modelo de comunicaÇÃo verbal com o cego · modelo de comunicação verbal com o cego:...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR
FACULDADE DE FARMCIA, ODONTOLOGIA E ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENFERMAGEM
DOUTORADO EM ENFERMAGEM
KTIA NYLA DE FREITAS MACDO COSTA
MODELO DE COMUNICAO VERBAL COM O CEGO:
DESENVOLVIMENTO E VALIDAO EM CONSULTA DE ENFERMAGEM
FORTALEZA
2009
KTIA NYLA DE FREITAS MACDO COSTA
MODELO DE COMUNICAO VERBAL COM O CEGO:
DESENVOLVIMENTO E VALIDAO EM CONSULTA DE ENFERMAGEM
Tese submetida Coordenao do Curso de Ps-
Graduao em Enfermagem da Faculdade de
Farmcia, Odontologia e Enfermagem da
Universidade Federal do Cear como requisito
parcial para obteno do ttulo de Doutor em
Enfermagem.
rea de concentrao: Enfermagem Clnico-
Cirrgica
Linha de pesquisa: Tecnologia em Sade e Educao
em Enfermagem Clnico-Cirrgica
rea temtica: Sade Ocular
Orientadora: Profa. Dra. Lorita Marlena Freitag
Pagliuca
FORTALEZA
2009
C873m Costa, Ktia Nyla de Freitas Macdo Modelo de comunicao verbal com o cego: desenvolvimento e validao em consulta de enfermagem / Ktia Nyla de Freitas
Macdo Costa. Fortaleza, 2009.
129 f. : Il.
Orientador: Profa. Dra. Lorita Marlena Freitag Pagliuca
Tese (Doutorado) Universidade Federal do Cear. Programa de Ps-Graduao em Enfermagem, Fortaleza-Ce, 2009
1. Enfermagem 2. Cegueira 3. Comunicao 4. Estudos de
Validao I. Pagliuca, Lorita Marlena Freitag (orient.) II.
Ttulo
CDD: 610.7369
KTIA NYLA DE FREITAS MACDO COSTA
MODELO DE COMUNICAO VERBAL COM O CEGO:
DESENVOLVIMENTO E VALIDAO EM CONSULTA DE ENFERMAGEM
Tese submetida Coordenao do Curso de Ps-Graduao em Enfermagem da Faculdade de
Farmcia, Odontologia e Enfermagem da Universidade Federal do Cear como requisito
parcial para obteno do ttulo de Doutor em Enfermagem. rea de Concentrao:
Enfermagem Clnico-Cirrgica.
A citao de qualquer trecho desta permitida, desde que seja de conformidade com as
normas de tica cientfica.
Data da aprovao: _____/____/______
Banca Examinadora:
________________________________________________
Profa. Dra. Lorita Marlena Freitag Pagliuca (Orientadora)
Universidade Federal do Cear (UFC)
________________________________________________
Profa. Dra. Namie Okino Sawada
Escola de Enfermagem de Ribeiro Preto da Universidade de So Paulo (EERP-USP)
________________________________________________
Profa. Dra. Isabel Amlia Costa Mendes
Escola de Enfermagem de Ribeiro Preto da Universidade de So Paulo (EERP-USP)
________________________________________________
Profa. Dra. Inacia Stiro Xavier de Frana
Universidade Estadual da Paraba (UEPB)
________________________________________________
Profa. Dra. Maria Vera Lcia Moreira Leito Cardoso
Universidade Federal do Cear (UFC)
______________________________________________
Prof. Dr. Paulo Csar de Almeida (Suplente)
Universidade Estadual do Cear (UECE)
________________________________________________
Profa. Dra. Ana Karina Bezerra Pinheiro (Suplente)
Universidade Federal do Cear (UFC)
Dedico este trabalho minha famlia, cuja
existncia tornou-se razo e incentivo para que
seguisse em frente e realizasse esse sonho.
AGRADECIMENTOS
A Deus, em primeiro lugar, por ter me erguido e direcionado diversas vezes, superando os
inmeros obstculos e dando-me a vitria;
Ao Divino Esprito Santo, pelos dons de luz e sabedoria.
Ao meu esposo Deyves, pela compreenso e incentivo.
Aos meus pais, Antnio Epitcio e Maria Leide, a quem amo de corao e agradeo a vida.
Aos meus irmos, Mrcia Leyla, Elnio Csar e Antnio Epitcio, que sempre estiveram
disponveis s minhas necessidades e tornaram possvel minha trajetria universitria.
Ao meu cunhado, Willame Felipe e aos meus sobrinhos, Ana Ldia, Felipe Neto e Ricardo
Felipe, por todo amor e carinho transmitidos em todos os dias, mesmo a distncia.
minha orientadora, Profa. Dra. Lorita Marlena Freitag Pagliuca, pela dedicao e
ensinamentos indispensveis na concluso deste trabalho e pelas prazerosas oportunidades de
crescimento pessoal durante nossa convivncia.
Profa. Dra. Maria Vera Lcia Moreira Leito Cardoso, pela disponibilidade como ser
humano e como docente.
s Profas. Dras. Namie Okino Sawada, Isabel Amlia Costa Mendes, Inacia Stiro Xavier de
Frana e Ana Karina Bezerra Pinheiro, por terem aceito o convite para participar da banca.
Ao Prof. Dr. Paulo Csar de Almeida, pelas idas e vindas de dados e pela troca de afeto
sincero.
amiga Grazielle Roberta, sempre comigo durante esses anos de estudo e de vitria.
amiga Cristiana Almeida, pela ajuda e amor em Cristo.
Antonia, sempre disponvel, principalmente no final da construo dessa tese.
A todos os professores, mestres e orientadores cujos conhecimentos me propiciaram diversos
saberes.
Aos colegas de curso, pelo compartilhamento de momentos inesquecveis e saudvel
companheirismo.
Ao Projeto Sade Ocular, onde tudo comeou, e ao Projeto LabCom Sade e todos seus
integrantes, incluindo bolsistas e funcionrios.
A todos os professores da Universidade Federal do Cear, pela decisiva contribuio nessa
jornada acadmica.
Ao Programa de Ps-Graduao em Enfermagem, pela oportunidade de fazer parte desse
grupo to slido e reconhecido nacionalmente.
A todos os funcionrios da Universidade Federal do Cear, pela amizade e presteza.
CAPES e ao CNPQ, pelo apoio financeiro.
s especialistas, por aprimorarem o modelo de comunicao proposto.
s juzas, por disponibilizarem tempo na anlise das filmagens.
Aos concludentes e enfermeiros, pela ajuda e compreenso durante os dias de treinamento e
filmagens.
associao dos cegos e seus integrantes, pela agradvel receptividade.
A todos, enfim, obrigada.
RESUMO
Embora o cego tenha limitaes, isso no pode impedir sua comunicao e seu
relacionamento com outras pessoas. Porm na formao acadmica os profissionais da sade,
a exemplo dos enfermeiros, no so preparados para cuidar de cegos. Assim, objetivou-se
validar um Modelo de Comunicao Verbal com o Cego e o Enfermeiro luz da Teoria de
Roman Jakobson. Estudo quantitativo, com abordagem metodolgica realizado por meio de
filmagens no LabCom_Sade no Departamento de Enfermagem da UFC, de dezembro/2007 a
dezembro/2008. O ambiente foi organizado com vistas a se aproximar das condies ideais de
uma sala de consulta de enfermagem para triagem de pessoas cegas e com diabetes.
Participaram 30 enfermeiros recm-formados e concludentes do curso de graduao em
Enfermagem e 30 cegos de ambos os olhos e seus acompanhantes. Alm desses, colaboraram
na pesquisa os especialistas que avaliaram o modelo e os juzes que analisaram as filmagens,
observada a titulao, produo cientfica e atuao na temtica. Aps a construo, o modelo
foi avaliado por trs especialistas para validao aparente e de contedo. Feito o julgamento,
incorporaram-se as modificaes. Para o teste do modelo realizaram-se 30 consultas de
enfermagem registradas e filmadas. Destas, 15 foram de responsabilidade de enfermeiros no-
treinados e 15 de treinados. As filmagens foram analisadas por trs juzes, enfermeiras
treinadas no Modelo de Comunicao. Atentou-se para todos os princpios da Resoluo
196/96. Os dados foram processados no programa Statistical Package for Social Sciences
(SPSS) verso 14.0 e analisados por meio de tabelas univariadas com freqncia relativa e
porcentagens. Dos enfermeiros, 17 (56,7%) tinham idade entre 22 e 25 anos, a maioria, 26
(86,7%), era do sexo feminino. Dos cegos, 8 (26,7%) estavam na faixa etria entre 39 e 49
anos e a maioria, 16 (53,4%), era do sexo feminino; 20 (66,7%) ficaram cegos entre 21 e 35
anos. A construo do modelo desenvolveu-se em quatro momentos: diretrizes gerais;
acolhimento; processo de enfermagem; encerramento. Nas diretrizes gerais, o grupo treinado
apresentou excelncia em todos os itens, varivel de 60% a 91,1%. O grupo no-treinado
mostrou comunicao pssima/ruim, em maior freqncia, em quatro itens ao empregar
palavras que indicam a direo (97,8%); tocar ligeiramente brao ou ombro (95,6%); evitar
gesticular (68,9%); falar olhando para o cego (22,2%). Na etapa de acolhimento, todos os
enfermeiros treinados a desempenharam com xito, diferentemente do ocorrido com os no-
treinados, cujo resultado foi pssimo ou ruim em 100% de algumas aes. Na etapa da coleta
de dados, o grupo treinado teve excelente atuao em cinco das aes e nas etapas de
diagnsticos e planejamentos de enfermagem, apresentou aes boas e excelentes nos
seguintes itens: seguir protocolo (95,6%); fazer anotaes informando o motivo do silncio
(93,4%); e evitar silncio prolongado (100%). O desempenho do grupo no- treinado foi
considerado pssimo nos itens: anotaes por no informar o motivo do silncio (100%);
evitar o silncio prolongado (91%). Na etapa de intervenes de enfermagem o grupo treinado
denotou excelncia em todos os itens, enquanto na etapa de avaliao no ocorreram aes
consideradas pssimas/ruins em nenhum dos itens do mencionado grupo. J na etapa de
encerramento da consulta, identificou-se excelncia dos treinados nos seguintes itens:
comunica-se acompanhando o cego at a porta (82,2%); despede-se falando e apertando a
mo (62,2%); e refora as informaes (42,2%). Na anlise da comunicao verbal entre o
enfermeiro e o cego, na funo vocativa, este grupo apresentou 65,7% das aes e na funo
imperativa 19,5%. O silncio manifestou-se em quase metade (45%) das interaes dos
participantes no-treinados e em 12,4% das dos treinados. No grupo treinado tambm
estiveram presentes a empatia (69,2%), a tranqilidade (49,6%), a satisfao (44,2%) e, a
solidariedade (29,4%). Dos canais, o mais evidenciado nos treinados foi a fala (86,8%),
enquanto a linguagem comum ocorreu nas interaes dos treinados (85,6%) e nas dos no-
treinados (50,1%). Conforme se conclui, o modelo foi validado pela amostra e pode-se
afirmar que o Modelo de Comunicao Verbal com Cegos eficaz. Recomenda-se, pois, sua
utilizao na consulta de enfermagem a pessoas cegas.
Palavras-chave: Enfermagem. Comunicao. Validao. Cegos.
ABSTRACT
Although blind people have limitations, this cannot impede their communication and
relationship with other people. In academic education, however, health professionals, such as
nurses, are not prepared to take care of blind people. This study aimed to validate a Verbal
Communication Model with the Blind and the nurse in the light of Roman Jakobsons Theory.
A quantitative study was a methodological approach was carried out at the LabCom_Sade of
the Nursing Department at the Federal University of Cear, Brazil, between December 2007
and December 2008, using filming. The environment was organized for the sake of maximum
similarity with a nursing consultation room for the screening of blind diabetes patients.
Participants were 30 newly-graduated nurses and graduates of the Nursing course and 30
patients blind in both eyes and their possible companions. The specialists who assessed the
model and the judges who analyzed the filming collaborated in the research, in view of their
degree, scientific production and work on the theme. After the construction, the model was
assessed by three specialists for face and content validation. After the assessment,
modifications were incorporated. To test the model, 30 nursing consultations were registered
and filmed. Fifteen of these were under the responsibility of untrained and 15 under the
responsibility of trained nurses. The films were analyzed by three judges, who were nurses
with training on the Communication Model. All principles of Resolution 196/96 were
complied with. Data were processed in Statistical Package for Social Sciences (SPSS)
software and analyzed through univariate tables with relative frequency and percentage.
Seventeen (56.7%) of the nurses were between 22 and 25 years of age, and a majority, 26
(86.7%), were women. Eight (26.7%) blind patients were between 39 and 49 years old and
most of them, 16 (53.4%), were women; 20 (66.7%) became blind when they were between
21 and 35 years of age. The model was constructed in four phases: general guidelines;
welcoming; data collection; nursing interventions. In the general guidelines, the trained group
obtained excellent results on all times, ranging from 60% to 91.1%. The non-trained group
showed very bad/bad communication, with higher frequencies on four items, using words that
indicate direction (97.8%); lightly touching the arm or shoulder (95.6%); avoiding gestures
(68.9%); talk while looking at the blind (22.2%). In the welcoming phase, all trained nurses
displayed a successful performance, as opposed to the non-trained nurses: 100% very bad or
bad in some actions. In the data collection phase, the trained group obtained an excellent
performance on five of the actions and, in the nursing diagnosis and planning phases, trained
nurses presented good and excellent actions for the following items: following the protocol
(95.6%); informing on the reason for the silence when making notes (93.4%); and avoiding
long periods of silence (100%). The performance of the non-trained group was considered
very bad in terms of notes because they did not inform on the reason for the silence (100%);
avoiding long periods of silence (91%). In the nursing intervention phase, the trained group
achieved excellent performance on all items, without any very bad/bad actions on any of the
items in the assessment phase. In the final phase of the consultation, excellent performance of
the trained nurses was identified on the following items: communicates while accompanying
the blind to the door (82.2%); says goodbye while talking and shaking hands (62.2%); and
strengthens the information (42.2%). In the analysis of verbal communication between the
nurse and the blind, the vocative function presented 65.7% of actions, against 19.5% for the
imperative function. Silence was manifested in almost half (45%) of interactions with non-
trained nurses against 12.4% for trained nurses. In the trained group, empathy (69.2%),
tranquility (49.6%), satisfaction (44.2%) and solidarity (29.4%) were also present. The most
evidenced channel in the trained group was speech (86.8%). And common language occurred
in the trained groups (85.6%) and the non-trained groups (50.1%) interactions. In
conclusion, the model was validated by the sample and it can be affirmed that the Verbal
Communication Model is effective. Thus, its use in nursing consultations with blind people is
recommended.
Key words: Nursing. Communication. Validation. Blind.
LISTA DE QUADROS E FIGURAS
QUADRO 1 Faixas de perda de viso............................................................................ 28
QUADRO 2 Definio da CID-10 sobre cegueira.......................................................... 29
QUADRO 3 Definio da CID-10 sobre cegueira.............................................................. 29
FIGURA 1 Modelo de comunicao de Shannon-Weaver (1949)............................... 39
FIGURA 2 Modelo reflexivo de Leary (1955)............................................................. 40
FIGURA 3 Fatores presentes na comunicao verbal segundo Jakobson (2001)........ 41
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Perfil dos enfermeiros participantes da pesquisa. Fortaleza,
2009............................................................................................................ 62
TABELA 2 Perfil dos cegos participantes da pesquisa. Fortaleza, 2009...................... 63
TABELA 3 Comparao das aes de enfermagem entre o grupo treinado e o no-
treinado de acordo com as diretrizes gerais. Fortaleza,
2009............................................................................................................ 64
TABELA 4 Comparao das aes de enfermagem entre o grupo treinado e o no-
treinado de enfermeiros relacionadas ao acolhimento do paciente.
Fortaleza, 2009........................................................................................... 65
TABELA 5 Comparao das aes de enfermagem entre o grupo treinado e o no-
treinado de enfermeiros relacionadas coleta de dados. Fortaleza,
2009............................................................................................................ 66
TABELA 6 Comparao das aes de enfermagem entre o grupo treinado e o no-
treinado de enfermeiros relacionadas aos diagnsticos e planejamentos
de enfermagem. Fortaleza, 2009................................................................ 67
TABELA 7 Comparao das aes de enfermagem entre o grupo treinado e o no-
treinado de enfermeiros relacionadas implementao de enfermagem.
Fortaleza, 2009........................................................................................... 68
TABELA 8 Comparao das aes de enfermagem entre o grupo treinado e o no-
treinado de enfermeiros relacionadas avaliao de enfermagem.
Fortaleza, 2009........................................................................................... 69
TABELA 9 Comparao das aes de enfermagem entre o grupo treinado e o no-
treinado de enfermeiros relacionadas ao encerramento da consulta de
enfermagem. Fortaleza, 2009..................................................................... 70
TABELA 10 Valores do Coeficiente Alfa de Cronbach, do modelo de comunicao
verbal do enfermeiro com o cego. Fortaleza, 2009.................................... 71
TABELA 11 Distribuio das interaes de acordo com os elementos/funes da
comunicao verbal. Fortaleza, 2009......................................................... 73
SUMRIO
1 INTRODUO.................................................................................................. 15
2 HIPTESE E OBJETIVOS................................................................................ 22
2.1 HIPTESE.......................................................................................................... 22
2.2 OBJETIVOS....................................................................................................... 22
2.2.1 Objetivo geral...................................................................................................... 22
2.2.2 Objetivos especficos.......................................................................................... 22
3 REVISO DE LITERATURA........................................................................... 23
3.1 Deficincia.......................................................................................................... 23
3.1.1 Deficincia visual................................................................................................ 27
3.2 Comunicao Humana........................................................................................ 30
3.2.1 Bases tericas...................................................................................................... 30
3.2.1.1 Base biolgica..................................................................................................... 30
3.2.1.2 Base social.......................................................................................................... 31
3.2.2 Fatores que influenciam a comunicao............................................................. 33
3.2.3 Formas e nveis de comunicao........................................................................ 34
3.3 Modelos Tericos................................................................................................ 36
3.4 Comunicao em Enfermagem........................................................................... 43
4 METODOLOGIA............................................................................................... 51
4.1 Tipo de Estudo, Local e Perodo de Realizao................................................. 51
4.2 Sujeitos da Pesquisa e Aspectos ticos.............................................................. 51
4.3 Construo do Modelo de Comunicao Verbal com o Cego........................... 53
4.4 Validao do contedo do Modelo de Comunicao Verbal com o Cego por
especialista..........................................................................................................
56
4.5 Coleta de Dados................................................................................................. 57
4.5.1 Teste do Modelo de Comunicao Verbal com o Cego..................................... 57
4.5.1.1 Ambiente e procedimentos para filmagem......................................................... 57
4.5.1.2 Grupo no-treinado............................................................................................. 58
4.5.1.3 Grupo treinado.................................................................................................... 58
4.6 Anlise das Filmagens........................................................................................ 59
4.7 Anlise dos Dados............................................................................................... 61
5 RESULTADOS................................................................................................... 62
5.1 Perfil dos Enfermeiros e dos Cegos.................................................................... 62
5.2 Validao do Modelo de Comunicao Verbal.................................................. 63
5.3 Anlise de Confiabilidade do Modelo de Comunicao Verbal......................... 71
5.4 Anlise da Comunicao Verbal entre o Enfermeiro e Cego............................. 72
6 DISCUSSO DOS DADOS............................................................................... 75
6.1 Validao do Contedo do Modelo de Comunicao Verbal com o Cego por
especialistas.........................................................................................................
75
6.2 Perfil dos Enfermeiros e dos Cegos.................................................................... 78
6.3 Validao do Modelo de Comunicao Verbal.................................................. 79
6.4 Anlise da Comunicao Verbal entre o Enfermeiro e o Cego.......................... 90
7 CONCLUSES.................................................................................................. 94
REFERNCIAS.................................................................................................. 98
APNDICES....................................................................................................... 110
ANEXO
15
1 INTRODUO
Deficincia toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou funo psicolgica,
fisiolgica ou anatmica que gera incapacidade para o desempenho de atividade dentro do
padro considerado normal para o ser humano (BATTISTELLA; BRITO, 2002). O termo
deficincia visual refere-se a uma situao irreversvel de diminuio da resposta visual, em
virtude de causas congnitas ou hereditrias, mesmo aps tratamento clnico e/ou cirrgico e
uso de culos convencionais (ORGANIZAO MUNDIAL DA SADE, 2005).
Na deficincia visual, a acuidade visual igual ou menor do que 20/200 no melhor
olho, aps a melhor correo, ou campo visual inferior a 20% na escala de Snellen, ou
ocorrncia simultnea de ambas as situaes, sendo considerados deficientes visuais os cegos
e os portadores de viso subnormal (BOLONHINI JNIOR, 2004).
Cego aquele que apresenta desde ausncia total de viso at a perda da percepo
luminosa. Sua aprendizagem se d por meio da integrao dos sentidos remanescentes
preservados. Tem como principal meio de leitura e escrita o sistema braille, o qual obtido
pela justaposio de pontos em relevo, seis no mximo, cujas diferentes combinaes
permitem reproduzir todas as letras do alfabeto, os algarismos, a pontuao e a notao
musical. Sua escrita difcil, pois exige a inverso da disposio dos pontos. Nesse caso, o
cego deve escrever da direita para a esquerda, e o prprio signo invertido para poder a
leitura ser feita normalmente da esquerda para a direita (HUGONNIER-CLAYETTE;
MAGNARD, 1989; MASINI; CHAGAS; COVRE, 2006).
A cegueira pode ser decorrente do diabetes e representa uma das suas mais srias
conseqncias. Entre as complicaes microvasculares do diabetes sobressai a retinopatia
diabtica, principal causa de novos casos de cegueira entre norte-americanos nas idades de 20
a 64 anos. So 8 mil novos casos de cegueira a cada ano (AMERICAN ACADEMY OF
OPHTHALMOLOGY BASIC AND CLINICAL SCIENCE COURSE, 2000). No Brasil,
segundo se estima, metade dos pacientes portadores de diabetes afetada pela retinopatia,
responsvel por 7,5% das causas de incapacidade de adultos para o trabalho e por 4,58% das
deficincias visuais (BOELTER; AZEVEDO; GROSS, 2003). Hoje, com freqncia, esses
nmeros so importantes para retratar a deficincia visual pelo diabetes, razo por que no
pode ser desconsiderada pelos profissionais de sade.
16
Atualmente, de acordo com as estatsticas, existem 180 milhes de pessoas com
deficincia visual, em todo o mundo, dos quais 45 milhes so cegos e 135 milhes
apresentam algum tipo de baixa viso. Conforme previsto, at o ano de 2020 o nmero de
pessoas cegas dobrar. Determinados fatores concorrem para esta realidade, tais como o
crescimento populacional mundial, com um aumento do nmero de pessoas acima dos 65
anos, alm da falta de diagnstico de algumas doenas crnicas, como o glaucoma, e de uma
maior sobrevivncia de bebs prematuros que podem vir a ter a retinopatia peditrica, a
segunda maior causa de cegueira infantil. Como aponta estudo feito pela Organizao
Mundial da Sade (OMS), as principais causas de cegueira no mundo, em ordem decrescente,
so estas: catarata (47,80%); glaucoma (12,30%); degenerao macular (8,70%); opacidades
de crnea (5,10%); retinopatia diabtica (4,80%); cegueira infantil (3,90%); tracoma (3,60%);
oncocerquase (0,80%) e outras (13,00%) (OMS, 2005).
Os pases menos desenvolvidos so responsveis pela maior parte dos casos. Como
mostram dados da OMS (2005), a prevalncia da cegueira no mundo pode variar de 1% na
frica a 0,2% na Europa ocidental e nos Estados Unidos. No caso da baixa viso, com a
melhor correo possvel, sem levar em considerao, deste modo, os erros refrativos como a
miopia (a hipermetropia e o astigmatismo), varia de 3% na frica a 1,1% na Europa
ocidental. Outra caracterstica da cegueira no mundo que as mulheres apresentam maior
tendncia deficincia visual do que os homens.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), o Censo 2000
contabilizou 148 mil cegos no Brasil, 57 mil apenas no Nordeste. A Bahia, com 15,4 mil
pessoas, o segundo Estado brasileiro com maior nmero de deficientes visuais. Perde apenas
para So Paulo, onde vivem 23,9 mil cegos. O detalhe que mais de 16 milhes de pessoas
declararam ter algum tipo de dificuldade de enxergar. Desse total, estima-se que 2 milhes
tm baixa viso (IBGE, 2000).
A pessoa com deficincia visual, especialmente os cegos, encontra inmeras
dificuldades na integrao social, na medida em que o despreparo e o desconhecimento da
sociedade, de modo geral, criam barreiras de toda natureza. Assim, obstculos arquitetnicos
nas vias e logradouros pblicos, falta de sinalizao sonora no trnsito, inexistncia de
materiais didticos, problemas de comunicao, so alguns exemplos dos transtornos
enfrentados no dia-a-dia por essas pessoas (BOLONHINI JNIOR, 2004).
17
Tudo isto compromete a acessibilidade, definida como a condio de alcance das
pessoas com deficincia ou com mobilidade reduzida para utilizar com segurana e autonomia
os espaos mobilirios, os equipamentos urbanos, as edificaes, os transportes e os sistemas
dos meios de comunicao. A acessibilidade no diz respeito, apenas, ao espao fsico,
envolve todo um contexto de ambiente, o acesso aos meios de comunicao e at mesmo a
participao como cidado (GODOY et al., 2000), por meio do desenvolvimento sadio da sua
personalidade com vistas garantia da sua dignidade humana, nesta includa a promoo da
sade. No entanto, como observado no cotidiano da sociedade brasileira, a falta de orientao
no referente promoo da sade, preveno e tratamento de doenas atinge todas as camadas
sociais, principalmente as pessoas com deficincia. Estas sofrem duplamente: de um lado,
pela dificuldade de acesso fsico, e do outro, por no possurem os canais necessrios para a
obteno das informaes, como ocorre com o cego e o surdo.
Cada pessoa nica em seu modo de pensar, querer e sentir. Portanto, no h
necessariamente identidade de interesses e de comportamento entre as pessoas com uma
mesma deficincia. Do ponto de vista humano, as expectativas em relao pessoa com
deficincia so semelhantes s das demais pessoas: que, ao fim de um processo educativo, ou
de reabilitao, sejam seres completos, com autonomia de vida, liberdade de escolha,
independncia econmica e financeira e integrao ao seu meio.
Para isso, o Estado deve promover polticas educacionais e de incluso social que
permitam s pessoas com deficincia ingressar no processo social, interagindo com a
comunidade. Assim, funo do Estado, por meio dos seus rgos de fiscalizao, exigir o
cumprimento das normas que garantem as prerrogativas das pessoas com deficincia. Cabe-
lhe assegurar, por exemplo, a possibilidade de incluso educacional, o respeito reserva de
mercado, a eliminao de barreiras arquitetnicas, o atendimento sade, ao transporte, entre
outras necessidades bsicas (BOLONHINI JNIOR, 2004).
Como assevera a Constituio brasileira, a sade um dever do Estado, podendo ser
exercida pela iniciativa privada. A sade direito de todos e dever do Estado, garantida
mediante polticas sociais e econmicas destinadas reduo do risco de doena e de outros
agravos e ao acesso universal igualitrio s aes e servios para sua promoo, proteo e
recuperao (BRASIL, 1988).
18
A sociedade plural e, em particular, os profissionais de sade precisam se
conscientizar a entender que as pessoas, independentemente da sua condio, devem ser
tratadas com igualdade, pois todas so portadoras dos mesmos direitos fundamentais que
provm da humanidade e definem a dignidade da pessoa (FRANA, 2000). Tal considerao
expressa-se tambm por evidenciar que na enfermagem se fala muito de cuidado humanizado,
viso holstica, no qual o cliente assistido de uma forma global como indivduo singular,
respeitando-se suas crenas, seus valores, seu contexto histrico e seus limites fsico,
intelectual, social e mental.
Embora o cego tenha limitaes, isso no pode impedir sua comunicao e seu
relacionamento com outras pessoas. Ademais, ele tem direito a sade, com a garantia de
acesso aos estabelecimentos de sade e ao seu adequado atendimento. importante ento
haver essa harmonia na relao do profissional da sade e da pessoa com deficincia visual,
com vistas a esse relacionamento satisfatrio. Pessoas com deficincia fazem parte da
diversidade humana e a diferena entre as pessoas um princpio bsico. Em respeito a este
princpio, nenhuma forma de discriminao pode ser tolerada. Conforme proposto, o respeito
e a valorizao das diferenas definem a sociedade inclusiva.
Em qualquer sociedade, a comunicao exerce papel decisivo. No mbito da sade,
freqentemente o enfermeiro assume ora o papel de emissor ora o de receptor num mesmo
processo comunicativo ao se relacionar com um paciente. Para concretizar esse processo,
necessrio tanto enviar mensagens que o paciente entenda como entender as mensagens
recebidas. A mensagem a idia transmitida pelo emissor e essa idia deve ter o mesmo
significado para o receptor, pois s dessa forma a comunicao se efetivar.
No cuidado ao ser humano, a enfermagem tem a oportunidade de ocupar seu espao.
Todo ser humano complexo e indivisvel, e para se comunicar com ele ser preciso
considerar seus valores e crenas, prezar a auto-estima e o autoconceito, alm de se
estabelecer um relacionamento emptico. o exerccio da comunicao.
Atualmente, a temtica comunicao vem sendo bastante estudada. Spagnuolo e
Pereira (2007), em sua reviso de literatura em mbito nacional e internacional envolvendo
processos de comunicao do enfermeiro na sua prtica, identificaram cerca de 370 citaes
na base de dados LILACS. Os cenrios eram os mais diversos, a saber: maternidades
(LCIO; PAGLIUCA; CARDOSO, 2008; CAMPOS et al., 2008); unidades obsttricas
19
(PINTO; ROCHA; SILVA, 2002); unidades de doenas sexualmente transmissveis
(ARAJO et al., 2006); geriatria (SANTOS; SILVA, 2003); unidades de terapia intensiva
(ZINN; SILVA; TELLES, 2003; INABA; SILVA; TELLES, 2005); hospitais universitrios
(SILVA, 2001; BRAGA; SILVA, 2007; PONTES; LEITO; RAMOS, 2008); unidade de
queimados (SILVA; SILVA, 2004); unidade cirrgica (ZAGA; CASAGRANDE, 1997);
servios administrativos de sade (PUGINNA; SILVA, 2005; TREVIZAN et al., 1998);
pronto-socorro (SOUZA; SILVA, 2007); anotaes de enfermagem (ANGERI; MENDES;
PEDRAZZANI, 1981; ANGERI; MENDES; TAKAKURA, 1982; OCHOA-VIGO et al.,
2001) e universidades (JESUS; CUNHA, 1998; ROCHA, 1999; BRAGA, 2004; BRAGA;
DYNIEWICZ; CAMPOS, 2008).
Alm desses, outros estudos foram feitos por pesquisadores da temtica da
comunicao (MENDES; TREVIZAN; NOGUEIRA, 1987; MENDES et al., 1991;
SAWADA et al., 1993; CARVALHO; BACHION; BRAGA, 1997; BACHION;
CARVALHO; BELISRIO, 1998; MENDES; TREVIZAN; VORA, 2000; FAVRETTO;
CARVALHO; CANINI, 2008; CARDOSO; SILVEIRA; CARVALHO, 2008).
No referente deficincia, entre elas a visual, alguns estudos nacionais foram
encontrados, tais como: Inaba, Silva e Telles (2005); Pagliuca, Macedo e Silva (2003);
Macdo (2005); Macdo e Pagliuca (2004); Almeida (2005); Pagliuca, Fiuza e Rebouas
(2007); Frana, Pagliuca e Baptista (2008); Frana e Pagliuca (2008); Pagliuca, Regis e
Frana (2008); Cezrio, Mariano e Pagliuca (2008); Siqueira et al. (2009).
Quanto s exigncias para a comunicao, uma das principais interao entre
emissor e receptor. A comunicao eficaz quando a mensagem transmitida torna-se comum.
No entanto, esse processo pode ser afetado por vrios fatores. Entre eles, sobressaem:
inadequao do emissor na maneira de se expressar; falta de habilidade do emissor para
transmitir a mensagem e do receptor de compreend-la; alteraes da mensagem durante a
transmisso em virtude de falha no canal de comunicao (NOGUEIRA; CAETANO;
PAGLIUCA, 2000).
Estes problemas de comunicao ocorrem no apenas entre videntes, mas tambm
entre videntes e cegos. Quando a comunicao entre profissionais de sade e cegos e, no
caso, entre enfermeiras e cegos, eles so ainda mais complexos, sobretudo porque os
enfermeiros, na sua formao acadmica, no so instrudos a cuidar de pessoas cegas. Desse
20
modo, as experincias vividas por esses profissionais como estudantes no so suficientes
para capacit-los a lidar com essas pessoas (MACDO, 2003). Trabalho de concluso do
curso de mestrado realizado pela autora desse estudo corrobora estas afirmaes, pois
identificou falhas na comunicao verbal entre enfermeiro e cego em consulta a paciente
diabtico. Portanto, refora o real despreparo desses profissionais e a necessidade de
atentarem para esse aspecto durante sua atuao.
Em pesquisa na qual se estudaram os planos das disciplinas de quatro universidades,
percebeu-se que as proposies so universais, igualitrias e democrticas, e os planos
encampam a maioria das aes recomendadas pelo Ministrio da Sade para prevenir as
deficincias. Embora a prtica acadmica exercite a preveno-tratamento, silencia a respeito
da insero do enfermeiro no processo de integrao da pessoa com deficincia (FRANA;
PAGLIUCA; SOUZA, 2003).
No respeitante atuao do enfermeiro no processo de integrao social das pessoas
com deficincia, esse profissional precisa tomar parte ativa na equipe de reabilitao,
particularmente mediante aes educativas que ajudem essas pessoas a assumirem o
autocuidado e a desenvolverem uma conscincia transitiva crtica que facilite sua re-incluso
social (FRANA; PAGLIUCA; SOUZA, 2003). Por se acreditar nessas aes, optou-se por
desenvolver um Modelo de Comunicao Verbal com o Cego, com a finalidade especfica de
orientar o enfermeiro a comunicar-se verbalmente com essas pessoas.
Esta opo vem de longa data. O primeiro contato da pesquisadora com pessoas com
deficincia visual, ou, com pessoas surdas ocorreu durante o curso de graduao, ao ingressar
em um projeto de pesquisa do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal do
Cear (UFC) intitulado Projeto Sade Ocular. Sua abordagem era centrada na sade ocular do
adulto, da criana e na educao em sade do cego, vertente pela qual a pesquisadora
interessou-se e passou a desenvolver atividades de pesquisa e extenso, apesar dos recursos
utilizados em nosso meio para tal fim ainda serem escassos, no mbito da enfermagem.
Tambm houve participao em outros projetos durante a ps-graduao, a saber: o Projeto de
Comunicao em Sade e o Projeto Acessibilidade Fsica e ou Sensorial aos Servios de
Sade.
Quanto ao contato direto, verificou-se em uma associao de cegos do Estado do
Cear, local onde so desenvolvidas as atividades desses projetos por alunos da graduao e
21
ps-graduao componentes do grupo de pesquisa. Contudo toda essa experincia com a
deficincia s foi possvel em face das atividades cientficas da universidade e
conseqentemente desses projetos de pesquisa, pois, naquele tempo, o assunto no era
abordado na matriz curricular do Curso de Graduao de Enfermagem da UFC. Isso refora
ainda mais a dificuldade dos profissionais da enfermagem ao se relacionarem com pessoas
com deficincia.
Diante destas justificativas, considera-se relevante esse estudo, pois o enfermeiro tem
possibilidade e potencialidade para adquirir habilidades em usar adequadamente a
comunicao, tornando assim suas aes efetivas nesse processo. Ele deve tambm ter
conhecimento sobre cegueira e possveis conseqncia da doena. Saber comunicar-se com
essa clientela pode melhorar a assistncia de enfermagem local e ensejar embasamento para a
cincia no concernente ao relacionamento interpessoal entre pessoas com deficincia visual e
profissionais de sade quer em mbito estadual ou nacional.
22
2 HIPTESE E OBJETIVOS
2.1 HIPTESE
O Modelo de Comunicao Verbal com o Cego permitir ao enfermeiro maior
habilidade para se comunicar verbalmente com a pessoa cega.
2.2 OBJETIVOS
2.2.1 Objetivo geral
Construir e validar um Modelo de Comunicao Verbal com o Cego e o enfermeiro
luz da Teoria de Roman Jakobson.
2.2.2 Objetivos especficos
1) Desenvolver um Modelo de Comunicao Verbal com o Cego.
2) Validar o contedo do Modelo de Comunicao Verbal com o Cego junto a especialistas
em comunicao.
3) Aplicar o Modelo de Comunicao Verbal com o Cego com o enfermeiro na consulta de
enfermagem.
4) Avaliar o Modelo de Comunicao Verbal com o Cego em um grupo de enfermeiros
treinados e no-treinados.
5) Comparar o grupo de enfermeiros treinados e no-treinados em relao utilizao do
Modelo de Comunicao Verbal com o Cego.
23
3 REVISO DE LITERATURA
Nestas sees se abordaro detalhadamente os objetos de estudo no intuito de
clarific-los e darem suporte terico suficiente para atingir os objetivos propostos nessa tese.
So eles: deficincia; comunicao humana; modelos tericos; comunicao em enfermagem.
3.1 Deficincia
Uma das misses da Organizao Mundial da Sade (OMS) consiste na produo de
Classificaes Internacionais de Sade que representam modelos consensuais a serem
incorporados pelos sistemas de sade, gestores e usurios, com vistas utilizao de uma
linguagem comum para a descrio de problemas ou intervenes em sade. O propsito de
The WHO Family of International Classifications, em portugus, A Famlia de Classificaes
Internacionais da OMS, resume-se em promover a seleo apropriada de classificaes em
vrios campos da sade em todo o mundo. Estas facilitam o levantamento, consolidao,
anlise e interpretao de dados; facilitam tambm a formao de bases de dados nacionais
consistentes e permitem a comparao de informaes sobre populaes ao longo do tempo
entre regies e pases (OMS, 2007).
Entre elas, sobressai a CID-10. Segundo a OMS (2007), a CID-10 (Classificao
Estatstica Internacional de Doenas e Problemas Relacionados Sade, 10 Reviso) fornece
um modelo baseado na etiologia, anatomia e causas externas das leses. Outro documento
tambm elaborado pela OMS foi a International Classification of Functioning Disability and
Health (ICF) ou em portugus Classificao Internacional de Funcionalidade (CIF). No
intuito de responder s necessidades de se conhecer mais sobre as conseqncias das doenas,
em 1976 a OMS publicou a International Classification of Impairment, Disabilities and
Handicaps (ICIDH), em carter experimental, traduzida para o portugus como Classificao
Internacional das Deficincias, Incapacidades e Desvantagens, a CIDID (PORTUGAL, 1989;
FARIAS; BUCHALLA, 2005).
Aps vrias verses e numerosos testes, em maio de 2001 a Assemblia Mundial da
Sade aprovou a International Classification of Functioning, Disability and Health (OMS,
2001). A verso na lngua portuguesa foi traduzida pelo Centro Colaborador da Organizao
Mundial da Sade para a Famlia de Classificaes Internacionais (OMS, 2003). No referente
deficincia, a CIF foi elaborada com a finalidade de registrar e organizar uma gama de
24
informaes relacionadas a diferentes estados de sade. Visa uniformizar a linguagem
internacional concernente descrio de diferentes aspectos quanto a funcionalidade,
incapacidade e sade (BATTISTELLA; BRITO, 2002).
Pela CIF as funes corporais so entendidas como as funes fisiolgicas dos
sistemas corporais e as estruturas corporais so as partes anatmicas do corpo humano. Desse
modo, as deficincias so problemas nas funes ou estruturas corporais tais como um desvio
significativo ou uma perda, enquanto limitaes so dificuldades que uma pessoa pode ter no
desempenho e/ou realizao das atividades. Ter limitaes no significado de deficincias
evidentes. Por exemplo, pessoas impossibilitadas de desenvolver as atividades dirias por
estas estarem relacionadas com muitas doenas. A incapacidade entendida como a restrio,
resultante de uma deficincia, da habilidade para desempenhar uma atividade considerada
normal para o ser humano (OMS, 2003).
De modo geral, as deficincias devem ser parte ou expresso de um estado de sade,
porm no indicam necessariamente a presena de uma doena ou que o indivduo deve ser
considerado doente. Portanto, o conceito de deficincia inclui vrios aspectos, como
transtorno ou doena. Por exemplo, a perda de uma perna uma deficincia, no um
transtorno ou uma doena (OMS, 2003). Para essa nova classificao, o termo funcionalidade
substitui termos usados no passado, como incapacidade, deficincia, invalidez e desvantagem,
e amplia seu significado para incluir experincias positivas registrando a potencialidade da
pessoa com deficincia. A nova classificao mede a capacidade da pessoa com deficincia
em superar diferentes nveis de dificuldades relacionadas s tarefas do cotidiano
(BATTISTELLA; BRITO, 2002). Assim, segundo se entende, esses dois sistemas so
complementares e os profissionais devem utilizar essas classificaes de forma conjunta.
Os conceitos apresentados nessa classificao introduzem um novo paradigma para
pensar e trabalhar a deficincia e a incapacidade: elas no so apenas uma conseqncia das
condies de sade/doena; so determinadas tambm pelo contexto do meio ambiente fsico
e social, pelas diferentes percepes culturais e atitudes em relao deficincia, pela
disponibilidade de servios e de legislao. Dessa forma, a classificao no constitui
somente um instrumento para medir o estado funcional dos indivduos. Alm disso, ela
permite avaliar as condies de vida e fornecer subsdios para polticas de incluso social
(FARIAS; BUCHALLA, 2005).
25
Ao se percorrer a histria da humanidade, visvel o preconceito em relao aos
diferentes. Tal preconceito parece resistir com o advento da revoluo industrial do mundo
contemporneo. Segundo Adorno (1995), na indstria, ou seja, com o capitalismo, o
indivduo ilusrio no apenas por causa da padronizao do modo de produo. Ele s
tolerado na medida em que sua identidade incondicional com o universal est fora de
questo. O indivduo transformado em consumidor dos produtos oferecidos pela indstria
cultural v-se enfraquecido diante da mesmice que lhe oferecida e, na seqncia, induzido
a reaes massificadas, propcias reincidncia de prticas preconceituosas.
O preconceito incorpora fenmenos contemporneos, resultantes das relaes sociais
cada vez mais impeditivas para a reflexo sobre a prpria impotncia em face de uma ordem
social que diferencia pela estigmatizao. Numa sociedade que impe renncias e sacrifcios
capazes de enriquecer o pensamento, em virtude das condies de sobrevivncia num
contexto de privaes determinadas por relaes desiguais, de apropriao concentrada dos
bens materiais e simblicos, o preconceito torna-se um elemento presente e freqente
(SILVA, 2006).
Como assevera a literatura, a sociedade possui uma viso de homem padronizada e
classifica as pessoas de acordo com essa percepo. Elege-se um padro de normalidade e se
esquece de que a sociedade se compe de homens diversos, que ela se constitui na
diversidade, assumindo de um outro modo as diferenas (MATTOS, 2007).
Por ser disforme ou fora dos padres, o corpo marcado pela deficincia lembra a
imperfeio humana. Como nossa sociedade cultua o corpo til e aparentemente saudvel, as
pessoas com deficincia mostram a fragilidade que se quer negar. A sociedade no os aceita
porque se considera diferente deles. Se os aceitasse, se igualaria. como se eles a remetesse a
uma situao de inferioridade. T-los em seu convvio funcionaria como um espelho a
lembrar que tambm se pode ser como eles. Esse potencial, que real, em vista das trgicas
mudanas possveis de ocorrer, que faz o homem frgil, pois ele quer ser sempre completo e
constante. O estigma, por ser uma marca, um rtulo, o que mais se evidencia, propiciando a
identificao. E, assim, idealiza-se uma vida particular dos cegos, dos surdos, que explica
todos os seus comportamentos de forma inflexvel. Por exemplo: ele age assim porque cego.
Nesse processo de rotulao, o indivduo estigmatizado incorpora determinadas
representaes, passa a identificar-se com uma tipificao que o nega como indivduo
(SILVA, 2006). O preconceito s pessoas com deficincia configura-se como um mecanismo
26
de negao social, porquanto suas diferenas so ressaltadas como uma falta, carncia ou
impossibilidade.
Num primeiro contato, as pessoas com deficincia causam estranheza. Tal estranheza
pode manter-se ao longo do tempo, a depender do tipo de interao e dos componentes dessa
relao. Como afirma Sassaki (2003), diante dessa situao o preconceito emerge como um
comportamento pessoal. Para modificar referida situao, tanto os rgos do Estado, como a
Coordenadoria Nacional para a Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia (CORDE), e a
prpria sociedade, devem discutir a forma como essas pessoas so tratadas no pas e exigir o
cumprimento das leis vigentes.
De acordo com Tanaka (2006), desde a aprovao da Declarao de Salamanca, em
1994, questes referentes s teorias e prticas inclusivas vm sendo incessantemente
discutidas quer por educadores e rgos envolvidas com a educao de pessoas com
necessidades educacionais especiais, por empregadores e organismos interessados na
colocao dessa populao no trabalho, quer pela sociedade de modo geral. A partir de 1999,
com a aprovao da Portaria n 1.679, o tema acessibilidade tambm passou a fazer parte do
cenrio dessas discusses, pois o direito de ir e vir tornou-se um elemento importante para
auxiliar na incluso social.
Um dos espaos dessas discusses foi a VIII Jornada de Educao Especial, ocorrida
de 8 a 11 de maio de 2006, promovida pelo Departamento de Educao Especial da Unesp,
campus de Marlia. Nesse espao os profissionais e pesquisadores tiveram a oportunidade de
debater diferentes questes relacionadas ao eixo temtico incluso e acessibilidade, alm de
disseminar suas produes cientficas e divulgar as experincias desenvolvidas na rea
(TANAKA, 2006). Nesta jornada, contudo, no se abordou a sade dessas pessoas. Urge,
pois, intensificar as discusses sobre tal tema.
A convivncia na diversidade deve ser aceita. Mas no significa assumir a posio de
espectador passivo e tolerante. Nesse caso, o pressuposto essencial est em admitir que cada
indivduo tem direito de combinar experincias pessoais de vida com a coletividade,
imprimindo, todavia, uma identidade particular: sua individualidade. Na atual sociedade, esse
direito ainda no concretizado, em virtude de se ignorar singularidades individuais (SILVA,
2006).
27
3.1.1 Deficincia visual
Paralelamente aos conceitos da CIF, deve-se levar em conta o art. 3 do Decreto
3.298, de 20 de dezembro de 1999, que regulamenta a Lei n 7.853, de 24 de outubro de 1989,
e dispe sobre a Poltica Nacional para a Integrao da Pessoa Portadora de Deficincia.
Segundo consta nesse documento, deficincia toda perda ou anormalidade de uma estrutura
ou funo psicolgica, fisiolgica ou anatmica que gere incapacidade para o desempenho de
atividade, dentro do padro tido como normal para o ser humano. Assim, considera-se
deficincia visual quando a acuidade visual igual ou inferior a 20/200 no melhor olho, aps
a melhor correo, ou campo visual inferior a 20 (escala de Snellen), ou ocorrncia
simultnea de ambas as situaes (SENAC, 2003).
Para a delimitao e avaliao da viso podem se adotar duas vertentes: acuidade
visual, aquilo que se enxerga a determinada distncia, e campo visual, a amplitude da rea
alcanada pela viso (JARVIS, 2002; PORTO, 2005). Em 1966 a OMS registrou 66
diferentes definies de cegueira, utilizadas para fins estatsticos em diversos pases. Para
simplificar o assunto, um grupo de estudos sobre a Preveno da Cegueira da OMS, em 1972,
props normas para a definio de cegueira e para uniformizar as anotaes dos valores de
acuidade visual com finalidades estatsticas (SILVA, 2005; MASINI; CHAGAS; COVRE,
2006).
Determinados estudos foram produzidos sobre o assunto. Entre estes, o da American
Academy of Ophthalmology em parceria com o Conselho Internacional de Oftalmologia no
qual se estabeleceram extensas definies, conceitos e comentrios, transcritos no Relatrio
Oficial do IV Congresso Brasileiro de Preveno da Cegueira (1980). Na oportunidade foi
introduzido pela primeira vez, ao lado de cegueira, o termo viso subnormal (SILVA, 2005;
MASINI; CHAGAS; COVRE, 2006). Foi, no entanto, a partir de uma resoluo adotada pelo
Conselho Internacional de Oftalmologia, em Sidney, Austrlia, em 20 de abril de 2002, que se
passou a utilizar os seguintes termos: cegueira; baixa viso; viso diminuda; viso funcional
e perda da viso (MASINI; CHAGAS; COVRE, 2006), cujas definies esto expostas a
seguir:
A cegueira ocorre somente em caso de perda total de viso e para condies nas
quais os indivduos precisam contar predominantemente com habilidades de substituio da
viso. A baixa viso est presente quando h graus menores de perda de viso nos quais os
28
indivduos podem receber auxlio significativo por meio de aparelhos e dispositivos de
reforo da viso (outro termo ainda utilizado viso subnormal). J a viso diminuda ocorre
quando a condio de perda de viso caracterizada por perda de funes visuais (como
acuidade visual e campo visual). Muitas dessas funes podem ser medidas
quantitativamente. Quanto viso funcional, constitui a capacidade de uso da viso pelas
pessoas para as Atividades Dirias da Vida (ADV). Muitas dessas atividades podem ser
descritas apenas qualitativamente. Por fim, a perda de viso, termo geral que compreende
tanto a perda total (cegueira) como a perda parcial (baixa viso), caracterizada por viso
diminuda ou perda de viso funcional (MASINI; CHAGAS; COVRE, 2006).
Para relatar a prevalncia de perda de viso em estudos populacionais e na pesquisa
clnica, a recomendao descrev-la mais detalhadamente mediante classificao em faixas
de perda de viso. Tal critrio baseado na acuidade visual (CONSELHO BRASILEIRO DE
OFTAMOLOGIA, 2007). Segue o quadro 1 com as faixas.
Quadro 1- Faixas de perda de viso
Acuidade visual
Viso normal 0,8
Perda leve de viso < 0,8 e 0,3
Perda moderada de viso < 0,3 e 0,125
Perda grave de viso < 0,125 e 0,05
Perda profunda de viso < 0,05 e 0,02
Perda quase total de viso (prxima
cegueira)
< 0,02 e SPL (Sem percepo da luz)
Perda total de viso (cegueira) SPL
Fonte: Masini, Chagas e Covre (2006).
De acordo com Masini, Chagas e Covre (2006), o termo deficincia visual abrange
conceitos que incluem desde a cegueira total, na qual no h percepo de luz, at a baixa
viso. A baixa viso ou viso subnormal foi catalogada pela CID, na sua dcima verso, como
H54.2 e compreende determinados graus de comprometimento, como mostra o quadro 2.
29
Quadro 2 - Definio da CID-10 sobre cegueira
Acuidade visual com a melhor correo possvel
Graus de comprometimento
visual
Mxima menor que: Mnima igual ou maior que:
1 6/18
3/10 (0,3)
20/70
6/60
1/10 (0,1)
20/200
2 6/60
1/10 (0,1)
20/200
3/60
1/20 (0,05)
20/400
Fonte: Masini, Chagas e Covre (2006).
Em sua dcima reviso, a CID cataloga a cegueira total e congnita como categoria
H54.0, com os seguintes graus de comprometimento expostos no quadro 3.
Quadro 3 - Definio da CID-10 sobre cegueira
Acuidade visual com a melhor correo possvel
Graus de comprometimento
visual
Mxima menor que: Mnima igual ou maior que:
3 3/60
1/20 (0,05)
20/400
1/60 (capacidade de contar
dedos a 1 m)
1/50 (0,02)
5/300 (20/1200)
4 1/60 (capacidade de contar
dedos a 1 metro)
1/50 (0,02)
5/300
Percepo da luz
5 Ausncia da percepo da luz -
Fonte: Masini, Chagas e Covre (2006).
Assim, de suma importncia que os profissionais de sade, em especial os
enfermeiros, dominem todas essas conceituaes para poderem deter um conhecimento mais
aprofundado e buscar a melhoria no relacionamento interpessoal com os deficientes visuais.
30
3.2 Comunicao Humana
As pessoas se comunicam com a finalidade de definir e clarificar mensagens em suas
interaes com o seu redor. um processo humano de emisso e recepo de mensagens no
qual existem dois meios de transmisso: o verbal e o no-verbal.
Trata-se de um processo inerente ao ser humano. Portanto, nenhuma comunidade ou
sociedade subsiste sem comunicao: os homens interagem, convivem, agem em comum,
comunicam-se sempre (ROSSI; BATISTA, 2006). Como afirma Vasconcellos et al. (2002),
este um fenmeno universal, que alcana sua mxima complexidade no ser humano e na
sociedade.
Nessa perspectiva sero abordados detalhadamente os seguintes assuntos: Bases
tericas da comunicao humana, fatores que a influenciam; modelos de comunicao e a
comunicao em enfermagem.
3.2.1 Bases tericas
No referente temtica pode-se encontrar vasta abordagem na literatura. Como bases
tericas da comunicao humana identificaram-se a base biolgica e a base social. Ambas so
direcionadas comunicao verbal e esto explicitadas a seguir.
3.2.1.1 Base biolgica
Essa base fundamentada na anatomia e fisiologia. Na comunicao, diversas partes
do corpo esto associadas. Entre elas, ressaltam-se: boca, nariz, faringe, epiglote, traquia,
pulmes, msculos e crebro. Na comunicao verbal, a combinao entre essas estruturas
produz uma variedade de sons, os quais propiciam s pessoas interagirem com o meio. Falar
articular o som empurrando o ar para fora dos pulmes, atravs da traquia na laringe, onde as
cordas vocais esto.
A voz uma caracterstica humana intimamente relacionada com a necessidade do
homem de se socializar e se comunicar. Ela produto da evoluo da humanidde, resultado da
interao do sistema nervoso, respiratrio e digestivo, e de msculos, ligamentos e ossos, em
atuao harmoniosa para se obter uma emisso de sons eficiente. Na realizao da
comunicao verbal, a voz est associada fala, e pode variar quanto a intensidade, altura,
31
inflexo, ressonncia, articulao e muitas outras caractersticas (CROWFORD; BROWN;
CATER, 2004).
De acordo com Potter e Perry (2005), a voz produzida quando o ar expiratrio
passa pelas pregas vocais e, pelo comando neural, por meio de ajustes musculares, pressiona
sob diferentes graus a regio abaixo das pregas vocais, fazendo-as vibrarem. O ar expiratrio,
indutor das vibraes das pregas vocais, vai sendo modificado e os sons vo sendo articulados
(vogais e consoantes). Depois, emitidos pela boca, fazem a onda sonora que vai atingir a
cclea do ouvinte.
As pregas vocais vibram muito rapidamente. Nos homens, esse nmero de ciclos
vibratrios inferior ao das mulheres. A essa caracterstica d-se o nome de freqncia. De
modo geral, as pregas vocais do homem tm mais massa e so menos esticadas que as da
mulher. Por isso, o som se torna mais agudo e vibra mais que as cordas mais graves. Quanto
ao timbre da voz humana, depende das vrias cavidades que vibram em ressonncia com as
pregas vocais. A se incluem as cavidades sseas, as cavidades nasais, a boca, a faringe, a
traquia e os pulmes, bem como a prpria laringe (CROWFORD; BROWN; CATER, 2004).
Caso haja alguma interferncia nesse sistema complexo denominado fala/discurso, pode
ocorrer dificuldade de comunicao.
3.2.1.2 Base social
No plano social, a comunicao inicia-se com o grito do nascimento e, a partir da,
desenvolve-se uma variedade de sons que formam a linguagem falada (TEIXERA; BRAGA;
ESTEVES, 2004). Tal linguagem est presente na vida cotidiana e constitui-se em uma
necessidade da pessoa humana como ser social. Sociedade e comunicao esto unidas; no
existe comunicao por si mesma, separada da vida em sociedade (ALMEIDA, 2001). A
linguagem deve ser analisada sob uma perspectiva dialgica na qual interagem os
componentes da relao verbal: esta sempre detm um carter social e ideolgico.
Mais do que possibilitar a transmisso de informaes de um emissor a um receptor,
a linguagem vista como um lugar de interao humana: atravs dela o sujeito fala, pratica
aes no possveis de outro modo a no ser falando. Com ela, o falante age sobre o ouvinte,
estabelece compromissos e vnculos preinexistentes antes da fala. Esta terceira concepo
sugere uma postura diferenciada no referente ao ensino da lngua, pois situa a linguagem
32
como espao de constituio de relaes sociais no qual os falantes se tornam sujeitos
(ALMEIDA, 2001).
Na verdade, o centro de gravidade da lngua reside na significao que assume tal
forma em cada contexto. No so as palavras que se pronunciam ou se escutam, mas verdades
ou mentiras, coisas boas ou ms, importantes ou triviais, agradveis ou desagradveis. A
palavra est sempre carregada de um contedo ou de um sentido ideolgico ou vivencial. Para
ser apreendida a comunicao, preciso se descobrir a particular percepo de mundo de cada
indivduo que participa desse processo. O ato de fala, bem como seu produto, a enunciao,
no pode ser analisado apenas a partir das condies do sujeito falante, embora no se possa
abrir mo dele. Assim, a enunciao assume carter social: sua apreenso demanda entend-la
como um fenmeno a se realizar sempre numa interao (BAKHTIN, 1988).
Como observado, dois aspectos presentes no enunciado o caracterizam como um
processo interado realidade social, a saber: o significado e o sentido. O significado detm o
carter de significado abstrato. como descreve Faraco (1988): "dicionarizado", e
reconhecido pelos lingistas. Por sua vez, o sentido o significado contextual. Explica o autor
que a sentena e a palavra detm um significado prprio. Essas, como unidades de lngua, no
possuem autor nem pertencem a nada. a partir de um enunciado completo que palavra e
sentena adquirem a condio de expresso de uma situao individual do falante num
contexto concreto de comunicao discursiva.
O enunciado tem por caracterstica seu contedo e seu sentido. Ou seja, corresponde
a um significado abstrato que detm do ouvinte uma compreenso passiva que o decodifica.
J o sentido exige uma compreenso, isto , vai alm da decodificao. O sentido requer uma
compreenso ativa, mais complexa, na qual o ouvinte, alm de decodificar, relaciona o que
est sendo dito com o que est presumindo e prepara uma resposta para o enunciado.
Compreender no , portanto, simplesmente decodificar, mas supe toda uma relao
recproca entre falante e ouvinte, ou uma relao entre os ditos e os presumidos (ALMEIDA,
2001).
Um dos recursos a expressar a atitude emotiva e valorativa do falante que se
relaciona ao objeto do seu discurso a entonao (JAKOBSON, 2001). Essa aparece
claramente na interpretao oral e indissocivel do enunciado, pois no existe fora dele, no
sistema da lngua, nas unidades da lngua. Dessa forma, a emotividade, a expressividade so
33
particulares da palavra em sua condio de unidade da lngua. So essas caractersticas que
formam o processo ativo da palavra no mbito do enunciado.
Ao diferenciar a palavra como unidade gramatical no processo de comunicao, que
interpessoal, Bakhtin (1988) esclarece o seguinte: como nos dicionrios, os significados
neutros, as palavras da lngua garantem seu carter e a intercompreenso daqueles que a
compartilham como unidade de fala. O carter dialgico da comunicao verbal,
independentemente do seu tipo, est intrnseco nas relaes sociais que se modificam no
decorrer da histria da humanidade, muitas vezes se confundido com ela.
3.2.2 Fatores que influenciam a comunicao
Vrios fatores podem ter influncias tanto positivas quanto negativas no concernente
efetivao da comunicao e podem ser de cunho fsico, psicolgico, sociocultural e/ou
poltico-econmicos. Os fatores fsicos interferem na capacidade de uma pessoa se comunicar
atravs de uma linguagem verbal e no-verbal. Nesse caso, especialmente importante o
funcionamento adequado das estruturas corporais e dos sistemas nervosos e endcrinos. Por
exemplo, para a aquisio da fala existem pelo menos trs mecanismos adequados: boa
audio, um aparelho fonador em funcionamento e a possibilidade de ouvir e imitar outras
vozes. Obter capacidade de ler exige, pelo menos, viso mnima. Conseguir capacidade de
escrever ainda mais dependente de um funcionamento adequado da mo preferida (ROPER;
LOGAN; TIERNEY, 1993).
Dos fatores psicolgicos, sobressaem alguns. Por exemplo, a ansiedade, por afetar a
comunicao, especificamente quando pessoas/clientes participam de uma entrevista e ou
anamnese. Mos trmulas, pupilas dilatadas, testa e lbio superior suados podem mostrar ao
entrevistador o estado de tenso. Outro a excitao, a qual geralmente aumenta tanto a
velocidade do discurso como o tom da voz. Inclui-se tambm a raiva, quase sempre expressa
pela elevao da voz. J a depresso baixa a voz quase monotonia. Nesse caso, o movimento
diminudo e gestos de tristeza caracterizam muitas pessoas quando esto nesse estado.
Mencionam-se, ainda, a alegria, que aumenta a voz e torna a pessoa risonha, entusiasmada.
Outro fator importante para uma comunicao efetiva o humor do remetente e do
destinatrio.
34
Alm destes fatores influenciveis na comunicao, existem aqueles ditos
socioculturais. Uma sociedade cada vez mais multirracional e mvel exige a considerao dos
fatores socioculturais da comunicao. Dentro de uma determinada lngua pode haver vrios
vocbulos locais, os regionalismos, que algumas pessoas no compreendam. Em algumas
regies, evidencia-se o sotaque. A maneira de vestir pode comunicar informao to diversa
como origem tnica de uma pessoa, religio, ocupao ou grupo social. A aceitabilidade de
tocar outros seres humanos tambm varia, assim como a prtica do beijo e do fixar os olhos
do interlocutor no momento da comunicao.
No referente aos fatores polticos e econmicos, segundo alguns autores afirmam,
estas condies variam de diferentes formas, de indivduo para indivduo, como, por exemplo,
na seleo da vizinhana para compra de uma casa, na escolha de um crculo social e de um
tipo de ocupao. Determinadas situaes corroboram estes fatores. Assim, a disponibilidade
do telefone, rdio e televiso depende freqentemente de servios governamentais, pois as
decises poltico-econmicas so envolvidas e tendem a ser mantidas na medida em que os
meios de comunicao oferecem oportunidade de presso poltica e para a comunicao uma
forma de propaganda (ROPER; LOGAN; TIERNEY, 1993).
3.2.3 Formas e nveis de comunicao
Como mencionado, as duas formas de comunicao so a verbal e a no-verbal, e a
primeira pode ser efetuada de maneira falada e pela escrita. Nessa forma de comunicao os
aspectos relevantes so exatamente o vocabulrio, o significado do que est sendo
transmitido, o silncio, a entonao, a clareza e a conciso, o ambiente (momento) e a
relevncia da mensagem (STEFANELLI, 1993; SILVA, 1996; MACDO, 2003).
A comunicao verbal a base da comunicao cotidiana, por meio da qual se
exercita a capacidade de atribuir o significado das coisas que no so ditas explicitamente,
enriquecendo a compreenso da realidade. Nesse processo, o conhecimento dos mecanismos
de comunicao pelos profissionais de sade, em especial os enfermeiros, facilita o
desempenho das suas funes, bem como melhora o relacionamento entre os sujeitos
envolvidos na assistncia sade (DOBRO et al., 1998). J a comunicao no-verbal inclui
os cinco sentidos sensoriais, e leva em considerao outros aspectos como a prpria
aparncia, a postura, a expresso facial, o contato visual, os gestos, os sons, a territorialidade e
o espao pessoal (HALL, 1986; REBOUAS, 2008).
35
Alm dessas duas formas existem tambm os nveis de comunicao que descrevem
em que grau essas relaes podem ocorrer, a saber: intrapessoal, interpessoal, transpessoal,
em pequeno grupo, macia ou em massa (ATKINSON; MURRAY, 2002; BRODY, 2003;
CROWFORD; BROWN; CATER, 2004; POTTER; PERRY, 2005). Segundo esses
estudiosos, a comunicao intrapessoal uma forma de comunicao que ocorre internamente
no indivduo. Esse nvel de comunicao tambm chamado de autoconversa,
autoverbalizao e pensamento interior. Os pensamentos das pessoas influenciam fortemente
nas percepes, sentimentos, comportamento e autoconceito. Por este motivo, os enfermeiros
devem estar cientes da natureza e do contedo do seu prprio pensamento e tentar substituir
os pensamentos negativos e de autodefesa por asseres positivas. Os enfermeiros e pacientes
podem usar a comunicao intrapessoal para desenvolver a autoconscincia e um
autoconceito positivo, com vistas a obter a auto-expresso adequada.
Quanto comunicao interpessoal, esse nvel a interao entre uma e outra pessoa
que, freqentemente, ocorre face a face. o nvel mais comumente utilizado nas situaes de
enfermagem e na sua prtica. Ele acontece no contexto social e inclui todos os smbolos e
sugestes usados para emitir e receber significados. Pelo fato de o sentido residir nas pessoas
e no nas palavras, as mensagens recebidas podem ser diferentes das pretendidas. Os
enfermeiros trabalham com pessoas que tm opinies, experincias, valores e sistemas de
crenas diferentes. Quando a comunicao interpessoal mais significativa resulta na troca de
idias, soluo de problemas, expresso dos sentimentos, tomada de decises, cumprimento
de metas, construo de equipe e crescimento pessoal (MURRAY, 2002; BRODY, 2003;
CROWFORD; BROWN; CATER, 2004; ATINKSON; POTTER; PERRY, 2005).
Outro nvel de comunicao o transpessoal. Nele a interao acontece no domnio
espiritual da pessoa. Muitas pessoas usam a orao, a meditao, a reflexo orientada, os
rituais religiosos ou outros meios para se comunicar com uma fora superior (POTTER;
PERRY, 2005). De modo geral, os enfermeiros que valorizam a espiritualidade humana usam
esta forma de comunicao com os pacientes e consigo mesmos, principalmente em
momentos crticos advindos do dia-a-dia.
Quanto comunicao em pequeno grupo, ocorre quando um limitado nmero de
pessoas est junto. Normalmente esse tipo de comunicao est objetivamente direcionado e
requer uma compreenso sobre dinmica de grupo. Quando os enfermeiros trabalham em
comits, lideram grupos de suporte ao paciente, formam equipes de pesquisa ou participam de
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conferncias de cuidados ao paciente, um processo de comunicao em grupo pequeno
utilizado. Esse tipo de grupo mais eficaz quando tem tamanho razovel, acontece em um
lugar apropriado, possui disposio dos assentos adequada e h coeso e comprometimento
entre os membros do grupo (BRODY, 2003; CROWFORD; BROWN; CATER, 2004).
J a comunicao em massa pressupe transmisso e recepo a distncia de
produtos imagticos e informativos, em teipe ou em tempo real, predominantemente de uma
via apenas, com mediao de formas culturais (telenovela, jornalismo, programas de
auditrio, etc.) e mquinas eletrnicas (rdio, TV). Nesse nvel os enfermeiros tm
oportunidade de falar com grupos de consumidores sobre temas relacionados sade e de
apresentar trabalho acadmico aos colegas em eventos cientficos (PERUZZO, 2008). A
comunicao eficaz em pblico aumenta o conhecimento da audincia sobre temas associados
sade, questes de sade e outros assuntos importantes para a profisso de enfermagem
(BRODY, 2003; CROWFORD; BROWN; CATER, 2004).
3.3 Modelos Tericos
Os estudos especficos em comunicao vm de longo tempo. No sculo III a.C.
Aristteles j estudava a comunicao interpessoal dirigida para determinada audincia.
Como mostra a literatura, os estudos sobre a retrica, desenvolvidos pelos sofistas,
enfatizavam a transmisso da informao como processo de persuaso, composta por trs
elementos bsicos: locutor, discurso e ouvinte. o modelo clssico tricotmico definido por
Aristteles. Tal modelo fundamenta-se na formulao da teoria para os estudos de
comunicao. Este sistema linear perdura at os dias atuais (FISKE, 1990; MELO, 1998;
TRIGUEIRO, 2001).
Com a preocupao de melhor definir os estudos de comunicao, Fiske (1990)
analisa duas importantes linhas tericas. A escola processual, como uma tentativa de
aproximao das cincias sociais, da psicologia e da sociologia, com o objetivo de
compreender os atos da comunicao, e a escola semitica, a qual tenta uma aproximao da
lingstica com as artes para compreender a produo e elaborao da mensagem. A primeira
como sendo a transmisso de mensagens e a segunda como a produo e troca de significados
(TRIGUEIRO, 2001).
37
No primeiro caso os estudos esto voltados para o modo como os emissores e os
receptores codificam e decodificam as mensagens, como so selecionados e utilizados os
canais e os meios de comunicao, como a comunicao influencia a motivao e o
comportamento da recepo. A segunda linha de estudo est voltada para a anlise dos
significados das mensagens nas culturas. Qual a funo da comunicao na nossa cultura e
como as mensagens interagem nos grupos sociais ou nas pessoas? Esta linha de investigao
dos signos e significados, denominada de semitica, no considera como fracasso os
conflitos, os objetivos no alcanados no ato de comunicao. O que existe so resultados das
diferenas culturais entre emissor e receptor (MELO, 1998; TRIGUEIRO, 2001).
importante compreender a comunicao em trs suposies bsicas: processual,
transacional e multidimensional. A seguir a descrio detalhada de cada uma. A comunicao
humana um processo contnuo, dinmico, e sempre em mudana. Insinua uma comunicao
entre a pessoa A e a pessoa B; uma interao contnua com um nmero extremamente
grande de variveis, que mudam continuamente. Sobretudo durante o processo comunicativo,
os estados fsicos, emocionais e sociais da pessoa A e da pessoa B podem mudar. Isto poderia
causar mudanas adicionais em sua interao (TRIGUEIRO, 2001). Conforme se supe, uma
comunicao humana um processo decisivo porque fora reconhecer a complexidade desta
comunicao e de muitos relacionamentos que a envolve. Na assistncia de enfermagem, o
processo parece ter uma nica direo: profissional profissional e profissional cliente
(MACDO; PAGLIUCA, 2004). Diante desta realidade, exige no somente rever os fatores
que afetam o cliente, mas analisar tambm os fatores que afetam todos os indivduos
envolvidos, isto , demais membros da equipe, familiares, entre outros.
Uma segunda suposio sobre a comunicao humana que ela seria transacional, ou
seja, ambos os indivduos em uma interao esto afetados por ela e ou afetam o outro.
Assim, a pessoa A constri uma mensagem para a pessoa B; A est recebendo as sugestes de
B que influenciam como A formula a mensagem. Um aspecto relevante a possibilidade de
ver a interrelao simultnea entre o remetente e o receptor. Referida interrelao caracteriza
os relacionamentos entre os indivduos e sua influncia mtua. A interao pode ser
influenciada pelos desejos da enfermeira ou do mdico, por suas percepes dos desejos da
outra pessoa, ou por uma combinao destes fatores que trabalham juntos simultaneamente
(SAMPAIO, 2001; TRIGUEIRO, 2001).
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Uma terceira suposio a multidimensional, a ocorrer em dois nveis: contedo e
dimenso do relacionamento. O contedo refere-se lngua, s palavras e informao em
uma mensagem; a dimenso do relacionamento define como os participantes em uma
interao esto conectados (TRIGUEIRO, 2001). Para exemplificar, considere-se a seguinte
indicao hipottica feita por um mdico a uma enfermeira: "Faa exame, por favor, deste
material no laboratrio." Enquanto o contedo o exame do material no laboratrio, a
dimenso do relacionamento da mensagem a reao profissional: a autoridade do mdico no
relacionamento com a enfermeira, a atitude deste em relao enfermeira, a atitude da
enfermeira em relao ao mdico e a seus sentimentos que aproximam um do outro.
Alguns modelos foram construdos para elucidar o processo de comunicao e
ilustrar como seus componentes esto interconectados. Destes, quatro principais modelos
tericos representam a complexidade de uma comunicao humana, a saber: modelo de
Shannon-Weaver; modelo de SMCR ou de Berlo; modelo de comunicao de discurso e
modelo de Leary (SAMPAIO, 2001; TRIGUEIRO, 2001; CROWFORD; BROWN; CATER,
2004).
A idia de ser a comunicao uma transmisso de mensagens surge em 1949 na obra
de Shannon e Weaver, A teoria matemtica da informao, com o modelo de Shannon-
Weaver. Neste modelo linear, uma comunicao representada como um sistema no qual
uma fonte seleciona a informao que formulada em uma mensagem. Esta mensagem
transmitida a um receptor, que a interpreta e d-lhe um destino. Nesse processo pode haver
rudo, constitudo por fatores que perturbam ou influenciam de outra maneira mensagens
enquanto esto sendo transmitidas. Uma fora deste modelo a maneira uniforme como tenta
descrever o percurso da comunicao da fonte ao destino (SAMPAIO, 2001; TRIGUEIRO,
2001).
Nele h, porm, uma limitao: no demonstra o relacionamento transacional entre a
fonte e o receptor. Porque o modelo linear, a comunicao possui sentido nico e falta esse
feedback para regular e monitorar o fluxo da informao. Conforme evidenciado, o uso deste
modelo no cuidado em sade mostra o caminho nico da comunicao de um mdico a uma
enfermeira, ou de uma enfermeira a um paciente. Neste modelo, falta o componente da
interao (figura 1).
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Figura 1- Modelo de comunicao de Shannon-Weaver (1949)
De acordo com Fidalgo (2007), as questes no so sobre a formao das mensagens,
da sua estrutura interna, da sua adequao ao que significam, da sua relevncia, mas sim sobre
sua transmisso, partindo-se do pressuposto de que as mensagens esto j determinadas no
seu significado.
No Brasil, o Modelo de SMCR, assim chamado porque traz as iniciais dos seus
principais componentes, Sourcer (Fonte), Message (Mensagem), Channel (Canal) e Receiver
(Receptor), mais conhecido, como modelo de Berlo.
Nesse modelo, os elementos includos so a fonte, o codificador, a mensagem, o
canal, o decodificador e o receptor. A fonte o incio do processo da comunicao e atravs
dela que a mensagem transmitida. Para que isso ocorra deve haver empatia, isto , uma
similaridade entre este e o receptor. Esse emissor, quando for falar, precisa saber como
pronunciar as palavras, como gesticular, como interpretar as mensagens que recebe dos que o
ouvem e como alterar as suas palavras no decorrer do discurso. Alm de outras habilidades,
outro aspecto tambm importante na comunicao o nvel de conhecimento tanto da fonte
como do receptor. O codificador a maneira pelo qual se transmite a mensagem, seja por
escrita, fala, toque, gesto e olhar. A mensagem definida como o produto fsico real do
codificador-fonte. Quando se fala, o discurso a mensagem, quando se escreve, a escrita a
mensagem, ao pintar, a pintura a mensagem. Quando se gesticula, os movimentos dos
braos, as expresses do rosto so a mensagem. O canal o meio pelo qual a informao
emitida, ou seja, pela viso, audio, tato, olfato e paladar. O receptor aquele que receber a
informao, sendo decodificador a maneira pelo qual ela recebida (BERLO, 1999).
Neste modelo, o ponto forte a maneira como representa a complexidade de uma
comunicao e a trata como um processo, enquanto as limitaes so a falta do feedback e a
no ilustrao do funcionamento do processo (SAMPAIO, 2001; TRIGUEIRO, 2001). Se este
modelo fosse usado no mbito do cuidar, ajudaria indivduos a reconhecer muitos fatores que
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influenciam a comunicao de uma pessoa. Entretanto, o efeito do feedback no seria
demonstrado neste modelo.
Diferentemente do modelo anterior, o Modelo de Comunicao de Discurso inclui a
caracterstica do feedback, e representado por trs fatores: o autofalante, o receptor e o
feedback. O autofalante interpreta (codifica) as mensagens baseadas nas atitudes do indivduo;
as mensagens so traduzidas (descodificadas) por um receptor com base em atitudes dessa
pessoa. Ento, o receptor d o feedback positivo ou negativo ao autofalante que pode
interpretar e modificar mensagens subseqentes (SAMPAIO, 2001; TRIGUEIRO, 2001). Este
modelo representa a seqncia de eventos tpicos em uma comunicao de discurso. Em
virtude, porm, da sua simplicidade, no captura a complexidade do processo de uma
comunicao. Por exemplo, na sade pode haver vrias interpretaes errneas, especialmente
onde fatores como o contexto ou o feedback podem significativamente influenciar o processo
de uma comunicao.
Por fim o Modelo de Leary. Transacional e multidimensional, fora relacionamentos
e os aspectos interacionais de uma comunicao interpessoal. Segundo enfatiza, uma
comunicao entre seres humanos um processo no qual ambos influenciam e so
influenciados. De acordo com este modelo, o comportamento tem papel decisivo. Os
indivduos adaptam os papis baseados em como querem ser percebidos por outros
indivduos; inclui a submisso, a dominncia ou o contrrio. Neste modelo cada comunicao
pode ser reconhecida como ocorrendo ao longo de duas dimenses: dominncia-submisso e
dio-amor, presentes quando os indivduos interagem. As respostas so feitas s mensagens
percebidas por cada um (SAMPAIO, 2001). Como indica Leary, em uma comunicao
humana duas rguas governam a funo destas dimenses (figura 2).
Figura 2- Modelo reflexivo de Leary (1955)
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O ponto forte desse modelo a maneira transacional como so descritas as interaes
humanas. Seus dois pontos fracos so permitir outro caminho e omitir outras variveis
importantes que se levantam no ambiente onde a interao est ocorrendo.
Alm desses quatro modelos, Crowford, Brown e Cater (2004) acrescentam mais
dois de grandes estudiosos, a saber, Habermas e Roman Jakobson. Para o terico Habermas
(1989) existem dois princpios reguladores da discusso, atravs dos quais se podem aceitar e
validar os conhecimentos fundamentados nas argumentaes: princpio universalizao e
princpio discurso. Ambos partem da perspectiva de que os resultados obtidos atravs do
dilogo dizem respeito coletividade e, portanto, devem ser acolhidos dessa forma por seus
membros. A nica coao possvel, para a teoria do agir comunicativo, a presso exercida
pelo melhor argumento sobre os demais mediante argumentao e veracidade da fala.
Assim, a ao comunicativa enfatiza o entendimento pela argumentao racional,
busca a liberdade, a emancipao. Ao ser enfatizada em seu carter processual e sustentada na
intersubjetividade, ele ratifica a racionalidade comunicativa muito mais como uma atitude,
uma postura em face de um mundo ps-tradicional merc da razo instrumental e
funcionalista (TEIXEIRA, 2003). Em suma, Habermas parte de uma feroz crtica ao
utilitarismo, questionando o tecnicismo e optando por repensar o homem e o mundo via
retomada de uma tica emancipatria.
Ao considerar o contexto e a finalidade para o remetente e a mensagem, est se
resgatando Jakobson (2001), interessado nas circunstncias nas quais os indivduos se
encontram durante a transmisso da mensagem. Segundo ele, seria imprescindvel a presena
de seis elementos fundamentais para a ocorrncia de um ato de comunicao verbal:
remetente, destinatrio, contexto, mensagem, contato e cdigo. Esses fatores presentes na
comunicao verbal podem ser assim esquematizados:
Contexto
Remetente ---- Mensagem ------ Destinatrio
Contato
Cdigo Figura 3 - Fatores presentes na comunicao verbal segundo Jakobson (2001)
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O REMETENTE envia uma MENSAGEM ao DESTINATRIO. Para ser eficaz, a
mensagem requer um CONTEXTO a que se refere (ou REFERENTE, em outra nomenclatura
algo ambgua), apreensvel pelo destinatrio e que seja verbal ou suscetvel de verbalizao;
um CDIGO total ou parcialmente comum ao remetente e ao destinatrio (ou, em outras
palavras, ao codificador e ao decodificador da mensagem); e, finalmente, um CONTATO, ou
seja, um canal fsico e uma conexo psicolgica entre o remetente e o destinatrio, que os
capacite a entrar e a permanecer em comunicao (JAKOBSON, 2001).
Como remetente (ou emissor) considera-se todo aquele indivduo ou grupo que envia
uma mensagem a um ou mais receptores. Enquanto o emissor corresponde primeira pessoa
do discurso, EU ou NS, e aquele que fala, o destinatrio (ou receptor) o indivduo ou
grupo que recebe a mensagem. Corresponde segunda pessoa do discurso, TU ou VS; ele
aquele com quem se fala. A mensagem o ato da fala, o conjunto de enunciados. Falar
significa selecionar e combinar signos (JAKOBSON, 2001).
Portanto, a mensagem a seleo e combinao de signos, realizadas por
determinado indivduo. Por contexto (ou referente) entende-se o contedo, o assunto da
mensagem. Corresponde terceira pessoa do discurso, ELE OU ELES, e algo ou algum de
que se fala, ou seja, o objeto da mensagem. Quanto ao cdigo, a lngua com que se fala, ou
seja, o instrumento da fala, e se expressa por um conjunto de signos convencionais e pela
sintaxe, que deve ser total ou parcialmente comum ao emissor e ao receptor. O contato (ou
canal) o meio fsico por onde passa a mensagem entre o emissor e o receptor. Pode ser
sonoro ou visual, e tambm se tratar da conexo psicolgica entre emissor e receptor
(JAKOBSON, 2001).
Alm desses elementos, so importantes nessa interao as seguintes funes: a
expressiva ou emotiva, que exprime uma atitude em relao mensagem que se quer
transmitir, sendo um discurso marcado pela subjetividade, mediante uso da adjetivao,
interjeies, frases exclamativas e repeties; a referencial ou informativa, centrada na
mensagem sobre um referente, um discurso marcad