Download - Interacionismo
INES - DEPARTAMENTO DE ENSINO SUPERIOR CURSO BILINGUE DE PEDAGOGIA - 2° PERÍODOCONSTRUÇÕES COGNITIVAS - PROFESSORA: Aline Lima da Silveira Lage
UNIDADE I - A psicologia como campo de conhecimento e as concepções de desenvolvimento humano e da aprendizagem nos sistemas psicológicos. I.2. Concepções de desenvolvimento humano e da aprendizagem: inatismo, ambientalismo, interacionismo e sócio-interacionismo.
A Concepção Interacionista
Resumo: As teorias de influência Interacionista discordam do Inatismo porque esses desprezam o papel do
ambiente; discordam dos ambientalistas porque esses ignoram os fatores maturacionais (ligados às mudanças internas dos sujeitos).
O organismo e o ambiente exercem função recíproca; um influencia o outro e essa interação provocaria mudanças no indivíduo. A criança conhece o mundo na interação com esse mesmo mundo físico e social. Um processo que acontece por toda a vida.
Para os psicólogos interacionistas as crianças (as pessoas) procuram sempre compreender aquilo que vivenciam e explicar aquilo que para eles é estranho construindo hipóteses que pareçam razoáveis (possíveis).
Concepções teóricas ligadas ao Interacionismo (não harmônicas entre si):
- Jean Piaget (1896 a 1980): teoria fundamentada em estudos no campo da Biologia e da Filosofia;
- Lev Vygotsky (1896 a 1934): concepções teóricas com referência no campo da Psiconeurologia, da lógica dialética de orientação marxista e da Arte.
Antes de abordarmos a concepção Interacionista convém retomar os limites relativos ao
Inatismo e ao Ambientalismo.
Aos pensadores do Inatismo poderíamos perguntar:
Se os princípios e as ideias da razão são inatos, e por isso universais e necessários, como
explicar que possam mudar? Descartes, por exemplo, considerava que a natureza era uma realidade
mecânica. Considerava também que as leis mecânicas ou leis do movimento elaboradas por sua
filosofia ou por sua física eram ideias racionais deduzidas de ideias inatas simples e verdadeiras.
Quando comparamos a física de Descartes com a de Galileu, elaborada na mesma época, verificamos
que a física galileana é oposta à cartesiana e é a que foi provada e demonstrada verdadeira. A física de
Descartes foi considerada falsa. Como poderia isso acontecer, se as ideias da física cartesiana eram
ideias inatas? (Host, 2008)
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Quanto aos pensadores do Ambientalismo poderíamos dizer:
A teoria empirista também possui limitações. As ciências nessa concepção não possuem verdade
alguma, não explicam realidade alguma, não alcançam os objetos, não possuem nenhuma
objetividade, pois as ciências são apenas hábitos psicológicos pela associação de percepções e ideias.
O ideal racional da objetividade científica afirma que uma verdade é uma verdade porque corresponde
à realidade das coisas e não depende de nossos gostos, nossas opiniões, nossas preferências, nossos
preconceitos, nossas fantasias, nossos costumes e hábitos. Em outras palavras, a ciência não é
subjetiva, não depende de nossa vida pessoal e psicológica.
Com alguma segurança podemos afirmar que Piaget foi o autor que elaborou críticas e apontou
o limite dessas concepções, especialmente quando tentavam explicar o processo de produção de
conhecimentos.
Interacionismo de Piaget
Processo de aprendizagem
O professor deve conhecer a qualidade do pensamento da criança para planejar o ensino.
A partir da década de 1930 as ideias de Jean Piaget foram difundidas no Brasil. Naquela época
o movimento da Escola Nova defendia a importância de conhecer a criança para organizar o processo
pedagógico. As preocupações principais de Piaget não eram as questões educacionais, mas as
questões epistemológicas. Realizou uma série de pesquisas visando a descrever e compreender: como
o ser humano constrói o conhecimento, ou seja, passa de um estado de menor conhecimento (na
infância) para outro de maior conhecimento (fase adulta)? Mesmo não manifestando uma
preocupação explícita com a educação, as ideias de Piaget agradaram aos educadores brasileiros
(Vasconcelos, 1996 apud Carvalho, 2002).
Em 1965, Piaget publicou “Sabedoria e ilusões da filosofia”. Nessa obra, falou dos rumos que
as ciências seguiram: ao longo dos tempos têm se colocado ora na verificação (empirismo), ora na
especulação (racionalismo). A pesquisa piagetiana foi apresentada como alternativa porque propôs
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retornar às fontes ou gêneses do conhecimento aos quais a epistemologia1 só conhece os estados
superiores. Sua Epistemologia Genética foi apresentada como “estudo da passagem dos estados
inferiores do conhecimento aos estados mais complexos ou rigorosos” (Piaget, 1983, p. VIII).
Em outra publicação “A epistemologia genética”, Piaget (1983) apresenta de forma bem clara
suas críticas ao Inatismo e ao Ambientalismo.
Afirmou que a hereditariedade e a maturação, presentes no Inatismo, limitam-se a determinar
as zonas das impossibilidades ou das possibilidades de aquisição. Nas visões “maturacionistas”, ou
seja, do Inatismo, as “categorias do saber” seriam biologicamente pré-formadas, seriam condições
preliminares (anteriores) a toda experiência. Comparou essa visão ao desenvolvimento dos animais: as
categorias do saber amadureceriam como as patas dos cavalos e as nadadeiras dos peixes que se
desenvolvem na embriogênese (fase de desenvolvimento que ocorre ainda na vida embrionária, intra-
uterina) seguindo uma programação hereditária. Piaget alegou que essa biologia é estreita e constitui
uma forma ortodoxa de interpretação do darwinismo. A essa tendência chamou estruturas sem
gênese, sem origem na experiência.
Quanto aos pressupostos ambientalistas Piaget (1983) afirmou que estão equivocados porque
afirmam que o conhecimento tem natureza fenotípica, isto é, relacionado ao desenvolvimento
somático dos indivíduos, não aponta para a necessidade de mecanismos biogenéticos, ao genótipo e às
transmissões hereditárias. A essa tendência denominou gênese sem estrutura, sem origem,
baseada apenas nas influências do ambiente. Continuou a sua crítica apresentando as conclusões
daquela época acerca da relação genótipo-fenótipo. Sabia-se já em 1970 (ano de publicação do texto
original) que o fenótipo é o produto de uma interação contínua entre a atividade sintética do genótipo
durante o crescimento e as influências exteriores. Para cada influência do meio pode-se determinar a
forma de reação de um genótipo que fornece a amplitude e a distribuição das variações individuais
possíveis.
1 Epistemologia na Filosofia é o estudo do grau de certeza do conhecimento científico em seus diversos ramos, especialmente para apreciar seu valor para o espírito humano (Bueno, 1976)
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A equilibração majorante = estrutura gênese
Toda gênese parte de uma estrutura e chega a uma estrutura
Exemplo:
gênese da inteligência sensório-motora (p.ex.: comer usando colher)____________________________________________
a estrutura são reações comportamentais automáticas (p.ex.: reflexo de sucção)
Toda estrutura tem uma gênese
Exemplo:
a estrutura da inteligência lógico-matemática dos
adultos
não é inata nas crianças
são construídas pouco a pouco
estrutura simples estrutura complexa
processo de construção = gênese
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Piaget afirmou que toda a gênese parte de uma estrutura e chega a uma estrutura. Assim, por
exemplo, a gênese da inteligência sensório-motora, tem por base, estrutura, reações comportamentais
automáticas, constituindo outra. Mas, toda estrutura tem uma gênese. As pesquisas em Psicologia da
Inteligência indicaram que as estruturas presentes nos adultos, como a inteligência lógico-matemática,
não são inatas nas crianças, ao contrário, são construídas pouco a pouco. Piaget (1983) afirmou que
não existem estruturas inatas, pois toda estrutura supõe uma construção. Essas construções se ligam
em cadeia a estruturas anteriores. Portanto, estrutura e gênese são termos indissociáveis. Em presença
de uma estrutura como ponto de partida, e de uma estrutura mais complexa como ponto de chegada,
entre as duas tem-se sempre um processo de construção que é a gênese. De maneira íntima os dois
termos se relacionam no sentido de uma equilibração majorante.
A evolução do pensamento da criança ao adolescente foi descrita por Piaget como um
processo, uma construção contínua. O autor comparou a evolução do pensamento com a construção
de um edifício grande: à medida que se acrescenta algo, fica mais sólido. No campo da inteligência a
estrutura está em equilíbrio na medida em que o indivíduo é ativo o suficiente para poder resistir a
todas as perturbações exteriores. No equilíbrio superior as perturbações exteriores podem ser
antecipadas, assim como é possível organizar operações inversas ou operações recíprocas.
Assim, Piaget não nega a importância da experiência nem de estruturas inerentes ao ser
humano. Mas, aponta que na relação da experiência e das estruturas inerentes está um sistema auto-
regulado com tendência ao equilíbrio dinâmico. Sujeito e objeto do conhecimento se constroem
mutuamente. Na medida em que interage no mundo o homem descobre suas próprias capacidades
para conhecer.
Piaget não estabeleceu um sistema de aprendizagem. Mas, sua teoria oferece fundamento à
aprendizagem escolar orientando que ela deve estar subordinada às estruturas de pensamento já
construídas pela criança. Assim, as questões educacionais, como o conteúdo, os métodos de ensino e o
papel do professor, mesmo tendo um papel formador necessário ao próprio desenvolvimento, ficam
subordinadas ao processo de construção das estruturas cognitivas. Piaget afirmou a importância do
professor como uma figura que deve incitar os alunos ao desafio e à reflexão. Para realizar tal objetivo
o professor precisaria conhecer como acontece o desenvolvimento cognitivo dos alunos (Carvalho,
2002).
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Sócio-interacionismo de Vygotsky
Vygotsky é outro autor que destaca a importância dos fatores biológicos e dos fatores
ambientais no processo de produção de conhecimentos. Junto aos seus colaboradores buscou uma
síntese alternativa entre as duas abordagens predominantes até então na Psicologia; duas fortes
tendências antagônicas de pesquisa (contexto dos anos de 1930).
Psicologia como ciência natural
Explicação dos processos elementares
sensoriais e reflexos
Homem é Corpo
Fundamento nas ciências naturais
Quantificação de fenômenos observáveis
Psicologia como ciência mental
Descrição das propriedades dos processos
psicológicos superiores
Homem como Mente (consciência)
Fundamento na Filosofia
Abordagem descritiva, subjetiva e
dirigida aos fenômenos globais
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Projeto da nova Psicologia de Vygotsky
Homem como ser biológico e social
Corpo & Mente
Homem como um membro da espécie humana e participante de um processo histórico
De um lado a Psicologia era vista como ciência natural: procurava-se explicar
processos elementares sensoriais e reflexos tomando o homem basicamente pelo seu
corpo; preocupava-se com a quantificação de fenômenos observáveis e com subdivisão
dos processos complexos em partes menores, mais facilmente analisáveis. Por outro
lado tinha-se a Psicologia vista como ciência mental: descreviam-se as propriedades dos
processos psicológicos superiores tomando o homem como mente, consciência;
tendência próxima da filosofia e das ciências humanas; abordagem descritiva, subjetiva
e dirigida aos fenômenos globais, sem a preocupação com a análise desses fenômenos
em componentes mais simples. Vygotsky canalizou seus esforços para que na
Psicologia o Homem pudesse ser compreendido como ser biológico e social,
relacionando corpo e mente que juntos constituem um membro da espécie humana e
participante de um processo histórico.
O que Vygotsky procurou foi uma abordagem abrangente que possibilitasse a descrição e a explicação das funções psicológicas superiores, em termos aceitáveis para as ciências naturais. (...) Ela (tarefa) deveria incluir: a identificação dos mecanismos cerebrais subjacentes a uma determinada função; explicação detalhada de sua história ao longo do desenvolvimento, com o objetivo de estabelecer as relações entre formas simples e complexas daquilo que aparentava ser o mesmo comportamento; e de forma importante, deveria incluir a especificação do contexto social em que se deu o desenvolvimento do comportamento. As metas de Vygotsky eram extremamente ambiciosas, talvez até de forma não razoável. Ele não as atingiu (como, aliás, estava bem ciente). No entanto, conseguiu, de fato, fornecer-nos uma análise arguta e presciente da psicologia moderna.(Cole & Scribner, p. XXIII-XXIV, 2007)
Os métodos e princípios do materialismo dialético apareceram para Vygotsky
como a solução do impasse na Psicologia. No seu método de pesquisa todos os
fenômenos foram estudados como processos em movimento e mudança. A tarefa do
cientista seria reconstruir a origem e o curso do desenvolvimento do comportamento e
da consciência. Todo fenômeno tem sua história, mas essa história é caracterizada por
mudanças qualitativas (mudança na forma, estrutura e características básicas) e
quantitativas. A abordagem de Vygotsky privilegia o desenvolvimento, mas não deve
ser confundida como uma “teoria do desenvolvimento” da criança (Cole & Scribner,
2007).
Para Vygotsky as funções psicológicas têm suporte biológico, pois são produtos
da atividade cerebral. O cérebro é o órgão material e base biológica do funcionamento
psicológico, pois define limites e possibilidades para seu desenvolvimento. O cérebro
não é um sistema de funções fixas e imutáveis, mas aberto, de grande plasticidade, cuja
estrutura e modos de funcionamento são moldados ao longo da história da espécie e do
desenvolvimento individual. A plasticidade cerebral é muito importante: o cérebro pode
servir a novas funções, criadas na história do homem, mas não sofre transformações
físicas. A flexibilidade supõe a presença de uma estrutura básica estabelecida ao longo
da evolução da espécie, que cada ser traz consigo ao nascer.
O funcionamento psicológico, por sua vez, fundamenta-se nas relações sociais
entre o indivíduo e o mundo exterior que se desenvolvem num processo histórico. O
homem transforma-se de ser biológico em ser sócio-histórico, num processo em que a
cultura é parte essencial da constituição da natureza humana. A organização das funções
psicológicas superiores tipicamente humanas está baseada na ordenação do real
construída socialmente.
A relação homem/mundo é uma relação mediada por sistemas simbólicos. A
mediação é um conceito central para a compreensão do fundamento sócio-histórico do
funcionamento psicológico descrito por Vygotsky. A relação do homem com o mundo
não é direta, mas mediada e os sistemas simbólicos são os elementos intermediários
entre o sujeito e o mundo.
Os sistemas de signos (a linguagem, a escrita, o sistema de números), assim como o sistema de instrumentos, são criados pelas sociedades ao longo do curso da história humana e mudam a forma social e o nível de seu desenvolvimento cultural. Vygotsky acreditava que a internalização dos sistemas de signos produzidos culturalmente provoca transformações comportamentais estabelece o elo entre as formas iniciais e tardias do desenvolvimento individual. Assim, para Vygotsky, na melhor tradição de Marx e Engels, o mecanismo de mudança individual ao longo do desenvolvimento tem sua raiz na sociedade e na cultura. (op. cit., p. XXVI)
Segundo Carvalho (2002), nas diferenças que podemos ainda apontar entre a
proposta piagetiana e a de Vygotsky está a forma como cada um relaciona o
desenvolvimento e a aprendizagem. Os teóricos com abordagem semelhante ao Piaget
subordinam o processo pedagógico ao desenvolvimento das estruturas cognitivas da
criança, considerando que o conteúdo básico a ser desenvolvido na educação é o próprio
processo de pensamento. Os teóricos próximos da abordagem de Vygotsky consideram
que ao ensinar conteúdos científicos e socialmente relevantes, a escola, possibilita à
criança o domínio dos conhecimentos exigidos pela sociedade para o futuro, ou seja, tal
aprendizagem é um dos principais motores do desenvolvimento.
A abordagem sócio-interacionista de Vygotsky defende um papel mais atuante
para o professor no processo de ensino-aprendizagem, porque considera que a
aprendizagem estimula o desenvolvimento e não é apenas resultado deste; é salientado,
nesse caso, o papel formador da educação escolar e sua relação com a cultura.
O professor deve planejar o ensino para impulsionar o desenvolvimento mental dos seus alunos.
O aluno se desenvolve porque aprende.
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