jornalismo · do curso de comunicação social com habilitação em jornalismo da faculdade...
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JORNALISMO
CÉLIA REGINA MARTINEZ
CLÁUDIO CESAR VITORINO DOS SANTOS
LEMBRANÇAS DE PIONEIROS SOBRE A PRAÇA RAPOSO TAVARES: A
HISTÓRIA RECONTADA SOB A PERSPECTIVA CIDADÃ
MARINGÁ
2013
Célia Regina Martinez
Cláudio Cesar Vitorino dos Santos
Lembranças de pioneiros sobre a praça Raposo Tavares: a história recontada sob a
perspectiva cidadã
Monografia apresentada à disciplina de
Projetos Experimentais do Curso de
Comunicação Social com habilitação em
Jornalismo da Faculdade Maringá, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Comunicação Social.
Orientadora: Dra. Luzia Deliberador
Yamashita
Maringá
2013
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer primeiramente a Deus que me ajudou a vencer todas as
etapas desses quatro anos de estudo e por ter me guiado nas horas mais difíceis dando força,
coragem e determinação durante as dificuldades. Minha família que de forma direta ou
indiretamente contribuiu para a realização deste sonho.
Também agradeço a todos os professores que acompanharam os passos
dessa trajetória acadêmica contribuindo para o meu aprendizado com leituras, dicas, “puxões
de orelha” e incentivo ao crescimento intelectual. Agradeço aos amigos e Diretores da Rede
Massa de Telecomunicações que durante o segundo ano de graduação me deu oportunidade
de trabalho que contribuiu para minha formação acadêmica e profissional. Agradeço aos
amigos Luiz Humberto, Cláudio C. Vitorino dos Santos, Nilson Cirino e em especial a
professora Valdete da Graça pelo apoio nos momentos difíceis.
Agradeço aos meus colegas de classe pelas parcerias, conversas, discussões
em sala de aula e por compartilharem das alegrias, dificuldades, frustrações e conquistas
durante o curso.
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer a Deus que me colocou no caminho certo e dando visão e
colocando os meus olhos naquilo que mais importa o conhecimento. Minha família que me
acompanhou em todo o processo e viu as minhas lutas para que este alvo fosse alcançado.
Também agradeço a todos os docentes que contribuíram para o meu
crescimento intelectual, dispondo de tempo e esforços. Agradeço aos meus amigos Luiz
Humberto e Nilson Cirino, pelo apoio constante e quando pensava em desistir me ajudaram e
auxiliaram com sabedoria e uma amizade que com certeza permanece em meu coração.
Sou grato aos meus colegas de classe que foram igualmente importantes na
minha formação, ainda quando discordávamos isso se refletiu na melhoria e no lapidar de
minha vida acadêmica.
DEDICATÓRIA
Em primeiro lugar dedico este trabalho a Deus
que tornou possível a realização de todo
processo criativo. Também aos meus pais
Aparecido Luiz Martinez e Elza Gonçalvez
Martinez.
DEDICATÓRIA
Em primeiro lugar dedico este trabalho a Deus
autor e consumador de todas as coisas.
Também a meu pai Joaquim dos Santos e a
minha mãe Maria dos Santos.
CÉLIA REGINA MARTINEZ
CLÁUDIO CESAR VITORINO DOS SANTOS
Lembranças de pioneiros sobre a praça Raposo Tavares: a história recontada sob a
perspectiva cidadã
Monografia apresentada à disciplina de disciplina de Projetos Experimentais
do Curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo da Faculdade Maringá,
como parte dos requisitos para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social.
Aprovada pela Banca Examinadora, em:
_____________________________________
Profª. Dra. Luzia Deliberador Yamashita
Orientador
_____________________________________
Profª. Ms Anderson Alves Rocha
Prof. Convidado
_____________________________________
Profª. Ms Mariana Lopes
Prof. Convidado
Maringá
2013
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi documentar a memória de pioneiros sobre a praça Raposo
Tavares, em Maringá. Pesquisas sobre o tema evidenciaram que o espaço tem sofrido com o
abandono e as consequências da falta de cuidados, o que é partilhado pelas pessoas que
participaram do processo de colonização da cidade. Por meio de um vídeo documentário se
buscou captar os relatos e vivências individuais destes pioneiros, sob a perspectiva da
comunicação comunitária, visando desenvolver a cidadania, ao passo que eles puderam se
sentir participantes da história da cidade. Para tanto, foi utilizada a técnica de História Oral,
aliada a Pesquisa Documental. O resultado desta análise foi dar a oportunidade de pessoas
comuns a participarem do registro histórico e terem vez e voz, resgatando a importância da
participação do indivíduo na construção da sociedade.
Palavras-chave: História Oral. Pioneiros. Memórias.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Mapa da divisão do norte do Paraná segundo a geografia dos anos 1950 ................ 35
Figura 2: Anteprojeto da cidade de Maringá ............................................................................ 42
Figura 3: Foto do Eixo Monumental de Maringá ..................................................................... 43
Figura 4: Foto da praça Raposo Tavares com a fonte luminosa ............................................... 43
Figura 5: Foto da inauguração do Templo Aberto ................................................................... 44
LISTA DE SIGLAS
CMNP – Companhia Melhoramentos Norte do Paraná
CTNP – Companhia de Terras Norte do Paraná
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10
2 ORALIDADE E PIONEIROS ............................................................................................ 13
2.1 Por que os pioneiros? ............................................................................................. 13
2.2 Aspectos teóricos sobre oralidade e memória ...................................................... 14
2.3 Pesquisa Documental .............................................................................................. 26
2.4 Revisão da bibliografia ........................................................................................... 27
3 ASPECTOS TEÓRICOS SOBRE COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA E
CIDADANIA ........................................................................................................................... 29
4 COLONIZAÇÃO DO NORTE DO PARANÁ E FUNDAÇÃO DE MARINGA .......... 35
4.1 Colonização e Povoamento .................................................................................... 37
4.2 Plano de Colonização ............................................................................................. 39
4.3 Origem de Maringá e da praça Raposo Tavares ................................................. 40
5 O VÍDEO DOCUMENTÁRIO ........................................................................................... 46
5.1 Processos de produção ........................................................................................... 52
6 ANÁLISE DAS MEMÓRIAS DOS PIONEIROS ............................................................ 59
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 63
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ..................................................................................... 65
APÊNDICE .............................................................................................................................. 67
10
1 INTRODUÇÃO
Maringá tem 67 anos e sua população estimada está próxima a 400 mil
habitantes, é uma cidade planejada, com ruas largas e arborizadas, e muitos espaços públicos,
entre eles, está a praça Raposo Tavares. Na atualidade o local está esquecido e sofre as
consequências da falta de manutenção. Pioneiros que participaram ativamente do processo de
colonização da cidade demonstram o seu desapontamento em relação à situação de
degradação daquele lugar.
A praça Raposo Tavares é parte do eixo monumental da cidade que
compreende toda a avenida Getúlio Vargas (trecho entre a Catedral até a antiga estação
ferroviária onde hoje está localizada a avenida advogado Horácio Raccanelo). Ao longo deste
eixo está localizada a Catedral Basílica Menor Nossa Senhora da Glória, bancos, lotéricas, os
Correios e o Terminal Urbano de Maringá.
Nas décadas de 1940 e 1950, no espaço onde atualmente é a praça, foi
aberta a clareira para que os pioneiros desbravassem a floresta e constituíssem as primeiras
edificações da cidade. A Raposo Tavares Teve origem no dia do lançamento da pedra
fundamental do povoado de Maringá à 10 de maio de 1947. Foi local de visitação, lazer e
passeio com a construção da Fonte Luminosa, que à medida que jorrava água era iluminada
por lâmpadas de diversas cores. O cine teatro Plaza também foi inaugurado neste período.
As décadas de 1960 e 1970 foram marcadas pela construção do terminal
rodoviário Américo Dias Ferraz e o projeto de revitalização realizado na praça, considerado
moderno à época. Outra transformação foi o surgimento do comércio ambulante e a criação
do Templo Aberto, um espaço destinado à realização de cultos de diversas denominações
protestantes que está em atividade até hoje.
A partir de 1980, a praça passou a ser local de manifestações populares, a
exemplo, o Movimento “Diretas Já”, além de mobilizações de centrais sindicais, realização de
comícios, feiras e eventos cívicos e da prefeitura como a Semana Nacional de Trânsito, Feira
da Agroindústria, entre outros.
Com o crescimento da cidade e o surgimento de novos bairros a convivência
nas praças centrais diminuiu. Além disso, o surgimento de novas formas de entretenimento
também esvaziou as praças. A partir das análises das histórias pessoais dos pioneiros se pode
perceber que houve uma mudança nos modos de vida das pessoas à medida que a praça
Raposo Tavares representava um local de encontro das famílias para se confraternizarem.
Muitas pessoas conviveram diariamente na praça, alguns trabalhando, outros em momentos de
11
lazer, são estes personagens que fomos buscar para dar seu testemunho da história e da
importância da praça.
O objetivo desta pesquisa é documentar em forma de vídeo documentário as
memórias individuais destes pioneiros, entendendo que, neste processo, se expressam
aspectos da memória coletiva. Para alcançar tal meta foi utilizada a técnica de História Oral,
ferramenta esta que se baseia na história de vida aliada à Pesquisa Documental, indicada para
o levantamento de dados bibliográficos, fotos e arquivos pessoais.
Outro ponto de aporte na pesquisa foi à perspectiva da Comunicação
Comunitária oportunizando a participação cidadã, ou seja, ao passo que os pioneiros
compartilham suas experiências e vivências individuais, eles participam da construção da
história de modo ativo. Como afirma o pedagogo Paulo Freire, neste processo de
comunicação dialógico o indivíduo não recebe apenas informações, mas tem a oportunidade
de comunicar, entendendo que esta faculdade é inata a todo o ser humano.
De acordo com a proposta estabelecida, esta pesquisa está dividida em cinco
capítulos. A princípio será abordado o porquê da escolha dos pioneiros, além da técnica de
História Oral que fornece uma base para a fundamentação da pesquisa, utilizando os estudos
de Eclea Bosi, Dàniele Vodman, Michael Frisch e Le Goff. Outros assuntos trabalhados nesta
seção são as técnicas de Pesquisa Documental e Pesquisa Bibliográfica, para o
aprofundamento metodológico.
O terceiro capítulo é reservado para as considerações teóricas sobre
Comunicação Comunitária e Cidadania, descrevendo a relevância de se resgatar este aspecto
aos pioneiros como instrumento para que o indivíduo possa participar do processo de
comunicação e de construção da sociedade. Para isso serão exploradas as obras de Cicília
Peruzzo, Paulo Freire e Raquel Paiva.
O quarto capítulo traz fundamentos da história oficial com vistas a origem e
planejamento de Maringá, culminando na criação da praça Raposo Tavares. Esta seção é um
recurso que vai reforçar alguns dados que serão apresentados nas analises das histórias de
vida. Colaboraram neste processo autores como France Luz, Reginaldo Benedito Dias, e José
Hilário
No quinto capítulo estão pontuadas as definições da coleta das entrevistas,
que culminaram na produção do vídeo documentário, bem como o processo de produção e
pós-produção, baseado nas referências de Bill Nichols, e Manuella Penafria.
A análise sobre os relatos dos idosos e o confrontamento entre as memórias
e a história oficial são o tema do sexto capitulo. O objetivo é tecer comparações e ampliar a
12
visão sobre o processo histórico e a raiz da memória coletiva que é condicionada pelas
memórias individuais.
A pesquisa conta ainda com um apêndice com as entrevistas de cada
pioneiro, isto foi realizado para que o material colhido esteja à disposição e possa ser
consultado e revisitado. É salutar refletir que estes pioneiros viram e participaram da história,
poucos ainda estão vivos, isso mostra que este trabalho contribuiu para que eles pudessem
deixar sua registro na história.
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2 ORALIDADE E PIONEIROS
2.1 Por que os pioneiros
Para recontar uma história podem ser utilizados inúmeros métodos. Uma
alternativa é recorrer aos livros, a sítios eletrônicos, fotos, museus, entre outros. Todavia,
existe uma história ou mesmo versões que não se encontram nos livros. São relatos
particulares que também constituem a história, mas que não estão em evidência, precisam ser
chamados a submergir.
Quando a ideia original deste estudo foi concebida a preocupação era de se
realizar um estudo que contemplasse e desse voz aos idosos, pois Peruzzo (2004, pg. 287)
afirma que, “a ampliação da cidadania levará o homem e a mulher a serem, cada vez mais,
sujeitos e não objetos da história”, e devido a um inquietação pessoal de quem busca conhecer
mais e saber o porque uma praça tão importante, atualmente é um local esquecido.
Outra questão é a valorização dos idosos. O desejo de dar a eles vez e voz,
contribuindo para a emancipação e a participação cidadã. Sem que se fosse forçada a
participação de cada personagem é voluntária e a maioria se dispôs a contar a sua história, que
no decorrer do estudo mostra uma história comum de todos um local um ambiente comum. O
lugar das experiências, do trabalho, do dia a dia, da fantasia, da correria e tantas histórias.
Para Peruzzo (2004, pg. 260) “a comunicação verdadeira passa por um intercâmbio de vozes e
interesses entre os emissores e os receptores, permitindo que todos possam falar em condições
iguais; e que se devia ser criativo na busca de outras maneiras de diálogo com o povo”.
O anseio de oportunizar a participação destes cidadãos na construção social
é outra razão que levou a considerar os idosos como fontes. A sociedade rejeita o idoso, mas
ele pode ainda contribuir com ela e pode dar subsídios para a construção da realidade social.
Este intento é o desejo de que mais idosos tenham asseguradas também as sus memórias para
a posteridade.
O vídeo documentário que se seguirá é a forma de documentar e evidenciar
a participação destes idosos que saíram da escuridão para a luz e puderam dar as suas
contribuições para a sociedade e mostram com seus relatos que apesar do tempo a vida
continua e que ainda tem muita história pra contar.
14
2.2 Aspectos teóricos sobre oralidade e memória
O propósito deste estudo exploratório é documentar a memória de idosos,
com um espaço em comum, a praça Raposo Tavares, entendendo que como cidadãos, eles
contribuem para o processo de construção da história. Para abordar tal aspecto será utilizado o
método de História Oral, que se baseia no relato individual, convergindo em uma construção
coletiva. Num primeiro momento serão feitas algumas relações sobre a memória, e em
seguida algumas considerações sobre História Oral, dois conceitos chave que nortearão todo
este trabalho.
Alguns ensaios do historiador francês Le Goff (1924), resumidos e
traduzidos pela Unicamp (1990) trazem conceitos pertinentes sobre a memória e sua ação na
sociedade, bem como o seu processo de manutenção. Considera-se que a memória na
antiguidade era responsável pela transmissão das tradições e da história de uma civilização.
É notório que a memória possui maneiras infinitas de sobrepor impressões
nas pessoas e também na sociedade em variadas formas. A escrita limitou, mas também
ampliou a oralidade, o incremento desta nova possibilidade de manter os registros. No
entanto, também causou uma perda de significados, pois se por meio da oralidade, a história
chegava a todos, a partir do momento em que esta história passa a ser escrita, somente os
conhecedores dos signos poderiam obter os fatos por ela fornecidos.
Há, portanto, que se levar em consideração que as atuais formas de registrar
a história devem contemplar também a oralidade, desta forma é possível facilitar a
participação e a apropriação da memória coletiva.
A propriedade fundamental da memória é conservar certas informações,
desta forma é possível que o homem possa atualizar impressões ou informações passadas, ou
que ele representa como passadas. Portanto, o estudo da memória abarca várias outras
especialidades entre as quais se pode citar, por exemplo, a psiquiatria, a psicologia, entre
outros.
Dentro de qualquer uma destas ciências é possível que se encontre traços e
problemas da memória histórica e da memória social. No entanto, estas representam apenas
uma forma de organização da memória que se dá em variadas formas.
Descendem daqui diversas concepções recentes da memória, que põem a
tônica nos aspectos de estruturação, nas atividades de auto-organização. Os
fenômenos da memória, tanto nos seus aspectos biológicos como nos
psicológicos, mais não são do que os resultados de sistemas dinâmicos de
15
organização e apenas existem "na medida em que a organização os mantém
ou os reconstitui". (GOFF, 1924)
Florès1 (1972) afirma que o “comportamento narrativo”, (...) “se caracteriza
antes de mais nada pela sua função social2, pois que é comunicação a outrem de uma
informação, na ausência do acontecimento ou do objeto que constitui o seu motivo”
(FLORÈS, p. 12, 1972).
As possibilidades de armazenamento da memória são reveladas de forma
muito peculiar, através da utilização da oralidade e também pela escrita. Revelam, sobretudo,
que ela pode sair dos limites do nosso corpo e transcender para outros indivíduos e para os
livros, a exemplo. Isto revela a existência de uma linguagem própria que permite a alocação
de informações na memória.
O esquecimento, tomado sob a expressão amnésia, pode ocasionar
“perturbações mais ou menos graves da presença da personalidade, mas também a falta ou a
perda, voluntária ou involuntária da memória coletiva nos povos e nas nações que pode
determinar perturbações graves da identidade coletiva” (GOFF, 1924). O estudioso ainda
reforça, “O estudo da memória social é um dos meios fundamentais de abordar os problemas
do tempo e da história, relativamente aos quais a memória está ora em retraimento, ora em
transbordamento”.
Este último conceito de Goff (1924) acena para a obra Memória e
sociedade: lembranças de velhos da coordenadora da Universidade da Aberta Terceira Idade
(Unati) Ecléa Bosi (1994), que aborda a constituição da memória no tempo histórico-
biográfico, além da coleta e arquivo de relatos pessoais. O resultado foi à constituição de um
acervo que reside na lembrança individual, e salienta acima de tudo aspectos de um espaço
comum e a ideologia dominante.
Bosi (1994) entrevistou idosos com idade superior a setenta anos, e com um
local predominante em suas vidas, a cidade de São Paulo. O seu objetivo, foi o de, registrar as
memórias deles, por meio de lembranças individuais. De forma mais contundente, o
propósito, foi alcançar uma memória social, familiar e grupal, situando a pesquisa na fronteira
em que se cruzam os modos de ser do indivíduo e da sua cultura.
Não dispomos de nenhum documento de confronto dos fatos relatados que
pudesse servir de modelo, a partir do qual se analisassem as distorções e
lacunas. Os livros de história que registram esses fatos são também um ponto
1 Florès apud. GOFF, Jacques Le, 1924, Historia e memória, tradução Bernardo Leitão, Editora Unicamp, 1990.
2 Grifo da autora;
16
de vista, uma versão do acontecido, não raro desmentidos por outros livros
com outros pontos de vista. Nosso interesse está no que foi lembrado e no
que foi escolhido para perpetuar-se na história de sua vida. (BOSI, 1994, p.
37)
Por meio da metodologia da Observação Participante ela buscou uma
relação com o objeto de estudo, culminando em uma relação interpessoal que incorporasse
uma experiência mais próxima, “o principal esteio de meu método de abordagem foi à
formação de um vínculo de amizade e confiança com os recordadores” (BOSI, 1994, p. 38).
Nos estudos Bosi (1994) se utilizou de conceitos distintos de memória
dividindo-a em individual e coletiva. Para fundamentar a primeira ela baseou-se nos estudos
de Bergson e já para o segundo aspecto Halbwachs.
No tocante dos objetivos propostos no desafio de documentar a história da
Praça Raposo Tavares, do mesmo modo, pretende-se alcançar este nível de compreensão.
Contar a história de modo individual, na perspectiva de cada ator social, no entanto, tendo
sempre como base, que as construções do indivíduo, têm aspectos que predominam também
na sociedade.
E é com esta perspectiva que este trabalho se propõe, a partir de lembranças
de idosos constituir a história da praça Raposo Tavares, e enxergar a sociedade maringaense
da época, evocando o passado que constrói o presente. Como observa o estudioso José Carlos
Sebe Meihy “Quando nós vamos fazer a história do outro, vamos dar vida a história e nos
reconhecer enquanto cidadãos” 3.
Num primeiro momento, Bosi (1994) enfoca a questão da memória
individual em Henri Bergson, baseando na obra do autor intitulada Matiére et Mémoire
(Matéria e memória). Bergson é conhecido por ser um “filósofo da vida” e o interesse em
resgatar a obra de tal filósofo, é a intenção de reforçar a ideia do souvenir (lembrança) e a
forma como esta atua sobre o indivíduo.
A intenção de Bosi (1994) nesta introdução é compreender que o processo
de documentação histórica já conta com quem a reproduza de maneira formal. No entanto, sua
principal arguição, é a partir de Bergson, explicar o lugar comum das experiências, que
compõem a história do sujeito.
Bosi (1994) se interessou em registrar não aquilo que pré-determinado
deveria ser lembrado, mas o que a memória, ou o indivíduo, selecionou para lembrar e trazer a
3 MEIHY, José Carlos Sebe. Palestra Memória, História Oral e Diferenças. Disponível em:
http://www.youtube.com/watch?v=QvPyJ-OjsuM. Acesso 02/09/2013.
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tona. Portanto, esta pesquisa é a reconstrução individual de cada ser, levando em consideração
a cultura e a construção social. Este estudo parte deste lugar comum dispõe também neste
espaço transcender as lembranças dos idosos e por meio delas enxergar cada pessoa em sua
uniformidade.
O que nos interessa em Bergson é a rica fenomenologia da lembrança que
ele persegue em sua obra, bem como uma série de distorções de caráter
analítico, extremamente sugestiva e cuja adequação podemos comprovar ao
longo das narrativas parte do nosso trabalho (BOSI, 1994, p. 43).
Em seguida a autora explica em Bergson, o que ele entende pelas duas
memórias, memória-sonho e memória-trabalho. E como cada uma delas tem um papel
determinante no sujeito.
As duas memórias, que são o ícone fundamental da obra de Bosi (1994), as
quais são trabalhadas por ela de forma exaustiva, durante toda a obra. Talvez este seja o ponto
fundamental, pois determina como as lembranças vêm à mente de quem as solicita. Se por um
lado a primeira está associada às lembranças afetivas, a segunda lembra quais tarefas
desempenhar no cotidiano. No entanto, três outros aspectos também são delineados pela
autora: Ação e representação, O cone da memória e Memória e inconsciente.
A percepção é o aspecto inicial trabalhado por Bergson. Esta, no entanto, é
fundamental na análise da memória individual, pois é o eixo que situa o indivíduo no espaço-
tempo.
A posição introspectiva de Bergson em face do seu tema leva-o a começar a
indagação pela autoanálise voltada para a experiência da percepção. “O que
percebo em mim quando vejo as imagens do presente ou evoco as do
passado?” Percebo, em todos os casos, que cada imagem formada em mim
está mediada pela imagem, sempre presente, do meu corpo. (BOSI, 1994, p.
44)
Isto equivale dizer que, a representação da memória é intermediada pela
matéria, ou corpo, da qual o indivíduo se constitui. É evidente que não é possível considerar
as alterações do espaço-tempo sem levar em conta as mudanças físicas. De que modo então se
evocam as memórias do passado? Com o aspecto presente ou do passado? Bergson afirma que
a percepção atual leva a constituição da lembrança.
Quando da escolha dos idosos, esta afirmação corresponde a entender que
muitos hoje fazem comparação com as suas imagens no passado, aspectos juvenis, como força
18
e vitalidade, os permite situar no tempo presente e trazer das águas profundas da memória as
lembranças passadas.
Bergson faz alusão ao fenômeno da lembrança (souvenir), e para representar
a relação entre o processo cumulativo da memória e a percepção imediata, o estudioso, valeu-
se de uma representação em forma de cone invertido. A base representa o passado com as
suas lembranças, e no vértice o presente. Em todos os momentos, estas duas representações se
tocam, se relacionam. “Esses dois atos, percepção e lembrança, se penetram sempre, trocam
sempre alguma coisa de suas substâncias por um fenômeno de endosmose” (BOSI, 1994, p.
46-47). A memória atua como a mediação na relação entre passado e presente.
Para Bergson o elo que une passado ao presente é a memória. Esta relação
dá a oportunidade aos idosos de elaborarem suas experiências. Esta simbiose ajuda o
indivíduo a enxergar a sua existência na totalidade. Analisando esta particularidade é possível
dar voz aos idosos, que de alguma forma tiveram uma relação com a praça Raposo Tavares, e
ao mesmo tempo contribuir para a construção de sua representação atual.
A memória permite a relação do corpo presente com o passado e, ao mesmo
tempo, interfere no processo “atual” das representações. Pela memória, o
passado não só vem à tona das águas presentes, misturando com as
percepções imediatas, como também empurra, “desloca” estas últimas,
ocupando o espaço todo da consciência. A memória aparece como força
subjetiva ao mesmo tempo profunda e ativa, latente e penetrante, oculta e
invasora (BOSI, 1994, p. 46-47).
Este é o princípio idealizador da obra de Bergson, pois, para ele, “é do
presente que parte o chamado ao qual a lembrança responde” (BOSI, 1994, p.48). Este
conjunto corpo, presente e passado são constituintes do processo da memória. Estão ligados,
pois cada um exerce um papel distinto para o indivíduo, na atividade de recontar a sua
história.
A autora explica em seguida, as duas memórias e o papel que ambas
desempenham, cada uma em sua especificidade. De acordo com BOSI (1994), Bergson
fundamenta que, “a memória hábito4 adquire-se pelo esforço da atenção e pela repetição de
gestos ou palavras” (p. 49). Ao contrário desta que é meramente repetitiva e mecânica, temos,
“no outro extremo, a lembrança pura quando se atualiza na imagem-lembrança, traz a tona da
consciência um momento único, singular, não repetitiva, irreversível da vida” (p.49).
4 Grifo da autora.
19
Bergson contesta a afirmação de que a memória estaria escondida em algum
lugar do cérebro humano. Para ele, a memória se encontra livre e inteira no indivíduo. Bosi
(1994) pontua que,
A burning question de Bergson consiste em provar a espontaneidade e a
liberdade da memória em oposição aos esquemas mecanicistas que a
alojavam em algum canto escuro do cérebro. Bergson quer mostrar que o
passado se conserva inteiro e independente no espírito; e que o seu modo
próprio de existência é um modo inconsciente. (BOSI, 1994, p. 51)
Isto leva a entender que para Bergson, o “princípio central da memória
como conservação do passado; este sobrevive, quer chamado pelo presente sob as formas de
lembrança, quer em si mesmo, em estado inconsciente”, (BOSI, 1994, p. 53).
Em contrapartida, Bosi (1994) pontua que a cultura e as influências da
sociedade são perceptíveis no discurso de cada um dos seus entrevistados. Por isso, o
aprofundamento de Halbwachs é, sobretudo, a segunda parte mais específica de seu trabalho.
Tal autor aprofunda as teorias de Émile Durkheim do fato social, que consiste em entender o
predomínio dos acontecimentos e convenções socais sobre o individuo.
Isso é percebido no relato dos entrevistados, que contam, além das
experiências pessoais, as vivências na cidade de São Paulo, em outra época. Assim fica
explícito, como, por exemplo, em alguns relatos, a interpelação entre o indivíduo e as relações
trabalhistas, a visão da mulher e suas atribuições, entre outros.
Halbwachs é também um crítico que impulsiona a olhar com severidade os
efeitos sobre a velhice, principalmente do ponto de vista do desuso da sua força de trabalho.
E, além disso, da desvalorização social do idoso, representando um vergonhoso pano de
fundo, que visa esconder, o velho, o qual se julga desnecessário a lógica do capital.
No intermédio dessas afirmações, há também a ênfase de Bosi (1994) em
demonstrar que cada sociedade, ou modelo social, enxerga o velho de maneiras distintas, seja
ela de transmissão de sabedoria ou conhecimento, ou até a função de não ter função alguma.
De acordo com Bosi (1994), Maurice Halbwachs, é “o principal estudioso
das relações entre memória e história pública, a qual dedicou a maior parte das suas obras de
fôlego, Les cadres sociaux de la mémorie e La mémorie colletive”. E, além disso, “Halbwachs
não vai estudar a memória como tal, mas os ‘quadros sociais da memória’” (p. 54). Para
Halbwachs, não é possível imaginar o sujeito fora de um contexto social o que envolve as
20
suas relações com o ambiente em que este se encontra, segundo ele, “a lembrança é a
sobrevivência do passado!” (BOSI, 1994, p. 53)
Isto é determinante em sua obra, para ele, “A memória do indivíduo
depende do seu relacionamento com a família, com a classe social, com a escola, com a
igreja, com a profissão, enfim com os grupos de convívio e os grupos de referência peculiares
a esse indivíduo”. (BOSI, 1994, p. 54).
Bosi (1994) salienta que, “o caráter livre, espontâneo quase onírico da
memória é, segundo Halbwachs, excepcional. Na maioria parte das vezes, lembrar não é
reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e ideias de hoje, as experiências do
passado”.
Quando desta afirmação, é que se pode reconhecer que histórias que são
recontadas e trazidas à tona pela memória, possuem um ar de saudosismo. Como em várias
histórias da praça Raposo Tavares, trazem alguns elementos que não se encontram mais a
disposição e fazem parte dos relatos dos idosos e esta é a importância da busca da memória a
oportunidade de reconhecer e encontrar em algum lugar aquilo que foi perdido pelo tempo.
Halbwachs pontua ainda, que a linguagem é a catalisadora da memória
coletiva. Isso significa que ela é a responsável pela construção comum das convenções
verbais produzidas pela sociedade.
O instrumento decisivamente socializado da memória é a linguagem. Ela
reduz, unifica e aproxima no mesmo espaço histórico e cultural a imagem do
sonho, a imagem lembrada e as imagens da vigília atual. Os dados coletivos
que a língua sempre traz em si entram até mesmo no sonho (situação-limite
da pureza individual) (BOSI, 1994, p. 56).
A linguagem pode ser considerada a forma mais elementar e mais estável da
memória coletiva. Para explicar como se dá o processo de reconstrução do passado
Habwachs, utiliza-se da “experiência da releitura”. Fazendo a alusão de um livro que foi lido
na juventude por um adulto, mostrando as diferenças das impressões psicológicas e daquilo
que foi retido pelo jovem na época da leitura e pelo indivíduo já formado. “A experiência da
releitura é apenas um exemplo, entre muitos, da dificuldade, senão da impossibilidade que
todo sujeito que lembra tem em comum com o historiador” (BOSI, 1994, p. 59), isto significa
que as interpretações variam muito, portanto a forma que o ser interpreta as situações do
passado no momento depende das impressões que vão se formando, dadas as características
sociológicas.
21
Halbwachs discorre que as sociedades possuem maneiras distintas de
perceber a velhice. Se em uma, a experiência adquirida com o tempo é instrumento de
valorização do idoso, principalmente na cultura ocidental, isto não se aplica, visto que a
velhice, na maioria delas, está relacionada com a perda da capacidade produtiva. Isto
representa a ausência da capacidade de acúmulo de capital, o que para uma sociedade, na qual
a função maior é o consumo, a velhice, representa um entrave às relações comerciais.
Haveria, portanto, para o velho uma espécie singular de obrigação social,
que não pesa sobre os homens de outras idades, a obrigação de lembrar, e
lembrar bem. Convém, entretanto, matizar a informação de Halbwachs. Nem
toda sociedade espera, ou exige dos velhos que se desencarreguem dessa
função. Em outros termos, os graus de expectativa ou de exigência não são
os mesmos em toda parte. (BOSI, 1994, p.63)
No entanto, há sociedades que valorizam a sabedoria adquirida com o
tempo. Mais comum em países orientais, à relação da sociedade com o velho, mostra que a
construção social, delimita o papel deste na coletividade.
Na construção social os “esquemas coerentes de narração e de interpretação
de fatos, verdadeiros “universos de discurso”, “universos de significado”, que dão ao material
de base uma forma histórica própria, uma versão consagrada dos acontecimentos” (BOSI, p.
66). Partindo da psicologia social de Frederic Charles Bartlett, o qual argumenta que o
contexto de “convencionalização” da memória, não se dá pura e simplesmente pela
linguagem, Bosi lembra que, todavia ele também é estilizado “pelo ponto de vista cultural e
ideológico do grupo em que o sujeito está” (BOSI, 1994, p. 64).
O que Bartlett admite, de um modo bastante compreensivo, é a existência de
um “contínuo” que vai da simples assimilação, por transplante, até a criação
social de novos símbolos, a partir do recebimento de formas extragrupais. A
memória das pessoas também depende desse longo e amplo processo pelo
qual sempre “fica” o que significa. E fica não do mesmo modo: às vezes
quase intacto às vezes profundamente alterado. A transformação seria tanto
mais radical quanto mais operasse sobre a matéria recebida a mão de obra do
grupo receptor. Assim, novos significados alteram o conteúdo e o valor da
situação de base evocada. No outro extremo, se a vida social ou individual
estagnou, ou reproduziu-se quase que só fisiologicamente, é provável que o
significado que tinham para os sujeitos no momento em que as viveram
(BOSI, 1994, p. 66).
Através das histórias pessoais é possível compreender características de um
tipo de sociedade, a construção familiar e cultural. Nos jovens e adultos, isso não é tão latente,
22
como nos velhos, haja vista, estes já não possuem obrigações cotidianas, e se ocupam da
tarefa de reconstruir as lembranças do passado.
Não se trata apenas de entender as dimensões da memória coletiva no
contexto da história, mas, sobretudo de entender como a historização formal
e autoconsciente vem se transformando numa dimensão cada vez mais
importante do como lembramos o passado e entendemos sua relação com a
vida e a cultura contemporâneas (FRISCH, 2001, p. 79).
Este aspecto norteará também este estudo, pois, mostrando aspectos sociais
e culturais de uma Maringá dos anos 1950, suas incongruências, seus costumes e o modo de
viver característico da metade do século na formação de uma cidade do interior.
Comportamentos e formas distintas de enxergar a sociedade e a construção social na
atualidade são características que serão analisadas nos discursos dos idosos.
A riqueza de suas lembranças produz um retrato da família e da experiência
do grupo de como a praça Raposo Tavares, reflete histórias diferentes, mas que revelam
particularidades do passado comuns. Esta é a contribuição fundamental que os idosos têm
para com a cidade e a sociedade, mostrar que as lembranças podem trazer aspectos da
construção coletiva que se faz em determinado tempo histórico.
É por esta crença que este estudo se baseia na propriedade de influenciar na
sociedade de hoje com as lembranças do passado. Dessa forma, desmistificar que o idoso não
é ativo na sociedade. Bosi (1994) entende que findada a capacidade produtiva, resta ainda ao
ser humano, utilizar de suas experiências individuais, para a cidadania de forma que ao se
dedicar a recontar a história participa-se dela. A autora critica a visão fatalista de que a
velhice é a espera da morte.
Durante a velhice deveríamos estar ainda engajados com causas que nos
transcendem, que não envelhecem, e que dão significado a nossos gestos
cotidianos. Talvez seja esse um remédio contra os danos do tempo. Mas,
pondera Simone de Beauvoir, se o trabalhador aposentado se desespera com
a falta de sentido da vida presente, é porque em todo o tempo o sentido da
vida lhe foi roubado. Esgotada sua força de trabalho, sente-se um pária, e é
comum que o escutemos agradecendo sua aposentadoria como um favor ou
esmola. (BOSI, 1994, p. 80)
Utilizando-se da obra de Simone Beavouir, La Vielliesse, Bosi (1994)
discorre sobre a perda da capacidade produtiva do velho o que o projeta a uma vida de
exclusão, rejeição e desvalorização. A acumulação de bens e a busca frenética pela construção
23
de um patrimônio é incentivado pela sociedade de consumo. Quando a velhice chega, e se
esgota a capacidade produtiva o que resta ao ser humano? Este é o esteio desta reflexão. Não
existe espaço na sociedade para o velho, que deixa de produzir.
O caráter deste estudo é mostrar que ao recontarem as suas histórias
pessoais em relação a praça Raposo Tavares, estes cidadãos que já estão na terceira idade,
possam exercer a sua cidadania e serem um contraponto a esta realidade secular que impera
na sociedade. Além disso, construir por meio de suas histórias um memorial para a
posteridade, mostrando que eles são participantes da mesma forma na história coletiva da
sociedade e de forma muito particular na história da cidade.
A sociedade rejeita o velho, não oferece nenhuma sobrevivência à sua obra.
Perdendo a força de trabalho ele já não é produtor nem reprodutor. Se a
posse, a propriedade constituem, segundo Sartre, uma defesa contra o outro,
o velho de uma classe favorecida defende-se pela acumulação de bens. Suas
propriedades o defendem da desvalorização de sua pessoa. O velho não
participa da produção, não faz nada deve ser tutelado como um menor.
Quando as pessoas absorvem tais ideias da classe dominante, agem como
loucos porque delineiam assim o seu próprio futuro. (BOSI, 1994, p. 78)
Bosi (1994) lembra que a velhice é uma categoria social e que cada meio
contempla de modo diferente o declínio biológico do homem. A autora considera que a
sociedade industrial é maléfica para a velhice, pois não há continuidade daquilo que foi
construído e idealizado pelo indivíduo. O que se edifica hoje não terá consecução no futuro.
Bosi (1994) também critica a infantilização do velho. Pontua que não se debatem ideias com
ele, procura-se adaptá-lo a uma condição em que não confrontar e fazer vistas grossas é o
melhor caminho. A autora denomina este fato de falta de reciprocidade, com uma abdicação
do diálogo.
E neste estudo esta é uma característica fundamental, o idoso é considerado
como uma pessoa em plena capacidade de atuar sobre a história e d colaborar com ela. Este
papel lhe é ofertado na oportunidade de contar a sua história e de torná-lo cidadão, enxerga-lo
como uma pessoa que ainda pode contribuir na sociedade.
Outra crítica à sociedade industrial é quanto ao modo de produção.
Anteriormente um ofício era tido como forma de perfeição do desempenho. A vida toda um
artesão dedicava-se a sua atividade, dessa forma o trabalho viria a torna-se cada vez melhor.
Contudo, a produção mecânica obriga o sujeito a uma repetição de gestos que não redunda em
um aperfeiçoamento da atividade.
24
Ao concluir esta seção Bosi (1994) defende a sedimentação da “cultura para
os velhos com interesses, trabalhos, responsabilidades que tornem sua sobrevivência digna”.
Isto equivale a dar sentido, razão a sua existência.
Após a análise das lembranças dos velhos, Bosi (1994) conclui que a
memória vem acompanhada de uma valorização do trabalho. Porém isto revela também que
“aquilo que se levou anos para se construir e sustentou uma existência, passa (ou deveria
passar) a outra geração como valor. As ideias de memória e conselho são afins: memini e
meneo, “eu me lembro” e “eu advirto”, são verbos parentes, próximos”, (BOSI, 1994, p.481).
Após esta discussão a cerca da memória, outro conceito central deste estudo,
no desafio de se documentar a memória dos idosos, é a técnica de História Oral. A escolha se
deve pelo caráter que se busca neste estudo rememorar a história da praça Raposo Tavares,
por meio de histórias de vida de pessoas comuns que raramente seriam solicitadas a participar
do processo de construção da história. “Bem diferente é o testemunho das pessoas simples e
dos excluídos, aqueles que tendemos a considerar os não-atores da história, cuja importância
passa a ser valorizada pelo simples fato de o historiador solicitá-los e entrevista-los”
(VODMAN, 2001, p. 40).
No início da colonização de Maringá, como já descrito, a “vida” da cidade
passava pela praça de um modo muito particular. Fosse pelos comércios, pelos viajantes, pela
localização entre outros aspectos, a Raposo Tavares reuniu muitas pessoas que têm uma
relação afetiva com a praça. Resta então que se dê voz a estes idosos para que eles
contribuam com suas memórias no processo histórico.
Portanto, a escolha pela História Oral é pela oportunidade de entender a
conexão existente entre memória e a história. Ao mesmo tempo em que os indivíduos relatam
o que viveram na praça, constrói-se um panorama histórico da sociedade. Este cenário permite
visualizar aspectos culturais e comportamentais.
Não se trata apenas de entender as dimensões da memória coletiva no
contexto da história, mas, sobretudo de entender como a historização formal
e autoconsciente vem se transformando numa dimensão cada vez mais
importante do como lembramos o passado e entendemos sua relação com a
vida e a cultura contemporâneas (FRISCH, 2001, p. 79).
A Historia Oral não pode ser considerada apenas como um processo de
colher memórias e juntá-las, Meyhi (2012) afirma que é preciso ter responsabilidade com as
fontes e com a história, o estudioso aponta a necessidade de se ter um propósito bem definido,
um por que para a pesquisa. O pesquisador ainda revela que este método permite que se
25
construa um memorial que vai se perpetuar no tempo e se garanta a manutenção da história.
Como personagens, os idosos têm uma função importante no processo de
construção da história. Além disso, Thompson, Frisch e Hamilton, (2001) acrescentam e
pontuam que “a exploração coletiva de histórias de vida em projetos participativos pode
ajudar as pessoas a reconhecer e valorizar experiências que foram silenciadas, ou a enfrentar
aspectos difíceis de suas vidas”.
Outro aspecto que levou a adoção da História Oral é seu o caráter
qualitativo. Frisc (2001) salienta que os estudos baseados na oralidade, atuam no “esforço de
recuperar a experiência e os pontos de vista daqueles que normalmente permanecem
invisíveis na documentação histórica convencional e de considerar seriamente essas fontes
como evidência”. O autor ainda defende que as experiências do passado se catalisam no
presente “É amplamente reconhecido que na sociedade moderna nossas imagens do passado
são conservadas e transmitidas através do tempo não só por meio da experiência vernacular,
mas também como construções culturais administradas e mediatizadas”.
Entendidos estes conceitos sobre a contemporaneidade e relevância da
História Oral, é necessário explicar a técnica de trabalho, o como serão colhidas e analisadas
as memórias dos idosos. Na perspectiva do referido método Lozano (1994) descreve vários
tipos de analistas. No entanto, a ênfase neste espaço é para o que ele chama de analista
completo. Ele entende que este tipo de análise envolve outras áreas e não exclusivamente a
coleta de histórias individuais. Para o autor integrar a prática da história alguns aspectos
sociais, antropológicos, sociais e psicológicos é a forma de se fazer uma síntese da obra que
se pretende criar.
É salutar reconhecer que este processo exige o trabalho de consulta a outras
fontes não orais. E isto representa enriquecer ainda mais o processo e não contraria as fontes
orais. O intuito é o de dar credibilidade ao processo de construção da história e que este
processo não se perca na constatação de um senso comum. Portanto, outros registros
históricos fazem parte deste estudo, como estão aferidos no primeiro capítulo. Para Lozano
(1994) os analistas orais completos,
colhem, ordenam, sistematizam e criticam o processo de produção da fonte
oral. Analisam, interpretam e situa, historicamente as evidências orais.
Complementam suas fontes orais com as outras fontes documentais
tradicionais. Não se limitam a um único método e uma técnica, mas as
completam e as tornam mais complexas. Estes pesquisadores consideram a
fonte oral muito importante, mas é apenas mais um dos meios e acervos de
que dispõe o para a construção da percepção, no tempo e no espaço, da
26
experiência humana, particularmente dos grupos sociais. (LOZANO, 1994,
p. 24)
Após esta exposição a seguir será traçado um perfil da pesquisa documental,
a qual se insere neste estudo. E foi útil na pesquisa de fontes não orais e na captação de
documentos que ajudam na comprovação de dados históricos relatados pelas fontes orais.
2.3 Pesquisa documental
Para as ciências sociais a pesquisa documental é uma aliada, principalmente
no que tange a reconstrução de fatos históricos. Daí a necessidade de utiliza-la neste estudo,
serão consultadas como fontes documentais acervos imagéticos e complementos impressos
que auxiliarão no processo de levantamento de dados. Isso porque a confiabilidade dos relatos
estará atrelada a busca de dados e fontes também oficiais.
Esta pesquisa qualitativa possui particularidades, como a forte utilização da
oralidade em complemento aos dados escritos históricos oficiais. Portanto, o objetivo se
utilizar a análise de alguns documentos serve para tomar posse de referencias que serão
utilizadas como parte do monumento que está sendo construído por meio das histórias de vida
que estão sendo relatadas.
No decorrer da pesquisa alguns documentos como fotos, revistas, jornais e
outros foram utilizados como forma de confronto com os relatos orais. Estes dados
complementares são úteis e ajudam no processo de conferir credibilidade aos relatos orais e
também como forma de mostrar através de fragmentos algumas interjeições que auxiliaram no
processo de compreensão e análise das histórias de vida.
cartas, fotografias, documentos de trabalho, registros de viagens, diários,
diplomas, comprovantes e recibos ou simplesmente “papéis velhos”. Estes
documentos, quando tomados em conjunto, podem revelar não apenas a
trajetória de vida, mas também gostos, hábitos e valores de quem os
guardou, constituindo o seu arquivo pessoal. (...) os arquivos pessoais
constituem valiosas fontes de pesquisa, seja pela especificidade dos tipos
documentais que os caracterizam, seja pela possibilidade que oferecem de
complementar informações constantes em arquivos de natureza pública.
(CPDOC-FGV, 2004, website)
Pimentel (2001) utilizou a análise documental para investigar e
compreender as relações da psicologia com a educação no contexto sócio-histórico nas
27
décadas de 1950 e 1980. A pesquisadora objetivou demonstrar os processos a serem
admitidos na tarefa de analisar os documentos que se tem a disposição. Sistematizar a
pesquisa é uma das atividades que devem ser levadas em consideração pelo analista.
Além disso, a utilização dos documentos é uma ferramenta para a
contextualização de fatos, ideias, e materialização de diversos acontecimentos. Para que se
tivesse a visualização de algumas realidades da praça Raposo Tavares, a exemplo, foi
necessário recorrer a fontes como revistas, jornais e fotos que deram ampla visão de como era
a praça em diferentes décadas.
Acervos pessoais também foram utilizados e que dificilmente seriam
encontrados em fontes oficiais. Esses documentos valorizam o estudo e complementam
informações repassadas pelas fontes orais. Essa apuração dos materiais consiste em outro
aspecto da análise documental, que será amplamente utilizado.
Organizar o material significa processar a leitura segundo critérios da análise
de conteúdo, comportando algumas técnicas como o fichamento,
levantamento quantitativo e qualitativo de termos e assuntos recorrentes,
criação de códigos para facilitar o controle e o manuseio (PIMENTEL, 2001,
pg. 182).
Pretende-se, portanto, realizar um elo entre passado e presente para ampliar
a construção da história e complementar de forma rica e com veracidade os períodos que
serão relatados pelas fontes orais.
Como se espera de uma análise científica a princípio foi realizada uma
percepção de quais documentos seriam importantes para a pesquisa. Em seguida a seleção
destes documentos foi realizada. Os principais arquivos são retratos, cedidos pelos próprios
personagens, e fotos de arquivo disponibilizadas na internet em blogs dedicados a história da
cidade. Objetos fornecidos pelos entrevistados também foram importantes para a
comprovação histórica e que foi de grande utilidade.
Poucos documentos foram utilizados e isto se revela pelo fato de que a
oralidade foi à fonte de dados primária.
2.4 Revisão da bibliografia
Esta pesquisa, além de analisar documentalmente, se utilizará de outras
obras para contextualização e auxílio ao processo de rememorar a história da praça Raposo
28
Tavares. Bibliografias farão parte deste processo, que se encaixa no método de revisão da
literatura.
A priori foram revisados alguns estudos que já foram feitos sobre História
Oral e também a cerca de Comunicação Comunitária e Cidadania, Segundo Stumpf (2010),
“para estabelecer as bases em que vão avançar, alunos precisam conhecer o que já existe,
revisando a literatura existente sobre o assunto. Com isto evitam despender esforços em
problemas, cuja a solução já tenha sido encontrada”. Ou seja este processo é fundamental no
estudo.
Em seguida a classificação das literaturas para o processo e posterior
fichamento. As obras selecionadas passaram pelo crivo da relevância dos autores, da relação
com o tema proposto e com a metodologia. Dessa forma todos os acervos bibliográficos
enriquecem a pesquisa e trazem confiabilidade. Para Stumpf a revisão da literatura,
Num sentido restrito, é um conjunto de procedimentos que visa identificar
informações bibliográficas, selecionar os documentos pertinentes ao tema
estudado e procederá respectiva anotação ou fichamento das referências e
dos dados dos documentos para que sejam posteriormente utilizados na
redação de um trabalho acadêmico (STUMPF, 2010, p. 51).
Em seguida o próximo passo segue na interpretação dos conceitos que estão
em voga e na apropriação daquilo que foi produzido pelos autores e que vão colaborar de
modo importante na pesquisa. Culminando no resultado final do estudo, refletindo,
ponderando, considerando ou não o que foi exposto e dialogando com estudiosos.
Separando em categorias as bibliografias utilizadas serão a) históricas que
abordarão aspectos da história de Maringá b) conceituais sobre os conceitos que fazem parte
da pesquisa e c) técnicas sobre o modo e o processo de documentação das histórias de vida
dos personagens.
As bibliografias utilizadas neste estudo serão livros e artigos de sítios
digitais de artigos, teses, dissertações e resumos de congressos, devidamente baseados em
fontes confiáveis e sites certificados por instituições renomadas. Além disso, uma rigorosa
seleção mantendo o foco no tema proposto, vão proporcionar uma análise das obras que
deverão ser utilizadas.
Além disso, a utilização destes documentos visa enriquecer o processo de
reprodução desta história na peça que está proposta, a qual, será um vídeo documentário.
Proposta esta que vai reunir e coletar as memórias dos idosos e com este arcabouço de
memórias físicas irão auxiliar no processo de reconstrução da história.
29
A próxima seção deste trabalho é um compêndio sobre Comunicação
Comunitária e sua importância neste estudo. Esta reflexão é de suma importância para que as
discussões iniciadas sobre a memória se calcem também de uma justificativa da relevância e
contribuição social.
3 ASPECTOS TEÓRICOS SOBRE COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA E
CIDADANIA
Na seção anterior foram abordados os temas Memória e pioneiros, e as
técnicas de pesquisa utilizadas. Além disso, outro aspecto de suma importância para este
trabalho é a perspectiva na qual este estudo se apoia. A comunicação Comunitária é uma
práxis que envolve a participação popular, ou seja, tem como principal objetivo ser uma
porta-voz do povo, e visa desenvolver aspectos da cidadania. Como salienta Mário Kaplún
(1985, p. 7), “uma comunicação libertadora, transformadora, que tem o povo como gerador e
protagonista”.
E isto se revela neste estudo, a partir do objetivo de dar aos pioneiros e a
oportunidade de se expressarem e exercerem plenamente a sua cidadania. Fazendo isso por
meio da participação ativa na construção do acervo histórico, ao passo que serão registradas
as suas experiências e vivências individuais, em vídeo, na praça Raposo Tavares. A priori será
realizada uma conjuntura sobre do que se trata a Comunicação Comunitária, além da origem
desta linha de atuação. Também será discutida a importância desta análise para o estudo em
questão, particularmente especificando os contornos sociais permitidos.
A comunicação comunitária surgiu na América Latina em meio a um
contexto de repressão política. Isso porque no Brasil, por exemplo, imperavam regimes de
controle e censura, provocando o surgimento de iniciativas populares de comunicação.
A origem dessa comunicação remonta à ação dos movimentos populares
típicos dos anos de 1970, os quais perpassam as décadas seguintes,
transformando-se, portanto, em ações características do processo de reação
ao controle político, às condições degradantes de vida e ao desrespeito aos
direitos humanos que foram se instaurando no país ao longo do tempo. Não
devemos, nesta reflexão, menosprezar o fato de que, nas primeiras décadas
do século passado, também existiram jornais e outros meios de comunicação
alternativa a serviço dos interesses dos trabalhadores (PERUZZO, 2009, p.
38).
Academicamente, nas universidades muitos estudiosos começaram a
defender a comunicação comunitária, entre eles “destacam-se as de Regina Festa, Gilberto
30
Gimenez, Juan Diaz Bordenave, Luis Ramiro Beltrán, entre outros, que trouxeram
importantes contribuições para o desencadeamento de estudos nessa linha de pesquisa”
(PERUZZO, 2008).
Movimentos pró-liberdade de expressão então irromperam e inúmeras
atividades, congressos e trabalhos comunitários começaram a surgir, dando origem ao que se
conhece na atualidade por comunicação comunitária. TVs, rádios, meios impressos, blogs e
outras formas de comunicação que contemplam todas as camadas da sociedade tem se
sobressaído na sociedade e mostrado que os meios de comunicação podem servir como voz da
população.
Tais acontecimentos marcam o surgimento da escola latino americana de
comunicação, marcada pela defesa da liberdade, da prática cidadã e dos interesses da
coletividade e de grupos da sociedade. Esse marco revolucionário permite que congressos e
seminários discutindo o tema aconteçam em toda América Latina e projetos de extensão nas
universidades deem início a uma nova perspectiva de atuação das mídias.
[...] às pessoas não interessam somente as questões de âmbito universal e
nacional, mas também os acontecimentos, as organizações, e as relações
sociais que lhe estão próximos. Interessam-lhes assuntos que dizem respeito
à vida do bairro, da vila, da cidade ou do município onde vivem (PERUZZO,
2003, p. 245).
Outro aspecto que não deve ser negligenciado é o de que os indivíduos na
comunicação comunitária são considerados como atores do processo social e construtores da
realidade. No tocante desta análise, a importância é de constituir um canal de participação em
que estes atores sociais possam sentir a relevância que possuem para a cidade de Maringá na
construção da história, compartilhando as memórias de um lugar comum a mais de 380 mil
habitantes, a praça Raposo Tavares. Os pioneiros constituem o objeto de estudo pelo qual a
Comunicação Comunitária deve atender ao interesse de lhes dar vez e voz, por intermédio do
vídeo documentário, reunindo as lembranças deste espaço comum em suas vidas.
Assim sendo, a comunicação comunitária diz respeito a um processo
comunicativo que requer o envolvimento das pessoas de uma “comunidade”,
não apenas como receptoras de mensagens, mas como protagonistas dos
conteúdos e da gestão dos meios de comunicação (PERUZZO, 2003, p. 246).
Como instrumento de mobilização, entende-se que neste caso específico se
pode pensar na contribuição para a sociedade em geral com o complemento histórico dado
31
pela memória dos pioneiros que podem contribuir no processo de construção da história da
cidade de Maringá. Isso porque, existem particularidades que não se encontram nos livros de
história e também há construções coletivas que pertencem ao grupo, pois, fizeram parte de sua
vivência diária.
Nas entrevistas realizadas, por exemplo, os pioneiros se lembravam
constantemente da fonte luminosa, que à época, representava um acontecimento expressivo.
Apesar de a memória individual revelar aspectos particulares, a memória da grande maioria,
expressa a lembrança saudosista deste ponto da cidade. Esta característica comum é um
aspecto que não pode ser desprezado, pois é neste momento em que a convergência acontece
entre passado e presente. Trazendo a tona este fato os pioneiros contribuem com suas
lembranças no processo histórico.
Portanto, “outra dimensão importante é a dos conteúdos. A comunicação
comunitária por natureza se ocupa de conteúdos aderentes às realidades sociais concretas de
cada comunidade ou lugar” (PERUZZO, 2003, p. 24). Ou seja, propõe debates que levem de
certa forma a uma participação no processo de construção da sociedade, com impacto visível
nas comunidades ou nos meios em que atue. Este entendimento é ratificador da importância
deste estudo, pois se percebe que os pioneiros exercem a sua cidadania ao emprestarem a sua
voz para revelar as lembranças pessoais da praça Raposo Tavares, este conteúdo comum entre
eles expressa esta característica particular da Comunicação Comunitária.
Isso porque, “o propósito básico é que comunicar seja um direito, não só de
donos, profissionais especializado ou lideranças comunitárias dos meios de comunicação, mas
de todo cidadão e de suas organizações representativas” (PERUZZO, 2003, p. 250). No
âmbito da Comunicação Comunitária, a participação do indivíduo permite uma interação onde
a comunidade se perceba como participante do processo de construção da sociedade. “O
mundo existe para todos. Assim como o ar é de todos, o deveriam ser as descobertas
científicas e tecnológicas e as riquezas socialmente produzidas” (PERUZZO, 2003, p. 252).
Como participantes da construção da história da cidade, os pioneiros que
viram o surgimento da praça Raposo Tavares e viveram momentos importantes de suas vidas,
podem ter garantidos os seus status de participantes e atores desta realidade e na base da qual
foi construída a cidade. “Havendo cidadania, haverá desenvolvimento social. Cidadania quer
dizer participação, nos seus múltiplos sentidos e dimensões, incluindo a cidadania cultural,
que perpassa o direito a liberdade de expressão” (PERUZZO, 2003, p. 256).
Há ainda que considerar características que Peruzzo (2001) define como
determinantes de uma comunidade, dentre as quais que, “sentimento de pertença. É sentir-me
32
membro, parte importante do processo e como tal contribuir para a coesão interna”. Portanto
este fazer parte de, é fundamental para a manutenção da comunidade. Porque situa o
indivíduo num espaço em comum dando-lhe uma identidade a qual só pode ser atribuída a ele
naquele local. Neste caso se entende que o resgate da memória individual e coletiva
possibilita a participação ativa dos pioneiros na construção da história. Nas práticas
comunicacionais comunitárias os indivíduos são tratados de forma igualitária não existe uma
incomunicação e sim um diálogo entre sujeitos da própria história.
A própria estrutura socioeconômica vai determinar a ausência de
comunicação. “Não há realmente, como se possa pensar, dialogação com a
estrutura do grande domínio, com o tipo de economia que o caracterizava,
marcadamente que não floresce em áreas fechadas, autarquizadas. Estas,
pelo contrário, constituem um clima ideal para o antidialogo” (MELO 1998,
pg. 263 apud FREIRE, 1967, p. 69).
Paulo Freire alterna o sentido de mutismo do homem brasileiro, para
“cultura do silêncio”, após o seu período no exílio, no qual pode constatar que a experiência
da ausência de comunicação era um fenômeno universal, presente, principalmente nos povos
colonizados. Sociologicamente Freire defende que, “esta espécie de cultura é uma expressão
de superestrutura que condiciona uma forma especial de consciência. A cultura do silêncio
sobre determina a infraestrutura de onde brota” (FREIRE, 1967, p. 63).
Mais adiante Freire conclui que o homem é na sua essência oprimido, e é
neste conceito chave que se baseia toda a sua pedagogia. No tocante a este estudo, interessa,
porém tomar como ponto principal os dois conceitos, o de incomunicação e cultura do
silêncio. Isso porque, consequentemente os pioneiros não seriam ouvidos, na construção da
história.
Paulo Freire também entende que a comunicação deve ser dialógica. Isso vai
contra a educação bancária que entende o indivíduo como um simples receptor que é cheio de
conteúdos pragmáticos com vistas à manutenção do status quo. Dentro do processo
comunicacional equivale ao entendimento que atualmente a comunicação serve aos interesses
de uma minoria em detrimento do direito de todo cidadão a se comunicar. A pedagogia
freiriana entende que o cidadão independente de sua posição ideológica, cultural ou classista
pode e deve manifestar-se, e, além disso, é neste processo dual que se complementam os
conhecimentos, pois nenhum indivíduo é pleno em conhecimento, está sempre em construção.
Cidadania é um conceito complexo que engloba várias dimensões, mas a
reflexão que deve ser feita é: o que torna um sujeito cidadão. No artigo Comunicação
33
Comunitária e educação para a cidadania, Peruzzo (2002) elenca cada um dos entendimentos
a respeito deste conceito.
Na concepção liberal, cidadania pode ser entendida como o pertencimento a
uma nacionalidade, uma nação, o que corrobora em direitos e deveres. Este conceito, porém, é
individualista, por considerar o sujeito apenas como u indivíduo isolado e não compreende a
coletividade e os direitos sociais de cada um.
Baseada nos ideais de igualdade e liberdade, cidadania nesta concepção é
tida como uma atribuição coletiva, o que pressupõe direitos e deveres. Este conceito se
sobrepõe ao primeiro aspecto, no entanto, ele também é vago, pois não compreende toda a
coletividade, apesar de defender ideais igualitários, apenas uma minoria compartilha desta
realidade. A explicação é que enquanto uma parte da população terá o acesso a Lei que
garante os seus direitos a cidadania outra parte, mais abastada ficaria subjugada, por não ter a
mesma oportunidade e acesso a recursos sociais na mesma medida.
Peruzzo (2002) cita Marshall para explicar os três tipos de direitos que ele
incorpora a cidadania. Estes termos ampliam as duas noções citadas acima e reforçam a
participação do exercício do poder de forma igualitária e ao mínimo bem estar.
Na perspectiva de Marshall (1967, p. 63-64), a cidadania incorpora três tipos
de direitos: os civis, os políticos e os sociais. O elemento civil é composto
dos direitos necessários à liberdade individual: liberdade de ir e vir,
liberdade de expressão, pensamento e fé, o direito à propriedade e o direito
à justiça. Tais direitos estão sob a alçada do poder judiciário. Por elemento
político da cidadania se deve entender o direito dos indivíduos de participar
do exercício do poder, como membros de um organismo investido de
autoridade política ou como eleitores de tais membros. As instituições
correspondentes são o parlamento e os conselhos do governo local. O
elemento social da cidadania se refere a tudo o que vai do direito a um
mínimo de bem-estar econômico e segurança ao direito de participar na
herança social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões
que prevalecem na sociedade. As instituições mais ligadas com ele são os
sistemas educacionais e de serviços sociais (PERUZZO, 20025).
Segundo Peruzzo (2002), na segunda metade do século XX outros direitos
de coletividades foram incorporados ao conceito de cidadania ampliando e assegurando
conquistas importantes para grupos com causas específicas.
Com base nestes conceitos é que se fundamenta o direito que todos têm ao
acesso e a difusão da comunicação e aos meios como forma de exercício e prática da
5 Comunicação comunitária e educação para a cidadania, 2002 programa de pós graduação da Universidade
Metodista de São Paulo. Disponível em: http://www2.metodista.br/unesco/PCLA/revista13/artigos%2013-3.htm. Acesso em 02/09/2013.
34
liberdade. Assim se entende que todos os conceitos que foram apresentados colocam o
indivíduo de alguma forma como participante e atuante na sociedade. Esta compreensão ajuda
a explicar como se dá a participação cidadã a qual se refere este estudo, ou seja, é
fundamental que se coloque neste âmbito a importância de conceder ao indivíduo a
participação na interface de comunicação e uma abertura aos processos comunicacionais.
De posse deste entendimento os idosos que são o objeto de estudo deste
trabalho terão resgatados os seus direitos a participação e atuação como protagonistas da
história. Termo este que paralelamente ao de cidadão definem o intuito desta pesquisa. Assim
tratados, eles não só relembram o passado ou somente vivem o presente, mas exercem a sua
cidadania e participam do presente de modo ativo e partem de suas próprias experiências que
podem construir o futuro das próximas gerações.
Finalmente, queremos ressaltar algumas noções fundamentais que encerram
a questão da cidadania. Primeiro: o cidadão tem direitos e deveres. A
participação política, a responsabilidade pelo conjunto da coletividade, o
cumprimento das normas de interesse público são deveres, por exemplo.
Segundo: a cidadania é histórica. Varia no tempo e no espaço, varia
conforme o período histórico e o contexto vivido. Portanto, cabe sempre
perguntar quem pode exercer plenamente a cidadania. Terceiro: a cidadania
é sempre uma conquista do povo. A ampliação dos direitos de cidadania
depende da “capacidade política” dos cidadãos, da qualidade participativa
desenvolvida. Quarto: as formas de participação decorrem do tipo de
sociedade política em que se vive. Quinto: a cidadania não se encerra nas
suas dimensões da liberdade individual e participação política, mas inclui os
direitos sociais e coletivos (PERUZZO, 2002).
Após estas reflexões é que se compreende a multiplicidade de termos
referentes à cidadania e que necessitam ser revisitados e amplamente discutidos. Como se é
possível entender não existe uma afirmação que possa afirmar o que é cidadania, mas o
importante é considerar que direitos individuais jamais podem se sobrepor aos interesses
coletivos. Neste trabalho, a evidência é que a busca não foi por autoridades, a busca dos
personagens foi feita visando principalmente encontrar pioneiros que participaram,
vivenciaram e tiveram alguma relação com a praça Raposo Tavares.
Via de regra se buscou socializar os personagens no encontro de suas
lembranças que estavam relacionadas à suas vidas particulares. Os livros históricos, nas
placas, nos memoriais, sempre se vê as matizes e o despontar de colonizadores, políticos e das
autoridades. Quanto aos cidadãos que trabalharam e construíram a história só lhes resta às
lembranças. Este estudo se propõe a realizar esta ponte entre o indivíduo e o seu papel
cidadão na construção da história.
35
4 COLONIZAÇÃO DO NORTE DO PARANÁ E A FUNDAÇÃO DE
MARINGÁ
Para que possam ser recontadas as histórias de vida dos idosos que tiveram
alguma relação com a praça Raposo Tavares é importante traçar um panorama histórico do
surgimento de Maringá e da praça Raposo Tavares. Divida em quatro partes se buscou neste
capítulo localizar e situar o local e reforçar a importância da praça para Maringá.
Conforme os registros da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná
(CMNP), na bibliografia Colonização e Desenvolvimento do Norte do Paraná, a região norte
do estado possuía 100 mil quilômetros quadrados e foi definida com a soma territorial dos
vales formados pelos afluentes da margem esquerda dos rios Paraná e Paranapanema. No
período de colonização esta região foi dividida em três áreas: o norte velho, norte novo e norte
novíssimo conforme mostra o mapa abaixo:
Figura 1: Mapa da divisão do norte do Paraná segundo a geografia dos anos 1950. DIAS e GONÇALVES, 2001,
p. 441.
36
A CMNP aponta que no período de colonização do norte do Paraná, o
desenvolvimento dessa região estava relacionado à fertilidade da terra roxa que propiciou a
expansão do café no Brasil e motivou a conquista de novas terras, aberturas de fazendas e
investimentos no transporte para escoamento das safras. (CMNP, 1975, p 31)
E é somente à custa da riqueza e da exuberância proporcionadas pela terra
fértil que se pode desenvolver um processo natural - por isso efetivo e
duradouro – de acumulação de capitais e de industrialização, semelhante ao
que se verificou em São Paulo e no Norte do Paraná. (CMNP, 1975, p31)
Conforme mostram os relatos da Companhia, a terra roxa, passou a ser
cobiçada por fazendeiros e desbravadores que desejavam aumentar a produtividade do café
explorado, até então, nas terras do vale do Paraíba em São Paulo e Minas Gerais. Em 1923,
para expandir as lavouras e distribuir as safras, os produtores precisavam investir na
construção de estradas de ferro que ligassem a cidade paulista Ourinhos a paranaense
Cambará no norte Velho.
Segundo a CMNP (1975), nesta época o Norte paranaense era coberto pela
Mata Atlântica e o acesso era difícil. Os plantios de café eram feitos em pequenas clareiras
abertas pelos colonos, com isso, os barões do café perceberam a necessidade de uma linha
férrea ligando as duas cidades, mas a obra se tornou inviável por falta de capital. [...] “as
disponibilidades financeiras dos fazendeiros de café estabelecidos no Norte Velho não eram
suficientes para concluir com a desejável rapidez os trabalhos do trecho ferroviário Ourinhos-
Cambará” (CMNP, 1975, p. 39)
No ano seguinte, se iniciou a busca por investidores, e por essa razão
(CMNP 1975 p.39) o presidente da estrada de ferro, Major Barbosa Ferraz, promoveu um
encontro com o inglês Lord Lovat6, que visitava o Brasil como técnico em agricultura e
florestamento da missão inglesa Montagu7. A reunião decidiu os rumos da colonização do
Norte do Paraná e os fazendeiros ofereceram ao inglês, novas perspectivas de lucros com a
construção da linha férrea “se a compra for seguida do prolongamento da estrada de ferro que
estamos construindo entre Ourinhos e Cambará, de maneira a garantir para os compradores o
escoamento de seus produtos, a valorização da áreas adquiridas pode tornar muito lucrativo o
6 XVI Barão do Reino Unido e técnico em agricultura e florestamento da missão inglesa Montagu. Ele veio ao
Brasil com o objetivo de estudar qual melhor possibilidade da empresa inglesa Sudan Plantations aplicar seu
capital no país. Com isso, buscou informações sobre a agricultura e de terras adequadas para plantio do algodão. 7. Missão que reuniu vários especialistas ingleses para estudar a situação financeira, econômica e comercial do
Brasil para fins de garantias de quitação da dívida para com a Inglaterra. Além disso, reformular o sistema
tributário do país para implantação de um novo sistema de arrecadação. Investigar as possibilidades de
investimento do capital estrangeiro.
37
empreendimento” (CMNP, 1975, p.51). Segundo a CMNP (1975) a fertilidade das terras
roxas de São Paulo e do norte paranaense atraiu Lord Lovat que adquiriu várias áreas para
cultivo de algodão, tanto que em 1924 ele fundou a empresa Brazil Plantations Syndicate 8
para administrar as terras no país.
Conforme mostram os relatos da CMNP (1975), Lord Lovat, um grupo de
ingleses e o Governo do Estado negociaram grandes áreas de terra. A missão instituiu um
plano de colonização do norte do Paraná para a venda das terras colonizadas. Entre 1925 a
1927 a empresa obteve 515 mil alqueires de terras que passaram a integrar à economia
agropastoril do Estado. Além disso, a Companhia precisou adquirir lotes ocupados por
posseiros e grileiros instalados na região, e negociar com a Companhia Marcondes de
Colonização. Esta empresa havia chegado ao Paraná em 1922 para ocupar a porção norte do
Estado com terras negociadas pelo governo, não conseguindo cumprir o que havia proposto
no projeto de colonização e, sem condições de prosseguir o processo, acabou vendendo as
terras para a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP9).
4.1 Colonização e povoamento
Segundo a obra Colonização e Desenvolvimento do Norte do Paraná,
produzida por meio de depoimentos dos funcionários da CMNP sobre o processo de
colonização da porção norte do Estado, traz poucas referências sobre a presença de outras
civilizações nas terras adquiridas e há informações restritas sobre o que foi feito das aldeias
indígenas existentes nas regiões colonizadas.
Nos registros descritos da CMNP constam o trabalho de colonização dentro
dos moldes ingleses, revelando como foram os desmatamentos, a construção de estradas de
ferro, a divisão de lotes e as primeiras fundações. Em um dos depoimentos o funcionário da
Companhia, Gordon Fox Rule, mencionou um fato curioso ocorrido em uma das viagens
quando foi levar compradores de terras para visitarem o patrimônio Três Bocas, atual cidade
de Londrina.
Certa vez paramos na estrada para encher o radiador de água do nosso
fordeco e de repente ouvimos de todos os lados, vindo da mata, o som de
paus batendo nas árvores. Eram os índios que então existiam nos arredores
8 Empresa composta por acionistas ingleses para administrar as terras adquiridas no Brasil para fins de plantação
de algodão e implantação de usina de beneficiamento da fibra no país. 9A partir deste momento a sigla CTNP será usada para identificar a Companhia de Terras Norte do Paraná;.
38
do que viria a ser nossa progressista Londrina de hoje. Isso foi em 1930.
Lembro-me de que todos queriam correr, mas eu os acalmei e disse que
fizessem tudo com naturalidade. Ouvíamos os índios, mas não podíamos
vê-los. (CMNP, 1975, p. 86)
Mota e Noelli (1999) criticam os estudos publicados sobre a colonização da
região norte do Paraná em que autores constroem a ideologia de que esses territórios
indígenas estavam desabitados e prontos para serem ocupados entre as décadas de 30 e 50 no
século XX. Para os autores, os territórios localizados entre os rios Paranapanema, Tibagi e
Ivaí, denominados norte e noroeste do Paraná estavam ocupados desde tempos imemoráveis.
No século XVI expedições portuguesas e espanholas cruzaram essas regiões em busca de
metais, escravos, e de um caminho para o Paraguai e Peru. No século XVI, as expedições dos
padres jesuítas, e no século XVII, a descoberta de ouro e diamantes no rio Tibagi, atraiu
diversas expedições militares que construíram fortes na região. E a partir da metade do século
XIX houve a invasão da tribo Kaingang por fazendeiros dos campos gerais paranaenses na
expansão dos seus territórios (MOTA E NOELLI, 1999, p. 23).
A exploração das populações indígenas pelos conquistadores não foi sem
obstáculos, como afirmam muitos autores, e a conquista dos seus territórios
também não ocorreu de forma pacífica. Em todos os momentos, e por várias
etnias, a resistência foi renhida e sangrenta. A conquista desses territórios
indígenas foi feita palmo a palmo, com o uso da espada, do arcabuz, da besa,
da cruz, de doenças e de acordos. Alianças foram estabelecidas e rompidas e,
de ambas as partes, fidelidades foram sacramentadas e traições
meticulosamente planejadas (MOTTA E NOELLI, 1999, p.27).
Para Tomazi (1999), a região norte do Paraná não era desabitada nem tão
pouco desconhecida. O autor observa que a região “já era conhecida e esquadrinhada por
engenheiros, agrimensores, viajantes e que ademais viviam índios e caboclos que conheciam e
habitavam esse espaço” (TOMAZI, 1999, p.53). Assim, a conquista dos territórios e o
extermínio de populações indígenas nos séculos XVI, XVII e XVIII, segundo os autores,
foram justificados, primeiramente, em nome do Rei e de Deus. Já no século XIX, a conquista
ocorreu em nome da Nação Brasileira e no século XX, período em que as empresas
colonizadoras atuaram no desbravamento dessas regiões, tudo era em nome do progresso.
Grandes áreas pertencentes às tribos Kaingang, Guarani e Xetá foram
invadidas, desmatadas e transformadas em campos agrícolas. “Em todos os tempos a
conquista cumpriu o objetivo de satisfazer a ambição dos conquistadores, fossem eles
39
espanhóis, portugueses, paranaenses tradicionais ou os denominados pioneiros modernos”
(MOTTA E NOELLI, 1999, P. 50).
4.2 Plano de colonização
De acordo com os registros da CMNP (1975) para colocar em prática o
plano de colonização, a empresa criou quatro núcleos urbanos a cerca de 100 km de distância
entre eles. Maringá, Londrina, Cianorte e Umuarama tiveram apenas uma única ferrovia
ligando essas regiões. E para oferecer assistência aos colonos que adquiriram terras nessas
regiões foram instituídos pequenos patrimônios, centros comerciais e abastecedores
intermediários entre esses municípios de grande porte.
Em 1929, a CTNP iniciou a venda dos primeiros lotes no patrimônio de
Três Bocas, que em 1935 se tornou a cidade de Londrina. No entanto, para dar continuidade
ao projeto de colonização foi necessário investir na construção de ferrovias, para escoamento
da safra e valorização das terras.
Em 1928, depois que a Paraná Plantation comprou ações da Companhia
Ferroviária São Paulo-Paraná, completou a ligação entre as cidades de Ourinhos em São
Paulo e Cambará no Paraná. A partir daí, os trabalhos foram dedicados a levar os trilhos a
Jataí, à margem do rio Tibagi. Mais tarde, as construções realizadas, que foram realizadas em
diversas etapas, chegaram às cidades de Londrina, Cambé, Rolândia, Arapongas e Apucarana.
Em meio a esse desenvolvimento das estradas, liderado pelo engenheiro
Gastão de Mesquita Filho, foi deflagrada a Segunda Guerra Mundial em 1939, isso fez com
que os ingleses mudassem os planos de investimentos no Brasil. A Companhia de Terras
Norte do Paraná foi posta a venda em 1943 e se tornou uma grande oportunidade de
investimento para quatro brasileiros: Gastão Mesquita Filho, Gastão Vidigal, Arthur
Bernardes Filho e os Irmãos Soares Sampaio, que compraram a Companhia dando assim
continuidade ao plano de colonização dos Ingleses, mas estabelecendo um novo modelo de
gestão voltado para outras fontes de renda e não somente a venda de terras. Sob a
administração dos Brasileiros, em 1951 a Companhia foi batizada de Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná e em 1954 a estrada de ferro chega a Maringá, cumprindo
mais uma etapa de obras, em 1973 alcança Cianorte.
À medida que as estradas de ferro foram avançando, as terras ficavam mais
valorizadas e continuavam a ser negociadas pela CMNP. A divisão dos lotes foi
40
minuciosamente planejada pela empresa que preferiu fracionar as terras em pequenos lotes de
15 alqueires paulistas, o equivalente a 36 hectares. (CMNP. 1975) Como dito acima, ao
definir o planejamento da colonização da região norte do Paraná a Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná tomou o cuidado de criar centros urbanos estratégicos. As
cidades polo ficavam cerca de 100 quilômetros de distância uma das outras com pequenos
patrimônios intermitentes. As cidades eram projetadas mediantes estudos topográficos que
indicavam inclusive o traçado da estrada de Ferro. Neste contexto surgiram Londrina, Cambé,
Apucarana, Mandaguari e Maringá.
4.3 Origem de Maringá e da praça Raposo Tavares
Maringá está distante a 127 quilômetros de Londrina, no centro geométrico
da zona colonizada pela CMNP ligando a outras regiões de São Paulo. A localização
geográfica, as terras férteis e o clima favorável para cultivo do café foram características que
levaram a companhia a tornar a cidade um dos mais importantes centros urbanos do Estado.
A intenção era construir um polo para acolher grande quantidade de emigrantes de vários
estados do Brasil para investir nas terras do norte paranaense.
De 1938 a 1943 Maringá permaneceu como patrimônio de Londrina e em
seguida de Apucarana de 1943 a 1947, quando em maio deste ano, foi lançada a pedra
fundamental da cidade, após a derrubada da mata da região onde está localizado o centro da
cidade atualmente. Cinco meses depois, a localidade se tornou distrito de Mandaguari e neste
ano a CMNP iniciou a venda dos terrenos.
Os primeiros pioneiros chegaram a Maringá por volta de 1938, porém as
construções urbanas iniciais foram erguidas no início dos anos 40 quando surgiu no bairro
Maringá Velho10
o Hotel Maringá que recebia os trabalhadores. Conforme descreveu um dos
engenheiros da companhia Cássio Vidigal “precisamos hospedar bem para atrair bons
compradores de terras” (CMNP 1975 P. 140).
Nesta época, mais precisamente em 1942, conforme aponta Luz (1999), a
Companhia já tinha comercializado 12,2% das propriedades rurais de Maringá. Enquanto a
Companhia aguardava onde seria o traçado da estrada de ferro para definir o projeto de
Maringá, o primeiro povoado se instalou no bairro Maringá Velho. Conforme aponta Recco
(2012), o bairro nasceu com oito quadras atravessadas por uma rua principal.
10
Bairro pioneiro de Maringá, denominado assim justamente por ser a porção mais antiga da cidade.
41
Como a Companhia não tinha a intenção de que o Maringá Velho fosse o
centro definitivo, não permitiu a expansão do bairro. A intenção era desenvolver um plano
urbanístico arrojado em um terreno menos acidentado e próximo a estação ferroviária. Apesar
disso, o bairro Maringá Velho tinha que atender as necessidades substanciais dos primeiros
moradores tanto da região rural, quanto da urbana e por isso a companhia permitiu a
instalação de um comércio bem diversificado naquele local, ou seja, cada indivíduo
estabeleceu um ramo de atividade diferente a fim de que não faltassem suprimentos aos que se
instalavam na região. As condições urbanas eram precárias. De acordo com Recco, (2012), as
primeiras construções eram quase todas de madeira fornecida pelas serrarias locais, que
aproveitavam a abundante oferta da derrubada das matas.
Caminhar é uma aventura arriscada, com inevitáveis escorregões e tombos.
Se demorava a chover, o problema é a poeira incessante, ocasionada pelo vai
e vem dos veículos. O pó fino está em todos os lugares, traz aborrecimentos
principalmente para as donas de casa, que não conseguem deixar roupas
secando nos varais (RECCO, 2012, p.17).
Com a demarcação da estrada de ferro, a CMNP solicitou um estudo
topográfico do local para por em prática o projeto de urbanização de Maringá. Dr. Cássio
Vidigal e o engenheiro e urbanista Jorge de Macedo Vieira planejaram a cidade com base em
dados climáticos e ambientais. Segundo Luz (1999), as ruas e avenidas foram traçadas com
46, 35 e 30 metros de largura, duas mãos de trânsitos e canteiros centrais para jardinagem.
Recco (2012) pontua que, feito o projeto em 1945, a Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná iniciou a derrubada da mata e a venda dos lotes urbanos do
novo centro de Maringá. No período de 1947 a 1948, visando impedir a especulação
imobiliária com a valorização das terras, a Companhia exigiu que os compradores
construíssem casas imediatamente, e Maringá ficou conhecida como, “cidade fantasma”,
porque muitos proprietários edificavam suas moradias, mas não habitavam nelas.
No projeto inicial, afirma Luz (1999), a cidade tinha 600 alqueires, cerca de
cinco quilômetros de cumprimento e três de largura. Previa espaço para bosques, bairros
residenciais populares e para classe média, área industrial e o centro cívico. As quadras eram
traçadas em forma de xadrez e com ruas largas. Foram reservadas áreas para escolas, praças
igrejas, bibliotecas, hospitais, parques, aeroporto, universidade e área para o esporte.
42
Figura 2: anteprojeto da cidade de Maringá. Acervo do Museu da Bacia do Paraná
Entre os espaços destinados a praças está a Raposo Tavares. O projeto
original previa uma área na região central que vai da avenida Brasil até onde atualmente
funciona o terminal urbano da cidade. De acordo com o Historiador João Laércio Lopes Leal
(Apêndice p. 89)11
, a praça foi instituída no mesmo dia da fundação de Maringá. O historiador
acrescenta que o nome Raposo Tavares foi escolhido pelo engenheiro Wladmir Babokov, a
época contratado para fazer o estudo topográfico da cidade. Segundo o historiador, Babokov
seguiu as orientações dos diretores da CMNP, que possivelmente, um ou mais eram
descendentes do bandeirante português. Antonio Raposo Tavares chegou ao Brasil em 1618 e
dedicou-se ao aprisionamento de índios para o trabalho escravo nos engenhos coloniais e
realizou expedições com o intuito de expulsar os jesuítas espanhóis para assegurar os
territórios dos atuais estados do Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul.
Leal (Apêndice p. 90) aponta ainda, que com a instituição do Novo Centro
no fim da década de 40, a Companhia definiu um eixo monumental da cidade que
compreendia toda a avenida Getúlio Vargas (trecho entre a catedral até a estação ferroviária)
para instituir um centro de atendimento ao público. Era um local com instituições públicas e
privadas como: bancos, igreja, prefeitura, correio para atender as necessidades da população.
11
A entrevista com o historiador João Laércio Lopes Leal se encontra no apêndice deste trabalho.
43
Catedral
Avenida Getúlio Vargas
Praça Raposo Tavares
Terminal Rodoviário
Linha Férrea
Figura 3: foto do Eixo Monumental de Maringá
Blog Maringá Histórica
Com isso a praça Raposo Tavares passou a receber crescente fluxo de
pessoas. Inicialmente o local era um descampado sem pavimentação e muito utilizado para
apresentações de circo, instalação de parques de diversão e realização de comícios.
Somente em 1957, de acordo com Leal (Apêndice p. 91), o segundo prefeito
de Maringá, Américo Dias Ferraz, realizou um projeto de revitalização do local dotando-a
com características de praça pública. Entre as melhorias, Américo Dias providenciou a
pavimentação, iluminação e em 10 de maio de 1957 inaugurou uma fonte luminosa que
jorrava água e com luzes coloridas acesas durante a noite, vista do alto a praça lembrava uma
bandeira.
Figura 4: foto da praça Raposo Tavares com a fonte luminosa . Blog Planeta JC
44
A partir dos anos 1960 Maringá viveu um processo de êxodo rural e muitas
famílias migraram para a cidade e novos loteamentos surgiram na região norte. Com a
construção de bairros, foram construídas outras praças e o movimento nas praças centrais
diminuiu.
Nas décadas de 1960 e 1970 foram realizadas mudanças estruturais, além da
constituição de novos espaços públicos ao redor da praça Raposo Tavares. Em 1963 foi
construído o terminal rodoviário e urbano Américo Dias Ferraz. Parte da estrutura da fonte
luminosa foi retirada em meados da década de 1970 ficando apenas uma piscina, não há
estudos que expliquem o motivo dessa inciativa. Em 1972, o Cine Teatro Plaza foi inaugurado
em frente à praça e neste ano o busto de Joubert Carvalho foi posto na praça em homenagem
ao compositor da canção Maringá! Maringá! que deu nome a cidade.
De acordo com Leal (Apêndice p. 94), somente em 1973 a praça passou por
novo projeto de revitalização durante a administração do prefeito Silvio Magalhães Barros. A
época, o projeto foi elaborado pelo arquiteto e ex-secretário de planejamento urbano do
município Luty Kasprowicz. Leal salienta que, o projeto era arrojado e moderno e previa
ondulações no cimento em formato plissado. Nesta época, o pastor Nilton Tuller reinvindicou
ao prefeito a construção de um templo aberto na praça para realização de cultos evangélicos, a
obra foiincluída no projeto e inaugurada em 1975.
Figura 5: foto da inauguração do Templo Aberto. Arquivo pessoal pastor Nilton Tuller
Já na década de 1980, foi instalado na praça um módulo policial, este
período marcou também a inauguração do Centro Comercial Maringá. Nesta época também
foi instituído o comercio informal na praça com a presença de dezenas de vendedores
ambulantes atraídos pela movimentação do local. A praça também recebeu um monumento
45
em homenagem aos corretores de imóveis da cidade. Conforme aponta Leal (Apêndice p. 94),
desde a sua fundação, a praça Raposo Tavares tem sido palco de mobilizações sociais,
recebeu manifestantes do movimento “Diretas Já” e ainda é local para as reinvindicações
sindicais, protestos, comícios e os mais variados eventos.
46
5 VÍDEO DOCUMENTÁRIO
Dentro da perspectiva trabalhada no capítulo anterior, sobre a Comunicação
Comunitária, este estudo vai utilizar o vídeo documentário na tarefa de realizar o registro das
histórias das personagens. Para Penafria (2001) “Um documentário é uma obra pessoal e
implica uma necessidade da parte do documentarista em expressar algo, em dizer algo sobre
determinado assunto. Não se trata de egoísmo ou narcisismo”. O que motivou este vídeo
documentário a princípio foi o incômodo em relação a praça Raposo Tavares que a posteriori,
foi identificado também nas fontes escolhidas. Porém, por estar inserido na Comunicação
Comunitária este vídeo documentário também é esforço de conferir a práxis, ou seja, de modo
prático evidenciar a participação dos pioneiros no registro da história da praça Raposo
Tavares.
Documentaristas que fazem filmes pessoais, ou seja, sobre eles próprios,
sobre temas que a eles lhe interessam ou sobre temas sobre os quais lhes
interessa apresentar a sua visão, estão, obviamente, a apresentar a sua visão
pessoal. Antes de mais, estão a contribuir para o desenvolvimento do género.
Cada filme contribui para o cumprimento de uma das principais funções do
documentarismo: promover a discussão sobre o nosso próprio mundo;
confrontarmo-nos ou distanciarmo-nos de nós próprios. Estão, também, a
incentivar o diálogo sobre diferentes experiências, sentidas com maior ou
menor intensidade. (PENAFRIA, 2001)12
A oralidade possui várias maneiras de ser documentada, nesta pesquisa se
escolheu o vídeo documentário, pois o objetivo deste estudo é registrar as memórias afetivas
dos pioneiros sobre a praça Raposo Tavares, com vistas a efetivar a sua participação cidadã. O
motivo de se escolher esta forma de documentação se deve ao completo acervo imagético a
disposição e também pela intenção de captar as emoções com mais fidelidade, amparado por
todo o conjunto de imagem, som, movimento e ângulos de visão.
A priori é conveniente algumas interpretações sobre o engajamento dos
vídeo documentários. Isso porque o caráter deste, em especial, que tem uma função social
inserido na perspectiva da Comunicação Comunitária. Nesta tarefa proposta, Nichols (2008)
define dois tipos de filme. Segundo o estudioso há os documentários de satisfação de desejos
e os de representação social. No primeiro gênero se encaixam as produções normalmente de
ficção, elas tornam concretas as abstrações e compreende em sua maioria aspectos da
12
O ponto de vista no filme documentário. Universidade da Beira Interior Departamento de Comunicação e
Artes 2001. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/_texto.php?html2=penafria-manuela-ponto-vista-
doc.html Acesso em 02/09/2013 às 07h41.
47
imaginação. Está aberta a interpretações distintas e representa a materialização de anseios,
desejos, medos, entre outros. Já o segundo torna visível a realidade social com base em uma
organização e seleção imposta pelo cineasta. Assimila vários aspectos do real e costuma
proporcionar novas visões do espaço ocupado e apresenta um ponto de vista, um argumento
defendido pelo autor. Em ambos os casos para Nichols (2008) o vídeo documentário
[...] não é uma reprodução da realidade, é uma representação do mundo em
que vivemos. Representa uma determinada visão do mundo, uma visão com
a qual talvez nunca tenhamos deparado antes, mesmo que os aspectos do
mundo nela representados nos sejam familiares. Julgamos uma reprodução
por sua fidelidade ao original – sua capacidade de se parecer com o original,
de atuar como ele e de servir aos mesmos propósitos (NICHOLS, 2008, p.
47).
Dialogando com Nichols (2008), Penafria (2001) entende que o vídeo
documentário reúne o ponto de vista do documentarista e isso já é uma intervenção na
realidade. Portanto, não há como afirmar que ele seja uma representação do mundo, mas um
recorte de uma realidade aparente, mas ao mesmo tempo invisível. “O fim último é apresentar
um ponto de vista sobre o mundo e, o mais das vezes, mostrar o que sempre esteve presente
naquilo para onde olhamos, mas que nunca vimos”, (PENAFRIA, 2001). Por isso mais que
um anseio particular este vídeo documentário é também uma produção conjunta e que se
utilizou da liberdade dos indivíduos em contar sobre as suas lembranças individuais.
Como afirma Godoy (apud PENAFRIA 2001) os vídeos documentários
também apresentam uma nova forma de ver o mundo, ampliam as formas de enxergar a
realidade e mostram realidades pela mediação da imagem. A contribuição deste vídeo
documentário, portanto, não se limita a apenas mostrar a realidade, mas tem uma tarefa
múltipla resgatar a história por meio da memória de cidadãos idosos. Nesta relação dual se
pretende mostrar que os cidadãos podem contribuir de forma ativa na construção da história
de um povo. As fontes orais, vão contribuir com esse processo de enriquecimento do acervo
histórico.
Incentivar o diálogo sobre diferentes experiências, sentidas com maior ou
menor intensidade. Apresentar novos modos de ver o mundo ou de mostrar
aquilo que, por qualquer dificuldade ou condicionalismos diversos, muitos
não veem ou lhes escapa. (PENAFRIA, 2001, p.5)
O ponto de vista é outra característica marcante do vídeo documentário.
Segundo PENAFRIA (1999) a conclusão dos fatos é sempre feita pelo telespectador com base
48
nos recortes da realidade, proporcionado pelo vídeo documentário. E esta conclusão da autora
é fundamental para a ênfase desta pesquisa. O espaço da abertura de interrogações e das
reflexões as quais se propõe, evidenciando que existe um problema uma inquietação.
Para Jullier e Marie (2009) os pontos de vista não são apresentados por
acaso, eles dão margem a interpretações, portanto, convém reforçar que eles exercem uma
influência significativa no processo fílmico. “O ponto de vista é apresentado antes de tudo
pela localização da câmera. É o ponto de observação da cena, aquele de onde parte o olhar,
Nenhum ponto de vista é neutro. Todas as posições de câmera conduzem uma série de
conotações”.
Para este vídeo documentário optou-se, na maior parte do tempo, por
colocar o telespectador como uma testemunha da história, ou seja, se escolheu utilizar o foco
da objetiva fechado na face do entrevistado. Assim a intenção é que a pessoa que assista ao
vídeo documentário sinta como se estivesse frente a frente com os idosos e pudesse ouvi-los
contar os relatos. Isso reforça o que dizem Jullier e Marie (2009)
O ponto de vista talvez seja o parâmetro mais importante no nível do plano,
e isso por pelo menos duas razões: se as câmeras comandadas
eletronicamente pudessem ser colocadas em piloto automático, mesmo assim
seria preciso que o seu operador soubesse ou decidisse em que lugar as
instalar e sobre o que apontar sua objetiva; pode-se escapar de muitas
regulações técnicas, mas não dessa (JULIER e MARIE, 2009, p. 22).
É natural que os vídeo documentários apresentem como dito acima um
ponto de vista, o qual irá se estender por toda a obra mostrando sob qual ótica se apresentarão
as cenas. Penafria (2001) entende que, “o ponto de vista determina com quem o espectador se
identifica e o modo como o espectador lê os planos (e o filme) e interpreta a acção”. Segundo
Nichols (2008) “em geral, portanto, podemos dizer que o documentário trata do esforço de
nos convencer, persuadir ou predispor a uma determinada visão do mundo real em que
vivemos”.
Quanto ao plano o referido vídeo documentário vai utilizar o Close Up,
como já citado, a câmera estará focada, na maioria das cenas, e principalmente, nas
entrevistas no rosto dos idosos. A escolha por este plano se deve pela proximidade com a qual
se pretende dar, mas, além disso, outro fator que contribuiu para a escolha, a oportunidade
como reforça Jullier e Marie (2009), uma maior intimidade com a personagem.
49
O close up rompe essa unidade isolando uma de suas partes (classicamente, a
passagem em close up pode apresentar uma “aproximação” no sentido
próprio e figurado que obedece a um desejo de entrar em intimidade maior
com um personagem) ou isolar um detalhe que importa na história (em
Alfred Hitchcock ou em Martin Scorsese), mas há também motivações
psicológicas (esboçar o retrato de uma personagem “em pedaços”),
puramente plásticas (os close ups dos olhos dos olhos do Western Spaghetti)
ou vouyeristas (os close ups constituem o vocabulário básico do filme pornô)
(2009, p. 24).
Além disso, outro elemento que será disposto no vídeo documentário será o
realismo, Nichols (2008) argumenta que ele revela aspectos da vida que passariam
despercebidos ou então obsoletos quando se mostra o cotidiano pelas lentes da câmera. E aqui
está a grande diferença desta produção, se levar em consideração o seu papel de permitir a
participação cidadã, reforçando conceitos da Comunicação Comunitária, pois Peruzzo (2002)
afirma que,
Por seus conteúdos podem dar vazão à socialização do legado histórico do
conhecimento, facilitar a compreensão das relações sociais, dos mecanismos
da estrutura do poder (compreender melhor as coisas da política), dos
assuntos públicos do país, esclarecer sobre os direitos da pessoa humana e
discutir os problemas locais. É conhecida a existência, por exemplo, de
programas de rádio montados por moradores de favela, em que se faz um
trabalho educativo junto a crianças e jovens quanto aos perigos do consumo
e do tráfico de drogas. Podem facilitar a valorização das identidades e raízes
culturais, abrindo espaço para manifestações dos saberes e da cultura da
população: da história dos antepassados às lendas e às ervas naturais que
curam doenças. Ou servir de canal de expressão aos artistas do lugar, que
dificilmente conseguem penetrar na grande mídia regional e nacional. Ou,
ainda, informar sobre como prevenir doenças, sobre os direitos do
consumidor, o acesso a serviços públicos gratuitos (como registro de
nascimento) e tantos outros assuntos de interesse social (PERUZZO, 2002).
Nichols (2008) classificou este recurso em três tipos: o realismo fotográfico,
o realismo psicológico e o realismo emocional. Na perspectiva deste vídeo documentário o
estio que mais o caracteriza é o segundo, pois tem como ênfase a revelação de aspectos
individuais dos atores sociais. Os idosos e as suas memórias particulares vão construir o relato
deste vídeo documentário permeados por toda a emoção e construção que foi realizada com o
passar dos anos. É essa realidade proposta, encontrando base no que define Nichols (2008),
que o,
Realismo psicológico implica a transmissão dos estados íntimos de
personagens e atores sociais de maneira plausível e consciente. Ansiedade,
felicidade, raiva, êxtase etc. podem ser retratados e transmitidos
realisticamente. Consideramos realística a representação desses estados
50
quando sentimos que a vida interior de um personagem foi transmitida de
modo eficiente, mesmo se, para isso, o diretor teve de recorrer a
inventividade, prolongando um plano mais do que o usual adotando um
ângulo revelador, acrescentando uma música sugestiva ou sobrepondo uma
imagem ou sequência à outra (NICHOLS, 2008, p. 128).
Outro aspecto deste estilo que Nichols (2008, p. 128) pontua, é o que ele
define como realismo de tempo e espaço, mas para que se alcance este nível, “depende de
encontrar pessoas, ou atores sociais que se revelam diante da câmera, com uma abertura e
falta de timidez semelhantes a de profissionais experientes”. Os personagens escolhidos
demonstram em seus diálogos a expressiva tranquilidade em abordar o tema pelo fato de
serem escolhidos locais para as filmagens que eles mesmos escolheram para exporem as suas
lembranças pessoais.
A questão social e a participação cidadã e o comprometimento social são
fatores perceptíveis nos pioneiros, a satisfação em participar do projeto revela a disposição em
participar da documentação do processo histórico. Segundo o Nichols (2008, pg. 129) “o
documentário procura transmitir aos espectadores a sensação de envolvimento emocional ou
comprometimento com as pessoas e questões relatadas”. É o que também argumenta Penafria
(1999) para ela o vídeo documentário,
Geralmente trabalha com fragmentos de uma realidade, buscando a reflexão
e a compreensão aprofundada da questão abordada, deixando para o
espectador o papel de relacioná-la com seu contexto histórico, econômico,
político, social e cultural (...) permitindo ao espectador suas próprias
conclusões. (PENAFRIA, 1999, p.1)
Portanto, pode-se compreender com isto, que estes atores sociais
desempenham um papel histórico relevante e ao mesmo tempo é possível notar as distorções
da história, além de fatos e curiosidades que não constam na história oficial. O vídeo
documentário dentro da proposta cidadã é uma construção participativa que permite esta
análise de um modo mais contundente, pois revela aspectos sociais que não são abordados em
outras mídias.
Em sua obra Introdução ao Documentário, Nichols (2008) faz uma distinção
entre os modos de documentário. O autor elenca seis formas, entre elas, o modo performático
é o que caracteriza este vídeo documentário, pois salienta aspetos subjetivos e afetivos como
afirma o próprio estudioso.
51
Isto pode ser percebido pela característica fundamental das personagens que
emprestaram sua voz ao vídeo documentário. Segundo Penafria (2001), “no documentário há
lugar quer para narcisismos, quer para voyeurismo, quer para a defesa de vozes que não têm a
oportunidade de se expressar (ou seja, fazer nossa a luta dos outros)”. Este segundo conceito
apresentado pela autora é o que mais se encaixa nesta proposta, o espaço livre para a
participação dos pioneiros que raramente seriam ouvidos no processo de registro histórico.
A expressão individual de cada pioneiro reflete em uma diversidade que ao
mesmo tempo possui vários ângulos em outro dado momento remonta a uma construção
social coletiva. Isto poderia ser visualizado de outra forma, mas o modo performático permite
que esta representação seja mais contundente ao ampliar o conhecimento do mundo.
O significado é claramente um fenômeno subjetivo, carregado de afetos. Um
carro, um revolver, um hospital ou de uma pessoa terão significados
diferentes para pessoas diferentes. Experiência e memória, envolvimento
emocional, questões de valor e crença compromisso dos aspectos do mundo
que mais são explorados pelo documentário: a estrutura institucional
(governos e igrejas, famílias e casamentos) e as práticas sociais específicas
(amor e guerras, competição e cooperação) que constituem uma sociedade.
O documentário performático sublinha a complexidade de nosso
conhecimento do mundo ao enfatizar suas dimensões subjetivas e afetivas
(NICHOLS, 2008, p. 169).
A estrutura deste vídeo documentário conta com o auxílio do que Nichols
(2008) chama de voz over ou off. A inclusão deste elemento se baseou no intuito de realizar
um abertura que situasse o telespectador e abrisse também a uma interpretação completa do
tema. No entanto, este recurso é pouco utilizado, pois dentro da Comunicação Comunitária a
voz principal é dos atores sociais, portanto, a tarefa principal é oportunizar a participação
ativa dos cidadãos em detrimento de uma imposição. Além disso, o uso de imagens,
fotografias, entre outros, é um recurso que não está ausente, principalmente por se tratar da
história passada.
O uso destas ferramentas poderia ser atribuído ao modo expositivo, mas
para Nichols (2008), “a característica obsessiva e pessoal do comentário leva-o na direção do
performático. O filme é menos sobre história que sobre memória; menos sobre história das
classes dominantes – o que aconteceu, quando e por quê – e mais sobre histórias das bases”.
Este último conceito é o que mais leva a compreensão da escolha deste modo neste vídeo
documentário.
Este vídeo documentário pode ser assim definido: de modo performático,
com preferência no uso de pontos de vista que levem o telespectador a se sentir como uma
52
testemunha das histórias, visando uma intimidade com os idosos, as imagens em plano close
up pretendem realçar este aspecto. Em seguida serão abordadas as etapas de produção do
vídeo documentário, revelando os processos de planejamento, produção e pós-produção.
5.1 Etapas de produção
Na pré-produção deste vídeo documentário houve um intenso trabalho de
pesquisa, antes da elaboração do projeto inicial. Julgou-se necessário encontrar fontes que
dariam o devido suporte a construção da narrativa que se pretende adotar. De posse das fontes
o desafio era focar a pesquisa na própria história da praça Raposo Tavares, o que demandou
uma revisão da bibliografia, para construir uma linha cronológica de acontecimentos que
darão um norte a produção.
A pré-produção é uma fase de preparação para as filmagens. Esta fase
caracteriza-se por uma pesquisa e desenvolvimento do tema/assunto a tratar.
Não há regras a seguir, aqui trata-se de justificar o interesse de um filme.
Assim, há que definir a motivação, ou seja, o documentarista deve, antes de
mais, interrogar-se quanto às razões por que quer fazer determinado filme,
definir a abordagem ao tema, recolher informação, fazer a caracterização e
selecção dos locais a filmar, a caracterização dos intervenientes
("personagens"), definir a estrutura do filme, tipo de planos, etc
(PENAFRIA, 2001).
De acordo com este entendimento a pré-produção deste vídeo documentário
seguiu exatamente este percurso. Definida a ideia, iniciaram-se as pesquisas acerca do tema,
foram coletadas informações, dados históricos complementares, a escolha dos locais,
preferencialmente aqueles nos quais as personagens convivem ou conviveram e por fim,
determinada a estrutura do filme. Abaixo seguem as informações sobre o assunto/ideia e a
definição do vídeo documentário.
A proposta deste vídeo é ouvir e registrar a memória dos idosos, que
viveram e fizeram parte da história de Maringá, com um lugar em comum, a praça Raposo
Tavares. Fazendo isto por meio da História Oral, método que tem nas lembranças individuais
ferramenta para contar e documentar a história.
A intenção com este documentário não é confirmar dados históricos já
existentes, e sim captar o que cada pessoa escolheu em sua memória para descrever. Aquilo
que cada uma delas selecionou ou decidiu lembrar.
53
Como exemplo pode-se citar as transcrições de entrevistas com filhos de
escravos ou netos de ex-escravos do projeto “Memória da Escravidão em Famílias Negras de
São Paulo”, desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) no ano de 1987. Os leitores
são descendentes de escravos da Fazenda São José da Serra em Valença, Rio de Janeiro.
Este vídeo documentário destina-se a complementar o registo histórico e,
além disso, como instrumento para o desenvolvimento da cidadania. Atingindo este grau pela
participação voluntária de idosos que contribuíram com as suas memórias para a construção
deste acervo audiovisual.
Foram entrevistados sete idosos selecionados de acordo com a sua história e
seu nível de participação na praça Raposo Tavares. As entrevistas foram feitas em locais
familiares aos idosos, isso porque interessava que eles se sentissem a vontade para expor as
suas memórias.
A pré-produção, além do trabalho de pesquisa, também envolveu a
sistematização do processo. Abaixo, segue o sistema que foi adotado e o foco determinado.
Story line
Apresentação do conflito
Apresentação das personagens e breve história da praça Raposo Tavares;
Desenvolvimento do conflito
Lembranças dos idosos contadas por eles;
Solução do conflito
Relato da situação atual da praça Raposo Tavares e considerações dos idosos;
Sinopse
A praça Raposo Tavares fica no centro de Maringá, noroeste do Paraná e
surgiu na década de 1940. Foi idealizada entre a estação ferroviária, o terminal rodoviário, e a
principal via da cidade, a avenida Brasil. Dela é possível contemplar até hoje, a Catedral,
ponto turístico da cidade. Além da localização, a praça também era um espaço de lazer,
contava com o Cine Teatro Plaza, primeiro cinema da cidade e a fonte luminosa, companhias
artísticas itinerantes, utilizavam o espaço para suas alocações e apresentações. Era também ali
54
que as comemorações cívicas aconteciam, prova disso é a comemoração dos 10 anos da
cidade, ocasião em que um dos aviões da esquadrilha da fumaça, que se apresentava, caiu
matando o piloto e o copiloto. Na década de 1970 a praça Raposo Tavares passa por uma
transformação, se tornando Templo Aberto. Ali evangelistas passam a fazer pregações, cultos
e apresentações de música cristã. Com o tempo, a falta de investimentos e preservação,
colocou a praça numa situação deplorável de má conservação. Apesar disso, ela ainda é local
para feiras e eventos semanais da prefeitura e dos órgãos municipais, principalmente porque
está exatamente no centro da cidade. À noite e também durante o dia, é ponto de prostituição,
consumo e venda de drogas. Estes acontecimentos serão contados de a partir da perspectiva
comunitária e cidadã sob a ótica dos pioneiros, mas também por pessoas que viveram na
praça momentos que marcaram a sua vida pessoal.
Depois da definição do assunto e da fundamentação sobre o tema, o trabalho
seguinte foi a elaboração de um projeto que elencou as fases de produção. Abaixo é
apresentado o projeto que foi realizado. Este aporte foi de inúmera importância por ser o
ponto de partida para a produção do vídeo documentário e a sua realização.
Argumento
Maringá, fundada pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná
(CMNP), foi traçada obedecendo a um plano urbanístico previamente estabelecido. Praças,
ruas e avenidas foram demarcadas considerando, ao máximo, as características topográficas
da área escolhida, revelando preocupação lúcida no que se refere à proteção de áreas verdes e
vegetação nativa. Com esta filosofia, caracteristicamente contemporânea, nasceu Maringá, a
10 de maio de 1947, como Distrito de Mandaguari. Em 1951 foi elevada a Município, com os
distritos de Iguatemi, Floriano e Ivatuba. Em 1954 foi instalada a Comarca de Maringá. Hoje
sede de uma grande região que abrange cem municípios.
Esta história recente de Maringá é baseada em fatos e documentos oficiais e
apresenta muitas vezes relatos de pessoas de “grande influencia” (políticos, empresários,
escrituras, plantas urbanísticas). Mas há fontes que também possuem memórias as quais
constituem a mesma biografia. A inquietação inicial que deu origem a proposta deste vídeo
documentário se deu pelo incômodo ao passar pela praça e constatar a sua degradação.
Sondagens iniciais revelaram que a praça era um local de grande importância para a Maringá,
55
mas com o passar dos anos este local foi negligenciado até que se chegasse a atual situação de
abandono e degradação.
A antiga fonte luminosa, o primeiro cartão postal de Maringá, o primeiro
cinema da cidade, as primeiras lojas e os primeiros bancos e a localização central. Além disso,
ponto de encontro de muitas pessoas do início do que se tornaria o terceiro mais importante
município do Estado do Paraná, isto é o que a praça representou para a cidade nas primeiras
décadas após a colonização do município. A proposta é realizar um outro olhar através de
uma história de baixo para cima, por meio do relato de pioneiros, tendo como base a
Comunicação Comunitária e sua contribuição na história, permitindo a participação cidadã
destes atores sociais.
Descrição do(s) Objeto(s)
O objeto de pesquisa serão pessoas que viveram na década de 1940 – 1950
que presenciaram os fatos ocorridos na praça Raposo Tavares. As pessoas escolhidas são:
Izaltino Machado
Marceneiro, funcionário da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná (CMNP). Construiu
o Cine Teatro Plaza e trabalhou na construção da praça Raposo Tavares. Morou no primeiro
acampamento da Cia em frente a praça, na década de 1940.
Edgar Werner Osterroht
Arquiteto que projetou a fonte luminosa da praça Raposo Tavares. É o único funcionário do
setor de engenharia da CMNP vivo.
Pastor Nilton Tuller
Pastor da Igreja Movimento para a Libertação de Vidas (Molivi). Fundou o Templo Aberto
em 1975.
Clóvis dos Santos
Engraxate na infância. Trabalhou na praça Raposo Tavares e relata momentos emocionantes
da vida na praça.
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Onofre Bento Corradini
Balconista da Casa Paratodos antiga loja de materiais de construção instalada em frente a
praça.
Clarice Álvares Grandi
Aposentada, conheceu o marido na praça Raposo Tavares.
Giuvencio Aurélio Pereira
Vendedor ambulante na praça Raposo Tavares, onde permanece atualmente.
Cronograma de Produção
Agosto Setembro Outubro Novembro
Captação de
internas e
externas
X X
Captação de
depoimentos
X
Gravação de
locução (off)
X
Edição X
Confecção de
arte final
X
X
Após a etapa de pré-produção a etapa de produção do vídeo documentário
teve início. As tomadas foram realizadas em diferentes locais, estes foram selecionados
levando em consideração aspectos do próprio entrevistado. Por exemplo, no caso do pioneiro
Izaltino, a entrevista foi realizada em frente ao Cine Teatro Plaza que ele mesmo ajudou a
construir. Em outro caso o de seu Clóvis, que era engraxate na praça, o relato foi feito no seu
atual ponto de trabalho. Só para citar estes dois casos.
Como já explicado acima os close ups foram utilizados como forma de criar
uma relação de intimidade entre o telespectador e o entrevistado. Assim foram alcançados
exatamente aquilo que era pretendido com o trabalho, expor as emoções, os sentimentos mais
profundos que sequer poderiam ser reproduzidos de forma fidedigna pela história.
57
O momento das filmagens propriamente ditas é extremamente importante,
não só porque é aqui que se estreita a relação documentarista-intervenientes,
mas também, porque o material recolhido é decisivo para o filme final. O
momento em que se liga e em que se desliga a câmera de filmar condiciona a
fase seguinte - a pós-produção (PENAFRIA, 2001, website).
Nesta seção não se aprofundará sobre as personagens e suas características,
visto que o próximo capítulo fará uma síntese e uma análise das histórias dos pioneiros.
Roteiro da edição das imagens
OFF1: O TEMPO PASSOU DEPRESSA /// MAIS DE SEIS DÉCADAS DE TRABALHO,
INVESTIMENTOS E SONHOS / ///A MARINGÁ DO BARRO //DAS MATAS ESTÁ NOS
LIVROS, NOS MUSEUS E NA MEMÓRIA DOS PIONEIROS /// DESDE OS PRIMEIROS
PASSOS RUMO AO PROGRESSO, A PRAÇA RAPOSO TAVARES FOI O PALCO PARA
OS ACONTECIMENTOS MAIS IMPORTANTES NO DESENVOLVIMENTO DA
CIDADE /// ALGUMAS TESTEMUNHAS DESTA HISTÓRIA GUARDAM AS
LEMBRANÇAS MAIS RARAS...
SEU IZALTINO CHEGOU AQUI NA ADOLESCÊNCIA EM 1945 / NA ÉPOCA ERA
AUXILIAR DE CARPINTEIRO E NÃO DEMOROU MUITO, SE TORNOU UM DOS
FUNCIONÁRIOS DA COMPANHIA DE TERRAS NORTE DO PARANÁ /// EMPRESA
RESPONSÁVEL PELA COLONIZAÇÃO DO NORTE DO ESTADO // HOJE COM 83
ANOS AINDA RECORDA DOS PRIMEIROS ANOS VIVIDOS NO ACAMPAMENTO
MONTADO EM FRENTE A PRAÇA....
SONORA: IZALTINO MACHADO – PIONEIRO DE MARINGÁ
OFF2: ONOFRE CORRADINI PISOU PELA PRIMEIRA VEZ EM SOLO
MARINGAENSE EM 1951 AOS 8 ANOS / NA ADOLESCENCIA COMEÇOU A
TRABALHAR COMO VENDEDOR NA CASA PARATODOS QUE FICAVA EM
FRENTE A RAPOSO TAVARES / ATRÁS DO BALCÃO, ENTRE AS DÉCADAS DE 50
E 60 TESTEMUNHOU OS FATOS MAIS INUSITADOS QUE POUCOS TIVERAM O
PRIVILÉGIO DE VER...
SONORA: ONOFRE B.CORRADINI – BALCONISTA
OFF3: JUVENCIL PASSOU A PARTE DA VIDA TRABALHANDO NA RAPOSO //
PRIMEIRO COMPROU UMA FROTA DE CARROÇAS PARA TRANSPORTAR
PESSOAS /// O PONTO DE TAXI FICAVA EM FRENTE A PRAÇA /// A PARTIR DA
DÉCADA DE 70 PASSOU A TRABALHAR COMO AMBULANTE // DEPOIS DE 63
ANOS AINDA PERMANECE NO MESMO PONTO ///
SONORA> GIUVENCIO A. PEREIRA - APOSENTADO
OFF4: JA PARA O CLOVIS, RAPOSO TAVARES FOI O PRIMEIRO LOCAL DE
TRABALHO AOS 12 ANOS // ALÉM DE GANHAR O DINHEIRINHO PARA AJUDAR
A FAMÍLIA, O ENGRAXATE GARANTE QUE SE DIVERTIA...
SONORA> CLOVIS DOS SANTOS - ENGRAXATE
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OFF5: FOI AQUI QUE DONA CLARICE ENCONTROU O GRANDE AMOR DA VIDA DELA
COM QUEM TEVE 4 FILHOS/// O BANCO DA PRAÇA ERA LOCAL DAS RODAS DE S E
BRINCADEIRAS COM OS AMIGOS...
SONORA: CLARICE ALVARES GRANDI – APOSENTADA
OFF6: COM O PASSAR DOS ANOS, A PRAÇA GANHA NOVO FORMATO /// NA DÉCADA DE
70, AS IGREJAS EVANGÉLICAS QUE SE CONSTITUIAM NA CIDADE, PERCEBERAM UMA
FORMA DE DIFUNDIR AS RELIGIÕES // EM 1975 O PASTOR NILTON TULLER INAUGURA O
TEMPLO ABERTO NA RAPOSO TAVARES....
SONORA: NILTON TULLER – PRESIDENTE DA ORDEM DOS PASTORES DE MARINGÁ
OFF7: PARA EDGAR, O RELACIONAMENTO COM A PRAÇA FOI PROFISSIONAL ///RECÉM
FORMADO NA ALEMANHA VEIO COM A FAMÍLIA A MARINGÁ // A PEDIDO DO PREFEITO
AMÉRICO DIAS FERRAZ CONSTRUIU A FONTE LUMINOSA ...
SONORA : EDGAR OSTEAROT – ARQUITETO
OFF8: A RAPOSO TAVARES FOI O CENÁRIO DE UMA GRANDE TRAGÉDIA /// O PRIMEIRO
ACIDENTE DA ESQUADRILHA DA FUMAÇA, ONDE MORRERAM 2 PILOTOS DURANTE AS
APRESENTAÇÕES...
OFF9: A PRAÇA AINDA PRESERVA ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DO PASSADO // É UM
LOCAL DE GRANDE CIRCULAÇÃO DE PESSOAS E REALIZAÇÃO DE EVENTOS//// DÁ
ESPAÇO PARA AS RODAS DE CONVERSA DOS IDOSOS E AOS AMBULANTES // FUNCIONA
COMO UM CORREDOR PARA OS USUÁRIOS DO TRANSPORTE COLETIVO ////// NUM
PASSADO NÃO TÃO DISTANTE SE TORNOU PONTO DE PROSTITUIÇÃO E USO DE
DROGAS.
E ASSIM, EM TORNO DA PRAÇA, QUE A CIDADE CRESCE, QUE A HISTÓRIA ANDA E
MUNDO GIRA....
59
6 ANÁLISE DAS MEMÓRIAS DOS PIONEIROS
Ser pioneiro é chegar primeiro, é um substantivo masculino proveniente do
termo em francês pionnier e significa alguém que é o primeiro a abrir caminho através de uma
região mal conhecida. Também pode ser um termo que designa um precursor, um desbravador
ou descobridor e está relacionado costumeiramente a aqueles que chegaram à determinada
região de uma cidade, estado ou país. Além disso, os pioneiros podem ser considerados
testemunhas da história, e isso tem um significado muito peculiar, pois são estes que vão
carregar por determinado tempo às lembranças de determinado local.
Com o passar do tempo, as gerações seguintes também conhecerão estas
histórias, mas já se terá perdido alguns fragmentos que só aqueles que viveram estes
momentos podem contar ou relatar, pois as lembranças são individuais e pessoais, e os
significados também, o que significa para um não significa da mesma forma para outro e vice
e versa. Daí a importância da documentação da história e principalmente do ponto de vista de
quem a fez, pois quem melhor para contar uma coisa senão quem a viveu?
Depois de meses de conversas, pesquisas, histórias tristes, alegres, lágrimas
e risos, a praça Raposo Tavares sob a ótica dos pioneiros maringaenses é um lugar que deixou
saudades e motivo de orgulho para pessoas como seu Izaltino Machado que aos 83 anos tem
ansiedade em contar a sua história, principalmente porque este pioneiro é um dos poucos que
participaram do processo de colonização de Maringá que ainda vive. Ele que foi carpinteiro
da CMNP conta que, no início a vida no povoado recém desbravado, as condições de vida
eram difíceis.
Não era fácil não porque você não tinha luz, não tinha água, não tinha
médico era muita poeira você cruzava com onça toda hora no meio da cidade
aí porque era mato os quatro lados só via onça bicho brabo então cê não
tinha aquele um lazer não tinha prazer nenhum cê não tinha pra onde ir, não
tinha pra onde ir, cê tinha que ficar no acampamento e trabalhar e a noite ir
pra rede dormir, dormia na rede, naquele tempo não era cama, era rede,
acendia um fogo pro lado de fora e largava o fogo aceso onça não atacava
não. Tinha bastante gente tudo armado tudo tinha cartucheira espingarda não
tinha problema não nenhum (Apêndice, p. 73).
Relevante do ponto de vista histórico como o lugar do lançamento da pedra
fundamental da cidade, economicamente importante, pois fazia e ainda faz parte do Eixo
Monumental de Maringá, ou seja, toda a extensão da avenida Getúlio Vargas, antiga avenida
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Ipiranga, até chegar a praça é permeada por bancos, lotéricas, igrejas, correios, entre outros.
Na questão do lazer, no entanto, algumas características estão apenas nas lembranças, isso
porque, na década de 1960 a praça perdeu uma de seus atrativos, a fonte luminosa. Seu Clóvis
dos Santos lembra que,
a praça Raposo Tavares era uma praça bonita pra nós na época, encantada
porque, o que mais aparecia aqui tinha os bancos lá pra gente sentar o
pessoal sentava e conversava e tinha aquela água colorida da fonte luminosa
que jorrava todas as cores o pessoal andando ali e conversando era a alegria
nossa tá conversando correndo brincando na praças as família tudo
(Apêndice, p. 67).
Além disso, o crescimento da cidade causou um processo de
descentralização, quando a população passou a se concentrar na periferia da cidade,
abandonando as praças centrais. Com outros atrativos como a Televisão, a Internet, o aumento
da violência e as próprias mudanças sociais causaram um esvaziamento das praças que
deixaram de ser espaços que podiam ser visitados e contemplados. Atualmente a Raposo
Tavares é local de prostituição, venda e consumo de drogas como revela com tristeza o ex-
balconista da Casa Paratodos seu Onofre Corradini.
Quando eu chego lá (praça Raposo Tavares) a decepção que é hoje, cê vai ali
hoje não dá nem pra falar o que tem lá só marginal tudo o que não presta tem
lá, se quer arrumar briga você vai lá, se quer arrumar um pistoleiro, se vai lá,
se que arrumar um marginal você encontra, o que você precisar de ruim
encontra ai. E antes não, era um prazer chegar na praça e tal, hoje em dia é
isso aí. A noite por exemplo você não pode passar sete ou oito horas, é
homem e mulher tudo quanto é porcaria ali (Apêndice, p. 70).
Quase unanimidade entre esses pioneiros é este sentimento, decepção,
muitos se emocionam ao lembrar de como era a Raposo Tavares, das amizades, das conversas
das famílias e dos momentos de lazer. Há pessoas que formaram família e construíram suas
vidas tendo a praça como cenário. Entre elas está dona Clarice Grandi, que se sente
privilegiada por ter vivido momentos importantes de uma época que segundo ela não volta
mais.
Ah eu tenho assim uma lembrança e saudade. O mato é tão gostoso e deixa o
ar bem fresquinho. O mato tem cheiro e eu tenho saudade disso. A minha
lembrança maior e essa aí porque era muito bom a gente passar ali e
encontrar um amigo e conversar e sentir aquele cheio das árvores. As árvores
‘invertia’ água hoje nós temos esses bosques coitadinhos nem cheiro não tem
mais de tão judiado que tá nossos bosques (Apêndice, p. 84).
61
Dona Clarice viveu os momentos de sua adolescência tendo aquele espaço
como diversão e lazer, mas algo mais especial faz com que a praça seja mais importante ainda
para ela, pois foi ali que encontrou o seu marido, com que construiu sua família e vive
atualmente. “Às vezes o namoro dava certo, às vezes não dava certo. Como o meu deu certo,
mas dali saiu muitos casamentos depois que começou lá na praça a namorar e casaram”,
(p.85).
Porém mais que um local de lazer a Raposo Tavares era também para muitos
ambiente de trabalho, movimentada pela linha ferroviária que trazia passageiros das mais
diferentes regiões do país, era o “cartão de visitas da cidade”, há até o registro de um cartão
postal da praça. Pessoas como o seu Geovencio que levava pessoas de charrete,
pra todo lugar. Sítio, zona, casa, morangueira. Tinha umas casinhas lá no
fundo da Morangueira. No Maringá velho não tinha nada. Levava nos
carreadô, levava no Borba gato, era fazenda. No Guaiapó, na Mandacaru.
Uma vez um tinha fábrica de doces, enchia a charrete de doces e entrei ali
por Atalaia e saí em Pulinopolis. Voltei e entrei ali por Mandaguaçu. E
quase matei a eguinha. Eu não sabia a estrada. Era tudo barro, terra. Ia pra
são Jorge vender doce de charretinha (Apêndice, p. 87).
Há outros aspectos da Raposo Tavares que ficaram perdidos no tempo e um
desses é o acidente com a esquadrilha da fumaça em 10 de maio de 1957, no décimo
aniversário de Maringá. As comemorações cívicas iniciais eram realizadas todas na praça, que
era um centro de aglomeração como citado acima e também um ponto de encontro, por isso,
estava lotada neste dia festivo. Este acidente é uma marca presente na memória de quem
esteve na celebração, como o engenheiro e arquiteto Edgar Ostearot.
O cara não enxergou o mastro da bandeira e cortou um pedacinho bem
pequeninho. Não foi a asa inteira, ou metade da asa. Foi só um redondinho
assim. Aí ele subiu e “pô, pô, pô, pô e pufff”! Porque ele perdeu o equilíbrio.
Se ele tivesse ido reto, ele não quis ir reto porque ele pensava cair em cima
do trem, e o trem estava lá cheio de gente. Ai tinha 500 mortos ou coisa
assim. Como o cara foi pra cima e desceu e caiu uns 5 metros, 10 metros do
trem que estava cheio, explodiu o avião era tudo em pedaço tinha pouco de
fumaça. Porque lá no quintal da Companhia eu vi tudo lá ai eu sai de lá e fui
um dos primeiros que chegou lá eu tinha medo de chagar perto porque os
tanques de gasolina podia explodir ai se vai junto (Apêndice, p. 83).
Já na década de 1970, precisamente em 1975 a praça Raposo Tavares passa
por um processo de revitalização por parte do poder público e ganha um aspecto moderno
mantido atualmente, neste novo plano, no local onde estava localizada a fonte luminosa passa
62
a existir o Templo Aberto, inaugurado naquele ano. Esta iniciativa foi movida pelo pastor da
Igreja Presbiteriana Renovada da época, Nilton Tuller, o que representa uma mudança total na
atividade da praça. Os cultos ainda são realizados neste local, mas o público diminuiu
consideravelmente como revela Tuller.
Muita gente, muitos carros, muita gente muitos carros porque muitas pessoas
também iam lá para levar as pessoas que se decidiam né porque muitos se
decidiam para... Eu me lembro de uma vez que eu contei 100 pessoas adultas
ajoelhadas e nós orando por 100 pessoas adultas ali. E a inauguração daquilo
ali foi uma coisa linda demais porque nós tivemos ali mais de 5.000 pessoas,
estava ali o Silvio Barros estava ali o Dom Jaime né o Dom Jaime Luiz
Coelho, muita gente muitos convidados que estavam ali (Apêndice, p. 77).
A ausência de iniciativas de conservação e também a mudança de costumes
da sociedade fizeram com que a Raposo Tavares perdesse seu status de lazer, por isso, muitos
destes que foram entrevistados choravam diante das câmeras ao se lembrarem da vida naquela
época. As condições precárias faziam que aflorasse nas pessoas um sentimento comum de
amizade e solidariedade compartilhado pela maioria dos personagens revelando que naquela
época a palavra comunidade era vivida no sentido real da palavra, as pessoas se ajudavam e se
compadeciam da situação do outro que estava necessitado, mas, além disso, a união envolvia
as diversões sem malícia ou má intenção, isso provocado talvez pelos pistoleiros comuns na
região nesta época. Contudo os aspectos supracitados revelam que a Raposo Tavares é e
sempre será um local importante para Maringá, basta apenas um olhar mais atento e curioso
para revelar que sua história se mistura com a da cidade e por sua vez também com a desses
pioneiros.
Levadas em consideração todas as histórias é perceptível a acentuação da
memória coletiva, ou seja, a maioria tem histórias sobre a fonte luminosa ou sobre a queda do
avião da Esquadrilha da Fumaça, do lazer na praça ou mesmo da convivência das pessoas. Por
mais individuais que sejam estas experiências, elas fazem parte da totalidade da história.
Como apenas um tijolo não pode dizer que é uma casa, mas muitos se pode construir um
palácio, da mesma forma uma história é incapaz de revelar o todo, mas muitas podem contar
como se construiu uma cidade, uma praça, um bairro, um estado e um país.
63
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste estudo foram trabalhadas as memórias individuais de pioneiros sobre
a praça Raposo Tavares, por meio da técnica de História Oral, aliado a isso o
desenvolvimento da cidadania pela participação ativa destes atores sociais. Por meio de
entrevistas foram registradas as lembranças do período de colonização, a origem de Maringá e
da praça Raposo Tavares. Os pioneiros legaram um documento, contaram a própria história e
contribuíram para a construção do acervo histórico. A História Oral destes idosos foi captada
na forma de vídeo documentário e a produção foi realizada levando em consideração as etapas
de entrevistas dos idosos.
As gravações priorizaram os relatos dos acontecimentos, que o personagem
presenciou vivenciou na Raposo Tavares, além de outros períodos históricos que tiveram
instantes relevantes para a cidade e que envolvem o espaço. Esta pesquisa foi responsável por
uma práxis desenvolvida a partir dos conhecimentos adquiridos na graduação. Dentre estes
pode-se destacar a pesquisa de campo e de fontes, análise de documentos históricos, apuração
de dados, seleção das informações relevantes e a produção e edição do vídeo documentário.
A pesquisa também é uma contribuição à cidade de Maringá para que a
preservação dos espaços públicos e também a importância da participação dos atores sociais
no registro da história cidade. Percebeu-se também que neste processo de diálogo o fato de
serem consultados e solicitados era uma alegria e uma satisfação, todos os pioneiros sentiram-
se satisfeitos em ficar defronte à câmera e expor suas lembranças, muitos até se emocionaram.
No tocante aos objetivos propostos, visto que foram prestados os
esclarecimentos acima, entendemos que eles foram alcançados, pois o fato de buscarmos além
das fontes oficiais a história da Raposo Tavares, reflete o cerne do trabalho de pesquisa de
solicitar cidadãos comuns e convidá-los a participar do registro histórico. Portanto,
acreditamos que contribuímos também para que estes pioneiros e atores sociais dessem a sua
contribuição para a sociedade maringaense.
Esperamos que esta pesquisa seja um complemento, mas também uma
reflexão que remonte uma preservação do bem público e dos locais históricos para que a
posteridade saiba a importância de tais lugares. É salutar reconhecer que as praças perderam
em parte suas funções iniciais de ambientes de lazer e de passatempos, que não eram somente
aos fins de semana, mas durante a noite também, e, principalmente a Raposo Tavares, sofreu
com tais alterações, mas é preciso lembrar que ela é o lugar do início de Maringá,
64
historicamente, economicamente e socialmente, ela tem muito a revelar aos maringaenses
bastando um olhar mais atento.
Aspiramos que este estudo possa despertar também outras pesquisas
semelhantes contribuindo para a disseminação do conhecimento e da práxis, pois dessa forma
é possível legitimar os conhecimentos e contribuições que todo acadêmico tem com a
sociedade. A graduação como processo evolutivo visa também despertar esta faculdade de
transformar o indivíduo para que ele se torne um cidadão ativo e reflexivo, portanto, ao
término deste trabalho ponderamos que agimos nestes dois sentidos contribuímos para o
desenvolvimento da sociedade, do bem estar comum e da cidadania, todavia percebemos que
a nossa participação refletiu no crescimento acadêmico, pessoal e como seres humanos
participantes da sociedade.
65
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67
8 APÊNDICE
8.1 Entrevistas dos pioneiros
Clóvis dos Santos
Maringá quando eu vim era uma criança tava nascendo ainda tinham três
prédios em Maringá só praticamente tinha centro uns três quatro bairros tudo era mato, barro,
buraco. Agora com o passar de uns três quatro anos foi melhorando, assim, restaurando as
praças aí já fizeram uma fonte luminosa na Praça Raposo Tavares deram uma organizada nela
fizeram uma fonte luminosa que jorrava luz agua colorida, aí as pessoas já vinham ali pra se
divertir pra ver aquela água colorida que era uma coisa linda na época encantava todo mundo
né as famílias se confraternizavam, conversavam ali, sempre vinham durante a noite pra
andar, naquele tempo não tinha perigo, não tinha roubo, não tinha ladrão, não tinha esse
problema de droga então era tudo família tudo gente boa em Maringá.
Era uma grande alegria que a gente criança tudo era bom, mas aquela época
parece que as pessoas eram diferentes, eram muito amável, muito amigas assim, não tinham
essas desconfianças, esse negócio de fazer coisa errada, era tudo... Conhecia uma pessoa era
como se fosse um irmão uma pessoa da família e todos se reuniam ali as famílias
conversavam. Brincar as crianças ficavam brincando os pai o pai e a mãe contando histórias
68
falando sobre a vida se divertindo com aquelas fonte luminosa. Apareciam umas pessoas
fazendo tipo palhaçada brincadeira um tipo assim de um teatro e outros que fazia
apresentando capoeira, dança coisa assim era bem animado aquele....
As pessoas conversavam como se fossem assim uma pessoa da família a
gente engraxava o sapato deles conversando e sempre tinha dois três ao lado daquele cliente
conversando com ele também falando sobre a colheita falando sobre o que ele tinha feito ali
na roça e tinha vindo pra cidade fazer alguma coisa era sempre histórias assim da roça do
trabalho do boi que aconteceu lá e vinha pra cidade pra ver as novidades da cidade também
eles vinham pra ver o circo o pessoal vinha pra ver... O que tinha aquele tempo era circo e
parque infantil, esses parquinho de dar tiro ao alvo jogar argolinha nas garrafa e o circo
encantava a meninada, o palhaço aquelas coisinha de festa.
A maior parte assim era as pessoas da roça que vinha, fazendeiros eram
muito simples andavam com aquelas botas sujas de barro tudo e alguns empresários da
cidade na época era muito pouco que tinha mas tinha dono de cinema tinha o pessoal da
prefeitura que já tinha e vinha engraxar com a gente, a gente nem tinha na memória que era o
prefeito que era o secretário era ratado como irmãos como pessoas amigas assim atendia
normal engraxava o sapato tudo dando risada alegre contente era desse jeito assim
Os sapatos era mais difícil porque os sapatos daquela época era tudo
botinona sapatão chamava sapatão tinha o nome tal de gostosão eles falava um sapatão grosso
bem grosseiro e tinha umas bota sanfonada o pessoal vinha do sítio com aquelas botas
sanfonada aí vinha cheia de barro, barro estrume de boi de cavalo tinha que lavar bem
lavadinho com água, limpar e depois engraxar, a gente engraxava contente porque as botas
rendiam davam um dinheiro a mais também era mais esses sapatos que tinha, era tudo bota até
galocha tinha uma tal de galocha eles ponhavam quando tinha barro sujava ponhava pra sair
da chuva e não molhar por cima do sapato aí tirava engraxava e ponhava de novo.
Só boas lembranças viu a gente... na época eu lembro que tinha até um trem
de ferro depois a gente pegava o trem ia pro lado sei que é pro lado de Paiçandu não sei pra
onde a gente ia até um certo lugar não sei se é Água Boa por ali ia e ia tudo pra brincar
passear conhecer ia famílias aos domingos ia voltava depois. A gente brincava muito naquele
tempo corria atrás de passarinhos era criança ainda usava o tal de estilingue para dar pedrada
nos passarinhos, hoje que nem pode pensar nisso né aquele tempo à gente fazia isso.
A praça Raposo Tavares era uma praça bonita pra nós na época, encantada
porque, o que mais aparecia aqui tinha os bancos lá pra gente sentar o pessoal sentava e
conversava e tinha aquela água colorida da fonte luminosa que jorrava todas as cores o
69
pessoal andando ali e conversando era a alegria nossa tá conversando correndo brincando na
praças as família tudo. Da praça mesmo além daquela fonte luminosa aquelas luzes colorida é
uma vez que veio assim... aquele tempo tinham muitos tropeiros carregava cavalos boi assim
e o pessoal parou por ali ( emocionado seu Clóvis chora) parou os rapaz engraxou uma bota
um negócio lá e ficou uns vários cavalos assim lá aqueles tropeiro naquele tempo a gente
achava encantador diferente aqueles tropeiro tudo vestido a rigor tudo assim com vários
cavalos bastante mesmo as meninada tudo encantada alegrada de ver os cavalos mexendo com
os cavalos aquilo lá fica sempre marcado (emoção).
O dinheiro que a gente pegava naquela época era a gente levava tudo pro pai
tinha que levar pro pai e a mãe pra ajudar em casa aí o pai dava um dinheirinho no domingo
pra gente ir no matinee tinha o cine Maringá e tinha o cine Horizonte nós ia muito no cine
Maringá aqui do Silvio Wainer na (avenida) Getúlio Vargas tinha um matinee a tarde e agente
pegava um dinheirinho pagava pouquinho pra gente ir no cinema aí só ia no cinema chupava
um sorvete e depois voltava a trabalhar novamente era sempre assim a vida aqui.
Onofre Corradini
Lembrança que eu tinha era o povo que passava ai a gente ficava entretido
em vender querendo vender chamava atenção tudo que passava pra gente era novidade a
70
gente era novo na cidade então aqueles camarada vinha assim aquelas negaiada aqueles peão
e tinha até medo naquela época porque não conhecia ninguém né a cidade estava crescendo
então ficava com medo então só ficar de olho pra lá e pra cá e vendia porque as pessoas que
vinha tava derrubando tora comprar facão, enxada. Não vinha aqueles almofadinha de
gravata, não vinha nada disso, tava meio sujão, a gente ficava assim de olho pra lá e pra cá né
a gente ficava bastante de olho a gente não era acostumado vinha do Estado de São Paulo e
esse povo assim, a gente tinha medo será que era pistoleiro? Algum marginal, por isso a
gente ficava de olho.
Lá tinha o capim margoso que era o tamanho de mais um metro de um
metro tinha vinha o parque e ficava uma semana ou mais e ia embora aí vinha o circo e ficava
uma semana. Até o maior circo que vi na minha vida foi o circo Garcia tinha um cachorrinho
a coisinha mais linda. Então ia embora o circo e vinha o parque depois tinha o ringue teve luta
livre montaram um ringue de luta para ao camarada de fora e lutar com um fulano, mas era
muito ruim só tinha um lutador em Maringá que era o professor de um colégio acho do Gastão
Vidigal. Só o maio o calção, sem camisa, sem bota, sem nada, não é que nem essa luta que
tem hoje era luta livre. Lotava anunciava tinha luta até as dez, acendia as luzes a noite e o pau
comia ali e ele desafiava: “tem alguém pra lutar comigo?” Tinha uns curioso aqui uns
camarada que subia pra lutar com ele e saia no pau lá o cara era corajoso encarava mesmo não
tinha medo não. Você tirava a roupa ficava de calção e lutava Aquele juizinho que tinha aí
dizia deu acabou. Não saia briga porque o pessoal andava armado né, só pistoleiro.
Ali teve uma toreada então eles pegaram uns bois uma época, sabe aquelas
bancada de madeira e tal o boi resolveu pular e veio por um lado e quebrou uma cerca e só
veio nego por aqui, por aqui, por aqui ó, ainda bem que depois o boi parou lá, não teve mais
problema e pegaram o boi deu tudo certo. Não ficou um lá dentro o bicho bravo, depois ele
viu tanta coisa que ele chegou até parar.
O circo era festa. Anunciava ali na praça, Maringá tudo vinha, moleque
velho. Molecada gosta de circo, mas não pagava, os adultos pagava entrava, mas também era
assim... Tinha muito animal, né, hoje não tem mais elefante, leão, agora é proibido, né.
Maringá toda ia no circo mas agora é outras coisas, né.
Parques não vinha muita coisa não pouca coisa de diversão vinha só 4 ou 5
barraquinhas só mais nada, a turma trabalhava muito, né, era só de sábado e domingo e
também não ficava muito tempo porque vinha muita pouca gente não dava muito dinheiro pra
eles porque ia lotar mesmo falar 500 pessoas 600 não é, então vinha aquele povinho mais ou
menos ali, então ia embora logo se o parque por exemplo ficar muito tempo na cidade não
71
dava dinheiro depois né a turma vai uma vez não vai dois é pouca gente que tinha. Agora é
muita gente agora pode ser que lota né.
Ah a turma vinha de trem... Em 50 e pouco inaugurou a linha de trem então
vinha aqueles nordestino né então a propaganda que Maringá é Café tinha trigo não tinha soja
aquele época não existia soja aqui então era mais ou menos trigo e café isso era quente então
vinha mineiros, “ah sou de minas”, “sou do nordeste”, então vinha aqueles baianada, aqueles
terra seca, que a gente falava, a gente não falava sergipano só falava baiano e pra trabalhar
tudo braçal e depois com o frio eles se mandava, né, porque acabava a colheita eles iam tudo
embora por causa do frio.
Muita gente chegando, mas chegava aqui e já tinha serviço pra ir fazer no
sítio então eles iam pro sítio e os camaradas do sítio iam para o centro da cidade e iam lá na
loja vinha lá comprar uma caixa de lima uma caixa de machado uma caixa de enxada pra
sitio tal... pra fazenda tal... e os peão que vinha não ficava quase aqui e saiam pra onde? Pro
sítio, já tinha serviço garantido então e por isso.
Vendia não falava: “me dá uma lima, me dá uma enxada” não era assim não.
“Me dá meia dúzia daquilo, uma dúzia daquilo”, era desse jeito, né, era muito serviço tinha
muito mato né, Maringá tinha muito mato depois que tirou a quissassa, mas o mato foi
cortando o machado não resolvia pra eles não tinha motosserra não tinha nada era só no
machado e no facão, essas coisas. Vendia a vontade, e não tinha nó cego, também não paga...
era mais honesto naquele tempo, naquelas épocas mais antigo era melhor, hoje não, hoje você
vai vender uma coisa daí a pouco vai levando um cano e um cheque sem fundo, naquele
tempo não tinha não, pagava no dinheiro mesmo.
Chegava o camarada de caminhão e encostava lá: “quero lona e encerado
pra cobrir e quero quanto é? quanto é?”... “É tanto!”. Tantos metros encerado era lona
encerado não era plástico não existia plástico então já pagava o dinheiro pegava a notinha
fulano de tal e tanto. Muita saudade. De tudo né... (silêncio, e emoção, seu Cláudio faz uma
pausa e as lágrimas escorrem, em seguida fala sobre o que tem, saudades) ...amizades sadias,
né, ficou pra traz, (tenho saudades) de tudo dos amigos, ambientes, futebol que a gente
jogava, né, não volta mais, né.
Tem assim quando eu chego lá (praça Raposo Tavares) a decepção que é
hoje, se vai ali hoje não dá nem pra falar o que tem lá só marginal tudo o que não presta tem
lá, se quer arrumar briga você vai lá, se quer arrumar um pistoleiro, se vai lá, se que arrumar
um marginal você encontra, o que você precisar de ruim encontra ai. E antes não, era um
prazer chegar na praça e tal, hoje em dia é isso aí. A noite por exemplo você não pode passar
72
sete ou oito horas, é homem e mulher tudo quanto é porcaria ali.
(Antes) Era uma coisa linda né aquela fonte iluminada aquela água jogava
tudo colorida verde amarela azul e caía aquela água e mulher com carrinho andando em volta
a coisa mais linda até hoje se tivesse teria bastante gente, daria bastante gente aí.
Seu Izaltino Machado
Já passaram 67 anos. Ali no acampamento eu lembro muito bem parava no
meio da peãozada a gente fala peão por que era tudo derrubador de mato né não tinha nenhum
advogado e nenhum cartorário era só tinha peão derrubador de mato então convivia no meio
deles também era peão tava no meio do mato então eu trabalhava com a companhia fazendo
as casa para a companhia esse acampamento aí pertencia a companhia então a companhia que
bancava nós ali com alimento água puxava de longe dos tambor pra nós então ficamos durante
os 15 dias até fazer a nossa casa lá na morangueira aí fomos lá pra nossa casa.
Toda a família convivia no meio da família tinha mulher casada criança
rapaz e tudo aqui conviva junto uma comunidade uma comunidade pra abrir uma cidade nos
fomos os primeiros desbravadores de Maringá.
73
O churrasco foi feito que eu citei pra você fizeram uma vala aqui no chão e
a companhia matou acho uns três ou quatro novilhos pra fazer o churrasco né a companhia
que deu a inauguração de data (terrenos/lotes) da companhia. Ela inaugurou a venda de data
(terrenos/lotes) em de maio de 1947 então houve aquele churrasco para comemoração da
companhia tanto que deu muita gente, gente de fora daqui da região fazendeiro que tinha
muita fazenda na região né então encheu de muita gente naquela época pra comer um
churrasquinho foi aqui ao ar livre churrasco uma cervejinha, um guaraná, um pão então
naquela época foi feito isso aí pra nós na praça não ao ar livre.
A fonte luminosa onde era aquela concha acústica ali, ali era a fonte
luminosa muito bonita a noite funcionava ligava lá pras 19h30, 20h ligava a fonte e ficava até
23h, 00h funcionando né tanto é que dava muita gente aqui tinha garotão gostava de andar no
meio dos colegas então gostava de fazer a passeata com eles.
Eu faço parte da história de Maringá segundo dizem por aí eu sou o pioneiro
carpinteiro o carpinteirinho da história então eu fiquei os outros já foram, já morreram,
cheguei garoto na carpintaria aperfeiçoei na carpintaria e tô aposentado hoje, mas eu
participei de muitas casas em Maringá muitas se eu for contar pra você eu conto umas 200
casas que fizemo pra companhia fizemo umas 50 só pra companhia, ela fazia e vendia, fazia e
vendia e nós trabalhamo pra companhia 4 anos então ficamo tempo de 1946 até 1950 trabalhei
pra companhia. Os primeiros móveis de escritório da Companhia foi que nós fizemos tanto é
aquela aquele shopping (Shopping Avenida Center) ali embaixo na São Paulo com a Mauá ali
era a marcenaria da Companhia isso foi em 1947/1948.
Ali convivia uma comunidade as mulheres as crianças eram tudo amigo teu,
então não tinha aquele negócio de olhar de mau na pessoa ou com mau intenção não tinha isso
não era tudo gente amigo eles confiavam muito um no outro e comia, família fazia comida e
nós comia tudo junto por que tinha a cozinheira da companhia né ela fazia comida pra nós
então era todo mundo uma comunidade, que que é comunidade? Convivia tudo junto, isso é
uma comunidade aí se via mulher com criança com adolescente com velho então uma
comunidade bem unida e nós fazia parte dessa comunidade na raposo Tavares bem ali onde é
que é o Plaza hoje. Aí fomo fazendo casa pra companhia em roda do quarteirão inteiro casa
pra companhia. Tenho saudade e muita saudade aquele tempo não volta mais e essa história
enquanto eu for vivo eu vou contar.
O livro conta alguma historia muito importante, mas não conta aquela
história real que tem gente que chegou em Maringá hoje e tá escrevendo um livro então eu
pergunto a você que história ele tem pra contar pra você? Ele tem que pegar uma pessoa da
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minha idade ou mais velho que eu, que tem a memória boa, ou um pouco mais novo e tem que
ver naquela época que eu vim em 45 cheguei em Maringá, Maringá era um traçado “aqui vai
ser Maringá”. Aqui o centro era tudo capichigui e Samambaia só, não tinha mais nada. Era
derrubado, derrubado pra você ter ideia da Tiradentes a Tamandaré da São Paulo a Paraná,
derrubado, não tinha uma casa seque, como eu mostrei no livro pra você, só aqui ó só tinha
esse acampamento nosso aqui então não tinha nada nós fomos levantando as primeiras casa a
companhia tinha serraria ela fornecia madeira né ela tinha serraria, tinha olaria, ela tinha todo
o poder aquisitivo fácil pra poder adquirir o material. A companhia ela foi uma mãe de todo
mundo, porque a companhia vendia um terreno proce pra você pagar em três quatro anos você
não pagava nem juro, ela vendia um sítio pra você derrubar se pagava em três quatro anos se
você pagava eles não tomava não continuava derrubando e pagando com a produção então a
companhia foi uma companhia idônea muito boa deixou muitas saudades pra nós aí.
Não era fácil não porque você não tinha luz, não tinha água, não tinha
médico era muita poeira você cruzava com onça toda hora no meio da cidade aí porque era
mato os quatro lados só via onça bicho brabo então cê não tinha aquele um lazer não tinha
prazer nenhum cê não tinha pra onde ir, não tinha pra onde ir, cê tinha que ficar no
acampamento e trabalhar e a noite ir pra rede dormir, dormia na rede, naquele tempo não era
cama, era rede, acendia um fogo pro lado de fora e largava o fogo aceso onça não atacava não.
Tinha bastante gente tudo armado tudo tinha cartucheira espingarda não tinha problema não
nenhum. Trabalho era bom, era novo né, tinha bastante saúde né, então não era nada difícil
pra trabalhar, era difícil se precisasse de médico tinha que ir pra Mandaguari que aqui não
tinha só tinha farmacêutico só.
Atração coisa diferente não tinha atração nenhuma na cidade né a não ser a
fonte luminosa num tinha mais nada, o cinema e a fonte luminosa mais nada. Ficavam ali em
roda batendo papo comendo pipoca, comendo amendoim, diversão do turista. Era bonito
aquelas águas colorida e jorrava água pra cima e jato d’agua e o povo gostava. Eu era
mulecão tinha 13, 14 anos não queria namorar, aí depois quando começou em frente a
Pernanbucana aquela praça Napoleão lá já era mais diferente tinha bastante banco barraca de
quermesse já era garoto tinha 17 pra 18 anos já comecei a arrumar namorada ali aí fui
namorando, arrumando uma arrumando outra até que acertei uma casei já to com 63 de
casado.
O comércio era intenso tinha a casa Ribeiro ai embaixo também que era de
ferragem muita ferragem o Ribeiro é um dos primeiros comerciante aí Francisco Feio Ribeiro
e o Manoel Ribeiro era comerciante muito forte o Azauri Pietrobom e tinha outras centenas de
75
casa que ce na hora você não alembra os nomes das casa porque era muito comércio.
A queda do avião eu lembro bem, bem ciente que eu tava no pé do mastro
da bandeira dois metros afastado e eles estava ficava bem de frente a avenida né então eles
iam atrás do outro a coisa mais bonita a esquadrilha da fumaça e um deles errou a balisa e
bateu aponta da asa do lado direito no mastro da bandeira ele bateu e subiu, mas deu uma
subida coisa rápida e caiu na Joubert de Carvalho no que ele caiu ele caiu de bico no que ele
caiu ele foi arremessado de novo aí ele caiu lá na rede ferroviária na caixa d’agua lá foi
embaixo da caixa d’agua por sorte a caixa d’agua não desmontou em cima dele caiu no lado
dos pilar né ali o fogo já tava tomado conta que quando ele bateu aqui no chão ele já pegou
fogo explodiu ai levantou uma tocha de fogo e caiu lá só que quando ele caiu já não tinha
mais nada já estava tudo foco de fogo a gasolina se espalhou e começou a se espelhar daqui
quando estava aqui e bateu.
O povo correu tudo pra lá né não podia fazer nada chegar perto de um fogo
daquele fogo intenso e aquele tempo não existia bombeiro veio o carro pipa da prefeitura, mas
jogou água apagou o fogo, mas não resolveu nada já tava morto já. E outra coisa os outro oito
avião continuou voando não pararam não fazendo o show que eles vieram fazer então eles
perdeu um na batalha, mas não desistiu da batalha achei que eles iam parar de fazer o show
mas não pararam aí subia junto assim e abria aquela cortina de fumaça os oito avião que era
de três em três três seis nove e aí ficou três três seis e dois oito os dois que perderam o
companheiro continuaram a fazer o mesmo show. Na hora eles correram pra lá mas o avião
continuo a fazer o show deles então não teve escapatória não. Achei triste porque fazer uma
festa fazer uma comemoração para o aniversário de Maringá 10º aniversário e aconteceu um
acidente daquele morreu três o piloto, o comandante e o outro da corporação.
Representa tristeza que você vinha, porque você não pode vir aqui com a
família não tem como você frequentar aqui mais então se tornou uma praça abandonada e só
dá pessoa... Aquele tempo era bom que só tinha gente sadia, pessoas honesta, gostava de
conviver com a gente então você tem aquele triste passado de hoje com aquele bom passado
de antigamente esse que a gente lembra daquela época.
Tenho mais saudade do tempo que eu era jovem namorava gostoso hoje
você casou tem bastante filho pra cuidar bastante neto bisneto então a responsabilidade é
outra naquele tempo se é solteiro namorava chegava em casa tomava seu banho ia jantar
levantava de manhã cedo ia trabalhar o meio de vida já era melhor você já tinha o lugar de
morar tinha sua água encanada tinha a sua energia elétrica, não é como você começou aqui no
começo e lamparina, lampião, vela não tinha mais nada.
76
Não tinha como tomar banho tomava banho de caneca não tinha chuveiro,
fazia um quadrado de madeira aí é nosso banheiro então você tomava banho de balde
pendurava um balde tinha um crivo no fundo dele aí você abria a torneira caia a aquela água,
só aquele balde d’agua, acabou a agua acabou o banho. (Se viesse a onça ) tinha que sair do
banheiro correndo, mas ela não vinha não ela passava de longe que ela via o fogo aceso a
onça não ataca a onça não te ataca você de frente ela te ataca de traição, você vai andando ela
vem atrás de você ela pula em você, nós pioneiro não somos pioneiros somos resto de onça
que a onça não comeu nós.
O escritório da Companhia era aqui em frente nós trabalhava pra companhia
fim de semana você vinha receber o salário aí então a praça aqui era um lugar que vc convivia
todo dia passava por aqui ia para o trabalho então aqui era o lugar que se conviveu mais aqui
depois saiu a Napoleão mais foi bem depois, saiu uns quatro anos depois, lá eu também
conhecia bastante a Napoleão lá também tinha bastante atração bastante atração alto falante
música barraca de quermesse, bastante coisa pra comer, pra você beber então já era... era só
vc ter o dinheiro era o que não faltava no bolso.
Vinha aqui ver a fonte comer pipoca, amendoim torrado, era isso aí... era
daquela época era o povo da cidade mesmo povo muito ligado um com o outro vinha pai
vinha filho mulher tudo, ver a fonte aí era um povo bem aconchegante, não tinha problema.
Era um centro que era a única praça de Maringá aí depois foi saindo outras
praças, mas já bem depois essa aqui é a primeira praça. Nossa Todos os maringanese a
rodoviária lá nós embarcava lá e vinha pra cá aquele tempo não tinha asfalto era tudo terra
tudo poeira barro então não tinha asfalto não tinha tempo chegava em casa tomava banho e ia
dormir não tinha tempo ruim não.
77
Pastor Nilton Tuller
Ali era o centro de aglomeração maior por causa da rodoviária então e a
rodoviária não tinha campo, não tinha aviação aqui né... então a rodoviária era o centro e
também aquela praça era um centro de famílias também, muitas famílias vinham para ali pra
passar as tardes porque naquele tempo era um lugar que.. a mesma praça né naquele lugar
naquele tampo as praças podiam ser frequentadas pelas famílias e tal. Então tinha ali muito e
também tinha muito esse negócio de... daquelas pessoas que vendem as na praça como chama
camelôs então era um centro de aglomeração e também a passagem normal ali tinha a
ferroviária, então tinha a ferroviária com trens de passageiros, então tinha tudo ali pra ser um
lugar central pra gente montar um templo aberto.
Muitas histórias, mas pelo menos duas histórias uma dum camarada que
chegou lá e depois que eu fiz o meu, meu discurso inflamado o nome da, da, do meu trabalho
era... era o que? Era A Hora da Verdade, então meu trabalho era bem inflamado, a gente
falava... hoje não se pode falar, mas a gente falava muito contra, idolatria contra, contra
políticas, contra isso contra aquilo, contra drogas, principalmente, e um rapaz encostou, um
senhor com chapéu grande encostou uma faca no meu umbigo lá e meu cabelo cresceu um
pouco na hora, mas logo passou e ele acabou.. era uma prova que ele estava fazendo se eu
tinha coragem de falar aquilo ali na frente dele e ele acabou chorando pedindo oração e eu
orei por ele.
78
E um outro que ficou alguns meses olhando pra mim lá e que eu não sabia
não esboçava nenhuma reação e um dia ele disse que queria ir a nossa igreja foi e lá ele me
disse que fazia quase quatro meses que ele estava indo a praça para me matar, eu não sabia
nada disso, mas que aquele dia ele queria entrar pra igreja e queria ser batizado no próximo
domingo e tal e eu acabei indo sozinho com ele na água Maringá fiz o batismo dele e depois
ele chorando disse que tinha um problema do coração tinha sido picado pelo bicho barbeiro e
que ia morrer logo ele se tornou um diácono da igreja e mais tarde morreu sozinho e foi
achado depois de cinco dias já em estado de decomposição.
Eu começava... eu começava o programa: “aqui está um pregador que não
tem medo de nada e não tem medo de ninguém. Um pregador que não tem medo do próprio
diabo” quase todo dia isso aí era o jeangle, isso aí era quase para a introdução da mensagem
então eu chegava e falava isso aí e isso aí de certa forma incomodava, incomodava muita
gente né e eu falava inclusive contra pastores que exploravam as pessoas que ficam aí para
ganhar dinheiro fosse hoje seria mais fácil porque hoje o campo é maior né quantos pastores
estão aí com aviões helicópteros, com fazendas, com tanta coisa, não é? Mas naquele tempo...
Eu falava contra todo tipo de coisa seja de uma igreja ou de outra, que eu visse que tinha
exploração para o povo então eu falava isso aí e isso incomodava.
Muita gente, muitos carros, muita gente muitos carros porque muitas
pessoas também iam lá para levar as pessoas que se decidiam né porque muitos se decidiam
para... Eu me lembro de uma vez que eu contei 100 pessoas adultas ajoelhadas e nós orando
por 100 pessoas adultas ali. E a inauguração daquilo ali foi uma coisa linda demais porque nós
tivemos ali mais de 5000 pessoas estava ali o Silvio Barros estava ali o Dom Jaime né o Dom
Jaime Luiz Coelho, muita gente muitos convidados que estavam ali.
Tem que representar para igreja um saudoso passado não é? a gente olha
pra aquilo ali para uma namorada que não é mais sua, não é?, mas que você ainda contempla
aquilo ali muitas vezes eu olho e tenho muita tristeza porque aquilo ali era muito bonito,
aquilo ali era muito iluminado e com muita música a noite né depois das 18h... Porque havia
várias Igrejas que faziam uma atrás da outra e eu aproveitava a garupa da Assembleia de
Deus, porque a Assembleia de Deus fazia um trabalho ali com a banda de música muito lindo
e quando acabava eu já pegava um pouco do povo da Assembleia de Deus e juntava mais um
povo ali para isso, então eu olho para... E também é uma perspectiva passada e futurista
também porque eu tenho um sonho ainda de ver aquela praça e ver o Nilton Tuller e outros
pastores ali em cima daquele palco ali falando de Jesus.
79
Naquele tempo era um tempo que havia uma história de avivamento
espiritual em toda essa região principalmente em Cianorte era a meca do avivamento
espiritual então as Igrejas tradicionais estavam se avivando muito e claro caiu isso aí até na
Igreja Católica e nasceu o movimento carismático na igreja católica então havia uma sede
disso e também havia um pouco mais de fidelidade dos fiéis aqueles fiéis eram daquela igreja
daquela igreja, aqueles daquela igreja daquela igreja. Hoje há muitas profetadas por aí e
muitas, muitas coisas enganosas e o povo muito oferecimento com marketing e então isso
hoje, isso hoje às vezes há um pouco de comichão nos ouvidos a pessoa vem pra igreja e a
porta de entrada da Igreja é às vezes é do mesmo tamanho da porta da saída lá dos fundos o
elemento fica aí uns seis meses um ano e depois vai pra outra igreja então há uma miscelânea
uma confusão.
Os primeiros trabalho que eu fiz aqui foi em frente a praça da prefeitura,
mas nós tínhamos alto falantes e eu não queria incomodar a Igreja Católica que ficava muito
próximo então isso aqui... e logo, logo me instalou de que ali não era o melhor momento pra
eu fazer um trabalho principalmente que não existia trabalhos quase nas praças aqui, né.
Então o Airton Justos que foi um dos primeiros aqui de Maringá da Igreja Missionária ele foi
pioneiro em trabalhos de praça aqui isso é uma coisa é uma dívida que a gente tem com o
Airton Justos sabe? E ele fazia também naqueles lugares ali. mas depois a gente viu que a
gente podia aglutinar duas coisas boas primeiro a movimentação da ferroviária, da rodoviária
tudo ali na praça Raposo Tavares e Casa Pernanbucanas e Casa isso, aquelas primeiras casas
de muito movimento e segundo que a gente distanciava um pouco da Igreja Católica pra que a
gente não pudesse incomodar a Igreja Católica, que eu respeito, e que não deveria ser um
incômodo ali pra Igreja Católica esse foi o motivo principal que eu namorei a praça Raposo
Tavares.
Eu ficava mais contente na praça Raposo Tavares do que dentro da Igreja ali
era um negócio... era um auditório diferente todo domingo muita gente e nordestinos que
passavam por ali e que estavam indo para o nordeste que iam com a mensagem e que me
agradeciam muito e tal e a gente não só fazia o trabalho mas a gente distribuía literatura né eu
aprendi isso com Hitler a esquerda tem que dar literatura e então a gente dava muita literatura
e como era um trabalho pensando no Reino de Deus e não na Placa de Igreja a gente pedia
para as outras igrejas ir pra lá então não havia sectarismo sabe? Esse negócio de querer trazer
só pra minha igreja e levar só pra outra igreja eu tinha um interesse geral ali pelo reino para
que todas igrejas pudessem se beneficiar daquilo que a gente tava fazendo ali.
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Edgar Osteorot
O Américo Dias, o segundo prefeito de Maringá, ele queria de todo jeito
alguma coisa que chamava a atenção na cidade porque nas outras cidades Apucarana,
Mandaguari, Marialva não tinha nada a não ser casinha, igreja e acabou. Então ele queria
nessas praças, como Maringá tinha praças ele queria fazer 10 fontes luminosas e pediu para eu
desenhar esse negócio. Meu pai fez o cálculo de concreto e tudo lá. Eles pagaram direitinho.
Tudo bem, mas era horrível! Mesmo depois de construído você não podia fazer nenhuma
maquilagem para ficar mais e eles também não tinham muito dinheiro para fazer uma fonte
luminosa em barroco ou coisa assim. E foi a água e depois a água foi iluminada com
lâmpadas que constantemente queimavam e com o tempo não sei se foi um moleque, ou coisa
assim, colocaram lá uma meia dúzia de sapos e em poucos meses eles eram mil sapos lá
dentro e com o tempo eles tinham que pegar os funcionários para tirar os sapos porque eles
entupiam onde saia a água. Um funciona, outro não funciona.
Os sapos no começo logicamente ninguém riu, nem quando era um sapo ou
outro sapo começaram a pular lá, mas depois tinha lá uns dez mil sapos e eles a noite faziam
um conserto que ninguém mais conseguia dormir nesse “qua qua qui qui qua qua” que isso
começava quando escurecia e parava de manhã cedo quando o sol saia. Coisa mais engraçada
eu também não sabia que eles cantam só a noite. Cantam realmente só a noite eram uns sapos
enormes. Virou um problema. Eles cataram os sapos e acabaram com os sapos aí ficou um.
Eles esqueceram esse que é uma fêmea e começou dentro de 6 meses, estava tudo como
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estava, né? Então tinham sempre esses problemas. Então depois mais tarde eles tiraram a
água da fonte luminosa, exatamente para não acontecer mais.
Depois eles fizeram várias modificações, mas no fim das contas os
evangelistas eles tinham lá um estrado de madeira depois foi feito de alvenaria para eles
fazerem lá...falarem sobre Deus. Então essa fonte foi demolida.
A praça foi feito tipo aquelas praças inglesas. A companhia já tinha nos
projetos e nas plantas sempre a mesma coisa porque o Arthur Thomas que se tornou muito
amigo meu quando eu estava na Companhia ele tinha nessas praças inglesas como era em
Londres e começa dividindo o quadrado em quatro ou cinco partes e no centro também tinha
o negócio de água, um monumento ou coisa assim. Então ele quis igual, então em Mandaguari
tinha o mesmo problema, tinha de mudar a praça e aqui também foi feito e nas outras cidades
também. Só depois quando em 53 Anibal Bianchini ele falou olha isso não dá e a Companhia
e Hermans Moraes de Barros nossos chefes lá em São Paulo juntaram com Américo Dias e
falaram: Pô não dá! Você tem que fazer uma coisa mais chique. Logicamente como é que
Américo Dias ele não tinha cultura, não tinha estrutura,, nunca foi numa cidade grande,
depois ele ficou 2 anos lá em São Paulo. Então nós tinha uma na frente do grande hotel, uma
em frente a praça Napolião Moreira uma acho que aqui na Rocha Pombo também tinha um. E
tinha mais previstos eu não sei quanto, dez, e 5 ou 6 foram construídas. E isso aqui com
dinheiro do povo já nessa época. A prefeitura em vez de fazer uma coisa mais emergencial ele
fez as fontes e depois elas foram derrubadas. Porque o João Paulino o terceiro prefeito ele
falou. “tiramos essa porcaria já já”. Não logo no começo, mas ao longo do mandato dele ele
tirou isso.
Raposo Tavares foi um desbravador do mato. Eles procuram lá algumas
pessoas que fizeram alguma coisa para o Brasil e ele foi chamado lá, mas esse nome já existia
quando eu vim pra cá. Ela chamava já Raposo Tavares. Agora eu vou te dizer uma outra coisa:
Antes da fonte luminosa, lá tinha um parque de diversão permanente você entrava lá dentro.
A entrada era de graça e você depois, você podia jogar esses joguinhos de cavalos. Cavalo
número nove, cavalo número 8, coisa assim. Também cavalo melhor e quem ficou com o
último ganha, ne? E também tinha um palco lá e tinha esses cantores, esses famosos cantos,
filho milionário e não sei como eles chamam esses cantores.
O povo não quer dizer nunca se encontrou o povo lá. Mas no centro da praça
tinha uma praça lá onde você podia a comprar um sorvete talvez. Tinha um palco lá quando
todo mundo podia ir com um violão lá. Essa história da Maria onde até hoje não compreendi
“nem, nem, nem, nem” era horrível. Esse negócio. Eles fizeram dia e noite essa música
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caipira só sei que a Maria lá ela era “sem vergonha” aliás nós estamos aqui na frente do
parque do ingá. E a Maria Ingá. Esse aqui já foi na minha época ela lavava roupa lá dentro
depois falaram que ela era uma putinha. Compreendeu? Agora eu não sei porque. Todos que
lavavam roupa lá. Compreendeu?
Eu não conhecia ela. Eu só sei que foi tais mulheres lá dentro que lavavam
roupa porque todas essas mulheres simples que lavavam roupa para ganhar dinheiro eles
lavavam roupa, né? E como lavar roupa? Em casa não tinha água, não tinha isso. Então
domingo, sábado, domingo os batistas batizavam os fiéis deles dentro desse buraco de água
que foi feito em dia de chuva e tudo. Meu cachorro também tomava banho lá dentro. Então
você pode imaginar que água. Quando você botava a mão lá embaixo era um lamaçal
tremendo.
Nós fizemos dois três projetos para a Praça Raposo Tavares e outra praça
que foi derrubada agora para passar uma ligação como o trem. O trem bala não tem mais. A
Dilma já falou ele custa dez vezes mais que um trem simples, mas o trem era interessante
porque todos os pedreiros de Sarandi eles vieram nessa praça. Os trilhos do trem eles tinham
até um prédio da estrada de ferro. Então eles pagariam R$ 0,10 ou R$ 0,20, uma mixaria, de
Sarandi para chegar a Maringá. Então 6 horas da manhã, 7 horas da manhã. Eles já estavam
aqui em Maringá. Eu acho isso foi muito interessante. Então nós tínhamos feito um dos
projetos já nos tempos de Said e agora novamente recentemente uma passagem embaixo. A
praça fica, mas embaixo um corredor largo, estacionamento para 5 mil carros embaixo e uma
passagem embaixo da praça. Foi projetado. Eu tenho no projeto aqui no escritório e posso te
mostrar. Eu não quero falar muito sobre esse negócio. Não sei o que o prefeito vai fazer agora,
mas na época já foi feito isso. Quando você sai do trem você subterraneamente você andava
no Shopping Center onde tem bar, restaurante um Shopping Center porque na Alemanha já
tem isso. Porque lá neva, chove, frio lascado uma coisa então essas praças eles tiraram a praça
fora fecharam. Deixaram alguns buracos com iluminação direto em casos que não tem luz
então eles chegaram até Getúlio Vargas. Então vamos dizer você chega de Sarandi e chega na
Getúlio Vargas. Na Getúlio Vargas você está no centro de Maringá, aí você vai pra esquerda,
direita, pra cá, pra lá. Acabou. Pode fazer de 5, 10 quantos quiser de dez andares pra baixo
para estacionamento de automóveis.
A Rodoviária foi feita por uma empresa. Ela foi muito bem construída. A
estrutura dela foi perfeita. O modelo foi perfeito porque meu engenheiro do nosso escritório
da Arcontec ficou 4 meses lá dentro pra ver o que pode ser feito. Como essa velha Rodoviária
lá, a número 3. A primeira na Maringá velho. No Maringá novo, na Napoleão Moreira tinha a
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segunda a mais famosa onde eu também cheguei, não por causa disso ela é famosa ela é a
segunda e a terceira foi então essa esta já na estilo moderno. Ele foi infelizmente derrubada eu
não sei o porque uma coisa assim.
Foi muito interessante se viu atrás agora tem os ônibus da cidade e a outra
rodoviária esta um pouco fora, um pouco longe, mas atendeu os dois momentos não tem
problema nenhum. Na praça tinha uns cantores. Esses cantores que ficavam nesse parque de
diversão, esse milionário tinha esses cantores que chama milionário. O sócio dele tinha outro
lá tinha esses cantores caipiras que cantavam e quando eles cantavam antigamente enchia um
pouco mais no sábado, domingo enchia mais eles ganhavam alguma coisa e depois, tinha, um
boxe lá, luta de boxe também, uma coisa assim, tinha um cara lado com violino lá. Tocou
violino, mas era tão horrível compreendeu? Imagine você matar um gato. Eu nunca matei um
gato, mas eu já escutei de longe matar um gato. É um miau, miau, miau. Com esse violino
você ficava louco, aí realmente o povo ficava revoltado fez lá o barulho e ele tinha de parar e
sair do palco. Tinha disso. Todo mundo deu risada depois e depois chegava outro, uma
dançarina e eles fizeram isso lá. Pelo menos os maringaenses, a juventude tinha alguma coisa
a noite sábado e domingo para ficar na praça onde foi derrubada que a rodoviária era a praça
Raposo Tavares.
Eu estava na Companhia e como eu passei a segunda guerra mundial na
Alemanha então eu já sei como esta aquele negócio lá esses caras fizeram façanhas. Eles
entraram aqui na Getúlio Vargas a uns 3 a 4 metros de altura, com motores abertos, máximos.
Uma coisa assim e foi em direção da estação de trem. E quando eles chegavam lá na avenida
Brasil, lá tinha 3 postes de bandeira porque foi colocado porque era o décimo aniversário.
Então queríamos fazer. Américo Dias também queria fazer uma coisa diferente. Então foi
hasteado as bandeiras e depois tinha grandes jantares lá no Aero Clube e esta aqui onde tem
Mercadorama hoje e eu vi quando foi para a Companhia eu vi isso e falei: Nossa! Isso vai
acontecer um desastre porque aqui é uma cidade com essas velhas máquinas. Esses Mustang
bimotores, porque todo mundo escreve alguma coisa. Uns fala que os pilotos foram
queimados. Eles não foram queimados, não houve nenhuma chamazinha. Eles caíram,
arrebentou avião, arrebentou os pilotos, um braço lá, era horrível e eu estava na companhia
começando a trabalhar e o negócio não parava e eu vi quando os aviões chegavam sobre os
prédios da companhia e tinha o hotel esplanada e subia na parede do hotel que tinha 3 andares
e meu Deus esses caras são todos bêbados, loucos, doido não sei se tem mais alguma coisa pra
eles.
Eu sai da Companhia, eu tinha a chave e subi na porta porque se um desses
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aviões caem em cima da Companhia eu morro junto. Porque pega fogo. Tudo de madeira.
Quando eu sai lá eu já escutei “pum, pum, pum” aí eu vi o avião caindo. Só tinha cortado um
pedacinho da asa. Coisa ridícula porque o redondo da asa, um pedacinho só porque e tinha
pegou um desses postes da bandeira. Isso aconteceu, era máquinas velhas e esse vidro que
eles tinham na frente, não era vidro, era de plástico, era desde a segunda guerra mundial, mais
de 10 anos. Era aniversário, 47 a 57. Então esse vidro nós achamos depois no chão. Você não
podia olhar porque foi tudo trincado fissurado de tão velho o plástico quando você guarda
muito tempo um desses plásticos vagabundo de antigamente. O cara não enxergou o mastro
da bandeira e cortou um pedacinho bem pequeninho. Não foi a asa inteira, ou metade da asa.
Foi só um redondinho assim. Aí ele subiu e “pô, pô, pô, pô e pufff”! Porque ele perdeu o
equilíbrio. Se ele tivesse ido reto, ele não quis ir reto porque ele pensava cair em cima do
trem, e o trem estava lá cheio de gente. Ai tinha 500 mortos ou coisa assim. Como o cara foi
pra cima e desceu e caiu uns 5 metros, 10 metros do trem que estava cheio, explodiu o avião
era tudo em pedaço tinha pouco de fumaça. Porque lá no quintal da Companhia eu vi tudo lá
ai eu sai de lá e fui um dos primeiros que chegou lá eu tinha medo de chagar perto porque os
tanques de gasolina podia explodir ai se vai junto.
Clarice Grandi
Não tinha novidade nenhuma. E como você tá andando ai na rua encontra
alguém na rua, conversa, para bater um papinho, porque não tinha, não tinha nada. Hoje a
gente vê. Então era mato, isso tudo aqui era mato. Olha a jardineira, não era ônibus como
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hoje, era jardineira da Garcia, ela encavalava assim com o barro. Chovia, encavalava, mato
dos dois lados e quase como daqui quase Londrina era pouco aberto mais era mato.
Meu irmão passou mal da apendicite e quase morreu. 6 horas para chegar
daqui a Londrina. O pessoal carregava o carro na mão porque não ia. Encavalava. Então tinha
que descer do ônibus e erguer a jardineira para caminhar mais um pouco assim até chegar era
6 horas. Hoje com uma hora você faz, mas era 6 horas para chegar em Londrina, era o recurso
que tinha. Aqui tinha o farmacêutico que dava um remédio, o dentista que só tinha o boticão
para arrancar um dente. Não tinha nada. Eu mesmo perdi meus dentes porque meu dentista
não tinha. Rancou todos os dentes bons porque não tinha outro tratamento. E porque não tinha
outro tratamento. E porque inchava doía. Ele achou melhor rancar porque não tinha outro
tratamento.
Não ainda nessa época a gente passava por hora tinha uma picada. Você
sabe o que e uma picada? Faz uma limpada, uma roçadinha e você andava e aí as taquaras
ficavam assim. Rasgavam as pernas da gente. Além dos mosquitos, as taquaras rasgavam as
pernas da gente e a gente vai contar a quem mora aqui ou quem veio depois disso aqui
formado. Ela está mentido, mas tem uns primos pioneiros que eles passaram por tudo isso
também e pode confirmar.
A mulher era discriminada, como é discriminada até hoje. A liberdade que a
mulher ganhou, mas ela está discriminada, a gente só trabalhava, quem comprava as coisas
pra gente era o pai, nem a mãe não vinha na cidade comprar era meu pai que vinha agora
trazia a gente assim quando ia na missa quando o padre vinha de Londrina rezar a missa por
mês. Então, a gente andava 7 a 8 quilômetros a pé pra vim na missa que era esse sacrifício que
a gente fazia. Então não tinha. A gente vivia assim como os índios. E que a gente derrubou o
mato e foi laborando, comia o que plantava. A gente não tinha outra novidade a não ser aquilo
o que se plantava e colhia. Frangos, ovos, porco o que se tinha aquilo que você produzia.
Ah eu tenho assim uma lembrança e saudade. O mato é tão gostoso e deixa
o ar bem fresquinho. O mato tem cheiro e eu tenho saudade disso. A minha lembrança maior e
essa aí porque era muito bom a gente passar ali e encontrar um amigo e conversar e sentir
aquele cheio das árvores. As árvores “invertia” água hoje no termos esses bosques coitadinhos
nem cheiro não tem mais de tão judiado que tá nossos bosques.
Era animada. Nóis brincava muito de lenço atrás e de passar anel e de jogar
lenço, né? Joga e sai correndo o outro vem atrás e pega. Eram as nossas brincadeiras. Passar
anel. Não tinha novidade. Não tinha cinema, não tinha nada. A gente foi conhecer cinema,
essas coisas foi depois de 50 que já foi aparecendo o cinema. A gente falava matinê porque
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meu pai não deixava a gente sair de noite, aí meu pai vinha junto, aí a gente andava muito pra
assistir uma matinê. Aí reunia a turma da vizinhança e ía. Daquele tempo eu tenho saudade,
muita saudade que agente era unido. Se você não tinha uma coisa pra comer você falava
comigo e eu levava pra você. Quando eu não tinha você trazia pra mim. A gente tinha aquela
unidade muito linda. Não tinha esse negocio de divisão tão grande que tem gente morrendo de
fome e outros jogando fora o que tem que é um pecado mais é isso, um pecado, mais é isso
que está acontecendo.
Não tinha, era igual o que está aqui. Aqui ainda tem coisa pra nos vermos.
Naquela época não tinha grande movimentação não. Na realidade essas “paquerinhas” que
tem hoje não podia ter isso. Tinha que namorar na presença dos pais, então se arrumava aí 5 a
6 moças e uns 5 a 6 rapazes e ia lá pra praça. Aí contava piadas. Piadinhas tudo assim coisas
leves. Nada dessas piadas pesadas que a gente vê na televisão hoje e a gente passava hora ali.
As vezes a gente fazia as coisas em casa e ía lá. Vamos comer junto com os amigos na praça.
Aí repartia ali o pãozinho cada um e a gente passava horas ali. Aí a noite a gente se reunia
numa casas e aí a noite se reunia numa casa que era maior ai nos cantava, dançava, era
gostoso, sabe. Era muito bom a natureza convida a gente a amar mesmo, muito bom. Tenho
saudade porque eu sei que isso não volta nunca mais e eu me sinto muito feliz porque eu tive
a oportunidade de passar por esses momentos belos da vida. Hoje eu tenho pena dessa
juventude que não tem isso.
Então, naquela época a gente se reunia numa turma. A gente não ia só como
hoje as mulheres andam só. Nós não, porque os pais não deixavam e na praça se reunia um
tanto de rapaz e um tanto de meninas e ali a gente se reunia e fazia brincadeiras. Até dançava
brincando um com o outro e a gente começava a namorar ali na praça. As vezes o namoro
dava certo, as vezes não dava certo. Com o meu deu certo, mas dali saiu muitos casamentos
depois que começou lá na praça a namorar e casaram. Muitos já foram, e graças a Deus eu
ainda estou aqui levando, mas muitos já não existem mais. Essa turma que era nossa turma
mesmo que a gente ia junto para os bailes brincadeira era assim não tinha um clube. Você
tinha sua casa, você falava hoje a festinha vai ser lá em casa. E a festinha o que era? Um
puxava um violão, um tocava, outro cantava e ali dançava. Porque na praça não podia fazer
isso porque era mato. Os mosquitos não davam sossego, também quando a praça foi abrindo e
ficando iluminada, bonita, aí sim a gente, ate hoje eu gosto e ir lá sentar naquela praça
admirar.
Os bichos passavam perto da gente. Uns tinha medo, outros não tinha. O
finado meu pai um dia ele falou: Eu vou e não sei se eu voltar porque a onça vai me comer.
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Tinha onça. Não e que a onça correu atrás dele mesmo? Ele se salvou por uma graça de Deus.
Tinha onça, tinha macaco, tinha bugil, tinha outros bichinhos menores. A gente conheceu
muito bicho que não conhecia e veio conhecer aqui.
Iam também para ver os bichos e pra passar horas. Não tinha nada o que
fazer, vai na praça jogar conversa fora. Um lugar muito bom. A praça foi muito importante
não só pra mim, mas pra todos que já foram e para os que estão ai até hoje. A praça é muito
boa.
Foi bom porque quando aconteceu assim uma coisa muito linda que e o
amor que até hoje eu tenho ele que já fez 62 anos casados. Então foi muito bom porque daí a
gente foi pra casa e eu falei pra ele que só namorava fosse em casa porque meu pai não
deixava namorar fora ai já foi pediu em namoro e 5 meses nos casamos e fizemos uma
família. Aí todos os dias eu agradeço a família que Deus me deu. A praça é a vida da gente. Eu
amo a minha praça. Eu gosto de ir lá passear. Faz parte da vida da gente. A gente casou, a
gente saiu fora e depois voltamos de novo. Maringá é Maringá, você não fica longe. Eu saio e
não vejo a hora de voltar para Maringá. Minha vida e aqui.
Era meu pai que fazia. A gente usava aquilo que os pais compravam, nem
minha mãe vinha. Era meu pai. Tinha um jipe, aqueles jipão grande ia lá em casa vender lote
de roupa. Uma historia interessante e que todos os homens, os rapazes da minha família, as
causas eram todas iguais e as mulheres eram todos vestidos iguais. Era interessante aquilo.
Era uma vida difícil porque morria uma pessoa e andava 7 quilômetros para levar no
cemitério no pau de arara porque não tinha caixão também não. Fazia o caixão ali e ponhava
uma vara aqui e outra ali e pegava em quatro. Dois lá e dois aqui. A história é até bonita, eu
tenho saudade. Todo esse conforto eu não esqueço daquilo lá não. Tinha meus pais, meus
irmãos tudo vivo comigo e hoje Deus já levou tudo. Só deixou eu aqui. To viva e forte.
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Giovencio Pereira
A lembrança que era mato, era depósito de milho, não tinha praça, não tinha
nada. Era mato. A Avenida Brasil era só toco de peroba, fora a fora, e aqueles dois ladinhos de
pegar carro, passar carro. Carro não tinha, era charrete. Não tinha carro aquela ocasião só
charrete. Então a charrete carrega duas pessoas só e eu. Gente gordo eu só carregava uma
pessoa. Era grandão! Charretinha virava pra cá, pra lá.. Eguinha não agüentava puxar, apiava.
Rapava terra, rapava barro. Era difícil, aqui não tinha nada. Era tudo barro.
Pra todo lugar. Sítio, zona, casa, morangueira. Tinha umas casinhas lá no
fundo da Morangueira. No Maringá velho não tinha nada. Levava nos carreadô, levava no
Borba gato, era fazenda. No Guaiapó, na Mandacaru. Uma vez um tinha fábrica de doces,
enchia a charrete de doces e entrei ali por Atalaia e saí em Pulinopolis. Voltei e entrei ali por
Mandaguaçu. E quase matei a eguinha. Eu não sabia a estrada. Era tudo barro, terra. Ia pra
são Jorge vender doce de charretinha.
Ali no lugar onde passava não era só eu que tinha não, tinha mais de 20
charretes. Na Operária, aqui era só charretinha, não tinha carro, não tinha nada. O trem veio
depois. O trem chegou a Maringá em 54 parava Apucarana.
Todo mundo. Chegava freguesia: dava pra levar não sei onde? E eu levava.
O dia inteirinho, ai chegava a mulher prostituta da zona, não era prostituta, era respeitada né?
Chegava: da pra levar na Marumbi? Da pra levar não sei onde?
Família, só não tinha biscate ne? Só tinha mulher de zona. Era bem vestida,
bem trajada, respeitada. Era gente, que não apiava pra fazer compra em loja, nada. É o lugar
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que tinha gente, pra fora não tinha nada, não tinha. Operaria, não tinha. Jardim Alvorada era
fazenda de café. A universidade era fazenda de café. Onde eu morava eu comprei pra planar
alface eu tinha pensão. Sim, era pra encontrar família. Gente que viajava esse negócio de
mulherada não tinha não. Ah namorei! Eu trabalhei em hotel e tinha bastante muié. Eu
morava onde era o campo. Namorava onde trabalhava, empregada, mulher mocinha,
trabalhava muita gente mulher, mocinha também. Era um namoro seguro. Não e essa
cachorrada de hoje.
A praça na minha época não dava nada porque era tudo mato. Só encostava
ônibus e depois surgiu o Villaova, o Américo Dias, João Paulino Vieira Filho, doutor Luiz
Carvalho ai foi melhorando né? O Américo Dias, essa praça era bonita tinha um fonte d’água
bonita. Tinha banco dos freguês. Depois desmanchou.
Aqui era em 72. Vendia tudo. Aqui o caminhão do Chinai descarregava o
caminhão cheio. Era maçã, era banana, era melancia. O caminhão descarregava inteiro e a
noite vinha buscar o dinheiro. Naquele tempo eu não sei o que dinheiro era naquele tempo,
né? Eu sei que eu colocava, 5, 6 até 10 moleques vendendo maçã e vendia 10 caixas de maçã
em saquinho. Aí vendia 5 maçãs por um real. Vendia data, vendia relógio, vendia revólver,
vendia de tudo nos 5 dias. Tinha! Mas nossa! Toda vida tive bastante freguês. A gente sabe
lidar com o povo, ne?
O movimento do povo, né? Minha amizade e muita. Às vezes mulher, moça
chega barrigudinha, traz o neném pra eu ver. Lembra de mim? Muita amizade. Tenho amizade
no sítio, na prefeitura. Daquela época mudou muito. Mudou porque a cidade cresceu, evoluiu.
Tudo isso cresce todo dia. De tudo! De tudo! Por que a gente mora aqui desde essa ocasião.
Não tem inimizade com um cachorro, nunca fui preso, a prefeitura, nunca mexeu comigo. Eu
nunca fui no advogado. Sempre andei com os meus negócios certinho. Nunca deleguei nada
aos outros.
Depois que a praça ficou boa tinha muita visita. Não era essa bagunça não.
Tinha banco, familiares sentava. As moças vinham. Todo mundo. A noite era lotada de gente.
Hoje tá uma bagunça isso aqui. Hoje você não pode nem passar. Foi importante porque tinha
amigos, namoradinha, juventude. Tudo isso faz parte.
Quem não tem saudade da juventude? Pode perguntar a um velhinho de cem
anos que ele tem saudade da juventude.
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8.2 Entrevista com o Historiador João Laércio Lopes Leal
Entrevista realizada com o historiador João Laercio Lopes Leal, na terça-
feira, 22 de outubro, às 15h. Esta gravação foi importante, pois algumas informações não são
encontradas em bibliografias.
Como foi originada a praça Raposo Tavares?
A praça Raposo Tavares não está presente digamos no hall das praças com
fundações, porque ela faz parte do plano onde não havia essa figura da inauguração do
logradouro público, ela foi criação da própria diretoria no caso da Companhia de Terras do
Norte do Paraná e quem formalizou o desenho foi o Jorge Macedo Vieira, portanto, a praça
Raposo Tavares não tem uma data de fundação, ela tem uma data que nós podemos considerar
desse jeito algo similar que é o 10 de maio de 1947 que é exatamente a inauguração de
Maringá, que se dá naquele ponto naquele sítio histórico que hoje é a praça Raposo Tavares,
mas o nome já existia naquele momento porque desde 1947 você já tem as denominações de
ruas, avenidas e praças já estipuladas pelo seu Wladmir Babkov que era o engenheiro
agrimensor da companhia de origem russa e que além de fazer o trabalho topográfico de
medição das ruas e avenidas do sítio urbano ele também se encarregava da nominação das
vias públicas tanto é que não existe nenhum decreto lei por parte da Câmara Municipal destas
vias porque todas elas são anteriores a criação da própria Câmara Municipal que é de 1951 e
isso nós estamos falando de 1947 quatro anos antes portanto isso ficava a cargo da empresa da
Companhia.
Quais praças existiam no projeto inicial da Companhia Melhoramentos Norte do
Paraná?
Nessa época você tem a Raposo Tavares a praça da rodoviária que
atualmente é a praça Napoleão Moreira da Silva, a praça Emiliano Perneta na Vila Operária,
que é onde fica a Igreja São José e você vai ter a praça Dom Pedro 1º, onde hoje é o Centro de
Convivência, seriam essas as praças. Porque você vai ter a praça Regente Feijó na Vila
Operária, mas ela não pode ser considerada uma praça na concepção da palavra era mais uma
rotatória, uma rótula, balão enfim várias denominações que são dadas, e também você vai ter
a própria Rocha Pombo que também é nesse sentido mais uma rotatória, então praça é algo
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mais evoluído mais bem equipado, depois esses pontos se tornaram praças, mas no momento
eles eram considerados rotatória.
Qual era a função da praça Raposo Tavares nas primeiras décadas?
Ela servia também como ponto de lazer mesmo, de distração para as
pessoas, era um local de passeio né é... e servia como referência, como área de localização
geográfica, dentro do plano urbanístico, então ela tinha algumas funções bem determinadas já
desde o início. A determinação do espaço é do Jorge Macedo Vieira, o nome é que é do
Wladmir Babkov o nome de Raposo Tavares, ele previa uma praça central.
O terminal urbano e a Ferroviária também estavam no projeto inicial da Companhia?
A ferroviária sim, a rodoviária é uma ideia posterior é uma ideia que surge
com o Américo Dias Ferraz que é o segundo prefeito de Maringá que pegou parte da praça até
a rua bandeirantes que hoje é a rua Joubert de Carvalho, na época ela ia até a Almirante
Tamandaré. Era um ponto de parada de comércio de convívio social, de passeio e de
passagem para as pessoas também porque ela fica no eixo monumental né.
O que seria este Eixo Monumental?
O eixo monumental é a Getúlio Vargas que antigamente era a avenida
Ipiranga que vai da Catedral até a estação rodoviária. É uma via onde se localizam instituições
de referência na cidade é um local privilegiado geograficamente onde tem uma reta onde você
coloca instituições que são referências prefeitura, correio, igrejas, bancos coisas desse gênero
para o atendimento da população.
A queda dos aviões da esquadrilha da fumaça, como foi este acontecimento e qual o
impacto disso para a cidade?
Na verdade foi mais uma parte da estação ferroviária, bateu no mastro do
pátio da estação, então foi um acidente de grandes proporções né foi inclusive o primeiro
acidente da esquadrilha da fumaça né. Tava no pátio ferroviário e caiu em algum lugar ali eu
não sei dizer.
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Muitas pessoas dizem que foi na praça?
É as pessoas não tem uma precisão e genericamente. Morreram dois pilotos
da esquadrilha da fumaça foi uma comoção porque é uma tragédia e veio na contramão o
clima festivo que estava na cidade né 10 anos de fundação cidade bombando crescendo pra
todos os lados e de repente um acidente desses foi um anticlímax né o pessoal deu uma
entristecida né.
Qual era a principal característica da praça Raposo Tavares?
Era uma praça mais pra lazer mesmo, uma praça, pois uma coisa é o plano
urbanístico outra é o que veio se tornar depois, muitos pontos do plano, o plano do Jorge
muita coisa foi alterada depois uma delas é essa né da praça, por exemplo, a praça dele era o
dobro de tamanho. Ela pegava da Brasil até a Tamandaré aí passou a pegar só da Brasil até a
Bandeirantes que é a atual Joubert de Carvalho. O que fez mudar foi os prefeitos, que a
prefeitura manda mais que a companhia né. Então a companhia podia espernear a vontade,
mas o que a prefeitura determinasse tinha que ser obedecido.
Que parte da praça foi tomada?
Bem onde está a rodoviária é ali que foi tomado da praça, que o projeto
remonta desde 1959 quem começa e termina é o João Paulino o terceiro prefeito de Maringá,
mas o Américo deixa tudo a lei preparada e o terreno destinado. A companhia não queria a
rodoviária ali ela queria onde era na praça Napoleão onde era a rodoviária que foi onde
funcionou de 1948 a 1962. Esta praça era arborizada, o Américo acabou com o bosque das
essências como era chamado era uma parte da praça com uma reserva de árvores de essências
florais e aí o Américo em plena madrugada mandou os funcionários irem lá e derrubar tudo
como uma forma de represália a companhia né. A companhia e o Américo nunca se deram
bem eles tinham uma relação muito conflituosa. A companhia era muito difícil e não era fácil
por nenhum dos dois a companhia brigou também como o primeiro prefeito, então a
companhia brigou com o primeiro, com o segundo, o terceiro, o quarto o quinto, o sexto, o
sétimo, o oitavo, o nono, o décimo, o décimo primeiro, o décimo segundo, o décimo terceiro a
companhia brigou com todos os prefeitos de Maringá ela nunca se deu bem com os prefeitos
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porque ela se julgava o prefeito, se julgava a dona da cidade e os prefeitos não admitiam e
isso foi péssimo para a cidade mas seria talvez mais organizada em alguns pontos, porque
esse conflito trouxe prejuízos não no crescimento, mas na organização urbana na
funcionalidade de alguns equipamentos.
Em que momento a Raposo Tavares passa a ganhar uma estrutura de praça?
Ela começa a ganhar mesmo é no governo do Américo pavimentação, fonte
luminosa, iluminação, arborização em 1958, até pouco tempo atrás Maringá tinha praças não
urbanizadas ainda.
Alguns relatos indicam que muitos circos e parques se instalavam ali como era isso?
Tinha circo, circos se instalavam ali, quando tinha circo, em Maringá um
dos pontos que eles se instalavam era ali, parques de diversões também, você tinha comícios
em época de política, ringues de luta que ficavam dentro do circo normalmente era uma
atração do circo e isso na década de 1950 e até antes do Américo, na época do Inocente
(Inocente Villanova) antes de ser urbanizada já se instalava este tipo de atrações já porque
depois que se instala a praça já não tem condições de se instalar porque complica.
Como acontece o processo de êxodo rural em Maringá?
É o êxodo rural esse êxodo já começa nos anos 1960 esse êxodo, há muitos
motivos a própria crise do café e a questão trabalhista também porque o café ele é um
complexo que envolve muita mão de obra o período que começa a surgir os sindicatos dos
trabalhadores e o sindicato dos trabalhadores rurais é um dos mais ativos de Maringá. O
sindicato rural surge em 1957/1958 por aí. Maringá nunca foi um grande produtor de café,
Maringá foi um centro processador de café. Em Maringá o café não foi tão importante assim
na história, Londrina não bem menos, Maringá sempre teve outras culturas importantes, a
cana de açúcar também, não é a toa que Maringá tem a maior usina de açúcar do Paraná desde
os anos 1960 a Usina Santa Terezinha é de 1961. Na década de 1950 se plantava arroz, milho,
café, hortelã Maringá tinha 20 usinas de hortelã instaladas aqui.
O êxodo se dá exatamente da mudança de atitude de alguns cafeicultores
que passam a não ver mais tanto interesse na produção de café, o Jardim Alvorada é um
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produto típico disso, o Jardim Alvorada é um bairro de 1962 era uma Fazenda de Café a
Fazenda Santa Lina propriedade do senhor Alexandre Rasgulaeff o seu Alexandre vende essa
fazenda para o seu Lucílio de Held que é um empresário de Londrina que tinha a Codal que
era uma empresa de colonização em 1962 eles abrem o Jardim Alvorada eles acabem com a
fazenda e eles abrem o loteamento, um novo bairro na cidade.
Maringá a partir dos anos 1960, Maringá expande horizontalmente a zona
norte pra lá da colombo ela nasce toda nesse momento Morangueira é... Jardim Alvorada, Vila
Esperança a UEM, o Mandacaru, é uma nova região que nasce em Maringá é a zona norte
tudo isso, até então Maringá era só da colombo pra cá. A UEM é um produto típico dessa
época também porque Maringá começa nessa encruzilhada, porque Maringá começa a ensaiar
uma estagnação nos anos 1940/1950 a cidade explodiu, chegou os anos 1960 ficou uma época
meio complicada Maringá tinha que dar uma resposta para os anseios da sociedade organizada
e aí começam a surgir as mobilizações as articulações políticas para a cidade não parar no
tempo e aí começam a surgir estes novos bairros e loteamentos investimentos de fora, tudo
isso a partir da década de 1960.
Qual era a cultura agrícola predominante em Maringá nessa época?
Trigo, feijão arroz, feijão tudo isso cultura de subsistência não é cultura de
exportação né desde o início desde os anos 1930, porque Maringá nasce nos anos 1930 não é
nos anos 1940 né.
Como acontece a expansão da cidade?
A partir da década de 1960 começa o êxodo rural e começa a criação de
loteamentos e paralelamente a expansão horizontal você tem a expansão vertical também que
é quando começam a surgir os primeiros arranha céus de Maringá, o Maria Tereza, no caso o
primeiro é o Três Marias aí vem o edifício Maringá, o Maria Tereza e aí vai, a década de 1960
inaugura essa nova fase de Maringá.
Ainda na década de 1960 você tem também uma incrementação em outros
setores de Maringá, como, por exemplo, no setor educacional né você tem a entrada do ensino
superior que começa com a entrada da faculdade de economia, aí vem a de direito, aí vem a
de Filosofia, Ciências e letras ainda não é na UEM não são em faculdades isoladas a
Faculdade de Ciencias econômicas que é de 1961, a de direito que é de 1965 e a de letras e
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ciências humanas que é de 1966. É a junção destas três faculdades que vai gerar em 1969 a
UEM, mas antes da UEM já tem curso superior em Maringá, são estas três faculdades.
O que acontece na década de 1960, muda muita coisa?
Na verdade muda bastante, mas muita gente ia embora daqui para estudar
porque as opções ainda eram muito poucas né. Maringá perdeu muita gente por causa disso
nos anos 1960 porque muita gente saía daqui para estudar em Curitiba pra ir pra São Paulo,
para o interior de São Paulo e nas regiões mais antigas que tinham universidades mais
categorizadas então Maringá nos anos 1970 que a UEM se consolida.
E na década de 1970 o que acontece com a Raposo Tavares? Pois em alguns relatos dos
entrevistados, inclusive do pastor Nilton Tuller, há mudanças e a criação do Templo
Aberto.
O que acontece é que a praça Raposo Tavares sofre uma nova intervenção
que é um projeto de Luty Kasprowicz que era secretário de planejamento e arquiteto do
Silvio Barros em 1973/1974 aproximadamente, ele que projeta a Raposo Tavares dentro do
desenho atual dela, é um novo projeto. O templo ele é desse período, o Nilton Tuller teve uma
relação de convivência com o Silvio Barros, eles se davam muito bem e ele requeriu,
requisitou que ali houvesse um templo aberto para os protestantes. O Luty Kasprowics
aplicou ali uma arquitetura em formato plissado, uma arquitetura moderna em outras praças
ele utilizou o mesmo método com bancos em formatos diferentes sem encosto que até hoje se
você olhar é mantido até hoje. A ideia do Luty era a praça não envelhece com o tempo, esta
arquitetura foi feita a frente do seu tempo.
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