o mito da família perfeita

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (ISRAEL BELO DE AZEVEDO) EDITORA PRAZER DA PALAVRA Página 1 EDITORA PRAZER DA PALAVRA O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA Edição eletrônica ISRAEL BELO DE AZEVEDO 2008

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Page 1: O Mito da Família Perfeita

O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (ISRAEL BELO DE AZEVEDO) EDITORA PRAZER DA PALAVRA Página 1

EDITORA PRAZER DA PALAVRA

O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA Edição eletrônica

ISRAEL BELO DE AZEVEDO

2008

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1

-- Quando eu me casei com você, em pensei que fosse para sempre.

-- Eu também pensei, mas acabou.

-- Como acabou, se era para sempre?

-- Acabou.

2

-- Eu não sei onde você quer chegar.

-- Mas você nunca me perguntou.

3

"Dá para ficar com os meninos hoje?"

-- Diga para a sua mãe que eu só faço o que o juiz determinou.

4

— Quem é aquela mulher, que estava aqui agora com você?

— É minha esposa.

— Há quantos anos você está casado?

— Há 20 anos.

— Com a mesma mulher?

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Prólogo em forma de manifesto

PARA QUE ESTE PAÍS VÁ BEM

Calar diante do erro é contribuir para o seu avanço.

A banalização dos relacionamentos sexuais pré e extraconjugais e a espetacularização das chamadas

―produções independentes‖ de filhos certamente contribuem, no contexto individualista, hedonista e

relativista de nossa cultura, para fazer com que comportamentos antes considerados promíscuos e

infieis se tornem socialmente aceitáveis, não importam os elevados preços que cobrem.

Em nome do prazer a qualquer custo, são esquecidos até mesmo os dramas individuais, transformados

em números capazes de estarrecer as consciências cidadãs, como, por exemplo, os de que a cada ano

35 mil meninas com menos de 14 anos se tornam mães e que de quatro partos um é protagonizado por

uma adolescente e de que de seis abortos no país um é realizado numa adolescente.

Deve-se considerar isto normal?

Não, não devemos. Antes, devemos, como dever de cristãos, repetir que a família faz parte do

propósito divino para a felicidade dos indivíduos e das sociedades e quem quiser ser feliz deve

procurar viver segundo os princípios que o Senhor da história fez registrar na Bíblia Sagrada.

Devemos insistir na afirmação de que a família tem sua base no casamento monogâmico feito para

durar a vida toda e seu propósito é prover a satisfação das necessidades humanas de comunhão,

educação, companheirismo, segurança e preservação da espécie. Este propósito original foi

desfigurado, quando o homem escolheu livremente afastar-se de Deus e seus princípios. Os resultados

nós os vemos a cada dia, mas não devemos nos acomodar diante deles. Antes, devemos buscar

cumprir o propósito de Deus para os cônjuges e seus filhos.

Por isto, nossas igrejas devem conclamar as famílias a fazerem tudo o que estiver licitamente ao seu

alcance para barrarem a sua própria desintegração. Entre seus cuidados, estão:

. uma profunda autocrítica, que lhes permita ver em que estão falhando na consecução dos propósitos

estabelecidos por Deus para as famílias em todas as épocas e lugares;

. uma aguda consciência crítica, capaz de lhes tornar mais cidadãs e menos consumidoras de valores

equivocadas, às vezes verdadeiros entulhos empurrados cabeça a dentro, como, por exemplo, a falsa

noção do infelizmente clássico slogan de que ―é proibido proibir‖;

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. um sólido compromisso com a mudança, se for esta a necessidade no seu interior, visando até mesmo

um recomeço sobre bases válidas nas quais se valha a pena investir, com informação, educação,

diálogo e coerência, conteúdos capazes de referências claras e orientações seguras;

. uma corajosa disposição de buscar ajuda, para a superação das dificuldades familiares, mesmo que

isto custe o alto preço da humildade.

Nossas igrejas também devem conclamar os proprietários e profissionais dos meios de comunicação a

uma postura menos banalizadora. É próprio de quem trabalha neles pensar que seus veículos

influenciam pouco o comportamento das pessoas, uma vez que apenas retratam a realidade. Trata-se

de uma visão corporativista, que defende a liberdade apenas para a ponta da produção. Do lado da

recepção não faltam aqueles que, equivocadamente, propõem a censura. O Brasil já viu que ela, além

de atentar ferozmente contra os direitos fundamentais do ser humano, não funciona. Foi na época da

censura mais ciosa, por exemplo, que se produziram as chamadas pornochanchadas, porta pela qual o

homossexualismo foi banalizado e ―aceito‖ no país.

Precisamos, portanto, de responsabilidade por parte dos meios, incluindo aí seus donos e seus

produtores. Essa responsabilidade que virá quando os telespectadores deixarem de ser passivos, para

assumirem os papéis próprios de pessoas educadas que não renunciam o que lhe é essencial: a

consciência crítica.

Estamos longe, infelizmente, desta percepção, razão pela qual, por exemplo, não chegamos ainda a

nenhum boicote eficiente a um programa de televisão ou produto, que julgamos desrespeitoso aos

valores nos quais cremos. Quando muito, protestamos em silêncio, gesto inútil diante da retórica

grandiloqüente do mal.

É atitude responsável, por exemplo, abrir espaço, sem ridicularizá-los, para aqueles que defendem a

família e proclamam os valores da monogamia heterossexual, da castidade e da fidelidade conjugal.

De igual modo, nossas igrejas devem conclamamos os governantes a não abdicarem de seu papel

educativo, mas não só pelos eventuais prejuízos que as práticas contrárias à preservação da família

provocam no sistema de seguridade social. Cabe ao governo a coragem de, respeitadas as liberdades

individuais, prover a sociedade de idéias e programas capazes de tornar as pessoas mais saudáveis e

mais íntegras.

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Quanto a nós, busquemos viver segundo os padrões que proclamamos, sem desistir, mesmo quando

assaltada pela sensação de estarem marchando contra a corrente. Afinal, só muda o mundo quem não

se conforma com os valores do seu tempo, mesmo que burramente unânimes.

Prossigamos pedindo a Deus por nossas próprias famílias e nos dispondo a viver conforme os

propósitos que Ele tem para nós.

Nenhum de nós consegue ter a família que gostaria. Por melhor que seja a nossa família, gostaríamos

que ela fosse ainda melhor.

Quero desafiar aos que estão satisfeitos com a sua família a não ficarem satisfeitos e quero desafiar

aos que estão insatisfeitos a não desistirem dela.

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SUMÁRIO

Parte 1

A FAMÍLIA E SUA FRAQUEZA

1. O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA

2. VALORES TROCADOS

3. PAIS QUE SEPARAM

4. PRIORIDADES INVERTIDAS

5. UMA PARÁBOLA DE NÓS MESMOS

Parte 2

A FAMÍLIA E SUA FORÇA

6. UMA OBRA PRIMA

7. O PRAZER E A RESPONSABILIDADE

8. OS QUATRO PILARES DA VIDA EM FAMÍLIA

9. O ESPAÇO DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL

10. A VIDA COMO ENCONTRO

11. OS DEVERES DE CADA UM

12. CELEBRANDO A VIDA EM FAMÍLIA

13. APRENDENDO COM UMA BELA FAMÍLIA

14. COMEÇANDO DE NOVO

15. UM LUGAR PARA A FELICIDADE

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EPÍLOGO EM FORMA DE MONÓLOGO

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Parte 1

A FAMÍLIA E SUA FRAQUEZA

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1

O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA

A minha família é assim porque eu sou assim.

Mente quem diz que é fácil viver em família. Mente quem diz que dá pra viver sem família.

Ninguém escolhe a família de que faz parte.

O filho não escolhe o pai que vai ter.

Um irmão não escolhe seu irmão.

São todos da mesma família, mas ninguém pediu para estar ali. É por isso que o sábio da Bíblia admite

que pode haver amigos mais chegados dos que os irmãos. Isto, no entanto, não é o ideal.

Numa família as pessoas são diferentes. Um pai cria seus filhos de modo aparentemente igual, mas

eles são diferentes uns dos outros. Um irmão que tem outros irmãos tem que se relacionar de modo

diferente com eles. Cada pessoa tem suas preferências. Uns gostam de matemática e outros de música.

Cada um tem seu temperamento. Uns são calados e outros são extrovertidos. Essas diferenças devem

ser respeitadas e até mesmo valorizadas. São elas que tornam a família o lugar ideal para as pessoas se

desenvolverem.

Numa família todos estão crescendo. Os pais crescem como pessoas, como esposos e como pais.

Assim deve ser. Os filhos crescem como pessoas, como filhos e como irmãos. Que bom. Por isso,

acontecem as crises. Só passa por crises quem está crescendo e quem está crescendo está realmente

vivendo. Os outros estão apenas fazendo de conta... Precisamos olhar para as crises como

oportunidades de crescimento. Não é para olhar para elas, como se elas fossem passar um dia. Elas só

passarão se nós crescermos. Se ficarmos parados, podemos afundar nelas.

Na família não há máscaras. A raiz das tensões familiares está precisamente que nela ninguém usa

maquiagem. Nela não colocamos a melhor roupa. Nós somos o que nós somos. Como todos são o que

são, os choques acontecem. Há choques, mas há verdade. Em outros ambientes, por causa das

convenções sociais, há menos choques e também menos verdade. Isto não quer dizer que podemos

manter a cara amarrada o dia inteiro... O nosso direito de manter a cara amarrada tem limites. A

maturidade é entender esses limites.

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Maturidade não é coisa fácil. Tal como na vida cristã. De Jesus ouvimos com prazer que ele é manso e

suave. Quando o Senhor pede que carreguemos sua cruz, temos a cara-de-pau, como Pedro, de dizer

que não o conhecemos.

Quando o Mestre falou umas coisas duras sobre o casamento (Mateus 19.1-12), os discípulos

reclamaram que ele estava sendo radical demais. Sua resposta foi:

— Isso não é mesmo para qualquer um (Mateus 19.12).

Viver em família não é para esposos que se separam diante dos obstáculos de relacionamento. Não é

para pais que não sabem amar seus filhos. Não é para filhos quem não têm prazer em respeitar seus

pais.

O padrão bíblico para a vida em família é realmente muito elevado, mas quem o seguir será feliz. A

família que o buscar só será separada pela morte.

Não existe família perfeita.

Este é um mito a ser derrubado. É como o jardim do vizinho, cuja grama parece sempre mais verde do

que a do nosso. É como o prato da mesa do vizinho, cuja comida parece sempre mais gostosa do que a

do nosso.

Às vezes, os filhos olham para certos pais de seus colegas e dizem:

-- Ah, se eu tivesse um pai como esse!

Às vezes, os pais olham para certos filhos tão comportados, tão dedicados, e suspiram:

-- Ah, se eu tivesse filhos como estes.

Às vezes, uma esposa olha para um outro homem e reclama:

-- Por que não tenho um marido como este?

Às vezes, um marido olhara para uma outra mulher e se lamenta:

-- Por que é que não tenho uma esposa como esta, tão dedicada, tão atenciosa, tão amorosa?

Não importam as famílias dos outros, que conhecemos na superfície, mas a nossa, que conhecemos

em profundidade. Nossos problemas, às vezes, em família advém do fato que na família toda hora é a

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hora da verdade. É o lugar em que realmente crescemos porque ali nós somos o que somos. Nossas

famílias, pois, não são perfeitas mas são as nossas famílias.

De fato, quando convivemos com uma família, mesmo aquela que julgamos perfeita, vemos que nela

há imperfeições. A imperfeição faz parte da natureza humana. Assim como não há pessoas perfeitas,

não há famílias perfeitas.

Não foi o mundo moderno que inventou os conflitos na família. Oito séculos antes de Cristo, por

exemplo, o poeta Hesíodo lamentava que os filhos não respeitavam os pais...

Problemas familiares nós sabemos existem desde que as famílias se constituíram. A Bíblia mesma está

repleta de situações reais que nos mostram problemas reais de familias reais. Algumas relatam

convivências mais trágicas do que as contadas nas novelas da noite.

Já na primeira família, Adão e Eva se desentenderam em torno de quem era a culpa da desobediência a

Deus.

Abraão, o pai da fé, para atender a exigência da esposa Sara, expulsou de casa uma de suas esposas e

pôs o seu filho Ismael à morte no deserto.

Isaque, o filho da promessa de Deus, não consegui ser respeitado na velhice e foi ludibriado com o

apoio da esposa Rebeca por um dos filhos, que acabou ameaçado de morte pelo irmão enganado e teve

que fugir.

Jacó, o fundador de uma nação que seria uma bênção de Deus para o mundo inteiro, teve filhos

capazes de se unir para vender como escravo um dos irmãos, informar ao pai que ele morrera e,

depois, chorar em família rios de lágrimas.

Moisés e Zípora se desentenderam acerca da educação do seu filho, que foi vítima da violência física

decorrente esse desentendimento.

Aarão, o porta-voz, o executivo de Moisés, teve que engolir em seco a morte de dois dos seus filhos,

ambos sacerdotes que trouxeram à presença de Deus um fogo estranho.

A despeito de tais exemplos, que nossas experiências pessoais poderiam multiplicar, nós ainda

cultivamos a idéia de uma família perfeita.

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2

VALORES TROCADOS

Viver em família é como dormir com o inimigo.

Os verdadeiros inimigos da família não são a televisão, com seus espetáculos e valores, nem o estilo

de vida contemporâneo, que nos empurra para o individualismo e consumismo. Os verdadeiros

inimigos da família estão na própria família. Como o título daquele filme, viver em família é como

dormir com o inimigo.

Tendemos à autovitimização, no plano pessoal e no plano familiar. No pessoal, nós nos achamos

sempre vítimas de algo, seja da falta de solidariedade e de interesse em nossas vidas por parte dos

outros. No plano familiar, justificamos que nossa família não vai bem porque as pressões externas são

fortes demais...

OS INIMIGOS

No entanto, nossos piores inimigos somos nós mesmos, com nossos pensamentos e gestos. De igual

modo, os piores inimigos da família são pensamentos e gestos cujos autores estão na própria família.

Isto não quer dizer que não devamos considerar os inimigos externos, que não são poucos. Antes,

queremos lembrar que, como são externos, eles são secundários.

Inimigo 1

SUPREMACIA DO PRINCÍPIO DO PRAZER SOBRE O PRINCÍPIO DO DEVER

O princípio do prazer é próprio dos pequenos. É pequena a família (ou os membros da família que...)

que está escravizada ao princípio do prazer (em que todo mundo quer apenas as coisas boas do

relacionamento, como o marido ser acordado carinhosamente pela esposa, como o filho ser despertado

com o café da manhã na cama, como pai ter o sapato tirado dos pés pelo filho...). Grande é a família

que sabe que o dever é essencial para a convivência e para sobrevivência (na divisão do trabalho, na

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obediência, no cuidado com o outro, no ouvir a música numa altura individual e não numa altura

coletiva, etc.).

Viver apenas sob o princípio do dever é algo falso, obsessivo e opressivo. Mais dia, menos dia, a

família vai implodir.

Os princípios do prazer e do dever devem estar em sintonia.

Inimigo 2

CONFUSÃO DOS VALORES QUE SÃO DE BAIXO COM OS VALORES QUE SÃO DO ALTO

De tanto sermos habitados pelos valores de baixo acabamos confundindo-os com os de Deus, como na

frase "a voz do povo é a voz de Deus". Passamos a achar tudo normal, até os desvios (como

comportamentos que a Bíblia tacha de imorais). Passamos a achar tudo natural, até os absurdos (como

um estilo de vida consumista, ditada pelos modismos).

Como somos deste mundo, vivemos segundo os valores deste mundo. No entanto, não podemos

esquecer os valores do Alto (Colossenses 3.1), que são mais altos do que os deste mundo. Este Aqui

está o problema central de nossas famílias. O apóstolo Paulo aplica estes valores também ao plano

familiar. Estes valores nos devem habitar.

Inimigo 3

PREDOMÍNIO DA EMOÇÃO SOBRE A RAZÃO

O predomínio da emoção sobre a razão faz da família uma antecipação do inferno.

Com ele, vem, por exemplo, o predomínio do corpo sobre o espírito.

Vida familiar saudável é aquela que considera as duas dimensões da vida. Devemos nos indignar um

com o outro, mas devemos ter a mesma pressa em pedir perdão ao outro.

DEUSES

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Os povos antigos tinham deuses de suas famílias. Por isto, quando se apresentou a Moisés para ser

apresentado ao povo, Deus não se autonomeou senão como EU SOU. Não queria ser identificado

como mais um deus.

Nossas famílias não seguem deuses particulares, mas tendem a seguir certos valores que se

contrapõem aos valores de Deus.

Hoje ainda há muitos deuses a nos possuir. É um lugar comum dizer que a idolatria não se aplica tão

somente a outras confissões religiosas. Todavia, cada um de nós tende a ser idólatras.

Quando Deus se apresentou a Moisés para que ele o apresentasse ao povo, Deus não se autonomeou

senão como sendo "Eu sou" Deus não queria ser identificado por nenhum deusinho. É por isso que

Josué lembra aos seus que eles tinham um grande Deus e que não precisavam seguir a nenhum outro.

Certamente nenhuma de nossas famílias segue a um deusinho nesse sentido, mas às vezes nos

deixamos levar por alguns valores que se colocam no próprio lugar de Deus, deuses contemporâneos

que não tem estátua nem imagem nem efígie mas diante dos quais por vezes nos prostramos, no seio

da família.

Deus 1

A PROSPERIDADE

Quando lhes nascem os filhos, os pais começam a se preocupar com o futuro profissional deles.

Deixam que eles escolham suas profissões, mas querem que sejam "boas" profissões (isto é, que

remunerem bem, etc.)

Em resumo, os pais querem que nossos filhos tenham mais dinheiro do que eles, mais sucesso do que

eles, como se a felicidade estivesse nisso. Os pais acabam cingindo toda a vida de seus filhos em

função desse tipo de ideal.

Quando outras pessoas perguntam por eles, as respostas trazem informações sobre o que estudam ou

estudaram, que profissão têm, como são bem sucedidos, etc.

Há uma clara inversão de valores. A família não vive em função de valores, que é a dimensão

espiritual da vida, mas em função de resultados. Pouco lhe importa o presente, mas o futuro. A

privação desnecessária no presente (viver fazendo economia como um estilo de vida e não por

necessidade) é justificada pelo que pode vir no futuro, como se todos fôssemos viver 130 anos.

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Os pais chegam a ficar doentes e a adoecer seus filhos por causa do futuro. De tal modo isso é verdade

que muitas crianças, adolescentes e jovens passam a vida inteira ou boa parte dela se preparando para

o futuro. Isso é um equívoco. Vinte anos são para serem vividos intensamente, não apenas como uma

preparação.

O deus da prosperidade nos faz desejar que nossos filhos tenham mais dinheiro ou sucesso do que nós.

Há pessoas que se privam no presente para acumular no futuro que não sabem se virá. Há muitos pais,

que, em nome do deus da prosperidade, prejudicam a vida presente de si mesmos e dos seus filhos.

Que venha o futuro que venha, mas que vivamos agora o presente.

Deus 2

O INDIVÍDUO

Outra divindade é o individualismo atrofiado, que faz com que haja uma falta de projetos familiares.

Há um incensamento dos projetos individuais. É um "cada um por si" que mata na gênese a própria

idéia de família.

Afinal, é preciso respeitar-se a individualidade do outro, de modo a tornar o companheirismo apenas

um retrato na parede...

Este deus tem matado as famílias. É o deus do cada-um-por-si. A família não tem nenhum projeto

coletivo. Cada um tem o seu projeto e cada um passa por cima do seu irmão, do seu pai, do seu tio, da

sua mãe, se aquilo for atrapalhar o seu projeto. A doença, portanto, desse individualismo penetrou em

nossas famílias.

Nossa cultura é assim a cultura de cada um por si e essa cultura é a gênese da morte da família. De

certo modo a síndrome de Caim continua presente. Nenhum de nós, mesmo no interior da família, se

considera guardador de seu irmão... Em nome do respeito à individualidade e à liberdade, muitas

famílias não se constituem em torno de ideais comuns, esquecidas que uma família que não tem ideais

comuns não é propriamente uma família. É a comunidade dos ideais que nos torna próximos uns dos

outros.

Deus 3

A IRRESPONSABILIDADE

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Os pais gostam de pensar nos filhos como sendo intrinsecamente irresponsáveis. No entanto, são-no

também, especialmente quando transferem para outros aquelas responsabilidade que lhes pertencem.

Assim, a responsabilidade pela felicidade familiar é transferida para outros, seja para a escola, para

igreja ou para os meios de comunicação. Há muita gente, alguns até não crentes, que transferem para a

igreja a educação moral dos seus filhos. Alguns afastados chegam a voltar a igreja por causa dos

filhos, como se eles não também não precisassem de Deus.

Pais há que não se assentam com os seus filhos, permanecendo longe daquilo que o livro de

Deuteronômio recomenda: levar os nossos filhos a amar a Deus sobre todas as coisas e testar

literalmente esse conhecimento no andar, no levantar, no caminhar. Pais há que acham que levando os

seus filhos a igreja, a sua tarefa pedagógica está completa.

Ser responsável dá trabalho, mas é preciso que aceitemos a nossa tarefa e a nossa responsabilidade.

Nosso compromisso deve ser o de Josué: "eu e a minha casa serviremos ao Senhor". É como se o líder

da conquista dissesse: "Vocês, povo de Israel, façam o que quiserem, mas aqui na minha casa nós

serviremos ao Senhor".

Numa época democrática, como a nossa, podemos tomar de Josué esse "eu e a minha casa serviremos

ao Senhor" como um desejo. Como ele, devemos desejar que nossa família sirva ao Senhor. Como

Josué, devemos orar para que nossa família sirva ao Senhor. Devemos fazer o que estiver ao nosso

alcance para que nossa família sirva ao Senhor. Devemos nós mesmos servir ao Senhor com

fidelidade e prazer tais que nossa família queira servir ao Senhor.

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3

PAIS QUE SEPARAM

Algumas atitudes devem estar presentes nas vidas daqueles que procuram servir a Deus.

É difícil encontrar família complicada como a de Jacó, como relatado em detalhes a partir do capítulo

27 de Gênesis.

Problemas não faltavam. Jacó era gêmeo, mas seu irmão era completamente diferente. Não havia

diálogo entre eles.

Os dois sempre disputaram o direito de ser o mais velho. Na cultura hebréia isso fazia uma grande

diferença. O mais velho ficava com a melhor parte na herança. Numa negociação, Jacó ficou com o

direito da primogenitura.

Quando seu pai estava velho, abençoou Jacó, mas seu irmão, Esaú, não aceitou. Teve início uma briga

que duraria décadas. Percebendo que o musculoso Esaú acabaria matando Jacó, a mãe deles

recomendou que fugisse. Jacó concordou.

No novo ambiente, apaixonou-se por uma prima, Raquel, mas teve que trabalhar sete anos para poder

casar com ela. Depois do casamento, viu que fora enganado. O sogro lhe dera outra filha, Lia, que era

meiga, mas não era bonita como a amada. Teve que trabalhar mais sete anos para merece.

A adolescência e a juventude de Jacó foram feitas de uma crise atrás de outra. Aliás, os anos da

maturidade não foram menos problemáticos. A esposa predileta teve dificuldades para lhe dar filhos.

Teve que fugir da casa do sogro e foi perseguido. Teve que lutar com o próprio Deus. Uma de suas

filhas foi estuprada e depois vingada pelos irmãos. Por puro ciúme, seus filhos venderam como

escravo um de seus irmãos. Embora fosse rico, chegou a passar fome.

A Bíblia mostra bem claramente porque aquela família passou por crises. Notam-se nela algumas

atitudes que não devem estar presentes nas vidas daqueles que procuram servir a Deus em todas as

dimensões da vida.

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Havia preferência entre eles. O pai gostava mais de Esaú, porque era o mais velho e tinha hábitos que

o agradavam. Esaú era caçador. A mãe gostava mais de Jacó, porque seu parto fora difícil e tinha

hábitos que a agradavam. Gostava de ajudar na cozinha.

O ciúme passou para as gerações seguintes. José, por exemplo, foi maltratado porque parecia o

queridinho dos pais.

Todos sabemos que os pais não podem ter preferência, mas às vezes têm. Isto é raro, mas pode

acontecer. No entanto, a maioria das preferências não passa de invenção dos filhos.

Havia muita troca entre eles. Isaque estava idoso. Já não enxergava direito e não mais podia trabalhar.

Aliás, esta é uma situação que muitas famílias vivem hoje. Muitos atritos decorrem disso. Ninguém

quer ficar com os pais velhos. Os adolescentes não têm carinho para com os avós. Eles são

considerados um peso. Se forem pobres, a falta de consideração pode ser ainda maior.

Não era o caso de Isaque. Ele estava prestes a morrer, mas ainda era rico. Esaú estava de olho na

herança. Jacó também. Sua mãe era sua aliada nesta causa. O fato é que Isaque fez uma troca com

Esaú. Pediu uma bela porção de carne para poder abençoá-lo.

As relações eram de troca. Não eram conseqüência de amor verdadeiro, pelo menos nesta situação.

Esaú ―bajulava‖ o pai, na esperança de ficar com a melhor parte. Jacó se apoiava na mãe. Uma família

não pode viver de trocas. Quando seus membros buscam satisfazer apenas seus próprios interesses não

formam uma verdadeira família.

Quando isso acontece, é fácil deixar de lado os compromissos assumidos. Na adolescência, Esaú e

Jacó tinham feito um acordo. O primeiro vendeu ao segundo o direito da primogenitura. Depois,

quando lhe interessou, ―esqueceu-se‖ do acordo. Isaque também ―esqueceu‖.

Havia muita mentira entre eles. Rebeca estava do lado de Jacó e achava que ele merecia a bênção do

pai, pois Esaú lhe vendera o direito. Como viu que a causa estava perdida, armou um esquema

baseado na mentira. Jacó fez o mesmo.

Deu certo: Jacó foi abençoado. O preço foi alto demais e quase custou sua vida. Definitivamente, um

relacionamento não pode se basear na mentira, mesmo que aparentemente dê certo. Como diz o sábio,

suave é o pão da mentira, mas a boca de quem a profere se encherá de pedras (Provérbios 20.17).

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Usava-se falsamente o nome de Deus. Quando se viu apertado, Jacó usou o nome de Deus para

justificar sua ―habilidade‖ em encontrar alimento para seu pai.

Mais tarde, Jacó se encontrou cara a cara com Deus e não pôde mais mentir e nem usar o seu nome em

vão. A luta foi dura. Jacó se converteu e foi verdadeiramente abençoado. Até então ele conhecia o

Deus de seus pais e avós. Agora, ele o conhecia pessoalmente.

Quem conhece a Deus não pode e nem deve usar seu nome para obter vantagens. Nós existimos para

servi-lO e não o contrário.

Havia ódio entre os irmãos. Como resultado de todo o processo, baseado no esquecimento dos

acordos, na mentira, na troca e no uso do nome de Deus, aumentou o ódio de Esaú por seu irmão. Seu

desejo era mata. Só restou a fuga. Só restou a separação entre irmãos, separação que só o futuro

resolveria.

A lembrança desses fatos é uma indicação de que as crises são sempre menores do que nós, se temos a

Deus como Senhor. Este mesmo Jacó, sofrido, constituiu uma grande família, responsável por levar

adiante o plano de Deus para a salvação de toda a humanidade.

Apesar de a história parecer terminar com um final infeliz, Esaú e Jacó seguiram seus caminhos e

foram felizes. Eles superaram essas crises. Aprenderam que o ódio não leva a nada. Cada um seguiu

seu caminho, mas em paz, porque perdoaram-se pelo mal que fizeram um ao outro.

Não se deixaram dominar pelo passado. Aprenderam a superar seus problemas. Como eles, o mesmo

pode acontecer conosco. A lembrança das experiências desses nossos antepassados deve nos servir em

nossas próprias experiências hoje.

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PRIORIDADES INVERTIDAS

Nenhuma família está livre de passar por dificuldades.

A família de Davi teve momentos de glória e momentos de tragédia. Davi mesmo teve muitos

problemas pessoais, que a Bíblia conta sem nenhum disfarce. A Bíblia é sempre assim. Mesmo o pai

da fé Abraão aprontou e disso sabemos porque a Bíblia registrou.

No caso de Davi, sua família era numerosa. Ele teve 19 filhos, de diferentes mulheres. Suas venturas e

desventuras estão registradas nos livros de Samuel, Reis e Crônicas.

OS FILHOS DE DAVI

Um de seus filhos foi o sábio Salomão, concebido por meio do adultério e do homicídio, mas que o

sucedeu no reino e realizou seu maior desejo: construir um templo para o povo adorar a Deus.

A vida de Salomão nos mostra que não existe uma situação pessoal que não possa ser superada. Com a

ajuda de Deus, a quem Salomão pediu sabedoria, podemos superar os obstáculos, seja a separação dos

pais, a falta de oportunidade para estudar ou a morte de um parente. Embora fosse filho do rei,

Salomão tinha tudo para ser um fracassado. Cometeu erros, mas entrou para a história como um

grande. Não podemos mudar o passado, mas podemos construir um futuro bem diferente.

Outro filho de Davi foi Absalão. O príncipe era muito bonito e tinha longos cabelos. Ele parecia

jogador de vôlei da seleção brasileira... Se vivesse hoje, seria modelo ou ator de novela. O rapaz só

deu tristezas a Davi. Matou um irmão, tentou tomar o lugar do pai no trono, que fugiu para não ter que

mata, e envergonhou o pai. Assim mesmo, quando seus exércitos se enfrentaram, o pai pediu para que

o príncipe fosse poupado.

A história termina com a morte de Absalão.

Nenhuma família está livre de passar por dificuldades, algumas trágicas. No caso de Absalão, sua vida

foi uma tristeza. Sua morte foi uma vergonha.

Absalão teve todas as oportunidades do mundo para se recuperar. Ele, no entanto, era ambicioso

demais para enxergar que seu pai o amava. Além disso, preferiu seguir os conselhos dos outros do que

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os da sua família. O ambiente não era fácil: viver no palácio deve ser o pior lugar do mundo: que o

diga a princesa Diana, da Inglaterra, que o digam os ministros do governo brasileiro, às voltas com

intrigas e conspirações dentro do gabinete presidencial. Absalão se deixou levar. Ele foi vítima dos

seus conselheiros, mas quem ―pagou o pato‖ foi ele mesmo. Ler a história de Absalão é muito

instrutivo. É por isso que está na Bíblia.

OS ERROS DE DAVI

Davi era mais um político do que um pai. Ele amava seus filhos, mas as preocupações militares,

econômicas, religiosas e poéticas, possivelmente fizeram com que deixasse o cuidado da educação dos

filhos com seus assessores. Ler a história de seu fracasso como pai inspirará os pais de hoje e os pais

do futuro. Um pai não pode abrir mão de seu privilégio e dever de educar seus filhos.

O relacionamento entre Davi e Absalão definitivamente não serve de modelo para nós. O único

sentimento legítimo nessa história é que o pai amava o seu filho, mas só amar nem sempre é

suficiente. As atitudes têm que ir além dos sentimentos para serem eficazes.

Quatro erros fatais cometeu Davi em sua vida familiar. Como todas as personagens da Biblia, este rei

é uma pessoa como nós somos, com as mesmas dificuldades, e cometendo erros às vezes piores do

que os nossos. Assim mesmo Davi foi um homem segundo o coração de Deus. Evidentemente, ele não

foi um homem segundo o coração de Deus por ter cometido esses erros.

Vale a pena pensar nos erros de Davi na vida familiar, erros a serem evitados por nós.

O primeiro erro de Davi foi não priorizar a família.

Lendo 2Samuel 2, 3 e 5, vemos claramente como Davi evoluiu negativamente em relação a sua

família. Observamos que, no início de sua vida política, ele dava um grande valor a família. Quando

deixou de ser um guerreiro ou um valente começou a reinar sobre Israel e foi morar em Hebrom, Davi

levou a sua família, não só a sua família como as de seus auxiliares. O rei, portanto, priorizava a sua

família.

No entanto, no capítulo seguinte, quando Davi se muda para Jerusalém, não há nenhuma menção a sua

família ou as de seus auxiliares. Muito possivelmente Davi deixou a família que constituíra em

Hebrom em Hebrom e foi sozinho para Jerusalém. Não temos essa informação precisa, mas notamos

que o texto omite este cuidado, anteriormente tão evidenciado.

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Parece ter havido em Davi uma mudança de perspectiva. Talvez no início de sua carreira, a família era

um valor importante. Agora, que passava a ser reverenciado um grande rei e não reinava mais de

Hebrom mas de Jerusalém, a família ficara em segundo lugar.

Esta é uma experiência emblemática. Muitos maridos dependem de suas esposas para as suas

conquistas profissionais, políticas, educacionais; no entanto, depois dos triunfos abandonam-nas. O

mesmo pode acontecer por parte das mulheres, conquanto em nossa sociedade, este seja um

comportamento mais masculino.

Quantos, como Davi, em nome da sobrevivência, em nome do progresso pessoal e mesmo em nome

do progresso familiar, esquecem-se de suas famílias? É fácil olhar para Davi e recriminá-lo por ter

feito o que fez. Davi estava empenhado em causas gigantes: unificar um reino desorganizado e até

mesmo levar seu povo a servir a Deus. Seu envolvimento fez com que colocasse sua família em

segundo lugar e pagasse um alto preço: as vidas de dois dos seus filhos, por ele abandonados.

Davi, portanto, foi um péssimo pai. Ele não se constitui em exemplo para nós nesta área, a não ser

negativamente. Muitos de nós incorremos no mesmo erro de Davi, mesmo que com as melhores

intenções. Às vezes, colocamos nossas famílias em plano secundário, para colocar a igreja em plano

primeiro, como se Deus o quisesse.

Às vezes, colocamos Deus em primeiro lugar e a nossa família em segundo, como se Deus precisasse

disso. Na verdade, isso não acontece a não ser desculpa, porque não há nenhuma incompatibilidade

em servir a Deus e colocar a família em primeiro lugar. A família foi uma criação de Deus para

cumprir os propósitos dEle para a nossa felicidade.

Só podemos viver para o louvor de Sua glória se colocamos a família em primeiro lugar, porque Deus

sabe que, quando a nossa família sucumbir, nós sucumbiremos juntos. Embora possamos ser reis,

presidentes, chefes, executivos, seremos um fracasso se a nossa família não ocupar o primeiro lugar

em nossas vidas.

Não cometamos, pois, o erro de Davi que priorizou o reino em prejuízo da sua família e pagou pessoal

e nacionalmente um alto preço. Em certo sentido, a divisão do Império de Israel foi a conseqüência

exata do fato de Davi de não ter colocado a sua família em primeiro lugar, uma vez que a divisão foi

fruto das conseqüências ocorridas no seio dos seus descendentes em função dos seus erros como pai,

membro, líder de uma família.

Quem lidera uma família, como pai ou mãe, precisa rever o lugar que tem dado a sua família, não

meramente no plano do discurso mas no plano da prática. Todos dizemos que a nossa família é

prioridade em nossas vidas mas nem todos agimos como se fosse.

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Aquele que ainda vai liderar uma família e pretende se casar deve ter em mente que não vai fazer uma

gracinha, uma brincadeira. Antes, vai fazer algo que está no propósito de Deus para a sua própria

felicidade. Por isto, comprometa a colocar a sua família em primeiro lugar e só se comprometa com

que se comprometer em colocar a sua família no mesmo lugar.

Se a igreja estiver se interpondo entre você e a sua família fique com a sua família. Digo isso com

tanta tranqüilidade, pois a igreja jamais se interpõe entre um cristão e a sua família. Trata-se de uma

frase de efeito, pois não há nenhuma oposição entre servir a Deus de todo o coração, de todo o

entendimento e de toda a alma, e viver no interior de sua família, colocando-a como primeiro lugar

como um projeto que Deus estabeleceu para cada um de nós.

Davi cometeu um segundo erro, ao não dialogar sobre os seus problemas, como o demonstra o

episódio de seu desentendimento com sua esposa Mical, registrado em II Samuel 6 16-23.

Após uma vitória militar, Davi começou a sair pelas ruas dançando com quem encontrasse pela frente

de alegria porque a arca voltara para Jerusalém. Como naqueles filmes antigos, Mical olhou pelas

cortinas do palácio e viu seu marido olhando para as moças. Ela ficou tão irritada que não deu

nenhuma chance para Davi se explicar, quando entrou em casa. O resultado foi uma imensa confusão.

E se Davi estivesse realmente dançando para o Senhor? Não foi isso que Mical entendeu. E se Davi de

fato estivesse com uma intenção e uma prática totalmente pura? Não foi isso que Mical achou. E se

Mical não estivesse enciumada, mas realmente interessada em proteger Davi? Não ficarão sabendo,

não ficamos sabendo, porque não conversaram; apenas brigaram. Um não deu ao outro a oportunidade

de esclarecer o que se passava com cada um deles. Se tivessem dialogado, discutido, conversado,

tratado do assunto, possivelmente as intenções de cada um seria esclarecidas.

O erro de Davi e o erro de Mical foram precisamente ignorar o princípio elementar da vida familiar,

que é o princípio da comunicação. A maioria de nossos problemas familiares não resiste a alguns

minutos de diálogo. Grande parte de nossos problemas seria superada, se conversássemos e

discutíssemos todos os ângulos da questão. Davi e Mical erraram por não dialogarem sobre os seus

problemas.

Reflita sobre alguns problemas considerados insuperáveis em sua família. Será que eles vão

permanecer, se você e sua esposa, ou você e a sua filha, ou você e o seu pai, ou você e a sua sogra, se

sentarem para conversar? Sabe por que nós não conversamos? Porque podemos chegar à conclusão de

que nós estamos errados. Preferimos não conversar, porque, não conversando, estamos certos que

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estamos certos. Nós nos recusamos ao diálogo, porque temos medo de perder. Nós nascemos para a

vitória, queremos ganhar sempre.

No caso de Davi e Mical, possivelmente Davi estivesse com uma belíssima intenção: louvar ao Senhor

com a glória da chegada da arca. Possivelmente Mical estivesse com uma belíssima intenção:

preservar a Davi de algum tipo de tentação. No entanto, não conversaram e deixaram que o ódio

fizesse morada no coração um do outro com conseqüências terríveis para a vida conjugal deles e de

sua família.

Por isso, nunca deixemos de dialogar. Seja qual for a situação, conversemos até cansar. Não formemos

pré-julgamento antes de esgotar todas as dimensões do problema.

O terceiro erro fatal de Davi foi não agir como pai.

Davi era um pai distante e, como todo pai distante, era omisso. Quando uma de suas filhas, Tamar

(segundo a narrativa de 2Samuel 13), foi atacada sexualmente por um dos seus irmãos, Amon, Davi

não estava.

Ele estava tão distante que, quando Tamar se referiu ao seu pai, disse:

-- Pergunte ao rei.

Essa distância fez com que Davi não tomasse para si as suas atribuições e não agisse como pai. Davi

ficou irado mas não fez nada, apenas ficou irado, revoltado, aborrecido, triste, mas não tomou

nenhuma providência. Três anos depois esqueceu-se. Então, Absalão matou Amon. Absalão matou

Amom porque o pai não castigou o irmão.

Absalão achou que devia honrar a família e providenciou a morte de Amnom. Seu gesto foi uma

conseqüência de um pai que não agiu e que não tomou para si a tarefa que lhe cabia.

E, então, mais uma vez, em lugar de castigar o seu filho Absalão, Davi distante deixou para lá e esse

mesmo Absalão, a quem Davi nunca deixou de amar, tramou-lhe a morte. Quem morreu foi Absalão.

Davi chorou a perda do filho, num lamento generoso:

―Meu filho Absalão, meu filho!

Meu filho Absalão!

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Quem me dera que eu morrera por ti.

Absalão, meu filho! Meu filho!‖

(2Samuel 18.33)

Diz a Bíblia que Davi chorou por muito tempo gritando pelas ruas. Davi não agiu como pai e pagou

um elevado preço, descobrindo tardiamente que não agir hoje é chorar amanhã.

Aprendamos com Davi a amar um filho em quaisquer circunstâncias mas não aprendamos com Davi a

proteger um filho demasiadamente, ao ponto não atuar como um pai e deixando de corrigir e

disciplinar. Os filhos esperam isso dos pais.

Quantas vezes nós ouvimos histórias de pais que choram por seus filhos. Nem sempre aquilo que os

filhos fazem são conseqüências dos atos dos seus pais. Mas no caso específico de Davi, o estilo

omisso de vida familiar que ele implementou não poderia gerar outras práticas, a não ser tais

tragédias.

O quarto erro fatal de Davi foi não ser fiel à esposa.

O livro de Samuel narra os pecados seriais cometidos por Davi depois que viu e desejou Bete-Seba. A

partir daí Davi cometeu uma sucessão quase interminável de pecados, culminando com a morte

tramada de um general co seu exército. Um adultério nunca é uma ação única. Alguns têm dito que

não existe uma hierarquia de pecada, que todos os pecados são iguais diante de Deus. No entanto, nem

todos os pecados são iguais nas suas conseqüências. O adultério é um dos pecados mais terríveis.

Aqueles que escolhem o caminho do adultério pagam um alto preço como a dissolução do seu

casamento, a culpa e a doença. Davi pagou esse preço. Davi, o homem segundo o coração de Deus, foi

impedido por Deus de Lhe construir um templo, porque Deus considerava Davi indigno pelo muito

sangue que derramou e entre esse sangue estava o do general Urias.

O adultério é um erro fatal. A experiência de Davi o demonstra. Nós somos convidados para a

fidelidade sexual, seja ela corporal, mental ou visual. A pureza está no corpo e também na mente.

Quando nos casamos, fizemos uma escolha livre pela qual somos responsáveis.

Se você está como Davi e não prioriza a sua família na prática, disponha-se a priorizá-la.

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Se você é como Davi e não tem dialogado sobre os problemas que estão acontecendo com o dia a dia

familiar e conjugal, aprenda a tomar ciência de onde está e recomece um novo tipo de vida familiar

dialogando, discutindo, expondo os problemas em busca de uma solução comum.

Se você é como o Davi e, às vezes, se esquece de ser pai, de ser mãe, aprenda com Davi a pedir

perdão pelo seu pecado e começar uma nova vida.

Se você, em algum momento de sua vida no passado ou mesmo no presente, não foi ou não está sendo

fiel ao seu cônjuge, faça como Davi: reconheça que contra Deus somente você está pecando e peça a

Ele que apague essa transgressão, para que você possa fruir de novo a alegria da salvação.

A experiência de Davi negativamente nos impulsiona positivamente a mudar alguns de nossos estilos

de vida familiar para não cometer aqueles erros fatais.

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UMA PARÁBOLA DE NÓS MESMOS

Quatro personagem em busca de um autor.

A história do filho pródigo (Lucas 15.11-32) simboliza o itinerário da humanidade, que se afastou

voluntariamente de Deus. Todos sabemos que a parábola contada por Jesus é um convite do grande

Pai aos seus filhos, que devem se arrepender e restabelecer um relacionamento sadio com ele.

No entanto, a parábola permite também uma outra interpretação. Embora não fosse a intenção de

Jesus, sua história mostra o retrato de uma família infeliz.

A história é composta de quatro personagens. Trata-se, portanto, de uma família típica. A primeira

parte da história é trágica.

UMA MÃE AUSENTE

Na história contada por Jesus, inexiste a figura da esposa e da mãe. Há várias possibilidades para isso:

ela poderia estar morta; ela poderia ter se omitido, ou ela pode ter estado presente, mas Jesus a

ignorou em sua narrativa. A conclusão é livre, desde que se saiba que nunca se saberá o que

aconteceu.

Por isso, ela será aqui também ignorada. De qualquer modo, podemos concluir que ninguém preenche

o vazio deixado pela mãe ou pela esposa.

UM PAI BENEVOLENTE

Se a mãe é ausente, o pai é benevolente, aquele que concede sempre, que sempre acha que o filho

miraculosamente vai mudar de atitude. Talvez porque estivesse interessado em ganhar dinheiro, nunca

prestou muita atenção aos filhos. Sua lógica era: aumentar a fazenda, para, com isso, estar o melhor

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para seus filhos. Não há dúvida que a vida os obriga os pais a trabalharem muito, mas o trabalho, o

negócio, a profissão, a empresa, aqui nesta história que antigamente era um campo e hoje é uma

indústria ou uma loja ou departamento, não pode nos impedir de dar atenção, cuidado, afeto e carinho,

as suas maiores necessidades, mesmo que nossa sociedade convencione colocar os recursos materiais

como sinônimo de felicidade.

O pai, além disso, não soube impor sua autoridade, que não se exerce pela força, mas pelo

oferecimento de limites e caminhos claros aos seus filhos. Talvez não o tenha feito, por lhe faltar

autoridade moral. Assim, quando um de seus filhos pediu para que dividisse seus bens, logo ele

concordou. É possível que tivesse pensado que os bens seriam divididos, mas a família ficaria unida.

Só mais tarde, ele pode ter percebido seu erro, o erro de não ter exercido sua autoridade na época

própria. Talvez tenha confiado na educação que lhe dera. Mas será que ele realmente lhe deu valores

permanentes, ou apenas deu bens materiais?

Podemos pensar ainda que aquele se interessava apenas pelo futuro dos seus filhos e não com a

felicidade presente. O futuro dos filhos é muito importante, mas ao ponto de ficarem proibidos de ser

felizes no presente. O filho revoltado se cansou de acumular para um dia ser feliz.

Às vezes, podemos pensar nisso como acontecendo com os outros mas como perguntou o nosso pai, a

quanto tempo não temos uma conversa em família? Não é uma pergunta para outros responderem e

sim para eu responder. Que pai estou sendo eu? Um pai benevolente, um pai muito interessado em seu

sucesso profissional com boa intenção ou um pai voltado para o futuro dos filhos e esquecido do

presente.

UM FILHO INTERESSEIRO

O filho mais novo agiu irresponsavelmente. Diante das riquezas da família, imaginou que poderia

passar a vida inteira gastando o que achava que era seu. Talvez desde cedo tenha ido para roça e se

achava merecedor de tudo aquilo. Por isso, pegou a sua parte na herança e desapareceu.

Longe de casa, não procurou desenvolver amizades sinceras. Apenas, com seu dinheiro, foi

―comprando‖ amigos aqui e ali. Um dia, o dinheiro acabou e ele não tinha sequer um amigo. Ele não

se preocupou em fazer amigos porque achava que os tinha. Ele só descobriu a bobagem que tinha feito

depois de torrar todo o seu dinheiro. A fome bateu forte.

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Procurou emprego, mas nada conseguiu, a não ser um trabalho de tratador de porcos. O seu patrão era

tão ―bonzinho‖, que não lhe dava comida diferente daquela que os animais comiam. Salário, nem

pensar. O desespero bateu na cabeça.

Ele, então, pensou no seu pai, a quem nunca mandara uma carta, nem para dizer onde estava, se estava

bem, etc. Até então se importou com o sofrimento dos seus familiares. Quando, porém, as dificuldades

chegaram, lembrou-se do seu pai. Pensou nos empregados do seu pai. Comparou a comida que comia

com a dos seus empregados. Comparou a cama que não tinha com a cama dos seus empregados.

A segunda parte da parábola relata a volta do irmão mais novo e as reações dos seus familiares.

UM FILHO ARREPENDIDO

Enquanto os porcos faziam sua alimentação, o ex-filho do fazendeiro rico pensou no seu pai.

Primeiramente, pensou apenas em voltar. Depois, tomou a atitude correta: arrependeu-se do que

fizera. Para tanto, viu o erro que tinha cometido, percebendo a injustiça que tinha feito contra seu pai.

Qual foi o erro? Entre os erros, ele sucumbiu ao instante. Se o seu pai e seu irmão pensavam na

felicidade como uma coisa futura, ele pensava nela apenas como algo presente, sem a dimensão

daquilo que ainda estava por vir.

Mais ainda, ele se considerava o centro do mundo, ignorando por completo as vozes do seu pai e do

seu irmão. Só ele sabia tudo. Só ele seria capaz de decidir o que lhe era melhor. O que os outros

pensavam não lhe importava. Por isto, não foi amigo do seu pai nem do seu irmão, como não foi

amigo dele nenhum daqueles que comprou com o seu dinheiro, quando ainda o tinha.

No entanto, o filho mais novo tinha virtudes. Ele teve a coragem de se arrepender, a coragem de voltar

derrotado para casa. Voltar para casa triunfante é fácil, voltar para casa de carro novo e bom emprego

também é fácil. Agora, voltar para casa, de ônibus ou a pé, sem dinheiro nenhum, sujo, andrajoso,

faminto, demanda muita coragem. Já ouvimos histórias de pessoas que deixaram suas casas para

mudar de vida, fracassaram e preferiram ficar na sarjeta a ter coragem de voltar.

O filho pródigo reconheceu que a sua casa era melhor do que todas as casas do mundo. Depois de

experimentar outras casas, concluiu que a sua era a melhor das casas. Ele, então, resolveu voltar para

casa, disposto a pedir perdão e a pagar por seus erros. Ele não se achava merecedor de ser mais

considerado um verdadeiro filho. Chegou humilde. Ensaiou um pedido de perdão. Final feliz.

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Por esta atitude, pôde redescobrir a amizade em família, amizade de uma família que lhe deu o que ele

não mais merecia. Por causa do amor da sua família, aprendeu a viver de novo em família.

UM PAI COMPREENSIVO

Seu pai ainda se considerava seu pai. Talvez da varanda de onde, diariamente, esperava a volta do

filho, seu pai o viu. Viu-o e saiu correndo ao seu encontro. O filho tentou dizer alguma coisa, para

pedir perdão, mas o pai não quis nem saber.

Abraçou o filho e demonstrou que ainda o amava. Deu a melhor roupa. Calçou-lhe os melhores

sapatos. Ofereceu as jóias mais bonitas. Além disso, deu uma grande festa, movida por um churrasco

gigante, com uma carne supremacia. Para ele, era como se um morto tivesse ressuscitado.

O pai se redime no final da história. Ele teve a coragem de receber o seu filho de volta. Ele poderia

seguir outra lógica: "Não escolheu? Que pague. Não quis assim, que vá até o fim". Esse pai, que

tipifica a atitude de Deus, teve a coragem de receber o seu filho, não como um filho de segunda

categoria, mas como um filho querido, como uma grande pérola perdida, agora encontrada.

A partir de então possivelmente ele tenha aprendido a valorizar a dimensão presente da felicidade.

Recebeu o seu filho sendo o seu filho. Espera-se também que ele tenha aprendido exercer a sua

autoridade com dedicação com amor e tenha aprendido a colocar os negócios, a profissão, a empresa

no seu devido lugar, isto é, como meio para a sobrevivência e não a própria vida.

UM IRMÃO CIUMENTO

A história tinha tudo para terminar de modo feliz, porque todos na casa começaram a festejar. O irmão

mais velho, que tinha ficado em casa e ajudado o pai nos negócios e que tinha investido sua herança

na fazenda da família, não gostou do que viu. Ele achava aquilo tudo uma injustiça, porque o pai

nunca dera uma festa em sua homenagem, mesmo que regada a modestos cabritos.

Para ele, seu irmão, com quem pouco se importava, era alguém que iria atrapalhar, era alguém que iria

dividir algo que não merecia mais porque já fora dividido. Ele pensou tão somente em si mesmo.

Ambicioso, pensou apenas na perda do patrimônio, não na alegria do irmão, no reencontro com o

irmão. Sua ambição incapacitou-o para o amor.

A maior partes das brigas em famílias, especialmente depois que os pais morrem, é em torno da

divisão da herança, às vezes minúsculas heranças. Essa é uma história, sabemos, que acontece todos

os dias.

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Quando o seu irmão chegou e foi dada uma festa, ele não quis participar, não tinha tempo para festa,

ou porque não foi avisado como parece a história ou podemos atualiza não se interessou em ouvir.

Não lhe dizia respeito aquela festa, mesmo porque festa não fazia parte da sua vida, porque ele

precisava acumular para o futuro.

Não podemos deixar de registrar que esse irmão também tinha virtudes: era um trabalhador, pegava de

sol a sol, batia no pesado. Parte dos recursos da família, ele os havia amealhado. Com ele, nós

aprendemos o valor do trabalho.

Com esta parábola, aprendemos que os desajustes nas famílias podem acontecer, mas todos (pais e

filhos) devem contribuir para que tudo seja superado. Só assim, poderão encontrar a felicidade que

buscam, no convívio uns com os outros. O pai agiu certo, ao perdoar o filho mais moço. O filho mais

moço agiu certo, ao voltar para casa. O filho mais velho agiu errado, ao se considerar vítima de uma

injustiça.

Os pais têm deveres específicos, dos quais não podem abrir mão. O pai, nessa história, se mostrou

omisso quando deveria ser firme. Nem sempre um adolescente sabe o que é melhor para si mesmo.

Cabe ao pai orientá-lo, mesmo que seja necessário contrariar sua vontade. O pai, por sua experiência,

enxerga longe e pode ver onde as atitudes de hoje vão levar amanhã. Os filhos precisam reconhecer

que os pais têm essa capacidade e aceitar a experiência deles como importante para suas vidas. Os

filhos devem ouvir mais e agir menos. Em outras palavras, os filhos devem escutar os seus pais.

Os filhos também não devem ser rancorosos, mesmo quando acham que seus irmãos ou seus pais

agiram de forma errada. O filho mais velho deixou-se levar pelo ciúme, quando deveria alegrar-se

com seu irmão. O ciúme cegou o amor.

Estes três personagens tipificam nossas tensões em família.

O pai não pode ser benevolente, nem omisso, nem apenas voltado para o futuro e nem muito menos

tão modo assoberbado com o trabalho que não olhe para os carecimentos profundos de cada membro

da família. O pai deve ter a coragem de receber o seu filho ou a sua filha de volta porque há pais que

não recebem e nem procuram. O pai deve valorizar o presente de seus filhos. Não devem entupir os

seus filhos com atividades ou estudos, de modo a não sobrar tempo para viverem. Não devem também

entupir-se a si mesmos de trabalho ou estudo que não tenha tempo para dedicar a seus filhos.

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Cada pai deve refletir se não está sendo pai da parábola do filho pródigo e se estiver então se dispor a

mudar a ser um outro tipo de pai.

Quanto aos irmãos, aprendemos também que não devem ser ciumentos, nem ambiciosos, nem projetar

o seu futuro apenas para o futuro, mas que, ao contrário, devem buscar o mais possível a harmonia e a

paz, mesmo na hora da partilha. Cuidemos para não dar valor aos nossos irmãos quando estamos

longe deles. Se os temos, devemos dar valor aos nossos irmãos, por mais que eles sejam como os da

parábola.

Diferentemente do irmão mais novo, tenhamos sempre a dimensão das conseqüências dos nossos atos

no futuro. Imaginemos que nossa vida tenha um prosseguimento, um devir, um acontecer que não será

no futuro mas não também é só no presente. Sabemos que não podemos mudar o passado mas

podemos construir o nosso futuro.

Devemos ter a humildade de reconhecer que nós erramos, como pais, como filhos. É um bom começo

reconhecer o nosso erro, voltar, retornar, reviver, valorizar a nossa casa como a melhor das casas.

Que não seja necessário para nenhum de nós ser um filho pródigo que retorna, mesmo porque pode

não haver retorno. A Bíblia nos ensina que o lar é o nosso lugar. Façamos dele de fato o nosso lugar

melhor. Oremos a Deus para que Ele nos ajude e nos fortalece para colocarmos tais desejos em

prática.

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Interlúdio para um sermão numa cerimônia de casamento

O QUE DEUS UNIU

Então Jesus respondeu: Não tendes lido que no princípio o Criador fez homem e mulher? Portanto, o

homem deixará pai e mãe e se unirá a sua mulher e serão ambos uma só carne. De modo que já não

são mais dois, porém uma só carne. Portanto, o que Deus uniu não o separe o homem (Mateus 19.4-

6)

Ao lhes trazer este texto, pareço estar-lhes falando sobre aquilo que vocês não esperam. Antes, na

verdade, estou-lhes falando sobre o que lhes acontece hoje e sobre o que certamente vocês almejam

para o resto de suas vidas: ajuntamento, união, companheirismo.

Na verdade, ninguém se casa para se separar. Obviamente, se um casal o desejasse, bastaria que não se

casasse. No entanto, a separação é uma realidade que alcança a muitos casais. A Bíblia mesma fala

desta realidade, realidade não desejada por vocês e não anelada por Deus.

É por isto que Ele, por meio da Bíblia, lhes deixa esta advertência, visando a felicidade de vocês,

advertência que quero reforçar, visando o mesmo bem, em nome de todos os que se encontram aqui

nesta noite, pelo amor que nutrem por você, [ela], e por você, [ele].

Quero-lhes propor, então, três perguntas.

Deus une quando o casamento entre duas pessoas é, na verdade, entre três: ele, ela e Deus. São três os

casantes porque foi Deus quem uniu vocês dois.

Neste novo tipo de triângulo amoroso, Deus está no vértice superior, ditando os valores, inspirando as

decisões e fortalecendo os laços conjugais. Nos outros dois vértices, vocês dois ouvem esses valores,

seguem-nos com seriedade e têm prazer na companhia abençoadora de Deus.

Quando há este tipo de disposição, podemos dizer que Deus está ajuntando o casal. Eu espero que esta

seja a disposição de vocês.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 35

Quando o casamento é a três, os três procuram o bem-estar um do outro. Deus sempre procura o nosso

bem-estar, porque os planos de Deus para nós são de paz, nunca de mal. Cabe-nos querer também o

bem-estar dele e o bem-estar do cônjuge.

Num mundo em que as pessoas se centram em si mesmas, o casamento é um escândalo, no sentido

que nele um vive para o bem-estar do outro. Ambos, portanto, vivem para fazer o outro feliz. No

casamento, firmado segundos os princípios espirituais de Deus, o maior prazer (em todas as suas

dimensões) é o prazer do outro. Não se casa para ver o que se pode tirar do outro, mas para oferecer o

máximo ao outro, em termos de cuidado, carinho, afeto, proteção e preocupação.

Quando há este tipo de disposição, podemos dizer que Deus está ajuntando o casal. Eu espero que este

seja o interesse de vocês.

Quando um procura o bem-estar do outro, há um compromisso mútuo de fidelidade entre os dois.

Nunca foi, não é e jamais será fácil ser fiel. As ofertas são muitas. É por isto principalmente que se faz

a recomendação bíblica aqui repetida. Não ser fiel é precisamente separar-se mesmo que se esteja

junto.

Ser fiel guardar-se um para o outro, tanto na exclusividade e na permanência da paixão quanto na

direção e sentido do amor e do respeito. É desejar apenas o outro. É querer estar sempre com o outro.

É viver um relacionamento de transparência, aquela transparência que se pode ver prazerosamente

porque dela saem cores e odores agradáveis. É viver um relacionamento de integridade, isto é, de

inteireza, verdade e completude.

Só é fiel quem é capaz de renunciar ao fácil e ao fútil, ao ilusório e ao perfunctório. Não é fácil

manter-se junto, mas esta é a recomendação bíblica e exatamente por isto.

Deus criou o homem e a mulher como seres complementares. Um sem o outro é incompleto; não é

ainda um ser. Homem e mulher são radicalmente diferentes no plano biológico. E nesta diferença, eles

se complementam. Possivelmente vocês sejam muito diferentes entre si no plano psicológico e nesta

diferencia vocês se complementam. Deus fez vocês assim.

A sua felicidade, [ele], acontece porque a [ela] veio lhe completar. Ao completá-lo, [ela], você é feliz.

A sua felicidade, [ela], acontece porque o [ele] veio lhe completar. Ao completá-la, [ele], você é feliz.

Embora vocês saibam disso, devem cuidar para que o egoísmo não lhes descomplete. Há dois tipos de

egoísmo: um egoísmo solo, em que um dos cônjuges vive apenas para si, esquecido do voto, que

daqui a pouco se fará, de interesse pelo bem-estar do outro. O egoísta solo é aquele que se basta a si

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 36

mesmo, por não precisar que o outro lhe complemente. Se o egoísmo solo triunfar, vocês não

manterão o sentido da complementaridade.

Há um segundo tipo de egoísmo: o egoísmo duplo, que é aquele em que o casal vive apenas para si

mesmo, sem interesse pelos outros, seja a família anterior, sejam os amigos, seja a igreja, seja o

mundo. O egoísta duplo é aquele em que o casal se basta a si mesmo, por não precisar que ninguém

mais complemente. Se o egoísmo duplo triunfar, vocês não manterão o sentido da complementaridade.

Se vocês se lembrarem que um completa o outro, vocês não vão separar o que Deus mesmo uniu.

Complementaridade tem a ver com companhia, cujo contrário é solidão. Se vocês preferissem a

solidão, não se casariam. No entanto, preciso-lhes dizer que viver na companhia do outro é algo a ser

aprendido, constantemente aprendido porque facilmente lembrado.

Viver em companhia é, em essência, ter prazer em estar com o outro. É gostar de fazer em conjunto as

coisas que antes se fazia em separado.

Viver em companhia é estar um ao lado do outro, mesmo que sem palavras.

Viver em companhia implicam em ter coragem de renunciar a alguns gostos, próprios de quem vive

só. Vocês são jovens, mas devem ter preferências que não combinam com as do outro. Elas devem

continuar, mas a sua quantidade deve diminuir.

Viver em companhia significa respeitar a individualidade do outro. Se o seu querido não gosta de

feijão, não lhe dê feijão. Se a sua querida gosta de ver a televisão até tarde, vá dormir. O casamento

não é para lhes anular, mas para lhes ser prazeroso.

Se vocês forem companheiros um do outro, contribuirão para que permaneça unido aquilo que Deus

uniu.

Em tudo, vocês precisam viver permanentemente se comunicando, com palavras.

Os gestos comunicam mas demandam muita interpretação. Por isto, falem. Falem de seus projetos,

mesmo que ligeiros. Falem de suas ansiedades, mesmo que passageiras. Falem de suas reclamações,

mesmo que rasteiras. Comuniquem-se.

Possivelmente, um seja mais calado do que o outro. E isto não vai mudar. Nem deve. No entanto, o

que não pode haver é a incomunicação. Nada resiste à palavra: nem a tristeza, nem a dúvida, nem a

angústia. Se vocês conversarem entre si sobre essas coisas, elas vão desaparecer. Mantenham entre

vocês o espírito, o hábito, o prazer em conversar.

Se vocês tomarem este cuidado, o que Deus uniu vocês não vão separar.

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Parte 2

A FAMÍLIA E SUA FORÇA

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6

UMA OBRA PRIMA

Quando inventou a família, Deus sabia bem o que estava fazendo.

Não dá pra imaginar uma vida sem família, embora nem tudo nela seja a flor que deveria ser.

A razão é muito simples: nenhum de nós, como diz a expressão popular, é flor que se cheire.

Por experiência própria, pelas experiências dos outros e pelos ensinos bíblicos, sabemos que nem

sempre na família as coisas acontecem como deveriam. Às vezes, o egoísmo triunfa, o desinteresse

reina e o mal-humor acompanha a vida diária.

Apesar de tudo isto, quando a gente chegou ao mundo, não tinha a menor condição de sobreviver

sozinho. Quando a gente fica doente, o cuidado vem da família. Quando a gente precisa de apoio, é

com ela que se pode efetivamente contar.

Deus sabe das coisas. Por isso, fez a família. Se ela não é lá essa maravilha, a culpa não é de quem a

inventou.

O PROJETO DE DEUS

Quando a inventou, Deus sabia bem o que queria.

Segundo a Bíblia, primeiro, ele fez o mundo, achou bonito e precisou de um gerente para tomar conta

dele. Por isso, criou os seres humanos, sua maior obra. Para cuidar do mundo e, principalmente, para

ser nele feliz, fez o homem e a mulher.

Deus é um profundo conhecedor da natureza humana. Afinal, ele fez o ser humano à sua imagem e

semelhança. Por isso, sabia que esse homem apreciava a comunicação e o companheirismo. No

entanto, Deus estava vendo que a sua criação estava sozinha. A família ainda não existia.

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O primeiro homem era um solitário. Para não morrer de tédio, conversava com bois, passarinhos,

cobras e lagartos. De vez em quando, o próprio Criador vinha bater papo com ele. Deus mesmo é um

ser que se comunica. Ele também gosta de conversar.

Nesse convívio com o homem, Deus notou que faltava alguma coisa. O homem que criara dava um

duro danado para administrar o mundo. Perfeito e amigo da perfeição, Deus notou que o mundo era

bonito e grande demais para uma pessoa só. Então, criou-lhe uma companheira. Os dois começaram a

dividir alegrias e problemas. A família ainda não estava completa. Foi surgindo aos poucos. Só

quando vieram os filhos, o projeto divino se tornou uma verdadeira obra-prima.

Por isto, na família, a palavra-chave é companheirismo. Aliás, é bom não esquecer que esta é também

a palavra-chave no relacionamento entre Deus e os homens. Quando se referia ao Criador, Jesus

Cristo, o filho, usava a palavra ―Pai‖. Quando se referia aos seus seguidores, pensava neles como

―irmãos‖. Ele mesmo tinha pai (José), mãe (Maria) e vários irmãos.

Deus criou a família para criar um lugar onde as pessoas pudessem ser companheiras umas das outras.

Viver é amar e a família é o primeiro lugar onde exercemos este amor.

O amor precisa de parceiros para existir. Ninguém ama o vazio, mas a alguém de carne e osso. Nossos

primeiros amores são nossos pais. Só mais tarde, muito mais tarde, já na adolescência, amamos a

outras pessoas fora da família. Se este amor crescer e se desenvolver, fará nascer uma outra família.

O companheirismo é uma conseqüência de sermos criados à imagem e semelhança de Deus. O amor

dele não é vazio. É concreto e tem uma direção: nós. Ele aprecia a nossa companhia, assim como

devemos apreciar a sua companhia. Devemos buscar a sua presença como uma pessoa sedenta procura

por água no deserto, como um animal que corre em busca de um riacho na montanha (Salmo 42.1).

OS SÍMBOLOS PERMANENTES DA CRIAÇÃO

Quando criou o homem, Deus viu que ele era incompleta sozinho. Quando criou a mulher, Deus a

chamou de auxiliadora idônea, alguém no mesmo nível do homem e com quem ele se pudesse se

relacionar maduramente.

A criação do primeiro casal indica também que eles são complementarmente diferentes. Essa

diferença lhes é essencial porque Deus os fez assim. É ela que atrai um em direção ao outro. Os gênios

dos dois serão sempre incompatíveis: um é homem e a outra é mulher.

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Não há sentido alegar-se incompatibilidade de gênios na hora da crise conjugal. Aquilo que um dia os

atraiu não os pode separar agora. O caminho da maturidade é longo, mas deve ser percorrido até a

última milha.

Essas verdades estão claras na história da criação (Gênesis 2.18-25, Gênesis 4.1-2). Por isso, devem

ainda hoje ser consideradas símbolos da vida em família.

A história da criação e a vida em família nos ensinam, entre outras realidades, que nenhum de nós é

completo sozinho (Gênesis 2.18). O primeiro homem tinha a companhia de Deus, dos animais e das

plantas. Ele reinava absoluto na terra. Embora fosse o governador da terra, era infeliz. Era como

aqueles ricaços dos filmes. Têm tudo, inclusive uma mesa-gigante na sua mansão-gigante, mas tem

que almoçar sozinho. Deus, que sabe das coisas, notou que faltava ao primeiro homem uma

companheira que lhe fosse igual em tudo. Só assim o vazio que sentia desapareceria.

A mulher é fruto da decisão divina de encontrar uma companheira para o primeiro homem (Gênesis

2.18). Antes, ofereceu-lhe a oportunidade de encontrá-la entre aves e animais, criados para o homem.

O primeiro homem teve, portanto, a oportunidade de se relacionar com todas as criações de Deus

(Gênesis 2.19). Ele era senhor de todas elas. Pôde inclusive escolher seus nomes (Gênesis 2.20).

Contudo, nenhuma lhe serviu, assim como um gato de estimação não preenche certos vazios. Quem

tem um gato dentro de casa sabe que todos os animais domésticos têm nomes. É alguém que pertence

à família. Quando ele sofre, todos sofrem. Já há clínicas de atendimento para esses animais,

oferecendo até cuidado psicológico...

A mulher é uma criação especial de Deus (Gênesis 2.20-23). O homem e a mulher foram criados por

Deus, que usou o mesmo ―material‖. Ambos são sangue, carne, osso, pêlo, razão, emoção, vontade.

Logo, têm o mesmo valor diante de Deus, por mais que algumas sociedades achem que um seja

superior ao outro. Deus queria criar uma companheira que fosse igual ao primeiro homem. Ele

conseguiu.

A família é o lugar onde homem e mulher se realizam como pessoa, vivendo em harmonia (Gênesis

2.24-25). O autor bíblico resume o projeto de Deus: na época própria, o filho e a filha deixarão as

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casas de seus pais para formarem novas famílias, ele com sua esposa, ela com seu esposo. O ideal é

que vivam em harmonia, reconhecendo-se como iguais e buscando a felicidade um do outro.

Quando eles vêm, os filhos completam o projeto de Deus (Gênesis 4.1-2). O primeiro casal teve três

filhos. A Bíblia dá inclusive seus nomes. Na cultura hebraica, todos os nomes têm um significado.

Não sabemos o significado dos nomes Abel e Sete, mas sabemos o de Caim. Significa: ―aquisição‖.

Caim teve uma vida infeliz, mas seu nome era muito feliz e simboliza o que são os filhos para os seus

pais: presentes de Deus, com os quais o Criador completa a sua obra. Depois que Abel morreu, Deus

providenciou outro filho para o casal. Eva também recebeu Sete como um presente de Deus (Gênesis

4.25).

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7

O PRAZER E A RESPONSABILIDADE

Nem todas as mudanças nos padrões familiares são ruins.

Diante das coisas que ocorrem com as famílias de hoje, há duas atitudes muito comuns.

A primeira é:

— Oh! O mundo está mesmo perdido!

A segunda é:

— Qual o problema? Não vejo nada demais nisto!

De fato, muitas mudanças vêm ocorrendo. Nem todas são ruins. Antigamente, por exemplo, os pais

escolhiam com quem seus filhos iam se casar. Hoje não é mais assim. Pouca gente acha que a

transformação tenha sido para pior.

Como saber quais mudanças são aceitáveis e quais são inaceitáveis? Este é um problema que a Bíblia

nos ajuda a resolver. Ela nos oferece padrões permanentes.

Mas, cuidado! Não podemos querer simplesmente copiar o ambiente das famílias bíblicas para os dias

de hoje. Nenhum pai pode hoje, por exemplo, fazer como Abraão, que expulsou de casa um filho e se

dispôs a matar o outro. Nosso mundo é outro. Agar e Sara, por exemplo, poderiam ir à polícia e

denunciar Abraão, que, certamente, seria preso.

Nenhum pai também pode espancar seu filho e depois abrir no Salmo 137.9...

Essas práticas valiam para uma época, quando os pais podiam até matar seus filhos. Jefté, por

exemplo, prometeu sacrificar a primeira pessoa que encontrasse, caso vencesse uma guerra. Ele a

venceu e sua única filha veio lhe cumprimentar. Perturbado, ele explicou à menina a oração que tinha

feito. Ela lhe disse para ir em frente. Seu pai cumpriu seu voto (Juízes 11.30-40). Não era crime...

A Bíblia precisa ser lida com fé e inteligência. Fé para que Deus nos ilumine a entendê-la e a aceitar

seus princípios. Inteligência para que Deus possa nos iluminar neste entendimento. Fé e inteligência

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para ver na Bíblia, por trás do fato, os princípios de Deus para nossas vidas. Os padrões da sociedade

mudam. Os de Deus não.

AS IDÉIAS NO LIQUIDIFICADOR

Nossos familiares (pais, avós e tios, principalmente) procuram nos comunicar aquelas coisas que

acham certas e erradas. Nossos professores e colegas na escola fazem o mesmo. Nossos amigos agem

da mesma forma. Nosso(s) pastor(es) e professores na igreja estão sempre nos apontando caminhos.

Os meios de comunicação de massa, especialmente a televisão, vivem nos dizendo como viver.

Que fazemos com tantas idéias?

Sem saber, pegamos essas idéias como se fossem ingredientes de uma vitamina. Primeiro,

selecionamos as frutas. Aquelas das quais não gostamos, deixamos de lado. Depois, descascamos

algumas e lavamos outras. Por fim, acrescentamos água, leite ou açúcar. Ligamos a máquina e

fazemos um sabor novo.

Assim acontece com as idéias. Aquelas com as quais concordamos completamente nós passamos a

considerar nossas. Aquelas das quais discordamos, deixamos de lado. Às vezes, pegamos uma parte de

uma idéia e rejeitamos a outra.

Desse modo, nossos valores são o resultado do filtro que fazemos das idéias dos outros. Nosso

conjunto de valores é uma espécie de vitamina pronta para ser tomada. Ela terá o gosto das frutas que

tivermos colocado. Sobressairá aquela fruta que for mais forte.

É aí que entra a família. Na composição de nosso coquetel de valores, se os valores da família forem

mais fortes, é dela que vamos beber durante a vida inteira.

No projeto de Deus, é nela que devemos aprender as verdades essenciais para a vida, especialmente o

valor máximo de amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. No entanto,

tendemos a trocar a família por uma conversa de escada de escola ou por um papo leve da turma da

esquina.

ANTIGO, MAS SEM CHEIRO DE NAFTALINA

Por isso, os pais que amam a Deus e aos seus filhos procuram lhes passar os princípios contidos na

Bíblia. A razão disto é que esses valores valem para sempre, porque são inspirados pelo próprio Deus.

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Deuteronômio 6 é uma orientação aos pais sobre como ensinar esses valores aos seus filhos. É dever

de nossos pais viverem e comunicarem esses valores. É dever dos filhos que amam a Deus e a seus

pais viverem esses valores. Aqueles filhos cujos pais não estão preocupados com esses valores devem

vivê-los por sua própria conta.

As idéias deste texto foram apresentadas há quatro mil anos. A vida familiar hoje é completamente

diferente. Naquela época não havia escolas como as de hoje. Não havia formas de lazer como as de

hoje. O casamento era completamente arranjado e a opinião de quem estava casando não tinha a

menor importância. Aliás, os jovens nem tinham opinião.

Diante disso, talvez alguém duvide que os ensinamentos bíblicos em geral sirvam ainda hoje. Triste

engano. A Bíblia foi escrita numa época, mas vale para todas as épocas. Naquele tempo, era comum

colocar pensamentos, com ensinamentos divinos, nas portas das casas. O costume desapareceu, mas

continua valendo a idéia de que se deve buscar formas para que esses valores sejam lidos e

compreendidos. Pode ser um adesivo, que não existia naquela época, um plástico de automóvel, que

também não existia.

O que ensina o texto aos filhos e aos pais?

O temor a Deus é o princípio da vida (1-3). Os adolescentes hebreus estavam no deserto, acampados

em barracas. Como a vida era dura, estavam sempre se lembrando de Deus. Daqui a pouco, porém,

iriam viver em casas numa terra onde havia leite e mel à vontade. Não precisariam mais comer mana

sem gosto e beber água da chuva. Será que se lembrariam de Deus?

Quando as coisas vão de mal a pior, lembramo-nos de Deus, oramos, fazemos jejum, vigílias e

promessas. Quando as coisas melhoram, ficamos sem tempo... Por isso, na nova terra Deus deveria ser

lembrado, ser temido (verso 2). Seus mandamentos precisariam ser guardados. Temer a Deus não é

morrer de medo dele: é saber que ele é o Senhor.

O amor a Deus deve ser o primeiro dos amores (4-5). A recomendação é que amemos a Deus como

sendo nosso primeiro amor. As três expressões para o amor (―de todo o coração‖, ―de toda a alma‖ e

―com todas as forças‖) repetem a mesma idéia. Nosso amor a Deus deve ser semelhante ao amor-

paixão no qual colocamos todo o ser. Queremos estar juntos. Queremos fazer a sua vontade. Não ser

correspondido é como perder o sentido de viver. Amamos assim a Deus? Ele nos ama assim e quer da

gente a mesma intensidade.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 47

Os valores devem ser cultivados (6-9). Os pais devem viver os valores que querem ensinar aos seus

filhos (verso 6). Eles os comunicarão mais por atitudes do que por palavras. O pai ensina que devemos

falar a verdade, mas manda dizer que não está quando toca o telefone... A verdade não está no seu

coração, só na boca. Numa interpretação para os dias de hoje, o conselho (versos 7-9) poderia ficar

assim: ―Fale diariamente dos princípios divinos para a vida, estejam vocês em casa ou viajando de

férias. Aproveite as oportunidades em que estiverem juntos. Tenha em casa adesivos sobre o amor de

Deus. Coloque placas nos quartos e na porta da geladeira. Faça da sua casa um ambiente propício para

se lembrar de Deus‖.

Não se deve descartar a Deus (12-15). Na família e fora dela, há um convite permanente para

deixarmos Deus de lado.

Quando as coisas estão difíceis, contamos com Deus. Quando as coisas estão sob o controle, contamos

conosco mesmos. Quando tudo na família vai mal, todos se reúnem para orar pelo(s) problema(s).

Quando a tempestade passa, cada um ora no seu canto, se tanto.

Quando a família joga Deus para a lateral do campo, ela viverá seus próprios valores. Acontece que

nossa luta neste mundo é contra adversários mais fortes do que nós. Precisamos da roupa de guerra de

Deus. Com ele, venceremos. Sem ele, já perdemos. É uma questão de escolha, e muitos estamos

escolhendo lutar com nossas próprias forças. Para perder.

Parece que o texto não tem nada a ver com a gente. Todos seguimos a Deus. Todos oramos a ele, para

agradecer ou para pedir. Todos louvamos e servimos a Deus. No entanto, toda essa obediência pode

ser pura fachada. Muitas vezes dizemos que são cristãos alguns valores que não são cristãos. Essa é

uma forma de descartar a Deus.

Não vale a pena esquecer a misericórdia de Deus (10,11,20-23). Na família e fora dela, somos

convidados a pensar que nossas vitórias são conseqüências de nossa inteligência e força.

A misericórdia de Deus é a causa da nossa felicidade; sem ela, a destruição é certa (Lamentações

3.22). A história do povo de Israel deixa isso bem claro. Quando entraram na terra prometida, a

começar por Jericó, receberam cidades para morar, cidades que não construíram (verso 10). Além

disso, colheram onde não plantaram e beberam água de poços que não cavaram (verso 11).

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 48

Nossas famílias também têm experimentado vitórias vindas de Deus. Será que nos lembramos disso

sempre?

Não se deve transformar Deus num servo (16). Na família e fora dela, somos convidados a considerar

Deus um servo nosso, como se fosse um deusinho feito à nossa imagem e semelhança e segundo

nossos desejos e caprichos.

O autor bíblico pede que o povo de Israel não cometa o mesmo erro que cometera em Massá, alguns

anos antes. Naquela época, no deserto, faltou água (Êxodo 17.1-7). Eles desafiaram a Deus. Primeiro,

exigiram água. Eles não oraram, pedindo. Eles exigiram (verso 2). Há alguns pregadores por aí que

ensinam essa besteira ao povo, dizendo que a felicidade é um direito nosso e que basta decretarmos a

bênção, que ela virá.

Depois, os hebreus questionaram a presença Deus entre eles (verso 7). Eles duvidaram do mesmo

Deus que os tirara de modo sensacional da escravidão do Egito (Deuteronômio 6.12), estivesse com

eles. Muitos ―crentes‖ só ―crêem‖ em Deus, quando o tempo é de sombra e água fresca. É só vir o sol

forte e a água sair morna para a fé ficar congelada.

A recomendação bíblica é seguir outros padrões e não estes dos filhos de Israel em Massá.

Obedecer é bom (17). Todo capítulo repete que as famílias de Israel deveriam guardar os

mandamentos deixados por Deus. A condição para a felicidade é a obediência a esses mandamentos.

A conseqüência de quem obedece é ter sua vida preservada. Olha que linda verdade: Deus quer ―o

nosso bem em todo o tempo‖ (verso 24).

Buscar a justiça é muito bom (18). Somos incentivados a praticar o que é reto e o que é bom. Na

Bíblia, justiça e bondade não são conceitos vazios; são práticas cheias. Na Bíblia, praticar a justiça e a

bondade não é apenas viver corretamente para si mesmo; mais que isso, é a busca do bem-estar dos

pobres (Dt 15.7), especialmente crianças, viúvas e estrangeiros.

Recordar também é bom (20-23). Neste texto, os pais são incentivados a dar respostas corretas às

perguntas dos seus filhos. Até podemos atualizar o diálogo entre pais e filhos, hoje:

— Pai, por que Deus se preocupa conosco?

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 49

— Filho, Deus sempre se preocupou conosco. Você ainda não era nascido e ele já cuidava de você.

Foi ele quem nos trouxe você. Temos sentido a cada dia o seu carinho para com a gente, nos livrando

do perigo, nos apontando o caminho, nos segurando pela mão. Filho, a misericórdia de Deus é

simplesmente demais!

Devemos agir segundo os valores que temos dentro de nós. O valor maior é o temor a Deus. Temer a

Deus é viver acreditando nessa verdade. É viver gostando de acreditar nessa verdade. É ter prazer de

ter a esse Deus como Senhor em todas as áreas da vida.

Só assim desenvolveremos a verdadeira sabedoria e só assim entenderemos os princípios de Deus para

nossa vida em família.

A condição básica para a felicidade é temer a Deus, que não deve ser nunca descartado nas horas boas

e apenas lembrado nos tempos ruins. Por mais que sejam fáceis esses caminhos, é preciso andar longe

deles. Eles levam ao vazio.

Cada um deve se esforçar para viver os valores de Deus, que são permanentes, e conduzem à

felicidade. O prazer é de todos. A responsabilidade também.

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8

OS QUATRO PILARES DA VIDA EM FAMÍLIA

As familias estão sempre passando por mutações, que vão definindo novos papéis para os seus

membros. A mãe, por exemplo, um dia apenas mãe, convive com o papel de provedora, antes

exclusivo do pai. O filho, por exemplo, um dia um sem-vontade, agora tem o direito de escolher seu

cônjuge e mesmo sua profissão.

O conceito de família vai se ampliando diante das separações e dos novos casamentos. Não se fala

mais em meio-irmão, mas apenas em irmão. Avós são cada vez mais pais. Há famílias compostas por

filhos e mãe ou por filhos e pai.

A desenfreada luta pela sobrevivência, imposta pela chamada civilização moderna, vai tornando a

imagem de uma família reunida, em torno da Bíblia ou em torno da televisão, apenas uma pose para a

fotografia.

No entanto, velhas e novas famílias surgem a cada dia. Para todas a Bíblia tem orientações completas

e perfeitas, porque atemporais. Os pilares que sustentam uma família são os mesmos de Adão, Eva,

Caim, Abel e seus demais irmãos. Esses pilares, quando firmes, sustentam as famílias; quando,

frouxos, colocam seus membros à deriva.

A partir de algumas histórias de famílias na Bíblia, quero enunciar quatro destes pilares. Todos eles se

organizam em torno da idéia da mutualidade, porque a família é precisamente o lugar do convívio.

O primeiro pilar da família é o INTERESSE MÚTUO.

Todos nós somos suficientemente egoístas para nos interessarmos primeiramente pelo nosso bem-

estar. O parentesco, no entanto, nos empurra para fora de nós mesmos, levando-nos a nos interessar

pelo bem-estar dos nossos parentes. Assim, por exemplo, toda mãe busca o bem-estar do seu filho,

que sempre vela pelo bem-estar da sua mãe.

Mesmo quando os relacionamentos são tensos, por alguma razão, principalmente pela exacerbação do

individualismo, quando nosso alguém do nosso "sangue" (filho, neto, tio, pai, mãe, irmão) está em

dificuldade, nós nos movemos em sua direção como se o "sangue" falasse mais alto.

Este pilar é bem ilustrado pela história de Moisés e sua família. Ele foi salvo da morte pelo interesse

de sua mãe em preservá-lo da ira do faraó. Ele foi tirado das águas, onde seu berço derivava, pelo

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interesse de sua irmã, Miriam. Já adulto, ele pôde enfrentar o dono do Egito graças à habilidade

retórica do seu irmão Arão. Ele pôde cumprir a missão que Deus lhe deu graças à compreensão da sua

esposa Zípora, que cuidou sozinha dos filhos do casal no exílio.

Houve muitos problemas entre eles, como entre nós e em nossas famílias. Miriam, um dia, se rebelou

contra o irmão. Os filhos de Arão acabaram sucumbindo diante do seu incontido desejo de poder.

Zípora, um dia, se irritou com o desinteresse de Moisés pelos seus filhos e os lançou aos pés, cansada.

A face feliz da família de Moisés não pode esconder o seu lado sombrio. Esta dupla face, porque

verdadeira, tem muito a nos ensinar.

O principal ensino é este: para que seja um pilar da família, o interesse tem que ser mútuo. Também

na família, nós precisamos apreender que a mutualidade do interesse não é natural. Embora seja

cultural, o interesse tem que advir de uma fonte espiritual, do Espírito habitando em nós. Do contrário,

as decepções, que vão gerando amarguras, às vezes quase incuráveis, nos tornarão cada vez mais

egoístas, interessados, sim, mas apenas em nós mesmos. Quando isto acontece, os membros da família

começam a trilhar na estrada da solidão.

Um dos piores inimigos do pilar do interesse mútuo é o sentimento da justiça própria. O chamado

Filho Pródigo, por exemplo, não merecia uma recepção... pelos olhos da justiça. Seu irmão mais

velho, cheio de amargura no coração, não percebeu o que o seu pai sentiu: seu irmão era um morto

que revivia, um perdido que fora achado. Ele, então, só pensou no seu bem-estar, no que iria perder

injustamente, nunca no bem-estar do seu irmão, de volta à vida.

Se queremos ter uma vida familiar que valha a pena, busquemos o interesse um dos outros. Os filhos,

por exemplo, tendem a pensar que a vida lhes pertence e que aos pais nada pertence. Este é um erro a

ser corrigido. Pequenos gestos trazem alegria aos pais. Se, por exemplo, furar a orelha de um certo

modo vai trazer tristeza aos pais, por que fazê-lo? Para nada. Bem farão os filhos que, antes de

tomarem um caminho, pensarem no bem-estar ou no mal-estar que suas decisões poderão acarretar.

O mesmo cuidado se aplica aos pais, que, muitas vezes, criam casos por coisas pequenas demais,

esquecidos do bem-estar presente dos seus filhos.

Quando há interesse mútuo, é mais fácil abrirmos mão de algumas coisas que nos parecem tão caras,

mas não têm o valor que lhe atribuímos, o que só descobrimos quando abrimos mão delas...

O segundo pilar da família é o RESPEITO MÚTUO.

O pai do chamado Filho Pródigo é um exemplo de alguém capaz de respeitar as escolhas dos filhos,

mesmo que, ao seu ver, erradas. Quando o mais novo quis repartir precocemente a herança, ele aceitou

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 52

a sua decisão. Quando o menino quis ganhar a poeira das estradas, ele só fez lançar seus longos

olhares de saudade.

A primeira lição que um casal aprende é precisamente o do respeito às diferenças. Todos nos casamos

porque somos diferentes um do outro. No entanto, com o tempo estas diferenças que nos atraíam se

tornam em mares que nos separam. Nós precisamos cultivar as diferenças como marido e mulher.

A lição precisa ser aprendida por pais e filhos. Eles têm visões diferentes acerca de política, de

vocação e de profissão. Hoje um dos pontos de tensão entre pais e filhos é a escolha da profissão dos

jovens.

Sabendo que aquela profissão não vai dar certo para o seu filho, tem o pai direito de interferir? Pode o

respeito à diferença ser colocado acima das dimensões práticas da vida?

Um dia destes, um pai de três filhas me contou as escolhas de cada uma delas. A mais jovem era

excelente em língua portuguesa, como o pai. Todos pensaram que o seu caminho seria o ensino da

língua ou coisa semelhante. Ela resolveu fazer vestibular para matemática. Seu pai lhe disse:

-- É isso que você quer, minha filha?

E foi como ela fazer a inscrição para o vestibular. Ela estudou e concluiu seu curso de matemática.

Encontrou emprego numa área de estatística. Hoje é responsável por fazer a revisão dos textos do

departamento...

O respeito às escolhas pessoas não significa que não possa orientar seus filhos, dizer-lhes que, em

tese, a profissão desejada tem esta e aquela características. O respeito aos filhos significa que os pais

não têm direito de impor as escolhas aos filhos. O respeito aos pais significa que os filhos devem ouvir

os seus pais.

Certamente o pai do Filho Pródigo fez tudo para que o menino não tomasse aquele caminho. Sua

atitude de respeito não só permitiu a sua partida como esperou, desejou e festejou o seu retorno.

O terceiro pilar da família é o CARINHO MÚTUO.

Começo por lembrar que são as relações, não as coisas, que valem; são os gestos, não as palavras, que

contam.

O que importa na vida não são as condições materiais, mas as relações pessoais. Desde cedo, ainda no

ventre materno, os seres humanos percebemos que somos alimentados pelo cuidado, que se expressa

no carinho, feito de contatos, sorrisos, beijos e abraços.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 53

Nós nos entendemos melhor quando olhamos para uma criança. De que mais elas gostam? do carinho

de sua mãe, de seu pai e dos outros, especialmente quando este carinho é acompanhado de um

presente..., que também é uma forma de comunicação por si mesmo. Olhemos para os idosos: o que

eles querem? Carinho dos seus filhos, dos seus netos, dos outros. Eles querem ser ouvidos, abraçados,

sorridos...

Há alguns de nós que nos esquecemos que fomos crianças e que, se Deus permitir, seremos idosos.

Esse esquecimento faz de nós pessoas sérias e chatas, que só falam de trabalho e problemas, que só

correm para ganhar dinheiro e posições, esquecidos que nascemos para dar e receber afeto.

Eu ilustro esta verdade com uma experiência pessoal. Os filhos guardam lembranças que não são as

mesmas dos pais. Do meu eu guardo, entre outras, uma longínqua cena. Já jovem, eu não morava mais

em casa. Nas férias, eu passava o dia todo lendo na varanda. De repente, eu me vejo sentado na cama

do meu conversando sobre várias coisas. Eu não sei bem sobre o que, mas todo o dia esta cena me

vem docemente à memória. Foi aquele encontro que importou.

Eu também me lembro de reações dele totalmente contrárias aos seus padrões. Quando eu era

adolescente, eu derrubei o muro da nossa casa tentando aprender a dirigir. Ele estava viajando. Passei

dias de sofrimento. Quando ele chegou, me repreendeu suavemente e prometeu me ensinar a dirigir.

Já jovem, eu o substituía no programa de rádio que nossa igreja mantinha. Um dia, antes do nosso

programa, um farsante prometia conselhos em troca de dinheiro num envelope. Mudei o tema da

minha mensagem e critiquei os que enganam o povo. O diretor da rádio saiu em meu encalço e

garantiu que o programa ficaria fora do ar enquanto não nos retratássemos. Quando meu pai voltou, eu

lhe contei a história, preocupado. Sua reação foi:

-- Você disse alguma mentira?

-- Não.

-- Então, não temos do que nos retratar?

E o programa ficou fora do ar.

Estou falando de atitudes, atitudes que só muito mais tarde pude perceber como carinho. Além de

atitudes coerentes, firmes e corretas, nós, pais, precisamos demonstrar carinho com atitudes, mas

também com palavras e gestos. As atitudes são essenciais, mas as palavras e os gestos são as suas

formas de comunicação.

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Tem pai seco demais. E isto é uma rematada bobagem. Há pais que não beijam seus filhos. E isto faz

uma falta enorme. Há pais que não conversam de igual para igual com seus filhos, exigindo um

respeito completamente hipócrita.

Os pais, não só as mães, precisam ser um pouco mais melosos, não importa a idade das crianças.

Nossa sociedade parece ter dividido o carinho: o carinho explícito é para as mães; o carinho secreto é

para os pais. Tem pai que acredita numa asneira desta.

Tem filho seco demais. Tem filho que parece envergonhado do pai ou da mãe que tem. Em público,

comportam-se como não se conhecessem, quando deviam se abraçar, sentar juntos, se curtir também

publicamente.

Tem pai e filho com vergonha de pagar mico. Na Bíblia, temos a história de Ana, que não teve

vergonha de parecer ridícula por seu filho, em vários episódios. Sua oração pela gravidez é uma das

mais tocantes das Escrituras, porque regada a lágrimas e suspiros. Quando o menino passou a servir

no templo, periodicamente ela lhe levava uma beca nova. Não tinha ela vergonha de lhe trazer o

presente e entregá-lo publicamente, nem tinha filho vergonha de receber publicamente a beca da mãe-

coruja...

Eu me senti motivado a lembrar-lhes do simples pilar do carinho ao ler a seguinte declaração de Julian

Lennon, filho do beatle John Lennon: "Meu pai sempre falou de paz e amor, mas este amor nunca

chegou a mim".

O quarto pilar da vida em família é a APRENDIZAGEM MÚTUA.

A família é a maior escola do mundo, escola aberta, escola livre, escola informal, mas escola. A

verdadeira educação é aquela em que o professor é aluno e o aluno é professor. O verdadeiro professor

não é professor; está. O verdadeiro aluno não é, está aluno.

Cabe aos pais ensinar os princípios aos filhos, especialmente o levar Deus a sério.

Aqui, no entanto, preciso me corrigir. Na verdade, os pais ensinam princípios aos filhos sempre. A

questão, portanto, é saber: que princípios estão ensinando? Com palavras e atitudes, o pais ensinam;

quando há uma discrepância entre palavras e atitudes, os filhos ficam com as atitudes, atitudes que

contêm princípios, que podem ser de verdade, mas também de mentira; de altruísmo, mas também de

egoísmo; de amor a Deus, mas também de descaso para com Ele.

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Os pais precisam acreditar nos princípios que ensinam. Eles precisam acreditar que, se ensinam

mentira, possivelmente é o que verão nas vidas dos seus filhos; se ensinam amor a Deus e ao próximo,

é possível que seus filhos pratiquem este princípio ao longo de suas existências.

Aqui eu trago a história de Manassés (2Crônicas 33; 2Reis 21). Ezequias lhe passou princípios

corretos, mas o filho deles se afastou, fazendo coisas abomináveis diante de Deus e levando o povo a

fazer o mesmo.

Diante das ações de Manassés, a pergunta que demanda resposta é: Em que falhou Ezequias? Na

formação do seu filho, que parte Ezequias não cumpriu? Em que podemos estar falhando? Que parte

não estamos cumprindo?

Mesmo supondo que Manassés foi completamente responsável -- e o foi -- por suas escolhas, sugiro, a

partir da imaginação e da inferência, que Ezequias falhou como pai em quatro aspectos.

A FALTA DE LIMITES AOS DESEJOS DO FILHO -- Minha primeira inferência é que Ezequias não

deu limites ao seu filho.

O menino era filho da velhice, nascido depois que Deus curou Ezequias e lhe deu uma sobrevida de 15

anos. Ele tinha muito que fazer nesta fase da sua existência. Neste período, cometeu acertos e erros.

Um deles, no plano da inferência, foi não dar limites a Manassés. Imagino que Ezequias nunca tenha

dito um "não" para o seu filho da velhice. Assim, criado como um príncipe, foi educado para mandar,

não para obedecer. Quem não aprendeu a obedecer não sabe comandar.

Manassés viveu sua vida na presença de um pai ausente que talvez lhe desse carinho nos intervalos

das suas realizações governamentais. No entanto, Ezequias não ensinou ao seu filho que a vida é feita

de escolhas. Escolher um caminho significa recusar outro caminho.

A educação autoritária, recebida pelos pais de hoje dos pais de ontem, leva muitos ao medo de

apresentar limites. A repressão no passado acaba produzindo antiteticamente no presente uma

educação de fronteiras sempre móveis, isto em, sem fronteiras, sem limites. Todo pai não pode

esquecer que quem escolhe não escolher se torna inseguro. Uma pessoa insegura faz tudo para agradar

aos outros. Jamais tem a segurança de escolher. O medo de Manassés levou-o a escolher as escolhas

do seu povo, e seu povo queria o paganismo, a idolatria, a corrupção, a injustiça.

Depois do fracasso da cultura do "é proibido proibir", nossa sociedade clama por limites. Nossos

filhos clamam por limites. Dar limites não significa não dar carinho. O limite é uma dimensão do

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afeto. Quem verdadeiramente ama é aquele que apresenta limites ao amado. São com estes limites,

tecidos com "sim" e "não", que os filhos vão percorrer seus caminhos, presentes ou ausentes os pais.

A FALTA DE PARTICIPAÇÃO NA VIDA DO FILHO -- Ouso inferir que Ezequias terceirizou a

formação do caráter do seu filho. Diz 2Reis 21.1 que sua mãe se chamava Hefzibá. Desta informação,

que aparece no contexto de poucos monarcas de Israel, deduzo, com alguma liberdade, que o rei

deixou para a rainha-mãe a tarefa de educar o filho do casal. Talvez seja por isto que seu nome

apareça na história dos reis israelitas.

É até possível que, além da esposa, os sacerdotes e mestres do templo e do palácio tenham tido um

papel decisivo na formação do garoto. Esta seria uma terceirização ainda mais grave e pode ter

ocorrido.

Estamos falando de Ezequias e, ao mesmo tempo dos pais contemporâneos. A escola e a igreja

acabam recebendo um papel que não têm como desempenhar. O tempo que se gasta na escola e na

igreja é diminutamente inferior ao que se gasta na rua e em casa. Além disso, na escola e na igreja a

educação tende mais para o formal e para o grupal, com pouco espaço para o individual, para o

encontro face a face, como é típica da relação pai-filho, irmão-irmãos. Só o lar pode verdadeiramente

formar para os princípios. Escola e igreja, no máximo, reforçam-nos, quando não os deformam.

Engana-se o pai que terceiriza seu inalienável compromisso.

Formar é participar. Sejam quais forem as circunstâncias.

.

A FALTA DE PRIORIDADE CORRETA -- Rei por 29 anos, Ezequias muito realizou. Entre suas

obras, está a transposição das águas de Giom, até hoje um desafio para a engenharia. Estes triunfos

salienta que ele era uma pessoa excessivamente ocupada com o seu trabalho.

Se vivesse hoje, talvez fosse aquele que pai que chega em casa tarde, já cansado. Se não jantou,

alimenta-se e se posta em frente à televisão para relaxar as tensões do dia. Calado, entrou; calado,

continua, até o sono o derrubar.

Nossa sociedade torna o trabalho o centro da vida, não as relações pessoais, particularmente as

familiares. Pais e filhos são vitimas deste modelo.

Quando trouxe a história da família de Hefizibá, fi-lo para mostrar que os problemas são comuns. O

dilema é real, porque, também segundo as pesquisas, a renda familiar é um fator importante no

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desenvolvimento integral das crianças. Além disso, muitas vezes os pais não têm escolha. Talvez

Hefzibá e Ezequias não tenham tido escolha.

No entanto, se os pais tiverem escolha, procurem fazer a escolha certa. Mesmo quando não puderem

escolher, insistam em buscar recursos para a família, mas insistam, com o mesmo empenho, em

demonstrar afeto para com os seus filhos, participando das suas vidas.

Estas histórias e os dados das pesquisas recentes são um convite àqueles que não se inscrevem nesta

galeria a "curtirem" mais seus filhos.

Preciso lembrar às mães que elas não precisam se sentir culpadas por não trabalharem fora. Durante

algum tempo a sociedade exerceu uma pressão muito forte sobre as mulheres, considerando como

modernas apenas aquelas que trabalhassem fora do lar. Esta ditadura não tem sentido. Ser apenas mãe

é tão nobre quanto ser, ao mesmo tempo, mãe e profissional.

Os pais, às vezes, se angustiam com os caminhos que os seus filhos tomam, caminhos nos quais não

foram educados, caminhos que não lhe foram desejados. Os pais tendem a sentir culpa, mas não lhes

cabe. Os pais não podem esquecer que os seus filhos têm projetos próprios, até porque foram criados

para isto, por mais que os pais se assustem quando eles assumem os seus projetos. É bom nos

lembramos que educar não é fabricar pão, onde se colocam os ingredientes e sai um pão tal como foi

previsto. Não! Os pais não são padeiros e os filhos não são massa ou fermento. A mesma "educação"

que os pais dão aos filhos "produz" filhos diferentes entre si, às vezes radicalmente diferentes. A

educação, portanto, é um fator e não é único fator.

Isso não nos deve eximir de educar; pelo contrário, aumenta a nossa responsabilidade mas nos deve

tirar a atitude de culpa quando o pão sair sem sal, embora tenhamos colocado sal. São vários fatores

que nos constituem como pessoa.

De iqual modo, o marido não tem necessariamente culpa se a esposa o deixou ou vice e versa. Cada

um pode agir independentemente da vontade do outro ou das ações do outro. Nós não podemos mudar

o passado. Se alguma coisa deu errado, não podemos fazer mais nada em relação ao passado.

Digo isso para tirar de mim, como pai e como esposo, culpas que às vezes nos cabe? Não! Digo isto,

não para nos eximir de responsabilidades, mas para aumentá-las.

A PRECOCIDADE DAS ESCOLHAS -- A quarta inferência advém não de um erro de Ezequias, mas

de uma circunstância socialmente dada. Manassés começou a governar com 12 anos de idade. Morto o

pai, ele tinha que assumir o trono, mas o que sabia ele da vida?

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Diante de uma responsabilidade tão grande e tão precoce, Manassés, como se diz na linguagem

quotidiana, não teve tempo de ser criança.

A luta pela sobrevivência também tem levado muitos adolescentes a tomarem papéis que não

deveriam ser seus. Merecem elogios os programas públicos de estímulo à escolarização, como o da

bolsa-escola. Na medida do possível, deixemos nossas crianças e nossos adolescente na escola.

A propósito, além da profissionalização precoce, nossa época comete também a sexualização precoce.

A busca por novos consumidores tem levado a industria e o comercio a, através dos meios de

comunicação de massa, a antecipar a entrada das pessoas no circuito do consumo. As roupas das

crianças e as suas danças revelam.

Ezequias não pôde evitar a profissionalização precoce do seu filho, mas a sociedade precisa proteger

suas crianças e seus adolescentes.

Não dá para dizer, com certeza, em que Ezequias e Hefizibá erraram. Dá para dizer, com absoluta

certeza, que Deus nos capacita para fazer o que devemos. Esta deve ser a nossa esperança.

Também devemos ter em mente que, como registra a Bíblia, um dia Manassés se arrependeu e pediu

perdão a Deus e passou a viver uma nova vida. Os princípios ensinados por Ezequias um dia

frutificaram no coração de Manassés.

O conselho para os pais é óbvio: já que ensinam, reflitam sobre o que e como ensinam. Se ensinou

com coerência, descansem e aguardem. Vocês já fizeram a sua parte.

Voltando ao tema da mutualidade da aprendizagem, convido-o a uma reflexão a partir de nossas

experiências contemporâneas. Tenho visto filhos ensinando os pais a viver. Trata-se de um ensino por

caminhos tortos, mas mesmo assim ensino. Os erros dos filhos ensinam os pais, rigorosos e legalistas

um dia, a serem compreensivos e tolerantes mais tarde.

No plano da igreja, quantos pais são os primeiros a apontar os dedos para os filhos dos outros, antes de

verem os seus próprios fazendo escolhas que condenavam nos dos outros! Sim, os filhos ensinam os

pais a serem mais tolerantes, mais amorosos, menos ranzinzas, menos fariseus. Muitos pais tiveram

que aprender a serem pessoas compreensivas por meio da dor... inflingida por seus filhos.

Há um outro tipo de ensino por parte dos filhos. Os pais podem aprender com eles a não só manejar os

novos equipamentos técnicos (como o computador), mas também a compreender o novo sentimento

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do mundo. Pelo diálogo, pais e filhos podem entender melhor o mundo e se envolverem na tarefa de

mudá-lo.

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9

O ESPAÇO DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL

A família deve ser o lar da sabedoria.

Não dá para acertar sempre, mas estamos sempre tentando tomar as decisões corretas nas horas certas.

Por isso, lamentamos muito quando descobrimos que escolhemos mal. A descoberta do erro não

resolve os problemas, já que não podemos voltar no tempo e consertar o passado. O que está feito está

feito.

Precisamos de sabedoria para decidir. O ―xis‖ da questão é como adquirir essa sabedoria. Um

adolescente, certa vez, achou que, se lesse o livro de Provérbios, aumentaria o seu QI (Quociente de

Inteligência -- índice usado para medir a inteligência das pessoas). De uns tempos para cá, tem-se

falado mais em QE (Quociente Emocional), que mede a maturidade emocinal das pessoas. O

adolescente esqueceu o resto da Bíblia e se concentrou em apenas um dos seus livros. O rapaz não

chegou a lugar algum.

Na realidade, o adolescente confundiu sabedoria com sabedoria. Não façamos como ele.

Há dois tipos de sabedoria. Há a sabedoria intelectual, que se adquire com muita aplicação aos

estudos. Há a sabedoria de vida, que se adquire pela observação, pela inteligência e pela dependência

de Deus.

UM LUGAR PRIVILEGIADO

A família é o lugar onde a sabedoria se desenvolve.

A sabedoria intelectual é indispensável na carreira profissional e contribui para que você saiba mais a

respeito do mundo do que Aristóteles (384-322 a.C.), um dos maiores filósofos e cientistas de todos os

tempos.

Cada vez mais, a informação é tudo. Os pais estão cobertos de razão quando investem na educação de

seus filhos, seja em termos de gastos financeiros com os melhores colégios, seja em termos de

atenção, acompanhando seus filhos nas atividades escolares.

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Todos aqueles que podem estudar devem se aplicar ao máximo. A oportunidade na vida pode ser um

rio que passa. Quem não a tem deve fabricá-la. Se, para quem estuda, a vida está difícil, imagine para

quem não estuda. A sabedoria é indispensável.

Há um segundo tipo de sabedoria igualmente indispensável. É a sabedoria de vida, que não tem nada a

ver com bancos escolares. Neste sentido, uma pessoa pode ser sábia e analfabeta, ao mesmo tempo.

Essa sabedoria se adquire pela observação e pela inteligência natural.

Nós, cristãos, acreditamos que Deus nos ajuda a adquiri-la. A Bíblia contém uma sabedoria de

milênios. Quando mais passa o tempo, mais profunda e atual é a sua sabedoria.

A família precisa instruir-se nessas duas sabedorias, para que seus membros possam crescer como

Jesus: em desenvolvimento físico, em conhecimento intelectual e em maturidade espiritual (Lucas

3.52). Essas três dimensões devem estar sempre juntas. Um corpo atlético com uma mente vazia é um

vexame. Um corpo atlético e uma mente aplicada, mas com uma espiritualidade pobre, não servem

para nada (I Timóteo 4.8).

A busca dessas sabedorias é tarefa de todos: de pais e filhos. Os filhos não devem ficar passivos

esperando a instrução dos seus pais. Eles também devem ir à Bíblia, a enciclopédia maior, e beber da

sua sabedoria.

A SABEDORIA DE SE DEIXAR CORRIGIR

Todo o livro de Provérbios é um convite à sabedoria. O capítulo 3 é um dos mais diretos sobre o

assunto. Para o autor, a sabedoria se desenvolve. A condição é que a gente se deixe disciplinar

(Provérbios 3.1-12). Com esta disposição, pode-se alcançar três tipos de sabedoria: a vivencial, a

intelectual e a convivencial.

Ninguém gosta de ouvir que está errado.

Um autor não gosta de escutar que seu texto não está bem escrito.

Um pastor não gosta de saber que seu sermão não foi lá grande coisa.

Um filho corrigido pelo pai tende a achar que foi injustiçado. No fundo, a maioria dos filhos se acha

sábio aos seus próprios olhos.

Por isso, quem tem um pai que o corrige deve dar graças a Deus. O filho que tem um pai que não o

corrige deve ficar preocupado, pois tem um pai indiferente.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 62

O conselho bíblico é claro: filho, deixe-se disciplinar.

O livro de Provérbios é um livro de sabedoria por várias razões: uma delas é a insistência que põe na

disciplina. A toda a hora, vem a recomendação: ―filho, ouve as minhas instruções‖.

A Bíblia fala de instrução e disciplina. A instrução é preventiva, apresentando os ensinamentos a

serem seguidos. A disciplina é corretiva, indicando o erro cometido. Ambas são dimensões de uma

mesma realidade.

Aceitando a disciplina (1,2,8). A conseqüência prática da aceitação da disciplina é a felicidade. Bem-

aventurado aquele que aceita ser disciplinado por pessoas mais experientes.

Na crua linguagem bíblica o beneficio de aceitar a disciplina é uma vida longa, em quantidade e

qualidade. Quem não sabe ouvir conselhos vive dando cabeçadas, vive cometendo erros que outros já

cometeram. Quando se viaja por uma estrada, há muitas placas de aviso com relação ao limite de

velocidade permitido. O motorista que não segue a instrução pode ser flagrado por um radar e ser

disciplinado com uma multa pelo excesso.

É assim na vida. Quem quiser ser feliz não pode esquecer as instruções que estão na Bíblia. Quem as

seguir viverá de modo digno. A aceitação da disciplina gera saúde e refrigério. Hoje se fala muito em

uma vida integral, na qual o corpo e a mente interagem. A doença de um ataca o outro. O autor bíblico

já sabia disso. Por isso, fala de um corpo abençoado e de uma mente descansada pela disciplina.

Como uma roupa (3,4). As instruções máximas da Bíblia são a bondade e a fidelidade. A bondade está

associada ao relacionamento com os semelhantes. A fidelidade é a atitude devida a Deus.

Provérbios pede que nossas vidas vivam de tal modo esses valores, como se eles estivessem

amarrados ao nosso corpo, como se fosse uma calça ou uma camisa. Viver desse modo é algo pessoal

e natural. Não precisamos fazer força para viver segundo esses valores, porque esses valores são

partes de nossas vidas.

Devemos tomar as virtudes da bondade e da fidelidade e as coloquemos no pescoço como se fosse um

colar. A imagem poética segue para ser ainda mais forte: não basta atá-las ao pescoço: é melhor

escrevê-las nas tábuas do coração, isto é, dentro de nós mesmos. Elas devem estar no sangue que o

coração bombeia para o resto do corpo.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 63

Quem age deste modo é reconhecido como uma pessoa digna tanto pelos homens quanto por Deus

mesmo.

O verdadeiro eixo (5-7). Deus é o tronco, nós somos os galhos da árvore.

O grande problema do homem, desde o Éden, é achar que pode descartar a Deus. Por isso, o conselho

é repetido. Primeiro, aparece: ―não te estribes no teu próprio entendimento‖. Isto quer dizer: não pense

que você é o máximo e pode bolar seus próprios padrões. Depois, a Bíblia é ainda mais direta: ―Não

sejas sábio a seus próprios olhos‖. Quando achar que ainda muito sábio, olhe para a sabedoria de

Deus. Tente responder as perguntas que Jó não conseguiu.

Não confie em você mesmo: confie em Deus. Esta é a síntese do livro de Provérbios, que apresenta

uma promessa com base na realidade: viva os valores de Deus e a sua vida será corrigida naquilo que

tem de errado. A expressão ―Reconheça-o em todos os seus caminhos‖ quer dizer a mesma coisa que

Eclesiastes 12.1: ―Lembre-se do seu Criador nos dias da tua mocidade‖. Significa viver na presença de

Deus. Viver na presença de Deus é vê-lo como companhia nas situações de cada dia.

Quem vive assim poderá perder o caminho, mas Deus fará que o reencontre.

A disciplina de contribuir (9, 10). De repente, o texto começa a falar de dinheiro, destacando o valor

da contribuição financeira para os programas de Deus que hoje a igreja de Cristo dirige na terra. O que

tem a ver uma coisa com a outra?

Apenas, tudo!

O autor sabe que, muitas vezes, é mais fácil converter o coração do que convencer o bolso. Estamos

sempre apertados financeiramente e, se não formos disciplinados, jamais contribuiremos. A prática diz

que deixaremos sempre para o mês que vem, quando as coisas vão melhorar para o lado da gente. E

assim, as coisas vão correndo.

Só contribui na igreja quem se autodisciplina para tal.

No texto bíblico, a instrução à contribuição vem também como uma recompensa. Não haverá falta

para quem tirar um pouco e coloca-lo à disposição de Deus. Haverá abundância, mas não é a promessa

que deve incentivar à contribuição. É o prazer de honrar a Deus com os bens que ele colocou à nossa

disposição.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 64

O amor da correção (11, 12). O motivo da correção é o amor. Deus nos repreende e corrige porque

nos ama. Se não fosse assim, deixaria as coisas correrem frouxas. Como quer o nosso bem, puxa-nos

para dentro do caminho, puxa-nos para sua direção.

Primeiro, o autor pede para não rejeitarmos a disciplina. Parece um conselho desnecessário, porque

nenhum de nós desprezará a disciplina divina. Ela sempre será bem-vinda. O problema é que pode ser

bem-vinda apenas em nossas palavras, quando na prática fazemos o que bem entendemos. Fazemos de

conta que ouvimos a Deus e continuamos ouvindo a nós mesmos.

Depois, o autor pede para não termos nojo da repreensão divina. Novamente: quem fará uma coisa

dessas? De boca, ninguém. Pela prática, no entanto...

A recomendação final é uma prova que a disciplina é mesmo uma prova de amor.

A SABEDORIA DE CONVIVER

Uma das sabedoria mais difíceis é a de conviver, especialmente na família onde geralmente somos só

que somos.

Nesta busca, a segunda parte de Provérbios (3.13-35) pode ser de grande ajuda.

Sabendo viver (versos 13-18, 21-22). O elogio à sabedoria começa com o conhecimento vivencial,

aquele que nos ajuda a tomar as decisões de cada dia. A família é a escola desse tipo de entendimento,

que se adquiria pela observação da experiência dos outros. No caso dos filhos, os pais são seus

grandes exemplos, para bem e para mal.

É feliz que possui este tipo de sabedoria (verso 13). Tê-la é melhor do que possuir muito dinheiro

(versos 14, 15). Nada se lhe compara (verso 15). Quem é sábio é capaz de caminhar e não tropeçar,

mesmo que o caminho seja feito de pedras. Todos os seus relacionamentos são relacionamentos de paz

(verso 17). Sua vida é uma vida de qualidade (verso 16). Quem chega perto de uma pessoa assim

recebe benefícios diretos e indiretos (verso 18). Esta é a verdadeira jóia que deve embelezar nossos

corpos (versos 15 e 22).

A família deve se empenhar ao máximo que este tipo de sabedoria seja desenvolvida nela e por ela. O

ambiente deve propiciar a observação permanente das experiências, a discussão respeitosa das

vivências e a troca constante de idéias. Os filhos, por exemplo, devem prestar muito atenção às

histórias que seus pais e avós contam, procurando tirar delas o máximo proveito.

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Sabendo entender (versos 19-20). A seguir, o autor fala da sabedoria intelectual. Foi com ela que Deus

fez o mundo. É com ela que governamos o mundo.

A família deve possibilitar oportunidades para que todos cresçam no conhecimento das coisas. Toda

casa deve ter uma biblioteca, que vá crescendo na medida dos recursos. Os livros devem ser lidos e

discutidos. Por isso, fique feliz quando ganhar um livro em lugar de um brinquedo ou de uma roupa.

Estudar é absolutamente indispensável. Não há idade para começar e não se termina nunca. Se seus

pais pararam de estudar para criá-los, incentive-os a voltar à escola ou aos livros. Todos sairão

ganhando. Se os pais lhe cobram nos estudos, agradeça-lhes.

Não há incompatibilidade entre fé e razão, entre ciência e Bíblia, entre inteligência e oração. A família

precisa viver esta verdade.

Sabendo conviver (versos 23-35). A sabedoria vivencial e a sabedoria intelectual devem ter como

conseqüência a sabedoria da convivência.

A verdadeira sabedoria não convive com o medo (versos 23-26). A verdadeira sabedoria não se

contenta com a felicidade própria e busca também a dos outros (versos 27, 28).

O verdadeiro sábio não faz o mal premeditamente e evita todo tipo de confusão (versos 29, 30). O

verdadeiro sábio não tem inveja do sucesso dos ímpios, porque sabe que a vitória final é daqueles que

estão com Deus (versos 31-35).

O importante é que sua família encontre meios criativos para o crescimento de todos em sabedoria e

em temor a Deus. Se ela está falhando, faça a sua parte.

O prazer de Deus é que você cresça em graça diante dele e diante dos homens. Siga o exemplo de

Jesus, que, graças aos seus conhecimentos, pôde conversar de igual para igual como os professores.

Não se contente com a mediocridade espiritual.

Seja você também o educador de sua família.

A concorrência é grande e nem sempre há tempo para esse culto, que é uma tarefa para pais e filhos.

Tome a iniciativa, se e quando seus pais falharem.

Deixe-se disciplinar por seus pais, que agem como Deus age conosco. Eles querem o seu bem.

Eventualmente, eles podem até errar, mas o fazem no interesse de acertar.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 66

Ninguém é sábio o bastante que não precise ser instruído e corrigido.

A sabedoria deve ser buscada, desenvolvida e cultivada na família.

Se a família não propiciar um ambiente para o desenvolvimento da sabedoria, dificilmente ele se

desenvolverá em qualquer outro lugar. A sabedoria é tesouro que todos, pais e filhos, devem buscar.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 67

10

A VIDA COMO ENCONTRO

Não há como não se comunicar.

A falta de comunicação já é comunicação. O excesso de comunicação, também. Afinal, como

escreveu Martin Buber, ―toda vida verdadeira é encontro‖.

Na família podem ocorrer as duas situações.

Às vezes, a gente pede um ao outro:

— Fala, por favor!

O inverso pode ser verdadeiro:

— Cala essa boca por um momento, pelo menos!

Quem já não participou de um diálogo desses?

Num caso, reina o silêncio.

No outro, impera o excesso de palavras.

A família é o lugar onde as pessoas se ajudam. Por isso, quem não fala precisa saber que, se não falar,

nunca será ajudado e nunca ajudará. Quem fala demais precisa saber que, agindo assim, nunca será

ajuda e nunca ajudará.

MOMENTO DE FALAR

O sábio bíblico (Eclesiastes 3.1,7) ensina que há tempo para tudo na vida (verso 1). Há um momento

próprio para todos os nossos atos. Somos nós quem decidimos quando chega o momento para cada um

de nossos gestos.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 68

O sábio bíblico ensina também que há momento de falar e momento de calar (verso 7). A confusão

entre esses momentos faz muitos estragos no relacionamento, especialmente no familiar. O conselho

está associado há outro conselho: há tempo de rasgar e tempo de costurar. Nossas palavras têm o dom

de rasgar vidas, separando pessoas, e tempo de costurar, unindo pessoas.

Bom seria que agíssemos de modo a nunca nos arrependermos de ter falado, quando deveríamos ter

ficado com a boca fechada. Afinal, uma palavra na hora certa é como uma porção de maçãs de ouro

numa bandeja de prata (Provérbios 26.11). Bom seria que agíssemos de modo a nunca nos

arrependermos de ter ficado calados, quando deveríamos ter aberto a nossa boca, para dar opinião,

para oferecer um consolo. Afinal, a língua do justo é uma jóia de grande valor (Provérbios 10.20).

Na família, onde tendemos a ser menos cuidadosos com as palavras, essas recomendações de

sabedoria não podem ser esquecidas.

PRINCÍPIOS PARA A COMUNICAÇÃO NA FAMÍLIA

A Bíblia está cheia de recomendações sobre o uso da palavra. O livro de Provérbios compara as

palavras às águas. O sábio diz que elas são como águas profundas (Provérbios 18.4). A partir de seus

ensinos, podemos elaborar uma lista de sete princípios para a comunicação na família.

A comunicação é uma extensão da pessoa (Provérbios 6.16-19)

De certo modo, uma pessoa é o que ela comunica. O sábio diz que Deus detesta sete coisas no

comportamento humano: a falta de humildade, a língua mentirosa, a violência contra os inocentes, o

planejamento da maldade, a prática do mal, o testemunho baseado na mentira e a semeadura da

discórdia.

A palavra é o principal meio da comunicação (Provérbios 18.4)

Falamos com o corpo, mas o meio principal para a comunicação é a palavra. Por isto, devemos tomar

o máximo cuidado. Cuidado quanto ao momento de falar. Cuidado quanto ao conteúdo do que

falamos.

Devemos evitar o excesso de palavras, mas também a escassez (Provérbios 25.11).

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Como ensina o sábio, há hora de calar e hora de falar. O cuidado com as palavras, no entanto, não

deve levar a gente a nunca falar. Falar demais não é virtude, mas falar de menos também não é.

Nossas palavras devem ser sempre proferidas com carinho (Provérbios 15.1, 23).

Quando falamos com amor, até quem está com raiva da gente fica sem saber o que fazer. Uma palavra

suave funciona como um balde de água fria numa cabeça quente. Uma palavra grosseira, mesmo que

seja verdadeira, só serve para pôr mais lenha na fogueira. Se falamos com amor, podemos falar a

verdade, mesmo que essa verdade desagrade o outro. Se falamos sem carinho, até a verdade parece

mentira.

Nossas palavras devem sempre primar pela verdade (Provérbios 6.19a).

Não devemos justificar nossas atitudes, nem basear nossos argumentos em informações falsas. Mentir

é enganar o outro e enganar a si mesmo. Por isso, mesmo a certeza de que a mentira jamais será

descoberta não nos devem estimular a proferi-la. Também é bom lembrar que não há crime perfeito. A

mentira é um crime.

Nossa verdade deve ser dita com caridade (Provérbios 16.24)

Devemos medir as conseqüências de nossas palavras, mesmo que estejamos com a melhor das boas

intenções. É muito difícil, às vezes, entender isto. Alguém poderá argumentar: ensinam a gente a falar

a verdade e depois pedem para a gente só falar a verdade quando for conveniente. Não é bem assim.

Trata-se de verificar o momento e a forma de falar. Primeiro, a nossa verdade é a nossa verdade.

Mesmo quando um médico acha que seu paciente tem três meses de vida, ele pode errar. Por que,

então, falar essa verdade? Em que ela vai ajudar? É nisto que devemos pensar. Não para não falar a

verdade, mas para guardá-la, como Maria, em seu coração (Lucas 2.51).

Nossas palavras devem sempre promover a concórdia (Provérbios 6.19b).

Na lista de pecados que Deus detesta está o de semear a discórdia. Pode-se semear a discórdia falando

a verdade e falando a mentira. Nem sempre a fofoca é mentirosa. Pode conter muitas verdades. A

intenção, no entanto, é provocar confusão, nunca o bem-estar.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 70

Nosso comportamento deve ser sempre de semear a união entre as pessoas, especialmente na família.

Além disso, nossa meta, na hora do sofrimento de um irmão, é usar a palavra para promover o

conforto. Quando agimos assim, nossa língua se torna uma árvore de vida (Provérbios 15.4)

Jamais devemos responder antes de ouvir (Provérbios 18.13, 17)

Em termos práticos, o sábio ensino que quem responde antes de ouvir é um bobo. Na realidade, uma

resposta dada antes da pergunta não é uma resposta. Há pessoas que têm respostas para tudo, até para

as perguntas que não foram feitas. A Bíblia chama a estas pessoas de ignorantes (verso 13).

Aquele que sabe ouvir demonstra que tem respeito pelo outro. Quem não sabe ouvir só ouve a si

mesmo, porque acha que só o que ele pensa tem valor.

Devemos tomar cuidado com nossos argumentos. Numa conversa, não podemos considerar os nossos

argumentos como sendo únicos e definitivos. A primeira pessoa a apresentar um argumento parece ter

toda a razão, até que a segunda pessoa comece a falar (verso 17), e assim por diante. Se entramos

numa conversa é para convencermos e sermos convencidos. Do contrário, é mais honesto não

participar da conversa.

Veja como está a comunicação na sua família. Se ela vai bem, pode ser melhorada. Faça a sua parte.

Se ela não vai bem, ela precisa melhorar. Faça a sua parte.

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11

OS DEVERES DE CADA UM

A família é, portanto, uma invenção de Deus para a felicidade dos seres humanos. O Inventor continua

interessado na felicidade de todos os membros dessa família. O que cabe a ele fazer, ele faz. Agora, há

coisas que cabem aos pais e coisas que cabem aos filhos.

Um dos textos bíblicos mais diretos sobre o assunto é o do apóstolo Paulo em Efésios 5.22-6.5. Por

sua dureza, é também um dos mais controvertidos de toda a Bíblia.

AS MULHERES (Efésios 5.22-24).

As esposas, diz o apóstolo, devem obedecer a seus maridos. O marido é o cabeça do casamento. O

padrão de submissão é o mesmo da igreja em relação a Jesus Cristo.

A maioria das sociedades – a nossa inclusive – é patriarcal, isto é, nelas os homens detêm a

autoridade. São raras as sociedades matriarcais. Mesmo entre elas, as esposas não exercem autoridade

sobre seus maridos.

Cada vez mais, no entanto, o padrão vem mudando. As decisões cada vez mais são tomadas em

igualdade. Há constituições em que o chefe da família não é mais o pai. Há situações em que a mulher

sustenta a casa e acaba decidindo mais que o marido.

Estaria uma família comandada pela mulher fora dos padrões bíblicos? Quando e se houver uma

transformação nos padrões, a Bíblia ficará superada?

A primeira maneira de ler esta recomendação é tomá-la literalmente. Neste caso, a submissão da

esposa ao marido é uma norma, divinamente inspirada, a ser seguida.

Outra possibilidade é procurar o princípio por trás da norma. O apóstolo parte da prática do seu tempo,

em que os homens imperavam sozinhos. Ele não pretende discutir esse costume, nem mesmo

preservá-lo. Seu interesse é a preservação da família.

Para que uma família subsista, são necessárias regras claras. Até mesmo quando um grupo de rapazes

ou de moças organizam uma ―república‖ para morarem juntos, precisam estabelecer regras. Do

contrário, a vida ficará impossível. O mesmo acontece na família. Este é um princípio básico por trás

da recomendação de submissão feminina.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 73

O segundo princípio é que na família deve haver um líder. Na maioria das sociedades, esse líder é o

marido. O líder é aquele que provê as necessidades de hoje e estimula os sonhos para amanhã. Essa

liderança pode ser compartilhada. Há coisas em que os pais são melhores. Há coisas que as mulheres

fazem melhor. O importante é que os papéis fiquem claros e o amor frutifique. Só assim não se

separarão aqueles a quem Deus ajuntou (Marcos 10.9).

O importante é que as esposas amem seus esposos. Uma forma de amá-los é seguir tranqüilamente sua

liderança. Uma esposa pode se submeter a seu marido sem amá-lo. Não é isto que pede a Bíblia. O

essencial é que a esposa o ame.

OS MARIDOS

Em segundo lugar, o apóstolo coloca o padrão de comportamento para os homens, que têm o dever de

amar suas mulheres (Efésios 25-33). É impressionante que para as esposas o apóstolo Paulo dedica

três versículos, mas para os maridos ele reserva o triplo. Paulo conhecia bem os homens. Então,

porque somos tão machistas. Se um homem quiser ser machista, que o seja, desde que não use a

Bíblia.

Este é um mandamento duro. Duro porque é fácil de ser transformado em palavras vazias. Duro

porque é um padrão muito mais elevado do que a submissão. Duro porque as formas de sua realização

estão em aberto: cada situação exige uma ação concreta e específica de amor.

O padrão do amor, tanto para mulheres quanto para maridos, é comparado à relação de Cristo com sua

igreja. O texto (Efésios 5.33) faz um perfeito resumo do ideal para o casamento. O marido deve amar

sua esposa com a mesma intensidade com que ama a si mesmo. A mulher deve reverenciá-lo, isto é,

respeitá-lo, do modo como gosta de ser respeitada.

É nesse contexto que o apóstolo Paulo fala que nós devemos pensar no casal como uma só carne,

pensar no casal em uma só carne e unir aos versículo anterior a cerca da submissão, acabou a

submissão serviu, porque ambos formam uma só carne, uma unidade. Por isso que a maior parte da

dificuldades, especialmente quando o casal tem filhos advém de os dois não formarem uma só carne

de propósitos, de ideais e de respeito mútuo.

OS PAIS

Além de esposos, quantos têm filhos, eles têm outro dever: criá-los no Senhor (Efésios 6.4).

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 74

Os pais não devem ficar irritando seus filhos (Efésios 5. 4a) com exigências tolas. Os pais devem, ao

contrário, fazer tudo o que puderem para tornar o lar um ambiente gostoso para se viver.

Os pais devem discipliná-los e instruí-los com as verdades de Deus. Há muitos pais falhando nesta

tarefa. Muitos aderem ao autoritarismo, considerando seus filhos como objetos que podem manipular.

Outros aderem à irresponsabilidade, deixando a educação dos seus filhos para a rua, para escola e para

os meios de comunicação. Esses pais estão longe do caminho do Senhor.

OS FILHOS

Os filhos também têm responsabilidades específicas.

Eles devem obedecer aos seus pais (Efésios 6.6). O apóstolo apresenta duas razões para a obediência.

Ele poderia ter dito: obedeçam porque seus pais são seus pais, e pronto. Não. O apóstolo oferece duas

razões imbatíveis.

A primeira é que a obediência é uma coisa justa (Efésios 6.6), isto é, traz conseqüências boas para

quem a pratica. A segunda é que é uma demonstração de sabedoria (Efésios 6.7). Quem sabe obedecer

sabe viver. Quem vive pelo seu próprio nariz tem grande chances de quebrá-lo. O mundo é complexo.

A experiência dos pais é indispensável.

Se essas razões não bastassem, é um imperativo divino. Está nos Dez Mandamentos (Êxodo 20.12)

O mandamento de honrar aos pais vem logo depois do sábado. Não por mero acaso. Muito

provavelmente, por um motivo muito claro: os pais devem ser honrados, entre outros motivos, porque

eles lembram aos filhos, pela educação religiosa, que existe o sábado a ser santificado.

E o que é honrar?

Honrar é, basicamente, obedecer.

Obedecer é algo muito difícil. Queremos ser logo independentes, para não termos que obedecer. No

entanto, este mandamento coloca uma conseqüência positiva para quem obedece: uma vida longa.

Este mandamento é o único que contém o resultado para quem o segue. Aquele que honra a seu pai e

sua mãe terá seus dias prolongados. Na nova terra, onde o povo de Israel estava entrando. E na terra

de hoje, onde vivemos. Por que?

A honra aos pais forma uma cadeia sem fim. A gente honra nossos pais; nossos filhos honram a gente.

Este respeito vai produzindo vida. Nossos pais estão com a sua personalidade formada, enquanto a

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 75

nossa está em processo. Eles têm a responsabilidade de nos passar os valores centrais da vida. Na

medida em que os fazem corretamente, esses valores vão permanecendo e a gente vai acumulando a

sabedoria de viver.

A Bíblia e a experiência da vida demonstram que nossos pais já passaram por muitas situações pelas

quais estamos passando agora. Honrá-los significa buscar essa sabedoria. Isto não quer dizer que

vamos simplesmente repetir suas experiências e entregar a eles a responsabilidade de decidir; antes,

significa que, ao tomar nossas decisões, levaremos em conta suas ações no passado. Elas nos ajudam a

agir hoje.

Honrando nossos pais, vivemos como se dependêssemos um dos outros. Isto nos ajuda a entender que

a nossa independência é, na verdade, interdependência. Todo mundo depende de todo mundo. E todos

dependemos de Deus. Ao aceitarmos isto, recuperamos a dimensão profunda de nossa existência: a

dimensão da fé e da graça. É por isto que este mandamento vem logo depois do mandamento sobre o

sábado.

Devemos ver nossos pais como os guardiães (isto é, defensores, preservadores) dos valores corretos,

estabelecidos por Deus para nós.

Honrar pai e mãe é pura sabedoria. Não honrá-los, não cuidar deles, é pura burrice. Pode ser que

obedecer a eles doa, mas é para nosso bem, embora, por vezes, possa não parecer.

O resultado é uma vida longa com qualidade, que é a vida que vale a pena ser vivida.

O relacionamento na família, entre pais, esposos e filhos, deve ser no Senhor. Os esposos devem se

amar e se respeitar, no Senhor. Os pais devem respeitar seus filhos, no Senhor. Os filhos devem

respeitar seus pais, no Senhor.

A vida em família deve ser vivida segundo a mente de Cristo. Este é o grande alvo para todos os seus

seguidores, para todos que gostam de viver segundo os seus princípios.

Viver em família é um chamamento de Deus.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 76

12

CELEBRANDO A VIDA EM FAMÍLIA

As experiências de Jacó ilustram as dificuldades próprias da vida familiar e, ao mesmo tempo, seu

imenso valor. Foi Deus quem inventou a família.

Em sua história, encontramos alguns problemas comuns a todas as famílias da terra:

. a preferência por um dos filhos por parte dos pais (Gênesis 26.28)

. a competição entre irmãos, gerando o ódio entre eles (Gênesis 27, 32-33)

. o conflito por causa do namoro (Gênesis 27.46-47)

. a dificuldade para se encontrar a metade certa para o casamento (Gênesis 29.1-28)

. a expectativa, às vezes, frustrada, pela chegada dos filhos (Gênesis 29.31-30;26)

Nossos dramas modernos não são, pois, modernos.

Como na família de Jacó, podemos cultuar deuses diferentes, seguir valores diferentes, buscar

objetivos diferentes. Na família, as afinidades precisam ser desenvolvidas. Não escolhemos nossos

pais, nem nossos irmãos, nem nossos filhos. A família é uma dádiva de Deus para o nosso

crescimento. A partir desta dádiva, precisamos desenvolver as afinidades que tornem possível este

crescimento.

Cremos que a família faz parte da provisão de Deus para nosso crescimento. Só haverá, então,

crescimento se Deus mesmo for o sustentáculo desta família, por meio da sua misericórdia para

conosco e de nossa busca dos Seus valores.

Esta é uma tarefa para todos, sejam eles membros de uma família-de-um (quem vive sozinho), de uma

família-de-dois (cônjuges sem filhos ou cônjuge só com um filho) ou de uma família-de-mais-de-dois

membros (pais e filho ou pais e filhos).

A partir de Gênesis 35, aprendemos acerca do ideal de Deus para a família, contra todos os tipos de

desagregação.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 77

A FAMÍLIA PRECISA CULTUAR JUNTO

Esta não é uma tarefa fácil, em função das características da vida urbana. Cada família, no entanto,

precisa buscar suas formas de atender a este ideal estratégico.

Gênesis 35:1-8

[1] Depois disse Deus a Jacó:

-- Levanta, sobe a Betel e habita ali; e faze ali um altar ao Deus que te apareceu quando fugias da

face de Esaú, teu irmão.

[2-3] Então disse Jacó à sua família, e a todos os que com ele estavam:

-- Lançai fora os deuses estranhos que há no meio de vós, e purificai e mudai as vossas vestes.

Levantemo-nos e subamos a Betel; ali farei um altar ao Deus que me respondeu no dia da minha

angústia e que foi comigo no caminho por onde andei.

[4] Entregaram, pois, a Jacó todos os deuses estranhos, que tinham nas mãos, e as arrecadas

[brincos] que pendiam das suas orelhas; e Jacó os escondeu debaixo do carvalho que está junto a

Siquém.

[5-8] Então partiram; e o terror de Deus sobreveio às cidades que lhes estavam ao redor, de modo

que não perseguiram os filhos de Jacó. Assim chegou Jacó à Luz, que está na terra de Canaã (esta é

Betel), ele e todo o povo que estava com ele. Edificou ali um altar, e chamou ao lugar El-Betel;

porque ali Deus se lhe tinha manifestado quando fugia da face de seu irmão.

A instrução que Jacó recebeu é absolutamente válida para hoje. A família deve lançar fora seus deuses

estranhos.

No contexto da era dos patriarcas, o monoteísmo ainda não estava claramente estabelecido. As

pessoas seguiam o Deus de Abraão e Isaque, mas mantinham seus deuses e ídolos particulares. Esta é

uma tendência humana universal e permanente. Para muitos, Deus é um ser muito distante,

inalcançável e impessoal, pelo que preferem deuses mais visíveis, tocáveis e manipuláveis...

Ao longo de toda a Bíblia, porém, faz parte do caráter de Deus não ter comunhão com quem se

comunica com outros deuses. Ele exige exclusividade no relacionamento. E esta é a maior dificuldade

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 78

do ser humano, adúltero (polígamo) por natureza: curvar-se diante de Deus, reconhecendo nEle o

propósito de nossas vidas.

As crianças sabem bem o que é exclusividade: exclusividade é aquele amigo que fica com ciúme

(magoado) quando a gente faz outras amizades, com outros coleguinhas. Deus quer ser nosso Amigo

único.

A diferença é que nosso amigo tem ciúmes porque não quer dividir. Deus quer exclusividade, porque

ele sabe o quanto somos capazes de seguir valores que levam à destruição. A exclusividade exigida

por Deus é para o nosso bem, não para o bem dEle.

Por isto, o líder da família deve fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que os demais membros, a

começar por ele, expulsem os deuses estranhos de suas vidas.

O desenvolvimento de um relacionamento exclusivo com um Deus exclusivo não é tarefa da Igreja,

mas da família. A tarefa da Igreja é proclamar o amor de Deus e convidar as pessoas ao

arrependimento. Como as familias se eximem, a Igreja tem que fazer esta parte também, mas não o faz

bem.

A família deve ser o lugar em que se estimula a busca da santidade, isto é, o afastamento dos deuses

estranhos. Em termos práticos, isto significa buscar viver segundo os valores do Pai.

E como a família pode fazer isto, incentivando à leitura da Bíblia, à prática da oração e à freqüência às

atividades da Igreja. Se um filho não vê o pai lendo a Bíblia, ele também tenderá a não ler. Se um

filho não vê a mãe orando, ele também tenderá a não orar. Se um filho cresce vendo seus pais lendo a

Bíblia e orando, pode até ser que não façam o mesmo, mas jamais essas imagens se apagarão de suas

mentes. Se os pais não vêm à Igreja, pode-se esperar que seus filhos venham? (Por isto, fico muito

feliz quando vejo filhos mais fiéis que seus pais, em termos de freqüência e contribuição financeira...)

A família deve promover o louvor/gratidão pelo que Deus faz, que é a essência do culto. A expressão

máxima de louvor por parte de Jacó era levantar colunas ou altares. Ao faze, ele reconhecia a

soberania de Deus. Só louva quem reconhece esta soberania. Por isto, o louvor é o princípio da

verdadeira espiritualidade.

A família deve propiciar um ambiente para a transmissão das maravilhas do Senhor a outras gerações.

Em Betel, Deus tinha se manifestado a Jacó. Ele agora que transmitir aquela experiência fundamental

aos seus. Ali ele se encontrara com um Deus de amor e de imensa bondade. Este é o Deus verdadeiro;

qualquer imagem de Deus que lembrar ódio e maldade se refere a deuses estranhos, falsos,

inexistentes. Que Deus estamos transmitindo aos nossos filhos e vizinhos?

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 79

CULTO DOMÉSTICO: UTOPIA OU POSSIBILIDADE?

A cena é mesmo bonita: pais e filhos se reúnem diariamente em volta de uma mesa para ler e estudar a

Bíblia, para orar e cantar, para trocar idéias e discutir seus problemas à luz da Palavra de Deus.

No entanto, a cena do chamado culto doméstico, realizado no interior do lar, é hoje cada vez mais

rara.

A propósito, quantas famílias você conhece que fazem o culto doméstico?

Não temos na Bíblia nenhuma instrução específica sobre como deve ser este culto doméstico. Não está

escrito em lugar algum: ―façam o culto doméstico‖. No entanto, na cultura bíblica, é bastante evidente

que as famílias se reuniam regularmente com esta finalidade. A prática está clara quando Moisés

recomenda com tanta ênfase a educação religiosa no lar.

A necessidade é cada vez maior hoje, especialmente diante das pressões que a escola, a rua e os meios

de comunicação exercem sobre a família e seus membros. Os valores da maioria das pessoas não são

os valores que nós entendemos como sendo divinos. Para afirmar, reafirmar e praticar esses valores, a

família precisa se unir, para conversar. Nada mais próprio para isto do que o culto doméstico.

NA CASA DO ADOLESCENTE JESUS

Aos 12 anos, tudo o que sabia Jesus aprendeu em casa. Maria e José não apenas foram a embalagem

na qual o Filho de Deus veio ao mundo. Mais que isso, eles providenciaram a família, junto com os

outros irmãos, na qual o garoto cresceu e se fortaleceu, cheio de sabedoria e de graça (verso 40).

Não há dúvida: José e Maria cuidavam da educação religiosa dos seus filhos. Todo os sábados iam a

igreja (sinagoga) e uma vez por ano iam à igreja-matriz (o templo de Jerusalém). No entanto, um

encontro semanal era insuficiente para dar aos filhos todo o conhecimento da revelação de Deus.

O mesmo é verdade para os dias de hoje.

Se seus pais acham que você aprenderá tudo o que precisa para entender o caminho de Deus indo à

igreja uma ou duas vezes por semana, eles estão enganados. Se você pensa o mesmo, também está

enganado. Infelizmente, muita gente tem esta visão e por isto não cresce. Essas pessoas são e serão

sempre como meninos inconstantes, que correm para lá e para cá como o vento (Efésios 4.14), sem

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saber o que realmente crêem. Estão sempre atrás de uma novidade, são chegados numa bênção. Nunca

sabem qual é a razão da esperança que têm (1Pedro 3.15).

Com o adolescente de Nazaré foi muito diferente. Como aprendeu em casa as verdades de Deus, sem

ter uma revista para estudar, um livro para pesquisar e muito menos um CD-ROM para navegar, Jesus

pôde discutir de igual para igual com os professores de Bíblia (verso 46). Eles ficaram entusiasmados

com sua inteligência e seu conhecimento (verso 47).

Inteligência a gente nasce com ela. Cabe-nos desenvolvê-la. Cabe-nos usá-la bem. Já o conhecimento

a gente adquire. Conhecimento é o resultado de estudo, pesquisa e discussão. Jesus adquiriu

conhecimento em casa e o desenvolveu. A família criou um ambiente favorável para isto. Algo

semelhante ao que nós chamamos hoje de culto doméstico devia acontecer regularmente em sua casa.

Não podemos esquecer que Jesus era um adolescente normal, menos numa coisa: ele nunca pecou

(Hebreus 4.15). Portanto, para aprender, teve que estudar. A Bíblia não registra nada de especial em

sua adolescência. Ele era como a gente.

COMO DEVE SER

A Bíblia não descreve como deve ser o culto doméstico, mas seu objetivo está claro em Deuteronômio

6 e em Lucas 2. O seu resultado deve ser o mesmo que era para os judeus em geral e foi para Jesus em

particular.

Segundo Deuteronômio 6.1-5, a meta da educação religiosa é levar os membros da família a temer a

Deus e seguir os seus mandamentos. O amor é um sentimento que se aprende. O culto doméstico deve

ajudar os membros da família a aprender a amar a Deus de todo o coração.

Segundo Lucas 2.52, graças à instrução que recebia em casa, o adolescente Jesus crescia

constantemente em sabedoria de vida, em tamanho físico e na compreensão do que é amar a Deus e ao

próximo como a si mesmo.

Como alcançar esse resultado?

Cada família deve buscar a sua maneira de se educar religiosamente.

O ideal é que a família encontre tempo e lugar para se reunir diariamente, em estudo da Bíblia, oração

e comunhão. Nem sempre isso é possível. Todo mundo vive correndo. A correria, porém, não justifica

o esquecimento da educação religiosa em casa.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 81

O pastor João Soren se converteu aos seis anos de idade. Seus pais eram muito ocupados. Num livro

sobre sua vida, 1 ele não fala de culto doméstico, mas conta que toda noite sua mãe (Jane) perguntava

sobre a leitura bíblica diária de cada filho. Se ela sentia que a leitura não fora feita ou fora mal-feita,

insistia para que fosse feita. No dia seguinte, cobrava de novo. Se via alguma dificuldade, sentava-se

na cama para ler em conjunto.

Não havia culto doméstico, mas havia educação religiosa.

E se seus pais não são crentes ou são descuidados, você tem condições de resolver esse assunto. Você

não estuda a matéria da escola sozinho? Por que não fazer o mesmo com a Bíblia? Por que não pegar

um livro sobre vida cristã para se instruir? Por que não pegar um vídeo religioso ou bíblico para ver

em família?

Se você tem computador em casa, por que não se interligar na Internet, para ter acesso a arquivos de

estudo bíblico? Você não faz isso com jogos e outros aplicativos?

A FAMÍLIA PRECISA SE ALEGRAR NAS VITÓRIAS

[22b-26a] Eram doze os filhos de Jacó: os filhos de Leia: Rúben, o primogênito de Jacó, depois

Simeão, Levi, Judá, Issacar e Zebulom; os filhos de Raquel: José e Benjamim; os filhos de Bila, serva

de Raquel: Dã e Naftali; os filhos de Zilpa, serva de Leia: Gade e Aser.

[26-b]Estes são os filhos de Jacó, que lhe nasceram em Padã-Ara.

O capítulo 35 chega ao fim de uma maneira aparentemente desconexa, ao relacionar os nomes dos

filhos de Jacó. Trata-se apenas de uma lista, que deve ser complementada com as narrativas de

nascimento de cada filho.

Cada nascimento tem uma história, hoje possivelmente de ser documentada desde a primeira

ultrassonografia, passando pelo nascimento, pelos 15 anos, pela maioridade, pelo casamento. As

crianças gostam de ver as imagens de suas vidas. Os pais aqui talvez agora se reportem à espera e à

chegada dos filhos. Cada filho foi uma história diferente. Você já contou isto para seu filho? Você já

contou as lágrimas de alegria que verteu quando soube que ele ira chegar? Você já lhe mostrou o

1Cf. AZEVEDO, Israel Belo de (org.). João Filson Soren: o combatente de Cristo. Rio de Janeiro: Primeira Igreja

Batista do Rio de Janeiro, 1995.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 82

hospital onde nasceu? Você já contou como foi difícil (se foi) o parto? Você já contou as agruras

financeiras da família naqueles dias?

Essas narrativas são parte da celebração da vida em família.

Os pais devem se alegrar pelos seus filhos, que são dons de Deus. E quando digo isto, lembro de uma

mancada que dei (e não foi em Itacuruçá): eu disse que uma família sem filhos é uma família

incompleta. Se marido e mulher querem filhos e não os têm, sua família está incompleta. No entanto,

se marido e mulher não podem ter filhos, sua família está completa.

Há famílias incompletas, por egoísmo (um dos dois não quer dividir o seu amor ou não quer perder

suas comodidades ou mesmo alterar a escultura do seu corpo) ou mesmo por uma visão errada da vida

(espera de condições financeiras plenas -- elas são necessárias, mas nunca haverá plenitude; medo de

colocar uma criança num mundo hostil -- este é o nosso mundo).

Se vocês são dois (e não três ou mais) por razões alheias às suas vontades, curtam suas vidas a dois.

Vocês são completos sendo dois.

A FAMÍLIA PRECISA BUSCAR SEU DESENVOLVIMENTO

Estamos diante da narrativa do progresso de uma família.

Gênesis 35

[9-12] Apareceu Deus outra vez a Jacó, quando ele voltou de Padã-Ara, e o abençoou. E disse Deus:

-- O teu nome é Jacó; não te chamarás mais Jacó, mas Israel será o teu nome.

Chamou Israel. Disse mais:

-- Eu sou Deus Todo-Poderoso; frutifica e multiplica; uma nação, sim, uma multidão de nações sairá

de ti, e reis procederão dos teus lombos; a terra que dei a Abraão e a Isaque, a ti a darei; também à

tua descendência depois de ti a darei.

[13-14] E Deus subiu dele, do lugar onde lhe falara. Então, Jacó erigiu uma coluna no lugar onde

Deus lhe falara, uma coluna de pedra; e sobre ela derramou uma libação e deitou também azeite; e

Jacó chamou Betel ao lugar onde Deus lhe falara.

[21] Então, partiu Israel, e armou a sua tenda além de Migdal-Eder.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 83

[27] Jacó veio a seu pai Isaque, a Manre, a Quiriate-Arba (esta é Hebrom), onde peregrinaram

Abraão e Isaque.

O horizonte geográfico de Jacó não serve para nós. Ele era um nômade. Estava sempre peregrinando,

armando sua tenda (verso 21) onde fosse propício para sua família e seu gado.

Aprendemos com ele, no entanto, que não devemos nos acomodar como famílias. Há familias

acomodadas. Há famílias que se conformam com as condições socioeconômicas em que estão. Isto

não faz parte do plano de Deus. O plano dele é que cada família se supere, por meio do estudo, do

trabalho. Isto requer sacrifícios e ousadia. Jacó tinha uma meta: chegar a Canaã, que estava ocupada

por outros clãs. Há familias que não têm metas; andam a esmo. São nômades quanto aos seus

propósitos. Jacó era nômade para alcançar um propósito, não porque não os tivesse.

Por isto, digo aos pais: se seus filhos são acomodados, arrastem. Isto vai gerar conflitos, mas se

imponham nem que seja na marra. Nenhuma criança ou adolescente ou jovem quer naturalmente se

esforçar. Ele tem que ser levado a isto.

Por isto, digo aos cônjuges. Se seu marido ou mulher é acomodada: não permita. Empurre-o para

frente.

Por isto, digo aos filhos: se seus pais são acomodados, vocês não devem ser. Vocês têm que ser

maiores que seus pais, no bom sentido de "maior" (sendo e tendo; não apenas tendo; não apenas

sendo). Frutifiquem (dêem mais frutos, mais resultados)! Façam com que a visão dos seus pais

frutifique em vocês e por meio de vocês. Multipliquem os bens que você recebeu. Multipliquem seus

quadros de relacionamentos. Multipliquem seus conhecimentos.

diplomas.

Jacó é um exemplo de uma vida de luta. É um padrão para nós. Sua inconstância geográfica era uma

constância de propósitos. Ele não sabia que o que ele queria era impossível; por isto, foi lá e fez.

Há um segundo cuidado a se aprender com Jacó. A narrativa indica que, desde cedo, Jacó aprendeu a

pôr Deus nos seus negócios. O desenvolvimento que buscava era um desenvolvimento na presença de

Deus.

Quando Deus está nos negócios da família, esses negócios são éticos. Não dá para ter Deus conosco

em negócios escusos. Talvez por isto, muitos não o queiram por perto.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 84

Quando Deus está nos negócios da família, esses negócios são abençoados por ele. Por vezes,

queremos que Deus abençoe nossos negócios, apenas quando eles estão perto do fracasso.

O texto mostra que, convidado, Deus não se recusa a participar.

A FAMÍLIA NÃO DEVE DESANIMAR DIANTE DOS PROBLEMAS

A vida familiar não é feita apenas de dificuldades, angústias e medos, mas isto é parte da sua vida.

O texto retrata também parte da vida em família, ao nos falar de problemas de saúde (partos difíceis) e

mortes, de desavenças entre os cônjuges (verso 18), de problemas de relacionamentos e de pecados.

Fala ainda de esperas (gravidez) e de saudades.

Gênesis 35

[8] Morreu Débora, a ama de Rebeca, e foi sepultada ao pé de Betel, debaixo do carvalho, ao qual se

chamou Alom-Bacute [o carvalho do pranto].

[16-17] Depois partiram de Betel; e, faltando ainda um trecho pequeno para chegar a Efrata, Raquel

começou a sentir dores de parto e custou o dar à luz. Quando ela estava nas dores do parto, disse a

parteira:

-- Não temas, pois ainda terás este filho.

[18] Então, Raquel, ao sair a alma (porque morreu), chamou ao filho Benôni; mas seu pai chamou

Benjamim.

[19-20] Assim morreu Raquel e foi sepultada no caminho de Efrata (esta é Bete-Lêem). E Jacó erigiu

uma coluna sobre a sua sepultura; esta é a coluna da sepultura de Raquel até o dia de hoje.

[22a] Quando Israel habitava naquela terra, foi Rúben e deitou-se com Bila, concubina de seu pai; e

Israel o soube.

[28] Foram os dias de Isaque 180 anos; e, exalando o espírito, morreu e foi congregado ao seu povo,

velho e cheio de dias; e Esaú e Jacó, seus filhos, o sepultaram.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 85

Uma vez mais, é essencial que a família esteja unida para enfrentar suas dificuldades. Podemos

integrar uma família espiritual, que pode até suprir carências diversas, mas a família é o lugar que

Deus proveu para nos fortalecer e apoiar nos embates da peregrinação humana.

Temos problemas que não teríamos se não tivéssemos família, mas também não nos desenvolveríamos

integralmente como pessoas. A falta de uma família nos livra de algumas dificuldades, mas nos livra

também de todas as facilidades.

Desta história, podemos tirar algumas conclusões para nós.

Não pense que só a sua família tem problemas.

O autor bíblico faz um resumo da problemática humana. Todos os nossos dramas estão aqui descritos.

Há um parto difícil, seguido da morte da mãe e de muita saudade (versos 8, 16-20). Os dramas fazem

parte da vida. A morte faz parte da vida.

Há uma tensão na escolha do nome de um dos filhos. Há um pai que tem preferência por um dos

filhos. Benoni significa "filho da minha agonia", mas Benjamim significa "filho da mão direita", isto

é, filho predileto. Ele não permitiu que seu filho carregasse aquele nome sinistro. Por isto, deu outro,

glorioso.

Há desvio de um dos membros para práticas fora dos padrões divinos (verso 22). Para imensa tristeza

do pai, seu filho Rubem tem um relacionamento sexual com a sua concubina (mulher secundária). Ele

não aceitou o comportamento do seu filho, como deve ocorrer hoje também, entre pais e filhos e entre

filhos e pais.

Há a morte do pai Isaque (versos 27-29), morte esperada, porque aos 180 anos de idade, mas morte

chorada, como toda morte.

Em nossas familias, experimentamos também estas realidades. Algumas, por mais difíceis que sejam,

precisamos aprender a aceitar. Outras, porque fora dos padrões de Deus, temos que lutar para evitar.

Se a família enfrentar junto essas dificuldades, triunfará. Se não, elas são ainda maiores do que são.

Quando acontece a morte de Isaque, temos uma clara indicação da força desta unidade familiar.

Embora morasse em cidade diferente, Jacó não abandonou seu pai. Foi levar seus filhos para que ele

visse cumprida a promessa que Deus lhe fizera.

Mais que uma indicação de unidade, a atitude de Jacó mostra que ele vivia sob a perspectiva da

promessa. É assim que a família deve enfrentar seus problemas: confiante na ação de Deus.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 86

De onde vem a força para a vida familiar? Do terror de Deus (verso 5). Deus é um terror para os

problemas (verso 5). Não são os problemas que são um terror para nós; mas Deus é que é um terror

para os problemas. Que tal ter Deus conosco? Que tal enfrentar nossos problemas contando com Ele?

Quando uma família cultua a Deus, ela se capacita para enfrentar as suas dificuldades. A santificação

produz força. Conclame sua família (seus filhos, seus pais, seu cônjuge) a adorar a Deus e a viver

segundo os seus valores.

A unidade é essencial. Quando Jacó conclamou sua família a se livrar dos seus ídolos, ele estava

fazendo um convite à participação de todos os membros. A unidade é essencial, para a santificação,

para o desenvolvimento, para a alegria e para o enfrentamento das lutas.

Pai, busque a santificação, para você e os seus. Cônjuge, busque a santificação, para você e os seus.

Filhos, busquem a santificação, para você e os seus.

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13

APRENDENDO COM UMA BELA FAMÍLIA

O apóstolo Paulo nos fala de uma família bonita (2Timóteo 1.3-6). Ao elogiar seu auxiliar Timóteo,

ele elogia sua mãe e sua avó. Não sabemos porque ele não fala do avô e nem do pai, mas isto não

importa agora.

Paulo tinha prazer em estar com seu auxiliar, ao ponto de ter saudade dele quando estava distante

(verso 4). As qualidades que via no assistente, Paulo as atribuía à formação que recebera de sua avó e

de sua mãe. Por isso, Timóteo era uma pessoa tão querida que o apóstolo orava por ele sempre.

O que aprendeu Timóteo na sua família?

Ele aprendeu a dar valor às amizades verdadeiras, mesmo ao interesse das pessoas mais velhas, como

no caso de Paulo. Ele admirava os conselhos do seu ―pai‖ na fé. Pelo amigo apóstolo ele era capaz de

chorar quando as coisas não iam bem. A amizade é uma atitude a ser aprendida e Timóteo a aprendeu

em casa.

Ele conheceu a Deus pela fé, de modo que regia a sua vida a partir dessa fé, que aprendera a ter com

sua avó e sua mãe. Essa fé era sincera. Ele não era crente porque sua a mãe o era. A fé que havia nele

era verdadeira. A sua experiência era diferente da de Paulo, que se tornou cristão adulto. Timóteo

experimentou desde o ventre a maravilha de crer. No entanto, essa maravilha era algo pessoal, não era

apenas uma afirmação feita de palavras; era uma afirmação feita de vida.

Com todas estas qualidades, esta era uma família imperfeita ou, pelo menos, incompleta. Fala-se da

avó, fala-se da mãe e se fala do filho, mas não se fala do avô e não se fala do pai. Nossas famílias

também são assim, mas é nelas que temos que buscar a nossa perfeição e a perfeição dela.

Na família de Timóteo aonde havia conflitos de gerações, como todas as famílias têm, porque ali estão

presentes mais de uma geração. Esta família era formada por três gerações. Os conflitos são

necessários, inevitáveis e úteis, embora tenhamos que mantê-lo sob controle. Eles são saudáveis,

porque cada geração tem uma visão daquilo que lhe parece melhor.

Entre aquelas três pessoas, os conflitos de tal modo estavam sob controle que Timóteo tinha prazer em

ouvir os mais velhos, e os mais velhos tinham prazer de estar com Timóteo. Eis o que Paulo diz sobre

o seu relacionamento com o membro mais novo da família:

-- Estou ansioso por te ver para que eu transborde de alegria.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 88

Talvez, quando se encontravam, o rapaz lhe contasse piadas, que faziam Paulo rolar de rir. Talvez o

apóstolo. que tinha sérios problemas de visão, tivesse saudade dele, porque o amigo o conduzisse para

passear pela cidade.

Imaginação à parte, o certo é que o Timóteo era um motivo de alegria para Paulo. O jovem tinha

prazer na companhia do velho, várias vezes o procurou. Os jovens precisam ter prazer em estar com os

mais velhos, em lugar de procurar descarta. Os mais velhos precisam ter uma percepção mais positivas

dos jovens e não achar que sempre estão no caminho errado.

Nos mais velhos, de quem se espera sabedoria, vemos muita impaciência. Eles precisam de nutrir uma

visão mais positiva dos mais jovens. Por sua vez, há muitos jovens inventando a roda... Se prestassem

mais atenção nos mais velhos, poderiam gastar tempo inventando coisas muito mais interessantes.

Timóteo era capaz de chorar por Paulo. Não predominou no rapaz espírito do "cada um na sua". O

mesmo sentimento positivo havia em Paulo, que, numa certa circunstância, aconselhou Timóteo sobre

um problema de saúde no estômago. Ambos, pois, eram membros de duas gerações de amigos, que de

preocupavam um com o outro. O exemplo nos mostra que devemos cultivar a amizade no seio da

família, nada importando a faixa etária. Ninguém é melhor do que ninguém, apenas diferentes.

Juventude não é virtude, velhice não é doença; elas são etapas da vida.

A vivência que Timóteo tinha da fé, herdada de sua avó e sua mãe, era algo muito pessoal. Timóteo

foi educado na fé cristã mas essa era também a sua fé. Devemos nos alegrar quando temos uma

família que busca a santidade e o serviço a Deus. O apóstolo Paulo dava graças por aquela família e o

apóstolo Paulo dava graças a Deus por sua própria família que também, o levou para o caminho do

bem embora às vezes no erro quando perseguiu os Cristãos mas foi também uma aprendizagem para

entender o verdadeiro chamado de Deus.

Às vezes, tendemos a exaltar apenas aqueles que não conheceram o Evangelho no interior de suas

familias. Por vezes, achamos mais valioso aquele testemunho de uma pessoa que passou por

experiências dramáticas fora do seio da família e da igreja. Contudo, é por si um milagre aqueles que

nasceram no Evangelho e nele continuaram. Isso agrada tanto o coração de Deus quanto um filho

pródigo que retorna.

O notável pastor João Filson Soren se converteu aos oito anos de idade. Seus pais se perguntaram se

não era cedo.

Sua resposta foi:

-- Eu sei o que eu quero.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 89

Ele foi batizado e serviu a Deus na Igreja por toda a vida, sendo seu pastor por meio século.

O exemplo da família de Timóteo é um desafio à responsabilidade da família como educadora e, ao

mesmo tempo, um convite àqueles que herdaram a fé vinda dos pais. Timóteo tinha uma fé sem

fingimento. Não era fé para agradar aos seus pais, mas uma experiência diretamente nutrida no

coração de Deus.

A nossa fé tem que ser reavivada. Não podemos viver de experiências do passado, mas de

experiências vivas a cada dia. Precisamos guardar o que nos foi confiado, mas aperfeiçoando,

robustecer e engrandecendo aquilo que nos foi um dia legado. A família é o lugar estratégico para que

isso aconteça.

Os pais devem lembrar que educação é palavra e principalmente atitude. As duas se complementam.

Um pai não pode pedir ao filho para falar sempre a verdade e, ao mesmo tempo, noutra circunstância,

pedir para dizer, ao telefone, que não está. Toda palavra anterior morrerá naquele momento. A atitude

permanecerá viva.

Em relação à nossa família, portanto, o apóstolo Paulo nos recomenda algumas atitudes, duas das

quais serão destacadas agora.

A primeira é que devemos dar graças a Deus pela família que somos e que temos. Devemos dar graças

a Deus por aquilo que somos como família e pedir a Deus que nos ajude a chegar onde nós queremos

chegar. Muitas famílias não crescem, porque que não o pedem a Deus e porque não têm o propósito de

crescer.

A segunda é que devemos orar uns pelos outros em família. Nada sabemos sobre a família de Paulo,

mas o apóstolo Paulo adotou a família de Loide, Eunice e Timóteo como sendo a sua:

-- Eu não paro de orar por vocês. Dou graças a Deus e oro sem cessar.

Você, pai, ora por seu filho ou filhos?

Você, filho, ora por seus pais?

Você ora por seu irmão ou irmãos?

Os filhos devem orar pelos seus pais, certos que os problemas dos seus pais são problemas dos filhos,

assim como os problemas dos filhos são problemas dos pais.

E nós oramos por nossos irmãos de família?, esses irmãos que nos chateiam todos os dias, devemos

orar também pelos nossos irmãos, porque sem essa atitude de gratidão e sem a oração nós não nos

apropriaremos das armas que o apóstolo Paulo menciona nos versículos 6 e 7, sobre o qual eu vou

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 90

tratar em outro momento para que nós façamos a nossa família não perfeita, repito, deixemos de lado a

fantasia mas curtamos a utopia mas em oração buscar uma família cada vez melhor e esta tarefa não é

dos pais, tornar uma família melhor é uma tarefa de cada um de nós. A minha família é assim porque

o meu pai é assim, não, a minha família é assim porque eu sou assim. A minha família é assim porque

os meus filhos são assim, não, a minha família é assim porque eu sou assim. A minha família é assim

porque meu irmão é assim, não, a minha família é assim porque eu sou assim. Se queremos uma

família melhor partamos de onde estamos e oremos uns pelos outros para nos apoderarmos das armas

de Deus nesta guerra que é tornar a nossa família cada vez melhor.

PARA MUDAR

Como é a sua família? Ela está mais para a de Jacó, para a de Davi ou para a do filho pródigo? Ou está

mais para a de Timóteo?

De qualquer modo, lembre-se que não existe a família perfeita. Mesmo na de Timóteo, não se fala do

pai e nem do avô. Por que? Talvez não fossem crentes. Talvez a mãe de Timóteo tenha ficado viúva

cedo.

Ter em mente que não existe família perfeita é um bom começo e pode lhe motivar a dar o máximo

para mudar aquilo que acha que deve ser mudado em você e nos outros. Não é para cruzar os braços e

aceitar as coisas como elas são. Mude aquelas que podem ser mudadas. Aprenda a conviver

criativamente com as que não podem.

Deus tem uma missão para cada membro da família, mesmo que você não goste de algumas ou de

muitas coisas nela.

Nossa oração deve ser para que a nossa família seja de fato uma bênção para todos os seus membros e

todos quantos a conhecem, não porque seja perfeita, mas porque busca a perfeição.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 91

14

COMEÇANDO DE NOVO

Quando nos casamos, constituindo uma nova família, temos muitos sonhos para todos os membros

desta nova família. Estes sonhos, no entanto, nem sempre vão na direção que gostaríamos.

Isto nos traz culpa e até um certo complexo de inferioridade. O texto de Josué 24, especialmente o

verso 15, faz com que nos sintamos pequenininhos. Alguns de nós, por mais que queiramos, não

conseguimos servir, nós e nossa família, ao Senhor, como Josué prometeu e cumpriu (verso 31).

A experiência deste texto é a experiência do povo de Israel. A história deste povo é a historia de uma

família, desde Abraão. No entanto, podemos aplicar este texto à experiência de nossas famílias.

A VALIDADE DE UM COMPROMISSO

A primeira é a de centralidade da família na experiência da fé comum de um povo. A todo momento

aparece aqui nesse sermão que Josué pregou ao povo o termos "pais". Pai aqui tem um sentido

historicamente longo, para alcançar Abraão, Jacó, José, seus descendentes e até os pais imediatos dos

ouvintes do sucessor de Moisés. A conseqüência é que a vida em família é de certo modo

grandemente responsável pela vida da própria nação. Famílias destroçadas geram nações destroçadas.

Diante das idolatrias contemporâneas, vale a pena nos comprometermos como se comprometeu Josué:

"eu e minha casa serviremos ao Senhor"? É isto possível?

Em certo sentido, não. O respeito que cada membro da família merece nos impede de prometer que

qualquer um dele servirá ao Senhor. Na compreensão moderna da vida, cada um é responsável pelos

seus compromissos.

Como já vimos, a tarefa de edificar a família não é só dos cabeças (marido e mulher), mas pertence a

um dos seus membros. E missão de cada um tornar o seu lar um ambientes propícios para que todos os

seus integrantes venham a aceitar a Jesus Cristo como o Senhor e viver segundo os valores de Deus.

Há muitos filhos de pais crentes que não encontraram em casa um ambiente propício para conhecerem

a Jesus. Há muitos lares ditos cristãos que talvez sejam o último lugar para alguém conhecer a Deus.

Josué queria que seu lar fosse um espaço para se servir ao Senhor e não a nenhum outro deus. Não sei

como vai sua família, mas quero insistir com você a não desistir dela, seja você pai, filho ou cônjuge.

Esteja você aonde estiver, esteja a sua família como estiver, prometa a Deus hoje a começar de novo.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 92

Muitos têm tentado, casais em vias de separação têm começado de novo e tem dado certo. Pais tem

revistos os seus métodos em relação aos seus filhos e esposas e têm recomeçado e tem dado certo.

Filhos têm revisitado as suas práticas e tem dado certo. Faça um voto como Josué fez: o de servir ao

Senhor, que significa não seguir qualquer outro valor mas tão somente tentar, com toda a sua força, de

todo o seu coração, de todo o seu entendimento, de toda a sua mente, servir ao Senhor.

Se esse desejo morar no seu coração, isso não quer dizer que automaticamente tudo nela vai se

transformar, mas que haverá uma disposição de sua parte de servir ao Senhor e não a nenhum deus

que destrói a família. Nunca é tarde para começar. Não há problema sem solução. Não há filho rebelde

que não se converta. Não há pai estúpido que não aprenda a amar a seu filho. Não há cônjuge adúltero

que não possa começar a ser fiel.

No entanto, podemos fazer como Josué:

. devemos desejar que nossa família sirva ao Senhor

. devemos orar para que nossa família sirva ao Senhor

. devemos fazer o que estiver ao nosso alcance para que nossa família sirva ao Senhor

. devemos, nós mesmos, servir ao Senhor com fidelidade e prazer tais que nossa família também

queira servir ao Senhor

Como Josué, nosso compromisso deve ser:

. não servir a outros deuses, mas a Deus (verso 2)

. recordar as bênçãos recebidas como família (verso 3)

. lembrar o deserto (verso 7) = valorizar o fracasso, pois é ele que nos prepara para a vitória

Como está o seu compromisso, com Deus, com seus filhos, com seu cônjuge?

Você tem procurado, como família, servir ao Senhor ou tem seguido outros deuses (prosperidade,

individualismo, irresponsabilidade)?

Você tem procurado, como membro da família, o bem de todos ou apenas o seu (individualismo

transformado em egoísmo)?

Esteja você onde estiver, faça um compromisso diferente com Deus hoje. Prometa a ele começar de

novo.

Page 93: O Mito da Família Perfeita

O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 93

Muitos têm tentado. Casais em vias de separação têm tentado e têm recomeçado...

Pais têm revisto seus métodos e recomeçado.

Filhos têm revisitado suas práticas e recomeçado.

COMEÇAR DE NOVO

Se eu começasse a minha família de novo, o que é que eu faria? Trago algumas possibilidades. Queria

que você elaborasse as suas. Anotei algumas.

Eu procuraria não ser como o Davi, que priorizou o sexo e o poder e teve uma família desgraçada; não

há exemplo de família mais destroçada na Bíblia do que a família do primeiro grande rei de Israel. Ele

fez escolha certa, ao escolher servir a Deus, que o considerava um homem segundo o Seu coração,

mas tomou um caminho errado: em lugar da família, preferiu o sexo e o poder.

Eu me empenharia para não ser como Salomão, que também priorizou o sexo. Sabemos quantas

mulheres ele tinha e quão idólatra se tornou, levado por essas muitas mulheres. Como o pai Davi, teve

uma família igualmente estraçalhada ao ponto de ter o próprio império de Israel dividido em norte e

sul por causa do seu pecado.

Eu evitaria ser como Isaque, que priorizou ser servido pelos filhos e também teve uma família dividida

e magoada pela sua atitude.

Eu não teria tanta certeza no acerto de minhas escolhas, especialmente no meu relacionamento com a

minha esposa e no modo de educar meus filhos. São as muitas certezas que nos fazem brigar. Quando

temos certeza, estamos prontos a ensinar, e quando estamos todos prontos para ensinar não tem

ninguém para aprender.

Eu não mentiria jamais, mas falaria sempre a verdade. Onde há mentira, não há amor.

Page 94: O Mito da Família Perfeita

O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 94

Eu leria mais a Bíblia tanto pessoalmente como em minha família. Eu procuraria seguir os seus

conselhos, por mais ultrapassados que possam parecer.

Eu não transferiria para a igreja a tarefa da educação cristã dos meus filhos. Antes, eu faria tudo o que

estivesse ao meu alcance para que a em minha igreja a educação de meus filhos fosse de excelente

qualidade, a melhor possível, melhor até que na escola secular, mas mesmo assim não transferiria para

minha igreja a tarefa de educar os meus filhos.

Eu faria tudo para que a minha família fosse um mundo, nunca uma redoma, nunca um lugar

escondido, nunca um refúgio secreto, mas um mundo com um lugar para cada um dos seus membros.

Eu daria mais valor aos meus familiares. Nós, às vezes, contamos com colegas de escolas e de

trabalho: como são maravilhosos! como são prestativos! como são solidários! Mesmo que isso fosse

verdade plena, eu não os trocaria de modo algum pelos meus familiares; antes, procuraria dar a eles o

valor que merecem.

Eu me divertiria mais com os meus filhos, passaria mais horas brincando, rindo, pulando, rolando,

contando piadas. Freqüentemente, por exemplo, me vem a mente do meu pai tentando me ensinar a

nadar. Mesmo que não tenha conseguido, eu me lembro com alegria das suas tentativas. A minha

incompetência impediu que isso acontecesse, mas ele tentou.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 95

15

UM LUGAR PARA A FELICIDADE

Amar é preciso.

Não há dúvida que a família que seguir os princípios éticos de Deus estará fora dos padrões de nossa

sociedade, mas completamente dentro dos padrões de Deus. Quanto mais uma família vive segundo os

padrões de Deus mais se sente pressionada, porque vai se sentindo isolada no mundo. Assim como

não existe uma família perfeita, também não existe um padrão do que seja uma vida familiar feliz.

Cada uma deve buscar a sua felicidade. De qualquer modo, uma família feliz é aquela em que pais e

filhos se sintam felizes.

Compreender essas realidades é meio caminho para uma vida familiar feliz. Além disso, como já

vimos nos estudos anteriores, a família precisa se empenhar para que seja um lugar agradável.

Eis algumas metas que valem a pena buscar.

1. Os membros da família devem procurar estar juntos. O companheirismo deve ser uma meta de

todos.

2. Os membros da família devem procurar compartilhar suas alegrias e seus problemas. A alegria de

um é a alegria de todos. O sofrimento de um é a tristeza de todos.

3. Os membros da família devem procurar momentos para o culto. O ideal é que todos sejam

reconhecidos na igreja como uma família. Devem chegar juntos e sair juntos, na medida do possível.

Além dos cultos na igreja, a família de procurar seus próprios momentos em que se reúnem para

estudar a Bíblia, orar, brincar e conversar.

4. Os membros da família devem-se interessar pelo bem-estar um do outro. Mais do que compartilhar

alegrias e tristezas, sonhos e problemas, cada um deve fazer o que estiver ao seu alcance para que o

outro (pai, mãe ou irmão) esteja bem.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 96

5. Os membros da família devem-se empenhar em ajudar uns aos outros. Nas tarefas da casa, não é

justo deixar tudo por conta da mãe ou de uma irmã mais velha. Nas tarefas escolares, é justo ajudar os

que têm algum tipo de dificuldade. Nas crises, cada um deve ser o ombro do outro, cada um deve

estender sua mão para tirar o outro do buraco, cada um deve formar suas mãos para recolher as

lágrimas do outro.

ROTEIRO DA CAMINHADA

Para alcançar estas metas, os princípios recordados pelo apóstolo Paulo em Romanos 12:9-21 são um

roteiro de segura orientação para a família, embora suas recomendações não sejam exclusivas para a

vida familiar.

Amar é preciso (verso 9-11). Em nossas igrejas e em nossas famílias, não há verbo mais conjugado

que este: amar. A prática, no entanto, continua sendo um desafio, mas no dia em que desistirmos dele

deixaremos de ser cristãos.

O apóstolo Paulo é direto:

. amar é ser sincero (verso 9). Não há coisa pior do que a hipocrisia. Não há coisa pior do que receber

um elogio na presença e um xingamento pelas costas. Amar de palavras é muito fácil. Por isso, muita

gente prefere dedicar todo o seu amor a Deus... a quem não vê (1João 5.20). É muito difícil amar

àqueles a quem conhecemos, especialmente aos familiares com os quais convivemos diariamente e

aos quais conhecemos mais do que ninguém. É mais fácil amar uma máscara do que uma pessoa.

. amar é abrir mão dos seus direitos (verso 10). Na família, os maiores problemas vêm daí. Todos

querem direitos iguais: o bife do mesmo tamanho, a mesma mesada, brinquedos e roupas do mesmo

valor. Famílias um dia unidas se dividem depois que os pais morrem por causa da herança. Como

poucos querem abrir mão, raramente todos saem satisfeitos. Resultado: inimizade. A recomendação é

que busquemos a satisfação de nossos próximos. Se todos fizerem isso, todos ficarão felizes.

. amar é estar junto (verso 13,15). Na família e fora dela, precisamos aprender a considerar a tristeza

do outro como sendo nossa tristeza, o motivo de alegria do outro como sendo nosso motivo (verso 15).

Precisamos considerar as necessidades materiais (casa e comida) do outro como sendo nosso dever de

atender como se fossem nossas (verso 13). Isso é ser unânime (verso 16a). Isso é desejar o bem

comum.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 97

A humildade é uma necessidade sublime (verso 16b). Na família e fora dela, a ambição mata. O

apóstolo não está dizendo que não devemos ter sonhos, projetos, desejos. Devemos lutar para chegar

aonde queremos. No entanto, esses desejos não podem nos escravizar, levando-nos, por exemplo, a

pisar no pescoço do outro... em nome do nosso ideal. O conselho é não ser sábio segundo sua própria

consideração. Se há alguma inteligência em nós, deixemos que os outros o digam. Por poder e

dinheiro os homens se matam, até em família. Uma das coisas mais comuns nestes últimos anos tem

sido filhos matarem pais. Na maioria dos casos, a ambição apertou o gatilho.

É preciso lutar pela paz (verso 14, 17-21). Parece uma contradição, mas devemos brigar para que haja

paz. Na família e fora dela, o princípio da paz é querer o bem até daqueles que não nos querem bem

(verso 14), porque amar a quem nos ama não é qualidade alguma (Mateus 5.46). Esse amor é fruto de

uma duríssima aprendizagem.

Naquilo que depender de nós devemos viver em paz (verso 18) com nossos pais, nossos irmãos,

nossos parentes, nossos amigos e nossos colegas. O padrão geral é ―bateu, levou‖ (versos 17, 19). No

futebol, ações violentas são retribuídas com ações violentas. A justificativa é sempre esta: ―nós

também somos homens‖... Bobagem. Ser forte é ser capaz de dar de comer àquele que praticou

violência contra você (verso 20,21). Dar a outra face (Mateus 5.39) não é para qualquer um. Revidar

é.

A verdadeira religião, na família e fora dela, segundo a Bíblia (verso 12) é:

. alegrar-se e celebrar a esperança, que é uma atitude concreta que Deus inspira;

. ter paciência e esperar pelo apoio divino, quando as coisas estiverem difíceis;

. persistir na oração, mesmo que Deus pareça estar demorando a responder.

Viver assim exige atenção e dedicação.

COLOCANDO DEUS NO CENTRO

A família é o lugar que Deus providenciou para que seus filhos crescessem e encontrassem a

felicidade. No casamento, marido e mulher completam-se como pessoas. Na família, pais e filhos

encontram-se para buscar a realização um do outro.

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É assim que deve ser.

Depois dessa conversa toda, talvez você conclua que precisa mudar (em) alguma(s) coisa(s).

Você sabe que mudar é muito complicado porque parte daquilo que somos hoje, daquilo que

pensamos sobre as coisas e das atitudes que tomamos a cada dia nós aprendemos e desenvolvemos na

vida familiar.

As coisas acontecem muita rapidamente. Por isso, a maioria das decisões que você toma a cada dia

acontece num piscar de olhos. Não dá tempo para pensar.

Por isto, é absolutamente indispensável ter na mente que a tarefa de edificar a família não pertence aos

pais. A você não cabe apenas obedecer.

A tarefa de obedecer, no caso a Deus, pertence também aos pais e aos filhos. Evidentemente, a

liderança da edificação pertence aos pais. Eles, porém, não cumprirão este desejo de Deus sozinhos.

Nunca se esqueça que você também é a família e que, portanto, deve cuidar dela. Cuidando da sua

família, você estará cuidando de si mesmo.

Agora, que você recordou os princípios de Deus para sua vida e sua família, veja como você está. Veja

como sua família está. Veja o que é preciso mudar. Comece hoje.

Pode demorar, mas Deus criou você e sua família para a felicidade. Se você está feliz e sua família

está feliz, Deus está feliz. Este é o louvor do que ele mais gosta.

Para sua inspiração nesta caminhada, veja os conselhos que o rei Davi deu ao príncipe Salomão,

quando lhe foi passar o trono (1Crônicas 22.6-19).

Davi tinha um plano: construir um templo para Deus. No entanto, Deus lhe disse que tinham outros

planos. Davi confiou (versos 6-10). Essa deve ser também a atitude dos pais em relação aos filhos,

mas também dos filhos em relação aos pais. Confie em Deus em todos os seus projetos.

Davi perdeu a chance de entrar para a história como construtor de um templo. A tarefa ficou para seu

filho. Ele sentiu igualmente feliz e orou pelo sucesso do seu filho (versos 11-12). Essa deve ser nossa

atitude, em relação aos pais e aos irmãos. Queira o bem um do outro.

Salomão recebeu o comando, mas tinha muito ainda por fazer. A principal obra seria a construção do

templo, mas haveria outro. O conselho do pai, por isso, foi: ―mãos à obra‖. Na família, cada um deve

fazer a sua parte, para si mesmo e para a família como um todo.Empenhe-se.

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Davi recomendou a seu filho que seguisse os conselhos da Palavra de Deus. Se agisse assim, seria

bem-sucedido como pessoa e como político (verso 13). Guarde as instruções divinas.

Davi não só aconselhou seu filho e não só quis o seu bem; ele tomou providências para que seu filho

fosse bem-sucedido (versos 14-16). Faça o que for possível pelo bem dos outros.

Davi sabia que seu filho e sucessor era sábio, rico e poderoso. Nada disse seria suficiente se ele e seu

povo se esquecessem de Deus. O poeta pede então que eles se dispusessem a buscar a Deus em

primeiro lugar. A construção do templo era o símbolo dessa dedicação (versos 17-19). Esta deve ser a

atitude de todos na família. Os corações de todos devem estar voltados para buscar a Deus, o centro da

família. Coloque Deus no centro.

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Por isto, Josué adverte aos seus ouvintes a que não seguissem seus próprios deuses, mas o Senhor de

Israel, como manifesto desde Abraão

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EPÍLOGO EM FORMA DE MONÓLOGO

Eu, Jônatas, conto a minha história de filho, como está no Livro das Crônicas dos Reis de Israel, mais

especificamente no Primeiro Livro de Samuel, capítulo 14.

Meu pai quase me matou quando eu derrotei os filisteus.

Eu conto esta história, porque quero deixar bem claro que eu nunca desobedeci ao quinto

mandamento, aquele que diz que devemos honrar nossos pais. Nunca me afastei desta recomendação e

não me arrependo.

Eu tenho muito conflitos com meu pai.

Nossos principais conflitos são por causa de nossas perspectivas de vida. Meu pai é ambicioso demais.

Ele só vê o poder e não mede os meios para alcançar os fins.

Na história da minha vitória, isto ficou muito claro. Ele queria vencer. Por isto, deu aquela ordem

absurda: de que ninguém poderia comer. Escutem o que está no Primeiro Livro de Samuel 14.24:

"Maldito o homem que comer pão antes da tarde, antes que eu me vingue de meus inimigos. Pelo que

todo o povo se absteve de comer." Meu pai queria vencer, mesmo que todo o seu exército morresse. A

ambição cegou meu pai.

É claro que eu gosto de ser príncipe em Israel, mas não é isto que me faz feliz. Eu sei que o povo gosta

de mim, mas este gostar tem de ser natural, não imposto. Meu pai usa o terror para conseguir o que

quer.

A vida não é isto. Eu espero viver para mostrar ao meu pai esta verdade. Fico muito triste que tudo

aquilo que meu pai me ensinou quando eu era criança, e que ele aprendeu com o avô dele, ele agora

esqueceu. Meu pai está errado.

Ele não vê que Deus não o quer mais. Ele podia obedecer a Deus, perder o reino e continuar fiel a

Deus. Ele prefere o reino em lugar de Deus. Isto é lamentável.

Nossos conflitos são por falta de comunicação. Vocês acham que meu pai conversa comigo. Quando

éramos crianças, sim. Quer dizer: ele falava e a gente escutava. Quando me tornei um adolescente, eu

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fazia qualquer coisa para conversar com meu pai, mas ele só tinha interesse pelo seu trabalho no

Palácio.

Sei que a sua tarefa é dura, sempre foi dura, mas eu sou seu filho. Espero que Davi não faça a mesma

coisa que meu pai. Ele parece ser diferente. Ele já poderia ser rei de Israel, mas está esperando as

coisas acontecerem, sem se precipitar.

Naquele episódio, quando quase morri, eu não sabia que meu pai tinha proibido o povo de comer. Se

eu soubesse, teria obedecido. Parece que ele só me via como um guerreiro, nunca como um filho.

Aliás, quero dizer, nunca mais tomei um mel tão bom. Se eu não tomasse aquele mel, acho que eu

morreria. Morreria, mas obedeceria meu pai, se soubesse.

Eu soube depois, mas me calei. Tive medo da reação do meu pai. Sei que errei: devia ter falado logo.

Uma coisa boa é que fiquei sabendo como o povo gosta de mim. Não é bom ser querido?

Agora, falando sério: aprendi esta. A gente precisa se comunicar mais. Com meus filhos, quero ser

diferente. Disciplina é fundamental, mas respeito também. Diálogo é tudo. Por falta de comunicação,

eu podia estar morto, se o povo não me salvasse e se Deus não estivesse comigo.

Nossos conflitos são também religiosos. No fundo, meu pai não é um crente. Lendo o Livro de

Samuel (verso 38), fiquei sabendo que ele edificou seu primeiro altar a Deus no oitavo ano do reinado.

De fato, nunca me lembrei dos seus sacrifícios.

No fundo, meu pai é um legalista. Ele faz tudo ao pé da letra, quando lhe interessa. Não tem realmente

interesse em Deus. Ele parece ter interesse em Deus, mas só parece. Ele é rígido com as coisas

religiosas, mas não crê em Deus, eu acho. Quando proibiu o povo de comer sangue, ele fez certo, mas

fez isto para intimidar as pessoas. Ele usou a religião para conseguir seu objetivo, que era vencer a

guerra.

Não gosto disto no meu pai. Acho que religião é coisa séria e que não posso usar isto para mim

mesmo, mas para servir e adorar a Deus.

Apesar destas diferenças e destes conflitos, quero dizer algumas coisas para os meus irmãos:

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Nunca minta ao seu pai. Aprendi isto dolorosamente. Naquele episódio, eu poderia ter logo dito ao

meu pai o que tinha acontecido. Afinal, eu não sabia de nada. A falha foi dele.

Outras vezes, eu errei ao mentir ao meu pai. Se eu não tivesse escondido minha amizade com Davi, as

coisas seriam diferentes. Meu pai não é fácil, mas eu compliquei. Posso até explicar: foi o medo que

me fez mentir, mas mentira é mentira e tudo ficou mais difícil.

E depois, tem mais: não adianta: os pais da gente sempre acabam descobrindo que a gente está

mentindo. Eu espero que meus filhos não mintam para mim. Se vocês estão mentindo, parem de

mentir.

Assuma suas escolhas. Outra coisa que aprendi é que a gente deve sempre assumir as decisões

tomadas, mesmo depois de ver que estão para sempre assumi minhas escolhas e meus erros. Eu decidi

enfrentar os filisteus e sem querer desobedeci ao meu pai. Assim mesmo, eu me dispus a pagar o

preço de minha involuntária desobediência.

A gente tem que arcar com todas as conseqüências dos nossos aos. Não posso fazer o que bem

entendo e depois correr pra baixo da saia da mamãe. Isto é coisa de criança.

Honre sempre seu pai. Eu não sei como vai acabar esta loucura do meu pai. Sinto que vai sobrar para

mim. É o preço de ser o filho de um rei maluco. Não posso simplesmente fazer de conta que não sou

filho de Saul. Sou e pronto.

Sou e vou honrar meu pai até o fim. Deus não escreveu o quinto mandamento por acaso. Ele sabia o

que estava escrevendo. Pretendo buscar sempre o bem do meu pai. Se ele for para a guerra, eu vou

com Ele.

Agora, quero dizer umas coisas para o meu pai. Talvez sua loucura não permita que ele me ouça, mas

vou dizer assim mesmo. Se a sua saúde mental voltar, pai,

Ajude seus filhos a ter perspectivas corretas acerca da vida, baseadas na Palavra de Deus. A ambição

pela ambição só leva à destruição. Os pais também erram, mas nunca erre, pai, na construção da

perspectiva de vida. Não leve seu filho a escolher uma profissão apenas pelo dinheiro. Não leve seu

filho a vier apenas o hoje ou a superfície. Ajude a enxergar longe, nas apenas o agora.

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Nunca minta aos filhos. Nós vão descobrir pela vida e vamos ficar muito decepcionados. O pior é se a

gente gostar e fizer o mesmo. Se você não quer que a gente minta, não minta pra gente. Um filho

mentiroso é feio, mas um pai mentiroso é muito feito.

Assuma suas escolhas também. O, pai, não fique procurando um bode expiatório para seus erros. Isto

é coisa de criança. Você não tem que acertar sempre. A gente aceita isto. Não bote a culpa nos outros,

muito menos na gente. E também não venha descontar sua raiva em cima da gente.

Faça tudo para que o diálogo aconteça. Esqueça que você é rei e venha dialogar com seus filhos.

Esqueça o seu trabalho e vem conversar com a gente. Nós somos mais importantes que o reino. Não

desista de conversar, mesmo quando seu filho desistir. Você tem mais idade que ele e sabe que o

diálogo é tudo.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 105

DEZ AUTORES QUE VALEM A PENA

Sugiro alguns autores que merecem uma visita. Alguns têm edições mais recentes.

CAMPOLO, Tony e Bart. O relacionamento entre pai e filho. São Paulo: Vida, 1994.

Tony, o pai, e Bart, o filho, trocam cartas imaginárias avaliando o relacionamento dos dois.

CRABB, Larry. Como construir um casamento de verdade. Belo Horizonte: Betânia, 1995.

"Quando dizemos qualquer coisa com a intenção de modificiar nosso interlocutor, sem um interesse

consciente pelo bem dele, nossas palavras são inúteis. Como não atendem a um propósito eterno, irão

deteriorar-se" (p. 62)

DOBSON, James. Ouse disciplinar. São Paulo: Vida, 1995.

"Conquanto a ausência de amor tenha um efeito previsível sobre as crianças, algo que não é muito

conhecido é que o amor excessivo, ou `super-amor', também inflinge seus riscos. Acredito que certas

crianças são estragadas por amor, ou o que passa por amor" (p. 46).

DRESCHER, John M. Se eu começasse minha família de novo. Campinas: Cristã Unida, 1996.

DRESCHER, John M. Em busca do amor no casamento. Campinas: United Press, 1999.

"A assim chamada incompatibilidade é um mito inventado por advogados carentes de argumentos

com o fim de requererem o divórcio. É provavelmente uma desculpa comum que as pessoas usam para

esconder seus próprios sentimentos. Eu simplesmente não creio que ela exista. Não há

incompatibilidade. Há divergências e erros que, entretanto, podem ser corrigidos, quando há vontade

para fazê-lo" -- Citando Paul Tournier (p. 27).

HARLEY Jr, Willard F. Ela precisa. Ele deseja. São Paulo: Candeia, 2001.

Um estudo sobre as características psicológicas do homem e da mulher.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 106

MALDONADO, Maria Tereza. Vida em família. São Paulo: Saraiva, 1996.

MALDONADO, Maria Tereza. Casamento; término e reconstrução. São Paulo: Saraiva, 1995.

"A construção de uma nova união faz a diferença entre busca e consolidadao. Na busca, sempre se

imagina que o parceiro seguinte será melhor e não se consegue ficar com ninguém por muito tempo,

na medida em que logo surge alguém mais interessante, atraente e promissor. Na consolidadao, o

interesse e o afeto se centram no processo de construir o vínculo do cotidiano, enfrentando medos e

dificuldades, aparando arestas e fazendo vida de dois para dois" (p. 294).

TROBISCH, Walter. Amor, um sentimento a ser aprendido. São Paulo: ABU, 1986.

O autor mostra que a felicidade é apenas uma parte do amor - isso é o que deve ser aprendido. O

sofrimento também pertence ao amor. Este é o mistério do amor, a sua própria beleza e o se próprio

fardo.

STOTT, John. Grandes questões sobre sexo. São Paulo: Vinde, 1993.

"No coração da condição homossexual está uma profunda solidão; a natureza humana está faminta de

amor mútuo, uma busca de identidade e um desejo de complementação. Se as pessoas homossexuais

não podem achar isto dentro da `família da igreja' local, não há mais porque continuarmos a usar esta

expressão. A alternativa não está entre o calor do relacionamento físico do intercurso sexual e o

sofrimento do isolamento no frio. Há uma terceira questão, que é um ambiente cristão de amor,

compreensão, aceita e apoio" (p. 202).

WARD, Ted. Os valores começam no lar. Rio de Janeiro: Juerp, 1981.

"Uma criança não é um filhote de cachorro para ser treinado. Deus nos criou com uma extraordinária

sensibilidade moral. Não é necessário um esquema severo de recompensas e punições para despertar

tal conscial moral" (p. 55).

ZAGURY, Tânia. Sem padecer no paraíso. Rio de Janeiro: Record, 1991.

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O MITO DA FAMÍLIA PERFEITA (Israel Belo de Azevedo) – EDITORA PRAZER DE LER (livros eletrônico) Página 107

ZAGURY, Tânia. Educar sem culpa. Rio de Janeiro: Record, 1993.

ZAGURY, Tânia. O adolescente por ele mesmo. Rio de Janeiro: Record, 1996

ZAGURY, Tânia. Encurtando a adolescência. Rio de Janeiro: Record, 1999.

"Amar os filhos é dar-lhes oportunidade de crescer, de ser gente de verdade, de pensar, de refletir, de

se realizar. Quanto mais cedo, portanto, os fizemos compreender que o DEVER e o PRAZER devem

caminhar lado a lado, que não são excludentes e que, mesmo que em alguns momentos tenham que

optar pelo DEVER, logo adiante terão PRAZER, mais cedo eles amadurecerão" (p. 303).