o conselho geral da província do pará e a definição da política indigenista no império do...

56
409 Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos General Council of the Province of Pará and the Definition of the Indigenist Politics in the Empire of Brazil (1829-31) 1 O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31) André Roberto de A. Machado Universidade Federal de São Paulo, São Paulo - SP, Brasil e-mail: [email protected] Abstract The objective of this article is to demonstrate how General Council of the Province of Grão-Pará discussed and proposed projects that aimed to intervene in the indigenist politics in operation, between 1829 and 1831. Prioritily, it is sought to expose as this theme was vital for the province, which explains largely why the indigenous issue was a subject that deserved one of the largest numbers of projects and interventions presented in General Council during the studied period. At the same time it is sought to understand the tensions among the local and national interests in the definition of an indigenist politics, reminding that just in 1845 a general law will be formulated for all the Indians of the Empire of Brazil. Resumo O objetivo deste artigo é demonstrar como o Conselho Geral da Província do Grão-Pará debateu e propôs projetos que visavam intervir na política indigenista em vigor, entre 1829 e 1831. Em um primeiro plano, busca-se expor como este tema era vital para a província, o que em grande medida explica porque a questão indígena foi um assunto que mereceu um dos maiores números de projetos e intervenções apresentados no Conselho Geral no período estudado. Ao mesmo tempo, busca-se compreender as tensões entre os interesses locais e nacionais na definição de uma política indigenista, lembrando que apenas em 1845 se formulará uma lei geral para todos os índios do Império do Brasil. Keywords General Council, Indians, Grão-Pará, Indigenist politics Palavras-chave Conselho Geral, índios, Grão-Pará, Política Indigenista 1 I thank the CNPq for the financing of my research. A preliminary and summarized version of this text was published in the Annals of the 27º Simpósio Nacional de História – ANPUH.

Upload: fernanda-sposito

Post on 31-Jan-2016

6 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Artigo da revista Almanack

TRANSCRIPT

Page 1: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

409Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

General Council of the Province of Pará and the Definition of the Indigenist Politics in the Empire of Brazil (1829-31)1

O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

André Roberto de A. MachadoUniversidade Federal de São Paulo, São Paulo - SP, Brasile-mail: [email protected]

AbstractThe objective of this article is to demonstrate how General Council of the Province of Grão-Pará discussed and proposed projects that aimed to intervene in the indigenist politics in operation, between 1829 and 1831. Prioritily, it is sought to expose as this theme was vital for the province, which explains largely why the indigenous issue was a subject that deserved one of the largest numbers of projects and interventions presented in General Council during the studied period. At the same time it is sought to understand the tensions among the local and national interests in the definition of an indigenist politics, reminding that just in 1845 a general law will be formulated for all the Indians of the Empire of Brazil.

ResumoO objetivo deste artigo é demonstrar como o Conselho Geral da Província do Grão-Pará debateu e propôs projetos que visavam intervir na política indigenista em vigor, entre 1829 e 1831. Em um primeiro plano, busca-se expor como este tema era vital para a província, o que em grande medida explica porque a questão indígena foi um assunto que mereceu um dos maiores números de projetos e intervenções apresentados no Conselho Geral no período estudado. Ao mesmo tempo, busca-se compreender as tensões entre os interesses locais e nacionais na definição de uma política indigenista, lembrando que apenas em 1845 se formulará uma lei geral para todos os índios do Império do Brasil.

KeywordsGeneral Council, Indians, Grão-Pará, Indigenist politics

Palavras-chaveConselho Geral, índios, Grão-Pará, Política Indigenista

1I thank the CNPq for the financing of my

research. A preliminary and summarized version of this text was published in the Annals of the 27º Simpósio Nacional de História – ANPUH.

Page 2: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

410Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

It was only in 1845 with the approval of the “Rule about the catechism missions and Indian civilization” that the Empire of Brazil now had a general law for the Indians valid in all the dominion. A law that, moreover, would remain the unique of its type during all the Empire.

Patrícia Sampaio, studying the new law, attracted attention for the fact that it would not just promote the catechism with the new rule. On the contrary, Sampaio demonstrated that although the catechism being a central aspect of the “Rule of Missions” the entire administration was in charge of civilian authorities: a General Director of every province named directly by the central power, and Village Directors these were indicated by the General Director to the Provincial President. For these authori-ties was reserved the decision about a series of actions that composed the multifaceted characteristic of the new law. In this sense the new rule secured land for the Amerindians that were incorporated to the culture of the White men, simultaneously it created mechanisms so that the land of these people could be rent. In the same matter, at the core of the law was the preoccupation about the control and discipline of the Indian labor, pro-moting its engagement on several activities under salaried employment of a third party and under the command of Village Directors.2 Incorporation, land and work: a triad that would always go along with the discussion about the indigenous issue in the Empire of Brazil. In addition, of course, of the talk of those who the only possible treatment for these people was the eradication, given its supposedly failure for civilization.3

The nonexistence, until 1845, of a valid law in all the territory of the Empire, who regulate the relationship with the Indians maintained the statement of Manuela Carneiro da Cunha, that during all that period they lived a “legislative void” regarding this question. The statements of Cunha imply that this flaw would be caused specially by the supposedly loss of importance of the theme. For her the Indians in the Nineteenth Century would be mainly a land issue, with merely few exceptions in the territory where their labor was still relevant.4

Indeed, there was not until 1845 a general law for the entire Em-pire that established a policy for the Indians in the entire territory, but it doesn’t look like the lack of significance of the theme could be the expla-nation of this fact. Instead, it’s necessary to think that one of the most difficult duties of the builders of this new State was to found a new legal base. Several were the urgent themes to be disciplined by the law and looks like it was clear for the men of the period, since very early, that it would take many years to do so. As noted by Mônica Dantas, the very Con-stituent Assembly took the precaution of create a law in October 20, 1823 that defined that as long as there were no new legislation in the Empire, laws and other rules edited in Portugal until 1821 would still be valid in national territory.5 This, in truth, ended being the current practice too as a way to remedy a number of gaps for which there was no legal definition yet. As summarized by José Reinaldo Lopes:

Thus, as we don’t do daily things overnight, the independent first years [of the Empire of Brazil] were of intimacy with a complex order, which kept foreign (Portuguese) and colonial devices (or pre-liberal).6

In this regard, many sensitive themes did not had a fast legal regula-tion, as they do not always were in the center of the discussion. To exem-plify this, Tâmis Parron points to the trade and slavery of black people in

2SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Política

Indigenista no Brasil Imperial. In: GRINBERG, Keila; SALLES, Ricardo. História do Brasil Imperial. Volume 1 – 1808-1831. 2ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. p.175-206.

3MONTEIRO, John. Tupis, tapuias e historiadores:

estudos de história indígena e indigenismo. 2001. 233 fls. Dissertation (Habilitation/Livre-docente). Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.

4CUNHA, Manuela Carneiro da. Prólogo.

IN:______(org.). Legislação indigenista no século XIX: uma compilação. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1992. p.9-11.

5DANTAS, Mônica Duarte (org.) Revoltas, Motins,

Revoluções: homens livres pobres e libertos no Brasil do século XIX. São Paulo: Alameda, 2011. Introdução.

6LOPES, José Reinaldo de Lima. Iluminismo e

Jusnaturalismo no ideário dos juristas da primeira metade do século XIX. IN: JANCSÓ, István (org.) Brasil: formação do Estado e da nação. São Paulo: Hucitec, 2003. p.200.

Page 3: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

411Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

the Empire of Brazil, a matter that looks to be of indisputable importance. As pointed by Parron, excluding the strong clashes between 1826 and 1827 of the international treaty about the end of the slave trade in 1831, this theme was secondary in the registered debates on the annals of the Parliament at least until 1834. In addition to the bet that the silence was a form to keep the established situation, Parron clarifies other reason: the efforts were centered in the very definition of the political game, in the establishment of rules for the running of the institutions.7 It should not be forgotten that this too was an aspect that lacked urgent legal definition for many fields.

Despite not being constituted a general law until 1845, the debate about an Indigenist policy was constant during the Nineteenth Century. On the Court of Lisbon were sent projects for this matter from São Paulo, Per-nambuco, Pará and Bahia, four great provinces, what on its own demonstrate the importance of the theme. It is truth too that the dimensions of this debate were much more different than what occurred in the Cádiz Cortes, a comparison that seem very valid for the enormous influence that the Spanish Constitutional Assembly had over the later Portugal experience.

At Cádiz the Indians’ question had important developments with the explicit acknowledgement of this group as Spanish citizens, action that featured the pressure from the American deputies interested in a growth of the number of seats from the New World in the European parliament. Directly resulting from this, the congress of Cádiz ended the forced labor of Indians in the Hispanic America under the assumption of tributes, as the mita. This is a decision that draws attention because the end of the tributes was justified as necessary to match the condition of the Indian citizens with the other Spanish. From other view, it is important to high-light too, that the conquest of rights of these people in the territory of Hispanic America was not linear: after the Independence, the compulsory work of the Indians had returned in some countries.8

At the Courts of Lisbon, as consecrated in historiography, the dis-patch of many projects about the Indians question, even the famous plan of civilization written by José Bonifácio, did not resulted in an extensive debate with effective decisions. On the contrary, only one of these plans, dispatched from Pará by the Colonel Francisco José Ricardo Zany – who we will talk about later – managed to pass the first barrier of the discussions: it was approved by the Comissão de Ultramar das Cortes Gerais de Lisboa, reaching to the point of being transcribed in the Diários do Congresso with a friendly opinion by the Comissão9. Still, there is no register that the same project made by Zany had resulted in concrete decisions or that the very project had been discussed in plenary after its presentation by the Comissão de Ultramar and the order of impression.10 In the very Portuguese constitution of 1822 there is only one unique mention about the Indi-ans, precisely in the last article which establish a vague obligation by the Executive and the Courts in the attempt to promote the civilization of the Indians, incorporated to a series of actions categorized as charity institu-tions.11

Yet in the constituent debates of the Empire of Brazil, Fernanda Sposito presented that the Indians were cited since the discussions to de-fine who the Brazilians were. In this occasion prevailed the understanding that those who were outside the living together of the “civilized” should not be considered members of the political pact. Regardless the deci-

7PARRON, Tamis. A política da escravidão no

Império do Brasil (1826-65). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. Cap. 1.

8GODOY, Scarlett O’Phelan. Los diputados

peruanos en las Cortes de Cádiz y el debate sobre el tributo, la mita y la ciudadanía indígena. Revista de História Iberoamericana, v.5, n.1, 2012. LARSON, Brooke. Trials of Nation Making: Liberalism, Race and Ethnicity in the Andes, 1810-1910. New York: Cambridge, 2004. For a comparision between the process in Cádiz and the Courts of Lisbon regarding the Indian question see SANTOS, Raquel Dani Sobral. A construção do estatuto do cidadão para os índios do Grão-Pará (1808-22). 2014. 121 fls. Thesis (Master’s Degree in History). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014. Cap. 2.

9Look for ZANY, Francisco José Ricardo. Projeto

para os índios do Grão-Pará. IN: Diário das Cortes, 1821/1822. Sessão de 26 de Agosto de 1822. Available at: <http://debates.parlamento.pt>. Accesed in: January 09, 2015.

10About the projects of the Indians in the Courts

of Lisbon and the debate of this matter, see BOEHER, George. Some Brazilian Proposals to the Cortes Gerais 1821-23, on the Indian Problem. In: COLÓQUIO INTERNACIONAL DE ESTUDOS LUSO-BRASILEIROS, 3., Lisboa. Actas do 3o Colóquio Internacional de Estudos Luso-brasileiros. Lisboa: [inserir editora], 1960. v.II, p.201-209; de MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Índios da Amazônia: de maioria a minoria (1750-1850). Petrópolis: Vozes, 1988; de SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem brasileiros: indígenas na formação do Estado nacional brasileiro e conflitos na província de São Paulo (1822-1845). São Paulo, Alameda: 2012. p.65-71; e de SANTOS, Raquel Dani Sobral. Op. Cit., cap. 3.

11Constituição Portuguesa de 23 de Setembro de

1822. Available at: <http://www.fd.unl.pt/Anexos/Investigacao/7511.pdf> Accessed in: January 09, 2015

Page 4: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

412Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

sion of excluding the Indians who were at the forests – and the complete uncertainty about those who lived between the white men but still were identified as Indians, or those who would be incorporated afterwards – it becomes clear that this was an unavoidable problem for the Constituents. The constitutional project consecrated to the theme a single article, very similar to what had been approved at the Courts of Lisbon, with a vague promise of the government dealing with the catechism of the Indians. However, as pointed by Sposito, the Constituent Assembly sanctioned favorable measure to the project made by José Bonifácio which was also presented at Lisbon. The authoress supposes that the non-instant welcom-ing of the proposition was connected to a stratagem of the Constituents: the responsible committee ordered to spread copies of the project to all the Empire and to question the provincial authorities about a way to implement it at each part of the territory.12

The non-definition of an Indigenist policy in the Constituent draws as much attention as the decision to question the local governments about the matter, rather than claim the responsibility to them. It is precisely to this matter, the role of the provinces attempting to define an Indigenist policy in the Empire of Brazil, that this article intents to claim attention.

In the already cited text, Manuela da Cunha, in a superficial way, said that the provinces even legislated about the theme in their own ac-cord, giving space to understand that it was a casual policy and resulted from the lack of definitions by the Court.13 Unlike the conclusion made by Cunha, the Indians still were a central question for the politics in many regions of the Empire and the role of the provinces in the regulation of this matter doesn’t seem to be casual or secondary. Instead, seems clear that there was a clash about who would have the primacy about this mat-ter: the central government or the provinces? As highlighted by Patrícia Sampaio even during the approval of the “Rule of Missions” the discus-sion about who should legislate on the matter was a stress point. Sampaio demonstrate that even at the Council of State the project about the Rule of Missions suffered resistance from people like the Marquis of Paraná, who the establishment of a general rule for all the Empire would be ill because it would remove the role of the provinces to discuss the matter. More than that: it is very significant that the Marquis of Paraná in his pro-test against the law had set it as “misuse” of the right that was competent to the Provincial Assemblies, that on its own show that to him the natural would be the non-existence of a general law about the theme.14

This tension between the establishment of a general policy and the interest of the provinces is permanent. Even the first effort of the Parlia-ment to create a general plan for the Indians had as strategy to consult the provinces. This is a matter that claims attention twice: first because it re-peats the same procedure of the Constitutional Assembly; second because this was an absolutely unusual procedure on the practice of this power. Sent in the very first year of operation of the Chamber and the Senate, in 1826, the answers seem to explain the stalemates behind this problem: the reality of the Indian question varied considerably between the prov-inces. Analyzing the answers sent, John Monteiro shows that in Goiás and São Paulo, for example, they had the expectation of integration of these people, to the point of thinking that with this last answer the utilization of this manpower could be relevant to the end of the slave trade. On the other hand, the feedback that came from Paraíba did not saved words to

12SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem

brasileiros. Op. Cit., p.73-74.

13CUNHA, Manuela Carneiro da. Op. Cit., p.9-11.

14SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Política

Indigenista no Brasil Imperial. Op. Cit.

Page 5: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

413Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

tell that every effort of catechism was made in vain, specially noting that it was impossible to entrust public offices to the Indians as intended since Pombal. But in Ceará and Pernambuco, the center of concerns was the danger of being represented by these men who, according to the provincial authorities, had gained power after the Constitutionalist Act. Moreover, it’s remarkable the absence of any response by the provinces where the Indi-ans were the center of the problems, following the example of Grão-Pará.15 Furthermore, the different levels of incorporation of these people to the world of the white men not only were different for each group, but also had different significance between the provinces. In the decade of 1840, for example, the Rio Grande do Norte claimed that it could not execute the Rule of Missions because the Indians already lived between the white men under the administration of civil authorities.16 Certainly it was a differ-ent Indian than those imagined by the writers of the Rule of Missions, but also it draws attention to the fact that the incorporation to the world of white men did not make this people lose their distinct trait to the province authorities. They still were Indians.

Given the urgency at many places, the provinces used existing mechanisms in an attempt to regulate the Indian question, in an illustra-tion of the spaces of autonomy that existed for the local powers of the Empire of Brazil, as supported by Miriam Dolhnikoff.17 Fernanda Sposito, focusing specially in the case of São Paulo, demonstrates it very well: there was not a “legislative void” until 1845 because the provinces, with many restrictions, mistakes and success, tried their own policies or suggesting changes for the central government. In São Paulo, for example, they tried to form a specific organization to create laws concerning the Indians to be made effective, the Sociedade de Catequese e Civilização in 1830. Yet, the most emblematic example seems to be the initiative of the Conselho Geral da Província de São Paulo to require for the Parliament to abolish the just war act ordained by D. João VI in 1808, a request that was answered because of such local plea.18 Sposito maps the paths that led to the revoca-tion of these just wars, showing that the initiative of the Conselho Geral da Província de São Paulo, which would culminate into a legal and effective change, was motivated by many debates that, in turn, were powered by events in many parts of the São Paulo territory.

Obviously these local actions about the Indigenist Policy had limita-tions and the absence of a general law carried stalemates that created reasons for complaints, including some that were made by the members of Conselho Geral de São Paulo. However, what we want to highlight here is that the Indigenist policy and the definition of laws about this theme were not abandoned by the provinces, something that is forgotten when the sight is focused only into the legal marks determined by the Parliament The debates and the proposition of laws, even when they not resulted into effective policies, show us an important role of the legal institutions and help us comprehend the dead ends in specific regions of the Empire.

Following this thinking, this article intends to emphasize the action of the Conselho Geral da Província do Grão-Pará in the attempt to estab-lish an Indigenist policy in the period between 1829 and 1831. In previous researches, from Reading the Annals of Parliament and sparse documents, in other works was possible to deduce that this debate was present in the discussions of the General Council of the Pará province, including at least one representation made by the Province reaching to the inquiry of the

15MONTEIRO, John. Op. Cit.

16SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Política

Indigenista no Brasil Imperial. Op. Cit.

17DOLHNIKOFF, Miriam. O Pacto Imperial: origens

do federalismo no Brasil. São Paulo: Editora Globo, 2005.

18SPOSITO, Fernanda. Liberdade para os índios no

Império do Brasil. A revogação das guerras justas em 1831. Almanack, Guarulhos, n. 01, nov. 2010. Available at: <http://www.almanack.unifesp.br/index.php/almanack/article/view/715>. Accessed in: March 11, 2013; SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem brasileiros. Op. Cit.

Page 6: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

414Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

deputies and senators.19 Yet, confined to the Annals of Parliament it was not possible to exactly know the recurrence of this matter in the Council and its importance in the entirety of debates. At the same time, it drew attention to the fact that, despite the importance of the theme and its discussion in the General Council it failed to formulate in this organ a wide Indian policy that were implemented. This pretense – at least on what con-cerns the discipline and manpower of those who already lived between the white men – would only be achieved years later, at the Province Assembly with the creation of the law of the Corpo de Trabalhadores in 1838. Why such a thing happened?

In this very article is expected to answer these questions adding up to the research a group of fonts that are being gathered since 2008 in the Arquivo Público do Pará, in the Biblioteca Nacional, in the Arquivo Nacional and the Arquivo da Câmara dos Deputados. Even if it still has flaws, these documents allow us to comprehend from aspects of the elections for the General Council until details of their meetings. Emphasize here the analysis of the minutes of the Conselho Geral da Província do Pará, between 1829 and 1831, something that was only made possible after assembling a puz-zle made by documents that were scattered at many archives, a completely different reality than Minas Gerais or São Paulo, where this minutes had been published. Even if the form of construction of the minutes of these Council impose some limits to our comprehension of the debate, as it will be explained soon, without a doubt it is the best documentation to under-stand who were these counselors, what were the projects presented related to the Indians, which were the positions assumed and the difficulties about getting an agreement to establish a complete policy. The chronological cut covers from the beginning of the works made by the Council, in 1829, going to 1831. In this year the President of the Province is deposed, with great repercussion into the works of the General Council, including the relations of the propositions about the Indians. Also, after 1831 it begins to arrive at the Province news that in the past year, as a consequence of an action made by the General Council, the Parliament had approved a law that ended the Milícia de Ligeiros, which was the main form of recruiting Indians for compulsory labors in Pará.

The importance in Grão-Pará of the definition of an Indigenist policy In Grão-Pará of the nineteenth there was not a way to undervalue the problem of the Indians and, as we see bellow, the definition of a policy concerning these people became more and more urgent. There were many reasons to this. First it was a very expressive contingent of the population of the villages, towns and the city of Belém. In fact, almost the totality of the villages and towns that existed in Pará in the nineteenth had been created during the government of Pombal from the Jesuit Missions or some other Order that previously existed.20 So, a good portion of the people of Pará were composed by descendants of those Indians that were reduced by the Jesuits and, after Pombal, became to be known as subjects of the king of Portugal, without any distinction as it was liked to be emphasized in the period.21 Therefore it was a case similar to what has already been reported in Rio Grande do Norte: even if the Indians that lived in the forest were an important matter in Pará, mainly because of the wish to resume the slave raids, the core of the question was about individuals who had their relatives living with dozens of different ethnic groups in the same space

19MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da

Balança: o papel do parlamento brasileiro nos desdobramentos do golpe de 1831 no Grão-Pará. Revista de História, São Paulo, n.164, 2011.

20BAENA, Antonio Ladislau Monteiro. Ensaio

Corográfico sobre a província do Pará. Brasília: Edições do Senado Federal, 2004; ALENCASTRO, Luis Felipe de. O Trato dos Viventes: formação do Brasil no Atlântico Sul. São Paulo: Cia das Letras, 2000. p.142-143.

21DOMINGUES, Angela. Quando os índios eram

vassalos: colonização e relações de poder no norte do Brasil na segunda metade do século XVIII. Lisboa: Comissão Nacional para as comemorações dos descobrimentos portugueses, 2000. p.37-41.

Page 7: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

415Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

for decades and, after Pombal, not only living with the white men but also having their miscegenation encouraged.22

In the nineteenth, it was recurrent to call these people tapuios, a word also used by them to refer to themselves, as it was shown in some documents. In documents of the period there are denominations as “índios avilados” or “christian Indians” what, in general, refer to the same iden-tify logic.23 Bessa Freire has pointed that the level of language proficiency of Portuguese or the general language also determined different ways of naming these individuals, as meek Indians, tapuios or civilized Indians.24 In the records of the period that were investigated, the pure and simple classification of “Indians” and, furthermore, the mention of specific ethnic groups are restricted to the Indians that inhabited the forests.

There is a debate about the use of terms such as “tapuios”, rethought by José Veríssimo and spread by Moreira Neto, it does not simplify a mul-tifold reality or ignore the capability of the Indians of reformulating their own identities, even in the midst of a process that pretend to thwart their ethnic identities.25 Despite recognizing that this is a relevant debate, this is not the point of this article. On the contrary, what matters here is to highlight the persistence of terms that were used to identify these people as Indians, even if some had great levels of incorporation to the culture of the white men. As it is known by the historiography and by documental records, since Pombal there were tapuios performing relevant political roles such as councilman and assuming different positions in the troops progres-sively, even as officers.26 In the lists of culprits from the Cabanagem, men identified with the term tapuio appear with the most divergent occupa-tions, even as merchants.27 Once more, we insist that what is important here is to highlight that, even in such situations, these men still had their Indian identity marked as a distinct trace from the rest of the population.

What explains this persistence? Maria Regina Celestino de Almeida, analyzing the villages in Rio de Janeiro until the nineteenth century, makes a rich demonstration of how the Indians from these places have been reformulating their own identities since the sixteenth. Despite the differ-ences in context, that analysis is significant to this discussion, because it is also composed by Indians who interact with white men and share the same space with different ethnic groups since long ago. Almeida empha-sizes that the reformulation of their identities no longer have the way to save strict correspondence with the specific ethnic origins of each group, but the condition of Indian is claimed by the very individuals. Among other reasons, the Indian origin was a way to secure collective rights of these people, especially the land.28

In the tricky debate about the identity of the “índios avilados” of Pará in the nineteenth, this is a question that must be thought about and investigated. On the other side, it seems undeniable that the permanence of this distinctive trait, so marked in the relationship of these individu-als with the State, was linked to questions about the control of their manpower. This because although was said that the Indians after Pombal were subjects to the king of Portugal without any distinction, in fact it was applied to these men the so called provisions against the idleness: in general, right after the affirmation of the liberty of the Indians during the Pombal Government, the Directory disciplined this manpower. The Indians now inhabitants of the villages and towns of the Captaincy could practice relevant public roles, had their marriage with white men encouraged, but

22PORRO, Antonio. História indígena do alto e

médio amazonas. Séculos XVI e XVIII. In: CUNHA, Manuela Carneiro da. História dos Índios no Brasil. São Paulo: Cia das letras, 1992.

23SILVA, Ignácio Accioli de Cerqueira e.

Corografia Paraense ou descrição física, histórica e política da província do Grão-Pará. Salvador: Typografia do Diário, 1833; BAENA, Antonio Ladislau Monteiro. Representação ao Conselho Geral da Província do Pará sobre a especial necessidade de um novo regulamento promotor da civilização dos índios da mesma província. Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará. Tomo II. Belém: Imprensa Oficial, 1902.

24FREIRE, José Ribamar Bessa. Rio Babel: a história

das línguas na Amazônia. Rio de Janeiro: EDERJ, 2004. p.181.

25VERÍSSIMO, José. As populações indígenas e

mestiças da Amazônia, sua linguagem, suas crenças e costumes. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, n.50, tomo 1, p.295-390, 1887. It is needed to highlight that Veríssimo saw the taupio as a specific population from Pará, but relied in one question, above everything else, racial and not historic. The great diffusion of the word nowadays is because, mainly the book of MOREIRA NETO, Carlos de Araujo. Op. Cit. For a critical view of the using of the word tapuio, see among others LIMA, Leandro Mahalem de. Rios Vermelhos: perspectivas e posições de sujeito em torno da noção de cabano na Amazônia em meados do 1835. Thesis (Master’s Degree in History). 2008. 288 fls. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. In a recent work, Mark Harris has pointed too what he considers to be the limits of the usage of the word tapuio, even if highlighting that it was of common use in the documents of the period. For Harris, the distinctions in this territory in the Nineteenth century were not marked by the fixation of the races, for the surprising of the travelers that saw the classifications as white and Indians to be used with very fluid criteria and that depended of the very social condition of the individuals. In this sense, for example, he points that an Indian with proprieties and powers could be seen by his similar as a white man. However I believe this fluidity pointed by Harris, even if true in many situations find its limits precisely in the laws that organized the work. In the read documents, some of them noted forward, the racial distinction and especially the identification as Indian is a crucial element. On the other hand it is important to highlight that for Harris the ethnical distinctions of the Indians that lived among the white men could be an important element until the end of the Eighteenth Century, but is no longer during the Nineteenth. Among other thing, remembers an episode of Spix and Martius in the region of the Tapajós wherein when asking the Indian about his origin tribe this could not answer. See HARRIS, Mark. Rebellion on the Amazon: the Cabanagem, Race, and popular culture in the North of Brazil, 1798-1840. New York: Cambridge University Press, 2010. p.40-49.

Page 8: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

416Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

still remained under tutelage of directors who had among their mainly attributions to ensure the division of this Manpower between the private, ensuring at the same time the salaried employment of these men.29 We see that even with the intentions of Pombal to make the African slaves the main group of laborers in the State of Grão-Pará and Maranhão, ensuring the offering of Amerindians manpower in the region still had been central for the Empire of Portugal in this part of America.

This would be of great importance because if it is undeniable that Pombal brought African slaves to Grão-Pará in such great numbers than had been until then, it is also true that in this Captaincy the reforms from the middle of the Eighteenth did not had the same success as they had in Maranhão. For as much as in the last the success of the agricultural initia-tives encouraged by the Monopolist Company, mainly cotton, secured the increase in wealth and the continuous entry of African slaves, in Pará this increment did not reversed the profile of the local manpower: the impor-tance of the African slaves had rose sharply, but the main laborers of the territory of Pará were still Indians, especially those who lived between the white men and could be distributed by the authorities.30

Following this train of thought it is of great importance that the un-derstanding of the legislation of 1798 that put an end to the Directory in Pará also had emerged from the supposedly natural tendency of these men for idleness to create laws that forced them to compulsory labor on public and private works. In other words, even after the changes caused by the law of 1798 related to the Directory, the logic that assured the access to this enormous manpower remained. All these Indians started to be listed by military officers and submitted to the organization of the so called Milícias de Ligeiros, the main apparatus for recruitment for the compulsory labor of the tapuios. By the law, any of these individuals that had no means to prove a fixed occupation could be recruited to take part in public or private works. We highlight that even if they were paid for the work – though, sometimes, with years of delay for the payment – it was not given to them the opportunity to refuse to fulfill the demanded tasks.31

Although they kept the access to this manpower, the law of 1798 had created restrictions that, as we will see in the text, always appeared as tension points regarding those who wanted more freedom in the recruit-ment of the Indian laborers. Not by chance, propositions to end the restric-tions created by the law of 1798 appear, frequently, as central points in the changes that were intended to be implemented through the projects of Indigenist policies formulated in the province. One of these restrictions is the prohibition of the old slave raids of Indians from the forest, even if the law assured that, under the authorization of the orphan judges, the residents could, by many years, keep as salaried workers in their proprieties Indians that supposedly had left their tribes of their own volition to live with the white men.32 Other point of continuous conflicts after 1798 is regarded to the end of the tutelage of Indians, a power that in the previ-ous law was exerted by the old Directors. Since very soon and with great recurrence during the Nineteenth, part of the males of the province were assigned by the authorities and by owners for this purpose, under the point that the end of the tutelage had permitted the emptying of the villages because of the continuous abandon by the tapuios. To have an idea about the tension around the right of free transit of these Indians it is exemplar an episode written by Patrícia Sampaio: in the village of Meglaço, in 1799,

26MACHADO, André Roberto de A. A quebra

da mola real das sociedades: a crise política do Antigo Regime Português na Província do Grão-Pará (1821-25). São Paulo: Hucitec : FAPESP, 2010; CLEARY, David. Lost Altogether to the Civilised World: race and Cabanagem in Northern Brazil, 1750-1850. Comparative Studies in Society and History, 1998. NOGUEIRA, Shirley M. S. “A soldadesca desenfreada”: politização militar no Grão-Pará na Era da Independência (1790-1850). Dissertation (Doctorate in History). 2009. 341 fls. Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009. In fact, Pombal cared to create a kind of Indian elite, distributing a number of privileges especially to the leaders of these people, named Principais. About his, see among others SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Espelhos Partidos: etnia, legislação e desigualdade na colônia, Sertões do Pará, 1755-1823. Dissertation (Doctorate in History). 2001. 331 fls. Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2001; DOMINGUES, Angela. Op. Cit.; ROCHA, Rafael Ale. Os Oficiais índios na Amazônia Pombalina: Sociedade, Hierarquia e Resistência (1751-1798). Dissertação (Mestrado em História). 146 fls. Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009.

27Document from Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro. Rio de Janeiro, Brasil. lata 290, pasta 3.

28ALMEIDA, Maria Regina Celestino de.

Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2001.

29Diretório que se deve observar nas povoações dos

índios do Pará e Maranhão enquanto sua majestade não mandar o contrário. Lisboa: Oficina de Miguel Rodrigues, 1758. IN: MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Índios da Amazônia: de maioria a minoria (1750-1850). Petrópolis: Vozes, 1988. About the Directory see SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Espelhos Partidos. Op. Cit.; DOMINGUES, Angela. Op. Cit.; COELHO, Mauro Cezar. Do sertão para o mar - um estudo sobre a experiência portuguesa na América, a partir da colônia: o caso do diretório dos índios (1751-1798). Dissertation (Doctorate in History). 2006, 433 fls. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.

30About the entrance of the African slaves in Pará

see BEZERRA NETO, José Maia. Escravidão Negra no Grão Pará (séculos XVIII-XIX). Belém: Paka-tatu, s.d; SALLES, Vicente. O Negro no Pará, sob o Regime da Escravidão. Belém: UFPA, 1971; DIAS, Manuel Nunes. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão (1755-1778). São Paulo: Coleção da Revista de História, 1971. For a comparision between the impact of the Pombal’s reforms and the entrance of African slaves see MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit.

31About the law of 1798, look for SAMPAIO,

Patrícia Maria de Melo. Espelhos Partidos. Op. Cit. Em um artigo, Patrícia Sampaio even stats that the law of passed to tolerate that entrance not exclusively of Indians, but also blacks and whites at the Milícia de Ligeiros that could not

Page 9: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

417Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

a military officer asked the permission of the Governor to take three Indian women - two spinners and one master of the loom factory – because these had abandoned the village that in turn not intended to stay without the skilled work of these women. The attitude to treat the displacement of these Indians – it is worth mentioning that they were free people – as a crime of desertion was common to the point where the Governor have to manifest himself, even in 1799, remembering that the end of the Directory assured free transit to these individuals as to any subject of the King.33

Anyway, looks clear that the conditions of free people of the tapuios were always called into question.

At the beginning of the decade of 1820 this image still had been in its own general lines. The contemporary chronicles and the travelers’ report registered the omnipresence of the Indians in almost any of the province activities. They were occupying functions reserved to the African slaves in other parts of Brazil, but were in army positions too, from the most low-ranking to a high ranking.34 At the decade of 1830, a report by Viscount of Goiania gives us an understanding of the importance of this manpower in the province. In a long text where Goiania pretended to give its own version about the coup d’état that deposed the president of the province – this episode will be explained in details later – said that in front of the increasing of the conflicts and the opposition to his administration, it were suggested to him a cunning trick to recover the order: to disseminate the fear of a riot of the African slaves, something that Goiania ironized writing that this method were the most used in the period to intimidate the people and regulate the mood. More important, however, it is the consideration for this manpower in the province, regarding the Indians:

In Pará, almost every servant people are caboclo. And if there were African slaves of any kind, not a single problem they would give me because the experience had showed me that it is in those cases that Brazilian and Portuguese hold hands and even the mulatos make union against the blacks. So from this boogey I do not fear.35

From the context of the document, the caboclo people that Goiania is referring to are the Indians that lived between the white men and that were enlisted in the Milícia de Ligeiros. The enormous dependence of this manpower caused it to be in the center of the political life of the province too. It is exactly this that is stated in the beginning of the decade of 1820, during the debates around the Vintismo and Independence.

As said previously, on the contrary to what happened at Cádiz, in the Courts of Lisbon no nominal policies intent to the Indians had been estab-lished, be those who were in contact with the Portuguese civilization, those who already lived in the villages, towns and city of Belém. Yet, the tapuios started to reclaim to themselves guarantees and rights approved at the Courts of Lisbon, in a logic that made their past condition of vassals from the King of Portugal to turn into citizenship.36 Among the questions discussed in this article, the problem that was shown in this situation is that the claim of these rights often implied in an attempt of these groups to raze the mecha-nisms that assured the exploration of their compulsory labor.

An example of such thing is the execution of a law approved by the Courts of Lisbon that, under the argument of pretending to encour-age the agriculture, forbid the recruitment for the Militias. The law was published in May, 1822 in the first issue of the journal O Paraense, the first newspaper of the province, which certainly contributed to its knowing.37

prove a stable work. However, in every document read until today by this scholar referring to the Nineteenth there are no evidences of the participation of other groups in the Milícias de Ligeiros that were not Indians. About this see SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Vossa Excelência mandará o que for servido”...: políticas indígenas e indigenistas na Amazônia Portuguesa do final do século XVIII. Revista Tempo, Niterói, n.23, 2007. About the law of 1798, look for MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit. too.

32The understanding by Maria Regina Celestino

de Almeida is that this gap permitted, indeed, private slave raids, supposing that this served the privates much more. The truth is that the law was very critical to the slave raids and this gap seem not be able to end with the obstacles for the obtainment of Indian manpower, given the recurrence that is requested the return of the raids. ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios na história do Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010. p.141-150. However, it is necessary to acknowledge that even today it is not possible to calculate the number of Indians that were inside the properties in this condition or that were simply enslaved during the Nineteenth century.

33SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Vossa

Excelência mandará o que for servido”. Op. Cit., p.48 e p.53.

34SPIX, Johann Baptist von; MARTIUS, Carl

Friedrich Philipp. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. Belo Horizonte / São Paulo: Itatiaia : Edusp, 1981; SILVA, Ignácio Accioli de Cerqueira e. Op. Cit.

35Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ9

– 108 – Ministério do Reino e Império. Pará, Correspondência do Presidente da Província (1829-31), doc. 313.

36For Raquel Santos the crescent insubordination

of the tapuios was also because of the fact that these had acquired knowledge, even if partial, about the debates in Cádiz referring to the Indians. SANTOS, Raquel Dani Sobral. Op. Cit.

37Arquivo Histórico Ultramarino. Lisboa, Portugal.

ACL, CU 013, Caixa 155, doc. 11.875 (Projeto Resgate). Edição n. 01, de 22 de maio de 1822. Sobre O Paraense, a melhor análise é de COELHO, Geraldo Mártires. Anarquistas, Demagogos e Dissidentes: a imprensa liberal no Pará de 1822. Belém: CEJUP, 1993.

Page 10: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

418Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

Just under two months later, José Maria de Moura, Arms Governor of the Province wrote to Lisbon saying that he would not abide by the law. In the letter he exposed in details the situation above: he said that the majority of the population of Pará was composed by Indians and those, under the law of 1798, were subdued to the military power So, following the descrip-tion made by the Arms Governor, the Indians that were not recruited to frontline troops where engaged into Militias, especially in the Milícia de Ligeiros, which was responsible to regulate the compulsory work of such individuals at all activities of the province. Despite the caution to not confront the power in Lisbon, Moura has been adamant: in his vision the enforcement of the law in Pará was impossible because the Indians would not work if they were not forced to do so as they were from the recruit-ment to the Milícia de Ligeiros. It is mostly here that Moura shows the stalemate about this new politic moment: according to the Governor, the Indians were refusing the recruiting, claiming for them the right created by the law of the Courts of discharge from the Militia, which placed the authorities in a dilemma.38

This was far from being the sole episode of this type. In 1823, the Judge Ordinary from the Vila Nova de El-Rei complained that he could not gather the number of militia that was required because the Indians were threatening him under the allegation that the Courts did not permit-ted any more arrest warrants without conviction of guilt and the practice until then was to keep these men in jail or trunks till they got to the right number of required laborers.39 Similarly, during the Vintismo and after the Independence it is possible to verify protests against civil servants respon-sible for the forced recruitment of tapuios, trying to link such practice as acts of despotism that the Constitutionalism has come to overthrown.40

As demonstrated in previous works, with the Independence the situa-tion worsened. For those who wanted to keep the control of this manpower the end of the relationship with the Courts of Lisbon had put an end to the legal questions that gave base to the refusals of recruitment written above. For the tapuios, however, the rupture with Lisbon was a movement such as or even more radical than the Vintismo. Even if the war that followed the years of 1823 and 1825 in many parts of the province is complex, it seems clear that the clashes about the keeping of the compulsory work of the tapuios was a central point, particularly powered by the fact that many of these individuals were armed with weapons.41

In recent researches it became possible to show that the mechanisms of exploration of manpower from the tapuios in Pará continued to be the same of the law of 1798 at least until 1831. Yet it seems undeniable that the questioning of this law during the Vintismo and the Independence weakened its legitimacy. Because of this the definition of an Indigenist policy linked with the new political system was vital in the Pará province. Certainly it is not by chance that, as we will see, that this is the theme that most deserved proposition of projects in General Council of the Prov-ince. In addition to give more legitimacy to the mechanisms of usage of these laborers, it is necessary to highlight that there were pressures in the interior of the province to modify the devices that had been determined by the law of 1798 too and those that were considered obstacles by the proprietors and public servants responsible for the recruitment. Certainly this is one of the impulses that also makes other projects intended for the Indians to be formulated in the province before and after the operation of

38Arquivo Histórico Ultramarino. Lisboa, Portugal.

ACL, CU 013, Caixa 155, doc. 11.874 (Projeto Resgate), 06 de julho de 1822.

39Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

748, doc. 33.

40Maybe the most remarkable example is the

dismissal of the Arsenal Intendant João Martins. Ver Arquivo Histórico Ultramarino. Lisboa, Portugal. ACL, CU 013, cx. 151, docs. 11.654 e 11.644.

41For a long analysis about this conflics and the

bond with the compulsory work of the tapuios, see MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit.

Page 11: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

419Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

the General Council, and that invariably they try to revert the restrictions to the slave raids and the end of the tutelage, the latter identified as the responsible device from 1798 for the right of free transit of the Indians and the consequent desertion of the villages.

These two questions are in the center, for example, of the already cited project sent by Zany to the Courts of Lisbon. With the main focus the Rio Negro, Zany complained about the restrictions of the slave raids, remembering that existed in that territory few white men and very few African slaves, on the other hand there were 26 Indian nations that re-mained untouched under the protection of Portuguese determinations. On the other side, it exposed as well how a problem that he called absolute freedom of the Indians that made them leave their villages and lost them-selves to the “catholic church, the State and the private sector”. From his complaints and suggestions, the Comissão de Ultramar das Cortes de Lisboa ordered to print a project of 20 articles that included the claims made by Zany. In a train of thought very closer to the Directory, he instructs the cre-ation of a general inspector for the Indians of the province and delegates in the villages. Regarding the forest Indians, the project not only foresaw the continuity of the slave raids, but also defined that the chosen Inspec-tor should bear the costs of such activity. Once captured, these Indians would be divided between the privates that could employ them as labor-ers for six years, been the tapuios included among those who could have them. Regarding the “índios avilados”, the proposed structure remembers the Directory too: it would be up to the inspectors to distribute the Indians to the various types of work and ensure their payment. More than that, according to the project the tapuios lost their free transit, not being able to leave their villages without the consent of the inspectors and delegates, these two being responsible to search for the whereabouts of the first when they were not at their original villages or at the employments that they were designed to.42

After the Independence, in 1825, again came from this region a new plan of civilization for the Indians, this time elaborated by the second lieutenant Antonio Joaquim de Bitencourt e Sá and sent to the Court.43 In general lines it is almost a repetition of the same motto that had been defended a few years ago by Zany. It begins praising the resources of the region and then gets to the point of telling that the existence of Indians at the forest prevented the exploration of all this potential because they even attacked the ships. To solve this problem Bitencourt e Sá had only one solution: resume the slave raids. In his words: “the civilization of these Indians is of great concern for the Nation it not just tends to remove the obstacles mentioned but it will increase the national wealth with such thousands arm useless tot themselves and the State”.44

If there is an agrarian interest, clearly he is secondary in the pro-posal, because there is not only one line referring to what they would do with the lands after the removal of the Indians. On the contrary, the core of the discussion is about the Indians and more specifically in the control-ling of the manpower. This way, Bitencourt e Sá asks to be the performer of this plan, compromising to finance the slave raids, something that once more remembers the plan of Zany. However, on the contrary of the previ-ous project, the lieutenant makes clear that the raids would be realized by force, if necessary, a resort expressly banned by the Courts of Lisbon. About the fate of the Indians that lived in the villages and those who would be

42See ZANY, Francisco José Ricardo. Projeto para

os índios do Grão-Pará. IN: Diário das Cortes, 1821/1822. Sessão de 26 de Agosto de 1822. Available at: <http://debates.parlamento.pt>. Accessed in: March, 01 2014. It is not totally clear in the Diaries of the Courts if the topics of the project were originally written completely by Zany, if they were only modified by the Overseas Committee or if they were fully written by the later after the complains and suggestions sent by Zany.

43I thank my advisee Samuel Rocha Ferreira for

locating this document.

44Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

855, doc. 45.

Page 12: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

420Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

incorporated Bitencourt e Sá is economic but revealing: said that in those situations it would be followed the laws of the Directory. Once more it became explicit the critic of the law of 1798.

Other important thing to realize in both projects of Zany and Biten-court e Sá is that the themes of the slave raids have a greater feature than those that would be elaborated by the General Council of the province, far more focused in issues related to discipline and regulate the manpower of the “índios avilados”. Maybe an explanation of this is just in the expo-sure of the Project by Bitencourt e Sá: according to him, historically the Indian slaves would not remain in their home area, they would be brought to Belém and from there distributed as expense to regions such as Rio Negro.45 As so looks like that in this question the situation in the center of province was different from the countryside, wherein the last there was the need to restore the manpower in addition to discipline it.

As we know, like the projects of an Indigenist policy developed by the General Council of the Pará province where never executed46, the proposals made by Zany and Bitencourt de Sá had no success too. Yet, it would be in the range of the province that an Imperial Law would finally regulate the control of the manpower of the Indians from Pará. As the second law made at the Provincial Assembly it was created in 1838 the Corpo de Trabalha-dores. In the middle of the Cabanagem, the Corpo de Trabalhadores assured that every free man from Pará that have not a known profession, excluding the white men, could be forced to work either to private works or public works47 Here we have three points to highlight: First the evidence that his was a matter of urgency in Pará to the point of being the second Law sta-blished by the Provincial Assembly. In the second place, the racial excep-tion, as the White men are the only that could not be forced to work. In third place, even if not identified as an Indigenist policy, on the contrary of the Project made by Zany, Bitencourt and those elaborated at the General Council of the province that were always addressed as plans of civiliza-tion, the great impact of the act was in discipline the labor of the tapuios including for their demographic dimension, even if the law permitted the compulsory work of the black slaves and freed mestiços. In fact, now under the legitimacy of a law promulgated by the Empire, the apparatus of the Corpo de Trabalhadores resumed in wide range the organization of the Milícias de Ligeiros that, as we will see, had been extinct by the Parliament in 1831. One of the questions that reinforced such impression is that the law assured that the commanders and officers responsible for the Corpo de Trabalhadores would be the ones that exercised this function in the extinct Milícia de Ligeiros. It would be up to these individuals the distribution of the manpower to the public and private works. Other question is that the new law praised critics of the law from 1798: it was assured that the men listed in the Corpo de Trabalhadores could not leave their villages without the permission of the officers. In other words, the tapuios and the others under this regime, even if freed, no longer had the freedom of transit.48

After the reflection made above, it seems clear that the definition of an Indigenist policy in Pará was something important in the province, even raising local propositions for the theme before and after the existence of the General Council of the Province and always centered into a common aspect: the preoccupation to regulate the labor of the Indians. A partir da reflexão acima, parece evidente que a definição de uma política indigenista no Pará era algo importante na província, inclusive suscitando propos-

45Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Loc. Cit.

46At least not in its original content.

47Arquivo do Instituto Histórico e Geográfico do

Pará. Belém, Brasil. Lata 415, pasta 8. Collecção das leis provinciaes do Pará promulgadas na primeira secção que teve principio no dia 2 de março e findou no dia 15 de maio de 1838 e vão numeradas de 1 a 13. Pará: Tipografia Restaurada, 1838.

48About the Corpo de Trabalhadores see FULLER,

Claudia Maria. Os Corpos de Trabalhadores: política de controle social no Grão-Pará. Revista de Estudos Amazônicos, Belém, v.III, n.01, p.93-115, 2008; MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Op. Cit.; MACHADO, André Roberto de A. O direito e o arbítrio em tempos de Guerra: os debates no Parlamento em torno das garantias constitucionais durante a repressão à Cabanagem (1835-40). IN: NEVES, Lúcia Maria Bastos P.; BESSONE, Tânia Maria (org.). Dimensões Políticas do Império do Brasil. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012.

Page 13: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

421Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

tas locais para o tema antes e depois da existência do Conselho Geral de Província e sempre centradas em um aspecto comum: a preocupação em regular o trabalho dos indígenas. Bellow we will see how the Council sent and expressed this local request.

The Councelors and the dynamic of the General Council of the Pará Province The institution of the General Council had been one of the most important achievements of the political groups that defended more freedom to the government of the provinces during the first years of the Empire of Brazil. The existence of this Council was expected in the Constitutional Chart of 1824 and, as we will see, it became to provide in that year the election of those offices, even in Pará, together with the choosing of deputies and senators and members of the Presidential Council.49

Yet, the operation of this institution only began after 1828 since it depended from a regulation of the Parliament that took two years of intense clashes between the Senate and the Chamber about the details of the Project. In this sense, it is exemplary that at the final stage of the negotiations the regulation had stopped between the desire of the Cham-ber to give the counselors the immunity to make critical issues and the solid decision of the Senate not to accept such formulation. This debate, somehow, synthesized the positions between those who desired to increase counselors’ powers front to other provincial authorities, such as the presi-dent and those who rejected that referral. Andréa Slemian shows that the urgency of the majority of the deputies to make work the General Councils of the provinces was crucial for the Chamber to leave the clashing against the Senate and temporarily give up about the immunity of the counselors.50

It was not by mere chance that the majority of the deputies ac-cepted the retreat. The creation of the General Councils of the Province was an important segment for the action of the political group that was consecrated in the historiography as “liberals” and identifying them as the protagonists of the efforts to decentralize the political and administrative decisions of the Empire.51 In less than a decade of the beginning of the legislative works, in 1826, are created institutions pointed towards this new direction such as the Judges of Peace, the National Guard and pos-teriorly the very Provincial Assemblies that would substitute the General Councils after the constitutional reform.52 Particularly, the creation of the General Councils was urgent in the context that initiated the political life of the Empire, when the provinces had few mechanisms to refer and to manage their requests. The high grade of centralization of the decisions becomes clear at the minutes of the Parliament. During the first parliament term, between 1826 and 1829, many deputies devoted their mandates to make requests restricted to the everyday of their own provinces, such as the simple request to make a contract for a teacher to a school located in the countryside, the construction of a road, a bridge or even the request for ground to build a Seminar. It was precisely a deputy from Pará, named João Cândido de Deus e Silva, which is maybe the most perfect example of such profile: in his first two months of mandate he formalized twenty-five projects of such type.53. Obviously, demands of such nature that frequently were presented directly to the plenary without having to go through any commission that fell into abyss. As said countless times, especially at the Chamber there was no condition for the parliamentarians to begin a discussion about the requests that were little known and that were

49The minutes of Pará made clear that the

electoral instructions of 1824 were followed rigorously. For this instructions, see the Edict of March 26, 1824 – Orders to proceed with the election of the Deputies and Senators of the Legislative General Meeting and the members of the General Councils of Provinces. IN: SOUZA, Francisco Belisário Soares de. O Sistema Eleitoral no Império. Brasília: Senado Federal, 1979.

50SLEMIAN, Andréa. Sob o Império das leis:

constituição e unidade nacional na formação do Brasil (1822-1834). São Paulo: Hucitec : FAPESP, 2009. p.148-159.

51Sérgio Buarque de Holanda makes an important

safeguard when showing that the automatic linking between Liberalism and the decentralizing pretension, even if consecrated in our history, was not common sense among the men of the period. HOLANDA, Sérgio Buarque de. A Herança colonial – sua desagregação. IN: ______. (org). História Geral da Civilização Brasileira. Tomo II – O Brasil Monárquico. Volume 1 – O processo de emancipação. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p.15-20.

52About the period and this reforms, see among

others FLORY, Thomas. El juez de paz y el jurado en el Brasil Imperial: control social y estabilidad política en el nuevo estado. México: Fondo de Cultura Económica, 1986. cap.1; de SLEMIAN, Andréa. Op. Cit.; e de DOLHNIKOFF, Miriam. Op. Cit.

53MACHADO, André Roberto de A. Machado. As

“reformas em sentido federal”. A atuação dos representantes do Grão-Pará no Parlamento e as expectativas na província em torno do Ato Adicional. Revista Estudos Amazônicos, Belém, v.4, n. 01, p.57-58, 2009.

Page 14: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

422Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

positioned, in general, without taking into account the funding sources to execute them.

With its creation at 1828, the General Council could suggest political measures of specific interest to their provinces, but the transformation of such proposition into law still was conditioned by its approval at the Par-liament. It is necessary to emphasize that this political body did not have any tax authority too, being the provincial budgets still conditioned by Deputies and Senators.54 Despise these limits the General Council seemed a great change, because the requests of the province would be referred after a local debate and the obtainment of minimal agreement capable to approve it in this forum. After reading the regulation of the General Council and even the minutes of this institution at Pará it becomes clear that its operation was thought so it would largely replicate the Parliament, with a series of rites that pretended to mark its own dignity and power55 As it had a throne speech in the beginning of the legislative works at the Court, in the province the President too directed communications to the General Council, pointing priorities that claimed his attention. And as at the Parliament, the counselors directed a response that in some occasions could express disagreements or censorships to the Executive Branch. The organization of the works, debates and voting, in addition to the complete Independence of management regarding the Executive Branch, everything remembered the work of the Deputies and Senators.

Despite the enthusiasm born from the creation of the General Council, soon they realized its limitations. As said before, even after being approved in the voting, the proposal of the counselors had to be sent to the Parliament and only if confirmed in this last instance it would have any practical value. As we can imagine, this was a long and hard road, since the proposals had beginning to come in dozens, from all provinces. To have an idea, in the middle of 1833 there already were counted more than 200 proposals that came from the Province Councils that still awaited comment of the Parliament, some of those still were in the drawers of the Chamber and Senate over four years.56 Once more, the case of Pará is exemplar: until 1834 when the Constitutional reform extinguished the General Councils in favor of the Province Assemblies, only one proposition managed to go through the Chamber and the Senate and in the end be ap-proved and became law.57

Front to the impossibility to answer the requests of the provinces, they made various reform proposals. In 1832, for example, the senator José de Alencar suggested that the propositions made by the General Council that could get an approval rate of two-thirds from their Coun-selors would be automatically valid, plus the same percentage of the members from the Presidential Council and a sanction from the very president. Although being a process difficult as well, the proposal has been considered absurd by the Viscount of Cairu who claimed that the Central Government would be blind. This made clear the open resistance from part of the Parliament to give up the absolute control of the final decision about the requests of the province.58

As result, logically, the frustrations increased. Realizing that a resolu-tion send by the General Council of Maranhão, rather than being approved had its reading delayed until the arrival of various information demanded by the Senate, the Viscount of Alcantara, a Senator from that State, mani-fested himself severely: with no mince words, he said that the projects sent

54SLEMIAN, Andréa. Op. Cit., p.145-200;

DOLHNIKOFF, Miriam. Op. Cit., p.59-60.

55Law of August 27, 1828. Gives regiment for the

General Councils of Province. IN: Coleção das Leis do Império do Brasil. 1828, parte primeira. Rio de Janeiro: Tipografia Nacional, 1879. p.10-23.

56ANAIS do Parlamento Brasileiro. Câmara dos sr.

deputados, em 4 de junho de 1833. Available at: <http://imagem.camara.gov.br/pesquisa_diario_basica.asp>. Accessed in: March, 01 2014.

57ANAIS do Senado do Império do Brasil. Em 11

e 27 de outubro de 1830. Available at: <http://www.senado.gov.br/publicacoes/anais/asp/IP_AnaisImperio.asp>. Accessed in: March, 01 2014. The law aproved determined that the Foreigner had a deadline to present themselves before the Judge of Peace and register their presence in the province. The same way, to retire from the Province they also needed an authorization.

58ANAIS do Senado do Império do Brasil. Em 23 de

maio de 1832.

Page 15: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

423Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

were treated differently according to the province that they originated, to the point of claiming that already had seen true absurdities. Two weeks later he was clearer: to him the provinces of the north were being harmed by that game.59

Regarding some provinces having privileges or not during the pro-cessing of their proposals, the fact is that despite the rule for the creation of these Councils being uniform for all the Empire, there were differences between them that affected directly their prestige, influence and even the nature of their proposals. The first who draws much attention is that the proximity of the Council regarding the Court could be decisive to its com-position or to improve its reception between the deputies and senators. In São Paulo, as example, one of the most active counselors was Father Feijó, who at the same time was one of the top parliamentarians of the period.60 Meanwhile, Bernardo Pereira de Vasconcelos not only had his influences inside the chamber but was also engaged in matters and positions in Minas Gerais. The consequence of this was his proximity with themes discussed in the General Council of his province, something that even earned him the unbiased defense to propositions made front to the critics made by Parlia-mentarians.61 This was possible in some places near the Court, such as São Paulo or Minas Gerais, because the period of the reunion of the General Councils, between November’s end and the January, was done during the recess of the Parliamentarian term. On the contrary, the long time wasted to travel between the Court and Belém itself prevented the participation as a Counselor to any representative of Pará or even to monitor closely the developed discussions. Consequently, in the analyzed meetings, the Coun-selors were all prominent figures of the local policy, but none arrived in the Court stage. Similarly, was not among the Counselors the Bishop Romualdo Coelho, a man that still had great influence or holders of the presidency of the province during the Empire, such as Araújo Rozo inhabitant of Pará, who was still active.

Maybe the absence of politicians with more transit inside the Court had eased the focus of the Council to be tied with the province if compared to the situations of Minas Gerais or São Paulo. Between the proposals that came from Minas Gerais, for example, the first of them lectured about the necessity to delay the deadline for the slave trade, a matter clearly out of the discussion of the General Councils.62 As for São Paulo, Marisa Leme shows that there was a continuous attempt to intervene in matters of national poli-cy, with pronouncements about general questions and actions of the parties inside the Court.63 Differently there was a caution from the Pará Counselors to focus at local questions, only reporting to the national policy in specific matters, generally linked to provincial subjects.

For the General Councils of more populated provinces such as Pará, there should be elected 21 Counselors. The elections to the Council hap-pened simultaneously with the elections to Deputies and Senators and with the same procedures, obeying this order and producing to the voter a list with each one of the roles. Pará was divided into 10 electoral zones: the city of Belém and the towns of Bragança, Viçosa, Santarém, Barcelos, Marajó, Nova da Rainha, Crato, Olivença and Cametá. Each one of these zones should send their lists with the voted names for Counselors to the Chamber of Belém, where the last sum of the votes and the indication of the chosen were finally made.64

After the research in many archives it was possible to find a piece of

59Ibidem, em 17 e 31 de maio de 1833.

60LEME, Marisa Saenz. Dinâmicas centrípetas e

centrífugas na formação do Estado monárquico no Brasil: o papel do Conselho Geral da Província de São Paulo. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.28, n.55, jun 2008.

61ANAIS do Parlamento Brasileiro. Em 25 de abril

de 1829.

62ANAIS do Parlamento Brasileiro. Loc. Cit.

63LEME, Marisa Saenz. Op. Cit.

64Edict of March 24, 1824 – Orders to proceed

with the election of the Deputies and Senators of the Legislative General Meeting and the members of the General Councils of Provinces. IN: SOUZA, Francisco Belisário Soares de. O Sistema Eleitoral no Império. Brasília: Senado Federal, 1979.

Page 16: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

424Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

those lists of the electoral zones from Pará in the National Archives, both for the years of 1824 and 1828. Sadly, for example, it was not possible to locate the general minute with the total votes of the Counselors, which would permit us to know who the most voted were. The minutes between 1829 and 1831 only identify those who took by the time they joined the Council, which was possible to fix 20 names, including the surrogates that exercised the role. It is also to be regretted the absence of such lists of important places, like Belém. The amount of information at the lists varies widely, with some describing only the names and the votes while others add the occupations and the residence locations. Even if relying only on partial data it is possible to take some important notes, such as the dif-ferences about the profiles of the voted in 1824 – that did not took office because of the lack of regulation of the Councils – and the counselors chosen in 1828 that will be the characters of this article.

From 1824 were located five electoral minutes: from the villages of Vigia, Cametá, Santarém, Macapá and Marajó.65 Considering the 21 most voted names from each list the first thing that draws attention is the great number of military officers that were elected, some of them are officials from the Milícia de Ligeiros. They are 14 officers identified in Vigia, 13 in Cametá, 13 in Santarém, 13 in Macapá and surprising 16 in Marajó. Meanwhile the quantity of people with other occupations such as bach-elors in Law or from the clergy is low on the contrary to what would be in 1828. Moreover, the reflex between the two elections is very different. This is expressed by the low number of voted in 1824 that match to the elected Counselors in 1828. At Vigia, Santarém and Marajó they are only two in each list, at Cametá one and at Macapá none. It also draws atten-tion the fact that it was not mentioned not even a single time characters that would be central in the General Council now studied, such as Batista Campos, by the time a main character in the provincial policy. There are some explanations to this: first, the province lived in 1824 a civil war that certainly contributed to the leading figure of the military.66 Directly linked to that, the election for the General Council of the Province seemed to follow the same tendency that I described for the elections of deputies in Pará: In 1824, in the middle of the repression of the civil war, the cho-sen names had a more conservative character. In 1828 the names chosen for the Parliament are identified more as a liberal stance.67 Apparently this change in character is not so radical in the General Council, but without a doubt it is more plural than during the first election. Other important point to highlight is the great dispersion of the votes: of the 105 names that composed the 21 most voted from each list, around 28 are cited only at one electoral zone. On the contrary, only three names succeed in appear on four different electoral zones. We believe that this is enough to show the nonex-istence of a closed list containing names to be voted and that if there were attempts of the provincial powers to control the plea, the result was fruitless. Other point to highlight is that it doesn’t look like the dispersion of the votes shows the powerful local members because when the list informs the place of residence, it is often distinct from the electoral zones.68

These last aspects are repeated in the elections of 1828. From this plea were located minutes from four electoral zones: Cametá, Porto de Moz, Macapá and Rio Negro. Of the 84 indicated names, 40 are also cited at only one electoral zone. However, only three names appear on three of the four lists. Even if at Macapá and Rio Negro the names identified as

65Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ5

– 18. Ministério do Império. Eleições. Pará. Correspondências (1824-49). Both in 1824 as 1828, the headquarters of the electoral zones were slightly different than those established in the decree of 1824.

66About this, see MACHADO, André Roberto de A.

A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit., cap. 4 e 5.

67About the comparision between this

elections, see MACHADO, André Roberto de A. Redesenhando caminhos: o papel dos representantes do Grão-Pará na primeira legislatura do Império do Brasil (1826-29). Almanack Braziliense, São Paulo, v.10, p.75-97, 2009; MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da Balança. Op. Cit.

68Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ5

– 18. Ministério do Império. Eleições. Pará. Correspondências (1824-49).

Page 17: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

425Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

military officers remain very high, with 16 and 14 respectively, this seems to be an exception. It is so that between the first 21 names indicated from Macapá, only three are among the elected to be part of the General Council, wherein the case of Rio Negro this rate reaches four. It is a very different picture from Cametá, one of the biggest electoral zones of the province. There, in 1828, only one name identified as a military officer is among the most voted, less than the seven clerics and the two individuals classified as “doctorates”. This trait seems to be predominant across the province, because between the 21 most voted names at Cametá, 12 were chosen to be part of the Council. This was also the same number of elected at Porto de Moz between the 21 most voted, zone where the number of military officers was also low.69

Finished the elections in 1828, the job of the General Council of Province began in November 28, 1829. On the first two annual meetings 1829/30 and 1830/31 the chairman was Antonio Correa de Lacerda, a figure until then known for being the president of the Governing Body elected during the Vintismo. It also draws attention the presence of Marco Antonio Rodrigues and Marcelino José Cardoso, two leaders of the coup d’état from August, 1831 that overthrew the president of the province the Viscount of Goiania. Among the most active, equally was the counselor Cônego Batista Campos, one of the characters arrested and deported to the countryside of the province because of the coup in 1831.70 Very active too was Silvestre An-tunes da Serra that got to the role as a substitute. Serra became very known because of his actuation in Pará’s press that for a long time had been aligned with the positions of Batista Campos. Beside these, it had been elected Felix Antonio Clemente Malcher, political protagonist from the time of Indepen-dence and that posteriorly would be the first president of the province during the Cabanagem. Malcher, however, failed to take the role because he was under a lawsuit in the Council of War. Still composed this first Council João Marcelino Rodrigues Martins, Jacinto Francisco Lopes, João Batista Came-cran, João Manoel Ribeiro, Antonio Manuel de Souza Trovão, Carlos Manuel de Alcantara, José Domingues de Serqueira, Francisco Pinto Moreira, André Fernandes de Souza, Francisco de Pinto Castilho, Agostinho Domingues de Serqueira, Manuel Otávio Prestes and Francisco de Elvas Portugal. Ambrósio Henrique da Silva Pombo was also elected but begged to be excused because he already was the president of the Chamber of Belém, in addition to this claiming that he was sick. His case is not discussed in the minutes, but the fact is that he does not assume the post.71

Besides counting with the presence of some of the several political characters from Pará since the Vintismo, the composition of the General Council also mirrored the presence of economically powerful families of the province. For example, starting from the considerations of Shirley Nogueira, it is possible to find here the Pombos and Elvas Portugal, pointed by her as families that enriched through their military ranks, something very common in this region and that often was related to the controlling of the Indian labor. Also in her description, the Carodoso had farms in Marajó and the Correa de Larcerda had thousands of heads of cattle. At the same time, it draws attention the absence of the Chermont, Moraes Bittencourt and Ayres, that according to Nogueira were among the major land owners and that had the wealth that was more linked to the agricultural economy, such as rice and cocoa plantations and cane mills.72

Although it had the participation of prestigious figures, during its

69Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. Loc. Cit.

70MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da

Balança. Op. Cit.

71Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, em 29 de novembro, 1 e 14 de dezembro de 1830.

72NOGUEIRA, Shirley M. S. “A soldadesca

desenfreada”. Op. Cit. In a different perspective, Mark Harris also analyzes the trajectory of some families from Pará and their importance in the politics. About this, see HARRIS, Mark. Op. Cit., p.81-91.

Page 18: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

426Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

first days the General Council of Pará lived with a contradiction: on one side it had a real effort from its members to provide it power, testing all its limits. This becomes much clearer with the many direct clashes of the counselors against the province’s president. One of the most impressive occurred right at the first days of operation of the new agency, when it received a written representation against the recorder of the Chamber, Tristão Rangel de Azevedo Coutinho.

This was an ordinary matter in the Council, because it was frequent the reception of written representations from citizens or institutions complaining about the behavior of public servants in this agency. As it had made with in other cases, the counselors forwarded the question to the president of the province, the Baron of Bagé and demanded actions. How-ever, on the contrary of other times, the president sent a harsh response saying that it was his own assignment and he would settle in his own way. The counselors then written a reply saying that they did not acknowledged authority in the province that could say which were the limits of their duties. The Baron of Bagé, in sequence, replied more aggressively, saying that it would not admit to receive mail about the matter anymore. Front to that, the Council decided to write about the matter directly to the Emperor, reporting the case. In addition to that they decided to make public their acts through a note in the Livro da Porta, what makes clear the concerns of the representatives to show to the people that the issues were sent.73

In 1831, the Council again had a clash against the province’s presi-dent, now José Félix Pereira de Burgos, the Baron of Itapicuru-mirim. The counselors decided to write to the Parliament complaining about the fact that the president did not provided the requested information that were essential to make the projects of improvement of the province. More than a complain, the Council of Pará wished for the Chamber and the Senate to express their views about the matter, saying that the local Executive Power was bound to give such information.74 In fact the local clash also mirrored the confrontation that already was happening in the Parliament between those who wanted so that the provincial presidents could be questioned by the General Council and those who disagreed with this vigorously.75

On the other side of the contradiction, on behalf of the concomitant occupation of other offices by the counselors, during many moments it becomes clear that the new agency still had less prestige than those most acclaimed. The extreme case was the already cited refuse from Ambrósio Pombo in taking office, under the plea that he already was the president of the Chamber of Belém. Although none had resigned from their posts of Counselors, it was many the occasions where the members of the Council justified their absences because of the necessity to attend to other agencies, such as the Chamber or the Presidential Council, occurring at various times the cancellation of the meeting because of the absence of quorum.76

This choice of the counselors is hard to understand, especially regarding the Chambers, because the law created in October, 1828 sub-ordinate many of their actions to the Council, in a clear deflation of the old agency to the appreciation of the Provincial Powers.77 In the studied meetings, the stances of the Chamber from the city of Belém and many other towns were discussed in detail by the Council that not just authenti-cated it or not, but also did amendments to them. Thus the intrusion of the Council in the most common matters of the Chambers, such as the regula-tion of the commerce or the definition of penalties to those who did not

73Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 11, 16, 17, 23, 24 de dezembro de 1829 e 05 de janeiro de 1830.

74Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. MS-

602, doc. 17 – Atas do Conselho Geral do Pará, sessões de 23 e 26 de fevereiro de 1831.

75SLEMIAN, Andréa. Op. Cit.

76Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 07 de janeiro , 03 de fevereiro, 18, 20, 22, 23, 24, 29, 30 de dezembro de 1830.

77SLEMIAN, Andréa. Op. Cit., p.193.

Page 19: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

427Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

light the lamps, was even greater than that of the Parliament regarding the Council, since the latter exercised the power to make amendments to the decisions that were made by the Chamber. Moreover, the stressful task of analyzing each point of the stances is one of the explanations for the low number of relevant propositions sent by the Council to the Parliament: of the 57 effectively realized meetings between November, 1829 and Febru-ary 1830, 24 of them had as main agenda the discussion about the stances of Belém, reserving more four days for the debate about the stances of the towns of Óbidos, Melgaço, Cametá and Marajó. Furthermore, the very extension of the works of the Council, which should have ended in January, was justified by the president for not being able to finish the approval of the stances of the Chamber of Belém. As we can see the debate about the municipal stances was responsible for virtually half of the activities of the Counselors, which clearly hindered the elaboration of propositions about capital problems of the province.

Besides that, the prestige of the new institution could also be mea-sured by the many petitions that were sent to them. They are complains about public servants, as the one already cited, allegation of application of unfair penalties, complaints about mistreatment or nonpayment and even request to increase the salaries. In the local level, the General Council seems to have occupied the role that Vantuil Pereira saw for the Parlia-ment: the guardian of the constitutional rights.78 A role that, we highlight, is reinforced by the decision of the deputies to receive complaints of the Council about the members of the Executive and Judiciary Powers of the province, accused of despotism.79

Front to that, maybe the explanation that is left for the preference of some Counselors on occupying their jobs in old institutions is the difficulty to know what the resolution power of the Council was. This was a discus-sion even in the Parliament, where many representatives insisted that the Counselors could only suggest actions and nothing more. Many times this hit a wall for practical situations. For example, in one of their first actions, the Council wished to create a press to announce their minutes. There was a great discussion to make it possible, to the point of notify the president. In the end, it was decided to send this to the Parliament as proposition, describ-ing even the staff needed and their salaries. The final answer of the Parlia-ment was to refuse the proposition under the allegation that the Council did not have the privilege to create roles.80 In such situations certainly remained the impression that the Council had prestige, but very little true power.

The policy for the Indians debated in the General Council of ParáThe evidence of the importance of the Indian question in Pará, among other things, manifests itself as the way this matter was recurrent amid the meetings of the General Council of Province, appearing in the de-bates of this institution in different ways. One of them was speeches of the provincial presidents that opened the annual meetings of the Coun-cil, whenever the topic appears, but always as a subtle matter, indirectly. Example is the speech of the Baron of Itapicuru-mirim in December, 1830. As the speech of the last year, the early focus was in the question of the labor and the production as one of the key themes of the province. In the first point indicated by him to be an object of meditation by the Council he discussed about the primitive men, saying that this condition could not remain. Supposedly supported by history, insists that the natural way was

78PEREIRA, Vantuil. Ao Soberano Congresso:

direitos do cidadão na formação do Estado Imperial brasileiro (1822-31). São Paulo: Alameda, 2010.

79ANAIS do Parlamento Brasileiro. Sessões de 25 de

setembro e 15 de outubro de 1830.

80Ibidem. Sessão de 18 de setembro de 1830.

Page 20: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

428Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

the civilization of the men and their subjection to the laws. The reference to the Indians of the province seems clear, as the linking of its civiliza-tion to the increase in the capabilities of the province. To this direction he insists that the abundance of resources of the province had made the men from that place little industrious, pleased merely with what was offered by nature.81 It is good to remember that it was precisely the so-called idleness of the Indians, featured by their satisfaction in supply themselves only with natural resources that justified since de Directory that the laws that forced them to the compulsory work. Particularly, this topic of the speech of the Baron of Itapicuru-mirim was a criticism target in the response made by a commission of Counselors composed by Batista Campos, his allied Cônego Serra, besides the counselor Alcântara. In this occasion, the commission refused to link the precarious situation of the province to what would be a tendency for idleness from its inhabitants, supposedly feed by the fertility of the province. On the contrary, they preferred to credit the low economi-cal production, among other things, to the free will, saying that it were the good laws that stimulated the industrious men.82 Even if the Indigenist policy was not clearly called into question, it is very significant that this answer – that negates the natural tendency of the Pará people for idle-ness as the element for the absence of wealth in the province and make a complaint about the free will – had Batista Campos among their authors precisely because of some of his actions about the theme in the General Council, as we will see below.

As we said, the Indians were a recurrent subject and returned to the agenda in different ways. In this sense, in some occasions the Coun-selors demanded to the Government about the matter, showing that their intervention was not only made by propositions but also taking a stance of policing the Executive Power. This was the case when they demand data about the already cited conditions of the Milícias de Ligeiros, what would subsidize a written representation to the Parliament, which we will talk about later. In the same logic, in December, 1830, Batista Campos asked for the Council to demand that the President made public the “orders, attributions and instructions” related to the Indians that the Lt. Col. José de Brito Ingles and the Colonel Francisco Ricardo Zany were taking to the District of Rio Negro.83 This was not just any concern: Zeny was a well-known character in the province. As mentioned in the early pages of this article, Zeny was the author of a project that were analyzed in the Courts of Lisbon that pretended to enlarge the exploration of the labor of the Indians, with greater control over the tapuios’ labor and the license to per-form slave raids on the forest people.84 Besides that, Zany was going to a territory where the presence of the tapuios was remarkable and the African uncommon. It also must be highlighted the fact that the request for clarifi-cation had as sole focus the Indians, not worrying about any other act that the two military officers could practice in the District of the Rio Negro. The action clearly aimed to constrain the Executive Power and the military and force them to make clear their policy about the Indians.

Beside the importance of the interventions and mentions above, without a doubt the actions of greater relevance of the General Council regarding the Indians were in the preparations and debating of the proj-ects about the theme, even if their acts were restricted to the provincial sphere. In this sense, the first thing to be observed is the great quantity of submitted propositions: in the analyzed period it were discussed in the

81Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessão de 01 de dezembro de 1830.

82Ibidem, sessão de 11 de dezembro de 1830.

83Ibidem, sessão de 06 de dezembro de 1830.

84MACHADO, André Roberto de A. A quebra da

mola real das sociedades. Op. Cit., p.75-76.

Page 21: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

429Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

General Council three propositions and one written representation about the Indigenist policy, certainly the matter that deserved most intervention from the Counselors.

In December 15, 1829, little more than 15 days after the beginning of the work, the first proposition made its debut. Presented by Batista Campos, the proposition required the end of the Fábricas Nacionais. As explained by Vicente Salles, Fábricas Nacionais was the given name to the institutions that organized extractive activities, especially wood, Brazil nut, rubber and cocoa, everything gathered through the compulsory work of the Indians.85 Sadly, it is not possible to know the contents of the original project because none of the propositions were transcript, only being able to understand the debate through the discussions of the amendments.

About the two amendments presented, besides some differences, both converge to the idea that would eliminate the Fábricas Nacionais, yet ensuring some exceptions. The very Council President, Antonio Correia de Lacerda, defended the extinction of the Fábricas Nacionais under the argument that they presented an unfair subjection of the Indians, but he required the keeping of the fishery and also that it could continue with the institution in places where the government could not gather wood. It also draws attention the fact that Lacerda proposed that the extinction of the Fábricas Nacionais not extended itself to the Rio Negro, precisely where happened to be a great concentration of tapuios. The justification was that this part of the province would become independent and should decide the matter later. As we can observe, the amendments pointed by Lacerda, even if they formally condemn the existence of the Fábricas Nacionais, they permitted exceptions and devices for the government that guaranteed the survival of the institutions. The other amendment, proposed by the Coun-selor Alcântara, had the same nuance of ensuring exceptions, requesting the keeping of the Fábricas devoted to gathering wood and, more precisely, the sawmill of Monte Alegre.86

This proposition, almost as the other ones related to the Indians, had a disappointing route: presented in the beginning of the works of the Council, in less than 20 days of project and the presented amendments had already passed by two of the three discussions needed to sanction the act. However, as far as the research went, this last discussion was never made. A year after its presentation, in December 15, 1830, it were created com-missions to end unfinished business of the last year, being the project of extinction of the Fábricas Nacionais among them.87

How to understand that a project discussed so much still had not being finished and sent to the Parliament? Sadly, there is no final answer for this. Firstly it is truth that the agenda of the Council after the second discussion of this theme passed to be more and more taken by the debates about the Stances of the Chambers, which helped to paralyze the proceed-ing of the proposition. Even so it is good to remember that some proposi-tions, even if few, could be finalized after this period. This makes us think that the central reason was the absence of agreement about such a deli-cate topic, that makes the act be forgotten inside the Chamber’s drawer, as example of what constantly happened in the Parliament. Far from being a sole case, this seems to be the rule in the General Council of Pará: in the first term, despite projects about central themes of the province having been presented and discussed, it were few the propositions that could complete the entire course of action, be approved and sent to the Parlia-

85SALLES, Vicente. Memorial da Cabanagem:

esboço do pensamento político-revolucionário no Grão-Pará. Belém: CEJUP, 1992. p.62.

86Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice 889,

Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 24 de dezembro de 1829 e 05 de janeiro de 1830.

87Ibidem, sessão de 15 de dezembro de 1830.

Page 22: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

430Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

ment. In fact, only four had been sent and all they were about peripheral themes, as the obligation of the foreign to present to the Judge of Peace at the maximum of three days after their arrival in the province, the installa-tion of a public typography or the job dismissal for the Counselors that had public posts during the meetings.88 Other evidence that the problem was disagreement is that, as we will see, after the coup d’état in 1831 that de-posed the Viscount of Goiania from the Presidency of the Province and ar-rested men of a more Liberal mind, the Council became to discuss a Project about the civilization of the Indians that followed the contrary direction of the proposal above, as it was the way until then.

The Fábricas Nacionais, however, seem to be a “hot topic” in the province. If it was not possible to finally find a project approved in the two first annual meetings of the Council, in 1831 they came back to the center of the public administration, now by the hands of the Executive Power and during the troublesome management of the already cited Viscount of Goiania as the President of Pará. In the end of July, 1831, a reunion of the Committee of Public Treasury takes place, also led by Goiania. In such occasion, they thought about the situation of the Fishery of Vila Franca and the Cocoa Plantation, two examples of institutions named as Fábricas Nacionais. The Committee, in first place, highlighted the few public gains of these projects and determined their extinction under the argument that it was a barbarian act against the Indians. The Committee mentioned that the Indians worked there compulsory, under gunpoint, with low salaries that went from 80 to 20 daily coins and that remained several years with-out being paid.89 Especially draws attention, however, the main argument to the end of these institutions: the Committee thinks that this “oppression should since long being end because they are contrary to the individual guarantees of the Brazilian people”, adding to it in other part that this was an “ancient barbarism and contrary to the Constitution of the Empire”.90

The importance here, beyond the extinction of these Fábricas Nacionais, is in those arguments, because they classify explicitly the Indians as citizens that had Constitutional rights and that were incompatible with such “an-cient barbarism”: the compulsory work. In other words, broadly speaking they repeated in this context the topic that questions the legitimacy of the forced labor of the tapuios since the Vintismo.

It is also important to have in mind that this was a decision of a collegiate and not only the president, what shows that the debate that was inside the General Council of Province, especially about the Fábricas Nacionais and about the Indians, was equally flowing inside other ways. Lastly, it is necessary to highlight that even if it was constituted as a bold act, the text of the Committee of Treasury suggests that only the cited Fábricas Nacionais would be extinct, the two unprofitable, and not the entirety. Then, this report and a complaint would be sent to the Court, from where apparently a decision was waited. Even if it weren’t entirety clear the effectiveness of this action, in a long letter that was sent to the Court about his own version of the deposition from Presidency, the Viscount of Goiania insisted in mention the extinction of the Fábricas Nacionais – and from that we could understand that he was referring to every – as one of the main motifs for he being deposed of the presidency.91 In addition to demonstrate that the question of the Indian labor was a politically ex-plosive matter in Pará, it is good to have in mind that one of the reasons alleged by the putschists to depose him was because Goiania was aligned

88Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados –

Centro de Documentação e Informação. Brasília – DF, Brasil. Lata 49, maço 21, pasta 1 – Lista dos trabalhos do Conselho Geral do Pará (1829-30). Look for MACHADO, André Roberto de A. As “reformas em sentido federal”. A atuação dos representantes do Grão-Pará no Parlamento e as expectativas na província em torno do Ato Adicional. Revista Estudos Amazônicos, Pará, v.4, n.1, p.64, 2009. Except the four sent projects, it was also sent to the Parliament and to the Executive other texts, classified as resolutions, notes or with other titles.

89In the text of the Viscount of Goiana that

followed this annex, the former presidente of Pará affirmed that this practice had enriched some men from Pará that he called “wicked exploiters”.

90Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ9

– 108 – Ministério do Reino e Império. Pará, Correspondência do Presidente da Província (1829-31), doc. 328, anexo 15.

91Ibidem, doc.328. Raiol transcribed part of this

letter, also giving enormous emphasis to the end of the Fábricas Nacionais as one of the reasons for the fall of Goiania. RAIOL, Domingos Antonio. Motins Políticos. Belém: UFPA, 1970. p.228.

Page 23: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

431Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

to the positions of Batista Campos, precisely the member of the General Council of Province that had proposed, without success, the end of the Fábricas Nacionais.

Even during the first year of work of the Council, a second proposi-tion emerged about the Indians question. On the contrary of the propo-sition made about the Fábricas Nacionais, this pretended to be a wider project for this population, but had a similar course as the first. Presented by the Counselor Carlos Manuel de Alcântara in January 02, 1830, it is also not possible to know its complete content, since the propositions were not transcribed, leaving space only for some notes to be taken from the few amendments presented. Apparently just from adapting a device that already existed, one of these amendments foresaw the figure of an Indian attorney that would be responsible to regulate the payment of these men. Thus it is possible to see again the centrality of the manpower in the issues that were related to the Indians. And, in addition to this, the intention of returning to the system of tutelage that had been shut down with the end of the Directory reappeared again, something that as we see until now was a recurrent attempt of the critical groups to what was considered by them as an excessive freedom of the “índios avilados” since the legisla-tion of 1798. However, after passing down from the two initial discussions in January 26, the project was sent to a redaction committee and never went back to the plenary. Maybe an explanation to this is the fact that, beside the author, composed the committee Marcos Martins and Marcelino Cardoso, two leaders of the Agostada de 1831that deposed the Viscount of Goiania from the presidency.92

In the middle of this process where the projects about the Indians discussed in the General Council could not achieve a final version to be sent off to the Parliament, it was other type of action that originated there and that ended having an effective impact in the Indians’ policy, even if totally distinct of what had been the original proposition. In this sense, when we read the summary sent to the Court about the activities produced by the General Council of Pará during its first year, as we said before, there are only four projects included, but they still follow more than ten manifests, general-ly included as presentations. This was a common practice and often aimed to criticize or complain about other authorities, besides demand the decision of the Parliament about some matters. Thus it is a representation of the Council requesting the position of the Parliament about the Milícia de Ligeiros that could broke this blockade and arrive at the Court.

As said before, at the very beginning of their term it was ordered the information of the Presidency about the Milícia de Ligeiros, institution described in the previous pages of this article as one of the fundamental pieces for the recruitment of the tapuios for the compulsory work, as it was defined by the legislation of 1798. The Council received this informa-tion with such speed and soon made a committee with a very significant composition: Batista Campos and his ally Cônego Serra complemented by the Counselor Jacinto Lopes Silvestre. Having this information, the com-mittee made a little evaluation of this institution and proposed a feedback to be sent to the Parliament in the form of a representation.

Mentioning the information offered by the government the commit-tee confirmed the continuity of the usage of the law of 1798 to oblige the Indians to the compulsory work, through the enrollment in the Milícas de Ligeiros. Batista Campos and the committee did not left any doubts about

92Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 02, 05, 19, 26 de janeiro de 1830.

Page 24: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

432Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

who were those enrolled in the Milícias de Ligeiros when they said that were the villagers of the Directory, confirming that besides the law of 1799 having extended the recruiting for white and black without occupation,93 in practice this was an onus for the so called “Christian Indians”. As men-tioned before, under the control of the military, it was created lists of the tapuios from the villages and the recruited were destined to the compul-sory work in public and private works. Because of that, the control of this body was a decisive aspect in the province. The central point of the debate that moved committee was to prove, from some considerations about the legislation, that these Indians, although the organization having the name of Militia, should not be considered military, but yet an order. The sending of a question such as this one to the Parliament made entire sense, since the interpretation of the laws in that period was also up to this institution. As well observed by João Nei Eduardo da Silva, the reason for the feedback was not to end the Milícia de Ligeiros, but remove the control from the hands of the military and pass it for the civil power.94 The very text by the commission says that this body should be out of the “military privileges”. Also this was not a new polemic: during the Vintismo the Committee of Civilian Government and the Arms Governor clashed about to what power should be the control over the Militia, a clash that even deserved manifests in the newspaper O Paraense.95 In 1828, the Baron of Bagé, by time the Province President, wrote to the Minister of War, complaining that the Indians from the Militia were under the control of the military.96 For the rest, the very feedback gives the dimension of the importance of the Milícia de Ligeiros for the economy of the province and the organization of the society:

(...) Suits the public good and good administration of the Constitutional Government that the so-called Milicianos Ligeiros should be declared actual orders (...) for the end of the questions and conflicts between civilian and military authorities that since remote times entangle the march of the Government of Province and for the last to embrace with energy the most important branches of the Public Administration that cannot succeed in the actual condition because of complication of the military authorities with the civilian regarding the economic control of the said Indians; may well say that the province is a country purely military.97

Once sent to the Parliament, the discussion was fast and with a surprising end. In July 8, the Committee of War of the Chamber summa-rized the major points of that representation and decided to ally with the interpretation sent by the Council. From the representation, they proposed a resolution where it would only became explicit that the Militias were not subjects to the Commander of Arms from the Province and, as so, end the clashes between the powers.98 However amendments were presented to this proposition. Between November 26 and 27, 1830, prevailed the substitutive amendments of the deputy from Maranhão, Odorico Mendes. In two articles of what was to be a legislative decree, Odorico Mendes just ordered the end of the Milícia de Ligeiros, abolishing every contrary device.99 Records about the debate were not registered, and the silence of the representatives from Pará is absolute. In the Senate, after the explicit condemnation by the Senator Saturmino, for which these militias were good only to exploit the Indians, the approval was very fast, and originated the transformation of the dissolution of the Milícia de Ligeiros by law of August 22, 1831.100

It was, without a doubt, a giant change in the politics of the Indians

93SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. “Vossa

Excelência mandará o que for servido”. Op. Cit.

94SILVA, João Nei Eduardo. Batista Campos: uma

discussão biográfica na historiografia paraense. In: BEZERRA NETO, José Maia; GUSMÁN, Décio de Alencar (org.). Terra matura: Historiografia & história social na Amazônia. Belém: Paka-tatu, 2002. p.139-149.

95COELHO, Geraldo Mártires. Anarquistas,

Demagogos e Dissidentes: a imprensa liberal no Pará de 1822. Belém: CEJUP, 1993. p.172 e p.255; ver também de MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit., p.157.

96Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

869, doc. 03, em 20 de maio de 1828.

97Ibidem. Códice 889, Atas do Conselho Geral de

Província, sessão de 08 de fevereiro de 1830.

98ANAIS do Parlamento Brasileiro. Em 8 de julho

de 1830

99Ibidem. Em 27 de novembro de 1830.

100ANAIS do Senado do Império do Brasil. Em 18 e

26 de maio, 11 de junho de 1831. Coleção das leis do Império de 1831. Primeira parte. Rio de Janeiro: Tipografia Nacional, 1875. p.76.

Page 25: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

433Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

in Pará because it would interfere in the main mechanism of recruitment of the so-called “Christian Indians” to the compulsory work in public and private works. The effective application of this change, their cheats and the possible impact of this in the conflicts that happened posteriorly in the Province are issues that need further researches. For now, however, it is possible to affirm that the information of the dissolution of the Milícia de Ligeiros had flowed through Pará at least since 1832 and that it were used as political capital by Batista Campos. So, in March, 1832, the minute of the Chamber of the town of Alenquer registered the request made by Batista Campos that it should be spread the end of the Milícias de Ligeiros through the publication of an edict.101 In 1834, in the newspaper “Senti-nella Maranhense na Guarita do Pará”, the publisher Lavor Papagaio listing what should have been the services made by Batista Campos, also men-tions the extinction of the Milícia de Ligeiros.102 Even if we know through the crossing of the documents that this was not the original intention of Batista Campos, it is important to understand that the extinction of the militia was a matter of repercussion in the political life of the province.

Another important point to highlight is that Batista Campos require the advertisement of the ending of the Milícia de Ligeiros in a period where the political conflict in the province was more opened and more polar-ized. Few months before, in August, 1831, it happened a coup d’état that deposed the so president of the province the Viscount of Goiania. The Agostada, as this episode happened to be known, were a complex event which we already have written enough about, trying to comprehend its reasons and consequences.103 For the ending of this article, it should only be noted some points that help us think about their consequences for the General Council of the Province and for the discussion of the Indians policy within it. In first place, it is visible that the group that starred the deposition of Goiania had a more Conservative character and was frankly supported by an important portion of the military. In addition to that, the explicit motif for the coup, even in the letters sent to the Court was the proximity of the president with the political group led by Batista Campos. Even if the reality is more complex than that, about the questions linked to the Indians this observation finds some support. After all, as mentioned previously, Goiania ended with at least some Fábricas Nacionais, pretension that had previously appeared in one project made by Batista Campos and sent to the General Council. Not only that, it fell responsible to the manag-ers of Goiania to apply a decision of the Parliament to put an end to the role of the District commanders. The ironic of all this is that it happened almost simultaneously to the failure of Batista Campos to approve some-thing similar in the General Council.104 In such occasion, Campos defended the act as necessary because the commanders reduced the Indians to the condition of slaves. This point remembers much the posterior report that Goiania sent to the Court, when he listed the fulfillment of the law about the district commanders as one of the reasons for his fall.105 At last, think-ing about its impact in the General Council of the Province and the debate about the Indigenist policy it is necessary to have in mind that the coup of 1831 implied not only in the deposition of Goiania, but also in the prison of many men considered connected to Batista Campos and their deporta-tion to prisons within the province. This obviously altered the political equilibrium inside the General Council.

Precisely in this scenario of instability towards the most conserva-

101Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados –

Centro de Documentação e Informação. Brasília – DF, Brasil. Lata 115, maço 16, pasta 4 – Província (acontecimentos de agosto de 1831 no Pará). Ata da Câmara de Alenquer em 26 de março de 1832.

102Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. PR

SOR 4750 – A Sentinella Maranhense na Guarita do Pará. Edição de 4 de outubro de 1834.

103MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da

Balança. Op. Cit.

104Arquivo do Instituto Histórico e Geográfico

do Pará. Belém, Brasil. 105,6,23 – Coleção de proclamações, atas e outros impressos políticos relativos ao Pará entre 1827 e 1837 (doc. 3).

105Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ9

– 108 – Ministério do Reino e Império. Pará, Correspondência do Presidente da Província (1829-31), doc. 328.

Page 26: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

434Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

tive groups, one of the first acts to be discussed about the General Council of the Province was a Project of civilization for the Indians. Presented in December 6, 1831, the proposition did not come from a Counselor, but was sent by the Maj. Antonio Ladislau Monteiro Baena. Better known today by his works on statistics and about the history of the province, Baena was a Portuguese military who lived many years in Pará and was a great criti-cal of the Liberals. The welcoming of the proposal made by Baena from this “new” General Council could not be any more explicit: at the second day, December 7, it is created a committee to evaluate the text with the orientation to utilize at maximum level the original text. Other surprisingly demonstration of the support of the Council for the proposition is that, when they received several requests from the Chambers of the countryside to send Indians to be engaged in different works, it is formulated an of-ficial answer that declared to be necessary to wait for the approval of the project made by Baena to regulate the offering of Indian manpower.106

On the contrary to other projects about the Indians that were pre-sented in the Council, the text of Baena was preserved integrally, what help us to better comprehend his objectives.107 Already at its introduction, it becomes explicit that what moves the action of Baena is the preoccu-pation with the Indian manpower: after all, he points that the end of the slave trade – that he considers to be inevitable – made urgent the debate about a new plan of civilization for the Indians.108 At the same time, at the very beginning he insists that this was an opportunity to return to a route that has been abandoned: the tutelary regime of the Directory. The praise for the Directory and the critic of the law of 1798 are some of the pillars of the text and, as observed in the previously pages, echoed observations that were similar in projects previously drafted since the Vintismo. Moreover, in many moments he defends that his ideas are based in experience, suppos-edly using history as a topic for his train of though. Other important point to highlight is that the text made by Baena makes clear the expectation that the Province, through the General Council, had sufficient autonomy to impose a change in the politics about the Indians, revealing the prestige and the expectative that surrounded this institution.

Baena’s project was divided in two parts: “Christian Indians” referring to those that already lived in the villages and “savage Indians”, referring to those that were in the forests. The division, in first place, makes clear the importance of the Indians that were in the villages and that in Pará, as many assume for other regions, the civilization plans were not restricted to those that were out of the living with the white men. This division also exposed the two main objectives: for the “Christian Indians”, resume the tutelage regime and so control its manpower. For the “savage Indians”, resume the practice of the slave raids and thus bring new contingent of labors to the Province.

The control over the Indians and their obligation to labor were prem-ises for the project of Baena. Using historical examples, he insisted that one of the greater errors was the law of 1755, which had given full liberty to the Indians before the establishment of the tutelage by the Directory, suggesting that this situation had made the province run out of workers, while the slave trade was still being stablished. Still during the introduc-tion, it is very clear that by stating that when stablishing a new civilization plan, it should not let it fall into wrong points that preached against the “impelled work”. Once more, recurring to history he says that the defense

106Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados –

Centro de Documentação e Informação. Brasília – DF, Brasil. Lata 68, maço 37, pasta 4, Atas do Conselho Geral de Província, em 06, 07 e 29 de dezembro de 1831.

107BAENA, Antonio Ladislau Monteiro.

Representação ao Conselho Geral da Província do Pará sobre a especial necessidade de um novo regulamento promotor da civilização dos índios da mesma província. In: Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará. Tomo 2, Belém: Imprensa Oficial, 1902.

108This was not the sole case in the Empire that

the usage of Indians had been pointed as the solution to revert the effects of the end of the slave trade. For examples and a wider discussion, see SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem brasileiros. Op. Cit.

Page 27: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

435Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

contrary to the compulsory work of the Indians was not sustained against the light of experience, returning to the old point of natural idleness of these people:

About the first proposition she is impugnable with the conclusive point that is experimentally acknowledged even by the Jesuits, yours most renewed catechists, that the inert hereditary idleness of the Indians that is for them the sovereign happiness, and their ineptitude to know and experience the comforts and incalculable benefits of the civil society prevent them from their own volition to search for regular work (...) therefore, they cannot be abandoned by themselves, but yet need to be guided by dispositions and rules of a contemporaneous compulsory controlling regime, which serving as diffuse or fundamental stimulant that reanimate their dead excitability and that turn them into useful agents and so adherents of the social life as other men.109

When talking about the “Christian Indians” the center of the proposi-tion made by Baena is the description of this “controlling regime”, that ac-cording to him, would last until the time the Indians already lived “accus-tomed to the art of making the existence happy searching for the benefits that the work and the industry can minister to them”.110 Shortly, in each vil-lage would have a “Regent Patrolman” and above him a “Superintendent of the Indians”, which would befall the regulation of the work, as the spatial organization of these men too. About this last aspect, it was predicted not only the suppression of the sparsely populated villages and the creation of new ones, but also the transit of the Indians passed to be controlled by the village authority, as saw at an old demand by the critics of the law of 1798. The text highlights the many activities that would be stimulated by the “Regent Patrolman”, but owned by the Indians, coming to propose the donation of “little sesmarias” to these men. However, it is clear that every action, every work activity would be conducted by the Regent Patrolman and that he could punish those that do not fit together in the expected pace under the charge of vagrancy.

The recruitment mechanisms for the public and private works are not described in details, but appear mostly through the exclusion rules of this service. So it is said that the house leaders could not be removed from the villages to do other works, but could be obliged to “work for daily gains in the farms of Pará” if they did not support their families.111 Far from being just a punishment, in other parts of the text it became clear that it was up to the “Regent Patrolman” to provide manpower for both the public and private works. Thus it is shown that this authority should have the control of the Indians that were absent from the villages to provide services with their authorization and how much time they would be away. In other part it imposes that it should not exceed one third of the children of each fam-ily those that could be removed “ for both the public service and for the owners of cane mill and crop plantations”, emphasizing later that it still would be charged a tax from the salaries received by these Indians.112

In comparison to the number of pages destined to the “Christian In-dians”, Baena is much shorter when talking about the “Savage Indians”. By itself this shows that the sensitive question for this military officer was the Indians that lived in the villages. However, there is still another question that reinforces this thesis: Baena defended the slave raids for new contin-gents of Indians that were in the forests, but on the contrary of the previ-ous projects it did not intended that these men were distributed between

109Ibidem, p.252.

110Ibidem, p.271.

111Ibidem, p.261.

112Ibidem, p.260-262.

Page 28: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

436Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

the owners. Instead, the destiny of the “savage Indians” would be the vil-lages where the “Christian Indians” had already been established under the regime of the “Regent Patrolman”. This way these villages seemed to be the heart of the system by which Baena intended to regulate the labor of these Indians under a tutelage regime.

The proposition made by Baena, with the support of the Council after the Agostada, clearly tried to revert what seemed to be the progressive loss of institutions from the Colonial period that guaranteed the control over this manpower. Yet, as it happened with other propositions gestated in the Council, this never came to be implemented. The most plausible explana-tion is that with the tenure of office by Machado de Oliveira in 1832, the new province president sent by the Court and the return of the former Counselors the proposition faced resistances and was sent to limbo.

However the effective application or not of the Indigenist projects debated in the General Council is only one of the aspects that interests the historians. Most importantly than that seems to be the evidence that this was a central subject in the province to the point of receiving several projects and many discussions. Also the difficulties for the approval of the final propositions of these projects could not be credited to their low im-portance but rather to the difficulty of reaching a consensus in the Council about a matter that was vital and that would hit public and private inter-ests. Lastly, when evaluating these projects and the debates in the General Council we light the central issue in Pará regarding the Indians: all the projects, all the discussions had as major subject the control of the labor of these individuals.

Translated by Arthur Baltazar

Received for publication in July 09, 2014Approved in November 17, 2014

Page 29: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

437Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)1

André Roberto de A. MachadoUniversidade Federal de São Paulo, São Paulo - SP, Brasile-mail: [email protected]

ResumoO objetivo deste artigo é demonstrar como o Conselho Geral da Província do Grão-Pará debateu e propôs projetos que visavam intervir na política indigenista em vigor, entre 1829 e 1831. Em um primeiro plano, busca-se expor como este tema era vital para a província, o que em grande medida explica porque a questão indígena foi um assunto que mereceu um dos maiores números de projetos e intervenções apresentados no Conselho Geral no período estudado. Ao mesmo tempo, busca-se compreender as tensões entre os interesses locais e nacionais na definição de uma política indigenista, lembrando que apenas em 1845 se formulará uma lei geral para todos os índios do Império do Brasil.

Palavras-chaveConselho Geral, índios, Grão-Pará, Política Indigenista

1Agradeço ao CNPq pelo financiamento da

pesquisa. Uma versão preliminar e resumida desse texto foi publicada nos Anais do 27º Simpósio Nacional de História – ANPUH. Disponível em: <http://www.snh2013.anpuh.org/site/anaiscomplementares>. Acesso em: 01 mar. 2014.

Page 30: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

438Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

Foi apenas em 1845, com a aprovação do “Regulamento acerca das mis-sões de catequese e civilização dos índios”, que o Império do Brasil passou a contar com uma lei geral para os indígenas válida em todo o território. Legislação, aliás, que permanecerá sendo a única desse tipo durante toda a existência do Império.

Patrícia Sampaio, ao se debruçar sobre a nova lei, chamou a aten-ção para o fato de que não se pretendia apenas promover a catequização com o novo regulamento. Ao contrário, Sampaio demonstrou que apesar da catequese ser um dos aspectos centrais do “Regulamento das Missões”, toda a administração estava a cargo de autoridades civis: um Diretor Geral em cada província, nomeado diretamente pelo poder central, e Diretores de Aldeia, estes indicados pelo Diretor Geral ao Presidente da Província. A estas autoridades estava reservada a decisão sobre uma série de ações que compunham o caráter multifacetado da nova lei. Nesse sentido, a nova norma assegurou terras para os ameríndios incorporados à cultura dos brancos, ao mesmo tempo em que criou mecanismos para que os territó-rios desses povos pudessem ser arrendados. Da mesma forma, no centro da lei estava a preocupação em regular e disciplinar a mão de obra indígena, promovendo seu engajamento em diversas atividades sob assalariamen-to de terceiros e controle dos diretores de aldeia.2 Incorporação, terras e trabalho: uma tríade que sempre acompanhará os debates sobre a questão indígena no Império do Brasil. Além, é claro, do discurso daqueles para os quais o único trato possível com esses povos era o extermínio, dada a sua suposta incapacidade para a civilização.3

A inexistência até 1845 de uma lei com validade em todo o território do Império, que regulasse a relação com os indígenas, sustentou a afirma-ção de Manuela Carneiro da Cunha de que em todo esse período viveu-se um “vazio legislativo” no tocante a essa questão. As afirmações de Cunha dão a entender que essa brecha seria provocada especialmente pela supos-ta perda de importância do tema. Para ela, os índios seriam no século XIX, sobretudo, uma questão de terras, com apenas algumas poucas exceções no território, nas quais a sua mão de obra ainda era relevante.4

De fato, não houve até 1845 uma lei geral para todo o Império que estabelecesse uma política para os indígenas , mas não parece que a falta de importância do tema seja o que poderia explicar este fato. Ao invés dis-so, é necessário pensar que uma das tarefas mais difíceis para os constru-tores desse novo Estado era estabelecer uma base legal nova. Eram vários os temas urgentes a serem disciplinados em lei e parece que esteve claro para os homens do período, desde muito cedo, que isso levaria muitos anos. Como lembra Mônica Dantas, a própria Assembleia Constituinte tomou a precaução de criar uma lei em 20 de outubro de 1823 em que definia que enquanto não houvesse nova legislação do Império, leis e outras normas editadas em Portugal até 1821 continuariam a ter validade em território nacional.5 Isso, em verdade, acabou sendo a prática corrente também como forma de remediar uma série de lacunas para as quais ainda não havia definição legal. Como bem resume José Reinaldo Lopes:

Assim, como não se faz as coisas do cotidiano do dia para noite, os primeiros anos de vida independente [do Império do Brasil] foram de convivência com um ordenamento complexo, que guardava dispositivos estrangeiros (portugueses) e coloniais (ou seja, pré-liberais).6

2SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Política

Indigenista no Brasil Imperial. In: GRINBERG, Keila; SALLES, Ricardo. História do Brasil Imperial. Volume 1 – 1808-1831. 2ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. p.175-206.

3MONTEIRO, John. Tupis, tapuias e historiadores:

estudos de história indígena e indigenismo. 2001. 233fls. Tese (livre docência). Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.

4CUNHA, Manuela Carneiro da. Prólogo.

IN:______(org.). Legislação indigenista no século XIX: uma compilação. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1992. p.9-11.

5DANTAS, Mônica Duarte (org.) Revoltas, Motins,

Revoluções: homens livres pobres e libertos no Brasil do século XIX. São Paulo: Alameda, 2011. Introdução.

6LOPES, José Reinaldo de Lima. Iluminismo e

Jusnaturalismo no ideário dos juristas da primeira metade do século XIX. IN: JANCSÓ, István (org.) Brasil: formação do Estado e da nação. São Paulo: Hucitec, 2003. p.200.

Page 31: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

439Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

Nessa direção, muitos temas sensíveis não tiveram um ordenamento legal rápido, assim como nem sempre estiveram no centro dos debates parlamentares. Exemplo disso é o que aponta Tâmis Parron para o tráfico e a escravidão negra no Império do Brasil, assunto que parece ser de impor-tância incontestável. Como aponta Parron, excetuando os fortes embates entre 1826 e 1827 em torno do tratado internacional para o fim do tráfico em 1831, essa temática foi secundária nos debates registrados nas anais do Parlamento pelo menos até 1834. Para além das apostas de que o silêncio era uma forma de manter a situação estabelecida, Parron explicita outra razão: os esforços estavam concentrados na própria definição do jogo político, no estabelecimento de regras para o funcionamento das institui-ções.7 Não se deve esquecer que este era também um aspecto que carecia de definição legal urgente para vários campos.

Apesar de não ter se constituído até 1845 uma lei geral, o debate em torno de uma política indigenista foi constante durante o XIX. Já nas Cortes de Lisboa foram enviados projetos, a esse respeito, de São Paulo, Pernam-buco, Pará e Bahia, quatro grandes províncias, o que por si só demonstra a importância do tema. É verdade também que as dimensões deste debate foram muito diferentes do que ocorreu nas Cortes de Cádiz, uma comparação que parece bastante válida pela enorme influência que a Assembleia Consti-tucional espanhola teve sobre a posterior experiência portuguesa.

Em Cádiz, a questão dos indígenas teve desdobramentos importantes, com o explícito reconhecimento desse grupo como cidadãos espanhóis, ação que contou com a pressão dos deputados americanos interessados em aumentar o número de assentos do Novo Mundo no parlamentou europeu. Diretamente decorrente disso, o congresso de Cádiz acabou também com os trabalhos forçados dos indígenas na América Espanhola sob a forma de tributos, como a mita. Essa é uma decisão que chama a atenção pelo fato de que o fim dos tributos foi justificado como necessário para equiparar a condição de cidadão dos indígenas a dos demais espanhóis. Por outro lado, também é importante ressaltar que a conquista de direitos desses povos na região da América Espanhola não foi linear: após a independência, o trabalho compulsório dos indígenas retornou em alguns países.8

Já nas Cortes de Lisboa, tal como consagrado na historiografia, o envio de tantos projetos sobre a questão dos indígenas, inclusive o famoso plano de civilização escrito por José Bonifácio, não resultou em um de-bate amplo, com decisões efetivas. Ao contrário disso, apenas um desses planos, enviado do Pará pelo coronel Francisco José Ricardo Zany – sobre o qual retornaremos adiante – conseguiu ultrapassar a primeira barreira de discussões: foi aprovado pela Comissão de Ultramar das Cortes Gerais de Lisboa, chegando a ser transcrito nos Diários do Congresso juntamente com um parecer favorável da comissão.9Mesmo assim, não há registro que mesmo o projeto de Zany tenha resultado em decisões concretas, ou que o mesmo tenha sido discutido em plenário após a sua apresentação pela Co-missão de Ultramar e o pedido de impressão.10 Na própria constituição por-tuguesa de 1822 há apenas uma única menção aos indígenas, justamente no último artigo, em que se estabelece um vago compromisso do Executivo e das Cortes no esforço de promover a civilização dos índios, misturada a uma série de ações caracterizadas como instituições de caridade.11

Já nos debates constituintes no Império do Brasil, Fernanda Sposito demonstrou que os índios foram mencionados desde as discussões para definir quem eram os brasileiros. Nessa ocasião, prevaleceu o entendimento

7PARRON, Tamis. A política da escravidão no

Império do Brasil (1826-65). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. Cap. 1.

8GODOY, Scarlett O’Phelan. Los diputados peruanos

en las Cortes de Cádiz y el debate sobre el tributo, la mita y la ciudadanía indígena. Revista de História Iberoamericana, v.5, n.1, 2012. LARSON, Brooke. Trials of Nation Making: Liberalism, Race and Ethnicity in the Andes, 1810-1910. New York: Cambridge, 2004. Para uma comparação entre o processo em Cádiz e nas Cortes de Lisboa em relação à questão indígena, ver também SANTOS, Raquel Dani Sobral. A construção do estatuto do cidadão para os índios do Grão-Pará (1808-22). 2014. 121 fls. Dissertação (Mestrado em História). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014. Cap. 2.

9Ver de ZANY, Francisco José Ricardo. Projeto

para os índios do Grão-Pará. IN: Diário das Cortes, 1821/1822. Sessão de 26 de Agosto de 1822. Disponível em: <http://debates.parlamento.pt>. Acesso em: 09 jan. 2015.

10Sobre os projetos para indígenas nas Cortes de

Lisboa e o debate sobre esse tema, veja BOEHER, George. Some Brazilian Proposals to the Cortes Gerais 1821-23, on the Indian Problem. In: COLÓQUIO INTERNACIONAL DE ESTUDOS LUSO-BRASILEIROS, 3., Lisboa. Actas do 3o Colóquio Internacional de Estudos Luso-brasileiros. Lisboa: 1960. v.II, p.201-209; de MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Índios da Amazônia: de maioria a minoria (1750-1850). Petrópolis: Vozes, 1988; de SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem brasileiros: indígenas na formação do Estado nacional brasileiro e conflitos na província de São Paulo (1822-1845). São Paulo: Alameda, 2012. p.65-71; e de SANTOS, Raquel Dani Sobral. Op. Cit., cap. 3.

11Constituição Portuguesa de 23 de Setembro

de 1822. Disponível em: <http://www.fd.unl.pt/Anexos/Investigacao/7511.pdf>. Acesso em: 03 ago. 2015

Page 32: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

440Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

de que aqueles que estavam fora do convívio dos ditos “civilizados” não deviam ser considerados como membros do pacto político. A despeito da decisão de excluir os indígenas que estavam nas florestas – e da completa indefinição sobre os que conviviam entre os brancos, mas continuavam a ser identificados como índios, ou daqueles que posteriormente seriam incorporados – fica claro que esse era um problema inescapável para os constituintes. O projeto constitucional consagrou ao tema também um único artigo, muito parecido com o que foi aprovado nas Cortes de Lisboa, com um compromisso vago do governo com a catequese e civilização dos indígenas. Entretanto, como aponta Sposito, a Assembleia Constituinte aprovou medida favorável ao projeto de civilização proposto por José Boni-fácio e que também tinha sido apresentado em Lisboa. A autora supõe que o não acolhimento imediato da proposta esteve ligado a uma estratégia dos constituintes: a comissão responsável mandou espalhar exemplares do projeto por todo o Império e questionar as autoridades provinciais sobre a forma de implementá-lo em cada parte do território.12

A não definição de uma política indigenista na Constituinte chama a atenção tanto quanto a decisão de questionar os governos locais sobre o assunto, ao invés de tomar a responsabilidade do tema para si. É justa-mente para este aspecto, o papel das províncias nas tentativas de definir uma política indigenista no Império do Brasil, que este artigo pretende chamar a atenção.

No texto já citado, Manuela da Cunha, de passagem, diz que as pro-víncias chegam a legislar sobre o tema por conta própria, dando a entender que seria uma política ocasional e consequência da falta de definições no Corte.13 Ao contrário das conclusões a que chegou Cunha, os indígenas ain-da eram uma questão central para a política em várias regiões do Império, e o papel das províncias na regulação desse assunto não parece ter sido ocasional ou secundário. Ao invés disso, parece claro que houve um embate sobre a quem deveria caber a primazia nesta matéria: ao governo central ou às províncias? Conforme destacado por Patrícia Sampaio, até mesmo na aprovação do Regulamento das Missões o debate sobre a quem cabia le-gislar sobre esse assunto foi um ponto de tensão. Sampaio demonstra que em pleno Conselho de Estado o projeto do Regulamento das Missões sofreu resistências de homens como o Marquês de Paraná, para quem o estabele-cimento de uma regra geral para todo o Império seria prejudicial por retirar das províncias o papel de decidir sobre esse assunto. Mais do que isso: é muito significativo que o Marquês de Paraná em seu protesto contra a lei a tenha definido como uma “usurpação” do direito que caberia às Assem-bleias Provinciais, o que por si só demonstra que, para ele, o natural seria que não existisse uma lei geral sobre o tema.14

Essa tensão entre a constituição de uma política geral e o interesse das províncias é permanente. Mesmo o primeiro esforço do Parlamento em elaborar um plano geral para os indígenas teve como estratégia consul-tar as províncias. Essa é uma medida que chama duplamente a atenção: em primeiro lugar, porque repete o mesmo procedimento da Assembleia constituinte; em segundo lugar, porque este era um procedimento abso-lutamente inusitado na prática desse poder. Enviado logo no primeiro ano de funcionamento da Câmara e do Senado, em 1826, as respostas parecem explicar os impasses por trás desse problema: a realidade da questão indí-gena variava muito entre as províncias. Analisando as respostas enviadas, John Monteiro demonstra que em Goiás e em São Paulo, por exemplo,

12SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem

brasileiros. Op. Cit., p.73-74.

13CUNHA, Manuela Carneiro da. Op. Cit., p.9-11.

14SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Política

Indigenista no Brasil Imperial. Op. Cit.

Page 33: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

441Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

havia a expectativa de integração desses povos, chegando-se a conside-rar nesta última resposta que o aproveitamento desses braços poderia ser relevante com o fim do tráfico negreiro. Por outro lado, o parecer vindo da Paraíba não economizava palavras para afirmar que todo o esforço de cate-quização tinha sido em vão, destacando especialmente que era impossível confiar cargos públicos aos índios como se pretendia desde Pombal. Já no Ceará e em Pernambuco, o centro das preocupações era o perigo represen-tado por esses homens que, segundo as autoridades provinciais, tinha ganho gravidade a partir do movimento constitucionalista. Por outro lado, é notável a ausência de qualquer resposta por parte de províncias em que os indígenas estavam no centro dos problemas, à exemplo do Grão-Pará.15 Somado a tudo isso, os diferentes graus de incorporação desses povos ao mundo dos brancos não só variavam a cada grupo, mas também tinham importância com pesos diferentes entre as províncias. Já na década de 1840, por exemplo, o Rio Grande do Norte alegou que não poderia aplicar o Regulamento das Missões porque os indígenas já viviam misturados entre os brancos, sob o governo de autoridades civis.16 Certamente tratava-se de um indígena distinto daquele imaginado pelos formuladores do Regulamento das Missões, mas também chama a atenção o fato de que a incorporação ao mundo dos brancos não fazia com que esses homens perdessem o seu traço distintivo para as autori-dades provinciais. Continuavam sendo índios.

Dada a urgência e m muitas regiões, as províncias utilizaram os meca-nismos existentes na tentativa de regular a questão indígena, numa ilustra-ção dos espaços de autonomia existentes para os poderes locais do Império do Brasil, tal como defendido por Miriam Dolhnikoff.17 Fernanda Sposito, centrando-se especialmente no caso de São Paulo, demonstra isso muito bem: não houve um “vazio legislativo” até 1845 porque as províncias busca-ram estabelecer, com várias restrições, acertos e erros, políticas próprias ou sugerir mudanças ao governo central. Em São Paulo, por exemplo, busca-se criar um organismo específico para propor medidas a serem adotadas em relação aos indígenas, a Sociedade de Catequese e Civilização, em 1830. No entanto, o exemplo mais emblemático parece ser a iniciativa do Conselho Geral de Província de São Paulo de pedir para que o Parlamento revogasse as guerras justas decretadas por D. João em 1808, solicitação que é atendida em razão deste pleito local.18 Sposito mapeia os caminhos que levaram à revogação dessas guerras justas, demonstrando que a iniciativa do Conse-lho Geral de Província de São Paulo, que culminará em uma mudança legal efetiva, foi motivada por vários debates que, por sua vez, eram alimentados por acontecimentos em várias partes do território paulista.

Obviamente estas ações locais sobre a política indigenista tinham limites, e a ausência de uma lei geral trazia impasses que eram motivos de queixas, inclusive, dos membros do Conselho Geral de São Paulo. No entanto, o que se quer ressaltar é a que a política indigenista e a definição de leis sobre esse tema não foram abandonadas no âmbito das províncias, algo que se esquece quando o olhar está voltado apenas para os marcos legais definidos pelo Parlamento. Os debates e a proposição de leis, mesmo quando não resultaram em políticas efetivas, evidenciam um papel im-portante das instituições locais e ajudam a compreender os impasses em regiões específicas do Império.

Seguindo essa trilha, este artigo pretende enfatizar a ação do Con-selho Geral da Província do Grão-Pará na tentativa de estabelecer uma política indigenista no período entre 1829 e 1831. Em pesquisas anteriores,

15MONTEIRO, John. Op. Cit.

16SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Política

Indigenista no Brasil Imperial. Op. Cit.

17DOLHNIKOFF, Miriam. O Pacto Imperial: origens

do federalismo no Brasil. São Paulo: Editora Globo, 2005.

18SPOSITO, Fernanda. Liberdade para os índios no

Império do Brasil. A revogação das guerras justas em 1831. Almanack, Guarulhos, n. 01, nov. 2010. Disponível em: <http://www.almanack.unifesp.br/index.php/almanack/article/view/715>. Acesso em: 11 Mar. 2013; SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem brasileiros. Op. Cit.

Page 34: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

442Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

a partir da leitura dos Anais do Parlamento e de documentos esparsos, foi possível apontar que esse debate esteve presente nas discussões do Conse-lho Geral da Província do Pará, inclusive com pelo menos uma representa-ção da província chegando para consideração de deputados e senadores.19 No entanto, restrito aos Anais do Parlamento não era possível saber exa-tamente a recorrência desse assunto no Conselho e seu peso no conjunto dos debates. Ao mesmo tempo, chamava a atenção o fato de, apesar da importância do tema e dele ter sido discutido no Conselho Geral, não se ter conseguido formular neste órgão uma política ampla para os índios que de fato fosse implementada. Essa pretensão – ao menos no que se refere ao disciplinamento da força de trabalho dos que já viviam entre os brancos - só seria alcançada anos depois, já na Assembleia Provincial, com a criação da lei do Corpo de Trabalhadores, em 1838. Por que isso teria acontecido?

Neste artigo, espera-se responder a essas questões somando à pesquisa um conjunto de fontes que vem sendo recolhidas desde 2008 no Arquivo Público do Pará, na Biblioteca Nacional, no Arquivo Nacional e no Arquivo da Câmara dos Deputados. Ainda que com lacunas, esses docu-mentos permitem compreender desde aspectos das eleições para o Conse-lho Geral até um detalhamento das suas sessões. Destaque-se aí a análise das atas do Conselho Geral da Província do Pará, entre 1829 e 1831, algo que só foi possível após montar um quebra-cabeça a partir de documentos dispersos em vários arquivos, realidade totalmente diferente de Minas ou São Paulo, nos quais essas atas foram publicadas. Ainda que a forma de construção das atas desse Conselho imponha certos limites à nossa com-preensão do debate, como será descrito posteriormente, sem dúvida trata-se da melhor documentação para compreender quem eram esses conse-lheiros, quais foram os projetos apresentados em relação aos índios, quais os posicionamentos assumidos e as dificuldades em se chegar a consensos para estabelecer uma política ampla. O recorte cronológico abarca desde o início dos trabalhos do Conselho, em 1829, prosseguindo até 1831. Nesse ano, é deposto o Presidente da Província, com grande repercussão para os trabalhos do Conselho Geral, inclusive no tocante às propostas para os in-dígenas. Também depois de 1831 começa a chegar à província a notícia de que no final do ano anterior, justamente como consequência de uma ação do Conselho Geral, o Parlamento tinha aprovado uma lei que determinava o fim da Milícia de Ligeiros, principal forma de recrutamento dos indígenas para os trabalhos compulsórios no Pará.

A importância no Grão-Pará da definição de uma política indigenistaNo Grão Pará do século XIX não havia como desprezar o problema dos indígenas e, como se verá abaixo, a definição de uma política para essas populações passou a ser cada vez mais urgente. Havia várias razões para isso. Em primeiro lugar, esse era um contingente muito expressivo dos ha-bitantes dos povoados, das vilas, e da cidade de Belém. Na verdade, quase a totalidade das vilas e povoados existentes no Pará no século XIX tinha sido criada durante o governo de Pombal a partir das missões jesuíticas ou de outras ordens anteriormente existentes.20 Portanto, boa parte da população do Pará era composta por descendentes dos indígenas que tinham sido reduzidos pelos jesuítas e que, a partir de Pombal, passaram a ser conside-rados súditos do rei de Portugal, sem qualquer distinção, como se gostava de ressaltar no período.21 Tratava-se, portanto, de um caso parecido com o já relatado no Rio Grande do Norte: ainda que os índios que viviam na

19MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da

Balança: o papel do parlamento brasileiro nos desdobramentos do golpe de 1831 no Grão-Pará. Revista de História, São Paulo, n.164, 2011.

20BAENA, Antonio Ladislau Monteiro. Ensaio

Corográfico sobre a província do Pará. Brasília: Edições do Senado Federal, 2004; ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O Trato dos Viventes: formação do Brasil no Atlântico Sul. São Paulo: Cia das Letras, 2000. p.142-143.

21DOMINGUES, Angela. Quando os índios eram

vassalos: colonização e relações de poder no norte do Brasil na segunda metade do século XVIII. Lisboa: Comissão Nacional para as comemorações dos descobrimentos portugueses, 2000. p.37-41.

Page 35: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

443Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

floresta fossem um assunto recorrente no Pará, sobretudo pelo desejo reto-mar os descimentos, o cerne da questão estava em indivíduos que tinham seus familiares há décadas convivendo com dezenas de etnias diferentes no mesmo espaço e, a partir de Pombal, não só convivendo com os brancos, mas também tendo sua miscigenação incentivada.22

No século XIX, era corrente denominar esses indivíduos como ta-puios, palavra utilizada também por eles para se identificar, como demons-tram alguns documentos. Em textos do período também há designações como “índios avilados” ou “índios cristãos” que, de modo geral, remetem a mesma lógica de identificação.23 Bessa Freire apontou que os graus de domínio da língua portuguesa ou da língua geral também determinavam formas diferentes de nomear esses indivíduos, como índios mansos, tapuios ou índios civilizados.24 Nos registros do período pesquisados, a classificação pura e simples de “índios” e, sobretudo, a menção a etnias específicas mais comumente se restringem aos indígenas que estão na floresta.

Há um debate se a utilização de termos como “tapuios”, retoma-do por José Veríssimo e difundido por Moreira Neto, não simplifica uma realidade múltipla ou ignora a capacidade dos indígenas de reelaborarem suas identidades, mesmo em meio a um processo que pretende tolher suas distinções étnicas.25 Apesar de reconhecer que esse é um debate relevan-te, esse não é o foco deste artigo. Ao contrário disso, o que aqui importa ressaltar é a persistência de termos que identificavam esses homens como indígenas, mesmo que alguns tivessem um alto grau de incorporação à cultura dos brancos. Como se sabe pela historiografia e por registros docu-mentais, desde Pombal havia tapuios exercendo cargos políticos relevantes, como o de vereador, e assumindo progressivamente diversas posições nas tropas, inclusive como oficiais.26 Nas listas de culpados da Cabanagem, homens identificados com o termo tapuio aparecem com as mais diversas ocupações, inclusive como negociantes.27 Mais uma vez, insiste-se, o que importa aqui ressaltar é que, mesmo nessas situações, esses homens con-tinuavam a ter a identidade indígena marcada como um traço de distinção em relação ao resto da população.

O que explica essa persistência? Maria Regina Celestino de Almeida, analisando os aldeamentos no Rio de Janeiro até o século XIX, faz uma rica demonstração de como os indígenas desses lugares foram reelaborando suas identidades desde o XVI. Apesar das diferenças de contextos, essa análise é instigante para essa discussão, pois também se tratam de indígenas em con-tato com os brancos e compartilhando o mesmo espaço com etnias diferen-tes há muito tempo. Almeida destaca que a reelaboração dessas identidades já não tem como guardar estrita correspondência com as origens étnicas específicas de cada grupo, mas a condição de indígena é reivindicada pelos próprios indivíduos. Entre outras razões, a origem indígena era uma forma de assegurar direitos coletivos desses povos, sobretudo a terra.28

No intricado debate sobre a identidade dos “índios avilados” do Pará no século XIX, essa é uma questão que precisa ser mais refletida e pesqui-sada. Por outro lado, parece inegável que a permanência desse traço distin-tivo, tão marcado na relação desses indivíduos com o Estado, estava ligada às questões do controle do seu trabalho. Isso porque apesar de se dizer que os indígenas, a partir de Pombal, eram súditos portugueses sem qualquer distinção, na verdade aplicava-se apenas a esses homens os chamados dispositivos contra ócio: em linhas gerais, logo depois da afirmação da li-berdade dos índios no governo Pombalino, o Diretório disciplinou essa mão

22PORRO, Antonio. História indígena do alto e

médio amazonas. Séculos XVI e XVIII. In: CUNHA, Manuela Carneiro da. História dos Índios no Brasil. São Paulo: Cia das letras, 1992.

23SILVA, Ignácio Accioli de Cerqueira e.

Corografia Paraense ou descrição física, histórica e política da província do Grão-Pará. Salvador: Typografia do Diário, 1833; BAENA, Antonio Ladislau Monteiro. Representação ao Conselho Geral da Província do Pará sobre a especial necessidade de um novo regulamento promotor da civilização dos índios da mesma província. Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará. Tomo II. Belém: Imprensa Oficial, 1902.

24FREIRE, José Ribamar Bessa. Rio Babel: a história

das línguas na Amazônia. Rio de Janeiro: EDERJ, 2004. p.181.

25VERÍSSIMO, José. As populações indígenas e

mestiças da Amazônia, sua linguagem, suas crenças e costumes. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, n.50, tomo 1, p.295-390, 1887. É preciso ressaltar que Veríssimo pensava o tapuio como uma população específica do Pará, mas apoiava-se em uma questão, sobretudo, racial e não histórica. A grande difusão do termo atualmente deve-se, sobretudo, a livro de MOREIRA NETO, Carlos de Araujo. Op. Cit. Para uma crítica a utilização do termo “tapuio”, veja entre outros: LIMA, Leandro Mahalem de. Rios Vermelhos: perspectivas e posições de sujeito em torno da noção de cabano na Amazônia em meados do 1835. Dissertação (Mestrado em História). 2008. 288 fls. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. Em trabalho mais recente, Mark Harris também pontuou o que considera serem as limitações do termo tapuio, apesar de ressaltar que ele era de uso frequente nos documentos do período. Para Harris, as distinções nesse território no século XIX não eram marcadas por uma fixidez em torno das raças, para surpresa dos viajantes que viam classificações como “brancos” e “índios” serem utilizadas com critérios muito fluídos e que dependiam da própria condição social dos indivíduos. Nesse sentido, por exemplo, pontua que um indígena com propriedades e poder podia ser visto por seus pares como um branco. No entanto, acredito que essa fluidez apontada por Harris, apesar de ser verdadeira em muitas situações, encontra o seu limite justamente nas leis que organizam o trabalho. Nos documentos lidos, alguns deles citados adiante, a distinção racial e particularmente a identificação como indígena é um elemento crucial. Por outro lado, é importante destacar que, para Harris, as distinções étnicas dos indígenas que viviam entre os brancos conseguiu ser um elemento importante até o final do século XVIII, mas não mais no século XIX. Entre outras coisas, lembra de um episódio de Spix e Martius na região do

Page 36: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

444Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

de obra. Os indígenas, agora habitantes das vilas e povoados da Capitania, podiam exercer cargos públicos relevantes, tinham seus casamentos com brancos incentivados, mas permaneciam sob a tutela de diretores que ti-nham entre suas principais atribuições garantir a distribuição dessa mão de obra entre os particulares, assegurando ao mesmo tempo o assalariamento desses homens.29 Vê-se que mesmo com a intenção de Pombal de tornar os escravos africanos o principal contingente de trabalhadores do Estado do Grão-Pará e Maranhão, garantir a oferta dos braços ameríndios na região continuou sendo central para o Império Português nessa parte da América.

Isso ganharia ainda mais importância porque, se é inegável que a ação de Pombal trouxe escravos africanos ao Grão-Pará em número muito superior ao de tentativas anteriores, também é verdade que nesta capitania as reformas de meados do XVIII não tiveram o mesmo êxito que no Mara-nhão. Enquanto nessa última província o sucesso das iniciativas agrícolas incentivadas pela Companhia Monopolista, sobretudo do algodão, garantiu o aumento da riqueza e a contínua entrada de escravos africanos, no Pará esse incremento não conseguiu inverter o perfil da mão de obra local: a importân-cia dos cativos africanos aumentou muito, mas os principais trabalhadores do território paraense continuaram a ser os indígenas, especialmente os que viviam entre os brancos e que podiam ser distribuídos pelas autoridades.30

Nessa linha de raciocínio é muito significativo perceber que a legis-lação de 1798, que pôs fim ao Diretório no Pará, também partiu da suposta tendência natural desses homens ao ócio para criar regras que os obriga-vam ao trabalho em obras públicas e particulares. Ou seja, apesar das mu-danças provocadas pela lei de 1798 em relação ao Diretório, permaneceu a lógica que garantia acesso a esse enorme contingente de mão de obra. Todos esses indígenas passaram a ser listados por autoridades militares e submetidos à organização das chamadas Milícias de Ligeiros, principal mecanismo de recrutamento para os trabalhos compulsórios dos tapuios. Pela lei, qualquer um desses indivíduos que não tivesse como comprovar uma ocupação fixa poderia ser recrutado para atividades em obras públicas ou de particulares. Ressalte-se que apesar de receberem pelo trabalho – ainda que, às vezes, com atrasos de anos - não era dada a esses homens a possibilidade de se recusar a cumprir as tarefas deles exigidas.31

Apesar de manter o acesso a esses braços, a lei de 1798 criou restri-ções que, como se verá ao longo do texto, sempre surgiam como ponto de tensão em relação àqueles que queriam ainda maior liberdade no recruta-mento dos trabalhadores indígenas. Não por acaso, propostas para acabar com as restrições criadas pela lei de 1798 aparecem, frequentemente, como pontos centrais nas mudanças que se pretende implementar através dos projetos de políticas indigenistas formulados na província. Uma dessas restrições é a proibição dos antigos descimentos de indígenas da flores-ta, ainda que a lei garantisse que, sob a autorização dos juízes de órfãos, os moradores pudessem, por vários anos, manter como assalariados em suas propriedades índios que supostamente tivessem deixado por vontade própria suas tribos para viver entre os brancos.32 Outro ponto de contínuos conflitos a partir de 1798 diz respeito ao fim da tutela dos indígenas, poder que na lei anterior era exercido pelos antigos diretores. Desde muito cedo e com enorme recorrência ao longo do XIX, parte dos males da província são atribuídos, pelas autoridades e por proprietários, a essa decisão, sob o argumento de que o fim da tutela teria permitido o esvaziamento das vilas a partir do seu contínuo abandono pelos tapuios. Para se ter uma ideia das

Tapajós, em que ao perguntarem ao indígena a sua tribo de origem este não soube responder. HARRIS, Mark. Rebellion on the Amazon: the Cabanagem, Race, and popular culture in the North of Brazil, 1798-1840. New York: Cambridge University Press, 2010. p.40-49.

26MACHADO, André Roberto de A. A quebra da

mola real das sociedades: a crise política do Antigo Regime Português na Província do Grão-Pará (1821-25). São Paulo: Hucitec : FAPESP, 2010; CLEARY, David. Lost Altogether to the Civilised World: race and Cabanagem in Northern Brazil, 1750-1850. Comparative Studies in Society and History, 1998. NOGUEIRA, Shirley M. S. “A soldadesca desenfreada”: politização militar no Grão-Pará na Era da Independência (1790-1850). Tese (Doutorado em História). 2009. 341 fls. Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009. Na verdade, Pombal esmerou-se em constituir uma espécie de elite indígena, distribuindo uma série de privilégios, especialmente às lideranças desses povos, chamados de Principais. Sobre isso, ver entre outros, SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Espelhos partidos: etnia, legislação e desigualdade na colônia, Sertões do Pará, 1755-1823. Tese (Doutorado em História). 2001. 331 fls. Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2001; DOMINGUES, Angela. Op. Cit.; ROCHA, Rafael Ale. Os Oficiais índios na Amazônia Pombalina: Sociedade, Hierarquia e Resistência (1751-1798). Dissertação (Mestrado em História). 146 fls. Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009.

27Arquivo do Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro. Rio de Janeiro, Brasil. lata 290, pasta 3.

28ALMEIDA, Maria Regina Celestino de.

Metamorfoses indígenas: identidade e cultura nas aldeias coloniais do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2001.

29Diretório que se deve observar nas povoações dos

índios do Pará e Maranhão enquanto sua majestade não mandar o contrário. Lisboa: Oficina de Miguel Rodrigues, 1758. IN: MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Índios da Amazônia: de maioria a minoria (1750-1850). Petrópolis: Vozes, 1988. Sobre o Diretório, veja-se: SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Espelhos partidos. Op. Cit.; de DOMINGUES, Angela. Op. Cit.; de COELHO, Mauro Cezar. Do sertão para o mar - um estudo sobre a experiência portuguesa na América, a partir da colônia: o caso do diretório dos índios (1751-1798). Tese (Doutorado em História). 2006, 433 fls. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.

30Sobre o ingresso de escravos africanos no Pará,

veja-se: BEZERRA NETO, José Maia. Escravidão Negra no Grão Pará (séculos XVIII-XIX). Belém: Paka-tatu, s.d; SALLES, Vicente. O Negro no Pará, sob o Regime da Escravidão. Belém: UFPA, 1971; e DIAS, Manuel Nunes. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão (1755-1778). São Paulo: Coleção da Revista de História, 1971. Para uma comparação entre o impacto das reformas pombalinas e o ingresso de escravos africanos, veja-se: MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit.

Page 37: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

445Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

tensões em torno do direito de livre trânsito desses indígenas, é exemplar um episódio descrito por Patrícia Sampaio: na vila de Melgaço, em 1799, um oficial pediu a permissão do governador para buscar três índias – duas fiandeiras e uma mestre da fábrica de fiar – porque estas tinham abando-nado a vila que, por sua vez, não pretendia ficar sem o trabalho especiali-zado dessas mulheres. A atitude de tratar os deslocamentos desses indíge-nas – ressalte-se, homens livres – como um crime de deserção foi comum a ponto de o governador ter que se manifestar, também em 1799, lembrando que o fim do Diretório garantia livre trânsito desses indivíduos como a qualquer súdito do rei.33 De qualquer forma, parece claro que a condição de homens livres dos tapuios estava sempre posta em xeque.

No começo da década de 1820, esse quadro permanecia em suas linhas gerais. As crônicas coevas e os relatos de viajantes deixam regis-trada a onipresença dos índios em quase todas as atividades da província. Eles estavam em funções reservadas aos negros em outras partes do Brasil, mas também em postos das forças armadas, desde o mais reles soldado até os lugares de oficiais.34Já na década de 1830, um relato do Visconde de Goiana dá a dimensão da importância dessa mão de obra na província. Em um longo texto em que Goiana pretendia dar a sua versão do golpe que o depôs da presidência da província – episódio que será detalhado adiante – diz que, diante do crescimento dos conflitos e da oposição à sua adminis-tração, foi-lhe sugerida uma artimanha para recuperar a ordem: propagar o medo de um levante dos escravos africanos, algo que Goiana ironiza di-zendo que esse era o método favorito da época para atemorizar as pessoas e sossegar os ânimos. Mais importante, no entanto, é sua ponderação sobre o peso dessa mão de obra na província, em relação aos indígenas:

No Pará, quase toda a pessoa de servir é cabocla. E quando houvessem negros de algum vulto nenhum cuidado me dariam porque a experiência tem me mostrado que é nesses casos que brasileiros e portugueses se dão as mãos e até os mulatos fazem causa comum contra os negros. Portanto, desse papão eu não tenho medo.35

Pelo contexto do documento, a gente cabocla a que Goiana se refere são os indígenas que viviam entre os brancos e que estavam alistados na Milícia de Ligeiros. A enorme dependência dessa mão de obra fazia com que isso estivesse necessariamente também no centro da vida política da província. É exatamente isso que se constata no início da década de 1820, durante os debates em torno do Vintismo e da Independência.

Como dito anteriormente, ao contrário do que aconteceu em Cádiz, nas Cortes de Lisboa não foram definidas políticas nominalmente des-tinadas aos indígenas, fossem os que estivessem fora do contato com a civilização portuguesa, fossem aqueles que já vivessem nas vilas, povoados e na cidade de Belém. Contudo, os tapuios passaram a reivindicar para si garantias e direitos aprovados nas Cortes de Lisboa, numa lógica que fazia a sua antiga condição de vassalos do rei de Portugal transformar-se no status de cidadão.36 Dentro das questões abordadas neste artigo, o proble-ma que estava posto nessa situação é que a reivindicação desses direitos várias vezes implicava numa tentativa desses grupos de colocar por terra os mecanismos que garantiam a exploração compulsória do seu trabalho.

Exemplo disso é o desdobramento no Pará de uma lei aprovada pelas Cortes de Lisboa que, sob o argumento de pretender incentivar a agricultu-ra, proibiu o recrutamento para as Milícias. A lei foi divulgada em maio de 1822 no número de estreia do jornal O Paraense, o primeiro periódico da

31Sobre a lei de 1798, veja-se SAMPAIO, Patrícia

Maria de Melo. Espelhos Partidos. Op. Cit. Em um artigo, Patrícia Sampaio chega a afirmar que uma lei de 1799 passou a permitir o ingresso na Milícia de Ligeiros não só de indígenas, mas também de negros e brancos que não pudessem comprovar trabalho fixo. No entanto, em todos os documentos até hoje lidos por este pesquisador referentes ao XIX não há evidências de participação de outros grupos nas Milícias de Ligeiros que não fossem os indígenas. Sobre isso, SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Vossa Excelência mandará o que for servido”...: políticas indígenas e indigenistas na Amazônia Portuguesa do final do século XVIII. Revista Tempo, Niterói, n.23, 2007. Sobre a lei de 1798, veja-se também MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit.

32A leitura de Maria Regina Celestino de

Almeida é de que essa brecha permitia, de fato, descimentos privados, supondo que isso atendia ainda mais o interesse dos proprietários. A verdade é que a lei é bastante dura nas críticas aos descimentos e essa brecha não parece ter acabado com os obstáculos para a obtenção dos braços indígenas, dada a recorrência com que se pede o retorno dos descimentos. ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios na história do Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010. p.141-150. Contudo, também é preciso reconhecer que até hoje não tem sido possível dimensionar o número de indígenas que estavam nas propriedades nessa condição no século XIX ou que estivessem simplesmente escravizados.

33SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. Vossa

Excelência mandará o que for servido”. Op. Cit., p.48 e p.53.

34SPIX, Johann Baptist von; MARTIUS, Carl

Friedrich Philipp. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. Belo Horizonte / São Paulo: Itatiaia : Edusp, 1981; SILVA, Ignácio Accioli de Cerqueira e. Op. Cit.

35Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ9

– 108 – Ministério do Reino e Império. Pará, Correspondência do Presidente da Província (1829-31), doc. 313.

36Para Raquel Santos a crescente insubordinação

dos tapuios também se deveria ao fato destes terem tomado conhecimento, mesmo que parcialmente, dos debates em Cádiz referentes aos indígenas. SANTOS, Raquel Dani Sobral. Op. Cit.

Page 38: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

446Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

província, o que certamente contribuiu para o seu conhecimento.37Pouco menos de dois meses depois, José Maria de Moura, Governador de Armas da Província, escreveu a Lisboa dizendo que não cumpriria essa lei. Na carta, expõe em detalhes a situação descrita acima: diz que a maior parte da popu-lação do Pará era composta por índios e que estes estavam, pela lei de 1798, subordinados ao poder militar. Assim, segundo a descrição do governador de armas, os indígenas que não estavam recrutados para as tropas de primeira linha ficavam engajados em Milícias, especialmente na Milícia de Ligeiros, que era a responsável por organizar o trabalho compulsório desses indivíduos em todas as atividades da província. Apesar da cautela para não afrontar o poder em Lisboa, Moura era taxativo: em sua visão, o cumprimento da lei era inviável no Pará, pois os índios não trabalhariam se não fossem forçados tal como eram através do recrutamento para a Milícia de Ligeiros. É justamen-te aí que Moura mostra o impasse em torno desse novo momento político: segundo o Governador, os indígenas estavam recusando o recrutamento e reivindicando para si o direito criado pela lei das Cortes de licenciamento das Milícias, o que punha as autoridades num dilema.38

Este estava longe de ser o único episódio deste tipo. Em 1823, o juiz ordinário da Vila Nova de El-Rei reclamava que não conseguia reu-nir o número de Ligeiros que lhe era exigido, pois os indígenas o estavam ameaçando, sob a alegação de que as Cortes não permitiam mais prisões sem culpa formada, e a prática até então era a de manter esses homens em cadeias e troncos até chegar ao número de trabalhadores necessários.39 Da mesma forma, durante o Vintismo e depois da Independência, é possível verificar vários protestos contra funcionários públicos responsáveis pelo recrutamento forçado dos tapuios, buscando vincular essa prática a atos de despotismo que o constitucionalismo teria vindo derrubar.40

Como demonstrei em trabalhos anteriores, com a Independência essa situação se agrava. Para aqueles que queriam manter o controle dessa mão de obra, o fim do vínculo com as Cortes de Lisboa tinha encerrado os ques-tionamentos legais que deram base às recusas ao recrutamento descritas acima. Para os tapuios, no entanto, a ruptura com Lisboa era um movimen-to tão ou mais radical do que o Vintismo. Ainda que a guerra que se seguiu entre os anos de 1823 e 1825 em várias partes da província seja complexa, parece claro que os embates em torno da manutenção do trabalho compul-sório dos tapuios foi um dos pontos centrais, especialmente potencializado pelo fato de muitos desses indivíduos estarem com armas nas mãos.41

Em pesquisas recentes tem sido possível demonstrar que os mecanis-mos de exploração da mão de obra dos tapuios no Pará continuaram sendo os mesmos da lei de 1798, pelo menos até 1831. Contudo, parece inegável que o questionamento desta lei durante o Vintismo e a Independência enfraquecia sua legitimidade. Em razão disso, a definição de uma política indigenista já vinculada ao novo sistema político era vital na província do Pará. Certamente não é por acaso que, como se verá, esse é o tema que mais mereceu a proposição de projetos no Conselho Geral da Província. Além de dar mais legitimidade aos mecanismos de uso desses trabalhado-res, também é preciso ressaltar que havia pressões no interior da província para modificar dispositivos que tinham sido definidos pela lei de 1798 e que eram considerados obstáculos por proprietários e agentes públicos responsáveis pelo recrutamento. Certamente esse é um dos impulsos que também faz com que outros projetos para os índios sejam formulados na província antes e depois do funcionamento do Conselho Geral, e invaria-

37Arquivo Histórico Ultramarino. Lisboa, Portugal.

ACL, CU 013, Caixa 155, doc. 11.875 (Projeto Resgate). Edição n.01, de 22 de maio de 1822. Sobre O Paraense, a melhor análise é de COELHO, Geraldo Mártires. Anarquistas, Demagogos e Dissidentes: a imprensa liberal no Pará de 1822. Belém: CEJUP, 1993.

38Arquivo Histórico Ultramarino. Lisboa, Portugal.

ACL, CU 013, Caixa 155, doc. 11.874 (Projeto Resgate), 06 de julho de 1822.

39Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

748, doc. 33.

40Talvez o exemplo mais marcante seja a da

demissão do Intendente do Arsenal, João Martins. Arquivo Histórico Ultramarino. Lisboa, Portugal. ACL, CU 013, cx. 151, docs. 11.654 e 11.644.

41Para uma longa análise sobre esses conflitos e

a vinculação com o trabalho compulsório dos tapuios, veja-se: MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit.

Page 39: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

447Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

velmente busquem reverter as restrições aos descimentos e o fim da tutela, esta última identificada como o dispositivo de 1798 responsável pelo livre trânsito dos indígenas e o consequente abandono das vilas.

Estas duas questões estão no centro, por exemplo, do já citado pro-jeto enviado por Zany às Cortes de Lisboa. Tendo como principal foco o Rio Negro, Zany queixava-se das restrições aos descimentos, lembrando que existiam naquele território poucos brancos e raros escravos africanos, em contraste com 26 nações indígenas que permaneciam intocáveis por força das determinações portuguesas. De outro lado, também expunha como um problema o que ele chamou de liberdade absoluta dos índios, que os teria feito abandonar as vilas e se perderem para “a igreja, para o estado e para os particulares”. A partir das suas queixas e sugestões, a Comissão de Ul-tramar das Cortes de Lisboa mandou imprimir um projeto de 20 artigos que contemplavam as reivindicações de Zany. Numa linha muito próxima ao do Diretório, instrui a criação de um inspetor geral dos índios da província e de delegados nas vilas. Em relação aos índios da floresta, o projeto não só previa a continuidade dos descimentos, como definia que o Inspetor a ser escolhido deveria arcar com os custos dessa atividade. Uma vez descidos esses indígenas, seriam divididos entre os particulares que poderiam em-pregá-los como trabalhadores por seis anos, estando os tapuios, inclusive, entre os habilitados a os receberem. Já em relação aos “índios avilados”, a estrutura proposta também lembrava bastante o Diretório: caberia aos inspetores fazer a distribuição dos indígenas para os mais diversos tipos de trabalho e zelar pelos seus pagamentos. Mais do que isso, pelo projeto, os tapuios deixariam de ter livre trânsito, não podendo mais sair das vilas sem o consentimento dos inspetores e delegados, cabendo a estes o dever de buscar o paradeiro desses indivíduos quando não estivessem em suas vilas de origem ou nos trabalhos para os quais tinham sido designados.42

Já depois da Independência, em 1825, vem novamente dessa re-gião um novo plano de civilização para os índios, dessa vez elaborado pelo tenente de 2ª linha, Antonio Joaquim de Bitencourt e Sá, e enviado à Corte.43 Em linhas gerais, é quase uma repetição dos mesmos motes que tinham sido defendidos poucos anos atrás por Zany. Começa enaltecendo as riquezas da região e chega a dizer que a existência dos indígenas na flo-resta impedia a exploração de todo esse potencial, pois estes atacavam até mesmo embarcações. Para resolver esse problema, Bitencourt e Sá só tinha uma solução: retomar os descimentos. Em suas palavras: “A civilização pois destes índios é de grande interesse Nacional, não só tende a remover os obstáculos mencionados mas vai aumentar a riqueza nacional com tantos mil braços hoje inúteis a si e ao Estado”.44

Se há um interesse fundiário, ele é claramente secundário na propos-ta, pois não há uma só linha encaminhando o que se faria com as terras após a remoção dos indígenas. Ao contrário disso, o centro está nos indíge-nas e mais especificamente no controle da sua mão de obra. Dessa forma, Bitencourt e Sá pede para ser o executor desse plano, comprometendo-se a custear os descimentos, algo que mais uma vez lembra o plano de Zany. No entanto, ao contrário do projeto anterior, o tenente deixa claro que os descimentos seriam realizados utilizando a força se necessário, recurso claramente vetado pelas Cortes de Lisboa. Sobre o destino dos indígenas que viviam nas vilas e os que seriam incorporados, Bitencourt e Sá é eco-nômico, mas revelador: diz que nessas situações iria se seguir as normas do Diretório. Mais uma vez ficava explícita a crítica à lei de 1798.

42ZANY, Francisco José Ricardo. Projeto para

os índios do Grão-Pará. IN: Diário das Cortes, 1821/1822. Sessão de 26 de Agosto de 1822. Disponível em: <http://debates.parlamento.pt>. Acesso em: 01 mar. 2014. Não fica totalmente claro nos Diários das Cortes se os itens do projeto foram originalmente escritos em sua totalidade por Zany, se foram apenas modificados pela Comissão de Ultramar, ou se foram integralmente redigidas por essa última a partir das queixas e sugestões enviadas por Zany.

43Agradeço ao meu orientando Samuel Rocha

Ferreira pela localização deste documento.

44Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

855, doc. 45.

Page 40: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

448Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

Outra coisa importante a perceber tanto no projeto de Zany como no Bitencourt e Sá é que o tema dos descimentos tem um destaque maior do que aqueles que serão elaborados no Conselho Geral de Província, mui-to mais concentrados em assuntos relacionados a disciplinar e regular a mão de obra dos “índios avilados”. Talvez uma explicação para isso esteja justamente na exposição do projeto de Bitencourt e Sá: segundo ele, histo-ricamente os índios descidos não ficavam na sua região de origem, sendo levados para Belém e dali distribuídos em prejuízo de regiões como o Rio Negro.45 Assim, parece que nessa questão a situação no centro da provín-cia era distinta do interior, sendo que nesta última havia a necessidade de recompor a mão de obra, além de discipliná-la.

Como se sabe, assim como os projetos de uma política indigenista elaborados no Conselho Geral da província do Pará jamais foram executa-dos46, as propostas de Zany e de Bitencourt e Sá também não obtiveram êxito. No entanto, será no âmbito da província que uma lei imperial final-mente regulará o controle da mão de obra dos indígenas no Pará. Como a segunda lei elaborada na Assembleia Provincial, cria-se em 1838 o Corpo de Trabalhadores. Em plena guerra da Cabanagem, o Corpo de Trabalhadores garantiu que todos os homens livres do Pará que não tivessem ocupação conhecida, excetuando os brancos, pudessem ser obrigados a trabalhar tanto para particulares como em obras públicas.47 Há aqui três pontos a serem ressaltados: primeiro, a evidência de que esse era um assunto urgente no Pará, a ponto de ser a segunda lei criada pela Assembleia Provincial. Em segundo lugar, o recorte racial, já que os brancos são os únicos que não podem ser obrigados a trabalhar. Em terceiro lugar, mesmo não se identificando como uma proposta de política indigenista, ao contrário dos projetos de Zany, de Bitencourt e daqueles elaborados no Conselho Geral de província que sempre se intitulavam como planos de civilização, o grande impacto da medida estava em disciplinar o trabalho dos tapuios, inclusive pela sua dimensão demográfica, ainda que a lei também permitisse o serviço compulsório de negros e mestiços livres. Na verdade, agora sob a legitimidade de uma lei promulgada já no Império, os dispositivos do Corpo de Trabalhadores retomavam em larga medida a organização das Milícias de Ligeiros que, como se verá, tinham sido extintas pelo Parlamento em 1831. Uma das questões que reforçam essa impressão é que a lei garantia que os comandantes e oficiais responsáveis pelo Corpo de Trabalhadores seriam os que anteriormente exerciam essa função na extinta Milícia de Ligeiros. Caberia a esses indivíduos a distribuição dos braços para obras públicas e particulares. Outra questão importante é que a nova lei atendia a críticos da lei de 1798: ficava garantido que os homens alistados no Corpo de Trabalhadores não poderiam deixar suas vilas sem a permissão dos oficiais. Ou seja, os tapuios e demais homens sob esse regime, apesar de livres, não tinham mais liberdade de trânsito.48

A partir da reflexão acima, parece evidente que a definição de uma política indigenista no Pará era algo importante na província, inclusive suscitando propostas locais para o tema antes e depois da existência do Conselho Geral de Província, e sempre centradas em um aspecto comum: a preocupação em regular o trabalho dos indígenas. A seguir, vejamos como o Conselho encaminhou e expressou essa demanda local.

Os Conselheiros e a dinâmica do Conselho Geral da Província do ParáA instituição dos Conselhos Gerais foi uma das conquistas mais importan-tes dos grupos políticos que defendiam maior liberdade para o governo

45Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Loc. Cit.

46Pelo menos não no seu teor original.

47Arquivo do Instituto Histórico e Geográfico do

Pará. Belém, Brasil. Lata 415, pasta 8. Collecção das leis provinciaes do Pará promulgadas na primeira secção que teve principio no dia 2 de março e findou no dia 15 de maio de 1838 e vão numeradas de 1 a 13. Pará: Tipografia Restaurada, 1838.

48Sobre o Corpo de Trabalhadores, veja-

se: FULLER, Claudia Maria. Os Corpos de Trabalhadores: política de controle social no Grão-Pará. Revista de Estudos Amazônicos, Belém, v.III, n.01, p.93-115, 2008; MOREIRA NETO, Carlos de Araújo. Op. Cit.; MACHADO, André Roberto de A. O direito e o arbítrio em tempos de Guerra: os debates no Parlamento em torno das garantias constitucionais durante a repressão à Cabanagem (1835-40). IN: NEVES, Lúcia Maria Bastos P. das; BESSONE, Tânia Maria (org.). Dimensões Políticas do Império do Brasil. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012.

Page 41: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

449Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

das províncias nos primeiros anos do Império do Brasil. A existência desse Conselho estava prevista na Carta Constitucional de 1824 e, como se verá, chegou-se a providenciar neste ano as eleições para estes postos, inclusive no Pará, em conjunto com a escolha de deputados e senadores e de mem-bros do Conselho Presidencial.49

Contudo, o funcionamento desta instituição só ocorreu a partir de 1828, já que dependia de uma regulamentação do Parlamento que con-sumiu dois anos de intensos atritos entre o Senado e a Câmara em torno de detalhes do projeto. Nesse sentido, é exemplar que na fase final das negociações a regulamentação tenha travado justamente entre o desejo da Câmara em dar aos conselheiros a imunidade para emitir opiniões e a firme decisão do Senado em não aceitar essa formulação. Este debate, de alguma maneira, sintetizava as posições entre aqueles que desejavam aumentar o poder dos conselheiros frente a outras autoridades provinciais, como o presidente, e os que rejeitavam esse encaminhamento. Andréa Slemian mostra que a urgência da maioria dos deputados para fazer funcionar os Conselhos Gerais de Província foi decisiva para que a Câmara acabasse abrindo mão da sua disputa com o Senado e desistisse temporariamente da imunidade dos conselheiros.50

Não foi por acaso que a maioria dos deputados aceitou o recuo. A criação dos Conselhos Gerais de Província era uma peça importante na ação do grupo político que ficou consagrado na historiografia como “libe-rais” e identificado como os protagonistas no esforço de descentralização das decisões políticas e administrativas do Império.51 Em menos de uma década desde o começo dos trabalhos legislativos, em 1826, são criadas instituições nessa direção como os Juízes de Paz, a Guarda Nacional e, posteriormente, as próprias Assembleias Provinciais que substituirão os Conselhos Gerais após a reforma constitucional.52 Particularmente, a cria-ção dos Conselhos Gerais era urgente no contexto em que se iniciou a vida política do Império, quando as províncias tinham raros mecanismos para encaminhar e gerir as suas demandas. O alto grau de centralização das decisões fica patente nas atas do Parlamento. Na primeira legislatura, entre 1826 e 1829, vários deputados dedicaram seu mandato a fazer solicitações restritas ao cotidiano das suas províncias de origem, como o simples pedido da contratação de um professor para uma escola no interior, a construção de uma estrada, de uma ponte ou até mesmo solicitar um terreno para um Seminário. Justamente um deputado do Pará, João Cândido de Deus e Silva, talvez seja o exemplo mais acabado deste perfil: nos seus dois primei-ros meses de mandato formalizou 25 projetos deste tipo.53 Obviamente, demandas desta natureza, frequentemente apresentadas diretamente ao plenário sem passar por nenhuma comissão, caíam no vazio. Como dito inúmeras vezes, sobretudo na Câmara, não havia condição dos parlamenta-res sequer começarem a discussão sobre demandas que pouco conheciam e que eram peticionadas, de modo geral, sem levar em consideração as fontes de recurso para executá-las.

Com a sua criação, em 1828, o Conselho Geral podia sugerir medidas de interesse específico para a sua província, mas a transformação dessa proposta em lei ainda era condicionada à sua aprovação no Parlamento. Também é preciso ressaltar que esse órgão não tinha autonomia tributária, sendo os orçamentos provinciais ainda decididos por deputados e sena-dores.54 Apesar dessas limitações, o Conselho Geral parecia uma enorme mudança, pois as demandas da província seriam encaminhadas após um

49As atas do Pará deixam claro que se seguiu

rigorosamente as instruções eleitorais de 1824. Para estas instruções, veja Decreto de 26 de março de 1824 – Manda proceder à eleição dos Deputados e Senadores da Assembleia Geral Legislativa e dos Membros dos Conselhos Gerais de Províncias. IN: SOUZA, Francisco Belisário Soares de. O Sistema Eleitoral no Império. Brasília: Senado Federal, 1979.

50SLEMIAN, Andréa. Sob o Império das leis:

constituição e unidade nacional na formação do Brasil (1822-1834). São Paulo: Hucitec: FAPESP, 2009. p.148-159.

51Sérgio Buarque de Holanda faz uma importante

ressalva ao demonstrar que a vinculação automática entre liberalismo e a pretensão descentralizadora, apesar de estar consagrada na nossa historiografia, não era um senso comum entre os homens do período. HOLANDA, Sérgio Buarque de. A Herança colonial – sua desagregação. IN: ______. (org). História Geral da Civilização Brasileira. Tomo II – O Brasil Monárquico. Volume 1 – O processo de emancipação. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p.15-20.

52Sobre o período e estas reformas veja-se, entre

outros: FLORY, Thomas. El juez de paz y el jurado en el Brasil Imperial: control social y estabilidad política en el nuevo estado. México: Fondo de Cultura Económica, 1986. cap.1; SLEMIAN, Andréa. Op. Cit.; e DOLHNIKOFF, Miriam. Op. Cit.

53MACHADO, André Roberto de A. Machado. As

“reformas em sentido federal”. A atuação dos representantes do Grão-Pará no Parlamento e as expectativas na província em torno do Ato Adicional. Revista Estudos Amazônicos, Belém, v.4, n. 01, p.57-58, 2009.

54SLEMIAN, Andréa. Op. Cit., p.145-200;

DOLHNIKOFF, Miriam. Op. Cit., p.59-60.

Page 42: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

450Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

debate local e a obtenção de um consenso mínimo capaz de aprová-la nesse fórum. Ao ler a regulamentação do Conselho Geral e mesmo as atas desta instituição no Pará fica claro que o seu funcionamento foi pensado de forma a replicar em grande medida o Parlamento, com uma série de ritos que pretendiam demarcar a sua dignidade e poder.55 Tal como havia uma Fala do Trono no início dos trabalhos legislativos na Corte, na província o Presidente também dirigia uma comunicação ao Conselho Geral, apontado prioridades para as quais chamava a atenção. E, assim como no Parlamento, os conse-lheiros redigiam uma resposta que em algumas ocasiões podiam expressar discordâncias ou censuras ao Executivo. A organização dos trabalhos, de-bates e votações, além da completa independência de gestão em relação ao Executivo, tudo lembrava o trabalho de Deputados e Senadores.

Apesar do entusiasmo gerado pela criação dos Conselhos Gerais, logo se percebeu suas limitações. Como dito anteriormente, mesmo após ser aprovada nas votações, a proposta dos conselheiros tinha que ser enviada para o Parlamento e apenas se confirmada nesta última instância teria algum valor prático. Como se pode imaginar, esse era um percurso muito demorado e de difícil fluxo, já que as propostas começaram a chegar, às dezenas, vindas de todas as províncias. Para se ter uma ideia, em meados de 1833, já se contabilizavam mais de 200 propostas vindas de Conselhos de Província que ainda aguardavam apreciação do Parlamento, sendo que algumas estavam nas gavetas da Câmara e do Senado há quatro anos.56 Mais uma vez, o caso do Pará é exemplar: até 1834, quando a reforma Constitucional extinguiu os Conselhos Gerais em favor das Assembleias Provinciais, apenas uma única proposição conseguiu passar pela Câmara e pelo Senado e, ao final, ser aprovada e transformada em lei.57

Frente à impossibilidade de dar vazão às demandas das províncias foram feitas várias propostas de reformas. Em 1832, por exemplo, o senador José de Alencar sugeriu que passassem a ter validade automática as pro-posições do Conselho Geral que conseguissem ter dois terços de aprovação entre os seus conselheiros, além do mesmo percentual de consentimento dos membros do Conselho Presidencial e sanção do próprio presidente. Apesar de ser um trâmite também difícil, a proposta foi considerada absurda pelo Visconde de Cairu, que alegou que o governo central ficaria às cegas. Isto deixava clara a franca resistência de uma parte do Parlamento em abrir mão de um controle absoluto da decisão final sobre as demandas provinciais.58

Como resultado, logicamente, as frustrações se avolumaram. Perceben-do que uma resolução enviada pelo Conselho Geral do Maranhão, em vez de ser aprovada, teria sua apreciação adiada até que viessem várias informações exigidas pelo Senado, o Visconde de Alcântara, senador por esta província, manifestou-se duramente: sem meias palavras, disse que os projetos en-viados eram tratados de maneiras diferentes dependendo das províncias de origem, chegando a alegar que já teria presenciado a aprovação de verda-deiros absurdos. Duas semanas mais tarde foi ainda mais claro: para ele, as províncias do norte estavam sendo prejudicadas nesse jogo.59

A despeito de haver ou não privilégios de algumas províncias no trâ-mite das suas propostas, o fato é que apesar da regra para criação desses Conselhos ser uniforme para todo o Império, havia diferenças entre eles que afetavam diretamente seu prestígio, influência e até a natureza das suas propostas. A primeira que chama a atenção é que a proximidade do Conselho em relação à Corte podia ser decisiva para a sua composição ou para a melhor recepção de suas propostas entre deputados e senadores. Em

55Lei de 27 de agosto de 1828. Dá Regimento para

os Conselhos Gerais de Província. IN: Coleção das Leis do Império do Brasil. 1828, parte primeira. Rio de Janeiro: Tipografia Nacional, 1879. p.10-23.

56ANAIS do Parlamento Brasileiro. Câmara dos sr.

deputados, em 4 de junho de 1833. Disponível em: <http://imagem.camara.gov.br/pesquisa_diario_basica.asp>. Acesso em: 01 mar. 2014.

57ANAIS do Senado do Império do Brasil. Em

11 e 27 de outubro de 1830. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/publicacoes/anais/asp/IP_AnaisImperio.asp.> Acesso em: 01 de março de 2014. A lei aprovada determinava que os estrangeiros tinham um prazo para se apresentarem ao juiz de paz e registrarem sua presença na província. Da mesma forma, para se retirarem da província precisavam igualmente de uma autorização.

58ANAIS do Senado do Império do Brasil. Em 23 de

maio de 1832.

59Ibidem, em 17 e 31 de maio de 1833.

Page 43: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

451Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

São Paulo, por exemplo, um dos conselheiros mais ativos era o padre Feijó, que ao mesmo tempo era um dos principais parlamentares do período.60 Ao mesmo tempo, Bernardo Pereira de Vasconcelos não deixava sua influência apenas na Câmara, mas ocupava-se também dos assuntos e de cargos em Minas. A consequência era a sua proximidade com os temas tratados no Conselho Geral da sua província, algo que lhe rendeu inclusive a aberta defesa de proposições feitas frente às críticas dos parlamentares.61 Isso era possível em lugares próximos da Corte, como São Paulo ou Minas, porque o período de reunião dos Conselhos Gerais, entre o final de novembro e janeiro, fazia-se no recesso dos trabalhos parlamentares. De modo contrá-rio, o longo tempo gasto para percorrer a distância entre a Corte e Belém, por si só impedia a participação como conselheiro de algum representante paraense, ou mesmo seu acompanhamento mais próximo dos trabalhos lá desenvolvidos. Consequentemente, nas sessões analisadas, os conselhei-ros eram todos figuras de destaque na política local, mas nenhum deles chegou ao teatro da Corte. Da mesma forma, também não esteve entre os Conselheiros o bispo Romualdo Coelho, homem que ainda gozava de gran-de influência, ou titulares da presidência da província durante o Império, como o paraense Araújo Rozo, ainda atuante.

Talvez a ausência de políticos com mais trânsito na Corte tenha facilitado o foco do Conselho nos assuntos ligados à província se compa-rado às situações de Minas Gerais ou São Paulo. Entre as propostas vindas de Minas, por exemplo, a primeira delas dissertava sobre a necessidade de ampliar o prazo para extinção do tráfico negreiro, assunto claramente fora do escopo dos Conselhos Gerais.62 No caso de São Paulo, Marisa Leme mostra que também há uma contínua tentativa de interferir em assuntos da política nacional, com pronunciamentos sobre questões gerais e ações dos partidos na Corte.63 De modo diferente, há um cuidado dos conse-lheiros paraenses em se concentrar nos assuntos locais, só reportando-se à política nacional em assuntos específicos, geralmente atrelados a um desdobramento de questões provinciais.

Para os Conselhos Gerais de províncias mais populosas, como o Pará, deveriam ser eleitos 21 conselheiros. As eleições aconteciam simultanea-mente com a de senadores e de deputados, com os mesmos procedimentos, obedecendo esta ordem e produzindo o eleitor uma lista para cada um dos cargos. O Pará ficou dividido em dez colégios eleitorais: a cidade de Belém e as vilas de Bragança, Viçosa, Santarém, Barcelos, Marajó, Nova da Rainha, Crato, Olivença e Cametá. Cada um desses colégios devia enviar suas listas de nomes votados para conselheiros à Câmara de Belém, onde se fazia finalmente a somatória e a indicação dos eleitos.64

Após a pesquisa em vários acervos foi possível encontrar uma parte dessas listas dos colégios eleitorais do Pará no Arquivo Nacional, tanto para o ano de 1824 quanto para o ano de 1828. Infelizmente, por exemplo, não foi possível localizar a ata geral com os votos totais dos Conselheiros, o que permitiria saber quais foram os mais votados. As atas entre 1829 e 1831 apenas identificam os que tomaram posse na medida em que che-gavam ao Conselho, pelo que foi possível fixar 20 nomes, já contando os suplentes que exerceram o cargo. Também é de se lamentar a ausência das listas de lugares importantes, como Belém. A quantidade de informações das listas varia bastante, com algumas descrevendo apenas os nomes e votos, enquanto outras acrescentam as ocupações e os lugares de resi-dência. Mesmo podendo contar apenas com os dados parciais, é possível

60LEME, Marisa Saenz. Dinâmicas centrípetas e

centrífugas na formação do Estado monárquico no Brasil: o papel do Conselho Geral da Província de São Paulo. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.28, n.55, jun 2008.

61ANAIS do Parlamento Brasileiro. Em 25 de abril

de 1829.

62ANAIS do Parlamento Brasileiro. Loc. Cit.

63LEME, Marisa Saenz. Op. Cit.

64Decreto de 26 de março de 1824 – Manda

proceder à eleição dos Deputados e Senadores da Assembleia Geral Legislativa e dos Membros dos Conselhos Gerais de Províncias. IN: SOUZA, Francisco Belisário Soares de. O Sistema Eleitoral no Império. Brasília: Senado Federal, 1979.

Page 44: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

452Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

fazer alguns apontamentos importantes, como as diferenças nos perfis dos votados em 1824 – que não assumiram por falta da regulamentação dos Conselhos – e dos conselheiros escolhidos em 1828 e que serão os perso-nagens desse artigo.

De 1824 foram localizadas cinco atas eleitorais: das vilas de Vigia, Cametá, Santarém, Macapá e Marajó.65 Considerando os 21 nomes mais vo-tados de cada lista, a primeira coisa que chama a atenção é o número mui-to grande de militares eleitos, alguns deles oficiais das Milícias de Ligeiros. São 14 militares identificados em Vigia, 13 em Cametá, 13 em Santarém, 13 em Macapá e espantosos 16 em Marajó. Enquanto isso, a quantidade de pessoas com outras ocupações, como bacharéis em Direito ou reli-giosos, é baixa, ao contrário do que será em 1828. Aliás, o perfil entre as duas votações é bastante diferente. Isso se expressa pelo pouco número de votados em 1824 que coincidem com os conselheiros eleitos em 1828. Em Vigia, Santarém e Marajó são apenas dois em cada lista, em Cametá um e em Macapá nenhum. Também chama a atenção o fato de não serem mencionados nenhuma vez personagens que serão centrais no Conselho Geral agora estudado, como Batista Campos, àquela altura já um protago-nista na política provincial. Há algumas explicações para isso: em primei-ro lugar, a província vivia em 1824 uma guerra civil, o que certamente contribuiu para o protagonismo dos militares.66 Diretamente ligado a isso, a eleição para o Conselho Geral de Província parece ter seguido a mesma tendência que já descrevi para as eleições de deputados no Pará: em 1824, em meio à repressão da guerra civil, os nomes escolhidos tem um perfil mais conservador. Em 1828, os nomes escolhidos para o Parlamento já são mais identificados a uma postura liberal.67 Aparentemente, essa mudança de perfil não é tão radical no caso do Conselho Geral, mas sem dúvida ele é mais plural do que na primeira eleição. Outro ponto importante a destacar é a grande dispersão dos votos: dos 105 nomes que compõe os 21 mais votados de cada lista, 58 são citados apenas em um colégio eleitoral. Em contraposição, apenas três nomes conseguem aparecer em quatro colégios eleitorais diferentes. Acredita-se que isso é suficiente para demonstrar a inexistência de uma lista fechada de nomes a serem votados e que, se existiram tentativas por parte dos poderes provinciais de controlar o pleito, o resultado foi infrutífero. Outro ponto a destacar é que não parece que a dispersão dos votos expresse os poderosos locais, pois quando a lista cita o lugar de residência muitas vezes ela é distinta do colégio eleitoral.68

Esses últimos aspectos se repetem nas eleições de 1828. Deste pleito foram localizadas atas de quatro colégios eleitorais: Cametá, Porto de Moz, Macapá e Rio Negro. Dos 84 nomes indicados, 40 também são citados ape-nas em um colégio eleitoral. Em contraposição, apenas três nomes aparecem em três das quatro listas localizadas. Ainda que em Macapá e no Rio Negro, os nomes identificados como militares continuem muito numerosos, com 16 e 14 respectivamente, isso parece ter sido a exceção. Tanto é assim que entre os primeiros 21 nomes indicados por Macapá, apenas três estão entre os eleitos para o Conselho Geral, sendo que no caso do Rio Negro esse índice chega a quatro. É um quadro muito distinto de Cametá, um dos maiores colégios eleitorais da província. Lá, em 1828, apenas um nome identificado como militar está entre os mais votados, número menor do que os sete cléri-gos e os dois indivíduos classificados como “doutores”. Esse perfil parece ter sido o predominante no conjunto da província, pois entre os 21 nomes mais votados em Cametá, 12 foram escolhidos para o Conselho. Esse foi o mesmo

65Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ5

– 18. Ministério do Império. Eleições. Pará. Correspondências (1824-49). Tanto em 1824 quanto em 1828, as sedes dos colégios eleitorais são levemente diferentes daquelas estabelecidas no decreto de 1824.

66MACHADO, André Roberto de A. A quebra da

mola real das sociedades. Op. Cit., cap. 4 e 5.

67Sobre a comparação entre estas eleições:

MACHADO, André Roberto de A. Redesenhando caminhos: o papel dos representantes do Grão-Pará na primeira legislatura do Império do Brasil (1826-29). Almanack Braziliense, São Paulo, v.10, p.75-97, 2009; MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da Balança. Op. Cit.

68Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ5

– 18. Ministério do Império. Eleições. Pará. Correspondências (1824-49).

Page 45: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

453Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

índice de eleitos em Porto de Moz entre os 21 mais votados, colégio em que o número de militares escolhidos também foi baixo.69

Terminada as eleições em 1828, os trabalhos do Conselho Geral de Província começaram no dia 29 de novembro de 1829. Nas duas primei-ras sessões anuais, 1829/30 e 1830/1831, o presidente dos trabalhos foi Antonio Correa de Lacerda, figura então conhecida por ter sido o presi-dente da Junta de Governo eleita durante o Vintismo. Também chama a atenção a presença de Marco Antonio Rodrigues Martins e Marcelino José Cardoso, dois líderes do golpe de agosto de 1831 que depôs da presidência da província o Visconde de Goiana. Entre os mais atuantes, igualmente foi conselheiro o cônego Batista Campos, um dos personagens mais importan-tes da política local desde o Vintismo e um dos homens presos e depor-tados para o interior da província pelo golpe de 1831.70 Também bastante ativo é Silvestre Antunes da Serra, que chega ao cargo como suplente. Serra ficou bastante conhecido por sua atuação na imprensa do Pará, que durante muito tempo esteve alinhada às posições de Batista Campos. Além desses, tinha sido eleito Felix Antonio Clemente Malcher, protagonista político também do tempo da Independência e que, posteriormente, será o primeiro presidente da província durante a Cabanagem. Malcher, entretan-to, não chegou a tomar posse do cargo por estar sofrendo um processo no Conselho de Guerra. Ainda compunham esse primeiro conselho João Mar-celino Rodrigues Martins, Jacinto Francisco Lopes, João Batista Camecran, João Manoel Ribeiro, Antonio Manuel de Souza Trovão, Carlos Manuel de Alcantara, José Domingues de Serqueira, Francisco Pinto Moreira, André Fernandes de Souza, Francisco de Pinto Castilho, Agostinho Domingues de Serqueira, Manuel Otávio Prestes e Francisco de Elvas Portugal. Também foi eleito Ambrósio Henrique da Silva Pombo, que pediu dispensa por já ser presidente da Câmara de Belém, alegando, além disso, estar doente. Seu caso não é discutido claramente nas atas, mas o fato é que não assume o posto.71

Além de contar com a presença de vários dos protagonistas políticos do Pará desde o Vintismo, a composição do Conselho Geral também espe-lhava a presença de famílias economicamente poderosas na província. Por exemplo, partindo das considerações de Shirley Nogueira, é possível en-contrar aqui os Pombos e Elvas Portugal, apontados por ela como famílias que enriqueceram através dos seus postos militares, algo bastante comum nesta região e que muitas vezes estava relacionado ao controle da mão de obra indígena. Também na sua descrição, os Cardoso tinham fazendas em Marajó, e os Correa de Lacerda milhares de cabeças de gado. Ao mesmo tempo, chama atenção a ausência dos Chermont, Moraes Bittencourt, e Ayres, que segundo Nogueira estariam entre os principais da terra e que tinham em comum a riqueza mais ligada à economia propriamente agríco-la, com plantações de arroz, cacau e engenhos.72

Apesar de contar com a participação de figuras de prestígio, em seus primeiros dias o Conselho Geral do Pará convivia com uma contradição: de um lado, havia um esforço real dos seus membros em dotá-lo de poder, testando todos os seus limites. Isso fica nítido nos vários choques diretos dos conselheiros com os presidentes da província. Um dos mais impres-sionantes ocorreu justamente nos primeiros dias de funcionamento do novo órgão, quando este recebeu uma representação contra o escrivão da Câmara, Tristão Rangel de Azevedo Coutinho.

Este era um assunto corriqueiro no Conselho, pois era frequente o recebimento neste órgão de representações de cidadãos ou instituições

69Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. Loc. Cit.

70MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da

Balança. Op. Cit.

71Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, em 29 de novembro, 1 e 14 de dezembro de 1830.

72NOGUEIRA, Shirley M. S. “A soldadesca

desenfreada”. Op. Cit. Numa perspectiva diferente, Mark Harris também analisa a trajetória de algumas famílias do Pará e sua importância na política. HARRIS, Mark. Op. Cit., p.81-91.

Page 46: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

454Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

queixando-se da conduta de funcionários públicos. Assim como fizeram em outros casos, os conselheiros encaminharam a questão para o presidente da província, então o Barão de Bagé, e exigiram providências. No entanto, ao contrário de outras ocasiões, o presidente deu uma resposta ríspida, di-zendo que isso era sua atribuição e resolveria do seu jeito. Os conselheiros escreveram, então, uma réplica, dizendo que não reconheciam autoridade na província que pudesse dizer quais eram os limites das suas atribuições. O Barão de Bagé, na sequência, respondeu de maneira ainda mais agres-siva, dizendo que não admitiria mais receber correspondências sobre esse assunto. Frente a isso, o Conselho decidiu escrever diretamente ao Impe-rador, denunciando o caso. Além disso, decidiu tornar pública sua ação através de uma anotação no Livro da Porta, o que deixa clara a preocupa-ção dos representantes em demonstrar para a população que os assuntos eram encaminhados.73

Já em 1831, o Conselho voltou a ter um novo enfrentamento com o presidente da província, agora José Félix Pereira de Burgos, o Barão de Itapicuru-mirim. Os conselheiros decidem escrever ao Parlamento quei-xando-se que o presidente não fornecia as informações solicitadas que seriam essenciais para fazer os projetos de melhorias da província. Mais do que uma queixa, o Conselho do Pará desejava que a Câmara e o Senado se pronunciassem, dizendo que o executivo local era obrigado a dar essas informações.74 Na verdade, a disputa local espelhava também o confronto que já ocorria no Parlamento entre os que pretendiam que os presidentes de província pudessem ser questionados pelo Conselho Geral e aqueles que discordavam disso de maneira enérgica.75

Do outro lado da contradição, por conta da ocupação concomitante de outros postos pelos conselheiros, em muitos momentos ficou claro que a nova instituição ainda tinha menos prestígio do que outras já consagradas. O caso extremo foi a já citada recusa de Ambrósio Pombo em tomar seu posto, sob a alegação de que já era presidente da Câmara de Belém. Ainda que não tenham renunciado à sua condição de conselheiros, são várias as ocasiões em que os membros do Conselho justificam suas faltas pela necessidade de comparecer a outros órgãos, como a Câmara ou o Conselho Presidencial, ocorrendo em várias ocasiões o cancelamento da sessão por falta de quórum.76

Essa opção dos conselheiros chega a ser difícil de compreender, sobretudo em relação às Câmaras, pois a lei criada em outubro de 1828 subordinava várias de suas ações ao Conselho, num claro esvaziamento do órgão antigo pela valorização dos poderes provinciais.77 Já nas sessões acompanhadas, as Posturas da Câmara da cidade de Belém e de várias outras vilas são discutidas minuciosamente pelo Conselho, que não só as validava ou recusava, mas também fazia emendas. Desse modo, a interferência do Conselho nos assuntos mais corriqueiros das Câmaras, como a regulação do comércio ou a definição de multas para quem não acendesse os lampiões, era ainda maior do que a do Parlamento em relação ao Conselho, já que este último exercia o poder de emendar as decisões antes tomadas pela Câmara. Aliás, a desgastante tarefa de analisar cada ponto das posturas é uma das explicações para o pequeno número de proposições relevantes encaminhadas pelo Conselho ao Parlamento: das 57 sessões efetivamente realizadas entre novembro de 1829 e fevereiro de 1830, 24 tiveram como principal pauta a discussão das Posturas de Belém, reservando-se ainda mais quatro dias para o debate das Posturas das vilas

73Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 11, 16, 17, 23, 24 de dezembro de 1829 e 05 de janeiro de 1830.

74Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. MS-

602, doc. 17 – Atas do Conselho Geral do Pará, sessões de 23 e 26 de fevereiro de 1831.

75SLEMIAN, Andréa. Op. Cit.

76Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 07 de janeiro , 03 de fevereiro, 18, 20, 22, 23, 24, 29, 30 de dezembro de 1830.

77SLEMIAN, Andréa. Op. Cit., p.193.

Page 47: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

455Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

de Óbidos, Melgaço, Cametá e Marajó. Aliás, a própria prorrogação dos trabalhos do Conselho, que deveria ter findado em janeiro, foi justificada pelo presidente por não se ter terminado de aprovar as Posturas da Câmara de Belém. Como se vê, o debate das posturas municipais foi responsável por praticamente a metade das atividades dos Conselheiros, o que claramente dificultou a elaboração de proposições sobre problemas capitais para a província.

Além disso, o prestígio da nova instituição também pode ser medido pelas várias petições que para lá foram encaminhadas. São queixas contra funcionários públicos, como a já citada, alegação de aplicação de multas injustas, queixas contra maus tratos ou falta de pagamento e até mesmo pedidos de aumento de salário. No nível local, o Conselho Geral parece ter ocupado o papel que Vantuil Pereira enxergou para Parlamento: o guar-dião dos direitos constitucionais.78 Papel este, destaque-se, reforçado pela decisão dos deputados de acolher denúncias do Conselho contra membros do poder executivo e judiciário da província, acusados de despotismo.79

Diante disso, talvez a explicação que reste para a preferência de alguns conselheiros em ocupar seus postos em instituições antigas seja a dificuldade até então de enxergar qual era o poder de deliberação do Conselho. Esta era uma discussão até mesmo no Parlamento, onde vá-rios representantes insistiam que os conselheiros podiam apenas sugerir medidas e nada mais. Isso esbarrava muitas vezes em situações práticas. Por exemplo, em uma das suas primeiras medidas o Conselho desejou criar uma imprensa para publicar suas atas. Houve grande discussão para viabilizar isso, chegando-se a comunicar o presidente. Por fim, decidiu-se encaminhar isso ao Parlamento como proposição, inclusive descrevendo os funcionários necessários e seus salários. A resposta do Parlamento foi recusar a medida, sob a alegação de que o Conselho não tinha a prerroga-tiva de criar cargos.80 Em situações como essa, certamente restou a muitos a impressão que o Conselho tinha prestígio, mas pouco poder real.

A política para os índios debatida no Conselho Geral do ParáA evidência da importância da questão indígena no Pará, entre outras coisas manifesta-se na forma como este assunto foi recorrente durante as sessões do Conselho Geral de Província, surgindo nos debates dessa insti-tuição de diferentes modos. Um deles foram os discursos dos presidentes da província que abriram as sessões anuais do Conselho, quando o tema surge, mas sempre de maneira sutil, não direta. Exemplo disso é a fala do Barão de Itapicuru-mirim, em dezembro de 1830. Assim como a fala do ano anterior, centrava de início na questão do trabalho e da produção como um dos temas chaves da província. Logo no primeiro ponto indicado por ele para ser objeto de reflexão do Conselho, discursava sobre o homem primitivo, dizendo que esta condição não podia se manter. Supostamente amparado na história, insiste que o caminho natural era a civilização dos homens e a sua sujeição às leis. A referência aos indígenas da província parece clara, assim como a vinculação de sua civilização ao aumento das potencialidades da província. Nessa direção também insiste que a abun-dância de recursos da província teria feito dos homens daquele lugar pouco industriosos, satisfeitos apenas com o que era oferecido pela natureza.81 É preciso lembrar nesse ponto que era justamente o suposto ócio dos in-dígenas, caracterizado pela sua satisfação em suprir-se simplesmente de recursos naturais, que justificou, desde o Diretório, as leis que os obriga-

78PEREIRA, Vantuil. Ao Soberano Congresso:

direitos do cidadão na formação do Estado Imperial brasileiro (1822-31). São Paulo: Alameda, 2010.

79ANAIS do Parlamento Brasileiro. Sessões de 25

de setembro e 15 de outubro de 1830.

80Ibidem. Sessão de 18 de setembro de 1830.

81Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessão de 01 de dezembro de 1830.

Page 48: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

456Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

vam ao trabalho compulsório. Particularmente, esse tópico da fala do Barão de Itapicuru-mirim foi alvo de crítica na resposta elaborada por uma comis-são de conselheiros composta por Batista Campos, seu aliado o cônego Serra, além do conselheiro Alcântara. Nessa ocasião, a comissão recusou-se aligar a situação precária da província ao que seria uma tendência ao ócio de parte dos seus habitantes, supostamente alimentada pela fertilidade da província. Ao invés disso, preferiram creditar a pouca produção econômica, entre outras coisas, ao arbítrio, dizendo que eram as boas leis que estimulavam os ho-mens industriosos.82 Ainda que a política indigenista não esteja claramente posta em discussão, é bastante significativo que essa resposta – que nega a tendência natural ao ócio por parte da população paraense como o elemento da falta de riquezas da província, e faz uma denúncia do arbítrio – tenha Batista Campos entre os seus autores, justamente por algumas de suas ações a respeito desse tema no Conselho Geral, tal como se verá abaixo.

Como dito, os indígenas eram um assunto recorrente e retornavam à pauta de diferentes formas. Neste sentido, em algumas ocasiões os con-selheiros pediram informações ao governo sobre a matéria, demonstrando que sua intervenção não se dava apenas na elaboração de proposições, mas também assumindo uma postura de fiscalização do executivo. Esse foi o caso de quando solicitaram dados sobre as condições das já citadas Milícias de Ligeiros, o que subsidiará uma representação sobre o assunto ao Parlamento, do que falaremos adiante. Na mesma lógica, em dezembro de 1830, Batista Campos pediu que o Conselho exigisse que o Presidente tornasse públicas as “ordens, atribuições e instruções” relativas aos índios com as quais o tenente coronel José de Brito Ingles e o coronel Francisco Ricardo Zany estavam indo para a Comarca do Rio Negro.83 Esta não era uma preocupação qualquer: Zany era uma figura conhecida na província. Como mencionado nas páginas iniciais desse artigo, Zany era autor de um projeto analisado nas Cortes de Lisboa que pretendia ampliar a exploração sobre a mão de obra dos indígenas, com maior controle sobre os braços dos tapuios e a liberação para a realização dos descimentos dos povos da floresta.84 Além disso, Zany ia para um território no qual a presença dos tapuios era marcante, e a dos escravos africanos rarefeita. Também deve-se destacar o fato de que o pedido de esclarecimento tinha como único foco os indígenas, não se preocupando com qualquer outra atividade que os dois militares pudessem exercer na Comarca do Rio Negro. A ação visa-va constranger o executivo e os militares e forçá-los a deixar clara a sua política para os indígenas.

Apesar da importância das intervenções e menções acima, sem dú-vida nenhuma as ações de maior relevância do Conselho Geral em relação à questão indígena estavam na elaboração e debates de projetos sobre o tema, pois evidenciam a tentativa dessa instituição em interferir sobre essa realidade, mesmo que restrita sua ação à esfera provincial. Nessa direção, a primeira coisa a ser observada é a grande quantidade de propostas apre-sentadas: no período analisado foram discutidas no Conselho Geral três proposições e uma representação sobre a política indigenista na província, certamente o assunto que mereceu mais intervenções dos conselheiros.

Logo em 15 de dezembro de 1829, pouco mais de 15 dias depois do início dos trabalhos, apareceu a primeira proposta. Apresentada por Batista Campos, a proposição pedia a extinção das Fábricas Nacionais. Como esclareceu Vicente Salles, Fábricas Nacionais era o nome dado a estabele-cimentos que organizavam atividades extrativistas, especialmente madeira,

82Ibidem, sessão de 11 de dezembro de 1830.

83Ibidem, sessão de 06 de dezembro de 1830.

84MACHADO, André Roberto de A. A quebra da

mola real das sociedades. Op. Cit., p.75-76.

Page 49: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

457Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

castanha, borracha e cacau, tudo coletado através do trabalho compulsório dos indígenas.85 Infelizmente, não é possível saber o teor do projeto original porque nenhuma das proposições foi transcrita, restando apenas perceber o debate através das discussões das emendas.

Sobre as duas emendas apresentadas, apesar de algumas diferenças, todas convergem para a ideia de que seriam eliminadas as Fábricas Nacio-nais, mas garantindo exceções. O próprio presidente do Conselho, Antonio Correia de Lacerda, defendeu a extinção das Fábricas Nacionais sob o argumento de representavam um julgo injusto sobre os índios, mas pediu que fossem mantidos os pesqueiros e que também se pudesse continuar com a instituição nos locais em que o governo não conseguisse madeiras. Também chama a atenção o fato de Lacerda propor que a extinção das Fá-bricas Nacionais não se estendesse ao Rio Negro, justamente onde estava uma grande concentração de tapuios. A justificativa era que essa parte da província se tornaria independente e deveria decidir posteriormente sobre o assunto. Como se percebe, as emendas de Lacerda, apesar de condenarem formalmente a existência das Fábricas Nacionais, permitiam exceções e dispositivos para o governo que garantiam a sobrevida dessa instituição. Já a outra emenda, proposta pelo Conselheiro Alcântara, tinha o mesmo tom de garantir exceções, pedindo a manutenção das Fábricas dedicadas à madeira e, mais especificamente, a Serraria de Monte Alegre.86

Essa proposta, assim como quase todas as outras relativas aos indí-genas, tem um percurso frustrante: apresentada no começo dos trabalhos do Conselho, em menos de 20 dias o projeto e as emendas apresentadas já tinham passado pelas duas discussões das três necessárias para aprovar a matéria. No entanto, até onde a pesquisa alcançou, esta última discus-são nunca foi feita. Um ano depois de apresentada, em 15 de dezembro de 1830, são criadas comissões para finalizar assuntos pendentes do ano anterior, estando o projeto da extinção das Fábricas Nacionais entre elas.87

Como compreender que um projeto já tão discutido não tenha sido finalizado e encaminhado ao Parlamento? Infelizmente, não há uma resposta definitiva. Em primeiro lugar, é verdade que a pauta do Conselho a partir da segunda discussão desse projeto passou a estar cada vez mais tomada pelos debates das Posturas das Câmaras, o que ajudou a emper-rar o trâmite da proposta. Mesmo assim, é preciso lembrar que algumas proposições, ainda que poucas, conseguiram ser finalizadas após esse período. Isso leva a crer que a razão central era a falta de consenso sobre um tema tão delicado, o que fez a medida ser esquecida na gaveta do Conselho, à exemplo do que frequentemente ocorria no Parlamento. Lon-ge de ser um caso único, essa parece ter sido a regra no Conselho Geral do Pará: na primeira legislatura, apesar de projetos sobre temas centrais para a província terem sido apresentados e discutidos, foram poucas as propostas que conseguiram seguir todo o trâmite, serem aprovadas e seguir para o Parlamento. Na verdade, apenas quatro foram encaminha-das e todas elas sobre assuntos periféricos, como a obrigatoriedade dos estrangeiros se apresentarem ao juiz de paz em até três dias após a sua chegada à província, a instalação de uma tipografia pública, ou a dispen-sa do trabalho para conselheiros que tivessem cargos públicos durante as sessões.88 Outro indício de que o problema era a falta de consenso é que, como se verá, após o golpe de 1831 que depôs o Visconde de Goiana da Presidência da Província e prendeu homens de um perfil mais liberal, o Conselho passou a apreciar um projeto de civilização dos indígenas

85SALLES, Vicente. Memorial da Cabanagem:

esboço do pensamento político-revolucionário no Grão-Pará. Belém: CEJUP, 1992. p.62.

86Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice 889,

Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 24 de dezembro de 1829 e 05 de janeiro de 1830.

87Ibidem, sessão de 15 de dezembro de 1830.

88Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados –

Centro de Documentação e Informação. Brasília – DF, Brasil. Lata 49, maço 21, pasta 1 – Lista dos trabalhos do Conselho Geral do Pará (1829-30). Ver também MACHADO, André Roberto de A. As “reformas em sentido federal”. A atuação dos representantes do Grão-Pará no Parlamento e as expectativas na província em torno do Ato Adicional. Revista Estudos Amazônicos, Pará, v.4, n.1, p.64, 2009. Fora os quatro projetos enviados, também foram encaminhados ao Parlamento e ao Executivo outros textos, classificados como resoluções, pareceres ou com outros títulos.

Page 50: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

458Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

que seguia na direção contrária à proposta acima, bem como ao teor que predominou até então nas propostas em torno desse tema.

As Fábricas Nacionais, contudo, pareciam ser um assunto “quente” na província. Se não foi possível chegar finalmente a um projeto aprovado nas duas primeiras sessões anuais do Conselho, já em 1831 elas voltavam ao centro da administração pública, agora pelas mãos do executivo e du-rante a conturbada gestão do já citado Visconde de Goiana na presidência do Pará. No final de julho de 1831, aconteceu uma reunião da Junta da Fazenda Pública, também liderada por Goiana. Nessa ocasião, reflete-se sobre a situação do Pesqueiro da Vila Franca e da Plantação de Cacau, dois exemplos de instituições nomeadas como Fábricas Nacionais. A Junta, em primeiro lugar, destacou os poucos ganhos públicos obtidos com esses empreendimentos, e determinou a sua extinção sob o argumento de que se tratava de uma ação bárbara contra os índios. A Junta mencionava que os indígenas trabalhavam ali compulsoriamente, sob a mira de armas, com baixos salários que iam de 80 a 20 réis diários e que ficavam vários anos sem serem pagos.89 Chama especialmente a atenção, no entanto, o argu-mento principal para o fim destas instituições: a Junta diz que essa “opres-são deveria a mais tempo ter cessado por serem contrárias às garantias individuais dos cidadãos brasileiros”, acrescentando, em outro trecho, que esta era uma “barbaridade antiga e contrária a Constituição do Império”90. A importância aqui, para além da extinção dessas Fábricas Nacionais, es-tava nesses argumentos, pois classificavam explicitamente esses indígenas como cidadãos que tinham direitos constitucionais que eram incompatíveis como uma “barbaridade antiga”: o trabalho compulsório. Ou seja, grosso modo, repetia-se nesse contexto o argumento que questionava a legitimi-dade do trabalho forçado dos tapuios desde o Vintismo.

Também é importante ter em mente que essa era a decisão de um colegiado, e não apenas do presidente, o que demonstra que o debate no Conselho Geral de Província, especialmente sobre as Fábricas Nacionais e sobre os indígenas, estava igualmente circulando em outros meios. Por fim, é preciso destacar que apesar de ter se constituído como uma ação ousa-da, o texto da Junta da Fazenda dá a entender que seriam extintas apenas as Fábricas Nacionais mencionadas, as duas deficitárias, e não todas as existentes. Em seguida, seria enviado este relato e denúncia à Corte, de onde aparentemente se esperava um posicionamento. Apesar de não estar totalmente clara a efetividade dessa ação, em uma longa carta que escre-veu à Corte para dar a sua versão sobre a sua deposição da presidência, o Visconde de Goiana fez questão de citar a extinção das Fábricas Nacionais – e ali dava a entender que isso recobria a todas - como um dos motivos principais pelos quais foi deposto da presidência.91Além de demonstrar que a questão do trabalho indígena era um assunto politicamente explosivo no Pará, é bom ter em mente que um dos motivos alegados pelos golpistas para o terem deposto era o de que Goiana estava alinhado às posições de Batista Campos, justamente o membro do Conselho Geral de Província que tinha proposto, sem sucesso, o fim das Fábricas Nacionais.

Ainda no primeiro ano de funcionamento do Conselho, surgiu uma segunda proposição sobre a questão dos indígenas. Ao contrário da propos-ta sobre as Fábricas Nacionais, esta pretendia ser um projeto mais amplo para essas populações, mas teve um percurso bem parecido com a primei-ra. Apresentada pelo conselheiro Carlos Manuel de Alcântara em 02 de janeiro de 1830, também não é possível saber o seu teor completo, já que

89Em texto do Visconde de Goiana que

acompanhava esse anexo, o ex-presidente do Pará afirmava que essa prática tinha enriquecido a alguns homens no Pará, a quem chamava de “ímpios desfrutadores”.

90Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ9

– 108 – Ministério do Reino e Império. Pará, Correspondência do Presidente da Província (1829-31), doc. 328, anexo 15.

91Ibidem, doc.328. Raiol transcreve parte dessa

carta, dando também enorme ênfase ao fim das Fábricas Nacionais como um dos motivos da queda de Goiana. RAIOL, Domingos Antonio. Motins Políticos. Belém: UFPA, 1970. p.228.

Page 51: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

459Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

as propostas não eram transcritas, restando apenas alguns apontamentos a partir das poucas emendas apresentadas. Aparentemente apenas adaptan-do um dispositivo já existente, uma dessas emendas previa a figura de um procurador de índios, que seria o responsável por regular o pagamento do trabalho desses homens. Assim, é possível ver novamente a centralidade da mão de obra nos assuntos relacionados aos indígenas. E, além disso, reapa-rece novamente a intenção de retornar ao sistema de tutela que havia sido encerrado com o fim do Diretório, algo que, como se viu até agora, era uma tentativa recorrente dos grupos críticos ao que consideravam uma excessiva liberdade dada aos “índios avilados” a partir da legislação de 1798. Contudo, depois de passar pelas duas discussões iniciais, em 26 de janeiro o projeto foi encaminhado para uma comissão de redação e nunca mais voltou ao plenário. Talvez uma explicação para isso seja o fato de que, além do autor, compunham a comissão Marcos Martins e Marcelino Cardoso, os dois líderes da Agostada de 1831 que depôs o Visconde de Goiana da presidência.92

Em meio a esse processo em que os projetos sobre os indígenas discutidos no Conselho Geral não conseguiam chegar a uma versão final para serem enviados ao Parlamento, foi um outro tipo de ação originada ali que acabou tendo um impacto efetivo na política para os índios, ainda que totalmente distinta do que tinha sido a proposta original. Nesse sentido, quando se lê o resumo enviado à Corte das atividades produzidas pelo Conselho Geral do Pará no seu primeiro ano de funcionamento, como já se disse, constam apenas quatro projetos, mas também acompanham mais de uma dezena de manifestações, geralmente enquadradas como represen-tações. Esta era uma prática comum e visava muitas vezes fazer críticas ou denúncias de outras autoridades, além de pedir o posicionamento do Parlamento sobre alguns assuntos. É, pois, uma representação do Conselho pedindo o posicionamento do Parlamento sobre a Milícia de Ligeiros que consegue furar esse bloqueio e chegar à Corte.

Como mencionado anteriormente, logo no início dos seus trabalhos foram solicitadas informações da presidência sobre a Milícia de Ligeiros, instituição descrita nas páginas anteriores desse artigo como uma das peças fundamentais do recrutamento dos tapuios para o trabalho com-pulsório, tal como definido pela legislação de 1798. O Conselho recebeu essas informações com alguma rapidez e logo se formou uma comissão com uma composição muito significativa: Batista Campos e o seu aliado cônego Serra, complementados pelo conselheiro Jacinto Lopes Silvestre. De posse dessas informações, a comissão fez uma pequena avaliação dessa instituição e propôs um parecer a ser enviado ao Parlamento sob a forma de uma representação.

Ao mencionar as informações oferecidas pelo governo, a comissão confirmava a continuidade do uso da lei de 1798 para obrigar os indí-genas ao trabalho compulsório, através do alistamento nas Milícias de Ligeiros. Batista Campos e a comissão não deixaram dúvidas sobre quem eram os alistados nas Milícias de Ligeiros, ao dizer que se tratavam dos aldeados do Diretório, confirmando que apesar da lei de 1799 ter esten-dido o recrutamento também para brancos e negros sem ocupação,93 na prática este era um ônus para os ditos “índios cristãos”. Como mencionado anteriormente, sob o controle de militares, criavam-se listas dos tapuios das vilas e os recrutados eram destinados ao trabalho compulsório em obras públicas e particulares. Por conta disso, o controle desse corpo era um aspecto decisivo na província. O ponto central de debate que movia a

92Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

889, Atas do Conselho Geral de Província, sessões de 02, 05, 19, 26 de janeiro de 1830.

93SAMPAIO, Patrícia Maria de Melo. “Vossa

Excelência mandará o que for servido”. Op. Cit.

Page 52: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

460Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

comissão era provar, a partir da algumas considerações sobre a legislação, que esses indígenas, apesar da organização levar o nome de Milícias, não deveriam ser considerados militares e, sim, uma ordenança. O envio de uma questão como essa para o Parlamento fazia todo o sentido, já que nesse período cabia a essa instituição também a interpretação das leis. Como bem observado por João Nei Eduardo da Silva, o propósito do parecer não era dar fim à Milícia de Ligeiros, mas retirar o seu controle da mão dos militares e passá-la para o poder civil.94 O próprio texto da comissão diz que esse corpo deveria estar fora dos “privilégios militares”. Esta, aliás, não era uma polêmica nova: durante o Vintismo, a Junta de Governo Civil e o Governador de Armas entraram em confronto sobre a que poder cabia o controle dos Ligeiros, conflito que mereceu inclusive manifestação no jornal O Paraense.95 Já em 1828, o Barão de Bagé, então presidente da província, escrevia ao Ministro da Guerra, reclamando que os índios ligeiros estivessem sobre controle dos militares.96 De resto, o próprio parecer dá a dimensão da importância da Milícia de Ligeiros para economia da província e para organização dessa sociedade:

(...) Convém ao bem público e a boa administração do Governo Constitucional que os ditos corpos denominados de Milicianos Ligeiros sejam declarados verdadeiras ordenanças (...) a fim de terminarem-se as questões e conflitos entre autoridades civis e militares que de tempos remotos embaraçam a marcha do Governo da Província e poder este abraçar com energia os ramos mais importantes da Administração Pública que não pode suceder no estado atual pela complicação das autoridades militares com as civis relativamente ao governo econômico dos ditos indígenas; podendo muito bem afirmar-se que a província é um país puramente militar.97

Uma vez enviado para o parlamento, o trâmite foi rápido e com um desfecho surpreendente. Já em oito de julho a Comissão de Guerra da Câmara resumiu os pontos principais dessa representação e posicionou-se a favor da interpretação enviada pelo Conselho. A partir da representa-ção, propunha uma resolução na qual apenas se deixaria explícito que os Corpos de Milícias não eram sujeitos ao Comandante de Armas da Província e, assim, acabar com o conflito entre os poderes.98 No entanto, foram apresentadas emendas a essa proposta. Entre 26 e 27 de novembro de 1830, prevaleceram as emendas substitutivas do deputado pelo Mara-nhão, Odorico Mendes. Em dois artigos do que seria um decreto legislativo, Odorico Mendes determinava simplesmente o fim da Milícia de Ligeiros, revogando todos os dispositivos em contrário.99 Não se registram debates na câmara sobre a proposta, sendo que o silêncio dos representantes paraenses é absoluto. No senado, após a explícita condenação do senador Saturnino, para o qual essas milícias se prestavam apenas à exploração dos indígenas, a aprovação foi muito rápida, do que resultou a transformação da dissolução das Milícias de Ligeiros em lei em 22 de agosto de 1831.100

Tratava-se, sem dúvida, de uma mudança gigantesca na política para os indígenas no Pará porque interferia no principal mecanismo de recru-tamento dos ditos “índios cristãos” para o trabalho compulsório em obras públicas e particulares. A efetiva aplicação dessa mudança, suas burlas e o possível impacto disso nos conflitos ocorridos posteriormente na província são assuntos sobre os quais ainda é necessário ter mais pesquisas. Por ora, no entanto, é possível afirmar que a informação da dissolução das Milícias de Ligeiros já circulava no Pará pelo menos desde 1832 e que foi utilizada como capital político de Batista Campos. Assim, em março de 1832, a ata

94SILVA, João Nei Eduardo. Batista Campos: uma

discussão biográfica na historiografia paraense. In: BEZERRA NETO, José Maia; GUSMÁN, Décio de Alencar (org.). Terra matura: Historiografia & história social na Amazônia. Belém: Paka-tatu, 2002. p.139-149.

95COELHO, Geraldo Mártires. Anarquistas,

Demagogos e Dissidentes: a imprensa liberal no Pará de 1822. Belém: CEJUP, 1993. p.172 e p.255; ver também de MACHADO, André Roberto de A. A quebra da mola real das sociedades. Op. Cit., p.157.

96Arquivo Público do Pará. Belém, Brasil. Códice

869, doc. 03, em 20 de maio de 1828.

97Ibidem. Códice 889, Atas do Conselho Geral de

Província, sessão de 08 de fevereiro de 1830.

98ANAIS do Parlamento Brasileiro. Em 8 de julho

de 1830

99Ibidem. Em 27 de novembro de 1830.

100ANAIS do Senado do Império do Brasil. Em 18 e

26 de maio, 11 de junho de 1831. Coleção das leis do Império de 1831. Primeira parte. Rio de Janeiro: Tipografia Nacional, 1875. p.76.

Page 53: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

461Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

da Câmara da vila de Alenquer registrava o pedido de Batista Campos de que se divulgasse o fim das Milícias de Ligeiros através da publicação de um edital.101 Já em 1834, no jornal Sentinella Maranhense na Guarita do Pará, o editor Lavor Papagaio, ao enumerar o que teriam sido os serviços de Batista Campos, cita também a extinção da Milícia de Ligeiros.102 Mesmo sabendo, através do cruzamento da documentação, que essa não era a intenção original de Batista Campos, é importante perceber que a extinção das Milícias era um assunto com repercussão na vida política da província.

Outro ponto importante a salientar, é que Batista Campos pede a publicidade do fim da Milícia de Ligeiros em um período em que o conflito político na província estava aberto e cada vez mais polarizado. Poucos me-ses antes, em agosto de 1831, ocorreu um golpe que depôs o então presi-dente da província, o Visconde de Goiana. A Agostada, como este episódio ficou conhecido, foi acontecimento complexo sobre o qual já escrevemos demoradamente, buscando compreender suas razões e desdobramentos.103

Para os fins deste artigo, cabe salientar apenas alguns pontos que ajudam a pensar suas consequências para o Conselho Geral de Província e para a discussão, no seu interior, da política para os indígenas. Em primeiro lugar, é visível que o grupo que protagonizou a deposição de Goiana tinha um perfil mais conservador e estava francamente apoiado por uma parcela importante dos militares. Além disso, o motivo explícito do golpe, inclusive nas cartas enviadas à Corte, seria a proximidade do presidente com o grupo político liderado por Batista Campos. Ainda que a realidade seja mais com-plexa do que isso, no que se refere às questões ligadas aos indígenas esta observação encontra algum respaldo. Afinal, como mencionado anterior-mente, Goiana acabara com pelo menos algumas Fábricas Nacionais, pre-tensão que já aparecera em um projeto de Batista Campos ao Conselho Ge-ral. Não bastasse isso, coube à gestão de Goiana dar cumprimento a uma decisão do Parlamento de pôr fim ao papel de polícia dos comandantes de Distrito. O irônico é que essa decisão da Corte aconteceu quase simulta-neamente a uma tentativa fracassada de Batista Campos em aprovar algo semelhante no Conselho Geral.104 Na ocasião, Campos defendeu a medida como necessária porque os comandantes reduziam os indígenas a uma condição de escravos. Esse argumento lembra muitíssimo o relato posterior que Goiana enviaria à Corte, quando elencou o cumprimento da lei sobre os comandantes de Distrito como uma das razões da sua queda.105 Por fim, no que cabe pensar sobre o seu impacto no Conselho Geral de Província e o debate sobre a política indigenista, é preciso ter em mente que o golpe de 1831 implicou não só na deposição de Goiana, mas também na prisão de vários homens considerados ligados a Batista Campos e o seu envio para prisões no interior da província. Isso, evidentemente, alterava o equilíbrio político no interior do Conselho Geral.

Justamente neste cenário de desequilíbrio a favor dos grupos mais conservadores, uma das primeiras medidas a serem apreciadas pelo Con-selho Geral de Província foi um projeto de civilização para os indígenas. Apresentado em 06 de dezembro de 1831, a proposta não vinha de um conselheiro, mas através de uma representação enviada pelo major Antonio Ladislau Monteiro Baena. Mais conhecido hoje por seus trabalhos de esta-tística e de história da província, Baena era um militar português radicado há muitos anos no Pará e um crítico ferrenho dos liberais. O acolhimento da proposta de Baena por esse “novo” Conselho Geral não poderia ser mais explícito: já no dia seguinte, 07 de dezembro, é criada uma comissão para

101Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados –

Centro de Documentação e Informação. Brasília – DF, Brasil. Lata 115, maço 16, pasta 4 – Província (acontecimentos de agosto de 1831 no Pará). Ata da Câmara de Alenquer em 26 de março de 1832.

102Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. PR

SOR 4750 – A Sentinella Maranhense na Guarita do Pará. Edição de 4 de outubro de 1834.

103MACHADO, André Roberto de A. O Fiel da

Balança. Op. Cit.

104Arquivo do Instituto Histórico e Geográfico

do Pará. Belém, Brasil. 105,6,23 – Coleção de proclamações, atas e outros impressos políticos relativos ao Pará entre 1827 e 1837 (doc. 3).

105Arquivo Nacional. Rio de Janeiro, Brasil. IJJ9

– 108 – Ministério do Reino e Império. Pará, Correspondência do Presidente da Província (1829-31), doc. 328.

Page 54: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

462Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

avaliar o texto com a orientação de aproveitar ao máximo a proposta ori-ginal. Outra demonstração surpreendente do apoio do Conselho à proposta é que, ao receber contínuos pedidos de Câmaras do interior pelo envio de índios para serem engajados em diferentes trabalhos, é formulada uma res-posta oficial que declara ser necessário aguardar pela aprovação do projeto de Baena para regular a oferta de mão de obra dos indígenas.106

Ao contrário de outros projetos para os indígenas apresentados no Conselho, o texto de Baena foi preservado na íntegra, o que nos ajuda a compreender melhor os seus objetivos.107 Logo na sua introdução, fica explíci-to que aquilo que move a ação de Baena é a preocupação com a mão de obra dos indígenas: afinal, aponta que o fim do tráfico negreiro – que ele considerava inevitável – tornava inadiável o debate sobre um novo plano de civilização para os índios.108 Ao mesmo tempo, insiste logo no começo do texto que essa era uma oportunidade para retornar a uma rota correta que tinha sido abandonada: o regime tutelar do Diretório. O elogio ao Diretório e a crítica à lei de 1798 são um dos pilares do texto e, como observado nas páginas anteriores, ecoavam observações semelhantes em projetos anterior-mente esboçados desde o Vintismo. Aliás, em vários momentos defende que suas ideias são baseadas na experiência, supostamente utilizando a histó-ria como argumento para o seu ponto de vista. Outro ponto importante a destacar é que o texto de Baena deixa clara a expectativa de que a província, através do Conselho Geral, tinha autonomia suficiente para impor uma mu-dança na política para os indígenas, evidenciando o prestígio e expectativa que cercavam essa instituição.

O projeto de Baena dividia-se em duas partes: “índios cristãos”, refe-rindo-se aqueles que já viviam nas vilas, e “índios selvagens”, sobre os que estavam nas florestas. A divisão, em primeiro lugar, deixa clara a importân-cia dos indígenas que estavam nas vilas e que no Pará, como muitos supõe para outras regiões, os planos de civilização não estavam restritos àqueles que estavam fora do contato com os brancos. Essa divisão, também expu-nha os dois objetivos principais: para os “índios cristãos”, retomar o regime de tutela e assim controlar sua mão de obra. Para os “índios selvagens”, retomar a prática dos descimentos e assim trazer novos contingentes de trabalhadores para a província.

O controle sobre os índios e a sua obrigação ao trabalho eram uma premissa para o projeto de Baena. Recorrendo a exemplos históricos, insis-tia que um dos maiores erros teria sido a lei de 1755, que tinha dado plena liberdade aos indígenas antes do estabelecimento da tutela pelo Diretório, sugerindo que este quadro tinha deixado a província sem trabalhadores, enquanto o tráfico negreiro ainda era estabelecido. Ainda na introdução, é bastante claro ao afirmar que, ao estabelecer um novo plano de civilização, não se deveria deixar cair em argumentos equivocados que pregavam contra o “trabalho impelido”. Mais uma vez recorrendo à história, diz que a defesa contra o trabalho compulsório dos indígenas não se sustentava à luz da ex-periência, retomando o velho argumento do ócio natural dessas populações:

Quanto à primeira asserção ela é impugnável com o terminante argumento experimentalmente reconhecido até pelos mesmos denominados Jesuítas, seus catequistas mais universalmente acreditados, de que o ócio inerte hereditário dos índios que é para eles a soberana felicidade, e a sua inépcia para conhecer e experimentar os cômodos e as vantagens incalculáveis da sociedade civil, impedem que eles de seu próprio movimento busquem o trabalho regular (...) portanto, eles não podem ser abandonados a si mesmos, mas antes precisam de serem dirigidos pelas

106Arquivo Histórico da Câmara dos Deputados –

Centro de Documentação e Informação. Brasília – DF, Brasil. Lata 68, maço 37, pasta 4, Atas do Conselho Geral de Província, em 06, 07 e 29 de dezembro de 1831.

107BAENA, Antonio Ladislau Monteiro.

Representação ao Conselho Geral da Província do Pará sobre a especial necessidade de um novo regulamento promotor da civilização dos índios da mesma província. In: Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará. Tomo 2, Belém: Imprensa Oficial, 1902.

108Este não foi o único caso no Império em que o

uso dos indígenas foi apontado como a solução para reverter os efeitos do fim do tráfico negreiro. Para exemplos e uma discussão mais ampla, veja de SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem brasileiros. Op. Cit.

Page 55: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

463Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

disposições e normas de um temporâneo regime policial compulsório, o qual servindo de estimulante difusivo ou tônico que reanime a sua amortecida excitabilidade os faça agentes úteis e tão aderentes a vida social como outros homens.109

Ao falar sobre os “índios cristãos”, o centro da proposta de Baena é a descrição dessa “regência policial” que, segundo ele, duraria até que os indígenas já vivessem “afeitos à arte de fazer feliz a existência procuran-do as vantagens que o trabalho e a indústria lhes podem ministrar”.110 De modo resumido, em cada vila existiria um “Regente Policial” e, acima de todos eles, um “Superintendente dos Índios” aos quais caberia a regulação do trabalho, como também a disposição espacial desses homens. Sobre este último aspecto, previa-se não só a supressão de vilas pouco habitadas e a criação de novas, como também o trânsito dos indígenas passava a ser controlado pela autoridade da vila, como visto, uma velha reivindicação dos críticos da lei de 1798. O texto dá destaque às várias atividades que seriam estimuladas pelo “regente policial”, mas de propriedade dos indí-genas, chegando a propor a doação de “pequenas sesmarias” para esses homens. No entanto, fica claro que toda a ação, todas as atividades de trabalho seriam conduzidas pelo regente policial que poderia punir aqueles que não se encaixassem no ritmo esperado sob a acusação de vadiagem.

Os mecanismos de recrutamento para o trabalho de particulares e para o serviço público não estão detalhadamente descritos, mas apa-recem, sobretudo, através das regras de exclusão desse serviço. Assim, é dito que os chefes de família não podem ser retirados da povoação para outros trabalhos, mas podem ser obrigados “a trabalhar por jornal nas roças pa raenses” se não sustentarem sua família.111 Longe de ser apenas uma punição, em outros trechos do texto fica evidente que aos “regentes policiais” cabia a tarefa de fornecer mão de obra para trabalhos públicos e particulares. Assim, se mostra que essa autoridade devia ter o controle dos indígenas que estavam fora da vila para prestar serviços com a sua autori-zação e quanto tempo estariam fora. Em outro trecho, impõe que não de-veria exceder a um terço dos filhos de cada família aqueles que poderiam ser retirados “quer para o serviço público, quer para o de proprietários de engenhos e plantações de cultura”, ressaltando, adiante, que ainda incidiria um imposto sobre os salários recebidos por esses indígenas.112

Em comparação com o número de páginas destinadas aos “índios cristãos”, Baena é muito mais econômico ao tratar dos “índios selvagens”. Por si só isso indica que a questão sensível para esse militar eram os indígenas já moradores das vilas. No entanto, há ainda outra questão que reforça essa tese: Baena defendia o descimento de novos contingentes de índios que estavam na floresta, mas ao contrário de projetos anteriores não pretendia que esses homens fossem distribuídos entre os proprietários. Em vez disso, o destino dos “índios selvagens” seriam as vilas onde já estavam estabelecidos os “índios cristãos” sob o regime dos “regentes policiais”. Dessa forma, essas vilas pareciam ser o coração do sistema pelo qual Baena pretendia regular a mão de obra desses indígenas sob um regime de tutela.

A proposta de Baena, com o apoio do Conselho após a Agostada, cla-ramente tentava reverter o que parecia ser a progressiva perda de institui-ções do período colonial que garantiam o controle dessa mão de obra. No entanto, assim como aconteceu com outras propostas gestadas no Conse-lho, esta não chegou a ser implementada. A explicação mais plausível para isso é que com a posse, em 1832, de Machado de Oliveira, novo presidente

109Ibidem, p.252.

110Ibidem, p.271.

111Ibidem, p.261.

112Ibidem, p.260-262.

Page 56: O Conselho Geral da Província do Pará e a definição da política indigenista no Império do Brasil (1829-31)

464Almanack. Guarulhos, n.10, p.409-464, agosto de 2015 artigos

da província enviado pela Corte, e o retorno dos antigos Conselheiros, a proposta enfrentou resistências e foi ao limbo.

Contudo a aplicação efetiva ou não dos projetos para os indígenas debatidos no Conselho Geral é apenas um dos aspectos que interessam aos historiadores. Mais importante do que isso parece ser a evidência de que este era um assunto central na província a ponto de merecer muitos pro-jetos e vários debates. As dificuldades para a aprovação de formatos finais desses projetos também não podem ser creditadas à sua pouca importância e, sim, à dificuldade para se alcançar consensos no Conselho sobre um as-sunto que era vital e que atingia interesses políticos e econômicos. Por fim, ao avaliar esses projetos e discussões no Conselho Geral, ilumina-se qual era a questão central no Pará em relação aos indígenas: todos os projetos, todas as discussões tinham como principal objeto o controle da mão de obra desses indivíduos.

Recebido para publicação em 09 de julho de 2014Aprovado em 17 de novembro de 2014