esquerdas no panfleto. a crise política de 1964 no jornal da frente de mobilização popular -...

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  • 7/23/2019 Esquerdas No Panfleto. a Crise Poltica de 1964 No Jornal Da Frente de Mobilizao Popular - Jorge FERREIRA

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    Anos 90, Porto Alegre, v. 16 n. 29, p. 81-124, jul. 2009

    Esquerdas no Panfleto. A crisepoltica de 1964 no jornal da Frente

    de Mobilizao PopularJorge Ferreira*

    Resumo: Desde o incio do governo do presidente Joo Goulart, partidos, movi-

    mentos e organizaes de esquerda se uniram em torno de um programa poltico

    conhecido como reformas de base. No incio de 1963, sob a liderana de LeonelBrizola, as esquerdas fundaram a Frente de Mobilizao Popular (FMP). O grupo

    nacional-revolucionrio que, dentro do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), seguiaa liderana de Leonel Brizola tinha o seu jornal:Panfleto, o jornal do homem da rua. Mas

    Panfletotambm era porta-voz da FMP. Por meio de um veculo prprio de comu-

    nicao, as esquerdas que reconheciam a liderana de Brizola expressavam suas ideias,

    seus projetos e suas estratgias. O objetivo do artigo resgatar ideias e projetos

    polticos das esquerdas unidas na FMP e publicados no Panfletoentre os dias 17 de

    fevereiro de 1964, data da primeira edio do jornal, e 30 de maro do mesmo ano,

    quando foi publicado o ltimo nmero em um total de sete exemplares. Os dois

    meses foram crticos na crise que desestabilizou o governo Goulart, com o acirra-

    mento do processo de radicalizao das esquerdas que lutavam pelas reformas e das

    direitas que resistiam a sua implementao.

    Palavras-chave: Panfleto, o jornal do homem da rua. Frente de Mobilizao Popu-

    lar. Crise poltica de 1964. Governo Joo Goulart. Reformas de Base.

    *Professor Titular de Histria do Brasil da Universidade Federal Fluminense e Pes-

    quisador do CNPq. Endereo eletrnico: [email protected]

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    Durante o governo de Juscelino Kubitschek, partidos, movi-mentos e organizaes de esquerda cresceram em termos de orga-nizao e avanaram em suas lutas. Tendo o nacionalismo como

    bandeira poltica, suas propostas reformistas encontraramreceptividade em amplos setores da sociedade brasileira.

    Embora com diferentes orientaes ideolgicas, e nem sempreunidas, as esquerdas formaram, no incio do governo Goulart, oque Argelina Figueiredo chamou de coalizo radical pr-reformas(FIGUEIREDO, 1993, p. 66). No incio de 1963, sob a lideranade Leonel Brizola, surgiu a Frente de Mobilizao Popular (FMP),

    qualificada por Ruy Mauro Marini como um parlamento das esquer-das (citado em NEVES, 1989, p. 236). Reunindo as principais organi-zaes de esquerda que lutavam pelas reformas de base, a Frenteexigia que Goulart governasse apenas com o apoio poltico dela, desco-nhecendo outras organizaes partidrias, inclusive as de centro.

    O movimento estudantil participava da FMP, sendo repre-sentado pela Unio Nacional dos Estudantes (UNE). Em processode radicalizao poltica desde o incio do governo Kubitschek, aslideranas estudantis defendiam a formao da aliana operrio-estudantil-camponesa (SALDANHA, 2005). O movimento sindicalurbano estava representado pelo Comando Geral dos Trabalhadores(CGT), central sindical que uniu sindicalistas comunistas e traba-lhistas. A Confederao Nacional dos Trabalhadores na Indstria(CNTI), a Confederao Nacional dos Trabalhadores nas Empresasde Crdito (CONTEC) e a intersindical Pacto de Unidade e Ao

    (PUA) tambm estavam na FMP. Setores das Ligas Camponesasigualmente participavam da Frente. Na luta pela terra, lderes campo-neses defendiam a reforma agrria com ou sem a participao doCongresso Nacional e da o lema formulado por Francisco Julio:reforma agrria na lei ou na marra ou reforma agrria com floresou com sangue. O movimento dos subalternos das Foras Armadastambm atuava na FMP. Mobilizados desde o governo Kubitschek,

    o movimento dos sargentos tomou fora com a crise de agosto de

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    1961. Marinheiros e fuzileiros da Marinha de Guerra formaramsua prpria organizao, aderindo Frente.

    Os intelectuais se engajaram no projeto nacionalista e refor-

    mista. Diversos deles, junto a artistas, fundaram o Comando Geraldos Trabalhadores Intelectuais, o CGTI, aderindo FMP. A alianaque se estabeleceu entre a UNE, o CGT, o CGTI, setores das LigasCamponesas e o movimento dos sargentos, marinheiros e fuzileirosnavais abriu novas perspectivas para o movimento reformista. Aadeso de organizaes revolucionrias fortaleceu ainda mais a frentede esquerda. Entre elas, estavam o Partido Operrio Revolucionrio

    (Trotskista) (POR-T) e a Ao Popular (AP). A Frente de MobilizaoPopular ainda agregava outras organizaes: polticos do GrupoCompacto do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), a Frente Parla-mentar Nacionalista (FPN), o grupo poltico de Miguel Arraes e aala esquerda do Partido Socialista Brasileiro (PSB).

    Um ltimo grupo poltico que integrava a FMP merece des-taque: os nacional-revolucionrios, maneira como os seguidoresde Leonel Brizola dentro do PTB se autodefiniam. A encampaode empresas norte-americanas e a criao de 680 mil vagas escolaresno governo do Rio Grande do Sul, mas, sobretudo, o enfrentamentoda direita civil-militar na crise de agosto de 1961, deram a Brizolagrande prestgio entre as esquerdas. Identificados como a ala deextrema-esquerda do PTB, os nacional-revolucionrios que seguiama liderana de Brizola, no dizer de Maria Celina DArajo, estavamvivenciando um intenso processo de competio por liderana

    dentro do partido, cujo alvo de disputa era o prprio Joo Goulart.Com a criao da FMP, a competio extrapolou os limites parti-drios e passou a centrar na rivalidade com os membros atuantesdo PCB (DARAJO, 1996, p. 150). Nas sextas-feiras noite, Brizolafalava na rdio Mayrink Veiga. Em associao com emissoras deoutros estados, sua voz chegava a praticamente todo o pas. Aaudincia era calculada em 10 milhes de ouvintes (SCHILLING,

    1979, p. 219-220).

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    Em fins de novembro de 1963, Brizola liderou a formaode grupos de onze companheiros ou comandos nacionalistas.O objetivo mais imediato era organizar os nacional-revolucionri-

    os para pressionar Jango e o Congresso Nacional a decretarem asreformas e para resistir a um eventual golpe perpetrado pelas direi-tas. Com os grupos de onze, Brizola tinha planos de formar umpartido revolucionrio sob sua liderana. Segundo avaliao deMarli de Almeida Baldissera, a formao dos grupos de onze ocor-reu em um momento de intensa mobilizao de ambos os lados,direita e esquerda. Na defesa de seus interesses, a radicalizao

    poltica intensificou-se e a capacidade de negociao tornou-senula (BALDISSERA, 2005, p. 32).O Partido Comunista Brasileiro (PCB) tinha uma linha pol-

    tica prpria de apoio a Goulart. Contudo, militantes que discordavamda linha adotada pelo partido atuavam na FMP.

    Plurais e com propostas nem sempre confluentes, as esquerdas,durante o governo Goulart, conseguiram se unir em uma mesma fren-te, defendendo um programa comum. Na avaliao de Luclia deAlmeida Neves Delgado, a Frente de Mobilizao Popular se trans-formou na organizao referncia de unio de todas as foras refor-mistas que atuaram naqueles anos (NEVES, 1989, p. 245). Diver-gncias existiam, sobretudo entre lideranas que concorriam no cam-po reformista. Apesar das dificuldades, a FMP conseguiu congregarorganizaes, movimentos e partidos de esquerda sob um programapoltico comum. A Frente exigia que Goulart decretasse imediata-

    mente as reformas de base, entrando em confronto direto com asdireitas e os conservadores, incluindo o Partido Social Democrtico(PSD). Procurava se impor como fora alternativa ao PCB, cuja estra-tgia era considerada moderada. Segundo Herbert de Souza, o Betinho,na poca militante da AP, a FMP foi uma experincia rica para asesquerdas. Foi uma experincia aberta, um frum de debates, de arti-culao, de politizao. (apud MORAES, 1989, p. 259).

    Como comum em organizaes de esquerda, o grupo nacio-nal-revolucionrio brizolista tinha o seu jornal:Panfleto, o jornal do

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    homem da rua. Mas Panfletotambm era porta-voz da FMP. Por meiode um veculo prprio de comunicao, as esquerdas que reconhe-ciam a liderana de Brizola expressavam suas ideias, seus projetos

    e suas estratgias.Meu objetivo, neste artigo, resgatar ideias e projetos polticos

    das esquerdas unidas na FMP, publicados no Panfletoentre os dias17 de fevereiro de 1964, data da primeira edio do jornal, e 30 demaro do mesmo ano, quando foi publicado o ltimo nmero. Osdois meses foram crticos na crise que desestabilizou o governoGoulart, com o acirramento do processo de radicalizao das esquer-

    das que lutavam pelas reformas e das direitas que resistiam a suaimplementao.

    A UNE e a aliana operrio-estudantil-camponesa

    Em entrevista no primeiro nmero do Panfleto, o presidenteda UNE, Jos Serra, afirmou que aquele ano seria decisivo para asforas populares, particularmente porque a contradio entre asnecessidades do povo brasileiro e a incapacidade estrutural desatisfaz-las atingir o ponto mais agudo.1A queda da renda brutano pas e o crescimento demogrfico agravariam ainda mais a crise.Segundo sua anlise, o grande problema era que existia a alternativade um processo radical de transformaes sociais, mas o governono demonstrava interesse em adot-lo. Para Jos Serra, falar em

    libertao econmica sem falar na encampao, pura e simples,das empresas estrangeiras concessionrias de servios pblicos, mera pilhria. Para o presidente da UNE: procuraremos, portodos os meios, organizar os estudantes e fortalecer a aliana ope-rrio-estudantil-camponesa. Outro tema importante era a sucessopresidencial. Neste caso, a opo por Juscelino Kubitschek estavadescartada, porque os estudantes no aceitariam candidaturas

    conservadoras, ou que se intitulem de centro. Para Jos Serra, ouse a favor ou contra o povo.

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    A luta imediata da UNE era pela reforma universitria. ParaJos Serra, a universidade de elite era alienada. Nela, no existiamfilhos de operrios e de camponeses, nem manifestaes da cul-

    tura brasileira. A reforma universitria significar transformar todaa estrutura social do pas, afirmou. Mas, para isso, seria necessriaa reviso da Constituio do pas: Entretanto, modificar a CartaMagna, para extinguir a vitaliciedade da ctedra, to difcil quantodar voto ao analfabeto ou abolir o preceito que impede a desapro-priao de terras por interesse social. Vamos enviar ao CongressoNacional uma emenda Constituio com o objetivo de extinguir

    a vitaliciedade da ctedra. No entanto, o presidente da UNE noescondia seu descrdito em relao ao Congresso: no esperamosque o Parlamento vote essas matrias, e sim que se desmascare,mais ainda.

    Outro dirigente estudantil, Marcelo Cerqueira, vice-presidentepara Assuntos Nacionais da UNE, afirmou, em entrevista ao Panfleto,a necessidade de executar uma poltica nacionalista para combatero imperialismo e o latifndio. Goulart deveria decretar imediata-mente as seguintes medidas: moratria da dvida externa, mono-plio integral da Petrobras, nacionalizao da empresa norte-ameri-cana Bond and Share, implementao do decreto da SUPRA, refor-mulao da poltica econmico-financeira, anistia aos sargentos elegalizao do PCB. O presidente, no entender de Cerqueira, deveriaestar ao lado da frente de esquerda, mesmo porque os fatos recentesdemonstravam o falecimento da poltica de conciliao.2Con-

    cluindo, ainda afirmou: no encaminhamento da luta fundamentala aliana operrio-estudantil-camponesa, parcela mais consequenteda unio das foras anti-imperialistas.

    O CGT e o programa sindical

    O segundo nmero do Panfleto, de 24 de fevereiro de 1964,publicou entrevista com o secretrio-geral do CGT, Oswaldo

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    Pacheco. Inicialmente, ele defendeu o papel central da classe traba-lhadora no processo de transformaes por que passava a socie-dade brasileira:

    O CGT considera, sem menosprezo aos demais patriotascivis e militares, que lutam pelas reformas no Brasil, que a classeoperria tomada como agrupamento social em crescentedesenvolvimento numrico tcnico, de concentrao emgrandes unidades de produo, como tambm de conscien-tizao, e capacidade para unir-se e organizar-se com disci-plina e comando firme, uma fora destinada a ter papel rele-

    vante no processo de lutas pelas reformas e pela libertaoeconmica de nossa Ptria.3

    Como programa poltico para o pas, Pacheco exigiu a liber-dade de greve, a reforma agrria, a reforma urbana, a implementaodo decreto da SUPRA e a elegibilidade para soldados, cabos, sar-gentos e analfabetos. Como medidas econmicas, acreditava nanecessidade de instaurar o monoplio estatal do cmbio e das expor-taes do caf e de ampliar o do petrleo. Tambm faziam partedo programa do CGT a encampao das refinarias privadas de petr-leo e a nacionalizao das empresas estrangeiras em posies-chaveem nossa economia, indenizando-as apenas pelo custo histrico.Segundo Pacheco, as lideranas sindicais estavam dispostas a dartodo o apoio ao governo, desde que ele se decidisse a acabar coma inflao, atacando suas causas reais, ou seja, o latifndio e o impe-

    rialismo. Sem essas iniciativas, as medidas superficiais no pas-saro de meros paliativos que no curaro o doente, mas apenastransferiro o desfecho da crise por alguns meses ou alguns dias.Para o secretrio-geral da CGT: Ao final, prevalecem os pontosde vista das massas populares e que os inimigos, que pareciamfortes e ameaadores, cederam sempre diante da conscincia, uni-dade e organizao do povo.

    Outro dirigente sindical, Aluzio Palhano, vice-presidente doCGT e presidente da CONTEC, em entrevista ao Panfleto, defendeu

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    a decretao imediata da reforma bancria, com a democratizaodo crdito e o direcionamento do sistema bancrio para o desenvol-vimento econmico do pas.4Defendeu tambm que o dinheiro do

    povo aplicado nos bancos somente fosse investido em empresasestatais, sem nenhum benefcio para as empresas estrangeiras. Almdisso, o crdito deveria estar disponvel para suprir as necessidadesbsicas do povo, e no para financiar produtos de luxo. Alm dessasmedidas, na mesma entrevista, o vice-presidente do CGT afirmouque a nacionalizao dos bancos estrangeiros e o monoplio docmbio so imperativos de uma verdadeira Reforma.

    O movimento dos sargentos

    Panfletomantinha uma coluna intitulada Trincheira dos Sar-gentos, assinada por Paulo Lemos. Para ele, a luta da categoria na-quele momento ocorria em duas frentes. A primeira era pela anistiapoltica aos sargentos que participaram da rebelio em Braslia em

    setembro de 1963. A segunda era pelo direito de elegibilidade.Ambas as lutas estavam interligadas.

    Na edio de 24 de fevereiro, Paulo Lemos garantiu que arebelio dos sargentos em Braslia fora em protesto contra a discri-minao odiosa de que foram vtimas. Levantaram-se em defesade um direito democrtico. O direito de serem elegveis.5Segundoseu argumento, todos so elegveis, inclusive os oficiais militares,

    mas no os sargentos, soldados e marinheiros: Que bela Demo-cracia, uma Democracia hierrquica. Uma Democracia de castas eprivilgios. Uma Democracia de fora, afirmou. Muitos sargentosque haviam sido eleitos tiveram seus mandatos cassados pelo PoderJudicirio. Ficou evidente, alegou, que temos a uma justia declasses, onde os verdadeiros filhos do povo tiveram seus direitosnegados. E o que ser sargento?

    Ser sargento ser cidado, chefe de famlia, filho e pai (...).Ser sargento colocar acima de tudo o interesse da Ptria

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    (...). Ser sargento sentir com o povo, que precisamos urgente-mente de solues. Reformas radicais, instituio de umanova ordem social, onde o analfabeto possa participar do

    processo democrtico, onde todos possam trabalhar decen-temente e viver como seres humanos (...). Onde o camponsexplorado e famlico do interior possa possuir um pedaode terra (...). Ser sargento ser amigo de cabos, soldados emarinheiros, irmanar-se com eles na luta de libertao donosso povo e de nossa Ptria, no mais permitindo a explo-rao a que estamos sendo submetidos pelos trustes inter-nacionais. (...) Ser sargento acima de tudo ser povo.

    O movimento que ocorreu em Braslia em setembro de 1963foi, segundo Paulo Lemos, uma luta pacfica pelo direito elegibi-lidade. Naquele momento, o Congresso Nacional estava avaliandoo projeto de anistia aos sargentos que participaram da rebelio. Des-se modo, afirmou Lemos, os parlamentares deveriam resolver asduas reivindicaes imediatamente: anistia e direito de elegibilidade.Contudo, se o projeto de anistia fosse rejeitado, concluiu: ns no

    seremos responsveis pelas revoltas que explodirem dentro dasbases, quartis e navios.Na edio do dia 23 de maro de 1964, Panfletopublicou dis-

    curso do tenente Jos Wilson da Silva, vereador de Porto Alegre,eleito com os votos dos sargentos e suboficiais do Exrcito, daAeronutica e da Brigada Militar: No podemos mais admitir esteroubo oficializado do qual somos vtimas por parte dos trustes inter-nacionais. Para acabar com esse processo, era necessria, inicial-mente, presso sobre o Congresso Nacional, que pago pelo povo,e NO TRABALHA. Segundo o tenente, faremos com que ascpulas dirigentes e dominantes, mesmo contra sua vontade, recuemna inteno declarada ou disfarada de manter seus privilgios,cedendo lugar aos direitos das massas populares. Nesse sentido,ele argumentou:

    preciso que o povo esteja preparado nessa hora em quea burguesia capitalista decreta sua falncia, para dar caa s

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    velhas raposas que certamente tentaro a fuga, responsabi-lizando-os perante a justia do povo, pelos crimes cometidos;devemos nessa hora tambm, estar preparados, conscientese politizados, para assumir o poder poltico na Nao, fa-zendo com que esse poder seja exercido realmente em nomedo povo, atendendo objetivamente o interesse desta grandeNao. (...) Estaremos ao lado do povo e dos seus lderes,pondonos [sic], como POVO FARDADO, com NOSSOSINSTRUMENTOS DE TRABALHO

    Para o tenente, a luta seria rdua, mas os sargentos eramfilhos e irmos de operrios e camponeses, enquanto seus filhoseram estudantes. A integrao entre eles era irreversvel, garantiu.

    Miguel Arraes, a Frente Parlamentar Nacionalista, ossocialistas e os catlicos de esquerda

    Outras lideranas de esquerda tambm apareciam nas pginas

    do Panfleto. Esse era o caso do governador de Pernambuco, MiguelArraes. Em entrevista, ele afirmou que governar no era apenasgerir a mquina administrativa, mas tratava-se, sobretudo, de um atopoltico. Como exemplo, citou sua iniciativa de exigir o cumpri-mento das leis no campo, garantindo o direito de organizao dostrabalhadores rurais, parceiros e pequenos proprietrios em seussindicatos e cooperativas. Os resultados mais imediatos foram

    melhorias salariais, maiores vendas no comrcio e aumento da pro-duo canavieira, evitando, ainda, o desemprego nas cidades.

    Alm de aumentar o grau de conscientizao e de organizaonecessrias conquista dos nossos objetivos superiores, semas quais no poderemos solucionar os problemas brasileiros,notadamente a liquidao dos monoplios internacionais.7

    Miguel Arraes tambm se mostrava favorvel alterao docaptulo da Constituio que tratava das inelegibilidades. Qualquer

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    reforma, defendeu o governador de Pernambuco, deveria ser am-pla, beneficiando os analfabetos, cabos, sargentos, o ex-presidenteJnio Quadros, o deputado Leonel Brizola e o prprio presidente

    Joo Goulart.8

    A Frente Parlamentar Nacionalista era representada no Panfletopor seu presidente, o deputado federal Srgio Magalhes. Defen-dendo o nacionalismo como projeto para a emancipao do Brasil,ele afirmou que a unidade das foras populares e progressistas imanente ao processo de libertao nacional e que a Frente deMobilizao Popular expressava essa unidade.9Sculos de explo-rao internacional geraram a misria no campo e nas cidades, masfundamentaram a unio do povo em torno de suas organizaespolticas e da FMP. Os representantes autnticos das foras popu-lares estavam unidos em torno de alguns pontos:

    (...) fortalecimento das empresas estatais de carter nacionalista,como a Petrobras, a Eletrobras, a Companhia SiderrgicaNacional, a Vale do Rio Doce ou a Hidreltrica do So Fran-

    cisco. Ou a necessidade do estabelecimento do monoplioestatal do cmbio. Ou a urgncia da reforma agrria com amodificao do dispositivo constitucional que impede opagamento das desapropriaes a prazo e em ttulos. Ou aurgncia da reforma bancria que considere o carter socialdo crdito e a nacionalizao total da rede de estabeleci-mentos de crdito. Ou a aplicao rigorosa da lei que limitaas remessas de lucros.

    Segundo Srgio Magalhes, essa plataforma unia as foraspopulares, mas dividia a sociedade brasileira entre os que lutampela libertao do povo e os que querem manter seus privilgios.O que ocorria no Brasil naqueles dias era um processo de emanci-pao econmica que avanava com a politizao do povo. Osque tentavam dividir essas foras no compreendiam a existnciadesse processo de libertao nacional. So reacionrios.

    Max da Costa Santos representava a ala esquerda do PartidoSocialista Brasileiro na FMP. Um dos personagens mais atuantes na

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    Frente, ele afirmou que os dois maiores inimigos do povo brasileiroeram o latifndio e o imperialismo. Os latifundirios eram repre-sentados fundamentalmente pelo PSD, esse PSD de eterna pre-

    sena nos postos principais de todos os governos, do atual governo,inclusive.10Mas o imperialismo, tinha vrios representantes. Lacerdaera o agente mais ostensivo. Nesse sentido, Max da Costa Santosconcluiu que a hora da conciliao j passou. Para ele, insistir naconciliao fugir luta, enfraquecer o nimo do povo. Criti-cando o presidente, finalizou: as foras populares esto unidas.Jango quem diz que no. Escrevendo regularmente no Panfleto,

    Santos denunciava a explorao imperialista com a atuao dasmultinacionais.Panfletotinha uma coluna intitulada Evangelho. Ontem, Hoje

    e Amanh, do padre Alosio Guerra. Segundo o padre, no adian-tava pregar contra o comunismo sem buscar solues para os pro-blemas do povo. Era o caso do cardeal do Rio de Janeiro em suamensagem de final de ano. Em vez de levar uma palavra de espe-rana aos trabalhadores, to injustiados e massacrados quantoescravizados,11apenas desejou que o ano de 1964 tivesse menoscomunismo. Para o padre, tantos crimes contra um povo que sofrecrucificado de vrias formas e a preocupao esta?! A demo-cracia, com o nome de crist, o regime em que o povo compreen-dido como meia-dzia de nababos, permitindo aos entreguistasa explorao, o roubo organizado e legalizado.12A nossa demo-cracia ou no de castas? perguntou. A democracia e a liberdade

    pertencem exclusivamente a meia dzia de nababos. E isto ouno uma forma disfarada de totalitarismo?13

    Brizola e o nacionalismo revolucionrio

    Com imenso prestgio entre as esquerdas, Brizola expressava

    e unificava ideias e crenas de organizaes e partidos reunidos naFMP. Interpretando a experincia trabalhista no Brasil no contexto

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    da guerra fria, da Revoluo Cubana, da Guerra do Vietn e dosmovimentos anti-imperialistas latino-americanos, Brizola radicalizouo nacionalismo de matriz getulista.

    Em sua leitura da Carta Testamento de Vargas, por exemplo,Brizola afirmou que, naquele texto, encontrava-se a denncia doquanto era injusta e desumana a estrutura econmica e socialbrasileira. Todo este quadro de sofrimentos, de necessidades, demisrias e injustias, nada mais seno o trgico painel dos efeitose consequncias da espoliao econmica.14Somente com a liber-tao da espoliao internacional, o Brasil alcanaria o desen-

    volvimento econmico e a justia social. A situao de dependnciado pas tinha um agravante: as alianas que uma minoria de pode-rosos e privilegiados brasileiros mantinha com os interessesespoliativos estrangeiros. Tendo como matriz o nacionalismogetulista e o projeto trabalhista, Brizola formulou um conjunto deideias de esquerda, marcadas sobretudo pelo anti-imperialismo.

    O texto acima tinha o ttulo de A Carta de Vargas e foipublicado na forma de editorial no primeiro nmero do Panfleto. Apartir da, todas as edies do Panfleto comeavam com editorialescrito por Brizola. Alguns criticavam duramente Joo Goulart,sobretudo o que as esquerdas definiam como poltica de concili-ao. Em um deles, Brizola afirmou que, logo ao tomar posse napresidncia, Jango comeara a poltica de acomodao, aceitandoo parlamentarismo.15Mas como dera mostras de que desejava retor-nar ao sistema presidencialista, manteve-se a aliana entre o go-

    verno e o povo. A unidade resultou no plebiscito que devolveu aGoulart os poderes presidencialistas. Na interpretao de Brizola,a imensa vitria obtida pelo governo demonstrou que a vontadepopular pelo retorno ao presidencialismo teve o sentido de umrepdio poltica de acomodao, de vacilaes, de indefinies,vigorante no perodo do parlamentarismo.

    Embora o povo esperasse que Jango, com seus poderes restau-

    rados, iniciasse uma poltica popular, firme e definida, comentouBrizola, o presidente continuou insistindo na poltica conciliatria.

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    Como resultado, no defendeu os interesses nacionais, impedindoa espoliao internacional e o saque internacional, no deteve ocrescimento da inflao e, mais grave, enfraqueceu a unidade entre

    povo e governo.

    Enquanto o governo procurava a conciliao, o ganha-tempo,os interminveis entendimentos com os nossos espoliadores,seus scios e aliados internos haveriam de fortalecer-se. (...)Isto para no falar no quanto desnorteou e dividiu as foraspopulares, com as quais o governo, at pouco tempo, for-mava uma unidade invencvel, sempre que acionada e dirigida

    para os caminhos de nossa liberao econmica e social.

    Segundo Brizola, os caminhos que resultaram na posse deJango em setembro de 1961 e na vitria do plebiscito em janeirode 1963 deveriam ser retomados em vez da conciliao. Brizolareferia-se a dois momentos da histria recente do pas: a Campanhada Legalidade que garantiu a posse de Goulart e o plebiscito que lhe

    devolveu os poderes presidenciais. Em sua interpretao, os doisepisdios resultaram em vitrias das foras populares contra asdireitas devido unio do governo com o povo. Tratava-se de umacrena fortemente disseminada entre as esquerdas: quando o gover-no buscava o apoio do povo, como em 1961 e 1963, era vitorioso.Jango, desse modo, poderia realizar as reformas de base se tivesseo apoio do povo e das foras populares.

    A maneira de interpretar os acontecimentos da Campanhada Legalidade e da vitria do plebiscito fortalecia, entre as esquerdasreunidas na FMP, a crena de que era possvel obter outra vitriaem 1964. Brizola, em seus editoriais, garantia que os sucessos ante-riores poderiam ser novamente alcanados. Nas duas situaes, asociedade brasileira acompanhou os chamados dos lderes de es-querda. Portanto, era possvel mobilizar outra vez o povo pelaaprovao das reformas de base e pela instaurao de um governo

    popular e nacionalista, como ocorrera anteriormente.

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    Jango e a poltica conciliao

    Para os lderes e militantes da Frente de Mobilizao Popular,a maior crtica ao presidente Joo Goulart era em relao a suapoltica de conciliao. A expresso era usada em sentido muitonegativo. Mas em uma conjuntura de grande radicalizao poltica,o que significava conciliao para as esquerdas reunidas na FMP?

    Goulart havia chegado presidncia da Repblica com o pasdividido e em gravssima crise militar e poltica (FERREIRA 2003e 2004; GOMES E FERREIRA, 2007). Sua estratgia de governo

    foi desarmar seus opositores da direita civil e militar, esforando-separa ampliar sua base poltica no Congresso Nacional com o apoiodo centro, sobretudo do PSD. Seu objetivo era reforar a alianaentre pessedistas e trabalhistas. De acordo com seus planos, asreformas de base, sobretudo a reforma agrria, seriam negociadase pactuadas entre os dois partidos. A estratgia de Jango era darcontinuidade aliana partidria que garantira a estabilidade pol-

    tica ao governo de Juscelino Kubitschek e aprovar as reformas.Em sua percepo, o PSD, apesar de seu perfil conservador, noera um partido reacionrio, e diversos lderes pessedistas, comoJK e Tancredo Neves, estavam dispostos a discutir a reforma aagrria, desde que realizada com moderao. A direita golpista seexpressava pela ala de extrema-direita da UDN, liderada por CarlosLacerda. Jango queria manter suas bases de apoio esquerda, mas

    almejava aprovar as reformas por meio de acordos, pactos e compro-missos entre o PTB e o PSD.Para as esquerdas organizadas na Frente de Mobilizao Popu-

    lar, a estratgia presidencial era recusada: acordos com os pessedistasno passavam de poltica de conciliao. Sindicalistas, lderesestudantis, sargentos e lderes nacionalistas passaram a exigir do presi-dente o fim da poltica de conciliao com o PSD. Conciliao tor-nou-se o termo mais ofensivo entre as esquerdas naquele momento.

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    Afinal, se o confronto com as direitas resultaria na vitria das forasreformistas, por que a insistncia do presidente em conciliar comos pessedistas?

    O PSD era interpretado pelas esquerdas reunidas na FMPcomo partido reacionrio e qualquer proximidade com ele era recu-sada. Na edio de 9 de maro de 1964, uma reportagem tratou dadeciso tomada pelo Diretrio Regional do PTB no Rio Grandedo Sul de vetar o apoio candidatura de JK presidncia da Rep-blica em 1965, bem como de repudiar alianas com o PSD. A moodo Diretrio Regional, ligado politicamente a Brizola, foi votada

    com a presena e o apoio da bancada de deputados estaduais e amaioria dos parlamentares federais trabalhistas gachos, alm dediversos dirigentes municipais. A deciso foi tomada recorrendo aosseguintes argumentos:

    1 Pelo que o PSD representa de reacionarismo e antirreformano Pas; 2 Pelas suas origens e vinculaes com as velhasoligarquias, cuja ao poltica s visa a defender odiosos

    privilgios antipopulares.16

    Joo Caruso, presidente do PTB gacho, perguntou o quesignificava a candidatura de JK. Para ele, tratava-se da

    perpetuao da iniquidade. O predomnio das mesmas forasque agora nos agridem e nos oprimem. A permanncia dasmesmas classes dirigentes (...). A subservincia aos nossosespoliadores. (...) Significaria que renegamos a nossa f, repudi-amos o nosso passado, rasgamos a bandeira das reivindicaespopulares, de que nos fizemos portadores.

    Alianas com o PSD eram descartadas pelas esquerdas unidasno FMP. Na edio do Panfletode 23 de maro de 1964, uma notafazia referncia Conveno realizada pelos pessedistas. Com seu

    apetite de poder e o apoio dos latifundirios, alm da mais radi-cal inconsistncia ideolgica, o PSD aclamou JK como candidato

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    presidncia nas eleies de 1965.17Os ataques a Juscelino aumen-taram com a confirmao de sua o candidatura. Na edio de 30de maro de 1964, uma reportagem desqualificava seu governo. Com

    o ttulo de Juscelino, candidato da Hanna, o texto afirmava queJK insistia na questo do desenvolvimento econmico.

    Mas at agora (...) no contou aos brasileiros por que o seuplano de metas, no que respeita exportao de minrio deferro, foi todo ele elaborado por homens que ao mesmotempo eram assalariados da Hanna Corporation e em seuspareceres defenderam sempre a participao dos grupos

    internacionais e da empresa norte-americana na nossa ex-portao de minrios contra a independncia econmicado Brasil.18

    As esquerdas reunidas na FMP recusavam qualquer aproxi-mao com o PSD. Cobravam de Jango seu rompimento com aquelepartido e a formao de um governo nacionalista e popular, apoiadoexclusivamente nas foras polticas reunidas na FMP.

    A Constituio e as reformas

    Desde o incio do governo Goulart, as esquerdas criticavamalguns dispositivos constitucionais que impediam a efetivao dasreformas. Dois deles eram recorrentes. O primeiro era o pargrafo

    16 do artigo 141, que estabelecia o seguinte: garantido o direitode propriedade, salvo o caso de desapropriao por necessidadeou utilidade pblica, ou por interesse social, mediante prvia e justaindenizao em dinheiro. O artigo 147 completava e reforava oartigo 141. Sem dvida, esses artigos impediam a implementaoda reforma agrria. Da maneira como estavam redigidos, as desapro-priaes eram do interesse do proprietrio. Para as esquerdas, a refor-

    ma agrria no poderia implicar indenizao alguma. Outro dispo-sitivo constitucional interpretado como excludente era o que se

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    referia ao direito de votar e ser votado. A Constituio exclua doalistamento eleitoral os analfabetos, os praas, os suboficiais e ossargentos das Foras Armadas. Os parentes consanguneos e afins

    do presidente e do vice-presidente da Repblica eram inelegveispara cargos no Poder Executivo e alguns no Poder Legislativo.

    Para o PTB, a lei das elegibilidades era prejudicial aos seusinteresses eleitorais naquele momento. Enquanto a UDN dispunhade dois nomes de grande competitividade Carlos Lacerda e Maga-lhes Pinto e o PSD j lanara a candidatura de Juscelino Kubitschek,o PTB no tinha um nome de peso. Seus maiores lderes estavam

    impedidos de participar das eleies: Joo Goulart no podia sereeleger e Leonel Brizola, cunhado de Jango, no podia concorrer.As esquerdas reunidas na FMP passaram a exigir do Con-

    gresso Nacional uma reforma constitucional. Em editorial no Pan-fleto, o secretrio-geral da FMP, Neiva Moreira, pediu urgncia parauma reforma eleitoral que resultasse na verdadeira democratizaodo voto e do sistema representativo.19Contudo, afirmou: setoresdo Congresso Nacional tm impedido o voto livre e autntico,receosos de que a democratizao eleitoral signifique sua liqui-dao poltica. Pequenas cpulas partidrias indicavam candidatose a Nao homologava as decises dessa minoria.

    Eleio hoje, sem voto de analfabeto, com a ingerncia escan-carada e decisiva do poder econmico, com tantas inelegi-bilidades que no final privam o eleitor de votar em quem

    deseja, pode ser tudo menos uma escolha democrtica elivre da verdadeira representao do povo.

    Por essa razo, continuou Neiva Moreira, os grupos dirigentesvivem receosos em relao a solues revolucionrias. Para ele,ningum inventa revoluo, do mesmo modo que no tem comoimpedi-la se as condies esto criadas. Assim, as eleies de 1965poderiam gerar algo similar ao que ocorreu em 1930: o conflitoentre o povo marginalizado e o sistema antidemocrtico.

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    Nas pginas do Panfleto, o questionamento das instituiesliberal-democrticas da Constituio de 1946 era comum. No edi-torial da edio de 9 de maro de 1964, lia-se: Valendo-se de um

    sistema eleitoral falho, que no reflete a vontade popular, a direitaconquistou o governo de alguns estados fundamentais Guanabara,So Paulo e Rio Grande do Sul.20Na mesma pgina, Maio Neto,criticando a falta de construo de habitaes populares no pas,afirmou que o problema ocorria porque uma liberal-democracia,como a nossa, mais preocupada com os aspectos formais do quecom os de essncia, registra, em sua Constituio, largas pginas

    dedicadas aos direitos do homem. Mas, segundo seu argumento,

    estranho, tambm, que, sendo to minuciosa, no que serefere aos direitos abstratos como liberdade de palavra,inviolabilidade individual e outros a nossa lei bsica notivesse acrescentado, sua relao de direitos e garantias,outros que mais e mais se fazem indispensveis a este povo:o direito de comer, por exemplo.21

    Na edio de 16 de maro do Panfletofoi publicada a propa-ganda de um dos volumes da srie Cadernos do Povo Brasileiro. Otexto explicativo sobre o livro dizia:

    Finalmente ao alcance do povo o livro que abalar a Naobrasileira!Que a Constituio?de Osny Duarte Pereira. Queinteresses determinaram a redao de seus artigos? Quaisos constituintes que se prestaram ao resguardo desses inte-resses antinacionais? Que privilgios imorais so por elaconsagrados?Que a Constituio?(Cadernos do Povo Brasi-leiro, n. 23) demonstra insofismavelmente que o povo temrazo quando reclama a reforma constitucional.22

    Entrevistas, artigos e editoriais publicados no Panfletoexigiammudanas na Constituio, enquanto as instituies da democracialiberal eram questionadas. Para Daniel Aaro Reis, as esquerdas

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    durante o governo Goulart adquiriram um perfil reformista revolucio-nrio. Trata-se de um movimento comprometido com reformas,mas as suas realizaes implicavam rupturas revolucionrias. Nos pri-

    meiros meses de 1964, afirma o autor,

    configurava-se uma clara ofensivapoltica reformista-revolucio-nriados movimentos mais radicalizados. Crescia a descrenana possibilidade de que as reformas pudessem ser conquis-tadas nas margens legais (AARO REIS, 2004, p. 35).

    As duas Frentes e a escolha do presidente

    Em fins de 1963 e incio de 1964, a radicalizao alcanounveis muito preocupantes para a estabilidade poltica do pas. Asesquerdas, agrupadas na FMP e lideradas por Leonel Brizola, ataca-vam duramente Joo Goulart. As direitas, por sua vez, avanavam

    no processo conspiratrio. A intransigncia do governo dos EstadosUnidos de no renegociar a dvida externa levava o pas falncia.O objetivo era estrangular financeiramente o Brasil, desgastandoo governo. No contexto da guerra fria, o avano das esquerdasassustava os setores conservadores e direitistas.

    Jango no obteve sucesso em sua poltica de unir o centropessedista com a esquerda trabalhista e, com maioria no Congresso,

    viabilizar as reformas. A ala radical dos trabalhistas e as esquerdasorganizadas na FMP recusavam negociaes com os pessedistas,apostando na poltica do confronto. O PSD, temeroso com o pro-cesso de radicalizao, aproximava-se da UDN. Todas as iniciativasde Goulart para manter a coligao trabalhista-pessedista resultaramem fracasso.

    No entanto, alternativas crescente radicalizao existiam eJango poderia dispor delas. Em janeiro de 1964, Santiago Dantas,liderando polticos do PTB e de outros partidos, props a formao

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    da Frente Progressista de Apoio s Reformas de Base (FIGUEI-REDO, 1993 e GOMES, 1994). Dantas estava preocupado como isolamento poltico do governo, com a oposio agressiva das

    esquerdas, a hostilidade crescente do PSD e o avano da conspi-rao das direitas. Com o processo de radicalizao, ele acreditavaque nem as reformas seriam implementadas nem o regime democr-tico teria continuidade. A Frente Progressista, qualificada pelo pr-prio Dantas de esquerda positiva, para diferenci-la da esquerdanegativa, referindo-se Frente de Mobilizao Popular, teria comoobjetivo impedir o crescimento da conspirao das direitas, reagru-

    pando as foras de centro-esquerda no sentido de apoiar o governo.Os objetivos da Frente eram retirar o presidente do isolamentopoltico, sustar o processo de radicalizao das direitas e das esquer-das e aprovar as reformas de base. Na formao da Frente Progres-sista, Dantas buscou o apoio do PSD, do PCB e do PTB que noseguia a liderana de Brizola. Tambm queria o apoio de MiguelArraes e de sindicalistas no alinhados com o CGT (FIGUEIREDO,1993, p. 143-144). Nesse momento, havia duas frentes polticas

    que disputavam o apoio de Goulart. Na avaliao de Angela deCastro Gomes, ambas pressionavam Jango, uma lutando pela legali-dade e outra por sua ruptura (GOMES, 1994, p. 160).

    Santiago Dantas e sua Frente Progressista tornaram-se, des-se modo, os concorrentes mais imediatos de Leonel Brizola e daFMP. Ambos passaram a disputar o apoio poltico de Goulart. Nocasualmente, Carlos Lacerda e Santiago Dantas tornaram-se os

    personagens mais atacados no Panfleto. O primeiro era o lder daextrema-direita; o segundo, o lder da esquerda moderada.No primeiro nmero do Panfleto, liam-se graves denncias con-

    tra Santiago Dantas. Longa reportagem o acusava de causar prejuzosde bilhes de cruzeiros para os cofres pblicos, beneficiando osEstados Unidos. A acusao era de que, no Ministrio da Fazenda,foi apanhado em flagrante negociata a compra da Bond and Share.23

    Para o editorialista, com tantas denncias, no era possvel levar asrio sua proposta de formao de uma Frente e

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    juntar num mesmo esquema poltico o que de mais autnticoapresenta o quadro brasi-leiro Brizola, Arraes, CGT, UNE,CGTI, Organizaes Camponesas, Sargentos e Oficiais Nacio-

    nalistas, comunistas brasileiros, Frente Parlamentar Naciona-lista, Frente de Mobilizao Popular com as velhas raposasdo PSD. Maior se torna o absurdo dessa coligao, quandoconhecido o seu objetivo: a realizao das reformas.

    Nesse sentido, concluiu o editorial, Goulart teria que fazer suaopo. Se escolhesse a FMP,

    o apoio das foras populares ser total, incondicional, noter preo e se manifestar por todas as maneiras, em praaspblicas e de armas nas mos, se necessrio. O que no fazsentido que o Presidente Joo Goulart, com livre acessos reas populares, escolha tal intermedirio.

    As esquerdas reunidas na Frente de Mobilizao Popular recu-saram, de maneira categrica, a proposta de Santiago Dantas, negan-

    do-se a aceitar qualquer acordo com o PSD. Na anlise de NeivaMoreira, o PSD vivia de privilgios e se mantinha artificialmenteno poder devido a um sistema eleitoral antidemocrtico, que excluidas decises imensos setores do povo.24Segundo seu argumento:

    as foras populares so a maioria do pas [...] e pelo seuvigor e a vitalidade de suas ideias, reivindicam a liderana

    do poder, para a execuo de seu programa. [...] Um pro-grama popular e nacionalista executado por um governohomogneo, afinado com a audcia das grandes decisess pode partir de uma base doutrinria coerente.

    Neiva Moreira descartava a proposta de Santiago Dantas eda Frente Progressista, qualificada por ele como um mero rtulo paragarantir o domnio do PSD no governo Jango. A frmula tinha por

    objetivo neutralizar o governo e anestesiar o povo, abrindo

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    caminho para um novo perodo de dominao das foras maisretrgradas e intolerantes do pas.

    No incio de 1964, Goulart fez sua escolha. Preferiu ter como

    base de apoio poltico a FMP e sua estratgia ofensiva. Descartoua alternativa moderada de Santiago Dantas. No se sabe por queele escolheu a alternativa da radicalizao, tratando-se de um pol-tico que sempre preferiu a negociao e o acordo. Possivelmente,a escolha pela Frente Progressista de Dantas o afastaria de suasbases sindicais e de esquerda, tornando-o refm poltico do PSD.Em fins de janeiro de 1964, Jango aceitou a proposta de realizao

    de um comcio na Central do Brasil, marcado para 13 de maro,aderindo ao programa da Frente de Mobilizao Popular e selandosua aliana poltica com as esquerdas que a integravam. No evento,ele anunciaria uma srie de reformas.

    O comcio da Central e o governo das esquerdas

    Com a manchete Povo sepulta a conciliao, Panfleto, naprimeira pgina da edio de 16 de maro de 1964, descreveu o com-cio que ocorrera na Central do Brasil dias antes, em 13 de maro.O secretrio-geral da FMP, Neiva Moreira, com satisfao, afirmouque, na praa pblica, foi sepultada a poltica de conciliao25eque Jango deveria recompor todo o seu governo:

    O prximo passo ser varrer a mquina poltica da espriainfiltrao, barrar os caminhos do imperialismo e consolidaras conquistas da revoluo, atravs de um poder doutrina-riamente coerente e funcionalmente coerente e integrado.

    Referindo-se a um processo revolucionrio em curso, o secre-trio-geral da Frente exigia que o presidente fosse coerente comsuas decises no comcio, retirando os homens do PSD de seu

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    governo, passando a compor, unicamente, com os partidos e orga-nizaes da FMP.

    No palanque, falaram as principais lideranas das organizaes

    que compunham a Frente de Mobilizao Popular. Um dos oradoresmais esperados era Leonel Brizola. Discursando em nome da FMP,ele retomou o argumento que defendia no Panfleto: a necessidadeda unio entre povo e governo. Brizola afirmou que essa unidadeexistiu em 1961, quando o povo, praticamente de fuzil na mo, repe-liu o golpismo, mas tambm no plebiscito de 1963, quando maisde dez milhes de eleitores exigiram o fim da conciliao do parla-mentarismo e a realizao das reformas.26Para Brizola,

    se conseguirmos hoje a restaurao daquela unidade, o presi-dente poder retornar, atravs da manifestao do povo, sorigens de seu governo. E, para isso, ser suficiente que ponhafim poltica de conciliao e organize um governo real-mente democrtico, popular e nacionalista.

    Segundo seu argumento, o pas chegara a um impasse:

    No podemos continuar nessa situao. O povo est a exigiruma sada. Mas o povo olha para um dos poderes da Rep-blica, que o Congresso Nacional, e ele diz NO porque um poder controlado por uma maioria de latifundirios,reacionrios, privilegiados e de ibadianos. um Congressoque no dar mais nada ao povo brasileiro. O atual Congresso

    no mais se identifica com as aspiraes de nosso povo. Averdade que, como est, a situao no pode continuar.(...) E o Executivo? Os poderes da Repblica, at agora, comsuas perplexidades, sua inoperncia e seus antagonismos,no decidem.

    A alternativa defendida para a superao do impasse entre opovo e os poderes da Repblica era, desde fins de 1963, discutida

    pelas foras polticas que integravam a Frente de Mobilizao Popu-lar. Brizola apresentou a proposta:

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    Por que no conferir a deciso ao povo brasileiro? O povo a fonte de todo o poder. Portanto, a nica sada pacfica fazer com que a deciso volte ao povo atravs de uma

    Constituinte, com a eleio de um congresso popular, de queparticipem os trabalhadores, os camponeses, os sargentos eoficiais nacionalistas, homens pblicos autnticos, e do qualsejam eliminadas as velhas raposas tradicionais.

    Pelo programa defendido pela FMP, uma Assembleia NacionalConstituinte substituiria o Congresso Nacional e, ao mesmo tempoem que redigiria uma nova Constituio, aprovaria as reformas de

    base. Formada por trabalhadores urbanos e rurais, junto com sargen-tos e oficiais nacionalistas das Foras Armadas, eleitos sem a influn-cia do poder econmico e da imprensa reacionria, a Constituinteexpressaria a vontade do povo e no das classes dominantes.Continuando, Brizola afirmou:

    Diro que isto ilegal. Diro que isto subversivo. Diro

    que isto inconstitucional. Por que, ento, no resolvem advida atravs de um plebiscito? Vero que o povo votarpela derrogao do atual Congresso.

    Ao trmino de seu discurso garantiu: o nosso caminho pacfico, mas saberemos responder violncia com a violncia. Edesafiando o presidente, finalizou: O nosso presidente que se de-cida a caminhar conosco e ter o povo ao seu lado. Quem tem o

    povo ao seu lado nada tem a temer.O comcio na Central do Brasil foi o primeiro de uma srie

    planejada entre as esquerdas reunidas na FMP e o presidente. Novoscomcios foram programados para abril: dia 3, em Santos; 10, emSanto Andr; 11, em Salvador; 17, em Ribeiro Preto; 19, home-nageando Vargas, em Belo Horizonte; 21, em Braslia. O ltimo,marcado no casualmente para 1ode maio, seria realizado na capital

    paulista, deflagrando uma greve geral. A estratgia era pressionaro Congresso Nacional, incitando a populao contra ele nas ruas.

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    Com o parlamento fragilizado pela presso do povo, as esquerdasacreditavam que encontrariam foras para alterar a Constituio eaprovar as reformas de base. O programa mais imediato das orga-

    nizaes sob a liderana de Brizola era a realizao de um plebiscitosobre a necessidade de convocar uma Assembleia Nacional Cons-tituinte.

    No editorial intitulado Constituinte sem golpe, do Panfletode16 de maro,27o editorialista argumentava que o comcio da Centraldo Brasil demonstrara, com clareza, o impasse vivido pela Naobrasileira: o desencontro entre a realidade dinmica e a estrutura

    de instituies envelhecidas ou totalmente superadas. Com as con-tradies sociais exacerbadas, o crescente processo inflacionrio e asvacilaes do governo, todos sentem que vivemos uma vspera.O editorial continuava com crticas ao presidente Joo Goulart eao Congresso Nacional:

    Preso a um esquema de conciliao, mobilizando tudo, desdea habilidade poltica at a fisiologia mais desenfreada, oPresidente da Repblica no quis entender que impossvelconciliar um PSD decadente e esclerosado com as impetuosasforas de vanguarda que surgem no cenrio do pas. Por seulado, o Congresso o grande mudo, enrolado no varejo dapequena legislao ou fazendo o jogo das aparncias e fari-sasmo que nada tm de comum com as angstias do povo.

    O editorialista denunciou que a soluo para as minorias privi-legiadas da sociedade brasileira, com apoio do imperialismo, era ogolpe de Estado. As foras populares, no entanto, impediriam.Mas ser contra golpes no significava apoiar um Executivo amar-rado, um Congresso inativo e um Judicirio s filigranas de leisconfusas ou interpretadas sempre contra o povo. O Brasil chegaraa um impasse e o problema somente seria solucionado com umaconsulta popular sobre a necessidade de convocao de uma

    Assembleia Constituinte. Somente com uma Constituinte, eleita

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    com a participao das foras renovadoras que compem o novopoder em nosso pas, ser possvel sair da crise e abrir caminho emancipao econmica nacional. Uma das reivindicaes mais

    imediatas era a extenso do direito do voto aos analfabetos, praase sargentos, bem como permitir a elegibilidade daqueles que, pelalegislao em vigor, no podiam concorrer a cargos executivos como Leonel Brizola. Desse modo, seria possvel abrir Nao umaperspectiva de sada pacfica para a crise. Concluindo, o edito-rialista afirmou: Constituinte para evitar o golpe. Plebiscito pra abrircaminho revoluo pacfica.

    Nesse momento, amplas parcelas dos empresrios nacionais,bem como importantes grupos civis e militares, demonstravamunnime desconfiana em relao ao governo, afirma Maria CelinaDArajo (1996, p. 154 e 264). No entanto, mesmo com toda a conjun-tura desfavorvel, Rodrigo S Motta considera que a deposio deGoulart da presidncia da Repblica no era um processo inexo-rvel. Desde o incio de seu governo, os polticos conservadores emoderados deram a ele um voto de confiana, esperando que resol-vesse alguns problemas cruciais vividos pelo pas, como a crise econ-mica, o crescimento da inflao e a instabilidade poltica derivada daradicalizao entre direitas e esquerdas. Para o autor, Goulart goza-ria de apoio tranquilo, desde que a esquerda radical fosse afastada docrculo do poder (MOTTA, 2002, p. 251-252). O quadro polticotornou-se outro aps o comcio da Central do Brasil. A bibliografiasobre o governo Goulart converge no sentido de interpretar a mani-

    festao de 13 de maro como o estabelecimento da aliana pol-tica entre o presidente e as esquerdas. Jango, a partir da, governariaexclusivamente com a FMP e adotaria seu programa poltico. ParaRodrigo S Motta, no campo conservador, o comcio da sexta-feira13 foi recebido com alarme. Os conservadores e anticomunistasestavam certos de que o evento resultaria inexoravelmente numgolpe esquerdista com participao ativa dos comunistas. Para o

    autor,

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    setores sociais importantes, que, at ento, mantinham-seem expectativa, alguns inclusive simpticos pregao refor-mista, alinharam-se ao lado da direita e dos conservadores,

    sob a bandeira do anticomunismo (MOTTA, 2002, p. 263-264).

    A Mensagem do Presidente

    Dois dias aps o comcio da Central do Brasil, o presidente Joo

    Goulart enviou Mensagem ao Congresso Nacional. O texto poucoconhecido, embora muito importante para o desenrolar da crisepoltica que culminou com o golpe de Estado. Redigido por DarcyRibeiro, a Mensagem era uma prestao de contas do governo aoCongresso Nacional, mas o captulo O caminho brasileiro, em queo presidente solicitava providncias aos parlamentares, foi elabo-rado em comum acordo com as lideranas da Frente de Mobilizao

    Popular e publicado no Panfleto.O presidente, inicialmente, fez referncias ao plebiscito querestituiu seus poderes presidencialistas.28 A sociedade brasileirasabia que sua plataforma poltica eram as reformas de base. Assim,ele convocou o Congresso Nacional para a adoo de uma reformaconstitucional.

    A mais importante reforma era a da estrutura agrria. Pela pro-

    posta presidencial, ficaria estabelecido que a ningum lcito mantera terra improdutiva por fora do direito de propriedade. Mas o queviabilizaria a reforma agrria eram as alteraes que o presidentepropunha nos artigos 141 e 147 da Constituio, modificaes reivin-dicadas pelas esquerdas. Como vimos anteriormente, o pargrafo16 do artigo 141 estabelecia o seguinte: garantido o direito depropriedade, salvo o caso de desapropriao por necessidade ouutilidade pblica, ou por interesse social, mediante prvia e justaindenizao em dinheiro. Na Mensagem, Jango propunha suprimir

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    do texto a palavra prvia e a expresso em dinheiro. Tratava-se,na verdade, da mais importante reivindicao das esquerdas: refor-ma agrria sem indenizao prvia em dinheiro.

    Goulart tambm propunha outra alterao da Constituio:a que tratava da reforma eleitoral. Jango alegava que a Constituiode 1946, entre outros privilgios, consagrou, no campo eleitoral,normas discriminatrias. Era o caso dos praas e sargentos e dosanalfabetos, impedidos de votar. Tambm eram inelegveis parentesconsanguneos e afins, at o segundo grau, de personalidades queexercessem cargos no Poder Executivo e alguns no Poder Legislativo

    dispositivo que impedia Leonel Brizola, cunhado de Jango, deconcorrer nas eleies presidenciais de 1965. Assim, pela propos-ta contida na Mensagem, seriam alistveis para exercer o direitodo voto todos os brasileiros que soubessem se expressar em lnguanacional, excetuando os casos incorridos no artigo 135 da Consti-tuio incapacidade civil e condenados por crimes. Tambm seriaacrescentada a expresso: So elegveis os alistveis. Com a novaredao do texto constitucional, os praas, os sargentos e os analfa-betos teriam o direito ao voto, enquanto Leonel Brizola poderiaconcorrer sucesso de Jango na presidncia. Outra consequnciada proposta era que, na prtica, estaria instituda a reeleio noPoder Executivo, beneficiando o prprio Goulart.

    O presidente tambm propunha a reforma do ensino superior,extinguindo a ctedra e sua vitaliciedade. Alm disso, a Mensagemtratava das relaes entre Executivo e Legislativo: o cumprimento

    dos deveres do Estado moderno no se concilia com uma ao legis-lativa morosa e tarda. A sugesto era suprimir o princpio da indele-gabilidade dos poderes, cuja presena no texto constitucional s sedeve aos arroubos de fidelidade dos ilustres constituintes de 1946a preceitos liberais do sculo XVIII. Jango propunha revogar opargrafo 2 do artigo 36 da Constituio, que dizia: vedado aqualquer dos Poderes delegar atribuies. Na prtica, o Executivo

    poderia exercer atribuies do Legislativo. Como ltima medida

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    contida na Mensagem, Jango sugeria a convocao de um plebis-cito para o povo se pronunciar a respeito das reformas de base.

    No Congresso Nacional, a Mensagem foi recebida de maneira

    negativa entre parlamentares de oposio e os pessedistas. A pro-posta de reforma agrria no surpreendeu. Os parlamentares sabiamque expropriaes sem indenizaes faziam parte do programa dopresidente e das esquerdas. Mas estas tambm sabiam que o Con-gresso recusaria a iniciativa presidencial.

    A repercusso mais negativa da Mensagem foi causada porsua parte poltica, geradora de suspeitas e desconfianas. A extenso

    do direito de voto aos analfabetos beneficiaria diretamente o PTB,partido muito popular naquele momento. Tudo indicava que os anal-fabetos, contingente mais pobre da populao, votariam nos traba-lhistas. No que se refere sucesso presidencial, a proposta de refor-ma eleitoral tambm vinha ao encontro das necessidades polticasdo PTB. Enquanto o PSD e a UDN tinham polticos de grande expres-so para a eleio de 1965 Juscelino Kubitschek entre os pesse-distas e Carlos Lacerda e Magalhes Pinto entre os udenistas , ostrabalhistas no tinham um candidato de peso. A reforma eleitoralpermitiria ao PTB dispor de dois fortes nomes: Brizola e o prprioJango. Mais surpreendente foi a proposta de delegao de poderes,que assustou diversos setores polticos. Parlamentares no CongressoNacional se perguntavam: o que Jango queria ao dispor, ao mesmotempo, de poderes executivos e legislativos? O plebiscito, por suavez, daria ao presidente uma vitria muito expressiva pesquisas

    apontavam a grande popularidade das reformas de base entre a popu-lao. Uma votao esmagadora a favor das reformas fragilizaria oCongresso diante do presidente da Repblica.

    Grupos civis e militares de direita estavam decididos a golpearas instituies, sobretudo aps o comcio de 13 de maro. Mas coma Mensagem presidencial, as lideranas direitistas ficaram conven-cidas de que estava em andamento um plano continusta acoplado

    a um projeto de concentrao de poderes excepcionais por parte

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    do Executivo, no dizer de Maria Celina DArajo (1996, p. 157).Tambm na anlise de Carlos Fico, o presidente dava sinais dbi-os de suas verdadeiras intenes, havendo forte suspeita de que

    ele estaria urdindo um golpe que lhe permitisse um segundo man-dato, proibido pela Constituio. Fico ainda lembra que o ldercomunista Lus Carlos Prestes apoiava uma reforma constitucionalnesse sentido (FICO, 2004, p. 17). As medidas propostas na Mensa-gem alimentaram hipteses de que um golpe estava sendo plane-jado por Jango e Brizola. Para os conservadores e partidos de centro,como o PSD, receios e temores surgiram com as propostas deGoulart. Assustados, cederam aos argumentos da direita golpista.A Mensagem presidencial gerou desconfianas generalizadas, bene-ficiando lderes de direita e grupos de conspiradores civis e militaresque necessitavam de aliados para desferir o golpe de Estado. Consi-derando ainda o anticomunismo, os argumentos que defendiam ocombate corrupo, a busca de estabilidade econmica e a preser-vao da hierarquia na Foras Armadas, o campo conservador, naavaliao de Gunter Axt, convergiu e se fortaleceu. Dessa unio

    brotou a insurreio (AXT, 2008, p. 453).

    As esquerdas no poder

    Na ltima semana de maro, o presidente Joo Goulart sofreufortes presses de seus aliados polticos na FMP.

    O sexto nmero do Panfletochegou s bancas de jornal comdata de 23 de maro. Naquele momento, Jango tinha a Frente deMobilizao Popular como base de apoio poltico. A estratgia depressionar o Congresso Nacional com novos comcios estavamantida, enquanto a Mensagem contemplava as reivindicaes maisimediatas das esquerdas. Um novo ministrio deveria dar feioao governo da FMP. O secretrio-geral da Frente, Neiva Moreira,alegou que, passada a euforia com o comcio de 13 de maro, era

    necessrio que Jango formasse um novo ministrio.

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    O que se impe a ao rpida e ofensiva. Ora, o programada Frente Nacionalista, condensado recentemente em notada Frente de Mobilizao Popul-ar, tem tudo ou quase tudo

    o que se quer e precisa fazer. s nomear os ministros doGoverno Popular e comear a ofensiva geral em todas asfrentes.29

    Para Neiva Moreira, o programa existia, faltando execut-lo.Na mesma edio, o editorial assumiu posio de ofensiva

    poltica. O Brasil est vivendo um clima de Espanha, 1936. Aguerra civil estava sendo preparada pelos reacionrios. Para o

    editorialista, o povo est certo de que vive uma vspera detranscendental importncia histrica e se aflige ao ver que o conluioimperialista e reacionrio avana (...). Desse modo, continuou,

    quando o povo luta pela reviso constitucional est certo.O fetichismo da ordem jurdica intocvel absurdo. O nossocompromisso o da democracia verdadeira, que regimedo povo. Uma constituio pode ou no ser popular e, se nofor, deixar, necessariamente, de ser democrtica. Nessa linhade ao, o plebiscito que defendemos para consultar o povosobre a Constituio que far as Reformas pode no ser rigo-rosamente constitucional, mas inequivocamente democr-tico. , ainda, uma sada contra a guerra civil, que a reao ela-bora nos subterrneos do crime poltico e da traio nacional.Todos os patriotas devem se lanar a essa luta, certos de que,se a democracia intocvel, a Constituio no pode ser

    uma camisa de fora.

    Encerrando o texto, o editorialista lanou as palavras de ordem:

    O povo quer as Reformas. O Congresso as recusa. Diantedo impasse, as palavras de ordem justas para as foras po-pulares devem ser:1 Manuteno intransigente das liberdades democrticas;

    2 Unidade das foras autenticamente populares;3 Formao de um governo popular nacionalista;

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    4 Plebiscito sobre a convocao de uma constituinte;5 Democratizao do voto para a sucesso.Esta hora de definio e de luta. O povo deve vigiar e agir.

    Nossa ptria no dar passos atrs, no ser uma nova Espanhaou um Paraguai ampliado. O processo de libertao nacionalseguir seu curso, mesmo custa de todos os sacrifcios.

    As esquerdas reunidas na Frente de Mobilizao Popular,naquele momento no poder e base de sustentao poltica deGoulart, decidiram pelo rompimento com o regime liberal-demo-crtico, inaugurado pela Carta de 1946. Os instrumentos eram o

    plebiscito e a Constituinte.

    A crise militar, a crise final

    Desde a posse de Joo Goulart at fins de 1963, a conspiraodireitista contra ele era, na definio de Rodrigo S Motta, confa-

    bulaes de grupos radicais margem do processo poltico(MOTTA, 2002, p. 268). Para o autor, foi somente no incio de1964 que a coalizo conservadora, majoritariamente, inclinou-sepela ruptura institucional. At aquele momento, a direita radi-cal, mais especificamente, os anticomunistas extremados, encon-trava-se numa posio isolada em relao opinio conservado-ra (MOTTA, 2002, p. 273). Mas em meados de maro de 1964, aconspirao formava um amplo leque de alianas, privando Jangodo apoio do centro poltico. Em fins do mesmo ms, as condiespara a deposio do presidente estavam postas. Faltava apenas afagulha, o elemento para detonar o mecanismo golpista e empurrar ao os que ainda hesitavam ante a hiptese de rompimento insti-tucional (MOTTA, 2002, p. 268). O episdio foi a revolta dosmarinheiros e fuzileiros navais, cuja Associao integrava a FMP.

    Em seu ltimo nmero, em 30 de maro, Panfletonoticiou a

    rebelio, defendendo os marinheiros. De acordo com as reportagens,

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    diversas organizaes de esquerda apoiaram ativamente a revolta.Ainda no primeiro dia, durante assembleia dos marinheiros, o vice-presidente do CGT, Dante Pelacani, afirmou que a luta, naquele

    momento, no mais pertencia aos marujos, mas a todo o povo, inclu-sive porque o Exrcito tambm povo. Os gorilas no tero coragempara invadir esta assembleia.30lvaro Lins, em nome do ComandoGeral dos Trabalhadores Intelectuais declarou que a rebelio eraum ato histrico da revoluo brasileira, e que a constituio nopode ser usada como um tabu, nem os marinheiros deveriam acatarordens injustas. Segundo noticiado no Panfleto, o CGT, por meio

    de Osvaldo Pacheco, Hrcules Correa e Dante Pelacani, manteveos operrios em estado de alerta, com dispositivos prontos para defla-grar greves. Representando a Frente Parlamentar Nacionalista, odeputado Max da Costa Santos foi quem sugeriu que os marinheirosse concentrassem no Sindicato dos Metalrgicos. Ainda segundoPanfleto, o CGTI deu assistncia completa aos marinheiros, a UNEmobilizou os estudantes e a Liga Feminina Nacionalista levou manti-mentos, enquanto os sargentos estavam determinados a no cumpri-rem ordens consideradas injustas. Leonel Brizola e Miguel Arraeseram informados dos acontecimentos a cada meia hora, mantendoseus dispositivos de alerta todo o tempo. Segundo Panfleto, acrise comeou a ser solucionada quando, logo ao chegar ao Rio deJaneiro, Goulart teve uma conferncia secreta com o deputadoLeonel Brizola, com quem examinou a situao.

    Em negociao com o CGT, Goulart nomeou o novo ministro

    da Marinha. Os marinheiros se entregaram ao Exrcito e foram anis-tiados pelo governo. Para amplos setores militares e civis, o queestava em curso no pas era um processo revolucionrio em estgioavanado, sobretudo com a desmoralizao da hierarquia e da disci-plina nas Foras Armadas. Joo Goulart e as esquerdas que compu-nham a Frente de Mobilizao Popular no perceberam a gravidadedaquele episdio.

    O desafio hierarquia e disciplina nas Foras Armadascontinuou presente nas pginas do Panfleto. Na mesma edio de

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    30 de maro, Paulo Lemos, na coluna Trincheira dos Sargentos,escreveu matria com o seguinte ttulo: Anistia ou Revoluo.31

    Sua preocupao era com o projeto de anistia aos sargentos que

    participaram da revolta em Braslia, em setembro de 1963, e queestava para ser votado no Congresso Nacional. O movimento dossargentos esperava que os parlamentares aprovassem a anistia. Otexto era contundente. De um lado, os sargentos presos; do outro,os deputados e senadores. Segundo Paulo Lemos:

    Vs [deputados e senadores] representais o passado, o velho,

    o obsoleto. Eles [os sargentos] representam o novo, o futurode um povo, a esperana da ptria. Vs terminais. Eles come-am. Eles vencero. Vs sereis os derrotados. E o trata-mento que recebemos agora vos ser retribudo em dobro,no alvorecer do novo dia, que no est longe, pois, j vivemosa aurora feliz e radiante deste amanhecer. (...) Vs agonizais.Usais de vossos ltimos recursos. Os trabalhadores, os cam-poneses, os estudantes, os sargentos, cabos, soldados e mari-nheiros, so o povo e a ns, sobra-nos ainda muita resistncia,capaz de enfrentar a luta e venc-la. A a justia popular serimplacvel.

    Para Paulo Lemos, o povo brasileiro j tinha conscincia deseu papel histrico: os sargentos de fuzil na mo e abraados aopovo faro a independncia econmica do Brasil, pacificamenteou no. Era prefervel que a libertao fosse por meio pacfico,

    mas aceitaremos a luta em qualquer terreno e de qualquer maneira.Quando for preciso, saberemos usar nossas armas e, entrinchei-rados ao lado do povo, os sargentos sabero sobre quem apontar aala de mira. Os deputados e senadores estavam diante dela, afir-mou Paulo Lemos, e somente votando a lei da anistia, a reformaagrria radical, as demais reformas que o pas precisa e o povoclama, que podereis ficar a salvo. Por fim, a ameaa final: Este

    um brado de alerta. Talvez o ltimo. Ao torpedeardes a anistia eas reformas, o que estais fazendo cavar a vossa prpria sepultura.

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    As mensagens no Panfletoeram contundentes. Os textos publi-cados na edio de 23 de maro exigiam a reviso constitucional eevidenciavam o enfrentamento ao Congresso Nacional. A defesa do

    Panfletodos marinheiros rebelados e o artigo de Paulo Lemos, amea-ando o Poder Legislativo, ambos publicados no dia 30 de marode 1964, desmoralizavam a hierarquia e a disciplina nas ForasArmadas. Os textos alimentaram a imagem de que havia um pro-cesso revolucionrio em andamento, com o agravante de obter orespaldo do presidente da Repblica

    Palavras finais: sociedade, democracia e reformas

    Historiadores, socilogos e cientistas polticos dedicaram-sea estudar o processo que resultou no golpe que deps Joo Goulart.As direitas foram muito pesquisadas, sobretudo porque foram elasque patrocinaram e desferiram o golpe de Estado. Sob vrios ngu-los, dos civis ou dos militares, das instituies ou da sociedade ci-vil, so diversas as pesquisas que comprovaram a conspiraodireitista. As esquerdas, por sua vez, no receberam a mesma aten-o.

    Quando se pesquisam as esquerdas naquela poca, as fontesso eloquentes e Panfleto, nesse sentido, um documento estra-tgico. As esquerdas se expressavam por meio de organizaes,movimentos e partidos polticos. Tinham lderes e programas. Em

    certo momento, formaram uma frente com o objetivo de aumentarsuas foras. Lutavam por reformas que exigiam mudanas na Consti-tuio. Como a estratgia preferencial que adotaram era extrapar-lamentar, criava-se uma tenso com as instituies, sobretudo como Congresso Nacional. Outra questo presente nos textos o menos-prezo manifestado pela democracia-liberal. Os depoimentos estorepletos de menes necessidade de implantar uma democracia

    autntica, uma democracia verdadeira, embora tais expresses

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    nunca fossem claramente definidas. O que se l em entrevistas, arti-gos e editoriais o desprezo pelo regime da Carta de 1946 e pelasinstituies da democracia-liberal.

    Contudo, isso no significa dizer que se tratava de uma esquer-da golpista. Tal interpretao foi formulada pelos que, de fato,golpearam as instituies. Na verso dos militares vitoriosos como golpe, 1964 visto como um contragolpe ao golpe de esquerdaque viria, provavelmente assumindo a feio de uma repblicasindicalista ou popular (DARAUJO, SOARES e CASTRO, 1994,p. 12). O argumento foi utilizado pelas direitas, sobretudo aps o

    comcio de 13 maro, e reafirmado com o envio da Mensagempresidencial ao Congresso e a crise militar na Marinha. Mas no hnenhuma prova documental que garanta que as esquerdas reunidasna FMP planejavam um golpe de Estado. Tambm no h provasobre as acusaes de que Jango pretendia liderar tal golpe.

    No entanto, no se pode desconhecer uma questo difcil:por que as direitas afirmaram que havia um plano golpista das

    esquerdas, de Jango e de Brizola, e por que os liberais e importantesforas polticas de centro acreditaram nessa verso? Algumas res-postas esto a nosso dispor. Por exemplo, a Mensagem de Goulartenviada ao Congresso Nacional, propondo que fosse permitidasua reeleio e o direito de exercer, ao mesmo tempo, prerrogativasdo Executivo e do Legislativo, deram argumentos aos seus oposi-tores para afirmar que se tratava de um plano golpista. A proposta

    de concesso de voto aos analfabetos alimentou ainda mais a verso,porque beneficiaria o partido do presidente da Repblica. neces-srio considerar ainda algo ausente das anlises: a FMP, aps 13de maro, tornou-se a base poltica do governo Goulart, exigindoum governo exclusivo das esquerdas, o que implicava excluir darepresentao no Estado todas as outras expresses polticas. Porfim, a palavra revoluo era comum nos textos e nos discursosde lderes esquerdistas.

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    Embora as esquerdas no tivessem como objetivo dar umgolpe de Estado assim como as direitas fizeram , manifestaramdesprezo pelas instituies da democracia-liberal; atacaram o Con-

    gresso Nacional, instituio qualificada de reacionria, e definirama Constituio de 1946 como ultrapassada. Privilegiaram a aodireta como luta poltica, sobretudo por meio de comcios, e defen-deram a convocao de uma Assembleia Nacional Constituinte.Comcios e Constituinte so instrumentos democrticos de luta,sem dvida, mas o resultado mais imediato naquela conjunturapoltica, particularmente no ltimo caso, seria o rompimento com

    as instituies vigentes e com a Carta de 1946.Portanto, se no havia planos de golpe de Estado, como asdireitas perpetraram, estava em curso um projeto de rompimentoinstitucional e o estabelecimento de um governo exclusivo dasesquerdas. Tudo isso deu argumentos aos conspiradores de direita;tudo isso alimentou as verses que aludiam ao iminente golpe dasesquerdas, de Brizola e de Jango; tudo isso, para usar um jargo muitoconhecido, fez o jogo ou deu armas para a direita.

    A questo a se formular a seguinte: havia interesse da socie-dade brasileira em romper com as instituies da Constituio de1946? Existem diversos indcios para responder pergunta. Du-rante o comcio da Central do Brasil, por exemplo, uma equipe depesquisadores profissionais realizou pesquisa de opinio com opblico presente no evento. O resultado demonstrou que 95% daspessoas apresentavam pensamento legalista e reformista: queriam

    eleies presidenciais em 1965 e as reformas de base, mas no admi-tiam o fechamento do Congresso Nacional e a reeleio de Goulart(NETO et alli, 1964, p. 37-38).

    Outras pesquisas igualmente confirmam que o sentimentoreformista e legalista expressado no comcio da Central fazia partede um universo bem mais amplo. Antonio Lavareda, por exemplo,trabalhou com pesquisas de opinio pblica do IBOPE. Alguns

    dados so muito expressivos e reveladores. Em pesquisa realizada

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    entre 9 e 26 de maro de 1964, em oito capitais brasileiras, a se-guinte pergunta foi formulada: Na sua opinio, ou no neces-sria a realizao de uma reforma agrria no Brasil? (LAVAREDA,

    1999, p. 177) Para 72% dos entrevistados, a resposta foi positiva;para 11%, foi negativa; 16% no souberam responder. importanteobservar que a opinio favorvel reforma agrria foi positiva emtodas as classes sociais, incluindo os ricos e as classes mdias (62%na cidade de So Paulo). Em outra pesquisa, realizada nos mesesde junho e julho de 1963, em dez capitais do pas, os pesquisadoresdo IBOPE ofereceram trs opes polticas aos entrevistados. A

    pergunta era a seguinte: Destas trs hipteses, qual , a seu ver, amais indicada para ser adotada pelo governo do Brasil? (LAVA-REDA, 1999, p. 176). A primeira opo era chamada de direitae seus representantes eram Carlos Lacerda e Ademar de Barros. Asegunda era chamada de centro e os nomes relacionados eramMagalhes Pinto e Juscelino Kubitschek. A terceira era chamadade esquerda e os nomes citados eram Leonel Brizola e MiguelArraes. Do total de entrevistados, 45% se identificaram com ocentro, 23% com a direita, 19% com a esquerda e 13% nosouberam responder. Respaldado por mltiplos dados, Lavaredaafirma que, em meio crescente polarizao das lideranas deesquerda e de direita, a opinio pblica brasileira estava ancora-da, em sua maioria, ao centro. Centro que, para o autor, apoiavapolticas reformistas: o governo gozava de simpatia e razovelcredibilidade. As principais reformas poderiam vir a ser viabilizadas

    com seu apoio (LAVAREDA, 1999, p. 179-180).Outro indcio tambm aponta para a tendncia reformista e

    legalista presente na sociedade brasileira. As esquerdas obtiveramgrandes vitrias quando mobilizaram a sociedade pela defesa dalegalidade, como ocorreu em agosto/setembro de 1961, com aluta pela manuteno da ordem jurdica e democrtica. Naqueleepisdio, as esquerdas e os grupos nacionalistas defenderam a ordem

    legal. O movimento, portanto, era defensivo. Os setores direitistas,

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    por sua vez, ao pregarem abertamente o golpe de Estado e a alteraoda Constituio pela fora, perderam a legitimidade. Ou seja, em1961, a vitria foi das esquerdas, mas a luta era pela legalidade. Proces-

    so similar ocorreu no plebiscito que, em janeiro de 1963, garantiua Goulart os poderes presidencialistas. As esquerdas, naquelemomento, defenderam as prerrogativas constitucionais que foramusurpadas da sociedade em setembro de 1961. Mas, nos primeirosmeses de 1964, sob o impacto de movimentos revolucionrios queocorriam em vrias partes do mundo, Cuba em particular, os projetosdas esquerdas, segundo Daniel Aaro Reis, eram de ruptura. As

    esquerdas estavam longe da plataforma de resistnciade agosto de1961. A posio defensiva, de defesa da legalidademetamorfoseara-seem posio ofensiva, e, se fosse o caso, contra a lei (AARO REIS,2004, p. 36).

    Os episdios da Campanha da Legalidade e do plebiscito, bemcomo a pesquisa durante o comcio de 13 de maro e as do IBOPE,so indcios que apontam para duas questes valorizadas pela socie-dade brasileira na poca: a necessidade das reformas e a preservaoda legalidade democrtica dimenses da vida social que no eramcompreendidas como excludentes entre si. Quando, no fim de 1963e incio de 1964, as esquerdas passaram a menosprezar e a questionaros fundamentos da democracia liberal, institudos pela Constituiode 1946, seus apelos no encontraram respaldo na sociedade. ParaLavareda, o acirramento dos conflitos ideolgicos no teve forasuficiente para cindir a sociedade brasileira em plos antagnicos,

    esvaziando o centro poltico. A radicalizao, que terminaria pordestruir a ordem constitucional, era apenas uma opo estratgicadas elites desinteressadas do jogo democrtico. (LAVAREDA,1999, p. 11-12).

    As esquerdas em 1964 foram ousadas. Formularam um projetoofensivo e de poder. Alcanaram, inclusive, o poder. Mas no tinhama fora que imaginavam e declaravam ter. Lutaram por reformas,

    mas acusavam as instituies da Carta de 1946 de impedir a sua

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    efetivao. Foram necessrias experincias muito duras sob a dita-dura civil-militar para que se compreendesse, nas palavras de AdamPrzeworski, que a democracia no um contrato social susten-

    tado por algum que est fora do jogo. A democracia dura apenasse tornada duradoura pelas partes em conflito (FIGUEIREDO,1993, p. 16).

    Left-wing onPanfleto. The political crisis of 1964 in the Popular Mobilization

    Front Newspaper

    Abstract: Since the beginning of President Joo Goularts government, parties,movements and left-wing organizations joined for a political program known as

    base reforms. In early 1963, the left-wing parties founded the Popular MobilizationFront (PMF), under the leadership of Leonel Brizola. The national-revolutionarygroup, which followed the Brizolas ideal in Brazilian Labor Party (BLP), had itsown newspaper: Panfleto, the newspaper of street man. But this publication wasalso PMFs spokesman. Through their own means of communication, the left-wing groups, which acknowledged Brizolas leadership, expressed their ideas, projectsand strategies. The purpose of this article is to resume ideas and political projectsof left-wing groups joined to PMF and published on Panfletofrom February 17,day of its first issue, and March 30, 1964, when the last issue was published of atotal of seven numbers. These two months were critical during the crisis, whichdestabilized Goularts government, when left-wing groups pro-reform becamemore and more radical, and the right-wing groups were against these changes.Keywords:Panfleto, the newspaper of street man. Popular Mobilization Front.Political crisis in 1964. Joo Goularts Government. Base reformation.

    Notas

    1Panfleto. O jornal do homem da rua. Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de 1964, p. 13. Ascitaes seguintes, at a nota 2, encontram-se na mesma edio e pgina de Panfleto.2Idem, 9 de maro de 1964, p. 31.3Panfleto, 24 de fevereiro de 1964, p. 6 e 7. As citaes seguintes, at a nota 4,encontram-se na mesma edio e pgina de Panfleto.4Idem, 9 de maro de 1964, p. 7.

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    5Panfleto, 24 de fevereiro de 1964, p. 9. Em 11 de setembro de 1963, o SupremoTribunal Federal considerou inelegveis os sargentos eleitos no ano anterior. EmBraslia, os sargentos, em assembleia, decidiram realizar um protesto armado,pretexto para desencadear uma insurreio de mbito nacional. Depois de obstruremas rodovias, dominaram o aeroporto civil, o Servio de Rdio-Patrulha do Depar-tamento Federal de Segurana Pblica no Ministrio da Justia, a Central Telefnica,a Base Area e o Grupamento de Fuzileiros Navais. O mesmo ocorreu com oCongresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal. A seguir, convocaram todas asunidades militares do pas a aderirem ao movimento. Os comunicados eram assi-nados pelo Comando Revolucionrio de Braslia. Ver PARUCKER, 1992.**Na linguagem dos sargentos daquela poca, instrumentos de trabalho eram osfuzis.

    As citaes seguintes, at a nota 6, encontram-se na mesma edio e pgina dePanfleto.6Panfleto, 23 de maro de 1964, op. cit., p. 25.7Idem, 2 de maro de 1964, p. 13.8Idem, 16 de maro de 1964, p. 28.9Panfleto,16 de maro, p. 6. As citaes seguintes, at a nota 10, encontram-se namesma edio e pgina de Panfleto10Panfleto,2 de maro de 1964, p. 7. As citaes seguintes, at a nota 11, encontram-se na mesma edio e pgina de Panfleto.11Idem, 17 de fevereiro de 1964, p. 21.12

    Idem, 24 de fevereiro de 1964, p. 9.13Idem, 2 de maro de 1964, p. 21.14Panfleto,17 de fevereiro de 1964, editoral A Carta de Vargas, p. 2. As citaesseguintes, at a nota 15, encontram-se na mesma edio e pgina de Panfleto15Idem, 9 de maro de 1964, editorial Lacerda: subproduto da conciliao, p. 2 e 3.16Idem, p. 33. A citao seguinte da mesma fonte.17Idem, 23 de maro de 1964, p. 30.18Idem, 30 de maro de 1964, p. 9.19Panfleto, 24 de fevereiro de 1964, p. 28. As citaes seguinte