reabilitaÇÃo urbana no bairro da ribeira: … · 2016-02-18 · monografia apresentada à...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS BACHARELADO EM GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS LUIS RENATO NOGUEIRA DA ROCHA NATAL 2015 REABILITAÇÃO URBANA NO BAIRRO DA RIBEIRA: perspectivas de um centro urbano em transformação.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

BACHARELADO EM GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

LUIS RENATO NOGUEIRA DA ROCHA

NATAL

2015

REABILITAÇÃO URBANA NO BAIRRO DA RIBEIRA:

perspectivas de um centro urbano em transformação.

LUIS RENATO NOGUEIRA DA ROCHA

REABILITAÇÃO URBANA NO BAIRRO DA RIBEIRA:

PERSPECTIVAS DE UM CENTRO URBANO EM TRANSFORMAÇÃO.

Monografia apresentada à Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, em

cumprimento às exigências legais, como

requisito parcial à obtenção do título de

Bacharel em Gestão de Políticas Públicas.

Orientador: Prof. Dr. Alexsandro Ferreira

Cardoso da Silva

NATAL

2015

UFRN / Biblioteca Central Zila Mamede

Catalogação da Publicação na Fonte

ROCHA, Luis Renato Nogueira da.

Reabilitação urbana no bairro da Ribeira : perspectivas de um centro urbano

em transformação / Luis Renato Nogueira da Rocha. – Natal, RN, 2015.

101 f.

Orientador: Prof. Dr. Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva

Monografia (Graduação) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Curso de Bacharelado Gestão de

Políticas Públicas.

1. Política Urbana - Monografia. 2. Reabilitação Urbana - Monografia. 3.

Habitação Social em Áreas Centrais – Monografia. 4. Centros Urbanos –

Monografia. 5. Ribeira - Monografia. I. Silva, Alexsandro Ferreira Cardoso da. II.

Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BCZM CDU: 71

LUIS RENATO NOGUEIRA DA ROCHA

REABILITAÇÃO URBANA NO BAIRRO DA RIBEIRA:

PERSPECTIVAS DE UM CENTRO URBANO EM TRANSFORMAÇÃO.

Monografia apresentada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em

cumprimento às exigências legais, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em

Gestão de Políticas Públicas.

APROVADO EM:____/____/ 2015

BANCA EXAMINADORA

________________________________________

Prof. Dr. Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva

(Orientador – UFRN/CCHLA/DPP)

________________________________________

Profa. Dra. Maria do Livramento Miranda Clementino

(Membro interno – UFRN/CCHLA/DPP)

________________________________________

Ms. Glenda Dantas Ferreira

(Membro externo)

NATAL

2015

AGRADECIMENTOS

Mesmo não me considerando uma pessoa religiosa, não poderia começar meus

agradecimentos sem citar Ele, que me dá, a cada dia, a oportunidade de viver e aprender cada

vez mais: obrigado, Deus!

Aos meus pais, Lita e Vavá, eu agradeço pela formação, aceitação, incentivo e puxões

de orelha que me dão todos os dias. Aos senhores eu devo a descoberta do verdadeiro sentido

do amor e dedico cada centímetro do caminho que eu estou trilhando. Obrigado por darem

sentido à minha vida.

Ao meu amigo Milson Santos, eu agradeço pela dedicação que teve a mim nos tempos

do ensino médio no Instituto Padre Miguelinho, me incentivando e aconselhando a nunca

desistir. A sua ajuda foi fundamental para que eu conseguisse ingressar na UFRN.

Dirijo um agradecimento especial ao meu orientador, o professor Alexsandro Ferreira,

pelos valiosos ensinamentos a respeito das políticas públicas, pelas divertidas histórias

contadas nas nossas reuniões, como também pela dedicação que teve à minha orientação

durante os meses de execução deste trabalho. Obrigado pela confiança!

Agradecimentos igualmente especiais vão para Maria Floresia, Secretária Adjunta de

Informação e Planejamento Urbanístico e Ambiental da SEMURB, ao professor João Galvão,

técnico de Planejamento Urbanístico da SEMURB, e à Violeta Quevedo, diretora do

Departamento de Ação Social e Projetos Especiais da SEHARPE. Os três deram grande

contribuição à execução deste trabalho.

Aos professores e demais funcionários do Departamento de Políticas Públicas da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o meu sincero agradecimento.

Ao meu amigo Gleidson, o meu agradecimento sempre me receber com um sorriso

apesar do meu constante mau humor. A sua presença, o seu apoio e incentivo foram

fundamentais para a conclusão dessa fase da minha vida. Aos meus amigos de GPP Isaías, Mariana e Lília, eu agradeço pelo companheirismo,

pela paciência e pelo carinho que tiveram comigo durantes os anos de graduação. Foi um

período de muita diversão e aprendizado ao lado de vocês, meus “beagles enfezados”.

Às minhas amigas Juliete Bernardino, Márcia Aparecida, Fátima Abrantes e Andréa

Mousinho, que contribuíram diretamente para a elaboração deste trabalho, o meu imenso

agradecimento. As leituras e os apontamentos feitos por vocês foram essenciais. Muito grato!

Aos meus amigos da Secretaria Municipal de Planejamento (SEMPLA) Thiago

Augusto, Junior Freire, Bruna Duarte, Daniele Mariano, Luciana Raposo e Paula Cardoso, eu

agradeço por terem, cada um a seu modo, me ajudado na conclusão deste trabalho.

A todos um grande abraço.

Obrigado!

RESUMO

Este trabalho consiste em um estudo acerca dos programas e projetos de Reabilitação e

Revitalização urbana do bairro da Ribeira, em Natal/RN, cujos objetivos fundamentaram-se

na recuperação das atividades econômicas e das dinâmicas sociais da área em questão,

colocando o acesso à moradia como uma das condicionantes para se lograr o êxito pretendido.

Aborda-se, inicialmente, o desenvolvimento da Ribeira dentro do seu contexto histórico e a

partir das características que o colocam como um Centro Urbano com os traços e

problemáticas típicas de outras centralidades do mundo, a saber: o abandono populacional e a

deterioração de suas estruturar urbanas e sociais. Para efeito de análise e posterior

comparação com a atuação do poder público nos os dias atuais, tem-se como referência para

esta pesquisa o Programa ReHabitar em Natal e o Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas

Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira), sendo este último fruto de um planejamento participativo

que mobilizou os diversos atores sociais interessados nos usos do referido território. Conclui-

se fazendo uma abordagem a respeito da atuação da Prefeitura do Natal frente ao

planejamento dos investimentos para o bairro, na tentativa de identificar as perspectivas

existentes por parte da gestão municipal para o futuro do bairro e se as respostas que estão

sendo dadas contemplam as frentes de ação tidas como fundamentais para a efetividade e a

eficácia dos projetos de revitalização dos centros, ou seja, o incentivo à habitação e o fomento

às atividades comerciais e culturais.

Palavras-chave: Política Urbana; Reabilitação Urbana; Habitação Social em Áreas Centrais;

Centros Urbanos; Ribeira.

ABSTRACT

This assignment consists in a study about urban revitalization and recovery of Ribeira

neighborhood, placed in Natal-RN, whose goals focused on the resumption of economic

activities and social dinamics in that area, supporting the access of housing as a condition to

success as expected. First, this assignment will approach the development of Ribeira,

considering its historical context and its features of an urban center, with issues of other urban

centers else, like populacional abandonment and urban blight. This study uses the program

“ReHabitar em Natal” and “Rehabilitation Plan of Central urban Areas (Plano de Reabilitação

de Áreas Urbanas Centrais - PRAC/Ribeira)” as a reference to analyze and make comparison

to the current government relations towards that issue. The latter program was created from a

collaborative planning, which mobilized several social actors who had interests on the using

of that area at issue. This study concludes with an approach about the actions of City

Government towards the budgeting directed to Ribeira neighborhood, attempting to identify

possible perspectives of the municipal management towards the future of the neighborhood.

Another point in this study is to identify if the answers that have been given by the authorities

are enough to fulfill the main demands of the urban recovery plans, such as habitation support

and economic and cultural support.

Keywords: Urban Policy, Urban Rehabilitation, Social habitation in Central Areas, Urban

Center, Ribeira.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

CF Constituição Federal

CEF Caixa Econômica Federal

COOPERE Coordenação de Projetos Estruturantes da Ribeira e do Entorno

CODERN Companhia Docas do Rio Grande do Norte

FNHIS Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social

FUNPEC Fundação Norte Rio-Grandense de Pesquisa e Cultura

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

IPLANAT Instituto de Planejamento Urbano de Natal

IPTU Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana

ISSQN Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza

MCidades Ministério das Cidades

MinC Ministério da Cultura

OAB Ordem dos Advogados do Brasil

OGU Orçamento Geral da União

ONG Organização Não Governamental

ONU Organização das Nações Unidas

OUR Operação Urbana Ribeira

PAC Programa de Aceleração do Crescimento

PAR Programa de Arrendamento Residencial

PDN Plano Diretor de Natal

PMCMV Programa Minha Casa Minha Vida

PNDU Política Nacional de Desenvolvimento Urbano

PRAC/Ribeira Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira

PRI Perímetro de Reabilitação Integrada

PRSH Programa de Revitalização de Sítios Históricos

PT Partido dos Trabalhadores

PTS Projeto Técnico Social

SEMURB Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo

SEMUT Secretaria Municipal de Tributação

SNHIS Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social

SNPU Secretara Nacional de Programas Urbanos

SPH Setor de Patrimônio Histórico

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

ZEP Zona Especial Portuária

ZEPH Zona Especial de Preservação Histórica

ZOPP Planejamento de Projetos Orientado por Objetivos

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - ESTAÇÃO RODOVIÁRIA DE NATAL (DÉCADA DE 1980). ........................................... 38

FIGURA 2 - RUA CHILE, RIBEIRA, NATAL/RN. .......................................................................... 40

FIGURA 3 - EDIFÍCIO BILA ......................................................................................................... 59

FIGURA 4 - EDIFÍCIO TAVARES DE LIRA..................................................................................... 59

FIGURA 5 - EDIFÍCIO GALHARDO/ARPEGE ................................................................................. 60

FIGURA 6 - EDIFÍCIO PARIS EM NATAL ...................................................................................... 60

FIGURA 7 - EDIFÍCIO NOVA AURORA ......................................................................................... 61

FIGURA 8 - PRIMEIRA OFICINA DO PRAC/RIBEIRA ................................................................... 65

FIGURA 9 - COMUNIDADE DO MARUIM AO LADO DO PORTO DE NATAL ..................................... 74

FIGURA 10 - RESIDENCIAL MARUIM, COM 32% DE OBRAS EXECUTADAS. .................................. 80

LISTA DE MAPAS

MAPA 1 - ZONAS ESPECIAIS (ZEP E ZEPH) .............................................................................. 35

MAPA 2 - ÁREAS DELIMITADAS PELA OPERAÇÃO URBANA (2007) NO BAIRRO DA RIBEIRA,

NATAL-RN. ............................................................................................................................... 47

MAPA 3 - PERÍMETRO DE REABILITAÇÃO INTEGRADA DEFINIDO PELO PROGRAMA REHABITAR56

MAPA 4 - ÁREA DE ABRANGÊNCIA E ÁREA DE ATUAÇÃO DO PRAC/RIBEIRA ........................... 67

MAPA 5 - ÁREAS PREDOMINANTEMENTE RESIDENCIAIS NO BAIRRO DA RIBEIRA ....................... 68

MAPA 6 - PROPOSTA 2: RELOCAÇÃO PARCIAL DO ASSENTAMENTO, COM PERMANÊNCIA DAS

EDIFICAÇÕES CONSOLIDADAS, INTEGRANDO-AS COM O PROJETO DE URBANIZAÇÃO DO CANTO DO

MANGUE.................................................................................................................................... 77

MAPA 7 - ATUAL LOCALIZAÇÃO DA COMUNIDADE DO MARUIM E LOCAL DE CONSTRUÇÃO

RESIDENCIAL MARUIM. ............................................................................................................. 81

LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - CARACTERÍSTICAS DAS ÁREAS DELIMITADAS PELA LEI OPERAÇÃO URBANA

RIBEIRA 2007. ........................................................................................................................... 48

QUADRO 2 - COMPARAÇÃO DOS USOS E CONDIÇÕES, ENTRE OS ANOS 2003 E 2015, DOS CINCO

EDIFÍCIOS SELECIONADOS PELO PROGRAMA REHABITAR. .......................................................... 57

QUADRO 3 - PRODUTOS DO PLANO DE REABILITAÇÃO DE ÁREAS URBANAS CENTRAIS – RIBEIRA

(PRAC/RIBEIRA). ...................................................................................................................... 71

QUADRO 4 - PROBLEMÁTICAS E CENÁRIO FUTURO PARA O BAIRRO DA RIBEIRA E A METAS DO

PLANO DE VALORIZAÇÃO TURÍSTICO-CULTURAL. .................................................................... 84

QUADRO 5 - PROJETOS DO PLANO DE VALORIZAÇÃO TURÍSTICO-CULTURAL DA RIBEIRA. ....... 86

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 - MÉDIA, EM SALÁRIOS MÍNIMOS, DA POPULAÇÃO COM 10 ANOS OU MAIS DE IDADE. 75

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 16

1. DESENVOLVIMENTO URBANO NO BRASIL: UM BREVE HISTÓRICO PRÉ

E PÓS-MINISTÉRIO DAS CIDADES. ............................................................................... 20

1.1. Criação do Ministério das Cidades no contexto da Política Urbana do Governo Lula

(2003-2010). ......................................................................................................................... 22

1.2. Um novo olhar sobre o planejamento urbano no Brasil por meio da Política de

Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais. ............................................................................. 26

2. O MUNICÍPIO DO NATAL E A CONSTITUIÇÃO DO SEU CENTRO

HISTÓRICO ........................................................................................................................... 32

2.1. O bairro da Ribeira como Centro Urbano Histórico: seus limites e desafios. ............... 36

2.1.1. Primeiros passos para a Revitalização Urbana para o bairro da Ribeira ................ 39

3. A NOVA POLÍTICA DE GESTÃO DOS CENTROS URBANOS APLICADA AO

BAIRRO DA RIBEIRA ......................................................................................................... 45

3.1. A Operação Urbana Ribeira e o Plano Diretor de Natal ............................................ 46

3.2. O Programa ReHabitar em Natal................................................................................ 52

4. DOS GABINETES ÀS RUAS: O PRAC/RIBEIRA COMO UMA PROPOSTA DE

REABILITAÇÃO INTEGRADA. ........................................................................................ 63

4.1. Uma abordagem metodológica do Projeto Técnico Social do PRAC/Ribeira. ......... 69

4.2. Moradia Social e Reurbanização Integrada: uma visão das propostas para a

comunidade do Maruim. ....................................................................................................... 72

4.3. Esforços por um Plano de Valorização Turístico-Cultural da Ribeira ...................... 83

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 89

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 93

APÊNDICES ........................................................................................................................... 98

16

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988, que estabelece as diretrizes gerais da Política Urbana

brasileira, designa os municípios como os agentes executores da política de desenvolvimento

urbano e, nos diversos tópicos dessa política, a gestão do espaço urbano mostra-se um dos

grandes desafios, principalmente em se tratando da reabilitação dos centros urbanos, em

especial daqueles com valor histórico. Neste sentido, a promulgação da Lei 10.257/01,

conhecida como Estatuto da Cidade, constituiu um importante marco da Política Urbana,

como um todo, e para a reabilitação dos centros históricos das cidades brasileiras, pois em seu

artigo 2º inciso XII quanto à preservação dos elementos patrimoniais, históricos e de

relevância urbanística desses centros urbanos. Atender aos Programas de Reabilitação ou

Revitalização dos centros históricos é, desse modo, dever do Estado alinhado com as demais

políticas setoriais de promoção de bem-estar urbano.

Para avançarmos um pouco acerca dessas questões, consideramos a criação do

Ministério das Cidades (MCidades) e os esforços empreendidos para a elaboração da Política

Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU), como um novo momento de pactuação

democrática os entes federativos e a sociedade civil organizada, em torno do tema Patrimônio

Histórico Urbano e Centros Históricos. Isso devido a importância de tratar o tema como uma

política setorial dentro do quadro de preocupações do MCidades, especialmente destacando a

“moradia social” como um importante eixo de trabalho.

A sinergia desses esforços a partir de 2004 foi no sentido de reverter o quadro

estabelecido pelos efeitos da crise urbana brasileira, que segundo Maricato (2006), tinha em

um dos seus principais problemas a enorme dificuldade do acesso à moradia pelos mais

pobres e no atendimento ao Déficit Habitacional. Essa problemática perpassava por outras

áreas e influencia no desenvolvimento das cidades e agrava a desordem urbana estabelecida,

seja nas periferias ou nos centros.

Nas grandes e médias cidades, especialmente naquelas cujos centros históricos

decorrem ainda do século XVII ao XIX, existem números consideráveis de imóveis ociosos e

subutilizados, reforçando a constituição da cidade ilegal, o que acarreta em diversos

problemas de ordem urbanística e social. Desse modo, associa-se a precariedade do ambiente

construído com a falta de moradia social adequada. Assim, uma das primeiras tarefas do

MCidades, em 2004, foi inserir a problemática moradia associada à recuperação das áreas

degradadas nas cidades brasileiras, ocupando os imóveis vazios ou subutilizados.

17

Na estrutura organizacional do Ministério das Cidades, o órgão responsável por dar

apoio aos municípios nas ações com vistas a reverter o atual quadro é a Secretaria Nacional de

Programas Urbanos (SNPU) que segundo Rolnik (2006), foi pensada no intuito de fomentar

as estratégias municipais em duas frentes de ação: as curativas e a preventivas, referentes ao

planejamento territorial urbano e à política fundiária dos municípios brasileiros. Ainda de

acordo com Rolnik (2006), a SNPU seria responsável por “mudar a agenda do planejamento e

gestão do solo urbano que, na maioria das cidades brasileiras, sempre esteve mais voltada

para a cidade formal, raramente dialogando com os mercados de baixa renda”.

Uma das preocupações dos governos a partir dos novos arranjos institucionais pós-

Ministério das Cidades, se referem à gestão dos centros urbanos, cuja formação está

intrinsecamente ligada a uma série de movimentos de forças centrípetas, que por meio da ação

coletiva ou individual do homem centraliza em determinadas áreas urbanas as suas atividades

econômicas e sociais (SILVA, 2013). No entanto, quando acontece o movimento contrário, e

não há a efetivação de ações preventivas, esses centros começam a sofrer as consequências

diretas da descentralização das atividades para outras regiões das cidades, a saber: o abandono

e a deterioração de suas estruturas urbanas e sociais, fazendo-se necessário a implementação

de ações curativas com vistas a reverter o processo de segregação sócio-espacial.

De acordo com Maricato (2001), as duas frentes de intervenção fundamentais para a

revitalização das áreas centrais se caracterizam pelo incentivo à habitação e a defesa do

pequeno negócio. Para tanto, ela considera importante a atuação dos municípios no que

concerne à legislação urbanística local, a partir de Operações Urbanas, como também a

implementação de programas de moradia.

Neste sentido, o presente trabalho objetiva estudar em que medida os projetos dessa

ordem foram implementados no bairro da Ribeira, em Natal/RN, cujas dinâmicas sociais e

estruturas urbanísticas se encontram em forte declínio, o que fez com o que o bairro fosse, nos

últimos vinte anos, alvo de projetos com vistas a sua revitalização, dentre os quais este

trabalho destaca o Programa ReHabitar, a Operação Urbana Ribeira e o Plano de Reabilitação

de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira), sendo este último fruto de um

programa homônimo da SNPU.

Este estudo se dá, também, na perspectiva de identificar em que medida se deu a

eficácia e a efetividade dos referidos projetos e qual a expectativa da gestão municipal acerca

do futuro do bairro da Ribeira, levando em consideração que, além da existência de propostas

18

e fonte de recursos para financiá-las, há também alguns projetos já sendo executados, seja por

parte da Prefeitura do Natal, seja por parte de iniciativas de outros órgãos e entidades, que

influenciarão nas dinâmicas e fluxos do bairro.

O presente estudo se justifica, portanto, pela importância conferida ao bairro da

Ribeira e o seu significado para a história da cidade do Natal, como também por ser

necessário identificar os motivos que fizeram o bairro continuar passando pelo processo de

segregação e abandono, mesmo com a implementação de projetos nos últimos vinte anos. O

estudo torna-se importante, também, para que se possa pensar a revitalização do bairro da

Ribeira de maneira a não repetir os erros cometidos, seja no processo de planejamento, seja no

processo de execução das referidas propostas.

Para se chegar ao resultado final deste trabalho, foram realizadas pesquisas

documental e bibliográfica que segundo Marconi e Lakatos (2003) possibilitam ao

pesquisador uma noção geral do campo de interesse, além de possíveis orientações para outras

fontes de informações. Sobre a pesquisa bibliográfica em si, realizada tendo como referencial

fontes secundárias, enfatiza-se a utilização deste método, uma vez que ele “propicia o exame

de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras.” (idem,

2003, p. 183).

Ainda no campo dos recursos metodológicos utilizados, foram feitas visitas de campo

com vistas a identificar os atuais usos de cinco imóveis que foram alvos do Programa

ReHabitar, a fim de se fazer posterior comparação com os usos à época do projeto. Também

foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os gestores da Prefeitura do Natal, entre

aqueles que trabalharam na época de planejamento e implementação dos projetos de

revitalização da Ribeira, e com outros que estão atualmente envolvidos com projetos que

prometem impactar nas dinâmicas do bairro. Ainda de acordo com Marconi e Lakatos (2003),

este recurso possibilita a obtenção informações mais precisas e de outros dados que não

constam em fontes disponíveis, de forma a dar mais credibilidade e veracidade aos resultados

obtidos.

Este trabalho está dividido em quatro capítulos, sendo o primeiro um resgate histórico

sobre o processo de gestão das políticas públicas de desenvolvimento urbano no Brasil nos

períodos pré e pós-Ministério das Cidades, como também se faz uma abordagem conceitual

sobre alguns tipos de intervenções urbanas existentes, dentre os quais destacamos a

revitalização, a renovação e a reabilitação do espaço urbano; no segundo, tem-se uma

19

referência ao bairro da Ribeira, no sentido de identificar a sua formação como um centro

urbano de valor histórico. Ademais, aborda-se no terceiro capítulo a nova política de gestão

dos centros urbanos (pós-MCidades) aplicada ao bairro; e por fim, no quarto capítulo, é

apresentado o Plano de Reabilitação de Áreas Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira), enfatizando

a metodologia de planejamento participativo utilizada na sua elaboração, como também

destaca-se três produtos oriundos do referido plano: o Projeto Técnico Social; o projeto

destinado à comunidade do Maruim; e o Plano de Valorização Turístico-Cultural, e a

posterior comparação dos dois últimos com as propostas mais recentes e atividades que estão

sendo desenvolvidas no bairro.

20

1. DESENVOLVIMENTO URBANO NO BRASIL: UM BREVE HISTÓRICO

PRÉ E PÓS-MINISTÉRIO DAS CIDADES.

A questão urbana no Brasil tem sido alvo de debates há mais de cinquenta anos. Os

movimentos sociais pela reforma urbana1 tiveram início ainda na década de 1960, “quando

segmentos progressistas da sociedade brasileira demandavam reformas estruturais da questão

fundiária” (SAULE JUNIOR e UZZO, 2009), sendo estancado na época do regime militar,

tendo em vista o limitado espaço existente para a participação política no referido período,

que reprimiu os movimentos socais e cerceou as liberdades e os direitos individuais durante

mais de duas décadas.

Após o fim da Ditadura Militar, em 1985, os movimentos em defesa da reforma

urbana foram reorganizados. Os problemas urbanos causados pela ausência do Estado no

planejamento urbano das cidades e o baixo crescimento da economia do país nas décadas de

1980 e 1990, prejudicou o desenvolvimento urbano e estimulou os movimentos sociais a se

reorganizarem de forma mais consistente (MARICATO, 2006). Como efeito de uma política

neoliberal que fortaleceu o ajuste fiscal e comprometeu a atuação do Governo Federal na

elaboração de políticas públicas, além da existência de uma sociedade patrimonialista, na qual

prevalecia a cultura do acúmulo de terras e imóveis nas mãos dos mais abastados, as

dificuldades na elaboração de soluções claras para a questão urbana deu origem a um modelo

de desenvolvimento segregador.

O alto índice de crescimento populacional nas cidades, atrelado a um padrão de

desenvolvimento excludente e a uma política econômica desenvolvida por um Estado

autoritário, responsável por fomentar as injustiças sociais e urbanas, impactou de forma

negativa nas dinâmicas das cidades e regiões metropolitanas. Resultado disso foi a privação

da população de baixa renda de condições básicas de urbanidade, o que ocasionou o aumento

da desigualdade, dificultou o acesso dos mais pobres à cidade legal e à propriedade,

acarretando em problemas de acesso à moradia, “incentivando”, assim, o surgimento de

favelas, ocupações irregulares e cortiços. Esses acontecimentos ajudam-nos a entender o

porquê da articulação entre os diversos segmentos e atores sociais na luta pela Reforma

Urbana (GRAZIA e RODRIGUES, 2003; ROLNIK, 2006).

1 Os movimentos sociais pela reforma urbana eram integrados por “lideranças populares, lideranças sindicais,

lideranças profissionais, religiosos, intelectuais, parlamentares, pesquisadores acadêmicos, ONGs etc.”

(MARICATO, 2011, p.15).

21

Os problemas supracitados foram se agravando com o tempo e persistem até os dias de

hoje. As políticas de enfrentamento desses entraves do desenvolvimento social e urbano, pelo

menos até a década 1960, foram poucas e desarticuladas. No período dos governos militares

foi enfatizado o planejamento tecnocrata em detrimento do planejamento participativo, que

visava a implementação de ações normatizadoras para o desenvolvimento das cidades,

modificando o comportamento dos cidadãos e a atuação das gestões municipais (idem, 2003).

A partir da década de 1980, os movimentos sociais foram ganhando mais força no

Brasil, muito graças ao contexto existente naquela época: o de uma sociedade ávida por

liberdades políticas. Em janeiro de 1985 foi criado o Movimento Nacional pela Reforma

Urbana, fruto de uma articulação e unificação dos movimentos sociais e instituições de ideias

progressistas, e, no enredo do processo de redemocratização, uma emenda constitucional de

iniciativa popular pela Reforma Urbana foi apresentada na Assembleia Nacional Constituinte

para ser incorporada à Constituição Federal de 1988.

A inclusão da questão urbana na Carta Magna permitiu que estados e municípios

incluíssem em suas constituições e leis orgânicas propostas democráticas2 sobre as funções

sociais da propriedade e da cidade (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004). Contudo, no

mesmo contexto da década de 1980, o Brasil enfrentava uma crise financeira, que combinada

com os planos econômicos do Governo Federal para a contenção da alta inflação da época,

colocou em segundo plano os rumos da Política Urbana no país, delegando aos municípios a

responsabilidade por enfrentar os problemas das cidades. (GRAZIA e RODRIGUES, 2003).

Face ao novo momento vivido pelo Brasil a partir da abertura das eleições diretas para

os prefeitos das capitais, em 1985, e da promulgação da Constituição Federal 1988, que

passou a permitir eleições diretas para a presidência da República a partir de 1989, alguns

municípios brasileiros passaram a adotar novos modelos de gestão que contemplavam a

participação popular e elaboração de programas cujos objetivos eram cobater a “desigualdade

social urbana” (MARICATO, 2011, p.10). Porém, segundo Grazia e Rodrigues (2003):

A ausência da questão urbana na agenda política nacional e a falta de interlocutores

claros, bem como a inexistência de uma instância nacional de negociação,

prejudicaram a atuação dos governos locais e a participação dos atores sociais na

formulação e implementação de políticas públicas voltadas para a cidade,

redundando na falta de diretrizes gerais para a política de desenvolvimento urbano,

cuja competência foi delegada à União pela Constituição de 1988.

2 Têm-se como “propostas democráticas” aquelas que contassem com a participação popular na sua formulação.

22

A inclusão de dois capítulos da Política Urbana na Constituição de 1988 foi

considerada uma importante vitória do Movimento Nacional pela Reforma Urbana. Outro

avanço no que se refere à questão urbana foi no ano de 2001, sob a gestão do então presidente

Fernando Henrique Cardoso, quando foi aprovado o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001),

que estabeleceu as diretrizes para a Política Urbana brasileira, dispôs sobre a atuação dos três

níveis de governo e regulamentou os artigos 182 e 183 da CF de 1988, norteando os caminhos

para o desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e da cidade, além do

desenvolvimento de gestões municipais democráticas (SAULE JUNIOR e UZZO, 2009).

No decorrer do processo das lutas sociais, algumas propostas de criação de instâncias

federais que gerenciassem as políticas urbanas do Brasil foram apresentadas, porém sem

muito êxito. Todavia, no ano 2000, a partir de uma articulação do Instituto Cidadania3, que

mobilizou especialistas, estudiosos, sindicalistas e lideranças sociais para a elaboração de um

projeto denominado “Projeto Moradia”, uma construção coletiva com base no diálogo entre os

diversos setores da sociedade no seu planejamento, surgiu a proposta de criação do Ministério

das Cidades4 (MCidades), que teria como um dos seus objetivos fazer o resgate social e

institucional da questão urbana no Brasil, mas que só fora concretizado no ano de 2003,

quando Luiz Inácio Lula da Silva (Lula) assumiu seu primeiro mandato de Presidente da

República.

1.1. Criação do Ministério das Cidades no contexto da Política Urbana do Governo

Lula (2003-2010).

Nas eleições presidenciais de 1994, a campanha do então candidato Luiz Inácio Lula

da Silva, do PT, apresentou em seu Programa de Governo uma proposta de gerenciamento da

Política Urbana brasileira, que foi formulada por meio da articulação dos militantes do

Movimento Nacional pela Reforma Urbana. A proposta compreendeu, entre outras

recomendações, uma reforma urbana baseada nos princípios do movimento, e a criação de

uma estrutura institucional denominada Ministério da Reforma Urbana, que atuaria as áreas

de habitação, de saneamento ambiental, de infraestrutura e de transporte urbano. O programa

3 O Instituto Cidadania era uma ONG presidida por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que foi eleito Presidente da

República em 2002, ganhando no segundo turno das eleições presidenciais, derrotando o ex-governador de São

Paulo, José Serra, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). 4 O nome “Ministério da Cidade” foi proposto inicialmente pelos militantes dos movimentos sociais pela reforma

urbana no ano de 1998. A proposta integrava o Programa de Governo da campanha do então candidato Luiz

Inácio Lula da Silva, do PT.

23

não logrou êxito, haja vista o candidato ter sido derrotado pelo ex-ministro da Fazenda

Fernando Henrique Cardoso, do PSDB. Na campanha de 1998, a estrutura federal novamente

proposta pelo candidato do Partido dos Trabalhadores denominou-se “Ministério da Cidade”,

porém, mais uma vez sendo derrotado, agora pelo então presidente e candidato à reeleição

FHC, a proposta não foi concretizada.

Como já elucidado anteriormente, o Ministério das Cidades foi fruto do Projeto

Moradia, proposta de iniciativa do Instituto Cidadania que tinha como um dos seus

integrantes o ex-metalúrgico e sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva, eleito Presidente da

República 2002. Algumas das justificativas do projeto para a criação do MCidades foi

tentativa de planejar, de forma articulada com os demais níveis de governo, políticas públicas

para o combate às injustiças sociais e urbana nas cidades, que já castigavam cerca de 80% da

população brasileira, além de acabar com a “ausência de uma política urbana e de um espaço

institucional que se responsabilizasse por ela” (GRAZIA e RODRIGES, 2004).

A criação do Ministério das Cidades foi por meio da Medida Provisória 103 de 2003,

sendo institucionalizado em definitivo pela Lei Federal nº 10.683 do mesmo ano, período

correspondente ao primeiro ano de governo do então presidente Lula. O MCidades foi criado

dentro de um contexto de declínio do Estado provedor do bem-estar social e do abandono de

políticas públicas setoriais no campo da habitação, saneamento, infraestrutura e transporte

público (MARICATO, 2011, p.23). O Ministério das Cidades teve sua criação ligada a um

histórico de lutas sociais iniciadas na década de 1960, na qual era pujante o desejo pela

democracia que contemplasse a participação popular nos mais diversos aspectos das decisões

públicas, incluindo-se aí, evidentemente, as decisões sobre a Reforma Urbana. Maricato

(2011, p. 24) destaca que “o Ministério das Cidades foi fruto de um amplo movimento social

progressista e sua criação parecia confirmar, com os avanços, os novos tempos para as

cidades do Brasil.”.

O movimento social citado por Maricato envolveu um grande número de pessoas,

mobilizou lideranças políticas, profissionais e técnicos das mais diversas áreas, acadêmicos,

entidades eclesiais de base, partidos políticos de esquerda e sindicatos. Em suma, uma vasta

rede de ideias progressistas que, através de documentos, Projetos de Lei e plataformas

desenvolvidos por meio do Fórum Nacional de Reforma Urbana, pavimentaram o caminho

para a criação do Ministério das Cidades (idem, p.24), que surgiu com a função de levar o

Governo Federal para o centro das discussões sobre a Política e o Planejamento Urbano, antes

24

atribuições dos municípios. A intenção era que, a partir de então, os desafios urbanos do

Brasil fossem encarados como política de Estado. (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004).

Levando em consideração os três principais problemas que afetam a população das

zonas urbanas, o Governo Federal estruturou o Ministério das Cidades em quatro Secretarias

Nacionais: a de Habitação, a de Saneamento Ambiental, a de Mobilidade e Transporte Urbana

e a de Programas Urbanos. As referidas secretarias ficaram responsáveis por desenvolver

ações planejadas, monitoradas e articuladas com a sociedade civil e os demais entes da

federação, a fim de desenvolver a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano. A Secretaria

Nacional de Programas Urbanos, em especial, foi responsável pelo planejamento territorial

junto aos municípios, mas de forma a coordenar, fomentar e financiar os estudos e as ações,

haja vista a questão territorial ser de competência das cidades. (MINISTÉRIO DAS

CIDADES, 2004; MARICATO, 2006; 2011, p. 25).

Alguns desafios foram postos às responsabilidades do Ministério das Cidades.

Desafios estes que foram se agravando com o tempo, haja vista o descaso com a questão

urbana no País e o aumento populacional nas áreas urbanas, que acarretou no crescimento

desordenado das cidades e no surgimento de áreas periféricas desprovidas dos serviços

públicos mais básicos, o que agravou o quadro de desigualdade social no país, caracterizando

a crise urbana brasileira. Grazia e Rodrigues (2003) destacam que “de 1980 a 1990, a

população que vivia em favelas passa de 2.248.336 para 5.020.517”. Dados do Censo

Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que, no ano

de 2010, a população residente nos chamados aglomerados subnormais5 era de 11.425.644,

número que representava 6% da população brasileira.

A cultura patrimonialista existente na sociedade, atrelada à ausência de políticas

socioeconômicas e urbanas, segregou e impeliu a população pobre à marginalidade da cidade

ilegal, onde as carências urbanas são muito evidentes, fator que compromete as condições de

habitabilidade e dificulta o acesso à cidade formal. Considerando os efeitos da exclusão social

e urbana, fruto dessa mentalidade historicamente construída, que o Ministério das Cidades

recebeu a responsabilidade de viabilizar o desenvolvimento urbano por meio de um

crescimento com equidade e sustentabilidade. (GRAZIA e RODRIGUES 2003; MARICATO,

2006).

5 Aglomerado Subnormal, na conceituação do IBGE, “é um conjunto constituído de, no mínimo, 51 unidades

habitacionais (barracos, casas...) carentes, em sua maioria de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo

ocupado [...] terreno de propriedade alheia (pública ou particular) e estando dispostas, em geral, de forma

desordenada e densa.

25

Um dos obstáculos para a elaboração de políticas públicas que solucionassem os

problemas urbanos era a inexistência de uma integração federativa entre o Governo Federal,

estados e municípios. E o MCidades, na tentativa de estruturação de uma Política Nacional de

Desenvolvimento Urbano (PNDU), teria que buscar o diálogo com a sociedade civil e os

demais entes da federação, a fim de desconstruir o atual modelo excludente de urbanização e

de modificar o quadro de desordem urbana existente no Brasil, que tem como principal fator a

dificuldade no acesso à moradia. Maricato (2006) infere que “somente um pacto social e um

pacto federativo teria a durabilidade, a legitimidade e a eficácia para as transformações

pretendidas”.

O processo de construção da PNDU se deu a partir da realização da primeira

Conferência Nacional das Cidades, realizada no ano de 2003, que contou com a participação

popular, por meio dos delegados eleitos em conferências municipais e estaduais. Na

oportunidade houve a apresentação e discussão de proposições para a formulação da Política

Nacional de Desenvolvimento Urbano. Na primeira conferência nacional foi eleito o

Conselho das Cidades, que estabeleceu as diretrizes e os princípios da PNDU, e quatro

câmaras técnicas que começaram as suas atividades em 2004. Além de aprovar propostas de

origem popular para as áreas de habitação, saneamento ambiental, trânsito, mobilidade e

transporte urbano, o Conselho aprovou a Campanha Nacional pelos Planos Diretores

Participativos, entre outros assuntos. Essa construção de novos arranjos institucionais de

diálogo entre governo e sociedade passaria a permitir a gerência dos conflitos e a construção

de consensos no que se refere formulação de políticas públicas que visassem reverter o atual

quadro de exclusão social e urbana. (MARICATO, 2006; NACIMENTO et al., 2008).

A questão do acesso à moradia, considerada por Maricato (2006) o cerne da desordem

urbana, foi um dos destaques da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, tanto é que

em junho de 2005 foi sancionada pelo então presidente Lula, a Lei nº 11.124 que criou o

Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) e o Sistema Nacional de Habitação

de Interesse Social (SNHIS). O FHNIS6 e o SNHIS surgiram após a integração da política

habitação à política urbana, e foram vinculados ao Conselho Nacional das Cidades.

(NACIMENTO et al., 2008).

6 Segundo Nascimento et al. (2008), “O FNHIS é o principal instrumento para implementação da política de

habitação de interesse social e seu Conselho Gestor tem caráter deliberativo e é composto de forma paritária por

entidades do poder público e representantes da sociedade civil, todos pertencentes à representação do Conselho

Nacional das Cidades.”

26

A dificuldade de acesso à moradia e à terra regularizada e urbanizada obriga uma

parcela da população brasileira a viver em áreas de risco, que são caracterizadas por

ambientes insalubres e impróprios para a habitação. Um dos fatores que ajudam a reforçar

essa exclusão é a subutilização de edificações que poderiam servir de moradia para esse

contingente populacional. As grandes cidades, mais especificamente em suas áreas centrais,

têm números consideráveis de imóveis ociosos e subutilizados, reforçando a constituição da

cidade ilegal, o que acarreta em diversos problemas de ordem urbanística e social.

Na tentativa de dirimir os problemas causados pela crise urbana, o MCidades busca

dar prioridade, dentro da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, ao planejamento

territorial urbano e à política fundiária dos municípios brasileiros, tendo como norte o

disposto na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto das Cidades. Para isso foi criada a

Secretaria Nacional de Programas Urbanos (SNPU), órgão integrante do Ministério das

Cidades que tema missão, segundo Rolnik (2006), de “mudar a agenda do planejamento e

gestão do solo urbano que, na maioria das cidades brasileiras, sempre esteve mais voltada

para a cidade formal, raramente dialogando com os mercados de baixa renda”. Considerando

que a Constituição Federal de 1988 responsabiliza os municípios brasileiros pela gestão do

solo urbano, a SNPU apoia e fomenta as ações municipais em duas frentes de ações: as

curativas e as preventivas (ROLNIK, 2006).

A atuação da Secretaria Nacional de Programas Urbanos foi pensada no intuito de

regularizar a situação dos assentamentos precários, como também de evitar que novos

territórios ilegais surgissem nas cidades. Para além da questão fundiária, a SNPU atuou

também na questão da preservação do patrimônio cultural e ambiental, por meio do incentivo

à utilização das edificações já existentes, da reabilitação e democratização das áreas urbanas

ocupadas, subutilizadas e degradadas. Para atingir os objetivos iniciais, foram criados quatro

programa nacionais no âmbito do Ministério das Cidades: Fortalecimento da Gestão Urbana,

Programa Papel Passado, Programa de Prevenção da Ocupação de Áreas de Risco e o

Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais (idem, 2006).

1.2. Um novo olhar sobre o planejamento urbano no Brasil por meio da Política de

Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais.

No Brasil, a partir do ano 2000, o Governo Federal começou uma série de iniciativas

para a revitalização dos centros históricos nas cidades brasileiras, inspirado, possivelmente, na

27

agenda internacional que colocou em voga, na década de 1990, a ideia de reutilização dos

centros tradicionais das cidades, na tentativa de estimular a competitividade das mesmas. Essa

mudança no alvo do planejamento urbano internacional se explica pela mudança no perfil e

no papel da economia urbana dos países e pelo desejo de pertencimento à rede de cidades

globais, por meio da renovação das infraestruturas, principalmente as ligadas às redes de

tecnologia de ponta, contribuindo para a construção uma imagem de cidade contemporânea e

moderna, ao mesmo tempo (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004).

Nesse contexto de mudanças nas dinâmicas urbanas internacionais, a Caixa

Econômica Federal implantou o Programa de Revitalização de Sítios Históricos (PRSH) e o

Ministério da Cultural o Programa Monumenta, que era financiado com recursos do Banco

Interameticano de Desenvolvimento (BID) e do Governo Federal (com contrapartidas dos

municípios) e objetivava a restauração de imóveis integrantes de sítios históricos e criar ações

de fortalecimento institucionais dessas práticas, como o apoio à atualização de legislação

urbana, treinamento com equipes das prefeituras, formação de mão de obra para desempenhar

os trabalhos de restauração dos equipamentos e o incentivo às atividades econômicas. O

PRSH tinha a sua atuação focada em áreas consideradas patrimônio histórico e cultural e

procurou desenvolver parcerias para a reabilitação de edifícios para fins habitacionais. (idem,

2004).

Apesar das iniciativas dos programas supracitados, o Brasil não tinha uma política

nacional de reabilitação urbana, que só passou a ser pensada a partir da criação do Ministério

das Cidades no governo do ex-presidente Lula. Mas, antes de começarmos a falar sobre os

programas de reabilitação urbana pós-MCidades, é preciso, a priori, compreendermos o

conceito de reabilitação e as características que a diferenciam de outros tipos de intervenções

urbanas, como é o caso da revitalização e da requalificação. Em determinados casos, esses

termos chegam a ser confundidos, porém, segundo alguns autores, cada um deles, apesar das

similaridades, tem características específicas.

A partir da década de 1960, os projetos urbanos em locais construídos passaram a

reconhecer e dar importância ao valor histórico e cultural existente, fazendo um contraponto

às intervenções de períodos anteriores, que visavam tão somente a expansão urbana e a

substituição de usos de alguns territórios edificados. Esse novo método de intervenções no

espaço urbano ocasionou o surgimento de terminologias para caracterizar as ações realizadas

28

nos espaços urbanos. São elas requalificação, revitalização e reabilitação (VARGAS e

CASTILHO, 2009).

No campo da conceituação dos referidos termos, temos as cartas patrimoniais, que

surgiram ainda no século XX, oriundas de discussões internacionais entre Nações sobre a

preservação da memória e dos patrimônios históricos. Dessas discussões, também surgiram

instituições internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização das

Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), além de outras

organizações de luta pela preservação cultural (CALDAS e SANTOS, 2013). A Carta de

Lisboa7 (1995), fruto do 1º encontro Luso-Brasileiro

8 sobre o tema, conceitua Reabilitação

Urbana como um modelo estratégico de gestão urbana que deve priorizar o Homem,

centrando nele as suas preocupações, a fim de melhorar qualidade de vida nos Centros

Históricos, mantendo a identidade e as características locais:

Reabilitação urbana – É uma estratégia de gestão urbana que procura requalificar a

cidade existente através de intervenções múltiplas destinadas a valorizar as

potencialidades sociais, económicas e funcionais a fim de melhorar a qualidade de

vida das populações residentes; isso exige o melhoramento das condições físicas do

parque construído pela sua reabilitação e instalação de equipamentos,

infraestruturas, espaços públicos, mantendo a identidade e as características da área

da cidade a que dizem respeito (CARTA DE LISBOA, 1995 apud SOUSA E

KRUSE, 2012).

Ermínia Maricato (2001, p. 126), concordando com a referida carta patrimonial,

considera que a reabilitação “preserva, o mais possível, o ambiente construído existente”,

porém adaptando-o a uma nova realidade, possibilitando que as características locais

permaneçam e que não haja o rompimento da relação pessoa-lugar, considerando que os

maiores interessados no processo de reabilitação são os moradores locais.

A definição acima nos permite fazer a diferenciação entre reabilitação, requalificação

e revitalização. Esta última tida como ação para dar nova vida econômica e social a

determinadas localidades com atividades em declínio, mas sem o compromisso de manter a

identidade e características locais, contrapondo-se à reabilitação, que pensa as dimensões

7 A Carta de Lisboa (ou Carta de Reabilitação Urbana Integrada), elaborada no primeiro encontro luso-brasileiro,

é um documento que dispõe sobre as definições de conceitos de alguns tipos de intervenções urbanas, como

também os princípios norteadores das ações urbanísticas nos países de Portugal e Brasil. 8 O 1º Encontro Luso-Brasileiro aconteceu em Lisboa, no ano de 1995, e foi resultado de duas reuniões entre

especialistas portugueses e brasileiros, realizadas anteriormente em Lisboa, em 1993, e no Rio de Janeiro, em

1994.

29

econômicas, sociais e funcionais em conjunto, mantendo vivos os aspectos de origem

(SOUZA e KRUSE. 2012 p. 19).

Quanto ao termo requalificação, Souza e Kruse (2012) discordam do conceito definido

pela Carta de Lisboa, que considera a sua aplicação em lugares próprios da habitação,

promovendo atividades ligadas a esses lugares. As autoras consideram que qualquer área

debilitada pode ser requalificada, independe das especificidades funcionais desempenhadas.

Consideram ainda que “a requalificação tem, assim, um significado mais geral, podendo

abrigar os dois tipos de intervenções: revitalização e reabilitação” (idem, 2012).

Existem algumas especificidades na reabilitação urbana, entre elas o diálogo entre

governo e sociedade civil e a integração de ações e organismos governamentais. O contato

com a população se faz pertinente tendo em vista que a reabilitação de bairros antigos não

deve modificar a composição social dos habitantes nem a do tecido urbano, e deve

proporcionar que todas as camadas sociais sejam beneficiadas pela intervenção realizada

(Carta de Amsterdã, 1975)9. Para isso, considera-se que a participação popular nos processos

de formulação, execução e avaliação dos planos, programas e projetos que causem impacto na

vida das pessoas seja de forma efetiva e eficaz.

Ainda no campo das conceituações dos tipos de intervenção, tem-se a renovação

urbana, que Maricato (2001, p. 126) considera a mais ofensiva ao desenvolvimento sócio

espacial, Ela infere que “na renovação ganha importância o grande capital imobiliário –

promotores, construtores, financiadores – e os proprietários imobiliários privados.” Fato este

que agrava o sistema excludente existente nas grandes cidades.

A expansão e o crescimento do espaço urbano nas últimas décadas causou, segundo

Vargas e Castilho (2009), o “processo de deterioração/degradação” dos centros, ocasionando

a necessidade de intervenção, seja por reabilitação, revitalização ou requalificação. Alguns

comportamentos que podem explicar a necessidade de intervir são o surgimento de outros

centros mais competitivos, fomentando a concorrência e promovendo a migração dos

moradores, principalmente os de classe média, devido à política habitacional de construção de

novas unidades habitacionais em detrimento da utilização dos imóveis existentes e que estão

relegados à ociosidade, dos comerciantes (formais ou informais) e das atividades mais

9 A Carta de Amsterdã foi fruto do Congresso de Amsterdã, realizado em 1975, celebrado por ocasião do Ano

Europeu do Patrimônio Arquitetônico, que ratificou a arquitetura europeia como patrimônio comum de todos os

seus povos e do mundo.

30

rentáveis para essas novas centralidades, acarretando o abandono e a periferização do lugar

inicial.

Considerando o caráter da reabilitação urbana, marcado pela existência de ações

integradas que visam, além do equilíbrio social e urbano, o desenvolvimento econômico das

localidades reabilitadas, podemos dizer que esse modelo de intervenção objetiva, também,

quebrar o paradigma de que reabilitar significa deslocar a população pobre para as áreas

periféricas sem condições de habitabilidade. Rolnik (2006) infere que “o desafio de reabilitar

os centros como estratégia de ampliação do espaço de urbanidade para todos é […] de enorme

complexidade”. Na mesma linha de pensamento de Rolnik, Choay (1988) entende que a

reabilitação urbana é mais do que realizar simples melhorias pontuais nos tecidos urbanos, e

sim um trabalho mais bem planejado e meticuloso, o que desestimula os governos, devido às

possíveis dificuldades que podem ser encontradas no período de elaboração e execução dos

planos (ROLNIK, 2006; CHOAY e MERLIN, 1988, p. 573).

O Governo Federal do Brasil, por meio do Ministério das Cidades, criou, no ano de

2003, o Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, dentro da Política Nacional de

Desenvolvimento Urbano, que objetivou dar suporte técnico e financeiro os municípios

brasileiros na elaboração de planos para reabilitação urbana de áreas centrais, seguindo os

princípios e diretrizes do Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001) e em consenso com

os Planos Diretores Municipais, haja vista as especificidades de cada município. Os planos

visavam à melhoria da qualidade de vida nos centros urbanos das cidades, incentivando a

habitação nessas áreas com a permanência dos atuais moradores e a atração de novos

habitantes das diferentes classes sociais, além de estimular a diversidade funcional na busca

pelo desenvolvimento econômico, social e cultural. Pode-se quer que se buscava, também, a

quebra do estigma que de que as intervenções urbanísticas tinham como objetivo apenas

favorecer o turismo e o entretenimento.

Em geral, nos municípios brasileiros, as áreas centrais são formadas pelos bairros mais

antigos das cidades, que configuram os “Centros Históricos”. Esses bairros têm, geralmente,

diversas funcionalidades que vão desde a habitação até a oferta de comércio e serviços. Com

o passar dos anos, novas dinâmicas foram surgindo, provocando modificações nos fluxos

sociais dessas áreas, promovendo, em determinados casos, fenômenos como a degradação e

subutilização das estruturas físicas, causando prejuízo ao patrimônio histórico e arquitetônico;

o esvaziamento populacional, tanto no que diz respeito à habitação, quanto no tocante a

31

utilização dos serviços que outrora eram oferecidos, fazendo com que, nos períodos noturnos,

os centros fiquem abandonados.

Segundo o Ministério das Cidades, a Política Nacional de Reabilitação de Áreas

Urbanas Centrais partiu da hipótese de que reabilitar consiste no processo de devolver aos

cidadãos o direito de ter acesso à terra urbanizada e à cidade legal. Ainda de acordo com o

MCidades (2004):

[...] a política de reabilitação urbana deverá promover a diversidade de usos e de

atividades voltadas para o desenvolvimento urbano, social e econômico,

compreendendo a reutilização de edificações ociosas, de áreas vazias ou

abandonadas, subutilizadas ou insalubres, bem como a melhoria da infraestrutura,

dos equipamentos e dos serviços urbanos.

A Secretaria Nacional de Programas Urbanos (SNPU) definiu os princípios e diretrizes

do Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, que consistia, entre outros tópicos,

na priorização da gestão democrática das cidades, objetivando promover uma nova relação

dos governos locais com a sociedade no que se refere ao planejamento participativo da gestão

urbana e a inclusão socioespacial; a garantida do direito à cidade e à propriedade; a interação

intergovernamental entre os demais níveis de governo e instituições públicas e privadas;

promover a conservação do patrimônio construído (cultural e ambiental); fortalecer o vínculo

da população com o bairro onde residem, a fim de aumentar a coesão e a diversidade social;

reduzir o déficit habitacional por meio da recuperação e ocupação dos imóveis vazios; dar

apoio à inclusão e permanência da população de baixa renda no bairro reabilitado; e estimular

o desenvolvimento de atividades econômicas para fins de desenvolvimento e geração de

emprego e renda. Em suma, princípios que, se postos em prática, ajudariam a promover a

inclusão socioespacial e o desenvolvimento urbano com equidade.

32

2. O MUNICÍPIO DO NATAL E A CONSTITUIÇÃO DO SEU CENTRO

HISTÓRICO

Observando o desenvolvimento da cidade do Natal desde a sua fundação, em 1599,

pode-se inferir que a história social, econômica, política e urbana da cidade se explica na

narrativa do seu Centro Histórico. Luís da Câmara Cascudo (1999), relatou que “o chão

elevado e firme” onde Natal foi plantada é hoje a praça André de Albuquerque, no bairro

Cidade Alta, que compõe, junto com o bairro da Ribeira, o Centro Histórico do Natal. A

Cidade Alta concentrou o núcleo do poder religioso, administrativo e residencial da capital

potiguar, representado pela primeira igreja de Natal, a Matriz de Nossa Senhora da

Apresentação, e pelos palácios Potengi (que foi sede do Governo Estadual até a década de

1980) e Felipe Camarão (sede da Prefeitura Municipal até os dias de hoje). O bairro da

Ribeira, considerado a parte baixa de Natal, concentrou até meados dos anos 1860 as

atividades comerciais e de trânsito de pessoas que chegavam e saíam da cidade (IPHAN,

2010). A partir de 1870, com a transferência temporária da sede da administração provincial

para a Ribeira, o bairro começou a receber os fluxos antes pertencentes ao alto da cidade.

No contexto do desenvolvimento urbano, Natal ficou estagnada até meados dos anos

1900, tendo em vista que o seu território era restrito aos bairros da Ribeira e Cidade Alta. Esse

início tardio e lento de crescimento urbano explica a expressão urbanística da cidade, que tem

em algumas áreas ainda preservadas características do século XX. Entre 1903 e 1904, uma

grande seca castigou a população do estado, que na tentativa de fugir dos efeitos severos da

estiagem, migrou para Natal, causando, nos anos subsequentes, um boom demográfico10

considerável na cidade. Esse aumento populacional motivou o surgimento de novos territórios

habitacionais, entre eles áreas bastante precárias.

Já no início dos anos 1900, a expansão de Natal começou a ser pensada. O Master

Plan da Cidade do Natal (ou Plano Cidade Nova) previa surgimento de um terceiro bairro,

que hoje compreende os territórios dos bairros Tirol e Petrópolis. Esse novo bairro viria

formar um novo modelo de cidade, fazendo um contraponto aos dois primeiros bairros, em

especial ao da Ribeira, que na visão das autoridades locais representava o que havia de pior

para uma cidade: poluição, proliferação de doenças e desordem urbana. Pensado também para

abrigar a classe política dominante que procurava meios para se distanciar da situação

10

De acordo com o IBGE, entre nos anos 1900 e 1920, a população de Natal aumentou de 16.056 para 30.696.

33

precária11

que tomou conta da parte baixa da cidade, o que caracterizou um dos primeiros

fenômenos de segregação socioespacial, foi fator determinante para a primeira crise da

Ribeira, devido à descentralização das áreas no seu entorno (CASCUDO, 1999; SILVA,

2002; NASCIMENTO, 2012).

A cidade do Natal, que ainda em meados dos anos 1920 ainda respirava os ares do

século XVIII, só se direcionou para o caminho do século XX quando Omar O’Grady, com

suas tendências europeias e americanas no setor urbanístico (SOUZA, 2008), chegou à

presidência da Intendência Municipal em 1924. O governo O’Grady marcou uma nova fase

do desenvolvimento urbano da cidade, “caracterizada pela intensificação e sistematização de

ações reformadoras” (SIQUEIRA, 2012).

Segundo Cascudo (1999, p.149):

O aterro colonial foi lentamente sendo substituído por pedras soltas, empedrado,

trilha, calçada, paralelepípedo. Várias vezes o aclive foi rebaixado. A história

termina quando o prefeito Omar O’Grady venceu o barro, tirou as pedras e vestiu a

ladeira com o calçamento que resiste a tempo, água e esquecimento.

O prefeito Omar O’Grady pôs Natal no caminho do século XX. Estava no XVIII

[grifo do autor].

Além do projeto Master Plan (1903), do arquiteto Antônio Polidrelli, outros projetos

foram contribuindo para a expansão de Natal a partir dos bairros Ribeira e Cidade Alta, entre

eles o “Plano Geral de Systemização de Natal”, elaborado na gestão do então prefeito Omar

O’Grady em 1929. O referido plano visava ampliar os acessos aos bairros vizinhos como

Rocas, Alecrim, Cidade Nova, e às praias do Meio e Areia Preta. (MEDEIROS e LUNA,

2012). A ideia de sistematizar a cidade consistia também em controlar o crescimento

desordenado do espaço urbano por meio do zoneamento, dividindo a cidade em bairros com

especificidades diferentes (comercial, operário, jardim e residencial), além de planejar um

porto, um aeroporto e vias de tráfego humano para que as pessoas pudessem transitar sem

qualquer congestionamento. Porém, apesar de todo o planejamento do arquiteto italiano

Giácomo Palumbo, que assinou o projeto, e do empenho do prefeito O’Grady, o plano não

11

Segundo Cascudo (1999) além da ocupação dos retirantes migrados para Natal por ocasião da seca no estado,

o ambiente insalubre que tomara conta da Ribeira devido à situação caracterizada pelo então presidente Casimiro

José de Morais Sarmento (1847) como “pântano da campina da Ribeira” que proliferavam enfermidades e outros

males, afastou a classe dominante.

34

implementado integralmente. Segundo Souza (2008) “a Revolução de 1930, que tirou do

poder os idealizadores deste plano, impediu a sua [...] implementação”.

Com a abertura da malha viária e a ocupação de outros territórios nos quais foram

surgindo novos bairros e centralidades, a cidade antiga, representada pela Cidade Alta e

Ribeira, foi relegadas à perda de fluxos e dinâmicas dos anos anteriores. Como parte desse

abandono gradual dos primeiros bairros que compuseram Natal, o Centro Histórico começou

a adquirir características e problemáticas de outros centros urbanos do mundo, entre elas a

deterioração física. (SILVA, 2002; NASCIMENTO, 2012).

Outro período importante para o traçado da história de Natal é o da Segunda Guerra

Mundial (1939-1945), quando ela se transformou em base militar dos Estados Unidos da

América e cerca de 10 mil soldados norte-americanos se instalaram na cidade. Juntos às

tropas norte-americanas vieram o crescimento e a modernização por meio dos investimentos

em infraestrutura naval, vilas militares e abertura de estradas, uma delas interligando a capital

potiguar ao município de Parnamirim, que serviu como eixo norteador para o crescimento

urbano de Natal. Essa nova dinâmica fez com que um grande contingente de pessoas migrasse

para a cidade na busca por oportunidades de emprego, ocasionando um forte aumento

populacional na cidade:

A população da cidade que era cerca de 55 mil habitantes em 1940, foi acrescida, em

1942, de mais 10 mil pessoas, só de militares norte-americanos. A estes somaram-se

militares brasileiros das três armas. E um grande contingente de migrantes atraídos

pelas possibilidades de conseguir trabalho nas obras das instalações militares e

complementares, que estavam em andamento, ou expulsos dos sertões por causa da

seca [...] Entre 1941 e 1943 a população de 55 para 85 mil habitantes [...] Em 1950 a

população de Natal já era de 103 mil habitantes. (LIMA, 1998, p. 95 apud BORBA,

2007).

Todas essas transformações físicas, sociais e econômicas que acometeram Natal

durante décadas influenciaram na formação e no destino do seu Centro Histórico. Esses

acontecimentos tiraram do núcleo central inicial de Natal as suas características iniciais e têm

reflexos negativos até os dias de hoje, principalmente no que se refere ao bairro da Ribeira. A

área que deu origem à cidade do Natal sofreu com o impacto do desenvolvimento

desordenado da cidade e do mau planejamento da administração pública. A fim de viabilizar

alternativas para a reversão desse quadro de abandono e descaso, em 1990 a então prefeita

35

Wilma Maria de Faria Maia sancionou a Lei municipal nº 3.942, que definiu a Zona Especial

de Preservação Histórica (ZEPH) (Mapa 1) que abrange os bairros Ribeira e Cidade Alta.

Mapa 1 - Zonas Especiais (ZEP e ZEPH)

Fonte: SILVA, 2002.

A Zona Especial de Preservação Histórica dispõe sobre a preservação do patrimônio

histórico da cidade do Natal, que é constituído, segundo a referida lei, de “prédios, sítios

notáveis de valores históricos, arquitetônicos e paisagísticos” (NATAL, 1990). A partir de

então houve a viabilidade e embasamento legal para a elaboração de projetos de revitalização

das áreas que fazem parte da ZEPH.

36

2.1. O bairro da Ribeira como Centro Urbano Histórico: seus limites e desafios.

O Centro Urbano não é uma realidade simples. A sua formação está intrinsecamente

ligada a uma série de movimentos de forças centrípetas, que por meio da ação coletiva ou

individual do homem centraliza em determinadas áreas urbanas as suas atividades econômicas

e sociais (SILVA, 2013). A relação com o conjunto da cidade também interfere na

constituição do centro, a partir da ideia de que a capacidade de agrupamento de fluxos e

dinâmicas depende da realidade da urbe12

.

Dentre os autores que abordam a questão dos Centros Urbanos, Henri Lefebvre (1999)

destaca-se ao defender a ideia de que os centros concentram ao redor de si o vazio. A

centralização das atividades em apenas um espaço torna o centro um lugar segregado do resto

da cidade. No entanto, ele também defende que qualquer lugar no tecido urbano pode se

tornar um espaço de convergências e de interações sociais, ou seja, um lugar foco da

concentração de fluxos e fixos que pode ser ocupado até o seu limite.

O centro urbano é preenchido até a saturação; ele apodrece ou explode. Às vezes

invertendo seu sentido, ele organiza em torno de si o vazio, a raridade. Com mais

frequência, ele supõe e propõe a concentração de tudo o que existe no mundo, na

natureza, no cosmos: frutos da terra; produtos da indústria; obras humanas, objetos e

instrumentos, obras e situações, signos e símbolos. Em que ponto? Qualquer ponto

pode tornar-se o foco, a convergência (LEFEBRVE, 1999, p 44).

Entretanto, é interessante destacar que este processo de centralização de tudo que se

possa imaginar destina os centros urbanos, com o passar do tempo, ao enfraquecimento da sua

centralidade. Nas palavras de Henri Lefebvre (1999): ao apodrecimento.

Vasconcellos e Vaz (2012) também colocam o centro como o núcleo do crescimento

urbano das cidades, bem como destacam as características desses serem grandes

concentradores de atividades relativas ao setor de serviços. Ainda segundo as autoras, dentro

do recorte das áreas centrais há também outras urbanidades e particularidades, destacando-se

os centros históricos, que abarcam uma simbologia e uma das dimensões culturais das

cidades.

12

Do latim Urbs, que quer dizer Cidade.

37

Vargas e Castilho (2009, p. 2) têm sua compressão sobre o conceito de centro urbano

na mesma linha dos outros autores. Elas afirmam que:

A noção de centro urbano, como ponto para o qual convergem os trajetos ou as

ações particulares que facilita o encontro, o descanso e o abastecimento, definindo-

o, historicamente, como o lugar das trocas comerciais, conduz ao conceito de centro

de mercado. Agregando-se a este último outras atividades urbanas, como religiosa, a

de lazer, a política, a cultural, as atividades financeiras e as de comando [...]

Partindo do princípio das considerações dos autores supracitados, e observando as

características que compõe o bairro da Ribeira desde a sua origem, podemos inferir que este

se caracteriza como um Centro Urbano, e que hoje está alinhado às problemáticas que

atingem outros centros no mundo: a deterioração do patrimônio construído, o

enfraquecimento das atividades econômicas, o abandono no período noturno e o esgotamento

habitacional, mesmo o bairro nunca tido grande número de moradores13

.

A Ribeira mantém até os dias de hoje as características que adquiriu ainda na metade

do século XIX, quando as atividades comerciais de Natal eram concentradas no bairro. Entre

armazéns, hotéis e teatros, a área consolidou-se como um marco para a história e o

desenvolvimento de Natal. Segundo Cascudo (1999, p. 155) “a Ribeira conservou os grandes

hotéis da época, as casa comerciais, armarinhos, alfaiates, farmácias, clubes de danças, o

primeiro cinematógrafo da cidade, o Politeama”. Todos esses atributos foram potencializados

a partir construção do Porto de Natal que impulsionou o desenvolvimento urbano do bairro e

o consolidou como um centro comercial.

O potencial da Ribeira foi mantido até o período da segunda guerra mundial, quando a

cidade foi invadida por soldados e migrantes e se expandiu nos aspectos populacional,

territorial e econômico. Após a guerra, o bairro começou a entrar em declínio das suas

atividades comerciais e econômicas. Souza (2008, p. 247) relata que “com o desaparecimento

dos dólares americanos, muitos comerciantes foram embora de Natal”. Além disso, a

proibição das importações durante o governo Getúlio Vargas prejudicou a movimentação no

porto, causando a transferência dos bancos e firmas para a Cidade Alta, relegando a Ribeira a

um processo de esvaziamento.

Na década de 1960, com a Ribeira já em processo de ofuscamento, o então prefeito

Djalma Maranhão (1960-1964) iniciou um debate sobre a definição do local para a construção

13

Evolução populacional no bairro da Ribeira: ano 2000: 2.110 habitantes; ano 2010: 2.222 habitantes; ano

2012: 2.231 habitantes. (ANUÁRIO NATAL, 2013).

38

de um terminal rodoviário na capital. Essa discussão veio à tona devido ao início do processo

de desenvolvimento da indústria automobilística brasileira durando o governo do ex-

presidente Juscelino Kubistchek (1956-1960). Os grandes centros urbanos do Brasil passaram

a receber considerável número de viajantes que partiam de ônibus do interior para as capitais.

Em Natal, o local escolhido para abrigar a Estação Rodoviária (Figura 1) foi o bairro da

Ribeira, mais precisamente na Praça Augusto Severo. De acordo com Souza (2008) essa foi

uma tentativa – um pouco exitosa14

, diga-se de passagem – de revitalizar o bairro.

Figura 1 - Estação Rodoviária de Natal (década de 1980).

Foto: ANUÁRIO NATAL, 2013.

No entanto, na década de 1970, surgiram alguns conjuntos habitacionais na cidade,

abrindo caminho para a formação de novas centralidades, acarretando, assim, na

descentralização comercial da Ribeira. Outro agravante para esta situação foi a transferência

da Estação Rodoviária para a zona oeste de Natal, mais precisamente para o bairro Cidade da

Esperança. Silva (2002, p. 105) afirma que essa mudança “debilitou ainda mais o comercio

atacadista” no bairro. Com a decadência que se instalara na Ribeira, o poder público começou

a pensar alternativas para a reversão desse quadro. A partir de então, uma série de propostas e

marcos legais começaram a surgir no sentido de preservar esse patrimônio chamado Ribeira.

14

De acordo com Souza (2008) a ativação da Rodoviária no bairro da Ribeira fez crescer o fluxo de pessoas na

Praça Augusto Severo, o que acabou atraindo um número considerável que comerciantes individuais.

39

2.1.1. Primeiros passos para a Revitalização Urbana para o bairro da Ribeira

Na década de 1990, começa a se pensar um novo tipo de atuação sobre os centros

tradicionais das grandes cidades do mundo. O cenário globalizado da economia impôs um

planejamento para a agenda internacional da gestão dos centros urbanos. A ideia seria

trabalhar na perspectiva de fortalecer a capacidade competitiva das cidades e atrair

investimentos. Nesse contexto pode-se observar que o município de Natal, no que se refere à

gestão do seu centro histórico, agiu de acordo com a nova agenda mundial proposta. As ações

que visavam intervir no centro antigo da cidade, como poderemos ver a seguir, priorizaram a

restauração da vida econômica da área em questão, deixando de lado o desenvolvimento

social que é intrinsecamente ligado à qualidade de vida nos centros urbanos.

As ações com vistas à revitalização do sítio histórico de Natal tiveram início no

território do bairro da Ribeira. A escolha desse território é explicada por duas razões: o bairro

concentra o maior acervo pertencente ao patrimônio edilício da cidade em condições de ser

recuperado e foi a área que primeiro sofreu com o abandono e a desvalorização por causa dos

efeitos do surgimento de outros centros urbanos mais atrativos e competitivos. Podermos

observar que, com exceção do Programa de Arrendamento Residencial (PAR) – que será

abordado mais à frente – e dos projetos de lei que dispunham sobre a operação urbanizadora

da Ribeira, as ações executadas no bairro priorizaram o embelezamento e o desenvolvimento

econômico, deixando de lado a questão da moradia.

No ano de 1993, iniciou-se, durante o Seminário Ribeira Velha de Guerra, uma série

de discussões em torno da elaboração do Plano Diretor do município do Natal, que foi

sancionado um ano após, em 1994, na gestão do então prefeito Aldo Tinoco15

. Além dessas

discussões, também estiveram na pauta dos debates as ideias de intervenções visando à

preservação e à recuperação do bairro da Ribeira. Participou do seminário a Arquiteta e

Urbanista Raquel Rolnik, que viria a chefiar, anos depois, a Secretaria Nacional de Programas

Urbanos do Ministério das Cidades.

Fruto do seminário, surgiu o projeto Viva Ribeira, o qual deu origem à iniciativa

denominada Fachadas da Rua Chile, que propunha, pela primeira vez, intervenções no

conjunto arquitetônico das edificações de Natal. Ao todo foram recuperadas 45 fachadas de

prédios na Rua Chile (Figura 2). Esse projeto incitou na população natalense o interesse pelo

15

Aldo Tinoco governou o município de Natal entre nos anos de 1993 e 1996.

40

centro histórico da cidade. A partir dele, as ações de intervenção urbanística para a Ribeira

ganharam as atenções dos estudiosos, acadêmicos e interessados no tema.

Figura 2 - Rua Chile, Ribeira, Natal/RN.

Foto: Fábio Pinheiro.

A importância do Fachadas da Rua Chile para o cenário urbano do sítio histórico de

Natal e a ideia inicial de tornar esse projeto um ponto de partida para a elaboração de um

programa de desenvolvimento urbano para a capital potiguar (SILVA, 2002) não impediram a

sua paralisação. A mudança na gestão municipal, que levou Wilma de Faria16

de volta ao

comando do Poder Executivo da cidade, impactou negativamente no andamento do projeto, e

o organismo responsável pela gerência das ações de revitalização urbana na Ribeira foi

desativado, impossibilitando a continuidade da execução. Porém, a nova gestão deu início ao

processo de discussão da Operação Urbana Ribeira que prometeu levar inovações para o

bairro. Vejamos a seguir.

No campo legislativo, leis específicas para a preservação do patrimônio histórico

foram instituídas. Silva (2002, p. 109) afirma que elas foram “os primeiros passos concretos

no tocante à [...] revitalização” da Ribeira. Durante as décadas de 1980 e 1990, foram

16

Wilma de Faria foi prefeita de Natal por duas vezes: a primeira entre os anos de 1989 e 1993; a segunda entre

1997 e 2002 (seu segundo mandato duraria até 2005, mas ela renunciou para disputar o cargo de Governadora do

Rio Grande do Norte).

41

aprovados os seguintes marcos legais: o Plano Diretor de 1984, que estabeleceu as Zonas

Especiais de Natal, mas que só foram regulamentadas nos anos de 1990 (Zona Especial

Portuária – ZEP, lei nº 4.069) e 1992 (Zona Especial de Preservação Histórica – ZEPH, lei nº

3.942); o Plano Diretor de 1994, citado anteriormente, estabeleceu os bairros Cidade Alta e

Ribeira como áreas de Operação Urbana, e em 1997, com a aprovação da lei nº 4.932

(Operação Urbana Ribeira – OUR), o disposto no PD de 1994 foi regulamentado.

A OUR de 1997 compreendia um conjunto de ações integradas coordenadas pela

Prefeitura Municipal do Natal em parceria com os demais níveis de governo e a sociedade

com vistas à revitalização urbana do bairro da Ribeira (NATAL, 1997). Era, talvez, a

possibilidade de retomada, doravante de forma mais bem estruturada e ampliada, da gestão do

centro histórico da cidade, desta vez com um diferencial: a preocupação com a questão da

moradia estava presente.

O art. 2º da Lei nº 4.932/1997 estabelece quais são os objetivos da Operação Urbana

Ribeira:

Art. 2º - A Operação Urbana Ribeira tem como Objetivos a promoção do

desenvolvimento urbano, a melhoria da qualidade de vida dos seus moradores e

usuários, o incentivo ao uso residencial, às atividades turísticas, culturais e artísticas,

a valorização do patrimônio histórico, artístico, cultural, arquitetônico e urbanístico,

mediante a melhoria da infraestrutura local e da qualidade ambiental da área.

O proposto pela OUR estava alinhado às necessidades do bairro, porém, como exposto

por Silva (2002), as ações iniciadas pela Operação Urbana Ribeira foram paralisadas e não

tiveram continuidade. Umas das explicações dadas pela Arquiteta da SEMURB Ana Miriam

Machado de S. Freitas (2001) sobre a ineficácia da OUR consiste na afirmação de que não

houve marketing das ações previstas na Lei que, por conseguinte, perdeu fôlego. Ela retala o

seguinte:

[...] falta uma coisa de marketing, uma coisa mais bem explicativa, mais abrangente,

uma coisa mais real, mostrando realmente como é que pode ser feito, mostrando, por

exemplo, numericamente como é que ele [o empresário] pode investir aqui, o

retorno que ele pode ter, eu acho que é mais ou menos por aí [...] (FREITAS, 2001

apud SILVA, 2002, p.121).

42

O relato de Freitas (2001) confirma a incapacidade da gestão municipal da época em

gerir de forma eficaz e eficiente os projetos para a Ribeira. De acordo coma agenda

internacional para as intervenções nos centros urbanos, a estratégia do marketing está ligada

às políticas de revitalização dos centros das grandes cidades e é importante para chamar a

atenção do público que possa, tanto contribui para a valorização da área, quanto para usufruir

dos serviços que outrora pudessem ser oferecidos. Serviços estes muitas vezes inacessíveis a

determinadas camadas sociais.

Observando o cenário da época, podemos identificar que, apesar de uma integralidade

de ações previstas na lei, a busca pelo desenvolvimento econômico foi posta em primeiro

lugar. Uma crítica feita à Operação Urbana Ribeira e ao modo da Prefeitura do Natal enxergar

a revitalização do bairro diz respeito à priorização do capital no processo de revitalização.

Silva (2002) afirma que:

Identificamos nessa realidade específica dois pontos que merecem destaque: o

primeiro se refere ao errado entendimento [grifo do autor] de que o capital,

necessariamente, revitalizará a área; e o segundo diz respeito ao equívoco de reduzir

a revitalização urbana ao aspecto econômico, ou, simplesmente, acreditar que o

processo deva iniciar por ele. Tal fato é preocupante, pois [...] atrair capital privado a

uma determinada área sem mecanismos de controle pode gerar resultados

urbanísticos conflituosos e negativos. (SILVA, 2002, p. 121-122).

Ainda em 1997, destacou-se o Projeto Djalma Maranhão, instituído pelo Decreto nº

6.108/1997, que também proporcionava incentivos fiscais às atividades culturais na cidade. O

Decreto não se tratou de uma legislação específica para centros históricos, mas de certa

maneira também poderia beneficiar o bairro da Ribeira.

Outra medida institucional de relevância para a preservação do sítio histórico de Natal

foi a criação, em 1999, do Setor de Patrimônio Histórico, Arquitetônico e Arqueológico

dentro da estrutura administrativa da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo. O

setor foi responsável por desenvolver estudos e projetos urbanísticos para Natal. Um desses

projetos foi o denominado “Projeto Ribeira: reabilitação urbana”. A SEMURB tentou incluir

o referido projeto dentro dos programas do Governo Federal que disponibilizavam recursos

para intervenções urbanas cujos objetivos eram preservar o patrimônio histórico construído.

Dentre esses programas, destacam-se o Monumenta/BID, o URBIS e Reabilitação do

Patrimônio Cultural Urbano do Ministério da Cultura (MinC).

43

Também vale destacar um projeto que não é da Ribeira, mas que atinge diretamente o

bairro: a ampliação do Porto de Natal, que vem sendo discutida desde meados dos anos 1990

e, segundo a Companhia Docas do Rio Grande do Norte (CODERN), a ampliação visa o

desenvolvimento econômico do estado. Algumas implicações desse projeto, como por

exemplo, a necessidade de espaço para o armazenamento de carga; o aumento do fluxo de

transporte pesado; e o crescimento de atividades ligadas ao transporte marítimo vão de

confronto aos planos da gestão municipal, que, oficialmente, priorizava para a área da Ribeira

atividades relativas ao fomento da cultura, do uso residencial, artístico e áreas afins.

Também é importante frisarmos as iniciativas que partem de fora do âmbito da

administração pública e que tentam, na medida do possível, atrair a população para o bairro.

Isso aconteceu quando da criação, em 2001, da Casa da Ribeira, idealizado pelo grupo teatral

Clowns de Shakespeare. O Espaço Cultural teve apoio da iniciativa privada e foi beneficiado

diretamente pelas Leis nº 8.313/199117

(Lei Rouanet) e nº 7.799/199918

(Lei de Incentivo à

Cultura Câmara Cascudo). Essas iniciativas de fomento à cultura ajudam parte da população a

olhar para a Ribeira numa outra perspectiva. Silva (2002) coloca que “as pessoas vivem em

mundos diferentes, embora compartilhem a mesma localidade [...]. Aquilo que é

agradavelmente antigo para um pessoa é decadente e arruinado para outra.” (WRICHT, 1985

apud SILVA, 2002, p. 115).

Identificou-se na Ribeira, no período de elaboração e execução dos projetos, a

ausência de uma medida fundamental para a efetividade e eficácia dos planos, programas e

projetos gerenciados pela administração pública: a inexistência de mecanismos que

possibilitassem a participação popular. Essa deficiência contrariava a própria lei da Operação

Urbana Ribeira (1997), que previa a participação social por meio do Comitê Gestor. A carta

de Nairóbi coloca participação popular como elemento fundamental para o sucesso das

intervenções urbanas nas cidades: “a participação e a implicação dos habitantes de toda a

cidade são indispensáveis ao sucesso da salvaguarda [...] e nunca se deve esquecer que a

salvaguarda das cidades e bairros históricos respeita, em primeiro lugar, aos seus habitantes”

(UNESCO... 1976 apud SILVA, 2002, p. 118).

Silva (2002) faz uma pertinente observação sobre a gestão pública do município do

Natal:

17

Lei Federal, sancionada pelo Presidente da República em 23 de dezembro de 1991. 18

Lei Estadual sancionada pelo Governador do Estado do Rio Grande do Norte em 30 de dezembro de 1999.

44

A ausência de mecanismos de participação observada nas últimas administrações

municipais vem resultando ações definidas por um grupo de técnicos da Prefeitura

sem o envolvimento de, ao menos, os interessados nas questões do bairro, como

pesquisadores, representantes vinculados a entidades organizadas, entre outros. Tal

resultado certamente compromete o resultado das ações levadas a efeito pela

Prefeitura do Natal [grifo do autor], contrariando a própria lei de Operação Urbana

Ribeira, que prevê a participação da sociedade civil no Comitê Gestor. (SILVA,

2002, p. 119).

O afastamento da gestão municipal da população resultou na realização de ações

desconexas e isoladas que, ao invés de levar o bairro da Ribeira a um novo patamar, o fez

submergir a atual decadência e abandono. O autor destaca que “[...] o êxito de uma operação –

como da envergadura que se propõe o Projeto Ribeira – passa pela participação social, o que

pouco tem acontecido nas gestões municipais de Natal [grifo do autor].” Como embasamento

para a sua afirmação, e justificando a execução de “ações descontextualizadas” desenvolvidas

na Ribeira, Silva (2002) apresenta, também, a afirmação do arquiteto e ex-consultor do

Projeto Ribeira, João M. F de Miranda, que fez o seguinte relato: “existe em Natal um

distanciamento dos administradores públicos e o povo, fato que não existe em lugar nenhum

do mundo.” (MIRANDA, 2000 apud SILVA, 2002).

Com o intuito de incentivar o uso habitacional na Ribeira, a Prefeitura Municipal do

Natal, por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB), iniciou

uma parceria com a Caixa Econômica Federal (CEF) para trabalhar em cima do Programa de

Arrendamento Residencial (PAR) do Governo Federal, que objetivou, por meio do

arrendamento de imóveis novos ou usados, atender a população que tinha renda familiar

mensal de até seis salários mínimos. A prioridade do PAR era a construção de conjuntos

habitacionais em vazios urbanos; a reutilização de edifícios existentes, que era apenas mais

uma das suas frentes de ação, foi insignificante. Contudo, o PAR é considerado um programa

inovador, partindo do princípio de que os projetos anteriores eram apenas no intuito de

preservar o patrimônio histórico (BONATES, 2009).

Apesar da atuação da Prefeitura do Natal em revitalizar o seu centro histórico pelas

mais diferentes vias, foi só a partir da criação do Ministério das Cidades, em 2003, e da

construção coletiva de uma Política Nacional de Desenvolvimento Urbano que a cidade

passou a ter como base para os seus projetos destinados ao sítio histórico, diretrizes nacionais

que visavam à execução de ações integradas com o foco na inclusão social e urbana.

45

3. A NOVA POLÍTICA DE GESTÃO DOS CENTROS URBANOS APLICADA

AO BAIRRO DA RIBEIRA

A criação do Ministério das Cidades, como elucidado no primeiro capítulo deste

trabalho, foi um divisor de águas para a política urbana brasileira. Adotou-se, a partir de

então, um novo modelo de gestão das cidades, em especial dos centros urbanos, que

contemplava, entre outras coisas, a priorização da gestão democrática e da habitação de

interesse social. Em Natal não foi diferente. Começou-se a formular uma agenda que

contemplava a política habitacional e a recuperação urbanística do centro histórico nos

moldes das diretrizes e princípios da Política Nacional de Reabilitação Urbana de Áreas

Centrais, gerenciada pela Secretaria Nacional de Programas Urbanos.

A orientação da nova política do Governo Federal era, entre outros aspectos,

democratizar o acesso à cidade; aperfeiçoar o uso da infraestrutura e serviços públicos

existentes; atuar de maneira a reabilitar os imóveis ociosos e utilizá-los para fins

habitacionais, indo na contramão de antigas propostas que visavam a construção de novas

moradias; e promover a diversidade social e funcional das áreas reabilitadas (BONATES,

2009).

Algumas ações com vistas à reabilitação das áreas centrais, com foco na reutilização

do acervo construído, foram viabilizadas por meio do Programa de Arrendamento Residencial

(PAR), citado anteriormente, e outras com recursos próprios do Orçamento Geral da União

(OGU). Pode-se citar dois exemplos, ambos no município de Natal/RN: o Programa

ReHabitar em Natal, financiado pelo PAR, e o Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas

Centrais (PRAC/Ribeira), financiado pelo OGU. Essas duas propostas estavam alinhadas à

nova política de gestão dos centros urbanos.

No caso de Natal, além do ReHabitar e do PRAC/Ribeira, existem dois atos

normativos que dispõem sobre a política e o planejamento urbano do município. São eles a

Lei Complementar nº 79, de 05 de Janeiro de 2007 (segunda versão da Operação Urbana

Ribeira) e a Lei Complementar nº 82, de 21 de Junho de 2007 (Plano Diretor). Ambas as leis

abordam o território do bairro da Ribeira, foco dos dois projetos supracitados, e definem um

novo modelo de zoneamento que “privilegia o controle de densidade e pressupõe a mistura de

usos” (NATAL, p. 14, 2010).

46

3.1. A Operação Urbana Ribeira e o Plano Diretor de Natal

A legislação urbanística que passa vigorar em Natal a partir do ano de 2007 consiste

em dois instrumentos normativos: a Lei de Operação Urbana Ribeira – OUR (Lei

Complementar nº 79/2007) e o Plano Diretor de Natal – PDN (Lei Complementar nº

082/2007), sendo esta primeira o instrumento de ordenamento urbano que tem como principal

objetivo aumentar a densidade populacional e recuperar o ambiente de urbanidade

exclusivamente do bairro da Ribeira. Atrelada a este propósito, e como meios para consegui-

lo, tem-se a pelo desenvolvimento sócio-espacial e a utilização, para fins de moradia e de

comércio, do acervo edificado existente. Também está na lista de objetivos da OUR a

valorização da identidade cultural e arquitetônica do bairro da Ribeira. O Art. 2º da Lei

Complementar nº 79/2007 define que a Operação Urbana Ribeira:

[...] tem como objetivos a promoção do desenvolvimento urbano, a melhoria da

qualidade de vida dos moradores e usuários, o incentivo ao uso residencial,

comercial e de serviços, às atividades turísticas, culturais e artísticas, a valorização

do patrimônio histórico, artístico, cultural, arquitetônico e urbanístico, mediante a

melhoria da infraestrutura local e da qualidade ambiental do bairro.

Tendo como referência a definição acima, como também o detalhamento de ações que

a referida lei propõe, pode-se inferir que a proposta OUR está em alinhamento com os

princípios e diretrizes da Política Nacional de Reabilitação Urbana, que segundo o Ministério

das Cidades:

[...] deverá promover a diversidade de usos e de atividades voltadas para o

desenvolvimento urbano, social e econômico, compreendendo a reutilização de

edificações ociosas, de áreas vazias ou abandonadas, subutilizadas ou insalubres,

bem como a melhoria da infraestrutura, dos equipamentos e dos serviços urbanos.

(MINISTÉTIO DAS CIDADES, p. 77, 2004).

A Lei nº 079/2007 definiu que as ações da Operação Urbana Ribeira seriam

articuladas entre a Prefeitura Municipal do Natal – sob a coordenação da Secretaria Municipal

de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB) – em parceria com os Governos Estadual e

Federal, e contariam ainda com a participação popular, valorizando a gestão democrática das

cidades, um dos marcos norteadores da Política Urbana instituída pelo Ministério das

Cidades.

47

Para viabilizar o controle sobre a gestão do solo urbano face ao novo contexto da

política urbana existente no país após a criação do Ministério das Cidades, a OUR dividiu o

território da Ribeira em três (Mapa 2) e definiu as funções e especificidades para cada área:

Mapa 2 - Áreas delimitadas pela Operação Urbana (2007) no bairro da Ribeira, Natal-RN.

Fonte: Elaborado pelo autor com base na ferramenta digital Google Earth, 2015.

No quadro abaixo, podemos identificar as características das áreas delimitadas pela

Operação Urbana Ribeira – 2007:

Área de Recuperação Histórica

LEGENDA Área de Renovação Urbana

Área Adensável

48

Quadro 1 - Características das áreas delimitadas pela Lei Operação Urbana Ribeira 2007.

Área de Recuperação

Histórica Área de Renovação Urbana Área Adensável

Localidade do bairro da

Ribeira que guarda sítios e

edificações de importância

histórica, cultural e

arquitetônica, que, em parte,

está coberto pela Zona

Especial de Proteção

Histórica - ZEPH, definida na

Lei 3.942, de 9 de julho de

1990.

Área do bairro da Ribeira que

reúne condições de maior

adensamento, embora com

coeficientes menores do que

na Área Adensável, e

consequentemente otimização

da infraestrutura existente no

bairro.

Refere-se à delimitação da

área de intervenção da Lei

Operação Urbana Ribeira, de

acordo com o Plano Diretor

de Natal - PDN, para o

bairro.

Fonte: NASCIMENTO, 2012.

Não que se refere à Área de Renovação Urbana e à Área Adensável, a Operação

Urbana Ribeira prevê incentivos fiscais19

a fim de incentivar o uso e aumentar o potencial

construtivo. Tem-se o seguinte:

Art. 18 – Para consecução dos objetivos desta Lei são concedidos incentivos fiscais

para realização de investimentos na restauração, recuperação e manutenção do

patrimônio construído e na instalação de atividades produtivas voltadas para o

comércio, turismo, cultura, lazer e uso residencial, localizada, exclusivamente, na

Área de Intervenção da Operação Urbana Ribeira. (NATAL, Lei nº 079, de 04 de

janeiro de 2007).

O que se entende a partir dessa divisão é que a OUR age na perspectiva de conciliar,

no território da Ribeira, os usos referentes à renovação e preservação do bairro. Nascimento

(2012, p. 56) considera que a divisão nessas três áreas consiste em uma “ferramenta

estratégica para o seu uso e sua ocupação” que poderia, de forma planejada, levar o bairro a

um novo patamar dentro das perspectivas da Política Nacional de Reabilitação Urbana.

Um dos entrevistados no decorrer do processo de elaboração deste trabalho foi o

professor João Galvão do Nascimento Neto20

, Arquiteto e Urbanista, que exerceu por mais de

vinte e sete anos a função de técnico de planejamento urbanístico na Prefeitura do Natal,

19

A Lei nº 079/2007 prevê, em seu Artigo 28, que os benefícios fiscais poderiam ser revogados caso fosse

constatado que o beneficiário não estivesse cumprindo com os objetivos da OUR. 20

João Galvão exerce hoje a função de professor de Língua Inglesa no Instituto Federal do Rio Grande do Norte

(IFRN).

49

tendo ingressado na gestão municipal desde os tempos do Instituto de Planejamento Urbano

de Natal21

(IPLANAT) e permanecido após a transformação da referida instituição na hoje

Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB).

Segundo João Galvão, a intenção da Prefeitura era "incentivar quem tinha imóvel [na

Ribeira] a fazer a recuperação e ganhar benefícios". Ainda de acordo com o professor, na

OUR de 2007 foi incorporado mais itens ao código de obras, se comparado com a de 1997, a

fim de aumentar o leque de opções para os incentivos às pessoas que quisessem investir na

Ribeira. Com a variação de opção havia possibilidades de escolha sobre o que fazer e o que

ganhar de benefícios do poder público.

Além dos novos recortes territoriais citados anteriormente, a Operação Urbana de

2007 também trouxe outras inovações. As parcerias público-privadas com a finalidade de

viabilizar intervenções urbanas estruturantes, como também foram considerados incentivos

aos usos para fins habitacionais, comerciais e de serviços são umas delas. A Lei Operação

Urbana Ribeira de 1997 previa apenas o incentivo ao uso para fins de moradia.

Mesmo munida de todo um arcabouço legal, a atuação da administração pública

municipal no tocante ao que fora estabelecido pela Lei da Operação Urbana Ribeira é

questionável. Segundo Sá (2011) a Operação Urbana Ribeira fugiu ao seu objetivo inicial e

priorizou, junto à iniciativa privada, a construção de novas edificações, promovendo um

processo de verticalização no bairro. A chamada Ribeira Alta (Área Adensável), parte do

bairro que faz fronteira com o bairro de Petrópolis, sofreu um intenso adensamento

populacional proporcionado pela OUR. Além disso, cerca de 57% dos moradores e

comerciantes da Ribeira desconheciam as propostas da operação urbana (SÁ, 2011).

O desconhecimento da Operação Urbana Ribeira deu margem à realização de ações

que favoreceram majoritariamente o capital privado, suscitando na construção de

condomínios de alto padrão. Resultado também desse desconhecimento foi a inexistência da

participação popular no processo de definição das ações que seriam executadas pela OUR, o

que acarretou na exclusão dos moradores e comerciantes do bairro como beneficiários diretos

do que foi posto em prática, comprometendo a implementação da referida política pública. Sá

(2011, p. 11) infere que:

21

Segundo o professor João Galvão, o IPLANAT era não apenas um instituto de planejamento urbanístico, mas

também o órgão responsável por fazer licenciamento das demais obras da cidade, o que ele considera um erro. O

professor infere que talvez tivesse sido mais proveitoso se o IPLANAT fosse apenas um setor de planejamento, o

que acarretaria na centralização de mais esforços na resolução dos gargalos urbanísticos da cidade.

50

[...] observou-se que a falta de divulgação da Operação Urbana Ribeira alijou a

participação dos empresários e moradores do bairro, repercutindo nos resultados das

primeiras ações de revitalização do bairro, que não favoreceram esses atores, pois

[...] alguns pontos do projeto foram implantados, outros não, numa seletividade das

ações que permitem inferir os verdadeiros beneficiados por essas intervenções: o

mercado imobiliário.

É reconhecido que houve, nos últimos anos pós-Operação Urbana Ribeira, alterações

nas dinâmicas urbanas em uma parte do Centro Histórico de Natal. Modificações estas

relativas aos investimentos do mercado imobiliário que passou a direcionar suas atenções à

área central da cidade, mais precisamente para o bairro da Ribeira. Confirmando essa

tendência, Sá (2011) expõe os aspectos assinalados pelos agentes imobiliários ao escolherem

o bairro como local de investimento: a) o potencial construtivo; b) a vista fantástica; c) a

infraestrutura; e c) a centralidade do bairro. O autor destaca, ainda, que não houve, por parte

dos agentes, a justificativa referente ao valor do solo urbano que, na Ribeira, é inferior ao

valor das áreas circunvizinhas.

Observando o local dos investimentos imobiliários, entende-se que eles podem ter

viabilizados pela modificação na legislação da OUR, que como explicitado anteriormente,

instituiu a Área Adensável no bairro da Ribeira. Neste sentido, Sá (2011) observa que “a

canalização significativa de investimentos e incentivos públicos [...] tornou o bairro da

Ribeira atrativo às atividades imobiliárias e lugar de moradia das classes mais favorecidas da

cidade”, o que nos faz entender que houve na Ribeira um processo de segregação sócio-

espacial, contrariando a própria a Lei da Operação Urbana Ribeira.

No tocante à recuperação do patrimônio histórico pouco se tem registro, apesar dos

planos e projetos pensados para o bairro, que tiveram como referência os marcos legais

existentes. São eles o ReHabitar em Natal e o Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas

Centrais – Ribera (PRAC/Ribeira), que serão explicitados mais à frente.

Sobre a crítica direcionada à ausência de participação social na execução das ações da

OUR, entende-se que a não instituição das estruturas administrativas inicialmente previstas na

Operação Urbana Ribeira – a lei previa o Escritório Técnico e o Comitê Gestor da Operação –

foi um fator dificultador do acesso do público interessado às propostas e benefícios previstos,

comprometendo a efetividade e eficácia da Operação. A equipe seria responsável por planejar

e gerir o processo de revitalização do bairro da Ribeira. A representante da SEMURB, Maria

51

Floresia Pessoa de Souza e Silva22

, afirma que existia um grupo de gestores na secretaria que

respondia pelo Setor de Patrimônio Histórico do município, e não sobre a Ribeira em si, como

orientara a OUR.

“[...] um problema básico foi que nunca implementaram o grupo gestor da lei de

Operação Urbana Ribeira. Porque esse grupo gestor era [...] quem faria a gestão de

perto de tudo. Na verdade era para criar um “Escritório Técnico”, que existia dentro

da SEMURB [...] mas não se formalizou. A gente era o Setor de Patrimônio

Histórico, mas não o Escritório Técnico da Ribeira”. (informação verbal23

).

Em suma, podemos compreender que as dificuldades referentes à baixa efetividade da

Operação Urbana Ribeira tem a ver com problemas de gestão na aplicabilidade do disposto na

Lei de Operação Urbana Ribeira. Os instrumentos normativos e as proposições da Política

Urbana existiram, porém a ausência de um aparato institucional que possibilitasse colocar em

prática tudo o que a lei previa, foi um indutor da inércia no sentido de realizar o que o projeto

realmente propunha, ou seja, o desenvolvimento urbano e a melhoria da qualidade de vida dos

moradores e usuários do bairro.

Contudo, não podemos deixar de considerar que as modificações existentes no

cenário urbano da Ribeira, a partir dos investimentos imobiliários mais recentes, consistem

numa forma de revitalização do bairro, e o coloca como um espaço social em transformação,

o que, de certo modo, contempla um dos objetivos da OUR, porém não contemplando o

principal objetivo da operação.

Ainda em relação à legislação urbanística, tem-se a revisão do Plano Diretor de Natal

(PDN), que por meio da Lei Complementar nº 082, de 21 de junho de 2007, dispõe sobre os

rumos da política urbana do município. Entre questões que versam sobre a preservação e

proteção do meio ambiente e da paisagem urbana, as quais seus aspectos normativos buscam

atingir o objetivo maior do PDN, que, de acordo com o Art. 2º, é o “desenvolvimento das

funções sociais e ambientais da cidade e da propriedade”, a fim de promover a justiça social e

urbana, temos a atenção voltada ao sítio histórico de Natal. O Plano Diretor subdividiu a

cidade em áreas com normas específicas para a atuação tanto do poder público, quanto da

22

Secretária Adjunta de Informação e Planejamento Urbanístico e Ambiental da SEMURB, que integrou a

equipe do Programa ReHabitar, na época ocupando a chefia do Departamento de Planejamento Urbanístico e

Ambiental. Entrevista realizada em 20 de abril de 2015. 23

Entrevista concedida ao autor, pela titular da Secretaria Adjunta de Informação e Planejamento Urbanístico e

Ambiental da SEMURB, no dia 20-04-2015.

52

iniciativa privada. A criação da Zona Especial de Interesse Histórico – ZEIH, que compreende

a totalidade dos bairros Cidade Alta e Ribeira, é exemplo disso.

A ZEIH compreende um perímetro mais abrangente do que o instituído pela lei nº

3.952/1990, que dispõe sobre a Zona Especial de Preservação Histórica – ZEPH que continua

em vigência até os dias de hoje. O Plano Diretor de 2007 apenas reforçou a visão de

patrimônio histórico sobre os bairros Cidade Alta e Ribeira, que já estavam elevadas a uma

posição de destaque no cenário urbano municipal e na normativa urbanística (NATAL, 2010).

Apesar da criação da ZEIH, não foi observada, ainda, efeitos práticos sobre a sua constituição,

haja vista que o plano não define parâmetros nem diretrizes para a área, sendo o único

destaque referente à ZEIH a questão da aplicação do direito de preempção. Porém, o PDN

abre a possibilidade de realização de Planos Setoriais e Operações Urbanas que podem dispor

sobre regulamentação específica dos usos e ocupações de determinadas áreas, entre elas o

sítio histórico, como ocorrido nas duas operações urbanas para o bairro da Ribeira, em 1997 e

2007, sendo esta última aprovada antes mesmo da sanção do Plano Diretor do mesmo ano.

3.2. O Projeto ReHabitar em Natal

Dentro do histórico de projetos, programas e políticas públicas de intervenções

urbanas para o bairro da Ribeira, temos três propostas que prometiam modificar as dinâmicas

sociais e econômicas do bairro. São elas a já citada Operação Urbana Ribeira (2007), o

Programa ReHabiar em Natal o Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira

(PRAC/Ribeira). Os três alinhados à proposta da Política Nacional de Desenvolvimento

Urbano no tocante à gestão dos centros urbanos.

A Ribeira, cuja simbologia e o significado para a história do município de Natal é

incontestável, foi alvo, durante anos, de projetos que buscaram reverter o quadro de declínio

de suas estruturas sociais, econômicas, culturais e edilícia. Porém, mesmo com a gama de

propostas e algumas ações pontuais, o bairro não conseguiu se reerguer e seus problemas

perduram até os dias de hoje. Neste sentido, o programa propunha uma série de ações com

vistas ao incentivo do uso de algumas edificações do bairro para fins de moradia, fazendo um

contraponto à política de produção habitacional que se consolidou no Brasil.

O programa segue os princípios das políticas preservacionistas que visam a

preservação do patrimônio arquitetônico construído e pregam a utilização da infraestrutura

existente que estejam em situação de ociosidade, a fim de promover o equilíbrio da cidade

53

(NATAL, 2007). A sua atuação estava prevista para ser promotora da reestruturação do bairro

da Ribeira a partir de investimentos públicos e privados e do incentivo à habitação. De acordo

com o depoimento de Maria Floresia Pessoa de Souza e Silva, representante da SEMURB, a

intenção da Prefeitura do Natal era, a princípio, “trazer habitação pra Ribeira”, e com isso

fomentar o surgimento de novas ofertas de serviços no bairro. Ainda segundo ela, o ReHabitar

ajudaria a consolidar uma política de habitação no Centro Histórico, principalmente no bairro

da Ribeira, área mais carente de população.

De acordo com o relato da técnica da SEMURB, o mote do programa ReHabitar não

era a habitação de interesse social em si, mas havia a preocupação da gestão municipal em

realocar a população da comunidade do Maruim e dos cortiços instalados no prédios

abandonados na Ribeira, que consistiam num contingente com perfil de interesse social. Ela

justifica que:

Como a gente focava a Ribeira, e naquela época a gente observou que havia

pouquíssima habitação no bairro, que consistia basicamente na comunidade do

Maruim, mais um pouco perto do Salesiano e alguns cortiços, habitações bem

precárias mesmo, em alguns prédios abandonados, o objetivo do programa não

consistiu em habitação de interesse social, mas havia [o dilema] sobre o que fazer

com o Maruim. Teríamos que reestruturar [...] E essas pessoas que moravam nesses

cortiços teriam que ser acomodadas nos mesmos locais depois da reforma. Então a

ideia era que mesmo reformando, aquelas pessoas teriam que ser reacomodadas,

independente do imóvel [passar a ter] outros moradores.

Dentre alguns autores que colocam a questão habitacional como fator intrinsecamente

ligado ao processo de revitalização urbana de áreas históricas, destaca-se Jane Jacobs. A

autora ressalta o valor da habitação e coloca a diversidade de usos e funções das edificações

(também objetivo do Programa ReHabitar, que visava proporcionar o uso misto dos imóveis

no bairro, porém priorizando o uso habitacional) como fator decisivo para a efetividade do

processo de revitalização. Jacobs (2000, p. 222) infere que:

As pessoas que habitam o distrito também constituem em geral uma grande

porcentagem das pessoas que utilizam as ruas, os parques e os estabelecimentos

locais. [...] Sem dúvida, as moradias de um distrito (como qualquer outro uso do

solo) precisam ser complementados por outros usos principais, de modo que haja

uma boa distribuição de pessoas nas ruas em todas as horas do dia, [...] vida atrai

vida.

54

Concordando com a ideia de Jacobs, Costa (2006) faz uma abordagem acerca o reuso

de imóveis em áreas de interesse histórico, colocando a habitação como “um elemento

impulsionador de processos de revitalização de áreas históricas degradadas”, e defende que o

“mix de funções” se insere dentro do processo de revitalização, partindo do princípio de que

“a presença de pessoas durante todo o dia estimula e incrementa todo o processo de

revitalização dessas áreas” (COSTA, 2006, p. 117). Dito isto, pode-se inferir que programas

que promovem os usos residenciais nos centros são fundamentais para vencer a ociosidade e o

abandono, funcionando como indutores eficazes do processo de recuperação das áreas

degradadas (MARICATO, 2000).

Considerando os aspectos e conceitos acima, e relacionando-os ao depoimento da

representante da SEMURB e aos documentos obtidos durante execução deste trabalho, pode-

se inferir que, de fato, a gestão municipal da época tinha a intenção de modificar em

profundidade as dinâmicas e o cenário social e urbano do bairro da Ribeira, e o Programa

ReHabitar seria a via pela qual essas transformações aconteceriam.

Firmado por um convênio de cooperação técnica entre a Prefeitura Municipal do Natal

e o Programa Cidade Brasil da Caixa Econômica Federal e da Embaixada a França, o

Programa ReHabitar tem como base jurídica a Lei nº 5.567, de 2 de julho de 2004 e foi

estruturado a partir de duas frentes de ação (Operações Imobiliárias e Intervenções Urbanas)

que abarcavam seis vertentes, a saber: reuso de imóveis públicos e privados, tendo como foco

o uso habitacional; reabilitação de espaços públicos; dinamização de atividades culturais, de

lazer, sociais, turísticas e econômicas; qualificação ambiental, incluindo a preservação do

acervo arquitetônico e cultural; acessibilidade; e recuperação de vantagens imobiliárias

provenientes dos investimentos públicos. Os recursos de financiamento habitacional que

deram suporte ao ReHabitar eram provenientes do Programa de Arredamento Residencial da

Caixa Econômica Federal.

Apesar de ter sido elaborado de forma independe do Ministério das Cidades, o

Programa ReHabitar seguias as diretrizes da Política Nacional de Habitação24

, que ganhou um

novo sentido a partir do governo do ex-presidente Lula e da criação do MCidades, quando

passou-se a pensar a implementação de programas habitacionais nas áreas centrais que, além

almejar a democratização do acesso à cidade legal por meio de incentivos à habitação de

24

A PNH apresenta seus eixos de ações estruturantes centrados em questões fundamentais para o acesso à

moradia e à terra urbana, dentre os quais é destacado o eixo de produção habitacional, norteado por quatro

tópicos que versam sobre a aquisição de imóveis novos e usados; locação social; reabilitação de áreas urbanas

centrais; e melhorias habitacionais. (NAIME, 2010)

55

interesse social, busca a otimização do uso das infraestruturas e da oferta de serviços

existentes.

Na atuação do programa na frente de ação de Operações Imobiliárias, a SEMURB

utilizou-se de uma pesquisa25

feita no ano 2000, que identificou uma grande quantidade de

imóveis desocupados, subutilizados e degradados, dos quais foram selecionados 15 edifícios

para serem alvos de estudos específicos de viabilidade, cujos conteúdos continham

informações, propostas e projetos de reuso que foram apresentados aos seus referidos

proprietários com a finalidade de negociar possíveis vendas ao poder público ou a outros

interessados (NATAL, 2007). Após este mapeamento, a equipe do ReHabitar definiu a área

denominada Perímetro de Reabilitação Integrada (PRI) e empreendeu esforços para elaborar a

lei26

que instituiu o Programa. Lei esta que “representa um marco importante na

reestruturação das áreas centrais do Município [e] surgiu a partir da necessidade de uma base

legal para a concretização das operações imobiliárias propostas.” (NATAL, 2007, p. 43).

De acordo com a Operação Urbana Ribeira (Lei nº 79/2007), o PRI está submetido ao

Direito de Preempção, que confere à Prefeitura Municipal do Natal a preferência pela

aquisição de imóveis desde que haja interesse do proprietário em se desfazer do bem.

Salienta-se que este direito é garantido desde que o objetivo da compra seja a preservação ou

conservação do imóvel. (NASCIMENTO, 2012).

As intervenções previstas no ReHabitar seriam priorizadas na área de interesse social27

na qual o Perímetro de Reabilitação Integrada (Mapa 3), se insere, e que segundo

informações da SEMURB, tinha o uso do solo predominantemente destinado ao setor de

serviços. Essas ações de revitalização da área definida pelo PRI seriam dotadas de

instrumentos de desenvolvimento urbano na perspectiva de médio e longo prazo, a partir das

revisões do Plano Diretor Municipal e da Operação Urbana Ribeira. (NATAL, 2007).

25

Nessa pesquisa foram identificados mais de 54 quadras que englobam mais de 1300 imóveis, dentre os quais

grande parte estavam desocupados, subutilizados e degradados. (NATAL, 2007). 26

Lei nº 5.567/2004. 27

O ReHabitar define a área de interesse social para a sua atuação.

56

Mapa 3 - Perímetro de Reabilitação Integrada definido pelo Programa ReHabitar

Fonte: NATAL, 2007.

Como parte inicial do programa, foram escolhidos cinco imóveis dentre os quinze

previamente selecionados para estudos de viabilidade. São eles o Edifício Bila, o Tavares de

Lira, o Galhardo/Arpege, o Paris em Natal e o Nova Aurora. Todos localizados no PRI. Esses

imóveis foram analisados e tiveram documentadas informações relevantes à consecução dos

objetivos do programa.

Analisando a situação do referido grupo de imóveis à época da pesquisa feita pela

equipe do programa, em 2003, e comparando com o seu estágio atual, em 2015, conclui-se

que o ReHabitar não logrou o êxito pretendido no que se refere à frente de ação de operações

imobiliárias. O mesmo pode-se identificar nas ações de requalificação do espaço urbano.

Porém, a exemplo do Edifício Bila, que passou por uma intervenção via ReHabitar, pode-se

identificar que existe o interesse em residir na Ribeira, haja vista todos os cômodos do

edifício (depois de reformado) foram ocupados, e, segundo Souza (2013), a procura por

apartamentos foi maior do que a disponibilidade existente no edifício.

O Edifício Bila passou por um longo processo de deterioração e se encontrava em

condições relativamente precárias quando da definição dos imóveis que comporiam o acervo

do programa ReHabitar. A reforma pela qual ele foi submetido preservou a sua arquitetura

57

original e priorizou o uso residencial (TRIBUNA DO NORTE, 2006; 2015). Os demais

edifícios não passaram pelo processo de revitalização via ReHabitar. Contudo, tem-se o caso

do Edifício do Hotel Central que foi adquirido pelo município no ano de 2007, dentro do

contexto do ReHabitar, mas só em 2010 a Prefeitura do Natal transformou-o em um Albergue

público para atender pessoas em situação de rua (SOUZA, 2013).

No quadro abaixo, pode-se encontrar as informações referentes aos usos e condições

das cinco edificações do programa da época de início dos planejamentos do ReHabitar,

comparadas com informações atuais. Percebe-se que não houve muitas modificações nas

estruturas e nos usos. Em alguns, o a situação se agravou.

Quadro 2 - Comparação dos usos e condições, entre os anos 2003 e 2015, dos cinco edifícios selecionados pelo

programa ReHabitar.

Nome do

edifício e

endereço

Uno

instalado

(2003)

Uso

instalado

(2015)

Condições encontradas

(2003) Condições

encontradas (2015)

BILA –

Avenida Duque

de Caxias, nº

110.

Misto:

Residencial,

Comercial e

Prestação de

Serviços.

Misto:

Residencial,

Comercial e

Prestação de

Serviços.

Subutilizado; Presença de

questões trabalhistas;

Risco de incêndio;

Estulhos e sujeira; Dívidas

de IPTU; e Serviços de

abastecimento de água e

energia suspensos.

Reformado em 2006.

Serviços de água e

energia elétrica

restabelecidos.

TAVARES DE

LIRA –

Avenida

Tavares de

Lira, nº 57.

Misto:

Comercial e

Prestação de

Serviços

Sem uso

Situação de risco, com

imóveis em ruínas; Serviço

de abastecimento de água e

energia elétrica suspensos;

Não há dívidas de IPTU;

Péssimas condições de

tranalho; Subutilização

Abandonado e

deteriorado.

GALHARDO/

ARGEPÊ – Rua

Chile, nº 161. Sem uso Sem uso

Desocupado; Serviço de

abastecimento de água e

energia elétrica suspensos;

Dívidas de IPTU

Desocupado; em

ruínas; tombado pelo

IPHAN em 2010; em

2011 partes de sua

estrutura desabou

devido a

desmoronamento de

um galpão vizinho;

58

PARIS EM

NATAL –

Praça Augusto

Severo, nº, 250.

Misto:

Residencial,

Comercial e

Prestação de

Serviços.

Misto:

Residencial e

comercial

Situação de risco nas

instalações elétricas;

Serviço de abastecimento

de água e energia

suspensos; Péssimas

condições de trabalho, de

higiene, insalubridade,

pobreza, desemprego,

prostituição; Subutilização.

Subutilizado, situação

de risco nas instalações

elétricas, estrutura

danificada pelo tempo.

NOVA

AURORA –

Rua Dr. Barata,

nº 241.

Misto:

Residencial,

Comercial e

Prestação de

Serviços.

Comercial

Situação de risco nas

instalações elétricas;

Serviço de abastecimento

de água e energia

suspensos; Péssimas

condições de trabalho;

Imóvel abandonado pelo

proprietário; Os ocupantes

não pagam aluguel;

Subutilização

Subutilizado, situação

de risco nas instalações

elétricas, estrutura

danificada pelo tempo.

Não há residentes.

Fonte: Elaboração própria com base nas informações do Programa ReHabitar, do Jornal Digital Tribuna do

Norte e visita de campo realizada no dia 18/04/2015.

A área onde esses imóveis estão localizados tinha o uso das suas edificações

predominantemente destinado ao setor de prestação de serviço privado e comércio, enquanto

outra parcela não tinha nenhum uso. O número de imóveis destinados para fins de moradia era

insignificante28

, de acordo com o levantamento feito pela Secretaria Municipal de Meio

Ambiente e Urbanismo. As características do recorte territorial justificaram e tornaram a área

propícia à implementação das ações do Programa ReHabitar.

28

A SEMURB identificou que os principais usos dos imóveis no PRI eram no setor de prestação de serviço

privado, 53%; e comércio, 18%. Outra quantidade, 14%, não tinha uso, e os que desempenhavam funções de

residência representavam 1%. (NATAL, 2007, p. 51).

59

Figura 3 - Edifício Bila

Fonte: Acervo do autor, 2015.

Figura 4 - Edifício Tavares de Lira

Fonte: Acervo do autor, 2015.

60

Figura 5 - Edifício Galhardo/Arpege

Fonte: Acervo do autor, 2015.

Figura 6 - Edifício Paris em Natal

Fonte: Acervo do autor, 2015.

61

Figura 7 - Edifício Nova Aurora

Fonte: Acervo do autor, 2015.

No decorrer da entrevista com a técnica da SEMURB, ela esclareceu que um dos

principais entraves que prejudicaram a efetiva execução do ReHabitar foi a intervenção do

Ministério das Cidades no processo de negociação entre a Prefeitura do Natal, a Caixa

Econômica Federal e o Governo Francês: “[...] o MCidades dizia que toda e qualquer parceria

[que envolvesse organismos do Governo Federal] teria que passar pelo ministério. [...] Isso foi

um dos motivos que fez a parceria da [Prefeitura do Natal e] Caixa com o Governo Francês

perder força”.

Motivos também citados pela gestora foram referentes à dificuldade que o município

teve em acessar recursos federais e de negociar com os proprietários dos edifícios, tendo em

vista que alguns imóveis eram espólios e tinham muitos donos, o que gerava conflitos internos

e prejudicavam as negociações. Em alguns casos, os proprietários não foram identificados. A

inexistência do Escritório Técnico e do Comitê Gestor também consistiram num obstáculo à

efetiva implementação do programa.

Mesmo com todos esses entraves elucidados pela gestora da SEMURB, a proposta do

ReHabitar continuou viva. O ambiente de renovação que se instalou na Ribeira, com outros

62

estudos e projetos para a sua revitalização, fez com que surgisse a necessidade de um plano

macro de ações integradas que unisse todos os esforços empreendidos até determinado

momento na tentativa de elevar o bairro a um novo patamar, que possibilitasse o

desenvolvimento urbano com inclusão social. Dentro desse contexto, e aproveitando a

abertura, por meio do Ministério das Cidades, do Programa Nacional de Reabilitação Urbana,

foi possível a realização do Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira

(PRAC/Ribeira), que incorporou, conforme o disposto na Lei nº 5.768, de 28 de dezembro de

2006, as ações do Programa ReHabitar, dando um sentido mais amplo à proposta de

revitalizar o bairro da Ribeira.

63

4. DOS GABINETES ÀS RUAS: O PRAC/RIBEIRA COMO UMA PROPOSTA

DE REABILITAÇÃO INTEGRADA.

Observando a necessidade de um projeto de intervenção que levasse o bairro da

Ribeira se desenvolver de forma integrada, contemplando os diversos setores que compõem o

seu território, a Prefeitura Municipal do Natal empreendeu esforços para elaboração de uma

proposta de intervenções que se traduziu no Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais

– Ribeira (PRAC/Ribeira). O referido Plano consistiu numa proposta que viria nortear os

caminhos para os investimentos a serem realizados no bairro, na tentativa de preservar o meio

ambiente, de recuperar o patrimônio histórico e cultural, e de fomentar o desenvolvimento

econômico e social da área (NATAL, 2007).

Antes de iniciarmos a análise da proposta do PRAC/Ribeira, é pertinente retornar à

discussão inicial deste trabalho sobre os tipos de intervenções urbanas existentes. Para efeito

de comparação, destacamos dois modelos antagônicos: a renovação e a reabilitação urbana.

As diferenciações entre um modelo e outro nos faz refletir sobre qual método é mais

adequado para determinados lugares. Para isso, deve-se observar a realidade local antes de

definir o plano de intervenções a ser realizado.

A Carta de Lisboa (1995) coloca a reabilitação urbana como uma estratégia de gestão

urbana que objetiva modificar a realidade de determinados territórios a partir de mudanças

que potencializem a economia e as funcionalidades, de modo a melhorar a qualidade de vida

dos moradores e usuários dos espaços urbanos, “mantendo a identidade e as características da

área”. Ermínia Maricato (2001, p. 126), concordando com a referida carta patrimonial,

considera que a reabilitação “preserva, o mais possível, o ambiente construído existente”,

porém adaptando-o a uma nova realidade, possibilitando que as características locais

permaneçam e que não haja o rompimento da relação pessoa-lugar, considerando que os

maiores interessados no processo de reabilitação são os moradores locais.

A escolha pelo modelo de reabilitação implica em resultados mais conectados às

necessidades da comunidade da área reabilitada. Há também a influência sobre o modo como

proceder no processo de implementação das ações, que vai desde o planejamento até a

execução da proposta, sendo necessário que haja uma relação entre as etapas e os agentes

envolvidos. Para que seja possível essa conexão, faz-se premente o que Maricato (2001, p.

126) coloca como “valores que predominam sobre o mercado”, ou seja, a participação social e

a cooperação entre os atores sociais.

64

Com relação ao fenômeno conhecido por renovação do espaço urbano, a sua escolha

oportuniza a total ou parcial modificação do perfil social, econômico e urbanístico de

determinadas localidades. Este modelo, que prioriza o capital e o mercado imobiliário de alto

padrão, pode causar consequências danosas à população de baixa renda que porventura habite

o lugar alvo das mudanças. Essas consequências se caracterizam, geralmente, pela expulsão

desse contingente populacional para a periferia das cidades.

Maricato (2001, p. 126) infere que:

Na renovação ganha importância o grande capital imobiliário – promotores,

construtores, financiadores – e os proprietários imobiliários privados. A valorização

imobiliária é alta criando forte dinâmica de mercado. As atividades culturais, os

shoppings centers, os museus, as galerias de arte, as sedes das grandes corporações

são novos usos e predominantes.

Observando as colocações dos autores e relacionando-as à proposta do PRAC/Ribeira,

vê-se que a Prefeitura do Natal optou pelo modelo de reabilitação urbana, evitando, assim, o

processo de renovação conforme apontado por Maricato (2001) logo acima. De acordo com

Ramos (2006) o Plano de Reabilitação da Ribeira surgiu na perspectiva de uma gestão

democrática, na qual se priorizou o planejamento participativo, considerado aqui como “um

instrumento que vai nortear uma intervenção promotora de mudanças” (idem, p. 30), a partir

da organização dos atores sociais interessados.

Tendo como princípio norteador a participação popular na definição das ações, a

equipe de pesquisadores29

responsáveis pela elaboração do PRAC/Ribeira utilizou-se da

metodologia ZOPP – Planejamento de Projetos Orientado por Objetivos (SANTOS, 2006),

que consiste em um:

Processo de planejamento participativo e transparente orientado para as necessidades

dos parceiros e dos grupos-alvo e na noção de que um projeto ou programa constitui

um processo cujos elementos principais tem que ser desenvolvidos passo a passo em

equipes que contam com a participação dos indivíduos ou grupos afetados pelo

projeto e que têm de ser documentado30

de forma facilmente reproduzível (GTZ,

1997, p. 2).

29 O processo de elaboração do Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira se deu por meio da

contratação de uma consultoria de pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN),

através da Fundação Norte Rio-Grandense de Pesquisa e Cultura (FUNPEC) e tinha como órgão coordenador a

então Secretaria Municipal de Planejamento, Orçamento e Finanças (SEMPLA). 30

Sendo fiel à metodologia ZOPP, as informações referentes ao PRAC/Ribeira estão documentadas e

disponíveis no endereço virtual: <http://cchla.ufrn.br/rmnatal/relatorios.htm>.

65

O método ZOPP estabelece quatro etapas para o planejamento dos projetos de

desenvolvimento, sendo a primeira referente à análise do projeto; a segunda à concepção do

plano e do projeto; a terceira consiste na execução do projeto; e a quarta no monitoramento e

na avaliação. A primeira etapa, na qual são identificados os grupos diretamente ligados à

proposta, possibilitando elencar os principais problemas, identificar o nível de participação da

comunidade e as expectativas da população local em relação ao plano, como também fazer

uma análise dos objetivos pretendidos, foi fundamental para o início do planejamento do

PRAC/Ribeira.

Seguindo as orientações do modelo ZOPP, a equipe do plano realizou oficinas (Figura

8) de trabalhos com o intuito de ampliar o debate sobre o PRAC/Ribeira com a sociedade

civil. Os encontros tiveram objetivos diversos e específicos, entre eles a apresentação da

proposta, a identificação das lideranças e das demandas mais urgentes, a construção coletiva

das alternativas e a definição do plano de ação para a reabilitação do bairro. O desafio era

equipar o município com argumentos técnicos que permitissem viabilizar a proposta, como

também contar com a participação popular na elaboração do conjunto de intervenções que

viriam a ser executadas no bairro, para que as mesmas pudessem ser traduzidas em resultados

efetivos e eficazes (SANTOS, 2006).

Figura 8 - Primeira Oficina do PRAC/Ribeira

Fonte: SANTOS, 2006.

66

Almejando atingir seus objetivos e romper com o planejamento e gestão setorial, o

Plano previa a realização de ações integradas e multidisciplinares – planejadas em articulação

com os demais entes públicos que atuavam no bairro – que estivessem em sintonia com o

fenômeno de expansão metropolitana. (TINÔCO et al., 2008). Concordando com a ideia,

Virgínia Ferreira, então secretária municipal de planejamento de Natal, alegou que “a Ribeira

[não] pertence somente a Natal, pertence à região metropolitana. As intervenções na cidade

não são só de responsabilidade da Prefeitura de Natal, mas também do Governo Federal e do

Governo do Estado”. (TRIBUNA DO NORTE, 2008). Renato Balbim, à época a frente da

Coordenação Nacional do Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, declarou que

“a intenção do projeto é fazer isso [as intervenções no espaço urbano] de maneira coordenada.

E não fazer obras pontuais que acabam por não surtir o efeito esperado, que é a recuperação

do bairro da Ribeira.” (idem, 2008).

As ações do Plano foram planejadas seguindo os princípios do planejamento territorial

e urbano do município do Natal, e o seu intuito era ampliar o espaço de urbanidade da Ribeira

para todos os indivíduos que, à sua maneira, tivessem interesse em usufruir do bairro. Nesta

perspectiva, buscou-se promover o uso e a ocupação do solo de forma democrática, na medida

em que fosse preservada a permanência dos atuais moradores, independente de classe social, e

atraído novos grupos populacionais. (TINÔCO et al., 2008).

Uma das preocupações do Plano, segundo Tinôco et al., (2008, p. 25), era “romper o

paradigma de que reabilitar é sinônimo de excluir qualquer traço da presença de segmentos de

baixa renda”, como também potencializar a diversidade social e funcional do bairro. Neste

sentido, o PRAC/Ribeira também se preocupou com a questão do direito à moradia, e

articulando-se com a Política Nacional de Habitação, prometeu priorizar os usos residenciais

no bairro. Ações estas já previstas no Programa ReHabitar e que foram incorporadas ao

PRAC pela Lei nº 5.768/200631

.

A área de atuação do Plano de Reabilitação, no âmbito de todos os projetos existentes

para a região, compreendia todo o território do bairro da Ribeira. Porém, justificando-se pelo

fato de também serem alvos de outros projetos, e por estarem na mesma Área de Expansão

Demográfica (AED), segundo o IBGE, os bairros Rocas e Cidade Alta integraram a Área de

Abrangência do PRAC/Ribeira, como podemos observar no Mapa 4.

31

Segundo o inciso VII da Lei nº 5.768/2006, serão incorporadas ao PRAC/Ribeira as ações referentes ao

Perímetro de Reabilitação Integrada – PRI, Projeto Becos e Travessas e Programa ReHabitar.

67

Mapa 4 - Área de Abrangência e área de atuação do PRAC/Ribeira

Fonte: SANTOS, 2006.

No campo da habitação, para que se pudesse ter controle sobre o espaço a ser trabalho,

a equipe de planejamento do Plano de Reabilitação identificou as áreas predominantemente

residenciais da Ribeira e subdividiu o bairro em três regiões (Mapa 5), obedecendo a

classificação dos setores censitários estabelecida pelo IBGE para o Censo Demográfico de

2000, a saber: região 9 – Ribeira Alta; região 10 – Ribeira Baixa; e região 11 – Comunidade

do Maruim.

LEGENDA

Limites dos bairros

Área de abrangência

Área de atuação

68

Mapa 5 - Áreas predominantemente residenciais no bairro da Ribeira

Fonte: SANTOS, 2006.

A área de atuação do Plano de Reabilitação foi resultado de um mapeamento dos

principais projetos e problemas sociais no território da Ribeira. Considerando a diversidade

das demandas existentes, o PRAC pautou-se numa série de articulações de políticas públicas

que perpassam por diversas áreas, indo desde a Política de Recuperação da Identidade

Cultural e do Patrimônio Histórico Local até a Política de Habitação de Interesse Social e a de

Desenvolvimento das Atividades Econômicas.

Todo esse encadeamento de intenções configurou-se no surgimento de quatro produtos

que norteariam os caminhos para (re)desenvolvimento da Ribeira, a saber: 1) Plano Técnico

Social; 2) Plano de Reabilitação das Edificações Públicas e Privadas; 3) Plano de Valorização

Turístico-Cultural; e 4) Plano de Intervenções Físicas. Para se chegar até este resultado, foi

traçado um longo caminho com estudos e pesquisas que fundamentaram o plano.

69

4.1. Uma abordagem metodológica do Projeto Técnico Social do PRAC/Ribeira.

O Governo Federal, por meio do Ministério das Cidades, tem como regra comum para

os projetos que são desenvolvidos via seus planos e programas de desenvolvimento urbano, a

elaboração de Projetos Técnicos Sociais – PTS, que de acordo a Portaria ministerial nº 21, de

22 de janeiro de 2014, é um documento que deve ser desenvolvido através de uma

metodologia participativa, devendo conter um diagnóstico socioterritorial da área alvo do

projeto, apresentando informações relevantes à execução da proposta. Entre outros

apontamentos, o PTS orientado pelo MCidades recomenda o incentivo à organização

comunitária, à autonomia e ao protagonismo social dos beneficiários direto dos projetos,

como também a viabilização da participação desses atores no processo de planejamento e

implementação das ações, para que sejam traduzidas em resultados efetivos e eficazes.

O instrumento que sistematizou a proposta de planejamento do Plano de Reabilitação

de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira) caracterizou-se como um Projeto

Técnico Social – PTS que, de acordo com Clementino (2006, p. 2), tratou-se de “um

documento temático, de caráter metodológico e indicativo das ações que serão desenvolvidas

durante esta etapa de planejamento visando o processo de validação social e comunitária e

que perpassa todo o processo de planejamento do Plano”. Ressalta-se, no entanto, que o PTS

do PRAC/Ribeira diferiu de um PTS normal de acompanhamento de obras físicas – como é

comumente elaborado para os projetos via MCidades – que geralmente utiliza metodologia

diferenciada, porém com igual foco na participação social (idem, 2006).

Neste sentido, tem-se o PTS como um instrumento de contato com “a comunidade”.

Fazendo uma rápida visita à literatura, encontramos algumas denominações ligadas à

expressão “comunidade” que nos remetem a identificar a existência de dois fundamentos que

são capazes de romper a cultura individualista da sociedade. São eles “o sentido da

solidariedade e a ideia de identidade comum” (ANDRADE, 2006, p.12), e esta era a

concepção que a equipe do PRAC/Ribeira queria passar aos moradores do bairro: que aquele

local onde o convívio e as relações sociais acontecem pertence a eles e que era papel de todos

ajudar e participar das definições sobre o futuro do bairro.

Sobre o PTS32

do PRAC/Ribeira, a equipe de planejamento elaborou-o de acordo com

os princípios contidos no Termo de Referência – TR do Programa de Reabilitação de Áreas

32

O PTS para o bairro da Ribeira consistiu no “planejamento das ações de discussão dos trabalhos de elaboração

do Plano e do seu planejamento junto com a comunidade” do bairro, o que o diferencia de um PTS “comum” no

âmbito de intervenções por obras físicas, que utiliza metodologias diferentes. (CLEMENTINO, 2006).

70

Urbanas Centrais do Ministério das Cidades, que seguia os preceitos do planejamento

participativo colocando “a participação da comunidade no processo de construção, discussão

e implementação das alternativas de intervenção” como um objetivo a ser alcançado, e que

sistematizaria o trabalho social a ser desenvolvido no bairro da Ribeira no contexto do Plano

de Reabilitação. (Termo de Referência apud CLEMENTINO, 2006).

Neste sentido, o PTS do PRAC/Ribeira foi o documento temático que indicou quais as

ações e como elas deveriam ser desenvolvidas no período de elaboração do Plano. As

atividades contidas no Projeto Técnico Social foram pensadas no sentido de possibilitar que a

população do bairro da Ribeira, que seria diretamente afetada pelas consequências da

implementação do Plano de Reabilitação, participasse do seu planejamento.

Tido como a “célula mater” do planejamento participativo do Plano de Reabilitação da

Ribeira, a atuação do Projeto Técnico Social objetivava, de acordo com Clementino (2006): a)

discutir com a população da Ribeira as perspectivas de seu futuro; b) garantir a população

interessada no bairro as informações sobre o mesmo durante o período de formulação da

proposta de intervenção ä sua reabilitação c) Fomentar a organização comunitária d) Atrair

interesse pelo bairro para fins de moradia e de atividade econômica e) Estimular o surgimento

de uma cultura crítica sobre o futuro do bairro f) Estimular atitudes da população frente a

manutenção do patrimônio histórico e cultural.

Para que se conseguisse atingir tais objetivos, a equipe do PTS do PRAC/Ribeira

adotou uma metodologia que permitiu a coleta de informações para dar subsídio às discussões

referentes ao Plano. Uma das orientações era no sentido fazer a identificação das

características socioeconômicas33

da população residente no bairro da Ribeira e da

comunidade do Maruim34

. Para isso, foram realizadas suas pesquisas: uma quantitativa e outra

qualitativa sócio-organizativa, sendo a primeira, em sua fase inicial, consistindo em um

levantamento de dados secundários e posteriormente uma pesquisa censitária com as famílias

das referidas localidades. Ainda neste processo, foram catalogados e cadastrados os imóveis

do bairro, separados por suas funcionalidades: domiciliar, não domiciliar, histórico entre

outros.

A Pesquisa Qualitativa Sócio-Organizativa, cuja metodologia consistiu em três fases e

tinha como objetivo formular possibilidades de envolvimento da sociedade civil por meio da

33

Para maior detalhamento dos dados, ver CLEMENTINO, 2006. 34

Devido ao pouco número de domicílios no Maruim, optou-se por fazer uma pesquisa censitária exclusiva na

comunidade.

71

identificação de lideranças, fomentando o planejamento participativo que, como dito

anteriormente, era tido como a marca do PRAC/Ribeira. As fases da pesquisa foram: 1ª

Levantamento da História Oral; 2ª Mapeamento dos Grupos Organizados da Sociedade Civil;

e 3ª Realização de Oficinas com a Participação da Sociedade Civil.

As oficinas realizadas faziam parte do Método ZOPP utilizado no planejamento do

PRAC/Ribeira. Ao todo a equipe realizou quatro encontros que geraram informações sobre os

principais problemas do bairro (Anexo 2), que serviram como subsídios para a construção de

um cenário futuro para o bairro, caracterizado nos quatro produtos finais (Quadro 4) do Plano

de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira).

Quadro 3 - Produtos do Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira).

Produto Abordagem

Plano Técnico Social

Estratégias e instrumentos de participação

social no processo de formulação do Plano de

Reabilitação da Ribeira

Plano de Reabilitação das Edificações

Públicas e Privadas

Definição das metas para ações de curto,

médio e longo prazos quanto ao uso dos

prédios situados na área central, com

indicação das propostas para as praças, becos,

travessas e pontos de apreciação do Rio

Potengi.

Plano de Valorização Turístico-

Cultural

Aborda as estratégias e planos de curto,

médio e longo prazo com o de potencializar a

Ribeira como um bairro que abriga atividades

culturais e de interesse turístico,

Plano de Intervenções Físicas Projetos e obras com estudos complementares

e prioridades dos investimentos.

Fonte: elaboração própria com base em TINÔCO et al., 2008.

Como observado no quadro acima, um dos produtos do Projeto Técnico Social (PTS-

1)35

do PRAC/Ribeira foi um Plano Técnico Social (PTS-2). A partir das pesquisas realizadas

para execução deste trabalho, chegou-se a conclusão de que havia dois momentos dentro de

uma mesma preocupação em relação do Plano de Reabilitação da Ribeira: a necessidade de

um PTS cuja atuação compreendesse desde a elaboração até a implementação do Plano, e de

outro PTS que abrangesse o processo de execução, o monitoramento e avaliação das ações.

35

As denominações “PTS-1” e “PTS-2” têm funções meramente explicativas.

72

Apesar das nomenclaturas diferentes, o objetivo de um e de outro ainda eram convergentes e

necessários ao planejamento e à implementação do PRAC/Ribeira.

Em suma, o traçado metodológico definido pela equipe de planejamento do Plano de

Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira) possibilitou que a

sociedade civil organizada e os moradores do bairro da Ribeira participassem diretamente da

construção da proposta que levaria o bairro a uma nova realidade.

O desafio que se colocou após a conclusão das primeiras atividades contidas no

Projeto Técnico Social do PRAC/Ribeira, ou seja, as duas fases iniciais do método ZOPP – a

Análise do projeto e a Concepção do plano e do projeto – foi a execução, por parte da

Prefeitura do Natal, das duas últimas etapas da referida metodologia de elaboração do Plano: a

Execução do Projeto (os demais produtos oriundos do PTS) e o Monitoramento e Avaliação36

do Projeto. A partir daí é que se verificaria se a proposta teria sido traduzida em resultados

concretos, efetivos e eficazes e se teria a sustentabilidade desejada.

4.2. Moradia Social e Reurbanização Integrada: uma visão das propostas para a

comunidade do Maruim.

A comunidade do Maruim, após a sua ocupação por volta da década de 1940, foi

caracterizada por conflitos junto ao poder público e à administração do Porto de Natal, tendo

em vista que o terreno onde estão situadas as suas unidades habitacionais pertence à União e

está dentro dos limites da gerência da unidade portuária, cujo início das operações data do ano

1930. A polêmica que se coloca é que a CODERN, órgão que administra o Porto, quer

ampliá-lo para a área onde está localizada a comunidade do Maruim, a fim de utilizar o

terreno para estoque contêineres.

A questão que se põe é que ambas as construções desempenham funções sociais e têm

o direito de ocuparem a área e requererem, junto ao Patrimônio da União, a regularização

fundiária devido ao tempo de ocupação (TINÔCO et al., 2008). Existem, porém, alguns

marcos normativos que conferem poderes legais ao Porto de Natal sobre as suas áreas

adjacentes. Para efeito de esclarecimento sobre a legislação, temos a Portaria do Ministério

36

A metodologia ZOPP prevê um acompanhamento e uma avaliação contínua dos projetos, e não apenas do

produto final.

73

dos Transportes nº 1.029/199337

; na esfera municipal, tem-se a Zona Portuária instituída pelos

Planos Diretores de 1984, 1994 e 2007. Entretanto, a população da comunidade do Maruim

também encontra segurança jurídica e proteção por meio do Estatuto da Cidade, da Medida

Provisória nº 2.220/200138

, da Lei nº 11.481/200739

e dos Planos Diretores de Natal dos anos

de 198440

, 1994 e 200741

.

Não somente pelo conflito existente com o Porto de Natal, mas também por outras

características que compõem aquela área, a comunidade do Maruim merece atenção especial

da sociedade e do poder público. Segundo Tinôco et al., (2008, p. 180):

[...] a comunidade do Maruim se insere num quadro de alta vulnerabilidade social,

enquadrando-se em três tipologias principais que exigem atenção especial quanto ao

risco de violação do direito à moradia, ou seja: (i) apresenta grande precariedade no

atendimento do direito à moradia, sobretudo pela insegurança da posse e pelo baixo

nível de habitabilidade; (ii) possui características socioculturais relevantes em sua

relação com a colônia de pescadores e o mercado do peixe do Canto do Mangue;

(iii) possui características físico-territoriais especiais pela localização adjacente ao

Porto de Natal.

O Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira), na

tentativa de gerir o conflito existente entre Porto de Natal e Comunidade do Maruim, propôs

uma séria de medidas que contemplariam os interesses de ambas as partes. As propostas

foram no âmbito do Plano de Intervenções Físicas, que orientou uma série de projetos para

modificações estruturantes de ordem urbanística, habitacional e de mobilidade urbana no

bairro da Ribeira. A intenção era incorporar essas proposições a outras propostas existentes,

porém com escopos e orçamentos próprios. Para a comunidade do Maruim, uma das

alternativas apontadas foi a relocação total ou parcial das moradias e equipamentos para outra

área com a posterior urbanização do espaço onde, porventura, permanecessem unidades

habitacionais.

Como dito no início deste capítulo, um dos objetivos do Plano de Reabilitação da

Ribeira era a ampliação do espaço de urbanidade no bairro, criando condições para que a

Ribeira tivesse como manter os atuais habitantes e atrair novos moradores, democratizando o

37

A Portaria-MT nº 1.029/1993 define as áreas de abrangência do Porto de Natal, que compreende a sua

totalidade e regiões adjacentes, portanto, incluindo oficialmente a Comunidade do Maruim dentro do espaço de

responsabilidade da administração do Porto. 38

A Medida Provisória nº 2.220/2001 autoriza a regularização fundiária em áreas públicas para fins de moradia. 39

A Lei nº 11.481/2007 prevê medidas voltadas à regularização fundiária de interesse social em imóveis da

União. 40

O Plano Diretor de 1984 colocou a Comunidade do Maruim como Área Especial de Recuperação Urbana. 41

Os Planos Diretores de 1994 e 2007 definiram a Comunidade do Maruim como Área Especial de Interesse

Social.

74

acesso ao seu território. E uma das preocupações do Plano era com a Habitação de Interesse

Social, tendo em vista que uma parte da população do bairro da Ribeira, em especial a

população da comunidade do Maruim (Figura 9), vivia em condições inadequadas de

habitabilidade (TINÔCO et al., 2008).

Figura 9 - Comunidade do Maruim ao lado do Porto de Natal

Fonte: TRIBUNA DO NORTE, 201142

.

A comunidade se enquadra nas características das áreas prioritárias para a atuação do

PRAC/Ribeira, definidas pelo Termo de Referência do Programa do Ministério das Cidades,

que estabelece como prioridades os “pontos onde se concentram problemas sociais como

prostituição, tráfico de drogas, moradores de rua e de habitações precárias que demandam

intervenções do Poder Público, como os cortiços, cômodos cedidos ou improvisados” (idem,

2008).

De acordo com pesquisa realizada pela equipe de planejamento do Plano de

Reabilitação, como parte do Projeto Técnico Social, identificou-se que a população da

comunidade do Maruim apresentava as maiores condições de vulnerabilidade social do bairro

da Ribeira. Nos indicadores de renda, identificou-se que o rendimento per capita das pessoas

com 10 anos ou mais de idade era inferior a meio salário mínimo (Tabela 1), caracterizando a

situação de pobreza extrema (TINOCO et al., 2008). Índice que colocou a comunidade da

42

Disponível em: < http://tribunadonorte.com.br/noticia/moradores-do-maruim-aguardam-

transferencia/197075>. Acessado em: 08 de maio de 2015.

75

Área Especial de Interesse Social do município de Natal, que abriga famílias com renda

familiar de até 3 (três) salários mínimos.

Tabela 1 - média, em salários mínimos, da população com 10 anos ou mais de idade.

Setor Pessoas de 10 anos ou mais

Total Renda média (R$) Renda média em SM

9 679 1259,9 3,6

10 714 1220,6 3,5

11 279 147,6 0,4

Fonte: TINÔCO et al., 2008.

Os dados apresentados na tabela acima indicam que a comunidade do Maruim era alvo

dos objetivos da Política de Habitação de Interesse Social do município de Natal, uma vez que

o Plano Diretor, no Inciso XXIII do art. 6º, define Habitação de Interesse Social como sendo

“aquela destinada a famílias [grifo do autor] que auferem renda inferior ou igual a 6 (seis)

salários mínimos, que vivem em favelas, vilas, loteamentos irregulares e frágeis urbanas que

apresentam fragilidade em termos de habitabilidade”. Foi nesta perspectiva que o

PRAC/Ribeira fez suas proposições para a resolução dos conflitos e problemas envolvendo a

comunidade do Maruim.

O Plano de Reabilitação da Ribeira considerou alguns aspectos relevantes antes de

propor as intervenções sobre a comunidade, entre eles a função social de moradia; a inserção

do Maruim no marco jurídico de proteção à habitação social; o tempo de ocupação pelos

moradores, que é equivalente ao tempo de operação do Porto de Natal; a configuração

urbanística consolidada; e a identidade cultural formada devido à relação dos moradores com

o local (TINÔCO et al., 2008).

Considerando a situação da comunidade frente aos desafios apontados pelo

PRAC/Ribeira, verifica-se a real necessidade de intervir neste espaço e mudar a realidade

apresentada. Porém, antes de ser tomada qualquer decisão sobre o tipo de intervenção, era

necessário ponderar o desejo da população que habitava no local. Para tanto, era

imprescindível que houvesse a participação popular na tomada de decisões, obedecendo ao

disposto no Estatuto da Cidade, que coloca a gestão democrática das cidades como diretriz

para a formulação, implementação e avaliação das políticas públicas de desenvolvimento

urbano.

76

Ao analisar a proposta do PRAC/Ribeira para a comunidade do Maruim, caracterizada

pela apresentação de procedimentos administrativos e urbanísticos, constata-se a orientação

para o poder público ouvir a população a fim identificar as principais demandas e, a partir daí,

definir-se o tipo de intervenção a ser realizada no local, que poderia ser desde a urbanização e

melhorias habitacionais da comunidade, até a relocação parcial ou total dos moradores para

alguma área próxima à ocupação de origem.

Os procedimentos administrativos43

propostos pelo PRAC/Ribeira foram no sentido de

criar condições para a Prefeitura do Natal resolver os problemas da comunidade do Maruim.

Sobre os procedimentos urbanísticos, a equipe do Plano levou em consideração a localização

dos dois tipos de habitação na comunidade: as mais consolidadas e as mais precárias. Neste

sentido, foram apresentadas três alternativas, a saber: i) a urbanização da área onde está

instalada a comunidade, integrando-a ao Canto do Mangue; ii) a relocação parcial do

assentamento, com permanência das edificações consolidadas, integrando-as com o projeto de

urbanização do Canto do Mangue (já previsto pela Prefeitura do Natal), liberando parte

terreno para a ampliação do Porto; e iii) seria a relocação total do assentamento em área

próxima, possibilitando integração com o Canto do Mangue.

Das soluções acima, a recomentada pelo PRAC/Ribeira foi a segunda (Mapa 6), uma

vez que contemplaria tanto a comunidade, quanto o Porto de Natal, além de viabilizar a

criação do “Conjunto Urbano Sociocultural do Canto do Mangue”, também projeto do Plano.

É curioso observar que o PRAC/Ribeira foi sensível ao buscar manter os laços dos moradores

da Comunidade do Maruim com a Colônia dos Pescadores, o Marcado do Peixe e o Canto do

Mangue, ao colocá-los como referência em todas as alternativas. Como dito anteriormente, há

uma relação sociocultural forte da comunidade com estes ambientes, principalmente em se

tratando dos pescadores, que além de morarem, tiram de lá o sustento para as suas famílias.

43

Procedimentos administrativos sugeridos pelo PRAC/Ribeira: (i) constituição do comitê de resolução formado

por atores qualificados para atuar na mediação, a exemplo de: Gestores, representantes dos moradores, assessoria

técnica dos moradores, Ministério Público, Defensoria Pública; OAB/RN; (ii) cadastramento das famílias com a

natureza da propriedade (posse, aluguel, compra e venda); (iii) aplicação do princípio do devido processo legal –

direito à ampla defesa, acesso as informações dos procedimentos adotados e garantia de assessoria técnica e

jurídica à comunidade; (iv) definição de alternativas e instrumentos para negociação de conflitos, fundadas no

marco jurídico do direito à moradia; (v) no caso da solução encaminhada pelo Comitê de resolução vir a ser a

relocação, deve-se garantir a moradia no local de origem até a efetivação da solução apontada (construção de

nova moradia, permuta de imóveis, indenização, outros); (vi) acompanhamento das condições socioeconômicas e

de habitabilidade da população deslocada, se for o caso (TINÔCO et al., 2008).

77

Mapa 6 - Proposta 2: Relocação parcial do assentamento, com permanência das edificações

consolidadas, integrando-as com o projeto de urbanização do Canto do Mangue.

Fonte: TINÔCO et al., 2008.

Mesmo com a existência das propostas do PRAC/Ribeira, que datam de 2008, e apesar

de toda pressão exercida pela administração do Porto, os resultados concretos referentes ao

destino da comunidade do Maruim só começaram a aparecer em 2014.

Em entrevista com realizada com Violeta Odete Ribeiro de Quevedo, atual diretora do

Departamento de Ação Social e Projetos Especiais (DASPE) da Secretaria Municipal de

Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes (SEHARPE), constatou-se que

não há, na secretaria, nenhum registro da proposta PRAC/Ribeira. Porém, verificando o

projeto atual destinado à Comunidade do Maruim, e comparando-o à proposta do Plano de

Reabilitação da Ribeira, evidenciou-se que os princípios continuam os mesmos: habitação

adequada para todas as famílias da comunidade e a reurbanização e a integração daquela área

à praça Pôr do Sol (Canto do Mangue).

78

Os dois projetos propunham a utilização de uma parcela do terreno onde se localiza a

comunidade para fins de reurbanização e integração ao Canto do Mague, sendo que o do

Plano de Reabilitação da Ribeira considerava a permanência de algumas famílias que

ocupavam a área com moradias mais consolidadas, enquanto o atual projeto propõe que uma

parte da área se destine à instalação de equipamentos de comércio e serviços para serem

ocupados pela população, garantindo, assim, a sustentabilidade econômica das famílias.

Segundo Violeta Quevedo, a atual gestão do Prefeito Carlos Eduardo44

encontrou, no

ano de 2013, o atual projeto de reassentamento da Comunidade do Maruim em fase de

modificação na Caixa Econômica Federal e no Ministério das Cidades, tendo em vista que o

modelo anteriormente adotado pela prefeitura estava-se mostrando de difícil execução. A

técnica da SEHARPE alega que a administração anterior45

tinha dado início à remoção das

famílias e que ficaria a cargo delas a indicação dos locais (leia-se das residências) onde seriam

abrigadas. Após a indicação, a prefeitura legalizaria o imóvel – se necessário – e alojaria a

família.

Nós [equipe da SEHARPE] pegamos o barco andando. O projeto do Maruim ele

vem desde 2007 para 2008, a primeira versão. Então ele já passou por várias

modificações. A última que eu tenho conhecimento, e que data da gestão anterior,

foi de que o reassentamento seria individualizado. Cada morador veria para onde

queria ir. Teria que encontrar um imóvel, obviamente dentro das limitações de preço

imposta pelo projeto [grifo do autor] e [que seria, caso necessário] regularizado

para o município poder adquirir e reassentá-lo. Então, era uma coisa um tanto quanto

complexa para você realocar mais de 100 famílias na cidade (informação verbal)46

.

Sob esta metodologia, de acordo com a entrevistada, foram reassentadas cerca de

dezessete famílias em três bairros47

de Natal. A discussão que se coloca a partir da fala da

técnica da SEHARPE é se havia a aceitação das famílias por este método utilizado pela

prefeitura e que tipo de imóvel essas famílias poderiam escolher, tendo em vista que eles [os

imóveis] deveriam seguir as especificações do projeto. Sobre essa proposta, a então prefeita

de Natal Micarla de Sousa, justificou o seguinte ao jornal Tribuna do Norte (2010) 48

:

44

O Prefeito Carlos Eduardo estava à frente do Poder Executivo Municipal na época de elaboração do

PRAC/Ribeira, tendo exercido seu mandato no período de 2002-2008. Após quatro anos afastado da prefeitura,

ele retornou ao cargo no ano de 2013. 45

Gestão da ex-prefeita Micarla de Sousa (2009 – 2012). 46

Entrevista concedida ao autor no dia 18 de maio de 2015. 47

A entrevista só lembrou-se de dois dos três bairros nos quais algumas famílias da Comunidade do Maruim

foram reassentadas: Quintas, na região oeste; e Nossa Senhora da Apresentação, na região Norte. Porém, em

pesquisas documentais, verificou-se que o terceiro bairro que recebeu famílias da comunidade é o Nordeste,

também na região oeste da cidade. 48

Disponível em: <http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/mais-tres-familias-do-maruim-recebem-casas-nas-

quintas/147293>. Acesso em: 18 de maio de 2015.

79

O Maruim foi uma das comunidades de Natal que mais sofreram com a falta de

infraestrutura. Com a mudança das famílias para as novas casas, estamos resgatando

a dignidade e a cidadania dessas pessoas, que já recebem o imóvel completamente

regularizado e estão vivendo no lugar que escolheram.

Dando embasamento à justificativa da ex-prefeita, tem-se o relato de uma das

moradoras que foram reassentadas, a senhora Almira Lau da Costa, de 68 anos, que alegou o

seguinte: “Estou muito feliz. Lá [na Comunidade do Maruim] eu vivia como um animal

abandonado e sempre ficava doente por causa da sujeira. Aqui nas Quintas tenho toda a

estrutura que preciso. É a minha casa, nunca sairei daqui”. No entanto, mesmo com a aparente

aceitabilidade das famílias reassentadas, o projeto precisou ser revisto devido a sua

complexidade. Neste ínterim, houve a mudança de gestão na Prefeitura do Natal e com o

aperfeiçoamento da proposta que estava em negociação com o Governo Federal.

A técnica da SEHARPE informou que o ano de 2013 foi basicamente para reformular

a proposta, que originou a ideia de conjugar a concepção de reassentamento de famílias em

áreas precárias com o Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV). Depois de meses de

trabalho a prefeitura conseguiu, por meio do Programa e Aceleração do Crescimento (PAC) e

do PMCMV viabilizar recursos para o financiamento das obras de construção do Residencial

Maruim (Figura 10), que segundo a entrevistada, acontecerão em duas frentes de trabalho,

sendo a primeira a construção de empreendimento com 200 apartamentos (que já se encontra

em execução) para abrigar as famílias que hoje residem na comunidade do Maruim; e a

segunda consiste na reurbanização da praça Pôr do Sol (Canto do Mangue) e na construção do

Centro de Descasque de Camarão, que abrigará outros pontos de atividades econômicas,

possibilitando também melhores condições de trabalho à população.

80

Figura 10 - Residencial Maruim, com 32% de obras executadas.

Fonte: Fotografia cedida ao autor.

Foto: Rosa de Fátima, 2015.

A partir da nova concepção do projeto aprovada pelo Ministério das Cidades, a

SEHARPE iniciou o estudo da proposta objetivando contemplar todos os moradores da

comunidade, tendo em vista que a prefeitura não queria realocar apenas parte das famílias,

deixando ainda moradores naquela área com baixas condições de habitabilidade. A ideia era

contemplar todas as famílias e realocá-las para um local próximo do “original”, a fim de não

romper com os laços existentes.

A gente já sabia, pelos projetos anteriores, que a grande maioria não gostaria de sair

da região. Então a gestão foi trabalhar no sentido de encontrar um local próximo

aonde já moravam para manter os laços de vizinhança, de uso dos equipamentos

sociais já existentes e a estrutura de trabalho já instalada (informação verbal).49

Em entrevista ao jornal Tribuna do Norte (2014)50

, o secretário de habitação do

município de Natal, Homero Grec, afirma que a construção do empreendimento irá solucionar

problemas refentes à moradia, ao oferecer à população um lugar em condições adequadas de

habitabilidade. E no que se refere à sustentabilidade econômica dos moradores, o secretário

alega que o Residencial Maruim está sendo construído em um terreno (Mapa 7) a menos de

49

Entrevista concedida ao autor no dia 18 de maio de 2015. 50

Disponível em: < http://tribunadonorte.com.br/noticia/a-a-vez-do-minha-casaa/293559>. Acessado em: 10 de

maio de 2015.

81

700 metros de distância da atual comunidade, não prejucando, assim, a relação deles com o

ambiente de trabalho.

Mapa 7 - Atual localização da Comunidade do Maruim e local de construção Residencial Maruim.

Fonte: elaboração própria com base na ferramenta digital Google Earth. Imagens do dia 25/01/2015.

Como forma de manter contato prévio com os beneficiários do projeto, está sendo

executado o Plano Técnico Social. A sua implementação está sendo feita paralelamente em

duas frentes de ação, sendo a primeira a parte da realocação das famílias e todo o processo

que envolve esta ação; na segunda tem-se a atuação do PTS em relação ao comércio e o

fomento à sustentabilidade econômica das famílias realocadas. Segundo Violeta Quevedo, a

SEHARPE pretende no período de atividades pós-obras, dar início às ações de formação

voltadas principalmente para os jovens, que consistirão, entre outras a atividades, no fomento

à Educação Patrimonial e Ambiental, e formação profissional no setor de turismo, tendo em

vista os projetos de revitalização do bairro da Ribeira e o seu potencial para o turismo

cultural.

Levando em consideração a proposta de reurbanizar e integrar aquela área, a técnica

da SEHARPE informou a secretaria está desenvolvendo também, dentro das ações do Plano

Técnico Social, a elaboração de um diagnóstico da área destinada ao comércio das famílias, a

LEGENDA:

Comunidade do Maruim Praça Por do Sol (Canto do Mangue)

Residencial Maruim Trajeto entre comunidade e empreendimento

82

partir da identificação das tipologias locais, dos usos de imóveis para fins de comércio como

bares, restaurantes, quiosques de tapioca, sucata, costura dentre outros, a fim de definir os

eixos deste processo na área de reurbanização integrada (Mapa 8).

A SEHARPE está desenvolvendo ações. A gente tem uma equipe que está lá toda

semana. Têm atividades, as visitas [técnicas] para identificação de comércio, uso

misto [dos imóveis], quem tem moradia e desenvolve alguma atividade de geração

de renda dentro de casa (informação verbal).

Mapa 8 - Área de reurbanização integrada e expansão do Porto de Natal

Fonte: elaboração própria com base na ferramenta virtual Google Earth e nas informações obtidas na entrevista

realizada com a técnica da SEHARPE, em 18 de maio de 2015.

No entanto, mesmo com todos os benefícios prometidos pela gestão municipal às

famílias do Maruim, ainda se identifica certa resistência por parte de alguns moradores da

comunidade. O senhor Francisco Antônio Ferreira, de 38 anos, que alegou não concordar com

o projeto, porém, como não serão transferidos para um local muito longe do atual, contenta-

se: “Não queremos sair porque o nosso sustento vem daqui. Desde pequeno pesco, criei meu

filho pescando tainha no rio, e indo pra longe é difícil. [O local do empreendimento] é longe,

mas melhor do que ir pra mais longe ainda”.

Área de expansão do Porto de Natal Área de Reurbanização Integrada

Área de instalação de equipamentos para comércio das famílias Mercado do Peixe

Praça Por do Sol (Canto do Mangue)

83

Entretanto, a partir do exposto neste tópico, entende-se que a Prefeitura do Natal está

buscando conciliar os interesses da Comunidade do Maruim e do Porto de Natal, o que acaba

por contemplar a ideia de revitalizar o bairro da Ribeira. O desafio que se coloca a partir de

então é que essas ações, em especial as do empreendimento Residencial Maruim e da

reurbanização integrada, tenham sustentabilidade. Para tanto, é necessário que haja o

acompanhamento permanente por parte da gestão municipal, a fim de garantir a efetividade e

eficácia das intervenções.

4.3. Esforços por um Plano de Valorização Turístico-Cultural da Ribeira

O desafio de revitalizar os centros urbanos perpassa por algumas questões que devem

ser minuciosamente observadas e colocadas à sujeição daqueles que serão direta e

indiretamente atingidos pelas ações a serem desenvolvidas. Alguns tópicos dessas colocações

versam sobre vertentes fundamentais para a efetividade e eficácia das ações de revitalização, a

saber: o incentivo à habitação, que consequentemente gera demandas por outros serviços; e o

incentivo à diversidade de usos dos equipamentos públicos e mobiliários disponíveis, que por

sua vez podem se traduzir em atrações para novos visitantes, entre eles moradores da própria

cidade e turistas.

As questões postas merecem especial atenção, principalmente em se tratando de

intervenções em sítios históricos, uma vez que a articulação entre novos usos e funções e a

preservação do patrimônio deve existir nos projetos de intervenção nesses espaços. Para tanto,

alguns autores, dentre os quais podemos destacar Ramos e Ferraz (2010), colocam a

participação popular como elemento fundamental para elaboração de propostas de

revitalização urbana, uma vez que estas, como colocam Vasconcellos e Mello (2009, p. 59),

podem ter suas atuações pautadas “na privatização de áreas públicas e de gestão do meio

ambiente por meio de parcerias, nas quais o capital privando prevalece”, visando, de forma

implícita, a recuperação econômica de áreas degradadas em detrimento da preservação do

patrimônio e do desenvolvimento social.

Considerando as características do bairro da Ribeira, e chamando atenção para o fato

relatado acima, Ramos e Ferraz (2010, p. 6) inferem que “vitalidade urbana não é garantia da

conservação do patrimônio”, uma vez que surgem necessidades de modificações estruturais

na arquitetura devido às exigências dos setores de comércio e serviço. Portanto, as autoras

apontam para a importância da participação popular nas ações de planejamento e

84

acompanhamento de projetos culturais para que estes não se caracterizem como ameaças à

preservação do patrimônio histórico local.

Relacionado à discussão supracitada aos projetos de revitalização urbana do bairro da

Ribeira, temos o Plano de Valorização Turístico-Cultural, fruto do PRAC/Ribeira, que

objetivava transformar os elementos de cultura do bairro em produtos turísticos, promovendo

a diversidade funcional e social do bairro, de maneira a considerar a sua identidade cultural e

buscando a vitalidade econômica da área. A referida proposta teve sua estrutura pensada a

partir dos apontamentos da população sobre os principais problemas que afetam direta e

indiretamente o bairro e os seus moradores. No quadro abaixo podemos conferir as

informações foram colhidas por meio das já citadas oficinas e possibilitaram a construção de

um diagnóstico e a elaboração de um cenário futuro para a Ribeira, como também as metas a

serem atingidas a partir da implementação das ações propostas (TINÔCO et al., 2008).

Quadro 4 - Problemáticas e cenário futuro para o bairro da Ribeira e a metas do Plano de Valorização Turístico-

Cultural.

Problemas

prioritários51

Cenário futuro Metas do Plano de Valorização

Turístico-Cultural

Falta de

segurança; Falta

de iluminação;

Falta de incentivo

fiscal; Falta de

área de lazer;

Falta de

estacionamento;

Prédios vazios;

Falta de

drenagem nas

ruas.

Bairro com moradias e com infraestrutura

para a fixação dessas moradias (os grupos

concluíram que essa estrutura virá em

consequência das reivindicações dos futuros

moradores); Patrimônio Histórico valorizado

e restaurado (identificação do que deve ser

restaurado e trabalhado para o turismo);

efetivação de um turismo cultural (que

valorize todo o potencial histórico);

valorização do Rio com o aproveitamento de

sua beleza como um potencia turístico; um

rio que possibilite passeios fluviais/prática de

esportes náuticos; Porto com Terminal de

Passageiros no Largo da Rua Chile; Bairro

Boêmio (com vida noturna, Casas de

Shows/Eventos)/Polo Cultural de Natal);

imagem recuperada de Centro Histórico e de

detentor de valorosas memórias de Natal;

drenagem e limpeza pública eficientes

(erradicação desses problemas); um bairro

seguro, com uma polícia comunitária

eficiente.

Promover a requalificação da

Ribeira como Produto Turístico-

Cultural, de forma que as

intervenções possam significar a

emergência de uma identidade para

o bairro como centro histórico e

cultural de Natal consolidado pela

valorização do Patrimônio Histórico

e pelo o aproveitamento do espaço

para lazer cultural e entretenimento,

privilegiando as manifestações

culturais e proporcionando

qualidade de vida para a população.

Proporcionar a transformação da

Ribeira em espaço para o

desenvolvimento do

empreendedorismo, do exercício da

cidadania e para a geração de

emprego e renda através dos

princípios do turismo sustentável.

Fonte: elaboração própria com base em TINÔCO et al., 2008.

51

Ao todo foram elencados 26 principais problemas que afetam o bairro da Ribeira, dentre os quais foram

destacados 7 como prioritários. Ver TINOCO et al., 2008.

85

Considerando as informações do quadro acima, podemos identificar que alguns

apontamentos feitos pela população são compatíveis com as ressalvas feitas pelos autores.

Nas três colunas há a indicação de que a própria população estava querendo a transformação

do bairro em um produto turístico, fazendo surgir uma alternativa ao chamado “turismo de

céu e mar”, possibilitando que outras áreas se beneficiassem com os seus resultados mais

imediatos: geração de emprego e renda.

As ações pensadas a partir do diagnóstico participativo foram sistematizadas em dez

projetos (Quadro 5) para o bairro da Ribeira, dentre os quais destacamos o de “Educação

Patrimonial” e o da “Ribeira Organizada”. A importância desses dois projetos se reflete na

sustentabilidade que eles podem conferir aos demais, sendo este primeiro uma referência à

valorização do patrimônio histórico e cultural por parte da população da cidade, como

também o fortalecimento das identidades locais. Essas ações são importantes uma vez que “a

comunidade quando toma consciência de seu patrimônio, o valoriza, gerando novos

conhecimentos num processo contínuo de enriquecimento individual e coletivo” (RAMOS e

FERRAZ, 2010, p. 7). No que se refere ao tópico “Ribeira Organizada”, enfatizou-se a

necessidade dos grupos da Sociedade Civil Organizada se organizarem para atuarem na

implementação do Plano de Valorização Turístico-Cultural, a fim de buscar a garantia da

efetividade e da eficácia dos projetos.

86

Quadro 5 - Projetos do Plano de Valorização Turístico-Cultural da Ribeira.

Classificação Projeto Objetivos

Pri

ori

da

de

mu

ito

alt

a

Educação

Patrimonial

(1) a formação de educadores patrimoniais que possam exercer seu papel

permanentemente na sociedade natalense, estimulando a valorização da história e do

patrimônio; (2) o conhecimento do papel da Ribeira na história do Município de Natal e

do Rio Grande do Norte; (3) o reconhecimento dos ícones presentes na Ribeira que

remetem a determinados contextos históricos, restabelecendo relações referenciais de

tempo/espaço; (4) a conscientização da importância do Patrimônio Histórico para a

identidade de um grupo social e seu papel enquanto cidadão nesse processo.

Ribeira

Organizada

(1) Estimular a organização da sociedade civil para o acompanhamento das ações do

Plano de Valorização Turístico Cultural; (2) promover a gestão conjunta do espaço, de

forma a viabilizar a participação dos grupos envolvidos no processo; (3) identificar a

Ribeira com um espaço democrático de exercício da cidadania e participação popular.

Pri

ori

da

de

alt

a

Novos roteiros

de visitação

(1) proporcionar ao turista ou excursionista o conhecimento dos diferentes espaços

(praças, monumentos, imóveis) inseridos em um contexto histórico e em um sentido,

permitindo sua valorização; (2) permitir aos receptivos de Natal que possam conduzir

os turistas por um roteiro que proporcione conhecimento do local, entretenimento e

segurança; (3) consolidar a Ribeira como um Produto Turístico que possa atender

satisfatoriamente a demanda por história e cultura presente nos diferentes grupos de

turistas.

Rio Potengi

(1) possibilitar a transformação do Rio Potengi em atrativo turístico valorizando as

paisagens em seu percurso; (2) promover o aproveitamento do Rio para passeios de

barco monitorados para grupos de turistas e visitantes.

Rua da Cultura

(1) estimular a identificação da Ribeira com Arte e Cultura; (2) proporcionar um espaço

para artistas potiguares se apresentarem aos finais de semana promovendo a

possibilidade de divulgarem sua arte e obterem reconhecimento junto à população; (3)

estimular a aproximação da população com a arte popular promovendo sua valorização.

Cinema de Arte

(1) proporcionar a circulação na Ribeira de um público interessado em cultura; (2)

promover a criação de um espaço na Ribeira para o estímulo ao cinema de arte e o

acesso permanente ao circuito cultural de cinema exibido no país.

Centro Cultural

Poliesportivo

(1) estimular a prática do esporte e as atividades culturais para a população de Natal; (2)

promover a circulação na Ribeira de um público permanente que realizará cursos

diferenciados de artes e praticará esportes em um espaço determinado para esse fim; (3)

proporcionar a identificação da Ribeira como um local aonde se vai para adquirir

cultura, saúde e qualidade de vida para a população.

Atividades

Esportivas

(1) Estimular a prática de atividades físicas para a população de Natal; (2) Promover a

rua como espaço de sociabilidade e interação; (3) Proporcionar aos finais de tarde

atividades esportivas monitoradas como tai chi, aeróbica, dança, caminhada, etc, com

educadores físico que podem também oferecer orientações sobre saúde e qualidade de

vida para a população; (4) Estimular a circulação das pessoas na Ribeira e a

sociabilidade no espaço público.

Lazer com Arte

(1) Integrar a população natalense no espaço da Ribeira por meio da oportunidade do

aprendizado de atividades artísticas; (2) Valorizar as praças como espaço de interação e

sociabilidade; (3) estimular a circulação das pessoas e a sociabilidade no espaço

público; (4) Promover espaço para a revelação de novos talentos; (5) estimular artistas

locais; (6) desenvolver habilidades artísticas na população.

Noite Boêmia

(1) resgatar a identidade da Ribeira como “Bairro Boêmio”, voltado para um público

interessado em arte e cultura; (2) promover a ocupação do espaço com cantinas, bares e

restaurantes de pequeno porte que ofereçam serviços diferenciados e com qualidade; (3)

estimular o empreendedorismo; (4) desenvolver um circuito gastronômico.

Fonte: Adaptado pelo autor com base em TINÔCO et al., 2008.

87

Uma das medidas tomadas pela gestão municipal no sentido de viabilizar parte dos

projetos postos acima foi a elaboração da Lei de Operação Urbana Ribeira (2007), que previa

incentivos fiscais para quem quisesse morar ou fazer outros investimentos no bairro da

Ribeira. Os incentivos previstos pela OUR compreendiam desde a redução de taxas referentes

ao Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), ao Imposto sobre Serviços

de Qualquer Natureza (ISSQN) e à Taxa de Licença decorrente da localização e da execução

de obras em estabelecimentos.

O art. 18 da Lei de Operação Urbana Ribeira de 2007 estabelece que:

Para a consecução dos objetivos desta Lei são concedidos incentivos fiscais para

realização de investimentos na restauração, recuperação e manutenção do

patrimônio construído e na instalação de atividades produtivas voltadas para o

comércio, turismo, cultura, lazer e uso residencial, localizada, exclusivamente, na

Área de Intervenção da Operação Urbana Ribeira.

No entanto, apesar da reivindicação popular e da lei aprovada, a demanda por

incentivos que realmente impulsionem modificações no cenário social e urbano do bairro da

Ribeira ainda é baixo. Em entrevista ao Jornal Nominuto.com no ano de 2010 (três anos após

a sanção da Lei), o então secretário municipal de Tributação André Macedo, afirmou que a

maior demanda era sobre a redução do ISSQN, porém destinados a grupos artísticos que se

apresentariam no Teatro Alberto Maranhão, ou seja, sem impacto sobre as dinâmicas do

bairro. Referente ao IPTU, o secretário afirmou que a Secretaria Municipal de Tributação

(SEMUT) não tinha registros de solicitação de incentivos: “não sei se falta divulgação, o fato

é que não recebemos esses pedidos de isenção no IPTU nos últimos anos” (JORNAL

NOMINUTO.COM52

).

É interessante a colocação do hoje ex-secretário municipal de Tributação, uma vez que

ela retoma a fala da técnica da SEMURB, Ana Mirian Machado de S. Freitas, que relatou a

Silva (2002), a falta de marketing nos projetos da Prefeitura do Natal para a Ribeira, fazendo

com que o empresariado não olhasse o bairro como um lugar promissor para os investimentos.

Neste sentido, podemos afirmar o mesmo em relação às pessoas com possível interesse em

morar na Ribeira, uma vez que a SEMURB tem, em seus arquivos, cadastros de milhares de

interessados em residir no bairro, porém, não existe hoje no município de Natal, uma política

pública destinada ao incentivo à habitação no Centro Histórico, o que acaba por comprometer

as tentativas de reabilitação do bairro da Ribeira.

52

Disponível em:< http://www.nominuto.com/noticias/cidades/mesmo-com-incentivos-fiscais-ribeira-ainda-nao-

atrai-moradores/62966/>. Acessado em: 15 de maio de 2015.

88

Outro relato importante foi o do professor João Galvão que justificou a não efetividade

das ações da Operação Urbana Ribeira dizendo que "nós temos um empresariado que,

infelizmente, não está interessado em investir no bairro não53

". Fato que nos leva a fazer uma

reflexão a respeito das limitações que são impostas aos usos das edificações no bairro da

Ribeira ou até mesmo como o poder público tem trabalhado para despertar o interesse por

parte desse contingente que tem a capacidade de investir.

Olhando para os projetos propostos pelo Plano de Valorização Turístico-Cultural e

comparando com a realidade da Ribeira hoje, verificamos que nada foi implementado. O

bairro continua com baixa expressividade cultural e não há vida noturna. O que se tem em

alguns períodos do ano são festivais de música e literatura que acontecem no largo do Teatro

Alberto Maranhão e nas ruas do bairro. Eventos geralmente gratuitos que abrem a

possibilidade da interação entre os diversos públicos.

O Circuito Cultural Ribeira, um dos eventos que movimentam o bairro, acontece

geralmente no primeiro domingo de cada mês e tem a iniciativa privada como principal

patrocinadora, apesar do município também investir no evento. Também acontecem no bairro

a Virada Cultural de Natal, o Festival Literário de Natal (Flin) e os shows do evento “Natal

em Natal”, ambos realizados pela Prefeitura, por meio da Fundação Capitania das Artes

(FUNCART) e da Secretaria Municipal de Cultura (Secult).

No entanto, é preciso que haja mais investimentos do poder público no sentido de

garantir além da continuidade desses eventos, o surgimento de novas ações que permitam dar

vida noturna constante ao bairro, possibilitando a interação dos indivíduos de todas as classes

sociais e o acesso à cultura. Desta maneira, se estará dando ao bairro da Ribeira um novo

sentido de Centro Urbano: aquele que mescla funções e usos e garante benefícios econômicos

ao conjunto da cidade, seja por meio do turismo cultural ou pela simples movimentação de

pessoas que o bairro receberá. Além disso, tem-se o incentivo à diversidade e à inclusão

social, como também se estará fazendo justiça à história do bairro e ao seu significado para a

cidade do Natal.

53

Em entrevista ao autor no dia 28 de abril de 2015.

89

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os projetos de revitalização para o bairro da Ribeira, sobretudo aqueles que surgiram a

partir da década de 2000, mostram-se ser propostas claras e bem definidas, cujos objetivos

estavam de acordo com os princípios e diretrizes do Ministério das Cidades, que versam sobre

“a diversidade de usos e de atividades voltadas para o desenvolvimento urbano, social e

econômico, compreendendo a reutilização de edificações ociosas, [...] bem como a melhoria

da infraestrutura, dos equipamentos e dos serviços urbanos” (MINISTÉRIO DAS CIDADES,

2004). Além dessas colocações, fazemos referências aos preceitos colocados por alguns

autores, dentre os quais destacamos Maricato (2001), ao considerarem fundamental o

incentivo à moradia e o fomento ao pequeno negócio e às atividades culturais nos centros

urbanos que sofrem com o esvaziamento e a deterioração de suas estruturas sociais e urbanas.

Verificou-se, no entanto, que apesar das propostas existentes, poucas ações se

concretizaram, relegando o bairro da Ribeira, durante mais de vinte anos – se considerarmos

também os períodos anteriores à gestão de Carlos Eduardo Alves (2002-2008) – a projetos

malsucedidos que não tiveram seus resultados traduzidos em melhorias perceptíveis das

condições de vida e do habitat da população local. Temos ainda hoje um bairro que sofre com

os efeitos de décadas de forte abandono residencial e que vem, ao longo dos últimos meses,

passando por um processo mais acentuado de declínio de suas atividades com a saída de

pontos de comércio e repartições públicas, fato que agrava mais a situação, haja vista serem

esses dois os principais tipos de serviços que asseguram, ainda, o pouco dinamismo que o

bairro possui.

Apesar da inefetividade e ineficácia dos antigos projetos para o bairro da Ribeira,

constatou-se que foi deixado para o município um “legado institucional” e a abertura dos

caminhos que devem ser seguidos para uma efetiva revitalização. A troca de experiências com

outros gestores, inclusive internacionais, possibilitou à equipe da Prefeitura do Natal adquirir

valioso aprendizado na elaboração e no planejamento de ações de revitalização de centros

urbanos. A crítica que se faz, no entanto, é sobre o descompasso existente entre o

planejamento e a execução das propostas.

Sobre o “legado institucional” o qual nos referimos acima, identifica-se que a

Prefeitura do Natal não está sabendo aproveitar de maneira a garantir a efetivação de ações de

recuperação do Centro Histórico. Não há, na gestão municipal, o fortalecimento das estruturas

governamentais e técnicas, fato evidenciado pela extinção, em 2014, por meio da Reforma

90

Administrativa na Prefeitura, do Setor de Patrimônio Histórico (SPH) da Secretaria Municipal

de Meio Ambiente e Urbanismo. Este fato, de acordo com uma das gestoras entrevistadas54

,

fez a gestão perder em muitos sentidos, tendo em vista que alguns profissionais capacitados

deixaram a administração e outros mudaram de setor, prejudicando o andamento das

atividades referentes a alguns projetos para a Ribeira.

Apesar disso, vê-se hoje sendo construído um novo cenário para o bairro da Ribeira.

Com o tombamento pelo Iphan e a criação do Programa de Aceleração do Crescimento –

Cidades Históricas (PAC Cidades Históricas) viu-se abrir uma nova janela de oportunidades

para o bairro. Tem-se novamente uma gama de novos projetos que podem influenciar na

atratividade turística e habitacional da Ribeira, desta vez sob a responsabilidade de diversos

órgãos (Iphan, UFRN, Governo do Estado e Prefeitura do Natal).

Saindo do campo das ideias, vemos hoje algo concreto acontecendo na Ribeira. Este

estudo identificou algumas ações e projetos que estão dando, paulatinamente, uma maior

visibilidade ao bairro nos aspectos culturais e urbanísticos. Eventos que permitem a interação

entre os diversos públicos e colocam as noites do bairro em evidência, mesmo que de forma

ainda insuficiente. Sobre as atuais mudanças de ordem urbanística, tem-se o projeto da

comunidade do Maruim, que este estudo considera como o maior passo concreto atualmente

rumo à revitalização da Ribeira, haja vista que o mesmo já se encontra em execução e, se

implementado completamente, terá considerável impacto sobre as dinâmicas do bairro.

Sobre a atuação da iniciativa privada no processo de recuperação imobiliária, é

perceptível o aumento do estoque habitacional em uma parte da Ribeira, caracterizado pelo

processo de verticalização existente no bairro e nas suas áreas limítrofes55

, que de certa

maneira impactam nas dinâmicas do bairro em si. Este processo é evidenciado pela oferta, nos

últimos anos, de empreendimentos de alto padrão na chamada Área Adensável instituída pela

Lei de Operação Urbana Ribeira de 2007.

As dinâmicas demográficas e de mercado também influenciam no processo de

evolução imobiliária da Ribeira. O tombamento, por parte do Iphan, tornou mais difícil as

modificações nas estruturas físicas do bairro, limitando o interesse do setor privado da área. O

único local que ainda se pode implementar modificações profundas é na Área Adensável. O

54

Em entrevista concedida ao autor no dia 18 de abril de 2015. 55

Ver NASCIMENTO, 2012.

91

que o poder público deve fazer é gerenciar os diversos interesses em torno do bairro, a fim de

garantir que haja o desenvolvimento sustentável.

No campo das iniciativas legais, identificou-se que a gestão municipal pretende,

segundo informações da representante da SEMURB, reeditar a Lei de Operação Urbana

Ribeira, cuja última versão, de 2007, teve sua vigência terminada em 2013. Além disso, o

mais novo fato foi a publicação no dia 28 de maio de 2015, no Diário Oficial do Município,

do Decreto nº 10.706, que dispõe sobre a regulação do Grupo de Trabalho para Projetos

Estruturantes da Ribeira e do Entorno. O grupo, vinculado à Secretaria Municipal de Meio

Ambiente e Urbanismo (SEMURB), tem a missão de promover a integração entre os órgãos

da Administração Municipal, Estadual, Federal e demais e demais setores da sociedade civil

com vistas á formulação, implementação e acompanhamento de projetos, estudos e ações para

a revitalização da Ribeira e do seu entorno.

Dito isto, as principais percepções que se pode tirar acerca do resultado deste trabalho

evidenciam que não é por falta de propostas, dentre as quais destacamos alguns projetos e

marcos normativos, que o bairro da Ribeira se encontra na atual situação de abandono e

deterioração do seu patrimônio histórico. No entanto, é premente a necessidade de efetivação

de uma política pública de incentivo à habitação no bairro, de forma a dar novos usos aos

prédios abandonados, a fim de promover a sustentabilidade das ações de revitalização e a

recuperação efetiva do bairro.

Ademais, verifica-se que as perspectivas para o bairro da Ribeira são boas. Projetos

existem, no entanto, é preciso que o poder público trabalhe no sentido de evitar alguns

fenômenos como o aprofundamento da crise urbana em que o bairro se encontra no caso da

não efetividade dos projetos; e no caso da efetivação das ações, deve-se trabalhar no sentido

de evitar o processo conhecido por gentrificação, um fenômeno viabilizado por meio de

transformações sociais, culturais, habitacionais e econômicas (HAMNET, 1984 apud

BIDOU-ZACHARIASEN, 2006, p. 23) que geralmente tem efeitos “perversos” causando a

expulsão do contingente populacional de baixa renda e atraindo a classe média das áreas

“gentrificadas”, quando o ideal é que haja a convivência dos indivíduos das diversas classes

sociais no mesmo espaço.

Segundo Vargas e Castilho (2009), o processo de melhoria nos centros urbanos, além

de ser destinado aos cidadãos locais, deve contar com o envolvimento deles na construção e

recuperação do espaço. Dito isto, considera-se fundamental que as instituições responsáveis

92

pelos novos projetos trabalhem de forma articulada e busquem o diálogo com a sociedade

civil, a fim de se obter resultados efetivos e eficazes e construir novos tempos para a Ribeira,

este centro urbano em gradual transformação.

93

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Leão de. (Org). Metodologia do Trabalho Social: A experiência da extensão universitária.

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Arquitetura em Urbanismo) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2007.

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Trabalho nos Programas e Ações do Ministério das Cidades.

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Barueri, SP: Manole, 2009.

98

APÊNDICES

99

APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA COM FLORÉSIA PESSOA

ROTEIRO DE ENTREVISTA

Pesquisador: Luís Renato Nogueira da Rocha

Prof. Orientador: Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva

Curso: Gestão de Políticas Públicas

INFORMAÇÕES DO ENTREVISTADO

Nome Maria Floresia Pessoa de Sousa e Silva

Instituição Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – SEMURB

Função Secretária Adjunta de Informação e Planejamento Urbanístico e

Ambiental

Data ____/____/____; Hora: ____ : ____.

PERGUNTAS

1) Há quanto tempo a senhora trabalha na gestão municipal?

2) Recuperando a memória dos dois últimos projetos destinados à revitalização da Ribeira,

encontra-se o Programa ReHabitar e o Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais –

PRAC/Ribeira. Qual a sua leitura a respeito desses dois documentos?

3) Tendo como referência as propostas do ReHabitar e do PRAC/Ribeira, e observando a

situação atual do bairro, identifica-se que os projetos não foram efetivados. Por quê? O que

deu errado?

4) Ainda em relação ao ReHabitar e ao PRAC/Ribeira, houve algum desdobramento

institucional que deu resultado positivo ao à gestão municipal? Se sim, qual?

5) A mudança de gestão em 2009 influenciou na implementação das propostas? Se sim, de que

forma?

6) Há, atualmente, na estrutura administrativa da SEMURB algum setor/departamento

destinado a gerir os projetos para o Centro Histórico de Natal?

7) Há projetos para de revitalização do Centro Histórico de Natal viabilizados pelo PAC –

Cidades Históricas? Se sim, como a Ribeira será contemplada?

8) Há, no município de Natal, alguma política de Revitalização Urbana para o bairro da

Ribeira? Se sim, o que constitui essa política?

100

APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA COM JOÃO GALVÃO

ROTEIRO DE ENTREVISTA

Pesquisador: Luís Renato Nogueira da Rocha

Prof. Orientador: Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva

Curso: Gestão de Políticas Públicas

INFORMAÇÕES DO ENTREVISTADO

Nome João Galvão do Nascimento Neto

Instituição Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – SEMURB

Função Servidor aposentado da SEMURB (foi membro da equipe técnica do

Programa ReHabitar em Natal.

Data ____/____/____; Hora: ____ : ____.

PERGUNTAS

1) Por quanto tempo o senhor trabalhou na SEMURB?

2) Qual função o senhor desempenhava lá?

3) Recuperando a memória dos dois últimos projetos de revitalização da Ribeira,

encontramos o ReHabitar e o PRAC/RIBEIRA. Qual a leitura do senhor sobre essas

duas propostas?

4) O senhor participou da construção da proposta do PRAC/Ribeira?

5) Qual foi o papel da SEMURB na construção do PRAC/Ribeira? E na construção do

ReHabitar?

6) Com a criação do Ministério das Cidades, houve alguma mudança no modo como o

município pensava a revitalização do bairro?

7) Com a atualização da Lei Operação Urbana Ribeira, em 2007, houve mudança no

modo de planejar da revitalização do bairro?

8) Como a gestão municipal via a questão da Habitação no centro? Falava-se em

Habitação de Interesse Social?

9) Como o senhor vê o Centro Histórico de Natal, e em especial o bairro da Ribeira, nos

dias de hoje?

10) Quais as expectativas do senhor para o futuro da Ribeira?

101

APÊNDICE C – ROTEIRO DE ENTREVISTA COM VIOLETA QUEVEDO

ROTEIRO DE ENTREVISTA

Pesquisador: Luís Renato Nogueira da Rocha

Prof. Orientador: Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva

Curso: Gestão de Políticas Públicas

INFORMAÇÕES DO ENTREVISTADO

Nome Violeta Odete Ribeiro de Quevedo

Instituição Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e

Projetos Estruturantes – SEHARPE.

Função Diretora do Departamento de Ação Social e Projetos Especiais

Data ____/____/____; Hora: ____ : ____.

PERGUNTAS

1) Há na SEHARPE algum registro da proposta do Plano de Reabilitação de Áreas Urbanas

Centrais – Ribeira (PRAC/Ribeira) para a comunidade do Maruim?

2) Foi realizada uma pesquisa para identificar qual destino os moradores da comunidade do

Maruim queriam para si? Se sim, o que eles propuseram?

3) Considerando a realocação, as famílias da comunidade do Maruim participaram da escolha do

local do empreendimento?

4) Por que a opção por realocação?

5) Quantas famílias residem na comunidade do Maruim, hoje? Desse universo, quantas serão

realocadas?

6) Quais os critérios adotados a escolha das famílias que serão realocadas?

7) Considerando o fato de que ainda permanecerão famílias no Maruim, quais intervenções

estão sendo planejadas para evitar a reocupação?

8) O que contempla o Residencial Maruim em termos de infraestrutura e social? Há

equipamentos públicos no entorno do empreendimento, que possibilite o acesso fácil dos

moradores?

9) Como a SEHARPE vê a questão da habitação no bairro da Ribeira, considerando que o bairro

tem potencial e características que permitem sua expansão habitacional?

10) A SEHARPE tem algum projeto para Habitação no bairro da Ribeira? Se sim, é no âmbito

dos projetos de Habitação de Interesse Social?