relatos do iii encontro de pesquisadores do caminho novo

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Resumo das palestras realizadas em CONSELHEIRO LAFAIETE, MG 29 de junho de 2012 Transcrição: Nilza Cantoni

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Resumo das palestras realizadas em Conselheiro Lafaiete, Minas Gerais, no dia 29 de junho de 2012

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Resumo das palestras realizadas em

CONSELHEIRO LAFAIETE, MG

29 de junho de 2012

Transcrição: Nilza CantoniRevisão: Joana Capella

SUMÁRIO

Abertura.................................................................................................................................................1

2. Primeiras sesmarias do Caminho Novo..............................................................................................2

3. A Paleografia na pesquisa Histórica – Leitura Documental..............................................................24

4 - Transcrição Documental: oportunidade de trabalho e desenvolvimento cultural..........................28

5 – A integração incompleta das instituições preservacionistas e culturais de Minas Gerais...............31

6 – Santeiro, além da matéria..............................................................................................................40

7 – Os índios carijós nos primórdios de Conselheiro Lafaiete..............................................................47

8 – A Teoria das Assinaturas e o Caminho Novo..................................................................................50

9 – A Genealogia no século XXI: metodologia de pesquisa...................................................................60

10 – Arquivologia: técnicas de conservação e restauro........................................................................64

11 – O latim nos monumentos de Mariana e Ouro Preto.....................................................................70

12 – O Caminho Novo entre o Arraial dos Carijós e Conselheiro Lafaiete............................................76

13 – Album Chorographico Municipal de Minas Gerais (1927)............................................................80

14 – Vias de Minas – Caminho Novo e Ferrovias..................................................................................84

15 –Caminho Novo em 3D....................................................................................................................93

16 –Mapeamento Interativo da Estrada Real.......................................................................................97

1

Abertura

Os trabalhos foram abertos por Francisco Rodrigues de Oliveira e Luiz Mauro Andrade da Fonseca, ambos pesquisadores e membros da comissão organizadora dos Encontros de Pesquisadores do Caminho Novo, seguidos das boas vindas da professora Mauriceia Maia, também pesquisadora e atual Secretária Municipal de Cultura de Conselheiro Lafaiete.

O professor Luiz Mauro Andrade da Fonseca iniciou sua fala lembrando que o Encontro de Pesquisadores é uma confraria de amigos, profissionais, pesquisadores e memorialistas para a qual não é necessária muita formalidade. O mais importante, disse ele, é o contato entre os participantes, apresentando pesquisas e novas fontes bibliográficas.

Passou a palavra ao professor Francisco Rodrigues de Oliveira que deu as boas vindas aos presentes e agradeceu à professora Mauricéia Maia pela boa vontade, hospitalidade e acolhida, bem como pela estrutura que ofereceu para o Encontro.

Em seguida a professora Mauricéia dirigiu algumas palavras ao grupo, agradecendo a presença de todos e desejando que tivessem um bom dia de trabalho, bastante frutífero, com uma rica troca de informações. Falou de sua satisfação pelo 3º Encontro realizar-se em Conselheiro Lafaiete e colocou-se à disposição.

2

2. Primeiras sesmarias do Caminho NovoO professor Luiz Mauro Andrade da Fonseca apresentou o trabalho que vem desenvolvendo

em conjunto com o professor Francisco Rodrigues de Oliveira há cerca de quinze anos, através de

reuniões semanais. Explicou que estava trazendo um resumo do que ambos haviam obtido até o

momento, deixando claro que não se trata de uma obra concluída, mas de um processo sujeito a

revisões, interferências e correções.

Explicou que concentram seus estudos no trecho que vai de Simão Pereira, ponto em que o

Caminho Novo adentra o estado de Minas Gerais, até as sesmarias próximas ao caminho em

Conselheiro Lafaiete. Ressaltou que não conhecem bem as sesmarias no estado do Rio de Janeiro e

pouco sabem das sesmarias de Lafaiete, bem como das que daí seguem até Ouro Preto.

Os pesquisadores fizeram uma comparação entre Antonil (1709), Tavares de Brito (1732) e

material da Casa de Contos (1717), ressaltando que nesta última fonte são encontrados registros

oficiais que incluem a quantidade de escravos de cada sesmeiro. Desta forma puderam montar os

quadros mostrados, os quais listam os sesmeiros na ordem em que se localizaram ao longo do

Caminho Novo. O primeiro foi Simão Pereira de Sá, seguido por Matias Barbosa da Silva e logo depois

por Antônio de Araújo dos Santos, sobre o qual pouco se sabe até o momento.

Foi destacado que os registros da Casa de Contos são considerados mais fidedignos, por ali

estarem dados relativos a pagamentos de impostos, e que foram encontradas informações

inconsistentes nos autores Antonil e Tavares de Brito.

No próximo trecho, já na região do município de Juiz de Fora, constam os seguintes

sesmeiros: José de Medeiros, com 14 escravos; José de Souza Fragoso com 6 escravos, na localidade

de Marmelo, onde foi construída a primeira Usina Hidrelétrica da América do Sul; João de Oliveira o

primeiro sesmeiro da fazenda Juiz de Fora, conforme descoberta de Wilson de Lima Bastos. Esta

sesmaria, concedida em janeiro de 1710, posteriormente foi vendida a um Juiz do Rio de Janeiro –

Luiz Bustamante de Sá, donde teria surgido o nome Juiz de Fora.

Continuando com as sesmarias no município de Juiz de Fora: Tomé Correia Vasques, com 26

escravos, na Fazenda da Tapera, de triste lembrança para os imigrantes que por ali passaram no final

do século XIX; Antônio Moreira da Cruz, com 12 escravos; José de Queiroz, com 8 escravos; Manoel

Correia Vasques, Juiz da Alfândega; e, José de Azevedo, com 18 escravos.

Na área do município de Ewbank da Câmara: Luiz Ferreira, com 5 escravos e Manoel de

Araújo, com 8 escravos.

3

Passando para o município de Santos Dumont, Luiz Mauro mencionou uma passagem de

Antonil em que é mencionado o sítio do Bispo, a respeito do qual não foi encontrada nenhuma outra

referência. Já o Tavares de Brito fala num Gonçalves que, segundo documentos da Casa de Contos,

seria Domingos Gonçalves Ramos e seu genro, Pedro Alves de Oliveira, com 9 escravos. O outro

Gonçalves referido pelo Tavares de Brito seria João Gonçalves Chaves que posteriormente vendeu as

terras para João Gomes, que deu nome ao local.

O próximo sesmeiro de Santos Dumont foi Agostinho Pinho e Silva, com 6 escravos, cujo

nome permanece ainda hoje nas localidades de Pinho Velho, Pinho Novo, Rio Pinho e Represa Pinho,

sendo que o rio mencionado é um afluente do Rio Pomba.

Chega-se ao município de Antônio Carlos onde foi concedida sesmaria a Domingos Rodrigues

da Fonseca com 30 escravos, Fazenda da Borda do Campo. Este sesmeiro ajudou Garcia Rodrigues

Paes na abertura do Caminho Novo e, para os pesquisadores, Domingos da Fonseca teria construído

o trecho entre Valença, no estado do Rio de Janeiro, e Barbacena, em Minas Gerais.

Passando a território do município de Barbacena, segundo Tavares de Brito encontram-se as

sesmarias do Registro – de Garcia Rodrigues Paes e os sesmeiros José Rodrigues e João Rodrigues. Os

pesquisadores apuraram na Casa de Contos os seguintes: Sargento Mor José Pereira, com 3 escravos;

José Ribeiro Leitão com 6 escravos e José Dias de Carvalho com 3 escravos.

Em Alfredo de Vasconcelos a sesmaria foi concedida a Alberto Dias de Carvalho, que possuía

20 escravos, e que deu nome ao Ribeirão Alberto Dias. Já em Carandaí a mencionada Roça de

Manuel Araújo.

Em relação às sesmarias de Conselheiro Lafaiete os autores chamaram a atenção para o fato

de não terem ali realizado um trabalho de campo que lhes permitissem melhor desenvolver o

assunto. Sendo assim, apresentaram de maneira sintética as seguintes informações sobre os

sesmeiros:

- João Batista e João da Silva Costa, citados por Antonil;

- Outeiro, Dois Irmãos, Galo Cantante, Rocinha, Amaro Ribeiro e Carijós, segundo Tavares de

Brito;

- Manuel Seixas com 6 escravos; Leandro de Carvalho com 4 escravos; Bento Gonçalves com

8 escravos; Belchior Rodrigues de Lima com 3 escravos; José Ferreira com 2 escravos; Manuel Gomes

Ribeiro com 12 escravos; Urbano de Couto Menezes com 10 escravos; Mateus da Costa com 2

4

escravos e Sargento Mor Antônio Delgado com 7 escravos, todos conforme registro da Casa de

Contos.

Foi citado, também, o sesmeiro Jerônimo Salgado Pimentel, cujas terras confrontavam com

João da Silva Costa e com Amaro Ribeiro Sena que é mencionado nos documentos do Arquivo

Público Mineiro como tendo recebido as terras em 1711.

A seguir Luiz Mauro informou que, considerando a presença da professora Maria Lúcia Prado

Costa, que mais tarde falaria sobre o Album Chorographico Municipal de Minas Gerais, incluiu entre

os slides o mapa do município de Juiz de Fora para auxiliar na identificação das localidades

mencionadas: Simão Pereira é São Pedro de Alcântara, Matias Barbosa e Ewbank da Camara que

depois pertenceu a Santos Dumont.

Os autores reuniram, também, mais algumas informações sobre os primeiros sesmeiros de

Simão Pereira:

Manuel da Silva Rosa, alferes: entre a roça da Paraibuna e a roça de Simão Pereira

de Sá , 5 de dezembro de 1709 (APM, sc 7, p. 143).

5

Antônio Alves da Costa: (1719 - Carrara), sobejos da sesmaria de Manuel da Silva

Rosa no Paraibuna.

Simão Pereira de Sá: paragem adiante do Paraibuna, no Caminho Novo, 30 de

setembro de 1716 (APM, sc 09, p. 208); declara ter 17 escravos em 1717 (Arquivo da

Casa dos Contos).

6

Sesmeiros de Matias Barbosa:

Matias Barbosa da Silva, coronel: 9 de março de 1709, data de concessão de

sesmaria, às margens do rio Paraibuna, compreendendo uma légua de testada,

correndo pelo Caminho Novo, por três léguas de sertão, confrontando com as

sesmarias de Simão Pereira de Sá e Antônio Araújo dos Santos. (Bastos, p.63-65). Um

dos fundadores de Barra Longa.

7

Antônio Araújo dos Santos (citado por Antonil e Tavares de Brito).

Sesmeiros de Juiz de Fora:

José de Medeiros: 17 escravos (Arquivo da Casa dos Contos), citado por Tavares de

Brito.

José de Souza Fragoso, sargento-mor: recebeu, em 1708, carta de sesmaria no lugar

dito Marmelo; 06 escravos em 1717 (Casa dos Contos); citado por Antonil e Tavares

de Brito.

João de Oliveira: primeiro sesmeiro da Fazenda do Juiz de Fora, em terras devolutas

de José de Souza Fragoso e Tomé Correia Vasques, obtendo carta de sesmaria em 15

de janeiro de 1710 (Bastos, p.55), vendendo-a posteriormente ao Juiz de Direito

(“Juiz de Fora”) Luiz Fortes Bustamante e Sá.

8

O palestrante destacou que a imagem acima é do século XIX e que a maioria das fazendas de Minas Gerais citadas como do século anterior são, na verdade, construções reformadas nos anos

oitocentos.

Tomé Correia Vasques, alcaide-mor: sesmaria no lugar dito Fazenda da Tapera;

declara ter 26 escravos em 1717 (Casa dos Contos); citado por Antonil e Tavares de

Brito.

Antônio Moreira da Cruz, capitão: declara ter 12 escravos em 1717; citado por

Tavares de Brito.

Manuel Correia Vasques, Juiz da Alfândega: citado em 1732 por Tavares de Brito.

9

Salvador Correia de Sá Vasques: sesmaria obtida em 1717, no Caminho Novo , entre

a roça de seu irmão Manuel Correia Vasques e a de Manuel de Azevedo. (Carrara).

José de Queirós: oito escravos (1717- Casa dos Contos); Rocinha do Queirós (1749 –

Costa Matoso).

José de Azevedo: 18 escravos (1717 – Casa dos Contos) - Azevedo (1732 – Tavares de

Brito).

Sesmeiros de Ewbank da Câmara:

Luiz Ferreira: declara ter 5 escravos (1717- Casa dos Contos); Sítio do Luiz Ferreira

(1749 – Costa Matoso); topônimo ainda atual.

Manuel de Araújo Eigueira: declara ter oito escravos (1717 – Casa dos Contos);

citado por Antonil (1711) e Tavares de Brito (1732).

Nome primitivo: Sítio dos Tabuões.

10

Sesmeiros de Santos Dumont:

Domingos Gonçalves Ramos: sesmaria pedida em 1709, sendo concedida em 7 de

junho de 1721 (APM, sc12, p. 26); declara ter nove escravos (1717 – Casa dos

Contos) e morar com o genro Pedro Álvares (Alves) de Oliveira (Fazenda Pedro

Alves); sesmaria, no Caminho Novo, entre a de Manuel de Araújo Eigueira e a de

João Gonçalves Chaves. Citado por Tavares de Brito (1732). Topônimo ainda

existente nos mapas atuais.

João Gonçalves Chaves: sesmaria concedida em 15 de janeiro de 1715, situada entre

terras de (seu sogro) Domingos Gonçalves Ramos e de Agostinho Pinho da Silva;

citado por Tavares de Brito (1732); Em 1728, vendeu a sesmaria a João Gomes

Martins, pai do inconfidente José Aires Gomes.

11

João Furtado de Mendonça (1717 - Carrara), 1, Agostinho de Pinho e Silva / João

Batista / João Gonçalves Chaves -----

Agostinho de Pinho e Silva (Fazenda Pinho Velho): seis escravos (1717 – Casa dos

Contos) - Agostinho de Pinho e Silva (1732 – Tavares de Brito) ----- Sítio do Pinho

Velho e Sítio do Pinho Novo (1749 – Costa Matoso).

Fazenda da Mantiqueira : sitio de Santo Antônio da Chapada da Mantiqueira? ;

Mantiqueira (1732 – Tavares de Brito); Sítio da Mantiqueira (1749 – Costa Matoso) .

12

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Sesmeiros de Antônio Carlos:

Borda do Campo do coronel Domingos Rodrigues da Fonseca (Fazenda da Borda do

Campo; citado por Antonil (1711) e Tavares de Brito (1732); declarou ter uma venda

e 30 escravos em 1717 (Arquivo da Casa dos Contos). Fazenda histórica ainda

existente.

João Raposo da Fonseca: (1718 - Carrara), 1, Borda do Campo, sobras das sesmaria

de Garcia Rodrigues Pais e Domingos Rodrigues da Fonseca [Leme].

14

15

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Sesmeiros de Barbacena:

Garcia Rodrigues Pais: (1727 - Carrara) ----- Registro Velho (1732 – Tavares de Brito)

----- Sítio do Registro Velho (1749 – Costa Matoso) ----- Registro Velho (1763/69 –

Gov. Luiz Diogo)

José Pereira, sgt-mor: roça, 1717, três escravos (Casa dos Contos)

Sítio de José Ribeiro Leitão: 1717, seis escravos, (1749 – Costa Matoso)

Sítio da Caveira: (1749 - CM0 ----- Igreja Nova (1763/69 – Gov. Luiz Diogo ----- Sítio

do Cangalheiro (1749 – Costa Matoso) - Teixeira, José Ribeiro – Sert. para dentro da

Faz. da Caveira, C. R. M. – 1770. ATUAL CIDADE DE BARBACENA.

17

18

Sesmarias de Alfredo Vasconcelos, Ressaquinha e Carandaí:

Manuel Dias Lobo (1719 - Carrara), sítio na Ressaca e nos ribeirões de Alberto Dias

(município de Ressaquinha) e da Caveira, Manuel Diniz ( seria Dias?) da Caveira /

Alberto Dias de Carvalho ---

José Dias de Carvalho, 1717- três escravos

Alberto Dias de Carvalho, capitão (1711 - Antonil) – 1717, 20 escravos –----- João da

Silva Lopes (1735 - Carrara), morador na Borda do Campo de Alberto Dias ----- José

Lopes de Oliveira (1735 - Carrara), com escravos, Caminho Novo, ribeirão Alberto

Dias, com posses para o Chopotó, lagoa no sítio do Macaco ------ Ribeirão Alberto

Dias (1749 - CM) ----- Alberto Dias (1763/69 – Gov. Luiz Diogo) -----

Ressaquinha (1749 – Costa Matoso) -----

Manuel de Seixas, 1717 – seis escravos (Casa dos Contos), Ressaca - Fonseca,

Manuel de Seixas da. Confirmação da sesmaria em 1725, doc. 518, p. 42, Lisboa.

Manuel Gonçalves Viana (1711 - Carrara), 3/1, # 6 a., Caminho Novo, Ressaca -----

Ressaca (1711 - Antonil) –---- Ressaca (1732 – Tavares de Brito) ----- Ressaca (1749 –

Costa Matoso) --

Manuel da Gama (1716 - Carrara), entre as roças de Carandaí e da Ressaca ----- Sítio

do Gama (1749 – Costa Matoso)

Carandaí (1732 – Tavares de Brito) ----- Sítio do Carandaí (1749 – Costa Matoso) -----

Carandaí (1763/69 – Gov. Luiz Diogo) -----

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Sesmarias de Conselheiro Lafaiete:

João da Silva Costa e Leandro de Carvalho, 1717 – quatro escravos

Jerônimo Pimentel Salgado: Sít. na Borda do Campo, em Carijós, junto das

Congonhas, F. N. Sra. da Conceição – 1711. . Principiava no ribeiro da casa branca

pelo caminho do povoado até a igreja de N. Sra. Da Conceição (W96). Confrontante:

João da Silva Costa e Amaro Ribeiro de Sena.

22

Urbano de Couto, 1717 – 10 escravos - Menezes, Urbano do Couto de – Sít Borda do

Campo, no caminho novo para os Goiases – 1737. Confrontantes: Manuel Fernandes

Serra e Lourenço de Amorim.

Antônio Delgado: 1717 – 7 escravos (Casa dos Contos).

Belchior Rodrigues Lima: 1717 – três escravos (Casa dos Contos)

Bento Gonçalves: 1717 – oito escravos (Casa dos Contos)

Francisco Araújo de Azevedo: sesmaria em Carijós – 1723.

José Ferreira: 1717 – 2 escravos

José Ventura Mendanha Soto Maior: Carijós – 1711

Manuel Gomes Ribeiro: 1717 – 12 escravos (Casa dos Contos)

Mateus da Costa: 1717 – 2 escravos (Casa dos Contos)

Taipas (1763/69 – Gov. Luiz Diogo)

Engenho (1763/69 – Gov. Luiz Diogo)

Paraopeba (1763/69 – Gov. Luiz Diogo)

Carijós (1763/69 – Gov. Luiz Diogo)

23

BIBLIOGRAFIAASSIS, João Paulo Ferreira de. História do município de Senhora dos Remédios. Barbacena: Ed. do

autor, 2003.

BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário histórico e geográfico de Minas Gerais. Belo Horizonte,

Itatiaia, 1995.

BASTOS, Wilson de Lima. Caminho Novo – Espinha dorsal de Minas. Juiz de Fora: Funalfa Edições,

2004.

CASTELLO BRANCO, Oswaldo H. Uma cidade à beira do Caminho Novo. Petrópolis: Vozes, 1988.

CASTRO, Olívio de Albuquerque. Apontamentos para a história de Matias Barbosa. 3. ed. , 1998.

CARRARA, Ângelo Alves. Contribuição para a história agrária de Minas Gerais – séculos XVIII-XIX.

Universidade Federal de Ouro Preto. Departamento de História. Mariana, 1999.

CATÁLOGO DE SESMARIAS – APM – 1988 – 2 VOLUMES

COSTA, Joaquim Ribeiro. Toponímia de Minas Gerais: com estudo histórico da divisão territorial

administrativa. Belo Horizonte: Imprenssa Oficial do Estado, 1970.

ESTEVES, Albino. Álbum do município de Juiz de Fora. Belo Horizonte: Imprensa Oficial do Estado de

Minas Gerais, 1915.

MASSENA, Nestor. Barbacena: a terra e o homem. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1985.

OLIVEIRA, Wilian Marcos de & SILVA, Geraldo Magela da. Ressaquinha de canto a canto.

Ressaquinha: Cidade de Barbacena Gráfica e Editora, 2002.

PINTO, José Damasceno. Subsídios para a história da Ex-Queluz de Minas (hoje Conselheiro

Lafaiete) até o final do século XIX. Libreto sem outros dados de indentificação.

24

3. A Paleografia na pesquisa Histórica – Leitura DocumentalJairo Braga Machado começou sua apresentação cumprimentando os organizadores pela

organização de um evento que reúne tantos pesquisadores de variadas áreas do conhecimento. Em

seguida explicou que falaria de um tema surgido de suas observações ao receber pessoas no arquivo

do IPHAN em São João del Rei.

Exemplificou com uma aluna da USP que visitou a instituição há poucos dias, com o objetivo

de fazer um levantamento sobre a ocupação urbana da localidade. Foram-lhe indicados os

inventários e explicado que o acervo conta com documentos cartoriais emitidos a partir de 1715 e

até o final do século XX. Dada a dificuldade com a leitura dos documentos a aluna levantou a

possibilidade de mudar o tema da pesquisa.

Entretanto, alertou o palestrante, sem que se possa inculpar os pesquisadores pelo fato, a

realidade é que muitos não se encontram preparados para lidar com os documentos por falta de

domínio da leitura paleográfica. Sendo assim, diante de um exemplar do final do século XVIII, o

pesquisador constata que não consegue ler o que ali está registrado. Nestas situações, Jairo

Machado costuma fazer uma brincadeira com o interlocutor, dizendo que o início do contato com o

documento é como um namoro. No primeiro encontro o pesquisador pode ficar vermelho e nervoso,

mas ao longo do tempo vai se acalmando e adquirindo uma certa intimidade.

Jairo Machado declarou não ser nenhum exagero afirmar que obrigatória e necessariamente

a história de Minas passa pela Comarca do Rio das Mortes e, naturalmente, por São João del Rei

25

como cabeça desta comarca. Acrescentou que grande parte da documentação encontra-se sob a

guarda do Escritório Técnico do IPHAN na cidade.

Foi também, destacada a necessidade de questionar o documento. “Que trem é este aqui?

Que suporte documental é este? Que coisa é esta que está passando sob meus olhos? O que querem

me transmitir estes fragmentos da história?” Para o professor Jairo, este diálogo deveria iniciar-se lá

no início do processo, quando se decide com que tipo de fonte se pretende trabalhar. De forma que,

ao escolher o material, o estudante se prepare, buscando dominar as técnicas necessárias para tirar

o melhor proveito das fontes.

A paleografia, declarou Jairo Machado, é um dos grandes entraves para quem deseja

trabalhar com documentação antiga. E para demonstrar a importância da paleografia para a história,

foram apresentadas imagens de alguns documentos. Durante a passagem dos slides o palestrante

pontuou a importância estratégica de São João del Rei como passagem obrigatória para quem chega

ou para quem sai das Minas.

Tratando do termo paleografia, foi explicado que o termo grego palaios significa antigo e

graphien significa escrita. Desta forma a paleografia envolve todos os sistemas de escrita antigos e os

tipos de suporte nas quais se inscrevem.

Dando prosseguimento o palestrante lembrou que no caso específico da documentação

cartorária sob a guarda do arquivo do IPHAN em São João del Rei, a quase totalidade está em suporte

papel, sendo importante ressaltar que o papel do século XVIII é de excelente qualidade, muito

superior aos congêneres utilizados nos séculos XIX e XX.

26

Foram também mencionados alguns elementos constitutivos da escrita, como a direção dos

traços, a forma das letras, as ligaduras e o peso que se imprime ao material utilizado para escrever.

Ou, em termos técnicos conforme mostrado em um slide: morfologia, ângulo, ductus, módulos,

ligaduras e nexus. O palestrante destacou que quanto maior o grau de formação acadêmica dos

produtores dos antigos documentos, mais fácil é a leitura.

ÂNGULO

É a relação entre posição

do instrumento com que se

escreve com a linha

imaginária da escrita.

Segundo o Ductus, a escrita pode ser: Assentada (também

chamada Redonda ou Textual) ou cursiva.

Ligaduras são pequenos traços que unem partes de letras

próximas.

27

Nexus: é a união de duas ou mais letras por superposição

ou inclinação de uma letra em outra.

A plateia que acompanhou a comunicação de

Jairo Braga Machado ficou sabendo que há casos em que

estudantes resolvem mudar de tema ou de metodologia

de pesquisa quando se deparam com a dificuldade de ler

os documentos com os quais planejou trabalhar.

Ao “conversar” com os documentos expostos na

tela, o palestrante chamou a atenção para as diferenças

existentes entre os vários escritos, levando a crer que os

autores tinham diferentes níveis de domínio da arte da

escrita.

Ao encerrar, o palestrante reiterou que a história

de Minas passa obrigatoriamente por São João del Rei e

que a documentação da Comarca do Rio das Mortes que

se encontra sob a guarda do IPHAN está disponível para

consulta pelos interessados.

BIBLIOGRAFIAANDRADE, Maria Cecília Jurado de. Paleografia. In: Eni de Mesquita Samara (org). Paleografia,

Documentação e Metodologia Histórica. São Paulo: Humanitas, 2010.

MENDES, Ubirajara Dolácio. Noções de Paleografia. 2 ed., São Paulo: Arquivo Público do Estado de

São Paulo, 2008.

28

4 - Transcrição Documental: oportunidade de trabalho e desenvolvimento cultural

Com o subtítulo Da transcrição de fontes históricas à Pesquisa Acadêmica, a comunicação do

professor Sheldon Augusto Soares de Carvalho versou sobre a transcrição documental com o

enfoque da oportunidade de trabalho e desenvolvimento cultural que a atividade oferece. Ao iniciar

a apresentação, o palestrante lembrou que não há como falar da árvore e de seus frutos sem se

referir à terra onde a semente foi depositada e, portanto, ele não poderia discorrer sobre o própria

trajetória acadêmica sem mencionar três grande ícones da sua formação: a professora Edna, de

História Local, no início de sua vida universitária; o professor Luiz Mauro, que o encaminhou para os

primeiros passos na transcrição documental; e o professor Francisco Oliveira, também, contratante

de seus serviços desde o início. Os três representam, portanto, a ancestralidade acadêmica do hoje

Mestre e Doutorando Sheldon Carvalho.

Em razão do investimento destes três personagens em sua formação profissional, o professor

Sheldon sentiu necessidade de abordar o ofício do transcritor neste 3º Encontro de Pesquisadores do

Caminho Novo. E declarou fazê-lo partindo de um conceito de Cristóvam Buarque em Revolução

Educacionista que é a produção do capital conhecimento por meio da educação e da produção

intelectual. Esta questão envolve a pesquisa e a transcrição documental, intimamente envolvidas

com a geração do capital conhecimento.

29

Após esta introdução o palestrante discorreu sobre sua trajetória iniciada na disciplina

História Local, com a leitura e análise do inventário de uma preta forra de nome “Vitória da Silva”

datado de 1805. Logo depois veio a primeira oportunidade e experiência de trabalho como leitor e

transcritor de fontes históricas com o “livro de contas de José Aires Gomes”. Em continuidade ao seu

processo de profissionalização vieram as transcrições de sesmarias e de registros paroquiais de

Terras para os historiadores e escritores de história local e Regional: Luiz Mauro Andrade da Fonseca

e Francisco Rodrigues de Oliveira.

Lembrando o desafio que é uma transcrição, informou que estes trabalhos lhe permitiram

financiar sua formação acadêmica, o que lhe faz declarar que a leitura e a transcrição documental

representam um setor promissor de investimento, tanto por parte do escritor, quanto por parte do

pesquisador e transcritor. Hoje, informou Sheldon Carvalho, há uma equipe técnica que trabalha sob

sua orientação e este grupo vem produzindo novas bibliografias. Surgiu, também, a função de

consultor de transcrições por ele realizada para diversos autores que o procuram.

Foi destacado que a atividade de transcrever documentos para terceiros deixou de ser um

trabalho eventual para se transformar num negócio que representa, também, desenvolvimento para

a cidade, conforme está ocorrendo com a nova coleção da História da Vida Privada, cujo

representante procurou a equipe de Barbacena para encomendar transcrições. Ou seja: o arquivo de

Barbacena estará registrado nesta grande coleção acadêmica.

As transcrições para terceiros ampliam o manancial de conhecimentos teóricos e

metodológicos do pesquisador, forçando-o a se aperfeiçoar cada vez mais. Importante destacar que

é um setor com pouca concorrência e de extrema peculiaridade. Quem domina este conhecimento

tem um poder nas mãos.

A atividade, que financiou o mestrado e hoje financia o doutorado do professor Sheldon,

gera desenvolvimento cultural e acadêmico por meio do avanço de pesquisas em diversos campos do

saber, bem como por meio de consultorias sobre fontes históricas regionais. Foi lembrado, ainda,

que a maior parte das transcrições para outras pesquisas serviram de complemento empírico ou

também acrescentaram volume às fontes utilizadas em suas pesquisas de doutorado. Como exemplo

citou a pesquisa em dois livros de registros de terras a pedido de Francisco de Oliveira, cujas

transcrições estão arquivadas em seu acervo pessoal e atualmente estão sendo utilizadas para

escrever o primeiro capítulo de sua tese de doutorado.

Sheldon Carvalho mencionou também a formação de um campo econômico e lucrativo de

trabalho somado à esfera de qualificação profissional especializada, como também à produção

30

cultural consoante ao trabalho com as fontes arquivísticas. Tal situação acelera e gera um maior

desenvolvimento no volume de pesquisas e situações novas como as oficinas que realizará com seus

alunos de Lafaiete e que nasceram da atividade de um deles, pesquisador do arquivo dos mórmons

(Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias).

A comunicação foi concluída com a apresentação da síntese a seguir:

• Pesquisador/Transcritor + Equipe programadora e revisora + escritor = agilidade e redução de tempo na conclusão de trabalhos;

• Utilização de grande parte das fontes pesquisadas para particulares em pesquisas de mestrado e doutorado;

• Fornecimento de documentos transcritos para outros pesquisadores gerando ganho financeiro duplo ou triplo;

• O ofício de transcritor testemunha ao mesmo tempo a necessidade do pesquisador estar dentro dos arquivos tendo contato com as fontes em razão do diálogo com as mesmas, surgindo daí novos métodos, novos problemas, novas hipóteses e novos objetos.

A coleta de dados, lembrou Sheldon Carvalho, é bastante peculiar. Se a pessoa não estiver

envolvida intimamente com a documentação e com a metodologia da pesquisa, será aberta uma

lacuna intransponível. Portanto, trata-se de uma área que envolve investimento econômico, cultural

e educacional. O ofício de transcrição é um setor promissor da economia, que gera outras atividades

também de viés econômico como vem ocorrendo em Conselheiro Lafaiete com o trabalho realizado

no Arquivo Perdigão.

31

5 – A integração incompleta das instituições preservacionistas e culturais de Minas Gerais

Alex Guedes dos Anjos informou que iria abordar as instituições preservacionistas que têm o

dever de cuidar do Caminho Novo e compartilhar a angústia provocada pela falta de integração entre

elas, uma das causas de serem menos eficientes ou até mesmo deficientes. Por esta razão decidiu

denominar sua comunicação no 3º Encontro de Pesquisadores do Caminho Novo como As

Instituições Preservacionistas e seus Papéis Soltos.

Iniciando pelas origens da ideia de preservação, e lembrando que diferentes autores

apontam diferentes origens, ressaltou que o Direito Romano já abordava o tema, levando-o a

suspeitar que até o homem pré histórico se ocupava do assunto. Isto porque a preservação remete

ao que é sagrado por transmitir a ideia de coletivo, dando a sensação de que fazemos parte de algo

maior. Sendo assim, o homem primitivo que lá em sua caverna escolheu um cantinho para cultuar o

deus dele, provalmente estava criando a ideia de manter uma identidade que nasce, então,

simultaneamente ao passado da humanidade.

Alex dos Anjos declarou que a primeira lei a tratar do assunto foi o Decreto Régio de Dom

João V, de 1721, que determinava a função para a Academia Real de Lisboa de preservar até mesmo

aquilo que já estivesse parcialmente demolido. Já no Brasil, a ideia de preservação proposta pelos

modernistas se destaca, através de Mário de Andrade que, a pedido de Gustavo Capanema, do

Ministério de Cultura, elaborou um ante projeto de lei de criação do Serviço de Patrimônio Histórico

e Artístico.

32

Mário de Andrade, que trabalhava no Departamento de Cultura da Prefeitura do Município

de São Paulo, fez um projeto do qual pequena parte foi aproveitada no Decreto Lei 25 de 1937, que

alguns autores alegam ser uma cópia do projeto de Mário de Andrade. Esta opinião não é

compartilhada por Alex dos Anjos que acrescenta ter o modernista sido tão avançado que já

mencionava até Patrimônio Imaterial, ideia só incorporada ao nosso ordenamento jurídico em 2000.

Passando-se para as instituições atuais, o público recebeu informações sobre os órgãos

existentes: IPHAN, órgão federal; IEPHA e CONEP, do Estado de Minas Gerais e Conselhos Municipais.

Em 1934 foi aprovado o novo regulamento do Museu Histórico Nacional para organizar “um

catalogo dos edificios de assignalado valor o interesse artistico-historico existentes no paiz, propondo

ao Governo Federal os que se devam declarar em decreto Monumentos Nacionaes”

Alex dos Anjos destacou que Ouro Preto foi reconhecida como Monumento Nacional antes

de existir uma lei sobre tombamento.

Em 1936 foi iniciado o funcionamento do SPHAN - Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico

Nacional e em 1937 foi “Creado o Serviço do Patrimonio Historico e Artístico Nacional, com a

finalidade de promover, em todo o Paiz e de modo permanente, o tombamento, a conservação, o

enriquecimento e o conhecimento do patrimonio historico e artístico nacional”.

- Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937 - Dá nova, organização ao Ministério da Educação e Saude Publica

33

- Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937 - Organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional

Ao longo do tempo o SPHAN - Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional recebeu

outros nomes:

- DPHAN - Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

- IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

- SPHAN - Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

- IBPC - Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural, nome que vigorou durante a era Collor e

que para Alex dos Anjos é o nome mais adequado por ser o patrimônio cuidado pelo Iphan muito

mais amplo do que o nome atual indica: IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico

Nacional

A principal finalidade do IPHAN é proteger, fiscalizar, promover, estudar e pesquisar o

patrimônio cultural brasileiro, conforme determina o Decreto nº 6.844, de 7 de maio de 2009. O

órgão tem duas funções básicas:

- Executiva – Realizar obras de preservação; e,

- Normativa – Elaborar normas e procedimentos a respeito das ações de preservação.

Está dividido em 27 Superintendências Estaduais e 25 Escritórios regionais, sendo que 5 deles

em Minas Gerais: São João del Rei, Tiradentes, Ouro Preto, Mariana, Congonhas, Serro e Diamantina.

34

Em seguida Alex dos Anjos falou a respeito do IEPA – Instituto Estadual do Patrimônio

Histórico e Artístico de Minas Gerais que sustenta a ideia expressa no título da comunicação, ou seja,

os “papéis soltos” das instituições preservacionistas, já que o IPHAN tem superintendências estaduais

e Minas Gerais criou este órgão praticamente com a mesma função da superintendência.

Muito autores indicam a criação da Inspetoria Estadual de Monumento Histórico, em 1926,

com provável primeiro órgão preservacionista do país. Entretanto, a lei de criação desta instituição

mineira não foi encontrada. Já em 1927 os mesmo autores indicam o segundo órgão nacional, no

estado da Bahia, cuja lei foi localizada pelo palestrante.

A preocupação em unir os órgãos surgiu apenas em 1970 com o chamado Compromisso de

Brasília. Só então é criado efetivamente em Minas Gerais o IEPHA, em 1971, com a finalidade de

pesquisar, proteger e promover o patrimônio cultural mineiro.

Em 2007 o IEPHA-MG desmembrou suas funções, criando o CONEP - Conselho Estadual do

Patrimônio Cultural a quem compete deliberar sobre diretrizes, políticas e outras medidas correlatas

à defesa e preservação do patrimônio cultural. O CONEP não faz parte da estrutura do IEPHA, sendo

subordinado à Secretaria de Cultura. A ele compete decidir sobre tombamentos, fomentar a

constituição e o funcionamento dos Conselhos Municipais do Patrimônio Cultural. Já o IEPHA-MG

deve observar as deliberações do CONEP e prestar-lhe apoio técnico, científico e operacional.

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A etapa seguinte foi tratar dos Conselhos Municipais do Patrimônio Cultural ou Histórico e

Artístico através de uns poucos comentários, já que seria impossível abordar cada um deles em

particular.

Até 1995 existiam 15 Conselhos Municipais no Estado de Minas Gerais: Belo Horizonte,

Betim, Cataguases, Congonhas, Divinópolis, Ituiutaba, Machado, Morro do Pilar, Santa Luzia,

Paracatu, Poços de Caldas, Sete Lagoas, Três Corações, Visconde do Rio Branco e Antônio Carlos.

Após 1996 em razão do advento da Lei Robin Hood (ICMS Cultural) surgiram centenas de Conselhos

Municipais.

Foram então apresentadas diversas imagens sobre a situação dos Conselhos Municipais no

país.

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37

Os Conselhos Municipais no Brasil e em Minas Gerais

38

Alex dos Anjos chamou a atenção para uma análise realizada pela Fundação João Pinheiro

constantando que de 55% dos Conselhos Municipais de Minas Gerais não há sequer possibilidade de

saber se estão realmente funcionando. Com discussão e votação existiam em 2005, época da

realização da pesquisa, 22% dos Conselhos. Sem discussão eram 14% e sem votação os demais 9%.

Portanto, observa-se que apenas uma pequena parcela dos Conselhos Municipais está funcionando

de forma adequada.

Além dos três órgãos citados, há outras instituições preservacionistas que completam o

panorama dos “papéis soltos” e que são considerados órgãos auxiliares por Alex dos Anjos,:

Ministério Público, Polícias e Defensoria Pública.

O Ministério Público, talvez o mais combativo, é o que denuncia e que em Minas Gerais age

de forma mais conciliatória. Os instrumentos de proteção do Ministério Público são a Ação Civil

Pública e o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).

Desde o ano de 2003 Minas Gerais conta com um grupo de promotores do Ministério Público

Estadual dedicado especificamente à preservação do patrimônio cultural.

Em seguida Alex dos Anjos apresentou à plateia um questionamento: por que a Polícia é um

órgão de preservação? A resposta é simples:

Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena – reclusão, de um a três anos, e multa. Lei nº 9.605/98

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Ou seja, o bem não precisa ser tombado para que seja imputada pena pelo atentado de que

seja alvo. Entretanto, ressaltou Alex ao responder pergunta da plateia, não se tem conhecimento de

que alguém tenha sido preso porque o Ministério Público tem optado por exigir elevadas penas

pecuniárias que auxiliam na preservação de outros bens e eventualmente acrescentam outros itens

ao patrimônio do estado.

O outro órgão auxiliar mencionado foi a Defensoria Pública que, com a Lei nº 11.448, de 15

de janeiro de 2007, ganhou o poder de ajuizar ação civil pública. Sem esquecer da sociedade civil,

organizada através de associações legalmente constituídas e dos ci individualmente que também

podem impetrar ações populares.

Alex dos Anjos chamou a atenção para a importância de conhecer os órgão, apresentando

um texto publicado no jornal Estado de Minas em 3 de março de 2012 e que se refere ao processo da

Fazenda do Registro Velho, em Barbacena:

“O conselho municipal já havia pedido ao Ministério Público Estadual autorização para a transferência do oratório [da Fazenda do Registro Velho], diante dos riscos de danos. Depois da concessão da liminar, em 16 de fevereiro, tivemos de esperar por um momento oportuno para que um técnico do Iphan pudesse acompanhar a remoção da peça”.

O palestrante acusou o erro cometido pelo jornal, uma vez que o Ministério Público não tem

o poder de autorizar nada, medida que só pode ser tomada pelos órgãos específicos: IPHAN,

Conselho Municipal ou IEPHA. Sendo assim, é importante conhecer o assunto para não cometer

estas gafes, como fez o jornal Estado de Minas.

A última parte da comunicação mencionou um necessário Sistema Nacional do Patrimônio

Cultural, ainda inexistente, que atuaria nos moldes do Serviço Nacional de Saúde. Curiosamente,

porém, o Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro 1937 inclui o seguinte artigo:

“Art. 23. O Poder Executivo providenciará a realização de acordos entre a União e os Estados, para melhor coordenação e desenvolvimento das atividades relativas à proteção do patrimônio histórico e artístico nacional e para a uniformização da legislação estadual complementar sobre o mesmo assunto”.

Justificando a expressão “papéis soltos” que utilizou para intitular sua comunicação, Alex

Guedes dos Anjos expressou sua preocupação com o fato de que os órgãos deixam de olhar os

interesses nacionais para se dedicarem aos interesses locais e regionais, dando margem aos conflitos

de competência, não existindo uma instância deliberativa para resolver a questão.

40

A primeira tentativa neste sentido foi em 1970, com o 1º Encontro de Governadores, o

chamado Compromisso de Brasília. Em 1971 aconteceu o 2º Encontro em Salvador. Somente em

2008, 37 anos depois, o diálogo foi retomado, tendo sido realizada uma reunião em março e um

encontro em agosto. Em 2009 foi realizado o 1º Fórum Nacional do Patrimônio Cultural, em Ouro

Preto, em que uma das conclusões foi pela necessidade de

“Regulamentar a cooperação entre os entes federativos, a fim de minimizar a superposição de comandos e recursos, conflitos interinstitucionais e falta de responsabilização dos diversos atores”.

Sobre a continuidade do processo, o palestrante destacou um texto obtido no Site do IEPHA,

relativo a entrevista da diretora de Articulação e Fomento do Instituto do Patrimônio Histórico

Nacional (IPHAN), Márcia Rollemberg:

“Uma resolução do Fórum foi a de que ele teria periodicidade bienal. Então, está previsto para final de outubro de 2011 o II Fórum Nacional do Patrimônio Cultural, em João Pessoa, para continuar esse processo de construção”.

O segundo fórum não foi realizado e Alex dos Anjos tem a expectativa de que não fiquemos

mais 37 anos sem outro encontro para tratar do assunto. Informando que cada instituição está

agindo de acordo com as próprias conveniências, o palestrante falou rapidamente sobre dois

modelos possíveis para as instituições:

Sua escolha recai sobre o modelo de rede, contando com uma instância deliberativa. O

desafio expresso por Alex dos Anjos é participar mais desta discussão:

“Encontrar o ponto de equilíbrio entre o modelo hierárquico - em razão da necessidade da criação de normas - e o de redes - a fim de que a execução se dê de maneira colaborativa entre os diversos atores.”

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6 – Santeiro, além da matériaLuciomar de Jesus explicou que, ao ser convidado

pela professora Mauricéia Maia para fazer uma

apresentação no 3º Encontro de Pesquisadores do

Caminho Novo, o tema sugerido foi a obra de Aleijadinho.

Entretanto, por já ter abordado o assunto em outras

oportunidades, escolheu falar sobre o ofício de santeiro

que traz em si um envolvimento espiritual muito grande.

Destacando ser extremamente difícil lidar com o universo

da fé, o artista lembrou que produzir uma obra desta

natureza implica lidar com o imaginário do devoto que,

diante do santo, não se detém na obra de arte em si, mas

naquilo que está além daquela matéria. Sendo assim, o

escultor precisa produzir algo tangível que tenha o poder

de levar o devoto ao universo intangível.

Para situar o tema, falou da origem da arte escultórica, destacando que a escultura “é a arte

de plasmar a matéria entalhando a madeira, modelando o barro, cinzelando pedra ou o mármore,

fundindo o metal” para produzir figuras em relevo ou em três dimensões. As três dimensões, ou seja,

altura, largura e profundidade, são apenas indicadas nas obras bidimensionais como as pinturas,

através dos efeitos de luz e sombra.

Em seguida a plateia teve oportunidade de ver alguns exemplares de arte escultórica desde o

período paleolítico, através de imagens projetadas no telão, acompanhadas de comentários do

artista como, por exemplo, o fato das esculturas egípcias terem sempre algum ornamento ou objeto

próximo ao pescoço para dar-lhe sustentação e evitar que se quebrasse, já que a ideia que

perpassava a produção das imagens é de que fossem permanentes.

Logo em seguida foram apresentadas imagens de materiais utilizados para esculpir barro,

pedra ou madeira e exemplares produzidos em bronze. Discorrendo sobre os materiais, Luciomar de

Jesus informou que “Imaginária Barroca é o estudo das imagens, ou seja, das esculturas que

representam os Santos da Igreja Católica”.

Conhecer a iconografia é fundamental para o santeiro, já que cada santo tem um atributo,

um adereço, uma história. Como não existem fotografias dos santos porque a arte fotográfica é

recente, o rosto não importa. Identificadores são os trajes e objetos característicos de cada um. O

42

santeiro não é exatamente um artista, mas um operário da fé que precisa respeitar o universo

intangível já mencionado, declarou Luciomar, sempre inclundo um comentário interessante e muitas

vezes espirituoso sobre as imagens que estavam sendo projetadas.

As esculturas, disse Luciomar, falam através de seus adereços. E na atividade de santeria o

artista precisa ter muito claro o objetivo do que irá produzir, respeitando os quatro grupos em que se

dividem as esculturas devocionais: retabulares, processionais, cenas escultóricas e imagens de

oratório.

Aqui não é necessário cuidar dos detalhes das costas da imagem.

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Para atenderem ao objetivo de serem carregadas em procissão, precisam ser leves.

Estas cenas representam uma situação, como são os passos de Congonhas.

Dando prosseguimento, Luciomar de Jesus reiterou que a arte do santeiro está sujeita ao

condicionamento, ou seja à história do santo. Além disso, é preciso uma grande sensibilidade para

identificar o que deseja o encomendamente e adequar o pedido aos imperativos da atividade.

Durante a produção de uma escultura é necessário estabelecer um “diálogo” com o material

bruto em busca de inspiração que permita transformá-lo em um objeto de devoção. Com este

destaque o artista introduziu uma fala do Mestre Vitalino, que não criou santos por acreditar ser um

sacrilégio colocar um santo no fogo para cozer o barro com que trabalhava.

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Encerrando a primeira parte de sua apresentação, o escultor Luciomar de Jesus projetou

imagens das várias etapas de um de seus trabalhos.

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Na segunda parte o artista encantou a plateia com rápida oficina de produção de uma

escultura.

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7 – Os índios carijós nos primórdios de Conselheiro Lafaiete

A comunicação da professora Mauricéia Maia teve por objetivo convidar a uma reflexão que

permitisse compreender um pouco mais sobre os carijós, grupo que representa os primórdios da

ocupação das terras do município de Conselheiro Lafaiete. Segundo a palestrante, os carijós são um

enigma e faltam pesquisas que esclareçam a sua história. Saindo da literatura tradicional, a

palestrante buscou produção mais recente e encontrou alguns olhares sobre os carijós sob diversas

definições: mestiço; alguém que vem de tribo remanescente dos caribenhos; uma planta comum na

região; e, uma palavra de baixo calão. Já o sentido encontrado em documentos é o mestiço que, de

alguma forma, faz parte da sociedade colonial. Dentro desta sociedade, vista como um organismo

muito bem engendrado, cada um tem sua função e seu lugar. Nela o carijó é um sujeito

administrado, domesticado e catequisado.

Lembrando uma sua professora da graduação em São João del Rei, que desenvolve trabalho

sobre os ameríndios, a palestrante informou que foram encontradas informações interessantes nas

delações das visitas pastorais, tentáculos da inquisição católica portuguesa. Entre as 767 delações

feitas entre 1721 e 1800, constam pecados cometidos pelos indígenas como trato ilícito, meretrício,

incesto, curandeirismo, feitiçaria, bebedeira e concubinato, este com a maior quantidade de casos

encontrados. Esclareceu que o concubinato, naquele momento, tinha o sentido de relação entre

indígenas e não indígenas. A moral indígena era tida como fraca e libidinosa, sendo entendida como

sedução qualquer relação que os indígenas mantivessem com o elemento branco, civilizador.

Ressalte-se que os documentos colocam o indígena sempre como culpado “por vagar em meio a

mato fechado” ou por “perturbação do senso moral”. Na união muitas vezes estável de indígena com

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branco, com casamentos durando décadas, a mulher indígena sempre carregava o pejorativo de

bastarda, seguido de carijó. Desta forma, o termo carijó fica entendido como sinônimo daquele que

não tem moral e, por isso, deve ser disciplinado e tratado.

Para melhor entender o significado do termo carijó, Mauricéia Maia fez uma busca mais

ampla e verificou que em São Paulo e no Rio de Janeiro o epíteto era dado aos capangas, ou seja,

àqueles que serviam para matar, apresar, roubar ou executar outros serviços de natureza deletéria a

mando de seus senhores. Em Santa Catarina e no Paraná os indígenas denominados carijós foram

aqueles empurrados da região de lagunas para a mata fechada, não tendo sido considerados

agressivos nem parte de bandos.

Já carijó mineiro era o indígena administrado, ou seja, submetido e modificado. A categoria

de administrado é demonstrada pela aproximação com a religião, através da catequese, prestação de

serviço mata a dentro e limpeza da área para moradia ou agricultura, conforme informação obtida

através do trabalho de Sheldon Carvalho em documentos do Arquivo Antônio Perdigão, de

Conselheiro Lafaiete.

Neste momento o professor Sheldon deu sua contribuição, mencionando detalhes sobre o

documento que serviu de base para a conclusão sobre quem eram os carijós mineiros e a professora

Mauricéia prosseguiu informando que os indígenas escravizados tinham alguns privilégios em relação

aos africanos, contando com legislação que permitiu até que chegassem à condição de homem pobre

livre.

Foi relatado o caso das índias Aurora e Cecília, apresadas na serra de Itaverava por Salvador

Furtado de Mendonça, que as encaminhou para batismo. Desta forma, as duas deixaram de ser

reconhecidas como índias e passaram a escravas. Além disso, foi informado que, quando um índio

encaminhava à justiça uma reclamação em defesa do seu direito de liberdade, na falta do descritivo

para nomear “a gente de cor” e de meios para identificar suas características pessoais, o juiz era

obrigado a fazer uma visitação para observar o reclamante em busca de traços físicos que o

identificassem como indígena e, assim, determinar que fosse libertado por estar sendo escravizado

desonestamente. Importante ressaltar que a designação “gente de cor” não se referia aos negros,

mas aos indígenas. Esta providência de “verificar a pessoa” era o grau extremo da reclamação.

A partir desta pesquisa, Mauricéia Maia declarou ter ficado demonstrado que o

desaparecimento da população indígena não se deu em decorrência de massacre, epidemia ou

qualquer outra forma de dizimá-la. Desrespeitando as etnias, o elemento colonizador mudou a sua

designação, adotando a reclassificação de carijós, cabras ou termos equivalentes, zerando o indígena

50

dos documentos e registros oficiais no período de dois ou três anos. Desta forma, reforçou a

palestrante, perdemos a designação mas não o indígena, que continuou vivendo no mesmo lugar.

Portanto, o mito de que os indígenas foram dizimados e não deixaram nenhuma herança cultural é

apenas isto, um mito.

Reiterando o que disse no início de sua palestra, Mauricéia lembrou que na história tudo se

renova na medida em que se buscam informações complementares. A população indígena em Minas

Gerais teve suas terras ocupadas numa abordagem intensa, motivada pelo apresamento e pela

exploração mineral, tendo sido empurrada ou administrada. Com a terra desocupada para a ação

colonial, os nativos tomaram rumos diferentes. Alguns foram para leste, onde ocorreu uma guerra

com os botocudos parcialmente incentivada pelos colonizadores.

Para Conselheiro Lafaiete, disse a professora Mauricéia, a história tradicional é mítica,

centrada em nomes e sobrenomes, bem distanciada do morador local, dando conta de que quando

os bandeirantes, dedicados à atividade mineradora nas terras vizinhas, quando chegaram a

Conselheiro Lafaiete foram bem recebidos pelos índios carijós que ajudaram na construção da Igreja

Matriz. Quando tomou conhecimento desta historiografia tradicional, a palestrante se assustou com

o ineditismo da situação: índios bonzinhos que colaboraram de bom grado com o branco invasor. A

palestrante procurou outros interessados no assunto e obteve contribuições que permitiram concluir

que os carijós de Conselheiro Lafaiete não eram como os mencionados na história tradicional, mas

índios que já haviam sido pacificados.

Este processo de busca de respostas que satisfaçam suas indagações é o que Mauricéia Maia

tem tentado incentivar na cidade, principalmente pelo trabalho que vem sendo desenvolvido no

Museu Antônio Perdigão. Sendo assim, declarou que não estava ali, diante dos demais

pesquisadores, para trazer uma novidade, mas para alertar sobre a necessidade de agrupamento das

informações existentes, dispersas em vários locais. Uma instituição como o Museu Antônio Perdigão

é fundamental neste mister por permitir que estudiosos, pesquisadores, intelectuais e curiosos

possam buscar as respostas que procuram.

Encerrando sua fala, a professora lembrou que havia o interesse em ocupar a terra e fazê-la

produtiva e, para isso, “a máquina” utilizada foi o indígena. Julgá-lo como imoral e devasso foi a

justificativa encontrada para torná-lo administrado, ou seja, mantê-lo sob controle do branco

colonizador. Convidou os presentes para uma reflexão sobre a valoração do negro africano e do

"negro da terra", ou seja, o indígena, fazendo uma revisão da história tradicional para ampliar a

compreensão de todos.

51

8 – A Teoria das Assinaturas e o Caminho Novo

O Doutor Geraldo Barroso de Carvalho abordou o conteúdo de seu livro recém-publicado

com o título As Assinaturas do Criador: Teoria exdrúxula, Terapias absurdas. Explicou que seria uma

conversa informal sobre a medicina do Caminho Novo, os curandeiros, a medicina caseira . O

palestrante se fez acompanhar de uma série de slides contendo não só o roteiro de sua fala como

imagens e dados curiosos que aqui transcrevemos.

Em todo o mundo ocidental, a medicina foi fortemente influenciada por um médico suíço e

por sua doutrina que ficou conhecida como “Teoria das Assinaturas”. Nas Minas Gerais, a medicina e

as práticas curativas sofreram influência de um cirurgião barbeiro português. Aliando-se a Teoria das

Assinaturas aos métodos do cirurgião-barbeiro e à medicina popular dos tropeiros e curandeiros,

toda a região adquiriu um modo próprio de tratar seus males menores, com chás de ervas caseiras.

A CORRIDA DO OURO

Com a abertura do Caminho Novo, os animais de carga, vindos do sul, puderam trafegar.

Chegavam às áreas de mineração pessoas de toda a sorte, em grande quantidade. Com a abertura de

novas lavras foi necessária a importação de escravos. Pouco a pouco, o comércio expandiu-se. Pelo

Caminho Novo, provisões e ferramentas chegavam para os mineiros, mas não chegavam médicos.

Afluíam, às áreas auríferas, pessoas de diferentes etnias e regiões. A entrada de doenças

novas, a miscigenação, a superpopulação e a promiscuidade, aliadas às péssimas condições

sanitárias, em áreas já, por si, insalubres, teriam de resultar em aumento das doenças e no

crescimento da taxa de mortalidade. A chegada de médicos, de dentistas e de boticários tornava-se

52

imperiosa, mas, na carência de profissionais, os tropeiros, empregando ervas da Mata Atlântica,

especiarias e plantas já conhecidas, preparavam remédios caseiros.

Em 1711, chega à região aurífera um cirurgião-barbeiro português.

O CIRURGIÃO-BARBEIRO LUÍS GOMES FERREIRA

Com licença para praticar medicina, devido à carência de médicos, em 1711 ele chega a

Sabará e, em 1716, muda-se para Mariana. Em 1724, transfere-se para Ouro Preto (Padre Faria) e

retorna a Sabará em 1730, mas volta para Portugal no fim de 1731. Em 1735 publica seu livro Erário

mineral.

Ferreira praticou muito nos caminhos de Minas, nas proximidades de Vila Rica. Ele exerceu

forte influência nas práticas curativas em toda a região. Baseou-se nos livros de um médico

português famoso e usou ervas brasileiras, aliadas a produtos importados do Reino.

O cirurgião Luís Gomes Ferreira exerceu forte influência nas práticas curativas de Vila Rica,

Mariana e Sabará, centros de propagação de “novidades”, para toda a área servida pelo Caminho

Novo e por caminhos alternativos.

Por outro lado, Ferreira sofreu uma forte influência das práticas curativas populares,

aprendendo a tirar da flora regional (com os índios, tropeiros e curandeiros) matéria prima para seus

remédios e “invenções”.

Phillipus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim (Paracelsus)

53

Paracelso, médico e alquimista, introduziu os minerais no arsenal terapêutico do século XVI e

influenciou a prática da medicina por longo tempo. Essa influência chegou ao Brasil e, portanto, às

Minas. Paracelso criou a extravagante Teoria ou Doutrina da Assinaturas.

Essa teoria, segundo Paracelso, baseia-se na idéia seguinte: cada coisa, vivente ou não, que

existe no universo, tem algo de peculiar e de misterioso escondido em si, uma espécie de hieróglifo

camuflado, revelador de uma virtude oculta. É preciso procurar o “espírito” de cada coisa, esse

hieróglifo ou sinal, que seria a assinatura de Deus, reveladora da virtude.

Giovanni Battista Della Porta (Della Porta) levou para o mundo vegetal a teoria das

assinaturas.

Della Porta estudava os vegetais e passou a anotar os sinais que indicavam as virtudes que

eles escondiam. Procurava a assinatura divina nas plantas, pois ela estaria gravada na casca, na raiz,

nas sementes, nas folhas, nas flores, nos frutos, no caule, na haste no bulbo ou no talo da planta. Há

exemplos de variadas mensagens divinas, felizmente muito bem interpretadas, pelos adeptos da

fantástica teoria.

ALGUNS EXEMPLOS DA TEORIA DAS ASSINATURAS

Para que serve o bambu, na medicina?

54

Na ótica dos adeptos da doutrina das assinaturas,

Deus colocou o bambu na superfície da terra, com sinais

claros de que ele tem poderes fantásticos.

O bambu cresce rapidamente e atinge grandes

alturas. Eis o sinal do Criador. Se ele cresce muito, com

rapidez, o chá de suas folhas deve ser usado pra que?

Resposta lógica (?): Chá de folhas de bambu é ótimo

para promover o crescimento de crianças.

Como o bambu, além de alto, é também septado,

nodoso, os cultores da Teoria das Assinaturas julgam que ele

evoca uma coluna vertebral. Então, o chá de suas folhas

estaria indicado para os males da coluna.

AIPO OU SALSÃO (Apium graveolens)– Talo branco, duro, não flexível

Devido a essa “grande semelhança” com o osso, o aipo estaria indicado no tratamento de

doenças ósseas, como a osteoporose e outras.

Como o aipo, por evocar o aspecto de ossos, o ruibardo é indicado contra doenças dos ossos,

pelos assinaturistas. Ferreira, o cirurgião-barbeiro, usava o aipo e o ruibarbo que tem efeito

antidiarreico, em doses pequenas, mas tem efeito laxativo em doses acima de 2 gr.

55

Alho –Allium sativum – Liliaceae. Segundo os torcedores da Doutrina das Assinaturas, o alho

tem uma haste oca que se parece bastante com a traquéia. Isso é perfeitamente admissível, para

quem não conhece a traquéia. Então, é indicado contra doenças da traquéia.

Pricípio ativo: Alicina (um óleo sulfuroso volátil)

Luís Gomes Ferreira usava alhos e cebolas para curar mordeduras e sarjas.

A cebola (Allium cepa) é um caule que faz chorar. Ela contém sulfuretos e alinases (enzimas).

A decomposição dos sulfuretos pelas enzimas produz ácido sulfênico que é instável e decompõe-se

num gás volátil. Esse gás dissipando-se no ar pode atingir os olhos e reagir com a lágrima (água) e

formar uma solução muito fraca de ácido sulfúrico que irrita os

olhos: Lágrima.

Foi muito empregada por Ferreira.

Medicina popular: Seus flavonoides teriam efeitos

antioxidantes. Ação anti-inflamatória, analgésica, antidiabética,

anti-cancerígena, antialérgico, etc.

Doutrina das Assinaturas: Gota

O papa Júlio III acreditava na Doutrina das Assinaturas.

Ele sofria de gota e vivia com o hálux inflamado. Como a

cebola evocava seu hálux inflamado, ele empestou o Vaticano

com o odor das carroçadas de cebolas que ele fazia chegar todo

dia, para seus repastos.

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Cipó: Um tipo de caule. Parece-se com uma cobra? Logo, chá de cipó é bom antídoto contra

veneno de cobra!!!

Estudos no Departamento de Psicobiologia da Unifesp comprovaram ação analgésica do

cipó-cravo, em testes com camundongos.

Estudos em ratos mostraram que o cipó-cravo, em infusão, proporcionou aumento da

produção espermática dos testículos. Este relato tem base na tese de doutorado de Fabiana Cristina

Silveira Alves de Melo, apresentada na Universidade Federal de Viçosa, em dezembro de 2007.

Os princípios ativos dessa planta incluem tanino, o alcalóide tinantina, o ácido tinântico,

cumarina e açúcares.

CIPÕ-DE-SÃO-JOÃO

Esta planta tem tonalidade escura e flores vermelhas. Por ser muito colorido, os

assinaturistas a indicam contra o vitiligo, doença

que apresenta falta de pigmentação da pele. A

assinatura de Deus, neste caso, é muito clara. Mas,

cuidado! Trata-se de planta muito tóxica. Não é

rara a morte de bovinos pela ingestão dessa planta

57

A raiz do ginseng costuma lembrar o corpo humano. No

caso do corpo masculino, com a estrutura fálica presente e muitas

vezes exagerada. Por isso, é considerado afrodisíaco, por imbecis e

por quem acredita na Teoria das Assinaturas.

NOZES

O Criador, neste caso, não quis saber de sutilezas. Ele deixou claro que as nozes curam todas as doenças do cérebro, da imbecilidade, à mais varrida doideira.

58

O confrei tem folhas ásperas, por isso os cultores da teoria dos signos juram que isso é o sinal de que ele cura as doenças escamosas da pele. O confrei, na verdade, tem muitos alcalóides tóxicos. Ainda

assim, ele é é utilizado, em chás ou infusões, para tratamento de inúmeras doenças (incluindo doenças do fígado), embora ele seja de alta toxicidade para o fígado. Pior: o confrei é cancerígeno,

isto é, pode provocar câncer.

Alecrim - Rosmarinus officinalis

Ferreira preparava a “agua-da-rainha” associando o alecrim, a arruda, alfavaca e poejos, ao óleo de oliva. Aplicando essa mistura, em uso externo, ele tratava das dores de “flatos de causa fria”.

Segundo a esquisita Doutrina das Assinaturas, o alecrim, erva perfumada, deve ter outro destino na medicina: o perfume seria o sinal do Criador de que essa erva deve ser usada para combater gases mal-cheirosos do intestino, que servem para afastar amigos e constranger flatulentos

Com que se parecem as sementes da abóbora?

Os assinaturistas garantem que uma semente de abóbora é muito parecida com a proglote de uma tênia. Então, para tratamento da teníase, nada é melhor do que as sementes de abóboras, nas mais diversas preparações.

Na medicina popular brasileira as sementes da abóbora são usadas para o tratamento da solitária.

Foram apresentadas diversas outras plantas que, segundo os assinaturistas, por se parecerem com determinadas partes do corpo servem para tratar os respectivos males.

59

Dentro do quadro de plantas tidas como medicinais, Geraldo Barroso declarou que a Ipeca que talvez tenha sido o primeiro quimioterápico, sendo precursora da penicilina e o primeiro medicamento surgido depois do ópio. Ressaltou que o ópio não curava nenhuma doença, apenas curava a dor.

Com o nome científico de Cephalis ipecacuanha, parece ter sido o primeiro produto a movimentar a economia de áreas adjacentes às nascentes dos rios Xopotó e Pomba.

Ferreira (Erário): tratamento de “cursos” (disenteria amebiana) e como emético. Os índios brasileiros usavam-na como emético e em diarreias (disenteria amebiana)

Evidentemente, o cirurgião-barbeiro aprendeu com os índios e com os tropeiros.

Como último exemplo dentre os citados pelo Doutor Barroso, ouvimos que Mercúrio, o Deus do Comércio para os romanos inspirou Paracelsus a concluir que o metal mercúrio seria muito bom para o tratamento da sífilis porque, sendo uma doença sexualmente transmissível, ocorreria em função da promiscuidade ou seja, da venda do corpo pelas prostitutas – o comércio do sexo. Sendo assim, entre os séculos XVI e XX usou-se o mercúrio para tratamento da sífilis, levando muitos portadores a óbito e sem jamais ter curado um único caso.

60

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASBRANDÃO, Maria das Graças Lins – Plantas úteis de Minas Gerais – Código Editora – Belo Horizonte - 2010

CAMPOS, Eduardo - Medicina popular: superstições, crendices e meizinhas - 2ª ed. –Livraria Editora da Casa do Estudante do Brasil – Rio de Janeiro – 1955) (Internet – Jangada Brasil)

CASCUDO, Luís da Câmara – Superstições no Brasil – Editora Global – São Paulo – 2001

CASTIGLIONI, Arturo – História da Medicina – Companhia Editora Nacional – São Paulo - 1947

CHASTEL, Claude & CÉNAC, Arnaud – Histoire de la Médicine, Introdution à l’épistémologie – Ellipses – Paris – 1998

DUFFY, Eamon – Santos e Pecadores – Cosac & Naify Edições LTDA – São Paulo – 1998

EDLER, Flávio Coelho – Boticas e Pharmacias: uma história ilustrada da farmácia no Brasil – Ed. Casa da Palavra – Rio de Janeiro - 2006

FERREIRA, Luís Gomes – Erário Mineral – Edição do Centro de Memória da Faculdade de Medicina da UFMG (Fac-simile do livro original de 1735) – Belo Horizonte – 1997

HUTIN, Serge – História da Alquimia – Editora Mundo Musical LTDA – Rio de Janeiro - 1971

LACERDA, Regina – Vila Boa – História e Folclore – Ed Oriente – Goiânia, GO – 1977 (Internet – Espinhela Caída – Jangada Brasil)

LE COUTER, Penny & Burreson, Jay – Os Botões de Napoleão – Jorge Zahar Ed. – Rio de Janeiro - 2006

MARTIUS, Karl E. P. Von – Natureza, Doenças, Medicina e Remédios dos Índios Brasileiros – 2ª edição - Companhia Editora Nacional – INL/MEC – Brasília - 1979

PISI, Guilherme – História Natural e Médica da Índia Ocidental – Instituto Nacional do Livro – Rio de Janeiro – 1957

REZENDE, Joffre Marcondes – À Sombra do Plátano – Ed. Unifesp – São Paulo - 2009

SABA, Agustín – Historia de los Papas – Editorial Labor – Barcelona – 1948

SAINT-HILAIRE, Auguste – Plantas Usuais dos Brasileiros – (organizado por Maria das Graças Lins Brandão e Marc Pignal) – IDM Composição e Arte Ltda – Belo Horizonte - 2009

SANTOS FILHO, Lycurgo de Castro – História Geral da Medicina Brasileira – Editora da Universidade de São Paulo - 1991

SPIX & MARTIUS – Viagem ao Brasil – Vol. I – Itatiaia – Belo Horizonte – 1981

61

9 – A Genealogia no século XXI: metodologia de pesquisa.

Gustavo Almeida Magalhães de Lemos apresentou-se agradecendo pelo convite e informou

que ali estava representando o Colégio Brasileiro de Genealogia com o objetivo de falar um pouco

sobre a contribuição que a genealogia pode dar à história. Em seguida, relatou sua trajetória

informando que apesar de pertencer a uma família tradicional de São João del Rei, até os anos de

1970 não tinha conhecimento da história de seus antepassados. Acrescentou ter tido formação

acadêmica na área de pesquisa e que em função disso, ao ter contato com um historiador de São

João del Rei - Sebastião de Oliveira Cintra, e tomar conhecimento do trabalho por ele realizado sobre

as antigas famílias daquela cidade, ficou perplexo por observar uma total falta de critério

metodológico. Na verdade, ressaltou, até bem pouco tempo fazia-se genealogia daquela forma

descoordenada. Mas quando decidiu pesquisar a própria família, Gustavo Lemos seguiu os critérios

que já conhecia para a realização de pesquisa social, buscando embasamento em fontes confiáveis.

Na medida em que passou a questionar a forma de trabalho dos genealogistas tradicionais, acabou

angariando alguns inimigos porque a visão deles era muito diferente do historiador. Sendo assim, o

palestrante seguiu pesquisando solitariamente.

Na década de 1990, aproximou-se dos membros do Colégio Brasileiro de Genealogia e

observou que já estava ocorrendo uma certa mudança de mentalidade e o caráter elitista da

genealogia começava a desaparecer. A partir de então, passou a contribuir com os demais

pesquisadores, tentando implantar métodos científicos na prática de todos, atitude que vem sendo

seguida por muitos.

62

Desta forma, Gustavo Lemos informou que apresentaria informações e conceitos

norteadores, iniciando por frase de Fritjof Capra no livro A teia da Vida: uma nova compreensão

científica dos sistemas vivos.

A crença do pensamento analítico de Descartes é que um sistema complexo pode ser entendido a partir das propriedades de suas partes. A ciência ocidental adotou esse paradigma. Mas, com a ciência do século XX, veio a percepção de que sistemas complexos não podem ser entendidos sem o pensamento sistêmico. As propriedades das partes não são intrínsecas. Só podem ser entendidas dentro de contexto mais amplo. E as propriedades essenciais são propriedades do todo, e não das partes, surgindo das interações entre elas.

A escolha desta frase se justifica porque a visão de pensamento sistêmico é nova nas ciências

sociais e a visão que a genealogia tem da família não é frequente entre os historiadores. Para situar o

tema, o palestrante informou que falaria do percurso da genealogia através dos tempos,

esclarecendo que seu início remonta aos primórdios da sociedade humana e comentando os

principais usos que teve da antiguidade até nossos dias conforme quadro a seguir.

• Religião - culto aos ancestrais e interpretação de fenômenos da natureza

• Marcação de tempo - contagem de gerações

• Genealogias Divinas - legitimação do poder dos reis, mitologia

• Livros da nobreza

• Justificativas da nobreza

• Habilitações De Genere et Moribus - acesso ao clero

• Nobiliarquias

• Perseguições étnicas/religiosas - Inquisição e Nazismo

• Impedimentos matrimoniais - Código Canônico

• Direito Sucessório - Código Civil

• História das famílias

• Estudos de imigração e povoamento

• Genealogia Genética - ciência natural

63

Gustavo Lemos esclareceu que a genealogia genética e a tradicional seguem caminhos

diferentes, esta última se apoiando prioritariamente em documentos e aquela em evidências físicas.

Em seguida o palestrante elencou as contribuições possíveis da genealogia para as ciências

sociais. Declarou que, com uma base de dados qualificada e classificada em famílias, os historiadores

poderão identificar os principais atores dos processos históricos e as teias familiares que

compunham o panorama social do passado. Os caminhos de penetração e ocupação podem ser mais

bem entendidos com o auxílio da genealogia. Esses novos conhecimentos podem alterar

significativamente a percepção dos fatos, como ocorreu com as descobertas do historiador Marcelo

Bogaciovas sobre os bandeirantes, a maioria descendente de perseguidos pela inquisição, o que

justificaria o ódio que nutriam pelos jesuítas.

Através de estudos genealógicos, os sociólogos podem montar um perfil de grupos sociais e

os seus efeitos na ordem política e social do período estudado. Já para os antropólogos, a questão

da identidade de um povo pode receber uma contribuição inestimável da genealogia. No caso

brasileiro, a nossa mistura de raças e culturas pode ser melhor estudada e compreendida através do

estudo das famílias.

Dando prosseguimento, Gustavo Lemos ressaltou que, com o desenho do perfil das famílias,

os demógrafos encontram uma grande ferramenta de análise da população brasileira através dos

tempos. Vários cruzamentos de dados poderão ser feitos a partir de pesquisas genealógicas. Para os

etnólogos, a composição étnica da nossa população e como se deu a miscigenação dos diversos

povos que formam a nação brasileira é uma grande contribuição que a genealogia pode fornecer

para estes estudos. Para os médicos, o estudo de doenças hereditárias.

Após mencionar as contribuições possíveis para Geneticistas – estudos de ancestralidade

genômica; Sanitaristas – estudo da propagação de epidemias através dos registros de óbitos;

Estudantes – base de dados para trabalhos escolares e acadêmicos de diversas áreas; Jornalistas –

fonte de pesquisa para enriquecer o conteúdo de reportagens; Escritores – fonte de pesquisa para

construção de personagens de romances históricos; Teólogos – já utilizam há muito a genealogia

como fonte de informação e o público em geral pelas obras de referência para consulta em

bibliotecas públicas e particulares, o palestrante apresentou um quadro sinótico com os principais

tópicos que devem ser adotados na pesquisa genealógica.

• Estabelecer um conceito de genealogia;

• Descrever com clareza o objeto da pesquisa;

64

• Obrigatoriedade da citação das fontes de pesquisa;

• Crítica de fontes;

• Citar as dúvidas surgidas no desenvolvimento da pesquisa, que podem comprometer

as conclusões;

• As hipóteses de ligações de parentesco devem estar perfeitamente caracterizadas

como tal, e não apresentadas como verdade;

• Informar ao usuário da pesquisa as características das sociedades estudadas;

• Inserir os dados obtidos no contexto histórico;

• Análise de conteúdo.

O genealogista Gustavo Almeida Magalhães de Lemos encerrou sua participação declarando

acreditar que o futuro da genealogia é centrar-se na História das Famílias e no fornecimento de

subsídios para os demais campos de pesquisa histórica e social.

65

10 – Arquivologia: técnicas de conservação e restauro

Baseada no trabalho que vem sendo desenvolvido no Arquivo Central da Universidade

Federal de Juiz de Fora, Andréia de Freitas Rodrigues ressaltou que a instituição está focada no

conceito de preservar para não precisar restaurar. Isto porque a restauração interfere muito

diretamente na constituição do documento, o que

deve ser evitado.

O exemplar ao lado, disse a palestrante,

não suportaria várias ações de restauro. A

alternativa são diversas ações integradas para

conservação de forma a evitar que outros

documentos cheguem a este nível de

comprometimento.

O Arquivo Central atua também na

formação de propagadores deste tipo de postura e

ação que objetivam o maior respeito possível ao

original, interferindo o mínimo possível.

Andréia de Freitas Rodrigues apresentou,

então, os conceitos básicos de Preservação, Conservação e Restauração.

66

PRESERVAÇÃO:

Função arquivística destinada a assegurar as atividades de acondicionamento,

armazenamento, conservação, restauração de documentos (CAMARGO,1996,

pg 61);

É o conjunto de medidas e estratégias de ordem administrativa, política e

operacional que contribuem direta ou indiretamente para a preservação da

integridade dos materiais (CASSARES,2000, pg 15).

CONSERVAÇÃO:

Conjunto de procedimentos e medidas destinadas a assegurar a proteção

física dos arquivos contra agentes de deterioração. (CAMARGO, 1996, pg 18);

Conjunto de ações estabilizadoras que visam desacelerar (sic) o processo de

degradação de documentos ou objetos, por meio de controle ambiental e de

tratamentos específicos: higienização, reparos, acondicionamento.

(CASSARES, 2000, pg 15).

RESTAURAÇÃO:

Conjunto de procedimentos específicos para recuperação e reforço de

documentos deteriorados e danificados (CAMARGO, 1996, pg 67).

Conjunto de medidas que objetivam a estabilização ou a reversão de danos

físicos /químicos adquiridos pelo documento ao longo do tempo e do uso,

intervendo de modo a não comprometer sua integridade e seu caráter

histórico (CASSARES, 2000, pg 15).

67

A imagem ao lado, de um exemplar

que passou pelo processo de restauração,

demonstra que foi necessário interferir na

constituição do documento para preservação

do suporte que já apresentava visível perda de

conteúdo.

A restauração tem, portanto, o

objetivo de prolongar a vida útil do objeto mas

não do conteúdo.

A ideia principal da Conservação

Preventiva é impedir que o material chegue a

este nível de comprometimento. Trata-se de

um conjunto de medidas destinadas a

assegurar a proteção física de documentos contra agentes de deterioração, realizadas como

precaução, preparando os documentos para quaisquer eventualidades com relação à sua integridade

física.

Quando se faz a conservação preventiva eficaz, a restauração não será necessária e é preciso

observar que não se deve interferir na constituição física e na autenticidade de um documento, que

sempre deve aparentar a idade que realmente possui.

Dando prosseguimento, Andréia Rodrigues apresentou os princípios que devem presidir

quaisquer projetos de preservação,

conservação e restauro de documentos

arquivísticos. O primeiro deles, a

Reversibilidade, indica que toda ação realizada

tem que ser reversível. A Inocuidade implica

em não prejudicar o original; a Pureza refere-se

à escolha de materiais de trabalho com o maior

grau de pureza possível; a Adequação

aconselha a usar sempre uma técnica ou

procedimento específico para cada caso e, finalmente, a Estabilidade que aborda o uso de materiais

que não venham a reagir em contato com o suporte, causando perdas e danos.

68

Reforçando o que foi dito, a palestrante destacou que os materiais empregados devem ser os

classificados como de Qualidade Arquivística, ou seja, livres de quaisquer impurezas, quimicamente

estáveis, resistentes e duráveis. Assim, usa-se a cola metil e os papéis alcalinos, por serem mais

adequados ao projeto de preservação.

Quantos aos fatores de deterioração do documento, a plateia foi informada a respeito dos

extrínsecos, como a fita adesiva que muitas vezes é utilizado para colar as páginas, e os intrínsecos,

como a acidez do papel e a oxidação que pode ser provocada pelas tintas metalográficas.

Lembrando, então, que extrínsecos são os que independem do suporte e neste grupo estão incluídas

a temperatura ambiente, a umidade relativa, a luz, os ataques biológicos de insetos, fungos e

roedores e, também, o manuseio inadequado. E como fatores intrínsecos, aqueles que fazem parte

do próprio suporte, estão a Acidez, a Oxidação e as Tintas Metalográficas.

Foram apresentadas diversas imagens sobre os problemas mencionados, chamando a

atenção o exemplo ao lado, de uma intervenção inadequada que tornou inviável a utilização deste

suporte.

A palestrante declarou que uma grande preocupação que deve nortear os projetos das

instituições arquivísticas é a constituição de um Plano de Emergência integrado aos procedimentos

operacionais rotineiros, contemplando os tipos variados de emergência e calamidades.

Andréia de Freitas Rodrigues abordou as várias ações necessárias, sendo que o diagnóstico

deve ser o primeiro passo do plano de ação integrada, pois nele se definem as prioridades e o

tratamento a ser realizado.

O controle da Temperatura e da Umidade Relativa é fundamental para a preservação do

acervo, sendo preciso identificar os espaços a serem controlados e quais procedimentos serão

adotados.

As vistorias são ações periódicas realizadas por amostragem para identificar ataques de

insetos ou microorganismos. Estas ações cíclicas permitem a avaliação do estado geral dos

documentos.

A higienização do acervo deve ser um hábito de rotina na manutenção dos documentos,

sendo uma atividade simples e eficaz, sem necessidade de grandes investimentos. A respeito deste

procedimento de conservação preventiva cujo foco é a sujidade que afeta o documento, foram

apresentadas algumas imagens dos materiais utilizados e do processo.

69

Além disso, muitas vezes são necessários pequenos reparos para prolongar a vida do

documento que ainda não se constituem em ações de restauro, mas atitudes simples que evitam a

ampliação de pequenos problemas que tenham sido detectados.

Após a higienização vem a etapa de acondicionamento que, segundo Andréia Rodrigues,

demanda a escolha da proteção adequada a cada suporte e devem ser utilizados materiais de

qualidade arquivística, em formato compatível com o tamanho e o tipo do material a ser

acondicionado.

O final do processo é o armazenamento, ou seja, a guarda criteriosa, baseada em condições

físicas do documento e local, considerando o tamanho e o peso de cada documento. No caso do

Arquivo Central da Universidade Federal de Juiz de Fora, está sendo feita a substituição das caixas de

papel craft, muito ácidas, por caixas do tipo poliondas.

70

Finalizando sua comunicação, a palestrante declarou que as recomendações gerais passam

pelo bom senso de quem usa ou cuida dos documentos, evitando qualquer situação que coloque em

risco a integridade do material.

BIBLIOGRAFIACAMARGO, A.M., BELLOTTO, H.L. Coord. Dicionário de terminologia arquivística. São Paulo: AAB,

1996.

CASSARES, N.C. Como fazer conservação preventiva em arquivos e bibliotecas. São Paulo: Arquivo

do estado e Imprensa Oficial, 2000. Projeto como fazer nº 15.

71

11 – O latim nos monumentos de Mariana e Ouro Preto

O professor Aldo apresentou um trabalho que vem desenvolvendo há mais de 10 anos em

Ouro Preto e Mariana e que consiste em identificar inscrições latinas nos monumentos existentes

nestas e em outras cidades históricas mineiras. O objetivo é recolher e traduzir as epígrafes e

enfeixá-las em livro, produzindo assim um instrumento para manter a memória destas inscrições.

Foi explicado que a epigrafia era um meio de comunicação da antiguidade através de textos

pequenos, sintéticos, geralmente em latim. Em Minas Gerais as mais antigas epígrafes estão em

sepulturas, chafarizes, igrejas, capelas, oratórios, forros, pisos e sacristias. Muitas são inscrições

honoríficas, mas a maioria é ligada às sagradas escrituras.

Após relatar como estas inscrições surgiram na Roma Antiga, e também na Grécia, muitas

vezes representando manifestações políticas e sociais, Aldo Sobral explicou que esta arte chegou ao

Brasil e especialmente a Minas Gerais, onde foram inseridas em quase todas as igrejas, além de

monumentos civis. Importante destacar a informação de que foram necessárias algumas correções

das frases para que fosse possível traduzi-las, já que muitas apresentam divergências no que tange às

normas da língua latina.

Em seguida o palestrante passou a apresentar imagens de várias epígrafes encontradas em

Mariana e Ouro Preto e destacou que muitas estão quase apagadas por não haver mais interesse em

sua manutenção. Selecionamos apenas alguns exemplares que se verá a seguir.

72

Na imagem acima, uma das três antífonas dedicadas a Nossa Senhora, pintadas no forro da

Igreja de São Francisco de Assis de Ouro Preto. Tradução: eu sou a mãe da beleza, da palavra, do

temor, do conhecimento e da santa esperança.

Na mesma Igreja, o aviso: lembra-te que há de morrer.

73

Acima uma das seis pequenas inscrições que falam da Paixão de Jesus, encontradas na Igreja do Carmo.

Parte do forro da Igreja das Mercês de Ouro Preto, painel que contém 24 invocações. A falta

de conservação que se percebe na imagem acima, feita há aproximadamente cinco anos, é um dos

motivos que estimulam o professor Aldo para lutar pela preservação desta memória.

Aldo Sobral destacou que as inscrições demonstram que as pessoas viviam uma realidade

religiosa e manifestavam suas crenças através destes escritos.

74

Acima um exemplar de epígrafe inscrita na placa comemorativa do cinquentenário do

Colégio Arquidiocesano, em Mariana, referência a uma frase de Virgílio: Conduzida por Deus,

auxiliada por Maria, iluminando a colina.

A imagem acima à esquerda traz o lema da Escola de Minas de Ouro Preto - Cum Mente et

Malleo, ou seja, com inteligência e o instrumento de trabalho, foi parodiada numa das repúblicas de

estudantes com o lema da imagem à direita – Cum Potu et Mulieribus que se pode traduzir por ”com

bebida e mulheres”, numa demonstração de que os jovens gostaram da frase latina e deste uso

específico.

75

Acima temos o Chafariz da Rua São José, cuja inscrição na imagem da direita demonstra a

falta de conservação. Segundo o professor Aldo, a frase é uma louvação ao Senado porque ele

permitia que todos tivessem água em abundância, parecendo até que seria um favor.

A seguir um painel, no frontispício da Igreja de São Francisco de Assis de Mariana, com o

registro da história de fundação daquele templo em 1763, sendo Dom José o rei de Portugal,

Clemente XIV o papa e o bispo de Mariana era Dom Frei Manuel Joaquim.

A pesquisa do professor Aldo conta com informações sobre inscrições que já desapareceram,

como é o caso das imagens abaixo, tomadas na Igreja do Carmo de Mariana, destruída num incêndio.

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O encerramento da participação do professor Aldo Eustáquio de Assis Sobral deu-se com a

apresentação de fotografias de uma parede do Cemitério de Mariana que não mais existe, na qual

havia uma epígrafe em que se buscou suavizar a morte dando-lhe o significado de descanso.

77

12 – O Caminho Novo entre o Arraial dos Carijós e Conselheiro Lafaiete.

O professor Antônio Gilberto Costa comentou que as fontes por ele analisadas para compor

um estudo cartográfico do Caminho Novo em Conselheiro Lafaiete, trazem informações não muito

claras. Apresentou uma linha do tempo iniciando no século XVII com referências textuais à aldeia de

índios carijós, à freguesia de Nossa Senhora da Conceição, depois a criação da Vila Real de Queluz, e

chegando a 1934 com a mudança do nome de Queluz para Conselheiro Lafaiete.

Tendo dividido os documentos cartográficos em períodos, o palestrante observou que no

mais antigo há indicação de ter sido extraído do mapa do Padre Cocleo, um jesuíta falecido em 1711

e que havia iniciado o trabalho do mapa em 1697. Entretanto, no documento analisado há

informações posteriores à morte do Padre Cocleo, o que vem demonstrar que não se trata de uma

cópia do original, mas de um trabalho de alguém que teria retrabalhado a obra daquele religioso.

Considerando a hipótese de um período de vinte anos entre o início do trabalho do Padre

Cocleo e a revisão por outros autores, com acréscimos diretamente sobre o original, Antônio Gilberto

procurou por lançamentos que se referissem à aldeia de carijós, nada tendo encontrado. Foi

projetada uma imagem com indicação dos rios Paraíba do Sul e das Velhas, sendo então recortado

este trecho para estudos mais detalhados. Identificou-se o “caminho de Garcia para as Minas” e,

ampliando-se a parte das minas propriamente ditas, não há indicação alguma sobre o arraial que

viria a constituir Conselheiro Lafaiete. Desta forma, pode-se dizer que para o primeiro quartel do

século XVIII não há referência sobre o Arraial dos Carijós, embora em documentos textuais já

existissem relatos sobre eles.

78

Em seguida foi projetado o Mapa das Minas de Ouro de São Paulo, posterior ao cartograma

acima referido, no qual foi possível localizar a região de Vila Rica e verificar que ali também não foi

mencionada a aldeia que deu origem à antiga Queluz.

Antônio Gilberto Costa declarou que, prosseguindo na busca cronológica de documentos,

analisou o conjunto conhecido como Cartas Sertanistas, produzidos no início do século XVIII e que se

encontram disponíveis na Biblioteca Nacional, constatando que ali também nada há sobre o Arraial

dos Carijós. Apresentou mais uma das Cartas Sertanistas para reafirmar que há de fato um vazio de

informação exatamente na região que se propôs a pesquisar.

Passado ao segundo quartel do século XVIII, surge a primeira referência a Carijós num

documento produzido pelo padre Diogo Soares, um dos dois jesuítas que vieram mapear o Brasil e

são conhecidos como os padres matemáticos. O palestrante explicou que um destes padres ficou

encarregado do território que se estendia do Maranhão ao Rio de Janeiro e o segundo mapearia daí

até a Colônia do Sacramento. Posteriormente, ao se constatar o imenso território a ser considerado,

foi feita uma revisão e redução da área a ser mapeada para apenas entre o Rio de Janeiro e a Colônia

do Sacramento. Os dois padres trabalharam durante um período de dez a onze anos e Diogo Soares

levantou principalmente a região que vai do centro das minas até o Jequitinhonha.

O mapa apresentado por Antônio Gilberto Costa tem 1734-35 como data considerada de

produção e, conforme apurou com outros conhecedores do assunto, é a primeira referência

cartográfica a Carijós de que se tem notícia.

Na segunda metade do século XVIII surgem documentos fazendo referência a Carijós como o

Mapa de uma parte do continente na América Portuguesa, localizado entre 20 e 25 graus de latitude

sul. Este cartograma é acompanhado por uma relação de moradores e é datado de 1760, havendo

nele a indicação do traçado do Caminho Novo ainda denominado “estrada do Garcia”. O Arraial dos

Carijós é o número 25 no mapa, Ouro Branco é o 26 e 27 é a marca do Arraial do Deus Te Livre, a

serra que era ultrapassada pelo caminho. Como curiosidade, Antônio Gilberto informou que

raramente há indicação de chiqueiros em documentos cartográficos como acontece neste exemplar.

O documento cartográfico apresentado a seguir foi Carta Geográfica da Comarca do Rio das

Mortes de 1766, produzido por ocasião da visita do Governador, que também traz indicação de

chiqueiros, da passagem da serra após Ouro Branco e do Arraial dos Carijós. Também interessante é

um documento do Termo de Vila Rica que traz a identificação de Carijós, destacando-se o fato de

que, apesar de não pertencer a Vila Rica, está muito mais próxima dali do que do Rio das Mortes. Tal

situação sugere que a ligação era muito maior com Ouro Preto do que com São João del Rei. Este

79

segundo documento também demonstra que a estrada cruzava a serra de Ouro Branco,

diferentemente do que faz a propaganda do Instituto Estrada Real, a qual modifica o traçado do

Caminho Novo, fazendo-o contornar a dita serra por Itatiaia.

Da mesma época é a Carta Geográfica de Minas Gerais e Partes Confinantes na qual também

há referência a Carijós e acrescenta Bandeirinhas, localidade da qual partiria o passeio cultural dos

pesquisadores que foi realizado no dia seguinte ao ciclo de palestras. O palestrante ressaltou que a

ideia inicial era preparar um trabalho que começasse em Bandeirinhas e terminasse na Estalagem do

Lourenço, ou seja, seguindo o traçado do Caminho Novo que cruzava a parte central do que é hoje

Conselheiro Lafaiete. O projeto deixou de ser cumprido conforme planejado, por não existir material

cartográfico suficiente, sendo esta Carta Geográfica de Minas Gerais e Partes Confinantes uma das

poucas antigas a contar com referências ao percurso que de Bandeirinhas passa por Santo Amaro e

Carijós.

Em seguida foram projetados o Mapa da Capitania de Minas e o Mapa da Comarca do Rio das

Mortes, ambos de José Joaquim da Rocha, que fecham o século XVIII e a partir daí a referência não

será mais Carijós, mas a Vila Real de Queluz. Importante esclarecer que este documento foi feito com

base em cartografia do outro padre matemático, o jesuíta Domingos Cabassi, que acompanhou o

Diogo Soares.

Um mapa de 1804, cuja base é certamente o trabalho de José Joaquim da Rocha, não

apresenta novidades. Já o Guia dos Caminhantes, de 1816, não registra a Vila Real de Queluz. Para

marcar este período, o professor Antônio Gilberto destacou uma descrição de Saint Hilaire, que

passou por Queluz e escreveu:

Essa pequena vila, que faz parte da comarca do Rio das Mortes, construída sobre uma crista elevada, seria bastante agradável se não fosse tão deserta; a rua que atravessa a estrada é larga e bem traçada, mas o mato ali cresce por todos os lados; casas bastante lindas nos pareciam estar abandonadas, e quase todas estavam mal conservadas e a ponto de cair em ruínas.

O palestrante esclareceu que a rua e a estrada mencionadas pelo viajante eram a mesma

coisa e a seguir projetou iconografia já da época do Império que retrata uma das escaramuças

ocorridas durante a Revolução Liberal, na qual está indicado o Caminho Novo e a Igreja de Nossa

Senhora da Conceição.

Já para o final do século XIX o professor Antônio Gilberto escolheu um mapa que fazia parte

do projeto Cruz Machado que não foi aprovado e que apresenta uma conformação de Minas Gerais

80

diferente do que é atualmente. Apesar disso, o documento serve aos propósitos de demonstrar a

referência a Queluz e Santo Amaro, bem como Ouro Branco.

A próxima imagem apresentada foi extraída do Álbum Corográfico Municipal de Minas

Gerais, de 1927, que foi objeto da comunicação que se seguiu à de Antônio Gilberto da Costa. Depois

a plateia foi direcionada para os dias atuais através de imagem do Google na qual foram destacadas

as localidades referidas na palestra e, principalmente, o Caminho Novo.

Concluindo, o palestrante mostrou que o que ainda existe de fato do Caminho Novo entre

Bandeirinhas e a serra de Ouro Branco, é um pequeno trecho próximo da Estalagem do Lourenço que

deveria ser preservado.

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13 – Album Chorographico Municipal de Minas Gerais (1927)

A professora Maria Lúcia Prado Costa abordou o trabalho realizado com os mapas

aquarelados que compuseram o Album editado em 1927, do qual resultou publicação na rede

mundial de computadores, no endereço http://www.albumchorographico1927.com.br/ Foi

esclarecido que a ideia inicial era fazer um livro e que não pretendiam simplesmente reproduzir os

mapas, mas fazer um estudo crítico que conseguisse aferir a validade científica deste material,

contextualizar os mapas e fazer uma análise dos belos desenhos contidos em cada prancha e que se

referem ao que cada município indicou como sendo o que tinha de mais bonito. Muitas pranchas

apresentam cachoeiras, grupos escolares, edifícios dos fóruns, parques municipais e prédios

relevantes segundo a ótica dos dirigentes locais da época. Havia muito interesse, por parte da equipe

de trabalho, em entender o que estes bens patrimoniais representavam e o motivo pelo qual foram

selecionados.

Foi realizado um grande esforço para tentar localizar a obra em outros acervos, já que faz

parte do projeto o monitoramento das unidades que foram preservadas. Surpreendentemente, a

obra não foi encontrada no Arquivo Público Mineiro, na Biblioteca Pública Estadual Luiz Bessa nem

em outros centros de documentação onde se supunha haver um exemplar, mas existe na Biblioteca

do Senado dos Estados Unidos.

O trabalho contou com a participação de profissionais de destaque em diversas áreas, como

a professora Márcia Maria Duarte Santos do Centro de Referência em Cartografia Histórica, o

professor Antônio Gilberto Costa, que fez a comunicação anterior deste Encontro, um parecer da

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professora Maria do Carmo Andrade Gomes que já havia sido diretora do Museu do Arquivo da

cidade de Belo Horizonte e a adesão da professora Maria Cândida Trindade Costa de Seabra,

especialista em Toponímia, entre outros.

Foram distribuídos convites para todas as escolas públicas, prefeituras, bibliotecas públicas,

casas de cultura e faculdades de geografia e história de Minas Gerais. Também receberam o convite

as principais faculdades de geografia e história existentes no território nacional.

Passando a demonstrar o conteúdo do site, a professora Maria Lúcia explicou que uma

grande dificuldade para tornar o conteúdo acessível a todos foi enquadrar todos os atuais municípios

nos 178 municípios que constituíam o estado de Minas Gerais em 1927. Foram consultadas inúmeras

fontes que aparecem descritas no quadro de cada município.

Segundo a pesquisa realizada, o Álbum traz a configuração do estado em 1911 e o projeto

tinha por objetivo comemorar o Centenário da Independência em 1922. Vários fatores atrasaram a

publicação, incluindo quatro mudanças de governadores. Assim, somente em 1927 ficou pronto o

Álbum que faz parte de um conjunto formado ainda por um Atlas e um Anuário de Minas Gerais.

Teixeira de Freitas, fundador do IBGE, foi o responsável pela compilação de todo o material e pediu

desculpas pelo atraso quando a obra foi publicada. Como se não bastasse o atraso, em 1923 tinha

havido uma reforma administrativa em Minas Gerais não contemplada pelo Álbum.

Após emitir vários comentários sobre a obra, sempre indicando o site para os que desejarem

saber mais a respeito, a palestrante escolheu Queluz, nome do município de Conselheiro Lafaiete na

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época, mas o site oferece opção de pesquisa também pelo nome atual. O resultado da busca pode

ser observado nas duas imagens seguir.

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Utilizando o recurso de ampliação do site, Maria Lúcia mostrou vários detalhes do mapa que

confirmam sua declaração de que, além da beleza dos mapas aquarelados, o material contém

informações muito importantes para pesquisadores ou leitores. Conhecedora da dificuldade das

escolas, pela escassez de documentos e boas fontes historiográficas, exaltou uma das

funcionalidades do site que é a permissão para imprimir os mapas em boa resolução. Lembrou,

também, que ao passar o mouse sobre o nome do município, o leitor encontra informações

toponímicas.

Voltando a tratar do Álbum em geral, a plateia foi convidada a conhecer os Estudos Críticos

que auxiliam o leitor a evitar uma análise precipitada. Sobre cada um deles a palestrante destacou os

principais aspectos de cada autor.

Considerando os variados aspectos mencionados nos mapas como localização das colônias

de imigrantes, informações sobre distritos, caminhos antigos e outras informações que não são

facilmente localizáveis, a obra agora disponível de maneira ampla poderá gerar subprodutos não só

dos acadêmicos como de todos aqueles que se interessam pela história e a geografia de Minas

Gerais.

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14 – Vias de Minas – Caminho Novo e Ferrovias

A professora Helena Guimarães Campos, que atualmente trabalha no Arquivo Público da

cidade de Belo Horizonte, compareceu ao Encontro de Pesquisadores do Caminho Novo como

representante do Movimento de Preservação Ferroviária, de âmbito nacional. Além de escritora com

vários títulos publicados, dedica-se também à Ong TREM - Transporte e Ecologia em Movimento, que

trabalha em três linhas de ação: ciclovia, biocombustível e revitalização e preservação do patrimônio

ferroviário.

Foi esclarecido que seria feita uma apresentação originada em estudo que buscou comparar

as estradas reais às ferrovias, sendo que por Estrada Real entende-se o programa criado pela

Federação das Indústrias de Minas Gerais, no qual estão incluídos 177 municípios, sendo 7 em São

Paulo, 8 no Rio de Janeiro e os demais em Minas Gerais. O estudo comparativo considerou a

realidade mineira.

A fotografia ao lado, com a qual

foi iniciada a projeção, é do município

de Rio Acima, localizado no Caminho

Novo entre Itabirito e Raposos. É

emblemática por mostrar um marco do

programa Estrada Real e uma ponte

ferroviária.

Helena Campos explicou que o

estudo buscou aproximar as estradas

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reais, as coloniais e as ferroviárias sob vários pontos de vista. Inicialmente, comparando o traçado.

Sem que se possa afirmar que o leito da antiga ferrovia foi construído em cima do traçado da Estrada

Real, é importante considerar que as ferrovias, como empresas que visam lucro, procuravam atingir

os centros com tradição na produção. Sua operação dependia de carga e passageiros e por isto iam

em direção a cidades que tiveram sua formação no período colonial.

Os pesquisadores da história ferroviária se deparam com um sério problema. Desde o

arrendamento da malha ferroviária da Rede, em 1996, toda a documentação das antigas unidades

regionais da Rede Ferroviária está indisponível. Em Belo Horizonte ela foi recolhida pelo IPHAN após

mais de 10 anos de abandono e sabe-se que muita coisa desapareceu. O principal motivo parece ter

sido o fato de que, no dia seguinte ao arrendamento, o primeiro de operação das concessionárias,

todos os funcionários da Rede foram despedidos e, assim, o material permaneceu sem cuidados.

Portanto, os estudiosos do tema concluíram que dos 162 municípios mineiros inseridos no programa

Estrada Real, mais de 60% foram servidos por ferrovias, mas sabem que este número pode ser bem

maior se forem localizados os documentos.

Helena Campos lembrou que muitos críticos consideram que o abandono do patrimônio

ferroviário foi proposital, criando condições para que fosse aprovado o arrendamento. Teria sido um

desmonte da Rede para facilitar a privatização do que hoje se transformou em “mineroduto”, tendo

acabado o transporte de passageiros e, mais importante, o de carga em geral.

A falta de um mapa ferroviário atual é um grande empecilho para os pesquisadores. Além

disso, o programa da FIEMG não considera todas as estradas coloniais públicas e oficiais que eram as

Estradas Reais. O Caminho da Bahia, por exemplo, não foi incluído. Entre os motivos da exclusão está

a dificuldade de pesquisa histórica, uma vez que este caminho teve seu tráfego proibido desde cedo.

Por outro lado, corta uma área marcadamente pobre e o programa da Federação das Indústrias tem

o viés mercadológico. Os municípios da região não oferecem estrutura para o turismo que o

programa visa incentivar.

Dando prosseguimento, a professora Helena Campos apresentou os mapas dos quatro

caminhos abordados em seu estudo.

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CAMINHO VELHO

Partindo do Rio de Janeiro até Parati pelo mar, em áreas terrestres passava por São Paulo e seguia até atingir Vila Rica e Sabará.

Importante ter claro que em Minas Gerais ocorreu, na virada do século XVII para o XVIII, a

descoberta quase simultânea de ouro em várias regiões. Entretanto, três áreas se destacaram: Ouro

Preto e Mariana, São João del Rei e Tiradentes, e, Sabará e Caeté. Portanto, o Caminho Velho tinha

por objetivo atingir estas três regiões.

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CAMINHO DA BAHIA

Partindo de Vila Rica, seguia todo o Rio das Velhas até encontrar o São Francisco e com ele seguir até o Oceano Atlântico.

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CAMINHO NOVO

Partido do Rio de Janeiro para Vila Rica, sem o percurso marítimo do Caminho Velho.

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CAMINHO DO DIAMANTE

Partindo da região do Rio das Velhas até o Tejuco.

Passando a abordar o esquema das linhas da Estrada de Ferro Central do Brasil-EFCB, Helena

Campos declarou que com esta pesquisa foi possível estabelecer um painel bem abrangente para

comparação das estradas coloniais com as ferrovias, especialmente com a EFCB. Em sua quase

totalidade a Central do Brasil é a Estrada Real, inclusive com o Caminho da Bahia não inserido no

programa da FIEMG, conforme se pode observar na imagem a seguir.

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A Central do Brasil foi o eixo ferroviário de Minas Gerais onde chegou em 1869 e foi se

estendendo até 1910, quando atingiu Pirapora. Fazia conexão com diferentes ferrovias como a

Estrada de Ferro Leopoldina, que atendeu a Zona da Mata, e a Estrada de Ferro Oeste de Minas,

além de outras menores que foram incorporadas em 1931 à Rede Mineira de Viação. Portanto,

unindo trechos da Rede Mineira e da Leopoldina à Central do Brasil, temos praticamente o desenho

das Estradas Coloniais em Minas Gerais. Torna-se fácil entender esta conclusão porque foi a natureza

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quem desenhou o traçado dos caminhos, já que a tecnologia existente na época resumia-se a pás,

picaretas e carroças. O quadro pouco mudou até a época da construção das ferrovias em Minas

Gerais. Sempre se buscava o percurso que implicasse os menores custos em obras de arte. Isto

significava margear o rio, buscando uma altura que evitasse o alagamento do leito, ou seja, seguindo

o traçado determinado pela natureza.

A apresentação da professora Helena Campos prosseguiu com a apresentação de imagens de

várias estações do Caminho Novo, entre as quais selecionamos a de Conselheiro Lafaiete abaixo.

Estação de Conselheiro Lafaiete em imagem de 1907.

Na medida em que as imagens eram projetadas a palestrante contava um pouco sobre cada

estação e em seguida declarou que seu estudo procurou aproximar diferentes aspectos da história.

Seja no que se refere à conservação e manutenção dos caminhos, quanto ao levantamento da

economia das áreas circundantes e a questão social, ou seja, as práticas culturais ligadas às estradas,

a autora pretendeu demonstrar que os papéis e funções dos caminhos são os mesmos ao longo do

tempo. Além disso, lembrou que nas tropas era muito marcante a presença do elemento familiar e

no meio ferroviário o mesmo acontecia.

Entre os pontos convergentes foram mencionados: o transporte do ouro que estava na

origem da abertura do Caminho Novo e também na função da ferrovia de Morro Velho; a

insegurança que tornou conhecidos bandos como a Quadrilha do Vira Saia e o célebre Assalto ao

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Trem Pagador; e, a via de migração que foi o Caminho Novo, mesma função exercida pela ferrovia,

com destaque para a que serviu de principal estrada para o migrante nordestino que fugia para o

sudeste a cada grande seca.

O objetivo principal de seu trabalho, enfatizou a professora Helena Guimarães Campos, é

divulgar a necessidade de dar tratamento ao patrimônio ferroviário nos mesmos moldes do que

ocorre com o patrimônio barroco.

A participação foi encerrada deixando a seguinte mensagem:

Em qualquer tempo ou espaço os caminhos marcam o traço - sinas viárias, várias – onde

gentes, sonhos e histórias se encontram se apartam.

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15 –Caminho Novo em 3D

O professor Ângelo Alves Carrara iniciou sua apresentação agradecendo pelo convite para

estar novamente entre os pesquisadores do Caminho Novo e destacou que concorda com a opinião

do organizador Luiz Mauro de Andrade Fonseca para quem o grupo ali reunido forma uma

verdadeira Confraria de Amigos do Caminho Novo.

Seu objetivo inicial seria mostrar um trabalho que vem

sendo desenvolvido dentro do conceito de Popularização da

Ciência. Infelizmente, porém, não poderia ser francamente

demonstrado por conta de problemas técnicos.

A questão fundamental, que o professor Carrara já

citara nos Encontros anteriores, é como a sociedade pode ter

acesso ao conhecimento produzido nas universidades. Para

ele, popularizar a ciência é, na verdade, uma prestação de

contas por parte das universidades, que devem apresentar os

seus estudos à população de uma forma muito objetiva e

muito concisa porque o espaço para esta resposta ser dada à

sociedade é muito pequeno.

No ambiente acadêmico as comunicações de resultados se utilizam de muitas páginas,

anexos e gráficos de dados, se necessários. Já para o cidadão comum é preciso ficar atento à

objetividade e concisão citadas.

Em Juiz de Fora há um grupo de pesquisa que desde 2006 aposta no diálogo da história com

a geografia. Inicialmente se fixaram em quatro iniciativas das quais a primeira era uma cartografia da

ocupação do solo, ou seja, a História Agrária que é um campo do saber da História Econômica bem

consolidado, com métodos muito consistentes. Isto tem a ver com a distribuição das sesmarias cujos

requerimentos não foram processos aleatórios, ou seja, o indivíduo não chegava ao local, gostava da

paisagem e se interessava por construir ali a sua fazenda. Na verdade, alertou Carrara, o sistema de

distribuição implicava num processo cuja tecnologia já perdemos. Donde surge a questão: como

reconstituir o sistema de escolha das áreas a serem requeridas como sesmaria?

O homem do campo tem uma tecnologia agrária que nós não conhecemos. Ele sabe que

determinada área é adequada ao plantio de certo gênero e não para outro tipo de plantação. Suas

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escolhas não são aleatórias, mas resultam do que o conhecimento deste homem indica como

capacidade do solo e das suas demandas econômicas. Para começar a se aproximar da resposta, o

grupo de pesquisa começou com o georreferenciamento do processo de uso e ocupação do solo. Ou

seja, mapeando cada propriedade rural entre 1715 a 1850.

O palestrante observou que, sendo farta a documentação em Minas Gerais, é possível saber

com quantos escravos o fazendeiro contava em 1715, 1736, 1750 e por aí vai. Sendo assim, pode-se

reconstituir o processo com certo nível de detalhe até chegar ao período entre 1850 e 1854 quando

ocorreu o cadastramento das propriedades.

Para surpresa dos pesquisadores, quando aplicaram os dados ao mapa eles perceberam que

o Caminho Novo surgiu como “vertebrador” da distribuição das propriedades. Ou seja, as pessoas

que registraram suas propriedades em 1854 se mantiveram próximas ao Caminho Novo como ele era

em 1712. Foram mapeadas 202 propriedades que formam uma linha nas margens daquele caminho.

A segunda ação decidida pelo grupo de pesquisa foi georreferenciar a Ouro Preto do século

XVIII. Isto significa gerar um arquivo em terceira dimensão, reconstituindo a mancha urbana da

cidade a partir de um mapa de 1784, o IPTU do início do século XIX, o Censo de Ouro Preto de 1804 e

outras bases de dados que permitem detalhar cada casa, saber o tamanho de cada imóvel, quem

mora ali e quanto vale a construção. Isto significa associar à base cartográfica urbana uma base

cadastral muito detalhada.

Este trabalho está em andamento e uma grande surpresa que ele trouxe foi a descoberta de

significativa quantidade de vielas, ruas e becos de Ouro Preto que desapareceram. Com a

transferência da capital e o consequente esvaziamento da cidade, muitas casas que confrontavam

com um beco ou uma viela simplesmente estenderam seus quintais. Foi identificado um caso

extremo de uma rua que saía defronte à Igreja de São Francisco e em seu lugar hoje existe um belo

casarão.

Associado a este projeto de Ouro Preto veio outro semelhante em Diamantina, onde o

desafio é muito maior. Isto porque em 1784 Ouro Preto já era uma cidade em decadência, conforme

se depreende da comparação do valor do IPT de Ouro Preto com o de São João del Rei, cidade na

qual as casas valem o dobro do que na então capital de Minas Gerais. Portanto, enquanto se

desenrolava a decadência urbana em Ouro Preto, Diamantina estava em pleno esplendor, como

revela cartografia com inúmeros elementos urbanos a demonstrarem seu fausto. Segundo Carrara,

para este período foi encontrada em Diamantina uma casa com valor igual ao de uma fazenda no

sertão com 1.500 cabeças de gado.

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Foi destacado que o projeto vem sendo desenvolvido por diversos pesquisadores e que cada

grupo trabalha com um programa específico, como um para a História Agrária e outro para a História

Urbana, por exemplo.

Passando a abordar a terceira vertente do projeto, Ângelo Carrara informou que nesta são

estudados os caminhos, os quais são mais fáceis de serem georreferenciados. Exemplificou com

alguns comentários sobre o sistema de trabalho que podem explicar a antiga questão sobre se o

caminho de Ouro Branco para Ouro Preto passaria ou não por Itatiaia.

Segundo Carrara, há um mapa do Caminho Novo, de 1843, com um importante nível de

detalhe. Este documento apresenta o traçado de Diamantina a Ouro Preto e daí até o Rio de Janeiro,

sendo facilmente identificável o que ele chamou de “caminho tronco”. Além disso, os pesquisadores

utilizaram também os Diários de Viagem dos Soldados Dragões que, ao saírem em missão, levavam

um caderninho para anotar todos os valores despendidos no trajeto como capim, ferraduras,

alimentação e pouso, além dos lugares por onde passavam. Ao reconstituir estes diários, os

pesquisadores encontraram diversas variantes para um mesmo caminho. Portanto, há um caminho

“vertebrador” e as suas variantes eram trilhadas pelos soldados porque o seu objetivo era patrulhar,

procurando encontrar aqueles que não estavam passando pela linha tronco. No caso de Ouro Preto a

Diamantina, impressiona a quantidade de variantes, sendo de notar que os soldados eventualmente

faziam o percurso de ida por um trecho e na volta se utilizavam de outra variante, dando notícia

precisa da distância entre cada parada que faziam.

A quarta iniciativa do grupo de pesquisa não poderia ser transmitida no telão por conta do

problema técnico mencionado do início da comunicação. Entretanto, os interessados puderam

observá-la individualmente no computador portátil trazido pelo palestrante, onde se encontra o jogo

criado para alunos de Ensino Fundamental, do 6º ao 9º ano que permite a popularização da História

Econômica. O aluno pode observar o uso e ocupação do solo e descobrir, por exemplo, quanto

tempo leva o indivíduo gastava para ir do Rio de Janeiro ao Registro do Paraibuna. Inúmeros outros

aspectos estão disponíveis, sendo possível analisar as variáveis geográficas e, quando chegar a um

pouso, o aluno é convidado a ver que tipo de mercadoria é transportada, ele pode descarregar as

cangalhas, observar o relevo e a paisagem natural reconstituída pelos pesquisadores que trabalham

com a paleogeografia.

O software permite que aluno brinque com a matemática e o português, além das

mencionadas história e geografia, ou seja, envolve múltiplas disciplinas que devem ser dominadas ou

desenvolvidas pelo estudante do Ensino Fundamental. O produto final será um livro didático,

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acompanhado de um CD, cujo objetivo é a popularização da História Econômica tendo como pano de

fundo o Caminho Novo. Segundo Carrara, em geral os textos de História Econômica são muito áridos

e avessos a um tratamento mais popular, mas, na realidade, ali são tratadas as questões mais básicas

da vida cotidiana.

A expectativa é ter o produto finalizado dentro de cerca de 9 meses e a “nossa confraria”,

disse Carrara, participará do teste de avaliação. Apesar da dificuldade de demonstração na pequena

tela do computador portátil, algumas pessoas da plateia puderam acompanhar os movimentos do

jogo.

Ao final de sua apresentação, Ângelo Alves Carrara afirmou que “o processo de ocupação é

fortemente condicionado pela geografia” e deixou para a plateia a convicção cada vez maior de que

Encontros como este são uma excelente oportunidade de nos aproximarmos do conhecimento que

vem sendo produzido pelas universidades.

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16 –Mapeamento Interativo da Estrada Real

O professor Altino Barbosa Caldeira explicou que o projeto disponível na rede mundial de

computadores no endereço <http://atlasdigitalmg.com.br/> antecede o trabalho em curso, do qual

falará. Sendo arquiteto por formação, escolheu as cidades históricas mineiras para desenvolver o

projeto de doutorado, realizado na Inglaterra entre 1994 e 1996. Na época ainda não existia a

internet comercial e ele não tinha informações muito claras sobre quais eram os bem tombados pelo

Iphan, órgão no qual havia trabalhado. Assim, com os meios então disponíveis não era possível obter

nada mais além do nome do bem, o código e a data do tombamento. As dificuldades no

desenvolvimento do doutorado fizeram nascer a vontade de realizar um trabalho que suprisse a

lacuna e, tão logo retornou ao Brasil, matriculou-se numa pós-graduação na Puc Minas, na área de

geografia. Desta forma, participou de um grupo de pesquisa multidisciplinar que entre 2002 e 2005

realizou um extenso levantamento dos bens tombados em Minas Gerais que resultou num livro e

conta com apresentação no site mencionado.

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Dos 47 municípios abordados no Atlas Digital, em 2005 observaram que 36 estavam também

no projeto do Instituto Estrada Real, da Fiemg, que na época estava em seu auge. Sendo assim,

surgiu a ideia de fazer o georeferenciamento da Estrada Real.

Após conseguir a aprovação do projeto pela Fapemig, o grupo de alunos e professores

percorreu toda a Estrada Real, de Diamantina ao Rio de Janeiro e também o trecho paulista,

identificando todos os bens mencionados no projeto da Fiemg. Altino Caldeira ressaltou que a Fiemg

selecionou municípios adequados ao desenvolvimento do turismo, ou seja, não incluiu todos os

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existentes ao longo da Estrada Real. Já o Mapeamento interativo da Estrada Real, desenvolvido pelo

grupo do qual Caldeira faz parte, o objetivo é a totalidade dos municípios ao longo do mencionado

caminho.

Foi feita uma demonstração do funcionamento do site, com seus objetivos e informações

técnicas, escolhendo-se o município de Antônio Carlos para demonstrar o funcionamento.

Caldeira declarou que o trabalho envolve duzentos municípios que guardam cerca de dois mil

bens tombados, mas nem todos estão disponíveis no site. Chamou a atenção para o fato de que

outros dados e imagens poderão ser inseridos na medida em que forem sendo obtidos e

organizados.

Após diversas demonstrações com o conteúdo já publicado, foi apresentado o endereço

<http://www.3geoprocessamento.com.br/estradareal/>.

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Altino Caldeira reiterou que o trabalho não está concluído e poderá vir a ser enriquecido com

diversos outros tipos de informação.