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Discurso e mudanga socia

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Discurso e m u d a n g a socia

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FUNDAC&O U N TVERS I D A D E DE BRA S I LI A

Relior

Laur o M o r h y

Vice-Re if or

T i m o t h y M a r t i n M u l h o l l a n d

E D I T O R A U N I V E R S I D A D E D E B R A S I L I A

D i r e t o rAlexand re L i m a

C O N S E L H O E D I T O R I A L

A i r t on Lugar i nho de L i m a C a m a r a .

A l e x a n d r a L i m a , E l i z a b e t h Cancelli. Estevao C h a v e s d eRezende Mar t ins . Henryk S i ew i e r sk i , Jose Maria Conceives de

Almeida Jun i o r , Moema Malheiros Pontes, Rei nhar d t A d o l f o

Fuck, Sergio Pau l o Rouane t e Sylvia Ficher

40 anosEditors Untvmldadf lie Brasi l i a

N o r m a n F a ir c lo u g h

Di scu rso e m u d a n ^ a soc i a l

, ,- :-. Izabcl Haggles |

Revisao tecnica e prefacio fi ediqao brasileira

Izabel Magalhaes

EDITORA

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E q u i p e ed i t o r i a l : A i r t o n L u g a r i n h o ( S u perv i s a o ed i t o r i a l ) ; R e j a n e d e

Men eses ( A c o mp a n ha m en t o ed i t o r i a l ) ; I z a b e l M a g a l ha es , A n d re R . N .

Mart ins , Carla Rosane Zorio , Cel ia M. L . Mota, J a n a i n a S a ra i v a de

A qu i n o , J o s en i a V i c i r a , M a r i a C h r i s t i n a D i n i z L ea l , S a n d ra d a R o c ha

M. de Olive i ra (Equipe de t raducao) ; G i l v a m J o a q u im Cosmo e W i l m a

Conceives Rosas Saltarelli (Prepa racao de or ig ina l s , revisao e indicc):

E u g en i o F e l i x Br a g a ( E d i t o r a c a o e l e l ro n i c a ) : W a g n er S o a res (Qipa).

Titulo original: Discourse and social change

Copyright © 1992 by N o r m a n Fairclough

Co pyr ig h t © 2001 by Editora Universidade de Brasilia, pela t r ad u c ao

Impresso no Brasil ** **B

*3'

Direitos exclusivos par a esta e d i g a o :

Editora Univers idade de Brasilia

S CS Q.02 BlocoC N° 78 Ed. OK 2 - a n d a r

70300-500-Brasilia-DFTel: (Oxx61) 226-6874

Fax: (OxxGl) 225-5611

ed i to r a ( 5 ) u n b . b r

integrtdo

Todos os direi tos reservados. Ne n h i i m a parte dcsta p u b l i ca g a o podera se r

a rmazenada ou reproduz ida por q u a l q u e r mei o sem a au to r izagao por cs-

cr i to da Edi tora .

Ficlia cata lografica e lab or ada pela

Bib l io teca Cen t r a l d a U n i v e r s i d a d e d e Brasil ia

Fa i r c lough , N or m anF165 Discurso e m u d a n ^ a social / N or man Fa i r c lough ; I za -

bel Magalhaes, coordena dora da traducao, revisao tecnica

e prefacio. - Br as i l i a : Edi tor a U nive r s idade de Brasil ia .

2001.

316 p.

T ra duga o de : Discourse an d social change.

ISBN 85-230-0614-1

1. Sociol ing t i is t ica . 2. An a l i se do t l iscurso. 3. M u d a n -

ca social . I . Magalhaes, Izabel. 11.T f t u l o .

CD U 801

801:30.1

Para minha mae, e em memoria de meu pai .

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S u m a r i o

PREFACIO A EDICAO BRASILEIRA, 11

AGRADECIMENTOS, 15

PREFACIO, 17

INTRODUCAO, 19

CAPITULO 1

ABORDAGENS DA ANALISE DE DISCURSO, 31

Sinclair e Coulthard , 32

Analise da conversacao, 36

Labov e Fanshel, 40

Potter e Wetherel l , 44

.* Lingtiistica critica, 46

Pecheux, 51

Conclusao, 57

CAPITULO 2_ _ _ ^MICHEL FOUCAULT E A A N A L I S E DE DISCURSO, 61

Os trabalhos arqueologicos de Foucaul t , 64

A formagao do s objetos, 65

—-t> A fo rmagao de modal idades enunciat ivas , 68

=—^A forma^ao de conceitos, 70

— T? A fo rma^ao de estrategias, 73

Da a rqueo log ia a genealogia , 74

Foucault e a an alise de discurso tex tua lmente or i en t ad a , 81

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N o rma n Fairclough

C A P I T U L O 3

TEORIA S O C I A L DO D I S C U R S O , 89

Discurso, 89

Discurso como texto , 101

Pratica discursive, 106

Fbiscurso como pratica social: ideologia e hegemonia , 116

M u d a n g a discursiva, 126

Conclusao, 130

C A P I T U L O 4

I N T E R T E X T U A L I D A D E , 133E xemplo 1: Reportagem de j o r n a l , 138

E xemplo 2 : Ur n guia p a ra os portadores de carlao do banco

Barclay, 148

Intertextual idade manifesta , 152

Inter textual idade e t ransformacoes, 166

Inter textual idade, coerencia e sujei tos , 170

C A P I T U L O 5

A N A L I S E T E X T U A L : A C O N S T R U C A O D A S R E L A C O E S S O C I A I S

E D O ' E U ' , 1 7 5

E xemplo 1: Entrevis ta medica ' p a d r a o ;, 176

E xemplo 2 : E n t rev is ta med ica a l t e r na t i v a , 183

E xemplo 3: Narra t iva conversa t iona l , 189

Car act en's ticas de controle interacional , 19 2T o m a d a de t u rno , 192

Es t r u t u r as d e t roca, 1 93

Controle de topicos, 195

De te rminacao e poJ i c i amenl o de agendas, 196

Formulagao , 198

M odal idade , 19 9

Polidez, 203

Ethos, 207

Conclusao, 2 0 9

Su m a no

C A P I T U L O 6

A N A L I S E T E X T U A L : A C O N S T R U C A O D A R E A L I D A D E S O C I A L , 2 1 1

[Co l lec t ives e argume n t ae,ao, 212

I T rans i t iv idade e t e ma, 22 1

Signif icado das pa lav ras , 2 30

Cr iagao de palavras , 236

M e t a f o r a , 2 4 1

Conclusao, 245

k

C A P I T U L O 7D I S C U R S O E A T U D A N C A S O C IA L N A S S O C IE D A D E S

C O N T E M P O R A N E A S , 247

Democra t i zacao , 248

Comod i f icagao , 255

Tecnologizagao, 264

P roduz iudo sen t ido das tendencias, 2 6 8

Conclusao: modelos relevantes d e discurso, 272

C A P I T U L O 8

A P R A T I C A DA A N A L I S E DE D I S C U R S O , 275

Os dados, 276

Anal ise, 282

Resu l tados . 291

R E F E R E N C E S B I B L I O G R A F I C A S , 29 5

I N D I C E , 3 0 7

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Prefacio a e d i^a o b r a s i l e i r a

Conheci Norman Fairclough n a Universidade de Lancaster.

Gra-Bre t anh a , em 1975. E m 1988, ele visi tou a Unive r s idade de

Brasilia a meu convi te , para minist rar o curso Linguage m, P ode r e

Ide o log ia . Dura n te a v i si t a , d i scu t imos a i de i a de um conve n io de

pesquisa in ternacional entre a Universidade de Brasilia e a Univer-

s idade d e Lancas te r . 0 c o n v e n i o recebeu apoio d o Conse lh o Br i t a -

nico e da Capes, em 1991. Fairclough visitou a Unive r s idade de

Brasi l ia novamente em 1994 e em 1998. A t r aducao de s t a obra eproduto do convenio e u m a real izacao d o G r u p o d e P e squi sa de

Linguage m e Ide o log ia da Un ive r s idade de B ras il i a .

0 t r aba l ho de F a i r c l o u g h e conh e c ido no mund o i n t e i r o , re-

pre se n tando uma signi f icat iva c ont r i hu i gao d a l ingi ifs t ica br i l anica

do f i na l do seculo XX, que tern iuf luenciado um g r a n d e n u m e r o de

pesquisadores, lanto estudiosos da l inguagem c o m o de d i sc ip l i nas

a f i n s . A Teoria Social do Discurso, que o a u t o r apresenta n o Ca -

p i t u l o 3, tern e m co m u m c o m a Escola Francesa de Anal i se de Dis-

curso a dimensao cr i t ica do olhar sobre a l i nguage m como pra t i ca

social . Entre tanto, a teor ia de Fairclough e inovadora q u a n d o pro-

p oe e x aminar e m pr o f und i d ad e nao ape nas o pap e l da l i ngua ge m

n a r e produgao d a s pr a t i c as sociais e das ideologias, mas t a m b e m

seu papel f u n d a m e n t a l n a t r ans f o r magao social.

Isso e possivel na t e or i a de Fairc lough porq ue el a e dialet ica

na m e d i d a em que considera o discurso. por um lado , m o l d a d o

pela est ru tura social e, por o u t r o , cons t i tu t ivo d a e s t ru tu ra social :

O discurso con t r i bu i para a cons t i t u i gao de todas as dimeasocs da

eslrutura social que, direta cm i nd i re t am ent e , o mok lan i e r es t r in -

gein: suas propr ias n o rmas e convencoes e t a m b e m as relac.oes, as

identidades e as instituic.6cs que I he sao subjacentes (cf. Capftulo 3).

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12 Norman Fairclough

A]em disso, a teoria de Fairclough resgata o conceito de ' i n -

terdiscurso', do teorico da analise de discurso francesa Michel

Pecheux. Faircloug h discule a conf iguragao de prat icas d iscurs ivas

e a relagao entre elas, em termos da 'o rdem de discurso ' (u m con-

ceito f o r m u l a d o i n i c i a l m e n t e p o r M i c h e l F o u c a u l t ) , q u e t a n t o

pode favo recer a r e produgao do sujei to social como a sua t r ans-f o r magao . A m u d a n g a discurs iva ocorre m edia nte a r e con f iguragao

ou a m u t a g a o dos e le me n tos da ordem de discurso q u e a l uam d i-

r j ami c ament e na re lagao en t re as prat icas d iscursivas . E la pode es -

t e nde r seus efeitos sobre os sujei los e suas i de n t idade s , as relagoes

sociais e os s is temas de conhecimento e crenca. N u m munclo de

grandes t ransform agoes como o nosso, essa e, sem sombra de dii-

v ida , um a que s t ao cent ra l .

E e ai que se enc ont r a a pr inc ipa l con t r ibu icao de Fairclough

para os leitores brasileiros: ate que pouto as t r ansformagoe s pro-

postas n o s textos orais e escritos sa o favoraveis ao s cidadaos? Pa ra

responder a essa questao, e preciso ter uma visao cri t ica sobre o

p a p e l da l inguagem n a organizacao e n a m a n u t e n g a o da hegemonia

d e d e t e r m i n a d o s g r u p o s sociais em d e t r i m e n t o d e o u t r o s . Tais

blocos i nc l uem n a o a p e n a s a classe social - como na visao de

Louis Althusser e Michel Pecheux -,mas t ambem a etnia , o genero

social e mesmo a l inguagem escri ta , que, no senso comum ideolo-

gico, separa os individuos em letrados e anal f abe tos , va lor i z ando

os p r ime i ros . A manu tengao desses blocos ex ige , em mui tos casos,

o apelo a m u d a u c a , a mode rn i z agao s up e r f ic ia l e a r e ar t i cu lacao

d as pra t icas socials conservadoras . Nu m pais e m que a populacao e

co m freqiiencia alvo de m a n i p u l a c a o por pa rte de grupos de pod er,couhecer o t r a b a l h o de Fairclough e uma necessidade.

Cabe esclarecer, porem, que o au to r n a o propoe so lugoe s fa -

ceis, p r i n c i p a l m e n t e p o r q u e o c a m i n h o d a cri t ica exige l e i tu ra , re -

f lexao e de se nvolv ime n to d e u m a consciencia sobre direitos e

deveres, q u e pode d e m a n d a r pr o f und as t r ans f o r mac oes na i d e n t i -

dade d o 'eu' e d o 'ou t ro ' e a i n d a n a i d en t i d ad e n a c i o n a l . Nesse

se n t ido , a t r ans f o r mac ao d as prat icas sociais passa p o r u m a I rans-

f o r m a g a o d as pra t icas l ingi i ist icas nos mais d iversos d o m f n i o s .

Na t r ad ugao , optou-se pelo uso do m a s c u l i n o e d o f e m i n i n o

(por exemplo, 'ele(a)') em siluagoes em que se usa normalmen te o

Discurso e mudan^a social 13

m a s c u l i n o generico em por tugue s , como em 'c iencias d o h o m e m ' .

Essa decisao segue um u so j a conso l idado n o ingles, f r u to da t e n -

dencia de ' d e m o c r a t i z a g a o do d i scu rso ' que o au to r d i scu te no

Capitulo 7 desta obra. Adolaram-se o ma scu l ino e o f e m i n i n o , em

subs t i t u i gao ao f e m i n i n o generico usado pelo au t o r . b u s c a n d o t'a-

c i l i tar a l e i tu ra , se m p re jud ica r a d i m e n s a o cri t ica da obra .

Izabel M a g a l h a e s

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A g r a d e c i m e n t o s

O ar t igo de jorna l a pagiua 139 foi reproduzido co m permissao do

Th e Sun. Agradego Ji Eclitora da Universidade de Cambr idge e ao

d ou t o r S . Levinson a permissao para usar a f igura a pagina 204, a

U ni v er s i d ad e d e Lanc as t e r por te r p e r m i t i d o a reproduce do t ex t o

as paginas 261-262 e a "MGN Limited", que autorizou a rep rodu-

cjio d o a r t i go a pag i na 145-

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Prefacio

A ide ia de escrever este l ivro surg iu n as discussoes co m u m

g r u p o d e colegas da Unive r s idade de Lancaster sobre a anal i se d e

discurso corao um m e t o d o n a pesquisa social , par t icularniente co m

o s sociologos P aul Baggule y , Sco t t Lash, Celia L u r y e M ick

Di l lon , do De par t ame n to d e Poli t ica, e Susan Condor , do De par -

t a m e n t o de Psicologia. T anibem foram beuef icos o apoio e o e n t u -

siasmo de colegas e a lunos de Linguistica, priucipalmente Romy

Clark, R oz Ivanic, Hi lary Janks, Stef Slembrouk. e M ary Talbo t .

M ary Talbo t t a m b e m forne ce u o exemplo d e n a r r a t i v a conversa-

cional do Capftulo 5. Agrade go a Gu nth e r Kre ss e J oh n Th ompson

por t e re m l ido e come utado u m a versao anter ior do l ivro. F i na l -

mente , l ive m u i t o apoio e pac i enc i a d e V o n n y , S i m o n e M a t t h e w

d u r a n t e o processo de produgao do l ivro.

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I n t r o d u ^ a o "

Hoje , o s i nd i v f d uos que t r aba lh ara em um a va r i e dade de d i s -

cipl inas come§am a reconhecer os modos como as mudanc^as n o

uso l ingiiistico estao l i gadas a processes socials e cul tu ra i s raais

a m p l o s e, conseqi ientemente , a cons ide rar a impor t anc i a do uso da

anal ise l inguis t ica como u m me todo para e s tudar a m u d a n g a social .

M as a i n d a n a o existe um me todo de anal ise l inguist ica que seja

t an to t e or icame n te ade quado como viavel na pra t i ca . M e u ob je t ivo

pr inc ipa l neste l ivro e, portanto, desenvolver um a abordage m de

analise lingiiistica qu e possa contribuir para preencher essa lacuna—uma abordage m que se ra uti l par t i c u l a r ment e para i nve s t i gar a

mudanc , a n a l i n g u a g e m e q u e sera litil em e s tudos d e m u d a i i g a

social e cul tu ra l .

P ara a t i ng i r isso, e necessario r eun i r metodos para ana l i sar a

l inguagem desenvolvidos ua l inguist ica e nos estudos de l i ngua-

g e m c o m o pe nsame n to soc ia l e poli t ico re levante , para desenvol-

ve r uma t e or i a soc ia l da l i nguag e m ade qu ada . En t re os pr ime i ros ,

incluo t rabalhos em varies ramos da lingiiistica (vocabulario , se-

m a n t i c a , g r a m a t i c a ) , n a pragmat ica e, ac ima de t udo , n a ' ana l i se de

discurso', q ue fo ram de se nvolv idos n os i i l t imos anos pr i nc ipa l -mente por l inguis tas (os varios se n t idos de 'discurso' e ' a na J i s e de

discurso' sao discut idos r e s u m i d a m e n t e ) ; e i nc luo enlre os iiltimos

os t rabalhos de Anton io Gramsc i , Loui s Althusser, M ich e l Fou-

caul t , J i i rgen Habermas e Anth on y G idde ns (ve j a r e fere nc ias) . Tal

sintese h a m u i t o d e v e r i a te r sido f e i t a , m a s h a v a r i o s f a t o r e s

q ue tern d i f icul tado su a real izagao sat i sfator ia a te o mome n lo . Um

e o i s o l a m e n t o d os estudos l ingi i ist icos d e o u t r a s ciencias socia ls

e ainda a dominac,ao da l ingufs t ica p o r p a r a d i g m a s fo rma l i s t a s e

Tr adui ; ao de Izabel Magalhaes.

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20 Norman F a i r c l o u gh

cognitivos. Dois out ros fatores sao a fal ta de inleresse pe la l i n g u a -

g e m p o r p a r t e de out r as c i enc ias sociais e uma tendei icia de consi-

de rar a l i nguage m t r anspa r en t e : e n q u a n t o d a d os l ingi i is t icos , como

e n t rev i s las , sao am plam e n te usados , h a um a tendeiicia e m a c r e d i t a r

q n e o con te udo soc ia l de t a i s dados pode se r l ido se m atencao a

propria l inguagem . Tais posicoes e atitudes estao m u d a n d o agora. Osl imites entre as ciencias sociais estao enf raquecendo, e uma m a j o r

diversidade de teor ia e pra t i ca vein se desenvolvendo n a s d i sc i p l i -

nas . Tais mudancas tem-se f e i t o ac ompanhar p o r u m a 'v i rada l i n -

giiist ica' na teor ia social , cujo r esu l t ad o e u m pape l m a i s c e n t r a l

con fe r ido a l i nguage m n os fenomenos sociais.

As t en t a t i v as anter iores de sintese entre os e s tudos l inguist icos

e a teor ia social t i v e r am, de ssa fo rma, sucesso l im i t ado . Por exem-

plo, um grupo de l ingi i istas n a Gra-Bre t anh a , n a decada de 1970,

de se nvolve u uma ' l ingt i is t ica cri t ica ' ao c o m b i n a r as teor ias e os

m e t o d o s de anal ise t e x tua l d a ' l ingi i is t ica sislemica' ( H a l l i d a y ,

1978) co m teor ias de i de o log ia . Algum te mpo an te s , n a Franca,Michel Pecheux e seus colegas come^aram a desenvolver um a

abordagem a anal ise de discurso que se baseou especialmente n o

t r a b a l h o d o l ingilista Zell ig Harr is e na r e e laboragao de um a te or i a

marx i s t a de ideologia fe i ta p o r Althusser. A m b a s a s t e n t a t i v a s

apre se n tam um desequil fbr io entre os e lemento s sociais e os l in -

gi i fst icos da sin tese , embora t e n h a m p o n t o s nega t ives e posit ives

comple me n tare s : nos primeiros , a ana l i se l i n gu f s t i c a e o t r a t a m e n t o

de t e x tos l i ngu i s t i cos e s tao be m de se nvolv idos , mas h a p ouca t e o-

ri a social , e os concei tos de 'ideologia' e 'poder' sa o u s a d o s co m

pouca d i scussao ou explicac.ao, e n q u a n t o n o t r a b a l h o de P e ch e ux ateor ia social e mais sof ist icada, mas a anal ise l ingi i ist ica e t r a ta da

e m te rmos semanticos m u i t o estreitos. Alera do mai s , ambas as

l en t a t i v as estao baseadas e m u m a visao estat ica da s relates d e

pode r , com e n fase e x age rada no pape l d e s e m p e n h a d o pelo a m o l -

d a m e n t o i d e o l o g i c o d o s tex tos l ingi i ist icos n a r e p r o d u c a o d a s

relac.6es de poder exislentes. Prestou-se p o u c a atenc_ao a l u ta e a

t r ansformacao nas r e l agoe s de pode r e ao pape l da l i nguage m ai .

Confer in-se enfase s e m e l h a n t e a descricao dos textos como pro-

du tos acabad os e de u-se pouca atenc_ao aos processos de p r o d u g a o

e interpretacao tex tual , ou as tensoes que caracterizam tais proces-

Discurso e m u d a n t p a s o c i a l 21

sos. Como conseqiiencia , essas t e n t a l ivas de sintese nao sao ade -

quadas para i nve s t i gar a l i nguage m d i n a m i c a m e n t e , em processos

d e m u d a n c a social e cu l tu ra l (ver Capi tulo 1 , para um a di scussao

mai s d e t a l had a dessas abordage ns e r e fe re nc ia a t e n t a t ivas ma i s

recentes d e apr imora- l as e desenvo lve- las).

A sintese que t e n ta re i real izar nes te livro estara c ent r ad a ,como a de P e ch e ux , na ' an a l i se de d iscu rso ' e no concei to de 'dis-

curso ' . Discurso e um concei to di f ici l , p r i nc ipa lme n te p o r q u e h a

t a n t a s def inicoes c onf l i t an t es e sobrepostas, formuladas de v ar i as

perspect ivas teor icas e discipl inares (ver va n Dijk, 1985; McDo-

nel l , 1986, sobre a lgum as dessas def inicoes). Na l ingi i ist ica, 'dis-

curso' e usado a lguma s vez e s co m referencia a a m o s t ra s a m p l i a d a s

de dialogo falado, em contraste com ' textos ' escritos. Nesse sentido,

' ana l i se t e x tua l ' e ' ana l i se de d iscu rso ' n a o p a r t i l h a m a l im i tac/io

t radic ional da analise lingiiistica a frases ou a unidades gramat icais

menores; ao contrario, focafizam as propr iedades organizacionais de

nivel super ior do dialogo (por exemplo , t o m a d a de tu rno , ou a e s-

t r n t n r a de abe r tu ras e f e ch ame n tos conversac iona is ) ou de textos

escr i tos (por exemplo, a e s t ru tu ra d e u m a reportagem de cr ime em

u m j o rna l ) . M ais comume n te , en t r e t an t o , 'discurso' e usado na l i n -

giiist ica co m referencia a a m o s t r a s a m p l i a d a s de l i n g u a g e m f a l a da

ou escr i ta. Alem de preservar a enfase em aspe ctos o rgan iz ac ion a i s

d e m'vel super ior , esse sent ido de ' d i scurso ' e n fa t i z a a i n t e r ac ao

ent r e f a l a n te e receptor(a) ou ent re escr i tor(a) e le i tor(a); p o r l a n t o ,

e n t re processos de producao e in t e rpre t acao d a fa la e da escr i ta,

como t ambe m o con te x to s i t uac i ona l do uso l ingi i i s t ico . Texto' e

considerado a q u i como um a d i m e n s a o d o discurso: o ' p r o d n t o 'escr i to o u falad o do processo de pro duca o textua l . (Sobre essa

concepc,ao de discurso como ' tex to e i n te racao ' , ve r W i d d o w s o n ,

1979.) Fina lmente , ' d i scurso ' t ambe m e usado e m re lacao a di fe-

r e n te s t i pos de l i nguage m usada e m d i f e re n le s l i pos d e s i t uagao

social (por e x e mplo , 'd iscurso d e j o r n a l ' , 'd iscurso pub l i c i t a r i o ' ,

'd iscurso de sala de a u l a ' , 'd iscurso de consu l t as medicas ' ) .P or ou t ro l ado , 'discurso' e a m p l a m e n t e u s a d o n a t e or ia e n a

anal ise social , como, p or e x e mplo , n o t r aba lh o de M ich e l Fou-

ca u l t , com re fe re nc ia aos d i f e re n le s modos de e s t ru l u ra g a o da s

areas de conhecimento e pratica social. Dessa fo rma, o discurso da

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22 Norman Fairclough

'ciencia medica' e a t u a l m e n t e o d o m i n a n t e n a prat ica de ass is ten-

ci a me dica , e mbora contraste co m var ios discursos holfst icos ' a l -

ternativos' (por exempio, os da h ome opat i a e os da a c u p u n t u r a ) ,

como t ambe m c o m o s discursos popu la res 'folcloricos'. Nesse

sent ido, os discursos sa o mani fe s t ados n os m o d o s par l i cu lare s de

uso da l i nguage m e de outras t 'ormas simbol icas, tais como i m a -g e n s vi sua i s (ver Th ompson , 1990). Os discursos nao apenas refletem

on representam ent idades e relagoes sociais, eles as constroem ou as

'consti tuem'; diferentes discursos constituem entidades-chave (sejam

elas a ' doenca m e n t a l ' , a ' c i d a d a n i a ' ou o Te t r ame n to ' ) de dife-

rentes modos e posicionam as pessoas de diversas m a n e i r a s c o m o

sujei tos sociais (por exempio, como medicos ou pac ie n te s ) , e sao

esses efe i tos sociais do d i scu rso que sao f o c a l i z a d o s n a a n a l i s e

de discurso. Outro foco impor lan te localiza-se n a mudane,a histo-

rical como diferentes discursos se combinam em cond igoes sociaispar t iculares para produzir um novo e complexo discurso. U m

exempio contemporaneo e a construgao social da doenga Aids, emque varios discursos (como os discursos da venereologia , da ' i n v a -

sao' cul tu ra l por 'es trangeiros ' , da poluic.ao) sao combiuados p a r a

c o n s t i t u i r u m n o v o d i s c u r s o , o d a Aids. Esse s e n t i d o m a i s so -

cioteor ico de discurso sera discut ido adiante n o Capi tu lo 2 .

M i n h a tentat iva de re un i r a anal ise linguistica e a t e or i a social

esta cenlrada n u m a combinagao desse sent ido mais socioteor ico de

'discurso' com o sentido de 'texto e interagao1

n a anal ise de discurso

orientada lingiiisticamente. Esse conceito de discurso e aniilise de dis-

curso e t r i d ime ns iona l . Q u a l q u e r ' evento" di scur s ivo ( is to e, q u a l -

quer exempio de discurso) e cons ide rado como s imul t ane ame n te

um texto, um exempio d e prat ica discursiva. e um e x e mpio d e pra-

tica social. A d i m e n s a o d o 'texto' cuida da ana l i se l inguis t ics d e

textos. A dime nsao da ' prat ica d i scur s iva ' , como ' interac.ao', na

concepcjio 'texto e interagao' de discurso, especifica a na t u r eza do s

processes de producao e i n t e rpre t acao t e x tua l - por exempio, que

t ipos de discurso (incluindo 'discursos' n o sent ido mais socioteo-

rico) sa o der ivados e como se combinam. A dime nsao de ' prat ica

social' cuida de que s toe s de in teresse n a analise social, tais c o m o

as c i rcuns t anc i as ins t i tuc iomi is e or gan i zac i ona i s do e ve n to d i scur -

sivo e como elas m o l d a m a na ture z a da pra t i ca d i scur s iva e os

efe i tos const i tut ivos/construt ivos refer idos an t e r i o r n i en t e .

Discurso e mudanca social 23

Acrescentaria q u e ' texto7 e usado neste l ivro e m u m se n t ido

que e bas t an te f am i l i a r na li ngu i s t i ca , mas nao a lh ure s , para re fe r i r

a qualque r produto escrito ou falado, de ta l m a n e i r a que a t ranscr i -

ca o de uma entrevista o u couversa, p o r exempio, seria d e n o m i m t d a

um 'texto'. A enfase neste livro e sobre a l i nguage m e, por t an to ,

textos l ingi i is t icos . mas e mu i to apropr i ado e s t e nde r a n o g a o d ediscurso a o u t r a s formas s imbolicas , tais como i m a g e n s vi sua i s e

textos que sao combinagoes de p a l a v r a s e image ns - por e x e mpio ,

na publicidade (ver Hodge e Kress, 1988). Usarei o t e rmo 'd iscurso '

sem um art igo para refer i r ao uso l ingi i is t ico considerado d o m o d o

t r i d i mens i ona l ci tado au t e r i o r ment e (por exempio. "a pos igao do s

sujeitos sociais e real izada n o discurso"), e refer i r -me-ei a ' t ipos

de discurso' ao s q u a i s as pessoas recorrem q u a n d o se envolvem n o

discurso, signif icando couvencoes como generos de discurso e es-

tilos. No Capi tulo 4, t am be m come garei a usar o termo ' d i scu rso '

co m u m ar t igo ( ' u m d iscu rso ' , 'os discursos'. 'o discurso d a biolo-

gia') n o se n t ido socioteorico para um a classe par t i cu lar de t i pos dediscurso ou convengoes . Tambem refer i r -me-ei as ' p ra t icas di scur -

sivas' d e ins t i tu igoes, organizagoes o u sociedades p a r t i c u l a r e s (em

contraste com 'prat ica di scur s iva ' como uma d ime nsao ana l i t i ca-

me n te dis t inta d o discurso).

A j us t i f i ca t iva p ara o couceito m u l t i d i m e n s i o n a l de discurso e

para a anal ise de discurso d e l i nead a an te r io rme n te e ap r esen t ad a

nos capitulos de 1 a 3. O Ca p i tu l o J e um estudo de abordage ns da

analise de discurso que sao or i en t ad as l ingi i ist icamente , isto e, elasfocal izam os textos e a anal ise textua l . Argu men tare i que essas

abordage ns dao a t engao insuf ic iente a aspectos sociais i m p o r t a n t e s

do discurso, para os qua i s e preciso recorrer a teor ia social . No

Capi tu lo 2 , c o m e n t o tais perspectives sociais do discurso n o t ra-

bal l io de Michel Foucaul t , um teor ico social q u e tern s ido uma i n -

f luencia de destaque no desenvolvirnento da anal ise de discurso

como forma d e anal ise social . No Capi tu lo 2 , a rgume n to a i n d a q u e

a mai o r a t engao aos textos e a anal ise l inguist ica aument a r i a o va-

lor da anal ise d e discurso como me todo n a pe squ i sa social . E m

se guida , no Capi tu lo 3 , apre se n to m i n h a a b o r d a g e m m u l t i d i -

me nsional como si'ntese das concepc_6es de discurso com orientagao

social e linguistica, av anc and o para o que d e n o m i n o ' teoria social do

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Norrnan Fairclough

discurso'. Essa abordagem e e laborada e apl icada a v ar i as especies

de discurso em capi tulos poster iores do l i v r o .

Suger i no in icio desta I n t r od ugao q u e a s m u d a n g a s n o u s o l i n -

giiistico sa o uma par t e i mpor t au t e d e m u d a n g a s s o ci a is e c u l t u r a i s

mai s amplas . Isso ocorre cada ve z m a i s ; en t r e t an t o , a a f i r magao

precisa de mais explicagao e j us t i f ica t iva . As a f i r magoes sobre aimportancia social da l i nguage m nao sao novas . A teor ia social em

decadas recentes at r ibui a l i nguage m um lugar m ai s ce n t r a l na vida

social (ver Thompson, 1984). Primeiro, na teoria marxis ta , G r a m s c i

(1971) e Althusser (1971) enfat izam o signif icado da i de o log ia n a

r e producao soc ia l mode rna , e out ros como P e ch e ux (1982) ident i -

f icam o d i scur so como a fo rma mate r i a l l inguis t ica p r e e m i n e n t e da

ideologia (ver. no Capitulo 1, o item "Pecheux"; entendo por ' repro-

d u g a o ' o s mecanismos por me io dos qua i s as soc ie dade s m a n t e m

suas estruturas sociais e relagoes sociais ao l ongo do t e mpo) . Se-

gundo, Foucault (1979) ressalta a importancia das tecnologias em

formas modernas de poder e esta claro que estas sao e x e mp l i f ica -

das ce n t r a lme n te n a l inguagem (ver , n o C a p i t u l o 2 , o i tem "D a a r-

queologia a genealogia") . Te rce i ro , H abe rmas (1984) foca l iza a

co lon izagao do ' m u n d o d a vida' pelos ' s i stema s ' da e conomia e do

Estado , q ue considera em tennos de um de s locame n to de usos

' comunica t ivos ' da l i uguagem - or ie n t ados para pr od uz i r a c o m -

preensao — por usos 'estrategicos' da l i nguage m ~ or ie n t ados para

o sucesso, par a conse gui r que as pessoas real izem coisas. A eleva-

gao da l inguagem e do discurso na esfera social ref le te-se de m a-

ne i r a var i ada e m t r aba lh os , por exemplo , sobre as re lagoes de

genero (Sp end er, 1980) ou a mi'dia (va n Dijk , 1985b), q ue focal i -z am a l i n guag e m, e na pe squ i sa sociologica q ue t o m a c o m o d a d o s

a conversagao (Atk inson e H e r i t age , 1984).

0 que esta aberto ao debate e se ta l teoria e pesquisa reconhe-

ce m a imp or t anc i a que a l i nguage m se mp re t e ve na v ida soc ia l,

mas que pre v iame n te nao foi suf icientemente reconhecicla, ou real-

m e n t e ref letem um de s t aque na imp or t an c i a soci a l da l i ngu age m .

Embora ambos os casos possam ser verdadeiros, acredito que te n ha

havido mud anga s ignif ica t iva n o f unc i onament o social da l i n g u a g e m ,

al teragao refletida n a c ent r a l i zagao da l i n g u a g e m n as pr i nc i pa l s

m u d a n g a s sociais ocorr idas nas ul t imas decadas. M u i t a s dessas

Discurso e mudanfa social 25

m u d a n g a s sociais n ao e nvolve m ape nas a l i n g u a g e m , mas sao

const i tui 'das de m o d o s ign i f i ca t ivo por m u d a n g a s nas pra t i cas de

l i nguage m; e talvez se ja uma i nd icagao da imp or t anc i a c rescen te

d a l i n g u a g e m n a m u d a n g a social e cul tural que (entat ivas de defi-

nir a diregao da mu dan ga cada ve z mai s i nc luam t en t a t i v as d e m u -

da r as prat icas de l i nguage m . Darei a lguns exemplos.Primeiro, em muitos paises h o u v e recentemente um movime n to

de extensao do mercado a novas areas da vida social: setores como a

educagao, a assis tencia me dica e as artes f o r am obr igados a rees-

t ruturar e a reconceituar suas ai ividades como produ gao e marketing

de be ns para consumidores (Urry, 1987). Tais m u d a n g a s afe tam

p r o f u n d a m e n t e as a t iv idade s . as re lagoes sociais e as i de n t idade s

sociais e profiss ionais das pessoas q ue t r aba l ham em tais setores.

Grande par t e de sen impac to d i z r espe i to a mu dan gas nas pr a t i cas

discursivas, isto e, m u d a n g a s n a l i n g u a g e m . Po r e x e mplo , na e d u -

cagao as pessoas encont ram-se so b pressao p a r a se envolver co m

novas a t iv idade s que sao de f in idas e m g rande par t e por novas p ra-

t icas discursivas (como marketing) e para ado tar novas pra t i cas

discursivas em ai ividades existentes (como o eiisino). Isso inclui

'relexicalizagoes' de a t iv idade s e re lagoes - por e x e mplo , a relexi-

c a l i zagao dos apre nd iz e s como ' consumidores ' ou 'clientes', de

cursos como 'pacotes' ou 'produtos' . Inclui tambem um a reestrutura-

gao mai s sut i l das prat icas discursivas da e ducagao - os t i pos de

discurso (generos, estilos, etc.) que af sao u s a d o s - e a ' co lon iza -

gao ' da e ducagao p or t i pos de discurso exter iores, i nc l u i nd o os da

publ i c idade , os da ad mi n i s t r agao e os da t e r ap i a .

Alem disso, a industria esta passando por m udangas , no se n tidodo que e d e n o m i n a d o p r o d u g a o ' pos - fo rd iana ' (Baggu ley e Lash ,

1988: Bagguley, 1990), em que os ope rar ios n ao mais l u n c i o n a m

como indivi'duos que desempenham rotinas repetitivas em um pro-

cesso de produgao invar iante, mas como grupos em re lagao flexivel

com um processo acelerado de m u d a n g a . Acrescente-se que as re-

l agoe s t r ad ic iona i s empregado- f i rma sao cons ide radas pe las admi -

nis tragoes como d is lunciona is nesse contexto; p o r t a n t o , e las teni

t e n t ado t r ans f o r mar a cul tu ra do local de t r aba l ho ~ por e x e mplo ,

ao e s t abe le cer i n s t i tu igoe s que pos ic ionam os e mpre gados e m um a

re lagao mai s par t i c ipa t iva com a gerencia. como nos ' c f rculos de

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qua l i d ad e* . Descrever tais m u d a n g a s como ' c u l t u r a i s ' n a o e a p e n a s

re tor ica: o obje t ivo e estabelecer novos valores cul turais, operar ios

que sa o 'empreendedores ' , au t omo t i v ad os e , como Rose (inedi to)

ch ama. ' au tod i r e c iouados ' . Ta i s mudangas n a organ iz acao e na

c u l t u r a sao, de modo significative, mud ancas nas prat icas discursivas.

O uso lingiiistico esta a s s u m i n d o m a i o r i mpor t anc i a como me io dep r o d u g a o e c ont r o l e social no local de t raba lho. Mais especif ica-

mente , espera-se agora que os operar ios se envo lvam em in te racao

face a face com o grupo , como f a l an te s e ouvin te s . Quase todas as

describes d e e mpre go n o t r aba lh o ' co la r inho b ranco ' , mesn io n o s

niveis mais inferiores, enfatizam agora as ha bi l idades comuii icai ivas.

O resultado e que as i de n t idade s sociais das pessoas c o m o t r a b a -

Ihadores passam a se r de f i n idas e m te rmos que t r ad ic iona lme n te

n ao tern side cons ide rados como ocupaciona is , mas pe r le nce n te s a

e sfe ra da v ida pr ivada . Um aspecto s u r p r e e n d e n t e d e m u d a n c a s

desse t i po e que sao t ransnacionais. Novos estilos de ad mi n i s t r agao

e m e c a n i s m o s como os 'circulos de q u a l i d a d e ' sa o i m p o r t a d o s depafses economicamente m a i s bem-suced idos , como o J apao , de ta l

m o d o que as m u d a n c a s n as prat icas discursivas dos locais de t r a -

ba lh o sao de cara te r parc i a lme n te i n t e r nac i ona l . A n o v a o r d e m de

discurso global e caracter izada, desse modo. por t e nsoe s gener a l i -

zadas entre prat icas i n t e r n a d o n a i s i m p o r t a d a s e t r ad i goes locais.

H a m u i t o s ou t ros e x e mplos de mudanca: m u d a n g a s n as re l a -

goes entre medicos e pacientes, entre polf t icos e o publico, e n t r e

mu lh e re s e h ome n s nos loca i s de tr aba lh o e na fami'lia, t odas e t as

parc i a lme n te cons t i t u i ' das por novas pra t i cas d i scur s ivas . Alem

disso. o de s t aque c a d a vez m a i o r d o discurso n as t r ansformagoe ssociais re laciona-se , como suger i a n t e r i o r m e n t e , c o m u m a preocu-

pagao para con t ro lar o d i scur so : causar m u d a n c a s n a s p r a t i c a s

d i scur s ivas com o p a r te d a e n g e n h a r i a d a mudanca soc ia l e cu l tu ra l .

Estamos observando uma ' tecnologizacao do discurso' (Fairclougb,

1990b), e m q u e tecnologias discursivas. ur n t i po d e ' l ecno log ias d e

governo' (Rose e M i l l e r , 1989), sa o s i s t e mal i came n te ap l i cadas em

um a var i e dadad e de organ iz acoe s por t ecno logos p rof i s s iona i s q u e

pe squ i sam, r e de se nh am e t'ornecem t r e i n a m e n t o e m pra t i cas d i s -

cursivas. Um exemplo inic ial de t a l de se nvolv ime n to sao os ps i -

cologos sociais envolvidos no ' t re inamen to de hab i l idades ' (ver

Discurso e mudanca social 27

Argyle , 1978). Tecnologias discursivas, como a ent revis ta e a t e r a-

p ia , sao t r a t adas como tecnicas ou h a bi l i dad e s l i v re s de contex to ,

que poclem se r apl icadas em varies domi 'n ios di ferenciados. E pra-

t icas inst i tucionais ve m se ndo amplame n te su j e i t as a s imulagao :

par t icularmeute , as prat icas discursivas conversac iona is que t r ad i -

c iona lme n te pertencem a e sfe ra pr iva da sao s imulad as de man e i r asistemat ica nas organizagoes. (Para discussao adicional da tecno-

logizacao discursiva, ver , n o Capi tu lo 7, o item "Tecnologizagao".)

Desse m o d o , m eu obje t ivo e de se nvolve r um a abordage m para

a anal ise de discurso q ue poder ia se r usada como u m m e t o d o d e n -

t r e ou t ros para i nve s t i gar mudan cas sociais como as refer idas ante-

r iormente . Para que um metodo de anal ise de discurso se ja u t i l em

tais contextos, ler ia de preencher a lgumas cond igoes m i n i m a s .

Comenta re i qua t ro de ssas condigoes e, ao faze- lo , pre te ndo de t a-

Ihar um pouco mai s o e sque ma da abordagem q ue apre se n te i an te -

r iormente . Pr imeiro, ser ia necessario um me todo para ana l i se

mul t i d i mens i ona l . Minha abordagem tr idimensional permite a va l i a r

as re lagoes entre m u d a n g a discursiva e social e r e l ac ionar s is tema-

t i came n te propr i e dade s de t a lh adas de textos as p r o p r i e d a d e s so -

ciais de eventos d i scur s ivos como ins tancias de pra t i ca social.

Segundo , ser ia necessar io um metodo de anal ise m u l t i f u n c i o -

na l . As prat icas discursivas em m u d a n g a c ont r i buem p a r a mod i f i -

ca r o conhecimento (a t e mesmo as c r engas e o senso c o m u m ) , as

relagoes sociais e as i de n t idade s soc i a is ; e necess i t amos de uma

concepgao de discurso e de um me todo de anal ise que contemplem

a re lagao entre essas t res areas. U m b o m p o n t o de par t i da e uma

teoria sistemica da l inguagem (Hall iday, 1978) que considera al inguagem como mul t i func iona l e cons ide ra que os tex tos s i m u l t a -

neamente representam a real idade , ordenam as re lagoes sociais e

estabelecem identidades. Essa teoria de l i nguage m pode te r apl i ca-

goes l i te is quand o combinada a enfase nas propr iedades socialmente

construt ivas do discurso n as abordagens socioteoricas do discurso,

como a de F ouc au l t .

Terceiro, se r i a ne ce ssar io u m m e t o d o d e a n a l i s e h i s l o r i c a .

A anal ise de discurso dev er ia focal izar a es t r u t u r agao ou os pro-

cesses ' a r t i cu la to r ios ' na c ons t r ugao de textos, e na const i tuicao a

longo prazo de 'ordens de discurso' (isto e, configuragoes totals tie

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prat icas discursivas em institutes par t i cu lare s , ou mesmo em

t oda um a sociedade). No ni v e l de tex tos, considero esses processos

em te rmos de ' in ter textual idade ' (ver , n o C a p i t u l o 3, o i tem "Prat i -

ca discursiva" e o Capj tu lo 4): os tex tos sa o c o n s t r m d o s p or m e i o

da ar t iculagao de outros textos de m o d o s par t iculares, modos que

dependem de circunstaucias sociais e m u d a m co m elas. No n ive lde orde ns de discurso, as re lagoes eiitre prat icas discursivas e li -

mites entre estas em uma inst i tuicao ou na sociedade mais a m p l a

sa o modif icadas segundo as diregoes seguidas pela muda ng a social.

Quarto, ser ia necessario u m m e t o d o crf t ico. T i p i c a m e n t e , as

re lagoes entre a m ud an ga discursiva, social e cu l tu ra l n a o sa o

t r a n s p a r e n t e s para as pe ssoas e n v o l v i d a s . N e m t a r a p o u c o o e a

t e cno log iz agao do d i scur so . 'Critico' implica mos t r a r conexoes e

causas q u e estao ocul t as; impl i ca t amb e m intervene, ao ~ por exem-

plo, fo rne ce ndo recursos p o r meio d a m u d a n g a p a r a aque l es q u e

possam encontrar-se em desvantagem. Nesse sent ido, e i m p o r t a n t e

e v i t a r uma image m da m u d a n c a discursiva como um processo u n i -l inear , de c i ma para ba ix o : h a lu ta n a esr ruturagao de textos e or-

dens d e discurso, e as pessoas podem resist i r as m u d a n c a s que vein

de c ima ou delas se a p r o p r i a r , c om o t a m b e m s i m p J e s m e n t e as se-

gui r (ver , n o Ca p i tu l o 3, o i tem "Discurso" e o Capi tu lo 7) .

Para conclu ir esta In i rodu cao, apresentare i uma breve discussao

do t r a l ame n to dado a mudanga d i scur s iva n os capi tu los de 3 a 7.

O Capi tu lo 3 apre se n ta m i n h a smtese de concepgoes de discurso

social e l ingi i ist icamente or i en t ad as . M i n h a f o r mu l agao d a a n a l i s e

n a d i m e n s a o d a pra t i ca d i scur s iva e s t a ce n t r ad a n o conceito d e i n -

t e r t ex t ua l i d ad e . En t r e t an t o , m i n h a f o r m u l a g a o d a anal i se na d i -mensao da prat ica social esta cen trad a n os conceitos de ideologia e

essencialmente de hegemonia, no sent ido de um modo de dominagao

que se base ia em a l i angas , n a i nc o r po r agao de g rupos s u b o r d i n a d o s

e n a geragao de c onsen t i ment o . As h e g e m o n i a s em o rgan izacoes e

instituigoes particulares, e no nivel societario, sa o produzidas, repro-

duzidas, contestadas e t ransformadas no discurso. Alem disso, pocle

ser considerada a est ruturagao de pra t i cas d i scur s ivas e m modos

par t i cu lare s nas o rde ns de d i scurso , nas qu a i s se n a t u r a l i z e e g a n h a

ampla ace it agao , como uma forma de h e ge mon ia (espec i f i c ament e

cultural). E a combinagao dos conceitos de in ter textual idade e

Discurso e niudanca social 29

h e ge mon ia que t o rna a teoria d o Capi tu lo 3 ut i l para invest igar a

mudanga d i scur s iva e m re lagao a mudanga social e cul tural . A se-

legao de tex tos previos e de t i pos de tex to que sao ar t i cu lados em

uma dada i n s t anc i a (um 'evento discursivo' par t icular) e a m a n e i r a

como sa o ar t i cu lados de pe nde m de como o evento discursivo se

s i l ua em re lagao as h e ge mon ias e as l u t a s hegemonicas - se, por

exemplo, el e contesta prat icas e re lagoes hegemonicas existentes

ou, ao contrario , toma-as como dadas. A abordage m da m u d a n g a

d i scur s iva apre se n tada n o Capi tulo 3 combiua uma concepgao de

tex to e prat ica discursiva q ue der iva do concei to de in ter tex tual i -

d a d e de Bakh t i n vi a Kristeva (Bakht in , 1981 e 1986; Kristeva,

1986a), e uma concepgao de pode r que der iva da teor ia de hege-

m o n i a de Gramsci (Gramsc i , 1971; Buci -Glucksmann , 1980).

A t e or ia do Capi tu lo 3 e e laborada n os capi tu los q ue se se-

guem. O Capitulo 4 toma o conceito de intertextualidade em te rmos

d e u m a dis t ingao e n t re i n t e r t e x tua l idade ' m a n i f e s t a ' (a preseuga

explici ta d e outros textos e m u m texto) e ' i n te rd i scu rs iv idade ' (acons t i t u igao de um te xto com base n u m a conf iguragao de t i pos de

texto ou convengoes discursivas). Sugiro um modo de di ferenciar

'generos d e discurso', 'discursos', 'estilos' e 'tipos d e a t i v i d a d e '

como convengoes discursivas dist in tas. O Capi tu lo 4 t ambe m d i s -

cu te a i n t e r t e x tua l idade em re lagao a dis t r ibuigao social de textos e

as t r ansformagoe s que sof rem, e em r e l agao a cons t rugao d a i d e n -

t idade social no discurso. Nos capi tulos 5 e 6 , a enfase e na anal ise

textual . Esses capi tulos e x a m i n a m aspeclos do v oc abu l a r i o , da

gramat ica, da coesao, da estrutura textual , da forga e da coerencia

textual (sobre esses te rmos, ver , n o Capi tu lo 3, o item "Discursocomo texto"). Tambem desenvolvem um a conce pgao mul t i f unc i o -

n a l da anal ise de discurso: o Capi tulo 5 versa p r i n c i p a l m e n t e sobre

a fung a o do discurso na const i tuigao de ident idades sociais e re la-

goes sociais, enquanto o foco do Capi tulo 6 e sobre cons t i t u igao ,

r e p r o d u g a o e m u d a n g a d o s s i s temas d e c o n h e c i m e n t o e c r e n g a

n o discurso. No Capi tulo 7, a enfase e sobre a dime nsao de p r a t i c a

social d o discurso, e e spe c ia lme n te sobre d e t e r m i n a d a s t e n d e n -

cias a m p l a s d e m u d a n g a q u e a f e t a m o r d e n s d e d i s c u r s o c o n l e m -

p o r a n e a s ( ' democra t i zagao ' , ' comodi f i cagao ' e ' t ecno log izacao '

do discurso) e sua relagao com m u d a n g a s sociais e culturais.

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30 Norman Fairclough

As analises de m u d a n g a n os capi tu los de 4 a 7 i l us t r a m um a var ie-

dade d e c a m p o s e institutes, co m anal i se d e t a l had a d e amost r as

de discurso. Um a que s lao e x a m i n a d a n o Capi tu lo 4 e o modo

como os meios de c o m u n i c a c a o de massa estao modi i icando o li -

mite entre as est'eras publicas e p r i v a d a s da vida social. Isso e nvol -

ve nao ap e nas que s toe s l igada s ao con te udo d o d i scurso d a m id ia ,

ta l como o t r a t am e n to de aspe c tos da v ida pr ivada como notfcia

(publ i ca) , mas t a m b e m se mani f es t a i n te r te x tua fme n te e m u m a

mescla de prat icas discursivas da esfera pr ivada com aquelas da

e sfe ra pub l i ca , r e su l t and o no use por a lguns se tore s da m id ia de

um a versao e s te re o t i pada da fa la popular . Uma out ra questao e a

pressao n as i ndus l r i as de servicos para t r a t a r os services como

be ns e os cl ientes como consumidores , que se ev i d enc i a n a mescla

das p ra t i cas d i scur s ivas de pres tacao d e in formagoe s e de publ ici-

dade . No Ca pi tu lo 5 , d is cufo mudanc.as nas i d en t i d ad es sociais de

profiss ionais e seus clienles e n a nature z a da interac,ao e n t r e eles,

focal izando medicos e pacientes. Sugi ro q u e a s m u d a n c a s n a si d e n t i d a d e s e nas relac.6es de medicos e p a c i e n t e s se r e a l i z e m

d iscu rs ivamente n a mudanc.a de consu l t as me dicas f o r ma t s p a r a

consu l t as mai s i n f o r ma i s . que pode m incorporar as pr a t i ca s d i scur -

sivas da (e r ap i a aque las da med ic ina mais t r ad i t i ona l . O Capi tu lo 6

i nc l u i amostras de dois l ivre tos de assis tencia pre -na t a l que e x e m-

pl i f icam representagoes opos t as de processes pre -na t a i s . Prossigo

d iscu t indo a e nge nh ar i a da m u da nc_a se man t i ca como par t e de uma

tentativa de realizac.ao de m u d a n g a cultural , com re fe renda especf-

fica as f a l a s de um min i s t ro do governo Thatcher sobre o tema da

' cul tura empresar ial ' . O Capi tu lo 7 retoma o t e ma da comodif icac ,aoe a mescla de prestacao de i n f o r mac ao e publ i c idade , agora co m

r e fe re nda a e duca^ao , u s a n d o o exemplo de um prospecto d e u n i -

versidade .

O obje t ivo deste l ivro e pe r suad i r os l e i t o re s de que a a n a l i s e

de discurso e um t i po de an a l i se in t e re ssan le de fazer e prove-los

co m o s r e cursos pa ra reah'zfi- la, 0 ul t imo capi tu lo d o l i v ro , o Ca-

p i t u l o 8, re i ine os a s s u n t o s i n t r o d u z i d o s n os c a p i t u l o s de 3 a 7 na

f o r ma de um c o n j u n t o de inst ruc.oes para fazer a na l i s e de discurso.

Tais ins trucoes referem-se a cole ta, a transcribe e a codificacao de

textos, ao uso de resultados, como tambem a analise.

C a p f t u l o 1

A b o r d a g e n s d a a n a l i s e d e discurso"

M e n obje t ivo , neste capftulo, e descrever bre ve me ute a l g u m a s

abordagens recentes e a t u a i s p a r a a aualise de di scur so , como

contex to e base para a e laboragao de m i n h a propr i a abordage m nos

capi tu los de 3 a 8. A anal i se de discurso e agora um a area de e s tu-

do mu i lo d ive r s if i cada , com uma var i e dade de abordage ns e m inn

g r u p o d e d isc ip l inas (exemplos de ssa var i e dade e s t ao r ep r esen t a -

dos em van Di jk , 1985a). A pe squ i sa de abordage ns ne s te capi tu lo

e, portanto, necessar iamente se le t iva. Selecionei abordagens que ,

de a ] g u m m o d o , c o m b i n a m a a n a l i s e d e t a l had a d e tex tos l ingi ifs t i-

cos com uma or ientagao social para o discurso. Isso corresponde

ao m eu obje t ivo . e m capi tu los posteriores , de real izar uma combi-

nacao efe t iva e ut i l de ana l i se t e x tua l e ou t ros modos d e a n a l i s e

soc ia l . Tambe m confe ri um t r a t am e n to se le t ivo as abordage ns . f o -

ca l i z ando os aspectos q u e sa o m a i s p r o x i m o s as m i n h a s p r i o r id a -

de s neste l ivro.

As aborda ge ns i nve s t i gada s pod e m se r d iv id id as e m do i s gru -pos, segundo a n a t u r e z a de sua or i en t agao social para o discurso,

d i s t i ngu i nd o -se abordage ns ' nao-c r f t i cas ' e 'criticas'. T a l d i v i s a o

n a o e abso lu t a . As abordage ns c r i t i cas di ferem d as a b o r d a g e n s

nao-cri t icas n a o a p e n a s ua descricao das pra t i cas d i scur s ivas . ma s

t a m b e m ao mos l r a r em como o d i scur so e molda t lo po r r e l acoes de

p o d e r e i de o log ias e os efeitos cons t ru t ivos que o discurso exerce

sobre as i de n t idade s sociais, as relac_6es soc ia i s e os s i s t emas de

conh e c ime n to e crenca, n e n h u m d o s q u a i s e n o r m a l m e n t e a p a r e n te

T r a d u ^ a o d e Izabel M aga l l i aes .

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32 Norman Fairclough

par a os par t i c ipan te s do d i scur so . As abordage ns que classi f iquei

como bas icame n te nao-cr f t icas sao: os pressupostos para a descri-

gao do discurso de sa l a de a u l a , de Sinclai r e C oul t ha r d (1975); o

t r aba lh o e tnome todolog ico da 'ana l i se da conversac.ao'; o m o d e l o

de discurso terapeut ico de L a b o v e Fanshel (1977) ; e u m a a b o r d a -

ge m recente d a anal ise de discurso desenvolvida pe los psicologos

sociais P ot t e r e W e t h e r e l l (1987). A s a b o r d a g e n s cr i t icas que

i nc lu i sao : a ' l inguist ica critica', de Fowler e! al. (1979), e a a b o r -

dage m f r ance sa da ana l i se de d i scur so de se nvolv ida com base na

teor ia de ideologia de Althusser p or Pecheux (Pecheux, 1982).

Conclui-se o cap i tu lo com u m resumo de questoes-chave na a na l i -

se de discurso ret i radas dessa pesquisa, q ue servirao c o m o p o n t o

de par t i da para a apre se n tagao de mi nha p r op r i a a b o r d a g e m n o

Capi tu lo 3.

Sinclair e Coulthard

Sinc la i r e Cou l th ard (1975; ve r t ambe m Coul th ard , 1977) t i ve -

r a m o propos i to de e l aborar um s i s t e ma descritivo geral para a

anal ise de discurso, mas decidiram focal izar a sa!a de au la p o r t r a -

tar-se de uma s i t uagao fo rma l cu ja pra t i ca d i scur s iva e passfve l d e

se r gove rnada por regras claras. 0 sistema descr i t ivo esta baseado

e m un idad e s que se supoe este jam n a m e s m a r e l agao u m a s com as

ou t r as como un idade s n as fo rmas i n i c i a i s da g ramat i ca s is temica

(H al l i day , 1961): hit um a 'escala hie ra rqu ica ' de un idade s , com

un idade s h i e r a r qu i c ament e super iores f o r m a n d o - s e de un idade s do

ni v e l abaix o . Dessa fo rm a, na g ramat i ca um a f r ase e f o r mad a d e

oracoes, que sao f o r mad as de grupos, e assim p or d i an t e . Da me s-

m a fo rma, no d i scur so de sa la de au la , h a cinco u n i d a d e s d e h i e-

r a r q u i a de sce nde n te - au la . t r ansagao , ( roca , l ance , ato -, de ta l

m o d o q u e u m a a u l a e f o r m a d a d e transacts, que sao f o r m a d a s d e

trocas, e assim po r dia nte .

Sinclai r e C o u l t h a r d tern pouco a d iz e r sobre a ' a u l a ' , mas su-

g e r e m u m a est rutura c lara para a ' t r ansagao ' . T ransacoes consis-

te m de t rocas. Sao aber tas e fechadas por ' t rocas l imi le* q u e

consis tem m i n i m a m e n t e d e ' l ances es t r u t u r ad o r es ' co m o u t r o s l a n -

Discurso e mudanga social 33

ces ou se m eles. Po r exemplo, "Bern, ho j e imagine! que f a r i amos

tres testes" consiste de um l a n c e es t r u t u r ad o r ('bem') e um l ance

' foca l i z ador ' que i u f o r ma a t u r m a sobre o que sera a transac.ao.

Entre as t rocas l imi te ha , ge ra lme n te , uma se q i ie nc i a de t rocas ' i n -

fo rma t ivas ' , ' d i r e t ivas ' ou ' provocat ivas' , em que se real izam res-

pe c t ivame n te a f i rma t iva s , pedidos (ou cornandos ) e p e r g u n t a s ,

ge ra lme n te pe lo (a) professor(a) .

V a m o s e x a m i n a r a e s t ru tu ra de um t ipo de t roca, a t roca pro-

vocat iva. Este consiste t ipicamente de t res lances: ' in iciador ' ,

' resposta ' e ' r e to rno ' . Por exemplo:

Professor: V o e e po d e me clizer por que voce come toda essa

c o mi d a ?

Sim.

A l u no : Para f icar fo r te .

P: P a ra f icar for te . S im . Pa ra f icar for te .

Por que voce q u e r ser forte?

A pr ime i r a con t r ibu igao do p rofessor e u m lance i n i c i ador , a

contr ibuicao do a l u n o e u m a resposta, e a pr ime i r a l i nh a da segun-

da contr ibuigao do professor e o retorno; a segunda l i n ha e outro lance

iniciador. Note que uma contribuic.ao ('enunciado') pode consistir

d e mais de u m la nce . A presenc.a consis tente de re torno pressupoe

que os professores tern o pode r de aval i a r as cont r ibu i^oes dos

a lunos ( r a r a m e n t e a l guem se arr iscar ia a fazer isso fora de uma

s i tuagao de apre nd iz age m) e mos t r a que g rande par t e do d i scur sode sala de a u l a concerne a av a l i agao do conhecimento d o s a l u n o s e

ao se u t r e i n a m e n t o pa r a dizer coisas que sao re levantes seg tmdo

cr i te r ios estabelecidos pe las escolas.

Um lance cons is t e de um ou mai s a tos . S inc la i r e Cou l th ard

d i s t i ngue m 2 2 atos para o discurso de sala de au la , a lguns do s

q u a i s (como 'pronto', qu an do um a c r ianca pe de o d i r e i t o de r e s-

ponde r , t a lve z le van tando a m a o ) sa o bas t an te especif icos desse

( ipo d e discurso. Out ros sao m e n o s especif icos: o lance in i ciad or

de uma t roca provocat iva iuc lui , por e x e mplo , uma ' p rovocagao ' ,

enquant o o lance in iciador de uma troca diretiva inclui um a 'dire t iva' .

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34 N o r m a n F a i r c l o u g h

Atos sa o func iona i s e nao categor ias fo rma is , e uma que s t ao

c ent r a l e a relagao entre eles e as categor ias f o r ma i s da gramat ica

(essa q u e s t a o v e m r e c e b e n d o m u i t a a t e n g a o n a p r a g m a t i c a ; v e r

L e v i n s o n , 1983; Leech e T h o m a s , 1989). Sabe-se bem q u e n ao

existem correspondencias s imple s . For e x e mplo , uma f r ase i n l e r -

roga t iva (uma ' pe r gun t a gramat ica l ' ) pode se r uma d i r e t iva como

tamb e m um a provocagao (por e x emplo , "Voce p o d e fecliar as cor-

tinas?") e uma frase declarat iva ( ' a f i r m a t i v a g r a m a t i c a l ' ) pode ser

q u a l q u e r ur n desses u l t i mos ou um a to 'i n form at ivo ' (por e x e mplo ,

"As cor t i nas nao eslao f ec had as" pode p e d i r uma con f i rmagao ,

pedir a alguem que as feche, ou apeuas prestar informagao). Sinc la i r e

Coul th ard referem-se a o q u e d e n o m i n a m ' s i tuagao ' e 'lalica' p a r a

d e t e r mi na r a fung a o d e u m a f rase em um e x e mplo p a r t icu l a r d e

discurso, A primeira t raz fatores s i t uac i ona i s que sao r e le van te s :

p or e x e mplo , se as cr i angas sabem que nao e pe rmi t ido conve r sar

n a sala, um a frase declarat iva do(a) professor(a) ("VocS esta con-

versando") provave lme n te sera i u t e r p r e t ad a como u m c o m a n d opara parar . Como Labov e Fansh e l (veja adiante) , Sinc la i r e C o u l -

t ha r d propoem regras i n t e r p r e t a t i v as q u e abr an j am t an t o a f o r m a

l ingufst ica d as frases como os f a to res s i t uac ion a i s . 'Tatica' t r a t a da

inf luencia da posigao seqi iencial tie uma f r ase no d i scur so sobre

sua i n t e rpre t agao . P or e x emp lo , uma f r ase de c lar a t iva como "Tal-

vez se ja di ferente do ponto de vista da mulher" , apos um re to rno

e m u m a serie de t rocas provo cat ivas (isto e , na q ua l seria a n t e t i p a d o

um lance i n i c i ador ) , e passivel de ser i n t e rpre t ada como provoca-

gao , ape sar do f a to de a ma ior i a das de c lar a t ivas nao se r p rovo-

cagoes e de a ma ior i a das provocago e s se r fr ase s i n t e r r oga t i v as .O p o n t o for te da teoria de Sinclai r e Coulthard esta n o m o d o

p i o n e i r o p e l o q u a ] c h a m a a t e n g a o p a r a a s p r o p r i e d a d e s o r g a n i -

z a c i o n a i s sistemat icas do dialogo e fornece m o d o s p a r a su a de sc r i -

gao. As l i m i t agoes dessa teor ia sao a ausencia de d e s e n v o l v i m e n l o

de uma or i en t agao social para o discurso e a insut lciente atengao a

in t e rpre t agao . Tais l i m i t agoes podem e,star r e l ac i onad as a escolha

de dados: e les se c onc ent r am e m u m a m o d a l i d a d e de di scur so de

sa la de au la t r a d i c i o n a l c e n t r a d a n o ( a ) p r o f e s s o r ( a ) , e o s d a d o s

nao r e f le t e m a d ive r s idade das a tu a i s p r a t i cas de sa la de au la . Isso

leva a que o discurso de sala de aula parega mais homogeneo do

Discurso e mudansa s o c i a l 35

que realmente e e uaturaliza prat icas d omi nan t es , ao apresenta-las

como se fossem as un icas . Elas aparecem como se s imple sme n te

estivessem 'la', disponlveis p ara a descrigao e nao como t end o sido

postas la por meio de processos de conlestagao a pra t i cas a l te rna t i -

ves; n ao como pra t i cas ' i nves t idas ' (ver , n o Capi tu lo 3, o item

"Ideologia") de ideologias par t iculares (por e x e mplo . concepgoes

de apre nd iz age m e de apre nd iz e s) e auxi l iares n a m a n u t e n g a o de

relagoes de pode r par t i c u l a r es na soc ie dade . Em re sumo, fa l ta n a

abordagem de S inc la i r e Coul th a rd uma or ie i i tagao social de se n -

volvida, ao de ix ar de considerar como as relagoes de pode r mol -

d am as prat icas discursivas e ao de ixar de s i tua r h i s to r icame n te o

discurso d e sala d e aula em processos de lu ta e m u d a u g a social,

Um a caracterfst ica surpre e nde n te da prat ica de sala de aula con-

t e mporane a e sua diversidade; indaga-se por que o discurso de sala

de au la t r ad ic iona l que eles descrevem esta so b pressao e o que

esta em jogo.

A h o m o g e n e i d a d e d o s d a d o s t a m b e m d e s v i a a a t e n g a o daambivale nc ia do discurso de sala de aula e da diversidade de i n t e r -

pretagoes possiveis. Considere este exemplo de Coulthard (1977:108):

Professor: Q ue t i p o d e pessoa voce acha q u e el e e?

Voce - de que es ta r indo?

A l u n o : D e n a d a .

P: Como?

A: De n a d a .

P: Voce nao esta r indo de nada, nada mesmo?

A: N a o .

E e n g r a g a d o m e s m o p o r q u e e l e s n ao acliam que se estivessem la

p o d e r i a m niio gostar disso e soa, d e cer to , c o m o um a a t i t u d e ar -

r o g a n t e .

Sinclai r e Coulthard c ons i d e r am esse e x e mplo uma i n t e r p r e t a -

ga o e r rone a da s i t uagao pelo a l u n o , t omando ass im a pe rgun ta do

professor sobre o riso como disciplinar na intencjSo, e m ve z de d i a-

log ica , mas tais exernp los t a m b e m - i n d i c a m a he te rogene idacle

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Norman Fairclough

pote nc ia l do d i scur so de saJa d e a u l a , a coexistencia nas escolas

de um r e p e r t o r i o de discursos d e sala d e a u l a , q u e o s p r o d u t o r e s

e os in terpre tes de textos precisam ter em me nte . Isso impl i ca

atenc.ao ao s processes discursivos, tanto em re lagao a i n t e r p r e t agao

como a produgao , e n q u a n t o a enfase de Sinclai r e Coulthard esta

n os t e x tos como produtos do discurso ( embora a categoria ' t a t ica '

impl ique a lguma a te ngao a i n t e rpre t agao) . I sso t ambe m lorna sua

atengao, como ana l i s t a s , proble mat ica , j a que os ana l i s t as interpre-

ta m os textos em vez de simplesmeute descreve-los. Ao alegar que

descrevem os dados , n ao estao S inclair e Coul th ard r e a lme n te i n -

t e rp re tando-os na pe r spe c tiva do p rofessor ? P or e x e mp lo , cons ide -

ram que o a l u n o ' come te u um erro' ao in terpre ter o professor e nao

o coii t rar io , que o a lu no t a lve z t enha d a d o u m a resposta evasiva a

um a pe rgun ta ambi v a l en t e do professor . Afinal de con tas , ' n ada '

t ambe m e ambivalente : poder ia signif icar "Nao posso dizer- ihe o

que me faz r i r aqui". Isso l e van ta ou t ro prob lema na teor ia: el a for-

ga decisoes sobre as f ungoes dos e nunc iados , mas os e n u n c i a d o s ,co m f reqi iencia, sa o r e a lme n te ambivale n te s para os i n l e r p r e t es ,

nao ap enas amblguos, como demon st ra recente (rabalho na pragmatica

(ver L ev inson , 1983), isto e, nao se p o d e decidir co m clareza sobre

seus sentidos.

Analise da conversa9ao

Anal ise da conversacio (AC) e uma abordagem da a n a l i s e de

discurso que fo i de se nvolv ida por um g rupo de sociologos que se

a u t o d e n o m i n a m ' e tnometodo log is ta s ' . A e tnome todolog ia e u m a

abordage m in t e rpre t a t iva da soc io log ia que foca li z a a v ida co t id i a-

n a como fe i to d e p e n d e n t e de h abi l i dade s e os me todos que as

pessoas usam para 'produzi-la ' (Garf inkel , 1967; Benson e H ugh e s ,

1983). A t end enc i a e n t re os e tnome todolog i s t as e e v i t a r a teor ia

geral e a discussao ou o uso de conceitos como classe, poder e ideolo-

g i a , q u e c o n s t i t u e m p r e o c u p a g a o ce n t r a l n a soc io log ia r e g u l a r .

A l g u n s e tnome todolog i s tas de mon s t r a t e i n t ere sse par t i cu lar na

conversac^ao e nos metodos que seus pra t i can te s u s a m p a r a p r o d u -

zi-la e interpreta- la (Schenkein , 1978; Atkinson e H e r i t a g e , 1984).

Discurso e m u d a n c a social 37

Os ana l i s t as da conversacjio tem-se conce n t r ado pr i nc ipa lme n te

em conversas informais entre iguais (por exemplo, conversas ao

te lefone), embora a lguns t r aba lh os recentes d irecionem-se para

t i pos i n s t i t uc iona i s de di scur so , n os q u a i s as assimetrias de pode r

sa o mais obv ias (But ton e Lee, 1987). A AC con t r as t a com a abor -

dagem de Sinclai r e Coul th ard ao destacar processes discursivos e,

conse qi i e n te me n te , ao con te mplar t an to a i n t e rpre t acao como a

p r o d u g a o . Contudo , como a r gument a r e i em seguida, a AC tern um a

concepgao eslreita de in terpre tagao e processo, comparando-se ,

por t an to , a S inc la ir e a Cou l th ard e m sua orientagao para a busca

de e s t ru turas nos textos.

Os anal istas da conve r sagao produ z i r am e s tudos de var ios as-

pectos d a conversacao: abe r tu ras e fe ch ame n tos conversacionais ;

como os topicos sa o estabelecidos, desenvolvidos e m u d a d o s ;

como as pessoas re latam estorias n o curso de conversas; como e

por que as pessoas ' f o rmu lam' conversas (por exemplo, resumem-nas,

sugerem o que implicam). Par t i c u l a r ment e notave i s e i u f l uen t essao os t r aba lh os sobre a t o m a d a de t u r n o descrevendo como os fa-

Ia n tes se a l t e r nam n o t u rno de fa la . Sacks, Schegloff e J e f fe r son

(1974) p r o p o em u m c onj un t o s imple s m as poderoso de regras para

a t o m a d a de turno. Tais regras apl icam-se ao comple ta r - se uma

' u n i d a d e de cons t rugao de t u r n o ' : o s prat icantes da conversagao

constroem seus t u r n o s com un idad e s , t a i s como a f r ase complexa ,

a f rase simples, o s in tagma , e mesmo a palavra , e os par t i c ipan te s

sa o capazes de de te rminar q u a l e essa uuidade e pre d iz e r , co m

g r a n d e precisao, se u p o n t o de comple tude . As regras sa o orde na-

das: 1 ) o f a l a n te atual pode selecionar o prox imo f a l an te; 2) se isso

n ao ocorrer, o prox imo f a l an te pode 'auto-selecionar-se' , i n i c i ando

a produgao de um t u r n o ; 3) se isso nao ocorrer, o f a l a n t e a t u a l

pode c o n t i n u a r . Sacks, Schegloff e Jefferson a r g u m e n l a m que es-

sas regras da o con ta de mu i tos aspe ctos obse rvados da con ve r sa-

cao: que as sobreposic.6es e n t r e os f a l a n t e s ocor rem. mas

ge ra lme n te sa o breves; q u e ocorre u m g r a n d e n u m e r o d e t ransicoes

en t r e os i u r n o s se m lacuna e sem sobrepos igao . e assim p or d i an t e .

Apesar da general idade das regras, elas per mi t em v a r i agao c ons i -

de rave l em aspectos como a ordem e a d u r a g a o dos t u r n o s .A AC tern e n fa t iz ado b as t an te a ' i mp l i c a t i v i d ad e seq i iencia r

da conversagao — a alegagao d e que qua l quer enunc i ad o impor<1

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38 Norman Fairclough

restric.6es ao que possa segui-lo. E x e m p l o s par t icularmente clarossao os 'pares ad j ace n te s ' c o m o p e r g u n t a e resposta - umap e r g u n t a

p r o d u z i d a p o r u m ( a ) falaote implica seq i ien t i a lmente uma re spos ta

de out ro(a) - ou reclamac,ao e de sculpa . A evidencia p a ra que x

impl iqu e se que nc ia lme n te y inc lui : 1 ) o fa to de que qualque r coisa

q u e ocorra apos x , se for de q u a l q u e r modo poss ivel , se ra t omada

como y (por exemplo, se "Essa e sua esposa?" e segu i d a por "Bern,

n a o e m i n h a mae" , a u l t i ma de ve ra se r tom ada como u ma re spos t a

posi t iva implicada; e 2) o fato de que se y nao ocorrer, su a a u s e n -

cia sera n o t a d a e comum e n te o fe re ce marge m para uma i n fe re nc ia

(por e x e mplo , se os professores de ixain de dar r e t o r no as respostas

dos a lunos , i sso pode se r t o rnado como uma rejeigao impl i c i t a

destes). Segundo Atkinson e Heri tage (1984: 6 ), "v i r tua lme n te

todo enunciado ocorre em a l gum local es t r u t u r a l ment e d e f i n i d o n a

conversa". Um a impl i cagao disso e que os turnos exibem um a

anal ise de turnos previos , fornecendo evidencia constante no texto

de como os e n u n c i a d o s sa o i n t e rpre t ados .Out r a implicac.ao e que a posigao seqiiencial d e u m e n u n c i a d o

e por si so bas t an te para determinar seu sentido. Mas esse p o n t o e

a l t ament e quest ionavel por dois motives: 1) os efe itos da sequ encia

sobre o se n t ido variam se guudo o t i po de discurso; 2) como suger i

q u a n d o di scu t i S inc la i r e Cou lthard , pode-se recorrer a u m a var ie-

dade de tipos de di scur so duran te um a i n t e r agao , e os par t icipantes,

como produtores e interpretes, constantemente tern de negociar suas

posigoes em r e l ac ao a esse repertorio . Considere esta passagem de

um a coiisulta me dica q u e analiso no Cap i tu lo 5 ("Ex e mplo 2"):

Pacien te: [e eu acho. qu e u ma d a s razoes pelas q u a i s eu b e b ia[ tanto [sabe - [ea h m

M ed i co : [ hu m [ hu m h um [ hu m v o ce

vol tou voce vol tou voce vol tou a beber

[ no va m e n te

P: [nao

M : ah voce n ao vo l tou ( i n i n [ t e l i g i v e l )

P: | n a o . m a s a h m u m a coisa que a s e nh o r a m e disse na terc.a-

feira

Discurso e mudan^a social 39

V ou suger i r em m i n h a anal ise desse f r agment o de c onsu l t a

q u e el a e um mis to de consu l t a m e dica e te rapia. Nessa mescla, o

que diz a sequencia J i i n t e r p r e t e sobre a p e r g u n t a do medico em

se u pr ime i ro t u rno ? Em uma con su l t a me dica ma i s c o n v e n t i o n a l ,

um a pe rgun ta do(a) me dico(a) i m e d i a t a m e n t e apos o (a) pac i en t e

ter-se refer ido a uma condic.ao medica possivelmente per igosa(aqu i , a be bida) p rovave lme n te se r i a t omada como uma que s t ao

medica, exigindo atengao comple ta de a m b o s os participates. E m

um a sessao de terapia. ta l pergunta poderia ser tomada de m o d o

mais conve r sa t iona l como u m come n tar io l a t e r a l , m o s t r a n d o q u e

o(a) t e r a p e u t a esta em sintoii ia com os prob lemas do(a) pac ie n te .

Aqui , a paciente parece toma-Ja como um come n tar io la teral : el a

da respostas mecanicas de uma p a l a vra a p e r g u n t a p r i n c i p a l e ao

assenl imento (talvez um teste?) do medico a resposta e m u d a o as-

s u n t o d e volta a n a r r a t i v a d e eventos receutes . Para t o m a r ta l deci-

sa o i n t e rpre t a t iva , a pac ie n te pre c isa de i n formagoe s ad i t iona i s asequ encia: e la precisa a val ia r a na t u r eza do evento social, a relac.ao

social e n t re ela e o medico e o t ipo de discurso. Isso implica um a

concepc,ao de processes discursivos e interpretac ,ao que e m a i s

complexa do que e geralmente pressuposto na AC — uma concep-

9ao que p o d e , p o r exeinplo, a c o m o d a r p r o d u t o r e s e i n t e r p r e t e s

n e g o c i a n d o se u c a m i n h o e m r e p e r t o r i e s d e t i p o s d e d i s c u r s o .

O e x e mplo t ambe m sugere que a pr op r i a anal ise e um processo de

i n t e r p r e t agao e , por t an to , uma p ra t i ca contenciosa e proble mat ica .

H a pouca pre ocupagao co m isso na AC. M as, como S inc la i r e

Coul th ard , h a uma t end enc i a e n t r e os a n a l i s t a s a i n t e r p r e t a r os da-dos com base e m u m a or ie n t agao par t i l had a e n t re os par t ic ipantes

para um um'co tipo de discurso (entretanto, ver Jefferson e Lee,

1981). O efeito e apre se n tar um q u a d r o da conversagao excessiva-

m e n t e h a r m o n i o s o e coope ra t ivo .

H a t a m b e m um neg l i genc i ament o d o pode r como u m f a to r n a

conversacjio. No s processes de negociac,ao a que m e refer i , alg un s

par t i c ipan te s t i p i came n te tern m a i s forga do que outros, e em m u i -

tos tipos de discurso (p or exemplo , discurso de sala d e au l a ) n ao

encont ramos regras par t i lh adas para a t om ada de tu rn o e m que os

4O Norman Fairclough

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participantes tern direitos e obrigagoes iguais , mas uma distribuicao

assimetrica de direi los (por exemplo, para auto-selecionarem-se,

i n t e r rompe re m, 'mante rem o piso' em var ies turnos) e obrigagoes

(por exemplo, t omar o tu rn o se forem chamados) . E m ta i s casos, e

evidente que produzir o d iscurso faz parte de processos m a i s a m -

plos de produgao da vida social , das relacoes sociais e das i d en t i -dades sociais; mas grande parte da AC, em su a le i tu ra ha rmoniosa

da i n t e r agao entre iguais, da a impressao de que produz i r o d i s c u r -

so e um fi m em s i m e s m o .

Apesar de diferenles pon tos de par t ida e orientacoes discipli-

nares e teoricas, as abordagens de Sinclair e Coul tha rd e da ACtern forcas e l imi tagoes bas tan te similares: ambas f i ze ram conl r i -

buicoes impor t an tes pa ra um a nova ap reciagao da na tu reza dase s t r u t u r a s n o dia logo , m a s n e n h u m a d as d u a s d e s e n v o l v e u m a

or ien tacao social para o discurso (a esse respeito, a AC sofre das

mesmas limitacoes de Sinclair e Cou l tha rd ) e nem fornece um a

expl icacao sat isfator ia dos processos discurs ivos e da i n t e rpre t a-cao, embora a AC apresente consideravel ref lexao sobre de te rmi-

nados aspectos da i n t e rpre t agao .

Labov e Fanshel

O trabalho de Labov e Fanshel (1977) e um estudo de um l i n -

gtiista e um psicologo sobre o d iscurso da entrevis la ps icoterapeu-

t ica. Ao contrario de Sinclair e Coul tha rd e da AC, L abov e

Fanshel assumem a heterogeneidade do discurso, que para eles re -

flete as "contradicoes e pressoes" (p. 35) da s i tuacao de entrevista.

Eles concordam co m Gof f man (1974) que as m u d a n g a s e n t r e

' m o l d u r a s ' sao um aspecto normal da conversacao e ident i f icam

n os seus dados um a conl ' iguragao de diferentes 'esti los ' associados

a d i fe ren tes mo ldu ras : o 'estilo d a ent rev is ta ' , o 'estilo co t id iano '

usado n as na r ra t ivas de pacientes sobre a "vida desde a u l t i m a vi -

si(a" (N , para 'na r ra t iva ' , a seguir) e o ' est i lo da f ami l i a ' (F, a se-

Ter mo da A C q ue s i g n i f i e s m an t e r o esp ago sociopsicologico, ou tero con t r o le ,

d o s t u rn o s c o n v e rsa c i o n a i s (N . da T.).

Discurso e mudan^a social

guir), o est i lo geralmente usado uas s i tuagoes de f ami l i a , p a r a ex -

pressar emogoes fortes.

As entrevistas estao divididas em 'segoes t r ansversa ls ' , q ue

correspondem aprox imadame n te em extensao as 'trocas' de Sinclair

e Coulthard , embora as secoes t ransversals tambem possam fazer

parte de monologos . A analise de segoes t ransversals enfat iza a

existencia de ' f luxos de comunicagao ' verbal e paral ingi i fst ica p a-

ralelos, os ult imos cobrindo aspectos como f reqi iencia, v o l u m e e

qual i f i cadore s de voz, como ' o feganc ia ' , e carregando se n t idos

impl icitos que sao 'negaveis' . Um a var iavel entre t ipos de discurso

e a re la t iva impor t anc i a do canal paralingi i is t ico: n o discurso tera-

peutico, as contradigoes entre os s ignif icados explici tos do canal

verbal e os sent idos implici tos do canal paralinguis t ico const i tuem

um aspeclo central .

A ana l i se p roduz um a ' e x p a n s a o ' de cada segao t ransversal ,

um a fo rmulagao do texto que t o r na explicito o que era impl ic i to .

ao fornecer referentes para pronomes, ao verbalizar os sent idosimplici tos das pis tas paralingiiisticas, ao i n t r od uz i r mater ia l f ac tua l

relevante de outras partes dos dados e ao tornar explfc i ta parte do

conhecimento pa r t i lhado dos part icipantes . As expansoes sa o

aber tas, podendo ser elaboradas i nde f i n idame n te . Aqui es ta um

exemplo, anal isado em termos de estilos, e sua expansao:

< N E-e e n t a o - q u a n d o - Ih e te lefon ei hoje, disse <F "Bern ,

q u a n d o voce pensa em vol ta r pa ra casa?" > F > N

< N Q u a n d o te le fone i a minha m ae ho j e (quin ta - fe i r a ) , r ea lmente

disse,

< F "Bern, em re l agao ao a s s u n to que ambas s a b e m o s que e im -

por tante e que me preocupa , quando voce va i sair da casa de

m i n h a i r m a o n d e {2} suas obr igacoes ja foram cu m p r id a s e

{4}voltar como cstou Ih e ped i n d o pa ra u m a casa o n d e {3} s u a s

obr igacoes p r i n c i p a l s sa o ncgl igenciadas , p o r q u e voce deve fa -

zer isso como {CHEFE-MAE} chefe de nossa f a m i l i a ? " > F > N

Os s imbolos entre chaves precedem proposigoes que sao re-

cor re n te me n te tom adas como d adas . Algumas destas sao especif i -

cas da i n t e r agao par t icu la r ; ou t ras como {CHEFE-MAE}, "a mae e

Norman Fairclough Discurso e tnudanga social

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a chefe da familia". tern implicagoes gerais n a cultura em termos

de obr igagoes do papel ; e outras sao pa r te dos pressupostos correnles

d a t e r a p i a ( p o r e x e m p l o , "o t e r a p e u t a nao d iz a p a c i e n t e o q u e

fazer") ou da cul tu ra (por e x emplo , "cada um de ve cu idar de si").

As propos igoes r a r ame n te sao fo rmuladas e x pl i c i t ame n te , mas a

que s t ao pr incipal numa i n t e r agao pode ser se um evento e ou nao

um e x e mplo de propos igao . Ale m disso, as propos igoes cons t i t ue m

conexoes implici tas entre par tes de u m a i n t e r agao que sao impor -

t an t es para sua coe re nc ia .

A segao transversal e entao anal i sada como ' i nferagao ' (s ignif i-

cando u m a "agao q ue afeta as relacoes do 'eu' e outros") . Supoe-se

que qualquer enunciado real ize simultaneamente a lgumas acoes

que sao l i i e r a r qu i c ament e orde nadas , de modo que agoes d e n j ve l

super ior sa o real izadas por me io de agoes de nivel infer ior (uma

relagao m a r c a d a por ' conseq i ien temente ' a seguir). Assim, para o

exemplo anterior (simplifiquei a representagao de Labov e Fanshel):

R h o d a (a pac ien te) c o n t i n u a a na r ra t iva e fo rnece informac,6es

para sus ten ta r su a asserc,ao de que rea l izou a sugestao {S}.

R ho d a requer Informac,6es sobre a hora em que sua mae p r e t e n -

d e voltar para casa; por consegu inte , solici ta i n d i r e t a m e n t e q ue

a m a e volte para casa; p o r t a n t o , r e a l i z a n d o a suges tao {S}, c o n -

s e q u e n t e m e n t e q u e s t i o n a n d o a m a e i n d i r e t a m e n t e p o r n a o

desempenhar de forma adequada se u papel como chefe da fa-

m f l i a , s i m u l t a n e a m e n t e a d m i t i n d o suas propr ias l imi tacdes . s i -

m u l t a n e a m e n t e a f i r m a n d o n o v a m e n t e q u e rea l izou a suges tao .

A propos igao {S} e a sugestao (d o t e r a p e u t a ) de quedevemosexpressar nossas necessidades a out r as pessoas. Tais representa-

goes sa o baseadas em regras discursivas proposlas p or Labov e

Fanshel pa ra in terp re tar as f o r mas de supe r f i c i e dos e nunc iados

como tipos par t i c u l a r es d e a g a o . Po r e x e mplo , h a u m a 'regra d e

pe d idos indiretos ' que especifica as condigoe s sob as q u a i s se to-

m a m p e r g u n t a s ( ' ped idos de i n formagao ' ) como pe d idos de agao .

A anal i se e comple t ada co m 'regras seqiienciais ' de c o m b i n a g a o

das segues t ransversals .

Labov e Fanshel referem-se a sua abordage m c o m o anal i se de

discurso ' ab rangente ' , e seu d e t a l h a m e n t o e de cer to impressio-

43

nante , einbora t a m b e m , como indicam, consuma m u i t o tempo. Eles

propr ios i de n t i f i cam a lguns prob lemas : as pistas paralingi i is t icas

sa o reconhecidamente dif ice is de in te rpre t ar , as expansoes podein

ser fe i tas i n t e r m i n a v e l m e n l e e i nex i s te um po n to obv iam e n te m o t i -

vado para a se gme n tagao , e as e xpansoe s tern o e fe i to de ap l a i na r

impor t an te s d i fe re ug a s e n t re ele me n tos de pr ime i ro e se gundo p i a-

no no d i scur so . Ent r e t an t o , q u e r o focal izar minh a d i scussao sobre

d u a s i m p o r t a n t e s percepgoes e m sua abordage m que precisam ser

l e vadas ad i an te .

A pr ime i r a e a visao de que o di scur so pode se r estilistica-

ment e heterog^neo p or causa de contradigoes e pressoes n a si tuagao

de fala. Por exemplo, n o caso do discurso lerapeutico, a sugestao e

q ue o uso do estilo ' co t id iano ' e ' f ami l i a r ' e par t e d e u m a estrate-

g i a da paciente para estabelecer algumas par f es da conversa como

imune s a h abi l i dade i n t rusa do t er ape u ta . M e nc ione i an te r io rme n te

a similaridade desse ponto com o conceito de molduras de Goffma n .

O pr inc ip io da h e te roge ne idade do discurso e um elemento centralem m i n h a discussao de 'hitertextualidade' (ver, no Capftulo 3, o item

"Prat ica discursiva"). Menciona re i a q u i a p e n a s d u a s d i f e r engas

ent re minh a pos igao e a de Labov e Fanshel. Primeiro, o encaixe de

um e s t i lo e m ou t ro , como no e x e mplo an te r io r , e ape nas um a for -

m a de heterogeneidade e f r equent ement e t o r na fo rmas mais com-

plexas, em que os estilos sao dificeis de separar . Segundo, a visao

deles sobre heterogeneidade e mu ito estatica: eles consideram o dis-

curso te rape u t i co como u m a configuragao estavel de estilos, m a s

nao ana l i sam a h e te roge ne idade d i n a m i c a m e n t e c o m o m u d a u c a s

his toricas n a s c onf i gu r agoes d e est i los. 0 valor p r i nc ipa l d o p r i n -

cipio da he terogeneidade parece estar na invest igagao da m u d a n g a

discursiva de n t ro da m u d a n g a social e cul tural mais a m p l a (ver. no

Capi tu lo 3, o i t e m "M udanga discnrs iva", para um a e laboragao

dessa perspect iva).

A se gunda p e rcepgao e que o di scur so e cons t ru ido sobre pro-

posigoes implici tas que sao t o m a d a s como taci tas pelos p a r t ic i -

pantes e que sustenlam su a coerencia. Novamente , esse e u m

pr inc ip le i m p o r t a n l e , cujo potencial e cn ja s impl i cagoe s nao sao

desenvolvidos por Labov e Fanshel . Par t i c u l a r ment e , eles n aoa t en t am p a r a o carater ideologico de algumas dessas proposigoes -

44- Norman Fairclough Discurso e m u d a n c a s o c i a l

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tais como as obrigagoes associadas ao pape l de m a e , ou a i de o log ia

i nd iv idua l i s t a do 'eu' n a propos igao "cada um d e v e c u i d a r de si" -

o u p a r a o t r a b a l h o ideo log ico da t e r ap i a e m sua r e p r o d u g a o se m

q u e s t io n a m e n t o , q u e e reminiscente de crf t icas da t e r ap i a como um

me can i smo para a d e q u a r as pessoas a papeis sociais convencio -

na i s . Em out r as pa lavras , L abov e Fansh e l aprox imam-se de uma

anal i se critico d o di scur so t e r ape u t i co , f o rne ce ndo re cur sos anal f-

ticos valiosos para t a l anal ise .

Potter e Wetherell

Como e x e mplo f ina l de uma abordagem nao-cn t i ca a ana l i se

d e discurso, discut i re i o uso po r Potter e W e t h er e l l (1987) d a a n a -

lise d e discurso como um m e t o d o n a psicologia social. Isso e i n -

teressante n o presente contexto, pr ime i ro porque mos t r a como a

anal i se de d i scur so pode se r usada para e s tuda r que s toe s que terns ido abordadas t r ad i c i ona l ment e co m out ros me todos e, s e g u n d o ,

p o r q u e levanta a questao se a an al ise de discurso concerne , pr incipal-

mente, a ' f o r m a ' ou ao 'coutei ido ' do discurso. (Veja a crit ica a

Sinclai r e Coul th ard em T h o m p s o n (1984: 106-108) por serein

' f o rma l i s ta s ' e po r neg l igencia rem o c ont e t i d o do discurso d e

sala de aula . )

A defesa da anal i se de discurso p or Potter e W e th e re ll como

um me todo para psicologos sociais baseia-se e m u m u n i c o a r g u -

me n to que e sucessivamente apl icado a var ias areas f u n d a m e n t a l s

da pesquisa na psicologia social . O argumento e que a psicologia

social t r ad ic iona l d i s to rce e m e s m o ' s u p r i m e ' propr i e dade s-ch ave

dos ma te r i a i s l i ngu i s t icos que usa como dados ; que o di scur so e

'cons t ru t ivo ' e , conse qi i e n te me n le , ' cons t i tu i ' obje tos e cate gor i as ;

e que o que uma pessoa d iz nao pe rmanece consistente d e u m a

ocasiao a ou t r a , mas var i a se gund o as funcoe s da f a l a . P r im e i ro , o

argume n to e ap l i cado a pesquisa sobre at i tudes: a pesquisa t radicio-

n a l pre ssupun h a que as pe ssoas t i n h a m a t i t u d e s consis tentes sobre

'objetos', t a i s como ' imigran tes de cor', e n q u a n t o a a n a l i s e de di s -

cur so mos t r a nao ap e nas que as pessoas f az e m aval i agoes d i f e r en-

tes e a te c ont r ad i t o r i a s de um obje to d e acordo c o m o con te x to ,

m a s t a r n b e m q u e o p r o p r i o obje to e c o n s t r u f d o d i f e r e n t e m e n t e ,

d e p e n d e n d o de sua av a l i agao (entao ' i m i g r a n t e s de cor' e u m a

cons t rugao que m u i t a s pessoas r e j e i t a r i am) . O a r g u m e n t o e e n t a o

apl icado ao e s tudo de como as pessoas usam regras, como as pes-

soas produz e m re la tos e x pl i ca t ivos de se n compor t ame n to (descul-

pas, just i f icat ivas, e tc . ) , e assim p or diaiite, a r g u m e n t a n d o - s e , em

c ad a caso, a f avor da supe r io r idade da a n a l i s e de discurso sobreoutros metodos, tais como os m e t o d o s e x pe r ime n ta i s .

Potter e We th e re l l c ont r as t am a pr io r i z agao do c o n t e u d o em

su a a b o r d a g e m com a pr ior izagao da f o r m a n a ' teoria da acomoda-

c,ao da f a l a ' na psicologia social . Esta focal iza a maneira como as

pessoas modi f i cam a fala de acordo com a pessoa a quer n f a l a m e

ass im com a var i ab i l i dade da fo rma l ingi i i s t ica se gundo o con te x to

e a fung a o ; e n q u a n t o n a p r i m e i ra eles a b o r d a m a var i ab i l i dade do

con te udo l ingi i is t ico. E m a l g u n s casos, o foco e sobre o c o n t e u d o

proposicional do s e nunc iados e sobre os t i pos de a r g u m e n t o n os

qua i s as proposigoes f unc i onam. P or e x e mplo , ao pe squ i sare mat i tudes, regist rant o que os i n f o r mant es da Nova Zel and i a d iz e in a

respei to da r epa t r i agao d o s imigran les pol i ne s ios . Em out ros casos,

o foco e sobre o vocabu la r io e a m e t a f o r a - por e x e mplo . os pre-

dicados (verbos , a d j e t i v o s ) e as m e t a f o r a s u s a d o s r e l a t i v o s a

' c o m u n i d a d e ' , e m re por t age ns da mid ia sobre os d i s t u r b i os u r b a -

nos n a Gra-Bre t anh a em 1980.

Na verdade, a dist ingao fo rma-conteudo nao e ta o clara como

pode parecer . Ha aspectos de c o n t e u d o que c lar ame n te estao l i ga-

dos a que s toe s de fo rma; por e x e mp lo , a me tafora pode se r uma

que s t ao de fus a o d e di ferentes dommios de se n t ido , mas ( ambem e

um a ques tao de quai s pa lavras sa o usadas e m um te x to , um aspe ct o

de sua f o r ma . E, do mesmo modo, aspectos de fo rma e s t ao ligados

ao con te udo: a mescla de e s t i los no d i scur so t e r ape u t i co , i d en t i f i -

cada p or Labov e Fanshel , e, em um ni v e l , a mescla de formas (re-

fere-se, p or e x e mplo , as l i nh as de e n tonagao que sao t i p i c as do

est i lo da ' f a m i l i a ' ) , m a s e t a m b e m s ign i f i c a t iv a em t e r m o s de

con te udo; p o r exeinplo , em t e r m o s ci a cons t rugao da p a c i e n t e c o m o

um t i po par t i cu lar de 'eu' o u sujei lo .

O q u a d r o a na l i t i co de Pot ter e W ethere l l e pobre em c o m p a r a -g ao co m o u t r a s abordage ns : se n ' con teudo ' reduz-se a a s p e c t o s

Norman Fairclough Discurso e mudanga s o c ia l 47

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l im i t ados do signi f icado ' i de ac iona l ' ou c onc e i l ua l d o di scur so , o

q ue d e i xa i n t oc ad as out ra s dime nsoe s d e s i gn i f i c ad o (em t e rmos

ampl os , ' i n (e rpe ssoa i s ' ) e aspectos associados'de f o r m a . (O s s i gn i -

ficados ' i de ac iona i s ' e ' J n t e r pessoa i s ' sa o exp l i c ad os em m a i o r e s

de ta lh e s no Capi tulo 3, i lem "Discurso".) E no t r a l ament o d ad o ao

'eu' por Potter e Wetherell que essas limitacoes ana l i t i c as se tor-

nam mai s apa r en t es . Ao c o n t r a r i o d e t r a t ament os t r ad i c i ona i s d o

eu n a psicologia social, eles a d o t a m u m a posicao const rut iv is ta

q u e enf a t i za a const i tu igf io v ar i av e l do e u no discurso. M as eles

sa o incapazes d e oper ac i ona l i za r a d e q u a d a m e n t e essa teoria em

su a ana l i se d e discurso, p o r q u e (como a r gument a r e i ad ian te : Ca-

pi'tulo 5, " E x e m p l o 3: E nt re v is ta medica 'padrao'") d i fe re n te s

'eus' sao s i na l i zad os i i np l i c i t ame n te por m e i o de c onf i gu r ac oes de

i nu i tos aspectos diversos d o c om por t am ent o v e r ba l (c omo t am bem

nao-verbal), e e necessario u m a p a r a t o an a l f t i c o mais r ico do que o

d e Pot ter e W et her e l l pa r a descreve-los.

C omo ou t r as abordage ns refer idas , a d e Po t t e r e Wet her e l l ei n s uf ic ie n l e me n te de s e nvol v ida e m s u a or ie n ta ca o social p a r a o

d i sc u r so . Ha em sua a n a l i s e de discurso uma enfase i n d i v i d u a l i s t a

parc ial sobre as estrategias retoricas dos f a l a n te s . A discussao do

eu e u m a excecao apa r en t e , po r qu e uma v i sao c o n s t r u t iv i s t a do eu

enf a t i za a ideologia e a moldage m social do e u no discurso, m as

essa teoria e p o u c o a d e q u a d a a or i e n t acao p r e d o m i n a n t e d o l ivro ,

alem d e nao se r oper ac i ona l i zad a na ana l i se d e d i sc u r so . F i n a l -

m e n t e , ha uma t end enc i a pa r a a a t i v i d ad e es t r a t eg i c a ou r e t o ri c a d o

'en', ao se usa r em categor ias. regras, etc., como a l t e r n a t i v a s a su -

jeicao d o 'eu'}

em l uga r de se t o m a r e m as d u a s e m u m a siutese

dialet ica (ver Capi tu lo 3 , i tem "Discurso", p a r a um a elaboracao

dessa visao).

Lingi i i st ica cr i t ica

'Lingiiistica critica' fo i um a abordage m d esenv o l v i d a po r um

g r u p o d a U n i v e r s i d a d e d e East Angl i a na d ec ad a de 1970 (Fowler

et al., 1979; Kress e Hod ge , 1979). Eles t e n t a r a m casar u m m e t o d o

de anal i se l inguis t ica tex tua l com uma teor ia soc ial do f u n c i o n a -

mei i to d a l i n g u a g e m em processes polilicos e ideologicos, recor-

r e n d o a teor ia l inguis t ica func iona l i s l a associada co m M i c hae l

H a l l i d a y (1978, 1985) e conhecida c omo ' l i ng u is t ica s i s le mica ' .

C ons i d e r and o-se suas or ige ns d i sc i p l i na r es , nao s u r p r e e n d e

que a l inguis t ica cr i t ica est ivesse ansiosa p or d is t ing u i r - s e d a l i n -

guis t ica regular (na epoca m a i s fi r m e m e n t e d o m i n a d a pelo p a r a -

d i g m a c h o m s k y a n o d o q u e agora) e da sociol ingi i i s t ica (ver Fowler

et ai, 1979: 185-195), Sao re je i t a dos dois ' d u a l i s m o s pr ev a l ec en-

tes e relacionados' n a teor ia l inguis t ica: o t r a t ament o d o s s i s t e m a s

lingiiisticos c o m o a u t o n o m o s e i n d e p e n d e n t e s d o 'uso' d a l i n g u a -

gem e a separacao e n t r e ' s i gn i f i c ad o ' e 'estilo' ou 'expressaV (o n

en t r e 'conteiido' e ' f o r m a ' ) . C ont r a o p r i me i r o d u a l i s m o , a l i n -

guis t ica cr i t ica a f i r m a co m Hal l i d ay que "a l i n g u a g e m e c omo e

p o r causa de sua f u n g a o n a e s t ru tu ra social" (Hal l iday, 1973: 65) e

a r g u m e n t a q u e a l i n g u a g e m a q u a l as pessoas tern acesso d e p e n d e

de sua posic.ao n o sistema social. C ont r a o segund o d ua l i smo , a

l inguis t ica cr i t ica apoia a concepcao d e H a l l i d a y d a g r a m a t i c a d eum a I f n g u a como sis temas d e 'op^oes', ent re as q u a i s o s f a l an t es

fazem 'sele^oes' segund o as c i r cuns t anc i as soc i a i s , a s sumi nd o q u e

opgoe s f o r ma i s t e rn s ig n i f ica dos c ont r as t an t es e que as escolhas d e

f o r mas sa o sempre signi f icat ivas . A sociolingiiist ica e cr i t icada

p o r q u e m e r a m e n t e estabelece corre la^oes en t r e l i nguagem e socie-

dade, em vez de buscar relac,6es c ausa i s ma i s p r o f u n d a s , i n c l u i n d o

o s efei tos d a l i n g u a g e m n a sociedade: "a l i nguagem se r v e pa r a

c o n f i r m a r e consol idar as or gan i zac oes que a mol d am' " (F ow l e r et

al,, 1979: 190).A ci tagao d e Ha l l i d ay no u l t i mo pa r agr a f o d i z ma i s : "A l i n -

guagem e como e por causa de sua f u n c a o n a es t r u t u r a soc ia l , e a

organizacao dos sentidos c o m p o r t a m e n t a i s d e v e p r o p i c i a r per-

cepcao de suas f und ac oes sociais" (Halliday, 1973: 65). Kress

(1989: 445) sugere que a Hngii is t ica critica d esenv o l v eu a a f i r m a -

§ao cont ida na segunda par te da c i tagao, mas na verdade nao aquela

con t ida n a p r i me i r a : el a " t en t ou 'compreender' e s t r u t u r a g o e s d as

' f und agoes sociais' da ' o rgan iz acao dos s e n t i d o s c o m p o r t a m e n -

tais'" n o s textos . A l ingu is t ica cr it ica no vam ente t o m a u m a posi-

g ao c onf o r me Hal l i d ay , em opos igao a p r a t i c a d a l i ngu i s t i c a

regular e da sociolingtiistica, ao tomar texlos completos (falados

Norman Fairclough Discurso e mudanca social

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ou escritos) como obje tos de a n a l i s e . Estende-se a 'h ipotese Sapi r -

W h o r f de que a l inguagem incorpora visoes d e m u n d o parliculares a

v a r i e d a d e s d a m e sm a l i n g u a ; os t e x t o s p a r t i c u l a r e s i n c o r p o r a m

ideologias ou (eor ias par t iculares, e o propos i to e a ' i n t e r p r e t a g a o

critica' de tex tos: "a r e cupe ragao dos sen t idos socials expresses

n o discurso pela anal i se das es truturas l ingi i ist icas a lu z dos con-

tex tos iuteracionais e socials mais ampJ os" (Fowler ef «/., 1979:

195-196). O obje t ivo e prod uz i r um me todo ana l i t i co q ue se ja ut i l i -

zavel p o r pessoas q ue possam ser, p or exemplo, l i i s tor iadores e

n ao especialis las em l ingi i ist ica.

Para a anal ise t e x tua l , os l i ngu i s t as criticos baseiam-se m u i t o

no t r aba lh o da ' g r ama t i c a sistemica' de H al l i day (ve r H a l l i d a y ,

1985), m as t ambem em conceitos de ou t r as teor ias , como *ato de

f a l a ' e ' t r ans fo rmagao ' . A lingiiistica critica d i fe re de out r as abor-

dagens n a a t engao que dedica a gramat ica e ao vocabular io dos

textos. H a mu i t a r e fere nda a ' t r ans i t i v idade ' , o aspecto d a g r a m a -

t ica da oragao ou da frase re laciouado ao seu s i gn i f i c ad o ideacio-n a l , isto e, o modo como representa a real idade (ver . n o C a p i t u l o 6 ,

o i t e m "T rans i t iv idad e e t ema" , para um a d i scussao de t a lh a da de

t r ans i t i v i d ad e) . A gramat ica fome ce d i f e r en t es ' t ipos de processo'

e 'participates' associados corao opgoes, e a selegao sistemat ica

de um t i p o de processo par t icular p o d e se r i de o log icame n te sign!-

f icat iva. Por e x e mplo , o j o r n a l c o m u n i s ta T he Morning Star (21 de

abr i l de 1980) formula par te de uma reportagem sobre um dia de agao

de um s ind ica to me dico como um processo 'de agao ' em que os

t r aba lh adore s ( 'nort is tas ' ) sao os atores: "O Par la men to foi ataca do

por cen tenas de nortistas". Isso poder ia te r sido f o r m u i a d o c o m o

u m processo ' r e l ac ionaF em que o s ign i f i cado de ' t r aba lh adore s

em a g a o ' fosse me nos p r o e m i n e n t e (por e x e mplo , "Houve u m

lobby n o P a r l a m e n t o co m centenas de nor t istas").

Um out ro foco r e l ac ionado e sobre os processos gramat ica i s

d a ' t r ans fo rmagao ' e x a m i n a d o s n o t e m p o r e a l (por e x e mplo , as

t ransformagoes associadas com o d e s e n v o l v i m e n t o d e u m a r e p o r -

t age m num j o r n a l n u m periodo d e anos . di scu t idas e m T r e w ,

1979), on m a i s abs t r a t ament e . p o r e x e mplo , o n d e o q u e p o d e r i a te r

s ido fo rmuiado como oragao ("x criticou b a s t a n t e y") e r e a l m e n t e

fo rmuiado de modo t r ausformado como ' n o m i n a l i z a g a o ' ("houve

m u i t a critica"). A nominal izacj io e a conversao de uma oragao em

um n o m i n a l o u n o m e , a q u i ' c r i t i ca ' de "x cr i t icou y" . O ut r a t r ans-

f o r magao e a ' apass ivagao ' , a conversao de uma oragao a t iva em

um a oragao passiva (por exemplo, a raanchete "Manifestantes sao

mortos (pe la policia)", em l uga r de "Policia mata man i fe s t an te s" ) .

Tais t r ansformagoe s pode m se r associadas co m aspectos do texto

ideologicamente signi f icat ivos, ta l como a mist i f icagao sistemat ica

d a agenda: ambas pe rmi te m que o age n te de uma oragao se j a

omi t ido .

Um foco ad i c i ona l e sobre aspectos da gramat ica da oragao

q ue dizem respei to a seus siguif icados in terpessoais, isto e , um

foco sobre o m o d o c o m o as re lagoes sociais e as i d e n t i d a d e s

socials sa o m a r c a d a s na oragao . Trata-se da g ramat i ca da ' m o d a J i -

dade' (ver. n o C a p i t u l o 5, o i tem "Modalklade", p a r a e x e mpJ os e

discussao). A a b o r d a g e m do vocabular io baseia-se n o pressuposto

de que diferentes m o d o s de ' lexical izar ' d o m f n i o s de signif icado

pode m e nvolve r sistemas de classificagao ideologicamente dife-rentes, assim ha Interesse em como as areas da experiencia pode m

vir a ser ' r e lex ica l i zadas ' em p r inc fp ios class if icatorios di fe re n te s ,

p or e x e mpJ o , n o curso da l u t a poli t ica (ver, n o Capi tu lo 6 , o i tem

"Metafora", para mai s detalhes) .

Na lingiiistica critica, li a u m a t end enc i a a enf a t i za r de n ia l s o

texto como produto e a re legar a segundo piano os processos de

p r o d u g a o e i n t e rpre t agao de textos. Po r e x e mplo , e mbora se diga

que o obje t ivo da l ingt i i s t ica critica seja a interpretagao critica de

textos, da-se pouca atencao ao s processos e aos problemas da in ter-

pre t agao , aos do(a) anal i s ta- interprete ou aos do(a) p a r t ic ip a n teinterprete. Assim, na an alise, a relagao entre aspectos tex tua is e s e n t i -

dos sociais e m u i t a s vez es r e t r a t ada como se m proble mas e t r a ns -

parente : apesar da ins is tencia de que "nao ha associagao previs ivel

de um para um e n t r e qua l quer f o r m a l ingi i ist ica e q u a l q u e r sen t i d o

social especifico" (Fowler el a f . , 1979: 198). na pr a t i c a at r ibuem-se

valores a e s t ru tu ra s par t i cu lare s ( t a i s como oragoes passivas sem

age n te s ) de modo bas t an te me can ico . Mas os tex tos podem estar

aberlos a diferentes interpretagoes, d e p e n d e n d o do con te x to e

do(a) i n t e rpre te , o que s ign i f i ca que os sent idos soc ia i s do discurso

(bem como ideologias) nao podem ser-simplesmente extrafdos do

50Norman Fairclough Discurso e mudanca socia l 51

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texto sem c ons i d e r a r padroe s e v ar i agoes na distribute, no con-

s u m o e na in terpre tac.ao social do texto . Pode ser que "a i de o log ia

seja Hnguis t icamente med i ad a e habi tual para um(a) lei tor (a) aquies-

cente , n r io -cn t i co(a)" (Fowler et al., 1979: 1.90), mas os le i tores

sao f re q ue n l e me n te c r f l i cos . Uma vez que a l ingi i i s t ica cr i t ica te-

nha estabelec ido sent idos sociais para um texto , ha uma t e n d e n c i a

a t o m a r o s efei tos ideologicos como taci tos.U m a o u t r a l imi ta g a o d a l i ng u is t ica cr i t ica e que el a c onf e r e

u m a enf ase un i l a t e r a l a o s efei tos d o discurso n a reproduce social

d e re lagoes e es t r u tu r as sociais existentes e , c o u s e q u e n t e m e n t e ,

negligencia t anto o d iscurso como d o m i n i o em que se re a l i z a m as

l u t as sociais, como a m u d a n g a n o discurso, u m a d i m e n s a o d a m u -

d a n g a social e c u l t u r a l ma i s am pl a . Isso n ao esfa desl igado d os

comentarios que f i z no u l t i mo pa r agr a f o : a i n t e r p r e t a g a o e um p r o -

cesso at ivo em que os sent idos a que se chegou d e p e n d e m dos re-

cursos usados e da posigao social d o ( a ) in terpre te , e so i g n o r a n d o

esse processo d i n a m i c o e que se pod e c o n s t r u i r textos que s i m -plesmente produzam efeitos ideologicos sobre um rec ipiente passive.

M ai s ge r a l ment e , o q u e esta em ques t ao e a visao exc l us i v ament e

d esc end ent e d o pod er e d a ideologia n a l inguis t ica cr i t ica, q u e cor-

responde a uma enf ase e n c o n r r a d a t a m b e m n a abordage m a l t husse -

r i a n a do g r u p o de Pecheux (d iscut ida a seguir) n a estase social e

n ao n a m u d a n c a , n as est ruturas soc iais e nao na agae social, e na re-

pr od ugao social e nao na transfonnagao social. Ha necessidade de

u m a teoria social d o d i sc u r so basead a em uma reaval iac.ao desses

d u a l i s m o s t o r nad os c omo polos em relacoes de t e nsao , e m ve z de

op t a r - se por um m e m b r o de ca d a par e r e j e i t a r o o u t r o como sefossem m u t u a m e n t e exclusivos.

U m come n tar io f i na l e que na l i ngu i s t i c a c r i t i c a se concebe a

i n te r fa ce l i nguage m-ide o log ia mui to es t r e i tamen t e . P r i me i r o . a l em

d a gr amat i c a e do vocabular io , out ros aspectos d o s t ex t os pod em

te r signif icancia ideologies - por e x e m p l o , a e s t r u t u r a a r g u m e n t a -

t iva ou na r ra t iva geral d e um t ex t o . Segundo, a l i ng u is t ica cr i t ica

l i d a p r i nc i pa l menl e c om o m o n o l o g o escrito e te m r e l a t i v a m e n l e

pouco a dizer sobre aspectos i de o log icame n te i m p o r t a n t e s d a o r-

gani za^ao d o d i a l ogo f a l a d o (como a t o m a d a d e t u r n o ) . e m b o r a

haja a l g u m a discussao d as dime nsoe s p r a g m a t i c a s d o s e n u n c i a d o s ,

tais como se ns aspectos d e p o l i d e z (ver , n o C api t u l o 5, o i tem

"Polidez"). Tercei ro , deviclo ao n e g l i g e n c i a m e n t o re l a t ive d os pr o -

cesses d e i n t e r p r e t ac ao , a enfase cai e x a g e r a d a m e n t e na r ea l i zagao

d e i d eo l og i as n os textos. O que e d e i x a d o de l a d o e o sen t i d o em

que o s processes de i n te rp re ta g a o l e va m os i n t e r p r e t es a pre ssupor

coisas que nao estao no le x to e que p o d e m ser de n a t u r e z a i de o lo-

gica (veja um exem pl o no C ap i t u l o 3 , i t em "Pratica discursiva").

(Fai rc lough, 1989b, ap r esen t a u m a discussao m a i s comple t a . )

R e c e n t e m e n t e , os l ingi i i s tas criticos f i ze r am sua p r o p r i a c r i t i -

ca do t r aba l ho an t e r i o r (Kress, 1989; Fowler, 1988a), i n c l u i n d o

a l guns pon t os q u e l ev an t e i an t e r i o r ment e , e d e t e r m i n a d o s m e m -

bros d o g r u p o e nvolve ram-se m u i t o c o m o d esenv o l v i ment o d e

um a abordage m um pouco diferente (Hod ge e Kress, 1988;Kress e

Thr ead go l d , 1988). que d e n e m i n a m 'semiolica social'. Em opos i -

gao a l inguis t ica cr i t ica, ha preocupagao c o m u m a v a r i e d a d e d e

sistemas semioticos, como a l i nguagem, e com a i n t e r - re l agao en t r e

l i n g u a g e m e semiose v i s u a l . O s processes di scur s ivos de p r o d u g a ee i n t e r p r e t agao t e x tua l to rna ra m- s e uma p r eoc upagao c en t r a l , e ha

mais a t e n g a o e x p H c i t a a o d e s e n v o l v i m e n t o d e u m a t e o ri a s o c i a l

de d iscurso, com uma or ientacae para a lu ta e a m u d a n g a historica no

discurso, que se cent ra em uma ten tat iva d e deseuvolver uma teor ia

do ge ne ro de discurso.

Pecheux

M i c he l Pec heux e seus colaborade re s (Pecheux el al..1979;

Pec heux , 1982) d esenv o l v er am u m a abordagem cr i t ica a a n a t i s e d e

d i sc u r so q ue , cemo a l inguis t ica cr i t ica, t e n t a c o m b i n a r uma t eo r i a

soc i a l d o d i sc u r so c om um met ed o d e ana l i se t ex t ua l , t r a b a l h a n d o

p r i n c i p a l m e n t e c o m o d i sc u r so po l i t i c o escrito. S u a pesqu i sa (e m

se l i g a d o consc ie u te me n te a d e s e n v o l v i m e n t o s peliticos n a F r a n c a ,

e spe c ia lme n te a re lacao en t r e o s pa r t i d os c emuni s l a e socia l is ln

nes a n o s 1970 e u m a c o m p a r a g a o de seu discurso pol i t ico .

A f o n t e pr i nc i pa l d a abo r d agem d e Pec heux na t eo r i a soc ia l

fo i a teor ia m a r x i s t a d e ideologia d e Alth usse r (1971). A i t husse r

en f a t i za a au t ono mi a r e l a t i v a d a id eo l og ia d a base ec onomi c a e a

52 N o r m a n F a i r c l o u g h Discurso e m u d a n c a s o c i al 53

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contr ibuic.ao significativa da ideologia para a reproduce ou t rans-

f o r m a g a o d as relagoes economicas . Ele t ambe m a r g u m e n t o u q u e ,

longe de ser me rame n te 'ideias' de scorpor i f i cadas , a ideologia

ocorre em formas mat e r i a l s . Alem disso, a ideologia f u n c i o n a pela

const i tuicao ( ' in terpelac,ao' ) das pessoas em suje i tos sociais e sua

f ixacao em 'posigoes' de su j e i t o , e n q u a n t o ao m e s m o te mpo Ihes

da a ilusao de serem agenles livres. Esses processes realizam-se no

i n t e r i o r de var i as ins t i tu igoes e organizagoes, la is como a e duca-

gao, a famil ia ou o dire i lo, que na concepcao de Althusser f u n c io -

n am como d imensoes ideologicas do Estado - que c h a m o u de

"aparelbos ideologicos de estado" (AlEs).

A contribuigao de Pecheux a essa teoria foi desenvolver a

i de i a de que a l i uguage m e uma forma mate r i a l da i de o log ia fun -

darne n ta lme n te i mpor t an t e . Ele usa o te rmo 'discurso' p a r a e n fa t i -

za r a nalureza ideologica do uso l inguis t ico. 0 discurso "mos t ra os

efe i tos da luta ideologica no funcionamento da l inguagem e , de

modo inverse, a existencia de mater ial idade l inguistica na ideologia"(Pecheux, citado em C our t i ne , 1.981). Um AIE p o d e se r concebido

como um complexo d e ' fo rmagoe s ideologicas' i n t e r - r e l ac ionadas ,

cada qua l corresponded o a p r o x i m a d a m e n t e a u m a pos igao de

classe n o in ter ior do AIE. Pecheux sugere q ue cada pos igao i ncor -

pora uma ' formagao discursiva' (FD), um termo que tomo u empresta-

do de Foucault. Uma FD e "aquilo que em uma dada formacao

ideologica. . . de te rmina 'o qu e pode e deve se r difo"' (P e ch e ux ,

1982: 111, ilalico no original) . Isso e c o m p r e e n d i d o em t e rmos

especif icamente semanticos: as pa lavras "mudam se n se n t ido de

acordo com as posigoes de quern as 'usa'" (Pecheux et oi., 1979:33). Alem disso, embora d u a s di ferentes formagoes discursivas

possam te r de te rminadas pa lavras ou expressoes e m c o m u m , a s

relates e n t re essas e out r as pa lavras e expressoes d i fe r i r a o n o s

dois casos. e assim t a m b e m d i f e r ir a o os sent idos dessas p a l a v r a s

o u expressoes p a r t i l h a da s , po r que e sua r e l agao com as ou t r as que

d e t e r m i n a sen seut ido. Fo r exemplo , ' m i l i t a n t e ' s ig n i f ica coisas

difereutes no discurso siudical (no q u a l poderia ser s i n o n i m o de

' a t i v i s t a ' e a n t o n i m o de ' apa t ico ' ) e no di scur so conse rvador d a

di rei ta (n o q u a l p o d e r i a s er s i n o n i m o d e ' s ubvers ive ' e a n t o n i m o

de 'mode rado ' ) . Ade mai s , os sujeitos sociais sa o cons t i t u idos em

relagao a FDs particulares e seus sentidos; essas FDs sao, de acordo

com Pecheux, faces Jingi i i s t icas de ' "domfn ios de pe i i same nkr . . .

sociohistor icamente const i tuidos na forma de pontos de estabi l iza-

cao que produzem o suje i to e s i m u l t a n e a m e n t ejunto c o w e l e o q u e

Hi e e dado ver , compre e nde r , fazer, temer e esperar" (P e ch e ux ,

L982: 112-113, i t a l ico no or ig ina l ) .

As FDs sao pos ic ionadas em complexos de FDs r e l ac i onad as

refer idas como ' i n t e rd i scur so ' , e os se n t idos especfficos de uma

FD sao de te rminados 'de fo ra ' por sua relacao com o u t r a s no in-

te rdiscurso. O ' e s t a d o ' par t i cu lar do i n t e rd i scur so e m um m o m e n t o

pa r t i c u l a r (qua i s as FDs nele c ont i d as e q u a i s suas re lagoes) de-

pende do estado da luta ideologica em um AIE. E nt re tan to , essa

de te rminagao e x te rna de FDs e a l go de que os su je i t os t i p i c a m e n t e

n ao tern consciencia ; os su j e i t os t end em a perceber a s i me smos

e q u i v o c a d a m e n t e como a fon te dos sent idos de uma FD, q u a n d o n a

verdade sa o seus efeilos. Pecheux refere-se a 'p re -cons t ru idos ' ,

e le me n tos ja f o r m a d o s q ue ci rculam entre as FDs, que sao perce-b idos como o que e ' d a d o ' ou conh e c ido ou j a di to pelos par t i c i -

p a n t e s , e n q u a n t o eles r ea l ment e se or i g i nam fora dos suje i tos, no

in te rd i scur so . Um e x e mplo ser iam expressoes c o m o " o a u m e n t o

n os padroes de vida do pos-guerra", ou "a ameaga sovietica", que c ru-

za m de uma FD a outra como expressoes ja pronlas, j u n t o com suas

pressuposicoes (que houve um aumento e que existe uma ameaya) .

Um aspe c to impor t an te e que os suje i tos n em sempre se iden-

t if icam t o t a lme n te com uma FD. Os su j e i t os pode m d i s t anc i ar -se

de uma FD pelo uso de marcadore s m e tad i scurs ivos (ve r , no Ca-

pi' tulo 4, o i tem "Metad iscu rso") , tais como 'o assim c h a m a d o x' ,

'o q u e voce ch ama u m x' e o 'x'. Pecheux d e n o m i n a isso ' con t r a-

identificagao' - o distanciar-se de praticas existentes sem substitui' -ias

por novas prat icas. Onde um a ta l substituigao ocorre, trata-se de uma

si tuagao m a i s r a d i c a l de 'desident i f icacjJo' , q ue e nvolve "o 'rear-

r a n j o d a expulsao' d o c o m p l e x o d e f o r m a ^ o e s ideologicas (e

d as fo rmagoe s discursivas q ue a f estao imbricadas)" (Pecheux,

1982: 159). E n t r e l a n t o , Pecheux considera a possibilidade de

d es i d en t i f i c ac ,ao e s p e c i f i ca m e n t e l i g a d a a t e or i a e a p r a t i c a re -

v o l u c i o n a r i a d o m a r x i s m o - l e n i n i s m o , n a f o r m a or gan i zac i ona l d o

P ar t i do Comun i s t a .

Norman Fairclough Discurso e mudanca s o c i a l 55

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O me todo de anal i se e denominado ' ana l i se au t omat i c a do

discurso' po rque par te do p roced imento e c o m p u t a d o r i z a d a c o m o

fi m de ident i f icar FDs e m um corpus de textos. Pecheux et a f.

(1979: 33) notam que a compos icao me sma de um c orpus incorpora

"uma hipotese sobre a exis tencia de uma ou mais FDs" q ue ' do in i -

na m ' os t ex tos c ons t i t u i n t es e sugerem q u e u m a ta l hipotese deve-

ri a or ig inar -se em discJpJinas especialis tas , tais c o m o a h istor ia ou

a sociologia, e nao nos propr ios anal istas de discurso, para evi tar

ci rcular idade . A r eun i ao de um corpus na base de uma hipotese e a

me sma coisa que impor homogene idade n o dorm'nio tex tual , e ,

alem disso, o corpus e homogene izado po r me io da exclusao de

par t e s de tex tos cujas ' cond igoes de produgao ' (conse qi t e n te me n te

cujas FD s dominan te s ) sa o diferentes das pr incipals FDs.

A p r i m e i r a p a r t e d o proce d ime n to e u m a ana l ise l ingi i isl ica d o

texto em oragoes (isto e, oragSes simples), usando-se os procedi-

m e n t o s ' t r ansformac iona i s ' do lingiiista Zellig Harr is (1963). Po r

exemplo , "L amento sua par t i da" seria anal i sada e m duas o ragoe s :"Lamenlo", "que el a par t i u" . Sao prod uz idos g raf i cos q u e m o s t r a m

o s t ipos d e relates exis lentes entre as oragoes (coordenagao, su -

bord inagao , comple me n tagao , etc.). Submetem-se entao tais graf icos

a um s e g u n d o proce d ime n to , computador i z ado , para d e t e r m i n a r as

pa lavras e as expressoes que se e ncon t r am em uma re lacao de

' s ubs t i tu igao ' , isto e, as que pode m ocor re r n as m e s m a s posigoes

n as oragoes, as que sao semelhantes em sua es t r u lu r a g r am a t i c a l e

as que sao r e i ac ionadas , de m o d o se me lh an te , a out r as oragoes. Por

e x e mplo , ' m i l i t a n t e s ' e 'subversivos' es tao em uma r e l agao d e

subs t i t u igao e m " D e v e n a m o s obse rvar m i l i t an te s que de s t roe m a

indus t r i a" , "A n a g a o deve proteger-se de subvers ivos que so l apam

nossas i n s t i t u igoe s" . Quando as p a l a v r a s ou as expressoes sa o

postas em uma relagao de subst i tu igao em um texto, estabelecem-se

relagoes semanticas e n t r e elas - tais como as relates de s i n o n i m i a

(A impl i ca B, e B implica A) ou i mp l i c agao (A impl i ca B, mas B

n ao impl ica A)-que provave lme n te sao dist in t ivas na FD a q n a l o

texto esta associado. O procedimeuto f oc a l i za d e t e r mi nad as ' p a l a -

vras -chave ' , pa l av r as de excepcional signi t ' icado social ou poli t ico

(por exemplo, ' luta ' no discurso politico). (Para um a descrigao ma is

detalhada do m e todo de analise, ve r M aingue ne au , 1976; Thompson,

1984: 238-247.) F i n a l m e n t e . os resul tados dos proce d ime n tos a u a -

Ifticos precisam ser in terpre tados. embora se dedique pouca a ten^ao

a proble mas associados a i n t e r p r e l agao e o me todo par ega bas t an t e

ad hoc.

A forc,a da abordage m de P e ch e ux , e a razao para con s ide ra- la

como crf t ica , e que e la casa uma teor ia mar x i s t a do discurso com

metodos l ingi i fst icos de anal ise textual . E n t r e t a n t o , o t r a t a m e n t od os lextos e i usa t i s f a to r io . Como ind ique i an t e r i o r ment e , eles sa o

homogene izados an te s da anal i se pela mane i r a como o corpus e

const i tuido (Court ine e M a r a n d i n , 1981: 22-23), e o efei to d a a p l i -

cagao de proce d ime n tos t r ansformac ion a i s a ana l i s e de t e x tos e m

orac.6es separadas e e l im inar aspectos d is t in t ivos da organ iz agao

textual . Alem disso, tais procedimentos possibi l i tam u m foco sele-

t ivo sobre par tes dos textos, o que significa que os obje tos de a n a -

lise sa o e fe t ivame n te as oragoes e nao os textos comple tes . Os

textos t ambe m sa o t ratados como p r o d u t o s , e x at ame n te como n a

l ingi i i s t ica cr i l ica, e os processos discursivos de p r o d u g a o e inter -pre t agao t e x tua l r ecebe m pouca atenc,ao. S ao ana l i s ados e m te rmos

sema nt icos est re i tos (uma cr it ica que f iz tamb em a Pot ter e W ethe-

rell) com um foco pr ed e t e r mi nad o em 'pa lav ras -chave ': s ao consi-

d e r a d a s a p e n a s as d imensoes i d eac i ona i s do s ign i f i cado , e n q u a n t o

d e i xam de se r con te mpladas as d im e usoe s i n t e rpe ssoa i s que d i z e m

respei to as re lagoes sociais e as i d en t i d ad es sociais e sao favoreci-

das as relagoes d e s ign i f i cado mai s abs t r a l as em d e t r i m e n t o d as

propr i e dade s do sent ido dos enunciados no coiitexto. Sao i gnorados

m u i t o s aspectos da f o r m a e da organ iz agao dos textos q ue recebem

ate ngao e m ou t r as abordage ns . Em suma, os t e x tos sao t r a t ados

como evidencias p a r a hipoteses sobre as FDs f o r m u l a d a s a priori,

c o n l r a r i a m e n t e a t e n t a t i v a pelos a n a l i s t a s d e e s l u d o c u i d a d o s o

daqu i lo que e distintivo no texto e no evento discursivo. Ha uma

t e nde nc ia se me lh an te na t e or i a a l t husse r i ana de e n fase na r e produ-

gao - como os sujei tos sao pos ic ionados de n t ro de f o r magoes e

como a d o m i n a g a o ideologica e asse gurada - em d e t r i m e n t o da

t r ans f o r mac ao - como os suje i tos podem coutestar e progressiva-m e n t e re e s t ru turar a d o m i n a g a o e as formacoes m e d i a n t e a pra t i ca .

Suger i que semelhante enfase ocorre na l ingufs t ica critica. Conse-

qi i e n te me n te , h a uma visao un i l a te ra l , d a pos igao do su j e i t o como

56 Norman Fairclough Discurso e mudan^a social 57

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um efeito; e negl igenciada a capac idade do s sujei tos d e ag i r em

como age n te s , e m e s m o de t r a ns forma re m eles propr ios as bases da

su j e i c ao . A teoria d e 'des identif icagao ' como muda nc .a ge rada ex -

t e r i o r ment e p or u m a pra t i ca pol i t ica par t i cu lar e uma a l te rna l iva

imp laus ive l p a r a construir a possibi l idade de t r ans f o r magao em

nossa visao do di scur so e do sujei to .

A ' se gunda geragao ' da anal ise de discurso na tradicj io d ePecheux al terou aspectos f u n d a m e n t a l s da abordage m. e m par t e

em resposta as criticas e em p a r t e sob a infhiencia de m u d a n ^ a s

poh ' t icas n a Franca (M ald id ie r , 1984: xi-x iv). Alguns estudos do

discurso politico (por exemplo. Courline, 1981) enfat izam as es-

t ra tegias discursivas de alianc.a e combinacoes de diferentes FD s

q ue t o r n a m o discurso a l t a m e n t e h e le roge ne o e a m b i g u o . Tais pro-

pr iedades nao sao f ac i l ment e a c o m o d a d a s n a visao a n te r io r , em

que as FDs monoliticas tern relagoes estaticas de op osigao. Passou-se a

caracter izar o discurso como possu ido r de ' h e t e roge ne idade cons-

titutiva' (Authier-Revuz, 1982), de propriedades inerentes de 'dialo-gismo* e ' i n t e r t ex t ua l i d ad e ' nos t e rmos de uma t r ad i gao teor ica

di ferente (verB a k h l i n , 198]; Kr i s t ev a , 1986a; e, no Capi lu lo 3, o

i lem "Pratica discurs iva") , e o I r a b a l h o an t e r i o r fo i cons ide rado em

c o n f o r m i d a d e co m m i n h a cr it ica an ter ior , como proced imen tos

para imposic ,ao de h omoge ne idade . O in te rd i scur so passou a ser

considerado como "um processo de constante reestrutura^ao", no

q u a l a d e l i mi t agao de uma FD e " f u n d a m e n t a l m e n t e instavel , n a o

se t r a ta ndo de um l imi te permanente a separar o in ter ior do exterior,

m a s u m l imile entre di ferentes FDs que m u d a d e acordo c o m o q u e

esta em jogo na luta ideologica" (Cour t i ne , 1981: 24). Dada a he te-

roge ne idade const i tu t iva do discurso, par tes espeeif icas de um

texto serao f r equenl ement e ambi v a l en t es , pondo que s toe s para o s

i n t e r p r e t es sobre as FDs mais re levantes para sua interpretat ;ao e,

como observa Pecheux e m u m d e seus ul t imos i r aba l hos (1988),

confe r iudo a a na l i se de d i scn r so o cara t e r de uma d i sc i p l i na i n te r -

pre tat iva e nao d i r e t ament e descr i t iva. Ao me smo t e m p o , ocorre o

a b a n d o n o d a ' ilusao do teorico', de que t ransformagoes radica ls do

interdiscurso sao "autorizadas pela existencia do mar x i smo- l en i n i smo"

(Pecheux, 1983: 32).Com urn novo foco sobre o * even to ' discursivo

par t i cu lar , emerge u m a visao diale t ica. e a poss ib i l i dade d e t r a n s -

formates t o rna-se i ne r en t e a na ture z a h e te roge ne a e c o n t r a d i t o r i a

do discurso:

Q u a l q u e r discurso dado e o s in a l potenc ia l de um m o v i m c n t o

n as fiiiagoes socioliistoricas da identificacao, na medida em que

con s t i tu i . ao inesmo tempo , o re sul tado de lais f i l i acues e o t r a -

b a l h o . . . de des locamenlo em sen espac.o ( P ec heu x , 1988: 648).

Conclusao

Quero concluir esta discussao r e u n i n d o as que s toe s pr i nc ip a l s

a te agora n a f o r m a de um c o n j u n t o d e a f i r ma^oes q ue p o d e m se r

ju lgada s de se jave i s para um a abordagem cr i t ica a d e q u a d a a a n a l i s e

de discurso. Isso fornecera u m q u a d r o pr e l i mi na r d a abordage m

que come go a de se nvolve r n o Capi tu lo 3, e i nd icara sua relacao

com aque las j a di scu t idas . Ao me smo t e mpo, a ju d a r a a ident i f icar

as areas em que a t radigao de anal ise de discurso orientada l in-gu is t icamente , q ue resenhei neste capi tulo, e fraca e pouco desen-

volv ida , p re c i sando se r for talec ida pe la adogao de pressupostos da

l i nguage m e do discurso n a teoria social.

1 . O obje to de anal ise sa o tex los l inguis t icos , que sao a n a l i s a d o s

em termos de sua propr i a especificidade (compare-se Pecheux).

As selegoes de textos que representam utn d o m i u i o par t i cu lar de

prat ica devem assegurar que a diversidade de pr a t i c as e repre-

se n t ada (compf i re-se Sinc la i r e Coul th a rd) e e vi t a a h om oge ne i -

zagao (compare-se Pecheux).2 . Alem de textos como ' p rodu tos ' de processes de pr od ugao e

inlerpretacao tex tual , os proprios processos sao analisados

( comparem-se Sinc la i r e C o u l t h a r d e a lingiiistica critica e con-

f ira-se a abordagem a anal ise de discurso cri t ica e m van Dijk

(1988) p a r a a atencj io d e t a l h a d a ao s processos d iscu rs ivos ) .

A anal i se propr i ame n te d i ta e considerada como i n t e r p r e t a^ao , e

o s a n a l i s t a s b u s c a m ser sens f v e i s a suas proprias t e n d e n c i a s

interpretat ivas e a razoes sociais (comparem-se Sinclair e

C oul t ha r d , a ana l i se da conversayao, a l ingi i t s t ica critica).

58 Norman Fairclough Discurso e mudanipa socia l 59

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3. Os (extos podem se r h e te roge ne os e ambiguos , e pode-se recor-

rer a conf iguragoes de di ferentes t i p o s d e discurso e m sua p r o -

d u g a o e interpre tagao (Labov e Fanshel; compare m-se a ana l i se

d a conversagao , a 'pr imeira gerae j io ' do g r u p o de P e ch e ux ) .

4. O discurso e e s ludado l i is tor ica e d i n a m i c a m e n t e . em terraos de

configuracoes m u t a n t e s de t i pos de di scur so em processos dis-

cursivos, e e m te rmos de como t a i s mudangas ref le tem e cons-t i tue m processos de m u d a n g a social mais amplos (a ' s e g u n d a

geragao ' do g r u p o de Pecheux, a semiotica soc ia l ; compare m -se

Labov e Fansh e l , a ' p r ime i r a geragao ' do g rupo de P e ch e ux , a

liugiiistica critica).

5. O discurso e socialmeiite construtivo (liugiiistica critica, Pecheux,

Pot ter e Wetherell) , c ons t i t u i nd o o s sujei tos sociais, as relates

sociais e os sislemas de conh e c ime n to e cre nga , e o e s ludo d o

discurso focaliza seus efeitos ideologicos co nstru tivos (Pecheux,

l ingi i is t ica critica; compare-se Labov e Faushel) .

6 . A anal i se de di scur so pre ocupa-se n a o a p e n a s com as re lagoesde pode r no d i scur so (compare -se a a na l i se da conve r sagao) ,

m a s t a m b e m c o m a m a n e i r a como as re lagoes de poder e a l u t a

d e p o d e r m o l d a m e t r a n s f o r m a m as pr a t i cas discurs ivas de u rn a

sociedade ou insti tuicao ( ' segunda geragao' do gnipo de Pecheux;

compare m-se as abordage ns na o-c r i ti cas , a l i ng i i i s t ica crf t ica) .

7. A anal i se de discurso cuida do f unc i onameu t o deste n a t r ans -

fo rmagao c r i a t iva de i de o log ias e pr a t i cas como t am be m do f u n -

cionamento que assegura su a reprodugao (comparem-se Pecheux, a

l ingi i ist ica cr i t ica).

8 . Os textos sao anal i sados em le rmos de u m a g a m a dive r sa de as-

pectos de f o r m a e s ign i f i cado (por e x e mplo , as propr i e dade s dodialogo e da es t r u tu r a t e x tua l c om o t a m b e m o v oc abu l a r i o e a

gramat ica ) pe r t e nce n te s t an t o as f ungoes i de ac iona i s da l i n g u a -

g e m c o m o a s interpessoais (comp are m-se P ot t e r e W e th e re l l ,

Pecheux).

O que se busca e uma anal ise de discurso que focal ize a va r ia -

bi l idade , a m u d a n g a e a luta : var i ab i l i dade e n l r e as pr a t i cas e he t e -

roge ne idade e n l r e elas como ref lexo s incron ico de processos de

m u d a n g a his to r ica q u e s a o m o l d a d o s p e l a l u l a e n t r e as fo rgas

sociais. E rabora o s p o n t o s 4, 5 e 6 recebam a l g u m a p o i o , espe-

c ia lme n te nas abordage ns criticas a ana l i se de d i scur so que d is cu t i

an t e r i o r ment e , precisamos i r a teor ia social p a r a encoi i t rar d e s e n -

vo lv imentos completes e explici tos . F o u c a u l t c ont r i bu i com sua

val iosa percepgao de todos eles, como argumentarei n o Capftu lo 2 .

Entre tanto, nem a t radigao critica n a anal ise de discurso or ienlada l in-

giiisticamenle nemFoucaul t l idam satisfatoriamente com o pont o 7 -o m o d p c o m o o discurso c ont r i bu i t a n t o p a r a a r e produgao c o m o

p a r a a t r ansformagao d as sociedades. T al d u a l i d a d e do discurso e

de importancia central no quad r a teorico que apresento n o Capi tulo 3,

e seu negligenciamento uos escritos de Foucault e associado a fraque-

za s teoricas e metodologicas fundamenta ls em seu t rabalho.

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C a p f t u l o 2

Michel Fo u c au l t e a a n a l i s e de d i scurso '

A p r a t i c a d o discurso r evo l u c i o u a r i o e do d i scur so cient i f ico, nos

i i l t i m o s dois secu los . n a o n l iber tou dessa i d e ia d e qu e a s p a l a v r a s sa osopro. u m m u r m u r i o e x te r n o , um ha t e r d e asas qu e se tern d i f i c u l d a d e

de o u v i r n o assunlo ser io que e a l i i s to r i a ?

Mi c h e l Foucault , A arqueohgia do saher

Foucaul t (e m t i d o uma e norme inf luencia sobre as ciencias so-ciais e as h u m a n i d a d e s . e a popular i z agao do conceito de discurso

e de anal i se de discurso como um me todo pode par c i a l ment e se r

a t r ib u ida a essa inf luencia . E i mpor t a i it e exami n a r se u t r aba l ho em

detalhes p o r d u a s razoes . Pr i mei r ament e , a abordagem de ana l i se

d e discurso de F ouc au l t e a m p l a m e n t e refer ida c o m o u m mocle lo

pelos cientistas sociais. e a par t i r do i ns l an t e e m q u e eu estou de-

f end end o u m a abordagem diferente pa r a a ana l i se de discurso em

estudos d e mud an^as soc i a i s e cul turais , a relagao ent re as d u a s

abordage ns necessi ta se r esclarecida. Existe u m c ont r as te p r i nc i pa l

aqui entre uma analise de discurso t ex tua lmente (e, por conse-g u i n t e , l ingi i ist icamente) or i en t ad a (d o r av an t e ab r ev i ad a p a r a

ADTO) c o m o a m i n h a e a abordagem mais absfrata de F o u c a u l t .

E u t a r abem preciso dar as razoes pe las q u a i s os cientistas sociais

deveriam considerar o uso da ADTO; no f im do capitulo , argurne n ta-

re i como isso pode c ond uz i r a a na l i s e s sociais m a i s s a t i s f a to r ia s .

A se gunda r azao pa r a um c ap i t u l o sobre F ouc au l t j a f o i a lu d i -

da: o desenvolvimento de uma abordagem para a anal i se de d iscurso

Tra d u g a o d e C e l i a M a r i a La d e i ra M o t a .

62 Norman Fairclough Discurso e mudanca social 63

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que seja teor icamente ade quada . t anto quanto prat icameute uti l izavel ,

requer uma sintese da analise de discurso or i en t ad a lingiiist icamente e

a compreensao da teoria social recente sobre a lingiiagem e o discurso.

O t r aba l ho de Foucaul t r ep r esen t a u m a i mpor t an t e c on t r i bu i gao

para u m a t e or i a soc i a l d o d iscu rso em areas c o m o a r e l a g a o en -

t re discurso e p o d e r , a cons t rue . ™ d i scur s iva d e su je i t os sociais

e d o c o n h e c i m e n t o e o f u n c i o n a m e n t o d o di scur so n a m u d a n g a

soc ia l . C o m o eu d e s t a q u e i n o fi m d o C a p i t u l o 1, essas sao are as

e m q u e a b o r d a g e n s o r i e n t a d a s l i n g i i i s t i c a m e n t e s a o f r a c a s e

n a o - d e s e n v o l v i d a s .

No e n t a n t o , u m a vez que a abordage m d e Foucaul t para o dis-

curso e o con te x to i n t e l e c l u a l n o q u a ! fo i d e s e n v o l v i d a sa o ta o

d i f e r en t es d o m eu propr io t r aba lh o , uao se pode s imple sme n te

apl i car o t r aba lh o d e Foucaul t em a n a l i s e d e discurso: e, c o m o d iz

C our t i ne , uma questao de "por a perspect iva de Foucaul t para f u n -

cionar" (1981: 40 ) d ent r o da ADTO e t en t a r operacionalizar sua

percepgao em metodos reais de anal ise . A proe mine nc ia dada aodiscurso n o s t r aba lh os inic iais d e Foucaul l e uma conse que nc ia de

posigoes q ue ele assumi u em r e l agao a c o n d u g a o da pe squ i sa n a s

ciencias humanas. E le optou p o r e n focar a s pra t i cas d i scur s ivas

n u m esforgo para ir alem d os dois pr i nc i pa l s m o d e l o s a l t e r n a t i v o s

de investigate disponfveis na pesquisa social - o e s t r u t u r a l i s m o e

a hermeneu t ica (Dreyfu s e Rab ino w, 1982: x i i i -xxi i i ) . Fou caul t

preocupou-se com as prat icas discursivas como constitutive do

conh e c ime n to e com as cond igoe s de t r ans f o r magao do conheci-

mento e m u m a ciencia , associadas a u m a f o r magao discursiva.

Esse contexto i n te l e c tua l a ju d a a explicar as pr inc ipa l s dife-

r engas entre a anal ise de discurso de Foucaul t e a da ADTO. E m

pr ime i ro lugar , Fou caul t e s t ava p r e o c u p a d o , e m a l g u m a s fases d e

se u I r aba lh o , com um t ipo de discurso b ast an te especif ico - o dis-

curso das c i enc ias h um ana s , como a m e dic ina , a p s iq u ia t r i a , a eco-

n o m i a e a gramat ica. A ADTO, por ou t ro l ado , esta p r e o c u p a d a ,

em pr i nc i p i o , co m q u a l q u e r l ipo de di scur so - conve r sagao , d i s c u r -

so de sala de aula. discurso da mi 'dia, e assira p or d i an t e . Em se -

gundo lugar , como ja i n d i q u e i , e n q u a n t o a anal i se d e lex tos d e

l i nguage m fa lada ou escr i ta e a par te central da ADTO, el a n a o e

um a par te da anal ise de discurso de Foucau l t . Seu foco e sobre as

' cond igoes de possibi l idade ' do discurso (Robin. 1973: 83), sobrea s 'regras d e f o r m a g a o ' , q u e d e f i n e m possiveis 'objetos', 'rao-

dai idade s e n u n c i a t i v a s ' , ' sujeitos ' , 'conceitos' e 'es t ra teg ias ' d e

um t i po par t i cu lar de discurso (esses termos sao explici tados a se-

guir) . A enfase de Foucault e sobre os domin ios de conhecimento

que sa o const i tufdos p or tais regras.

E u citei an t e r i o r ment e a op in i ao de Cour t i ne , de que nos deve-n'amos "por a perspectiva d e Foucaul t para func ionar" de n t ro da

ADTO. A nogao da 'perspectiva de F o u c a u f t ' , n o e n tan to , pode se r

e nganadora , dadas as m u d a n g a s de e n fase de n t ro de se u t r aba lh o .

(claramente descritas em Davidson, 1986). E m seu t r aba lh o arque o-

logico i n i t i a l , o foco era nos t ipos de discurso ( ' fo rma^oes d i s c u r -

s i v a s ' , ve ja ad i an te ) como re g ras para a c o n s t i t u i g a o d e areas d e

conl lecimento. Em seus u l t i mos e s tudos genealogicos, a enfase

m u d o u para a_ § relacoes e n t re conh e cime n to e pode r . E no t r aba lh o

dos ul t imos anos de Foucault , a preocupa^ao era com a et ica, ou

"como o i nd i v f d uo deve const i tui r -se el e propr io como um suje i tom o r a l de suas propr i as ac.6es" (Rabinow, 1984: 352). E m b o r a o

discurso permanec.a uma preocupagao ao longo de toda a obra, seu

stains m u d a , e assim m u d a m tambem as implica§6es para a ADTO.

Neste capitulo, eu irei primeiro explicar e aval i a r as concep-

goes de discurso n os estudos arqueologicos de Foucaul t (especial-

mente Foucaul t , 1972) e. era seguida, discul i re i c o m o o stains do

discurso se allera no t r aba lh o ge ne alog ico d e Foucaul t ( e n f o c a n d o

Foucault , 1979 e 1981). O p r i n c i p a l objet ivo nessas segoes sera

ident i f icar a lgum as pe r spec t ivas e percepgoes val iosas acerca d o

discurso e da l i nguage m n o t r a b a l h o de Foucaul t , que devem ser

i n t e g radas a teor ia d a ADTO e o p e r a c i o n a l i z a d a s e m sua me todo-

logia , q u a n d o fo r ade quado . E u concluo , n o e n tan to , d i s c u t i n d o

ce rt as f r ag i l i dade s no t r aba lh o de Foucaul t , as qu a i s l i m i t am se u

v a l o r p a r a a ADTO, e como a ADTO p o d e r a c o n t r i b u i r p a r a

reforcar a an al ise social , ate me smo dentro da t radigao fouca u l t i a na .

O que eu es tou oferecendo, assim, e uma le i tura de Foucaul t de um

ponto de vista especifico; explicagoes e cr i t icas m a i s de ta l h a da s e

equilibradas sao disponiveis em outras fonles"(por e x emplo , Dre y fu s

e Rabinow, 1982; Hoy, 1986; Fraser, 1989).

64 N o r m a n F a i r c l o u g h Di scurso e m u d a n c a social 65

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Os trabalhos arqueologicos de Foucaiil t

Os estudos arqueologicos in iciais de Foucaul t (e u estarei m e

refer indo par t icularmente a Foucaul t , 1972) incluem as d u a s p r i n -

cipals contr ibuigoes teoricas sobre o di scur so que precisam ser in -

corporadas a ADTO. A pr imei ra e uma visao const i tut iva do

discurso, que euvolve um a 1109,00 de discurso c o m o a t ivame n tecons t i t u i ndo ou cons t ru indo a sociedade em var ias dimensoes : o

discurso const i lu i os obje tos de conhecimento , os suje i tos e < i s

formas sociais do 'eu', as relagoes sociais e as estruturas concei tuais.

A s e g u n d a e uma enfase n a i n t e rde pe nde nc ia das prat icas discurs i-

vas de uma sociedade ou iusti tuigao: os textos sernpre recorrem a

out ros textos co n t e m p e ran eos ou his toricamente an te r io re s e os

t r a n s f o r m a m (uma propr i e dade c o m u m e n t e refer ida c o m o a inler -

textualidade de textos - ver, no Capitulo 3, o item "Pratica discursi-

va"), e qualq ue r ti po de prat ica discursiva e gerado de combinagoes

de outras e e def inido pelas suas re lagoes co m outras prat icas dis-curs ivas (uma perspect iva reconhecida por Pecheux na pr imaz ia

que ele at r ibuiu ao in terdiscurso - ve ja , no Capi tulo 1. o item

"Pecheux"). Embora o foco de Foucaul t (.1972) seja sobre as for-

magoes discursivas da s ciencias humanas, sua percepgao e t ransfe-

rfvel para todos os t ipos de discurso.

O que Foucault entende por 'discurso' e 'analise de discurso'.

em seus t raba lhos arqueologicos? E le ve a anal ise de discurso

voltada para a anal ise de e mmcJ ados (a t r adugao usual do t rances

enonces\ o que e um pouco enganador , ao insinuar que enonces sa o

apenas assergoes, opostas a perguntas, ordens, ameagas, e assim po r

diante). De acordo com uma formulae.ao (Foucault, 1972: 107-108).a anal i se de e nunc iados e uma de uma serie de formas de a na l i s a r

desempenhos verbais. As demais sa o "uma anal ise logica de pro-

posigoes, uma anal ise gramat ical de frases. uma anal ise psicologica

ou con te x tua l de formulae,oes". A anal i se d i scur s iva de e n u n c i a d o s

n ao subs t i t u i esses oulros t ipos de analises , mas nao pode t a m b e m

se r reduzida a eles. Um a conse que nc ia e que , para Foucaul t , a

anal ise de discurso nao pode ser e q u i p a r a d a a anal ise l inguist ics,

ne m o discurso a l i n g u a g e m . A anal i se de discurso diz respei to nao

a especif icagao das f rases que sao possfveis ou gramat icais. mas a

especificagao sociohistoricamente variavel de formagoes discursi-

va s (a lgumas vezes referidas como discursos), s is temas de regras

q ue t o rnam possfvel a ocorrencia de cer tos enunciados, e nao ou-

tros, em de te rminados tempos, lugares e local izacoes ins t i tuc io-

nais. A concepgao d e anal i se l ingiifstica a*-qual Foucault esta

recorrendo e da t ada (o l ivro de Foucaul t , 1972, fo i escrilo em

1969). e o t i po de regras as q u a i s ele se refere parece ser o que ossociol ingii is tas a t u a n t e s n os anos 1970 chamaram de regras socio-

l iuguist icas, regras sociais de uso da l i n g u a g e m . No e n t a n t o , a

perspectiva d e Foucaul t e mui to d i f e re n te d e q u a l q u e r u m a encon-

t r ad a n a sociolingi i is t ica; par t e da di ferenga e a fa i t a de pre ocupa-

gao com textos de l inguagem anteriormente referidos.

Um a formagao discursiva consiste de regras de f o r magao p a r a

o c o n j u n t o par t icular de e nunc iados que per tencem a ela e, m a i s ;

especif icamente , de regras para a fo rmagao de objetos, de regras ,

para a formagao de modal idade s enunciat ivas e posigoes do suje i to, -,

de regras para a f o r m a g a o de conceitos e de regras para a fo rmagao jde estrategias (Foucault, 1972: 31-39). Essas regras sa o cons l i tu fda s

p o r c o m b i n a g o e s d e e l e m e n t o s di scur s ivos e nao-d iscu rs ivos

an te r io re s (e x e mplos sa o fo rnecidos a segu i r ) , e o processo d e

ar t i cu lagao desses elementos faz do discurso um a prat ica social

(Foucaul t u sa a expressao prat ica discursiva). E u discut i re i cada

tipo de regra apresentando um resutno da posigao de Foucaul t e

i nd icagao breve de seu interesse e suas imp l icagoes pote nc ia i s para

a anal ise de discurso.

A formacao dos objetos

A percepgao es sencia l no que d iz respei to a f o r m a g a o de

obje tos e que os obje tos do discurso sa o c ons t i t u f d os e t ransfor -

m a d o s em discurso de acordo com as regras de uma formagao dis-

cursiva especifica. ao c ont r a r i o de exist i rem iudependentemei i te e

s implesmente serem refer idos on discut idos dentro de um discurso

par t i c u l a r . Por obje tos, Foucaul t entende obje tos de conhecimento,

as ent idades c j u e as d i sc i p l i nas par t iculares ou as ciencias reconlie-

cem d e n t r o de seus campos de interesse e que elas t o m a m c o m o

66 Norman Fairclough Discurso e mudanca s o c i a l 67

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alvos de investigac,ao. (Esse se n t ido de objetos pode ser es t end i d o

para alem de d i sc i p l i nas ou cie"ncias f o r ma l ment e o r gan i zad as pa r a

as en t idades reconhecidas n a v i d a c omum.) F ouc au l t da o exempl o

da const i tu igao da loucura como um ob j e t o n o discurso d a psico-

patologia , a par t i r do seculo XIX e m d i an t e ; out ros exempl os p o -

der iam ser a const i tuicao de nacao e raca. ou l i be r d ad e e e mpre sa

(ver Keat e Abe rc rombie , 1990)n o discurso c o n t e m p o r a n e o dami'dia e d a pol f t ica , ou de l e t r ament o n o discurso educaciona l . De

acordo co m F ouc au l t . "a doeuga ment a l fo i c ons t i t u i d a p or t u d o o

que foi di to em t od os o s e n u n c i a d o s que a nome avara , d i v i d i a m ,

descreviam, explicavam...1' (1972: 32). Alem do mai s , a l o u c u r a

nao e um objeto estavel , m a s esta sujei ta a t r ansformagoe s con t j -

n u a s , t an to en t r e f o r mac oes discurs ivas , c o m o d ent r o d e u m a d a d a

fo rmacao discursiva. Isso significa q u e u m a f o r magao d i sc u r s i v a

precisa se r def inida d e ta l f o r ma q u e p e r m i t a a t ransformacj io de

seus objetos, e Foucault sugere que "a u n i d a d e de um discurso e

baseada n a o t a n t o na pe rmane nc ia e na s i ngu l a r i d ad e de um objeloq u a n t o n o espaco n o q u a l var ios objetos e me rge m e sao c o n t i n u a -

m e n t e t r ans fo rmados" (1972:32).

F - ' T f c . O que e de maior signif icance aqu i para a an al i se de d iscurso e

a visao de discurso como cons t i tu t iva - c o n t r i h u i n d o p a r a a p r o d u -

cao, a t ransformagao e a r ep r od ugao do s objetos (e , como veremos

logo, d os sujei tos) d a vida social. Isso i mp l i c a que o discurso tern

um a relacjio a t iva com a real idade, que a l i n g u a g e m signi f ica a

r ea l i d ad e no se u t ido da coiistruc.no d e s i gn i f i c ad os pa r a ela , em vez

de o discurso te r uma relac,ao passiva com a re a l ida de , com a l i n -

guagem m e r a m e n t e se refer indo ao s objetos. os q u a i s sa o l idos

- c o m o d ad os n a r ea l i d ad e . A v i sao r e f e r end a] d o r e l a c i o n a m e n t o

en t r e l i nguagem e real idade tern s ido g e r a l m e n t e pre ssupos t a pe la

l i ngu i s t i c a e pelas abordage ns da anal i se d e discurso baseadas n a

l ingi i is t ica.

O espaco a que Foucaul t se refere aqui e d ef i n i d o pa r a u m a

d a d a form.ac.ao discursiva em term os de re lac.ao; uma re lagao e n t r e

"instituicoes. processos sociais e economicos, p a d r o e s de corn-

p o r t a m e n t o , s i s t e mas de uormas , tecnicas , t ipos de classificac,ao.

m o d o s de caracter izagao" especificos (1972: 45); um a re lacao q ue

c ons t i t u i as regias de f o r mac ao pa r a os objetos. Usando o exemplo

da psicopatologia , Foucaul t escreve:

Se, em um per fodo p a r t i c u l a r n a h i s t d r i a d e nossa soc iedade, o

d c l i n q i i e n t e fo i ps ico logizado c pa to logizado , se um compor l a-

m e n to c r i m i n a l p o d e d a r or ige in a toda uma ser ie de ob je tos de

co nh e c im e n to ( h o m i c i d i o (e su icfd io) , c r im e s pass iona ls , o f e n -sas sexuais . cer tas fo rmas de roubo , vad iagem) , isso fo i po rque

um g r u p o d e relacoes p a r t i c u l a r s fo i ado tado para us n no d is-

curso ps iquia t r ico . A relagao entre pianos de cspecificagao.

como categorias p e n a i s e g r a n s reduzidos de r e s p o n s a b i l i d a d e , e

p i a no s d e caracter iza^ao ps icolog ica ( f a c i i i d a d e s . apt idoes ,

g r a u s d e d e s e n v o l v i m e n t o ou invo lucao . di fe ren tes f o r m a s d e

reacao ao ambien te . l ipos de carater, se adqu i r idos ou l ieredilar ios).

A re lacao entre a au to r idad e da decisao m ed ica e a a u t o r i d a d e

da decisao judicial . . . A relacao entre o f i l t r o tb rmado pe lo interro-

gatorio j ud ic ia l , a i n fo rmac .ao pol ic ia l , a invcst igagao , e todo o

m a q u i n a r i o d e i n t b r m a ^ a o j u d i c i a l , e o f i l t ro t b r m a d o p e l o

q u e s t i o n a r i o medico , ex a mes cl in icos , a p rocura po r a n t e c e d e n -

tes e explicates biograf icas . A re l agao entre a fam f l i a , as no r -

m as s e x u a i s e p e n a i s d e c o m p o r t a m e n t o d o s i n d i v f d u o s c a

tabe la de s i n t o m a s pato ldgicos e doenc.as da s q u a i s elas sao si-

na is . A re lacao entre conf iname 'n to te rapeu t ico no hospi ta l . . . c

c o n f i n a m e n t o p i i n i t i vo na p r isao . . . (1 9 7 2 : 43-44)

Foucaul t sugere q u e u m a f o r mac ao d i sc u r s iv a c on s t i t u i ob j e -

tos de f o r ma a l t ament e l im i t ada . na q u a ! as rest r icoes sobre o q u e

ocorre d e n t r o d e u m a formacao discursiva s a o u m a f unc ao das re-

lac.6es i n t e r d i sc u r si v as en t r e as fo rmacoe s discursivas e das re la-

^oes en t r e as pra t i cas discursivas e nao-discurs ivas que c o m p o e m

ta l formac.ao discursiva. A enfase n a s relacoes inferdiscursivas tern

i m p o r t a n t e s impl i cacoe s par a a a n a l i s e d e discurso, j a que p oe n o

cent ro da agend a a investigac,ao sobre a e s t ru turagao o u a r t i c u l ac ao

d as formacoes discurs ivas na r e l agao umas com as ou t r as , d ent r o

do que e u ch amare i , usando um te rmo f ouc au l t i ano , orde ns de d i s -

curso i n s t i t uc iona i s e socie tar ias — a to tal idade de prat icas d iscur-

s ivas dent ro d e u m a i ns t i t u i ^ao o u sociedade, e o r e l ac i onament o

en t r e elas (ver Fairclough, 1.989a: 29, e Capflulo 3, i tem "P ra t i cadiscursiva", adiante). A visao de que a articulacao de ordens de

68 N o r m a n F a i r c l o u s h Discurso e m u d a n ^ a socia l 69

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discurso e decis iva para a c ons t i t u i c ao d e q u a l q u e r f o r m a c a o d is -

c u r s i v a , e q u e deve, p o r isso, se r u m f oc o c en t r a l n a a n a l i s e d e

discurso, e expressa d e f o r m a v a r i a d a n o t r a b a l h o d e Pecheux

(em seu conceito de in terdiscurso: ve r Capi tulo 1) , Bernstein (1982) e

Laclau e M o u f f e (1985).

A forma^ao d e inodal idades enunciativas

A pr i n c i pa l t ese d e F o u c a u l t com respei to a f o r mac ao d e m o -

d a l i d a d e s e n u n c i a l i v a s e a de que o sujei to social q ue p r o d u z um

e u u n c i a d o n a o e u m a e n t i d a d e que ex i s t e f o r a e i nd epend ent e -

m e n t e d o discurso, como a or igem do e n u n c i a d o (seu a u tor / s ua

au t o r a ) , mas e , ao con t ra r io , u m a f unc j o d o pr op r i o e n u n c i a d o .

Isto e, os e n u n c i a d o s posiciouam os sujei tos - aque l es que os pr o -

d u z e m , mas l ambem aque l es pa r a quer n eles sao di r igidos - de

f o r mas pa r t i c u l a r es , d e mod o que "descrever u i n a f o r m u l a c a o

como e u u n c i a d o n a o consiste em a na l i s a r a relac j to e n t r e o a u t o r e

o qu e eJe d iz (ou qu is d izer , ou d isse se m quer e r ) , mas em d e t e r -

m i n a r que pos i gao pod e e d ev e se r oc upad a po r qua l quer i n d i v k l u o

p a r a que ele seja o sujei to dela" (1972: 95-96).

Essa visao da relacao e n t r e su j e i t o e enunc i ad o e e l abo r ad a

p or mei o d e u m a carac ter izacao de formacoe s discursivas const i -

t u i d as po r configurates p a r t i c u l a r e s d e m o d a l id a d e s e n u n c i a t i v a s .

M od a l i d ad es en unc i a t i v a s sao t ipos d e a t i v i d ad e d is curs iva , c omo

descricao, fo rmacao de hipoteses, f o r m u l a g a o d e r egu l ac oes , ens i -

no , e assim p o r d i an t e , c ad a u m a d a s q u a i s tern associadas suas

propr ias posicoes de sujeito. Assim. p o r e x e mplo , o ens i no c omo um aa t i v i d ad e discursiva posiciona aque l es que fazem par t e c omo p r o -

iessor(a) on aluno(a) . Como no caso de objetos, as regras de fo rma ca o

par a as mod a l i d ad es enun c i a t i v as d e uma f o r m a c a o d i sc u r s iv a

p a r t i c u l a r sao cons t i t u idas por um c o m p l e x o gr upo de relates.

Foucaul t resume isso para o d iscurso c l i n ico :

S c , no d i s cu r s o c l in ico . o m e d ico e a l t e r n a d a m e n t e o s o b e r a no

q ues t i onac lor d i r e t o , o o i ho q u e observa . o d e d o que toca , o 6 r-

g ao q u e d e c i f r a sinais. o p o n t o n o q u a l descr icoes p r e v i a m c n t e

f o r m u l a d a s sa o i n l e g r a d a s , o tecnico de l a b o r a t o r i o . i sso e po r-

q u e u m co m p l e t e g r u p o d e re l acoes e e n v o l v i d o . . . e n t r e d iversos

c l e m e n t o s d is t i n tos , a lgun s d o s q u a i s d i z e m respei to a o status

d o s m e d ico s, o u t r o s a o s l u g a r e s i n s t i t u c i o n a l e tecnico ( h o s p i t a l ,

l a b o r a t o r i o , p r a t i ca p r i v a d a , etc.), d e o n d e eles f a l a m , o u a i n d a

de acordo com sua posicao como su je i tos q u e perc eb em. obser-

v a m , d escre vein , e n s i n a m , etc. (1972: 53).

Essa ar t iculacao d e mod a l i d ad es enunc i a t i v as e h i s t o r i c ament e

especifica e a b e r ta a m u d a n ^ a histor ica; a a t e n ^ a o as cond igoe s

socials sob as quais tais articuJacoes sao transformad as e aos me-

canismos d e sua I r a ns forma ca o sao uma par te s igni f icat iva da pes-

quisa sobre a mud anc a d i sc u r s i v a em r e l a^ao a mud anc a soc i a l

(ver Capi tu lo 3 , i tem " M u d a n c a discursiva", e Capi tulo 7, ad i an t e ) .

D e p r e f e r enc ia a pos t u l agao d e um 'sujeito d a m e d i c i n a ' u n i t a r i o ,

que d a r i a coerencia a essas v ar i as mod a l i d ad es enunc i a t i v as e po-

sigoes de sujei to , Foucaul l sugere que essas v ar i as mod a l i d ad es e

posigoes m a n i f e s t a m a dispersao o u f r agment ac ao do sujei to . E m

ou t r as pa l av r as , um(a ) me dico(a) e c ons t i t u i d o (a ) pe la c o n f i g u r a -cao de m o d a l i d a d e s e n u n c i a t i va s e posicoes d e su j e i t o que e reas-

segurada pe las regras cor rentes do discurso medico. 0 t r a b a l h o de

F ouc au l t e u m a grande c ont r i bu i cao p a r a o d e s c e n t r a m e n t o d o s n -

jeito social n as recentes teorias socials (v e r Henr i ques el ctl.,

1984), par a a visao d o su j e i t o c ons t i t u i d o , r ep r od uz i d o e t r a ns for -

m a d o n a prat ica social e por mei o d e l a , e para a visao do su j e i t o

f r a g m e n t a d o .

O que e de par t i c u l a r s ig n i f ica g a o n o presente c ont ex t o e que

F ouc au l t a t r ib u i u m pape l f u n d a m e n t a l para o d iscurso na cons t i -

t u igao dos su j e i t o s socials. P or i mp l i c ac ao , a s questoes d e s ub je t i -

vidade, ident idade social e d o m i n i o d o eu d ev em se r d o m a i o r

i n t e re sse na s teor ias d e discurso e l i n g u a g e m , e n a a n a l i s e d i sc u r -

s iv a e l i ng u is t ica . De fato, eles tern recebido m u i t o pouc a a t e n y a o

n a pr inc ipa l c o r r en t e l i ngu i s t i c a , ou mesmo na anal i se de d iscurso

l inguis t ica e t e x t u a l m e n t e o r i e n l a d a , na soc i o l i ngu i s t i c a , ou na

p r agmat i c a l inguis t ica. Essas d i sc i p l i nas acade micas te m q u a s e

sempr e m a n t i d o o l i po de visao pre-social do su j e i t o social, o q u e

te m s i d o l a r gament e r e j e i t ad o em recentes debates sobre a su b je t i -

vidade. De acordo com essa visao, as pessoas e n l r a m na p r a t i c a e

70 Norman Fairclough Discurso e mudan^a socia l 71

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na interac,ao social co m i d en t i d ad es socials que sao pr e - f o r mad as ,

as qua i s afe lam sua prat ica, mas nao sao afe tad as por e la. Em ter -

m os da l i nguage m, e l a r gament e a d m i t i d o nessas d i sc i p l i nes que a

ident idade social d a pessoa afe tara a fo rma como ela usa a l i n g u a -

gem, mas ha pouca percepc,ao do uso de l i n g u a g e m - p r a t i c a s

d i scur s ivas - a fe ta ndo ou m o l d a n d o a i d e n t i d a d e social . A s u b j e l i -

vidade e a i d en l i d ad e social sao questoes sec und ar i as uo s e s ludosde l i nguage m. ger a l ment e n ao i n d o alem de teor ias de expressao e

signif icado expressive: a i de n t id ade (o r ige m soc ia l, genero , classe,

a t i t ud es , crengas, e assim por dianle) de u m ( a ) f a l au te e expressa

n as formas l ingi i ist icas e n os s i g n i f i c a d o s q u e ele(a) escolhe.

Ao con t r ar io disso, ado tare i a posic.ao de Fou caul t de local iza r

a questao dos efe i tos da prat ica discursiva sobre a i d en t i d ad e social

no cen t re da ADT O, teor ica e me todolog icam e n te . Essa visao tern

consequencias signi f icat ivas para a rewin d icagao de a a na l i s e de

discurso se r u m m e t o d o p r i n c i p a l de pe squ i sa social: u m a teoria

expressiva da subje t iv idade no d i scur so pe rmi te que el e seja con-

s ide rado como uma d ime nsao sec und ar i a da prat ica social , ao

contrar io de uma teor ia cons t i tu t iva . No e n t a n t o , existem i m p o r -

tantes l imitacoes. A ins is tencia d e F o u c a u l t sobre o s u je i to como

um efe i to das ib rmagoes discursivas tern u m s a b o r p e s a d a m e n l e

eslrutural ista. que exclui a agenda social a t iva d e q u a l q u e r sen t i d o

signi f icat ivo. Isso e insat i sfator io , p or razoes q u e d emons t r a r e i n a

sec.ao f ina l . A posicao sobre o discurso e a s u b j e t i v i d a d e que eu

defenderei n o Capftulo 3, item "Ideologia", e dialetica, que cons ide ra

o s sujei tds sociais m o f d a d o s pe l as prat icas discursivas, mas t a m -

bem capazes de r e mod e lar e re e s t ru tu ra r essas pr a t i c as .

A f o r m a f a o d e conceitos

Po r 'conceitos', F o u c a u l t e n t e n d e a b a te r ia de categor ies, ele-

m e n t o s e tipos que um a d i sc i p l ina u sa como u m a p a r a t o p a r a t r a t a r

seus campos de in teresse : e le da o e x e mplo d e su j e i t o , p r e d i c a d o ,

subs t an t ive , ve rbo e pa lavra como conce i tos d e gr amat i c a . Mas,

como n o caso d e obje tos e m o d a l i d a d e s enuncia t ivas , um a formacao

discursiva n ao de f ine u m c onj un t o u n i l a r i o d e concei tos estaveis

co m relacoes bem d ef i n i d as entre si . Ao con t r ar io , o q u a d r o e de

configurates rautaveis de conceitos em t ransformac.ao. Foucaul t

propoe abordar a formac.ao de conceitos de n t ro de uma f o r magao

discursiva por meio de uma descr ic .ao de como e organizado o

' c a m p o d e enunciados ' a ela associado, dentro d o q u a ! seus con-

ceitos ' s u r g i r am e c i r cu lar am ' . Essa estrategia da or ige m a uma

rica explicacjo (1972) dos di ferentes t ipos de re lagao q ue pode mexist i r uos textos e e n t re eles. Isso e iitil n o de se nvolv ime n to de

perspect ivas inter textuais e interdiscursivas n a ADTO, p a r t i c u l a r -

m e n t e p o r q u e essas pe r spe c t ivas tern recebido p o u c a ate n^ao na

l ingufst ica ou na anal i se d e discurso o r i e n t a d a l ingi i ist icamenle .

Dentro d o ' c a m p o d e enunciados ' de um a formac . ao discursiva

existem relagoes em var ias dime nsoe s . Uma classe de re1ac,6es e

entre os e nunc iados de um tex to par t icular , como, por exemplo. as

relagoes de sequencia e dependencia. Foucaul t se refere a "var ias

estruturas re toricas, d e acordo com as quai s g rupos de e nunc iados

pode m se r combinados (como sa o ligadas describees, deduc,6es, de -

f in igoes, cujo encadeamento caracter iza a a rq u i te tu ra de um texlo)"

p o r meios q ue de pe nde m da f o r magao di scur s iva (1972: 57).T a i s

re lagoes i n t r a t ex t ua i s tern sido invest igadas mais r e ce n te me n te na

l ingi i i s t ica de texto. Outras re lagoes sao in terdiscnrsivas, referen-

tes a re la^ao entre di feren tes formac,6es discursivas ou d iferentes

textos. As relayoes interdiscursivas podem ser diferenciadas con-

forme pertengarn a campos de presenca. concomitancia ou memoria.

Foucaul t de f ine um camp o de pre se nca como "todos os e nunc iados

f o r mu l ad os no ut ro lugar e acei tos no d i scur so , reconhecidos c o m o

verdadeiros , e n v o l v e n d o u m a descr igao exata, um racioci 'n io bem

f u n d a m e n t a d o . ou uma pre ssupos igao necessaria", como t ambe m"os que sao criticados, discutidos, julgados.. . rejeiiados ou excluf-

dos" (p . 57-58), explicita o u impl ic i tamente. Um campo de concomi-

tancia consiste mais especificamente de enunciados originados em

di ferentes fo rmagoe s discursivas e esta l igado a questao das re la-

coes entre as formac,6es discursivas. F i n a l m e n t e . u m c a m p o d e

m e m o r i a consiste de enun ciado s "que na o sao mais acei los ou dis-

cut idos" , p or meio do s q u a i s "relacoes de filiac.ao, genese , t rans-

form agao , c o n t i n u i d a d e e d esc ont i nu i d ad e h i s t o r i c a p o d e m s e r

estabelecidas" (p . 98-99). F o u c a u l t acrescenta as re lagoes de um

72 Norman Fairclough Discurso e tnudanca social 73

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e n u n c i a d o com "todas as formulates cuja possibi l idade subse-

q i i en t e e d e t e r m i n a d a p or ele", e a q u e l a s cwjo stains (po r exempl o .

a l i t e ra tu ra ) o enunc i ad o c o r apa r l i l ha .

Foucaul l resume essa perspect iva na a f i rma g a o d e q u e " n a o

pod e ex i s t i r enunc i ad o que d e uma f o r ma o u d e oul ra nao r ea l i ze

n o v a m e n t e ou t r os e n u n c i a d o s " (1972: 98). S eu t r a t a m e n t o das

r e l agoes en t r e os e n u n c i a d o s e r e m i n i s c e n l e dos escr i tos sobregener o e d i a l og i smo d e B a k h t i n (1981. 1986). o s qua i s Kr i s t ev a

i n t r od uz i u pa r a o piiblico oc i d en l a l com o conceito d e i n te r te x tua -

l i d ad e (1986a: 37). E corno eu observei an t e r i o r menl e . Pecheux

ad o t a um a pe r spec t iv a sem el han t e ao d a r p r i maz i a ao i n t e r d i sc u r so

e m sua teor ia do d i sc u r so . Embor a as dist ingoes en t r e os varies

t ipos d e relagao em Foucault n a o se j am se mpre c lar as , o que e le

esta f o r nec end o aqu i e a base p a r a u m a i nv es t i gagao s i s te ma t ica

das relagoes nos textos e nos t ipos de discurso e en t r e eles. Farei

uma d i s t i ngao en t r e i n t e r t ex t ua l l d ad e , relacoes ent re textos , e in-

t e r d i sc u r s i v i d ad e . relagoes ent re f o r magoes d i sc u r s i v as ou . m a i s

gener icamen te, ent re d i t 'erenles t ipos de d iscurso (ver C a p i f u l o 4,

i t em "I n t e r t ex t ua l i d ad e mani fe s t a" , ad i an t e ) . A in te rd i scur s iv idade

envolve as re lagoes ent re out ras formagoes d iscursivas que, d e

acordo co m Foucaul t , cons t i tue n t as regras de f o r m a g a o d e u m a

dada formagao discursiva (veja as segoes anter iores sobre a forma-

gao de obje tos e mod a l i d ad es enunc i a t i v as ) .

A o disculir as relagoes do s c ampos d e enunc i ad os , F ouc au l t

(1972: 97-98) fa z a l g u n s come n tar ios val iosos sobre a n n c a o d e

contexto, e especificamente sobre como o contexto s i tuacional d e u rn

e n u n c i a d o (a s i tua g a o social n a q u a l el e ocorre) e seu contexto

verbal (sua posiciio em r e l agao a o u t r o s e n u n c i a d o s que o prece-d em e o seguem) d e t e r mi nam a f o r m a que e le t oma e o m o d o pe lo

qual e interp retado. Trata-se de ur n l ug a r comura n a sociol ingi ifs t ica

que o s e n u n c i a d o s (o u 'falas') sa o assim de le rminados . A observa-

cao ad i c i ona l i m p o r t a n t e que Foucaul t faz e qu e a relagao en t re a

fala e seu c on t ex t o v e r ba l e si t uac iona l n ao e t r ansp a r en t e : a f o r ma

como o contexto afeta o que e d i t o ou escr i to , e como isso e i n t e r -

p r e t ad o , v a r i a d e uma f o r m agao d i sc u r s i v a pa r a ou t r a . Po r exem-

plo , os asp ectos da iden t ida de social c !o(a) f a l an te , t a i s como

genero social, etnia ou idade, que provavelmente afetam de modo

subs t anc i a l a s f o r mas e o s s i gn i f i cad os n u m a c onv er sagao , pod em

te r pouco ef e i t o numa con ie re nc ia de biologos. N o v a m e n t e , o f a lo

d e que a fala d e u m ( a ) p a r t ic ip a n te apa r ega i m e d i a t a m e n t e d epo i s

d e u m a p e r g u n t a d e ou t r o pod e c ons t i t u i r uma p i s t a f o r t e pa r a t o -

m a r a fala como resposta a p e r g u u t a n u m interrogators mai s d o

q u e n u m a conve r sagao casual . N ao se pode, por tanto , s imples-

ment e ape l a r ao c ont ex t o pa r a exp l i c a r o que e dito o u escrito o ucomo e i n t e r p r e t ad o , como m u i t o s lingiiistas fazem na soc io l i n -

guist ica e na p r agmat i c a : e preciso v o l l a r a t ra s p a r a a f o r m a g a o

discursiva e para a ar t iculagao da s formagoes d iscursivas n as o r d ens

de discurso para expl icar a relagao contexlo-texto-sigmficado.

A f o rm agao d e estrategias

A s regras d e f o r magao d i sc u t i d as a te a q u i cons t i t ue n t u m

c a m p o d e possibi l idades para a cr iagao d e teorias, t e mas ou o que

F ouc au l t c hama d e est rategias , nem todas elas r ea l ment e r ea l i za -

das. As regras para a f o r m a g a o d e es t r a t eg i as d e t e r mi nam qua i s

possibilidades sa o real izadas. Elas sa o c o n s t i t m d a s p o r u m a com-

b i n a c a o de rest r igoes interdiscursivas e nao-discursivas sobre pos -

sfveis est rategias (1972: 66-70). F ouc au l t sugere, p o r e x e m p l o , q u e

o discurso cconomico, no p e n o d o classico, c d e f i n i d o por um

certo m o d o conslante d e re l acionar poss ib i l idades de s is temat i-

zayao in te r ior a um di scurso , o u t r o s d i s cu r s o s que sao exteriore.s

a esse. e a um c a m p o complete nao-di scurs ivo de pralicas,

a p r o p r i a g a o , in leresses c de s e j o s (1972: 69) .

Note a r e i t e r a g a o a q u i de relagoes interdiscursivas como

rest r igoes sobre u m a f o r magao d i sc u r s i v a . F ouc au l t nola q u e pos-

si'veis r e l a ci o n a m e n t o s e n t r e d i sc u rs o s i n c l u e m a n a l o g i a , oposicao.

c o m p l e m e n t a r i d a d e e 'relagoes d e d e l i mi t agao m u t u a1 (p. 67).

A discussao das r e s t r i g o e s n a o - d i s c u r s iv a s a q u i e o m a i s

p r ox i mo que F ouc au l t ch e ga , uesse pr i me i r o t r aba l ho , ao r ec onhe-

cimento de que o discurso e d e t e r m i n a d o 'de f o r a ' : a posigao

p r e d o m i n a n t e t o m a d a sobre a rela gao ei i l re a p r a t i c a d i sc u r s iv a e

nao-discursiva sugere, ao contrar io, que a primeira tern pr imazia

Norman Fairclough Discurso e mudanca social 75

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sobre a u l t i m a . Foucaul l refere-se p r i m e i r o a f u n g a o d o discurso

n u m c a m p o d e pr a t i c as nao -d i sc u r s i v as , ta l como "a f u n g a o

exercida pelo discurso economico n a pratica d o capitalismo emer gen-

te" (1972: 69); segundo, para as 'regras e processes de ap r op r i agao '

d o discurso, n o se n t ido de que o 'di re i to d e f a l a r ' e a ' b ab i l i d ad e

p a r a e n t e n d e r ' , t a n t o q u a n l o o di rei to d e recor rer a o " c o r p u s d e

e n u n c i a d o s j a fo rmulados" , sao d es i gua l ment e d i s t r i bu i d os en t r egrupos sociais (p . 68); tercei ro , para

as posit^des possiveis de desejo em relafao ao discurso: o d i s -

curso pode de fato scr o l ugar para uma represenlagao i l uso r ia .

u m e l e m e n to de s i m b o l i z a g a o , uma fo rma do p ro ih ido . u m ins-

I rumenlo de sat isfacao der ivada (p. 68. i t a l icos d e Foucau l t ) .

Foucaul t associa a s regras par a a f o r mac ao d e es t r a t eg i as co m

a mat e r i a l i d ad e do s e n u n c i a d o s . As rest r igoes nao-discursivas refe-

r idas no paragrafo anter ior estabelecem re lagoes en t r e o s enu nc i a -

dos e as institutes. Por mat e r i a l i d ad e de um e n u n c i a d o , F o u c a u l te n t e n d e n a o su a pr op r i ed ad e d e se r p r o f e r i d o num t empo ou l uga r

pa r t i c u l a r , m a s o f a to de ter um status par t i c u l a r em prat icas i n s t i -

t uc iona i s especificas.

Da arqueologia a genealogia

Eu j a me referi as m u d a n g a s de foco n o curso d o t r aba l ho d e

F ouc au l t . M i nha pr eoc upagao agora e c om a t rans ig i io d a a r queo-

logia a genealogia e suas implicates p a r a a conce pgao de d i sc u r so

em F ouc au l t .

Foucaul t da a seguinte e x pl i cagao sucinta sobre a relagao ent re

a r queo l og i a e genea l og i a :

A 'verdade ' dcvc se r co m p r e e nd id a c o m o u m s is te iua d c proce-d im e n to s ordenados pa ra a p roduc.ao , regu lamenta^ao . dis t r ibu i -gao, circulate e operagao d e e n u n c i a d o s .

A ' ve r da de ' esta v i n c u l a d a a uma relac.ao ci rcula r c o m o s

sistcmas dc p o d e r que a p r o d u z e m e sus ten tam c com os efci tosde poder os q u a i s el a i n d u z e o s q u a i s a cs tcndem. Um ' reg ime'

dc v erd a d e ( R a b i n o w , 1984: 74).

A pr i me i r a p r opos i gao e, eu espero, u m s u m a r i o reconhecivel

d a a r queo l og i a como esbocei an t e r i o r ment e . A segund a mos t r a , em

r esumo , o efe i to d a genea l og i a sobre a arque olog ia : e l a acrescenta

o pod er , ou , nas p a l a v r a s de D av i d son , se u foco esta n as "relagoes

m u t u a s e n t r e s i s t e mas de v er d ad e e m o d a l i d a d e s d e poder"

(1986: 224). A t r ans i c ao p a r a a genea l og i a r ep r esen t a u m a des-

c ent r agao d o discurso. E n q u a n t o em F ouc au l t (1972) a intel igibi l i -dade dos s is temas de conhecimento e verdade era a t r i bu f d a a

regras do d i sc u r so , c onc eb i d as c omo au t onomas - e, de f a t o , a re-

J agao ent re prat icas nao-discursivas e discursivas e ra r e g u l a m e n t a -

d a a p a r e n t e m e n t e por essas regras - no pr inc ipal es tudo

genealogico de F ouc au l t , Discipline! e poder (1979), o discurso e

sec und ar i o ao s sis temas d e pod er .

A o m e s m o t e m p o , n o e n t a n t o , a vi sao d a n a t u r e z a d o pod er

n a s sociedades m o d e r n a s q u e F ouc au l t d esenv o l v e em seus estudos

genealogicos (verFraser, 1989) localiza o discurso e a l i n g u a g e m

no coragao das prat icas e dos processos sociais. O carater do pod er

n a s sociedades mo d er na s es ta l i gad o ao s p r ob l emas d e c ont r o l e d as

populates. O poder e im p l f c i t o n a s pr a t i c as soc i a i s c o t i d i anas .

q u e sa o d i s t r i b u i d a s u n i v e r s a l m e n l e e r n c ad a n i v e l d e t od os o s

d o m i n i o s d a vida social e sao c o n s t a n t em e n t e e m p r e g a d a s ; a l e m

disso. o pod er "e t o l e r av e l soment e n a c o n d i g a o de que mascare

um a g r a n d e par t e de si mesmo . Seu sucesso e pr opo r c i ona l a sua

h a b i l i d a d e p a r a esconder seus p r o p r i o s mecanismos" (1981: 86).

O pod er n ao t ' unc iona ne g a t iva me n te pela d o m i n a g a o fo rg a da d o s

que Ihe sao sujei tos; ele o s i uc o r po r a e e p r o d u t i v o n o sent ido d e

que o s mol d a e r e i n s t r u m e n t a l i z a , para ajusta- los a suas uecessida-

des. O p o d e r m o d e r n o n ao fo i impos to de c i ma p o r agentes colet i -vo s especff icos (pore x e m p l o , classes) sobre g r u p o s o u i n d i v f d u o s ;

ele se desenvolveu de baix o e m cer tas micro te cn icas (tal c omo o

exame em seu sen t i d o med i c o ou ed uc ac i ona l : v e r a d i a n t e ) , as

q u a i s emer g i r am em i n s t i l u ig oe s , c omo os hosp i t a i s , a s pr i soe s e as

escolas n o p r i n c i p i o d o per i od o mod er no . Tais t ec n i c as i m p l i c a m

uma r e l agao d ua l en t r e pod er e c onhec i ment o na soc i ed ad e mo-

de rna : po r um l a d o , as t ec n i c as d e pod er sao d esenv o l v i d as na base

d o c o n h e c i m e n t o que e g e r a d o , p o r exempl o , n a s ciencias sociais;

por out ro lado, as tecnicas sao m u i t o r e l ac i onad as ao exer c i c i o d e

76 Norm an F a irc loug h Discurso e mudanca social 77

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pode r n o processo d e aqu i s i gao d e c o n h e c i m e n t o . Fouca u l t cun l i a

o terrao biopoder para se refer ir a essa forma m o d e r n a de poder ,

q u e e m e r g i u n o seen I o X V I I : o b i o p o d e r " t r o u x e a v i d a e s e n s

m e c a n i s m o s p a r a o t e r r eno dos c a l c u l os explicitos e t o m o u o co-

n h e c i m e n t o / p o d e r u m age n te d e t r ans f o r magao d a vida h u m a n a "

(1981: 143).

Essa concepcao de poder sugere que o discurso e a l i n g u a g e msao de i mpor t anc i a c en t r a l n os processes sociais da sociedade m o-

de rna : as pra t i cas e as tecnicas que F o u c a u l t enfat iza t a n t o - a en -

t revista, o aconse lh ame n to , e assim por d i a n t e - sao em g r a u

s ignif icat ive pra l i cas discursivas. Assim, aiialisar as insr i tu igoes e

as organizagoes em termos de pode r significa e n t e n d e r e a na l i s a r

suas praticas discursivas. Mas a visao de poder de Foucault i mpH-

ca nao ape nas r aa io r atencfio ao discurso n a a n a l i s e social, m as

t a m b e m m a i o r a t engao ao poder na anal ise de discurso; tais ques -

toes sobre discurso e poder n a o s u rg e m n e m n o s es tudos arque olo-

gicos de Foucaul t , ne m e m abordage ns l i ngu i s t i c ament e or ie n t adas

d a analise d e discurso. C o m o S h a p i r o a p o n t a :

Foucault leva a conexao l i nguagem-pol ff ica a um til o ni'vel tie

abstrac.ao. o que nos p e r m i t e i r aleni das p e r m u t a s de p o d e r l i n -

g i i i s t icamente ref le t idas e n t r e pessoas e g r u p o s p a r a u m a a n a l i s e

da s cstrufuras denlro d a s q u a i s elas sao empregadas(198J : 162) .

A l g u m a s dessas questoes sao l ev an t ad as pe lo propr io F o u c a u l t

n u m e s tudo (1984) que e x plora var ies proce d ime n tos m e d i a n t e o s

quai s a s prat icas discursivas sa o socia lmente c ont r o l ad as e r es t r i n -

gidas:

em cada sociedade , a p rodugao dc d iscurso e i m c d i a t a m c n f c

contro l ada , se lecionada , o rganizada e rcd i s t r ibu fda por um ccr to

n u m e r o d e p r o ce d im e n to s , cu jo p a p e l e t u t e l a r sens poderes e

per igos , domest icar suas casual idades , escapa r da sua p o nd e r a -

ve l , formidave l m a t c r i a l i d a d e (p . 109).

Entre os 'procedimentos ' que Foucaul t examina estao restricoes

sobre o q u e p o d e se r d i to , p o r q u e r n , e e m que ocasioes; oposigoes

entre os discursos de r az ao e l oucura , enl r e di scur so ve rdade i ro e

falso; efeitos de at r ibuicoes de autor ia , l imi tes entre discipl inas,

a tr ibuicao de status canonico para certos lextos; e restricts sociais ao

acesso a cer tas prat icas discursivas - com r e l agao a isso, Foucaul l

no t a q ue " q u a l q u e r sistema de e ducagao e uma forma pol i t ica d e

m a n u t e n g a o o u m o d i f i c a g a o da apropr i acao de discursos e dos co-

nhecimentos e poderes que eles carreganr' (p . 123). Um a enfase

signi f icat iva em Foucaul t (1984) e sobre a l u t a de pode r e m t o r n oda de te rminagao d a s prat icas discursivas: "O discurso e nao a p e n a s

o q u e t r aduz as l u t a s o u o s sistemas de dominacao , mas e a coisa

para a q u a l e pela q u a l a l u t a exis te , o discurso e o poder a ser to-

rnado" (p . 110).

A passage m da arque olog ia para a ge ne alog ia env o l v e u m a

m u d a n g a de enfase em termos da q u a ! as d imensoes do di scur so

re ce be m proe mine nc ia . E n q u a n t o as formagoes discursivas de

Foucaul t (1972) sao caracter izadas em termos d e discipl inas pa r t i -

culares (por exemplo , os discursos da psicopatologia , da e conomia

pol i t ica e da histor ia n a t u r a l , embor a Foucault resists a ide ia d eum a simples correspondencia entre discursos e discipl inas). as ca-

tegor ias sal ientes do discurso em Foucault (1979, 1981) sao de um

carater mais gener ico (por exemplo, a ent revis ta e o aconse lh a-

m e n t o , como prat icas discursivas associadas respect ivamente ao

que Foucaul t c h a m a exame e conf issao: ver ad i an t e ) . Isto e, elas

ass i na l am var i as fo rmas d e i n te ra g a o que sao e s l r t l t u r adas d e f o r m a

par t i c u l a r e env o l v em co n j u n t o s especificos d e par t i c i pan t es (por

exemplo, entrevistador(a) e eutrevistado(a)). Essas i n t e r agoe s po-

d em ser usadas em var ias discipl inas ou i n s t j tu ig oe s e sao assim

compat ive i s com var i as formagoes discu rsiva s (assim, existem en -

trevistas medicas, sociologicas , de e m p r e g o e d a m f d i a ) . O con-

t raste para a lguns escritores e entre discursos e generos (ver Kress ,

1988. e, no Ca p f tu l o 4, o i tem "Interdiscursividade").

As duas pr incipals tecnologias de poder anal isac las po r Foucault

sao a discip l ina (o exame como sua tecnica nuclear , Foucaul t , J979) e

a conf issao (Foucaul t , 1981). Um a surpre e nde n le preocupagao bii-

sica e i n ic ia l da ana l i se genea log ies e como as tecnicas t r a b a l h a m

sobre os corpos, isto e, como elas at'etam as fo rmas n o r m a l i z a d a s

d e t a l had as de controle sobre as disposigoes, os hab i t o s e os n iov i -

me n tos d o corpo que sao discerniveis n as sociedades m o d e r n a s .

80 Norman Fairclough Discurso e mudan^a social 81

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Embora a explicagao da confissao em Foucault seja mais ex -

plicitamente d iscursiva do que a su a explicagao do exame (ele se

refere a primeira como u m a 'forma d iscu r s iva ' tanlo quanto u m

'ritual de discurso'). eu sugeriria que ambos sao claramente associa-

dos com generos particulares de discurso. No caso do exame, eles

incluir iam o exame medico,, o exame educacional e m ui tas var ie -

dades de entrevistas. No caso da coufissao, incluiriam nao somentea confissao religiosa, mas t a mb em discursos terapeuticos e va r ie -

dades de aconselhamenlo. Um dos temas de Fo u ca u l t e como aconfissao ganhou status cientrfico no seculo XIX, e ele nota , em

relagao a isso, que o exame e a confissao foram combinados no

interrogators, no qu es t io n a r io exato e na hipnose.

A s tecnicas de po d er as qua is Foucault confere a lengao sa o

relevantes para os t ipos de d iscurso que se t o rnaram evidentes na

sociedade moderna e que parecem estar intimamente associados

aos seus modos de organizagao social e valores culturais. Esses

generos cultura lmente evidentes , especialmeute a entrevis ta e oaconselhamento , e aqueles associados com a adminislragao e a pu-blicidade, a pa ren t a m estar colonizando as ordens de discurso de

var ias instituigoes e organizacoes conlemporaneas. Nesse processo,eles tern sofrido um a expansao dramatica d e fungoes , a medida qu e

atravessaram os limites entre as institutes, gerando muitos subti-

pos e variantes (aconselhamento terapeutico, educacional, do emprego

e do(a) consumidor(a) , por exemplo). A entrevis ta e o aconselha-

mento representam respecl ivamente generos de objeti fkacao e

subjelivagao. correspoudentes a tecnica de objetificagao do exame

e a t ecn ica de subjet ivagao da confissao. e os modos de discurso

qu e b u ro cra t ica men te ma n ipu la m a s pessoas como objetos, por uml a d o , e os modos de discurso qu e exploram e d ao voz ao 'eu' pare-

cem ser dois focos da ordem de discurso moderna.

A esse respeito , a perspectiva genealogica de Foucault aponta

direcoes de pesquisa do discurso que sao impo r ta n tes para os

objetivos deste l ivro: a investigagao das t ransformac/ ies h is toricas

na s praticas d iscursivas das ordens de discurso e suas relagoes comos processes mais amplos d e m u d a n g a socia l e cu l tu ra l (ver, no

Ca p i tu lo 3, o i t em "M u d a ng a discursiva". e o Capftulo 7, a seguir).Exis tem impo r ta n tes quesloes de causalidade aqu i : ate que po n to

as m u d a n g a s discursivas consti tuem essas mudangas socia is ou

culturais mais amplas, contrar iamente a serem meros reflexos de-

las? E, portanto , at e onde os processes mais amplos de mudanc.a

podem se r pesquisados por meio da analise de praticas d iscursivas

em m utagao? Existe t a mb em a questao d e quao difundidos e efeti-

vos sao os esforgos conscientes de agentes inst i tucionais para ge -

rar mudangas nas praticas discursivas, com base na pesquisacientifica social (por exemplo, na s tecnicas de entrevis ta) , fre-

qiientemente s imuland o as pra ticas d iscursivas de conversagao in-

formal da esfera privada em dominios publicos na base de calculos

de sua eficiicia (por exemplo, pondo os entrevis tados a vontade) e

t r e ina nd o pessoal d a inst i tu igao em novas tecnicas d iscursivas.

Eu me refiro a esse processo de intervengao como a 'tecnologiza-

ga o do discurso': o propr io discurso e agora l a r g a m e n l e su j e i to

as tecnologias e as tecnicas i d e n t i f i c a d a s por Fo u ca u l t como asmodernas tecnicas de poder (veja mais no Gipimlo 7, item 'Tecnolo-

gizagao", a seguir).

Foucaul t e a analise de discurso textualmente orientada

A s principais percepcoes sobre o discurso que eu ident if iquei

no trabalho de Foucault podem se r resumidas como se segue. Em

se u trabalho arqueologico initial, existem duas afirmagoes de im -

portancia par ticular :

1. a na ture za consti tu t iva do discurso - o discurso consti tu i o so-

cial, como tambem os objetos e os su je i to s sociais;2. a primazia da in terdiscursividade e da in ter textualidade - qua l -

quer pratica discursiva e definida por suas relagoes com outrase recorre a outras de forma co mplexa .

Tres outros pontos substantivos emergem do t r a b a lho genealogicode Foucault :

3. a natureza d iscursiva do poder - as praticas e as tecnicas do

biopoder m oderno (por exemplo. o exame e a confissao) sao emgrau s ignif ica tivo discursivas;

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4. a na ture za poh'tica do discurso - a luta por poder ocorre tantono di scurso qu anto s ub jac e n te a ele;

5. a natureza discursiva da m u d a n c a social - as pral icas discursi-vas em mutacao sa o um elemenlo importante na mudanca social.

Esse cons t i tu i u m rico coii junto de afirmacoes e hipoteses teo-

ricas para tentar incorporar e operacionalizar na ADTO.Existem. no entanto , certas di ficuldades para a ADTO no tra-

balho de Fo u ca u l t , ta i s como su a neg l igenc ia para com a ana l i s e

t e x tua l e sua visao consti tu t iva do discurso. O proposito dessa se-

cao final e discuti r essas di ficuldades e ind ic ar os ponlos em que aADTO nao dev eria seguir Fou caul t.

Como eu iudiquei an te r io rm e nte , um contraste essencia l e n t re

Fo u ca u l t e a ADTO e que a anal ise de discurso de Foucauh nao

inclui a analise discursiva e lingiifstica dos textos reais. Porem, a in-

clusao de ta l anal ise pode ser um meio de superagao de certas fra-

quezas que os comentadores tern enco n t r a d o nos t rabalhos de

Fo u ca u l t . Eu nao estou suger indo uma reducao da anal ise de dis-

curso a anal ise textual on l i ngu i s t i ca . A ques tao e an tes se a

a na l i se inc lu i r ia in s ta nc ia s concretas de discurso. Quando elassa o incluidas na ADTO, elas seriam suje i tas nao apenas as formas

lingiiisticas de anal ise textual , mas a ana l i se em tres dimensoes :analise do texto, analise dos processes discursivos de producao e

interpretacao tex tual ( incluindo a questao de quais t ipos e generosde discurso sa o tornados e como eles sa o articulados) e analise so -

cial do evento discursivo, em termos de suas condicoes e efei tos

socials em varies niveis (si tuacional . insti tutional , societario).

(Ver, t a mb em, o Capi tu lo 3, item "Discurso", a seguir). Assim, oque eu defendo e a analise t ex t u a l em c on junc ao co m outros tipos

de analise, e a principal questao e se exemplos especificos (e tex-tos) seriam analisados.

As fraquezas relevantes no t rabalho de Foucaul t tern a ver

com as concepgoes de poder e resistencia, e com questoes de luta emu d a nca . Foucaul t e acusado de exagerar a extensao na qua l a

maioria das pessoas e m anipu lada pelo poder; ele e acusado de nao

dar bastante peso a contestacao das pra ticas , as lutas da s forgas

sociais entre si , as possibi l idades de grupos d o mina d o s se oporem

a sistemas discursivos e nao-discursivos dominautes, as possibi l i -dades de propiciar a mudanca nas relagoes de poder m e diau te a

lu t a , e assim po r d ia n t e (Lecourt, 1972: Macdonel l , 1986). Nao e

qu e Foucault ignore tais questoes: e le esta interessado na mu d a t iga ,

por exemplo, q u a n d o dedica todo um capitulo (Foucault, 1972) a

mudanc.as e transformacoes, em que eufat iza com vigor que as re-

gras de fo rmacoes d i scurs ivas d ef inem nao objetos e conceitosestaticos, mas os campos de suas possiveis transformacoes. E, em

Foucault (1982), ha uma discussao detalhada das formas de luta.

Mas na totalidade de seu trabalho e nas analises principals, a im-

pressao dominante e a das pessoas d esa mpa ra d a men te assuje i tadas

a sistemas imoveis de poder. Fouc au l t cer ta men te insiste que o po-

de r necessariamente acarreta resistencia, mas ele da a impressao de

qu e a resistencia e geralmente contida pelo poder e nao represenlaameaga. Isso pareceria aconlecer assim, por exemplo, no que Fou-

cault chama de ' discurso reverse' da homossexual idade, A preo-

cupagao com a homossexual idade no s discursos da ps iqu ia t r ia eda j u r i sprude ncia do s ecu lo XIX resu l tou em que a homossexua-

l idade comegasse a "fa lar em seu proprio nome... f re que n te m e nte

no mesmo vocabulario, usando as mesmas categorias pelas quais

era desqualif icada na medic ina" (1981: 101). Esse e, assim, um

discurso de resistencia que nao vai alem dos pa ra met ro s de sua

formagao discursiva.

Esses problemas parecem estar l igados a ausencia de um con-

ceito de pratica nas analises de Fou caul t, abrangendo a ause ncia do

texto e da anal ise tex tual . Por pratica eu entendo os exemplos reais

das pessoas qu e fazem. dizem ou escrevem coisas. Foucaul t (1972).

de fato, refere-se a pratica, quando introduz o conceito de praticadiscursiva, mas ele a define de forma confusa como regras que

subjazem a pratica real : uma pratica discursiva e "um sistema de

regras anonimas, historicas" (p . 117). Em outras palavras, a pratica

e reduzida ao seu inverse, a es truluras , usando esse termo no lolo

sensu dos recursos que sao subjacentes e necessaries para a pralica

( tanto quanto sao produtos dela). Parece ser sempre as e s t ru tu ras

qu e estao em foco, sejain as regras de formacao de Fouc au l t

(1972), ou as tecnicas, tais como o exa me em Foucau l t (1979).

Co n tu d o , F o u c a u l t naturalmente propoe qu e esta f a lando sobre a

Nortnan Fairclough Discurso e mudanca social 85

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pratica: se u foco sobre as estruturas pretende explicar o que podeacontecer e o que acontece realraente.

A suposigao questionavel e se podemos extrapolar da e s t ru lu ra

para a pratica, se podemos chegar a conclusoes sobre a pra t ica se manalisar diretamente suas iustancias concretas, be m corao os tex-

tos. Isso pareceria implicar, por exemplo, ser a pratica considera-

velmente mais uniforme do que nos temos razoes para acreditar;que a extensao e as formas nas quais a pratica e d e te rmina d a pelas

estruturas sao menos var iaveis do que aparentar iam ser ; e que a

determinac.ao de quais regras ou conjuntos de regras sa o postas em

pratica e mais objetiva do que e realmente. Em sintese, o que falta

e um sentido de que a pratica tern propriedades propr ias , as qu a is :

(i) nao podem se r reduzidas a implementacao de estru turas; ( i i)

exigem que a forma como as estru turas f iguram na pratica nao

pode se r tomada como tacita , m as te m de ser determinada; e (iii)

em ult ima analise, isso ajuda a raoldar as estru turas.

Existe v j m a ausencia a mais, associada a esse foco nas estru tu-ras: a dos mecanismos detalhados de mu d a nca . Como as estru turas

se tornaram o que sao? Como fazer para as estru turas serem dife-

rentes? Como Taylor (1986: 90) cliz, co m referenda a Foucault ,

para o proposito de ta l explicagao diacroniea, podemos ques t io -

nar se nos devemos falar de uma pr ior idade da l inguagem sobre

a ac.ao. Essa e u m a relagao circula r . As es t ruturas de ac.ao ou de

l i nguas sao somente mant idas se forein renovadas cons tantc -

n iente na agao/fala. E e nessa acao/fala qu e elas t a m be m d e i x a m

de ser mant idas , qu e elas sao alteradas.

Em out ras palavras, as estru turas sao reproduzidas, mas tam-

bem transformadas na pra tica .

Mas, se as estruturas podem ser reproduzidas ou t ransfbrmadas

na pratica , o que e que de te rm ina resul tados reais em diferentes

exemplos? Mais gera lmente, o que e que d e te rmina os resultados

cumulat ivos da pratica em d o min io s ou insti tuicoes sociais especi-

f icas e as diferengas entre eles, nas t e nde nc ias reprodutivas do dis-

curso em oposicao as t ransformativas? Eu gostaria de suger ir queas estru turas sao reproduzidas ou transformadas, dependendo do

estado das relagoes, do equi l fbr io de poder , entre os que es ta o em

luta nu m domlnio s us te n tado par ticular de pra tica , la l como a es-

cola ou o lugar de trabalho. U m foco mu i to grande nas estru turas e

equivalente a t om ar um a perspectiva uni la tera l a respei to dessas

lu tas - a perspectiva do poder daqueles cu jo problema e a preser-vagao da ordem social e o sustento da dominagao. A concepgaogramsciana de p ode r em termos de begemonia e su per io r a con-

cepcao de poder de Foucault, porque evita tais desequilfbrios(Gramsci, 1971; Hall. 1988). Nessa abordagera, a hegemo n ia e

concebida como um equilibrio instiivel constnrido sobre a l ia nca s e

a geracao de consenso das classes ou grupos subordinados, cu jas

in s ta b i l id a d es sao os cons tan tes focos d e lu ta s (ver , no C a p f l u l o

3 . o i tem "Hegemonia", para uma d i scussao mais am pin) . A ne-

gligencia de Foucault com a pratica e com os mecanismos deta lha-

dos da m u d a n g a segue a par com uma negl igencia da lu ta , exceto

os inodos de resistencia sobre os quais se sabe que nao tem fun-

d a men ta lmen te a capacidade de t ransformar as estruturas.

A ausencia de um foco sobre a pratica e a lu ta pode a j u d a r aexplicar por que as analises de Foucault resultam em algo terrivel-

mente unila tera l , em outro aspecto (Taylor, 1986: 81). A s lecnicas

de poder caracterizadas no s estudos genealogicos sa o in terpretadas

como ins t rum e ntos nao-am biva le n te s de dominagao e m anipu la -

gao. Mas consideremos o caso do aconselhamento como um a for-

ma de confissao na sociedade contemporanea. O aconselliamento

e, de fato, usado para trazer o in ter ior das pessoas para de n t ro do

d o min io do poder/conhecimento, mas e tambem uma tecnica pa ra

af irmar o valor e a ind iv idua l idade das pessoas e m u m a sociedade

qu e cada vez mais as trata (como Foucault no s mostra) como nu -

meros. 0 aconselhamento e a l t am e nte ambivalente, e a complexi -dade manifesta de suas relacoes com o poder deve excluir qua lque r

afirmacao cle que suas d imens oes de l iberagao sao apenas i lusor ias .

Uma vi a adiante mais frut i fera e a inve s t igagao de como o acon-

se lha men to fu n c io n a como tecnica de discurso na pratica. o que

inclui um estudo das lu t as no discurso sobre suas or ientagoes con-traditor ias para a dom inagao e a ema nc ipa ga o (ver, no Capftulo 7,

o i tem "Produzindo sentido das tendencias").Existem, no e n tan to , a lguns comentarios em Fo u ca u l t sobre a

'polivalencia tatica do s discursos', os quais apontam nessa diregao:

86 _ Mor ma n_ F a i rcl ough Discur so e m u d a n ^ a soc ia l 87

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Na o existe. po r ur n lado , um discurso de poder e em oposic.ao a

isso oulro discurso qu e f u n c i o n a con t ra c le . O s discursos sa oelementos on blocos taticos que opcrajri no campo das rclac/ies

de forc.a: podem cxist ir discursos d i feren tes e ate mesmo con-

t rad i to r ios d e n t r o d u mesma eslrategia; eles podem, ao con t ra -

r io, c ircu lar sc m m u d a n c a em sua forma de u m a eslrategia a

oufr a oposta. Nos nao d c v c m o s esperar que os discursos sobre

sexo nos digam, acima de tudo. de qual estrategia d e r i v a m , ou

qu e d iv i soes mora i s e l es acompanham, ou que ideo logia - do-

m i n a n t e ou dominada - eles reprcsentam; antes, devemos ques-

t iona-los nos dois nfve i s de sua p r o d u t i v i d a d e tat ica (que cfei tos

reciprocos dc poder e c o n h e c i me n t o e les asseguram) e sua in te-

gra§ao estrategica (que conjuncao e que r e lacao d e forca lazem

su a u t i l i zacao necessaria cm um dado ep i sod ic dos varios con-

f rontos que ocorrem) (1981: 101-2).

Eu discut ire i essa perspectiva a seguir (ver, no Capft i i lo 3, o

item "Discurso") em termos de discursos e ordens de discurso qu e

sa o acessiveis ao investimento polit ico e ideologico, sem sereninecessariamente assim investidos, ou investidos em uma direcao

par t i c u la r .

A nocao de polivalencia tatica dos discursos e uma percepcao

valiosa dos processos de luta ideologica no discurso, como poder iam

ser compreendidos em um mo d elo hegemo n ico . Contudo , o pro-

prio Fouc au l t e res is tente ao conceito de ideologia e tambem a

ideia de analise como um a forma de cn'tica ideologica. Essas posicoes

su rgem d o re l a t i v i smo de Foucault : a verdade e re lat ive a for-

macoes discursivas par t iculares , a s isfem as de poder /conhecimento

particulares, os quais, portanto, na o estao abertos a critica de posi-coes externas ou acima delas. Tern sido af i r mado , no en t a u t o , qu e

a posicao de Foucault e contraditoria. porque ele aparenta eslar

comprometido com certas formas de critica, as quais estao em de-

sacordo com seu relativismo. de modo que ele t e rmin a por ser

a m b i v a l e n t e sobre a cr it ica (Dews, 1987; Fraser, 1989). Na ex-

plicacao da ADTO, no Capi tulo 3 a seguir, eu irei discordar de

Foucault no uso do conceito de ideologia, as s um indo que a ADTO

e u ma forma de critica ideologica. N o e n t a n t o , as criticas de Fou-

cault e outros significam que se deve ter cuidado de evi tar a lgum asda s coticepgoes incipientes de ideologia (ver Thompson, 1990).

Minha reserva final sobre Foucault relaciona-se a sua percepcao

valiosa das propriedades constitutivas do discurso. Embora eu aceite

que tan to os objetos quanto os sujeitos sociais sejam moldados pelas

praticas discursivas, eu desejaria insistir que essas praticas sao

constrangidas pelo fato de que sao inevitavelmente localizadas den-tro de uma realidade material, constitui'da, co m objetos e sujeitos

sociais pre-constituidos. Os processos constitutivos do discurso de-

ve m ser vistos, portanto, em termos de uma diale t ica, na qual o ira-

pacto da pratica discursiva depeude de como ela interage com a

realidade pre-constituida. Com respeito aos objetos, talvez seja litil

usar ambos os termos referenda e significacao: o discurso inclui re -

ferencia a objetos pre-constituidos, (anto quanto a significacao cria-

tiva e const i tut iva dos objetos. Aqui, de novo, as analises da pratica

real e do texto real sao um corretivo important^ ao exagero de Fou-

caultsobre

os efeitos constitutivos do discurso. Po r exemplo, os es-tudos do discurso da mfdia, que focalizam a forma de interpre tagao e

de organizacao de textos particulars, sugerern um quadro altamente

complexo, em que os textos podem se r interpretados de varias posi-

§6es mais ou menos aquiescentes ou opositivas, tornando a ltament e

problematica qualquer visao esquematica do efeito do discurso - por

exemplo, sobre a constituicao do s sujeitos sociais. Esse t ipo de

exemplo tambem indica que o processo de constituigao dos su jeitos

sempre tern lugar dentro de formas particulares de interacao entre os

sujeitos pre-cons(ituidos, onde as formas de interacao inf luenciam o

processo coustitutivo (ver Dews, 1987: 198). Isso tambem sugere

qu e os sujeitos sociais const!tm'dos nao sao meramente posicionadosde modo passivo, mas capazes de agir como agentes e. entre outras

coisas, de negociar seu re lac ionamento com os tipos variados de dis-

curso a que eles recorrem,

Em resumo, eu estou sugeriiido que a ADTO pro va ve lmen te

reforcara a analise social, essencialmente por assegurar a t en ga o a

exemplos concretes de,pra tica e a formas textuais e a processos dein terpretagao associados a elas. Tal a tencao ao de ta lh e de casos

par ticulares pode ajudar a anal ise social a evitar o esqu ema t ismo e

a un i l a tera l idade que l imi ta m o t rabalho d e Fo u ca u l t , s e ja em

88 Norman Fairclough

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relacjio aos efeitos de po d er e as possibilidades de resistencia, a

consti tu igao dos sujeitos sociais, seja ao s valores sociais e c u l l u -

rais associados com os generos particulares, ta l como o aconse-Ihamento, Isso pode tambem ajudar a relacionar os e n u n c i a d o s

gerais sobre a m udanc a social e cu l tu ra l ao s mecanismos e as mo-

dalidades precisas dos efeitos da rnudanc,a na pratica.

C a p f t u l o 3

Teor ia social d o d i scu rso '

Neste capitu lo , apresento u m a concepcjio de d iscurso e urn

q u a d r o leorico para a a n a l i se de discurso que sera elaborado e

i lustrado no decorrer do livro. M i n h a abordagem e delerminada

pelos objetivos estabelecidos na Introdugao: r eu n i r a analise de

discurso orientada iingiiisticamente e o pej isamento social e po l i t i -

co relevante para o discurso e a l ingu a gem, na forma de u m qu a d ro

teor ico que sera adeq uado para uso na pesquisa cient if ica social e,

especif icamente, no estudo da m u d a n g a social. Os dois primeiros

capi'tulos ident i ficaram varias reaiizacoes e limitac.6es do t rabalho

anterior, e o Ca pf lu lo 3 foi escrito a lu z de tal discussao sem se

basear dire tamente ai. Inicio com uma discussao do termo ' discurso' , e

em seguida analiso o tliscurso n u m q u a d r o t r id im e ns iona l , coino

textq, pratica discursiva e pratica social. Essas tres d imenso es de

analise sa o dis c u t idas uma a uma, e concluo estabelecendo min ha

abordagem para a investigagao da m u d a n g a discursiva em sua re la-

co m a mu d a nca social e cu l t u ra l .

Discurso

Quero focalizar a l inguage m e, conseqiienlemente, uso 'dis-

curso' em um senl ido mais estreito do que os cientislas sociais ge -

ra lmente fazem ao se referirem ao uso de l inguagem fa lada ou

escrita. Usarei o termo ' d i s curso ' no qual os lingiiistas tradicio-

Tradu^ao de Izabel Magal hae s .

_Norman Fairclough Discurso e mudan^a social 91

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nalmeiite escrevem sobre o 'uso de l ingu a gem' , parole (fa la) on

'desempenho'. N a tradigao iniciada por Ferdinand de. Saussure

(.1959), considera-se a fala como na o acessivel ao e s tudo s i s tema t i -

co, por ser essencialineiite u m a at iv idade i nd i v i dua l : os individuos

usam uma lingua de formas imprevisiveis, de acordo com seus d e-

sejqs e suas intengoes, uma laugue (lingua) que e em si mesma

sistematica e social. Os l inguis tas nessa tradigao ident if icam a pa-role para ignora-la, pois a implicac.ao da posigao saussureana e que

q u a l q u e r esludo sis tematico da l ingua deve ser urn esludo do pro-prio sistema. da langiie, e nao de se n 'uso'.

A posicao de Saussure e atacada f i rmemen t e pelos sociolin-

giiistas qu e afi rmam ser o uso de l inguagem mohiado socia lmente

e nao ind iv idua lm e nte . Eles argum e ntam que a variagao no uso de

linguagem e sistematica e acessivel ao estudo cient ffico e que

0 aquilo que o torna sistematico e sua correlagao com variaveis sociais:f a lingua varia de acordo com a natureza da relagao entre os partici-

pantes em interagoes, o lipo de evenlo social, os propositos sociais daslv pesspas na interacao, e assimj>or d ia n te (Downes , 1984). Isso re-

presenta claramerite u m avango na tradic.ao saussureana dominanle

na linguist ica regular, mas tern d u a s limitagoes pr incipals . Pr ime i-

ro, a enfase tende a ser uni lateral sobre como a lingua varia segun-

d o fatores sociais, o que sugere a exis tencia de tipos de sujeito

social, de relagoes sociais e de situacao bastante independentes do

uso de linguagem, e a exclusao da possibilidade de o uso de l in -

guagem re a lm e nte conlr ibuir para su a c ons f i t u i g ao , reprodugao e"

mudanga. Segundo. as 'variaveis sociais' que sao consideradas coinq

cprrejacionadas a variaveis lingiii'sticas sa o aspectos das sit L i n g o e s

sociais de uso lingiiistico rehit ivamente superficiais, alem de naoha v er u m a compreensao de que as prupr iedades do uso de l i n gu a -

gem podem ser de te rm inadas em um sentido mais global pela es-

t ru f u ra social em um nivel mais prof u n d o - as relacoes sociais

entre as classes e outros grupos, modos em que as ins t i tuigoes so -ciais sao ar ticuladas na formagao social, e assim por d i a n t e-e po-

de m coutribuir para reproduzi-la e Iransforma-la.

J Ao u sa r o te rmo 'discurso', p r op on h o considerar o uso de '1

linguagem como forma de pratica social e nao como ativ idade p u -

\ r a men te ind iv id u a l o u ref lexo de var iaveis s i t u a c io n a i s . Isso tern

< *>

1var ias implicacoes. J3rimeiro, impl ica.ser . o discurso um modo de

agao, uma forma em que as pessoas podem agir sobre o inunclo e

especialmente sobre os outros, como tambem um modo de repre-

sentac,ao., Trata-se de uma visao do uso de l inguagem que se tornou

familiar, embora f requentemente em termos individualists, pela

Filosofia linguistica e pela Pragmatics lingiifstica (Levinson, 1983).

Segundo, implica uma relagao diale t ica entre o d iscurso e a estru,-tura social, existindo mais geralmente tal relagao entre a pra tica

social e a estn.itura social; a u l t i ma e t a n t p uma condicjio como uin

efeilo d a pr im e i ra . Por outro lado, q_discurso e moldado e restr in-

gido pela estru tura social no sentido mais amplo e em todos os

& niveis: pela classe e por outras relacoes sociais em um n f v e l so -

cielar io , pelas relagoes especificas em insti tu i^oes part iculares ,

como 0^direito .ou a e duc agao , por sistemas de classificagao, por

varias normas e convengoes, taiito de natureza d iscursiva como

nao-discursiva, e assim po r diante. O s eventos discursivos especi-

f icos var iam em sua determinacao est ru tura l segu nd o o d o m f n i o

social par ticular ou o quadro ins t i tnc ional em que sao gerados. Po r

outro lado, o di S C U T S o e socialmente constitutive). Aqui esta a im-

portancia da discussao de Foucault sobre a formagao discursiva de

l o b j e t o s , su je i to s e concei tos . O d j scurso co n t r ib u i pa ra a cons-

°f t i t u igao de todas as dimensoes da estru tura social true, direta ou ,

indiretajriente, o moldam e q restringern: suas proprias normas e

convencoes., como tambem relagoes, identidad.es e inst i tu icoes qu e

; lhe_sao subjacentes. O discurso e uma pratica, nao apenas de re-

gresentagag.dQ. m u n d p . mas de s ignif icagao do mundo, consti tu in-

; do e construiiido o mund o em signif icado.

Podemos dist inguir tres aspectos dos e fe i to s c ons t ru t ivos dodiscurso. O discurso contr ibui, em pr imeiro lugar , para a constru-

ga o do que var iavelmente e refer ido como ' id en t id a d es sociais' e

'posigoes de su je i to ' para os 'sujei tos ' sociais e os tipos de 'en'

(ver H e nr ique s el al., 1984; Weedon, 1987). Devemos, contudo,

recordar a discussao de Fo u ca u l t sobre essa qu es ta o no Capitu lo 2

e as minhas observances ai qu a n t o a enfase na posigao c ons t ru t i -vista . Segundo, o d iscu r so co n t r ib u i pa ra co ns t ru i r as r e la go essociais entre as pessoas. E, terceiro, o discurso contribui para a

construgao d e sistemas de co nhec imen to e crenga. Esses tres efei-

92 Norman Fairclough Discurso e mudanca soc ial

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tos correspondent respeclivamente a tres fungoes da lingtiaeem e a

dimensoes de sentido qu e coexistem e interagem em todo discurso - o

que denom inarei as fungoes da l inguagem ' i de n t i t a r ia ' , ' r e la c io na l '

e ' ideacional ' . A funcao ideut i taria relaciona-se aos modes pelos

q u a i s as identidades socials sa o estabekcidas no discurso. a fu n ga o

relacional a como as relates sociais entre os par ticipantes do dis-

curso sao representadas e negociadas. a fung ao ideaciomil aos mo-dos pelos quais os textos s ignif icam o m u n d o e seus pfocessos,

e n t i d a d e s e relates. A s f u n g o e s i d e n t i t a r i a e relational sao

r eu n id a s po r Ha l l id a y (1978) como a fu n ga o in terpessoal. Ha l l i d a y

tambem dist ingue uma fu n ga o ' textual ' que pode ser u t i lmen t e

acrescentada a minha lista: isso diz respeito a como as in fo rm agoe s

sao traz idas ao pr imeiro pian o ou relegadas a urn piano s e c undar io ,

to ma d a s como d a d a s ou apresentadas como novas, se l e t ionadascomo 'topico' ou { tema ' , e como partes de um texto se l igam a

par tes precedentes e seguintes do texfo, e a situagao social 't'ora'

d o texto. • j •f

' . / . ' -• • 'A pratica Jiscursiva e c ons l i tu t iva t a n t o d e m ane i ra c onve n-

cionaJ como criativa: contribui para re produz i r a sociedade ( iden-

tidades sociais, relates sociais, sistemas de conhecimento e crenca)

como e, mas tambem conir ibui para t ransforma-la. Po r exemplo , as

identidades de professores e alunos e as relagoes entre elas, queestao no centro de u m sistema de educagao, d epend em da consis-

tencia e da durabilidade de padroes de fa la no in ter ior e no exter ior

dessas relagoes para sua reproducao. Porem, elas estao aberlas a

transformagoes que podem or iginar-se parcialmente no discurso:

na t'ala da sala de au la , do parqu inh o , da sala dos professores, do

debate educational, e assim por d ia n te . ^ --—•^ E importante que a relacao eiitre discurso e e s t r u t u r a socia l

seja considerada como dia let ica para evitar os erros de e nfas e in -d ev id a : de um lado, na determinagao social do discurso e, de ou tro ,

na construgao do social no discurso. N o primeiro case, o discurso

e mero reflexo de uma realidade social ma is p r o f u n d a ; n o u l t i m o ,

o discurso e represen tado id ea l iz a d a men te como fo n t e d o social .O ult imo ta lvez seja o erro mais imed ia ta meu te perigoso, d a d a a

enfase nas propr iedades const i tut ivas do discurso em debates con-temporaneos. Vamos lomar um exemplo para ver como esse erro

pode se r evitado sem por em risco o principio consti tu t ivo. A re la-

giio entre pais e filhos ua familia, a determinagao da s posi^oes de

'mae', 'pai' e ' f i lho(a) ' que sao socialmente disponweis , como

tambem a local iza^ao de ind iv iduos reals nessas posi^oes, a iiatn-

reza da fa mi l ia e do la r sa o todas const!tufdas parcia lmente no dis-

curso, como resultatlos cumulativos (e de i'ato contraditor ios) de

processes complexes e diversos de conversa e escrita. Isso poder ialevar facilmente a conclusao idealis ta de qu e realidades do m u n d o

social como a famil ia simplesmente ema na m das cabegas das pes-

soas. Enl re tan to , ha tres ressa lvas que juntas contr ibuem para blo-quear isso. Primeiro, as pessoas sao sempre coni'rontadas com a

familia como ins t i tuigao real (e m um c on jun to I j mi t ado de formas

variaiites) com praticas concretas, relagoes e identidades exis tentes

que foram elas proprias coiistitufdas no discurso, m as reif icadas

em insti tuigoes e praticas. Segundo, os efeitos consti tutivos do dis-

curso atuam conjugados com os de outras praticas, como a distri-

buigao de tarefas domesticas, o vestuario e aspectos afetivos do

comportamento (por exemplo, quern e emotivo). Terceiro. o tra-

balho consti tu t ivo do discurso necessariamente se realiza dentro

da s restrigoes da determinacao dia let ica do discurso pelas es t rn tu -

ra s sociais (que, nesse caso, incluem a realidade das estru turas da

familia , mas as ul trapassam) e, como argumentarei a seguir , no

interior de relagoes e lutas de poder par t ic ulares. Assim, a consti -

tuigao discursiva da sociedade na o emana de um livre jogo de ideias

na s cabegas da s pessoas , mas de uma pratica social qu e esta t'ir-

memente em-aizada em estruturas sociais materials, concretas, orien-

tando-se para elas.

Uma perspectiva dialet ica tambem e um corretivo necessario au m a enfase ind ev id a na determinagao do discurso p elas estru turas.

estru turas d iscursivas (codigos, convengoes e normas), como t a m-

bem por e s t ru lu ras nao-discursivas. Desse pouto de vis ta , a capaci -

dade da palavra 'discurso' de referir-se as es t ru tu ra s d e co nvenya o

qu e s ub jaze m ao s eventos discursivos reais, assim como ao s pro-

prios eventos, e uma ambigii idade feliz, mesmo se de outros pon-

tos de v is ta possa gerar confusao. O estru tura lismo (represenlado,

por exemplo, pela abordagem de Pecheux descr ita no C a p i t u l o 1)

t rata a pratica d iscursiva e o evento.discursive como meros exem-

94 Norman Fairclough Discurso e mudan^a social

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plos de estruturas discursivas, que sao elas proprias representad as

como unitarias e fixas. Considera a pra tica d iscursiva em lermosde ur n m o d e l o de ca u sa l id a d e mecanica (e, portanto , pessimista) .

A perspectiva dialetica considera a pratica e o evento contraditorios

e em lu ta , com uma relagao complexa e var iavel com as estru turas ,

as qu a is mauifes tam apenas u ma f ix id ez temporar ia , partial e con-

traditor ia .A pratica socia l tern varias orientagoes - economica. politica.

cultura l, ideologica -, e o discurso pode estar implicado em todas

elas, sem que se possa reduzdr qua lque r uma dessas orientacoes dodiscurso. For exemplo, ha varias maneiras em que se pode dizer

qu e o discurso e um modo de pratica economica: o discurso ligura

em proporgoes var iaveis como um consti tu inte da pratica econo-

mica de natureza b a s ica men te nao-discursiva, como a construcao

de pontes ou a produgao de maquinas de lavar roupa; ha formas de ,

pratica economica que sao de natureza basicamente d iscursiva ,

como a bolsa de valores, o jo rna l i smo ou a pro d u ga o de no ve la s

para a televisao. Alem disso, a ordem sociolinguistica de uma so-

ciedade pode se r es t ru t u ra d a pelo menos parcia lmente como um

mercado onde'os textos sao produzidos, distr ibuidos e co nsu mid o s

como 'mercadorias ' (e m ' industr ias cultura is ' : Bourd ieu , 1982).

r Mas e o discurso como modo de pratica polit ica e ideologica

qu e esta mais ligado as preocupagoes deste livro. O discurso como

pratica politica estabelece, m ante m e t r a ns fo rma as relagoes de

poder e as entidades coletivas (classes, blocos, comunidades, gru-

pos) entre as qu a is exislem relagoes de poder. O discurso como

pratica ideologica constilu i , n a t u ra l i z a . m a n t e m e t rausforrrm,os

significados d o m u n d o de posicoes diversas n as relagoes de poder .Como implicam essas palavras, a pra tica polit ica e a ideologica

nao sao iu d epend en tes uma da out ra , pois a ideologic sao os s i g n i -

ficados gerados em relagoes de poder como dimensao do exercfc ioF*

do poder e da lu ta pelo poder. Assim, a pratica polft ica e a calego-

ri a superior. Alem disso, o discurso como pratica polit ica e nao

apenas um local de lu ta de poder. mas t a mb em um marco delimita-dor na luta de poder : a pra lica d iscursiva recorre a convengoes que

n a t u r a l i z a m relacoes de poder e ideologias par t i c u la re s e as pro-

pr ias convengoes, e os modos em que se ar t i c u lam sao um foco

de lu ta . Argumentarei a seguir que o conceito de hegemonia, de

Gramsci , fornece um quadro frutifero para a conceituagao e a inves-

tigagao das dimensoes polft icas e ideologicas da pratica discursiva.

Em lugar de dizer qu e tipos cle discurso par t iculares tern va lo -

res poJiticos e ideologicos inerentes , direi que diferentes t ipos de

discurso em diferentes dom in ios ou ambienles ins t i tuc ionais po-

de m vir a ser ' investidos' politica e ideologicamente (Frow s 1985)de formas par t iculares. Isso significa que os t ipos de discurso po -

de m t a mb em ser e nvo lv idus de d i fe ren t es maneiras - po d em ser

' re invest idos ' . (Darei um exemplo no fi m deste capftu lo . no item

"Mudauga discurs iva".)Um a questao razoavelmente importante e como concebemos as

convengoes e as normas discursivas subjacentes ao s eventos discur-

sivos. Jii fi z alusao a concepgao estruturalista de que ha conju ntos on

codigos be m definidos que sao simplesmente concretizados no seventos discursivos. Isso se estende a uma concepgao do s dominios

sociol inguisticos c ons t i tu idos por um conjunto de tais codigos em

distr ibuigao co mplemen ta r . d e ta l modo que cada um t en ha suaspropr ias fungoes , situagoes e condigoes de adequagao que sejam

claramente demarcadas de outros. (Cr i t ique i concepgoes d e va r ia -

ga o sociolingiiistica baseadas no conceito de ' adequagao ' em Fa i r -

clough, no prelo b.) Abordagens dessa nat urez a delineiam v a r i a ga o

sislematica em comunidades de fala segundo conjuntos de variaveis

sociais. incluindo o ambiente (por exemplo, sala de a u la , pa rqu i -

nho, sala de professores e assembleia sa o diferentes ambientes es -

co l ares), t ipos de a t iv id a d e , proposi to social (por exemplo, ens ino ,

t raba lh o d e pesquisa ou teste n u m a sala de aula) e f a l an t e (por

exemplo, professor(a) em oposicao a aluno (a)). Nessa concep gao,o codigo e pr im ar io , e um c o n j u n t o de codigos e simplesmente

uma soma d e suas par tes .

U ma posigao mais frutifera pa ra a orientagao historica da mu-

danga discursiva nes te l iv ro e a dos analis tas de d iscu r so Franceses

qu e sugerem que o ' in terdiscurso ' , a complexa c onf igurac ao inter -

dependente de formagoes discursivas, tern primazia sobre as par tes

e as propriedades que nao sao previsiveis das partes (ver a discussao

de Pecheux no Capftu lo 1). Alem disso, o interdiscurso e a ent icla-

d e es t ru t u ra l que subjaz aos eventos-discursivos e nao a formagao

96 Norman Fairclough

ind iv idua l ou o codigo: m ui tos eventos discursivos manifes t am

Discurso e mudan^a social 97

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um a orientacao para configuragoes de elementos do codigo e parasens limites, para que se possa considerar como regra o evento dis-

cursive existente (mas especial) construido da concretizac.ao nor-

mativa de um unico codigo. Urn exemplo seria ' generos mistos ' ,qu e combinam elementos de dois ou mais generos, tais como o

' ba t e -papo ' em sho\vs da (elevisao, que e parte couversagao e parteen t r e ten imen to e desempeuho (verTolson, 1990, para uma ana l i s e

do 'bate-papo') . Entretanto, usarei o termo foucault iano 'ordem de

discurso ' de preferencia a interdiscurso, porque sugere mais c la -r a men te os tipos de configuragao que tenho em mente .

Vamos usar o t e rmo mais frouxo ' e l emen to ' e nao codigo ou a

formacao para as par tes d e u ma ordem de discurso (falarei da natu-

reza desses elementos a seguir). Contrariamente a abordagens basea-

das em teorias da adequagao, onde se supoe um a relagao uirica e

constante de complementaridade entre os elementos, su po nho qu e

a relagao pode ser ou tornar-se contraditor ia . Os l imi tes en t re os

elementos podem ser l i n ha s de tensao. Tornem-se, por exemplo, asdiversas posigoes de sujeito de um individuo no s diferentes ambientes

e atividades de uma instituigao, em termos da dispersao do sujei to

na formagao de modalidades enuncia tivas, segundo Fouc au l t (ver,

no Capi tu lo 2, o i tem "A formagao de modal idades enuncia t ivas") .E possivel que os l imites entre os ambienles e as praticas sejam ta o

natura lizados qu e essas posicoes de su j e i t o sejam viv idas como

co mplemen t ares. Em diferentes ci rcunstancias sociais, os mesmos

l imites poderiam tornar-se foco de co ntestacao e l u t a . e as posicoes

de sujei to e praticas discursivas associadas a eles poderiam ser

consideradas contraditor ias . Por exemplo, os a lunos podem ac e i t a rque as narra tivas da experiencia propria, em seus proprios dialetossociais, se j am 'adequadas ' a segoes da s au las destinadas a discus-

sac, mas nao a secoes des t inadas ao ens ino ou ao t raba lh o escri to;

ou , a ind a , as contradicoes entre o que e permitido em um lu ga r

mas nao em out ro podem tornar-se pla taforma d e l u ta para m u d a r

os l imites en tre a discussao, o e n s i n o e a escri ta. Em pnmeiro lu -

gar, a aceitagao de narra t ivas de experiencia pessoal , niesmo em uma

parte es tri tamente del imitada da al ividade da sala de aula, pode se rum a solugao resultante de lu tas anter iores para af incluf-la.

O que se aplica aos l imites en tre as posigoes de su j e i t o e ascouvencoes discursivas associadas geralmente se apl ica aos ele-

mentos das ordei is de discurso. Apl ica-se tambem aos l imites entre

dist in tas ordens de discurso. A escola e a sua ordem de discurso

podem ser consideradas em relac,ao co mplemen ta r e nao sobre-

poslas a dominios adjacentes , como o la r ou a viz inh anc a , ou, por

outro lado, contradicoes percebidas entre tais dominios podem vi-

ra r plataforma de lu tas para redef inir seus limites e suas relac/ies;

lu tas , por exemplo. para estender as propr i edades d a relacao

pai/mae-f i lho(a) e suas convenc,6es discursivas a re layao profes-

sor(a)-aluno(a) ou vice-versa, ou es tender as relates e as pra t i cas

entre amigos na viz inh anga e na rua a escola.

O s resultados de tais lutas sao re articulates de ordens de dis-

curso, tanto das relacoes entre elementos nas ordens de discurso

'locais' como a da escola, como das relagoes entre ordens de dis-

curso locais na ordem de discurso societaria. Consequentemente ,

os l im i t e s entre os elementos (como tambem e n t re as ordens de

discurso locais) podem variar entre rela t ivamente fortes ou relati -va men te fracos (verBerns te in , 1981), d e p e n d e n d o de sua articula-

c.ao a tua l : os elementos podem ser descontinuos e bem definidos,

ou podem se r pouco nftidos e mal def in idos .Nem se deve supor que esses 'elementos' se j am homogeneos

in te rna men te . U ma consequencia d a luta ar ticula tor ia que t e n h oem mente e que os novos elementos sao consti tuidos med ia n te a

redefinigao de l imites entre os elementos antigos. Portanto , um

elemeuto pode ser heterogeneo em sua origem, e m e s m o qu e essa

heterogeneidade historica nao seja senrida como ta l q u a n d o as

convengOes sa o altamente na tura l i zadas , pode ser senlida comocontradicao no elemento, em condicoes di ferentes. Um exemploseria u m esti lo de ensino famil iar qu e consiste na exploracao pelos

professores de uma ro t ina d e pergu n ta s e respostas estru luradas

para obter dos alunos informagoes pred e te rmina d a s . Esse esti lo

na o e necessariamente sentido em termos de uma c ont rad igao

q u a n d o usado po r professores com o proposi to de dar ordens ao s

alunos mediante a solicita^ao de informagoes, mas pode ser en ten -d id o dessa maneira. Se aplicarmos o conceito de inve s t im e nto nes-se caso, pode-se dizer que os e l ementos , as ordens de discurso

98 Norman Fairdough Discurso e mudan^a social 99

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locals e as ordens de discurso societarias sac na pratica potencia l-

men te es truturadas d e maneira contraditoria e, desse modo, estaoabertas para ter os investimentos pol i ticos e ideologicos como foco

de disputa em lutas para desinvesti-Ios ou reinvesti-los.

Os elementos a qu e m e refiro podem se r m u i t o variaveis em

termo s de um a 'escala'. H ;i casos em que podem parecer corres-

ponder a urna compreensao convencional d e ur n codigo ou 'regis-tro' inte iramente desenvolv ido (Hal l i day , 1978), ur n bloco de

var iantes em niveis diferentes co m padroes fonologicos distintos,

vocabular io , padroes gramaticais , regras de t om ada de turno. e as-

sim por diante. Exemplos de (ais casos sao o discurso de gessoesde bingo on de Jeiloes de gado. Em outros casos, contudo, as variaveis

sao em escala menor: sis temas de tomada de lu n io part iculares ,

vocabularios que incorporam esquemas d e class if icacao par ticula-

res. roteiros de generos como relates de crimes ou narrativas orais.

conjuntos de convengoes de pol idez, e assim por d ian te . Ur n ponto

de oposigao entre as ordens de discurso e a cr is ta lizacao de tais

elementos em blocos relativamente duraveis. Vou sugerir (Capftulo 4,i tem "Interdiscursividade") u rn pequ eno n u m e r o d e t jpos di feren-tes de elementos: generos, estilos, tipos de a t iv idade e discursos.

Pode se r i lum inador , nesle ponto, relembrar um a citagao d e

Fo u ca u l t (Capflulo 2. i tem "A formagao dos objelos"), ao refer i r-

se as regras de formagao de objetos na psicopatologia. As ' re la-

yoes' identificadas po r Foucaul t , que foram adoladas no discurso

psiquiatrico para propiciar a formacao do s 'objetos' a que se ret'e-

re, podem ser in terpretadas como relacoes en tre e l ementos d i scur -

sivos de diferentes escalas: ' p ia no s de especificacao' e 'pianos de

caracter izacao psicologica' sao, no mfnimo, parc ialmente cons t i -tu idos por vocabularios , enquanto o ' i n t e r roga tor io j u d i c i a l ' e e

' qu es t io na r io medico' sao elementos discursivos de l ipo gener ico

(sobre genero, ver Capftulo 4, item "Interdiscursividade"). Entre-

tanto , note-se que nao sao apenas elementos discursivos. A inves-

tigagao policial, o exame clinico, a reclusao terapeut ica e a pr isao

podem te r co mpo nen tes discursivos, mas nao sao per se en l idades

discursivas. As descricoes de Foucaul t ressal tam a imbricac.ao

m u t u a d o discursivo e do nao-discursivo nag condicoes es t ru t u ra i s

da pratica discursiva. Nesse seutido , as ordens de discurso podem

ser consideradas como facetas discursivas das orden s sociais, cuja

ar ticula^ao e rearticulacao in terna te m a mesma natureza.

Ale agora o foco esta principalmente no que torna o discurso

semelhante a outras formas de pratica social. Agora, precise conlra-

balan^ar. tratando da questao sobre o que torna a pratica discursiva

especificamente discursiva. Par te da resposta esta e v ide n te m e ntena l ingu a gem: a pratica discursiva manifesta-se em fo rma liugiiis-

tica, n a forma do que referirei como 'textos', usando 'texto' no

sentido ample de Halliday, linguagem fa lada e escri ta (Hal l iday,

1978). A pratica social (polftica, ideologica, etc.) e uma dimensao

do evento d iscursivo, d a mesma forma que o texto.

M as isso nao e suf ic iente . Essas duas dimensoes sao mediadas

por uma terceira que examina o discurso especificamente como

pratica discursiva. 'Pratica d iscu r s iva ' aqui nao se opoe a 'pra tica .£

social ' : a pr im e i ra e u ma fo rma par t i c u la r d a u l t i ma . Em a lguns t

casos, a pratica social p ode se r i n te i ramente consti tu ida pela prat i-

ca discursiva, enqua nto em outros pode envolver uma m escla de

prat ica discursiva e nao-discursiva . A anal ise de u m discurso parti -

cular como exemple de pratica discursiva focal iza os processes de

produgao, d is tr ibuicao e consume tex tua l . Todos esses processes

sao seciais e exigem referenda aos a mb ien tes economicos , pol f-

t icos e ins t i tuc iona i s par t i cu la res lies qua i s o discurso e gerado.

A producao e o consume sao de natureza parcialmente sociocognitiva,

j a que envoi vein processes cognit ivos de produgao e interpre tagao

textual que sao baseados na s es truturas e na s convencoes sociais

interiorizadas (dai o prefixo 'socio-'). Na explicate desses processes

sociocognitivos, u m a preocupacao e especi f i ca r (o s e l e m e n t o s

d) as ordens de discurso (como t am be m outros recursos sociais,

denominados 'recursos dos membros') em que se baseiam a pro-

ducao e a in terpretagao dos sentidos e como isso ocorre. A preocu-

pacao central e estabelecer conexoes explan atorias entre os modos

de organizagao e in terpretagao textual (normativos, inovativos,

etc.), como os textos sao produzidos, dis tribufdos e consumidos

em um sentido mais amplo, e a natureza da pratica social em ler-

100 Norman Fairclough Discurso e mudan^a social 101

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mos de sua re lagao co m a s es t ru t u ra s e as lutas socials. Nao se

pode nem recons truir o processo de producao nem explicar o pro-

cesso de interpre tacao s implesmen te por r e fe r end a aos textos: eles

sao respectivamente traces e pistas desses processes e nao poclem

se r produzidos nem interprelados sem os recursos d os memb ro s .

U m a fo rma de ligar a enfase na pratica d iscursiva e no s processos

de producao, distribuigao e consume textual ao proprio texto e focali-zar a intertextualidade do ultimo: ver o item "Pratica discursiva", a

seguir.

A concepcao tr id imensional do discurso e re pre s e n tada dia-

gram al ic am e nte na Figura 3.1. E u m a tentat iva d e r eu n i r tres tradi-

coes analft icas, cada uma das quais e ind i s pe ns ave l na anal ise d e

discurse. Essas sao a t radigao de analise textual e l inguis t ica d e t a -

Ihada na Lingiiistica, a f radic j io macrossociologka de a na l i se da

pratica social em relagao as es lruturas sociais e a tracligao in t e r -

pre tat iva on microssociologica de considerar a prat ica social como

a lgum a coisa qu e as pessoas produzem a t iv a men t e e ej i tendem

com base em procedimentos de senso comnm par ti lhados. Aceito a

af irmacao interpre tat iva segu nd o a qual d evemo s t e n ta r co mpreen -

de r como os membros d as comu nidade s sociais produze m sens

m u n d o s 'ordenados' ou 'explicaveis'. Ente udo que a analise d e

processos sociocognitivos na pratica disc ursiv a deva ser parc ial-

mente dedicada a esse o b je t ivo (embora faca sugestoes a seguir de

qu e ela apresenta d imenso es 'macro' e 'micro'). Eu t re t a n t o , argu-

m e ntar ia que, ao produzirem sen m u n d o , as praticas do s memb ro s

sa o m oldadas , d e fo rma incoiisciente, por estru turas socia is , re la -

coes de poder e pela n a t u rez a da pratica social em que estao en -

volvidos, cujos marcos delimitadores vao sempre alem d a

pro d u ca o d e sent idos . Assim, sens pro ced imen to s e su a s p ra t ica s

po d em ser inve s t idos politica e id eo lo g ica men te , podendo ser po-

sicionados por eles como suje i tos (e 'membros'). Argum e ular ia

tam be m que a pra tica dos membros tern re s u l t ados e efeitos sobre

as estru turas socia is , as relagoes sociais e as l u t as socia is , dos

qua i s outra v ez eles ge ra lm e nte n ao tern consciencia. E, f i n a h u e n -

te , argum e ntar ia que os proprios procedimenlos que os membros

usam sao heterogeneos e contraditorios e contestados em lutas de na-

tureza parc ialmente discursiva . A pa r t e^d o pro ced imen to qu e train

da analise t ex t u a l pode ser de nom inada 'descrigao', e as par tes que

tratam da analise da pratica discursiva e da analise da pratica social

da qual o d iscurso fa z par te podem ser denominates ' i n t e rp re t a -

cao'. (Sobre essa dist incao, ver C a pf tu lo 6, "Conclusao".)

TEXTO

PRATICA DISCURSIVA

(produ^ao, distribuipao, consumo)

P R A T I C A SO C I A L

F l G U R A 3. 1 Concepsao tr id imensional do discurso

Discurso como texto

Por razoes que se tornarao c laras m ais tarde, re a lm e nte nui ica

se fala sobre aspectos de ur n texto se m r e fe r end a a produc ao e/ou

102 Norman Fairclough Discurso e mudancpa social 103

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a interpretatao textual. Fo r causa dessa sobreposicao, a d iv i sa o dos

topicos anal f t icos entre analise textual e analise da pratica discur-

siva (e tambem entre as atividades analiticas de descrigao e inter-

pretagao) m ~ » o e nit ida. Onde os aspectos formais dos textos sao

mais destacados, os topicos sao ai inclufdos; onde os processos

produtivos e in terpreta tivos sa o mais destacados. os topicos sa o

incluidos na analise da pratica discursiva, mesmo que en v o lv a maspectos formais clos textos. 0 que proponho uessas d u a s cate-

gorias e ur n quadro analilico ou u m modelo ampJo; explicates

selelivas mais de ta lh adas serao enc ontradas nos capi tulos 4 e 5.

E u m a hipotese de trabalho sensala supor que qu a lqu er tipo de

aspecto textua l e potencia lmente s ignif ica tive na analise de dis c ur -

so. Isso cria uma grande dif iculdade. A analise linguistica e por si

mesma uma esfera complexa e as vezes bastante tecnica qu e incor-

pora muitos tipos e tecnicas de anal ise. Emb o ra um a experieiicia

previa em linguistica, em principle , possa se r pre-requisi to para

f aze r analise d e discurso. na verdade a analise de di scurso e

um a atividade multidisciplinar e nao se pode exigir uma grande ex-

periencia linguistica previa de sens praticantes , do mesmo modo

qu e nao se pode exigir experieiicia previa em sociologia, psicolo-

gia ou politica. Nessas circun standas , o que pretendo fazer e: (1)

oferecer, neste capftu lo , u m qu a d ro anal i tico m ui to geral qu e te m o

proposito de dar aos leitores um mapa da area em grande escala;

(2) iden tificar, para analise mais detalhada e ilustrac.ao uo s capftulos

de 4 a 6 , aspectos analiticos selecionados qu e parecem se r especial-

mente produtivos na analise de discurso; (3 ) abolir tanto q u a n t o

possi'vel termos tecnicos e j a rgao proibitivos; e (4) tbrnecer refe-

rencias para os que desejem seguir l inhas particulares de analise.Algumas das ca tegor ias no quadro de analise textual a seguir

sao or ientadas apare n te m e ute para formas l ingiifs t icas , enquanto

f outras aparentemente sa o orientadas para os sentidos. Ent re tan to ,

ta l d is t in^ao e i lusoria , po rqu e ao analisar textos sempre se exa mi-

na m s imultaneamente questoes de forma e questoes de significado.

Na te rminoiogia de grande par le da l inguist ics e da semiotica do

seculo X X , analisam-se 'signos', isto e, palavras ou seqiiencias

mais longas de texto que consistent de um signif icado combinadoco m u ma forma, ou de um 's ignif icado ' combinado com um 's igni-

ficante' (ver Saussure, 1959). Saussure e outros na tradicjio l i n -

giiistica enfat izam a natureza 'a rb itrar ia ' do s igno, a concepgao d e

que nao ha uma base motivada ou racional para combinar um

s ignif icante par ticular com um signif icado par t icular . Contra isso,

abordagens criticas da a na l i se de discurso de fe ude m que os signos

sa o socia lmente motivados, isto e, que ha razoes sociais para com-

biuar signif icantes par t iculares a signif icados par ticulares. (Agra-dec.o a Gunther Kress a discussao desse assunto.) Pode ser uma

questao de vocabular io - ' terrorista ' e ' l u t ador pela l iberdade ' sao

combinac.6es contrastantes de signif icante e significado, e o con-traste entre elas e s o c i a l m e n t e m o t i v a d o - ou uma q u e s t a o de

gramalica (ve ja exemplos a seguir), ou outras dimensoes da orga-

nizagao lingiiistica.

Out ra dist ingao importante em relagao ao significado e entre o

significado potencial de um texto e su a in terpretagao. Os textos

sao feitos de formas as quai s a pratica discursiva passada, conden-

sada em convengoes, dota de s ignif icado potencia l. O signif icado

potencial de uma forma e geralmente heterogeneo, um complexo

d e s ign i f ica d o s diversos , sobrepostos e a lgu m a s vez es co n t r a -

ditorios (ver Fairclough, I990a), de forma que os textos sao em

geral a ltamente ambivalentes e abertos a raultiplas interpretagoes.

Os in terpretes gera lmente reduzem essa ambivalencia potencia l

mediante opgao por um sentido particular, ou um pequeno con-

junto de sentidos a llernativos. Uma vez que tenhamos em men t e a

de pe nde nc ia que o sentido tem da in terpretagao, podemos usar

'sentido' tanto para os potencia is das formas como para os senti-

dos a tr ibuidos na interpre tagao.

A analise textual pode ser organizada em quatro itens: 'voca-b u la r io ' , ' gramatica' , 'coesao' e ' e s t ru tu ra tex tua l ' . Esses i tens

po d em se r imaginados em escala ascendente: o vocabular io t ra ta

principalmente das palavras ind iv idua l s , a gramatica das palavras

combinadas em oragoes e frases, a coesao trata da ligac.ao enfre

oracoes e frases e a estrutura textual trata das propriedades organi-

zacionais de larga escala dos textos. Alem disso, dist ingo tres ou-tros itens principals que nao serao usados na analise textual, m as

na analise da pratica discursiva, embora c e r tam e nte envolvam as-

pectos formais do s textos: a ' fo rca ' do s enunciados, isto e, os t ipos

104 Norman Fairclough

de atos de fala (promessas, pedidos, ameagas, etc.) por eles cons-

Discurso e mudanca social 105

agente (entre parenteses), porque ele e desconhecido, j a conhecido,

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t i tufdos ; a 'coereucia' dos textos; e a ' intertextualic lade ' dos tex-

tos. Reu n id o s , esses sete i tens consti tuem um quadro para a ana l i s e

textual que abrange aspectos de sua produgao e in terpretagao como

tambem as propriedades formais dos lextos.

A unidade principal da gramatica e a oragao. ou 'oragao sim-

ples' - por exemplo, a manchete de jornal "Gorbachev r ed u z oprego do exercito vermelho". O s principais e lemen to s das oracoes

gera lmen te sao chamados 'grupos' ou ' s i n tagraas ' - por exemplo ,

'o exerc i to verm elho ' , ' r eduz o prego' . As oragoes se co mb ina m

para formar oragoes complexas. M e u s comenfar ios aqu i se restr in-

girao a certos aspectos da oracao.

Toda oracao e mult ifuncional e, assim, (oda oragao e u m a

combinagao d e significados ideacionais, interpessoais (ident i tarios

e relacionais) e textuais (ver o i tem "Discurso", anter iormente) . A spessoas fazem escolhas sobre o modelo e a estru tura de suas ora-

goes que resultam em escolhas sobre o significado (e a construgao)

de identidades sociais., relacoes sociais e co nhec imen to e crenga.Ilustrarei com a manchete de j o rna l an te r io r . Em termos do s ignif i-

cado ideacional , a oragao e transi tiva: signifies ur n processo de um

indivi 'duo particular agindo fisicamente (note-se a metafora) sobre

uma entidade. Poderiamos mu ito be m ver a q u i u m inves t imen to

ideologico diferente de outras formas de significar os mesmos

eventos - por exemplo, "A U nia o Sovietica re duz as Forgas Arma-

das", ou "O exercito sovietico desiste da s cinco divisoes". Emtermos do significad o interpessoal, a oragao e de clarativa (oposta a

in t e r roga t iva , ou im pe ra t iva) e contem u m a forma verbal d o pre-

sente do i n d i ca t i v o que e ca tegor i camente a u t o r i t a r i o . A re lagaoautor(a)—leitor(a) aqui e entre alguem dizendo o que esta ac onte -

cendo em termos seguros e alguem qu e recebe a informagao; sa o

essas as duas posigoes de suje i to eslabelecidas na oragao . Terceiro,

ha um aspecto textual : 'Gorbachev' e o topico ou tema da oragao,

como geralmente ocorre com a primeira parte da oragao: o artigo esobre ele e seus atos. Por outro lado, se a oragao fosse t r a n s fo rma -

da em passiva, 'o prego do exerci to vermelho' passaria a ser otema: "O prego do exerc i to vermelho e r ed u z id o (por Gorbachev)".Out ra possib ilidade oferec ida pela passiva e o a pa ga men to do

julgado i rrelevante, ou talvez para deixar vaga a agenda e, conse-

qi ientemente, a responsabilidade. A abordagem da lingiiistica crft i-

ca e par t i c u la rm e nte interessante quanto a gramatica (Fowler el a/.,

1979; Kress e Hodge, 1979). O t rabalho de Leech, Deu cha r e Hoo-

genraad (1982) e uma introdugao acessivel a gramatica, e Ha l l iday

(1985) faz uma apresentagao mais avangada de uma forma d e gra-matica par t i c u la rm e nte litil a analise de discurso.

O 'vocabulario ' pode ser investigado de m ui las maneiras, e os

co men ta r io s a qu i e no Capftulo 6 sao m u i t o seletivos. U m ponto

que precisa se r esclarecido e que tern valor l imitad o conceber um a

l ingua com um vocabulario que e d o cu men ta d o 'no' dicionario,

porque ha m uitos vocabularios sobrepostos e em competigao cor-

respondendo aos dii 'erentes domfnios, instituigoes. praticas, valores e

perspectivas. O s termos wording,1

' l exical izagao' e 's igmficacao'(sobre isso e outros aspectos do vocabulario, ve r Kress e Hodge,

1979; Me y, 1985) captain isso melhor do que ' vocabular io ' , por-

que implicam processes de lexicalizagao (significagao) do m u n d oqu e ocorrem diferentemente em tempos e epocas diferentes e para

grupos de pessoas diferentes.

Um foco de analise recai sobre as lexicalizac,6es alternativas e

su a significancia politica e ideologica, sobre questoes, ta i s como a

'relexicalizagao' dos dommios da experiencia como parte de lutas

sociais e polft icas (e bem conhecido o exem plo de relexical izagao

de 'terroristas' como 'lutadores pela liberdade' ou vice-versa), ou

como certos dommios sao mais in tens iva men te lexicalizados 'd o

qu e outros. Outro foco e o sentido da palavra, par t i c u la rm e nte

como os sentidos das palavras entram em disputa dentro de l u tasmais amplas: quero sugerir que as estru turagoes particulares das

relagoes entre as palavras e das relagoes en tre os senl idos de uma

palavra sa o formas de hegemonia. U m terceiro foco recai sobre a

metafora , sobre a implicagao poli t ica e ideologica de metaforas

par ticulares e sobre o conflito en tre melaforas alternat ivas .

Ao considerar-se a 'coesao' (ver Hal l iday e Hasan, 1976;

H al l iday , 1985), estamos concebendo como as oragoes sao l igadas

O termo ii-o/Wrngsignif ica a cria^an de pafavras (N . daT.).

106 Norman Fairclough

em frases e corao as frases, por sua vez. sa o ligadas para fo rm ar

Discurso e mudanca soc ia l 107

za desses processes var ia entre d iferentes t ipos de d iscurso de

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unidades maiores no s textos. Obtem-se a ligagao de varias maneiras:

mediante o uso de vocabulario de um campo semantico comum, a

repetigao de palavras, o uso de sinonimos proximos, e assim por

diante; mediante u m a va r ied a d e de meca n ismo s de referenda e

substi luigao (pronomes, ar tigos definidos, d emo ns t r a t ives , elipse

de palavras repetidas, e assim por d ia n te ) ; med ia n te o uso de con-j imgoes. tais como ' po r ta u to ' , ' en t r e ta n to ' , 'e' e 'mas'. Focalizar acoesao e um passo para o que Fo u ca u l t refere como "varies es-

qu ema s retoricos segundo os qua i s grupos de enunciados podem

se r combinados (como sa o ligadas descrigoes, dedugoes . de f i n i -

goes, cu j a sucessao caracteriza a arquite tura de um texto)" (ver , no

Capilulo 2, o item "A formagao de conceitos"). Esses esqu ema s e

seus aspectos particulares, como a es t ru t u ra argum e nta t iva dos

textos, variam entre os tipos de discurso , e e in teressante explorar

tais variacoes como evidencias de diferentes modos de racionali-

dade e modificacoes nos modos de racionalidade, a m e dida qu e

m u d a m as praticas discursivas.'Es t ru tu ra t ex t u a l ' t a mb em d iz respei to a ' a rqu i te tu ra ' d o s

textos e especif icamente a aspectos superiores de plane jam e nto de

diferentes tipos de texto: po r exemplo. as maueiras e a ordem em

qu e os elementos ou os episodios sa o combinados para consti tu ir

um a reportagem policial no jornal, ou uma entrevista para emprego.

Tai s convengoes de estruturagao podem arapliar a percepgao do s sis-

temas de conhecimento e crenga e dos pressupostos sobre as relagoes

sociais e as id en t id a d es sociais qu e estao embutidos n as c o n v e n -

goes dos t ipos de texto. Como sugerem esses exemplos, es tamos

interessados na estrutura do monologo e do dialogo. O ult imo envolveos sistemas de tomada de t u rno e as convengoes d e organizacao da

troca de turnos do falante , como t a mb em a s conveucoes para abrir

e fechar entrevistas ou conversas.

Pratica discursive

A pratica d iscursiva , como i n d iqu e i anteriormente , envo lveprocesses de producao, dis tribuicao e consume t e x tua l , e a n a t u r e -

acordo co m fa tores sociais. Po r exemplo, os textos sa o produzidos

d e fo rm as par ticulares em contextos sociais especificos: um ar t igo

d e jo rna l e p r o d u z i d o m e d i a n t e r e t i n a s c o m p l e x a s d e n a t u r e z a

coJetiva por um grnpo cujos meinbros estao envolvidos var iavel-

mente em seus diferentes estagios de produgao - no acesso a fontes,

tais como nas reportagens d as agendas d e uolfcia , na t ransforma-ga o dessas fontes (f reqiientemente elas propr ias j a sao textos) na

pr imeira versao de uma repor tagem, na decisao sobre o local do

j o rna l em que e n t ra a repo r ta gem e na edicao da repor tagem (ver

va n Di jk , 1988, para uma discussao deta lhada e mais ge ra lm e nte

sobre processes discursivos).

H a outras maneiras em que o conceito de£produ tor (a ) t e x tua l '

e mais complicado do que. pode parecer . E produtivo desconslcuir

o(a) produtor(a) em um c on jun to d e posigoes, que podem ser ocu-

padas pela mesma pessoa ou por pessoas diferentes. Go ffma n

(1981: 144) sugere um a dist incao en t r e ' an imador(a) \ a pessoa

qu e re a lm e nte realiza os sons ou as marcas no papel ; 'autor(a) ' ,aquele(a) que re une as palavras e e responsavel pelo texto; e 'pr in-

cipal ' , aquele(a) cu ja posigao e representada pelas palavras. Em

ar tigos de j o rna ] . ha uma ambigiiidade na re lagao entre essas posi-

goes: f r eq i ien temen te , o principal e uma 'fonte ' t'ora do j o r n a l , m as

algumas repor tagens n ao deixam isso claro e dao a impressao de

que o pr inc ipa l e o jo rna l (o(a) editor(a) ou um(a) jornalis ta) ; e os

textos de autoria coletiva muitas vezes sao escritos como se fossem

assinados po r um(a) unic o(a) jornalis ta (que na melho r das hipote-

se s seria o(a) animador(a)). (Ve ja um exemplo em Fairclough,

1988b.)Os textos tambem sao consumidos di f e re n te m e nle em con-

textos sociais diversos. Isso tern a ver parcia lmente com o t ipo de

trabal l io in te rp re ta t ive que nel es se aplica ( ta is como e x a m eminucioso ou atengao dividida com a realizagao de outras coisas) e

co m os modos de inlerpretagao disponiveis - por exemplo, gera l-

men te nao se leem receitas come t ex to s estetices ou ar tigos aca-

demicos como textos retoricos, erabora ambos es t ipo s de i e i lu ra

sejam possiveis. O consumo, como a produgao , pode se r i n d iv id u a l

ou coletivo: compare cartas de amor co m registros adm in i s t ra t ivos .

108 Norman Fairclough

Alguns textos (entrevistas oficiais, grandes poemas) sao registra-

Discurso e mudanca socia l 109

Atlantico Norte/OTAN). E cada um a dessas posigoes pode se r

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dos, transcritos, preservados, relidos; outros (publicidade nao soli-cilada, conversas casuais) nao sa o registrados, m as transi torios e

esquecidos . Alguns textos (discursos polfticos, livros-texto) sa o

transformados em outros textos. A s inst i tu igoes possuem rotinas

especfficas para o ' processamento' de textos: um a consulta medica

e t ransformada em ur n registro medico qu e pode se r usado paracompilar estatfsticas medicas (ver, no Ca pi tu lo 4 , o item "Inter-

t e x tua l idade e transformagoes", para u m a discussao de t a i s 'ca-

deias in ter textuais ') . Alem disso, os textos apresentam resultados

variavels de natureza extradiscursiva , como tambem discursiva .

Alguns textos conduzem a guerras on a deslmicao de armas nuclea-

res; outros levam as pessoas a perder o emprego ou a obte-lo; outros

ainda modificam as atitudes, as crengas ou as praticas da s pessoas.

A l g u n s textos tern d is tr ibuigao s imples - uma conversa ca-

sual pertence apeuas ao contexto imed ia to de si tuacao em que

ocorre -, enquanto outros tern d is tr ibuigao complexa. Textospro-

d u z id o s por l id e res poli t icos ou t ex tos re la t ivos a negoc iagaoin ternacional de armas sao distr ibuidos em uma var iedade de dife-

rentes domfnios inst i tucionais , cada um dos qu a is possui padroes

proprios de consume e ro tinas proprias para a reprodugao e trans-

formacao de textos. Po r exemplo, os te lespectadores recebem um a

versao transformada de um discurso prommciado por Thatcher ou

Gorbachev, versao que e co nsu mid a segundo habi tos e ro t ina s

particulares de recepgao. Produtores em organizacoes sot'isticadas,

como departamentos do governo, produzem textos de forma a anteci-

pa r sua distribuigao, transform.ac.ao e consumo, e neles constroem lei-

tores multiples. Podem antecipar na o apeuas os 'receptores' (aquelesa quern o texto se dirige di re tam e nte ) , m as tambem os ' o u v i n t e s '

(aqueles a quern o texto nao se dir ige d iretamente, mas sao inc lu i -

dos entre os leitores) e 'destinatarios ' (aqueles que nao consti tuent

par t e dos leitores 'oficiais ' , mas sao conhecidos como consuntido-

res de fato (por exemplo, os oficiais sovielicos3 sa o d es t ina ta r io s

em com.unicac.6es entre os governos da Organizagao do Tratado do

Trala-se de oficiais da ex-Uniao Soviel ica (N. da T.)

ocupada de forma miil t ipla.

Como indiquei anter iormente. ha d imeusoes 'sociocogni tivas"especificas de produgao e interpretac,ao t ex tu a l , que se centra lizam

na in ter-relacao en t r e os recursos dos membros, que os pa r t i c ipa n -

tes do discurso tern in ter ior izados e Irazem consigo para o proces-

samento t ex tu a l , e o propr io texto . Este e considerado como u mc on jun to d e ' t r agos ' do processo d e produgao, ou um co n ju n t o de

'pistas' para o processo de interpre tagao. Tai s processos geral-

mente procedem d e maneira n a o - c o n s c i e n t e e a u t o m a t i c a , o que

e u m i m p o r t a n t e fa t o r ua de te rm J nagao d e su a e f ica c ia id eo lo -

gica (veja o u t ro s d e ta lhes adiai i te) , embora certos aspectos sejam

raais facilmente trazidos a consciencia do que outros.

Os processos de produgao e in terpretagao sa o so c ia lmen te

restringidos n u m serttido duplo. Primeiro, pelos recursos disponfveis

dos membros, que sao estru turas sociais efe t ivamente in ter ior iza-

das. normas e convengoes, como tambem ordens de discurso e

convengoes para a produgao, a d is tr ibuigao e o consumo de textosdo tipo j a refer ido e que foram consti tu idos mediante a prat ica e a

lu ta social passada. Segundo, pela n a t u rez a especffica da pratica

social da qual fazem parte, que determina os elementos dos recursos

dos membros a que se recorre e como (d e maneira normativa . cr ia-

tiva, aquiescente ou opositiva) a eles se recorre. Um aspecto fun-

dam e nta l do q u a d r o tridimensional para a analise de discurso e a

(entativa de exploragao dessas restrigoes, especialmente a segunda -

fazer conexoes explanatorias entre a nalureza do s processos discursi-

vos em instancias particulares e a natureza das praticas sociais de que

fazem parte. Dado o foco deste livro na m udanc a discursiva e social,e este aspecto dos processos d iscu r s ivo s - a d e te rmina ga o dos

aspectos dos recursos dos memb ro s a que se recorre e como serecorre — que e de ma io r interesse. Re tornare i a isso, a seguir , na

discussao d a in ter texUial idade.

M a s , p r imeiro , qu ero f a l a r u m p ouc o e m terraos raais ge-rais sobre os aspectos sociocognitivos da produgao e da in terpre-t agao e in t roduz i r mais d u a s d as sete dimensoes d e a na l i se : 'fore.a'e ' coerencia' . A produ gao ou a in terpretagao de um f ex to (referir-me-ei apenas a iuterpretagao em partes da discussao a seguir) ge-

110 Norman Falrclough

ra lmente e representada como ur n processo ti e nfve i s m ul t ip los e

Discurso e mudanca social 111

E, nesse sentido. as diferencas entre os lipos de discurso sa o social-

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como u rn processo 'ascendente'- 'desceudenle' . Nos nfveis inferio-

res, analisa-se uma sequencia de sons ou marcas graficas em frasesno papel . O s nfveis superiores dizem respeito ao s ignif icado, a

a t r ibu ic ao de significados as frases, a textos comple tos e a p a r f e so u a 'episodios' d e u m texto que cons i s ten t d e frases qu e podemser interpretadas como coerentemente conectadas. Os significados

das unidades 'superiores' sa o construidos em par te dos signif ica-

dos das u n id a d es ' infer iores ' . Essa e a interpre tagao ' a scendente ' .Entretanto , a iu terpretacao tainbem se caracteriza por pred icoes

sobre os s ignif icados d as unida des de nive l su per io r no infc io d oprocesso de interpretaciio com base cm evidencia l imi t a d a , e esses

significados preditos moldam a m ane i ra como as unid ades de nivel

infer ior sao in te rp re ta d a s . Esse e o p r o c e ss a m e n t o ' d e s c e n d e n t e ' .

A pro d u ga o e a in terpretacao sa o parc iahnente ' de scenden les ' eparcia lmente 'ascendentes1. Alem disso, a interpre tayao ocorre no

tempo real: a in terpretacao a que j a se chegou pa ra pa la v ra , on

frase. ou episodio x e xc lu i ra ou l ras iuterprelacoes possiveis parapalavra, frase, ou episodio x + 1 (ver Fairclough, 1989a).

Esses aspectos do processamenlo textual coutr ihuem para ex -

plicar como os interprets reduzem a ambiValencia potential dos

textos, mostrando pa r f e do efeilo do contexto na reducilo da ambi-

valencia , mini sentido estreito de ' con tex to ' como o que precede

(ou segue) em um texto . Entretanto , ' con texto ' t a mb em inc lui o que

as vezes e c h am ado o 'contexto de situac.ao': os interprets chegam a

interpretac,6es da totalidade da pratica social da qual o discurso faz

parte, e tais interpretacoes condnzem a predicoes sobre os sen t id o s

dos lexlos que novam e nte reduzem a ambivalencia pela exc lu sa o

de outros sentidos possiveis. D e certo modo. essa e u ma elaborac_ao

das propriedades 'descendentes* da interpretacao.

U ma grande l imit acao da e xpl ic agao d os processos sociocog-

nitivos apresentada aiiteriormente e que geralmente el a e posta em

termos unive rs a i s , como se, por exemplo. o el'eito do contexto no

sentido e a reducao da ambivalencia fossem sempre os mesmos.

Mas nao e ass im. A maueira como o contexto afela a interpretacaodo texto var i a de um tipo de d iscurso para outro , como Fo u ca u l tindicou (ver . no C a pi t u Jo 2, o i t em "A forniaclio de concei tos") .

mente interessantes porque apontam assuncoes e regras de baseimpl i ti tas que tern f reqiientemente carater ideologico. V ou i lus trar

esses pontos com uma discussao de ' forca' (ver Leech. 1983; Levin-

son, 1983; Leech e Thomas, J989).A for9a de parte de um lexto (f reqiientemente , m as nem sem-

pre, uma parte na extensao de uma frase) e sen componente acio-nal , par te de sen s ign if icado in terpessoal. a a^ao social qu e r ea l iz a .

que 'ato(s) d e f a la ' desempenha (dar u m a ordem, fazer u m a per-

gunta , ameacar, prom e te r , etc.). Forca esta em contraste co m 'pro-

posigao' : o componente proposicional . que e pa r te do s ign i f ica d o

ideacional, e o processo ou a re lagao que e predicado das en t t d a -

des. Assim. no caso de "Prometo pagar ao(a) porlador(a) se exigida

a soma de 5 l ibras",3 a forga e a de uma promessa, e n q u a n t o a pro-

posicao poder ia se r representada e s que m at ic am e nte como 'x paga

y a z'. As partes dos textos sao tipicamente ambivalentes em termos

d e forga, podendo ter 'forca poten t ia l ' extensiva . Por exemplo,

"Voce pode carregar a mala?" poder ia ser uma pe rgunta , um pedi-do ou uma ordem, uma suges tao , uma reclamacao, e assim por

diante. Algumas analises de atos de fala dis t ingue m for^a direta e

indireta; poderiamos dizer, nesse caso, qu e temos alguina coisa

proxima da for^a direta de uma pergun ta , que poder ia tam bem pos-

suir qualquer da s outras forc_as alis tadas como su a forga indireta.

Alem disso, nao e de forma a lgum a i n c o m u m que as in terpretacoes

permanegam ambivalentes: as vezes, pode nao estar claro se temos

um a pergunta s imples , ou tambem um ped id o velado (e assim, se

desafiado, negavel).

0 ' con tex to ' nos dois sentidos anteriores e um fa tor im por-t an te na reducao d a ambivalencia da forca. A posigao sequ en t ia l

no texto e um poderoso predifor de forca. Na acareacao, qu a lqu er

coisa que o advogado diga a uma t e s t e m unh a im e dia tam e nte apos

a resposta da testem unha pode ser interpre tada como uma pergunta

(o que nao imped e qu e seja in terpretada s im ul tane am e nte como

o u t ra s coisas, po r exemplo , como acusacj lo). Isso a j u d a a e xpl i -

car como e que as form a s d a s pa la v ra s po d em te r forgas qu e

Aproximadamente R$ 13,00 (treze reals) (K. da T.).

112 Norman Fairclough

parecem a l t a rae n te impro va ve is se a s cons idera rmos fora do

Discurso e mudan^a soc ia l 113

men to de ta is var iaveis e um aspecto insat is fatorio da analise con-

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contexto . E , n a t u ra lmen t e , o contexto de s ituacao, a na ture za genii

do contexto socia l, tambem reduz a ambivalencia . En tretan to , an-

tes qu e se possa recorrer ao contexto de situagao, ou niesmo ao

contexto seqiieucia], para in t e rpre ta r a forga de um e n u n c i a d o ,

deve-se ter chegado a uraa in terpretac,ao sobre qu a l e o contexto

de s i luagao. Isso e amilogo a in terpretagao textual : envolve u m ainter-re lagao entre pis tas e recursos dos membros, mas esles, nesse

caso, sao de fato um mapa mental da ordem social. O mapa mental

e necessar iamenle apenas uma iu t e rp ie tagao da s realidacies socialsque se prestam a mu i t a s in terpretacoes, polit ica e ideologicamente

investidas de formas par t iculares. Apontar o conlexto de s i t u a ga o

em termos do mapa mental fornece dois grupos de infonnacoes

relevantes para de te rm inar como o contexto afeta a interpretagao

do texto em qua lque r caso par t ic ular : uma l e i t u ra d a s i tu a ga o qu eressalta certos elementos, dim inu indo a importancia do s outros,

relacionando os elementos entre si de determinada m ane i ra , e uma

especif icagao dos t ipos de d iscurso que provavelmente serao re le-vau te s .

Assim, um efeito sobre a interpretacao da lei tura da s i tuac ao e

ressaltar ou d i m i n u i r a i m p o r t a n c i a d e aspec tos d a i d e n t i d a d e

social dos participates, de mo d o qu e , po r exemplo , o genero . aetnia ou a idade do(a) produtor(a) do t ex to p ro va ve lmen te afetam

m ui to menos a interpretacao no caso de um l ivro-texto de bolanica

do que no caso de uma conversa casual ou de uma entrevis ta para

emprego. Assim, o efeito do contexto de s i tuac ao sobre a inter-

pretacao textual (e produgao textual) depende da leitura da s i t u a -

cao. Por outro lado, o efeito do contexto seqiiencial d e p e n d e dotipo de discurso. Por exemplo , na o podemos supor que uma per-

gunta sempre predispora da mesma forma a in te rp re ta ga odo enu n -c ia d o qu e a segue como resposta; d epend e d o t i p o d e d iscu r so .

No discurso de sala de aula , as perguntas preclizem fortemente as

respostas; no discurso conversacional clentro de uma f a m f l i a , ro t i -

neiramente as perguntas pode m deixar de ser re s pondidas se m

qua lque r sentido real de infringimento ou necessidade de reparagao.Como argum e nte i no Capi tu lo 2, a enfase uni la tera l no co n lex to

seqiiencial como determinante da iuterpre tagao sem o reconheci-

versacional. Aleni disso, as diferencas en t r e os lipos de discurso

dessa ordem sao socia lmente importantes : onde as pergunlas de-

vem ser respondidas, ha uma probabiliclade de que sejam lom adas

como tacitas as assimetr ias de status entre os pa pe is d e s u je i to

n i t idam e nte de l im j tados . Assim, a inves l iga ca o d os princfpios

interpretativos que sao usados para determinar o sentido permite

compreetider o inves t imento polit ico e ideologico de um t ipo de

discurso.Passemos agora da forga a ' coerencia' (ver De Be augrande e

Dressier, 1981, no Capitu lo 5; Brown e Yule, 1983, no Capftulo 7) .

A coerencia e tratada freqiientemente como propriedade dos textos.

mas e mais bem considerada como propr iedade das interpre tagoes .

Um texto coerente e u m texto cujas partes constitutes (episodios,

frases) sao relacionadas com nm sentido. d e fo rma que o texto

como um todo ' faca sentido ' , mesmo qu e haja re la t ivam e nte pou-

cos marcadores forma is dessas relagoes de sentido - isto €, relati-

vam e nte pouca coesao explicita (veja o ult imo item). Entretanto , oponto em foco e que um texto so faz sentid o para alguem que nele

ve sentido , a lguem que e capaz de infer i r essas relagoes de sen t id o

na ausencia de marcadores explicitos. Mas o mo d o pa r t i cu la r em

que e gerada um a leitura coerente de um lexto depende n o v a m e n t e

da na tu rez a d os p r inc fp io s in te rp re ta t i vo s a qu e se r eco r r e . Pr in-

cipios in terprela tivos pa r t i cu la res associam-se de ma ne i r a na t u r a l i -

zada a tipos de discurso part icuJares , e vale a p e n a investigar ta is

ligagoes devido a luz que jogam sobre as importantes fiingoes

ideologicas da coereucia na interpelagao dos sujeitos. Isto e, os

textos estabelecem posigoes para os su jeitos interpre tes que sao

'capazes' de compreende-los e 'capazes' de fazer as conexoes e as

in f e re nc ias , d e a co rd o co m o s p r inc fp io s in te rp re la t ivo s r e leva n -

tes, necessarios para gerar leiluras coereutes, Tais conexoes e iufe-

rencias podem apoiar-se em pressupostos de tipo ideologico. Por

exernplo, o que estabelece a ligagao coerente entre as duas frases

"Ela pede demissao d o emprego na proxima quar ta-fe i ra. Esta gra-

vida" e o pressuposto de que as mulheres param de ( rabalhar q u a n -

do tern fi lhos. A med id a que os in terpretes tomam essas posigoes eautomaticamente fazem essas conexoes, sao assujeilados pelo

114 Norman Fairclough

texto, e essa e uina par te importante do ' t r a b a lho ' ideologico dos

Discurso e mudanca social 115

O conceito de in ter textu alidade toma os textos his tor icamente.

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textos e do discurso na ' i n t e rpe lagao ' dos su jeitos (ve ja o pro x imoitem). Entretanlo , existe a poss ib ilidade n ao apenas de lu t a quan to

a dit'erentes lei turas do s textos, m as tambem de resistencia as posi-

coes estabelecidas nos textos.

Agora quero voltar-me para a u l t ima das sete d imensoes de

analise e a que e de ma io r destaque nas preocupacoes deste l ivro: a

' in ter textualidade ' (ver B a kht in , 1981, 1986; Kristeva, 1986a).

Dedicarei todo o Capitu lo 4 a i u t e r t e x t u a l i d a d e ; dessa forma, a

discussao a qu i po d e ser breve. T n t e r t ex t u a l id a d e e b a s i c a m e n t ea propriedade que tern os textos de ser cheios de fragmentos de outros

textos, qu e po d em se r delimitados explicitameute ou mesclados e

qu e o texto pode assimilar, contradizer, ecoar ironicamente, e assim

por d iante. Em termos da produgao, u m a perspectiva in t e r t e x tua l

a cen tu a a historicidade dos textos: a ma neira como eles sempre

constituem acrescimos as 'cadeias de comunicagao verba l ' exis-

tentes (Bakhtin, 1986: 94), consislindo em textos previos ao s q u a i s

respondem. Em lennos d a dis tribuigao, uma perspecliva in ter tex-tual e ut i l na exploragao de redes re la t ivam e nte estaveis em que os

textos se m ovim e ntam , sofrendo t ransformagoes predizfveis ao

mu d a rem de um tipo de t ex to a outro (por exeraplo, os discursos

politicos f reqiientemente se t ransformam em reportagens). E em

termos do consume, uma perspectiva in ter textual e uti l ao acentuar

que nao e apenas 'o tex to ' , ne m inesmo apenas os textos qu e in -

ter textualmente o consti tuem, que moldam a interpretac,ao, m as

tambem os outros textos que os interpretes var iavelmente t r a z em

ao processo de interpretacjio.

Farei um a dis t ingao entre ' i n t e r t e x tua l idade m aui f e s ta ' , em

qu e , no texto, se recorre explicitam ente a outros textos especificos,

e ' interdiscursividade' ou ' i n t e r t e x tua l idade co ns t i tu t iva ' . A inter-

discursividade estende a inter textuaJidade em diregao ao princjpio

da pr im azia da ordem de discurso que discut i , anter iormente. no

item "Discurso". Por um lado, temos a const i tuigao heterogenea de

textos por meio de outros textos especificos (intertextualidade m a n i -

fest a); por outro lado, a conslilu igao heterogenea de textos por

meio de elementos (tipos de convencao) das ordens de discurso

( interdiscursividade).

transformando o passado - convengoes existeutes e textos previos -

no presente. Isso pode ocorrer de ma neira r e la t iva men te con veil-

cional e norm at iva : os t ipos de discurso tendem a t r a ns fo rma r em

rot ina formas particulares de recorrer a convengoes e a textos e a

natura liza-las . Contudo, pode ocorrer , cr ia t ivamente, com novas

configuragoes de elementos de ordens de discurso e novos modosd e in te r tex tu a l id a d e manifes t a. Sao a historicidade i n e ren t e a uma

concepcao in te r tex tual e a maneira como esta acomoda tao pron-lamente a pra tica cr ia t iva que a tornam tao adequada para m i n h a s

preocupacoes presentes com a m u d a u g a discursiva , embora. como

argumentarei ad ian te ( i tem "Hegemonia") , el a precise estar l igada

a um a teor ia de mudanca socia l e pol f t ica para a inves l igagao da

m u d a n c a discursiva dentro de processes mais amplos d e m u d a n g a

cul tura l e social.

Acredito que a analise da pratica d iscursiva deva envolver

um a combinagao do que se poder ia d eno mina r 'microanal ise ' e

'macroanal ise ' . A primeira e o tipo de a na l i se em que os analis tasda conversagao se dist inguem: a explicagao do mo d o precise como

os participates p r o d u z e m e i n t e r p r e t a m textos com base nos

recursos dos membres. M as isso deve ser ceinpiementado com a

macroanalise para que se conhega a natureza do s recursos do s

membros (como tambem das ordens de discurso) a que se recorre

para produzir e interpre tar os textos e se isso precede de ma neira

normativa eu cr i a t i v a . Na verdade, nao se pode realizar microana-

lise sem esse conhecimento . E , n a l u r a l m e n t e , a m i c r o a n a l i s e e a

nielhor ma neira de expor tais informagoes: desse m o d e , fornece

evidencias pa ra a ma cro a na l i se . Po r ta n te , a micro a na l i se e a

macroanalise sa o requisites mutuos. E devido a sua mter-re lagao

qu e a dimensao da pratica discursiva em m inh a teor ia t r id im e ns io -

na l pode inediar a relagao entre as dimensoes da pratica social e do

texto : e a natureza da pratica social qu e d e t e rmin a os ma cro -

processos da pratica discursiva e sao os microprocessos qu e mol-

da m o texto .

U ma impl icacae da posiyao que estou ado lando nesta segao e

que a maneira como as pesseas in terpretam os textos em v a r i a s

circunstancias sociais e uma que s tao qu e r equ er investigagao sepa-

116 Norman Fairclough

r a d a . Emb o ra o q u a d r o qu e apresentei aponte a impo r t a n c ia de

Discurso e mudan^a social 117

(segundo Althusser, 1971: 161, n. 16), e a const i tuigao dos s u je i -

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cousiderar-se a in terpretagao em seu proprio merito , deve-se no ta r

que nao foram i nc l u i dos neste l ivro es tu d o s empiricos . (Para ur na

d iscu ssa o de pesquisa sobre a interpre tagao de textos da midia, v er

M o r ley , 1980, e Thompson, 1990, no Capitu lo 6.)

Discurso como pratica social: ideologia e hegemoiiia

Meu obje t ivo nes la segao e e xpi ic a r m ais c la ra men t e aspectos

da terceira dimensao de rmnha teoria IridimensJoual, discurso como

prat ica social. Mais especif icamente . discut ire i o conceito de dis-

curso em re lagao a ideologia e ao pode r e situarei o discurso em

u m a concepgao de poder como hegemoii ia e em uma concepcao da

e vo lugao da s re lagoes d e poder como luta hegemonica . Ao fazer

isso, recorro as contr ibuigoes classicas do ma rx ismo do seculo

XX, d e Althusser e Gramsci, qu e (nao obstante a crescenle impo -

pula r idade c on te m porane a do m a rxi s m o) o fe rec e m um a t e or ia r i c apara a investigagao do discurso como fo rm a de prat ica social, emhora

com importautes reservas, especialmente no caso de Althusser.

Ideologia

A teoria d e ideologia qu e tern sido mu i t o mf lu en t e no re c e n te

debate sobre discurso e ideologia e cer lamente a de A l t h u s s e r

(Althusser, 1971; L a r ra in , 1979), a qua l m e referi b rev emen t e ao

d i scu t i r Pe c h e ux no Capi tu lo 1. De t 'ato, pode-se considerar que

Althusser forneceu as bases leorieas para o debate , e m bora Vo lo sh i -no v (1973) t en ha sido um a im por tan te co n l r ib u iga o b e m a n t e r i o r .

As bas e s t e or ic as que le nh o e m m e nte s ao I res i m p o r l a n t e s

assergoes sobre ideologia. Prim eiro, a assergao de que el a tern

exis tencia maleria l nas prat icas das insl i tu igdes, qu e abre o c am i-

nh o para inves t igar as prat icas discurs ivas como formas m a t e r i a l s

de ideologia. Segundo, a assergao de que a ide o logia ' i n t e r p e l a os

su je i to s ' , que c onduz a c onc e pgao de que urn d o s m a i s s ign i f i ca -

t ivos 'e feilos ideologicos' que os l ingt i is tas ignoram no discurso

tos. Terceiro, a asserclio de que os 'aparelhos ideologicos de es ta-

d o' (ins t i tuigoes tais como a educagao on a m i d i a ) sa o ambos

locais e marcos delimitadores na lu t a d e classe. qu e a po n t a m para

a lu t a no discurso e subjacente a ele como foco para um a a n a l i se

de discurso o r i en t a d a ideologicamenle .

Se o de ba te sobre a ideologia e o discurso tern sido fo r t emen t einf luenciado po r essas posigoes, t am be m tern sido pre jud ic ado pe -

las limitacoes amplamente reconhecidas da teoria de Althusser.

Part icularmente , o t rabal l io de Althusser conlem um a c onl rad igao

nao-resolvida e n t re u m a visao de dominagao que e imposigao u n i -

la tera l e reprodugao de uma ide o logia dom inan te , em que a ideolo-

g ia figura como um cimento social universal , e sua ins is tencia nos

apare lh os como local e m arc o d e l imi l a d o r de um a co n s t a n t e l u t a

d e classe c u jo re s u l t ado esta sempre em equilibr io . Com e fe i to , e

a visao ant erio r que e predominante, h ave ndo m argina l i zagao da

l u t a , d a c ont rad igao e da t ransformacao.

Ente ndo que as ideologias sao signif icagoes/construcoes da

real idade (o m u n d o fisico, as re lagoes sociais, as ide n t idade s soci-

•ai s) que sao cons truidas em varias d imenso es das formas/sentidos

das prat icas discurs ivas e que contribuem para a produgao, a re-

; pro d u ga o ou a t rans form agao da s re lagoes de d o m i n a g a o . (Tal

posigao e semell iante a de Thompson (1984, 1990). de que deter-

m i n a d o s usos d a l i n gu a gem e d e outras ' formas simbolicas ' sao

ideologicos, isto e, os que servem, em circunstancias especft ' icas.

para es tabelecer ou ma n t e r relagoes d e dominagao.) A s ideologias

embutidas nas pral icas discurs ivas sao m u i t o ef icazes quando se

i tornam na tura l i zadas e at ingem o status d e 'sense c o m u m ' ; m a sessa propr ie dade estaVel e estabelecida das ideologias nao de ve

ser muito enfat izada, po rqu e min ha referencia a ' t ransformagao'

j aponta a luta ideologica como dimensao da pra t i c a d i s c urs iva , um a

j ' l u t a para remo ldar as prat icas discurs ivas e as ideologias ne las

c ons t ru idas no c on le xto da re e s t ru tu ragao ou da t ran s form ag ao das

re lagoes d e d o m i n a g a o . Q u a n d o sao e nc ont radas pra t i c as d i s c ur -

sivas co n t r a s la n les em um d o m f n i o pa r t i cu la r on ins t i tu icf io , ha

probabilidade de que parte desse co ntras te seja ideologica.

118 Norman Fairclough

Afirmo que a ideologia investe a l inguagem de var ias m ane i -

Discurso e mudanca social119

meio de interpretac.6es dos textos e os textos eslao abertos a di-

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ras, em varies niveis, e que nao temos de escolher en t r e possiveis' localizacoes' diferentes da ideologia que parecem todas parcia lmente

justif icadas e nenhu ma d a s qu a is parece inte iramente sat is fatoria

(ver Fairclough, 1989b, para um a expl icacao ma is d e ta lha d a da

posicao qu e adoto aqui). A questao-chave e se a ideologia e uma

propr iedade de es truturas ou uma propr iedade de eventos, e a res-posta e 'ambas ' . E o problema-chave e encontrar , como j a sugeri

na discussao sobre o discurso, uma expl icacao sa tisfa tor ia da d ia-

letica de es t ru tu ra s e eventos.

Varias explicates tomam a ideologia como propriedade de

estru turas ao localiza-la em alguma forma de convenc.ao s ub ja -

cente a pratica lingiiistica, seja urn 'codigo', um a 'es t ru tu ra ' on

um a ' f ormacao ' . Isso tern a v ir tu d e d e mostrar que os eventos sa o

restr ingidos po r convengoes sociais, m as tern a desvanlagem ja

r e fe r id a d e pend er para uma desfoca l i zacao do e v e n t o n o pres-

supos lo de que os even to s sao meras reproduces d e e s t r u t u r a s .

p r iv i leg ia nd o a perspectiva da reproducao ideologica e nao a datransformacao, n u m a tendencia de representacao das convengoes

mais claramente de l im i tadas do que realmenle sao. Um exemplo

disso sao os primeiros trabalhos de Pecheux. Ou tra f raqueza da

opcao da es t ru tu ra e que el a nao reconhece a pr im az ia das ordens

de discurso sobre as convencoes discursivas particulares: precisamos

explicar os investimentos ideologicos das (partes das) ordens de

discurso, nao apenas as convencoes ind iv id u a is , e a po ss ib i l id a d e

de investimentos diversos e contraditorios. Uma al ternat iva a opcao

da estru tura e localizar a ideologia no evenlo discursive, ressal tan-

do a ideologia como processo, t ransform aca o e f l u i de z . M as issopode conduzir a uma ilusao de que o discurso corresponde a pro-

cesses livres de formagao, a nao ser que haja uma enfase si raul ta-ne a nas ordens de d iscurso.

Ha ta mb em u ma concepcjio textual da localizacao da ideolo-

gia, que se encontra na lingiiistica crftica: as ideologias estao nos

textos. Embora seja verdade que as formas e e co n teu d o des textos

trazem o carimbo (sao traces) dos processes e das es t ru tu ra s id eo -

logicas, niio e possivel 'ler' as ideologias nos textos. Como argu-

mente i no Capftulo 2, isso e perque os sentidos sa o pro d u z id o s por

versas interpretacoes qu e podem difer ir em sua im por tanc ta id eo -

logica e porque es processes ideologicos pertencem ao s discursos

como eventos sociais completes - sao processes en t r e as pessoas -

nao apenas ao s textos que sao mo men to s de ta is eventos. Alega-goes de descoberta dos processos ideologicos untc am e nte med ia n te

a analise textual tern o problema, agora familiar na sociologia da

n i id ia , de que os ' c o n s u m i d o r e s ' de textos ( leitores e lelespecla-

dores) parecem as vezes b a s ta n te imu nes aos efeitos das ideologias

qu e estao snpo s ta men te 'nos' textos (Morley, 1980).

Pref iro a concepgao de que a ideologia est.i localizada t a n t o

nas estru turas ( is to e, ordens de discurso) qu e consti tuem o resul-

(ado d e eventos passados como nas condic,6es para os eventos

atuais e nos proprios eventos q u a n d o reproduzem e t ransformam as

estru turas condicionadoras . E u ma orienta^ao acumulada e n a t u ra -

lizada que e construida nas normas e nas convengoes, como t a m-

be m um trabalho a tua l de natura lizacao e de s na tura l i zac ao de ta is

orieutacoes uo s evenfos discursivos.Out ra ques tao importante sobre a ideologia diz respeito aos

aspectos ou niveis do texto e do discurso qu e podem se r investidos

ideologicamente. U m a alegacjio comum e de que sao es ' sen t idos ' ,e especialmente os sentidos da s palavras (a lgumas vezes especif i-

cados come 'conteudo', em oposi^ao a forma), que sao ideologicos

(po r exemplo , T h om p s on , 1984). O s sen t id o s d as p a l a v r a s sao

impo r ta n tes , na tu ra lmen te . m as t a m b e m o sao outros aspectos

semanticos, tais come as pressuposicoes (ver, no Cap f t u l o 4 . o

item "Pressuposigao"), as metaforas (ver, no Capftulo 6, o item "Me-

tafora") e a coerencia. Ja i n d iqu e i na sec_ao anter ior a importanciada coerencia na constituicao ideologica dos sujeitos.

U m a oposicao rigida entre ' con teudo ' ou ' seu t ido ' e ' f o rm a7

ee qu ivoc ada porque os sentidos dos textos sao e s t re i t am e nte inlerl i -

gados com as formas dos textos, e os aspectos formais do s t ex to s

em varies niveis podem se r investidos ideologicamente. Po r exem-

plo, a representagae de bruscas que das no valor da nioeda (slumps}

e do desemprego relacionada a desastres na tura l s pode envolverum a preferencia por estru turas oracionais intrans i l ivas e atribut ivas

em oposicao a est ru tu ras oracionais - t ransi t ivas ("A nioeda perdeu

120 N o r m a n Fairc lough

o valor , milhoes estao desempregados", em oposigao a "Os inves -

t idores estao comprando ouro. as f irmas sacaram milho es" ; ve r .

Discur so e m u d a n ^ a soc ia l 121

di regoes d i f e r e n t e s , p or exemplo -, po d e se r di f i c i l m a n t e r a

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no Ca pi tu lo 6 , o i tem "Transi tividade e tema'% sobre esses termos).

Em ur n nivel diferente , o sis tema de t om ada d e tu rno num a s a la d e

aula ou as convengoes de polidez qu e operam entre secretar ia e

gerente implicam pressupostos ideologicos sobre as ide n t idade s

socials e as relates sociais entre professores e alunos, e gerenles e

secretarias. Outros exemplos mais detalhados serao dados no s textosanalisados nos capi tulos de 4 a 6 . Mesmo aspectos do 'estilo' deu m tex to podem se r investidos ideologicamente: ver rn in ha analise

(Capitu lo 4 , item " In te r t e x tua l idade e transformagoes") de coino o

estilo de um fo lhe to d o D e p a r t a m e n t o d e Comerc io e Indus t r ia

c o n t r i b u i pa ra co ns t i tu i r o 'eu empresar i a l ' como u m t i p o d e

ic lentidade social. Nao se d eve p ressu po r que as pessoas tern

consc ienc ia d as d imenso es id eo lo g ica s de sua pro pr ia p ra t ica .

A s ideologias construfdas na s convengoes po d em se r ma is oumenos na tura l i zadas e automutizadas. e as pessoas podem achar

dificil compreender que suas pra ticas normals poder iam te r inves-t imen to s ideologicos especfficos. M esmo qu a nd o nossa pra t ica

po d e ser interpre tada como de resistencia, contr ibuindo p a r a a

m u d a n g a ideologica, nao estamos necessa r ia men te conscientes d os

detalhes de sua significagao ideologica. Essa e u m a razao para se

defender um a mo d a l id a d e de educagao lingiifstica qu e enfatize a

consciencia crftica dos processos ideologicos no discurso, para qu e

as pessoas possam tornar-se mais conscientes de sua propria pra f i -

ca e ma is cnticas dos discursos investidos ideologicamente a que

sa o submet idas (ver Clark et al., 1988: Fairclough, 1992 - a).

Esses comentarios sobre a consciencia podem se r ligaclos a

questoes sobre a interpelagao do s sujeitos. O caso id ea l na teor ia

althusser iana e o do suje t to posicionado 113 ideologia de ta l m ane i -

ra qu e disfarga a acjio e os efeitos desta e da ao su je i to um a au to -

nomia Imagimir ia . Isso sugere convengoes d iscursivas a l t am e nte

natura lizadas. Mas as pessoas sa o r ea lmen te subjugadas de formas

diferentes e contraditor ias; ta l consider a c/io comega a l angar diivi-

das sobre o caso ideal. Quando a su jeigao e co n t r a d i lo r ia- q u a n d o

u m a pessoa que opera num quadro ins l i t uc iona l uuico e n u m u n ico

c on jun to de praticas e in te rpe la d a de van as posigoes e p u x a d a em

n a t u r a l i z a g a o . A in te rpe la ga o co n t r a d i lo r ia pode ma nifes ta r - se

e x p e r i e n c i a l m e n t e em um sentido de confusao ou incerteza e na

problemalizagao das convengoes (ver o i tem "Mudanga discursiva",

adiante). Essas sao as condigoes em que uma pra t ica conscienle etraiisformadora podera mais facilmente desenvolver-se.

A teoria a l thu sse r ia na d o su je i to exageni a const i tuicf to id eo -

logica dos sujei tos e, conseqiientemente, subestima a ca pa c id a d e

de os su jeitos agirem i n d iv id u a l ou coletivamente como agentes .

ate mesmo no compromisso com a crftica e na oposigao as pra ticas

ideologicas (ver m inh as reservas so b re F o u ca u l t a esse respeito no

Capitu lo 2, i tem "Foucault e a anal ise de discurso t e x tua lm e nle

• orientada"). A q u i tambem e importanle adotar a posigao dia let ica

qu e defendi an te r io rm e nle : os su je i to s sa o posicionados ideologi-

camente, mas sao tambem capazes de agir c r ia t ivam e nle no sen t id o

de realizar suas proprias conexoes en t r e as diversas praticas e ideo-

logias a que sao expostos e de r ees t ru tu ra r as praticas e as e s t ru tu -

ra s posicionadoras. 0 equih 'brio en tre o su j e i t o *efeito* ideologicoe o su jeito agente ativo e uma v a r i a v e l qu e depende das condigoes

sociais, ta l como a es ta b i l id a d e re lat iva da s relagoes d e dominagfio .

Todo discurso e ideologico? Suger i que as praticas d iscursivas

sao investidas ideologicamente a medida que incorporam signif i-

cagoes que contr ibuem para m ante r ou re e s l ru tu ra r as relagoes de

poder . Em principio, as relagoes de poder podem se r a fe ta d a s pe la s

pra t i cas discursivas d e qna lqu er t ipo , mesmo as c ie n t i f i c as e as

t eo r ica s . Isso imped e um a oposigao categorica entre ideologia e

ciencia ou teor ia qu e a lgu ns autores qu e escrevem sobre l i ng ua-

gem/ideologia sugerem (Zima, 1981; Pecheu x , 1982). Mas da i nemtodo discurso e ir remediavelmente ideologico. A s ideologias sur-

ge m nas sociedades caracter jzadas por relagoes de d o mina ga o

com base na classe, no genero social, no gru po cu l tu ra l , e assimpor d ia n te , e. a m e d i d a que os seres l iumanos sao capazes de trans-

cender ta is sociedades, sa o capazes de t r a nscend er a ideologia .

Por tanto , na o aceito a concepgao de Althusse r (1971) de ' id eo lo g iae m geral' c o m o f o r m a d e c i m e n t o social que e i n s e p a r a v e l d a

pro pr ia so c ied a d e . Alem disso, o f a to de que to d o s os l ipos d ed iscu r so sa o abertos em principio,

Je sem d u v id a de cer to moclo

122 Norman Fairclough

co ncre ta men te , ao inve s t im e nto ideologico em nossa sociedade

na o signifies que lodos os tipos de discurso sao investklos ideologi-

Discurso e mudan^a social 12 3

'premissas' teoricas impl ici tas), considerando-se a ideologia "uma

concepcjio do mundo que esta implicitamen te manifesta na ar te , no

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camente no mesmo grau. Nao d eve ser m u i t o d i f ic i l m o s t r a r qu e

a p u b l i c i d a d e em termos amplos e inves t id a com ma is v igo r doque as c ienc ia s fisicas.

Hegewonia

O conceito de l iegemonia , que e a peca central da a na l i se qu eGra msc i faz do ca p i tal i smo o c id e n ta l e da estralegia r ev o lu c io n a r i a

na Europa Ocidental (Gramsci, 1971; Buci-G lucksm ann. 1980),

harmoniza-se com a concepc/lo de discurso qu e defendo e lornece

ur n m ode de teorizagao da m u d a n g a em relac.ao a evolucjio das re-

lagoes de poder que permite u m foco par ti cula r sobre a m u d a n ^ a

discursiva , mas ao mesmo tempo um modo de considera-la em

termos de sua contribuic,ao ao s processos mais amplos de mudanc,a

e de seu am oldam e nto por tais processos. Hege ino n ia e l ide ranc atank) qu a n lo dorm"nac,ao nos dominies economico, polit ico , c u l t u -

ra l e ideologico de uma sociedade. Hegemo n ia e o poder sobre a

sociedade como urn todo de uma das classes eco no mica men te de -

f in idas como fundamentals em alianga com outras forcas sociais ,m as n u n c a atingido senao parcia l e temporar iamente, como um

'equib 'brio ins tavel ' . Hegemonia ia coustrugao de aliangas e a in -

tegrac.ao muito mais do que s implesmen te a d o mina ca o de classes

subalternas, mediante concessoes on meios ideologicos para g a n h a r

seu conseutimento. Hegemo n ia e um foco de cons tan ts l u t a sobre

pontos de maior ins tabil idade eiitre classes e blocos pa ra c ons l ru i r ,

m ante r ou rompe r alianc,as e relagoes de dominac.ao/subordinac.ao,

que assume formas economicas , pol i ticas e ideologicas. A l u t a

hegemonica localiza-se em uma (rente ampla, qu e iuclui as insfituicoes

da sociedade civil (educac.ao, sindicatos. farm'lia), co m possi'vel d es i -g u a l d a d e entre d iferentes niveis e domfuios .

Compreencle-se a ideologia nesse q u a d r o em termo s qu e a n te -

cipam todos os avangos de Alt lmsser (Bu c i -G lu cks ma n n , 1980:

66), por exemplo, em sua focalizac,ao da materia l izagao implici ta eiu co nsc ien le das ideologias nas praticas (que as contem co mo

direito , na a t iv idade economica e nas manifestacoes da vida indi-

vidua l e colet iva" (Gramsci, 1971: 328). E u q u a n t o a interpela^ao

dos su jeitos e uma elaboragao althusser iana , ha em Gramsci um aconcepgao de su jeitos estru turados por diversas ideologias impli-

citas em sua pratica que Ihes atribui um carater 'es tranhamente

compos to ' (1971: 324) e uma visao de 'senso c o m u m ' lanto como

reposi torio dos diversos efeitos de lu tas ideologicas passadas,

como alvo cons tan te para a re e s t ru tu ra^ ao nas l u t a s atuais . No sen-

so comum, as ideoiogias se t o rnam na tu ra l iz a d a s ou a u to ma t iz a -

das. Alem disso, Gramsci concebia "o campo das ideologias em

termos de correntes ou formac,6es confli tantes , sobrepostas ou cru -

zadas" (Hall, 1988: 55-56), a que se refer iu como ' u m complexo

ideologico' (Gramsci, 3971: 195). Isso sugere um foco sobre osprocessos por meio dos quais os complexes ideologicos sa o estru-

t u ra d o s e reestru turados, ar t iculados e rear t iculados. (Ha uma dis-

cussao importante de hegemonia e ar ticulagao em Laclau e M o u ffe(1985) que consti tui um precedente para minha aplicagao desses

conceitos ao discurso, embora sera a a na l i se de textos reais qu e eu

consideraria como essenciais a aualise de discurso.)

Tal concepgao de lu ta hegemonica em termos da art iculagao.

desar t iculagao e rear t iculagao de elementos esta em harmonin co m

j o que disse an ter ionnente sobre o discurso: a concepgao dia let ica

j da relac,ao en t r e e s t ru tu ra s e eventos discursivos; considerando-se

] as estruturas discursivas como ordens de discurso concebidas como

i configuragoes de elementos mais ou m e n o s instaveis ; e ado tando

um a concepgao de textos que se cen t r a sobre su a in t e r t e x tua l idade|,e sobre a maneira como art iculam textos e converges previas.

V Pode-se considerar um a ordem de discurso como a faceta d iscursiva

do equilibr io contraditor io e instavel qu e consti tu i um a hegemonia ,

e a art iculagao e a reart iculagao de ordens de discurso sao, conse-qu en temen te , um marco delimitador na lu t a hegemonica . Alem

disso, a pratica discursiva. a produc,ao, a dis t r ibu igao e o consumo(como tainbem a inlerpretagao) de textos sao uma faceta d a lu ta

hegemonica qu e contribui em gra u s va r ia d o s pa ra a reproduce oua transformac,ao nao apenas da ordem de discurso exis tente (por

124 Norman Fairclough

exemplo, m e d i a u t e a m a n e i r a c o m o os texlos e as c o n v e n g o e sprev ias sa o art iculados na produc/ io textual) , mas tambem das re-

Discurso e mudan^a social 125

gemo n ia ta mb em fo rnece la n to u m m o d e l o como u m a ma t r i z .

Fornece um modelo: por exemplo, na educagao, os grupos domi-

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lagoes socials e assimetricas exislentes.

Vamos tomar como exemplo o discurso pol i tico d e T h a t c h e r .

Este pode ser in terpretado como rearticulacfio da ordem discursiva

polj'tica existenle, que reuniu os discursos conservador Iradic ional ,

i ieolibera l e populis ta em u m a no va mescla e tambem co n s t i t u iu

u m discurso de poder polit ico se m precedence para uma Iider m u-

Iher. Tal rearticulagao discursiva materializa um projeto liegemo-

nico para a coust i tuicao de uma nova base e agenda polfl ica , que e

um a faceta do pro jeto polit ico mais amplo de reestru turaeao da

h e ge m onia do bloco c e u t rado na burguesia em novas condic,6es

economicas e polit icas. 0 discurso d e Tha tcher fo i descr ito nesses

te rmos po r Hall (1988) e Fairclough (1989a) e demonstra comoessa analise pode se r realizada em termos de uma concepcao de

discurso semelhanle a que fo i in troduzida anteriorrnente . d e fo rma

qu e exp l iqu e o s aspectos especificos da linguagem dos lextos politi-

cos de Thatcher (o que H all nao faz) . Ac resc ent ar ia que a ordemd e discurso re ar t i c u lada e contraditor ia : e iemen to s aulori tarios

coexistem co m eiementos democraticos e igualilarios (por exem-plo, o pronome inclusive 'nos', que implica uma tenta l iva d e f a l a r

para as pessoas comuns, coexiste com o u so de £voce" como pro-

no me iudef inido em exemplo s como "Voce fica doente com a c h u -

va, nao") e eiementos patriarcais com eiementos femin i s i a s . Alem

disso, a reart iculagao das ordens de discurso e oblida nao a pena s

na pra tica d iscursiva produtiva , mas tambem na interpretagao: a

compreensao de sentidos n os textos d e Tha tcher r equ er interprets

qu e sejam capazes de estabelecer conexoes coerenles en Ir e senseiementos heterogeneos, e parte do projeto hegemonrco e a cons-

t i tuigao d e sujeitos in terpretes para quern tais conexoes sa o n a t u -

rais e automaticas .

Ent re tan to , a m aior par te do discurso se sustenta na lu t a he -

geraonica em ins t i tuigoes pa r t icu la r es (famflia , escolas, t r i b u n a l s

d e j u s t i g a , etc.) e nao em m'vel da po l i t ica n a c i o n a l ; os prola-

gonistas nao sao classes on forgas polit icas l igadas de forma re la -

t ivam e nte direta a classes ou a blocos, mas professores e ahmos, apolfcia e o publico ou mu lheres e homens . Em la i s casos, a he-

na n tes tambem parecem exercer poder mediante a co ns t i tu ica o

de aliangas, integrando e nao simplesmente dominando os grupos

subalteruos, ganhand o seu consentimento, oblendo um equ ilibr io

precario que pode se r enfraquecido po r outros grupos, e fazera isso

em par te por meio do discurso e m edia nte a consti tuicao de ordens

discursivas locals. Fornece uma matr iz : a obtengao de hegemouiaem um nivel societario r equ er um grau d e integragao de i n s t i t u i -

c,6es locais e semi-autonomas e de relagoes de poder, de la l niodo

que as u lt im as sejam parcia lmente m oldadas por relagoes hegemo -

uicas e lu tas locais possam se r in t e rpre tadas como lu tas hegemoni-

cas. Isso dir ige a atenc.ao para as l iga^oes entre as inst i tukoes epara ligagoes e movimeiito entre as ordens discursivas ins t i tuc io-

nais (ver o Capftulo 7, adiante , para um a analise.de mudangas quetranscendem as ordens discursivas particulares).

Embora a hegemonia parega ser a forma organizational de

poder predominante na sociedade contemporanea. nao e a unic a .Ha tambem os res idues de uma forma anter iormente mais evidente

em que se atinge a dominacao pela imposi^ao inf lexivel de regras.

no rma s e convengoes . Isso parece corresponder a um mo d elo

'codigo' d e d iscu r so , qu e co ns id era o discurso em t e r m o s da

concretizagao de codigos co m mo ld u ra s e classif icagoes for tes

(Bernstein. 1981), e a uma pra t i ca norm at ive a l t am e nte arregi-

m e ntada . Tal modelo contrasta com o que poderiamos cha ma r o

modelo 'articulacao' de discurso descrito anteriormente, que corres-

po nd e a forma organizacional hegemonica . Os modelos 'codigo'

sao a ltamente or ientados para a ins t i tuigao, enquanto os modelos

'ar t iculagao ' sao mais or ientados para o(a) cliente /publico; co mpa -

rem-se form as tradicionais e formas mais recentes do discurso de

sala d e a u l a ou do discurso medico-pacien le (d iscuto exemplos

especificos do u l t i m o no Capilu lo 5) . Por outro lado, aulores do

pos-modern i smo sugerem u ma fo rma o rga n iz a c io na l emergen te

de poder que e bastante di f ic i l d e apontar, mas que representa uma

outra m udanga na or ientacao insl i tucional associada a u m a des-

central izagao de poder exp l i c i t a d a e parece ligar-se a um modelo

'mosaico* de discurso qu e caracterjza a pratica discursiva como

126 JMorman Fairclough

u m a constante rear t iculagao d e e lemen to s m i n i m a m e n t e res tringi-

dos. A pra tica discurs iva que parece adequar-se a esse raodeJo fo i

Discurso e mudanga socia l 127

l ado , precisamos de uma orientagao rela t iva a m a n e i r a como os

processos de rear t iculagao afetam as ordens de d iscurso. Passo

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ident if icada como 'pos-modern a' (Jameson, 1984), e o exemplo

m ais claro e a public idat le (ver Fairclough, 1989a: 197-211). V o l -

tarei a esses inodelos do discurso no Capftu lo 7, em relagao a uma

discussao d e de te rm inadas tendencias amplas que afetara as ordensde discurso c onte m porane as .

Para re s um ir . no qu a d ro t r i d imen s io n a l para a a na hse d e d is -curso in t roduz ido an te r io rm e nte , i d en t i f i qu e i como pre oc upagao

pr inc ipa l a descr igao, para exemplo s part iculares de discurso. de

conexao explanatoria entre a natureza das praticas sociais de que

fazem par te e a natu reza de sua pratica d iscursiva , incluindo os

aspectos sociocognitivos de sua produgao e iu terpretacao. O con-

ceito de hegemo n ia nos a u x i l ia nessa t a re f a , fo rne c e ndo para o

discurso lanto uma matriz - uma fo rma de analisar a pratica social

a qual per tence o discurso em termos de relagoes de poder, isto e,

se essas relagoes de poder reproduzem, rees truturarn-ou desaf iam

ashegemouias exis tentes

—como urn mo d elo

— um afo rma

dea n a -lisar a propria pratica discursiva como ur n m o d o de luta h e ge m oni -

ca , que reproduz, reest ru tura ou desafia as ordens de d iscurso

existentes. Tsso for ta lece o conceito d e i n v es l imen t o polit ico das

praticas discursivas e, ja que as hegemo n ia s tern dimensoes id eo -

logicas, e u ma fo rma d e avaliar o inves t imen to ideologico d as pra-

ticas d iscu r s iva s . A hegemo n ia tambem tern a v i r t u d e nolavel , no

presente contexto , de faci l i tar o estabelecimento de u m foco sohre

a m udauga , que e m inh a preocupacao ult ima neste capftulo.

Mudanca discursiva

0 foco deste l ivro e a m u d a n g a discursiva em relagao a m u -

danga social e cu l t u ra l ; su a j u s t i f i ca t i v a teorica fo i apresentada na

In t rodugao em termos d o fu n c io n a men t o do discurso na vi da socia l

c o n t e m p o r a n e a . Esse deve ser um duplo foco, de acordo com a

d ia l e t i ca entre as ordens d e discurso e a pra t ica d iscu r s iva ou o

e ve n to discursivo. For um lado, precisamos e n te nde r os processos

d e m u d a n g a como ocorrem nos eventos d iscursivos. For out ro

agora a d iscu t i r essas questoes.

A s origens e as m ot ivagoe s im e dia tas d a mu d a nga no even to

discursivo repousam na problematizagao das convengoes para os

produtores ou in t e rpre te s , que pode ocorrer de var ias formas. Porexemplo, a problematizagao das conveugoes na i n t e ra ga o en t r e

m ulh e re s e h o m e n s e um a exper i en c ia ge ne ra l i zada e m va r ia s i n s -t i tu igoes e dominios. Tais problematizagoes tern su a s bases em

contradigoes - neste caso , contradigoes entre as posigoes de s u j e i t o

tradiciouais , em que m ui tos de nos fomos socializados, e novas

relagoes d e genero. N u m piano bem difereute , pode-se consi tJerar

qu e o discurso politico de Thatcher surge d a problem at izayfio de

prat icas discursivas t radic ionais da direita em que se baseiam as

relagoes sociais, as posigoes de su j e i lo e as pra ticas polft icas, em

circunstancias em que se tornam aparentes as contradigoes entre

elas e u m t n u n d o em mu d a ng a . Qu a nd o su rgem pro b lema t iz a go es ,

as pessoas se veem d i a n t e do que Billig et ah (1988) d e n o m i n a m'dilemas'. Com freqi iencia , elas tentam resolver esses di le m as ao

serem inovadoras ou cr ia t ivas, ao adapta re m as convengoes exis-

tentes de novas m ane i ras e assim contr ibuirem para a mu dang a

discursiva. A in t e r t e x tua l idade e, por tanto , a his lor icidade inerente

da produgao e interprelagao t ex tual (ver o item "Pratica discursiva".

neste capftulo) constituem a criatividade como opgao. A m u d a n g a

envo lve fo rma s d e transgressao, o c ruzam e nto d e fronteiras, t a i s

como a reuniao de convengoes exis tentes em novas combinagoes,

ou a sua exploragao em situagoes que ge ra lm e nte as proibem.

Tais contradigoes, d i l ema s e e n te nd im e ntos s ub je t ivos dos

problemas em situagoes concretas tern suas condigoes sociais em

contradigoes e lu t as e s t r u t u r a i s n os niveis ins t i tuc iui ial e societa-

rio. R e t o m a u d o o exemplo d as relagoes d e genero , a posigao con-

t radi toria d os individuos nos eventos d iscursivos e os dilemas qu e

disso resultam originam-se e m co n t r a d igo es es t ru tu ra is n a s r e la -

goes de genero n as i n s t Hu igo es e n a sociedade co mo u m to d o .

Ent re tan to , o que de c i s ivam e nte de te rm ina a forma como essas

contradigoes se refletem em eventos especificos e a re lagao desses

eventos com as lutas que se desenvolvem ao redor da s contradigoes.

128 Norman Fairclough

Para polarizar as possib ilidades que sao m ui to mais complexas, ur n

even to discursive pode ser u m a contribuigao para preservar e re-

Discurso e mudanca soc ial 129

mu d a nca social se m considerar as ult imas, da mesma fo rma qu enao e possivel avaliar a contr ibuigao do discurso para a m u d a n c a

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produz i r as relagoes e as hegemonias tradicionais de genera e

pode, por tan to , ligar-se a convene. 6es problematizadas, ou pode ser

um a contribuicao para a transformagao dessas relagoes mediante a

luta hegemdnica ; dessa forma, tenlando resolver os d ilemas pela

inovacao. Os proprios eventos discursivos tern efeilos c um ula t ivos

sobre as contradicoes sociais e sobre as lutas ao sen redor. Assirn,para resumir , os processes sociocognitivos serao ou nao inovado-

res e conlr ibuirao on nao para a m udanga d iscu r s iva . d epend e nd o'.da ua lure za da pratica social.

V a m o s considerar a d imensa o t e x tua l do discurso. A m u d a n c a

deixa Iracos D O S textos na forma de co-ocorrencia de e lemen to s

coutraditor ios ou inconsis tentes - mesclas de estilos forma is e in-

formais , vocabular ies tecnicos e nao-tecnicos, marcadores de a u to -

r idade e familiaridade , formas s in ta ticas mais t ipicamente escr itas

e ma is t ip ica men te faladas . e assim por dian te . A med id a qu e u ma

tend enc ia pa r t icu la r de m u d a n c a discursiva se estabelece e se (or-n a s o l id i f i c ada e m u m a n o v a c o n v e n c a o e m e r g e n t e , o que/€

percebido pelos interprets, n u m primeiro mo men lo , como textos

esti l is t icamente contraditor ios perde o efeito de 'colcha de reta-

Ihos ' , passando a ser considerado ' intei ro ' . Tal processo de n a t u -

ral izagao e essencial para estabelecer novas hegeraonias na esferado discurso.

Isso conduz a nosso segundo foco, a m u d a n c a nas ordens de

discurso. A m e d i d a que os produtores e os in terpretes c om binam

convengoes discursivas, codigos e e lemen to s de m ane i ra nova em

eventos d iscursivos inovadores estao , se m d u v i d a , pro d u z ind o

c um ula t ivam e nte m udangas es trulurais nas o rd ens c ie discurso:estao desar t iculando ordens de discurso exis tenles e r ea r l i cu la n d o

novas ordens de d iscurso. novas hegemonias d iscursivas. Tai s m u -

dancas es t ru t u ra i s podem afetar a pena s a o rd em d e d iscu r so local'

d e u ma inst i tu igao, on podem t rans c e nde r as institutes e afe tar a

ordem de discurso societar ia . O foco de a tencao na investigacao da

mu d a n ga d i scu r s iv a d ever ia m ante r a a l l e rn a n c ia eutre o evento

discursivo e ta is m u d a n c a s estru tu ra is . porque nao e posslvel ava-liar a imporlancia do pr ime iro pa ra os processes ma is amplos de

social se m considerar o primeiro.

Ilustrarei as quesloes qu e poderiam se r investigadas dentro do s

estudos de m u d a n c a nas ordeus de discurso referindo-me a doist i p o s re lac ionados d e mu d a nga qu e a fe ta m a tu a lmen te a o rd em

de discurso societar ia . (Ha uma discussao mais deta lhada dessas

questoes no Capi tulo 7, adiante.) Uma e a aparente deroocratizacao

d o d iscu r so , envo lvend o a redugao de marcadores explici tos de

a ss imet r ia d e poder eiitre pessoas com p o d e r i n s t i t u c i o n a l d e s i -

gu a l - professores e alunos, gerentes e trabalhadores, pais e fi lhos,medicos e pacientes -, que e ev id en te n u m a d iver s id a d e de do-

m i n i o s insti lucionais. A out ra e o que venho cha ma nd o de £ perso-

nalizagao sintetica' (Fairclough, 1989a), a simulacao de discurso

privado face a face em discurso publico para audiencia em massa

(imprensa, radio, televisao). Ambas as tendencias podem se r ligadas

a inf luencia do discurso conversacional do dominio privado do

' m u n d o da v id a ' no s dommios institucioiiais. Essas tendencias so -ciais e discursivas sa o estabelecidas mediante lu la e , alem disso,

sa o estabelecidas co m estabilidade apenas l imitada , com a pers-

pectiva de que seus proprios elementos heterogeneos sejam consi-

derados contraditor ios , levando a posterior luta e mu d a nga .

U m aspecto da abertura das ordens de discurso a luta e que os

e lemen to s de uma ordem de discurso nao tern valores ideologicos

ou modos fixos de investimento ideologico. Considere-se. porexemplo, o aconselhamento , o mo d o de conversar com as pessoas

sobre elas mesmas e seus problemas. apare n te m e nte nao-diretivo,

nao-avalia t ivo , buscando estabelecer empatia, em situagao de u mpara um. O aconselhamento tern suas origens na terapia, mas agora

circula como tecuica em muitos dominios inst i tucionais , como

efeito de uma rees truturagao da ordem de discurso. Mas ta l desen-vo lv imen to e altamente ambivalente em termos ideologicos e poll-

ticos. A maior ia dos terapeutas propoe oferecer espaco as pessoas

como individuos num m u n d o que os t rata cada vez mais como ci-fras, o que parece tornar o a co nse lha men to u m a pratica contra-

l iegemonica e sua colonizacao de novas inst i tu igoes um a m u d a n c al iberadora . En tretanto , usa-se o aconselhamento agora de preferen-

130 Norman Fairclough

cia a pra tic as de mitureza explicitamente disc ipl inar em var ias ins-

t i tu icoes, o que o faz parecer ma is um a tecnica hegemo n ica por

Discurso e mudanga social 131

leoricas e metodos para o que e, assim espero, u m poderoso recurso

para estudar as dimensoes cliscursivas da mudanga social e cul tura l .

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trazer su t i lmen t e aspectos das vidas parliculares das pessoas para od o mfn io do poder . Aparentemente, a l u t a hegemonica ocorre par-cia lmeute m e dian te o ac ons e lh am e nto e sua expansao e parcia l-

mente acima deste. Esse pnuto esta de acordo com a observacao de

Foucaul t :

O s d i s c u r s o s sao e l e me n t o s t i i t ic o s on b l o c o s q u e o p e r a m n o

campo de relacoes de forc.a: p ode haver discursos dife rentes e

mesmo conlradi to r ios na mesma estraiegia; p o d e m , ao con l ra r io.

ci rcu la r sem m u d a r sua forma de uma cstrategia a outra que I he

sejaoposta(l981: 101).

A exploracao de tendencies de mudanca nas ordens de discurso

pode trazer u m a contribuigao s ignif icat iva ao s debates a tuais sobre

mudanca social. Os processos de mercado, a extensao dos modelosde mercado a novas esferas, podem ser iuvestigados, po r exemplo ,

med ia n le a recent e colonizacao extensiva das ordens de d iscursopela pu b J ic id a d e e outros t ipos de discurso (ver Fairclough. 1989a.

e o Capftu lo 7, adiante) , Se a democratizacilo do discurso e a per-

sonal izacao sintetica podem se r l igadas a democratizacao subslan-cial da sociedade, tambem estao ligadas de m ane i ra controver tidaaos processos de marque izacao e especif icamente a a pa ren fe

mudanca no poder dos produtores para os consumidor.es. que eassociada ao consumismo e as novas hegemonias a ele a tr ibuidas.

Tanibem poder ia haver uma dimensao discnrsiva-util nos debates

sobre a modernidade e a pos-modernidade. Por exemplo, a d e m o -cratizacao, a personalizacao s in tet ica e o avanco da conversacao

nos dominies ins t i tuc ionais podem ser considerados aspectos deuma 'dedi t 'erenciacao' Jos d o min io s publ icos e privados ( Ja meso n ,

1984) ou de uma f ragmentacao de pra ticas prof iss ionais ate agora

estruturadas? (Ver Capitulo 7 para u m a discussao ma is completa.)

Conclusao

A abordagem do discurso e da ana l i s e d e discurso qu e apre-sentei neste capitu lo tenta in tegrar uma var ie dad e de perspectivas

Tente i co mb ina r aspectos de uma concepgao foucaul t iana de d is -

curso com a enfase b a kh t in i a n a na in te r t e x tua l idade : a primeira

inclu i um a enfase fundame nt a l na s propr iedades socia lmenleconstru tivas do discurso, a ul t ima ent'atiza a 'textunr dos textos

(Halliday e Hasan, 1976) e sua composicao por meio cie f ragmen-tos de outros textos, e ambas apontam para o modo como as ordensde discurso e s f r u l u r am a pratica discursiva e sao por ela es t ru t u ra -

das. Tambem tentei localizar a concepc-ao dinam ica da pratica dis-

curs iva e de sua relacao com a pra tica socia l que emerge dessa

co n ju n t u ra de n t ro d e u ma conceituagao gramsciana de poder e de

luta de poder em term os de hegemoii ia. Ao mesmo te mpo, recorri a

outras tradicoes na lingiiistica, a analise de discurso baseada no

texto e a analise da conversacao etnometodologica para a analise

textual . Acredito que o quadro resultante no s permite combinar

re levancia social e especif icidade textual ao fazer analise de d is-

curso e exp licar a m udanc a .

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C a p f t u l o 4

In ter textual idade*

In t roduz i o conceito de in t e r t e x tua l idade no Capftu lo 3 (item

"Pratica discursiva") e assiiialei a sua compatibi l idade com a prio-

ridade qu e a t r ib u i a m u d a n g a no discurso e a e s t ru tu ra^ ao e rees-

truturac.ao das ordens de discurso. O conceito de in te r tex tu a l id a d e

fo i tambem usado no Capftu lo 2 como um elemento s ignif icante

nas analises de discurso d e Fo u ca u l t . L emb ro a qu i su a afirmac.iio:

"nao pode haver enunciado que de u m a m ane i ra ou de outra naoreatualize outros" (1972: 98). Meu objetivo neste ca p i lu lo e pr imei-

ramente tornar o conceito de in te r tex tu a l id a d e algo mais concrete ,

usando-o para analisar textos e, em segundo lugar, apresentar Tnais

sis tematicameute o potencial do conceito para a anal ise de discurso ,

como par te do desenvolvimento de um quadro analft ico .

O termo ' in ter textualidade ' fo i cu nha d o por Kristeva no finaldos anos 1960 no contexto de suas inf luentes apresentacoes para

audiencias ocide nta is do trabalho de Bakh tin (ver K ris teva , 1986a,

na verdade escr ito em 1966). Embora o termo nao seja de B a kht in ,

o desenvolvimento de uma abordagem inlertextual (ou em seus

propr ios termos ' Iranslingui st ica ') para a analise de textos era o

tema maior de se n t r a b a lho ao longo de sua carreira academica e

estava estreitamente l igado a outras quesloes impo r ta n tes i n c lu in -

do su a teoria do genero (ver Bakhtin 1986. um artigo que ele escre-

ve u no infcio do s anos 1950).

Bakhtin destaca a omissao reta t iva quanto as fundoe s co mu n i-

cativas da l inguagem pelos ramos pr incipais da lingiiistica e mais

Tradii(;ao de Maria Christina Diniz Leal. .

13* Norman Fairclough

especificamente a omissao do mo d o como os textos e os eniuic iados

sao moldados por textos anteriores aos quais eles estao ' respondend(V

e por textos subseqiientes qu e eles ' an tec ipam' . Pa ra Ba kht in , to -

Discur so e m u d a n ^ a socia l 135

processes de mudanca mais amplos, antecipando e tentando mol-

da r textos subseqiientes , Essa liistoricidade inerente ao s textos

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dos os enunciados, taiito na forma oral quanto na escrita, do m ais

breve turno n u m a conversa a u m ar tigo cienlffico on rom anc e , sa o

demarcados por uma m u d a n c a de fa lante (ou de quern escreve) e

sao onen tados r e t ro spec t iva men te pa ra enu nc ia d o s d e fa l a n t es

anleriores (sejam eles t u rnos , artigos cient fficos ou romances) eprospectivamente para enunciados antecipados de falantes seguintes.

Desse modo, "cada ennnciado e lira elo na cadeia da coiminicacjio''.

Todos os enu nc ia d o s sa o povoados e, na verd a d e , constJ tuidos por

pedacos de enunciados de outros, mais ou menos explicates ou

completes :

nossa faia...e preench ida c om palavras de oulros , var iavei s g rans

d e al te r idade e var iavei s grans do q u o e de nos prdpr ios , var ia -

veis grat is de consciencia e de afas tamento . Essas pa lavras d e

outros carregam com e las suas propr ias cxpressoes. se u p r o p r i o

torn a v a l i a f i v o , o q u a l nos assimilamos. retrabalhamos e rea-c e n t u a mo s ( B a k h t i n , 1986: 89).

Isto e, enu nc ia d o s - ' t ex tos ' em rneus termos — sao inerente-

mente intertextuais , consti tu idos por elementos c!e outros textos.

Foucault acrescenta o refinamento de distinguir dentro da aura in -

ter textual de um texto diferentes 'campos' d e ' p resenca ' , 'conco-

m i t a n c i a ' e 'memor ia ' (ver, no Ca pi tu lo 2, o i tem "A formygao de

conceitos") .

Ind ique i no Capitu lo 3 que a relevancia do concei to de in ter-

textualidade na teor ia que estou d esenvolvendo esta de acordo commeu foco sobre o discurso na m udanga socia l. Kris teva observa

qu e i n t e r t ex t u a l id a d e implica "a inserc.fio da his tor ia (sociedade)

em um texto e deste lexto na hislo ria" (1986a: 39).Por "a ins e rgao

da historia em um texto", el a quer d izer que o texto absorve e e

construfdo de textos do passado ( textos sendo os maiores artefa tos

qu e const i tuem a historia). Por "a insercao do texlo na his t or ia" ,

ela quer d izer que o texto responde, re ac e n tua e ret rabalha t ex to s

passados e, assim fa z en d o , a j uda a fazer histor ia e co n t r ib u i para

permite-lhes desempenhar os papeis centrals que tern na sociedade

contemporanea no limite pr incipal da m udanc a social e cul tura l

(ver a discussao nos capitu los 3 e 7). A rapida transformacao e

rees truturac .3o de tradic.6es textua is e ordens de d iscurso e um

e xt raord inar io feu o meno co n tempo ra u eo , o qu a l su gere que a

intertextualidadedeve ser um foco principal na analise de discurso.

£ - A relacjio entre iu ter textualidade e hegeraonia e impo r ta n te .

0 conceito de in ter textuaiidade aponta para a produ t iv idade d os

textos, para como os textos podem t ransformar textos anter iores e

reest ru turar as convengoes existenles (generos, discursos) para ge-

ra r novos textos. Mas essa pro d u t iv id a d e na pratica n ao esta d is-

ponivel para as pessoas como um espago i l imi t a d o para a inovacao

textual e para os jogos verbais: ela e so c ia lmen te l imitada e res-

t r ingida e coudicional conforme as relates de poder. A teor ia da

in ter textualidade na o pode ela propr ia explicar essas l imitacoes

sociais, assim el a precisa se r combinada com uma teoria de rela-

£oes de po d er e de como elas moldam (e sao moldadas por) estru-

turas e praticas sociais. A combinagao da teoria da hegemo n ia

(descrita, anteriormente, no Capitulo 3, item "Hegemonia") com a

in t e r t ex tual idade e par t i cn la rmente pro d u t iva . Nao so se pode

ma pea r as possibi l idades e as l imitacoes para os processos in te r -

tex tu a is d en t ro d e hegemo n ia s pa r t icu la r es e estados d e l u t a

hegemonica , mas tambem conceituar processos in te r tex tu a is e

processos de contestac,ao e reestruturac,ao de ordens de discurso

como processos de luta hegemonica na esfera do discurso, qu e ternefeitos sobre a luta hegemonica, assim como sao afetados por ela no

sentido mais amplo.

Bakhtin d is t ingue o que Kristeva chama dimensoes ' hor i zon-

tal ' e 'vertical ' da in ler textual idade (ou relacoes no 'espago' in te r -

textual: ve r Kristeva. 1986a: 36). Por um lado, ha relates i n t e r t ex t u a i s

'horizontals* d e u m t ipo ' dialogico' (embora o que normal men te e

considerado como monologo seja, em meu ponto de vista , dia logico

nesse sentido) entre um t ex to e aqueles que o precedem e seguem

136 Norman Fairclough

«a cadeia de textos. O caso mais obvio e como lu rnos de fala em

u m a co n versa incorporara e respondem a turnos que os precedem e

antecipam aqueles qu e seguern; mas uma carta e tambem relacionada

Discurso e mudanca social 137

para a cons t i tut iva q u a n d o a dis t ingao nao estiver em qu es tno , m as

in troduzirei o novo termo ' in terdiscursividade ' pre fe r ive lm e nte a

inter textualidade co ns t i tu t iva qu a nd o a dis t ingao for necessar ia .

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in ter textualmente a car tas anter iores e subseqi ienles na correspon-

dencia. Fo r oulro lado, ha relagoes in ter textuais 'ver t ic a ls ' entre u m

texto e outros textos qu e consti tuent seus contextos ma is ou menos

imedia tos ou distantes: textos com os qu a is esla his to r ica men te

ligado em var ias escalas temporals e por viirios parametros, ale

mesmo textos que sao mais ou menos contemporaneos a ele.

Alem d e incorporar ou , por ou tro l a d o , responder a o u t ro s

textos, a in t e r t e x tua l idade do texto pode se r considerada como in -

corporando as relagoes potencialmente complexas qu e tern com as

convengoes (generos, discursos. esti los, t ipos de a t iv idades — veja

a seguir) qu e estao estru turadas juntas e consti tuent uma ordem de

discurso. Bakhtin , d iscutindo genero, observa que os textos podem

nao so recorrer a essas convengoes de um modo re la t ivam e nte di-

reto, m as po d em ta mb em ' r eacen tua- l as ' , p or exemplo , u sa nd o -a sironicamenle, reverentemente. parodiando-as, ou podem 'mescla-las'

de viirios modos (1986: 79-80). A distincao entre as relagoes inter-

textuais de textos com outros textos especificos e as relagoes in -

te rtextuais de textos com as convengoes esta relacionada com uma

outra dis t ingao usada pelos analistas de discurso franceses: a in-

ter textualidade 'manifesta ' oposta a 'consl iUi tiva ' (Au th ie r -Revu z ,

1982; Maingueneau, 1987), Na in ter lextualidade manifesta . outros

textos estao explicitamenle preseutes no t ex to sob analise: eles

estao 'manifestamente' marcados ou suger idos por tragos na super-

ficie do texto, como as aspas. Observe, e n t re tan to , que um t ex topode ' incorporar ' outro texto se m que o u lt imo esteja e xpl ic i t a -

mente sugerido: pode-se responde r a outro texto na forma como se

expressa o proprio texto , por exemplo. A in t e r t e x tua l idnde consti -

tut iva de um texto , entretanto , e a configuragao de conven goes d is-

cursivas que en t ra m em sua produgao. A pr ior id ade que dei as

ordens de discurso ressa lla a in t e r t e x tua l idade consli tut iva (ver, no

Capitu lo 3, o i tem "Discurso"). Usarei a i n t e r t ex t u a l id a d e co mo

um termo geral tanto para a in ter textualidade manifesta quanto

para enfatizar que o foco esta n as convengoes d iscursivas e nao

em outros textos.

f A in te r tex tu a l id a d e impl ica uma enfase sobre a heterogenei-

* dade dos textos e um mo d o de a na l i se qu e ressalta os elemenlos e

. ' as l inhas d iversos e freqiientemente contradi torios qu e c o n t r i b u e m

para compor um texto. Tendo dito isso, os textos variam miiito em

seus niveis de heterogeneidade, dependendo se suas relagoes in -

ter lextuais sa o complexas on s imples. Os textos tambem d i fe rem

na med id a em que seus elementos heterogeneos sao integrados, e

tambem ua medida em que sua heterogeneidade e e v ide n te na su-

perficie do texto. Po r exemplo, o texto de um outro pode es ta r cla-

ramente separado do resto do texto por aspas e verbo dicendL ou

pode nao estar marcado e estar in tegrado es trutural e est i l is t ica-

mente, ta lvez po r meio de nova formulacao do o r ig ina l , no t ex toem sua volta (ver a discussao adiante no item "Represen tacao de

discurso"). N o va men te , os textos podem ou nao ser ' r ea cen tu a -

dos?; eles podem ou nao recorrer ao esti lo ou ao torn pred o mina n te

( i ronico o u sen t imen ta l ) d o tex to c i r cu nd a n te . Ou no va men te . o s

textos de oulros podem ou nao ser fund idos co m suposigoes do

segundo piano d o t ex to que nao sao a t r i b u i d a s a n i n g u e m , p or

meio da pressuposigao (ver a seguir , para uma discussao da pres-

suposigao). Desse modo, textos heterogeneos podem ter uma su-

perficie textual desigual e 'acidentada ' , ou rela t ivamente regular .

A in t e r t e x tua l idade e a fonte de m ui ta da am biva le nc ia do stextos. Se a superficie de um t e x to pode ser m ul t ip lam e nte d e te r -

m inada pelos varios outros textos que en tram em sua composigao,

entao os elementos dessa superficie textual nao po d em se r clara-

m e n t e colocados em re lagao a rede i n t e r t ex lu a l d o texto , e seu

sentido pode se r ambivalente; diferentes sen t id o s po d em co ex is l i r ,

e pode nao ser possivel de te rm inar 'o' sentido. A fa la do o u t ro

pode ser repres entada no que e tradicionalmente chamado 'discurso

i nd i re to ' (por exemplo, "Os estudantes disseram o quanto eles

138 Norman Fairclough

gostam da flexibilidade e da variedade de escolha de curso"); nesse

caso, ha sempre uma ambivalencia sobre se as pa lavras re a l s sa o

atr ibufveis a pessoa cu ja fala e representada on ao autor do texto

Discurso e rnudan^a soc ia l 139

G R A - B R E T A NH A enfrenta uma guerra para deter

os traficahteSj alertam os Membros do Pariamento

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principal . H a a qu i a r e iv in d ica ga o de que os es t u d a n t es r ea lmen te

d is se ra m, "E u gosto da flexibilidade e da var ie dade de escolha de

curso", ou palavras para produzir esse efeito? D e quern e essa 'voz\ a

do s es tudantes ou a da a d min i s l r a ga o u n iv er s i l a r i a ? E, como eu

observe! anter iorraente (Capi tu lo 3, item "Pralica discursiva"). os

e lemen to s d o t ex lo pode m se r plane jados para se r in t e rpre tados de

diferentes modos, por diferentes le i tores ou ouvin te s , o qu e e u ma

out ra fonte de ambivalencia antec ipatoria, i n t e r t ex t u a l .

N a par te restante deste capitulo, eu vou analisar dois e x e m -

plos d e textos para i lus trar u m pouco do potencial anali t ico do

conceito d e i n t e r t ex t u a l id a d e ; co m base nesses exemplos, eu vou

discutir aquelas dimensoes d a in t e r t e x tua l idade que sao im por lan-

te s para construir um quadro teor ico para a analise de discurso -

intertextualidade ma n i fes t a , in t e rd i s c urs iv idade , ' t r a n s fo rma ^o es '

textuais , e como textos consti tuem as i d en t id a d es sociais.

Exemplo 1: Reportagem de jornal

O pr im e i ro exemplo e u ma reportagem qu e apareceu em u m

jo rna l br itanico nacioual, Th e Sun, em 1985 (ver fairclough, 1988b,

para u m a analise mais detalhada) . E u ma reportagem sobre u m d o -

cu men to ofic ial produzido pelo comite da Casa d o s Co mu ns , i n i i -

tu lado Abuso d e droga pesada: pre ve ngao e coiitrole.

Eu vo u focalizar a 'repor tagem' ou 'representayao ' do discursono artigo (para uma boa discussao do as s un to , ver Leech e Sho r t ,

1981). Eu vou de fato usar um termo diferenle, po r razoes qu e co-

mentare i depois: ' representagao do discurso'. A re pre s e n tagao d o

discurso e u ma fo rm a d e in t e r le x tua l idade na qua! par ies de outros

textos sao incorporadas a um texto e expl ici tamenle marcadas como

Convoquem as

for^as armadasna batalha contra

as drogas!por David Kem p

As forcas armadas deverao ser chamadas para re-

pelir uma invasao niacica dos vendedores de tiro-

gas, exigiram os Membros do Paria mento .

Trafi can les de cocaina sao a m a i o r ameaca ja enf ren tada pclaG r a - B r e t a n h a em tempo de paz- e poderao deslruir o modo de v ida

do pa is, elcs di s seram.

Os Membros do Pariamento

querem que os Minislros conside-

rem a possibilidade de ordenar qu e

a Marinha e a RAF/Foixja Aerea

Real localizem navios suspeilos de

transporlar drogas que se aproxi-

inam de nossas costas.

Em terra dever iam se r in len -

s i f icadas san^ocs legais pcla

a lfandega , po l icia e services dc

seguran?a.

LucrosO Comi te de Assunlos E n l e r i o -

res de lodos os partklos visi tou a

America e ficou profundamenle

chocndo C O T T I o que viu.

Km um dos relalorios de maior

impaclo dos Comuns em muilos

anos, o comile - presidido pelo

advogado dos Conservadores M l1

Si r Edward Gardner - atertou

gravemen tc:

A sociedade o c i d e n ta l

enf ren la uma ameaga seme-

Ih ant e a guerra pela indiislria

de drogas pesadas.

Os Iraficantes acumulam

quantias magnfficas po r meio da

explorac.ao da fraqucza liumana,

do l e d i o c d a miseria.

E prcciso qu e percam tu i lo

- suas casas. sen d i n h e i r o . e

tudo o qu o possuem qu e possase r a t r i b u f d o a l u c r o s com a

v c n d a d e drogas."

Sir Rdward disse ontcin:

"Nos acredilamos que o irallco

de drogas e igua! a malar c a pu -

niejio deveria reflet ir isso.77

Kspera-se q u e o Cove mo iin-

plemenle sevens leis no outono.

140 Norman Fairclough

tal , com recursos, como aspas e oracoes rela tadas (por exempio ,

"ela disse" ou "Maria at'irmou"). A representacao do discurso e '

o b v ia men te um a parte importaiite da s noticias: representac.6es do

Discurso e mudanca socia l

de quern rela ta - por exemplo, 'agora' se torna 'entao'. As vozes

do(a) relator(a) e do(a) relatado(a) sao menos claramente demar-

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qu e as pessoas disseram e qu e nierece se r notfcia. M as fa mb em e J

ex t r ema men te im por lan te em outros t ipos de d iscurso , por exem-

plo, como evidencia em tr ibunals , na retorica politica e na conver-

sac_ao diar ia , na s qua i s as pessoas in f indave lm e nte rela lam o que

outros d isseram. De fa to, nao tern sido geralmenle ava l iado o

qu a n to e irapor tante a representacjio do discurso , nao so como u m

elemento da liuguagem d e textos, ma s ta mb em co mo u ma d imen-

sao da pratica social.

Eu escolhi esse ar tigo em par ticular po rqu e nos temos infor-

maQoes dispomveis qu e us ua lm e nte os leitores nao tern; o docu-

m e n t o qu e esta sendo rela tado (HMSO, 1985); podemos, portanto ,

co mpa ra r a reportagem e o original e observar como o discurso

esta sendo represeutado.

Os estudos us ua lm e nte trac.am um a disl incao basica entre re-presentagao do discurso ' d i r e to ' e 'indireto'. "Sra. Thatcher avisou

os colegas de Gabinete: 'Eu nao vo u se r responsavel po r n e n h u m a

desercjio agora'" e um exemplo de discurso direto, e "Sra. Thatcher

avisou ao s colegas de Ga b ine te que ela nao ser ia responsavel por

n e n h u m a desergao en tao" e um exemplo d e d iscu r so i n d i r e t o .

Ambos consistem em uma oragao re la tada ("Sra. ThatcheTavi sou

ao s colegas de Gabinete") seguida por uma representacao de dis-

curso. No caso do discurso direto , as palavras representadas estao

co m aspas, e o t empo e os deiticos - palavras relacionadas com o

t empo e o lugar do enunciado, tal como ' agora1 nesse e x e m p l o -

sao os do 'o r ig ina l ' . Ha um l imite explrcito entre a ' voz 1 da pessoa

que e rela tada e a 'voz' de quern rela ta e diz-se f re que n te m e nle qu e

o discurso direto usa as palavras exalas da pessoa qua ndo as re la ta .

N o d iscu r so ind i r e to , as aspas desaparecem e o discurso repre-

sen tado toma a forma de uma oracao gramaticalraente s ubord inada

a oracao qu e r e la ta , umii re l agao marcada pela c on j t ingao ' q u e ' .

O t empo e os deiticos sa o mudados para incorporar a perspectiva

cadas, e as palavras usadas para representar o discurso no u l t imo

caso podem ser as do(a) relator(a) e nao as do(a) relatado(a).

- Tais explicates da gramatica pa d ra o t ip ic am e nte d im inue m a

complexidade do que realmente acontece nos textos. Vamos foca-

lizar as ma nche tes . A manchete pr incipal ( "Convoquem as ForcesArmadas na bata lha contra as drogas!") nao tern n e n h u m a d a s

marcas formais da representagao do discurso - n e n h u m a oracao

rela tadora e ne m aspas - , mas e uma orac,ao im pe ra t iva em sua

forma gramatical, e o ponto de exclamagao indica que ela deve ser

t om ada como uma reivindicagao. M as quern esta r e iv ind ica nd o ?

N ao ha nada formaImente para m arc ar isso como u m a out ra 'voz'

qu e nao a do proprio Th e Sun, mas os artigos de jornal tradicio-

nalmente rela tam as reiviiidica§6es de outros, em vez de fazerem

as suas proprias reivindicagoes (exceto no s editorials), o que sugere

que ta lvez isso seja afinal um a fo rma pecu l ia r de representacao do

discurso. Po r o u t ro lado, a distincao en t r e ' reportagem' e ' op in iao '

na imprensa sensacionalis ta e m enos clara do que a analise sugere,

assim talvez essa seja a voz do The Sun. Mas, no paragrafo de

abertura da repor tagem, a reivindicacao na manchete e a t r ib u id a

ao s 'Membros do Parlamento ' . Eslamos diante de uma ambivalen-

cia de voz, uma manchete cuja fo rma linguisiica ambi'gua a torna

co m *dupla voz' (Bakhtin , 1981). The Sun parece estar mesclando a

voz do documento HMSO com sua propr ia voz. Essa conclusao e

sustentada pelo subtilu lo precedente ("Gra-Bretanha enfrenta u m aguerra para deter os traficantes, aler tam os M emb ro s do Parla-

mento") . Nesse caso, ha uma oragao relatadora, mas ela e posta

nu m segundo piano, ao ser colocada depois do discurso rela tado, e

fa l tam tambem as aspas, a inda que seja d iscu rso direto . Essas pro-

priedades formais nov amen te contr ibu em para uma ambivalencia

', de voz.

- A seguir , compare essas manchetes e o paragrafo de aberiura

co m o seu original no d o c u m e n t o H M S O :

142 Norman Fairclough

O G o v e r n o dc vc r i a cons iderar o us o da M a r i n h a Real e da Forca

Aerea Real para missues de radar c de vigi lanc ia aerea ou mar i -

Discurso e m u d a n ^ a socia l

fa lada ( ' traficantes ' se torn am ' v endedores ' , ' forgas ' ocorre se m

' a rmadas ' como modif icador) , d o monologo escrito para o dialogo

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t ima . Recomendamos, por tanto , q u e devem ser in lens i f icadas

sancoes legais conlra t r a f i can tes de drogas pe la Al landega de

Su a Majes tade, poli'cia, services de seguranca e poss ive lmcntc

pelas Forcas Armadas.

A o mesclar a voz do d o cu men to com sua propria voz, Th e Sim

esta t am be m t raduz indo a pr imeira nos termos da u l t ima . Isso e

parc ialmente um a questao de vocabulario: 'convoquem'. ' b a ta lha ' ,

'repelir, 'maciga ' , ' invasao' , 'vendedores de drogas' e ' t ra f icantes '

nao sao u sa d o s n o d o cu men lo HM SO. E t a mb em um a questao de

metafora : The Su n esta u sa nd o uma metafora - t ra lando de t r a f i -

cantes de drogas como se estivesse t r a va nd o um a guerra -, o q u e

de fato e usado em u m ponto do documento HM SO, e esta trans-

p o n d o a voz do documento para sua mo ld u ra . A ma nche te contem

u m a elaboragao dessa metafora to ta lmente ausente no d o cu men to

HM SO -mobilizacao ( ' c o n v o q u e m ' ) das Forgas Armadas -, e o

mesmo e verdadeiro para a representacao do t rafico de drogas

como um a ' i nvasao ' . Finalmente, e t a mb em um a questao de t r a d u -

zi r as recomendagoes cautelosas da reportagem em um c on jun to de

' re iv ind icagoes ' . Xx

O que a cha mo s na representacao de discurso do Th e Sun, en -

tao, e (i) ambiguidade da forma linguist ics , o que significa que e

freqi ientemenfe pouco claro se a lgum a coisa e discurso representa-

do ou nao (outros exemplos sao os dois paragrafos im e dia tam e nteantes e depois do s ub t i tu lo 'Lucros'); e (ii) fusao da voz do Th e

S un com a voz do d o cu men to H M S O , o que impiica Th e Sun re pre -

sen ta nd o as recomendagoes do d o cu men to corao se elas fossem

suas proprias recomeu dagoes, mas, ao mesmo tempo , t r a d u z ind o o

documento para sua propr ia l inguagem,

Entrelanto, e simplesmente ' sua propria liuguagem'? O processo

d e t radugao envolve m u d a n g a s qu e se afas tam d a t e rm ino logia

le g i t im a da linguagem escri ta. para um vocabuli ir io da linguagem

conversaciona l ( a r e iv ind ica ca o na m a n c h e t e e i m p l i c i l a m e n t e

dialogica), recorrendo a uma metafora (mobil izacao para a guerra)

qu e tern ressonancias na experiencia e na mitologja popular. A m u -

danga , em resumo, e de um documento oficia l para a fala po pu la r ,

ou mellior, para "a propria versao do jornal da linguagem do piiblicopara quern el e se dir ige p r i n c i p a l m e n t e " ( Ha l l et af., 1978: 61).

Isso e associado com uma t e nde nc ia dos fornecedores de uo t ic ias

para agirem como 'mediadores ' , figuras qu e c u l t ivam "caracten's-

ticas que sao consideradas tipicas da a u d ienc ia alvo" e t ima relagao

de so l id a r ied a d e co m essa a u d i e n c i a suposta, e que podem med ia r

os eventos dignos de serem notic ias para a a u d ienc ia nos t e rmo s de

se u proprio 'senso c o m u m ' ou n u m a versao estereotipada disso

(Har tley, 1982: 87).

A mid ia de noticias tem m u d a d o largamente nessa d i rega o e e

preciso se consi'derar por q u e . Em u m nfvel , isso reflete o que tem

sido identif icado como L i m a importante dimensao do consumisrno:

um a m u d a n g a , ou m u d a n g a aparente. no poder dos p rodutores para

os consumidores. A midia de noticias esta no negocio co mpet i t ive

de 'recrutar le itores, te lespecladores e o u v in tes em um contexlo

de merca d o no qual suas vend a s ou sens indices sa o decisivos pa ra

a sobrevivencia. A s tend enc ia s l ingt i is l icas qu e eu note i podem se r

in t e rpre ladas como uma real izagao de uma tendencia mais a mpin

para os produtores comercial izarem suas mercadorias em formas

qu e ma ximiz em su a adaptagao ao s eslilos de vida e as aspiragoesde estilos de v id a dos consumidores (embora eu acrescente qu e

eles estao b u sca nd o construir as pessoas co mo co nsu mid o res e os

estilos de vida a que elas aspiram). Ent re tan to , o processo e ma isf-.

\ c o m p l e x o qu e isso. O s even tos d igno s de se t o r n a r n o t i c i a se

o r ig ina m de H m i t a d o gru po de pessoas que tem o acesso pr iv i l e -

g ia d o a m i d i a , que sao t r a t a d a s p e l o s j o r n a l i s t a s como fo n les

i c onf iave i s , e c u jas vozes sao aque las que sao mais l a r g a m e n t e

representadas no discurso da midia . Em algumas noticias da mfdi a .

N o r m a n Fai rc lough

essas vozes externas tendein a ser explicitamente identif icadas e

demarcadas, um ponto a que eu retorno a seguir. Quando , entretanto,

elas sa o traduzidas na versao do jornal da l ingu a gem po pu la r ,

Discurso e mudanfa social 145

O mordomo de

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como nesse caso, ha um gran de mistificagao a respeifo de quern

sao as vozes e as posicoes qu e estao sendo representadas. Se as

vozes de pessoas e grupos poderosos na poiitica, na industr ia , e tc .

sao representadas em uma versao da fala colid iana (mesmo s imu -lada e parcia lmente irreal), entao as identidades. as relacoes e as

distancias socials e n t ram em colapso. O s grupos poderosos sa o

representados como se falassem na linguagem (|ue os proprios le i-

tores poderfam te r usado, o que t o rna mu ito mais facil de adolar os

seus sentidos. Pode-se considerar que a m i d i a de noticias e f e t i v a

o t r a b a l h o ideologico de transmitir as vozes do poder em uma

forma d is fa rga d a e ocul ta.

Traduzir a linguagem de documentos oficiais escritos em uma

versao de fala pop ular e uma instancia de uma t r a d u ga o mais gera l

da l inguagem publica - seja ela escrita ou fa lada - na l inguage m

privada: uma mu d a n ga lingiiistica que e ela propr ia p a r t e da reart i -

culagfio da relagao entre o d o min io pu b l ico dos eventos polil icos

(economicos, religiosos) e agentes sociais, e o dominio pr ivado, o

d o min io do 'mundo da vida cotidiana ' . da experiencia comum.

Tern havido um a tendencia de eventos 'pr ivados ' e de ind iv id u o s

(por exemplo, a tr is teza de pareutes de vi t im as de acidentes) se

tornarem notic ia em , pelo menos, alguns dos meios, e essa t e n d e n -

cia estii comegando a m u d a r da imprensa sensacional ista para, por

exemplo, jornais da televisao. Jnversamente, as pessoas e os even -tos no dominio publico passaram a ser representados em termos

privados. Aqui esta um exemplo da impreusa bri tanica {Sunday

Mirror, 28 de margo de 1980):

Di deixa o

emprego... detenis!monlomo do P RI N CI P E CHARLES

esta deixando o emprego.

E onlem ele revelou que

a l g u m a s vezes ele cumpr i i i

seus deveres reals de lenis.

0 Sr. Alan Fisher cos-

tuniciramcntc usava a Lradicio-

na l j a q u e l a escura esl i lo

'Jeeves' e cal?as l i s l r adas na

casa de Char les e D i a n a no

Paliiciode Kens ington .

Os Ign is usados, ele ad-

m i l i u , foram um legado d e s e u

Iraball io com Bing Crosby.

O Sr. Pisher, que sai em

seis semanas, di z qu e o casal

real "sao as pessoas mais

cliarmosas, agradaveis e s im-

ples. A 1'rincesa e extraordina-

r i amenlc s imples e natu ral " .

O m o r d o m o de 54 anos.

que l ambem I r a l i a f l i o i i para oDucjue e a Duquesa de

Windsor em Paris, niio le m

emprego em vis la , ma s espera

r elornar a A m e r i c a .

"I l av ia a lguma coisa sohre a

in formal i dade da vida la que

me faz senl i r saudade, " disse

ele.

"Ha uma cer ta formalidade

no Ir aha lho em um palac io real ,

mas eu sou um gr a n d c a d m i r a d o r

dii Famflia Real."

Eslaria ele escreveiulo

siias mcmurins sobrc o casnl

real?"Se voce nao gosla das

pessoas para as q u a i s voce Ira-

balha. lalvez". el e disse. "Mas eur ea lmente goslei de le r t rabalha-

do la."

Um poila-voz do Palacio

de Bu c k i n g h a m disse onlem anolle que o Pr inc ipe e a Princesa

receberam o ped ido de demiss i io

do Sr. F isher "com pcsar."

(DailyMirror. I T d e m a i o d e 1984)

146 Norman Fairclough

Ur n mordomo er a um palacio real seria t rad ic iona lm e nte visto

como u m a figura publica, ainda qu e secundar ia , em termos de pa-

pel e fungao e nao como i nd i v fduo . A voz do mordomo real, nesse

Discurso e mudanga social 147

Muito ocupado

para o tribunal, diz Norm

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caso, enlre tanto, e uma voz po pu la r , nao so na representac.ao do

discurso direto no fi m do artigo, como tambem no uso atr ibufdo a

'tenis'. Essa I radugao para o d o min io pr ivado das vidas comuns

esta s a l i e n tada pelo mordomo ' de ixando se u emprego" em vez de,

po r exemplo, renunciando a seu posto. Ao raesmo tempo, a maissignit ica tiva m udanga dos proprios membros da famfl ia real para o

d o min io pr ivado e e v ide u te : D i a n a e c h am ada universalmente na

imprensa sensacionalis ta pela forma reduzida de seu pr imeiro

nome ('Di'), geralmente usado na exper iencia diaria somenle enlre

famil iares e amigos. o que implica que a famfl ia real e como o

resto de uos ao usar tais formas reduzidas, e que 'nos' ( jornalis tas ,

leitores) podemos nos referir a D i a n a como 'Di' como se nos esli-

vessemos em relac,6es in t imas semelhantes com ela. O que estaimplicito nesse uso universal de 'Di' e to rna d o exp l ic i to nessa

reportagem nas palavras atribuidas ao mordomo: ela e ' a g ra d a ve l ' ,'como uma pessoa comu m' . ' s i m p l e s ' e ' na tu ra l ' .

Kress (1986) observa um a reestru(urac,ao semelhante da f ron-

te ira do l imi te en t r e o publico e o privado na imprensa aus t ra l i ana .

Ele contrasta a cober tura , em dois jornais austra lianos, da exiinc,ao

do registro da Federac.ao dos Trabal had ores da Co ns t ru ga o /FTC,

isto e , a perda de suas imu n id a d es sindicais. Um jo rna l t rata o

evento em termos publicos, focalizando o processo legal, e n q u a n t o

o outro tra ta-o em termos pr ivados, focalizando a pessoa e a perso-na l id a d e do l ider da FTC,Norm Gallagher . O contraste e claro nos

paragrafos iniciais dos dois artigos:

O tribunal pleno anunciaa decisao sobre a FTC hoje

O TRIBUNAL PLBNO da Comissao lie Arbilragem ira esta inanha tomar urna

decisao sobre o caso da perda de rcgistro contra a Federacao dos Trabalhadorcs

da Const rugae,

(Sydney Morning Herald, 4 de abr il de 1986)

Norm Gallagher nao va i comparecer a sessao da Comissao de Arbitrager]! hoje para

ouvir a sua decisao solirc o caso de exlingao do regislro contra seu sindicato.

"Eu lenlio Irabalho para fa?:cr" t o secretario-geral da Federacao dos 'f 'rabal had ores da

Construcao disse ontema noile.

(Doily Telegraph, 4 de abri l de 1986)

Novamente, a reestnituragao do limite publico/privado envolve oestilo, assim como o conteudo, por exemplo, o uso do pr imeironome e do presente na manchete, e o aspero comentario de Gallaghercitado.

A m f d i a tern u m impor tan te p a p e l h e g e m o n i c o nao so emrepro d u z i r mas tambetn em r ees t ru tu ra r a rela^ao en t r e os domi-nios publico e privado, e a tendencia que eu ident if iquei aqui en-volve a f ragm e ntagao da distinc.ao, de modo que a vida publica e a

privada sa o reduzidas a um modelo de agao e motivagao i n d iv id u a l ,e de relates baseadas em presumida exper iencia popular da v id apr ivada. Isto e realizado largamente pela reestru tura^ao dentro daordem de discurso de relagoes entre a ' fa la popular ' e varios outrostipos de discurso publico.

Comecei esta discussao focalizando a representac.ao do dis-curso como um mo d o de in t e r t e x tua lk lade - como um t ex to incor-pora partes de outros textos -, mas ela agora se a mpl io u pa ra aquestao de como o discurso da mfdia de jornais como o The Sun econst i tufdo po r meio da articulagao particular de tipos de discurso

e processes particulars de traduc.ao entre eles: o que po d emo s

chamar ' i n terd i scurs iv idade ' ou ' i n t e r t e x tua l idade co ns t i tu t iva ' d odiscurso da mfdia (veja, a seguir, "Interdiscursividad e"). No textosobre o abuso de drogas, as traduc,6es para -a fa la popular coexis-te m com citagoes diretas do d o cu men to H M S O , embora o pr imeiroesteja em pr imeiro p ia no nas manchetes e no paragra fo inicial.Embora a mid ia seja diversif icada e inc lu a varias praticas de repre-sentagao d e discurso e varios padroes de i n t e r d i s c u r s i v i d a d e ,atendencia dominante e combinar os tipos de discurso publico eprivado desse modo.

148 Norman Fairclough

Exemplo 2: Um guia para os poitadores de caitao do banco Barclay

O segiindo exempio tornado de Fairclough (I988a) e o c onte udo

Discurso e mudan^a socia l 149

M en foco para esse exempio e sobre a iuterdiscurs ividade( i n t e r t ex t u a l id a d e co n s t i t u t i v a ) de n t ro d o q u a d r o da luta e da t rans-

formacao hegemonica, sobre as condigoes e os m e c anis m os sociais

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d a l i n g u a g e m d o " G u i a para o s p o r t a d o r e s d e c ar tao d o b a n c oBarclay". 0 texto ocupa o tergo superior de u m a pagina d u p la , o

resto e tornado por uma fotografia de uma sorridente recepcionis taj a p o n e s a oferecendo a u m clienle (nao-representado) um a c ane la ,p r e s u m i v e l m e n t e p a r a a ss ina r o rec ibo a que se refere o t e x to(o numero das f rases foi acrescentado por raim).

Usa-lo e simples voce nao ternsequer de falar a linguaOnde quer que voce veja un i sinal Visa, voce pode apresenlar o sen c a r l f t o

Barclay, quando voce desejar pagar [I]. 0 vendedor ira colocar o seu carlao eo re-

cibo em um a impressora para gravar seu nome e o numero de conta [2].

Ele ira en lao c o m p l e t a r o recibo e depois tie es la r cerlo de que os

dela l l ies eslao correlos. voce apenas ass ina [3].

Voce va i receber uma copia do recibo, que voce dcvcra g uarc la r para

confcr i r com o seu exlrato. e as mercadorias sao suas | < I J .

Bso isso [5].

Voce pode usar o seu carlao Barclay o quanio voce desejar. desde qu e

seus pagatnenlos eslejam em dia e voce se mantenha denlro do l i n i i t c de crcdilo

disponivel (isso esla impresso no older qu e contem o seu carlao Barclay) |6J.

Ocas ionalmenle , a loja pode precisa r dar um le lefonema para o car-

la o Barclay, a fim dc oblcr uma auior izacj io para a Ir ansacao [7|. Bssa c

um a exigencia de rotina de nosso p r o c e d i m e n l o , e nos apenas no s cerlifi-

camos de que i u d o esta em ordem arKes de dar um va em frenle [8].

Em um esibrco para t r a t a r co m m a i s rap idez esses t e le foncmas , o

car lao Barclay esla i n t r o d u z i n d o u m n o v o s i s l e m a a u t o m a t izado [9].

Isso vai economizar tempo para voce, mas, por far or. observe qu e

qiia/qnei- Iransafao qu e poxsa levar a conta do cwtao Barclay para aleni

de sen limile fie credito pode tmiiio hem ser rejeitadci f 10].

E importatite garantir qu e sen limt/e dc credito aeja stt/iciente paracobrir t o f l c / a as suas compras e saquesem dinheiro [ I I ] .

Q u a n d o voce q u i s e r l i r a r vanlagens dc uma ofcrla do reembol so

postal , e m u i t o mais facil dar o n u m e r o do seu car tao Barclay , em vez de

e n v i a r cheques ou va les posfai s [12].

Apenas escteva se u n u m e r o de car tao no espaco d e s t i n a d o no for-

mular io . assine-o e e n v i e - o [ I ? ] .

Ou se voce q u e r reservar enlradas para o lealro, fazer reservas de vi -

agem ou m e s m o fazer um a compra pen l e le fone , apenas diga seu n u m e r o

do eartao, e o custo pode se r pago por seu carlao Barc lay [ 14|.

Voce va i aclmr que o ca r lao B a r c l a y po d e l o r n a r a v i d a m u i l o

m a i s fac i l [ 1 5 ] .

para a emergenc ia de um novo t ipo de discurso que e const i t t i fdo

por meio d e u ma nova configuracao dos t ipos exis tentes , e, especi-

f i ca men t e , a emergencia de um discurso h ibrido cle informagao-e-

pub l ic idade (ou de ' fa lar-e-venderj). A m e s c la par t i c u la r nesse

e xe m pio e d e regulamentagao f inanceira e publ ic idade : o t e x toapresenta as condigoes de uso do servigo d o cartao Barc lay e, ao

m e s m o tempo, t e n t a 'vende-lo'. O s p r o d u t o r e s d o t e x to estao

f u n c i o n a n d o em duas s i tuagoe s e em dois con j u n t o s d e po s igo es

de suje i to ao mesmo tempo, e tambem posic ionando os leitores d e

raodo contraditorio. A contradigao central e a relagao de autoridade

en Ir e banco e pu b l ico : o b a n c o e, por um lado. o ' a u t o r i z a d o r '

c o m u n i c a n d o regulamentos a ura(a) 'autorizado(a)' e, por out ro

lado, u m produtor (autorizado) tentando vender a um (a) c ous um i-

dor(a) (autor izador(a)) . Tam be m estao em que s tao signif icados

interpessoais no s e n t ido de Hall iday (ver, no Cap f t u l o 3, o item"Discurso").

0 texto apresenta um padrao de a l t e rn a n c ia no nivel da frase

en t re t ipos d e discurso d e re gu lam e ntagao f inanc e i ra e d e public i-

dade , de ta l rnodo que certas f rases sao muito c laramente at r ibuf-

veis a um tipo de discurso ou a outro. Por exempio, a manchete

parece um anuncio , e a frase (6 ) pare c e re gu lam e ntagao f inanc e i ra .

Out ras , como (12) e (14), sao mais ambivalentes. Mas m e s m o as

f rases que geralmente pertencem a um t ipo de discurso f reqiiente-

mente contem algum t rago d o o u t r o . Por exempio, n a f rase (6) e ao

longo do texto, o(a) le i tor(a) e dire tamente referido (como 'voce').

A referencia dire ta e us ada c onve nc iona lm e nte como m arc ador de

i n fo rma l id a d e na public idade moderaa. H a um a pagina no gu ia ,

i n t i t u l ada "Condigoes d e uso", que faz uma comparagao interes-

sante . Ela lista 13 condigoes em tipo m ui to pe que no . Nao ha mes-

cl a de t ipos d e discurso e nem referen cia dire t a. Aqu i es ta u ma d a s

condigoes:

2. O car tao precisa scr assinadu pelo possuidor do cartao e so-

me n t e pode ser usado (i) pelo possuidor, ( i i ) sujeito aos termos

150 Norman Fairclough

das Conduces de Uso do Barclay que es t ivercm em vigor no

m o m e n t o tie uso, (iii) den t ro do l imite de credi to , d e tempos cm

tempos notificado ao p r i n c i p a l possuidor do cartao pclo banco,e (iv) para obter os services oferecidos, de tempos em tempos,

Discurso e mudan^a socia l 151

derno. Setores da economia fora da produgao de bens de c o n s u m e

eslao, de modo crescente, sendo arrastados para o mo d elo do s b ens

de consume e pa ra a matr iz do co nsu mismo , e estao so b pressao

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pelo banco com respeito ao cartao.

A palavra ' a p e n a s ' , como e u sa d a no tex to (frases (3), (8),

(13) e (14)), pertence a publicidade. Ela min imiz a as imposigoes

sobre o(a) cliente e. assim, a le nua a autor id ade do produtor do

texto com u m a m udanga em diregao a o s ign i f ica d o d e a u to r id a d e

do consumidor. Ela comunica o significado de simplicidade, centra l

na propaganda: 'e facil '. U m caso bem diferente e evitar significados

qu e poder iam ser problematicos nessa mescla do falar-e-vender.

For exemplo, esperarfamos que, na s regulamentagoes f inanceiras.

o que for exigido do cliente seja tornado explfc i to, como esta no

extra to das 'Condigoes de Uso' citado auteriormente. Mas, embora

o texto se refira a dez agoes exigidas do cliente, a obrigagao esta

expressa expl ici tamente em somente um caso (';que voce devera

guardar para conferir") e, mesmo a qu i , o signif icado e de obriga-gao fraca ('voce devera ' em vez de 'voce d e v e ' ) . ( V e j a a discussao

sobre 'modalidade' no Capftulo 5, item "Modai idade".)

A par te do t ex to em i tal ico - frases (10) e (11) - e a mais cla-ramente regulamentadora , mas, mesmo aqui. ha uma a te nuac ao d e

torn. O significado expresso em (10) e po tenc ia lmen te ofensivo ao

cliente, mas tern o torn atenuado pelo significado hipotetico ('possa

l evar ' , 'pode se r rejeitada '} , a mo d a l id a d e de 'poder se r re j e i t ada '

com 'mui to bem' , e o uso aqui da passiva sem um agente, qu e d e ixa

se m especif icar quern po d er ia ' r e je i ta r ' - e faci l de ser inferido do

resto do texto que e o banco, mas o texto na o po e isso em pr imeiropiano. Em (11), a obrigacao do po ssu id o r do car tao e apre s e n tada

em termos impessoais ('e importante garan t i r ' em vez de 'voce

deve garantir ' ) e e s t ranh am e nte t r a n s fo rma d a em uma exigencia

para controlar o l imi t e de credito, que o banco de fato controla , emvez de f icar no l imite.

A mesela d e informacoes sobre r e g u l a m e n t a g o e s f i n a n c e i r a s

e pu b l ic id a d e po d e ser in le rpre tada como um modo de r ea g i r aod i lema qu e insti tu igoes como bancos en fren t a m no merca d o m o-

para 'empacotar ' suas atividades como bens de consumo e 'vende-las '

ao s ' consumidores ' . Isso cria uma dif icuklade part icular para os

bancos: para competi r com os bens de consumo, sens services pre-

cisam se c u r v a r ao poder dos co nsu mid o res e se t o rnar atra tivos,

s imples e sem qu a isqu er restr icoes; mas a natureza par t ic ular dos'bens' em ofer ta torna im pe ra t ivo que o acesso dos co nsu mid o res a

eles seja controlado por regras e sa lvaguardas. Esse di le m a nao e

unicamente dos bancos. Ele surge sob formas bastante diferentes

na educagao, onde a pressao para ' vender o pro d u to ' e compensada

pela pressao para protege-la dos efeitos adu l t e radore s do mercado.O dilema se ma n i fes t a no ' m odo ' da relacao intertextual entre a

informagao f inanceira e os elementos publ ici tar ios do t ex to , e es-

peci f i camente o f a to m e n c i o n a d o a n t e r i o r m e n t e de que o t e x l o

a l t e rn a entre oragoes que sao pr im ar iam e nte uma coisa e nao outra.

Isso d a o sen t id o de que os dois t ipos de d iscu r so t e n t a m com

di f i c u ldade coexist ir no t ex to , em vez de es ta r em p l e n a m e n t e

in teg ra d o s . (Sobre os m o d o s d e relates i n t e r t e x t u a i s , ve ja o

comego da p r o x i m a segao.)Textos do t ipo i n fo rma ga o -e -pu b l i c id a d e ou falar-e-vender sa o

comuns em varias ordens de d iscurso insti tucionais na sociedade

contemporanea. Eles tes temunbain um movimento colonizador da

public idade do dominio do mercado de bens de consumo, nu m sen t id o

estrito, para um a var iedade de outros dominios. Pode-se relacionar

isso com uma tend enc ia atual (associada, na Gra-Bretanha, com a

'cultura empresarial '), no processo de longo prazo de comodificagao,

de incorporagao de novos d o min io s no merca d o , e d e ampliagi io doconsumismo. Tem-se considerado que o consumismo causa um a m u -

danga n o poder rela t ive de produ lore s e consumidores em fa v o r

d os ul l imos. embora seja questionavel em que medida essa m u d a n -

ga de poder e rea l ou cosmetica .

A comodificagao, a expansao do consumismo e a marquel izagao

tern efeitos general izados sobre as ordens de d iscurso. var iando de

um a reestru turagao penetrante de ordens de d iscurso i n s t i t u c io n a i s ,

sob o impaclo do mo vimen to co lo n iz a d o r do d iscu r so da pu b l i c i -

152 N o r m a n r a i r c l o u g h

dade, do mercado e da adrninistrac,ao. ate y ubfquaLrelexicalizacaV

(ver Capftulo 6 , i tem "Criagao de palavras") de publ ico, cl ienies,

estudantes e assim por diante como ' consumidores ' ou ' f r egueses ' .

Discurso e m u d a n c a s o c i a l 153

Discut ire i a in ter textualidade manifesta em relacjio a: repre-

sentacjio do discurso, pressuposic.ao, negaQao, inetadiscurso e iro-

nia. (Eucontrei em M a ingu enea u (1987) u m a fonte part icularmenle

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Essas tendencias provocam u m a resistencia, u m a lu ta hegemonica

para a estruturac.ao da s ordens de discurso, e d i lema s pa ra os pro-d u t o r e s e in te rp re tes d e texlos qu e t e n l a m d e s e n v o l v e r form as

d e acomodar, confer ou subver ter a colonizacao (ver Capitu lo 7) .

J j i t e r t ex t iml idade mani fes ta

A seguir, eu vo u elaborar a distincjio a qual ja fiz ahisao ante-

r iormente entre ' intertextualidade manifesta ' e In terdiscursividade '

( ' in te r tex tu a l id a d e c ons t i tu t iva ' ) . Ain te r tex tu a l id a d e ma n i fes t a e o

caso em que se recorre explicilamente a outros textos especfficos

em um texto , en quan to in terdiscursividade e uma questao de comourn tipo de discurso e constituido por meio de uma combinac/ io de

elementos de ordens de discurso. O princfpio da in te rd iscu r s iv id a -

de, embora nao o termo, fo i discutido em conexao com as ordens

de discurso no Capitu lo 3. Tambem e ut i l ler em mente d is t in^o es

tipologicas entre diferentes 'modos' de relates intertextuais qu eja apareceram na m inh a discussao sobre os exemplos. Pode-se dis-t inguir entre:

intertextualidade 'sequential', em que diferentes textos ou ti-

pos de discurso se alternam em um texto, como e parcialmenle o

caso no exemplo 2;

'interlextuaUdade encaixada', em que um texto ou t ipo dediscurso esta claramente contido dentro da m atr iz de um out ro .Essa e a relac.ao entre os 'estilos' dist inguidos por Labov e Fa nshe l

para o discurso terapeutico (ver discussao no Capitu lo 2);

'interlextoialidade mista\ em que textos ou tipos de discurso estaofundidos de forma mais complexa e menos facilmente sepanivel.

util para esta discussao.)

Representa<;ao de discurso

U so o termo 'representac,ao de di scurso ' em Jugar d o te rmo

tradicional ' discurso re la tado ' po rqu e (I ) el e capta melhor a ideia

de qu e , qu a nd o se 'relata ' o discurso. necessar iamente se escolhe

representa-lo de um modo em vez de outro; e (2) o que esta repre-

sentado nao e apenas a fala. m as t a mb em a escrita, e nao so men te

sens aspectos gramaticais, mas t a mb em su a organizacao dis c urs i -

va, assim como varios outros aspectos do evento discursivo -

suas c i r c u n s t a u c i a s , o torn no qu a l as coisas foram ditas , e tc .

(Ver Fai rc lough (1988b) para maiores detalhes .)

O s t ipos de discurso di lerem nao somente no modo como eles

representam o discurso, m as t a mb em n os tipos d e d iscu r so qu e

eles representam e nas func/ies do discurso no texto representador.

Desse modo, ha diferenc.as no que e citado, qua ndo , como e por

que, entre sermoes, ensaios cieiilfficos e conversayao. U ma var ia-

ve l pr incipal a respeito de como o discurso e representado e se a

representa^ao vai alem do ideacional ou couteudo da ' m e n s a g e m '

para i n c lu i r aspeclos d o estilo e d o contexto d os enu nc ia d o s repre-

sentados. Voloshinov (1973: 119-120) sugere que algumas cul luras

sao orientadas mais exclusivamente para a mensagem do que ou-

tras, e o mesmo e verdade para a lgumas pra ticas d iscursivas dentro

d e qua lque r cultu ra par t icular e dentro de nossa cu l t u ra .Voloshinov (talvez um pseudonimo usado por Ba kht in ) acen-

tu a a relacao dinamica entre as 'vozes' d o discurso representado e

representador . 0 exemplo 1 i lust rou como as vozes podem se rfundidas . Novamente, ha uma consideravel var iacao entre os t ipos

de discurso, o que pode se r explicado em termos de duas escalasqu e se sobrepoem: (1) em que extensao os l imites entre o discurso

representador e representado estao explicita e c la ra men le . ina rca -

Sistemafete^d;

154 Norman Fairclough

dos; e (2) em que extensao o discurso representado e t raduzido navoz do discurso represenlador.

O grau d e 'ma nu tenca o d e l i m i t e ' e parc ia lm e nte L i m a que s tao

d e escolha en t r e r ep resen ta c j io d i r e ta o u i n d i r e t a d e d i s c u r s o .

Discurso e mudanca s oc ia l 155

A especificagao do contexto do discurso representado, do stains de

prestigio de seu presidente, e de se n torn 'grave', tudo ressalta o

peso e a importancia dele. Note tambem 'a ler tou ' (selecionado em

vez de 'disse', ' emi t i i r , ou ' a s s ina lo u ' ) . A escolha do verbo repre-

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A primeira pre tend e , pelo menos, reproduzir as palavras exalas

usadas no discurso representado, embora, como o exemplo 1mos-

trou, isso nao acontega sempre. O discurso indire to, ao contrar io . e

ambivalente: nao se pode ter certeza de que as palavras do or iginalsa o repro d u z id a s o u nao. Muitos t raba lh os (ver,por exemplo,Leech e Short , 1981) tambem dist inguem u m a categor ia de 'dis-

curso ind i r e to livre", que deixa de apresentar uma oragao re latadora

e tern 'dupla voz', mesc la nd o as vozes do discurso representador e

representado, por exemplo a manchete no exemplo 1 ("Convo-

quem as Forgas A rmadas na b a t a lha contra as drogas!").

Uma outra af irmagao no t rabalho de Voloshinov e que o s igni-

ficado do discurso representado nao pode ser d e te rmina d o se mrefe renda a como ele funciona e e contextualizado no discurso

representador . Ur n bom exemplo disso e o u so de aspas s imples -

colocando palavras isoladas ou pequ ena s expressoes entre aspas -,

como os exemplos jormm'sticos "investigar o enredo de espionagem

sobre escandalo co m 'mulheres" ' , "umaoferta ' f i na l ' de paga-

mento" . As expressoes entre aspas s imples sa o s im ul rane am e nte

usadas e referidas: as aspas simples as estabelecem como per ten-

cendo a uma voz externa. AJem disso, elas po d em ter var ias fun-

goes mais especfficas, como dista i iciar a si proprio da voz ex t e rn a ,

usar sua autor idade para s us te n ta r a propria posicao, mo st ra r u rn

uso para inovar , ou in troduzir uma palavra nova. De forma seme-

Ih an te , pode-se usar o d iscurso direto para construir ou mos trar o

discurso representado.A contextualizagao do discurso representado t o ma varias for-

mas. Isto e do exemplo 1: "Em u m dos rela tor ios de m aior i m p a c t o

dos C o m u n s ' em mu i t o s anos, o comite - presid ido pelo aclvogado

d o Partido Conservador e M e m b r o d o Parlamento , Sir Ed wa rd

G ardne r - aler tou gravemente : 'A sociedade ocidental enfrenta... '".

O Pa r la menlo Briiameo possui dua s ca ma ra s : a dos ' C o m u n s ' e a dos 'Lordes'

(N . "

sentador , ou verbo do 'ato da fala ' , e sempre s ignif icat iva. Como

nesse caso, ela frequentemente marca a forga ilocuciouaria do dis-

curso representado (a natureza da agao realizada na enunciagao de

uma forma par t ic ular de palavras) , o que e um a queslao de im porum a in terpretagao para o discurso representado.

Pressuposiqao

Pressupos igoes sao propos i^oes que sao t o m a d a s pelo(a)

produtor(a) do texto como ja estabelecidas ou 'dadas ' (embora

haja a questao sobre para quern elas sa o dadas, como argum e nlare i

a seguir). e ha varias pistas formais na organizacjio de superf ic ie

do texto para mostrar isso. Po r exemplo, a proposicao em u ma ora-

ga o in t roduz ida pela c on jungao ' q ue ' pressupostamente segue ver-bos como 'esquecer', ' lamentar ' e 'perceber' (por exemplo, "Eu

esqueci qu e sn a m ae tiuha casado novamente"); e os artigos def i-

nidos indicam proposi^oes que tern significados 'existenciais* (por

exemplo, 'a aineaga sov ie t i ca ' p r e s s u p o e que ha uma a m e a c a

sovietica; 'a chuva ' , qu e esta /estava chovendo).

Alguns estudos sobre pressuposic,6es (ver L ev inso n , 1983,

Capitu lo 4 , para um a visao geral) t ratam das mesmas de forma

nao-inter textual, como mera men te proposi^oes que sao dadas e

tomadas como tacitas pelos produtores do t e x t o . M as lia proble-

m as nessa posigao: ela poderia implicar que, por exemplo, a frase"a ameaca sovietica e um mito" seja sema n t ica men te contradiloria,

po rqu e o(a) produtor(a) do texto e s la r ia s im ul tane am e nte to ma nd o

como tacito qu e ha u ma ameaga sovietica e af i rm ando que nao ha

ta l ameaga. Se, por outro lado, temos uma visao intertextnal da

pressuposigao e assumimos que as proposigoes pressupostas saoum a forma de incorporar os iextos de outros, nao ha c ont rad i^ ao

neste caso: a expressao 'a ameaga sov ie t i ca ' e a pressuposigao qu e

el a sugere vem de um outro ( 'a lhe iq ' , co mo Ba kht in d e n o m i n a )

156 Norman FairclougH

texto que e aqui contestado. Deveria ser acrescentado que, emmu ito s casos de pressuposigao. o 'outro texto ' nao e ur n o u t ro

texto especificado ou ident if icavel , m as ur n ' texlo* mais nebulosocor respondendo a opiniao geral (o que as pessoas tendem a dizer ,

Discurso e mudan^a social 157

texto, de que a pessoa citada aqui realmente matou ur a ' informante'(d a polfcia). Portanto, as frases negativas carregam tipos especiais

d e pressuposicao qu e tambem funcionam interlextualmente , incor-

porando outros textos somente para contesta-los ou rejeita-los

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experiencia textual acumulada). A expressao 'a ameaca soviet ica' ,nesse caso, pode se r reconhecida por todos nos como u m a fo rmu la

amplamente usada, nos termos de Pecheux, uma expressao 'pre-

conslrufda' que circula em uma forma j a pronta .Dentro de uma perspectiva inler textual da pressuposicjio, o

caso em que a propos icao pressu po s ta co ns t i tu i r ea lmen te algotornado como tacito pelo(a) produtor(a) do texlo pode se r inter-

pretado em termos de relacoes in tertextuais com textos previos

do(a) produtor(a) do texto. Ur n caso especial e qu a nd o um a propo-

sicao e a f i rma d a e estabelecida em uma parte do t ex to e entiio

pressuposta na outra parte do mesmo.Deve se r observado que as pressuposicoes, quer sejam baseadas

em lextos anteriores do(a) produtor(a) do t ex to , qu er em textos de

outros, podem ser m anipu la t ivas assim como sinceras. Isto e, o(a)produtor(a) do texto pode apresentar uma proposicao co mo d a d a

po r o u t ro ou estabelecida po r el e mesmo desonestamente, insince-

ramente e com in teu ca o m a n i p u l a l i v a . As pressuposicoes saoformas efetivas de ma nipu la r as pessoas, porque elas sa o f r eq i ien -

temente diffceis de desafiar. U m enlrevistado, em uma entrevistada mfdia , que desafia um a pressuposicao em uma pergunla do(a)

en t r ev is ta d o r (a ) , pode aparecer fa c i lmen te como quern esta se

esqu ivando do problema. A s pressuposicoes m anipu la t ivas t a m-

be m re que re m su jeitos in terpretanles com exper ienc ia s e suposi-

coes part iculares em textos anteriores e, assim fazendo, elas

contr ibuem para a consti tnicao ideologica dos sujeitos.

Negagao

As frases negativas sa o freqiientemente usadas co m f inalidades

polemicas. Por exemplo, uma ma nche te de jornal no The Sun dtz :

"E u nao matei o inl'ormaute! O reu Robbey se defende" . Essa pri-

meira orac_ao negat iva pressupoe a proposigao, em algum outro

(ve ja o estudo de frases negativas em Leech, 1983). (Observe qu e

"a ameaca sovietica e ur n mito" funciona do mesmo modo: embora

a f'rase na o seja gramaticalmente negativa , e sernanticamente ne -

gativa, como e mostrado por uma parafrase como "a ameaca sovieli-ca nao e uma real idade".)

Metadiscwso

O metadiscurso e uma forma peculiar de in t e r t e x tua l idade

manifesta em que o(a) produtor(a) do texto d is t ingue niveis dife-

ren tes dentro de seu proprio t ex to e d is ta nc ia a si propr io(a) de

alguns n ive is do texto , tra tando o nivel distanciado como se fosse

um outro texto, externo (ver M a ingu enea u , 1987: 66-69). H a var ias

maneiras de conseguir isso. Uma e o uso de expressoes ' evas ivas '(Brown e Levinson, 1978) co m expressoes como ' especie de %

' t ipo de', para marcar alguma expressao como possivelmente naomuito ade qu ada (por exemplo, "ele era uma especie de pa te rna l i s -

ta"). Ou uma expressao pode se r marcada como per tencendo a um

outro texto ou convengao par ticular ( 'como x poderia ter dito isso ' ,'e m termos cientit ' icos'), ou conio metalorica ( ' f a la nd o metafori-

camente ' ) . U m a outra possibilidade e parafrasear ou relbrinular

uma expressao (sobre reformiila$ao, ver, no Capitulo 5, o i t em

"Formulacao") ; por exemplo, um m inis t ro do governo pode ofere-

ce r parafrases do termo-chave 'empreendimento ' no decorrer tieum discurso tra tando de 'cu ltura empresar iar : "Cedo na v id a te -

mo s muito empreendimento. in icia t iva , a habilidade de i d en l i f i ca r

um a oportunidade e t i rar rapida vanlagem dela".

O meta d iscu r so implica que o(a) f a i an l e esteja s iluado aciina

ou fora de seu propr io d iscurso e es te ja em urna posicao tie con-trola-lo e manipula-lo. Isso te m implicacoes interessantes para a

relagao entre discurso e ide n t idade (subjetiv idade): parece ir contra

a visao de que a identidade social de uma pessoa e uma questiio ele

158 Norman Fairclough

como eJa esta posicionada em tipos part icular es de discurso. H a

dois lados ness a questao. Por um lado, a possibi l idade de u m a

distancia metadiscursiva de se n proprio discurso pode dar a i lusao

de que a pessoa esta sempre p l e n a m e n t e no co n t ro le dele, de que

Discurso e tnudan^a social 159

t u d e negativa sobre seu enunciado , ou de fa to sobre voce - seja e la

de ra iva , sarcasmo ou o que quer qu e seja. Observe que a i ro n ia

depende de os i n l erpre tes serem capazes de r e c o n h e c e r que os ignif icado de um texto ecoado nao e o s iguif icado do pro d u t o r d o

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o discurso e um efeito d a s u b j e t i v i d a d e m a i s do que v i ce-versa .

E interessante a esse respeilo que o meta d iscu r so parece ser co-

m u m em tipos de discurso em que e v a l o r i z a d a a a presen ta ca o

do 'eu' em posigao de controle, como a cri t ica l i te raria ou ontrasformas de analise academica nas l ium anidade s . Por outro lado, eu

eufatizei uma visao dialetica da relagao en (r e discurso e subje t ivi-

dade: os sujei tos sao em parte posicionados e c ons l i tu ldos no d i s -

curso, mas eles t am be m se envolvem na pratica que contesta e

re e s t ru tu ra as estruturas discursivas (ordens de discurso) que ospo s ic io na m. Isso inclu i reestru turagoes que sao mo t iva d a s por con-

s ideracoes polemicas e o b j e t iv o s m a n i p u l a t i v o s : a s pa ra f r a ses

oferec idas an ter io rmente pelo ministro do governo consti tuem

'"uma engenharia sem antic a" (Leech, 1981: 4 8-52). O que pode

aparecer como uma ino cen te c la r i f ica ca o d o s i g n i f i c a d o d e

'empreen dimento ' pode ser i n terpre tado mai s propr iamente como

u m a definigao pol i tica e ideologicamente m ot ivada (para discus-

soes ad ic iona i s , ver Fai rc lough , 1990a, e, no C a p i t u l o 6 , o i t e m

"Significado das palavras").

>Ironia

Os estudos t radic ionais sobre i rouia a descrevem em termos de

"dizer u m a coisa e significar outra". T al explicagao e de u f i i i d a d e

l imitada , porque o que t'alta e a n a t u rez a i n t e r t ex t u a l da i rouia: ofa to de que um e nunc iado i ronico 'ecoa* o enunciado de um o u t r o

(Sperber e Wilson. 1986: 237-243). Por exemplo, s u p o n h a qu e

voce diga: "Esta u m l i n d o d ia para u m pique n ique " . N os vamos

para u m piquenique , chove, e eu digo enlao: "Esta u m l i ndo d ia

para um piquei i ique". Meu en un ciad o seria i ronico: ele ecoa seu

enu nc ia d o , mas ha uma di spar idade e n t re o s ign i f i cado a que eu

estou d a nd o voz, para assim dizer, ao ecoar se u e n u n c i a d o , e a

func_ao real de meu enunciado , que e expressar algum t i po de a t i -

texto . Esse reconhecimento pode ser baseado em vari t is fatores:

um a evidente falta de combinagao en t re o s ign i f i cado apareute e o

contexto situacional (no exemplo anterior , chu va ) ; ind ic agoe s no

torn de voz do(a) falante ou no texto escri to (por exemplo, por pa-lavras entre aspas simples); ou pressupostos dos in t e rpre te s sobre

as crencas ou os valores do(a) produ tor (a ) do tex to ("nos eslamos

todos i u t e i r a m e n t e c o n s c i e n t e s d as real i zacoes e c o n o m i c a s d o

comunismo" sera fac i lmente reconhecido como ironico por lei to-

re s regulares do jornal The Daily Telegraph na Gra-Bretanha, ou

em um discurso do presidente dos Estados Unido s da A merica).

No Capi tu lo 3 (i tem "Discurso") afirmei, e m termos diferen-tes, o p r i n c i p i o da interdiscurs ividade (o u intertextuaf idade cons-

t i tut iva) , sugerindo que as ordens de discurso tern pr im az ia sobreos tipos particulares de discurso e que os l i lt imos sao consti tu idos

como configuracoes de elemenlos diversos de ordens de discurso.

Ta mb em sugeri que o principio da interdisc ursividad e se apl ica a

varios niveis: a ordem de discurso societaria, a ordein de discurso

ius t i tuc ional , o tipo de discurso, e mesino os elementos que cons-

t i tuem os tipos de discurso. Alem disso, a adocuo de um modelo

hegemonico aponta para a mesma direcao, levando a uma visao

das ordens de discurso como equilfbrio instavel, consis t iudo deelementos que sao in teruamente heterogeneos - ou i n t e r t e x t ua i s

em sua constitu igao. Os limites entre os elementos estao constan-

temen te abertos para serem redesenhados a medida que as o r d e n s

d e di scurso sa o desar t i cu ladas e re ar t i c u ladas no curso d a l u t a

liege monica.Ne s ta secao, qu ero levantar a ques tao sobre qu e t ipo d e ele-

m e n t o e c o m b i n a d o n a c o n s t i t u i g a o dos tipos de discurso. Nadiscussao an te r io r , enfat izei a sua diversidade e a var iab i l idade d e

160 Norman Fairclough

su a escala: eles se estendem dos sistemas de toraada de t u r n o ao svocabularies, aos ro teiros para generos , ta is como rela tos de cr ime ,

conj imtos de convengoes de polidez , e assim po r d ia n te . Mas epossivel classificar os e lemen to s que compoem as ordens de dis-

Discurso e mudanca social 161

poder ia haver , u m a lista de te rm iuada de generos, estilos ou discur-

sos, e que estamos constantemente encontrando o que freqiiente-

mente parecem ser decisoes bastante arbi trarias (inf luenciadas pelopo n to de pa r t id a de nossa analise) sobre se a lgum a coisa e ou nao

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curso, e que sao abertos a ar ticulacao nos lipos de discurso. em

termos de um pequeno numero de l ipos principals , cujas propr ie-

dades sao vocabularies parl iculares , sis temas de lom ada de lurno,

e assim por d ia n te . Termo s a mpla men te usados para esses t iposincluem 'genero', 'estilo', ' regis lro' e 'discurso'. Po r ta n to , pode-sefalar de ' genero de entrevisla ' . 'estilo de conversacao'. 'regislro del ivros de cu l in a r i a ' ou 'd iscurso medico-cienti fico ' .

A vantagem de usar tais termos e que eles nos pe rm i te m sele-

cionar em nossa analise diferencas principais de t ipo entre os ele-

mentos de ordens de d iscurso que, de outra m ane i ra , poderfamosperder de vista e, fazendo assim, tornam claro o senlido de que a

pratica discursiva e l imitada por convencoes. Ta mb em e ma is tac i l

usar um quadro analit ico com um pequeno n u m e r o de categoriasrazoavelraente be m diferenciadas, e a lgu ns dos termos sa o a m p l a -

mente usados por cientis tas socials, por exemplo, na analise dacultura popular (Bennett e Woollacott , 1987); usa-los na a na l i se de

discurso a j u d a a tornar o seu valor como metodo mais imedia ta-

mente obvio para os cientistas sociais. Isso e verd a d e co m relate

a 'genero' e a 'discurso', usados para referir a um tipo par t icular

de convenc.30 ( 'urn discurso' , 'esses discursos'), preferive lmente ,

de um modo geral , ao uso de Hngu a gem co mo mo d o de pratica

social (como o usei pr incipalmente at e agora: lembre a d iscu ssa osobre ' d i s curso ' na Introduc.ao). Mas ha desvantagens. O s ele-

men to s das o rd ens de discurso sao e xt re m am e nte diversos, e nao e

de mo d o a lgum sempre fac i l decidir se estamos t ra t ando d e gene-ros, estilos, discursos, ou o que for . U m qu a d ro a na l i t ico m u i t o

rigido pode no s levar a perder de vista as co mplex id a d es do dis-

curso. Por lanto , devemos usar esses termos ca u te lo sa men le , reco-

nheceudo que cada um c e r lam e nte cobre um d o m i n i o diverse e

heterogeneo, que vai ser diiicil , algumas vezes, usa-los de fo rma

bem motivada, e que podemos ter de r eco r r e r a termos mais vagoscomo ' t i po d e di scurso ' (que eu usei a te aqui para qu a lqu er t i po d e

convencjio) . Deveriamos tambem reconhecer que nao ha , e nao

um exemplo separado de um desses tipos.

Com essas considerac,6es em raente, passemos a discussao do s

t ipos. Os termos que eu usarei sa o 'genero', ' t ipo de a t iv id a d e ' ,

'estilo' e 'discurso'. Embora esses diferentes t ipos de elemenlost e nh am um a cerla autonomia com respeito um ao out ro , eles nao

sa o estr i tamente iguais . Em par ticular , o genero inclui os oulros

tipos, no sen t id o de que os generos correspondem muito estreila-

men te ao s tipos de pratica social (v er a seguir). e o s i s tema de ge-

neros que e adotado em uma sociedade par t i c u la r , em u m tempo

part icular de termina em que combinac.oes e configuracoes os ou -

tros tipos ocorrem. Alem disso. os outros elementos diferem em

se u grau de a u to no mia em relacao ao genero, isto e, na extensao

em qu e eles sa o l ivremente combinaveis com uma variedade degeneros e com outros tipos de elemenlo. Eles se posicionam em

um a escala do meuos a u t o n o m o ao mais autonomo: t ipo de at iv i -dade, estilo, discurso. D a perspectiva deste livro, e de pa r t icu la r

interesse a mu d a nga no s i s fema de generos e seus efeitos sobre asconfigurates de outros elemenlos. Ent re tan to , u ma v a n ta gem d a

vi sao (essencia lmente b a k h t i n i a n a ) de genero que eu estou ado-

ta nd o a qu i e que el e nos permite dar o devido peso nao so ao mo d o

como a pralica social e l imi ta d a pelas convencoes , como t a m b e m a

potencia lidade para mudanc,a e cr ia t iv idade.

Eu vou usar o t e rmo ' genero' pa ra u m c on jun to de convengoes

rela tivaraente eslavel que e associado com. e parcia lmente repre-

senta , um tipo de at ividade socialmente aprovado, como a conversainformal, comprar produtos em uma loja, uma en trevi s ta de erapre-

go, um doc um e nlar io d e televisao, u m poema ou um ar t igo cien-

tifico. U m genero impl ica nao so men le u m tipo par t i c u la r de texto ,

m as t a mb em processos part icnlares de producf io, dis tr ibuigao e

consumo de textos. Po r exemplo, os urtigos de jornal e os poeinas

nao sao apenas t ipo s de textos t ip ic am e nte be m d i fe r en tes , m ase les la mb em sao p r o d u z i d o s d e fo rma s bem d i f e r e n t e s (por

exemplo, um e um produlo coletivo, outro e um produto individual);

162 Norman Fairclough

lera distribiricfio bastaute diferente e sao consumidos be m diferen-

t emen te - os i i l tJmos inc lu indo protocolos rauito diferentes pa rasua leitura e interpretac.ao. Assim, o genero atravessa a disl incj io

entre ' descrigao' e ' in terpretacjio ' qu e in t roduz i no Ca pi tu lo 3.

Discurso e mudanca social 163

peso solicitado sa o acei taveis, etc.); o(a) fregues(a) agradece ao(a)

vendedor(a); o(a) vendedor(a) informa o(a) fregues(a) sobre o

custo; o(a) fregues(a) paga; o(a) vendedor(a) da o troco e agradece

ao(a) f regues(a) ; o(a) fregues(a) agradece ao(a) vend ed o r (a ) e faz

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D e acordo co m Bakhtin (1986; 65), os generos sao "os cintosde seguranca da his toria da sociedade para a l i is toria da l ingua-

gem". A s m udany as na pralica social sa o m ani fe s tadas nao so no

piano da l inguagem. na s m n d a n c a s no sisterna d e generos, m astambem em par te provocadas por ta is mu d a nca s . Ao me refer ir ao

sis tema de generos, estou apl icando a qu i o pr iu c ip io da pr i rnazia

da s ordens de discurso, in t roduzido no Capitu lo 3: u m a sociedade - on

um a inst i tu igao part icular on d o mfn io d e n t r o d e la - tern u m a con-

f iguracao par t icular de generos em relagoes par t i c u la re s uns co m

os outros, consf i tuindo u r n sis tema. E, e claro, a configuragao e osistema estao abertos a mudanc,a.

•Jfcj Focal izando o genero conio u m tipo de texto , inn genero par t i-

cular e associado corn uma ' e s t ru tu ra composic iona l ' pa r t i cu la r ,

como Ba kht in a cha ma (1986; 60), ou, na te rminologia qu e eu es -

tou usando, um ' t ipo d e a l iv id a d e ' pa r t i cu la r ( u m a categoria qu e

Oestou adaptando de Levinson, 1979). U m t ipo de a t iv id a d e pode

se r especificado em termos de uma seqiiencia e s t ru tu rada d e agoes

das qu a is e le e composto, e em termos d os participates envolvi-

dos na aliv idade — sto e, o conjunto de posicoes de sujeito que sao

so c ia lmen te cons t i tu idas e reconhecidas em c o n e x a o com o t i p o

de a liv id ade. Por exemplo, a a t iv id ade de comprar produlos em

uma mercear ia envolve o(a) ' fregues(a) ' e o(a) ' vendedor (a ) ' co mo

tipos de su jeilo designados, e uma seqiiencia de acoes , a lgu ma s

das quais podem ser opcionais ou repelidas, conforme se segue:

o(a) fregues(a) entra na loja e aguarda a vez; o(a) vendedor(a)cumprimenia o(a) fregues(a) (o(a) iYegues(a) re lribui o c um pr i -

menlo, eles trocam am abi l idade s ) e solicita o pedido de compra ;

o(a) fregues(a) faz o ped id o de compra (possivelmente precedido

por uma seqiiencia pre-pedido como: "Como estao as mac.as esta

s e m a n a ? " - "Bem, as 'Coxes' es tao boas"); o (a ) v e n d e d o r ( a )

a p a n h a as mercadorias (pesa, empacola , elc.) e as entrega ao(a)fregues(a) (o(a) fregues(a) e o(a) vendedor(a) possivelm ente con-

versam sobre se as mercadorias sao aceila"veis, se as variac_6es no

uma sauda^ao de d esped id a ; o vend ed o r r e t r ib u i a s auda^ ao d e

despedida. Como o exemplo mostra, um tipo de atividade freqiiente-

m e nte de l im i ta u m c on jun to d e opcoes em vez d e espec i f ica r u m

so padrao r igido. V e j a as contr ibuigoes de Hasan , em H al l iday eHa sa n (1985), para uma visao de genero que enfa tiza ta is propr ie-

dades de estru tura composicional.

U m genero t e n d e a ser associado com um es t i lo pa r t icu la r ,

embora os generos f requentemente possam ser compativeis com

estilos alternativos - por exemplo , as entrevis tas podem ser ' for -

m a i s ' e Mnformais ' . 0 estilo, como os outros termos que estou

usando, e diffcil de ser identif icado e tern sido usado de variosmodos. Podemos peusar que os estilos variam ao longo de Ires pa -rametros principals , de acordo com o 'tenor', o 'modo' e o 'modo

retorico' do texto , para usar a term inolog ia da lingiifstica sis temica

(Ha l l id a y , 1978). Pr im e i ram e nte , o esti lo var ia de acordo com o

tenor, isto e, de acordo com o tipo de relacao que existe entre os

par ticipantes na interacao. Assim, podemos classif icar os esti los

c om termos como 'formal ' , ' informal ' , ' o f i c i a l ' , ' i n l i m o ' , 'casual',

e assim por d ia n te . Em segundo lugar , os esti los variam de acordo

com o modo, isto e, se os textos sa o escritos ou f a lados ou uma

co mb ina ga o dos dois (por exemplo, escr ito-para-ser-fa lado - es-

cri to-como-se-falado, fa lado-como-se-escr ito) . Por tanto , podemos

classificar os estilos como falado, escrito, falado-como-se-escrito,

e assim por diante. Podemos tambem usar termos que em pa r te re-

flelem o modo, mas em parte refletem o tenor, o genero ou o discurso,como 'conversacionaP, 'escrito formal ' , 'escrito in fo rm al ' , ' a ca -

de m i c o ' , ' jornal i 's tico ' , e assim por d i a n t e . Em terceiro lugar . osesti los var iam de acordo com o modo retorico e podem se r classi-

f icados em termos como 'argum entativo ' . 'descritivo' e 'exposi tivo ' .

O ma is a u to no mo dos t ipos d e e le m e nto (a le m do genero) e o

'discurso' (ver Kress (1988); Kress e T h r e a d g o l d (1988), sobre

a re lagao en l re ' genero ' e ' discurso' ) . Os discursos correspondema pro x ima d a men te as dimensoes dos textos, qu e tern sido d iscu t id a s

164 Norman Fairclough

tradicionalmente em lermos de ' con teudo ' , ' s ignificados ideacio-na i s ' , 'topico', ' a ssun lo ' , e assim por d ia u le . H a um a boa razao

para us ar 'discurso' em vez desses tennos tradicionais: ur n discur-

so e urn modo par t i cu la r de construir urn as s un to , e o concei lo di -

Discurso e mudanga social 165

outros nu ma conversa f reqiientemente tentam capturar aspectos d o

estilo, no qu a l as coisas foram ditas, isso e raramente assim na s

reportagens do noticiario. Em lermos mais gerais. a extensao em

que outros textos f iguram em um tex to depende d o genero, assim

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fere d e seus predecessores po r enfat izar qu e esses c onle udos ou

assuntos - areas de conhecimento - somente enlram nos lexfos na

forma mediada de conslrugoes par t iculares do s mesmos. E i i f i l ,

nesse sen t id o , escolher tennos para d i scursos par t i cu la res quedesigiiam nao so a area relevante de conhecimento , m as lambem o

modo particular como el a e cousti tu ida - por exemplo, o ' d i scurso

medico tecnico-cientif ico ' (isto e. a med ic ina como uma area de

conhecimento construida d e u ma perspectiva tecnologica e cient f-

fica, em contraste com os discursos associados as varias medicinas

' a l t e ru a t iva s ' ) - ou os 'discursos femiuistas sobre a s e x u a l i d a d e '

(isto e , a sexua l idade como um a area de conhecimento cons t ru ida

de u m ponto de vista feminista) . Os discursos, uesse sentido, sao

um a preocupacao principal de Foucaul t (ver Capitu lo 2) . Como eu

indiquei anteriormente, os discursos sa o mais aulonomos qiie outros

tipos de elementos. Isto e, embora liaja ainda importantes limitacoes e

regras de compatibilidade entre generos particulares e discursos parti-

culares, um discurso, como o discurso tecnico-cientifico medico, e

comumente associado com uma variedade de generos (artigos c ien -

tificos, conferencias, consultas, e assim por diante) e pode aparecer

er a (odos os tipos de outros generos (conversacao, shows de entre-

vistas informais na televisao, ou mesmo poemas).

Generos particulares sao associados com 'modo s de inter tex -

t ua l idade ' (manifesta) particulares. Por exemplo, a f reqiiencia, os

modos e as fu ngo es de r ep resen ta ga o d o di scurso sao b a s t a n t e

diferentes em u ma reporlagem d o noticiario, em u ma conversa ouem um artigo cienti fico. O s modos e as pra ticas contrastantes de

r e p r e s e n t a c ao d o d i s c u r s o desenvolvem-se em conexao com os

diferentes t ipos de atividade social , d e acordo com as di feren tes

significances e com os valores que o discurso de outros v e n h a a

ter. Por exemplo., nao se espera que um re l a to l i tera l d e u ma con-

versa on mesmo de um t r ibunal seja necessariameiile perfe i to em

palavras, e nquanto u m a citaciio de um artigo cienti fico em umoutro deveria ser . O u a inda , e n q u a n t o as representagoes d a fala d e

como ocorre com as formas de in t e r t e x tua l idade ma n i fes t a que sao

usadas e com os modos nos quais outros textos funcionam dentro

de um texto.

Deixe-me agora tentar ilustrar esse c on jun to de tipos de ele-mentos co m referenda ao exemplo 1 anteriormen te ci tado. O gene-

ro e repor tagem de jornal , e talvez um subgen ero de repor tagem de

tabloide que envolve u m a configuragfio co m diferentes esti los d e

outros subgeneros (veja a seguir). 0 t i po d e a t iv idade es tabele-

ce as posicoes de su j e i to para fo rnecedor (a ) de noticias (u m

i n d i v i d u o f ic t ic io a u t o r ( a ) da repor tagem, dado que essas re -

por tagens sa o produz idas co le t iva men te ) e para receptor(a) do

io rna l (leitor(a)). Isso envolve a segu in te e s t ru tu ra sequen t ia l :

manchetes (duas nesse caso), que dao a ideia principal da materia;

resume (dois paragrafos iniciais) , que dao uma versao l ige iramente

mais completa d a i de i a pr inc ipa l ; elaboracj io (do i s paragra fos

aleni desses); d esenvo lv imen to ( tudo exceto o paragrafo f inal so b

o subtitu lo 'Lucros'), que da mais detalhes da mater ia ; resultado (oparagrafo f inal) , que indica que agao deve se r s e gn ida . (Sobre a

estni tura d e artigos de j o r n a l , ver van Di jk , 1988.) Tambem cabe

notar que a reportagem tern um a es t ru tura de crise-resolu^ao: a

manchete e muito do corpo da reportagem apresentam a crise, en -

quanto o pequeno paragra fo final apresenta a resoluc,ao.A reportagem e bastante complexa em termos de estilo. Co-

mecemos com o modo retorico. que e clar informagao. Mais preci-

samente. o(a) fornecedor(a) de noticias e aqui c ons t ru ido(a) comoa fon te de conhecimento e informac.ao, o(a) le i tor(a) como um(a)

recipiente passivo(a) da mesma, e a reportagem consiste em asser-

goes categoricas autoritarias que os jornais tipicamente fazem sobre os

eveutos, apesar do fato de que tais eveutos sao usualmente de um ca-

rater incerto e abertos a varias interpretac.6es. O que e inleressante

nesse caso e como o modo retorico combimi com d imenso es deesfilo baseadas-no-tenor e baseadas-no-modo. O e sti lo e ve rnac u la rno tenor: como eu suger i an ter io rmente , os escri tores s im ulam a

166 Norman Fairciough

fala popular , como se a relacao entre fornecedores de noticias e

leitores fosse s i m e t r i c a e d o ' m u n d o d a v i d a ' ( n o s e n l i d o d eHa b erma s , 1984). E o estilo e do m o d o fa l a d o e conversational.

Essa configuragao es t i l is t ica parece se r contraditoria, po rqu e o

Discurso e tnudanca social 167

variedade de diferentes t ipos de textos, poderia haver , em pr iucfp io,

um imenso e de fato indeterminavel numero de cadeias intertextuais

en t re eles. E n t r e t a n l o ,o n u m e r o d as cadeias r ea l s e pro va ve lmen te

bas tan te l imi t a d o : as inst i tu icoes e as pra ticas sociais sa o art icula-

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modo retorico estabelece posicoes de suje i to assimetricas e impl ica

formalidade escrita de instituicoes publicas, qu e estao em desacordo

com os elemenlos do estilo informal, conversacional do mundo da

vida . H a u m discurso c u j a presenc,a na re por tage m e p ar f i c u l a r -mente su rp reen d en t e : o que poderiamos chamar um discurso ra il i-

tarizado da cr imin a l id a d e , construfdo por meio da metafora de

cr imino so s ' em gu er ra ' co m a sociedade, e da sociedade t e ndo d e

'mobilizar suas forcas a rma d a s ' pa ra 'combate-Ios'. Nessa repor-

ta gem, e n t re tan to , o discurso e a metafora sao a r t i cu la d o s co m u m

apelo a m obi l i zac ao no sentido li te ra l , para que as forcas armadas

sejam usadas contra os t raficantes de droga, o que leva a uma certa

ambivalencia na frase inicial: esta o The Sun projetando a lgum tipode batalha real aqui?

Intertextualidade e transferma^oes

Praticas par t iculares den tro e por meio d e insti tu icoes tern as -

sociado a elas 'cadeias in ter textuais ' par t iculares , series de t ipos

de textos que sao t r a n s fo rma c io n a lmen t e relacionadas u m a s as ou-

t ras , no sentido de que cada membro das series e t rans form ado em

um outro ou mais, de forma regular e previsivel. (Sobre t ransfor-

m agao , ver Kristeva , 1986a; Hodge e Kress, ]988; e a discussao

sobre l inguis t ica cr it ica no Capi lu lo 1). Essas cadeias sao seqlien-

ciais ou s in tagm at ic as , em c ont ras t e com as relacoes i n t e r t e x t u a i sparadigmaticas , d iscutidas na secao anter ior , sob o t i tu lo d e in te r -discursividade. Especif icar as ca d e ia s in te r tex tu a is nas qua i s en t ra

u m t i p o p a r t i c u l a r d e discurso e urn m o d o d e e s p e c i f i c a r su a

'distribute': re le m bre a discussao a n t e r io r (Capi tu lo 3. i t em

"Pratica d iscursiva") sobre a producao, a dis t r ibu ic ao e o co nsu me

de lextos. Um simples e xe m plo seria a cadeia que liga as co n su l t a s

medicas com regis tros medicos: os medicos ro t i n e i ra men t e t rans -formam as pr im e i ras nos ullimos. Dados o consideravel n u m e r o e a

d a s d e mo d o s pa r t icu la r es , e esse aspecto da e s t ru tu rac ao socia l

l imita o desenvolvimento de cadeias i n t e r t e x t ua i s . (Na verdade, o

e s tudo das cadeias i n t e r t e x t ua i s reais e uma forma de se le r u m a

co mpreensa o dessa dim e ns ao d a es t ru t u ra ca o social.)As cadeias in ter tex tuais podem ser mu i t o complexas - por

exemplo, aque las e m que entra in textos de d ip lom ac ia e ne goc ia -

cao in t e rnac iona l d e armas. U m d iscu r so impo r t a n t e d o pre s ide n te

Gorbachev sera transf ormad o em textos da m i d i a d e varios tipos

em cada pafs do mun do, em reportagens , analises e comentar iospor d iplomatas, em livros e ar t igos academicos, em outros dis c ur -

sos que o para f ras e iam . o e laboram , respondem a ele. e assim por

dian te . Por outro lado, u m a contribuic.ao a uma conversa in fo rma l

provavelmente sera trans form ada somenle em fo rm ulac oe s pelos

co-par t icipantes , e ta lvez em rela tos da mesma por outros. Assim.

os diferentes t ipos de textos var iam rad ic a lm e nte q u a n t o ao tipo deredes d e dis t r ibu igao e ca d e ia s in te r tex tu a is em qu e eles en t r a in ,

e , por tanto , quanto aos t ipos de t rans for rnac ao qu e e les sofrem.Embora aqueles que elaboram um discurso para Gorbachev n a o

possam de modo a lgum antec ipar em de ta lh e os muitos circuitosd e produgao e consume de texto em que ele vai e n t ra r , eles prova-

ve lm e nte te n ta rao elabora-lo de um modo que ari tecipe as respos-

tas dos t ipos pr incipals de a u d ien c ia . T al an te c ipac ao complex a e ,

como eu j a suger i , um a fonte d e h e te roge ne idade e a mb iva lenc ia , e

po d e bem ser que os textos co m cadeias in ter textuais complexas

se jam ma is propensos a essas propr iedades do que outros.As transformacoes entre t ipos de texto em uma cadeia in t e r -

textual podem ser de d iversos t ipos. Elas podem euvolver fo rm as

de i n t e r t ex t u a l id a d e mani fe s t a , como a represe i i tagao de discurso.

Por outro lado, elas podem te r um ca ra t e r mais difuso . O q u e pode

se r in te rp re ta d o co mo eJementos co mu ns pa r t i l ha d o s p or d i fe ren t es

t ipos de texto pode ser m ani fe s tado em d i fe r en tes n iv e i s e d e

fo rm as r a d ica lmen te d i fe ren t es - no voc abula r io em um caso, em

narrat ivas ou met a fo ra s em outro , ou na se legao entre opgoes gra-

168 Norman Fairctough

ma t ica is , ou na forma como o dialogo e organizado. For exemplo,

um a explicate teorica sobre a pratica de sala d e a u la c o labora t iva ,

nao-hierarquica em um livro sobre teoria e duc ac iona l , pode m oldar

principalmente o voc abulario do l ivro, e n q u a n t o a ' m e s m a ' teor i a

Discurso e mudan^a social 169

Esse resume vem na secao de orientac.ao no infcio do artigo e,como outras secoes de orientac.ao na brochura , consiste em asser-goes expl ici tas, categoricas, sobre a pratica d ie negocios que, como

a primeira t'rase nesse exemplo, deve ser um tniismo para a a u d ien -

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pode apresentar-se na pratica real de sala de au la na forma como o

dialogo entre professor(a) e aprendizes e organizado , e na sala dosprofessores (ou em entrevis tas d e pesquisa) em metaforas que o(a)

professor(a)L i s a

parafalar

sobre suas t u rm as e sua re lagao com osaprendizes (por exemplo, os aprend izes t rabalham em 'grupos'.

'times', ou mesmo em ' forcas-tarefa '?) .

V a m os considerar um exemplo real tornado de Fairclough

(1990a). O s discursos de Lord Young como secretario de Estado

Britanico do Comercio e Indust r ia entre 1985 e 1988 foram umelemento principal no desenvolvimento do conceito, das pni ticas e

das politicas da 'cu ltura empresar i a l ' . Foi Lord Young que reno-meou se n depar tamento em "o Depa r ta men to da Empresa". Em

sens discursos, a pa lavra ' empresa ' e su b met id a a um processo deengenharia semantica (discutida em maior detalhe, adiante, no Ca-

pitulo 6, item "Signif icado das palavras") , que envolve a r t i cu la rem volla da pa lavra u m c on j unfo de qua l idade s associadas com a

capacidade emp resarial , como e en tend id a pelos pro po nen tes d a

c u l tu ra empresar i a l . i n c lu in d o a autoconfianc.a e a au to -a juda . Pa-

rece haver um a relacao entre a construgao teorica nesses discursos

de sujei tos empreendedores. 'o eu empreendedor ' e a publ ic idade

exibida pelo Departameuto de Comercio e Indus tria (DTI) sobre a

' i n i c ia t iva empres arial ' de You ng. O que esta contido no voc abula-

rio dos discursos e transformado aqui em um estilo comunicat ivo par-ticular.

U ma brochura do DTI sobre a in icia t iva empresarial conlem

um artigo t ratando especificamente d a ' i n i c i a t i v a d e marketing',

qu e ele resume nestes termos:

A essencia do bom marketing e provcr os scus clientes com

aquilo qu e eles querern. Nao gaslar tempo e dinlieiro fen lant lo

persuadi- los a levar aquilo qu e voce tern. Assim, se voce es(;i

vendendo em casa ou no exterior, e importanle entender u mer-

cado e seus compet idores.

cia de negocios para a qu a l a brochura e dir igida ou , como a se-

gu nd a frase, pode ser ameagadora para alguns negocios. Observe

que e uma frase negativa que pressupoe que algumas fi rmas real-

menle gastam tempo e dinheiro t e n tando persuadir as pessoas alevar o que eles tern para vend er. Portanto, pode-se esperar que os

leitores negociantes achem tais orientacoes i rr i tantes e/ou ins u l -

tantes. Mas eu suspei to que elas serao l idas de forma diferente .

U m a pessoa empreendedora. no sentido de Y o u n g , pode fa lar se m

rodeios e podem falar com ela do mesmo modo; o que essas orienta-

goes estao talvez buscanclo fazer e, ao mesmo tempo, dar ao DTI

u m a ide n t idade empresarial e oferecer u m modelo d e pessoa em -

preendedora e de um compor tamento empreendedor para os ne-

gocios. A natureza do 'e u empreendedor ' figura na o someute no

vocabulario do s discursos, mas tambem no estilo d e escrever ( im pl i -

cando u m estilo de falar) d a b r o c h u r a .

As cadeias in t e r t e x tua i s podem consti tu ir relacoes transforma-

cionais rela t ivamente estabelecidas entre tipos de texto (como na

relac,ao eutre consulta medica e registros medicos, ou as ro t inas

para transformar repor tagens em artigos d e jo rna l ) . M a s elas fre-

qiientemente se tornam l inhas de tensao e mu d a nga , os canais pe-

los quais os t ipos de textos sao colonizados e investidos, e aolongo dos quais as relagoes entre tipos de texto sao contestadas.

Este e o modo de interpre tar as cadeias inter textuais associadas

com a ' c u l tu ra empresa r ia l ' : textos sobre a prevenc ,ao da saiide, a

educagao, os servigos sociais e a mfdia. assim como os textos so-bre a publicidade oficial, como a brochura do DTI, estao senclo

colonizados com signif icados associados a cul tura em presa rial de

centros, como os discursos de Young, e investiclos coin ideologiasda empresa e com estrategias pol i ticas da Nova D irei ta. As l i n ha s e

os canais exislentes nas cadeias m te r le x tua i s estao sendo usados

co m proposi tos estrategicos.

170 Norman Fairclough

Intertextual! dade, coereneia e sujeitos

A i n t e r t e x t u a l i d a d e tern impo r ta n tes implicates para u m a

questao de ioteresse c e n t ra l ne s t e l ivro: a co n s t i t u iga o d e suje i tos

textos contr ibuigao pra t i c as d i s c urs ivas em processo

Discurso e mudan^a social 171

gao dos suje i tos como consu mid ores, e o processo educacional pa -

rece, e n t re ou t ras coisas, es tar e d u c a n d o os(as) le i tores(as) a le rem

amincios. Com o su ger id o a n t e r io rmen t e , e xe m plos desse (ipo sa o

re levantes para a c ons t i tu igao do s grupos sociais e das c o m u n i d a -

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t ransform a c, a o para mu d a n ga s n a i d e n t i d a d e social (ver Kris teva,

1986b; Threa d go ld , 1988, e Talbot, 1992). A i n t e r t e x t ua l i dade

complica su b s t a n c ia lmen t e os processos de in terpretagao t e x t ua ld iscu l id o s an te r io rm e nte ( Cap f t u l o 3, item "Pratica discursiva") ,

pois, para que os textos fagain sent ido. os interpre tes tern de a c h a r

modos d e c om binar os diversos elementos do t e x to em u m todo

coereute, embora nao necessariainente unitario, d e t e rmin a d o o n

n ao am biva le n le . E facil ver is to como s im pie s m e nte um a re a l i za -

cao do s in t e rpre te s , que imp l i c i t a meu t e posiciona os i n t e r p r e t e s

como suje i tos do discurso acima e fora da inlertextualidade , como

capazes d e controlar os processos discurs ivos que sao e xte r io re s a

eles, Tal visao implies suje i tos sociais e dis c urs ivos qu e mister io-

s am e nte pre e xi s t e m as pralicas sociais e dis c urs ivas e om i te a

contr ibuicj io dessas pra t i c as para a c ons t i tu igao d os s u je i tos e p a r a ,sua t ransformagao atraves d o t e m po. A pos igao que eu vou ado ta r

aqu i e que a in t e r t e x tua l idade e as relagoes i n t e r t ex t u a i s c ons tan-

t e m e nte mu t a v e i s no discurso sao centra is para a co mpreensa o dos

processos de const i tuigao do sujeito. Isso e assim em u ma escala de

tempo biografica, duran te a vida de um individuo, e para a c ons t i tu i -

gao e a recons t i tuigao de grupos sociais e c om unidade s .

Kress (1987) oferece u m exemplo qu e su b l in ha a significancia

social d e tais processos discurs ivos . Ele anal isa e xe m plos d e textos

educacionais de varios tipos e sugere que sua constituicao inter tex tual

incorpora elementos partilhados com o discurso da propaganda . Forexemplo, anuncios de firmas de limpeza de casa par ti lham com iivros

dida t i c os p ar a au las de ecouomia domeslica a propr ie dade de d i s -

t r ibui r a age nda D O S processos de l impeza entre o agente hu ma n o -

por implicagiio o(a) l e i to r (a ) do ani inciu ou do l i v ro - e o prod t i l o

(por exemplo. "Ajax l impa sem enxa gu a r " , "f inos pos po d em a b -

sorver h'quidos") , que sugerem, em ambos os casos, que o agente

h u m a n o 'precisa' d o produ to . O s l iv ros d ida t i c os e oul ras fo rma s

de discurso educacional , desse mo d o , co n t r ib u em para a co n s t i t u i -

des, assim como para a socializagao dos i n d iv id u o s ; t a i s pra t i c as

discursivas s im ul tane am e nte ge ram um a v i s ao (c ons um is ta ) d o

m u n d o e u ma c o m u n i d a d e (d e consumidores) associada co m (a !

visao. Isso esta de acordo com uma visao do t rabalho ideologico dodiscurso, s i mul t ane ame nt e gerando represent agoes e organizando as

pessoas em com unid ades (ver Debray, 1981; Ma in gu en ea u , 1987: 42).

O conceito de 'coerencia' e o c e n t ro d e m ui tas e xpl ic agoe s

sobre a i n t e rp re t a ca o . Como ja i n d iqu e i , a coerencia nao e uma

propr ie dade d os textos , ma s u ma propr ie dade que os i n t e r p r e t e s

impoem aos textos , e diferenles in lerpretes ( Jnc l u i ndo o(a) produ-

tor(a) d o texto) po ss ive lmen te geram diferentes le i turas coerentes

do mesmo texto. T a m b e m a coerencia nao d e v e r i a se r en t en d id a

e m um s e n t ido abs o lu to , logico: um texto coerente es ta l igado su -

f i c i en t emen t e be m para propositos presentes no que concerne ao s

interpre tes , o que nao evita indeterminagoes e a mb iv a len c ia .

No Capf tu lo 3 , usei um e xe m plo para i l u s t r a r a de pe nde nc ia

da coerencia d e s upos igoe s que os interpre tes trazem p a r a o pro-

cesso de i n t e rp re t a ga o , i n c lu in d o suposigoes de n a t u rez a i d eo lo g i -

ca . "Ela esta de ixando o emprego na proxima quar ta-fe i ra. Ela esta

gravida", por exemplo, fa z s e n t ido com a suposigao de que as

m u l h e r e s cessam d e t r a b a l h a r q u a n d o tern (o u estao e s p e r a n d o )

f i Jh os . Suger i t am be m que os produ tore s i n t e rpe la m os s u je i los

in terpretes que sao 'capazes' d e desenvolver re levantes suposigoes

e d e fazer as conexoes que pro d u z em l e i t u ra s coerentes . Essa visao

da coerencia e de seu pape l na in t e rpe lac ao ideologica p o d e se restendida para lomar em considera ao a iutertextualidade. Os tex-

to s postulam suje i tos interpre tes e i mp l i c i t ame nt e estabelecem po-

sigoes i n t e rp re t a l i v a s para e les que sfio 'capazes' de us ar

suposigoes de sua experiencm anter ior , para fazer conexoes entre

os diversos e lementos in tertextuais de um texto e gerar inlerpre tagoes

coerenles. Nao se d e v e e n t e n d e r co m isso que os i n t e rp re t es sem-

pre resolvem p l e n a m e n l e as contradigoes d os textos ; os in t e rpre te s

pode m ge rar i n t e rp re t a go es res is tentes{veja ad i an t e ) , e e po ss ive l .

172 Norman Fairclough

para os interpretes, chegar a uma reconciliagao parcial ou a n m a

resolugao das contradigoes qu e seja adequada para sens proposi tosimediatos. Mas, na inedida em que os in terpretes resolvem as con-

tradigoes interpre tat ivamente , eles estao, eles proprios, tambem

Discurso e mudan^a social 173

para eles no s textos. Mas nem todos os in te rp re tes s f x o submissos:

alguns sao resistentes em uma extensao maior ou menor, e ma is ou

menos expl ici tamente. Os in terpretes sao, e claro, m a i s do que su-

je i tos do discurso em processes de discurso par t iculares; eles sa o

tambem su je i to s sociais, co m exper iencias sociais par t i c u la re s

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sendo posicionados (ou t end o posigoes existentes reforgadas) pelostextos como su je i to s complexos.

A s in te rp re ta go es coeren tes dos d iver so s e lemen to s i n l e r -

t e x t u a i s d e u m texto sao geradas s imu l ta nea men te por suas var iasdimensoes de signif icado, ideacioual e interpessoal (o u l t imo des-

membrand o-se nos signi t' icados relacional e identi tar io: ver C a pf-

t u lo 3, item "Discurso"). Por exemplo, tan to o exemplo 1 como o

exemplo 2 tern complexes signit'icados relacionais associados co m

os modos pelos quais eles m esclam esti los e generos heterogeneos .

Sao os in terpretes qu e encontram formas aceitaveis de u n i r esses

diversos signit ' icados relacionais . N o caso do e x e m p l o 1 , u n i r

significados relacionais e uma ques tao de tornar compativel , de umlado, a relagao entre a fonte e o provedor de informagao e um reci-

piente passivo da informagao, e, de outro lado, a relagao entre co -

meinbros do mu nd o da vida eo mu m. No caso do exemplo 2. e a re-

lagao anunciador(a) - consumidor(a) e a relagao entre ins t i tuigao,

como fornecedora de regra, e membro do publico, como su jei lo (por

exemplo. banco e cliente) , qu e precisam se r nnidas . U m exemplo

de texto co m signif icados ident icos complexes e a en t r ev is ta de

radio com Margaret Thatcher que eu analisei em Fairclough (1989a).

U m a posigao de su je i to complexa para o(a) leitor(a) e const i tufda

po r meio de uma grande var ie dade de elementos ( inc lu indo os pa-

tr io tas bri tanicos, a dona de casa cuidadosa, os pais preocupados,

os empresarios), e cabe no va men te ao s in terpretes u n i r essas i d e n -

tidades contraditorias em um conjunto coerente. Hall (1988) forneceum a explicacao sobre o discurso de Thatcher em termos similares,

o conceito de ' condensagao ' em Laclau (1977) t rata do processo

de unir interpre tal ivamente os elementos em termos de seus efeitos

ideologicos, e ambos e n c a i x a m essas ques toes em uma t eo r ia de

hegemonia . 0 que esta fal taudo em suas expl icagoes, enlretanto , ea especif icidade do s textos reals.

O que eu disse at e agora im pl ic a in te rp re tes que sao s ubm is -

sos, no sentido de se a ju s ta r em as posigoes qu e s f u > estabelecidas

acumuladas e com recursos orientados var iavelmeute para mu l t i -

plus dimensoes da vida socia l , e essas va r ia ve is afe tam os modos

como va o interpre tar textos par t iculares. Outras var iaveis sao osprotocolos interpreta tivos pa r t icu la r es qu e estao dispom'veis e aos

quais eles recorrem. no domfnio par t icu lar da pra tica d i scursiva: a

capacidade para l e i t u ra crft ica, po r exemplo , na o e distribui 'da

igualmente e n l re todos os inierpre tes em todos os contextos inter-

preta tivos.Lei turas resistentes podem desarticular, em diferentes g ra u s , a

art iculagao intertextual de um texto . Por exemplo, um(a) in terprete

pode reagir contra os elementos do aniincio no exemplo 2, lendo-os

em termos do cartao Barclay " ten tando me vend er a lgu ma coisa".

Como par te desse processo, o(a) in terprete acrescenta mais um a

dimensao de i n t e r t ex t u a l id a d e ao texto , ao trazer oufros textos parasustentar sua in terpretacao - nesse caso, anal ises sociologicas ou

criticas polil icas do consumismo. As in te rp re ta go es r es i s ten tes sa o

um modo d e lu t a hegemo n ica qu a n t o a ar t iculagao dos e le m e nfos

in ter textuais . Embora e]as t ipicainente levem a processos de pro-

d u ga o tex tu a l que pro jetam a l u t a hegemonica em fo rma s ma is

explfc i tas , isso nem sempre ocorre, e e im por tan te levar em consi-

deragao as formas pelas qu a is os in terpretes in lerpretam os textos,

para que se possa avaliar adequadameii te sua el'icacia pol f t ica e

ideologica. (Re lemhre m inh a critica a lingiifslica crftica em te rmo s

semelhantes no Capi tulo 1, mas veja o uso do conceito de 'leito-res/leituras resistentes' em Kress (1988).)

C a p f t u l o 5

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Anal ise t ex tua l : a con s t ru ^ao das

relates socials e do 'eiT*

Os capitulos 5 e 6 focalizam a analise textual e 'microaspeclos'associados da pra tica d iscursiva , desenvolvendo muito selet iva-raen te as categor ias analnt icas in t ro d u z id a s n o Ca pi tu lo 3 (com

excegao d a in t e r t e x tua l idade , da qual tra ta o Capitu lo 4) : vocahu-lario, gramatica , coesao, estru tura textual, forca e coerencia. A c l i -

t'erenca entre os capitulos 5 e 6 e de enfase. O Capitu lo 5 concentra-seprincipalmente nas propriedades analfticas de textos que sao ligadas

pa r t i cu la rmen t e a fungao in terpessoal da l inguagem e aos s ignif i-cados interpessoais , e n q u a n l o o Capi tu lo 6 t r a ta p r inc ipa lmen te d e

aspectos da analise textual que sao l igados par ticularmente a f u n -

^ao ideacional e aos siguificados ideacionais.Suger i , no Ca p i tu lo 3 , qu e a f u n g a o in te rpesso a l po d ia ser

d iv id id a e m duas fu n d o es componentes, as quais chamei fu n ^o es

' relacional ' e de ' id en t id a d e ' . Estas eslao ligadas as form as comoas relates sociais sao exercidas e as ide n t idade s sociais sa o m a n i -festadas no discurso, mas tambem, naturalmente, a como as relacoes

sociais e as idenfidacles siio construidas (reproduzidas, contestadase r ees t ru lu ra d a s) no discurso. Quero focalizar, neste ca p i t u io . a

construcao d e identidades socia is, ou a conslrugao d o 'e n 1 no dis-curso, e , mais pa r t icu la rmen te , as formas em que o discurso con-

t r ibui para processos de m udan^ a c u l t u r a l , em c j u e as i d e n t i d a d e ssociais on os 'eus' associados a d o min io s e a ins t i tuigoes especif i-

Tradu^ao de I z ab e l M aga l i i ae s . Josenia V i e i ra , Car la R os a ne Zor io e J a n a f n n

Sa ra i v a d e A q u i n o .

176 Norman Fairclough

cas sao redefin idos e recons t i tufdos . Quero en f a t i za r esse ponto e mespecial, por se tratar de u m aspecto discursivo de mudanc,a cu l tu ra l

e social muito importante; um aspecto, porein, qu e tern recebido at ereceiiteraente rnenos atengao do que merece na aniilise de discurso.

Abordarei as seguintes propr iedades analf t icas d o t ex t o : o

Discurso e rnuda nca so c ia l 177

Doutor:Pacien te :

D :

5 P: II

H um hum.. .Bern, o que voce quer clizer com estomago azedo?

O que e eslornago azedo? U m a que imayfio

_ como uma qu e ima^ ao ou um a coisa [assimArdea qui?

Eco - eu acho - euacho quee como - Se o senhor pegar um aS i m ;

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controle in teracional ( i nc l u i ndo a tomada de t u rn o , a est ru tura detroca, o controle de topicos, o c ont ro le de age ndas , a formulac,ao).a modalidade, a polidez e o ethos. Em termos das categories anal f-

ticas do Capftulo 3, o contro le interacional e um a dimensao da est rutu-

ra textual, a modal idade , um a dimensao da gramatica (embora se ja

u ma concepcao de gramatica m u i t o orientada para o signi t ' Jcado,

como a de Ha l l i d a y , 1985) e a polidez, um aspecto que d e n o m i n c i

' forga*. O ethos t r a n scen d e as categorias , como explicare i logo aseguir, e e m ot ivado pelo foco no 'eu'. A se le^a o desses lopicosparticulars para discussao nao e arbitraria: cada um deles e uma rica

base para a percepc/io do s aspectos sociais cui turalmente significantesde mudanc.a na s fungoes relational e de ident idade do discurso.

Como no Cap i t u l o 4, comegare i com a discussao de exemplos

part iculares de discurso. Dois dos exemplos sao t i rados do nie s m o

t ipo amplo de discurso, entrevistas m e dic as , p o r q u e elas most ra mformas coatras tantes como as relacoes meclico(a)-paciente e aide n t idade do(a) m e dic o(a) - 'o eu medico' — sao c ons t ru idas na

sociedade contemporanea. 0 te rce iro exemplo e t i rado de conversa

i n fo r mal e foi i nc l u fdo para ressal tar outro co n t ra s t e e n t re os dois

primeiros , o que uo s leva de volta a o u l t i m o capftulo: as dit'erenc,asnos modos de intertextualidade.

Exemplo 1 : Entrevista niedica 'padrao'

M en pr im e i ro e xe m plo e um e xt ra to de um a entrevis ta e n t r eum m e dic o e um a pa c ien t e , que l ire i de um es tu do de M i shier(1984) sobre entrevis las medicas gravadas nos E U A . Os s i l e nc ios

sa o marcados por s e que nc ias de pontos, c ada um re pre s e n tando um

d ec imo d e segu nd o , dois pon tos m arc am pro long am e n to de um a

silaba; as inlerrup^oes e as sobreposi^oes sa o marcadas po r colchetes;o material entre parenteses e i'ala ininteligfvel. Os numerais roma-

nos d iv id em o e xt ra to e m 'ciclos', co r r espo nd end o gros s e i ram e nleas t rocas d o s is tema de S i nc l a i r e C o u l t ha rd (ver Cap f t u l o 1) .

D :

10 D:

P:

P:

20 D:

P:

D:

25 P:

D:

P:

30

Ill

a g u l h a e e spe t a r [ be m a q u i [....dot be m a q u i

I H u m h u m [limn h u m

e e af vai d a q u i nesse l ad o at e esse outro la do .

H um hum A dor [ vai al e as costas?I.E so : a q u i . Nao e so

[aqui na frente .

[Sim E q u a n d o voce sente isso?

H u m h u m

D:

P; IV

J5 |_ Bern: q u a n d o eu c o m o uma c o i sa e r rada .

D: ,,n- Q u a n t o - q u a n t oV

Vtempo depois q u e voce come?

.Bern:

. . . .provavelmente um a hora. . . . ta lvez [menos

Mais ou menos uma hora?

Tal ve z m e no s Fi z boba g em e vol te i

a beber, o que eu nao devia ter f'eito.

r— rA bebida faz piorar?[(...) ah ah si m

V I I—.. . .Espec ialmente a f e r me n tac ao e o a lcoo l .

H um h um Q ua nta s doses voce bebe?

VII

vir

D:

P:

D: VII"35 P:

D:

i Na o sei . ..O suf ic ien te pra me fazer

! dormir a n o i t e e isso e m u i l o .

U ma ou d u a s doses po r c i i a ?

(nia is de ) de z . f...a n o i t e .

All: nao nao n;lo e

i Q u a n t a s doses - pornoi te .A no i t e .

178 Norman Falrclough

P:

40 D:V I I I

_....o queque - Que ip o debebida? EL I [(...)-

L Ah vodca

..e vodca e ginger ale.

P IX

Ha quanTo tempo voce lem hebido tanto assim?

Descie que en rue casei.

Discurso e mudanca social 179

O medico, entao, controla f irmemente a organizagao basica dain leragao, abr indo e fechando cada ciclo e ac e i ta n do/recon hecen do

as respostas da paciente. U m corolario disso e que o med ico esteja

controlando o sistema de turnos conversacionais, a forma como os

turnos sao distribuidos entre os participates na iuteragao (sobre

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D : IX'

45 P:

...Ha quanto tempo?

(riso..) Quatro anos. (riso)

Comegarei focaJizando u m leque do que c h am are i 'caracten's-l icas de controle in t e rac iona l ' , qu e , em l inhas gerais, estao l igados

a ga ra n t ia de que a inlerac.ao f u u c i o n e r e g u l a r m e n t e n u m n i v e l

organizacional : c|ue os lurnos ua conversa^ao sejam dis tr ibuidosregu la rmen le , que os topicos sejam escolhidos e mudados , per-

guntas sejam respondidas, e assim p or d ian te.

Ur n po n to de par t ida obvio e a forma como a interagao e orga-

nizada em torno de perguntas do medico, que sao respondid as pela

paciente. A transcricao incorpora a ana l i s e de M ishie r dos dadosem nove ciclos, cada u rn i n i c i a d o po r u ma p e r g u n t a d o med ico .A divisao dos ciclos V , V ll e IX (o u l t imo dos q u a i s eu reduzi) em

subciclos mostra que eles envolvem tambem perguntas 'seqiiencia is '

do medico e solicitam um a elaboragao d as respostas da pa c ien le .

Em alguns casos (linhas 10, 13 e 27), a pergunta do medico e pre-cedida por ur n elemento c j u e reconhece e xpl ic i t am e nte ou aceita a

resposta anter ior da pa c ien te . V ou chama-la de aceitac.ao. Mesmoq u a n d o el a esta ausen te, o t 'alo de que o medico procede a pe rgim la

segiiin te, em vez de fazer uma pergunta seqiiencial, pode ser tornado

como aceitac.ao imp licit a d a resposta anter ior da paciente. Eis a

razao para as perguntas do medico serem mostradas entre os ci -clos: elas terminam um ciclo, ac e i t ando imp l i c i t a men t e as respos-

tas da paciente, be m como iuiciando o proximo. Podemos dizer ,

por tan to , de acordo co m M ishle r , qu e esses ciclos tern um a estru-

(ura basica em tres par tes: uma perg unta do medico, um a respostada paciente e uma aceitagao implfc i ta ou exp l i c i t a da resposta por

pa r te d o medico.

(linger ale e lima bebida nao-atcoulica, condimenttula com gengihre (N. daT.).

tomada de turuo, ve r Sacks, Schegloff e Jefferson, .1974; Schenkein.

1978). A paciente apenas toma o t u rno quando esta possib iiidade

Ih e e oferecida pelo medico, ou seja, q u a u d o o med ico Ih e d ir ige

um a pergunta . O medico, por outro lado, na p recebe a ofer ta deturnos, antes os toma, assim que a paciente tenba conclufdo sua

resposta, ou q u a n d o ele decide que a paciente j a disse o bastante

para os seus proposi tos (ver a seguir).U m outro corolario dessa orgauizagao basica esta re lac ionado

ao 'controle de topicos'. E pr inc ipa lm e nte o medico qu e i n t ro d u z

novos topicos por meio de suas perguntas, por exemplo, quando

m u d a nas linhas 1-13, do que se entende por ' qu e ima ga o ' pa ra

onde 'arde', para saber se a dor 'va i ate as costas', pa ra qu a nd o a

paciente sente a dor. Note-se, entre tanto, que a paciente in l roduz

um topico nas linhas 21-22 - bebida - que o medico retoma nalinha 24. Vollarei a essa excegao mais a seguir .

A forma seletiva como o medico considera as respostas da pa-

ciente para perguntas anter iores e um outro aspecto de seu controle

de topicos. Po r exemplo, na sequencia nas l inha s 21-24, a qu a l

acabo de me referir, a paciente reconhece te r agido errado ao beber,

mas o medico nao explora essa admissao. El e parece preocupado

apenas com o efeito do alcool sobre a condi§ao medica da pacienle.

Da raesma fo rma , as respostas da paciente nas l inhas 29-30 e 42

s ina l i zam problemas da par te da paciente que o med ico ignora em

favor da minuciosa delalhagao medica. Tem-se a sensacao de queo medico muda e restr inge o topico. de acordo com uma a gend a

preestabelecida que nao e pe rm i t ido a paciente pe r tu rbar .

U m outro aspecto do controle do medico e a na tu rez a da s per-

guntas que ele faz . A s pergu n ta s nao sao aber tas , dando o 'piso' a

paciente (como seria "Diga -me como voce esta"), m as perguntasmais ou menos fechadas que estabelecem limiles re la t ivam e nte

estreitos para o co n teu d o das resposlas da paciente. Algumas sa ope rguntas d e tipo ' s im/nao ' que requerem u m 'sim' ou um 'nao'.

L

3.80 Norman Fairclough

confirmando ou ne gando uma proposigiio (por exemplo , "Arde

aqui?"). Outras sa o perguntas que comecam com 'o q u e ' , ' q u a n d o ? '

e 'como?', qu e extraem deta lhes especificos rela t ivos ao m o m e n l o ,

a cjiianlidade e ao tipo de bebida.

E t a m b e m ins trut ivo observar de perto a relagao en t re as per-

Discurso e mudanfa social 181

na men to (e ' a f in idade ' ) entre a o(a) produtor(a) e outros part ici -

pantes do discurso. N as linhas 2-3, por exemplo, a paciente def ine

um 'estomago azedo* como "uma queimagao como um a qu e ima -

ga o ou uma coisa assim". A paciente primeiro o d ef in e como um

t e rmo d a medicina popular e depois se distancia da def inicao, re -

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guntas do medico e as respostas da paciente. Na l i n ha 4. o medico

inicia a pergunta antes mesmo que a paciente tenha t e rmina d o de

fa lar , e ha a f um a superposic,ao. D a mesma forma, uas l i n ha s 20 e34, embora nesses casos haja L i m a pausa no t u rno da paciente c|iie

o medico ta lvez in terprete como um ind ic ador de co mple tu d e . Em

outros casos, o turno do medico segue imediatamente ao da pacientesem pausa , seja co m u ma avaliacao seguida im e dia lam e nte por

uma pergunta ( l inhas 10 e 13), seja a pena s com uma p e r g u n l a

(linha 16). 0 modelo e diferente na l inha 23 por razees sugeridas aseguir. Isso reforca a impressao de que o medico esta t raba lh ando

com uma agenda ou rotina preestabelecida. m u d a u d o de um estagio

a outro, tao logo t en ha o que considera como informagao suf ic iente .

mesmo que isso signifique u m corte no t u r n o da paciente. Obser-

v a d a do ponto de vista c fa paciente. essa rotina pode se configurarn u m a serie de perguntas imprevisfveis e desconexas , qu e ta lvez

seja a razao pela qu a l as respostas da paciente. em contraste com

as perguntas do medico na primeira par te do extra to , sao precedi-

da s de hesi tagoes (linhas 15, 18, 29 e 42).

O quadro geral, e n tao , no que se refere as caracteristicas de

controle interacional, e q u e , po r meio dos ciclos pergunta-respos-

ta-aval iagao. o medico segue u m a ' agenda ' preeslabelecida. de

acordo com a qual ele controla a to ma d a , o co n teu d o e a duragao

do s turnos da paciente e a introdugao e a mudanca do s topicos. Acres-

centarei, agora, breves comentarios sobre tres onlros aspectos doexemplo que serao tra lados com m ais deta lhes neste capflu lo : m o-

dalidade, pol idez e elhos.

A modalidade t rata da re lagao enfre os produtores e as propo-

sigoes. do comprometimento ou, inve rs am e nte , d o d i s t a n c ia men t o

e n t re produtores e proposigoes: scu grau de ' a f i m d a d e ' co m elas,

como Hodge e Kress (1988) denominam. Como Hodge e Kressressa ltam, entre tanlo, a af i n i dade que urn(a) produtor(a) demonstra

em relaciio a uma representagao de m u n d o e inseparavel do relacio-

baixando-a a uma s imi le ('como' uma queimagao) e, em seguida ,

distancia-se ainda mais, modalizando-a (Brown e Levinson, 1978)

com "ou uma coisa assim". Esta e uma modalidade d e ba ixa af in i-dade. Mas e dificil desembaracar fatores de verdade prepositional

e de relacoes sociais na motivagao da paciente: ela escolhe a mo-

dalidade baixa porque nao tern certeza da acuidade da definiciio,

ou porque relu ta em reivindicar qu a lqu er coisa parecida com o co-

nhec imen to med ico , em u ma interagao com um especialista legiti-

mado na area medica? Verdade proposicional e relagoes sociais,

conhecimento e poder parecem estar in tr incadamente l igados em

tais casos.

Vamos t ra tar agora da polidez. A paciente in t roduz o presu-

mivelmente d if icil e potencia lmente embaragoso assunto da bebicla

nas linhas 2 (-22, como um acrescimo a resposta a uma das per-

guntas do medico. Segundo Mishler (1984: 86), neste m o m e n t o el afa z su a revelacjo em u m torn ' p rovocante ' , 'coquete' ou ' i n f an t i ! ' ,

que pode se r in terpretado como um a forma de mitigar a ameaga a

sua auto-estima, a sua 'face' (ver Brown e Levinson, 1978, e a

segao sobre polidez no final deste capitu lo) . Em contraste , as per-

guntas do medico em relagao a bebida da paciente sao sem mitiga-

gao, diretas e ate crueis ( l inha 41): el e ' fo rmu la ' a situagao da

paciente como consumidora de 'bebidas fortes' se m diplomacia ou

mitigagao (ver o item "Formulagao" neste capitulo). A s pergu n ta s

do medico sa o fracas em polidez, usando o termo no sentido ampleem que e usado na l i t e ratura pragmiitica (por exemplo, Leech,

1983; Brown e Levinson, 1978), para orientagao e sensibilidade

em relagao a 'face' dos participates, a sua auto-estima, pr ivacida-

de e autonomia.

A ausencia de polidez pode se r associada ao concei to ma is ge -

ra l de ethos - como o comportamento to ta l de um(a) part ic ipante ,

do q u a l se n estilo verbal (falado e escrito) e torn de vo z fazem

parte, expressa o tipo de pessoa qu e e-le(a) e e sinaliza su a idenli-

182 Norman Fairclough

dade social, be m como su a subjetividade (M a ingu enea u , 1987:31 -

35). O s medicos na pratica medica padrao manifestam o que se

poderia chamar um ethos cientifico (a medicina moderna se orgu-Ih a de ser 'ciencia medica' ) , o que e realizado variavelmente naforma como tocam e olham os pacientes ao examina-los, na ma nei -

Discurso e mudanca social 183

42 ("Desde que eu me casei") e vice-versa em 44 ("Ha qu a n to

tempo?") . A paciente continua o turno iniciado na l inh a 45* comuma longa explicagao de por que el a precisa de alcool e por queusa alcool , em vez de apenas pilu las , o que e no va men te seguido

po r uma p e r g u n t a do medico ("Quando voce as toma?", i sto e. as

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ra como f i l t ram as contributes dos pacien tes em termos de to -

picos e na ausencia de genlilezas de siguif icado interpessoal ,

coino a pol idez, o que sugeriria um a orientagao para os pacientescomo pessoas, ao conlrario de uma orientac.ao cieiitffica para ospacientes como casos (ver Emerson (1970) para um estudo de exames

ginecologicos seguindo essas linhas, e Fairclough (1989a: 59-62) paradiscussao do estudo).

A anal ise do exemplo 1 (em sido at e aqui unilateral em seufoco sobre o controle da inleragao do medico. Mishler observa qu eha formas de se anal isar a entrevis ta que sao mais orientadas para a

perspectiva do paciente. Tais formas de anal ise mostram-se tam-

be m mais interessanles em termos da inter textual idade. Ja me referi

a ev idencia de um desencontro entre a perspectiva do medico e a

perspectiva da experiencia comum na m ane i ra como o medicof i l t ra partes dos turnos da paciente que. para ele, saem do topico.

Enqu a n to o medico consistentemente manifesta a voz da med ic iu a ,

as contribuigoes da paciente mesclam a voz da medic ina com a vozdo 'mundo da vida' ou da experiencia comum (esses termos sao de

Mishler, seguindo Habermas). A analise alteniativa sugerida por

Mishler enfoca a clialetica, o conflito e a lu ta na interagao entre

essas dua s vozes. Isso sugere uma forma de estender o que eu disse

ate agora sobre inter te xtual idad e, para permiti r a possibi l idade, no

dialogo explicito, de uma relagao in ter textual en tre diferentes vo -

zes, trazidas a interagao por d i feren tes par t i c ipan tes .Toraada nesses termos, a interagao se mostra bem mais fragmen -

tada e mu ito menos orden ada do que se a considerannos como umama nifes ta ga o do contro l e do medico . A s vozes da m e d i c i n a (M )e d o m u n d o d a v i d a (V ) in t e r rompem-se m u t u a m e n t e r e p e t i d a svezes: V in terrompe M na l inha 21 (em "fiz bobagem"), M in ter-rorape V na linha 24 ("A bebida faz piorar?"), V interrompe M nal inha 29 ("0 suf ic iente para me t'azer dormir") e vice-versa na li-nha 31 ("uma ou duas doses por dia?") , V in ter rom pe M na l inh a

pilulas?) . Nessa parte da en trev i s ta , M e V estao em contes tagao .O medico us a repet idamenle o seu controle de pergu n ta s para rea-

firmar M. Todavia, as repetidas incursoes de V parecem pe r tu rbar

a agenda do medico: notem-se as hesitagoes qu e comegam a apare-ce r antes da s perguntas do medico ( l inhas 23-24, 27. 37. 41 e 44).

Enquauto o medico raram ent e recorre a V, a paciente usa M exten-sivamente, acomodando-se mais ao medico nesse sentido do quevice-versa. A s vozes, ev idente men te, contrastam em seu conteudo :M corporifica a racionalidade lecnologica que t rata a doenga emtermos de grupos de sintomas fisicos livres de contexto. e n q u a n t o

V corpori fica a racional idade de *senso c om um ' qu e s i tua a doengano contexto de outros aspectos da vida da paciente. M ishler assinala(1984: 122) que o contraste parece corresponder a distincao fei ta

po r Schutz (1962) entre a ' a t i t ude cienti fica ' e a 'a ti tude na tura l ' .Tan to a analise em termos do controle da interagao pelo medico

quanto a analise feita em termos de uma clialetica de vozes sa o for-mas de ad quirir-se percepgao sobre a pratica medica padra o em umnivel microanalitico e sobre a medicina como um modo tie profis-sionalismo. Entretanto, a medicina, assim como outras profissoes,

tern sofrido dramaticas m u d a n g a sna sociedade contemporanea. Tal-vez a maior contribuigao que a analise de discurso possa da r seja

foraecer um meio para investigar-se o peso dessas mudangas, napratica, na maneira como m edicos e pacientes realmente interagem.

Exemplo 2: Entrevista medica a l terna t iva

M eu segundo exemplo pretende abordar tais tendencias demu d a nga na pratica medica. E tambem um a entrevista medica, era-

bora de tipo radicalmenle d iferente. Pequenas pausas sao marcadasco m pontos; pausas longas com travessoes; coichetes mostram su -perposigao; e mat erial obscuro ve m e n t r e parenteses.

Essa parte n ao foi i n c l u i c l a no exemplo. (N. da T.)

184 N o r m a n Fairclough

Paciente : mas ela realmente tein sido mu i to i n j u s t a comigo. [ nan tern

D o u t o r : [ h u m

P: respeito p er min i Fe en ac ho q u e uina da s razoes

D : [ h u m

5 P: p e l a s q u a i s [ e u b e b i a [ t an to sabe - e [ a h n

D : [ h u m [ h u m h u m [ h u m voce

Discurso e mudanca social 185

co encontradas no exemplo 1. bem como da discrepancia manifest a

e do confli to entre vozes d iferen tes.

A diferenga mais marcante entre os dois exemplos em lennos

de caracteristicas de controle interacional e que o ciclo pergunta-

resposta-avaliagao esta ausente no exemplo 2, que se e s t ru tu ra em

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voltau voce voltou voce vo l tou a b e b e r

[ n o v a m e n t e

P: [na o

10 D: ah voce na o vo l tou (o tio [...)P: [nao. mas ah u m a coisa que a

senhora me disse na te r^a-fe ira f o i que . Se m i n l i a ma e

m e mandasse embora de [casa o que el a acha que

D : [sim h um

15 P: pode acontecer. que. el a na o gosta du je i to qu e ten ho me

comportado ela ja me [expulsou [ antes e ah. Ela disse que .

D : L hu m [ hu m

P: ela achava que eu p odia que seria possfvel eu ir para

[ um a p a r ta mento 2 d a p re f e i t u ra

20 D: [certo . sim [sim

P : [mas el a dis s e que e m u i t o ah

qu e n ao estava [forc.ando p orque . m i n h a

D : [humP: m ae tern d e as s in ar um monte [de [coisase

2 5 D : [ h u m [ h u m

P: e:. el a disse que e d i f f c i l [e ah. nao te m

D : [hum

P: pressa. eu nao sei se. que r diz er uma coisa que eles dizem

et n AA3

e que voce nao devia m u d a r na da . d u r an te um a no

30 D: hum

D: hum s i m acho acho que e sensato . acho que e sensato

(p a us a de 5 segundos) bem olhe eu gostaria d e c o n t i n u a r

s a be me encont ra ndo com voce c o n t i n u a r . sabe o t iv in d o

como as coisas vao i n d o de vez em q ua nd o s e f o r possfvel

O medico, neste caso , per tence a urn grupo m inor i t a r io do

Servico Nacional de Saude Bri tanico, que e aber to a m e dic ina 'a l -

t e rna l iva ' (como homeopatia) , e a um tra tamenlo 'holrstico ' da

pessoa, o que combina com o us o de tecnicas de a co nse lha men to .

Este exemplo carece das estru turas explfcitas de controle do m e d i -

Mora dia p o p u l a r a d m i u i s t ra d a p e la p re f e i t u ra local (N. da T.).

A l c o o l i c o s A n o n i m o s .

torno de um prolongado rela to da paciente, com f reqiientes mani -

festates de atengao do medico na fo rma de respostas minimas

( ' h u m ' , 'nao', 'sim', *certo')5 fazendo uma pergunta que esta liga-da topicamente com o relato da paciente ( l inhas 6-7), f aze ndo

um a avaliacao nao das respostas da paciente as perguntas, como no

exemplo 1. mas de um mo d o de proceder recomendado por um

t e r ce i ro p a r t i c i p a n t e (l inha 31), e s uge r inc lo o u t r a en t r ev is ta

( l i n h a s 32-33).

A seqi iencia de turnos e organizada de maneira cohiborativa ,

em vez de ser assimetricamente c ont ro lada pelo medico. H a evi-

dencias da natureza negociada da dis tribuigao de turnos na per-

gunta do medico (linhas 6—7), que e ar t icula da de forma rap ida e

suave como um aparte, mo st ra n d o a sens ib i l id a d e do medico a ma-

neira como ele se ' i n t romete ' no 'piso' da pa c ien te . A pergu n ta etratada assim pela pa c ien te , que a r espo nd e d e fo rma b reve e

imed ia ta men te r e to ma se n rela to . Ha m ais evidencia na longa pau-sa do medico na l inha 30 , depois de su a avaliacjio, que parece estar

tornando o 'piso' novamente d isponivel para que a pacienle conti-

nu e se n rela to se desejar , antes que o med ico prossiga para o f i m

da entrevis ta .

0 controle sobre a m trodugao e a m u d a n g a de topicos, que foi

exercido pr incipalmente pelo medico no exemplo 1. e aqui exerci-do pela paciente. O modo de desenvolvimento do topico e o de

conversacao e do m u n d o da v id a : a paciente ' conversa to p ica men-

te' sem se prender a um topico unico, m as percorrendo uma seriede topicos inter ligados - a injus t ica de sua ma e. seu h ab l to de be-

b e r , a l terna t ivas po ss fve is a v i v e r com a mae, e a ss im por d i a n -te . Dessa forma, ela elabora a fala d e forma bastante relevante

pelos padroes conversacionais, mas provavelraente ir relev ante para

os padroes medicos na perspectiva da med ic ina convencional . Du-

rante todo o exemplo, as manifeslagoes de atencao do med ico im -pl ic am acei tagao desse modo conversacional de d e s e n v o l v i m e n t o

do topico.

186

Norman Fairclough

Porem, nao se pode simplesmenle concluir que o medico esta

concedendo todo o controle interacional a paciente. Note-se que a

iniciativa de ceder uma parte do controle ao s pa c ien les em entre-

vis tas medicas desse t ipo vem invar iavelmente dos medicos, o que

sugere qu e eles ainda exercem controle, em cerlos nfveis . mesmo

Discurso e mudan^a social 187

da vida: os medicos, uesse t ipo de entrevis ta medica , parecem re-

j e i f a r o elitismo, a fo rm al idade e a dis t anc ia da f igura do cient is ta

medico em favor de uma (freqiientemente simulada) pessoa am ave l

e co mu m, ur n 'bom ouv in te ' . Jsso esta de acordo com as rn.udanc.as

gerais uos valores cu ltura is domiiiantes em nossa sociedade, qu e

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qu e nessa forma paradoxal de concessao de controle. D e fato, caracte-

n'sticas manii 'estas de controle permane cem mesmo aqui: o fa to de

omedico fazer

apergunta imporlante

do poiilo devista medico

sobre o habito de beber da paciente, de oferecer uma avaliagao e de

controlar o inicio, o terrnino da entrevis ta (nao evidente neste

exemplo) e agoes fu turas.

Ele o faz, enlretanto , co m u ma reticencia que nao e caracler is-

tica da pratica medica e da rela^ao m e d ico-paciente tradicionais , o

que nos remete a m o d a l i d a d e , a polidez e ao ethos. A avaliacao na

l inha 31 tern urn marcador explicito de modalidade 'subjetiva' (acho)

qu e deixa claro que a avaliagao e apenas a opiniao do medico e

ateuua su a autor idade (veja a secjio sobre modalidade a seguir) : "e

sensato" por si so implicaria acesso da pa r te do med ico a fontes de

ju lga men to profissional implicitas e mistif icadas. A u n ica pe rgu n tae, como j a sal iente i , produzida como ur n apar te , e isso consiste de

um a vaga e hesitante formulacao in ic ia l ("voce voltou voce vol-

tou?") , seguida de uma formulagao mais explicita ("voce voltou a

beber?"). Essas caracteristicas d a pergunta minimizam se u po ten -

tial ameagador a face e dessa forma auinentam a polidez. Nessesentido , a sugestao de outras entrevis tas e tambem pol ida. Ela e

muito indireta : presumivelmen te. o medico esta pedindo a paciente

para marcar outras consul tas, mas o que el e realmente diz, como

t e n t a t i v a ("eu gostar ia . . . se fo r possfvel") , e que ele q u e r ve - la

outra vez. El e tambem formula o proposi to de o u t r a s en t r ev is ta scomo se elas fossem visi tas sociais ("ver como as coisas va oindo"). E modaliza su a sugestao duas vezes com "sabe" e hes i ta

("continuar, sabe ouvindo") , clando mais uma vez uma impressaode hesita;ao.

Esses comentarios podem se r relacionados a nogao de ethos.

Enqu a n to , no exemplo 1, o estilo de i'ala do medico esta de acordo

com o ethos cientffico, nesse exemplo a ret icencia , a tenta t iva e aaparente hesitagao do medico se coadunam com urn ethos d o m u n d o

desvalorizam o elit ismo profiss ional e estabelecem u m alto valor

para a informalidade, para a natural idade e para a normalidade.

Oexemplo

2difere

do 1t a m b e m

em lermos de sua in te r tex -tualidade. Nada ha de analogo a dialet ica da s vozes da medi tin a e

do m u n d o da v i d a qu e percebi no pr imeiro . A o contrar io . o medico

parece estar ele mesmo recorrendo a voz do m u n d o da v i d a - por

exemplo, retra tando fu turas entrevis tas em termos de "ouvir como

as coisas va o indo" e endossando o recurso da paciente a essa voz,

ao dar-lhe espago para qu e el a conte sua his toria com suas proprias

pa lavras e encorajando-a com extensas m an if esta goes de atengao.

Todavia , o medico exerce o controle, mesmo de uma maneira

nao caracteristica. Podemos n o t a r esse fa to em termos da in terdis-

c urs iv idade ( in te r tex tu a l id a d e constitu t iva) , pressupondo uma con-

vergencia do g e n e r o pa d ra o d e enfrevis tas medicas com outrosgeneros , de fo rma que a lgumas caracter is t icas d e co n t ro le in te ra -

cional do primeiro sejam m ant idas , porem realizadas de uma for-

m a indireta e m it igada sob a inf luencia do s u l t imo s . Os proprios

atos e m anam de um genero, suas realizacoes de outros. Quais sa oesses outros generos? Ja me referi a conversagao, mas a conversa-

ga o esta presente aqui como um elemenlo consti tu t ivo de o u f ro

genero, o aeonsel hiimento. A relacao in terdiscursiva pr imaria nes-

se t ipo de entrevis ta medica parece estar entre o genero padrao de

entrevista medica e o aconselhamen to , ou o que Ha ve (1989) - ver

tambem Jefferson e Lee (1981) -, segu ind o a rnesma l inha de ana-lise, d eno mina 'conversa t e r a peu t ica ' . O ac ons e lh am e nto enfat iza

a concessao ao s pacientes (o u clienles) do espago para falar , mos-

trando empatia em relagao a seus relatos (com o conselheiro sem-

pr e ecoando ou fonnula iido esses relatos na voz do(a) paciente)

sem ser diretivo. A procura po r modelos para aconselhamento , na o

surpreendentemente, conduziu para fora do discurso inst i tu t ional,

em diregao ao discurso conversacional, no qua l ta is valores (mani-festos aqui na reticencia e na mitigagao do medico) sao l a rgam e nte

183 Norman Fairclough

reconhecidos, por exemplo, na figura do 'bom ouvinte ' do mimdo

da v ida.Diferentes variedades de entrevista medica nao coexis tem

simplesmente: elas entram em relagoes de conteslagao e luta, como

parte da luta mais geral em tomo da natureza da pratica medica.

Discurso emudanga social 189

Exemplo 3: Narrativa conversational

O terceiro exemplo ilustra outra dimensao da in ter textualidade.Trala-se de um excerto de um relato feito por um casal a outro ca -

sal sobre um encontro com a alfandega na vol ta de umas ferias noexterior. A transcrigao esta organizada em 'estrofes ' de qu a t ro li -

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Entrevistas medicas como a do exemplo 2 sao transparentemente

ligadas a valores, tais como tr atar o(a) p acien te como pessoa e nao

apenas um caso: enco rajar o(a) paciente a assumir alguma respon-sabilidade pelo t ra t am e nto , e assim po r d ia n te . N a l u t a en t r e asvariedades de entrevista medica, sao as fronteiras nas o rd ens de

discurso, tais como a fronteira entre o aconselhamento e a entre-

vista medica e a articulacjio interdiscursiva dos elementos nas

ordens de discurso, qu e estao em debate.

A diregao principal de mudanga na medicina contemponmea

parece aproximar-se de entrevistas como a do exemplo 2. Essa euma manifestagao par ticular de mudangas nos valores cu l turais e

na s relates sociais as quais eu j a me referi - mudancas na cons-

t rugao d o ' eu medico ' d i s t a n t e d a a u t o r i d a d e e da competencia

explfcitas , mudangas no poder, distanciando-o dos produtores debens e services e aproximando-o dos consumidores ou cl i en tes ,saindo da formalidadeera diregao a informalidade, e assim po r diante.

A mudanga, entretanto, nao e suave. Primeiro, ha tendencias diver-

gentes e contraditorias em ac.ao. Em segundo lugar, as tendencias namudanga cultural podem harmonizar-se co m tendencias em outros nf -

veis, ou entrar em confiito com elas. Por exemplo, a transformagao da

pratica medica na diregao do exemplo 2 e economicamente d ispen -

diosa. Os medicos podem 'processar' os pacientes com mnito mais

'eficiencia' e rapidez por meio de um a rotina preestabeiecida. como a

do exemplo 1. do que com tecnicas que concedem aos pacientes otempo de que eles precisam para falar. H a. hoje em dia , mi Gra-

Bretanha e em outros lugares, grandes pressoes sobre os medicos e

outros professionals para que a u men tem su a 'eficiencia ' , e essaspressoes e n t ram em confi i to com as tendencias d o mina n tes no ni-ve l cultural. (Para discussfio mais deta lhada sobre as tend encia s

contemp oraneas na mudan ga discursiva, ver Capftu lo 7, a seguir.)

nhas, com uma l inha para cada par ticipante; apos a primeira , asestrofes con tem l inhas somente para os par t i c ipan tes que fa l am.

A s sobreposigoes sa o mostradas como fala sirnullanea em d u a sl inhas ou mais; as pansas sao representadas por pon tos f inais ; ums inal de igualdade mostra um enunciado seguido imed ia ta men te de

outro, e as letras ma iu scn la s mostram fala em voz al ia.

Ma rido I:

Ma rido 2:

Esposa 1:

Esposa 2:

M l :

M 2:

E l :

M l :

M 2

E lM2:

El:

M l :

M 2:

El :

E2:

M l :

M 2:

M l :

E l :

M l :

M 2:

Silvie tinha algumas plantas embaixo do assento qu e eram Einzidas ilegalmente

al l r\i\o ili

d e q u a l q u e r f o rma dorffora

p la n ta s m i n h a nossa

realmente ilegal . P l a n t a s e si m e e r a iva

um um-

r a iv a

e po rque s e um a nima l qu e tern ra iva cospe na s

minha

folhas que estao n o c hao out ro a n i m a l po de c on t ra f - l a

e h u m . a ma e de Si l v i e

nossa

enta o lie li e p la n ta s s a o r ea lmente p ro ib ida s h e

he lie

t i n ha me conip ra do esse te lescopic como. preset!te de

an iv e r s a r io e be m er a

ah si m

p res en te comb ina do de a n i v e rsa r i o e de na ta l

na o presente

combinado

e isso t a mbem d e v i a t e r s i d o d e c l a r a d o = bem

. p o r q u e =

190 Norman Fairclough

El : de aniversario e de natal

M I : eles sa o mais baratos por la do que e como q u a n d o

voce compra relogios onMl : ins t rumentos oticos voc6 tem de dec la ra r porque voce paga

M 2: minh a nossa

Discursoe

mudanca socia l191

sigao de que esteja p ro d u z ind o uma his tor ia de narrador unico, en-

quanto El (assim como M2) pressupoe que eles estao produzindo

um a historia de forma conjugada, embora el a possa encarar o seu

papel como ' secundar io ' . E l e M2 t a mb em parecem narra r com

base em um modelo por meio de na rra tiva produzida interat iva-

mente, com o sentido adicional de uma narra tiv a produ zida parci-

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M l : imposto. E e n t a o n no s t inh a mos l i nham o s u m m o nt e

de aparelhos er a

M2 : h um

Ml : t udo coisa p e q u e n a ma s a c ac um ul ada e

M2: hum e he

Ml : men ar de inocencia t e r ia a umenla d o su a cr edu credul ida de

eu t i n ha e

M 2: l i u m

M 1 : .comprado e. um pacote de 250 gramas de f umo sabe.

para voce e

M l: M a r t i n , e Mary c la r os a h e h e e hum- eM2: he isso era excesso tambem

M I : bem-. na o isso er a dentro do i i n n i t e . mas eu esqueci . que tambem

El : nao isso-

MI : t inha comprado alguns pacotes de Gitanes que eu proprio t i n h a fumado =

Ml : com excecao de um pacote EU QUER1A QU E VOCE PARASSE D EM E I N T E R R O M P ER

El: = si m m as eles eslavam abertos

Ml : h a v i a um pacote que e nao t inh a sido aherlo (a f i t a c o n t i nua)

M2 : h um h um

N a penultima estrofe, M l pede a El para parar de interrompe-lo.Considerar o que El faz d u r a n t e o relate como u m a ' in terrupgao a

Ml ' ou nao d epend e d e nossas proprias suposicoes sobre a na ture -

za precisa da atividade aqu i . Ma var ios subgeneros de narra t iva ou

do ato de contar his tor ias , e uma maneira importante em que eles

di f e re m e se tem na r ra d o res unicos ou m u l t i p l e s . A s narra t ivas

desenvolvidas conjun tamente por par te de duas ou a le mais pessoas

'a quern a histor ia per tence ' nao sao inco mu ns nas n a r ra t i v a s con-

versacionais. Talvez, nesse caso, Ml esteja uarrando com a supo-

almente por meio do dialogo entre narradores e audiencia . Essa

situacao em que diferentes par t icipantes func ionam co m modelos

genericos d i fe r en tes po d e se r considerada como um outro modo de

intertextualidade, como na situagao do exemplo 1, em que os dife-

rentes par t icipantes sao orientados para d iferentes vozes (recorde a

diferenciagao nos m odos de in te r tex tu a l id a d e no comego do Capi-

tu lo 4).Os dois subgeneros de narra tiva que estou poslu lando difer i-

rao, na tu ra lmen te , em seus sistemas de tomada de turno e de con-trole de topico. A narra tiva de um unico narrador a tr ibui d ireitos

ao 'piso' para a duracao da histor ia ao narrador , o que implica qu e

outros par t icipantes nao tem o direito de tomar tumos substanciais,

embora ainda se espere que eles deem retorno na forma de respostasmmimas e, consequentemente, na o tenham o direito de controlar o

topico. A h is tor ia conjuntamente produ zida , entretanto , implica um

piso compartilhado, e direitos coinparti lhados d e tomada de turno,

in t rodugao e mu d a nga de topico. A t en ta t iva de Ml de 'po liciar '

seu d ireito ao piso parece desastrada, po r causa de sua insens ibi l i -

dade a orientacao de El e M2 para a narrativa desenvolvida conjun-

tamente.

Ate que p o n t o a questao do genero e re le van te a qu i? O fa to de

M 2 par ti lhar com El uma orientagao para a narra tiva produzida con-

ju n ta men te e em s i mesrao evidencia contra qualquer equa^ao di-reta desse tipo de na r ra t iva co m mu lheres e do genero de uarrador

u n ico co m homens , mesmo se isso nao fosse implausivel em out ras

bases. Todavia , esse exemplo aproxima-se do que m i n h a exper ien-

cia me diz ser um padrao generalizado de na r ra t iva s de casais: o

m arido conta a histor ia (e rouba a cena) , e nquanto a esposa a t u a

em um papel secundar io interpelando comentar ios qu e apo iam o

relato do marido e o elaboram d e forma minu c io sa , se m t en l a r di -vidir o conlrole do topico. Em iermos desse padrao, El ultrapassou

192 Norman Fairclough

essa limitagao ao introduzir topicos e ao engajar-se no dialogo com

M 2. Note-se a similaridade dessa seguuda analise orientada pelo

marido com a analise do exemplo 1 em termos de controle do me-

dico.

Passo agora dos exemplos de discurso para um a discussao

mais sistematica dos tipos de analise qu e eles susci tam.

Discurso e mudan^a social 193

veis a todos os participantes. Elas se apJicam a possfveis pontos de

completude no t u r n o da falante atual - por exemplo , quando ela

chega ao fi m de uma unidade gramatical (uma frase. uma orac,ao,

um sintagma ou a te uma palavra) com um padrao de entonacao

final.

Como o exemplo 1 demonstrou, no entanto , os sistemas de

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Caracterfsticas de c ontrole iitteracional

As caracteristicas de controle interacional asseguram um a boa

organizac.ao inleracional - a distribuiyao de turnos. a selec,ao e mudan-

ca de topicos, a abertura e o fechamento da s interagoes, e assim po r

diante. O controle interacional e sempre exercido, at e certo ponto ,

d e m a n e i r a co labora t iva pelos par t i c ipau tes , mas pode h a v e r

assimetria en t re os par ticipantes quanto ao grau de controle. As

convengoes d e controle interacional de um genero corporificam

exigencias especificas sobre as relagoes sociais e de poder entre os

participantes. A investigagao do coutrole interacional e, portanto,um meio de explicar a realizac,ao e a negociacao concrelas das re-lagoes sociais na pratica social.

Tomad a de turno

Os generos diferem no que se refere a seus sistemas de to ma d a

de tu rno . A a n a l i se etnometodologica da conversagao (ver Sacks,

Schegloff e Jefferson (1974); Schenkein (1978); e minha discussao

de anal ise conversacional no Capi tulo 1) produziu explicates iu -f luentes d a tomada d e t u r n o na conversagao como u m a realizagao

orgauizacional colaborativa d os participantes, baseada n u m con-

j u n t o simples de regras ordenadas: (1) a falante a tua l pode esco-

Iher a proxima fa lante, dir igindo-se a ela, no mea nd o -a , etc.; (2) se

isso nao acontece, qualquer par t icipaute pode 'esco lher a si mes-m a ' como proxima falanle ; e (3) se isso nao ocorre. a falante a t u a l

pode co n t inu a l . Essas opc,6es ordenadas estao igu a lmen te di spom-

tomada de t u ruo nem sempre sa o construidos em torno de direi tos

e obrigacpes iguais para (odos os participantes. O sistema de to-

ma d a de tu rno do exemplo 1 e tipico de sistemas que enco n t r a mo sn u m a var i edade de inst i lu icoes em que profissionais, gente 'd e

deu tro ' . ' porteiros ' interagera com o 'piiblico', 'clientes', 'gente

de fora ' ou aprendizes. Nesses casos, o seguinte tipo de dis lribui-

530 de direitos e obrigagoes entre poderosos (P) e nao-poderosos(N-P) e comum: (1) P pode escolher N-P, mas o inverso nao e pos-

sivel; (2) P pode escolher a si mesmo(a), mas N-P nao pode; (3) e

o turno de P pode ser estendido a qualquer uumero de pontos de

completude possfvel.

A analise da conversacao se propoe a explicar a notavel fluencia

da conversagao comum , o fato de as pessoas geralmente conseguiremfalar sem superposigao extensiva e sem grandes lacunas no f luxo

da fala. Outra caracten'stica dos sistemas assimetricos de tomada

de turno e que tanto as superposic.6es quanto as lacunas podem

estar disponiveis como mecanismos para P: P que pode ter o di-

rei to de in terromper N-P, q u a n d o esse ul timo se torna ' i r r e leva n te ' ,

segundo os cr iter ios de reievancia controlados por P, e P, mas nao

N-P, que pode ter o direito de 'manter o piso' sem realmenle falar -

po r exemplo, ficar em si lencio como forma de reafirmar o propr io

controle, ou como forma de critical os outros implici tamente.

Estruturas de troca

O s ciclos pergunta-resposta-aval iacj io identif icados no exem-

plo 1 manifestam um t ipo de troca, no sentido de uma padronizacaorecorrente dos turnos dos diferentes participantes. No Cap i tulo 1, re-feri-me ao Irabalho pioneiro de Sinclair e Coul thard (1975) sobretrocas no discurso de sala de aula: eles i solaram uma est ru tura

194 Norman Fairclough

'iniciagao-resposta-avaliacao', que e semelhante a es trutura de

troca do exemplo 1. Poderaos tambem inc lu i r aqui o t ipo de estru-tura meuos elaborado e raenos especifico que os anal istas da con-

versacao chamam de 'pares a d ja cen tes ' (Schegloff e Sacks, 1973).

Pares adjacentes sa o tipos gerais de e s t ru tu ra e nao um tipo part i -

cular de troca. Eles envolvera duas categorias ordenadas tie ato de

Discurso e m u d a n ^ a s o c i a l 195

Controle de topicos

Ha rvey Sacks (1968) nola que "conversar segu indo o 'topico'

na o consiste em blocos de conversa sobre 'um topico'". E q u a n d o

se apresenta um topico, exceto em circunstancias bastante espe-

ciais. pode-se ter certeza de que os outros tentarao fa lar segu indo o

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fala, de modo que a ocorrencia da pr imeira preve a ocorrencia d a

segunda, mas os emparel l iamentos particulares sa o bastante diver-

sificados: pergunta-resposta, cumpr imento-cumpr imento , r ec l a -macao-pedido de desculpa, convite-acei tagao, convile-recusa, eassim por diante. E, como ind ic am os dois ult imos exemplos, na oha sempre urna relagao de um para um entre a primeira e a segundaparte do s pares adjacentes: um convite pode se r seguido por L i m a

acei tacao ou por u m a recusa, embora haja varias maneiras pelas

quais essa ul t ima possa se r marcada como opgao 'nao-preferida '

(Schegloff, Jefferson e Sacks (1977); Po mera n tz (1978); Levinson(1983: 332-345). O par adjacente pergunta-resposta e central para

muitos tipos de trocas. Em alguns generos, encontram-se seqiienciasde trocas pergunta-resposta que constiluem estruturas de nfveis maisaltos, qu e podemos cliamar (seguindo Sinclair e Coulthard , 1975)'transa5oes' ou 'episodios'. Isso ocorre em sala de aula, na qual

partes das aulas podem ser const i tufdas como seqiiencias de per-gunta-resposta sobre topicos especificos, n o rma l iu en t e com o pro-

fessor abrindo e fechando a transagao; tarabem se apHca, mas de

modo diferente, ao interrogatorio jur idico. no qual o advogadopode usar tais seqi iencias para formar um caso contra u m a teste-m u n h a (Atkinson e Drew, 1979).

A natureza do sistema de trocas e relevante nao so para a to-mada de turn os, mas tambe m para o tipo de coisas que as pessoas

podem dizer . Por exemplo, ao iniciar um a troca, os professorespodem dar aos alunos informacoes, t'azer-Jhes perguntas. plane ja r

agendas para a a u l a , ou con trolar o com port a men to dos a lun os .O s a iu no s , por outro lado, sao mu ito mais l i ini tados no que podemdizer ou fazer : pr incipalmente respondeni perguntas e desempe-nha m certas tarefas em resposta a pedidos, com a exigencia de que

o facam dentro dos l imite s do que e j u l g a d o re l evan te . M u ila s per-guntas na sala de a u la sao ' fechadas ' , exigindo respostas do tipo'siin' ou 'nao', ou com elaboracao min im a.

topico sobre o qua l se f a lou , mas nao se pode te r certeza de queo topico qu e voce pretendia sera o topico sobre o qua l eles falarao.

H a sempre m uito s topicos diversos que se podem considerarrelevantes para o desenvolvimento de qu a lqu er topico que foi in-troduzido, e Sacks sublinha que nao se pode prever, na conversa-

cao , po r qual topico se optara . O s topicos de conversac.ao e asformas pelas quais as pessoas de fa t o conectam topicos, ao co nver -

sarem seguindo um topico, permitem a pro fu n d a r a percepgao sobre

as preocupacoes da vida co mu m e a estru turagao de senso comumdo mundo da vida. Tambem sao interessantes os mecanismos pormeio dos q u a i s os topicos conversac ionai s sao estabelecidos

(But ton e Casey, 1984): t ipicamente, os topicos sau oferecidos po rum(a) par ticipante, aceitos (ou rejeitados) por outro(a) e en tao ela-borados pelo(a) primeiro(a) participante. Por exemplo (Button e

Ca sey , 1984: 167):

A: O que voce sabeB: So cheguei ontem a noite

A: Ah . v / ' / H ?

B oferece o topico, A o acei ta e B continua (mais tarde) a

desenvolve- lo. Pesquisas sobre a in t e ragao domestica entre parcei-

ros masculinos e femininos mostram. por exemplo, uma assimetria

na to ma d a de topicos: as mu lheres oferecem mais topicos do queos homens , mas os topicos do s homens sa o aceitos mais freqiien-

temente pelas mulheres do que vice-versa (F i shman, 1983).

A pesquisa emometodologica sobre topicos e, entretanto , ba -seada na conversacao e pressupoe d i re i tos e obrigacoes igu a is

entre participantes. A expl icacao de Sacks sobre o conversar se -gu ind o um topico e sobre a iniprevisibi l idade de como outros par-ticipantes desenvolverao nossos topicos e pouco relevante para aconversa de pacientes em uma consul ta medica padrao ou de alu-

196 Norman Fairc lough

nos em sala de aula . Em ta is in terag5es, como suger i na analise d o

exemplo 1, os topicos serao introduzidos e mudados apenas pelo(a)

parlicipante dominante, frequentemente de acordo com uma agenda ou

rotina preestabelecida, que pode ou nao ser explicita no discurso.

Determi na^ao e policiamento de agendas

Discursoe

mudanc.a social 197

0 t u r n o do segundo a luno e r e je i ta d o por P a despeito de ser

pe r f e i t am e ute relevante para o topico gera l, aparentemente por nao

se ajustar a ordem de de s e nvo lv im e nto do topico especificado na

age nda que a professora esta seguindo impl ici tamente: ela esta

t e n tando trazer a tona o uome de outro meio de trans por te. A re je i -1

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Determina r e policiar agendas e u m e lemen to impo r t a n t e nocontrole interacional. As agendas sao f reqiientemenle esfabeleci-

das por P de modo explfc i to no comedo d e u ma interagao. O s pro-

fessores o fazem no comego d e aulas , ou de t rans agoe s nas aulas. e

um a entrevis ta d i s c i p l i nar f r equ en t emen t e comeca com o(a) e n t re -

v i s t ador(a ) explicitando para o(a) entrevis tado(a) "porque voce

esta aqu i" (ver Thomas, 1988, para um exemplo). Estabelecer agendase um aspecto do controle geral de P sobre o infcio e o t e rm ino de

uma interagao e sua es truturagao em transagoes ou episodios.

Agend a s explicitas e implic i las t a mb em sao 'policiadas'. no

sentido de que P m ante m outros par t icipantes , de var ias formas ,

em suas agendas duran te u m a interagao. O exemplo 1 co n t in hauma ins tancia d e policiamento: o medico in t e r rom pia os turnos d a

pa c ien te , q u a n d o ele apare n te m e nte decidia que a paciente t inha

fornecido a informagao relevante para aquele estagio da a gend a .

Outra manifes tagao e i lu s t r a d a por este extra to d e u ma aula ( trans-

crito de Barnes, 1976), no qual a professora esta tentando fazer com

que seus a lunos fa lem sobre problemas de excesso de populate

urban a:

AUin o :

Professora:

A:P:

A:P:

A:

P:

a f u m a ^a dos c ano s de escape causara

po hi igao bo a palavra M a u r i c e mais algumn coisn sohre o i r an s i to

as calyadas f icariam ( i n i n t e l i g f v e l )niio estou pe nsando

em um meio diferente de transporte alguem pode responder. P l i i l i p

hum ( i n i n t e l i g f v e l }

estou fa lan d o sobre o t ra ns i to . estou fa lan d o sobre o Iran-

site David

os t r ens [ ( in in t e l ig fve l )

[ t r ens si m

gao se realiza quando a professora especifica 'onde ela esta na

age nda , mas note que ela tambem parece in terromper o a lu no antes

qu e ele (ermine seu e nunc iado . Como os dois primeiros turnos su-gerem, a agenda foi plane jada para conseguir nao so informagao

especifica do s alunos, m as tamb em palavras-chave, como 'poluigao'.

U m aspecto no tave l d a interagao entre professores e a lu no s e

qu e os pr imeiros t ipicamente avaliam os enunciados dos ul t im os .

Nesse caso, por exemplo, a professora, em seu primeiro t u ruo ,

avalia positivameute o uso da palavra 'poluigao' p or M a u r i c e .

A es t ru tu ra de trocas 'iniciagao-resposta-coraentario' suger ida

para o discurso de sala de aula po r Sinclair e Coulthard (1975) in -

corpora esse e lemen to de avaliagao no 'comentario'. Essa avalia-

ga o sis tematica dos enunciados dos outros e uma forma poderosa de

policiar agendas. Seu uso em sala de a u la nao so sublinha o poder

dos professores sobre os alunos, como tambem demonstra ate que

ponto a pratica rotineira de sa la de a u la coloca os a lunos em uma

s i tuagao de teste ou exame: nessa forma de discurso de sala de a u la ,

v i r t u a lmen t e tu d o o qu e eles dizem e verbalmente 'marcado'.

H a var ias out ras maueiras pelas quais um par ticipante e m um a

in te ragao pode policiar as contribuigoes de outros. Uma forma que

T h o m a s (1988) descreve e forcar um a explicitagao. S er am biva-

lente e/ou calar-se sao mecanism os de defesa classicos da par te deN-P era encontros desiguais , que podem ser combatidos por for-

mulagoes de P com o i n t u i t o de forgar N-P a ser explicito(a); ou

ins is tencia, por pa r te de P. que N-P reconhega o que fo i dito (por

exemplo: "Voce e n te nde isso, nao?").

198 Norman Fa i rc lough

Formiilacao

A formulacao e outro aspecto do controle in te ra c io na l qu e tern

recebido muita a tencao dos analis tas da conversacao (ver Heritage

e Watson, 1979). Sacks descreve a fo rm ulac ao assim:

Discurso e mudan^a soc ia l199

Mesmo q u a n d o o ato de formular n ao esta especif icaraente li -

gado a policiamento , freqiientemente el e ainda tern u m a fu n ca o

im por tan te de controle in teracion al, nas tenta tivas de a lguns par t i-

cipantes d e g a n h a r a aceitacao de outros para suas versoes d o qu e

fo i dito ou sugerido em u ma interacao, o que pode entao res tringir

as opgSes d os ul t im os de fo rma vanta josa para os primeiros. En-

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U m m e m b r a p o d e t ra tar um a par fe da conversagao como um a

ocasiao para descrever aquc la conversacao. para expl i ca - la , para

caracter i za - la . para esc larecer , t r a d u z i r , r e s u m i r , fornecer se usen t ido, ou observar qu e esta de acordo com as regras, ou co-

m e n t a r o seu afas tamenfo das rcgras (1972: 338).

Exceto pelas dims ult imas oracoes que se associam com os

mecanismos d e pol ic iam e nto da fo rm ulagao como os tipos descri-

to s na secao anter ior , a formulagao, segundo Sacks, se parece com

uma forma par t icular de representacao do discurso , na qu a l ele e

par te d e u m a interagao corrente, e nao de uma a n te r io r . D e qua l -

que r ruodo, o l imite entre in teracoes co r ren fes e anter iores nao e

tao claro quanto se pensa; a conversacao que t ivemos antes da in -

t e r rupc ao por um a c h a m a d a te letonica , ou antes do almoco, ou na

sema na passada, e parte de nossa conversacao corrente ou e uma

conversacao d i fe ren t e? Nao ha um a resposta simples.

Como as d u a s oragoes f inais de Sacks podem implicar , for-

mular e freqiientemente u m a fo rma d e policiar. U m a maneira efi-

ciente de forcar o(a) interlocutor(a) a sair da am biva le nc ia e

oferecer uma formulacao do que ele(a) esta dizendo. Eis a q u i u m

exemplo, l irado de uma entrevis ta d isciplin ar entre um policia! (P)

e um oficial de policia (0) (Thomas, 1988).

O: voce di z qu e voce esta t r a ba lh a ndo de acordo com e e e os padroes a dequa doscer to

P: hem nimca l ive comentarios diferentes desseO: voce esta dizendo que n i n g u e m observou suas falhas

Ambos os tu rno s de O formulam as contribuic.6es de P, e am -

bos (como fica claro no segundo caso do extra to anter ior) m u d a m

substancialmente as palavras que P realmente disse e tern o objetivo

claro de fazer com que P torne mais explicito o que 'esta dizendo'.

contramos formulacoes fu n c io n a n d o desse modo, nao apenas em

entrevistas e inque r i tos policiais, mas tambem em entre vistas de

r ad i o (Her itage, 1985).

Modal id ad e

D a d a u m a proposigao sobre o rn u n d o , como "a terra e plana",

pode-se categoricamente afi rms-la ("a terra e plana") ou nega- la

("a terra nao e plana"), mas tambem estao disponfveis varies graus

d e co mpro met imen to m e nos categoricos e menos de te rm inados a

favor ou contra : "a terra pode ser / provave lm e nte e/ possivelmente

e/ e mais ou menos plana", por exemplo. Essa e a esfera da m oda-lidade, a dimensao da gramatica da oracao qu e corresponde a fungao

'interpessoal' da l inguagem (ver, 110 Capitulo 3, o item "Discurso").

E m q u a l q u e r e n u n c i a d o proposicional, o produ tor deve ind ic ar o

qu e Hodge e Kress (1988: 123) chamam de um grau de ' a f in idade '

com a proposicao; por tan to , q u a l q u e r e n u n c i a d o desse tipo tern a

propr iedade da modalidade, ou e 'modalizada ' .

A mo d a l id a d e n a gra ma t ica e ra t rad ic iona lm e nte associada

co m os 'verbos auxi l iares modais' ('dever' - obrigacao moral;

'poder' - permissao, possibilidade; 'poder' - ca pa c id a d e , 'dever',

etc.), qu e sao u m meio i m p o r t a n t e d e realizar a m o d a l i d a d e . En-

tre tanto, a abordagem 'sistemica' a gramatica a qu e Hodge e Kress

(1988) recorrem enfat iza que os auxiliares modais sao apenas um

aspecto da m o d a l i d ad e e n t r e mu i t o s (ver Halliday, 1985: 85-89):

O tempo verb a l e o u t ro : como d emo ns t r a o exemplo d o u l t i m o

paragrafo , o presen te d o indicativo ('e') realiza u m a mo d a l id a d e

categories. Outro aspecto e o co n ju n to d e adverbios modais , como'provavelmente ' , 'possivelmente', 'obviamente ' e ' d e f in i t i v a men t e ' ,

com seus adjetivos eq uivalen tes (por exempio, "e provavel/possfvel

200 Norman Fairclough

que a terra seja plana"). Alem dessas possibilidades, existe aind a

uma gama u m tan to difusa de formas d e manitestacao d e variesgraus de af in idade: indeterminacoes como ' um a especie de' , 'u mpouco', 'ou um a coisa assim', padroes de entonacao, fala hesi tante, e

assim por diante. Havia ur n caso de indeterminacao no exemplo 1,

quando a paciente glosou "estomago azedo" como "queimac.ao como

Discurso e mudan^a social 201

um a resposta posi tiva) pressupoem que a al ta af iu idade com a pro-

posigao e comparti lhada entre falante e receptor(a) e (dado que as

respostas do(a) ult imo(a) sejam previamente conhecidas) tais per-

guntas sao fei tas para demoustrar essa afinidade e sol idarieda de e

nao para obter informacoes. Assim, expressar al ta af inidade pode

ter pouca relagao com o co mpro met imen to de alguem com uma

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uma queimac.ao ou uma coisa assim".

A modal idade pode ser 'subjetiva ' , no sent ido de que a base

subjetiva para o grau de afinidade selecionado com uma proposicao

pode ser expl ici tado: "penso/suspei to/duvido que a terra seja pla-

na " ( lembrem-se tambem de "acho que e sensato", no e x e m p l o 2) .Ou a modal idade pode ser 'objetiva ' , em que essa base subjetiva

esta implicita: "a terra pode ser/e provavelmente plana". No caso

da mod al idade subjetiva, esta claro que o grau de a f in id a d e do(a)

proprio(a) falante com uma proposicao esta expresso, enqna n to no

caso da modal idad e objetiva pode nao ser claro qu al ponto de vista

e representado — po r exemplo, o(a) falante esta projetando se u

propr io ponto de vista como un iversal, ou agind o como um veiculo

para o ponto de vista de um outro indfviduo ou grupo. O uso damodalidade objeliva freqiientemente implica algum a forma de poder.

E comum que a modal idade se real ize em rniiltiplos aspectos

de um enunciado ou frase simples, Por exemplo, em "penso qu e

ela estava um pouco bebada, uao estava?", a ba ixa a f in id a d e e

expressa no marcador de modal idade s ub je t iva ('penso'), na i nde-

t e r m i n a c a o ( ' um pouco') e na a d iga o de uma pergunta f i na l aassergao ('nao es tava? ' ) .

Porem, na modal idade ha mais do que o comproinetimento

do(a) f a lan te ou do(a) escritor(a) com suas proposicoes. Os pro-

dutores indicam comprometimenlo com as proposicoes no cursodas in tercedes com outras pessoas, e a afinidade que expressam

com as proposigoes e f reqiientemente dif ic i l de separar de seu sen-

tido de afinidad e ou sol idariedad e com os in teragenles. Por exem-

plo, "ela nao e boni ta!" ou "ela e bouita , nao e!" sao formas deexpressar alta afin idade com a proposicao "ela e boni ta", mas t a m-

bem formas de expressar sol idaried ade com a pessoa com que rn sefala. Perguntas desse tipo (uma pergunta negativa e uma assergao

posiliva co m u ma p e r g u n t a final nega t iva qu e antecipam ambas

proposicao, mas muita relagao com um desejo de d emo ns t r a r sol i -

dar iedade (Hodge e Kress, 1988: 123). Inversamente, o exemplo 1

a que aludi ("queimagao como uma queimagao ou coisa assim")

demonstra que a baixa af inidade com uma proposigao pode ex-

pressar falta de poder, e nao falta de convicgao ou conhecimento. e

aqui lo que pode ser reivindicado como conhecimento (e, portanlo,

a expressao de al ta afinidade com uma proposicao) depende de

relagoes de poder. A modal idade e, entao, um ponto de intersecgao

no discurso, entre a significac,ao da realidade e a represeutac,ao da s

relagoes sociais — ou, nos termos da linguistica sistemica, entre as

flingoes ideacional e interpessoal da l inguagem.A modal idade e uma importante dimensao do discurso e mais

central e di fund ida do que tradicionalmente se tern considerado.Um a medida da sua i tnportancia social e a extensao com que a

modalidade das proposigoes e contestada e aberta a luta e a trans-

formacao. Transformacoes da modal idade sao, por exemp lo, gene-ralizadas em reportagens da mfdia . Hodge e Kress (1988: 148-149)

da o o exemplo de uma declaracao altaraente modal izada de baixa

af inidade fe i ta por Michael Foot como lider do Par t ido T raba lhi s ta

Bri tanico ("em geral creio que um fator qu e influenciou as eleigoes

foram alguns d os acontecimentos que ocorreram na Prefeitura da

Gra nd e Londres") , que se t ransforma na manchete de jo rna l cate-

gorica"Foot

d ina mita Ken o Vermelho pela surra nas urnas ". (Keno Vermelho e Ken Livingstone, h'der de uma controver tida admi -

nistragao Trabalhista em Londres no inicio dos anos 1980.)

Alem dos exemplos especificos, ha mais propriedades gerais

associadas com a modal idade nas pra t ica s d a m fdia . A m i d i a

geralmenle pretende tratar d e fatos, d a verdade e d e questoes d e

conhecimento. Ela sis tematicamente transforma em ' fatos ' o que

freqiientemente nao passa de in terpretacoes de conjuntos de even-to s complexes e confuses. Em termos do modal idade , isso e nvo ive

202 Norman Fairclough

uma predilec,ao por modalidades categoricas, assercoes po s i t iva s e

negativas, como i lus tra o exempio no u l t imo paragrafo. e, portanto ,

pouco uso de elementos modalizantes (verbos modais., adverbios,

adjetivos, indeterminacoes, e assim por diante). Trata-se tambem

de uma predilegao por modalidades objetivas qu e permi tem qu e

perspectivas parciais sejam universal izadas.

Discurso e m u d a n ^ a social 203

O que o exempio do discurso da mid ia indica e que a mo d a l i -dade nao e simplesmente um co n ju n to de escolhas disponiveis para

falautes ou escritores para registrar gratis de afinidade, O que umatal perspectiva orientada para a escolha perde, i soladamente, e avar iabilidade das praticas de modalidade como entre tipos de dis-

curso, a extensao em que as praticas par t iculares de mo d a l id a d e

pessoas recorrem tipos discurso par t i-

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Vamos tomar u m exempio especifico. A conlerencia de cupula

da OTAN em 30 de maio de 1989 tratava da questao li l igiosa de

qual posicao a OTAN deveria adotar sobre a negociagao de umaredu§ao nos mfsseis nuclea tes de curto alcance si tuados na Europa.

Foi-lhe atribufda tanto a solucao quanto o ocultamento de desacordos

e t'oi em alguns casos interpre tada como uma vitoria da posigao de

l inha dura da Gra-Bretanha (de Thatcher) . Eis algumas das m a n -

chetes : "Cupula da OTAN termina em acordo incomodo" (Guar-

dian), "Vitor ia nuclear de Maggie na Batalha de Bruxelas 1 ' (Mail),

"Bush saiida unidade da OTAN na resolucao da d ispu ta do s mis-seis" (Daily Telegraph). Cada uma fornece uma leitura diferente

da conferencia de cu pu la , mas cada um a us a a mo d a l id a d e catego-

rica. Note-se que a manchete do Mail na verd a d e 'pressupoe' (verCapftulo 4 , "Pressuposicao") que 'Maggie' obteve u m a v i to r ia nu-

clear na Batalha de Bruxelas , em vez de alirma-lo: poderfamos

considerar que a pressuposicao leva a modalidade categor ica um

estagio ad ian te ao tomar a fatualidade como tacita . Poderiamosfazer um a objecio a esses exemplos, co m base em que a m o d a l i -

dade categorica e imposta pehi natureza abreviadora e resumidora

das manchetes , nao pelo discurso da midia per se. Cer tamente , po -rem, as ma nche tes sa o mera men te um exempio par ticularmente

obvio de uma tendencia geral no discurso da mid ia . O s jo rna is t en -

de m a oferecer versoes da verd a d e as vezes opostas (embora fre-

qi ienlemente harmonizadoras) , cada uma das quais se baseia na

reivindicac.ao implicita e indefensavel de que os eventos po d em se r

representados transparente e categoricamente e que perspectiva

pode se r universalizada. Esse mito su s ten ta o trabalho ideologico

da mid ia , qu e oferece imagens e categorias para a r ea l id a d e ; posi-

ciona e mo ld a os su jeitos sociais e contr ibui pr incipalmente para ocontrole e a reprocluc.ao social.

sao impostas as qu e a deeulares. Outro exempio e a escrita academica: em uma tradic,ao de

escr ita academica familiar e ainda influente (embora largamentecriticada), evitar a modalidade categorica e um principio fu n d a -mental. Argumenta -se qu e isso se dar ia por questoes retoricas,mo tiva d a s pela projecao d e u m a s u b j e t i v i d a d e e u m ethos ca u te -losos e circunspectos aprovados para 'academicos' e nao por baixa

afinidade com as proposic,6es. (Sobre a retorica da escrita acade-mica e especialmente cientifica, ve r Economy and Society, 1989.)

Polidez

A polidez na l inguagem tern sido uma das grandes preocupa-goes da pragmatica anglo-americana dos anos 1970 e 1980 (Brown

e Levinson, 1978; Leech, 1983; Leech e Thomas, 1989). A teor ia

mais influente e a de Bro wn e Levinson. Eles pressupoem umconjunto u n iver sa l de ' desejos de face' humanos: as pessoas tern

' face posit iva ' - querem ser amadas, co mpreend id a s , admiradas,etc. - e ' face nega t iva ' - naoqu erem sercontroladas ou imped id a spelos outros. Geralmente e do interesse de todos que a face seja

protegida. Eles veem a polidez em termos de conjuntos de estrategias

da parte dos participantes do discurso para mitigar os atos de fala

qu e sa o potencialmente amea^adores para sua propria ' face ' ou para

a dos interlocutores. Essa explicacao e tipica da pragmatica ao con-siderar o uso da l ingu a gem mo ld ad o pelas intencoes de individuos.

O que esta f a l t ando e um sen t id o da va r ia b i l id a d e das praticas

de polidez nos diferentes t ipos de discurso dentro de uma cu l tu ra ,

das l igacoes en t r e as prat icas de polidez var iave i s e as relacoessociais variaveis ou das restric,6es ao s pro d u to res pelas p r a t i c a s depolidez . Bourdieu (1977: 95 , 218) sugere um a visao da polidez qu ee mu ito d i fe r en te d a qu e la de Brown e L ev inso n , alegando que "as

Norman Fairclough

concessoes da polidez sao sempre concessoes politicas". Ele a ela-

bora da seguinte maneira:

o domfnio pratico do que chamamos regras de polidez e, particu-

larmente, a arte de ajustar cada uma das formulas disponi'veis ... as

d i feren tes classes de receptores possfveis prcssupocm o domfnio

impl fc i to , logo o reconhec imento , de u in con jun to de oposigocs

Discurso e mudan^a social 205

Vamos considerar pedir ajuda com um pneu fu ra d o como

exemplo. Um pedido e polencia lmente danoso para a face neg ativa

de um(a) receptor(a) (A) - assim como para a face do(a) fa lante -

n a medida em que pressiona A para agir de determinada m anei ra.

O pedido pode ser feito 'claramente' (estrategia 1) sem a tentativa

de mitiga-lo , isto e, sem ' acao reparadora ' ("A. jude-me a trocar

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que cons t i t uem a ax iomat ica impl ic i t a de uma ordem pol f t ica

de te rminada.

Em outras pa lavras , as convengoes de pol idez par t i cu la res in -

corporam, e seu uso implicitameute reconhece relagoes socials e

de poder particulares (ver Kress e Hodge, 1979), e, ua medida emqu e se recorre a elas, devem conlr ibuir para reprodtiz ir essas rela-

goes. Um corolario e que investigar as convengoes de pol idez de

um dado genero ou tipo de discurso e um modo de obler percepgao

das relagoes socials dentro das praticas e dos dominios inst i tucio-

nais, aos quais esse genero esta associado. Isso nao significa trocara explicagao voluntarista de Brown e Levinson (1978) das estra te-

gias de pol idez por uma expl icagao estrutural ista da s convencoesde polidez: minha posigao e dialetica, reconhecendo as restrigoesdas convencoes, m as tambem a possibi l idade de, sob certas condi-

coes, rearticula-las cr i a t i vamente e, assim, t ransforma-las (ver. no

Capi tulo 3, o item "Discurso").

O trabalho de Brown e Levinson, porem, incorpora r ea lmen te

um a exceleute expl icagao dos fenomenos de pol idez, e pode ser

apropriado dentro de um q u a d r o teorico dil 'erente. A Figura 5.1

resume as partes principals de sua teoria, em que eles d i fe ren c ia m

cinco estrategias gerais para real izar 'a tos ameagadores da face ' -

AAFs (FTAs, B r o w n e Lev inson , 1987: 60).

irealized AAF

< e x p l i c i l a m e n ( e <

'4. impl ici lamenle

\. sem agao reparadora,

c l a r a m c n l c

"com a^ao reparadora '

• 2. pol idez posi l iva

'3. pol idez nega t iva

5. nao realize o AAF

-Estrategias para a reaiiza^ao de 'rttos amca^adoros ti n face'.

esse pneu") ; pode se r fei to com 'polidez positiva' (estrategia 2) ,em cu jo caso e mitigado ou reparado - por exemplo, d emo u s t r a nd o

afeicao, simpatia ou solidar iedade com A ("De uma a ju d a para tro-ca r esse pneu , amigo"); pode se r fei to co m 'polidez nega t iva ' (es-

trategia 3), em cujo caso e mit igado ao mostrar respeito pela

privacidade de A, ou por seu desejo de nao ser per turbado(a) ou

control ad o( a), etc. ("Desculpe incomodar, mas poderia a ju d a r co m

esse pneu?") ; pode ser feito ' impl ici lamente' (estrategia 4), de

modo que t enha de ser inferido, e o que e dilo esta aberto para in -

terpretagoes alternativas ("Agora, como diabo vo u trocar isso?", ousugerindo: "Voce notou que estou com um pneu furado?"). Note-se

qu e o exemplo de polidez negal iva usa a forma verbal '(voce) po -

d er i a a j u d a r ' em vez de simpiesmente ' a jude ' . Esse e um modoindireto de se fazer um pedido - a p a r e n t e m e n t e iudaga sobre a hi-

potetica ha b i l i d a d e de A para ajudar — e compartilha a propriedadede indiretiv idade da estrategia ' impl ici ta ' . Dizer coisas indire ta-

mente — usar os 'atos de fala indiretos' — e uma parte iniportante

da pol idez. Porem, enquanto a indiretiv idade dos exemplos implf-

citos pode exigir que A interprete o seu significado, a indiretividade

de '(voce) poderia a judar ' tornou-se convencional e nao apresenla

problema in terpreta tive a lgum.

Uma d imensa o da m udanga que, como sugeri, esta ocorrendo

na na tureza d as entrevistas medicas parece ser uma m udanga nas

convengoes de polidez; alguns indicios disso estao presentes nos

exemplos 1 e 2. A modal idade de baixa afinida de, obtida po r meio

da indeterminagao, da glosa da paciente sobre 'estomago azedo'

("uma qu e ima ga o como uma queimagao ou uma coisa assim''),

pode ser explicavel, como sugeri antes, por uma relu tancia em pa-recer mu ito segura, dados o poder e a 'per fc i a ' do medico. Essa

caracteristica da modal idade e tambem uma caracter is t ica da poli-

de z negativa: evi ta iufr ingir o d o mfn io d e autor idade do medico .

206 Norman Fairclough

As mudanc.as da paciente para a voz do mu nd o da vida no exempio 1,

l inha s 21-22, 29-30 e 42, tarnbem podem ser cons ideradas em ter-raos da pol idez. E las podem ser consideradas pistas implici tas para

o medico acerca de um conjunto de problemas adicionais e subja-

centes ao problema em foco. Como sa o implici tas, protegem a face

pos i ti va da paci en te , o que da a impres sao de que e l a e re l i cen te

a respei to de levantar o que e f r eq i ien temen te d e s c a r t a d o c om o

Discurso e mudanfa social 207

quanto o exempio 2 demonstra pol idez posi tiva e negativa para omedico e polidez positiva para a paciente. Essas diferencas estaode acordo com as relacoes sociais contrastantes entre a pratica me-

dica padrao e a ' a l t e r n a t i v a ' . N a pra t i ca medica padrao ha u ma

ass imetr i a marcada d e c o n h e c i m e n t o e a u t o r i d a d e en tre medi -

cos e pacientes, o que implica deferencia e pol idez nega t iva de

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problemas 'pessoais'. Sao talvez igualmente or ientadas para a

face negativa do medico: em entrevis tas medicas convenciona i s , ospro b lema s ' nao-medicos ' sa o m ui tas vezes considerados como nao

sendo estr i tamente assuntos dos medicos, e levanta-los pode ser,

portanto, interpre tado como impor a eles questoes alem do seu de-

ver normal .

O medico do exempio 1 nao e nem negativa n em pos i t i va -

mente pol ido. Pe rgunta r e um ato pote uc ia lm e nte amea^ador para a

face negativa do(a) receptor(a), e a lgumas das perguntas do medi -

co sao tambem potent ial m e nte ameacadoras para a face posi tiva

da paciente, por serem possivelmenfe embaragosas ou hu milha u tes

(especialmente "H a quanto lempo voce tern bebido tanto assim?").Porem, o medico na o mitiga essas perguntas e e co ns is ten temen te

claro e explicito.

No exempio 2, as convengoes de pol idez parecem estar inver-

tidas: e o medico qu e demonstra polidez positiva e negativa a pacien-

te. Ele demonstra polidez positiva ao adotar ele mesmo a voz do

m u n d o d a vida, tanto produ t ivam e nte (consul tas fu turas sa o para

"saber como as coisas vao indo") quanlo receptivamente (em seu

comentar io sobre o relato do mundo da vida da paciente). Ele de-

monstra pol idez ne gativa nas formas reticentes e miligadas de sua

pergunta , avaliacjo e sugestao de visi tas posteriores. A pa c ien t e

na o demonstra pol idez negativa; na verdade , el a interrompe clara-

m e nte o lance do medico em direcao a u m fechamento (d a consu l l a )

com uma retomada do seu relato (isso nao esta inc lu ido no m en

exempio). Ela demonstra, entretanto , polidez positiva no simples

fato de falar com o medico na voz do mu ndo da vida, o que impli -c i ta meu te re ivindica te r reno comum com o medico .

E m suma, o exempio 1 demonstra pol idez negativa para a pa-

ciente, mas nem pol idez negativa nem posi tiva para o medico, en -

pacien tes em re l agao a medicos. 0 r e l a c i o n a m e n t o e n t r e m e d i -cos e pacien tes e fo rmal e socialmente distanciado, o que e anta-

gonico a pol idez posi tiva. E os pacientes nao sao tratados comopessoas, m as como por tadores de prob lemas: isso j u s t i f i c a a

ausencia de po l idez ne ga t iva da par te dos m edicos , que e f re-

quen temente cr i t i cada precisamente como insensibi l idade aos

pacientes como pessoas. Na pratica medica alternat iva, o(a) med i-

co(a) Simula simetria, informalidade e proximidade social , qu e

combatem a pol idez negativa da parte do(a) paciente e favorecem a

pol idez positiva mu tua. O s pacientes sa o tratados como pessoas, oqu e significa que atos potencia lmente ameagadores a face, que sao

inseparaveis do t ra t am e nto dado pelos medicos aos pacientes , ten-

derao a ser mitigados pela pol idez ne gativa.

Ethos

Refer i-me, ao discuti r os dois exemplos medicos, a diferengas

no ethos, no s tipos de i d en t id a d e social que os medicos s inalizam

implicitamente po r meio de seu coinportamento verbal e nao-verbal.

A questao do eihos e iutertextual : que modelos de outros generos e

tipos de discurso sao empregados para const i tuir a s ub je t iv idade

( identidade social. *eu ') dos par ticipantes de interagoes? No caso

do exe mpio 1, os modelos foram tirado s do discurso cien tifico; nocaso do exempio 2 , de discursos do m undo da vida.

Eut re tan to , o ethos pode ser considerado como parte de um

processo mais amplo de 'modelagem' em que o lugar e o tempo de

um a interacao e seu conjunto de participantes, bem como o ethosdos particip antes , sao consti tuidos pela projec.ao de l igagoes em

determinadas diregoes interlextuais de preferencia a outras. M a in -

gueneau (1987: 31-35) da o exempio do discurso (discursos poli t i -

208 Norman Fairclough

cos, por exemplo) da Revoluc,ao Francesa, qu e fo i modelado sobre

o discurso r epu b l ica no d e R o ma aut iga em termos de lugar , tempoe 'cena' (n o sentido de circunstancias gerais do discurso), assim

como do s participates e d o ethos dos participantes.

O exemplo 2 e um caso historicamente menos antigo. A medi-

cina 'a l ternativa ' desse t ipo const i tui o discurso da pratica medica

baseado no modelo do m u n d o da v id a : 'conversa sobre problemas '

Discurso e m u d a n c a s o c i a l 209

Conclusao

0 conceito de ethos consti tu i um ponto no, qual podemos u n i r

as diversas caracteristicas, nao apenas do discurso, mas tanibem do

comportamento em geral, que levam a construir uma versao part i -

cular do 'en'. Dentro dessa configuragao, os aspectos da a na l i se

t e x tua l nos qna is m e concentrei neste capltu lo — controle in t e ra -

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(Jefferson e Lee, 1981; Ten Have, 1989), entre u m a pessoa com

um problema e um(a) ouvin te solidario(a). F az sen t id o p ressu porqu e esse modelo se torne disponfvel pa ra o discnrso medico v ia

discurso cle aconselliamento , que e ele mesmo construido sobre

aquele. Os part ic ipantes sa o construidos em uma relagao de solida-

r iedade e de experiencia c onium , se nao de amizade, e a ceua e

conslruida no sentido de as pessoas se aliviarem de seus proble-

mas. Enquanto o lugar e ainda claraineute medico — o consultor io

de um med ico -, e comum que os med ico s deiitro da medic ina

alternativa (bem como professores e outros professionals qu e ado-

tern posigoes semelhantes) se preo cu pem co m qu es to es como a

posigao da mobilia on a decoragao. procurando mudar os locaisinst i tucionais para fazer as pessoas se senti rem a vontade 011 'em

casa'. E o ethos sinalizado pela fala do(a) medico(a) e, em ternios

mais gerais, pelo modo como os medicos se comportam nesse tipo

de entrevis ta , e o do(a) amigo(a) in(eressado(a) e solidar io(a) , o'bom o u v in te ' .

O ethos e , entao, manifes tado pelo corpo inteiro , nao so pela

voz. Bourd ie u (1984: CapKulo 3) sugere que a l inguagein seja con-

s iderada como uma "dimensao da hexis corporal na q u a l a relacao

global da pessoa com o m u n d o socia l e expressa". Po r exempJo, o"estilo art iculalorio das classes populares" e "inseparavel de uma

relagao geral da pessoa com o proprio corpo, dominada pela rejei-cao d e 'manei r i smos ' ou ' fr icotes ' e a va lor izac ao da vi r i l idade " .

Nao e ape nas o modo como os medicos falam qu e sinaliza o ethos;

e o efeito curnulalivo de su a disposigao corporal total - o modo

como se sentam, su a expressao facia l , sens movimentos, sens mo-dos de responder f is icamenle ao que e di to , seu co mpo r ta men to

proxemico (se chegam perto dos pacientes ou m e s m o os tocam onm a n t e m distancia) .

cional, modalidade e polidez - todos tern um papel . Com efeito , a

maior par te , se nao a to la lidade das dimensoes anali t icamente se -paraveis do discurso e do texto , tern a lgu ma s impl icag5es, direlas

ou indiretas, para a construgao do 'en".Porem, como eu afi rmei no imcio deste capi tulo, essa e u ma

questao negligenciada nos estudos de l inguagem e a na l i se de dis-

curso. A maior parte da atengao que e normalmente dada ao 'eu'

no discurso focaliza o conceito de 'expressao': € comum dist inguir

uma fun§ao emotiva ou expressiva da l inguagem, que esta ligada

ao modo como as pessoas expressam as coisas, de maneira a mos-

trar seus sentimentos sobre elas, ou a t i tu d es em relagao a elas. e ha

um conceito amplamente u ti l izado de 'significado emot ivo ' para

aspectos 'expressivos' do significado da s palavras. O inf luente estu-

do d e Jakobson sobre fungoes da linguagem, por exemplo, d is t in-

gu e como 'emoliva' ou 'expressiva' um a fungao qu e "visa a

expressao direta da at i tude do fa lante em relagao aquilo que ele

esta falando" (1961: 354). O que isso deixa de fora e a perspectiva

crucial da construcao: o papel do discurso na constituigao ou

construgao do 'eu'. Qu a nd o se enfat iza a construcao, a fung ao d a

ide n t idade da linguagem coineca a assumir grande importancia,

po rqu e as fo rma s pelas q u a i s as sociedades ca tegor izam e cons-

troem ide n t idade s para seus mem bros sao um aspecto fundame nt a l

do modo como elas func ionam . como as relagoes de po d er sa oimpostas e exercidas, como as sociedades sa o reproduzidas e m o-

dif icadas . Focalizar a expressao, po r outro lado, m argina l i zou

completamente a funcao de identidade como aspecto menor da

fungao interpessoal, Esta e a razao pela qu a l dis t ingu i a fu u ga o de

ide n t idade em minha modif icagao da teoria de Ha l l i d a y (1978) da s

funcoes da Hnguagem (ver, no Capitulo 3. o item "Discurso"). Nao

obstante, um a discussao mais tecnica e de ta lh ada a ind a es ta fa l tan-

210 N o r m a n F a i r c l o u g h

do para distinguir-se uma fuucao de identidade separada: segundo

Hall iday, para ident if icar u m a fungao separada seria preciso d e-

monstrar que ha uma area relativamente discreta da organizacao

gramatical correspondente a ela. C a p f t u l o 6

A n a l i s e t ex tua l : a c o n s t r u f a o da

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r e a l i d a d e social*

O foco pr inc ipa l nes te c a p i t u l o es ta vo l tado para a q u e l e saspeclos da anal ise de texto que se relacionam com a fungao idea-cional da linguagem e com os sentidos ideacionais -ou com a

' construcao da realidade social', como pus no t i tulo. A enfase,porlanto, esta no papel do discurso na s ignif icant) e na referenda(ver, no Capitulo 2, o item "Foucault e a analise de discurso textual-

mente orientada")., onde o primeiro compreende o papel do discursoem consti tui r . reproduzir , desafiar e reestruturar os sislemas dec o n h e c i m e n t o e crenca. M a s n a o e m a i s d o q u e u m a q u e s t a od e enfase: ine v i t ave lm e nte havera coincidencia com as funcoes derela^ao e de identidade que foram a minha preocupagao no C apitulo 5.

Os dois exemplos principals de discurso qu e discuto sa o um

extra to sobre cuidados pre-nata is de um l ivreto para fu tures pais eo con jun to de discursos ao s quais ja aludi brevemente, feitos p oru m ministro do gabinete britanico , Lord Young, sobre ' cu l tu raempresarial ' . O s topicos anal i ticos especificos que anal iso sao:conectivos e a rgu men ta ^a o , t rans i t ividade e tema, significado depalavra, criagao de palavras1 e metcifora. Em termos das categoriasanalit icas do Capitulo 3, os ultirnos tres topicos alinham-se sob ot i tu lo geral de vocabulario, enqu a n to o primeiro pertence a coesao

e o segundo a gramatica.

Trndugaa de Cel ia M a r i a Ladeira Mota.Palavras (wording), de acordo com o Concise Oxford Dictionary, e a formapela qua l se expressa alguma coisa. O termo e usado pelo au t o r para s ignif icar acriagao de novas palavras de acordo com um de t e rm i nado cnntexto. Na t r a du-gao, optou-se pelo termo ' cr ia^ao de palavras ' ' ou lexical iza^ao. (N. da T.)

212 Norman Fairclough

Conectivos e argumentative

O seguinte exemplo e parte de um a secao sobre cuidados pre-natais de O I f v r o do bebe (Morris, 1986), um l ivreto dirigid o a fu-

turos pais pelos hospitals. Durante a analise, introduzirei t ambem

extratos coulrastantes do Livro da gravidez (Conseilho de Educa-

cao da Saude, 1984), uma publicacao semelhante produzida pelo

Discurso e mudanca social 213

O medico e a parteira t a m be m desejarao saber sobre todos os

seus problemas de saude anteriores, assim como discut ir suas

circunslancias sociais. No s sabemos que as conduces sociais

podem influenciar o resul tado da gravidez. Po r essa razao, elesIh e pergunla rao dctal l ics sobre sua moradia . assim como seu

cmprcgo atual . Alem disso, eles precisarao saber se voce fuma.

bebe alcool, ou esfa tomando a lgum t ipo d e me d i c a me n t o qu e

tenha sido prescrito por seu medico ou por farmaceuticos. T o-

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Conselho de Educacao da Saude britanico. (Omiti a subsec.ao inti -

tulada "Duragao da gravidez", que esta no original antes da subse-ga o in t i tu lada "Exame".)

Assistencia pre -nafal

O objetiv o essencial da assistencia pre- natal e garan t i r que voce

atravesse a gravidez e o t rabalho dc par to nas melhores condi-

c,6es. Inevi tave lmente , portanto. isso envolve um a serie de cxa-

mes e testes durante todo o curso da sua gravidez. C o m o

mencionado ante r iormente , a assistencia pre-natal e fornecida

po r sen hospital local ou por seu clfnico geral, freqiientemente

traballiando em cooperacao com o hospi ta l .

E importante comparecer ao seu pr imeiro exame tao cedoquanto possi'vel, ja que podem ocorrer dis turbios menores q u e o

medico pode corrigir, o que beneficiara o resto da sua gravidez .

Mais especificamente, tendo visto se u medico e reservado um

leito no hospital local, voce receb era de u ma ma ne ira geral a ga-

ranlia de que t udo csta se desenvolvendo normalmente .

A pr imeira visi ta

Su a primeira vis i ta e n v o l v e u ma revisao abrangente de sua saii-

de desde a infancia ate o momento em que voce ficou gravida.

Ocasiona lmente . as mulheres podem sof rer de cer tos dis tu rbios

medicos dos q u a i s elas nao tern c onh e c im e nt o - tais como pres-sao sangiimea elevada. diabetes e doenc.a dos rins. E impor tan te

qu e esses problema.s se jam ident i f ic ados no estagio i n i c i a l , jaqu e podem i n t luencia r sc r iamcnte o curso da gravidez.

da s essas substancias as vezes podem afetar o desenvolvimento

de um bebe.

E x a m e

Voce sera pesada, de forma que o seu g a nh o de peso subse-

qiiente possa ser avaliado. Sua a i tu ra sera medida , j a que asmulheres pequenas em geral tern a pelvis l ige iram ente menor do

qu e as mulheres altas - o que na o e surpreendente . Um exame

fi 'sico comple to sera entao rca l izado e i nclu i ra a observacao de

seus seios, do coracao, do s pulmoes , da pressao sangiimea, do

abdome e da pelvis .

0 proposito desse exame e ident i f icar qua i squer a nor m a l ida de s

qu e possam estar presenfes, mesmo qu e n u n c a Ih e tenham cau-

sado qua is que r problemas. U m exame vagina l permi t i r a que a

pelvis seja ava l iada , a fi m de verit'icar as condic.oes do ute ro , da

cervice e da vagina. Uma l amina cervical e tambem freqiiente-mente colhida nesse momento para exclu i r q u a l q u e r m u d a n g a

pre-cancer igena inicial que, embora rara, possa cstar presente.

Comegaremos analisando certos aspectos da coesao t ex tual e

da estru tura frasal nesse exemplo; este procedimento nos fornecera

um meio de olhar para a especie de argumentac,ao que e usada e aespecie de padroes de racional idade qu e ela pressupoe; isso, po r

sua vez, no s dara alguma percepc.ao dos tipos de ident idade social

qu e sao construidos no texto, em particular, a voz medico-cientifica e

o ethos que ela content.

Na Ingbterra, as par te iras sa o reconheciclas e i n t e g r ad as ao Sis tema Nac io n a l de

Saude . (N. da T.)

214 Norman Fairclough

Va mo s comegar com a maneira em que os periodos sa o cons-truidos na segao int i tulada "Exame", qu e consiste em dois paragra-

fos, cada um co m tres periodos. Com excegao do ul t im o per iodo

do primeiro paragrafo e do primeiro per iodo do segundo paragrafo ,

cada periodo consiste em duas oragdes (isto e, sao oragoes sim-

ples: ver , no Capitu lo 3, o item "Discurso como texto") l igadas por

um a c on juugao que iudica proposi to ou razao. Esquematicamente,

Discurso e mudanca social 215

Nesse caso, os pro d u to res do texto estao claramente ident if i -

cados com o corpo medico. A evidencia mais explicita disso esta

no segundo paragrafo da segao intilulada "A primeira visita". O pri-

meiro e o terceiro periodos desse paragrafo preveem que o corpo

medico 'desejara saber' e ' pergunta r ' . O segu nd o periodo e umaexpl icagao sobre o p o r q u e das perguutas , mas o conhecimento

cientifico no qu a l o corpo medico baseia suas praticas e signif ica-

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oragao 1 para que/desde que/a f im de que/para oragao 2

Mesmo as d u a s excegoes se adequam pa rc ia lmen te a esse pa -

drao, porque a conexao entre elas e a de proposito : o primeiro pe -

riodo do segundo paragrafo comega co m "O proposito disso e",

sendo qu e 'disso' se refere acima ao ul t im o per iodo do primeiro

paragrafo. D e fato, o padrao de periodos ligados em termos de

proposito ou razao, tanto quanto as oraches no s periodos, e repetido

em todo o exemplo . A mensagem que e transmitida e de seguranc.a:

tu d o o que acontece durante a assis tencia pre-natal acontece por

um a bo a razao. Pica claro quern recebe essa seguranga, mas o quenao e muito claro e precisamente quern esta fornecendo a seguranga.

Vamos ten tar estabelecer isso examinando os par ticipantes:

aqueles qu e es ta o pa r t ic ipa nd o nesse t e x t o como p a r t e d e u m a

pratica discursiva , e aqueles que par ticipam dos processes de as-sis tencia pre-nata l que es ta o send o descr i tos . Os pr imeiro s sao(1 ) leitores do texto , na ma io r ia dos casos su jeitos a assistencia

pre-natal (como as mulheres gravidas) ou par ticipantes envolvidos

dire tamente (como parceiros); e (2) os produtores do texto: n e n h u m

autor e ident if icado, mas um organizador (u m professor de obste-

tricia e ginecologia) e uma equipe editor ia l sa o citados. O s pa r t ic i -

pantes na assistencia pre-natal sao (1) as mulheres gravidas, e (2) o

corpo medico. A relagao entre os le itores como par ticipantes do

discurso e as mu lheres como par ticipantes da assis tencia pre -n a t a l

e obvia : a maior ia do s primeiros sao os que pro va ve lmen te es tarao

no segundo grupo. A relagao entre os produtores do t ex to e os par-ticipantes da assistencia pre-natal e bem menos obvia: em principio, osprodutores do texto poder iam adotar tanto a perspectiva das mu-

lheres gravidas como a do corpo medico, ou ne m uma nem outra .

t iva men te t r a d u z id o por palavras como o que 'nos' sabemos: esse

'nos' marca a ligagao entre os produtores do texto como partici-pantes no processo discursivo e o corpo med ico como par ticipante

do processo de assistencia pre-natal.

Ha, no entauto , um exemplo de distanciamento entre os dois,

no segundo per iodo do primeiro paragrafo sob o t i tu lo "Exame": o

comentar io acrescentado "o que nao e surpreendente" surge como

a voz do m u n d o da vida do futuro paciente, ou mesmo do corpo

medico em sua condigao nao-profissional (relembre a discussao deMishler sobre vozes do m u n d o da vida em sua ana l i s e do exemplo

do discurso medico analisado anter iormente - ver , no C a pi t u lo 5, o

item "Exemplo 1: Entrevista m edica 'padrao'"). M as note o contrastenas vozes entre o co men ta r io e a segunda oragao do per io d o ("ja

qu e as mu lheres p e q u e n a s em geral tern a pe lv is l ige i r a men te

meno r do que as. mu lheres alias"), o que e uma oragao explicativa.

A oragao esta na voz med ica : 'pelvis' e um termo medico, a oragao

consiste em uma afirmac,ao co m autor idade, que nos consideramos

estar baseada na evidencia medico-cientif ica . Ela e t a mb em de

longe a mais tipica do exemplo como um todo: a ma io r ia da s ora-

goes explica tivas esta na voz medica. O a b r a n d a m e n t o da afi rma-

gao ("em geral") e interessante: de um lado, su a indeterminacj io

sugere uma m u d a n g a para a voz do m und o da vida , enquan to por

o u t ro lado ma rca o ethos cu id a d o so e c i r cu nspec to que nos asso-

ciamos com a medicina cientifica.

C la ra men te , que rn tia seguranga e o corpo medico. A s orachesexplica tivas ou de proposito , consis tentemente apresentadas na voz

da medicina , clao a especie de racionalizagao e argumentagao que

se pode esperar do corpo medico, o que contribui para a construgao

do ethos medico-cientif ico (ver. no Capitu lo 5, o i tem "Exemplo 1:

216 Norman Fairclough

Entrevista med ica 'padrao'") no extra to . Compare o seguiuteextra to de O livro da gravidez:

D u r a n t e toda a su a gravidez voce tern exames regulares . Isso e

para ter certeza de que tan to voce como o bebe cslao bem e coin

saiide, para ver i f icar se o bebe esta se d e s c n v o l v e n d o apropr ia -

damente e . tanlo q u a n t o possi'vel, p r e ve n i r a lguma coisa de er-

Discurso e mudanca social 217

mente' (segundo periodo do primeiro paragrafo). O uso de voca-

bular io tecnico medico (por exemplo, 'pre-cancerigena') reforga o

efeito de conhecimento previo .Em su ma , u ma a n a l i se da coesao nesse exemplo permite que

se observe o seu modo de argum e ntagao e de r a c io na l id a d e e. as-

sim. permite a observac.ao de como a voz e o ethos med ico -

cientiTico estao construidos no texto . Generalizando co m base nesse

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rado... (o i ta l ico e meu)

A s expressoes em i ta lico sa o e v ide n te m e nte mais proximas da

voz do m u n d o da v id a do que as e q u i v a l e n t e s em O livro do

bebe, m as considero, n o en ta n to , que ha uma ambiValencia d e

voz em O livro da gravidez. A razao e que o corpo medico fre-

qiientemente m u d a pa rc ia lmen te pa ra u ma vo z d o mu nd o d a v id a

q u a n d o fala com os pacientes ( lembre do exemplo 2 anterior, C a-

pitulo 5, "Exemplo 2: Entrevis ta medica 'alternativa'"), e o treclio

em italico poderia te r sido usado pelo corpo medico. Por tanto ,

permanece pouco claro se o(a) produtor(a) de O livro da gi'avidez

esta escrevendo da perspectiva da paciente ou da perspectiva (d e

um a posigao 'modemizante') do corpo medico.Outras evidencias de uma fusao do s produtores do texto com o

corpo medico no extra to de O livro do bebe estao na sua m odal i -

dade (ver, no Capitu lo 5, o item "Modalidade"). No pr imeiro para-

grafo da secao in t i tu lada "Exame", todos os tres per fo d o s sa o

modalizados com o futuro simples (will em ingles), o que constroi

um sen t ido de predicao categorica ~ "isso e o que acontecera" (will

happen) - e sugere que o produlor do texto esta escrevendo de

um a posigao com co nhec imen to interno. Da mesma fo rma , com o

verbo poder (can em ingles, um a possibilidade m ais categorica), isto

e, "essas substancias as vezes po d em afetar.. .", ou com uma fo rmamais abrandada para o verbo poder (e m ingles may, qu e sugereapenas um a possib ilidade) , "qualquer mu d a nca pre-cancer igena

inicia l , embora rara, possa estar presente", na s quais o produtor do

texto faz afirmacoes especializadas sobre possibilidades medicas. Os

adverbios de freqiiencia ( 'a lgumas vezes', ' r a ramente ' ) reforgam a

ideia de autor idade dessas af irmagoes . Note tambem "e im por tan te

para" (periodo de abe r tu ra do segundo paragrafo) e "inevi tavel-

exemplo, os t ipos de texto diferem nas formas de relagao que sao

estabelecidas entre suas oragoes e nas formas de coesao qu e essasrelagoes favorecem, e essas diferengas podem ter s ignif icagao

cu l t u ra l ou ideologica. Essas diferencas d e coesao co mb ina m-se

com outras para marcar as diferencas na textura geral dos tipos de

texto (Ha l l id a y , 1985: 313-318), no raodo geral de es truturar as

oracoes em um texto . Outras dimensoes de variagao incluem o

tema, d isculido na proxima segao, os meios pelos qu a is a informa-

gao dada (apresentada pelo(a) produtor(a) do texto como j a conhe-

cida ou estabelecida) se dist ing ue da informagao no va (Ha l l id a y .

1985: 271-286; Qu irk et al., 1972: 237-243), e os meios de por em

pr imeiro p iano ou em piano de f u n d o par tes especif icas d o t ex t o(Hoey, 1983). U m aspecto da mudanca discursiva que e ta lvez m e-

nos obvio do que os outros, mas que pode valer a pena investigar .

e a m u d a n g a na t ex tu ra e na coesao: sera o caso, por exemplo, de

investigar que tipos de informagao piiblica colonizada pela propagan-

da (um exemplo e a public idade governamental em questoes como a

Aids) manifes tam mudang as nesses aspectos, e, se assim for , como

essas mudangas poderiam ser l igadas a outras qu e ocorrem nosmodos de racionalidade e de ethos.

N u m a passagem ja citada , Fouc au l t refere-se a

var ios csquemas reloricos, de acorcio com os qua i s os grupos de

c n u n c i a d o s pod em ser comb inados (como as describes, as dc -

duc oe s , as def in icoes , cuja sucessao caractcriza a a r q u i t e t u r a tie

um texto, estao ligadas) (1972: 57).

N u m pr imeiro nfve l , a analise da coesao focaliza as relac,6es f u n -

cionais entre as oragoes, e pode se r usada para investigar os 'esque-m as reloricos ' em var ios t ipos de texlo. Por exemplo , no extra to de

218 Norman Fa i rc lough

O livro do bebe, um padrao predominate e a descrigao (do que

acontecera a u m a mu lher gravida) segu ida d e uma expl icagao

(das razoes medicas para isso). O seguinte extrato, a abertura de

um anuncio de re vista , e estrutu rado de forma bem diferente:

C ons ide r s por um mo me n t o por que os d ip lomatas e os d i re tores

d c c m p r e s a s em todo o m u n d o p r e f e r e m v i a j a r na classc S .

Dlscurso e m u d a n g a social 219

cado de outra , qualif icando-a d e varias maneiras possiveis: pela

referenda ao tempo, ao lugar . ao modo, a causa ou a condigao". A s

principais relagoes entre oragoes e periodos aqui sao relagoes tempo-

rais (A entao B, A depois de B, A q u a n d o B, A e nquanto B, etc. -

considerando-se A e B oragoes ou periodos); relagoes causais (tais

como relagoes de razao ou propos i to i d e n t i f i c a d a s na ana l i se de

O livro do bebe); relagoes con dicionais (se A entao B); relagoes

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T a l v e z seja p o r q u e o c a r r o -c he fe d a M e r c e d e s -Be n z t r a n s -

p o r t a presence se m ex ibi r ostentagao. Sim e leganc ia comple la oe s t i l o d a q u e i e s q u e n a d a p r e c i s a m p r o v a r (Sunday Times

Magazine, 21 de Janei ro de 1990).

O anun cio se inicia com uma sequencia de pergunta e resposta,

ou mais precisamente um a pergunta indire ta (u m pedido ao leitor

para considerar u ma pergu nla) seguida po r uma possivel resposta

sugerida (e m dois periodos); esse e um esquema retorico larga-

mente usado na publ icidade. E provavel que diferentes modos re-

toricos, tais como t ipos de narra t iva , sejam dis t in tos no s esquemas

usados.

Hal l iday (1985: 202-227) fornece um arcabougo teorico deta -Ih ado para analisar alguns tipos importa ii tes de relagao funcional

entre as oragoes (ver tambem Hoey, 1983), embora isso nao inclua

a relagao pergunta-resposta do ultimo extrato. Uma versao do m e s m omodelo leorico pode ser usada para relagoes funciona i s entre pe-

riodos inteiros (p . 303-309). Em resumo, Ha l l i d a y di s t i ngue os tres

tipos principals de relagao entre oragoes, como 'elaboragao' , 'ex-

tensao' e ' realce'. Na elaboragao, uma oragao (periodo) "elabora o

sentido d e outra oragao por meio d e u ma maior especif icagao ou

de descrigao desta outra oragao", ou seja, refor m ul an do - a, exem-

pl i ficando-a ou esclarecendo-lhe o sen t ido . U m exemplo desseprocesso e o ul timo periodo do s e g u n d o paragrafo do texto sobre

assistencia pre-natal , comegando coin "Mai s par tku la rmente" . Na

extensao, uma oragao (periodo) "expande o sentido de outra acres-

centando-lhe alguma coisa nova". A extensao pode ser uma ques-

ta o de ad igao (marcada por 'e', ' a l em disso', etc. ) , d e relagao

adversativa (marcada por 'mas', 'porem', ' con tudo ' , etc.), ou devar i agao (marcada p o r 'ou', ' a l t e r n a t i v a m e n t e ' , 'em v e z de',

etc.). Na relagao de realce, uma oragao (periodo) "realga o s ignif i-

espaciais (A onde B); e comparagoes (A como B, A da mesma

forma B).

U m a variavel importanle entre tipos de texto e a medida em

qu e relagoes entre oragoes e periodos sao marcadas explicitamente.

Uma diferenca entre O livro do bebe e O livro da gravidez e que asrelagoes causais (razoes e propositos) sao geralmente mais expl i -

ci tamente marcadas no primeiro - ha, por exemplo. mais conjun-

goes como ' para que ' ou ' desde que ' -, e essa explicitude parece

contr ibuir para chamar atengao para o d o min io claro da voz e do

ethos medico-cienti fico no prime iro l ivreto.Essa variagao na expl ici tude tambem aponta para a necessidade

de distinguir dois niveis na analise da coesao: a analise das rela-goes funcionais coesivas, tais como as descri tas anteriormente, e a

analise dos marcadores coesivos expl ici tos na superficie do texto,

tais como as conjungoes referidas. Estas ul tim as tambem merecem

atengao, na o apenas para determinar em que medida as relagoes

funcionais sao marcadas expl ici tamente, mas tambem porque ha

diferengas significativas e ntre os tipos de texto nos tipos de mar-cadores que eles tendem a favorecer. H a l l i d a y (1985: 288-289)

dist ingue quatro tipos principais de marcagao coesiva d e su per f i -

cie: 'referenda', 'elipse', 'conjungao ' e 'coesao lexical' . Novamen-te, posso razer apenas uma apresentagao rapida desses tipos de

coesao. Referenda e quando o texto se refere a uma parte anterior

ou quando antedpa parte do texto que esta adiante, ou para o exte-

rior, a situagao ou o contexto cul tu ral mais amplo do texto, us an-

do-se i tens, tais como pronomes pessoais, demonstrativos, eartigos definidos. A elipse elimina material que e recuperiivel de

outra par te d o texto, ou o substi tu i por outra pa lavra , realizando

um elo coesivo entre as duas partes do texto (por exemplo, a el ipsede 'espada' na segunda parte desta troca: "Por que voce nao en-

220 Norman Fairclough

t rou com espada?" - "Eu nao t inha.") . A conjunc.ao ja fo i bas tan te

de ta lh ada : e a coesao co m pa lavras e expressoes co n ju n t iv a s , in -

c lu ind o aque las que sao t rad ic iona lm e nte c h am adas 'conjunc.des '

('desde',£se', ' & * , etc.), assim como ' ad juntos conjunt ivos ' (Hal l iday,

1985: 303) ou ' c o n j u n t o s ' (Q ui rk el al, 1972: 520-532), tais como

'portanto', 'alem disso', 'em outras palavras ' . Ja a coesao lexical e

a coesao po r meio da repeticao de palavras , da ligagao de pa la v ra s

Discurso e mudan^a social 221

u ma caracterls t ica de dip loma tas e dire tores de empresas ( t ransfe-

r i da a qu i para o carro), e qu e dip lom atas e di re to re s d e empresas

possuem 'estilo' e nada precisam provar. Note-se que essas relagoes

colocacionais nao sao as que pode r iam ser enconlradas num dicio-

nario (diferentemente , p or exemplo, da rela^ao e n t re 'cachorro' e

'latido'); elas sao estabelecidas no texto pelo(a) produtor(a) do

texto. A o estabelece-las, o(a) produtor(a) pressupoe t am be m iun(a)

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e expressoes em relae,6es de sent ido (ver Leech, 1981), t ai s como a

sinonmiia (mesmo s e n t ido) ou a h ipom m ia (onde o sentido de u m'indui' o s e n t ido d e outro) , ou a ligagao de pa lavras e expressoes

qu e 'se colocam' (Hall iday, 1966), isto e, que per tencem ao mes-

m o dom in io semantico e t en d em a co-ocorrerem (por exemplo.

'cachimbo', ' f u ma cX, 'fumo').

Seria um equivoco considerar esses t ipos d e marcac,ao coesiva

d e su per f ic ie s im ple s m e n te c om o propr ie dade s ob je t ivas d o s

textos. O s ma rca d o res coesivos tern de ser in t e rpre tados pelos

interpre tes d e textos como parte d o processo de construc.ao de lei-

t u ras coerentes d os textos (ver, no Capiiulo 3, o i tem "Prat ica dis -

cursiva"); a coesao e u m fa to r n a coerencia. Por exemplo, nao sepode especificar qu e itens lexicais num texto se colocam sem con-

s iderar as interpretac.oes do s interpre tes desses textos, isto e. e n t r e

quais itens os interpretes realmenle discernem as relagoes. Contudo ,

os marcadores coesivos tambem precisam ser considerados d i na-

mica men te d a perspect iva d o produ tor d o texto: os produ tore s d e

texto estabelecem at ivamente relac,6es coesivas de tipos part iculares

no processo de posicionar o(a) interprete como sujeito. Conseqiiente-

mente, a coesao considerada nesses te rmos dinamicos pode tomar-se

um modo s ignif icat ive de t rabalho ideologico levado a cabo num

texto.

0 aiiuncio de revis ta apresentado anteriormente (neste i t e m )i lust ra esses pontos . U m a interpretac.ao coerente dessa passagem

de pe nde de bas tan te t raba lh o in fe re nc ial , centrado na reconstruc,ao

das ligagoes coesivas colocacionais estabelecidas pelo(a) produtor(a)

d o lexto - entre "diplomatas e dire tores de empresas", " t rans por ta

presence sem e xib i r ostentac.ao", e "o c om por tam e nto daque le s

qu e n a d a precisam provar". Isto e, pode-se dar s e n t ido ao t e x to

assumindo-se que o t r a n spo r t e de preseuga se m exibir ostentac,ao e

interprete que e 'capaz' de perceber essas relacoes colocacionais;

e, na med id a que os interpre tes sa o localizados com sucesso nessaposic,ao, o texto e ef icaz no t raba lho ideologico de construgao dos

suje i tos para os quais essas conexoes sa o senso co mu m (ver a dis-

cussiio sobre sujeic.ao no Capi tu lo 3, i tem "Discurso como prat ica

social: ideologia e hegemonia", e no Capitulo 4, item "Intertextua-

lidade, coerencia e sujeitos").

Transit ividade e tern a

A d imensa o id ea c io na l da gram at ic a da oragao (ver, no Ca-

pitulo 3, o item "Discurso"), usualmente referida na lingiiistica

sistemica como trans i t iv idad e (Hall id ay, 1985: Cap itulo 5), l i da

com os t ipos de processes que sao codif icados em oragoes e com

os tipos d e participates e nvo lv idos ( ' pa r t i c ipan te ' aqu i s ignif ica

e le m e ntos em ora^oes). Como i n d iqu e i no Capitulo 1. a t rans i t iv i -

dade recebe mu i t a aten^ao em analises por parte d a lingiiistica cri-

tica (ver Fowler et a!., 1979; Kress e Hodge, 1979; Kress, 1988;

Hodge e Kress, 1988). Dois tipos principals de processes sao

processes re lac ionais , onde o verbo marca uma rehigao (ser, ter,

tomar-se) entre os part ic ipantes , e processes de ac,ao, onde um

agente age em direc.ao a um obje t ivo. Tambem falare i u m pouc onesta segao sobre t ema , um a d im e ns ao t e x tu a l da gram at ic a da

oragao de d ic ada ao s modos pelos qua i s os elementos d a o ra ya o sa o

posicionados de acordo com a sua proe m iue nc ia i n fo rma c io n a l .

U ma colsa a no ta r sobre o t ipe de processo de ac.ao no extralo

d e l iv re to sobre assis tencia pre -na ta l e qu e a s mu lheres grav idas

ra ram e nte sa o refer idas como agentes . Os agentes em processes d e

agao sao em geral o corpo medico (e m m ui tos cases d e fo rm a im -

222 Norman Fairclough

plicita, porque a oragao e passiva e o agenle e omit ido - por exem-

plo, "voce sera pesada"), on entidades nao-humanas (por exemplo ,

' condigoes sociais' e ' subs tancias ' , no segundo paragrafo sob otitulo "Sua primeira visi ta"). Inversamen te, as mulhe res gravidas

ou suas caracteristicas fisicas ('voce', 'sua a l tu ra ' ) quase sempre

ocorrem como objetivos em oracoes de agao. Tambem cabe lem-

brar que voce (referindo-se a mulh eres gravidas) r a ra men te ocorre

Discurso e mudan^a social 223

U m a caracteristica final d e transi tividade e o grau de no mina -

lizagao no exemplo. A nom ina l i zac ao e a conversao de processes

em nomes, que tern o efei to de por o processo em si em segundo

piano - o tempo e a modalidade nao sao indicados - alem de us ua l -

mente nao especificar os participates, de forma que agente e pa-

ciente sa o deixados implici tos. A l inguagem medica. cientif ica ou

tecuica i'avorece a nominal izacao, mas ela pode se r abstrata, amea-

gadora ou misti ficadora para pessoas leigas, como os le i tores

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na posicao inicial, inforraacionalmente importante, da oragao, como

o seu ' tema' (ver mais adiante) .O livro da gravidez e diferente nesses aspectos. El e contem

mu ito s processes de acao co m 'voce' na fungao de agente, e rnui -

ta s de suas oracoes tern 'voce' como tema. Po r exemplo:

Voce provavc lmente deseja ra fazer mui tas perguntas - sobre as-

sistencia pre-natal, sobre o hospi ta l , sobre sua gravidez . Voce

pode tambern querer d iz e r algo sobre o que voce espera na gra-

videz e na hora do parto. Conte a par t e i r a q u a l q u e r coisa quevoce a c h e im p or t a n t e . E sc r cva com a n t e c e de nc ia as coisas

que voce quer pergun ta r ou dizcr .

'Voce' e o agente de ' desejara' , ' fazer ' , ' q u e r e r ' , 'dizer' e,

impl ic i ta men te , de 'conte' e 'escreva'; e 'voce' e o tema em cinco

oracoes ( incluindo oracoes dependentes, tais como "o que voce

espera na gravidez e na hora do parto"). Poderiamos dizer que e

tambem um tema im pl f c i to n os i m p e r a t i v o s 'conte' e 'escreva'.

O caso de 'voce' em negri to sublinha a central idade de 'voce' em

O livro da gravidez, em conlraste com a descentral izacao das mu-

lheres em O livro do bebe. No ultimo, a proporgao re la t ivam e nte

alta de passivas se m agente, onde o agente implfci to e um memb ro

do corpo medico, combinada co m modal idades categoricamente

previsiveis a que me referi na ul tima segao ("voce sera pesada"

combina as duas caracteristicas), constroi o sentido de mulheres

gravidas sendo su j e i t a s a proced imentos anonimos e inva r ia ve is .

A tematizagao de 'voce' em O livro da gravidez mostra novamente

qu e ele adota (mesmo qiie ambivalentemente, como sugeri na u l t i -

m a segao) a perspect iva d as mulheres grav idas , e n q u a n t o a

perspect iva em O livro do bebe e claramente a do corpo medico.

desse exemplo . Ha um g r a n d e n u m e r o d e n om i n a l i z a c oe s en iO livro do bebe; alguns exemplos na subsecao "A primeira visita"

sao: "uma revisao abrangente de sua saude", "dis turbios medicos",

"doen^a dos rins", "seus problemas de saude anteriores", "o re-s u l t ado da gravidez", "o desenvolvimento do bebe". A alta fre-

quencia de nominalizacoes e uma outra indicagao de corno este

texto esta r ep ro d u z ind o uma voz medica.

Discuto agora as questoes levantaclas po r esse exemplo, em ter-

mos mais gerais, comegando pela transi tivid ade, passando em se-

guida para a voz (ativa versus passiva), a nom ina l i zagao e o tema.

Existem processes e participantes na real idade, animados einanimados, e existem processes e participantes na l inguagem, m asnao podemos simplesmente extrapolar da natureza de u m processo

real para a forma como ele e significado Hnguisticamente. Ao contra-

rio, um processo real pode ser signif icado lingiiis t icamente n u m a

var iedade de formas, de acordo com a perspectiva em que ele e

interpret ado. Uma l ingua diferencia um pequeno numero de tipos

de processo e tipos de participantes associados, e a significagao de

um processo real e uma questao d e assimila-lo em u m desses tipos.

U m a motivagao social para anal isar a transi tividade e tentar for-

mular qu e fa tores sociais, cu l tu ra i s , ideolog icos , pol i t i cos ou

teoricos determinam como um processo e significado nu m tipopar ticular de discurso (e em diferentes discursos), ou num texto

par ticular .

Os principals tipos de processes em ingles sao: agao', 'evento ' ,

' relacionaF e 'mental ' . Ja me referi ao s processes relacionais e deagao anleriormenle. Dois tipos de processes de agao podem ser

distinguidos: 'agoes dirigidas' e 'acoes nao-dirigidas ' . A agao dir i-

gida e o t ipo qu e ident if iquei em O livro do bebe. ohde um agente

224 N o r m a n F a i r c l o u g h

ag e em diregao a um objetivo. El a gera lmen te se concretize - ou se

manifesta na superficie do texto - como uma oracao t rans i t iva

(sujeito-verbo-objeto), por exemplo: "a polfcia atirou em cem maiii-festantes". A agao nao-dirigida envoive um agente e uma agao, mas

nenhum objetivo (explicito), e geralm ente ela se concretiza como uma

oracao intransitiva (sujeito-verbo), como "a policia estava atirando".

Os processos de even lo envolvem um evento e um objetivo e t am -

be m geralmente se concretizam como oragoes i n t rans i t i vas , ta l

Discurso e mudan^a socia l 225

cagao politica e ideologica na escolha do tipo de processo, Porexemplo, um a questao que e sempre irapor lante e se agenda, cau-

sa lidade e responsabilklade sao tornadas expl ici tas ou deixadas

vagas no s relatos de eveutos importantes na midia. O s exemplos

anter iores evocam uma categoria de eventos onde essa ques tao se

apresenta constantem ente: violencia e morte violenta. Assim, Trew

(1979) mostra que a orientacao poli t ica de um jornal determina a

escolha de tipos de processo para significar mortes durante m a n i -

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como "cem m a n i f e s t a n t e s morre ran r ' . As oragoes de agao nao-dir igida e as oragoes de evento nao sao sempre f ac i lm e nte distin-

guiveis, mas elas diferem em termos das perguntas que podem ser

feitas com mais naluralidade; a agao nao-dirigida esta mais uatural-

mente ligada a pergunfa "0 que x (= o agen(e) fez?", e o evento a pe r-

gunta: "O que aconteceu a x (= o objetivo)?". Os processos

relacionais envolvern relagoes entre entidades ligadas a ser, tornar-se

ou te r (posse), po r exemplo, "cem manifestautes estao mortos".

Fina lmente , os processos menta i s sao cognitivos (verbos como'saber', 'pensar'), perceptivos ('ouvir', 'notar) e afetivos ('gos-

tar ' , 'temer'). Eles geralmente se concretizam como oracoes t ran-

sitivas (por exemplo, "o s mani fes tan tes teraiam a policia"),

envolvendo o que Hal l i day cliama um senser ("aquele que sente")("os manifestantes" neste caso - a en t id a d e que vivencia o proces-

so mental) , e urn ' f enomeno ' ("a policia" neste caso - o alvo ou a

fonte dessa experiencia).

A escolha do tipo de processo para significar um processo real

pode ter signif icagao cu l tu ra l , politics ou ideologica, como sugeri

anter iormente. Hal l iday tbrnece u m exemplo literario de sua signi-

ficacao cul tural em um estudo sobre o livro O s herdeiros, de William

Gold ing (H al l iday , 1971). Ele mostra como a perspectiva de Lok

(homem de Neander tha l ) e s ignif icada no romance com processosde eventos , com a conseqi iencia de que as 'agoes dir igidas ' e as

relagoes de agenda e causalidade associadas a elas nao podem se r

representadas. Isso registra o primitivismo cultural de Lok e sua inabi-

l idade de construir um sentido da s agoes do Povo (Homo sapiens).

Algun s dos exemplos ilustrativos usados anteriormente ("a polfcia

alirou em cem manifestantes", "cem m ani fe s tan te s morreram".

"cem man ifestan tes estao mortos") sugerem um a possivef sign if i-

festagoes politicas na Africa do Sul e, desta maueira, determ ina sea responsabi l idade pelas mortes e atr ibuida explicitamente e a

quern e atribuida. Da mesma forma, guerras, desemprego, decl inio

industr ia l e acidentes indus t r i a l s sa o significados algumas vezes

como eventos que apenas ocorrem, e em outras vezes como agoes

co m agentes responsaveis . Essas al ternal ivas podem ser um foco

de luta politica e ideologica. 0 mesmo e verdade para a significa-

ga o de processos de assistencia pre-natal no exemplo anterior, e a

queslao de saber se as mulheres gravidas sa o representadas como

agentes de acoes ou apen as objetos de acoes.A forma gramat i ca l de uma oragao nao e sempre um gu ia

ob je t ivo para o seu tipo de processo; existem casos, po r exemplo,do que H al l iday chama 'metaforas gramaticais ' (1985: Capilulo 10),q u a n d o um tipo de processo assume a realizagao gramatical tipicade outro. Estes sa o algims extratos de uma reportagem do jorna l

comunista bri tanico The Morning Star: "Grandes manifestagoes

estimulam a briga pelo Servigo de Saude" (manchete) ; "trabalha-

dores e colegas da saude fizeram manifestagoes e comicios. ma r -

charam e fizeram piquetes, panfletaram e recolheram ass ina turas

em abaixo assinados"; "0 Parlamento fo i atingido por centenas de

nortistas". Essas sa o aparen temente oragoes de agao qu e dao a

forte impressao de at ividade com proposi to. A primeira e a terceirasa o oracoes transitivas (sujeito-verbo-objeto), a realizagao t ipica de

agao dirigida, mas pode-se considera-las como al tern ativas metat 'o-

r icas para, por exemplo, "muitas pessoas fizeram manifestagoes, e

isso a juda os que lu tam pelos servigos de saude". e "centenas de

nortistas real izaram um lobby no Parlamento". A segunda oracao

consiste em uma serie de oracoes de agao aparentemente nao-dirigidas,qu e novamente podem ser consideradas como metaforas (para

226 N o r m a n Fai rc lough

"participaram das manifestacoes", "real izaram comfcios", etc.).

Nesse caso, ha u m a clara motivagao para a metafora gramalical naposigao polftica do jornal.

Uma var iavel adicional nas oragoes de agao d i r i g i da e a 'voz',

que tanto pode ser ativa como passiva (Quirk el a/., 1972: 801-811;

Ha l l id a y , 1985: Capi'tulo 5). N u m a oragao passiva, o objelo e su -

j e i to e o agente e agente da passiva (uma estrutura qu e comecaco m 'por') ou e omitid o (exemplos com ou sem agente de O Vivro

Discur so e m u d a n f a socia l 227

na l i zagao ("um exame fisico completo") - sem um agente ident i fi -

cado — fortalece isso. As nominalizagoes podem tambem envolver

a omissao de outros participantes alem dos agentes; por exemplo,t a n t o o agente como o objeto sa o omitidos de 'exames' e 'tesles'

em "isso envolve uma serie de exames e lestes durante todo o cur-

so da sua gravidez".A no mina l iz a ga o t ransforma processes e atividades em esta-

dos e objetos, e agoes concretas em abstratas. Por exemplo, uma

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do bebe sao "a assistencia pre-nata l sera fornecida por sen hosp i tallocal ou por seu clfnico geral" e "sua a l t u ra sera med id a " ) . Ativa e

a escolha nao-marcada, a forma selecionada q u a n d o nao ha razoes

especificas para escolher a passiva. E as motivagoes pa ra escolhe r

a voz passiva sao varias. Uma e que el a pe rm i te a omissao do

agente, embora isso possa ser molivado pelo fa to de que o agen te e

ev id en te em si mesmo, ir relevante ou desconhecido. U ma outra

razao polftica ou ideologica para uma passiva sem agente p ode ser

a de ofuscar a agenda e. portan to, a c aus a l idade e a responsahil i -

dade (compare "a poh'cia at irou em cern manifestantes" co m "cem

manifestantes foram mortos"). As pass ivas sao tambem mot ivadas

por cons ideragoes re l ac ionadas co m a f u n g a o t e x t u a l d a oragao .

A voz passiva muda o objeto para a posigao i n i c i a l d e ' t e m a ' , o

que us ua lm e n te s ign i f ic a apresenla-lo como informagao j a 'dada '

ou conhecida; a passiva tambem muda o agente, se nao o omite,

para a posicao proe m ine n te no f inal da oragao oude em geral eu -

c o n t r a m o s a informagao nova . P or e x e m p l o . em "a ass i s tencia

pre -na ta l sen! fornecida por seu hospi tal local ou por seu clfnico

geral", a 'assistencia pre-natal ' e uma iiiformacao dada - e o t e m a

do extra to in teiro -, e a i n formagao nova e quern a fornece, com o

agente (d e fato duas al ternativas) na posigao de informagao nova .

V e j a mais sobre ' tema' adiante .A nominalizagao divide com a voz passiva a possibi l idade de

omiti r o agente e a var ie dade de motivagoes para faze-lo. As duas

trabalham na mesma diregao em "u m exa me fisico co mple to sera

en tao real izado": como observei anleriormente. a combinagao dapassiva sem age nte e da mod al id ade categorica de fu t u ro reforga

a v oz med ico -c ien t i f ica no l i v re to , cons l ru indo o se n t ido de m u -Iheres sujei tas a procedimentos anonimos e invar iave i s , e a nomi-

coisa e se referir a processos concretes na gravidez qu e podem naoestar se desenvolvendo normalmente; outra e se referi r a estes

identi ficando-os como "quaisquer anormalidades que possam estarpresentes", o que cria uma nova cutegor ia de e n t i d a d e s abstratas.

A criagao de novas entidades e uma caracter is t ica da nomina l i za -

gao que te m consicieravel im por tanc ia cultural e ideologica. Por

exemplo, um auu ncio de ci rurgia cosmetica tem o t i tu lo "Boa apa-

rencia pode d urar a vida inteira!"; 'boa aparencia ' e uma nomina l i -

zagao (d e processos relacionais concretes , ta l como "voce tem boa

aparencia!") q u e t rausforma u m a condigao local e tempo ra ria nu m

es tado ineren te o u n u m a p r o p r i e d a d e , a qu a l p o d e e n t a o to rna r -se ela propr ia o foco da atengao cultural e da manipulagao (a boa

aparencia pode, po r exemplo, se r cultivada, realgada, cuidada; dela

se diz que traz as pessoas bo a sorte. torna-as felizes, ou Hies causa

problemas). Conseqiientemente, pode-se encontrar nominalizacoes

em si d esempenha nd o o papel de objetos e mesmo de agentes deprocessos. (Para u m a discussao maior das propr i edades d a nomi-

nalizagao, ve r Kress e Hodge. 1979: Capi'tulo 2. )Ja me referi a ' t e m a ' ao discuti r as motivagoes para escolher

oragoes passivas. 0 tema e a parte inicial da oragao, e a parte final

referida a lgumas vezes como ' r ema ' (Quirk el ai, 1972: 945-955;

Halliday. 1985, Cap i'tulo 3). Analisar as oragoes nesses termos signi-fica exa mina r suas fungoes textuais (ver, no Capi'tulo 3, o item

"Discurso como texto") e como elas e s t ru tu ram a ' i n formacao 'num sentido geral. O tema e o ponto de par t ida do(a) produtor(a)

do texto numa oragao e geralmente corresponde ao que pode ser

considerade (o que nao significa que r ea lmen te seja) ' i n fo rm agao

d a d a ' , isto e , informagao ja conhecida ou estabelecida para os pro-

dutores e in terpretes do texto.

228 Norman Fairclough

Examinar o que tende a ser selecionado como tema em diferentes

t ipos de texto pode jogar lu z sobre os pressupostos de senso co -

mu m a respeito da ordem social e das estrategias retoricas. Vamos

considerar , primeiro , os pressupostos de senso comum. A escoiha

'nao marcada ' do tema num a oragao declarativa (u ma af irmativa) e

o sujeito da oragao; essa e a escoiha feita se nao ha razao especial

para escolher alguma outra coisa. Na subsegao do extrato de O fivro

do bebe inti tulada "Exame", por exemplo, temos uma seqi iencia de

Discurso e tnudan^a s oc ia l 229

Concluo esta segao com uma analise de um exemplo breve

que mostra como a selegao de tipos de processo, nominal izagao e

tema interagem nos textos. O texto segninte fo i extraido de um

anuncio do Forum Nuclear Britanico:

Podemos Seriamente

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temas (uma 'estrutura tematica') nas principals oragoes dos pen'odos,o que mostra a agenda com a qua l o corpo medico esta t raba lh ando

( ' sua a l tu ra ' , 'urn exame fisico comple te ' , ' um exa me va g ina ! ' ,'u m esfregago cervical'), e indica pressupostos de senso c o m u m

sobre ret inas do exame. A primeira oragao do segundo paragrafo,

com o tema 'o proposito desse exame' . e bem diferente e mostra outro

aspecto do potencial do tema: a existencia de constmcpes gramaticais

qu e permitera que elementos particulares sejam ' tematizados' . Nesse

caso, e a propria explicagao que e tematizada.

As escolhas marcadas do tema sao freqiientemente interessantes

pelo qu e elas mostram nao apenas sobre os pressupostos de sensocomum, m as tambem sobre as estrategias retoricas. U m e x e m p l o e

o segundo perfodo do extrato de O livro do bebe. comegando por

"Inevi tavelmente, portanto, i sso envolve...". ' I nev i tavelmente ' e

' por tan to ' sa o adjuntos (Quirk e1 al, 1972: 420-506), func ionando

como temas marcados. Fazer do s elementos temas marcados e uma

forma de po-los em primeiro piano, e o que e posto em primeiro

piano aqui e a racional idade da assistencia pre-natal ; como iudi-

qu e i na u l t im a segao, essa e uma preocupagao que tambem da o

sentido d e coesao no extra to . U m caso be m di feren te e o segundo

periodo da subsegao int i tulada "A primeira visita". O tema aqui e

'ocasionalmente ' . e sua colocagao em prime iro pia no e uma i lus-tragao d e u ma preocupagao fundam e nta l na assistencia pre-natal

em an te c ipar e acalm ar temores que se apresentam f reqiientemente

de forma paternalis ta .

Resumindo, entao, sempre vale a pena observar o que e posto

in icia lmente nas oragoes e nos periodos, porque isso pode jogar luzsobre pressupostos e estralegias que nao sao tornados explicitos.

Atender nossas Demandasde Energia sem aEnergia Nuclear?

o consume de energia em lodo

o munilo cresceu vinte vezes

clesde 1850. Ha uma pers-

pecliva de que a demanda

de energia nas micoes indus-

(riiiis poderia m e s m o I r ip i i c a r

n o s p r o x i m o s I r i n l a anos.

(The Guardian, 14 de agosto de 1990)

A primeira oragao (a ma nche te ) pode ser considerada comoum a metafora gramatical : e transi tiva e parece uma oragao de agao

dirigida ('nos' como agente, "nossas d ema nd a s de energia" como

objeto), mas pode ser considerada como uma construgao melator i-

ca de, por exemplo, "podemos produzir seriamente t an ta energia

como queremos usar sem a energia nu c lea r?" . N a versao metafori-

ca , temos um a nominalizagao ("nossas demandas de energia")

como objeto, o que trata como uma entidade pressuposta o qu e se-

ria uma assergao questionavel (como "nos co n t inu a mo s a que re r

mais energia"). E n q u a n t o a assercao esta aberla ao debate, a pres-

suposigao nao. Coisas semelhantes acontecem nos dois periodosseguintes, exceto que aqui as entidades pressupostas sao tambem

temas ('o co nsu mo de energia em todo o m u n d o ' , *a demanda de

energia nas nagSes indus t r ia i s ' - a ul t im a e tema da oragao subor-

dinada iu t roduz ida po r 'de que'), o que reforga sua posigao de ' in-formagao dada', informagao que pode ser tomada como tac i ta.

Assim, a metafora gramatical , a nomina l i zagao e o tema conspiram

230 Norman Fairclough

para por em segundo piano a questao principal que e se r e a lmen te

necess i tamos de tanta energia.

Signif icado das palavras

, """ Como produtores ou in terprete s de textos, somos sempre con -

f ron lados com o que Raymond Wi l l i ams chama 'grupos' de p a l a -

Discurso e mudan^a social231

do s ignif icado potencia l de uma palavra sa o descontinuos. isto eclar,amente demarcados en t re si; e (iv) os significados no inter ior

do signif icado potencia l de uma p a l av ra estao n u m a relacao de

complemen ta r idade (ou , ou um com o ou t ro ) , e sao m u t u a m e n t e

exclusivos.

Embora (i) e (iv) func ionem mui to be m em a lguns casos, eles

sa o mui to i lusorios em ou t ros casos, especia lmente onde palavras e

s ign i f i cados estao envolvidos em processes de contestagao e m u -

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vras e significados (Williams, 1976: 19), ao contrar io de palavras esignificados isolados, embora a lgumas vezes seja u t i l pa ra propo-

sitos ana l i t icos foca l iza r um a un ica pa lav ra , como f ago a seguir .

A relagao d as palavras c o m o s significados e de mui tos -para-um e

n ao de um-para-um, em ambas as d iregoes: as palavras tern tipica-

m en t e varies significados, e estes sa o 'lexicalizados' t ipicamente

de varias maneiras (embora isso seja um tanto enganoso, porque

lexicalizagoes diferentes mudam o sentido: ver a prox ima segao).

Isso s ign i f ies que como p r o d u t o r e s e s t a m o s d i a n t e de escolhas

sobre como usar um a pa lav ra e como expressar um signif icado por

meio de palavras, e como in terpretes sempre nos conf ron tamos

co m decisoes sobre como interpre tar as escolhas que os produtores

f izeram (que valores at ribui r a elas). Essas escolhas e decisoes nao

sao de na tu reza pu ram en te ind iv idua l : os signif icados da s pa lavras

e a lexicalizagao de s ignif icados sa o questoes que sao var i ave i s

soc ia lmente e soc ia lmente con tes tadas , e facetas de processes so -

-.ciais e cu l t u ra i s mais amp los .

Focalizarei a q u i os signif icados da s pa lav ra s e nao a lexicali-

zagao de significados, m as farei o contrario nas duas segoes seguintes .

Como Will iams aponta , ha certas pa lavras -chave cu l tu r a lmen te em

des taque que merecem ser focalizadas na pesquisa socia l ; quero

discutir um exemplo a tua l . a pa lav ra ' em p r een d im en t o ' . Usare i ot e rmo significado-potencial p a ra a gama de s ignif icados convencio-

n a l m e n t e associados coin a pa lav ra , que um d ic iona r io t en t a r a

representar . O s d ic iona r ios com umen te estabelecem verbetes para

as palavras de ta! fo rma que implicam a segu in te concepgao de

significado: (i) o s ignif icado potencia l e estavel; (ii) o s ignif icado

potencia l e un iver sa l , no sen t ido de ser comum a todos os m e m -

bros de uma comun idade de fa la ; (iii) os signif icados no i n t e r i o r

danga social e cultura l . Nesses casos, a relagao pa lavn i- s ign i f icadopode m u d a r r ap idamen te , e assim muitos s ignif icados poten cia is

sa o ins taveis , e isso pode envolver d isputa entre a tr ibuigoes con-

f l i tantes de significados e significados potenciais da s palavras .

(Como Pecheux argumentou - ver, noCapitulo 1, o item "Pecheux"-

a variagao semantica e uma faceta e um fator de conflito ideologico.)

Alem disso, a m u d a n g a e a contestagao de s ignif icados resultam

em m u d a n g a s na forga e na clareza dos Hmites entre significados

no in ter ior do significado potencial da palavra , e, de fa(o, a con-

\ tes tagao pode g irar em toruo desses l imites . Ela pode g irar tambem

em torno da natureza da re lagao entre s ignif icados no in ter ior do

; significado potencial da palavra , em to rno do t ipo de relagao, se de

\complementaridade ou se, ao contrario, h ie ra rqu ica , e, nesse caso,

em torno de re lagoes especif icas de d o m i n a g a o e subord inagao

entre significados. Ilustrarei algumas dessas possibilidades adiaute .

A evidencia para esses modelos alternatives de significado

potencia l vein dos textos. O modelo do ' d ic ionar io ' se ha rmon iza

com textos que sao produzidos e in terpretados com uma orientagao

n orma t i v a para o s ignif icado potencia l , que tra ta este como um

codigo a seguir ou de onde selecionar. Artigos e ensaios escritos

po r a lunos de ciencias podem se r bons exemplos. O modelo a l ter-

nat ive que seguem encontra apoio em textos com uma orientacaocr iat iva para o s ignif icado potencia l que tra ta es te como um recu r -

so exploravel e em mu t ag ao , como no exemplo a seguir. Os textos

cria t ivos sao caracter izados p or ambig i i idades e a m b i v a l e n c i a s

de s ignif icado e pelo jogo retorico com os s ignif icados potencia is

das palavras . Os textos cr ia t ivos usam necessariamente os signi f i -

cados potencia is como recursos, m as eles contr ibuem para deses-

232 Norman Fairclough

t ru t u ra r e reestru tura- los , i nc lu indo a m u d a n g a de l im i t e s e de

relagoes entre significados.

Examina re i agora como a pa lav ra ' empreend imen to ' e usada

no s discursos de Lord Young, minis tro de Estado de Indus t r i a e

Comercio no governo Thatcher (1985-1988), e uma I' igura-chave

na projegao de uma 'cu ltura empresaria l ' (ver Fairc lough, 1990a.

para deta lhes do s discursos e mais analise) . J a me referi a esse

exemplo no Capitulo 4, para ilustrar as transformagoes intertextuais;

Discurso e mudanipa social 233

p lora r um a opor tun idade de mercado) e qualidades pessoais m a i s

gerais (porexemplo, o desejo de correr riscos).

No s discursos de Young, empreendimento no seu sentido de

negocio e usado gera lmen le sem os modi f i cadore s ' p r i v a d o ' ou

'livre'. Isso aumenta a ambiValencia potencial de empreendimento:

em pr inc ip le , qua lque r ocor renc ia da pa lav ra esla aberta a ser

interpre tada em qualquer um dos tres sentidos, ou em q u a l q u er

combinac.ao destes. No entanto, embora mu i ta s ocorrencias de em-

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minha preocupa^ao a q u i e especif icamente com o termo comoexemplo de aspectos do s ignif icado da p alav ra . Ele i lus tra como o

s ignificado potencia l pode ser ideologica e pol i t i camente invest ido

no curso da const i tu igao discurs iva de u m conceito cu l tu ra l chave.

As observances seguintes se referem a ' empreend imento ' como

um s ub s t an t ivo relacionado a 'massa' ou s ub s t an t ive ' i n cou tave l ' ,

a especie de substantivo que ocorre apenas na form a s ingular e sem

artigo indefinido (Quirk et al., 1972: 130). Empreendimento pode ser

usado tambem como um substantivo contavel (por exemplo, um

empreendimento, empreendimentos) . D e acordo c o m o Dicionario

de Oxford , empreendimento como um substantivo incontave-1 terntres sentidos, ao s quais m e ref iro como senlidos 'de ativ idade ' , 'de

qua l idade ' e 'de negocio':

1. a t iv idade; "envolvim enlo em einpreendime ntos arduos, cora jo-

sos e impor tan tes" ;

2. qualidade: "disposicao ou p ron t i d ao para envolver-se em em-

preendimentos dificeis, que envolvem risco ou perigo; espfrito

audac ioso" ;

3. negocio: quando modificado po r 'privado' ou 'livre'. 'empreendi-

mento p r ivado ' .

Ref iro-me a esses sentidos cole t ivamente como o s ign i f i cado

potencia l d e empreend imen to . Ex is te t ambem um con t r as t e , no

caso do sentido de qu alidad e, enlre qualic lades especif ic ame nte

l i gadas a a t iv idade de negocios (por exemplo, a h ab i l i d ad e de ex -

preendimento sejam de fa to ambivalentes e envolvam a lgumacombinagao dos tres sentidos, a amb iva lenc ia potencia l e reduzida

pelo contexlo, inclu iudo o contexto verbal mais ou menos imediato

no qua l a palavra ocorre. O contexto verbal tein duas especies de

efeito. Primeiro, pode eliminar u m o u mais sentidos. Segundo,

pode confer i r destaque rela t ivo a um dos sentidos sem eliminar os

outros. Os exemplos serao dados a seguir .

O significado potencial de empreendimento, e sua potenciali-

dade para a ambivalencia , const i tu i um recurso que e explorado

estra tegicamente nos discursos de Young . Discursos diferentes dao

desta que a diferentes sentidos, nao pela promogao de um sentidocom a exc lus ao dos outros , m as pelo estabelecimento de configu-

ragdes part iculares de s ignif icados, h ierarquias part iculares de re-

lagoes de saliencia entre os sentidos de empreend imen to , o que se

pode considerar adequado a objet ivos es tra tegjcos maiores , contr i-

b u i n d o para a reaval iagao de um setor d e negocios p r ivados u m

tan to desacreditado, po r meio da associac.ao de empreend imen to

privado com qua l idades cu l t u ra l men t e va lo r izadas d e 'espfr i to em -

preendedor'. Este e um exercfcio de interdiscursividade estrategica,

na medida em que elementos d iferentes do s ignif icado potencia l d a

pa lavra sa o deslacados em t ipos d iferentes de d iscurso.

Aqui es ta um exemplo de um discurso p ronuncia do em marcpde 1985: "A larefa do governo (e) produzir um clima no qual a

prosperidade e criada pelo empreendimento". Isso ocorre i med i a -

t amente apos um paragrafo que se refere a negocio p r ivado , o que

t o rn a sal iente o sentido de negocio sem, e n t r e t a n t o , exc lu i r os

outros sentidos: poder-se-ia substituir empreendimento por qualquer

das expressoes ' empreend imento privado' , 'a t ividade emp resa r i a l ' ,

' i nd iv iduos empreendedores ' , se m tornar a frase s emanl i camente

234 Norman Fairclough

in cong ruen te no seu contexto verba l . Em ou t ros casos do m es m o

discurso, as reJagoes de saliencia sa o estabelecidas mediante outros

aspectos do contexto verbal - por exemplo, a ligagao de empreen-

dimento com ou t r as expressoes: "empreend imen to tie negocios e a

tarefa de cr iacao de r i queza" destaca o sentido de negocio, en-

q u a n t o " iniciativa i n d i v i d u a l e empreend imen to" des taca o sen t ido

de qua l idade , embora o con tex to verbal precedente ponha esse

sentido no f inal da escala das ' qua l idades cle negocio'.

Discurso e mudan^a social 235

(por exemplo , "Todo o cl ima para criacao de r i quezas e empreen -

d imen to mudou") .

0 movimento subjacente nos discursos caminha na direc,ao de

um a rees t ru t u rag ao do s ignif icado potenc ia l de empreend imen to

que eleva o sentido de qualid ade e a parte da escala de qu alid ade

sobre qualidades pessoais gerais. Esse m o v i m e n l o em si e p a r t e da

evolugao da estra tegia empresaria l dos Conservadores duran te os

primeiros dez anos do goveruo Thatcher. Na primeira parte desse

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Um segundo discurso, pronunciado em j u l h o de 1985, dirige-seaos empreendedores , e seu loco se reflet e na forma como os senti-

dos de empreend imen to sa o hierarquizados, com o sentido de q u a -

l idade tornando-se inais sal iente . Esse destaque rela t ive e m a r c a d o

sintaticamenle em alguns casos por meio da ligagao de empreen-

d imen to co m expressoes q ue i solam o sentido de qua l idade : "peri-

goso para o empreend imen to e o ins t in to para negocios dos

iudividuos" , "encorajar os empreend imen tos e encorajar os ind iv f -

duos empreendedores". Mas e a parte da escala relacionada as

qua l idades de negocio que e mais proeminen te , de forma que,

como no primeiro d iscurso, a es truturagao dos sentidos de empreen-

dimento e dominada pe lo sen t ido de uegocio.

Um terceiro d iscurso foi pronunciado em novembro de 1987.

O que merece destaque nesse discurso e o i iumero de exemplos em

que o contexto verbal reduz a ambivalencia e impoe o sentido de

qua l idade; "aum en ta ram as -hab i l i dades e o espir i to empreendeclor

d os indiv iduos". " reconhecer o prof iss ionalismo e o empreend i -

men to dos seus gerentes", "usar os t a l en tos e o senso pa ra empre-

e n d i m e n t o do povo" . E m cada caso, o sen t ido d e q u a l i d a d e e

imposto pela palavra empreendimento, coordenada com um subs-

t an t ivo que s ign i f i ca qua l idades pessoais, e modi f i cada por s in -

tagmas preposicionais ('dos i n d i v i d u o s ' , etc.) q u e a t r i bu emempreend imen to - como uma qua l idade . n a l u r a l m e n t e - a (calego-

rias de ) pessoas. Alem disso, as qua l idades re f e r ida s estao m a i s

direcionadas a parte da escala sobre as qualidades pessoais gerais

do que nos dois discursos anteriores. No en tan to , isso e somen te

u m a m u d a n c a rela t iva n a sal iencia : u m a p roporgao s ignificat ive de

ex em p lo s p e r m a n e c e a m b i v a l e n t e en t re os tres sentidos, e em

a l g u n s casos o contexto verbal a i n d a destaca o senlido de negocio

perfodo, o pressupos to era que uma cu l t u ra empresaria l poderia se rcriada pr iuc ipa lmen te por meio de medidas economicas ( ta is como

pr ivat izagao. re laxamen to de regulamentos que afe tam a indus t r i a ,

redugao de impostos) e medidas pol f t icas ( la l como a reclugao do

stains das autoridades locais sobre a habitagao e a educacfio supe-

rior). A p r o x i m a d a m e n t e na metade dos anos 1980, os ministros do

governo comegaram a pensar que o que era necessario era um

conjunto de m u d a n g a s na "cu l tu ra e na psicologia" (nas palavras

de Nigel Lawson) . Eles comegaram a proje t a r - por exemp lo , me-

diante iniciativas do Ministerio de Industria e Comercio e mediante

elementos de empreend imen to na educagao e no t r e i n a m e n t o -

modelos pa ra a a t i v i d a d e e m p r e s a r ia l e p a r a o ' eu ' empresa r ia l

qu e a inda es tavam f u n d a m e n t a l m e n t e l ig ados aos negoc ios , m as

que des tacavam conjuntos de qual idade s empresariais (ver Morris,

1990, para uma analise detalhada dessas mudangas) . A constante

mu d an g a de enfase dentro da or ientagao para os negocios se ref lete

tambera na mescla heterogenea de sentidos pa ra e rnpreend imento a

que aludi an te r iormente ao fa lar sobre o terceiro discurso.

Ha uma homologia entre a rees t ruturagao estra tegica de Young

do signif icado potencial de empreend imenlo e a reestruturagao das

ordens de discurso que d iscuti no Capftu lo 3 (item " Heg em o n ia " )

em te rmos de um modelo hegemonico. E o sucesso em obter acei-t agao para s ignif icados par t i cu l a r e s de pa lav ra s , e pa ra um a estru-

t u rag ao p a r t i cu l a r do seu s ignif icado potencia l , e se m di ivida

interpretavel como um a forma c!e adquirir hegemonia. Podemos

assim c h a m a r o m o d e l o que descrevi no comego des ta segao de

modelo hegemonico de s ignif icado de palavras . E um modelo que

pode ser usado nao apenas pa ra a na l i s a r discursos po l f t i c o s , m as

236 Norman Fairclough

tambem para invest igar o s ignif icado de palavras na educagao, na

publicidade, e assim po r diante .

de palavras

Nesta secao, passo ao segundo aspecto da n atureza de 'mui tos-

para-um' da relacao palavra-signif icado: a muUipl icidade de meios

Discurso e m u d a m p a soc ia l 2 3 7

da rea l idade como um domi'n io pre-const i tu ido de ' obje tos ' refe-

ridos no discurso).

Novas pa lavras geram novos ' i tens lexicais' (H al l ida y , 1966),

um te rmo (ecnico que e usado algumas vezes de preferencia a pa-

lavras, porque esse ultimo termo e usado para tantos propositos

diferentes , e porqu e i tem lexical cap tura a ide ia de expressoes

que alcancaram um grau de f ixidez e estabilidade. Um tipo de lexi-

calizacao que torna esse processo part icularmente c laro e a lexica-

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de ' expressar com novas palavras ' um signif icado ou, para usar otermo em ingles, wording (sobre wording., ve r Mey, 1985: 166-168;

sobre ' lexical izacao' , ver Halliday, 1978: 164-182). Como sugeri

anteriormente (ver, no Capftulo 3, o i tem "Discurso como texto"),

a perspectiva de estudo do vocabulario que focaliza a criagao de

palavras contrasta com a visao de vocabu la r io que tern po r base o

dicionario. Os dicionarios fazem parte do aparalo de padronizagao

e codificagao de I fnguas (Leith, 1983) e sao sempre mais ou menos

compromet idos co m u m a visao un i t a r i a da l ingua de uma comun i -

dade e de sen vocabu la r io , que e, impl ic i tamente , se nao explici-

tamente, uormativa: por isso, os dicionarios tendem a apresentar as

palavras dom inantes e os signif icad os das palavras como un ices.

Falar de "uma multip l ic idade de meios de expressar um signi-

ficado", no entanto, conduz ao en tend imen lo equ ivocado de que os

signif icados sao atribuidos antes de serem postos em palavras de

var ias manei ra s , e de que eles sa o es taveis em var ias pa lavras .

Seria ma is produtivo dizer que ha sempre formas alternativas d e

signif icar (Kristeva, 1986b) - de a t r i bu i r s en t i d o a - domfnios par -

ticulares de exper iencia , o que implica ' interp retar ' de uma forma

part icular , de uma perspectiva teorica, cu l tu r a l ou ideologica parti-

cular. Perspectivas diferentes sobre os domfn ios da exper ienc ia

imp l icam formas diferentes de expressar essas experiencias ; e nes-ses termos que devemos considerar lexicalizacoes alternativas, tais

como as pa lavras como i n f luxo ou enchente usadas para expressar

imigracao de forma opos ta a ' b u s c a ' de uma v ida n o v a . No sen t i -

do rea l , enlao, q u a n d o se troca a palavra tambem se troca o signifi-

cado (mas lembre de mi n h as reservas, Capitulo 3. item "Discurso",sobre a enfase exagerada no processo ativo da siguificacao/constituicao

da realidade de uma maneira que ignora a existencia, e a resistencia,

lizacao que envolve o processo de nominalizagao. Por exemp lo , alexicalizacao de (1) a seguir tornou-se consolidada em um novo

item lexical, 'despe rtar da consc iencia ' , em (2):

1. Eles realizaram encontros para encorajar as pessoas a se t o rn a -

re m mais conscientes de suas v idas .

2. Eles realizaram sessoes de despertar da consciencia.

A criagao de i lens lexicais permi te conceber as perspectivas

particulares dos dominios da experiencia segundo uma v isao teorica,

cientif ica , cu l tu r a l ou ideologica mais abrangente. Em casos como

esse, ela gera novas categorias cultunilmente iniportantes. Os efeitos

podem ser bem mais paroquiais. Um anunc io de uma clinica de

cirurgia cosmetics contain alguns itens lexicais (tais como ' remo-

cao de o lhei ras ' , ' a f inamen to do nariz ' , 'me lhor ia de rugas ' e 'cor-

regao de orelhas de abano' ) , que sao id eo log icamen te signi f jcantes

ao a t r ibu i r a c i ru rg ia cosmet ica um v o c a b u l a r i o cienlff ico, e pelo

menos a aparencia de operar dentro de um d o m m io complexo; se u

signif icado implic i to e , portanto, o status p res t ig iado de uma t e ra -

pi a com base cientif ica .

A mu l t ip l ic ida de de pa lavras pode ser cons iderada p rove i to -samen te como um aspecto de i n t e r t ex tua l idade . N o m e a r ur n dornf-

nio da experieucia e equ iva len te a, no n i v e l do v o c a b u l a r i o ,

con s t t t u i r um a configuracao p a r t i cu l a r de elementos in ter textnais

na produgao de um tex to . As diferencas no vocabu la r io de O livro

do bebe e O livro da gravidez i lus t ram isso, como as explicates

para a necess idade de esfregago cerv ica l : "para exc lu i r q u a l q u e r

mudanga pre-cancen'gena" (O livro do bebe), "para de tec ta r m u -

238 Norman Fairclough

dancas in ic ia is iia cervice q ue possam mais tarde coiiduzir ao can-

cer" (O fivro da g ravidez). Tan to 'pre-cancerigena' como 'excluir.

do je i to como sao usados aq u i , per tencem ao discurso med ico , en -

q u a n t o "mudangas . . . que poder iam ma is t a rde conduz i r ao cancer"

pertence ao d iscurso conversacional da v ida colid iana. Essas dife-

rencas de vocabular io sao parte das diferencas na inlertextualidade do s

dois livretos. Comenlarios semelhantes se aplicam a reportagens. No

Exemplo 1 d o Capitulo 4 (item "Repor tagem de j o rna l " ) : a rraducj io

Discurso e m u d a n g a so c i a l 239

representado p or p a l a v r a s como ' t r u n f o s ' e 'recursos' pa ra se

refer i r a e m pr e ga do s . Segundo , h a u m a ex t en s a o de um d iscu r -

so de gerenc iamen to o rgan izac iona l do domin io das organ iza -

§6es para o d o m i n i o d a pessoa, na ex p r e s s a o ' g e r en c i a m en lo d o

estresse'. Em te rce i ro l ugar , ha um discurso de gerenciamento de

pessoal, ele propr io incorporando a aplicacao de um discurso tec-

nologico ao s seres h u m a n o s (classif icando as pessoas em termos

de seu 'desempenho'), o que ampl i a o concei to de h a b i l i d a d e d e

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no jornal bri tanico The Sw i de ' t raf icantes ' (de drogas) em 'passa-dores' e 'camelos' e u m a d imensao de L i m a conf igura^ao in t e r tex-

tua l q ue esta c e n t r a d a na s imu lagao de uma H n g u a g e m da v ida

co l id iana fei ta por esse jo rna l .3

U m outro exemplo vern d e u m ar t igo i n t i t u l a d o "O 'Estresse'

e o hojnem de negocios: evite o 'estresse' pa ra o sucesso da saude"

(Looker e Gregson, 1989), que ecoa a ideia corrente em gerencia-

mento de que a chave para o sucesso nos negoc ios con temporaneos

sao a qua l idade e o compromet imen to da forc,a de t r aba lho (a s pes-

soas como "recursos humanos" , de acordo com o art igo).

I N VI S T A E M G ER EN C I AMEN T O D E ESTRESSE

O g e r e n c i a m e n l o d o est resse f a c i l i t a o uso de h ; i b i l i d a d e s pes-

soais, o que , por sua vez, m e l h o r a o d cs cm p e n h o n o t r a b a l h o e

leva a um f u n c i o n a m e n t o e gerenc iamen to ef icazes de q u a l q u e r

organizacao. Um pe quc no inve s t ime n to em cursos c p rog ram as

de ge r e nc i a me n to de estresse pode te r um impac to dec is ivo na

l u c r a t i v i d a d c de uma o r ga n iz a ga o . Nao Iia d u v i d a de que os

maiores t r u n f o s d e u m a o r ga n iz a c a o sa o se us e mpr e ga do s . e sao

a sa ude e o dc sc mpe nho de l e s q u e a pa r e c e m n o ba l an ce gera l

no fi m d o d i a . Assim, pa r a te r sa ude e sucesso , e v i t e o estresse.

U m aspecto impressionante d a conf iguracao i n t e r t ex t u a l aq u i

e a mescla de generos d iscu rs ivos : o genero do a r t igo a c a d em ic o

e o genero da public idade (este u l t imo rep resen tado pelo slogan

r imado no f inal do tex to ) . Mas m inha preocupacao p r inc ipa l e com

a conf igura^ao de discursos no exemplo (ver C a p i t u l o 4, i tem " In -

terd iscurs iv idade") . Primeiro, ha um discurso de con tab i l i dade ,

O The Sim (O So!) e um tab lok le p o p u l a r br i ta n ico . (N. da T. )

se u uso mais t radic ional de capacida de para o trabalho ma nual paracapacidade nao-manual m as tradicionalmenle 'privada' ('habilidades

pessoais').Esse exemp lo i l u s t r a um a m u d a n g a importante que esta ocor-

rendo nos locais de t raba lho . um a m u d a n g a ligada aos avancos

tecnologicos e a novos estilos de gerenciamento. As carac t e r f s t i cas

pessoais dos empregados, que ate bem pouco t em p o eram cons ide-

radas pr ivadas e fora do alcance legitimo de i n t e rven9ao dos em-

pregadores , sa o agora redef in idas como passfveis de in terveii^ao.

A s s i m . o s p r o b l em a s d e estresse d o s empregados se t o r n a m

um a preocupagao leg it ima dos chefes de pessoal. Exemplos desse

t ipo sao indicatives de ten ta t ivas de criagao de um novo discurso

de local de t rabalho l igado a la is p reocupacoes . recorreudo a uma

gama de discursos que mais tradic ionalmente pertencem ao local

de t r a b a l h o (como o da contabil idade, do gerenciamento organiza-

cional, da tecnolog ia e do gereuc iamen to de pessoal). Essa conf i-

guracao de d iscursos se ref lete em novas lexicalizagoes para os

empregados, sua capacidade e sens prob femas (de saude).

E ut i l compara r as expressoes de domfn ios part iculares , de

perspectivas part iculares em termos da dens idade relativa. isto e ,

em termos do numero de lexicalizagoes d iferentes ( inclu indo itens

lexicais) que sao geradas, muitas das qua is serao quase s inon imos .Nu m ensaio impor tan te , H al l i d ay (1978) usa o t e rmo ' superlexica-

lizac,ao' para a densidade de expressoes de um domin io ; u sa re i o

te rmo ' s uperexpres sao ' (ovenvording) . ' Superexpres sao ' e um s i -

nal de ' p reocupagao in tensa ' apon tando para as 'peculiar idades na

ideologia' do grupo responsavel por ela (Fowler er al. , 1979: 210).TJm

exemplo e o con jun to de palavras usadas p a r a se referi r a capaci-

dade de Hnguagem no Relatorio K i n g m a n de 1988, sobre o ens ino

240 Norman Fairclough

de ingles na s escolas br i tanicas (Depar taraento de Educagao e C ien-

cia, 1988). As novas lex icalizagoes i nc luem: 'competeucia', 'e f ica-

cia', 'domfnio' , ' faci l idade ' , 'especialidade' e 'habi l idade ' . Essa

superexpressao parece es tar l igada a u m a preocupagao n o r e l a tor io

com a projegao (ideologica) de uma visao de linguagem como ur n

con j u n t o d e hab i l idades tecnicas d e t e r m i n a d a s q u e podem se r en -

s inadas e ad q u i r i d a s de uma forma m o d u l a r . E u m a concepgao de

liuguagem que enfatiza a produgao e a interprelac.ao convencional

Discurso e mudan^a social 241

Metafora

A me ta f o ra tern s ido cons iderada t r ad i c i on a l men t e como u m

aspeclo da l inguagem l i te rar ia, especialmente da poesia, co m p o u -

ca relevancia para outros tipos de l inguagem. Trabalhos recentes

sobre melaforas te rn suger ido for temente q ue isso n a o e ve rdade

(ver Lakoff e Johns on , 1980). As metaforas pene t r am em todos os

tipos de linguagem e em todos os tipos de discurso, mesmo nos

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e a d e q u a d a de as pec tos ideac iona i s do s ign i f i ca do (ve r Fa i rc loughe Ivan ic , 1989).

Alem da superexpressao, Halliday (1978) dis t ingue 'reexpressao'

(o n relexical izacf io , nos t e rmos dele), isto e, a geragao de novas

palavras que sao es tabelecidas como a l t e rn a t i v a s as exis tentes , ou

oposigoes a elas . O t e i m o 'reexpressao' (rewording} e u m ro t u l o

u t i l para o car a t e r in te r t e x tua l e dialogico do processo de cr iagao

de novas palavras. Edelman (1974) acentua a perspectiva que e

subjacente as lexical izagoes convencionais das prat icas de I ra ta -

m e n t o p s i q u i a t r i co , ao r eexpre s s a-l as de uma form a opos t a e ho s t i l .

O texto sobre gerenciamenlo do estresse anter iormente citado en-

vo i veu a r e l ex ica l i zagao do s e m p r e g a d o s e de s u a c a p a c i d a d e e

p rob lemas para incorpora-los a es fera de gerenciamenlo de pessoal .

No exemplo s egu in t e , a r e e x p r e s s a o pode ser considerada c o m o

par t e da marque t i zacao da educac,ao:

O produlo de preparagao vocacional e em geral um p rog ram a .

Scu p la ne j a me n to e sua i rnplemenlac ,ao sao, portan to , pariesc e n t r a l s d o processo d e marketing e d e v e m c o m e c a r p e l a s

necess idades dos fregueses e dos c l ientes p o ten c ies e pelos he -

neffcios qu e elcs estao buscando (Unidade de E duc a c a o Cont i -

nua da , 1987: 51).

A q u i , a reexpressao cami n n a j u n t o com a reesl ru turac .ao se -

man t i ca q u e d is c u t i n a segao a n t e r i o r . Note c o m o ' p l a n e j a m e n t o '

esta s ub ord inado expl ic i tamente a 'marketing' no seguiido pe r iodo,

que e par t e de um proce s s o que r e s ume o conce i to de 'p i ano de

cur s o ' num s eu t ido comercial mais abrangente da palavra 'piano'.

casos menos promissores, c o m o o discurso cient i f ico e tecnico.Alem disso, as m e t a f o r a s nao s ao a p e n a s ad orn os es t i lf s t i cos su -

perficiais do d i s cur s o . Quando nos significamos coisas por meio

d e uma me ta for a e nao de ou t ra , e s t amos cons t ru indo nossa r e a l i -

dade de uma m a n e i r a e nao de ou t ra . A s me ta for as es t ru t u ram o

modo como pensamos e o modo como agimos, e nossos s is temas

de conhecimenlo e c r enga , de uma form a pene t r an te e fu n d amen t a l .

U m dos marcos definidores no inter ior e a lem das pra t i cas

discurs ivas e a f o rma como um domin io p a r t i cu l a r da ex p er i en c i a e

met a fo r i zad o . Por exemplo , a lguns t r ab a lhadore s da educagao su -

perior resistem fortemente a metaforas de bens de consume (tal

como, "os cursos tern de ser empacotados em m o d u l o s que nossos

cons umidores de s e jam comprar " ). E um as pec to da m uda uga d i s-

cursiva com implicates culturais e sociais signiftcativas e a m u -

danca na met a fo r i zag ao da real idade. Para cont inuar no exemplo, a

const i tu igao metafor i ca da ed u cag ao e de ou t ros servigos c o m o

mercados e u m e lemento poten te na t r ans formagao nao a p e n a s do

d i s cur s o , mas t amb em do pens amento e da pnitica nessas esferas

(ver a seg u i r ) .

Algumas metaforas s ao t ao p ro fu n d amen t e n a t u ra l i zad as n o

in terior de uma c u l tu ra pa r t i c u la r que as pessoas n ao apenas de i -

x a m d epercebe-las

n a mai or par t e do t empo, como cons ide r amext r emamente diffcil escapar de las no seu discurso, pensamento ou

agao, mes mo quando s e chama s ua a t enc .ao par a i s s o . Lakof f e

Johnson discutem a conslrugao metafor ica de uma discussao como

u m a g u e r r a (ref let ida , po r exemplo , em "suas a f i rmag oes s ao inde -

fensaveis" , "ele a t acou cada p on to f r aco n o meu a rgumento" , "suas

criticas foram direto ao alvo" e "eu demol i seu argumento"). Eles

des t acam que i s so nao e apen as uma ques t ao s upe r f i c i a l de lex i ca-

242 Norman Fairclough

lizac.ao: "Mui tas coisas quefazemos ao d iscu t i r sa o parc i a lmen te

es l ru tu radas pelo conceito de guerra" (1980: 4) . Assim, a mil i tari -

zac,ao do discurso e tambem a mili lar izacao do pensamen to e da

prat ica socia l (Chil ton , 1988), lan to como a marketizagao do dis-

curso na educagao referida anter iormente e tambem a market izac.ao

do pensamen to e da p ra t i ca .

O exemplo seguinte da mili tar izagao do d iscurso i lustra m u i t o

bem a ef icacia das metaforas na es truturacj io da realidade de uraa

Discurso e m u d a n c a s o c i a l 243

lliisla ou q u a l q i i e r ou t ro pa r t ido p romover por meio da mid ia um a

poli t ica de defesa que nao fosse baseada numa c rua visao de con-

f ron tayao das relagdes i n t e rn ac i on a i s (apresentada em te rmos de

' e n f r en t a r os va len toes ' , ' de t e r ' , e assim por diante; veja a seguir) .

Alern disso, as campanhas elei tora is nao sao conduzidas na

verdade como conf ron lagoes ou discussoes diretas , face a face:

essa e apenas a f o r m a como a m i d i a as constroi . A midia , pe la

m a n e i r a como s e l ec io n a , o r d e n a e r e p r e s e n t a as i n f o r m a g o e s .

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forma part icular . O exemplo e ret irado de um estudo sobre as EleicoesGerais Bri lanicas de 1987, ind icando m a i s especif icamente como a

questao da defesa fo i tratada pela mfdia (Carton, Montgomery e Tolson,

1988; Montgomery, 1990). Os autores observam que ha um a 'con-

g r u en c i a ' entre a questao da defesa em si e a form a como a mfdia a

represen tou na c a m p a n h a : a metafora dominante para a propria

campanb a e a da guerra. Os exemplos seguintes da cobertura peia te-

levisao e pela imprensa i lus t ram esse ponto (os i talicos sao meus) :

1. A defesa fo i o item central do sen ataque ao P a r t i d o Trabalhista

e a Neil Kinnock (BBC 1, 26 de maio) .

2. Hqje a noite, no su l de Gales, comegou o conlra-ataque de

Thatcher (BBC 1, 26 de maio) .

3. O ataque da sra . Thatcher fo i parte de w na ofensiva em duas

frentes dos Conservadores para parar os Trabalhis tas (BBC 2,

2 6 de m a io ) .

4 . O Part ido Trabalhis ta monioit nnia f irme acao de retaguardaontem (Financial Times, 27 de m a i o ) .

5 . O movimento de piuga dos Conservadores e da AH an ^a contra

os Trabalhis tas inclu iu um assallo amargo por Dav id Owen (In-

dependent, 26 de maio) .

A questao da defesa forneceu a midia uma metafora mi l i t a r

p r o n t a . Um efeito pra t ico que ela teve, segundo os autores desta-

c a m , foi te r to rnado ex t r emamenfe diffcil para o P a r t i d o T r a b a -

r e d u z a comp lex idade e a con fu sao d e u m a c a m p a n h a a u m adiscussao ou a um comba te com par tes f ixas , a taq ue seguido por

con t ra - a taque . Isso 6 en tao re t ra tado como uma rea l idade que a

m i d i a s imp lesmen le reflete, dis fargando assim os efei tos conslmti-

vos que a midia , ela propria , exerce sobre a real idade. Uma ou t ra

conseq i ienc ia pr<itica e que a cober tu ra da mid ia em s i mesma

passa a ser moldada pela meia lb ra : nos podemos , por exemp lo ,

encontrar um padrao de a l t e rnanc ia . dia a dia, entre os ' a t a q u es ' de

um pa r t ido e os ' contra-a taques ' de outro. E os part idos polilicos

adap tam suas campanhas pa ra adequa - la s a ' r e a l i d a d e ' de su a

re t r a la^ao na mid ia . Se a oposic,ao e re t ra tada como tendo rea l i -

zado um a g r a n d e ' o fens iva ' n um dia , um par t ido p rec i sa p rodu zi r

fatos nas entrevis tas colet ivas e nos discursos que sens assessores

de mid ia considerem qu e possam se r p ron tamen te conver t idos em

u m ' c o n t r a - a t a q u e7. E m s u m a , a m e t a f o r a te rn efei tos sobre a

cobertura da campanha e sobre a campa nha em s i .

C a r t o n , M o n t g o m e r y e Tolson (1988) t ambem des tacam a

potencia ideologica dos ' roteiros ' na cobertura do assunto ' defesa '

na s eleigoes de 1987. Eles usam o t e rmo 'roteiro' como outros te m

usado o termo 'narra t iva ' , para cenarios es tereotipados e para as

seqiiencias de eventos associados co m eles, que fazem parle do

senso comum p r o f u n d a m e n t e incorporado a uma cu l t u ra . Muitos'roteiros' te m base metafor ica. P or exemplo, Chil ton (1988: 64)

discute um folheto do Minis ter io da Defesa bri tanico cu j o objet ivo

e persuadir o povo da necessidade de aumenta r o a rsen a l nuc lea r

bri tanico:

244 N o r m a n F a l r c l o u g h

C O M O L I D A R COM UMA

PA Z 1NTIM ID ANTE FO R MEIO DO I MPE D I ME NTO-A U N I C A

RESPOSTA A AMEACA D E U M V A L E N T A O

M u i t o s d e n o s ja e n f r e n t a r a m u m v a l e n t a o e m a l g u m e s l a g i o d e nossas v i d a s .

A iiiiica resposta e dizer : "D e ix e -m e em paz - ou voce se a r r e p e n d e n V . E te r fo r ca

pa ra s us t en ta r a s p a lav r as .

0 que Chil ton chama de ' rote i ro do v a l e n t a o ' ("Os v a l en t oes

Discurso e mudanca social 245

C o n c l u s a o

Com isso concluo a discussao das propr i edades anal i t icas dos

textos , anal isadas no s capi'tulos 5 e 6 . Os topicos q ue cobr i serfxo

r eun idos no Ca pf tu lo 8, em fo rma d e sumar io , como par t e das li -

nhas gerais de como fazer anal ise de discurso. E a p r o p r i a d o lem-bra r os le i tores a q u i da ab ordagem ( r i d i men s i on a l para a an a l i se do

d i s cur s o que introckizi no Ca pf tu lo 3 — ana l i s e de discurso como

t ex to , prat ica d iscurs iva e prat ica social -, a fi m de enfat izar que a

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s empre a lacam vf t ima s inais fracas : a un ica mane i r a de nao s e ra t acado e parecer for te") e us ado par a me ta f or izar as relates in -

te rnacionais como relates entre indiv iduos e. a r q u e t i p i c a m e n t e ,

como relagoes entre meninos em idade escolar. Garton, Montgomery e

Tolson (1988) mos t r am que esse e outros rote iros p r e p a r a r a m o

te r reno para que uma declarac.ao-chave sobre a defesa, feita po r

Neil Kinnock , o l ider dos Traba lh i s ta s , fosse t ransformada e cons-

t r u i d a p e l a mf dia .

As formas pelas q u a i s os acontecimentos que p er l u rbam o eq u i -

librio social re lat ive (guerras , epidemias , desas t res ecologicos, etc.)

sao metafor izados na m fd ia e em ou t r as situa§6es nos permitem uma

b oa percepcao d o s valores e das preocupac.6es d e u m a c u l t u r a .

Por exemplo, Son tag (1988) invest igou a metafor izacao c la doenca

Aids. E la sugere que a pr inc ipa l m e ta for a as s oc iada com a Aids e a

de 'praga'. Como a praga, a Aids tern uma origem alienfgena e esta

associada ao que e e s t r ange i ro : el a ge ra lmen te e cons ide r ada como

originar ia da Afr ica e tern um a aura r ac i s t a que se a l i m e n ta de as-

sociagoes es tereot ipadas de pessoas neg ra s com ' l i cenc ios idade

sexual e animalesca'. A me ta fora da p r aga t amb em s e l iga a u m a

me tafora mi l i t a r : a Aids como um a 'invasao', e mais especif ica-

mente como uma invas ao da Europa e da A mer ica pelo Terceiro

Mundo. C omo a praga , a Aids e cons t ru ida como um ' j u l g a m e n t oda sociedade ' por sua lassidao m o r a l , e a expansao da Aids e us ada

pol i t i camente e homofob icamente p a r a f r e a r a ' s oc iedade pe rmis -

siva'. A metafora , no en t an t o , te m as pec tos cou t r ad i tor ios e pro-

b iemat i cos : n i n g u era es ta imune a pragas , ou a Aids, m as essa

un ive r s a l idade poe em risco a cons truc.ao ideologicamente i mp or-

t an t e da Aids como um a doenga do 'outro': a doenga 'deles' c o m o

u m a a m e a g a a 'nos'.

aiialise t ex t u a l na o e a l g u m a coisa que deva ser fe i ta i s o l adamente .

E faci l tornar-se ta o envolv ido com a com p lex idade dos textos q ue

a an a l i se t ex tua l acab e por s e r cons ide r ada como um f im l ou v av e l

em si mesmo. Existem, mesmo, a lgumas f o r m a s de ana l i s e de d i s -

curso que ten dem a essa diregao, tais como as formas que Bou rd i eu

t inha em mente q u a n d o descreveu a ai ial ise de discurso como tendo"recafdo para formas indefensaveis de analise in terna" (1988: xv i i ) .

Ao contrar io, que ro ins i s ti r que a ana l i s e nao pode cons is t i r s im-

p le s mente em descri^ao de textos levada a e fe i to i s o l adamente de

sua interpre tagao (esses t e rmos foram d i s t ingu idos an te r iormente ,

no Ca pf tu lo 3). Por isso, procure! cons t an temente i n t e rp re l a r ostextos descritos neste e no capf tulo anter ior . A in terpretac .ao e ne-

cessaria em dois niveis. U m nfve l e t en t a r cons t ru i r um s en t ido

para os apec tos dos textos , observando-os como e lemen tos da p r a -

tica discursiva, em particular como 'tracos' de processos de produ-

ga o t ex t u a l ( i n c l u i n d o a combinagao inter texlual e interdiscurs iva

de e l ementos e de convengoes heterogeneas), e c o m o 'pistas' nos

processos de in t e rp re t agao tex tua l . Exuste aqu i uma s imi l i t ude en-

t re minha explica^ao sobre o que o(a) analista faz e o Ca pf tu lo 3

(item "Pratica discursiva"), em que d i s cu to como os i n t e rp re t es de

t ex to p rocedem: os ana l i s t as t amb em n ece s s i tam dos recursos q ue

t em como membros compe ten te s de comunidades , mes mo se elesu s a m estes recursos be m mais s i s t emat i camente . O ou t ro n fv e l tie

interpre tacj io e u ma q u e s t a o c f e t en t a r - s e cons t ru i r u m s e n t i d o

dos aspectos dos t ex tos e de nossa i n t e r p r e t a g a o de c o m o e l e s

sao produz idos e i n t e rp re t ad os , cons ide rando a m b o s , aspectos e

interpre lagao, como enca ixados n u m a pra t i ca s oc i a l mai s a m p l a .

Em t rabalho anterior, dis t ingui esses dois niveis de interpre tacao res-

pect ivamente como ' interpretacjio' e 'explicagao' (Fairclougli, 1989a:

140-141).

246 N o r m a n F a i r c l o u g h

A descrigao nao e tao sepa rada da i n t e rp re l agao , como se su-

poe f req i ien temen te . Como u m ( a ) ana l i s t a (e como u m ( a ) simples

interpre te de texlo), sempre se esta in te rp re tando inev i lave lmen te ,

e nao ha fase da analise que seja p u r a descrigao. Conseqiiente-

men te , nossa analise t ex t u a l e tb rmada e g a n h a cor pela i n t e rp re t a -

ga o de se n relacionamento co m processes d iscu rs ivos e com

processos sociais m a i s amplos. M es m o p rod u zi r u m a transcricao

de ur n tex to fa lado i nev i t ave lmente implica i ' ixar uma in terprela-

C a p f t u l o 7

Discurso e m u d a n f a so c i a l n as

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gao desse texto (ver. no C a p i t u l o 8, o i tem "Transcrigao"). e aesco lha que se faz do que desc rever depend e de conc lusoes i u t e r -

pre t a t ivas anteriores . Alem disso, o que denomine i aspectos an a l i -

ticos dos tex tos tern, em mui tos casos. um a pesada mescla de

i n t e rp re t agao. Fo r exemp lo , os padroes de colocagao lexical no s

tex tos q u e ana l i se i como pa r te d a ana l i se d e coesao n a o estao

ob je t ivamen te 'la' no tex to; eles sao, pode-se dizei, 'postos la'

pela maneira como se interpre ta um texto. Assim, nao apenas a

descrigao e a in te rp re tagao sa o m u t u a m e n t e necessar ias . como elas

t amb em se i n t e rpene t r am.

Existem outras similitudes entre analista e par t icipants . A anal ise

l e v a a p r o d u g a o d e t e x t o s que sao s o c i a l m e n l e d i s t r i b u i d o s e

consumidos como outros tex tos , e o discurso da ana l i se e , como

qualquer outro discurso, um modo de pratica social: ele esta dialetica-

mente relacionado com estru turas sociais, posicionado em relagao a

lu ta s hegemonicas e aberto para ser invest ido ideologica e po l i t i -

camen te . Os aua l i s t a s nao estao acima da pra t i ca social q u e a na l i -

sam; estao den t ro de la . Poder-se- ia , portanto , esperar que fossem

ta o conscientes q u a n t o possfvel quauto aos recursos a que recor-

re m ao in te rpre tar o d iscurso e a na tu reza da prat ica soc ia l de ana -

Us e em si mesma - as es t ru t u ra s que a condic ionam, su a or i en t agao

para posigoes em l u t a , os resultados d isso e os sens efe i tos sobrelu ta s e e s t ru tu ra s .

soc iedades c o n t e m p o r a n e a s *

Em re f e renda a s d u a s vertentes para m u d a n g a discursiva q ue

d i s cu t i no Cap i tu lo 3, i tem " M u d a n g a discursiva", o foco deste

capitulo e antes sobre a mudanga em progresso na s ordens de discurso

do que sobre a m u d a n g a no s even tos d i scu rs ivos . Iden t i f i c a re i

a lgumas tendenc ia s abrangen tes de mu danga d iscu rs iva que afe tam

a ordem societar ia de discurso e relacionarei essas tendencias as

diregoes mais gerais de m udang a socia l e cultura l . O t ipo de mu-danga a que me referirei tern um carater em parte in ternacional ou

pelo menos t rausnacional , como mostrei na Introdugao. E s u rp reen-

den te como se tern dado pouca a tengao a essas t endenc ia s de mu-

danga nas ordens de discurso; por isso, este capitulo deve se r

considerado como um espago de invest igagao de um amplo e lar-

g a m e n t e esquecido campo de pesquisa . Discutirei tres t endenc ia s

principais : ^democrat izagao' , ' comod i f icagao ' e ' tecnologizagao

do discurso ' . As du as primeiras referem-se a mudangas e fe t ivas

nas praticas de d iscurso, enquan to a terceira sugere q ue a i n t e rven-

ga o consciente nas prat icas d iscurs ivas e um fator cada ve z m a i simpor t an te na p rodugao de mudanga . Essas tendencias tern causa-

do um impacto notavel sobre a orde m de d iscurso contem porane a,

embora se u impacto seja desigual e exis tam conlrastes c laros eu t r e

ordens de discurso locais associadas a inst i tu igoes ou a domfn iospart i culares .

Tradu?:io de Andre R. N. Martins.

248 Norman Fairclough

Enfocar tendencies especificas propicia u m meio de ide n t i f i -

ca r padroe s nos processes complexes e con t r ad i lor ios d a muclanga

d i s cur s iva em progresso, mas e um meio a l t a m e n t e abs trato de

o lha r a mu d an c . a . A sec,ao f i n a l d o c a p i t u l o t en t a cor r ig i r isso

de a l g u m modo, ao ob s e rvar como as t endenc ias i n t e r agem ent r e

si, e ao considerar como podem f igura r no s processes de lu ta hegemo-

nica sobre a e s t ru tu r a das ordens de d iscu rso . Apresen to interpre-

tacoes d i fe r en te s d as t e n d e n c i a s e m t e r m o s d e modelos

Oiscurso e mudancpa social 249

ra m res is tencia e con t inuam a provoca- la . Alem disso, sa o des i -

guais: a maior par t e das minorias em des van tagem-como as varias

c o m u n i d a d e s asiaticas na G r a - B r e t a n h a - e s t a s u je i t a a in ust i-

gas em r a z a o d o r ac i s mo ne s s e aspecto, como em ou t ros . No

entanto, a democrat izagao tern s ido uma forga real nesse sentklo, e,

r ae s mo que o deb a te co n t inu e em t o rn o de casos em que a de s i -

gua ldade e a i n to l e r anc ia a i u d a sa o notor i as , o nfvel e a percepyao

d o d e b a t e ja i n d i c a m q u e tais ques to es es tao de fa to n a agenda . U m

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d i f e r e n t e s de pra t i ca d i s cur s iva . a rgumentando que o mode lo he-gemonico q u e d efen d o fo rn ece u m a explicate m a i s sa t is fa tor ia d o

que um mode lo de codigo ou um mode lo do t i po 'mosaico' (o u

'negociado').

Democratiza^ao

,./"k

Por ' d e m o c r a t i z a g a o ' do d i s c u rs o e n t e n d o a r e t i r a da de des i-

gua ldades e ass imetr ias do s direitos, das obrigagoes e do pres t igio

discursive) e lingiiistico dos grupos de pessoas. T a n t o no d i s cur s o

C , como de um modo m a i s geral. a d e m o c r a t i z a g a o tern s ido umparame t ro impor t an te de m u d a n c a nas u l t i m a s decadas. mas em

amb os os casos o processo tern sido rauito des igual (n a Gra-Brelanha,

po r exemplo, os fa l an te s de gales tern conqu i s t ado d i r e itos m ui to

m a i o r e s do que os f a l a n t e s de g u j a r a t i ) , e em a m b o s os casos

existem questoes sobre o q u a n t o as mudanc,as tern s ido reais ou

superficiais . Anal isare i cinco areas de democra t izacao d i s cur s iva :

relates entre l inguas e diale tos sociais, acesso a tipos de discurso

de prestigio, e l im inagao de marcadores expl ici tos de pode r em t i -

pos de discurso ins t i tucionais com relagoes des igua i s de pode r ,

um a tendenc ia a i n formal idade da s l inguas , e m u d a n g a s nas pra t i -cas referentes ao genero na l i nguagem.

E f a t o a m p l a m e n t e conhecido que l i n gua s d i fe r en te s do ing le s ,

diale tos sociais d i s t i u t os d o ingles padrao , l an lo q u a n t o uma var i e -

dade de sotaques , te rn se t o rnado mai s l a rgamente aceltos , ou tole-

rados, n u raa serie d e f undo e s publ ica s des de a Segunda Gue r r a

M u n d i a l . Nao s e t r a t a de p roc lamar o s u rg imen to de uma Ut o p i a

l ingi i is t ica. S ao conqu i s t as adv indas de l u t as sociais que encon t r a -

exemplo freqi ientemente ci lado e a t r ans mis s ao de r a d i o e TV emqu e as pessoas com d ia l e tos nao-padrao e s o t aques r eg iona i s te m

t id e acesso se m precedeutes. ainda q u e den t ro d e Hmite s b as t an te

estreitos. P or exemplo , o i ng le s padrao e a pron i inc i a p r e s t ig i ada

sa o a i u d a a norma para ap re s eu tadore s nac iona i s . e apesar de se

encon t r a r em pessoas co m ou t ros s o t aques l endo, por exemplo , no-

ticias regionais na s redes nac iona i s de TV e rad i o , n ao se e n c o n -

t r am pessoas com sotaques da classe t r ab a lhadora . Esses sotaques

ocorrem, mas em programas como competicoes e novel as . De igua l

modo, enquan to ha um servico de t r ans mis s ao extensive a l i n g u a

galesa, as l i ng uas as i a t i cas e de ou t r as m inor i as sao apenas super -

f i c i a l men t e a tend idas . A s t r ans mis s oe s pe rmi t em uma medida de

apropr i agao d e v a r i e d a d e s n a o - p a d r a o e l i nguas minor i t a r i as no

domin io pub l i co r aesmo que em areas de menor pres t igio.

Essas tendencias levantam a q u e s t a o de saber se a dominacao

do i ng le s padrao , q ue caracter iza o periodo moderno (Le i th , 1983),

es ta agora chegando ao f i m . Es tamos v i v e n d o um a s i t u ag ao 'pos-

p a d r a o ' (ve r James on . 1984)? H a t a m b e m u m a d i m e n s a o i n t e r n a -

c iona l par a essa ques t ao : e n q u a n t o a posicao do ingles como lin-

gua m u n d i a l nao oficial t ende a se fo r t a l ece r , d ive r s as var i edades

do ingles, como o ingles i n d i a n o e o a f r i can o , que tem t i do at e a q u i

r e conhec imento pequeno, e s t ao comegando a f igu ra r n u m a re lagaomai s i gua l c o m o ingles br i t an i co e o a m e r i c a n o . ( E m b o r a isto nao

deva se r superes t imado : a inda sao p r e d o m i n a n t e m e n l e o i ng le s

b r i t a n i c o e o a m e r i c a n o que sao e n s i n a d o s a m i l h o e s d e pessoas

em e s colas de id ioma s em todo o m u n d o . ) E se ha um a fa s t amen l o

g e n u i n e dos padroe s u n i t a r i o s nos n iveis nac iona l e i n t e rnac iona l ,

isso r ep re s en ta uma queb ra r e a l de hegemon ia na esfera l ingi i is -

tica, ou e a h e g e m o n i a s i m p l e s m e n t e a s s u n i i n d o n o v a s f o r m a s ?

250 Norman Fairclough

A discussao da mudanca d iscursiva no con tex to do debate do 'mo-

derm' smo-pos-modern ismo' retornara a tais questoes.

Ligada a esse p r imei ro m o d o de democra t izagao esta L i m a

certa democrat izagao de acesso a tipos de discurso de pres t fgio e,

nestes. a posigoes de sujeito de prestigio e poder para fa)antes de

var i edades nao-padrao do ingles , para mulheres e para pessoas ne-

gras e asia t icas . U rn exemplo e o a u m e n t o no mimero de mulheres

q ue conqu is tam acesso a posigoes na area jurfdica (embora raais

Discurso e mudanca social 251

Argumenta-se tambem que, como os marcadores explic i tos se tor-

nam menos evidentes, os marcadores encobertos de ass imetr ia de

poder tornam-se mai s sutis em vez de desaparecerem. Por exemplo. se

um a pessoa e regu la rmen le a unica que f o r m u l a ou resume o que

se disse numa in t e r acao (e cons t an temente oferece su a versao do

que ocorreu) , isso e u m l ipo mais su t i l de assimetr ia do que se a

pessoa for a unica permilida a falar sem ter sido convidada a faze-lo.

No entanto, a inda e uma assimetr ia bas t an t e poderosa e pode se r

explorada para controlar a inleragao. Heritage (1985), por exemplo.

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como ju fzas e advogacias nas cortes baixa s do qu e nas al tas cortes),on na educacao super io r on na media . A principal questao aq u i e ,

na tu ra lmeu te , o acesso a ius t i tu icoes e a posicoes den t ro deias , e o

acesso ao discurso e somente um a parte disso. U m a consequetic ia

e que dialetos nao-padrao e so taques regionais sa o aceitos de al -

guma mane i ra corao compativeis com pniticas de discurso na s

quais eram considerados at e aqui incompatlveis. U m a aula na univer-

s idade pode se r dada a tualmente no sotaque de Liverpool (mas isso

nao se tornou exatamente um a coisa que se faga se m problema).

Out ra mudanga largamenle perceptive!, que e a preocupagao

mais centra l neste l ivro, e a eliminagao de marcadores explic i tos

de hierarquia e assimetria de poder em tipos de discurso ins t i tucio-na l nos q u a i s a s relacoes de poder sa o desiguais. U m exemp lo e o

contraste entre amostras de entrevis ta medica pad rao e a l t e rna t iva

cons ideradas anteriormente (Cap f t u l o 5): na primeira , o med ico

controlava a tomada de t u rno e o top ico po r meio dos ciclos de

pergunta-resposta-aval iagao, e n q u a n t o na u l t i ma essas assimetr ias

explicitas estavam ausentes . Contrastes semelhantes poderiam se r

encon t rados entre as pra t icas mais t r ad i c iona i s e ma is 'modernas '

em in teragoes entre professores e a lunos , cliefes e empregados . pais

e f i lhos. Entre os mui tos t ipos de marcadores q u e t endem a ser

e l im in a d o s estao: fo rmas a s s imet r ica s d e t r a t a m e n t o ; d i re t ivosd i r e tos (por exemplo, imperat ives) , subst i tu idos por formas mais

i n d i re l a s e sensiveis a "face ' (Brown e Levinson, 1978);ass imet r i -

as no direi to de fazer certos tipos de con t r ibu icao , como os topicos

de in ic iacao e pe rgun tas ; uso por pa r t i c ipan tes poderosos de voca-

bu la r io especializado inacessfvel a outros. Ainda podemos , n a l u -

r a lmen te , achar todos esses aspectos em certos tipos de in teracao.

sugere que entrevis tadores de radio usam se n direi to de f o r m u l a r

como u m meio de exerce r con t ro le e a v a l i a r o que seus en t r ev i s -

tados dizem. se m con i r a r i a r sua obrigagao de nao expressar j u l g a -

mento s sobre o que e d i to .

U ma fo rma de interpre tar esses casos e que a e l i m i n a g a o a p a -

rente de marcadores e assimetrias explicitas de poder e, de fa to ,

apenas aparente, e que detentores de poder e ' sen t ine las ' de va r ios

t ipos es tao s imp lesmen te su bs t i t u i n d o mecan ismos exp l ic i tos de

controle por mecanismos encobertos . H a cer ta ve rdade nisso, m as

apenas meia-vert lade: esse modo de democra t i zagao e a l g u m a s ve-

zes apenas aparente, mas pode ser tambem substantia l , e ha l u t asobre seu s ignif icado, como demous t r a r e i a segu i r .

A tendencia de e l im inar marcadores explic i tos de poder esla

i u t imamente l igada a tendencia a i u fo rma l i d ad e : e nos tipos m a i s

format s de s i tuacao que as ass imetr ias de poder e s f c i t u . s sao as

mais n i t i d a s . Uma mani fe s tagao cen t r a l de i n fo rma l i d ad e c rescen te

e a fo rma com que o discurso conversacional tern sido e esta sendo

p ro j e t ad o de seu dommio pr imar io , nas i n t e r agoes pessoa is da es-

fera privada para a esfera pi ib l ica. A conversacao esta colon izando

a midia (Kress, 1986; Fowler , f 988b), varios t ipos de d iscurso pro-

f i s s iona l / pub l i co , educa c iona l e oulros: por isso, quero dizer q uesen discurso esta as s umindo um carater cada ve z mais conversacio-

n a l . Isso e parte de uma reest r i i turagao impor t an te dos l imi le s e n l r e

os d o m i u i o s pubi ico e p r ivado .

U m a d imensao dessa man i fes t ag ao d e i n fo rma l i d ad e e uma

m u d a n g a na relagao entre d iscurso t ' a lado e escri to. 1' ivemos

exemplos d isso nos j o rna i s , no C api tu lo 4 , i tem " E x em p lo 1: Re-

portagem de jornal": o exemplo 1 s imula o discurso conversac io-

252 Norman Fairclough

n a l ao med la r os atos e os dizeres dos poderosos pa ra o publico-

le i tor do jorna l , e a manche te " M o r d o m o de Lady Di retira-se... de

tenis!" usa nao apenas vocab u la r io conversac iona l mas t ambem

u m ins trumento grafico - as ret icencias - para s i mu l a r pausa 'dra-

m a t i c a ' na fa la . A separagao en t re fala e escri ta nao e m a i s o senso

comum que apa ren ta se r, em qua lq uer d iregao . A expressao ' con-

versar como um l iv ro ' refle te u m a percepgao p o p u l a r de como a

l i ngua escri ta tern i n f luenc iado a fa la mais f o rma l , e nola-se a mu-

Discurso e mudanca social 253

Coates. f 986 ; Graddo l l e Swann , 1989). Por e x e m p l o , um es tudo

de conversagao entre jovens casais americanos brancos (F ishman ,

1983) mostra que , enquan to as mulheres iu troduzem mais topicos

qu e os h o m e n s (47 e 29, respectivamente) , quase todos (28) os to-

picos dos homens e ram abordados na conversagao , enquan to nao

mais que um tergo (17) dos topicos das mu lheres er a abordado.

Quando os homens i n t roduz iam topicos, a tendencia era as m u l h e -

re s sinalizarem su a a tengao enquan to os lopicos estavam seudo

(com 'respostas m f n i m a s ' , ta is como 'sim' ou 'aha')

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d a n g a re f e ren te a c o n v e r s a g a o nao somen te em toda p a r t e dosmeios impressos e p u b l i c i d a d e , m as t ambem em novos m ode los de

formularies , como os formularies de in sc r igao pa ra pagam en los do

seguro social (Fairc lough, 1989a: 218-222). As m u d a n g a s da f a l a

p a ra a escri ta podem ter t ido seu apogeu; os valores cu l t u ra i s con-

temporaneos atr ibuem alto valor a in formal idade , e a mudanga

predominante es ta l igada a formas que lembram a fa la na escrita.

Mas a c o n v e r s a g a o t a m b e m e u m m o d e lo poderoso p a r a

outros t ipos de d iscurso falado. Assim, nao sa o apenas os meios

impressos que estao se t o rnando mais conversac iona i s , mas t am-

be m os ineios eletronicos, radio e televisao. Tolson (1990) descre-

veu o processo conversac iona l de en t rev i s la s na m f d i a . H a m u i t o

mais conversagao para ouv i r e assistir nesses meios (por exemplo,

programas de entrevis tas) , o que ref lete por s i m es m o sua avalia-

cao, mas e t ambem o caso de apresentadores que ' conversam*

largamente com sua aud ienc ia de massa , como se estivessem 'ba-

t endo papo' com alguns indiv iduos. E uma variedade de t ipos de

e n t r e v i s t a e ou t ros t ipos d e e n c o n t r o e n t r e p r o f i s s i o n a i s e sens

' pub l i cos ' t endem a tornar-se mais conversacionais , como sugeri

anter iormente. Como no caso da e l im inagao de marcadores de as-

simetria, ha um problema sobre a exlensao com que a i n fo rma l i d ad e

e s imu lada por razoes estrategicas; voltarei a isso ad ian te .O u l t i m o d omfn i o de democrat izagao q ue quero apon la r e o de

reiagdes de genero na l i nguagem, q ue tern sido o caso de lu ta sobre

p ra t ica s discursivas mais pub l icameu te em ev idenc ia nos u l t i m o s

anos. A l i t e r a t u r a q ue prol i fera sobre ' l i nguagem e g en e r o ' con tem

e s t u d o s q u e s u g e r e m a s s i m e t r i a s e n t r e m u l h e r e s e h o m e n s (em

favor dos h o m e n s ) q u a n t o ao tota l d o t empo de f a la , o in fc io de

topicos , a probabil idade de i n t e r rupgao e outros (Cam eron, 1985;

apresentadose a t ivamente aceitarem e responderem aos topicos. Por sua vez,

q u a n d o as mulheres apresentavam os topicos. era c o m u m os ho-

mens nao s ina l iza rem a tengao enquan to a s mu lheres es tavam f a -

l a n d o e dar uma resposta m i n i m a ao topico sugerido (o que nao

anima ninguem a continuar com o topico) q u a n d o elas acabavam

de falar .

Aspectos discriminatorios (e, portanto, an t idemocra t icos) da

l ingua e do uso lingiifstico tern s ido la rgamen te documen tados ,

como o uso de 'ele' como se fosse um pronome generico para se

refer i r tanto a mulheres qu an to a homens, ou o uso de ' h o m e in ' e

termos semelhanles, a exemplo de ' coordenador' (Graddoll e Swann,1989: 99-110). Se 'ele' fosse genuinamente generico, ser ia usado

i nd i fe r en temente para se refer ir a membros nao especificos de gru-

pos de pessoas. Contudo , exis tem de fa to a lguns casos em que

'ela' e largamente usado dessa fo rma , po r exemplo, " se uma se-

cretaria( ' ) comega a sentir dor nas costas, ha chances de que o

equ ipamen lo do escritorio dela esteja co m defeito" . 'Ela' e u sado

dessa forma quando o membro estereotipado do con j u n t o de pes-

soas em ques tao e uma mulhe r : a secretiiria tipica, ou enfe rme i r a , e

um a mulher . Mas se o uso de 'ela' para referenda n ao especffica

esta baseado em um estereotipo, nao ocorre o mesmo com 'ele'?S e regras un ive r s i t a r i as contem coisas como essa: "Se um a luno

deseja in terrom per seu curso por razoes pessoais ou de s a u d e ,

el e dever ia d i scu t i r a ques tao com seu o r i e n t a d o r em p r imei ro

Em ingles, a palavra secretary pode referir-se ao homem ou a mulher, mas e

baslante generalizado o uso do pronome feminine she (ela) em subst i tuicao a

esse substantive, indicando que e uma profissao feminina. (N. do T.)

254 Norman Fairclough

lugar". a i nao e o es tereot ipo de 'o a luno ' mascu l ino? Pa ra u m

argumento re lac ionado a esse ponto , ve r M a r t y n a (1978).

Embora a m a i o r parte do debate es teja cen t r ada ou t ra vez na

continuagao de prat icas nao-democrat icas e d i s c r imina tor i as . o

conlexto para o debate e uma certa abertura de democrat izagao das

relacoes de genero q ue tern suas facetas discursivas. Nao apenas

feministas conscientes m as muitas outras mulheres , e muitos homens,

in tervem a t ivamen te nos dias de hoje para t o r u a r as p ra t i ca s l i n -

giiisticas m en o s d isc r imina to r ia s , com graus va r iados de sucesso.

Discurso e mudan^a social 255

par t i lhando co m M r ( a t r ibu ido ao homem) a p rop r iedade de de ixa r

em aberto o estado c iv il da pessoa. M as Ms, Mrs e Miss sa o agora

usados l a rgamen te em formular ios oficiais como alternativas de es-

colha. Optar po r M s entao torna-se um a to po l i t i co , que , na ma io r ia

do s d o m m i o s , pode l evar alguem a ser marginalizado(a). A luta so-

bre essas formas cont inua e, embora a democrat izagao de pra t icas

discursivas re lac ionadas a genero nao seja um processo faci l e

un iversa l , a s a s s imet r ia s de genero no d i scu rso tern sido d e s n a l u -

ralizadas e prob lemat izadas nunia escala s ignif ica t iva .

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A intervengao pode assumir varias formas: produzir or ienlagoes

para a prat ica nao discr iminalor ia em i n s t i t u i coe s ; pi char nos

anunc ios de outdoors para enfat izar e ques t iona r o discurso dis-

cr iminalorio; ou l u t a r pelo acesso de mulheres a pra t icas d iscurs i-

vas e a pape is de pres t fgio. U m a f o r m a impor t au te de intervene, ao e

engajar-se em lu ta s de natureza mais hegemonica para mud ar pra-

ticas - por exemplo. em reun ioes de sindicatos ou de depa r tamen-

to s academicos em diregoes q ue faci l i tem as mu lheres conlr ibuir

ou encorajar modos de interagao mais colaborat iva que competi t i-

va que sao com f requencia mais a l t amente va lo r izados por mu lhe-

res do que por homens. Nem deve 'a l i ngua do silencio* como umm o d o de i n t e rvengao ser desconsiderada: as pessoas podem i n t e r -

pre t a r e reagir ao discurso de modo oposil ivo mesmo se sua oposi-

c.ao nao for expressa exp l ic i t amen te . A i n t e rvengao pe los homens

a lgumas vezes se d ir ige a d imensoes d iscurs ivas de praticas de

mascu l in idade - por exemplo, a pressupostos de que ser homem

implica p ra t icas d iscurs ivas agressivas e obscenas . Ta i s prat icas de

intervencfio sa o m a i s t ipicas de certos segmentos da classe m e d i a e

tern mais impac to ai do que em outras classes.

As ques toes de in te rvengao sa o como um a l emb ranga opor tuna

de que tendencias abstra tas , ta l como a democra t izagao , sao umexemp lo resumido de lu tas contraditorias , nas q u a i s as i n t e rv en -

goes p a r a r e e s t r u t u r a r as ordens de discurso podem se r res i s t ida s

de va r ia s mane i ra s e estar suje i tas a varias estra tegias de con ten -

c,ao, de modo a preservar hegemonias ex is ten tes na esfera do dis-

curso. Um a estra tegia desse t ipo e a marg ina l izagao , e um exemp lo

claro na l ingua inglesa e o t i tulo M s ( a t r ib u ido a mulhe r ) . Este fo i

p lane jado or ig ina lmen te para impor s imetr ia de genero nos t i tu los,

Comodifica^ao

A comod i f icacao e o processo pelo q u a l os d omfn i os e as in s -

t i tuicoes sociais, cujo proposito nao seja pro du zir merca dorias no

sen t ido economico res tr i to de art igos para venda, vem nao obs tan te

a se r organ izados e def in idos em te rmos de p rodugao , dis tr ibuigao

e consume de mercador ia s . Na o surpreende mais , por exemp lo ,

qu e setores das artes e da educac,ao, como o tea tro e o ens ino da

l ingua inglesa , sejam referidos como ' industr ias ' dest inadas a pro-duzir , a comercia l izar e a vender mercadorias cu l tu r a i s e educac io -

nais a seus ' c l ien tes ' ou 'consumidores'. A comod i f icagao nao e

um processo pa r t i cu la rmeu te novo , mas recen temen te g a n h o u novo

vigor e in tensidade como um aspecto da 'cultura empresarial ' (Keat

e Abercrombie , 1990). Marx mesmo no lou os efei tos da comodif i-

cagao sobre a l ingua: refer ir-se as pessoas em term os de 'maos' em

con tex tos industr ia ls , por exemp lo , e um m o d o de ve- las como

mercadorias u teis para produzir outras mercadorias , como forca de

trabalho incorporada. Em termos de ordens de d iscurso, p o d em o s

entender a comodif icagao como a colonizacao de ordens de discurso

i n s t i t uc iona i s e m a i s l a rgamente da ordem de d iscurso societar ia

por tipos de discurso associados a p r o d u g a o de mercadoria . Apre-

sentarei exemplos da educacao e do d iscurso educacional .

Um aspecto gene ral izad o do d iscurso educacion al contempo-

r aneo e a l ex i ca l i zagao de cu isos ou p rog ramas de es tudo como

mercadorias ou produtos que devem se r comerc i a l i zados aos c l ien-

tes. O tex to que usei no Capitu lo 6 e urn exemp lo t ip ico :

256 Norman Falrclough

O produto de preparagao vocacional e usua lme n te um programa.

Seu desenho e su a implernentacao sao. portanto, partes essenciais

do p r ocesso d e c o m e r c i a l i z a c a o e de ve m com e^a r d a s n eces -

siciades do s con s u m i d o re s e dos cl i en tes em potencial e dos be -

neffcios qu e estao buscando (Further Education Unit. 1987: 51).

A m ensagem para autores de cursos e professores e uma var ianle

m a i s e lab orada da maxima comercial "De aos clientes o que que -

rem". Tais expressoes geram uma t ransferencia metafor i ca do vo-

cabu la r io de mercador i as e mercados para a ordem de discurso

Discurso e mudanca social

cia, 1989). A coexistencia dessas constructs a t ivas e passivas dos

aprendizes faci l i ta a manipulacao das pessoas po r meio da e d u c a -

c.ao pelo reves t imento dela com o que se pode r i a chamar um a r e to-

rica i nd iv idua l i s l a e consumis ta .

O discurso educacional comodificado e d o m i u a d o por um voca-

bular io de habi l idades , inclu indo nao apenas a palavra ' h ab i l idade ' ,

e palavras associadas como ' compefenc ia ' , m a s u m a lex icalizagao

comple ta (ver , no C apf tu lo 6 , o i tem " C r i a g a o de pa lavras " ) dos

processos de aprendizagem e ensino baseados em concei tos de

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educac iona l . M as na Gra-Bretauha contemporanea a metafora e

mais que um floreio retorico: e uma d imensao discursiva de uma

ten ta t iva de rees t ruturar as pra t icas de educagao sobre um modelo

de mercado, q ue pode te r (como o texto anter ior sugere) efe i tos

claros sobre a elaboragao e o ensino de cursos , o esfor^o e o di-

nheiro investidos, entre outros.

Mas o discurso educacional comodif icado e comumente mais

contraditorio por si mesmo do que isso pode suger i r . Ha u m a pista

para tais contradigoes na combinagao de ' consumidores ' e 'clien-

tes' no texto, que expoe uma ambigii idade generalizada sobre a

quern sa o vend idos as mercador i as ou os 'pacotes'. Sao os apren-

dizes ou as empresas qu e a tua lmen te empregam ou podem vir a

empregar os aprendizes? Os u l t imos podem de fa to ser ' c l ien tes ' ,

no sent ido dire to de pagar para os aprendizes fazerem um curso.

Em conseqiiencia, os aprendizes sa o construfdos con t r ad i tor i a -

menle. De um l ado , sa o cons trufdos no papel ativo tie clientes ou

cons umidore s conscientes de suas 'necessidades' e capazes de

se lec ionar cursos que v e n h a m ao encon t ro de suas necess idades .

Por outro lado, sao cons t ru fdos no pape l passive de e lemen los ou

instruments em processes de p rodu^ao (algo c o m o 'maos', n o

exemplo de M a r x ) q ue se jam alvos para t r e inar ' h ab iKdades ' ou'competencias' requeridas , com cursos concebidos em torno de

'metas de realizac_ao' precisas resu l t ando em 'per f i s ' de aprendi-

zes, ambos os q u a i s sa o especificados em t e rmos de h a b i l i d a d e s

b as t an te precisas. Esses p ressupos tos e essa terminologia estao

agora generalizados, espec ia lmen te na educac.ao p re -vocac iona l ,

mas sao l ambem usados , p or exemplo , no Rela to r io C ox sobre o

ens ino de ing les nas escolas (D epar t amento de Educacjio e C ien-

habi l idade , r re i n amen t o de hab i l idade , uso de habi l idades , t ransfe-

rencia de habil idades e outros (ver Fairclough. 1992). O conceito de

habilidade e um fator importante ao permitir que as duas construgoes

contraditorias dos aprendizes coexis tam se m man i tes ta r inconsis-

tencia , porque parece ajus tar-se t an t o a uma visao ind iv idua l i s l a e

su b j e t i v a da aprendizagem como a uma visao objet iva de t r e ina-

men to . Essa ambivalencia es ta refletida na his tor ia do conceito no

discurso educacional l iberal humanis ta e conservador e na his tdr ia

seman l ica da p a l a v r a ' h ab i l idade ' . De um l ado , o concei to de ha-

b i l idade tern implicagoes at ivas e i nd iv idua l i s t as : hab i l i dades sa o

atr ibutos apreciados dos ind ivfduos, estes diferem em t ipos e emgraus de hab i l idade , e esta aberto a cada um aper f e i tpa r a s hab i l i -

dades ou acrescen ta r novas habi l idades . (A propos i to , o conce i to e

t ambem democra t ico , suger indo que todos tern a capac idade de

aprendizagem e desenvolvimento, dado apenas o t re inamento apro-

pr iado.) P or ou t ro lado, o conceito de hab i l idade tern i raplicacoes

normat ivas , passivas e obje t i f icadoras : todos os i n d i v f d u o s a d q u i -

re m e l em en t o s d e u m reper to r io soc ia l c o m u r a d e h a b i l i d a d e s ,

por meio d e p roced imen tos d e t r e inamenlo ins t i t uc iona l i zados e

supondo-se que as habi l idades se jam t ransferfveis a contextos , a

ocasioes e a u sua r ios de um modo que deixa pouco espago a i nd i -v idua l idade .

0 vocabu la r io d e hab i l idades tern u m a hi s tor i a longa e res-

peiravel em l ingiifslica e em l ingiif s t ica ap l i cada , nas q u a i s e l ugar -

c o m u m a ide ia de que o uso da l ingua es ta baseado em co n j u n t o s

de ' habil idades l ingtifs t icas ' (habil idades de escr i ta, le i tura, fa la e

compreensao oral) . Essas lex icaliza^oes a j u d a m a comodii ' icar o

c o n t e u d o da educacao lingiifstica, no s en t ido de que isso f a c i l i t a

su a divisao em un ida des de s con t t 'nuas que , em princfp io, sao ensi-

258 Norman Fairclough

nadas e avaliadas separadamente e podem ser compradas e vencl i -

das como art igos d is l in tos na va r iedade de m ercador ia s d i spon ivei s

no mercado educac iona l . Essas un idades nao sao apenas a s p r inc i -

pa l s categorias de habil idades de escrita , l e i tu ra , t'ala e compreen -

sao oral , mas tambem partes mais especif icas de cada uma dessas

categorias. As habi l idades de fala podem se r div id idas em fornecer

informac ao, expressar opiniao e engajar-se em discussao de grupo,

e cada um a dessas pode se r div id ida mais a i n d a , e assim por d ian te

(ver, por exemplo , a l i s ta de habil idades comunica t ivas do Piano

Discurso e mudanfa social 259

guagem e imagens v isuais , e a tendencia em voga e que as imagens

se tornem m ais evidentes . Em parte, isso esta em ha rmon ia com osdesenvo lv imen tos tecnologicos na televisao e na editora^ao. Mas

as tecnologias, como sugeri antes , tendem a ser completamente

exploradas apenas na medida em que elas se harmonizam com o

choque da m u d a n g a social e cultura l . Entao, o que a public idade

obtem das imagens visuais? Para responder a essa ques tao preci-samos considerar as propriedades gerais da pub l ic idade como um

genero de discurso.

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d e Tre inamen to de J o v e n s na U n i d a d e de Educac,ao Super io r -

Youth Training Scheme, 1987: 38). Dependendo de qual faceta

conlraditoria dos aprendizes e enfat izada. es ta faci l i ta a eficienle

definigao e corre§ao de deficiencias ou uma provisao que e dest i-

nada a a tender as necessidades dos consumidores tao especif ica-

m e n t e q u a n t o possivel. A lexicalizacao da educacj io lingtiistica em

termos cle um vocabulario de habil idades implica tambem uma vi-

sao da lingua altamente normativa, como um conjunto determinado

de prat icas (como argumento em Fairc lough, 1992).

Mas a comodificac,ao do discurso educacional nao e apenas

u m a q u es t a o de vocabu la r io ; e t ambem uma ques lao de generode d i s c u r s o . A educac.ao e apenas um de uma serie de d omfn i os

cu j a s ordens de d iscurso sao colonizadas pelo genero p u b l i c i t a r i o

(Fairclough, 1989a: 208-211), e , como resultado, ha uma prol i fera-

gao de tipos de texlo q ue c o n j u g a m aspectos de pub l ic idade com

aspec tos de outros generos de discurso. J a e n c o n t r a m o s um e x e m -

plo disso no tex to de Barclaycard (Capitu lo 4, Exemplo 2) que

mescla public idade e r egu lamentos f inance i ros . Nesta segao, ha

um exemplo bem diferente do d o m i n i o ed u c a t i o n a l , extra ido do

prospecto da g rad u ag ao da Unive r s idade de Lancaster de 1990.

N e n h u m signi f icado deve se r l igado a escolha da universidade ou do

curso, pois tendencias semelhantes sa o evidentes em outros registros e

em outros prospectos.

Aspectos comuns de regis tros ueste prospecto sao a localiza-

ca o de uma fotogral ' ia proxima ao im'cio do texto, o t i t u l o "Voce

prec isa ra" e o grafico no f im. A inclusao s is temat ica c le fotografias

em prospectos e um desenvo lv imen to relalivamente recente quepor s i so reflele o impac to da pub l ic idade . A pub l ic idade con tem-

poranea de mercador i a consis te t ip icamente de um misto de l in-

A publicidade e discurso 'estrategico' po r excelc^ncia, em ter-

mos da distingao feita por Habermas entre linguagem 'estrategica' e

' comunicat iva ' (1984). E uma questao de cons truir ' imagens ' n o u t r o

sentido - modos de apresentar publicamente as pessoas, as organiza-

coes e as mercadorias e a construgao de identidades ou personal idades

para elas. As condic.6es de mercado contemporaneas requerem que

series de empresas comercia l izem produtos be m semelhantes; para

estabelecer seus produtos como diferentes. sua identidade tern de

se r constru ida. Ao mesmo tempo , as categorias de potenciais com-

pradores freqi ientemente nao sao expHcitaveis em termos de gru-

pos sociais existeutes independen temen te do segmento social(classe, grupo regional e etnico, genero, etc.): eles t a m b e m tern d e

se r c o n s t r u id o s n o discurso. E assim t ambem ocorre com os

produtores e vendedores do produto, cuja imagem tern de ser feita

para harmonizar com as imagens do p rodu to e de seus consumido-

re s potenciais. Produtor(a) , produto e consumidor(a ) sa o reunidos

como co-part ic ipantes em um est i lo de v i d a , uma comun idade de

consumo (Leiss, Kline e Jha l ly , 1986) que a public idade constroi eSimula.

O que os pub l i c i t a r ios obtem da s imagens v isuais e sua capa-

cidade de evocar n a s imulacao de estilo de vida, capacidade que e

gera lmen te mais poderosa e imediata que a da l ingua . Se uma ima-

gem visual func iona , pode criar ins tantaneamente um m u n d o qu e

consumidores potencia is , produtores e produtos podem con jun ta -

mente ocupar, an tes que os lei tores possam le r (ou os telespectado-

re s ouvir) a l inguagem da publ ic idade . Desse m o d o , a ma io r ia das

fotografias nesse prospecto da universidade apresenta a lunos fa -

zendo coisas (senlados em au la , u t i l i zando equ ipamento , conver -sando , etc.), ofe recendo aos a lunos po tenc ia i s u m a m b i e n t e

260 N o r m a n F a i r c l o u g h

fi'sico e socia l n o q u a l eles podem encaixar-se segundo a i m a g i n a -

cjio. A foto no exemplo reproduzido nao representa as ativ idades

do s a lunos , m as oferece um amb ien te natural de uma beleza fora

do comum pa ra os a lunos potenciais ocupa rem imag ina r iamen te

(passando um ano n u m a univers idade amer i cana como parte do

curso). A imagem v isua l pro]e ta um a imagera para o ' p rodu lo1,

isto e, o esquema do curso, e para o(a) a luno(a) potenc ia l como

parte dele.

O s graficos abaixo do t i tu lo "Voce precisara" no fi m do t e x t o

na o tern as propriedades evocativas de uma fotografia, m a s , nao

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obstante, fazem sua propria contribuic.ao para a co-cons t rugao

do(a) a luno(a) , da univers idade e do curso potenciais. Desenhos

graficos desse t ipo sao meios efet ivos de tornar as informacoes

d ispon ive i s n u m relance. O uso de graf icos sugere um a instiluic.ao

que e tanto atualizada como sensivel as necessidades dos alunos. es -

pecialmente dada a historia dos prospectos univers i tar ios , comple-

xes em termos de iiiformacjio e 'dificeis de ler'. Tambem constroi

o(a) a luno(a) potencia l com necessidades e valores particulars,

tais como precisar de informac.oes praticas numa fo rma digerfvel e

valorizar a c lareza e a ef ic iencia no seu forn ecimento.O uso de graf icos tambem a juda a resolver uma contradicj io

qu e resulta da colonizagao do s prospectos pela publicidade. As u n i -

vers idades podem dispor-se a venda aos a f uno s , m as elas t a m b e m

impoem controles e condic,6es rigidos para o acesso. Conseqiiente-

mente, os alunos estao posicionados, de um lado, como consumidores

poderosos com o d i re i to de escolher e, de outro, como cand ida tes

se m poder. Ao marg i n a l i za r as condicoes para o acesso e t ra ta- las

por meio de graficos, as exigencias impost as pela univers idade sa o

cons t ru fdas como ques toes de fa to pelas quais n inguem e aparen-

t emen te responsave l. Observe-se como isso tambem aparece em

de ta lhes lexicais, tais como optar por 'voce precisara ' em vez de

'nos ex ig tmos ' .

Vol temos f i na lmen te p a ra o p r inc ipa l corpo do tex to. 0 q u e

chaina a a tengao e a combinagao de in formacj io e pe r suasao , in -

forraando ao s alunos potencia is sobre o curso e vendendo-o. Isso e

Os a l uno s de Lancaste r sempre

de m o ns l r a r am g r ande inte re sse po r

d i s c i p l i ne s a m e r i c a n a s , seja nos

depar tamentos de Ingle s , His tor ia ,

Po l f l i c a ou em oulros depar ta -

menlos . Agora , c possive l faze r um

curso especial izado em Bs ludos

Americanos. Esse curso co m b i na

cliferentes abordagens discipl inares

ao e s t udo dos Bslados Unicfos e

ofe rece opcoes que cobrem l i isio-

!\n, I J Iera lu ra e po l f l i c a a m e r i c a n a ,desde os prime iros a s s cn t am e n l o s

co lonials a te os dias de lioje

Alem disso, os a l u n o s de Estudos

A m e r i cano s passarao seu segundo

a no num a un i ve r s i dade am e r i c ana ,

co mo a U n i v e r s i d a d e de Massa-

ch us e t t s , em Amherst , ou oul ra

u n i v e r s i d a d e a m e r i c a n a se leciona-

da. As l igacoes americanas proxi -

m as es tabc lec idas por [ . ancaste r

l o r nam possfvel inlegrar ao curso o

ano no exte r io r , de fo rma que , de

rna ne i r a i n c o m u m na s univers ida-

de s br i lSn icas , o curso de Estudos

Americanos pode se r conc lufdo em

Ires anos . Uma or ienlacao e special

ga ra nt i r i i inlegracao proxima en l re

o ano no ex lc r ior c os do is anos emLa n caste r .

Os cursos de Lancaster requisi lam

especialistas n u n i a serie de deparla-

mentos. c. como na maioria do scursos de Lancaster, os alunos ganha-

rao experiencia valiosa em mais de

um a disciplina. Mas um grau consi-

deravel de flexibil idadc e manl ido. e e

permi t ido que os a lunos se direcio-

nem firmemente ranlo para hisloria

como para l i ieralura ou polilica. se

assi inesco lhe rem.

0 pr imei ro ano e cledicado em grande

parte a prover um alicerce clisciplinar.

e os a lunos segucm os cursos regtila-

res de primeiro ano nos de pa r l am e n-

tos de Historia, Ingles e I'olflica.

fazendo opcoes amer icanas onde

exislirem. Depois disso. a l i n h a de

estudo e quase exclusivainenlc dedi-

cada ao s lopicos americanos c podc

incluir a elaboracao de uma disserta-

9iio sobre um lema am e r i c ana

Os graduados em Estudos Americanos

segucm carreiras normalmenlu l igadasa fonnacao em Ciencias 1 lumanas ou

em Ciencias Sociais: educagan. comer-

cio, jornalisrno, editoracao. biblioieco-

nomia e servico social, com as

oportunidades mais ampins que podem

decorrer da experiencia e da pcrspeeli-

va transallanlica do s alunos.

B A Horn E ST UD O SAMERICANOS Q400

Primeiro AnoHis to r ia (opcoes am e r ican as )

I n g le s

Po l i t ica

Segundo AnoQu at r o d e c in co cursos em d i sc i p l i -

na s amer ica n as d ad os nunia im ive r -

sidade do s Estados Unidos, i ndu indo

Do s Purifanos ao s lanques: NovaInglaterra, 1630-1730A Grande Alianca: Gra-Brefanha,

Russia e Estados Unidos, 1941-

1945A America da Guetra Fria: Os

Estados Unidos de Truman a

Kennedy

Ingles:

Literaiura Ame ricana, 1620-1865

Literatura A m e r i c a n a , 1 8 6 5 - 1 9 4 0

Literature A m e r i c a n a , 1940-1980

Pol f l i c a :

A Politica de Raca

Discu rso e m u d a n c a s o c i a l 263

evidente na ordenagao de oragoes no pr imeiro paragrafo. A terceira

orac,ao descreve a compos igao do curso, m as e p reced ida e prepa-

rada por duas oragoes que a p r e s e n t a m o curso n u m a n a r r a t i v a

sobre Estudos Americanos em La ncaster . Isso e infbrrn.ac.ao ou

persuasao? Pode haver na tu r a l inen te a cons t rugao de ambas : o

regis tro da univers idade em Es ludos Americanos e ce r t ameute in -

fo rmacao re levante aos cand ida tos , mas a inovagao p rovave lmente

sera mais a t r aen te se resu l la r de realizacoes passadas. Os pros-

pectos do s anos 1980 comparados com os dos anos 1970 ou an t e -

riores estao mais preocupados em selecionar e o rdena r s u a s

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peJo menos «m curso interdiscipli-

nar.

Terceiro AnoQ uatro ou cinco cursos, n or m al-

m en te tie:

Historia:

A Historia dos Estados Unidos da

America

Religiao na America de James-town aAppomatox, 1607-1865

Governo dos Estados Un idos :

A Poli t ica da Fresidencia

O Proccsso Ame ricano de Politi-

caS

Poli t ica Externa dos Estados Uni-

do s desde 1945

Avaliacao: veja na s discip linas rela-

cionadas

VOCE PRECISARA D E

Cursos N l v e le ,A L J ^Jivel O/Gt:SE(*)

Estudos

Americanos

BBC /BC C Aprovacsio

n o r m a l m e n te i n d u i n d o nil m a lingua

Ingles estrangeira

on outras qua l i f icacoes ( IB , EB, Scott ish H ighcrs ) num padrao com paravc l.

Niveis AS: serao aceitos.

Entrevista: ap en as em casos especiais .

Visilas: os cand idatos selecionados serao convidados a conhecer a universidade.

Os N i v e i s A, O e G C S E sai» e xame s nac ionai s realiz f ldos, na Ing la t erra ,

durante o Seg u n d o Gran . Ao con c lu i r o Seg u n d o Gran, se o(a) a lnno(a ) pre-

tendc ingrcssar na universidade, e obr ig ad o(a) a prestar o e x a m e n ac ion al

d en omin ad o Niv el A.

in fo rmacoes com base em calculos estrategicos e efei tos persuasi-

ves. Poderlamos argumentar com razao que nao ha novidade sobre

calculo estrategico em i n fo rmag ao . A n o v i d a d e de fa to e que a in -

formacao pode se r expressameii te estrategica e persuasiva se m que

seja considerada como um as s un to impor t an te . Sob a i n f l u en c i a da

public idade como um modelo de prestfg io, a combinagao de in -

formagao e persuasao esta se tornando n a t u ra l i zad a , as d is t incoes

enlre elas em ordens de discurso estao desaparecendo e , como con-

seqiiencia, a natureza da ' in fo rmagao ' e s ta mudan do rad ica lmen te .

A combinacao de i n fo rmag ao e persuasao e t amb em ev iden teem outros paragrafos do texto; f i xemo-nos no segundo. A pr irae ira

oracao apa ren ta con teudo i n fo rma t i v o claro ate a palavra 'selecio-

n a d a ' que sugere quao solicita a univ ersid ade e diante dos interesses

de seus a lunos. 'Especial' na terceira oracao fa z algo m u i t o pa re -

cido. Na segunda oragao, a ordenagao e a moldura es tao de novo

evidentes: a i n formacao sobre a du racao do curso e p reced ida ,

emoldurada e, de fa to, faz um a couexao causal ( ' p a r a que') com

' l igagoes amer icanas p rox im as ' de Lancas te r que , i n c i d en t a l men t e ,

sa o pressupostas como se os candid atos devessem conhecer sobre

elas. Troximas' sugere discretamente a super ior idade de Lancastere e p a r t e de uma t e n d e n c i a d e comparac j io exp l ic i l a e n t r e Lan-

caster e outras univers idades. O fa to de 'tres' estar ein i tal ico e a

comparagao explicita ent re Lancaster e outras universidades sugerem

qu e a duragao menor do curso e projetada como um 'ponto a vender ' .

264 Norman Fairclough

Tecnologiza^ao

A s s oc iedades mode rnas sa o carac t e r i zadas por u m a t endenc ia

relacionada ao controle sobre par t e s cada ve z maiores da vida da s

pessoas. Habermas descreveu isso em termos da colonizagao do

'mundo da vida' pelos 'sistemas' do Estado e da economia (1984: xi).

O qu e disse an t e r i o rmen t e sobre comodificagao sugere urn aspecto

discursive de colon izagao pela economia . Foucau l t t am b em ab or-

do u essa t endenc ia geral , ca ta logando as 'tecnologias' e as ' tecni-

cas' que es tao a servico do ' b iopode r ' m o d e r n o (ver , no C a p f t u l o

Discurso e mudanca social 265

A s tecnologias d i s cur s ivas eslabelecem uma l igagao i u t i ma

entre o conhec imen to s ob re l i ngu agem e discurso e poder . Elas siio

p l an e j ad as e aperfeicoadas com base nos efe i tos antecipados mes-

m o nos mais apurados de t a lhe s de escolhas l ingii is t icas no voca-

bulario, na gramatica, na entonacao, na organizagao do dialogo,

entre outros , como t amb em a expressao facia l , o gesto, a pos tu r a e

os mov imen tos corpora i s . E las p roduzem mudanca d i s cur s iva rae-

d i au t e um p laue jamento consciente. Isso implica acesso de p a r t e

do s tecnologos ao couhec imen lo sobre a l i n g u a g e m , o discurso e a

semiose e a i n d a ao conhec imento psicologico e sociologies. E pre-

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2, o i tem "Da arqueolog ia a genealogia").

A ana l i se de F o u c a u l t das t e c n o l o g i a s de p o d e r pode ser

es tend ida ao discurso. Podemos refer i r p r o d u t i v a m e n t e a 'tecnolo-

gias discursivas' (Fa i r c lough , 1989a: 211-223) e a 'tecnologizacao

do discurso' (Fairclough, 1990b) como caraclerfs t icas de ordens de

discurso modernas . Exemplos de tecnologias de discurso sao en-

t revis ta, ensino, aconselhamento e p u b l i c i d a d e . A o denomina- l as

tecnologias do discurso, quero sugerir q u e n a s oc iedade mode rna

elas te rn assumido e e s t ao as s umindo o c a r a t e r de t e cn icas t r ans -

contextuais que sao consideradas como recursos ou con j u n t o dein s t rumen tos que podem s e r usados para pe r s egu i r um a var i eda de

a m p l a de es t ra teg ia s em m u i t o s e diversos contextos . As t e cnolo-

gias discursivas sa o cada ve z mais adotadas em locais ins t i tuc iona is

esp ec f f i cos po r agentes sociais designados. Elas tern seus p rop r ios

tecnologos especial is tas : pesquisadores que cu idam de sua e f ic ie n -

cia, especialistas que t r aba l h am em se n ape r fe igoamento a l uz da

pesqu isa e d a m u d a n g a n as exigencias i n s t i t uc iona i s e t r e inadore s

q u e t r ans mi t em as tecnicas .

Esses t e cnologos i n c l u e m membros d e d e p a r t a m e n l o s d e

cienciassociais da u n i v ers i d ad e : exemplos he m estabelecidos saoa pesquisa e o t re inamento em 'habi l idades sociais' real izados po r

psicologos sociais (Argyle, 1978). Os que sao direcionaclos p a r a o

t r e inamento em t ecnolog ias d i s cur s ivas t endem a s e r professores,

entrevis tadores , publ ici tar ios e ou t ros 'por te i ros ' e de ten tore s de

pode r . e as t e cnolog ias d i s cur s ivas sao ge ra lmen te p l an e j ad as p a r a

te r efe i tos par l iculares sobre o pub l i co (cl ientes , f regueses , consu-

midores ) que nao es tao t re inados uisso.

visfvel que cada vez mai s haja expec t a t iva de que os ana l i s t as de

discurso e os lingiiistas fu n c i on em como tecnologos do discurso ou

t o rnem os resultados de suas pes qu i s as d i sp on i v e i s a eles.

As tecnologias discu rs ivas envolv em s imulagao: em par t i cu -

lar , a s imulagao par a propositos es trategicos e i n s t ru men t a i s de

significados inlerpessoais e prat icas discurs ivas . Isso se h a r m o n i z a

co m m e u s c o m e n t a r io s an te r ior e s sobre a d e m o c r a t i z a g a o d i s c u r -

s iva : a s imulagao de s ime t r i a de pode r e a i n formal idade sa o t e cn i -

ca s l a rgamente us adas por par t e dos detentores de p o d e r

ins t i tucional . U m exemplo e o t ipo de en t r ev i s t as par a emprego

real izadas em servigos publ icos , tais como hospitals, orgaos da

a d m i n i s t r a g a o publica local e u n i v ers i d ad es . Usei em ou t ro lugar

(Fairclough, 1989a: 62) o termo 'personalizagao sintelica' para a

s imu lacao de aspectos de s ignificado in terpessoal a l i ce rgada no

calculo estra tegico de efe i tos . A s i mu l ag ao de s ign i f i cados i n t e r -

pessoais p rovem da subordinagao de todos os o u t r o s aspectos da

prat ica e do sent ido discurs ivos para alcancar obje t ivos es t rategicos

e i n s t rumenta i s - o t ipo de i n t e rag ao que Hab e rm as denom ina ' e s -

t ra teg ica* em opos ig f io a ' co mu nica t iva ' ( ve r comenta r io an te r ior ) .

A tecnologizagao discurs iva es ta l igada a u m a e x p a n s a o d o d i s cur -so es trategico para novos dominios.

A tecnologizagao discu rs iva parece es tar se es tendendo de ge-

neros , como a en l r ev i s t a , que tern um cara t e r pub l i co no s en t ido de

q ue estao associados a uma serie de f u n c o e s i n s l i t u c i on a i s pi ib l i -

cas , para o genero cen t r a l da e s fe r a p r ivada , a conversagao. Isso

ref lete em par t e a ap ropr i agao da conve r s agao pe la s inst i tu lgoes e

se u inves t imen to com con teudo pol i t i co e ideologico especffico.

266 Norman Fairclough

U rn exemplo d isso e a enlrevis ta medica ' a l t e r n a t i v a ' (ver, no Ca-

p i lu lo 5, o i t em "Exemplo 2: En t rev is ta med ica ' a l t e rna t iva ' " ) . Isso

t amb em ref lete o m o d o como as esferas privadas es tao se Irans-

f o r m a n d o em dommios pi lb l icos , como, nas palavras de Habermas,

os domm ios do mundo da vida co t id iana vein a ser coionizados por

sis temas. Assim, as es truturas domest icas e os r e l ac ionamentos da

fanri l ia at e certo p o n t o estao se lornaiido publicos e sao f req i ien-

t emen te re f e ridos como um dom in ie especffico da pol f t ica .

Tornarei esses pontos mais concre tes pela r e fe renda a um li -

v ro q ue descreve como os gerenles em locais de trabalho podem

Discurso e mudan^a social 267

conhec idas na l i t e r a tu ra pragmat i ca como ' po l idez pos i t iva ' e *po-

lidez negat iva* (ver, no Ca pitu lo 5 , o i tem "Polidez") apa recem em

var ies capitu los . Essas incluem meios de d e m o n s t r a r a apreciacao

e a compreensao de s outros de modo conversacional ( ta lvez en -

quan to ten tamos ganha r consen t imen to para nossa propria posigao

con t r a r i a ) e meios de a t e n u a r a cn'tica aos outros . Ha um capilu lo

que t ra ta sobre como ques t ionar pressuposigoes que sao conversa-

c iona lmente tomadas como taci tas , e como se r assertive(a) se m

agressiv idade. Outro capitu lo d iscute o controle e a m u d a n g a detopico, espec ia lmente a m u d a n g a da analise de falhas do passado

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m e l h o r a r suas hab i l idades conversac iona i s (Marger i son , .1987).

O livro versa sobre 'habilidades de controle conversational ' , m u i t o

embora se jam inc lu idos como ' conver sacao ' encon t ros e en t rev i s -

tas de negocios t an to q u a n t o couversa in fo rma l n u m sen t ido ma is

restrito. Algumas d as habil idades d iscutidas , ta l como ' r e s u m e '

(quase equivalente a formulae, ao - ver, no Cap i tu lo 5, o i tem

"Formulacao" ) , sao p r inc ipa lm en te a s soc iadas a esses ( ipos ma is

formai s de discurso i n s t i t u t iona l , mas ou t ros t ambem per leucem a

conversacao informal. De fa te , as 'habil idades de controle conver-

sational' sao t ida s como re levan tes nao apenas no t r aba lho , mastambem no gerenc iamen to das relates den t ro da f a mi l i a e en t r e

amigos.

O l i v r o chama a atengao para um numero s ign i f i ca t ivo de ha-

bi l idades . Um cap i tu lo t r a ta de hab i l id ades inferenciais para o re-

couhec imen to d e 'pistas' verbais e 'siuais' nao-verbais e pa ra a

reagao a essas ' p is tas ' e a esses 'sinais', o que leva a senlidos qu e

sa o expresses i nd i r e t amente ou ape nas sugeridos. Pro blemas im -

por tau tes sa o freqi ientemente s inalizados dessa forma, q u a n d o as

pessoas se sentem incapazes para fa lar exp l ic i t amen te sebre eles. e

a falha na captagao de pistas e sinais pode ter conseqiiencias serias.U m a ques tao relacionada diz respeito as hab il ida des em obter

permissao para aden l r a r o terr i tor io conversac iona l - os sen t i -

m e n t o s , os es tados men ta i s , os p e n s a m e n t o s p a r t i c u l a r e s e as

motivagoes pessoais do s outros — , qu e podem estar 'fora do a l c a n c e ' .

Outro cap i tu lo foca l iza tecnicas pa ra to rna r um a conversacao de

confronto em um tipo colaborat ivo e coopera t ive , i nc lu indo t ecn i -

cas pa ra ' g e r e n c i a r ' o desacordo e a r e j e igao . As h a b i l i d a d e s

para a elaboragao de p ianos para o fu t u re .

O livro a f i r m a que as habil idades de controle conversacional

podem con t r ib u i r para o sucesso e os lucres no s negocios, a segu-

r anga no t r aba lho , a mot ivagao dos empregados e a preven^ao de

disputas indus tr ials : "0 controle conversacional e , portanto, crucia l

para criar conduces em que as pessoas trabalhem efetivamente

j un t as " . E na familia e em outr as relag5es sociais, "Diferengas de

opiniao podem levar a argumentos e conflitos desagradaveis ou podem

ser resolvidas por meio da administrate habil idosa de conversa-

goes". M as essa indicagao clara do potent i a l do controle da con-

versagao corao um a tecnologia e a c o m p a n h a d a pe la af i rmacao nao

convincente de que "nao se t ra ta de con t ro la r o compor lamen to

dos outros, mas de obter o controle de nossa propria conversagao e

do nosso p ropr io c o m p o r t a m e n t o " , de que e uma q u e s t a o d e' i n f l u en t i a l - ' as pessoas, mas nao de as ' m a n i p u l a r ' (p . 193-194).

Ha uma l i gagao in t ima en t re a tecnologizagao discursiva e a

concepgao de educacao e t r e i n a m e n t o l ing i i i s t i cos baseada n as

hab i l idades e na competenc ia q ue discuti an tes como ' comod i f ica -

gao*. A ex tensao pa ra os domm ios da v i d a p r ivada e pa ra a conver -

sagao parece corresponder a universalizacao a tua l de t reinamentode hab i l idades lingii is t icas . A te r e cen temente , eram p r inc ipa lmen te

'porteires' e detentores de poder i n s t i t u t iona l e pessoas d e a l g u m a

fo rma fisica ou ps icolog icamente invalidas que estavam e x p e s t a s

ao treinamento de habii idades de comunicagao. Na Gra-Bre t an h a

de h o j e , c o m a s novas pe l i t i c a s p a r a o G C S E (General Cowit-

nication Skills Exam - E x a m e G e r a l de H a b i l i d a d e s de Co-

m u n i c a g a o ) , p a r a o C u r r f c u l o N a e i o n a l nas escolas e pa ra a

268 Norman Fairclough

educagao pre-vocacional (Agao de Educacao Tecnica e Vocatio-

na l , P iano de Tre inamento da J u v e n t u d e , etc.), as h a b i l i d a d e s

lingiifsticas e comun ica t iva s sa o un ive r s a lmen te ens inadas (ver

U u id a d e tie Educagao Conlmuada/FwrAAer Education Unit, 1987;

Depar tamento de Educagao e C\&nc\alDepartment of Educationan d Science, 1989).

Produzindo sentido da s tend£ncias

Discurso e mudanca social 269

comodif icados construfdos sobre modelos d e p u b l i c i d a d e t a m b e m

manifestam comumente outros aspectos democratizantes, incluindo

a informalidade e um movimen to pa ra o d iscu rso conversa t iona l .

Essa convergencia entre comodi f i cagao e democra t izagao e

apenas parcia l e numa direc.ao unica: a democrat izagao ocorre se m

a comodificacao como na entrevista medica ' a l ternativa ' , no exemplo

do Cap i tu lo 5. No en tan to , a convergencia parece revelar caracte-

rist icas comuns n u m ni'vel m a i s prof undo, em par t i cu la r o m o d o

como essas tendencias inf luenciam a cons t i t u igao da s u b j e t i v i d a d e

ou ' ind iv idualidade ' pelo discurso, no contexto de mudancas que

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Abstra ir e isolar tendencias , como fi z an te r io rmen te , e u m

modo de enfatiza-las. M as ineu foco em todo o l iv ro tern sido so -

br e ordens de discurso, caracter izadas corao complexas, heteroge-

neas e contradiforias; devemos, portanto, tenlar produzir sen t ido da s

tendencias a med ida que elas interagem e se atravessam. Fazendo

assim, precisamos incluir variacoes possfveis nos efeitos das ten-

dencias sobre as diferentes ordens de discurso locais na m e d i d a em

que sao aceitas ou re je i t adas , e assim por d ian te . Tambem p rec i -

samos in c lu i r f enomenos como a 'personal izagao s in te t ica ' refe-

rida na u l t i m a secao. O ponto geral e que as t endenc ia s podem te rvalores contrastantes e m u i t o d i f e ren tes , dependen do das ar t i cu l a -

coes a que se associam; estao abertas a diferentes inves t imentos

politicos e ideologicos (ver, no C a p i t u l o 3, o i tem "Discurso").

A democrat izagao e a comodif icagao podem aparen ta r se r

s imples opostos - a primeira e um en f raquec imen to de controle, a

u l t ima , um forta lecimento de con t ro le - , mas fenomenos como a

personalizagao s in tet ica mostram que o re lac ionamen to e inais

complexo. O u t r a razao pela qua l as tendencias nao podem ser con-

s ideradas como simples opostos e que a comodif icagao de fato im -

plica a democrat izagao. Voltemos a minha sugestao de que t an to o

texto do Barclaycard n o Capitu lo 4 como o tex to do prospecto u n i -

versi tar io envoivem um a mudanga parcia l das relagoes t r ad i c iona i s

de superior-subalterno no s sistemas banciirio e educacional respecti-

vamen te em f avor dos ' consumidores ' (c l ientes , fu t u ros a lunos ) .

Essa m u d a n c a se mani fe s t a no discurso democrat izado: o poder do

banco e da univers idade na o esta expresso explic i tamente, e existem

tensoes conseqiientes que destaquei em ambos os textos. Os textos

tern sido documenladas (Rose, por exemplo) na const i tu igao socia l

d o 'eu' n a soc iedade c o n t e m p o r a n e a . Essas m u d a n g a s o b j e t i -

va m um 'eu' m a i s au tdnomo e automotivado (u m 'eu' autodirecioiia-

do , como Rose sugere). As duas tendencias parecem ter em coraum

uma orientacao para o *eu' autodirecionado: l an to o medico na entre-

vis ta medica ' a l te rna t iva ' como os autores do tex lo do B a r c l a y c a r d

e do prospecto un ive r s i t a r io se d i r igem imp l ic i t amen te a versoes

do 'eu' a u l o d i r e c i o n a d o (e , p o r t a n l o , as pres supoem) . O s 'con-

sumidores ' , os des t ina ta r ios universais da p u b l i c i d a d e e de suas

extensoes colonizadoras na educagao e outras esferas , sa o versoesdo 'eu' autodirecionado, caracter izado pela capac idade e pela von -

tade pa ra 'escolher'. Ass im tambem sao os c l ien tes -pac ien tes d a

ent revisfa medica ' a l t e rna t iva ' , a quern t ambem se atr ibuein au lo -

nomia e escolha. Se a comodit' icagao e os processos m a i s ainplos

de democratizagao t endem de fato a constru ir fundamenta lmeu te o

mesmo f ipo de 'eu', nao seria surpresa encontra- los sobreposlos

em dominios ta is como a educacao. Desse modo, os a lunos po ten -

cia is que sao con strufd os como consumidores po dem encontrar-se

na chegada construklos como 'aprendizes a u t o n o m o s ' . Caracter izei

as tendencias de democrat izagao e comodit ' icacj io em linhas geraiscomo p rop r iedades da ordem de d i scu rso soc ie ta r ia con tempora -

nea . Como observe! a n t e r i o r m e n t e , s eu im p a c t o sobre a s d iv e r -

sa s ordens de discurso mais locais e i n s t i t uc iona i s e var i ave l :

a l g u m a s ordens de discurso estao se to rnando fo r temen te d em o -

crat izadas e/ou comod i f icadas , ou t ra s nem tan to . Na o ob s t an te , o

qu e es ta chamando a a t en g ao e a on ip re s enga da s t e n d e n c i a s e a

facilidade com que elas aparentara transceiver as i'ronteiras entre

270 Norman Fairclough

as institutes e entre os d omfn i os . A impor t anc ia a lua l dessas len-

dencias parece corresponder nao apenas aos modelos de auto-im agem

que elas implic i tamente projetam, m as tambem a um estado ou condi-

gao particular da ordem de discurso sodelaria na sociedade contempo-

ranea qu e torna possive] a pro jegao de novos modelos.

Essa condigao de ' f ragmentagao' re lat iva de normas e con-

vencoes d iscu rs iva s afe ta u m a ser ie de in s t i tu igoes e d o m i n i o s .

O que en tendo por ' f r agmentagao ' e um certo colapso, uraa perda

d e e f i c a c i a , d e o r d en s d e d iscu rso ma is loca i s que as f a z e m

p e r m e a v e i s as teudencias gerais . Explicando em maiores de ta lhe s ,

Discurso e mudan^a social 271

meio da colonizagao pelas princip ais tecnologias d iscurs ivas — a

public idade, a entrevis ta e o acouselhamento - e por meio do Irei-

n a m e n t o nessas tecnologias como habilidades descontextualizadas.

Entretanto, essa explicacao e mu i to categorica e un i la te r a l .

Padece do p rob lema qu e Taylor (1986: 81) cri t ica uos es tudos ge-

nealogicos de Foucau l t , de ve r mudanga tao-somente em termos de

tecnicas de poder que sao interpre tadas se m ambigii idade c o m o

inslrLimentos de dominagao. Falta aq u i o que o propr io Foucau l t

refere como a ' po l iva lenc ia t a t ica dos discursos ' - o falo de que

eles podem te r valores diferentes em 'e s t rategias" d i fe ren t es (ver ,

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a f r agmen tagao envolve: (i ) var i agao maior na pnitica discurs iva

(por exemplo, as entrevis tas medicas sao conduzidas em m o d o s

mais variados); ( i i ) previs ibi l idade m e n o r para os participates em

qua lquer even to discursive, e uma necessidade conseqiiente de,

por exemplo, negociar como um a entrevis ta part icular se da ra ; e

(iii) pe rmeab i l idade maior a t ipos de discurso que p rovem do exte-

rior do dominio em questao (por exemplo. maior aber t u ra ao dis-

curso conversacional) e a s teudencias gerais. Existem indicates

de que os d iscu rsos educac iona l , m e di c o e d o l o c a l d e t r a b a l h o

estao mais f r agmentados nesse sentido.Paradox almen te, a f ragmenta cao das ordens de d iscurso local 's

aparen ta r i a ser uma condigao para a tecnologizagao crescente do

discurso, no sentido de que a permeabil idade maior das ordens de

di scur so locais i n c l u i a a b e r t u r a a processos de tecnolog izagao

de 'fora'. O paradoxo e que a f ragment agao parece ser um rela xa-

mento do r egu lamento da pral ica discursiva , en q u an t o a tecnoiogiza-

ga o parece ser uma intensificagao disso. Uma forma de interpre tar o

processo e em termos da m u d a n g a na nalureza e na localizagao do

regu lamen to . Q u a n d o as ordens de discurso locais sa o re l a t i v a -

m e n t e estaveis e au tonomas , elas sao reguladas , localizada e in te r -n a m e n t e , por meio de mecan ismos d i sc ip l ina res exph'citos ou , ma is

comumen te , por meio de pressoes encober tas . Mas a tendencia

agora e os 'especialistas' em pesquisa e t r e inamenlo regularem apra t i ca numa variedade de ins t i tuigoes e dominios locais. Desse

m o d o , a colonizagao das ordens de d iscurso locais pelas t en d en c i es

de democra t izagao e comodi f i cagao e causada pelos t ecuo iogos do

discurso? De r'alo, o efeito das tendencias f requen temen te vein por

no Capftu lo 2, o i tem "Foucault e a an a l i se de discurso t ex t u a l -

m e n t e or ien tada") . U m caso em ques tao e o re inves t imen to d e

democrat izagao representado pela personalizagao s in tet ica . Desen-

volverei um pouco este exemplo. O a r g u m e n t o e que a d e m o c r a t i -

zagao e, nesse caso, ambivalente . parte de um r e l axamento genuino

ou usada estra tegicamente como tecnologia. Mesmo no ultimo caso,

a tecnologizagao pode nao ser defin i t iva . O s de ten tore s de poder

podem apropriar-se da democrat izagao, mas o processo de apropri-

agao pode por s i m es m o possibil i tar mais um campo de l u t a em

que os detentores de poder podem sofrer der ro ta s . Hii um sen t idoem que a democrat izagao s in tet ica ou s imu lada co m propositos

estrategicos e uma es trategia de alto risco que e por si um a conces-

sa o ao poder de forgas democratizantes lanto quanto um movimeii to

para combate- lo. Usar as formas do discurso democraf i zado - a

e l i mi n ag ao das ass imetr ias expl i 'ci tas em termos da s fo rmas de

t r a t amento , a informalidade, a m u d a n c a pa ra o t e r reno comum da

conve r s agao - torna implici tas certas a f i rmag oes sobre a n a t u reza

dos relacionamenlos sociais realizados, que nao sao sustentaveis

o n d e a democrat izagao e s imulada. O resultado pode ser uma con-

tradigao na prat ica discursiva entre as formas e o conteudo do discurso

democratizado, qu e pode tornar-se um a area de l u t a .

As l endenc ia s , en tao , estao presas ao s processos de lu ta da s

pn'iticas discursivas em que elas podem se r invest idas var iavelmente .

Alem da possibilidade levantada no u l t imo paragrafo, de apropriar-sedelas e 'muda - la s ' , ha t ambem a possibil idade de resistir e rejei ta- las

ou acomodar-se e marg ina l i za- l as . Consideradas como tecnicas emprocessos de tecnologizagao discu rsiva , as tendencias der ivam um agrande variedade de formas de discurso liiistas ou hibridas em que sao

272 Norman Fairclough

efetuadas conciliates entre elas e praticas discursivas m a i s t radi-

c iona is nao-comodif icadas ou nao democra t izadas . O tex to do

Barclaycard e a entrevista medica ' a l ternat iva ' foram analisados ante-

riormente nesses termos. U m a justificativa para um a abordagem da

analise de discurso centrada na inter textual idade e na inlerdiscursivi-

dade, e nogoes associadas, tais como a heterogeneidade e a ambiva-

lencia do discurso, e que as ordens de discurso contemporaneas sa o

cheias de semelhantes textos hfbridos.

Porein , a en fa se aqu i e a inda mui to sobre a tecnologizagao,

mesmo se for enfat izada a resistencia a isso, e o pressuposto e a i n d a

Discurso e mudanga social 273

cokmizagao uni l inear, implica um modelo de 'codigo' da prat icadiscursiva. A versao classica de um modelo de codigo pressupoeuma ordem de discurso local estavel e convengoes natural izadas que

sa o normat ivamente exemplif icadas na pra t ica : a pra t ica e s imples-

mente seguir as uormas. Mas a colonizagao uni l inear t ambem imp l i -

ca um modelo de codigo, apesar de que, neste caso, os codigos qu e

sa o normativamente seguidos sao em parle moldados ex te rnamente

po r meio da colonizagao pelas tecnologias discursivas.

A segunda in te rp re tagao , em termos da lu ta hegemon ica , im -

plica ur n modelo hegemonico da pratica discurs iva , isto e , umavisao da prat ica d iscurs iva como ar t i cu l agao: a desarticulagao de

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de processes discursivos e socia is rela l ivamente centra is . E m opo-

s igao a isso, t e rn h av i d o um a enfase na l i t e r a t u r a p o s - m o d e r n a

sobre o colapso do social, o que sugere u m a in te rp re tagao bem d i-

ferente dos processos a t u a i s de m u d a n g a discursiva. Tal i n t e r p r e t a -

ga o enfat izaria a f r agmenlagao da s ordens de discurso locais, a que

m e refer i an ter iormente, como um a dimensao discursiva de umaf r agmentagao da o rdem soc ia l . Tambem sugeriria considerar os

processos a que me rel'eri como 'democratizacao' em termos de frag-

meu tagao , no sentido do que J ameson (1984) chaina de ' d ed i f e ren -

ciagoes ' , a demol igao de distingoes e barreiras , se m imp l ica r que

ta l demoligao seja s implesmente corolario de tendencias nnitar ias

em o u t r o s m'veis, seja a d e m o c r a t i z a g a o ou a lecnolog izagao.

As 'dediferenciagoes' incluir iam as fronleiras en t re va r iedades

padrao e nao-padrao da l ingua e implicariam uma certa reversao de

processos de padroriizagao que lem sido um aspecto principal da

sociedacle mode rna. Dessa perspectiva, as explicates que dei ale

agora sao in te rp re tagoes exageradas d a m u d a n g a b a s e a d a s em

premissas ou pressupostos sobre a r ac iona l idade e a cen l r a l i zayao

de processos socia is que podem nao mais se m a n t e r na s soc iedades

cou temporaneas .

Conclusao: moil e los relevaiites d e discurso

Com efeito, apresentei iuterpretagoes di ferentes das t endenc ia s

que ident i f iquei : interpre tagoes em termos de colonizagao un i l ine a r ,

lu ta hegemonica e fragmentagao. Cada interpre tagao implica ummodeJo par t icular de pratica discursiva. A explicagao, em termos da

configuragoes existentes de tipos e e lemen tos de d iscu rso e a rear-

t iculagao de novas conf iguragoes, daudo p roeminenc ia a in terd is-curs iv idade e a i n t e r t ex tua l idade .

A terceira in terpretagao, em termos da f ragmentagao, corres-

ponde ao que se poderia denoininar um modelo 'mosaico' ou talvez

'negociado' . Ainbas as imagens implicam fragmentagao da s conven-goes. Mas a iinagem de 'mosaico' eiifatiza o espago resultante dojogo cria t ivo ao combinar os elemeutos do discurso de novas formas

para a t ingir impacto momentaneo, para o past iche. E n q u a n t o a ima-

gem de 'negociagao' enfaliza qu e onde as convengoes na o podemmais se r consideradas como dadas, ha uma necessidade conseqiientede os agentes negociarem (quase sempre implic i tamente) a q u a i s

elementos do discurso se deve recorrer. E a iinagem da negociagao

qu e tem aplicabilidade mais larga: nem toda prjitica discursiva que enegociada nesse sentido tem as propriedades sugeridas pelo mos;ii-

co, mas a pratica discursiva que tem essas propriedades (os melhores

exemplos provavelmente vem da public idade) deve se r negoc iada ,

no sentido de que um acordo imph'cito sobre a ar t iculagao do s ele-

mentos do discurso deve se r estabelecido entre produtores e in ter-pretes para que funcione o efeito mosaico.

O d e s en v o lv im en t o d e u m modelo hegemon ico d a p r a t i c adiscursiva , especia lmente em oposigao ao m o d e l o de codigo pre-

d o m i n a n t e , e o ob je t ivo p r inc ipa l des te l i vro . U m m o d e l o d ehegemonia parece fazer o sentido mais geral da ordem de discurso

societar ia contemporanea. Mas isso nao e s imp lesmen te um a a l te r -

nat iva preferivel ao s outros dois modelos. Antes, cada um dos mo-delos se aplica de algum modo a ordem de discurso contemporanea,

e cada modelo parece funcionar r e l a t ivamente bem em a lguns

274 Norman FairclougH

d o m m io s de prat ica d iscurs iva , e m en o s em ou t ros . Melhor q ue

optar por u rn e rejei tar os outros , fu t u ra s pesqu isas poderiam foca-

l izar proveitosamente a questao de quais modelos t'azem mais sen -t ido em cada dominio e sobre as teusoes enlre os modelos, aom es m o tempo em que se mantem em discussao toclas as tres linhas

de in terpret ac.ao da mudanc.a discursiva atual ,

Capftulo 8

A pratica da anal ise de discurso'

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Este capftu lo t ra tara de questoes praticas da analise de discurso.

0 que se segue nao deve se r considerado como ur n esquema, pois nao

ha procedimento fixo para se fazer analise de discurso; as pessoas

ab ordam-na de d iferentes maneiras , de acordo com a natureza es-

pecif ica do projeto e conforme suas respectivas visoes do discurso.

Os pontos a seguir, por tanto, poderiam ser tornados como diretrizes

gerais, indicadoras dos principals elementos e das consideracpes que

se aplicam a anal ise de discurso, conforme a posicjio teorica que apre-

sentei anter iormente. Tenho, even tua lmen te , agido baseado na s u -

posicao de que o(a) leitor(a) esta proximo de se engajar em ur n projeto

de pesquisa de investigacjio social e mudanca discursiva maior , mas.

como muitos leitores devem estar usando a analise de discurso para

propositos mais modestos, estes na o poderiam se r postos de lado em

funcao dessas supos igoes grandiosas . H a tres p r inc ipa l s i tens: os

dados, a analise e os resultados. 0 enfoque deste l iv ro esta, nalural -

mente , na analise, mas este capitulo sera u m a opor tunidade para se

abordar ou tros aspectos impor t an te s para a real izagao da analise dediscurso. O s le i tores poderao comparar estas l i n h a s mes t ra s co m

aquelas fornecidas por Potter e Wetherell (1987), ou (para a analise

somente) po r Fowler efal. (1979).

Tradu^ao de Sandra da Rocha M. de Ojive i ra.

276 Norman FairclougVi

Os dados

Definigao de um projeto

A analise de discurso deve ser idealmente urn empreendi-

men to in te rd i sc ip l ina r . Tal af i rmagao decor re da concepgao d e

discurso que eu venho de fendendo, a q u a l envo lve um interessenas propriedades dos textos , na p rodugao , na dis lr ibuicao e no

consume dos textos, nos processos soc iocogni t ivos de produc,ao e

interpretac.ao dos textos, na pratica social em varias instituic.6es, norelacionamento da pratica social com as relates de poder e nos

Discurso e mudanca social 277

O corpus

A perspectiva do(a) especialista e dos pesqu isados e t a m b e m

impor tan te na sele^ao de dados, na cons t rugao de um corpus de

amoslras de discurso e na decisao des dados suplementares a se-

re m coletados e usados. A na tu reza do s dados requer idos var i a r ao

de acordo com o p ro je to e as ques toes da pesqu isa , mas ha certos

princfp ios gerais para ter-se em mente. Pode-se apenas t o m a r um a

decisao sensivel sobre o conteudo e a es trutura de um corpus, a lu z

de i n formagoes adequadas sobre o ' a rqu ivo ' . (Esse t e r m e e usado

de uma m a n e i r a que v a i alem do se n us o historico, pa ra referir-se a

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projetos hegemonicos no nivel social. Essas t'acetas do d iscu rsocoincidem co m os interesses de varias ciencias sociais e humani s t as .

i nc lu indo a lingih'stica, a psicologia e a psicologia social, a socio-

logia, a his toria e a c iencia poli t ica .O que e especif ico acerca de um a praiica discursiva part icular

depende da prat ica socia l da q u a l e u m a faceta . Projetos de pes-q u i s a em analise de discurso sao, portanto, mais sens ivelmente

definidos. pr ime i ro em termos de questoes sobre form as par t icu la-

res de pratica social e suas relac,6es com a estru tura social; d ian te

do eni 'oque que tenho adotado, em termos de aspectos pa r t i cu la resde mudanc.a social ou cu l tu ra l . Isso que r d izer que sao as discip li-

nas que se ocupam com essas ques toes - a soc io log ia , a c ienc ia

politica, a historia - que deveriam ser consideradas em primeiro

lugar na def in igao do s projetos de pesquisa . A analise de d iscu rso

seria raais be m t ra tada como um metodo pa ra conduzi r pesqu isa

sobre questoes que sao definidas fora dela . Poderia dar um breve

exemplo. Trata-se, c o n t u d o , de uma mane i r a to ta lmen te inovadora

de considera- la : em muitos cases, grupos i l l terd isc ip lina res de pes-

qu isaderes podem estar aptos para t r ab a lhar com pessoas, po r

exemplo, na educagao ou na saude, em investigates de questoes e

p rob lemas que elas e x p e r i m e n t a m d u r a n t e o cu rso da m u d a n c a .De fato, e possivel erigajar em co-pesquisa os ind iv iduos ou os

grupos que sao os sujei tos da pesquisa , que se envo lverao no pla-

ne iamen to , na implementac.ao, na exposic j io e no uso da pesquisa

(ver Ivanic e S i m p s o n , 1992').

Ivanic , R. e Simpson, J . Who's wlio in academic wr i t ing? In : Fairc lough. N. (ed.)

Criticallangiiagetnvai-eness. L on d r e se Nov a York: Long man. 1992. p. 141-173.

t e ta l idade da pra t ic a d iscurs iva , seja regis tro de pra t ica pas sada ou

de pra t ica em a n d a m e n l o , que se inclui den t ro do p ro je to de pes-

qu i s a . ) Trata-se, em parte , de um problema prat ico de saber-se o

que e ut i l , e como chegar a te la , mas tambem de ter-se um m o d e l o

men ta l da ordem de d iscurso da inst i tu icao. ou o d omfn i o do que

se esta p es q u i s a n d o , e o s processos d e m u d a n c a q u e esiao em

andamen to , corao um a p re l i mi u a r para decid ir-se onde coletar

amos t r as pa ra um corpus. Nat u ra l men t e , t raba l h a r sobre o corpus

pode a l t e ra r o mapa p re l imiua r . Os analis tas de d iscurso depende -r iam das pessoas nas disciplinas relevantes e das que t r ab a lham na

area da pesquisa para decisoes sobre qu ais amostras sao t ipicas ou

representativas de uma certa praiica; se o corpus ref lete adequa -

damente a divers idade da prat ica e as mudanc.as na prat ica median te

diferentes t ipos de s i tuacao, amb as consideradas de maneira nor-

mat iva e inovadora ; e se o corpus i n c l u i p o n t o crit ico e m o m e n t o s

de crise (essas noc,6es sa o explicadas a seguir) . H a p rob lemas pa r -

t iculares em celetar um corpus de dados que da acesso a processos

d e m u d a n c a , p e r q u e , o b v i a m e n t e , e prec i so t e n t a r i n c o r p o r a r

periodosde t empo razeaveis nos dados.

Aujpliacao do corpus

H a varias mane i ra s pelas qua is um corpus pode se r a m p l i a d o

com dades suplemenlares . Pode-se, por exemplo, obter j u l g a m e n -

to s sobre aspectos de amos t ra s do discurso no corpus, co m base

278 N o r m a n Fairc lough

em paineis de pessoas que estao em a l g u m a relacao signi f icat iva

com a p ra t ica social em foco. Se as p ra t ica s de sa la de a u l a e o

discurso d e sa la d e a u l a s e r a o e s t u d a d o s , o s p a in e i s p o d e r i a m

inc lu i r professores , a lunos, pais, m em b r o s de diferentes comun i -

dades minor i t a r ia s e major i tar ias , e admin i s t r adore s educac iona is .

(Para uso dos pa ineis , ver Gu mperz, 1982.)

Urn a fo rma comum de ampl i a r - s e o corpus i o uso de en t re -

vistas. Pode-se entrevis tar pessoas envolvidas c o m o par t i c ipan te s

em amos t ra s do corpus, nao somente para es t i mu l a r suas in terpreta-

coes sobre as amostras, mas lambent como uma opor tun idade pa ra

o(a) pesquisador(a) exper imentar problemas q n e vao alem da amos-

Discurso e t n u d a n ^ a soc ia l 279

f o r m a d e ' c i r culos d e q u a l i d a d e ' , g rupos de c inco a dez empre-

gados que u s u a l m e n t e t r aba l h am j u n t o s e se encontram regu la r -

mente para d iscutir formas de aperfe icoamento da qua l idade , da

produ t iv idade , e outros problemas relacionados ao t r ab a lho. U m a

ques tao nao respond ida sobre os c i r cu los de qua l idad e que be m

pode estar relacionada as s us pe i t as do s i n d i c a t o sobre a al ta inci-

dencia de falhas desses circulos e se reahnente eles rompem as

velhas d iv isoes entre empregados e dao mais poder ao s t r a b a l h a d o -

res da secao, ou se fu n c i on am como i n s t rumento admin i s t r a t ivopara comprovar a experiencia valiosa dos trabalhadores da segao e

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tr a como ta l e tenlar descobrir , por exemplo, se uma pessoa esta

mais consc ien te do i nve s t imen to ideolog ico de uma convengao

d iscu rs iva pa r t i cu la r , em a lgum as s i tuacoes mais do que em ou l ra s .

O u, na co-pesquisa , pode-se ter acesso m a i s fe chado e ma is fo rma l

a perspectiva daqueles que sao pesqu isados . O pon to a enfat izar e

qu e entrevis tas , paineis . e tc . sao amos t ra s ad ic iona i s d e d iscu rso , e

u ma man e i ra pela q u a l podem am p l ia r o corpus e s imp lesmen te

acrescentii-las. O corpus poderia ser cons iderado nao como t o t a l -

mente const i tu ido antes do inicio da analise, mas aberto e compossibilidades de c resc imen to em resposta a ques toes que surgem

na analise.

U m exemplo

U m exemp lo de urn p ro je to de pesqu isa posswel dara a essas

ques toes fo rma conc re ta . Usa re i o exemp lo m enc ionado na In t ro-

ducao, de mudancas na pra t ica d iscurs iva associadas com a subs-

t i tuigao da produgao fordiana pela pos-fordiana, focalizando u me s tudo p lane jado de ' c irculos de qua l idade ' . (Esse exemp lo es ta

baseado no p lane jamento de um p ro je to de j uncao in t e rd i s c ip l inar

sociologies e linguistico na Univers idade de Lancaster .) Uma ca-

racteristica da indus tr ia l p os- fo rd i an a e a impor t anc ia crescente da

comunicacao na secao. Novas formas de in teracao en t re os t r ab a-

Ihadores d a segao, s u p e r v i s o r e s e g e r en t e s e s t a o e m e r g i n d o , n a

integra-los em prioridades adminis t rat ivas . A pesquisa e necessaria

para saber como os c irculos de qualidade func ionam a tua lmen te ~

como selecionam topicos, como deba tem p rob lemas , como geram

propostas e apresentam-nas a administ ragao - e se o controle dessas

atividades e par t i lhado e negociado, ou exercido mais ou menos

superf ic ia lmente pela admin i s t r a^ao. Essas questoes podem se r

invest igadas usando-se a analise de d iscurso como metocio. O cor-

pus pa ra ta l estudo deve consistir de registros de v ideo de circulos

de q u a l i d a d e por um pen'odo de cerca de um ano, desde o se n co -

meco. U m foco posswel pode estar em saber como emergem as

convengoes para a condugao de encontros no pen'odo, t o m a d a s

como parte de um estudo mais amplo do des envolv imento das re-

lacoes de poder nos circulos de q u a l i d a d e . Esse corpus pode se r

amp l iado com registros do t r e inamento de gerentes - como l ideres

ou faci l i tadores dos circulos de q u a l i d a d e - com apresen tacoes de

p ropos ta s pelos circulos de q u a l i d ad e pa ra pa ine i s admin is l r a t ivos ,

e com a comun icagao en t re os circulos de q u a l i d a d e e os membros

da forca de t rabalho que nao estejam envolvidos. Poderia t a tnb emser ampliado por meio de entrevistas sobre os circulos de qua l idade

com seus membros, com a administragao senior, com representantes

do sindicato, e com outros trabalhadores da secao. Os analistas devem

euvolver membros dos c irculos de qualidade para chegar a definicao

da s questoes de pesquisa e do foco analitico. Desenvolverei esse

exemplo um pouco mais quaiido discutir, os resultados.

280 N o r m a n F a i r c l o u g h

Transcriqao

O discurso ia lado, ta l como o dos encontros do circulo de

q u a l i d a d e , necessi ta ser t ranscr i to. A transcribe e um processo

dificil que consorae m u i t o t empo . Dependendo do s is tema de

transcrigao usado, pode-se precisar de seis a v in te horas ou mai s

pa ra t r an sc rever uma hora de fala g ravada . Ha uma d ive r s idade de

sistemas validos de transcrigiio capazes de rep resen ta r d i f e ren tes

caracter is t icas da fa la , com d i f e ren tes g raus de de ta lhe - e n t o n a -

gao, en fa se , pausa , a l t e ragoes n a a l tu ra e n o r i t m o e assim po rd ian te (Atk in son e Heritage, 1984: ix-xvi; T a n n e n , 1989: 202-204).

Discur so e m u d a n c a soc ia l 281

Codificagao e sele^ao de amostras no corpus

Os pesqu isadores podera b em des eja r codil 'icar um corpus

inte i ro ou grande parte dele, em te rmos arnplos , ta lvez r e s u m i n d o o

discurso ou codificaudo-o em topicos. Ou podero decompor o corpus

em classes part iculares de t ragos - certos t ipos de questoes ou

formulagoes (ver , no Capitu lo 5 , o i t em "Formulae.ao"). C o n t u d o , a

concepgao de d iscurso que apresente i e a visao de analise que re-

s unn an le r iormente sa o espec ia lmen te relevantes para a analisede ta lhada de um p e q u e n o n u m e r o de amos t ra s de discurso. Isso

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Nenhum sis tema poderia mostrar tudo, e sua escolha e sempre um

prob lema de ju lgamen to , cons iderando-se a na tu reza do projeto e

as questoes de pescjuisa, os t ipos de caracter is t ica que se quer

mos t ra r , e qua is os detalhes. Um t ipo de t r ans cr igao r azoave lmente

economico, a d e q u a d o p a ra muitos p ropos i tos , deve mostrar as

justaposigoes entre fa lanles , as pausas e os silencios (exemplos sa o

as transcrigoes do Cap i tu lo 5, item "Exemplo 1: Enl r ev i s t a med ica

'padriio'").

O que e . ta lvez, inenos obvio e que a t ran sc r igao necessa ria -men te impoe um a interpre tagao da fa la ; nas pa lav ra s de um a r t igo

sobre esse assunto, a t ranscricao e teoria (Ochs. 1979). Considere

um a s i tuagao onde tres pessoas es tao conversando, e uma t oma

8 0 % d a conversa . A fo rma como isso e r e p r e s e n t a d o no pape!

poder ia ser como uma conversagao. na q u a l t odas as tres pessoas

t o m a m t u r n o s de fa la , mas uma toma tu rnos mais longos e mais

tu rnos do que a s ou t ra s ; ou pode se r r ep resen tado como um

m o n o lo g o , c o m va r ia s i n t e r rupgoes o u demonstrates d e apo io

de ou t ros fa l an te s , ta lvez pela exibigao da conversa do(a) f a l an t e

mais loquaz em um a co luna no meio da p a g i n a , com ou t ra s con t r i -

buigoes apresentadas nas margens (ver Edelsky, 1981, para exem-

plos desse t ipo). De modo semelhan te , se ha s i lencio na f i ta , o(a)

transcri tor(a) tem de decidir se o a t r i bu i a um ou a ou t ro part ic i-

pan te ; se ha superposigao, se a rep resen t s como u m ( a ) f a l a n t e

i n t e r r o m p e n d o outro(a) .

l evan ta o p r o b l e m a de como se lec ionar amos t ra s pa ra ana l i se

dela lhada. A resposta e , p r iuc ipa lmen te , que as amos t ra s pode r i am

se r cu idadosamen te se lec ionadas com base em um l evan tamento

preliminar do corpus, toraando-se o c u i d a d o de efe tua-lo en t re os

pesquisados e os colegas das d isc ip l ina s re levan tes das ciencias

socia is , de forma que possam t r aze r percepcoes t a n t o q u a n t o pos-

sivel em con t r ib u igao ao d iscurso da pra t ica socia l sob escrutin io.

U m a estrategia de selecao que deve ser recomeudada consis te em

focal izar o que an te r ionnen te cliamei cle ' pon to cn'lico' e ' m o -men to de crise'. Ha momen tos do d iscu rso onde ha eviclencia de

que a s coisas estao caminhando de mane i r a er rada : a lgum dis tu rb io

a exigir que os part ic jpantes reparem um problema de comun ica -

gao, por exemplo, mediante solicitagoes ou ofertas de repetic,6es, ou

mediante a corregao de um(a) p a r t i c i p an t e po r outro(a ) ; d i s f luen-

cias excepcionais (hesilagoes, repetigoes) na produgao de um texto;

silencios; m u d a u g a s sub i ta s de est i lo . Alem das ev idenc ia s e do

compor tamen to i n t e r a t i v o dos pa r t i c ipan tes , deve-se novamen te

usar pa ine i s de ju lgamen to ou ju lgamen tos re t rospec l ivos dos pa r -

t i c ipan te s sobre os poii tos que representem dit' iculdades. Tais mo-

meu tos de crise tornam visweis aspectos de prat icas que d e v e m se r

n o r m a l m e n t e naturalizados e, portanto, dificultar a percepgao; mas

tambem mostram m u d a n g a no processo, formas reais pelas q u a i s as

pessoas l i d am com a prob lemat izagao das pra t icas .

282 Norman Fairclough

Anal i se

Esta secao consiste de u m s u m a r i o do s t ipos de ana l i s e q ue

i n t roduz i e i lus t re i nos capf tulos 3-7. Nao obedeci exa tamen te aordem pe la q u a l os topicos forara discutidos nes se s cap f tu los , m as

segui a mesma progressao global : (1) a n a l i s e das pra t i cas discursi-

vas (n o nivel da macroanalise: ve r , no C api tu lo 3, o i tem "Prat ica

discursiva") , foca l i zando a in tertex tual idade e a interdiscurs ividade

da s amos t r as do discurso; (2 ) anal ise dos ( ex tos (microana l i s e da

pratica discursiva); (3) analise da pratica social da qua l o discursoe u m a par te . Essas t res dimensoes d a ana l i s e vao i nev i t ave lmente

Dlscurso e mudanfa social 283

v e l m e n te m a i s r e l e v a n t e s e u t e i s q u e o u t r a s , e o s a n a l i s l a s p r o -

vave lmente d ese j am t 'ocal izar u m n u m e r o p e q u e n o d e ca tegor i as .

Pratica discursiva

Cada u ma da s t res dimensoes da prat ica discurs iva e representada

a seguir. ' Interdiscursividade' e ' In tertex tualidade Manifesta ' focal i -

zam a p roducao d o t ex to , 'C ade ias I n t e r t ex tua i s ' , a d i s t r i bu i ^ao d o

texto, e 'Coereucia', o consumo do texto (ver, no Capitulo 4, dis-

c u s s a o d e t a l h a d a ) . C o m p l e m e n t e i c o m 'Condigoes d a Pr a t i ca -

Discurs iva ' para apresen tar aspectos sociais e i n s t i t u c i o n a i s bre-

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estar s upe rpos t as na pra t i ca ; p or e x e m p l o , os a n a l i s t a s s e m p r e

comegam com a lguma ideia da pra t i ca socia l em que se s i t ua o dis-

curso. Mas a seqiiencia e u t i l p a ra o r d e n a r o r e s u l t a do do en g a j a -

m e n t o d e alguem e m u m a amostra d i s cur s iva par t i cu l a r an t e s de

apresenta-la na forma escr i ta ou falada. Note-se que envolve uma

progressao da i n t e rp re t acao a descricao e vol t a a i n t e rp re t acao: da

i n t e rp re t acao da p r a t i ca d i s cur s iva (processos de p rodugao e con-

s u m o de texto) a descricao do texto. a i n t e rp re t ag ao de ambos a lu z

da prat ica social em que se s i t ua o discurso. Nao e necessario pro-

ceder nesta ordem, e os anal is tas podem comeca r da a n a l i s e dotexto, ou de fato da anal ise da prat ica social . A escolha depende ra

dos propositos e das enfases da anal ise . 'Olhar' para os processos

de an a l i s e de d i s cur so parece s e r par t i cu l a rm ente ap ropr i ado , dada

a minha p r inc ipa l p reocupacao aqu i com processo e m u d a n c a .

C ada in n do s principals i t ens no s umar io a d i a n t e e segu ido p or

um a descricao breve do t ipo de anal is e que envolve e , em mui toscasos, de um con j u n t o d e ques toe s q u e a t u a m como i nd icadore s

duran te a an a l i s e de um a amos t r a d i s cur s iva pa r t i cu l a r . D eve-s e t e r

em mente que d u r a n t e a ana l i s e ha uma cons t an te a l t e rna nc ia de

foco d a p a r t i cu l a r i d ad e da amos t r a d i s cur s iva par a o t i p o (o u t ipos )

de discurso q ue el a d e l i n e i a , e as configurates d os t i p o s d e dis-curso para os quais es ta or i en t ad a . A an a l i s e pode r i a s e r d i r ig ida

para ambos: poder ia mostrar caracter is t icas , p a d r o e s e e s t r u t u r a s

que s ao t ip icos de cer tos l ipos de discurso, rees t ru t u ran d o t e n d e n -

cias n as o r d e n s de d i s cur s o , e m o s t r a r f o r m as de u s a r esses re -

cursos convenc iona i s que sao especfficos dessa amos t r a . Note q ueem q u a l q u e r a n a l i s e p a r t i cu l a r a l g u m a s d a s categor ias sa o p r o v a -

vemente a lud idos no C api tu lo 3 ( i tem "Prat ica discurs iva") .

I N T E R D I S C U R S I V I D A D E

(Ver , no C api tu lo 4, o i tem " In te rd i scu rs iv idade" . ) 0 obje t ivo e

especificar os t ipos de discurso que estao de l ineados na amos t r a

discurs iva so b anal ise , e como isso e fe i to. Sinta l i b e rdade par a

us ar o te rmo gera l 'tipo de discurso' se nao es t iverem claros o ge-nero, a a t iv idade , o estilo, ou o d i s cur s o . A p r i n c i p a l f o r m a de ju s -

t i f ica r uma h i t e rp re t agao e por me io da an a l i se do t ex to , mos t r ando

qu e nossa i u t e rp re t acao e compat ive l com as caracter is t icas do

t ex to , e mais com pat iv e l do que ou t r as . Ou t ros t i pos de ev idenc ia

fo r a m m e n c i o n a d o s an te r iormente sob o t i t u l o " A m p l i a c a o d o

corpus".

H a u m a mane i r a obvia de carac t e r i za r a amos t r a g lob a l (e m

te rmos de genero de discurso)?

(Se for o caso, o que implica em te rmos de como a amos t r a e

p rod u zi d a , d i s t r ib u ida e cons um ida? )

A amos t r a de l ine i a mai s de um genero?

Que t ipo(s ) de at iv ida de , es t ilo(s ), discurso(s ) sa o de l ineados ?

(Voce pode especificar estilos de acordo com o t e n o r , o modo e o

m o d o retorico?)

E a amos t r a d i s cur s iva re l a t i v amen t e c o n v e n t i o n a l n a s s uas

propr i edades in t e rd i s cur s ivas , ou re l a t i v amen t e i n o v a d o r a ?

284- Norman Fairclough

CADEIAS INTERTEXTUAIS

(Ver , n o Cap i tu lo 4 , o i t e m " I n t e r l e x t u a l i d a d e e t r a u s f o r m a -

gdes".) 0 objelivo a q u i e especif icar a distribute de u m a (u m

t ipo de) amostra d iscurs iva pela descri^ao das cadeias in ler textuais

das qua is part ic ipa , is to e, as ser ies de t ipos de tex tos nas q u a i s

ou das q u a i s e t r ans formada .

Qu e tipos de t ransformagao essa (esse t ipo de ) amostra d iscur-

siva sofre?

Sao as cadeias in ter textuais e as t ransformacoes rela l ivamenteestaveis, on sao inconstantes. ou contestadas?

Discurso e mudanca social 285

O tex to e p roduzido (consumido) indiv idual ou co le t ivamen te?

(H a estagios dis t in tos de produgao? As pessoas do(a) animador(a) ,

autor(a) e principal sao as mesmas ou diferentes?)

Q u e t i pos d e efe i tos nao-di scur s ivos possu i e s ta amos t ra?

INTERTEXTUALIDADE M A NI F E S TA

(Ver, no Capftu io 4, o i tem "Exemplo 2: Um gu ia pa ra os portado-

res do cartao do banco Barclay".) A intertextualidade manifest;! eum a area cinzenta entre a prat ica d iscurs iva e o t ex to : l evan ta

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Ha s ina is de que o produtor do tex to antecipa ma is do que um

t ipo de audiencia?

COERENCIA

(Ver, no C a p i t u l o 3, o i tem "Prat ica discurs iva".) O objet ivo aq u i e

cons ide ra r as implicagoes interpre tat ivas da s p rop r iedades i n t e r -

t ex tua i s e iu terd iscursivas da amostra . Isso poderia envolver os

analis tas em pesquisa de leitor(a), isto e. pesquisa de como os

tex tos sa o rea lmen te in te rp re lados .

Q u a o b e t e r o g en eo e quf io a m b i v a l e n t e e o t ex to pa ra u m ( a )

in te rp re te par t i cu l a r , e, conseqiientemente, q u a n t o de trabalbo in-

f e renc ia l e r e q u e r i d o ? (Isso c o u d u z d i r e t a m e n t e a s d i m e n s o e s

in te r lex tua i s de cons t rugao do s s u j e i t o s no di scur so : v er " Pr a l i -

ca social", a seguir) .

Esta amostra recebe leituras resistentes? De que tipo de leilor(a)?

CONDUCES DAP R A T I C A D I S C U R S I V A

(Ver, no Cap i tu lo 3, o i tem "Prat ica discursiva" .) 0 objet ivo e es-pecif icar as prat icas socia is de produgao e c o n s u m e do t e x t o , asso-

ciadas com o t ipo de discurso que a amos t ra representa (o q u a l

pode ser relacionado ao genero de d iscurso: ver a pr imeira ques t f io

sob o t i tulo "Tnterdiscursiv idade", anler iorm ente) .

questoes sobre o que vai na produgao de um texto, mas tambem diz

respeito as caracteristicas que eslao manifestas na superficie do

tex to. O objet ivo e especificar o que outros textos estao del ineando

na constituicao do tex to que esta sendo analisado, e como isso

ocor re . O s generos de discurso d i f e rem no s m o do s da in te r tex -

t u a l i d a d e m a n i f e s t a c o m a q u a l es t ao a s soc iados (ver, n o C a -

p i t u l o 4, o i t em " In terd iscurs iv idade" ) , fazendo-se necessar io a q u i

explorar tais diferengas.

representa$ao d iscursiva-E direta ou indireta?

O que esta representado: aspectos do con tex to e est i lo , ou

apenas o signif icado ideacional?

O discurso representado esta c la ramen te demarcado? E s ta t r a -

duzido na voz do discurso representado?

Como esta contextualizado no discurso representado?

pressuposi^aoComo estao as pressuposigoes sugeridas no t ex to?

Estao l igadas a textos principals de outros ou a textos an te r io-re s do(a) produ tor (a ) do t ex to?

Sao sinceras ou manipu la t ivas ?

Sao polemicas (como oragoes negatives)?

E u m a ques tao adic ional:

Ha instancias de metad i s cur s o ou i ron ia?

286 Norman Fairclough

Texto

CONTROLE INTERACIONAL

(Ver, no Capitulo 5. os itens "Caracteristicas de controle inleracio-

nal" e "Formulagao".) O objelivo aqui e descrever as propriedades

organ izac iona is gera is das in te ragoes , das qua is dependem o f u n -

c ionamento regular e o controle das interagoes. Uma ques tao im -

por tan te e quem controla as interagoes e em que nivel: em queex tensao o controle e negociado como u m e m p r e e n d i m e n t o efe-

Discurso e mudanga social 287

P O L I D E Z

(Ver, no Cap i tu lo 5 , o i tem "Pol idez".) O objetivo e d e t e r m i u a r

quais estrategias de polidez sa o mais usadas na amostra, se ha di fe-

rengas entre os par t ic ipan tes e o que essas caracteristicas sugerem

sobre as relagoes sociais entre os participantes.

Qua is estralegias de polidez (polidez negativa , pol id ez pos i t i-

va , implfcitos) sa o usadas, por quem e com quais propositos?

E T H O S

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tuado pelos participantes, e em que extensao e as s ime t r i camenfe

exercido por um participanle?

Que regras de tomada de turnos estao em operagao? Sao os di-

reitos e as obrigagoes do s participantes (com respeito a jus tapos i -

c.ao ou ao silencio, por exemplo) simetricos ou assimetricos?

Qu e es t r u t u r a de troca esta em operagao?

Como os topicos sao in troduzidos, desenvolv idos e estabele-

cidos, e e o controle de topico simetrico ou assimelrico?

Como sao as agendas apresentadas e por quem? Como sao poli-

ciadas e por quem ? Um participa nte avalia as expressoes dos outro s?

Em que extensao os participantes formulam a interagiio? Qu e

fungoes as formulates tern, e qual(is) participante(s) formula(ra)?

COESAO

(Ver, no Capitulo 6 , o item "Conectivos e argumentagao".) O objetivo

e mos t ra r como as oragoes e os perfodos estao conectados no tex to.

Essa informagao e relevante para a descrigao do modo retorico do

texto (ver, no Cap itulo 4. o i tem "Interdiscursividad e"): sua estru-tura como um modo de argumentagao, narra t iva . etc.

Qu e relagoes func iona i s exis tem en t re as oragoes e os perio-

dos do texto?Ha marcadores coesivos de re lagoes func iona is explfci tos na

superffcie? Que tipos de marcadores (referenda , elipse, con jungao,

lexical) sa o mais usados?

(Ver, no Capitulo 5, o item Ethos.} 0 objetivo e reunir as diversas

caracten 'sticas que vao em diregao a cous t rugao do eu, ou de i den-

t idades sociais, na amost ra . O ethos envolve nao apenas o d iscurso ,

mas todo o corpo. Qualqu er uma das categorias anali t icas l is tadasaqui pode se r re levan te para o ethos.

G R A M A T I C A

Tres dimensoes da gramatica nas oragoes sa o diferenciadas aq u i :

t ransi t iv idade, tema e modal idade . Correspondem respect!vamente

as fungoes da linguagem ideacional, tex tua l e interpessoal (ver, noCapitulo 3, o item "Discurso").

T R A N S I T I V I D A D E

( V e r , n o Capi tu lo 6 , o i tem "Trans i t iv idade e tema".) O obje l ivo e

ver i f icar se tipos de processo e part ic ipantes p a r t i c u l a r e s estiiofavorecidos no texto, que escolhas de voz sao fei tas (ativa ou pas-

s iva) e q u a o sjgni f icante e a nomina l i zagao dos processos. U m

maior interesse esta na agenda, na expressao de causa l idade e na

atr ibuigao de responsabil idade.

Qu e t ipos de processo (agao, evento, relacional, men t a l ) sa omais usados, e que falores podem se r considerados em fungao disso?

A metafora g rama l ica l e uma caracteristica s ign i f i can te ?

288 Norman Fairclough

As orações passivas ou as nomina l i zações sã o f reqüentes , e.

em caso positivo, que funções parecem desempenhar?

T E M A . .

(Ver, no Capítulo 6, o i tem "Transit iv idade e tema".) O objet ivo é

verificar se há um padrão discernível na estrutura temática d o texto

para as escolhas dos t emas das orações.

Qual é a estrutura temática do texto e que suposições (porexemplo, sobre a es truturação do conhecimento ou da prá t ica) lhe

Discurso e mudança social 289

CRIAÇÃO DE PALAVRAS

(Ver, no Capítu lo 6, o item "Criação de palavras".) O objet ivo é

contrastar as fo rmas de lexicalização dos sent idos com as fo rmas

de lexicalização dos mesmos em outros (tipos de ) textos e iden t i f i -

car a perspectiva in terpre ta t iva que subjaz a essa lexicalização.O texto contém itens lexicais novos e, em caso posilivo, que

significado teórico, cul tura l e ideológico eles t êm?

Q ue relações inte rtext uais estão delinea das para a lexicaliza-

ção no texto?O texto contém evidência de perífrase ou relexicalização (em

oposição a outras lexicalizações) de certos domínios de sent ido?

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sã o subjacentes?

O s temas marcados sã o f reqüentes e, em caso posi t ivo, quais

sã o suas motivações?

M O D A L I D A D E

(Ver, n o Capítu lo 5, o item "Modal idade".) O ob je t ivo é de te rmi -

nar padrões, n o texto, quanto ao grau d e af in idade expressa co m

proposições, por meio da m o d a l i d a d e . O interesse maior está em

aval iar o significado relativo das características da modalidade

para: a) as relações sociais no discurso; e b) o controle das repre-

sentações da realidade.

Que t ipos d e moda l idade sã o mais f reqüentes?

São as modalidades predominantemente subjetivas ou objetivas?

Q ue características de modalidade (verbos modais , advérbios

modais, etc.) sã o mais usadas?

S I G N I F I C A D O D A S P A L A V R A S

(Ver, no Capí tu lo 6, o i tem "Signif icado das palav ras ' ' .) A ênfase

está nas palavras-chave que têm s ignif icado cul tura l geral ou mais

local; na s palavras cujos significados sã o variáveis e mutáveis : e

no s ignif icado potência! de uma pa lavra - uma estruturação part i -

cular de seus significados - como um modo de hegemonia e um

foco de lu ta.

M E T Á F O R A

(Ver , n o Capí tu lo 6, o item "Metáfora" . ) O objetivo é caracterizar

as metáforas usadas na amostra discurs iva, em contras te com asmetáforas usadas para sentidos similares em outro lugar , e deter-

m i n a r que fatores (cul tural , ideológico, etc.) determinam a escolha

da m etáfora. O efeito das metáforas sobre o pensamento e a prá t icadeveria também se r considerado.

Prática Sócia/ (ver, no Capí tu lo 3, o item "Discurso como

prát ica social: ideologia e hegemonia", e o Capítulo 7) .

A anál ise da prática social é mais difícil de ser reduzida a umal ista; portanto, os i tens que se seguem deveriam se r considerados

somente como uma orientação aprox imada . O objet ivo geral aqui é

especificar: a natureza da prática social da qua l a prá t ica discurs iva

é uma parte , const i tu indo a base para explicar por que a prá t ica

discurs iva é como é; e os efeitos da prática discursiva sobre a prá-tica social.

M A T R I Z S O C I A L D O D I S C U R S O

O objet ivo é especificar as relações e as estruturas sociais e hege-mônicas que const i tuem a matr iz dessa i n s t ân c i a par t icu l a r da pra-

Norman Fairclough

tica socia l e discursiva; como essa i n s t an c i a apa rece em re l ag ao a

essas e s t ru tu r as e relagoes (e c o n v e n c i o n a l e normal iva , c r ia t iva ei novadora , or i en t ad a para rees t rutura-las , opos i t ivas . etc .?) ; e que

efeitos ela t raz, em t e rmos de s ua r ep rodugao ou t r an s fo rmag ao?

O R D E N S D E D I S C U R S O

O obje t ivo e especif icar o re l ac ionamento d a in s ta nc ia d a p ra t i ca

social e d iscurs iva com as ordens de d i s cur s o que ela d e l i n e i a e osefei tos de reprodugao e t r a ns f o rma ga o d as ordens d e discurso p a ra

as qua i s c o n t r i b u i . A a t e n g a o d e v e r i a s e r d a d a a s t e n d e n e i a s d e

Discurso e mu d a n ^a social 291

mane i r a contraditoria , pelo de l ineamento incorapativel de generos,

os part ic ipantes r e a lmen te dao evidencia de que experimentam is to

como problematico em suas contr ibuicoes? Pode-se t amb em levar

em conta as reacoes do s part ic ipantes a ana l i se ; se ela faz sentido

para eles e a j u d a -os a explicar outros aspectos do t ipo de d iscurso

em foco, isso e a seu favor. Uma considerac .ao r e l a c i o n a d a e a

extensao coin que a analise joga lu z sobre outros dados p a ra o(a)

anal i s ta e prove uma base (mesmo um m ode lo ) para ou t ra s aaalises

(ver Potter e Wetherell , 1987: 169-172, para uma discussao mais

d e t a l h ad a de ques toes relacionadas com a va l idagao) .

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larga escala q u e afetam as ordens d e d iscu rso d i scu t ida s no C ap i -

t u l o 7.

E F E I T O S I D E O L O G I C O S E P O L I T I C O S D O D I S C U R S O

E u t i l foca l iza r os segu in les e f e i tos ideologicos e hegemon icos

par t i cu l a r e s (ver. no Cap i t u l o 3, o i tem "Discurso como pra t i c a

socia l : ideologia e hegemonia"):

sistemas de conhec imen to e crenga ;

relagoes sociais;

i den t idades sociais ('eu').

H a sempre an a l i ses a l t e rn a t i v a s poss ive i s pa ra as amos t ra s

disc 'ursivas, e emerge a ques t i io de como os an a l i s t a s p o d e m j u s t i -

f icar a s analises q u e propoem (como podem ' va l ida- l as ' ) . Nao ha

um a resposta s imples , e t u d o o que s e pode i'azer e d e c i d i r , d i a n t e

das ana l i ses a l t e rn a t i v a s , q u a l pa rece se r prefen 've l n a av a l i ag ao d a

ev idenc ia disponivel . H ii var ios f a t o res a serem levados em con ta .U rn deles e a ex tens ao com que uma ana l i se p ropos ta exp l ica a

amos t r a d iscu rs iva : el a exp l ica t o l a lmen te as c a r a e t e n s t i c a s d e t a -

I h a d a s , ou de ixa as ca rae ten s t ica s inexp l icadas , ou a i n d a parece

es t ran h a r a s c a ra c te r i s f i c a s ? O u t ro f a t o r e se uma ana l i se p ropos ta

esta b a s e a d a n o q u e o s p a r t i c i p a n t e s f a z e m e m u m a i n l e r a g a o .

Se, por exemplo, a f i rma- se q ue u m t ex to esta e s t r u t u r a d o d e u m a

Resultados

A primeira observagao a fazer aqui e que, se os analis tas tern

algum controle sobre como os resultados sao usados, nunca tem to ta l

controle depois que os r e s u l t ados caem no domin io publico. Isso

confronta os analis tas com um dilema do qual es tou p l e n a m e n t e

consciente, mas que nao es ta com p le tamen te reso lv ido . Argumen-

te i no Capitu lo 7 que ha um processo d i fu n d i d o de tecnologiza9aodo discurso, que usa a pesquisa sobre o d iscurso para r ede s enhar

as prat icas discursivas e t r e ina r as pessoas para usar novas pra t icas

discursivas. A tecnologizacao d o d iscu rso e uma fon te pa ra a en-

genhar i a c u l tu ra l e social, e mui tos analis tas d e discurso encou t r a -

ra o obje^oes para o fa to de ser u sad a e , ce r l amente , pa ra a l g u m a s

forraas em que e usada. M as como posso eu ou ou t ros ana l i s t a s

estarmos seguros de que a pesquisa que estou desenvolvendo nao e

us ada em ta is contextos? A respos la hones ta , mesmo que dolorosa ,

e de que nao posso: como os academicos em mui tos ou t ros c a m -

pos, os analis tas de d iscu rso eslao cada ve z ma is c o r r e n d o o risco

d e se r in teg rados em agendas b urocra t i cas e ad i n i u i s t ra t i v a s . Como

a f i rme i n a discussao d a tecnologizagao d o discurso, es ta e u m a

tendenc ia que esta , a te o presente, maiiifesta apenas p a rc i a l men t e

em d i f e ren tes ins t i tuigoes e dominios . A m i n h a impre s s ao e a de

q ue esta camin hando para congregar forga, taivez be m rap i d amen t e ,

e por os ana l i s t a s em d i lemas ma is p remen tes , nurn f u t u r o n a om u i t o d i s t a n t e .

292 N o r m a n F a i r c l o u g h

Pode-se, na tu r a lmen te , parar de fazer pesquisa , ou fazer pes-

quisa sobre algo diferente; mas e dificil encontrar areas de pesqu i -

sa que es te jam livres de abuso, e eslas sao solucoes que a mai or i a

de nos acha d if ic i l contem plar . Talvez ta l pess imismo deveria ser

qualificado. As teenologias do discurso, como outras tecnologias.

abreni possibilidades em var ias direc,6es, a lgum as ma is benef ica s

para a maioria das pessoas do que outras . Descrevi a tecnologiza-

C , a o do discurso como ur n us o burocratico ou adminis tra t ive do

conhec imen to sobre o d iscu rso pa ra i m p o r m u d a n c a , m as esse co-

nlieci inento poderia tambem se r u sado em busca de mudanga de

ba ixo para c ima. Nesse sent ido, venho a r g u m e n t a n d o com colegas

Discurso e mudanca social 293

como a va r iedade padrao (por exemplo, o ing les padrao) e im post a

em contextos de prestigio; de como tais coercoes prejudicam os

usuarios de o u t r a s va r iedades : das possibil idades e dos riscos d e

i r contra elas , des af i ando a hegemonia do padrao. Como is to con-

clui, a CLC considera o deseuvolvimento da consciencia linguisti-

ca e da prat ica l inguis t ica como m u t u a m e n t e reforc,ador.

Os ana l i s t as podem t a m b e m desejar cont inuar se n r e l ac iona-

mento com os pesquisados apes a pesquisa es tar comple t a . Isso

pode envolver no mi'nimo a escrita dos resultados em uma fo rma

qu e se ja acessivel e litil para eles, e t a lvez en t r ando em dialogo

co m eles sobre os resu l t ados e suas implicates. O u pode r eque re r

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em ou t ra s ocasioes (Clark el ai, 1988; Fairclough e Tvanic , 1989:

Fairclough, 1992)2

a favor de ur n elemento de 'Consciencia Linguis-

t ica Critics' (CLC), n a educa9ao l ingu is t ica de todos os a l u n o s ,

que poderia fornecer- Ihes o conhecimento para iniciar mudancas

em suas proprias praticas discursivas, e nas praticas discursivas de

s u a c o m u n i d a d e .

A CLC o b je t iva recorrer a l i nguagem e a exper iencia discurs i-

va dos proprios aprendizes , para a juda- los a toruarem-se mais

conscientes da pra t ica em que estao envolvidos como produlores econsumidores de textos: das forces sociais e interesses que a mol-

d a m , as relates de poder e ideologies que a inves tem; sens efei tos

sobre as i den t idades sociais, relac.6es socia is , conhecimentos e

crencas ; e o papel do discurso no s processes d e m u d a n c a c u l t u r a l

e socia l ( inclu indo a tecnologizagao do discurso). Median te a

conscientizacao, os aprendizes po d em tornar-se mais conscientes

das coergoes sobre sua propria pratica, e das possibilidades. dos

riscos e dos custos do desafio ind iv idua l ou colet ivo dessas coer-

c,6es, para se engajarem em um a pratica l i ngu i sl i ca em anc ipa tor i a .

Dessa descrigao sumaria i'ica claro como a CLC poderia recorrer

ao t ipo de analise de d iscurso que defendi neste l ivro. Mas ela

lambem envolve a consciencia da varieda de l inguis t ica : conscien-

cia his torica dos processes hegemonicos de padronizagao da l in-

guagem, e os interesses que residem per tras deles; consciencia de

F ai r c lou g h , N. (ed.) Critical language awareness (Con sc ien c ia l ingufst ica c r i t i -

ca), L«ntlres e Nov a Y o r k , Ui ngman, 1992.

envolv imento a longo prazo na a^ao que as pessoas decidem t o m a r

em resposta aos resultados. Por exemplo, se o projeto para investi-

gar os circulos de q ua l idad e na i n d u s t r i a , refer ido an te r iormeute ,

fosse pa ra mos t ra r q u e o s gerentes c o n t r o l a m a m p l a m e n t e o s

encontros do circulo de qualidade (talvez em termos de tipos de

controle in teracional d isc utido s no Cap i t u l o 5, i tens "Caracter fs t i -

cas de conlrole in teracional" e "Formulacao'1), os t r ab a lhadore s

(o u gerentes ou ambos) poderiam decid ir t en t a r desenvolver for-

mas de i n t e r agao que permit issem que o controle fosse mais be mdist r ibufdo e negociado. Os analis tas de d iscurso podem bem estar

ap tos a t r ans formar suas hab i l idades anah'ticas em au x i l i o nessep lane jamento .

Por tan te , ha possibil idades para os analistas exercerem algum

con t ro le sobre o uso de seus resu l t ados de pesquisa . Mas penso

q ue seria e n g a n a d o r f e r m i n a r com uma nota ta o o t i m i s t a . S e a

tecnologizagao do discurso ganha fort;a, conforme eu predisse, os

ana l i s t as de discurso serao fo r t emen t e press ionados a proteger suas

intervene,oes bem i n t enc ionadas , pa ra n ao serem apropriadas por

aque le s que detera o poder, os recu rsos e o d inhe i ro .

Refe renc ia s b ib l iog ra f i c a s

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A

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a m b i v a l e n c i a de. 85; discurso

n a l , 29; r e su l t a do s , 291-293:

t e x t u a l m e n t e o r i e n t ad a . 61-88.131: t r i d i m e n s i o n a l , 23, 82,

100.116,126,245

Page 154: Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

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adequac .ao , t eor ias de , 95-96

adverbios mod ai s , 199 , 288

agenda, socia l , 56, 69-70

Alfhu sser , L., 20, 51-52, 116-117,

121-123

a m b i v a l e n c i a de textos. 35-36, 49 ,

56-58, 111-112, 137-J38, 149,167, 198, 233, 27L 283-29J:

po te n t i a l , 103, 110, 233-235;

reducao de a mb iva l e nc i a , 11 0

a mb iva l e nc i a de voz, 141, 216

a n a l i s e a u t o m a t i c a do d i scurso, 54

an a l i s e como interprctagao, 36. 39,

49-50, 57, 245-246

a na l i s e da con v e r s acao , 36 , 37-41.

58, 131, 192-194, 198

analise de discurso ' ab rangente ' , 42 -43

analise de discurso, 31-60, 275-293;

apropriac.iao da , 292-293; da -

dos, 276-281; metodo na pes -

q u i s a social , 276, 279; mul t i d i -

mensiona l . 27-28; m u l t i f u n c i o -

a na l i s e de d i scurso cri ' tica. 3J. 4 4

analise de discurso cri'tica v. analise

de discurso nao-crftica. 31-60

a na l i s e t e x t u a l . 21. 29. 51, 55, 57-

62,82, 101-104, 131, 175-246,

282

an i i l i scs jus t i f ic adora s . 290-291

a pa r e lho s ideoldg icos de es t ado,

52, 117

argumentac,ao no s textos. 106, 212-

221: m o do s de a r g imie n l a c a o .

286-287

arqueologia c genealog ia em Fou-

c a u l t , 74-75

a r q u i v o , 2 77

a r t icu lacao de ordens de d i scurso.

123-124, 273; lu ta s sobre a,

97-98

aspas s imples , 154

a t i t u d c c i en t f f i c a , 183

afos ameacadores da face. 186. 204.

206

atos de fala. 1 J 1

indiretos, 111,205

ava l iacao de enuncia t los , 19 7

3O8 Norman Fairclough

B

Bakl i l in , M- 29, 72 , 13J, 133-

134, 135-136, 162

bate-papo nos shows de conversa

na te levisao , 96

B e r n s t e i n , B., 68,125

B i l l i g . M., 127

b o m o u v i n t e , 188,208

B o u r d i e u , P . . 2 0 3 . 2 0 8 . 245

B rown . P.. 203-204

c

conip lexo ideolog ico. 123

concepgao consti tu t iva do discurso .

63-64, 81 , 86-87. 92-94; exa-

gero da concepcao consti tu t iva.

87. 120-121

concepcao c o n s t r u t i v a do d i s c u r -

so . 91-92, 131:const rugae da

rea l idade , 211

con ce p cao d e s i g m f i c a d o do d ic i -

o na r io . 230-231. 236

con d cn s acao , 1 7 2

conec t ivos , 21 2

conf i s sao. 77-79

Discurso e m u d a n c a soc ia l 3O9

cr iagao d e p a t a v r a s , 236-240. 257-

259. 263, 289; alternativas , 105:

m u l t i p l i c i d a d e de. 237

cuidados pre-natais. discurso de c u i -

dados prc-nata i s , 211-223

c u l t u r a en ipresa r ia l , 30 , 1 5 1 , 168.

169, 232, 255

D

democra t izac ,ao do acesso. 25 0

democrat izac.ao do discurso. 129-

130. 247-249, 268-272: s imula -

di s curso d a i n k l i a . 1 3 7 - 1 4 8 . 147.

201-203.241-242.252

discurso d e ge r e nc i a me n lo do de-

sacordo e da re je igao . 26 6

discurso dc sala dc anla. 32-36, 193:

hc t e r o ge ne ida de . 35. 43:

m u d a n y a his lor ic a , 35

discurso dire to . 140-141, 146. 15 4

discurso do loca l de t r a b a t h o . 25 -

26. 239

discurso educac iona l . 255-264

discurso ind iret o, 140, 154

discur so i n d i r e t o l iv re . 154

Page 155: Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

8/7/2019 Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

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cad e i a s i n t er t ex tu a i s , 108. 166-

169. 283-284

campanhas e le i to ra is , 24 3

c a m p o d e e nunc i a do s . 71

caracteristicas de controle in tcracio-

nal. 178, 180. 185-188. 192,

199,251,286

C h i l t o n , P ., 243-244circulos de qualidade, 278-279. 29 3

co t i i f icacao de u m corpus. 281

coerencia de textos. 42. 43-44. 50-

51. 103-104. 113, 119, 170-

172,220,284;

func.6es ideolog icas , 113-114

eoesao de textos . 103, 105-106,

113. 214, 217, 219-221,228.

246. 286

colocacao. 220-221, 246

colonizacao de ordens dc discurso.80/129-130, 255, 270-271.

272-273; pela conversacao, 251-

252: pela p u b l i c id ad e. 258-259

c o n i o d i f i c a c a o do discurso . 151-

152, 247. 255. 257, 268-

271; d o d i s c u r s o e duc a c io -n a l , 255-259

c o n junc a o . 214,219-220

consc ienc ia l inguis t ica crit ica . 120-

121,292-293

construgao no discurso, cont r ad i to-

ria, 256: das relacxies sociais.

91-92; de imagens , 258-259:

do(a) aprendiz, 257:do s siste-

m as de conhec imento . 9. 1

consumismo. 143,151,170-171.269

c o n s u m o de texlos. 99-100.106-

108,114

contexto, 72-73, 110-112. 233-234:

e intcrpretacao. 112-113: efei to

sobre o sentido. 110

contradicfio na pratica discursiva. 271

c o n t r a d igo c s no s textos , 171-172

conl r a - iden t i f ic ac j io , 53

conversa seguindo um topico.

195-196

conversa sobre prob lemas . 20 8

co-pesquisa . 276. 278

corpus, a m pl i a c a o . 277: cole ta dc .

277-278: com p os i cao de. 54

C o u l tha r d , M ., 32-4L , 44, 57. 176.

193

C o u r t i n c . J .-J . , 56

da , 27 1

d e s a r t i c u l a c a o . 123. 128, 159

descric,ao de textos, 21, 101, 245-

24 6

des iden t i f i ca^ao. 53, 56

d e s n a t u r a l i z a g a o d as pra t ic a s , 25 5

d e t e r m i n a g a o de agendas , 19 6

d i a I e t i c a . 8 7 ,9 1 - 9 3 ' , 20 4 ;

d e v o z e s , 185. 187d ia lo g i smo . 72.135

d ia lo go , e s t r u t u r a do , 106

di lemas discursivos, 127,151-152

di r e l r izes gera is para a a n a l i s e d e

d i s c u r s o , 31, 275-293

disciplina, 77-78

discurso. 21-24, 89-10.1; como pra-

tica social. 93 . 116:como texto.

101, 245; concepgao consti lu t i-

va de. 22. 29. 44-45. 66. 91; e

es t ru tu ra social. 91-94: e podcr,62 , 75-76, 81-82; estudo liisto-

rico do, 58; na lingui'stica. 22 -

23; na leoria social, 22, 24

d i s c u r s o c o m u n i c a l i v o v. discurso

estrategico, 259, 263

discurso conversac iona l , 189, 251-

252; simulado, 25 2

discurso politico. 51. 56; de Thatcher.

124. 127. 172: discursos pol f -

t i cos . 168,232-236

discursos, 29-30, 77 , 97-98, 160.

163; configurates de. 238-239

d i s t r i bu igao de textos. 99 , 106-108.

114, 166;simples v. complexa ,

108

engenharia semant ica . 30,158.168

e n t r c v i s t a mc d ic a . 176-188. 205-

206. 208. 215. 250, 272

en t r ev is la te r apeu t ic a , d i sc u r so d a .

40-45

en t r ev is ta s . 80 . .187. 252: me to do

na a n a l i s e de discurso . 27 8

e n t r e v i s t a s co m po l i c i a i s . 199en t r ev is ta s de r a d io , 199. 25 1

e nunc i a do s (enonces). 64-74

escr i ta acad e m i ca , 20 3es tabe lec imenlo dc agenda. 286-287

est i lo, 29, 40-43. 97-98. 120. 160-

161 . 1 6 3 , 1 6 5 - 1 6 6 , 2 8 3

eslra tcgias de con ten cf io , 254

rf"

310 Norman Fairclough Discurso e mudanga social 311

e s t r a t e g i a s i m p l f c i t a s d e p o l i d e z ,

205-206, 287

est ra tegias re tor i cas , 228

es t ru tu ra do monologo, 106

est rutura f rasa l , 21 3

e s t r u t u r a temat ica do t ex fo , 2 88

es t ru tu ra textual, 103, 10 6

e s t r u f u r a s de t roca, 193, 28 6

est ruturas re to r icas , 71 , 106, 217-

21 9

ethos, 181-182, 186, 203, 207-209,

213,217,219,287

ethos c ien t i f ico , 182, 18 6

1'ormac.ao dos obje tos , 65-68. 72

f o r m u l a c a o , 37, 41, 157, 198-199.

251, 286

Foucault , M- , 19 . 2L 24. 27, 59-87,

91, 96, 98, 106, 130. 133-134,

164, 217, 271; con ce p cao de

analise de discurso. 62-63

Fowler, R.. 46

fragmentacao das ordens de discur-

so, 270-273func_ao exprcssiva, 20 9

func.ao i d e a c i o n a l d a l i n g u a g e m .

201,211-246,287

H

Ha b c r ma s . J. , 19, 24

hab i l id ad e , 257-258; comunicacao ,

258: linguagem, 257: vocahula-

rio de , 257-259

H a l l . S., 172

U a l l i d a y , M., 20, 47, 92, 99. 149,

218-220. 224-226. 239

Ha r r i s . Z., 20. 54

Ha sa n , R ., 16 3

hegemonia. 122-124: e discurso, 123-

1 2 6 , 1 2 8 ; m a t r i z , 1 26

i n f e r e n c i a . 38. 113.224

i n f o r m a c a o . 26 3

i n f o r m a c a o da da , 226-227. 229

i n f o r m a g a o nova , 226

infonnalidade. tend^ncia para a. 188.

251-252

ing les com o I f n g u a n u i n d i a l . 24 9

ing les pa d r a o , d o m i n a c a o do . 249-

250: situacao p os - p ad rao . 249

in le r a^ao. 21 . 41-42: c o l a b o r a t i v a

v. compet i l iva , 254

in le rd iscur .s iv idadc , 29, 67 , 7 J - 7 3 .

81. 11.4, J 3 7 . 147, 149. 152.

Page 156: Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

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ellws niedico-c ient i i ' ico . 215

e lno me to do lo g i a , 36. 131

'e u medico1, 188

eventos discurs ivos , 127-128

exame. 77-80

expl icacao do discurso . 24 6

exprcssao, teo r ia da, 209

face, 181,203

t'ala e escri ta, 252

f a t a p o p u l a r , 143-144, 146, 147;

versoes jorna l i s t ic a s , 14 4

f a la r -e-vender , 149-151

Fanshel , D., 40, 42-45, 58

F ishma n , P.. 253

fort;a de urn e n u n c i a d o , 103, 111-

112; potencial, 111-112

fo rma c c o n te udo , 44-45, 47, 102-103,119

fo rmacao dc conce i tos , 70-73

fo rmacao de estrategias, 73-74

formacao de moda l idades en u n c ia -

t ivas, 68-70, 96

formagao discursiva. 52 , 62-63, 70 ,

72

funcao idcnti laria da l inguagem. 92 .

209

func.ao i n t c rpe s so a l da l i ngua ge m ,

92.199,201,209,287

fu n cao re lac iona l da l ing uagem, 92

f u n c a o t e x t u a l d a l i n g u a g e m , 9 2 ,

226-227, 287

f u n d o e s da l i n g u a g e m , 9 2

gc ne r o de discurso , 29, 51 , 72, 77 ,

80, 98, 133. 161-163, 165. 187,

258-259. 283-285: mescla de,

238: s is temadc , 161-162

genero e ling uag em, 191, 252. 254-

255

g e n c ro s mislos. 96

G i d d e n s , A . . 19

G o f f m a n , E., 40, 43, 107

graf icos , 26 0

g r a m a t i c a , 48, 49, 103-105, 211-

230, 287

G r a msc i , A., 19. 24, 29, 95, 116,

122-123,131

He r i t a ge , J . . 251

l ic tc rogeneidad e. 167. 27 2

he le r o ge ne ida de c o n s t i t u t i v e . 56

he t e r o ge ne ida de de textos, 40, 43,

56-58.97, 114, 1.37, 172,284:

visao d i n a m i c a da , 43

hexis corpora l . 20 8

hibr id izacao d e discurso . 271-272:

enlrevista medica e aconselha-mento. 39-40: i n f o r ma c a o e

persuasao, 260, 263: i n f o r m a -

cao e pub l i c ida de , 30

hipo tese S a p i r - W h o r f , 48

his tor ic idadc dos textos e do dis-

cu r s o , 1 1 4 - 1 1 5 ,1 27 . 1 34 - 1 35

Hodge , R . , 180, 199,201

homogene izacao do s dados, 54-56

I

i d c n t i d a d e soc ia l , 25, 91 , 181-182.

290: e d i sc u r so . 175-210

ideo logia . 116-122: crf t ica da. 86:

m a t e r i a l i d a d e da. 116

imagens visuais, 23. 51. 258-260

imp l ica t iv id ad e seqiiencial da con-

versacao, 37

159-166. .187. 245. 272 . 283:

cs t ra teg ica. 233

i n t e r d i s c u r s o . 53, 56. 64, 67. 72.

95

interpelacao contraditoria. 120-121.

interpelacao ideologica dos sujeitos.

52-114.116.120421.171

in le rpre lacao c r f t i c a de textos. 48-

50

in lerpre tacao d e textos. 20 , 57-58.

109-114 ; ascendente v. descen-

dente , 110; mo du s de. 107

in tc rp re tagoes res is lentes . 171-173

in te rpre tes . s u bm i s s os v. res is ten-

les. 17 3

i n l c r r u p c a o . 19 0

i n t e r t e x l u a l i d a d e . 28-29, 64. 133-

173. 272; e coerencia, 170-173;

e t rans tbrmacocs , 166-169 ;

consti tu i iva. 114. 136-137. 147 .152, 159: e n c a i x a d a . 152: he -

gcmonia , 28-29, 135; man i fes -

la . 29 , 1 L 4 - H 5 . 152-160. 167.

285; modes dc . 151-152. .160.

164.191

i n t e r v e n y a o mi s p r a t i c a s d i s c u r s i -

• vas , 254

312 N o r m a n F a i r cl o u g h

i n v e s t i m e n t o do discurso, ideo lo-

gico e p o l i t i co . ' 8 6 , 95, 98.

104, 113, 118-122. 126, 129.

232, 268, 278

i r o n i a , 158-159

i t ens lexicais. 237. 289

J

Jo hnso n , G., 241

K

l u l a sobre a s p r a t i c a s d i s c u r s iva s .

58, 85-87, 93-97.101.105, 114.

117,252-254,270-271

M

m a c r o a n a l i s e . 11 5

macrossociologia, 100

M a i n g u e n e a u . D.. 153, 207

ma nc hc t e s . 20 2marcadores coesivos. 219-221. 286

m arcad o re s e nc o b c r to s dc p oc ler .

Discurso e mudanca social 313

saico, 125. 248. 273: negocia-

do , 248. 27 3

m o d e r n i d a d e e po s -mo dc r n ida de ,

130

m o d o rc to r ico , 163, 365-166, 283,

286

modo, 163, 165-166,283

m e m e n t o s d e crise, 277. 28 1

Montgomery. M. . 242-243

M o u f l e . G, 68. 123

mu d an g a no discurso, 24 , 50, 58-59,

126-130, 247-274: evento dis-

cursivo, 127: niudanc.a no dis-

o rdens d e d i sc u r so , 28 , 67-68. 9 6-

99 . 1.18'. 123-124, 133, 152 .

159-160. 268 ; e lementos , 97-

98. 359-160; cstruturacao. 152;

globais. 26 ; inst i tucionais. 159.

269-270; l i m i t e s e n t r c o r de ns

de discurso. 96-97; locals. 128.

247. 270: luta . 129: p r i m a z i a .

11 4, 118. 162; societarias.

128. 159.247,270

Page 157: Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

8/7/2019 Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

http://slidepdf.com/reader/full/discursoemudancasocial-normanfairclough 157/160

Kress, G., 46, 146, 170. 173, 180,

3 9 9 , 2 0 1

Kris teva , J., 29, 72, 133-135

L

Labov , W., 34, 40. 42-45, 58

L a c la u , E., 68, 123,172

Lakof f , G.. 241lance . 32-33

langue, 90

Levinson,S.. 203-204

lexica l izacao . 49, 105, 236. 239-

24 0

l ingiiagem discr iminatoria co m base

no sexo. 253-254

l inguagem do si lencio, 254

I m g u a s m i n o r i t a r i a s , 2 49

l inguis t ica, 19-21, 46-47, 100, 102.

131l i n g i i f s t i c a critica. 21-22, 46-51, 55-

58.105,118,221

l i n g u i s t i ca s is temica , 20, 27 , 32,

47-48.201,221

l ivros didat i cos . J70

l u t a h e g c m o n i c a , d i s c u rs o c o m o ,

123-126

250-251

marquctizacao, 130: e muda nc a d i s-

cursiva. 23-24, 24.1

marxismo, 116

m a t e r i a l i d a d c dos e n u n c i a d o s , 74

mecanismos encohertos de conlrole.

253

medic ina alternative, 185-186. 207-

208: consullas, 269me ta d i s c u r so , 157-158.285

m e t a f o r a , 45, 105, 142-143, 241-

244, 256, 289

metafora gramat ica l . 225-226. 229-

230. 287

ni ic roana l i sc , 115

militar izac,ao do discurso. 2 42

Mishier. E., 178,181-182,183,215

moda l idade , 49. 150. 180-181. 186.

199-203. 205. 216: e afin idade.

180-18J , 199, 200-201, 288;

categorica, 199, 202: obj etiv a.

200, 288: sub je t iva , 200, 288

moda l idades en u n c ia t iv as , 68-69. 72

mo dc la me n io , 207-208

modelos de discurso. 125-126; arti-

culacao, 125: cckligo, 125. 273:

hegemonico , 235-236. 273; mo-

c u r so e m u d a n c a s o c i a l e

c u l t u r a l . 24-30, 80. 134-135;

o r de ns d e discurso . 129.247

N

narrat iva, 190-191, 286: convcrsa-

cao, 189-191; p r o d u z i d a con-

juntarnente. 190-191; subgenerosde narrat iva, 19 1

n a t u r a l i z a c a o . 9 4 , 3 1 7 , 1 20 - 321 ,

123, 128.241-242,263

n a t u r e z a pol i t ic a do discurso , 82

negacjio, 156-157

ne go c i a ?a o no discurso . 39. 186

n o m i n a l i z a c a o , 48-49, 223, 226-

227. 229-230, 237, 287-288

0

orac.ao intransit iva, 22 4

oragao t r an s i t i v a . 104. 119-120,

224-225, 229

orac.ao, gr a ma t i c a . 304-1.05. 221;

m u l t i f u n c i o n a l . 104;

oracoes passivas, 49, 104-105, 150,

221-227.287

pa d r o n iz a c a o I l nguf s t i c a . 29 2

palavras -chave . 54-55. 230. 288

par adjacente . 38, 193

paral inguagem, 41

parole. 90

Pecheux , M.. 20. 24. 50-59. 64. 68.

72,116, 118.231

pcrgunta-resposta -ava l ia^ao . 179-

^180.185-186,193perguntas. e respostas, 178-181. 186-

"l87. 194: fechadas ,179 ,194

p e r m e a b i l i d a d e d as pra t icas dis-

c u r s iva s . 270

per sona l izac f io s i n t e t i c a . 129-330.

268. 21 1

pe squ i sa dc I c i tores , 28 4

piso, 179

poder. 75-83. 1.16. 121-126: ma r c a -

dores de poder, 251: nas socie-

dades modernas , 75-76policiamento de contr ibui^oes. 19 7

polidez, 5.1. 98. 120, 180-182. 386.

203-207, 287: eslrategias, 287:

n c g a t i v a , 205-207. 287: pos i -

t i va . 205-207, 287

p o l iv a lcn c ia latica do discurso. 85 -

. 86.271

314 N o r m a n Fairclough

po s -mo de r n i sn io . 125. 272

Pot ter , 1, 44-46. 55. 58

pr a gma t i c a . 34. 73,181. 203

pragmatica l ingiifs t ica. 9 1 .

pra t ica discurs iva . 23-25, 28-29.

65, 83, 92-95, 98-102. 103,

106-107, 1)5, 1 3K 245, 283.

289-290: aimlise da . 282; con-

dicdes da . 284; criat iva v. nor-

mativa. 115; variahil idadc, 269-

270pratica discurs iva criat iva v . prat ica

discursiva normativa. 115, 126-

127, 289-290

processos sociocognit ivos. 99-100.

110

pr o duc a o de textos. 21. 55. 57-58.

99-100, 106-116

proposic ,des i m p l f c i t a s . 4 2- 4 3

pr o to c o lo s i n t e r p r e t a f i v o s , 17 3

psico logia soc ia l , 4 4

publ ic idadc , 149-152. 258-260. 260.

263. 268-269: ligada a rcg u la -

mentac,6es f inanceiras . 259-260

R

Discurso e m u d a n c a soc ia l 315

re lagoes i n t e r t e x l u a i s , l ior izon la is .

135: verticals. 135-136

re lexica l izacao . 25. 49. 105. 152.

240.289

report ag e m. 138-147

representagao de discurso . 137-138,

141-153, 164. 167, 198, 285:

i n a t i u t e n c a o dc l imi t e , 15 4

reprodu^ao soc ia l . 58-59, 84. 92,

118. 128: enfa se na r e p r o du -

gao, 55re spos tas m i n i mas. 186-187, 25 3

res l r i coes sobre o acesso, 77

r c tor ic a , 46. 203

s ign i f ic ado potcnc ia l dc u m te.xlo.

J03: d c u m a pa lavra . 230-

232. 288: m o d c l o s dc. 231

s i g n i f i c a d o s impl ic i tos . 41

significados interpessoais. 46 . 104.

149

s ignos, m o t i v a c a o socia l . 102-103

Sinclair.!, 32-41. 44 , 57.176.193

s i s l e m a s d e c o n l i c c i m e n t o c cren-

ca. 290

soc io l ing i i i s t ic a , 47. 72. 90sotaques da classe Iraball iadora. 24 9

so t a que s r e g io na i s . 249-250

s u j e i t o so c i a l , 45-46. 6 8 : com o

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8/7/2019 Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

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pr a t i c a l ing i i i s l ic a e m a n c i p a t o r i a .

29 2

pra t ica soc ia l , 22, 83-85. 90, 93-

94, 99. 245, 289-290; cm

Fouciuilt, 83 : relac.fio com a

es t ru tu ra soc ia l . 84

p r a f i c a s dc discur.so, mcscla dc, 30

pra l icas dc po l idcz. v a r i a h i l i d a d cda po l idez. 203

praficas discur s iva s publ ica s e pr i-

vadas. 30,144-147

pr a t i c a s l ingi 'ust icas , teri tal ivas d e

m u d a n c a , 25

pre-construfdos. 53, 156

prcssupos igao. 1.37, 155-156. 202,

229, 285: conccpcao intcrtcxtu-

al da pressuposicao, 155; man i -

p u la t iv a . 15 6

p r i m e i r o p i a n o v . p ia no d e ( u n d o

n os l e x to s . 21 7

p r i n c i p i o s i n lerp re la f iv os , 11 3

problcma t izacao de convencdes , 12 7

processo conver sac iona l do discur-

so, 252: entrevistas. 252

processes d i sc u r s ivo s , 36. 39-40,

51.55.57-58,82.107

r a c i o n a l i d a d e . 213: m o d o s de ra-

c io na l i da de , 2 17

r a c i o n a l i d a d e . s cn s o c o m u m . 383:

m o d o s de r a c io na l i da de , 106:

t e c no lo g i c a , 18 3

rear liculacao de ordens de discurso,

97. J23-124,128,159-160

rccursos dos membros. 99-100. 109.

112.115

rede i n t e r t e x t u a l , 13 7

redes de dis(ribuic,ao de textos. .167

r ees t ru tu ragao se ma n t i c a , 2 4 0

referenda dire ta . 1 4 9

re f e r e n d a . 87

regis t ro , 98. 160

regras de f on n acao , 63, 65

regulamentac,ao financeii 'a, 149-150

re lacao cu t re as orac,oes. elabora-

^ao. 218: coesao l ex ica l , 21 9 :

e l i p s e . 2 1 9 : c x t c i t s a o , 218:

rea lce . 218: referen da. 2 1 9

re lacoes coes ivas f u n c i o n a i s , 2 1 9 -

22 0

relates e n t r e ofancies , 21 8 - 21 9

re lacoes f u n e i o n a i s . 28 6

r e td r ic a c o nsumis l a , 2 5 7

refo rn o . 19 1

r i t ua l de discurso , 7 9

Rose, N. , 26, 269

ro te i ros , 98. 243-244

Sacks. H., 194-195 , 198

S a ussu r e , F. de. 90

Sc l iu lz , A. , 18 3

se^ocs t r ansve r sa ls . 4 1

selec.ao de dados , 277. 281

se mio t i c a soc ia l , 5 1

senso c o m u m . 123

Shapiro . M., 76

s ign i f ic acao, 66, 87, 91. .1.05. 236.

241

significado, 103:conf iguracdcs

do .233-234: c o n t c s t a c a o do , 231:

c in te rpre tacao, 10 3

s ign i f ic ado da pa l a v r a . 105. 230-

236. 288: modelo h e g e m o n i c o

do. 235

s ig n i f i cad o e m o t i v o . 20 9

s ign i f ic ado i de a c io na l . 46. 10 4

aeenle a t i vo . 12 1 : como efei to

idcologico, 121-J22: cons l i t u i -

^•ao discurs iva do , 46, 170-171 ,

175-210: c o ns l i t u i c a o do , 69.

87-88. 22J: dc sc c n ln ime n to

d o. 69: e m u d a n g a discurs iva .

25-30: IVagmentacao do. 69: no

d i s cu r s o , 52-53. 68-70, 87-88.120-J21, 175-210. 269: posi-

cdes, 55-56, 96-97.165

s u p e re x p re s s ao . 239-240

T

T a y lo r , C., 271

l e cn i ca s de po de r . 75 - 76 . 79-80.

85 : o b je t i f i c a ^ a o . 78-79: sub -

j e t i f i c a ga o . 79

l e c no lo g i a s de po de r . 24. 75-76

tccnologizacao do discur.so. 26-28.29 81 747.270-272,291-293

t cma da oracSo. 1 0 4 . 21 7 . 22 . 1 - 222 .

226-228- 287-288

t c ma t i z a c a o , 228t e n d c n c i a s n a m u d a n c a d i s c u r s i v a .

. J88.247-274

316 N o r m a n Fa i r c l o ug h

tenor , 163, 165, 283

t cor ia da acomodacao da f a l a , 45

teor ia soc ia l do d i scurso, 51 , 62,

89 -L3J

iexto , 21-23, 99, 106, 123-124;

a r q u i t e l u r a do . 106; e s t i l i s t i -

ca m e n te contradi tor io , 128;

p roce s s am e n l o , 110; resultado

do, 108

texto de dupla voz. 141. 15 3

t extura do texto, 217

T h o m p s o n . J . B . , 4 4 , 1 17l ipo de a t ividade , 30 , 97-98, 161-

162, 165,283

t ipo de discurso, 23, 159-162, 283

t r a n sc r i c a o . 28 0

t r a n s f o r r na c a o d i s c u r s iva . 48-49.

108, 114,167-169,201

t r a n s tb r ma c a o soc ia l , 58-59. 84 .

92. J 1.7-1.18, 1 28

transformacoes en t r e tipos de texto,

166-169

I r ans i t iv idade , 48 . 22J-230. 28 7

t r a n smis sa o d e r a d io e TV. 249

T re w, T.. 225

troca, 32

u

us o l i n g u fs t i co . 90

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8/7/2019 Discurso_e_Mudança_Social_-_Norman_Fairclough

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tipos de participants, 214-215,

221-223, 286-287: agente , 87.

221-222, 223-224, 226-227;

o b j e t i v o , 221-222, 224-228,

229-230

t ipos de processo, 221-225. 287:

processos de agao , 221-222;

processos de evento, 223-224;

processos me nta i s . 223-224;processos r e l a c i o n a i s . 221.

223-224

t ipos de texto, 106, 161-162, 217-

219, 284

To l so n , A., 96, 242-243, 252

tomada do t u r n o , 21, 37 , 39-40,

50, 98, 120,179,191-193, 286:

s i s t e m as d e . 179, 192-193

topico, 179, 182, 185, 194-195,

253,286; controle dc. 179. 191,

194-195, 286; desenvo lvimentode, 185: i n t r o d u g a o de. 253;

t om ad a de, 195

trabalho ideoldgico, discurso com o .

171,220-221

transacpes, 32, 194, 196

V

v a n D i j k , T . , 1 07v a r i a b i l i d a d e d a s p r a t i c a s d e m o-

da l ida de , 2 03

v a r i a b i l i d a d e das pra t icas d i s c u r -

s ivas . 58-59

va r i a gao s e m a n t i c a . 231

va r icdades lingiifsticas na o -pa d r a o .

249-250, 272

ve rbos auxi l i ares modai s , 199. 28 8

vo ca bu iar io, 103, 105. 230-244:

de mercador ias , 256Vo lo s h i n o v , V . I . , 1 1 6 , 1 5 3 - J 5 4

voz. 138, 140-144. 191: da m e d i -

c i n a , 182, 184-185, 213-218,

219, 223, 226: do mimdo da

vi da , 182, 185. 188. 206 . 215-

216; dos poderosos, 144

w

W e t h e r e l l . M ., 44-46. 55. 58

W i l l i a m s , R .. 230

Outros lan^amentos da Edi to ra U nB

S e r m a o do manda te

Padre Antonio Vieira

0 imag inar i o d a c i dade

Rogerio Lma e Ronaldo Costa Fernandes

(Organizadores)

Abo l tndo moc inhose band idos

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Bira da MOOCH, 1921 Sao Palc. SPW (111 0099-0,157/40W-9J29CNPJ JB 066 OJ7/0001-3J

Reg.204.507

Elzamir Gonzaga S i l v a e Eliz abeth Tunes

A c o m e d i a h u m a n a , cul tura e fem in i l i dade

Terezinha de Camarg o Viana

Aprend izagem signt f icat iva

Marco Antonio Moreira

A rab s ou a rab i co

Sergio Bath

Suspires poet/cos e saudades

Domingos J o s e Gon^alves de Magalhaes

Obra poet ica cornp leta

Fedenco Garcia Lorca