interação de crianças autistas com o mundo digital

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Doutorado AMÉLIA LEITE DE ALMEIDA INTERAÇÃO DE CRIANÇAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: UMA TRAVESSIA DE EMOÇÃO E PRAZER FLORIANÓPOLIS-SC 2005

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA DE

    PRODUO

    Doutorado

    AMLIA LEITE DE ALMEIDA

    INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: UMA TRAVESSIA DE EMOO E PRAZER

    FLORIANPOLIS-SC 2005

  • II

    AMLIA LEITE DE ALMEIDA

    INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: UMA TRAVESSIA DE EMOO E PRAZER

    Tese submetida ao Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito para obteno do ttulo de Doutora em Engenharia de Produo.

    Orientador: Prof. Francisco A. P. Fialho, Dr.

    Florianpolis, 2005.

  • III

    Ficha Catalogrfica

    Almeida, Amlia Leite de. Interao de Crianas Autistas com o Mundo Digital: uma travessia de emoo e prazer/ Amlia Leite de Almeida. Florianpolis, UFSC/PPGEP. 2005.

    X - 263 p. Orientador: Prof. Dr. Francisco Antnio Pereira Fialho. Tese-Universidade Federal de Santa Catarina. 1. Autismo. 2. Cognio-Emoo-Afetividade. 3. Computador I. Titulo.

  • IV

    AMLIA LEITE DE ALMEIDA

    INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: UMA TRAVESSIA DE EMOO E PRAZER

    Esta Tese foi julgada adequada para a obteno do Ttulo de Doutor em Engenharia de Produo e aprovada em sua forma final pelo

    Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa Catarina

    Florianpolis, 2005.

    ___________________________________ Prof. Edson Pacheco Paladini, Dr.

    Coordenador do Programa

    BANCA EXAMINADORA

    _____________________________ Prof. Francisco A. P. Fialho, Dr.

    Universidade Federal de Santa Catarina Orientador

    ______________________________ ________________________________ Prof. Fbio Edir dos Santos Costa, Dr. Prof. Llian M. Ribeiro Conde, Dr. Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul Faculdade Cenecista de Varginha ______________________________ ________________________________ Prof. Ana Maria B. Franzoni, Dr. Prof. Christianne C. de S. R. Coelho, Dr. Universidade Federal de Santa Catarina Universidade Federal de Santa Catarina

  • V

    Dedico esta tese memria de meus pais, Maria Luiza Farias Leite, que por mim sonhou, mas que nos deixou antes que o sonho se concretizasse, e Jlio Pires Leite, cujos ensinamentos, exemplos e ternura acompanham minha vida e com ela seguiro para o sempre. Saudades, lembranas e acima de tudo, necessidade da companhia e da presena dessas pessoas que me amaram muito. Tambm dedico esta tese: Ao meu orientador, Prof. Fialho, pelo osis de tranqilidade, serenidade e amizade sempre presente em todas as minhas travessias e angstias; Ao meu neto, Pedro Henrique, pela emoo, vivacidade e alegria com que colore a minha vida. O seu sorriso, carinho e ternura motivaram a minha caminhada; E, especialmente, s crianas protagonistas deste trabalho, que mesmo sem perceberem, tornaram possvel a realizao deste estudo deixando marcas profundas em meu corao e fazendo com que me tornasse uma pessoa mais humana e serena.

  • VI

    O autismo no algo que uma pessoa tenha, ou uma concha na qual ela esteja presa. No h nenhuma criana normal escondida por trs do Autismo. O Autismo um jeito de ser, pervasivo; colore toda a experincia, toda sensao, percepo, pensamento, emoo e encontro, todos os aspectos da existncia. No possvel separar o autismo da pessoa. E se o fosse, a pessoa que voc deixaria no seria a mesma com a qual voc comeou. Os autistas so estrangeiros em quaisquer sociedades.

    (Jim Sinclair, 1993)

  • VII

    AGRADECIMENTOS

    Ao chegar ao final da trilha, desbravando caminhos desconhecidos, superando

    obstculos, o momento de agradecer a todos que me ajudaram nessa viagem, dando-

    me pistas maravilhosas para que eu pudesse chegar ao tesouro.

    Primeiro, a Deus, por ter me proporcionado a oportunidade de abrir caminhos para

    poder agregar conhecimentos e conviver com pessoas que me fizeram sentir que poderia

    chegar at o fim da travessia;

    Aos mestres e aos mentores espirituais que me iluminam, me acompanham, me

    orientam, me protegem e me mantm alinhada ao meu propsito de vida, cumprindo uma

    misso muito especial;

    Ao Programa de Ps-Graduao da UFSC, pelo inestimvel crescimento intelectual e

    pessoal possibilitado pelas interaes com os professores, colegas e funcionrios,

    dando-me a oportunidade de vivenciar uma moderna e avanada experincia educativa;

    Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), por me desafiar para a

    busca de meu fazer pedaggico, principalmente por ter promovido esta oportunidade de

    promoo de conhecimento;

    Aos meus colegas de trabalho da UEMS, principalmente ao Prof. Dr. Fbio Edir, pelo

    crdito e tambm pelo descrdito que me apontaram o rumo a seguir;

    Aos meus amigos e s minhas amigas, que ao meu lado ou distante, me alimentam

    com o alento de no estar s, nem fazer nada sozinha, nesta caminhada de necessrio

    isolamento e reflexo, especialmente a Eleuza, a Cida, a Cidinha, a Gilberto, o Joo, a

    Elaininha, a Vanessa, a Lcia, a Ana, o Ednei e a Maria Peixoto;

    Agradeo a todas as acolhidas: de teto, de trabalho-pesquisa e acima de tudo, de

    companhias-afeto e aqui incluo pessoas muito especiais: Profa. Dra. Ana Franzoni,

    Profa. Dra. Christianne Coelho, Profa. Dra. Llian Conde, Isabelle, Marta, Sandra, Val,

    Rose e Juliana, pessoas que me ajudaram a vivenciar a magia da vida nesta bela Ilha da

    Magia, minimizando a saudade da famlia que deixei em Mato Grosso do Sul;

    Elaine, que me auxiliou com muita dedicao na formatao;

    Prof. Dr. Rosana Zanellato Santos, pela correo final do texto.

    Ao Christiano, pelos momentos animados em que passamos discutindo a arte;

    Ao Prof. Fialho, pelo olhar atento durante todo o trabalho e, em especial, pela partilha,

    humildade e disponibilidade, prprias dos grandes mestres. Ele fez a diferena;

  • VIII

    Direo e aos funcionrios do Centro de Educao Especial Brisa, pelo

    acolhimento, disponibilidade de informaes, respeito e confiana depositados neste

    trabalho e tambm pelo pronto atendimento a todas as solicitaes e discusses,

    tornando-nos uma equipe multidisciplinar e principalmente, s professoras Mary,

    Marielza e Roseli, pela dedicao e carinho com suas crianas;

    Direo e aos funcionrios da Escola de Educao Especial Maria Jlia Ribeiro,

    pelo acolhimento, disponibilidade de informaes, respeito e confiana depositados neste

    trabalho, principalmente a Profa. Edinalva, que nos proporcionou momentos de reflexo;

    Direo e aos funcionrios da Escola Erasmo Braga, que aceitou o desafio de

    matricular uma criana com autismo na Educao Infantil, oferecendo todas as

    condies para sua incluso total, principalmente a Coordenadora Maria, a Profa. Nia e

    o Prof. Anderson, do Laboratrio de Informtica, pela disponibilidade e troca de

    experincias;

    Associao Amigos dos Autistas/AMA, pelo acolhimento, disponibilidade de

    informaes, respeito e confiana depositados neste trabalho;

    Um agradecimento muito especial s famlias das crianas, com quem tive o privilgio

    de conviver ao longo da pesquisa, pela qualidade do elo construdo, acreditando neste

    trabalho, aceitando que desenvolvssemos a pesquisa com seus filhos;

    Cilene, pela amizade, motivao, troca de experincias e pacincia, sempre

    disposta a me ouvir;

    A toda minha famlia, em especial ao meu esposo, aos meus filhos e minha nora,

    por me apoiarem sempre! Mesmo distantes estiveram presentes, compartilhando os

    meus sentimentos e meus fazeres; o amor, o respeito e a compreenso dessas

    pessoas possibilitaram-me trilhar caminhos desconhecidos sem temer o novo;

    A todos que, direta ou indiretamente, contriburam para a elaborao desta tese.

    E, por fim, agradeo minha egrgia Banca, que sacramenta institucionalmente este

    trabalho, estudo, pesquisa e empenho de vida.

  • IX

    RESUMO

    ALMEIDA, Amlia Leite de. INTERAO DE CRIANAS AUTISTAS COM O MUNDO DIGITAL: Uma travessia de emoo e prazer. Florianpolis, 2005. 262 p. Tese (Doutorado em Engenharia de Produo) Programa de Engenharia de Produo Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC.

    Nesta tese analisa-se o uso da Informtica como recurso pedaggico no processo de interao e de desenvolvimento cognitivo de crianas com autismo. Foram realizados cinco estudos de caso, focalizando a Informtica como suporte sociocognitivo para essas pessoas, a partir de um referencial terico construtivista, construcionista, contextualizado e significativo, que pudesse apontar para um fazer pedaggico inclusivo, numa perspectiva inter e transdisciplinar. Adotou-se um enfoque qualitativo, compondo um caleidoscpio de informaes e de impresses, fazendo com que diferentes mtodos e a comunicao socioafetiva com os atores convergissem, produzindo uma relevante troca de experincias, propondo uma metodologia que privilegia as interaes e o desenvolvimento cognitivo no processo de comunicao entre autista-mundo exterior, a partir do mundo digital virtual. Como sujeitos da pesquisa, pde-se contar com crianas autistas com idades de quatro a 15 anos de idade, da Escola de Educao Especial Maria Jlia Ribeiro (Dourados/MS), do Centro de Educao Especial Brisa (Itapor/MS) e da Escola Erasmo Braga (Dourados/MS). Os dados foram coletados entre familiares, portadores da sndrome, gestores, professores e equipe tcnica, por meio de entrevistas abertas, questionrios e observao participante. Como recursos para coleta de dados, utilizaram-se: gravador, mquina fotogrfica e um caderno de campo (Dirio de Bordo). As condutas dos alunos diante das aulas de Informtica educativa foram analisadas luz das categorias conceituais eleitas para observar as interaes dos alunos em meio informtico. Os resultados alcanados mostraram que o uso da Informtica educativa mediada pelo professor traz benefcios visveis no desenvolvimento cognitivo, afetivo-emocional e coordenao viso-motora dos educandos.

    Palavras-chave: Autismo; Cognio-Emoo-Afetividade; Computador.

  • X

    ABSTRACT

    ALMEIDA, Amlia Leite de. AUTIST CHILDREN AND THEIR INTERACTION WITH THE DIGITAL WORLD: a journey of emotion and pleasure. Florianpolis, 2005. 262 p. Thesis (Doctorate in Production Engineering) Program of Masters degree in Production Engineering, Federal University of Santa Catarina, UFSC.

    In this dissertation the use of computer techniques as learning tools is analyzed in the process of the interaction and development of cognitive knowledge in autistic children. Five case studies were undertaken focusing computer use as a socio-cognitive support for these children, starting from a theoretical referential based on constructivism and constructionism which are both seen within a context of significance which could indicate a pedagogical procedure of an inclusive, inter and trans-disciplinary perspective. A qualitative approach was adopted, composed of a kaleidoscope of information and impressions, forcing a convergence of differing methods within the socio-affective communication of players; thus producing a relevant exchange of experiences and proposing a methodology which stresses interactions and cognitive development in the communication process between the autistic subject and the outside world, starting from the virtual and digital world. Children from four to fifteen years of age, from the Special Education School Brisa (Itapor/State of Mato Grosso do Sul, Brazil) and from the Centre of Special Education of the Erasmo Braga School (Dourados/ State of Mato Grosso do Sul, Brazil) were the research subjects. Data was collected amongst family members, syndrome bearers, managers, teaching and technical staff, by open interviews, questionnaires and participatory observation. Cassette recorders, photographic camera and field notebook (field log book) were used as data collection resources. Student behaviour during educational computer sessions was analyzed in the light of the conceptual categories elected to observe student interaction in the computing media. Results showed that the use of the computer as an educational tool, mediated by the teacher, brings visible benefits in the cognitive, affective-emotional, and visual and motor development of the pupils.

    Key words: Autism; Cognition-emotion-affectivity; Computer.

  • XI

    Sumrio

    Resumo p. IX

    Abstract p. X

    Lista de Figuras p. XV

    Lista de Quadros p. XVII

    Lista de Tabelas p. XVIII

    1 INTRODUO p. 02

    1.1 Apresentao p. 02

    1.2 Justificativa p. 09

    1.3 Relevncia do Estudo p. 13

    1.4 Apresentao do Problema p. 14

    1.5 Delimitao do Tema p. 17

    1.6 Objetivos p. 18

    1.6.1 Objetivo Geral p. 18

    1.6.2 Objetivos Especficos p. 18

    1.7 Hiptese p. 19

    1.8 Limitaes p. 21

    1.9 Plano Metodolgico p. 22

    1.10 A Estrutura da Tese p. 24

    2 EDUCAO ESPECIAL p. 27

    2.1 A Educao Especial: Contextualizao p. 27

    2.2 Reabilitao p. 33

    2.3 O Uso da Informtica na Educao Especial p. 34

    2.4 Declarao de Salamanca e suas implicaes na Educao

    Especial

    p. 35

    2.5 Deficincia Mental: Conceitos e Pressupostos Tericos p. 40

    2.6 Contribuies de Vigotsky na Concepo da Deficincia p. 49

    2.7 Contribuies de Feurstein a respeito da Educao Especial

    de forma mediatizada

    p. 52

    2.8 Contribuies de Piaget na questo do desenvolvimento e

    na formao das estruturas lgicas

    p. 56

  • XII

    3 AUTISMO p. 62

    3.1 Autismo: Breve Histrico p. 62

    3.2 Definio, Caracterizao e Diagnstico do Transtorno

    Autista

    p. 68

    3.3 Probabilidade e Prevalncia p. 74

    3.4 Condies Mdicas Associadas ao Autismo p. 77

    3.5 Caractersticas Comportamentais p. 78

    3.5.1 Distrbios do Relacionamento p. 78

    3.5.2 Distrbios da Fala e Linguagem p. 79

    3.5.3 Distrbios do Ritmo do Desenvolvimento p. 79

    3.5.4 Distrbios da Motilidade p. 79

    3.5.5 Distrbios da Percepo p. 80

    3.6 Prognstico e Intervenes p. 80

    3.7 Utilizando o Computador como Recurso de Interveno no

    Autismo

    p. 87

    3.8 Autismo: Papel da Famlia, da Escola e da Sociedade p. 89

    4 A Contextualizao da Informtica na Educao p. 93

    4.1 Abordagens do Uso da Informtica na Educao p. 95

    4.1.1 Abordagem Construcionista p. 96

    4.1.2 Abordagem Instrucionista p. 101

    4.2 Informtica na Educao Especial p. 102

    4.3 Informtica na Educao dos Autistas p. 103

    5 Metodologia p. 107

    5.1 Primeiros Passos p. 107

    5.2 Especificao da Metodologia p. 107

    5.3 Contexto da Investigao p. 111

    5.3.1 Amostra p. 111

    5.3.2 Instrumentos Utilizados p. 112

    5.3.3 Os Cuidados ticos p. 113

    5.4 Caracterizando as Instituies de Ensino p. 114

    5.4.1 Apresentando a Escola Especial Maria Jlia Ribeiro

    Dourados/MS

    p. 114

    5.4.2 Apresentando o Centro de Educao Especial Brisa p. 117

  • XIII

    Itapor/MS

    5.4.3 Apresentando a Escola Presbiteriana Erasmo Braga

    Dourados/MS

    p. 121

    5.4.4 Proposta Pedaggica das Instituies p. 123

    5.5 Caracterizando os alunos p. 123

    5.5.1 Contextualizando as Crianas p. 124

    5.6 Proposta de Trabalho junto Aos Alunos p. 130

    5.7 Softwares Educativos Utilizados p. 131

    5.8 Procedimentos Metodolgicos p. 136

    6 Anlise dos Resultados p. 140

    6.1 Das Instituies p. 140

    6.2 Das Entrevistas com Professores, Gestoras, Coordenadoras,

    Psiclogas e Pais

    p. 143

    6.3 Das Observaes e da Anlise dos Dados no Ambiente

    Informatizado

    p. 151

    6.3.1 Fragmentos dos Dirios de Bordo p. 157

    7 Consideraes Finais p. 194

    7.1 Sugestes para Trabalhos Futuros p. 202

    8 Referncias Bibliogrficas p. 206

    APNDICES p. 226

    APNDICE A Ofcio aos Dirigentes p. 226

    APNDICE B Termo de Esclarecimento p. 227

    APNDICE C Termo de Consentimento Livre Aps

    Esclarecimento

    p. 228

    APNDICE D Termo de Autorizao dos Pais p. 229

    APNDICE E Formulrio para Entrevista com os Pais p. 230

    APNDICE F Formulrio para Entrevista com as Psiclogas p. 232

    APNDICE G Formulrio para Entrevista com as Professoras p. 233

    APNDICE H Formulrio para Entrevista com Professores da

    Rede Regular

    p. 234

    APNDICE I Formulrio para Professores de Informtica p. 235

    APNDICE J Formulrio para Entrevista com as Coordenadoras

    Pedaggicas (Ensino Especial)

    p. 236

  • XIV

    APNDICE L Formulrio para Entrevista com Coordenadora e

    Diretora da Escola Regular

    p. 237

    APNDICE M Formulrio para Entrevista com Dirigentes

    (Educao Especial)

    p. 238

    APNDICE N Ficha de Acompanhamento na Sala de Aula p. 239

    APNDICE O Ficha de Acompanhamento Laboratrio de

    Informtica (Professores)

    p. 240

    APNDICE P Protocolo de Registro (Pesquisadora) p. 241

    ANEXOS p. 242

    ANEXO A Autorizao da Direo da Escola Especial Maria Jlia

    Ribeiro Dourados

    p. 243

    ANEXO B Autorizao da Direo do Centro de Educao

    Especial Brisa Itapor

    p. 244

    ANEXO C Autorizao da Direo da Escola Presbiteriana

    Erasmo Braga Dourados

    p. 245

  • XV

    Lista de Figuras Figura 1. Atendimento da Educao Especial nos nveis de ensino p. 28 Figura 2. Alternativas de Atendimento Educacional dos Portadores

    de Necessidades Educativas Especiais

    p. 28

    Figura 3. Nmero por Tipo de Deficincias Detectadas p. 31 Figura 4. TEACCH Ensino Estruturante p. 83 Figura 5. Fachada da Escola de Educao Especial Maria Jlia

    Ribeiro

    p. 114

    Figura 6. Servios Prestados Comunidade pela APAE/Dourados p. 115 Figura 7. Fluxograma de Atendimento APAE/Dourados p. 116 Figura 8. Fachada do Centro de Educao Especial Brisa p. 117 Figura 9. rea de Abrangncia dos Servios Prestados pela

    APAE/Itapor

    p. 119

    Figura 10. Fluxograma de Atendimento APAE/Itapor p. 120 Figura 11. Fachada da Escola de Presbiteriana Erasmo Braga p. 121 Figura 12. Caracterizao das Crianas Investigadas p. 124 Figura 13. Tela Principal do MicroMundos p. 133 Figura 14. Centro de Comandos do MicroMundos p. 133 Figura 15. Passos da Tartaruga Obedecendo a uma Seqncia de

    Comandos

    p. 133

    Figura 16. Centro de Figuras do MicroMundos p. 134 Figura 17. Centro de Desenhos do MicroMundos p. 134 Figura 18. Ferramentas de Criao de Objetos do MicroMundos p. 135 Figura 19. Ferramentas de Edio de Objetos do MicroMundos p. 135 Figura 20. Trade da Vida p. 142 Figura 21. Desenho do Paint (20 Abr. 2004) p. 160 Figura 22. Desenho do MicroMundos (18 Jun. 2004) p. 161 Figura 23. Desenho do Paint (13 Ago. 2004) p. 163 Figura 24. Desenho do Paint (17 Set. 2004) p. 164 Figura 25. Desenho do Paint (17 Set. 2004) p. 164 Figura 26. Desenho do MicroMundos (01 Out. 2004) p. 164 Figura 27. Desenho do MicroMundos (08 Jun. 2004) p. 166 Figura 28. Desenho do MicroMundos (08 Jun. 2004) p. 166

  • XVI

    Figura 29. Letras Digitadas Aleatoriamente pelo Aluno (25 Jun. 2004)

    p. 167

    Figura 30. Desenho do MicroMundos (29 Jun. 2004) p. 168 Figura 31. Desenho no Paint (03 Ago. 2004) p. 168 Figura 32. Desenho do MicroMundos (103 Ago. 2004) p. 169 Figura 33. Desenho do MicroMundos (24 Ago 2004) p. 169 Figura 34. Desenho do MicroMundos (29 Set. 2004) p. 170 Figura 35. Desenho do MicroMundos (27 Out. 2004) p. 170 Figura 36. Desenho do MicroMundos (03 Nov. 2004) p. 171 Figura 37. Desenho no Paint (18 Mai. 2004) p. 173 Figura 38. Desenho no Paint (18 Jun. 2004) p. 174 Figura 39. Desenho no Paint (18 Jun. 2004) p. 174 Figura 40. Desenho do MicroMundos (15 Jun. 2004) p. 175 Figura 41. Desenho no Paint (03 Ago. 2004) p. 179 Figura 42. Desenho no Paint (07 Ago. 2004) p. 179 Figura 43. Desenho no Paint (24 Ago. 2004) p. 179 Figura 44. Desenho no Paint (06 Out. 2004) p. 180 Figura 45. Desenho no Paint (19 Abr. 2004) p. 183 Figura 46. Desenho no Paint (03 Mai 2004) p. 184 Figura 47. Desenho do MicroMundos (17 Mai. 2004) p. 184 Figura 48. Desenho no MicroMundos t (24 Mai 2004) p. 185 Figura 49. Desenho no MicroMundos (24 Mai. 2004) p. 185 Figura 50. Desenho no Paint (14 Jul. 2004) p. 186 Figura 51. Pintura no MicroMundos (14 Jul. 2004) p. 186 Figura 52. Obra de Alfredo Volp (21 Jun. 2004) p. 186 Figura 53. Trabalho a Partir da Obra Paint (21 Jun. 2004) p. 186 Figura 54. Partes do Corpo - Desenho no Paint (26 Jun. 2004) p. 187 Figura 55. Desenho no Paint (16 Ago. 2004) p. 187 Figura 56. Desenho no Paint (13 Set. 2004) p. 188 Figura 57. Desenho no Paint (18 Out. 2004) p. 188 Figura 58. Desenho no MicroMundos (25 Out. 2004) p. 189 Figura 59. Desenho no MicroMundos (01 Nov. 2004) p. 190

  • XVII

    Lista de Quadros Quadro 01. Categorias da Deficincia Mental p. 43 Quadro 02. Condies Mdicas Associadas p. 77 Quadro 03. Infeces Associadas ao Autismo Infantil p. 77 Quadro 04. Tipos de Anormalidades Orgnicas p. 78

  • XVIII

    Lista de Tabela Tabela 01. Nmero por Tipo de Deficincias Detectadas p. 31

  • SSee aass ccooiissaass ssoo iinnaattiinnggvveeiiss oorraa!! nnoo mmoottiivvoo ppaarraa nnoo qquueerr--llaass...... QQuuee ttrriisstteess ooss ccaammiinnhhooss,, nnoo ffoorraa aa mmggiiccaa pprreesseennaa ddaass eessttrreellaass!! MMrriioo QQuuiinnttaannaa

  • 2

    1. INTRODUO O INCIO DA TRAVESSIA

    No h nenhuma criana normal, escondida por trs do autismo. (Jim Sinclair)

    1.1 Apresentao

    A vida acadmica permeada por eventos formais que lhe do contornos

    peculiares. Um deles o desenvolvimento de teses de Doutorado, comparveis a

    caminhos longos e acidentados, com reforadores escassos e remotos em demasia

    para seus viajantes. E quem so estes viajantes? So os alunos de Ps-graduao,

    seus professores, seus orientadores, seus companheiros de turma e de profisso, ou

    cooperadores, confidentes e amigos de todas as horas e principalmente, o objeto de

    pesquisa, no caso deste estudo, a criana portadora de Autismo. Ela nos conduzir

    por entre as pedras do caminho e as prolas da emoo e do prazer de aprender,

    ensinando-nos a trilha desta travessia: como (trans) passar as dificuldades

    enfrentadas, chegando ao crescimento, que muitas vezes representa para os

    envolvidos uma rdua travessia, mas como diz a melodia cantada por Almir Sater e

    Renato Teixeira: [...] Todo mundo ama um dia, todo mundo chora. Cada um de ns

    compe a sua prpria histria, e cada ser em si carrega o dom de ser capaz de ser

    feliz.

    Por mais cpticos ou crdulos, certos ou dogmticos que sejam os homens, eles

    tm a companhia permanente das dvidas, que o fazem um inquiridor nato. No

    entanto, se aes falam mais alto do que palavras, como afirma o conhecido ditado,

    ento as primeiras e mais importantes palavras caminham rumo ao reconhecimento

    das pesquisas disponveis e que desde os anos de 1940 tm-se efetuado sobre o

    autismo. Por outro lado, a sensibilidade quanto s questes ticas, a capacidade de

    raciocnio e de deliberao moral, a descentrao, a empatia, a coragem em

    defender posies, so competncias requeridas pelo exerccio profissional de quem

    convive com essa e outras patologias, e que integram necessariamente a

  • 3

    competncia profissional, permitindo, nos dias de hoje, falar da evoluo da sndrome

    com mais convico.

    Muitos so os estudiosos que se tm dedicado ao estudo dessa sndrome.

    Entretanto, ela se apresenta como um grande quebra-cabea que, aos poucos, se vai

    construindo e entendendo.

    A patogenia do autismo ainda obscura. Ela alimenta grandes foras dialticas no

    discurso de especialistas, em detrimento da experincia da famlia em face desse

    problema. Com efeito, as estruturas relacionadas dentro da famlia da criana autista

    encontram-se perturbadas, distorcidas e dramaticamente desorganizadas diante do

    contexto da sndrome.

    O tema ora em questo toca particularmente os profissionais de educao, uma

    vez que, ao longo de nossa atividade profissional, constatamos que apesar de todas

    as modificaes verificadas no ensino e a diversidade de mtodos utilizados, a falta

    de recursos humanos, fsicos e pedaggicos adequados continua a marcar de forma

    estigmatizante as crianas com Necessidades Educativas Especiais.

    Conscientes de que para o encaminhamento de todo trabalho, necessrio

    satisfao e um ambiente favorvel para a troca de saberes, julgamos no poder

    continuar a vestir casaces de profissionais de educao, em conformidade com

    regras estabelecidas. preciso, isto sim, mostrar, sem vergonha, a cor da pele que

    cada um tem, exibindo nossas preocupaes e nossas limitaes em face do

    desconhecido, nunca esquecendo que tudo depende de como somos, como vivemos

    e como descobrimos o mundo do entorno.

    Assim, este trabalho, alm de ser fruto de um processo de investigao cientfica

    desencadeado nos Cursos de Mestrado e de Doutorado, tambm o resultado de

    uma srie de impresses sistematizadas a partir de nossa experincia profissional.

    Foi em classes de educao infantil e de ensino fundamental que iniciamos a

    trajetria como educadora, em 1970, alfabetizando crianas em escolas pblicas.

    Muitas foram as percepes que se transformaram em problemas de investigao

    nesta caminhada. Este trabalho produto do aprofundamento sobre um objeto de

    estudo especfico dessa trajetria.

    Toda nossa vida profissional esteve muito ligada necessidade da busca terica,

    de como se ensina e como se aprende. Essa preocupao nos conduziu ao Mestrado

    em Engenharia de Produo, na rea de Mdia e Conhecimento, e nosso foco de

  • 4

    estudo passou a ser, ento, a pessoa com histria de deficincia1, especificamente

    aquela que apresentava, entre outras atipicidades, dificuldades no que se refere

    aprendizagem.

    Assim, vislumbramos a possibilidade de acesso de pessoas com Transtornos

    Invasivos do Desenvolvimento, em um ambiente de aprendizagem informatizado e

    um olhar mais aprofundado sobre essas pessoas, nos conduziu a outras reas, tais

    como a Tecnologia aplicada Educao e o estudo da pessoa autista.

    Trata-se, pois, de um estudo sobre as lutas cotidianas de pessoas com histria de

    deficincia, no caso, o autismo, contra os preconceitos e as discriminaes. Para

    desenvolv-lo, foi realizado um estudo da histria de vida desses sujeitos. Essas

    histrias, mediadas pelo referencial terico, serviram de aprofundamento para a

    construo do presente texto.

    Neste trabalho, propositadamente, utilizamos algumas metforas para caracterizar

    os passos da pesquisa realizada.

    Assim, cada captulo uma prola importante que conduziu os nossos passos

    nesta travessia, e as prolas esto interligadas umas s outras por um fio muito

    especial. A ausncia de uma s prola far com que nos percamos na trilha a trilha

    da aprendizagem da pessoa autista, que pode ser gerada pela prtica educativa que

    aqui se encontra descrita.

    Esta pesquisa resultado de uma preocupao histrica com a fragmentao do

    conhecimento no ensino e que nos acompanha desde a formao profissional como

    professora, at o trabalho como docente e tcnica da Secretaria de Educao, e

    tambm como membro do Conselho Estadual de Educao/CEE/MS, no qual era

    responsvel pelas normas da Educao Especial, tendo participado das discusses

    no Ministrio de Educao e Cultura/MEC, representando o CEE/MS. A pesquisa

    tambm foi motivada pela oportunidade de repensar nossa prpria prtica como

    educadora, contribuindo assim para que outras pessoas tambm possam refletir

    sobre o tema.

    1 No h um consenso em torno da nomenclatura ideal para designar as pessoas com histria de deficincia. Durante todo o trabalho, utilizamos essa nomenclatura por acreditar ser ela menos estigmatizante que as at ento empregadas. Eventualmente podero aparecer outros termos como: pessoas portadoras de deficincia e pessoas com necessidades educativas especiais. Essa variao acontecer quando no for possvel empregar a primeira opo e, assim, sero utilizadas como sinnimos.

  • 5

    Um outro motivo significativo foi o envolvimento com este trabalho, que nos levou

    a desenvolver uma prtica educativa com a pessoa com autismo, utilizando o

    computador como instrumento mediador na aprendizagem dessa pessoa.

    Segundo os Parmetros Curriculares, a Educao Especial uma modalidade da

    educao escolar voltada para a formao do indivduo, com vistas ao exerccio da

    cidadania (PCN, 1998, p.21). destinada a crianas, jovens e adultos portadores de

    necessidades especiais e deve ser oferecida em todos os nveis de escolaridade; da

    educao infantil ao ensino superior, de preferncia na rede regular de ensino.

    Pesquisas mostram que entre 1999 e 2000, esse tipo de atendimento cresceu

    27,1%, e dados do Censo Escolar de 2001 apontam 7,5 % de crescimento da

    educao especial no Pas em escolas e em classes especiais. Segundo o Censo, o

    nmero de matrculas de pessoas com necessidades especiais chegou a 323.073 em

    2002, enquanto em 2000 foram 300.520 matrculas (BRASIL, 2002).

    No entanto, a realidade nos tem apontado que a incluso do aluno com

    necessidades especiais em algumas escolas de ensino regular dificultada pela

    infra-estrutura inadequada, pela falta de professores capacitados e pela insuficincia

    de materiais e de equipamentos.

    Em geral, segundo Mazzotta (1982), a sociedade ainda desacredita que a pessoa

    com histria de deficincia possa realizar atividades desafiantes e desenvolver-se

    intelectualmente, da o motivo da sociedade, muitas vezes, se omitir em relao

    organizao de servios para atender s necessidades individuais especficas dessa

    populao. Essa realidade caracterstica marcante da sociedade capitalista, que

    cultua a produtividade, a eficincia e a competio, porque para a lgica capitalista

    do lucro, suficiente para justificar a excluso de investimento na educao do

    portador de necessidades educativas especiais, pois seu retorno no se manifesta de

    maneira imediata (BRASIL, 1999:31), mostrando a no valorizao do potencial

    produtivo das pessoas com deficincia.

    Alm disso, no raro as crianas com deficincia crescerem com excessivas

    restries de interao com o meio que as cerca, no se valorizando suas

    potencialidades e tornando-as passivas diante da realidade e dos problemas dirios,

    por conta de suas limitaes motoras e sociais e do tratamento dados a elas, muitas

    vezes paternalista. Tais crianas acabam sendo objetos de seus prprios processos

    (GALVO, 2001a).

  • 6

    Com a remoo destes rtulos e preconceitos que a sociedade lhes impe,

    torna-se possvel o atendimento s pessoas com deficincias, tanto em servios

    educacionais quanto em servios de reabilitao. Trata-se de um processo complexo

    que tem como meta a integrao de todos os elementos que constituem a escola:

    professores, alunos, pessoal administrativo e, especialmente, os pais, buscando um

    ambiente rico e variado que possibilite uma melhor aprendizagem para a pessoa com

    deficincia. O primeiro passo a aceitao da deficincia apresentada pela pessoa e

    no a busca de uma tentativa de normalizao (Manzini, 1999).

    Porm, a incluso das pessoas com deficincias nas escolas regulares um

    desafio para o ensino brasileiro. O modelo inclusivo segue a resoluo n 45/91 da

    Organizao das Naes Unidas (ONU), que prope a construo de uma sociedade

    para todos. O incio dessa construo foi em 1990 e a meta para finalizar este

    processo o ano de 2010 (BRASIL, 1999, p.83).

    No Brasil, cerca de 3% das crianas e adolescentes com deficincia tm acesso e

    permanncia na escola, e acredita-se que isto se deve, como mencionado

    anteriormente, formao econmico-social brasileira, na qual essas pessoas so

    vistas como no eficientes perante a produtividade, a eficincia e a competio que a

    sociedade exige.

    Nesse sentido, a escola tem o papel de facilitar a integrao dos alunos com

    necessidades especiais, promovendo seu ingresso no meio social como membros

    ativos, afinal, a educao o principal meio para que esses indivduos exeram suas

    funes sociais. Ademais, a escola deve facilitar a aprendizagem, permitindo ao

    prprio aluno com necessidades especiais adquirir e buscar o conhecimento,

    aprender a aprender, participar em sala de aula e no apenas ser um mero receptor

    de informaes transmitidas pelo professor (Valente, 1991, 1993, 1996, 1999, 2001).

    Mudanas na prtica docente, portanto, so importantes e necessrias. E tais

    mudanas esto sendo auxiliadas pela Informtica, por intermdio do

    desenvolvimento e da adequao de softwares para a aprendizagem de alunos com

    deficincia, bem como equipamentos para a interao dessas pessoas com o

    computador. Desenvolve-se assim a coordenao motora, integrando-se essa

    ferramenta ao processo de aprendizagem, oferecendo aos alunos a alternativa de

    adquirir conhecimento e sobrepujar suas deficincias motoras e intelectuais.

    As crianas com deficincia mental, em particular as consideradas mais

    comprometidas, no caso, as autistas, ainda so vistas como incapazes de obter

  • 7

    aprendizagens formais. Por isto, sua ateno, em muitos casos, est restrita ao

    tratamento de suas dificuldades. Por consider-las deficientes, sem inteligncia

    para aprender, so submetidas a um processo de ensino baseado em mtodos

    repetitivos, cujo objetivo a automatizao de alguns desempenhos que possam

    torn-los um pouco mais independentes na realizao de suas habilidades bsicas,

    como comer, vestir-se, pentear-se. Como define a Associao Americana para

    Deficincia Mental, o retardo mental faz referncia a limitaes substanciais no

    desenvolvimento do indivduo. Caracteriza-se por um funcionamento intelectual

    inferior mdia, que se manifesta em duas ou mais reas de habilidades cognitivas:

    comunicao, cuidado pessoal, vida diria, adaptao social e autonomia, sade e

    segurana, habilidades funcionais, lazer e trabalho.

    Observa-se, nessa definio, que a pessoa valorizada, considerada

    importante em seu processo e que a deficincia um aspecto que faz parte de sua

    da vida. Do ponto de vista educativo e considerando-se suas caractersticas, o aluno/

    a pessoa com autismo apresenta um ritmo muito lento na aprendizagem, assim

    sendo faz-se necessria uma proposta pedaggica adequada s suas condies.

    Para essas pessoas, a literatura referente ao tema, ao considerar a lentido com

    que aprendem e as dificuldades de abstrao que apresentam, orienta um ensino a

    partir de atividades concretas, diversificadas e funcionais, para despertar o interesse

    e a motivao para aprender. importante tambm considerar o carter dispersivo

    que elas demonstram, para que possam selecionar atividades de curta durao,

    variando o tempo gradualmente, de acordo com suas possibilidades, maximizando

    seus pontos fortes e minimizando os pontos de dificuldades, buscando progresso da

    aprendizagem, independentemente do nvel de desenvolvimento cognitivo que

    apresentam.

    Isto posto, as aes propostas apontam para a busca de mudanas na qualidade

    do ensino, apoiadas pela integrao do computador s atividades educacionais, com

    o desenvolvimento de ambientes de aprendizagem para pessoas com autismo.

    Acreditamos que o computador pode ajudar os autistas a se destacarem, pois

    apresentam enorme afinidade para atividades concretas. a que se insere o

    computador, ferramenta que se mostra extremamente amigvel aos olhos dos

    autistas, pelo fato de apresentar uma lgica rgida. A resoluo de um problema em

    determinado programa de computador aparece quase sempre igual, como uma

    equao matemtica. Alguns autistas chegam, inclusive, a se definir como

  • 8

    computadores que simulam o ser humano, decodificando o mundo exterior como a

    mquina faria, o que facilita o processo, porque se trata de um instrumento adaptvel

    forma como essas pessoas vem e compreendem o mundo.

    Por contarem com um pensamento estritamente visual e uma tima memria, os

    autistas podem fazer do computador um meio de expresso e at mesmo de

    sustento; tambm podem utilizar a Internet para travar relaes com o que lhes

    mais apavorante: o mundo exterior. O trabalho no computador se caracteriza por ser

    essencialmente solitrio, da a afinidade do autista. Alm disso, pela dificuldade em

    manter contato interpessoal, muitos autistas estabelecem relaes sociais via correio

    eletrnico.

    Isto pode ser verificado por meio das palavras de Temple Grandin (Phd do

    Department of Animal Science, Colorado State University), que autista com uma

    carreira internacional bem sucedida. Seu trabalho projetar equipamento para

    animais (especialmente gado) de fazendas. Ela descreve sua memria em forma de

    imagens e diz poder visualiz-las como se estivesse em uma pgina da Web. O

    pensamento dessas pessoas puramente visual, tal qual uma tela do windows ou

    uma pgina da Internet. Qualquer informao muito grfica, ou seja, que tenha

    muitas imagens, rapidamente guardada por eles (SEGATTO, 2002).

    A motivao para iniciar esta investigao, entre outras preocupaes, foi a de

    saber como se d o processo de interao do autista no uso do computador,

    considerando os aspectos afetivos, emocionais e cognitivos.

    Acreditamos que nunca haver cansao de saber, por isso somos o que somos,

    seres humanos. No entanto, tempo vir em que a investigao diligente, cobrindo

    longos perodos, esclarecer questes que hoje no esto codificadas; tempo vir em

    que os nossos descendentes se surpreendero por no sabermos coisas que sero

    to bvias para eles. O universo seria uma coisa insignificante se no houvesse

    sempre algo a ser investigado por todas as geraes que surgem. A natureza no

    revela os seus mistrios de uma s vez; h sempre um mais alm escondido nos

    bastidores do mundo. (PENNINGTON, 1997, p.65). Essa a promessa da natureza:

    ser sempre mais complexa do que a imaginao e ao mesmo tempo, to simples que

    a todos surpreende.

  • 9

    1.2 Justificativa

    Segundo Paulo Renato de Souza, A educao principal alicerce da vida social. Ela transmite e amplia a cultura, estende a cidadania, constri saberes para o trabalho. Mais do que isso, ela capaz de ampliar as margens da liberdade humana, medida que a relao pedaggica adote, como compromisso e horizonte tico-poltico, a solidariedade e a emancipao. No desempenho dessa funo social transformadora, que visa construo de um mundo melhor para todos, a educao escolar tem uma tarefa clara em relao diversidade humana: Trabalh-la como fator de crescimento de todos no processo educativo. Se nosso sonho e o nosso empenho so por sociedade mais justa e livre, precisamos trabalhar desde a escola o convvio e valorizao das diferenas, bases para uma verdadeira cultura da paz (SOUZA, 2001, p.7).

    As palavras de Souza (2001) nos levam a refletir sobre a problemtica da

    sndrome do autismo, sendo que poucas patologias mobilizam mais o ser humano do

    que o autismo. Neste temos uma criana normalmente bonita, sem sinais de uma

    leso, que mostra uma falta de receptividade e de interesse pelas pessoas,

    incapacidade na comunicao interacional e nas atividades imaginativa e um

    repertrio de atividades e interesses restritos.

    Os autistas apresentam dificuldades que limitam sua capacidade de interagir com

    o mundo exterior, impedindo que desenvolvam certas habilidades que formam o

    processo de aprendizagem. A pertinncia da nossa temtica considera a igualdade

    de oportunidades e as perspectivas de educao que levam em conta o

    desenvolvimento integral da pessoa, aceitando e valorizando o direito diferena,

    crescente a presena dos computadores nos diversos setores da sociedade,

    facilitando a vida de todos, principalmente dos portadores de deficincias. Na

    educao especial, eles tambm passaram a ser vistos e utilizados como excelentes

    ferramentas, auxiliando na incluso social e na reabilitao de pessoas com

    deficincia. Entretanto, pouco se fala de Informtica na educao dos autistas,

    indivduos com dificuldades de se relacionarem e de se comunicarem, muitas vezes

    analfabetos, porm com uma excelente memria e capazes de compreender

    procedimentos lgicos.

  • 10

    Nas falas do cotidiano, identificamos a presena marcante de um discurso

    preconceituoso que, ao pensar a deficincia como sinnimo de insuficincia, traa um

    esteretipo de quem o deficiente. Dessa forma, a descrena e o descrdito tm

    provocado inquietaes que nos levam a pensar sobre o porqu de centrarmos nossa

    ateno na incapacidade e destacarmos apenas a deficincia. O discurso que centra-

    se no quadro patolgico e na a-historicidade do sujeito, faz prevalecer o indivduo em

    si como portador de uma deficincia e que se realiza como indivduo por ser portador

    de. Assim, ao ser um indivduo em si, na condio de deficiente, seu entorno

    parece no existir, a no ser para e atravs do estigma reafirmar essa condio.

    Diante da inquietao gerada por esses e outros discursos, esta pesquisa surgiu

    do desejo de dialogar com a pessoa autista, buscando enfocar a questo da

    eficincia e da capacidade a partir do seu olhar com o histrico de deficincia sobre

    sua prpria vida, sobre a construo de sua prpria histria.

    Nas ltimas dcadas do sculo XX, observamos uma preocupao crescente,

    sobretudo no meio psicolgico, psiquitrico e psicanaltico, com a Psicologia infantil

    de forma geral e em particular, com a psicose da criana. So conhecidos e fecundos

    os estudos desenvolvidos simultaneamente em vrios pases.

    O autismo tem sido objeto de hipteses formuladas por psicanalistas, educadores,

    bilogos, geneticistas e cognitivistas. Permanece, no entanto, como um mistrio

    quanto a sua origem e sua evoluo. difcil determinar se a oposio ao mundo que

    as crianas autistas manifestam ativa e voluntria, sendo lhes imposta por

    deficincias biogenticas cujas origens ignoramos, ou se o inato e o adquirido se

    articulam entre si para criar desordem no universo interno dessas crianas. em face

    dessa impenetrabilidade que oscila nossa interrogao, entre um ele no quer e um

    ele no pode. Uma e outra hiptese sucedem-se e revelam-se igualmente

    inquietantes. Nesse contexto, bastante comum que o desejo e a vontade de saber

    vacilem.

    Esperana e decepo so partes permanentes de um trabalho cujos resultados

    se mede ao microscpio, em que a noo de tempo se congela em um universo

    esttico e fechado e em que, dia aps dia, o mesmo cerimonial se repete com seus

    rituais e suas estereotipias. O melhor aparece quando esperamos o pior, e o

    progresso pode ser seguido de regresses desanimadoras.

    Assim, a educao de pessoas autistas, em razo das dificuldades e das

    limitaes que abrangem desde aspectos relativos at recursos materiais e humanos,

  • 11

    passando por questes de poltica pblica, tem sido freqente alvo de pesquisas e de

    reflexes. Entretanto, o cotidiano escolar revela, ainda hoje, uma grande discrepncia

    entre o que proposto em lei, o desenvolvimento do conhecimento produzido nas

    universidades e a realidade das escolas brasileiras no que se refere educao de

    pessoas autistas.

    No limiar deste novo sculo, estamos imersos no contexto global da informao.

    Podemos dizer que as tecnologias fazem parte de nosso dia-a-dia, embora com

    ritmos diferenciados para cada pessoa.

    A reflexo que precisamos fazer sobre como o autista pode se apropriar dessas

    inovaes e seu benefcio em relao cognio.

    A partir do Mestrado, passamos a refletir sobre o uso do computador no cotidiano

    escolar de pessoas portadoras de deficincia mental, e como pode redimensionar a

    prtica pedaggica, e tambm sobre como possvel criar um ambiente de

    aprendizagem baseado nessa ferramenta, para propiciar criana a oportunidade de

    desenvolver atividades interessantes, desafiadoras e que viabilizem propsitos

    educacionais.

    A escolha do universo da pesquisa pessoa autista e Informtica justifica-se

    pelos grandes comprometimentos que a pessoa autista apresenta na aprendizagem e

    pelo fato de no manter um contato mais prximo afetivamente e s vezes, no

    manter nenhum tipo de comunicao com o mundo exterior. Assim sendo, o processo

    de estigmatizao social cria situaes que reforam o esteretipo da deficincia.

    Neste sentido, buscamos unir nossa prtica pedaggica tecnologia, a fim de

    enfrentar o desafio de percorrer o caminho, criando um ambiente de aprendizagem

    que abrisse possibilidade para a pessoa autista atingir uma melhor qualidade de vida,

    atendendo diversidade, procurando romper com os destinos previamente

    determinados, procurando dar igualdade de oportunidades, ou seja, oferecer a cada

    um aquilo de que necessita para construir seu projeto de vida. necessrio que no

    se aceitem modelos assentados em uma concorrncia feroz e que se comprometa a

    dar cotidianamente a todas as pessoas uma experincia de vida solidria.

    Trata-se, portanto, de um tema desafiador que busca essencialmente vivenciar e

    fomentar um processo de aprendizagem no qual a tecnologia e o autista, como

    poesias em versos, sejam elementos estruturantes de um outro modo de

    aprendizagem, mais aberto, flexvel e condizente com as inovaes cientficas e

    tecnolgicas.

  • 12

    Experincias em vrios pases, inclusive no Brasil, tm demonstrado benefcios

    oriundos da introduo da Informtica na educao especial e com pessoas autistas.

    O programa de softwares que possibilita a manipulao de objetos cria uma nova

    metodologia na educao, que favorece o desenvolvimento da criatividade e da

    iniciativa do aluno. Dentro da relao criana/computador possvel estabelecer uma

    metodologia que favorea o desenvolvimento cognitivo por meio da resoluo de

    problemas.

    Existem diversas metodologias de ensino que so usadas na educao especial,

    e so vrias as maneiras de se usar o computador nessa situao de aprendizagem

    educacional.

    Seymour Papert (1986) prope o ambiente LOGO2, que uma linguagem de

    computador que permite o desenvolvimento de ensino-aprendizagem e que segue a

    abordagem construcionista, em que o computador tem uma funo especfica no

    processo de construo do pensamento. A sua principal caracterstica est no fato de

    ser uma linguagem de fcil assimilao, que permite a explorao de atividades

    espaciais, tem uma fcil terminologia e possibilita a criao de novos termos ou

    procedimentos.

    O objetivo do LOGO est na filosofia de seu uso, que a facilitao e a

    assimilao de conceitos que envolvem as atividades, sendo formado por uma parte

    de textos e outra grfica. A parte grfica composta por um conjunto de comandos.

    Os conceitos espaciais so utilizados em atividades para comandar uma Tartaruga

    que se move no cho (tartaruga solo) ou na tela do computador, em atividades

    grficas. Isto se deve ao fato dessas atividades envolverem conceitos espaciais que

    so adquiridos nos primrdios da infncia, quando se comea a engatinhar.

    Entretanto, estes conceitos permanecem em nvel intuitivo. No processo de

    comandar a Tartaruga para ir de um lado para o outro, esses conceitos devem ser

    explicitados.

    Sabe-se que atualmente h inmeros softwares, especialmente alguns

    especficos para autistas, como: Labeling Tutor, Baldi, Saca e o Hrcules e Feij

    (produzido pelo Ministrio de Educao e Cultura MEC para a Educao

    Especial), A Festa do Ursinho de Pijama, Alfabeto, Boardmaker, Brincando no Sto LOGO o nome de uma filosofia de educao que possvel graas a uma famlia sempre crescente de linguagens de computao que acompanha essa filosofia. uma linguagem interpretativa, o que significa que pode ser usada de forma interativa (Papert, 1986, p.21).

  • 13

    da Vov, Casa da Matemtica da Millie, Cebolinha e Floquinho, Jardim da Infncia, O

    Menino que aprendeu a ler, Betsy, dentre outros.

    Esses programas tm em comum a apresentao das interfaces que utilizando os

    recursos tecnolgicos, exploram o visual com atividades interativas, recursos de som,

    uso de imagens e animao adequadas aprendizagem da pessoa autista.

    1.3 Relevncia do Estudo

    No Brasil, 10 % da populao possui algum tipo de deficincia fsica, auditiva,

    visual, mental ou mltipla (BRASIL, 1999), o que corresponde a cerca de 18 milhes

    de pessoas. Destas, o autismo atinge aproximadamente, 20 de cada 10.000 crianas

    que nascem vivas, sendo que ocorre quatro vezes mais em meninos que em

    meninas.Ou seja: existem no Brasil mais de 10 mil crianas menores de cinco anos

    atingidas pela sndrome. Segundo a Associao dos Amigos Autistas (AMA), s no

    municpio de So Paulo nascem mais de 200 crianas autistas a cada ano. No Cear,

    por exemplo, segundo a AMA, estima-se a existncia de 6 a 19 mil autistas.

    Fora do Brasil, a situao similar e h ainda estatsticas que apontam para um

    aumento da incidncia do autismo nos ltimos anos. Segundo Nash, de forma

    aparentemente repentina, casos de autismo e desordens relacionadas, como a

    sndrome de Asperger3, esto crescendo significativamente na Amrica do Norte e

    nenhum estudo conseguiu respostas satisfatrias para sua explicao. Na Califrnia,

    por exemplo, o nmero de crianas autistas que buscam servios sociais, mais do

    que quadruplicou nos ltimos 15 anos, passando de menos de 4.000 em 1987, para

    quase 18 mil em 2002. O problema cinco vezes mais comum que a sndrome de

    Down e trs vezes mais comum que a diabete juvenil (NASH, 2002).

    Pelo quadro supracitado, podemos destacar que a relevncia deste estudo

    expressa pela pluralidade do campo semntico de desafios propostos ao processo de

    ensino-aprendizagem das pessoas com histrias de deficincias, no caso, os

    autistas. Busca-se sua interao e integrao ao meio exterior, bem como a

    Tipo de Autismo mais sutil em que a pessoa afetada apresenta perfil inteligente e empreendedor, falta de empatia e determinao na busca de interesses pessoais (MARVEL, 2003).

  • 14

    promoo de um processo de enfrentamento e de aceitao da necessidade especial

    apresentada por essas pessoas, sem o risco de serem encaradas como um meio de

    superao e normalizao do quadro apresentado pelos educandos.

    O desenvolvimento de novas tecnologias, as exigncias de qualidade no

    atendimento dessas pessoas so fatores que levam reflexo sobre a necessidade

    de repensar a prtica educacional e assim propor um ambiente favorvel para a

    aprendizagem do autista, promovendo a Incluso social desse sujeito por meio do

    computador.

    Portanto, a importncia terica deste estudo, considerando a complexidade do

    assunto, a falta de mais pesquisas e de bibliografia especficas na rea, tambm se

    reflete na exigncia de qualidade no ensino da Educao Especial, que deve buscar

    melhoria no processo ensino-aprendizagem. Deste trabalho dever resultar material

    de apoio aos professores, pais e demais profissionais que trabalham com pessoas

    autistas, alm de provocar reflexes que requerem uma ntima conexo entre a

    pesquisa e a prtica para que se atinja o sucesso educativo.

    1.4 Apresentao do Problema

    Pessoas com histria de deficincia apresentam caractersticas significativamente

    distintas das demais, uma vez que necessitam de uma mediao considervel para

    perceberem as informaes que recebem, na manuteno da ateno, na

    memorizao, na conceitualizao e no desenvolvimento do raciocnio lgico e da

    linguagem.

    Alguma dessas necessidades tornam a aprendizagem dessas pessoas uma

    grande problemtica para a maioria daqueles que no conseguem ignorar os mitos

    da incapacidade e tentam desenvolver a habilidade de olhar o outro, especial, como

    um ser distinto, que possui pensamentos, estruturas cognitivas e emoes

    diferenciadas.

    Assim, o problema de pesquisa consubstanciou-se nas seguintes interrogaes:

    Como o computador pode auxiliar a pessoa autista a descobrir um mundo

    diferente, rompendo com o esteretipo da deficincia, e podendo constitu-

  • 15

    la em sujeito que resiste ao processo de estigmatizao social em sua vida

    cotidiana?

    Como se d a interao e a cognio do autista por meio do computador?

    Com base nessas interrogaes, cotejadas com os dados coletados da histria

    cotidiana das pessoas autistas em ambiente informatizado, procuramos compreender

    os movimentos de resistncia como expresses de um coletivo e como

    enfrentamento, por ter dado sua vida rumos diferentes daqueles comuns s

    histrias de deficincia, ou seja, os de passividade e de resignao.

    Baseamo-nos para tanto numa concepo de deficincia que entende que, para

    alm das caractersticas individuais, o sucesso desses sujeitos determinado pelas

    condies concretas de vida, pelas relaes estabelecidas por eles e com eles. Uma

    concepo de deficincia como construo histrica e social pautada nos estudos de

    Vigotsky (1997). Em consonncia com os estudos desse autor, pode-se afirmar que

    as conseqncias sociais de uma deficincia podem alimentar, acentuar e consolidar

    a limitao, de maneira que o que decide o destino da pessoa, em ltima instncia,

    no est no defeito em si, sim nas suas conseqncias sociais, sua realizao

    sociopsicolgica (VIGOTSKY, 1997, p.44).

    Segundo Lunardi:

    Esta forma de compreender a pessoa com histria de deficincia fundamental para pensar o quanto dinmico o seu processo de desenvolvimento. Percebe-se que no cotidiano das relaes sociais que vo estabelecer intersubjetividade em interaes, capaz de aniquilar o sujeito ou de contribuir com a superao do defeito. Portanto, intersubjetividades que reafirmam a sua prpria condio, mas que tambm o colocam como sujeito do devir (2000, p.20).

    No caso do processo de estigmatizao social, o sujeito tem o seu

    desenvolvimento regulado pelos esteretipos sociais construdos a respeito de sua

    deficincia. Isso gera no indivduo uma desorganizao que o faz agir conforme a

    audincia social. As estratgias defensivas podem surgir como uma forma de lidar

    com esse circuito perverso e possibilitar outras aes para esses indivduos. Isso s

    acontece, porm, quando essas estratgias defensivas individuais e coletivas

  • 16

    transformam-se em resistncia ou em compensao do defeito4, conforme Vigotsky

    (1997) caracterizaria. Ou seja, o sujeito no incorpora o esteretipo da deficincia

    porque, de certa forma, luta para resistir a ele.

    No se trata de negar a deficincia ou de consider-la em si. Fsica ou orgnica,

    ela existe e no agradvel conviver com ela. Buscamos perceber nas diferentes

    histrias dos sujeitos autistas, a construo social da resistncia como um elemento

    de relao com o mundo e com os demais indivduos.

    Nesse contexto, importante destacar que os processos constitutivos do sujeito

    so entendidos aqui como tendo dimenses indicotomizveis: coletivo e individual,

    interno e externo, objetivo e subjetivo. Os sujeitos so compreendidos como produtos

    histricos, sociais e tambm produtores do social/histrico.

    O desenvolvimento desta pesquisa concernente com as novas tendncias

    educacionais, que encaram o professor como mediador do desenvolvimento do

    sujeito cognitivo no seu sentido pleno. Tem como objeto de estudo a pessoa autista e

    as implicaes metodolgicas de uma abordagem que toma como foco a sua

    interao com o computador. indispensvel, portanto, que o mediador do processo

    de aprendizagem desenvolva, alm de seu conhecimento terico, cognitivo, a

    competncia profissional. Quanto s emoes envolvidas nessa interao, elas

    precisam ser valorizadas, pois permeiam todo o processo ensino-aprendizagem e

    so de primordial importncia para o alcance de bons resultados.

    As pessoas com autismo apresentam problemas no desenvolvimento das

    habilidades sociais, ou seja, na interao social, no desenvolvimento da linguagem,

    mais precisamente a comunicao, e no repertrio comportamental. Na rea da

    comunicao um sintoma precoce o entendimento sobre compartilhar experincias

    com outras pessoas.

    A pessoa com autismo apresenta dificuldade em iniciar um dilogo, pois na

    linguagem e na comunicao que se concentra o maior obstculo para elas. Poucos

    autistas desenvolvem habilidades para a conversao, muitos desenvolvem

    habilidades verbais e grande parte desenvolve somente habilidades no verbais de

    comunicao. O dilogo, que pressupe o compartilhamento de emoes, quase

    4A expresso defeito empregada, aqui, como sinnimo de deficincia, conforme utilizado por Vigotsky (1997).

  • 17

    impossvel, em face da dificuldade de interpretar expresses emocionais e tambm

    expor as prprias emoes.

    Isto posto, acreditamos que o computador permite melhorar a qualidade de vida

    da pessoa autista, oferecendo-lhe um ambiente adequado ao desenvolvimento das

    suas potencialidades. Nesses ambientes possvel criar situaes que contribuem

    para o desenvolvimento intelectual, social e afetivo do sujeito autista, buscando

    estratgias que contribuam de fato para a reabilitao e a incluso social dessa

    parcela significativa na sociedade com dignidade. Dessa forma, a Informtica

    aplicada educao especial inserida no processo como um instrumento de

    mediao5, no processo sociocognitivo de desenvolvimento dos sujeitos

    participantes.

    1.5 Delimitao do Estudo

    Este trabalho est baseado num estudo de caso em trs instituies, sendo duas

    de ensino especial e outra de ensino regular, que atendem crianas com autismo. Os

    trabalhos e as observaes foram feitos com 05 (cinco) crianas dessas trs escolas.

    Foram usados os mesmos programas, com as mesmas atividades, com o principal

    objetivo de observar como se d a interao dessas crianas por meio do uso do

    computador, considerando o grau das limitaes de cada uma. Conseqentemente,

    foram direcionadas aes prticas no laboratrio e na sala de aula, de modo que as

    atividades propostas pudessem desencadear o desenvolvimento de suas

    potencialidades no campo cognitivo, afetivo e social.

    O estudo envolveu professores, equipe tcnica pedaggica, pais, alunos e outros

    profissionais da sociedade, como: musicoterapeuta, psiquiatra e psicloga que

    trabalham com crianas autistas.

    5 Aqui utilizamos o sentido vygotskyano do termo, que considera a mediao uma caracterstica da cognio humana e que se refere internalizao de atividades e comportamentos scio-histricos e culturais. A mediao inclui o uso de ferramentas e de signos dentro de contexto social. A combinao do uso desses instrumentos, chamados de mediao ou mediadores, possibilita o desenvolvimento dos Processos Psicolgicos Superiores num processo que passa do social (inter) para o individual (intra) atravs da internalizao (Vygotsky, 1998).

  • 18

    A observao em campo se realizou no perodo fevereiro a novembro do ano de

    2004.No incio, o encontro acontecia uma vez na semana e no segundo semestre,

    duas vezes na semana,perfazendo um total de 70 (setenta)sesses, sendo que os

    registros das observaes foi feito durante as aulas assistidas e no laboratrio de

    informtica, posteriormente organizado em forma de relato no protocolo.

    1.6 Objetivos

    1.6.1 Objetivo Geral

    Para o desenvolvimento deste trabalho definiu-se como objetivo geral desenvolver

    um trabalho pedaggico que visasse a uma interao em meio informtico, auxiliando

    o desenvolvimento do autista, estimulando sua interao com o meio fsico e social e

    suas relaes interpessoais, aumentando assim sua tolerncia s mudanas e s

    frustraes, privilegiando as situaes de interaes e de desenvolvimento cognitivo,

    afetivo e social e o processo de comunicao entre autista-mundo exterior a partir do

    mundo digital virtual.

    1.6.2 Objetivos Especficos

    Para alcanar o objetivo geral foi estabelecido um conjunto de sub-objetivos

    especficos:

    Identificar como ocorre o processo de interao da criana autista e o

    computador;

    Propiciar, atravs de ambientes informatizados construtivistas adequados,

    novas oportunidades de interao da criana autista;

  • 19

    Favorecer a apropriao das ferramentas informticas pelo indivduo

    atravs de estratgias pedaggicas, envolvendo as reas cognitivas do

    desenvolvimento socioafetivo;

    Propiciar a vivncia em ambientes de aprendizagens digitais que

    oportunizam a descoberta das suas potencialidades individuais e que

    favoream a interao social com vistas construo do conhecimento,

    atravs da reflexo sobre suas prprias aes e da participao do outro

    como agente mediador;

    Analisar se existem benefcios para os alunos com autismo com o uso do

    computador nas suas atividades escolares;

    Avaliar qualitativamente o desenvolvimento da criana autista em relao

    ao processo de comunicao mundo interior- mundo exterior- tecnologia;

    Analisar o uso da imagem e o impacto que ela provoca como elo de ligao

    entre usurio-computador;

    Verificar se ocorrem mudanas no processo comportamental da criana

    autista, com caractersticas de hiperatividade e ausncia da fala,

    introduzindo-a num ambiente tecnolgico;

    Analisar os dados coletados luz da epistemologia gentica, no que se

    refere construo do conhecimento, e da teoria sociointeracionista quanto

    zona do desenvolvimento proximal, nas observaes realizadas na

    pesquisa;

    Analisar a interao da criana no ambiente computadorizado utilizando o

    software MicroMundo6 e outros softwares educativos que possam atender

    s necessidades das crianas com autismo.

    1.7 Hipteses

    6 Termo cunhado pelo educador e pesquisador Seymour Papert no final da dcada de 1970, para definir um ambiente de aprendizagem em computador para crianas. Gradualmente passou a significar qualquer simulao, geralmente em computador. Portanto, MicroMundos so considerados espaos virtuais, fora do cotidiano, destinados aprendizagem (Sinzato,1998).

  • 20

    Para a formulao das hipteses foram considerados os aspectos da

    complexidade do tema e tambm das relaes que se estabelecem na Instituio

    como Sistema Complexo, quando se est atendendo a alunos afetados por

    deficincia, no caso, as crianas autistas. Associados a isso se encontram os

    pressupostos filosficos das leis em vigor, tais como o envolvimento das famlias, das

    equipes tcnico-pedaggicas e a utilizao de recursos e aparatos tcnicos.

    Entendendo como as crianas autistas se comunicam e como o mundo pode se

    comunicar com ela, possvel construir propostas de trabalhos mais prximas das

    necessidades dessas crianas.

    Este trabalho poder contribuir cientificamente com todos os profissionais que

    lidam com crianas autistas, permitindo-lhes uma melhor compreenso sobre essa

    sndrome e todos os aspectos do desenvolvimento envolvidos, possibilitando uma

    deteco e interveno precoce. O estudo desses aspectos constitui-se em fator

    determinante para a elaborao das hipteses para a pesquisa.

    Uma proposta metodolgica com nfase no trabalho para desenvolver a

    capacidade de expresso, de criao e de aprendizagem de pessoas autistas,

    atravs do uso de um software pedaggico, promove significativamente o

    desenvolvimento integrado, tornando possvel a interao entre contexto virtual e

    contexto real.

    Todas as travessias tm como objetivo possibilitar a sada. E exatamente sobre

    isto que esta pesquisa se debruou: no esforo tipicamente humano de constituir-nos

    em sujeitos capazes de superar, adaptar, modificar e sermos modificados pelas

    adversidades presentes em nosso entorno, buscando estratgias que possibilitam

    nossa emancipao, a transposio dos sonhos para o mundo digital. Sem frmulas

    prontas, sem verdades estabelecidas a defender, mas com um ponto de encontro,

    um espao de aprendizagem compartilhada desafiando-nos a transformar

    experincias vivenciadas na busca de interao, comunicao e aprendizagem da

    pessoa autista.

    O estudo dos aspectos supracitados constitui-se em fator determinante para a

    elaborao das hipteses para a pesquisa:

    O computador permite a criao de ambientes de aprendizagens adequados

    ao desenvolvimento das potencialidades das crianas autistas. Nesses

    ambientes possvel criar condies que favoream a interao e o

  • 21

    desenvolvimento cognitivo, social e afetivo dessas pessoas, facilitando sua

    integrao na sociedade;

    O computador favorece a participao ativa da pessoa e, portanto, uma

    aprendizagem com maior autonomia;

    O computador favorece a interao do autista com o outro, ou seja, com o

    mundo exterior, por meio de e-mails, chats e Internet.

    1.8 Limitaes

    Considerando a natureza deste estudo, alguns fatores limitantes devem ser

    mencionados. Dentre esses fatores, est o fato de a pesquisadora ter que buscar

    uma das crianas em sua residncia. Expliquemos melhor: a criana freqenta a

    APAE uma vez por semana e sua residncia no fica em local acessvel s linhas de

    transporte urbano de Dourados/MS. Assim, a criana faltava muito, pois a famlia no

    possui condies financeiras de pagar uma conduo at a APAE.

    O olhar da pesquisadora, muitas vezes ofuscado pela paixo destinada a este

    trabalho, traduzida em momentos de euforia, sonho e entusiasmo exagerados, pode

    em alguns momentos ter se desviado do foco da objetividade, dificultando a anlise e

    descrio dos dados, mas o compromisso e tica profissional no permitiram que o

    sentimento estivesse acima dos princpios ticos.

    Barreiras subjetivas foram encontradas em alguns momentos, fazendo com que

    esta pesquisadora se deparasse com algumas dificuldades para o desenvolvimento

    do trabalho, tornando muito difcil sua concluso em uma das instituies de ensino

    pesquisadas. Porm, a determinao e a objetividade na elaborao de hipteses

    factveis superaram essas barreiras. Conseguimos romper a concha com serenidade

    e pacincia, envolvendo-nos aos acontecimentos no dia a dia: Lembremos aqui uma

    frase de Jean Piaget: Os fenmenos humanos so biolgicos em suas razes,

    sociais em seus fins e mentais em seus meios. Dessa forma a pesquisadora,

    percebendo a complexidade humana, deu nfase s percepes gerando

    sentimentos e emoes, quebrando as barreiras existentes.

  • 22

    O fato de a pesquisa ter sido feita em trs ambientes diferentes em todos os

    aspectos, sendo que uma ficava em outro municpio (Itapor), a 15 quilmetros de

    Dourados/MS, tornou mais difcil o desenvolvimento do trabalho, o que, no entanto,

    no impediu que ele fosse realizado dentro do prazo previsto.

    Porm, o que mais dificultou a pesquisa que nenhuma das instituies de ensino

    pesquisada estava organizada para atender a crianas autistas, isto , nenhuma

    delas possua uma proposta adequada para tanto. Da necessidade de a

    pesquisadora proceder a algumas modificaes em sua pesquisa e desenvolver uma

    proposta metodolgica adaptada ao mtodo TEACCH7 Treatment and Educacion of

    Autistic and Comunication Handicaped Children , um projeto experimental de cinco

    anos, visando educar, com a ajuda dos pais, as crianas autistas e orientar as

    professoras no trabalho pedaggico em sala de aula. A aplicao de nossa proposta

    contou com a disposio de todas as professoras em fazer o melhor para essas

    crianas, colaborando para a concretizao deste estudo.

    1.9 Plano Metodolgico

    Toda viagem pode ter vrios destinos e deve ser planejada para que no nos

    percamos nos caminhos e possamos chegar ao nosso destino. Todo estudo cientfico

    pressupe uma metodologia para sua realizao, o que, segundo Minayo (2000,

    p.16), inclui as concepes tericas de abordagem, o conjunto de tcnicas que

    possibilitam a construo da realidade e o sopro divino do potencial criativo do

    investigador.

    A investigao desenvolveu-se com base no Mtodo Qualitativo, Estudo de Caso

    do tipo Pesquisa-Ao, num exerccio dinmico de construo terico conceitual e

    prtico, com nfase no uso do ambiente informatizado como apoio aprendizagem, o

    que nos permitiu assumir nossa subjetividade e organizar dados da realidade, sem

    perder de vista a objetividade da pesquisa cientfica.

    7 Eric Schopler professor de psicologia na Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, com o professor Gary Mesibov, da unidade A&R, que coordena os centros regionais TEACCH (Amy, 2001, p.52).

  • 23

    Ao usar os recursos do estudo de caso, entramos em contato direto com as

    crianas autistas, protagonistas da investigao, permitindo-nos um olhar crtico

    sobre o objeto da pesquisa.

    Partindo do princpio que o estudo de caso busca retratar o particular para ento

    transp-lo para uma anlise entre o estabelecimento de relaes sociais amplas

    relacionadas a um determinado objeto de estudo, que buscamos desenvolver esta

    pesquisa. Para tanto fez-se necessrio compreender sua instncia singular, o que

    significa que o objeto de estudo retratado como nico, uma representao singular

    da realidade que multidimensional e historicamente situada (LDKLE; ANDR,

    1986, p.21).

    Ao optar por este tema, decidimos realizar uma pesquisa que trouxesse

    elementos para elucidar e compreender questes relacionadas aprendizagem da

    pessoa autista e sua interao com a tecnologia. Propomos analisar as

    possibilidades que a tecnologia pode oferecer pessoa autista, ampliando

    sobremaneira as possibilidades de um processo educativo que se paute por maior

    flexibilidade, fluidez e interatividade do aprendente, constituindo-se num instrumento

    de qualidade capaz de modificar percepes, diluir fronteiras e ressignificar valores

    num contexto sempre atual.

    Costa considera que aquilo que identificamos genericamente como uma

    metodologia qualitativa a nica forma de ao que possibilita

    [...] o arcabouo terico de uma cincia em educao, numa era de incertezas, pois, apenas no mbito dessa concepo de cincia possvel pesquisar, tendo conscincia da transitoriedade, das rupturas, do esfacelamento dos grandes sistemas de sustentao do presente e da perda do futuro (COSTA, 1994, p.20).

    Assim sendo, procuramos articular a fundamentao terica desta pesquisa com a

    prtica pedaggica, por meio da reviso bibliogrfica e posteriormente, com a

    realizao de observaes e de investigaes sistemticas e empricas.

    As entrevistas foram realizadas com os familiares das pessoas autistas, tendo

    como propsito a obteno de informaes relevantes sob diversas pticas, alm de

    entrevistas abertas com profissionais envolvidos no processo ensino-aprendizagem

    dessas pessoas.

  • 24

    Para a pesquisa, a observao sistematizada foi realizada pelo procedimento de

    registro de protocolo (Apndice P). Trata-se de registrar em protocolo cada fato

    descritivamente, por observao direta, evitando o pr-julgamento.

    Foi feita a proposta de trabalho do estudo e o esclarecimento quanto natureza

    da pesquisa e seus objetivos, junto direo e aos profissionais das instituies de

    ensino onde as crianas esto matriculadas, e principalmente, famlia das crianas

    objetos do estudo, para obter o consentimento para a aplicao da pesquisa e a

    disposio em colaborar com o trabalho.

    A metodologia escolhida reflete a concepo terica e o conjunto de atividades e

    aes que envolveram a pesquisadora e os pesquisados no dinmico exerccio das

    vivncias educativas ocorridas nas salas de aula e no Laboratrio de Informtica

    junto a cinco crianas autistas e na anlise e na avaliao quanto ao processo de

    interao das crianas com o computador.

    Para a realizao da pesquisa empregamos aparatos tecnolgicos tais como:

    filmadora que se ocupou do registro documental oral e visual das atividades

    desenvolvidas; gravadores para que no se perdesse nada da fala dos atores;

    computadores que atuaram como o coletivo de no humanos, mediador do fazer

    coletivo de humanos que, na produo de aplicativos pedaggicos, interagia numa

    dimenso flexvel e aberta polifonia de sentidos.

    As etapas da pesquisa tramaram-se de modo intenso e harmnico, enlaando

    pesquisa bibliogrfica na qual se ancora o lastro terico-conceitual com as atividades

    desenvolvidas com as pessoas com Autismo, objetivando atingir a confirmao de

    nossa hiptese e consecuo de nossos objetivos explicitados no decorrer desta

    seo.

    1.10 A Estrutura da Tese

    O presente trabalho caracteriza-se como um estudo qualitativo em situao de

    estudo de caso e est sistematizado de forma que a reviso da literatura permita ao

    leitor manter contato com a extenso do problema e o contexto em que a pesquisa

  • 25

    est inserida. A reviso da literatura est distribuda em trs captulos. Quanto

    estrutura geral da pesquisa, encontra-se distribuda em sete captulos.

    O Captulo I traz a apresentao do trabalho, a justificativa e a relevncia do

    estudo; a apresentao do tema e o problema de pesquisa; os objetivos (geral e

    especficos); os pressupostos bsicos; as limitaes encontradas e o plano

    metodolgico.

    O Captulo II trata da Educao Especial, com enfoque em definies, correntes

    tericas, paradigmas, tendncias e barreiras incluso.

    O Captulo III trata do autismo, apresentando um breve histrico, enfocando as

    definies, diagnstico e prognsticos, das diferentes abordagens; formulaes de

    algumas hipteses; discusso sobre o papel da famlia, da escola e da sociedade em

    relao ao indivduo autista.

    O Captulo IV versa sobre a Informtica na Educao, com uma breve reviso de

    conceitos e teorias, discutindo o papel do professor diante das novas tecnologias, e

    as abordagens do uso da Informtica na interao da criana autista.

    O Captulo V trata dos Aspectos Metodolgicos, contextualizando as instituies

    de ensino pesquisadas, apresentando a postura e a perspectiva de estudo, a

    especificao da metodologia, seu delineamento, caracterizao da populao,

    definio de instrumentos e de procedimentos de campo.

    O Captulo VI destinado apresentao, anlise e interpretao dos dados

    coletados.

    O Captulo VII contm as Consideraes Finais, com recomendaes e sugestes

    para futuros trabalhos.

    Para entrar no mundo Autista preciso saber amar sem esperar troca. O amor verdadeiro a maior lio que eles podem nos dar.

    (Fundao Vernica Bird-Rede Saci)

  • OO mmeeddoo ddooss oollhhooss ddooss oouuttrrooss sseennttiimmeennttoo uunniivveerrssaall.. TTooddooss ggoossttaarraammooss ddee oollhhooss mmaannssooss.. [[......]] AA ddiiffeerreennaa nnoo

    rreessoollvviiddaa ddee ffoorrmmaa ttrriiuunnffaannttee,, ccoommoo nnaa hhiissttrriiaa ddoo PPaattiinnhhoo FFeeiioo.. OO qquuee mmuuddaa nnoo aa ddiiffeerreennaa.. SSoo ooss

    oollhhooss.. RRuubbeemm AAllvveess..

  • 27

    2. EDUCAO ESPECIAL

    CONTINUANDO A TRAVESSIA ENTRE AS PROLAS... E CONSTITUINDO-SE COMO SUJEITO NA E PELA TRAVESSIA

    Todo mundo ama um dia, todo mundo chora. Um dia a gente chega e no outro vai embora. Cada um de ns compe a sua prpria histria, e cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz. (Renato Teixeira e Almir Sater. Tocando em Frente)

    2.1 A Educao Especial: Contextualizao

    Dando incio a metfora das travessias deste trabalho, comeamos a percorrer as

    trilhas em busca de um porto seguro. Ao longo deste captulo trataremos do

    referencial terico que busca discutir e alimentar um determinado entendimento sobre

    a Educao Especial, o processo de reabilitao, o uso da Informtica na Educao

    Especial, a Declarao de Salamanca e suas implicaes educacionais, a Deficincia

    Mental e as contribuies de Vigotsky, Feurstein e Piaget sobre as discusses sobre

    os pontos ora em questo.

    A atual Lei de Diretrizes e Bases para a Educao Nacional (LDB), Lei N 9.394,

    de 20 de dezembro de 1996, trata, especificamente no captulo V, da Educao

    Especial. Define-a como modalidade de educao escolar, oferecida

    preferencialmente na rede regular do ensino, para pessoas portadoras de

    necessidades educativas educacionais com necessidades educacionais especficas.

    Conforme a Figura 1, ela perpassa transversalmente todos os nveis de ensino,

    desde a educao infantil at o ensino superior, bem como as demais modalidades

    de educao, de jovens e adultos e educao profissional.

  • 28

    Figura 1 Atendimento da Educao Especial nos nveis de ensino. Fonte: www.mec.gov.br/seesp/oquee.shtm

    De acordo com o site do Ministrio de Educao e Cultura (MEC), na pgina

    intitulada O que Educao Especial?, encontramos o seguinte: Esta modalidade

    de educao considerada um conjunto de recursos educacionais e de estratgias

    de apoio que estejam a disposio de todos os alunos, oferecendo diferentes

    alternativas de atendimento.

    Figura 2 Alternativas de Atendimento Educacional aos Portadores de Necessidades Educativas Especiais.

    Fonte: MEC/UNESCO, 1995. www.mec.gov.br.

    http://www.mec.gov.br/seesp/oquee.shtmhttp://www.mec.gov.br/

  • 29

    Segundo a LDB (1996), a Educao especial tem os mesmos objetivos que a

    geral, sendo dever da famlia e do Estado, inspirada nos princpios de liberdade e nos

    ideais de solidariedade humana. Tem por finalidade o pleno desenvolvimento do

    educando, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o

    trabalho.

    Ainda segundo a LDB (1996), entende-se por Educao especial, para os efeitos

    da Lei, a modalidade de educao escolar oferecida preferencialmente na rede

    regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

    A diferena bsica entre a educao geral e a especial dada em termos de local

    de atendimento, tipo de material pedaggico, currculo trabalhado, profissional

    envolvido e individualizao no atendimento.

    A Educao Especial definida como modalidade de ensino que se caracteriza

    por um conjunto de recursos e servios educacionais especiais, organizados para

    apoiar, suplementar e, em alguns casos, substituir os servios educacionais comuns,

    de modo que se garanta a educao formal dos educandos que apresentem

    necessidades educacionais muito diferentes das da maioria das crianas e jovens.

    preciso no se perder de vista a importante observao de que nem todo

    portador de deficincia requer ou requerer servios de Educao Especial, ainda

    que possa necessitar de tratamento de interveno teraputica (habilitao ou

    reabilitao) em razo de suas condies fsicas ou mentais.

    Uma questo levantada por muitos estudiosos: quem so as pessoas

    deficientes? Uma pessoa deficiente no pertence a uma categoria ou classe de

    profissionais. O termo serve para caracterizar pessoas que diferem das demais, em

    virtude de suas disfunes fsicas, sensoriais, orgnicas ou mentais. So pessoas

    que nasceram com ou adquiriram algum dficits intelectuais, fsicos ou orgnicos, o

    que no as impede de serem respeitadas enquanto cidados com direitos e deveres.

    O Centro de Informaes Multieducao define que Portadores de Necessidades

    Educativas Especiais (PNEE) so portadores de deficincia fsica, mental, auditiva e

    visual, portadores de altas habilidades, e os portadores de condutas tpicas de

    sndrome.

    Segundo Cruz, PNEE so aquelas pessoas com deficincia mental, visual,

    auditiva, fsica, paralisia cerebral, autismo, distrbios de comportamentos severos,

    distrbios de aprendizagem e deficincias mltiplas, ou seja, que englobam mais de

    uma deficincia (2002, p.30).

  • 30

    Para a International Classification of Impairments, Disabilities and Handicaps

    (AZEVEDO, 1995), uma pessoa com uma necessidade especial uma pessoa com

    falta ou restrio de capacidades para executar atividades, tarefas, habilidades e

    comportamentos, na forma ou mbito considerado normal para o ser humano.

    Com base nas definies supracitadas, muitos podem questionar: mas qual ,

    afinal, a diferena entre os termos deficincia e PNEE? Os estudos mais recentes

    tm demonstrado que o termo PNEE, por ser mais amplo, alm de nomear a prpria

    deficincia em si, tambm se preocupa com as metodologias e os recursos

    educacionais para atender s necessidades especiais. Assim, pode-se classificar

    meninos de rua como PNEE.

    Atualmente as transformaes socioculturais esto atropelando as transformaes

    educacionais nas escolas de ensino regular. Quando se trata de Educao Especial

    ou do trato da educao de Pessoas Portadoras de Necessidades Educativas

    Especiais (PPNEE), elas soam mais contundentes, pois se destinam a uma fatia

    significativa da populao brasileira.

    H uma estimativa de que 10% da populao ou em ento, uma em cada dez

    pessoas portadora de necessidades especiais no Brasil. Em documento elaborado

    por Sassaki (1998), so enumerados diversos dados de pesquisas reconhecidas

    mundialmente. Os dados compilados fazem meno a essa estimativa, fato que levou

    a Organizao Mundial de Sade (OMS) a adotar esta porcentagem. Algumas

    citaes de Sassaki reafirmam a aceitao pela OMS: Calcula-se que havia no

    mundo cerca de 500 milhes de pessoas deficientes, o que equivaleria a 10% de

    toda a populao mundial (SASSAKI, 1998, p.14).

    Sassaki ainda destaca:

    A proclamao da Dcada das Naes Unidas para pessoas com deficincia uma clara indicao da preocupao da comunidade internacional para com o destino dos 500 milhes de pessoas deficientes no mundo. As estatsticas indicam que uma em cada 10 pessoas no mundo tem deficincia (1998, p.14).

    O dado mais recente obtido refere-se ao Censo 2000 do IBGE. Em reportagem da

    Folha de S. Paulo, mostra-se um nmero maior de portadores de deficincia do que o

    esperado: 24,5 milhes de pessoas, ou seja, cerca de 14,5% da populao brasileira.

  • 31

    O jornal O Globo informa que foram includas na pesquisa todas as pessoas que

    apresentam alguma dificuldade: de enxergar, de ouvir, de locomover-se ou que tem

    alguma deficincia mental. O conceito utilizado no Censo 2000, de limitao de

    atividades, seguiu recomendaes recentes da ONU, segundo Alicia Bercovich,

    pesquisadora do IBGE (cf. tabela 1).

    Tabela 1 Nmero por tipo de Deficincias Detectadas.

    TIPO NMERO Visual 16.573.937 Motora 7.879.601 Auditiva 5.750.809 Mental 2.848.684 Fsica 1.422.224

    Fonte: IBGE Censo 2000.

    De acordo com a tabela 1, a porcentagem estimada por rea de deficincia fica

    assim distribuda: Deficincia Visual 48,1%; Deficincia Motora 22.9%; Deficincia

    Auditiva 16,7%; Deficincia Mental 8,3%; Deficincia Fsica 4,1% (cf. grfico 1).

    .

    Porcentagem por rea de deficincia

    Visual48%

    Fsica4%

    Mental8%

    Auditiva17%

    Motora23%

    VisualMotoraAuditivaMentalFsica

    .

    Figura 3 Porcentagem por rea de deficincia Fonte: IBGE Censo 2000.

    Para atender a essa populao com dignidade, a Educao Especial procura

    fundamentar-se em referenciais terico-metodolgicos compatveis com as

    necessidades especficas de seus alunos.

  • 32

    O sistema vigente define uma metodologia de ensino intitulada Educao

    Especial. A Educao Especial no uma modalidade educacional alijada e diferente

    da Educao Geral, mas sim uma forma diversificada de organizao e de

    funcionamento educacional, incorporando atitudes e providncias de acordo com sua

    finalidade, que a de formar cidados conscientes e participativos. Esta modalidade

    intervm desde a estimulao essencial at os graus superiores de ensino. Ela

    apresenta como princpio filosfico que todo ser humano capaz de aprender. Visa

    tambm promoo do desenvolvimento das potencialidades de PPNEE,

    reconhecidas como aquelas pessoas portadoras de condutas tpicas, altas

    habilidades e de deficincias em diversos modos e nveis.

    Em tempos passados, as escolas especiais tinham cunho clnico, porm, hoje so

    consideradas instituies educacionais com princpios educativos vigentes na

    Educao Nacional, contando com um currculo dinmico e flexvel e uma

    metodologia adequada e diversificada; a renovao do fazer pedaggico nas Escolas

    Especiais visa uma atuao eficiente e pautada na realidade brasileira.

    Os critrios de avaliao utilizados para identificar quem realmente necessita de

    Educao Especial so extremamente rigorosos e responsveis e, sendo assim,

    quando um indivduo apresenta dificuldade no desenvolvimento cognitivo, realizada

    uma avaliao diagnstica (no caso do Deficiente Mental DM a avaliao a

    psicoeducacional) para detectar suas potencialidades e suas necessidades

    educativas especiais.

    Mediante os resultados obtidos nessa avaliao, o aluno encaminhado a uma

    das alternativas de atendimento educacional que melhor lhe convier. A programao

    desenvolvida para esses alunos procurar atender s suas necessidades individuais,

    efetuando um trabalho sistematizado das reas do desenvolvimento, quais sejam: a

    cognitiva, a psicomotora e a afetivo-emocional.

    Na Educao Especial so integradas as reas sociais, de sade e de trabalho.

    Os contedos trabalhados so similares aos do ensino regular, e apenas so

    adaptados s necessidades dos alunos.

    Os profissionais que atuam na rea so especial