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Marília Costa Morosini (Org.) l Silvia Maria de Aguiar Isaia l Rafael PorlÆn Ariza l JosØ Martín Toscano Maria Isabel da Cunha l Denise Leite l Maria Estela Dal Pai Franco l Marlene Correro Grillo PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR IDENTIDADE, DOC˚NCIA E FORMA˙ˆO Brasília, abril de 2000

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  • 1Marlia Costa Morosini (Org.) l Silvia Maria de Aguiar Isaia l Rafael Porln Ariza l Jos Martn ToscanoMaria Isabel da Cunha l Denise Leite l Maria Estela Dal Pai Franco l Marlene Correro Grillo

    PROFESSOR DO ENSINO SUPERIORI D E N T I D A D E , D O C N C I A E F O R M A O

    Braslia, abril de 2000

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO2

    Coordenador-Geral de Difuso de Informaes EducacionaisAntonio Danilo Morais Barbosa

    Coordenador de Produo EditorialJair Santana Moraes

    Coordenador de Programao VisualAntonio Fernandes Secchin

    RevisoJair Santana MoraesJos Adelmo GuimaresMarluce Moreira SalgadoValter Kuchenbecker

    Normalizao BibliogrficaRegina Helena Azevedo de MelloRosa dos Anjos Oliveira

    Projeto Grfico e Arte-FinalF. Secchin

    CapaF. Secchin

    TIRAGEM1500 exemplares

    ENDEREOINEP/MEC Esplanada dos Ministrios, Bloco L, Anexo I, 4 Andar, Sala 416CEP 70047-900 Braslia-DF BrasilFones: (61)224-7092

    (61)224-1573Fax: (61)224-4167http://www.inep.gov.brE-mail: [email protected]

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais.

    Professor do ensino superior: identidade, docncia e formao / Marlia Costa Morosini(Org.). Braslia : Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, 2000.80 p. : il. tab.

    1. Professor de ensino superior. I. Morosini, Marlia Costa. II. Instituto Nacional de Estudos ePesquisas Educacionais.

    CDU 378.124

  • 3Sumrio

    Apresentao 5

    Parte I Professor do Ensino Superior: identidade e desafios 9

    Docncia universitria e os desafios da realidade nacional 11Marlia Costa Morosini (Ulbra)

    Professor universitrio no contexto de suas trajetriascomo pessoa e profissional 21

    Silvia Maria de Aguiar Isaia (UFSM)

    El saber prctico de los profesores especialistas: aportacionesdesde las didcticas especficas 35

    Rafael Porln Ariza (Universidade de Sevilha, Espanha)Jos Martn Toscano (Universidade de Sevilha, Espanha)

    Parte II Ensino e pesquisa como mediao da formaodo professor do Ensino Superior 43

    Ensino como mediao da formao do professor universitrio 45Maria Isabel da Cunha (UFPel)

    Conhecimento social na sala de aula universitriae a autoformao docente 53

    Denise Leite (UFRGS)

    Comunidade de conhecimento, pesquisa e formaodo professor do ensino superior 61

    Maria Estela Dal Pai Franco (UFRGS)

    O lugar da reflexo na construo do conhecimento profissional 75Marlene Correro Grillo (PUCRS)

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO4

  • 5ApresentaoO presente texto visa cobrir uma instncia do ensino brasileiro vulnervel e merecedora de

    uma ateno toda especial o professor do ensino superior, sua identidade, formao e docncia. Aproduo cientfica sobre o tema tem se caracterizado por poucos estudos, isolados e descontnuos.Pode-se afirmar que o tema do professor do ensino superior no se constitui rea de slida produocientfica. Agravando essa carncia de produo no Brasil, ocorre uma expanso acelerada do Sistemade Educao Superior, em que projees governamentais alertam para a presena de trs milhes dealunos em 2004. Esse aumento j vem sendo registrado quando se examina a trajetria no nmero deprofessores universitrios. Outro fato que tende a ressaltar a importncia do tema aqui em discusso apresena, na dcada de 90, do olhar avaliativo do Estado e, conseqentemente, da sociedade civilsobre a educao e sobre o desempenho do docente.

    A realidade acima sintetizada nos aponta para a necessidade de refletirmos sobre a temticae potencializarmos a construo de propostas inovadoras, sendo esse o propsito deste nmero. As-sim, o estudo se divide em dois blocos. O primeiro trata do Professor do ensino superior: identidade edesafios, e o segundo, do Ensino e pesquisa como mediao da formao do professor do ensino superior. Noprimeiro bloco, esto reunidos os seguintes textos:

    Docncia universitria e os desafios da realidade nacional, escrito pela professora MarliaCosta Morosini, da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), no qual analisada a docncia univer-sitria frente aos limites da realidade nacional, no contexto dos desafios propostos pelo mundoglobalizado. A autora destaca que o mundo globalizado tem priorizado a internacionalizao baseadana sociedade da informao, em padres de excelncia e na presena do Estado Avaliativo. Marca estecontexto a influncia do mercado sobre a docncia universitria, exigindo permanente capacitao dosrecursos humanos, a flexibilizao das organizaes de aprendizagem e a intensificao dacompetitividade. No plano da realidade nacional, so destacados os limites de legislao de educaosuperior referenciados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB) e pelo SistemaNacional da Avaliao, os quais orientam a demanda, pressionam as instituies universitrias e, porconseqncia, os professores a seguirem os ditames internacionais. definida a identidade do profes-sor universitrio e, a formao didtica, que anteriormente se caracterizava pelo laissez-faire, tende aocupar papel importante no desempenho acadmico. So discutidas tais determinaes ante o sistemade educao superior atravs da anlise do Censo de Ensino Superior do Brasil (Inep/MEC, 1998), notocante distribuio de docentes segundo as IES, formao escolar, ao regime de trabalho, etc.Como concluso, so apontados os desafios da docncia universitria num contexto de transforma-es aceleradas, em que a identidade da universidade est sendo posta em xeque, e em que o docente,que nela atua, defronta-se com um contexto institucional extremamente competitivo por um lado e,por outro, com novos padres de docncia definidos pelo mercado de trabalho/governo.

    Professor universitrio no contexto de suas trajetrias como pessoa e profissional, escri-to pela professora Silvia Maria de Aguiar Isaia, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Oartigo, de carter terico, busca subsdios para a discusso sobre a formao de professores, delimitan-do seu interesse aos docentes do ensino superior. Tal delimitao justificada no s pela pesquisaincipiente nesta rea como tambm pela constatao da perplexidade dos professores quando indaga-dos sobre sua prtica educativa e a solido que sentem em relao conduo da mesma. Diante destequadro, instaura-se a temtica da formao do professor universitrio, que, no artigo, ressignificadaa partir da perspectiva do professor como pessoa. O interesse pela pessoa do professor no inseparveldo estudo da dinmica dos acontecimentos internos e externos que contribuem ou no para a suaconstituio como profissional e pessoa. Neste sentido, temas como mal-estar docente, mundo interi-

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO6

    or, eu profissional individual e coletivo, processo identitrio, entre outros, constituem-se os focos deanlise da contextualizao da trajetria de constituio/construo dos docentes do ensino superior,tendo por horizonte a inerente relao pessoa/profisso. Os temas acima constituem-se o contrapontos questes de fundo que permeiam a discusso proposta pelo texto: Quem forma o professor univer-sitrio? Quem este sujeito pessoa e profissional? possvel ajud-lo em sua trajetria de formaosem entend-lo como unidade pessoa/profissional?

    El saber prctico de los profesores especialistas: aportaciones desde las didcticas espec-ficas, escrito pelos professores Rafael Porln Ariza, visitante do Programa de Ps-Graduao emEducao da Ulbra e Jos Martn Toscano, ambos docentes da Universidade de Sevilha. Destaca aconstituio do conhecimento desejvel dos professores. A partir da anlise das caractersticas doconhecimento que de fato possuem os professores, e levando em conta os aportes que, durante osltimos anos, vm sendo desenvolvidos pelas diferentes didticas especficas, os autores esboam umaproposta do que deveriam conhecer e saber fazer os professores especialistas.

    O segundo bloco, Ensino e pesquisa como mediao da formao do professor do ensino superior,rene os seguintes textos:

    Ensino como mediao da formao do professor universitrio, escrito pela professoraMaria Isabel da Cunha, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no qual ela destaca que, nombito da universidade, tomando como base o Brasil, o desencadear de distintas formas de avaliao,especialmente as externas, representa movimentos conformadores da profisso e da profissionalidadedocente. Considera que possvel haver distintas concepes do papel docente, que tem variaoespacial e territorial. A idia do professor desejado est sempre configurada a partir de um projeto desociedade e de educao. A autora defende a avaliao institucional numa perspectiva acadmico-crtica, mas percebe que a comunidade docente, submetida aos processos de avaliao oficiais, comeaa redimensionar, por foras das circunstncias, o sentido da sua profissionalidade, a qual presididapela racionalidade tcnica, baseada na produtividade e na competio. Em que pese ao fato de mani-festaes de resistncia, tanto individuais como grupais, essas foras no tm sido suficientes e acabamengolidas pela ordem dominante. O que ser professor de sucesso para esse parmetro avaliativo?Que conhecimentos, habilidades, valores e compromissos se requer deste professor? Qual a sua prin-cipal tarefa para ser bem avaliado? Que lgica preside a sua formao? Que racionalidade est confor-mando o seu fazer? Como ele mesmo est construindo seu imaginrio docente? Essas no so ques-tes discutidas e suficientemente explicitadas da mesma forma como no o o projeto poltico-peda-ggico para a universidade brasileira. Paradoxalmente, porm, h um esforo na literatura internacio-nal e nacional para redimensionar a condio da profisso docente num sentido mais autnomo etico, preocupado com uma profissionalidade reflexiva, produtora de uma profissionalidade docenteemancipatria, distinta da racionalidade tcnica. A contradio portentosa. Enquanto estamos en-volvidos com nossas pesquisas e tentando elaborar projetos de formao que contribuam para a que-bra da racionalidade tcnica, submetemo-nos, sob a batuta dos programas avaliadores, lgica dessamesma racionalidade. Os saberes constitutivos da profisso docente implicam conscincia, compreen-so e conhecimento. Sobre essas bases, que se pode estabelecer a reflexividade e, com ela, umaperspectiva mais emancipatria da profisso. O objetivo do texto foi aprofundar a contradio queestamos vivendo enquanto professores universitrios e ajudar na explicitao das demandas dos pro-cessos avaliativos e na conformao da professoralidade no ensino superior.

    Conhecimento social na sala de aula universitria e a autoformao docente, escrito pelaprofessora Denise Leite, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), no qual ela discu-te a prtica da construo de um conhecimento social na sala de aula universitria e os processos dequalificao e autoformao docente. Destaca a autora que essa possibilidade foi identificada naquelassalas de aula e nos processos educativos micro e macroinstitucionais que fizeram parte do estudoInovao como fator de revitalizao do ensinar e do aprender na universidade. Nessa investigao, foramestudados casos inovadores em quatro universidades pblicas do Brasil e da Argentina: aula universi-tria convencional e no-convencional, centro de estudos multidisciplinares, novas tecnologias, n-cleo de educao popular, avaliao institucional integrada e vestibular dissertativo. Esses casos foramintencionalmente selecionados por apresentarem alguma caracterstica visvel de ruptura com osparadigmas de uso tradicional na pedagogia universitria. A metodologia inclui, alm de estudos decasos, inmeras entrevistas presenciais e eletrnicas, observaes, questionrios e anlises de docu-mentos. Foram destacadas anlises transversais dos casos, com a metodologia da pesquisa em parce-

  • 7ria. A autora analisa alguns desses encaminhamentos de pesquisa, destacando a emergncia do conhe-cimento social e suas potencialidades para a autoformao docente. Destaca, ainda, que o caminhopercorrido na investigao se mostrou frtil. Seu incio, no entanto, foi trilhado com esforo em meioa um campo de extensa produo terica e prtica.

    Comunidade de conhecimento, pesquisa e formao do professor do ensino superior,escrito pela professora Maria Estela Dal Pai Franco, da UFRGS, no qual ela discute o trinmio comu-nidade de conhecimento, pesquisa e formao do professor de ensino superior, problematizando aquesto sob a perspectiva de uma prtica social e investigativa. A autora parte da constatao de queo professor de ensino superior integra uma comunidade de conhecimento e, sob tal fundante, discutea pesquisa como mediao da formao do professor. Duas categorias so utilizadas na anlise doprofessor de ensino superior: a identidade e a racionalidade. A identidade discutida na embocadurada complexidade da formao, tomada como problema social e problema de investigao. So anali-sadas mltiplas identidades situacional, institucional, poltica, profissional e de avano do conheci-mento , perpassadas pela de partcipe em uma comunidade de conhecimento. A racionalidade buscada nos vetores da formao para a pesquisa (acesso ao conhecimento sistematizado numa reade contedo e sua produo) e da formao para o ensino (acesso ao conhecimento sistematizado narea pedaggica). A autora discute, posteriormente, a comunidade do conhecimento em sua compo-sio e caractersticas, destacando a tendncia da pesquisa como prtica social. A associao entrepesquisa e docncia analisada enquanto formao na ao, sendo objetivada em trs pontos: a cres-cente conscincia da pesquisa para a sociedade hodierna, a pesquisa em sua insero poltica e demudana e a associao ensino-pesquisa na formao. Essa associao discutida no plano organizativo(aproximao graduao/ps-graduao pela continuidade e multidisciplinaridade do conhecimen-to), no plano contextual (problemas educacionais e investigativos) e no plano da ao pedaggica(partilha de saberes). Finalmente, so apresentadas duas prticas sociais de pesquisa, interinstitucionais,que fazem uso de modalidades cooperativas de redes de pesquisa. A concluso sugere que o pesquisa-dor lide com elementos necessrios para o desempenho do professor numa sociedade em constantemudana, destacando-se o acesso ao conhecimento sistematizado e produo de novos conhecimen-tos. Ressalta a importncia da formao pedaggica e da pesquisa nessa rea, pois as mesmas forne-cem uma dimenso crtica e tcnica que as tornam nicas e imprescindveis, forjando a identidade doprofessor como partcipe crtico da comunidade do conhecimento, empenhado na busca e na dissemi-nao de valores relevantes para a formao das novas geraes e para a sociedade da qual fazem parte.

    O lugar da reflexo na construo do conhecimento profissional, escrito pela professoraMarlene Correro Grillo, da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul (PUCRS), quediscorre sobre a importncia da reflexo na construo do conhecimento prtico, um forte integrantedo conhecimento profissional docente. Apia-se nos estudos de autores reflexivos (Dewey, Schn,Zeichner, Zabalza, entre outros), destacando conceitos bsicos encontrados na produo terica dosmesmos. Apresenta a questo da transposio didtica como uma possibilidade de prtica reflexiva,tendo em vista que o professor cria e recria quotidianamente sua ao pedaggica a partir do dilogocom situaes diversificadas da sala de aula. Conclui, recomendando a vivncia de seminrios reflexi-vos como um espao de dilogo e de abertura s peculiaridades das prticas, o que leva (re)construodo conhecimento profissional.

    Os temas anteriormente discutidos sobre o professor do ensino superior, sua identidade,docncia e formao, foram resultantes do I Simpsio de Educao Superior, promovido pelo Progra-ma de Ps-Graduao em Educao (PPGEdu) da Ulbra, com a cooperao e participao das uni-versidades PUCRS, UFPel, Universidade da Regio da Campanha (URCamp), Universidade de Caxiasdo Sul (UCS), Universidade de Iji (Uniju), Universidade do Vale dos Sinos (Unisinos), UFSM,UFRGS, Universidade do Vale do Taquari (Univates), Universidade Regional Integrada do AltoUruguai e das Misses (URI) e Centro Universitrio La Salle.

    Pelo teor dos textos abordados neste estudo, pode-se afirmar que a docncia universitria,oscilante entre os plos do laissez-faire e das presses do Estado Avaliativo, merece reflexes no s noplano terico, mas tambm no da prtica, onde as rupturas silenciosas j vm ocorrendo. Nessas refle-xes, no podem ser esquecidas as especificidades do local ante as determinaes do global. A caminhadaj comeou. Urge que a docncia universitria, como foco de discusso, reflexo e inovao, seja abraada.

    A Organizadora

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO8

  • 9Parte I Professordo Ensino Superior:identidade e desafios

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO10

  • 11

    Docncia universitria Marlia Costa Morosini*e os desafios

    da realidade nacional

    Introduo

    A docncia universitria tem sido considerada uma caixa de segredos, na qual as polticas pbli-cas omitiram determinaes quanto ao processo do ensinar, ficando o mesmo afeto instituio educaci-onal, que por sua vez o pressupe integrante da concepo de liberdade acadmica docente. Com oadvento da dcada de 90 e da marcada presena do Estado Avaliativo, orientado pela qualidade/excelncia,a avaliao da educao torna-se foco de interesse, sendo averiguada por um sistema nacional de medidas.

    Questes novas passam a ocupar lugar comum: quem o docente universitrio? Ele estpreparado para acompanhar as mudanas do terceiro milnio? A complexidade da resposta pode servista de diversos ngulos. Se nos reportarmos formao docente, no h uma unidade. Exige-se,cada vez mais, capacitao permanente em cursos de ps-graduao da rea de conhecimento. Mas odocente est preparado didaticamente para o exerccio acadmico? Por premissa, considerando o tipode graduao realizada, encontramos, exercendo a docncia universitria, professores com formaodidtica obtida em cursos de licenciatura; outros, que trazem sua experincia profissional para a salade aula; e, outros ainda, sem experincia profissional ou didtica, oriundos de curso de especializaoe/ou stricto sensu. O fator definidor da seleo de professores, at ento, era a competncia cientfica.

    Com o processo de globalizao, que se adentrou de forma acentuada pelo panoramanacional, a concepo de docncia universitria est sofrendo alteraes. No plano da capacitaoda rea de conhecimento, os parmetros so claros. No plano da didtica, embora esses parmetrosno sejam claros, da etapa da docncia universitria, caracterizada pelo laisse-faire, passa-se etapada exigncia de desempenho docente de excelncia. Tornam-se definidores: um cidado competen-te e competitivo; inserido na sociedade e no mercado de trabalho; com maior nvel de escolarizaoe de melhor qualidade; utilizando tecnologias de informao na sua docncia; produzindo seutrabalho no mais de forma isolada, mas em redes acadmicas nacionais e internacionais; domi-nando o conhecimento contemporneo e manejando-o para a resoluo de problemas, etc. Umdocente que domine o trato da matria do ensino, a integre ao contexto curricular e histrico-social, utilize formas de ensinar variadas, domine a linguagem corporal/gestual e busque a partici-pao do aluno (Cunha, 1990).

    A par desses questionamentos, a dcada de 90 apresenta uma rpida expanso da matrculano 3 grau (em 1998, 9% em relao ao ano anterior temos 2,7 milhes de alunos). E a previso doInstituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep/MEC) de 3 milhes de alunos matricu-lados nos cursos de graduao em 2004, o que se reflete no nmero de professores: 131.641 professo-res em 1990, e 165.122 em 1998. Tal expanso fortifica a importncia de estudo sobre docncia univer-sitria. Quem so (sero) esses novos professores? Estaro preparados didaticamente?

    Neste contexto, o presente trabalho tem como objetivo identificar e analisar a docncia uni-versitria diante dos desafios da realidade nacional num mundo globalizado. Partindo-se do princpiode que a docncia sofre influncias da realidade em que est inserida e que, nessa, a relao Estado/Universidade/Professor cerne, so abordados: a) os limites da legislao de educao superior, atravsdo exame dos atos normativos, destacando-se, entre esses, a Lei de Diretrizes e Bases da EducaoNacional (LDB) e o Sistema Nacional de Avaliao; e b) so discutidas tais determinaes ante adistribuio docente no sistema de educao superior brasileiro (MEC/Inep. Censo do Ensino Superior,1998). Concluindo o texto, so apontados os desafios que a docncia enfrenta numa realidade at ento

    *Doutora em Cincias Humanas; professora do Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Luterana do Brasil(Ulbra); professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvol-vimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq). E-mail: [email protected]

    DOCNCIA UNIVERSIT`RIA E OS DESAFIOS DA REALIDADE NACIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO12

    praticamente inquestionvel, na qual as solues estavam postas e que, atualmente, vm enfrentando asndrome de um ensino para a sociedade de massa num mundo globalizado, com padres definidos deexcelncia, em que a sociedade de informao ocupa lugar de destaque.

    Docncia universitria: a realidade nacional

    1. Determinaes da legislao de educao superior

    O final da dcada de 90, refletindo orientaes internacionais, marcado pela edio deinmeras normatizaes que do um carter determinante s relaes Estado/Universidade. A prin-cipal legislao a LDB (Lei n 9.394), sancionada pelo Presidente da Repblica em 20 de dezem-bro de 1996.

    A principal caracterstica dessa legislao sobre quem o professor universitrio, no mbito desua formao didtica, o silncio. Enquanto nos outros nveis de ensino o professor bem identifica-do,1 no ensino superior parte-se do princpio de que sua competncia advm do domnio da rea deconhecimento, na qual atua. E a remetemos definio apresentada por Pierre Bourdieu (1983),quando caracteriza o campo cientfico e discute a competncia cientfica do professor como resultanteda imbricao entre competncia tcnica e poder social, sendo a primeira definida no prprio campocientfico, pelos pares.

    Na anlise da LDB, fica manifesto que o docente universitrio deve ter competncia tcnica compreendida como domnio da rea de conhecimento.2 Tal competncia aparece em seu artigo 52(definidor de Universidade), incisos II e III, onde determinado que as universidades so instituiesque se caracterizam por:

    II um tero do corpo docente, pelo menos com titulao acadmica de mestrado ou dou-torado;

    III um tero do corpo docente em regime de tempo integral.

    A legislao concede um prazo de oito anos, a partir da sua regulamentao, no qual asinstituies sero avaliadas, correndo o risco de, no obtidos os ndices determinados, perderem ottulo de universidade, com as prerrogativas que tal organizao possui. Essa legislao est sendoseguida risca pelo governo. Recentemente, o setor de avaliao da Secretaria de Educao Superior(SESu/MEC) solicitou s instituies envio de relatrio avaliativo sobre o processo de capacitao emdesenvolvimento pelas IES para atender ao dispositivo de 2004.

    Entretanto, no plano da formao didtica, a LDB se abstm. Em outros atos normativos,embora a formao didtica no seja especificada de forma direta, de forma indireta ela o . Entre esses,um dos mais importantes o Decreto n 2.026, de 20 de outubro de 1996, que define o sistema deavaliao do sistema de educao brasileiro. Nesse decreto, so institudos: a) indicadores de avaliao

    1A LDB criou um novo tipo de rgo formador de professores. Tal determinao objetiva fomentar ao determinado por essa prprialegislao que exige que todos os professores em atividade tenham curso superior em 2007. Em agosto de 1999, o MEC autorizoua criao dos Institutos Superiores de Educao que podero funcionar isoladamente ou integrados a universidades. O cursonormal, em nvel mdio, continua sendo a formao mnima para o exerccio da Educao Infantil e do ensino nas quatro sriesiniciais do Ensino Fundamental. Os Institutos Superiores de Educao podero oferecer cursos de magistrio para a formao deprofessores de Educao Infantil (at 6 anos) e de sries iniciais (at a 4 srie do Ensino Fundamental) ou licenciatura para as sriesiniciais. Para o Ensino Mdio, sero oferecidos programas de atualizao de professores (formao continuada) e programas espe-ciais de formao pedaggica (para bacharis de outras reas). Tambm poder ocorrer ensino de ps-graduao. Alm das novaspossibilidades para a formao de professores oferecidas pelos Institutos de Educao, so mantidas as disciplinas de formaodidtica nos cursos de licenciatura (para cursos de graduao como Histria, Educao Fsica, Qumica, Fsica, etc) e a exigncia de60 horas de metodologia do ensino superior nos cursos de especializao.

    2Mesmo antes da legislao avaliativa em questo, existiam ndices para medir a qualificao na rea de conhecimento. Um dos maisimportantes o ndice de Qualificao do Corpo Docente (IQCD), que concede pesos diferenciados aos professores segundo aposse e o tipo de curso de ps-graduao. Soma-se o nmero de professores graduados, mais os especialistas multiplicados por dois,os mestres por trs e os doutores por quatro. Divide-se essa soma pelo nmero de docentes da instituio. Quanto mais prximo decinco, melhor o curso.

  • 13

    do desempenho global do sistema de educao superior, que analisa as reas de conhecimento e o tipoe a natureza das IES; b) avaliao do desempenho individual das IES, que destaca as funes universi-trias; c) avaliao do ensino de graduao; e d) avaliao da ps-graduao stricto sensu.3

    Com a implantao desse amplo sistema de avaliao nacional da educao superior, o docen-te passa a ter avaliado o seu desempenho, inclusive o didtico. N medidas isoladas indiretamente serefletem sobre o docente. Por exemplo, o Provo avalia a instituio, o professor e o aluno. Pois, almde saber o que o aluno aprendeu, importante averiguar as condies em que o aprendizado ocorreu.Qualidade de biblioteca e dos professores, laboratrios, equipamentos disponveis e projeto pedaggi-co esto entre os aspectos que precisam ser verificados. As visitas das comisses de especialistas4 tmesse objetivo. (Provo..., 1998, p. 6).

    Um outro exemplo integrado do Sistema Nacional de Avaliao que apresenta reflexos sobreo desempenho do professor a avaliao institucional (anlise do conjunto de atividades desempenha-das pela instituio). Desde 1992, vrias IES mantinham programas de avaliao institucional, mas apartir de 1993, com a criao do Programa de Avaliao das Universidades Brasileiras (Paiub), queaposta num sistema de avaliao institucional adaptvel a cada instituio, mas com parmetros nacio-nais, que as universidades comeam a examinar a sua instituio, e a se encaixa o desempenho doprofessor, inclusive o didtico. Pela LDB, ocorre a vinculao do credenciamento e do recredenciamentodas instituies a uma avaliao de qualidade. E essa implica rendimento dos alunos, mrito dos profes-sores e qualidade da instituio como um todo.

    Nessa averiguao da qualidade, devem ser oferecidas ao aluno informaes disponibilizadaspor boletim sobre a instituio, o curso, seus professores (ttulos, experincia profissional, produocientfica), nmero de alunos/turma, laboratrio, etc.

    Assim, apesar de a LDB...reconhecer a liberdade de ensino; a legislao ganhou novos contornos... com a coexistncia,lucratividade e avaliao... a qual muda o foco da qualidade do ensino superior da entrada do processopara o produto final... e o presente e o futuro do ensino superior pblico e privado estaro determina-dos pelo modo como se efetivarem os processos de avaliao do rendimento escolar, de avaliaoinstitucional e de avaliao de desempenho docente... (Cury, p. 110).

    importante ainda chamar a ateno para uma medida que avalia o desempenho docente,recentemente implantada nas IFES a Gratificao Estmulo Docncia (GED). A GED relacionadiretamente remunerao docncia, tendo como fator de destaque a sala de aula.

    Em sntese, o professor universitrio, na ltima dcada, sofre uma marcante presso, advindada legislao, imposta pela instituio e buscada por ele, para sua qualificao de desempenho, no qualo didtico passa a ocupar um papel de destaque. Advinda do governo com o fito de avaliar a qualidadedo ensino superior, imposta pela instituio com o objetivo de obter credenciamento da mesma juntoao MEC e para captar os alunos e buscada pelo professor para a manuteno de seu emprego e aumentode remunerao, entre outros requisitos.

    3So indicadores de: a) avaliao do desempenho global do sistema de educao superior (taxas de escolaridade bruta e lquida, relaoentre vagas e preenchimento, taxas de evaso/produtividade, tempo mdio de concluso do curso, ndices de qualificao do corpodocente, relao aluno/docente, tamanho mdio de turmas, despesa de educao superior/despesas pblicas de educao, despesapblica por aluno/ensino superior, despesa aluno/PIB e despesa publicao/remunerao dos professores) tais indicadores seroconsiderados por regio, Estado, rea de conhecimento e tipo de instituio; b) avaliao de desempenho individual da IES realizadapor uma comisso externa designada pela SESu/MEC, avaliando: a administrao geral (funcionamento dos rgos colegiados, arelao entre a mantenedora e a instituio de ensino e as atividades-meio sobre os objetivos finais da instituio), a administraoacadmica (relao entre o currculo de graduao e sua gesto e execuo, controle das exigncias do regimento sobre a execuodo currculo, critrios e procedimentos de avaliao), integrao social (cursos de extenso e a prestao de servios), e a produocientfica, cultural e tecnolgica em relao ao regime de trabalho dos docentes qualificados e ao seu nmero; c) avaliao do ensinode graduao realizada pela comisso de especialistas, designada pelo MEC, que emite parecer a partir dos indicadores seleciona-dos pela comisso, mais os resultados do Provo, mais indicadores do estado da arte da rea, mais as condies de oferta dainstituio onde o curso est alocado (organizao didtico-pedaggica, instalaes fsicas e especiais, qualificao docente e bibli-oteca); e d) avaliao da ps-graduao realizada h mais de vinte anos, combina comisses avaliativas indicadas pelos programasde ps da rea com padres internacionais apontados pela Fundao Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Supe-rior (Capes/MEC). Os procedimentos dos quatro nveis que compem o sistema Nacional de Avaliao so complementares einterdependentes, com mtodos e tcnicas especficos a cada um. Esse processo compatibilizado pela SESu/MEC.

    4So comisses formadas por profissionais de todas as regies do pas com experincia acadmica e de mercado que, a partir dadefinio de critrios mnimos, avaliam cursos de graduao, tendo poderes que iro definir o caminho do curso, inclusive de suasobrevivncia. Os membros da comisso so designados pela SESu/MEC.

    DOCNCIA UNIVERSIT`RIA E OS DESAFIOS DA REALIDADE NACIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO14

    2. Limites do sistema de educao superior

    A aplicabilidade da legislao est condicionada realidade do Pas. O Sistema de EnsinoSuperior Brasileiro tem 973 IES, 6.950 cursos, com uma matrcula de 2.125.958 alunos, mais de 50%em instituies particulares. Candidatam-se ao vestibular 2.858.016 e ingressam 651.353, ficando124.678 vagas no preenchidas. A taxa de sucesso (ingressantes/concluintes) de 62%, sendo 274.384concluintes. Em todos os dados, h o predomnio da instituio particular, o que no ocorre nos outrosnveis de ensino. um sistema de grande magnitude, diferenciando e impondo limites docnciauniversitria. Nesta seo do texto, far-se- uma anlise separada desses itens, mas, na prtica, nopodemos esquecer que integram um programa e, portanto, encontram-se imbricados.

    O professor universitrio e a IES onde exerce suas funes

    No caso da Educao Superior, um dos condicionantes mais fortes da docncia universitria o estabelecimento em que o professor exerce sua atividade. Dependendo da misso da instituio e dasconseqentes funes priorizadas, o tipo de atividade do professor ser diferente. Dependendo damantenedora, governamental ou privada, com administrao federal, estadual ou municipal, o pensar eo exercer a docncia sero diferentes, com condicionantes diferenciados tambm.

    No Brasil, temos uma variedade de tipos de Instituio de Ensino Superior. Pela LDB/96, asIES se dividem, segundo a organizao acadmica, em: Universidades e No-Universidades CentrosUniversitrios, Faculdades Integradas e Institutos ou Escolas Superiores. Dos 973 estabelecimentos deensino superior, 153 so universidades e 820 no-universidades.

    A instituio Universidade significa desenvolver ensino, pesquisa e extenso, ter autonomiadidtica, administrativa e financeira e congregar um corpo docente com titulao acadmica significa-tiva de mestrado ou doutorado.

    Exercer atividade docente em Centros Universitrios, ente institucional criado pela LDB, sig-nifica trabalhar em instituio que desenvolva ensino de excelncia, que atue em uma ou mais reas doconhecimento e que tenha autonomia para abrir e fechar cursos e vagas de graduao sem autorizao.J as Faculdades Integradas representam um conjunto de instituies em diferentes reas do conheci-mento, que oferecem ensino e, s vezes, pesquisa e extenso. Esses estabelecimentos dependem doConselho Nacional do Educao (CNE) para criar cursos e vagas. Os Institutos Superiores ou EscolasSuperiores atuam, em geral, em uma rea do conhecimento e podem fazer ensino ou pesquisa, depen-dendo do CNE para expandir sua rea de atuao.

    Assim, conforme o tipo de instituio de ensino superior em que o professor atua, sua docnciasofrer diferentes presses. Se ele atua num grupo de pesquisa em uma universidade, provavelmentesua viso de docncia ter um forte condicionante de investigao. J se ele atua numa instituioisolada, num centro universitrio, ou mesmo numa federao, sua viso de docncia ter um fortecondicionante de ensino sem pesquisa, ou, quando muito, do ensino com a pesquisa. A cultura dainstituio e da decorrente a poltica que ela desenvolve tero seus reflexos na docncia universitria.Entretanto, importante ressaltar que, mesmo nas instituies universitrias, a afirmao de que todosos docentes tenham a sua atividade relacionada pesquisa no verdadeira. As instituies tm diferen-tes graus de desenvolvimento de pesquisa em seu interior e mesmo entre as instituies.

    As IES, segundo a LDB, tambm se dividem, segundo a dependncia administrativa, empblicas e privadas. As pblicas, por sua vez, se dividem em federais, estaduais e municipais. Peloexame da Tabela 1 e Grfico 1, pode-se visualizar que a maioria das 973 IES so particulares (78,5 %).Tem-se 764 particulares e 209 pblicas.

    Essa diviso apresenta um fator condicionador muito importante sobre a docncia universitria.Via de regra, a maioria das pesquisas cientficas produzida nas instituies federais. Hoje, esta afirmaoest tendendo a sofrer alteraes, pelo alto investimento que as instituies particulares esto realizandopara o desenvolvimento da atividade investigativa no seu cerne. Entretanto, a implantao da cultura dapesquisa na instituio no uma ocorrncia de fcil transformao, pois implica o desenvolvimento demassa crtica (e o perodo de formao longo) ou a contratao de docentes com linhas de pesquisa j emdesenvolvimento. Por outro lado, implica tambm a implantao de infra-estrutura necessria, o fomento

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    ao desenvolvimento das atividades de pesquisa, desde a implantao de bolsas at o apoio a projetos,concesso de horas na carga horria do professor para a atividade de pesquisa, etc.

    Tabela 1 Instituies de Educao Superior, organizao acadmica,dependncia administrativa, regio da Federao Brasil 1998

    Universidades No-Universidades

    Total geral % Total % Fed. Est. Mun. Part. Total % Fed. Est. Mun. Part.

    Brasil 973 100 153 39 30 8 76 820 18 44 70 688Norte 40 4 9 6 6 2 1 31 4 1 2 12 7Nordeste 124 11 28 18 10 12 6 96 12 4 4 14 74Sudeste 570 59 70 46 13 7 1 49 500 61 10 15 37 348Sul 131 14 34 22 6 6 7 15 97 12 3 11 5 78Centro-Oeste 108 11 12 8 4 3 5 96 12 12 13 71

    Fonte: MEC/Inep/Seec. Censo do Ensino Superior, 1998. Braslia : Inep,1999. http://www.inep.gov.br

    Grfico 1 Instituies de Educao Superior, segundo a unidade da FederaoBrasil 1998

    Fonte: MEC/Inep/Seec. Censo do Ensino Superior, 1998. Braslia : Inep,1999. http://www.inep.gov.br

    Um outro fator da realidade brasileira condicionante da docncia universitria a distribui-o das IES segundo as regies da Federao. Pela Tabela 1, fica claro a alta concentrao (59%) deinstituies na Regio Sudeste (So Paulo, Rio de Janeiro, Esprito Santo, Minas Gerais), seguida daRegio Sul (14%), da Regio Nordeste e da Centro-Oeste (11%). Baixo o percentual de IES naRegio Norte (4%).

    bvio que o desenvolvimento da regio vai implicar um nmero maior de instituies, opredomnio de um determinado tipo de instituio, segundo a organizao acadmica, um maior de-senvolvimento da funo pesquisa, um maior nmero de ps-graduados, e assim por diante. Tal afirma-tiva pode ser vislumbrada na Tabela 2 e no Grfico 2.

    Tabela 2 Docentes, formao, regio da Federao Brasil 1998

    Funes docentes

    S/Grad. % Graduao % Espec. % Mestrado % Doutorado % Total %

    Brasil 107 6 30.783 18 57.677 35 45.482 27 31.073 19 165.122 100Norte 2 3 1.686 26 3.011 42 1.764 24,7 503 7,0 7.148 4,3Nordeste 8 3 5.696 22 8.966 35 7.488 29,4 3.321 13,0 25.479 15,4Sudeste 72 8 15.013 17 27.822 32 23.121 26,4 20.731 24 86.759 52,5Sul 24 7 5.642 16 13.182 39 10.156 30 4.959 14,6 33.963 20,6Centro-Oeste 1 8 2.564 22 4.696 40 2.953 25,1 1.559 13,2 11.773 7,1

    Fonte: Inep/MEC/Seec. Censo do Ensino Superior. Brasil, 1998. Braslia : MEC/Inep, 1999. http//.www.inep.gov.br/

    DOCNCIA UNIVERSIT`RIA E OS DESAFIOS DA REALIDADE NACIONAL

    Universidade Pblica Universidade Particular N/Universidade Pblica N/Universidade ParticularNorte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO16

    Grfico 2 - Docentes, formao, regio da Federao - 1998

    Fonte: Inep/MEC/Seec. Censo do Ensino Superior. Brasil, 1998. Braslia : MEC/Inep, 1999. http//.www.inep.gov.br

    O professor universitrio e a formao acadmica

    A poltica nacional de capacitao dos professores clara quanto ao investimento e controleda formao em programas de ps-graduao. Tal poltica apresenta seus reflexos quando examinamosa trajetria numrica da formao dos docentes universitrios. Segundo os dados do Inep ocorreu,entre 1990 e 1998, um aumento do nmero de professores com mestrado e doutorado: o percentual deprofessores com mestrado variou de 21% para 27% e o de professores com doutorado, de 13% para19%. Enquanto que o percentual de professores sem ps-graduao caiu de 34,5% para 19%, a catego-ria dos docentes com especializao teve uma pequena alta de 32% para 34%. Assim, hoje, no Brasilcomo um todo, o maior percentual para professores com ps-graduao stricto sensu 46% (mestradoe doutorado). Tambm merecem destaque os professores com especializao (34%). A esses, a partir dadcada de 90, exigido cursar a disciplina de Metodologia de Ensino Superior (60 horas). Um dadoque deve ser registrado a presena, embora pequena, de professores sem graduao (0,6%).

    A Tabela 3 complementa os dados de formao docente, correlacionando-os com a depen-dncia administrativa e a regio da Federao. Por tais informaes, solidifica-se mais ainda a afirmaode que o docente universitrio apresenta diferenciao entre as regies.

    Formao e organizao acadmica

    Com relao formao e organizao acadmica, verifica-se: o predomnio de docentes comespecializao exerce atividades nas instituies no universitrias; o predomnio dos docentes comformao stricto sensu nas universidades; e nas pblicas, h uma tendncia acentuada para percentuais dedoutores similares aos de mestres. As instituies pblicas tm professores mais qualificados que asparticulares: 28% so doutores, contra 9% das particulares. Com mestrado, so 30% nas pblicas e25% nas particulares. Com especializao, 24,8% nas pblicas e 45% nas particulares. E sem ps-graduao, so 17% nas pblicas e 20% nas particulares.

    O professor universitrio e o regime de trabalho

    No h uma homogeneidade do perfil do professor universitrio em relao ao nmero dehoras de trabalho na instituio. Pela Tabela 4 e Grfico 3, verifica-se que 44,4% dos docentes tmregime integral, 33,7% so horistas, e 21,9%, regime parcial. Para as universidades, h um predomniodo regime de trabalho de tempo integral (55,6%), e para as no-universidades, o de horista (59,4%). Odado acima poderia nos levar a uma anlise errnea. O que realmente acontece a diferena entrepblico e privado. No pblico, via de regra, o professor no trabalha por hora-aula, como no privado,mas ele tem, por exemplo, no caso do regime de 40 horas, um perodo de tempo que no atividade desala de aula. atividade de pesquisa ou de extenso. Esta afirmativa minimizada quando examinamosas particulares. Embora exista tambm a relao acima apontada, os diferenciais no so to fortes: osprofessores de tempo integral das particulares (12.068) correspondem a 24,8% dos horistas (48.719).

    1RUWH 1RUGHVWH 6XGHVWH 6XO &HQWUR2HVWH

    Sem Graduao Especializao Mestrado Doutorado

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    Tabela 3 Docentes, formao e regio da Federao Brasil 1998

    Universidades No-Universidades

    Total Geral % Total % Pblica Particular Total % Pblica Particular

    Brasil 165.122 100 120.013 100 75.485 44.528 45.109 100 8.253 36.856

    Sem Graduao 107 0,65 39 0,32 26 13 68 0,21 31 37

    Graduao 30.783 18,6 21.387 17,8 12.492 8.895 9.396 51 1.779 7.317

    Especializao 57.677 34,9 34.822 29 16.992 17.830 22.855 22 2.801 19.054

    Mestrado 45.482 27,5 35.695 30 23.254 12.441 9.787 6,7 1.819 7.968

    Doutorado 31.073 18,8 28.070 29,01 22.721 5.349 3.003 823 2.180

    Norte 7.148 100 5.475 100 5.034 441 1.673 100 358 1.315

    Sem Graduao 2 0,3 2 0,37 2 - - - - -

    Graduao 1.686 23,6 1.334 24,4 1.290 44 534 32 115 419

    Especializao 3.011 42,1 2.210 40,4 1.416 283 801 48,1 94 707

    Mestrado 1.764 24,7 1.494 27,3 1.392 102 270 16,1 111 169

    Doutorado 503 7,04 435 8 423 12 68 4,1 38 30

    Nordeste 25.479 100 21.542 100 18.786 2.756 3.934 100 957 2.980

    Sem Graduao 8 0,31 - - - - 8 0,20 - -

    Graduao 5.696 22,3 4.773 22,1 4.117 656 923 34 271 652

    Especializao 8.966 35,2 6.894 32 5.603 1.291 2.072 57 534 1.538

    Mestrado 7.488 29,4 6.698 31,1 6.027 671 790 20,1 117 673

    Doutorado 3.321 13,0 3.177 15 3.039 138 144 3,7 136 117

    Sudeste 86.759 100 56.813 100 29.663 27.150 29.946 100 4.402 25.544

    Sem Graduao 72 0,82 28 0,49 22 6 44 0,15 18 26

    Graduao 15.013 17,30 8.810 16 3.185 5.625 6.203 21 949 5.254

    Especializao 27.822 32,10 13.338 24 3.575 9.763 14.484 48,4 1.608 12.876

    Mestrado 23.121 26,6 16.294 27 8.437 7.857 6.827 23 1.196 5.631

    Doutorado 20.731 23,9 18.343 32,3 14.444 3.899 2.388 7,8 631 1.757

    Sul 33.963 100 28.279 100 16.929 11.350 5.684 100 1.671 4.013

    Sem Graduao 24 0,70 8 0,02 1 7 16 0,3 5 11

    Graduao 5.642 16,6 4.726 17 2.636 2.090 916 16,1 213 603

    Especializao 13.182 38,8 9.887 35 4.707 5.180 3.295 58 951 2.344

    Mestrado 10.156 29,9 8.975 32 5.953 3.022 1.181 21 283 898

    Doutorado 4.959 14,6 4.683 17 3.632 1.051 276 4,8 119 157

    Centro-Oeste 11.773 100 7.904 100 5.073 2.831 100 1865 3.004

    Sem Graduao 1 0,8 1 0,01 1 - - - - -

    Graduao 2.564 21,8 1.744 22,1 1.264 480 820 4,5 131 689

    Especializao 4.696 39,9 2.493 32 3.953 1.313 2.203 57 745 1.589

    Mestrado 2.953 25,1 2.234 28,3 1.445 789 719 19 112 607

    Doutorado 1.559 13,3 1.432 18,1 1.183 249 127 3,3 8 119

    Fonte: MEC/Inep/Seec. Censo do Ensino Superior, 1998. Braslia : Inep,1999. http://www.inep.gov.br

    DOCNCIA UNIVERSIT`RIA E OS DESAFIOS DA REALIDADE NACIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO18

    Tabela 4 Docentes, regime de trabalho, regies da Federaoe dependncia administrativa Brasil 1998

    Universidades No- Universidades

    Total Geral % Total % Pblicas Particulares Total % Pblicas Particulares

    Brasil 165.122 100 120.013 100 75.485 44.528 45.109 100 8.258 36.856Tempo Integral 73.263 44,4 66.788 55,6 58.025 8.763 6.475 14,3 3.170 3.305Tempo Parcial 36.235 21,9 24.390 20,3 13.231 11.159 11.845 26,3 2.407 9.438Horista 55.624 33,7 28.835 24,0 4.229 24.606 26.789 59,3 2.676 39.579

    Norte 7.148 5.475 5.037 441 1.673 358 1.315Tempo Integral 3.870 54,1 3.454 63,1 8.460 31 416 25 211 205Tempo Parcial 2.115 29,6 1.577 28,8 1.414 163 538 32,1 74 464Horista 1.163 16,3 444 8,1 641 247 719 43 73 646

    Nordeste 25.479 21.542 18.786 2.756 3.934 957 2.980Tempo Integral 16.507 64,8 16.095 74,7 15.753 342 412 10,5 211 201Tempo Parcial 4.779 18,7 3.743 17,4 2.968 775 1.036 26,3 259 777Horista 4.193 16,5 1.704 8 65 1.639 2.489 63,3 487 2.002

    Sudeste 86.759 56.813 29.663 27.150 29.946 4.402 25.544Tempo Integral 32.041 36,9 27.911 49,1 23.315 4.596 4.130 13,8 1.702 2.428Tempo Parcial 19.845 22,9 11.699 0,02 4.810 6.889 8.146 27,2 1.146 7.000Horista 34.873 40,2 17.203 30,3 1.538 15.665 17.670 59 1.554 1.6116

    Sul 33.963 28.279 16.929 11.350 5.684 1.666 4.013Tempo Integral 14.619 43,0 13.533 47,9 28.153 2.309 1.086 19,1 860 226Tempo Parcial 7.138 21,0 5.822 20,6 3.312 2.510 1.316 23,1 657 659Horista 12.206 35,9 8.924 31,5 2.393 6.531 3.282 58 154 3.128

    Centro-Oeste 11.773 7.904 7.466 2.831 3.869 865 3.004Tempo Integral 6.226 52,9 5.795 73,3 4.310 1.485 431 11,1 186 245Tempo Parcial 2.358 20,0 1.549 19,6 420 822 809 21 1.271 538Horista 3.189 27,1 560 7,1 36 524 2.629 68 1.993 2.221

    Fonte: MEC/Inep/Seec. Censo do Ensino Superior, 1998. Braslia : Inep, 1999. http://www.inep.gov.br

    Grfico 3 Docentes, regime de trabalho, regio da Federao Brasil 1998

    Fonte: MEC/Inep/Seec. Censo do Ensino Superior, 1998. Braslia : Inep, 1999. http://www.inep.gov.br

    Tempo Integral Tempo Parcial Horista

    Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

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    Entre os 165.122 docentes, o maior nmero est em universidades 120.013 (universidadespblicas 75.485), e o menor nmero est em no universidades pblicas 8.253.

    Essa afirmao mais forte quando examinamos somente as instituies particulares no-universitrias: 65,4% so professores horistas.

    Analisando o regime de trabalho por regio da Federao, tambm a distribuio dos do-centes no apresenta homogeneidade. Nas regies menos desenvolvidas, h o predomnio do regimede trabalho de tempo integral: Norte 54,1%, Nordeste 64,8%, e Centro-Oeste 52,9%. medi-da que a regio apresenta ndices de desenvolvimento maiores, a diferena entre docentes de regimeintegral e horistas se minimiza. No Sul, os professores de regime de tempo integral (43%) so relati-vamente prximos aos horistas (35,9%) e na Sudeste, o percentual de horistas (40,2%) maior doque o de tempo integral (36,9%). Tal percentual decorrente basicamente da presena de particulares 15.665 docentes (universidades) e 16.116 (no-universidades).

    Alm das caractersticas acima, que interferem na docncia universitria, o MEC/Inep (1999)identifica como mdia da relao professor/aluno: 12,9 alunos nas universidades. Para as universidadespblicas, estaduais e federais, a relao de 9 alunos, e nas instituies particulares de 16,2 alunos.

    Um outro dado a presena de mulheres como docentes: 40,3%. Elas apresentam ummenor nmero entre os especialistas, mestres e doutores: 42,2% possuem o ttulo de especialista,45,3% possuem o ttulo de mestre e 33,8% o ttulo de doutorado.

    Concluso

    A pedagogia universitria no Brasil exercida por professores que no tm uma identidadenica. Suas caractersticas so extremamente complexas, como complexo e variado o sistema deeducao superior brasileiro: temos instituies pblicas e privadas, universidades e no-universida-des, em cinco regies da Federao de caractersticas tnicas, sociais e econmicas diferentes.

    Na base desta realidade, a poltica de formao de professores para o ensino superior realizada de forma indireta. O governo determina os parmetros de qualidade institucional, e a IESseleciona e desenvolve uma poltica de capacitao de seus docentes orientada por tais parmetros. Aformao docente especifica diretamente cursos de capacitao em ps-graduao mestrado, douto-rado , e inclusive cria ndices avaliativos e estabelece prazos: 2004, para que seja feita a avaliao dosdefinidores de qualidade. Entretanto, diretamente, o governo no estabelece normas de capacitaodidtica do docente. Essas so feitas atravs da avaliao de outros indicadores que refletem o xito dapedagogia universitria. Na relao Estado/Universidade, a poltica de capacitao didtica fica afeta instituio. O governo normatiza e fiscaliza, e a instituio desenvolve os parmetros atravs de suapoltica de capacitao docente.

    At ento, a formao docente baseava-se no princpio do laissez-faire, entretanto, com achegada do Estado Avaliativo, as instituies, inicialmente, elaboraram polticas de capacitao emcursos de ps-graduao. Mais recentemente, verifica-se um movimento nas polticas de buscar aqualificao didtica de seus professores, tendo em vista que medidas avaliativas, de forte resultado,foram implantadas avaliando o desempenho dos alunos da instituio. E est provada a relao entredesempenho didtico do professor e desempenho do aluno.

    No podemos esquecer que os desafios acima resumidos tero suas questes agravadas, poisa sociedade da informao desloca o eixo do sucesso da posse do bem para a posse do conhecimento,e isto implica capacitao continuada dos recursos humanos. A duplicao das matrculas no ensinosuperior projetada para 2004, e o conseqente crescimento acelerado no nmero de professoresuniversitrios far-se- necessrio.

    Referncias bibliogrficas

    BOURDIEU, Pierre. O campo cientfico. In: ORTIZ, Renato. Pierre Bourdieu : sociologia. SoPaulo: `tica, 1983.

    CUNHA, Maria Isabel. O bom professor e sua prtica. Campinas : Papirus, 1993.

    DOCNCIA UNIVERSIT`RIA E OS DESAFIOS DA REALIDADE NACIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO20

    BRASIL. Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da EducaoNacional. Sancionada em 12 de dezembro de 1996, pelo Presidente da Repblica Federativado Brasil.

    BANCO INTERNACIONAL DE RECONSTRUCCIN Y FOMENTO/BANCO MUNDIAL.La enseanza superior : las lecciones derivadas de la experiencia. Washington : Banco Mundial,1994.

    CURY, C.R. Evoluo da Educao Superior no Brasil : a participao do setor pblico e da inicia-tiva privada. Rio de Janeiro : CUI, s/d. (Saudaes Acadmicas, 4). Boletim Informativoda Consultoria Universitria Internacional (CUI).

    PROVO faz parte de amplo sistema de avaliao. Revista do Provo, Braslia, v. 3, n. 3, p. 6-8,1998.

    INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS. Diretoria de Infor-maes e Estatsticas Educacionais (Inep/Seec). Censo do Ensino Superior, 1998. Braslia : Inep,1999. http://www.inep.gov.br

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    Professor universitrio Silvia Maria de Aguiar Isaia*no contexto de suas trajetrias

    como pessoa e profissional

    Apresentando o tema

    No presente artigo, a preocupao de base com a constituio do docente universitrio e,em especial, com o de licenciatura, responsvel pela formao de futuros professores para o ensinobsico e mdio.

    Contudo, o desvelamento dessa constituio parte do enfoque que privilegia o professorcomo um ser unitrio, entretecido pela trajetria pessoal e profissional, pressupondo que o mesmo uma pessoa que se constri nas relaes que estabelece com os outros que lhe so significativos, coma histria social que o permeia e com sua prpria histria.

    Neste sentido, aponta-se a importncia de pesquisas e estudos voltados para as trajetrias devida dos professores, contemplando o modo como articulam o pessoal e o profissional e, conseqen-temente, como vo se (trans)formando, ao longo do tempo, contribuindo assim para o conhecimento deser professor (Nvoa, 1992).

    Entende-se que a concepo de trajetria de vida, seja pessoal ou profissional, encontrafundamento em Ortega y Gasset (1970). Vida, para este autor, tempo, durao e, como tal, finitude.A idade dos homens se deve ao fato de estes estarem sempre situados em uma poro de seu tempo,que finito. Portanto, a vida ocorre em fases, etapas, idades, que no s se sucedem, mas principal-mente se enlaam, convivendo em uma mesma durao histrica.

    A idade, fase ou etapa, por marcar pores de tempo vivido, no compreende apenas umano, mas um conjunto de anos vivenciados por um conjunto de pessoas que compartilham, entre si,valores, crenas, convices, estilos de vida, constituindo o que Ortega y Gasset denomina gerao eque contempla simultaneamente uma comunidade temporal e espacial. Por isso, para o autor (Ortegay Gasset, 1970, p. 37-38): Hoy es para uno veinte aos; para outros, cuarenta; para outros sesenta...Todos somos contemporneos, vivimos en el mismo tiempo y atmsfera en el mismo mundo , pero contribu-mos a formarlos de modo diferente. (Hoje para algum vinte anos; para outros, quarenta; paraoutros, sessenta... Todos somos contemporneos, vivemos em um mesmo tempo e atmosfera emum mesmo mundo , mas contribumos para form-los de modo diferente).

    Desse modo, a trajetria, tanto pessoal quanto profissional, envolve uma multiplicidade degeraes que no s se sucedem, mas se entrelaam na permanente tarefa de produzir o mundo. Assimcada uma, em um mesmo percurso histrico, possui papel diferenciado nessa tecitura. Metaforica-mente, Ortega y Gasset apresenta as cinco idades do homem, entendendo-as em termos geracionais.Assim, as duas primeiras tm por funo inteirar-se do mundo que lhe dado pelas geraes anterio-res; a terceira tem por tarefa gestar uma nova concepo de mundo; a quarta volta-se para a efetivaconcretizao do que estava sendo gestado, envolvendo predomnio e mando; a ltima cabe desvestir-se do mundo, entregando seu governo para a gerao que a sucede.

    Em termos de trajetria pessoal, estas idades corresponderiam s fases de desenvolvimentopelas quais cada pessoa passa de acordo com determinados parmetros de tempo, espao e estilo de vida.O caminho do desenvolvimento pessoal, contudo, no pode ser visto apenas em termos individuais,mas sim grupais, pois, no seu percurso, cada sujeito interage com todos aqueles que com ele compar-tilham os mesmos parmetros geracionais, constituindo uma gerao.

    Em termos de trajetria profissional e, no presente caso, a dos professores, estas idadescorresponderiam s diversas geraes pedaggicas, cujas funes, voltadas para a produo do mundo

    PROFESSOR UNIVERSIT`RIO NO CONTEXTO DE SUAS TRAJETRIAS COMO PESSOA E PROFISSIONAL

    *Doutora em Cincias Humanas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); professora do Programa de Ps-Graduao em Educao do Centro de Educao da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

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    educacional, abarcariam o modo peculiar de inteirar-se sobre ele, gest-lo, govern-lo e finalmenteentreg-lo s novas geraes.

    A trajetria profissional vista como um processo complexo, um conjunto de movi-mentos em que revoluo e involuo esto presentes, em que fases da vida e da profisso seentrecruzam, mas no so uma s e, fundamentalmente, em que grupos geracionais de diferentesconstituies encontram-se em uma mesma durao histrica, podendo interagir, repelir-se oumesmo se desconhecer mas, mesmo assim, sendo responsveis pela trama de uma trajetria queem muitos aspectos nica.

    Tecendo o tema

    O tema do professor universitrio, no contexto de suas trajetrias, enfatiza sua condio desujeito e como um dos atores do processo educativo superior.

    Sem desconsiderar as condies intra e interpessoais que o cercam, busca-se contempl-las apartir da tica de como estas so vividas e percebidas pelo docente, concedendo-lhe um papel ativo naelaborao e interpretao de seu mundo. Assim, o interesse que orienta este estudo, volta-se para acompreenso da dinmica dos acontecimentos que contribuem para contextualizar a trajetria deconstituio/construo desse professor, tendo por horizonte a inerente relao percurso pessoal/pro-fissional.

    A trajetria pessoal entendida como o transfundo a partir do qual a vida dos professoresadquire consistncia e significado existencial. Para sua configurao, optou-se pela concepo de de-senvolvimento para toda a vida, tendo por base o iderio de Riegel (1979), Erikson (1981, 1985) eLevinson (1982, 1986).

    Para contemplar-se o percurso existencial dos professores do ensino superior, o foco a vidaadulta, por ser o momento deste desenrolar em que eles se encontram. Nesta etapa da vida, segundoIsaia (1992), transformaes e mudanas continuam a ocorrer, alterando o modo como os adultos eo mundo transacionam, influenciando-se mutuamente. Dessa forma, eventos concretos como sadade casa, formao acadmica, carreira profissional, casamento, cuidado com os filhos etc., envolvemdesafios, crises e transtornos que surgem a partir de uma combinao de necessidades e expectativaspessoais com normas e exigncias sociais, bem como a capacidade de enfrent-las e gerenci-las dentrode determinado marco geracional e histrico.

    Buscando-se a contextualizao da vida adulta dentro da perspectiva dialtica, tem-se ascontribuies de Riegel (1979), segundo as quais o desenvolvimento adulto o resultado do entrejogode quatro nveis desenvolvimentistas: biolgico-interno, psicoindividual, sociocultural e fsico-exter-no. A dinmica entre estes quatro nveis decorre da busca de sincronia entre eles, o que nem sempre possvel, levando a ocorrncia de crises ou conflitos, vistos como confrontaes construtivas quefornecem a fonte para novas transformaes, tanto do indivduo quanto da sociedade com a qual eleinterage.

    Partindo do enfoque rigeliano, pode-se inferir que os adultos esto em constante trans-formao, mas estas s podem ser apreendidas a partir do estudo de eventos concretos ocorridosinterativamente em dois ou nos quatro nveis do desenvolvimento. Dessa forma, eventos inter-nos ou externos, isoladamente, pouco dizem, sendo importante levar-se em conta o modo comoos indivduos, no caso os professores, enfrentam esses eventos, mais ainda, consider-los na inter-seo das interaes do mundo interno (biolgico e psquico) e do mundo externo (socioculturale fsico).

    Devido aos posicionamentos acima, a preocupao de Riegel no est em estabelecer estgiosuniversais de desenvolvimento, mas em explicitar a mecnica atravs da qual este desenvolvimento de seranalisado compreendido. Como para ele, este envolve uma seqncia de eventos que ocorrem em umprocesso transacional indivduo/mundo, as pautas desenvolvimentistas iro depender da conjugaoentre diversos componentes de uma determinada situao. Nesse sentido, Riegel elabora uma estratificaodo ciclo adulto, atravs de nveis conectados com idades e eventos que provavelmente so responsveispela incidncia de determinadas mudanas em relao a estes nveis. Exemplificando, tem-se conformeRiegel (1979), o Quadro 1.

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    Quadro 1 Nveis e eventos da vida adulta

    Nveis (anos) Modificaes graduais Modificaessbitas

    Homens Mulheres

    Psicossocial Biofsica Psicossocial Biofsica

    Colgio/ 1 Trabalho/ 1 FilhoI 1 trabalho Colgio Casamento(20-25) Casamento

    1 Filho

    2 trabalho Perda do trabalho Outro filhoII Outro filho Crianas na pr-escola(25-30) Crianas na pr-escola

    Mudana MudanaIII Promoo Ausncia de trabalho(30-35) Filhos na escola Filhos na escola

    Segundo lar Segundo larIV Promoo Segunda carrreira(35-50) Partida dos filhos Partida dos filhos

    Desemprego Incapacitao Desemprego Menopausa Perda do trabalhoV Isolamento Av Perda dos pais(50-65) Av Chefe de famlia Perda de amigos

    Chefe de famlia Doena

    Privao Deficincias Viuvez AposentadoriaVI sensorio-motoras Incapacitao Perda(65 + ) do companheiro

    Morte

    Fonte: RIEGEL, 1979, p. 139.

    Partindo-se de uma abordagem psicossocial, a trajetria pessoal ser entendida, na perspec-tiva de Erikson (1981, 1985), como um ciclo formado pela inter-relao de oito etapas ou idades,cada uma conectada ao contexto da totalidade do ciclo vital e vice-versa. Assim, a adultez compreen-dida em relao a todas as outras fases e no apenas como um fim maduro e acabado do ciclo de vida.

    A abordagem eriksoniana, no desconsiderando o processo orgnico, privilegia a interaoentre processo psquico e social, concebendo o fator psicossocial como aquele capaz de explicar adinmica do transcurso existencial. Este se d ao longo de etapas, representando as oito idades dohomem, desde o nascimento at a velhice. Cada idade est associada a um marco existencial que asepara das demais, consubstanciado na noo de crise e sendo expressado em termos de uma polarida-de formada por um elemento sintnico (positivo ajustamento) e distnico (negativo transtorno).A dinmica do desenvolvimento, tendo em vista esta noo de crise, no linear e ascendente; aocontrrio, permeada pelo positivo e pelo negativo, em um jogo de figura/fundo, em que no h asupremacia total de um sobre o outro, mas um equilbrio mvel entre eles. Assim, as pessoas, deacordo com as circunstncias que enfrentam ao longo da vida, podem oscilar para cima ou para baixona escala do amadurecimento; contudo, se possurem um saldo positivo de suas crises, os movimentosdescendentes sero menos destrutivos.

    Da luta entre as tendncias sintnicas e distnicas, inerentes a cada etapa vivencial, emergemforas psicossociais, entendidas como qualidades ou virtudes bsicas, relativas s estratgias de ajusta-mento da pessoa e ao sistema de valores da cultura a que esta pertence. Buscando-se configurar odesenvolvimento psicossocial, tem-se o Quadro 2 elaborado por Erikson (1985).

    Tendo por foco de interesse o percurso de vida dos professores de licenciatura, considera-serelevante a explicitao da sexta e stima etapa psicossocial, ou seja, juventude e vida adulta. A primei-ra corresponde ao prtico de entrada no mundo adulto, sendo que a crise que a caracteriza envolve adialtica intimidade versus isolamento. A intimidade corresponde capacidade do adulto jovem, mais

    PROFESSOR UNIVERSIT`RIO NO CONTEXTO DE SUAS TRAJETRIAS COMO PESSOA E PROFISSIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO24

    seguro de sua identidade, experimentar sua prpria vida interior e afiliaes concretas de amizade e deamor com outras pessoas, desenvolvendo fora moral para cumprir os compromissos assumidos,mesmo que estes exijam sacrifcios pessoais. Como qualidade decorrente dessa fase, tem-se o amor,visto como sentimento maduro, implicando uma relao de reciprocidade com outros significativos.No plo oposto intimidade e ao amor, encontra-se o isolamento, caracterizado pelo impulso a evitarcontatos em que o trao distintivo a mutualidade, a reciprocidade e o compromisso.

    A segunda corresponde anttese crtica, geratividade versus estagnao, sendo que a pecu-liaridade distintiva da mesma situa-se na dimenso da geratividade, entendida no s como a capaci-dade de gerar novos seres, produtos e idias, mas tambm como autogerao. Neste sentido envolve,alm do componente biolgico, uma necessidade psicolgica de sentir-se responsvel pelo desenvolvi-mento de outras pessoas e do seu prprio. Coerente com o impulso geratividade, a qualidade pr-pria dessa etapa o cuidado, ou seja, o compromisso que o adulto estabelece de cuidar das pessoas,dos produtos e idias com os quais est vinculado e pelos quais se sente responsvel. O rechao, plonegativo do cuidado, implica a resistncia do adulto em se comprometer com as obrigaes advindasde seu vnculo com outros significativos, revertendo na anttese da geratividade que a estagnao.Esta expressa-se em uma necessidade obsessiva de autocentralizao e autopreocupao, levando a umempobrecimento da personalidade.

    Quadro 2 Crises psicossociais

    Velhice V IntegridadeI x desesperana,I desgostoI SABEDORIA

    Adultez V GeratividadeI x estagnaoI CUIDADO

    Juventude V IntimidadeI x isolamento

    AMOR

    Adolescncia V Identidadex confusode identidadeFIDELIDADE

    Idade escolar I IndstriaV x inferioridade

    COMPETNCIA

    Idade do jogo I IniciativaI x culpaI FINALIDADE

    Infncia inicial I AutonomiaI x vergonha,

    dvidaVONTADE

    Infncia I Confiana bsicax desconfianabsicaESPERANA

    1 2 3 4 5 6 7 8

    Fonte: ERIKSON, 1985, p. 72-73.

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    J em uma perspectiva evolutivo-estrutural, como a de Levinson (1982, 1986), a dinmi-ca existencial adulta, para ser compreendida, envolve a interdependncia entre as noes de curso devida, ciclo vital e estrutura de vida. A primeira refere- se ao carter concreto de uma vida em suaevoluo, indicando seqncia, fluxo temporal e desdobramento mltiplo atravs dos anos, compre-endendo todos os componentes do viver: histria ocupacional; mudanas fsicas; desejos; relaciona-mentos de amor, de trabalho e familiares; bons e maus momentos; participaes de outras pessoas,instituies e grupos, enfim, tudo o que significativo para uma pessoa. A segunda sugere umaseqncia bsica do curso da vida, que compartilhada por todas as pessoas, apesar do carteridiossincrtico deste curso para cada uma. Assim, o ciclo vital concebido como um desenrolarseqencial de pocas ou eras, tendo cada uma seu carter biopsicossocial prprio. Cada poca, emboradiferente da anterior, no nem melhor, nem mais importante do que aquela. A terceira correspondea um padro bsico, dado no tempo, formado pela interao de componentes internos (valores, dese-jos, conflitos, competncias, noo de eu, etc.) e externos (pessoas, grupos, instituies sociais, even-tos, objetos, produtos culturais, etc.). Dentre os componentes centrais da adultez tem-se a famlia, ocasamento e a ocupao. Esta estrutura, assim constituda, determina a natureza e o padro de relaci-onamento de um adulto com todos os outros com os quais se relaciona, bem como a evoluo desterelacionamento. Em linhas gerais, o desenvolvimento adulto delineia-se para Levinson (1986), noQuadro 3 abaixo.

    Quadro 3 Fases da vida adulta

    Transio adultez tardia: idade 60-65

    Culminncia da adultez mdia: 55-60 Fase da adultez tardia: 60-fTransio anos 50: 50-55Entrada na adultez mdia: 45-50

    Transio da adultez: idade 40-45

    Culminncia da adultez inicial: 33-40 Fase da adultez mdia: 40-65Transio anos 30: 28-33Entrada na adultez inicial: 22-28

    Transio da adultez inicial: 17-22

    Fase da adultez inicial: 17-45

    Fase da pr-adultez: 0-22Fonte: LEVINSON, 1986, p. 8.

    Em termos levinsonianos, a era da adultez inicial estende-se se dos 17 aos 45 anos, caracte-rizando-se por ser a fase de maior energia e contradio. Isto porque envolve de modo geral: o cumedo ciclo vital, compreendendo dos 20 aos 30 anos; a formao e perseguio das aspiraes elabora-das nos seus anos iniciais; o estabelecimento de um lugar na sociedade adulta e o incio da vidaprofissional, o que determina um misto de grandes satisfaes e grandes tenses. As primeiras, relati-vas ao amor, sexualidade, progresso profissional, vida familiar e realizao de muitos dosobjetivos buscados. As ltimas, devido carga de compromissos decorrentes das novas responsabili-dades profissionais, familiares e econmicas, sem ter ainda uma experincia vivencial adequada paratanto.

    A era da adultez mdia situa-se entre os 40 e os 65 anos, caracterizando-se fundamental-mente pelo papel de gerao dominante, ou seja, o adulto mdio no s responsvel por sua vida epor seu mundo, como tambm engaja-se na orientao de uma gerao de jovens adultos que logoestaro buscando o lugar que ele ocupa em termos de comando e liderana. Nesse sentido, estabelecidauma luta de geraes, isto , entre os que no momento so os donos do mundo (adultos mdios) e osque querem atingir este domnio (adultos jovens).

    PROFESSOR UNIVERSIT`RIO NO CONTEXTO DE SUAS TRAJETRIAS COMO PESSOA E PROFISSIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO26

    Assim, como a trajetria pessoal do professor foi especificada, cabe agora demarcarconceitualmente a noo de trajetria profissional, entendendo-a, a partir de Ortega y Gasset (1970),no s como uma sucesso de geraes, mas principalmente como o entrelaamento de vrias gera-es pedaggicas em determinado momento histrico. Nesse sentido, a compreenso dessa trajetriadeveria levar em conta como diferentes geraes encontram eco ou dissonncia em um dado percursoprofissional.

    A idia de trajetria como carreira pedaggica encontra suporte em Hubermam (1989),sendo entendida como um processo que envolve o percurso de professores em uma ou vrias institui-es de ensino, nas quais estiveram ou esto engajados. Este processo influenciado tanto pela traje-tria pessoal, quanto pelo contexto institucional e social em que esto inseridos. Assim, apesar deenvolver a idia de sucesso (Hubermam, 1986, 1989; Cavaco, 1991; Abraham, 1986), no apresen-ta linearidade seqencial absoluta, compreendendo arrancadas, recuos, caminhos sem sada (labirin-to), mudanas repentinas de rota, etc.

    Mesmo que haja uma certa estandartizao seqencial, os acontecimentos dentro de deter-minada etapa so percebidos e enfrentados de forma idiossincrtica. Nesse sentido, o estudo da traje-tria profissional do professor procura compreend-lo como pessoa (Hubermam, 1986, 1989; Holly,1992; Cavaco, 1991) ao longo da carreira, sendo esta permeada pela tenso entre:

    centrao na prpria pessoa e a problemtica dos alunos; inventividade e conformismo; aspiraes, necessidades, valores pessoais e estruturas institucionais; sentimento e razo; cultura institucional e social; investimento afetivo e desinvestimento; fases da vida adulta e fases da carreira docente.

    Tanto o desenvolvimento pessoal quanto profissional podem ser concebidos como um pro-cesso dialtico (Riegel, 1979), integrando foras internas e externas, importando, para sua compreen-so, o modo como estas foras so enfrentadas concretamente ao longo da vida e da carreira.

    Na perspectiva acima, Cavaco (1991), em sua pesquisa sobre o desenrolar da vida pessoal eprofissional de professores, detectou linhas de fora ao longo de seus percursos profissionais. Emborase refira aos professores do ensino secundrio, suas constataes so significativas para a compreensoda trajetria dos professores de licenciatura. As linhas de fora encontradas so:

    expectativas pessoais e familiares relacionadas a oportunidades e a condies institucionais; tenso e sentimentos que acompanham as primeiras experincias profissionais, contribu-

    indo para a elaborao da identidade profissional; progressivo amadurecimento profissional, envolvendo a relao com os alunos, com os

    colegas, com o conhecimento e a prpria profisso; dificuldades relativas articulao com a dimenso familiar e profissional; mudana de expectativas decorrentes de alteraes institucionais, podendo levar a maior

    ou menor investimento pessoal.

    Para Cavaco, da interao dessas foras surgem duas linhas que orientam o sentido dado profisso. Uma voltada para a burocracia e aceitao da hierarquia, levando ao isolamento na aopedaggica, fechamento mudana, ceticismo e ressentimento em relao aos outros e, conseqente-mente, amargura em relao profisso. A outra, centrada na inovao, na diversidade, na partilha deexperincias, na aceitao do desafio, na sensibilidade ao outro, possibilitando permanente aberturaao desenvolvimento profissional.

    A compreenso sobre a trajetria profissional, alm de incluir a idia de uma trama depercursos, precisa incorporar a noo de eu profissional, a fim de realmente contemplar o professorem sua unidade (pessoa/profissional).

    De acordo com Abraham (1987), o eu profissional concebido como mundo interior, ouseja, um complexo subjetivo (consciente e inconsciente), formado no jogo de influncias inter-huma-nas, envolvendo significantes positivos ou negativos, objetos amados ou odiados, representando as-pectos da pessoa e do grupo. Assim, o que acontece no mundo interior do professor est eminterdependncia com o que acontece com o mundo interior coletivo (grupo de professores).

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    Na base deste mundo interior, individual e coletivo, encontram-se mecanismos de defesaestruturados socialmente, assegurando proteo contra a ansiedade que, ao se tornar permanente,impede o contato direto com a realidade. Esses mecanismos de defesa so constantemente alimenta-dos pelo sistema de defesa social de cada profisso e reprimidos tanto no inconsciente individual,quanto no coletivo.

    O eu profissional constitui-se a dinmica entre o eu individual e o eu coletivo.O eu profissional individual envolve um complexo subjetivo formado pelo eu real, eu ideal

    e eu idealizado. O primeiro decorre da possibilidade de o professor dar-se conta de suas reais possibi-lidades e perceber-se de forma autntica. O segundo compreende o que o professor gostaria de ser,mas sabe que no , segundo seus valores, ideais e aspiraes, compartilhados com o grupo. O terceiroadvm da iluso de ser perfeito. O eu idealizado, quando reforado ou ameaado pelas exignciassociais e profissionais, pode debilitar o eu real, levando a que o professor no tenha condies derecri-lo, conforme suas experincias reais.

    O eu profissional coletivo formado pelos professores vistos como classe e pertencentes adeterminadas instituies de ensino, cuja fora motriz est na noo coletiva de eu. Compreende ocomplexo subjetivo grupal, formado pelo eu coletivo real e o eu coletivo ideal ou oficial. As tensesexperimentadas esto relacionadas com as variaes entre as diversas imagens que o grupo tem de simesmo. Quando o eu ideal ou oficial sobrepuja o real, ocorre um distanciamento das experincias vivi-das pelo grupo, impedindo inter-relaes autnticas, levando fatalmente alienao e ao conformismo.

    Para as intrincadas relaes entre o eu profissional, individual e coletivo, Abraham (1986)cria a idia de labirinto. Este representa o difcil e tortuoso caminho a ser percorrido pelos professores,na busca de deslindar as situaes confusas, conflitantes e alienantes em que se encontram ao longo desuas trajetrias, como indivduos e grupo.

    A experincia labirntica, no que tem de positivo e criadora, vivida por poucos professoresao longo de suas trajetrias. Para tanto, precisariam sentir-se seguros como pessoa e grupo, masprincipalmente encontrar no centro do labirinto o eu verdadeiro, responsvel por sua motivao comodocente, sua diferenciao, permanncia e unicidade. S assim eles seriam capazes de se aventurar nosdiversos caminhos do labirinto, constituindo-se como professores autnticos, conscientes das tensese grilhes pessoais e grupais, permanecendo abertos inovao e ao desafio, compartilhando desco-bertas e possibilidades de crescimento com os outros significativos de seu campo profissional.

    Infelizmente, a grande maioria dos professores seguem trilhas equivocadas: ao se encontrarem nos caminhos sem sada do labirinto, no percebem que tm de tomar

    decises, experimentar novos caminhos, pois o eu inautntico aciona mecanismos de defesa que ne-gam a problemtica vivida e a ansiedade dela decorrente;

    ou ainda, passam pelo labirinto sem nem ao menos viv-lo, usando a mscara de que tudosabem, de que o caminho linear, consagrado pela norma, abafando seu mal-estar, seu desejo de abandonaro campo educativo, sua profunda ansiedade ante o desconhecido e a necessidade de tomar decises.

    O estudo de Huberman (1989), sobre o percurso profissional ou ciclo de vida dos professo-res, considerado um clssico na rea. Mesmo referindo-se a professores secundrios e da culturafrancesa, o modelo, por ele apresentado, contempla percursos possveis de serem percorridos porprofessores universitrios da cultura brasileira.

    Seu modelo, visando abarcar percursos variados, apresenta sucesso de anos combinadoscom fases que podem apresentar mais de uma temtica, permitindo entradas e sadas diversificadas aolongo da carreira, rompendo assim, com a idia de modelo linearmente monoltico. Contudo, enfatizaa ocorrncia de tendncias centrais capazes de dar conta de sua idia de ciclo de vida dos professores,conforme Quadro 4 (Huberman, 1989).

    O modelo hubermaniano apresenta as seguintes peculiaridades ao longo de suas fases: Entrada na carreira (1-3 anos): contato inicial com a sala de aula, envolvendo dois com-

    ponentes: sobrevivncia e descoberta. O primeiro, ligado ao que se pode chamar de choque do real; eo segundo, vinculado idia de entusiasmo inicial por estar finalmente exercendo a profisso. Ambosso vivenciados paralelamente, mas o segundo permite agentar o primeiro. Esta fase pode envolvervariadas combinaes com estes dois componentes ou apresentar outros, mas a temtica central estna possibilidade de explorao que pode se apresentar de mltiplas maneiras, sendo favorecida ou nopor condies pessoais e institucionais.

    PROFESSOR UNIVERSIT`RIO NO CONTEXTO DE SUAS TRAJETRIAS COMO PESSOA E PROFISSIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO28

    Quadro 4 Ciclo de vida dos professores

    Anos da carreira Fases/Temas da carreira

    1 3 Entrada, Tateamento

    4 6 Estabilizao, Consolidaode um repertrio pedaggico

    7 25 Diversificao Ativismo Questionamento

    25 35 Serenidade, Distncia afetiva Conservadorismo

    35 40 Desinvestimento(sereno ou amargo)

    Fonte: HUBERMAN, 1989, p. 23.

    Estabilizao (4-6 anos): implica pertencer a um grupo docente, acompanhando ou prece-dendo um sentimento de competncia pedaggica crescente. Nesta fase, o professor passa a preocupar-se menos consigo e mais com os objetivos pedaggicos, sentindo-se mais vontade para enfrentarsituaes complexas ou inesperadas. Esta fase envolve o estabelecimento de um estilo prprio comoprofessor e a consolidao de um repertrio pedaggico que lhe traz crescente confiana.

    Diversificao (7-25 anos): o estabelecimento de percursos individuais decorre da possibi-lidade de o professor, mais estabilizado, iniciar novas experincias pedaggicas. Motivao e dinamis-mo so a tnica, envolvendo a busca de ascenso pessoal, tanto administrativa, quanto acadmico-cientfica, bem como a necessidade de contribuir para a reformulao do sistema, convergindo para ootimismo prprio a este perodo.

    Questionamento (7-25 anos): temtica paralela diversificao e que tem por base umbalano da vida profissional percorrida, em face dos ideais e objetivos do incio da carreira. Esteperodo trabalha com componentes psicolgicos e sociais, sendo que estes ltimos envolvem, entreoutros, caractersticas da instituio, contexto poltico e econmico e vida familiar. O questionamentoparece ser de natureza diferente para homens e mulheres. Para os primeiros, liga-se ao sucesso pessoalna carreira enquanto que para as segundas, relaciona-se a condies desfavorveis de trabalho.

    Serenidade Distanciamento afetivo (25-35 anos): compreende fundamentalmente umestado de esprito. A serenidade possibilitada pela menor vulnerabilidade ao julgamento dos outros(alunos, colegas, superiores), devido ao maior equilbrio entre o eu ideal e o real. O distanciamentoafetivo em face dos alunos pode estar nas diferenas de gerao entre os professores e seus alunos.Como diz Ortega y Gasset (1970), cada gerao apresenta convices, valores e expectativas diferen-tes sobre o mundo e sobre si mesma.

    Conservadorismo (25-35 anos): a temtica paralela serenidade/distanciamento afetivo.Envolve um engessamento pessoal e profissional, no sentido de maior resistncia inovao, ou seja,dificuldade em mudar e aceitar a mudana dos outros, seja em termos de alunos, colegas ou doprprio sistema. Tal posicionamento propcio s lamentaes, principalmente em termos de nostalgiado passado.

    Desinvestimento (35-40 anos): nesta fase, os professores passam a libertar-se progressiva-mente do investimento feito no trabalho pedaggico, preparando-se para encerrar a carreira. Esteafastamento pessoal do horizonte docente pode ser sereno ou amargo, dependendo da histria de vidapessoal e profissional do professor.

    Cabe destacar que o modelo de Huberman ultrapassa os anos da trajetria profissional dosprofessores universitrios brasileiros que, pela legislao anterior, podiam aposentar-se aps 25 anosde carreira (sexo feminino) e 30 anos (sexo masculino) o que, na legislao atual foi estendido respec-tivamente para 30 e 35 anos. Contudo, no contexto universitrio, os professores com maior titulao

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    e engajados em Programa de Ps-Graduao, mesmo aps a aposentadoria, continuam atuando emsua prpria instituio ou em novos contextos institucionais, mantendo atividades de ensino, orienta-o e pesquisa, prolongando, assim, sua permanncia no espao acadmico e aproximando-se dosanos de carreira apresentados por Huberman.

    Neste sentido, Mizukami (1996), em um estudo realizado com professoras aposentadas,visando rastear suas trajetrias profissionais, aponta que o desinvestimento, constatado por Huberman,no fez parte do percurso destas docentes, uma vez que todas investiram em novas atividades pedag-gicas. Contudo, importante salientar a inexistncia de estudos sistemticos, no Brasil, sobre o ciclode vida de professores universitrios, o que demonstra uma lacuna de pesquisa nesta rea.

    Com relao aos professores universitrios, a trajetria profissional contemplada por Riegel(1979) em termos de carreira acadmica. Esta descrita atravs de cinco nveis, dos quais serosalientados os aspectos mais pertinentes. Assim tem-se:

    Nvel I: alonga-se dos 20 aos 25 anos e corresponde ao perodo de tempo em que as basesda carreira acadmica so assentadas, envolvendo os anos de formao universitria e aquelas aps asua concluso. Na viso do autor, este nvel decisivo porque, ao longo de seu percurso, que seforma a imagem filosfico-cientfica de uma nova gerao de acadmicos, dando, assim, origem auma orientao paradigmtica inicial. Esta alcanada pelos futuros professores sem que estes tenhampassado por um profundo processo de estudo, reflexo e questionamento. Contudo, apesar de seucarter relativamente superficial, servir de base para uma nova orientao paradigmtica, mais cons-ciente e consistente em termos de elaborao pessoal, que poder surgir nos anos vindouros;

    Nvel II: compreende dos 25 aos 35 anos, fase em que os professores, por estarem inician-do sua carreira, muitas vezes precisam engajar-se em atividades de pesquisa e de ensino, cuja temticanem sempre fecha com seus interesses paradigmticos. Entretanto, atravs do ensino, da pesquisa e daapresentao de trabalhos que eles tentaro divulgar sua prpria orientao em confrontao com asexistentes. Contudo, para Riegel, neste nvel, normalmente, os docentes ainda no propem umaorientao, mas a pressupem. Logo, eles so mais seguidores do que iniciadores de uma orientaoparadigmtica;

    Nvel III: abrange dos 30 aos 35 anos, correspondendo ao perodo em que os docentes jse estabeleceram na carreira, atuando como professores efetivos e podendo dedicar-se ao estudo detemas que fecham com seu campo de especializao. Entretanto, apesar de publicarem vrios traba-lhos explicando sua orientao, nem sempre recebem a ateno que esperavam do meio acadmico.Em termos de pesquisa, adquirem maior autonomia, recebendo auxlio econmico e podendo contarcom um pequeno grupo de trabalho no qual constam estudantes, assistentes e candidatos a doutora-do. Para Riegel, estes so os anos mais efetivos da carreira, durante os quais o professor tem a oportu-nidade de propor e explicar sua prpria orientao paradigmtica;

    Nvel IV: vai dos 35 aos 50 anos, englobando os anos em que os professores esto firme-mente estabelecidos em sua carreira, ou seja, so professores plenos, tm laboratrios e temas depesquisa prprios e so nacionalmente conhecidos, sendo freqentemente convidados para falar emencontros cientficos. Continuam fazendo conferncias em seminrios avanados e lecionando emclasses de graduao, porque estas atividades lhes ajudam na elaborao de textos sobre tpicos de suaespecializao. exatamente atravs de livros-texto que seus temas cientficos tornam-se aceitos econfirmados pela comunidade acadmica;

    Nvel V: abrange dos 50 aos 65 anos, correspondendo ao final da carreira. o perodo emque o professor passa a dedicar mais tempo aos encargos administrativos em detrimento do trabalhode pesquisa e de ensino. Pouco interage com estudantes e, mesmo com seus assistentes, mantmcontato atravs de intermedirios. Passa a ocupar cargos de chefia, seja na universidade, seja em orga-nizaes profissionais. Em termos de produo, dedica-se elaborao de captulos de livrosespecializados e a preparar novas edies de seus textos. Seu status e papel continuam inalterados atsua aposentadoria. Em relao a esta ltima, Riegel considera que o docente no to afetado quantoos profissionais de outras carreiras, porque ele pode continuar atuando e produzindo, tanto em ter-mos quantitativos (nmero de trabalhos) quanto qualitativos (aperfeioamento e aprofundamentodos conhecimentos elaborados). Entretanto, no se pode esquecer que este profissional, mesmo con-tinuando engajado no trabalho que desenvolveu ao longo de sua carreira, afetado pela mesma se-qncia de eventos prprios velhice.

    PROFESSOR UNIVERSIT`RIO NO CONTEXTO DE SUAS TRAJETRIAS COMO PESSOA E PROFISSIONAL

  • PROFESSOR DO ENSINO SUPERIOR: IDENTIDADE, DOCNCIA E FORMAO30

    As progresses da carreira acadmica, propostas por Riegel, distanciam- se, em muitos as-pectos, da percorrida por professores brasileiros, pois o percurso destes abarca nveis e condiesprprias cultura universitria nacional. Por exemplo, com respeito ao nvel II de Riegel, Isaia (1992)constatou que os professores da instituio estudada, mesmo que em termos de idade e de progressofuncional, estivessem prximos a nveis posteriores da escala riegeliana, continuavam responsveis pordisciplinas que muitas vezes no contemplavam suas temticas de pesquisa, levando a que poucosutilizassem sua produo pessoal nas aulas que ministravam. No mesmo estudo, a autora pode cons-tatar que, em relao ao nvel V de Riegel, os docentes no se distanciavam das atividades de ensinoe de orientao de pesquisa, sendo que os cargos de chefia podiam ser ocupados desde os primeirosnveis da carreira. Contudo, em termos de expectativas, os professores em final de carreira demonstra-ram o desejo de se dedicar mais produo acadmica do que docncia.

    Refazendo a tecitura do professor e suas trajetrias

    Depois de um giro terico sobre a questo das trajetrias de vida dos professores, instaura-se como necessrio desvelar o horizonte das reais dificuldades que estes sujeitos enfrentam ao longo dacarreira pedaggica, acrescidas dos percalos inerentes ao percurso pessoal.

    Cabe aqui situar o professor universitrio brasileiro e mais especificamente o de licenciatura,resgatando as questes relativas destinao de sua profissionalizao e quais as condies concretasque enfrenta para realiz-la.

    Os contextos social, cultural, poltico e educacional aos quais se atrela sua constituio comoprofissional da educao, permitem entend-la em uma flagrante crise, tanto em termos de expectati-vas e valorizao social, condies formativas iniciais e continuadas, respaldo econmico, quantoreconhecimento de uma identidade coesa e autntica.

    As trajetrias pessoal e profissional dos professores circunscrevem-se a um cenrio em queaparecem como fomentadores da crise dos cursos de licenciatura, quanto sua vocao de formardocentes para o ensino bsico e mdio, os seguintes indicadores:

    precria formao inicial, bem como futura recapacitao; baixo rendimento escolar apresentado pelos alunos do sistema de ensino fundamental e

    mdio; desprestgio socioprofissional dos docentes do ensino fundamental e mdio, acarretando o

    crescente desinteresse pelos cursos de licenciatura; fato de o professor (de 5 a 8 srie do fundamental e de todo o ensino mdio) atender a

    vrias escolas simultaneamente, no podendo identificar-se com nenhuma e muito menos com seuscursos;

    lugar pouco privilegiado que as licenciaturas ocupam nas polticas das universidades,frente aos demais cursos;

    distanciamento entre formao inicial oferecida e a realidade escolar a ser empregada(Gatti, 1992, 1997; Weber, 1996).

    Alm dos indicadores acima apresentados de cunho contextual, considera-se indispensvel areferncia a indicadores de carter constitutivo ou estrutural, responsveis por essa crise. Tais indica-dores circunscrevem-se polmica sobre o tipo de profissionais que as licenciaturas devem formar, ouseja: especialistas em reas especficas do conhecimento; professores voltados para a traduo dosconhecimentos de sua rea de conhecimento para o ensino; profissionais integrando simultaneamentea funo de especialistas e professores.

    Mazzotti (1993) delineia com clareza a disputa travada sobre a destinao dos cursos delicenciatura, mostrando que essa envolve racionalidades divergentes em termos pragmticos e que,conseqentemente, seria necessrio aos cursos de licenciatura o redimensionamento de sua voca-o, sob a orientao da lgica voltada para a formao do es