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FACULDADE CATÓLICA DE UBERLÂNDIA EDVALDO SANT´ ANA LOURENÇO COMPREENSÃO, SABER NECESSÁRIO A EDUCAÇÃO NO PRESENTE E NO FUTURO: desafios e perspectivas em Edgar Morin Uberlândia 2012

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FACULDADE CATÓLICA DE UBERLÂNDIA

EDVALDO SANT´ ANA LOURENÇO

COMPREENSÃO, SABER NECESSÁRIO A EDUCAÇÃO

NO PRESENTE E NO FUTURO: desafios e perspectivas em Edgar Morin

Uberlândia

2012

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EDVALDO SANT´ ANA LOURENÇO

COMPREENSÃO, SABER NECESSÁRIO À EDUCAÇÃO

NO PRESENTE E NO FUTURO: desafios e perspectivas em Edgar Morin

Trabalho de Conclusão de Curso (monografia)

apresentado ao Curso de Filosofia da Faculdade

Católica de Uberlândia como requisito parcial para a

obtenção do grau de bacharel em Filosofia.

Orientador: Prof. Ms. Manoel Messias de Oliveira

Uberlândia

2012

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EDVALDO SANT´ANA LOURENÇO

COMPREENSÃO, SABER NECESSÁRIO À EDUCAÇÃO NO PRESENTE E NO

FUTURO: desafios e perspectivas em Edgar Morin

Trabalho de Conclusão de Curso (monografia)

apresentado ao Curso de Filosofia da Faculdade

Católica de Uberlândia como requisito parcial para a

obtenção do grau de bacharel em Filosofia.

Orientador: Prof. Ms. Manoel Messias de Oliveira

Banca Examinadora

Prof. Ms. Manoel Messias de Oliveira

Orientador / FCU

Prof. Ms. Sandra Olades Martins Venturelli

Docente / FCU

Uberlândia, 21 de novembro de 2012

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A meus familiares, amigos e todos que acreditam que a educação pode ser um

caminho para se construir o presente e um futuro mais humano e compreensivo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pelo dom da vida, e a todos que contribuíram e colaboraram para

que o sonho de um curso acadêmico fosse possível.

Agradeço a meus pais, senhor Aparecido Lourenço e dona Maria Sant`Ana Lourenço,

por me ter dado a vida e a educação que me trouxe a este momento sublime, que é a

conclusão da graduação em Filosofia e meus queridos irmãos Edirlene, Edimara, Luciana,

Luciele e Edelson, pela força, incentivo e confiança.

Aos Padres e Religiosos da Congregação das Escolas de Caridade que, por vários

anos, acompanharam-me e prestaram todo auxílio necessário na formação para que me torna-

se uma pessoa melhor, especialmente ao Padre João Pedro pelo testemunho de vida, que me

ensinou a viver com mais intensidade e alegria.

Aos professores pelo esforço, dedicação e carinho, especialmente Manoel Messias

que, com grande disponibilidade, auxiliou-me na elaboração deste trabalho, a professora Vani

Terezinha Rezende, e Sandra Olades Martins Ventureli pelas provocações à reflexão em

filosofia e para a elaboração deste trabalho que em muito contribuiu para meu

desenvolvimento pessoal e intelectual.

Aos colegas graduandos em Filosofia pelo companheirismo e amizade, partilha e

construção de conhecimento que muito me enriqueceu. Gratidão a todos os colaboradores,

facilitadores e instigadores do conhecimento.

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Somos seres infantis, neuróticos, delirantes e também racionais. Tudo isso constitui

o estofo propriamente humano. O ser humano é um ser racional e irracional, capaz

de medida e de desmedida; sujeito de afetividade intensa e instável. Sorri, ri, chora,

mas sabe também conhecer com objetividade; é sério e calculista, mas também

ansioso, angustiado, gozador, ébrio, extático; é um ser de violência e de ternura, de

amor e de ódio; é um ser invadido pelo imaginário e pode reconhecer o real, que é

consciente da morte, mas que não pode crer nela; que secreta o mito e a magia, mas

também a ciência e a filosofia; que é possuído pelos deuses e pelas Idéias, mas que

duvida dos deuses e critica as Idéias; nutre-se dos conhecimentos comprovados, mas

também de ilusões e de quimeras.

(Edgar Morin, 2003a, p. 59)

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RESUMO

O objetivo deste trabalho monográfico é apresentar a “compreensão, como saber necessário a

educação no presente e no futuro”, bem como a sua interrelação, que perpassa toda e qualquer

perspectiva educacional reducionista e fragmentária. A partir de Edgar Morim, se discute as

dimensões mais pertinentes da vida humana, como: sabedoria, loucura, trabalho, ludicidade,

empiria, economia e consumismo, etc. Dimensões que fazem parte de situações corriqueiras

da vida, que são estimuladas a todo instante pela vida moderna e que não são consideradas

pertinentes para povoar e compor o ambiente escolar na preparação educacional do individuo

para que se torne sujeito de sua própria história neste século dos saberes e da complexidade.

Para Morin, a contemporaneidade trouxe os novos arranjos educacionais ao rol das

discussões, a cerca das políticas educacionais, que são frutos de “nosso tempo”, onde a

correria prevalece e se terceiriza a educação necessária por formar a pessoa para a vida adulta

compreensiva. A escola é este espaço de complexidade e laboratório da compreensão, onde

também se dá educação, pois, por meio da aprendizagem formativa, aos poucos se concretiza

sob a infinidade de métodos intermediada por meio da interdisciplinaridade e

transdiciplinaridade. Em meio a essas problemáticas educacionais, uma solução pertinente é o

desenvolvimento das potencialidades, aptidões e talentos humanos em meio à complexidade

que envolve a educação. Faz-se necessário repensar o que foi pensado, discutir as idéias de

outrora e trazer para o centro dos espaços educacionais o diálogo, o respeito, o outro, a fim de

conscientizar os indivíduos sobre os benefícios sociais e culturais das relações humanas

pautadas pela ética da compreensão. A ética da compreensão se propõe a acolher sem

julgamento e avaliar quais são as reais causas das situações. A empatia, a simpatia, a

identificação, a projeção e a generosidade fazem parte do processo de compreensão do outro,

como outro a partir de uma justificativa intersubjetiva. O outro, deve ser respeitado como

outro, porque evoca a alteridade e porque revela a própria identidade humana, com quem

somos convidados a conviver desenvolvendo-se na realidade social que nos cerca e

construindo uma sociedade mais humana, compreensiva e feliz.

PALAVRAS-CHAVE: Compreensão. Complexidade. Educação. Pensar.

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ABSTRACT

The purpose of this monograph is to present " comprehension, knowing how necessary

education now and in the future," as well as their interrelationship, which permeates any

educational perspective fragmentary and reductionist. From Edgar Morin, discussing the most

relevant dimensions of human life, such as: sapience, madness, work, playfulness,

empiricism, economics and consumerism, etc… Dimensions that are part of everyday life

situations, which are stimulated all the time by modern life and which are not considered

relevant to people and make the school environment in the educational preparation of the

individual to become subjects of their own history in this century of knowledge and

complexity. To Morin, the contemporary new arrangements brought the educational role in

discussions about educational policies, which are the fruits of "our time", where the rush

prevails and outsources the education necessary for a person to form a comprehensive

adulthood. The school is this complexity and laboratory space of understanding, which also

gives education because, through formative learning gradually materializes under the plethora

of methods intermediated through interdisciplinarity and transdisciplinarity. Amid these

educational issues, an appropriate solution is the development of capabilities, skills and

talents amidst the complexity involved in education. It is necessary to rethink what was

thought, discuss the ideas of the past and bring to the center of the educational spaces for

dialogue, respect each other and different in order to educate individuals about the benefits of

social and cultural human relationships guided understanding of ethics. The ethics of

understanding aims to accommodate without trial and evaluate what are the real causes of

situations. Empathy, sympathy, identification, projection and generosity are part of the

process of understanding the other as another justification from an intersubjective. The other,

must be respected as the other, because it evokes otherness and because it reveals the very

human identity, to whom and with whom we are invited to live with developing the social

reality around us and building a more humane society, understanding and happy.

KEY-WORDS: Comprehension. Complexity. Education. To think.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 10

2 COMPLEXIDADE E INCOMPREENSÃO....................................................... 13

2. 1 A COMPLEXIDADE QUE COMPORTA A PERTINÊNCIA DO CONHECIMENTO.... 13

2.2 A CEGUEIRA, BARBÁRIE E A FORMAÇÃO DO SUJEITO INCOMPREENDIDO...... 16

3 CABEÇA BEM FEITA PARA UMA VIVÊNCIA COMPREENSIVA............. 19

3.1 REPENSANDO O PENSAMENTO....................................................................... 19

4 COMPREENSÃO DA DIFERENÇA PARA A ÉTICA DA

COMPREENSÃO...................................................................................................

21

4.1 BULLYNG E A ÉTICA DA COMPREENSÃO........................................................ 21

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 27

REFERÊNCIAS........................................................................................................ 30

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1 INTRODUÇÃO

Edgar Morin nasceu em 08 de julho de 1921, graduou-se em Economia Política,

História, Geografia, Direito Filosofia. É um dos mais arrojados defensores da incorporação

dos problemas cotidianos ao currículo escolar e a interligação dos saberes. Morin faz uma

crítica ao ensino fragmentado sem uma reforma do pensamento e afirma que o ser humano é

reducionista por natureza e, por isso, é preciso esforçar-se para compreender a complexidade

e combater a simplificação. Reformar o pensamento é essencial para se construir uma

sociedade pautada pela ética da compreensão.

A educação compreensiva é uma das propostas apresentada por Edgar Morin,

estudioso francês marginal1, que tem tradição de discutir grandes temas. Considerado pai da

teoria da complexidade, minuciosamente explicada em suas obras de sucesso sobre o Método,

onde defende a interligação de todos os conhecimentos, combate o reducionismo instalado em

nossa sociedade e valoriza o complexo.

A realidade histórica, social e complexa é fortemente marcada pelas constantes

transformações e incompreensão, assistimos a sobreposição de paradigmas e pressupostos

educacionais que se propõem pretensiosamente ser e dar respostas plausíveis e razoavelmente

fundadas, nos novos modelos pedagógicos e na tradição educacional, acerca dos elementos

fundamentais da educação que acompanham e inquietam o homem no processo de

significação de seu espaço, numa árdua construção cultural.

O campo educacional da compreensão é um leque de possibilidades no que tange as

inúmeras correntes pedagógico-filosóficas ao longo da história com o intuito de ser um

caminho, que vem ao encontro dos problemas educacionais pertinentes. Realmente as novas

correntes pedagógicas intituladas, interdisciplinar, multidisciplinar e transdisciplinar, são

modelos amplamente discutidos, questionados e problematizados como caminhos possíveis da

educação compreensiva, neste século de múltiplos saberes.

Educação compreensiva é o processo de internalização do conjunto de ensinamentos

absorvido pelo individuo numa contínua relação dialética que se dá na “realidade do ser

educando e do ser educando educador” (LOURENÇO, 2012, p. 68). Educar pode ser

compreendido como uma vastíssima gama de maneiras e possibilidades e de deixar

postergados as técnicas, hábitos e comportamentos de um determinado grupo, como herança e

1Marginal - Que vive à margem do meio social e cultural em que deveria estar integrado, desconsiderado como

um autor de relevância e mais conhecido na América Latina do que na França, seu próprio país.

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até mesmo como condição elementar para a sobrevivência e continuação da espécie

(LIBÂNIO, 2002).

O termo educação possui uma grande variedade de possibilidades nas mais diversas

áreas do saber. Está sempre em voga e não passa despercebido nos discursos políticos, e toda

iniciativa, seja ela de cunho social ou privado, preocupando-se com o desenvolvimento

integral do ser humano.

Educar é uma necessidade real que precisa ser compreendida e assumida como ou

enquanto missão por todos e com maior responsabilidade pelos gestores escolares, pais e

educadores, onde quer que estejam, objetivando a transmissão de cultura e sobrevivência na

manutenção da própria espécie, num processo educacional cumulativo que protege e promove

o indivíduo.

Este trabalho pretende apresentar a educação compreensiva, a partir da perspectiva

educacional de Edgar Morin, em suas várias obras sobre a educação, mas, sobretudo, Os sete

saberes necessários a educação do futuro, o capítulo 6º, no qual o autor trata do saber

“Ensinar a Compreensão”. Será discutido a “Compreensão, saber necessário a educação do

presente e do futuro” a partir da complexidade e interligação dos saberes que corrobora para a

formação da cabeça bem feita e a partir de então discutir a compreensão objetiva e subjetiva

para construção de uma ética da compreensão. A compreensão é conditio sine qua non para

uma vivencia respeitosa e amistosa onde é possível a alteridade e a diferença.

As consequências do modelo educacional competitivo atual que a princípio, parece ser

o mais indicado e que traz melhores resultados, possui muitas falhas e nuances perigosas. Este

trabalho se propõe a discutir abertamente quais são as reais causas da incompreensão que

geram a xenofobia, preconceito e bulling e como é possível viver e ensinar a

compreensibilidade nos espaços educacionais no “presente e no futuro”.

A educação é o caminho que pode contribuir para que o homem se compreenda a si

mesmo e aprenda a conviver com o signo da diferença. Nenhum dedo de nossa mão é igual,

os filhos dos mesmos pais são totalmente diferentes, a cada hora já não somos mais como

éramos, as células realizam em nós uma constante transformação e torna-nos diferentes em

todos os instantes. Então, porque o diferente causa tanto estranhamento a ponto de minar o

outro psicologicamente e moralmente através de brincadeiras e “piadinhas” maldosas no

intuito de afirmar a própria diferença particular e se impor como melhor e superior. O que

temos é paradoxal, pois se por um lado afirma-se a diferença pessoal, porque negar a

diferença do outro? Será que não se aceita o diferente porque se vê nele aquilo que se nega em

si?

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A incompreensão está em constante processo de crescimento alimentada em grande

parte pelos meios de comunicação que mesmo atravessando o planeta no intuito de diminuir

os espaços e aproximar as pessoas, é também usada para disseminar a intolerância

A situação é paradoxal sobre a nossa Terra. As interdependências multiplicaram-se.

A consciência de ser solidários com a vida e a morte, de agora em diante, une os

humanos uns aos outros. A comunicação triunfa, o planeta é atravessado por redes,

fax, telefones celulares, modems, Internet. Entretanto, ainda a compreensão

permanece geral. Sem dúvida, há importantes e múltiplos progressos da

compreensão, mas o avanço da incompreensão parece ainda maior. (MORIN,

2003a, p. 93).

De um lado estão as parafernálias da comunicação envolta pela mutabilidade

tecnológica que facilita a comunicação, interpretação e compreensão da realidade complexa,

porém, acompanhamos por meio da mídia avanços da incompreensão recheados de requintes

de maldades que preconizam a barbárie de que o homem é capaz. Para Morin, a informação

fria e gélida, não é o bastante para educar o sujeito na aprendizagem da compreensão é

preciso que haja interligação dos saberes e compromisso inter e transdisciplinar na formação

compreensiva de hominização do homem.

A educação do sujeito precisa ter comprometimento com a compreensibilidade e com

a vida, preparando-o para que possa ser um cidadão de bem que cumpra seus direitos e

deveres em harmonia entre “seus iguais” na construção de um mundo melhor. Entretanto, o

que se percebe é que o outro ao invés de evocar alteridade e respeito, torna-se vítima pelo

simples fato de ser diferente, para tal problemática Edgar Morin, evoca iminentimente a ética

da compreensão.

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2 COMPLEXIDADE E INCOMPREENSÃO

A complexidade2 é neologismo que tem desdobramento importantíssimo para Edgar

Morin, compreendida a partir de seu sentido etimológico, complexus, e significa o que foi

tecido junto. Complexo não é somente o que é difícil de ser entendido, mas elementos que são

inseparáveis na constituição de um todo como o afetivo, o mitológico, o econômico, o

político, o psicológico que fazem parte da constituinte multidimensional do humano e onde há

uma interdependência, inter-interação entre o objeto de conhecimento e seu contexto, o todo e

as partes, as partes e o todo e as partes entre si (MORIN, 2003a, p. 38).

A complexidade favorece a compreensão, no sentido em que oferece condições para o

entendimento da realidade. A construção do conhecimento pertinente de uma realidade social

complexa mais humana, onde se comporta as inúmeras formas de diferenças e manifestações,

que diminui o risco da cegueira, da incompreensão, possibilita condições para se formatar

uma nova visão da realidade e transformação social da mesma.

2.1 A COMPLEXIDADE QUE COMPORTA A PERTINÊNCIA DO CONHECIMENTO

A complexidade é a junção da unidade e da multiplicidade e no campo dos saberes

favorece a formação integradora do sujeito. O conhecimento pertinente comporta a

complexidade no sentido em que a integra no rol das discussões e políticas educativas das

variadas maneiras e formas de compreensão de uma mesma informação.

Por exemplo, a economia, que tem como objeto a escassez e por meio dos números

estatísticos frios, não está inseparável das necessidades e das paixões humanas, pois fazem

uso de instrumentos e conhecimentos específicos e complexos como ferramentas da

Estatística para mensurar, quantificar os desejos de compra das pessoas, que determina os

investimentos e estratégias que trarão retornos financeiros, e que controlam a inflação e

determina a expansão ou a restrição na política econômica de um determinado país.

Além desses saberes complexos, o autor propõe que sejam integrados os saberes que

advêm das artes, pois, a literatura, a poesia e as artes não são apenas meios de expressões

estéticas, mas também meios de conhecimento. É preciso que o homem se olhe interiormente,

para se perceber como sujeito ativo de sua história. Essa é uma tarefa complexa que exige

2A complexidade corresponde à multiplicidade, ao entrelaçamento e à interação contínua da infinidade de

sistemas e de fenômenos que compõem o mundo, as sociedades humanas, a pessoa e todos os seres vivos. Não é

possível reduzir a complexidade a explicações simplistas, a regras rígidas, a fórmulas simplificadoras ou a

esquemas fechados.

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esforço pessoal de cada indivíduo e em meio às dificuldades corriqueiras que nos encerram,

somos convidados a progredir no conhecimento pessoal nesta realidade complexa de

múltiplos saberes. Em Os sete saberes necessários à educação do futuro, na qual faz

indicações para a educação, Morin (2003a, p. 52) afirma:

O humano é um ser a um só tempo plenamente biológico e plenamente cultural, que

traz em si a unidualidade original. É super e hipervivente: desenvolveu de modo

surpreendente as potencialidades da vida. Exprime de maneira hipertrofiada as

qualidades egocêntricas e altruístas do indivíduo, alcança paroxismos de vida em

êxtases e na embriaguês, ferve de ardores orgiásticos e orgásticos, e é nesta

hipervitalidade que o Homo Sapiens é também o Homo Demens. O homem é,

portanto, um ser plenamente biológico, mas, se não dispusesse plenamente da

cultura, seria um primata do mais baixo nível.

O conhecimento pertinente é complexo, pois está arraigado a multiplicidade das

dimensões humanas e é o humano que a partir de sua capacidade de representação que

significa e compreende culturalmente seu meio e age conscientemente para melhorá-lo.

A pertinência do conhecimento comporta o contexto em que se dá a significação e o

sentido da existência humana, o global que é o conjunto das diversas partes ligadas a ele de

modo inter-retroativo. A educação compreensiva comporta em seu bojo o multidimensional e

o complexo, realidades que tem o objetivo de reduzir as antinomias e reducionismos, as

disjunções hiperespecializadas3, que inviabiliza a apreensão do que é tecido junto, e,

sobretudo da redução unilateral e falsa racionalidade que acaba por eliminar elementos

humanos do homem, isto é paixões, emoções, dores e alegrias.

A inteligência parcelada, compartimentada, mecanicista, disjuntiva e reducionista

rompe o complexo do mundo em fragmentos disjuntivos, fraciona os problemas,

separa o que está unido, torna unidimensional o multidimensional. É uma grande

inteligência que acaba por ser normalmente cega. Destrói no embrião as

possibilidades de compreensão e de reflexão, reduz as possibilidades de julgamento

corretivo ou da visão em longo prazo. (MORIN, 2003a, 43).

A educação do presente e do futuro precisa possibilitar que os educandos tenham

contato com o conhecimento em sua maior amplitude, complexidade, favorecendo o

desenvolvimento do sujeito na multidimensionalidade, formando-o para a integralidade e a

compreensão e jamais parcelada e reducionista.

Jacques Delors, ao fazer sua abordagem educacional na elaboração do relatório

Educação: Um tesouro a descobrir, para a UNESCO, trouxe à tona a discussão sobre os

3 Hiperespecializadas são especializações disciplinares que se fecham sobre si mesmas, sem permitir sua

integração na problemática global ou na concepção de conjunto do objeto do qual ela só considera um aspecto ou

uma parte.

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quatro saberes que perpassam toda a vida do sujeito em suas várias dimensões para assumir as

responsabilidades da vida adulta com determinação e responsabilidade, colaborando para a

disseminação do conhecimento e autopromoção do mesmo.

A educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa, espírito, corpo,

inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal e

espiritualidade. Todo o ser humano deve ser preparado, especialmente graças a

educação que se recebe na juventude, para elaborar pensamentos autônomos e

críticos e para formular os seus próprios juízos de valor, de modo a poder decidir,

por si mesmo, como agir nas diferentes circunstancias da vida. (DELORS, 2003, p.

97).

O conhecimento é perfilado em sua constante interação e relação que liga e religa

saberes, que significa e re-significa a cultura com o intuito de construir uma realidade que

faça sentido e tenha ressonância na vida das pessoas. A educação compreensiva precisa fazer

sentido na vida dos educandos, educadores e familiares e contribuir para o desenvolvimento

total do indivíduo que compreende e entende o outro, como outro que contribui para a

formação humana4 do homem, tornando-o sensível para absorver todas as formas de

conhecimentos e formação que agrega e o torna melhor como pessoa.

A proposta educativa de Edgar Morin procura contemplar todo o sujeito em suas

múltiplas fases do desenvolvimento humano, com o intuito de que o indivíduo possa crescer e

desenvolver todas as suas potencialidades respeitando os limites da liberdade do outro, em um

processo que constrói o conhecimento e estabelece novas fronteiras epistemológicas.

4 O processo de hominização do homem se dá a partir da tripé: individuo, espécie e sociedade. O individuo em

função de sua espécie é homem, mas é na sociedade, onde se estabelece as relações é que o homem vai se

tornando humano.

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2.2 A CEGUEIRA, BARBÁRIE E FORMAÇÃO CULTURAL DO SUJEITO INCOMPREENDIDO

Todo conhecimento comporta o risco do erro e da ilusão (MORIN, 2003a,). Essa

afirmativa de Edgar Morin no primeiro capítulo do livro Os sete saberes necessários a

educação do futuro, remete a vigilância epistemológica, pois ignorar este sinal seria

retrógrado e desfavorável ao conhecimento pragmático que é exaltado por sua hegemonia

metodológica. Os erros mentais, intelectuais, metodológicos e das cegueiras pragmáticas

precisam de especial atenção. Os erros mentais estão presentes em nossa memória o tempo

todo e pode nos deixar a mercê de falhas e sujeitos a erros e ilusões. Por exemplo, existem

falsas lembranças que juramos ter vividos e não passam de confusões mentais que nos

colocam em dúvida.

A elaboração do conhecimento está construída em frágeis argumentações e

impregnadas de racionalização, concepções deterministas, materialistas, espiritualistas e

estruturalistas que podem trazer o espectro da barbárie.

É na sociedade, nos grupos sociais que o homem tem a possibilidade de desenvolver a

prática da educação compreensiva justificada pela ética do dever, vivenciando assim a

maturidade da razão sem a necessidade de terceiros e regras que determinem o que se deve ou

não fazer, mas vive-se por justificação do imperativo categórico que educa o sujeito para a

compreensão e vivência com o outro sem preconceitos causados pelo signo de diferença.

A cultura é constituída pelo conjunto dos saberes, fazeres, normas, proibições,

estratégias, crenças, idéias, valores, mitos, que se transmite de geração em geração,

se reproduz em cada indivíduo, controla a existência da sociedade e mantém a

complexidade psicológica e social. (MORIN, 2003a, p 56).

A cultura, espaço de conhecimento, é o laboratório onde o sujeito pratica a vivencia

com o diferente e compreende quais as ideologias e interesses que as fomenta. Para que se

possa continuar a desenvolver o individuo para a educação compreensiva, se faz necessário

proporcionar que os espaços multiculturais dos saberes tenham lugar para a pluralidade e para

o diálogo amistoso, já que o homem é uma resultante complexa e multidimensional que

ultrapassa qualquer conceito.

Em nossa realidade, como antídoto para a incompreensão, se faz necessário pensar um

caminho educacional que leve em conta todas as dimensões que compreende o sujeito em sua

maior amplitude, pois reduzir o humano é correr um grande risco de cindir e tolher as

potencialidades naturais inerentes ao sujeito.

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Como afirma Kant, que “quem não tem cultura é um bruto e quem não tem educação é

um selvagem” (1996, p. 16), então a racionalização ao tentar impor exclusivamente os

processos racionais para explicar a realidade acaba por simplificá-los, limitando e

fragmentando a vida humana, impedindo a racionalidade, começam a aparecer os riscos e

centelhas da barbárie.

Mas optar pela racionalização é condicionar o humano ao determinismo pragmático

impedindo o florescer de suas potencialidades, pois o homem é um conjunto complexo de

paradoxos e antíteses que coexistem simultaneamente e precisa ser respeitado e compreendido

como tal, afirma Morin (2003a, p. 58).

O século XXI deverá abandonar a visão unilateral que define o ser humano pela

racionalidade (Homo sapiens), pela técnica (Homo faber), pelas atividades utilitárias

(Homo economicus), pelas necessidades obrigatórias (Homo prosaicus). O ser

humano é complexo e traz em si, de modo bipolarizado, caracteres antagonistas:

Sapiens e demens (sábio e louco)

Faber e ludens (trabalhador e lúdico)

Empiricus e imaginarius (empírico e imaginário)

Economicus e consumans (econômico e consumista)

Prosaicus e poeticus (prosaico e poético).

A compreensão precisa estabelecer diálogo entre as dimensões humanas, o sábio

precisa compreender as razões do louco, o trabalhador a importância do lúdico, o empírico

aceitar o imaginário como expressão humana legítima, o econômico conviver com o

consumista, o prosaico permitir o poético em uma adida relação harmônica que se completam

e coexistam no palco do espetáculo da vida complexa.

Um bom exemplo de desequilíbrio destas dimensões é apontado por Morin na barbárie

dos campos de concentração, que foi exacerbado a racionalização e instrumentalizadas todas

as potencialidades humanas em nome de um objetivo bildre e torpe. “O campo de

concentração tornou-se cada vez mais racional quando os métodos industriais foram aplicados

à morte, a racionalidade instrumental culmina em Auschwitz”, ou seja, incompreensão e

intolerância instalada é barbárie certa (MORIN, 1986, p. 271).

Theodor Adorno, importante filósofo, aponta como uma das principais causas para a

ocorrência das barbáries, como a de Auschwitz, a identificação cega com o poder coletivo que

carrega um arsenal de justificativas racionalizadoras. Trata-se da própria razão

instrumentalizada e total falta de compreensão que gera a cegueira que evolui para a bárbárie.

Mas aquilo que gera Auschwitz, os tipos característicos ao mundo de Auschwitz,

constituem presumivelmente algo de novo. Por um lado, eles representam a

identificação cega ao coletivo. Por outro lado, são talhados para manipular massas,

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tais como os Himmler, Höss, Eichman. Considero que o mais importante para

enfrentar o perigo de que tudo se repita é contrapor-se ao poder cego de todos os

coletivos. (ADORNO, 1995, p. 127).

Por tudo o que já vivenciamos e evoluímos é válido aprofundar a concepção de razão

aberta ou de racionalidade. É válido pensar a concepção de razão crítica e autocrítica da

complexidade humana. Pensar a educação compreensiva no presente e no futuro se faz

necessário aprofundar a partir do diálogo o conjunto dos esforços dos educandos, educadores

e familiares com o objetivo comum de encontrar caminhos que possam auxiliar no seu

desenvolvimento e concretização de uma educação que prepara o sujeito para viver a vida e

suas circunstâncias.

A educação compreensiva quer construir um caminho para a superação da barbárie,

minimização da cegueira e formação cultural do sujeito para a compreensão autônoma e

emancipadora, objetiva e subjetiva, onde há espaço para o outro com sua alteridade e

diferença.

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3 CABEÇA BEM FEITA PARA UMA VIVÊNCIA COMPREENSIVA

Vivemos no século dos saberes e a todo instante somos bombardeados e cercados por

milhões de informações, com o tempo ficamos tão imbuídos deste espírito informacional que

nem paramos para pensar como somos capazes de absorver tanto conteúdo diariamente, muito

menos pensamos sobre a qualidade das informações que a cada dia mais estão carregadas de

ideologias e mensagens subliminares. Temos jornal, televisão, rádio, internet e redes sociais,

outdoors, placas, rótulos de alimentos e as informações próprias de quem trabalha e as

informações escolares e tantas outras que enchem nossa cabeça diariamente.

Para Morin, “uma cabeça bem feita” não corresponde a um acúmulo de informações e

muito menos a uma organização destas informações, mas sim uma capacidade de avaliar as

informações e fatos e “aptidão geral que permita interligar os saberes para dar sentido”

(MORIN, 2003b, p.21) a eles, assim questionando, religando e re-significando os saberes vai

se elaborando uma cabeça bem feita.

3.1 REPENSAR O PENSAMENTO

A cabeça bem feita então, é a capacidade de colocar em linha de frente da

epistemologia o espírito problematizador que interroga, questiona, reflete, analisa,

contextualiza, globaliza e interliga os saberes com o intuito de compreendê-lo em sua maior

amplitude. A compreensão favorece a construção do processo de repensar o pensamento, pois,

traz a clareza da complexidade, impedindo a mediocridade e a unilateralidade falseadas como

afirma Morin, (2003b, p. 25):

Tal pensamento torna-se, inevitavelmente, um pensamento do complexo, pois não

basta inscrever todas as coisas ou acontecimentos em um “quadro” ou uma

“perspectiva”. Trata-se de procurar sempre as relações e inter-retro-ações entre cada

fenômeno e seu contexto, as relações de reciprocidade todo/partes: (...) Trata-se, ao

mesmo tempo, de reconhecer a unidade dentro do diverso, o diverso dentro da

unidade; de reconhecer, por exemplo, a unidade humana em meio às diversidades

individuais e culturais, as diversidades individuais e culturais em meio à unidade

humana.

O pensamento que unifica o conhecimento e passa pela unidade e pela diversidade

precisa ser um pensamento criativo e que compreenda a diferença, a desigualdade, o outro tal

qual é e fomente o respeito e a tolerância. Repensar o pensamento é estabelecer uma nova

ordem onde se passa a ver a partir de outra perspectiva, outro prisma, estabelecendo um novo

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paradigma que traga maneiras diferentes e novas e não mais presa a moral estabelecida, mais

sim fundada na justificativa ética amparada pela racionalidade que tem o bem comum como

pano de fundo.

Edgar Morin estabelece a partir de Pascal, Voltaire, Juan de Mairena que “uma

educação para a cabeça bem feita, que acabe com a disjunção entre as duas culturas, daria

capacidade para se responder aos formidáveis desafios da globalidade e da complexidade no

quotidiano, social, política, nacional e mundial”. (MORIN 2003b, p. 33).

O termo compreensão é de suma importância e deveria ser discutido em nossas

escolas, pois a educação não pode ser compreendida sob o viés de um determinismo que a

reduz a um arsenal de metodologias e de instrumentos de aprendizagem que não leve em

conta a totalidade epistemológica por onde passe a educação como estabelece Bernard Charlot

ao afirmar que “nascer é ingressar em um mundo no qual se estará submetido à obrigação de

aprender. Ninguém pode escapar desta obrigação, pois o sujeito só pode „tornar-se‟

apropriando-se do mundo” (CHARLOT, 2000, p. 59), então não pode haver um modelo que

tem por pretensão abarcar o conhecimento com o intuito de formar uma cabeça bem feita. A

radicação do sujeito no mundo é marcada expressamente pela capacidade natural de absorver

conhecimento:

[...] independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais,

lingüísticas ou outras, crianças deficientes e bem dotadas, crianças que vivem nas

ruas e que trabalham crianças de populações distantes ou nômades, crianças de

minorias lingüísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos ou zonas

desfavorecidos ou marginalizados. (CHARLOT apud CARVALHO, 2004, p. 77).

Paulo Freire também problematiza a relação do homem com o mundo e a elaboração e

reelaboração do pensamento na absorção do conhecimento que vem em contraposição aos

pensamentos preestabelecidos diz que “o homem está no mundo e com o mundo. Se apenas

estivesse no mundo não haveria transcendência nem se obtivessem a si mesmo. Mas pode

observar-se, pode também distinguir entre um eu e um não eu” (FREIRE, 1979, p. 30), essa

capacidade de construção cria um conhecimento identitário.

Rousseau, que comunga da educação compreensiva, ao falar da formação educacional

natural de Emílio afirma que “Emílio será um cidadão do mundo, versátil e cosmopolita,

pronto para mudar, em casos de divergências entre a moral interior e as leis de um

determinado país” (apud Dozol, 2003, p. 58), onde o sujeito não deve ficar engessado pelos

sistemas, mas aberto as possibilidades para uma vivência compreensiva.

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3 COMPREENSÃO DA DIFERENÇA PARA UMA ÉTICA DA COMPREENSÃO

A incompreensão pode ser percebida nas escolas, praças, ruas, playgrounds, clubes e

na internet, que traz em si a intolerância, que são a porta de entrada para a raiva, ódio,

violência, preconceito e bullyng.

A incompreensão normalmente está acompanhada pelo fanatismo, dogmatismo,

insegurança e medo, frutos das relações predatórias estimuladas pelas famílias e reforçada nas

escolas que estão a serviço do sistema que têm na competição o método eficaz que separa os

melhores para ocupar os empregos mais cobiçados no país e assim garantir seu futuro. Porém,

as consequências deste modelo educacional que a princípio parece ser o mais indicado e que

mais traz resultados, possui muitas falhas e nuances perigosas.

A educação do sujeito precisa ter comprometimento com a compreensibilidade e com

a vida preparando-o para que possa ser um cidadão de bem que cumpra seus direitos e deveres

em harmonia entre “seus iguais” na construção de um mundo melhor. Entretanto o que se

percebe é que o outro ao invés de evocar a alteridade e respeito torna-se vítima pelo simples

fato de ser diferente, para tal problemática, Edgar Morim evoca iminentimente a ética da

compreensão.

3.1 BULLYNG E A ÉTICA DA COMPREENSÃO

A compreensão tornou-se um problema “crucial” para os humanos, afirma Morin ao

iniciar a exposição sobre como ensinar a compreensão (2003a, p. 93). Para que um problema

venha a ser resolvido a partir da complexidade precisa ser entendido esquematicamente e o

autor estabelece, que há uma dupla polarização da compreensão, a primeira é objetiva e passa

pela capacidade intelectual, ou seja, inteligibilidade na religação dos saberes e pela

explicação. A segunda, passa pelo conhecimento de indivíduo a indivíduo como indivíduo,

por exemplo, ao ver uma criança chorando, não vou compreendê-la por medir a quantidade de

salinidade em suas lágrimas, mas porque se busca nas memórias infantis, identifico-a comigo

e identifico-me com ela, então percebo o outro como sujeito que como num espelho revela em

si a mim mesmo num processo empático de identificação e projeção. (MORIN, 2003a, p, 95).

O advento da modernidade, a ampliação das redes sociais por meio da wide web worl5,

trouxe no bojo da peculiar “civilização”, um paradoxo imprevisível. Os meios de

5 Rede mundial de computadores.

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comunicação que surgiram da necessidade de minimizar os espaços e tornar o planeta uma

“aldeia global”, por meio da globalização das informações, que favoreceria a

intermundialização do comércio e o desenvolvimento de toda a humanidade, entretanto ainda

não atingiu o seu objetivo, pois convivemos com a violência e assistimos a vítimas fazer

novas vítimas numa relação predatória de total incompreensão e a mídia que poderia ser usada

para protagonizar campanhas preventivas e de conscientização, não faz, pois não há retorno

financeiro.

As redes sociais tornam-se ferramentas que ao invés de diminuir as distâncias, às

vezes separa os que estão juntos, inviabilizando a convivência social salutar e cheias de

possibilidades de relacionamentos interpessoais e torna-se um espaço profícuo para a

proliferação de guetos virtuais, grupos sociais reducionistas e fragmentários que agridem,

ofendem o diferente. Por vezes provocam o deslocamento do individuo de seu meio social e o

leva a construir suas relações no mundo virtual e não no mundo real.

O bullyng é um termo novo usado para falar de um problema antigo que fragiliza a

auto estima e pode trazer consequências trágicas como homicídios, suicídios e bullycídio6. As

políticas educacionais precisam investir em pesquisa para minimizar o sofrimento de tantas

crianças e adolescentes que são vítimas do desrespeito e agressão. A intolerância aos olhos de

muitos parecem brincadeiras e provocações normais, frutos dos conflitos próprios do

relacionamento interpessoal, porém o que se assiste é a progressão dessa violência covarde

(bullyng) a agressões verbais, assédio emocional, torturas e agressões físicas.

A educação compreensiva se propõe a dialogar com a interdisciplinaridade,

transdiciplinaridade e os inúmeros segmentos da educação para detectar quais são as reais

causas da evolução da incompreensão que gera sofrimento a tantas crianças e adolescentes

para propor um plano de ação eficiente, a fim de combater o bullyng que minimiza as

possibilidades humanas neste século dos múltiplos saberes.

Bullyng é o comportamento agressivo intencional que pode se expressar de diversas

maneiras (verbal, física, social e emocionalmente; em relacionamentos, pela internet

ou uma combinação de vários desses). É gerado pelo desequilíbrio de poder e

ocorrem repetidas vezes, durante um período de tempo. Surgem espontaneamente,

não como reações a provocações, e possui modalidades diversas (uma criança passa

a maltratar outras, um grupo de crianças se une para atacar uma terceira ou um

grupo ataca o outro). (CARPENTER e FERGUSON, 2011, p. 9).

6 Bullycídio é um termo (neologismo), aplicado a criança que comete suicídio para escapar dos ataques de seus

agressores, denominados bullies (agressores).

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O bullyng, gerador de intolerância e incompreensão parece ser um mal metamórfico ao

longo dos anos, que só muda de endereço e impede o desenvolvimento do homem em seu

processo de “hominização”, tornar-se pessoa humana. A educação preventiva também procura

preparar o sujeito para viver com qualidade e compreensibilidade e isso implica o cultivo do

elogio que impulsiona e encoraja o indivíduo a realçar as características positivas,

favorecendo assim seu desenvolvimento, emancipação e autonomia. “O elogio derrete a raiva

como gelo ao sol do meio dia e o incentiva o individuo a ir adiante” (CURY, 2003 p. 143).

Ser educador é ser promotor da vida e suas possibilidades estabelecendo pontes de

compreensão nos desertos do individualismo egocêntrico.

Como se percebe nas gerações que se seguem os modos culturais de ser, estar e agir,

são necessários à convivência e ao ajustamento de um membro no seu grupo ou sociedade.

Enquanto processo de sociabilização, a educação é exercida nos diversos espaços de convívio

social, seja para a adequação do indivíduo à sociedade, do indivíduo ao grupo ou dos grupos à

sociedade, este é o nicho onde as relações se estabelecem e são promovidas a compreensão

humana e subjetiva.

A partir das contribuições de Herder7 (1744-1803), pode-se compreender a história da

educação como um processo evolutivo que influencia a vida e “suas circunstancias” e não

existe um padrão universal da história que determina o agir humano, mas se faz necessária a

compreensão para o seu desenvolvimento, cada indivíduo é importante e responsável por

construir parte do meio em que se vive. O sujeito para compreender o outro precisa mergulhar

nas reais situações e perspectivas que ele está inserido, para evitar o preconceito e a

possibilidade de não compreensão objetiva e subjetiva do outro enquanto tal com sua riqueza

complexa de alteridade e diferença.

Para Edgar Morin, os herdeiros do socialismo8 estabelecem uma maneira nova de

compreensão da educação, parte da teoria da natureza social onde propõe um sistema social

de escola humana, passando pela crítica e tem como objetivo a integração das correntes

pedagógicos designada pedagogia da essência, comungam da ideia marxista que a educação

7 Herder, Johann Gottfried Von Herder (Mohrungen, Prússia Oriental, 25 de agosto de 1744 - Weimar, 18 de

dezembro de 1803) foi um filósofo e escritor alemão que escreveu sobre a necessidade de conhecer a

simbolização cultural de um povo a partir de suas razões, a fim de evitar ao máximo a intolerancia e a

incompreensão.

8 Herdeiros do socialismo, em oposição ao liberalismo político, surgiram as teorias socialistas em suas duas

vertentes, a utópica e a científica. Robert Owen, Pierre-Joseph Proudhon e Henri de Saint-Simon foram alguns

dos teóricos do socialismo utópico. Owen e Proudhon denunciaram a organização institucional, econômica e

educacional de seus países e defendem a criação de sociedades cooperativas de produção, ao passo que Saint-

Simon preconizou a industrialização e a dissolução do Estado.

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do futuro deveria nascer do sistema fabril, associando-se o trabalho produtivo com a

escolaridade e com a ginastica, preconizando assim a omnilateralidade9 a politecnia

10.

O educador George Snyders11

que levanta a bandeira de uma escola não autoritária, a

escola precisa ser um espaço democrático estimulador do saber em suas perspectivas atuais e

pensamento pedagógico socialista, assim se construirá numa escola mais humana que

corroborará a construção de um mundo onde todos tenham lugar e haja espaço para o diálogo,

reflexão, respeito, autonomia e de condições para que aflore a criatividade e estimule a

fantasia, seja um espaço de efervescência de ideias e todos possam contribuir para que as

mesmas sejam aperfeiçoadas e aproximem ainda mais da verdade e tenha sentido e

ressonancia na realidade social.

O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um

favor que podemos ou não conceder uns aos outros. Precisamente porque éticos

podemos a desrespeitar a rigorosidade da ética e resvalar para a sua negação, por

isso é imprescindível deixar que a possibilidade do desvio ético não pode receber

outra designação senão a de transgressão. (FREIRE, 1996, p. 59).

A educação possibilitou o desenvolvimento da autonomia, da dignidade e garantia dos

direito elementares, porém ainda falta muito para que possamos avançar enquanto nação,

precisamos evoluir, avaliar “compreender melhor o ambiente sob os seus diversos aspectos,

que favorece o despertar da curiosidade intelectual, estimula o sentimento crítico e permite

compreender o real, mediante a aquisição de autonomia na capacidade de discernir”

(DELORS, 2003, p. 245), construir e significar nosso espaço social.

Em nossa realidade social, em seu ritmo acelerado, com uma grande competição pelos

lugares de destaque em todos os níveis societários, causados pelas mudanças rápidas nas

novas tecnologias obrigando que cada um se adapte aos novos contextos o mais rapidamente

possível sob pena de ser ultrapassado tornou-se obrigatório pensar-se na educação ao longo da

vida e para a vida.

Aprender a conhecer e a pensar é fundamental num mundo fortemente marcado por

muitas informações e pouco conhecimento. Esta perspectiva deve, no futuro, inspirar e

9 Omnilateralidade é um termo apontado por Karl Marx, como o sujeito constituído em suas amplas

potencialidades, pleno, na perspectiva da completude, possível na perspectiva educacional.

10

Politecnia é o estudo de muitas artes técnicas ou ciências aplicadas, desenvolvido por Marx na tentativa de

preparar o homem para o enfrentamento do processo alienante da burguesia.

11

George Snyders, criador do termo progressista que resulta da morte de uma velha estrutura educacional e na

construção de uma nova, usado aqui para designar as tendências que partindo de uma analise critica das

realidades sociais sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da educação.

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orientar as reformas educativas e métodos de aprendizagem, tanto em nível da elaboração de

programas como da definição de novas políticas pedagógicas. Nesta linha de pensamento, a

educação baseia-se em quatro pilares, aprender a conhecer, aprender a fazer aprender a viver

juntos e aprender a ser.

Morin, afirma que construir uma expectativa educacional compreensiva e arrojada

implica aprender a conhecer, combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a

possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno número de matérias. O que também

significa, aprender a aprender, para beneficiar das oportunidades oferecidas pela educação ao

longo de toda a vida.

Aprender a fazer, a fim de adquirir, não somente uma qualificação profissional, mas,

de uma maneira mais ampla, competências que tornem a pessoa apta a enfrentar numerosas

situações e a trabalhar em equipe. Mas também aprender a fazer no âmbito das diversas

experiências sociais ou de trabalho que se oferecem aos jovens e adolescentes, quer

espontaneamente, fruto do contexto local ou nacional, quer formalmente, graças ao

desenvolvimento do ensino alternado com o trabalho.

Aprender a viver juntos, desenvolvendo a compreensão do outro e a percepção das

interdependências a realizar projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos no respeito

pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz. Aprender a ser, para melhor

desenvolver a sua personalidade e estar à altura de agir com capacidade cada vez maior de

autonomia, de discernimento e de responsabilidade pessoal, possibilitando que o indivíduo

cresça, desenvolva-se vivendo em harmonia. Para isso, não devemos negligenciar na

educação compreensiva e nenhuma das potencialidades do indivíduo: memória, raciocínio,

sentido estético, capacidades físicas, aptidão para comunicar-se, etc.

Superando todos os obstáculos da compreensão Edgar Morin propõe a ética da

compreensão que é a arte de viver que nos demanda, em primeiro lugar, compreender de

modo desinteressado. A ética da compreensão não espera nenhuma reciprocidade e pede que

se compreenda a incompreensão. Uma pessoa que compreende porque um bandido quer fazer-

lhe mal, é capaz de compreender as raízes, as formas e as manifestações das maldades

humanas, compreende-se porque e como se odeia ou se despreza.

A ética da compreensão se pauta pela racionalidade, caminho amplo do diálogo, da

argumentação, que faz questão de evidenciar os erros, as ideologias e as cegueiras que

conduzem a barbárie. A ética da compreensão está a favor da vida em suas múltiplas formas e

circunstancias procurando compreender e trilhar o caminho da humanização das relações,

onde, o outro, o diferente, tem lugar de destaque na proposta educacional compreensiva, pois

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o outro evoca a alteridade e revela por meio de sua identidade as particularidades que agrega e

enriquece as relações.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das reflexões desenvolvidas acerca da complexidade, que corresponde à

multiplicidade, em que as relações se entrelaçam em uma inter intra retroação contínua da

infinidade de fenômenos e sistemas que compõem o mundo para construir “uma cabeça bem

feita”. A construção de uma cabeça bem feita requer desenvolver a capacidade de

compreender, significar, resignificar o pensamento, pensando o que foi pensado nesta

realidade de múltiplos saberes. A perspectiva educacional compreensiva de Edgar Morin,

neste recorte da problemática educacional, permite algumas considerações que justificam a

importância da compreensão, como saber necessário a educação no presente e no futuro.

A educação compreensiva se preocupa em preparar o sujeito para a vida e formá-lo

para a autonomia, para a consciência de si, para a cidadania capaz de a partir de si construir

um mundo melhor (MORIN, 2003a).

Tendo percorrido o longo caminho de pesquisa e respondido algumas perguntas

propostas no inicio deste trabalho e levantado muitas outras, é possível perceber que a

educação tem grande relevância na vida das pessoas e é necessária para a construção de uma

sociedade mais humana, onde o desenvolvimento de suas potencialidades são possíveis para

construir um lugar melhor para se viver, na realidade complexa de múltiplos saberes.

Formar para a vida é mostrar as ferramentas a serem usadas e incitar sempre a

aprender maneiras novas de usá-las. Pois a educação está arraigada a vida e falar de si é falar

de educação, passando assim um elaboração espírito crítico, questionador peça fundante para

se criar um mundo melhor. Esse é o papel do educando educador, aquele que não está pronto

e acabado, mas que foi instruído e instrumentalizado, para exercer uma educação

emancipadora, nesse processo o pedagogo não deve dar o peixe, mas ensinar a pescar como já

nos ensinou o adágio popular.

Destarte, mais do que nunca a educação compreensiva tem papel essencial na

formação autônoma do sujeito, tem a missão de conferir aos seres humanos a liberdade de

pensamento, discernimento, sentimento e imaginação de que necessitam para desenvolver

suas potencialidades, talentos, “tesouros” e permanecerem tanto quanto, possíveis donos de

seu próprio destino.

Por meio deste trabalho abordou-se assuntos que tocam a educação compreensiva, em

suas inter-intra relações: consigo mesmo, com o outro, com seu meio social na medida em que

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o sujeito compreende e passa a significar e re-significa a realidade, na qual o individuo está

plantado12

.

O tema central desta pesquisa foi à compreensão que Edgar Morin considera como um

assunto crucial a ser debatido, discutido e provocado no intuito de estabelecer um diálogo

salutar que enriqueça a educação em meio à realidade social de múltiplos saberes.

Vale lembrar que Edgar Morin, procura estabelecer uma educação que favoreça o

desenvolvimento de uma cabeça bem feita, ou seja, a capacidade de articular as idéias,

questionar o que está sendo colocado como fundamentos. Uma cabeça bem feita ajuda a

repensar o pensamento e sugerir mudanças que tragam benefícios em favor da sociedade e do

indivíduo. A escola deve ser espaço, um nicho de possibilidades onde as ideias sejam

consideradas como uma grande riqueza. A escola deve incentivar e fomentar a criatividade e

oportunizar salutar convivência com o diferente.

A educação compreensiva propõe capacitar o individuo e oferecer-lhe as condições

necessárias para que se torne autor de sua história e não aceite os cabrestos autoritários que o

vitíma e sujeita, mas possa desenvolver-se para construir soluções plausíveis e inteligentes aos

problemas da vida quotidiana.

A perspectiva educacional de Morin quer ser uma proposta que acompanhe e ofereça

possibilidades ao homem em todos os seus propósitos. Essa pratica educativa precisa ser

diária, para que seja cultivada em meio à liberdade, a promoção e exercício da autonomia.

O planeta está salpicado de aldeias globais, a informação envolve-nos com seu

potencial de mutabilidade tecnológica que facilita a comunicação, interpretação e

compreensão da realidade complexa, porém, assistimos pelos meios de comunicação como a

compreensão ainda é frágil e a intolerância e a incompreensão prevalecem.

Para Morin, a informação é muito importante, mas não é o bastante para educar o

sujeito na aprendizagem da compreensão, é preciso que haja interligação dos saberes e

compromisso inter e transdisciplinar na formação compreensiva de hominização do homem e

que a informação esteja alinhada a educação para que ela se torne atrativa, interessante.

Neste século dos saberes e informação tecnológica é possível intensivar o diálogo e as

políticas publicas acerca do bullyng. Que nos espaços educacionais possa-se iniciar a

compreensão e o respeito pela diferença e seja um laboratório onde se pratica e vivencia a

tolerância e jamais o preconceito e bullyng. Que a abordagem intolerante e incompreensiva

seja abominada e punida, afim de que outros não se sintam encorajados a praticar tal violência

12

Onde está plantado é um termo usado para determinar o espaço social em que o individuo está inserido sendo

ali que ele é convidado a viver suas relações e escrever sua própria história.

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que mina a vida emocional do individuo. Que por meio de atividades didático-pedagógicas

educativas os gestores escolares, educadores, familiares e sociedade civil possam discutir e

elaborar planos de ação que aumente a viabilidade da compreensão do outro enquanto outro.

Que o acompanhamento as vitimas sejam especializados e proporcione possibilidade de

convivência social, aos que necessitarem com o intuito de minimizar os males causados pela

violência conhecida pelo bullyng.

A ética da compreensão se propõe a acolher sem julgamento e avaliar quais são as

reais causas que estão por trás de cada situação. A ética da compreensão passa pela empatia,

simpatia, identificação, projeção e generosidade e compreende o outro como outro a partir de

uma justificativa intersubjetiva.

O outro deve ser respeitado como outro, porque evoca a alteridade e a diferença e

porque revela a própria identidade humana, a quem e com quem se deve conviver

desenvolvendo a realidade social que nos cerca construindo uma sociedade mais humana. Que

a partir da compreensão possamos colaborar na construção da realidade social complexa,

repensando o pensamento e compreendendo o outro objetiva e intersubjetivamente.

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