fabricio jesus teixeira neves
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UFRJ
DIREITA, CENTRO E ESQUERDA NO BRASIL:
UM MAPA DO REALINHAMENTO POLÍTICO-IDEOLÓGICO (1994-2002)
Fabrício Jesus Teixeira Neves
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-graduação em Ciência Política, Instituto de
Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em
Ciência Política.
Orientador: Charles Pessanha
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2005
ii
DIREITA, CENTRO E ESQUERDA NO BRASIL:
UM MAPA DO REALINHAMENTO POLÍTICO-IDEOLÓGICO (1994-2002)
Fabrício Jesus Teixeira Neves
Orientador: Charles Pessanha
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em
Ciência Política, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal do
Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título
de Mestre em Ciência Política.
Aprovada por:
___________________________________
Presidente, Prof. Charles Pessanha
___________________________________
Prof. Eurico de Lima Figueiredo
___________________________________
Prof. Aluízio Alves Filho
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2005
iii
Neves, Fabrício Jesus Teixeira.
Direita, centro e esquerda no Brasil: Um mapa do realinhamento político-ideológico (1994-2002)/ Fabrício Jesus Teixeira Neves - Rio de Janeiro: UFRJ/ IFCS, 2005.
xi, 93f.: il.; 31 cm.
Orientador: Charles Pessanha.
Dissertação (mestrado) – UFRJ/ IFCS/ Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, 2005.
Referências Bibliográficas: f. 80-81.
1. Direita. 2. Esquerda. 3. Neoliberalismo. 4. Partidos. 5. Eleições. I. Pessanha, Charles. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Programa de Pós-graduação em Ciência Política. III. Direita, centro e esquerda no Brasil: Um mapa do realinhamento político-ideológico (1994-2002).
iv
RESUMO
DIREITA, CENTRO E ESQUERDA NO BRASIL:
UM MAPA DO REALINHAMENTO POLÍTICO-IDEOLÓGICO (1994-2002)
Fabrício Jesus Teixeira Neves
Orientador: Charles Pessanha
Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-
graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ,
como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciência
Política.
Esta dissertação analisa o realinhamento político-ideológico ocorrido nas
eleições para a Presidência da República e para o Congresso Nacional, em 1994,
1998 e 2002. Na busca de seus objetivos, explicita-se a fundamentação teórica
relativa aos conceitos de Direita e Esquerda; examina-se o quadro partidário
brasileiro, distinguindo-o em três grandes campos político-ideológicos: Direita,
Centro e Esquerda; identifica-se as origens das políticas neoliberais, no Brasil e no
mundo. Conclui-se demonstrando o aumento da representação dos partidos de
esquerda, como um todo, e em particular do PT, capitaneado pela candidatura de
Luís Inácio Lula da Silva, o que decorreu da gradual quebra de consenso em torno
da política econômica de Fernando Henrique Cardoso, nos últimos anos de seu
segundo mandato presidencial.
Palavras-chave: direita, esquerda, neoliberalismo, partidos, eleições.
Rio de Janeiro
Fevereiro 2005
v
ABSTRACT
RIGHT WING, CENTER AND LEFT WING IN BRAZIL:
A MAP OF THE POLITICAL AND IDEOLOGICAL REALIGNMENT (1994-2002)
Mariana Peluso de Araujo
Orientadora: Eli Diniz
Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-
graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ,
como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciência
Política.
This dissertation analyses the political-ideological re-direction which took
place during both the President and the National Congress elections, in 1994, 1998
and 2002. Aiming at our objectives, we present the theoretical literature related to
the Right and Left wings concepts; we closely look into the Brazilian poltical parties,
classifying them into three broad poltical-ideological fields: Right wing, Left wing
and Center; we identify the origins of the neoliberal policies in Brazil and in the
world. We conclude showing the increase in the representation of left wing political
parties, as a whole, and particularly in the Working Party representation (PT), led
by the candidacy of Luís Inácio Lula da Silva which sprang due to a gradual break in
the general agreement on the economical policy of Fernando Henrique Cardoso
during the last years of his second presidential term.
Key words: right wing, left wing, neoliberalism, political parties, elections.
Rio de Janeiro
Outubro de 2006
vi
AGRADECIMENTOS
A realização deste trabalho não teria sido possível sem a colaboração de algumas
pessoas. Desejo, neste breve espaço, agradecê-las.
Um agradecimento especial ao prof. Eurico pela paciência comigo e
indispensável aconselhamento em inúmeros sentidos. Esta dissertação também lhe
pertence.
Ao meu orientador, prof. Luís Fernandes, que acolheu com entusiasmo o
tema deste trabalho.
Aos queridos amigos Alan e Luís Octávio, que deram contribuições valiosas
na redação final do texto.
À Vivian, minha monitora, que, sempre solicita, me ajudou na parte gráfica
do trabalho.
À Taís, minha doce amiga, agradeço muitíssimo a boa vontade na revisão
ortográfica do texto.
À Aline, minha namorada, pelo carinho e dedicação inesgotáveis. Nossas
conversas, nas pausas do trabalho, sempre me trouxeram a tranqüilidade e o
estímulo necessários para seguir adiante.
Ao meu filho João Victor, o mais que amado, que iluminou e alegrou as
minhas horas de descanso com sua graça infinita.
E, naturalmente, a minha mãe e avó – por tudo.
vii
À memória de meu avô, Victor Teixeira, por tudo que ele representa para mim.
viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Bancadas na Câmara dos Deputados (Cadeiras Obtidas pelos Partidos em 1994)
48
Figura 2 Evolução da Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancadas Eleitas de 1990 e 1994)
49
Figura 3 Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancada eleita em 1994)
50
Figura 4 Evolução da Composição Político-Ideológica do Senado Federal (Bancadas Eleitas de 1990 a 1994)
51
Figura 5 Composição Político-Ideológica do Senado Federal (Bancada Eleita em 1994)
52
Figura 6 Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancada Eleita em 1998)
59
Figura 7 Composição Político-Ideológica do Senado Federal (Bancada Eleita em 1998)
60
Figura 8 Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancada Eleita em 2002)
69
Figura 9 Evolução da Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancadas Eleitas de 1994 a 2002) 72
Figura 10 Composição Política-Ideológica do Senado Federal (Bancada Eleita em 2002)
74
Figura 11 Evolução da Composição Político-Ideológica do Senado Federal (Bancadas Eleitas de 1994 a 2002) 75
ix
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Votação dos Candidatos nas Eleições Presidenciais em 1994, Segundo orientação político-ideológica (Primeiro Turno)
45
Tabela 2 Votação dos Candidatos nas Eleições Presidenciais em 1998, Segundo orientação político-ideológica
56
Tabela 3 Votação dos Candidatos nas Eleições Presidenciais em 2002, Segundo orientação político-ideológica (primeiro turno)
68
Tabela 4 Realinhamento Político-Ideológico na Câmara dos Deputados (Bancadas Eleitas em 1994, 1998 e 2002)
71
Tabela 5 Realinhamento Político-Ideológico no Senado Federal (Bancadas Eleitas em 1994, 1998 e 2002)
74
x
SUMÁRIO
Introdução 1
Capítulo 1. Direita e esquerda: Problemas conceituais 7
Capítulo 2. Direita, centro e esquerda: Os partidos políticos no Brasil 17
Antecedentes: Redemocratização e pluripartidarismo
A classificação partidária: Direita, centro e esquerda no Brasil
Capítulo 3. Neoliberalismo: As origens de uma nova hegemonia 28
Capítulo 4. As eleições de 1994 39
O processo político: Antecedentes
A votação para Presidência da República
As eleições para o Congresso Nacional
A composição da Câmara
A composição do Senado Federal
Capítulo 5. As eleições de 1998 53
Geral: O processo político: De 1995 a 1998
A votação para Presidência da República
A composição da Câmara dos Deputados
A composição do Senado Federal
Capítulo 6. As eleições de 2002 61
Geral: O processo político: De 1999 a 2002
A votação para Presidência da República
A composição da Câmara dos Deputados
A composição do Senado Federal
Conclusão 76
Referências bibliográficas 80
Anexo 82
Introdução
Esta dissertação resulta da continuação e ampliação de trabalho anteriormente
realizado pelo seu autor.1 Pretende examinar, tendo em vista o período
compreendido entre 1994 e 2002, o realinhamento político-ideológico ocorrido nas
eleições para a Presidência da República e para o Congresso Nacional. Restringe-se,
por motivos a um só tempo práticos e operacionais, apenas aos dois níveis acima
indicados, não considerando as eleições nem para os demais cargos majoritários
(governador de Estado), nem para os proporcionais (assembléias legislativas). A
análise agrupa os partidos representados naqueles pleitos em três grandes
conjuntos político-ideológicos: direita, centro e esquerda.
Em 1994, o então senador Fernando Henrique Cardoso, que mais tarde seria
conhecido como o Presidente FHC, à frente de uma coalizão de centro-direita –
formada, principalmente pelo PSDB e o PFL –2, foi eleito para a Presidência da
República logo no primeiro turno, com quase 54% dos votos válidos. Devendo
governar o país de início por quatro anos (o tempo de seu mandato), FHC acabou
sendo eleito para um segundo mandato à frente do Executivo federal. Nesses oito
anos, liderou e implementou profundas modificações na condução da política
econômica do país. Os que se sentiram surpresos com os caminhos seguidos nos
1Trata-se de monografia apresentada como requisito para a obtenção do título de bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense, sob a orientação do Prof. Dr. Luís Manuel Rebelo Fernandes, do Departamento de Ciência Política do Instituto de Ciências Humanas e Filosofia da UFF. Nesse trabalho, procurou-se examinar de que modo se deu, no Estado do Rio de Janeiro, o realinhamento político-ideológico face à composição das bancadas partidárias na Assembléia Legislativa e na Câmara dos Deputados, nos pleitos de 1990, 1994 e 1998. NEVES, F. J. T. O realinhamento político-ideológico no Estado do Rio de Janeiro. A composição das bancadas na Assembléia Legislativa e na Câmara dos Deputados (1990-1998). Concluiu-se demonstrando o aumento da representação dos partidos de Centro e de Direita, como um todo, em contraste com o declínio da Esquerda nas duas instâncias examinadas, o que comprovava a hipótese que se pretendia demonstrar (id., 2001). As conclusões estavam em consonância com outra pesquisa de maior escopo conduzida por Fernandes, conforme ficará mais claro no desenvolvimento desta dissertação. FERNANDES, L. M. Muito barulho por nada? O realinhamento político-ideológico nas eleições de 1994. 2 A coalizão de centro-direita não se restringiu apenas a esses dois partidos. Dela também fizeram parte o PTB e o PL. A enunciação do que se entende por direita, esquerda e centro e possíveis coalizões que daí resultam serão objetivadas adiante.
2
seus dois mandatos não haviam possivelmente prestado atenção devida ao seu
pronunciamento de despedida do Senado, já como presidente eleito, em 1994.
Nesse discurso, FHC declarou-se empenhado em superar a Era Vargas e a
promover, conforme os padrões internacionais vigentes, a reestruturação da
economia e do Estado. Justificou a adoção de uma agenda liberalizante devido à
inviabilidade da implementação de qualquer política de desenvolvimento com
ênfase no setor estatal. Sua despedida na câmara alta foi, também, a partida para
o cumprimento de um rumo que jamais deixou de ser perseguido tenazmente.3
Ao assumir a presidência, passando da retórica à ação, FHC pôs em marcha
um conjunto de reformas que, nos seus aspectos financeiros centrais, encontravam
lastro na sua gestão à frente do Ministério da Fazenda do governo Itamar Franco
(1992-1994). De fato, como ministro responsável pela condução da política
econômica do país, FHC pôs em prática um novo plano de estabilização monetária,
que, essencialmente, se voltava para o combate à inflação e ao déficit público. Tal
plano, entre outras medidas contundentes, foi responsável pelo lançamento de uma
nova moeda – o real –, que perdura até hoje.4
Como presidente eleito em 1994, FHC fez do plano de estabilização o carro-
chefe de seu primeiro governo (1995-1998). Apesar de seus altos custos sociais, foi
um sucesso no combate à inflação, assegurando um largo consenso em torno das
políticas governamentais. Afinal, acabou por produzir resultados eleitorais
espetaculares e foi mote de sua campanha à reeleição, em 1998.5 Nesse pleito,
3 O melhor balanço da era FHC se encontra em LAMOUNIER & FIGUEIREDO JÚNIOR, A era FHC. 4 Para uma análise crítica do plano de estabilização, ver TAVARES & FIORI. Poder e dinheiro: Uma economia política da globalização. Para uma compreensão da política econômica durante os governos de FCH, ver LAMOUNIER & FIGUEIREDO JÚNIOR, A era FHC. Do ponto de vista macroeconômico, a suposição da equipe governamental era a de que, com o equacionamento das contas públicas, e o resultante controle inflacionário, criar-se-iam as condições necessárias para a recuperação econômica, de maneira organizada e sustentável. 5 As principais medidas do plano levavam à supervalorização do real. Os resultados mais palpáveis foram a elevação substancial das taxas de juros, o agravamento da vulnerabilidade externa dada a forte dependência do capital
3
repetiu-se a aliança que o havia levado pela primeira vez ao Planalto, incluindo o
PPB, à direita, e o PMDB, ao centro.
No decorrer do segundo mandato de FHC, a política macroeconômica
conduzida pelo governo começou a apresentar sinais de desgaste. Isso esteve
associado ao recrudescimento dos efeitos recessivos do plano de estabilização
econômica, tendo repercussões diretas sobre os índices de popularidade do
presidente.
Esse novo cenário abriu espaço para o principal (e como sempre, desde
1989) candidato de oposição ao governo federal, o petista Luís Inácio Lula da Silva.
Coube a ele capitanear o apoio dos trabalhadores urbanos e rurais, das classes
médias e dos empresários da indústria, setor descontente com os rumos da
economia no país. Persistindo em sua crítica ao modelo econômico vigente no país,
Lula se lançou para sua quarta disputa à Presidência da República, derrotando o
candidato governista, José Serra, no segundo turno das eleições. Se foi ampla a
vitória do candidato do PT no primeiro turno, no segundo, contando com o apoio
dos demais candidatos de oposição, sua vitória foi, na verdade, esmagadora.
É sobre esse pano de fundo – aqui tão rapidamente sintetizado – que se
estrutura a presente investigação. Ela pretende discutir, tendo em vista uma série
de critérios previamente delimitados,6 quais foram os caminhos percorridos pelo
processo político ao longo do espectro ideológico. Os objetivos perseguidos foram
basicamente três:
1. examinar, no plano do quadro partidário vigente no país, a distribuição
político-ideológica que se manifestou na disputa presidencial, segundo critérios
previamente estabelecidos;
internacional, o aumento sistemático do desemprego e a elevação das dívidas externa e interna. 6 As noções de esquerda, centro e direita estão enunciadas no capitulo I.
4
2. analisar, sempre no contexto do quadro partidário vigente, a correlação
de forças que se manifestou na distribuição das vagas para o Congresso Nacional e
o Senado Federal;
3. avaliar até que ponto o processo político-eleitoral ocorrido no período em
tela manteve conexão com a dinâmica da economia.
Tendo em vista os objetivos acima explicitados, as hipóteses que nortearam
a pesquisa foram as seguintes:
1. a formação de uma aliança de centro-direita – que garantiu a eleição (em
1994) e a reeleição (em 1998) do Presidente da República – refletiu a consolidação
de um novo projeto de desenvolvimento econômico-social para o país;
2. o realinhamento mostrou uma consonância entre os votos dados para a
Presidência e para o Congresso Nacional;
3. No decorrer do segundo mandato foi se observando a perda de força de
execução política da coalizão liderada pelo PSDB/PFL em função mesmo das
dificuldades sócio-econômicas enfrentadas pelo modelo neoliberal.
4. A gradual perda de substância política da coalizão de centro-direita, levou
ao fortalecimento da centro-esquerda no pleito de 2002, em torno de uma política
econômica alternativa àquela prevalecente durante a era FHC.
A exposição se estrutura ao longo de seis capítulos que dão seqüência a esta
introdução. O primeiro consiste numa revisita às noções de Direita e Esquerda. Elas
correspondem, de antemão, a linhas de pensamento e de ação política antagônicas
que, desde suas origens, na França, durante a Revolução de 1789, têm adquirido
significados distintos. Foi preciso inseri-las (embora ainda preliminarmente) na
conjuntura política nacional, perseguindo sua tipificação ao longo da prevalecente
estrutura partidária.
O capítulo seguinte – Direita, centro e esquerda: Os partidos políticos no
Brasil – ,tendo em vista as qualificações conceituais estabelecidas na parte anterior,
5
classifica os partidos brasileiros ao longo do espectro político ideológico que vai da
Esquerda à Direita, passando pelo seu Centro. Essa classificação levou em conta a
posição do conjunto dos partidos face às questões de interesse público, não se
atendo às diferenciações internas de cada partido, no que diz respeito às diversas
tendências que neles se representam. Embora isso possa tornar a análise imprecisa
e pouco refinada, o procedimento é, pelo menos inicialmente, justificável, tendo em
vista os objetivos aqui delineados. Ressalte-se, ainda com relação aos critérios
metodológicos adotados, que por partido indefinido entenderam-se aqueles que não
conseguiram eleger representantes para a presidência ou para nenhuma das duas
instâncias legislativas, embora tenham lançado candidatos nos pleitos aqui
considerados. Sem se poder contrapor o posicionamento político-ideológico desses
partidos com a votação de suas bancadas, não restou outra alternativa senão
posicioná-los dessa maneira.
O terceiro capítulo caracteriza, nas suas linhas gerais, as origens da doutrina
neoliberal, no Brasil e no mundo. Esta doutrina inspira-se nas políticas de
estabilização e de ajuste, notadamente a abertura comercial e a liberalização dos
fluxos financeiros. A compreensão das condições que sedimentaram o credo
neoliberal supõe uma incursão histórica ao período que se seguiu ao declínio do
assim chamado Estado de bem-estar social nos países da Europa continental, no
plano geral, e do início da gestão Collor, no início dos anos 1990, no plano
particular.
Nos capítulos subseqüentes, examina-se o desempenho individual dos
candidatos que disputaram a presidência da República e dos partidos que
concorreram às eleições para a Câmara dos Deputados e Senado Federal. A análise
dos pleitos demarcados prevê a contextualização histórica das condições
econômicas e sociais em que se realizaram as eleições aqui analisadas. São
apresentados, também, os resultados percentuais de suas votações, assim como o
total de votos obtidos por categoria político-ideológica em cada pleito investigado.
6
No caso dos partidos ou coligações que lançaram candidatos à disputa presidencial,
foi também apresentada a sua votação absoluta e dos conjuntos de partidos de
direita, centro e esquerda.
O último capítulo, à guisa de conclusão, tendo em vista a hipótese que
orientou o inquérito, propõe um balanço geral da evolução do realinhamento
político-ideológico no país, no que diz respeito aos períodos aqui considerados.
Capítulo 1
Direita e esquerda: Problemas conceituais
A classificação referente à oposição entre direita e esquerda originou-se nas
reuniões, às vésperas da Revolução de 1789, da Assembléia Nacional francesa.
Nela, à direita do rei, sentava-se a nobreza, e à esquerda, o Terceiro Estado,
composto pela burguesia e pela massa camponesa. Assim, a direita se identificava
com posições aristocráticas, tradicionalistas e monárquicas; e a esquerda com
posicionamentos democráticos, liberais, nacionalistas e, pelo menos
potencialmente, republicanos.7 Nesse período, posicionar-se à esquerda era ser a
favor da Revolução e, portanto, de uma mudança radical na sociedade; e estar à
direita significava colocar-se contra ela. Gradualmente, entre esses dois limites, iria
se interpor um gradiente de posições. À esquerda, à idéia de uma mudança radical,
revolucionária, iria se contrapor a noção de que outras formas de mudanças seriam
possíveis, com escopo e ritmo cadenciado, espaçado e gradual. À direita,
igualmente, à idéia de se colocar contra a qualquer mudança, iria se contrapor a
alternativa de se aceitar por inevitável, o processo de transformação, desde que ele
ocorresse de forma ordeira e gradual. No limite, à esquerda, estariam os
revolucionários; à direita, os reacionários, defensores intransigentes de um retorno,
completo ou parcial, ao passado.8
Há ainda aqueles que encontram as raízes da dicotomia na Assembléia
Constituinte francesa, instalada logo após a tomada da Bastilha em 1789. Nela, os
partidários mais radicais – personificados nos jacobinos – sentaram-se à esquerda;
e os mais conservadores – representados pelos girondinos – à direita. Esses dois
grupos se distinguiam de acordo com sua composição social e filiação política.
Liderados por Robespierre (1758-1794) e Jean-Paul Marat (1743-1793), os
7 FERNANDES, L. M. Muito barulho por nada? O realinhamento político-ideológico nas eleições de 1994: 108. 8 PICKLES, W. Esquerda e direita (significados correntes): 413.
8
jacobinos, também chamados de (partido da) Montanha, representavam os
interesses da pequena burguesia; eram favoráveis à implantação da República e à
limitação do poder real. Esse segmento da burguesia aproximou-se dos sens-
coulottes (proletariado urbano composto de artesãos, diaristas, assalariados em
geral, desempregados e, como se chamaria hoje, por mais complexa que seja a
expressão, dos setores marginais). Já os girondinos, identificados com os interesses
da grande burguesia mercantil, defendiam a propriedade privada e o princípio do
livre mercado. Posicionavam-se, portanto, contrariamente às reivindicações
republicanas e de caráter mais popular.9 Mais uma vez, por um lado, a esquerda
representava a mudança política e a defesa dos interesses sociais mais amplos. E,
mais uma vez também, por outro lado, a direita se identificava com a conciliação
entre um processo de mudança política mitigada e, do ponto de vista social, de
restrição ao atendimento dos interesses sociais dos mais desprotegidos.10
A luta entre as duas tendências da Revolução se prolongou durante quase
todo o período da Convenção Nacional (1792-1795). Os deputados da Gironda
foram perseguidos por seus adversários jacobinos, que instalaram, em 1793, um
regime de violência patrocinado pelo Estado, conhecido como período do Terror. A
reação jacobina, em nome de uma sociedade mais aberta, alimentou um
movimento contra-revolucionário que atraiu não só aqueles que haviam sofrido
perseguição política ou religiosa. Acabou, também, por atrair os interesses do
antigo regime, os que haviam perdido posições e privilégios, assim como os que
haviam sofrido o confisco e/ou a destruição, parcial ou completa, de seus bens e
propriedades. Findado o Terror com o golpe do 9-Terminador (1794), os girondinos
assumiram a liderança política do país.11 A Contra-Revolução trouxe como
conseqüências a restauração da monarquia na França e o abandono dos ideais
9 SOBOUL, A. A Revolução Francesa: 59-65. 10 Há de se observar que girondinos e jacobinos eram revolucionários: foram aliados na derrubada da realeza. O choque de interesses entre eles indica que a dinâmica política passa a operar em um patamar de maior complexidade política. 11 SOBOUL, A. A Revolução Francesa: 64-89.
9
igualitários ou populares que haviam motivado a tendência radicalizada da
Revolução.12
As noções de direita e esquerda não permaneceram estáticas no tempo.
Com a ascensão do movimento socialista na segunda metade do século XIX, a idéia
da intervenção do Estado na atividade econômica introduziu um novo critério de
diferenciação entre as duas partes. Desde então, passaram a ser identificados como
de esquerda aqueles que defendiam a ação do Estado para neutralizar e/ou
reverter as desigualdades econômicas e sociais provocadas pela industrialização
capitalista. Isso significou, portanto, que a noção do que era a esquerda passou a
englobar não só os comunistas e os socialistas, mas outros posicionamentos
ideológicos (de caráter partidário ou não) que se identificavam com essas posições
relativas às desigualdades sociais.13 Por contraposição, ficavam à direita os
opositores dessas políticas e bandeiras.
No tumultuado século XX, o choque entre esquerda e direita alimentou a
dinâmica política. Não será possível passar em inspeção a história da centúria ao
largo dessas noções, por mais frouxas que sejam no contexto de certas
conjunturas. As duas guerras mundiais, as duas revoluções comunistas, as guerras
de libertação nacional na África e na Ásia, as diversas revoluções e contra-
revoluções etc., em grande parte, e com sentidos complexos, foram a história do
embate entre a direita e a esquerda. E mesmo nos países centrais do Ocidente –
onde tiveram vigência mais sólida os princípios e os métodos da democracia liberal
12 Há de se anotar, no entanto, que a Revolução Francesa, nos marcos do ideário liberal, era extremamente excludente: não se previa a participação das mulheres, da massa de homens que não tinham acesso à educação, e se deixava de fora os despossuídos de bens e rendas. FIGUEIREDO, E. de L. Globalização, neoliberalismo e a estratégia do poder: Os jogos não estão feitos: 243-261. 13 Foram os movimentos anarquista e comunista de diferentes matizes da Europa que lutaram pelo restabelecimento dos princípios republicanos e das conquistas sociais básicas introduzidas pela Revolução. A coordenação dessa luta deu-se em torno da Associação Internacional dos Trabalhadores, depois conhecida como Primeira Internacional. Segundo os membros da Internacional, os ideais da Revolução Francesa – liberdade, igualdade e fraternidade – só poderiam ser realizados através da substituição do capitalismo e de suas barreiras materiais por uma sociedade internacional fundamentada na auto-emancipação do homem. SADER, E. O anjo torto: 25 e 27.
10
– a noção esteve sempre presente na mente e ação dos atores políticos e, assim,
dos analistas que procuravam estudá-los e entendê-los.
Nos últimos anos, a distinção clássica entre direita e esquerda tem se
tornado alvo de severas contestações. Difundiu-se, em certos meios políticos e
intelectuais, a idéia de que estas duas noções – que, como assinala Bobbio, por
mais de dois séculos serviram para dividir o universo político em pólos distintos –
tiveram seus significados esvaziados e, portanto, não tem mais sentido sua
utilização.14 Jean-Paul Sartre se referia aos dois termos como caixas vazias, sem
mais valor heurístico ou explicativo.
A literatura referente à invalidade da oposição Direita e Esquerda é vasta e
diversificada. Norberto Bobbio, por exemplo, querendo propor um breve sumário da
discussão, se refere a cinco tipos ou matrizes teóricas que põem em dúvida a
pertinência da distinção. Em primeiro lugar ele indica as polêmicas relativas ao fim
das ideologias, iniciadas nos anos 60 do século passado e retomadas a partir das
teses de Fukuyama na década de 1980,15 como diluidoras da polarização.16
Em segundo lugar, observa que, para muitos, a dicotomia perdeu sua nitidez
no mundo político atual porque a complexidade das grandes sociedades e, em
particular, das grandes sociedades democráticas tem tornado inadequado o
estabelecimento de uma separação nítida entre duas partes contrapostas em um
sistema pluriverso.17 Em seguida, comenta que muitos teóricos pregam o
esvaziamento da díade direita/esquerda na medida em que ela perde seu valor
descritivo. E, desse modo, não dá conta das contínuas transformações pelas quais
14 BOBBIO, N. Direita e esquerda: Razões e significados de uma distinção política: 32. 15 De acordo com a tese de Francis Fukuyama, o colapso do regime soviético anunciou o fim dos conflitos tradicionais entre ideologias oriundas Iluminismo europeu. Com base nessa constatação, o autor afirma que a história chegou ao fim, com a vitória do capitalismo democrático ocidental, segundo ele a última forma de governo dos homens. GRAY, J. Falso amanhecer: Os equívocos do capitalismo global: 157-158. 16 BOBBIO, N. Direita e esquerda: Razões e significados de uma distinção política: 33. 17 Idem: 35.
11
as sociedades têm passado e que deram origem a diversos movimentos sociais
(ecologistas, feministas, pacifistas etc.)18 que não se enquadram no tradicional
esquema polarizado.19 Em quarto lugar, aponta para a argumentação de certos
estudiosos, segundo os quais o conceito se esmaece devido aos novos e intrincados
dilemas impostos às sociedades mais avançadas. Nelas, direita e esquerda
apresentam, na verdade, mais ou menos as mesmas propostas e objetivam os
mesmos fins. Logo,
basta desautorizar um dos termos, não lhe reconhecendo mais nenhum direito à existência; se tudo é esquerda, não há mais direita e, reciprocamente, se tudo é direita, não há mais esquerda.20
Finalmente, lembra que, ainda para outros, a dissolução do conceito liga-se
ao fato de que ambas
as etiquetas tornaram-se meras ficções e, na realidade, diante da grandeza e novidade dos problemas que os movimentos políticos devem enfrentar, os destros (destri) e os esquerdos (sinistri) dizem, no fim das contas, as mesmas coisas, formulam, para uso e consumo de seus eleitores, mais ou menos os mesmos programas e propõem-se os mesmos fins imediatos.21
Discordando de cada uma dessas interpretações, o pensador italiano
reafirma a pertinência da distinção, pelo menos em um dos seus pontos essenciais:
a questão da igualdade é a característica maior da esquerda, sendo a desigualdade
originária daquele terrível direito à propriedade individual.22
Alguns autores, embora concordando com a validade da distinção, chamam
a atenção para uma mudança do conteúdo das ideologias de esquerda e de direita.
18 Bottomore escreve que durante a década de 1960 esses movimentos agruparam-se na chamada Nova Esquerda (New Left). A Nova Esquerda, diz ele, alcançou o apogeu de seu desenvolvimento nos Estados Unidos no final da década de 1960, no movimento pelos direitos civis e na oposição à guerra do Vietnã, na Europa em 1968, com a generalização dos protestos estudantis, especialmente o movimento de maio na França, e com a primavera de Praga na Tchecoslováquia. BOTTOMORE, T. Nova esquerda: 530. 19 BOBBIO, N. Direita e esquerda: Razões e significados de uma distinção política: 40. 20 Idem: 43. 21 Idem: 47. 22 Idem: 121.
12
Argumentam que a Esquerda passou por mudanças radicais nas últimas décadas. A
queda do Muro de Berlim (1961-1989) e o colapso dos sistemas soviéticos do Leste
teriam contribuído para a transformação das referências ideológicas tradicionais da
Esquerda. Essa transformação pressupõe uma maior participação e controle dos
partidos de esquerda pelos cidadãos comuns, a fim de torná-los menos
hierarquizados e fechados, com base na idéia da democracia participativa.
Na mesma linha de argumentação, Giddens, querendo vislumbrar um
horizonte para além da esquerda e da direita, aponta novos esquemas ideológicos
que se formaram a partir da polarização tradicional.23 A esquerda e a direita,
materialistas, associadas a assuntos de natureza econômica, teriam sido
atravessadas, na pós-modernidade,24 por questões como direitos das mulheres e
proteção ambiental.25
Boris Fausto, em artigo recente, mostra afinidade com o pensamento de
Giddens, registrando que
os critérios definidores [da Esquerda] não são a revolução, o papel dominante do Estado, ficando a sociedade em segundo plano, o partido autodefinido como vanguarda dos trabalhadores (...) mas temas como a luta contra o preconceito racial; pela igualdade entre homens e mulheres, na esfera doméstica e no mercado de trabalho; pelo reconhecimento de comportamentos tidos como desviantes; pela defesa do ambiente (...).26
23 GIDDENS, A. Para além da esquerda e da direita. 24 O termo é geralmente utilizado para dar conta da sociedade consumista e tecnológica das últimas décadas do século XX. Segundo Jean-François Lyotard (1924-1998), um dos fundadores do conceito, a pós-modernidade não constitui o início de uma nova era por oposição à anterior – a modernidade –, mas antes o corolário natural dos aspectos característicos desta última. LYOTARD, J. A condição pós-moderna. Como diz Kumar, o pós-modernismo foi a forma assumida pelo modernismo depois deste perder o seu élan revolucionário (...) representa a ruptura interminável com o passado, por mais radical que este tenha sido em sua própria época. KUMAR, K. Da sociedade pós-industrial à pós-moderna – Novas teorias sobre o mundo contemporâneo: 121. Entre os principais representantes dessa corrente estão Lyotard, Gilles Deleuze (1925-1995), Michel Foucault (1926-1994) e Jacques Derrida (1930-2004). A partir de seus proponentes franceses, o movimento pós-moderno difundiu-se por outras partes do continente europeu, pelo mundo anglo-saxão e América Latina. 25 KNUTSEN, O. Left right materialist value orientions. 26 FAUSTO, B. O mundo movente das ideologias: 3.
13
Para David Miliband, os ataques contra a convicção de que os termos direita
e esquerda ainda guardam algum significado relevante partem do mesmo
pressuposto. Este consiste na idéia de que o projeto emancipatório e igualitário da
esquerda correspondeu a um período histórico específico, tendo chegado ao fim nas
economias capitalistas avançadas, caracterizadas pela globalização das decisões
econômicas e descentralização da organização industrial.27 Focando o fracasso do
comunismo do Leste e do modelo social-democrata da Europa ocidental e
Escandinava – mistura de dirigismo estatal, serviços públicos universais e uma
economia mista de setores públicos e privados –, argumenta que para alguns a
Esquerda passa a ser vista como incapaz de enfrentar os desafios sociais e
econômicos da década de 1990.28 Por essa época, o neoliberalismo29 se afirmou
como a principal doutrina da Nova Direita,30 passando a influir decisivamente sobre
governos de diferentes matizes ideológicos – inclusive comunistas e socialistas –
em quase todo o mundo.
27 MILIBAND, David. Introdução: 32. 28 Idem: 17-18. 29 O termo neoliberalismo designa a doutrina que aspira renovar algumas posições do velho liberalismo, embora afirmando suas teses centrais. As concepções principais que inspiraram o liberalismo do séc. XVIII foram a liberdade individual de pensamento e a competição política e econômica entre os indivíduos, através da representatividade e da economia de mercado, respectivamente. O liberalismo econômico encontrou sua mais poderosa justificativa em A riqueza das nações (1776), obra do filosofo e economista escocês Adam Smith (1723-1790). Considerado o fundador da moderna ciência da economia, Smith sustenta a tese de que o bem comum resulta da busca desimpedida do interesse próprio individual. Desse ponto de vista, qualquer governo que interfira no mercado mundial impede o progresso social dos povos. Nesse sentido, caberia apenas aos governos garantir a liberdade econômica e individual, além de providenciar serviços de educação aos mais pobres com vistas a aliviar os efeitos negativos da divisão social do trabalho. WATKINS & KRAMNICK. A idade da ideologia: 11-13. Da mesma forma, a liberdade, para os neoliberais, significa ordem natural e harmonia espontânea de interesses. Ocorre que este retorno às idéias liberais clássicas se dá dentro de um contexto diferente de quando surgiu o liberalismo. Este se pronunciou contra as restrições feudais ao comércio e à produção; e teve um caráter revolucionário em sua época. As teorias neoliberais têm sua especificidade e atualidade. Refletem, portanto, as novas condições organizadoras do capital nos tempos contemporâneos. 30 Esta expressão foi adotada por intelectuais de esquerda, durante os anos 1980, para definir um movimento comum de oposição ao socialismo e de seus congêneres. GRANT. S/ ref.: 526-527.
14
Afinado com o discurso pós-moderno acerca da inexistência de estruturas
capazes de comandar mudanças sociais e econômicas,31 os teóricos do
neoliberalismo – entre os quais se destaca o economista austríaco Friedrich von
Hayke32 (1899-1992) – anunciaram o fim da era da atividade política
transformadora33 e deslocam a ênfase das decisões do âmbito estatal para o
mercado, identificado como a única democracia autêntica.34 Este credo, defendido
por seus atuais adeptos como antipolítico, constitui, para Milliband, o supra-sumo
da política. Nos seus dizeres,
a política de empregos no projeto da Nova Direta se reduz a liberar o mercado de trabalho ao jogo das forças de mercado. A política econômica inclui em manter baixa a inflação e deixar o mercado fazer o resto. A política industrial é anátema, a política energética uma contradição em termos.35
Outro estudioso, insistindo na validade das definições tradicionais de
esquerda e direita, identifica três características cruciais que estruturariam o
antagonismo entre os dois conceitos. No caso da Esquerda, seriam esses seus
principais atributos: 1) a crença na educabilidade plena dos seres humanos; 2) a
confiança na influência de instituições sobre a conduta humana; e 3) a prioridade
pelos direitos e necessidades sociais sobre os individuais. Já a direita se
caracterizaria, no essencial, por: 1) acreditar em autoridades estabelecidas para o
controle de seres humanos limitados; 2) confiar somente em instituições evoluídas
e consolidadas; e 3) priorizar os direitos individuais sobre os sociais.36
Uma das possíveis ramificações do debate, como não poderia deixar de ser,
encontrou repercussões no Brasil, em particular, e na América latina, em geral.
31 MILIBAND, David. Introdução: 15. 32 Em O caminho da servidão (1944), considerado o texto de origem do neoliberalismo, Hayek propôs um individualismo econômico radical, aliado à crença de que qualquer forma de controle coletivo destrói a liberdade – tanto econômica como política – e prepara o caminho para um novo totalitarismo. Suas idéias tiveram notável influência sobre a Direita da Grã-Bretanha durante os anos 1980. 33 MILIBAND, David. Introdução: 16. 34 GRANT. S/ ref.: 526. 35 MILIBAND, David. Introdução: 18. 36 PICKLES, W. Esquerda e direita (significados correntes): 413.
15
Emir Sader coloca a dicotomia direita/esquerda nos termos da contraposição
entre mercado e justiça social. Ele escreve:
Os que acreditam que o mercado supostamente livre define o destino de cada um, são de direita. Os que acreditam, ao contrário, na justiça social e norteiam suas crenças, sua palavra e sua ação nesse sentido, são de esquerda.37
Além, disso, a direita, ao não se assumir como uma força política, faz com
que a esquerda tampouco se assuma, com o fim de enfraquecer a tradicional
dicotomia. Essa pressão sobre a esquerda se faz, segundo ele,
seja pelo convencimento de que os termos da questão teriam se alterado, seja pela tentativa de desmoralização do que possa significar esquerda hoje.38
Investida de uma nova roupagem, a direita rompeu com seu caráter
conservador, procurando dar um sentido evolucionista aos seus posicionamentos.
Considera Sader, entretanto, que a direita se manteve fiel às idéias centrais do
liberalismo clássico, visto que sustenta, ainda hoje, com o mesmo ardor do
passado, a antiga tese da liberdade de mercado.39 Ele, portanto, identifica nas
posições que favorecem a lógica do mercado, em detrimento da lógica do social, o
divisor de águas entre a direita e a esquerda.
Em seu livro Utopia desarmada, Jorge Castañeda distingue direita e
esquerda pretendendo localizar a diferenciação no contexto da história atual da
América Latina. Assim, segundo ele, a esquerda defende: 1) a transformação
social; 2) a democracia e os direitos humanos; e 3) a identidade e a soberania
nacionais. Ao passo que a direita apóia: 1) a continuidade; 2) a segurança
nacional; e 3) a integração econômica. Nas áreas econômica e social, a esquerda
enfatiza: 1) a justiça social; 2) a manutenção de emprego; 3) o controle nacional
de recursos e de setores estratégicos da economia; 4) a distribuição de renda; 5) a
redução de desigualdades; 6) o gasto social; e 7) as necessidades de
37 SADER, E. O anjo torto: 17. 38 Idem: 182. 39 Idem: 181-182.
16
investimentos. A direita, ao contrário, privilegia: 1) o desempenho econômico; 2) a
eficácia; 3) as políticas de livre mercado e livre empresa; 4) o bom funcionamento
do mercado; 5) a competitividade; 6) o controle da inflação; e 7) o saneamento
das finanças governamentais.40
Esses objetivos múltiplos levantados por Castañeda definem posturas
diferenciadas (e, na maioria das vezes, incompatíveis) com relação a determinados
assuntos. Mas fornecem elementos conceituais básicos para uma compreensão e
análise do comportamento dos principais atores políticos da atualidade. É do que se
aproveita o investigador, após restrições de caráter metodológico, para fazer suas
análises41 e que, como já referido na introdução, servem para fundamentar esta
investigação.42
40 CASTAÑEDA, J. G. Utopia desarmada: Intrigas dilemas e promessas da esquerda latino-americana: 31-33. 41 FERNANDES, L. M. Muito barulho por nada? O realinhamento político-ideológico nas eleições de 1994: 107-144. 42 Outras classificações relativas às noções de direita e esquerda podem ser encontradas na literatura pertinente. É bastante sugestiva, por exemplo, a utilizada por Singer em trabalho publicado sobre o assunto. SINGER, A. V. Esquerda e direita no eleitorado brasileiro: A identificação ideológica nas disputas presidenciais de 1989 e 1994.
Capítulo 2
Direita, centro e esquerda: Os partidos políticos no Brasil
Partidos políticos,43 como todo e qualquer ente social, têm suas raízes – tanto as
mais próximas, como as mais distantes – plantadas no solo da história. Por isso
mesmo, o espectro político partidário vigente no país nos dias que correm, quando
inspecionados com maior rigor, não escondem suas origens mais recentes. Ainda
que superficialmente, convém relembrá-las. A reconstituição será útil para a
compreensão mais larga e mais profunda, assim como mais sistemática e sintética,
dos processos que encaminharam, do ponto de vista da análise dos partidos
políticos, a história recente do país.
Antecedentes: Redemocratização e pluripartidarismo
O Brasil viveu 21 anos sob o regime militar instaurado no país em 1964 e findo em
1985, com a posse do primeiro presidente civil, o então senador maranhense José
Sarney. Durante esse período, o sistema partidário brasileiro funcionou, de 1965 a
1979, sob o bipartidarismo. O objetivo estratégico do regime era montar um
sistema organizado em termos de apoio ou oposição ao governo, reunindo em uma
única legenda todos os congressistas cujas tendências políticas fossem favoráveis
ao regime, e num modesto partido de oposição as forças políticas restantes. Esta
oposição formal teria, junto com a agremiação governista, a responsabilidade de
dar a fachada democrática ao regime militar. Sob esta ótica foram criados a Aliança
Renovadora Nacional (Arena), que abrigava os partidários do regime vigente, e o
Movimento Democrático Brasileiro (MDB), ao qual se aglutinaram todas as
tendências contrárias a ele. Com o desenvolvimento do processo de distensão
43 Max Weber (1864-1920), procurando chamar a atenção para as bases sociais dos partidos políticos, define-os como uma associação que visa a um fim deliberado, seja ele a realização de um programa de propósitos ideais ou materiais, seja pessoal, isto é, destinado a obter benefícios, poder e, conseqüentemente, glória para seus líderes e seguidores, ou então voltado para a consecução de todos esses objetivos ao mesmo tempo. Seus meios de alcançar essas metas variam entre a violência exclusiva e a coleta de votos, através das mais variadas formas, como o dinheiro, o prestígio social, a força da oratória do chefe de partido etc. WEBER, M. Classe, estamento e partido: 227.
18
política do presidente Ernesto Geisel (1974-1979), o sistema bipartidário sofreu
desgaste com o passar do tempo, sobretudo com o crescimento do partido de
oposição, consubstanciado na significativa vitória do MDB nas eleições legislativas
de 1974. Para garantir a aprovação dos seus projetos no Congresso, onde já não
controlava facilmente a maioria da Casa, em abril de 1977 o governo editou um
pacote de medidas, entre as quais a criação da figura do senador indireto,
consagrado pela mídia como biônico. Diante dessas dificuldades, que aumentavam
com o passar do tempo, o principal articulador político do governo, o general
Golberi do Couto e Silva, então chefe do Gabinete Civil da Presidência da República,
passou a defender o fim da era bipartidária, com o objetivo de dividir as forças de
oposição ao regime.
Com o fim do bipartidarismo em novembro de 1979 e o conseqüente retorno
ao pluripartidarismo, começaram a surgir as agremiações que passaram a abrigar
as tendências possíveis, dentro do ainda vigente regime militar, que se
encontravam especialmente camufladas no MDB, agremiação que se constituía
muito mais numa frente de oposição ao governo do que, verdadeiramente, num
partido político. Mesmo ainda dentro do regime militar, na medida em que eram
criadas novas agremiações partidárias, elas iam sendo rotuladas pela imprensa e
especialistas sob o ponto de vista político-ideológico, de acordo com o perfil das
figuras mais proeminentes de cada partido que surgia. Em 1980, os arenistas
criaram o Partido Democrático Social (PDS), nova agremiação que passou a dar
sustentação ao governo e foi classificada como de direita. A maioria dos
emedebistas foi para o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB),
herdeiro do MDB e principal agremiação de oposição ao governo militar, tido como
de centro-esquerda. Alguns moderados, liderados por Tancredo Neves, criaram o
Partido Popular (PP), classificado como de centro, de efêmera duração, já que em
fevereiro de 1982 seria incorporado ao PMDB e, dessa forma, desapareceria do
quadro partidário. Os trabalhadores, representados pelas lideranças sindicais da
região do ABC paulista, liderados pelo então metalúrgico Luís Inácio Lula da Silva,
19
fundaram o Partido dos Trabalhadores (PT), classificado como de esquerda; o ex-
governador gaúcho Leonel Brizola, de volta do exílio, em companhia de alguns
nomes ligados historicamente ao antigo trabalhismo, como Doutel de Andrade,
fundou o Partido Democrático Trabalhista (PDT), agremiação também tida como de
esquerda, após perder a disputa da sigla do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)
para a deputada Ivete Vargas. O PTB ganhou a classificação de um partido de
centro-direita, abrigando o outro segmento de trabalhistas históricos liderados pela
sobrinha-neta de Getúlio Vargas. Esta passou a ser, naquele momento, a nova
realidade do quadro partidário brasileiro. Dissidências, como a do PDS em 1984,
que deu origem ao Partido da Frente Liberal (PFL), de direita, fundado em janeiro
do ano seguinte, aconteceram durante esse processo de mudança ocorrido no
quadro partidário brasileiro. O PFL é uma agremiação que, em particular, deu sua
decisiva contribuição para o fim do regime militar, pois os seus integrantes foram
as figuras mais destacadas do partido governista.
Findo o ciclo de presidentes militares em março de 1985, os partidos de
esquerda, que até então se encontravam na clandestinidade, como o Partido
Comunista Brasileiro (PCB) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), ganharam o
direito à busca da legalização de suas legendas através dos seus registros na
Justiça Eleitoral. Entretanto, surgiram outras agremiações políticas, como o Partido
Socialista Brasileiro (PSB) e o Partido da Mobilização Nacional (PMN), ambos
considerados como de esquerda, e as que foram incluídas na categoria de centro-
direita: o Partido Democrata Cristão (PDC), o Partido Liberal (PL), o Partido Social
Cristão (PSC) e o Partido Municipalista Brasileiro (PMB). Esses partidos, embora
assim classificados, naquela ocasião ainda careciam de expressão nacional e/ou de
uma feição ideológica definida. Eles surgiram dentro do processo de
redemocratização do país com o fim do regime militar, que teve como seu último
presidente da República o general João Batista de Oliveira Figueiredo (1979-1985).
20
O aumento do número de partidos significava a elevação do índice de
fragmentação do sistema partidário e mostrava a complexidade do bipartidarismo,
sob o ponto de vista político-ideológico. Segundo Leôncio Martins Rodrigues,
os fatores responsáveis pelo aumento do índice de fragmentação e do número de partidos relevantes foram o declínio dos dois grandes partidos (o PMDB e o PFL), juntamente com o crescimento do número de partidos que poderíamos classificar de partidos de tamanho médio.44
Dentro dessa nova realidade brasileira, em novembro de 1986 foi eleita a
Assembléia Nacional Constituinte (ANC). A composição partidária no Congresso
Nacional resultante deste pleito deu ao PMDB uma significativa maioria, com 53%
de sua representação na Câmara dos Deputados e 63% no Senado. O segundo
partido foi o PFL, com 24% na Câmara e 21% no Senado. O fator que singularizou
o momento político-partidário brasileiro resultante do pleito de 1986 mostrou a
existência de uma coalizão, a Aliança Democrática, formada pelos dois maiores
partidos, que constituíam a base de sustentação do governo, em que o segundo
partido (PFL, com 24% das cadeiras da Câmara) era muito mais poderoso do que o
terceiro (PDS, com apenas 7%). Só os dois maiores dispunham de,
aproximadamente, dois terços do Congresso. O outro terço restante ficara dividido
entre uma fragmentada oposição composta de dez partidos, entre os quais o PDS, o
maior e mais forte deles, com apenas 7% do total de parlamentares, ou seja, 33
deputados e sete senadores.45
De acordo com a classificação estabelecida por Rodrigues, o esquema
partidário brasileiro decorrente das eleições de 1986 ficou descrito da seguinte
forma: um partido grande (PMDB), um partido médio (PFL), os mais importantes e
de maior expressão dentro do contexto partidário brasileiro, que comandavam as
votações no Congresso e na Constituinte; quatro partidos pequenos (PDS, PDT, PTB
e PT), com alguma expressão e importância, pela capacidade de influir sobre o
sistema decisório; e seis micropartidos (PL, PDC, PCdoB, PCB, PSB e PMB), assim
44 RODRIGUES, L. M. As eleições de 1994: Uma apreciação geral: 78-79. 45 Idem: 27.
21
classificados pelo seu reduzido número de representantes, a saber: o PL com sete;
o PDC e o PCdoB, cada qual com cinco, o PCB com três, o PSB com dois e o PMB
com um.46
A capacidade de influenciar o jogo parlamentar desses partidos era muito
reduzida, considerando-se as divergências ideológicas que os separavam. Eles não
tinham poder de intimidação nem eram importantes para uma coalizão, pois não
tinham nem mesmo a possibilidade de atuar como fiel da balança entre os dois
grandes partidos. O PDS e o PT, por exemplo, dois extremos sob o ponto de vista
político-ideológico, poderiam, eventualmente, se unir, juntamente com outros
pequenos partidos,
para a defesa da sua representação em comissões parlamentares, na obtenção de maior tempo nos horários gratuitos nos meios de comunicação, ou seja, em assuntos de interesse comum de pequenos partidos mas muito dificilmente conseguiriam pôr-se de acordo na votação de assuntos substantivos da política nacional.47
Por conseguinte, eles eram compelidos
a acompanhar os dois partidos maiores e a explorar as divergências existentes entre eles e no próprio interior de cada um deles.48
A descrição a seguir dá uma idéia da força eleitoral relativa dos partidos em
cada unidade da Federação, ou seja, da força de cada agremiação partidária em
relação às demais. Considerando, portanto, os resultados eleitorais por Estado, a
performance de cada partido por unidade da Federação foi a seguinte: PMDB
(elegeu deputados em todos estados, com exceção de Roraima); PFL (elegeu
deputados em todos os estados); PDS (elegeu em quatorze: AC, CE, MA, MT, MG,
PR, PB, PI, RJ, RN, RS, SC, SP, SE); PDT (elegeu em sete: AM, CE, MG, PR, RJ, RS
e SP); PTB (elegeu em seis: AL, MG, MS, RJ, RR e SP); PT (que elegeu em cinco:
ES, MG, RJ, RS e SP); PCdoB (elegeu em cinco: AL, BA, GO, MG e RJ); PCB (elegeu
46 Idem: 25. 47 Idem: 31. 48 Ibidem.
22
em três: BA, DF e PE); PL (elegeu em dois: RJ e SP); PSB e PSC (um cada,
respectivamente em AM e SP).
O esvaziamento sofrido pelo PDS, com a saída de seus nomes mais
expressivos para o PFL, acabou prejudicando bastante o desempenho dessa
legenda no Nordeste. Em alguns estados dessa região, o PDS não conseguiu eleger
um deputado sequer, como ficou comprovado na Bahia, com 39 deputados, e em
Pernambuco, com 25 representantes, nenhum. O PDT, embora tenha eleito 24
parlamentares em sete estados da Federação, 13 foram eleitos só no Rio de
Janeiro, onde prevalecia a força de sua liderança maior, o governador Leonel
Brizola. Isto dava uma aparência ao partido de uma agremiação eminentemente
fluminense e, em muitos aspectos, até mesmo carioca.49 Aparência que se estendia
ao PL, que tinha uma bancada de seis deputados, cinco dos quais eleitos pelo Rio
de Janeiro. Tinha, porém, no seu conjunto, o deputado paulista Guilherme Afif
Domingos, o terceiro parlamentar mais votado do país, com mais de meio milhão
de votos. Mas o grande e único partido verdadeiramente nacional revelado pelas
urnas, usando-se como critério a importância eleitoral da agremiação e a
distribuição de sua força nos estados e territórios, foi o PMDB. O segundo partido, o
PFL, embora também estivesse presente em todas as unidades da Federação, não
tinha sua força distribuída pelo território nacional de forma mais equilibrada, em
virtude do grande peso do Nordeste, de onde provinha a metade de sua bancada de
deputados federais.
Como observa Rodrigues, sendo o PMDB o mais nacional de todos os
partidos,
com penetração em regiões fortemente contrastantes entre si, abrigando deputados de meios sociais e culturais diversos,
49 Analistas, inadvertidamente, utilizam os termos fluminense e carioca como sinônimos. Não se trata de um equívoco meramente terminológico, porquanto fluminense se refere ao cidadão nascido no Estado do Rio de Janeiro, e carioca ao natural da cidade do Rio de Janeiro e adjacências. Leva, também, a erros de avaliação política: fluminense e carioca representam culturas políticas diferentes, assim como se referem a diversas condições do processo político-eleitoral em um e outro contexto.
23
somente por este fato, [tendia] a ser um partido menos homogêneo e de menor coesão interna. [Já] os partidos menores, com características sociais ou regionais mais marcadas, [tendiam] a ser mais coesos e programaticamente mais coerentes, na medida, precisamente, em que devem representar interesses de grupos mais definidos. O PMDB, ao contrário, ao espraiar-se por todo o território nacional, [era] obrigado a atender a uma gama maior e mais heterogênea de interesses. Conseqüentemente, em comparação com os demais partidos, [tinha] mais dificuldade para definir estratégias e movimentar-se com rapidez na própria medida em que [necessitava] ouvir (e eventualmente conciliar) tendências e grupos espalhados por todo o território nacional: facções político-ideológicas, demandas regionais, forças políticas estaduais (governadores, deputados, vereadores, grupos de interesses variados etc.).50
Embora considerando apenas uma variável, isto é, a combinação da
importância do partido e sua extensão pelos diferentes Estados, Rodrigues ressalta
a importância de duas outras que teriam contribuído para aumentar a
heterogeneidade do PMDB: 1) o ingresso de políticos oriundos de partidos
adversários após o declínio do regime militar; 2) a necessidade em conciliar grupos
de pressão e interesses divergentes tendo em vista o exercício do poder em uma
sociedade complexa.51 Todas essas razões, ao que parece, fizeram do PMDB o
partido mais dividido internamente diante das questões verdadeiramente cruciais
para a sociedade brasileira.
Em janeiro de 1987 mais uma agremiação surgia no universo partidário
brasileiro: o Partido Verde (PV), que entrou na categoria dos partidos de esquerda.
No início dos trabalhos da ANC houve várias tentativas da imprensa de
caracterizar, ideologicamente, o Congresso. Mas surgiu certa dificuldade, uma vez
que as categorias utilizadas eram bastante genéricas, pois tinha que ser
considerado o fato de que boa parte dos parlamentares havia chegado ao
Congresso sem opiniões sedimentadas e que o rol de questões relevantes a serem
discutidas na Constituinte era muito grande. Isto levou a uma conclusão inicial de
que se tratava de um Congresso de centro ou de centro-esquerda. Porém, as
50 RODRIGUES, L. M. As eleições de 1994: Uma apreciação geral: 28-29. 51 Idem: 29.
24
questões em jogo na ANC aguçaram os antagonismos no eixo esquerda-direita.52 A
situação partidária às vésperas da instalação da ANC caracterizava-se pelo que
Bolívar Lamounier chamou de uma hegemonia nominal do PMDB.53 Entretanto, este
partido, com 53% de representação na Câmara dos Deputados e 63% no Senado,
tinha na sua presidência um líder muito forte e carismático, o deputado federal
paulista Ulisses Guimarães, o que tornava aparente a hegemonia dessa
agremiação, pois mal conseguia disfarçar a fermentação interna, em decorrência da
frente em que se constituía que poderia conduzir o sistema partidário, no seu
conjunto, a um acentuado grau de fracionamento, dependendo das circunstâncias
em que tal fato ocorresse. Mas a expectativa de esfacelamento peemedebista
acabou não se concretizando; porém, houve mudanças significativas no espectro
partidário, tornando-o mais nítido ideologicamente. Vale ressaltar que, a partir da
abertura dos trabalhos da ANC em fevereiro de 1987, o PMDB começara a sofrer
graves perdas, culminando com a criação do Partido da Social Democracia Brasileira
(PSDB) em junho de 1988. Dos 257 deputados peemedebistas então eleitos, 131
deixaram o partido, fazendo com que a proporção de cadeiras sob esta sigla
baixasse para 26,5% ao final da legislatura.54 Ainda em 1987 surgira mais uma
agremiação que fora incorporada ao grupo de partidos de direita: o Partido Social
Democrático (PSD).
No ano de 1989 seriam realizadas as primeiras eleições presidenciais no país
após o fim do regime militar. Nesse contexto, o médico Enéas Ferreira Carneiro
fundou o Partido da Reedificação da Ordem Nacional (Prona) que, por sua radical
defesa da ordem, foi classificado como um partido de direita. Em fevereiro desse
ano foi criado o Partido da Reconstrução Nacional (PRN), valendo-se da incipiente
estrutura existente do Partido da Juventude (PJ), minúscula agremiação partidária.
O PRN surgiu sem uma definição sob o ponto de vista político-ideológico, mas com
52 LAMOUNIER, B. Partidos e utopias: 55-84. 53 Idem: 55. 54 Idem: 78-79.
25
um objetivo definido, que seria viabilizar, formalmente, a candidatura do então
governador de Alagoas, Fernando Collor de Mello, à Presidência da República. Os
articuladores do partido, de olho na propaganda eleitoral gratuita no rádio e na
televisão, procuraram compor uma bancada que assegurasse um bom espaço de
campanha para o seu candidato. O crescimento do candidato do partido nas
pesquisas de opinião fez também elevar o número de parlamentares que aderiram
à nova legenda. A eleição de Fernando Collor e o desempenho inicial de seu
governo proporcionou um crescimento significativo do PRN. No pleito de 1990,
conseguiu dobrar sua representação na Câmara dos Deputados, onde o partido
chegou a ter uma bancada de 43 membros (8,4%), e cinco senadores (6,2%). Com
a derrocada do governo Collor veio também o declínio dessa agremiação. No final
de 1991 o partido já havia perdido oito parlamentares e em agosto de 1993,
quando Collor já se encontrava fora do governo, sua bancada na Câmara estava
reduzida a 16 deputados. No pleito de 1994 só conseguiria eleger um deputado
federal (0,2%) e não elegeria nenhum senador.
Novas alterações ocorreram no quadro partidário brasileiro durante a
primeira metade da década de 1990. Em janeiro de 1992, durante o X Congresso
do PCB, foram deliberadas amplas alterações no conteúdo programático e
doutrinário do partido, que acabou recebendo a nova denominação de Partido
Popular Socialista (PPS). Em janeiro de 1993, a fusão do Partido Trabalhista
Renovador (PTR) com o Partido Social Trabalhista (PST) deu origem ao Partido
Progressista (PP). Em abril seguinte, o PDS e o PDC se fundiram, surgindo daí o
Partido Progressista Reformador (PPR), que manteve em seus quadros as figuras
mais conservadoras do PDS, mesmo se autodenominando progressista.
A classificação partidária: Direita, centro e esquerda no Brasil
A classificação do quadro partidário brasileiro em apenas três categorias político-
ideológicas – direita, centro e esquerda – enfrenta, logo de início, alguns obstáculos
de caráter conceitual. Dizem respeito, por exemplo, a aspectos da própria estrutura
26
do sistema de partidos, tais como, sua excessiva fragmentação e heterogeneidade,
a baixa representação no Parlamento da maioria deles, a ausência de mecanismos
legais de fidelidade e disciplina, sua fraca implantação nacional, a ausência de
mecanismos eficazes de disciplina e fidelidade partidária etc.55
Embora insistindo na fragilidade e instabilidade da estrutura partidária
brasileira, Maria D’Alva Kinzo, em estudo acerca do comportamento dos partidos,
constatou que eles defenderam posições diferenciadas diante das principais
votações que ocorreram durante o período do Congresso Constituinte, de 1987 a
1988.56
Propondo uma classificação dos partidos no período constituinte, foi sugerido
que eles poderiam ser dispostos em campos político-ideológicos. Segundo
classificação de Fernandes,57 o quadro partidário revelado pelo período constituinte
ficou definido da seguinte forma: um campo à direita: PFL, PDS, PTB, PL, PDC e
PSC; um grande campo ao centro: PMDB; um campo à esquerda: PDT, PT, PCdoB,
PCB e PSB.
Como o quadro partidário se subdividiu e se ampliou, essa distribuição foi
atualizada pelo pesquisador para os pleitos de 1990 e 1994, tendo ele, porém, se
mantido fiel aos mesmos critérios classificatórios.58 Assim, tornou-se possível
55 FERNANDES, L. M. Muito barulho por nada? O realinhamento político-ideológico nas eleições de 1994: 110. 56 Essa constatação é demonstrada pelo exame do posicionamento político-ideológico dos referidos partidos sobre questões de acentuada relevância suscitadas durante a elaboração da Constituição de 1988. Num primeiro momento a pesquisadora classificou os partidos segundo o grau de governismo, isto é, conforme os respectivos níveis de concordância com posições defendidas pelo governo Sarney. Procedimento semelhante foi usado para aferir o grau de conservadorismo dos partidos com base nas votações sobre o direito de propriedade, a reforma agrária, a estabilidade no emprego, o direito de greve etc. Tal análise permitiu que ela fizesse as seguintes observações: o PFL e o PDS lideraram a escala de governismo e conservadorismo; o PMDB ficou no centro; e o PSDB, o PDT e o PT sustentaram posições antigovernistas e anticonservadoras, sobretudo os dois últimos, que assumiram posições no limiar da Esquerda. KINZO, M. D. S/ ref: 77. 57 FERNANDES, L. M. Muito barulho por nada? O realinhamento político-ideológico nas eleições de 1994: 110. 58 Idem: 111.
27
caracterizar: um campo à direita: PFL, PPR (fusão do PDS com o PDC), PTB, PL,
PSD, PSC, PRP e Prona; um campo ao centro: PMDB, PSDB, PP (fusão do PTR com
o PST) e PRS; um campo à esquerda: PT, PDT, PSB, PCdoB, PMN, PPS (antigo PCB)
e PV.
A análise do presente estudo se pauta nesta disposição do quadro partidário,
não só a ampliando, mas também mantendo sua necessária validade para a análise
das eleições de 1994, como dos pleitos de 1998 e 2002.
Capítulo 3
Neoliberalismo: As origens de uma nova hegemonia
No início da década de 1970, uma grave crise internacional lançou todo o mundo
capitalista numa profunda e duradoura recessão, pondo fim ao período mais
dinâmico e contínuo de prosperidade econômica da história, conhecido como les
trente glorieuses.59 O modelo econômico montado no pós-guerra, baseado no
Estado de bem-estar social,60 mostrava àquela altura claros sinais de exaustão.
Será, no essencial, nesse contexto, que as disputas político-ideológicas entre a
Direita e Esquerda ocorrerão, em grande parte do mundo e, em particular, no
Brasil.
A crise havia começado com o declínio da economia norte-americana,
observável desde a década de 1960. Os compromissos da superpotência com seus
objetivos estratégicos durante a Guerra Fria (1945-1989) levaram-na à emissão de
59 A expressão les trente glorieuses foi cunhada pelo economista francês Jean Fourastié em 1979 para designar os gloriosos trinta anos seguintes à Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Entre as principais tendências do período, vale ressaltar o significativo aumento populacional (baby boom) acompanhado do aumento ainda maior da produção de alimentos, tanto no mundo desenvolvido como no mundo não industrial. Como comenta Hobsbawm, durante as décadas de ouro não houve fome crônica no mundo, como depois se tornou freqüente nas décadas seguintes. Isso foi possível graças à expansão da mecanização da agricultura e aos avanços técnico-científicos que marcaram essa época. Outro importante fator a considerar foi a explosão de produtos industrializados e seu consumo por um mercado de massas. Artigos antes considerados de luxo (automóveis, eletrodomésticos etc.) passaram a fazer parte do padrão de conforto da população, pelo menos nos países ricos HOBSBAWN, E. Era dos extremos. O breve século XX (1914-1991): 255 e 259. 60 Na perspectiva do bem-estar social, o Estado encarregava-se de incorporar diversos programas sociais (assistência familiar, habitacional, auxílio financeiro, saúde etc.), investir em obras públicas com vista à criação de empregos, financiar pesquisas científico-tecnológicas, dinamizar setores estratégicos da economia (siderurgia, energia elétrica, transportes, comunicações), intermediar as relações entre capital e trabalho e tributar a renda dos mais ricos para assegurar uma melhor distribuição da riqueza entre os setores mais pobres da população. PADRÓS. S/ ref.: 250-252. O historiador inglês Eric Hobsbawm observou que em fins da década de 1970 todos os Estados capitalistas avançados haviam se tornado Estado de bem-estar social, alguns dos quais gastando mais de 60% de seus orçamentos em seguridade social. A base teórica do Estado de bem-estar foi formulada pelo economista inglês John Maynard Keynes (1883-1946) em A teoria geral do emprego, do juro e da moeda (1936). De acordo com o sistema de Keynes, o estímulo da demanda de consumo e o aumento da produção, da renda e do emprego através do financiamento governamental seria a melhor maneira de corrigir as deficiências do mercado e dinamizar a economia. PADRÓS. S/ ref.: 237.
29
papel-moeda sem lastro em ouro, produzindo uma onda inflacionaria que dificultou
as exportações do país. Por outro lado, o surgimento de novas economias
competitivas, como o Japão e a Alemanha, ameaçava a hegemonia dos Estados
Unidos nos mercados europeu e asiático. A fim de recuperar a competitividade no
mercado externo, o governo Nixon suspendeu a conversibilidade do dólar pelo ouro
em agosto de 1971, dentro das diretrizes firmadas pelos acordos de Bretton
Woods,61 e decretou, subseqüentemente, a desvalorização da moeda,
desencadeando uma recessão em escala planetária. Tudo isso se agravou ainda
mais com a crise do petróleo em 197362. Em meados dessa década, a produção
industrial nos países desenvolvidos diminuiu em 10% em um ano e o comércio
internacional em 13%.63 Os índices de crescimento econômico no mundo capitalista
caíram e a taxa de inflação aumentou, caracterizando o que os economistas
chamaram de estagflação. Para os países do Terceiro Mundo, os efeitos da crise
foram ainda mais devastadores.
61 O regime firmado em Bretton Woods (New Hampshire, EUA), em 1944, estabeleceu a livre conversibilidade do ouro em dólares (padrão ouro-dólar) e a criação de instituições para sustentar os acordos como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento). A partir de então se estabelecia o dólar como moeda-padrão para todas as transações financeiras internacionais. O sistema monetário, baseado no ouro-dólar, funcionou como uma espécie de estabilizador da economia capitalista mundial, permitindo a livre circulação de capital e de mercadorias entre os países. HOBSBAWN, E. Era dos extremos. O breve século XX (1914-1991): 270. 62 Em outubro de 1973, sob a pressão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), o preço do barril do produto aumentou em 70%. Além disso, a Opep impôs um embargo total aos países que apoiaram Israel – entre os quais, e principalmente, os Estados Unidos – na Guerra do Yom Kippur, contra a Síria e o Egito. PADRÓS. S/ ref.: 260-261. Como registra Hobsbawm, o barril do petróleo, vendido a um preço médio de 2,53 dólares, quase quadruplicou em 1973 e praticamente triplicou em 1979, após a revolução islâmica no Irã, chegando a custar 41 dólares em fins da década de 1980. HOBSBAWN, E. Era dos extremos. O breve século XX (1914-1991): 459. A crise internacional do petróleo aumentou drasticamente o preço do custo energético da produção dos países centrais do capitalismo, tornando quase inviável o modelo produtivo baseado no fordismo, que vigorara na Europa nos anos 1950 e 1960 e nos Estados Unidos desde os anos 1930. Os mais afetados foram, porém, os países periféricos que, além de não disporem de jazidas e reservas suficientes, haviam construído suas redes internas de transporte e comunicação a partir de rodovias e ferrovias, como no caso brasileiro. PADRÓS. S/ ref.: 261. 63 HOBSBAWN, E. Era dos extremos. O breve século XX (1914-1991): 395.
30
É sobre esse pano de fundo que se ressalta uma ampla discussão levada a
cabo por acadêmicos, políticos e tecnocratas nos dois últimos decênios, sobre as
alternativas mais viáveis para a retomada do crescimento econômico. A batalha foi
travada no plano ideológico entre keynesianos e neomonetaristas. Estes últimos,
chamados por seus críticos de neoliberais, responsabilizavam o elevado custo de
sustentação do Estado de bem-estar, baseado numa pesada carga tributária, como
sendo o maior obstáculo à retomada do crescimento econômico e o principal fator
da recessão internacional (Anderson, 1996, p. 11).64
Identificado com as formulações do Consenso de Washington,65 o modelo
neoliberal prescrevia como remédio à crise econômica a abertura comercial, a
liberalização dos fluxos financeiros internacionais, a redução dos gastos públicos –
notadamente nas áreas de habitação, saúde, educação e saneamento básico – e a
privatização de empresas estatais, estigmatizadas como inerentemente ineficientes.
As diretrizes neoliberais foram acompanhadas pelo processo de globalização.
Os teóricos do neoliberalismo identificam a emergência de um mercado
efetivamente global nas últimas três décadas provocado pelo desenvolvimento do
computador, da telemática e de aplicações da cibernética, combinadas com as
facilidades proporcionadas pela revolução tecnológica. Esse processo teria
conferindo tamanha mobilidade às aplicações financeiras e tornado ineficaz
qualquer tentativa de controle e/ou intervenção por parte dos Estados nacionais,
forçando-os a liberalizar e desregular suas economias para tentar dar conta da
velocidade alcançada pelo capital. De acordo com a visão liberal, os Estados
nacionais estariam perdendo (de forma generalizada) capacidade de gestão
macroeconômica diante da operação de um mercado auto-regulador e
64 ANDERSON, P. Balanço do neoliberalismo: 11. 65 O Consenso de Washington resultou de uma série de reuniões, encontros e seminários promovidos pelo governo dos Estados Unidos em 1993, quando se elaborou uma estratégia de ajuste e estabilização das economias dos países periféricos em consonância com as orientações do FMI e do Banco Mundial. Para uma discussão mais ampla sobre o Consenso de Washington, ver BATISTA, P. N. O consenso de Washington: A visão neoliberal dos problemas latino-americanos.
31
perfeitamente integrado em escala global. Os defensores dessa nova ordem
mundial consideram positivas as últimas transformações porquanto, no seu
entendimento, concorrem para a promoção de uma economia competitiva e
eficiente, livre da intervenção arbitrária do Estado.66
Os ideólogos do laissez-faire tomaram a ofensiva a partir de 1974,67 embora
só viessem a influir nas políticas de Estado no final da década, com exceção do
Chile, onde após a derrubada do governo popular de Salvador Allende em 1973,
uma ditadura militar conduzida pelo general Augusto Pinochet havia permitido a
tecnocratas norte-americanos instalar no país uma economia capitalista de mercado
irrestrita.68
No mundo capitalista avançado, os principais gestores do neoliberalismo
foram Ronald Reagan, eleito presidente dos Estados Unidos em 1979, e Margaret
66 Procurando apresentar um quadro diverso daquele pintado pela corrente liberal sobre o processo de globalização, Hirst e Tompson consideram que, apesar dos altos níveis de comércio e de investimentos estrangeiros, a economia mundial continua sendo ditada pelas políticas nacionais. HIRST & THOMPSON. Globalização em questão: 22. Filiados a esta perspectiva, Tavares e Fiori destacam um papel absolutamente determinante desempenhado pelo Estado norte-americano na imposição de uma agenda de liberalização global. Esta imposição refletira um movimento de reconfiguração e relançamento da hegemonia dos Estados Unidos no mundo, via a instrumentalização unilateral do poder estrutural que este detém na economia mundial (com destaque para as posições de força ocupadas por sua moeda nos mercados internacionais). Considerações de poder, portanto, estão no centro das preocupações desta corrente, que se pode denominar de cética. Ao contrário de um enfraquecimento generalizado dos Estados nacionais, o processo de globalização teria por base um esforço do poder mundial do Estado norte-americano – em íntima associação com o capital industrial e financeiro, que procuraria abrir e conquistar mercados em todo o globo a partir dos Estados Unidos. Como boa parte do que identifica como globalização é composta por movimentos de liberalização politicamente induzida (e não tecnologicamente determinada), os autores dessa corrente a concebem como um processo perfeitamente evitável e/ou reversível, a partir de iniciativas intervencionistas/regulatórias nacionais ou internacionais. TAVARES & FIORI. Poder e dinheiro: Uma economia política da globalização. 67 A entrega do Prêmio Nobel de Economia a Friedrich von Hayke (1899-1992) em 1974 e a seu discípulo Milton Fridman em 1976, dois importantes teóricos ligados à economia de livre-mercado, reflete a forte influência das idéias liberais na época. 68 Sob a inspiração dos teóricos da Escola de Chicago, os chamados Chicago boys, de forte inclinação liberal, o Chile de Pinochet adotou medidas austeras de estabilização monetária: desregulamentação da economia, desemprego massivo, repressão sindical, redistribuição de renda em favor dos mais ricos e privatização de bens públicos, ANDERSON, P. Balanço do neoliberalismo: 19. Ver também HOBSBAWN, E. Era dos extremos. O breve século XX (1914-1991): 399.
32
Thatcher, conduzida à chefia do governo britânico em 1980. Reagan reduziu os
gastos sociais e os impostos dos mais ricos. Thatcher, conhecida como a dama de
ferro, iniciou a privatização do amplo setor estatal inglês, impôs uma dura
legislação anti-sindical (contenção salarial, controle dos movimentos grevistas etc.)
e cortou gastos públicos com educação, saúde e aposentadoria.69
Os países da OCDE (Organização Européia para o Comércio e
Desenvolvimento), que durante os anos 70 trataram de aplicar remédios
keynesianos às crises econômicas, acabaram sucumbindo à onda neoliberal na
década seguinte. Nesse período, os partidos social-democratas do norte da Europa
perderam o controle político para governos de direita que adotaram um
neoliberalismo com ênfase na política orçamentária e nas reformas fiscais. Somente
Áustria e Suécia conseguiram resistir, por mais algum tempo, à forte pressão por
mudanças neoliberais. Enquanto isso, no sul do continente, chegavam ao poder
governos de esquerda, chamados de euro-socialistas: François Mitterrand, na
França; Felipe González, na Espanha; Mário Soares, em Portugal; Bettino Craxi, na
Itália; e Andreas Papandreou, na Grécia. Esses governos se empenharam para
realizar políticas de pleno emprego e de proteção social muito próximas do que
havia sido a socialdemocracia do pós-guerra no norte europeu. Mas o projeto
fracassou. No final da década de 1980, o nível de desemprego na França, por
exemplo, era mais alto do que na Inglaterra de Thatcher. Diante da dificuldade de
implementar com sucesso suas políticas, e sob forte pressão dos mercados
financeiros, a esquerda sulista se viu obrigada a substituir o estímulo de demanda
keynesiano pela austeridade liberal.70
Na interpretação de Perry Anderson, a desintegração dos regimes soviéticos,
de 1989 a 1991, contribuiu decisivamente para a radical mudança de rumo das
69 ANDERSON, P. Balanço do neoliberalismo: 12. 70 Idem: 13.
33
esquerdas no sul da Europa.71 O colapso do comunismo (a utopia que empolgou as
reivindicações trabalhistas em todo o mundo por quase dois séculos) reforçou a
convicção dos defensores do capitalismo de que nenhuma economia baseada no
planejamento central, socialista ou não, poderia funcionar dentro de condições
satisfatórias de competição internacional.72 A crise do Leste consolidou a
hegemonia do neoliberalismo como promessa de uma nova ordem mundial
globalizada, cujos recursos econômicos seriam alocados exclusivamente pelo
mercado, entregue às regras de uma concorrência sem limites.
Nos países da extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS)
foram introduzidos programas mais radicalmente liberais do que aqueles
experimentados pelos países do Ocidente. Orientados por economistas e
especialistas financeiros norte-americanos e britânicos, os governos do Leste
realizaram, em um tempo notavelmente breve, a transição de uma economia
centralmente planejada para uma de mercado livre. Fizeram isso promovendo uma
desmontagem dos serviços públicos e privatizando empresas estatais. Esse
caminho rumo ao capitalismo de mercado provocou quedas drásticas de produção73
e o empobrecimento da maior parte da população.74
Os diagnósticos e práticas inspirados na visão neoliberal se difundiram por
toda a América Latina. Isso aconteceu com a eleição para a presidência da
República de Carlos Salinas, no México, em 1988, seguido de Carlos Menem, na
Argentina, em 1989, de Carlos Andrés Perez, na Venezuela, no mesmo ano, e de
Alberto Fujimori, no Peru, em 1990.
71 Idem: 15. 72 HOBSBAWN, E. Era dos extremos. O breve século XX (1914-1991): 542-543. 73 Como registra Amaral, na Polônia, Hungria e República Tcheca, as reformas liberais fizeram a produção industrial recuar até 42%, em relação a 1989. Na Rússia, a produção industrial caiu 50% no mesmo período. AMARAL, Roberto. A construção conservadora: 256. 74 HOBSBAWN, E. Era dos extremos. O breve século XX (1914-1991): 477.
34
No Brasil, as primeiras medidas de cunho neoliberal foram introduzidas no
final dos anos 80, ainda no governo Sarney (1985-1989).75 Àquela altura o país
amargava uma grave crise econômico-social, com altas taxas de inflação. Diante do
fracasso do Plano Cruzado, um forte sentimento de decepção e incerteza quanto
aos rumos da economia instalara-se na população.
A profunda crise dos anos 80 expôs os traços críticos da estratégia de
desenvolvimento proposta no começo da década de 1950. Esta previa a expansão
da industrialização – implantação do setor de bens de consumo duráveis e de bens
de capital – mediante a incorporação de recursos estrangeiros, principalmente sob
a forma de empréstimos contraídos a juros flutuantes.76 Dependente do crédito
externo, o plano começou a apresentar sinais de cansaço na segunda metade da
década de 1970 com a retração da economia mundial. Apesar da elevação da taxa
internacional de juros no período, o governo militar continuou tomando
empréstimos para financiar o crescimento econômico.77 Disso resultou o aumento
da dívida externa, tanto pública quanto privada. No final de 1978, ela chegava em
torno de US$ 43,5 bilhões.78
75 DINIZ, E. Globalização, reformas econômicas e elites empresariais. 76 O ingresso de capital externo no país chegou ao seu auge durante o período do chamado milagre brasileiro (1969-1973). Em 1973 alcançou o nível anual de US$ 4,3 bilhões. FAUSTO. S/ ref. (2000): 268. 77 A insistência dos dirigentes militares na estratégia de crescimento pode ser explicada com base na conjuntura política da época. O fortalecimento da oposição ao regime ditatorial a partir de 1974 pôs em risco a pretensão, por parte dos militares, de uma abertura política lenta, gradual e segura. Nas eleições legislativas realizadas em novembro daquele ano, o MDB quase duplicou sua bancada na Câmara dos Deputados e elegeu para o Senado Federal praticamente o triplo dos senadores eleitos pela Arena. SCHIMITT, R. Partidos políticos no Brasil: (1945-2000): 45. Em 1978 realizaram-se eleições gerais. Embora o pleito tenha beneficiado a Arena (que reverteu a situação favorável à oposição nas eleições anteriores para o Senado e continuou majoritária na Câmara Federal, conquistando 231 cadeiras contra 189 do MDB), a oposição obteve a maioria dos votos nos principais estados do país – o MDB recebeu para o Senado cerca de 83% dos votos em São Paulo, 63% no Rio de Janeiro e 62% no Rio Grande do Sul. FAUSTO. S/ ref. (2000): 273. Diante desses resultados eleitorais, o governo do general Ernesto Geisel (1974-1979) procurou evitar que a economia entrasse em recessão, mantendo as linhas da política industrial, calcada fortemente no intervencionismo estatal. 78 FAUSTO. S/ ref. (2000): 274.
35
A crise da dívida estourou nos anos 80, quando já estavam dadas as
condições objetivas para o apoio das elites brasileiras às teses do assim chamado
Consenso de Washington.79 De acordo com o diagnóstico liberal, a escalonada da
inflação se atribuía ao elevado déficit fiscal do Estado. A superação da crise,
portanto, viria do controle inflacionário que, por sua vez, teria no combate ao
déficit público a sua principal alavanca. Durante o governo Sarney, como assinala
Eli Diniz, foram tomadas as primeiras medidas no sentido de uma reforma do
Estado, com o enxugamento da máquina estatal, o corte de gastos públicos, a
demissão de funcionários e a extinção de vários órgãos estatais, como por
exemplo, o Banco Nacional de Habitação, mais conhecido por sua sigla BNH.80
Do ponto de vista político-ideológico, o governo Sarney se caracterizou, no
essencial, pela configuração de uma coalizão de interesses bastante heterogênea,
da qual faziam parte atores políticos identificados com idéias internacionalistas e
nacionalistas, liberais e antiliberais. Entre as principais forças políticas, procurou-se
conciliar crescimento econômico com o combate à pobreza e às desigualdades
sociais.81 Por um lado, se havia um amplo consenso em torno de uma agenda de
liberalização capaz de instaurar uma ordem democrática, por outro, não havia
ainda um acordo quanto ao esgotamento do antigo modelo de desenvolvimento.82
A meta de ruptura com o modelo do passado só se tornou prioritária com a
ascensão de Fernando Collor de Mello à Presidência da República.
Decretado oficialmente no dia 16 de março de 1990, o Plano Collor
introduziu no país uma política austera de combate à inflação (que superava os
80% mensais). O plano estabelecia o bloqueio de todos os depósitos bancários
existentes, por dezoito meses, permitindo apenas saques até um limite de 50 mil
cruzeiros. Estabelecia também o congelamento de preços, o corte de despesas
79 FIORI, J. L. Em busca do dissenso perdido: Ensaios críticos sobre a festejada crise do Estado: 113. 80 DINIZ, Eli. Globalização, reformas econômicas e elites empresariais: 48. 81 Idem: 78. 82 Ibidem.
36
públicas e a elevação de alguns impostos. Na esteira do plano, foi iniciado um
processo de enxugamento da máquina estatal com a privatização de empresas, a
redução do número de funcionários públicos, a eliminação de restrições à instalação
do capital estrangeiro no Brasil e a ampla abertura às importações através do
desmonte de barreiras alfandegárias. O novo presidente simbolizou o Estado
esbanjador com os marajás – funcionários das estatais que recebem salários
exorbitantes –, responsabilizando-os pela má distribuição de renda e precariedade
dos serviços públicos.
Na interpretação de Diniz, o início dos anos 90, quando do governo Collor,
representou um importante ponto de inflexão na vida pública brasileira,
caracterizado pela estruturação de um movimento de ruptura com a antiga ordem,
tendo em vista a implantação de um modelo econômico centrado no mercado.
Segundo a autora, nesse momento teve início o desmonte do Estado
intervencionista, característico do modelo da industrialização substitutiva de
importações,83 vigente no país durante sessenta anos.84
83 A industrialização substitutiva de importações foi iniciada nos anos 30 por Getúlio Vargas. Encontrando o Brasil sob forte efeito da crise econômica mundial desencadeada em 1929, Vargas idealizou um projeto que reservava ao Estado o papel-chave na construção de um país moderno do ponto de vista industrial. Para promover a industrialização, o Estado tinha de intervir na economia, gerar uma infra-estrutura adequada e proteger o mercado interno da concorrência estrangeira. Esse compromisso com a criação de um parque industrial avançado implicava a dissolução do modelo agrário-exportador, típico da República Velha (1889-1930). Não por acaso, Vargas enfrentou a oposição das oligarquias tradicionais, comprometidas com o comércio de exportação de produtos primários e importação de mercadorias industriais. SADER, E. A hegemonia neoliberal na América Latina: 72. Depois de um período afastado voluntariamente da política, Vargas voltou a ser eleito presidente em 1951. Seu segundo governo combinou uma política social progressista com um amplo programa de industrialização. Por outro lado, no Brasil, para garantir os empréstimos estrangeiros, foi criado, em 1952, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE). Com o governo Vargas e os movimentos intelectuais em prol do desenvolvimento, como as idéias formuladas pelo Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb), a ideologia do desenvolvimento se firmou no país nas décadas de 1950 e 1960. Um passo decisivo nesse sentido foi tomado pelo Programa de Metas do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), o qual promoveu uma atuação do Estado tanto no setor de infra-estrutura como no incentivo direto à industrialização. O governo Kubitschek, entretanto, buscou atrair o capital estrangeiro, concedendo-lhe importantes vantagens. Idem: 236. Procurando complementar o processo de substituição de importações, o governo do general Ernesto Geisel (1974-1979) lançou, em 1974, o II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), que avançava em direção à autonomia de insumos básicos (petróleo, aço, alumínio, fertilizantes etc.) e de
37
Simultaneamente a toda essa contextura – e este é o ponto que se quer
destacar – e, na verdade, sujeito a ela, se desenvolveu o longo processo de
transição entre uma forma de organização e desenvolvimento capitalista já
esgotada e um novo modelo em construção. Tal transformação ocorreu por meio de
um ajuste das estruturas econômicas e estatais assentado em políticas voltadas
para o fortalecimento do mercado.
Esse processo se articulou ainda a duas questões fundamentais: a natureza
do Estado emergente e o tipo de governabilidade democrática que se ensejará
como resultado do novo arranjo socioeconômico. Ainda sobre tal processo, é
importante destacar o fato de ele se desenrolar sob o impacto de um contexto
internacional reconfigurado, conforme acima descrito.
Com a eleição de Fernando Henrique Cardoso afirmou-se a supremacia do
modelo neoliberal na sociedade brasileira. Expressou-se aí a confluência entre a
socialdemocracia do PSDB e as forças conservadoras de direita, congregadas,
especialmente, no PFL. Alicerçado na coligação PSDB-PFL-PL-PTB, depois ampliada
com a participação do PMDB e do PPB, Fernando Henrique conseguiu implementar
as reformas do Estado e da economia, de acordo com as novas bases da
acumulação capitalista internacional.85 As principais medidas tomadas nessa
direção foram a quebra das limitações a investimentos estrangeiros no país, com a
mudança do conceito de empresa nacional e quebra do monopólio estatal do
petróleo e das telecomunicações, o impulso às privatizações e a aprovação das
reformas da previdência e da administração, embora muito aquém do que
bens de capital. Idem: 273. Durante todo o período em questão, o Estado brasileiro atuou decisivamente, seja através do investimento e da produção direta, ou de participação indireta no financiamento interno e externo. 84 DINIZ, Eli. Globalização, reformas econômicas e elites empresariais: 89. 85 No período atual do capitalismo, o processo de acumulação de riquezas concentra-se, em larga medida, nas atividades relacionadas aos bancos, seguradoras e fundos de pensão, configurando, assim, a supremacia do capital financeiro, especulativo e multinacional sobre o capital produtivo.
38
propunha o Executivo. Nos capítulos seguintes procurar-se-á examinar essas
mudanças nos termos do realinhamento político-ideológico em curso no Brasil.
Capítulo 4
As eleições de 1994
As eleições de 1994 foram condicionadas pelos efeitos do Plano Real, o plano de
estabilização econômica lançado em fins de 1993 pelo então ministro da Fazenda
Fernando Henrique Cardoso.
O processo político: Antecedentes
Quando Fernando Henrique assumiu o controle da economia, em maio daquele ano,
a inflação já ultrapassava o índice de 30% ao mês. O novo ministro associou o
problema da inflação à crise do Estado, com seu déficit crônico. De acordo com
essa perspectiva, o combate à escalonada inflacionária deveria implicar uma total
redefinição do papel do Estado através do saneamento de suas finanças, a
racionalização da administração federal, a capacitação profissional do servidor
público e a privatização de empresas.
Fernando Henrique começou a elaborar um novo plano de estabilização
econômica, com medidas nas áreas cambial, fiscal e monetária. Os principais
pontos do programa de FHC diziam respeito ao ajuste fiscal, que seria perseguido
basicamente por meio de cortes radicais nos gastos públicos, e à criação de uma
nova moeda – o real – sobrevalorizada em relação ao dólar.
O projeto de estabilização, desenhado de acordo com o modelo neoliberal,
se tornou a prioridade absoluta para o governo brasileiro obter aval do FMI junto
aos credores estrangeiros na renegociação da dívida externa, depois de um período
de tumultuadas relações do país com o exterior.
Com as primeiras medidas do plano já adotadas, Fernando Henrique
afastou-se da Fazenda e retornou ao Senado, lançando seu nome à presidência da
República. Intelectual respeitado nos círculos acadêmicos e senador por São Paulo,
FHC era ainda relativamente desconhecido do grande público quando assumiu a
candidatura presidencial.
40
Dentro de seu partido, o PSDB, Fernando Henrique foi um dos principais
articuladores da aliança com o PFL, oficializada em maio, como forma de inviabilizar
uma possível união das forças de direita em torno de Paulo Maluf (PPB) ou de
Orestes Quércia (PMDB). Além disso, a aliança com o PFL viabilizaria a candidatura
tucana no Nordeste. De base política oligárquica e conservadora, o PFL tinha
grande força eleitoral naquela região.
Poucos dias depois de implementada a nova moeda, a inflação declinou
consideravelmente, com o incremento da renda de alguns segmentos mais pobres
da população. O sucesso do Plano Real no combate à inflação fez com que o nome
de Fernando Henrique disparasse nas pesquisas de intenção de voto, que até ali
apontavam uma tendência majoritária a sufragar o candidato petista, Luís Inácio
Lula da Silva.
Além do impacto da implementação do real na campanha eleitoral, FHC
contou com amplo apoio dos meios de comunicação, que o apresentaram como o
candidato do progresso, da modernização e da estabilidade econômica. Lula, por
sua vez, foi estigmatizado pela mídia como representante de um projeto
estatizante, corporativista e nacionalista, que havia se esgotado desde a década
passada.86 Emir Sader observa nisso uma importante virada de enfoque. Nas
palavras do autor, a Esquerda e o movimento popular, passam a ser classificados
como responsáveis pelo atraso do país, como obstáculo ao progresso e à
modernização, por seu corporativismo, seu nacionalismo e seu economicismo.87
Embora não desconhecendo a crise fiscal do Estado e o problema
inflacionário dela decorrente, o discurso da esquerda, cristalizado na candidatura
petista, privilegiou o combate à injustiça social e a promoção do direito de
cidadania, negado à maioria da população. Atribuindo a crise econômica às
desigualdades sociais, seu programa defendia reformas estruturais, como uma
86 SEGATTO. S/ ref. (1995): 157. 87 SADER, E. A hegemonia neoliberal na América Latina: 162.
41
radical redistribuição de renda e a reforma agrária no país.88 Com base nessa
avaliação, o PT se recusou a propor qualquer plano emergencial de combate à
inflação, visto que, na percepção de suas lideranças, o fenômeno estava associado
a causas estruturais. Assim, o partido investiu pesado contra o Plano Real, sem
apresentar, contudo, alternativa capaz de se constituir como proposta eleitoral e de
governo. Sader considera que esse ponto fraco na estratégia eleitoral de Lula
representou uma subestimação do adversário.89
Em contrapartida, FHC, voltando seu discurso para os setores médios e
populares, propôs a remoção da inércia inflacionária, como forma de recuperar o
poder aquisitivo e melhorar a renda da população. Embalado pelos resultados
positivos da estabilidade monetária e alicerçado na aliança com a maior parte da
Direita, Fernando Henrique acabou elegendo-se presidente em outubro de 1994.
Nas eleições de 1994, as mais amplas realizadas no Brasil após 1950,
estiveram em disputa a Presidência da República, os governos estaduais, dois
terços do Senado, 513 lugares na Câmara dos Deputados e 1049 nas Assembléias
Legislativas.
De modo geral, e preliminarmente, sob o ângulo da consolidação do regime
democrático e das divisões partidárias, houve um avanço considerável das forças
de esquerda, representadas especialmente pelo PT, que, além de conquistar o
governo de duas unidades da federação (Espírito Santo e Distrito Federal),
aumentou significativamente sua bancada no Congresso. O PSB e o PCdoB, embora
muito abaixo do PT, também registraram ganhos na Câmara. Porém, o progresso
da Esquerda foi moderado, capaz de ser absorvido sem maiores traumas pela
direita, levando-se em conta o fato de que o grande vencedor foi o PSDB. Como
esta legenda estava coligada com o PFL, o PL e o PTB na competição para o
Executivo federal, as forças de direita não se julgaram derrotadas. Sob este ângulo,
88 Idem: 157. 89 Idem: 167.
42
dada a importância da Presidência da República, por paradoxal que possa parecer,
foi a Esquerda, representada notadamente pelo PT, que se considerou perdedora,
apesar de haver ganhado, pela primeira vez, dois governos estaduais e aumentado
suas bancadas no Congresso Nacional e nas Assembléias Legislativas. Por isso, em
termos do equilíbrio do sistema e da consolidação democrática, a vitória do PSDB e
de seu candidato presidencial, indiscutivelmente, contribuiu para não acirrar
oposições à esquerda e à direita, dentro e fora do Parlamento. Segundo Rodrigues,
ante o temor de ver a Presidência entregue a Lula e, pior ainda, ao PT, a vitória de
Fernando Henrique Cardoso foi recebida com alívio pelos partidos e forças de
direita. As derrotas nas eleições para os governos estaduais e o ganho de cadeiras
pelos partidos de esquerda no Congresso passaram relativamente despercebidos.
Complementarmente, do ponto de vista da Esquerda, a vitória de Fernando
Henrique e de seus correligionários do PSDB foi bem mais palatável do que seria a
de outros candidatos. Desse modo, o avanço do PSDB, ao contrário do que
costumava acontecer em outras competições para a Presidência, pôde ser
absorvido por todas as facções derrotadas.90
Neste capítulo, a seguir, se fará a análise do pleito de 1994, primeiro, no
âmbito da eleição presidencial, e posteriormente no do Congresso Nacional.
A votação para a presidência da República
Nas eleições de 1989 houve um claro paradoxo. Se o sistema partidário era
dominado pelo PMDB e pelo PFL, não foram essas agremiações que acabaram
empolgando o processo eleitoral; mais ainda, não foram eles que saíram na frente
da contenda. Um político ainda pouco conhecido, Fernando Collor de Mello,
abrigado em uma sigla mais desconhecida ainda, o PRN, e Luís Inácio Lula da Silva,
do PT, acabaram liderando a disputa presidencial, que terminou com a vitória
inesperada do primeiro. Esse foi o exemplo mais claro da falta de importância, para
a eleição presidencial majoritária, da força relativa dos partidos.
90 RODRIGUES, L. M. As eleições de 1994: Uma apreciação geral: 75.
43
As eleições presidenciais de 1994 não são comparáveis às de 1989 em
termos de distribuição político-ideológica dos seus resultados. A principal questão
diz respeito às formas distintas de posicionamento dos partidos nos dois pleitos. No
de 1989, prevaleceu a tendência de cada partido apresentar a sua própria
candidatura, certamente por ser o primeiro pleito presidencial após o fim do regime
militar e quase trinta anos depois da eleição do último presidente pelo voto direto,
juntando-se a isto o fato de que cada agremiação partidária queria firmar o seu
próprio nome na cena política brasileira e no quadro partidário nacional. A única
exceção foi a formação da Frente Brasil Popular em torno da candidatura do então
líder metalúrgico Luís Inácio Lula da Silva. Entretanto, esta coalizão reuniu
agremiações políticas pertencentes ao mesmo campo, como o PT, o PSB, o PCdoB e
o PV, todos identificados com a Esquerda. A conseqüência desse processo foi a
diferenciação político-ideológica existente no quadro partidário brasileiro que se
expressara abertamente na disputa eleitoral, com a eleição de um presidente da
República de um partido recém-criado e sem obter a maioria no Congresso
Nacional.91
Nas eleições de 1994, com a situação partidária mais definida, houve uma
maior tendência à formação de alianças. Além disso, aumentaram as restrições à
apresentação de candidaturas. Assim sendo, se em 1989 chegou a 22 o número de
candidatos à Presidência da República, em 1994 esse número caiu para oito. Diante
disso, vale ressaltar que, a partir da coalizão de um dos dois grandes partidos de
centro, o PSDB, formado, originalmente, a partir de uma dissidência do PMDB,
classificada como de centro-esquerda, com três dos quatro principais partidos de
direita (PFL, PTB e PL), foi quebrada a segmentação de campos político-
ideológicos.92 Numa escala menor, houve, ainda, a aliança de outro grande partido
de centro, o PMDB, com um pequeno partido de direita, o PSD, e, no âmbito da
91 FERNANDES, L. M. Muito barulho por nada? O realinhamento político-ideológico nas eleições de 1994: 114. 92 Idem: 113.
44
esquerda, a coalizão do PDT com o PMN e a reedição da Frente Brasil Popular,
ampliada com a incorporação do PPS (antigo PCB). A constituição de uma nova
opção eleitoral de centro-direita nas eleições de 1994, que não existiu em 1989, foi
o traço mais significativo desta mudança.93
O que marcou o pleito de 1994, além da forte influência do lançamento do
Plano Real, que despertou novas expectativas no povo brasileiro, foi a quebra da
polarização Direita/Esquerda, que caracterizara as eleições de 1989, a partir da
formação da coalizão de centro-direita, que acabou vitoriosa. Como observou
Fernandes, este pleito presidencial marcou o fortalecimento deste novo campo de
centro-direita, que provocou o esvaziamento eleitoral da Direita propriamente dita,
como também se valeu do relativo enfraquecimento da Esquerda.94
Observa-se a votação (54% dos votos válidos) obtida pelo candidato
Fernando Henrique Cardoso, da coligação PSDB-PFL-PTB-PL, e sua aproximação da
soma dos votos obtidos pelo candidato do PSDB, Mário Covas, com o conjunto dos
partidos de direita em 1989 (58%). Fernandes atribui esse deslocamento ao
desmoronamento da votação alcançada pelo candidato do PRN, Fernando Collor.
Das eleições presidenciais de 1989 para 1994, constata-se que a votação da
Esquerda reduziu-se de 35% para 30%, tendo como fato mais significativo o
deslocamento de forças no âmbito das próprias candidaturas de esquerda. Pode-se
ainda observar que a disputa equilibrada ocorrida em 1989 desapareceu no pleito
de 1994, com o candidato Lula, respaldado pela Frente Brasil Popular, absorvendo
quase toda a votação da Esquerda (27%), enquanto o candidato do PDT, Leonel
Brizola acabou amargando um resultado surpreendentemente fraco (3%).
Vistos sob o ângulo da disputa majoritária, torna-se ainda mais significativo
o fortalecimento desse novo pólo de centro-direita nas eleições presidenciais de
1994.
93 Ibidem. 94 Idem: 115.
45
No primeiro turno das eleições de 1989, a Esquerda venceu com Brizola nos
estados do Rio de Janeiro, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, e no Distrito
Federal, com Lula, cujo contingente eleitoral destas quatro unidades da Federação
atingia apenas 19,6% da população brasileira. Já o candidato do PRN venceu em 23
estados, tendo sido o mais votado em todos os estados das regiões Norte e
Nordeste. Nas eleições de 1994, o candidato do PSDB, Fernando Henrique Cardoso,
venceu o primeiro turno em 25 estados da Federação e foi o mais votado nas
regiões Norte, Nordeste e Sudeste. A Esquerda, com o candidato Luís Inácio Lula da
Silva, só conseguiu vencer no Rio Grande do Sul e no Distrito Federal, unidades que
têm apenas 7,3% da população brasileira95. Pode-se observar, na tabela abaixo, a
distribuição político-ideológica da eleição presidencial de 1994.
Tabela 1: Votação dos Candidatos nas Eleições Presidenciais em 1994, segundo Orientação Político-Ideológica (Primeiro Turno)
Partidos ou Coligação do Candidato
Votação Absoluta % dos Votos
Válidos
Partidos de Direita
Prona 4.672.092 7,38%
PPR 1.740.231 2,75%
PRN 387.949 0,61%
PSC 238.332 0,38%
Total Direita 7.038.604 11,11%
(Total sem Prona) 2.366.512 (3,74%)
Coligação de Centro-Direita
PSDB-PFL-PTB-PL 34.377.829 54,28%
Total Centro-Direita 34.377.829 54,28%
Coligação de Centro
PMDB-PSD 2.773.883 4,38%
Total Centro 2.773.883 4,38%
95 Ibidem.
46
Coligações de Esquerda
PT-PSB-PCdoB-PPS-PV-PSTU 17.126.784 27,04%
PDT-PMN 2.016.410 3,18%
Total Esquerda 19.143.194 30,23%
Partidos Indefinidos
(Prona) 4.672.092 7,38%
Total Indefinido - -
Total com Prona 4.672.092 7,38%
Total de Votos Válidos 63.335.510 100,00%
Fonte: Dados do TSE.
As eleições para o Congresso Nacional
Ao todo, nas eleições de 1994, 18 partidos conseguiram pelo menos um lugar na
Câmara dos Deputados (PRN, PRP e PV) e 11 passaram a ter assento no Senado
(PFL, PPR, PTB, PL, PMDB, PSDB, PP, PT, PDT, PSB e PPS). Na Câmara, além dos
citados acima, os seguintes partidos se encontravam representados nessa casa
legislativa: PMDB, PFL, PSDB, PPR, PT, PDT, PP, PTB, PSB, PL, PCdoB, PSC, PSD,
PTdoB e PMN.
A composição da Câmara dos Deputados
Como os critérios de representação para cargos legislativos são obrigatoriamente
unipartidários, sem que isso signifique exclusão da possibilidade de formação de
coligações partidárias para a disputa eleitoral, os resultados das eleições permitem
uma comparação mais direta da distribuição político-ideológica produzida em
diferentes pleitos. Com base no que se procurou demonstrar anteriormente, não
houve alteração significativa do pleito de 1990 para o de 1994 no número de
partidos que elegeram representantes para a Câmara dos Deputados (baixou de 19
para 18).
O índice de fragmentação partidária também permaneceu praticamente
estável. Segundo observação de Leôncio Martins Rodrigues (1995), essa
47
fragmentação não foi produzida propriamente pelo elevado número de partidos com
representação no Congresso, mas pelo surgimento de um punhado de agremiações
partidárias por ele classificadas como de porte médio, a partir da decomposição das
duas agremiações do início do período de redemocratização, o PMDB e o PFL, que
na sua classificação foram chamadas gigantes.96
Pode ser vista ou enfocada de diversas maneiras a força relativa dos
partidos na Câmara dos Deputados e são possíveis algumas classificações
alternativas como, por exemplo, as que foram usadas por Rodrigues (1995). Na
época, ele identificou quatro faixas de representação: os partidos grandes, que ele
assim classificou as agremiações que tinham a partir de 81 deputados. Nesta
categoria entraram apenas duas: o PMDB e o PFL. Como partidos médios, assim
chamados os que tinham bancadas de trinta a oitenta deputados, entraram PSDB,
PPR, PT, PP, PDT e PTB. Os partidos classificados como pequenos, cujas bancadas
tinham de dez a 29 deputados, foram PSB, PL e PCdoB. Finalmente vêm os
micropartidos, com menos de dez deputados, em cuja categoria foram enquadrados
PMN, PSD, PSC, PPS e PV. Esse corte, determinado pelo pesquisador (1995), que
permitiu a classificação dessas faixas de representação, é totalmente arbitrário.
Para Fernandes, a representação gráfica das bancadas eleitas para a Câmara dos
Deputados (Figura 1), permite discernir cinco degraus de representação relativa: os
partidos maiores na faixa aproximada de noventa a 110 deputados, na qual se
encontram PFL e PMDB, respectivamente; os partidos mediano-grandes, na faixa de
cinqüenta a sessenta deputados, onde figuram PT, PPR e PSDB; os partidos
mediano-médios, com trinta a quarenta deputados, em cuja faixa são enquadrados
o PTB, PDT e PP; os partidos mediano-pequenos, na faixa de dez a vinte deputados,
onde encontramos o PCdoB, o PL e o PSB; e por último os partidos menores, que
estão na faixa de um a cinco deputados, como o PMN, o PSD, o PSC, o PPS, o PRN,
96 RODRIGUES, L. M. As eleições de 1994: Uma apreciação geral: 78-79.
48
o PRP e o PV (Fernandes, op. cit., p. 118). A Figura 1 ilustra o número de cadeiras
obtidas por partidos no pleito de 1994.
O que mais interessa na presente análise, porém, é examinar a força
relativa dos partidos ao longo do eixo de diferenciação direita-esquerda. O gráfico a
seguir discrimina a força relativa das bancadas eleitas em 1994, agrupadas nos
seus campos político-ideológicos, registrando o seu peso na Câmara dos Deputados
e sua evolução de 1990 a 1994.
Figura 1
Bancadas na Câmara dos Deputados (Cadeiras O btidas pelos Partidos em 1994)
020406080
100120
PRPPV
PRNPPS
PSCPSD
PMN
PCdoB PL
PSBPTB
PDT PP PTPPR
PSDBPFL
PMDB
Nº dos Deputados
Fonte: Dados do TSE.
Um enfraquecimento importante da representação dos partidos de direita,
um aumento significativo do centro e um crescimento ligeiro da esquerda é o que
se pode encontrar indicado no quadro geral que surgiu dos resultados das eleições
de 1994 para a Câmara dos Deputados. Entretanto, dentro de cada um desses
segmentos ideológicos há realinhamentos e recomposições de destaque.
Houve uma perda significativa dos partidos de direita, como um todo, nas
eleições de 1994, quando chegou a quase um quarto a redução de sua força na
Câmara dos Deputados. Parte importante desse enfraquecimento é creditada ao
quase desaparecimento do PRN, que já ocupara a condição de quinta maior
bancada da Câmara e neste pleito só conseguira eleger apenas um deputado
federal. Também o PPR, o PL e o PTB, nesta ordem, perderam força nesta casa
legislativa. O crescimento de 200% do PSD deve ser ignorado, pois de um
49
deputado passou para três, e, nesta condição, este percentual só serviria para
distorcer qualquer análise estatística. Já o PFL, como parte integrante da frente de
centro-direita, que saiu vitoriosa no pleito presidencial, teve um crescimento
apenas modesto – o peso de sua bancada na Câmara subiu de 16,5% para 17,3%.
Figura 2
19901994
Esquerda
Centro
Cireita
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
Evolução da Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados
(Bancadas Eleitas de 1990 e 1994)
Fonte: Dados do TSE.
Os partidos de centro conseguiram aumentar a sua participação na Câmara
dos Deputados em quase um terço. A estrutura partidária do PMDB fez com que ele
permanecesse na condição de maior partido da Casa, o que lhe permitiu manter
praticamente inalterado o seu percentual de um quinto de ocupação das cadeiras. O
crescimento do Centro é creditado ao aumento em quase dois terços da
representação do PSDB, que pulou da sexta para a condição de terceira maior
bancada, bem como ao surgimento do PP, que passou a ocupar a sexta colocação
quanto ao número de representantes.
Quanto aos partidos de esquerda, houve apenas um pequeno crescimento
na Câmara dos Deputados, cujo índice de ocupação das cadeiras passou de 20,1%
para 22,5%. No realinhamento interno desse campo político-ideológico destaca-se
a troca de posições entre o PDT e o PT, com o contingente petista formando a
maior bancada da esquerda nesta casa do Congresso, acompanhando, assim,
50
embora de forma mais atenuada, o resultado da eleição presidencial. Excetuando-
se o PMN, que, como o PSD, teve sua bancada aumentada em 300%, já que passou
de um para quatro representantes, o partido de esquerda que mais cresceu na
Câmara foi o PCdoB, que conseguiu dobrar sua bancada, passando de cinco para
dez deputados.
Na disputa eleitoral para a Câmara, não rendeu muitos frutos a
transformação de parte do PCB em PPS, pois o partido perdeu uma das três
cadeiras que ocupava na legislatura anterior, em decorrência da eleição do seu
líder, o deputado pernambucano Roberto Freire, para o Senado, que acabou
compensando a composição da bancada do partido no Congresso Nacional.
Enquanto isso, o PV conseguiu manter a mesma bancada com um deputado,
considerando a eleição de um integrante dessa agremiação pela legenda do PDT no
pleito anterior. A Figura 3 ilustra a composição das bancadas eleitas para a Câmara
dos Deputados em 1994.
Figura 3
Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancada Eleita em 1994)
Esquerda23% Direita
37%
Centro40%
Fonte: Dados do TSE.
A composição do Senado Federal
Antes de iniciar o exame da evolução na disputa para o Senado Federal, vale
ressaltar que havia um diferencial significativo nas eleições para o Senado em
51
1994, pois elas eram as únicas em que não estava em disputa a totalidade das
cadeiras dessa Casa legislativa, o que não ocorria nos demais níveis. No pleito
desse ano haveria renovação de dois terços das cadeiras do Senado, já que em
1990 havia sido de um terço. Não havia, portanto, disputa simultânea de todos os
cargos eletivos nesse nível. Para viabilizar o enfoque comparativo do que se tratou
aqui, examinar-se-á a composição político-ideológica do Senado no início da
legislatura, ou seja, englobando os senadores eleitos em 1990 e 1994.
Também no Senado a representação dos partidos de direita se enfraqueceu,
como ocorreu na Câmara dos Deputados, enquanto a dos de centro se fortaleceu
(embora ambos com menos intensidade do que na outra Casa do Congresso). Ao
contrário dos realinhamentos ocorridos nos outros níveis examinados até aqui, foi
exatamente a Esquerda o campo político-ideológico que mais cresceu no Senado
Federal de 1990 a 1994. O gráfico abaixo ilustra o desenvolvimento da composição
político-ideológica do Senado entre 1990 e 1994.
Figura 4
19901994
Esquerda
Centro
Direita
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
Evolução da Composição Político-Ideológica do Senado Federal
(Bancadas Eleitas de 1990 a 1994)
Fonte: Dados do TSE.
Após as eleições de 1994, a Direita perdeu cerca de um décimo do seu peso
no Senado. Supõe-se que tal fato tenha decorrido da desintegração da bancada do
52
PRN. Mas o PFL e o PPR conseguiram manter suas posições. Vale chamar a atenção,
da mesma maneira, nesse campo da direita, especialmente por sua novidade, para
o ingresso do PL no Senado com uma cadeira. O fortalecimento do Centro ocorreu
na exata proporção da queda da Direita. O PMDB e o PSDB, basicamente,
mantiveram suas posições na Casa. O PP foi o grande responsável pela ampliação
do Centro, pois parece haver absorvido as posições anteriores do PST – partido que
lhe dera origem após a fusão com o PTR – e dos senadores sem partido. Mas o
crescimento da Esquerda constituiu-se no grande destaque das eleições para o
Senado Federal, com um percentual de quase 45% de aumento na sua
representação – passou de 11% para 16%. Este acréscimo é creditado, de forma
real e decisiva, ao salto observado na bancada do PT, que passou de um para cinco
senadores. O PDT, ao contrário da Câmara dos Deputados, ainda se manteve, no
entanto, como a maior bancada da Esquerda no Senado, com seis cadeiras. Cabe
também registrar, sobretudo por sua novidade, a eleição de um senador do PPS.
Esse realinhamento aparece representado na figura que segue abaixo.
Figura 5
Composição Político-Ideológico do Senado Federal
(Bancada Eleita em 1994)
Esquerda19%
Direita32%
Centro49%
Fonte: Dados do TSE.
Capítulo 5
As eleições de 1998
No decorrer de seu primeiro mandato à frente do Executivo federal, as principais
decisões tomadas por FHC, no plano macroeconômico, foram a renegociação da
dívida externa, o aprofundamento da abertura comercial e a aceitação irrestrita das
diretrizes internacionais de política econômica prescritas pelo FMI para o
saneamento do déficit fiscal e controle inflacionário. Dessa maneira, a política
industrial, entendida como elemento importante para a viabilização do crescimento
econômico, foi abandonada pelas elites dirigentes do país.
Geral: O processo político: De 1995 a 1998
Um novo e inesperado acontecimento, em outubro de 1997, acabou por fortalecer
ainda mais a posição de Fernando Henrique à frente do Executivo, porém de modo
inusitado. A crise das economias do sudeste asiático,97 que rapidamente se alastrou
pelo mundo inteiro, produziu resultados políticos favoráveis no contexto sucessório:
defendeu-se o fortalecimento interno do presidente para fazer frente à
vulnerabilidade externa do país. Embora isso não tenha determinado
completamente os rumos do pleito de 1998, contribuiu, de maneira inequívoca,
para agregar apoio político e fazer aprovar, no Congresso, emenda constitucional
que lhe permitiu ser reconduzido à presidência – fato inédito na história republicana
do país.
No plano econômico e financeiro, porém, a crise asiática obrigou as
autoridades brasileiras a tomarem urgentes e amargas decisões em defesa do Plano
Real. Para elas, o perigo mais sério a ser evitado era a retomada perversa da
inflação e da recessão, sempre, para muitos, o pior dos cenários. Nesse sentido, o
97 A crise asiática foi provocada pela queda das cotações das moedas da Indonésia, Tailândia, Malásia e Filipinas, além do Japão. O FMI e o Banco Mundial organizaram pacotes de salvamento: US$ 55 bilhões para a Coréia do Sul, US$ 17,2 para a Tailândia e US$ 23 bilhões para a Indonésia. BRENER, J. Jornal do século XX: 334.
54
governo federal decretou, em novembro daquele ano, um austero conjunto de
medidas fiscais, frente ao qual se posicionaram favoravelmente os principais órgãos
da imprensa brasileira. Entre as medidas tomadas pelo Planalto, destacaram-se a
eliminação da estabilidade dos funcionários públicos e o aumento dos impostos.
Apesar dos altos custos da estabilização (supervalorização do real, elevação
substancial das taxas de juros, agravamento da vulnerabilidade externa dada a
forte dependência do capital externo, aumento sistemático do desemprego e
elevação das dívidas externa e interna, principalmente) impostos a uma série de
grupos, o êxito do plano no combate à inflação assegurou o consenso em torno das
políticas governamentais.
Durante quase todo o seu primeiro mandato, a prioridade absoluta com as
metas de estabilização econômica garantiu ao presidente um poderoso suporte
parlamentar, que abrangia cerca de 74% das cadeiras do Congresso Nacional.98
Semelhante apoio pôde ser verificado entre os empresários industriais. No
período de 1994 a 1998, o empresariado nacional, através de suas principais
entidades, manifestou-se favorável às reformas liberais,99 embora, entre eles,
surgissem críticas no tocante a certos aspectos da política governamental de
estabilização, como a ampla abertura externa da economia e a elevação da taxa de
juros.100
A reeleição do presidente, em outubro de 1998, assegurou a continuidade do
processo de modernização do país e a estabilidade da economia. Em seu segundo
mandato à frente do Executivo federal, FHC tratou de tocar a segunda rodada das
98 DINIZ, E. Globalização, reformas econômicas e elites empresariais: 102. 99 Nas considerações de Diniz, a postura de adesão dos empresários industriais aos programas liberais de reforma do Estado tem suas origens no questionamento do modelo econômico desenvolvimentista, em fins do regime militar. Ibidem. Nessa época, explica a autora, as elites empresariais da indústria e do comércio lideraram uma campanha contra a estatização da economia, que contribuiu para o enfraquecimento e queda do regime autoritário instalado no país em março de 1964. Idem: 79. 100 Idem: 94.
55
reformas do Estado, que serão rapidamente comentadas no capítulo seguinte.
Antes, porém, cabe fazer um esboço do realinhamento político-ideológico produzido
no pleito de 1998.
Considerando-se somente o universo aqui analisado, do qual não fazem
parte os governos estaduais e as assembléias legislativas, estiveram em disputa no
pleito de 1998 a Presidência da República, as 513 cadeiras da Câmara dos
Deputados e um terço do Senado Federal.
A votação para a presidência da República
Sob o ponto de vista político-ideológico, verifica-se, neste pleito, o inexpressivo
desempenho da Direita. Este bloco acabou sendo representado na disputa à
Presidência da República apenas por dois partidos políticos, o PSC e o Prona. Por
outro lado, o segmento de centro-direita, representado pela coligação PSDB-PFL, se
fortaleceu, repetindo o sucesso obtido no pleito anterior. Embora tenha perdido o
PL, que integrara esta frente em 1994, manteve o PTB e recebera ainda o ingresso
do Partido Progressista Brasileiro (PPB), agremiação resultante da fusão do PPR
com o PP em agosto de 1995, e do PSD. Já o Centro, representado
fundamentalmente pelo PMDB, ficou acoplado à representação de centro-direita,
pois não apresentara candidato próprio. A Esquerda, por sua vez, não conseguiu se
unir numa única frente, ficando dividida, embora suas forças mais expressivas
tenham se reunido numa mesma coligação, formada pelo PT, PDT, PSB e PCdoB.
Observando-se os percentuais obtidos por cada segmento político-ideológico,
houve um quase completo desaparecimento da Direita, que caiu dos seus 11,12%
obtidos em 1994 (7,38% só do Prona) para um insignificante 2,30% em 1998, dos
quais 2,10% obtidos pelo Prona, que, como se pode constatar, também
experimentou uma queda significativa em relação às eleições anteriores. No bloco
de centro-direita houve uma ligeira queda, pois em 1998 obtivera 53,30%, contra
54,28% de 1994, quase um ponto percentual (0,98%) abaixo. Já a Esquerda
parece haver se beneficiado com o enfraquecimento da Direita, pois houve um
56
significativo deslocamento para este segmento: dos seus 30,22% obtidos em 1994,
a soma da coligação (31,7%) com o total dos demais partidos de esquerda (PPS,
PMN e PV) chegou aos 43,4% em 1998, representando um crescimento de 13,18%
(cf. Tabela 3). A soma da votação obtida pelos chamados partidos indefinidos (PSN,
PTN, PSDC e PTdoB) atingiu o insignificante índice de 1%. A distribuição dos votos
válidos por partidos e seu somatório por blocos políticos-ideológicos ocorrida na
disputa presidencial de 1998 pode ser vista na Tabela 2.
Tabela 2: Votação dos candidatos nas eleições presidenciais em 1998, segundo orientação político-ideológica (primeiro turno)
Partidos ou Coligação do Candidato
Votos Válidos % dos Votos
Válidos
Partidos de Direita
Prona 1.446.783 2,10%
PSC 124.546 0,20%
Total Direita 1.571.329 2,30%
(Total sem Prona) 124.546 0,20%
Coligação de centro-direita
PSDB-PFL-PTB-PPB-PSD 35.922.692 53,10%
Total Centro-Direita 35.922.692 53,10%
Partidos de esquerda
PSTU 202.614 0,30%
PV 212.866 0,30%
PMN 251.276 0,40%
PPS 7.424.783 11,00%
PT-PSB-PCdoB-PDT 21.470.333 31,60%
Total Esquerda 29.359.460 43,60%
Partidos indefinidos
(Prona) 1.446.783 (2,10%)
PSN 108.969 0,20%
57
PTN 166.053 0,20%
PSDC 171.814 0,30%
PTdoB 198.830 0,30%
Total Indefinidos 645.666 1,00%
(Total com Prona) 2.092.449 3,10%
Total de Votos Válidos 67.499.147 100,00%
Fonte: Dados do TSE.
A composição da Câmara dos Deputados
Em 1998, 17 partidos (um a menos que em 1994) conseguiram pelo menos uma
das 513 cadeiras disputadas na Câmara dos Deputados. Tal fato pode ser atribuído
à fusão do PPR com o PP, dando origem ao PPB, portanto, desaparecendo duas
agremiações do quadro partidário e aparecendo uma nova.
Cabe destacar também o completo desaparecimento do PRN e a eleição de
um representante do Prona. Os partidos da Direita formaram a maior bancada, com
214 deputados, ou seja, 41,8% da Câmara, apresentando um crescimento de 22
cadeiras (4,5% do total) em relação às 192 (37,3%) de 1994. Vale observar neste
segmento que o PTB manteve-se com o mesmo número de representantes eleitos
no pleito anterior.
Os partidos do Centro vieram logo em seguida com 183 cadeiras (35,7%),
com uma redução de 22 parlamentares (4,5%), em relação aos 205 (40,0%) de
1994. Observa-se aqui uma migração do Centro para a Direita, visto que os
números coincidem com o crescimento havido nos partidos de direita, mais
precisamente no PFL e no PPB. A Esquerda apareceu neste pleito com 115
deputados (22,5%).
Assim, a composição político-ideológica da Câmara dos Deputados, por
partido, ficou da seguinte forma: na Direita, o PFL elegeu a maior bancada, com
105 deputados (20,5%) – um aumento de 16 cadeiras (3,2%) em relação às 89
58
(17,3%) de 1994; o PPB (resultado da fusão entre o PPR e o PP) com sessenta
(11,7%), apresentou um crescimento de 1,6% (oito deputados) em relação ao
pleito anterior, quando, ainda como PPR, tinha 52 cadeiras (10,1%); o PTB, com 31
(6,0%), manteve a sua representação; o PL, com 12 (2,3%), perdeu uma cadeira
(0,2%) em relação a 1994; o PSD continuou com sua bancada de três
representantes (0,6%); o PSC fez uma cadeira a menos (duas – 0,4%) em relação
ao pleito anterior (três – 0,6%), enquanto o Prona elegeu apenas um representante
(0,2%).
No Centro, o PSDB elegeu a maior bancada, com 99 deputados (19,3%), 37
a mais que em 1994, o que representou um crescimento de 7,2%; e o PMDB, com
83 cadeiras (16,2%), teve uma redução de 24 deputados (4,7%), em relação aos
107 (20,9%) do pleito anterior. A Esquerda conseguiu manter sua representação na
casa distribuída da seguinte forma: o PT, que em 1994 elegeu 49 deputados
(9,6%), aumentou sua bancada para 58 (11,3%), um acréscimo de nove
parlamentares (1,7%); o PDT, segunda maior bancada de esquerda, elegeu 25
deputados (4,9%), tendo perdido de um pleito para outro exatamente nove
deputados (1,7%), que apareceram na bancada do PT. Aí, observa-se uma
migração dentro do mesmo campo.
O PSB, com 19 deputados (3,7%) em 1998, teve um crescimento de 0,8%
(quatro cadeiras) em relação a 1994, quando tinha 15 (2,9%). No PCdoB houve
uma redução de três cadeiras (0,6%), de dez (1,9%), em 1994, para sete (1,4%)
em 1998. Estas três cadeiras, de acordo com os números aqui apresentados,
aparecem no PSB, que completa a sua quarta aquisição com uma migração do
PMN, que tinha uma bancada de quatro deputados (0,9%) em 1994, e no pleito
seguinte só elegeu dois (0,4%).
A outra migração foi se alojar no PPS, que em 1998 elegeu três
representantes (0,6%), contra dois (0,4%) no pleito anterior. O PV, com um
59
deputado (0,2%), manteve a sua representação na Casa. A Figura 6 ilustra o
realinhamento político-ideológico produzido nesse pleito.
Figura 6
Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancada Eleita em 1998)
Centro36%
Direita41%
Esquerda
Fonte: Dados do TSE.
A composição do Senado Federal
No Senado Federal houve renovação de apenas 27 cadeiras, correspondentes a 1/3
(um terço) da representação desta Casa do Congresso. Por isso, a análise deve ser
feita ou sobre todo o período, das eleições de 1994 a 2002, ou por partes, de 1994
a 1998 e de 1998 a 2002. Somente seis partidos conseguiram em 1998 eleger pelo
menos um representante para ocupar uma dessas cadeiras que compunham o
universo em disputa, observando-se que foram dois de cada campo político-
ideológico. A Direita elegeu sete representantes, sendo cinco do PFL, praticamente
a metade do contingente que esta legenda conseguira eleger em 1994, quando
foram renovados 2/3 (dois terços) do Senado e o partido ganhara 11 cadeiras, e
dois do PPB, que conseguiu aumentar sua bancada (ele é resultante da fusão do
PPR com o PP), ao eleger dois representantes, o mesmo número obtido no pleito
anterior, quando estava em disputa o dobro de cadeiras. O Centro abocanhou a
maior parte do bolo disputado, ao eleger 16 senadores, com destaque para o PMDB
que, sozinho, obteve 12 cadeiras, número próximo das 14 cadeiras obtidas em
1994, e o PSDB quatro, praticamente a metade do pleito anterior, quando obteve
60
nove. Na esquerda, o PT elegeu três senadores, quase o mesmo número de 1994, e
o PSB aumentou sua bancada com a obtenção de mais uma cadeira. A distribuição
das bancadas por campo político-ideológico produzida nesse pleito para o Senado
pode ser observada no gráfico a seguir.
Figura 7
Composição Político-Ideológica do Senado Federal
(Bancada eleita em 1998)
Esquerda15%
Direita26%
Centro59%
Fonte: Dados do TSE.
Capítulo 6
As eleições de 2002
A política de adesão quase irrestrita ao governo, conforme caracterizada no capítulo
anterior, começou a apresentar sinais de esgotamento logo após a reeleição do
presidente em outubro de 1998.
Geral: O processo político: de 1999 a 2002
No final de 1998, a crise da economia russa fez o real sofrer fortes ataques
especulativos, reduzindo as reservas do país em até 40 bilhões de dólares. Em
decorrência desse acontecimento, em janeiro de 1999 o governo central modificou
a política de câmbio, permitindo a livre flutuação da moeda. Com a desvalorização
cambial, os preços externos, em reais, aumentaram 421% até outubro de 2000,
enquanto os internos cresceram em média de 120%.101 Ao lado da adoção do
câmbio flexível, teve lugar um acordo com o FMI que previa metas ambiciosas de
superávit fiscal (3,1% do PIB em 1999, 3,3 em 2000 e 3,4% em 2001). Para
realizar a meta do superávit primário, o governo federal elevou significativamente
as receitas da União e intensificou, de forma substancial, o corte de gastos nas
diversas áreas da administração pública. Entre as principais medidas tomadas
nessa direção, estavam as privatizações (que chegaram ao seu ápice em 1998), as
reformas do Estado (administrativa, tributária e previdenciária) e uma política de
juros altos como estratégia inibidora do consumo e, por conseguinte, da inflação.
Essas medidas, combinadas, contribuíram para o agravamento da dívida pública
brasileira. Por outro lado, a paridade artificial ouro-dólar, e o controle inflacionário,
teve como efeito altos índices de recessão e desemprego.102
101 NASSIF, L. Política macroeconômica e ajuste fiscal: 62. 102 AMARAL, R. A construção conservadora: 67.
62
A partir da crise cambial de janeiro de 1999, o nível de satisfação com o
presidente começou a declinar103. O enfraquecimento do governo perante a opinião
pública o obrigou a ceder cada vez mais às exigências de um Legislativo nem
sempre motivado por questões ideológicas, mas muitas vezes por interesses
particulares e imediatos. Como forma de assegurar a coesão da base governista e,
através dela, a implementação do programa de estabilização, o presidente fez uso
das prerrogativas constitucionais que teve à sua disposição, como o pagamento de
emendas parlamentares, individuais e de bancadas, a edição e reedição de medidas
provisórias e a distribuição de cargos na administração pública.
O agravamento da crise econômica e, conseqüentemente, a desvalorização
do real passaram a dificultar as relações entre o Executivo e sua base aliada no
Congresso Nacional. Isso se verificou, por exemplo, na dificuldade do Planalto para
fazer aprovar a contribuição previdenciária dos inativos – lei que depois de
aprovada foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal, que a considerou
inconstitucional. O mesmo aconteceu com a reforma administrativa: foi aprovada,
mas seu texto ficou bem longe do que pretendia de início o governo federal. Essa
resistência do Congresso em aprovar as reformas administrativas e, em especial,
previdenciária, contrastava nitidamente com a facilidade que tivera o governo em
fazer aprovar a primeira temporada de reformas constitucionais, responsáveis pela
quebra do monopólio estatal e abertura da economia ao capital estrangeiro e à
iniciativa privada.
No decorrer do segundo governo de FHC, os índices de crescimento
econômico caíram drasticamente em relação ao primeiro mandato do presidente,
recuperando-se apenas em 2000 (4,4%). A retomada, no entanto, foi prejudicada
103 Em meados de 1999, a popularidade de FHC chegou ao nível mais baixo, como demonstram pesquisas de opinião realizadas no período. Em julho de 1999, 52% dos entrevistados consideraram a administração do presidente ruim/péssimo e, em setembro, 67% disseram desaprovar a maneira como FHC vinha conduzindo o país até o momento. Esses índices, embora tenham declinado um pouco em consultas subseqüentes, mantiveram-se bem acima dos níveis de rejeição observados ao longo do primeiro mandato do presidente. CHAGAS, H. Relações executivo-legislativo: 359-360.
63
novamente por fatores externos – a crise Argentina e a desaceleração da economia
norte-americana. Com isso o crescimento de 2001 ficou em apenas 1,4 %. No ano
de 2002, o crescimento da economia continuou estagnado em 1,5%. A renda per
capita do brasileiro caiu no período, chegando ao nível mais baixo em 2002 (US$
2.583).104
Tendo obstaculizado o aquecimento da economia e a capacidade produtiva
nacional, o Plano Real acabou prejudicando setores importantes da sociedade
brasileira.105 Em 2002, a indústria nacional apresentou um crescimento de apenas
1,52%, semelhante ao setor de serviços (1,49%), e bem abaixo da agropecuária
(5,79%). Entre os subsetores industriais, a construção civil foi o mais prejudicado,
com queda de 3,2% em relação ao ano anterior.106
Em face disso, as organizações empresariais, que antes compunham a base
de sustentação do governo, começaram a se pronunciar a favor de um novo modelo
de desenvolvimento econômico para o país.107 Lideranças do setor criticaram a
ausência de uma política industrial para o país e de canais de interlocução entre o
governo e o empresariado nacional. Esses mesmos setores acusavam o governo de
dispensar um tratamento privilegiado ao capital financeiro internacional em prejuízo
dos setores produtivos do país.108
A nova conjuntura econômica reacendeu a polêmica entre
desenvolvimentistas e monetaristas, ou, noutros termos, entre estabilização e
crescimento sustentável. Envolvendo políticos (dentro e fora do governo) e
104 Dados compilados no Almanaque Abril 2004. 105 A rápida liberalização do comércio depois de décadas de protecionismo estatal, combinada com a supervalorização da moeda, teve forte impacto sobre centenas de empresas brasileiras que não tiveram tempo de ajustar-se à concorrência intensificada pelas importações. 106 Dados extraídos do Almanaque Abril 2004. 107 DINIZ, E. Globalização, reformas econômicas e elites empresariais: 96. 108 Em junho de 2001, por ocasião da proposta governamental de repassar às empresas parte dos custos referentes ao pagamento dos expurgos do FGTS, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e seus associados apelidaram a equipe econômica do governo de “talebans da ortodoxia financeira que mandam em Brasília” (Folha de S. Paulo, 13 julho de 2001).
64
lideranças empresariais, o debate repercutiu nos meios jornalísticos. De um lado,
se alinharam aqueles que defendiam posições desenvolvimentistas e, portanto,
uma maior participação do Estado nos setores produtivos do país, com vistas ao
incremento da indústria nacional. Para essa perspectiva, a liberalização irrestrita da
economia nacional à entrada de capitais voláteis tornava o país vulnerável às
oscilações dos mercados internacionais, configurando uma situação de elevada
instabilidade. Do outro lado da polêmica, se posicionaram aqueles que
preconizaram políticas de ajuste fiscal e austeridade orçamentária. Estes vêem no
modelo desenvolvimentista um grave risco à estabilidade econômica, identificando-
o com o retorno da inflação.
A polêmica entre liberais e desenvolvimentistas demarcou as eleições de
2002. A grande novidade desse pleito esteve na ampla aliança de centro-esquerda,
com a inclusão de setores da direita, que se formou no âmbito da disputa
presidencial.
Após três derrotas eleitorais consecutivas e oito anos de oposição
sistemática a FHC, com críticas ao modelo econômico vigente, Lula se lançou mais
uma vez à disputa presidencial. Disposto a firmar um amplo pacto social para
montar uma nova estratégia de desenvolvimento para o Brasil, o petista se
aproximou de setores conservadores, até então refratários à sua candidatura. A
ampliação das alianças petistas resultou no lançamento de José Alencar pelo PL
para vice na chapa de Lula. Senador mineiro e presidente da Coteminas, Alencar
contribuiu para calçar o apoio do empresariado industrial ao candidato.
Apesar das reservas ao candidato pelas greves que comandou na região do
ABC paulista durante os anos 1980, aderiram à campanha de Lula importantes
nomes do setor industrial, como Eugênio Staub, presidente da Gradiente, Paulo
Skaf, da Associação Brasileira da Indústria Têxtil - Abit, e Victor Siauly, do
Laboratório Aché.
65
O apoio do empresariado à candidatura Lula representou um importante
ponto de inflexão em relação a 1989, quando o ex-presidente da Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo - Fiesp, Mario Amato, falou em debandada de
vários capitalistas caso o ex-torneiro mecânico vencesse as eleições daquele ano. A
nova postura do setor empresarial face ao candidato petista, alargando o leque de
alianças, manifestou a necessidade de um projeto de desenvolvimento do país
voltado para o mercado interno em contraposição àquele proposto pela ortodoxia
liberal.
Em sua terceira tentativa de chegar ao Planalto, o candidato petista adotou
um tom mais conciliatório, além de procurar melhorar sua imagem aos olhos da
classe média, público que tradicionalmente apresentava os maiores índices de
rejeição ao político. Apesar de continuar a defender causas sociais antigas, passou
a fazer isso sem atacar diretamente o governo, mas propondo mudanças no modelo
vigente. Mesmo com o discurso mais moderado de Lula – a campanha do
presidenciável adotou o slogan Lulinha paz e amor –, alguns analistas financeiros
recomendaram a diminuição de investimentos no Brasil, devido ao crescimento do
candidato nas pesquisas de intenções de voto. O especulador internacional George
Soros, manejando o tema do caos, declarou à imprensa brasileira que só a eleição
de um candidato comprometido com o que chamou de modelo hegemônico poderia
acalmar os mercados financeiros.109
O principal adversário de Lula na disputa pelo Executivo federal foi o
candidato tucano José Serra, duas vezes ministro de FHC e um dos principais
nomes do PSDB. Para sua campanha, Serra definiu o slogan Nada contra a
estabilidade; tudo contra a desigualdade, assegurando as diretrizes centrais da
política econômica de Fernando Henrique.
O candidato governista começou a disputa pela vaga presidencial, oscilando
entre o quarto e sexto lugares nas pesquisas de opinião. Em março, conseguiu
109 Folha de S. Paulo, 8 de junho de 2002.
66
chegar à segunda posição, depois das denúncias contra a empresa Lunus, de Jorge
Murad e Roseana Sarney, então pré-candidata do PFL à Presidência. Após esse fato,
Roseana, que aparecia nas pesquisas de opinião empatada tecnicamente com Lula
na primeira posição, começou a despencar, beneficiando o candidato tucano.
Embora sob forte pressão dos mercados financeiros, Lula liderou a
campanha presidencial desde o início. No primeiro turno das eleições, realizado em
outubro de 2002, obteve 39,4 milhões de votos, com ampla vantagem sobre seus
concorrentes mais diretos, José Serra, Anthony Garotinho (PSB) e Ciro Gomes
(PPS). Iniciada a segunda etapa da campanha presidencial, Lula construiu uma
aliança ainda mais ampla para enfrentar o candidato governista. A Coligação Lula
Presidente, formada por PT, PL, PMN, PCB e PCdoB, conquistou o apoio do PSB, PPS
e PDT. O resultado das eleições do segundo turno apontou a vitória de Lula, com
52,7 milhões de votos, a maior votação da história do país.
De maneira geral, e levando-se em conta o espectro político-ideológico
resultante das eleições gerais de 2002,110 pode-se dizer que este pleito marcou o
fim da hegemonia de centro-direita no Brasil, representada pelos oito anos de
mandato de Fernando Henrique Cardoso. Com a vitória de Luís Inácio Lula da Silva
na eleição de outubro daquele ano, a esquerda finalmente chegou ao poder,
através de uma coalizão de centro-esquerda, sinalizando um novo ciclo hegemônico
no país.
Votação para a Presidência da República
Do ponto de vista político-ideológico, o pleito de 2002 confirmou o pífio
desempenho da Direita, fenômeno já observado na eleição de 1998. Representado
por PFL, Prona e PSC, este campo obteve uma votação, em termos percentuais,
ainda mais inexpressiva do que aquela obtida quatro anos antes. O setor de centro,
110 Excetuando-se os pleitos estaduais, que escapam ao objeto desse estudo, esteve em jogo em 2002, além da eleição presidencial, a disputa de 512 cadeiras para a Câmara dos Deputados e de dois terços das vagas do Senado Federal (51 cadeiras).
67
formado pela coalizão PSDB-PMDB, também amargou um recuo bastante
significativo, conseqüência, talvez, do esfacelamento da base de sustentação do
governo Fernando Henrique.
O PFL, que juntamente com o PSDB havia sido um dos pilares da eleição do
candidato tucano em 1994 e 1998, optara pela candidatura própria, ao passo que o
PTB decidira apoiar um dos candidatos lançados pela esquerda. Com isso, nem
mesmo o apoio do PMDB foi suficiente para fazer decolar a candidatura governista.
A grande novidade desta eleição foi, portanto, o extraordinário crescimento da
esquerda, que, mesmo dividida em três coligações, obteve uma expressiva votação
no primeiro turno, confirmada posteriormente com a eleição de Lula em segundo
escrutínio.
Conforme mostra a tabela abaixo, o resultado da eleição presidencial de
2002 reforçou uma tendência já observada no pleito anterior, qual seja, a do
desaparecimento da direita, que dos 2,30% dos votos válidos obtidos em 1998
desceu para uma votação ainda mais insignificante, considerada nula em termos
percentuais.
O segmento de centro obteve 23,20% dos votos, revelando um decréscimo
bastante acentuado em relação a 1998, quando conquistou 53,10% do total. Já o
campo formado pelos partidos de esquerda experimentou um crescimento inédito,
representado por uma votação de 76,8% dos votos válidos. A principal responsável
por esse total foi a coligação que deu a vitória a Lula, liderada pelo PT e integrada
por PCB, PL, PMN e PCdoB, que conquistou cerca de 46% dos votos.
A coalizão formada por PSB, PGT e PTC ficou com 17,90%, enquanto a
coligação PPS-PDT-PTB obteve 12%. Concorrendo ao pleito com candidatura
própria, o PSTU recebeu apenas 0,50% dos votos válidos. Esses dados estão
evidenciados na Tabela 3.
68
Tabela 3: Votação dos candidatos nas eleições presidenciais em 2002, segundo orientação político-ideológica (primeiro turno)
Partidos ou Coligação do Candidato
Votação Absoluta % dos Votos
Válidos
Partidos de Direita
Total Direita - 0,00%
(Total sem Prona) - 0,00%
Coligação de Centro-Direita
PSDB-PMDB 19.694.843 23,20%
Total Centro 19.694.843 23,20%
Partidos de Esquerda
PCO 38.517 0,0%
PSTU 402.028 0,50%
Coligações de Centro-Esquerda
PT-PCB-PL-PMN-PCdoB 39.436.099 46,40%
PSB-PGT-PTC 15.176.204 17,90%
PPS-PDT-PTB 10.166.324 12,00%
Total Esquerda 65.219.172 76,80%
Total de Votos Válidos 84.914.015 100,00%
Fonte: Dados do TSE.
A composição da Câmara dos Deputados
A eleição de 2002 ratificou uma das principais características do cenário político
brasileiro: a acentuada fragmentação de seu sistema partidário. Neste pleito, 18
agremiações conseguiram representação na Câmara Federal, uma a mais do que
em 1998. Aos 17 partidos que formaram a legislatura passada, somou-se o PSDC,
que elegeu um deputado. Os partidos de direita continuaram com a maior bancada,
ainda que com uma redução em relação a 1998, quando obtiveram 214 cadeiras ou
41,8% do total. Em 2002, a Direita como um todo elegeu 196 deputados (38,5%),
18 a menos que na eleição anterior, uma redução de 8,4%. Os partidos de centro
69
conquistaram 148 cadeiras (32,5%), contra 183 (35,7%) em 1998, uma diminuição
de 35 parlamentares (19,1%). A Esquerda, por sua vez, fez-se representar por 167
(32,5%) deputados em 2002, 52 a mais do que na eleição anterior, quando elegeu
115 candidatos (22,5%). Esse resultado revela uma acentuada inflexão na
distribuição dos votos pelos partidos, com uma significativa migração do eleitorado
de direita e, sobretudo de centro, para a Esquerda, que em 2002 viu sua
representação na Câmara aumentar em cerca de 45%. Ver abaixo como ficou a
distribuição das bancadas por campo político-ideológico nesse nível.
Figura 8
Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados (Bancada Eleita em 2002)
Centro29%
Direita38%
Esquerda33%
Fonte: Dados do TSE.
A diminuição dos votos à direita se deu basicamente pela redução da representação
de PFL, PPB e PTB. Destes, o declínio mais acentuado ocorreu no PFL, que deixou
de ser a maior bancada, passando de 105 cadeiras (20,5%) em 1998 para 84
(16,4%) em 2002, uma redução de 20%. O PPB perdeu 11 (18,3%) das sessenta
vagas (11,7%) que possuía, ficando com 49 deputados (9,6%). Já o PTB viu sua
bancada ser reduzida em cinco cadeiras (16,1%), passando de 31 (6%) em 1998
para 26 (5,1%) no pleito seguinte. Ainda no campo da direita, vale destacar o
expressivo crescimento do PL, com 26 parlamentares eleitos (5,1%), 14 a mais
(116%) que em 1998, quando detinha apenas 2,3% da representação na Câmara.
Outra agremiação que experimentou significativo crescimento foi o Prona, cuja
70
bancada passou de um (0,2%) para seis deputados (1,2%), revelando um aumento
de 500%. Além destes partidos, conseguiram eleger representantes em 2002 o
PSC, que passou de dois (0,4%) para um deputado (0,2%), e o PSD, que elegeu
quatro parlamentares (0,9%), contra três (0,7%) no pleito anterior.
No segmento formado pelas agremiações de centro, a queda na
representação parlamentar foi ainda mais nítida. O PSDB foi o partido que mais
perdeu deputados, passando de 99 (19,3%) em 1998 para 71 (13,8%) em 2002,
uma redução de cerca de 28%. No PMDB, o declínio, apesar de menos acentuado,
foi também significativo. Das 83 cadeiras (16,2%) conquistadas no pleito de 1998,
o partido manteve apenas 74 (14,4%), o que representou um decréscimo de
10,8%. Ainda no centro, o PST elegeu três deputados (0,6%), contra apenas um
(0,2%) que havia sido eleito em 1998.
No campo da esquerda, o PT confirmou sua hegemonia, tornando-se, pela
primeira vez, a maior bancada da Câmara dos Deputados. Embalada pela
campanha vitoriosa de Lula, a agremiação elegeu 91 parlamentares (17,7%), 33 a
mais que em 1998, quando conquistou 58 cadeiras (11,3%). Esse crescimento
representou uma elevação de 36,2% na representação do partido. Vale ressaltar,
ainda em relação ao PT, que no período de 1994 a 2002, o partido cresceu 87,5%
(ver Tabela 4). O PSB passou de 19 (3,7%) para 22 deputados (4,3%), registrando
um aumento de 15,7%. Outro que apresentou crescimento significativo foi o
PCdoB, que elevou sua bancada de sete (1,4%) para 12 parlamentares (2,3%),
traduzindo um aumento de 71,4%. Crescimento ainda maior foi aquele
experimentado pelo PPS, que suplantou o PCdoB como quarta maior bancada do
campo das esquerdas. Com apenas três deputados (0,6%) eleitos em 1998, o
partido chegou a 15 parlamentares (2,9%) em 2002, apresentando um acréscimo
de 400% em sua representação, índice também alcançado pelo PV, que pulou de
uma (0,2%) para cinco (1%) cadeiras. Além do PMN, que teve sua bancada
reduzida de dois (0,4%) para apenas um (0,2%) parlamentar, somente o PDT,
71
entre os partidos de esquerda, viu sua representação ser diminuída, confirmando
uma tendência já observada no pleito de 1998. Em 2002, os trabalhistas perderam
mais quatro vagas na Câmara, passando de 25 (4,9%) para 21 (4,1%)
parlamentares. Com isso, o partido deixou de ser a segunda maior bancada entre
as agremiações de esquerda, posto que passou a ser ocupado pelo PSB. O
realinhamento político-ideológico produzido na Câmara dos Deputados durante o
período de 1994 a 2002 pode ser visualizado na Tabela 4 e na Figura 9.
Tabela 4: Realinhamento político-ideológico na Câmara dos Deputados (Bancadas eleitas em 1994, 1998 e 2002)
Partidos
Bancada eleita
em 1994
A % do
total
Bancada eleita
em 1998
B % do
total
Bancada
eleita em
2002
C % do
total
Evolução 1994-2002*
[(B-A)/A]
Partidos de Direita
PFL 89 17,3% 105 20,5% 84 16,4% -5,6%
PPR(PDS + PDC)
52 10,1%
PPB (PPR +PP)
60 11,7% 49 9,6% -5,8%
PTB 31 6,0% 31 6,0% 26 5,1% -16,1%
PRN 1 0,2% 0 0,0% 0 0,0% -100,0%
PL 13 2,5% 12 2,3% 26 5,1% 100,0%
PSC 3 0,6% 2 0,4% 1 0,2% -66,7%
PSD 3 0,6% 3 0,7% 4 0,9% 33,3%
PRONA 0 0,0% 1 0,2% 6 1,2% 500,0%
Total Direita 192 37,3% 214 41,8% 196 38,5% 2,1%
Partidos de Centro
PMDB 107 20,9% 83 16,2% 74 14,4% -30,8%
PSDB 62 12,1% 99 19,3% 71 13,8% 14,5%
PP (PTR + PST)
36 7,0% 0 0,0% 0 0,0% -100,0%
PST 0 0,0% 1 0,2% 3 0,6% 200,0%
72
Total Centro 205 40,0% 183 35,7% 148 28,8% -27,8%
Partidos de Esquerda
PDT 34 6,6% 25 4,9% 21 4,1% -38,2%
PT 49 9,6% 58 11,3% 91 17,7% 85,7%
PSB 15 2,9% 19 3,7% 22 4,3% 46,7%
PCdoB 10 1,9% 7 1,4% 12 2,3% 20,0%
PPS/PCB 2 0,4% 3 0,6% 15 2,9% 650,0%
PMN 4 0,9% 2 0,4% 1 0,2% -75,0%
PV 1 0,2% 1 0,2% 5 1,0% 400,0%
Total Esquerda
115 22,5% 115 22,5% 167 32,5% 45,2%
Partidos Indefinidos
PRP 1 0,2% 0 0,0% 0 0,0% -100,0%
PSDC 0 0,0% 0 0,0% 1 0,2%
Total Indefinidos
1 0,2% 0 0,0% 1 0,2% 0,0%
Total Geral 513 100,0% 512 100,0% 512 100,0% -0,2%
Fonte: Calculada com base em dados do TSE.
* No caso dos partidos que não elegeram representantes no pleito de 1994, foi calculada a evolução do período de 1998 a 2002.
Obs: Devido a arredondamentos, pode haver pequenas diferenças entre as somas das percentagens e os totais indicados.
Figura 9
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
1994 1998 2002
Evolução da Composição Político-Ideológica da Câmara dos Deputados
(Bancadas Eleitas de 1994 a 2002)
Direita Centro Esquerda
Fonte: Calculada com base em dados do TSE.
73
A composição do Senado Federal
Na eleição de 2002 foram renovados dois terços das vagas para o Senado Federal.
Neste pleito, dez partidos conseguiram eleger ao menos um parlamentar para
preencher uma das 52 vagas em disputa, ao passo que em 1998 apenas seis
agremiações obtiveram representação.
A Direita conquistou 19 cadeiras, ou 35,2% do total de votos válidos,
aumentando em 11,8% sua participação na Casa em comparação com o pleito de
1994, quando elegeu 17 senadores (31,6%). Daquele total, 14 vagas (25,9%)
foram obtidas pelo PFL, duas pelo PTB (3,7%), duas pelo PL (3,7%) e uma pelo
PSD (1,9%).
Os partidos de centro viram sua representação reduzir-se drasticamente em
relação a 1994, ocasião em que conquistaram 27 cadeiras (50%). Em 2002, PMDB
e PSDB fizeram-se representar por apenas 17 senadores (31,5%), uma redução de
37%. O PMDB sofreu um declínio mais acentuado, passando de 14 senadores
(25,9%) em 1994 para nove senadores (16,7%) em 2002. O PSDB perdeu uma
vaga, caindo de nove (16,7%) para oito parlamentares (14,8%).
Tal como observado nas eleições para a Câmara, o recuo do Centro foi
acompanhado por um expressivo crescimento da Esquerda, que pulou de dez
cadeiras (18,6%) conquistadas em 1994 para 18 (33,3%) em 2002, registrando
um aumento de 80% entre os dois pleitos. O PT foi o partido que mais cresceu,
passando de quatro (7,4%) para dez senadores (18,5%).
O PDT manteve as quatro vagas (7,4%) obtidas em 1994, ao passo que o
PSB aumentou sua participação de uma (1,9%) para três cadeiras (5,6%). O PPS
elegeu apenas um senador (1,9%) em 2002, resultado idêntico ao obtido em 1994.
Essa evolução está representada na Tabela 5 e na Figura 11. A distribuição das
bancadas por campo político-ideológico neste nível segue logo abaixo na Figura 10.
74
Figura 10
Composição Político-Ideológica do Senado Federal
(Bancada Eleita em 2002)
Esquerda33%
Direita36%
Centro31%
Fonte: Dados do TSE.
Tabela 5: Realinhamento político-ideológico no Senado Federal (Bancada eleita por partidos em 1994, 1998 e 2002)
Partidos
Bancada Eleita
em 1994
A % do
Total
Bancada Eleita
em 1998
B % do
Total
Bancada Eleita
em 2002
C % do
Total
Evolução 1994-2002*
[(B-A)/A]
Partidos de Direita
PFL 11 20,4% 5 18,6% 14 25,9% 27,3%
PPR/PPB/PDS 2 3,7% 2 7,4% 0 0,0% -100,0%
PTB 3 5,6% 0 0,0% 2 3,7% -33,3%
PL 1 1,9% 0 0,0% 2 3,7% 100,0%
PSD 0 0,0% 0 0,0% 1 1,9%
Total Direita 17 31,6% 7 26,0% 19 35,2% 11,8%
Partidos de Centro
PMDB 14 25,9% 12 44,4% 9 16,7% -35,7%
PSDB 9 16,7% 4 14,8% 8 14,8% -11,1%
PP 4 7,4% 0 0,0% 0 0,0% -100,0%
Total Centro 27 50,0% 16 59,2% 17 31,5% -37,0%
Partidos de Esquerda
PDT 4 7,4% 0 0,0% 4 7,4% 0,0%
PT 4 7,4% 3 11,2% 10 18,5% 150,0%
75
PSB 1 1,9% 1 3,8% 3 5,6% 200,0%
PPS 1 1,9% 0 0,0% 1 1,8% 0,0%
Total Esquerda 10 18,6% 4 15,0% 18 33,3% 80,0%
Total Geral 54 100% 27 100% 54 100,0% 0,0%
Fonte: Baseado em dados do TSE.
* No caso dos partidos que não elegeram representantes no pleito de 1994, foi calculada a evolução do período de 1998 a 2002.
Obs: Devido a arredondamentos, pode haver pequenas diferenças entre as somas das percentagens e os totais indicados.
Figura 11
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
1994 1998 2002
Evolução da Composição Político-Ideológica do Senado Federal
(Bancadas Eleitas de 1994 a 2002)
Direita Centro Esquerda
Fonte: Calculada com base em dados do TSE.
Conclusão
O pano de fundo deste inquérito foi tecido à luz de critérios previamente
explicitados relativos às noções de direita e esquerda. Foi preciso inseri-las (embora
ainda preliminarmente) na conjuntura política nacional, perseguindo sua tipificação
ao longo da prevalecente estrutura partidária.
Nos marcos do período delimitado (1994-2002), a investigação orientou-se a
partir de três principais objetivos. Em primeiro lugar, ao longo do espectro político-
ideológico previamente concebido, propôs-se o exame do desempenho eleitoral das
candidaturas e coalizões à Presidência da República. Em segundo lugar, pretendeu-
se analisar a correlação de forças que se manifestou na distribuição das vagas para
o Congresso Nacional e o Senado Federal. Finalmente, guardou a preocupação de
estabelecer as necessárias conexões entre a dinâmica do processo político-eleitoral
com a dinâmica das conjunturas socioeconômicas verificadas no decorrer do
período considerado.
Tendo em vista as hipóteses que nortearam a pesquisa, podem-se propor as
seguintes conclusões:
1. A formação de uma aliança de centro-direita – que garantiu a eleição (em
1994) e a reeleição (em 1998) do presidente da República – refletiu a consolidação
de um novo projeto de desenvolvimento econômico-social para o país. A aliança
PSDB-PFL-PTB expressou a tentativa de consolidação do modelo neoliberal na
sociedade brasileira. Tal aliança, ampliada com a participação do PMDB e PPB,
garantiu ao governo FHC a aprovação das emendas constitucionais necessárias
para implantar as reformas do Estado e da economia de acordo com as teses do
Consenso de Washington. Essa coligação de forças políticas de orientações
ideológicas distintas refletiu o consenso sobre a necessidade de superação com o
modelo de desenvolvimento implantado pelo presidente Getúlio Vargas, no qual o
Estado detinha o papel de principal agente regulador da economia e provedor do
77
bem-estar social, responsabilizado pela estagnação econômica e retrocessos sociais
que marcaram os anos 1980, também conhecidos como a década perdida.
2. O referido realinhamento político-ideológico ocorrido a partir da eleição de
1994, mostrou consonância entre os votos dados para a Presidência e para o
Congresso Nacional. Como resultado, a pauta político-econômica do Executivo
submetida ao Congresso Nacional não só obteve significativo apoio, como também
obteve, no pleito de 1998, forte receptividade eleitoral. O segundo mandato foi
uma confirmação do primeiro em dupla acepção. De um lado, ele refletiu o apoio da
sociedade ao programa de estabilização econômica; de outro, permitiu ao governo,
no Congresso Nacional, obter decidido apoio para o aprofundamento de suas
reformas liberalizantes, a partir das bem sucedidas manobras lideradas pelos dois
principais partidos de sua base política, o PSDB e o PFL.
3. No decorrer do segundo mandato foi se observando a perda de força de
execução política da aliança de centro-direita em função mesmo das dificuldades
sócio-econômicas enfrentadas pelo modelo neoliberal. A eleição de Luís Inácio Lula
da Silva em 2002, e das forças partidárias que o apoiavam, capitaneadas pelo PT,
decorreu da paulatina quebra de consenso em torno da política econômica nos
últimos anos da década de 1990. Entre 1999 e 2002, a coalizão liderada pelo PSDB
e PFL passou a sofrer acentuado processo de corrosão política. Amplos setores da
sociedade foram prejudicados pelas práticas da política econômica do governo FHC.
Por conseguinte, cada vez menos encontravam apoio político-eleitoral às
representações situadas ao centro-direita, enquanto cada vez mais aumentava a
receptividade eleitoral das identidades partidárias localizadas à esquerda do
espectro político, com especial destaque para o PT. O Congresso Nacional,
funcionando como uma caixa de ressonância, começou a encontrar crescentes
dificuldades para apoiar a programa governamental, já que as representações
partidárias não se sentiam imunes às demandas da sociedade. A eleição da
candidatura oposicionista no pleito de 2002 teria, então, decorrido da quebra de
78
consenso em torno do modelo neoliberal em fins dos anos 90. Passava a ganhar
força uma nova agenda de alternativas, em termos de diretrizes não só políticas,
mas também socioeconômicas. Em suma, os descontentamentos acumulados ao
longo da chamada Era FHC foram, paulatinamente, refletindo-se no adensamento
político das forças em oposição ao governo tucano e de seus aliados. As eleições de
1998 (menos) e de 2002 (mais) repercutiram, dessa maneira, os interesses
satisfeitos/insatisfeitos com as políticas neoliberais postas em prática. Se em 1998
ocorreu o crescimento da coalizão de centro-direita, em 2002 houve
correspondência entre as motivações do eleitorado (plano social) e a da classe
política (plano da representação institucional), orientando-se o processo político-
eleitoral no sentido centro-esquerdo.
4. A gradual perda de substância política da coalizão de centro-direita levou
ao fortalecimento da centro-esquerda no pleito de 2002, em torno de uma política
econômica alternativa àquela prevalecente durante o governo de FHC. Sufragada a
coalizão de forças que conduziu o candidato petista à Presidência da República, a
suposição é que se verifique novo realinhamento no Congresso Nacional, desta vez
em torno do PT, que elegeu a maior bancada federal (91 deputados), aumentando
significativamente sua representação no Senado (7,4% das cadeiras em 1994,
contra 5,6% em 1998 e 18,5% em 2002). Há ainda que se observar que, tanto no
Senado Federal, como na Câmara dos Deputados, a Esquerda experimentou um
crescimento maior do que os outros blocos político-ideológicos durante o período
em questão. Tal crescimento foi mais significativo face ao aumento acentuado das
bancadas do PT nas duas casas do Legislativo federal, tanto nas eleições de 1998
como nas de 2002, especialmente.
Passados mais de dois anos das eleições que conduziram Lula e o PT ao
Poder, a política macroeconômica do país segue praticamente inalterada. Apesar da
melhora de alguns indicadores econômicos e do fim das turbulências no mercado
financeiro, o novo governo persiste na austeridade fiscal, com o objetivo de
79
assegurar o superávit primário exigido pelo Fundo Monetário Internacional (entre
4,10% e 4,15% do PIB de 2004). Nascido do novo sindicalismo com o compromisso
de dar condições à classe operária e, por extensão, aos segmentos mais
injustiçados da sociedade, o PT enfrenta a resistência de parlamentares ligados à
esquerda do partido, que se opõem sistematicamente à condução da economia, à
política de alianças promovida pelo presidente para obter maioria no Congresso e
ao desempenho na área social, considerado insatisfatório.
A mudança nas diretrizes centrais do PT, longe de invalidar a dicotomia
direita/esquerda, parece confirmar a validade dos dois termos que marcaram as
lutas pelo poder desde o tempo da Revolução Francesa, quando esta se dividiu em
duas correntes, política e ideologicamente conflitantes, os jacobinos e os
girondinos. Indica que esta divisão persiste até hoje, no Brasil e alhures.
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Anexo
Glossário das siglas partidárias
Siglas Partidos Número Eleitoral
PCdoB
PCB
PCO
PDC
PDS
PDT
PFL
PGT
PL
PMDB
PMN
PP
PPR
PPS
PRN
Prona
PRP
PSB
PSC
PSD
PSDB
PSDC
PSL
PSN
PST
PSTU
PT
PTC
PTdoB
PTN
PV
Partido Comunista do Brasil
Partido Comunista Brasileiro
Partido da Causa Operária
Partido Democrata Cristão
Partido Democrático Social
Partido Democrático Trabalhista
Partido da Frente Liberal
Partido Geral dos Trabalhadores
Partido Liberal
Partido do Movimento Democrático Brasileiro
Partido da Mobilização Nacional
Partido Progressista
Partido Progressista Reformador
Partido Popular Socialista
Partido da Reconstrução Nacional
Partido de Reedificação da Ordem Nacional
Partido Republicano Progressista
Partido Socialista Brasileiro
Partido Social Cristão
Partido Social Democrático
Partido da Social Democracia Brasileira
Partido Social Democrata Cristão
Partido Social Liberal
Partido Solidarista Nacional
Partido Social Trabalhista
Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado
Partido dos Trabalhadores
Partido Trabalhista Comunitário
Partido Trabalhista do Brasil
Partido Trabalhista Nacional
Partido Verde
24/65
23/21
29
17
11
12
25
30
22
15
33
39
1
23
36
56
44
40
20
41
45
27
17
31
52/18
16
13
74
70
46/19
43