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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI
ELIANE CRISTINE LYRA OLIVEIRA VIANA
ESTRATÉGIAS DE GESTÃO PARA A QUALIFICAÇÃO DA ATENÇÃO A SAÚDE
DO SUS
Itajaí (SC)
Novembro/2018
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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO - MESTRADO PROFISSIONAL EM
SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: CIÊNCIAS DA SAÚDE E SAÚDE COLETIVA
LINHA DE PESQUISA: EDUCAÇÃO NA SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO NA
PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR
ELIANE CRISTINE LYRA OLIVEIRA VIANA
ESTRATÉGIAS DE GESTÃO PARA A QUALIFICAÇÃO DA ATENÇÃO A SAÚDE
DO SUS
Dissertação submetida à Universidade do Vale do Itajaí como
parte dos requisitos para a obtenção do grau de Mestre em
Saúde e Gestão do Trabalho.
Orientadora: Profª. Drª. Rita de Cássia Gabrielli Souza Lima.
Itajaí (SC)
Novembro/2018
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Ficha Catalográfica
Bibliotecária Eugenia Berlim Buzzi CRB 14/963
V654e
Viana, Eliane Cristine Lyra Oliveira, 1980- Estratégias de gestão para a qualificação da atenção a saúde do SUS. [Manuscrito] / Eliane Cristine Lyra Oliveira Viana. – Itajaí. SC. 2018.
171 f. ; fig. ; quad. ; mapa Inclui referências bibliograficas: f.147-160 Cópia de computador (Printout(s)). Dissertação submetida à Universidade do Vale do Itajaí como parte dos requisitos para a obtenção do grau de Mestre em Saúde e Gestão do Trabalho. “ Orientadora: Profª. Drª. Rita de Cássia Gabrielli Souza Lima.”
1. Gestão em saúde. 2. Educação Permanente. 3. Gestão em Saúde. 4. SUS. I. Universidade do Vale do Itajaí. II. Título.
CDU: 614
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ESTRATÉGIAS DE GESTÃO PARA A QUALIFICAÇÃO DA ATENÇÃO A SAÚDE
DO SUS
ELIANE CRISTINE LYRA OLIVEIRA VIANA
Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de Mestre em Saúde e Gestão
do Trabalho, Área de Concentração Ciências da Saúde e Saúde Coletiva e aprovada em sua
forma final pelo Programa de Pós-Graduação de Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do
Trabalho da Universidade do Vale do Itajaí.
_______________________________________________
Stella Maris Brum Lopes
Doutora em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (2005). Coordenadora do
Programa de Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho
Apresentado perante a Banca Examinadora composta pelos Professores:
______________________________________
Rita de Cássia Gabrielli Souza Lima
Doutora em Saúde Coletiva, UFSC, 2013. Professora do Centro de Ciências da Saúde da
Universidade do Vale do Itajaí, SC.
Presidente orientador
______________________________________
Marco Aurélio da Ros
Doutor em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, 2000. Professor do Centro de
Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Itajaí, SC.
Membro
______________________________________
Marta Verdi
Doutora em Enfermagem, Universidade Federal de Santa Catarina, 2002. Professora do
Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Santa Catarina.
Membro Externo
Itajaí (SC)
14/12//2018.
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Ao meu marido Fábio,
que orou e cuidou de mim e da nossa filha
enquanto eu estudava.
Essa dissertação não teria sido escrita sem você!
Muito obrigada, amo-te!
5
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, fonte inesgotável de cuidado, graça e amor!
Ao meu esposo Fábio e a Alícia, minha filha, por terem me amado enquanto estive
“distante”!
A minha mãe pela dedicação e entrega não somente por mim, mas também no
cuidado com a minha família. Você é inspiração e exemplo na luta pelos menos favorecidos!
Gratidão eterna pela sua vida!
A toda minha família, que desde a infância estiveram presentes nos melhores e piores
momentos.
Aos amigos (as) mais chegados que irmãos que me sustentaram em oração e
cuidaram da minha filha com tanto carinho! Que o Eterno de pra vocês o dobro da alegria e
alívio que me proporcionaram.
Aos amigos, alunos do Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho da UNIVALI, pelo
companheirismo na caminhada, principalmente a você Mariana Vilela Veiga, pela amizade,
parceria e por me ajudar em tudo! Em tudo!
Aos atuais e ex-professores do Mestrado, especialmente Cutolo, Marcão, Maria da
Glória, Antônia, Stella e Rita. Gratidão por serem apaixonados pelo que fazem - isso é o que
faz de vocês verdadeiros doutores!
A minha orientadora, Rita, que corajosamente me assumiu no meio do caminho e
construiu uma bela estrada!
À Secretaria Municipal de Saúde de Itajaí por me conceder a oportunidade de
realizar essa pesquisa.
Aos colegas e amigos de trabalho das Unidades de Saúde Rio Bonito e Cidade Nova
2, por terem “trabalhado por mim” enquanto estive fora.
A Juliana Wolf, minha gratidão por sua amizade, dedicação e carinho demostrados a
mim pelas madrugadas ao meu lado me ajudando na correção e formatação desse trabalho.
A todos vocês muita obrigada! Essa vitória é nossa!
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É URGENTE pensarmos quais são as possibilidades reais que nós
temos para efetivar o Sistema Único de Saúde hoje no Brasil. O nosso
débito é grande para os desassistidos desse país! Investir no que é
fundamental! Esse é o porquê dessa dissertação!
Não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de
desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade
consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural,
nada deve parecer impossível de mudar. Bertold Brecht
E não vós conformeis com este século, mas transformai-vos pela
renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa,
agradável e perfeita vontade de Deus. Romanos 12:02
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RESUMO
O modelo institucional do SUS é ousado e enfrenta limites federativos para concretizar,
regionalmente, o direito à saúde e fortalecer o controle social. No presente estudo, analiso
duas estratégias de gestão do município Itajaí, SC, na perspectiva de um coletivo intrassetorial
da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e do controle social. É um estudo qualitativo de
caráter exploratório-descritivo. Os dados foram coletados por meio de três técnicas: oficinas,
entrevista semiestruturada e grupo focal. As oficinas foram realizadas com diretores e/ou seus
representantes, supervisores, coordenadores da SMS e com profissionais da atenção básica. A
entrevista semiestruturada foi aplicada com o gestor municipal. O grupo focal foi
desenvolvido com conselheiros de saúde municipais. O estudo sinalizou que o planejamento,
apontado como uma estratégia de gestão, se pautado na defesa do projeto político do SUS,
tem capacidade para produzir mudanças nos processos de trabalho e consequentemente
melhorar os serviços e a qualidade da atenção. Destacou, também, que o planejamento
institucional sofre abalos a cada mudança de governo ou gestor, a chamada “descontinuidade
administrativa”, trazendo prejuízos em níveis técnicos e gerenciais na medida em que pessoas
são substituídas, independente de qualificação ou mérito. Sinalizou, ainda, a necessidade de o
planejamento ser voltado para as necessidades das pessoas. A educação permanente foi
apontada como estratégia fundamental para transformação das práticas em saúde, mas há a
necessidade de nova modelagem para a garantia de ações e serviços do SUS. A atenção básica
foi considerada, pelos participantes, o eixo estratégico principal para a estruturação de um
sistema de saúde municipal resolutivo. Os dados revelaram, ainda, que trabalhadores do SUS
precisam ser estimulados, sugerindo a criação de espaços coletivos para pensar, refletir e
problematizar as práticas cotidianas. Para tanto, sugeriu-se a criação de um espaço/setor
formador dentro da SMS. Ainda que a sustentabilidade do SUS requeira inúmeras frentes de
existência, é preciso que gestores estejam dispostos a desenvolverem estratégias consistentes
com os princípios do SUS.
Palavras–chave: Educação Permanente; Planejamento em Saúde; Gestão em Saúde; SUS.
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ABSTRACT
The institutional model of the SUS (Unified Health System - the national Brazilian healthcare
service) is a bold one, but it comes up against federal limits in its attempts to materialize the
right to health and strengthen social control at regional level. This study introduces an
analysis of two management strategies in the municipality of Itajaí, Santa Catarina, from the
perspective of an inter-sectoral collective team of the Municipal Health Secretariat (SMS) and
social control. It is a qualitative study with exploratory and descriptive approaches. The data
were collected using three techniques: workshops, a semi-structured interview, and a focus
group. The workshops were carried out with directors and/or their agents, supervisors, SMS
coordinators and professionals of the primary healthcare service. The semi-structured
interview was conducted with the municipal manager, and the focus group was developed
with municipal health counselors. The study signaled that the planning – indicated as a
managerial strategy, and when grounded in the defense of the SUS political project - has the
capacity to produce changes in labor processes and consequently, to improve the health
services and the quality of the care provided. It also showed that the institutional planning
suffers setbacks with each change of government or manager, resulting in a so-called
“administrative discontinuity” that causes harm at technical and managerial levels, as people
are replaced, regardless of qualification or merit. It also signaled that planning should be
focused on the needs of people. Continuing education was emphasized as a fundamental
strategy for the transformation of health practices, but a new modelling is needed to guarantee
the continuity of actions and services of the SUS. The study participants considered primary
health care to be the main strategic axis for the structuring of a resolutive municipal health
system. The data also showed that SUS workers need to be stimulated. For this purpose, the
creation of collective spaces was proposed, where workers can think, reflect and investigate
their daily practices. This could be in the form of a training space or sector within the SMS.
Although the sustainability of the SUS requires it to be present on numerous fronts, it is
crucial for the managers to be prepared to develop strategies that are consistent with the SUS
principles.
Key words: Permanent Education; Health Planning; Health Management; SUS.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 – Esquema Geral de Formulação de Políticas do CPPS....................................... 23
FIGURA 2 – Sequência das etapas que constitui o processo de formulação preliminar de
proposições políticas do CPPS................................................................................................. 25
FIGURA 3 – Localização de Itajaí no Estado de Santa Catarina........................................... 94
FIGURA 4 – Proposta de Maguerez..................................................................................... 112
QUADRO 1 – Formulação preliminar de proposições políticas............................................. 27
QUADRO 2 – Leis, normas e decretos na operacionalização do SUS - Evolução
Histórica................................................................................................................................... 60
QUADRO 3 – Fontes de Financiamento do SUS – Evolução Histórica................................. 88
QUADRO 4 – Aspectos demográficos e socioeconômicos da cidade de Itajaí...................... 98
QUADRO 5 – Divisão da estrutura administrativa da Secretaria Municipal de Saúde de
Itajaí....................................................................................................................................... 100
QUADRO 6 – Unidades de atendimento à população e suas localizações geográficas....... 101
QUADRO 7 – Distribuição das Equipes de ESF por área de abrangência........................... 104
QUADRO 8 - Sistematização dos dados............................................................................... 119
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AB Atenção Básica
ADCT Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
AIH Autorização de Internação Hospitalar
AIS Ações Integradas de Saúde
APS Atenção Primária a Saúde
CAPs Caixas de Aposentarias e Pensões
CF Constituição Federal
CGRs Colegiados de Gestão Regional
CIB Comissões Intergestores Bipartite
CIMS Comissões Interinstitucionais Municipais de Saúde
CIR Colegiado de Gestão Regional
CIS Comissões Interinstitucionais de Saúde
CIT Comissão Intergestores Tripartite
CNS Conselho Nacional de Saúde
COAP Contrato Organizativo de Ação Pública
CONASEMS Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde
CONASS Conselho Nacional de Secretários de Saúde
CPPS Centro Pan-Americano de Planejamento da Saúde
CRIS Comissões Regionais Interinstitucionais de Saúde
DOU Diário Oficial da União
ESF Estratégia Saúde da Família
FEM Fator de Estímulo a Municipalização
FHC Fernando Henrique Cardoso
GASE Gestão Avançada do Sistema Estadual
GED Grupo Especial de Descentralização
GPAB Gestão Plena da Atenção Básica
GPABA Gestão Plena de Atenção Básica Ampliada
GPSE Gestão Plena do Sistema Estadual
GPSM Gestão Plena do Sistema Municipal
IAPs Institutos de Aposentarias e Pensões
INAMPS Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
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INPS Instituto Nacional de Previdência Nacional
IO Imagem-objetivo
IVISAI Índice de Valorização do Impacto em Vigilância Sanitária
LDO Lei de Diretrizes Orçamentarias
LOS Lei Orgânica da Saúde
MRSB Movimento da Reforma Sanitária Brasileira
MS Ministério da Saúde
NOAS Norma Operacional da Assistência à Saúde
NOBs Normas Operacionais Básicas
OPAS Organização Pan-Americana de Saúde
PAB Piso da Atenção Básica
PACS Programa Agentes Comunitários de Saúde
PBVS Piso Básico de Vigilância Sanitária
PDI Plano Diretor de Investimentos
PDR Plano Diretor de Regionalização
PGASS Programação Geral das Ações e Serviços de Saúde
PMS Plano Municipal de Saúde
PNPS Política Nacional de Participação Social
PPI Programação Pactuada e Integrada
PROS Programação e Orçamento da Saúde
PS Previdência Social
PSF Programa Saúde da Família
RENASES Relação Nacional de Ações e Serviços de Saúde
RENAME Relação Nacional de Medicamentos Essenciais
SAI Sistema de Informação Ambulatorial
SAQS Sistema de Avaliação de Qualidade em Saúde
SIH Sistema de Informações Hospitalares
SMS Secretarias Municipais de Saúde
SUDS Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS Sistema Único de Saúde
TCG Termo de Compromisso de Gestão
TCGA Termo de Compromisso para Garantia de Acesso
UBS Unidade Básica de Saúde
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UCA Unidade de Cobertura Ambulatorial
UNA-SUS Universidade Aberta do SUS
UCR Unidades de Capacitação da Rede
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 15
2 OBJETIVOS DA PESQUISA ............................................................................................ 20
2.1 Objetivo Geral ............................................................................................................... 20
2.2 Objetivos Específicos .................................................................................................... 20
3 MARCO TEÓRICO ............................................................................................................ 21
3.1 Quando a Novidade Germina na História: contribuição latinoamericana para a
formulação de políticas de saúde ....................................................................................... 21
3.2 Quando a Normalização Hegemoniza no Processo Histórico: normas, pactos e
decreto para a organização dos SUS ................................................................................. 30
3.3 Quando o Protagonista Desperta para a sua Conquista Histórica: o controle social
do SUS. ............................................................................................................................... . 66
3.4 Quando o Direito Social é Sufocado pela Economia: das fontes constitucionais de
receita à Emenda Constitucional 29 .................................................................................. 75
4 MARCO CONTEXTUAL .................................................................................................. 94
4.1 Por que Itajaí? ............................................................................................................... 94
4.2 Aspectos Históricos do Município ............................................................................... 94
4.3 Aspectos Demográficos e Socioeconômicos do Município ......................................... 96
4.4 O Sistema Municipal de Saúde de Itajaí ..................................................................... 98
4.4.1 A Secretaria Municipal de Saúde ............................................................................. 99
4.5 O Plano Municipal de Saúde de 2014-2017 .............................................................. 106
5 PERCURSO METODOLÓGICO ................................................................................... 109
5.1 Desenvolvimento da Pesquisa 2013-2015 .................................................................. 109
5.2 Desenvolvimento da Pesquisa 2016-2018 .................................................................. 115
5.2.1 A entrevista coletiva, do tipo grupo focal, com os conselheiros de saúde ............. 116
5.2.2 A entrevista semiestruturada com o(a) gestor(a) municipal................................... 117
5.3 Organização dos Dados .............................................................................................. 118
6 RESULTADOS .................................................................................................................. 121
6.1 Planejamento: uma estratégia para não se perder no meio do caminho ............... 122
6.2 Educação Permanente: uma estratégia para transformação das práticas em saúde
............................................................................................................................................ 137
7 CONSIDERAÇÕES ........................................................................................................ 1434
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 147
14
APÊNDICES ......................................................................................................................... 161
ANEXOS ............................................................................................................................. 1617
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1 INTRODUÇÃO
A motivação para ingressar no Programa de Mestrado Profissional em Saúde e Gestão
do Trabalho, oferecido pela Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, SC, foi despertada já no
início de meu processo de atuação em um serviço público de atenção básica local. No
encontro vivenciado com a realidade dos serviços, foram gerados muitos produtos
questionadores sobre os entraves e fragilidades do Sistema de Saúde brasileiro, bem como,
sobre as iniquidades postas pela realidade ao direito universal à saúde. Esses produtos
mobilizaram a minha bagagem teórica trazida da formação em enfermagem e, por acreditar
que sempre há um mundo a fazer, senti vontade de retornar à universidade para aprofundar a
minha formação.
Dentre as questões que cotidianamente acompanharam o desenvolvimento das minhas
atividades na atenção básica, destaco duas: os desafios e contrassensos da integralidade da
atenção, em âmbito das ações garantidas pelos serviços de atenção básica; e; a gestão do SUS,
em interlocução com seu planejamento. A vontade de compreender por que a integralidade,
enquanto um princípio do SUS, não se concretiza de modo responsivo, em sua totalidade e em
conformidade com as suas múltiplas dimensões; a vontade de conhecer que estratégias são
eleitas pela gestão, em direção à materialização da atenção básica e a de compreender o modo
como o município as elege, acompanhou e tem acompanhado todo meu processo de trabalho.
Há dezesseis anos realizo uma atividade profissional que tem por objeto o cuidado. Ainda na
graduação, aprendi o que está sintetizado em Oliveira (2012): a enfermagem é arte de cuidar e
não a de curar e na relação de cuidado espera-se que a atenção seja direcionada à pessoa que
dele necessite e não ao problema e/ou doença que ela apresente.
Com base nessa síntese, passei a entender que as minhas ações para o cuidado na
atenção básica deveriam levar em consideração as necessidades de saúde das pessoas, tanto
nas especificidades da enfermagem como nas de cunho coletivo. Tarefa nada fácil, uma vez
que ainda não tinha aporte teórico suficiente para refletir sobre “necessidades de saúde”.
No entanto, o reconhecimento da importância de uma dimensão de tais necessidades
sempre se fez presente: a escuta atenta e acolhedora gerada em interlocução com o meu
sistema de valores. Várias pessoas encaminhadas para mim com o mesmo diagnóstico e
fazendo uso das mesmas medicações, exigiam e continuam exigindo diferentes abordagens de
cuidado: aprendi na prática que quando as abordagens são norteadas por uma escuta atenta e
acolhedora, elas possibilitam a participação das pessoas cuidadas nas decisões concernentes a
sua própria vida.
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Na medida em que a minha atuação nos serviços ganhava maturidade, comecei a
experimentar diversos sentimentos: da alegria ao sofrimento; da esperança à desesperança. Ao
observar, por exemplo, profissionais realizando tratamentos com o uso de tecnologias efetivas
em defesa da vida ao mesmo tempo em que consideravam a pessoa cuidada um objeto de
investigação, vivia uma confusão de sentimentos. Não raramente, a pessoa cuidada tinha e
tem um número, uma doença ou um apelido por uma característica pessoal e/ou humoral; elas
não eram (e, ainda não são) consideradas proprietárias de sua própria história, de seu processo
saúde-doença. Esses fatos produzidos pelo desenvolvimento real dos serviços resgatavam
continuamente, de minhas memórias, as atividades realizadas no estágio da graduação em
Enfermagem, e, em meu exercício profissional anterior, em um hospital privado.
Em estágios da graduação, realizados em hospitais públicos e Unidades Básicas de
Saúde (UBS), vivenciava inúmeras dificuldades referentes a processos e fluxos, questionando
cotidianamente também as razões para as más condições de trabalho. O filme cotidiano era de
“descaso” para com o cuidado. Não demorei em questionar à falta de recursos disponíveis,
fossem eles materiais, pessoal ou estrutural, para que o trabalho (o cuidado) fosse realizado de
forma efetiva e responsiva; no entanto, não tinha consciência do porquê isso acontecia. Não
demorei a questionar também o papel estratégico do controle social na gestão do SUS e as
diferenças dos rumos tomados quando da entrada de nova gestão.
Em 2004, com a graduação concluída, iniciei minhas atividades em um hospital
privado que tinha como compromisso a qualidade da assistência e de demais serviços
prestados. Nesse período, tive a oportunidade de gerenciar os serviços de hemodinâmica,
unidades de internação clínica, cirúrgica e pediátrica, praticando o que eu havia aprendido na
universidade: o cuidado. Para garantir a qualidade, o hospital contava com infraestrutura
adequada, investia na educação dos profissionais e em processos e fluxos bem definidos. É
inegável que essas condições me permitiram cuidar de maneira diferenciada, “com
qualidade”, mas, sobretudo, com o sentimento ao final do dia de ter cumprido a minha função
de forma responsiva, naquele nível de complexidade do SUS.
Em 2012, ingressei no serviço público a fim de trabalhar como enfermeira da
Estratégia Saúde da Família (ESF). Foi praticamente impossível não fazer comparações em
relação ao serviço privado: infraestrutura precária, más condições de trabalho, falta de
insumos e medicamentos, entre outros. Vários questionamentos começaram a ser gerados, tais
como: Por que não se pode ter as mesmas condições de trabalho e qualidade na atenção à
saúde nos serviços públicos? Por que existem tantos trabalhadores desmotivados e
descomprometidos? Por que existe tanta desorganização nos processos de trabalho? Por que
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as pessoas usuárias andam de um lado para o outro sem terem respostas resolutivas aos seus
problemas? Como a gestão organiza os nossos processos? Que estratégias estão voltadas para
a qualificação dos serviços? De que modo elas são produzidas?
Esses questionamentos me levaram a ingressar na Universidade Aberta do SUS
(UNA-SUS), no curso de pós-graduação em Saúde da Família, oferecido na modalidade à
distância e, posteriormente, no Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho da
Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, Santa Catarina. Meu objetivo nestes projetos era muito
claro: eu queria me apropriar do SUS com profundidade, dele me alimentar. A finalidade de
meu ingresso em ambos os projetos, também, era muito clara: apreender e trocar
conhecimentos teórico-práticos para, selecionando aqueles que fazem sentido para mim e
aliando-os ao meu modo de ver o mundo, contribuir para melhorar a qualidade da atenção e
dos serviços. Enfim: trabalhar para fazer valer um direito social muito caro à nossa sociedade
– o direito a saúde –, conquistado pelo povo brasileiro na VIII Conferência Nacional de
Saúde, em 1986 (BRASIL, 1986) e reconhecido pela Constituição de 1988 (BRASIL, 1988).
A partir de então, passei a conciliar meu processo profissional com o processo de
desenvolvimento do Mestrado. Paulatinamente, fui me apropriando de um aporte teórico
novo, que acabou significando uma reabertura das portas de meu processo de formação: de
formação nos serviços.
Em leituras e discussões sobre conceitos, teorias, e métodos correlatos ao Sistema
Único de Saúde (SUS), começou a ganhar forma, por exemplo, um jeito geral de entender a
expressão necessidades de saúde: ela abarca várias dimensões. Em âmbito macro,
necessidades de saúde são necessidades sociais, historicamente determinadas e refletem as
intervenções individuais e coletivas que movimentam a prática social das pessoas (SOUZA;
BOTAZZO, 2013). Em âmbito micro, a expressão é traduzida como problema de doença. De
acordo com Stotz (1991 apud SILVA; PINHEIRO; MACHADO, 2003, p. 237), "[...]
problemas e necessidades de saúde apresentam-se como noções conexas: a necessidade é, de
algum modo, a tradução de problema em termos operacionais."
Ainda que de modo breve, começou a ganhar forma também, para mim, alguns
conceitos e teorias do campo da administração pública. Em interação com o novo universo,
pude reconhecer uma perspectiva de processo de trabalho e gestão: as práticas em saúde vêm
sendo construídas historicamente com base no modelo hegemônico de prestação de serviços
taylorista/fordista e a gestão instituída para o SUS é fortemente marcada por influências dessa
composição, a qual apresenta características de centralização administrativa no poder
executivo, com estruturas organizacionais de desenho piramidal, onde as atividades gerenciais
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estão voltadas mais para o controle de execução de tarefas especializadas e avaliação de
resultados.
Há algumas décadas, vem se debatendo os efeitos negativos deste modelo de
organização do trabalho ao processo de trabalho, que se caracteriza pela fragmentação com
separação entre concepção e execução que, associada ao controle gerencial do processo e à
hierarquia rígida, tem levado à desmotivação e à alienação dos trabalhadores (MATOS;
PIRES, 2006). Esta racionalidade gerencial hegemônica que Onocko (2003, p. 124) reconhece
como “ação sobre a ação dos outros”, induz a certa cultura organizacional que nega a
incerteza e a discussão coletiva e ainda estimula a uma prática clínica reduzida, especializada
e fragmentada, tornando-se insuficiente na gestão da saúde pública.
Ainda sobre a ampliação de meu referencial teórico no processo de Mestrado, li um
artigo em que o autor relatava a sua experiência de gestão, executada por dois anos e meio,
em uma secretaria de saúde de um município de grande porte. Nesta leitura (SOUZA, 2009),
encontrei aproximações sobre um tema exaustivamente abordado na disciplina Bases Teóricas
e Políticas de Atenção à Saúde – SUS conquistado e SUS garantido – e algumas linhas de
base que fazem sentido ao meu modo de pensar, da condição de enfermeira de uma ESF, as
estratégias de gestão necessárias à materialização de um SUS, no mínimo, executado de modo
responsivo. Um SUS executado com vontade de dirimir as desigualdades sociais injustas de
acesso ao direito à saúde e ao cuidado longitudinal; executado com participação social,
controle social forte, disposição, engajamento e militância.
Revivendo a sua condição de gestor, o autor refere que a reflexão sobre “estratégias de
gestão que aproximem o SUS possível do SUS necessário”, deve partir, necessariamente da
compreensão de SUS como “uma luta política” e que a organização da atenção é objeto “de
disputa nos planos ideológico, econômico e institucional”. Ele expressa que, apesar da
expansão significativa nos últimos anos de serviços de saúde, problemas de acesso e baixa
qualidade técnica persistem e sugere como estratégia de gestão, a fim de aproximar “o SUS
possível do SUS necessário”, a expansão e melhoria da qualidade dos serviços. Manifesta,
ainda, que existe uma oposição à implantação de um SUS universal e equânime por este
representar um risco ao capital financeiro (SOUZA, 2009, p. 912).
Este texto ampliou os horizontes de possibilidades para o meu projeto de pesquisa,
aproximando-o de discussões vivenciadas em disciplinas sobre formação econômico-social,
saúde e sociedade de classes, estrutura e gestão do trabalho, SUS conquistado, SUS garantido,
SUS paralelo, ética, dialética, política, comecei a fortalecer uma linha de pensamento,
sentando-me na condição de gestora: por vivermos em um país neoliberal fomos
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“formatados” para planejar e fazer gestão municipal em saúde nos adequando aos recursos
disponíveis e às tomadas de decisão centralizadas no gestor e talvez este produto histórico-
cultural seja exatamente a fronteira que não nos movimenta para executar uma gestão
municipal efetivamente participativa, dirigida para as iniquidades de acesso ao direito à saúde.
Uma questão posta: como distender esta fronteira, considerando também que o governo
central tem um papel regulatório e redistributivo a cumprir, em termos nacionais?
O caminho, dali em diante, seria percorrido em direção a outras fontes teóricas, para
responder a seguinte pergunta de pesquisa: nesta conjuntura antidemocrática, em que o
federalismo brasileiro parece estar em xeque; em que o país tem-se deparado com a
necessidade de formar pensamento estratégico para garantir a sustentabilidade do SUS; em
que os ventos de austeridade têm soprado com força em direção aos interesses de um poder
político formal que defende a inoperância de política de caráter nacional e público coordenada
pela atenção básica/atenção primária abrangente, que estratégias de gestão um município de
grande porte pode lançar mão para preservar e expandir com qualidade os serviços de atenção
à saúde?
20
2 OBJETIVOS DA PESQUISA
2.1 Objetivo Geral
Analisar as estratégias de gestão do SUS de um município de grande porte do sul do
Brasil, na perspectiva de um coletivo intrassetorial da secretaria e de conselheiros municipais
de saúde.
2.2 Objetivos Específicos
Descrever a estrutura administrativa e o modelo de gestão da secretaria municipal de
saúde de um município do sul do Brasil, com base no Plano Municipal de Saúde
2014-2017;
Identificar as estratégias de gestão do SUS de um município de grande porte do sul
do Brasil, na perspectiva de um coletivo intrassetorial da secretaria e de conselheiros
municipais de saúde;
Discutir as estratégias de gestão do SUS de um município de grande porte do sul do
Brasil, na perspectiva de um coletivo intrassetorial da secretaria e de conselheiros
municipais de saúde.
21
3 MARCO TEÓRICO
3.1 Quando a Novidade Germina na História: contribuição latinoamericana para a
formulação de políticas de saúde
“Alice – Poderia me dizer, por favor,
qual é o caminho para sair daqui?
Gato – Isso depende muito do lugar
para onde você quer ir.
Alice – Não me importa muito onde.
Gato – Nesse caso, não importa por
qual caminho você vá.”
Até me deparar com um documento em uma disciplina do Mestrado denominado
Formulación de Politicas de Salud, editado pelo Centro Pan-Americano de Planejamento da
Saúde (CPPS) da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), em 1975, entendia
planejamento por uma única perspectiva: como a elaboração de um plano, produzido
hegemonicamente por pessoas situadas em um nível hierárquico superior ao meu processo de
trabalho, voltado para a resolução de problemas e situações que deveriam ser mudadas pela
gestão. Uma espécie de programação editada por pessoas distantes da produção cotidiana do
SUS, dotada de um conjunto de normas a serem seguidas por todos os atores que trabalham
em uma determinada instituição e dotada, ainda, do cálculo dos recursos materiais, humanos
e, principalmente, financeiros que se tem, para que um determinado serviço funcione.
O contato com este documento levou-me a fazer o que Lima e Miranda (2018)
denominam de “exercício de reflexividade dirigida para o ponto de partida”. O primeiro
enfrentamento, experimentado no exercício sugerido, correspondeu à necessidade de
reconciliação com o ser político que sou. Imersa em um movimento interno de resistência a
este termo, política, uma vez que meu processo de trabalho expõe cotidianamente entraves do
SUS originados pela política dos partidos políticos nacionais, fez-se necessário um
movimento interno reconciliador, pois seria exatamente através da política que eu poderia
começar a pensar o tal “ponto de partida”.
Inicialmente e, com certa facilidade no percurso, pensei que o ponto de partida
(LIMA; MIRANDA, 2018) seria a história, caminho apreendido pela disciplina Bases
Teóricas e percorrido, deste então, pelo pensamento. Pensei, especificamente, em meados da
década de 1970, quando emergiu o movimento que lutou pelo SUS e o conquistou: o
Movimento de Reforma Sanitária. No entanto, percebi que não eu não tinha ferramentas para
22
explorar um Movimento histórico, por meio do planejamento do Formulación em relação
com o SUS que sonho garantido. O caminho possível ao pensamento seria dialogar o
Formulación, “enquanto história”, com a gestão e planejamento do SUS que temos.
A partir de então, o Formulación levou-me a pensar a gestão e o planejamento do SUS
de modo diferente daquele que se edifica sobre uma programação com vistas à adequação dos
recursos que se tem; aquele que se desenvolve de modo desconectado de um futuro
concebível de ser alcançado. O documento ajudou-me a refletir que, provavelmente, uma das
razões pelas quais ainda não alcançamos um sistema de saúde universal e equânime, seria a
ausência de um ponto de partida do planejamento coerente com o SUS. Várias questões se
colocaram deste então, por exemplo, que ponto de partida macro poderia ser pensado por um
coletivo em defesa do SUS conquistado?
Esta questão começou a movimentar meu pensamento gerando novos conflitos e
angústia. A sensação era que meu cérebro parecia condicionado a pensar de modo
programático, no afã de encontrar rapidamente insumos e recursos para mudar uma dada
situação (cabe um parêntese para socializar que, embora eu seja enfermeira e atue na
enfermagem na atenção básica do SUS, eu tenho muita afinidade com a gestão). A visão
cristalizada no que “deveria” ser feito, historicamente posta para os trabalhadores-produtores
do SUS colidia com os fundamentos do Formulación, que me levava a pensar e repensar
sobre que estratégias de gestão poderiam efetivamente ser geradas em um planejamento
orientado por um ponto de partida: um ponto de partida militante.
Na insistência por novos caminhos ao pensamento, procurei mergulhar mais e mais no
Formulación de Politicas de Salud da OPAS. Trata-se de um texto complexo, estruturado por
uma lógica que propõe uma construção ao planejamento muito particular, por meio de uma
linguagem quase excessivamente erudita para quem atua nos serviços e está começando a
desvendar o universo da pesquisa acadêmica. No entanto, prevaleceu a vontade política de
compreender, minimamente, a sua lógica.
O modelo básico proposto (Figura 1) pelo CPPS/OPAS para a formulação de políticas
de saúde traz contribuições importantes para o planejamento do SUS, mas parece sinalizar, já
de início, que a definição do ponto de partida para um planejamento estratégico exige um
coletivo aliado estrategicamente, pois é:
[...] extremamente difícil propor um procedimento ou uma sequência que
satisfaça a todos os que têm a responsabilidade de formular políticas de
saúde ou, ainda, que satisfaça totalmente a alguns. Contudo, a experiência
mostra a necessidade de contar com políticas de saúde bem formuladas para
23
que o desenvolvimento das ações adquira solidez e coerência e para que o
planejamento traduza essas decisões em planos, projetos e programas que
coordenem e conduzam sua execução (OPAS, 1975, p. 35, tradução nossa).
Figura 1 - Esquema Geral de Formulação de Políticas do CPPS
1 2 3 4 5
Fonte: Elaborado pela autora readaptado de OPAS (1975, p. 36).
Aproximando as leituras iniciais do documento da noção de ponto de partida, focando
para uma determinada política pública a ser planejada, vê-se que ponto de partida é condição
inicial necessária para a formulação de uma política. Não qualquer ponto de partida, mas um
concebido e concebível para se chegar onde se quer - uma imagem-objetivo (I.O.):
[...] a imagem-objetivo representa uma situação futura ideal ou desejada, que
não está condicionada pela disponibilidade presente de recursos nem por
prazos ou tempos determinados [é] a configuração que, a partir de um
presente determinado, situa-se na periferia do futuro concebível [...] Não é
uma construção de uma imaginação sem ataduras, mas, sim uma situação
que se julga desejável e possível de alcançar (OPAS, 1975, p. 35-37,
tradução nossa).
Corresponde a uma meta ativa, a ser buscada mediante a atuação consciente e
planejada. Refere-se tanto à situação de saúde quanto à estrutura e ao funcionamento dos
Serviços de Saúde. Os elementos que contribuem para a formulação da I.O. são ensejados
pelo diagnóstico situacional e primordialmente os valores políticos e ideológicos
Imagem-
Objetivo
Formulação de
Proposições
Análise das
Proposições
Estratégia
Formalização
das Políticas
O “desenho”
de um futuro
no qual se
quer chegar
a
n
á
l
i
s
e
s
d
e
f
a
c
t
i
b
i
l
i
d
a
d
e
e
c
Formulação
Preliminares
(Quadro 1 e
Figura 2)
Factibilidade: análise
das questões operacionais
(tecnologias disponíveis)
Coerência:
convergência, sinergia,
ausência de contradições
Viabilidade: análise
sociopolítica
a
n
á
l
i
s
e
s
d
e
f
a
c
t
i
b
i
l
i
d
a
d
e
e
c
Característica de meio
para um fim (a
política). É o “como
fazê-lo” pertencente
ao âmbito do “que
fazer”
a
n
á
l
i
s
e
s
d
e
f
a
c
t
i
b
i
l
i
d
a
d
e
e
c
24
correspondentes em última instância ao projeto societário da força social que a constrói
(RIVERA, 1987).
Na gênese da I.O., podem-se identificar dois elementos básicos: a ideologia e o
conhecimento da situação de saúde:
Efetivamente, enquanto os componentes da situação de saúde são os sujeitos
deste conhecimento (estado de saúde da população; estrutura e
funcionamento do sistema de serviços de saúde; produtos que o sistema de
serviços de saúde proporciona à população), as categorias que se
estabelecem para a análise de cada um desses sujeitos não são politicamente
neutras, nem é assim a forma de processar e de resumir a informação obtida.
Por outro lado, o conhecimento da situação existente é o objeto de
valorizações (ideologia) que identificam as áreas-problema que serão
tomadas em consideração. [...] O conhecimento da situação de saúde – no
qual, como se tem visto – intervém a ideologia – interage com os valores na
medida em que se precisa e se aperfeiçoa a imagem da situação desejada na
periferia do futuro concebível (OPAS, 1975, p. 38, tradução nossa).
Neste momento inicial do processo de formulação de políticas de saúde é oportuno
que ocorra uma interação da política e da técnica:
O conhecimento da situação de saúde, que possui o nível político, confronta-
se e modifica-se diante da informação diagnóstica que lhe fornece o nível
técnico, o qual, por sua vez, adequa seu diagnóstico à intenção e necessidade
do nível político num processo interativo de duração bastante variável. O
diagnóstico, resultante desse processo de interação é, não só um elemento
essencial da I.O., mas, também, um elemento básico para o processo de
planejamento (OPAS, 1975, p. 39, tradução nossa).
A explicação situacional deve ser realizada tendo em vista fornecer elementos para a
mudança da situação encontrada. Ela deve ajudar a discriminar os níveis da realidade sobre os
quais será necessário atuar para avançar na modificação sistêmica. Em síntese, “a definição da
I.O. representa o ponto de partida da formulação política, na medida em que o próprio
diagnóstico de situação é delineado em função dos interesses da I.O” (RIVERA, 1987, p.
450).
Uma vez estabelecida, no limite do futuro concebível, uma visão “sintética” de uma
nova situação do sistema de serviços de saúde, da relação entre seus produtos e do estado de
saúde que se deseja alcançar, inicia-se o processo de formulação preliminar da política que
inclui a execução de análise de viabilidade, análise de coerência e fixação de prioridades.
Ou seja, a partir da situação presente estabelece-se “[...] uma série de objetivos que se
pretende alcançar em prazos determinados e uma seleção de meios – ou caminhos - para
25
alcançá-los” (OPAS, 1975, p. 40), os quais “[...] configuram para um futuro determinado, uma
situação de saúde, que se considera, deva e se possa transitar no percurso do caminho até a
I.O.” (OPAS, 1975, p. 40). Essa etapa consiste na definição de todos os projetos que a
princípio podem levar a situação inicial (presente) até o cumprimento da I.O. Os projetos
preliminares têm uma delimitação temporal mais ou menos clara, no sentido de que apontam
para o cumprimento ou para construção de situações intermediárias. Estas correspondem a
desdobramentos da I.O., em situações/momentos parciais de uma estratégia maior que os
engloba (RIVERA, 1987).
A definição do processo da formulação preliminar de proposições políticas origina-se
da comparação entre a I.O. ou a situação intermediária e a situação presente. Para Rivera
(1987, p. 451), a comparação entre a I.O. e o diagnóstico da situação inicial é a “brecha
histórica” que terá que ser superada e que corresponde ao conjunto de mudanças parciais ou
ao projeto global de mudança situacional que o planejamento pretende instituir. Para Da Ros e
Souza (2006, p. 85) a situação inicial corresponde em fazer uma análise de conjuntura, a qual
deve fazer parte do planejamento logo após a construção da I.O. e então seguir construindo
“projetos de situações intermediárias distintas”, que conduzirão à aproximação da I.O.
O documento estudado propõe uma sequência de passos para a construção do processo
da formulação preliminar de proposições políticas do seguinte modo (OPAS, 1975, p. 41-45):
Figura 2 - Sequência das etapas que constitui o processo de formulação preliminar de
proposições políticas do CPPS
1 2 3 4
Problema
Fonte: Elaborado pela autora.
A primeira e a segunda etapas se realizam pela identificação do diagnóstico (situação
presente/atual), os problemas surgem após a definição da I.O. final, a qual serve para
“problematizar” a situação atual. Nesse momento é que a autoridade política define outras
I.O. similares à I.O. final e aponta objetivos e meios para alcançá-las com a intenção de
solucionar os problemas pré-estabelecidos, porém estas se encontram num futuro mais
próximo e definido. No final dessas etapas estarão identificadas as “áreas problemas” e para
Problemas,
objetivos e meios
pré-determinados
politicamente
Preferências ou
prioridades
Preferências ou
prioridades
Identificação e
definição de
problemas
Seleção de
soluções
26
cada uma delas, estados ou situações que as aproximem à situação final desejada [...] “e que
se considere possível de alcançar nos prazos das políticas às quais servirão como objetivos”
(OPAS, 1975, p. 41-42).
Posteriormente, uma vez estabelecido os problemas, objetivos e meios pré-
determinados, também denominados pelo documento como “problemas conjunturais” (OPAS,
1975, p. 45), segue-se para a terceira etapa, a qual estabelece e/ou determina as possíveis
soluções para os problemas identificados nas fases anteriores, ou seja, aqui deverá ser
questionado: quais são as prováveis soluções, meios ou alternativas necessários para o
equacionamento dos problemas, tendo “como referencial o cumprimento da situação-objetivo
e na sua priorização?” (RIVERA, 1987, p. 4)
A seleção das soluções adotam critérios políticos, técnicos e administrativos. O
primeiro leva em consideração o impacto e/ou “repercussão social previsível”, seu efeito
sobre a “sustentação política” e o “custo social” que tal solução trará. Os demais consideram a
eficácia e a eficiência da solução, isto é, prever se a mesma cumprirá seu propósito, total ou
parcialmente, em quanto tempo e com que quantidade de recursos (OPAS, 1975, p. 43).
Por último, se elege as preferências ou prioridades dos problemas, que naturalmente
não se dão ao acaso. Os conjuntos dos problemas, já com suas correspondentes soluções,
servirão de base para determinar ações concretas de acordo com sua importância ou primazia,
e este(s) problema(s) prioritário(s), por sua vez, irão privilegiar outros que são condição
prévia para solucioná-lo(s) (OPAS, 1975, p. 44). Cabe relembrar que o critério mais
importante para se eleger os meios, os objetivos, as prioridades e/ou preferências, é a
capacidade que estes terão para provocar a mudança necessária ao alcance da I.O. Esses
conjuntos de problemas e soluções ordenados, conforme ao cumprimento da I.O., deverão por
fim se transformar em proposições políticas que servirão para orientar todas as ações
subsequentes.
27
Quadro 1 - Formulação preliminar de proposições políticas
Insumos principais Etapa Produto
Decisão Política
►
Problema, objetivos e meios
pré-determinados
politicamente
▼
. Imagem objetivo
.. Situação atual
... Problemas, objetivos e
meios pré-determinados
politicamente
.... Problemas
Conjunturais
Identificação e definição
dos problemas
►
Problemas
▼ ▲
. Imagem objetivo
.. Problemas
... Impacto sociopolítico
.... Tecnologia e recursos
Seleção de soluções
conforme os critérios de
eficácia e eficiência
►
Soluções
▼
. Valorização política dos
problemas e suas
soluções
Ordenação prioritária
conforme a
“importância”
►
Prioridades e preferências:
conjunto ordenado de
problemas e soluções
▼ ▲
Critérios técnicos e
administrativos
Ordenamento sequencial
conforme a procedência
funcional
►
▼
Prioridades e Preferências Construção de
proporções políticas a
partir das prioridades e
preferências, definindo
objetivos e meios
para cada um dos
problemas e soluções
►
Formulação preliminar de
proposições políticas
Fonte: OPAS, 1975, p. 45, tradução nossa.
Definidos os projetos preliminares, é necessário submetê-los às análises de
factibilidade e coerência e posteriormente a análise de viabilidade.
A factibilidade é considerada no momento de selecionar a solução do problema
correspondente, principalmente no que diz respeito à existência de tecnologia disponível, ou
seja, a possibilidade de cumprimento de cada proposição – “com eficácia e eficiência” – irá
depender da tecnologia disponível, recursos disponíveis e organização técnica administrativa
e técnico operacional adequada. Vale ressaltar que a tecnologia, os recursos e a organização
que deverão ser considerados nesta análise, são aqueles que existirão durante o processo de
execução das ações e não aqueles existentes na situação presente. (OPAS, 1975, p. 47) Para
28
Rivera (1987, p. 454-455) essa análise consiste em responder a três perguntas e caso as
respostas destas sejam positivas estará assegurada a factibilidade:
- há disponibilidade de recursos para implementar esses projetos??
- há disponibilidade de tecnologia e de insumos técnicos-científicos
(incluindo conhecimentos) para realizar tais projetos?
- a estrutura administrativa e gerencial existente apresenta condições de
implementação de tais projetos ou será necessário promover uma (macro)
adequação de tal estrutura?
Nessa etapa algumas proposições preliminares são descartadas e outras modificadas e
deverão então ser submetidas à análise de coerência, a qual consiste na “avaliação do grau de
consistência e/ou compatibilidade interna dos diferentes projetos” objetivando a eliminação
de proposições inconsistentes com o conjunto setorial. (RIVERA, 1987, p. 455) Nessa etapa
se analisam a coerência interna e também a coerência externa:
A coerência, no sentido em que é utilizada neste documento, é mais que a
relação ou conexão de umas coisas com outras. O nível mínimo de coerência
é a compatibilidade, a ausência de contradição. Porém, graus maiores de
coerência abrangem a convergência, a sinergia e, até a potenciação que uma
ação gera sobre os efeitos de outra. Quando se examina a coerência de uma
determinada proposição política, em si mesma, deve-se entender coerência
como ausência de contradições lógicas. Quando a análise indaga, na relação
entre cada uma das proposições com cada uma das outras, ou entre cada uma
das proposições e o conjunto das mesmas, coerência pode significar
compatibilidade, convergência, sinergia ou mútua potenciação de efeitos.
Até aqui, a análise tem-se limitado às políticas de saúde (coerência interna);
estende-se, então, o âmbito à sua relação com as políticas de outros setores,
ou com o conjunto total de políticas nacionais (políticas globais, políticas de
desenvolvimento), falando-se, então, de “coerência externa.” (OPAS, 1975,
p. 48).
Uma vez que os projetos consigam responder positivamente à questão da coerência,
teremos uma série ordenada de proposições viáveis e coerentes, tanto internas como externas,
e através destas, uma definição geral do “que fazer”, decidido pela vontade da autoridade
política (OPAS, 1975, p. 51). Cabe nesse momento fazer uma análise de viabilidade, que
consiste em fazer uma avaliação da possibilidade política dos projetos, e/ou uma análise
sociopolítica das proposições, ou seja, os recursos políticos disponíveis e necessários para
alcançá-las. Supõe o levantamento dos graus de apoio, rejeição ou indiferença que as políticas
provocam-nos diferentes atores sociais e políticos e na capacidade desses para atuarem no
sentido de viabilizar seus projetos (RIVERA, 1987; CORDONI JUNIOR; CARVALHO; GIL,
2017).
29
Quando se decidiu o “que fazer” e há uma vontade de ação e uma previsão das reações
de grupos sociais envolvidos, é hora de “desenhar uma estratégia” (OPAS, 1975, p. 54).
Estratégia – “arte de dirigir as operações militares” – tem, também, um
sentido figurado, “arte ou traçado para conduzir um assunto”. De outra parte,
a extensão, a quase toda a sociedade, dos esforços exigidos pela guerra,
ampliou a concepção castrense de estratégia, ligando-a, cada vez mais, a
uma seleção de meios, intensidades e oportunidades de ação ou dissuasão,
que exige a dialética de vontades enfrentadas. [...] A estratégia tem
características de meio para um fim (a política). É o “como fazê-lo”
pertencente ao âmbito do “que fazer”. O planejamento, enquanto
instrumento, trabalhará sobre a decisão política ordenada, em sua sequência
ou intensidade, pela estratégia e preparada para enfrentar as situações
previsíveis, não só segundo as possibilidades do momento, no qual, às vezes,
“a jogada está forçada”, mas fundamentalmente segundo condutas pensadas
frente a todas as situações previstas (OPAS, 1975, p. 55-57, tradução nossa).
Em síntese, a sequência didática exposta, revela que para cada proposição, existe certa
ordem temporal e certa ordem de primazia, assim como a previsão de diversos atores sociais
frente aos objetivos da proposição e aos meios que a estabelece. Na análise de viabilidade são
determinados os recursos que existem ou existirão para o desenvolvimento das ações, as quais
também suscitarão reações de atores sociais referidos tanto às mesmas ações como suas
consequências. Na realidade, os organismos de planejamento são os que mais colaborarão
com o nível político no diagnóstico e na previsão, nas análises de factibilidade e coerência, de
viabilidade e no desenho da estratégia.
Cabe aqui ressaltar que o CPPS permaneceu quase clandestino, já que preconizava a
análise sociopolítica da situação que seria o objeto do planejamento. Tais análises requeriam
um ambiente democrático e, naquele momento histórico, quase toda a América Latina estava
sob o julgo de ditaduras militares. No final da década de setenta, com o enfraquecimento do
autoritarismo ditatorial, no Brasil, um novo contexto começa a surgir e se fortalecer por meio
do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira (MRSB), e, posteriormente, com as eleições
diretas para os governadores, em 1982, essa conjuntura favoreceu o pensar propostas para o
planejamento estratégico na área da saúde (CORDONI JUNIOR; CARVALHO; GIL, 2017).
O surgimento e fortalecimento desse novo contexto também foi impactado pela valorização
da Atenção Primária a Saúde (APS) no contexto mundial que fortaleceu as primeiras
iniciativas de descentralização dos serviços de sistemas nacionais de saúde (LIMA, 2013;
CORDONI JUNIOR; CARVALHO; GIL, 2017).
30
3.2 Quando a Normalização Hegemoniza no Processo Histórico: normas, pactos e
decreto para a organização dos SUS
“[...] é preciso continuar pedalando
enquanto se conserta a bicicleta [...]”
Ao analisar historicamente o arcabouço normativo-operacional do SUS, percebi que
um dos grandes desafios enfrentados ao longo do tempo tem sido a (re)definição das
atribuições e das competências dos gestores das três esferas de governo. Acredito que isto se
deva, especialmente, à escolha constituinte por um federalismo baseado em uma ordem
institucional que confere autonomia político-administrativa aos estados e municípios, defende
a execução descentralizada das políticas públicas, mas centraliza a formulação dessas
políticas (ARRETCHE, 2012) e o poder decisório fiscal na União (SOUZA, 2005) e, ainda,
pela falta de uma cultura de planejamento no setor.
Penso que não refletimos e/ou planejamos o suficiente sobre a polaridade de efeitos
existentes entre organizar um sistema e ordená-lo de modo descentralizado. Parto do
pressuposto de que, no momento em que o SUS tornou-se uma “política oficial” na
constituinte, o caminho para sua construção efetiva não estava plenamente definido,
principalmente no que se refere à distribuição federativa de recursos e capacidade técnica para
assumir as responsabilidades da “nova política”. Por força disto, foram e ainda têm sido
elaborados, muitos dispositivos normativos demarcando os limites da tomada de decisão de
cada gestor no seu âmbito de atuação. Esta configuração operacional acaba criando brechas e
possibilidades para cada um fazer ou não fazer “do seu jeito” de acordo com as suas posições
político-ideológicas e receitas dos recursos constitucionais a eles vinculados. Na visão de
Lima (2013), o produto desta configuração gerou e tem gerado dilemas federativos nas
relações entre os entes federados, em nível político, fiscal e administrativo.
Na década de 1980, o amplo movimento pela redemocratização do Brasil
comprometeu-se com a elaboração de uma nova Constituição Federal (CF). Este
compromisso foi expresso no Manifesto à Nação anunciado pelos partidos que compunham a
Aliança Democrática, constituída em prol da candidatura presencial de Tancredo Neves.
Durante vinte meses, o Congresso Nacional e Brasília impulsionaram um intenso exercício de
participação política, visando à tessitura de uma nova carta constitucional. Para delinear uma
primeira versão da Constituição, a Assembleia Nacional Constituinte concebeu vinte e quatro
subcomissões que, posteriormente, aglutinaram-se em oito comissões, seguida de uma
31
comissão de ordenação. As regras para o funcionamento da Constituinte previram também a
possibilidade de recebimento de propostas externas ao Congresso, desde que contassem com a
assinatura de 30 mil eleitores, bem como o envio de propostas pelo correio (SOUZA, 2002a).
Considerada a mais circunstanciada das Constituições brasileiras, a Constituição
Federal de 1988 “regulou princípios, regras e direitos” (SOUZA, 2005, p. 109). Em seu Art.
18, define que “[...] a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil
compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos nos
termos desta Constituição[...]” (BRASIL, 1988, grifo nosso). Na Seção II, da Saúde,
reconheceu o Sistema Único de Saúde, conquistado na VIII Conferência Nacional de Saúde,
de 1986:
Seção II
Da Saúde
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação.
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao
Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação,
fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou
através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito
privado.
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede
regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de
acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem
prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade (BRASIL, 1988).
Para que as determinações expressas nos Artigos acima ecoassem em ações e serviços
públicos do SUS, seria necessário positivá-las em leis ordinárias, isto é, a concretização das
ações e serviços do SUS reconhecido na CF estaria na dependência de regulamentação
(CARVALHO, 2001).
Duas leis orgânicas foram publicadas no Diário Oficial da União (DOU) dois anos
após a promulgação do texto constitucional: a Lei 8.080/90 e a Lei 8.142/90. Ambas foram
objeto de muita disputa política e só foram sancionadas no segundo semestre de 1990
(ANDRADE, 2001). A primeira “[...] dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e
recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá
outras providências [...]”. Esta teve que ser complementada, devido aos vetos que recebeu do
então presidente Fernando Collor de Mello, por meio de uma segunda lei que “[...] dispõe
32
sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as
transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área de saúde [...]” (BRASIL,
1990a; 1990b).
De acordo com essa legislação, o SUS tem direção única, sendo exercida em cada
esfera de governo pelos seguintes órgãos: no âmbito da União, pelo Ministério da Saúde
(MS); no âmbito dos estados e Distrito Federal, pela respectiva secretaria de saúde ou órgão
equivalente e no âmbito dos municípios, pela respectiva secretaria de saúde ou órgão
equivalente. Compete ao SUS, entre outros, prestar assistência às pessoas por intermédio de
ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com realização integrada das ações
assistenciais e das atividades preventivas, incluindo as ações de vigilâncias sanitária e
epidemiológica, saúde do trabalhador e assistência terapêutica integral (CARVALHO et al.,
2017). O contexto de execução do Sistema é o federalismo cooperativo (ARRETCHE, 2012).
O sistema federativo brasileiro é constituído por três instâncias governamentais
autônomas: União, 26 estados, o Distrito Federal e 5.570 municípios (REIS et al., 2017).
Segundo Campos (2014), entre os países com sistemas universais de saúde, somente o Brasil
organiza seu sistema de saúde com base na autonomia de três governos federados mais
Distrito Federal. Para Sousa e Castro (2017), países unitários regionalizados executam o
planejamento e a gestão regionais de seus sistemas de saúde, por meio de desconcentração e
não de descentralização em nível municipal. Na Espanha, por exemplo, a regionalização do
sistema de saúde se dá em nível estadual, e na Itália, em âmbito regional. Na visão de
analistas da redemocratização, o federalismo brasileiro pós-1988 “tem uma natureza
particular” que compromete a efetividade do Estado na garantia de políticas públicas
(ARRETCHE, 2012, p. 173). No entanto, Arretche (2012) chama a atenção para a
importância de não se dimensionar em demasia esta natureza, uma vez que a existência de
profundas desigualdades regionais e a herança de oligarquias locais levaram à esta escolha
federativa, em que a autoridade para a formulação das políticas e as tomadas de decisão sobre
as mesmas políticas estão nas mãos do governo central e a execução das políticas públicas
está sob a alçada dos governos locais.
Em que pese a coerência desta linha compreensiva, a organização tríplice, com a
autonomia das esferas de governo, tornou complexa a construção do sistema de saúde, pois
municípios, estados e União não apresentam relação de hierarquia entre si (DOURADO;
ELIAS, 2011). Os munícipios tornaram-se os principais atores/executores do sistema, e essa
organização, tendo como esfera principal o município, dificulta a oferta, resolutiva e em
tempo oportuno, de ações e de serviços de saúde (MIRANDA; MENDES; SILVA, 2017).
33
Percebe-se, em visita a artigos nacionais, que o texto constitucional fortaleceu os
atores municipais na arena política e colocou novos desafios para os processos de condução
de políticas públicas. Se, por um lado, abriu possibilidades de transformação da relação
Estado e sociedade e de maior experimentação em nível local, por outro sabe-se que a maioria
dos municípios brasileiros, de pequeno porte populacional, não possuí arrecadação própria
significativa e depende de transferências intergovernamentais de recursos, o que acaba
resultando em limitada capacidade para aumentar seu grau de autonomia política e financeira
a partir do processo de descentralização (LIMA, 2013).
Para Rodrigues (2014) a diversidade de municípios não foi considerada, ao longo do
desenvolvimento do processo de descentralização, visto que, muitas cidades não possuíam
população suficiente para implantar um sistema de saúde propriamente dito, com diferentes
níveis de complexidade de atenção. Vale ressaltar que 80% das cidades brasileiras têm menos
de 30 mil habitantes (IBGE, 2016), e, portanto, os municípios, como já dito, dependem dos
repasses do governo federal para sustentar a sua estrutura de saúde (MIRANDA; MENDES;
SILVA, 2017).
Afinal, temos um Sistema centralizado e descentralizado? Sim, com base em Arretche
(2012) temos um SUS que centraliza a arquitetura de suas políticas públicas e a esfera fiscal e
descentraliza, “para governos estaduais e locais autônomos político-administrativamente” a
execução do conteúdo arquitetado. De acordo com Scatena e Tanaka (2001, p. 55):
Em relação ao Brasil, há que se determinar quais são os níveis de
descentralização e de autonomia políticas que têm as esferas regionais
(estados) e municipais e se eles expressam, realmente, a ideia de direito
autônomo. Os níveis sub nacionais tiveram sua autonomia ampliada após
1988, mas ainda se trata de uma autonomia limitada, uma vez que,
principalmente em termos financeiros, grande parte dos estados e a maioria
dos municípios brasileiros são bastante (e às vezes totalmente) dependentes
dos repasses financeiros centrais. É óbvio que por trás dessa relativa
centralização financeira (que já foi muito mais acentuada e impermeável a
questionamentos) está a necessidade da existência, num Estado Federal
democrático, de um governo central com papel redistributivo e redutor de
desigualdades, mas também é inegável que tal situação limita a autonomia
dessas esferas de governo.
Uma vez sancionadas as Leis Orgânicas, pelo então Presidente da República Fernando
Collor de Mello, era chegada a hora de “fazer o SUS acontecer”. Sua regulamentação,
disposta pelas Leis Orgânicas, exigiu a construção de ferramentas operacionais para
materializar o novo sistema e colocar em prática seus princípios: as chamadas Normas
34
Operacionais Básicas (NOBs), instituídas na década de 1990 (BRASIL, 1991; 1992; 1993b;
1996).
A regulação do processo operacional foi realizada pelo Ministério da Saúde (MS) por
meio da normatização, seguidas anualmente de portarias, em geral, associadas a mecanismos
financeiros, objetivando a implantação das políticas pelos gestores municipais (locais) e
estaduais (MACHADO, 2007). Ao longo do tempo, as normas federais foram sendo
complementadas, substituídas e marcadas por debates envolvendo as três esferas do governo e
o Conselho Nacional de Saúde (CNS) (LEVCOVITZ; LIMA; MACHADO, 2001).
As primeiras NOBs, as de 1991 e de 1992, foram editadas pelo Instituto Nacional de
Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS). Este órgão, vinculado ao MS, desde
1990, e mantenedor de um modelo de saúde médico-assistencial/hospitalar desde 1977, havia
recebido a chancela do Ministério da Saúde para editá-las (SCATENA; TANAKA, 2001).
O enfoque da NOB/91, a qual foi regulamentada por resolução nº 258, e publicada no
DOU em 07 de janeiro de 1991, foi dirigida para a normalização de mecanismos de
financiamento do SUS: repasse, acompanhamento, controle e avaliação dos recursos
financeiros do INAMPS para estados e municípios, todos estes considerados fatores de
incentivo ao processo de descentralização. Essa Norma privilegiou o financiamento
principalmente da assistência hospitalar e ambulatorial (BRASIL, 1991; SCATENA;
TANAKA, 2001). Está dividida em quatro partes: a primeira define critérios para o
financiamento da atividade ambulatorial; a segunda define instrumentos de acompanhamento,
controle e avaliação da execução que trata dos: Conselhos de Saúde; dos Fundos de Saúde
aprovados em lei e geridos pelo órgão de saúde, fiscalizados pelo Conselho; Consórcios
Administrativos Intermunicipais; Relatórios de Gestão; Programação e Orçamentação da
Saúde; Planos de Aplicação dos Fundos; Prestação de Contas dos Fundos de Saúde; a terceira
parte descreve sobre o controle e acompanhamento; e a quarta e última parte, traz as
disposições gerais a serem observadas pelos estados e municípios no processo de implantação
da nova portaria principalmente no que se refere ao financiamento (BRASIL, 1991;
CARVALHO, 2002).
O financiamento do SUS, para atividades hospitalares e ambulatoriais, a ser garantido
pelo orçamento do INAMPS, foi organizado em cinco itens:
a) financiamento da atividade ambulatorial proporcional à população;
b) recursos transferidos na forma de Autorização para Internação Hospitalar
(AIHs) a cada unidade executora, proporcional à população;
c) custeio da máquina administrativa do INAMPS/MS;
35
d) custeio de Programas Especiais em saúde;
e) investimentos (despesas de capital), alocados no Plano Quinquenal de
Saúde MS/INAMPS, em lei orçamentária de iniciativa do Poder Executivo
aprovados pelo Congresso Nacional, e em caráter excepcional a critério do
Ministro de Estado da Saúde (BRASIL, 1991).
Para o financiamento das atividades hospitalares (hospitais públicos ou privados
contratados ou conveniados que integram o SUS) foi definido o Sistema de Informações
Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH-SUS) e seu formulário próprio denominado
Autorização de Internação Hospitalar (AIH) (BRASIL, 1991). Esta forma de repasse, por sua
vez, foi considerada por Scatena e Tanaka (2001, p. 58) um instrumento de distribuição
desigual de poder que “favoreceu municípios política e estrategicamente mais importantes, ou
socialmente organizados”. Foi o próprio INAMPS que definiu os critérios demográficos,
epidemiológicos e estrutura física, os quais passariam a orientar o repasse de AIH aos
municípios e estados.
Para o financiamento das atividades ambulatoriais, por sua vez, o INAMPS definiu a
Unidade de Cobertura Ambulatorial (UCA), para cada estado, de “acordo com a população,
capacidade instalada, qualidade e desempenho técnico, econômico e financeiro em períodos
anteriores”, e o pagamento através do Sistema de Informação Ambulatorial (SIA/SUS), via
fundo, aos municípios habilitados pela NOB ou via Secretaria Estadual de Saúde, para aqueles
que não se habilitaram (BRASIL, 1991). O texto da NOB/91 foi orientado pelo Art. 35 da Lei
n. 8080/90:
Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados,
Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes
critérios, segundo análise técnica de programas e projetos:
I - perfil demográfico da região;
II - perfil epidemiológico da população a ser coberta;
III - características quantitativas e qualitativas da rede de saúde na área;
IV - desempenho técnico, econômico e financeiro no período anterior;
V - níveis de participação do setor saúde nos orçamentos estaduais e
municipais;
VI - previsão do plano quinquenal de investimentos da rede;
VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas
de governo (BRASIL, 1990b).
Para o financiamento de investimentos, o INAMPS estabeleceu as Unidades de
Capacitação da Rede (UCR) para fins de definição de valores e reajustes a serem repassados,
de forma automática e regular, aos Estados e Distrito Federal para reposição e modernização
tecnológica dos equipamentos da rede pública estadual e municipal (BRASIL, 1991;
SCATENA; TANAKA, 2001).
36
E, por fim, para estímulo à municipalização do SUS e as ações de Saúde Coletiva foi
criado o Fator de Estímulo a Municipalização (FEM), que corresponderia a 5% do valor da
UCA aos municípios que atendessem aos critérios da Lei n° 8.142/90:
Art. 4°. Para receberem os recursos [...] os Municípios, os Estados e o
Distrito Federal deverão contar com:
I - Fundo de Saúde;
II - Conselho de Saúde, com composição paritária;
III - Plano de Saúde;
IV - Relatórios de Gestão;
V - Contrapartida de recursos para a saúde no respectivo orçamento;
VI - Comissão de elaboração do Plano de Carreira, Cargos e Salários
(PCCS), previsto o prazo de dois anos para sua implantação.
Parágrafo único. O não atendimento pelos Municípios, ou pelos Estados, ou
pelo Distrito Federal, dos requisitos estabelecidos neste artigo, implicará
em que os recursos concernentes sejam administrados, respectivamente,
pelos Estados ou pela União (BRASIL, 1990a).
Os instrumentos de acompanhamento, controle e avaliação da execução da presente
Norma, pelos estados e municípios, trazem de forma incipiente o papel dos Conselhos de
Saúde, dando mais ênfase aos processos burocráticos de prestação de contas do que às
orientações com vistas ao fortalecimento de instituições políticas viabilizadoras da
transparência e controle social (SCATENA; TANAKA, 2001). Os instrumentos enfatizam o
modo como os fundos de saúde serão geridos, fiscalizados e poderão ser aplicados; os
consórcios administrativos intermunicipais; quais aspectos o relatório de gestão precisa
abordar, sendo este um requisito básico para a transferência automática de recursos aos
municípios e da Programação e Orçamento da Saúde (PROS):
2.5.1 – A PROS dos Estados, Distrito Federal e Municípios deve
compatibilizar as necessidades da política de saúde com a disponibilidade
de recursos, buscando melhoria da eficiência e dos procedimentos a serem
seguidos para concretização das ações de saúde em benefício dos usuários.
2.5.2 – A PROS constituirá a base das atividades e ações de cada nível de
direção do SUS, devendo demonstrar as diretrizes, objetivos e metas a
serem atingidos, o diagnóstico das necessidades da população, bem como
as estratégias que levem à obtenção dos objetivos propostos.
2.5.3 – Para a consecução dos objetivos propostos, será de grande
importância a participação ativa no processo de planejamento de todos
quantos executam as ações de saúde, bem como dos que as recebam.
2.5.4 – As diretrizes a serem observadas na elaboração da PROS serão
as estabelecidas pelo Conselho Nacional de Saúde, em função das
características epidemiológicas e da organização dos serviços em cada
jurisdição administrativa (BRASIL, 1991, grifo nosso).
Scatena e Tanaka (2001, p. 60) sintetizam, de modo primoroso, uma crítica à NOB/91:
37
A NOB 01/91 teve seu papel histórico no processo de construção do SUS e
destacou-se como o primeiro instrumento a regulamentar os inúmeros
"espaços abertos" deixados pelas Leis Orgânicas da Saúde. Sua grande
limitação é derivada de sua orientação pelos princípios do INAMPS e de seu
enfoque dirigido fundamentalmente ao financiamento, com valorização das
atividades hospitalares e ambulatoriais, perpetuando a lógica de
privilegiamento da assistência médica (e da concepção de saúde tendo a
doença como referência), que sempre orientou o INAMPS. Além disso, a
forma convenial que permitia a municipalização - termo aditivo entre
INAMPS e prefeituras, excluindo as Secretarias Estaduais - e o controle
exercido pelas Coordenadorias Regionais do INAMPS, representaram uma
barreira à habilitação para a grande maioria dos municípios brasileiros.
Cabe ainda ressaltar uma crítica: a contradição existente em um de seus itens, ainda na
primeira parte quando diz “[...] os Estados, Distrito Federal e Municípios administrarão os
recursos destinados à saúde, cabendo-lhes a responsabilidade na promoção das ações de
saúde diretamente voltadas aos seus cidadãos [...]” (BRASIL, 1991, grifo nosso). Aqui fica
uma pergunta: Como responder pela promoção das ações em saúde se todos os investimentos
posteriormente detalhados foram voltados para a assistência à saúde principalmente nos níveis
de média e alta complexidade? Inclusive a tabela de procedimentos e preços adotada não
previa a remuneração de ações promocionais e preventivas. Para Santos e Andrade (2007) a
NOB/91 foi alvo de muitas críticas por ignorar as disposições da Lei 8.142/90 sobre a
transferência intergovernamental regular e automática a estados e municípios, além de manter
o INAMPS no comando da implementação do SUS e ainda por empregar o pagamento por
produção e não prever uma estratégia para as ações de vigilância epidemiológica e sanitária.
Para Oliveira Júnior (1998, p. 126), “[...] continuou prevalecendo a estrutura de compra de
serviços privados de saúde do INAMPS, agora aplicado aos gestores públicos estaduais e
municipais”. A ênfase ainda permanecia nas atividades curativas do sistema de saúde.
Houve uma reedição da NOB/91, em julho de 91. A NOB/92 deu continuidade a
NOB/91, regulamentada por Portaria nº 234 e publicada no DOU em 07 de fevereiro de 1992,
e teve um ínfimo avanço. Para Carvalho (2002) as modificações nela contidas foram
periféricas, já que, para sua publicação optou-se por um consenso entre o INAMPS, a
Secretaria Nacional de Assistência à Saúde/MS, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde
(CONASS) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), o que
acabou inviabilizando a possibilidade de mudanças em suas questões estruturais “[...] suas
ilegalidades continuariam intocáveis [...]”. Municipalistas chamados a contribuir para sua
38
formulação usaram a expressão: “estamos enfeitando a corda do enforcamento”, uma vez que,
não acreditavam em sua essência (CARVALHO, 2002, p. 74).
Seus objetivos foram “[...] normalizar a assistência à saúde no SUS e dar forma
concreta a instrumentos operacionais à efetivação dos preceitos constitucionais da saúde [...]”.
Por força disto, traz em seu texto introdutório um resgaste dos preceitos constitucionais da
saúde e as leis regulamentadoras do SUS, também a importância do planejamento para o
processo de descentralização, que na NOB/92, é denominado de planejamento integrado das
ações de saúde, além de afirmar que na área da saúde uma política de qualidade e
produtividade é fundamental. Esta NOB deixa claro que será implantado no SUS o Sistema de
Avaliação de Qualidade em Saúde (SAQS) e que este terá como compromisso fundamental o
incremento da qualidade do atendimento e da satisfação do usuário. Ainda descreve como a
municipalização deve ser entendida informando o processo desta para o repasse de recursos
financeiros (BRASIL, 1992):
A municipalização na saúde não deve ser entendida apenas pelo
cumprimento aos critérios, estabelecidos na Lei 8.142/90, para repasse, de
forma regular e automática, dos recursos financeiros federais para cobertura
de ações e serviços de saúde a serem implementados pelos municípios. Ela
deve ser entendida principalmente pela nova responsabilidade do município
de administrar as ações e serviços de saúde em sua área de abrangência,
planejando, decidindo e gerindo os recursos humanos, materiais e
financeiros. É o estabelecimento do comando único do SUS na esfera
municipal.
No que tange ao financiamento, praticamente mantém o que a NOB anterior havia
regulamentado, priorizando o financiamento da assistência médica curativa para atividades
hospitalares e ambulatoriais com repasses baseados em dados populacionais para as AIHs e
além desses, em estrutura física (capacidade instalada) e desempenho financeiro prévio para
as UCAs (BRASIL, 1992).
Vale a pena expor alguns trechos originais dessa NOB. Em relação ao planejamento
(BRASIL, 1992, grifo nosso):
[...] deve ser desenvolvido através de uma metodologia participativa, é a
projeção das ações a serem executadas e a racionalização dos procedimentos
técnico-administrativos, necessários à execução dessas ações.
[...] é de competência das três esferas de Governo e constitui a base para a
execução, o acompanhamento, a avaliação, o controle e a gerência do
sistema de saúde, e pressupõe o conhecimento da realidade existente e dos
instrumentos disponíveis e necessários para se atingir as metas propostas.
39
Assim, o planejamento, além de ascendente, deve ser uma tarefa dos
municípios, estados e União.
[...] Uma das consequências do planejamento será proporcionar o
aclaramento das responsabilidades das três esferas de governo, da
definição da prestação e gestão dos serviços e do aporte dos recursos
financeiros. Dessa forma, o processo de planejamento-orçamentação deve
ser indivisível. Assim, a Programação e Orçamentação em Saúde – PROS, é
essencial enquanto parte integrante e detalhamento dos planos de saúde.
[...] O primeiro passo no processo de planejamento é a análise da realidade
através do levantamento dos problemas de saúde, suas causas e pontos
críticos e os recursos disponíveis: "do que e como as pessoas estão
adoecendo ou morrendo?", "o que deve ser feito para melhorar os
indicadores de vida/morte, saúde/doença?" A seguir são definidos os
objetivos e metas a serem alcançadas e as atividades a serem desenvolvidas
(é importante identificar, nessa fase, os possíveis entraves políticos, técnicos,
administrativos e financeiros para a consecução de cada atividade e do plano
de ação como um todo). Passa-se então à definição dos recursos necessários
e das fontes de financiamento para cada atividade e ao estabelecimento de
um cronograma de execução.
Sobre Produtividade e qualidade (BRASIL, 1992, grifo nosso):
[...] O desenvolvimento das ações de saúde, sejam elas de promoção,
proteção, recuperação ou reabilitação, devem fazer parte do planejamento
integrado das ações de saúde, pois somente através da integralidade das
ações haverá a melhoria da qualidade da assistência.
[...] Acima de tudo, o Sistema de Avaliação de Qualidade em Saúde deverá
ter um caráter pedagógico para todos os envolvidos, dentro do qual o
incremento à qualidade deve ser mais do que incentivado: provocado, e
cuja avaliação constituirá uma responsabilidade conjunta dos gestores,
prestadores e usuários.
Em síntese, essa NOB traz de forma muito clara que os municípios têm a
responsabilidade primária da execução das ações e gestão dos serviços de saúde; os estados
têm por função “controlar o controle municipal” e de assumir essa responsabilidade na
incapacidade municipal de fazê-la e; à União cabe a tarefa de fornecer coordenação técnica
aos demais entes federados. Traz definições do SIA e SIH, mantendo o controle e a
fiscalização da execução orçamentária pelo INAMPS conforme a NOB/91 e ainda reconhece
a importância do planejamento nos campos da promoção, proteção e recuperação da saúde,
levando em consideração o conceito abrangente de saúde definido na Constituição,
acreditando que somente através deste haveria melhoria da qualidade da assistência (BRASIL,
1992; BRASIL, 2011c). Aqui cabe novamente a pergunta: Como responder pela promoção
40
das ações em saúde se todos os investimentos foram voltados para a assistência à saúde
principalmente nos níveis de média e alta complexidade?
Essas duas NOBs sem dúvida representaram um novo processo para a
operacionalização das ações e serviços do SUS e intencionaram a descentralização, mas
apesar disso, esta não ocorreu de modo amplo. A NOB 91/92 vigorou entre janeiro de 1991 e
novembro de 1994 e, o volume de municípios que assinaram convênios com o INAMPS foi
bastante reduzido, sendo 321 em 1991, 565 em 1992 e 188 em 1993, totalizando1.074
municípios ao final de 1993, o que correspondia a apenas 21,6% do universo local do país
(OUVERNEY, 2015).
Eram tempos difíceis, a conjuntura do setor de saúde no início da década de 1990 foi
marcada pelas dificuldades impostas pelo Governo Collor que retardou em dois anos a edição
das leis orgânicas e ainda vetou partes importantes desta para a operacionalização do SUS
conquistado pelo MRSB; adiou o debate com a sociedade civil ocorrido na 9ª Conferência
Nacional de Saúde; manteve as estruturas centralizadas do INAMPS; reduziu os recursos
federais para a saúde, tudo isso, dentre outros aspectos, para retardar a descentralização. Por
força disto, elevaram-se as pressões por parte de militantes do setor e a discussão de que os
Municípios e Estados não poderiam ficar recebendo por produção e mediante convênios. A
descentralização era uma diretriz do texto constitucional, porém, como já dito, sua efetivação
encontrava barreiras políticas, financeiras e técnicas expressivas (LIMA, 2013; OUVERNEY,
2015).
Buscando vencer esse desafio, outra norma foi criada no ano seguinte: a NOB/93 pela
Portaria nº 545, de 20 de maio de 1993 (BRASIL, 1993b). Em sua introdução ela traz
claramente qual o objetivo mais importante da descentralização:
[...] o objetivo mais importante que se pretende alcançar com a
descentralização do SUS é a completa reformulação do modelo assistência
hoje dominante, centrado na assistência médico-hospitalar individual,
assistemática, fragmentada e sem garantia de qualidade, deslocando o eixo
deste modelo para a assistência integral universalizada e equânime,
regionalizada e hierarquizada, e para a prática da responsabilidade sanitária
em cada esfera de governo, em todos os pontos do sistema (BRASIL,
1993b).
Esta norma significou, expressivamente, um avanço. Mesmo com o agravamento da
crise financeira do setor de saúde, com a interrupção dos repasses da previdência em 1993, foi
no Governo Itamar Franco que se verificaram as condições políticas propícias para o início
41
efetivo da transferência de atribuições e recursos para os estados e, especialmente, municípios
(OUVERNEY, 2015).
Foi aprovada pelo CNS, em janeiro de 1993, seguida de um longo processo de
discussão e negociação com um conjunto de atores da área da saúde que se dedicaram em
analisar, questionar e oferecer sugestões para o aperfeiçoamento da proposta, as quais em sua
maioria foram incorporadas e originaram a versão final de um documento denominado
“Descentralização das ações e serviços de saúde: A ousadia de cumprir e fazer cumprir a lei”,
aprovada em 15 de abril de 1993 (BRASIL, 1993a; 1993b). A formulação da estratégia para a
descentralização descrita nesse documento foi pautada nas recomendações da 9ª Conferência
Nacional de Saúde, ocorrida em agosto de 1992 com o tema: “Municipalização da Saúde,
condição indispensável para a efetiva implantação do SUS” (CARVALHO et al., 2017).
Originária de um Grupo Especial de Descentralização (GED), o qual elaborou uma
proposta de operacionalização dos preceitos legais que fundamentam o SUS e editada pelo
próprio MS, a NOB/93, buscou não somente regulamentar o financiamento, mas também o
processo de descentralização da gestão dos serviços e ações no âmbito do SUS. Foi o primeiro
instrumento de normalização voltado para a definição do gerenciamento do processo de
descentralização nos três níveis de governo, através da Comissão Intergestores Tripartite
(CIT), Comissões Intergestores Bipartite (CIB) e dos Conselhos Municipais. Ainda que tenha
preservado o repasse por produção de serviços, ela insistiu em um tipo de repasse que ia ao
encontro da descentralização: a transferência “fundo a fundo” (BRASIL, 1993b).
Também criou as condições de gestão para os municípios: Gestão Incipiente, Gestão
Parcial e Gestão Semiplena e; para os estados: Gestão Parcial e Gestão Semiplena, a fim de
assegurar viabilidade política à execução das mudanças necessárias, criando diferentes fases
para a habilitação, respeitando as condições técnicas e operacionais dos municípios e estados.
Para que esse processo se desse, a NOB-93 coloca para cada uma das situações requisitos,
responsabilidades, que deveriam ser cumpridas e prerrogativas que passariam a usufruir.
Passada essa fase transicional, a seguir, introduzir-se-ia a gestão plena do sistema, que era a
finalidade máxima, em que se cumpriria a lei, em sua totalidade (BRASIL, 1993b;
CARVALHO, 2002; OUVERNEY, 2015).
É comum omitir-se da NOB-93 a forma de gestão, denominada gestão plena.
Todos os quadros explicativos da NOB 93 e do documento que a precedeu
fala nessa situação, cuja característica seria, principalmente, a gestão que
cumprisse os princípios legais de forma inteira. Nessa situação: o
financiamento seria de acordo com o art. 35 da 8080, todos os recursos (teto
financeiro) repassados fundo a fundo, contratando e pagando serviços
42
terceirizados, quando necessários, complementarmente, gerenciamento
completo da rede, planejamento controle e avaliação próprios, com
cumprimento dos requisitos legais do plano, fundo, conselho de saúde
(aprovando plano e contas), relatório de gestão e outros (CARVALHO,
2002, p. 76).
Com a NOB/93, iniciava-se um processo de gestão municipal quase plena. Nesse tipo
de gestão o município teria que constituir e comprovar serviços de controle, avaliação,
auditoria, com médicos designados para as AIHs e de procedimentos ambulatoriais de alto
custo, capacidade técnica para operar os sistemas de informação SIA, o SIH e a central de
leitos (BRASIL, 1993a). Cada município brasileiro seguiu um curso próprio: uns já se
preparavam para instituir o novo formato de gestão, outros viviam limitações que implicavam
em um tempo maior para essa medida. Para Almeida (1995, apud SCATENA; TANAKA,
2001, p. 65), o processo de adesão dos estados e municípios, para a presente norma, com
início somente em junho de 1994, foi positivo, pois:
[...] não é e não representa uma simples regulamentação administrativa e
financeira. Significa, na realidade, a expressão de uma decisão política de
procurar realizar os princípios e diretrizes do SUS, particularmente quanto à
descentralização de gestão [...].
Vale ressaltar que em novembro de 1995, 2.750 municípios já estavam habilitados em
suas formas de gestão, sendo que 52 municípios estavam habilitados na condição de gestão
semiplena (BARROS, 1997). No início de 1996, os municípios em gestão semiplena já
somavam 92, representando 13% da população brasileira (BARROS, 1996).
Em síntese, a construção e estratégia da NOB/93 trouxeram mudanças significativas
no processo de descentralização: a extinção do INAMPS, a efetiva implantação das comissões
CIT e CIB, a transferência de recursos “fundo a fundo”, além de favorecer a realização de
mudanças organizacionais importantes na estrutura administrativa do Ministério da Saúde
(OUVERNEY, 2015). Para o autor, as transformações realizadas na trajetória do processo de
descentralização do SUS ao longo do Governo Itamar Franco, nos anos de 1993 e 1994, foram
impulsionadas pelos atores da Reforma Sanitária que souberam aproveitar uma “janela de
oportunidades no contexto federativo nacional e na correlação de forças do setor” a fim de
promoverem uma “passagem de um padrão concentrado de exercício das funções de política
de saúde de coordenação vertical e exclusiva na esfera federal para outro que pode ser
caracterizado como um federalismo integrado municipalista”, ou seja, os governos
subnacionais, em especial, os municípios, que passaram a atuar efetivamente como gestores
43
do SUS a partir de uma dinâmica tripartite de compartilhamento decisório e de
responsabilidades, apesar de a União ter mantido expressiva capacidade indutiva e regulatória
(OUVERNEY, 2015, p. 225).
Três anos depois da edição da NOB/93, o Governo Federal lançou a NOB/96,
mediante a Portaria n° 2.203, publicada no DOU em 06 de novembro de 1996, com a
pretensão de dar continuidade ao processo de consolidação do SUS. Novos ventos, novos
atores, novo governo: Presidente da época, Fernando Henrique Cardoso (FHC). De forma
diferente do que ocorreu na formulação da NOB/93, em que se formou um grupo à parte, o
GED, para insular o processo das influências retrógradas da burocracia técnica federal, então
oposicionista em relação à descentralização, no processo de construção da NOB/96 as
atividades inicias de consolidação textual são realizadas diretamente no âmbito do MS
(OUVERNEY, 2015).
O processo de elaboração até o início da implantação durou 03 anos, de 1995 até 1997
e apesar de ter sido publicada no início de novembro de 1996, sua adesão ocorreu apenas no
primeiro semestre de 1998, após a publicação de uma Instrução Normativa n° 01/98 que “[...]
regulamenta os conteúdos, instrumentos e fluxos do processo de habilitação de Municípios, de
Estados e do Distrito Federal às novas condições de gestão criadas pela Norma Operacional
Básica do Sistema Único de Saúde - NOB SUS 01/96 [...]” pelo então Ministro da Saúde
Carlos César de Albuquerque, em 02 de janeiro de 1998 (BRASIL, 1998). Várias portarias
foram publicadas entre 1997 e 1998 as quais acabaram por alterar significativamente o
conteúdo original da NOB, particularmente no que se refere às formas e aos instrumentos de
financiamento específicos nela previstos. Pode-se dizer que a NOB/96 nunca foi
integralmente implementada em seu modelo inicial. Por conta disto, Carvalho (2001, p. 442)
chega a denominá-la de “NOB/98” (LEVCOVITZ; LIMA; MACHADO, 2001; BRASIL,
1998).
Nesse período houve uma “inflexão na dinâmica federativa” no Brasil em direção ao
fortalecimento expressivo de tendências centralizadoras, impulsionando a formação de um
novo regime de relações intergovernamentais entre a União e os governos subnacionais no
plano legislativo, fiscal e de coordenação de políticas públicas. As oportunidades que
favoreceram a retomada do ideal descentralizador da Reforma Sanitária e que permitiu ao
municipalismo assumir o comando nacional do SUS, na era Itamar Franco (1993-1994),
cedeu lugar a uma conjuntura marcada pela recuperação do papel da União no jogo federativo
na era FHC (1995-2002) (OUVERNEY, 2015, p. 296; BARROS, 2001).
44
No período de 1995 e 1996, ao longo da Gestão do Ministro da Saúde Adib Jatene,
observou-se a predominância de preferências por menor regulação federal em virtude da
presença de uma elite no comando federal cuja formação e trajetória possuíam raízes
profundas no Movimento da Reforma Sanitária. No período seguinte de 1997 a 2000,
correspondente às gestões de Carlos Albuquerque e principalmente José Serra, prevaleceu às
preferências por um MS mais forte e com maior capacidade de regulação sobre os estados e
municípios. Essa tendência se sustentava em uma elite federal na direção do MS, em sua
maioria, com formação e trajetória externa ao movimento de formação do SUS e que
concentrou seus esforços na busca pela vinculação de recursos dos governos subnacionais e
na revisão do modelo adotado na NOB/96 em um processo decisório onde o MS teve
significativo diferencial de poder e conseguiu inserir novas regras que fortaleciam suas
capacidades indutivas (OUVERNEY, 2015; CARVALHO, 2002).
A NOB/96 colocou como finalidade primordial “[...] promover e consolidar o pleno
exercício, por parte do poder público municipal e do Distrito Federal, da função de gestor da
atenção à saúde dos seus munícipes, com consequente redefinição das responsabilidades dos
Estados, do DF e da união [...]" (BRASIL, 1996, p. 6). Conforme Andrade, Pontes e Martins
Junior (2000, p. 88) esta norma obrigou um “[...] aperfeiçoamento da gestão dos serviços de
saúde no país e na própria organização do sistema, visto que o município passou a ser, de fato,
responsável imediato pelo atendimento das necessidades e demandas de saúde de sua
população e das exigências de intervenções saneadoras em seu território [...]”. Implementou o
Piso da Atenção Básica (PAB) para o financiamento das ações de Atenção Básica (AB)
desenvolvidas pelos municípios, representando a introdução de uma lógica de financiamento
per capita pela primeira vez no SUS; criou um leque de incentivos específicos para áreas
estratégicas, como exemplo, o incentivo aos Programas de Saúde da Família (PSF) e de
Agentes Comunitários de Saúde (PACS), ações de Vigilância Sanitária: Piso Básico de
Vigilância Sanitária (PBVS) e Índice de Valorização do Impacto em Vigilância Sanitária
(IVISAI) e custeio das ações de epidemiologia e de controle de doenças. Também definiu a
remuneração por serviços prestados (internações hospitalares, ambulatório de alto custo,
vigilância sanitária e epidemiológica) e transferências por convênios para atividade de
epidemiologia e controle de doenças; institui a Programação Pactuada e Integrada (PPI) como
“[...] o instrumento essencial de reorganização do modelo de atenção e da gestão do SUS, de
alocação dos recursos e da explicitação do pacto estabelecido entre as três esferas de governo
[...]” (BRASIL, 1996, p. 18); definiu as condições de gestão para os municípios: Gestão Plena
da Atenção Básica (GPAB) e Gestão Plena do Sistema Municipal (GPSM), e para os estados:
45
Gestão Avançada do Sistema Estadual (GASE) e Gestão Plena do Sistema Estadual (GPSE),
relacionando responsabilidades, requisitos e prerrogativas para cada uma delas (BRASIL,
1996; SOUZA, 2002a; PEREIRA; QUITO, 2004).
Para o modelo de atenção à saúde, a NOB/96 trouxe bases para um reordenamento: da
assistência (atividades prestadas no âmbito ambulatorial, hospitalar e domiciliar), das
intervenções ambientais (vigilâncias e saneamento) e das políticas externas ao setor (emprego,
habitação, educação, lazer e à disponibilidade e qualidade dos alimentos), pressupondo a
incorporação do modelo epidemiológico ao clínico até então vigente (BRASIL, 1996;
SOUZA, 2002a).
Esta norma ainda definiu, de forma clara e precisa, a diferença conceitual entre
gerência e gestão:
Assim, nesta NOB gerência é conceituada como sendo a administração
de uma unidade ou órgão de saúde (ambulatório, hospital, instituto,
fundação, etc.), que se caracteriza como prestador de serviços ao Sistema.
Por sua vez, gestão é a atividade e a responsabilidade de dirigir um
sistema de saúde (municipal, estadual ou nacional), mediante o exercício
de funções de coordenação, articulação, negociação, planejamento,
acompanhamento, controle, avaliação e auditoria. São, portanto, gestores
do SUS os Secretários Municipais e Estaduais de Saúde e o Ministro da
Saúde, que representam, respectivamente, os governos municipais, estaduais
e federal (BRASIL, 1996, p. 8, grifo nosso).
Em síntese, para Barros (2001) a NOB/96 introduziu duas mudanças fundamentais.
Primeiro, a criação do PAB, ampliando o repasse automático no que se refere à AB e, por
outro lado, fragmentando o financiamento em um grande número de "parcelas", seja sob a
forma de parcelas variáveis do PAB ou sob a forma de subtetos para média e alta
complexidade. Para a autora, essa fragmentação criou rigidez para a alocação dos recursos nos
níveis municipal e estadual e reduziu significativamente a capacidade decisória dos gestores
subnacionais por impor condicionalidades para acesso aos recursos em determinadas áreas,
como exemplo, a exigência de implementar programas federais, definidos de modo
centralizado, como é o caso do PSF. A fragmentação do financiamento ainda inaugurou um
processo de “recentralização seletiva”, a qual veio a se consolidar com a edição da Norma
Operacional da Assistência à Saúde (NOAS) no ano de 2001 e reeditada em 2002, as quais
redefiniram funções das esferas de governo e fragmentaram a gestão do sistema segundo
níveis de complexidade tecnológica da assistência, subtraindo ao gestor municipal poder de
decisão sobre determinadas áreas do sistema (BARROS, 2001, p. 309).
46
Apesar disso, ao final do período de vigência da NOB SUS 01/96, mais de 99% dos
municípios brasileiros estavam habilitados a uma das condições de gestão da referida norma,
sendo 89% em GPAB e 10,1% em GPSM. A maior parte dessas habilitações ocorreu ainda
em 1998, no primeiro ano de implantação da NOB/96. Entretanto, o percentual de municípios
habilitados em cada uma dessas condições de gestão foi bastante variável entre os estados,
devido às desigualdades de condições e diferentes modelos de descentralização. Já o processo
de habilitação dos estados foi mais lento e irregular. Em dezembro de 2001, cinco estados
estavam habilitados na condição de GASE e sete estados na condição de GPSE (SOUZA,
2002a).
Para Scatena e Tanaka (2001) o fato de 99% dos municípios brasileiros terem se
habilitado às duas formas de gestão previstas na NOB/96, se por um lado representou um
avanço da descentralização, por outro, gerou grande preocupação, já que, na época 4.849
municípios foram colocados num mesmo patamar, em termos de condições de gestão, mesmo
que apresentassem heterogeneidade política, geográfica, social, cultural e sanitária. Cabe
ainda ressaltar que a NOB/96 se mostrou insuficiente na organização regional dos municípios,
nas palavras de Pereira e Quito (2004, p. 44) “[...] neste momento não se conseguiu uma
organização dos municípios em caráter complementar [...]”. A PPI, proposta pela NOB/96,
que tinha como princípio essa regulação, não foi implementada de maneira que superasse os
problemas burocráticos de acesso à população entre os municípios e/ou estados (ANDRADE,
2001), e foi definida claramente na Norma subsequente.
Para enfrentar essa atomização do SUS em sistemas municipais e estaduais isolados, o
Brasil avançou novamente: instituiu as NOAS editada em 2001 pela Portaria nº 95, de 26 de
janeiro de 2001 e reformulada em 2002 pela Portaria nº 373, de 27 de fevereiro de 2002
(BRASIL, 2001; 2002). Ambas tratam da organização dos sistemas de saúde e do
fortalecimento dos estados como coordenadores de um processo articulado de regionalização
do SUS, ampliando o conceito de distribuição de recursos per capita, a partir de alocação
microrregional. Ainda buscaram estabelecer mecanismos para a garantia da integralidade da
assistência através do fortalecimento da atenção básica (PEREIRA; QUITO, 2004).
A NOAS-SUS teve como objetivo “[...] promover maior equidade na alocação de
recursos e no acesso da população às ações e serviços de saúde em todos os níveis de
atenção", assumindo a regionalização como macroestratégia fundamental para o
aprimoramento do processo de descentralização (BRASIL, 2002).
47
[...] o processo de regionalização deverá contemplar uma lógica de
planejamento integrado, compreendendo as noções de territorialidade na
identificação de prioridades de intervenção e de conformação de sistemas
funcionais de saúde, não necessariamente restritos à abrangência municipal,
mas respeitando seus limites como unidade indivisível, de forma a garantir o
acesso dos cidadãos a todas as ações e serviços necessários para a resolução
de seus problemas de saúde, otimizando os recursos disponíveis (BRASIL,
2001).
Está dividida em quatro capítulos: o primeiro: Regionalização; segundo:
Fortalecimento da capacidade de gestão no SUS; terceiro: Critérios de habilitação e
desabilitação de municípios e estados; e; por último: Disposições transitórias (BRASIL,
2001).
O primeiro capítulo estabelece “[...] o processo de regionalização como estratégia de
hierarquização dos serviços de saúde e de busca de maior equidade”, assim como esse
processo deveria ser compreendido pelos diferentes governos (União, DF, estados e
municípios). Está dividido em cinco alíneas: da elaboração do Plano Diretor de
Regionalização (PDR), da Ampliação do Acesso e da Qualidade da AB, da Qualificação das
Microrregiões na Assistência à Saúde, da Organização dos Serviços de Média complexidade e
o último, da Política de Atenção de Alta Complexidade/Custo no SUS (BRASIL, 2001).
Um dos pontos mais importantes a ser enfatizado é a elaboração do PDR, uma vez
que, através dele, os estados passariam a ter a competência de organizar o fluxo da assistência
intermunicipal, isto é, de organizar os fluxos de referência e contrarreferência, no âmbito dos
níveis de atenção. No que diz respeito à organização da assistência, enfatiza-se a importância
de qualificar e melhorar a resolutividade da AB em todos os municípios brasileiros, a partir da
identificação de áreas estratégicas mínimas, relacionadas a problemas de saúde de
abrangência nacional (o controle da tuberculose, a eliminação da hanseníase, o controle da
hipertensão arterial, o controle da diabetes mellitus, a saúde da criança, a saúde da mulher e a
saúde bucal). A proposta de qualificação de regiões/microrregiões na assistência à saúde tem
a intenção de garantir o acesso a ações resolutivas para além dos limites municipais,
considerando critérios de qualidade e economia de escala. A NOAS-SUS ainda estabeleceu
diretrizes gerais para a organização das demais ações de média e alta complexidade,
preconizando que o PDR compreendesse o mapeamento das redes de referência em áreas
estratégicas específicas (gestação de alto risco, urgência e emergência, hemoterapia, entre
outras) (BRASIL, 2001; 2002).
O segundo capítulo, está dividido em três alíneas: da Programação da Assistência, das
Responsabilidades de cada Nível de Governo na Garantia de Acesso a População
48
Referenciada e do Processo de Controle, Avaliação e Regulação da assistência. Este capítulo
traz instrumentos que pretendem organizar e fortalecer o planejamento dos sistemas de saúde,
entre eles, a PPI, que é um instrumento de alocação de recursos entre os municípios e os
estados, iniciando um processo de negociação das referências e contrarreferências como
forma de garantia de acesso integral e os instrumentos de acompanhamento da garantia de
acesso, através do Termo de Compromisso para Garantia de Acesso (TCGA), o qual, os
gestores assinariam e consequentemente se responsabilizariam pela garantia do acesso aos
munícipes, de acordo com o fluxo definido no PDR e na PPI. Pela primeira vez se trabalhou
com os processos de controle e avaliação como instrumentos de fortalecimento da gestão, de
forma a otimizar os recursos financeiros e a organizar os fluxos definidos, através da
regulação (BRASIL, 2001; 2002; PEREIRA; QUITO, 2004).
O terceiro capítulo reorganiza os critérios e prerrogativas da habilitação de estados e
municípios, sendo diferentes das NOB’s anteriores, pois consideram, além de outros
requisitos, o perfil assistencial dos municípios, de acordo com o papel a ser desempenhado
por ele no PDR. A NOAS-SUS prevê dois tipos de habilitação, conforme a capacidade
resolutiva do município: a primeira, Gestão Plena de Atenção Básica Ampliada (GPABA)
estabelecendo cinco áreas estratégicas: saúde da mulher, saúde da criança, saúde bucal,
controle da diabetes e eliminação da hanseníase, além da obrigatoriedade de possuir
eletrocardiograma e posto de coleta de exames laboratoriais; e a segunda, GPSM
preconizando que o município ofereça um mínimo de procedimentos de média complexidade,
incluindo ultrassonografia, radiologia e odontologia especializada. Estabelece também dois
tipos de habilitação para os Estados: GASE e GPSE. A habilitação dos municípios e estados
às diferentes condições de gestão significa a declaração dos compromissos assumidos por
parte do gestor perante os outros gestores e perante a população sob sua responsabilidade
(BRASIL, 2001; 2002; PEREIRA; QUITO, 2004).
O quarto e último capítulo que trata de disposições transitórias, descreve os prazos
para adequação dos entes federados para todos os requisitos exigidos na presente norma,
permitindo ainda aos municípios que não conseguissem cumprir o prazo de que trata este
item, habilitarem-se de acordo com as regras de habilitação previstas na NOB-SUS 01/96
(BRASIL, 2001).
A partir da publicação da NOAS-SUS 01/01, as Secretarias Estaduais de Saúde (SES),
através do CONASS, e as Secretarias Municipais de Saúde (SMS), através do CONASEMS,
desencadearam diversas atividades de planejamento e de adequação de seus modelos
assistenciais e de gestão aos preceitos estabelecidos, ponderando criticamente os avanços e os
49
desafios que novas diretrizes organizativas trariam para sua realidade concreta. Durante este
percurso, em algumas unidades da federação, foram identificados entraves na
operacionalização de determinados itens, decorrentes das dificuldades para estabelecer o
comando único sobre os prestadores de serviços ao SUS e assegurar a totalidade da gestão
municipal nas sedes dos módulos assistenciais, bem como da fragilidade para explicitação dos
mecanismos necessários à efetivação da gestão estadual para as referências intermunicipais.
Em decorrência da necessidade de viabilizar o debate sobre essas questões, identificadas
como causadoras da distensão ocasionada na implantação da NOAS/SUS 01/01, o processo
de negociação foi reaberto durante o segundo semestre de 2001. Neste sentido, a CIT, em
reunião realizada em 22 de novembro de 2001, firmou acordo contemplando propostas
referentes ao comando único sobre os prestadores de serviços de média e alta complexidade e
o fortalecimento da gestão dos estados sobre as referências intermunicipais. Na mesma
ocasião, deliberou-se pela constituição de um Grupo de Trabalho, com representação
tripartite, com a atribuição de detalhar o acordo e incorporar a NOAS os pontos acordados,
mantendo a coerência do texto. Em 07 de dezembro de 2001 foi feito um relato, por
representantes do MS, CONASS e CONASEMS, aos membros do CNS, acerca da negociação
realizada na CIT e das alterações que dela resultaram. Como consequência, elaborou-se a
chamada NOAS-SUS 01/02. Com o objetivo de facilitar sua utilização, o documento
incorporou definições da regulamentação complementar, relacionada aos temas que foram
objeto do acordo, que, na versão anterior, encontravam-se descritos em documentos
normativos específicos. Enfim, cabe destacar que a NOAS-SUS 01/02, assegurou a
manutenção das diretrizes organizativas definidas pela NOAS-SUS 01/01, no entanto,
procurou oferecer as alternativas necessárias à superação das dificuldades e impasses oriundos
da dinâmica concreta de sua implementação (SOUZA, 2002a). A NOAS-SUS 01/02 se
organiza a partir da proposição de três estratégias articuladas: regionalização e organização da
assistência; fortalecimento da capacidade de gestão do SUS e revisão de critérios de
habilitação; e desabilitação dos estados e municípios (BRASIL, 2002). Ela pretendia avançar
na consolidação do SUS com base no aprimoramento da regionalização do sistema, assentado
em módulos assistenciais, micro e macrorregiões; no reforço do comando único sobre os
serviços em cada território e na organização dos mecanismos de regulação do acesso
(CARVALHO et al., 2017).
Para Pereira e Quito (2004) a publicação das NOAS/SUS 01/01 e 01/02 permitiram
um grande avanço no que diz respeito ao processo de planejamento em saúde e na
regionalização das ações de saúde. Também se notou um movimento no processo de
50
descentralização dos estados, já que estes, na sua maioria, se habilitaram segundo os critérios
nelas previstos. De certo modo, permitiram aos gestores buscar de forma consensuada e
pactuada, a organização dos espaços microrregionais de saúde.
No entanto, observou-se que muitas propostas constantes nos dois planos
preconizados, PDR e Plano Diretor de Investimentos (PDI), como forma de garantir o acesso
dos cidadãos às ações e aos serviços de saúde e a integralidade da atenção em saúde em uma
região, não foram concretizadas e, dessa forma o plano de regionalização da NOAS também
não se efetivou (CARVALHO et al., 2017). O insucesso dessas propostas representou um
impasse no campo da gestão descentralizada, caracterizado pela dificuldade da gestão
municipal em assegurar uma AB resolutiva e acesso à atenção especializada, e da gestão
estadual, que não conseguiu exercer a coordenação do processo e liderar a criação de
subsistemas de atenção à saúde nas regiões (VASCONCELOS; PACHE, 2006).
No período correspondente, em 2003, por iniciativa do CONASEMS, e já com um
novo Governo, de Luiz Inácio Lula da Silva, após a 12ª Conferência de Saúde, com o tema
“Saúde como direito de todos e dever do Estado – a saúde que temos, o SUS que queremos”,
entra na agenda de discussão a necessidade de mudanças na dinâmica de gestão do sistema.
Sobressai a construção de uma nova proposta a substituir a normatização excessiva, assim
como a lógica da habilitação, pela adesão e compromisso com os resultados (OUVERNEY,
2015; DOBASHI, 2005).
Cabe ressaltar que o compromisso do novo governo durante seus dois mandatos
(2003-2010) era de introduzir uma nova dinâmica de relações intergovernamentais que
pudessem resgatar o caráter cooperativo do federalismo setorial inscrito na Constituição de
1988 e compor uma estratégia de coordenação federativa (OUVERNEY, 2015; CARVALHO
et al., 2017), enquanto mecanismos que possibilitam a coordenação de políticas orientadas
para resultados expressos em metas sanitárias, por exemplo: ferramentas legais e normativas
com especificações sobre a distribuição de funções e competências gestoras; instâncias
federativas; e papel coordenador e/ou indutor do governo federal (LIMA, 2013).
Por força disto, foi formulada pelo MS uma proposta denominada Pacto pela Saúde,
em que a habilitação foi substituída pelo compromisso, por meio de instrumentos e pactos
entre os gestores da saúde (OUVERNEY, 2015; CARVALHO et al., 2017). O Pacto foi uma
tentativa de construir um modelo de gestão interfederativo, cooperativo e consensual para o
SUS (SANTOS; ANDRADE, 2009). Desde o início das discussões criou-se a expectativa que
esse pacto rompesse com as barreiras de habilitação e promovesse todos os municípios à
condição de gestor pleno no seu território (CARVALHO et al., 2017).
51
O Pacto pela Saúde foi publicado pela Portaria GM/MS nº 399 de 22 de fevereiro de
2006 e publicado no DOU em 23 de fevereiro do mesmo ano. Composto pelo Pacto pela
Vida, Pacto em Defesa do SUS e Pacto de Gestão teve a missão de consolidar o SUS e
aprovar Diretrizes Operacionais (BRASIL, 2006a; 2006b).
O Pacto pela Vida compõe um conjunto de compromissos sanitários expressos em
objetivos de processos e resultados que apresentam impacto sobre a situação de saúde da
população brasileira, ou seja, revelou a importância de estabelecerem uma gestão por
resultados, a partir das metas estaduais e municipais. Os pactos estaduais deverão estar
referenciados pelas metas e objetivos nacionais, da mesma forma, os pactos municipais
deverão estar em consonância com as metas e objetivos estaduais (BRASIL, 2006a; 2011c;
CARNEIRO et al., 2014). São seis as prioridades pactuadas: saúde do idoso; controle do
câncer de colo de útero e de mama; redução da mortalidade infantil e materna; fortalecimento
da capacidade de respostas às doenças emergentes e endemias, com ênfase na dengue,
hanseníase, tuberculose, malária e influenza; promoção da saúde e fortalecimento da AB
(BRASIL, 2006a). Em 2009, o MS incluiu no Pacto pela Vida mais algumas áreas prioritárias,
são elas: a saúde do trabalhador; a saúde mental; o fortalecimento da capacidade de resposta
do sistema de saúde às pessoas com deficiência; a atenção integral às pessoas em situação ou
risco de violência; e; a saúde do homem (BRASIL, 2009).
O Pacto em Defesa do SUS tem a missão de consolidar o SUS como uma política de
estado, expressando os compromissos entre os gestores do sistema, e de repolitizar a saúde
com a consolidação da Reforma Sanitária Brasileira. Suas ações devem contemplar a
articulação e apoio à mobilização social pela promoção e desenvolvimento da cidadania,
tendo a questão da saúde como direito, além de buscarem a garantia de um financiamento de
acordo com as necessidades do Sistema (BRASIL, 2006a).
O Pacto de Gestão estabelece as responsabilidades de cada ente federado de forma a
diminuir as competências concorrentes e a tornar mais claro quem deve fazer o quê,
fortalecendo a ideia de uma gestão compartilhada e solidária. Tem as seguintes tarefas:
descentralizar os processos administrativos relativos à gestão do SUS para as CIBs; definir os
modelos organizacionais a serem implantados de acordo com as especificidades de cada
estado, a partir de normas pactuadas na CIT; a construção de um Colegiado de Gestão
Regional (CIR), acordando sua constituição, denominação e funcionamento na CIB
(BRASIL, 2006a).
Os instrumentos do Pacto de Gestão são: PDR, PDI e a PPI. Em cada região a CIB
deverá definir o desenho mais apropriado, visando à garantia do acesso universal, em
52
consonância com as necessidades locais de saúde e capacidade de oferta da respectiva região
(BRASIL, 2006a).
O PDR deverá expressar o desenho final do processo de identificação e
reconhecimento das regiões de saúde, em suas diferentes formas, em cada
estado e no Distrito Federal, objetivando a garantia do acesso, a promoção
da equidade, a garantia da integralidade da atenção, a qualificação do
processo de descentralização e a racionalização de gastos e otimização de
recursos. Para auxiliar na função de coordenação do processo de
regionalização, o PDR deverá conter os desenhos das redes regionalizadas de
atenção à saúde, organizadas dentro dos territórios das regiões e
macrorregiões de saúde, em articulação com o processo da Programação
Pactuada Integrada. O PDI deve expressar os recursos de investimentos para
atender as necessidades pactuadas no processo de planejamento regional e
estadual. No âmbito regional deve refletir as necessidades para se alcançar a
suficiência na atenção básica e parte da média complexidade da assistência,
conforme desenho regional e na macrorregião no que se refere à alta
complexidade. Deve contemplar também as necessidades da área da
vigilância em saúde e ser desenvolvido de forma articulada com o processo
da PPI e do PDR (BRASIL, 2006a).
Em síntese, o Pacto pela Saúde é um conjunto de reformas institucionais do SUS
pactuado entre as três esferas de gestão (União, Estados e Municípios) com o objetivo de
promover inovações nos processos e instrumentos de gestão, visando alcançar maior
eficiência e qualidade das respostas do SUS. Ao mesmo tempo, pelo menos em tese, redefine
as responsabilidades de cada gestor em função das necessidades de saúde da população e
na busca da equidade social, por meio de sete eixos orientadores: descentralização,
regionalização, planejamento/PPI, regulação, financiamento, participação social e gestão do
trabalho. Sua implementação se dá pela adesão dos entes federados ao Termo de
Compromisso de Gestão (TCG), o qual substitui os processos de habilitação das várias formas
de gestão anteriormente vigentes e estabelecem compromissos, objetivos e metas para cada
ente da federação associados a indicadores e prioridades definidas nacionalmente, tendo que
ser renovado anualmente (BRASIL, 2006a, grifo nosso).
As formas de transferência dos recursos federais para estados e municípios também
foram modificadas pelo Pacto pela Saúde, passando a ser integradas em cinco grandes blocos
de financiamento: AB, Atenção de Média e Alta Complexidade, Vigilância em Saúde,
Assistência Farmacêutica e Gestão do SUS, substituindo, assim, as centenas de "caixinhas"
que eram utilizadas anteriormente para essa finalidade (BRASIL, 2006a). Cabe ressaltar
ainda, uma inovação trazida pelo pacto de 2006, a criação de Colegiados de Gestão Regional
(CGRs), instâncias que institucionalizaram o relacionamento horizontal entre os governos
53
municipais e representantes do governo estadual, nas quais se instituíram processos decisórios
compartilhados para a definição de políticas de abrangência regional, na tentativa de construir
um modelo de gestão interfederativo (CARVALHO et al., 2017; SANTOS; ANDRADE,
2009).
O Pacto pela Saúde, em suas três dimensões, representou uma mudança na forma de
atuação do nível federal, assim como uma revisão das relações federativas no SUS, com
aumento da necessidade de cooperação intergovernamental. No entanto, apesar da ênfase na
pactuação federativa como eixo, a elaboração dos compromissos pactuados pouco se articula
com o planejamento. Isso é evidenciado pela ênfase incipiente no diagnóstico situacional
prévio à pactuação, pela dificuldade de cada realidade local realizar uma adaptação das metas
e prioridades, e pela indefinição de instrumentos para atingir as metas pactuadas, como
exemplo, investimentos, recursos, estruturas e etc (MACHADO; BAPTISTA; LIMA, 2010;
CARNEIRO et al., 2014). Aqui surge mais uma pergunta: As metas pactuadas nacionalmente
refletem de fato as reais necessidades da população dos vários brasis regionais?
Para Santos (2007, p. 434), as mudanças propostas no Pacto pela Saúde devem ser
analisadas sob o ponto de vista da macropolítica e da microgestão. A microgestão está
atrelada à micropolítica do trabalho em saúde, “onde está localizado o espaço para
acumulação de êxitos visíveis e consecução de mudanças significativas do SUS”. Nesse
sentido, as prioridades definidas nacionalmente (macropolítica) para o Pacto pela Vida
apresentam objetivos, metas e indicadores que, necessariamente, se traduzem em um conjunto
de compromissos e responsabilidades para as práticas cotidianas nos serviços de AB,
articulando-os à finalidade do trabalho. Entre estas prioridades, como já dito, está o
fortalecimento da própria política de AB, organizada e qualificada pela Estratégia Saúde da
Família (ESF) (BRASIL, 2008) para a reorientação do modelo de atenção à saúde em todo o
território nacional (BRASIL, 2017). Desde a implantação do PSF, houve grande expansão no
número de equipes no País. No entanto, para além da expansão, questões de qualidade
permanecem em aberto, ao lado de problemas ligados à própria natureza de um programa
público que almeja a equidade (CARNEIRO et al., 2014), mas é indutivo (CAMPOS;
PEREIRA JÚNIOR, 2016).
Nesse sentido, Machado et al. (2009), discutem que o Pacto pela Saúde ainda se
apresenta como normativas e portarias expedidas pelo MS ou pelas CIB ou CIT e que embora
as informações sejam divulgadas em sites oficiais, demoram para chegar aos profissionais que
atuam diretamente na assistência à saúde. Carneiro et al. (2014) comprova essa percepção em
estudo realizado com profissionais de saúde vinculados à gestão colegiada da coordenação
54
das ESF e à coordenação da rede de APS no município de Marília-SP, com o objetivo de
discutir a implementação do Pacto pela Saúde a partir da prática cotidiana dos serviços de
saúde da AB. O estudo evidenciou haver pouca aproximação dos trabalhadores vinculados à
coordenação das ESF com o Pacto pela Saúde no espaço micropolítico do trabalho, revelando
um conhecimento superficial e uma percepção de distanciamento na elaboração do pacto
frente às realidades dos cotidianos dos serviços. Para os autores, isso se justifica pelo processo
de construção de metas municipais se darem em uma lógica setorizada, por programas
verticais, sem a participação dos atores que desenvolvem as ações previstas. Portanto, para
mudanças efetivas na construção do SUS, a relação entre os gestores nas comissões
interfederativas não é suficiente, é necessária a participação dos trabalhadores na construção
das pactuações, aqueles que convivem com a realidade local e que podem de fato adequar a
qualidade da resposta do sistema às necessidades da população (CARNEIRO et al., 2014).
Continuando, apesar dos avanços já alcançados na gestão do SUS, ainda era
frequentemente apontada, nos fóruns de gestores, a necessidade de se alcançar mais
transparência na gestão do Sistema, mais segurança jurídica nas relações interfederativas e
maior controle social. Além disso, a Lei n° 8.080/90, desde a sua edição, carecia de
explicitação de conceitos ali expostos, como o de regionalização, integralidade, redes de
serviços, e de explicitação de sua forma organizativa que pressupunha a gestão compartilhada
(CARVALHO et al., 2017). Por conta disso, em 2011, quase vinte e um anos após a
promulgação das Leis Orgânicas da Saúde, e cinco anos após a edição do Pacto pela Saúde, o
SUS é finalmente regulamentado por meio do Decreto n° 7.508, publicado no DOU em 29 de
junho de 2011, que dispõe sobre a regulamentação das Leis Orgânicas, sobre a organização do
SUS, o planejamento em saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, com base
em um instrumento jurídico nomeado Contrato Organizativo de Ação Pública da Saúde
(COAP) (BRASIL, 2011a).
O Decreto está dividido em seis capítulos. O primeiro “Das Disposições
Preliminares”, define alguns conceitos, como exemplo, o significado de região de saúde,
mapa de saúde, Contrato Organizativo de Ação Pública (COAP), entre outros; o segundo
capítulo “Da organização do SUS”, está subdividido em duas sessões, a primeira para efeito
da organização “Das Regiões de Saúde” e a segunda “Da Hierarquização” que trata que “[...]
o acesso universal, igualitário e ordenado às ações e serviços de saúde se inicia pelas Portas
de Entrada do SUS e se completa na rede regionalizada e hierarquizada, de acordo com a
complexidade do serviço”; o terceiro capítulo “Do Planejamento da Saúde”, no seu artigo 15º
descreve que “[...] o processo de planejamento da saúde será ascendente e integrado, do
55
nível local até o federal, ouvido os respectivos Conselhos de Saúde, compatibilizando-se
as necessidades das políticas de saúde com a disponibilidade de recursos financeiros”; o
quarto capítulo “Da Assistência à Saúde”, também está subdivido em duas sessões, a primeira
trata da “Relação Nacional de Ações e Serviços de Saúde” (RENASES) e a segunda “Da
Relação Nacional de Medicamentos Essenciais” (RENAME); o quinto capítulo, “Da
Articulação Interfederativa”, também subdividido em duas sessões: a primeira trata “das
Comissões Intergestoras” e a segunda “do COAP” e o sexto e último capítulo trata das
Disposições Finais (BRASIL, 2011a).
A RENASES compreende todas as ações e serviços que o SUS oferece ao usuário para
atendimento da integralidade da assistência à saúde. A RENAME compreende a seleção e a
padronização de medicamentos indicados para atendimento de doenças ou de agravos no
âmbito do SUS. O Mapa da Saúde é “a descrição geográfica da distribuição de recursos
humanos e de ações e serviços de saúde ofertados pelo SUS e pela iniciativa privada,
considerando-se a capacidade instalada existente, os investimentos e o desempenho aferido a
partir dos indicadores de saúde do sistema” (BRASIL, 2011a).
O planejamento integrado das ações e serviços de saúde exige o compromisso aos
governos signatários de discutir permanentemente a política de saúde e a sua execução e
integração nos Conselhos de Saúde e nas Comissões Intergestoras, sendo obrigatória a
elaboração de cada Plano de Saúde e do Relatório de Gestão para a manutenção das
transferências de recursos financeiros previstos da União para os Estados, DF e Municípios
(BRASIL, 2011b). No planejamento também devem ser considerados os serviços e as ações
prestadas pela iniciativa privada, de forma complementar ou não ao SUS, os quais deverão
compor os Mapas da Saúde regional, estadual e nacional (BRASIL, 2011a). Ainda sobre o
planejamento:
O planejamento regional integrado será a base para a instalação de novos
serviços de saúde na Região, sejam públicos ou privados, contratados e
conveniados, observando o Mapa da Saúde e o disposto no art. 197,
combinado com o art. 174 da CF e Decreto 7.508/2011.
Os entes Signatários devem, em seu âmbito administrativo, formular,
gerenciar, implementar e avaliar o processo permanente de planejamento,
orientado pelas necessidades de saúde da população, definindo as
diretrizes, os objetivos e as metas que comporão os planos de saúde de cada
ente, os quais devem ser discutidos e aprovados pelos conselhos de saúde
respectivos (BRASIL, 2011b, p. 19, grifo nosso).
Para efeito deste Decreto, são requisitos mínimos para a instituição de Região de
Saúde possuir serviços de AB, Urgência e Emergência, Atenção Psicossocial, Atenção
56
ambulatorial especializada e hospitalar e Vigilância em saúde (BRASIL, 2011a). Considera-
se:
Art. 2º I - Região de Saúde - espaço geográfico contínuo constituído por
agrupamentos de Municípios limítrofes, delimitado a partir de identidades
culturais, econômicas e sociais e de redes de comunicação e infraestrutura de
transportes compartilhados, com a finalidade de integrar a organização, o
planejamento e a execução de ações e serviços de saúde;
Art 4º As Regiões de Saúde serão instituídas pelo Estado, em articulação
com os Municípios, respeitadas as diretrizes gerais pactuadas na Comissão
Intergestores Tripartite – CIT,
§1°
Poderão ser instituídas Regiões de Saúde interestaduais, compostas por
Municípios limítrofes, por ato conjunto dos respectivos Estados em
articulação com os Municípios.
§2°
A instituição de Regiões de Saúde situadas em áreas de fronteira com
outros países deverá respeitar as normas que regem as relações
internacionais (BRASIL, 2011a).
Em relação à articulação interfederativa, as comissões intergestoras pactuarão a
organização e o funcionamento das ações e serviços de saúde integrados em redes de atenção
à saúde, sendo:
I - a CIT, no âmbito da União, vinculada ao Ministério da Saúde para efeitos
administrativos e operacionais;
II - a CIB, no âmbito do Estado, vinculada à Secretaria Estadual de Saúde
para efeitos administrativos e operacionais; e
III - a Comissão Intergestores Regional - CIR, no âmbito regional, vinculada
à Secretaria Estadual de Saúde para efeitos administrativos e operacionais,
devendo observar as diretrizes da CIB (BRASIL, 2011a).
O COAP é definido como um acordo de colaboração firmado entre os diferentes
governos com a finalidade de organizar e integrar as ações e os serviços de saúde em uma
rede regionalizada e hierarquizada, com definição de responsabilidades, indicadores e metas
de saúde, critérios de avaliação de desempenho, recursos financeiros que serão
disponibilizados, forma de controle e fiscalização de sua execução e demais elementos
necessários à implementação integrada das ações e serviços de saúde, com a intenção de
garantir a integralidade da assistência à saúde da população (CONASS, 2015). Desta forma, o
COAP se constituiu em um instrumento formal, necessário para corresponsabilizar os
governos federados, com aplicabilidade processual, tendo em vista que as condições
epidemiológicas, demográficas e socioeconômicas são dinâmicas. Nele foram incorporados os
instrumentos de compromisso e pactuação que já vinham sendo desenvolvidos pelo Pacto pela
Saúde e nele estão definidas, por meio da Programação Geral das Ações e Serviços de Saúde
57
(PGASS), todas as ações de assistência à saúde, da AB à especializada, a serem realizadas na
região a partir das prioridades definidas no planejamento regional integrado (BRASIL, 2011a;
CARVALHO et al., 2017).
O COAP é composto por quatro partes: a primeira denominada “Parte I - Das
responsabilidades organizativas do SUS” explicita as responsabilidades a que os entes
signatários estão submetidos em relação à organização do SUS (BRASIL, 2011b, p. 6).
A “Parte II - Responsabilidades executivas e seus anexos I, II e III” explicitam as
responsabilidades executivas dos governos signatários (caracterização é discorrida no Anexo
1), com os seguintes conteúdos: a) as diretrizes e os objetivos do Plano Nacional de Saúde –
PNS e das políticas nacionais; b) os objetivos regionais plurianuais, sempre em consonância
com o disposto nos planos de saúde nacional, estadual e municipal. c) as metas regionais
anuais, os indicadores e as formas de avaliação; d) os prazos de execução (BRASIL, 2011b, p.
9). O Anexo II fala da PGASS na Região de Saúde:
a) a relação das ações e serviços executados na Região de Saúde, observada
a Relação Nacional de Ações e Serviços de Saúde (RENASES) e a Relação
Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) e as correspondentes
responsabilidades individuais e solidárias; e
b) o mapa de metas em relação às ações e serviços a serem executados na
Região de Saúde (BRASIL, 2011b, p. 9).
O Anexo III - “Quadro entre os entes Signatários das ações e serviços com direção
única em relação aos entes Signatários”, descreve, a relação dos serviços de saúde em cada
esfera de governo e as respectivas responsabilidades pelo referenciamento do usuário de outro
município, respeitada a direção única em cada esfera de governo, de acordo com o disposto na
Lei n° 8080/90 (BRASIL, 2011b, p. 32-42).
A “Parte III – Das Responsabilidades Orçamentarias e Financeiras” do COAP dispõe
sobre as responsabilidades orçamentário-financeiras: financiamento global do contrato,
custeio e investimento, formas de incentivo e cronograma de desembolso e as regras nacionais
e estaduais sobre o financiamento (BRASIL, 2011b, p. 43) e a “Parte IV: Monitoramento,
Avaliação de desempenho e Auditoria” (BRASIL, 2011b, p. 48).
Este contrato tem como compromisso dos entes Signatários garantir
atendimento integral ao cidadão, com base na RENASES e de acordo com a
hierarquização das ações e serviços que competem à Região de Saúde xxxx,
fundado na orientação de que é necessário atuar de maneira integrada e
sistêmica, tanto no âmbito do próprio setor da saúde como nas demais
áreas sociais, ambientais e econômicas que influenciam e condicionam a
58
saúde das pessoas, promovendo a intersetorialidade, com o fim de
diminuir as desigualdades sociais e erradicar a pobreza, devendo haver
uma integração entre todos os níveis de assistência à saúde, sempre
orientadas para a qualidade dos resultados (BRASIL, 2011b, p. 11, grifo
nosso).
O instrumento COAP trouxe a possibilidade jurídico-legal de uma gestão cooperada
do SUS, pondo em discussão a exigência de atualização do Pacto Federativo em torno da
saúde, sob o exercício de uma gestão trina cooperada e regionalizada, em abertura às
necessidades e dinâmicas loco regionais. No entanto, no cenário nacional, após quase sete
anos de sua publicação, somente dois Estados, Ceará e Mato Grosso Sul, conseguiram
implantá-lo, o que corresponde a 6% das Regiões estruturadas no país (GOYA et al., 2017).
Em estudo qualitativo desenvolvido no período de 2013 a 2015 com o objetivo de
identificar as percepções de gestores estaduais da saúde do Ceará, sobre a produção e efeitos
do COAP na experiência do Estado, destacou-se a positividade da responsabilização
federativa trina pelo direito à saúde, o fortalecimento da regionalização no âmbito do governo,
avanços organizacionais relacionados à implantação de Ouvidorias e Sistema Nacional de
Gestão da Assistência Farmacêutica, registro da informação da força de trabalho e ainda
transparência do recurso orçamentário-financeiro por ente federado. Todavia, problemas
como baixa institucionalidade do funcionamento em rede e da capacidade do Estado de
regulação, o subfinanciamento e a educação permanente em saúde, revelaram impotência para
a consecução de seus princípios, e também, se destacaram como os grandes desafios do
Sistema e da implementação do COAP, dado o não enfrentamento de problemas estruturais
em cooperação trina (GOYA et al., 2017).
Cabe ainda ressaltar que nesse mesmo estudo, foi perceptível o distanciamento entre o
planejado e o executado, apontando a perspectiva de que o problema não é apresentado no
desenho da rede ou em sua concepção, mas no fazer depois, condicionado ao cumprimento
das pactuações intermunicipais, à regulação e ao apoio logístico, além do necessário
entendimento por parte dos profissionais que integram a rede. Foi indicado que a organização
e o funcionamento em rede requerem mais do que a planificação do desenho assistencial em si
pela gestão (GOYA et al., 2017).
Outro aspecto importante a ser ressaltado é que a adesão ao COAP, no estado do
Ceará, foi uma decisão política em ano eleitoral e nessa perspectiva houve um “atropelamento
do tempo técnico pelo tempo político”, todos os gestores tinham ciência que o COAP tinha
uma data X para ser finalizado, e essa data X era menos de um ano. Por conta da “supremacia
do momento político sobre o momento técnico” houve problemas centrais ao COAP no
59
tocante a sua dimensão organizativa, principalmente em manterem o uso da PPI, mantendo a
lógica da programação de procedimentos e capacidade de oferta irreal, substituindo o
preconizado pelo Decreto n° 7.508, que era a utilização da RENASES (GOYA et al., 2017, p.
1237).
No processo de construção do SUS nesses últimos 27 anos (1990-2017) o que se vê é
um constante processo de negociação e reconstrução da proposta original. Milhares de
portarias foram editadas pelo MS e novas leis foram aprovadas pelo Congresso Nacional.
Cada contexto político e de gestão de governo permitiu avançar e/ou definir rumos mais ou
menos consistentes para a reforma (LIMA, 2013).
O Quadro 2 demostra que houve longo período de tempo entre a aprovação da Lei n°
8.080/90 e sua regulamentação por meio de decreto, além de sintetizar os principais aspectos
das regulamentações. No entanto, eu aprendi na disciplina Bases Teóricas e Políticas de
Atenção à Saúde que essa lenta trajetória histórica de regulamentação do SUS tem múltiplas
determinações que, para ser compreendidas, requerem o raciocínio dialético e a identificação
dos processos que são anteriores ao conteúdo que os instrumentos parecem mostrar. Outro
universo, portanto, outra pesquisa. Nesta, é preciso pontuar que os momentos históricos
permitiram, ao longo desses 27 (vinte e sete) anos regulamentar o SUS do modo como se
regulamentou.
As normas de regulamentação do SUS instituídas pelos governos nacionais, desde a
década de noventa foram, portanto, importantes para a implantação do SUS ao longo do
tempo. Mas, não foi assegurado o processo de operacionalização, enquanto um “projeto
virtuoso” que atenderia às finalidades da política nacional de saúde, de garantia do acesso
universal às ações e serviços de saúde e da atenção integral compatível com as necessidades
diferenciadas da população (LIMA, 2013, p. 89). O SUS foi concebido como um sistema
regionalizado e hierarquizado que, na prática, vem instituindo a municipalização autárquica
(MENDES, 2001). Para Miranda, Mendes e Silva (2017) o elemento complicador da
organização do SUS não se deve à diferenciação entre os diferentes governos federados, mas
ao fato de o Brasil ser o único país do mundo com um alto nível de descentralização.
Foram normas, pactos e decretos que hegemonizaram o processo histórico. Desde os
anos 1970, o MRSB afirma que a pobreza e a desigualdade social são obstáculos a uma boa
situação de saúde (SOUZA, 2014). Se os projetos macroeconômicos considerassem que a
construção de um país cidadão, exige, antes de tudo, que todos se reconheçam em saúde como
direito de cidadania, em dignidade, a lógica se inverteria: construiríamos um Brasil
60
economicamente produtivo a partir de uma sociedade saudável (porque justa). Construiríamos
o SUS conquistado em 1986.
Na prática, o SUS que temos é o “SUS possível”, que se vê no cotidiano dos serviços
de saúde, fragmentado e frágil. Uma das razões apontada por Souza (2009) se deve ao fato de
que as organizações sofrem influência do contexto político e da limitação por autoridades
externas da capacidade de decisão de seus dirigentes, já que são obrigados a seguirem normas
definidas por outras instâncias ou organizações.
Concordo com Souza (2009, p. 912) quando diz que “o SUS possível ainda está longe
do SUS necessário”. Para Miranda, Mendes e Silva (2017) a concretização do SUS necessário
está na dependência da superação do caráter formal das normas e diretrizes instituídas desde a
sua implantação, o que exige das três esferas de governo a construção de um coletivo capaz de
consolidar as redes de saúde e de reduzir as desigualdades que marcam a sociedade brasileira.
Não posso, ou melhor, não podemos deixar o sonho possível morrer, o SUS, a garantia
da universalidade, indiscutivelmente foi a maior conquista social da população brasileira,
“[...] na verdade, o SUS é uma estratégia das mais importantes para a construção de um país
socialmente justo [...]” (SOUZA, 2009, p. 912).
Vamos continuar pedalando enquanto se conserta a bicicleta ou vamos ser criativos e
fortes para mudar de fato as instituições públicas do nosso país? Na Lei Orgânica 8080/90
está escrito que todos têm direito à saúde, independente de raça, gênero, idade ou classe
social. Na vida real, o que percebo é ainda uma grande insatisfação e descrença com relação
ao SUS. É fundamental, Estado e sociedade concordarem que hoje há uma necessidade
urgente de uma política mais justa, solidária e redistributiva no Brasil; eu também diria, de
uma política consistente, em que o “tempo técnico” não seja atropelado pelo “tempo político”
(GOYA et al., 2017, p. 1237) e suas ideologias. Vamos à luta!
Quadro 2 - Leis, normas e decretos na operacionalização do SUS - Evolução Histórica
Ano
Leis
Normas
Decretos
Contexto O que se propõe
Características
1988
Constituição
da República
do Brasil
05/10/1988
- Reabertura democrática
do Estado Brasileiro,
após duas décadas de
regime militar;
- Abertura política;
- Mobilização popular em
oposição ao sistema de
saúde vigente
(previdenciário).
- Federalismo
cooperativo: soberania
partilhada entre União,
estados e municípios.
Art. 18. A organização
político-administrativa da
República Federativa do
Brasil compreende a
União, os Estados, o
Distrito Federal e os
Municípios, todos
- Ênfase no Regime
Democrático e valorização da
cidadania.
61
autônomos, nos termos
desta Constituição;
- Saúde como direito de
todos e dever do Estado;
- Cria o SUS como
sistema público de saúde
no Brasil.
1990
Lei 8.080
19/09/1990
A conjuntura do setor de
saúde no início da década
de 1990 foi marcada
pelas dificuldades
impostas pelo Governo
Collor:
- Retardou em dois anos
a edição das leis
orgânicas e ainda vetou
partes importantes desta
para a operacionalização
do SUS conquistado pelo
MRSB;
- Manteve as estruturas
centralizadas do
INAMPS;
- Reduziu os recursos
federais para a saúde;
- A descentralização era
uma diretriz do texto
constitucional, mas sua
efetivação encontrava
barreiras políticas,
financeiras e técnicas
expressivas.
- Dispõe sobre as
condições para a
promoção, proteção e
recuperação da saúde, a
organização e o
funcionamento dos
serviços correspondentes
e dá outras providências;
- Traz de forma clara,
como incumbência
primária do município, a
execução das ações e a
gestão dos serviços de
saúde.
- Definição de repasse de
recursos federais aos
municípios e estados de forma
regular, mediante critérios
demográficos,
epidemiológicos, de
capacidade instalada e do
desempenho, histórico
pregresso.
Art. 35°. Para o
estabelecimento de valores a
serem transferidos a Estados,
Distrito Federal e Municípios,
será utilizada a combinação
dos seguintes critérios:
I - perfil demográfico da
região;
II - perfil epidemiológico da
população a ser coberta;
III - características
quantitativas e qualitativas da
rede de saúde na área;
IV - desempenho técnico,
econômico e financeiro no
período anterior;
V - níveis de participação do
setor saúde nos orçamentos
estaduais e municipais;
VI - previsão do plano
quinquenal de investimentos
da rede;
VII - ressarcimento do
atendimento a serviços
prestados para outras esferas
de governo.
Lei 8.142
28/12/1990
- Conjuntura de
instabilidade política do
governo: retrocesso na
decisão política de
viabilizar uma maior
participação da sociedade
no controle do sistema e
na definição do
financiamento do SUS.
- Dispõe sobre a
participação da
comunidade na gestão do
Sistema Único de Saúde
(SUS) e sobre as
transferências
intergovernamentais de
recursos financeiros na
área de saúde.
Art. 4°. Para receberem os
recursos [...] os Municípios, os
Estados e o Distrito Federal
deverão contar com:
I - Fundo de Saúde;
II - Conselho de Saúde, com
composição paritária;
III - Plano de Saúde;
IV - Relatórios de Gestão;
V - Contrapartida de recursos
para a saúde no respectivo
orçamento;
VI - Comissão de elaboração
do Plano de Carreira, Cargos e
Salários (PCCS), previsto o
prazo de dois anos para sua
implantação.
1991 - Editada pelo presidente - Objetivo: fornecer - Financiamento do SUS pelo
62
NOB 91
Resolução
nº258
07/01/1991
do INAMPS reforça a
ênfase nas atividades
curativas do sistema de
saúde;
- Descaracteriza os
principais objetivos do
SUS ao definir a lógica
de recursos a Estados e
Municípios e
consequentemente a
organização do Sistema.
instruções aos
responsáveis pela
implantação e
operacionalização do
SUS, principalmente no
que diz respeito ao
financiamento na
intenção de adoção da
Política proposta pelos
Estados e Municípios.
orçamento do INAMPS:
• Para atividades hospitalares
(custeio);
• Para atividades ambulatoriais
(custeio).
- Financiamento para
investimentos: • Para aquisição de
equipamentos de unidades
assistenciais públicas,
estaduais e municipais, já
existentes (capital).
- Estímulo à municipalização
do SUS e às ações de Saúde
Coletiva: Critérios da
8.142/90.
1992
NOB 92
Portaria nº
234
07/02/1992
- Mantém a lógica de
financiamento contida na
NOB/91;
- Insatisfação com a
política setorial, líderes
do MRSB demandavam a
realização da 9ª
Conferência de Saúde
para discutir os caminhos
para a implementação do
SUS e a descentralização.
Em agosto de 1992, foi
realizada essa
Conferência com o tema:
“Municipalização da
Saúde, condição
indispensável para a
efetiva implantação do
SUS”;
- Construção do
documento:
Descentralização das
Ações e Serviços de
Saúde - a ousadia de
cumprir e fazer cumprir a
lei.
- Normalizar a
assistência à saúde no
SUS, estimular a
implantação, o
desenvolvimento e o
funcionamento do
sistema; e dar forma
concreta e instrumentos
operacionais à efetivação
dos preceitos
constitucionais da saúde.
- Recursos alocados no Fundo
Nacional de Saúde
permanecendo ainda o
INAMPS como via de repasse
aos Estados, Distrito Federal e
Municípios.
1993
NOB 93
Portaria nº
545
20/05/1993
- Governo Itamar Franco:
condições políticas
propícias para o início
efetivo da transferência
de atribuições e recursos
para os estados e,
especialmente,
municípios, apesar da
crise no financiamento;
- Agravamento da crise
financeira do setor saúde:
interrupção dos repasses
da previdência;
- Editada pelo Ministério
da Saúde e construída por
um “Grupo Especial de
Descentralização”
(GED);
- Estabelecer normas e
procedimentos
reguladores do processo
de descentralização da
gestão das ações e
serviços de saúde;
- Disciplinar o processo
de descentralização da
gestão das ações e
serviços de saúde na
perspectiva de construção
do SUS.
•
• - Definiu “formas transitórias
de gestão para estados e
municípios, com ênfase na
municipalização”:
• Para os municípios três
condições de gestão: Gestão
Incipiente, Gestão Parcial e
Gestão Semiplena;
• Para os Estados duas
condições de Gestão: Gestão
Parcial e Gestão Semiplena;
• - Institucionalizou as
Comissões Intergestores
Tripartite (CIT) na esfera
federal e Bipartite (CIB) na
esfera estadual;
- Institucionalizou os
Conselhos Estaduais e
63
• - Extinção do INAMPS
(lei 8.698 de 27/07/93).
Municipais de Saúde;
- Financiamento: manteve o
repasse por produção de
serviços, mas insistiu em um
tipo de repasse denominado
“transferência fundo a fundo”.
Dois tipos:
- Forma preponderante:
repasse direto ao prestador
segundo produção aprovada;
- Forma residual: transferências em bloco
segundo montante definido no
teto financeiro.
1994
Decreto
nº 1.232
30/08/1994
- Dispõe sobre as
condições e a forma de
repasse regular e
automático de recursos
do Fundo Nacional de
Saúde para os fundos de
saúde estaduais,
municipais e do Distrito
Federal, e dá outras
providências.
- Art.1º § 1º Enquanto não
forem estabelecidas, com base
nas características
epidemiológicas e de
organização dos serviços
assistenciais previstas no art.
35 da Lei nº 8.080, de 1990, as
diretrizes a serem observadas
na elaboração dos planos de
saúde, a distribuição dos
recursos será feita
exclusivamente segundo o
quociente de sua divisão pelo
número de habitantes, segundo estimativas
populacionais fornecidas pelo
IBGE, obedecidas as
exigências deste decreto.
1995
Decreto
nº 1.651
28/09/1995
- Governo Fernando
Henrique Cardoso (FHC
1995-2002): As
oportunidades que
favoreceram a retomada
do ideal descentralizador
da reforma sanitária e
que permitiu ao
municipalismo assumir o
comando nacional do
SUS na era Itamar
Franco (1993-1994),
cedeu lugar a uma
conjuntura marcada pela
recuperação do papel da
União no jogo federativo
na era FHC.
- Regulamenta o Sistema
Nacional de Auditoria
(SNA) no âmbito do
Sistema Único de Saúde.
- Art. 2º O SNA exercerá
sobre as ações e serviços
desenvolvidos no âmbito do
SUS as atividades de:
I - controle da execução, para
verificar a sua conformidade
com os padrões estabelecidos
ou detectar situações que
exijam maior aprofundamento;
II - avaliação da estrutura, dos
processos aplicados e dos
resultados alcançados, para
aferir sua adequação aos
critérios e parâmetros exigidos
de eficiência eficácia e
efetividade;
III - auditoria da regularidade
dos procedimentos praticados
por pessoas naturais e
jurídicas, mediante exame
analítico e pericial.
1998
“NOB 98”
Normativa
01/98
02/01/1998
- Nesse período houve
uma “inflexão na
dinâmica federativa” no
Brasil em direção ao
fortalecimento expressivo
de tendências
centralizadoras,
- Regulamenta os
conteúdos, instrumentos
e fluxos do processo de
habilitação de
Municípios, de Estados e
do Distrito Federal às
novas condições de
- Financiamento:
Transferência Regular e
automática Fundo a Fundo;
- Teto Financeiro Global do
Município (TFGM): PAB
Fixo (valor per capita para
custeio das ações básicas de
64
impulsionando a
formação de um novo
regime de relações
intergovernamentais
entre a União e os entes
subnacionais no plano
legislativo, fiscal e de
coordenação de políticas
públicas;
- 99% dos municípios
estavam habilitados na
NOB/96, 89% deles em
Gestão Plena da AB.
gestão criadas pela
Norma Operacional
Básica do Sistema Único
de Saúde - NOB SUS
01/96.
assistência à saúde), PAB
Variável (incentivos
destinados a algumas ações e
programas), FAE (Fração
Assistencial Especializada) e
Remuneração de Internações
Hospitalares (com base na
AIH);
- Teto Financeiro Global do
Estado (TFGE): soma do Teto
Financeiro Global de todos os
municípios do Estado. O
gestor estadual era responsável
pelo gerenciamento dos
recursos (tetos financeiros) da
FAE e AIH dos municípios
habilitados em gestão plena da
Atenção Básica.
2001
NOAS 2001
Portaria nº
95
26/01/01
- Com o significativo
processo de
descentralização em nível
municipal, ocorreram
problemas na inter-
relação dos sistemas
municipais. Percebe-se
que estados e municípios
eram extremamente
heterogêneos: uns
pequenos demais para
gerirem um sistema de
saúde funcional completo
e outros eram polos de
atração regional;
- A PPI proposta pela
NOB/96 não foi
implementada de maneira
que superasse os
problemas burocráticos
de acesso da população
entre os municípios e/ou
estados.
- “Promover maior
equidade na alocação de
recursos e no acesso da
população às ações e
serviços de saúde em
todos os níveis de
atenção”, assumindo a
regionalização como
macroestratégia
fundamental para o
aprimoramento do
processo de
descentralização.
- Regionalização e
organização da Assistência:
Criou o Plano Diretor de
Regionalização (PDR) e Plano
Diretor de Investimentos
(PDI);
- Qualificação da AB através
da identificação de Estratégias
mínimas relacionadas a
problemas de saúde em nível
nacional: Tuberculose,
Hanseníase, controle da
Hipertensão, controle
Diabetes, Saúde da Criança,
Saúde da Mulher e Saúde
Bucal;
- Fortalecimento da
capacidade de gestão do
SUS:
Instituiu instrumentos para
organizar e fortalecer o
planejamento dos Sistemas de
Saúde: PPI e Termo de
Compromisso para Garantia
de Acesso (TCGA).
2002
NOAS 2002
Portaria
nº373
27/02/2002
- Identificação de
entraves em algumas
unidades da federação na
operacionalização de
determinados itens da
NOAS 01/01, decorrentes
das dificuldades para
estabelecer o comando
único sobre os
prestadores de serviços
ao SUS e assegurar a
totalidade da gestão
municipal nas sedes dos
módulos assistenciais,
bem como da fragilidade
para explicitação dos
mecanismos necessários
- Assegurar a
manutenção das
diretrizes organizativas
definidas pela NOAS
01/01 oferecendo as
alternativas necessárias à
superação das
dificuldades e impasses
oriundos da dinâmica
concreta da
implementação da NOAS
01/01.
- Revisão de critérios de
habilitação e desabilitação
dos estados e municípios
considerando critérios
assistenciais;
- Definiu duas formas de
gestão para estados e
municípios:
Para os municípios: Gestão
Plena de Atenção Básica Ampliada (GPABA) e Gestão
Plena do Sistema Municipal
(GPSM);
Para os Estados: Gestão
Avançada do Sistema
Estadual (GASE) e Gestão
Plena do Sistema Estadual
65
à efetivação da gestão
estadual para as
referências
intermunicipais.
(GPSE).
Lei 10.424
15/04/2002
- Acrescenta capítulo e
artigo à Lei nº 8.080, de
19 de setembro de 1990,
que dispõe sobre as
condições para a
promoção, proteção e
recuperação da saúde, a
organização e o
funcionamento de
serviços correspondentes
e dá outras providências,
regulamentando a
assistência domiciliar no
Sistema Único de Saúde.
- Art. 1º A Lei nº 8.080, de 19
de setembro de 1990, passa a
vigorar acrescida do seguinte
Capítulo VI e do art. 19-I:
Art. 19-I. São estabelecidos,
no âmbito do Sistema Único
de Saúde, o atendimento
domiciliar e a internação
domiciliar.
2006
Portaria
GM/MS
nº399
PACTO
PELA
SAÚDE
22/02/2006
- Compromisso do novo
governo: Luiz Inácio
Lula da Silva durante
seus dois mandatos
(2003-2010) de
introduzir uma nova
dinâmica de relações
intergovernamentais que
pudesse resgatar o caráter
cooperativo do
federalismo setorial
inscrito na Constituição
de 1988 e compor uma
estratégia de coordenação
federativa orientada para
resultados expressos em
metas sanitárias.
- Construir um modelo de
gestão interfederativo
cooperativo e consensual
para o SUS;
- Reforçar a necessidade
de consolidação do SUS
por meio de sete eixos
orientadores:
descentralização,
regionalização,
planejamento/PPI,
regulação, financiamento,
participação social e
gestão do trabalho;
- É composto pelo Pacto
pela Vida, Pacto em
Defesa do SUS e Pacto
de Gestão.
- Criação da CIR;
- Instrumentos Pacto de
Gestão: PDR, PDI e PPI;
Termo de Compromisso de
Gestão (TCG);
- Redefinição das
responsabilidades de cada
gestor em função das
necessidades de saúde da
população e busca da equidade
social;
- Financiamento:
Substituição na forma de
repasse de recursos –
Integração em Cinco Blocos
de Financiamento:
1. AB;
2. Atenção Média e Alta
Complexidade;
3. Vigilância em Saúde;
4. Assistência Farmacêutica;
5. Gestão do SUS.
Lei 12.466
24/08/2011
- Acrescenta arts. 14-A e
14-B à Lei no 8.080, de
19 de setembro de 1990,
que “dispõe sobre as
condições para a
promoção, proteção e
recuperação da saúde, a
organização e o
funcionamento dos
serviços correspondentes
e dá outras
providências”, para
dispor sobre as comissões
intergestores do SUS, o
Conselho Nacional de
Secretários de Saúde
(CONASS), o Conselho
Nacional de Secretarias
Municipais de Saúde
(CONASEMS) e suas
- Reconhecimento das CITs e
CIBs como foros de
negociação e pactuação entre
gestores, quanto aos aspectos
operacionais do SUS;
- Reconhecimento dos
CONASS e CONASEMS
como entidades
representativas dos entes
estaduais e municipais para
tratar de matérias referentes à
saúde e declarados de utilidade
pública e de relevante função
social, na forma do
regulamento.
66
2011
respectivas composições,
e dar outras providências.
DECRETO
7508
28/06/2011
- Necessidade de superar
a fragmentação das
políticas de saúde e de
fortalecer os vínculos
entre os entes federados
para a garantia de acesso
dos usuários à atenção
integral no SUS.
- Regulamenta alguns
aspectos da Lei Orgânica
dispondo sobre a
organização do SUS, o
planejamento em saúde, a
assistência à saúde e a
articulação
interfederativa, com base
em um instrumento
jurídico nomeado
Contrato Organizativo de
Ação Pública da Saúde
(COAP);
- Trazer a possibilidade
jurídico-legal de uma
gestão cooperada do
SUS, pondo em
discussão a exigência de
atualização do Pacto
Federativo em torno da
saúde, sob o exercício de
uma gestão trina
cooperada e
regionalizada, em
abertura às necessidades
e dinâmicas loco
regionais.
- Instituiu novos
instrumentos/documentos na
gestão compartilhada do SUS:
- RENASES;
- RENAME;
- Mapa da Saúde;
- Pactuação Integrada das
Ações e Serviços de Saúde;
- Regiões de Saúde;
- Comissões Intergestoras;
- COAP.
No COAP foram incorporados
os instrumentos de
compromisso e pactuação que
já vinham sendo
desenvolvidos pelo Pacto pela
Saúde e nele estão definidas,
por meio da Programação
Geral das Ações e Serviços
de Saúde (PGASS).
Fonte: Elaborado pela autora readaptado de Carvalho et al. (2017).
3.3 Quando o Protagonista Desperta para a sua Conquista Histórica: o controle social do
SUS
“O estado de justiça social, com bem estar coletivo,
só acontecerá quando, pelo processo democrático,
cada pessoa assumir o controle da sociedade e do
estado pela participação ativa e pela consciência e
prática plenas de deveres e direitos de socio-
proprietário de sua cidade, seu país e do mundo.”
(Gilson Carvalho)
Antes de iniciar o desenvolvimento deste tópico, é necessário esclarecer como os
termos participação e controle social serão aqui assumidos.
Do ponto de vista teórico são conceitos sociológicos sujeitos a reconfigurações
semânticas e fundamentação teórica diversa, o que, por si só, condena ao fracasso qualquer
tentativa de defini-los de modo unívoco e original (ALVAREZ, 2004). Segundo Rocha (2009)
participação social significa a democratização ou participação ampla dos cidadãos nos
processos decisórios em uma dada sociedade, independentemente de seu modelo político ou
67
econômico, pressupondo em sua prática o envolvimento de comunidades atuantes. Já o termo
controle social
É ambíguo, podendo ser utilizado em sentidos diferentes a partir de
concepções de Estado e de sociedade civil distintas. Tanto é empregado para
designar o controle do Estado sobre a sociedade quanto para designar o
controle da sociedade (ou de setores organizados na sociedade) sobre as
ações do Estado (CORREIA, 2008, p. 104).
No Brasil, o controle social se refere à participação da comunidade no processo
decisório das políticas públicas e ao controle sobre a ação do Estado (ARANTES et al., 2007).
Cabe destacar que a ênfase ao controle social que aqui será dada, refere-se às ações que os
cidadãos exercem para monitorar, fiscalizar avaliar e/ou interferir na gestão e não o inverso.
Dessa forma, a participação social é concebida na perspectiva do controle social.
No campo da saúde, o controle social deve ser compreendido como resultado da
participação direta da população no processo de gestão pública. Essa noção deve indicar uma
nova modalidade entre a sociedade e o Estado, onde o controle social é ao mesmo tempo
resultado do processo de democratização do país e um pressuposto essencial para a
consolidação desse ideal democrata (GERSCHMAN, 2004).
Para Rolim, Cruz e Sampaio (2013), o termo controle social é reducionista, uma vez
que não traduz a amplitude do direito assegurado na Constituição Federal (CF) de 1988, que
expõe não somente o controle e a fiscalização permanente dos recursos públicos, mas
também, a manifestação em ato e propositiva. Em ato, tendo cidadãos e políticos um papel
social a desempenhar através da execução de suas funções. De modo propositivo, com os
cidadãos participando da formulação de políticas, intervindo em decisões e orientando a
Administração Pública quanto às melhores medidas a serem adotadas com objetivo de atender
aos legítimos interesses públicos.
A partir da conquista do Sistema Único de Saúde (SUS), a saúde passa a ser concebida
como uma questão de cidadania, e a participação política na gestão do sistema se torna uma
condição sine quan non para o seu exercício (COTTA et al., 2011).
O Brasil, país de grandes desigualdades sociais, tem passado por importantes avanços
em sua história, no que se refere à participação e/ou controle social da saúde. Para
compreender elementos importantes da trajetória, penso ser interessante contextualizar
resumidamente a história das reformas que ocorreram no setor da saúde em alguns períodos
no País. No entanto, registro, desde já, que o marco histórico para sua compreensão traduz-se
68
pelo Movimento da Reforma Sanitária Brasileira (MRSB) (ROLIM; CRUZ; SAMPAIO,
2013; ILÍBIO; VIEIRA, 2017).
De 1822, período do Brasil Império até o fim do Regime Militar, em 1985, à saúde era
um “tema caro” para a maioria da população brasileira. Ilíbio e Vieira (2017, p. 80)
denominam a saúde como um “tema caro” por terem assistência à saúde somente quem
exercia trabalho formal e contribuía para adquirir tal direito. Tal modelo, denominado de
seguro social, teve seu início em 1923 com as Caixas de Aposentarias e Pensões (CAPs). O
Decreto n° 4.682/23, cria a primeira CAP, dos ferroviários, tendo-se esse modelo de seguro
social multiplicado nos anos subsequentes (COHN et al., 2015; CARVALHO et al., 2017).
A partir de 1930, são criados os Institutos de Aposentarias e Pensões (IAPs), que
institucionalizam o seguro social fragmentando as classes assalariadas urbanas por inserção
nos setores da atividade econômica: marítimos, bancários, comerciários, industriários e
outros. Ambos, CAPs e IAPs conviveram por décadas até 1966, quanto todo o sistema
previdenciário foi unificado, dando origem ao Instituto Nacional de Previdência Nacional
(INPS), e finalmente, em 1977, o Instituto Nacional de Previdência Médica e Previdência
Social (INAMPS) (COHN et al., 2015; ILÍBIO; VIEIRA, 2017; CARVALHO et al., 2017).
Do ponto de vista da relação Estado-Sociedade, os trabalhadores tinham assegurada
sua representação no Conselho de Administração das CAPs, elegendo diretamente dois
representantes dos empregados por empresa. Em 1933, com a substituição dos CAPs pelos
IAPs, organizados por categorias funcionais, a representação dos empregados e dos
empregadores passou a ser feita pelos sindicados, significando uma tendência de centralização
do poder decisório nas mãos do Estado. A diminuição da participação dos empregados e
empregadores no controle do sistema de saúde se intensificou após o golpe militar, em 1964,
com a criação do INPS, quando o Estado assumiu a direção do Instituto e consequentemente
empregados e empregadores perderam por completo o direito de gerir e definir a política
previdenciária e de saúde (ILÍBIO; VIEIRA, 2017; CARVALHO et al., 2017).
[...] é a partir desse momento, também, que tem origem uma característica
crucial da saúde em nosso país: a concepção da assistência médica, muito
mais restrita que saúde, como pertinente à esfera privada e não à pública.
Não se constitui, portanto, saúde como um direito do cidadão e muito menos
dever do Estado, mas sim a assistência médica como um serviço ao qual se
tem acesso a partir da clivagem da inserção no mercado de trabalho formal e
para a qual se tem que contribuir com um percentual do salário, sempre por
meio de um contrato compulsório (COHN et al., 2015, p. 18).
69
Com as profundas transformações da sociedade brasileira ocorridas nesse período,
sobretudo os processos de acelerada industrialização e urbanização, progressivamente os
serviços previdenciários de saúde vão sendo pressionados pela demanda dos trabalhadores
assalariados urbanos, sem outro serviço médico alternativo, quer estatal ou privado, à exceção
de uma rede de natureza filantrópica e de uma rarefeita rede pública hospitalar, ambulatorial e
de atenção primária (COHN et al., 2015). Vale ressaltar que a rede pública de serviços de
saúde não ofertava, até 1975, assistência médica individual. Somente a partir da promulgação
da Lei nº 6.229/75, publicada no DOU em dezoito de julho de 1975, que dispôs sobre a
organização do Sistema Nacional de Saúde, que os serviços ligados ao Ministério da Saúde
(MS) passaram também a contemplar os serviços de assistência médica individual (BRASIL,
1975).
Por conta disso, já na década de 70, as ações e serviços de saúde vinculados à
previdência social não eram suficientes para dar resposta às demandas da população,
especialmente aqueles à margem da previdência, como exemplo, as empregadas domésticas,
população rural e os desempregados (CARVALHO et al., 2017; CARVALHO; SANTOS,
1995). Surgem, então, as primeiras experiências de medicina comunitária no país, com a
população deixando de ser passiva e se responsabilizando mais ativamente por seu próprio
desenvolvimento social-sanitário (CARVALHO; SANTOS, 1995). No entanto, a lógica do
favorecimento do setor privado da assistência médica através da política previdenciária
prevalecia e prevaleceu de forma explícita até os anos de 1980.
Nesse contexto de materialização de um acentuado “sucateamento” na rede pública de
serviços de saúde (ILÍBIO; VIEIRA, 2017, p. 81; COHN et al., 2015, p. 20), de um “modelo
excludente” (DA ROS et al., 2006, p. 110), no auge da ditadura militar, surge com grande
força o MRSB. Segundo Da Ros et al. (2006), o MRSB foi constituído pelas seguintes frentes:
publicistas, preventivistas, Pastoral da Saúde, Movimento Intelectual da Área da Saúde (que
criou o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde/CEBES), Movimento de Renovação Médica
(REME), o Movimento Estudantil e o Movimento de Saúde Comunitária.
Apesar de todos possuírem raízes e características diferentes, se uniram pleiteando a
transformação política das práticas sanitárias e do conjunto do sistema de saúde até então
vigente, caracterizado pela prática curativa e privatista. Uma das grandes críticas dos
defensores do projeto reformador era o fato de a “[...] Previdência Social sustentar o setor
privado de assistência médica, fazendo este crescer com os recursos financeiros do Estado e
levando a ineficácia total da assistência à saúde pública” (GONÇALVES, 1999, p. 11).
70
O MRSB defendia a organização de um sistema de saúde hierarquizado, um sistema
único de saúde. Esse movimento foi ganhando forças no final da década de 70 e início da
década de 80, mas foi a partir de 1985 que se abriram espaços maiores de poder para o
Movimento. Durante o período de transição ditadura/redemocratização, o Movimento
Sanitário conseguiu grandes avanços, colocando em pauta questões de saúde, a exemplo da
possível unificação do Sistema (ESCOREL, 2008). Nesse mesmo ano, foram implantadas as
Ações Integradas de Saúde (AIS) que, entre outros aspectos, visava universalizar o
atendimento e a institucionalizar a participação de algumas parcelas mais organizadas da
população na gestão das ações de saúde. Foram criados órgãos colegiados, denominados
Comissões Interinstitucionais de Saúde, organizados em nível estadual (CIS), regional (CRIS)
e municipal (CIMS), que contavam com participação de gestores governamentais, prestadores
de serviços públicos e privados e representantes da população, na maioria das vezes, sindicato
ou associação de moradores (LOPES, 2000). Considera-se que a AIS foram a grande matriz
para o SUS (DA ROS, 2006).
Um ano depois, em 1986, realiza-se a 8ª Conferência Nacional de Saúde, que traz em
seu ideário propostas de reforma do sistema de saúde no país, apontando para a criação de um
SUS, descentralizado, e com acesso universal, como estratégias de fortalecimento do sistema
púbico de saúde. Nesse período de abertura democrática se reconhece a necessidade de
revisão do modelo de saúde vigente na época, com propostas discutidas em ampliar a
participação popular nas decisões e descentralizar a gestão pública em saúde, com vistas a
aproximar as decisões do estado ao cotidiano dos cidadãos brasileiros, consagrando e
assegurando a ideia de democracia com a participação da sociedade civil no controle e na
gestão de políticas públicas (ROLIM; CRUZ; SAMPAIO, 2013).
O compromisso do novo governo com a redemocratização repassou para Sérgio
Arouca, um dos integrantes e líderes do MRSB e na época diretor da Fundação Osvaldo Cruz,
a responsabilidade da coordenação da 8ª Conferência Nacional de Saúde (DA ROS, 2006).
A partir de 1983, o Movimento Sanitário ampliou a proposta de
reformulação do Sistema de Saúde, com a ocupação de espaços nas
instituições estatais da saúde, com o objetivo de produzir mudanças na
política de saúde e na medida em que o próprio processo de transição à
democracia o permitia. Este crescimento da proposta e do processo de
reformulação da política de saúde adquiriu sua mais acabada expressão com
a VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, na qual se definiu o projeto
da “Reforma Sanitária Brasileira”; o qual introduziu mudanças no setor da
saúde, de forma a torná-lo democrático, acessível, universal e socialmente
equitativo (GERSCHMAN, 1995, p. 42).
71
A 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em março de 1986, representou um
marco na história do controle social em saúde. Foi à primeira conferência aberta, com a
participação da sociedade organizada, envolvendo desde movimentos sociais à associação de
portadores de patologias e profissionais de saúde. A 8ª Conferência rompeu com o modelo
privatizante até então existente, resultando na implantação do Sistema Unificado e
Descentralizado de Saúde (SUDS), mediante um convênio realizado entre o INAMPS e os
governos estaduais. A 8ª Conferência também formou as bases para a seção “Da Saúde” da
CF de 1988, além de desempenhar um importante papel na propagação da Reforma Sanitária
(DA ROS, 2006). Ela consistiu em um amplo processo de mobilização social, que articulou
representação de diferentes segmentos e estimulou a realização de pré-conferências estaduais
e municipais, reunindo cerca de quatro mil pessoas em Brasília, dos quais mil eram delegados
com direito a voz e voto, para discutir os rumos do sistema de saúde (BRASIL, 1986). Essa
organização e mobilização popular realizada em prol de um Estado democrático e garantidor
do acesso universal aos direitos a saúde colocou em evidência a possiblidade de inversão do
controle social. Surge a perspectiva de um controle da sociedade civil sobre o Estado, que
durante muitos anos, foi exercido pelo Estado sobre a sociedade.
A CF de 05 de outubro de 1988 nasceu da base, das população e técnicos.
Denominada Constituição Cidadã, não sem razão, ela coloca como centro os direitos do povo
brasileiro. A maior das declarações é: “todo o poder emana do povo que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”, ou seja, conquistava-se
uma democracia representativa e participativa (BRASIL, 2018, p. 2; CARVALHO, 2007).
Paim (2009, p. 40) destaca também que “[...] tanto a Reforma Sanitária quanto o SUS
nasceram da sociedade, e não de governos e partidos”.
O Estado Democrático e de Direito está definido na CF como aquele que tem como
fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do
trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Constituem objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades
sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 2018, p. 2).
72
O SUS nesse contexto é “uma estratégia das mais importantes para a construção de um
país socialmente justo” (Souza, 2009, p. 912) e é a primeira política pública no Brasil a adotar
constitucionalmente a participação popular como um de seus princípios, sendo, como já dito,
um pressuposto essencial para a consolidação desse ideal democrata:
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede
regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de
acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem
prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade (BRASIL, 1988, grifo nosso).
A Lei n° 8080/90 estabelece em seu art. 12 a criação das Comissões Intersetorias
subordinadas ao Conselho Nacional de Saúde (CNS), com o objetivo de articular as políticas
públicas relevantes para a saúde:
Art. 12. Serão criadas comissões intersetoriais de âmbito nacional,
subordinadas ao Conselho Nacional de Saúde, integradas pelos Ministérios e
órgãos competentes e por entidades representativas da sociedade civil.
Parágrafo único. As comissões intersetoriais terão a finalidade de articular
políticas e programas de interesse para a saúde, cuja execução envolva áreas
não compreendidas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) (BRASIL,
1990b).
Entretanto, é a Lei nº 8.142/90 que dispõe sobre a participação social do SUS,
definindo que a participação popular estará incluída em todas as esferas de gestão do SUS:
Art. 1° O Sistema Único de Saúde (SUS), de que trata a Lei n° 8.080, de 19
de setembro de 1990, contará, em cada esfera de governo, sem prejuízo das
funções do Poder Legislativo, com as seguintes instâncias colegiadas:
I - a Conferência de Saúde; e
II - o Conselho de Saúde.
§ 1° A Conferência de Saúde reunir-se-á a cada quatro anos com a
representação dos vários segmentos sociais, para avaliar a situação de saúde
e propor as diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis
correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou, extraordinariamente,
por esta ou pelo Conselho de Saúde.
§ 2° O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão
colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço,
profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no
controle da execução da política de saúde na instância correspondente,
inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão
homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do
governo.
73
§ 3° O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Conselho
Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems) terão
representação no Conselho Nacional de Saúde.
§ 4° A representação dos usuários nos Conselhos de Saúde e Conferências
será paritária em relação ao conjunto dos demais segmentos.
§ 5° As Conferências de Saúde e os Conselhos de Saúde terão sua
organização e normas de funcionamento definidas em regimento próprio,
aprovadas pelo respectivo conselho (BRASIL, 1990a).
A concepção de controle social inscrita no texto constitucional e defendida pelo
movimento sanitarista é o da participação da sociedade na elaboração, implementação e
fiscalização das políticas de saúde, através dos Conselhos de Saúde e das Conferências nos
diferentes níveis: nacional, estadual, municipal e local (ABREU, 2014). Essa perspectiva é
considerada uma das formas mais avançadas de democracia, pois determina uma nova relação
entre Estado e a sociedade, de maneira que as decisões sobre as ações na saúde deverão ser
negociadas com os representantes da sociedade, uma vez que, estes conhecem a realidade da
saúde das comunidades (ROLIM; CRUZ; SAMPAIO, 2013).
Santos (2007) relata que a verdadeira reforma democrática do Estado foi realizada
pelo setor saúde por meio da criação e do funcionamento de Conselhos e das Comissões
Intergestoras. Há que se ressaltar que o setor da saúde foi pioneiro no processo de
implementação das práticas de participação social, justamente pela política efervescente que
caracterizou o final da década de 1970 e os anos 80, em especial, pelo MRSB (CORREIA,
2008).
Esse modelo de participação e/ou controle da população desenvolvido pelo SUS
influenciou a organização do controle social em outras áreas, tais como: assistência social,
mulher, meio ambiente, criança e adolescente, dentre outros. Também resultou em outras
políticas públicas, como política ambiental, de segurança alimentar e ainda, leis como o
Estatuto do Idoso e do Adolescente (ROCHA, 2014).
A evolução da participação social em vários setores da sociedade culminou com a
instituição de uma Política Nacional de Participação Social (PNPS) através do Decreto n°
8.243/14, publicado no DOU de 26/05/14, “com o objetivo de fortalecer e articular os
mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a
administração pública federal e a sociedade civil” (BRASIL, 2014). Esta política:
[...] reconhece a participação social como direito do cidadão e expressão de
sua autonomia e prega a complementariedade entre mecanismos da
democracia representativa, participativa e direta. Na prática, organiza as
instâncias de participação social já existentes em nível nacional, estabelece
74
diretrizes para seu funcionamento e estimula os órgãos e entidades da
administração pública federal a considerarem suas deliberações. A única
novidade é a ampliação dos espaços de diálogo por meio de plataformas
virtuais na internet, nas quais qualquer cidadão poderá se manifestar sobre
políticas públicas (DOMINGUES, 2014, p. 15).
No entanto, considerando os inúmeros avanços no tocante ao controle e/ou
participação social na gestão da política de saúde no Brasil e as transformações ocorridas nas
últimas décadas, no que se refere ao campo dos direitos conquistados por meio de
mobilizações da sociedade civil, ressurge a necessidade de fortalecimento do projeto sanitário
gestado na década de 1980. Os desafios em relação ao campo e à concretização da política de
saúde baseada nos princípios constitucionais e defesa do projeto sonhado pelo MRSB também
são colocados em questão.
Apesar de avanços significativos no exercício da democracia, a sociedade brasileira
continua a apresentar um forte “déficit democrático”, expresso na percepção generalizada de
que as elites políticas não representam os anseios da população e na persistência de graves
desigualdades sociais (SOUZA, 2014, p. 1018). A construção da Constituição Cidadã não foi
capaz de reduzir as iniquidades sociais e a cidadania tem se restringido a um caráter jurídico e
formal, não tendo alcançado o caráter transformador proposto pela Reforma Sanitária.
Isso é demostrado em estudos realizados, como exemplo, o descrito por Durán e
Gerschman (2014) com o objetivo de refletir sobre as possíveis modalidades de participação
social, e seus dilemas, encontrados nos Conselhos de Saúde, que revelam espaços altamente
institucionalizados que favorecem uma linha de atuação que hierarquiza e legitima as decisões
do gestor. Outro estudo, realizado por Guizardi e Pinheiro (2006, p. 804) demostra que
existem dificuldades culturais, que inibem a adequada participação de alguns membros dos
Conselhos e que isso caracteriza uma “relação assimétrica de poder”. Assim, o
desconhecimento e a falta de envolvimento dos conselheiros no processo de gestão em saúde
permitem aos detentores do poder político local exercer um maior controle sobre o
funcionamento do conselho como um todo.
Um aspecto apontado por Campos (2016, p. 5), ao comentar sobre as Conferências de
Saúde, é que “[...] esta performance inovadora de democracia popular não tem garantido,
automaticamente, efetividade política a essa forma de exercício de poder”, pois as resoluções
das Conferências de Saúde ao longo dos anos não têm orientado o planejamento e a gestão do
SUS. O autor descreve que o sentimento, após ter participado de uma das Conferências, era de
que nada asseguraria que os gestores acatariam as diretrizes e deliberações coletivas e, ainda,
75
mais grave o fato de parecer que as resoluções firmadas não cairiam nos corações e nas
mentes da sociedade.
É preciso lembrar que o SUS é, e sempre foi, desde a sua criação, um projeto de
disputa entre aqueles que o querem como uma conquista da sociedade e aqueles que desejam
o seu sucateamento e a privatização de seus serviços. Em 100% dos Relatórios Finais das
Conferências de Saúde analisados por Abreu (2014), de 1986 a 2013, aparecem propostas
contra a privatização da saúde no Brasil. No entanto, o chamado de projeto privatista, vem, ao
longo dos anos, debilitando e enfraquecendo os espaços de participação/controle social, por
representarem um risco de menor remuneração do capital financeiro àqueles que têm negócios
no setor privado de saúde.
Saúde é um direito essencial que, na Constituição, está colocado como dever do
Estado, mas que só acontecerá se todos nós cumprirmos com os nossos maiores e menores
deveres cotidianos, o que nos fará cidadãos plenos. O direito à saúde exige que cada um de
nós cumpra com seus deveres. Entre omitir-nos e compactuar existe uma terceira via: a
participação e luta de cada um de nós para que todos sejamos cidadãos plenos, iguais em
direitos e deveres. Ou seja, assumir o direito à saúde como parte da transformação de nosso
país.
Em síntese, a participação e/ou controle social em saúde é um direito de cidadania,
fruto de amplas mobilizações sociais desencadeadas no processo de redemocratização do
Estado brasileiro. Foi concebido no processo de Reforma Sanitária e posteriormente
regulamentado na CF de 1988, e em 1990 na Lei Orgânica da Saúde, com a garantia das
instâncias de participação no texto constitucional. O controle social no campo da saúde é um
direito fundamental para a consolidação do SUS e fortalecimento do projeto do MRSB. O
direito a saúde é uma conquista do movimento social e o caminho agora é a busca para a sua
real concretização.
3.4 Quando o Direito Social é Sufocado pela Economia: das fontes constitucionais de
receita à Emenda Constitucional 29
“A saúde é direito de todos e dever do estado”. Isso
significa dizer que a saúde é um direito e não um
serviço ao qual se tem acesso por meio de uma
contribuição ou pagamento de qualquer espécie.
Conforme a constituinte todos os cidadãos brasileiros
têm direito à atenção à saúde!
(Matta, 2007)
76
O direito a saúde está definido na CF de 1988 de forma clara entre os direitos
constitucionais inscritos no Art. 6º do Título II – “Dos direitos e Garantias Fundamentais”,
Capítulo II, que trata dos “Direitos Sociais”: [...] “são direitos sociais a educação, a saúde, a
alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados [...]”. Mais adiante no
Art. 196 do Título VIII – “Da ordem Social”, Capítulo II, Seção II – “Da Saúde”: [...] “A
saúde é direito de todos e dever do Estado” [...] (BRASIL, 1988, grifo nosso).
Genericamente, também podemos dizer, concordando com Carvalho (2007) que o
direito à saúde já está defendido na CF de 1988 logo no seu início, onde afirma-se que a
República Federativa do Brasil tem como fundamentos a cidadania, a dignidade da pessoa
humana e outros. Entre seus objetivos fundamentais estão à construção de uma sociedade
livre, justa e solidária com erradicação da pobreza e redução das desigualdades, além de
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e/ou quaisquer
outras formas de discriminação. O direito à saúde nesse sentido “tem como fundamento o
direito à vida e à vida em sua plenitude e abundância. Direito ao bem-estar, ao estar bem, à
felicidade individual e coletiva” (BRASIL, 1988; CARVALHO, 2007, p. 29).
Insisto em relembrar que o MRSB foi muito importante na luta pela formatação e
conquista de um sistema de saúde universal, como direito do cidadão e dever do estado.
Insisto em relembrar, também, que a VIII Conferência consagrou esses princípios que,
encaminhados à Constituinte, transformaram-se no SUS (BAPTISTA, 2007). Esta
Conferência, tendo como tema central “Saúde como Direito” definiu em seu Relatório Final
que:
Em seu sentido mais abrangente, a saúde é a resultante das condições de
alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho,
transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a
serviços de saúde. É assim, antes de tudo, o resultado das formas de
organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades
nos níveis de vida (BRASIL, 1986, p. 4).
Direito à saúde significa a garantia, pelo Estado, de condições dignas de vida
e de acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção
e recuperação de saúde, em todos os seus níveis, a todos os habitantes do
território nacional, levando ao desenvolvimento pleno do ser humano em sua
individualidade (BRASIL, 1986, p. 4).
77
Para que esse direito fosse garantido, foram discutidos mais dois temas e ambos
transcritos em seu relatório final: “Reformulação do Sistema Nacional de Saúde” e
“Financiamento do Setor”. O primeiro resultaria na criação de um Sistema Único de Saúde
(SUS) e geraria um “(...) novo arcabouço constitucional separando totalmente saúde de
previdência, através de uma ampla Reforma Sanitária”, além da criação, em nível federal, de
um ministério único para esse fim. Também definiu princípios para o novo sistema referente à
organização dos serviços, atinentes às condições de acesso e qualidade e relacionados às
políticas de recursos humanos e ainda apresentou quais seriam as principais contribuições dos
níveis federal, estadual e municipal nesse processo (BRASIL, 1986, p. 10).
Sobre o financiamento, a proposta era a criação de um “Fundo Único Federal de
Saúde”. Os recursos seriam determinados através da prefixação de percentual mínimo de 15%
(aprovado o percentual em plenária após a construção do texto original) sobre as receitas
públicas, além de serem desvinculados da Previdência Social (PS) e sua distribuição levaria
em consideração as condições de vida e de saúde de cada região (BRASIL, 1986):
Deverá ser constituído um orçamento social que englobe os recursos
destinados às políticas sociais dos diversos ministérios e aos distintos fundos
sociais. Este orçamento será repartido por setor, cabendo ao de saúde uma
parcela de recursos que constituirão o Fundo Único Federal de Saúde. Em
nível estadual e municipal serão formados Fundos Únicos de Saúde de
maneira análoga (BRASIL, 1986, p. 19).
Os recursos da Previdência serão gradativamente retirados do financiamento
das ações de saúde, devendo ser substituídos por fonte(s) alternativa(s),
permitindo melhorar as prestações pecuniárias (aposentadorias, pensões,
etc). Os recursos da Previdência Social devem destinar-se exclusivamente
para custear um seguro social justo aos trabalhadores da cidade e do campo.
Desta forma, o orçamento da Previdência deve ser administrado pelos
trabalhadores e utilizado somente para a concessão de benefícios e
aposentadorias igualitárias para trabalhadores rurais e urbanos (BRASIL,
1986, p. 20).
A distribuição de recursos financeiros não deve levar em consideração
apenas o contingente populacional de cada região e sua arrecadação fiscal.
Deve também considerar as condições de vida e de saúde da região,
promovendo assim uma distribuição mais justa e solidária (BRASIL, 1986,
p. 20).
O Relatório serviu como instrumento de pressão política no contexto da Nova
República e também de referência na discussão da Assembleia Nacional Constituinte nos anos
de 1987/88, sendo reconhecido como um documento de importante expressão social. O debate
constituinte foi acalorado, revelando resistências por parte dos prestadores de serviço privado
do setor da saúde e da medicina autônoma, além de conflitos de interesses entre os reformistas
78
atrelados ao MS e os reformistas da Previdência Social (PS). Tais disputas não foram
suficientes para barrar a aprovação do SUS e seus princípios, mas acabaram impedindo a
definição de algumas políticas importantes para o processo de implementação da reforma,
dentre elas, o financiamento, a regulação do setor privado, a estratégia para a descentralização
e a unificação do sistema (FARIA, 1997).
Uma vez legalizado o Sistema Único de Saúde (SUS) na CF de 1988, já no mesmo
ano, buscou-se definir regras em Lei Orgânica e em portarias do MS, para garantir o
financiamento do setor e a regulação do setor privado e demais pontos da política, na tentativa
de cumprir a lei constitucional que reconheceu saúde como “direito de todos e dever do
Estado”. Iniciaram debates em torno da Lei Orgânica da Saúde (LOS) 8.080/90, aprovada
somente dois anos após a aprovação do texto constitucional, a qual visava regulamentar o
SUS, a exemplo de questões referentes ao financiamento e da regulação do setor privado.
Porém, o contexto político no momento de negociação dessa Lei, marcado pelo último ano de
governo de José Sarney e o primeiro ano do governo Collor, não possibilitaram agilidade em
sua aprovação. Foram 390 dias de tramitação no Congresso Nacional e uma aprovação parcial
da Lei que, como já referido no tópico anterior, sofreu vetos presidenciais do então presidente
Collor (BRASIL, 1988; BAPTISTA; MACHADO, 2007).
Por força disso, três meses depois da aprovação da LOS 8.080/90, aprovou-se outra
Lei, complementar, a 8.142/90, definindo algumas propostas vetadas na lei anterior,
principalmente em questões relativas ao financiamento e participação social. Muitos outros
temas não foram resgatados, especialmente aqueles que já reuniam baixo consenso entre os
reformistas, como a isonomia salarial, a integração institucional MS-INAMPS e a definição
de um percentual de recursos da seguridade para a saúde. Contudo, apesar de já se passarem
mais de 20 anos de suas aprovações, ainda existem nas Leis reguladoras do SUS lacunas
expressivas para a implementação efetiva da política (BAPTISTA; MACHADO, 2007).
Sobre o financiamento da saúde, necessidade da definição de financiamento do setor
tem sido demanda recorrente, pois até os dias atuais não se alcançou tratamento legal
adequado. Foi um tema crítico na discussão da constituinte e ficou em aberto na legislação
complementar (CARVALHO, 2008; CEBES, 2011).
O financiamento da saúde é um problema crônico. Mendes e Marques (2009) afirmam
que os problemas relacionados ao financiamento sempre existiram. Isso porque as questões
que envolvem o tema estão relacionadas diretamente aos fatos sociais, políticos e econômicos
que ocorrem no país. Por exemplo, na época do INAMPS, no final da década de 1970 e na
década de 1980, aprofundou-se a chamada crise da previdência, que passou a viver
79
dificuldades financeiras por conta da ampliação dos seus beneficiários e estagnação de suas
receitas, afetada pela crise econômica iniciada em 1980 (SERRA; RODRIGUES, 2007;
COUTTOLENC, 2002).
A proposta da saúde era de que os recursos para a saúde estivessem separados e
fossem de fontes múltiplas e com quantidade e fontes definidas. Isto não foi possível. A saúde
foi englobada dentro da Seguridade Social, junto com Previdência e Assistência Social e, os
recursos, ainda que de fontes múltiplas, não puderam ficar definidos (CARVALHO, 2002).
Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações
de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os
direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma
direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e
das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da
lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados,
a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não
incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime
geral de previdência social de que trata o art. 201;
III - sobre a receita de concursos de prognósticos;
IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele
equiparar.
§ 1º As receitas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios destinadas
à seguridade social constarão dos respectivos orçamentos, não integrando o
orçamento da União.
§ 2º A proposta de orçamento da seguridade social será elaborada de forma
integrada pelos órgãos responsáveis pela saúde, previdência social e
assistência social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na lei
de diretrizes orçamentárias, assegurada a cada área a gestão de seus recursos.
(...)
§ 10 A lei definirá os critérios de transferência de recursos para o sistema
único de saúde e ações de assistência social da União para os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, e dos Estados para os Municípios,
observada a respectiva contrapartida de recursos.
Parágrafo acrescentado pela EC n. 20, de 15.12.1998 (BRASIL, 2018, p.
170-172).
Art. 198.
§ 1º O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com
recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.
Antigo parágrafo único renumerado pela EC n. 29, de 13.09.2000 (BRASIL,
2018, p. 173).
80
A legislação complementar, portanto, infraconstitucional da saúde (LOS 8.080/90),
estabelece que as transferências de recursos federais para estados, Distrito Federal e
municípios, devam ser realizadas de forma regular e automática por meio de Fundos de
Saúde.
Art. 33. Os recursos financeiros do Sistema Único de Saúde (SUS) serão
depositados em conta especial, em cada esfera de sua atuação, e
movimentados sob fiscalização dos respectivos Conselhos de Saúde.
§ 1º Na esfera federal, os recursos financeiros, originários do Orçamento da
Seguridade Social, de outros Orçamentos da União, além de outras fontes,
serão administrados pelo Ministério da Saúde, através do Fundo Nacional de
Saúde (BRASIL, 1990b).
O art. 35 da LOS 8080 define as variáveis a serem consideradas no cálculo dos
montantes a serem transferidos:
Art. 35°. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados,
Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes
critérios (...):
I - perfil demográfico da região;
II - perfil epidemiológico da população a ser coberta;
III - características quantitativas e qualitativas da rede de saúde na área;
IV - desempenho técnico, econômico e financeiro no período anterior;
V - níveis de participação do setor saúde nos orçamentos estaduais e
municipais;
VI - previsão do plano quinquenal de investimentos da rede;
VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas
de governo.
§ 1º Metade dos recursos destinados a Estados e Municípios será
distribuída segundo o quociente de sua divisão pelo número de
habitantes, independentemente de qualquer procedimento prévio. Revogado pela Lei Complementar nº 141, de 13/01/2012 (BRASIL, 1990b,
grifo nosso).
Até hoje tais critérios não são integralmente seguidos, por conta das dificuldades
vividas no processo de implantação do SUS. Como já dito, o ex-presidente Fernando Collor
de Mello vetou diversos dispositivos da LOS n° 8.080/90, dentre eles parágrafos do artigo 35,
que tratavam dos critérios para a transferência de recursos da União para os estados e
municípios. Foi a Lei n° 8.142/90 que tornou obrigatória a existência dos fundos de saúde nas
três esferas de governo.
81
Lei n° 8.142/90 que dispõe “(...) sobre as transferências intergovernamentais
de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências”
(...)
Art. 3
§ 1° Enquanto não for regulamentada a aplicação dos critérios previstos
no 35/8080, será utilizado, para o repasse dos recursos, exclusivamente o
critério estabelecido no parágrafo primeiro do mesmo artigo”.
Art. 4°. Para receberem os recursos (...) os Municípios, os Estados e o
Distrito Federal deverão contar com:
I - Fundo de Saúde;
II - Conselho de Saúde, com composição paritária;
III - Plano de Saúde;
IV - Relatórios de Gestão;
V - Contrapartida de recursos para a saúde no respectivo orçamento;
VI - Comissão de elaboração do Plano de Carreira, Cargos e Salários
(PCCS), previsto o prazo de dois anos para sua implantação.
Parágrafo único. O não atendimento pelos Municípios, ou pelos Estados, ou
pelo Distrito Federal, dos requisitos estabelecidos neste artigo, implicará
em que os recursos concernentes sejam administrados, respectivamente,
pelos Estados ou pela União.
(...)
Art. 5° É o Ministério da Saúde, mediante portaria do Ministro de Estado,
autorizado a estabelecer condições para aplicação desta lei (BRASIL, 1990a,
grifo nosso).
O que se percebe é que tanto a Lei n° 8.080/90, como a 8.142/90 que a complementa,
não explicitam os montantes a serem transferidos, nem traduzem operacionalmente a
composição dos critérios para as transferências federais. A cooperação financeira dos estados
aos municípios é estabelecida de modo vago, como também, não ficam claros os dispositivos
a serem utilizados no caso de estabelecimento de consórcios ou outros instrumentos para
formalização de acordos intergovernamentais envolvendo instâncias da mesma esfera do
governo. O montante a ser transferido pela União aos Estados, DF e Municípios, até a
regulamentação dos critérios que trata o art. 35 da LOS n° 8.080/90, seria baseado
exclusivamente no critério populacional (LIMA, 2013; CARVALHO, 2002).
É importante ressaltar que o art. 55 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT) estabeleceu que um mínimo de 30% do orçamento da Seguridade Social,
excluído o seguro desemprego, seria destinado ao setor saúde: “(...) até que seja aprovada a lei
de diretrizes orçamentárias, trinta por cento, no mínimo, do orçamento da seguridade social,
excluído o seguro-desemprego, serão destinados ao setor de saúde” (BRASIL, 2018, p. 220).
No entanto, Carvalho (2002) descreve que esse ADCT não foi cumprido pela equipe
econômica do governo federal e não se manteve na Lei de Diretrizes Orçamentarias (LDO)
depois de 1993. O presidente Itamar Franco vetou esse dispositivo e a indefinição total sobre
82
um montante estável para o financiamento do setor saúde resultou em crise a partir da década
de 1990 (CARVALHO, 2002; GOMES, 2014; SOARES; SANTOS, 2014).
A reforma do sistema de saúde representada pelo SUS foi dificultada também nos anos
90, quando simultaneamente outra reforma do Estado comandada pelo Ministério da Fazenda
(MF) promoveu abertura da economia, ajuste fiscal, contenção dos gastos públicos, reformas
administrativas desestruturantes, cortes de servidores públicos e rompimento precoce com a
lógica do bem-estar social, da cidadania e da seguridade social. Esse processo, conduzido com
mais habilidade a partir de 1995 pelos Ministérios da Administração e Reforma do Estado e
do Ministério do Planejamento, ampliou as barreiras e deu curso aos desvios da reforma
promovida pelo SUS (SANTOS, 2007; ABRASCO et al., 2006).
Após a regulamentação do SUS, disposta pelas LOS’s, prevaleceu a via infralegal, por
meio de numerosas portarias ministeriais, exigindo a construção de ferramentas operacionais
para materializar o novo sistema e colocar em prática seus princípios. Na década de 90, como
já dito em capítulo anterior, foram editadas as chamadas NOB’s associadas em geral, a
mecanismos financeiros. A Portaria MS/GM nº 1481, de 31 de dezembro de 1990, incumbiu
ao INAMPS de implantar a nova política de financiamento no SUS para o ano de 1991
(CARVALHO, 2002; GOMES, 2014; BRASIL, 1991). Isto significou manter a forma de
financiamento como de costume, a de valorizar a assistência médica, de caráter curativo e
especializado em detrimento às ações de prevenção e promoção à saúde. Estenderam-se ao
SUS os mecanismos usados pelo INAMPS para financiar as ações e serviços de saúde:
repasse por produção de serviços, transferências negociadas e as tabelas utilizadas pelo
INAMPS para pagar os prestadores privados de serviços.
Dessa forma, o SUS iniciou a sua atuação na área da assistência à saúde com caráter
universal, utilizando-se de uma instituição que tinha sido criada e organizada para prestar
assistência a uma parcela específica da população (SOUZA, 2002b).
Desde a criação do SUS, além das normas, pactos e decretos, houve inúmeras
mudanças nas fontes de financiamento do SUS, conforme quadro 3. Desde 1993, com o
esgotamento da principal fonte de financiamento para a saúde - a Contribuição sobre Folhas
de Salários (CFS), administrada pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, criou-se
uma instabilidade das fontes de recursos para o SUS (SERRA; RODRIGUES, 2007).
Abrindo um parênteses, é válido dizer que o longo período que precedeu a criação do
SUS, marcado pela dicotomia entre as ações preventivas do MS e as ações assistenciais pelo
sistema de saúde previdenciário, deixou heranças para os dias atuais (apesar de já se passarem
mais de 25 anos da criação do SUS) principalmente no que se refere ao mecanismo de repasse
83
de recursos. Este, baseado fundamentalmente no critério da remuneração por procedimentos,
tem dificultado o cumprimento da Lei n° 8.080/90 que enfatiza a referência populacional e
epidemiológica, mantendo a enorme disparidade existente na rede do nosso país, favorecendo
os maiores centros, como as regiões Sul e Sudeste, que tem maior capacidade de realizar mais
procedimentos de média e alta complexidade, além da existência de altos e inaceitáveis
índices de ações de saúde desnecessários, ocorridas além de outros fatores, pela
mercantilização (SERRA; RODRIGUES, 2007; SANTOS, 2007).
Para enfrentamento da crise econômica e de instabilidade de recursos instaurada na
década de 90, foram criados alguns dispositivos como o Fundo Social de Emergência (FSE), o
Fundo de Estabilização Fiscal (FEF) e foi criada pela Emenda Constitucional (EC) n° 12, de
15 de agosto de 1996, regulamentada pela Lei n° 9.311, de 24 de outubro de 1996, a da
Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), sendo oriunda das
instituições financeiras nas contas mantidas por correntistas sobre os movimentos financeiros
feitos pelos mesmos. Foi incluído o art. 74 nos ADCT:
Art. 74. A União poderá instituir contribuição provisória sobre
movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza
financeira.
§ 1º A alíquota da contribuição de que trata este artigo não excederá a vinte
e cinco centésimos por cento, facultado ao Poder Executivo reduzi-la ou
restabelecê-la, total ou parcialmente, nas condições e limites fixados em lei.
§ 2º A contribuição de que trata este artigo não se aplica o disposto nos arts.
153, § 5º, e 154, I, da Constituição.
§ 3º O produto da arrecadação da contribuição de que trata este artigo será
destinado integralmente ao Fundo Nacional de Saúde, para financiamento
das ações e serviços de saúde.
§ 4º A contribuição de que trata este artigo terá sua exigibilidade
subordinada ao disposto no art. 195, § 6º, da Constituição, e não poderá ser
cobrada por prazo superior a dois anos (BRASIL, 2018, p. 228-229, grifo
nosso).
A EC n° 21, criada em 18 de março de 1999, que “prorroga, alternando a alíquota, a
contribuição provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e de
direitos de natureza financeira, a que se refere o art. 74 do ADCT” (Brasil, 2018, p. 291)
incluí o artigo 75 no ADCT, com a seguinte redação:
Art. 75. É prorrogada, por trinta e seis meses, a cobrança da contribuição
provisória sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e
direitos de natureza financeira de que trata o art. 74, instituída pela Lei nº
9.311, de 24 de outubro de 1996, modificada pela Lei nº 9.539, de 12 de
dezembro de 1997, cuja vigência é também prorrogada por idêntico prazo.
84
§ 1º Observado o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição Federal, a
alíquota da contribuição será de trinta e oito centésimos por cento, nos
primeiros doze meses, e de trinta centésimos, nos meses subseqüentes,
facultado ao Poder Executivo reduzi-la total ou parcialmente, nos
limites aqui definidos.
§ 2º O resultado do aumento da arrecadação, decorrente da alteração da
alíquota, nos exercícios financeiros de 1999, 2000 e 2001, será destinado ao
custeio da previdência social.
§ 3º É a União autorizada a emitir títulos da dívida pública interna, cujos
recursos serão destinados ao custeio da saúde e da previdência social, em
montante equivalente ao produto da arrecadação da contribuição, prevista e
não realizada em 1999 (BRASIL, 2018, p. 229, grifo nosso).
Essa matéria foi alterada por mais oito leis, duas medidas provisórias até 2007 e ainda
por duas Emendas Constitucionais: a EC n° 37, criada em 12 de junho de 2002 e a EC n° 42,
criada em 19 de dezembro de 2003, que prorrogaram sua atuação ou modificaram sua
alíquota. Essas alterações nos ADCT demostram o caráter transitório das soluções, indicando
reduzida prioridade dos poderes instituídos (legislativo e executivo) para a solução de
medidas mais duradouras e suficientes (GOMES, 2014).
Cabe ressaltar que a CPMF utilizou-se da saúde como justificativa para a sua criação e
manutenção, no entanto, a situação de falta de recursos para o setor permaneceu inalterada.
Para Carvalho (2008, p. 44), a CPMF “já chegava à saúde mordida em 20%” pela
Desvinculação das Receitas da União, além do decréscimo de outras fontes como a
Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e a Contribuição Social
sobre o Lucro Líquido (CSSL).
Além da CPMF, outras soluções para o problema do financiamento foram
apresentadas: A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 169 (07/07/1993), que pretendia
garantir um mínimo de 30% dos recursos da Seguridade Social para à saúde, provenientes das
contribuições sociais e de 10% da receita dos impostos. Para estados e municípios, o mínimo
também seria 10% dos impostos; a PEC 82 (27/04/1995) destinava à saúde todos os recursos
das contribuições dos empregadores sobre o faturamento e o lucro, mais adiante, em
31/08/1999 foi determinada a anexação da PEC 82/1995 a PEC 169/93 e o agrupamento das
propostas deu origem a PEC 82-A (1999), sendo encaminhada ao Senado em 10 de novembro
de 1999. No Senado a PEC foi denominada PEC 86 (1999) e esta deu origem a EC n° 29
(GOMES, 2014).
A política de recursos financeiros na saúde, a despeito das definições contidas na
Constituição Federal de 1988 sobre as fontes que deveriam compor seu orçamento, avançou
somente em 2002, com a promulgação da EC n° 29, criada em 13 de setembro de 2000, que
85
garantiu recursos adicionais para a saúde e responsabilizou os entes federados pelo
financiamento do SUS, definindo os percentuais mínimos dos recursos financeiros que a
União, os Estados, o DF e os Municípios devem aplicar na saúde (BRASIL, 2000). A regra
geral, no período de transição (anos 2001-2004), deveria ser aplicado o montante disposto no
artigo 77 dos ADCT:
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias art. 77
Até o exercício financeiro de 2004, os recursos mínimos aplicados nas ações
e serviços públicos de saúde serão equivalentes:
I – no caso da União:
a) no ano 2000, o montante empenhado em ações e serviços públicos de
saúde no exercício financeiro de 1999 acrescidos de, no mínimo, cinco por
cento;
b) do ano 2001 ao ano 2004, o valor apurado no ano anterior, corrigido pela
variação nominal do Produto Interno Bruto – PIB;
II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, doze por cento do produto da
arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que
tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas
que forem transferidas aos respectivos Municípios; e
III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, quinze por cento do
produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos
de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º.
§ 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que apliquem
percentuais inferiores aos fixados nos incisos II e III deverão elevá-los
gradualmente, até o exercício financeiro de 2004, reduzida a diferença à
razão de, pelo menos, um quinto por ano, sendo que, a partir de 2000, a
aplicação será de pelo menos sete por cento.
§ 2º Dos recursos da União apurados nos termos deste artigo, quinze por
cento, no mínimo, serão aplicados nos Municípios, segundo o critério
populacional, em ações e serviços básicos de saúde, na forma da lei.
§ 3º Os recursos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
destinados às ações e serviços públicos de saúde e os transferidos pela União
para a mesma finalidade serão aplicados por meio de Fundo de Saúde que
será acompanhado e fiscalizado por Conselho de Saúde, sem prejuízo do
disposto no art. 74 da Constituição Federal.
§ 4º Na ausência da lei complementar a que se refere o art. 198, § 3º, a
partir do exercício financeiro de 2005, aplicar-se-á à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios o disposto neste artigo (BRASIL, 2018, p.
231, grifo nosso).
A lei complementar nº 141 foi promulgada somente 12 anos após a instituição da EC
n° 29, em 13 de janeiro de 2012, a qual regulamentou o parágrafo 3º do art. 198 da CF “[...]
para dispor sobre os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela União, Estados,
Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de saúde [...]”. Finalmente
estabeleceram-se previsões mais estáveis para o financiamento da saúde. No entanto, a lei
complementar manteve a mesma regra da EC n° 29/00, não acrescentando mais recursos
86
necessários ao SUS e mais uma vez, não fixou percentual a ser aplicado pela União em ações
e serviços públicos de saúde (BRASIL, 2012).
O estudo realizado por Soares e Santos (2014) demostrou que o perfil dos gastos em
saúde do período de 1995 até 2012 não deu conta de atender ao sonho do MRSB dos anos 80.
Comparando esses gastos com gastos internacionais, Produto Interno Bruto e com a Receita
Corrente Bruta do país, os autores evidenciaram uma queda acentuada da participação
proporcional do governo federal nos gastos com saúde, a qual se manteve ao longo de todos
os períodos. Em contrapartida, Estados e Municípios tiveram um aumento no percentual no
financiamento público de saúde; os municípios mais que dobraram esse percentual. Em
relação a países que possuem características do SUS, como o Canadá, Espanha, França e
Reino Unido, em comparação ao Brasil, o gasto per capita do Brasil, em 2011 foi de 476,65
dólares, contra 3.182,08 do Canadá, 2.238,18 da Espanha, 3.133,96 da França e 2.747, 29 do
Reino Unido (SOARES; SANTOS, 2014; BRASIL, 2015; GOMES, 2014).
A permanência dos baixíssimos recursos públicos para saúde, comparados
com os investimentos dos países desenvolvidos e com outros do dito
Terceiro Mundo, assim como a retração da contrapartida federal frente ao
crescimento das contrapartidas estaduais e municipais, são componentes da
mesma política econômico-social instalada no país a partir de 1990,
dificultando e distorcendo a implementação do novo modelo de atenção à
saúde. Esta política conflita com a Constituição Federal e a Lei Orgânica da
Saúde, e com as diretrizes assumidas pela tripartite, bipartites, Conselhos de
Saúde, Ministério Público, Frente Parlamentar da Saúde e pelas entidades
que integram o movimento da Reforma Sanitária Brasileira. Essa política de
diminuição do investimento em saúde, formulada pela "área econômica"
(Ministérios da Fazenda e Planejamento e Banco Central) desde 1990 é
inculcada a todos os governos e coligações partidárias como política de
Estado. A imagem-objetivo desta política, levada às últimas conseqüências,
constitui-se na consolidação do mercado de planos e seguros privados de
saúde. Estes se tornariam então no epicentro do sistema nacional de saúde,
elevando os atuais subsídios públicos ao consumo e o número de
consumidores. Isso tem como resultante a consolidação do caráter
complementar (e não central) do SUS ao mercado de planos e seguros. O
SUS vai se tornando "SUS pobre para os pobres", dentro da lógica dos
programas compensatórios, focalizados e de baixo custo (SANTOS, 2007, p.
432).
Somando a isso, na conjuntura atual, o SUS, como expressão institucional de um
direito social, encontra-se gravemente ameaçado. Um conjunto de ações conservadoras tem
buscado minar seus alicerces e fazer-nos retroceder às segmentações e hierarquizações que
conformaram historicamente a política de saúde. A aprovação da EC n° 86/15, que formalizou
o sub financiamento do sistema, a Lei n° 13.019 que abriu de modo inconstitucional, a
87
assistência à saúde ao capital estrangeiro, a EC n° 95/16 que instituiu o novo Regime Fiscal e
congelou por 20 anos os recursos destinados às políticas sociais e a Portaria nº 2.436, de 21 de
setembro de 2017, “a nova PNAB”, que permite que os investimentos federais contemplem
uma nova modalidade de equipe de Atenção Básica, no modelo tradicional e com menos
profissionais, são alguns exemplos de tais ameaças, absolutamente concretas (BRASIL, 2015;
2016; 2017; GUIZARDI, 2015).
Paim (2012) concorda que a sustentabilidade institucional e econômica do SUS
encontra-se ameaçada e informa que uma das justificativas apresentadas para a rejeição do
projeto que obrigava a destinação de 10% do orçamento federal para a saúde foi à crise
internacional. Não só o Brasil, assim como vários outros governos, têm feito a opção pela
austeridade fiscal1 em meio a importante recessão econômica, até mesmo por pressão de
instituições financeiras internacionais, como o Fundo Monetário Internacional e Banco
Mundial que, para conceder empréstimos aos países nos momentos de crise econômica,
impõem condicionantes aos governos que limitam o direito à saúde por mudanças no volume
e qualidade dos serviços prestados. Tais condições impostas são reformas fiscais e
institucionais que resultam na adoção de medidas como: focalização de programas, corte de
gasto social, ajustes estruturais para a introdução de taxas e de copagamento no uso dos
serviços de saúde, desregulação do setor de saúde para aumentar a participação do setor
privado na prestação de serviços e descentralização de responsabilidades fiscais e
operacionais para os níveis subnacionais (SANTOS; VIEIRA, 2018).
Para Butierres e Mendes (2010), a mundialização financeira produz uma difusão das
relações mercantis, conduzindo a um retrocesso no campo dos direitos, especialmente os
sociais e nas políticas públicas. Dessa forma, as políticas governamentais privilegiam a esfera
financeira em detrimento dos diretos sociais e das políticas públicas correspondentes.
Enfim, embora avanços importantes tenham sido feitos a partir da CF de 1988,
referente à transferência de recursos e a aprovação da EC n° 29/2000 por LC em 2012, há um
longo caminho a ser percorrido na garantia desse direito social – o direito à saúde, não apenas
em termos de quantidade de serviços disponíveis, mas também em qualidade, eficiência e
distribuição igualitária dos serviços, com vistas à diminuição das desigualdades. Esse é o
desafio a ser enfrentado pelo SUS e por nós cidadãos plenos e corresponsáveis por essa
política.
1 A austeridade fiscal caracteriza-se por escolhas que exigem grandes sacrifícios da população, seja porque
aumentam a carga tributária, seja pela implementação de medidas que restringem a oferta de benefícios, bens e
serviços públicos, em razão de cortes de despesas e/ou realização de reformas estruturais (SANTOS; VIEIRA,
2018)
88
Quadro 3 - Fontes de Financiamento do SUS – Evolução Histórica
Proposta Características O que se propõe/ Financiamento
8ª CNS
- Instrumento de pressão política no
contexto da Nova República e também de
referência na discussão da Assembleia
Nacional Constituinte nos anos de 1987/88,
sendo reconhecido como um documento de
importante expressão social.
- Criação de um Fundo Único Federal de
Saúde;
- Determinação dos recursos através da
prefixação de percentual mínimo (proposta
de 15%) sobre as receitas públicas;
- Recursos desvinculados da Previdência
Social (PS);
- Recursos com distribuição levando em
consideração as condições de vida e de
saúde de cada região.
CF
05/10/1988
- Saúde como direito de todos e dever do
Estado;
- Criação do SUS.
- O SUS será financiado, nos termos do art.
195, com recursos do orçamento da
seguridade social, da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, além
de outras fontes;
Art.195: “A seguridade social será
financiada por toda a sociedade, de forma
direta e indireta, nos termos da lei, mediante
recursos provenientes dos orçamentos da
União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios, e das seguintes
contribuições sociais...”;
As principais contribuições sociais são:
- Contribuição sobre a Folha de Salários;
- Fundo de Investimento Social;
- Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social;
- Contribuição sobre o Lucro Líquido.
Artigo 55 do
Ato das
Disposições
Constitucionais
Transitórias
(ADCT)
05/10/1988
- 30% do orçamento da Seguridade Social
para o setor saúde, excluído o seguro
desemprego.
EC 12
15/08/96
- Permite a União “instituir contribuição
provisória sobre movimentação ou
transmissão de valores e de créditos e
direitos de natureza financeira”.
- Inclui o Art. 74 nos ADCT.
Artigo 74 do
Ato das
Disposições
Constitucionais
Transitórias
(ADCT)
15/08/96
- Art. 74
§ 1º A alíquota da contribuição de que trata
este artigo não excederá a vinte e cinco
centésimos por cento, facultado ao Poder
Executivo reduzi-la ou restabelecê-la, total
ou parcialmente, nas condições e limites
fixados em lei.
§ 2º À contribuição de que trata este artigo
não se aplica o disposto nos arts. 153, § 5º, e
154, I, da Constituição.
§ 3º O produto da arrecadação da
contribuição de que trata este artigo será
destinado integralmente ao Fundo Nacional
de Saúde, para financiamento das ações e
serviços de saúde.
§ 4º A contribuição de que trata este artigo
89
terá sua exigibilidade subordinada ao
disposto no art. 195, § 6º, da Constituição, e
não poderá ser cobrada por prazo superior a
dois anos.
Lei 9311
24/11/96
- Lei regulamentadora da EC 12 - Institui a Contribuição Provisória sobre
Movimentação ou Transmissão de Valores
e de Créditos e Direitos de Natureza
Financeira - CPMF, e dá outras
providências.
EC 20
15/12/1988
- Modifica o sistema de previdência social,
estabelece normas de transição e dá outras
providências.
- Acrescenta parágrafo no Art. 195 da CF
§ 10 A lei definirá os critérios de
transferência de recursos para o sistema
único de saúde e ações de assistência social
da União para os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios, e dos Estados para os
Municípios, observada a respectiva
contrapartida de recursos.
EC 21
18/03/1999
- Prorroga, alterando a alíquota, a
contribuição provisória sobre
movimentação ou transmissão de valores e
de créditos e de direitos de natureza
financeira, a que se refere o art. 74 do Ato
das Disposições Constitucionais
Transitórias.
- Inclui o art. 75 no ADCT.
Artigo 75 do
Ato das
Disposições
Constitucionais
Transitórias
(ADCT)
Art. 75: É prorrogada, por trinta e seis
meses, a cobrança da contribuição
provisória sobre movimentação ou
transmissão de valores e de créditos e
direitos de natureza financeira de que trata o
art. 74, instituída pela Lei nº 9.311, de 24 de
outubro de 1996, modificada pela Lei nº
9.539, de 12 de dezembro de 1997, cuja
vigência é também prorrogada por idêntico
prazo.
§ 1º Observado o disposto no § 6º do art.
195 da Constituição Federal, a alíquota da
contribuição será de trinta e oito centésimos
por cento, nos primeiros doze meses, e de
trinta centésimos, nos meses subseqüentes,
facultado ao Poder Executivo reduzi-la total
ou parcialmente, nos limites aqui definidos.
§ 2º O resultado do aumento da arrecadação,
decorrente da alteração da alíquota, nos
exercícios financeiros de 1999, 2000 e 2001,
será destinado ao custeio da previdência
social.
§ 3º É a União autorizada a emitir títulos da
dívida pública interna, cujos recursos serão
destinados ao custeio da saúde e da
previdência social, em montante equivalente
ao produto da arrecadação da contribuição,
prevista e não realizada em 1999".
EC 29
13/09/2000
- Altera o artigo 198 da CF e acrescenta
artigo ao ADCT, para assegurar recursos
mínimos para financiamento das ações e
serviços públicos de saúde.
- Art. 6º O art. 198 passa a vigorar acrescido
dos seguintes §§ 2º e 3º, numerando-se o
atual parágrafo único como § 1º:
Art.198...........................................
§ 1º (parágrafo único original)..................
§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios aplicarão, anualmente, em
90
ações e serviços públicos de saúde recursos
mínimos derivados da aplicação de
percentuais calculados sobre:
I – no caso da União, na forma definida nos
termos da lei complementar prevista no § 3º
II – no caso dos Estados e do Distrito
Federal, o produto da arrecadação dos
impostos a que se refere o art. 155 e dos
recursos de que tratam os arts. 157 e 159,
inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as
parcelas que forem transferidas aos
respectivos Municípios
III – no caso dos Municípios e do Distrito
Federal, o produto da arrecadação dos
impostos a que se refere o art. 156 e dos
recursos de que tratam os arts. 158 e 159,
inciso I, alínea b e § 3º
§ 3º Lei complementar, que será reavaliada
pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá:
I – os percentuais de que trata o § 2º
II – os critérios de rateio dos recursos da
União vinculados à saúde destinados aos
Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios, e dos Estados destinados a seus
respectivos Municípios, objetivando a
progressiva redução das disparidades
regionais
III – as normas de fiscalização, avaliação e
controle das despesas com saúde nas esferas
federal, estadual, distrital e municipal
IV – as normas de cálculo do montante a ser
aplicado pela União
- Inclui o Art. 77 no ADCT.
Artigo 77 do
Ato das
Disposições
Constitucionais
Transitórias
(ADCT)
13/09/2000
- Art. 77: Até o exercício financeiro de
2004, os recursos mínimos aplicados nas
ações e serviços públicos de saúde serão
equivalentes:
I – no caso da União:
a) no ano 2000, o montante empenhado em
ações e serviços públicos de saúde no
exercício financeiro de 1999 acrescido de,
no mínimo, cinco por cento;
b) do ano 2001 ao ano 2004, o valor
apurado no ano anterior, corrigido pela
variação nominal do Produto Interno Bruto
– PIB
II – no caso dos Estados e do Distrito
Federal, doze por cento do produto da
arrecadação dos impostos a que se refere o
art. 155 e dos recursos de que tratam os arts.
157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II,
deduzidas as parcelas que forem transferidas
aos respectivos Municípios; e
III – no caso dos Municípios e do Distrito
Federal, quinze por cento do produto da
arrecadação dos impostos a que se refere o
art. 156 e dos recursos de que tratam os arts.
158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º
§ 1º Os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios que apliquem percentuais
91
inferiores aos fixados nos incisos II e III
deverão elevá-los gradualmente, até o
exercício financeiro de 2004, reduzida a
diferença à razão de, pelo menos, um quinto
por ano, sendo que, a partir de 2000, a
aplicação será de pelo menos sete por cento
§ 2º Dos recursos da União apurados nos
termos deste artigo, quinze por cento, no
mínimo, serão aplicados nos Municípios,
segundo o critério populacional, em ações e
serviços básicos de saúde, na forma da lei
§ 3º Os recursos dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios destinados às
ações e serviços públicos de saúde e os
transferidos pela União para a mesma
finalidade serão aplicados por meio de
Fundo de Saúde que será acompanhado e
fiscalizado por Conselho de Saúde, sem
prejuízo do disposto no art. 74 da
Constituição Federal
§ 4º Na ausência da lei complementar a
que se refere o art. 198, § 3º, a partir do
exercício financeiro de 2005, aplicar-se-á
à União, aos Estados, ao Distrito Federal
e aos Municípios o disposto neste artigo.
EC 37
12/07/2002
- Altera os arts. 100 e 156 da Constituição
Federal e acrescenta os arts. 84, 85, 86, 87
e 88 ao ADCT.
- Inclui o Art. 84 no ADCT.
Artigo 84 do
Ato das
Disposições
Constitucionais
Transitórias
(ADCT)
- A contribuição provisória sobre
movimentação ou transmissão de valores e
de créditos e direitos de natureza
financeira, prevista nos arts. 74, 75 e 80, I,
deste Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, será cobrada até 31 de
dezembro de 2004.
- Art. 84
§ 1º Fica prorrogada, até a data referida
no caput deste artigo, a vigência da Lei nº
9.311, de 24 de outubro de 1996, e suas
alterações.
§ 2º Do produto da arrecadação da
contribuição social de que trata este artigo
será destinada a parcela correspondente à
alíquota de:
I - vinte centésimos por cento ao Fundo
Nacional de Saúde, para financiamento das
ações e serviços de saúde;
II - dez centésimos por cento ao custeio da
previdência social;
III - oito centésimos por cento ao Fundo de
Combate e Erradicação da Pobreza, de que
tratam os arts. 80 e 81 deste Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias.
§ 3º A alíquota da contribuição de que trata
este artigo será de:
I - trinta e oito centésimos por cento, nos
exercícios financeiros de 2002 e 2003;
II - oito centésimos por cento, no exercício
financeiro de 2004, quando será
integralmente destinada ao Fundo de
Combate e Erradicação da Pobreza, de que
tratam os arts. 80 e 81 deste Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias.
EC 42
19/12/2003
- Altera o Sistema Tributário Nacional e
dá outras providências.
- Art.90: O prazo previsto no caput do art.
84 do ADCT fica prorrogado até 31 de
dezembro de 2007.
§ 1º Fica prorrogada, até a data referida
92
no caput deste artigo, a vigência da Lei nº
9.311, de 24 de outubro de 1996, e suas
alterações.
§ 2º Até a data referida no caput deste
artigo, a alíquota da contribuição de que
trata o art. 84 deste ADCT será de trinta e
oito centésimos por cento.
LC nº 141
13/01/12
- Lei Regulamentadora da EC 29
Regulamenta o parágrafo 3º do art. 198 da
Constituição Federal para dispor sobre os
valores mínimos a serem aplicados
anualmente pela União, Estados, Distrito
Federal e Municípios em ações e serviços
públicos de saúde; estabelece os critérios
de rateio dos recursos de transferências
para a saúde e as normas de fiscalização,
avaliação e controle das despesas com
saúde nas 3 (três) esferas de governo;
revoga dispositivos das Leis nº 8.080, de
19 de setembro de 1990, e n° 8.689, de 27
de julho de 1993; e dá outras providências.
- Art. 5º A União aplicará, anualmente, em
ações e serviços públicos de saúde, o
montante correspondente ao valor
empenhado no exercício financeiro anterior,
apurado nos termos desta Lei
Complementar, acrescido de, no mínimo, o
percentual correspondente à variação
nominal do Produto Interno Bruto (PIB)
ocorrida no ano anterior ao da lei
orçamentária anual.
- Art. 6o Os Estados e o Distrito Federal
aplicarão, anualmente, em ações e serviços
públicos de saúde, no mínimo, 12% (doze
por cento) da arrecadação dos impostos a
que se refere o art. 155 e dos recursos de
que tratam o art. 157, a alínea “a” do inciso
I e o inciso II do caput do art. 159, todos da
CF, deduzidas as parcelas que forem
transferidas aos respectivos Municípios.
- Art. 7o Os Municípios e o Distrito Federal
aplicarão anualmente em ações e serviços
públicos de saúde, no mínimo, 15% (quinze
por cento) da arrecadação dos impostos a
que se refere o art. 156 e dos recursos de
que tratam o art. 158 e a alínea “b” do inciso
I do caput e o parágrafo 3º do art. 159, todos
da CF.
- Art. 8o O Distrito Federal aplicará,
anualmente, em ações e serviços públicos de
saúde, no mínimo, 12% (doze por cento) do
produto da arrecadação direta dos impostos
que não possam ser segregados em base
estadual e em base municipal.
Decreto
nº 7827
16/10/12
- Regulamenta os procedimentos de
condicionamento e restabelecimento das
transferências de recursos provenientes das
receitas de que tratam o inciso II do caput
do art. 158, as alíneas "a" e "b" do inciso I
e o inciso II do caput do art. 159 da
Constituição, dispõe sobre os
procedimentos de suspensão e
restabelecimento das transferências
voluntárias da União, nos casos de
descumprimento da aplicação dos recursos
em ações e serviços públicos de saúde de
que trata a Lei Complementar nº 141, de 13
de janeiro de 2012, e dá outras
providências.
Lei nº 12.858
09/09/13
- Dispõe sobre a destinação para as áreas
de educação e saúde de parcela da
participação no resultado ou da
compensação financeira pela exploração de
petróleo e gás natural, com a finalidade de
- Art. 2º Para fins de cumprimento da meta
prevista no inciso VI do caput do art. 214 e
no art. 196 da Constituição Federal, serão
destinados exclusivamente para a educação
pública, com prioridade para a educação
93
cumprimento da meta prevista no inciso VI
do caput do art. 214 e no art. 196 da
Constituição Federal; altera a Lei nº 7.990,
de 28 de dezembro de 1989; e dá outras
providências.
básica, e para a saúde, na forma do
regulamento, os seguintes recursos:
§ 3º União, Estados, Distrito Federal e
Municípios aplicarão os recursos previstos
nos incisos I e II deste artigo no montante
de 75% (setenta e cinco por cento) na área
de educação e de 25% (vinte e cinco por
cento) na área de saúde.
- Art. 4º Os recursos destinados para as
áreas de educação e saúde na forma do art.
2º serão aplicados em acréscimo ao mínimo
obrigatório previsto na Constituição
Federal.
EC 86
17/03/15
- Altera os arts. 165,166 e 198 da CF, para
tornar obrigatória a execução da
programação orçamentária que a
especifica.
- Revogou a reavaliação das normas de
cálculo do montante a ser aplicado pela
União; os recursos pela exploração de
petróleo e gás natural destinados para área
da saúde não serão acrescidos ao montante
mínimo obrigatório pela Lei 12.858
(09/09/2013);
- 0,6% da RLC destinadas às emendas
individuais será alocado para a saúde e
computados para fins do cumprimento
mínimo de execução; e o percentual
definido pela aplicação da União de 15% da
RLC evoluirá de modo gradual em cinco
anos de, no mínimo, 13,2%, 13,.7%, 14,1%,
14,5%, 15%.
EC 95
15/12/2016
- Altera o Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, para instituir
o Novo Regime Fiscal, e dá outras
providências.
- Inclui o Art. 106 no ADCT.
Artigo 106 do
Ato das
Disposições
Constitucionais
Transitórias
(ADCT)
- Fica instituído o Novo Regime Fiscal no
âmbito dos Orçamentos Fiscal e da
Seguridade Social da União, que vigorará
por vinte exercícios financeiros, nos termos
dos arts. 107 a 114 deste Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias.
- Art. 110. Na vigência do Novo Regime
Fiscal, as aplicações mínimas em ações e
serviços públicos de saúde e em manutenção
e desenvolvimento do ensino equivalerão:
I - no exercício de 2017, às aplicações
mínimas calculadas nos termos do inciso I
do § 2º do art. 198 e do caput do art. 212, da
Constituição Federal; e
II – nos exercícios posteriores, aos valores
calculados para as aplicações mínimas do
exercício imediatamente anterior, corrigidos
na forma estabelecida pelo inciso II do § 1º
do art. 107 deste Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias.
Fonte: Elaborado pela autora baseado na Constituição Federal atualizada até a EC n. 99/2017 (2018)
94
4 MARCO CONTEXTUAL
“Nosso débito é grande com os
desassistidos deste país,
e eles têm pressa”!
Davi Capistrano
O marco contextual desse trabalho compreende a cidade de Itajaí. Um município do
estado de Santa Catarina, fundado em 15 de junho de 1860, localizado no litoral norte
catarinense, especificamente na foz do Rio Itajaí-Açu.
Figura 3 - Localização de Itajaí no Estado de Santa Catarina
Fonte: Wikipédia (2017).
4.1 Por que Itajaí?
Por sonhar em desenvolver a pesquisa no município em que trabalho, por vivenciar
fragilidades e limitações em experiências cotidianas na atenção básica do SUS que sugerem
uma interface com a organização do processo de trabalho, em nível de gestão. Essas
experiências recheadas de angústias, aumentaram o desejo de conhecer, compreender e
participar das lutas travadas pela gestão municipal.
Como complemento, pela própria constituição histórica do município e pela sua
posição regional na rede de atenção (ITAJAÍ, 2014).
4.2 Aspectos Históricos do Município
Itajaí é um nome tupi, oriundo da palavra Tajahy, que significa “Rio dos Taiás”, uma
planta comestível da família das aráceas. Outra tese mais aceita por estudiosos brasileiros e
95
estrangeiros e até mesmo por sua população, é que Itajaí pode significar “água do senhor da
pedra”, através da junção dos termos itá (“pedra”), îara (“senhor”) e ‘y (“água”). Acredita-se
que a origem indígena do nome justificaria a história de transformações de Itajaí. A rocha (ita)
simbolizaria a solidez sobre a qual o povo fundamenta seu desenvolvimento, impassível frente
às adversidades. Ao mesmo tempo, o movimento das águas (jaí), representado pelos rios que a
recortam, simbolizaria a busca constante por novos caminhos e a vontade da cidade em se
recriar (WIKIPÉDIA, 2017; ITAJAI, 2017c).
Quando os primeiros colonizadores vieram se fixar nas terras junto à foz do rio Itajaí-
Açu, os indígenas já faziam frente à ocupação das mesmas terras que, pouco a pouco, lhe
foram tomadas. Índios Carijós ou Caigangues, que até o século XVI, habitavam em todo o
atual litoral do estado de Santa Catarina, foram sendo escravizados para servir de mão de obra
nas plantações de cana de açúcar com a chegada de navegadores espanhóis e portugueses
(ITAJAÍ, 2017c).
Inicialmente, a ocupação das terras de Itajaí pelo homem branco se deu pela iniciativa
de João Dias de Arzão, companheiro do fundador de São Francisco do Sul em 1658. Ele era
paulista e sua família, a tempo, procurava minas de ouro e outros metais preciosos pelo
interior do Brasil. Naquele ano, ele requereu uma sesmaria (lote colonial), às margens do rio
Itajaí-Açu e ali construiu moradia. Seu interesse maior era a cata de ouro e não tinha nenhuma
intenção de formar ali uma póvoa. Já a partir do século XVII, diversas recomendações foram
feitas ao governo colonial no sentido de se promover a colonização das terras do Vale do
Itajaí, consideradas férteis e estratégicas para a fundação de colônias, no entanto, não foram
levadas em consideração (ITAJAÍ, 2017c).
Durante o século XVIII, a grande atividade econômica desenvolvida nas terras do
Itajaí foi à extração de madeiras, exportada para Santos e Rio de Janeiro, o que ocasionou
uma afluência de moradores, notadamente açorianos. Com a riqueza da madeira disponível, a
abundância da pesca e a fertilidade das terras, motivaram vários especuladores (altos
funcionários públicos, militares, eclesiásticos e comerciantes) a requererem sucessivas
sesmarias, prejudicando o direito de posse de moradores antes estabelecidos. Assim, no
começo do século XIX, as terras da Foz do Itajaí estavam todas tomadas por diversos
sesmeiros (ITAJAÍ, 2017c).
Motivado pela inexistência de qualquer obra e ao mesmo tempo as vantagens
econômicas da exploração da madeira, Antônio Menezes Vasconcelos de Drummond, um
jovem de 25 anos, morador do Rio de janeiro, que estava em Santa Catarina, como
contratador dos reais cortes de madeira, solicitou apoio governamental para a fundação de
96
uma colônia nas terras de Itajaí. O rei D. João VI autorizou o jovem a estabelecer uma colônia
em duas sesmarias reais junto ao rio Itajaí-Mirim, na atual região de Itaipava por aviso real de
05 de janeiro de 1820, porém, após iniciar os trabalhos de implantação da colônia, resolveu
suspender a tarefa, pois sabia que acabaria o apoio do governo (ITAJAÍ, 2017c).
Ainda no começo do século XIX, intensificou-se o comércio que os moradores de
Itajaí faziam com comerciantes de várias vilas do litoral catarinense. Numa dessas viagens
Agostinho Alves Ramos pela primeira vez chegou à Foz do Itajaí-Açu. Era português e sócio
de uma casa comercial em Desterro. Percebendo no local um bom ponto comercial, logo se
estabeleceu ali com sua esposa Ana Maria Rita. Com vistas a fundar uma póvoa, solicitou ao
Bispo do Rio de Janeiro um requerimento para a criação de um Curato, estabelecido em 31 de
março de 1824. E com a criação do Curato do Santíssimo Sacramento, estava fundada Itajaí.
O primeiro grupo de moradores da cidade foi de pessoas de São Francisco do Sul,
Florianópolis, Armação do Itapocorói e São Miguel da Terra Firme, majoritariamente luso-
açorianos. Devido a excelente posição geográfica, dispondo de bom porto, a localidade, desde
o seu povoamento, recebeu moradores de outros pontos de Santa Catarina e do Brasil, além de
estrangeiros, em sua maioria alemã, italiana e polonesa. Apesar da variedade de etnias
imigrantes que constituíram a população itajaiense, a marca cultural prevalecente da cidade
ficou sendo a luso-açoriana (ITAJAÍ, 2017c).
Em 1858, um grupo de destacados moradores encabeçou um movimento para a
criação do Município de Itajaí. Agostinho Alves Ramos, considerado seu fundador, já não
vivia mais, morrera em 1853. A emancipação política foi considerada uma luta gloriosa, pois
ocorreu uma oposição muito forte por parte da Câmara Municipal de Porto Belo, a quem Itajaí
estava subordinada. Através da resolução nº 464, de 04 de abril de 1859, criou-se o município
de Itajaí, que só foi instalado em 15 de junho de 1860, com posse de seus primeiros
vereadores (ITAJAI, 2017c).
4.3 Aspectos Demográficos e Socioeconômicos do Município
Itajaí faz parte da Região de Saúde da Foz do Rio Itajaí (Vale do Itajaí), composta
pelos municípios Camboriú, Balneário Camboriú, Itapema, Porto Belo, Ilhota, Luiz Alves,
Navegantes, Penha, Piçarras e Bombinhas. A Região foi criada em 28 de setembro de 1971,
através do Decreto Estadual nº 844/71, que criou as regiões polarizadas no Estado. Possui
área total de 1531 km² e correspondente a 1,6% da área total do estado de Santa Catarina
(ITAJAÍ, 2014).
97
Sua população, segundo o último censo realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), era de 183.373 habitantes e sua população estimada atual
(2018) é de 215.895. Esse número corresponde a 2,98% da população do estado e ocupa a 7ª
colocação entre as cidades mais populosas de Santa Catarina. Possui uma área territorial de
288,286 Km e uma densidade populacional de 636,11 hab/km². Seu clima é caracterizado
como mesotérmico úmido, sem estação seca e com verões quentes. É considerada uma das
cidades mais ricas de Santa Catarina (SC), atualmente possui o terceiro maior produto interno
bruto (PIB) e renda per capita do estado. É ainda sede da maior universidade privada do
estado, a Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) (IBGE, 2018).
Colonizada por portugueses, no século XVIII e alemães no século XIX, desde os seus
primórdios, a cidade tem uma forte ligação com a navegação e atualmente abriga um dos
maiores complexos portuários do país. É o segundo porto brasileiro em movimentação de
cargas em contêineres e o maior exportador de carnes congeladas do Brasil (ITAJAI, 2017b).
Atualmente Itajaí apresenta uma economia sólida e um padrão de qualidade de vida
relativamente alto (IDH-M 0,795). Sua localização continua condicionando o
desenvolvimento da atividade pesqueira, portuária e industrial. É considerada referência
nacional em infraestrutura voltada à instalação de empresas. A produção industrial predomina
como atividade econômica, destacando-se a área têxtil. Em matéria de expansão, os setores da
economia que mais se expandem são: logística, armazenagem de contêineres e turismo. É
também conhecida como capital brasileira da pesca por abrigar cerca de 50 empresas
beneficiadoras que produzem mais de um milhão de latas de sardinha e atum por dia. A
produção pesqueira de Itajaí está concentrada na captura do atum, da sardinha e do camarão.
Historicamente Itajaí já atravessou o ciclo do extrativismo, da madeira e da pesca, figurando
atualmente como uma cidade cosmopolita de comércio internacional (ITAJAÍ, 2017a; 2017b;
2017c; IBGE, 2018; ITAJAI, 2014).
Itajaí tem belas praias cercadas por morros cobertos pela vegetação subtropical da
Mata Atlântica. Possui também um píer para navio de passageiros que serve de ponto de
apoio no litoral de Santa Catarina, com infraestrutura adequada e exclusiva para recepção de
embarcações de grande porte, voltado a cruzeiros marítimos de lazer. Na cidade acontece um
dos maiores festivais de música popular brasileira, sempre no mês de setembro reunindo
músicos e artistas do país todo. O município tem duas tradicionais festas. Em outubro,
acontece o seu maior evento popular, a Marejada, Festa Portuguesa e do Pescado com um
prato típico: a sardinha assada. Em julho, a cidade homenageia o homem do campo e ressalta
a sua importância para a sociedade através da Festa Nacional do Colono, onde se destacam as
98
exposições e feiras agropecuária e agroindustrial, mostra de animais, apresentações artísticas e
culturais (ITAJAI, 2017a; 2017b; 2017c).
Quadro 4 - Aspectos demográficos e socioeconômicos da cidade de Itajaí
Aspectos demográficos e socioeconômicos
Área territorial (Km²) 288,286 (Urbana:100km² - Rural: 189 Km²)
População total estimada (2018) 215.895. A população de Itajaí corresponde a 2,98% da população
do estado, ocupando a 7ª colocação das cidades mais populosas de
Santa Catarina
Densidade demográfica (hab/Km²) 636,11 Km²/hab
Microrregião Itajaí
Macrorregião Vale do Itajaí
Distância até a capital (Km²) 94 Km²
Coordenadas Latitude: 27º35’48”S
Longitude: 48º32’57”S
Altitude média: 1,0 metro
Limites Norte: Navegantes
Sul: Camboriú, Balneário Camboriú
Leste: Oceano Atlântico
Oeste: Ilhota, Brusque e Gaspar
Clima Subtropical úmido
Hidrografia Composta unicamente pela bacia hidrográfica do rio Itajaí
Relevo Bastante diversificado, predominando o montanhoso e o forte
ondulado
Vegetação Cobertura vegetal pouco densa, caracterizada principalmente de
arbustos e restingas
IDH-M 0,795
PIB 18 855 445,00 mil
PIB Per Capita 91 856,35 mil
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2018); Plano Municipal de Saúde de Itajaí 2014-
2017.
4.4 O Sistema Municipal de Saúde de Itajaí
Os dados apresentados abaixo foram coletados do Plano Municipal de Saúde (PMS)
do município, referente aos anos 2014-2017, divulgado no site oficial da Secretaria Municipal
de Saúde (SMS) e através do diário de campo da pesquisadora.
O município de Itajaí adota a ESF como modelo de atenção integral à saúde,
incorporando os princípios básicos do SUS. Entende-se por princípios, ideias fundamentais
em torno das quais se estrutura a instituição, “[...] são valores e convicções a serem seguidos
no âmbito do Sistema Municipal de Saúde, para que sejam traçadas suas diretrizes, objetivos e
metas”. Os princípios da gestão do município de Itajaí estão ancorados nos mesmos do SUS,
que são: universalidade, integralidade, equidade, descentralização/regionalização,
hierarquização, humanização, participação social, acessibilidade, resolutividade e cidadania
(ITAJAÍ, 2014, p. 18).
99
O município está dividido em cinquenta e duas (52) equipes de ESF, nove (9) delas
com equipe de Saúde Bucal, distribuídas em vinte e três (23) Unidades de Saúde (US), com
abrangência e geoprocessamento definidos (ver quadro 7). Nos últimos anos houve expansão
desse modelo assistencial (ESF) através de um alcance da cobertura superior a 70% da
população. O Plano Municipal de Saúde de 2014-2017 assumiu o compromisso com a
continuidade dessa estratégia que melhor traduz a organização da atenção básica.
4.4.1 A Secretaria Municipal de Saúde
A Secretaria Municipal de Saúde de Itajaí, conforme nota em seu site oficial e em seu
Plano Municipal de Saúde (2014-2017), tem se organizado, pelo menos em síntese, de forma
a buscar um sistema de saúde equânime, integral e resolutivo, para assim proporcionar o
atendimento efetivo dos problemas de saúde da população local, através da realização de um
conjunto de ações articuladas entre os diferentes níveis de complexidade da atenção à saúde.
Seu principal objetivo é oferecer ações integrais e qualificadas em saúde, baseadas na
promoção e prevenção em saúde, bem como, permitir o rastreamento/diagnóstico precoce das
doenças, buscando melhorar a qualidade de vida da população.
Sua missão é defender a vida satisfazendo as necessidades de saúde da população,
através de um sistema humanizado, com responsabilização, acesso, vínculo, acolhimento,
gestão participativa, trabalho em equipe multiprofissional, de forma transdisciplinar e com
autonomia dos processos de trabalho (ITAJAI, 2014; 2017d).
A rede de saúde e serviços conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS) de Itajaí
realiza mais de 300.000 atendimentos de pessoas do município e de cidades vizinhas.
Também, por ano, cerca de 20.000 pacientes são internados na cidade para tratamento
cirúrgico ou clínico. Os principais serviços prestados pela secretaria são consultas médicas e
tratamentos, atendimentos de enfermagem, visitas domiciliares de médicos, enfermeiros e
agentes comunitários de saúde, vigilância sanitária e epidemiológica, atendimentos de
médicos especialistas, testes rápidos para diagnóstico de infecções sexualmente
transmissíveis, exames de laboratório, exames especializados, cirurgias, práticas integrativas e
complementares em saúde, atividades de promoção à saúde e prevenção, entre outros
(ITAJAI, 2017d).
Estruturalmente, a SMS está dividida em: Diretoria de Atenção à Saúde; Diretoria de
Vigilância Epidemiológica; Diretoria de Vigilância Sanitária; Diretorias e Setor
Administrativo; Unidades de Pronto Atendimento 24h; Unidades de Atendimento à população
100
e Unidades Farmacêuticas e Assistenciais (ver quadro 5). O organograma da estrutura
administrativa da Secretaria Municipal de Saúde implantada através da Lei Complementar nº
150/2009; Lei nº 6463/2013 encontra-se no Anexo A.
Quadro 5 - Divisão da estrutura administrativa da Secretaria Municipal de Saúde de Itajaí
Divisão da Secretaria Municipal de Saúde
Diretoria de Atenção à Saúde - Responsável por realizar o planejamento das ações de promoção,
prevenção, e recuperação da saúde dos pacientes atendidos pela rede
municipal de saúde;
- Monitora nove áreas de atendimento à saúde da população:
1. ESF:
2. Saúde da Criança;
3. Saúde da Mulher;
4. Saúde do homem;
5. Saúde do Idoso;
6. Saúde Mental;
7. Odontologia;
8. Assistência Farmacêutica;
9. Rede de Urgência e Emergência;
10. Serviço de Nutrição;
11. Serviço de Fisioterapia Domiciliar;
12. Práticas Integrativas e Complementares em Saúde e Curativos
especiais.
Diretoria de Vigilância
Epidemiológica
- Estabelece medidas de prevenção e controle de doenças e agravos. Coleta
informações epidemiológicas regularmente através dos pacientes com
doenças infectocontagiosas e planeja ações globais direcionadas;
- Está composta por seis gerências;
1. Gerência de controle de agravos de notificação crônicos;
2. Gerência de controle de agravos agudos;
3. Gerência de estatísticas vitais;
4. Gerência de vigilância alimentar e nutricional;
5. Gerência de imunização;
6. Gerência do programa DST/AIDS.
Diretoria de Vigilância
Sanitária
- Desenvolvimento de ações de controle e de fiscalização sanitária nas
áreas de alimentos, medicamentos e produtos de higiene;
- Composta por quatro gerências:
1. Gerência de ações de saúde;
2. Gerência de inspeção de produtos e serviços de saúde;
3. Gerência de vigilância ambiental;
4. Gerência do CERESTI.
Diretorias e Setor
Administrativo
- Secretário Municipal de Saúde;
- Departamento de Compras e Licitações;
- Serviço de Transporte;
- Administração de Materiais;
- Fundo Municipal da Saúde;
- Recursos Humanos (administração de pessoal);
- Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria;
- Conselho Municipal de Saúde;
- Diretoria de Gestão da Secretaria Municipal de Saúde;
- Diretoria de Manutenção da Secretaria Municipal de Saúde (Gestão de
materiais e medicamentos);
- Diretoria de Administração do Fundo Municipal da Saúde;
- Diretoria de Administração de pessoal;
- Diretoria de Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria.
Unidades de Pronto - As unidades de Pronto Atendimento são estruturas de complexidade
101
Atendimento 24h2
intermediária entre as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e as portas de
urgência hospitalares, onde em conjunto com estas compõe uma rede
organizada de Atenção às Urgências. O município de Itajaí possui duas
unidades: PA São Vicente (somente até o final de 2017)3, atualmente UPA
Dr. José Eliomar da Silva - CIS e UPA Cordeiros.
Unidades de Atendimento à
população
- As Unidades de Saúde, conhecidas popularmente por “postinhos”, são a
porta preferencial de entrada no sistema municipal de saúde. Ao todo, são
34 postos de atendimentos básicos e especializados, distribuídos pelas
regiões administrativas da cidade (ver quadro 6). Contam com equipes
formadas por médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem e agentes de
saúde.
Unidades Farmacêuticas e
Assistenciais
- Farmácia Popular do Brasil;
- Farmácia de Ações Integradas (Central de Itajaí);
- Ambulatório do Presídio Regional;
- Ambulatório do Porto de Itajaí;
- Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU);
- Distrito Docente Assistencial;
- Centro de Observação Animal.
Fonte: Site oficial da Prefeitura Municipal de Itajaí (2017-2018).
Quadro 6 - Unidades de atendimento à população e suas localizações geográficas
Unidades de
atendimento da
População
Tipo de
Atendimento
Área
geográfica
de atuação
Serviços
Disponibilizados
1. Centro de Referência de
Doenças Infecciosas
(CEREDI)
Especializado Centro - Pediatria, ginecologia e obstetrícia,
odontologia, enfermagem, planejamento
familiar, preventivo do câncer, pneumologia,
farmacêutico, infectologia, psicologia e
fisioterapia;
- Local abriga também os Programas de
Hanseníase, Tuberculose, Hepatites e HIV.
2. Centro de Referência da
Saúde da Criança e da
Mulher (CRESCEM)
Especializado Centro - Referência para gestação de alto risco,
laqueaduras, vasectomias, mastologia,
ginecologia, imunização (vacinas especiais),
fisioterapia e psicologia, além de exames
ecocardiograma adulto e pediátrico, doppler
de carótida e ultrassonografia para pacientes
acompanhadas pelo CRESCEM.
3. Centro Especializado
em Odontologia (CEO)
Especializado Centro - Serviços: atendimento e tratamento nas
diversas áreas da odontologia, como,
endodontia, periodontia, cirurgia
bucomaxilofacial, pacientes com necessidades
especiais, radiologia, odontopediatria e
prótese dentária.
4. Centro Práticas
Integrativas e
Complementares da Saúde
Especializado Centro - Serviços: atendimentos nas áreas de
Homeopatia, Acupuntura, Práticas Corporais,
Sito, Do In, Lian Gong e Relaxamento,
2 Além das Unidades de Pronto Atendimento UPA – CIS e UPA Cordeiros, o município de Itajaí disponibiliza ao
usuário os seguintes serviços de urgência e emergência: Pronto Socorro do HMMKB, Pronto Socorro do HUPA,
SAMU – Unidade Avançada – USA e SAMU - Unidade Básica- UBS. 3 Em 12/08/2017 o município de Itajaí inaugurou o Centro Integrado de Saúde (CIS) planejado para integrar
diversos serviços de saúde do município. Possui quatro blocos de atendimento: Unidade de Pronto
Atendimento (UPA) Porte III (Desativação do PA São Vivente); Unidade de Assistência Médica
Especializada (Desativação do PAM), Secretaria de Saúde de Itajaí e Laboratório Central de Análises
Clínicas (ITAJAÍ, 2017d).
102
(CEPICS) Neonatologia, Cardiopediatria, Psicologia,
Fisioterapia, Fisioterapia Domiciliar, Nutrição
e Gastropediatria.
5. Centro de Atenção
Psicossocial Infanto-
juvenil (CAPS I)
Especializado Vila
Operária
- Atende crianças e adolescentes com
transtornos mentais graves e persistentes,
inclusive os que fazem uso de crack, álcool e
outras drogas.
6. Centro de Atenção
Psicossocial Adulto
(CAPS II)
Especializado Centro - Atende pessoas com transtornos mentais
graves e persistentes. Serviço de saúde mental
aberto e de caráter comunitário.
7. Centro de Atenção
Psicossocial Álcool e
outras Drogas (CAPS AD)
Especializado Vila
Operária
- Atende adultos com necessidades
decorrentes do uso de crack, álcool e outras
drogas. Serviço de saúde mental aberto e de
caráter comunitário.
8. Unidade de Assistência
Médica Especializada Dr.
Carlos Alberto de Souza
Brito (CIS)
Especializado São Vicente - Consultas de diversas especialidades
médicas;
- Programas de tabagismo, diabetes,
ostomizados e oxigenoterapia;
- Serviços de regulação de cirurgias, exames e
Tratamento Fora do Domicílio (TFD), além
do setor de auditoria.
9. Centro Médico de
Referência Affonso Celso
Liberato (US São Judas)
Básico e
Especializado
São Judas - Atendimento médico com clínico geral,
pediatra e ginecologista;
- Atendimento odontológico, enfermagem,
imunização e dispensação de medicamentos;
- Referência em especialidades médicas que
atendem toda rede municipal: cirurgia geral,
dermatologista, geriatria, cirurgia plástica,
neuropediatria, cirurgia vascular, urologia,
ortopedia e hebiatria;
- Realização de pequenas cirurgias e curativos
especiais.
10. US Miro Sedrez (US
Cordeiros)
Básico e
Especializado
Cordeiros - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria e
ginecologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
11. US Vinícius Ivan
Alves Pedreira (US CN I)
Básico e
Especializado
Cidade
Nova
- ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria;
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
12. US Unidade de Saúde
Evilásio Victorino (US
CN II)
Básico e
Especializado
Cidade
Nova
- ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria;
ginecologia e psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
13. US Promorar II Básico e
Especializado
Cidade
Nova
- ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria;
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
103
14. US São Vicente Básico e
Especializado
São Vicente - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria;
ginecologia e nutrição;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
15. US Bernardino Miguel
Peirão (US Rio Bonito)
Básico e
Especializado
São Vicente - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria e
ginecologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
16. Unidade de Saúde
Rotariano Agenor Krobel
(US Bambuzal)
Básico e
Especializado
São Vicente - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
ginecologia; psicologia infantil;
Imunização e dispensação de medicamentos.
17. US Costa Cavalcante Básico e
Especializado
Costa
Cavalcante
- ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
ginecologia; psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
18. US Jardim Esperança Básico e
Especializado
Cordeiros - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
19. US Bento Rampelotti
(US Murta)
Básico e
Especializado
Murta - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
20. US Votorantim Básico e
Especializado
Cordeiros - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos;
- Núcleo de Apoio à Saúde da Família
(NASF).
21. US Salseiros Básico e
Especializado
Salseiros - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
22. US Rachel Dalçoquio
de Borba (US
Espinheiros)
Básico e
Especializado
Espinheiros - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
23. US Santa Regina Básico e
Especializado
Santa
Regina
- ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
24. US Elizabet Caetano
Pacheco (US Portal II)
Básico e
Especializado
Espinheiros - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: psicologia;
104
- Imunização e dispensação de medicamentos.
25. US Nossa Senhora das
Graças
Básico e
Especializado
Centro - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
26. US Manoel Amândio
Vicente (US Canhanduba)
Básico e
Especializado
Canhanduba - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: ginecologia e
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
27. US Fernando Wippel
(US Itaipava)
Básico e
Especializado
Itaipava - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico,
- Atendimento Especializado: pediatria,
ginecologia e psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
28. US Leopoldo Fischer
(US Brilhante)
Básico e
Especializado
Itaipava - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria,
ginecologia e psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
29. US Ignácio Theodoro
Pereira (US Limoeiro)
Básico e
Especializado
Limoeiro - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
30. US Enfermeira
Oswine Lorens (US
Imaruí)
Básico e
Especializado
Imaruí - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
31. US São João Básico e
Especializado
São João - Atendimento básico: consultas de
enfermagem e médico clínico geral;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento especializado: pediatria e
ginecologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
32. US Dom Bosco Básico e
Especializado
Dom Bosco - Atendimento básico: consultas de
enfermagem e medico clinico geral;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento especializado: pediatria e
ginecologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
33. US Nancy Patino
Reiser (US Fazenda)
Básico e
Especializado
Fazenda - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria e
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
34. US Vivaldo João
Linhares (US Praia Brava)
Básico e
Especializado
Praia Brava - ESF: médico, enfermagem, ACS;
- Atendimento odontológico;
- Atendimento Especializado: pediatria e
psicologia;
- Imunização e dispensação de medicamentos.
Fonte: Secretaria Municipal de Saúde (2017-2018).
Quadro 7 - Distribuição das Equipes de ESF por área de abrangência
Área geográfica de atuação Equipes ESF com Saúde Bucal e NASF vinculadas
Bairro Barra do Rio - US Imaruí: 02 ESF (01 ESF + 01 ESF com Saúde Bucal
modalidade II)
Bairro Canhanduba - US Canhanduba: 01 ESF
105
Bairro Cidade Nova - US Cidade Nova I: 02 ESF (01 ESF + 01 ESF com Saúde
Bucal modalidade I)
- US Cidade Nova II: 03 ESF
- US Promorar II: 02 ESF (01 ESF + 01 ESF com Saúde
Bucal modalidade II)
- NASF I: atende as sete ESF do bairro Cidade Nova
Bairro Cordeiros - US Cordeiros: 02 ESF
- US Costa Cavalcante: 01 ESF
- US Jardim Esperança: 04 ESF (03 ESF + 01 ESF com
Saúde Bucal modalidade I)
- US Votorantim: 03 ESF
- NASF II: atende as nove ESF do bairro Cordeiros
Bairro Murta - US Murta: 02 ESF
Bairro Dom Bosco - US Nossa Senhora das Graças: 04 ESF (03 ESF + 01 ESF
com Saúde Bucal modalidade I)
Bairro Espinheiros - US Espinheiros: 02 ESF (01 ESF + 01 ESF com Saúde
Bucal modalidade I)
- US Santa Regina: 02 ESF (01 ESF + 01 ESF com Saúde
Bucal modalidade I)
- US Portal II: 01 ESF com Saúde Bucal modalidade I
Bairro Fazenda - UBS Fazenda: 04 ESF
Bairro Itaipava - UBS Itaipava: 03 ESF
Bairro Praia Brava - UBS Praia Brava: 01 ESF
Bairro Salseiros - UBS Salseiros: 01 ESF
Bairro São Vicente - UBS São Vicente: 03 ESF
- UBS Rio Bonito: 06 ESF (05 ESF+ 01 com Saúde Bucal
modalidade II)
- UBS Bambuzal: 01 ESF Bairro Limoeiro - UBS Limoeiro: 01 ESF
Bairro Brilhante - UBS Brilhante: 01 ESF
Fonte: PMS 2014-2017 e diário de campo (2017).
O município de Itajaí é habilitado em Gestão Plena do Sistema Municipal e vem
tentando construir uma política de saúde a partir das realidades regionais, utilizando-se do
Pacto pela Saúde publicado pela Portaria GM/MS nº 399/06. As ações de planejamento
constituem um papel importante para a consolidação do compromisso público com base nos
princípios do SUS, nas quais as necessidades de saúde da população devem ser adotadas
como critério para o processo de planejamento, monitoramento e avaliação, sendo o Plano
Municipal de Saúde (PMS) o instrumento referencial básico por refletir as diferentes
realidades locais. (ITAJAÍ, 2014)
O planejamento da cobertura assistencial pela atenção especializada tem sido feito
com base nas Programações Pactuadas e Integradas (PPIs) da Atenção à Saúde, de acordo
com o perfil epidemiológico do município e outras informações em saúde. A Alta
Complexidade Ambulatorial encontra-se ainda na sua maioria sob gestão estadual e este duplo
gera dificuldades na atenção integral à saúde. A fragilidade nos processos de pactuação
intergestores, o baixo financiamento, o insuficiente processo regulatório e as diversidades
operativas são problemas estritamente vinculados que ocupam a agenda dos gestores como
106
desafios a serem enfrentados. O município de Itajaí vem avançando na realização de
procedimentos de alta complexidade, já realizando Ressonância Magnética, Tomografia
Computadorizada, Medicina Nuclear, Densitometria Óssea, Litotripsia, Hemodinâmica
(Cateterismo), Angiotomografia, Biopsia Guiada por Tomografia/Ultrassonografia, Oncologia
(quimioterapia), Cirurgia Vascular, Cirurgia Cardíaca, Cirurgia de Catarata e procedimentos
em Audiologia.
4.5 O Plano Municipal de Saúde de 2014-2017
O Plano Municipal de Saúde (PMS) e suas Programações Anuais são instrumentos de
planejamento e gestão do SUS previstos na CF/88, LOS 8.080/90, decreto 7508/11, LC
141/12 e Portaria nº 2.135 de 25/09/2013. Esses instrumentos constituem um processo
contínuo e interligado de planejamento, em consonância com os instrumentos de
planejamento e de orçamento do governo: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA), tendo relação direta com o
orçamento disponível para a função saúde (UNASUS, 2016).
O PMS tem vigência de quatro anos, devendo ser elaborado no primeiro ano de
mandato e viger nos três últimos anos e no primeiro ano do próximo mandato. É definido de
acordo com a Portaria 2.135/13 como:
Art. 3º [...] “instrumento central de planejamento para definição e
implementação de todas as iniciativas no âmbito da saúde de cada esfera da
gestão do SUS para o período de quatro anos, explicita os compromissos do
governo para o setor saúde e reflete, a partir da análise situacional, as
necessidades de saúde da população e as peculiaridades próprias de cada
esfera”.
§ 1º O Plano de Saúde configura-se como base para a execução, o
acompanhamento, a avaliação da gestão do sistema de saúde e contempla
todas as áreas da atenção à saúde, de modo a garantir a integralidade dessa
atenção (BRASIL, 2013, grifo nosso).
Para a elaboração do PMS de Itajaí 2014-2017 foram realizadas reuniões preparatórias
com um grupo condutor, que optou por “dividir o poder de mando utilizando um modelo de
construção participativa” (ITAJAÍ, 2014, p. 19).
Optou-se por oficinas organizadas em segmentos: grupo de gestores, grupo de
técnicos, Conselho Municipal de Saúde (COMUSA), Atenção Básica (1), Atenção Básica (2)
e Atenção Especializada. Utilizaram o método de Planejamento Estratégico Situacional
(PES), desenvolvido por Carlos Matus que foi desenhado principalmente para o trabalho em
107
administrações públicas com alta complexidade e uma pluralidade de atores envolvidos,
combinando simplicidade e potência. “Quem faz? Quem planeja? Quem é o ator desse
planejamento? É a equipe que será responsável pela implementação do plano”. Foram
realizadas 17 oficinas, como o número mínimo de 15 e máximo de 22 pessoas em cada uma
delas, divididas pelos grupos já descritos acima. Totalizaram 93 horas trabalhadas com o total
de 116 participantes. As equipes de Atenção Básica foram divididas em duas oficinas pela
quantidade expressiva de pessoas e contou com 100% de representação dos trabalhadores de
todas as Unidades Básicas de Saúde do Município (ITAJAÍ, 2014, p. 18).
Fui uma das participantes das oficinas realizadas no grupo da Atenção Básica. Foi um
processo de construção coletiva, bem planejado e elaborado, posso dizer também, reflexivo. A
metodologia foi desenvolvida por um grupo condutor que fomentou a capacidade de escutar,
utilizando a visualização (uso de tarjetas coloridas) como apoio a palavra oral e ainda contou
com um moderador que teve, entre outros papéis, o de ajudar o grupo a aprofundar o
conhecimento de uma determinada situação. Foi um processo livre, de discussão grupal onde
todos foram respeitados com direito de expor e defender as suas opiniões. Em síntese, pessoas
reunidas produzindo e problematizando em torno das questões da saúde do município, foi um
processo muito rico e de aprendizado.
Considero um avanço as reuniões coletivas realizadas para a construção do plano
2014-2017, visto que normalmente os PMS são produzidos pelos gestores como instrumento
obrigatório de planejamento, monitoramento e avaliação pelo período de quatro anos
associado geralmente à garantia de repasses financeiros ao município, sem nenhum
conhecimento prévio dos atores que irão colaborar para o cumprimento de suas metas, além
de não refletirem as reais necessidades dos trabalhadores e muito menos as necessidades de
saúde da população como preconizado pela legislação (NASCIMENTO; EGRY, 2017).
No entanto, apesar de notável participação e ampla discussão durante todo o processo
de construção do plano 2014-2017, o que favoreceu conhecimento, troca de saberes e
identificações importantes das necessidades de saúde da população, seu resultado final pouco
trouxe a beleza desse processo. A sistematização de ações, objetivo e metas, deram mais
reconhecimento às necessidades em saúde centradas na doença e em seus respectivos riscos,
com destaque para os indicadores de morbimortalidade, distanciando-se da compreensão de
saúde socialmente determinada. Os problemas de origem social foram ignorados, não
existindo relação dos aspectos sanitários e/ou epidemiológicos descritos com a condição de
saúde da população e seus grupos com menor autonomia para o cuidado. Os fatores dessa
ordem trazidos pelos participantes, inclusive com algumas hipóteses de solução, não foram
108
registrados no PMS 2014-2017. Acredito que esse tipo de reconhecimento resulta da
dificuldade de se dimensionar necessidades em saúde
É fato que houve uma tentativa de elaborar um plano que pudesse identificar e se
aproximar das necessidades em saúde da população, contudo, ao traduzi-lo, a realidade social
do processo saúde-doença ficou no vazio, permanecendo apenas na mente/corações de alguns
participantes, inclusive eu, que se sentiram valorizados em poder contribuir para o
planejamento das ações em saúde no seu município. Ficou a esperança que mais encontros
coletivos pudessem acontecer, a fim de avançarmos e atravessarmos essa fronteira.
109
5 PERCURSO METODOLÓGICO
“Não é no silêncio que os homens se fazem,
mas na palavra, no trabalho e na ação-reflexão”
Paulo Freire
Foi um percurso longo, dolorido e de muito crescimento.
Iniciei o Mestrado no segundo semestre de 2013 e tive a alegria de ter como orientador
o professor Dr. Luis Ágea Cutolo e como co-orientadora a professora Dra. Antônia Egídea de
Souza. Caminhamos juntos até janeiro de 2015, quando ambos os professores se desligaram
do Programa. Por esse motivo, eu tive que recomeçar meu processo com outro(a) orientador
(a), o que foi muito difícil pelo fato de restar somente mais um semestre para a conclusão do
Mestrado.
Além disso, fiquei grávida em fevereiro de 2015 e a nova condição levou-me a fazer a
escolha entre viver a nova experiência com o máximo de intensidade ou dividi-la com os
estudos de mestrado, casamento e trabalho. Decidi renunciar aos estudos e retomá-los
posteriormente.
Abro esse tópico com particularidades contextuais de meu processo, no plano privado,
para que o leitor possa compreender que as etapas constitutivas do percurso metodológico,
descritas a seguir, correspondem a duas trajetórias: a primeira, vivenciada na experiência
inicial de mestrado, de 2013 a 2015, e a segunda no período 2016-2018.
5.1 Desenvolvimento da Pesquisa 2013-2015
A pesquisa foi realizada no período 2013-2015 e adotou como cenário a cidade de
Itajaí, município polo da Região de Saúde da Foz do Rio Itajaí, Santa Catarina. Ela foi
desenvolvida com diretores, representantes de diretores, supervisores, coordenadores e
gerentes de áreas departamentais da Secretaria Municipal de Saúde do município.
O objetivo geral foi construir uma tecnologia de gestão que tivesse como princípio a
integralidade nas práticas do cuidado. A ideia era produzir um material com os sujeitos de
pesquisa que pudesse contribuir com os serviços ou que, pelo menos, pudesse apontar
caminhos para o fortalecimento da integralidade em modelos de gestão. Para alcançá-lo, vê-se
necessário conhecer o modo como os participantes concebiam gestão, integralidade e a
relação entre ambas às categorias.
110
A técnica utilizada foi pesquisa-ação.
Segundo Leopardi (2011), a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base
empírica, concebida e realizada com estreita associação com uma ação ou com a resolução de
um problema coletivo e na qual os pesquisadores e os participantes, representativos da
situação ou do problema, estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. Por meio
desta técnica, o conhecimento é produto do coletivo; pesquisadores e grupos interessados,
com iguais prerrogativas, discutem em reuniões e seminários o problema que direciona a
pesquisa. A argumentação, gerada pela discussão e diálogo, é uma de suas características.
Trata-se, portanto, de um tipo de pesquisa participante engajada, que considera a prática como
lócus de produção de conhecimento e compreensão. Um tipo de pesquisa atrativa pelo fato de
poder levar a um resultado específico imediato, no contexto do ensino aprendizagem. Pode ser
aplicada em qualquer ambiente de interação social que se caracterize por um problema, no
qual estão envolvidos pessoas, tarefas ou procedimentos (MONTEIRO et al., 2010).
Na visão de Thiollet (1996), a pesquisa ação tem como características: a) ação
conjunta entre pesquisadores e participantes; b) problemas existentes na situação social
estudada, e a própria situação social estudada são o objeto do estudo; c) resolução dos
problemas observados na situação social estudada constituem o objetivo o estudo. Quanto aos
seus objetivos, cabe citar: “propor soluções que auxiliem o grupo de pesquisa na sua atividade
transformadora da situação-problema [...] e aumentar o conhecimento de determinadas
situações” (LEOPARDI, 2011, p. 105).
Em síntese, a pesquisa-ação entende que o processo é libertador, já que, durante a
reflexão gerada pela pesquisa, espera-se que os sujeitos desenvolvam uma consciência crítica
sobre o seu cotidiano, ampliando seus horizontes de transformação e intervenção. E era
exatamente isso que buscávamos na primeira fase do processo de mestrado, já que tínhamos
como objetivo a construção de uma tecnologia social visando contribuir com o modelo de
gestão local.
Os participantes desta primeira fase do estudo foram diretores ou seus representantes,
supervisores, coordenadores e gerentes da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) das áreas
afins dos departamentos de Atenção Básica e Especializada, de Urgência e Emergência, de
Vigilância Epidemiológica e Sanitária, do Controle de Avalição, de Auditoria, Jurídico, de
Recursos Humanos, do setor de Compras, Patrimônio, Manutenção, Almoxarifado, Fundo
Municipal de Saúde e Administração, Transporte. Foram também convidados para participar
04 (quatro) profissionais da ESF (02 enfermeiras e 02 médicos), totalizando 30 (trinta)
pessoas.
111
Cada um foi convidado individualmente pela pesquisadora, após um primeiro contato
para agendamentos prévios, feitos por telefone ou e-mail. Esse movimento-convite exigiu
duas semanas para ser concluído, uma vez que, além da necessidade de socializar com os
participantes, a indispensabilidade de anuência em um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) foi necessário gerar um consenso sobre o dia a ser agendado para a
aplicação da técnica, dado que todos são trabalhadores dos serviços e que eu queria reunir os
representantes de todos os departamentos. Feita a escolha do dia, era a hora de decidir sobre o
local.
Em um primeiro momento, escolhemos, em conjunto, a SMS do município como local
para o desenvolvimento da técnica. No entanto, por falta de estrutura física que favorecesse a
metodologia a ser aplicada, acabamos realizando a pesquisa no Instituto Fayal de Ensino
Superior (IFES), que nos cedeu gratuitamente uma sala de aula por solicitação da própria
SMS. Foram realizadas três oficinas entre novembro e dezembro de 2014.
Para que as oficinas pudessem acontecer com todos os diretores, supervisores e
gerentes da SMS, primeiramente solicitamos autorização do Secretário Municipal de Saúde da
época e o mesmo se mostrou acessível e concordou com a saída dos profissionais para que
essa pesquisa acontecesse. Também contamos com a colaboração de duas pessoas que nos
auxiliaram, desde os preparativos iniciais até a arrumação da sala de aula ao final. Após a
realização de cada oficina, os dados foram registrados em áudio e transcritos na íntegra para
posterior análise dos dados.
Realizamos a coleta de dados através de 03 (três) oficinas, com duração de
aproximadamente três horas e meia cada uma.
Oficina é uma forma de construir conhecimento, com ênfase na ação, sem
desconsiderar, porém, à base teórica. É uma oportunidade de vivenciar situações concretas e
significativas baseadas no tripé sentir-conhecer-agir; vai além do foco tradicional de
aprendizagem (cognição); é uma maneira prática da ação-reflexão (PAVIANI; FONTANA,
2009). A opção pelas oficinas se justificou, uma vez que, sua técnica gerou um produto
coletivo com o objetivo de transformação da realidade, justamente o que desejávamos
inicialmente para essa dissertação.
Aplicamos uma metodologia problematizadora proposta inicialmente por Charles
Maguerez, na década de 1970 e, posteriormente adaptada por Berbel denominada “Método do
Arco” (BERBEL, 1996). A versão de Berbel indica o seu uso como metodologia de ensino, de
estudo e de trabalho, em situações em que os temas estejam relacionados com a vida em
sociedade (BERBEL, 1998). Nela existe a participação ativa e o diálogo constante entre os
112
sujeitos envolvidos no processo educativo. Aparece na perspectiva da transformação, ou seja,
“na ideia de que deseja ultrapassar a forma já existente de se tratar as questões do
conhecimento e da vida em sociedade, através de uma nova ação, subsidiada pela reflexão
metódica e informada cientificamente” (BERBEL, 1995, p. 13).
O Arco de Maguerez é composto por cinco etapas. A primeira: observação da
realidade (problema); a segunda: pontos-chave; a terceira: teorização; a quarta: hipóteses de
solução; e a quinta e última: aplicação à realidade (prática).
Figura 4 – Proposta de Maguerez
Fonte: Berbel (1996).
Primeira oficina dia 04/11/2014
A primeira oficina aconteceu no dia 04 de novembro de 2014, com início às 13h30min
e término às 17h00min, com intervalo de 30 minutos para um coffee breack. Esta oficina
contou com 18 (dezoito) participantes, dos 30 (trinta) que haviam sido convidados: 01 (um)
médico de família e comunidade, 02 (dois) enfermeiros(as) de família e comunidade, 04
(quatro) supervisores, 04 (quatro) coordenadores, 03 (três) gerentes, 01 (um) diretor e 03
(três) pessoas que representaram os diretores convidados.
Antes dos participantes chegarem, dispusemos as cadeiras em círculo e deixamos uma
folha de papel sulfite em cima de cada carteira com uma pergunta disparadora – Qual é o
principal objetivo da SMS –, a ser respondida conforme os mesmos iam chegando. Nesta
folha (ANEXO B), os participantes inseriram as iniciais de seus nomes, idade,
formação/profissão, função/cargo, forma de contratação, tempo de atuação na SMS/UBS e se
113
exercem outras funções/cargos concomitantes, com o objetivo de identificar e analisar o perfil
dos sujeitos de pesquisas. Após todos terem respondido, iniciamos a oficina agradecendo a
presença de todos e resumidamente explicamos novamente o objetivo da pesquisa e a
metodologia a ser aplicada.
Primeiramente solicitamos para que individualmente cada um fosse se apresentando
de forma a se identificar e responder verbalmente, em seguida, a pergunta disparadora.
Tínhamos o objetivo de observar a realidade (problema) vivenciada por cada sujeito no seu
processo de trabalho e compreender o que cada um pensava ser o principal objetivo da SMS.
Esse momento durou em torno de uma hora.
Posteriormente ao momento de apresentações e contextualização dos sujeitos, pedimos
que fossem feitos quatro grupos aleatórios (02 grupos com 05 pessoas e 02 grupos com 4
pessoas), disponibilizamos cartolinas, 30 minutos de discussão e solicitamos que cada grupo
definisse e escrevesse numa frase o principal objetivo da SMS, com a intenção de
apresentarem num segundo momento a definição ao grande grupo. Cada grupo compartilhou
sua produção e explicou o porquê da frase escolhida. Com todas as frases expostas,
solicitamos que todos, individualmente, analisassem as definições e votassem naquela que
mais correspondia ao que eles acreditavam.
Por último buscamos identificar as concepções sobre gestão, integralidade e sobre a
relação entre as duas categorias. Entregamos uma tarjeta de cartolina azul para cada pessoa e
solicitamos que respondessem com uma palavra o que significa gestão. Após escreverem
individualmente a palavra, os participantes foram convidados a se levantar, colar a tarjeta num
painel disponibilizado na parede, dizer a palavra em voz alta e o porquê da escolha da palavra.
Seguidamente, entregamos uma tarjeta rosa a cada um e perguntamos: o que significa
integralidade para você? E por último, questionamos se, e de que modo, integralidade e gestão
se relacionam. Assim foi concluída a primeira oficina, por meio da qual a primeira etapa do
arco foi completada (observação da realidade/problema).
Segunda oficina dia 18/11/2014
A segunda oficina aconteceu no dia 18 de novembro de 2014 e estavam presentes 12
(doze) participantes dos 18 (dezoito) que haviam participado da primeira oficina e mais 01
(um) sujeito de pesquisa que não compareceu na primeira, totalizando 13 (treze) pessoas. A
propósito importa ressaltar que destes 13, 10 eram representantes da Atenção Básica.
114
Antes de as pessoas chegarem, deixamos a sala preparada com a exposição dos painéis
produzidos na primeira oficina e mantivemos a disposição das cadeiras em círculo. Iniciamos
às 13h30min fazendo uma síntese da oficina anterior e solicitamos para quem não esteve
presente na primeira oficina se apresentasse da mesma maneira solicitada aos demais
anteriormente.
Essa oficina aconteceu em três momentos. Primeiramente aprofundamos a discussão
da primeira oficina, quando reconhecemos que para os participantes gestão e integralidade se
relacionam. Em seguida, selecionamos palavras descritas pelos participantes sobre o que é
gestão (apoiar, gerenciar, administrar, articular, fiscalizar) e sobre o que é integralidade
(empatia, união, cuidado, acesso), na ocasião da primeira oficina. Num terceiro momento,
relacionamos estas palavras em uma questão e a apresentamos ao grupo: de que maneira a
gestão pode apoiar, gerenciar, administrar, articular e fiscalizar na prática a empatia, a união,
o cuidado, o acesso, etc.? Para a elaboração da resposta, dividimos os participantes em 02
grupos e após 30 minutos de discussão os mesmos apresentaram sugestões, por eles definidas
como estratégias de gestão para qualificar a atenção à saúde dos serviços públicos do
município em estudo.
Nesse momento de discussão, já fomos levantando outros problemas, além de pontos
chaves, ou seja, os possíveis determinantes dos problemas identificados na primeira etapa.
Com a intenção de completar a etapa dois do arco, entregamos um caso – “O caso de Ana” –
(ANEXO C) para ambos os grupos e solicitamos que eles identificassem os problemas de
gestão apresentados no mesmo.
Após uma hora de discussão, os grupos apresentaram suas produções em cartolinas,
explicando o porquê de suas escolhas. Por último, voltamos novamente à primeira oficina,
para desenvolver uma reflexão conjunta sobre o atributo “qualidade”, porque naquela oficina
todos os participantes haviam dito que a função principal da SMS é a qualidade dos serviços
e/ou qualidade na atenção. Entregamos tarjetas a eles(as) e perguntamos: o que vocês
quiseram dizer com qualidade dos serviços e/ou qualidade da atenção, na primeira oficina,
como resposta ao objetivo principal da SMS? Os participantes responderam individualmente,
depois colocaram suas tarjetas em um painel para em seguida verbalizar as respostas.
Terminamos a oficina completando a etapa número 2 do arco, apesar de termos entrado
muitas vezes nas etapas números três e quatro.
Terceira oficina dia 25/11/2014
115
A terceira oficina aconteceu no dia 25 de novembro de 2014 e estavam presentes 14
(quatorze) pessoas.
Todo o material produzido nas oficinas anteriores estava exposto na sala e as cadeiras
em círculo. A oficina aconteceu em dois momentos. Primeiramente convidamos o professor
Cutolo e a professora Antônia para fins de teorização dos conteúdos trabalhados, com o
objetivo de reforçar a sua apropriação e, com efeito, contribuir com as proposições de
hipóteses de solução para os problemas já identificados nas etapas anteriores. Esse processo
durou aproximadamente uma hora e meia.
Após o intervalo, os participantes foram divididos em 02 (dois) grupos para a
apresentação das hipóteses para a melhoria dos serviços da gestão municipal e
consequentemente da atenção à saúde. A eles disponibilizamos o mapa do município com a
identificação setorial dos serviços de saúde, a lista dos especialistas da rede, a quantidade de
equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF) e respectiva distribuição. Em seguida, pedimos
que construíssem algo que, na visão deles, fosse possível colocar em prática dentro da
realidade do município estudado. Após uma hora e meia, os grupos apresentaram a produção
coletiva em cartolinas: o primeiro grupo dividiu o município por regiões e fez um check list
das soluções para os problemas anteriormente levantados. O segundo grupo propôs um novo
organograma para a SMS, além de sugerir também hipóteses para os problemas identificados.
Terminamos assim as oficinas, contemplando as etapas três e quatro do arco.
Tendo em vista que o processo de pesquisa no mestrado carece de seu
desenvolvimento em tempo hábil pré-determinado, e que o período de coleta de dados é
relativamente reduzido em relação à complexidade da produção de conhecimento e
transformação da realidade, não completamos a etapa cinco do arco que se refere à aplicação
a realidade. No final da quarta etapa desafiamos os participantes a levar o aprendizado para
seus cotidianos de trabalho, com a intenção de, com o produto, contribuírem com a
transformação do que não está bom na realidade.
5.2 Desenvolvimento da Pesquisa 2016-2018
Retomando a pesquisa no segundo semestre de 2016, fizemos a releitura do projeto e
de todo material produzido no desenvolvimento da pesquisa 2013-2015. Com isso
percebemos que os dados coletados e analisados em 2014 mostravam várias estratégias de
gestão para qualificar a atenção à saúde. Por força disto, mudamos o objetivo geral da
pesquisa, no entanto, sem mudar o sonho de partida da pesquisadora, aquele de ver um SUS
116
que funcione na prática. Assim se iniciou a segunda fase da pesquisa. Explorando todo
material da primeira fase sentimos necessidade de buscar dados de outros atores que
participam ativamente das instâncias decisórias do SUS: os gestores municipais e
conselheiros municipais de saúde.
O objetivo geral foi analisar as estratégias de gestão do SUS de Itajaí, SC, na
perspectiva de um coletivo intrassetorial da secretaria e de conselheiros municipais de saúde.
A pesquisa foi realizada no período 2016-2018 no mesmo cenário da primeira fase.
Ela foi desenvolvida com três conselheiros municipais de saúde e um gestor municipal. A
escolha se deu com a intenção de coletar dados e conseguir informações que não foram
possíveis com os sujeitos e a técnica anteriormente utilizada e por serem os sujeitos que
possuem, de certa forma, governabilidade para o desenvolvimento prático da pesquisa
posteriormente.
Cada um foi convidado individualmente pela pesquisadora, após um primeiro contato
para agendamentos prévios, feitos por telefone. Foi realizada uma entrevista coletiva, do tipo
grupo focal, com três conselheiros (as) municipais de saúde e uma entrevista semiestruturada
com um gestor (a) municipal. As entrevistas aconteceram no final de 2016 e início de 2017
com a concordância e disponibilidade de horários e datas dos sujeitos que foram
entrevistados.
5.2.1 A entrevista coletiva, do tipo grupo focal, com os conselheiros de saúde
A entrevista coletiva, do tipo grupo focal, aconteceu na sede do COMUSA. A escolha
do local foi proposta pelos próprios (as) conselheiros (as), e a escolha destes (as) se deu pela
facilidade de estarem semanalmente juntos no mesmo horário e local. O TCLE (APÊNDICE
A) foi entregue, explicado e assinado pelos participantes no mesmo dia da realização do
grupo.
Escolheu-se a técnica de entrevista coletiva, do tipo grupo focal, como forma de
coletar dados diretamente das falas de um grupo, oriundos de experiências e percepções em
torno de um tema de interesse coletivo.
Um grupo focal é um grupo de discussão informal e de tamanho reduzido,
com o propósito de obter informações de caráter qualitativo em
profundidade. É uma técnica rápida e de baixo custo para a avaliação e
obtenção de dados e informações qualitativas, fornecendo aos gerentes de
projetos ou instituições uma grande riqueza de informações qualitativas
117
sobre o desempenho de atividades desenvolvidas, prestação de serviços,
novos produtos ou outras questões (GOMES; BARBOSA, 1999).
O encontro teve a duração de uma hora e meia com a presença dos três
conselheiros(as) e a pesquisadora. O material coletado foi registrado em áudio e
posteriormente, todo o conteúdo foi transcrito, analisado e validado.
Ao iniciarmos a técnica, informamos aos participantes que não existiriam respostas
certas ou erradas e que todos poderiam expressar percepções e sentimentos diferentes uns dos
outros, além de que se gostaria que as discussões ocorressem livremente, uma vez que o
objetivo era conhecer o pensamento dos participantes, sem juízos de valor, sugerindo-lhes que
falassem um de cada vez, evitando interromper a fala um do outro, o que asseguraria uma
gravação mais clara e o direito individual de expressão.
A técnica utilizada possibilitou o acolhimento do sujeito, devido à criação de um
espaço para a expressão, valorizando a escuta em ambiente coletivo. A escolha por esta
técnica de coleta de dados foi sentida como adequada, uma vez que respondeu aos objetivos
do estudo. A entrevista coletiva, do tipo grupo focal, foi conduzida através de um questionário
elaborado com 11 questões, conforme o Apêndice (B). Consultando Minayo (2013) vi que um
instrumento para entrevista coletiva deve ser elaborado não por questões prontas, mas por um
roteiro de temas. No entanto, como se tratava da minha primeira experiência com pesquisa,
decidi, com a minha orientadora, por estruturar as questões, mantendo a possibilidade de
agregar novas indagações que se fizessem necessárias, no andamento do processo de coleta.
5.2.2 A entrevista semiestruturada com o(a) gestor(a) municipal
A entrevista foi realizada no gabinete do(a) gestor(a) após convite e agendamento
prévio feito por telefone. O TCLE (APÊNDICE C) foi entregue, explicado e assinado no
mesmo dia da coleta dos dados.
O instrumento foi a entrevista semiestruturada. A escolha deu-se em função de que
esse tipo de instrumento conferir flexibilidade para a inserção de novas questões
investigativas que se façam necessárias no momento da coleta (FIUZ; BARROS, 2011;
MYNAYO, 2014). A escolha por entrevista individual com o(a) gestor(a) foi feita devido à
possibilidade dele(a) proporcionar informações que possivelmente não seriam compartilhadas
em um espaço coletivo. O roteiro da entrevista (APÊNDICE D) foi composto por 10
118
perguntas, que buscava provocar no(a) gestor(a) falas que remetessem aos objetivos propostos
pela metodologia.
5.3 Organização dos Dados
Após a realização das entrevistas, transcrevemos literalmente as gravações, mantendo
a linguagem coloquial, gírias, erros gramaticais, durações de silêncios e as manifestações
enfáticas também foram registradas. Uma vez transcrito, o material foi submetido a uma
exploração inicial, com vistas à organização. Foram excluídas frases incompletas sem sentido
e vícios de expressão. Em seguida, foram feitas leituras e várias (re)leituras de todo material.
Cabe relembrar que as oficinas já tinham sido transcritas e analisadas na primeira fase (2013-
2015) da pesquisa e foram (re)analisadas na segunda fase (2016-2018).
Optamos em agrupar todos os sujeitos da pesquisa da mesma forma a fim de garantir o
anonimato de todos. Foram destacados nos resultados como Participante 1 (P1) e assim
sucessivamente. Para efeitos de análise, foram considerados 25 (vinte e cinco) sujeitos,
vinculados a SMS.
Os dados foram classificados através de uma adaptação do método temático
tradicional (Minayo, 2014), uma vez que, a nossa pesquisa não trabalhou com a contagem de
frequência de unidades de registro, bastando para nós, à presença de unidade com significado
relevante para o objeto analítico. O significado de tema, neste estudo é “uma unidade de
significação complexa de comprimento variável, a sua validade não é de ordem linguística,
mas antes de ordem psicológica. Pode constituir um tema tanto uma afirmação como uma
alusão” (UNRUG, 1974 apud MINAYO, 2014, p. 315-16).
As etapas classificatórias foram: Análise preliminar (etapa 1); Exploração do material
(etapa 2) e Categorização (etapa 3).
Na análise preliminar realizei leituras do material, leituras intensas e flutuantes, de
modo a permitir que me impregnasse do conteúdo. Nessa etapa já selecionei as unidades de
registro e de contexto. Por unidades de registro compreendem-se as unidades de significação
do material. Não houve definição prévia sobre a natureza dessas unidades; elas foram
representadas por palavras, frases, e parágrafos dos dados brutos. As unidades de contexto são
fragmentos mais amplos em que estão contidas as unidades de registro e servem de guia
contextual para delimitar o contexto de compreensão da unidade de registro.
Prosseguindo a exploração do material, correspondeu a um ato classificatório, no qual
buscamos “o núcleo de compreensão do texto” (Minayo, 2014, p. 317), a partir do encontro
119
com categorias geradas pela seleção das unidades de registro. A classificação foi realizada por
analogia, segundo critérios semânticos, em um esforço de interpretação.
Para fins didáticos de classificação/sistematização, as unidades de registro e de
contexto foram organizadas conforme quadro 8.
Quadro 8 - Sistematização dos dados
Perguntas
norteadoras /
Objetivos da
questão
Unidades de Registro Unidades de Contexto Código /
Subcategoria
Pontos para
Discussão
Fonte: LISTON; HENICKA (2018)
Na primeira coluna coloquei em sequência as questões-guia utilizadas nas oficinas, no
grupo focal e na entrevista semiestruturada, juntamente com o objetivo que a pergunta deveria
responder. Na segunda coluna transcrevi as unidades de registro, isto é, para os recortes de
fragmentos, palavras-chave, falas que, por seu valor significativo foram selecionadas. As
unidades de contexto compuseram a terceira coluna da tabela, servindo de guia contextual na
delimitação do contexto de compreensão das unidades de registro. Destinei a quarta coluna
para a inserção dos códigos de sentidos das unidades de registro; para o exercício de
codificação oriundo da rede de remissões criadas pela intersecção da leitura cuidadosa do
material, com a bagagem, vivências e experiência individual da pesquisadora e com o
referencial teórico escolhido. Este exercício foi conduzido individualmente. Foi atribuído
códigos às unidades de registro, em separado, agrupando-os por analogia, com base em
critérios semânticos - e, posteriormente, pontos convergentes da codificação foram
estabelecidos, o que fortaleceu o rigor deste passo metodológico essencial, retirando-se,
assim, a armadilha de subjetivismo da codificação e valorizando a potencialidade do alicerce
epistemológico (LISTON; HENICKA, 2018).
A quinta coluna foi criada por Liston e Henicka (2018) para descrever as possíveis
relações, conexões e argumentos, estabelecidos pelas pesquisadoras no processo de
codificação, antecipando a discussão transversal e servindo como espécie de lembrete para
posterior categorização, no entanto, sistematizei e codifiquei os dados somente até a quarta
coluna.
Em sequência, realizei a fase de categorização. Para tanto, mantive-me afastada da
classificação/sistematização dos dados e busquei identificar no material transcrito eventuais
120
unidades de significação a respeito de uma determinada questão em resposta a outros
questionamentos, uma vez que o tecnicismo inscrito em perguntas sequenciais (instrumento)
poderia ocultar eventuais unidades de significação. O material foi explorado, de modo
transversal, para realizar esta verificação. Feito isto, atribui significados e interpretei a
codificação.
121
6 RESULTADOS
Sonhar é preciso. Mas é preciso sonhar conhecendo a história. Essa pesquisa foi
construída por muitos sonhos e encontros. Primeiramente encontros com o marco histórico
oportunizado por referenciais bibliográficos: a redemocratização do País, o controle social, a
conquista do MRSB e do povo brasileiro por um direito sanitário – o direito à saúde, o
arcabouço operacional do SUS, as fontes de seu financiamento, dentre outras fontes teóricas,
a fim de compreender o processo de organização de um sistema público de saúde.
Encontros com usuários que sofrem diariamente por não terem suas necessidades de
saúde atendidas e sonhos por melhores condições de vida – saúde, encontros com
profissionais de saúde desmotivados por suas condições de trabalho, sonhos de ver um SUS
que funcione efetivamente.
Vivemos em um país neoliberal e fomos “formatados” para planejar e fazer gestão
municipal em saúde nos adequando aos recursos disponíveis e às tomadas de decisão
centralizadas na União e talvez este produto histórico-cultural seja exatamente a fronteira que
não nos movimenta para executar uma gestão municipal efetivamente participativa, dirigida
para as iniquidades de acesso ao direito à saúde. Encontros com a gestão-administração;
sonhos de “desnaturalizar” as práticas e reinventar possíveis.
Os caminhos/encontros trilhados por esta pesquisa tiveram o propósito de buscar
indícios sobre a pergunta de pesquisa: nesta conjuntura antidemocrática, em que o federalismo
brasileiro parece estar em xeque; em que o país têm-se deparado com a necessidade de formar
pensamento estratégico para garantir a sustentabilidade do SUS; em que os ventos de
austeridade têm soprado com força em direção aos interesses de um poder político formal que
defende a inoperância de política de caráter nacional e público coordenada pela atenção
básica/atenção primária abrangente, que estratégias de gestão um município de grande porte
pode lançar mão para preservar e expandir com qualidade os serviços de atenção à saúde?
O campo de possibilidades para responder à pergunta de pesquisa foi investido pelos
encontros e sonhos, gerados no acontecer da vida da pesquisadora, com os trabalhadores da
rede pública de saúde do município estudado e com o gestor local.
Três estratégias de qualificação da atenção foram identificadas, sendo que serão
analisadas, nesse trabalho, somente as duas primeiras: a) planejamento; b) educação
permanente; e c) financiamento estável para a continuidade das ações e serviços de saúde.
122
6.1 Planejamento: uma estratégia para não se perder no meio do caminho
“Quando se navega sem destino nenhum vento é favorável”
Sênica
“[...] nós precisamos da gestão para fazer o planejamento, porque senão,
nada vai mudar”(P3); “[...] eu acho que todas as ações elas devem ser
pensadas e organizadas pra que as coisas sejam vistas de uma forma mais
completa e eu acho que num bom planejamento a gente consegue ver
isso”(P10).
Parte dos participantes revelou que gestão é: “[...] planejar.” (P2); “[...]
planejamento.” (P3, P6, P10); “[...]organização.” (P7)
Planejar é uma atividade própria do ser humano. Pensar no futuro, estabelecer
objetivos e definir estratégias para alcançá-los orienta a atuação do homem em todos os
espaços. Planejar é arte de elaborar o plano de um processo de mudança. É um instrumento
contínuo para diagnosticar a realidade e propor as alternativas para transformá-la, os meios
para viabilizar que isso aconteça e as oportunidades para executar as ações pensadas
(LACERDA; BOTELHO; COLUSSI, 2016; CORDONI JUNIOR; CARVALHO; GIL, 2017).
Mehry (1994) define planejamento como o modo de agir sobre algo de modo eficaz. Não
planejar significa não modificar a realidade (CORDONI JUNIOR; CARVALHO; GIL, 2017),
planejar significa reduzir incertezas (BRASIL, 2016).
O processo de planejamento incorpora a ideia de definição de objetivos e a formulação
de estratégias. Neste momento, também se analisa a realidade, buscando oportunidades e
ameaças, além de alianças que aumentem a capacidade de executar o plano desenhado. Nesse
sentido, a fala de P10 revela que um bom planejamento e consequentemente uma boa gestão
preside que ações em saúde sejam primeiramente pensadas e organizadas e que não sejam
elaboradas de modo irreflexivo e de forma fragmentada. Considerando que o Brasil cultiva
uma cultura de apagar incêndios (LIMA et al., 2016), é fundamental pensarmos e
questionarmos: que tipo de planejamento é necessário para qualificação da atenção à saúde?
Que tipo de planejamento uma SMS pode lançar mão para tal propósito? O que está posto tem
sido suficiente para qualificar os serviços e a atenção a saúde?
“[...] planejar a gente tem conseguido fazer algumas coisas, mas dentro da
lógica que seria né pra efetivar, enfim, modificar, inclusive indicadores e
tal, a gente não consegue fazer né, dentro desse espaço de tempo que nos
permite, dentro da estrutura atual que a gente trabalha né.” (P21)
123
No setor saúde, as práticas de planejamento estão presentes em todo o processo que é
conhecido como Gestão do SUS. É uma das principais ferramentas que permite melhorar o
desempenho, otimizar a produção e elevar a eficácia e a eficiência do sistema no
desenvolvimento das funções de promoção, proteção, recuperação e reabilitação da saúde.
Definir metas, estabelecer objetivos e planejar ou programar ações representam o dia-a-dia
dos gestores do setor público em saúde. No entanto, sua aplicação no SUS ainda é frágil
(CARDOSO, 2013; BRASIL, 2016), pois o que se vê no cotidiano dos serviços de saúde é um
SUS cheio de fragilidades: persistem problemas de acesso, baixa qualidade técnica, falta de
investimentos, dentre outros fatores.
O planejamento no SUS é de responsabilidade conjunta das três esferas da federação,
seu processo está proposto desde a sua regulamentação pelas LOS, quando se instituiu a
necessidade que municípios, estados e União realizassem periodicamente seus Planos de
Saúde para a gestão do Sistema e para o recebimento de recursos. Posteriormente em 2006
com a publicação do Pacto pela Saúde, o planejamento foi considerado um dos eixos
estruturantes para a gestão do SUS, e este deixa claro que o planejamento deve ser assumido
como instrumento de trabalho e de referência para a gestão da saúde no país e ser
desenvolvido de forma articulada e integrada entre as três esferas de governo/gestão
(BRASIL, 2006a). Mais pra frente em 2011, o Decreto 7.508 que regulamentou a Lei 8080
reforçou o papel do planejamento para qualificar a gestão do SUS definindo em seu artigo
quinze que o processo de planejamento da saúde será “[...] ascendente e integrado, do nível
local até o federal, ouvido os respectivos conselhos de saúde, compatibilizando-se as
necessidades das políticas de saúde com a disponibilidade de recursos financeiros” (BRASIL,
2011a, p. 8). Assim, as atividades de planejamento desenvolvidas de forma individual, em
cada uma das esferas, em seus respectivos territórios, devem levar em conta as atividades das
demais esferas, buscando gerar complementaridade e funcionalidade.
São considerados instrumentos formais de planejamento da gestão do SUS: o Plano de
Saúde nacional, estadual e municipal; a Programação Anual de Saúde e o Relatório Anual de
Gestão, que devem estar articulados e subsidiar o planejamento do executivo: Plano
Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e lei Orçamentária Anual (LOA)
(CORDONI JUNIOR; CARVALHO; GIL, 2017). No entanto, apesar de em termos legais
serem “claros” os instrumentos de planejamento, estes, são excessivamente burocráticos,
realizados em sua maioria, como cumprimento para repasses financeiros, acabam não sendo
construídos coletivamente com aqueles que são responsáveis em colocar em prática as metas
124
assumidas e nem por aqueles que serão beneficiados ou não por elas, e muito menos pensados
estrategicamente para se alcançar uma única imagem-objetivo.
“[...] o plano anterior ele foi é na verdade escrito por uma ou duas pessoas,
no papel ele teria sido é, discutido e debatido com poucas dezenas de
pessoas, mas a gente sabe que na verdade foram duas três pessoas que
escreveram o plano.” (P15)
Mas afinal qual é o sentido maior do planejamento? Pra que serve exatamente? Não é
para determinar aonde se quer chegar, para onde queremos conduzir o sistema? Para onde
queremos conduzir a nossa S.M.S.? A nossa região de saúde? O que deve ser feito? Como?
Em qual sequência? E a partir dele tomar decisões pertinentes que nos levarão ao ponto
desejado? Nesse sentido, os instrumentos formais de planejamento trazem um
“engessamento” para gestores locais sonharem em construir novas formas de organizar o
trabalho, de construir “possíveis” para aproximação do SUS que queremos.
Desde a formulação das LOS em 1990, até os dias atuais, os instrumentos legais de
planejamento estão atrelados mais a processos burocráticos de prestação de contas do que às
orientações com vistas ao fortalecimento de instituições políticas viabilizadoras da
transparência e controle social (SCATENA; TANAKA, 2001) e também não favorecerem o
nível local pensar de outra forma, de ser criativos e/ou inovadores.
[...] em relação às políticas eu acho que é muito pouco a participação do
município na realização das políticas né, apesar de ter as câmaras de
participação intergestora tripartite, bipartite, o município tem pouca voz
[...] então isso é uma crítica grande, que as políticas vêm de cima pra baixo
e tu tens que simplesmente executar [...].” (P18)
P8 considera que é um desafio associar a gestão pública local com a do ministério da
saúde:
“[...] o nosso maior desafio é articular, com o gestor local as políticas
públicas né nacional, esse é o nosso maior desafio...eu acho que o nosso
maior desafio ainda é associar a gestão pública local com a do ministério
da saúde.” (P8)
Os planos municipais de saúde (PMS), um dos instrumentos formais do planejamento,
por exemplo, não refletem e/ou traduzem de fato as reais necessidades de saúde da população
e ainda a cada quatro anos são alterados por obrigação legal, ficando esquecidos dentro de
uma gaveta e/ou computador, “[...] virou uma peça de gaveta em muito tempo” (P17). Os
125
PMS são produzidos pelos gestores como instrumento obrigatório de planejamento,
monitoramento e avaliação pelo período de quatro anos associado geralmente à garantia de
repasses financeiros ao município, sem nenhum conhecimento prévio dos atores que irão
colaborar para o cumprimento de suas metas, além de não refletirem as reais necessidades dos
trabalhadores e muito menos as necessidades de saúde da população como preconizado pela
legislação (NASCIMENTO; EGRY, 2017). Também demostraram fragilidades segundo P16:
“[...] uma das nossas fragilidades é saber definir meta, quando tu vai fazer
o plano né. Porque daí às vezes tu coloca lá, garantia de atendimento ao
idoso, que é garantia de atendimento ao idoso?”;
“[...] eu sinto que há uma grande dificuldade de você planejar sem de fato
antes colocar na mesa o diagnóstico”;
“[...] embora a gente discuta o relatório anual de gestão, a gente discuta os
relatórios quadrimestrais, né, saiba o dos indicadores, não tem um
diagnóstico na mesa escancarado (se referindo as reais necessidades de
saúde da população) pra a partir dali tu conseguir (es) fazer um
planejamento.” (P16)
Acredito que essas fragilidades/dificuldades primeiramente são porque os planos, pelo
menos em tese, deveriam refletir as necessidades de saúde da população a partir da análise
situacional (diagnóstico). (BRASIL, 2013). Como fazer tal diagnóstico? Como medir
necessidades? Como na prática da gestão/administração identificar necessidades em saúde e
pensar em formas de produção e reprodução social da realidade? O Manual de Planejamento
no SUS, publicado em 2016 pelo Ministério da Saúde subsidia a formação técnico política
dos gestores de planejamento em saúde e preconiza meios para captação e interpretação das
necessidades em saúde, utilizando-se da compreensão social do processo saúde-doença
(BRASIL, 2016). O comportamento gerencial hegemônico ao se opor ao preconizado denota
a utilização do PMS como instrumento de acesso aos recursos financeiros, sem o
compromisso de compreender a realidade do processo de saúde da população.
A identificação e satisfação das necessidades em saúde têm se mostrado um desafio
para os gestores da área, especialmente quando da pertinência de compreender as demandas
de grupos sociais vulneráveis, cujos determinantes de fortalecimento e desgaste –
relacionados às formas de produção e reprodução social da realidade, que se traduzem em
situações salutogênicas ou não de se viver, exigem profissionais, modelos e instrumentos
alinhados à determinação social do processo saúde-doença (MEYER et al., 2013).
Para Spiegel, Breilh e Yassi (2015) tanto os profissionais envolvidos na gestão como
no cuidado à população devem estar alinhados a esses referenciais metodológicos – a
compreensão social do processo saúde e doença, visto que, ao compreenderem a saúde a partir
126
do seu processo de determinação social, possibilidades de atuação baseadas na emancipação
dos sujeitos envolvidos direta ou indiretamente no cuidado, mostram-se mais assertivas e,
consequentemente, o atendimento e a satisfação das necessidades em saúde desses indivíduos
e grupos sociais têm maior chance de ocorrer. Em essência, a orientação do planejamento a
partir das necessidades de saúde busca ampliar a efetividade das políticas públicas
(OUVERNEY; NORONHA, 2013).
“[...] em relação às políticas eu acho que é muito pouco a participação do
município na realização das políticas né, apesar de ter as câmaras de
participação intergestora tripartite, bipartite, o município tem pouca voz e
quando ele vai lá pra discutir uma ação específica, uma política específica,
não vai o técnico, muitas vezes vai o gestor que não tem o conhecimento de
causa daquela, daquele assunto né [...]” (P18).
“[...] vejo que a gestão é amadora, é amadora na medida em que a gente se
baseia em pessoas que são cargos comissionados, que estão lá sem ter uma
formação adequada, e o que se permitiria se ter algo longitudinal aqui,
seria um corpo técnico permanente, um corpo técnico permanente, o que se
muda é a gestão, mas eles estão lá, eles sabem o que fazer , o P19 está lá o
tempo todo, ele sabe o que fazer independente de alguém mandar [...]. Esse
corpo permanente é que deve existir[...] eu penso que não tem uma
profissionalização da gestão.” (P3)
Outro aspecto a ser considerado nesse trabalho e que é um dos grandes entraves para o
planejamento em saúde é que “[...] o que vale na execução das políticas públicas hoje é o
desejo do secretário, é o desejo do prefeito” (P15).
“[...] porque eles vêm (se referindo aos secretários municipais de saúde)
com o discurso de que o plano é o norte, o plano vai digamos dar sentido
aquela gestão, e a gente vê em questão de não chega há um mês, a gente já
percebe que aquela gestão vai seguir conforme as necessidades políticas de
quem está na pasta. E isso é ruim porque se faz um, se faz um, se dá um
documento que serve de parâmetro e este documento não serve.” (P17)
“[...] ele acaba como integrante de um governo que é uma colcha de
retalhos de interesses partidários locais, ele se vê na condição de, de, da
mais completa é, é sessão da sua capacidade decisória, isto é ele acaba
sendo cooptado, ele acaba tendo que tomar decisões que atendam os
interesses de um governo que é um governo justamente fragmentado nessa
dos interesses locais.” (P15)
A fala de P18 e P3 demostram a necessidade de se ter gestores qualificados e da
manutenção de um corpo técnico também capacitado e que estes permaneçam em suas
funções mesmo na entrada de uma nova gestão para que as políticas e planos não sejam
127
completamente modificados por interesses partidários como demostrados pelas falas de P17 e
P15. Isso é confirmado por outros participantes:
“[...] Então hoje eu faço todo um planejamento financeiro pra saúde, só que
eu não atrelo isso ao que tá previsto ao que tá planejado.” (P15)
“[...] ele (se referindo ao gestor) já deu indícios de que ele não vai seguir o
plano municipal de saúde.” (P17)
“[...] Nada do que ele tá fazendo hoje tá previsto no plano, ele simplesmente
ignorou o plano, então, do plano teria que ter saído à programação anual,
então também não saiu.” (P16)
“[...] Nada impede que eu não possa fazer a alteração (se referindo ao
PMS).” (P14)
“[...] O que eu sugiro que talvez tenha que ter nesse plano, é uma maneira,
talvez uma forma legal né, de comprometimento da gestão. [...] só que o
plano ele não foi, digamos, posto integralmente, até pelo relatório que foi
apresentado [...] é menos de 50% de todas as ações que foram pactuadas
naquele momento não foram executadas.” (P17)
“[...] o orçamento que foi aprovado é a metade do que a gente tem
disponível, os recursos materiais estão lá apodrecendo, enferrujando [...] se
faz um projeto para se receber recursos para se construir uma unidade, mas
não se coloca o endereço correto, perde-se o recurso todo, então vejo que a
gestão é amadora.” (P3)
“[...] Esse plano 2014-2017, se não me falha a memória eu acho que houve
em torno de oito, nove trocas de secretário. Né, então nós tivemos aí oito,
nove secretários apesar de que teve dois períodos que não teve nem
secretário, o período agora do final do ano de 2016 nós passamos
praticamente trinta dias sem secretário e lá acho que 2015, 2016 nós
passamos um período acho que quase três mês sem secretário.” (P17)
“[...] A gente tem muita rotatividade, abaixo do gestor a gente não tem
ninguém que fique sempre ali, numa questão gerencial um problema é a alta
rotatividade – tem muita rotatividade.” (P19)
“[...] Mas veja bem, veja bem onde tá, onde eu vejo a raiz do problema.
Quando tu tem um líder, teoricamente, um gestor que é teu líder, o
secretário de saúde né, o teu prefeito por exemplo, é e na gestão anterior
quando havia-se, não podia haver reclamação, porque reclamação é igual a
voto então eu perco o voto né, o pensamento era esse, aí entra troca, troca o
prefeito, troca a gestão, entra de uma gestão teoricamente técnica e aí você
pensa nossa agora se surgirem reclamações acredito que serão apuradas, e
aí o que que acontece? Exatamente a mesma coisa [...] porque tu não pega
um reclamação e vai fazer o diagnóstico, levantamento da causa daquilo, o
que é que tá causando né? Tu só tá preocupado em amenizar a irritação de
quem reclamou.” (P17)
“[...] Hoje é a gente não fala do SUS só como condição de gestão, a gente
tem uma, uma parte gestão e uma grande parte de político partidário, é o
128
SUS é uma situação política, mas a administração do SUS [...] é muito
partidária, porque tem não só na gestão, como nas unidades de saúde
pessoas que tão no comando que estão lá por um apadrinhamento político.”
(P17)
Nesse sentido podemos destacar que a “descontinuidade administrativa” que se
caracteriza a cada troca de gestão e/ou de gestor, decorrente de resultados de eleições do
poder executivo, se traduz em desperdício do dinheiro público, exonerações e perdas de
potencial intelectual, além de paralizações de programas importantes e remanejamentos de
pessoal sem critérios técnicos. Por conta de alianças políticas realizadas pelos prefeitos, vários
profissionais, em sua maioria, cargos comissionados, assumem gerências e coordenações nas
instituições públicas “[...] a gestão é amadora, é amadora na medida em que a gente se
baseia em pessoas que são cargos comissionados”. Ou seja, não necessariamente possuem
conhecimento ou interesse sobre a política ou sobre gestão pública (NOGUEIRA, 2006;
ALMEIDA, s/d).
[...] um número de cargos de direção, chefia e assessoria é trocado por serem
considerados cargos de confiança, pode-se imaginar que o resultado será, no
mínimo, uma fase de confusão, até que todos os novos ocupantes dos postos
se encontrem enraizados. Mas quando, além disso, há problemas com a
qualidade da prestação dos serviços (como há em quase todas as áreas dos
serviços públicos no Brasil), críticas às práticas da gestão anterior e falta de
clareza institucional sobre as estratégias a serem desenvolvidas, a tendência
de perda de rumo organizacional é maior ainda. Somando a esperança
inevitável sobre o novo à visão de processos históricos como páginas viradas
e à perda da memória institucional estimulada pelo rodízio de cargos, o
resultado é uma cisão, proposital ou não, em boa parte das atividades
operacionais. É essa situação que, para os servidores públicos e técnicos da
área, é conhecida como descontinuidade administrativa (FGV, 2001, p. 15).
Para Rios Neto (2009) algumas das causas para o insucesso do planejamento em
instituições públicas são: o problema crônico da descontinuidade administrativa, o qual
impossibilita que a organização crie uma identidade coerente com seu contexto e seja capaz
de integrar seus servidores em torno de sua missão institucional; ausência de
comprometimento de dirigentes e servidores para com a missão, objetivos e metas da
instituição; desconhecimento por parte da organização da natureza e das necessidades reais de
sua clientela, levando-a a atuar na base do improviso e do casuísmo; inexistência de política
de gestão de pessoas que atenda às reais necessidades dos servidores e que possibilite o seu
desenvolvimento como ser humano integral, que pensa e é capaz de criar e recriar, o
129
despreparo de gestores para exercer suas funções, provocado pela ausência de programas de
formação continuada, impedindo o desenvolvimento da organização.
Para Paim e Teixeira (2007) um dos maiores problemas vivenciados no processo de
gestão do SUS é a deficiência de compreensão e uma falta de consenso sobre a imagem-
objetivo do SUS. Para Souza (2009, p. 912) isso acontece pelo fato de a gestão de
organizações públicas de saúde serem uma, relevante, “arena de disputa”, nos planos
ideológico, econômico e institucional, entre os defensores e opositores do SUS. Para o autor,
para pensarmos em estratégias de gestão a fim de nos aproximarmos de um SUS necessário,
temos que compreendê-lo como “uma luta política”. Agora como planejarmos e fazermos
uma “boa gestão” se não sabemos para onde estamos indo? Ou quando nesse processo de
planejamento enfrentamos essa luta? Uma resposta estaria em adotar justamente o
planejamento como estratégia de gestão municipal para sustentar o projeto político do SUS.
Para P13 uma boa gestão é “[...] um grupo de pessoas que tem que se organizar, tem
que todos falarem a mesma coisa, pra que né, um grupo de gestores, eles tem que se
entenderem primeiro, pra que a gente possa compreender o que eles querem.” Essa fala
evidencia que a falta de planejamento, de uma imagem-objetivo – missão institucional traz
uma incompreensão por parte dos trabalhadores de saúde – membros dessa instituição e
responsáveis em cumprir essa missão, do que fazer na prática.
“[...] hoje as pessoas entram na secretaria de saúde, elas não têm de fato
um norte do que vão, pra onde vão, o que realmente vão fazer.... Ai eu tô
aqui hoje, e eu acho que tenho que fazer isso e vou fazendo, vou tocando o
meu processo de trabalho certo ou errado eu vou tocando.” (P5)
“[...] As pessoas passam no concurso e vão para onde tem vaga. Alguns
explicam o que vai fazer, outros nem explicam. Tem os protocolos
ministeriais, alguns protocolos municipais; cada um vai se adequando ou
fazendo o que acha ou o que é mandado.” (P8)
“[...]Hoje em dia a gente vê as unidades criando métodos e maneiras de
gerenciar determinadas situações que não são as mais adequadas...” (P3).
“[...] frequentemente você vê os servidores dentro de um processo de
trabalho que eles não entendem o lugar deles, aonde eles estão, qual é a
importância daquela pequena intervenção. E se o cara não sabe a
importância da intervenção dele todo o processo fica comprometido, né?
(P15)
As organizações devem ser vistas como uma forma de seus membros viabilizarem
futuros almejados, aportando recursos materiais e humanos para atingir seus propósitos. Cada
organização tem uma finalidade que a tornou necessária e garantiu a sua estruturação. Trata-
130
se da razão de ser da organização, também denominada de missão ou imagem–objetivo, que
define a sua função básica na sociedade, nos termos dos produtos e dos serviços que ela
produz. Nesse sentido, o sucesso de uma organização se dá pelo cumprimento de sua missão
que deverá agregar e orientar a ação de todos os seus membros “[...] Todos tem que saber que
a gente funciona de acordo com essa diretriz” (P3), e tem na figura do gestor o responsável
pela condução do processo administrativo, dos recursos e das pessoas em sua direção
(LACERDA; BOTELHO; COLUSSI, 2016).
Para Tancredi; Barrios; Ferreira (2002), o planejamento é um dispositivo poderoso
para apoiar o desenvolvimento e sofisticação administrativa das organizações. Promover uma
cultura institucional em que os agentes/profissionais estão habituados a refletir sobre a
finalidade das ações empreendidas é uma excelente forma de melhorar a qualidade e
efetividade no trabalho. Nas organizações onde os funcionários são introduzidos à missão
institucional, aos objetivos estratégicos e aos programas de trabalho, como exemplo, a
satisfação dos usuários e a resolução efetiva dos problemas de saúde, observa-se um maior
compromisso com os resultados concretos do trabalho, ao contrário de organizações que os
funcionários estão alienados e somente preocupados em cumprir as tarefas que lhe são
destinadas, como exemplo, realizar X consultas por turno de trabalho. Nesse sentido, o
planejamento é também uma forma de educação para a qualidade.
Será que uma gestão local pode fazer diferente? É possível criar estratégias para
melhorar os serviços? É possível pensar nos recursos e pessoal que se têm e fazer diferente? É
possível criar uma cultura organizacional que todos os seus colaboradores saibam para onde
estão indo? Será que é possível ter uma continuidade administrativa e um planejamento em
longo prazo sustentando o projeto político do SUS? P17 demostra que é possível seguir novos
caminhos:
“[...] o SUS ele é praticamente municipalizado ele é um, a área que
administra o SUS, recebe os recursos do estado, recebe os recursos do
governo federal, e coloca os serviços em prática dentro de sua abrangência
né. E, mas apesar de ter um esqueleto, uma secretaria de saúde tem a
liberdade de criar novas propostas, novos serviços, novos médicos né, de
acordo com a sua população.” (P17)
A organização de um sistema de saúde é um grande desafio. Num país, como o Brasil,
desigual e diverso, somam-se dificuldades. Para enfrentá-las é preciso ter claro o projeto
político (planejamento) e não perder de vista aonde se quer chegar (imagem-objetivo).
131
Para que isso ocorra é necessária à construção coletiva de um planejamento de longo
prazo. Toda organização é um coletivo que se organiza para produzir bens e serviços, assim,
todo serviço, é um coletivo que deverá estar organizado. No campo da saúde, para produzir
saúde tendo a atenção integral, centrada na pessoa como uma “imagem-objetivo” (missão
institucional) a ser alcançada por todos os sujeitos envolvidos nesse processo.
“[...] entendo que o objetivo principal (se referindo ao objetivo principal da
SMS) é executar ações políticas no que é o seu grau de responsabilidade né,
buscando sempre ofertar serviços de qualidade, essa questão aqui que foi
levantado, todo mundo acho que falou na qualidade, muitas vezes falta né e
procurando sempre estar de acordo com os princípios do SUS
universalidade, integralidade, equidade [...] e a utopia é o momento que tu
chegue e os pilares sejam realmente executados como é pra ser, na sua, he
he he plenitude, da universalidade, integralidade e equidade, quando
conseguir executar isso dessa forma, tu vai ter realmente o serviço de
qualidade né.”(P18)
A imagem-objetivo, etapa número um do planejamento, corresponde a “futuro
concebível [...] desejável [...] possível de alcançar” (OPAS, 1975, p. 37). Se uma SMS tem a
função na sociedade de “[...] propiciar saúde né” (P4); “[...] garantir a saúde da
população” (P6); “[...] atender a comunidade no tocante obviamente a saúde e no bem estar
da comunidade” (P1); “[...] dando qualidade né” (P2); “[...] é administrar a saúde pública
para o benefício das pessoas, as pessoas, a comunidade” (P9); “[...] é fornecer serviços de
qualidade” (P16);“[...] é instrumentar e apoiar o acesso dos usuários a serviços de
qualidade” (P18); “[...] é garantir o acesso da população aos serviços de saúde” (P23); é
“[...] garantir o acesso aos serviços de saúde à população, visando à qualidade da atenção,
tendo como norteadores os princípios do SUS, articulando as políticas públicas nas três
esferas de governo, envolvendo a participação do controle social” (P4, P5, P6, P8, P13),
fica entendido que produzir saúde com qualidade é ter o compromisso social em defender a
vida satisfazendo as necessidades de saúde da população, através de um sistema humanizado,
com vínculo, responsabilização e acesso: “[...] pra prestar um serviço de excelência e de
qualidade ele tinha que ser integral, ver as necessidades dos sujeitos e ter um serviço que
responda a essa necessidade.” (P8)
“[...] atendimento de qualidade é um atendimento onde a pessoa é atendida
primeiro com humanização, segundo ser atendida como um ser humano,
terceiro ser respeitada como tal, quarto que ela tenha um atendimento das
suas necessidades condignas com as tecnologias que a medicina oferece, e
que ela tenha o seu mal curado em menor espaço de tempo pra que ela volte
132
ao convívio da sua, da sociedade em condições de normalidade, volte a ter a
sua saúde, e volte a ter a sua felicidade.” (P14)
Além de não perder de vista aonde se quer chegar é preciso também saber como se
quer chegar.
“[...] como planejar em forma de ter um acesso, um cuidado integral,
biopsicossocial, entendo que dentro dos limites, devemos pensar ética, em
colocar as pessoas como fim, não como meio, não fazer que um orçamento,
ou um planejamento, por si só, mas pensando nas pessoas como fim em si
mesmas.” (P3)
“[...] é fazer a gestão dos recursos humanos, recursos financeiros, recursos
técnicos, dentro de uma perspectiva ou sob uma perspectiva humanista, que
considere a ética do cuidado como valor supremo, a incorporação de
tecnologia em saúde que resolva e que a solução não seja apenas atender os
interesses peculiares pertencentes à indústria farmacêutica e a indústria de
medicamentos, e que monitore os seus, o resultado dessas, dessas políticas.”
(P15)
“[...] então a dimensão ética, por exemplo, é a que me move no sentido de
tomar as decisões técnicas e políticas. Puxando a entender a saúde como,
saúde como direito, saúde como instrumento de valorização da vida, e saúde
como condição pra paz entre os povos, entre as pessoas, eu não vou tirar, eu
não tirar, decisões políticas ou técnico políticas pra estruturar esse
sistema.” (P15)
Para tal complexidade, a Atenção Básica (AB) que é uma Política Nacional aprovada
pela Portaria 648/GM de 28 de março de 2006 (BRASIL, 2006c) a fim de garantir os
princípios doutrinários e organizacionais do SUS, tem a ESF para operacionalizar e
(re)organizar suas ações. Essa organização pressupõe o deslocamento do processo de trabalho
centrado em procedimentos, para um centrado no usuário, no qual o cuidado desse usuário é o
imperativo ético-político que organiza a intervenção técnico-científica.
O Instituto Picker (2011 apud Mendes, 2016) estabelece oito princípios da atenção
centrada na pessoa: respeito aos valores, às preferências e às necessidades definidas pelas
pessoas; coordenação e integração da atenção; informação, comunicação e educação;
conforto físico; suporte emocional e alívio do medo e da ansiedade; envolvimento da família e
dos amigos; continuidade e transição; e acesso à atenção de qualidade.
Nesse aspecto, a APS/AB foi considerada pelos participantes o eixo estratégico
principal para a estruturação do sistema de saúde municipal, resolutivos e com melhores
níveis de equidade, efetividade e eficiência.
133
“[...] não há como você fazer saúde num país, numa cidade, ou no estado
começando pelo telhado. Essa visão hospitalocêntrica é uma visão que já
deve ter, já devia ter sido extinta, né, bem como a visão centrada no médico,
né. Nós, temos que fazer saúde fundamentada no alicerce, o alicerce é a
porta de entrada da rede de atenção de saúde que é a atenção básica [...] A
unidade da saúde da família ela é responsável pelo paciente, desde a sua
entrada na UBS, até a sua saída no mais alto ponto de complexidade,
voltando pra unidade da saúde da família para fazer o seu
acompanhamento.” (P14)
“[...] então eu particularmente penso que um sistema de atenção que queira
ser resolutivo e, e que seja acessível precisa ser um sistema que dê
universalidade de acesso né, e estruture todos os demais níveis de atenção a
partir das demandas que vem dele, isto é, quem deve ordenar o andar de
cima é a base, o andar de baixo.” (P15)
“[...] o SUS vai de fato alcançar o que a gente deseja quando nós tivermos
uma cobertura de cem por cento da atenção básica ou perto disso, e que a
atenção básica também mude o seu modelo de atuação, né, porque não
adianta tu ter uma ampliação da cobertura da atenção básica e ter uma
atenção básica biologicista [...] Mas a cereja do bolo é, o SUS será de fato
concretizado com a qualidade que nós queremos, com tudo que, que nós
desejamos quando a atenção básica mudar o seu modelo, mudar a sua
forma de atuação e passar a entender que ela é, é responsável além da
saúde das pessoas, que ela passe a também produzir cidadania no seu
território, pra que as pessoas possam também entender que o SUS é delas,
né, é um bem, e aí a partir daí nós teremos o sistema de saúde que nós
sonhamos. Então esse, acho que é a principal estratégia que a atenção
básica deve adotar, muito mais do que fazer procedimentos e consultas é
investir nessa comunidade, na população, no controle social, no fomento da
cidadania.” (P16)
“[...] nós apostamos todas as nossas fichas realmente na atenção básica, e
fazer com que ela seje extremamente resolutiva, no mínimo em oitenta por
cento que é o que a literatura dos países que aplicam a atenção básica
dizem que é possível se chegar.” (P14)
De acordo com o documento Formulación de Politicas de Salud, editado pelo Centro
Pan-Americano de Planejamento da Saúde, os principais insumos que orientam o processo de
elaboração da imagem-objetivo de uma política pública de saúde são: o estado de saúde da
população, a estrutura dos serviços, a execução dos serviços e as relações entre os produtos do
sistema de serviços e a população (OPAS, 1975). Atualizando esta caracterização da OPAS
no contemporâneo, observa-se a presença de quase a totalidade de elementos de continuidade.
À exceção do primeiro insumo descrito, estado de saúde, uma vez que a razão de ser
da atenção básica/atenção primária do SUS não é atuar sobre o “estado” de saúde da
população, mas sobre as necessidades de saúde desta, os demais insumos são igualmente
exigidos pelo processo de produção da APS/AB.
134
“[...] se é verdadeiro que nós queremos qualidade, em resumo, o que nós
queremos é saúde de qualidade, você precisa necessariamente dissecar o
processo que te leva a saúde de qualidade. Você tem, num primeiro
momento você tem a questão estrutural do serviço de saúde, no segundo a
questão do, dos processos de trabalho né, e num terceiro momento os
resultados que você chega. Então você precisa, efetivamente, enquanto
gestor ficar de olho em esses três pontos, principais pontos críticos da
gestão: estrutura, processos de trabalho e os resultados que você adquire.”
(P15)
No âmbito da estrutura e execução dos serviços:
“[...] quanto mais adequado estiver a nossa, a nossa população, adequado,
eu falo em números mesmo (se referindo a adscrição territorial por equipe)
[...] mais a gente vai conseguir garantir uma melhor gestão do cuidado pra
esses usuários.” (P10)
“[...] na estrutura o que que nós precisamos? Nós precisamos de unidades
básicas de saúde que sejam salubres, que sejam saudáveis, é inaceitável
você ter uma unidade em que você tem ali apinhadas as pessoas ali,
aglomeradas, em ambiente completamente insalubre, mal ventilado, com
uma possibilidade de tá transmitindo doenças do que estar evitando doença.
Então, nós precisamos uma rede que tenha unidades básicas de saúde que
sejam saudáveis do ponto de vista do ambiente físico [...] nós temos que ter
um bom ambiente e uma ambiência adequada pra se fazer, consolidar o
processo de humanização da atenção e o acolhimento especialmente. Amm,
nós temos que ter uma, uma rede é de qualidade que nos garanta os insumos
para o trabalho, então nós temos que ter medicamentos disponíveis,
medicamentos comprovadamente eficazes, que tenha eficácia clínica
comprovada, que tenha segurança, que sejam acessíveis a todos, né? Você
precisa ter uma, uma rede de, de laboratórios e clínicas que no momento
certo e no tempo certo proporcione a você como profissional, é seguindo
determinados protocolos, que você possa pedir um raio-x e tenha esse raio-x
[...] em tempo hábil essas questões estruturais são fundamentais.” (P15)
Nesse aspecto também é necessário pensar regionalmente:
“[...] se a atenção básica de um determinado município vizinho não for bem
feita ela vai estourar na média complexidade no município maior e a
universalidade me obriga a atendê-los [...] esse trabalho eu tenho que fazer,
fazer com que o meu município e os nossos municípios vizinhos também
adotem a mesma política da atenção básica, porque se não vai estourar a
atenção básica aonde ela é bem feita, não é? Ou vai estourar na, aonde
todos os municípios vizinhos nos nossos prontos socorros e nas nossas
UPA’s, quando não deveriam estar lá, não é? E vai estourar nas doenças de
alta complexidade que poderiam ser doenças de menor complexidade lá.”
(P14)
135
A fala de P14 nos faz pensar que gestor local de um município polo tem que ter no seu
planejamento uma maneira de apoiar, incentivar e ajudar a estruturar uma região de saúde
com uma APS/AB efetiva.
No âmbito processos de trabalho:
“[...] se eu tenho um processo de trabalho definido, as coisas se encaixam
melhor.” (P10)
“[...] todos tem que saber que a gente funciona de acordo com essa diretriz
[...].” (P3)
“[...] eu acho que a gestão (administração) deveria criar caminhos que
presidissem disso, ou seja, eu não preciso me preocupar se a pessoa que
está lá no balcão vai ou não estar de mau humor naquele dia, se vai achar
simpática à moça com câncer de mama, se vai decidir ajudá-la porque ela
gostou dela, ou que ela seja uma boa alma, não! O cara do balcão tem que
ter os instrumentos da gestão pra saber o quê fazer, não interessa quem ele
é ou quem está diante dele, então a gestão precisa fornecer esses fluxos,
esses protocolos, deve acompanhar e avaliar os seguimentos dos protocolos
e os resultados que eles têm para modifica-los se eles não estiverem sendo
resolutivos.” (P3)
“[...] Os processos de trabalho, do ponto de vista da gestão você precisa
estrutura-los de uma forma racional, inteligente e que sobre tudo as pessoas
entendam o processo de trabalho, frequentemente você vê os servidores
dentro de um processo de trabalho que eles não entendem o lugar deles,
aonde eles estão, qual é a importância daquela pequena intervenção. E se o
cara não sabe a importância da intervenção dele todo o processo fica
comprometido, né?!.” (P15)
Werneck, Faria e Campos (2009) afirmam que a ausência de uma padronização nas
ações significa fragilidade da gestão, podendo levar a uma grande variação nos modos de
fazer. Em relação aos fluxos e protocolos de atendimento, Jacques e Gonçalo (2007, p. 111)
apontam para a importância que os protocolos têm na AB. Eles propiciam “processos ricos em
aprendizagem organizacional e, como prescrevem racionalmente os melhores recursos a
serem utilizados, são a garantia da maior probabilidade de resultados assistenciais almejados”.
É na APS/AB o espaço de organização e práticas da ESF (territorialização, atenção
domiciliar, trabalhos com grupos, acolhimento, ações integradas da saúde, planejamento local
e participação popular através dos Conselhos Locais de Saúde). Por esse motivo, e para a
garantia do cumprimento de tais atributos, tão complexos, que reconhecem a importância do
cuidado ao ser humano, são imprescindíveis profissionais que rompam com o Modelo
Biomédico, que incorporem novas formas de organizar o trabalho e compreendam a saúde
além da sua dimensão biológica. Nesse sentido, um instrumento de gestão apontado pelos
136
participantes é a possibilidade do gestor escolher o perfil profissional para a instituição: “[...]
fazer uma avaliação de uma pessoa, por exemplo, tem um perfil mais adequado para tal
serviço, para estar em determinada situação, isso não é visto, é de acordo com a vaga”
(P10).
Indicaram que a gestão precisa ser profissional e utilizar os instrumentos de avaliação
existentes, por exemplo:
“[...]estágio probatório, ele não é utilizado, mas existe, o instrumento já
existe, desde que essa avaliação fosse feita de maneira criteriosa e utilizada,
a pessoa entrou e funcionou na prática, beleza fica, não funcionou, o estágio
probatório é pra isso, o instrumento já existe – é só saber utilizar.” (P3)
Por último e, não menos importante, os participantes revelaram que o planejamento
deve ser realizado com participação popular:
“[...] nós estamos elaborando nossa conferência nacional de saúde né, e
estamos fazendo as pré conferências, mas nós não estamos fazendo a
conferência pra conferência por si mesma, nós estamos fazendo as pré
conferências e conferências no sentido de fazer um processo de, fazer um
processo de ampliação e de apropriação pela comunidade da sua
responsabilidade, dos seus direitos também, mas sobre tudo das sua
responsabilidade pra cobrar, a comunidade ela tem o dever de, de tomar
pra si esse processo, de se deslocar do executivo, do secretário e tomar nas
mãos a possibilidade de interferir mais agudamente as decisões sobre tudo,
especialmente na saúde.” (P15)
“[...] nós tomamos a iniciativa de fazer a conferência porque nós
gostaríamos de um plano que representasse os anseios da sociedade e não
que fosse o plano construído por essa gestão dentro de gabinetes, então esse
é o objetivo do nosso empenho, da nossa luta, pra conseguir fazer a
conferência.” (P16)
Os resultados demostram que o planejamento é fundamental para sustentar o projeto
maior – político do SUS, e para que de fato isso seja possível, dois entrevistados apontam
que: “[...] o controle social hoje seria um dos melhores caminhos” (P16); “[...] hoje na atual
conjuntura eu vejo que é o único caminho.” (P17)
“[...] porque o nosso país é pródigo em leis, se leis resolvessem nós
estaríamos né, no céu, e não, a gente sabe que as leis não resolvem se ela
não tiver o lastro, uma, se a sociedade não se apropria do fundamento legal,
né do fundamento ético, moral, que tá por trás de uma lei, que a sociedade
não se apropria das razões pelas quais a lei foi criada. Então, se nós
tivéssemos de fato um controle social mais efetivo que tivesse um
empoderamento político fortemente sedimentado na sociedade, na
137
comunidade e ela entendesse o seu papel, nós não precisaríamos de leis pra
fazer valer o Plano Municipal de Saúde, ele por si só estaria legitimado,
teria a força da representação.” (P15)
Para Souza (2009) uma estratégia importante de gestão com a finalidade de
aproximação do “SUS possível do SUS necessário” é à participação popular. Afirma que o
gestor não pode negligenciar as ações que visem ao fortalecimento da participação de
usuários, trabalhadores de saúde e prestadores de serviços na definição e no acompanhamento
das políticas de saúde. Na prática é preciso que as pessoas percebam os benefícios que o SUS
traz para se mobilizarem em sua defesa ao ponto de influenciarem decisões governamentais.
Planejar é uma tarefa complexa por ser um processo contínuo de pensar no futuro.
Num futuro possível de ser concebido, o que exige tomada de decisões permanentes, dentro
de um contexto que sofre influências constantes. Sua riqueza está no processo de análise
(diagnóstico) de uma realidade, que permite pensar em meios para se alcançar o que se deseja
(imagem-objetivo).
Nesse trabalho os resultados demostraram que o planejamento de uma SMS pode ser
pensado para além dos instrumentos formais instituídos pelo poder executivo. É fato que
muitas decisões e definições do modelo de atenção adotado ainda são normativamente
centralizadas, com papel acentuadamente indutor do nível central. Entretanto, também é fato
que muitas estruturas loco-regionais podem fazer diferença. Em todas elas, sejam municipais,
loco-regionais, o diferencial é o planejamento.
6.2 Educação Permanente: uma estratégia para transformação das práticas em saúde
“[...] educação permanente, [...] então eu acho que é uma forma de ter a
mesma linguagem permanentemente, não se faltar isso [...] então eu acho
uma questão muito importante à educação permanente [...] é necessário à
qualificação dos trabalhadores de saúde” (P5); “[...]capacitação, educação
continuada, é uma coisa muito importante [...] Essa questão de educação
permanente é uma das coisas mais importantes” (P6);”[...]acho que
investimento em educação é uma boa vertente”(P23); “[...]com a educação
permanente a gente consegue melhorar o processo de trabalho” (P20)
Parte dos entrevistados revelou que a Educação Permanente (EP) é muito importante
para produzir mudanças nas práticas de atenção à saúde e também nos processos de trabalho
no sentido de atender as necessidades de saúde da população. A EP apareceu como uma das
principais estratégias de gestão para qualificação dos serviços, mudança no modelo de atenção
138
à saúde e consequentemente na melhoria da qualidade do cuidado e a humanização no
atendimento.
A Educação Permanente em Saúde (EPS) foi instituída em 2004 como uma política
pública estratégica, com o objetivo de promover mudanças nos processos de formação e
desenvolvimento dos trabalhadores do setor saúde, com base na problematização da realidade
e na construção coletiva de soluções, tendo como foco as necessidades da população e o
fortalecimento do SUS. A EP trabalha com alguns dispositivos metodológicos:
problematização (reflexão), aprendizagem significativa (promoção e produção de sentidos) e
trabalho em roda (BRASIL, 2004; GIL et al., 2017).
Segundo Ceccim (2005), para produzir mudanças de práticas de atenção em saúde, é
fundamental dialogar com as práticas e concepções vigentes, problematizá-las, não no
abstrato, mas no concreto do trabalho de cada equipe e assim construir novos pactos de
convivência e práticas, que aproximem o SUS da atenção integral à saúde. Não bastam novas
informações ou regras, mesmo que precisamente bem comunicadas, senão para a mudança,
transformação ou crescimento.
“[...] Não adianta você botar essas estratégias de goela a baixo pro
trabalhador. Algumas coisas você pode determinar e tentar no
convencimento. Eu não consigo de goela a baixo fazer convencer um
determinado profissional a fazer esse tipo de atendimento que eu gostaria,
[...] e o que a gente tem procurado fazer nas reuniões com as equipes é
exatamente isso. Sempre dar esse exemplo: como eu gostaria de ser
atendido? Você gostaria de ser atendido, de que forma eu gostaria de ser
atendido? [...] e lógico que isso não se muda num canetasso.” (P14)
A EP pressupõe organizações mais democráticas com criação de espaços que
possibilitem a reflexão (dimensão ética). Nessa perspectiva, ao adotar tais valores, busca
romper com a verticalização do sistema de saúde (CARDOSO et al., 2017). Nesse sentido, a
EP tem um potencial de induzir mudanças necessárias no perfil dos profissionais,
diferentemente dos processos de educação orientados apenas pela atualização técnico-
científico que normalmente se vê nos serviços ou ainda por situações emergentes (agravos em
saúde) que demandam capacitações, “[...] o que a gente consegue fazer é: deu algum problema?
Então vai lá e faz uma capacitação pontual, não é contínuo e isso a gente tem essa dificuldade
enorme” (P8).
Diferentes autores atribuem ao modelo de EP a capacidade de provocar mudanças nos
processos de trabalho. Para Luz (2010) a EP tem a capacidade de facilitar o envolvimento de
todos os profissionais e proporcionar uma troca de saberes, uma reflexão das práticas de
139
serviço, consequentemente, uma interação maior de toda a equipe e uma melhoria no processo
de trabalho. Para Carotta, Kawamura e Salazar (2009) a EP por si só é uma prática educativa
que aplicada ao trabalho tem a possibilidade de produzir transformações nas relações, nos
processos de trabalho, nas condutas, nas atitudes, nos profissionais e até mesmo nas equipes,
por esta ter como fundamento a reflexão crítica sobre as práticas de serviço. Para Sarreta
(2009), o diferencial é a construção coletiva de novas estratégias de trabalho comprometidas
com os princípios e diretrizes do SUS e com as necessidades de cada região mediante a
problematização das práticas cotidianas, visando desenvolver autonomia e participação.
Nesse aspecto, um ponto relevante a ser destacado na fala de um entrevistado é sobre
o conteúdo a ser abordado nas EP para atingir seu propósito de produzir mudanças nas
relações e nos processos de trabalho, para garantir uma atenção integral e com qualidade:
“[...]o que a escola faz? Forma indivíduos tecnicamente eventualmente
competentes, mas do ponto de vista ético, completamente afastados da
discussão [...] então de nada adianta eu ter o melhor das educações
continuadas se o material humano do ponto de vista ético não entende a
saúde como direito, não entende o usuário como o cara que paga o seu
salário, né, não entende a saúde como a expressão suprema do processo
civilizatório né?! Então, a educação em saúde ela precisa ter de um lado a
potência de um processo de qualificação profissional, mas junto com isso a
potência de um processo de qualificação ou de um reconhecimento do que
de ético tem nas pessoas e elas tem, elas precisam ser estimuladas.” (P15)
“[...] eu acho que a gente não pode, especificamente em saúde separar
essas dimensões: a dimensão técnica, a dimensão política e a dimensão
ética. Talvez de novo, a saúde, volta aquela questão, a saúde como a
grande possibilidade de você fazer a sociedade toda avançar na aquisição
né, dos direitos à cidadania e na compreensão desses direitos. Então a
dimensão ética, por exemplo, é a que me move no sentido de tomar as
decisões técnicas e políticas.” (P15)
A fala de P15 demostra que a EPS como uma estratégia de gestão precisa ser capaz de
formular um novo modo de produzir práticas de saúde indissociado de uma perspectiva ético-
política. Também apontou que as pessoas “precisam ser estimuladas”, sugerindo a criação de
espaços coletivos para pensarem, refletirem e problematizarem suas práticas cotidianas “[...]
Por que disso? Qual é a minha função? Qual é o meu lugar? Mas por que eu estou ali? Qual
é o resultado da minha intervenção?” (P15). Nesse sentido aposta na estratégia de EPS para
induzir mudanças necessárias nos perfis dos profissionais “[...] porque no mundo inteiro é
assim. As pessoas são, são um material, uma pedra bruta que você tem que lapidar, você tem
que reconhecer as potencialidades dos indivíduos e as suas vulnerabilidades e trabalhar em
cima disso, e aí você vai traçando aquele perfil” (P15) e consequentemente melhorar a
140
qualidade e efetividade no trabalho. Tal estratégia tem a finalidade de exercer forte influência
sobre o compromisso das pessoas com os objetivos institucionais, e no caso de uma SMS,
com a consolidação do SUS.
Para Pasche (2010) um dos maiores desafios do SUS é a construção de uma agenda
ética para a micropolítica, ou seja, o desenvolvimento da discussão sobre as relações entre os
diferentes sujeitos (gestores, profissionais, usuários) assentadas no cuidado e
responsabilização compartilhada. E nesse aspecto a EPS mostrou-se primordial.
Para a construção das mudanças necessárias no cotidiano das práticas
profissionais de saúde é preciso refletir sobre as implicações éticas das ações
dos trabalhadores como agentes morais. É preciso, também, compreender o
caráter dinâmico da sociedade como um espaço em permanente disputa de
interesses políticos e desejos individuais e coletivos, que envolvem forças
díspares, valores diversos e crenças divergentes (VERDI; CAPONI, 2005, p.
87).
A Política Nacional de Humanização (PNH) foi proposta pelos participantes como um
dispositivo a ser utilizado pelos gestores para “[...] criar uma visão uniforme desde o nível
central até a ponta”; “[...] trabalhar com a política de humanização desde a gestão em nível
central até com quem está lá na ponta (P6, P8, P9, P11, P12, P13, P24), com a intenção de
mudanças nas práticas de atenção em direção ao acesso, vínculo, responsabilização e ainda
potencializar a garantia de atenção integral, resolutiva e humanizada.
A PNH da Atenção e Gestão do SUS aposta na indissociabilidade entre os modos de
produzir saúde e os modos de gerir os processos de trabalho, entre atenção e gestão. Tem por
objetivo provocar inovações nas práticas gerenciais e as práticas de produção de saúde,
propondo para os diferentes sujeitos (coletivos/equipes) implicados nessa prática o desafio de
superar limites e experimentar novas formas de organização dos serviços e novos modos de
produção e circulação de poder (BRASIL, 2012b).
Para o alcance de tal objetivo expressaram que a gestão em saúde deve ofertar
métodos (modos de fazer) e apontaram que uma “[...]educação permanente forte
[...]eficiente” (P6) seria capaz de provocar inovações nas práticas gerenciais e nas práticas de
produção de saúde, de criar uma “visão uniforme”, guiados pelo pressuposto ético de
produzir saúde com o outro.
A proposta de EPS é uma das estratégias de gestão importantes para a humanização e
qualificação nos serviços, no entanto, ela é precedida de uma ação (dimensão política). Ela é
fruto de decisões políticas no sentido de estruturar uma rede de serviços com espaços para
141
viabilizar práticas de formação de pessoal e adequar seus perfis às necessidades de saúde da
população “[...] uma secretaria de saúde tem a liberdade de criar novas propostas, novos serviços,
novos médicos né, de acordo com a sua população” (P17).
Considerando a complexidade do sistema de saúde brasileiro, Ceccim (2005) afirma
que a EPS é necessária para a consolidação de práticas voltadas à resolutividade dos
problemas de saúde das populações locais. No entanto, um dos grandes desafios enfrentados
pela EPS segundo Cardoso et al. (2017) é o desconhecimento e desvalorização da EPS pelos
gestores, o que é confirmado pela fala de P16:
“[...] Outro instrumento de gestão que eu penso e que não é utilizado
infelizmente, é o serviço de educação permanente, né?! E aí em todos os
sentidos, no sentido de qualificar os profissionais de saúde, no sentido de
qualificar processo, descrever os processos, né, porque, e aí começa por
dentro da secretaria de saúde, na própria secretaria, então cada setor, tu
vai hoje na regulação tu pergunta pra uma determinada pessoa, pra quem
agenda tomografia por exemplo, quais são os locais no município que fazem
ultrassonografia, eles não sabem, só quem vai saber é quem faz o
agendamento da ultrassonografia. E assim sucessivamente, então todos os
processos descritos, organizados[...].” (P16)
A maioria dos entrevistados apontou a necessidade de se ter dentro da SMS um setor
que fosse responsável pelo processo de EPS de toda a rede municipal.
“[...] o que eu sinto que falta muito, e que eu penso que um setor de
educação permanente é daria conta, é a comunicação da rede, a rede não se
comunica e a rede não se conhece. Então se eu não conheço a rede que eu
trabalho fica difícil de eu, de eu dar uma atenção de qualidade pro paciente
né?” (P16)
“[...] e...as capacitações, é... essa educação continuada, esse serviço, eu
acho que também é um nó muito grande né, porque nós gostaríamos de ter
um serviço de capacitação né, que o RH tivesse um serviço de capacitação,
de educação permanente, processo formador contínuo e programado.” (P8)
“[...] capacitação, educação continuada, é uma coisa muito importante, só
que nós temos que administrar isso no meio de outras coisas assim, e
realmente se tivesse um alguém, um departamento, ou um local pensando
nisso [...].” (P6)
As falas de P6, P8 e P16 sugerem uma (re)organização da “arquitetura” da SMS do
município estudado, ou seja, apontam para a construção de uma unidade de produção que
fosse responsável por um “processo formador contínuo e programado”(P6), educação
142
permanente como “forma de ter a mesma linguagem permanentemente, não se faltar isso”
(P5).
Destacou-se ainda a importância de estruturar um serviço municipal com acolhimento
para novos funcionários, “uma formação inicial para o trabalho”, tendo como foco a EPS.
“[...] porque se todo profissional que fosse admitido tivesse um treinamento,
uma integração, um preparo, eu acho que até mais do que isso, fazer uma
avaliação de uma pessoa, por exemplo, tem um perfil mais adequado para
tal serviço, para estar em determinada situação, isso não é visto; tipo assim,
é de acordo com a vaga.” (P10)
“[...] todo o servidor da saúde que entra, ele, ele, claro assume e vai pra
rede, só que obrigatoriamente ele faz um curso na educação permanente
[...] ali era apresentado pra ele toda a rede, ele conhecia toda a rede, todos
os serviços que a rede tem e qual a lógica daquela secretaria municipal da
saúde, qual é o entendimento de saúde que aqueles gestores têm.” (P16)
As decisões da gestão interferem diretamente na atenção à saúde. Por isso,
trabalhadores e usuários devem conhecer como funciona a gestão dos serviços e da rede de
saúde, assim como participar ativamente do processo de tomada de decisão nas organizações
de saúde e nas ações de saúde coletiva. Qualquer mudança na gestão e atenção é mais
concreta se construída com a ampliação da autonomia e vontade das pessoas envolvidas, que
compartilham responsabilidades. Os usuários não são só pacientes, os trabalhadores não só
cumprem ordens: as mudanças acontecem com o reconhecimento do papel de cada um
(BRASIL, 2012b).
Outro tema identificado a partir da análise da fala dos participantes foi à importância
de se ter uma clínica de base efetiva, ou seja, uma clínica que visa compreender e resolver na
APS/AB, a maioria das necessidades/problemas de saúde da população, e nesse sentido a
qualificação profissional (dimensão técnica da E.P.S.), foi colocada pelos participantes como
estratégia fundamental para mudança no modelo de atenção à saúde.
“[...] eu na atenção básica como médico diante de alguém com cefaleia eu
posso ou fazer uma entrevista bem feita, detalhada e um exame físico
adequado ou, ou, eu lascar de cara uma ressonância magnética funcional ou
uma tomografia encefálica, né? [...] pega um exemplo, por exemplo,
transtorno de sono, você precisa antes de pensar em medicalizar o indivíduo
conversar com ele sobre a higiene do sono, que são uma série de requisitos
que o ser humano precisa pra criar as condições pra adormecer e ter um
sono reparador. Depois quem sabe vem a questão do fármaco, que que você
faz hoje? Você inverte, você já parte para o fármaco pra induzir o sono
naquele indivíduo, que é uma, uma, é um desatino completo, né.” (P15)
143
Nessa questão foi indicado que a organização e o funcionamento dos serviços
requerem mais do que a planificação do desenho assistencial em si pela gestão. A
resolutividade e qualidade na atenção incluem, principalmente “[...] as questões de cunho
eminentemente ético porque isso que faz as pessoas avançar na sua responsabilidade que tem
com a sociedade e saber entender que cada intervenção ela tem essa dimensão” (P15).
A Educação Permanente se mostrou, a partir das falas no contexto estudado, uma
estratégia de gestão que tem a potência de transformar as práticas em saúde na medida em que
têm a mesma potência de transformar as relações entre sujeitos e as formas de trabalho, uma
vez que está alicerçada na reflexão crítica sobre as práticas exercidas cotidianamente.
144
7 CONSIDERAÇÕES
Primeiramente, torna-se necessário destacar a importância desse trabalho para os
campos das políticas públicas, da gestão e da formação profissional. Para o campo das
políticas públicas acredito que o tema abordado traz uma reflexão sobre novas possibilidades,
principalmente a de romper com a subordinação impetrada por escolhas políticas e
econômicas assumidas pelos grupos dirigentes, para que, de fato, possamos avançar no
cumprimento dos direitos assegurados pela nossa Constituição. Avançarmos para uma política
de estado e não de governo. O documento estudado no capítulo três “Formulación de Politicas
de Salud”, editado em 1975 pelo CPPS/OPAS, traz contribuições importantes nesse sentido,
em como formular políticas públicas para o cumprimento de uma imagem objetivo – a
concretização do SUS conquistado na CF de 1988. A falta de clareza e insuficiência da
“Imagem-objetivo” do SUS, principalmente no que diz respeito ao seu desenho macro
organizacional, são dois desafios robustos a ser enfrentados no âmbito das políticas públicas e
na gestão do SUS. No campo da gestão, o trabalho chama a atenção para a histórica
necessidade de se pensar na chamada “profissionalização da gestão”, pois ainda prevalece a
prática de distribuição de cargos na estrutura administrativa em função dos interesses políticos
partidários, reproduzindo o amadorismo que caracteriza a gestão do SUS em vários de seus
subsistemas. Nesse sentido, a pesquisa destaca que a descontinuidade político-administrativa
é uma das causas do insucesso do planejamento em instituições públicas. No campo da
formação profissional, a pesquisa ilumina a importância e necessidade da formação e
construção de sujeitos/gestores dotados de capacidade técnica e comprometidos orgânico e
militantemente com o SUS, para fins de atuação efetiva, em diversos espaços e níveis de
gestão e de condução política do Sistema. Enfatiza, também, o quão importante é concretizar
a formação para o SUS, capaz de transformar as relações entre os sujeitos e as formas de
trabalho, alicerçada na reflexão crítica sobre as práticas exercidas cotidianamente. É
necessário que os gestores conheçam e dominem informações de natureza técnico-cientifica e
político institucional do SUS para que possam planejar com a intenção de intervir sobre as
necessidades de saúde da população.
Em segundo lugar, é fundamental registrar a importância dessa dissertação para o
crescimento e amadurecimento da pesquisadora. De enfermeira de um hospital privado à
enfermeira de atenção básica numa unidade pública de saúde, percebi que fiquei por muito
tempo alienada e que nunca tinha parado para refletir que mais de oitenta por cento da
população brasileira não tinham (não têm) o mesmo direito, apesar de garantido
145
constitucionalmente, a uma saúde de qualidade, e àqueles que têm, precisam pagar caro por
ela. No processo, várias indagações começaram a brotar no pensamento, o que acabou
direcionando-me para o estudo do SUS com profundidade, no sentido de tentar compreender
o porquê o direito a saúde, que custou tão caro à nossa sociedade, é tão negligenciado pelos
nossos dirigentes; o porquê da morosidade em se regulamentar o SUS (foram necessários 23
anos para regulamentar o que já estava previsto na CF de 1988) e ainda o porquê de sua
operacionalização ser diferente em cada município. Apesar de já se passar vinte e oito anos da
conquista do direito universal à saúde, o filme continua sendo o descaso, prova disto é o
congelamento de investimentos para área da saúde pelos próximos 20 anos.
O estudo analisou as estratégias de gestão do município Itajaí, SC, na perspectiva de
um coletivo intrassetorial da SMS e de conselheiros de saúde na tentativa de responder a
pergunta de pesquisa: nesta conjuntura antidemocrática, em que o federalismo brasileiro
parece estar em xeque; em que os militantes do SUS têm-se deparado com a necessidade de
formar pensamento estratégico, em uma contracorrente, para garantir a sustentabilidade do
Sistema; em que os ventos de austeridade têm soprado com força em direção aos interesses de
um poder político formal que defende a inoperância de política de caráter nacional e público
coordenada pela atenção básica/atenção primária abrangente; que estratégias de gestão um
município de grande porte pode lançar mão para preservar e expandir com qualidade os
serviços de atenção à saúde?
Pergunta nada fácil, para uma servidora que está na lida diária de uma unidade básica,
envolvida com necessidades e demandas de usuários, orientadas por um modelo que há
tempos apresenta sinais de esgotamento – o da gestão de oferta e demanda. Mas, a pergunta
foi respondida:
Na relação com os dados, foi-me possível perceber que o planejamento é uma
estratégia de gestão importantíssima para sustentar o projeto político do SUS. Para tanto, é
necessário construir um consenso sobre uma “Imagem-objetivo” única e, a partir dela, definir
objetivos e metas para alcançá-la num futuro concebível. Foi-me possível compreender,
também, que a aplicação de um efetivo planejamento estratégico para o SUS depende de
muitas variáveis, dentre as quais destaco a ineficiência de coordenação federativa que, com
seus instrumentos formais de planejamento, traz um “engessamento” à gestão e, com efeito,
um aprisionamento de sonhos por novas formas de organizar o trabalho, de construir
caminhos de aproximação ao SUS sonhado e conquistado, em 1986.
Outro aspecto observado foi à necessidade de construção de um planejamento voltado
para as necessidades das pessoas e, nesse sentido, a limitação gerencial em identificar
146
“necessidades em saúde”, em função da supremacia de demandas de saúde, torna-se um
desafio a ser enfrentado e tema para futuras pesquisas.
A educação permanente em saúde, outra estratégia de gestão, mostrou-se
potencializadora para a transformação das práticas em saúde, no sentido de “um novo modo
de” produção de saúde. Conclui-se que os gestores municipais são agentes importantes para
adotarem estratégias no sentido de qualificação da atenção; no entanto, precisam estar
dispostos e preparados para desenvolver estratégias conscientes e comprometidos na luta pela
efetivação do SUS.
Em terceiro lugar, ao reconhecer a complexidade do modelo de atenção preconizado
pelo SUS e as iniquidades postas pela realidade ao direito universal à saúde, cabe ressaltar
que o estudo apresentou algumas limitações, para citar três: a própria vida da pesquisadora
que, por fatores externos ao mundo da pesquisa, não conseguiu aprofundar a discussão do
tema abordado como gostaria; a impossibilidade em obter dados contextuais, de fontes
relacionadas à história viva do município estudado, em âmbito comunitário, social, cultural e
econômico; e a impossibilidade de aprofundar, na análise e interpretação dos dados, o valor
que os participantes dão à APS/AB na gestão dos serviços municipais.
Para concluir, compartilho um trecho citado por Paim e Teixeira (2007, grifo nosso),
no artigo intitulado Configuração institucional e gestão do Sistema Único de Saúde:
problemas e desafios:
É dever do SUS cuidar da vida e da saúde das pessoas que não podem ser
comprometidas pelos humores, crenças, ideologias e vaidades dos dirigentes
de plantão. Daí a necessidade de protegê-lo da descontinuidade
administrativa e de intercorrências desastrosas da gestão, posto que estão em
jogo a vida e a saúde das pessoas. Cabe destacar a pertinência de
investigar e debater novos formatos institucionais que possibilitem ao
SUS cumprir o seu dever e alcançar o devir concebido pela Reforma
Sanitária Brasileira.
147
REFERÊNCIAS
ABRASCO, CEBES, ABRES, Rede UNIDA, AMPASA. Fórum da Reforma Sanitária
Brasileira: Reafirmando Compromissos pela Saúde dos Brasileiros. Manifesto [online]. Rio
de Janeiro, Brasil, 2006. Disponível em:
<http://www.abrasco.org.br/publicacoes/arquivos/20060713121020.pdf>. Acesso em: 07 jun.
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governo; revoga dispositivos das Leis nos 8.080, de 19 de setembro de 1990, e 8.689, de 27
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161
APÊNDICES
APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE (COMUSA)
ESTRATÉGIAS DE GESTÃO PARA A QUALIFICAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE
DO SUS: UM ESTUDO DE CASO
MESTRADO EM SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO
Rua Uruguai, 458 - Centro - Itajaí / SC - CEP 88302-202 - Bloco F6 - Sala 302
Fone/Fax: (47)3341-7932
Email: [email protected]
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE (COMUSA)
Prezados(as) senhores(as),
O(a) senhor(a) estão sendo convidado para participar, como voluntário, da pesquisa
Estratégias de Gestão para a Qualificação da Atenção à Saúde do SUS. Esta pesquisa está
sendo realizada no Programa de Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho da Universidade
do Vale do Itajaí, Itajaí, SC. O objetivo geral é analisar a dialética das estratégias de gestão da
atenção à saúde de um município do sul do Brasil, na triangulação entre o plano municipal de
saúde, a visão de um coletivo intrassetorial da secretaria municipal, e o controle social. Sua
participação consistirá em participar de um grupo focal, organizado por um guia de temas. O
grupo focal não vai registrar seu nome e os dados serão divulgados em forma conjunta,
guardando assim o mais absoluto sigilo sobre as informações fornecidas pelo senhor(a),
enquanto a pesquisa for desenvolvida. O(a) senhor(a) pode se recusar a responder qualquer
pergunta realizada no guia de temas. O(a) senhor(a) também podem desistir de participar da
pesquisa a qualquer momento. Para facilitar a coleta de dados, o grupo focal será gravado, se
os senhor(a) concordar. Após a conclusão do estudo, os resultados serão publicados, mas não
será possível identificar nenhum dos indivíduos que participaram da pesquisa. A sua
participação não lhe trará nenhum benefício individual. O senhor(a) não terá que pagar nada
para participar dessa pesquisa e nem poderá receber. No entanto, seria importante sua
participação, pois, as suas informações servirão para qualificar a atenção à saúde do SUS.
Caso concorde em participar, rubrique, por favor, esta folha e assine a folha seguinte.
Obrigada pela participação.
162
CONSENTIMENTO:
Eu, _________________________________, declaro que fui devidamente informado e
esclarecido dos objetivos da pesquisa. Sei que posso não participar ou desistir a qualquer
momento. Sei que não gastarei nem receberei nada pela minha participação. Sei também que
meu nome não será mostrado em nenhum documento do estudo. Por isto concordo em
participar como voluntário.
__________________________________ de _________________ de ______.
____________________________________________________
Assinatura
Em caso de dúvidas:
Comitê de Ética em Pesquisa (UNIVALI):
Endereço: Rua Uruguai, 458. Caixa Postal 360
Bloco F6- Térreo Itajaí (SC) CEP: 88302-202 Fone: (47) 3341-7738
E-mail: [email protected]
Rita de Cássia Gabrielli Souza Lima. Orientadora.
E-mail: [email protected]
Fones: (47) 47)3341-7932 (48) 3238-8821.
163
APÊNDICE B - ROTEIRO ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA
CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE
ROTEIRO ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA
CONSELHEIROS MUNICIPAIS DE SAÚDE
1- Você participou da construção do Plano Municipal de Saúde 2014-2017, enquanto
conselheiro? Se ok, como se deu essa participação?
2- O secretário municipal de saúde iniciou suas atividades de gestão com um Plano
Municipal de Saúde em curso, ainda por um ano. Como você vê esta realidade, posta
pelo planejamento do SUS?
3- Em tempos de crise política e econômica, estados e municípios estão enfrentando
bastantes dificuldades para a garantia das ações e serviços de saúde. Diante, deste
cenário, como você vê a descentralização do SUS? Você a questiona, nesta conjuntura,
ou é otimista quanto ao nosso modelo de descentralização?
4- Vários países desenvolvidos inauguraram seus sistemas nacionais de saúde a partir da
atenção primária à saúde (APS). O Brasil, no entanto, conquistou o SUS primeiro,
para, depois, em sua década de operacionalização, criar o PACS e o PSF, políticas de
atenção primária. Enquanto conselheiro(a), você aposta na Atenção Básica/APS ou
acha que um sistema universal pode se garantir com uma cobertura razoável desta
atenção?
5- Para você, qual é o principal papel da secretaria municipal de saúde de um município
com o porte do nosso?
6- Na sua visão, que estratégias de gestão serão necessárias para garantir as ações e
serviços de saúde em nosso município?
7- Que instrumentos de gestão poderão garantir a materialidade de tais estratégias?
8- De que modo esses instrumentos poderão atuar na concretização dessas estratégias?
9- Sobre o controle social do SUS, de que modo ele poderá se fortalecer, considerando os
tempos difíceis que veem por aí, pós PEC?
10- Na sua visão, quais são as principais fronteiras do controle social?
11- E pra terminar, como está a luta do COMUSA?
164
APÊNDICE C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
GESTOR MUNICIPAL
ESTRATÉGIAS DE GESTÃO PARA A QUALIFICAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE
DO SUS: UM ESTUDO DE CASO
MESTRADO EM SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO
Rua Uruguai, 458 - Centro - Itajaí / SC - CEP 88302-202 - Bloco F6 - Sala 302
Fone/Fax: (47)3341-7932
Email: [email protected]
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
GESTOR MUNICIPAL
Prezado(a) senhor(a),
O(a) senhor(a) está sendo convidado para participar, como voluntário, da pesquisa
Estratégias de Gestão para a Qualificação da Atenção à Saúde do SUS. Esta pesquisa está
sendo realizada no Programa de Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho da Universidade
do Vale do Itajaí, Itajaí, SC. O objetivo geral é analisar a dialética das estratégias de gestão da
atenção à saúde de um município do sul do Brasil, na triangulação entre o plano municipal de
saúde, a visão de um coletivo intrassetorial da secretaria municipal, e o controle social. Sua
participação consistirá em responder a uma entrevista, organizada por um roteiro
semiestruturado. A entrevista não vai registrar seu nome e os dados serão divulgados em
forma conjunta, guardando assim o mais absoluto sigilo sobre as informações fornecidas pelo
senhor(a), enquanto a pesquisa for desenvolvida. O(a) senhor(a) pode se recusar a responder
qualquer pergunta da entrevista. O(a) senhor(a) também pode desistir de participar da
pesquisa a qualquer momento. Para facilitar a coleta de dados, a entrevista será gravada, se o
senhor concordar. Após a conclusão do estudo, os resultados serão publicados, mas não será
possível identificar nenhum dos indivíduos que participaram da pesquisa. A sua participação
não lhe trará nenhum benefício individual. O senhor(a) não terá que pagar nada para participar
dessa pesquisa e nem poderá receber. No entanto, seria importante sua participação, pois, as
suas informações servirão para qualificar a atenção à saúde do SUS. Caso concorde em
participar, rubrique, por favor, esta folha e assine a folha seguinte. Obrigada pela participação.
165
CONSENTIMENTO:
Eu, _________________________________, declaro que fui devidamente informado e
esclarecido dos objetivos da pesquisa. Sei que posso não participar ou desistir a qualquer
momento. Sei que não gastarei nem receberei nada pela minha participação. Sei também que
meu nome não será mostrado em nenhum documento do estudo. Por isto concordo em
participar como voluntário.
__________________________________ de _________________ de ______.
____________________________________________________
Assinatura
Em caso de dúvidas:
Comitê de Ética em Pesquisa (UNIVALI):
Endereço: Rua Uruguai, 458. Caixa Postal 360
Bloco F6- Térreo Itajaí (SC) CEP: 88302-202 Fone: (47) 3341-7738
E-mail: [email protected]
Rita de Cássia Gabrielli Souza Lima. Orientadora.
E-mail: [email protected]
Fones: (47) 47)3341-7932 (48) 3238-8821.
166
APÊNDICE D - ROTEIRO ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA
GESTOR (A) MUNICIPAL
1- O senhor iniciou suas atividades de gestão com um Plano Municipal de Saúde em
curso, ainda por um ano. Como o senhor vê esta realidade, posta pelo
planejamento do SUS?
2- O senhor (a) poderia compartilhar comigo o seu conceito de saúde?
3- O senhor aposta todas as fichas na Atenção Básica (AB/Atenção Primária à Saúde
(APS)? Poderia discorrer um pouco sobre seu olhar de atenção básica/primária no
nosso município e no País (depois da resposta dele (a), dando corda, se houver
espaço: o senhor acredita em Sistema Universal de Saúde sem AB/APS?)
4- Em tempos de crise política e econômica, estados e municípios estão enfrentando
bastantes dificuldades para a garantia das ações e serviços de saúde. Diante, deste
cenário, como o senhor vê o modelo de descentralização do SUS?
5- Sobre a lei de responsabilidade fiscal, como superar a problemática desta
responsabilidade?
6- Para o senhor, qual é o principal papel da secretaria municipal de saúde de um
município com o porte do nosso?
7- Na sua visão, que estratégias de gestão serão necessárias para garantir as ações e
serviços de saúde em nosso município?
8- Que instrumentos de gestão poderão garantir a prática (materialidade) de tais
estratégias?
9- De que modo esses instrumentos poderão atuar na concretização dessas
estratégias?
10- Sobre o controle social do SUS, qual é o seu olhar?
167
ANEXOS
ANEXO A – ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DA SECRETARIA MUNICIPAL DE
SAÚDE DE ITAJAÍ
168
ANEXO B - PRIMEIRA OFICINA 04/11/2014
Nome (iniciais):_______________________________________________Idade:__________
Formação/Profissão:___________________________________________________________
Função/Cargo:_______________________________________________________________
Forma de contratação:_________________________________________________________
Tempo de atuação na SMS/UBS:_________________________________________________
Exerce outa função/cargo concomitante? ( ) Não ( ) Sim Qual?________________________
Local (setor) que trabalha:______________________________________________________
O que você entende que seja o principal objetivo (a principal função) da Secretaria de Saúde
do Município?
169
ANEXO C - SEGUNDA OFICINA 18/11/2018
O CASO DE ANA
Ana é uma mulher de 49 anos que certo dia acordou apresentando dor e secreção em
um mamilo. No autoexame percebeu um pequeno volume na mama. Sempre muito atenta com
sua saúde, Ana buscou o mais rápido possível entender o que ocasionava aquela situação e
resolver seu problema de saúde.
CENA 1: ANA TEM UM SINAL DE ALERTA
O bairro onde Ana reside conta com uma UBS. A unidade funciona das 07h às 19h, de
segunda a sexta, mas não funciona nos finais de semana. Ana faz parte de uma das famílias
acompanhadas pela ESF. A história de Ana começa num sábado.
Ana acorda com uma sensação de incômodo em uma das mamas e percebe uma
secreção no mamilo. No autoexame percebe que há um volume diferente e até então
inexistente em sua mama. Temerosa por já ter tido um caso de câncer de mama na família,
Ana logo procura atendimento médico e recorre a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), já
que a Unidade de Saúde da Família (USF) de seu bairro não abre nos finais de semana.
Na UPA espera por algumas horas e é atendida pelo plantonista que conclui não tratar
de uma emergência, receita um analgésico e orienta Ana a procurar o médico da sua unidade e
relatar o ocorrido. Ana sai desolada da UPA, não queria adiar uma solução para os eu caso. E
o desconforto na mama persistia. Restava-lhe tomar o analgésico.
Na manhã de segunda-feira, Ana procura a USF do seu bairro para tentar um
atendimento. Quando a unidade abre as 7h00m Ana é informada que as fichas para o médico
de sua área acabaram e ela deveria ir ao UPA. Ela tentou explicar que já havia ido ao UPA, no
entanto, a atendente disse: - sinto muito, não posso fazer nada pela senhora, se nçao melhorar,
retorne amanhã e tente vir mais cedo!
A enfermeira a vê saindo e percebe a situação, porém como está envolvida com outros
afazeres não consegue saber o que Ana precisa. Todos os profissionais da unidade estão
envolvidos com algum atendimento. Ana sai da unidade nervosa, restava-lhe tomar
novamente os analgésicos e retornar na USF na manhã seguinte.
Na manhã de terça-feira Ana vai novamente à USF, encontra uma pequena fila na
porta da unidade e pensa que logo vai ser atendida por um médico. Consegue ficha assim que
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a unidade abre e após aguardar por três horas é atendida pelo médico de família e lhe explica
o ocorrido. O médico de família a encaminha para a ginecologista.
CENA 2: Ana é mais uma brasileira com câncer de mama
Ana sai da unidade sem discutir suas dúvidas e chega em casa no final da manhã na
terça-feira e se dá conta de que havia esquecido os afazeres domésticos: o almoço dos filhos, a
hora do colégio e etc. Esquece por algum tempo de sua situação e realiza as tarefas.
Assim que seus filhos saem, Ana resolve procurar uma vizinha, amiga de infância. Ela
precisava contar para alguém o que se passava e precisava também se informar onde haveria
médicos ginecologistas no município. A amiga de Ana trabalha na prefeitura e informa que,
no Hospital Municipal, além do pronto-socorro há também alguns ambulatórios com
especialidades, dente eles, a ginecologia. Ana se despede de sua amiga e vai imediatamente
para o Hospital Municipal.
Eram 15 horas quando Ana chega ao hospital. Na recepção ela busca informações
sobre a marcação de consultas:
- Boa tarde. Preciso de uma informação. Estou com a solicitação do meu médico para um
atendimento com o ginecologista. Onde posso agendar consulta? – pergunta Ana.
- O horário para agendamento de consultas é até as 14 horas, mas já te adianto que há uma fila
de espera de mais de dois meses para a ginecologista.
Ana insiste:
- Mas estou com muita dor e preciso fazer essa consulta com urgência.
A atendente não se sensibiliza:
- Todas dizem a mesma coisa. Se for de fato uma urgência vá ao pronto-socorro. Agora, se
quiser marcar uma consulta, volte amanhã até às 14h – a atendente encerra a conversa. Ana
não entende por que tanta má vontade.
Na saída encontra um amigo da família que trabalha na Secretaria Municipal de Saúde
(SMS) que diz pra Ana procurar no dia seguinte a SMS e falar com a Sra. M.D.R. para
conseguir uma vaga a qual ele já deixaria avisada. Assim Ana consegue agendar o
ginecologista para a próxima semana.
Uma semana depois, Ana finalmente consegue a consulta com o ginecologista que
imediatamente solicita uma mamografia e encaminha para um mastologista.
Com a solicitação da mamografia e o encaminhamento para o mastologista, Ana
procura novamente a UBS onde é recebida por uma atendente que não lê a solicitação do
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exame e informa que não é mais liberado mamografia para pacientes com menos de 50 anos e
ainda se quiser conseguir agendamento rápido para o mastologista que procure a SMS.
Sabendo que a consulta com o mastologista iria demorar, procurou novamente o
médico de família que a questionou quanto à mamografia e ao tratamento iniciado pelo
ginecologista. Ao saber que nenhum tratamento foi iniciado ele examinou as mamas da
paciente e preocupou-se com o que constatou. Imediatamente ele conversa com a enfermeira
da equipe para verificar a possibilidade de agilizar o exame e a consulta. Cinco meses depois
com a mamografia em mãos, Ana chega ao Mastologista e é mais uma brasileira com câncer
de mama que precisaria ter paciência para aguardar um procedimento cirúrgico.
Ana já não é mais a mesma. Não sente mais as dores físicas da doença, mas é uma
mulher marcada por um grande sofrimento, se sente insegura e deprimida com sua condição
de saúde, o que repercute na sua via conjugal e familiar. Todo seu percurso pelo sistema de
saúde do município havia deixado nela uma marca de tristeza; ela presenciou problemas mais
graves que o seu, e se sentiu insegura em muitos momentos. Sua cirurgia havia sido um
sucesso, diziam os médicos, mas ela se questionava: - que sucesso é esse que retirou a mama?
Se eu tivesse conseguido fazer logo os exames teria sido esse o meu destino? Ana pensava em
suas opções. Conhecia pessoas que haviam cansado do sistema público e que compravam
planos de saúde particulares, mas Ana não achava isso justo, conhecia seus direitos e sabia
que os planos não davam conta dos problemas mais complexos. O que Ana queria mesmo era
que o sistema público de saúde funcionasse, mas nesse momento, depois de toda a experiência
vivida, só lhe restava rezar.
FONTE: O caso de Ana: readaptado de BAPTISTA; MACHADO; LIMA, 2009.