~ao de cunhogeral. A luta por valores ou bens materiais pode gros­seiramente ser confrontada com a luta por valores es­pirituais ou mentais. Ainda empregando" o noss.o exem­plo de honestidade e desonestidade, podemos dizer queos bens materiais são valiosos para o homem honestoe para o desonesto; ambos respeitam a pr?priedade, m~so homem honesto valorizara mais a }dem da proprre­dade do que a de sua aquisição. a ladrão, por outro lado,que ambiciona a propriedade de outra pessoa e subse­qüentemente dela se apodera, o faz P?rque o ,seu valoré o ganho material. A idéia de propnedade e um con­ceito legal e, como tal, uma possessão intelectual oumental. Transforma-se num valor espiritual quando odefensor do direito legal à propriedade deseja protegera pessoa roubada daquele que ~ .esp?liou,. e quando ?motivo fundamental para tanto e justiça aliada a COmI-

seracão. o.. •

Temos aqui três espécies de valores pelas qUaIS 1I;spessoas podem lutar e cada ~EDa delas exigira um me­todo diferente de apresentação pelo movimento. a con­junto básico de combinações de esforços empregado emcada caso revelará uma ênfase diferente e uma escolhaparticular das áreas corporais encarregadas de carac­terizarem a expressão, ou seja, maos, ro~to.' tronco epernas em gestos, porte e passos característicos. Tam­bém haverá toda uma maneira diferent:. de desdobrartais segmentos no espaço, tanto em relação a SI mesmo,ou seja, em relação à forma dos gestos e da pos­tura corporal, quanto em relação aos arredores rme-

161

Page 83: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

díatos, quer dizer, aos desenhos de locomoção.O defensor dos seus direitos e posses poderá chegar

a uma luta verdadeiramente corporal com o ladrãoImpelido pelo desejo de reaver o objeto roubado, se~arranjo de esforço (III) poderá assemelhar-se bastanteao do ladrão. Mas se ele estivesse defendendo os direi­tos ?e outra ~essoa e lutando devido à pena e à indíg.naçao que estivesse sentindo, a princípio não se envol­veria numa verdadeira luta física. A veemência de seusmovimentos, neste segundo. caso, tenderia mais a fluirpara frente livremente nas suas qualidades gestuais degolpear, socar, ao invés de conduzir a um deliberadoape~tão, torção, característicos de uma ação aquisitiva.A diferença principal, contudo, aparecerá na expressãode satisfação quando o larápio for derrotado. O prazerdecorrente da recuperação de um objeto perdido nova­mente estará se mostrando diferente daquele sentidoao _se realizar um ato de compaixão. O impulso para aaçao que tende a ter maior destaque na luta corpo-a­corpo entre o defensor de sua propriedade e o ladrãocertamente ter-se-á transformado em um outro dos ím­petos para o esforço. Isto quer dizer que o fatar demovimento fluência substituirá algum dos demais fato­res, elevando assim o movimento para além' de suaexpr.essão física rotineira, para uma que exponha maissentimentos e qualidades interiores.

Consideremos agora o terceiro item relativo à si­tuação na qual se dá a luta pelos valor~s. Talvez sejamelhor fazermos isso retornando ao exemplo anteriorque havíamos escolhido dentre a infinita variedade deeventos possíveis na vida, a saber, o do homem honestolutando contra um ladrão, pois este exemplo encerra aluta por valores tanto espirituais quanto materiais.

Desta maneira, a cena seguinte apresenta situaçõesque poderão sofrer alguma transformação através dosconflitos, entre vários personagens pelas diferentes es-pécies de valores: '

Uma mulher velha e pobre caminha trôpega pela

162

...,c~~l <-

I,

I

rua. Compra um pedaço de torta de um vendedor am­bulante. Ao afastar-se do carrinho, deixa cair sua bol­sa sem perceber. Um homem que a seguia apanha abolsa, sabendo que era dela, e a coloca em seu bolsopensando que ninguém tivesse visto seu gesto. Depoisvai se reunir aos colegas, na esquina. Descobrindo aperda, a mulher em pânico volta e freneticamente co­meça a buscar a bolsa. Aproxima-se do grupo de ho­mens que estão parados na esquina e pergunta-lhes senenhum deles a teria visto. Estes apenas zombam davelha. Desesperada, vai se afastando, quando é detidapelo ambulante que avança para o grupo de vadios eaponta o homem que, acertadamente, julga ser o la­drão. Este se desconcerta a princípio mas readquire suacoragem, apoiado pelos companheiros. Nesse ínterim,a velha se afastara do local, mas, em meio à discussãoque se seguira, volta acompanhada de um policial. Oshomens que estavam na esquina fogem. O vendedor se­gura o meliante que, por sua vez, atira a bolsa ao pésda mulher, sendo detido neste momento. Rejubila-se avelha mulher, frente à recuperação de seu único te­souro.

Nesta cena, a passagem do tempo criada pela sériede situações permite, por exemplo, que um ator demons­tre a capacidade do vendedor ambulante de sentir pena.Este sentimento terá que ser expresso em seqüênciasde esforço antes, durante e depois do seu encontro como ladrão. Os acentos particulares sobre alguns esforçosespecíficos, a princípio, poderão acontecer na forma demovimentos de sombra que acompanhem as ações devender do ambulante, podendo, a seguir, ser desenvol­vidas como transições de esforços incompletos carac­terísticos, entre suas ações de deter a velha, aproximar­se do grupo de homens e agarrar o ladrão. A satisfaçãopor ele sentida quando a mulher recebeu de volta suabolsa poderá novamente ser expressa por meio de mo­vimentos de sombra que, desta feita, não acompanha­riam nenhuma ação dotada de objetivo mas, sim, qua-

163

.~ ;

Page 84: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

I, 'w,11

'LI.

"

"

~j

.,,'

lificariam de maneira significativa a postura de um ho­mem que conseguiu preservar vivos os valores interio­res da pena e da compaixão.

Deve-se notar que podem acontecer múltiplas va­riações nos temas de roubo, defesa, luta e vitória, re­querendo cada uma delas a cuidadosa formulação daexpressão de movimentos, segundo o valor e a situaçãodo personagem. . .

Há um mérito grande em se inventar. cenas destanatureza e em se tentar experienciar e exibir, atravésdos movimentos, as sutis diferenças de conduta quefluem da natureza íntima do homem e que, por seu tur­no, configuram o conteúdo básico da mímica*.

Proporemos agora algum material para a invençãode mímicas relativas à busca por outros valores inter­nos. A observação consciente e a experiência dos esfor­ços desencadeados no corpo terão grande importânciatanto para o crescimento como para o .refinamento dacapacidade de fazer mímicas, de representar e dedançar.

Tanto um indivíduo bondoso quanto um brutamon­tes violento podem subjugar uma pessoa que seja fisi­camente fraca ou delicada em algum sentido. O indiví­duo bondoso, contudo, respeita a delicadeza e abominaa brutalidade, ao passo que o brutamontes aprecia opoder e suas vantagens materiais, deliciando-se em der­rotar os fracos. É evidente que o bruto terá uma postu­ra corporal bastante diferente daquela exibida por umapessoa amável. Há, entretanto, uma diferença entre asposturas daquele que apenas deseja derrotar sua víti­ma e a do bruto que se alegra ao inflingir torturas es­pirituais, morais ou mentais. Apesar de não haver, nocaso, qualquer relação com um objeto material, se ocorpo da vítima não é considerado como objeto mate-

* o leitor deveria tentar executar e diferenciar a conduta do vendedor:a} como foi descrita no cenário acima, eb ) como provavelmente teria se dado, se a bolsa tivesse sido roubada do

próprio vendedor.

164

rial, há, não obstante, uma diferença. nas lut';l.s pelosvalores que será expressa pelo uso de típos varra.dos deesforços. Trata-se da diferença entre um conflito 'pa­tente e uma sutil tortura a qual se esboça na seguinte

cena: ,. t'Uma desanimada empregada domestica es a arru-

mando a sala e pondo a mesa para seu patrão. Esteentra e senta-se à mesa, ignorando completamente amoça. Esta lhe traz o seu café da manhã e, ~ace ao seuestado de nervos, deixa cair um prato espIrrando umpouco do seu conteúdo no casaco do patrao. Este, fu­rioso, bate na moça, fazendo com que ela se encol~afrente aos tapas. Ao sair correndo da sala, a domes­tica esbarra com sua patroa que percebe a causa daconfusão, mas mantém-se calada, naquele momento.A patroa recolhe os pedaços queb;rados e senta-se. Logodepois seu marido sai de casa; ai chama a empregada.Esta entra aterrorizada mas é acalma:Ia p':.la patroa.Evidentemente, o patrão e a patroa dlferrrao em suaorganização de esforço, não apenas ~o decurso da cenaesbocada neste exemplo, mas tambem em seus mOVI-mentos diários habituais. .

Os personagens de uma peç~ são pessoas comunsque exibem combinações de mnvirnentos de formas es­pecíficas. Os choque~ e,:tre os p~r~onagens e a apre~en­tação das soluções cómicas e ti-ágtcas de seus conf,h~os,que compõem o conteúdo mesmo da arte dramatlca,tornam-se visíveis nas mudanças de comportamento demovimento; e tais mudanças podem, às vezes, cont~rtoda uma estória sem diálogos ou explicações vcrbaís.Quase todas as cenas têm condições de ser executadasdramaticamente com diálogos ou na forma de c~nas deI'n.ímica, sem diálogos. A dança, na qual os movlm,entosfreqüentemente aparecem coordenados ~om a musica.é evidentemente de outra natureza, pois que a dançanão demanda conteúdo dramático. Apesar dlS3?, I:ta umaquantidade razoável de mudanças de cara:tenstlc,:s,docomportamento de movimento, na dança nao-dramatlca.

165

Page 85: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

,,:(I, •_~I~

:~I,

~"

:: C;;1 .... ~

""

As danças históricas, folclóricas e regionais/nacionaissão destituídas de conteúdo dramático e são freqüente_mente .~sa?as no drama no intuito de enfatizar o perío­do estílístíeo da peça, o que muitas vezes é tomadocomo base para o organizado domínio do movimentona representação dramática. As danças não são sim­plesmente encaixadas no enredo ou na estória como sefoss~m uma modalidade especial de entretenimento; omovImento da dança colore as ações da peça, determi­nando os. estilos de seu movimento. A apresentaçãoshakesperIana, por exemplo, foi fartamente influencia_da pelos movimentos das danças da corte elisabetianade origem franco-espanhola, bem como pela dança po~pular daquela época que permeava o espírito de quasetodas as cenas cômicas. Encontraremos nas peças deS!:akespear~, apesar disso, vasta gama de ações e pai­xoes naturaIs que parece exigir, para ser representada,~elo m~nos em alguns lugares, o âmbito- total das con­f~guraçoes de esforços humanos que não sejam influen­cíados pelas restrições de movimentos específicos daépoca.

.Os ~randes dramatúrgos e compositores de balé ja­mais criam seus trabalhos com o intuito exclusivo deespelhar uma época. Retratam eles o homem em Suaeterna lut~: o conflito de suas paixões pessoais e natu­rais restritas pela moda passageira de movimento deuma dada época. O dramaturgo Usa e precisa de ambas~s formas de movimentos, a de um certo período estí­lístico e as, outras, ~ão irrestritas de esforço, formasestas atraves das qUaIS surge o caráter real das pessoas.Toda pess~a tem a tendência de ampliar a gama desuas cap.acldades de esforço, sendo que essa ampliaçãose relaciona ao seu próprio desenvolvimento pessoal.? público, e o dramaturgo por conseguinte, estão muitomteressados no desenvolvimento da personalidade, o quedepende de um aumento na gama da capacidade deesforço.

A observação de esforço, quando a serviço de uma166

~I

caracterização, tem uma penetração nas atitude~ inte=riores do homem que é realizada segundo um ângulodiferente daquele empregado quando se trata da Inves­tigação de períodos estilísticos. Ao estuda.r uma pessoa,o artista logo se apercebe de. q~e. o~ IIl;ovlII~entos .obser­vados variam quanto a sua significância e a sua Impor­tância. Um registro exaustivo de to~a a gamél; de compor­tamento de movimento ultrapassara a capacidade do ob­servador, a menos que se tra~e ele ,d~ pessoa altamentetreinada em determinação sistemática. No entanto, ~

possível aprender-se a observar alguns dos desenvolv~­

mentos mais importantes no comportamento de mOVI­mento de um indivíduo, notando aqueles que se reves~em

de um interesse imediato. Por exemplo, pode ser VIStOque a pessoa em observação tem uma maneira toda suade empregar várias partes de seu corpo, Se}rat~r-s~dealguém que está sentado, chamara a atenção principal­mente a parte superior do corpo: tronco, braço, .maose cabeça, além de várias partes do r_osto. <?s movimen­tos das cordas vocais manifestar-se-ao baslcament~ naboca e lábios, sendo audíveis na ton?-lidade e no ritmovocais. Os movimentos dos olho.s,. pálpebras e_sobran­celhas devem ser objeto de detida consíderação. Pou­sando em inúmeros pontos, em várias díreções, os olhosao se moverem são acompanhados pelo voltar-se, peloerguer-se ou pelo abaixar-se do rosto. Em outras opor­tunidades, a cabeça poderá manter-se imóvel, enquantoapenas os olhos se movimentam.

Os movimentos dos dedos, quan~o.manipulam oubrincam com os objetos, devem ser distmgU1d~s dos da

- Há uma certa vantagem em se desconsíderar osmao. . d t - ,fins objetivos dos movimentos, confman o a a ençao asmãos e outras partes do corpo, independe~temen~e.dofato de a ação executada ser ou não de carater pratico.O caráter das pessoas em ativid~de é m,;lhor expressoem termos de movimentos, ou seja, atraves dos elemen­tos Espaço, Peso, Tempo e Flu~ncia, na medida em quese revelam nas ações corporais. Estes elementos com-

167

_.__.._--_..._----------~~=

Page 86: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

(:'II,I

""I'

"")1

.':1

II

"

portam a chave da com r - d .chamar o alfabeto da li:g~:;saod aqU1l~ que se poderiasível observar e analisa eu: o movImento; e é pos­linguagem. A pes uisa ~ o mOYI~ento em termos destamovimentação e ~orta t a ~nalIse desta linguagem daça só pode ser fU~da n o, a represe~tação e da dan­tíca dos elementos d~enta?a no COnheCImento e na prá­e seqüências bem co mOVImento, de suas combinaçõesAs formas e 'ritmos cr::::fino es~udo de su~ significação.esforço básico de sen ~ur~ os a partir de ações deincompleto e do ímpetsaçoes e ~Ovimento, de esforçobre a relação que a o para mOVImento, informam so­interno e externo s~:ss~~ eJtabelece com seus mundosç.ões interiores refletem~sI u e mental!: Suas participa­lIberadas bem co e em suas açoes corporais de-, mo em seus .que acompanham os p' . mOVImentos de sombranmelros

Pode-se notar que tod . - ,preceder de quatro fas ~s ast çoes praticas fazem-senam visíveis em e es e e~ orço mental que se tor­sivos. Há a fasePdi'~~nos~o~lmentoscorporais expres­e considera-se o objet~n~~o ~rante a ~ual !:xamina-seserá executada' pod açao e a situação na qualdiretamente co~cent:aser executada com uma atençãoou talvez, ainda, com ~a, oUflde, modo. mais superficialcontexto da seqüência nma rz: cIrcunspecção. Nofase é seguida pela faseo~m~ e e_sforço mental, estade forte a leve O tipo d : intenção, que pode variardas em pequen~s áreas c~ enso~s musculares produzi­ção referente à determí r.I~oralS oferecerá a informa­intenção de executar maçao ~a pessoa para agir. Aabandonada antes de s::r~/~?VIr:;ento ativo_ pode sersoa, por exem I e iva a. A atençao da pes­esteja sobre a ~~s1o~e ser atraída .por um livro quede pé, olha diretam~nt pessoa ap!oxlma-se da mesa e,sua intenção de lê-lo oe pa~a o Iívro. Torna-se visívelcular em seu tórax ~ ~e;meroge ~ma cer!a tensão rnus­move-se SUavemente nac~1~~ _eCIde p.ega-Io e sua mãode o apanhar, lembra-se d Içao do lIvro, .mas, antes

e a guma outra COIsa que tem168

de fazer. Não tencionando mais ler o livro, deixa cairo braço.

Neste exemplo, nós já introduzimos a fase seguinteque é a da decisão. a qual, neste caso, foi evidenciadapela súbita sacudida da mão. Pode-se igualmente, e éóbvio, chegar gradualmente a uma decisão que se tornevisível num mexer mais sustentado, lento, em alguma pe­quena região do corpo. Antes de ter início a ação objetivahá ainda uma outra fase passível de ser observada e que,a título de tentativa, pode ser denominada de a fase deprecisão. Trata-se de um momento muito breve de an­tecipação da execução da própria ação a qual, muitofreqüentemente, se não for familiar, está altamente con­trolada por um esforço de fluência controlada ou, casocontrário, apresenta-se descontraída carregada de fluên­cia livre.

Estas quatro fases constituem a preparação subjeti­va da operação objetiva e, em sua maior parte, estãomuito fortemente condensadas, podendo depois sertransferidas (ou em parte ou totalmente) para a açãoque concretiza a tarefa. No entanto, pode ser que asquatro fases ocorram ao mesmo tempo. que sua seqüên­cia seja inversa, variada ou complicada, ou até mesmoque uma ou outra das fases seja omitida.

Os movimentos de sombra nos relatam o andamen­to de tais processos interiores e boa parte dos movimen­tos mais característicos de uma pessoa são aqueles porela realizados inconscientemente, os quais precedem,acompanham ou são a sombra das ações planejadas, Oindividuo pode se coçar, esfregar o queixo, apertar onariz, sacudir ou contrair os dedos; ou ainda executaroutros gestos vagos, destituídos de significação práticadefinitiva, realizados apenas pelo movimento em si.Podemos referir-nos a tais ações como gestos subjeti­vos. Há outros tipos de movimentos como, por exemplo,acenar a cabeça, apontar com o dedo, piscar, acenar amão no ar, que substituem as palavras "sim", "aqui","ali", "olhe", etc. Denominamo-los gestos convencío-

169

Page 87: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

nais. Todos estes gestos, em geral, manifestam um es­forço incompleto e apenas sob condições de excessivaexcitação é que surgirão em sua totalidade como todauma graduação de soco, deslizar ou outra ação básica.

Os gestos convencionais; os movimentos de sombrainconscientes e as ações expressivas e funcionais exe­cutadas deliberadamente apresentam-se misturadas nocomportamento de um indivíduo, da maneira mais com­pleta. Podem aparecer em qualquer modalidade de se­qüência, havendo a possibilidade de ocorrerem simulta­neamente vários tipos de movimentos ou ações.

A compreensão do movimento vem por intermédioda descoberta das atitudes que prevalecem em relaçãoaos fatores de movimento, ou estão ausentes, numa da­da seqüência de movimentos. Um mesmo elemento podeestar presente em quase todas as ações, enquanto queoutros eventualmente ocorrerão apenas em algumas de­las, ao passo que outros ainda talvez estejam ausentespor completo. É como se alguém pudesse afirmar: estequadro é basicamente azul e aquele outro, basicamentevermelho. Pode haver no quadro azul, porém, manchasde outras cores, talvez até de vermelho, enquanto queoutras, como oamarelo ou o verde, possivelmente, es­tejam faltando. Isto quer dizer que, apesar de a expres­são pelo movimento de uma pessoa ser governada poruma modalidade de ação, por exemplo, deslizar, aindahá a possibilidade de estarem presentes outros tipos deação, em particular os mais próximos ao deslizar, taiscomo pressão, flutuar e pontuar. As qualidades opostas,talhar ou golpear, podem ser principalmente vistas nosmovimentos compensatórios, executados de modo incons­ciente.

A natureza preponderante naquela ação e sua som­bra podem ser observadas, ou nas reações da pessoa,diante de situações específicas, ou em sua conduta ha­bitual de movimento. Certas reações serão muito im­prováveis para algumas pessoas, ou pelo menos excep­cionais, mas raramente serão de todo impossíveis.

170

-TZ - , -

T

\i~.

de ver uma pessoa lenta ou rela­~emos pouca chan~a conduta heróica ou ativa, e~cetotIva~ente frAac~ nuextraordinárias. Atingimos aqui umem clrcun~tanclas a ossibilidade de alterar a com­pon~o_crucl8:l, \s~ber~sf!rÇOS.Mudanças vagarosas p_o­pOslçao habItua os via de uma compreensaodem ser levadas a cabo àO~itmo dos padrões habituaisconsciente da estrutura e o 1 uns destes poderão estarde esfor~o da pes:o:~ ::~eadffícil modificá-los, ampliá-tão enraizados qu , los por outros.los e, conseqüentemente, troca- um ator tem não ape-

Ao retratar um person~gem~ organizacão geral denas que ser c:apa z de espe a~omo também ter a habi­esforços do dIto per~t?nag~~enrolardas suas atitudeslidade para tranSml Ir o os acontecimentos da peça.internas, no transcurs~n:er_se_ãopossivelmente malte­Alguns personagens m d ti trágíco ou cômico para

gí ando um es lno . 'rados, pressa 1 1 - um sentido tanto POSItiVO quan-si. Outros desenvo verao d t cão às novas situações oto negativo, se~do sua a aP

Aa~ste respeito, a alteraçãoaspecto essencIal da; peça. esforcos nas várias postu­da organização hab~tual ds~ituir-s~-á no meio essencialras e ações corPdora~\cO~ar mão para elaborar sua ca­de que o ator po era an., _ e' uma arte e à parte

. - A caractenzacao '.racterlzaçao. . " á muitos fatores que deter~-a verdade pSlcol~gIca,~ rtista das seqüências defml­nam a escolha feita pe o a a rimeira e intui­tivas de movimento e es~orço~t~rmb~~ ~omo o bailarinotiva abordagem do papeb o do as seqüências particula­poderão não estar perce en escolheram Durante ores de qualidades de esforço quearte porém' dando-lheprocesso de traba~hfr n~ ~~a : arti~ta tem de escolheruma forma e men a lzfan ~s 'os ritmos e desenhos deconscientemente as ras ,movimentos. t aráter de uma única pessoa,

Além de retra ar o ~rmonia ou a desarmonia entredeve-se lembrar que a h

l,d d é a harmonia ou a desar­

os personagens, na rea 1 a e,monia entre modelos de esforço.

171

R

Page 88: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Essas situacões dr âtí -de química do e;forc ama tcas sao criadas por um ti ona própria química- o que resulta f:eqüentemente, co~ocriação de novos comnuma explosao destrutiva ou nade esforço de diferenf~stos. A correlação de modelosfrente às outras é um as pe:soa s q~e estejam umasmimica, que se vale de pe~ o esp~~lal do estudo dalhante ao diálogo falad um tlP

do de dIalogo-esforço seme-

e t O, no rama Um díáln re uma pessoa d I' d . la Ogo-esforço .t e ica a e um brutem que revelar os detalhe o, por exemploe princ.ipalmente os de s:a~e ~~bJs os seus caráteres:determmados valores A' a I u e~ com relação ada, por um impulso ~arüfoe::oa gent~l. poderá ser leva­fracos. Para tal individ ' a a~xihar e proteger osvalor mais alto ue uo, a carIdade poderá ter um

.outro lado, pareder ~~~~atural ~entileza; poderia, Porso; de seu protegido. Ur:oi~~i ~ront~r com o opres­alem de ser cruel derá . VI uo víoíento, porémf - , po era derivai- u 'açao de sua crueldade A ld ma grande satis-

valor mais alto que o' crue ade .tem, para ele, umsendo possivel que mero sobrepujar de sua vitima'nosa suavidade. sua crueldade assuma uma enga~

No diálogo-esforço d t doí .homem bruto e o gentil es es OIS_tlpos ~ontrastantes, ocombinações de esforc~ Ó~re~eraomuítas sombras derentemente delicado -'f' ru o ~or~a-se suave e apa­propósitos; o home~ ;e ~~ de atíngíj- seus malignostemente brutal pa n I parece ser duro e aparenra conseguir fí -esforços aparentes preludiam c seu irn..:ar~doso. Estesrevelador, pois a suavidad d brt: frequencla o esforcomodificar-se na sua vi r e. Oh r';lto deverá finalmenteagressividade do home~encIa. abrtual, assim como a~erreno à sua delicadeza 1ent~1 deverá acabar cedendomdulgente numa atitude d:~It~aI. MUdar uma atitudena força, ou na velocidad u a envo~ve um aumentoalteração de sentido inv e ou no movlm,,;nto direto; anuma outra indulgente derso, t: uma atltude de luta

, eman a um aumento nas sen­172

I./

sações de leveza, duração ou expansão do movimento.A mudança pode ter lugar em um fator após o outro ouem dois, ou em três deles ao mesmo tempo. Há uma pro­babilidade muito maior de dar-se uma modificacãoabrupta quando o violento, depois de uma suavid;;'deocasional, retoma sua brutalidade habitual, do que quan­do o indivíduo delicado tenta transformar suas maneirasnaturalmente gentis em outras mais violentas. A raivasúbita de alguém geralmente gentil e alegre dissolver­se-á com lentidão, mas a suavidade de uma pessoa nor­malmente brutal, suavidade que se desenvolve lenta­mente, volta com rapidez para sua verdadeira natureza.Estas são probabilidades e não regras, porque o con­flito dentro das várias configurações de esforço é muitocomplexo.

O fato é que o homem tem a habilidade de disfarçara natureza de esforço bem como os padrões deste, atécerto ponto. Esses disfarces enganarão apenas os indi­víduos que não são observadores, apesar de os deixa­rem com uma vaga impressão de que alguma coisa estáerrada. Esta sensação resulta de uma observação sub­consciente, ou melhor, de uma observação que não foipercebida em sua totalidade, pela consciência. Qual­quer esforço de outra pessoa, que seja percebido prin­cipalmente por nossos olhos ou ouvidos, provoca umareação de esforço que pode - mas nem sempre preci­sa - resultar num movimento facilmente perceptível, vi­sível ou audivel. O contra-esforço pode ter dois aspectos:pode ser semelhante ou dessemelhante ao esforço quecausou a reação. Um indivíduo agressivo pode desco­brir uma brutalidade latente numa pessoa amigável queele ataque violentamente, mas essa brutalidade poderádiluir-se lentamente em suavidade outra vez, à medidaem que a pessoa gentil começa a sentir pena da menteembrutecida de seu oponente. A suavidade da pessoaamigável poderá encontrar um eco Iongínqüo de sim-

173

Page 89: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

175

",",

patia no bruto. mas que será rapidamente transformadoem crueldade interior e exterior.

Muitas nuances das qualidades de esforço apare­cem nos movimentos de transição do drama. Freqüen­temente, revelam uma interação contraditória de ritmose formas, a qual indica os conflitos entre a atitudeinterna do personagem e sua conduta no meio ambiente.Conforme já dissemos anteriormente algumas vezes, asatitudes internas manifestam-se nos movimentos depequenas partes do corpo e muitas vezes são dificil­mente visíveis. A bem-conhecida expressividade dosolhos é ocasionada por contração e relaxamento dosmúsculos oculares. Tais movimentos têm uma .sériecomplexa de esforços básicos e incompletos que afetamas pupilas e os movimentos dos globos oculares. Assimque os impulsos nervosos e musculares, dentro dasórbitas, espalham-se para as pálpebras, sobrancelhasou outros músculos do rosto, o esforço interno torna-seexternamente mais visível e passível de ser controlado.O esforço pode se estender aos músculos maiores e,finalmente, a toda a musculatura do corpo, o que entãopassa a ser visível na forma de posturas, gestos e pas­sos, As reações do músculo ocular, porém, não são asúnicas que expressam reações internas. Também a res­piração pode ser influenciada por impressões surpre­endentes e até mesmo os batimentos cardíacos podemser igualmente afetados. Alterações glandulares pode­rão somar-se aos efeitos da resposta de esforço. E todosestes impulsos internos podem assumir uma forma visí­vel em maiores ou menores reações musculares.

Toda ação ou reação em termos de esforço é umabusca de valores, sendo o principal deles a manuten­ção ou o empreendimento do equilíbrio necessário àsobrevivência do indivíduo. A manutenção deste equilí­brio exige um funcionamento harmônico de corpo emente, segundo as capacidades de esforço ou o caráterda pessoa. O equilíbrio exige uma adaptação às situa­ções, bem como um reconhecimento mais ou menos

174

I uais o indivíduo luta habitualclaro d?s valores pe~~;; sempre é fácil discriminarou ocaslOnalmente, " mentais Acredita-se que aentre valor~s materIal~o~cima est~ja lutando por valo­pessoa gentIl do exe~p a estúpida estaria defendendores mentais: ~nquan o i~~o o prazer sensual e até mes­bens materiaIS. O 30n oI ' materiais mas que pode­mo a felic~da~e sao va or~~lores mentais que. por suariam constltUl: :: base de acão dos atos que propor­vez, talvez eXlglssfeml' ~ c~:s fossem tais atos envolvercionam -prazer e e lCl a ,alguma iniqüidade moral. . à uilo que os

O indivíduo violento que renuncia q r a fim deid omo conforto e praze • ,

demais consi eram, c e or crueldade, não estasatisfazer seu deseJf ard:~te~ais pelo menos no sen­apenas buscando valorest e se emp~ega o termo "bemtido em que norma men té rder sua vida namaterial", Na v~rdade, ele ~~~~:d:~~ueldade. Poderátentativa de saciar sl;la apa m e considerá-la um valorexibir uma coragerr~/~cOl;lUde sua sede de crueldade.que exceda o da sa IS açao, r .os valores mentais eEstas hesitações ao se estlma ituacão devem fazermateriais, no decorrer ta=~escuidad~sa quanto aodo artista uma pessoa . éticos O artista nadaempre~o de ~rec~i~~~ ~~~:~~a: e, do ponto de vista datem a Julgar, ca e e se concentrar na expres­representação teatr~, dev~porais. O ponto principal asividade de. sua;; açoes'~~e' qualquer que seja o aspec­ser apreendIdo e o ~egUl Ie pode ser expresso pela lin­to da luta pelos .va o~es'i~dependente de quão baixo ouguagem de rr:ovm~er o, ecto julgado de acordo com aquão alto seja o a asp t ceita Não são apenasescala de valores geralm~ndee aceder' coisas aos outros

. I cões corporais . tas simp es aç 'ltiplo inter-relaclOnamen oou de privá-los delas que o mu; . mas também os moti-de tipos de esforço pode exprml1r, t

. tai comportamen os,vos subJacentes a aIS - enas teste-Através da obse~vaçãtode esf:~~~~~â:SP passados,

munhamos aconteclmen os e

Page 90: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

~'-'I,

<:o~o também damos uma olhadela no futuro nas posSIveIS conseqüências de nossos atos. Podemo; detecta;âertas mcongruencias fundamentais nas configuracões

e ~sforço que, se levadas avante, provocarão um- de­~as ::e, o qual poderá ser evitado pelo desenvolvimento

e tIpo~ harmoniosos de esforço. Este equilíbrio podeser obtI~o desper~a!1do-se, no indivíduo, um sentido do~uet seriam tra~~Iço.es, ritmos e formas apropriadas,en ro das sequencias de movimento.

As for:mas e ritmos de nossos movimentos são pode­re~ ';ltraves dos quais podem-ser realizadas as açõesprátícas ; no entanto, contêm também fortes doses dee~ergla gerél;d?ra que dão lugar a reações de conseqüên­~~~~ ou benéficas ou desastrosas. Por exemplo, a cari­s pode se ~ransformar em egoísmo, se o prazer dee doar na amizade, no amor ou no sacrifício exceder o

praze:: de torn~r os outros felizes. Os impulsos internosque .vIsem entao ocultar o egoísmo denunciam-se nos~ov~mentos de. sombra. O calor do gesto pode ser con-~dIt~ pelo frio fitar dos olhos ou pelos movimentos

~rIspa tOS dos musculos da face. Uma parte do corpoonsen e, enquanto a outra nega. Podemos respirar

r:sada ou excitadamente enquanto buscamos demons­. ar ilsoa calma exterior. Faz parte do drama a luta dos~mp.u_sos e:n nosso interior. Quase que todas as nossast;r~:~es sa? ? resul~ado de uma luta interior que podei teí -se visível ate mesmo numa postura corporalonreIramente imóv~l. Uma posição corporal sempre éf esultado de movimentos prévios ou a antecipacão de~turos movimentos, que tanto deixam sua mar~a im­

p es;a n~. postura do corpo, como anunciam a próxima.I re~uentemente, a mímica transmite ao espectador

qua o tipo de luta interior pela qual vai passando opersonagem at a ' do . _ ,r ves apenas e postura corporal ouP siçao, sem movimentos ou sons perceptíveis Atémesmo no cotidiano é possível ver-se, na postu~a da:~soa, bem como e~ sua movimentação, o rumo assu-

o pelos seus sentimentos e pensamentos. A tarefa

176

c_"; .

da mímica é nos arrastar - a nós e a audiência - parao mundo de seu drama, através de gestos e expressõescorporais, para que possamos identificar-nos com ospersonagens e sofrer com o sofrimento, sentir ódiopelo que for indigno, ou rir perante a imagem de nossoseuS refletida ali à frente. Se pudermos fazer isto, tere­mos sido apartados de nós mesmos e afastados do pra­zer egoísta, em função do qual tantas e tantas vezesajudamos os outros, damos presentes ou executamosalgum outro ato caridoso. Embora o artista extraia,para as suas criações, as situações, sentimentos eacões da vida real, não as retrata diretamente emslia mímica; configura-as de maneira significativa,a partir de sua própria visão e imaginação. Neste sen­tido, o ator pode se constituir num grande doador deseu próprio eu, tornando-se um mediador entre o eusolitário do espectador e o mundo dos valores.

A atividade mediadora do ator exige alto nível deveracidade. O ator, o mímico ou o bailarino competen­tes revelam de maneira extraordinária a possibilidadede expressar os valores da veracidade com todas assuas complicações, por meio das ações corporais. Tra­ta-se de um erro grave tratar o teatro e a representa­ção teatral corno faz-de-conta, como situações onde selidam com ações e ideais falsos. A mímica e o teatrointroduzem o espectador nas realidades da vida interiore no mundo latente dos valores. As tentativas de com­preender o mundo pelo naturalismo e pelo reali~momaterialista estão destinadas a fracassar. As r-ealida­des da vida interior só podem ser retratadas pela arte,onde se confundem razão e emoção, e não pelo intelectoou pelo sentimento, em separado. A fim de proporcionarao espectador a resposta certa às suas mais íntimasexpectativas, o ator deve dominar a química dos esfor­cos humanos, devendo igualmente aperceber-se do, pro­fundo relacionamento entre tal química e a luta pelosvalores, que é do que consiste a vida. Embora o espec­tador possa não ter qualquer outro motivo para ir ao

177

Page 91: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

·J

"";

teatro além do de . d di . .desa t sejo e se ístraír, fica, não obstantedo ni°ndad~ quando não pode vislumbrar as realidade~

d un o os valores e, efetivamente, este mundo só~~ e sertrepresentado através da mobilidade tanto inter~

quan o externa,c d Já colocamos anteriormente que a mudanca dec~t:~a~ara lutar envolve. mais rapidez nas ações exe­ça Igu 'loU btem o conferir-lhes maior direitura ou for­e~ sen~imen e co~o?ada foi a noção de que a mudançavolve o do contrário, de lutante para a cedente, en­o que re~umento de _duração, da expansão e da leveza,xíveis e ulta em açoes cada vez mais sustentadas. fle­tadas ses~aves: Estas alterações podem ser experimen­ocorra mag~arm~S ou concretizarmos cenas ondeou ced: ~ ~n:. rutecimento ou a suavização. O lutarformam 'ose : Ivament~ ~ um fator de movimento, con­de ódí spectos básicos das atitudes psicológicasperce~~ec~mor; Sendo assim,. é ~til ao artista que elenam-se ~o e que estes dOIS polos emotivos relacio­seu rel a .ou ras formas de atitudes internas e como odiféren:;,~onamento é refletido pelos movimentos dossimbolizadier~o~agens.A emoção do amor pode sermento básic~eda imagem de uma deusa, cujo comporta­aceitação te movíménto demonstra tolerância emovimentoqu1n o ao~ fatores Peso, Tempo e Espaço de

üente . s ql;lahdades de seus movimentos conse-qde esfOmentde, derivarão principalmente da açã~ básica

rço e flutua ibí delement 1 r, eXI m o uma predominância detrário ~:c eves, sustentados e flexíveis. O ódio. ao con­poderia se e ~o se~ f~rte impacto sobre a realidade,demônio r SI~bolizado pela Imagem de um impetuosomoViment~O~ 01' que luta contra os três fatores dede movi 't spaço, Tempo e Peso, em seus atos típicostos súb~en os.. Seus movimentos revelar-se-iam díre­gic~s P~S~~V:i fIrI1?-es. Estes são personagens mitoló­no pa'lco N- s eV,ldentemente de serem representados

. ao sera m it dif'í ilimaginat' , u o I IC para um ator-bailarinoIVO retrata-las. Mesmo em se tratando de um

178

cínico moderno, o atol' se recordaria do antiqüíssimosimbolismo dos suaves e flutuantes movimentos doamor, contrapostos aos violentos e abruptos atos de

ódio.A caracterização de um mero mortal será mais difí-

cil, porque a imaginação credita aos deuses, deusas ediabos hábitos de esforço muito mais simples e díretosdo que os dos mortais, considerados bem mais intrinca­dos. Há determinados tipos de pessoas, que tanto podemser amantes quanto "odiantes". O político carreirista eaproveitador por exemplo, às vezes se mostrará tantocomo amante quanto como "odiante", dependendo doexigido por seus interesses pessoais. Mas, em sua movi­mentação, demonstrará normalmente uma mistura deesforços que deriva daqueles do demônio, ao defendera causa de um grupo oprimido e isto pode acontecermenos pelo sentimento de compaixão que possa .nutrirem relação a tais pessoas, do que pelo desejo de der­rotar seus odiados opositores políticos; ou mostrar-seuma pessoa mais caridosa, tipo "bom samaritano" queluta mais em socorro do oprimido do que para subjugaro opressor. Os movimentos do "bom samaritano" deri­vam de uma atitude interior inteiramente diferente dado político, qual seja, a de atenuar os efeitos das dispu­tas e da discórdia. Neste sentido, a mistura dos esfor­ços aproximar-se-á daquela da deusa.

O leitor apreenderá o parentesco do político com odemônio socador, bem como o do bom samaritano coma deusa flutuante. Por que é então que todos os polí­ticos não se assemelham nem se comportam como umanimal predador, e todas as pessoas caridosas não seportam como cordeiros? Simplesmente porque acon­tecem infinitos cruzamentos nos tipos de esforço quedeterminam a personalidade. Usando a terminologiado pensamento-movimento, pode-se fazer a tentativa dedefinir as características mistas de esforço de nossopolitico e de nosso samaritano, pelo menos em nívelelementar.

179

",-3 7W--

Page 92: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

'.'I"

Tendo-se como início uma ação na qual prevaleçaa luta contra alguns fatores de movimento, pode-sedizer que uma pressão, um talhar ou um pontuar lutamcontra dois dos fatores de movimento e cedem ao ter­ceiro*. Têm, como créditos, dois pontos a favor do ódioe um a favor do amor. O pontuar meticuloso, a rígidapressão e o fugaz talhar também comportam um certoelemento de amor em si que os impede de se transfor­marem facilmente em monstros explosivos e odientos.O politico, o bom samaritano e, na realidade, qualquerpessoa, podem ter qualquer uma destas várias misturasdas qualidades de esforço. Aqui, nós abordaremos afigura do político, atribuindo-lhe as tais misturas e apre-sentaremos três variedades do tipo. .

Ê possível observarmos, em algumas ações deesforço, condescendência a dois fatores de movimentoe junto com uma atitude lutante com o terceiro. As pes­soas presas a estas combinações de esforço são asdeslizantes, as que torcem, e as que sacodem. Sãoestas os cordeiros maculados nos quais, por exemplo, oamor ganha do ódio por 2 x 1, e onde a harmonia docaráter vê-se perturbada pela luta contra um dos fato­res de movimento. Podemos imaginar um bom sama­ritano suavemente deslizante super-ansioso para pres­tar algum socorro, ou algum indivíduo torcendo deses­peradamente as mãos sem saber O que fazer ao certo,ou ainda uma terceira pessoa caridosamente sacudindoa poeira de alguma vítima desafortunada, excitada ealvoroçada em redor do socorrido. Haverá sempre algu­ma coisa faltando nas atitudes deslizantes, torcentes ousacudintes destas pessoas que as deixa num nível huma­no de falibilidade, de tal modo que jamais atinjam oideal bastante estático de perfeição de uma deusa oudemônio.

Os exemplos acima de análise de esforço são pro­positalmente simplificações bem toscas mas podemmostrar-se úteis aos estudantes do tema, na medida

* Vide tabela à página 181.

180

lhes mostra como depurar os componentes~r:: ~~~rço de um caráter individual. e _como usartal informacão a serviço das caractenzapoes. Dentrode um mod~lo esquemático de apresentaça?, as carac­terísticas mencionadas podem ser registradas doseguinte modo:

Condescende emLuta contra aspectos de Ação

QUEMTempo

Peso Espaço Tempo Peso Espaço

direto súbito - - SocoDemônio .... firme

flexível sustentado FlutuarDeusa - - - leve..... sustentado Pressão

firme direto -- - -Político A

firm~ súbito flexível - TalharPolltico B - -...

súbito leve - - PontuarPolltico C - diretc Sacudir...

súbito leve flexível -Samaritano A . - - sustentado Deslizarleve -Samaritano B - direto -.. flexiveI sustentado TorcerSamaritano C firme - - -..

Este esquema aproxima-se um pouco mais da VIdareal se se compreende que:

1) Pessoa nenhuma persiste sempre n~ mesmadeúnica qualidade de esforço, mas esta mudan ocontinuamente.

2) Durante estas mudanças, alguns elementos deesforço são:a) mantidos intactos, enquantob) outros recebem ênfase especial, alterando

desta forma a qualidade de esforço, demodo mais ou menos visível, ao passo. queterceiros são quase inteiramente perdIdos.

N mudancas compreendidas pelo item (1),. podeQ(~;rrer qualquer seqüência, depend~ndo_das CIrcun~­tâncías. Podem-se imaginar muitas sIt.uaço~s_nas ~~~~~o Político A, por exemplo, muda s~a dísposíçao origde pressão numa de earáter mais leve, por exemplo,

181

Page 93: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

IJ'•

,..

assumindo uma característica dó Samaritano B. Todospodemos começar por qualquer uma das ações básicasde e~tado de ânimo, Independente de ser-nos habitualou nao. Podemos, então, com maior ou menor mobili­dade de esfor~o 'percorrer qualquer que seja a escalado est~do de ammo de nosso agrado, ou que sejamoscompelidos a assumir, por força de circunstânciasexternas. Cada conjunto de alterações deste tipo é umafrase de esforços 9ue fala clararnenta uma linguagemq~e traduz ascensoes e quedas, hesitações e precipita­çoes; se forem freqüentemente repetidas, tais frasesrevelam características habituais.

A q.uí~ica de esforço segue algumas regras poisa transição de uma qualidade de esforco para outraou é fácil ou difícil. Em circunstâncias normais, nenhu­ma pessoa mentalmente sadia saltará de uma quali­dade para a que lhe é contrastante devido ao grandeesf~rço nervos? l': ?lentaI envolvido em mudança tãor::,-dica~._ Se o mdn~duo muda repentinamente de umadisposição de pressao (Político A) para uma de sacudir.(Sa~arita~o A)..: isto indica forte tensão ou excitaçãointerior. Situações deste porte evidentemente podem?Correr, mas sempre sinalizam o perigo de alta tensãomterna. Às v~zes, a pessoa que age se volta para açõeselementares mcompletas, nas quais um ou dois elernen­t<?s apena~ encontram-se carregados com sua participa­çao ínteríor, enquanto o resto da manifestação dosesforços m~ntém~se mecânico e não recebe apoio dequalquer atitude mterna por parte do sujeito. A pessoaque mostrass~ uma forma indecisa na expressão deesforço poderia ser, por exemplo, uma pressão-deslizare ser conslde~adaum caráter razoavelmente indefinido.UI?a tal qualIdade num gesto poderia indicar qualquerCOIsa, .mas, em ~ssê~cia, seria a renúncia de ação forte.O ~UrIOS?, poren;, e que encontram-se caráteres que,seja habl~ual, seja extraordinariamente, valem-se deesforços íncompletos. Essas disposições de inatividade,que surgem ocasíonalmente, indicam uma inclinação

182

.~.

J

depressiva do estado de espirito que pode ser provo­cada tanto por eventos externos quanto por estados deespírito inibidores do surgimento da capacidade plenapara agir. Se tais estados mostra~en;-se c~nst?-D;tes, ocaráter estará fadado a uma desvitalizada inatividade.

Pode-se facilmente imaginar a enorme gama decombinações de esforço colocadas à disposição do artis­ta São inumeráveis as possibilidades de mudança ev~riação nas expressões de movimentos. Não simplificao problema o fato de que essas inúmeras combinaçõesde esforço possam aparecer em movimentos dos mem­bros ou de todo o corpo. A idéia básica, contudo, é sim­ples e suficiente. Se se observa a expressão de esforçode uma pessoa, notar-se-à que é sempre um mOVlme?topassível de uma descrição exata, portanto, um conteudode esforço bem-definido, que acontece de cada vez. Éevidentemente uma coisa bem diferente escolher umadentre as muitas possibilidades de movimento e con­teúdo de esforço a fim de caracterizar a conduta deuma pessoa, numa situação específica de palco.

Ao observar as pessoas, o ator poderá identificarcertos tipos de esforços habituais, tais como o pontuar­deslizar ou o talhar-torcer-flutuar, que poderão forne­cer sólida base para a elaboração do retrato de com­portamento de movimento de uma pessoa imaginária.Mas como será o comportamento de uma pessoa numadada situação? A composição de esforços de umapessoa, observada numa ocasião particular, poderá ofe­recer um retrato suficiente para o reconheCImento desuas capacidades predominantes. Pode-se ter uma ex­pectativa razoável de que certas combinações de. quali­dades de esforço poderão const~tuir-se,em. modal~d~desparticulares de condutas em círcunstâncías definidas.É provável que um individuo egocêntrico e cauteloso,em cujos tipos de esforço não se tenha observado ~mvigor especial, caso seja confrontado por um ata~u~ VIO­lento e súbito, tenda mais a abandOI~ar sua posiçao doque a defendê-la. O atacante podera, neste momento,

183

Page 94: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

.,

'".~I

:tl

modificar sua disposição de soco para tranqüilizar apessoa cautelosa.

. O soco é relativamente rápido. Se se modifica (querdizer, retar~a) a velocidade do soco, este se transformanuma pressao. Quando a força do soco é diminuída, estetorna-se um pontuar leve. Soco sempre se dá em linhareta: quando assume uma curva gradual, o trajeto destemovm;lento vai ser aos poucos levado para um talhar.Tudo Isto pode se dar numa situação apropriada.

Toda~ as ações básicas, por meio de alterações emsua velocId?-de, em seu grau de força ou na curvaturade, seu cammho, podem ser modificadas cada vez maisa~e . tornarem-se finalmente numa das outras açõesbaslCas. Esta mudança pode ser comparada ao gradualdesapar~<:Iment~/transformaçãode uma cor na outra,no arCO-IrIS. AS~Im como as muitas gamas de cor podemser co~p~eendIdas como transições ou misturas dascores básícas do espectro, também a grande variedaded~ açoes o?servada em nossos movimentos pode serv~st!'l- e explIcada como transições.ou misturas das acõesbásícas, ,..

Investiguemo.s aqui a série de esforço que variadentr? do potencIal natural do Demónio anteriormentemencIon~do, a quem atribuímos as características fun­?amenta.Is_de um "socador". A seguir, colocaremos emJustaP?SIçaO o potencial natural da Deusa, a quem ca­ra?terIzamos. como ':flutuantes" e compararemos osdOIS. Assu~Imos, eVIdentemente, nesta investigacão,que os carateres são completamente harmoniosos· emsuas respectivas tipologias.

. P.o~erá ser Yt.il, contudo, fazer um apanhado. aprmcIpI~, do~ va:lOS fatores do movimento, bem comode ~uas ImplIcaçoes tal como a propusemos nô final doc,!pItulo 3. As colocações serão tabuladas, uma vez quenao podem se; ~bordadas aqui as explicações obvia­mente nece~sa~I~s e detalhadas referentes, principal­mente, a.o. sIgr:rflCado do movimento e às suas comple­xas ramIflCaçoes na expressão humana.

184

Estudamos anteriormente, neste capítulo, as quatrofases do esforço mental precedentes das ações propo­sitais: atenção, intenção, decisão e precisão. Tentare­mos em nossa tabulação, agregá-las a cada um- dos fa­tore~ de movimento, considerando-as nã? apenas co~oaçâo precedendo urna ação, mas tambem como açaoacompanhante. . ,

O fator de movimento-Espaço pode ser associado afaculdade humana de participação com atenção A, teJ?-­dência predominante aqui é a de orientar-se a SI ~roprIoe a de descobrir um relacionamento com um objeto deinteresse, seja de modo direto e imediato, seja de modocauteloso flexível.

O fator de movimento-Peso pode ser associado à fa­culdade humana de participação com intenção. O desejode realizar certa coisa pode apoderar-se da pessoa asvezes de modo poderoso e firme e, em outras, leve e sua­vemente.

O fator de movimento-Tempo pode ser associado àfaculdade humana de participação com decisão. As deci­sões podem ser tomadas ou inesperada e. subitan:te~te,deixando que uma coisa desapareça e seja substituídapor outra, num dado momento, ou aos poucos, .h~vend?,neste caso, a manutenção de algumas das condições pre­vias, por um certo período de tempo. .,

O fator de movimento-Fluência pode ser assocIad~ afaculdade humana de participação com precisão ou, ditode outro modo, de participar com progressão. Trata-seesta habilidade de harmonizar-se com o processo de rea­lizar algo, ou seja, de relacionar-se à ação. O indivíduopode controlar e bloquear? fluxo natural c;Ieste processoou permitir-lhe um rumo Iivre e sem obstaculos.

Se nos referirmos, agora, a um caráter como sen?obasi~amenteum "esmurrador", qual é a implicação dIS­to segundo o ponto de vista do movimento? .0 q1!e é quese situa na própria base de qualquer modIflCaç~o.des!aação básica de esforço, e de quais tipos de par-ticrpaçâ.ointerna. atitude ou ímpeto derivam? Encorajamos aqui

185

m-.

Page 95: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Fatores de Espaço Peso Espaço Pesomovimento: Tempo Fluência

Espaço TempoFluência Tempo Peso Fluência·

Atitudes Internas: acordado onírico remoto perto estável móvel

dução de um dado personagem numa peça teatral, comotambém na criação de expressões poéticas das váriasdisposições internas, pela dança.

É evidente que os personagens e as disposiçõesinternas nem sempre se desenvolvem segundo padrõesharmoniosos. É bastante mais freqüente do que se pen­sa, principalmente quando a situação é dramática, queemerjam paralelamente as qualidades sem relação en­tre si, o que provoca distúrbios e tensão. Por isso, é im­portante aprender a dominar não apenas modificaçõesgraduais de uma ação básica como também praticar mo­dificações contrastantes umas de outras, sem transiçõesfáceis ou fatores equilibrantes. Lembremo-nos, a estepropósito, que as mudanças de esforço nem sempre sãoprovocadas pelas situações. O contrário também é ver­dade. Conforme já indicamos anteriormente, muitasvezes criam-se as novas situações por intermédio dealterações nos esforços de indivíduos e multidões.

A cadeia de acontecimentos que, na realidade. com­põe o conteúdo mesmo da ação dramática e, portanto,da mímica, também tem suas origens na química doesforço humano. O solo nutritivo onde se alimenta aárvore da mímica é o mundo dos valores.

de

Tabela VII

Verificação d? tipo e significados dos fatoresmooimento e suas combinações

A. Um [aior de movimento

B. Dois fatores de movim<mto

G. Três .fatores de mov,mento

Fator de Movimento' Espaço Peso TempoParticipação Interna:

Fluência

Relativo a: .Atenção Intenção Decisão Progressão

Afeta o Poder Humano de:Onde Oe-quê Quando Como

"Pensa- "Sensação" "Intuição" "Senti-mento" mente"

. Fatores de Movimento: Espaço, Fluência, Espaço, ~,Tempo Tempo FluênciaPeso Peso Peso

empo,

ímpetos para o Movimento:

Fluência

Ação Paixão Encanto(Fluência (Espaço (Tempo

Visão(Peso

latente) latente) latente) latente)

'.0

••

[,)IJ

..,

187

o.leItor a pesquisar ~s intrincadas implicações do fun­clOnament? psicológico, com base nas considera ­sobre movm~e?toapresentadas às Tabelas VIII e rt..°es

da ,~ma a~ahse comparativa dos potenciais naturaisco "Fl~~~~r:' a ql:l~m él;tri~uímos a ação básica de esfor-• , evi enciara que em todos os asp t 1ref~)s~ta o oposto do "Demônio" (Vide Tab:l~~~~I~d " o entanto, as modificacões que cada uma delas

:~~~~~;o~~crodm~:~~vf:re~~~~r~~~~:o:~~:~:fec~~ep~~t~~ ~:seu oponente.

even~u~~~~~tZ~i~~~~~~u~~t~~ie~~~~i~lroporc~narávolver seqüências de movimentos, não a;e~~~onae~~~~

186

__um.'••';E_7iiíl1;-------------.....!.--------------~~~

Page 96: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

id. ,~

oDEMôNIO~ Tabela VIII

Ações bJsicas de esforço Pertencendo ao Contendo variaçõesParticipação interna característica come suas 3 modificações ímpeto de atitudes internas

interno de: Atenção Intenção Decisão ProgressãoA (ação básica de Ação r estávelesforço)

-~direto firme(= Espaço: d/reto

(-. Perto- Peso: firmefirme súbitoTempor súbito

Soco r acordado diretosúbito

lo" modificaÇão

( estável( o elemento - flexivel firmeé mudalio, Isto

é. a Dlreção é(. Perto "-difusa através da firme súbito- Influência da - como em A

sensação -f1exfvel"

Talhar ) acordado flexivel súbito-2," modificação

'-estávelo elemento Peso direto level- é mudado. Istoli, a Reslst6ncla

~ Pertoe enfraquecidaleve súbitoatravés da- InfluênCia da -sensação "leve" r- acordado direto

como em A súbitoPontuar -.

-~"-- /-- ----- -.- ------- ---3.· modificação _...__._---_.- --~

\r estável direto firmeO elemento c.omo em Ar Tampo é mudado,Isto é, a

_ ( Perto- velocidade é firme sustentadodlmlnurda atravésda Influência dasensação de

r": acordado direto sustentado"longe"

-Pressão

B 3 transformações das Pertencendo ao Contendo variações Participação interna característica comAções Bâsicas de ímpeto de atitudes internas

Esforço e suas inte, no deProgressãomodificações Atenção Intenção Decisão

Transformação I Paixão (i)+ onirico firme controlado ou

-(= =f=livre

(ii) -L. móvel súbito controlado oulivre

-k:- Modificação (a) .---o-.

--k-o elemento de • onirico leve controlado ou•- Peso é mudado ~

livre&.e.·c- ~.o.~cw.~ -.0-=f- Modificação (b)ii::::sB-.

o elemento de mEl:controlado ou-~Ê -L- Tempo é

ª-§ ~ móvel sustentado livremudado «." -~

ceeo

Segue na pág. 190

Page 97: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

:.,~ ~i~; ~OTE.L:A_.. - -- . .'

te; Seqüência da tabela VIII<=> .

_.1..•....I~).

A DEUSATabela IX

Transformação II Visão (i) -C"remoto diretocontrolado ou

~ livre/(ii) --L móvel

controlado ou- - súbito- ....--... - como em

livre• I 1Il1,eo.

-L.. móvelcontrolado ou

C-- Modificação [aI ..~

sustentadoo elemento Tempo g~j - como emlivre

- é mudado ~Q-

U:.=,B i [b)(IJ.a~

-l remoto controlado ou-L Modificação (b) -iêo elemento Espaço '.o

flexível <, livre",.- é mudado «."

Transformação III Encanto (i) .....t:::::"' remoto direto controlado ou

-f=como em

livreii II)

--F (ii) f onírico firme controlado oucomo emlivre.............

1(lJ--1- Modificação lal s"

controlado (o elemento de

li. --.L remoto flexívelEspaço é mudado.!~i como em

livre!:h-~ii (b)~ -'o

~ Modificação (b) i:i:=CDo elemento de CIJ:ãê

-Js,00~Z8rf leve controlado aiPeso é mudado ".=AE (,

) 11vr'1.-2,..... .' Oc.:.••.•• ,. ",; ~,:ii:,8.'

.

- -.•,-- _.- "~'"",",''''''''-''--'''''--_.<>'.'"' .... ,.,..__.~._.,-'"

I~luiI!

\

...<lO...

Ações Básicas de Esforço Pertencendo ao Contendo variações Participação interna característica come suas modificlJfões ímpeto de atttudes internas

interno de: Atenção Intenção Decisão Progressão

A (ação básica de Ação ~ estável flexível leveesforço)

UEspaço: flaxlval

-~li Perto leve sustentado

Peso: leveTempo: sustentado --

) acordadoFlutuar flexível sustentado

-1.' modificação lr- estável direto leve

~ a Dlreção~:umentada Perto leve sustentado

- como em A-Deslizar r acordado direto sustentado

-2.' modificação ( estável flexível firme(:~_.

_ ( Perto firme sustentadoaumentada- ) acordadoTorcer I

como em A flexível sustentado-

Page 98: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

....~ Seqüência da tabela IX

D~...,..:,'- ..;

~'

3.' modificação U estável flexível leve

0 como em AA velocidadeé

'"Perto leve súbito

aumentada

- -Sacudir j acordado flexível súbitoB 3 transformações das Pertencendo ao Contendo variações Participação interna característica comAções Básicas de impulso de atitudes internas

Esforço e suas interno de:modificações Atenção Intenção Decisão Progressão

,Transformação I Paixão (i) -..k. onírico leve controlado ou

.-l livre

=f= (ii) -d- móvel sustentado controlado ou-livre

~ -+ onírico fírme controlado.=f-Modificação fa) •

livre,o elemento Peso e-

foi mudado o~...-- ~,

ulfl !l,~ .!'0i:L~B-.-lL. Modificação (b) .~ ,

o elemento 'Tempo -~ê....L. móvel controlado

,~_ foi mudado ~,.

súbito llvre'".~ ...

(i)1 remoto flexivel \ y'~o~~~o~~~~-_·~:Transformação II Visãolivre

-l. --l::(ii)-L móvel sustentado controlado (- -

livrecomo em-I (II)-• -L ·m6.vei; súbito controlado ou~ Modificação (a) ,

c-

livreo elemento Tempo

o. - como emé mudado .!(Ii'l:I (b)go.~

'~ 0-

controlado ouU::::I8-.

ModIficação (b) CII.E!l:

livre-.

--C" remoto diretoo elemento Espaço '5] E.....L::: é mudado ~::JQ).~

(i)-l remoto flexível controlado ouTransformação III Encantolivrecomo em

JL -f II (I)

controlado ou(ii).....!L onírico levecomo em livreI (I).------..,

•controlado ou

,c-

-L" .remoto díretoeo

livrek Modificação (a) ~~

como emo elemento Espaço .!E~00_

II Ib)é mudado ,iii I-.!!!,eLi:=41lI53ê". onírico

controlado ou-1- Modificação (b)

-oE +,~ .~,o

como em firmeo elemento Peso «o~

livreé mudado

I la)....~

r

Page 99: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

CAPíTULU 6'

o ESTUDO DA EXPRESSÃODO MOVIMENTO

o MELHOR mei~ de adquirir e desenvolver a capacidade~e usar o movImento como meio de expressão no palcoe executar cenas com movimentos simples. Em primei­r? lugar, o estudante do tema deve tomar total conhe.clm~nto do caráter das pessoas a serem representadasd? tipo de v~lores pelos quais lutam e das circunstân:eras nas quais esta luta ocorre. A seguir, como parted~ sua funçã~ criativa enquanto ator, deve ele sele­cionar os ~o;llme~tos apropriados ao personagem, aosval?res e a situação em particular. Esta seleção envol­ve intenso trabalho. A improvisação da cena represen­tada, conqud.nto,hrilhante, não basta e nem é suficientepara mémOrlz!i!' ~uma combinação de movimentos apa­rentemente eficaz. O que é necessário é que o estudanteponha-sé, 1>01" assim dizer, na pele do personagem a serretratado, penetre no âmago das várias possibilidadesde exec'!tar a cena e analise tudo o que diz respeitoa?s movlme~tos.Poderá descobrir que algumas seqüên­eras de movimentos ser~o de mais fácil execução queoutra~., S~ forem escolhidos movimentos que pareçamsE;!r. diffceís, dever-se-á procurar descobrir a causa dadificuldade, antes de tentar dominá-los.

~~ duas cau~as fundamentais que obstruem um fácildomínío do movimento: inibições de ordem física e deord~m mental. Foram feitas algumas sugestões, noscapítulos ? e 3, q~a~to ao melhor meio de compensar:U~~ :nab;l~dade física geral para se movimentar. Ainibição físíca quanto a um movimento definido serán:elhor afas~ada por um número suficiente de repeti­çoes das açoes corporais difíceis de serem realizadas.

194

Deve-se tomar muito cuidado para observar as quali­dades de esforço contidas na ação para que sejam clarae exatamente executadas, dentro dos ritmos adequados.A execução de seqüências de esforço demanda uma con­centração e uma atitude interiores correlacionadas. Ascausas do fracasso na realização de certas combina­ções, portanto, são de natureza mental tanto quantofísica.

Quando organizados em seqüências, os elementos domovimento compõem um ritmo. Podem-se discernirritmos-espaço, ritmos-tempo e ritmos-peso. Na realida­de, estas três formas de ritmo sempre estão associadas,apesar de uma delas poder ocupar lugar de destaqueem uma dada ação,

O ritmo-espaço se origina do uso de direções rela­cionadas entre si, o que tem por resultado formas econfigurações espaciais. Há dois aspectos relevantesneste processo:

a) num deles há o desenrolar sucessivo de direcõescambiantes, e -

b) no outro, as formas são produzidas através deações simultâneas de alguns segmentos corporais.

Em termos de comparação com a música, o primeiroaspecto seria o equivalente à melodia e o segundo, àharmonia. Cada um 'deles exige um fluir diferente departicipação de esforço, pois certas seqüências de es­forço vão dar em posições, enquanto que outras desen­volvem linhas de movimentos com ângulos e curvassempre em mutação.

O homem aprende, em seu trabalho diário, a apre­ciar o fato de que pode manipular alguns objetos melhorem certa posição do que em outras. Conseqüentemente,mobilizará seu corpo até que o objeto atinja a melhorposição para seu esforço. Sua experiência lhe permitemapear minuciosamente o espaço que circunda seucorpo*. Com o auxílio deste mapa imaginário, ele vai

* Vide Modern Educational Dance de R. Laban. Macdonald & Evans.

.195

. ·"l~·· . >

--...'1 ~~~~~'

Page 100: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

traçando seu caminho através de todas as combinaçõede esforço necessárias ao seu trabalho e a seu compor~t~m~nto geral e, no final do processo, encontrar-se_átao a vontade neste seu reino de esforço como set:-atasse de sua cidade natal, onde cada rua lhe é conh~~cida, onde reconhece possivelmente cada uma dc~sas e boa. parte dos habitantes. O estudo da expre~~sao d~ movimento envolve o domínio e a compreensãodos rItmos-espaço, dos quais se apresenta um rápidoapanhado no capítulo 2. Este resumo não é, de modoalgum, completo, mas servirá para estimular qualquerpes~oa que tente. peEsar em termos de movimento a fimde mvent1l;r ya.rIaçoes que, cada vez mais, abarquemas q~a~e m!Im,tas ?ombmações possíveis de ritmosespaciaís. Há ai, eVIdentemente, uma lógica que lhes éll;eren.te, mas transcende os objetivos deste volumediscuti-Ia. '

-~lém do ritn:o-espaço do movimento, temos queconsiderar seu ritmo no tempo. A atitude do homemfrente ao tempo é .caracterizada, de um lado, pela lutacontra ele nos movlm,ent.os rápidos e súbitos e, de outro,por ~ma condescendenCla em relação a ele, através demOVIment~s lentos e sustentados. Os ritmos produzidospelos movímentns corporais são marcados por umadivisão de fluxo c~:mtínuo do movimento em partes,c~da uma das qUaIS tem uma duração de tempo defi­~lda; As partos d:e um ritmo podem ter comprimentosI~uals ou desíguaís, Neste último caso, algumas partessao relatIvamente rápidas e outras relativamentelentas.

A significação dos rítmos-eernpo de movimento podeser observada em dançarmos individuais que demons­t~am evidente preferência por alguns ritmos em espe­cíal. Enquanto que um bailarino sentir-se-á mais ten­taqo .a mterpretar músicas nas quais prevaleça umametrIca .nas batidas regulares, um outro poderá sentirese repeh?o exatamente pela métrica, preferindo o de­senrolar IITegular e livre do ritmo-tempo. A precisão do

196

~-

! dançarino métrico está em forte contraste com a expres­sividade do atar-dançarina-mimico que dê preferênciaao ritmo livre. Há, porém, muitas modalidades inter­mediárias aos dois extremos contrastantes dos ritmosregulares e irregulares. Até certo ponto, é verdade queas pernas e pés do bailarino prefiram a função métrica;mas os pés, braços e mãos deveriam ser igualmentecapazes de expressar as qualidades de um ritmo tem­poral livre. Na verdade, o corpo como um todo deveriater condições de exprimir as vibrações e as ondas regu­lares e irregulares do movimento. Conquanto seja útilao atar em sua apreensão do ritmo, o entendimento e aapreciação da música, expressão abstrata do movimen­to, não são em si suficientes. Mesmo o bailarino queinterpreta a música tem que traduzi-la em seqüências deesforço, a partir das quais surgem os seus passos egestos expressivos. Na dança, o ritmo de movimento ébasicamente expresso por meio de passos, o que é parti­cularmente verdadeiro do balé clássico, que se vale devários passos básicos e de combinações característicasdestes mesmos passos.

Gastou-se enorme erudição na construção e recons­trução, a partir de pinturas antigas e documentos, dasformas e dos ritmos exatos dos movimentos de dançae dos passos das épocas passadas. Os ritmos mais anti­gos de que temos conhecimento são os da Grécia antiga,os quais relacionavam-se essencialmente aos trabalhosdramáticos e poéticos. Segundo uma perspectiva pura­mente histórica, é muito interessante perceber que anotação e a interpretação dos ritmos de esforço já foitentada há milhares de anos atrás. Os gregos atri­buíram um significado definido aos ritmos, expressoprincipalmente por uma disposição emocional. A com­binacão de uma unidade de tempo curta com uma longaparecia-lhes conferir uma tonalidade de energia mascu­lina à ação, ao passo que o oposto, uma longa seguidade- uma curta, era considerado como a expressão dafeminilidade. Uma longa e duas curtas eram conside-

197

---------------------

Page 101: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

radas graves e sérias enquant . dlonga expressavam o' anda o que uas curtas e umasimples. A excitação evocar;;ento moderato da marchaaterrorizantes era expressa ora de estados Je espíritouma curta; 'seguindo-se uma pO:d~el~ -de uma longa,duas longas e duas curtas um. a e onga de tempo;tação ou, ao contrário p' :ug:n~m um~ violenta agi­guez, a languidez e o des:o un a epr.ess.ao. A embría.ritmo consistindo de d spe~o eram Indícadns por umdescobertos seis ritmo~~~~~r-as ~. ~uas longas. Foramas durações breve e longa amen ~IS ao se associaremace~tuadas e não acentu~~~m~ ritmo-peso, ~~s ~artesmovImentos O uadrn . s e uma sequencIa defundamentais,~pon~~;:gUmte.m,?s.tra :sses seis ritmoscada um deles: o a slgmflCaçao especial de

2 • .J d

. I. d J

Consistindo de:

ou

J.ldd

5. dJ d

6.dd.l.l

Seisunidades

Cincounidades

que é uma composição do troqueu seguida de um iambo,significando uma mistura de disposições internas, talcorno os dois ritmos representam. Os gregos conheciammuitas variedades de disposições internas: austera, be­ligerante, festiva, voluptuosa, terna, apaixonada, entu­siasmada e sobrenatural. Estas disposições eram ex­pressas por combinações dos ritmos fundamentais comomostramos a seguir:

a) movimentos rudes, beligerantes e austeros, decaráter masculino. Ânimo Dórico, usando dác­tilo, anapesto e peão.

b) atitude'> ternas, fluentes, voluptuosas de caráterfeminino. Ânimo Lídio, usando o troqueu, o iam­bo e o anapesto.

I J,J.Jd I

O Peão é expressão de excita­ção e insensatez, devocandoalternadamente estados de es­píritoaterrorizantes e lasti­máveis. Aparece em dançasde guerra.

O Jônio expressa violenta agi­tação ou, ao contrário, de­pressão profunda. A embria­guez dos festivais dionisíacos,seu langor e desespero erammanifestos desta maneira.

Os gregos consideravam que todos os demais ritmoseram variantes destes seis fundamentais. Estes ritmos,denominados de medidas, eram organizados em versos,estrofes e poemas. Consideravam eles que o ritmo é oprincípio ativo de vitalidade. Em relação à música, in­vestiam o ritmo de um princípio masculino e a melodiade um feminino. As combinações destes ritmos detinhamassociações especiais na mentalidade grega como, porexemplo, .

O Troqueu é um ritmo calmoplácido, gracioso. '

O Iambo é ritmo' mais agres­sivo e foi freqüentemente em­pregado como o contrastemasculino do troqueu, apesarde empregado no modo Iídíofeminino. É alegre e energé­tico, sem ser rude ou belige­rante.

O. ~áctilo éum ritmo grave es:no, usado mais em procis­soes ou ocasiões solenes.O Anapesto é um ritmo demarcha que indica avançooco~r~ndo em danças de dis~posrcao moderada.

3. dJ J

4. J J d

Trêsunidadesde tempo

Quatrounidades

198

199

t...-' .. --

----- .L. '""""""'~"'__=~~~=

Page 102: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

CENA DE CARÁTER EMOCIONAL

CENAS EM AMBIENTES INUSITADOS

A tarefa agora é imaginar para você situações emambientes inusitados, tais como: na prisão; ficar per­dido numa floresta escura; ser um homem comum dasruas num palácio; ou um homem rico relegado à ca­bana de um mendigo; ou uma pessoa prudente numaboate de caráter duvidoso, e outras situações que você

201Campus Universitário de PalmasUFT

B! §LtOT,E,oC:;.I:\ _

Foi-lhe pedido que represente uma cena de caráteremocional tal como: apaixonar-se; discutir; observaruma situação engraçada; defrontar-se com alguma dor,como o sofrimento ou a solidão; expressar entusiasmo;embriagar-se; sentir-se sonolento; ou realizar qualqueroutra coisa que lhe pareça difícil de executar. Muitobem: vá em frente e execute estas cenas uma após aoutra, repetindo-as até sentir que seus movimentos aflo­ram com facilidade; acautele-se, porém, para não optarpor movimentos muito fáceis para demonstrar tais emo­ções. Analise as seqüências de esforço usadas por vocêem cada uma das cenas. Sua raiva, sua dor, sua ale­gria, seu entusiasmo e seu abandono sensual podem serexpressos em ritmos acentuadamente diferentes. Ten­te descobrir como é que caráteres diferentes exibiriamestas emoções e como é que o movimento rítmico modi­ficar-se-ia, nos vários caráteres.

tão de temperamento e de gosto artístico descobrir ainterpretação preferida. A semelhança do pintor, sujei­to ao agrado ou desagrado do crítico que vê sua pintura,o atol' também tem que arriscar-se a ver a aceitação ounão aceitação da interpretação de uma cena que venhaa fazer. O controle de um produtor habilidoso pode fun­cionar como um guia para o desenvolvimento do gostodo aluno, mas não pode ser um substituto para o sensopessoal de discriminação.

Imagine e execute as seguintes cenas:

c) atitudes entusiásticas, realçadas pela religião eap~ll::,onadas, de <:~r~ter sobrenatural. O ÂnimoFrrglO, usando o joruco e o peão.

, . o que no~ interessa de perto nisto tudo é que taisa.m.mos assocIavam-se, na mente grega, a um fluir de­f'ínído dos_ elementos tempo-peso de esforço.

_ As ~çoes dos operários industriais contemporâneossao muitas :,ez~~ restringidas ãum ou outro dos ritmos~undamentar~.'_ja determinados pelos nossos antepassa-

os gregos. l'Jao,expr~ssam~les apenas estados de âni­mo, como também erram habitas de estado de ânimose forem repetidos com alguma freqüência. Ao se ob­servar os trabalhadores saírem da fábrica, ao cair datarde, pode-se reconhecer os ritmos que vieram exe­cutando ao longo do dia, no fluir de seus movimentosd~ sombra, ca?sados ou excitados. O estudo conternpo­raneo de movímenm e o treinamento de esforco têmum~ grande oportunidade de aliviar as dificuld~des eo tédio d.o trabalho, decorrentes da não compreensãoda capacidade rítmica.

um ~~~elfquedest~da os movimentos poderá sentir que_o IpO e rttmo lhe é de maior dificuldade

exe~uçao do .que outro. Poderá descobrir tambémP~~:bft~se:~t~rrt~ edm .p~rti<:ula~, ou ainda, que tem há-

d co~. . eficiência rrtmica de qualquer tipo,po .e _ser corrrgIda pelo treino, acostumando-se pela repetição do exercício a produzir aquelas modalidade~~tm1CtaS tque, _a l?rincípio, foram tachadas de difíceis

o en an o, nao e apenas o ritmo d . .~?teressa ~o atar-bailarino. Existe, ~~~o,;::~n~:a~~~ica, um rrtmo bem maior de valores e de situa ões

Apresentamos, nas seguintes cinco cenas par~ es~;~t~~ç~~~~ eX~dlos simples ~e caráteres, valores e

. . es u ante de movImentos deverá tentar~~~I~a~e~u~~~~t~estats cebn~s até sentir-se satisfeitof . eve arn em perceber que não háormas certas ou erradas de interpretá-las. Ê uma ques-

200

Page 103: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

mesmo invente. Proceda exatamentemocionais apresentadas acima' e com

to nas cenas

a ar I' . execu e' pratique'n ise e, re <;:cIOne-as a caráteres definido's. 'Observaçao: Os carátere d .

podem ser tipos ocupacionaiss po ~m ser emocIOnais;ciaís : pessoas de dí de diferentes classes so., Iversos gru tá .as criancinhas pe . pos ~ ~rIOS, sem excluirte doentes e p quenas, P,;s~oas fIsIca ou mentalmen_condutas extra~~~:~te~~ varias fases temporárias de

~

CENAS CONTENDO AÇÕES PRÁTICAS

tru~~~~sa~orae~tá convidado a representar (sem íns­de tais e aPtOlO) cenas que denotem alguma ativida-

, como o rabalho de cuidar da casa de' díde roubar como se fosse um "tromh di h:' jar mar,t ' d' a m a ou um clepf~:::~t~\afc~~f;:~aro~~:~~~~eâcir~rgicas, de ser en~guerreiro. * Novame~te o procedi~ cH:~n:;a, caçador ouI?r~sente a cena; repit~-a várias ve~~s :no ~esmo: re­UI~lI~O, relacione-a a caráteres definid'os avhse-~ de, porbrrrá que té t . oce esco-dimento ~o~:e~~~~_;~nt:iestas

tquatro fases do proce-

você poderá analisá-la 'e a~f~~~ ~::rr:;:~~~ta a cena,sonagcm, poderá ainda tent . s a um per­representada Não ' d ar repetIr partes da cena

t~~S~~i~Od~t:f~~~:~~e:?~;~~~:~~~~~~l~~7~::~~~!i!~:~~r~~;~sdr:~6~i~s~me~t~a dadeqUabilidade' de seus

fr~gi~~, ~~~~~ ~~~~r~~s~:~~e;:sp:~:~aâ:n~a;:f;:DIÁLOGOS-MÍMICOS

sem~e~~ob~asr:~:irq~ed~a~ontrolared

aprimorar seu de-. um pro utor a observá-lo.

* Faça com que t dpara o espectador. o os os seus movimentos sejam claramente discerníveis

202

~

I

Imagine-se no lugar de um produtor crítico e tente ve­rificar sua interpretação pelos olhos críticos dele. Vol­te, a seguir, para o seu lugar e faça em mímica outravez, a versão corrigida, na íntegra, tal como você pen­sa que a cena deveria ser. É igualmente possível apre­sentar um diálogo-mímico colocando-se primeiramenteno lugar de uma pessoa que esteja atuando com vocêe, depois, no de alguma outra. Manipule estes diálogosexatamente da mesma maneira que com as demais ce­nas: .repita-os, analise-os e altere seu próprio caráterde maneira adequada. Invente cenas breves de diálogose mímica, nas quais os diferentes personagens se depa­ram com diversas situações.

CENAS RELATIVAS A MOVIMENTOS E COSTUMES

É comum hoje em dia ensinar-se ao atar-bailarinocertas formas de posturas corporais ou passos de dançaque se supõe terem sido adequados aos padrões e mo­vimentos de um determinado período histórico. Algumasdestas formas, principalmente aquelas dos últimos sé­culos da história européia, têm sido transmitidas degeração em geração. O reduzido montante de informa­ções dignas de confiança, relativas à forma dos movi­mentos originais, deriva principalmente de pinturasrepresentando cenas da vida contemporânea a cadaépoca, bem como cenas dos costumes do período. Algu­mas danças de épocas anteriores foram transcritas parao papel segundo formas antigas de notação do movi­mento. Os trajes do período em questão são o guia parase chegar à conclusão de como efetivamente se confi­guravam os movimentos da dança; mas o aspecto essen­cial da expressão pelo movimento, os ritmos dos esfor­ços, podem ser apenas supostos. Apesar disto, seriaaconselhável que o estudante de movimentos se fami­liarizasse com ilustrações dos trajes de diferentes pe­ríodos históricos. Através deste estudo, ele se capaci­taria a imaginar o vestuário e demais adereços que

203

____..'. ..l.. _

Page 104: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

205

OUTRAS FONTES DE ESTILIZAÇÃO DO MOVIMENTO

fossem pertinentes, adaptando-lhes os seus movimentos.Um exercício bastante útil é entrar numa sala e

andar segundo a moda característica de um dado perío­do. Pode-se expressar pelo movimento tanto o prazerquanto o desprazer com a tal moda. O estudante queestiver tentando usar o traje adequado deverá· dar-seconta dos vários estilos: selvagem, antigo, medieval,vitoriano, contemporâneo, usados tanto por camponesescomo por pessoas da cidade, por gente rica e pobre, emdias festivos e normais.

O que parece é que, durante várias centenas deanos, vieram se opondo duas modalidades gerais demovimentação passíveis de fácil reconhecimento: a daclasse alta e a da classe baixa, havendo talvez um es­tilo intermediário a estes dois. Atualmente, podemosvisualizar tal tipo de divisão, no cinema. As estrelase astros de cinema em moda apresentam uma movi­mentação convencionada que diverge amplamente domovimento da conduta média do homem comum dasruas. Não sabemos se isto também era assim com rela­ção às artes teatrais de épocas mais remotas, mas, éprovável que aquilo que se denomina estilo de um pe­ríodo, basicamente, seja a moda ditada pela minoriafavorecida de uma comunidade, de uma era históricaespecífica, enquanto que o comportamento natural damaioria pouco se modificou ao longo e ao largo de todaa história da humanidade. Este comportamento naturalé determinado, em todos os tempos, por uma rica mis­tura das ações de esforço fundamentais; formam elasa substância dos movimentos humanos, independentede serem eles funcionais e estarem a servico do traba­lho ou de serem expressivos e manifestarem estados deespírito e estados emocionais. Seria uma tarefa interes­sante o estudo do comportamento de homens e mulheresnas danças de época, bem como na observância dos

204

ritos religiosos, ou ainda em reumoes s~ciais: Dever­se-ia tentar descobrir, a partir do uso imaginado daroupa de um dado período, as formas ~e movimentousadas nessa época, em todas as reumoes da comu­nidade incluindo evidentemente as reuniões dançantes.

To~nam-se assim necessários alguns comentártossobre o significado da postura corporal, na medida emque ao alterarem-se as atitudes e::cternas podemos .de­tectar características rundamentaís. Um corpo estica­do para cima oferece uma impre~s~o diferente de umcurvado para baixo. O estado de amrno da pessoa quese move nestas duas direções contrastantes, índepen­de de se esticar ou curvar, pode ser a mesma. D.en­tro de um ânimo bem humorado, acompanhado d.e riso.o corpo todo, incluindo os dois. braços, pode esticar-sealto para o ar; ou a pessoa hilariante pode curva,:-see agachar-se, agarrando o abdome com ambas as maos.O estado de ânimo de zanga também pode ser expressopor uma postura corporal ou alta o~ b~~xa e, n.o entan­to, as duas atitudes podem ter um sígnif'icado diferente.Estes contrastes típicos da postura corporal podemacontecer de dois modos: tanto como expressão de u!Uestado de ânimo passageiro, quanto como um padraohabitual de um dado caráter que usa preferencialmenteuma ou outra das posturas, a curvada para baixo oua esticada para cima.

É comum, na arte da dança, desenvolver-se a cons­ciência e a sensação para a postura corporal típica. Domesmo modo que se distingue se o tom de voz de um can­tor é baixo, barítono ou tenor, ou alto, meio-soprano, ousoprano, pode-se também detectar no bailarino uma te~­dência natural para movimentos de erguer-se ou de abaí­xar-se. Estas são diferenças que não se explicam apenassegundo princípios fisiológicos ou psicológicos. E ummistério da constituição individual de uma pesso~,o fat?

I de ela na voz ou na gesticulação, tender para movi-I mentador baixo", para o "movimentador mé~io" ou par~

_______________________________L_ "rnovimentadcr alto". O balé clássico, herdeiro da, em

II,I

~I

Page 105: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

206

i'é[I~JI~J

,r',"f _I'I

•;1rtl...III,Ii I

.~,.".

mô?ü:s de corte dos últimos três' , .;;rtIstIca na qual prevalece o .seculos, e uma formae surpreendente porém quantmovlI!1en~ode dança-alta'mez;te esta capa~idadepara d os bailarmos não têm real~pacIdade faz de suas evoluc~nça-alt~e como esta inca_mente estreitos e até ridículo; ~s movImentos artificial_dem naturalmente para dan . be.os dançarinos que ten­em e~t~los de dança-baixa c ça- arxa ,dançassem apenasfo~cloncas e primitivas ii 0r.n

0 Se v~ em certas dancasPOIS.estariam expressa~doc:r~~:mUlto mais à vontade,destmou a exprimir. O critérIo d que a natu~eza os pre­mesmo de qualquer outr d e .um dançarmo alto ouracterístico Uso do espa ~ ançarmo mostrando um 'ca­nhecido e descrito O l ' po?e ser bastante bem reconatural para eleva~ãoe :S~~~I~O alto tem a tendênci~pelos movimentos que enfatiz~~'Mostrará preferênciada postura corporal e dad a característica eretasempre mostrará urd ce tO que atua contra a gravidade

. apto a transmitir uma rr: gratt. de tensão. Ele estaráapenas em seus saltos coni;~ssa~,de total leveza nãotos se dirigirem para baix Iam em quando seus ges­do chão. O tipo contrastan~~ ~v~ndo.a .posições pertoprefere dar ênfase a ati id d bailarmo baixo queO dançarino deste tipo ~~l~ es do ,centro de gravidade.c~lar.-se, em cujo caso os soco ar-se-a. a s~patear e a aga­nbmcamente pronunciados s, em direçao do solo, serãopreferivelmente curvada Ii ~endo a postura corporalmovimentador alto estará VI entemente, no drama, opadres ou seres de algu mellhor ::.epresentando heróis

ma e evaçao lrít 'soque o movimentador b . espirí ual, ao pas-o. alXo estará .

papeIS de caracteres mai t mars adaptado a?ara o alto em suas açõe~l~ere;ra-a-terra. O que tendemterna de asSumir form d a premente necessidadecisã.o, enquanto que o dan~s .e gra?de claridade e pre­~e. s.lmpatia pela expressãõa~:~o.baIXo demonstrará for-ano o elemento formal. nnca na qual seja secun-

Deve-se notar que a tendê . o.

para um desses movimentos n~la ,tI.plca do bailarinoan agomcos de expressi-

vidade não depende apenas da esbeltez ou altura docorpo. Embora seja verdade que indivíduos altos e ma­gros ínclinar-se-ão geralmente mais para o uso de dan­ca-alta e que as pessoas atarracadas, de constituiçãopequena tenderão para o estilo de dança-baixa, não se

. pode dizer que esta predileção sempre corresponda aoseu talento natural. Pessoas esbeltas poderão sair-semelhor em danças-baixas, enquanto que outros atar­racados se darão melhor nas altas. Qualidades emocio­nais e mentais desempenham um papel tão importantena determinação das tendências para cima e para baixoquanto o da estrutura corporal. Pode ser determinadoempiricamente para que tipos mais marcantes de mo­vimentos o ator ou bailarino é particularmente bem­dotado. Os hábitos de esforço adquiridos ou herdadostambém poderão exercer grande influência sobre as dis­posições individuais deste teor.

A preferência por alto ou baixo, porém, não é tudoo que pode ser observado num dançarino. Algumas habi­lidades técnicas, tais como a de girar com agilidade oudar piruetas, caracterizam um tipo que raramente seriamarcante no que diz respeito às suas tendências paradança-alta ou baixa. Esta habilidade para girar oufazer piruetas também não depende da estrutura cor­poral mas, sim, de fatores constitucionais internos,difíceis de serem resumidos. A facilidade em giros exigeuma combinação de rapidez e equilíbrio, de clareza for­mal e abandono, podendo ser empiricamente reconhe­cida, apesar de suas origens não terem condições deserem exaustivamente explicitadas. Os giros sempreacontecem em planos de espaço mais ou menos horizon­tais, não sendo realmente altos-baixos. Os giros podemser efetuados tanto numa direção para dentro quantonuma para fora, acompanhando gestos que se fecham emdireção do corpo ou que se abrem. para fora dele. Hámuitas pessoas que não exibem características pronun­ciadas, de um movimentador alto ou baixo. Tais pessoas,em geral, gostam de dar giros. Raramente apresentam.

207

Page 106: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

a o~~ulação de um movimentador alto nem tampoucoo sólido terra-a-terra do movimentador baixo. Eles sesobressaem em movimentos livremente fluentes, dan­çantes, que parecem surgir como ondas, do centro doc;orpo para o espaço, retrocedendo depois até à imobi­Iidade.

As direç~es ?? movimento (para frente e para trás)podem ser slgmfIcatIvas de muitos modos. A posturaereta de dançarino alto tem~freqüentementeuma ex­pressão de dignidade, acentuada por um leve reclinar dacabeça e pelo empinar do nariz; pode, porém, adotaruma expressão arrogante. A postura dobrada para fren­te, ~o dan~arino-baixo poderia tornar-se agressiva ouservil, As dlreções dos movimentos para um ou outro doslados do .corpo acentuam sua simetria direito-esquerda.Um movlm~nt? fechando para o lado pode ser ernpre­gado para Indicar medo ou timidez, enquanto que omovimento abrindo para os lados poderá denotar orgu­lho ou autoconfiança. As combinacões destas diferen­ças espaciais extremas, executadas -por diversas partesdo corpo, permitem a elaboração de uma rica escala deexpressão pelo movimento.

Além disto, há a expressividade do caminho do movi­mento. O caminho do movimento, seja no chão, como odese.nho de chão dos passos, seja no ar, como o rastroreah~ado pelo gesto do braço ou da perna, pode tantoser.dlJ;et? quanto curvo. Pode também ser simétrico ouasslmetrIco. As posições e caminhos simétricos de movi­mentação sã? mais ~áceis ~e entender e examinar queo q~a~e ~ue lllcalculavel numero de posições e trajetosasslmetrIcos. A simetria de movimento é menos apai­xonada do que assimetria; a primeira, oculta a excita­ção pessoal, a última revela-a. A natureza controladae formal das posições e caminhos simétricos de movi­mento faz com que pensemos na solene beleza arquíte­tural ~e l;im templ? grego. Os movimentos que expres­s~m dlgmdade cerimonial ou religiosa serão preferen­CIalmente executados de forma simétrica. A descarga

208

Ti emocional de atitudes internas desequilibradas, provo­

cada pela paixão e pela exuberância, será mais apro­priadamente expressa, porém, através de movimentosassimétricos. Estes têm a tendência de se degenerarnum exagero desequilibrado ou num jogo caótico demovimentos fantasiosos e, conseqüentemente, são decontrole e domínio menos fáceis de adquirir; já os movi­mentos simétricos oferecem um fundamento comparati­vamente mais estável para todas as atitudes expres­sivas. Há, contudo, esquemas de organização dentro daprópria assimetria da movimentação humana. Estesesquemas foram elaborados e aperfeiçoados por. mes­tres da danca em várias épocas, todos com o intuito dedominar a itssimetria da expressão pelos movimentos.Um de tais esquemas, é a subdivisão do espaço em dire­cões básicas e derivadas". Poder-se-ia até mesmo dizerque os vários métodos de treinamento do movimentoelaborados ao longo dos séculos têm o objetivo funda­mental de atingir o domínio do desequilíbrio do corponos movimentos assimétricos.

É importante compreender que os padrões desenha­dos no chão pelos passos e no ar pelos gestos represen­tam aspectos de forma que são fundamentalmente dife­rentes entre si, apesar de sua similaridade. Enquantoque os desenhos de chão restringem-se a combinações delinhas curvas e diretas, produzindo desenhos que con­sistem das formas angular, redonda e em forma deoito os efetuados no ar se tratam de contornos doscorpos no espaço, os quais são criados pelos trajetosque as várias articulações do nosso corpo desenhamsimultaneamente no ar. Poderão configurar-se de modoespiral ou torcido, entrelaçadas como nós ou de mar:~i~a

direta e movendo-se pelo espaço como um projétil.Quaisquer que sejam suas formas, estas são tão cheiasde significado, como o são os desenhos traçados no solo.

Como exercício, terá alguma serventia para o estu­dante experimentar as várias formas mencionadas. ten-

* Vide R. Laban: Cboreuties . Publicado por Macdonald & Evans.

209

Page 107: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

tando desco?rir como é que elas se adequam aos esti­los dos per~o.do~. Também é valioso para o ator quees~e se familiar-ize ~om as formas de trabalhar, viajar,aliment~r-.se, dormir, cumprimentar e de outros costu­mes SOCIaIS ~e determina?l?s períodos e em vários paí­ses. Ao. praticar os exerCICIOS, deve-se cuidar para queos seguintes pontos fiquem bem claros:

- O significado do movirríeÍÍ.to que se dirige paradiferentes pontos do espaço;

- Expressões tais como a" hilaridade ou a raivaquando o corpo está esticado para cima ou cur­vado para baixo'

- Se as car'acterfsticas do movimento pertencem aum movimentador alto, médio ou baixo;

- Giros abrindo ou fechando;- Movimentos simétricos ou assimétricos'- A natureza dos desenhos de chão; ,- As formas dos gestos de braços e pernas.

O estudo da história do comportamento humanosugere um certo paralelo entre o desenvolvimento dosen~ldl? ~o movimento, no transcurso da história de vidad.o indívíduo, e o progressivo aprimoramento do conhe­cI.mento do movimento, no decurso da história da huma­mdade. O desenvolvimento das primeiras sacudidelasdo c51r:po, c~:acterísticos da primeira infância, até odomínio estilIzado de movimento, usado pelo adolescen­te,. pode ser c?mparado ao desenvolvimento das dançasprimitivas ate as dos tempos modernos. Não é ininter­rupta a lmha da evolução tanto no desenvolvimento domOVImento. infantil quanto no dos hábitos de movimentosdas comumdades, na dança. Evidencia-se em ambas a,,:olta, em ~ermos de uma espiral, de estilos mais primi­tivos, Apos a descoberta de cada nova combinação dees~o:ço que, para um período, é venerada como a per­feIç,al? dos hábitos de movimento, ocorre um retorno tem­porario a formas mais primitivas pois se percebe que a

210

especialização num número restrito de qualidades deesforço tem lá os seus perigos. Se, por exemplo, é culti­vado com exclusividade o toque leve ou a leveza, dege­nera-se a força do corpo. Se saem de moda os movi­mentos grandes e flexíveis, cristaliza-se a rigidez. Sese torna objeto de exclusiva preferência o extremo sus-.tentamento* na conduta e na dança, fica prejudicada acapacidade para uma decisão e uma ação rápidas. Ocor­re o mesmo quando, na nossa época, a velocidade passaa ser um ideal. A excessiva indulgência no elemento derapidez do movimento gera problemas nervosoS. Umaflexibilidade excessiva demonstrada em movimentostortuosos. tal como se verifica em algumas épocas dahistória, cria um estado de agitação inimigo de qualquertentativa direta de abordar coisas e idéias. A mobili­dade de serpente poderá índuzír a fuga de temas diretose claros. A brutalidade social e individual freqüente­mente relacionacse à glorificação da força física.

A preferência por umas poucas combinações deesforço apenas resulta numa falta do equilíbrio de esfor­ço. Essa falta nem sempre é notada a nível consciente,mas as pessoas, cansadas de uma dada moda de movi­mento, tentam introduzir formas novas que, bastantefreqüentemente, contêm qualidades de movimento emacentuado contraste com as que estavam sendo previa­mente usadas. Novas danças e novos ideais de compor­tamento aparecem segundo um processo de compensa­ção, no qual é feita uma tentativa mais ou menos cons­ciente de reconquistar o uso de tipos de esforço negli­genciados ou perdidos. Esta é uma tendência -que podeser observada em nossos dias. As formas européias dedanças contemporâneas de salão têm suas origens nairrupção dos estados de ânimo primitivos de dança quese contrapuseram à nossa rigidez tradicional. Do maxi­xe ao tox-trot, charleston, rumba e [ítterburg. um fre­nesi cada yez mais acentuado no movimento parece ter

1< N. da T. _ Sustentamento refere-se' ao fetcr de movimento: tempo, 5US-.

tentado.

211

"\I

Page 108: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

IIt .1

•,í

inv~dido os bailes europeus; apesar disso, a cada opor­tumdade, o excesso de mobilidade nessas manifestaçõesde esforço é domado e reduzido a formas mais calmasaté mesmo rígidas. '

Pesquisando eras ainda mais antigas da história,,,-emos que todo tipo de danças exóticas foram introdu­zídas quando as formas de movimento anteriormente emvoga se. tornavam muito esteriotipadas e desequilibra­das. MUltas vezes essas mudanças nos ânimos de esforçose seguiram a eventos históricos como, por exemplo,guerras ou conquistas; ou foram introduzidas pelos ex­pl?~adores que viram-nas ser executadas por povos pri­mítívos. As danças mouras seguiram-se às Cruzadas eas danças dos Peles-vermelhas seguiram-se à descober­ta da América. Mais recentemente, presenciamos aintrodução, no balé clássico, de passos das dancas folcló­ricas e das formas de movimento predomin~ntementeeslavas quanto à sua origem. São poucos talvez os quesabem que as guerras napoleônicas criaram a moda dese dançar na ponta do pé, ou melhor, na ponta dos sa­patos. Este era um aspecto das danças dos guerreirosTcherkess, presenciadas pelos exércitos franceses, du­rante a invasão da Rússia. A introdução desta maneiraquase acrobática salvou o balé clássico do perigo de umsentimentalismo doentio e de uma manifestacão desti­tuída de significado, de ornamentações lineares 'delica­damente interligadas. A rígida tensão induzida no bai­larino pela maneira acrobática de dançar nas pontasdos pés foi posteriormente corrigida pela introducão demovimentos mais impulsivos, tais como os que s~ vêemno assim chamado balé moderno.

O que muitas vezes escapa à atenção é que estasalterações não se originam dos caprichos comerciais ouartistic?s de instrutores de dança espertos; devemout:ossJm, ser consideradas como verdadeiras cornpen­saçoes que respondem à' profunda necessidade de manot~r .vivo o equi!íbrio de esforço, no âmbito amplo doshábitos de movimento da dança social. Tanto no decor-

212

'}!li'iiA'~." I

rer da história de vida de um indivíduo quanto ao longoda história do gênero humano, há um evoluir ininter­rupto na direção do domínio do equilíbrio do esforço.Este é um domínio que vai sendo gradualmente alcan­cada; porém, aqui novamente pode dar-se que o exage­ro das recém-descobertas possibilidades de movimentoprovoque o surgimento de modismos e de estilos tempo­rários, nos quais a preferência desigual por apenas algu­mas qualidades do esforço ponha em perigo seu uso bem­equilibrado.

O estudante deveria tentar inventar cenas nas quaisencontrasse aplicação prática, o seu conhecimento dasvárias causas da estilizacão do movimento. Estas cena"podem ser sérias ou ser apenas carícaturas e devem serexecutadas, exercitadas, analisadas e atribuídas a ca­racteres especificamente imaginados. Podem ser cenasescolhidas ao acaso. A imaginação trabalha lívrernen­te e às vezes parecerá irracional. O aluno não deve­rá hesitar em pôr em prática até os lances mais bizar­ros que surgirem em sua imaginação, acautelando-seapenas para tentar organizá-los de modo tal que consigeapresentar uma representação clara dos personagens,de seus valores e das situações, tendo em vista que cadaseqüêncía de mímica transforma-se finalmente num todobem concatenado. Alguns desses "flashes" imaginati­vos terão uma natureza onírica enquanto que outrosserão acentuadamente realistas. Os acontecimentos lógi­cos da vida cotidiana podem ocasionalmente ser enf'ati­zados de modo dramático, como no melodrama. Aqui,acentua-se o conteúdo emocional e os eventos terão umcaráter além do comum. No melodrama, um aconteci­mento extraordinário se segue a outro, enquanto que nodia-a-dia as coisas excitantes apresentam-se mais dis­persas. Acontecimentos ~m estad~s oníricas s~o. fre­qüentemente bastante vividos e ate mesmo fantastlcos,mas na vida em geral, mesmo que coloridos mais for­ternerite pelo melodrama: os eventos e as ações pouquís­simas vezes são sentidos nesta intensidade. É óbvio que

213

Page 109: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

) e~tilo de movi~entode uma cena do cotidiano, compa.r~tIvamen~evazio de eventos, trará diferenças em rela­ça.o a? estilo dançado do melodrama. Enquanto que noprimeiro caso I2revalecerão os movimentos de sombra,no segu~do ::;.erao usados movimentos mais ativos e am­plos. Não ha regra passível de ser estabelecida para ocomportamento, na terra do~ sonhos da imaginaçãoteatral. ,

. Indicam-se, nas cenas seguintes, algumas sítuaçõessimples. A tarefa 9-0 leitor é torná-las interessantesat~aves da expressao dos movimentos. As ações corpo­:aIs características, (vide capítulos 2 e 3) devem sermventa~as e os conteúdos dos valores das cenas devemser analisados e postos em prática várias vezes segui­das. As cenas nas quais há várias pessoas envolvidaspodem ser realizadas pelo leitor se ele imaginar osmovimentos dos co-atores; além disso, cada uma daspartes pode ser feita em mímica uma após a outra. Al­guns dos exemplos de personagens envolvidos com cer­tos. acontecIr:rent~s e _situações poderão eventualmenteestImul,;r ':l rmagmaçao do leitor para que ele inventesuas proprras cenas de mímica.

1) Imagine um pai e uma filha sentados lado alado, ambos lendo. Ouve-se uma batida na porta. A me­nma atende à porta e entra um homem em estado detotal exaus.tão..Na re~idade, é um prisioneiro fugitivo,que desmar':l alí ?~ chao. A filha vai buscar água en­quanto o paI~e dir-ige para o telefone, a fim de chamara polícia. A f'ilha , "apiedando-se do homem, intercede porele ]unt~ ao par, dissuadindo-o de telefonar. O intrusomal havIa. se colocado em pé quando se ouve uma se­gunda batId':l na porta. A menina se volta para o prí­sionerro na mtençao de escondê-lo em outro cômodoquando, para ~ seu horror, o homem cai morto. É o paiquem atende a porta. A polícia havia chegado.

2) Outro tema. Um mendigo adormece na calçada.

214

Sonha que mora num palácio. Está numa sala rica­mente adornada de tapeçarias e mobiliada de maneiraexótica. Profundamente assustado, ignora os tesourosartísticos e se dirige para uma mesa comprida reco­berta de iguarias. A fome o dilacera e, feliz por estarsozinho come como um lobo tantos manjares quantosagüent~. Subitamente, as estátuas de mármore da s~latornam-se animadas e avançam ameaçadoras em díre­ção do coitado. Neste instante, ele acorda e se vê aindana calçada, grato por não ser mais do que um pobremendigo.

3) Um tema de tonalidade melodramática mos,tr~­rá cortesãos reunidos na sala do trono de um palácioreal. Entram o rei e sua comitiva. Este confere o graude cavalheiro a dois de seus súditos. Entra um escravoque se prostra aos pés do imperador. Segue-o de pertoum homem enorme e de aparência feroz que tem nasmãos um açoite. Os cortesãos rodeiam ambos os intru­sos e procuram afastá-los dali. O rei or~ena-lhes queparem. Aproximando-se do homem ~o chIcote,. arreba­ta-o de suas mãos, quebra-o e determma que seja preso.O rei ordena ao escravo ajoelhado a levantar-se e partir,na qualidade de liberto. Prossegue a cerimônia da corte.

4) Uma empregada tirando o pó de uma sala pode­rá ser o tema que aborda ações do cotidiano em con­junto com uma fantasia assustadora. Enquanto admiraum vaso ela o deixa cair, quebrando-o em mil pedaços.Horrorizada com o acontecido, olha à sua volta a verse não haveria alguém que pudesse ter ouvido o baru­lho e, rapidamente, recolhe e guarda consigo os frag­mentos. No suspense que se segue, imagina-se na cortejudicial, o juiz apontando-a c,9m o in~icador. T~ês ho­mens representando seu patrao de tres formas dif'eren­tes ~stão de um lado e, de outro, três mulheres repre­serrtando sua patroa.. Toda uma multidão circunda-a.acusando-a em altos brados. Subitamente, desfaz-se ofeitiço. A patroa entra na sala e percebe de imediato

215

'e- _-

Page 110: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

que há algo errado. A empregada corre para ela, mos­tra-lhe os fragmentos e pede perdão, o qual lhe é gene­rosamente concedido.

. 5) Uma ação trivial do dia-a-dia será vista no se­gumte tema: um contínuo chega no escritório. Trazem­lhe ur;:ta pilha de formulários, em cada um dos quaisd~vera escrever as mesmas I)alavras. Enfadado, elep.a~a exatamente no momento em que o chefe do escrí­tC?rlO entra. e o conduz a uma mesa abarrotada de altaspIlhas de lIvros e papéis para serem organizados. En­quanto o rapazinho se vê às voltas com esta monótonatarefa, o patrão entra na sala. Num ato de extremaousadia, o rapazinho junta toda sua coragem para sequeixar ao patrão da falta de sentido de seu trabalhoao que lhe é peremptoriamente ordenado que faça com~lhe mandaram ou então que passe no departamentopessoal para pegar o aviso prévio.

6) . O tema seguinte é de tipo semelhante. Umalon~a fIla de pessoas está formada à frente de um alrno­xa,n~ado para receber pacotes de comida. É distribuídoo ultU!lO pacote e uma mulher com três filhos fica semrecebe-lo. Uma outra mulher, que havia recebido o seupresencia o sofrimento da outra e hesita entre a pena'que sen~e das cria?ças esfaimadas e o pensamento deseu mando que esta doente. O marido sente a sua ansie­dade. Divide então o pacote, oferecendo metade dele às~a mulher e a outra metade à mulher com as criancasficarido sem nada para si. Uma das crianças corre p-ara'ele, ofertando-lhe sua bonequinha.

. 7) A cena seguinte será mais melodramática, Vá­rios homens entram numa sala, sozinhos e aos pares.Juntos planejam um crime e depois se separam. Um doscomparsas fica encárregado de guardar uns documen­tos importantes. Está profundamente absorvido emseu~ pensamentos quando entram dois detetives. Trai­çoeIramente, dá as informações todas sobre seus com-

216

panheiros, sendo recompensado. Saem os detetiyes eele outra vez está sozinho. Tranca-se na sala e, agitado,atravessa-a de um lado para o outr?, em passos nervC?­sos. Ouve, nesse instante, uma batida na porta. Rapi­damente constrói uma barricada c0J::? ca~eIras, contraa porta, o que não impede os outros ?umplI~e~ de entrarno aposento; neste momento, o traidor suicida-se comum tiro. Uma apressada busca deixa claro o fato. deque os documentos estão em outro local. A quadrilhaentão se dispersa.

8) Um tema que envolva dança poderia começarcom uma princesa que estivesse escrevendo uma car~a

para um de seus favoritos. Chega seu tutor e anunciaa chegada de uma delegação real.. Relutante, e~a s.eergue. Os cortesãos entram e humildemente se. mC~I­nam. A princesa, ainda relutante,. avança em díreçãodeles. Voltando-se para seu tutor, informa-o d~ seu d~­

sejo de ficar sozinha; saem,todos..Ela querf'ícar soz~­

nha para poder dar asas a sua imagmaçao e deleí­tar-so com uma visão em que se vê dançando com 3sseus favoritos todos, que ela sabe estarem sem exceçaoapaixonados por ela; e, também na imaginação, rega­lar-se por um curto instante com a vida descuidada epouco contida de uma mulher mundana, amante dosprazeres comuns.

9) Tema de natureza. fantasiosa o~ onírica poderiaser o de um menino preguiçoso, que esta sentado a umamesa. Quatro empregadas se revezam (cada uJ?a delasdeverá ser representada por um personagem diferente)em oferecer-lhe pratos apetitosos para ver se, despertamsua falta de apetite. Cada uma das ofertas e recusada.As empregadas preparam-se para tirar a mesa. ~ntra

o pai do menino e, sem sucesso" tenta persuadi-lo alevantar-se. O pai caminha de la para ca em francodesespero. Chama então um empregado e or~e~a-Ihe

que os músicos venham até ali. Cheg?-m.os mus.IcoS epõem-se a tocar. Reanimado pela mÚSICa, o memno se

217--------------------_............~~--~

Page 111: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

levanta e começa a dancar, primeiro com umpregadas, depois com mitra O .' a das em-;.mprdegados se reúnam no baile 1~p~~~~~:ct~u~:f:soS5:Sican o exaustos mas o patrã t . vao

Volta o apetite do menino a a,o exor a-.os a prosseguir..ef

os empregados têm dific~~a~:tee;'lo~~~~~faexercícioorne voraz. ;:; zer Sua

tasi~2~ p~~~~fatemamelgdramátie:> e de tonalidade fan-A. ser a representaçao de um ti

cfntnco que estivesse entrando num salão ~a~o ego-

ta guns se~viçais que construam uma plataf~rm~ eana aros que pIntem novamente d .' ou­

decorem o salão b as pare .es e a teroeiros, quecom ar ustos florIdos e á A

menta? número de trabalhadores e durantrvores. u­todo o tlrano compele-os a trabalhar cada e o. temp.odamente até que, cansado de seu treslouc:~o~:IS :apI­or?ena de súbito que cessem toda ati .d d O pncho,feIto desagrada-o e d VI a e. trabalhorestituído à forma an~~g=n~p~ortanto,.que o salão sejaos trabalhador '. s cumpnrem esta ordem,suas reflexões.es saem, deixando o egoísta entregue às

tem~l) Um. devaneio .ou yisão é o que se descreve nocesta ~eS;;~I:~ Duas armas entram carregando uma

tE~~ar{~~~~~~~;!t~:~}E~~t~~~~~i;?1~uma mansao no campo re I t d e ese dela um bel . ' p e a e pessoas. Aproxima-cida, levanta-s~p~~~v~::aai~~r:ela, ag~r~ rejuv:e,?-es­

D~sa~arec~ ~ multídãn e -eles dan~~~as~~~~~~: A~s~~~::I:::r~ ;ur::~~cad o Jove~ ajoelha-se e beija a mão de suadeles. Afasta~seeor:~e~ze, su:ge o pai da moça dianteseu pai até seu quart~. A

ev~sioov~~ ~ a~ompanha~a por

entregue aos seus pensamentos. es az e a avo fica12) N ,.

. a proxrma cena misturam-se sonho e acão d_ o218

cotidiano. Um músico paupérrimo, tendo acabado suaexecução pública, entra numa loja para vender seu ·vio­Iino. Guardando no bolso a quantia recebida pela venda,sai da loja desesperado, pois estava separando-se deseu tão amado instrumento. Como se estivesse sonhan­do, vaga pelas ruas. Faz um frio terrível e ele não temalternativa senão entrar em outra loja para comprarum agasalho. Mais uma vez na rua, desolado e só, semseu violino, dá seu agasalho recém-adquirido a um men­digo escassamente vestido.

13) O tema que vem a seguir poderá ser realizadocom variações. Uma jovem prepara a mesa para avolta de seu irmão. Toca a campainha. Ela vai atenderà porta e volta com um telegrama informando que seuirmão havia sido morto. Ao ouvir os passos de sua mãe,ela oculta o telegrama em seu bolso e sai da sala. Amãe entra, presa de grande excitação. Deixando delado sua sacola de compras, despe o agasalho e dá osretoques finais à mesa. A filha torna a entrar na salae as duas se abraçam. A mãe estranha o ar da filhamas crê que. é devido à excitação pela volta do irmão.Olha-se então no espelho e decide que deve trajar-seconvenientemente para a ocasião e assim sai da sala.O pai chega do trabalho e a filha imediatamente lheexibe o telegrama. A mãe torna a aparecer, cumpri­menta o pai e este lhe dá a notícia. Abatidas, mãe efilha limpam a mesa. Uma variação desta cena pode­ria ser feita com mãe e filha apreensivas e inquietas aprincípio, recebendo um telegrama com boas notícias.A cena poderá terminar do mesmo modo que esta, asduas limpando a mesa, mas com a família toda enga­lanada, como em dia de festa, para receber o parentehá muito afastado.

14) Um sonho com conteúdo de movimentacão rea­lística poderia ser o de uma mendiga esfarrapada, quejá fora bonita, mas. que estava agora encarquilhada emaltratada, coxeando ao longo de ruas desertas e escu-

219

II

_.T------~_---_...........- ...........~--~

Page 112: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

i((

~I'UI,}

.."l'~1:r~1III1.,

111 i': l't .i'~.'" .

ras, numa grande cidade, a esmolar um pedaço de pão.A mulher se encolhe no chão, ao lado de um muro depedra, fracamente iluminado por um poste de luz. Aliadormece e, em sonhos, recupera sua vida anterior deriqueza e conforto. Ela e o príncipe (pois, na verdade,ela é uma princesa) estão na sala de recepção do palá­cio, junto com outros lordes e damas nobres. Como aprincesa, o príncipe é -bonito e popular e todos sentemprazer com sua vivacidade de espírito e maneiras gra­ciosas; mas ele agracia uma das cortesãs com excessivaatenção. A princesa vai se amargurando com o ciúmee começa a cultivar a amizade de um certo nobre sábio egeneroso, um dos altos oficiais do príncipe. A princesanão se mostra absolutamente cuidadosa em manter se­cretos seus sentimentos pelo rapaz. O nobre sente-seconstrangido pela conduta da princesa e, guiado pelosditames da estrita etiqueta da corte, fá-la saber que eleé um súdíto leal do príncipe e que não se acha dispos­to a envolver-se em intrigas. A censura estudada donobre instiga a princesa até à fúria. Presa de seu orgu­lho ultrajado e ao sentimento de solidão, caminha inces­santemente em seus aposentos, maquinando uma viugança, Aos poucos vai se esboçando um plano em suamente distorcida. Subitamente ela se detém. Desenha­se em seu rosto a malícia de um sorriso. Abrindo umarmário secreto na parede, retira um pequeno frascocontendo veneno e oculta-o em seu vestido. Volta a sen­tar-se com toda a sua natural compostura e orgulhosaelegância. Chama sua serva com toques altos de sinetee ordena-lhe que traga os candelabros acesos e jarrasde vinho. Neste instante, o príncipe entra com suacomitiva real e aproxima-se da princesa, cujos malignospropósitos jazem ocultos no mais gracioso e conquista­dor dos sorrisos. Os escravos servem o vinho e ofere­cem-no a todos e a princesa é vista no flagrante dedespejar o veneno na taça do nobre. É então banidada corte.

220

15) Uma cena realista de mímica, contend~ umevento extraordinário, é mostrada na cena seguinte:Uma velha senhora está tricotando ao pé da lareira.O fogo está baixo e ela sai para buscar l~nha. Durantesua ausência dois ladrões entram pela Janela. Come­cam a roubar'. Há um relógio que os dois desejam parasi. Começam a discutir e acabam por lutar p~la possedo objeto. A velha senhora retorna com. o ca::v?-o, depo­sita o cesto no chão e põe-se entre os dOIS larapíos. Cadaum deles lhe pede o relógio. Ela consegue acalmá-losde algum modo, sentam-se todos e comem as frutas queela lhes oferece. Sem que a observem, a senhora mIS­tura um soporífero e o oferece aos dois homens. Esteso bebem e caem no sono. Em seguida, a mulher cha­ma a polícia. Ela reav~va o fogo e ,s~nta-se ao lado.Novamente começa a trIcotar. A policia chega e enca­minha os dois assaltantes para a prisão. A velha senho­ra fica tricotando.

PRODUÇÃO DE CENAS GRUPAIS

Além do esforco individual do ator-bailarino, há umoutro aspecto característico da arte do movim~n.to: oaspecto do grupo, o esforço incorporado necessar;.o ~m

todo trabalho teatral. O drama, a ópera e o bale sao,cada um deles, o trabalho conjunto de ateres. cantores,dancarinos e músicos reunidos numa equipe que tempor -objetivo apresentar um trabalho artístico n~ formade uma encenação teatral. Os poetas, composItores ecoreógrafos entram com a idéia em torno da qual secristalizam esses trabalhos de arte. Os produtores emaestros supervisionam e assistem a criação .ge umaatmosfera comum, incrementada pela decoraçao, p.elovestuário e pela iluminação. O público, a contr?-partIdado palco, compreende e aprecia o esforço conJunto dacompanhia como um todo e este to.do tem uma formae um caráter definidos. Isto quer dizer que cada um, oator o dancarino, o cantor e o músico devem adaptarseus' atos individuais de movimento, incluindo os mOVI-

221

ht -------.lo-.-:-------'~~~~~~

Page 113: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

mentos para a produção da voz, às condições da cria­ção grupal, Tanto através do esforço individual quantodo esforço da equipe, o objetlvo é atingir o público, par­ceiro essencial de qualquer representação. O dom, oua habilidade adquirida, com que o artista produz osseus atos de movimento deve ser aprimorado pela habi­lidade de adaptar tal capacidade a exigências outrasalém das próprias. Estas outras condições são o textoda peça, incluindo as direções de palco, a decoraçãodentro da qual a encenação deverá ser efetuada, o grupode atares ao qual se associa, as orientações dadas peloprodutor e, finalmente, e tão importante quanto os de­mais, o espírito do público ao qual se apresenta o tra­balho. Todos estes fatores, inclusive o estilo da épocada peça, do balé ou ópera, podem estar tão distantes doartista quanto o caráter que ele irá representar. O ar­tista tem que se submeter às exigências do esforçogrupal e de seu estilo unificado.

O produtor pode organizar vários agrupamentos depessoas para expressar a conduta dos indivíduos, emsituações definidas. Será melhor se o leitor dispuser dealguns parceiros com os quais possa realizar as seguin­tes cenas de mímica. Ê também um exercício exce­lente tentar transmitir ao grupo aquilo que você deseja,por meio de gestos apenas, de gestos sem palavras queos acompanhem. Os temas de movimentação que po­dem ser expressos desta maneira são os seguintes:

a) O ajuntamento de um grupo grande, no palco,segundo estados de espírito diferentes mas sempre cole­tivos; todos alegres, ou tristes, ou desconfiados, etc.Invente uma ação comum que pressuponha o estado deespírito escolhido para o grupo.

b) A execução de alguma ação simples, tal como:trabalhar, jogar um jogo de salão, sentar, levantar,recostar-se indolentemente. Ação comum não quer dizerque todos executem os mesmos movimentos. Pelo con­trário, vários e diferentes movimentos harmonizam-senuma ação comum.

222

c) Uma reação grupal a uma das seguintes provo­cacões: correr para um canto, alegres o~ zangados:aproximar-se cautelosamente de um possível pengo. e

. reparar-se para lutar; expressar medo ou indicar fuga.~ provocação pode ser proposta por uma pessoa ou poruma parte do grupo todo. . . c

Compare a coordenação das dlferent~s quahdade~

de esterco de várias pessoas movendo-se Juntas. O m.?vimento -grupal terá uma forma, um de~enho de chaoou uma direção geral ou tendência e~paclal.

d) Divisão em dois grupos hostis; um d~les, cadavez mais indignado ou discordante d? outro, delx~ a cen.aenquanto o outro ou se acalma ou fica ainda mais exci­tado. Torna a entrar o primeiro grupo e tem lugar ou areconciliacão ou o conflito declarado. Vence. um dosdois grupos enquanto o outro se resigna ?u capitula.

Poderá ocorrer que um solista desafie, em lugar dogrupo todo, a outra metade dos partícipantes: nestecaso o jogo de valores tornar-se-a mais ObVlO do ~ue

nas ~enas grupais anteriores. Poderá 3e~ deI?Ol;st~a o,por exemplo, que alguns dos valores sao inatingivets. Ocovarde inveterado será para sempre alguem dl~tante

da coragem. Há, contudo, aquilo que se denorr:ma acoragem do desespero e aí pode acontecer um milagre.Não obstante, há muitos valores à disposição do covarde

ue poderão compensar sua falta de coragem: a ref~e­

ião a autodisciplina e o senso de ocultar sua cova~dla.À s~melhança do covarde, dificilmente a pessoa mdo­lente e ignorante mostrar-so-á cheia. d~ energia. ~~m.oconcurso de algum estímulo extraordinário. A pacienciae a gentileza podem mais facilfnen~e"tr~nsfo~m~r-seemraiva do que a ignorância em inteligência energrca.

Tente representar esse desenrolar da luta pelosvalores numa cena com movimento. Tenha em men~e

o estabelecimento das seqüências de esforço as maisapropriadas, para cada membro do grupo:. i

e) O assassinato é considerado, com [ustiça , o crs­me maior; seu contraste real, no entanto, que e o re -

223

- --- n------ ~

Page 114: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

peito pela vida dos demais, de modo algum é tido comoa mais sublime virtude. Os valores do amor, da ami­zade e da confiança são valorizados muito mais do queo simples respeito à vida. A semelhança disto, o res­peito pela propriedade é menos considerado do que abenevolência nas pessoas. Apesar disso, o rouba é maisobjeto da que a malevolência. Atas ofensivas aos inte­resses materiais alheios sãoconsíderados coma ignomi­niosos, infames e revoltantes, mas, respeitar os inte..resses materiais das pessoas parece-nos não mais doque algo decente. As ofensas contra valores moraiscomo a amar e a amizade são encaradas. com muitomaior tolerância. São faltas, mas não faltas abjetas. Asexpressões de verdadeira amizade e amor, dado seucaráter inspirador e liberador, são exaltadas como asmais altas virtudes.

Invente cenas grupais nas quais se manifestemestas opiniões gerais sobre os valores.

f) Um grupo pode retratar uma expressão geralde exagerada alegria ou excitação, tenda como resul­tado o desapontamento. Este poderá ser provocada pelofato curioso de que os objetos de valor material são divi­síveis e passíveis de serem distribuídos e que, quantomaior for o número de contemplados, menos cada umdeles recebe. Este fato contrasta agudamente com ofato de que os valores morais são indivisíveis e, apesardisso, cresce o seu montante proporcionalmente ao nú­mero de indivíduos que os exibem. Considere o conceitode amor universal. A alegria advinda do recebimentode bens materiais, assim como a inveja suscitada quan­do tais bens não são distribuídos, contrasta com a ale­gria do compartilhar valores morais e espirituais.

Invente cenas de grupo nas quais se retrate ou oestada de exaltação espiritual ou o de gozo de bens mate­riais e ande se revelem as conseqüências destes doisestados.

g) Mostre a reação grupal ao seu meio ambiente,tal como a solenidade que se sente em uma cerimônia

224

-

~.-':0"(-i religiosa; o intenso fri? Slue faz tremer; a res!stência

à lei e à ardem; a assistir a ?I?a ~alestra, .seJa abor­'da soja interessante; o alIVIO vindo do fim de umarecI , "d trossão: o pânico ante o perrgo ; a CUPI ez peran e a

r~ ,. . .distribuição de bens materíaís. . ,

Expresse, através de cenas grupais , como .e .que osonflitos sociais se baseiam em valores matenaIs e na~esejo de tirar deles a maior vantagem, em noss? bene­fício, e como, ao mesmo tempo, a ~m~a~e. S?CI:U tem

s origens em valores espirituaIs mdIvIsIveIs que~~':nentam na proporção ao número dos que os compar-tilham.

A mímica oferece a ocasião para express~r con-ceitos espirituais e mentais, nas cenas com movImento.O atar médio talvez relute em reconhecer ,este fato e osintelectuais cheios de si pertencentes a atualmentemoribunda escola Bloomsbury teria~ até chegado anegá-lo. O conhecimento da expressao dos esforços ,edo mundo dos valores capacita-nos a provar pa.ra nosmesmos e para os outros que a linguagem do mO,v~mentoão se restringe à representação de eventos f.ISICOS.

n É recomendável que; a princípio, selecIOn,em-seformas elaboradas de ações físicas comuns (sem II?ple~mentes). tais como: construir uma represa.ou um dique:arrastar-se numa floresta; tratar de fendas; ~er 1;!mcirurgião realizando uma operação; ser ?~ cozínheiropreparando uma refeição; ser uma domestIca em seustrabalhas caseiros; atuar como um grupo executandoexercícios atléticas ou militares.

Quando se oferece ajuda aos smtros: um sussurroemocional causará arrepios. Como_e q~e isto se expres­saria em termos de movimentos? Sao dIferentes as duasmodalidades de satisfação que. acompanham a 0J:te~­cão de valores de ordem materIal e moral. No prrmei­;0 caso a satisfação poderá ser intensa mas, de al­guma f~rma, manter-se-á superfícial.: no seg~nd~ o~or­rerá muito mais profundamente. E a porçao l~bmado ser humano que responde aos valores morais. A

225

Page 115: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

equanimidade profunda e o equilíbrio interno de umapessoa que geralmente se concentra na temática dosvalores morais contrasta totalmente com a inquietainstabilida~e sem descanso daqueles que se lançam àcaça de objetos materiais. A nível individual, está claroque t?dos s~o l!vres para optar por um bolso cheio dedinheiro ao mves de buscar as profundidades equilibra­das da personalidade. Mas o que dizer-se da escolhaem si? É, precisamente esta diferença de gostos quetorna possível a luta pelos valores e, conseqüentementepossíveis os conflitos dramáticos. Como é que se rnarri­featam, nos movimentos, a equanimidade e o equilíbrio?~ compreensível que a mera explanação verbal não con­siga des~rever exatamente a manifestação destas qua­lídades mternas. Embora seja difícil descrevê-la empalavras, tal experiência interna pode perfeitamente serexpressa, através do movimento. A virtude do teatroreside, em grande parte, neste fato.

. A rotina da representação teatral encaminha-se porSI mesma para um número estonteante de observacõesdos movimentos. O diretor de cena e os artistas reve­lam, em vários estados de espírito, formas interessantesde conduta não só durante o espetáculo, como tambémantes de subir e depois de descei' o pano. O ator queou se atrasa ou se adianta excessivamente, nos basti­dores; aquele que, já meio vestido, esqueceu parte deseu traje: o ator que deve ser contido ou estimuladopelo diretor; o ator sempre meticuloso em excesso' oaparentemente indiferente e o nervoso; e o que se'vêtao afetado pelo medo do palco que chega ao vômito eao desmaio. Todos eles são modelos excelentes de ex­pressão de movimento. Como eles, o artista absorto emseu papel e que se comporta artificialmente como opersonagem que irá representar, os rivais num papelque começam a discutir nos bastidores e o artista quen~cessitaser encorajado antes de poder entrar em cena,sao todos bons objetos de estudo para o mímico. Observeo ator que entra pelo lado errado, que não consegue

226

subir a escada, que cai, escorrega ou tropeça nos basti­dores e no palco e que está todo preocupado com suaaparência. Esses infortúnios. acidentes e vai~ade~ tãocorriqueiros resultam de atitudes humanas ínteríoresou se fazem acompanhar delas. Qual é a diferença entreuma representação tosca e burlesca de tais cenas e umarepresentação mais sutil do sofrimento delas decorre~­te? A nível psicológico, poder-se-Ia dizer que o senti­mento de compaixão, ausente na 'represent?-ção de piorqualidade, está presente na de melhor. Porem, as cenasburlescas e de pastelão não evocam freqüentemente umsentimento de compaixão mais forte do que o fazemas de nível melodramático mais sério? E das duasapresentações, qual seria a mais ridícula?

Estes pontos são de bastante interesse na mímica,pois esta é a atividade em que as pessoas são cômicascom total seriedade; o artista absorvido por seus negó­cios particulares, o que fica com conversa mole o tempotodo; o que flerta; o que cambaleia, intoxicado, pelosbastidores; artistas em greve; aqueles outros que C~l­ticam a iluminacão, o cenário, a produção e tudo o mais,exceto sua própria atuação; os artistas super-ansios.~sem apresentar suas falas, que irrompem pelos .vestIa­rios a arrumar os trajes, que refazem a maqUIlagem,provocam distúrbios no grupo, nas cenas finais no pal­co' o que tenta forçar as chamadas, corre pela boca doparto e depois recua para trás no palco. Quais esforçose valores subjazem a todos estes acontecimentos? Obser­ve os atares atendendo à chamada para entrar em cena:alguns conservando o personagem, outros mudando paraum estado de ânimo pessoal de excessiva amistosidadeou excessiva auto-afirmação e aqueles aindaque come­cam a exibir muita mobilidade ou muita rigidez. Obser­~e o atar desanimado e descontente com suaatuaçãoe falta de êxito; note o comportamento do elen<?o; dopúblico; as discussões entre colegas e com o dlr~to~,com o pessoal da iluminação e com qualquer outro l?dl­víduo que possam encontrar para começar uma brtga ;

227

----------_.....~-----~~~-~._--~

Page 116: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

o artista presunçoso bastante satisfeito consigo mesmoe com su:'t. atuação ; o outro, que é invejoso, estimuladopor. hostIhd~de. profissional ou particular; o artistam,:us.do que jovial que abraça e beija todo mundo índís,cnmmadamente; o que esquece suas chamadas ou queemp?rra o~ outro~ para a boca do palco, sem a menorconsIderaçao.; o dIs~re~jssimo; e o sentimentalóide quederrama ~oplOsas Iágr-imas depois que baixa o pano.Poder-se-Iam desenvolver muitas cenas resultantes des­te tipo de material. As reações do diretor de cena a taisatuações, assim como as controvérsias entre ele e osa;t~stas podem ter uma tonalidade burlesca, côrnica ousena.

O esforço e os movimentos humanos são os únicosmeios de ação ; produzem situações e constituem o veí­culo das mudanças na vida e no drama. São tão incon­táveis estes acontecimentos quanto o são as estrelas da':ia Láctea. Motivos semelhantes podem ocorrer repe­tidas vezes; todos eles, no entanto, têm seu protótiponum tipo de mito que abarca toda a multiplicidade datragicomédia básica da existência.

CENAS SIMBÓLICAS

Um tema grandioso poderia ser aquele do conflitoentre dois grandes mistérios: Vida e Matéria. Pode-sevisualizar a Vida como estando ativamente envolvidacom Peso, Espaço, Tempo e Fluência, enquanto que aMatéria estaria passivamente submetida aos ditos fato­res. A Vida tira da Matéria o seu peso. O primeiroimpulso da Matéria, galvanizada pelo impacto da Vida,é a fonte de todas as venturas e sofrimentos insuspeitosda humanidade, tal como relatados pela história e queos dramaturgos usam em sua arte. Não há ser vivocapaz de escapar a este refletir dos motivos fundamen­tais, em sua vida individual. Ser concebido e nascer,crescer corporal e mentalmente, amadurecer e morrer- eis o vasto e abrangente movimento do drama de

228

paixão que é o destino de tod~s nós. O meio essencialde" expressão humana - o movimento corporal - acom­panha, portanto, o esquema fundamental de vida e exis­tência. Cada um dos movimentos tem seu momento deconcepção e nascimento, de cresc:imento e envelheci­mento e, finalmente, de desaparecimento no passado eno nada.

É uma verdade fundamental que a aparente cruel­dade deste motivo primário da ação dramática é suavi­zada pelo sorriso que confere à Vida uma delicadezaessencial. Nós somos impelidos a rir; o riso, porém,compõe-se de tragédia e de comédia porque, ao rirmosde nosso destino, somos levados a concluir que, de modoalgum, o homem não é tão importante quanto ele gostade se imaginar. Acabrunhados, percebemos que <;Jsmesmos gestos que usamos para expressar nossas maiselevadas aspirações também servem por vezes aosmais sórdidos objetivos. As lágrimas vertidas nos mo­mentos trágicos da vida parecem ridículas a muitos denós e é freqüentemente sinistro o nosso riso, frente asituações côrnicas, porque em ambos os casos lembra­mo-nos de que não passamos de átomos neste vastomundo. O materialista inclina-se a considerar sua pró­pria existência e também seus esforços e movimentoscomo algo de pouca valia, perante este radiante e agi­tado universo estelar, e que ele não é mais do que umapartícula de matéria posta acidentalmente em movi­mento. O materialista está errado. A Vida e seu gene­roso sorriso recordam-nos igualmente de que a crueldadesuperficial da existência nos torna mais cuidadosos eautoconfiantes em todos os tipos de situações, de modoque a aparente maldade parece, de certo modo, funcio­nar para o bem, oferecendo boa dose de esperança aosidealistas de nossa raça. O .corpo material do homemé como uma bigorna onde, incessante, bate o marteloda Vida. Um desconhecido ferreiro parece estar ocupa­do forjando uma obra-prima, ainda irreconhecível.Nesta misteriosa operação, que é o meio pelo qual se for-

229

Page 117: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

ma o carátcr, as lágrimas e os risos voam como fagulhase suas centelhas iluminam a obscuridade da oficina doferreiro. O homem vislumbra então o indeciso esboço deum ser, que pode reconhecer como o Ferreiro, e tem uma·vaga intuição da obra-prima que ele ainda virá a ser.

. Essas insinuações assomam, às vezes, no teatro,mas não podemos deixar de admitir que aquilo que real­mente vemos ali e ouvimos são os movimentos de tra­balho de atores, cantores, dançarinos e músicos. A cruanudez dos movimentos vê-se transcendida por um es­forço imaginativo por parte de todo um grupo de artis­tas e é este esforço, oriundo das profundezas de suaspersonalidades, que nos transmite tais insinuações. Atransfiguração imaginativa de um esforço, a partir daqual flui espontaneamente um movimento, é fator indis­pensável à nossa liberacão da monotonia cotidiana e àrecriação do espírito que temos em mente atingir nasencenações teatrais. Desejamos ver a vida de um ân­gulo novo e, desta forma, entender mais completamen­te as violentas batidas de nossos próprios corações.Imersos como estamos na perspectiva comum da multi­dão, desejamos esquecer nossas preocupações e inte­resses individuais e rir ou talvez chorar. Perguntas an­siosas .. afloram em nossos corações. Nossos desejospodem ser realizados e as nossas perguntas podem serrespondidas por um grupo de artistas, indivíduos queaprenderam a dominar sua química pessoal de esforçoe a coordená-la com a do grupo. Este feito não podeser conseguido apenas por meio de uma disciplina mecâ­nica. É evidente que seus corpos devem ser treinadospara a tarefa, a fim de que tenham condições de criarformas e sombras de ações imaginárias; suas criações,no entanto, devem simbolizar e estar repletas de umnível de vida aquém e além da percepção sensorial.

Parece ser um mistério como é que os sentidos, osolhos e ouvidos do espectador, possam ser levados .aperceber aquilo que está acima e abaixo de suas impres­sões sensoriais. Uma companhia de atores, cantores e

230

dançarinos de gabarito consegue, sem dúvida alguma,fazer com que o espectador compreenda mais do queaquilo que ele efetivamente vê ou ouve. Isto, porém,torna-se menos surpreendente se compreendermos queo penetrar nos mistérios da Vida é algo intimamenterelacionado à aquisição de qualidades bepl-defin~d~sd?sentido do movimento. Curiosamente, ha uma similar-i­dade profunda entre o processo de produç~o de .m~lVi­mentes habilidosos e o processo da produção artlstlc!l'O uso generalizado da palavra "arte" para uma açaohabilidosa em qualquer tipo de atividade human~denu~­cia um desejo secreto dos homens. Mas uma.aç~o hab~­lidosa nem sempre está relacionada aos mveis maisprofundos da vida. O virtuosismo completo, apesar deraro, em termos comparativos e, portanto, dotado. deum certo valor, mantém-se muitas vezes como .um tipode excelência exterior. O trabalho no pa~c~ exige ma~sdo que uma capacidade meramente mecamca. O fluirharmonioso do movimento nos gestos, ~a voz e nas pala­vras é governado por leis que se manifestam no estr~­nho mundo dos valores subjacentes, re~elados atray~sdas lágrimas e risos, no teatro..Um ~rtIsta pode exIl;nrum certo virtuosismo para a satisfação de seus desejosegoístas, sem incomodar-se muito com o.nível de vera­cidade interna que as formas de seu movImento possamrevelar, o que minimiza sua capacidade de prov<?car areverência perante a vida, profundament~escondI~o noíntimo do espectador. É verdade que o Vlrt~os~ nao seincomoda muito com o sentimento de reverencia ~o ~s­pectador pela Vida. Seu nível de satisfação é atingidoquando consegue provocar admiração suficiente. paralhe permitir extrair poderes é riquezas de tal sen~I;ne?­to. Ele não fica com qualquer, drama de conscienciaporque, ao cegar as pessoas com seus dotes.ofuscapte,s,poderá estar ocultando a importância da VIda ao mve.sde revelá-la. Não chega nem a notar que sonega o .alI­mento espiritual pelo qual tantos anseiam. Esse artIst~fica bem contente em satisfazer seus prazeres maIS

231

I!

----------------~---------~.;;.;'''_..,=

Page 118: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

superficiais, e está totalmente satisfeito com o sucessoexterno. A mitigação do mais profundo anseio do pú­blico exige uma atitude e um refinamento de esforçototalmente diferente daqueles parcialmente oferecidospelo virtuose. Ainda um grande número de pessoas hojeem dia acredita que todo o ensino e treino do movimentoconsiste na aprendizagem de truques com o corpo e queo objetivo deste treinamento é exibir o brilho vazio tãoao gosto do virtuose. Isto demonstra que a maioria daspessoas não tem a mais pálida noção do que sejam aforma e ritmo do movimento de palco; e não têm cons­ciência do mais profundo propósito ao qual busca servir.

a movimento é um processo pelo qual um ser vivose capacita a satisfazer uma gama imensa de neces-·sidades interiores e exteriores. a ator-cantor-dancarinoproduz movimentos no palco que resultam em gestos,sons e falas. a repertório de movimentos abarca todo oâmbito de ação através da qual satisfazem-se as neces­sidades cotidianas; há, no entanto, uma diferença mar­cante entre o comportamento diário e aquele exibido nopalco. Não passa de uma meia-verdade dizer-se que aVida é a realidade e que as encenações teatrais nãopassam de um faz-de-conta. Se o "faz-de-conta" querdizer que o ator tenta criar na mente do espectador algu­ma espécie de crença nos significados mais profundosda Vida, significado oculto atrás da aparência externa,então a afirmação é verdadeira. Mas não se poderiaconcordar que a tarefa do artista é induzir o espectadora acreditar que sua representação é apenas uma cópiasimulada dos eventos da vida diária. Felizmente, isto éimpossível porque, como todos os movimentos, os fatostêm que ser cuidadosamente escolhidos e integradosnum todo se se deseja apresentar uni trabalho eficientede criação teatral. Além disso, a seleção e a organiza­ção devem ser realizadas de maneira especial para queseja evocado um estado de espírito definido no públicoe para que este se conscientize de alguma nuance parti­cular do significado da Vida. Então, e somente então

232

é que se torna possível. C?m o auxílio da peça e dosmovimentos nos quais consiste sua representaçao, plan­t r no coracão do espectador a semente da qual possac~escer um;;' flor do jardim interior. Poderá aconteceraté que uma fruta venha a ocupar o l~gar da flor; afruta que se configure numa nova atitude peran~e aVida. a poder de fazer com ~ue a~ pessoas acreditemem coisas quase que íneréveís :esIde mteIram:nte nacapacidade bem cultivada do artista para o movimento.

233

Page 119: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

CAPíTULO 7

TRÊS PEÇAS MÍMICAS

~'f-~XTO escrito de uma peça oferece ao ator uma baseo Ida para 3e~ trabalho. É verdade que o diálogo de

um rama nao ~ tudo de que se tem necessidade. O atorte!? que .t:ad~zlr a palavra escrita em movimentos audí­vel~ e visrveis, O teatrólogo fornece-lhe indicacões tãoe~a as_ quanto possível referentes aos personagens às:~~açoes e aos valores pelos quais lutam as pessoa~ do

~do. Algumas vezes também, o dramaturgo dá índí­caçoes de açoes e movimentos. Estas indicacões con­tudo, mo~trar-se-ão incompletas €i superficiais, s~ com­paradas as palavras exatas que serão emitidas.f dO dançarmo em geral tem alguma música na qualun amenta s.e1! trabalho. Lá encontra um ritmo e um

estado de espír-ito e, em alguns balés, também se apre­sent~ um resumo dos principais acontecimentos Ocoreogr~fo é ql;'em principalmente auxilia o baila~inoqua~to a organização dos "passos". Os "passos" e~ovlmentos ~o balé clássico têm nomes e, desta manei-a, o dançarmo pode exibir uma imagem relativamente

gara da.s evol~ç?es corporais que ele deverá realizar.conteudo mirrnco mais sutil vem parcialmente índí­

ca~o ~o resumo do balé. Os bailarinos que criam suasproprras danças têm que encontrar a música apropriadaao tema.dos movimentos que pretendem representarcaso decidam não fazê-lo em silêncio, isto é, sem acom­panhame?to. Neste caso, têm que inventar os "passos"e ?s.movlmer:tos segundo a música escolhida; caso con­trárto, deverao ter uma música ou som especialmentecompostos, que irão sustentar adequadamente sua

234

coreografia. Isto é o que freqüentemente acontece nobalé moderno.

Na dança moderna, quer dizer, na forma contem­porânea. da arte da dança, não se estabelece uma com­posição a partir de um conjunto fixo de movimentos ou"passos", mas as concepções de elementos do espaçoe de elementos de esforço são um guia para se formu­larem as ações corporais. Para muitos bailarinos mo­dernos, a "dança literária", aquela cujo conteúdo podeser descrito num resumo, não é dança de modo algummas, sim, dança-mímica. Os movimentos familiares aoespectador devido à sua semelhança com os que se usamnas ações e comportamentos cotidianos são suspeitos aesses dançarinos modernos. Acreditam estes que oconteúdo real das danças jamais poderá ser descritoem palavras e, portanto, abominam os movimentos dedança que possam ser compreendidos intelectualmente.Acentuam-se, na dança moderna, aqueles aspectos danatureza humana que antecedem a fala e as palavras eque estão fora da esfera de qualquer recordação pes­soal de acontecimentos reais ou eventos da luta normalda vida, com as reações emocionais logicamente ineren­tes a tal luta. Na pintura moderna, o assunto ou temaé abstraído das impressões sensoriais ordinárias, rece­bidas do mundo exterior. Do mesmo modo, o dançarinoabstrato ou moderno tenta transmitir um "insight" deum estranho mundo espiritual que lhe é peculiar. Pre­sume-se que este mundo constitua a "herança primáriado espírito humano corporificado", nas palavras de umbailarino contemporâneo. A dança, para estes artistas,é a manifestação daquelas forças internas a partir dasquais brotam as complicações dos acontecimentos hu­manos. Eles não se interessam pelas situações, eventose conflitos da vida prática, nem tampouco pela formarealçada que o drama confere a tais conflitos, ao retra­tá-los. Acreditam eles que podem cavar ainda maisfundo na realidade que subjaz às experiências ordiná­rias da vida e que a dança é a linguagem pela qual

235

r

Page 120: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

pode-se transmitir ao espectador esse nível mais pro­fundo de conscientização. O tema de todas as dancasabstratas consiste exclusivamente no desenvolvimentode um ritmo característico de movimento, à medida emque vai se desenrolando através de alguns caminhos noespaço. A impressão que o espectador obtém destas for­mas ou desenhos espaciais ritmicamente progressivose desenhados no ar pelo corpo humano, de modo algumé apenas um arabesco ornamental. Caso fosse, teriaapenas um valor decorativo de beleza exterior, mas lhefaltaria qualquer significação mais profunda.

Os dançarinos modernos e os entusiastas da dancamoderna vêem nestas evoluções no espaço o mensagei­ro de idéias e emoções que ultrapassam os pensamentospassíveis de serem expressos em palavras. É óbvio queos movimentos que traduzem estas experiências inter­nas devem ser cuidadosamente escolhidos e organiza­dos em ritmos adequados às sensações interiores. Estaseleção resulta de uma concentração profunda e poderáenvolver um esforço tremendo e prolongado. O fatormental ou intelectual restringe-se à memorizacão dasérie correta de movimentos, a qual é a conseqüênciada seleção. Às vezes, dá-se um título a estas dancas abs­tratas; este, porém, não indica conteúdo algum, ape­nas um estado de espírito. Uma danca abstrata nãopode jamais ter um resumo porque seu conteúdo nãotem condições de ser descrito em palavras. A idéiatoda de modo algum é tão extravagante quanto poderiaparecê-lo para as pessoas que antes nunca deram muitaatenção para o problema. Na realidade, quase que to­das as danças folclóricas tradicionais e as danças na­cionais são abstratas. Ninguém consegue descrever oconteúdo, por exemplo, de uma "chaconne" ou "gavot­te". Tudo o que se consegue descrever é a seqüência e oritmo dos passos e os gestos que o dançarino tem deexecutar. O dançarino moderno reivindica o direito decriar invenções pessoais na dança, com base em seqüên­cias de evoluções não convencionais de seu corpo. Desta

236

forma espera realizar uma espécie de invocação mágicaou en~antamentodos poderes da vida. Estes poderes ouforças não têm nomes em nosso vocabulário contempo­râneo, mas todos os conhe<;emos quando o encon~ramosna forma de incontáveis ímpetos ínteríores. atI~l;lde:>,emoções e crenças. O homem atual oculta a expenencladesses poderes. Provavelmente, ele ~ente vergonha oumesmo medo de tais forças porque nao podem ser mte-lectualmente explicadas. .

Alguns bailarinos atuais t~~tam ~dot?-r. a termmo­Iogia e os pensamentos da analIse pSlCologlCa c~mt~m­porãnea, para descrever o conteúdo de suas. cnaçoes.Defrontam-se como dilema de empreg?-::em tal~ termos,ou de acordo com seu significado cien~l~lco ace~to, ~~ demodo livre, num sentido quase que poético ou símbólico.No primeiro caso, o conteúdo da dança e mtelectualIza­do do mesmo modo que ocorre ao empregarmos outraspalavras com seu significado conv:nclOnal. No segundo,seria necessário que o artista explIcasse detalhada~~n­te o significado dos termos empregados,. o que tam emé impossível. Parece que todas as tentatn,:as de se falara respeito da luta entre as forças naturais. lut~ perce­bida em nível muito profundo, só teriam condições d~acontecer numa comunidade onde ~ouvesse u~a .terlTJl­nologia filosófica ou religiosa aceita pela m.alOna. To­das estas considerações têm, por vezes, e~t:m~ado osdançarinos modernos a dança::e!U em slle~clO, semacompanhamento musical. permItmdo que a lmguagemdo movimento fale por SI mesma. .

O mímico não encontrará quase que nada escr~oem que possa basear seu trabalho. Em comparaçaocom O, grande número de peças de teatr? .acumuladasao longo dos séculos, na literatura dramatIca, e com oigualmente vasto acervo de m~si?as ?e ?anças, pode-sedizer que a literatura sobre mimica e vIrtualmente me­xistente. É da maior dificuldade desencavar as pousassinopses de antigas peças mímicas espalhadas aqui eacolá pelos tratados históricos sobre o teatro, ou em

237

Page 121: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

out::o~ livros. Não exist: uma tradição quanto à corn­posiçao de peças de mímica, Um artista que desejeerrar uma peça do gênero está completamente abando­nado à sua pr?pria intuição e criatividade. A invençãode cenas rmrmcas curtas não é assim tão difícil e "es­p.eramos que os exemplos esboçados nos capítulos ante­rIore.s .tenham proporcionado ao leitor o incentivo ne­ces~arlO para criar essas cenas. Uma peça mímica"mal;' longa, que c~ms.iste de várias cenas ou atos po­dera talvez contr-ibuir com novas perspectivas parao estudo da arte do movimento no palco. Portanto,acresce~ta~os ao pre~ente texto alguns esboços depeç:'ls rrnrmcas. Poderao proporcionar ao leitor a opor­tumdade de acompanhar desenvolvimentos coerentes~e e~forços bem como alguns conflitos de valores, emaT-bl~o bem amplo. Esses croquis de peças mímicasnao sao ~rabalhos ~e arte. Não pertencem nem à poesia,na q,!ali.d::de d~ ht.eratura dramática, nem tampoucos.tIa rttmícídads mt::mseca lhes permite reclamar aqueletipo de valor musical que uma peça de música tem.Um bom esboço de mímica tem a tarefa razoavelmen­te negativa de omitir todas as situações e idéias que nãopossam ser representadas pelo movimento. Poderá sur­gir a modalidade artística de peças mímicas escritas,se as pessoas se derem ao trabalho de aprender a escre­ver e ler textos de mímica, anotados segundo uma no­menclatura exata para movimento.

Os leitores que houverem estudado e assimilado oconteúdo dos capítulos anteriores deverão estar emcondições de apresentar uni conjunto preciso de movi­mentos a serem empregados na interpretação de umenredo de mímica. As três descrições verbais de peçasmímicas inseridas neste texto estão colocadas apenasde maneira bem sumária; a tarefa do mímico é preen­chê-las com um perfil de ritmos de esforço dotados devivacidade e expressos em movimentos definidos. Ainterpretação, seja ela rica e imaginosa ou pobre emonótona, é o verdadeiro ato criativo. Ultrapassa de lon-

238

"'•

ge o escopo deste livro a intenção de apresentar umadescrição minuciosamente detalhada das interpretaçõespossíveis das sinopses que se seguem, bem como dasseqüências de movimento que lhes seriam apropriadas.É preferível que o leitor resguarde sua liberdade decriar a própria versão, encontrando os ritmos de esfor­ço e as ações corporais que caracterizariam a persona­lidade em atuação e seu comportamento, em determi­nadas situações.

O primeiro esboço apresentado aborda o antigotema da "Flauta Mágica", mais conhecido na formade ópera de Mozart. Já se escreveu muita coisa sobreo significado simbólicu desta estória, que é consideradauma transcrição artística de um antiqüíssimo ritual deiniciação. Estes rituais têm todos uma idéia básicacomum, apesar de suas formas exteriores variaremsegundo as diferentes raças e épocas da história. Aidéia básica é a de introduzir os adolescentes na cons­cientização das poderosíssimas forças vitais que os im­pelem ao amor, à ambição e à satisfação da curiosi­dade. O resumo aqui oferecido conta apenas o inícioda estória: como é que o jovem Tamino obtém suaflauta e a primeira vez em que faz uso dela. A lutasubseqüente de 'I'amíno com todos os elementos daNatureza, bem como a aquisição posterior de umamentalidade madura, seria o conteúdo dos outros atosadicionais da peça, não apresentados aqui.

A BUSCA DE TAMINO

Tamino e seus companheiros, que o reconhecemcomo seu líder apesar da pouca idade, chegam a umlocal desolado, pedregoso e inóspito. Vão entrando nosarredores desconhecidos com ar apreensivo e ame­drontado.

" Ao cair de uma enevoada tarde, um arbusto soli­tário à beira de um penhasco rochoso assume a formade um gigante abaixado. Está ameaçando uma forte

239

Page 122: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

tempestade; o barulho que vem de sua formação jun­ta-se ao que chega do oceano próximo e parecem fun­dir-se ambos numa voz sobrenatural, que repete mono­tonamente um misterioso cantochão de encantamento.Ê a voz do gigante, Monostatus, servo da Rainha daNoite.

Monostatus foi enviado com a incum.bência de armaruma cilada para o mais corajoso dos jovens, o qual aRainha da Noite deseja usar para seus propósitossecretos.

Tamino desconhece tudo isto mas, como é o únicoque se mantém firme e resoluto diante do poder desco­nhecido, é o escolhido por Monostatus para ir ao encon­tro da Rainha da Noite.

Após seus companheiros terem sido varridos paramuit.o. longe pela fúria da tempestade, cessa o cantarenf'eitíçadn e aparece acima da cabeca de Tamino ofirmamento azul-profundo, coalhado de estrelas. Ê omanto da Rainha da Noite que chama o gigante Monos­tatus e ordena-lhe que agracie Tamino com a flautamágica. A Rainha não aparece para Tamino; tem seuspróprios planos de como entrar em contato com ele.

Tamino está exausto e se afunda nas ásperas raí- .zes do solitário arbusto; envolve-o profunda escuridão.Ao acordar já é madrugada, e a névoa encobre o arbus­to; o gigante Monostatus desapareceu. Tamino encon­tra a flauta mágica no chão, a seu lado. Está ao mesmotempo confuso e perplexo, mas tenta tocá-la; as notasencantadas de seu novo tesouro reanimam-no. Empol­gado com a beleza de sua melodia, dança a perder deVIsta num transporte de alegria e felicidade.

Novamente aparece a Rainha da Noite, mas seumanto majestoso se dissolve na bruma da manhã. Comaguçada astúcia, assume a aparência de uma velhamulher envolta num tecido cinzento que suas servasteceram com a bruma. Neste disfarce de velha senho­ra, a Rainha da Noite se acocora e aguarda Tamino.

Este reaparece contente,tocando sua flauta. Ao ver

240

'I

Ia velha, aproxima-se lentamente, apiedado de suapenúria.

A Rainha finge assustar-se com o súbito apareci­mento do jovem e simula surpresa ao ver um moço tãobonito vagueando sozinho pelo desértico planalto. Eladá a impressão de desejar saber o quê ou a quem estáo rapaz buscando, tão distante de qualquer grupohumano.

Tamino sabe tão-somente que está buscando algu­ma coisa, mas não atina com o que seja. A velha mostra­se amarga. Fixa miseravelmente o olhar à sua frente,sabendo que o que ele busca é algo que ela perdeu.Tamino oferece-lhe ajuda para descobrir o paradeirode seu tesouro perdido; neste momento, a mulher tirade dentro das dobras de seu manto um reluzente cristal.Tamino ergue o cristal até à altura de seus olhos, admi­rado com sua luminosidade igual à do arco-Íris. Aovoltá-lo em direção do horizonte iluminado pela rósealuz do sol matinal, Tamino vê na pedra a mais belaimagem que seus olhos já haviam presenciado: a visãode uma jovem. As delicadas nuvens a meio caminhoentre céu e Terra, raiadas de dourado, assumiram aforma de Pamina, filha da Rainha da Noite.

De imediato, o jovem apaixona-se perdidamente evê-se preso a incontido desejo de chegar até ela. Esque­cido do cristal, vai escalando os caminhos rochososdaquele lugar no intuito de tocar a encantadora apari­cão. O cristal cai no chão e se quebra em mil peda­ços. Desaparece a visão.

Em seu desespero, Tamino implora à velha que lheexplique a natureza da visão e lhe diga onde podeencontrar a maravilhosa criatura que o tocara tãofundo em seu coração.

A mulher ergue-se agora em toda sua altura, lan­çando fora o manto cinzento que a disfarçava. Boqui­aberto, Tamino está defronte. à .majestosa Rainha daNoite. Compreende então que a jovem que avistara éa filha da Rainha, Pamina. Implora-lhe que o leve até

241

Page 123: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

à moça, mas a Rainha ordena-lhe que recobre sua com­postura, que se sente e aguarde.

~l~ se afasta em direção a um canto rochoso daplanície, ~: .quanto que no canto oposto aparece, aofundo, a figura majestosa do rei Sarastro, seu marido,o i"enhor da Luz. Pamína ajoelha-se aos pés de suamae, enquanto esta tenta encobrir os olhos da mocapara que não veja o pai, Sarastro. Há uma contendaen~re a Rainh<;t e Sarastro, pois cada um deles desejaonent.ar Pamma segundo seus próprios princípios.A Ramha da Noite, confiante em que sua filha esco­lherá a ela, pede a Pamina que tome uma decisão,quanto _a qual dos dois deseja seguir, o pai, Sarastroou a mae, a Rainha.

Afasta,;d?-se de sua mãe, Pamina vaga insegura,presa da ~~vId~ e do desespero, mas a força de espíritode seu par e maior e ela busca abrigar-se em seu braço.Sarastro desaparece, levando a filha pela mão.

A Ramha mostra a Tamino quão amargo é o seudesapontamento e o jovem entende então que o tesouroperdido pela velha mulher é sua filha. Fica sabendotam1?em. que Pamina é o objetívo de sua busca.

~ VIsta da frustrada e vingativa rainha, o rapazdeseja correr para o local onde desapareceram Saras­tro e Pamina. Mas a Rainha o detém e, hipnotizadopor seus ?lhos faiscantes, cai aos seus pés como morto.

A Ramha chama por Papageno, meio pássaro, meiohomem, que chega saltitante, pulando, dançando emvolta ~e uma rocha enquanto vai alegremente tocandosua gaita. A Rainha deixa Tamino entregue aos cuida­dos de Papageno que, em seguida, começa a acordaro jovem adormecido. Tamino esfrega os olhos ao ver osurpreendente homem-pássaro e pensa que deve estarsonhando. Papageno inclina-se alegremente para cum­primentá-lo e Tamino responde com cortesia. Este de­seja esclarecer se Papageno é realmente um ser vivo,mas o homem-pássaro é muito rápido para Tamino.Papageno desaparece velozmente. Toda vez que Ta-

242

mino tenta tocá-lo, ele sai correndo numa direção dife­rente. Até que chega um momento em que dançamjuntos e os seus passos vão ficando cada vez maisrápidos. Finalmente Papageno aponta na direcão deuma brilhante réstia de luz no horizonte e TamiIio per­cebe que o homem-pássaro tem condições de levá-lo aPamina. No entanto, não consegue acompanhar o ritmode Papageno, que desaparece. Tamino fica ali incapazde se mover, como se alguma barreira invisível o impe­disse de continuar.

Aproxima-se solenemente um estranho barbado,que parece um alto sacerdote de um culto desconhe­cido. Tamino não tem certeza de quais serão as inten­ções deste homem, mas logo sente que a imponenteaparição está tentando ajudá-lo. O alto sacerdote apon-

. ta para uma porta grande e pesada. Trata-se da entra­da de um local misterioso no qual Tamino tem certezade que Pamina está escondida. Por meio de uma dançasolene e poderosa, o importante sacerdote mostra asdificuldades e perigos que aguardam todo jovem quese aventure na busca. Todos os elementos estão con­tra aquele que tenta penetrar no lugar encantado. Háum círculo de fogo e um círculo de água que devemser transpostos e o solo é tão instável e traiçoeiro quan­to as nuvens no céu.

Mas Tamino põe-se resoluto em pé, enfrentando odesconhecido. Ávido, deseja dar continuidade à suaj<;>rnada. O homem barbado, ao ver a força de propó­sito do rapaz, volta-se com lentidão e lhe indica comum gesto largo e terrível, a estrada que deverá seguir,depois de transposta a porta que se abrira nessemomento. .

Tomado de entusiasmo, Tamino avança mas per­cebe que as coisas ao seu redor estão continuamentemudando, como se fosse um redemoinho. Aonde querque se volte não consegue enxergar nenhum caminhofixo; fica assim incapaz de discernir por qual caminhoseguir. Freneticamente, volta-se para a direita, para a

243

Page 124: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

iIL

esquerda e dá voltas pela movediça paisagem. No mo­mento exato em que acredita estar totalmente perdi­do, Papageno salta à frente dele, como que saído daturbulenta atmosfera. O homem-pássaro o conduz aolongo de um caminho tortuoso e quase que invisível,primeiro por um lado, depois por outro, cada vez maisrapidamente, voltas e mais voltas, até que de súbito,se detém; e lá está Pamina, perdida no mundo de seussonhos.

Tamino pára e olha fixamente para a visão quereconhece como sendo a mesma que havia. enxergadono cristal. Ele é arrebatado por sua beleza. A moçaé imensamente mais adorável do que ele imaginara serpossível. Mal se atrevendo a respirar, aproxima-se dela,suavemente, mas ela não se move. Ele novamente seaproxima dela mas, com sua cabeça dobrada sobre opeito, ela apenas faz um simples e demorado gesto derecusa.

Tamino está profunda e amargamente desapontadocom aquele momento, pelo qual havia lutado e aguar­dado por tanto tempo, e que se mostrava tão diferentede sua ansiosa expectativa. Ajoelha-se aos pés dePamina, pede-lhe, suplica-lhe, implora-lhe que olhe paraele, siga-o, acompanhe-o de volta para seu mundo. Orapaz já se esquecera de seu propósito de trazer a mocade volta para sua mãe; tudo que deseja é mantê-la parasi, por todo o sempre. .

Pamina, imersa em profunda amargura, causadapela inimizade de seus pais, desvia o olhar do impetuosojovem e tristemente sacode a cabeça.

Tamino perde a paciência e fica zangado porquePamina não corresponde aos seus sentimentos. Mal sa­bendo o que está fazendo, invoca o primeiro ente sobre­humano que o havia ajudado, Monostatus, o qual surgeliderando um bando de selvagens guerreiros. Estesmarcham organizados em fileiras cerradas, fortes e va­lentes, voltando-se na direçâo de Pamina a fim decapturá-la e levá-la embora. Nó exato momento em que

244

'I

estão a ponto de agarrá-la, Pamina ergue a cabeça edeita o olhar à distância, com um sorriso enigmático.Imediatamente, Papageno, o homem-pássaro, dá umsalto para perto dela, vindo da díreção do olhar fixoda moça. Tocando alegremente a sua gaita, dança emvolta dos estupefatos soldados. A raiva e o azedume sedesvanecem nos corações de Tamino e dos homens daguarda.

.O grupo inteiro é tomado de assalto pela contagian­te alegria da música e da dança do homem-pássaro,com exceção do gigante Monostatus, o qual permanecepetrificado em sua sombria imobilidade. Todos - Pa­pageno, os guerreiros, até mesmo Pamina - dançamao redor deste rochedo de desolação, ao som do ritmovibrante.

Tamino, apesar de se divertir com a situação,sente que sua tentativa de conquistar Pamina foi des­virtuada e resiste à vontade imperiosa de juntar-se aoexuberante grupo, conduzido por Papageno, Levaentão sua flauta mágica aos lábios, como se a ques­tionasse para saber como proceder naquele momento.A canção que sai da flauta se funde com a da gaitade Papageno numa melodia alegre e exuberante e Ta­mino, quase que a contragosto, começa a se aproximarcom passos 'mais velozes de Pamina que continuabailando.

Mas ele não consegue alcançar a donzela porqueos guerreiros e Papageno sempre se interpõem entreele e Pamina. Monostatus desapareceu. Pamina, Pa­pageno e os soldados também desaparecem.

Mais uma vez, Tamino vê-se só. Continua dançan­do sem conseguir parar até que, exausto, cai no chãoe perde os sentidos, adormecendo profundamente.

Esta descrição não deverá ser usada como síntesedestinada ao espectador, mas como um estímulo parao dançarino ou para o produtor, os quais devem encon­trar as expressões apropriadas em termos de movimen­tos para apresentar a estória.

245

Page 125: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Tendo em vista esse propósito, poder-se-ia acres­centar um plano detalhado de desenhos de solo e seqüên­cias de esforco, ou mesmo uma notacão exata de todasas ações corporais, em cinesíograí'ía. A música queindicasse o ritmo e o estado de espírito das várias par­tes do enredo estimularia ainda mais a produção. Tam­bém .possível seria a discussão do significado simbó­lico deste "mito", "lenda", ou "ritual", ou seja lá qualfor a denominação que se escolha para a estória. Cabeao leitor ponderar qual seria seu significado simbó­lico e como representá-lo em movimentos.

A DANÇA DOS SETE VÉUS'

A descrição verbal do conteúdo de uma mímica oude uma dança-mímica pode assumir muitas formas dife­rentes. O que se segue são as notas de uma jovem bai­larina com respeito à dança dos sete véus de Salomé,que executara. A estória é conhecida de todos. Hero­des, rei da Judéia, pede a Salomé que dance para ele.Esta exige a cabeça do profeta João como prêmio parasua dança. O profeta é decapitado e trazem-lhe suacabeça numa bandeja. Os apontamentos da bailarinadescrevem os sentimentos e sensações a partir dos quaisoriginaram-se seus movimentos, em resposta aos sus­piros que, para ela, pareciam emanar dos lábios domorto. Ela ouviu a cabeça de João dizer:

"Salomé! Quando vi teus olhos pela primeira vez,no momento em que me avistaram e pousaram em meucorpo, enrubesci. Não por causa de timidez ou vergo­nha, mas porque recordei-me do animal que sou. Minhaauto-atenção, há já tanto adormecida, foi então des­pertada."

"Salomé, eu te vejo, vejo-te tomar consciência deteu corpo, tuas pernas, teus seios, teus lábios. É emvão que tu me dás as costas. Eu te vejo por todos oslados, à tua volta toda e de dentro de teu sangue."

"A vergonha é a sombra da tua auto-atenção. Tugostarias de ocultar teu corpo; mas onde o esconderias?

246

1I\\

Tu não suportas enfrentar o meu olhar fixo - nem eutampouco o consegui, quando te vi pela primeira vez."

"Abaixa os olhos e pareça tão desconfiada quantoo desejares, ou então olhe para mim com toda a altivezde uma rainha. Logo mais nossos olhos tornar-se-ão in­quietos, como aconteceu com os meus, na primeira vezem que te vi."

"Esconda teu rosto em tua veste. Lança teu corpoao chão e esconda tua cabeça. Eu não o fiz. Eu fiqueide pé, ereto, mas meu coração batia ansiosamente."

"Estava coberto de confusão; balbuciei e fiz movi­mentos desajeitados, estranhas caretas, bem sei. Agoraé a tua vez! Teus olhos brilhantes e tua conduta exci­tada mostram-me que já se foi a paz de teu espírito."

"As observações críticas e o ridículo com que tute dirigiste a mim, quando te vi pela primeira vez,além do orgulho e da admiração para os quais tu mu­daste' com tanta frivolidade não foram tão tocantescomo o é teu atento olhar, agora."

"Tu sentes a fixidez do olhar em meus olhos que­brados, dentro de teu sangue? Tu tremes, tu gostariasde jogá-lo fora, para bem longe, afastar o meu fitar:em vão."

"Do mesmo modo que o teu olhar ficou em meusangue quando te vi pela primeira vez, está agora o meuolhar em tuas entranhas."

"Tira o primeiro véu de minha cabeça. Era meurubor."

"Ao ouvir tuas palavras bajuladoras e ao sentir tuaaproximação, o teu toque em meu braço, minha timidezse transformou em surpresa, esta em sobressalto e estaem estupefação. Minha mente não estava mais tãodistante do terror."

"Mas não foram teus dedos que me terrificaram:foi minha própria pele."

"Erga teus braços cada vez mais alto, do mesmomodo que eu ergui as sobrancelhas. Abra as acarici-

247

Page 126: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

antes curvas de teu corpo do jeito que abri meus olhose boca, tomado pelo pasmo e pelo medo. Beba as novasde minha revelação em teus lábios, como eu bebi o per­fume letal de teus seios. Fiquei estonteado e aterrori­zado comigo mesmo. Estonteada e aterrorizada tuhaverás de ficar com teu medo."

"Balança tua cabeça de lá para cá e bata em teupeito como fiz eu ao te ver pela primeira vez. Fica imó­vel, incapaz de mover um membro sequer tal comofiquei com meu crescente terror frente à vida. Lançafora o véu de meu rubor e pula; pula bem alto: tunão conseguirás escapar."

"Eu não pulei. Estava algemado por cadeias deferro. Só meu coração pulava em meu peito, cada vezmais alto. E abri meus olhos, cada vez mais aterrori­zado. Foi então que consegui enxergar, ver o que éque tanto me amedrontava."

"Minha testa estava enrugada. Tu me perguntastepor quê. Não pude responder. Meus olhos foram olharcoisas longínqüas. Minhas narinas abriram-se junto comminha boca. Precisei de mais fôlego para escapar aoterror que chegava a mim, partindo do calor do teucorpo. O intenso frio em meus bracos e pernas estáagora invadindo tua carne: podes senti-lo?"

"Meus músculos relaxaram-se mais e mais. Temidesmaiar, cair aos téus pés. Meu queixo caiu e sufo­cou-se em minha garganta o inaudível grito de alarme."

"Tu sentes meus dedos gelados em volta do teupescoço? Chora, grita, urra! Eu não pude fazê-lo, quan­do te vi pela primeira vez."

"E ergui minhas mãos abertas acima de minhacabeça e toquei meu próprio rosto para cobri-lo, enver­gonhado de mim mesmo. Caí de joelhos, trêmulo - àtua frente _. como jamais o houvera feito antes, salvoquando rezava. E orei para que eu parasse de sentir,de ouvir e de ver."

"Voa, fuja - se puderes - eu estou em toda parte.Tu estás te sentindo torturada e completamente enros-

248

cada; arrasta-te mais e mais perto de minha cabecae despedaça-a completamente. Esse, o segundo véu- éo véu de meu horror."

"Cresceu dentro de mim o desprezo por mim mes­mo. Um nojo tal como se eu tivesse comido carne podre,tivesse cheirado o odor mais fétido, tocado a mais nau­seante massa de cobras putrefatas, visto o rosto hedion­do do nada. Engulhos e vômitos sacudiam minhasentranhas e eu ergui minha cabeça, curvei-a para tráse fechei meus olhos."

"Mostra teu mais profundo desprezo, tua majestosaarrogância. pequena Salomé, e olha para baixo, parabaixo onde está minha cabeça solitária. aqui no chão,aos teus pés."

"Mas tu não conseguirás estar tão desdenhosa emrelação ao meu crânio quanto eu o estava de mim mes­mo e de meu intercâmbio com tua paixão, ao ver-te pelaprimeira vez. Desfaça-o, empurra-o, amassa-o, acabacom este nó que te entrelaça e prende, tecido por meusbraços invisíveis ao teu redor. Foi assim que me senti-lembra-te. Salomé? - quando tentaste quebrar minhaaltivez pendurando teus macios braços ao redor de meupescoço. Salomé, eu não senti desprezo por ti, então;desprezei. mas a mim mesmo."

"0 desdém e o desprezo com que te afastei de mimfoi a aversão por minha própria carne. Tu sentes, tuconsegues sentir náusea de teu próprio e resplande­cente corpo?"

"Tu parecias culpada com aquele teu olhar furtivo.Mas era eu o culpado. Eram monstruosos minha vai­dade e orgulho. E pousavam sobre ti essa vaidade eesse orgulho. Encolhi meus ombros ao abaixar a cabe­ça, ocultando meu segredo. Meus olhos inquietos nãoconseguiam suportar teu olhar ofendido."

"E procuraste abrigar-te na astúcia; voltando acabeça para a direita e os olhos para a esquerda, naminha direção, tu maquinavas uma maneira de vencer

249

Page 127: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

meu orgulho; desconfiavas da minha firmeza. Tu inter­pretaste o meu encolher de ombros como aquiescência;Salomé, era submissão."

"Mas empertigada e cheia de ti como um pavãoou peru, tentaste olhar para mim de cima para baixo,mas eu estava ainda mais no alto que tu, ainda maisaltivo. "

"Contraiu-se o meu pescoço e eu fiquei desampa­rado. Curvei-me para trás como um cão, pacientementeaguardando os golpes de seu amo."

"Tu me deste as costas, abandonando-me ao meudesprezo e ao nojo que sentia de mim."

"Erga, Salomé, o terceiro véu, o véu de meu orgu­lho quebrado."

"Meu desdém e ódio voltaram-se contra ti. A injúriasofrida por meu orgulho fazia meu pulso palpitar. Nova­mente corei. Meu peito alçou-se e minhas narinastremeram.' ,

"Como é que te rebelas contra ti mesma? É pornão teres compreendido minha submissão? . Tu odeiasa tua própria e estúpida arrogância, tua falta depaciência? "

"Vejo teus dentes cerrados. Sinto a vingança doinsulto que me fizeste na tensão dos teus músculos.A rigidez que antecede ao ataque. Ataca tu mesma, ergateus braços, fecha os punhos, dê socos em ti mesma,apunhala-te. Joga-te ao solo e esmurra a terra. Ameaçaos céus e rasga em mil pedaços, com gestos frenéticose despropositados, tudo o que estiver ao teu alcance."

"Foi assim que procedi, vítima de minha violentaira, quando tu me deixaste, Salomé. Eu estava rolandono chão, berrando, chutando, arranhando e mordendomeus próprios braços, ao invés dos teus, que haviamido embora."

"Mas não era paixão por ti, Salomé. Era a paixãode meu orgulho ferido."

250

"Comecei a tremer e meus lábios petrificados re­cusavam-se a proferir as ímprecações que eu desejaraendereçar a ti." .

"Meu sorriso forçado se transformou numa violentarisada de ódio. Minha mente estava obscurecida pelodesejo de matar-te e a mim. A natureza bruta desper­tada pelo teu toque me sacudia convulsivamente. Nãoé tu quem se balança para trás e para frente, Sal~m.é.

É a minha vontade trabalhando em teu corpo fr-ágil.meu ódio selvagem de ti e de mim."

"Meus olhos esbugalhados perscrutavam à distân­cia, esperando alcançar-te, ~bsorver-t~, as~assinar~~ecom o fulminante olhar de minhas pupilas dilatadas.

"Mas nada. Nada. Vácuo. E o lusco-fusco danoite que' se aproximava fazia-se visível na solidão deminha cabana."

"Puxa-o, o quarto véu, o véu de minha ira e demeu ódio, Salomé."

. "Recuperei minha compostura e vi-me sentado desobrolhos abatidos. Senta-te, Salomé, e pensa, pensa,pensa na nossa perdida absorção um do outro. Pe~s~ n~eterno obstáculo entre nos, pensa em nosso amor-adio.

"Tu estás perplexa, temerosa, perseguida pelospensamentos que dançam em tua cabeça. São os mes­mos pensamentos que dançavam em minha cabeça,quando recuperei a razão e comecei a meditar no quehavia sucedido."

"Que é que havia acontecido exatamente? Nada.Uma criança que brincava havia acendido fogo; osprejuízos podem ser reparados. O fogo pode serextinguido."

"Tu estás torcendo o nariz, Salomé. Tu não acre­ditas que consigamos extinguir o fogo? Covarde! Tu teabaixas, esse torcer de nariz está tomando todo o te?corpo. Tu estás encolhendo, desaparecendo! Salo~e,

Salomé, fique. Ainda: não terminou. Terminará um dia?Pensa, Salomé, pensa."

251

Page 128: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

"Parece que tu estás lutando ao máximo para dís­cer~lir algumas coisas bem distantes. Quais são elas?Seriam meus pensamentos que se encontrarão com teuspensamentos?"

"Busca, Salomé, busca."

"Tu fechaste os olhos. Tu não queres ver a luz. Masdentro, Salomé, dentro, onde estou morando, eu, João,como se fosse um dragão numa caverna' na tua cabecaSalomé, pega-r:!, segura-o entre tuas ~ãos, apertá-o:est0l!rara. Joao, o dragão, estará livre, correrá paraos ceus e te deixará só, só sobre a Terra, só na com­panhia de teu mau-humor, do teu desespero, do teuassassinato.' ,

"E eu, em meu ódio, desejei te assassinar, Salomé.Meus olhos tornaram-se vazios, apáticos. A dor que tutens aí dentro ergue tuas pálpebras descaídas. Tu levasa mão à testa, à boca, à garganta. Tu dobras os bra­ços sobre teus seios. Estás com frio, Salomé? É osopro, gelado de meus suspiros que te faz tremer. Feia,feia e a vida, a morte. Feio é o nascimento, o amor.Mostra o descaso, afasta-te disso. Fora com tão amar­gos pensamentos, com idéias tão torturantes, fora comesse enxame de moscas."

"O quinto véu é o véu da minha alma meditativa."

"Quando despertei esta manhã, Salomé, soube quete amava. A pequena réstia de sol que furtiva tocavaa parede de meu tugúrio fez-me levantar e esticar osbraços em direção da luz. Meu coração estava repletode contentamento." .

"Erga os braços, Salomé! Dança! Dança e dançasem qualquer objetivo e sem pensar no porquê. Isto éalegr-ia, alegria de viver, a alegria da ternura."

".Bata palmas, bata os pés, ria! As crianças sem­pre raem quando estão brincando! A risada sem sentidoà melhor risada. E foi assim que ri quando soube quete amava!"

252

"Os sorrisos e risinhos à-toa, de pura felicidade,quando se sente a suprema carícia da vida, este é queé o verdadeiro sentido da existência."

"Nunca antes eu o soubera, desde minha infânciaeu jamais dera uma risada. Que louco eu fui! E, en­quanto era criança, ficava do lado de fora da brinca­deira dos outros, coisa que eu não conseguia enxergar.Não podia entender por que eles riam. Mas agora eusei. Tu me ensinaste a rir. Tu libertaste minhas enrí­jecidas articulações. Desejei que caíssem as algemasde meus punhos e tornozelos. Não porque eu desejasseser livre, mas porque eu queria dançar."

"Mas não é doloroso o sacudir de teu corpo? Dolo­roso como o são as convulsões da morte? A vida e amorte sempre estão lado a lado, Salomé, dois gêmeosinseparáveis e tu me enviaste o outro."

"Mas tudo isto não adianta nada, Salomé, pois assolas de teu pés tocam delicadamente o chão sobre oqual jaz imóvel e inerte a minha cabeça. Não toqueeste solo aterrorizante que bebe o meu sangue! Nãoo toque! Teus delicados pés poderiam ficar mancha­dos de sangue. Sacuda e enrola os dedos do teu pée cessará o erguer espasmódico de teu peito. Não émedo, Salomé. Não é o terror da minha morte quecontrai teus dedos. É o riso! É o amor!"

"As ilusões da tua riqueza, da tua posição social,da tua grandeza se desmancham em ti como eu dese­jara que se desmanchassem em mim as minhas alge­mas. Tuas coxas tremem prenunciando os saltos e vôosa que darão surgimento."

"Teus olhos claros e brilhantes iluminam intensa­mente teu rosto soerguído. Não te incomodes com meusolhos fechados! Mas fecha também os teus, Salomé,para o último êxtase."

"Tu tens vontade de tocar a minha odiosa cabeça.Aproxima-te, Salomé. Aproxima-te, terna e suave. Teuajoelhar humilde, tuas mãos voltadas para cima, e ounir das tuas palmas mostram-me tua devoção. Chega

253

Page 129: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

mais perto, Salomé, mais perto de mim, mais pertoainda, e leva embora o sexto véu, o véu de meu amor."

"Após meu paroxismo de alegria, vi os dois sol­dados descendo até minha cabana. Que será que tra­zem? A liberdade que tu me prometeste se eu te bei­jasse - eu não o fiz - e que estou louco para fazer'terias estado a ler o meu coração? '

"Jamais me defendi. Era muito orgulhoso e a vidame parecia sem valor. Mas agora, quando um dos sol­dados desembainhou sua espada - eu o compreendi _lutei violentamente, freneticamente, por minha vida."

"Mas meus olhos ficaram embaçados, ao pensarem ti, em tua juventude insensível e repulsiva e meucorpo estirou-se pela última vez, como eu desejarater-me estirado na luz, fora do meu abrigo, para ver-te,Salomé, uma última vez."

"Quando tu vieres retirar o último dos véus veráso arco inquiridor formado por minhas sobran~elhasEstarão te perguntando: 'por quê?' Elas se congela~ram nesta posição abarcando a última visão do ternoarco formado por teus seios. As ondas das rugas quese estendem ao largo de toda a extensão de minha frontesão de ondas congeladas de um oceano de amor."

"Bata uma na outra as tuas mãos semi-fechadasritmicamente, sem te interromperes, interminavelmen~te, como se para todo o sempre. É a batida do tempoque cessou a jornada através de meu coração."

"Trabalha, trabalha com teus músculos tensos, du­rante todo o tempo em que viveres. Meus músculos tam­bém estão enrijecidos, mas não posso mais trabalhar.Não me movo mais."

"Os cantos de tua boca estão descaídos, como sepadecesse de nojo, ansiedade e desprezo. Curva teupescoço. Minha orgulhosa princesa, por quê esses gol­pes selvagens, tão diferentes da tua dança de conten­tamento, saltitando sobre a terra como as folhas deuma tempestade de outono?"

254

"1,"Tu sentes meu desespero? Não o desespero de mor­

rer mas o desespero de não mais te ver ... ""Chora, Salomé, e mistura tuas lágrimas ao meu

sangue. Que possa viçar em teu coração a mais raradas flores da Terra: a verdadeira compaixão.. Salpicao germe desta flor com o fluxo da vida de nós doisjuntos, com tuas lágrimas e com meu sangue.

"E agora, Salomé, erga o último véu, o sétimo, comcautela e suavidade, o véu de meu desespero, e enterrameus lábios mortos entre teus seis em botão."

A dançarina que desejar traduzir esta descriçãopoética do conteúdo emocional em ações corporais temde considerar o ritmo, o qual poderá ou não correspon­der ao ritmo verbal. Além disso, a bailarina tem deconsiderar as sugestões dadas relativas a determinadasconfigurações de esforços. O texto contém igualmenteindicações das formas espaciais. O ponto principal, con­tudo, será a tentativa de apreender o estado de espíritode cada passagem e descobrir as seqüências de movi­mento apropriadas, .conforme o gosto de cada um.

A mímica que vem a seguir é um acontecimentorazoavelmente realista.

Estão descritos no diário do produtor os grupos emovimentos de palco principais; também aparecem aação ou conteúdo mímico de cada um. O leitor perce­berá que a descrição dos grupos e movimentos deixaem liberdade a imaginação da pessoa, seja produtor,seja ator, o qual tentará concretizar a mimica.

É óbvio que também é possível estabelecer e des­crever cada um dos movimentos em separado, comexatidão.

255

Page 130: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

o XALE DOURADO

Cena 1

Cena 2

cobrir quem está no barco. Asoutras aguardam ansiosamente.

Duas moças voltam rápidas,correndo, excitadas. Encontra­ram um mascate, vindo obvia­mente de terra estrangeira.

4. O mascate desconhecidoentra acompanhado pelas mocas.É um tipo de pessoa amígável,cordial, de bom-humor, e suscitaforte curiosidade.

Ele exibe algumas de suasmercadorias, gesticulando com.exuberência e as moças estãomuito admiradas pelo que elelhes val mostrando.

Notas à Cena 1: As características acima men­cionadas são todas acontecimentos de movimento. Osmodelos de esforço mudam e se seguem uns aos outros,criando várias formas nos gestos individuais, bem comonas formações grupaís. São executados uns poucos mo­vimentos de trabalho reconhecíveis, mas ainda não seusou outro movimento convencional de mímica.

4. Com a entrada de. uma fi­gura estranha, o desenho seconcentra num grupo semi-cir­cular formado à sua volta.

O grupo imóvel das três mo­ças desmanchou-se em surdina.A tímida se afasta para o fundo.

O esforço novo da expectativado grupo maior, que circunda omascate, é dotado de vivacidadee contrasta bastante com a quíe­tude da expectativa das trêsmoças.

, l

~•

,I

Ili

iI

;,j..lt

r',···"oí:~

AÇÃO

1. Quando se levanta a corti­na, três moças olham imóveisem direção do mar. Uma delasé uma moça muito tímída.

2. Entram dois pescadores eum deles chama um terceiro, oqual carrega no ombro uma redede pescar_Este olha para astrês moças mas, decidindo-senão se aproximar delas, avançaem díreção dos outros dois ho­mens. Cumprimentam-se todoscom cordial alegria e partemjuntos, com seu equipamento depesca.

AGRUPAMENTOS E MOVIMENTOS

1. A peça se inicia com umgrupo imóvel de três pessoas.Estas estão de costas para a au­diência. A formação do grupo ea tensão corporal dos indivíduossugerem atenção e expectativa.

2. Continuam imóveis quandoentram os homens, os quais exe­cutam movimentos de trabalho.Os passos e ações relativamen­te calmos dos trabalhadores vãoconstituindo um movimento emcrescendo, que conduz os olhosdos espectadores da imobilidadedo grupo central, para a atentarapidez de algumas mulherescuriosas que entram no palco nomomento seguinte, depois de pas­sarem pelo sustentado do mo­vimento dos passos e das açõesde trabalhar.

A tensão direta do grupo imó­vel das moças é seguida pelosgestos flexíveis mas pesados dospassantes. .

3. Esta flexibilidade é incre­mentada pela leveza atenta dacuriosidade perscrutadora exibi­da pelas mulheres que entraram.

O desenho de chão desta cenad.esenvolve-se a partir do ponto~lX? o~de estão de pé as moçasrrnovers para os caminhos rela­tivamente simples e diretos dostrabalhadores e, mais tarde, pa­ra os passos cruzados e disper­sos das curiosas.

3. Uma das moças em atitu­de de espera viu alguma coisa:ao 'longe, no mar. As outras tam­bém se encaminham à frentepara ver aquilo que a compa~nheira havia visto. Juntam-se aelas várias outras mulheres, fi­lhas e esposas dos pescadores.Todas estas excitadas porqueestá se aproximando do portoum barco desconhecido. Algumasmoças saem correndo para des-

I

i

f

AGRUPAMENTOS E MOVIMENTOS

1. O primeiro movimento des­ta cena consiste de várias dan­ças curtas executadas por moçassozinhas que se afastam do gru­po que rodeia o mascate e depoisvoltam a seus lugares. Cadauma das danças mostra umamodalidade distinta e específicade movimento, expressa porações corporais, formas e ritmoscorrespondentes. Segue-se uma

AçAo

1. Primeiramente, uma moçaavança para compr-ar um cintodo mascate, depois outra, paraadquirir um enfeite. Aproxima-seatrevida uma terceira para es­colher um pente e, depois, vá­rias se agrupam em volta domascate para bisbilhotar suasmercadorias. Todas dançam, se..gurando os objetos comprados.

256 257

Page 131: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

dança que envolve Iodas as mo­ças, em três grupos, cada umdeles em redor de uma das trêssolistas do primeiro movimento.

2. No próximo movimento, omascate se aproxima da moçatímida ao fundo, estabelecendo­se longo dueto. O conteúdo daação destas cenas é importantepela composição e alteração daexpressão do dueto.

O caráter é indicado pela re­lutância da moça tímida em di­rigir-se para a frente do palco epelo apoio meio encorajador,meio desdenhoso, proporcionadopelo grupo de moças, por meiode evoluções concomitantes.

3. O próximo movimento éum solo do forasteiro que chamapara si a atenção do grupo todode moças, com exceção da moçatímida. As moças chegam bemperto dele.

4. Segue-se agora o segundodueto entre o mascate e a moçatímida; desta feita, a moça ga­nha confiança e aceita a vesti­menta que lhe é ofertada pelomascate.

O ·conteúdo da ação é impor­tante pela articulação dos movi­mentos, bem como por sua ex­pressão.

258

2. Subitamente, o mascate vêa moça tímida ao fundo. "Quemé?", pergunta, mas as moçasnão respondem. Ela é por demaisinsignificante para ser notada.

O mascate se aproxima, poisacendeu-se seu interesse por ela.A moça timida traça uns pou­cos passos hesitantes em dire­ção do homem mas recua parao meio das outras moças quebuscam agora animá-la a seaproximar do mascate.

3. O mascate causa uma agi­tação . geral, procurando miste­riosamente alguma coisa nomeio de suas mercadorias e,finalmente, tira de lá um mara­vilhoso xale dourado.

Todas as moças admiram oxale, do qual o mascate tambémsente orgulho. A moça tímida seretrai, mas as outras amontoam­se em cima do homem.

4. O mascate insíste com amoça tímida para pegar o xaleem suas mãos. Ela está excita­da mas questiona-se'o que pen­sarão as outras, se ela assim ofizer. Estas impelem-na a fazê­lo enquanto o mascate sente queestá ganhando terreno. A tímidahesita, porém, dividida entre seunatural acanhamento e o desejode ter nas mãos o maravilhosotecido,

O mascate, então, sentindo-se

um pouco magoado, oferece-lheo xale de presente.

De repente, a moça percebe oque está acontecendo e toge, em­baraçada.

O mascate está aborr-ecido, enovamente chega perto da mo­ça, toma-a pela mão e suave­mente a conduz para a frente.A seguir, embrulha seus ombroscom o xale.

Notas à Cena 2: É indispensável a esta segundacena um acompanhamento musical compatível. A pri­meira cena poderia ser encenada sem música, ou comacompanhamento de ruídos de fundo que lembrassem obarulho do mar. Esta cena exige uma música alegre eritmada.

Os diferentes caráteres das três moças compradorasexpressar-se-iam em seus movimentos. Qualquer queseja o caráter por elas assumido, deve ser colocado emfranco contraste com a timidez da outra moça que maistarde ganha o xale. Quando o grupo todo corre para ondeestá o mascate, enquanto ele tira o xale dourado do meiode seus pertences, a surpresa e a admiração darão acaracterística central dos movimentos do grupo, numatensão grupal expressiva. O primeiro dueto é interrom­pido por meio deste movimento grupal e, quando o mas­cate se aproxima da moça tímida com o seu presente,todas olham atentamente; o grupo que rodeia o mascatese abre totalmente para dar passagem à moça. .

Ao ser retomado o dueto, os movimentos da moça. tímida tornam-se mais vívidos, correspondendo à suaavidez em tocar o xale. Ocorre um aumento em suavivacidade até o momento em que, com um movimentorápido, quase brusco, o mascate lhe apresenta o xale.Neste instante, ela recua para trás e está quase des­maiando, quando o homem a conduz à frente. Ao sentir oprecioso xale sobre seus ombros, ela fica extasiada emanifesta seus sentimentos num rápido solo de dança

259

-·-·--,.1

Page 132: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Cena 3

muito leve e feliz; ao final, encara o mascate com umaexpressão agradecida e modesta colorindo seu rosto.

Notas à Cena 3: Novamente é uma danca-mímícao aspecto coreográfico da terceira cena. Outra vez deveser bem viv;;tz e alegre a música escolhida; apesar disso,deve receber a devida consideração o aparecimento eas ações quase que grotescas das mães. Os movimentosdas mães e do grupo nesta cena diferem fundamental­mente dos empregados na delicada manifestacão emo­cional ao fim da segunda cena. Esta poderá ter tido umcaráter sustentado e ondeante, mas os movimentos des­ta terceira cena serão bruscos, angulares e energica­mente acentuados. A devolução dos presentes ao mas­cate reítapelas três primeiras moças consiste, aindaoutra vez, em solos curtos de dança nos quais o caráterpessoal de cada uma delas deve tornar-se manifestocom clareza. O mascate mantém-se ainda imóvel quan-

AGRUPAMENTOS E MOVIMENTOS

1. Aparecem duas figurasnovas. São mulheres de meia­idade, cujos movimentos tendema seguir um caminho reto. Des­te modo, o dueto final da segun­da cena é desfeito. O grupoprín­cípal de moças acompanha a en­trada dos novos personagenscom movimentos mais angula­res do que os usados até então.

2. O próximo movimento con­siste em vários solos curtos dedança, das moças que, uma apósa outra, aproximam-se do mas­cate e, a seguir, voltam a ocuparseus lugares.

As mulheres então ordenam àmoça tímida que chegue até omascate. Enquanto ela volta,ocorre um momento emocionaldistinto de tonalidade triste.

3. O mascate executa agoraum solo curto de dança, carre­gando e balançando o adornoque a moça tímida lhe devolve­ra. Ele o atira para ela, que pe-

260

AÇÃO

1. Entram duas velhas espo­sas de pescadores, uma 'delasmãe da moça tímida, muito zan­gadas com a folia. A moça como xale some de vista rapida­mente, ocultando-se atrás dasoutras. As mães ordenam quedevolvam ao mascate todas asmercadorias e disto riem todasas moças.

Desenrola-se um trio câmico·entre as duas senhoras de meia­idade e o mascate.

As mães declaram que nãotêm dinheiro e não podem com­prar as mercadorias, apesar demuito desejarem agradar suasfilhas.

2. Uma após a outra, as mo­ças devolvem suas compras, umadescuidadamente, outra .com pe­na, outra jogando rudemente oseu objeto ao mascate.

A mãe vê sua filha com o xale.A moça agarra-se a ele mas amãe insiste em que ela devedevolvê-lo. Relutante, ela o tirados ombros e devolve ao masca­te. Amargo é eeu desapontamen­to e ela corre para sua mãe aossoluços. É bem evidente no rostode todos o sentimento de pesar.

3. O mascate explica quepretendera oferecer o xale depresente, o que faz com que

. imediatamente se erga outra vezo ânimo da. _moça que olha à sua

ga o xale. O grupo das moças,dividido em dois J rodeia metadeo mascate e metade a moça tí­mida.

Segue-se um solo de dança damoça tímida, que se transformaem dueto quando o mascate jun­ta-se a ela. O grupo todo, alémdos solistas, se detém, e olhamcom expectativa para a entradade onde surgem os recém-chega­dos da cena seguinte.

volta maravilhada, mal podendocrer que o xale agora é verda­deiramente de sua propriedade . .

Seus olhos não se desviam domascate; enquanto este alegre­mente lhe joga o xale de volta.Ela o apanha com volúpia e dávoltas e mais voltas, em plenoêxtase. Enquanto atravessa opalco de lado a lado, todas asmoças e suas mães comparti­lham de seu entusiástico prazer.

Enquanto se acalma o primei­ro surto de excitação, a moçaolha mais de perto para o mas­cate. Começa a questionar se, defato, seria ela merecedora deum tal .presente. Timidamentedança em volta do homem, ob­servando-o com atenção o tem­po todo e, ao afastar-se dele,este vai lento em direção delae está quase que a lhe falar,bem como a falar com suamãe, quando aparecem os pes­cadores que voltaram de suapescaria.

2(l1

Page 133: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Cena 4

do a moça tímida lhe devolve o xale. Começa, a partirdeste momento, um novo dueto entre ela e o mascate.Juntam-se a eles as demais moças. Metade delas rodeiao mascate e dança com ele, enquanto que a outra meta­de dança com a moça tímida. Quando novamente sereúnem o mascate e a moça, que vão se achegandoà mãe que, por sua vez, está hesitando, em pé, alheiaà alegria geral, algumas moças advertem e anunciam avolta dos pescadores, que ainda não estão no palco aoterminar a terceira cena.

Como nas outras cenas, nesta também, é útil anotare considerar a ascensão e a queda da expressão emo­cional. Esta cena, poderia ser descrita do seguinte modo:

Entrada das mães: excitação simulada.Devolução das mercadorias ao mascate: moderado

e ressentida.Devolução do xale: pesado e dolorosa.Mascate ofertando o xale de presente, dueto: ale­

gria e contentamento crescentes.Consentimento da mãe: solene, emocional.Aviso do retorno dos pescadores: medo repentino.

AGRUPAMENTOS E MOVIMENTOS

1. Entram varres homens,pesados e de passos lentos. Amoça tímída dança delícadamen­te à volta e no meio deles.

Daqui para a frente, os movi­mentos tornam-se menos dança­dos mas os grupos aínda seguemum ritmo definido no espaço eno tempo.

2. Dois homens de meia-ida­de andam para a frente semprestarem muita atenção às mu­lheres excitadas e amedronta­das. Seguem-nos vários rapazes

262

AÇÃO

1. Entram os velhos pesca­dores. Apresentam-se morosos edescontentes tanto devído à ale­gria das mulheres quanto à domascate. A moça contínua adançar entre eles, usando o xale,mas incomodada por perceberos seus ânimos se exaltando.

2. Entram os pais e nestemomento a mãe rapidamente se­gura a moça tímida, .conduzín­do-a para trás das outras moças.

Os país fazem-se acompanhar

carregando e levando nas mãosimplementos de trabalho.

3. É encenado um trio forma­do pela moça tímida, uma dasmulheres de meia-idade e seumarido (o pai da moça tímida);neste trio, o-pai arrebata o xaledos ombros da filha.

4. Segue-se um dueto entre opai -e o mascate; ao final, surgeuma excitação generalizada queacaba por se transformar numa

dos pescadores jovens que car­regam a rede e os equipamentosde pesca. Estão abatidos e deaparência miserável e lançama rede ao chão, indicando, des­te modo; que não pescaram ab­solutamente nada.

As mães, acostumadas a umarede vazia, apenas lhes dão umaolhadela e, com o auxílio dasmoças, carregam-na para fora.

3. O pai vê a filha usando oxale. Fica furioso. A mãe ten­ta aplacá-lo mostrando-lhe quãoatraente está a filha, envolta nabelíssima vestimenta. Mas o paiarrebata-o dela e o lança norosto do mascate.

O mascate fica abatido e tentaexplicar que pretendia fazer da­quela peça um presente.

As mulheres avançam iradasem direção dos homens. Exigemalguma maneira de satisfaçãopara suas vidas, modificando dequalquer jeito seu cotidiano. Oshomens retrucam, acusando asmulheres de desejos egoístas, deter vida mansa, quando eles es­tão arriscando as próprias vidasno mar.

O mascate tenta pacificar a si­tuação e começa novamente amostrar algumas de suas merca­dorias para algumas moças etambém para dois dos pescado­res jovens que parecem mais in-·teressados em seu estoque doque os restantes.

4. Um dos pais avança sel­vático para o mascate, agarra­o e ameaça-o de uma surra, noque é impedido pelos demais ho-

263

.---------------------

Page 134: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Cena 5luta entre ambos e todo o grupode homens.

Em seguIda, há um dueto en­tre o pai da moça e o mascateque é uma dança de luta. Acrescente intensidade do movi­mento, durante a qual os doisadversários parecem alternar-sena vitória da luta, cessa repen­tinamente com o golpe final queo pai averta no mascate.

5. Depois da queda do mas­cate ao chão, o pessoal da al­deia fica de pé, imóvel, por uminstante. Segue-se uma pesada elenta procissão, na qual é trans­portado o corpo sem vida domascate.

Saem todos, com exceção dosdois homens de meia-idade.

mens ; estes seguram seu braçoerguido e o puxam de cá paralá, na tentativa de separá-lo domascate.

Isto continua até que o mas­cate consegue escapulir e, ata­cando primeiro um dos pais edepois cada um deles por suavez, derruba-os todos no chão.

Finalmente confrontam-se omascate e o pai da moça. De­corre daí uma luta de morte en­tre ambos, presenciada por to­dos os outros com profundohorror.

Subitamente, o pai dá no mas­cate um golpe tão eficaz que es­te cai no chão e todos julgam­no morto.

5. Reinam de imediato o si­lêncio e a quietude. Novamentevestida com o xale, a moça pre­cipita-se e ajoelha-se ao lado domascate morto. Depois de algunsinstantes, quatro homens er­guem o mascate e lentamentelevam-no embora, seguidos porlonga fila de pessoas que haviampresenciado a catástrofe.

Nem por um minuto pensamno pai que ficou para trás. Ape­nas um dos pescadores maisvelhos fica de pé a seu lado. Amãe tenta persuadi-lo a voltarpara casa com ela, mas em vão.Desconsolada, ela parte, fican­do os dois homens.

AGRUPAMENTOS E MOVIMENTOS

I. Dueto dos dois homens demeia-idade que foram deixadospara trás, no palco. Trabalhamagitados com os equipamentostrazidos ao palco na cena ante­rior.

2. Quase todo o grupo de ho­mens, com exceção de algunsdos pescadores mais jovens, en­tra marchando com passos len­tos e pesados, na direção dosdois homens de meia-idade.

Movimentos de mimica entreos dois solistas e o grupo. O pró­ximo movimentei é a saída cole­tiva dos homens pela mesmaporta por onde haviam entradona cena anterior.

AÇi\O

1. Ficam ambos de pé inde­cisos, o pai receando ser preso.Olha na direção em que foi car­regado o corpo inerte do mas­cate, mas não há sinal de pessoaalguma.

Os dois homens voltam-se pa­ra olhar o rnar, que lhes ofereceuma liberdade temporária. De­cidem partir numa pescaria no­turna,

Comecam a reunir seu equí­pamento e acender os lampiõespois vem chegando a escuridão.

2. Entram os outros homense ficam olhando desconfiados oque os dois estão fazendo. O paichega perto e diz-lhes que to­dos devem acompanhá-lo ao mar.Os homens estão desgostosos eaborrecidos com o pai por ter­lhes causado o problema.

Apontam para o céu, pres­sagiando uma violenta tempes­tade. Protestam contra o embar­que, argumentando que seriauma loucura. O pai diz-lhes queestão todos correndo. um graveperigo devido à morte do mas­cate. Após deliberarem entre si,os homens concordam e, compassos pesados, saem todos.

Notas à Cena 4: É necessária, até este ponto damímica, uma música de fundo semelhante à da primeiracena. Após o súbito silêncio que cai sobre o palco emseguida à morte do mascate, a cena deve prosseguirsem acompanhamento musical.

264

3. Precipitam-se as moçaspara o palco, primeiro de umaem uma, depois em grupos pe­quenos. Segue-se uma dança-mí­mica com movimentos balancea­dos de acalento, como se fossemempurradas de um lado para ou-

3.. Uma das moças vê os ho­mens, quando estão partindo.Implora ao último deles que pa­re com aquela loucura, mas emvão.

Ela dá o grito de alarme echama uma segunda moça.

265

Page 135: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

Natas à Cena 5: É necessário ruído de fundo paraindicar a veemência cada vez maior da tempestade.

A dança balançada do grupo de moças não deveráserrnuito curta e deverá seguir seu próprio desenrolar.Podem ser percebidas algumas indicações do conteúdomímíco dos grupos possíveis, durante a dança balan­çada, a partir dos duetos e quartetos inseridos na cena.O grupo principal, porém, presta apenas uma atençãoparcial a esses momentos intempestivos de emoçãoindividual.

tro pela tempestade. A mãe entra e grita para osEntram as mulheres de meia- pais que voltem, mas eles já es­

idade e o estado de espirita êe- tão em seus barcos. Uma porral é de desespero. . uma as moças entram precípí-

Em meio ao grupo central que tadamente em cena e chamamse balança para lá e para cá, seus namorados em voz alta,ocorre um breve dueto entre mas nenhum deles responde.uma das mulheres de meia-ida- A mãe cai soluçando nos om­de e uma das solistas - sua bras de sua filha. Vem a tem­filha - feito ·de movimentos ela- pestade acompanhada de tro­ramente discerníveis dos do gru- vões, raios e violenta chuva.po de fundo. De repente, uma das moças

Várias moças correm na díre- vê um barco naufragar. O de­ção por onde saíram os homens. sespero se apodera de todas.

A outra mulher de meia-idade Uma das mães corre em buscase lança para o outro lado do de homens que queiram ir bus­palco. car os pescadores. Há um an­

sioso suspense.

Cena 6

4. Ela volta acompanhadapor dois rapazes que haviam fi­cado para trás; quarteto de rá­pidas despedidas com as duasmoças solistas. Saem os rapazes.

Entra o mascate. O grupoprincipal fica paralisado de ter­ror. Dueto intenso e breve domascate com a moça tímida. Saí­da do mascate,

Solo curto da menina tímida.O grupo principal continua suadança de balanço.

4. A mãe volta com dois ra­pazes que se precipitam para omar.

São seguidos pelo mascate queentra com a cabeça fartamenteenfaixada, agarrado ao xale. Amoça tímida corre para ele etenta dissuadi-lo da arriscadatarefa de resgate, mas ele ra­pidamente dá-lhe o xale e segueos outros homens. A moça caino chão, soluçando.

AGRUPAMENTOS E MOVIMENTOS

1. Termina de maneiraabrupta a dança de balanço dogrupo principal.

Vários dos homens mais ve­lhos são arrastados para o palco.

2. O mascate deposita o cor­po no centro do palco, ajudadopor uma das mulheres de maisidade,. formando um grupo quelembra a Pietá das pinturasmedievais, onde o corpo .de Nos­so Senhor jaz estendido nos joe­lhos de sua mãe.

Breve dueto entre a moça tí­mida e sua mãe (que está sen­tada com o corpo do pai atra­vessado sobre seus joelhos).

3. O grupo de moças ajoe­lha-se em duas metades, à direi­ta e à esquerda do grupo cen­tral (Pietá).

Os homens caminham solenesem fila, atrás do grupo daPietá.

4. Solá breve do mascate.Dueto entre pai e mascate.

O pai, com o braço estendi­do, volta-se para o mascate. Omascate aproxima-se lentamentepara encontrar-se com aquele eas pessoas formam um círculoestreito 'em redor dos dois.

AÇÃO

1. Há um suspense ansioso eo primeiro homem resgatado étrazido por dois dos rapazes.Amontoam-se ao seu redor suaesposa e algumas das moças.

Trazem outro homem que éadmoestado por sua mulher pe­la imprudência de haver embar­cado com um tempo daqueles.

2. A mãe da moça tímida es­pera seu marido. Está prestesa perder as esperanças quandoo mascate entra carregando nosombros o pai com que havia lu­tado e que se havia suposto omatara. Todos exibem um olharapreensivo.

A mãe quase desmaia. Recebeapoio de um dos pescadores. Omascate deita o pai inconscien­te nos joelhos da mãe, que estásentada.

3. Todos pensam que o paiestá morto.

A menina dá o xale à sua mãe,que o usa para cobrir o marido.As mulheres ajoelham-se pararezar, enquanto os homens sereúnem e andam muito lenta­mente atrás da mãe e seu ma­rido.

4. No momento preciso emque a mãe está para cobrir orosto do marido, o mascate fazum movimento súbito e arrebatao xale. O pai abre os olhos eolha à sua volta. Há um assom­bro profundo e generalizado.

O pai levanta-se vagarosamen­te e ergue os braços, dando gra-

266267

Page 136: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

LEIA TAMBÉM

268

CONSCIÊNCIA PELO MOVIMENTOMoshe FeldenkraisAgimos de acordo com nossa auto-irn.agem que é con­dicionada por três fatores: constituição, socializaçãoe auto-educação. Feldenkrais nos abre um caminhoatravés de exercícios fáceis que melhoram a postura,a visão, a percepção de si mesmo e a nossa relaçãocom o mundo. É uma lição de amor e respeito aocorpo proporcionando a satisfação de vê-lo respon­der com presteza, facilidade e precisão. REF. 10101.

-'CONVERSAS COM GERDA ALEXANDERVida e pensamento da criadora da eutoniaVioleta Hemsy de GainzaSão entrevistas realizadas na Argentina e na Dina­marca, com Gerda Alexander, a criadora da eutonia.A autora desenvolve os principais conceitos do mé­todo, explicados por sua própria criadora. A obracontém relato de fatos pessoais de uma vida emocio­nante e atribulada. Importante leitura para os estu­diosos da área, bem como para pessoas que queiram

travar contato com o tema. REF. 10560.

ESPONTANEIDADE CONSCIENTEDesenvolvendo o método FeldenkraisRuthy AlonEntre os estudiosos do movimento mais proeminen­tes neste século está Moshe Feldenkrais, criador dométodo que leva seu nome e autor de obras consa­gradas como Consciênciapelo Movimento. Ruthy Aloné a herdeira intelectual de Feldenkrais, continuadorae enriquecedora de sua obra. Neste livro ela apre­senta seu desenvolvimento do método. Em lingua­

gem acessível, tece Informações teóricas e experiências práticas,apresentando sugestões que permitam a pessoas com dores e restriçõesde movimento descobrir uma nova sensação de liberdade. REF. 10738.

ças. Afastam-se dele os homense mulheres, maravilhados, comose houvessem presenciado ummilagre.

5. O pai faz um sinal paraos outros pescadores. Pergunta­lhes se eles também aceitam omascate como seu amigo. A res­posta não dá azo a dúvidas. To­dos colocam suas mãos, uma auma, sobre o braço estendido. Aum sinal do pai, o mascate seaproxima e é admitido comomembro da comunidade.

Aliviadas e agradecidas, asmulheres se aproximam do gru­po de bomens.

6. O mascate dá o xale aopai que o apanha com aparen­te relutância e o segura à suafrente. Enquanto o pai faz essesgestos, o mascate olha para amoça tímida que silenciosamentechega mais perto, acompanhadapor sua mãe; os outros abremcaminho para elas.

Quando a moça chega ria fren­te de seu pai, todos levantamos braços na direção deles. Opai levanta as mãos e as repou­sa depois num gesto de bênção,sobre os ombros de sua filha.

5. O pai estende à frente comfirmeza seu braço direito e, umpor um, os homens agrupam-senum meio-circulo apertado, cadaum deles estendendo um braçopara o centro do meio-círculo eapertando as mãos uns dos ou­tros.

6. Dueto do mascate com opai. Dissolve-se o grupo dos ho­mens.Dueto da moça tímidacom o pai que, de pé no meiodo palco, envolve os ombros desua filha com o tecido.

Dois grupos de homens e mu­lheres se aproximam do grupocentral formado pelo pai e pelafilha, com os braços erguidos,como se formassem os arcos deum túnel acima das cabeças dasduas figuras centrais. O masca­te dá um passo à frente, em di­reção à moça tímida, com osbraços abertos. A mãe da moçatoca o ombro do rapaz.

Cai o pano.

Notas à Cena 6: Os sons que configuram atempes­tade se acalmam e, após um curto intervalo de totalsilêncio durante o qual é formado o grupo da Pietá, étocada uma música solene e harmônica de caráter reli­gioso. A música prossegue até a cena final, quando opai cobre a filha com o xale dourado.

Page 137: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

·---------------------------------

'.

tI

dobre aqui -------------------------------

CARTA RESPOSTANÃO É NECESSÁRIO SELAR

o SELO SERÁ PAGO POR

I, AC AVENIDA DUQUE DE CAXIAS01214-999 São Paulo/SP

IMPRESSO NA G R Á F I C A

sumagográficaedltorialllda SUYYlanOrua ítauna, 789 vila marla ~.,..."""tr !3'

02111-031 são paulo sptelefax 1\ 2955 5636

[email protected]

1--------------------------------- dobre aqui -----------------------------.

]i

Page 138: RUDOLF LABAN 2 DOMíNIO DO MOVIMENTO

,

.~@l

summuseditorial

~ -~._.. . . --' .l'C'\.ivr'L,=, aq'úi'""'··..-.. _···._ .... ..;.. .: __ .. .. .. _ ...... .. _ ..

OOMfN10 DOMOVIMENTO

'....._-_._.- ---'-- _._'-'---------- "-------_.- -.... ..; -'-_.........._......-

CADASTRO PARA MALA.nJR~TA

1 1 1 -I 1 1 1 1 I I I I I I I I I~enchidaporcorreiooufox,livros.

(U

-

~.§~

~.0 W'= I­'''' I-'~ u.,0e~ ::i--.~:§ 1]..1to ::!Q::J

~ m~

reta

atá/ogo da editora7 OSim ONão

formativo Summus7OSimO Não~.... '"'"~ ~= c.... e-

::> :=<:> u:z: u

.e-; ~

~-. O-III(,»

~O0'->~ "

., Gl'~lf-lt-li-t--t-+~~-+-t--+-t-j-lJ-J iauro.;-------.-:==Q~ )Gl :::l cimee~n;;:to;;:::---------=~

'li O,,' III 'li

oeU,-

.. I U.

Summus EditorialRua ltapicuru, 6137A andar 05006-000 São Paulo - SP Brasil Tel. (11) 3872.3322 Fax(11) 3872~7476

Internet: http://www.summus.com.br e-mau. [email protected]