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Plataforma para melhorar o acesso a novos medicamentos oncológicos na Europa
2ª Mesa Redonda
Lisboa, 24 de Maio de 2017
Sala do Senado da Universidade de Lisboa
Preparado por:
Eurotrials, Scientific Consultants, SA
Para:
APIFARMA – Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica
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Índice
Lista de Abreviações Incluídas no Texto ................................................................... 3
Sumário Executivo .................................................................................................... 4
1 Introdução .............................................................................................................. 6
1.1 Enquadramento .............................................................................................. 6
1.2 Fundamentação da mesa redonda ................................................................. 7
2 Métodos ................................................................................................................. 8
2.1 Responsabilidades ......................................................................................... 8
2.2 Temas de discussão ...................................................................................... 9
2.3 Organização ................................................................................................. 10
3 Debate ................................................................................................................. 11
3.1 Tema 1: Financiamento ................................................................................ 11
3.1.1 Necessidade do aumento do orçamento de estado para a saúde ............. 11
3.1.2 Priorização do financiamento .................................................................... 11
3.1.3 Aumento da eficiência .............................................................................. 12
3.1.4 Valências adicionais para os doentes oncológicos ................................... 14
3.2 Tema 2: Dados e indicadores ....................................................................... 14
3.2.1 Ausência de dados ................................................................................... 14
3.2.2 Indicadores para avaliação de performance ............................................. 16
3.2.3 Dados versus informação ......................................................................... 17
3.2.4 Recolha de dados ..................................................................................... 17
3.2.5 Qualidade dos dados ................................................................................ 17
3.2.6 Registo Oncológico Nacional .................................................................... 18
3.2.7 Proteção da confidencialidade versus recolha de dados ........................... 18
3.2.8 Reavaliação .............................................................................................. 18
3.2.9 Cancro hereditário .................................................................................... 19
3.3 Tema 3: Acesso e equidade ......................................................................... 20
4 Recomendações e notas finais ............................................................................ 21
5 Referências .......................................................................................................... 22
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Lista de Acrónimos Incluídos no Texto
APIFARMA Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica
EFPIA Federação Europeia das Associações e Indústrias Farmacêuticas
KPI Key Performance Indicator
SNS Sistema Nacional de Saúde
SPO Sociedade Portuguesa de Oncologia
TAC Tomografia Axial Computadorizada
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Sumário Executivo
A Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA) promoveu a realização de
duas mesas-redondas para discussão do tratamento do cancro em Portugal pelas várias
partes interessadas: representantes dos doentes, profissionais de saúde, sociedades
científicas, economistas da saúde, decisores políticos, reguladores e Indústria Farmacêutica.
A realização de reuniões em formato de mesa-redonda sobre Oncologia integra-se num
projecto europeu mais amplo, apoiado pela Federação Europeia das Associações e
Indústrias Farmacêuticas (EFPIA), por 15 empresas membros da EFPIA e pelas
associações nacionais congéneres.
A primeira mesa-redonda, realizada a 8 de Março de 2017 (sala do Senado da Universidade
Nova de Lisboa), permitiu a análise e identificação de um conjunto de oportunidades de
melhoria no panorama actual do tratamento do cancro no sistema de saúde em Portugal,
considerado insustentável, a médio prazo, para doentes, profissionais de saúde e Indústria
Farmacêutica. A presente segunda mesa-redonda teve como principal objectivo o
desenvolvimento de três a cinco recomendações de actuação para melhorar o acesso a
novos medicamentos em oncologia.
A reunião teve como ponto de partida uma apresentação da Drª Gabriela Sousa, em
representação da Sociedade Portuguesa de Oncologia, com uma panorâmica geral do
tratamento do cancro em Portugal e a contextualização dos desafios da inovação em
oncologia, e seu impacto na sobrevivência e qualidade de vida dos doentes. De seguida,
decorreu o debate tendo como base os três temas principais de discussão decorrentes da
primeira mesa-redonda:
• Tema 1: Financiamento;
• Tema 2: Dados e indicadores;
• Tema 3: Acesso e equidade.
Com base no debate dos participantes sobre os temas elencados, resultaram as seguintes
recomendações, listadas em seguida, no sentido de introduzir melhorias no tratamento do
cancro em Portugal:
1) Aumento do orçamento do estado para a saúde e, em particular, do orçamento
alocado às doenças oncológicas;
2) Investimento prioritário em recursos humanos seguindo-se investimento em
estrutura, melhoramento da eficiência e modelos de avaliação de desempenho;
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3) Implementação de sistemas de monitorização de dados – e.g. dados de gestão;
dados do desempenho das instituições no tratamento do cancro, dados económicos;
dados de utilização de medicamentos em contexto de vida real - para utilização pelos
vários intervenientes, incluindo decisores e escrutínio público;
4) Contratação de profissionais especializados no registo e tratamento dos dados
pretendidos – e.g. data scientists, epidemiologistas, etc. – que assegurem a
qualidade do processo;
5) Em contexto de reavaliação de medicamentos, utilização dos mesmos indicadores
que conduziram à sua aprovação.
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1 Introdução
1.1 Enquadramento
A APIFARMA promoveu a realização de duas mesas-redondas para discussão do
tratamento do cancro em Portugal, as quais pretendiam reunir um grupo de representantes
de instituições/organizações com intervenção relevante no tratamento do cancro em
Portugal, incluindo médicos, grupos de pacientes e políticos da área da saúde. Um dos
principais objectivos das mesas-redondas consistia em definir de que forma os
intervenientes no sistema de saúde português podem trabalhar juntos para assegurar o
acesso atempado e sustentável dos doentes oncológicos ao melhor tratamento disponível.
Esta iniciativa integra-se num projecto mais amplo apoiado pela Federação Europeia das
Associações e Indústrias Farmacêuticas (EFPIA) e por 15 empresas membros da EFPIA e
da APIFARMA (Amgen, AstraZeneca, Bayer, Boehringer Ingelheim, Bristol-Myers Squibb,
Celgene, Ipsen, Janssen, Lilly, Merck, MSD, Novartis, Pfizer, Roche e Servier) com vista a
melhorar o acesso a novos medicamentos oncológicos na Europa.
A primeira mesa-redonda, realizada no dia 8 de Março de 2017 (sala do Senado da
Universidade Nova de Lisboa), teve como objectivo a identificação das principais
oportunidades de melhoria dos resultados em saúde para os doentes com cancro, de
desenvolvimento de sinergias entre as partes interessadas no tratamento oncológico em
Portugal e principais desafios no acesso à inovação. Entre as suas principais conclusões,
destacam-se:
• Bom desempenho de Portugal no tratamento do cancro (custos apurados
relativamente baixos e taxas de sobrevivência mais elevadas comparativamente a
outros países europeus cujo investimento foi consideravelmente superior);
• A necessidade de implementar um sistema efectivo de monitorização dos resultados
em saúde em Portugal, de modo a que dados que reflictam a realidade no
tratamento do cancro possam ser utilizados pelos decisores e conhecidos pela
sociedade;
• A existência de uma restrição no acesso a medicamentos oncológicos inovadores
em Portugal, bem como uma falta de equidade no acesso aos cuidados de saúde e à
inovação no tratamento do cancro;
• A necessidade de aumentar os fundos actualmente existentes para o tratamento do
cancro.
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1.2 Fundamentação da mesa redonda
A primeira mesa-redonda permitiu a identificação de um conjunto de problemáticas no
panorama actual de Portugal no tratamento do cancro, o qual foi considerado não
sustentável para os profissionais de saúde e Indústria Farmacêutica, e não desejável para
os doentes, a médio prazo.
Assim, a presente mesa-redonda teve como principal objectivo o desenvolvimento de três a
cinco recomendações de actuação para melhorar o acesso aos tratamentos em oncologia,.
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2 Métodos
2.1 Responsabilidades
O projecto foi financiado pela APIFARMA, que foi também responsável pelo:
• Planeamento científico da reunião
• Selecção e convite dos participantes
• Organização e logística da reunião
O Dr. Almeida Lopes participou na reunião por parte da APIFARMA. Na qualidade de
observadores estiveram ainda presentes na reunião:
• Por parte da APIFARMA:
Cristina Lopes
Heitor Costa
Isabel Soares
Paula Costa
Pedro César
• Por parte das empresas associadas da APIFARMA envolvidas no projecto estiveram
presentes a representar a respetiva empresa:
António Pé-Curto – Lilly
Carla Anjos – Celgene
Catarina Marcelino – Pfizer
Cristina Morgado – Novartis
Fátima Bragança – Amgen
Isabel Monteiro – Roche
Ana Paula Amorim – Servier
Mécia Fonseca – Novartis
Nídia Afonso – Janssen
Nuno Silvério – Merck S.A.
A Eurotrials, Consultores Científicos SA, foi responsável pelo:
• Tratamento e compilação da informação obtida durante a reunião
• Elaboração do relatório sumário
O Professor Nadim Habib, professor da Nova School of Business and Economics
(Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa), foi responsável pela moderação
da mesa-redonda.
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No total, 14 representantes de instituições/organizações com intervenção relevante no
tratamento do cancro em Portugal participaram na reunião (Tabela 1).
Tabela 1 – Participantes da 2º mesa-redonda.
Participante Organização
Ana Paula Martins Bastonária da Ordem dos Farmacêuticos
Fernando Regateiro Coordenador Nacional para a reforma do Serviço Nacional
de Saúde na área dos cuidados de saúde hospitalares
Francisco Ramos Presidente do Conselho de Administração do Instituto
Português de Oncologia Francisco Gentil de Lisboa
Francisco Rocha
Gonçalves
Membro do Conselho de Administração do Instituto
Português de Oncologia do Porto
Gabriela Sousa Presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia
João Almeida Lopes Presidente da APIFARMA
Jorge Espírito Santo Oncologista do Hospital do Barreiro
Laranja Pontes Presidente do Conselho de Administração do Instituo
Português de Oncologia do Porto
Luís Costa Diretor do Serviço de Oncologia do Hospital Santa Maria
Luís Silva Miguel Economista da Saúde do Centro de Estudos de Medicina
Baseada em Evidência
Luísa Glória Registo Oncológico Regional Sul
Nuno Miranda Coordenador do Plano Nacional de Prevenção das Doenças
Oncológicas
Sílvia Fernandes Tesoureira do Conselho Diretivo Regional da Secção
Regional do Sul da Ordem dos Enfermeiros
Tamara Milagre Presidente da EVITA – Associação de Apoio a Portadores de
Alterações nos Genes Relacionados com Cancro Hereditário
Vitor Neves Presidente da Europacolon Portugal – Associação de Apoio
ao Doente com Cancro Digestivo
2.2 Temas de discussão
A primeira mesa-redonda permitiu a identificação de três temas principais, sobre os quais se
pretendia debater mais aprofundadamente durante a presente mesa-redonda:
• Tema 1: Financiamento;
• Tema 2: Dados e indicadores;
• Tema 3: Acesso e equidade.
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2.3 Organização
A segunda mesa-redonda realizou-se no dia 24 de maio de 2017, em Lisboa (sala do
Senado da Universidade de Lisboa), e teve a duração de 4 horas, aproximadamente.
Globalmente, a reunião contemplou duas fases:
1) Panorâmica do tratamento do cancro em Portugal – apresentação da Dra. Gabriela
Sousa em representação da Sociedade Portuguesa de Oncologia (SPO);
2) Debate com os participantes, com o objectivo de desenvolver e desenhar 3 a 5
recomendações de actuação para melhorar o acesso aos tratamentos em Oncologia.
A discussão realizou-se sob as regras de Chatham House, e o sumário que reúne e destaca
os principais temas e tópicos abordados foi registado no presente relatório.
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3 Debate
3.1 Tema 1: Financiamento
3.1.1 Necessidade do aumento do orçamento de estado para a saúde
Os participantes da mesa-redonda concordaram consensualmente que será necessário um
aumento dos fundos disponíveis para a saúde e, em particular, para a área das doenças
oncológicas. Os seguintes motivos foram apontados para justificar a necessidade do
aumento do orçamento de estado para a saúde:
• O aumento da idade média da população portuguesa irá conduzir a um aumento
progressivo do número de doentes e das necessidades em saúde, levando ao
consequente aumento das despesas em saúde;
• Em particular na área da oncologia, o aumento progressivo da sobrevivência dos
doentes oncológicos conduzirá, por sua vez, a um aumento do número de doentes
oncológicos e da duração do tratamento;
• O orçamento de estado para a saúde, especialmente para as doenças oncológicas, é
muito reduzido em comparação com a média europeia.
Os participantes salientaram que Portugal enfrenta actualmente desafios noutras áreas
(e.g., segurança social, segurança interna, educação), pelo que se torna particularmente
desafiante o aumento do orçamento de estado para saúde.
3.1.2 Priorização do financiamento
Após ter sido acordado que será necessário aumentar o orçamento de estado para a saúde,
pediu-se aos participantes que indicassem qual a melhor forma de investir os fundos que daí
resultariam (ou seja, como direccionar o aumento dos fundos disponíveis resultantes de um
aumento do orçamento de estado para a saúde).
Os participantes concordaram consensualmente que o investimento em recursos humanos
deverá ser prioritário. Tal como discutido na 1º mesa-redonda, os bons resultados de
Portugal em termos de sobrevivência dos doentes oncológicos obtidos com escassos
recursos poderão estar em grande parte associados ao esforço dos profissionais de saúde
(em condições de restrição de vencimentos e horários exigentes). Este ambiente de
sobrecarga de trabalho e falta de condições tem conduzido ao burnout de uma percentagem
considerável de médicos, tal como reflectido no Estudo Nacional do Burnout na Classe
Médica (1). Deste modo, impõe-se agora valorizar e motivar os recursos humanos, tendo em
conta a importância fundamental da sua motivação para a prestação dos melhores cuidados
de saúde.
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Os participantes referiram também que o investimento em recursos humanos poderá
inclusivamente conduzir a uma redução de determinados gastos em saúde. A título de
exemplo, referiu-se a importância do tempo alocado pelos médicos a cada doente que,
quando insuficiente, conduz a diminuições do desempenho médico e a um aumento da
probabilidade de prescrições menos adequadas. Assim, é fundamental garantir a motivação
e disponibilidade dos profissionais de saúde para cada doente, as quais podem contribuir
decididamente para o êxito do tratamento.
Por fim, referiu-se que a falta de recursos humanos é especialmente preocupante no interior
do país, tendo em conta a particular dificuldade de mobilização dos médicos e enfermeiros
para os hospitais desta região, como resultado da falta de condições e equipamento novo.
Apesar de prioritário, ressalvou-se que o investimento em recursos humanos por si só não é
suficiente. É necessário também uma estrutura organizada e capacitada de modo a obter o
melhor desempenho dos recursos humanos (e que permita avaliá-lo). Deste modo, o
investimento deverá ser também focado em estrutura, bem como em modelos de avaliação
de desempenho.
Os modelos de avaliação de desempenho devem definir claramente quais os indicadores a
ser registados e permitir avaliar, no futuro, se os benefícios decorrentes da implementação
de uma determinada medida/utilização de um determinado medicamento, em contexto de
vida real, correspondem ou não às expectativas definidas a priori.
3.1.3 Aumentar a eficiência
Não obstante os bons resultados em termos de sobrevivência de doentes oncológicos, os
participantes defenderam que a procura da eficiência é um trabalho permanente, existindo
sempre oportunidades de melhoraria. Desta forma, oportunidades adicionais que permitam
um aumento da eficiência com o financiamento actualmente disponível deverão ser
procuradas.
As sugestões efectuadas pelos participantes no sentido de melhorar a eficiência encontram-
se descritas em baixo.
A actuação das instituições do Serviço Nacional de Saúde (SNS) de acordo com um modelo
colaborativo foi considerada fundamental, nomeadamente para permitir uma rentabilização e
poupança de recursos. Naturalmente, não é possível ter a mais alta tecnologia em todos os
hospitais, pelo que estes não devem competir entre si, mas sim actuar com base num
modelo colaborativo em que exista a capacidade de determinados hospitais
Modelo colaborativo
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complementarem o que falta noutros. Deste modo, defendeu-se que deveria existir um
planeamento estratégico que tenha em consideração a actuação das instituições do SNS de
acordo com um modelo colaborativo.
O papel dos cuidados de saúde primários numa possível redução de gastos em saúde foi
também referido. O primeiro contacto dos doentes com o SNS é feito nos cuidados de saúde
primários e, possivelmente, existirá um conjunto de desperdícios intercalares até que o
doente chegue aos hospitais numa fase mais avançada da doença. Assim, defendeu-se que
o trabalho nos hospitais é feito de uma forma demasiado isolada, pelo que uma maior
articulação com os cuidados de saúde primários permitiria aumentar os ganhos em saúde
(e.g., potenciando os rastreios para despiste e detecção de tumores em fases precoces),
rentabilizar e poupar recursos, particularmente em termos de medicamentos e exames
complementares de diagnóstico.
Cuidados de saúde primários
Adicionalmente, sugeriu-se que, provavelmente, poderá ser possível conseguir uma redução
de gastos em saúde na área dos meios complementares de diagnósticos efectuados no
decurso do período terapêutico dos doentes oncológicos.
Como discutido na 1ª mesa-redonda, e reforçado na presente, existe desigualdade em
Portugal entre regiões geográficas em termos de acesso aos cuidados de saúde e de
resultados em saúde. Os participantes defenderam que a redução desta desigualdade é
essencial no sentido de assegurar a sustentabilidade do sistema, com um possível impacto
ao nível da eficiência e redução de custos.
Redução das desigualdades em Portugal
Por fim, os participantes sugeriram duas medidas adicionais de forma a permitir um aumento
da eficiência:
Medidas adicionais
• O orçamento actualmente disponível deve ser distribuído com base em regras que
permitam recompensar as instituições mais eficientes;
• Contratação baseada em resultados.
Como ponto final na discussão sobre como aumentar a eficiência, ressalvou-se que a
optimização só é possível na presença de um sistema minimamente financiado. Caso a
diferença entre as necessidades e os fundos disponíveis seja demasiado marcada, a
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optimização torna-se extremamente difícil – não funcionando correctamente, por exemplo, a
relação com os recursos humanos ou com os agentes económicos.
3.1.4 Valências adicionais para os doentes oncológicos
Os participantes salientaram que os medicamentos, nomeadamente o acesso aos
medicamentos inovadores, foco exclusivo em discussões sobre a melhoria a alcançar no
tratamento dos doentes oncológicos, mas deve abranger outras dimensões relevantes.
Referiu-se a importância de diminuir os tempos de diagnóstico e do acesso a métodos
complementares de diagnóstico, terapêutica adjuvante, e à cirurgia e radioterapia em tempo
oportuno.
De facto, o intervalo de tempo que decorre entre a sintomatologia, o estabelecimento do
diagnóstico e o início da terapêutica é demasiadamente longo em Portugal, ultrapassando,
em alguns casos, os tempos máximos recomendados.
Por fim, os participantes referiram que seria relevante a criação de um planeamento
financeiro estratégico para o plano nacional de saúde a médio prazo, que contemple as
diversas necessidades em saúde (e não apenas de medicamentos).
3.2 Tema 2: Dados e indicadores
3.2.1 Ausência de dados publicados
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Um dos desafios actuais do panorama português no tratamento do cancro identificado na 1º
mesa-redonda consiste na escassez de dados na área da oncologia (e da saúde, em geral).
Particularmente, referiu-se que faltam dados que possam ser utilizados para identificar os
tratamentos associados aos melhores resultados em saúde, as áreas que necessitam de um
reforço do orçamento, e que permitam premiar as instituições mais eficientes.
No entanto, durante a discussão da presente mesa-redonda, defendeu-se que existe uma
grande quantidade de dados em Portugal na área da oncologia (inclusivamente dados não
agregados), sendo que alguns se encontram publicamente disponíveis- dados de
incidência, de tratamentos utilizados, cirurgia (tempos de espera e locais de realização) e
radioterapia (número de sessões realizadas e locais de realização). Adicionalmente,
salientou-se que Portugal é o único país que possuiu um certificado de óbito electrónico em
todo o país, o qual permite o conhecimento da mortalidade imediata.
Posto isto, os participantes esclareceram que existem dados macro, mas não dados micro
que permitam, por exemplo, avaliar o desempenho de uma determinada instituição no
tratamento do cancro ou identificar as suas necessidades no sentido de o melhorar o seu
desempenho. No seguimento deste esclarecimento, os participantes identificaram um
conjunto de dados de natureza distinta que são actualmente escassos ou não existentes, e
cuja monitorização e disponibilidade seria fundamental.
A existência de dados nos quais as decisões possam ser baseadas é uma das
características essenciais para fazer boas escolhas. No entanto, os participantes referiram
que não existem actualmente dados que permitam entender como é que as decisões são
tomadas (nomeadamente em termos da escolha de um determinado medicamento ou
terapêutica e do estabelecimento de um diagnóstico). Ou seja, os dados a partir dos quais
estas decisões foram tomadas não estão disponíveis – mas as decisões são tomadas.
Dados que suportem a tomada de decisão
Dados sobre a eficiência de medicamentos/intervenções
Os participantes referiram que faltam dados que permitam avaliar se a utilização de um
determinado medicamento ou implementação de uma determinada intervenção teve os
resultados que se antecipava no momento da sua introdução (dados relacionados com, por
exemplo, o aumento da sobrevivência dos doentes, a progressão da doença, e a frequência
de recaídas e toxicidades). Este tipo de dados está relacionado com o processo de
reavaliação de tecnologias de saúde, tendo os participantes defendido que apenas através
da sua monitorização e análise é possível perceber e demonstrar se a introdução de um
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determinado medicamento ou intervenção veio efectivamente trazer benefícios em contexto
real, bem com garantir o acesso dos doentes aos melhores tratamentos disponíveis. A
importância deste último ponto foi realçada, tendo em conta que os doentes não querem
necessariamente o produto mais recente, mas sim o acesso ao tratamento mais adequado
de acordo com o estado da arte para a sua doença, que conduza a um aumento da
sobrevida com a mesma ou maior qualidade de vida. Neste sentido, a monitorização em
contexto real e a consequente reavaliação das tecnologias de saúde é de extrema
importância.
Os dados relacionados com a gestão de uma instituição foram considerados basilares para
permitir um correcto planeamento de acordo com as necessidades antecipadas. Por
exemplo, referiu-se que poderá ser relevante identificar o número de casos de cada tipo de
cancro de uma determinada instituição, de modo a identificar e prever as necessidades e
tomar decisões em conformidade. Este tipo de dados é essencial para preparar a gestão de
um serviço de um ano para o outro (por exemplo, para assegurar que o número de médicos
com competência no tratamento de um determinado cancro está de acordo com o número
de casos numa dada instituição), garantindo que a instituição está devidamente apta para
receber e tratar os doentes.
Dados de gestão
Por fim, referiu-se que falta informação sobre o custo actual real do tratamento de cada tipo
de cancro no SNS – consegue-se apenas obter estimativas aproximadas).
Dados económicos
3.2.2 Indicadores para avaliação de desempenho
Quanto aos indicadores a considerar na área da oncologia, os participantes referiam a
existência de um conjunto de parâmetros que são fundamentais no sentido de avaliar o
desempenho, a qualidade dos cuidados prestados, e para detectar as ineficiências de uma
determinada instituição – os Key Performance Indicators (KPIs). A título de exemplo, os
participantes referiram que os KPIs relativos ao tratamento do cancro do cólon incluem,
entre outros, os intervalos de tempo que decorrem até que um doente realize a
colonoscopia, tenha a cirurgia agendada, retorne à anatomia patológica, a decisão para a
terapêutica adjuvante seja efectuada, a quimioterapia seja iniciada, bem como as
toxicidades que o doente teve ao longo do seu tratamento.
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Adicionalmente, os participantes referiram que, no momento da definição dos indicadores a
monitorizar para avaliar o desempenho das instituições no tratamento oncológico, importa
também assegurar que estes sejam comparáveis a nível internacional, de modo a ser
possível avaliar o posicionamento de Portugal face aos países comparadores.
3.2.3 Dados versus informação
Em adição à implementação da monitorização de dados relevantes, tais como os referidos
na seção anterior, importa igualmente definir e estabelecer métodos que permitam
aproveitar os dados actualmente produzidos para gerar informação útil.
A título de exemplo, referiu-se a grande quantidade de dados recolhidos pelos médicos no
contexto da sua prática clínica (nomeadamente durante consultas) na forma de texto livre
(word). Apesar de disponíveis, o facto destes dados serem recolhidos em texto livre dificulta
ou impossibilita a sua utilização no sentido de avaliar, por exemplo, o número de doentes
com um determinado tipo de cancro, ou em determinado estadio, ou os medicamentos
utilizados pelos doentes oncológicos, numa determinada instituição. Assim, impõe-se definir
de que forma transformar estes dados em informação facilmente acessível e passível de ser
utilizada pelos decisores.
3.2.4 Recolha de dados
Após a definição dos dados que cada instituição necessita para tomar melhores decisões,
ou dos indicadores necessários para determinar a eficiência de um determinado
medicamento/intervenção, é importante definir o método que será utilizado para a sua
monitorização. Naturalmente, considerando que estes dados são frequentemente complexos
e obrigam ao preenchimento de vários relatórios e escalas de qualidade, a sua
monitorização não deverá ser efectuada para a totalidade da população. Alternativamente, e
a título de exemplo, referiu-se que nos Estados Unidos da América as tomadas de decisões
são apoiadas por bases de dados que correspondem a apenas uma pequena percentagem
da população total (10 a 15%). Por fim, referiu-se que estes dados podem também ser
recolhidos e avaliados com base em estudos prospectivos.
3.2.5 Qualidade dos dados
A importância de gerar dados com qualidade, e não apenas em grande quantidade, foi
salientada durante a discussão. Nesse sentido, os participantes destacaram a importância
de garantir a competência do processo de recolha e tratamento dos dados pretendidos, a
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qual deve ser efectuada por profissionais especializados, contratadas especificamente com
este propósito, tais como data scientists, epidemiologistas, estatistas e data minners.
Adicionalmente, antes do início da recolha de um determinado tipo de dados numa
instituição, é necessário definir o número de pessoas que serão necessárias para efectuar o
registo pretendido. Deste modo, e naturalmente, a estrutura necessária para efectuar um
determinado registo de dados irá variar entre instituições, de acordo com as diferentes
necessidades – um hospital com elevado número de novos casos de cancro por ano terá
necessariamente que possuir um maior número de pessoas para efeitos de registo
comparativamente a um hospital com um menor número de casos por ano.
3.2.6 Registo Oncológico Nacional
Durante a discussão sobre a necessidade de uma maior disponibilidade de dados em
oncologia, lembrou-se que existem os Registo Oncológico regionais desde 1988, sendo da
responsabilidade de cada hospital ter os seus dados actualizados. Ainda assim, referiu-se
que a obrigação existente para a recolha de dados neste registo não é suficientemente
respeitada, defendendo-se, tal como referido na seção 3.2.4, a contratação de um núcleo de
pessoas especializadas com este propósito.
Por fim, defendeu-se que é importante dar prossecução ao recente Registo Oncológico
Nacional (RON), sendo agora necessário um aperfeiçoamento no sentido de possibilitar a
recolha e disponibilidade de uma maior quantidade e qualidade de dados de oncologia com
base neste registo.
3.2.7 Protecção da confidencialidade versus recolha de dados
No contexto da recolha de dados, referiu-se também o conflito entre a importância de
recolher e ter os dados necessários para tomar decisões versus a necessidade de proteger
a privacidade das pessoas (assegurar a sua confidencialidade). Os participantes referiram
que não existe ainda um consenso da sociedade sobre esta problemática, pelo que importa
definir como lidar com a protecção dos dados individuais face ao interesse colectivo da
sociedade de que esses dados sejam recolhidos e estejam disponíveis.
3.2.8 Reavaliação
O processo de reavaliação introduzido com o SiNATS, em 2015, foi também alvo de
discussão durante esta mesa-redonda.
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Enquanto na avaliação prévia de novos medicamentos existe produção de evidência para
realização da avaliação, referiu-se que é provável que se verifique uma falta de dados para
a realização da reavaliação das tecnologias de saúde (i.e. dados sobre a utilização dos
dispositivos médicos e medicamentos no contexto da prática clínica). Sendo assim, os
participantes anteciparam dificuldades para a realização do processo de reavaliação.
Adicionalmente, debateu-se sobre quais os indicadores a considerar pare efeitos de
reavaliação de um determinado medicamento. Sobre este tópico, defendeu-se que o
sistema deve ter em consideração a avaliação dos mesmos indicadores que conduziram à
aprovação inicial do financiamento de um determinado medicamento. Deste modo, impõe-se
implementar uma monitorização, para cada medicamento aprovado, dos mesmos
indicadores avaliados no momento da sua aprovação, no sentido de gerar dados que
possam ser utilizados para efeitos do processo de reavaliação.
Relativamente aos indicadores a utilizar para a reavaliação de medicamento oncológicos,
referiu-se que a avaliação prévia destes medicamentos é efectuada com base em três
parâmetros fundamentais: sobrevida livre de doença ou até progressão , sobrevida global e
qualidade de vida associados a cada estadio de evolução da doença. Assim, defendeu-se
que são estes três parâmetros que deverão ser considerados durante a reavaliação.
Por fim, defendeu-se que no âmbito da introdução de um novo medicamento, deveria ser
alocado orçamento para garantir a contratação dos recursos que serão responsáveis pela
realização do registo prospectivo, num determinado número de centros, dos dados a serem
utilizados para a sua posterior reavaliação. Este processo foi considerado fundamental para
a implementação dos esquemas de partilha de risco.
3.2.9 Cancro hereditário
Durante a discussão, alertou-se ainda para a escassez de dados relativos ao cancro
hereditário. Os participantes referiram que uma elevada percentagem de cancros de origem
hereditária surge em idade precoce, sendo que, frequentemente, os próprios profissionais
de saúde não conferem a devida importância aos sintomas destes doentes (falta de
consciencialização face a este tipo de cancro). Deste modo, os doentes com cancros
hereditários são frequentemente alvo de diagnósticos tardios, o que dificulta e encarece o
tratamento. Para além disso, tornam-se doentes crónicos, com comorbilidades, deixando de
produzir e conduzindo ainda a mais custos.
Tendo em conta que o cancro hereditário representa o tipo de cancro com maior potencial
de prevenção e detecção precoce, defendeu-se a importância de identificar os portadores de
mutações genéticas e distinguir os cancros hereditários dos esporádicos nas bases de
dados existentes, permitindo uma diminuição da mortalidade associada e conduzindo a
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poupanças de gastos em saúde. Neste contexto, referiu-se também a importância dos
conceitos de real world data e big data.
3.3 Tema 3: Acesso e equidade
Devido a restrições relacionadas com o tempo disponível, não foi possível discutir
especificamente sobre o tema “Acesso e equidade” durante a mesa-redonda. No entanto,
este tema foi sendo discutido durante o debate dos dois temas anteriores. Os participantes
referiram a existência de uma marcadíssima desigualdade em Portugal entre diferentes
regiões geográficas em termos de acesso aos cuidados de saúde e de resultados em saúde.
Adicionalmente, os participantes salientaram que a falta de acesso aos cuidados de saúde é
particularmente preocupante no interior do país, como resultado da falta de recursos
humanos e de condições das instituições de saúde.
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4 Recomendações e notas finais
Tendo como base o debate dos participantes sobre cada tema definido a priori, a presente
mesa-redonda permitiu definir um conjunto de recomendações no sentido de introduzir
melhorias no tratamento do cancro em Portugal:
1) Aumento do orçamento do estado para a saúde e, em particular, do orçamento
alocados às doenças oncológicas;
2) Investimento prioritário em recursos humanos, seguindo-se do investimento em
estrutura. Melhoria da eficiência e modelos de avaliação de desempenho;
3) Implementação de sistemas de monitorização de dados (e.g. dados de gestão;
dados do desempenho das instituições no tratamento do cancro, dados económicos;
dados de utilização de medicamentos em contexto de vida real) para utilização pelos
vários intervenientes, incluindo decisores e escrutínio público;
4) Contratação de profissionais especializados no registo e tratamento dos dados
pretendidos – e.g. data scientists, epidemiologistas, etc. – que assegurem a
qualidade do processo;
5) Em contexto de reavaliação de medicamentos, utilização dos mesmos indicadores
que conduziram à sua aprovação.
Ambas as mesas-redondas promoveram um debate aprofundado entre as várias partes
interessadas - representantes dos doentes, profissionais de saúde, sociedades científicas,
economistas da saúde, decisores políticos, reguladores e Indústria Farmacêutica - com
intervenção relevante no tratamento do cancro em Portugal. Os debates permitiram a
identificação de um conjunto de desafios e oportunidades actuais e permitiram definir
recomendações que visam melhorar o acesso atempado e adequado dos doentes
oncológicos ao melhor tratamento disponível num contexto de sustentabilidade do sistema.
Os resultados alcançados nas duas mesas-redondas serão apresentados numa Sessão
Pública, prevista para 27 de Setembro.
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5 Referências
1. Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Burnout na classe médica -
principais resultados. 2016. Disponível em:
https://www.dependencias.pt/ficheiros/conteudos/files/Burnout.pdf