jo e seus amigos
DESCRIPTION
um livro excelenteTRANSCRIPT
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J
E SEUS
AMIGOS
C. H. Mackintosh
Texto baixado da Internet de verdadespreciosas.com.ar
Traduo do espanhol para o portugus realizada por Daniela Raffo,
Terminada em sexta-feira, 2 de novembro de 2007, 09:01:46
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O livro de J ocupa um lugar muito particular na Palavra de Deus. Ele
tem um carter totalmente prprio, e ensina lies que no vamos
achar em nenhuma outra parte do inspirado Volume. No o nosso
propsito abordar a questo da autenticidade deste precioso livro nem
aportar as provas da sua divina inspirao. Estas coisas temos por
certas; e no temos a menor dvida em quanto sua veracidade, por
quanto deixamos tais provas em mos mais capazes. Recebemos o
livro de J como parte das Sagradas Escrituras e, por tanto, para
proveito e bno do povo de Deus. No precisamos de provas para
ns, nem pretendemos oferecer nenhuma delas aos nossos leitores.
E cabe agregar ainda que no temos intenes de entrar em
investigaes a respeito da autoria deste livro, tema que, por muito
interessante que seja, cremos se trate de um assunto puramente
secundrio. Recebemos o livro como procedente de Deus, e isto nos
basta. Cremo de todo corao que um escrito inspirado, e sentimos
que no nos incumbe discutir a questo referente a onde, quando e por
quem foi escrito.
Resumindo, nos propomos, com a ajuda do Senhor, oferecer ao leitor
alguns pensamentos simples e prticos sobre este livro, o qual cremos
que requer de um estudo mais profundo para poder ser melhor
compreendido. Queira o Esprito eterno o Autor do livro explic-lo e aplic-lo a nossas almas!
Prosperidade de J
Na primeira folha deste notvel livro vemos o patriarca J rodeado de
tudo quanto podia fazer o mundo agradvel aos seus olhos, assim
como de coisas que podiam outorg-lhe uma posio importante neste
mundo. "Havia um homem na terra de Uz, cujo nome era J; e este
era homem sincero, reto e temente a Deus, e desviava-se do mal"
(1:1). Vemos aqui o que era J em sua vida. Vejamos agora o que ele
tinha.
"E nasceram-lhe sete filhos e trs filhas. E era o seu gado sete mil
ovelhas, e trs mil camelos, e quinhentas juntas de bois, e quinhentas
jumentas; era tambm muitssima a gente ao seu servio, de maneira
que este homem era maior do que todos os do oriente. E iam seus
filhos, e faziam banquetes em casa de cada um, no seu dia; e
enviavam, e convidavam as suas trs irms a comerem e beberem com
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eles" (1:2-4). Por ltimo, para completar o quadro, se nos apresenta o
que J fazia.
"Sucedeu, pois, que, tendo decorrido o turno de dias dos seus
banquetes, enviava J, e os santificava, e se levantava de madrugada,
e oferecia holocaustos, segundo o nmero de todos eles; porque dizia
J: Porventura pecaram meus filhos e blasfemaram de Deus no seu
corao. Assim o fazia J, continuamente" (1:5). Aqui temos, ento,
um modelo de homem bastante fora do comum. Era perfeito e reto,
temeroso de Deus e apartado do mal. Alm disso, a mo de Deus o
protegia em tudo, e derramava sobre seu caminho as mais ricas
bnos. J tinha tudo o que o corao pudesse desejar: filhos,
abundncia de bens materiais, honra e distino sobre todos os que o
cercavam. Em poucas palavras, quase podemos dizer que a copa do
seu deleite terreno estava cheia.
O orgulho de J
Mas J necessitava ser provado. Abrigava no seu corao uma
profunda raiz moral que devia ser tirada luz; uma justia prpria que
devia sair superfcie e ser julgada. Podemos, com efeito, vislumbrar
esta raiz nos versculos que acabamos de ler. Ele diz: "Porventura
pecaram meus filhos..." (v. 5). No parece ter contemplado a
possibilidade de que ele mesmo tenha cometido algum pecado. Uma
alma que realmente tem-se julgado a si mesma, uma alma
quebrantada ante Deus, verdadeiramente consciente do seu prprio
estado, das suas tendncias e incapacidades, teria pensado em seus
prprios pecados e na necessidade de oferecer um holocausto por si
mesma.
Mas deve ficar em claro ao leitor que J era um verdadeiro santo de
Deus, uma alma divinamente vivificada, um possuidor da vida divina e
eterna. No poderamos insistir o suficiente neste ponto. Ele era um
homem de Deus tanto no primeiro captulo como no ltimo. Se no nos
apercebemos disto, nos privaremos de uma das grandes lies deste
livro. O versculo 8 do primeiro captulo estabelece este ponto fora de
toda cogitao: E disse o Senhor a Satans: "Observaste tu o meu
servo J? Porque ningum h na terra semelhante a ele, homem
sincero e reto, temente a Deus e desviando-se do mal".
Porm, a pesar disso, J nunca tinha sondado as profundezas do seu
prprio corao. Ele no se conhecia a si mesmo. Nunca tinha captado
realmente a verdade da sua prpria condio de runa, da sua total
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corrupo. Jamais havia aprendido a dizer: "...eu sei que, em mim, isto
, na minha carne, no habita bem algum..." (Romanos 7:18). Se no
se compreende este ponto, no se entender o livro de J. No
captaremos o objetivo especfico de todos esses profundos e penosos
exerccios pelos que J teve que passar, a menos que deixemos
evidente o solene fato de que a sua conscincia nunca tinha estado
realmente na presena divina, que ele nunca tinha se examinado ante
a luz, que jamais tinha se medido com a vara divina e que nunca havia
se pesado na balana do santurio de Deus.
Se nos remetemos por uns instantes ao captulo 29, acharemos uma
prova incontestvel do que acabamos de afirmar. Veremos ali, de
forma clara, a profunda e vigorosa raiz da satisfao pessoal que havia
no corao deste querido e honrado servo de Deus, e a maneira em
que esta raiz nutria-se dos mesmos sinais do favor divino que a
rodeavam. Este captulo encerra um pattico lamento pelo brilho
apagado dos seus dias passados; alm disso, o tom e o carter deste
lamento deixam manifesto quo necessrio era que J se despojasse
de tudo a fim de conhecer a si mesmo luz da presena divina que
tudo o examina com ateno. Ouamos as suas palavras:
"Ah! quem me dera ser como eu fui nos meses passados, como nos
dias em que Deus me guardava! Quando fazia resplandecer a sua
candeia sobre a minha cabea, e eu, com a sua luz, caminhava pelas
trevas; Como era nos dias da minha mocidade, quando o segredo de
Deus estava sobre a minha tenda; Quando o Todo-Poderoso ainda
estava comigo, e os meus meninos em redor de mim. Quando lavava
os meus passos em manteiga, e da rocha me corriam ribeiros de
azeite; Quando saa para a porta da cidade, e na praa fazia preparar a
minha cadeira. Os moos me viam, e se escondiam, e os idosos se
levantavam e se punham em p; Os prncipes continham as suas
palavras, e punham a mo sobre a sua boca; A voz dos chefes se
escondia; e a sua lngua se pegava ao seu paladar; Ouvindo-me algum
ouvido, me tinha por bem-aventurado; vendo-me algum olho, dava
testemunho de mim; Porque eu livrava o miservel, que clamava,
como tambm o rfo que no tinha quem o socorresse. A bno do
que ia perecendo vinha sobre mim, e eu fazia que rejubilasse o corao
da viva. Cobria-me de justia, e ela me servia de vestido; como
manto e diadema era o meu juzo. Eu era o olho do cego, e os ps do
coxo; Dos necessitados era pai, e as causas de que eu no tinha
conhecimento inquiria com diligncia; E quebrava os queixais do
perverso, e dos seus dentes tirava a presa. E dizia: No meu ninho
expirarei, e multiplicarei os meus dias como a areia. A minha raiz se
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estendia junto s guas, e o orvalho fazia assento sobre os meus
ramos; A minha honra se renovava em mim, e o meu arco se reforava
na minha mo. Ouvindo-me, esperavam, e em silncio atendiam ao
meu conselho. Acabada a minha palavra, no replicavam, e as minhas
razes destilavam sobre eles; Porque me esperavam, como chuva; e
abriam a sua boca, como chuva tardia. Se me ria para eles, no o
criam, e no faziam abater a luz do meu rosto; Se eu escolhia o seu
caminho, assentava-me como chefe, e habitava como rei entre as suas
tropas, como aquele que consola os que pranteiam. Mas agora, se riem
de mim os de menos idade do que eu, e cujos pais eu teria desdenhado
de pr com os ces do meu rebanho." (29:2-30:1)
Estas, seguramente, so expresses muito notveis. Em vo
buscaremos aqui os suspiros de um esprito contrito e quebrantado.
No existem rastos de nenhum tipo de aborrecimento prprio nem
muito menos de uma desconfiana em si mesmo. Expresses que
manifestem conscincia de debilidade ou de insignificncia, brilham
pela sua ausncia. No curso deste nico captulo, J se refere a si
mesmo mais de quarenta vezes, em tanto que os seus pensamentos
no se dirigem a Deus mais que cinco vezes. Este constante
predomnio do eu nos faz lembrar do captulo 7 de Romanos ("No
sabeis vs, irmos (pois que falo aos que sabem a lei), que a lei tem
domnio sobre o homem por todo o tempo que vive? Porque a mulher
que est sujeita ao marido enquanto ele viver, est-lhe ligada pela lei;
mas, morto o marido, est livre da lei do marido. De sorte que, vivendo
o marido, ser chamada adltera, se for de outro marido; mas, morto
o marido, livre est da lei, e assim no ser adltera, se for de outro
marido. Assim, meus irmos, tambm vs estais mortos para a lei,
pelo corpo de Cristo, para que sejais de outro, daquele que ressuscitou
de entre os mortos, a fim de que demos fruto para Deus. Porque,
quando estvamos na carne, as paixes dos pecados, que so pela lei,
obravam nos nossos membros, para darem fruto para a morte. Mas
agora, estamos livres da lei, pois morremos para aquilo em que
estvamos retidos; para que sirvamos em novidade de esprito, e no
na velhice da letra. Que diremos pois? a lei pecado? De modo
nenhum; mas eu no conheci o pecado seno pela lei; porque eu no
conheceria a concupiscncia, se a lei no dissesse: No cobiars. Mas
o pecado, tomando ocasio pelo mandamento, obrou em mim toda a
concupiscncia, porquanto, sem a lei, estava morto o pecado. E eu,
nalgum tempo, vivia sem lei, mas, vindo o mandamento, reviveu o
pecado, e eu morri; E o mandamento, que era para vida, achei eu que
me era para morte. Porque o pecado, tomando ocasio pelo
mandamento, me enganou, e por ele me matou. E assim a lei santa,
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e o mandamento santo, justo e bom. Logo, tornou-se-me o bom em
morte? De modo nenhum; mas o pecado, para que se mostrasse
pecado, operou em mim a morte, pelo bem, a fim de que, pelo
mandamento, o pecado se fizesse excessivamente maligno. Porque
bem sabemos que a lei espiritual; mas eu sou carnal, vendido sob o
pecado. Porque o que fao, no o aprovo; pois, o que quero, isso no
fao, mas o que aborreo, isso fao. E, se fao o que no quero,
consinto com a lei, que boa. De maneira que, agora, j no sou eu
que fao isto, mas o pecado que habita em mim. Porque eu sei que,
em mim, isto , na minha carne, no habita bem algum; e, com efeito,
o querer est em mim, mas no consigo realizar o bem. Porque no
fao o bem que quero, mas, o mal que no quero, esse fao. Ora, se
eu fao o que no quero, j o no fao eu, mas o pecado que habita
em mim. Acho, ento, esta lei em mim: que, quando quero fazer o
bem, o mal est comigo. Porque segundo o homem interior, tenho
prazer na lei de Deus; Mas vejo nos meus membros outra lei, que
batalha contra a lei do meu entendimento, e me prende debaixo da lei
do pecado, que est nos meus membros. Miservel homem que eu
sou! Quem me livrar do corpo desta morte? Dou graas a Deus, por
Jesus Cristo, nosso Senhor. Assim que, eu mesmo, com o
entendimento, sirvo lei de Deus, mas, com a carne, lei do
pecado."); mas devemos marcar uma diferena importantssima, a
saber, que nesse captulo de Romanos o eu uma pobre, fraca,
inservvel e miservel criatura que se encontra na presena da santa lei
de Deus; enquanto que em J 29, o eu uma personagem de
destacada importncia e influncia, uma personagem admirada e quase
adorada pelos seus semelhantes.
Agora bem, J tinha que se despojar de tudo isto; e, se comparamos o
captulo 29 com o captulo 30, poderemos formar-nos uma idia do
penoso que deve ter sido o processo deste despojamento. Existe uma
nfase particular nestas palavras: "Mas agora", no inicio do captulo 30.
J traa, entre estes dois captulos, um agudo contraste entre seu
passado e seu presente.
No captulo 30 ele se encontra ainda ocupado em si mesmo: ainda o
eu quem predomina; mas, ah, quo mudado est tudo! Os mesmos
homens que o elogiavam nos dias de sua prosperidade, o tratam com
desprezo no tempo de sua adversidade. Sempre assim neste pobre
mundo, falso e enganoso; e bom advertimos isso. Todos, antes ou
depois, terminaro descobrindo a hipocrisia deste mundo; a veleidade
daqueles que esto prestes a exclamar um dia "Hosanna!", e no
seguinte dia: "Crucifica-o!". no se deve confiar neste homem. Tudo
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marcha perfeitamente bem enquanto o sol brilha; aguardemos, porm,
que cheguem as geladas do inverso, e vejamos ento at onde
podemos confiar nas impressionantes promessas e declaraes da
natureza. Enquanto o "filho prdigo" teve bens em abundncia para
dilapidar, houve multides de amigos para compartilhar as suas
riquezas; mas quando comeou a padecer necessidade, "ningum lhe
dava (nada)" (Lucas 15:16).
O mesmo aconteceu com J no captulo 30. porm, temos que levar
em conta que o despojamento de si mesmo e o descobrimento da
hipocrisia e a veleidade do mundo no tudo. A gente pode
experimentar todas estas coisas e no achar finalmente seno
problemas e desiluses; e esse ser o resultado se no elevamos o
nosso olhar a Deus. enquanto o corao no encontre em Deus a sua
plena satisfao, qualquer mudana adversa de circunstncias nos
deixar submersos na desolao; ento, o descobrimento da veleidade
e hipocrisia dos homens nos encher de amargura. Esta a explicao
pela linguagem que J utiliza no captulo 30: "Mas, agora, se riem de
mim os de menos idade do que eu, e cujos pais eu teria desdenhado de
pr com os ces do meu rebanho" (30:1). Era este o esprito de Cristo?
Teria falado assim J ao final do livro? Certamente que no; oh, no,
querido leitor! Uma vez que J se encontrou em presena de Deus,
terminaram o egotismo do captulo 29 e a amargura do captulo 30.
Porm, ouamos ainda mais expresses de desafogo: "Eram filhos de
doidos, e filhos de gente sem nome, e da terra eram expulsos. Mas,
agora, sou a sua cano, e lhes sirvo de provrbio. Abominam-me, e
fogem para longe de mim, e no meu rosto no se privam de cuspir.
Porque Deus desatou a sua corda e me oprimiu; pelo que, sacudiram
de si o freio perante o meu rosto. direita, se levantam os moos;
empurram os meus ps, e preparam contra mim os seus caminhos de
destruio. Desbaratam-me o meu caminho; promovem a minha
misria; uma gente que no tem nenhum ajudador. Vm contra mim
como por uma grande brecha, e revolvem-se entre a assolao" (30:8-
14).
Agora bem, tudo isto bem podemos dizer estava muito, mas muito longe do alvo. Lamentaes por uma grandeza desvanecida e amargas
invectivas contra nossos semelhantes no serviro de nada para o
corao, nem manifestam para nada o esprito e a mente de Cristo;
assim como tambm no glorificaro seu santo Nome. Se
contemplarmos a bendita pessoa do Senhor, veremos algo
completamente diferente: o Senhor Jesus, "manso e humilde de
corao", recebe todo o desprezo do mundo, sofre o desengano em
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meio do seu povo Israel e se encontra com a incredulidade e os
desatinos dos seus discpulos. Tudo isto Jesus assumiu dizendo
simplesmente: "Sim, Pai, porque assim te aprouve" (Mateus 11:26).
Ele foi capaz de se apartar de toda a agitao dos homens e olhar
simplesmente a Deus, para proferir ento estas maravilhosas palavras:
"Vinde a mim... e eu vos aliviarei" (Mateus 11:28). Nenhum desgosto,
amargura, invectivas nem palavras duras ou ofensivas poderemos
achar jamais neste gracioso Salvador que desceu a este mundo frio e
sem corao, para manifestar o perfeito amor de Deus e prosseguir sua
trilha de servio apesar de todo o dio dos homens.
Mas o mais excelente, o melhor dos homens, quando medido com a
vara perfeita da vida de Cristo, no lhe chega nem sombra. A luz de
Sua glria moral pe de manifesto os defeitos e as imperfeies do
mais perfeito dos filhos dos homens, "para que em tudo tenha a
preeminncia" (Colossenses 1:18). Enquanto paciente submisso que
foi chamado a suportar, Ele sobressai em vvido contraste com um J
ou um Jeremias. J sucumbiu sob o peso das provas pelas que teve
que passar. No s deixou escapar um torrente de amargas invectivas
contra os seus semelhantes, mas at amaldioou o dia do seu
nascimento. "Depois disto, abriu J a sua boca, e amaldioou o seu dia.
E J, falando, disse: Perea o dia em que nasci, e a noite em que se
disse: Foi concebido um homem!" (3:1-3).
Achamos algo idntico no caso de Jeremias, esse bem-aventurado
varo de Deus. Ele tambm, no podendo resistir presso das
diferentes provaes que iam acumulando-se, deu lugar aos seus
sentimentos com estas amargas palavras: "Maldito o dia em que nasci:
o dia em que minha me me deu luz no seja bendito. Maldito o
homem que deu as novas a meu pai, dizendo: Nasceu-te um filho;
alegrando-o com isso, grandemente. E seja esse homem como as
cidades que o Senhor destruiu, sem que se arrependesse: e oua
clamor pela manh, e ao tempo do meio-dia um alarido. Por que no
me matou desde a madre? ou minha me no foi minha sepultura? ou
no ficou grvida perpetuamente? Por que sa da madre, para ver
trabalho e tristeza, e para que se consumam os meus dias na
confuso?" (Jeremias 20:14-18).
Que linguagem! S pensa em amaldioar o homem que traz as novas
do seu nascimento! E o amaldioa porque no o matou no ventre! Tudo
isto, tanto no que refere-se ao patriarca quanto ao profeta, encontra-se
em agudo contraste com o manso e humilde Jesus de Nazar. Ele, o
Salvador imaculado, sofreu provas muito mais numerosas e terrveis do
que todos os seus servidores juntos. Porm, jamais um s murmrio
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brotou dos seus lbios. Tudo suportou com pacincia e afrontou a hora
mais sombria com estas palavras: "No beberei eu o clice que o Pai
me deu?" (Joo 18:11) bendito Senhor, Filho do Pai, quo digno s da
nossa adorao! Nos prostramos aos teus ps, sumidos em adorao,
amor e louvores, te reconhecendo como Senhor de todo! "Escolhido
entre dez mil, e totalmente desejvel" (Cantares 5:10,16).
A histria dos caminhos de Deus com as almas que nos apresenta este
livro constitui o campo mais frtil para o nosso estudo; a mais
interessante histria, sumamente instrutiva e proveitosa. O principal e
grande objetivo destes desgnios de Deus com as almas pe o de
produzir uma verdadeira contrio e humilhao de esprito; apartar de
ns toda falsa justia; fazer com que nos despojemos de toda
confiana em ns mandamentos e ensinar-nos a buscar em Cristo o
nosso nico amparo. Todos tm que passar atravs do que poderia
denominar-se de "processo de despojamento e esvaziado de um
mesmo". Uns experimentam este processo antes de sua converso ou
novo nascimento; outros, depois. Alguns so trazidos a Cristo passando
por terrveis experincias e penosos exerccios de corao e de
conscincia, exerccios que podem durar anos e, a vezes, toda a vida.
Outros, em cambio, obtm esta mesma graa atravs de exerccios de
alma relativamente simples. Estes ltimos se apropriam de imediato
das boas novas do perdo dos pecados que foi possvel graas morte
expiatria de Cristo. Seu corao se enche de gozo em seguida. Mas o
despojamento e esvaziamento do eu vem depois e, em muitos casos,
pode sacudir a alma desde suas prprias fundaes e faz-la duvidar
de sua prpria salvao.
Isto muito doloroso, mas absolutamente necessrio. Efetivamente, o
eu, antes ou depois, deve ser conhecido e julgado. Se a gente no
aprende a conhec-lo na comunho com Deus, acabar fazendo-o
atravs da experincia amarga de alguma queda, "Para que nenhuma
carne se glorie perante Ele" (1 Corntios 1:29). E todos ns devemos
aprender a conhecer nossa absoluta impotncia para todo, a fim de
poder gostar da doura e o consolo desta verdade: que Cristo "para
ns foi feito, por Deus, sabedoria, e justia, e santificao, e redeno"
(1 Corntios 1:30). Deus quer vasos vazios. No esqueamos. uma
verdade solene e necessria. "Porque, assim diz o alto e o sublime, que
habita na eternidade, e cujo nome santo: Num alto e santo lugar
habito, e tambm com o contrito e abatido de esprito, para vivificar o
esprito dos abatidos e para vivificar o corao dos contritos." (Isaias
57:15). Tambm lemos: "Assim diz o Senhor: O Cu o meu trono, e
a terra o escabelo dos meus ps: que casa me edificareis vs? e que
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lugar seria o do meu descanso? Porque a minha mo fez todas estas
coisas, e todas estas coisas foram feitas, diz o Senhor; mas eis para
quem olharei: para o pobre e abatido de esprito, e que treme da
minha palavra." (Isaias 66:1-2).
Quo propcias so estas palavras para todos ns! Um esprito contrito
e quebrantado constitui uma das necessidades mais urgentes de nosso
tempo. A maior parte de nossas calamidades e dificuldades podem
serem atribudas a esta necessidade. Os progressos que realizamos dia
a dia, na vida familiar, na assemblia, no mundo, em toda a nossa vida
prtica, quando o eu subjugado e mortificado, so verdadeiramente
admirveis. Mil coisas que sem este exerccio seriam como uma chama
que faz arder nossos coraes, so estimados como nada quando as
nossas almas se encontram num estado verdadeiramente contrito.
Podemos ento suportar repreenses e insultos; passar por alto
menosprezos e afrontas; pisotear nossos caprichos, predilees e
prejuzos, como assim tambm ceder ante os outros quando no se
vejam comprometidos princpios fundamentais; estar dispostos a toda
boa obra, manifestar uma agradvel amplido de corao em todas as
nossas relaes, e ser menos rgidos em nosso trato com os outros, de
maneira de enfeitar a doutrina de Deus, nosso Salvador. Mas, ai, quo
freqentemente acontece o contrrio com ns! Manifestamos um
temperamento relutante, inflexvel; combatemos em favor dos nossos
direitos; nos inclinamos para todo o que nos d algum benefcio;
buscamos nossos prprios interesses pessoais; queremos impor nossas
prprias idias. Tudo isto demonstra claramente que o nosso eu no
ponderado nem julgado de forma habitual na presena de Deus.
Porm, o repetimos com nfase: Deus quer vasos vazios. Nos ama
demasiadamente para nos deixar em nossa dureza e teimosia, e por
isso estima conveniente nos fazer passar atravs de todo tipo de
exerccios a fim de nos trazer a um estado da alma em que possa nos
utilizar para a Sua glria. necessrio que a vontade seja
quebrantada, que a confiana prpria, a auto-satisfao e o orgulho
sejam arrancados de raiz. Deus se valer das cenas e circunstncias
pelas que temos que passar, assim como das pessoas com que nos
relacionamos na vida diria, a fim de disciplinar o nosso corao e
quebrantar a nossa vontade. E, alm disso, Ele mesmo tratar
diretamente com ns a fim de conseguir estes formidveis resultados
prticos.
Tudo isto revela-se com grande claridade no livro de J, tornando suas
pginas sumamente atrativas e frutferas. muito evidente que J
precisava ser fortemente chacoalhado. Podemos estar seguros de que
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se isso no tivesse sido necessrio, o Deus da graa e da bondade no
o teria feito passar por provaes semelhantes. Sem dvida, no foi
sem um propsito que Deus permitiu a Satans disparar suas
mortferas flechas sobre seu amado servo. Podemos afirmar, com
absoluta certeza, que Deus no teria procedido desse jeito se o estado
de J no o houvesse necessitado. Deus amava a J com um amor
perfeito; mas tratava-se de um amor sbio e fiel, um amor que tinha
em conta todos os detalhes da vida, e que podia penetrar no corao
de este amado servo de Deus, e descobrir uma profunda e maligna raiz
moral que J jamais tinha visto nem julgado. Que graa ter que ver
com semelhante Deus! Que graa estar nas mos de Aquele que no
evita esforos quando tem que submeter em ns tudo quanto seja
contrrio a Ele, e lavrar Sua bendita imagem em ns!
Mas, querido leitor, no h algo profundamente interessante no fato de
que Deus pode at se servir de Satans como instrumento para a
disciplina do sem povo? Vemos isto na vida do apstolo Pedro, mesmo
que na do patriarca J. Pedro tinha que ser cirandado, e Satans foi
utilizado para cumprir essa tarefa: "Simo, Simo, eis que Satans vos
pediu para vos cirandar como trigo" (Lucas 22:31). Ali tambm havia
uma necessidade imperiosa. Havia uma raiz profunda no corao de
Pedro que devia ser descoberta: a raiz da confiana em si mesmo. E
seu fiel Senhor considerou absolutamente necessrio faz-lo passar
atravs de um processo severo e doloroso, a fim de que essa raiz fosse
trazida luz e julgada. Por isso se lhe permitiu a Satans cirandar a
Pedro para que se conduzisse com prudncia todos os dias de sua vida,
e jamais voltasse a confiar no prprio corao. Deus quer vasos
vazios, j seja se trate de um patriarca ou de um apstolo. Tudo, no
homem, tem que ser abrandado e subjugado a fim de que a glria
divina resplandea nele com um brilho inextinguvel. Se J tivesse
conhecido este grande princpio, se tivesse captado o objetivo divino,
quo diferentemente teria se conduzido! Mas ele como ns devia aprender a sua lio; e o Esprito Santo, no texto inspirado, nos relata
a maneira em que J aprendeu essa lio, para que assim tambm ns
possamos tirar proveito dela.
Continuemos a ler o relato.
"E vindo um dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se
perante o Senhor, veio, tambm, Satans entre eles. Ento o Senhor
disse a Satans: Donde vens? E Satans respondeu ao Senhor, e disse:
De rodear a terra, e passear por ela. E disse o Senhor a Satans:
Observaste tu o meu servo J? Porque ningum h na terra semelhante
a ele, homem sincero e reto, temente a Deus e desviando-se do mal.
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Ento respondeu Satans ao Senhor, e disse: Porventura teme J a
Deus debalde? Porventura no o cercaste tu de bens, a ele, e a sua
casa, e a tudo quanto tem? A obra das suas mos abenoaste e o seu
gado est aumentado na terra. Mas estende a tua mo, e toca-lhe em
tudo quanto tem, e vers se no blasfema de ti na tua face!" (1:6-11).
Que cena temos aqui, da malcia de Satans! Que extraordinria
testemunha da maneira em que Ele vigia e considera os caminhos e as
obras do povo de Deus! Quo perfeitamente conhece o carter
humano! Que ntimo conhecimento possui da mente e do estado moral
do homem! Que coisa terrvel cair em suas mos! Ele est sempre
vigiando, sempre pronto se Deus o permitir a empregar todo o seu maligno poder contra os cristos.
Que solene pensar em tudo isto! Deveria induzir-nos a seguir uma
senda humilde e alerta, no meio da cena onde Satans pratica o seu
domnio! Esse encontra-se absolutamente impotente frente a uma alma
que permanece na dependncia e obedincia; e bendito seja Deus, Satans no pode, em caso nenhum, traspassar o limite traado por
prescrio divina. Assim aconteceu com J: "E disse o Senhor a
Satans: Eis que tudo quanto tem est na tua mo; somente contra ele
no estendas a tua mo. E Satans saiu da presena do Senhor"
(1:12).
Aqui, pois, permitido a Satans estender a sua mo sobre as
possesses de J, lhe arrebatar os filhos e despoj-lo de todas as suas
riquezas. E certamente ele no perdeu um instante para realizar a sua
obra. Com notvel velocidade cumpriu a sua misso. Um golpe trs
outra caia sucessivamente sobre a cabea do devoto patriarca. Apenas
um dos seus mensageiros pode lhe transmitir a sua triste notcia, e em
seguida aparece um outro com uma novidade ainda mais terrvel, at
que por fim o afligido servo de Deus "se levantou, e rasgou o seu
manto, e rapou a sua cabea, e se lanou em terra, e adorou, E disse:
Nu sa do ventre de minha me, e nu tornarei para l; o Senhor o deu,
e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor. Em tudo isto, J
no pecou, nem atribuiu a Deus falta alguma." (1:20-22).
Tudo isto profundamente comovente. Ser privado num instante dos
seus dez filhos e logo reduzido das riquezas principescas penria
absoluta, era, humanamente falando, motivo suficiente para
cambalear. Que notvel contrate entre as primeiras e as ltimas linhas
do primeiro captulo! Ao princpio, vemos a J rodeado de uma
numerosa famlia, e desfrutando das suas muitas possesses;
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enquanto que, ao ltimo, o vemos abandonado, sumido na pobreza e a
nudez. E pensar que foi Satans quem com a permisso e, ainda mais, com o pedido de Deus o tinha reduzido a tal estado! Y para que foi feito tudo isto? Para o proveito permanente e profundo da preciosa
alma de J. Deus via que o seu servo necessitava aprender uma lio;
e considerava, alm disso, que tal lio s poderia ser ensinada
fazendo passar a J por uma prova penosa por um verdadeiro tormento, cuja simples meno cheia a mente de solene temor. Deus no deixar de ensinar a Seus filhos, ainda que tivesse que despoj-los
de tudo ao que o corao se afeioa neste mundo!
Mas devemos seguir ao nosso patriarca em guas ainda mais
profundas.
"E, vindo outro dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se
perante o Senhor, veio, tambm, Satans entre eles apresentar-se
perante o Senhor. Ento o Senhor disse a Satans: De onde vens? E
respondeu Satans ao Senhor, e disse: De rodear a terra, e passear
por ela. E disse o Senhor a Satans: Observaste o meu servo J?
Porque ningum h na terra semelhante a ele, homem sincero e reto,
temente a Deus, e desviando-se do mal, e que ainda retm a sua
sinceridade, havendo-me tu incitado contra ele, para o consumir sem
causa. Ento Satans respondeu ao Senhor, e disse: Pele por pele, e
tudo quanto o homem tem dar pela sua vida. Estende, porm, a tua
mo, e toca-lhe nos ossos, e na carne, e vers se no blasfema de ti
na tua face! E disse o Senhor a Satans: Eis que ele est na tua mo;
poupa, porm, a sua vida. Ento saiu Satans da presena do Senhor,
e feriu a J de uma chaga maligna, desde a planta do p at ao alto da
cabea. E J, tomando um pedao de telha para raspar com ele as
feridas, assentou-se no meio da cinza. Ento sua mulher lhe disse:
Ainda retns a tua sinceridade? amaldioa a Deus, e morre. Mas ele lhe
disse: Como fala qualquer doida, assim falas tu; receberemos o bem de
Deus, e no receberamos o mal? Em tudo isto, no pecou J com os
seus lbios." (2:1-10).
Esta uma passagem muito notvel. Nos instrui acerca do lugar que
ocupa Satans a respeito do governo de Deus. Ele no mais do que
um instrumento; e, embora esteja sempre pronto para acusar ao povo
de Deus, no pode fazer nada, seno s o que Deus lhe permite. Seus
esforos, no que a J se refere, viram-se frustrados e, trs esgotar
seus ltimos recursos, desaparece, e no ouvimos nada mais acerca
das suas manobras no resto do livro, quaisquer pudessem ter sido as
suas intenes. J deu mostras de que pode guardar a sua integridade;
e, se as coisas tivessem acabado aqui, a sua pacincia nos sofrimentos
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no teria feito outra coisa seno firmar ainda mais as razes de sua
prpria justia e alimentar a sua auto-satisfao. "Ouvistes" diz Tiago "qual foi a pacincia de J, e vistes o fim que o Senhor lhe deu; porque o Senhor muito misericordioso e piedoso" (Tiago 5:11). Se
tivesse se tratado simplesmente de uma questo da pacincia de J,
ele teria conseguido assim mais motivos para seguir confiando em si
mesmo, e o "fim do Senhor" no teria sido alcanado. Pois e no esqueamos nunca a misericrdia e a compaixo do Senhor s podem ser gostadas por aqueles de esprito contrito e corao
quebrantado. Agora bem, J no podia ser contado entre estes, por
muito que estivesse sentado no meio das cinzas. Ele ainda no havia
quebrado por completo sua cerviz diante de Deus. Ainda era o grande
homem to grande nos seus infortnios quanto o fora em tempos da prosperidade; to grande sob os ventos violentos e erosivos da adversidade quanto era sob o sol radiante dos seus melhores e mais
esplendorosos dias. O corao de J ainda no tinha sido alcanado.
No estava ainda preparado para exclamar : "Eis que sou vil" (40:4),
nem havia todavia aprendido a dizer: "Por isso, me abomino e me
arrependo no p e na cinza" (42:6).
Estamos ansiosos de que o leitor capte com claridade este ponto.
Constitui, em grande parte, a clave de todo o livro de J. O objetivo
divino era expor aos olhos de J as profundezas do seu prprio
corao, a fim de que aprendesse a se deleitar na graa e na
misericrdia de Deus; todas as acusaes de Satans se
desmoronaram em sua prpria cara; porm, J continuava sem ser um
vaso vazio, e por tanto, no estava preparado para "o fim do Senhor",
esse fim bendito para todo corao contrito, um fim caracterizado pela
misericrdia e a compaixo. Deus bendito seja o Seu Nome no tolerar que Satans nos acuse; mas Ele quer nos fazer ver o que h
em nosso corao, a fim de que nos julguemos a ns mesmos e
aprendamos a desconfiar dos nossos prprios coraes e a repousar na
inquebrantvel firmeza de sua graa.
Por enquanto, vemos que J "retm a sua integridade". Enfrenta com
calma as terrveis aflies que Satans lhe causou com a permisso de
Deus; e alm disso, rejeita o insensato conselho de sua mulher. Em
uma palavra, aceita todo como proveniente da mo de Deus, e inclina
a sua cabea ante Suas misteriosas dispensaes.
Tudo isto sem dvida era bom. Porm, a chegada dos trs amigos de
J provoca uma mudana notvel. A sua simples presena, o mero fato
de serem testemunhas oculares de sua misria, influiu nele de uma
maneira surpreendente. "Ouvindo, pois, trs amigos de J, todo este
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mal que tinha vindo sobre ele, vieram cada um do seu lugar: Elifaz, o
temanita, e Bildade, o suta, e Sofar, o naamatita; e concertaram
juntamente virem condoer-se dele, e consol-lo. E, levantando de
longe os seus olhos e no o conhecendo, levantaram a sua voz e
choraram; e rasgando cada um o seu manto, sobre as suas cabeas
lanaram p ao ar. E se assentaram juntamente com ele na terra, sete
dias e sete noites; e nenhum lhe dizia palavra alguma, porque viam
que a dor era muito grande." (2:11-13).
Bem podemos crer que estes trs homens estavam motivados, ante
todo, por bons sentimentos para com J; e no lhes foi um grande
sacrifcio ter que deixar seus lares para vir a condoer-se do seu afligido
amigo. Tudo isto podemos compreend-lo sem maior dificuldade. Mas
evidente que sua presena teve o efeito de despertar no corao de J
sentimentos e pensamentos que at ento tinham permanecido
adormecidos. Ele tinha suportado com resignao a perda dos seus
filhos, dos seus bens e de sua sade. Satans tinha sido repelido, e o
conselho de sua mulher, rejeitado. Mas a presena de seus amigos
abateu por completo o esprito de J. "Depois disto, abriu J a sua
boca, e amaldioou o seu dia." (3:1).
Isto muito notvel. Seus amigos, pelo visto, no haviam proferido
uma nica palavra. Sentaram em absoluto silncio, com suas vestes
rasgadas e suas cabeas cobertas de cinzas, contemplando uma aflio
to profunda que era impossvel de sondar. J mesmo foi quem
rompeu o silncio. Todo o terceiro captulo consiste em um desabafo de
seus amargos lamentos, evidenciando assim, tristemente, um esprito
indmito. podemos dizer com certeza que impossvel que algum que
haja aprendido a dizer em alguma medida "seja feita a Tua vontade",
possa alguma vez amaldioar o dia em que nasceu ou empregar a
linguagem que vemos no terceiro captulo do nosso livro. Sem dvida,
algum pode dizer: " fcil falar quando nunca nos tocou ter que
suportar as terrveis provas de J". Isto muito certo, e podemos
agregar que nenhum outro homem haveria agido melhor em
circunstncias semelhantes. Tudo isto compreendemos perfeitamente;
mas no muda em absoluto o grande ensino moral do livro de J,
ensino que temos o privilgio de aprender. J era um verdadeiro santo
de Deus; mas ele como todos ns necessitava conhecer a si mesmo. Precisava que as razes ocultas do seu ser moral fossem
descobertas ante seus prprios olhos, de modo que pudesse
verdadeiramente aborrecer-se e arrepender-se no p e nas cinzas. E
necessitava, tambm, ter uma percepo mais profunda e verdadeira
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do que Deus era, para assim poder confiar nEle e justific-Lo em todas
as circunstncias.
Todas estas coisas, porm, as buscaremos em vo no primeiro discurso
de J. "E J, falando, disse: Perea o dia em que nasci, e a noite em
que se disse: Foi concebido um homem! (...) Por que no morri eu
desde a madre, e, em saindo do ventre, no expirei?" (3:2-3,11). Estes
no so os pontos de um esprito contrito e quebrantado, nem de
algum que tem aprendido a dizer: "Sim, Pai, porque assim te
aprouve" (Mateus 11:26). Se h alcanado um importante ponto na
histria da alma quando se s capaz de inclinar mansamente ante
todas as dispensaes da mo de nosso Pai. Uma vontade quebrantada
um dom precioso e extraordinrio. Tem se alcanado um grau
elevado na escola de Cristo quando se s capaz de dizer: "j aprendi a
contentar-me com o que tenho" (Filipenses 4:11). Paulo teve que
aprender isto. No era conforme sua natureza; e com certeza jamais
o teria aprendido aos ps de Gamaliel. Teve que quebrar-se por
completo aos ps de Jesus de Nazar antes de conseguir dizer desde o
fundo do corao: "estou contente". Teve que sopesar o significado
destas palavras: "A minha graa te basta", antes de poder "se
aperfeioar na fraqueza" (2 Corntios 12:9). O homem que foi capaz de
empregar esta linguagem o antpoda do que pode amaldioar o dia
em que nasceu, e exclamar: "perea o dia em que nasci". Pense s
num santo de Deus, num herdeiro da glria, dizendo: "perea o dia em
que nasci". Ah, se J tivesse estado em presena de Deus, nunca teria
pronunciado palavras semelhantes! Teria sabido perfeitamente bem por
que havia ficado com vida. Haveria um sentido claro e satisfatrio para
a sua alma do que Deus tinha reservado para ele. Haveria justificado a
Deus em todas as coisas. Mas J no se encontrava na presena de
Deus, seno na dos seus amigos, os quais demonstraram claramente
ter pouco ou nenhumconhecimento do carter de Deus e do verdadeiro objetivo dos Seus desgnios para com o Seu querido servo
J.
Discursos dos amigos de J
No de nenhuma forma o nosso propsito realizar uma exame
minuciosa das extensas discusses que se sucederam entre J e seus
amigos, discusses que abarcam mais de 29 captulos. S citaremos
alguns fragmentos dos discursos dos trs amigos, o que possibilitar ao
leitor formar-se uma idia do verdadeiro terreno em que estes homens
estavam errados.
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Elifaz e a experincia
Elifaz o primeiro em tomar a palavra. "Ento respondeu Elifaz, o
temanita, e disse: Se intentarmos falar-te, enfadar-te-s? Mas quem
poder conter as palavras? Eis que ensinaste a muitos, e esforaste as
mos fracas. As tuas palavras levantaram os que tropeavam, e os
joelhos desfalecentes fortificaste. Mas agora a ti te vem, e te enfadas;
e, tocando-te a ti, te perturbas. Porventura no era o teu temor de
Deus a tua confiana, e a tua esperana a sinceridade dos teus
caminhos? Lembra-te agora de qual o inocente que jamais
perecesse? E onde foram os sinceros destrudos? Segundo eu tenho
visto, os que lavram iniqidade e semeiam o mal segam isso mesmo"
(4:1-8). Assim tambm: "Bem vi eu o louco lanar razes; mas logo
amaldioei a sua habitao" (5:3). E tambm: "Eis que bem-
aventurado o homem a quem Deus castiga; no desprezes, pois, o
castigo do Todo-Poderoso" (5:17).
A partir destas declaraes resulta evidente que Elifaz pertencia a essa
classe de gente que gosta de argir se baseando na prpria
experincia. Seu ditado era: "Eu vi". Agora bem, possvel que o
que hajamos "visto", seja o que for, seja absolutamente verdadeiro.
Mas um erro terrvel fazer da nossa experincia individual uma regra
geral; porm, milhares tm esta inclinao. O que tinha a ver, por
exemplo, a experincia de Elifaz com a situao de J? Talvez ele
jamais se encontrou com um outro caso exatamente igual ao de J; e
embora houvesse existido um nico rasgo de disparidade entre os dois
casos, toda a argumentao baseada na experincia de um deles no
teria sido de utilidade alguma para o outro. E isto fica claro no
acontecido a J: assim que Elifaz acabou de falar, J quem no lhe havia prestado a menor ateno, prosseguiu falando das prprias aflies, intercalando palavras de justificao prpria e amargas
recriminaes contra os desgnios de Deus (cap. 6 e 7).
Bildade e a tradio
Bildade o segundo a falar. Ele se instala sobre um terreno
completamente diferente daquele do seu amigo. No menciona nem
uma vez s as suas experincias, nem o que fosse resultado da sua
prpria observao. Apela antiguidade. "Porque, eu te peo,
pergunta agora s geraes passadas, e prepara-te para a inquirio
de seus pais. Porque ns somos de ontem, e nada sabemos; porquanto
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os nossos dias sobre a terra so como a sombra. Porventura no te
ensinaro eles, e no te falaro, e do seu corao no tiraro razes?"
(8:8-10).
Agora bem, devemos admitir que Bildade nos conduz a um campo
muito mais vasto que aquele de Elifaz. A autoridade de uma multido
de "padres" tem muito mais peso e respeitabilidade que a experincia
de um simples indivduo. Por outra parte, se deixar conduzir pela voz
de uma multido de homens sbios e eruditos parece muito mais
modesto que faz-lo luz da experincia de um s deles. Mas o
assunto que nem a experincia nem a tradio serviro de nada. A
primeira, at onde chega, pode ser verdadeira; mas dificilmente
acharemos duas pessoas cujas experincias coincidam de maneira
perfeita. Referente segunda, uma profusa confuso; pois um difere
doutro, e nada pode ser mais volvel e incerto do que a voz da tradio
ou a autoridade dos pais.
Em conseqncia, como era de se esperar, as palavras de Bildade no
afetaram mais a J do que as de Elifaz. Um estava to longe da
verdade quanto o outro. Se eles tivessem apelado revelao divina,
quo diferentes teriam sido os resultados! A verdade de Deus a
nica regra, a nica grande autoridade. segundo a sua medida que
todo deve ser medido; e todos, antes ou depois, devero inclinar-se
sob a sua autoridade. Ningum tem o direito de estabelecer a sua
experincia como regra para os outros. E se nenhum homem tem este
direito, tambm no o tem uma multido de homens. Em outras
palavras, a voz de Deus no a voz do homem a que nos deve governar. Nem a experincia nem a tradio, seno a Palavra de Deus
sozinha a que pronunciar o juzo no ltimo dia. Fato solene e
importante! No o percamos nunca de vista! Se Bildade e Elifaz
tivessem discernido isto, as suas palavras teriam exercido muita mais
influncia no seu afligido amigo.
Zofar e a legalidade
Consideremos agora brevemente a primeira parte do discurso de Zofar,
o naamatita: "Mas, na verdade, oxal que Deus falasse e abrisse os
seus lbios contra ti, E te fizesse saber os segredos da sabedoria, que
multplice em eficcia; pelo que, sabe que Deus exige de ti menos do
que merece a tua iniqidade" (11:5-6). "Ainda que ele me mate, nele
esperarei; contudo, os meus caminhos defenderei diante dele" (13:15).
Estas palavras tm um forte gosto a legalidade. Mostram claramente
que Zofar no tinha um sentido justo do carter de Deus. No conhecia
a Deus. Nenhum que possua o verdadeiro conhecimento de Deus
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poderia falar dEle como de algum que abre a boca contra o pobre
pecador afligido ou que exige algo de uma criatura desvalida e
necessitada. Deus bendito seja Seu Nome por sempre no contra ns, seno por ns (Romanos 8: 31). Ele no um cobrador
ou um demandante legal, seno um generoso doador. Observemos
nos ltimos versculos que limos; Zofar diz: "Se tu preparaste o teu
corao" (11:13). Agora bem, que aconteceria se J no tivesse
preparado o seu corao? verdade que um homem deveria ter
sempre disposto o seu corao; mas isso no ser possvel em tanto e
enquanto o seu estado moral seja bom. J, lamentavelmente, no se
encontrava num bom estado, pelo que, quando tenta dispor seu
corao, no acha nele outra coisa seno iniqidade. Ento, o que
deveria fazer ele? Zofar no podia lhe dizer como tambm no podiam nenhum dos outros da sua escola. Eles somente conheciam a Deus como um severo opressor, como algum que s abre a sua boca
para falar contra o pecador.
Haveremos, pois, de assombrar-nos de que Zofar estivesse to longe
de redargir a J quanto os seus dois companheiros? Todos eles
estavam completamente errados. A tradio, a experincia e a
legalidade so todas igualmente defeituosas, limitadas e falsas.
Nenhuma desta trs coisas nem as trs juntas poderiam ter sido uma ajuda para J. Elas s "escurece(m) o conselho, com palavras sem
conhecimento" (38:2). Nenhum dos trs amigos compreendeu a J;
ainda mais, eles no conheciam o carter de Deus nem o seu propsito
a respeito da prova do servo. Estavam completamente errados. No
sabiam como apresentar a Deus ante J e, conseqentemente,
tambm no souberam levar a conscincia do seu amigo presena
mesma de Deus. Em vez de conduzi-lo ao julgamento de si mesmo, s
contriburam a sua prpria justificao. No introduziram a Deus em
suas conversas. Falaram algumas coisas verdadeiras, mais no
possuam a verdade. Trouxeram luz as suas experincias, a sua
tradio e a sua legalidade, mas no expuseram a verdade.
Por esta razo, os trs amigos no puderam persuadir J. Seu
ministrio era de uma natureza parcial e, em vez de fechar a boca de
J, s conseguiram lev-lo a um campo de discusso que parecia
interminvel. J, ento, no deixa de lhes responder palavra por
palavra, e de agregar muitas mais: "Na verdade, que s vs sois o
povo, e convosco morrer a sabedoria. Tambm eu tenho um corao
como vs, e no vos sou inferior; e quem no sabe tais coisas como
estas?" (12:2-3). "Vs, porm, sois inventores de mentiras, e, vs
todos, mdicos que no valem nada. Oxal vos calsseis de todo, que
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isso seria a vossa sabedoria!" (13:4-5). "Tenho ouvido muitas coisas
como estas, todos vs sois consoladores molestos. Porventura no
tero fim estas palavras de vento? Ou que te irrita, para assim
responderes? Falaria eu, tambm, como vs falais, se a vossa alma
estivesse em lugar da minha alma? Ou amontoaria palavras contra vs
e menearia contra vs a minha cabea?" (16:2-4). "At quando
entristecereis a minha alma, e me quebrantareis com palavras? J dez
vezes me envergonhastes; no tendes vergonha de contra mim vos
endurecerdes? (...) Compadecei-vos de mim, amigos meus,
compadecei-vos de mim, porque a mo de Deus me tocou." (19:2-3,
21).
Todas estas expresses demonstram que J estava longe de ter esse
esprito quebrantado e essa atitude humilde que surgem como
resultado de estar na presena de Deus. Sem dvida, seus amigos
estavam errados, completamente errados em suas noes acerca de
Deus tanto quanto em suas maneiras de tratar com Ele. Mas seus erros
no justificavam a J. Se a sua conscincia tivesse estado na presena
de Deus, ele no teria respondido aos seus amigos, ainda quando o seu
erro tivesse sido mil vezes maior e a sua maneira de trat-lo, mil vezes
mais severa. Teria inclinado a cabea com humildade e permitido que a
mar das repreenses e acusaes o atropelasse. Teria se beneficiado
com a mesma severidade dos amigos ao consider-la como uma
disciplina saudvel para o seu corao. Mais no; J ainda no tinha
conseguido acabar consigo mesmo. Se justificava a si mesmo, proferia
invectivas contra os seus semelhantes e estava cheio de pensamentos
errados acerca de Deus. Necessitava outro ministrio que o conduzisse
a uma atitude correta da alma diante de Deus.
Quanto mais detidamente estudamos as extensas discusses que se
sucederam entre J e os seus amigos, com maior claridade advertimos
a impossibilidade de que eles alguma vez se entendessem. J estava
determinado a justificar-se a si mesmo; enquanto que os seus amigos
tentavam por todos os meios de culp-lo. Ele permanecia
inquebrantvel, e o tratamento errados dos seus amigos s conseguiu
endurecer ainda mais a sua posio. Se tanto ele quanto seus amigos
tivessem adotado uma outra atitude, as coisas teriam sido
completamente diferentes. Se J se tivesse condenado a si mesmo, se
tivesse assumido uma posio humilde, se tivesse considerado que no
era nada nem ningum, no haveria dado espao a que seus amigos
dissessem nada. E se, por outra parte, eles se tivessem dirigido a ele
com suavidade, com ternura e com doura, teriam mais possibilidades
de amolecer seu corao. Como estavam dadas as coisas, no se
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vislumbrava sada alguma. J no podia ver nada de mau em si
mesmo; seus amigos no podiam ver nada de bom nele. Ele estava
firmemente decidido a manter a sua integridade; eles, porm, a
remover at achar manchas e defeitos. Na havia nenhum tipo de
aproximao entre eles, nenhuma base em comum sobre a qual se
entenderem. J no mostrava indcios de arrependimento; eles no
tinham nenhuma compaixo dele. viajavam em direes opostas e, por
tanto, jamais poderiam encontrar-se. Concretamente, faltava um
ministrio de uma natureza completamente diferente; e este ministrio
introduzido na pessoa de Eli.
O acertado ministrio de Eli
"Ento aqueles trs homens cessaram de responder a J; porque era
justo aos seus prprios olhos. E acendeu-se a ira de Eli, filho de
Baraqueel, o buzita, da famlia de Ram: contra J se acendeu a sua ira,
porque se justificava a si mesmo, mais do que a Deus. Tambm a sua
ira se acendeu contra os seus trs amigos: porque, no achando que
responder, todavia condenavam a J" (32:1-2).
Eli, com uma lucidez e um vigor extraordinrios, vai direito ao centro
do problema em cada uma das partes. Resume, em duas breves
sentenas, as extensas discusses que abarcaram 29 captulos. J se
justificava a si mesmo em vez de justificar a Deus; seus amigos, por
outra parte, o tinham condenado em vez de gui-lo ao julgamento de
si mesmo.
de transcendental importncia moral ver que quando nos
justificamos a ns mesmos, condenamos a Deus; em tanto que,
quando nos condenamos, O justificamos a Ele. "A sabedoria
justificada por todos os seus filhos" (Lucas 7:35). Esta uma grande
verdade. O corao realmente contrito e quebrantado reivindicar a
Deus custar o que custar. "Sempre seja Deus verdadeiro, e todo o
homem mentiroso; como est escrito: Para que sejas justificado nas
tuas palavras, e venas quando fores julgado" (Romanos 3:4). Deus,
finalmente, haver de sair vitorioso, e lhe dar a Ele a primazia agora,
o caminho da verdadeira sabedoria. To pronto como a alma
humilhada mediante o reto juzo de si mesma, Deus, com toda a
majestade de Sua graa, se apresenta ante ela como Justificador.
Mas entretanto sejamos governados por um esprito de justificao
prpria e de auto-satisfao, desconheceremos por completo a sublime
bem-aventurana do homem a quem Deus lhe imputa justia sem
obras. A maior insensatez da que ns podemos sermos culpados a de
justificarmos a ns mesmos; j que Deus, em tal caso, dever imputar-
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nos pecado. Mas a verdadeira sabedoria consiste em condenar-se
totalmente a si mesmo, pois deste modo Deus se torna Justificador.
Mas J ainda no havia aprendido a caminhar por esta senda
maravilhosa e bendita. Ainda estava revestido de sua prpria justia.
Ainda achava plena complacncia em si mesmo. Por isso Eli se
acendeu de ira contra ele. A ira haver de cair com certeza sobre a
prpria justia. No poder ser de outra maneira. O nico terreno
legtimo para o pecador e o de um sincero arrependimento. Ali no se
encontra mais que a pura e preciosa graa que reina "pela justia
mediante Jesus Cristo, Senhor nosso". Nela permanece impassvel por
sempre. prpria justia no lhe espera outra coisa seno a ira; mas
ao eu julgado, s a graa.
Querido leitor, lembre-se disto. Detenha-se uns instantes e considere.
Em que terreno voc se encontra? Tem se inclinado ante Deus com um
verdadeiro arrependimento? Tem se medido em verdade alguma vez
em Sua santa presena? Ou se encontra no terreno da sua prpria
justia, da sua justificao pessoal e da sua auto-satisfao? Lhe
rogamos encarecidamente que sopese estas solenes perguntas. No as
desconsidere. O nosso desejo chegar ao corao e conscincia do
leitor. No apontamos meramente ao seu entendimento, a sua mente
ou ao seu intelecto. Sem dvida, bom tentar iluminar o entendimento
pela Palavra de Deus; mas lamentaramos profundamente se todo o
nosso trabalho tivesse que acabar ali. H muito mais do que isso. Deus
quer operar no corao, na alma, no homem interior. Ele quer nos ter
diante dEle em nosso real estado. De nada vale que edifiquemos a
nossa prpria opinio; pois nada pode ser mais seguro do que o fato de
que toda a nossa obra, construda com tais materiais, ser demolida. O
dia do Senhor estar contra toda exaltao e altivez; sbio, pois,
ocupar agora uma posio humilde e ter um corao culpado, j que,
quando somos humildes, apreciamos com a maior claridade a Deus e a
sua salvao. Que o leitor penetre, com o poder do Esprito, na
realidade de todas estas coisas! Que todos lembremos que Deus se
deleita em ver um esprito contrito e quebrantado, e que Ele sempre
encontra Sua morada com os tais, mas ao altivo olha desde longe!
Assim sendo, podemos entender por que a ira de Eli se acende contra
J. Ele estava do lado de Deus. J, porm, no. No ouvimos falar a
Eli seno at o captulo 32, embora de tudo evidente que tinha sido
um ouvinte atento durante toda a discusso. havia prestado ouvidos
pacientemente s duas partes, achando que ambas estavam erradas.
J fez mal em tratar de se defender; seus amigos, em tratar de
conden-lo.
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23
Quo freqentemente acontece a mesma coisa com ns em nossas
discusses e controvrsias! Oh, que tristes manifestaes so estas! No
noventa e nove por cento dos casos de disputas entre pessoas,
acharemos o mesmo resultado que o que vemos entre J e seus
amigos. Um pouco de contrio em uma das partes, ou um pouco de
suavidade na outra, contribuiriam de maneira significativa para
solucionar a questo. naturalmente que no nos referimos s situaes
em que se v comprometida a verdade de Deus. Nestas ltimas,
devemos ser denodados, decididos e inflexveis. Ceder quando est em
jogo a verdade de Deus ou a glria de Cristo, no seria outra coisa
seno deslealdade a Aquele a quem devemos tudo. Clara deciso e
uma tenaz firmeza o nico que nos convm sempre que se trate dos
direitos de Aquele bendito que, para assegurar os nossos interesses, o
sacrificou tudo, at a Sua prpria vida. Que Deus nos guarde de deixar
escapar uma palavra ou de escrever uma nica linha que tenda a
debilitar a fora com que temos segurado a verdade ou a diminuir o
nosso ardor na contenda pela f que tem sido uma vez dada aos
santos. Oh, no, querido leitor!; este no o momento para afrouxar
os lombos, depor os arneses nem rebaixar a medida das normas
divinas. Tudo pelo contrrio. Nunca como hoje existiu to urgente
necessidade de termos cingidos nossos lombos com a verdade, com os
ps calados e mantendo a norma dos princpios divinos em toda a sua
integridade. Dizemos estas coisas com reflexo. As dizemos a causa
dos mltiplos esforos do inimigo por empurrar-nos fora do terreno da
pura verdade ao nos sinalar as faltas de aqueles que tm fracassado
em manter uma conduta pura. Ai, ai, ai, h fracassos, tristes e
humilhantes fracassos" no negamos, quem se atreveria a faz-lo?
demasiado patente, demasiado flagrante, demasiado grosseiro. O
nosso corao se parte quando pensamos nisto. O homem falha
sempre e em todas partes. Sua histria, desde o den at os nossos
dias, leva a marca do fracasso. Tudo isto inegvel, mas bendito seja o Seu Nome o fundamento de Deus est firme, e o fracasso humano no pode toc-Lo jamais. Deus fiel. Ele conhece os seus, e
todo aquele que invoca o nome de Cristo deve apartar-se da iniqidade
(2 Timteo 2:19). No cremos nem podemos crer que para melhorar a nossa conduta devamos abater a bandeira dos princpios de
Deus. Humilhemo-nos diante dos nossos fracassos; mais nunca
abandonemos a preciosa verdade de Deus.
Tudo isto uma digresso que nos permitimos com o objetivo de
evitar que, ao termos urgido o leitor importncia de cultivar um
esprito quebrantado e dcil, este pudesse ter inferido que com isso
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24
quisemos dizer que necessrio abandonar um Igreja ou um til da
divina revelao. Agora retornemos ao nosso tema.
O ministrio de Eli tem caractersticas muito peculiares e notveis.
Eli se encontra em vvido contraste com os trs amigos. Seu nome
significa "Deus ele" e, sem dvida, podemos consider-lo como um
tipo de nosso Senhor Jesus Cristo. Eli coloca a Deus na cena, e pe
fim tambm s tediosas contendas e disputas que se sucederam entre
J e seus amigos. Ele no discursa baseando-se na experincia;
tambm no apela tradio nem profere os acentos da legalidade,
seno que introduz a Deus. a nica forma de pr fim s
controvrsias, de acalmar os altercados, e de fazer um cesse o fogo
numa guerra de palavras. Ouamos as palavras desta notvel
personagem:
"Eli, porm, esperou para falar a J, porquanto tinham mais idade do
que ele. Vendo, pois, Eli que j no havia resposta na boca daqueles
trs homens, a sua ira se acendeu" (32:4-5). Note-se isto: "no havia
resposta". Em todos os seus arrazoamentos, em todos os seus
argumentos, em todas as suas aluses experincia, legalidade e
tradio, "no havia resposta". Isto muito instrutivo. Os amigos de J
haviam recorrido, por assim dizer, um amplo campo; tinham falado
muitas coisas certas e esgrimido muitas objees; porm, note-se
bem, no tinham achado nenhuma resposta. No est dentro dos
alcances da terra nem na natureza achar uma resposta para um
corao que tem segurada a sua prpria justia. Deus somente pode
dar a justa resposta, como veremos a continuao. Em nenhum outro,
seno em Deus, o corao no quebrantado pode achar uma rplica
sempre pronta. Isto resulta obvio na histria que estamos
considerando. Os trs amigos de J no acharam resposta nenhuma.
"E respondeu Eli, filho de Baraqueel, o buzita, e disse: Eu sou de
menos idade, e vs sois idosos; receei-me e temi de vos declarar a
minha opinio. Dizia eu: Falem os dias, e a multido dos anos ensine a
sabedoria. Na verdade, h um esprito no homem, e a inspirao do
Todo-Poderoso os faz entendidos." (32:6-8). Eis aqui que a luz divina
a luz da inspirao comea a fluir sobre a cena e a dissipar as espessas nuvens de p que se geraram por uma disputa de palavras.
To pronto como este bem-aventurado servo do Senhor abre seus
lbios, se deixam sentir a autoridade e o peso moral das suas palavras.
evidente que nos encontramos em presena de um homem que fala
como os orculos de Deus; um homem que se encontra
perceptivelmente na presena divina. No se trata de algum que
recorre magra adega da sua limitada e deficiente experincia, nem
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de um que apela venervel antiguidade, desconcertante tradio ou
s contraditrias vozes dos Padres. No; agora temos ante ns a um
homem que nos coloca de imediato sob a influncia do "sopro do
Onipotente".
Eis aqui a nica autoridade segura; a nica norma infalvel. "Os
grandes no so os sbios, nem os velhos entendem o que reto. Pelo
que digo: Dai-me ouvidos, e tambm eu declararei a minha opinio. Eis
que aguardei as vossas palavras, e dei ouvidos s vossas
consideraes, at que buscsseis razes. Atendendo, pois, para vs,
eis que nenhum de vs h que possa convencer a J, nem que
responda s suas razes; Para que no digais: Achamos a sabedoria,
Deus o derribou, e no homem algum. Ora ele no dirigiu contra mim
palavra alguma, nem lhe responderei com as vossas palavras. Esto
pasmados, no respondem mais, faltam-lhes as palavras." (32:9-15).
A experincia, a tradio e a legalidade so barridas fora da plataforma
para deixar espao ao "sopro do Onipotente", ao ministrio poderoso e
direto do Esprito de Deus.
O ministrio de Eli bate na alma com uma fora e uma profundidade
extraordinrias. Encontra-se em vvido contraste com o incompleto e
tremendamente defeituoso ministrio dos trs amigos. Era o remdio
para pr fim a uma controvrsia que parecia interminvel; uma
controvrsia entre um frreo egotismo por parte de J, e uma flutuante
experincia, uma volvel tradio e uma presunosa legalidade de
parte dos seus amigos; uma controvrsia que no servia para nada, ao
menos para J, e que acabaria deixando as partes muito mais
enfrentadas do que estavam no princpio. Porm, essa controvrsia no
deixa de ter o seu valor e interesse para ns. O claro ensinamento que
nos deixa este: duas partes em disputa jamais podero chegar a se
entenderem a menos que exista, de uma ou da outra parte, certo grau
de quebrantamento e avassalamento do corao. Esta a valiosa lio
a que todo ns devemos prestar ateno. No s no mundo, seno
tambm na igreja, existe uma grande quota de obstinao e de
arrogncia; uma grande quantidade de atividades centradas no
homem; uma forte dose de "eu, eu, eu" para tudo; e isso, alm,
prevalece onde menos o esperaramos, a saber, nas coisas que se
relacionam com o santo servio para Cristo. Quo repulsivo! Podemos
afirmar com absoluta certeza que nunca o egotismo mais detestvel
que quando se manifesta no servio de esse Bendito que se despojou a
si mesmo, de quem toda a vida foi uma completa renuncia prpria, e
quem nunca buscou sua prpria glria nem seus prprios interesses,
como tambm no agradar-se a si mesmo.
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Ai!, a pesar de tudo isto, no existe, querido leitor, largas e estendidas
demonstraes deste eu aborrecvel e no subjugado no terreno da
profisso crist e do ministrio cristo? Quem poderia neg-lo? A
medida que os nossos olhos examinam o relato da notvel discusso
entre J e seus amigos, descobrimos com surpresa que s no que v
dos captulos 29 ao 31, J se menciona a si mesmo aproximadamente
umas cem vezes! Em resumidas contas, tudo "eu", "mi", "me",
nestes captulos.
Porm, dirijamos os nossos olhares a ns mesmos. Julguemos nosso
prprio corao em suas atividades mais ntimas e profundas.
Revistemos nossos caminhos luz da presena divina. Coloquemos as
nossas obras e servios sobre a santa balana do santurio de Deus.
Ento, descobriremos quanto h desse detestvel eu, o qual estende-
se como um tecido escuro e contaminador por entre todas as vestes da
nossa vida crist e do nosso servio cristo. A que se deve, por
exemplo, que sempre que nos tocam o eu, por mesmo que seja no
mnimo, tenhamos tanta predisposio a assumir uma atitude
arrogante? Por que nos ofendemos com tanta facilidade e nos irritamos
tanto ante as repreenses, por muito delicado e doce que seja o tom
dessas? Por que essa to forte tendncia a ofender-se ante o menor
menosprezo que nos faam? Por que, em fim, nossas simpatias, nosso
respeito e nossas preferncias se dirigem com tanta energia a aqueles
que tm um bom conceito de ns, que apreciam o nosso ministrio,
que esto de acordo com as nossas opinies e que adotam as nossas
idias?
Todas estas coisas, no nos dizem nada? Acaso no nos chamam a
despojar-nos primeiramente do nosso grande egotismo, antes de
condenar ao do nosso antigo patriarca? Com certeza que ele no
precedeu bem; mas ns estamos muito mais enrolados no mal. O fato
de que um homem que vivia no escurecido crepsculo das distantes
pocas patriarcais se visse prisioneiro na armadilha do orgulho, deveria
surpreender-nos muitssimo menos que o de um santo na mesma
situao, mas sob a luz do cristianismo. Cristo ainda no tinha
aparecido. Nenhuma voz proftica havia chegado ainda aos ouvidos
dos homens. Nem sequer a prpria lei tinha sido entregue quando J
vivia, falava e pensava. Podemos fazer-nos uma muito ligeira idia,
certamente, do to tnue raio de luz que alumbrava a trilha dos
homens nos tempos de J. Mas ns temos o elevado privilegio e a
santa responsabilidade de andar na luz culminante de um cristianismo
cumprido. Cristo j veio. Viveu, morreu, ressuscitou e ascendeu aos
cus. Ele enviou o Esprito Santo para morar nos nossos coraes,
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como testemunha de Sua glria, como selo da redeno cumprida e
como as garantias de nossa herana at a redeno da possesso
adquirida. O cnon da Escritura est fechado. O crculo da revelao
est completado. A Palavra de Deus est concluda. Temos ante ns a
histria divina de Aquele que se despojou a si mesmo e que ia de lugar
em lugar fazendo o bem; o maravilhoso relato do que fazia e de como
o fazia; do que dizia e de como o dizia; de quem era e do que era.
Sabemos que Ele morreu pelos nosso pecados, conforme s Escrituras;
que condenou o pecado e o tirou do meio; que a nossa velha natureza
essa odiosa coisa chamada de eu, o "pecado", a carne tem sido crucificada e enterrada aos olhos de Deus; que se deu fim a seu poder
sobre ns para sempre. Sabemos, tambm, que somos participes da
natureza divina; que temos o Esprito Santo que mora em ns, que
somos membros do corpo de Cristo, de sua carne e de seus ossos; que
somos chamados a andar assim como Ele andou; que somos herdeiros
da Sua glria, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo.
Agora bem, o que sabia J de tudo isto? Nada. Como podia saber o que
no foi revelado seno cinco sculos depois dele? A medida do
conhecimento de J se pe de manifesto ao ler as suas veementes e
comovedoras palavras ao final do captulo 19: "Quem me dera, agora,
que as minhas palavras se escrevessem! Quem me dera que se
gravassem num livro! E que, com pena de ferro, e com chumbo, para
sempre fossem esculpidas na rocha! Porque eu sei que o meu Redentor
vive e que, por fim, se levantar sobre a terra. E, depois de consumida
a minha pele, ainda em minha carne verei a Deus. V-lo-ei por mim
mesmo, e os meus olhos, e no outros, o vero; e por isso, os meus
rins se consomem dentro de mim." (19:23-27).
Este era o conhecimento de J seu credo. Num sentido, o seu conhecimento era grande; mas, em comparao com o extenso e
proeminente crculo de verdades em meio ao qual temos o privilgio de
sermos introduzidos, muito pequeno. J olhava para a frente, atravs
de um enfraquecido crepsculo, para algo que havia de cumprir-se
num porvir distante. Ns, em cambio, desde o topo das guas da
revelao divina, olhamos atrs, a algo consumado. J pode dizer do
seu Redentor que "por fim se levantar sobre a terra". Ns sabemos
que o nosso Redentor, depois de ter vivido, trabalhado e morrido na
terra, sentou-se destra do trono da Majestade nos cus.
Em resumidas contas, a medida da luz e dos privilgios de J no
admite comparao com o que ns gozamos; e por isso ns temos
menos escusas para entregar-nos s diversas formas de egotismo ou
de amor princpio que se manifestam em ns. Nossa renuncia prpria
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deve ir em proporo medida dos nossos privilgios espirituais.
lamentavelmente, nem sempre assim. Professamos as mais elevadas
verdades; mas elas no formam o nosso carter nem governam a
nossa conduta. Falamos da nossa vocao celestial, mas os nossos
caminhos so terrenos e algumas vezes, carnais ou ainda piores.
Professamos desfrutar a mais alta posio; mas o nosso estado prtico
no consoante com ela. A nossa verdadeira condio no responde a
nossa assumida posio. somos presumidos, susceptveis, teimosos e
facilmente irritveis. Somos to propensos a embarcar-nos na empresa
da justificao prpria como o nosso patriarca J.
Por outra parte, quando nos sentimos obrigados a dirigir-nos a algum
em atitude e tom de repreenso, com quanto rudeza, brutalidade e
aspereza desempenhamos esta necessria tarefa! Que pouco tato e
que pouca suavidade no tom! Quanto falta de doura e de ternura! Que
pouca bondade, que pouco de esse "blsamo excelente" (Salmo
141:5). Que difcil achar entre ns coraes quebrantados e olhos
chorosos! Que miservel capacidade para conduzir o nosso irmo
extraviado a curvar a testa e a humilhar-se! A que se deve?
Simplesmente a que ns mesmos no cultivamos o hbito de curvar a
nossa testa e de humilhar-nos. Se, por um lado, permitimos, como J,
dar liberdade ao nosso egotismo e a nossa prpria justificao,
seremos, por outro lado, to incapazes como os seus amigos de
provocar em nosso irmo o juzo de si mesmo. Quo freqentemente
fazemos alarde da nossa experincia, como Elifaz; ou gostamos de um
esprito legalista, como Zofar; ou introduzimos a autoridade humana,
como Bildade! Quo pouco se v em ns o esprito e a mente de Cristo!
Quo pouco se v o poder do Esprito Santo ou a autoridade da Palavra
de Deus!
No nada agradvel escrever estas coisas. Ao contrrio. Mas
sentimos que o nosso dever faz-lo. Nos aflige sobremaneira ver e isto com a maior solenidade a crescente frivolidade e indiferena da poca em que vivemos. Nada mais aterrador que a desproporo
entre a nossa profisso e a nossa prtica. Se professam as mais
elevadas verdades em relao imediata com uma mundanalidade e
uma licencia grosseiras. Em alguns casos, pareceria como se o
caminhar fosse ainda mais baixo quanto mais elevadas so as
doutrinas professadas. Vemos em meio de ns uma extensa difuso da
verdade, mas, onde est o seu poder formativo? Torrentes de luz
derramam na inteligncia, porm, onde esto os profundos exerccios
de corao e de conscincia na presena de Deus? A regra de
apresentar a verdade de maneira precisa e exata se cumpre com
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extremo rigor, mas, onde esto os resultados prticos? Desenvolve-se
a s doutrina segundo a letra, mas, onde est o esprito? Vemos a
forma das palavras, mas, onde est a representao vivente?
Queremos dizer com isto que no apreciamos a s doutrina? Queremos
dizer que subestimamos a ampla difuso das preciosas verdades da
Palavra em suas formas mais elevadas? Longe, longe de ns esse
pensamento! A linguagem humana seria insuficiente para expressar a
nossa estima por estas coisas. Que Deus nos guarde de escrever um
ltima linha que pudesse de alguma forma fazer minguar na mente do
leitor o inefvel valor e a importncia de manter uma elevadssima em rigor, a mais elevada norma de verdade, tanto quanto uma Sua doutrina. Estamos plenamente persuadidos de que jamais
melhoraremos a nossa conduta rebaixando embora fosse s pela grossura de um cabelo a medida dos princpios de Deus.
Ms, querido leitor, lhe perguntamos com amor e solenidade: no lhe
aflige o fato de que em meio de ns exista to trgica ausncia de
conscincias delicadas e de coraes exercitados? Marcha parelha a
nossa piedade prtica com a profisso dos nossos princpios? Est a
medida de nossa conduta prtica a mesma altura que a medida da
doutrina que professamos? Ai, prevemos a resposta do leitor srio e
reflexivo! Sabemos muito bem os termos em que ela haver de ser
expressada. Fica claro que a verdade no atua em nossas conscincias
como seria de esperar, que a doutrina no brilha em nossas vidas e
que a prtica no est a tom com a nossa profisso.
Falamos por e para ns. Escrevemos estas linhas num esprito de juzo
prprio; na mesma presena de Deus, j que Deus a nossa
testemunha. nosso ardente desejo que a espada da verdade penetre
em nossa prpria alma e chegue at as mais profundas razes ocultas
dela. O Senhor sabe o muito que prefervel dar uma machadada
raiz do eu e deixar que faa o seu trabalho. Sentimos que temos um
sagrado dever a cumprir para com o leitor, assim tambm como para
com a igreja de Deus; mas tambm sentimos que esse dever no
poderia ser plenamente cumprido se apresentssemos meramente todo
o que h de precioso, todo o que h de formoso e todo o que h de
puro. Estamos convencidos de que Deus no s quer que a voz da
advertncia afete em nossos coraes e conscincias, seno que
tambm procuremos exercitar os coraes e as conscincias de todos
aqueles com quem nos relacionamos.
verdade que coisas tais como a mundanalidade, a carnalidade, o
relaxamento em todas as facetas da vida cotidiana no clube, na
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biblioteca, em casa, na igreja, etc, a moda e o estilo de vestir, a vaidade e a insensatez, o orgulho de casta, de talento ou de intelecto e
de riqueza, no podem tratar-se cabalmente. Nenhuma destas coisas
bem sabemos, por certo podem escrever-se, expor-se ou censurar-se de forma aberta e acabada. Mas, acaso no podemos apelar
conscincia? Acaso a voz da santa exortao no deve alcanar os
ouvidos de todos ns? Como poderamos tolerar a relaxao, a
indiferena e a tibieza laodiceana preparando assim o caminho para o ceticismo universal, a infidelidade e o atesmo prtico, sem acordar a nossa conscincia nem tratar de acordar a dos outros? Deus nos livre
disso! Sem dvida, o caminho mais elevado e excelente que o mal
seja sepultado pelo bem, a carne subjugada pelo Esprito, o eu
deslocado por Cristo e o amor do mundo suprido pelo do Pai. Tudo isso
o cremos plenamente e o admitimos com inteira liberdade; mas, com
tudo, devemos ainda assim urgir nas nossas conscincias e na do leitor
a necessidade de submeter-nos, com respeito a toda a nossa carreira,
a um solene e escrutinador exame de corao; a um profundo
julgamento de ns mesmos. Bendito seja Deus, podemos levar a cabo
estes exerccios diante do trono da graa, diante do precioso
propiciatrio! "A graa reina" (Romanos 5:21). Que preciosa e
consoladora verdade! Poderia ela enfraquecer o valor do julgamento de
ns mesmos? De maneira nenhuma! Ela s poderia infundir em ns o
tom e o carter corretos para este necessrio exerccio da alma. Ns
temos que ver com a graa triunfante; isto precisamente o que nos
ensina a no dar liberdade ao eu, seno a mortific-lo inteiramente.
Queira o Senhor nos fazer realmente humildes, zelosos e devotos! Que
a expresso ntima do nosso corao seja: "Senhor, sou teu, somente
teu, todo teu, teu por sempre".
Isto pode parecer a alguns uma digresso do nosso tema principal;
mas confiamos que esta pequena divagao que nos temos permitido
no seja em vo, seno que, pela graa de Deus, deixe algum proveito
ao corao e conscincia do escritor e do leitor; e assim estaremos
melhor preparados para entender e apreciar o poderoso ministrio de
Eli, ao qual dirigiremos agora a nossa ateno, confiando-nos guia
de Deus.
O leitor no pode deixar de advertir o duplo efeito que produz este
notvel ministrio: o seu efeito sobre nosso patriarca e o seu efeito
sobre os seus amigos. No podia se esperar outra coisa. Eli, como
j fizemos notar, havia escutado pacientemente os argumentos
esgrimidos por ambas partes. Ele tinha deixado, por assim dizer, que
falassem at o cansao, que dissessem tudo o que tinham para se
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dizer: "Eli, porm, esperou para falar a J, porquanto tinham mais
idade do que ele" (32:4). Isto se encontra numa bonita ordem moral.
Com certeza, era o caminho do Esprito de Deus. A modstia um
ornamento que cai bem a um jovem. Tomara que abundasse mais em
meio de ns! Quando a verdadeira dignidade jaz oculta debaixo de um
manto de modstia e humildade, ela com certeza atrair os coraes
com uma fora irresistvel. Ao contrario, nada mais repulsivo que a
temerria confiana em si mesmo, o denodado atrevimento e a
arrogncia de muitos jovens de hoje dia. Bom seria que estes jovens
considerassem as palavras introdutrias de Eli, e imitassem seu
exemplo.
"E respondeu Eli, filho de Baraqueel, o buzita, e disse: Eu sou de
menos idade, e vs sois idosos; receei-me e temi de vos declarar a
minha opinio. Dizia eu: Falem os dias, e a multido dos anos ensine a
sabedoria." (32:6-7). Esta a ordem natural das coisas. Pressupomos
que a sabedoria esteja na cabea dos homens na mesma medida que
os seus cabelos brancos; , pois, razovel e conveniente que os jovens
sejam prontos para ouvir e tardos para falar na presena dos seus
maiores. Podemos assentar, como um princpio quase invarivel, que
um jovem impetuoso no conduzido pelo Esprito de Deus; que
jamais se tem medido na presena divina, e que nunca tem
quebrantado o seu corao diante de Deus.
No tem dvida de que como sucedeu com J e seus amigos muitas vezes homens maiores proferem muitas palavras sem sentido.
Os cabelos brancos e a sabedoria nem sempre caminham junto; e
tambm um fato no pouco freqente que homens de idade,
apoiando-se meramente no nmero dos seus anos, se atribuem um
lugar para o qual no tm nenhum direito moral, intelectual nem
espiritual. Tudo isto que dizemos perfeitamente certo, e digno da
considerao de aqueles que pudessem sentir-se identificados com
estas coisas. Mas todas estas misrias no desmerecem no mnimo o
delicado sentimento moral que pode ver-se nas primeiras palavras de
Eli: "Eu sou de menos idade, e vs sois idosos; receei-me e temi de
vos declarar a minha opinio". Isto sempre estar bem. Sempre bom
e agradvel que um jovem tema declarar a sua opinio. podemos ter
certeza de que um homem que possui fora moral interior jamais
procurar levar vantagem com precipitao; seno, pelo contrario,
quando se coloca na frente, est seguro de que vai ser ouvido com
respeito e ateno. A modstia em combinao com a fora moral
comunicam um irresistvel atrativo ao carter da pessoa; em tanto que
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os talentos mais esplndidos perdem brilho a causa de uma
personalidade confiada em si mesma.
"Na verdade continua a falar Eli, h um esprito no homem, e a inspirao do Todo-Poderoso os faz entendidos" (32:8). Aqui se
introduz um elemento completamente diferente. Apenas o Esprito de
Deus entra em cena, j no se trata de uma questo de juventude nem
de velhice, pois Ele, para falar, pode se servir de um jovem ou de um
homem maduro. "No por fora, nem por violncia, mas pelo meu
Esprito, diz o Senhor dos Exrcitos" (Zacarias 4:6). Isto rege sempre.
Foi verdadeiro para os patriarcas, verdadeiro para os profetas,
verdadeiro para os apstolos e verdadeiro para ns e para todos. No
se trata aqui da fora nem do poder humano, seno do Esprito eterno.
Nisto estriba o segredo do calmo poder de Eli. Ele estava cheio do
Esprito; e ento, esquecemos a sua juventude para prestar ouvidos s
palavras de peso espiritual e de sabedoria celestial que brotam de seus
lbios; e isso noz faz lembrar a Aquele que falava como quem tem
autoridade, e no como os escribas. Existe uma notvel diferena entre
um homem que fala como os orculos de Deus e outro que fala
simplesmente de forma normal; entre um que fala desde o corao,
com a santa uno do Esprito, e outro que fala desde o intelecto com a
autoridade humana. Quem poderia estimar devidamente a diferena
entre estas duas coisas? Ningum, a exceo daqueles que possuem e
exercitam a mente de Cristo.
Mas voltemos s palavras de Eli: "Os grandes no so os sbios, nem
os velhos entendem o que reto. Pelo que digo: Dai-me ouvidos, e
tambm eu declararei a minha opinio. Eis que aguardei as vossas
palavras, e dei ouvidos s vossas consideraes, at que buscsseis
razes. Atendendo, pois, para vs, eis que nenhum de vs h que
possa convencer a J, nem que responda s suas razes" (32:9-12).
Notemos particularmente isto: "nenhum de vs h que possa
convencer a J". Isto claramente era suficiente. J, no final da
discusso, estava to longe de ter sido convencido quanto o estava no
comeo da mesma. E podemos dizer, em efeito, que cada novo
argumento extrado do tesouro da experincia, da tradio e da
legalidade no serviram mais que para provocar novas e mais
profundas manifestaes da natureza no julgada, no subjugada e
no mortificada de J.
Mas, quo instrutiva a razo de tudo isto!: "Para que no digais:
Achamos a sabedoria, Deus o derribou, e no homem algum" (32:13).
Nenhuma carne se gloriar na presena de Deus. A carne pode
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vangloriar-se e orgulhar-se das suas empresas, enquanto Deus no
levado em considerao. Mas, leitor, ao introduzir a Deus, toda soberba
e vangloria, toda iluso vaidosa, toda jactncia e arrogncia se
dissipam em um abrir e fechar de olhos. Lembremos isto. "A jactncia
excluda" (rom 3:27). Sim, toda jactncia, a de J e a dos seus
amigos. Se J tivesse conseguido estabelecer suas pretenses, teria se
vangloriado. Se, por outra parte, seus amigos tivessem conseguido lhe
tapar a boca, eles que teriam se jactado. Porm no, "o vence Deus,
no o homem".
Assim foi, assim e assim vai ser sempre. Deus sabe como humilhar
um corao soberbo e avassalar uma vontade inflexvel. De nada serve
que um se enaltea a si mesmo, pois podemos tirar o cavalinho da
chuva que quem quer que se enaltecer ser, antes ou depois,
humilhado. O governo moral de Deus tem determinado que todo o que
se eleve e enaltece deve ser derrubado at o p. Esta uma verdade
saudvel para todos ns; mas especialmente para os jovens
entusiastas e para os ambiciosos. A senda humilde, recatada e oculta
, inquestionavelmente, a melhor, a mais segura e ditosa. tomara que
podamos segui-la sempre, at que alcancemos essa cena brilhante e
abenoada, onde o orgulho e a ambio so coisas desconhecidas!
As palavras de apertura de Eli produziram um efeito surpreendente
nos trs amigos de J: "Esto pasmados, no respondem mais, faltam-
lhes as palavras. Esperei, pois, mas no falam; porque j pararam, e
no respondem mais. Tambm eu responderei pela minha parte;
tambm eu declararei a minha opinio" (32:15-17). E seguidamente,
para que ningum supunha que ele estava falando as suas prprias
palavras, agrega: "Porque estou cheio de palavras; o meu esprito me
constrange" (32:18). Esta a verdadeira fonte e poder de todo
ministrio em todas as pocas. Se no a "inspirao" ou "o sopro do
Onipotente", tudo em vo.
Reiteramos, esta a verdadeira fonte do ministrio em todos os
tempos e em todos os lugares. E, ao dizer isto, no devemos esquecer
que quando o nosso Senhor Jesus Cristo ascendeu ao cu e sentou
destra de Deus em virtude de uma redeno cumprida, teve lugar uma
grande mudana. Em outras oportunidades, j nos referimos muitas
vezes a esta gloriosa verdade, pelo que no abundaremos em detalhes
a seu respeito. A mencionamos aqui meramente para que o leitor no
ache que quando falamos da verdadeira fonte do ministrio em todas
as pocas, estamos esquecendo o que caracterstico e distintivo da
igreja de Deus na presente dispensao, como conseqncia da morte
e ressurreio de Cristo e da presena e morada do Esprito Santo
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tanto no crente individual como na igreja, que o corpo de Cristo na
terra. Nada mais longe dos nossos pensamentos! Graas a Deus temos
um sentido demasiado profundo do valor, importncia e alcance prtico
dessa grande e gloriosa verdade como para perd-la de vista nem por
um momento. De fato, precisamente este profundo sentido junto com a lembrana dos incessantes esforos de Satans por desconhecer
a verdade