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  • 7/30/2019 HC Algemas

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    HABEAS CORPUS 91.952-9 SO PAULO

    RELATOR :MIN. MARCO AURLIOPACIENTE(S) : ANTONIO SRGIO DA SILVAIMPETRANTE(S) : KATIA ZACHARIAS SEBASTIO E

    OUTRO(A/S)COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA

    R E L A T R I O

    O SENHOR MINISTRO MARCO AURLIO Adoto,

    como relatrio, as informaes prestadas pela Assessoria:

    Consta do processo que o paciente foidenunciado como incurso nos artigos 121, 2,incisos II - motivo ftil -, III - meio cruel - eIV - mediante recurso que impossibilitou a defesa davtima. Tambm foi recebida a denncia oferecida peloMinistrio Pblico, em que lhe imputada infrao aoartigo 10 da Lei n 9.437/97, em virtude de possuir,portar e manter arma de fogo, de uso permitido, semautorizao e em desacordo com determinao legal ouregulamentar. O ru foi pronunciado (folha 155 a 163do apenso). Desprovido o recurso em sentido estritointerposto contra a deciso (folha 214 a 219 do

    apenso), foi submetido a julgamento pelo Tribunal doJri, sendo condenado pena de treze anos e seismeses de recluso, por infrao ao artigo 121, 2,incisos II, III e IV, do Cdigo Penal e pena de umano de deteno e dez dias-multa, como incurso noartigo 10 da Lei n 9.437/97, observado o disposto noartigo 69 do Cdigo Penal.

    A defesa interps recurso de apelao,argindo preliminares de nulidade do julgamento: a)por erro de votao do terceiro quesito; b) emvirtude do fato de o ru ter permanecido algemadodurante a assentada em que realizado o jri; c)porque indeferidos, pelo Juiz togado, quesitospertinentes absoro do delito de porte de armapelo de homicdio. No mrito, pleiteou oreconhecimento da legtima defesa, da inexigibilidadede conduta diversa, do estado de violenta emoo apsinjusta provocao da vtima. Insurgiu-se, tambm,contra as qualificadoras acolhidas no julgamento equanto ao regime de cumprimento da pena integralmentefechado.

    O Tribunal de Justia proveu parcialmente oapelo, to-s para fixar o regime semi-aberto para ocumprimento da pena atinente ao porte de arma.Interpostos embargos de declarao, foram estesdesprovidos. O recurso especial protocolado peladefesa no foi admitido e o agravo de instrumento

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    formalizado contra esta deciso aguarda a remessa aoSuperior Tribunal de Justia.

    Nesse interregno, no Superior Tribunal deJustia, mediante habeas corpus, os impetrantesalegaram nulidade do julgamento: a) por erro de

    votao do terceiro quesito; b) em virtude do fato deo ru ter permanecido algemado durante a assentada emque realizado o Jri; c) o regime de penaintegralmente fechado, em relao ao crime dehomicdio. O ministro Gilson Dipp deferiu a liminar,assegurando ao paciente o direito progresso deregime prisional, observados os pressupostos erequisitos previstos na Lei de Execues Penais(folha 167 do apenso). No julgamento do mrito daimpetrao, a ordem foi parcialmente concedida:confirmou-se a liminar mediante a qual acolhido opleito de reconhecimento do direito progressoprisional, sendo indeferidos os pedidos atinentes nulidade do julgamento por erro de votao doterceiro quesito apresentado aos jurados erelativamente ao fato de o ru ter permanecidoalgemado durante a sesso do Jri.

    Este habeas est voltado a infirmar esseato, no ponto em que pretendida a nulidade doveredicto popular em razo de o ru ter permanecidoalgemado durante todo o julgamento realizado peloTribunal do Jri.

    Os impetrantes sustentam o cabimento daordem, ainda que pendente de julgamento o agravoformalizado contra a inadmisso do recurso especial.Evocam precedente do Supremo, no qual assentado queno impedem a impetrao de habeas corpus aadmissibilidade de recurso ordinrio ouextraordinrio da deciso impugnada, nem a efetivainterposio deles Habeas Corpus n 83.346-2/SP,relator ministro Seplveda Pertence, acrdopublicado no Dirio da Justia de 19 de agosto de2005. No mrito, afirmam que, de acordo com o quedecidido no Habeas Corpus n 89.429-1/RO, relatoraministra Crmen Lcia, o uso de algemas h deobedecer aos princpios constitucionais daproporcionalidade e da razoabilidade, sob pena denulidade.

    Ressaltam que, no caso em exame, no haviarazo plausvel para tanto. Alegam que a garantia daordem pblica, a convenincia da instruo criminal ea certeza da aplicao da lei penal, pressupostospara a decretao da priso preventiva, no servem debase para o procedimento adotado pelo Presidente doTribunal do Jri, uma vez que, na deciso depronncia, no constou a existncia de indcios depericulosidade ou de animosidades no paciente.Afirmam que a circunstncia de o ru permaneceralgemado no pode ser confundida com os requisitos dapriso cautelar, mostrando-se insubsistente tambm o

    argumento de que o ru teria permanecido algemado emtodas as audincias ocorridas antes da pronncia.

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    Asseveram paradoxal a assertiva de a segurana noTribunal ser realizada por apenas dois policiaiscivis, porquanto tal fato demonstraria adesnecessidade do uso das algemas, por no cuidar-sede ru perigosssimo, como, primeira vista, poderiatransparecer. Apontam ter havido desrespeito ao

    princpio da isonomia, com desequilbrio na igualdadede armas que h de ser assegurada acusao e defesa. Dizem da existncia de constrangimento ilegalno uso das algemas quando no verificadas ascondies de efetiva periculosidade. Aduzem que oprocedimento, alm de implicar ofensa dignidade dapessoa humana, influiria negativamente na concepodos jurados no momento de decidir. Requerem aconcesso da ordem, para declarar nulo, a partir dolibelo, o Processo-Crime n 7/2003, em curso no Juzode Direito da Comarca de Laranjal Paulista, e asubmisso do paciente a novo julgamento, desta vezsem as malsinadas algemas.

    A Procuradoria Geral da Repblica, noparecer de folha 30 a 35, manifesta-se peloindeferimento da ordem. Entende que o uso de algemasno afronta o princpio da presuno de no-culpabilidade e a manuteno do ru algemado durantea sesso plenria do Tribunal do Jri no configuraconstrangimento ilegal se a medida se mostranecessria ao bom andamento do julgamento e segurana das pessoas que nele intervm. A adoo doprocedimento ficaria a critrio do Juiz-Presidente doTribunal do Jri no exerccio da polcia das sesses.

    Lancei visto no processo em 2 de julho de

    2008, liberando-o para ser julgado no Pleno a partir de 6

    de agosto seguinte, isso objetivando a cincia dos

    impetrantes.

    o relatrio.

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    V O T O

    O SENHOR MINISTRO MARCO AURLIO (RELATOR) O

    julgamento perante o Tribunal do Jri no requer a custdia

    preventiva do acusado, at ento simples acusado - inciso

    LVII do artigo 5 da Lei Maior. Hoje no necessria

    sequer a presena do acusado Lei n 11.689/08, alterao

    do artigo 474 do Cdigo de Processo Penal. Diante disso,

    indaga-se: surge harmnico com a Constituio manter o

    acusado, no recinto, com algemas? A resposta mostra-se

    iniludivelmente negativa.

    Em primeiro lugar, levem em conta o princpio

    da no-culpabilidade. certo que foi submetida ao

    veredicto dos jurados pessoa acusada da prtica de crime

    doloso contra a vida, mas que merecia o tratamento devido

    aos humanos, aos que vivem em um Estado Democrtico de

    Direito. Segundo o artigo 1 da Carta Federal, a prpria

    Repblica tem como fundamento a dignidade da pessoa humana.

    Da leitura do rol das garantias constitucionais artigo 5

    -, depreende-se a preocupao em resguardar a figura do

    preso. A ele assegurado o respeito integridade fsica e

    moral - inciso XLIX. Versa o inciso LXI, como regra, que

    ningum ser preso seno em flagrante delito ou por ordem

    escrita e fundamentada de autoridade judiciria competente,

    salvo nos casos de transgresso militar ou crime

    propriamente militar, definidos em lei.

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    Alm disso, existe a previso de que a

    custdia de qualquer pessoa e o local onde se encontre ho

    de ser comunicados imediatamente ao juiz competente,

    famlia ou pessoa por ele indicada inciso LXII. Tambm

    deve o preso ser informado dos respectivos direitos, entre

    os quais o de permanecer calado, ficando-lhe assegurada a

    assistncia da famlia e de advogado inciso LXIII. O

    inciso LXIV revela que o preso tem direito identificao

    dos responsveis por sua priso ou por seu interrogatrio

    policial. Mais ainda, a priso ilegal h de ser

    imediatamente relaxada pela autoridade judiciria inciso

    LXV - e ningum ser levado priso ou nela mantido quando

    a lei admitir a liberdade provisria com ou sem fiana

    inciso LXVI.

    Sob o ngulo do cumprimento da pena, impe-se

    a separao em estabelecimentos prisionais considerada a

    natureza do delito, a idade e o sexo do apenado inciso

    XLVIII.

    Ora, estes preceitos a configurarem

    garantias dos brasileiros e dos estrangeiros residentes no

    pas - repousam no inafastvel tratamento humanitrio do

    cidado, na necessidade de lhe ser preservada a dignidade.

    Manter o acusado em audincia, com algema, sem que

    demonstrada, ante prticas anteriores, a periculosidade,

    significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar

    inferior, no bastasse a situao de todo degradante. O

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    julgamento no Jri procedido por pessoas leigas, que

    tiram as mais variadas ilaes do quadro verificado. A

    permanncia do ru algemado indica, primeira viso,

    cuidar-se de criminoso da mais alta periculosidade,

    desequilibrando o julgamento a ocorrer, ficando os jurados

    sugestionados.

    O tema no novo. Na apreciao do Habeas

    Corpus n 71.195-2/SP, relatado pelo ministro Francisco

    Rezek, cujo acrdo foi publicado no Dirio da Justia de 4

    de agosto de 1995, a Segunda Turma assentou que a

    utilizao de algemas em sesso de julgamento somente se

    justifica quando no existe outro meio menos gravoso para

    alcanar o objetivo visado:

    HABEAS CORPUS. CONCURSO MATERIAL DE CRIMES.PROTESTO POR NOVO JRI. PENA INFERIOR A VINTE ANOS.UTILIZAO DE ALGEMAS NO JULGAMENTO. MEDIDAJUSTIFICADA.

    [...]

    II O uso de algemas durante o julgamentono constitui constrangimento ilegal se essencial ordem dos trabalhos e segurana dos presentes.

    Habeas corpus ideferido.

    Assim tambm decidiu a Primeira Turma desta

    Corte no Habeas Corpus n 89.429-1/RO, relatora ministra

    Crmen Lcia, acrdo veiculado no Dirio da Justia de 2

    de fevereiro de 2007. Assentou o Colegiado:

    [...] o uso legtimo de algemas no arbitrrio, sendo de natureza excepcional, a ser

    adotado nos casos e com as finalidades de impedir,prevenir ou dificultar a fuga ou reao indevida dopreso, desde que haja fundada suspeita ou justificado

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    receio de que tanto venha a ocorrer, e para evitaragresso do preso contra os prprios policiais,contra terceiros ou contra si mesmo.

    No Superior Tribunal de Justia, no

    julgamento do Recurso de Habeas Corpus n 5.663, do qual

    foi relator o ministro William Patterson, acrdo publicado

    no Dirio da Justia de 23 de setembro de 1996, outro no

    foi o entendimento, como se constata da seguinte ementa:

    Penal. Ru. Uso de algemas. Avaliao danecessidade.

    - A imposio do uso de algemas ao ru, porconstituir afetao aos princpios de respeito integridade fsica e moral do cidado, deve seraferida de modo cauteloso e diante de elementosconcretos que demonstrem a periculosidade do acusado.

    - Recurso provido.

    Deste julgamento, sem voto discrepante,

    participaram os ministros Luiz Vicente Cernicchiaro,

    Vicente Leal, Fernando Gonalves e Anselmo Santiago.

    De modo enftico, o Tribunal de Justia do

    Estado de So Paulo, no julgamento da Apelao Criminal n

    74.542-3, acrdo publicado na Revista dos Tribunais n

    643/285, estabeleceu que algema no argumento e, se for

    utilizada sem necessidade, pode levar invalidao da

    sesso de julgamento.

    Essa postura remonta ao tempo do Imprio.

    Dom Pedro, quando ainda Prncipe Regente, em Decreto de 23

    de maio de 1821, ordenou:

    [...] que em caso nenhum possa algum serlanado em segredo, em masmorra estreita, escura ou

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    infecta, pois que a priso deve s servir paraguardar as pessoas e nunca para as adoecer eflagelar; ficando implicitamente abolido para sempreo uso de correntes, algemas, grilhes e outrosquaisquer ferros, inventados para martirizar homens,ainda no julgados, a sofrer qualquer pena aflitiva,

    por sentena final; entendendo-se, todavia, que osJuzes e Magistrados Criminais podero conservar poralgum tempo, em casos gravssimos, incomunicveis osdelinqentes, contanto que seja em casas arejadas ecmodas e nunca manietados ou sofrendo qualquerespcie de tormento. (Em Coleo das Leis do Brasilde 1821, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1889,Parte II, p. 88 e 89).

    O Cdigo de Processo Criminal do Imprio

    de 29 de novembro de 1832 -, no captulo Da Ordem de

    Priso, dispunha, no artigo 180, que, se o ru no

    obedecer e procurar evadir-se, o executor tem direito de

    empregar o grau da fora necessria para efetuar a priso,

    se obedecer porm, o uso da fora proibido. A Lei n

    261, de 3 de dezembro de 1841, reformou o Cdigo de

    Processo Criminal, mas manteve a mencionada norma.

    Nova reestruturao do processo penal

    brasileiro somente ocorreu trinta anos depois, com a Lei n

    2.033, de 20 de setembro de 1871, regulamentada pelo

    Decreto n 4.824, de 22 de novembro do mesmo ano. O artigo

    28 deste ltimo preceituava que o preso no seria

    conduzido com ferros, algemas ou cordas, salvo o caso

    extremo de segurana, que dever ser justificado pelo

    condutor; e quando o no justifique, alm das penas em que

    incorrer, ser multado na quantia de dez a cinqenta mil

    ris, pela autoridade a quem for apresentado o mesmo

    preso.

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    A Constituio de 1891 conferiu s unidades

    federativas a competncia para legislar sobre matria

    processual penal. Algumas exerceram a competncia

    legislativa, enquanto outras se limitaram a adotar a

    legislao do Imprio. O artigo 28 do referido decreto

    regulamentar, ento, acabou repetido em vrias leis.

    Com a Carta da Repblica de 16 de julho de

    1934, foi restabelecida a competncia privativa da Unio

    para legislar sobre direito penal. Em 15 de agosto de 1935,

    sendo Ministro da Justia e Negcios Interiores Vicente

    Ro, foi apresentado o Projeto de Cdigo de Processo Penal,

    cujo artigo 32 vedava o uso de fora ou o emprego de

    algemas, ou de meios anlogos, salvo se o preso resistir ou

    procurar evadir-se. O projeto no vingou, em virtude da

    Constituio promulgada com o golpe de Estado de 1937 (em

    Jos Frederico Marques, Tratado de Direito Processual

    Penal, So Paulo, Saraiva, 1980, v. I, 83, p. 123).

    O novo Cdigo somente veio balha em 3 de

    outubro de 1941, passando a viger desde ento o artigo 284

    - No ser permitido o emprego de fora, salvo a

    indispensvel no caso de resistncia ou de tentativa de

    fuga do preso -, que, embora no se refira expressamente

    ao uso de algemas, sinaliza as situaes de fato extremas

    em que podero ser utilizadas. o que se constata, ainda,

    no artigo 292 dele constante, a revelar que, se houver,mesmo que por parte de terceiros, resistncia priso em

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    flagrante ou determinada por autoridade competente, o

    executor e as pessoas que o auxiliarem podero usar dos

    meios necessrios para defender-se ou para vencer a

    resistncia, do que tudo se lavrar auto subscrito tambm

    por duas testemunhas.

    Na Lei de Execuo Penal n 7.210/84 ,

    bem se revelou o carter excepcional da utilizao de

    algemas, instando-se o Poder Executivo regulamentao no

    que previsto, no artigo 159, que o emprego de algemas ser

    disciplinado por decreto federal. Se, quanto quele que

    deve cumprir pena ante a culpa formada, o uso de algemas

    surge no campo da exceo, o que se dir em relao a quem

    goza do benefcio de no ter a culpa presumida, ao

    simplesmente conduzido, indiciado ou mesmo acusado que

    responda a processo-crime?

    At mesmo na rea penal militar, a utilizao

    de algema tida como excepcional. Consta do artigo 234 do

    Cdigo de Processo Penal Militar:

    O emprego de fora s permitido quandoindispensvel, no caso de desobedincia, resistnciaou tentativa de fuga. Se houver resistncia da partede terceiros, podero ser usados os meios necessriospara venc-la ou para defesa do executor e auxiliaresseus, inclusive a priso do ofensor. De tudo selavrar auto subscrito pelo executor e por duastestemunhas.

    O 1 do citado artigo, harmnico com a

    Carta de 1988, revela especificamente que:

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    O emprego de algemas deve ser evitado,desde que no haja perigo de fuga ou de agresso daparte do preso, e de modo algum ser permitido, nospresos a que se refere o art. 242.

    O artigo 242 prev que:

    Art. 242 - Sero recolhidos a quartel ou apriso especial, disposio da autoridadecompetente, quando sujeitos a priso, antes decondenao irrecorrvel:

    a) os ministros de Estado;

    b) os governadores ou interventores de Estados, ouTerritrios, o prefeito do Distrito Federal, seusrespectivos secretrios e chefes de Polcia;

    c) os membros do Congresso Nacional, dos Conselhos daUnio e das Assemblias Legislativas dos Estados;

    d) os cidados inscritos no Livro de Mrito dasordens militares ou civis reconhecidas em lei;

    e) os magistrados;

    f) os oficiais das Foras Armadas, das Polcias e dos

    Corpos de Bombeiros, Militares, inclusive os dareserva, remunerada ou no, e os reformados;

    g) os oficiais da Marinha Mercante Nacional;

    h) os diplomados por faculdade ou instituto superiorde ensino nacional;

    i) os ministros do Tribunal de Contas;

    j) os ministros de confisso religiosa.

    Pois bem, se fica excluda a utilizao

    da algema seja qual for o quadro, quanto a essas pessoas, o

    que se dir no tocante quele que, vindo sob a custdia do

    Estado h algum tempo, j se encontra fragilizado e

    comparece ao tribunal para ser julgado?

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    Vale registrar, ainda, que o item 3 das

    regras da Organizao das Naes Unidas para tratamento de

    prisioneiros estabelece que o emprego de algemas jamais

    poder se dar como medida de punio. Isso indica,

    semelhana do que antes previsto no artigo 180 do Cdigo de

    Processo Criminal do Imprio, que o uso desse instrumento

    excepcional e somente pode ocorrer nos casos em que

    realmente se mostre indispensvel para impedir ou evitar a

    fuga do preso ou quando se cuidar comprovadamente de

    perigoso prisioneiro.

    A ausncia de norma expressa prevendo a

    retirada das algemas durante o julgamento no conduz

    possibilidade de manter o acusado em estado de submisso

    mpar, incapaz de movimentar os braos e as mos, em

    situao a revel-lo no um ser humano que pode haver

    claudicado na arte de proceder em sociedade, mas uma

    verdadeira fera.

    No bastasse a clareza vernacular do artigo

    284, a afastar o emprego de fora, tomada esta no sentido

    abrangente ante abusos de toda sorte, vendo-se, nos

    veculos de comunicao, algemadas pessoas sem o menor

    trao agressivo, at mesmo outrora detentoras de cargos da

    maior importncia na Repblica, em verdadeira imposio de

    castigo humilhante, vexaminoso -, veio balha norma

    simplesmente interpretativa, e, portanto, pedaggica,

    especfica quanto postura a ser adotada em relao ao

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    acusado na sesso de julgamento pelos populares, pelos

    iguais, alfim, pelo Jri. A recente Lei n 11.689, de 9 de

    junho de 2008, ao implementar nova redao ao artigo 474 do

    Cdigo de Processo Penal, tornou estreme de dvidas a

    excepcionalidade do uso de algemas.

    Eis o preceito:

    Artigo 474 [...]

    3 No se permitir o uso de algemas noacusado durante o perodo em que permanecer no

    plenrio do jri, salvo se absolutamente necessrio ordem dos trabalhos, segurana das testemunhas ou garantia da integridade fsica dos presentes.

    hora de o Supremo emitir entendimento sobre

    a matria, inibindo uma srie de abusos notados na atual

    quadra, tornando clara, at mesmo, a concretude da lei

    reguladora do instituto do abuso de autoridade, considerado

    o processo de responsabilidade administrativa, civil e

    penal, para a qual os olhos em geral tm permanecido

    cerrados. A Lei em comento n 4.898/65, editada em pleno

    regime de exceo -, no artigo 4, enquadra como abuso de

    autoridade cercear a liberdade individual sem as

    formalidades legais ou com abuso de poder alnea a - e

    submeter pessoa sob guarda ou custdia a vexame ou a

    constrangimento no autorizado por lei - alnea b.

    No caso, sem que houvesse uma justificativa

    socialmente aceitvel para submeter um simples acusado

    humilhao de permanecer durante horas e horas com algemas,

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    na oportunidade do julgamento, concluiu o Tribunal de

    Justia do Estado de So Paulo que a postura adotada pelo

    Presidente do Tribunal do Jri, de no determinar a

    retirada das algemas, fez-se consentnea com a ordem

    jurdico-constitucional. Proclamou a Corte que a

    utilizao das algemas durante o julgamento no se mostrou

    arbitrria ou desnecessria e, por conseguinte, no vinga a

    nulidade argida, aludindo, no entanto, a precedente da

    Segunda Turma do Supremo que vincula a permanncia do preso

    algemado necessidade de manuteno da ordem dos trabalhos

    e de garantia da segurana dos presentes (folhas 408 e 409,

    numerao de origem, dos autos em apenso).

    Vale frisar, por oportuno, que, abertos os

    trabalhos do Jri - o acusado j estava preso h um ano e

    meio - o defensor, Dr. Walter Antnio Dias Duarte, pediu a

    palavra e assim se manifestou:

    MM. Juza: Ho (com a correo vernacular)que ser retiradas as algemas do acusado para quealgemado no influencie indevidamente o nimo dossenhores jurados. Se necessrio for a defesa apontara Vossa Excelncia as correspondentes folhas dos

    autos onde o meritssimo Juiz de ento cancelou doisdos motivos que autorizavam a decretao dapreventiva, vez que a garantia da ordem pblica e aconvenincia da instruo criminal no maisintegravam o rol dos motivos que autorizam adecretao desta custdia (fls. 115). Se, comoprecedente jurisprudencial e julgado do EgrgioTribunal de Justia do Estado de So Paulo que tempor ementa: rrto o julgamento do Jri se o rupermaneceu algemado durante o desenrolar dostrabalhos sob a alegao de ser perigoso, eis que talcircunstncia interfere no esprito julgador e,conseqentemente, no resultado do julgamento,

    constituindo constrangimento ilegal que d causa anulidade.(RT. 643/285) - confiram com a ata da

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    sesso realizada, que se encontra s folhas 301 e 302do apenso, numerao de origem.

    O Ministrio Pblico se ops retirada das

    algemas. Afirmou que ficara o ru algemado durante todas as

    audincias de instruo, reclamando fosse guardada a

    coerncia. Olvidou, com essa ptica, que o erro anterior

    no justificava a manuteno da violncia.

    Ento, a Juza deliberou:

    Entendo que no constitui constrangimentoilegal o ru permanecer algemado em Plenrio,sobretudo porque tal circunstncia se fazestritamente necessria para preservao e seguranado bom andamento dos trabalhos, j que a seguranahoje est sendo realizada por apenas dois policiaiscivis. Assim, indefiro o pleito da defesa, observandoainda, como bem notou a Dra. Promotora de Justia queo ru permaneceu algemado em todas as audinciasocorridas antes da pronncia.

    No foi apontado, portanto, um nico dado

    concreto, relativo ao perfil do acusado, que estivesse a

    ditar, em prol da segurana, a permanncia com algemas.

    Quanto ao fato de apenas dois policiais civis

    fazerem a segurana no momento, a deficincia da estrutura

    do Estado no autorizava o desrespeito dignidade do

    envolvido. Incumbia sim, inexistente o necessrio aparato

    de segurana, o adiamento da sesso, preservando-se o valor

    maior, porque inerente ao cidado.

    Concedo a ordem para tornar insubsistente a

    deciso do Tribunal do Jri. Determino que outro julgamento

    seja realizado, com a manuteno do acusado sem as algemas.

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    Informo que, hoje, ante pronunciamento em outro Habeas

    Corpus, o de n 86.453-8/SP, o paciente encontra-se em

    liberdade h cerca de trs anos, sendo que a sentena de

    pronncia ltimo ato que sobeja, prevalecente o voto, a

    interromper a prescrio, no caso de vinte anos - data de

    2004.