o lugar da população negra no telejornalismo...
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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – São Paulo - SP – 05 a 09/09/2016
1 ¹ Trabalho apresentado no IJ01 – Jornalismo do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, realizado
de 5 a 9 de setembro de 2016.
² Estudante de Graduação 8º. semestre do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), e-
mail: [email protected]
³ Orientador do trabalho. Professor do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), e-mail:
O Lugar da População Negra no Telejornalismo Capixaba¹
Gabriela Vasconcelos Soares COSTA²
Rafael da Silva Paes HENRIQUES³
Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Vitória, ES
RESUMO
Este trabalho analisa o espaço que é destinado à população negra no telejornalismo
capixaba. Através de um levantamento histórico, busca-se compreender os fatores que
levaram esta população à exclusão social e a pouca representatividade nos meios de
comunicação. Para testar a hipótese levantada, foi realizada pesquisa quantitativa e
qualitativa com amostragem de três semanas visando apreender a representatividade
negra nos telejornais capixabas. Enquanto o branco aparece 12 vezes mais como fonte
confiável de informação científica, o negro aparece 3 vezes mais como suspeito de
crimes, por exemplo. Concluiu-se que o espaço dos negros no telejornalismo capixaba é
desqualificado.
PALAVRAS-CHAVE: Telejornalismo; População Negra; Representatividade;
Racismo.
1 INTRODUÇÃO
Apesar dos 128 anos da abolição da escravatura e de o Brasil ser considerado o paraíso
das três raças e da miscigenação, a cor da pele e os traços físicos dos negros ainda são
motivo de agressões, preconceito e piada. 50,7% da população brasileira é constituída
por negros e pardos, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), mas muitas pesquisas que serão citadas ao longo do trabalho tem
demonstrado que essa não é a porcentagem de negros que aparecem na TV.
Pensar que a população negra não é bem retratada na TV é pensar que a maior parte dos
brasileiros e brasileiras não possui representatividade adequada no maior meio de
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comunicação do país. A mesma lógica é válida para o Espírito Santo, que, de acordo
com o censo 2010 do IBGE, o mais recente de classificação de cor ou raça por
município, tem uma população de mais de 3,5 milhões de pessoas, das quais 57,2% são
negras ou pardas.
Diante disso, o objetivo do trabalho é testar a hipótese de que o telejornalismo capixaba
tem uma representatividade negra secundária e desqualificada. Para isso, faremos um
breve levantamento histórico da condição social do negro após o fim da escravidão e as
consequências desse período para a vida dos negros até os dias atuais. Também haverá
um rápido histórico das emissoras que serão objetos de pesquisa (TV Tribuna, TV
Gazeta e TV Vitória). Por fim, serão apresentados os dados coletados durante três
semanas entre março e abril de 2016 dos telejornais Bom Dia Espírito Santo, ESTV 1ª e
2ª edição, Balanço Geral, ES no Ar, Jornal da TV Vitória, Tribuna Notícias 1ª e 2ª
edição e Ronda Geral.
Foram analisadas 145 edições desses veículos, com o objetivo apreender a presença de
negros enquanto fontes e produtores de notícias. A partir dos resultados obtidos, espera-
se ampliar as discussões sobre as maneiras de modificar essa realidade, e que os
resultados também possam incrementar e pautar o debate sobre racismo, cotas e
representatividade negra.
2 CONDIÇÃO SOCIAL DA POPULAÇÃO NEGRA PÓS-ABOLIÇÃO
Dentro da transição social e econômica emergente do século XIX, os negros foram
excluídos como categoria social das tendências de expansão do capitalismo. Os brancos
encararam tal fenômeno como “falta de ambição” por parte dos negros, e este seria o
fator determinante para sua condição miserável (FERNANDES, 1978). A população
negra foi preparada apenas para papéis servis, que eram considerados pela elite como
essenciais à economia e ao equilíbrio da sociedade. Enquanto qualquer tentativa de
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organização e união dos libertos era rechaçada, através da violência. O negro tornou-se
um inimigo público, que ameaçava a paz das grandes famílias brancas.
É possível afirmar que a realidade do mercado de trabalho pós-abolição para o negro era
uma espécie de escravidão disfarçada. Os baixos salários, as humilhações e a ausência
de benefícios faziam com que muitos recusassem os trabalhos disponíveis. Esse fator foi
decisivo para o desajustamento econômico e social desta parcela da população.
A Abolição e a implantação da República criaram a falsa ideia de que foi estabelecida
uma democracia racial no país, pois todos passaram a ser iguais perante a Lei, mas na
prática, as opressões ao povo negro continuaram. Uma verdadeira democracia racial
pós-abolição consistiria em reparações aos oprimidos, na criação de soluções para os
problemas sociais gerados pela escravidão. Mas a marginalização do negro foi ignorada.
Esse discurso ainda permanece nos dias atuais, quando surgem pautas sobre o racismo e
a sociedade ainda pensa que é desnecessário debater o tema, sob o argumento de que
isso incitaria ainda mais o racismo. Porém, existem evidências sólidas de que a
escravidão ainda tem consequências para a atual condição social do negro no Brasil. A
classe dominante ainda é notadamente branca, enquanto a grande maioria negra vive em
condições precárias de existência.
Em 2014, os negros (pretos e pardos) representavam a maioria da população brasileira
(53,6%), mas eram apenas 17,4% da parcela mais rica do país. Dentro desta classe ultra
rica (1% da população), 79% são brancos, de acordo com dados do IBGE. Já entre
população mais pobre, que tem renda média mensal de R$ 130 por pessoa, os negros
são maioria, representando atualmente 76%, ainda de acordo com o IBGE. E do total de
negros no país, 38,5% estão entre os mais pobres. Do outro lado, o percentual de pobres
brancos diminuiu, passando de 26,5% para 22,8%, em 2014.
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Dados ainda mais significativos são os referentes às mortes por armas de fogo. O Mapa
da Violência de 2015 informa que em 2012, morreram quase três vezes mais pessoas
negras vítimas de homicídio por arma de fogo em relação à quantidade de vítimas
brancas no Brasil. Foram 28.946 vítimas negras e 10.632 brancas. E também chama
atenção o fato de que essa taxa cresce ao longo dos anos. Enquanto os homicídios de
brancos diminuem em 18,7% entre 2003 e 2012, os homicídios de negros aumentam
14,1% no mesmo período.
Ou seja, por mais que se insista em dizer que o motivo da desigualdade social no Brasil
tem mais a ver com a renda do que com a raça, percebe-se a partir de dados como esses
que, dentro da população mais pobre, a população negra é a que mais sofre com a falta
de políticas públicas efetivas de inclusão e direitos.
3 REPRESENTATIVIDADE
Num mundo cada vez mais tecnológico e pautado por imagens, a representatividade é
determinante para o reconhecimento da identidade e do valor de um grupo que está
inserido nessa lógica. E o negro, nas escassas vezes em que aparece na mídia, ainda é
retratado como um cidadão de segunda classe. Essa postura reforça a ideia de que ele
existe apenas para ser um personagem secundário num mundo onde o branco é sempre o
protagonista. Para Sodré (1999), a sociedade brasileira é regida por um paradigma
branco e a clareza da pele continua sendo “a marca simbólica de uma superioridade
imaginária atuante em estratégias de distinção social” (p. 234).
Os discursos sociais desempenham um papel decisivo na reprodução do preconceito e
do racismo. E é de tais discursos que surgem os modelos cognitivos e as atitudes
relativas às minorias, especialmente aos negros numa sociedade eurocêntrica Ocidental
(SODRÉ, 1999). Os meios de comunicação de massa têm o poder de difundir
expressões políticas e institucionais sobre as relações inter-raciais, geralmente partindo
de um ponto de vista elitista, legitimando a desigualdade social pelo racismo.
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A televisão no Brasil, apesar de necessitar de concessões do governo, nasceu da
iniciativa privada e se desenvolveu como um bem patrimonial. Por isso, os formadores
da opinião pública são as famílias ricas, predominantemente. Logo, as influências
políticas, econômicas e ideológicas provenientes da televisão vão sempre favorecer os
interesses da elite, que é manter-se com seus privilégios, como aponta Sodré:
A mídia é o intelectual coletivo desse poderio, que se empenha em
consolidar o velho entendimento de povo como “público”, sem
comprometer-se com causas verdadeiramente públicas nem com a afirmação
da diversidade da população brasileira. O racismo modula-se e cresce à
sombra do difusionismo culturalista euramericano e do entretenimento
rebarbativo oferecido às massas pela televisão e outros ramos industriais do
espetáculo (SODRÉ, 1999, p. 244).
Como já foi apontado, a elite brasileira é majoritariamente branca. Logo, podemos
afirmar que o interesse dos produtores de televisão tende a ser a perpetuação do racismo
e da exclusão social. Desde o século passado, os negros existem no imaginário das elites
como “seres fora da imagem ideal do trabalhador livre, por motivos eurocentrados”
(SODRÉ, 1999, 244). Esse imaginário racista continua a ser reproduzido hoje através de
representações pejorativas do cidadão negro.
Vale citar um caso recente do programa Zorra Total (Globo), que exibiu um quadro de
conteúdo racista entre 2012 e 2013 com uma personagem chamada “Adelaide”.
Estereótipo de mulher negra, periférica e pobre, a personagem contava com falas como:
“Durante a enchente não pude ficar sem minha palha de aço, daí, corri atrás para pegá-la
e quando vi, eram os cabelos da minha filha”.
Como se não bastasse o teor racista das falas, a personagem era interpretada por um
homem que teve a pele escurecida e usou prótese no nariz para ficar alargado. A prática
se chama blackface e é uma espécie de glamourização do racismo, gerando a exclusão
de atores e atrizes negras, bem como a perpetuação do preconceito. O blackface teve
início no século XIX nos Estados Unidos e era realizado em ministrel shows (jograis),
em que os atores brancos utilizavam carvão para pintar o rosto, contribuindo muito para
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a proliferação de estereótipos em relação aos afro-americanos. No início do século XX a
prática ramificou-se e tornou-se um gênero de teatro próprio, até desaparecer durante o
movimento dos direitos civis dos negros nos EUA em 1960 (MAHAR, 1999). Mas
ainda é o nível de racismo apresentado na mídia brasileira.
Em termos qualitativos, no telejornalismo, o negro aparece em peso como personagem
marginal, como o bandido, sempre exposto e humilhado. Já enquanto protagonistas,
fontes oficiais ou profissionais do campo jornalístico, o percentual é drasticamente
reduzido. De acordo com a pesquisa de Silva e Moraes (2015), o percentual de
profissionais negros no telejornalismo do Bom Dia Brasil da Rede Globo, por exemplo,
é de 2,49%, em contraste abismal com os outros 97,51% de brancos.
A abordagem do racismo na mídia não retrata o problema como um todo. Apresenta
casos isolados, como de um negro que foi barrado em uma loja. O caso é quase sempre
apresentado como um episódio exótico. Mas não há uma cobertura diária sobre o fato de
que a grande maioria da população negra é tratada de forma inferior todos os dias. O
negro não é representado conforme a realidade étnica vivida na sociedade, e o problema
da desigualdade racial não é abordado de forma efetiva. Dessa forma, a mídia contribui
para a permanência do racismo, além de agravá-lo através da estereotipização da
imagem do negro.
4 A TV NO ESPÍRITO SANTO
Pouco mais de uma década depois de ser inaugurada no Brasil a TV é implantada no
Espírito Santo num cenário de transformação e disputa, de acordo com Martinuzzo
(org., 2006). Em 1962, a antena da TV Vitória foi instalada no Morro da Fonte Grande,
um dos pontos mais altos da cidade. No início, a TV apenas repetia a programação da
TV Tupi. Depois foram criados programas locais que eram exibidos ao vivo. Entre as
emissoras que serão analisadas, é a que possui mais programas regionais. Só de
jornalísticos são sete transmitidos diariamente.
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Mais tarde, em 1976, a TV Gazeta vai ao ar, como a 18ª afiliada da Rede Globo no país
e a primeira afiliada no Estado. Os principais atrativos que marcaram o início da
transmissão foram as novelas, shows e filmes que eram exibidos com mais qualidade
técnica do que as concorrentes. Depois, o jornalismo passou a ser o principal formato
explorado, porque o entretenimento vinha da programação nacional da Globo.
Em 1984, a partir de uma greve de jornalistas do impresso A Tribuna, o grupo Nassau
fechou o jornal, com um recesso. Então teve início a construção de todo o complexo de
rádios, jornal e TV Tribuna. Além disso, parte da equipe que trabalhava no impresso foi
remanejada para a constituição da emissora. O canal entrou no ar em 1985 com
retransmissões da programação do SBT. Depois, os programas locais começaram a ser
produzidos (Martinuzzo, org., 2006).
5 RESULTADOS DA PESQUISA
Foram analisadas 145 edições de nove (9) telejornais de três (3) emissoras capixabas,
entre os dias 13/03/2016 e 03/04/2016 (amostragem de três semanas): Balanço Geral,
Jornal da TV Vitória e ES no Ar (TV Vitória); ESTV 1ª e 2ª edição e Bom Dia ES (TV
Gazeta); Tribuna Notícias 1ª e 2ª edição e Ronda Geral (TV Tribuna). Por problemas
técnicos, não foram incluídas as edições dos dias 19, 25 e 26/03/2016 do Balanço Geral
e as edições dos dias 18 e 25/03/2016 do Jornal da TV Vitória.
O critério de escolha das emissoras foi audiência, pois o objetivo é falar sobre a
representatividade da população negra e parda na TV aberta, visto que é o meio de
comunicação com maior abrangência no país. A TV é o principal meio de informação
das classes mais baixas, onde se encontra o maior número de negros, como foi visto.
Gostaríamos de ter analisado todos os telejornais capixabas, mas essa amostragem foi a
possível de se fazer no momento.
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Foram produzidas três tabelas de quantificação para cada telejornal, que aqui foram
transformadas em gráficos. A primeira quantifica a presença de fontes negras e brancas
nos telejornais, de acordo com as seguintes classificações: personagem, autoridade e
especialista. A segunda indica a quantidade de fontes negras, brancas e não identificadas
nas reportagens policiais. São classificadas vítimas, suspeitos, parentes e testemunhas,
delegados e policiais, que aparecem como fontes ou que têm a imagem exposta de
alguma forma (vídeo ou foto). Finalmente, a terceira tabela classifica a aparição de
jornalistas, contando a quantidade de produtores de notícias negros e brancos que
apareceram em cada edição. Quantos repórteres negros, quantos brancos, nas funções de
apresentadores, repórteres e participações em estúdio, quantificados pelas vezes em que
aparecem.
Muito se discute sobre o uso do termo “pardo”, e a sociedade ainda tem dúvidas sobre o
que define se alguém pode ser chamado de negro ou não. Acreditamos que ser negro é
ter traços físicos de negros além do tom de pele, bem como sofrer a opressão que recai
sobre este grupo, como já foi visto. Alguns dos personagens e jornalistas inicialmente
classificados como negros disseram que se consideram pardos. Por essa razão e pela
classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acrescentamos o
termo para classificar os não brancos. Sendo assim, classificamos como negras ou
pardas todas as pessoas que possuem dois ou mais fenótipos negros, como o tom da
pele, o cabelo crespo e o nariz largo.
Não há outra forma de dizer: os dados obtidos refletem as consequências da escravidão,
confirmando a hipótese inicial deste trabalho. Os resultados gerais são indicadores do
padrão que se repete em praticamente todos os telejornais analisados, com raras
variações, que são pouco ou nada significativas. O número de fontes brancas supera o
de fontes negras em 87% como pode ser conferido no gráfico 1. Esse valor corresponde
a quase o dobro de fontes brancas em relação às fontes negras e pardas. Relembrando
que a população negra e parda representa mais da metade dos cidadãos brasileiros. É
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possível afirmar que no telejornalismo do Espírito Santo, a pessoa negra é tratada como
coadjuvante num mundo onde o branco é sempre o protagonista.
Dentro da categoria “Fontes”, a maior diferença está entre o número de especialistas
negros ou pardos e brancos. Foram entrevistados 12 vezes mais especialistas brancos do
que negros ou pardos. Ou seja, o número de especialistas brancos entrevistados supera o
de negros em 1.240%. Essa disparidade juntamente com a disparidade verificada nas
reportagens policiais demonstra o maior reflexo dos lugares sociais destinados a negros
e brancos na sociedade. Além disso, na categoria autoridades, percebe-se que foram
entrevistadas 5 vezes mais autoridades brancas do que negras, com uma diferença de
69% entre elas.
A academia ainda é um espaço marjoritariamente branco. A maioria da população negra
depende da educação pública e de todos os outrs fatores determinantes na vida de quem
tem uma renda bastante limitada. Tudo isso influencia nas chances dos negros de
ingressarem, concluírem e seguirem carreira no ensino superior, como já foi visto.
762
56 10
828
1120
313
124
1557
93 3 0
96
Personagem Autoridade Especialista Total
Gráfico 1 - Tipo de fonte por raça (Total)
Negras ou pardas Brancas Não identificadas
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10 4 Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil 2009-2010. Rio de Janeiro: Garamond, 2010. Disponível em <
http://www.palmares.gov.br/wp-content/uploads/2011/09/desigualdades_raciais_2009-2010.pdf>
De acordo com pesquisa do Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e
Estatísticas das Relações Raciais (Laeser), do Instituto de Economia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)4, os negros representam 37,6% dos profissionais das
áreas científicas e intelectuais. Mas entre os médicos, por exemplo, representam apenas
17,6% do total e não chegavam a um terço do total de professores universitários.
Por outro lado, ainda de acordo com o Laeser, a participação da população negra
aumenta entre as áreas de menor prestígio e remuneração, como profissionais técnicos
de nível médio, em que representa 44,5%. E entre as profissões como coletadores de
lixo e material reciclável, o percentual sobe para 70,2%.
Nas reportagens policiais, quantificadas no gráfico 2, os negros e pardos têm mais
destaque, superando o número de fontes brancas em 47%. A maior diferença está entre a
quantidade de suspeitos negros ou pardos e suspeitos brancos: 52,1%. Os negros
aparecem três vezes mais do que os brancos nesta categoria. Ou seja, quando o negro
aparece com mais frequência é por motivos ruins.
62
130
28 16
236
35 41 26
52
154
50
4
36
3
93
Vítima Suspeito(a) Parentes e
testemunhas
Delegados e
policiais
Total
Gráfico 2 - Tipo de fonte por raça em reportagens policiais
(Total)
Negras ou Pardas Brancas Não identificadas
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As reportagens policiais verificadas são factuais, relacionadas ao tráfico de drogas e à
violência urbana, episódios registrados em maioria na periferia. As vítimas negras são
maioria, 77% a mais. Mas nessa mesma análise, as fontes brancas só estão em maior
número na categoria autoridades. Os delegados e policiais brancos representam 76,4%
do total. É uma diferença de 52,9%. Então nas reportagens policiais do telejornalismo
capixaba aparecem 3 vezes mais autoridades brancas do que negras, e os negros
aparecem 3 vezes mais como suspeitos. Isso reforça a imagem dos papéis que negros e
brancos têm na sociedade, sendo o negro o bandido e o branco o herói.
No total, foram contabilizadas 997 aparições de produtores de notícias. Eles foram
contabilizados pelo número de vezes em que apareceram, pois o objetivo é falar sobre
representatividade. A maior diferença está entre o número de participações em estúdio.
No período analisado, não houve nenhuma participação de um produtor de notícia negro
nos telejornais, enquanto houve 39 participações de brancos.
A segunda maior diferença é entre o número de apresentadores: os apresentadores
brancos apareceram 6 vezes mais do que os negros. Apenas dois dos nove telejornais
analisados contam com apresentadores negros ou pardos. O ES no Ar, apresentado por
Eduardo Santos, que dentro do período foi substituído em uma edição por um
apresentador branco. E o Tribuna Notícias 1ª Edição, apresentado por Ingrid Schwartz e
Torino Marques, classificado aqui como pardo.
A terceira maior diferença verificada está entre o número de repórteres que apareceram.
Os brancos apareceram 3 vezes mais do que os negros. Em média, os produtores de
notícias brancos aparecem 4 vezes mais do que os negros e pardos. Mais uma vez se
confirma a hipótese de que o negro não é representado na mídia em conformidade com
sua presença na população.
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Os veículos da TV Gazeta apresentaram a maior disparidade entre negros e brancos no
total de fontes. No Bom Dia ES (gráfico 4) foi registrada a maior diferença: foram
exibidas 3 vezes mais fontes brancas do que negras. Entre os personagens, essa
diferença foi de 36%; os brancos apareceram 2 vezes mais. A diferença entre o número
de autoridades é ainda maior, com as fontes brancas aparecendo 6 vezes mais do que as
fontes negras. A porcentagem de negros nessa categoria foi de apenas 14%. E enquanto
nenhum especialista negro foi entrevistado, 39 especialistas brancos estiveram
distribuídos entre as 15 edições analisadas, sendo a maior disparidade registrada.
O Jornal da TV Vitória (Gráfico 5) é o mais branco entre todos os analisados em termo
de produção de notícias. A apresentação é feita por um homem branco e ao longo do
período de pesquisa, apenas um repórter negro apareceu em apenas uma edição. Isso
representa um percentual de 7%. Enquanto isso, todas as edições contaram com
repórteres brancos fazendo em média 6 matérias juntos por edição.
26
172
0
198 161
599
39
799
Apresentadores Repórteres Participações Total
Gráfico 3 – Participação como produtor de informação por raça
(Total)
Negros ou pardos Brancos
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho analisamos qual é a representação do negro no telejornalismo capixaba e,
a partir da hipótese testada, verificamos que o negro não é bem representado. Em
algumas edições, foi verificado que o branco chega a aparecer 12 vezes mais do que o
negro. Concluímos que a falta de representatividade ou representatividade ruim dos
91
11 0
102
194
67 39
300
2 0 0 2
Personagem Autoridade Especialista Total
Gráfico 4 - Tipo de fonte por raça (Bom Dia ES)
Negras ou pardas Brancas Não identificadas
Fonte: Elaborado pela autora
0 1 0 1
14
82
0
96
Apresentadores Repórteres Participações Total
Gráfico 5 - Participação como produtor de informação (Jornal da
TV Vitória)
Negros ou pardos Brancos
Fonte: Elaborado pela autora
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negros no telejornalismo é reflexo do racismo que ainda está enraizado na sociedade de
diversas formas.
A discussão sobre este tema precisa continuar viva. Um país que não relembra sua
história e consequências das injustiças do passado corre o sério risco de repeti-la. Uma
sociedade que se recusa a falar sobre racismo, que critica até mesmo as datas
comemorativas da cultura negra, que ainda demoniza as religiões de matriz africana e
que não consegue relacionar a condição social do negro na atualidade com os traumas
da escravidão, está condenada a seguir praticando o racismo em todos os níveis.
A população negra não é “coitada”, não é inferior e não “se vitimiza”. A população
negra sofre as consequências do regime escravocrata até os dias atuais. É preciso que as
reparações devidas sejam efetivadas em todas as áreas. Não porque o negro tem menos
capacidade, e sim porque sua vida sempre foi diferente da do branco, sempre foi
marcada pela discriminação e pela falta de acesso aos lugares mais altos da sociedade.
Consideramos que o espaço do negro no telejornalismo capixaba é pequeno e
marginalizado. É preciso que os profissionais da área reconheçam que a competência
não está relacionada com a cor da pele, e também é necessário ter avanços sociais,
especialmente na área da educação, para que negros e brancos tenham condições mais
próximas de obter sucesso na vida.
Acreditamos que esta pesquisa tenha expandido o leque da discussão sobre o racismo e
a representatividade negra. Esperamos contribuir para a exploração do tema na área da
comunicação social, que consideramos ainda ser pequena. Nossa expectativa é de que
sejam realizadas mais pesquisas que testem a hipótese deste trabalho, contribuindo
assim para a discussão deste problema dentro do jornalismo, da publicidade, e da
sociedade.
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