bueno - eficiência técnica e gestão de hospitais públicos sp
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A Revista Divulgação em Saúde para Debate é associada à Associação
Brasileira de Editores Científicos
PUBLICAÇÃO EDITADA PELO / PUBLICATION EDITED EVERY FOUR MONTHS BY
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES)
Diretoria Nacional / National Board of Directors
Avenida Brasil, 4036 – sala 802 – Manguinhos21040-361 – Rio de Janeiro – RJ – BrasilTel.: (21) 3882-9140, 3882-9141Fax.: (21) 2260-3782E-mail: [email protected] / [email protected] page: http://www.ensp.fiocruz.br/parcerias/cebes/cebes.html
DIREÇÃO NACIONAL (GESTÃO 2006-2009) / NATIONAL BOARD OF DIRECTORS (YEARS 2003-2006)
Diretoria Executiva
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1O Vice-Presidente / 1st Vice-President Ligia Bahia (RJ)2O Vice-Presidente / 2rd Vice-President Ana Maria Costa (DF)3O Vice-Presidente / 3th Vice-President Luiz Neves (RJ)4O Vice-Presidente / 4th Vice-President Mario Scheffer (SP)
1O Suplente / 1nd Substitute Francisco Braga (RJ)2O Suplente / 2nd Substitute Lenaura Lobato (RJ)
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Áquilas Mendes (SP), José da Rocha Carvalheiro (RJ), Assis Mafort (RJ), Sonia Ferraz (DF),Maura Pacheco (RJ), Gilson Cantarino (RJ) & Cornelis Van Stralen (MG).
CONSELHO CONSULTIVO / ADVISORY COUNCIL
Sarah Escorel (RJ), Odorico M. Andrade (CE), Nelson Rodrigues dos Santos (SP), LucioBotelho (SC), Antonio Ivo de Carvalho (RJ), Roberto Medronho (RJ), José Francisco daSilva (MG), Luiz Galvão (WDC), André Médici (DF), Jandira Feghali (RJ), José Moroni(DF), Ary Carvalho de Miranda (RJ), Julio Muller (MT), Silvio Fernandes da Silva (PR) &Sebastião Loureiro (BA).
CONSELHO EDITORIAL / PUBLISHING COUNCIL
Paulo Amarante (RJ), Jairnilson Paim (BA), Gastão Wagner Campos (SP), Ligia Giovanella (RJ),Edmundo Gallo (DF), José Gomes Temporão (RJ), Francisco Campos (MG), Paulo Buss (RJ),Eleonor Conill (SC), Emerson Merhy (SP), Naomar de Almeida Filho (BA) & José Carlos Braga (SP)
EDITORA EXECUTIVA / EXECUTIVE PUBLISHER: Maria Eneida de Almeida
SECRETARIA EXECUTIVA / EXECUTIVE SECRETARIES: Marília Fernanda de Souza Correia
INDEXAÇÃO / INDEXATION
Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS)
Os artigos sobre História da Saúde estão indexados pela Base HISA – Base Bibliográficaem História da Saúde Pública na América Latina e Caribe
The articles about Health History are indexed according to the HISA Base – Base Bibliográficaem História da Saúde Pública na América Latina e Caribe (Bibliographic Base on History in LatinAmerica and the Caribbean)
Divulgação em Saúde para Debate: Revista do Centro Brasileiro de Estudos deSaúde, Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, CEBES – no 1 (1989) – Rio de Janeiro: CentroBrasileiro de Estudos de Saúde, 2007.
n. 37; 27,5 cm
ISSN 0103-4383
1. Saúde Pública, Periódico. I. Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, CEBES
CDD 362.1
Apoio:
COMITÊ EXECUTIVO (2005-2006) / EXECUTIVE COMMITTEE (2005-2006)
Presidente / President Silvia Porto (ENSP/FIOCRUZ)Vice-Presidente /Vice-President Áquilas Mendes (FAAP/SP e CEPAM)1a Secretária / First Secretary Janice Dornelles de Castro (UNISINOS/UERGS)Suplente de Secretária / Second Secretary Eli Iôla Gurgel Andrade (UFMG)Tesoureira / Treasure Elezabeth Barros (Brasília)Suplente de Tesoureira / Second Treasure Maria Helena Lima Souza (SES/CE)
CONSELHEIROS / COUNSELORSPresidente / President Sérgio Piola (IPEA/Brasilia)Conselheiro / Counselor Gabriel Ferrato (UNICAMP)Conselheiro / Counselor Martha Teixeira (SES/BA)
CONSELHO EDITORIAL / PUBLISHING COUNCIL
Sílvia Marta Porto – ENSP/FIOCRUZEli Iola Gurgel Andrade – UFMGMaria Alicia Ugá – ENSP/FIOCRUZMariângela Leal Cherchiglia – UFMGMônica Viegas Andrade – UFMGMarcos Bosi Ferraz – CEPES/UNIFESPJanice Dornelles de Castro – UNISINOS/UERGSSebastião Antônio Loureiro de Souza e Silva – ISC/UFBAFrancisco Assis Acurcio – UFMGWaleska Teixeira Caiaffa – UFMGSueli Saes – SES-SP
A B R E SAssociação Brasileira
de Economia da Saúde
SÉRIE CONASEMS
Saberes e práticas da gestão municipal
Rio de Janeiro Número 37 ISSN 0103-4383 Janeiro 2007
II Jornada de Economia da Saúde – ABRES
SUMÁRIO / SUMMARY
EDITORIAL / EDITORIAL ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 3
APRESENTAÇÃO / INTRODUCTION ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 5
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Economia política da saúde: Introduzindo o debateThe political economy of health: Introducing the debateAna Luíza d’Ávila Viana, Hudson Pacífico da Silva & Paulo Eduardo M. Elias ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 7
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com Ações e Serviços Públicos de Saúde no BrasilNew layout for old problems: financing and expenditures in public health services and actions in BrazilJosé Aparecido Ribeiro, Sérgio Francisco Piola & Luciana Mendes Servo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 21
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – Tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência àsaúde no BrasilThe intervention of the Judicial Power in the private health sector – advanced granting as a health assistance guarantee instrument in BrazilMaria Hildete S. C. Souza, Ligia Bahia, Maria Lúcia W. Vianna, Mário Scheffer, Andrea Salazar & Karina B. Grou ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 44
O Sistema Único de Saúde e o mercado suplementar de assistência à saúde no BrasilThe Unified Health System and the private health market in BrazilRosa Maria Lages Dias & Rosa Maria Souza de Pastrana ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 61
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002Public health spending in the municipalities of Minas Gerais – 2000-2002Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P. Fortes, Edite Novais da Mata Machado & Bruna Duarte Matias ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 69
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São PauloTechnical efficiency and management of public hospitals of the State of São PauloRicardo Luiz Pereira Bueno ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 90
Correlação entre recursos financeiros e coeficiente de mortalidade infantil nas cinco macrorregiões do Brasil (de 1997 a 2002)Correlation between financial resources and infant mortality rate in the five Brazilian macro-regions (from 1997 to 2002)Jorge de Azevedo, Luciana Nucci, Cristiana Toscano, Paul Douglas Fisher & Ronaldo Bordin ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 104
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúdeClusters and thresholds of scientific-technological production: A comparison between C & T in general and in healthCatari Vilela Chaves, Eduardo da Motta e Albuquerque & Sueli Moro ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 110
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 3-4, janeiro 2007 3
EDITORIAL
A diretoria do Cebes, eleita em agosto de 2006, reno-
vou os compromissos da entidade com a retomadado projeto de Reforma Sanitária Brasileira. Para cumprí-los estamos revitalizando espaços de associação entre oconhecimento científico e a formulação de estratégias deintervenção política para reconstruir um bloco de forçassociais capaz de alterar a situação de saúde e reduzirdesigualdades. Espaços para elaborar, confrontar, deba-ter análises de conjuntura, refletir sobre as possibilida-des e limites estruturais às mudanças da sociedade bra-sileira e buscar alternativas à efetivação do direito à saú-de. Em 1 de dezembro de 2006 realizamos uma reuniãoNacional de Conjuntura na Escola Nacional de Saúde Pú-blica no Rio de Janeiro. O debate aprofundado sobre ocontexto, pós-eleitoral, as interrogações sobre o projetode desenvolvimento econômico e social para o Brasil nospróximos quatro anos e suas repercussões sobre a saúdedesdobrou-se na sistematização de uma agenda de te-mas e estratégias de ação prioritários tais como:
1) a inserção da política de saúde numa perspectiva dedesenvolvimento econômico e social voltado à dimi-nuição das desigualdades; a Reforma Sanitária im-plica a garantia e democratização do acesso univer-sal aos cuidados e serviços de saúde humanizados ede qualidade;
2) a necessidade de uma Reforma Política ampla inci-dente sobre formas, conteúdos de exercício do po-der material e simbólico e portanto sobre as for-mas de representação de interesses particulares emdetrimento das necessidades de saúde , nos Pode-res Executivo, Legislativo e Judiciário;
3) o acionamento de dispositivos para assegurar umaÉtica Pública plasmada na transparência do uso derecursos responsabilização, autonomia e profissio-nalização da gestão das instituições de saúde.
Baseados nessas premissas, pretendemos nos so-mar a outros movimentos sociais, instituições de ensi-no e pesquisa, partidos políticos, parlamentares e inte-grantes dos Poderes Executivo e Judiciário para:
1) reduzir as brutais transferências de recursos envol-vidas com o superávit primário, os altos juros e aDesvinculação de Receitas da União para recomporum orçamento público compatível com a transfor-
mação dos direitos enunciados de seguridade soci-al, entre os quais o de saúde em direitos efetivos;
2) incrementar os investimentos em saúde, desde aque-les referidos ao complexo industrial da saúde quecontribuam para alavancar projetos estruturantes deampliação do direito à saúde, passando pela insti-tucionalização de relações dignas de contratação dostrabalhadores da saúde até a reforma das formas degestão e responsabilização pela execução das açõesde saúde, ampliação e reforma da capacidade insta-lada dos estabelecimentos públicos de saúde e a re-gulamentação e cumprimento da EC 29;
3) convocar a I Conferência Nacional de SeguridadeSocial integrando entidades e órgãos governamen-tais relacionados direta e indiretamente com Previ-dência, Saúde e Assistência Social;
4) rever os valores que presidem as relações dos tra-balhadores entre si, usuários e fornecedores de bense serviços com instituições públicas e implementardispositivos normativos para lograr uma Ética Pú-blica que se coadune com a democratização dos di-reitos de cidadania no âmbito dos direitos sociaisenvolvendo a transparência e o controle dos recur-sos públicos;
5) participar do debate e mobilização em torno da ne-cessidade de uma ampla Reforma Política que revejanão apenas as estruturas de poder afetas à comuni-cação e difusão de informações mas também àque-las conseqüentes às distorções nas relações entreExecutivo, Legislativo e mercado, como ocorre coma inadequação e corrupção que circundaram as Emen-das Parlamentares da saúde e partidarização dosquadros dirigentes e técnicos das instituições públi-cas de saúde e ainda com a não observância do for-talecimento da organização e respeito às decisõesdas instâncias de controle e participação social.
O expressivo comparecimento à reunião, a riquezados pronunciamentos, a disposição para o debate, aolado da presença da Abrasco e Abres que contribuírampara sintetizar esta pauta preliminar evidenciaram anecessidade de seguirmos em frente.
O Cebes Vive! Viva o Cebes!
4 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 3-4, janeiro 2007
EDITORIAL
The CEBES directorship, elected in August 2006,
reaffirmed the entity’s commitment to resume theBrazilian Sanitary Reform project. In order to fulfill it,we are revitalizing spaces of association betweenscientific knowledge and formulation of politicalintervention strategies, in order to rebuild a block ofsocial forces capable of changing the health situationand reducing inequalities. Spaces to elaborate,confront, discuss scenario analyses, reflect on thepossibilities and structural limits to changes in theBrazilian society and search for alternatives to rendereffective the right to health.
In December 1st, we accomplished a NationalScenario Meeting in the National School of PublicHealth, in Rio de Janeiro. The deep discussion on thepost-elections scenario, the questions on the socialand economical development project for Brazil in thenext four years and its impact on health were unfoldedinto a systematic agenda of priority themes and actionstrategies such as:
1) insertion of health politics in a perspective ofeconomical and social development, aimed atreducing inequalities; the Sanitary Reform impliesthe guarantee and democratization of universalaccess to humanized and high-quality health careand health services;
2) the need for a broad Political Reform with an effectover the form and content of concrete and symbolicpower and, therefore, over forms of representation ofprivate interests which impair health needs and alsoof the Executive, Legislative and Judicial Powers;
3) the set in motion of devices capable of assuring aPublic Ethics rendered concrete by means oftransparent resource application, accountability,autonomy and professionalization of healthinstitutions’ management.
Based on these premises, we intend to join strengthswith other social movements, teaching and researchinstitutions, political parties, members of the parliamentand of the Executive and Judicial Powers, in order to:
1) reduce the huge transfers of resorces related to theprimary surplus, the high interest rates and theDesvinculation of Union Income (DRU), in order to
recompose a public budget compatible with thetransformation of the nominal rights of socialsecurity, among which is health, into effective rights;
2) increase investments in health, including thoserelated to the industrial health complex, helping toboost structural projects for extending the right tohealth; the institutionalization of fair relationshipsfor hiring health professionals; the reform ofmanagement and accountability mechanisms toperform actions in the health sector; the broadeningand reform of the installed capacity of public healthunits; and the regulation and enforcement of EC 29;
3) summon the 1st National Conference of SocialSecurity, including government entities andagencies directly or indirectly related to SocialWelfare, Health and Social Assistance;
4) reevaluate the values which guide the relationshipsof professionals, users and suppliers of goods andservices with public institutions and implementregulatory devices for accomplishing a PublicEthics in accordance with the democratization ofcitizenship, in the sphere of social rights involvingtransparency and control of public resources;
5) take part in the discussion and the mobilization onthe need for a broad Political Reform. This reformshould reevaluate not only the power structuresassociated to the communication and diffusion ofinformation, but also those caused by distortions inthe relationships between the Executive, theLegislative and the market. For example, theinadequacy and corruption around the ParliamentaryAmendments of Health, the influence of politicalparties over the managing and technical staff ofpublic health institutions and the noncompliancewhen it comes to strengthening the organization ofsocial participation and control instances and theadoption of their decisions.
The significant attendance to the meeting, thecompleteness of speeches and the willingness todebate with ABRASCO and ABRES contributed tosummarize this preliminary agenda and evidenced theneed to proceed.
CEBES lives! Long live CEBES!
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 5-6, janeiro 2007 5
APRESENTAÇÃO
Desde 1989, quando foi criada a Associação Brasi-
leira de Economia da Saúde (ABRES), uma agenda
voltada para a abordagem e desenvolvimento do tema
no país tem propiciado o encontro sistemático de pes-
quisadores e profissionais do sistema de saúde em seus
diversos segmentos de gestão. Foram realizados sete
encontros, três jornadas de âmbito nacional, além dos
Congressos de Economia da Saúde da América Latina e
do Caribe em 2004 e 2006. Nesta edição especial da re-
vista Divulgação para Saúde em Debate, temos a satis-
fação de apresentar os trabalhos selecionados e apre-
sentados na 2ª Jornada de Economia da Saúde, realiza-
da em Belo Horizonte, no ano de 2005, organizada pela
ABRES e o Grupo de Economia da Saúde da Universidade
Federal de Minas Gerais (GPES-UFMG).
Convocados ao debate sobre ‘A Contribuição da Eco-
nomia da Saúde na Política e na Gestão do SUS (Sistema
Único de Saúde)’, os trabalhos selecionados revelaram
as potencialidades de formulação neste campo de co-
nhecimento no Brasil.
O debate percorreu questões conceituais e práticas acer-
ca da aplicação da teoria econômica à gestão sanitária;
sobre a avaliação econômica e a regulação do mix públi-
co/privado; revelou experiências inovadoras sob a ótica
da eficiência e equidade na organização da atenção; as
desigualdades no uso e no acesso aos serviços, além de
contemplar a sempre importante pauta do financiamento e
alocação de recursos no Sistema Único de Saúde.
A abordagem dada a aspectos tão fundamentais à
consolidação de um sistema de saúde universal e equ-
ânime autoriza a idéia de que a incorporação da Eco-
nomia da Saúde já se apresenta como auxiliar indis-
pensável na determinação das prioridades da gestão
em saúde e na ampliação da eficiência na provisão de
serviços, seja sob o aspecto da demanda, por meio da
identificação das necessidades da população, seja sob
o aspecto da oferta, em termos da forma como esses
serviços são disponibilizados.
O importante e decisivo apoio manifestado pelo Mi-
nistério da Saúde (MS) – por intermédio do Departamento
de Economia da Saúde (DES) e da Secretaria de Ciência e
Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), ao lado da
Secretaria de Estado da Saúde (SES-MG), da Fundação
João Pinheiro (FJP) e Secretaria Municipal de Saúde (SMS-
BH) – reitera os avanços na apropriação institucional da
economia da saúde, assegurando as possibilidades de uma
parceria instigante e inovadora entre as universidades,
centros e núcleos de estudo e pesquisa em economia da
saúde e as instâncias e profissionais responsáveis pela
gestão do sistema de saúde em nosso país.
Esta edição especial compõe-se de dois números da
revista Divulgação para Saúde em Debate. Neste primei-
ro, são apresentados oito trabalhos que abordam diferen-
tes temáticas: desde a retomada de alguns conceitos cha-
ves da economia política para discutir o papel do setor
saúde nas economias capitalistas contemporâneas; pas-
sando pela análise das relações entre o público e privado
no sistema de saúde brasileiro; ou textos que destacam a
trajetória do financiamento público e gastos setoriais no
âmbito nacional, abordando aspectos do financiamento
estadual, por meio do exemplo de Minas Gerais e que
correlacionam financiamento e indicadores de saúde nas
microrregiões do país; efetuam uma avaliação de desem-
penho das experiências de gestão hospitalar no estado de
São Paulo; e, no último texto, comparam-se os limiares
da produção científica em C&T e a produção em saúde.
Com estas publicações, a ABRES pretende contribuir
para a divulgação do campo da economia da saúde,
hoje ainda incipiente entre nós, e estimular o desenvol-
vimento de estudos que articulem a pesquisa científica
a e a gestão dos serviços de saúde, buscando sempre o
alcance de sistemas universais, integrais e equitativos.
Sílvia Porto
Presidente da Associação Brasileira
de Economia da Saúde – ABRES
Eli Iola Gurgel Andrade
Presidente da Comissão Organizadora
da II Jornada de Economia da Saúde
6 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 5-6, janeiro 2007
INTRODUCTION
Since 1989, year of creation of the Brazilian
Association of Health Economics (ABRES), an
agenda oriented to the discussion and development of
this subject in the country allowed systematic
meetings of researchers and professionals from several
management segments. Seven meetings, three national-
wide one-day meetings and the Congresses of Health
Economics in Latin America in 2004 and 2006 were
accomplished. In this special edition of the Health
Disclosure for Discussion Journal, we are pleased to
introduce papers selected and presented in the 2nd
Health Economics One-Day Meeting, which took place
in Belo Horizonte city in the year 2005, organized by
ABRES and the Group of Health Economics of the Minas
Gerais Federal University (GPES-UFMG).
Joining the debate on ‘The Contribution of Health
Economics to Politics and SUS (Brazilian Unified
Health System) Management’, the selected papers
disclosed possibilities of formulation in this
knowledge field in Brazil.
The debate encompassed conceptual and practical
issues on the application of the economical theory to
sanitary management, the economical assessment
and the regulation of the public/private mix. It also
disclosed innovative experiences from the perspective
of efficiency and equity in health care organization,
and the inequalities in the use and access to services.
Besides, it comprehended the always important
agenda of financing and resource allocation in the
Brazilian Unified Health System.
The approach towards such fundamental aspects
for consolidating an universal and equitable health
system reinforces the idea of incorporation of Health
Economics as an essential auxiliary for determining
priorities in health management and extending the
efficiency in the provision of services, both in the
aspect of demand, by means of identifying the
population’s needs, and in the aspect of offer, in
relation to the way these services are supplied.
The significant and crucial support given by the
Brazilian Health Ministry (MS) — through the Department
of Health Economics (DES) and the Department of
Science, Technology and Strategic Inputs (SCTIE), along
with the Minas Gerais State Health Department (SES-MG),
the João Pinheiro Foundation (FJP) and the Belo Horizonte
City Health Department (SMS-BH) – supports
improvements in the institutional appropriation of health
economics. It ensures the possibilities of an impelling
partnership among universities, study and research
centers in health economics and the instances and
professionals responsible for our country’s health system
management.
This special edition comprises two issues of the
Health Disclosure for Discussion Journal. The first
one brings eight papers on different subjects: the
retaking of some core concepts of political economy,
in order to discuss the role of the health segment in
contemporary capitalist economies; the analysis of
relations between public and private in the Brazilian
health system; articles highlighting the trajectory of
public financing and sectorial expenses in the
national sphere, addressing aspects of state
financing, having Minas Gerais as an example, and
correlating financing and health indicators in the
country’s microregions; a performance assessment of
hospital management experiences in São Paulo state;
and a comparison between the thresholds of scientific
production in S&T and health.
With these publications, ABRES intends to contribute
to disclosing the currently embryonic health economics
field, and to stimulate the development of studies
capable of articulating scientific research and
management of health services, always searching for
universal, complete and equitable systems.
Sílvia Porto
Chairman of the Brazilian Association
of Health Economics – ABRES
Eli Iola Gurgel Andrade
Chairman of the Organizing Commission
2nd Health Economics One-Day Meeting
Economia política da saúde: Introduzindo o debate
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007 7
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Economia política da saúde: Introduzindo o debate1
The political economy of health: Introducing the debate
Ana Luíza d’Ávila Viana2, Hudson Pacífico da Silva2 & Paulo Eduardo M. Elias2
1 Texto elaborado para apresentação na 2ª Jornada de Economia da Saúde – Abres, realizada no município de Belo Horizonte, nos dias 30
novembro, 1º e 2 de dezembro de 2005.
2 Departamento de Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil.
RESUMO
Procura-se discutir o papel do setor saúde nas economias capitalistas contemporâneas, a partir da retomada de
alguns conceitos-chave da Economia Política e de sua visão integrada entre o social, o político e o econômico,
assim como da visão histórica da conformação da sociedade com base nas relações de mercado, no papel das
instituições, da organização social e do Estado, e nas relações que os padrões de desenvolvimento capitalista
estabelecem com a questão da saúde. Para esta finalidade, entra em discussão duas abordagens teóricas: a
convencional ou formalista, própria da Economia da Saúde, e a substantivista ou histórica que fornece elementos
para discutir a saúde a partir de suas especificidades enquanto mercadoria e bem econômico, como direito social e
como espaço de acumulação de capital. Conclui-se que a segunda abordagem fornece um referencial teórico mais
amplo, na medida que fornece categorias analíticas que possibilitam discutir a complexidade e a contradição entre os
movimentos simultâneos de desmercantilização do acesso (saúde como direito), mercantilização da oferta (saúde
como bem econômico) e formação do complexo industrial da saúde (saúde como esfera de acumulação de capital).
PALAVRAS-CHAVE: Economia da Saúde; Mercantilização; Setor de Assistência à Saúde.
ABSTRACT
This paper aims at discussing the role of the health sector in the contemporary capitalist economies, considering
some key concepts from the Political Economy and its integrated view of social, political and economic fields based
on two theoretical approaches: the conventional or formalist approach, characteristic of the Health Economics,
and the ‘substantive’ or historical approach, which provides elements to discuss health as of its specificities as a
merchandise and economic product, as a social right, and as a space for capital accumulation. It is, thus concluded
that the historical approach is more appropriate to analyze the health sector as it offers a wider theoretical referential,
once it provides analytical categories which enable the discussion of complexity and the contradiction between the
simultaneous de-mercantilism of access (health as a social right), mercantilism of offering (health as an economic
good), and the formation of the health industry complex (health as a sphere to accumulate capital).
KEYWORDS: Health Economics; Commodification; Health Care Sector.
VIANA, Ana Luíza d’Ávila; SILVA, Hudson Pacífico da & ELIAS, Paulo Eduardo M.
8 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007
INTRODUÇÃO
Em entrevista recente, Antonio
Barros de Castro, a propósito das
controvérsias sobre o estruturalismo,
cita uma discussão entre dois enfo-
ques econômicos distintos – cuja
denominação, segundo o autor, foi
contrabandeada da antropologia – os
substantivistas e os formalistas. Os
substantivistas, segundo ele, têm a
firme convicção de que os objetos de
análise em economia possuem carac-
terísticas fortes e próprias e podem
estar convencidos de que o mundo
econômico é um objeto que abriga
alta indeterminação, isto é, a inde-
terminação é inerente a esse objeto.
Prossegue, afirmando que a evoca-
ção natural nesse enfoque é Keynes
para quem existe uma ignorância
intransponível acerca do futuro: não
se conhece o futuro e isso decorre do
próprio objeto e tal deficiência não é
superável mediante técnicas estatís-
ticas. As alternativas de escolha não
estão previamente definidas e isso
caracteriza o quadro de incerteza.
Castro alerta para o fato de que exis-
tem decisões cruciais em economia
que alteram o curso dos acontecimen-
tos e são irreversíveis, e que a partir
delas abrem-se novos ou fecham-se
velhos caminhos.
Para o autor, a visão alternati-
va, típica do neoclassicismo e dos
economistas do maistream, não re-
conhece propriedades específicas a
certos objetos.
Citaremos aqui um grande pará-
grafo, no qual se destaca um fato re-
latado por Castro, pois esse trecho,
do nosso ponto de vista, é essencial
na discussão da economia da saúde:
“... (quanto a isso) vou me referir a
um fato anedótico. Quando começou
a ganhar corpo a onda de desregula-
mentação nos Estados Unidos, hou-
ve uma intensa discussão acerca da
indústria aeronáutica: ela deveria, ou
não, ser também desregulamentada,
como muitos pretendiam? Nesse de-
bate, os críticos da desregulamenta-
ção argumentavam que a indústria
aeronáutica constitui um caso espe-
zio, pela metade ou lotado. Há, en-
tão, propriedades nessa indústria que
requerem regras e compromissos es-
peciais. E o que diziam os neoclássi-
cos? Eles, absolutamente, não reco-
nheciam propriedades específicas nes-
te, ou em qualquer objeto, ou ramo
de negócios. Alfred Kahn, referência
obrigatória no tema, saiu-se a propó-
sito com esta frase fantástica, no meio
de um debate: ‘um avião nada mais é
que custo marginal com asas’. Isso,
certamente, leva ao limite as discre-
pâncias entre as duas abordagens.”
(CASTRO, 2004. p.164)
Da mesma forma, a saúde não
pode ser estudada, do ponto de vis-
ta econômico, dentro do estrito
campo do pensamento formalista,
pois, parafraseando Kahn, também
poderíamos dizer que um hospital
nada mais é que custo marginal
com doentes.
Por isso, nesse texto, buscamos
retomar alguns conceitos da eco-
nomia política para o estudo do pa-
pel da saúde nas economias capi-
talistas. Concordamos com ESPING
ANDERSEN (1999), quando ele diz que
a associação entre economia e po-
lítica – derivada tanto da escola
marxista quanto do pensamento
institucional europeu, cujos repre-
sentantes são JOSEPH SCHUMPETER, MAX
WEBER e KARL POLANYI – proporciona
a compreensão mais precisa dos
fenômenos sociais, pois somente a
visão conjunta entre economia e
política, Estado e mercado, públi-
co e privado (que fundamenta esta
linha de pensamento) fornece os
elementos essenciais para empre-
cial, merecedor de cuidados e trata-
mento diferenciado.
Argumentavam, por exemplo,
que ela é excepcionalmente capital-
intensiva , além de apresentar notó-
rios problemas no tocante à seguran-
ça. Com tais características, se a com-
petição for inteiramente liberada, sur-
girão, entre outras conseqüências,
comportamentos predatórios entre as
empresas. Se o avião vai mesmo voar,
vale a pena colocar passageiros por
uma fração do preço normal, por que
o equipamento está sendo pago de
qualquer maneira, esteja o vôo va-
BUSCAMOS RETOMAR
ALGUNS CONCEITOS DA
ECONOMIA POLÍTICA
PARA O ESTUDO DO
PAPEL DA SAÚDE NAS
ECONOMIAS CAPITALISTAS
Economia política da saúde: Introduzindo o debate
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007 9
ender a análise de um fenômeno,
ressalvando ainda que o mercado
é um espaço constituído por for-
ças coletivas e instituições sociais
em permanente mutação.
Não desconhecemos, entretan-
to, os importantes aportes que a
economia da saúde (formalista)
trouxe para a melhor compreensão
do funcionamento do setor, en-
quanto produtor de bens e servi-
ços, destacando-se desde os estu-
dos no campo da macroeconomia,
como perfil do gasto público em
saúde e suas relações com o PIB e
os padrões de desenvolvimento
econômico, bem como os microe-
conômicos, voltados para melhor
conhecer as formas de organização
e desempenho das unidades pro-
dutoras de saúde.1
1. ABORDAGEM CONVENCIONAL OUFORMALISTA: COMO A ECONOMIA DA
SAÚDE É VISTA ATUALMENTE
A abordagem convencional ini-
cia o enfoque da economia da saú-
de pela configuração da oferta e de-
manda em saúde, assumindo que
a saúde é um bem comum, igual
aos demais bens disponíveis no
mercado, uma mercadoria sem es-
pecificidades ou materialidade es-
pecífica, e o caminho é estudar
como se conformam a demanda, a
oferta e o mercado desse bem.
Se olharmos para o conceito de
bem econômico, na obra clássica
de Cláudio Napoleoni (Curso de
Economia Política), qualquer coi-
sa que seja capaz de satisfazer ne-
cessidades e que pode ser tornada
disponível somente em quantida-
Nesse ponto, já nos deparamos
com um grave problema: em primei-
ro lugar, como podemos limitar a
necessidade de estar saudável; e
dada essa limitação, como serão as
escolhas de acesso, isto é, segundo
quais critérios: econômicos, morais,
necessidade premente, etc.?
Segundo, como construir a cur-
va da demanda em saúde, se a eco-
nomia usa o parâmetro da utilida-
de para a construção da demanda
de um determinado bem e a utili-
dade tem baixo poder explicativo
para o caso da saúde? A própria
idéia de utilidade não se aplica ao
consumo de saúde, mas vincula-
do, segundo muitos autores, ao
conceito de necessidade.2
Terceiro, como não aceitar que
a produção (oferta) de saúde apre-
senta numerosas diferenças frente
à produção das demais mercadori-
as, inclusive, pela presença de um
profissional (médico) que represen-
tou, historicamente, a própria ofer-
ta, até o começo do século XX? O
caráter de essencialidade do consu-
mo de saúde e o fato da produção
ter muitas particularidades, como
a apontada acima, sugerem a ne-
1 Há, inclusive, propostas de autores norte-americanos dentro do enfoque formalista para que os estudos passem a tratar da área da
economia da assistência à saúde e a economia da saúde ganhe corpo (EDWARDS, 2001), de forma a apreender muitas outras variáveis que
interferem tanto na demanda da saúde (como condições de vida da população), quanto na oferta.
2 Segundo BIASOTO (2004), a idéia de utilidade provavelmente não é aplicável a uma situação de carência como a da ausência de saúde. Vale
notar, prossegue o autor, que a forma de aplicação de uma demanda por serviços e insumos de saúde é completamente distinta da decisão
de adquirir um automóvel. A segunda é a própria forma como a utilidade é medida nos estudos aplicados: a despesa realizada é tomada como
uma proxy das utilidades envolvidas, sob a racionalidade de que a decisão de gasto representa linearmente o desejo do consumidor. O autor
conclui que a mera interferência de utilidades e benefícios por uma representação monetária parece uma solução reducionista demais para
uma questão tão complexa.
de limitada é um bem econômico;
por isso, ele se define por duas ca-
racterísticas: utilidade e disponi-
bilidade limitada.
O MERCADO É UM
ESPAÇO CONSTITUÍDO
POR FORÇAS COLETIVAS
E INSTITUIÇÕES SOCIAIS
EM PERMANENTE MUTAÇÃO
VIANA, Ana Luíza d’Ávila; SILVA, Hudson Pacífico da & ELIAS, Paulo Eduardo M.
10 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007
cessidade da construção de outros
enfoques teóricos.3
Quarto, e pelas razões já levan-
tadas antes, há uma forma própria
de organização do acesso a esse
bem, pois foram criadas instâncias
institucionais específicas entre a
demanda e a oferta: isto é, a saúde
conformou uma intermediação sin-
gular entre a demanda (usuário) e a
oferta (assistência), e essa interme-
diação não é só financeira, só mer-
cado, como muitos apontam, é mais
que isso, pois está dentro e fora da
lógica de mercado. Na verdade, é um
longo processo histórico de confor-
mação do que chamamos hoje ‘sis-
tema de saúde’. As razões desse fato
decorrem da idéia de que há uma
substantividade nessa área, ela não
é igual a qualquer área produtora,
e tanto a oferta como a demanda têm
comportamentos singulares e não
conseguem convergir isoladamente
para o mercado, como se dá em
outros setores, como, por exemplo,
o caso do mercado de duráveis ou
mesmo de outros bens econômicos.
Quinto, e por isso mesmo, os
mercados, nessa área, fogem de
qualquer modelo abstrato. São re-
correntes, mesmo na literatura mais
convencional da economia da saú-
de, as observações sobre as imper-
feições dos mercados em saúde, fru-
to de uma série de fatores como: o
aparecimento de externalidades, a
existência de rendimentos crescen-
tes ou monopólios naturais, a exis-
tência de incertezas (comportamen-
to de um consumidor-paciente ante
o risco da enfermidade; incentivos
para o asseguramento; seleção ad-
versa e risco moral; processos de
screening; demanda induzida pela
oferta) e a informação assimétrica
ou incompleta entre os agentes eco-
nômicos.4
Por isso, nos textos de Economia
da Saúde, diz-se que o mercado e o
Estado não são figuras excludentes
em saúde e ambos oferecem vanta-
gens e falhas específicas. Os auto-
res apontam como vantagens do
3 No caso da economia formalista, BIASOTO (2004) cita o diagrama de Williams (WILLIANS, 1987), autor que destacou o conjunto de variáveis que
influenciam a demanda em saúde: a escala de utilidades da saúde, enquanto valor para os consumidores, o que envolve a percepção dos
atributos da saúde e o valor da vida. O segundo conjunto de fatores que dá forma à curva de demanda por saúde é composto por elementos
correlatos, como renda, educação, padrões de consumo, elementos morais, que acabam agindo como condicionantes externos aos ligados à
assistência médica. A partir da influência desses fatores, a curva da demanda por saúde passa a tomar forma, matizada por elementos como
barreiras ao acesso derivadas dos preços, as filas e as condições de referenciamento às especialidades e às intervenções complexas. Ao mesmo
tempo jogam papel essencial, as formas de regulação, como o acesso aos planos de saúde e os direitos à saúde pública, e o comportamento das
pessoas frente ao sistema. No campo da oferta de serviços de saúde, um amplo conjunto de fatores está por trás da curva de produção. Os custos
e as alternativas de formas de assistência, a tecnologia, os insumos, os métodos de organização da produção de serviços e as condições do
mercado de bens e do mercado de trabalho. A interação entre demanda e oferta, segundo o diagrama de Williams, condiciona o equilíbrio do
mercado e as condições microeconômicas enfrentadas pelos agentes envolvidos. O autor ressalta que, atualmente, o novo diagrama de Edwards
propõe superar o campo da economia da assistência à saúde e construir os elementos teóricos da economia da saúde. Segundo BIASOTO, o intento
de EDWARDS (2001), em suas palavras, conquanto extremamente louvável, não logra o alcance anunciado. O novo organograma estende o campo
de ação da economia da saúde, mas a conserva na condição de mera subdisciplina da economia, usuária do mesmo arsenal de instrumentos e
metodologias de que a matriz se utiliza. Conclui BIASOTO que a reflexão sobre o instrumental analítico em economia da saúde, se levada às últimas
conseqüências, deveria indicar a necessidade de novas abordagens e a estruturação de um marco teórico-conceitual próprio, distinto da matriz
ofertada pela ciência econômica. Enfatiza, finalmente, o autor que ainda que se utilizem ferramentas trazidas da ciência econômica, é crucial
desenvolver marcos e leis de movimento próprias da economia da saúde.
4 Ferlie et al., que estudaram a reforma do sistema inglês dos anos 1990, apontam a importância de alargar o estudo sobre os mercados, tendo
em vista a ênfase das reformas na construção de mercados administrados ou paramercados. Segundo ele, a análise sociológica dos mercados
tornou-se um campo em expansão nos anos 1980. Os conceitos essencialmente sociológicos das relações sociais, da confiança, da reputação
e da obrigação são vistos como centrais para a compreensão de como os mercados funcionam. Mais recentemente, a visão relacional dos
mercados (FERLIE et al., 1999), aponta para novos comportamentos, nos quais, segundo Ferlie, os seguintes sinais podem aparecer: um número
relativamente pequeno de compradores e vendedores pode ficar preso a contratos de longo prazo ou compras repetidas, e as decisões de
compra podem ser feitas com base em dados intangíveis (confiança, por exemplo), como também em informações tangíveis. O autor aponta
ainda uma característica importante dos mercados relacionais, o valor do atributo reputação, como bem intangível essencial, base no qual
fornecedores negociam.
Economia política da saúde: Introduzindo o debate
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007 11
Estado: reduzir os custos de transa-
ção, pois o controle interno é menos
necessário em estruturas hierárqui-
cas em que impera a autoridade;
facilitar as tarefas que requerem
continuidade, estabilidade, limita-
ção do favoritismo e da discrimina-
ção, garantias de acesso eqüitativo,
coesão social e coerência com ou-
tras políticas públicas. As vantagens
do setor privado são: eficiência pro-
dutiva, capacidade de resposta às
demandas de clientes e usuários;
maiores incentivos individuais e
organizativos; flexibilidade no uso
de insumos produtivos que permi-
tem responder com rapidez às mu-
danças, às novas tecnologias de pro-
dução, às preferências dos cidadãos
e à inovação, a possibilidade de re-
petição do êxito, a assunção de ris-
cos, geração de capital e a conquis-
ta de economias de escala. São apon-
tados como falhas do Estado, o ris-
co moral e, no setor privado, a sele-
ção adversa e o risco moral.
Como vimos, essa abordagem
trata não da relação Estado/merca-
do no setor saúde, mas discorre so-
bre duas instituições dissociadas,
nas quais se explicitam argumen-
tos para que se faça uma escolha
racional entre um ou outro, isto é,
por mais ou menos mercado, como
se não existissem razões de ordem
estrutural para a configuração de
determinados arranjos Estado/mer-
cado, em um dado período históri-
co. Belluzzo, em um capítulo do seu
mais recente livro, expõe esse pro-
blema de forma simples e brilhante,
ao observar que, nessa concepção,
Estado e mercado deixam de ser ins-
tâncias e resultados da constituição
do capitalismo enquanto sistema
histórico de relações sociais e eco-
nômicas e passam a representar al-
ternativas abstratas de organização
da sociedade. Diz ele: “... como o
senhor prefere, mais Estado ou mais
mercado? E conclui: desconfio que
algumas teorias serviriam melhor
como um guia de instruções para
ponsável pela reprodução humana,
pela própria existência do homem.
Poderíamos falar, copiando PO-
LANYI (1980)[1944], que a saúde é uma
mercadoria fictícia, como ele aponta
ser o trabalho, a terra e o dinheiro,
pois não foram criadas para e pelo
mercado, isto é, não são objetos pro-
duzidos para venda no mercado, e
somente depois de um longo proces-
so histórico é que foram constituí-
dos e organizados os mercados es-
pecíficos do trabalho, do dinheiro, da
terra e, completando, da saúde. Al-
guns autores, inclusive, argumentam
que outros bens, como é o caso do
ar, da diversidade biológica e da água
emergiram recentemente como novas
mercadorias fictícias, gerando mer-
cados que precisam ser instituciona-
lizados. Esse processo foi chamado
de mercantilização da natureza por
BERTHA BECKER (2005), em artigo recen-
te sobre a Amazônia, em livro orga-
nizado pelo IPEA (Instituto de Pesqui-
sa Econômica Aplicada).
Para o caso da saúde, também
podemos falar de um processo, o
qual Polanyi chama de ‘ficção’, daí
mercadorias fictícias a fomentar a
formação de um mercado em torno
do bem saúde. Essas mercadorias
fictícias tiveram que ser reguladas
pelo Estado, isto é, foram submeti-
das à regulação dos governos, no
sentido de protegê-las da ação iso-
lada do mercado geral.
Acrescenta BELLUZZO (2005), co-
mentando a obra magistral de POLANYI
– A grande transformação –, que a
garçons de restaurantes baratos”
(BELLUZZO, 2005. p.122).
2. ABORDAGEM SUBSTANTIVISTAOU HISTÓRICA: ALGUMAS QUESTÕES-CHAVE
A SEREM RESPONDIDAS POR ESSALINHA DE ANÁLISE
A abordagem substantivista ou
histórica parte do pressuposto de que
a saúde é um bem/serviço diferente
dos demais por razões óbvias, ten-
do em vista que sua presença é res-
PARA O CASO
DA SAÚDE,TAMBÉM
PODEMOS
FALAR DE
UM PROCESSO
VIANA, Ana Luíza d’Ávila; SILVA, Hudson Pacífico da & ELIAS, Paulo Eduardo M.
12 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007
transformação da terra, da mão-de-
obra e do dinheiro em mercadorias
significa a subordinação da própria
substância da sociedade às leis de
mercado. Prossegue afirmando que
a terra (recursos naturais), a mão-
de-obra (capacidade de trabalho) e o
dinheiro (poder de compra) não po-
dem estar sujeitos aos processos im-
pessoais, imprevisíveis e às vezes ca-
tastróficos do mercado, porque são,
antes de tudo, condições de sobrevi-
vência humana, meios que permitem
o acesso aos bens da vida. Condicio-
nar o acesso a esses meios de vida a
decisões que não têm outra finalida-
de senão a acumulação de riqueza
sob a forma monetária significa lan-
çar os indivíduos na insegurança per-
manente (BELLUZZO, 2005, p.191-192).
O que diria POLANYI sobre a cria-
ção incessante hoje de novas merca-
dorias fictícias como a saúde, o meio
ambiente, o ar, a biodiversidade etc.?
Esta é a primeira diferença da
abordagem da economia política da
saúde frente à linha formalista da
economia da saúde: discutir as es-
pecificidades da saúde enquanto
mercadoria e bem econômico.
A segunda abordagem, decorren-
te da primeira, é o imperativo de
uma análise histórica, tanto para
dar conta do processo acelerado de
mercantilização da área, como pelo
fato de que o papel da saúde, hoje,
é completamente distinto do que foi
há 50 anos, tendo em vista, por
exemplo, a constituição de um gran-
de campo de acumulação de capi-
tal nessa área, ou a forte convic-
ção da saúde como direito.
Propomos, mais adiante, discu-
tir três questões-chave no campo da
Economia Política da Saúde (ou da
linha substantivista): a primeira tra-
ta do referencial teórico da discipli-
na, que, do nosso ponto de vista,
deve partir da discussão central da
economia política, isto é, como se
dão os avanços das formas mercan-
tis e capitalistas em todos os espa-
ços da vida social e como podem
2.1. Marco ou referencial teórico de
como a saúde pode ser vista à luz
da economia política: complexida-
de e contradição entre os movimen-
tos simultâneos de desmercantili-
zação do acesso e mercantilização
da oferta / provisão, ao lado da
constituição (recente) de um cam-
po de acumulação de capital em
saúde, expresso pela formação do
complexo industrial da saúde.
O fenômeno mais marcante na
área da saúde, nos últimos 60 anos,
foi o processo que gerou, por um
lado, a desmercantilização do aces-
so à saúde e, por outro, a mercanti-
lização da oferta / provisão e, ao
mesmo tempo, criou um enorme
parque industrial ligado à área (re-
presentado pelas indústrias de base
química e biotecnologia e mecâni-
ca, eletrônica e de materiais).
O processo de desmercantiliza-
ção do acesso teve como corolário
a saúde como direito e o movimen-
to de formação dos modernos sis-
temas de proteção social e da saú-
de, que passam a responsabilizar-
se pelo risco social de um indiví-
duo adoecer. Esse risco seria de res-
ponsabilidade coletiva, seria cober-
to por toda sociedade, isto é, ga-
rantido pela idéia do direito social
(direito do cidadão e/ou responsa-
bilização coletiva, por isso, dever
do Estado). Esse processo se inicia
com a formação dos seguros ocu-
pacionais e nacionais na Europa,
no início do século XX, e se apri-
mora depois da Segunda Guerra
ser reguladas as contradições implí-
citas entre o crescimento dessas
mesmas formas mercantis e a liber-
dade e a igualdade entre os homens;
a segunda procura responder como
os mecanismos de financiamento são
definidos e quais implicações eles
têm para uma maior equidade no
acesso à saúde e para o reforço ou a
negação do processo de desmercan-
tilização do acesso; a terceira envol-
ve a discussão entre desenvolvimen-
to econômico e social e saúde.
O PROCESSO DE DESMERCANTILIZAÇÃO
DO ACESSO TEVE COMO COROLÁRIO
A SAÚDE COMO DIREITO E O MOVIMENTO
DE FORMAÇÃO DOS MODERNOS SISTEMAS
DE PROTEÇÃO SOCIAL E DA SAÚDE
Economia política da saúde: Introduzindo o debate
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007 13
Mundial, com a formação dos gran-
des sistemas nacionais de saúde fi-
nanciados por impostos públicos.
A longa trajetória de constitui-
ção dos sistemas de proteção soci-
al nos países avançados e seu apo-
geu no período 1945-75 – quando
a economia parece ter sido doma-
da pela sociedade e pelo Estado, no
sentido de que foi dada uma finali-
dade ao progresso material, como,
por exemplo, o bem-estar individu-
al e coletivo – foi objeto de análise
de numerosas pesquisas realizadas
por cientistas sociais europeus de
diferentes escolas e segundo meto-
dologias diversas.5
Segundo BELLUZZO, o século XX foi,
sem dúvida, palco de uma batalha
que, entre mortos e feridos, deixou o
saldo positivo da conquista dos di-
reitos sociais e essa conquista deter-
minou que o reconhecimento do in-
divíduo como cidadão não mais de-
pendia de sua inserção e posição no
circuito mercantil. A história do sé-
culo XIX e XX pode ser contada, como
diz acertadamente o autor, pela re-
sistência das camadas sociais mais
desprotegidas contra as forças cegas
e supostamente impessoais do mer-
cado. E, nas suas palavras, o Esta-
do social, construído a ferro e fogo
pelos subalternos, impôs o reconhe-
cimento dos direitos dos cidadãos,
isto é, da sua autonomia desde o seu
nascimento até sua morte:
“...ele será investido nesses direitos
desde o primeiro suspiro: o nascimen-
to de um cidadão implica, por parte da
sociedade, o reconhecimento de uma
dívida. Dívida com sua subsistência,
com sua dignidade, com sua educa-
ção, com seu trabalho, com sua velhi-
ce.” (BELLUZZO, 2005. p.65)
A saúde, como se sabe, foi peça
chave na construção dos modernos
sistemas de proteção social, pois o
adoecimento e a velhice são e foram
os dois principais problemas das
lidade da sociedade, do coletivo, e
obrigação do Estado, é o longo
movimento de desmercantilização
do acesso à saúde, e um dos te-
mas centrais de discussão da eco-
nomia política da saúde.
Em resumo, os sistemas de pro-
teção social exprimiram uma equa-
ção em que a política influía com
força na economia, pois foram os
movimentos e lutas dos trabalhado-
res e da classe média, em grandes
partidos de massa, que fomentaram
essa responsabilização coletiva pelo
bem-estar dos cidadãos.
Outro processo, em sentido
oposto, foi o da mercantilização da
oferta. A mesma se inicia com o as-
salariamento dos profissionais, so-
bretudo dos médicos, no início do
século XX, passando pela confor-
mação das empresas médicas, e
termina na formação das operado-
ras de planos e seguros de saúde,
que passam a realizar uma inter-
mediação de natureza financeira, no
setor. Esse processo de mercantili-
zação da oferta teve diferentes eta-
pas, muitas vezes não seqüenciais,
sendo que o assalariamento dos
profissionais é fenômeno mais an-
tigo, e a emergência das operado-
ras de planos e seguros, mais novo.
O processo de constituição de um
campo próprio de acumulação de
capital em saúde pode ser visto pela
formação das grandes indústrias do
5 Um resumo dessa discussão e a visão dos autores citados podem ser observados no artigo introdutório “Proteção social: introduzindo o
debate de Viana e Levcovitz”, do livro Proteção social – dilemas e desafios, organizado por VIANA; ELIAS & IBAÑEZ, 2005.
camadas mais pobres: como garan-
tir assistência à saúde em todos os
momentos do ciclo de vida (infân-
cia, idade adulta e velhice) e uma
renda digna, quando o cidadão dei-
xa de trabalhar? Esses dois itens
configuram um dos problemas cen-
trais da proteção social.
O processo de transformar a co-
bertura desse risco em responsabi-
ESSE PROCESSO DE MERCANTILIZAÇÃO
DA OFERTA TEVE DIFERENTES ETAPAS,SENDO QUE O ASSALARIAMENTO DOS
PROFISSIONAIS É FENÔMENO MAIS ANTIGO,E A EMERGÊNCIA DAS OPERADORAS
DE PLANOS E SEGUROS, MAIS NOVO
VIANA, Ana Luíza d’Ávila; SILVA, Hudson Pacífico da & ELIAS, Paulo Eduardo M.
14 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007
setor, conformando um complexo
industrial da saúde, sendo processo
recente, e altamente dependente da
inovação tecnológica e do próprio
avanço científico no campo biomé-
dico. O grande desenvolvimento tec-
nológico, a revolução tecnológica dos
últimos 25 anos, ao lado da etapa
atual de globalização e financeiriza-
ção acelerada propiciaram a forma-
ção / consolidação desse complexo.
Vários autores nacionais têm cha-
mado atenção para esse ponto,
como GADELHA (2003), BERMUDEZ
(1995), GUIMARÃES (2005) e outros.
As relações entre essas caracte-
rísticas / processos não são simples
nem lineares. Pode-se afirmar que
a saúde como direito influenciou,
de forma indireta, dado o aumento
de demanda que propiciou / esti-
mulou, em alguns casos, a rápida
expansão da saúde como bem eco-
nômico; essa mesma expansão da
demanda, ao lado do desenvolvi-
mento científico, por sua vez, esti-
mulou a formação do complexo
industrial da saúde (produção em
larga escala de medicamentos, por
exemplo). Entretanto, esses proces-
sos são e foram diferentes de país
a país e, mesmo hoje, essas carac-
terísticas / processos / dimensões
não estão igualmente desenvolvi-
dos, isto é, não estão plenamente
maduros em todos os países.
Há sistemas nos quais não se
implantou a saúde como direito, ao
lado de um acelerado processo de
constituição da saúde como bem
econômico e campo de acumulação.
Poderíamos dizer que esse é o pior
dos mundos. Há outros países em
que os três processos foram intensi-
ficados, como o caso dos europeus,
onde, como afirmam FREEMAN e MO-
RAN, paradoxalmente, é o complexo
industrial da saúde e seus interes-
ses que garantem o direito à saúde,
isto é, a permanência dos sistemas
universais. Outros, ainda, onde é
fraca a presença do complexo e de
seus interesses, e assim por diante.
Tal convivência contraditória e
complexa é altamente dependente de
QUADRO 1 – Processo complexo e contraditório da Economia Política da Saúde: saúde comodireito, bem econômico e campo de acumulação de capital ou Três características/dimensõesessenciais presentes hoje nas políticas de saúde
Hoje, o estudo desse aspecto da saú-
de é fundamental, pois o Brasil é
muito dependente da importação
desses bens e sua maior autonomia
frente a tais interesses pode ser peça
chave na consolidação do sistema
público de saúde.
O Quadro 1 exemplifica, ou me-
lhor, resume esses três processos /
dimensões, que não foram constitu-
ídos em um mesmo momento histó-
rico e nem de forma combinada, mas
que hoje convivem de forma com-
plexa e contraditória em um mes-
mo sistema de saúde.
A saúde como direito → desmercantilização do acesso → sistemas de proteção social
A saúde como bem econômico → mercantilização da oferta → assalariamento dos profissionais (médicos), formação de empre-sas e intermediação financeira (planos e seguros)
A saúde como esfera de acumulação de capital → formação do complexo industrial da saúde → globalização e financeirização
Fonte: elaboração própria
Pretendemos diferenciar o pro-
cesso de criação do bem econômi-
co saúde, que necessitou da forma-
ção de um conjunto de agentes mer-
cantis, como os médicos (já na sua
forma liberal de prestação de ser-
viços, ou depois, enquanto assala-
riados dos antigos aparatos previ-
denciários ou depois ainda, das
empresas médicas ou de sistemas
públicos), do processo de formação
do complexo industrial da saúde.
Esse segundo processo, além de ser
mais recente, necessitou da existên-
cia de grandes massas consumido-
ras, por um lado, e de todo um apa-
rato público e privado na área de ci-
ência e tecnologia que viabilizou a
aplicação massiva e continuada de
pesquisas básicas, principalmente na
área de fármacos e medicamentos.
Estamos chamando de ‘comple-
xa e contraditória’ porque, parado-
xalmente, é possível que não haja
uma oposição automática entre es-
sas dimensões, como veremos mais
adiante, nas pertinentes observações
de FREEMAN & MORAN (2002).
Economia política da saúde: Introduzindo o debate
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007 15
como o Estado intervém, no sentido
tanto de regular o ciclo econômico
quanto de criar espaços de integra-
ção não mercantis, exatamente o que
distingue o Estado liberal do início
do século XX, do Estado dos 30 anos
gloriosos (1945-75).
Segundo BELLUZZO (2005), nesse pe-
ríodo do consenso keynesiano foi pos-
sível contemplar, com sucesso, tanto
as exigências da acumulação capita-
lista quanto as pretensões dos homens
comuns que aspiravam a uma vida
digna e verdadeiramente livre, prote-
gida, em suas palavras, dos riscos e
atropelos periodicamente produzidos
pela engrenagem econômica.
Entretanto, atualmente, o Esta-
do está sendo combatido por ter de-
sempenhado ambas as funções, de
regulação do ciclo econômico e de
criação de espaços de integração
não mercantis, o que possibilita que
a convivência complexa e contradi-
tória entre os três processos / dimen-
sões seja auto-regulada, isto é, re-
gulada por lógicas próprias – pri-
vadas – e, portanto, destituídas de
caráter público e coletivo.
ANÁLISE DE FREEMAN E MORANSOBRE AS TRÊS DIMENSÕES DA
POLÍTICA DE SAÚDE
FREEMAN & MORAN (2002) interpre-
tam esse mesmo movimento a par-
tir da identificação de três dimen-
sões presentes (hoje) na política de
saúde. Segundo os autores, a polí-
tica de saúde desempenhou um pa-
pel fundamental na reconstrução dos
sistemas europeus de proteção so-
cial por muito boa razão: a vultosa
quantidade de dinheiro em jogo. A
“epidemia” de reformas (denomina-
ção dada por Rudolf Klein) foi guia-
da pelos fortes elos existentes entre
essas três dimensões:
• A dimensão da saúde como
sistema de proteção social. A in-
mesmo razoável alterar este quadro
– a saúde como direito, o que im-
põe alguns limites às reformas.
• A dimensão política da polí-
tica da saúde. A saúde é objeto de
conflitos entre o provedor, o usuá-
rio, o pagador e os governantes. As
instâncias decisórias são constituí-
das por redes de instituições, repre-
sentando uma complexa constelação
de atores.6 As mudanças promovem
alterações nas relações de poder e
na autoridade dessas instituições, e
nos seus interesses. A reforma sig-
nifica o momento de reconstrução
da autoridade pública na saúde.
Esse aspecto implica em reforçar o
papel do Estado nos processos de
reforma, de modo a não permitir que
nenhum ator tenha o domínio (he-
gemonia) das decisões políticas.
• A dimensão industrial da
saúde. A saúde está inserida num
complexo mercado constituído por
fortes setores industriais, como o
farmacêutico e o de equipamentos
eletroeletrônicos, por exemplo, que
auferem elevadas taxas de lucro nas
economias capitalistas. A saúde é
ainda o setor formador / responsá-
vel por um imenso número de em-
pregos diretos e indiretos, sendo, em
muitos países, a maior fonte empre-
gadora. Estes fatores geram confli-
tos internos e externos, resumida-
mente, pela oposição entre redução
6 Os médicos são os principais atores não-governamentais, e suas organizações de interesses corporativos constituíram-se em alguns países
antes mesmo do evento da democracia liberal.
serção da política de saúde como
componente dos sistemas e mode-
los de proteção social propiciou a
consciência do direito à saúde, as-
similada por diferentes sociedades,
constituindo uma característica das
sociedades modernas a preocupação
com a saúde e a procura por cuida-
dos médicos. Para muitas socieda-
des, não parece mais possível ou até
ATUALMENTE, O ESTADO ESTÁ
SENDO COMBATIDO POR TER
DESEMPENHADO AMBAS AS FUNÇÕES,DE REGULAÇÃO DO CICLO ECONÔMICO
E DE CRIAÇÃO DE ESPAÇOS DE
INTEGRAÇÃO NÃO MERCANTIS
VIANA, Ana Luíza d’Ávila; SILVA, Hudson Pacífico da & ELIAS, Paulo Eduardo M.
16 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007
do gasto por imperativo fiscal ver-
sus expansão da demanda, pela
pressão das indústrias do setor (ex-
terno, tendo em vista que a indús-
tria ligada à saúde é altamente in-
ternacionalizada e globalizada). Re-
formar, não atendendo aos impera-
tivos da expansão da demanda, tam-
bém não parece muito viável.
Como afirmam FREEMAN & MO-
RAN (2002), os sistemas nacionais
de saúde se inserem em contextos
socioeconômicos e políticos espe-
cíficos, isto é, conformam as eco-
nomias capitalistas e, reciproca-
mente, foram desenvolvidos por
elas; concorreram para a forma-
ção da democracia política e fo-
ram também formados por ela.
Portanto, esse deve ser o marco
teórico para as análises da econo-
mia política da saúde, isto é, en-
tender o processo de constituição
simultâneo e complexo, às vezes
contraditório (quando o desenvol-
vimento de um processo impede
outro), outras vezes positivo (quan-
do um processo reforça o outro),
das três dimensões (saúde como
direito, bem econômico e campo de
acumulação de capital) presentes
na política de saúde.7
Por último, esses três processos
materializam, para área da saúde,
o conjunto de questões que envol-
vem a relação entre desenvolvimen-
to econômico e social, como vere-
mos em tópico específico.
2.2. Financiamento da saúde: ló-
gica da equivalência e lógica da
solidariedade
Duas lógicas distintas presidem o
financiamento da saúde em diferen-
tes sistemas: a lógica da equivalên-
cia, presente na compra de planos e
seguros, cujo benefício está associa-
do às condições de pagamento (por
isso, equivalência entre o que eu fi-
A lógica da equivalência é um
mecanismo difundido em países em
que o mecanismo dos planos e se-
guros é predominante, como os Es-
tados Unidos, e a lógica da solida-
riedade é dominante nos sistemas
beveridgianos ou universalistas,
como são os sistemas de saúde da
Europa do Norte.
O Quadro 2 exemplifica o financi-
amento da saúde em diferentes siste-
mas de saúde (modelo universalis-
ta, assistencial ou residual, ocupa-
cional ou previdenciário e misto) para
diferentes classes de renda. É inte-
ressante observar que o modelo ocu-
pacional também funciona dentro da
lógica da solidariedade, mas dentro
de grupos (categorias ocupacionais
e seus dependentes) fechados.
São representativos do modelo
assistencial os Estados Unidos; do
modelo ocupacional, a Europa conti-
nental; do modelo universalista uni-
ficado ou puro, os sistemas de saúde
da Europa do Norte e da Inglaterra, e,
finalmente, dos sistemas universais
mistos ou diversificados, o Brasil.
As discussões no campo da eco-
nomia política estão focadas em
melhor conhecer os impactos de
cada tipo de financiamento na equi-
dade dos sistemas e para verificar
de que forma cada tipo de financia-
mento pode estar confirmando ou
negando a desmercantilização do
acesso nessa área.
nancio/contribuo e o que eu recebo
de benefícios); e a lógica da solidarie-
dade, presente nos sistemas de saúde
universais, financiados com impos-
tos gerais. A lógica da solidariedade
importa em socializar o financiamen-
to do risco de adoecer entre todos os
cidadãos de uma dada comunidade
ou país, onde todos pagam pela pres-
tação da assistência para todos.
7 No caso de FREEMAN e MORAN, as três dimensões se referem aos aspectos do direito, econômico e político, presentes na política de saúde. No
caso da economia política da saúde, os três processos são da saúde como direito, bem econômico e campo de acumulação de capital.
OS SISTEMAS NACIONAIS
DE SAÚDE SE INSEREM
EM CONTEXTOS
SOCIOECONÔMICOS EPOLÍTICOS ESPECÍFICOS
Economia política da saúde: Introduzindo o debate
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007 17
O crescimento do gasto privado
em alguns sistemas é um movimento
claro de mercantilização do acesso
e de negação do direito social.
Identificar as formas atuais de
(des)mercantilização a partir da aná-
lise do financiamento dos sistemas é
um exercício no campo da economia
política da saúde, e prioritário, no
sentido de melhor compreender me-
canismos visíveis e invisíveis do avan-
ço das formas mercantis, que podem
conduzir a um quadro de inseguran-
ça, próximo daquele que viveram os
trabalhadores do século XIX.
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO ESOCIAL E SAÚDE
Nas sociedades contemporâneas,
o bem-estar da população é fruto de
três tipos de políticas públicas: as
políticas de crescimento econômico
que garantem renda e emprego; as
políticas sociais universais, que se
responsabilizam pela promoção da
igualdade e qualidade de vida, como
previdência social, educação e aten-
ção à saúde; e, finalmente, as polí-
ticas assistenciais voltadas para os
grupos de excluídos por renda ou
algum outro tipo de discriminação.
Isto é, o bem-estar é fruto tanto do
desenvolvimento econômico quanto
do desenvolvimento social.
AMARTYA SEN, em texto recente
(SEN, 2004), dividiu as teorias do
desenvolvimento em dois grupos:
o primeiro seria constituído por te-
orias que tratam do desenvolvimen-
to como um processo de sacrifícios
e a idéia de que qualquer processo
de progresso material traz inevita-
velmente mais sacrifícios que bem-
estar (como advogam as concep-
ções que defendem que os interes-
ses dos indivíduos e grupos devem
ser subordinados aos interesses do
crescimento econômico), o que pode
justificar vias autoritárias e, no li-
mite, o crescimento sem melhorias
na distribuição de renda e de bene-
fícios sociais. O segundo grupo,
mais palatável, seria representado
pelas teorias que admitem uma
combinação virtuosa entre desen-
volvimento, liberdades individuais
e maior igualdade social, e valori-
zam políticas públicas que promo-
vem o bem-estar coletivo.
Nesse último caso, a idéia de
desenvolvimento é entendida como
desenvolvimento econômico e so-
cial, e deve estar associada à me-
lhor distribuição eqüitativa da ri-
queza e da renda, ao estabeleci-
mento de um equilíbrio regional,
a garantia de soberania nacional,
uma sociedade civil forte e um
Estado democrático.
Segundo Furtado (1968; 1998),
isso distingue o desenvolvimento,
em sentido lato, da situação de sub-
desenvolvimento, pois o subdesen-
volvimento não é uma etapa do de-
senvolvimento, mas um desenvolvi-
mento sem as características virtu-
osas apontadas aqui. Esse proces-
so se traduz na emergência e ama-
durecimento da democracia, e não
se faz, entretanto, de forma linear.
Se olharmos para a história dos
modernos sistemas de proteção so-
cial (no sentido de que eles materia-
lizaram formas de desenvolvimento
social), veremos que o pleno flores-
cimento dos mesmos esteve mais
QUADRO 2 – Financiamento da Saúde segundo diferentes sistemas e classes de renda
Fonte: Médici A.C. Economia e financiamento do setor saúde no Brasil: balanços e perspectivas do processo de descentralização. Faculdade de Saúde Pública da USP, 1994.
Camadas da População Modelo Assistencial ou Residual Modelo Ocupacional ou Previdencialista
Modelo Universalista Unificado Modelo Universalista Misto ou Diversificado
Classes de baixa renda Fontes fiscais Sem recursos definidos Fontes fiscais e contribuições sociais gerais
Fontes fiscais e contribuições sociais gerais
Trabalhadores formais e classe média
Pagamento direto pelos serviços Contribuições sociais sobre folha de salários
Fontes fiscais e contribuições sociais gerais
Contribuições sociais sobre folha de salários (compulsórias)
Grupos de alta renda Pagamento direto pelos serviços Pagamento direto pelos serviços Fontes fiscais e contribuições sociais gerais
Pagamento direto pelos serviços, planos privados especiais (voluntário)
VIANA, Ana Luíza d’Ávila; SILVA, Hudson Pacífico da & ELIAS, Paulo Eduardo M.
18 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007
associado a um tipo específico de
desenvolvimento capitalista, o capi-
talismo do pós-guerra.
É importante perceber que os sis-
temas de proteção social têm dife-
rentes características segundo os
padrões de desenvolvimento capita-
lista: na etapa liberal, emergiram os
seguros nacionais e ocupacionais,
e foi somente no pós-guerra que flo-
resceram, com intensidade e exten-
são, os modelos universais.
Por isso, o Estado de Bem-estar
Social (Welfare State) configura um
momento e um regime8 específico de
proteção social, introduzido a partir
de políticas sociais mais abrangen-
tes para diferentes grupos sociais, de
efeito sinérgico e incorporando as
classes médias em expansão.9 Este
padrão ou regime de proteção social
emerge na Europa no pós-guerra, e
configura uma etapa específica de
desenvolvimento capitalista, quando
o papel do Estado se alastra para
diferentes campos e ganham impor-
tância, nas decisões políticas, atores
como a burocracia governamental,
sindicatos e a grande corporação.
Algumas condições especiais
estão na raiz do surgimento do wel-
fare state no pós-guerra: a expan-
são do emprego e a incorporação
dos ganhos de produtividade nos
salários; o crescimento de um con-
sumo de massas; a teoria econô-
mica keynesiana que legitima e
modela a intervenção pública; o
crescimento da capacidade admi-
nistrativa do Estado; e o aprofun-
damento dos compromissos demo-
cráticos por parte da sociedade.
Segundo BELLUZZO (2005), citan-
do Bobbio, a democracia moderna
indivíduos submetidos à socializa-
ção dos mercados.
O desenvolvimento social, por
sua vez, pode ser visto como o grau
de legitimidade dado pela socieda-
de às necessidades sociais; esse
grau de legitimidade (das necessi-
dades sociais em dada sociedade)
determina o quão democrática essa
sociedade é.
Para muitos autores, a garan-
tia e a ampliação do atendimento
das necessidades sociais é a úni-
ca forma de compatibilizar econo-
mia de mercado, democracia e bem-
estar coletivo.
Os sistemas de proteção social
exprimem, por sua vez, tanto esse
grau de legitimidade quanto as res-
postas dadas por diferentes socieda-
des sobre quem proteger, quanta
proteção oferecer e como oferecer
essa proteção aos cidadãos de uma
dada territorialidade.
Além disso, aproximar bem-es-
tar individual do bem-estar público
é essencial, tendo em vista a cres-
cente socialização dos riscos soci-
ais entre grupos populacionais, re-
giões e países por conta do proces-
so de globalização. Nesse aspecto,
o papel do Estado é cada vez mais
relevante para garantia de renda,
8 ‘Regime’ expressa as formas de compartilhamento dos riscos sociais pela família, mercado e Estado em diferentes momentos históricos.
Observe-se que o termo será usado por OFFE (1993) para designar as considerações morais e políticas que sustentam o grau de compartilha-
mento dos riscos na política social. Esping-Andersen, por sua vez, utiliza esse mesmo termo para designar os diferentes arranjos entre
família, mercado e Estado nos diferentes tipos de Bem-estar Social (WS).
9 MELLO (1995) assinala que essa talvez seja a principal mudança ocorrida nos modelos de intervenção do Estado na área social,
configurando um terceiro modelo, quando o WS deixa de ser entendido enquanto mecanismo institucional voltado para os grupos mais
destituídos (pós-guerra).
significa, na verdade, a imposição
de limites ao domínio do econômi-
co, ao jogo da acumulação e do
enriquecimento privado para pre-
servar as condições de vida, o meio
ambiente, a saúde psicológica dos
APROXIMAR BEM-ESTAR
INDIVIDUAL DO BEM-ESTAR
PÚBLICO É ESSENCIAL,TENDO EM VISTA A CRESCENTE
SOCIALIZAÇÃO DOS
RISCOS SOCIAIS
Economia política da saúde: Introduzindo o debate
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007 19
emprego e políticas sociais univer-
sais, tendo em conta as limitações
do mercado e mesmo de novos seto-
res (ONGs, OSCIPs etc.) para amplia-
ção da extensão da proteção social
tanto na área de saúde quanto junto
aos demais setores componentes da
área social.
Dessa forma, os rumos do de-
senvolvimento social dependem do
enfrentamento desse conjunto de
questões e desafios, isto é, da vin-
culação entre bem-estar público e
QUADRO 3 – Questões que definem determinada via de desenvolvimento social
individual; do grau de legitimida-
de das necessidades sociais e do
papel do Estado como financiador,
regulador e articulador de um con-
junto de políticas. O Quadro 3 re-
sume essas questões, cujas respos-
tas permitem caracterizar os tipos
/ vias de desenvolvimento social em
determinado país.
Certamente, as questões aqui
elencadas são preliminares e não
esgotam todos os aspectos envolvi-
dos com o desenvolvimento social.
1. Qual o grau de legitimidade que as necessidades sociais possuem?
2. Quais são as maiores dificuldades (financeiras, organizacionais e administrativas, recursos humanos, políticas, tecnológicas etc.)para que o Estado melhor atenda a essas mesmas necessidades?
3. Qual o grau de articulação presente entre as políticas responsáveis pelas condições de bem-estar da população e que medidassão prioritárias para o incremento desse grau de articulação?
4. Qual o impacto das atuações setoriais para a melhora das condições de vida e saúde?
Por isso, a melhora das condi-
ções de saúde não depende apenas
do êxito das políticas de saúde,
mas também da forma como estão
sendo conduzidas as diferentes po-
líticas públicas responsáveis pela
garantia de condições mínimas de
bem-estar para a população como
um todo. Isto é, como se combina
desenvolvimento econômico e soci-
al. A forma, o tipo dessa combina-
ção é o balizador das estratégias
de extensão da proteção social em
saúde. E a inter-relação entre de-
senvolvimento econômico e social
nada mais é do que a tradução, para
o setor saúde, das formas como se
combinam e são reguladas as três
dimensões / processos – do direito,
econômica e política – discutidos
nesse texto.
A etapa atual do capitalismo, ao
dissociar desenvolvimento econômi-
co de desenvolvimento social, isto
é, ao deixar de ver, por exemplo, o
gasto social como componente im-
portante da demanda agregada e
como fator central na garantia do
direito social, no sentido da plena
autonomia do homem, coloca novos
desafios para as políticas setoriais,
ao mesmo tempo que introduz limi-
tes sérios para a sobrevivência de
algumas políticas públicas.
Retomar a discussão conjunta
entre desenvolvimento econômico e
social é a única forma de fugir, por
um lado, das amarras do economi-
cismo, o pensamento dominante atual
na área da economia, que naturali-
za o movimento de avanço das nor-
mas da mercantilização e da concor-
rência em todas as esferas da vida,
segundo Belluzzo, como critérios
dominantes da integração e do reco-
nhecimento social. Por outro, das vi-
sões seletivas e reducionistas da po-
lítica social, neste caso entendidas
apenas como combate à pobreza.
Aqui cabe uma nota para o caso
brasileiro, dadas as especificidades
das inter-relações entre o desenvol-
vimento econômico e social em nos-
so país, muito bem retratado no ar-
tigo de AMÉLIA COHN (2005). Em nos-
so caso, o aspecto tardio da implan-
tação do SUS (ver a definição de VI-
ANA (2002) para o uso do termo ‘tar-
dio’) – tardio, inclusive, no sentido
de ter sido implantado na derroca-
da do projeto nacional desenvolvi-
mentista, ao término de seu período
de apogeu, isto é, em um período
de crise, com subseqüente adoção
de políticas de cunho liberal no pla-
no econômico (configurando 15
anos de políticas liberais, um tem-
po de ‘hegemonia liberal’, na expres-
são de Brasílio Sallum Júnior) –,
naturalmente, impõe limites bastan-
te sérios para a efetiva implantação
de políticas mais universalistas, re-
distributivistas e igualitárias. Esse
processo, de emergência de políti-
VIANA, Ana Luíza d’Ávila; SILVA, Hudson Pacífico da & ELIAS, Paulo Eduardo M.
20 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 7-20, janeiro 2007
cas universais, difere radicalmente
das experiências européias, nas
quais a construção dos sistemas de
proteção social esteve associada a
abrangentes projetos de desenvolvi-
mento – o crescimento econômico do
pós-guerra – e o pleno florescimen-
to de um modelo de gestão integra-
do público (ver VIANA, 2002, para
definição desse modelo).
Dessa forma, o SUS carece de
uma integração com políticas de
crescimento e desenvolvimento, e
isso tem implicado um perfil espe-
cífico de implantação dessa políti-
ca. Certamente, a ausência de uma
política de investimentos para o SUS
e de um planejamento estratégico no
plano federal são as conseqüências
mais graves desse fato, isto é, da
ausência de integração entre a polí-
tica econômica e a política social.
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As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 21
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos desaúde no Brasil
New layout for old problems: financing and expenditures in public health services and actions in Brazil
José Aparecido Ribeiro1, Sérgio Francisco Piola1 & Luciana Mendes Servo1
1 Diretoria de Estudos Sociais, Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, Brasília, Distrito Federal, Brasil.
RESUMO
A Emenda Constitucional 29 estabeleceu a vinculação de recursos orçamentários da União, estados e municípios,
para despesas com Ações e Serviços Públicos de Saúde, com os objetivos de proporcionar maior estabilidade aos recursos
da Saúde e fazer com que as esferas subnacionais aumentassem sua participação no financiamento do SUS. A partir dos
dados do SIAFI para o período de 1995 a 2004, realiza-se uma análise detalhada da trajetória do financiamento e dos
gastos do Ministério da Saúde (MS) e das Ações e Serviços Públicos de Saúde. Destacam-se momentos de inflexão como
a criação da CPMF, a aprovação da Emenda 29 e a redução dos gastos federais ocorrida em 2003, além do crescimento do
gasto com transferências frente aos gastos diretos do MS. Utilizando dados do SIOPS para o período de 2000 a 2003,
analisa-se ainda a trajetória do gasto público da União, dos Estados e Municípios com Ações e Serviços Públicos de
Saúde, bem como a sua respectiva distribuição entre as três esferas de governo. Constata-se que a implementação da EC
29 obteve impactos distintos em cada uma das três esferas, alterando a composição relativa do financiamento público
da Saúde. Observa-se uma estagnação da participação federal ao lado de um crescimento da participação de estados e
municípios – embora os estados ainda não alcancem, em média, os mínimos exigidos pela EC 29.
PALAVRAS-CHAVE: Economia da Saúde; Financiamento da Saúde; Gasto Público Federal em Saúde; Gastos Públicos em
Saúde; Emenda Constitucional n. 29.
ABSTRACT
The Constitutional Amendment 29 (EC 29)sets forth the connection of the Federal, State and Municipal Government
budget resources, for expenses with Public Health Actions and Services, with the purposes of providing greater
stability to the Health resources, making sub-national spheres to increase their participation in the Unified Health
System (SUS) financing. As from data of the SIAFI for the period between 1995 and 2004, a detailed analysis is carried
out of the financing and expenditures of the Health Ministry (MS) and Public Health Actions and Services. We
highlight moments of inflection as the creation of the CPMF (Transitory Contribution over Financial Transactions),
the approval of Amendment 29 and the reduction of federal costs occurred in 2003 apart from the increased expenditure
with transfers considering direct expenditures of the MS. Using data from the SIOPS (Informational System on Public
Expenditure with Health) for the period between 2000 and 2003, we analyze also the route of the Federal, State and
Municipal public expenditure in Public Health Actions and Services, based on their respective contribution within the
three governmental spheres. We notice that the implementation of the EC29 had different impacts on each of the three
spheres, altering the composition related to the public health financing. We observed a stagnation of the federal
participation next to a growth in the participation of states and municipalities – although the states have not yet
reached, in average the minimum level required by the EC29.
KEYWORDS: Health Economics, Financing Health; National Government Expenditures on Health; Government
Expenditures on Health; Constitutional Amendment #29.
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
22 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
INTRODUÇÃO
O financiamento da saúde é, por
motivos diversos, objeto de preocu-
pação em quase todos os países do
mundo. Naqueles desenvolvidos,
que investem parcela considerável
do seu Produto Interno Bruto (PIB)
em saúde, a preocupação cresce,
com a eficiência, efetividade e equi-
dade nos gastos, uma vez que o in-
cremento nos dispêndios com servi-
ços médico-assistenciais não redun-
dam, necessariamente, em melhores
condições de saúde e nem resolvem,
de modo automático, as iniqüida-
des no acesso aos serviços. Nos paí-
ses em desenvolvimento, por sua vez,
existe o problema adicional de esten-
der a cobertura a toda a população e
de atender às exigências de financia-
mento setorial em concorrência com
outras necessidades do desenvolvi-
mento social e econômico.
Basicamente, os recursos para
o financiamento da saúde vêm de
dois grupos de agentes econômi-
cos – famílias e empresas. O Esta-
do, apesar de não gerar recursos
a não ser quando desenvolve ati-
vidade produtiva, tem o papel im-
portante de arrecadar – por inter-
médio de impostos, contribuições
e taxas – e distribuir recursos fi-
nanceiros para execução de ações
e serviços públicos.
A intervenção do Estado nesse
setor é justificada porque saúde é
um setor especial, diferente de ou-
tros setores da economia, e também
é uma necessidade especial, distin-
ta de outras necessidades conside-
radas básicas. Tal diferença vem da
relativa imprevisibilidade das ne-
cessidades de atenção, do fato de a
falta de atendimento oportuno po-
der levar à morte, e dos custos do
atendimento, por vezes elevadíssi-
mos, poderem ser financeiramente
catastróficos para as famílias, in-
clusive as de renda média.1
sar de tudo, a efetiva constituição e
configuração dos sistemas de aten-
ção à saúde dependem da trajetória
histórica e política de cada nação,
especificamente no campo dos direi-
tos sociais – o que resulta em con-
siderável diversidade de ‘soluções’
encontradas para a questão da saú-
de: alguns países adotam sistemas
universais, outros contributivos; uns
mais voltados para o mercado, ou-
tros predominantemente públicos.
Os modelos de financiamento da
saúde evoluíram de uma relação
direta consumidor/provedor, que
ainda se mantém de forma mais re-
duzida, para a criação de ‘fundos’
que agregam recursos, com o obje-
tivo básico de tornar o financiamen-
to da saúde mais solidário. Essa
função solidária está na gênese das
‘caixas’ por categorias profissio-
nais, da criação dos seguros soci-
ais, dos sistemas nacionais de saú-
de e até mesmo dos planos coleti-
vos privados de saúde.
Em sistemas nacionais existem
dois modelos paradigmáticos quan-
to à origem dos recursos alocados
pelo setor público: 1) financiado
basicamente por impostos gerais –
Modelo Beveridge –, como são, por
exemplo, os sistemas da Suécia,
Dinamarca e Inglaterra; e, 2) finan-
ciado majoritariamente por contri-
buições sociais, complementado por
impostos gerais – Modelo Bismar-
ckiano –, como são, por exemplo,
1 Para aprofundar a discussão dessa questão, ver MUSGROVE (2004).
Além disso, a intervenção do Es-
tado na saúde é justificada pelas
imperfeições do mercado da saúde,
pelas características de bem públi-
co de algumas atividades sanitári-
as, pelas externalidades geradas por
alguns serviços. Todas essas carac-
terísticas do setor justificam a par-
ticipação do Estado, seja como fi-
nanciador, seja como regulador das
atividades no campo da saúde. Ape-
BASICAMENTE,OS RECURSOS PARA O
FINANCIAMENTO DA SAÚDE
VÊM DE DOIS GRUPOS DE AGENTES
ECONÔMICOS – FAMÍLIAS
E EMPRESAS
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 23
os sistemas da Bélgica, França, Ho-
landa e Alemanha.2
De maneira geral, nos países de-
senvolvidos e em desenvolvimento a
maior parte do financiamento da saú-
de provém de fontes públicas.3 Nos
países da OCDE4 a maior parte do fi-
nanciamento – em torno de 70% –,
provém de fontes administradas pelo
poder público. Na América Latina,
onde predominam sistemas segmen-
tados, a participação de recursos
públicos é bem menor – inferior a
50%. O desembolso direto, forma
mais iníqua e instável de financia-
mento é, paradoxalmente, maior nos
países mais pobres (OMS, 2000).
FINANCIAMENTO DO SISTEMADE SAÚDE BRASILEIRO
O sistema de saúde brasileiro é
pluralista e, de certa forma, segmen-
tado, em termos das formas organi-
zacionais de atenção à saúde e das
fontes de financiamento. Essa plu-
ralidade é expressa nas quatro vias
básicas de acesso da população aos
serviços de saúde, que são:
• sistema único de saúde, que é
de acesso universal, gratuito, fi-
nanciado com recursos públicos;
• segmento de planos e seguros pri-
vados de saúde, de vinculação ele-
tiva, financiado com recursos das
famílias e/ou dos empregadores;
• segmento de atenção aos ser-
vidores públicos, civis e mili-
tares, de acesso restrito a es-
sas clientelas, financiado com
recursos públicos e contribui-
ções dos próprios servidores
– os chamados sistemas de
‘clientela fechada’;
• segmento de provedores priva-
dos autônomo de saúde, de
acesso direto mediante paga-
mento no ato.
O financiamento público, de cer-
ta forma, estende-se a todos esses
segmentos. Em alguns, de forma
mais direta e mais preponderante.
Em outros, como é o caso dos seg-
mentos privados, de forma mais
indireta, por meio da possibilida-
de de descontar os gastos com
médicos, laboratórios, hospitais e
planos de saúde dos rendimentos,
para fins de declaração do Impos-
to de Renda.
O Brasil não tem um sistema de
contas nacionais em saúde, o que
não permite dizer com precisão ade-
quada nem o gasto total com saú-
de e, muito menos, de onde se ori-
ginam os recursos.5 Sabe-se mais
sobre o gasto público. Têm-se esti-
mativas sobre os gastos das famí-
lias, com base nas pesquisas de or-
çamento familiar (POF-IBGE),6 mas
muito pouco sobre a participação
patronal, isto é, o gasto realizado
pelos empregadores.
2 Segundo SKIDELSKY (1998), o modelo bismarckiano começou na Alemanha em 1880, com base em um 'seguro social' compulsório. As
contribuições e benefícios eram associados aos rendimentos, bem como às ocupações, sendo a administração descentralizada. As contribui-
ções eram feitas em conjunto por empregados e empregadores que administravam os 'fundos sociais' que pagavam os benefícios. O modelo
beveridgiano, implementado na Inglaterra em 1940, está relacionado a um sistema com base em impostos e, em geral, com base de direitos
universais. Os benefícios, portanto, não eram baseados em contribuição, mas num cálculo de necessidades.
3 A exceção mais importante são os Estados Unidos, onde a maior parte dos recursos é originária de fontes privadas. O modelo dos EUA
baseia-se fundamentalmente na cobertura por meio da inserção no mercado de trabalho. A provisão de assistência à saúde pelo empregador
não é obrigatória, ainda assim, 61% da população estão cobertos por essa modalidade. Existe uma cobertura federal para os idosos e pessoas
portadoras de deficiência – Medicare –, complementada por uma cobertura compartilhada entre o nível federal e o estadual para os
indigentes que sejam também idosos, deficientes, crianças ou gestantes – Medicaid. O restante da população, para ter atenção à saúde, deve
pagar por ela diretamente do bolso – out-of-pocket (ROSS et al., 1999, p.73).
4 A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) reúne os países mais ricos e/ou desenvolvidos do mundo. Fundada
nos anos 1960, é composta pela maioria dos países da Europa Ocidental, EUA, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Japão, além dos novos
membros integrados nos últimos dez anos, como Coréia, México e alguns países do Leste Europeu.
5 Para uma apresentação esclarecedora das propriedades e limites das Contas de Saúde, ver SERVO et al. (2005).
6 cf. SILVEIRA et al. (2002).
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
24 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
A Organização Mundial de Saúde
(OMS) estima, no entanto, que o Bra-
sil gasta cerca de 7,6% do PIB com
saúde, que o gasto privado respon-
de por 58,4% do gasto total e que o
gasto direto das famílias atinge cer-
ca de 37,4% do gasto total em saúde,
ou ainda, 64,1% do total do gasto
privado (OMS, 2004). Se as estimati-
vas da OMS estiverem corretas7, se-
ria possível dizer que a sociedade
brasileira gasta com saúde uma par-
cela do PIB bastante próxima à dos
países da OCDE (ver Tabela 1). Entre-
tanto, como nosso produto interno
bruto per capita é menor do que o
desses países, percentuais equivalen-
tes significam gastos per capita em
saúde consideravelmente menores.
Como agravante, percebe-se que a
participação privada no Brasil é
maior do que naqueles países da
OCDE que possuem sistemas de saú-
de públicos e universais.
No ano de 2003, segundo dados
do Sistema de Informações Orçamen-
tárias sobre Políticas de Saúde (SI-
OPS), a estimativa do gasto público
total em saúde, ou seja, a soma de
todos os gastos da União, do Distrito
Federal, dos estados e dos municípi-
os em relação ao PIB, foi de 3,45%
(SIOPS, 2005). Cotejando com os re-
sultados de outros países, segundo
dados da Organização Mundial de
Saúde (OMS, 2004, p.136-43), para
o ano de 2001, o gasto público total
em saúde na França, na Espanha e
na Inglaterra correspondeu, respec-
tivamente, a 7,2%, 5,4% e 6,2% do PIB.
Na Argentina e Cuba, o gasto públi-
co correspondia, respectivamente, a
5,1% e 6,2%. Nos EUA, que têm um
sistema de saúde assentado com pre-
dominância no mercado, tais gastos
alcançavam 6,2% do PIB.8
FINANCIAMENTO PÚBLICO – ALGUMASCARACTERÍSTICAS
A garantia de fontes estáveis para
o financiamento público da saúde
sempre foi uma aspiração do setor.
Os constituintes de 1988 manifesta-
ram esse desejo ao dispor no artigo
55 do Ato das Disposições Constitu-
cionais Transitórias (ADCT) que
“...até que seja aprovada a lei de
diretrizes orçamentárias, trinta por
cento, no mínimo do orçamento da
seguridade social, excluído o segu-
ro-desemprego, serão destinados ao
setor saúde” (BRASIL, 1988). Parado-
xalmente, ao atribuir transitorieda-
de à vinculação, o legislador cons-
tituinte estaria, aparentemente, se
posicionando contra uma vincula-
ção específica e permanente, confi-
ando que, a cada ano, a Lei de Dire-
trizes Orçamentárias (LDO) definiria
a partilha mais adequada (BARROS et
al., 1996. p.65). Esse dispositivo foi
colocado em algumas LDOs, valen-
do mais como um teto orçamentá-
rio do que para a realização efetiva
de despesas. Mas, a partir de 1993,
TABELA 1 – Gasto Nacional em Saúde: percentual do PIB, per capita e participação do públicoe privado: estimativas para 2001
1 Em dólares internacionais, ou seja, valores padronizados segundo paridade de poder de compra (PPP)
Fonte: OMS (2004).
7 Como dissemos antes, o Brasil não possui um sistema de Contas de Saúde que permita dizer se essas estimativas estão ou não corretas. A
forma como a OMS calcula esses dados pode levar a que as informações apresentadas no quadro tenham não só problemas de comparabi-
lidade, mas também dupla contagem dos gastos, no caso brasileiro.
8 Interessante notar ainda que, embora o setor público de EUA e Inglaterra apliquem os mesmos 6,2% do PIB na área da Saúde, o significado
é distinto: os gastos do setor público correspondem a 82% do total dos dispêndios do setor na Inglaterra, enquanto que nos EUA este
percentual representa apenas 44% do total dos gastos em saúde.
País % PIB Per capita1 em saúde Índice Brasil: 100 % Público % Privado
Alemanha 10,8 2820 492 74,9 25,1
Brasil 7,6 573 100 41,6 58,4
Espanha 7,5 1607 280 71,4 28,6
EUA 13,9 4887 853 44,4 55,6
Reino Unido 7,6 1989 347 82,2 17,8
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 25
diante dos aumentos da despesa pre-
videnciária, os recursos arrecadados
pelo INSS deixaram de ser repassa-
dos ao Ministério da Saúde (MS),
sendo exclusivamente destinados à
Previdência. Como conseqüência, a
Saúde perdeu importante fonte de
cobertura de seus gastos, tendo de
disputar com outras áreas uma mai-
or participação nas demais fontes de
receitas, como a Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social
(COFINS) e Contribuição sobre o Lucro
Líquido de Empresas (CSLL).
A responsabilidade maior pelo
financiamento da seguridade social
– na qual a saúde está incluída – é
da União, mais isso não exclui ou-
tras instâncias de governo de com-
partilharem seu financiamento: a
Constituição, em seu artigo 159,
especifica que “...a Seguridade So-
cial será financiada (....) mediante
recursos provenientes dos Orçamen-
tos da União, dos Estados, do Dis-
trito Federal e dos Municípios e das
seguintes contribuições sociais
(...)” (BRASIL, 1988). De qualquer for-
ma, apesar de, na prática, estados e
municípios participarem do financi-
amento do SUS, havia uma relativa
ausência de critérios e parâmetros
para definir a participação dos go-
vernos subnacionais, fazendo que
todas as pressões para aumento dos
recursos setoriais recaíssem exclu-
sivamente sobre a União.
A situação de incerteza levou à
busca de soluções transitórias,
como a criação do Imposto Provisó-
rio sobre a Movimentação Financei-
ra (IPMF), em 1994, posteriormente
rebatizado como Contribuição Pro-
visória sobre a Movimentação Finan-
ceira (CPMF) em 1996. A CPMF vi-
ção desses problemas, o MS teve que
recorrer à utilização de empréstimos
junto ao Fundo de Amparo ao Tra-
balhador (FAT)10 que, se por um lado,
foram fundamentais para tornar
possível a travessia de uma situa-
ção particularmente crítica no finan-
ciamento da Saúde, por outro, one-
raram os orçamentos dos anos sub-
seqüentes. Assim, diante desse qua-
dro, desde 1993 começaram a sur-
gir, no âmbito do legislativo, diver-
sas propostas para dar maior esta-
bilidade ao financiamento setorial.
O ponto comum dessas propostas
era a vinculação dos recursos orça-
mentários dos três níveis de gover-
no que, no caso dos governos sub-
nacionais, variava de 10 a 15% da
receita disponível. O último desses
dispositivos foi o Projeto de Emen-
da Constitucional (PEC Aglutinativa
86-A) que, depois de aprovada pela
Câmara de Deputados e pelo Sena-
do, foi transformado na Emenda
Constitucional n. 29 (EC 29), em
agosto de 2000.
A EC 29 estabeleceu a vincula-
ção de recursos orçamentários da
União, estados e municípios, para
despesas com saúde. Para a União,
a EC 29 determina que, para o ano
9 Em prorrogações subseqüentes, a CPMF teve sua alíquota aumentada, passando a participar do financiamento das despesas previdenciá-
rias, a partir de 1999, e do Fundo de Combate à Pobreza, a partir de 2001.
10 "O Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT – é um fundo especial, de natureza contábil-financeira, vinculado ao Ministério do Trabalho
e Emprego – MTE –, destinado ao custeio do Programa do Seguro-Desemprego, do Abono Salarial e ao financiamento de Programas de
Desenvolvimento Econômico. A partir da promulgação da Constituição Federal, em 05 de outubro de 1988, nos termos do que determina
o seu art.239, os recursos provenientes da arrecadação das contribuições para o PIS e para o PASEP foram destinados ao custeio do
Programa do Seguro-Desemprego, do Abono Salarial e, pelo menos quarenta por cento, ao financiamento de Programas de Desenvolvi-
mento Econômico, esses últimos a cargo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES." (Ministério do Trabalho
e Emprego http://www.mte.gov.br/Trabalhador/FAT/Conteudo/Historico.asp).
gorou até o final de 1998 e, após
intenso debate legislativo, foi de
novo prorrogada, deixando de ser
uma contribuição exclusiva da saú-
de.9 Em caráter emergencial, em fun-
A EC 29 ESTABELECEU AVINCULAÇÃO DE RECURSOS
ORÇAMENTÁRIOS DA UNIÃO,ESTADOS E MUNICÍPIOS,
PARA DESPESAS COM SAÚDE
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
26 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
2000, o montante mínimo aplicado
em ações de saúde deveria ser o
valor executado em 1999, acresci-
do de 5%. Nos anos seguintes, en-
tre 2001 e 2004, o aumento das des-
pesas está vinculado à variação no-
minal do PIB. Para os estados e
municípios, os percentuais míni-
mos de vinculação de sua receita
de impostos deverão chegar a 12%
e 15% em 2004, respectivamente, es-
tipulando-se para o ano 2000 um
percentual mínimo de aplicação de
7% como ponto de partida. De acor-
do com estimativas feitas na oca-
sião, esperava-se que o impacto da
EC 29 fosse mais intenso sobre as
contas estaduais,
“...cujos gastos com saúde deverão
crescer 123% até 2004. Para a União
e municípios, os recursos adicionais
até 2004 serão da ordem de 20,7% e
45,0%, respectivamente, resultando
em um aumento total de 43,8% para
as três esferas de governo. Em valores
absolutos, isso representará um apor-
te de mais R$ 15,2 bilhões para a exe-
cução das ações e serviços públicos
de saúde.” (SIOPS, 2002)
Vemos, portanto, que a EC 29 teve
duas grandes motivações: garantir
recursos estáveis para a saúde, dian-
te das crônicas oscilações no volume
dos gastos públicos; e fazer com que
as esferas subnacionais, sobretudo os
estados, aumentassem sua participa-
ção no financiamento do SUS.
A importância e os objetivos da
EC 29, no entanto, transcendem a
preocupação com o volume e a re-
gularidade dos recursos no financi-
amento das políticas de saúde. Ao
exigir das esferas subnacionais
maior participação efetiva no finan-
ciamento da área, fortalece a parti-
cipação e a responsabilidade dessas
instâncias no arranjo federativo que
sustenta o SUS,11 como destaca BIA-
SOTO JUNIOR (2003. p.39-40):
“...a Emenda Constitucional n. 29
tem um papel crucial na ampliação
do gasto em saúde (...). No entanto,
fixação de recursos mínimos a serem
aplicados por cada uma das munici-
palidades trabalha no sentido de abo-
lir a prática identificada em certas re-
giões, onde alguns municípios, mais
comprometidos com o SUS, acaba-
vam assumindo a atenção à saúde
de cidadãos de outros municípios.”
Apesar dos seus aspectos positi-
vos, a EC 29 não está isenta de críti-
cas. Segundo DAIN (2001. p.136), a
EC 29 apresentou três problemas
sérios: o virtual abandono do Orça-
mento da Seguridade Social (OSS),
que previa solidariedade no finan-
ciamento das áreas que o compõem,
Previdência Social, Saúde e Assis-
tência Social; a dissociação da tra-
jetória dos recursos da saúde em
relação ao crescimento da arrecada-
ção das contribuições sociais – que
tem, sem dúvida, sido mais veloz; e
a vinculação ao PIB nominal, que
se torna um sério problema sob um
processo de estagnação econômica.
O risco de abandono dos princí-
pios da Seguridade Social, no que
tange o seu financiamento, deve ser
compreendido sob a constatação de
que, de fato, a implementação da
pretendida solidariedade entre as
áreas de Seguridade Social foi sem-
pre obstada, em diversas ocasiões,
em nome da austeridade fiscal e/ou
do ajuste de contas da Previdência.
O IPEA (2004. p.46) aponta, que
“...nesse contexto, as soluções se-
toriais, como a proposta pela EC 29,
partem de um cálculo realista, a
vale frisar a importância da EC no
sentido de reforçar as ações de saúde
numa situação de competência con-
corrente das três esferas de governo.
De um lado, a fixação de recursos
mínimos para aplicação dos Estados
serve como catalisador da discussão,
que já vem sendo conduzida, sobre a
necessidade da esfera estadual assu-
mir maiores obrigações dentro da ges-
tão do SUS, notadamente na alta e
média complexidade e na articulação
regional do sistema. De outro lado, a
11 Para uma discussão mais geral das relações entre o SUS e o marco federativo no Brasil, v. OLIVEIRA (2001).
A IMPLEMENTAÇÃO DA PRETENDIDA
SOLIDARIEDADE ENTRE AS ÁREAS DE
SEGURIDADE SOCIAL FOI SEMPRE OBSTADA,EM DIVERSAS OCASIÕES, EM NOME DA
AUSTERIDADE FISCAL E/OU DO AJUSTE
DE CONTAS DA PREVIDÊNCIA
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 27
inexistência de fato, e não de direi-
to, de institucionalidade que dê for-
ma e conteúdo aos princípios cons-
titucionais da Seguridade Social”.12
O critério de fixação da despesa
da União também tem sido alvo de
críticas. O parâmetro utilizado foi
um aumento de 5% no volume de
recursos aplicados em saúde em
1999, para o primeiro ano de vigên-
cia da EC – ano 2000 –, e a partir
daí, a correção pelo crescimento do
PIB. Como destaca Oliveira (2001,
p.38), “...desvinculou-se, na práti-
ca, (...) contribuições que têm apre-
sentado crescimento bem mais fa-
vorável do que o apresentado pelo
PIB – caso da COFINS, CPMF etc. –
de compromissos com o financia-
mento da Saúde.” Em outras pala-
vras, mesmo que o crescimento da
arrecadação tributária federal con-
tinue sendo liderado pelas contribui-
ções sociais, não necessariamente a
área de saúde será contemplada por
este crescimento.13
Por fim, a EC 29, ao vincular o
financiamento federal ao cresci-
mento nominal do PIB, virtualmen-
te congelou os recursos federais
para a área de Saúde, em termos
de participação no PIB, no patamar
atingido em 2000. De modo que os
recursos federais só se expandiri-
am em termos reais, dali para fren-
te, se ocorresse uma trajetória sus-
tentável de crescimento econômi-
co. De fato, como conclui DAIN
(2001. p.136), no âmbito federal a
EC 29 condena a população mais
carente e dependente do SUS a ser
duplamente atingida em caso de
estagnação econômica: pela que-
da na renda e aumento do desem-
prego, de um lado, e pela baixa
apresentou também problemas no
que se refere à sua efetiva imple-
mentação e controle. A intricada di-
versidade de enfoques e interpreta-
ções existentes dificulta a tarefa de
avaliar a aplicação da EC 29. Tenta-
remos resumir a seguir, o mais di-
daticamente possível, os dois prin-
cipais dissensos: a definição acerca
de quais gastos podem ser conside-
rados como “Ações e Serviços Pú-
blicos de Saúde”; e a base de cálcu-
lo a ser utilizada para a previsão
mínima de recursos, o embate ‘base
fixa’ versus ‘base móvel’.
Ao determinar que um patamar
mínimo de recursos – calculado
aplicando-se a variação nominal do
PIB sobre os gastos federais em Saú-
de ano a ano –, seria destinado obri-
gatoriamente a ‘ações e serviços
públicos de saúde’, a EC 29 não de-
terminou também quais ações go-
vernamentais seriam consideradas
para tal. Ao não expressar de modo
explícito, por exemplo, que apenas
os gastos com ações do SUS seriam
legítimos para o atendimento das
metas definidas na EC-29, foi aber-
to muito espaço para dúvidas. Dú-
vidas como o que fazer com as des-
pesas de saneamento; com os inati-
elevação dos recursos federais
para a saúde, do outro.
Além dos problemas vinculados
à trajetória futura do financiamento
da Saúde, apontados aqui, a EC 29
12 IPEA (2004, p.46) continua, apontando que "...significativo desse momento político da área de Saúde, no sentido de resguardar recursos de
forma setorialista, foi a recusa, na própria Conferência Nacional de Saúde de 2003, em sinalizar a criação de uma institucionalidade que dê
vida ao principio da Seguridade Social."
13 Além de implicitamente congelar a participação federal no SUS, deixando para as esferas subnacionais a responsabilidade pela elevação
no financiamento da saúde, PIOLA, REIS & RIBEIRO (2001. p.20), justificando a opção, apontam também a preocupação da EC 29 em constituir
uma defesa da vindoura reforma tributária, que, à época, esperava-se que atacasse e reformulasse todas as contribuições sociais. Ao se
vincular ao PIB, a EC 29 não se tornaria obsoleta poucos anos depois. Porém, isto não justifica de maneira adequada o tratamento
diferenciado à União - se o problema fosse o receio de se prender a contribuições sociais em vias de extinção, nada impediria que se fizesse
a vinculação federal sobre o conjunto da arrecadação tributária, do mesmo modo que foi feito para estados e municípios.
A INTRICADA DIVERSIDADE
DE ENFOQUES E INTERPRETAÇÕES
EXISTENTES DIFICULTA A TAREFA DE
AVALIAR A APLICAÇÃO DA EC 29
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
28 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
vos do setor saúde; com os gastos
das políticas de alimentação; e com
os gastos do setor público com ser-
viços de saúde de clientela fechada,
como os planos de saúde dos servi-
dores públicos, dentre outras. É es-
sencial, portanto, que se estabeleça
o que são ‘ações e serviços públi-
cos de saúde’, aos quais os recur-
sos foram vinculados, para que não
ocorram interpretações diferencia-
das a cada ano.14
Esta limitação foi em parte
equacionada na LDO de 2002 e de
2003, que definiam ‘ações e servi-
ços públicos de saúde’ como a to-
talidade das dotações do MS, des-
contada dos seus gastos com en-
cargos previdenciários da União
(EPU) e com os serviços da dívida,
descontando, também, a parcela
dos gastos financiada com recur-
sos do Fundo de Erradicação e Com-
bate à Pobreza (FCEP). Esta delimi-
tação, contudo, foi comprometida na
LDO de 2004, quando o artigo que a
determinava foi vetado pelo Execu-
tivo federal, com intuito de tornar
legal a inclusão dos recursos do
FCEP no âmbito da EC 29 – o que
permitiria ao governo utilizar os
recursos deste Fundo para cumprir
duas Emendas – a EC 31, que regu-
lamenta o FCEP, e a EC 29, que esta-
belece recursos mínimos para a área
de saúde. Na LDO de 2005, que ori-
enta o Orçamento do ano que se ini-
cia, o governo respeitou o entendi-
mento proposto pelo Legislativo,
mantendo a exclusão dos gastos do
MS financiados pelo FCEP.
Mesmo assim, ainda resta um
problema: a definição de ‘ações e
serviços públicos de saúde’ estabe-
lecida na LDO não exclui as ações
de transferência direta de renda, que
consolida os entendimentos do Con-
selho sobre a aplicação e implemen-
tação da EC 29, veremos que as di-
retrizes quinta, sexta e sétima não
consideram ações típicas de assistên-
cia social como integrantes do con-
ceito de ‘ações e serviços públicos
de saúde’. Neste sentido, para acom-
panhar a Emenda 29 de forma ade-
quada às recomendações do CNS,
deve-se descontar, além do previsto
na LDO, os gastos do MS com ações
de transferência direta de renda – o
antigo Bolsa-Alimentação, atualmen-
te parte integrante do Bolsa-Família.
Uma outra questão referente à
interpretação e implementação da EC
29, que tem gerado debate constan-
te, consiste na contraposição entre
os critérios de ‘base móvel’ e ‘base
fixa’. Por meio do artigo 77, adicio-
nado ao Ato das Disposições Consti-
tucionais Transitórias, a EC 29 defi-
niu como ponto de partida o exercí-
cio de 1999, uma vez que estabele-
ceu como patamar mínimo de recur-
sos da União para ações e serviços
públicos em saúde no ano 2000 “o
montante empenhado em ações e
serviços públicos de saúde no exer-
cício financeiro de 1999 acrescido
de, no mínimo, cinco por cento”.
Como o termo ‘empenhado’ é um
detém parcela significativa do orça-
mento do MS – R$ 818,8 milhões
executados em 2004, e R$ 1,1 bi-
lhão previstos na dotação inicial de
2005. Se consultarmos a Resolução
n. 322 do CNS, de maio de 2003, que
14 O MS organizou seminários sobre a operacionalização da EC 29 para tentar estabelecer consensos para a implementação da EC 29, com a
participação de representantes de Tribunais de Contas, do Conselho Nacional de Saúde, do Conselho Nacional de Secretários Municipais de
Saúde (CONASEMS), da Secretaria do Tesouro Nacional, além do próprio Ministério da Saúde e de diversos especialistas da área (SIOPS, 2002). A
proposta para o âmbito federal gira em torno da despesa realizada pelo Ministério da Saúde, sendo excluídos os gastos com inativos e
pensionistas e com amortização da dívida. Em relação ao saneamento básico, somente se considerariam, para efeitos da EC 29, as despesas
associadas ao controle de vetores, aos Distritos sanitários especiais indígenas ou outras ações que forem definidas pelo Conselho Nacional
de Saúde. Não seriam incluídas as despesas com merenda escolar e as relativas à coleta de lixo hospitalar. Nos seminários, entretanto, não
houve consenso em relação ao que considerar das despesas com encargos financeiros.
PARA ACOMPANHAR AEMENDA 29 DE FORMA ADEQUADA ÀS
RECOMENDAÇÕES DO CNS, DEVE-SE
DESCONTAR, ALÉM DO PREVISTO NA LDO,OS GASTOS DO MS COM AÇÕES DE
TRANSFERÊNCIA DIRETA DE RENDA
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 29
conceito de contabilidade pública
reconhecido na doutrina e legisla-
ção orçamentárias, não há dúvidas
a dirimir quanto ao piso definido
legalmente para o ano de 2000. Os
problemas surgem, entretanto, para
o período de 2001 a 2004, quando a
EC 29, no mesmo artigo 77, esta-
belece que os recursos mínimos a se-
rem aplicados corresponderão ao
“valor apurado no ano anterior, cor-
rigido pela variação nominal do Pro-
duto Interno Bruto”. Ao se empre-
gar o termo ‘apurado’ nesta frase, ao
invés de repetir o termo ‘empenhado’
utilizado antes, ou outro conceito
reconhecido, abriu-se espaço para
duplicidade de interpretação.15
A primeira interpretação defende
que o termo ‘apurado’ deve ser en-
tendido como ‘empenhado’, à seme-
lhança do que foi definido pela
Emenda para o ano 2000. Este en-
tendimento é conhecido como ‘crité-
rio de base móvel’, porque desta
forma a base de cálculo sempre será
o volume de recursos efetivamente
aplicado no ano anterior, exceto
quando este for inferior ao respecti-
vo piso mínimo calculado – o que
configuraria uma situação de des-
respeito à Emenda. Esta interpre-
tação é compartilhada, entre ou-
tros, pelo MS, pelo Conselho Naci-
onal de Saúde e pelo Tribunal de
Contas da União (TCU).
A segunda defende que o termo
‘apurado’ deve ser entendido como
‘calculado’, ou seja, o valor míni-
mo para determinado ano será o
valor mínimo calculado para o ano
anterior, corrigido pela variação
nominal do PIB. Esta interpretação
é conhecida como ‘critério da base
fixa’, pois ao considerar como base
de cálculo não a execução efetiva
do ano imediatamente anterior, mas
sim o piso calculado, os recursos
previstos para ações e serviços pú-
jamento, este último particularmen-
te importante na medida que orien-
ta os vetos presidenciais à LDO e à
Lei Orçamentária.
Em 2004, a Mensagem Presiden-
cial que encaminhou o Projeto de Lei
Orçamentária 2004 ao Congresso foi
favorável ao critério de ‘base mó-
vel’. Nela está manifesta a opção
pelo “critério definido pelo Tribunal
de Contas da União”, isto é, o crité-
rio de ‘base móvel’. Entretanto, na
LDO 2005, o artigo que definia como
base de cálculo o critério de ‘base
móvel’ voltou a sofrer veto presiden-
cial – assim como ocorrido na LDO
2003 –, restabelecendo deste modo
o critério de ‘base fixa’ como orien-
tador da Lei Orçamentária, e contra-
dizendo o comportamento adotado
pelo governo para 2004.
Na Tabela 2, podemos ver com
clareza como este debate entre as
distintas interpretações da EC 29
confunde o acompanhamento e a
avaliação acerca do cumprimento da
mesma. Comparando os gastos sob
o conceito de Ações e Serviços Pú-
blicos de Saúde utilizado na coluna
(b) – que exclui EPU, Juros e Amor-
tização da Dívida, FCEP e Transfe-
rências Diretas de Renda –, com o
piso calculado de acordo com o cri-
tério de ‘base fixa’ – coluna (c) –,
vemos que a Emenda teria sido
cumprida com relativa folga, exce-
blicos de saúde serão, em cada ano,
sempre correspondentes ao valor
empenhado em 1999, acrescido de
5% e corrigido pela variação nomi-
nal do PIB acumulada no período.
Tal entendimento é defendido, fun-
damentalmente, pelo Ministério da
Fazenda, pela Advocacia-Geral da
União, e pelo Ministério do Plane-
15 No texto da EC 29 está determinado que, em 2004, deveria ser aprovada Lei Complementar para regulamentar diversos pontos, que se
mostraram carentes de definições adicionais, e até mesmo revisar os parâmetros da referida Emenda. O Projeto de Lei está tramitando no
Congresso Nacional e é uma oportunidade de aperfeiçoamento do financiamento do Sistema Único de Saúde. De qualquer modo, enquanto
a Lei Complementar não for aprovada, continuam valendo os parâmetros básicos estabelecidos na EC 29.
AO SE EMPREGAR OTERMO ‘APURADO’,
AO INVÉS DE REPETIR OTERMO ‘EMPENHADO’, ABRIU-SE ESPAÇO PARA
DUPLICIDADE DE INTERPRETAÇÃO
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
30 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
tuando o exercício de 2003, quan-
do mesmo sob o piso menor obtido
a partir da ‘base fixa’, a execução
foi apertada.
Porém, se observamos a coluna
(d) – na qual o critério utilizado foi
o de ‘base móvel’, defendido pelo MS
e pelo Conselho Nacional de Saúde
–, o resultado da análise é comple-
tamente distinto. Excetuando o ano
de 2000, em nenhum outro exercí-
Tal valor é suficiente apenas para
atender o critério de ‘base fixa’ –
isto, apenas se a execução destes
programas alcançar o elevado pa-
tamar de 98%. Observando o crité-
rio de ‘base móvel’, seriam neces-
sários créditos adicionais a partir de
R$ 1,5 bilhão. Caso contrário, esta
diferença será acrescida no déficit
acumulado no cumprimento da
Emenda 29, que alcançaria a mar-
ca de R$ 4,4 bilhões.
Nesse sentido, merece menção
o recente Acórdão n. 957/2005 do
TCU, de 13 de julho. Neste docu-
mento, reafirmam-se alguns enten-
dimentos do TCU em relação à EC
29, dos quais destacam-se: 1) O
método considerado correto para
o cálculo do piso mínimo de apli-
cações em Ações e Serviços Públi-
cos de Saúde exigido pela Emenda
é o chamado critério de ‘base mó-
vel’; 2) Os gastos realizados por
meio do Fundo de Combate e Erra-
dicação da Pobreza, bem como os
gastos do Programa Bolsa-Família,
não devem ser considerados parte
integrante dos recursos aplicados
em Ações e Serviços Públicos em
Saúde; 3) O TCU reconhece que, de
acordo com os critérios reafirma-
dos nesse Acórdão, a Emenda Cons-
titucional n. 29 não foi cumprida
pelo governo federal no ano de
2003. Mas considera que os recur-
sos ausentes em 2003 foram ade-
quadamente compensados pelos
recursos excedentes em 2004,
quando a EC 29 teria sido cumpri-
TABELA 2 – Execução Orçamentária em Ações e Serviços Públicos de Saúde. Ministério da Saúde,2000 a 2004 e estimativa para 2005
cio desde então a Emenda teria sido
cumprida. Os recursos executados
em Ações e Serviços Públicos de
Saúde foram, sob este critério, per-
sistentemente insuficientes: R$ 0,6
bi a menos em 2001, R$ 0,2 bi em
2002, R$ 1,4 bi em 2003 e R$ 0,7 bi
em 2004, acumulando no período
um déficit de recursos da ordem de
R$ 2,9 bi, que deixaram de ser utili-
zados no cumprimento da EC 29.
Em R$ bilhões correntes
Fonte: SIAFI/SIDOR.1 Segundo a definição das LDOs: Gastos Totais do Ministério da Saúde, excetuando-se as despesas com Inativos e Pensionistas, Juros
e Amortizações de Dívida, bem como as despesas financiadas pelo Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza.2 Além das exclusões previstas na LDO, excluiu-se também nesta coluna as despesas com programas de transferência direta de renda.3 Sob o enfoque de ‘base fixa’, o percentual de variação do PIB nominal é aplicado sobre o valor mínimo de recursos calculado para
o ano anterior.4 Sob o enfoque de ‘base móvel’, o percentual de variação do PIB nominal é aplicado sobre o volume de recursos executado no ano
anterior, exceto quando este for inferior ao piso mínimo calculado.5 Dados da Execução para 2005 correspondem à Dotação Inicial.
Para 2005 o quadro não parece
promissor. A dotação inicial total do
MS para o corrente exercício é de
RS 40,5 bilhões. Excluindo-se os
gastos com Inativos e Pensionistas,
Juros e Amortização da Dívida, e
Fundo de Combate e Erradicação da
Pobreza, temos uma primeira apro-
ximação da dotação inicial para
Ações e Serviços Públicos de Saú-
de: R$ 36,8 bilhões, de acordo com
os critérios estabelecidos pela LDO.
Entretanto, a dotação do MS previs-
ta para financiar ações de transfe-
rências diretas de renda é de R$ 1,1
bilhão. Excluindo-se também este
valor, chegamos a uma dotação ini-
cial líquida de R$ 35,7 bilhões.
Exec. Orçamentária em Ações e Serv. Públicos de Saúde (a)1
Exec. Orçamentária em Ações e Serv. Públicos de Saúde (b)2
Base Fixa(c)3 Base Móvel(d)4
2000 20,4 20,4 19,3 19,3
2001 22,5 22,5 21,8 23,1
2002 24,9 24,9 23,8 25,1
2003 27,2 26,8 26,7 28,2
2004 32,7 31,9 30,8 32,6
2005 5 36,8 35,7 34,9 37,2
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 31
da; 4) O TCU também alerta a Pre-
sidência de República e o MS a res-
peito do sério risco de descumpri-
mento à Emenda no ano de 2005,
uma vez que as dotações iniciais
do Ministério de Saúde são clara-
mente insuficientes.
Uma questão importante em re-
lação a este último ponto, que ge-
rou muita polêmica, foi o crédito
adicional de R$ 1,2 bilhão ao MS
para o programa de transferência
direta de renda – o Bolsa-Família.
Embora tal recurso esteja suplemen-
tando a dotação orçamentária do
MS, ele não está resolvendo a insu-
ficiência de recursos para o cumpri-
mento da EC 29 em 2005 – segundo
a LDO, ações financiadas com recur-
sos do Fundo de Combate e Erradi-
cação da Pobreza não são conside-
radas Ações e Serviços Públicos de
Saúde. Além disso, como visto an-
tes, a Resolução 322 do Conselho
Nacional de Saúde também não re-
conhece gastos com ações de trans-
ferência direta de renda para fins de
cumprimento da Emenda. Nesse sen-
tido, seja por um ou por outro crité-
rio, estes recursos adicionais não
estarão contribuindo para a recom-
posição do orçamento do MS para
fins de cumprimento da Emenda
Constitucional n. 29.16 Excetuando
este crédito específico, as outras do-
tações orçamentárias do MS movi-
mentam-se muito pouco. Realizando
o mesmo exercício da Tabela 2, des-
ta vez para a dotação atual – dados
de 11 de novembro de 2005, da base
de dados de execução orçamentária
da COFF/Câmara e PRODASEN –, consta-
ta-se que enquanto a dotação atual
do MS passou de R$ 40,5 bilhões para
R$ 42,0 bilhões, a dotação líquida
para Ações e Serviços Públicos de
Saúde eleva-se apenas de R$ 35,7
bilhões para R$ 35,8 bilhões.
com detalhamento suficiente, o mes-
mo não acontece com os dados de
estados e municípios.
Nos anos 1990, foram realizados
pelo IPEA17 alguns levantamentos dos
gastos sociais estaduais e munici-
pais, que eram feitos a partir da ex-
pansão de amostra levantada pelo
Departamento de Contas Nacionais
(DECNA) do IBGE. Com a implantação
do Sistema de Orçamentos Públicos
de Saúde (SIOPS) pelo MS, o setor pas-
sou a contar com uma confiável fon-
te de informação. Ainda assim, ape-
sar da obrigatoriedade de alimentar
a base de dados do SIOPS, têm-se pro-
blemas para uma melhor aferição
dos gastos públicos em saúde. De
qualquer forma, já foram progressos
importantíssimos vis a vis a situa-
ção existente nas décadas anteriores.
A partir dos dados de recente
relatório divulgado pelo SIOPS (SI-
OPS, 2005), percebe-se que a im-
plantação da Emenda Constitucio-
nal n. 29 foi bem sucedida na bus-
ca do objetivo de elevar a partici-
pação de estados e municípios,
mas também que o seu desempe-
nho na União confirmou as piores
expectativas. Corrigindo pelo IGP
médio os valores encontrados pelo
SIOPS, vemos que os recursos des-
pendidos em Ações e Serviços Pú-
blicos de Saúde pelo Governo Fe-
16 Além disso, este crédito não constitui nem ao menos um acréscimo no total dos recursos para o Bolsa-Família – uma vez que ao crédito
realizado na parcela do programa contabilizada no MS correspondeu um idêntico corte na parcela contabilizada no Ministério do Desenvol-
vimento Social (BRASIL, 2005). E, pelo menos até o dia 11 de novembro, tal situação não se modificou.
17 A esse respeito, ver FERNANDES et al. (1998).
COMO ESTÁ A DISTRIBUIÇÃO DO GASTOPÚBLICO COM SAÚDE ENTRE AS TRÊS
ESFERAS DE GOVERNO?
A contabilização dos gastos pú-
blicos não é tarefa trivial. Se para o
gasto federal, a partir dos últimos
anos, existem bases confiáveis e
COM A IMPLANTAÇÃO DO
SISTEMA DE ORÇAMENTOS PÚBLICOS
DE SAÚDE (SIOPS), O SETOR
PASSOU A CONTAR COM UMA
CONFIÁVEL FONTE DE INFORMAÇÃO
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
32 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
deral mantiveram-se estagnados no
período – até 2003, quando ocorre
uma significativa queda. Já esta-
dos e municípios ampliaram seus
gastos em torno de 25% após a
aprovação da Emenda. Observan-
Em termos de percentuais do PIB,
a despesa com Ações e Serviços Pú-
blicos de Saúde das três esferas tam-
bém apresenta crescimento significa-
tivo no período. Porém, analisada por
esta ótica, a trajetória de crescimen-
to dos gastos públicos em Saúde se
apresenta um pouco mais fraca. O
crescimento dos recursos aplicados
por Estados e Municípios alcança o
patamar de 38% e 35%, respectiva-
mente, enquanto que os gastos do
governo federal recuam, particular-
mente no ano de 2003. Ainda assim,
o efeito consolidado das três esferas
de governo é de um crescimento de
mais de 11% nas aplicações em Ações
e Serviços Públicos de Saúde.
A implantação da EC 29 obteve
impactos distintos em cada uma das
três esferas de governo. Deste
modo, a composição do financia-
mento público da Saúde também se
alterou nos últimos anos. Os dados
do SIOPS revelam que o gasto públi-
co total com o SUS atingiu em 2003
o equivalente a 3,45% do PIB. Nes-
se ano, a União respondeu por
50,7% do total, os Estados por 22,8%
e os Municípios por 26,5%. No ano
de 1995, segundo dados estimados
pelo IPEA, a situação era bastante
diferente: os recursos da União res-
pondiam por 63,0% dos recursos
públicos destinados à saúde, os
Estados por 20,7% e os Municípios
TABELA 3 – Despesa com Ações e Serviços Públicos de Saúde por Nível de Governo, 2000 a 2003
do as três esferas de governo em
seu conjunto, o crescimento dos
recursos atingia quase 10% em
2002, mas este avanço foi quase
todo comprometido pelo desempe-
nho crítico realizado em 2003.18
R$ milhões de 2004, corrigidos pelo IGP médio
Fonte: SIOPS. Elaboração: DISOC/ IPEA.
TABELA 4 – Despesa com Ações e Serviços Públicos de Saúde por Nível de Governo, em Percentualdo Produto Interno Bruto, 2000 a 2003
Fonte: SIOPS.
18 Reconhece-se que o IGP apresenta grande sensibilidade às flutuações do câmbio – o que exige prudência na observação dos dados
para períodos que atravessaram choques cambiais, como os ocorridos nos anos de 1999 e 2002. Entretanto, a trajetória de redução dos
gastos do governo federal é corroborada pela análise em relação ao PIB – é necessário lembrar que 2003 foi um ano recessivo e, nesse
sentido, uma queda na participação percentual do PIB é particularmente drástica.
2000 2001 2002 2003 2000 2001 2002 2003
Em R$ milhões de 2004 Índice 2000 = 100
União 34.246,7 34.266,4 33.227,9 29.735,8 100,0 100,1 97,0 86,8
Estados 10.623,9 12.609,0 13.848,0 13.373,2 100,0 118,7 130,3 125,9
Municípios 12.458,5 14.132,4 15.795,4 15.554,8 100,0 113,4 126,8 124,9
Total 57.329,3 61.007,8 62.871,3 58.663,6 100,0 106,4 109,7 102,3
2000 2001 2002 2003 2000 2001 2002 2003
Em % do PIB Índice 2000 = 100
União 1,85 1,87 1,84 1,75 100,0 101,1 99,5 94,6
Estados 0,57 0,69 0,77 0,79 100,0 121,1 134,4 138,6
Municípios 0,67 0,77 0,87 0,91 100,0 114,9 129,9 135,8
Total 3,09 3,34 3,48 3,45 100,0 108,1 112,5 111,7
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 33
por 16,4% (FERNANDES et al., 1998).
Isto parece indicar19 que a EC 29
trouxe, efetivamente, maior parti-
cipação de Estados e Municípios no
financiamento do SUS.
Este movimento, entretanto, ain-
da não está completo. Os gastos dos
governos estaduais com Ações e
Serviços Públicos de Saúde cresce-
ram de maneira considerável, mas
não o suficiente para cumprir os
níveis exigidos pela EC 29. SIOPS
A situação dos municípios pare-
ce mais consolidada. O percentual
dos gastos em Saúde dos municípi-
os, frente à receita vinculada, pas-
sa de 13,9% em 2000 para 17,4% em
2003 – superando o patamar de 15%
definido pela Emenda (SIOPS, 2005b).
Em termos gerais, portanto, os go-
vernos municipais já se adequaram.
Mas, em um universo de mais de 5
mil municípios, a fiscalização dos
atores sociais deve permanecer vi-
gilante para encontrar e denunciar
as prefeituras que se encontrarem
irregulares em relação à Emenda.
EVOLUÇÃO RECENTE DOS DISPÊNDIOS EDO FINANCIAMENTO FEDERAL DO SUS
O gasto do MS apresentou um
comportamento irregular ao longo
do período 1995-2004, tanto em re-
lação ao seu valor global, quanto
ao valor destinado, mais especifica-
mente, ao financiamento das ações
e serviços de saúde.
A despesa com ações e serviços
de saúde corresponde ao gasto to-
tal, menos as despesas com inati-
vos e pensionistas – os chamados
Encargos Previdenciários da União
(EPU) – e os dispêndios com encar-
gos e serviços da dívida interna e
externa. São também excluídos des-
se conceito, os gastos financiados
(2005) aponta que os gastos em Saú-
de dos Estados e Distrito Federal,
como percentual da receita vincula-
da pela EC 29, crescem de 7,1% em
2000 para 9,6% em 2003, em mé-
dia. Patamar ainda bastante inferi-
or aos 12% da receita vinculada es-
tabelecidos pela Emenda. Em um
outro trabalho, revela-se, por exem-
plo, que apenas 11 governos esta-
duais cumpriram a EC 29 de manei-
ra inequívoca (SIOPS, 2005b).20
GRÁFICO 1 – Participação da três esferas de governo no gasto público em saúde, 1995 (IPEA)
Fonte: FERNANDES et al. (1998).
GRÁFICO 2 – Participação das Três Esferas de Governo no Gasto Público Total em Saúde,2003 (SIOPS)
Fonte: MS (SIOPS, 2005).
19 As diferenças entre as metodologias e as bases de dados utilizadas pelo IPEA e pelo SIOPS, que não serão exploradas aqui, fazem com que as
informações não sejam comparáveis de fato. A intenção de apresentar seus resultados lado a lado é tão-somente tentar caracterizar
tendências gerais.20 Tal afirmação não significa, necessariamente, que os outros 16 governos estaduais estejam irregulares. Como visto antes, a interpretação
e implementação da Emenda 29 é bastante complexa, dando margem a diversas interpretações.
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
34 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
com recursos do Fundo de Combate
e Erradicação da Pobreza (FCEP).21
Esse valor líquido é que tem sido
considerado oficialmente para efei-
to de verificação do cumprimento da
EC 29 pelo Governo Federal. Neste
TABELA 5 – Ministério da Saúde: Disponibilidade líquida para as Ações e Serviços de saúde,1995-2004
Em R$ milhões de dez/2004, deflacionados mês a mês pelo IGP-DI
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração IPEA/DISOC.
trabalho, entretanto, serão excluídas
também as despesas com programas
de transferência direta de renda – o
Bolsa-Família –, em acordo com o
prescrito pela Resolução 322 do Con-
selho Nacional de Saúde.
A magnitude dos recursos finan-
ceiros utilizados pelo MS para ad-
ministrar e executar as ações e ser-
viços de saúde – isto é, exclusive
aqueles destinados à amortização de
dívidas, ao pagamento de inativos
e os oriundos do Fundo de Combate
à Pobreza mais programas de trans-
ferência direta de renda –, oscilou
entre 82% e 90,1% do total de gastos
do Ministério entre 1995 e 2004.
Neste período, os dispêndios com os
EPU mantiveram um patamar apro-
ximado de R$ 3,2 bilhões, em ter-
mos reais, até 2000. Os encargos da
dívida, por sua vez, foram bastante
elevados, alternando valores na casa
de R$ 1 bilhão ou R$ 3 bilhões entre
1995 e 1998. A partir daí, estas duas
despesas apresentaram uma tendên-
cia declinante. No caso dos EPU, o
fluxo de novas aposentadorias, ace-
lerado em um primeiro momento
como uma reação defensiva frente
às incertezas geradas pela Reforma
da Previdência, reduziu-se; no caso
das despesas financeiras, estas vol-
taram a um patamar de normalida-
de,22 após a amortização do endivi-
damento acumulado durante a cri-
se de financiamento ocorrida em
1993 (ver Tabela 5).
Analisando a trajetória do gasto
total do MS, no período 1995 a 2004,
verifica-se que há uma queda em
1996 e recuperação em 1997 – ano
de início da CPMF – quando atingiu
o valor mais alto do período em ter-
mos reais, R$ 42,9 bilhões. Após
nova queda em 1998, os gastos se
mantiveram estáveis, em um pata-
mar um pouco inferior ao de 1997,
até 2001, quando ocorreu nova re-
cuperação nos valores. Os anos de
2002 e 2003 apresentam quedas pro-
nunciadas, sendo 2003 o pior ano
21 Criado em dezembro de 2000, o “Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza tem como objetivo viabilizar a todos os brasileiros o acesso
a níveis dignos de subsistência e seus recursos serão aplicados em ações suplementares de nutrição, habitação, saúde, educação, reforço de
renda familiar e outros programas de relevante interesse social, voltados para a melhoria da qualidade de vida” (Art. 1º da Lei Complementar
n. 111, de 6 de julho de 2001).
22 Parte das operações do MS é realizada por meio de convênios e empréstimos junto a organismos internacionais. Esta modalidade de endividamen-
to – a chamada dívida contratual –, é que mantém os encargos financeiros do MS em um patamar reduzido, mas ainda significativo.
Ano Gasto Total EPU Dívida
FCEP + Transf.
Direta de Renda
Ações e Serv. Públ.
Saúde
Ações e Serv.Públ.
Saúde % do G. Total
1995 41.252,0 3.643,3 3.716,1 0. 00,0 33.892,5 82,2
1996 35.798,1 3.677,2 1.235,8 0. 00,0 30.885,0 86,3
1997 42.980,1 3.591,2 3.642,1 0. 00,0 35.746,8 83,2
1998 39.162,5 3.900,4 1.235,9 0. 00,0 34.026,3 86,9
1999 40.312,4 3.687,3 0.306,9 0. 00,0 36.318,3 90,1
2000 39.789,6 3.566,7 00.95,1 0. 00,0 36.127,8 90,8
2001 41.350,6 3.269,2 0.371,6 1.765,4 35.944,5 86,9
2002 38.882,5 2.949,1 0.511,9 0.680,4 34.741,0 89,3
2003 34.557,9 2.569,7 0.479,6 0.411,4 31.097,2 90,0
2004 38.067,1 2.770,2 0.508,4 1.183,4 33.605,1 88,3
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 35
da série em termos reais. Houve al-
guma recuperação em 2004, mas
ainda insuficiente para recuperar o
patamar atingido em 2001.
A trajetória dos gastos em Ações
e Serviços Públicos de Saúde é, en-
tretanto, muito distinta da realiza-
da pelos gastos totais do MS (ver
Tabela 6). Os piores anos do perío-
do continuam sendo os de 1996 e de
2003, mas é no ano de 1996 que se
de 2001 e 2002, em ritmo inferior ao
da população, faz com que a partici-
pação das Ações e Serviços Públicos
de Saúde no PIB cresça enquanto o
seu valor per capita diminui.
FONTES DOS RECURSOS FINANCEIROS DOMINISTÉRIO DA SAÚDE
A Tabela 7 mostra quais são as
principais fontes de recursos do MS
e como a participação dessas fontes
varia ao longo do período. A primei-
ra constatação que pode ser feita, a
partir das Tabelas 7 e 8, e do Gráfico
3, é que as participações relativas
das diferentes fontes no financiamento
das despesas do MS não apresentam
um padrão estável, com flutuações
intensas na distribuição entre elas.
Só a partir de 2000, percebe-se mai-
or estabilidade, com variações mais
sutis na sua composição.
As contribuições sociais, toma-
das no seu conjunto, são responsá-
veis por parcela maior do financia-
mento do MS. A participação relati-
va dessas fontes no gasto total do
MS oscilou entre os 63% de 1996 e
os 87% de 2004 (ver Tabela 8). As
contribuições da Seguridade Social
– COFINS e CSLL – apresentam trajetó-
ria errática: no início do período atin-
giam, respectivamente, 49% e 20%
do total da despesa, caindo, a partir
daí, até 1999. A COFINS, após elevar
sua participação nos anos de 2000
e 2001, para um patamar próximo
a 40%, atingiu o seu menor nível de
participação em 2002 e 2003 – em
TABELA 6 – Ministério da Saúde: Gasto em Ações e Serviços Públicos de Saúde, Per Capita eProporção do PIB, 1995-2004
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: IPEA/DISOC.(1) Valores deflacionados mês a mês pelo IGP/DI.
têm o menor volume de gastos em
Ações e Serviços Públicos de Saú-
de. O ano de 1997, que apresenta
maior volume de gastos totais, teve
essa performance fortemente influ-
enciada pela amortização da dívida
contraída antes junto ao FAT. Os
anos que, de fato, revelam o maior
patamar de gastos totais em Ações
e Serviços Públicos de Saúde cor-
respondem ao triênio 1999-2001.
Mas, ao retomarmos a análise
utilizando os valores per capita, o
ano de 1997 volta a se apresentar
como o de melhor desempenho. Os
dispêndios do MS com Ações e Ser-
viços Públicos de Saúde oscilaram
entre R$ 218,7 – maior valor –, em
1997, e R$ 173,7 – menor valor – em
2003. Como percentual do PIB, a
maior participação alcançada foi de
1,90 % em 1995 e 2001. Porém, é ne-
cessário apontar o efeito da estagna-
ção econômica sobre os indicadores:
o baixo crescimento do PIB nos anos
Ano R$ milhões(1)
Constantes Dez/2004
Índices (1995=100)
Per capita R$ de Dez/2004
% PIB
1995 33.892,5 100,0 213,1 1,90
1996 30.885,0 091,1 191,5 1,59
1997 35.746,8 105,5 218,7 1,78
1998 34.026,3 100,4 205,4 1,67
1999 36.318,3 107,2 216,3 1,88
2000 36.127,8 106,6 212,3 1,87
2001 35.944,5 106,1 208,5 1,90
2002 34.741,0 102,5 197,0 1,88
2003 31.097,2 091,8 173,7 1,75
2004 33.605,1 099,2 185,1 1,82
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
36 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
TABELA 7 – Ministério da Saúde: Distribuição do Gasto, segundo a Fonte dos Recursos, 1995-2004
Em R$ bilhões de dez/2004, deflacionados mês a mês pelo IGP-DI.
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: IPEA/DISOC.
TABELA 8 – Ministério da Saúde: Distribuição Percentual das Fontes de Recursos, 1995-2004
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: IPEA/DISOC.
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Recursos Ordinários 01,3 00,1 00,4 4,2 5,9 2,1 5,9 4,0 4,5 2,7
Títulos Resp. Tesouro Nacional 01,1 01,2 01,2 0,2 0,3 0,3 0,4 0,5 0,2 0,0
Operações Crédito Internas - Moeda 03,2 03,0 00,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0
Operações Crédito Externas - Moeda 00,4 00,3 00,2 0,4 0,6 1,0 0,9 0,7 0,4 0,3
Recursos Diretamente Arrecadados 01,0 00,9 01,0 1,0 1,4 1,3 1,3 1,0 0,8 0,8
Contribuições Sociais 28,6 22,7 31,4 27,8 25,2 32,4 30,7 30,6 28,0 33,2
Contrib. Social Lucro PJ 08,3 07,4 08,3 3,1 5,4 4,9 2,9 9,2 9,5 12,4
Contrib. Social p/ Financ. Segurid. Social 20,3 15,3 11,1 10,2 10,7 15,0 16,3 7,5 7,3 9,6
Contrib. Prov. s/ Mov. Financeira 00,0 00,0 12,0 14,5 9,1 12,5 11,4 14,0 11,2 11,2
Fundo de Estabilização Fiscal 04,9 06,3 08,4 5,2 5,7 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0
Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza 00,0 00,0 00,0 0,0 0,0 0,0 1,8 0,7 0,0 0,3
Demais Fontes 00,7 01,3 00,3 0,3 1,2 2,7 0,5 1,4 0,7 0,7
TOTAL 41,3 35,8 43,0 39,2 40,3 39,8 41,4 38,9 34,6 38,1
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Recursos Ordinários 3,2 0,2 1,0 10,8 14,7 5,2 14,3 10,3 13,1 7,1
Títulos Resp. Tesouro Nacional 2,6 3,3 2,8 0,5 0,8 0,7 0,9 1,3 0,5 0,0
Operações Crédito Internas - Moeda 7,6 8,3 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0
Operações Crédito Externas - Moeda 1,1 0,9 0,5 1,1 1,4 2,6 2,1 1,8 1,1 0,7
Recursos Diretamente Arrecadados 2,4 2,5 2,4 2,6 3,5 3,2 3,1 2,6 2,3 2,2
Contribuições Sociais 69,4 63,4 73,1 71,1 62,5 81,5 74,1 78,7 80,9 87,2
Contrib. Social Lucro PJ 20,2 20,8 19,3 8,0 13,3 12,3 7,1 23,5 27,4 32,7
Contrib. Social p/ Financ. Segurid. Social 49,2 42,6 25,9 26,0 26,6 37,7 39,5 19,2 21,1 25,1
Contrib. Prov. s/ Mov. Financeira 0,0 0,0 27,8 37,1 22,6 31,5 27,6 36,0 32,4 29,4
Fundo de Estabilização Fiscal 12,0 17,7 19,5 13,3 14,2 0,1 0,0 0,0 0,0 0,0
Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 4,3 1,7 0,0 0,9
Demais Fontes 1,8 3,7 0,7 0,7 3,0 6,8 1,2 3,5 2,2 1,9
TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 37
torno de 20% –, atingindo 25% em
2004. A CSLL realizou um movimen-
to contrário nos últimos anos: de-
pois de apresentar a menor partici-
pação no ano de 2001 – apenas 7,1%
– aumentou fortemente sua impor-
tância, atingindo patamares inédi-
tos de participação – 27,4% em 2003
e 32,7% em 2004.
A CPMF, por sua vez, surgiu em
1997 já como a principal fonte de
financiamento do MS. Atingiu 37%
de participação no ano seguinte e,
após algumas flutuações, no últi-
mo triênio financia em torno de 30%
do total dos gastos do MS.
Outra importante fonte de finan-
ciamento do MS, no período, foi o
Fundo Social de Emergência (FSE),
posteriormente transformado no Fun-
do de Estabilização Fiscal (FEF). A
participação desta fonte na primeira
metade do período analisado é signi-
ficativa, variando entre 12% e 19,5%.
Como seus recursos eram originados
da desvinculação de receitas seria
importante visualizar em que propor-
ção os recursos desvinculados retor-
naram à área de Saúde, embora ape-
nas um olhar sobre o conjunto da
Seguridade Social, e não apenas so-
bre a Saúde, permitiria avaliar se o
FSE/FEF foi adequadamente ‘devol-
vido’ à área social.
O FSE/FEF foi reformulado no
ano 2000, passando a ser denomi-
nado Desvinculação das Receitas da
União (DRU). Embora a atual desig-
nação seja mais sincera que as an-
teriores, a nova sistemática de fun-
cionamento tornou a análise da exe-
cução orçamentária menos transpa-
rente. Os recursos desvinculados
pela DRU não integram uma fonte
de recursos específica, como no caso
do FSE/FEF. Ao invés disso, são exe-
cutados por meio da fonte Recursos
Ordinários. Até a criação da DRU, a
fonte Recursos Ordinários era res-
ponsável por expressar, na execu-
ção orçamentária, os recursos oriun-
dos de impostos gerais – no caso,
principalmente, Imposto de Renda e
IPI. A partir de 2000, entretanto, não
é mais possível distinguir, para de-
terminada área ou programa, qual
parcela de recursos é originária de
impostos gerais, e qual parcela é
originária da Desvinculação, uma
vez que ambas agora compõem,
combinadas, a mesma fonte Recur-
sos Ordinários.
É nesse contexto que deve ser
qualificada, a partir de 2000, a par-
ticipação da fonte Recursos Ordiná-
rios. Embora essa fonte mantenha
os percentuais significativos atingi-
dos em 1998 e 1999, a partir de 2000
ela incorpora também os recursos
GRÁFICO 3 – Participação de CPMF e FSE/FEF nos Gastos Totais do Ministério da Saúde, 1995-2004
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: IPEA/DISOC.
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
38 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
do antigo FSE/FEF. Ou seja, o volu-
me de recursos aplicados pela fonte
Recursos Ordinários no MS, a partir
de 2000, deve ser analisado levando
em conta não apenas a participação
anterior desta fonte, mas também a
parcela que cabia ao FSE/FEF. Nesse
sentido, a observação do Gráfico 3
parece tornar claro que o aporte dos
Recursos Ordinários ao financiamen-
to do MS, após 2000, não mantém o
grau de participação antes observa-
da para essa fonte e o FSE/FEF – o
que indica que ou os recursos dos
impostos gerais ou os recursos da
Desvinculação, ou ambos, tem tido
a sua destinação ao MS reduzida.23
A análise dos gastos do MS pela
ótica das fontes de financiamento tam-
bém permite demonstrar que a intro-
dução da CPMF em 1997 contribuiu
muito mais para estabilizar o pata-
mar de recursos orçamentários do
MS do que para efetivamente elevá-
lo (ver Gráfico 3). Isto porque as ou-
tras fontes que por tradição financi-
avam o MS realizaram uma clara
trajetória de acomodação, reduzindo
os seus aportes. A título de exemplo,
recuperando os valores apresentados
na Tabela 7, vemos que, se manti-
dos os montantes que as outras fon-
tes aportavam em 1996 – R$ 35,8 bi-
lhões – para os demais anos da sé-
rie, os recursos totais do MS, após o
acréscimo da CPMF, seriam muito
superiores aos efetivamente observa-
dos: R$ 47,8 bilhões em 1997, R$ 48,3
bilhões em 2000, R$ 49,8 bilhões em
2002 e R$ 47,0 bilhões em 2004. So-
bre 2004, é interessante notar também
o crescimento na participação das con-
tribuições sociais, paralela a uma re-
dução das demais fontes – um prová-
vel reflexo da recente elevação na ar-
recadação da COFINS.
de algumas tendências importantes,
conforme revelado pelas Tabelas 9
e 10 e pelo Gráfico 4.
Percebe-se, no período, uma re-
dução no volume de gastos com Pes-
soal, que pode ser explicada por uma
conjunção de fatores – a contenção
de salários devido aos longos perío-
dos sem reajustes a que foi submeti-
do o servidor público; a migração
precoce para a inatividade devido às
incertezas geradas pela Reforma da
Previdência; e a não-substituição de
recursos humanos transferidos para
estados e municípios.
Os gastos na rubrica de Outras
Despesas Correntes – onde são regis-
trados, entre outras despesas, os pa-
gamentos realizados diretamente a
prestadores de serviços de saúde –,
reduzem-se muito, como conseqüên-
cia da descentralização das políticas
de Saúde. As Transferências a Muni-
cípios realizam um crescimento im-
pressionante entre 1996 e 1999 – sob
a NOB 01/96 –, estabilizando-se a
partir daí em um patamar elevado
de recursos. Apesar da importância
da NOB 01/9324 para o avanço da des-
centralização, foi sem dúvida a apro-
vação da NOB 01/96 que intensificou
tal processo, sobretudo por meio dos
repasses do Piso da Atenção Básica
EVOLUÇÃO DO GASTO SEGUNDO ACATEGORIA ECONÔMICA DA DESPESA
A análise da evolução do gasto
do MS segundo categoria econômi-
ca da despesa permite a verificação
23 Mais uma vez, seria necessário um olhar panorâmico sobre a Seguridade Social para verificar se esta tendência é específica ao setor Saúde,
ou se ocorre neste momento também em outras áreas sociais. Desde logo, entretanto, pode ser enfatizado que, conforme trabalho realizado pela
Consultoria de Orçamentos da Câmara dos Deputados – Núcleo Previdência, Assistência e Trabalho –, a DRU retirou em 2002 R$ 20,1 bilhões
da Seguridade Social. Entretanto, apenas R$ 15,1 bilhão foi devolvido por meio da execução da fonte Recursos Ordinários (BRASIL, 2003).
24 Até janeiro de 1997, 3.127 municípios, representando 62,9% do total, haviam se habilitado a alguma das formas de gestão estabelecidas
pela NOB 01/93. Desses 3.127 municípios, 2.367 foram habilitados à gestão Incipiente (75,7%), 616 (19,7%) à gestão Parcial e 144 (4,6%) à
gestão Semiplena. (BRASIL, 1999).
OU OS RECURSOS DOS
IMPOSTOS GERAIS OU OS
RECURSOS DA DESVINCULAÇÃO,OU AMBOS, TEM TIDO A SUA
DESTINAÇÃO AO MS REDUZIDA
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 39
– PAB Fixo –, e dos repasses destina-
dos a programas incentivados – PAB-
variável. Também cresceu o número
de municípios que se habilitaram à
gestão plena de seus sistemas muni-
cipais.25 Estes dois movimentos cons-
tituem a principal explicação para o
significativo incremento dos repas-
ses do MS para a esfera municipal,
que saltam de R$ 3,8 bilhões em 1996
para R$ 12,1 bilhões em 1999.
O repasse dos recursos financei-
ros para a gestão estadual teve, no
início, comportamento mais está-
vel e modesto. Em 1999, por exem-
plo, alcançou a cifra de R$ 1,7 bi-
lhão. Isso pode ser explicado, por
um lado, pela tendência municipa-
lista observada no processo de des-
centralização na saúde sob as NOBs
01/93 e 01/96 e, por outro, pelo fato
de que os estados estavam mais
reticentes na assunção das respon-
sabilidades inerentes à gestão des-
centralizada.26 Somente a partir de
2001 verifica-se um crescimento
mais intenso nas Transferências a
Estados e DF, refletindo as mudan-
TABELA 9 – Ministério da Saúde: Gasto Total segundo Categoria Econômica, 1995-2004
ças na concepção do papel a ser
exercido pelos estados na imple-
mentação do SUS – consolidadas na
NOAS 01/2000.
As despesas com Inativos e Pen-
sionistas, que alcançaram níveis
elevados no início do período, co-
meçam a ser reduzidas a partir de
1999, assim como os gastos com
juros e amortização de dívidas.
Chama a atenção, também, o baixo
patamar de Investimentos realiza-
dos diretamente27 pelo MS.
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: IPEA/DISOC.
Em R$ bilhões de dez/2004, deflacionados mês a mês pelo IGP-DI
25 Apesar de publicada em novembro de 1996, a NOB 01/96 foi implementada somente a partir de janeiro de 1998. De janeiro de 1998 a abril
de 1999, 5.222 municípios (quase 95% do total) estavam habilitados em alguma das duas novas formas de gestão descentralizada: 4.752
(86,3% do total) estavam habilitados como gestores da Atenção Básica e 470 (8,5% do total) habilitados como gestores Plenos do sistema
municipal de saúde (BRASIL, 1999).
26 Até abril de 1999, poucos estados estavam habilitados nas novas condições de gestão estabelecidas pela NOB 01/96. Alagoas habilitou-
se na gestão Plena do sistema e o Distrito Federal, Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e Bahia na condição de gestão Avançada do
sistema estadual. O Rio Grande do Sul estava solicitando a mudança da gestão Avançada para Plena e o Paraná, Santa Catarina e Pará,
solicitando a habilitação na gestão plena (BRASIL, 1999).
27 É necessário lembrar que, além destes investimentos realizados diretamente pela União, parcela dos recursos transferidos a Estados e
municípios se destina a programas de investimento a serem realizados por estas esferas.
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Pessoal 6,8 5,9 5,7 5,0 5,0 4,9 4,5 4,7 4,3 4,3
Outras Despesas Correntes 22,6 19,9 22,5 16,6 15,8 13,4 12,7 11,4 9,1 7,3
Investimentos 0,6 0,2 0,3 0,3 0,3 0,6 0,5 0,3 0,3 0,5
Amortização, Juros e Encargos Dívida 3,7 1,2 3,6 1,2 0,3 0,1 0,4 0,5 0,5 0,5
Inativos e Pensionistas 3,6 3,7 3,6 3,9 3,7 3,6 3,3 2,9 2,6 2,8
Transf. Estados e DF 1,1 0,5 0,9 1,3 1,7 3,1 4,6 4,3 5,1 7,6
Transf. Municipios 2,2 3,8 5,5 9,4 12,1 12,7 14,2 13,5 11,9 13,9
Outros 0,6 0,6 0,8 1,4 1,4 1,3 1,2 1,3 1,0 1,2
TOTAL 41,3 35,8 43,0 39,2 40,3 39,8 41,4 38,9 34,6 38,1
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
40 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
A expressão financeira da descen-
tralização se torna ainda mais clara
no Gráfico 6, quando se compara a
evolução da participação conjunta dos
principais gastos do MS executados
TABELA 10 – Ministério da Saúde: Distribuição Percentual do Gasto Total segundo Categoria Econômica, 1995-2004
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: IPEA/DISOC.
GRÁFICO 4 – Descentralização dos gastos do MS: comparação entre a participação percentual das aplicações diretas do MS e os recursos transferidosa outras esferas de governo, 1995-2004
diretamente – Pessoal, Outras Despe-
sas Correntes e Investimentos – com
a trajetória das Transferências a esta-
dos e municípios. Em 1995, as pri-
meiras respondiam por 72,7 % do or-
çamento do MS, enquanto as transfe-
rências a outras esferas de governo
representavam apenas 7,9%. Em 2004,
os percentuais encontrados são de
31,8% e 56,5%, respectivamente.28
28 A soma dos dois percentuais não alcança 100% porque algumas despesas do MS – como Amortização e Juros da Dívida, Inativos e
Pensionistas, e Transferências a Instituições Privadas, foram excluídas deste exercício gráfico, para melhor efeito didático.
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: IPEA/DISOC.
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Pessoal 16,6 16,6 13,2 12,8 12,3 12,4 10,9 12,1 12,3 11,4
Outras Despesas Correntes 54,8 55,5 52,3 42,4 39,3 33,8 30,7 29,3 26,2 19,2
Investimentos 1,4 0,6 0,8 0,8 0,7 1,6 1,2 0,7 0,8 1,2
Amortização, Juros e Encargos Dívida 9,0 3,5 8,5 3,2 0,8 0,2 0,9 1,3 1,4 1,3
Inativos e Pensionistas 8,8 10,3 8,4 10,0 9,1 9,0 7,9 7,6 7,4 7,3
Transf. Estados e DF 2,6 1,3 2,1 3,3 4,3 7,8 11,2 11,0 14,8 20,0
Transf. Municipios 5,3 10,6 12,9 24,0 30,0 32,0 34,4 34,7 34,3 36,4
Outros 1,6 1,6 1,8 3,6 3,5 3,2 2,8 3,3 2,8 3,1
TOTAL 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100
As novas configurações de antigos problemas: financiamento e gasto com ações e serviços públicos de saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007 41
Seguridade Social para a saú-
de. Com o aumento das despe-
sas previdenciárias, a saúde
perde espaço na distribuição
dos recursos da Seguridade,
sendo feita outra tentativa, atra-
vés da CPMF, de garantir finan-
ciamento pra esse setor. Contu-
do, é a Emenda Constitucional
29 (EC 29), de agosto de 2000,
a busca mais direta de vincu-
lar recursos orçamentários para
• Explorou-se também as contro-
vérsias a respeito da aplicação
da EC 29, especificamente para
o caso do Governo Federal. Se
aplicados os entendimentos pro-
postos pela Resolução 322 do
CNS, conclui-se que a União
não vem cumprindo de manei-
ra adequada a Emenda. Por ou-
tro lado, os variáveis entendi-
mentos expressos na LDO garan-
tem a legalidade da atuação da
União. Para 2005, tais proble-
mas continuam – pelo menos
até o momento de conclusão
deste trabalho.
• Dados publicados recentemen-
te pelo SIOPS revelam crescimen-
to dos gastos realizados pelo
conjunto de União, Estados e
Municípios com Ações e Servi-
ços Públicos de Saúde – isto,
apesar da redução observada
nos dispêndios da União em
2003. Ressalte-se também que,
embora os gastos dos governos
estaduais com Ações e Serviços
Públicos de Saúde tenham cres-
cido de modo considerável, ain-
da não alcançaram os níveis
exigidos pela EC 29.
• Analisando o gasto do MS, ve-
rificamos que este apresenta um
comportamento irregular ao
longo do período 1995-2004,
com queda em 1996, recupera-
ção em 1997 – ano de início da
CPMF –, e nova queda em 1998,
mantendo-se os gastos estáveis
nesse patamar até 2001. Os
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os principais pontos destacados
neste artigo foram:
• Os modelos de financiamento
da saúde vêm passando por al-
terações em todo o mundo. Nos
países desenvolvidos, de modo
geral, a maior parte do financi-
amento provém de fontes públi-
cas (sendo uma das exceções os
Estados Unidos). Na América
Latina, predominam sistemas
mais segmentados, com menor
participação do setor público.
• O sistema de saúde brasileiro é
uma mistura de quatro segmen-
tos: o SUS, universal, gratuito
e financiado por recursos pú-
blicos; o segmento dos planos
e seguros de saúde, financiado
por recursos das famílias e/ou
dos empregadores; o segmento
dos servidores públicos, de
acesso restrito a essas cliente-
las, financiado parte com recur-
sos públicos e parte com recur-
sos dos próprios servidores; e
o segmento dos prestadores pri-
vados autônomos, com finan-
ciamento via pagamento no ato.
• Pelo lado do financiamento pú-
blico, observa-se, que, desde a
Constituição Federal de 1988,
houve uma preocupação em
buscar garantir recursos para
a saúde – inicialmente através
da busca de garantir uma apli-
cação mínima dos recursos da
a saúde, através da aplicação
de um montante mínimo.
• A EC 29 expressa, entre outros
objetivos, a preocupação com
garantir um aumento da parti-
cipação de estados e municípi-
os no financiamento de ações e
serviços públicos de saúde. Do
lado federal, ela virtualmente
congelou os recursos federais
para a área de saúde, em ter-
mos de participação no PIB.
A INTRODUÇÃO DA CPMF CONTRIBU
MUITO MAIS PARA ESTABILIZAR O PATAMAR
DE RECURSOS ORÇAMENTÁRIOS DO
MINISTÉRIO DA SAÚDE QUE PARA
EFETIVAMENTE ELEVÁ-LO
RIBEIRO, José Aparecido; PIOLA, Sérgio Francisco & SERVO, Luciana Mendes
42 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 21-43, janeiro 2007
anos de 2002 e 2003 apresen-
taram nova queda nos gastos,
e a recuperação de 2004 foi
apenas parcial.
• Analisando as fontes de finan-
ciamento dos gastos federais,
observamos que as contribui-
ções sociais, em seu conjun-
to, são responsáveis pela mai-
or parcela do financiamento
do MS – e elevam ainda mais
sua participação em 2004.
Contudo, individualmente, a
CPMF é a principal fonte de fi-
nanciamento do MS – exceção
feita ao ano de 2004, quando
foi superada pela CSLL. A aná-
lise dos gastos desse ministé-
rio permite demonstrar que a
introdução da CPMF contribui
muito mais para estabilizar o
patamar de recursos orçamen-
tários do mesmo que para efe-
tivamente elevá-lo.
• Por fim, ao analisar os gastos
do MS por categoria econômi-
ca, percebe-se o impacto da
descentralização nas finanças
do Ministério. As transferênci-
as para municípios crescem
rapidamente a partir de 1997
– sob o efeito da NOB 01/96 –,
enquanto que as transferênci-
as para Estados e DF crescem
a partir de 2001, com a NOAS
01/2000. Juntas, as transferên-
cias a governos subnacionais
alcançam 56,5% dos gastos do
MS em 2004.
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SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
44 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas comoinstrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil1
The intervention of the Judicial Power in the private health sector – advanced granting as a health assistance guaranteeinstrument in Brazil
Maria Hildete S. C. Souza2, Ligia Bahia3, Maria Lúcia W. Vianna4, Mário Scheffer5, Andrea Salazar6 & Karina B. Grou7
1 Este trabalho se baseia na dissertação de mestrado apresentada por Maria Hildete Souza ao Programa de Pós-graduação em Saúde
Coletiva do Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva (NESC), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sob orientação da Profa Dra
Ligia Bahia, em setembro de 2005.
2 Laboratório de Economia Política da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Secretaria Municipal de Saúde, Rio de
Janeiro, Brasil.
3 Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva e Laboratório de Economia Política da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.
4 Instituto de Economia e Laboratório de Economia Política da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.
5 Pela Vidda/SP & CNS.
6 Consultora jurídica.
7 Consultora jurídica.
RESUMO
O objetivo deste estudo foi investigar e contextualizar algumas relações conflituosas no mercado de planos
e seguros de saúde, sob a ótica de soluções judiciais singulares para estes conflitos de interesse. Esta questão
vem sendo investigada por diversos pesquisadores que observam o protagonismo do Poder Judiciário e a
garantia dos direitos sociais. Por um lado, um reforço da lógica democrática e, por outro, uma intervenção
concorrencial com outras instâncias políticas e legislativas. A este protagonismo, com sua intervenção no
âmbito das relações sociais e políticas, os cientistas sociais descrevem como um fenômeno de Judicialização,
que diz respeito a uma transformação das normas e das formas de atuação dos membros do Poder Judiciário,
colocando-os frente à escolha entre exercer um ativismo judicial diante das demandas advindas do
recrudescimento da chamada “questão social” ou manterem sua clássica postura de neutralidade política.
Este fenômeno tem origem comum ao movimento de constitucionalização do direito ordinário, porém, o que
mudou foi a infiltração de princípios de justiça social onde havia o império da lei. Na perspectiva de descrever
a intervenção judiciária nos conflitos inerentes ao setor de saúde suplementar, a análise de seiscentas e onze
decisões judiciais permitiu demonstrar que o Poder Judiciário tem agido no sentido de conceder, ou mesmo de
garantir, o direito à cobertura reclamada. Têm validado o direito à saúde, tanto no sentido de preservar a vida
humana numa situação dramática, quanto tem garantido o direito em casos de permanência em planos de
saúde, reajustes, carências, entre outros itens. O fato deste comportamento do Judiciário como aliado do
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 45
cliente em posição de vulnerabilidade, tem trazido para a superfície do debate regulatório, questões envolvendo
demandas que se repetem na justiça. Não é da natureza do Poder Judiciário criar direito, porém, tem funcionado
como mecanismo de afirmação e vocalização social, por maior abrangência do escopo dos contratos privados
de assistência à saúde.
PALAVRAS-CHAVE: Saúde Suplementar; Planos de Pré-Pagamento em Saúde; Seguro Saúde; Política – legislação &
jurisprudência; Poder Judiciário.
ABSTRACT
This study refers to the investigation and context of how conflicts of interest within the private health
insurance market are solved by means of judicial decisions in Brazil. The increasing demand for judicial
solutions and the consequent notability of the Judicial Power is interpreted, by different researchers, both as
a reinforcement of democratic founded values, and as a strategy to compete with other political and legislative
institutions. According to social scientists, the increasing intervention of the Judicial Power within the social
and political arena is characterized by the alteration of its norms, as well as its usual way of acting, when
facing the choice between advocating in favour of social demands – for whom the judicial pathway has proved
to be a potential means for social changes – or assuming its traditional neutral political position. Such
strengthening of the Judicial Power in the mediation of social relations originated, along with the movement
for the review of ordinary laws based on constitutional principles, during the second half of the 80’s in Brazil,
favouring the principles of social justice instead of the strict observation of lawful statements. Within the
perspective of describing the intervention of the Judiciary Power in the conflicts inherent to the private health
sector, the analysis of 611 judicial decisions enabled the demonstration that the Judiciary Power has been
granting, or even assuring, the right to the claimed coverage. It has been validating the right to health, not
only in the preservation of human life in a dramatic situation, but also assuring the right to permanence in
health plans, readjustment, grace periods, amongst other items. The fact is that this behaviour of the Judiciary
Power, as an ally to client in a vulnerable position, has been bringing to surface the regulating debate, issues
involving demands repeated in court. I.e., on one hand, it is not the Judiciary Power’s nature to create a right,
however, it has been working as a mechanism of social affirmation and verbalization, for a greater inclusion
in the scope of private healthcare contracts.
KEYWORDS: Supplemental Health; Prepaid Health Plans; Insurance, Health; Politics – law & jurisprudence;
Judicial Power.
SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
46 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
INTRODUÇÃO
Este texto está dividido em duas
partes. Na primeira, revisaremos al-
guns autores caros ao estudo da Ju-
dicialização, acentuando a transfor-
mação do papel do Poder Judiciário
entre os Poderes Republicanos, mi-
grando, ao longo do tempo, de uma
posição periférica e neutra, para um
rasgo de ativismo político quando
confrontado com questões sociais
advindas tanto do desabastecimento
de políticas sociais públicas, quanto
das relações assimétricas provenien-
tes do campo dos mercados. Na se-
gunda parte, analisaremos este ‘pro-
tagonismo’ do Poder Judiciário na
garantia dos direitos sociais. Para tan-
to, examinaremos ações judiciais sin-
gulares, promovidas por clientes de
planos privados de saúde, coletadas
pelo observatório jurídico do Labora-
tório de Economia Política da Saúde
(LEPS) da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ). Por fim, de um lado
alguns autores apontam um risco na
arena regulatória diante da presença
plural de várias instâncias com po-
der de influir no marco da regulamen-
tação; por outro lado, esta busca de
soluções judiciais abre possibilidades
de que esta pluralização institucional
produza uma ação sinérgica entre os
agentes envolvidos, capaz de tradu-
zir-se em benefício coletivo.
BREVE REVISÃO HISTÓRICA DO PAPELDESEMPENHADO PELO PODER JUDICIÁRIO
Uma série de fatos colaborou
nessa rotação na postura política
dos tribunais. De certa maneira as
exigências dos diferentes contextos
históricos coloca os tribunais frente
à escolha entre exercer um ativis-
mo judicial, diante das demandas
advindas do recrudescimento da cha-
mada “questão social”, ou manter
sua clássica postura de neutralida-
de política. Tanto um aspecto quan-
to o outro, ativismo ou neutralida-
de, têm um preço a ser pago. O pre-
ço da neutralidade e omissão frente
ao vigor das demandas sociais co-
locava-o no risco da inutilidade ins-
titucional, tornando-o obsoleto para
influir nos processos decisórios. O
preço do ativismo político chama
para si questionamentos a respeito
de sua legitimidade, capacidade e
independência frente aos demais
Poderes Republicanos, ao mesmo
tempo em que o fortalece enquanto
instância representacional.
A este protagonismo do Poder
Judiciário enquanto espaço repre-
sentacional no âmbito das relações
sociais e políticas, os cientistas so-
ciais costumam descrever como fe-
nômeno da judicialização.
Esse fenômeno da judicialização
das relações sociais tem origem co-
mum com o movimento de consti-
tucionalização do direito ordinário.
O que mudou foi a infiltração de
princípios de justiça social onde
havia o império da lei.
Entretanto, o desempenho dos
tribunais não depende só de fatores
políticos, não depende só de legiti-
midade, capacidade ou independên-
cia. Este desempenho, tanto o midi-
ático quanto aquele de rotina, guar-
da relação com outros fatores: com
o nível de desenvolvimento do país,
e sua posição no sistema de econo-
mia mundializado; com a cultura
jurídica dominante, associada aos
grandes sistemas ou famílias de di-
reito; com o processo histórico, por
meio do qual essa cultura jurídica
emergiu e se desenvolveu; e com a
propensão litigiosa da sociedade
estudada, associada aos meios e
recursos, formais e informais, de
resolução de litígios em determina-
da cultura (SANTOS, 1996).
Portanto, uma análise do siste-
ma judiciário não deve prescindir de
abordar uma periodização do de-
sempenho judicial de rotina ou de
massa, e dos fatores sociais, econô-
micos, políticos e culturais que con-
dicionam, historicamente, o âmbito
e a natureza da judicialização.
Santos distinguirá três grandes
variações neste “significado socio-
O QUE MUDOU FOI
A INFILTRAÇÃO DE
PRINCÍPIOS DE JUSTIÇA
SOCIAL ONDE HAVIA
O IMPÉRIO DA LEI
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 47
político da função judicial” nas so-
ciedades modernas: o período do
Estado Liberal; o período do Esta-
do-Providência e o período atual, ao
qual designa como período da “cri-
se do Estado-Providência”.
O período do Estado liberal inicia-
se no século XIX e se estende até a
Primeira Guerra Mundial. Sua longa
duração histórica tornou-o particular-
mente importante para a consolida-
ção do modelo judicial moderno.
Com uma clara delimitação de
fronteiras para a ação judicial con-
substanciada principalmente no fato
de os tribunais estarem circunscri-
tos aos parâmetros da lei – princí-
pio da legalidade – acabou influin-
do para que esses ficassem à mar-
gem do processo de explosão de con-
flituosidade social desse período,
pois seu âmbito funcional “se limi-
tava à microlitigiosidade interindi-
vidual, e não à macrolitigiosidade
social” (SANTOS, 1996).
No período pós-Segunda Guerra
Mundial, consolida-se nos países
centrais uma nova forma política do
Estado: o Estado-providência, o Wel-
fare State, que emerge na esteira das
lutas do movimento operário.
Esta “publicização” da esfera da
vida privada, agora sob a jurisdi-
ção da administração publica do
Estado, passa, também, a regular a
economia em todos os seus aspec-
tos. Inclusive o próprio mercado de
trabalho, regulado por direito espe-
cial – o direito do trabalho. Para
cumprir as metas de regular a eco-
nomia e administrar o social, o go-
verno começa a demandar, do Le-
gislativo, uma enorme produção de
leis de alcance específico.
Para CAPPELLETTI (apud WERNECK
VIANNA, 1999), em razão dessa cres-
cente necessidade de produção legis-
lativa ocorre o fenômeno de overlo-
ad do Parlamento. Ou seja, os par-
lamentos perdem a capacidade de
responder, a tempo e com competên-
cia técnica, às complexas questões
envolvidas nas tentativas de “orga-
A elevação dos direitos sociais e
econômicos a direitos constitucio-
nais – direito ao trabalho e ao salá-
rio justo, à segurança no emprego,
à saúde, à educação, à habitação, à
segurança social – significa, entre
outras coisas, “a juridificação da
justiça distributiva”.
A emergência dos movimentos
sociais em luta por direitos é, em
parte, a causa desta proliferação
normativa do Estado Social. A dife-
renciação entre conflitos individuais
e coletivos torna-se difícil, pois os
interesses individuais emergem as-
sociados a interesses coletivos.
As respostas que o Poder Judiciá-
rio deu a este fenômeno incluíram re-
formas, tais como: informalização da
justiça; reaparelhamento dos tribunais,
em recursos humanos e infra-estrutu-
rais, inclusive com a informatização e
a automatização da justiça; criação de
juizados especiais para as pequenas
causas, tanto em matéria civil como
criminal; inserção de novos e alterna-
tivos mecanismos de resolução de con-
flitos – mediação, negociação, arbitra-
gem; diversas reformas processuais –
ações populares, tutela de interesses
difusos, ação civil pública.
A “explosão de litigiosidade” con-
cedeu maior relevo aos tribunais. Os
diferenciais entre a demanda e a
capacidade de oferta de tutela judi-
cial, porém, questionam a efetivida-
de e as possibilidades de acesso à
tutela judicial.
Durante as décadas de 1970 e 80
emergiriam as primeiras manifesta-
nizar” o capitalismo, e assim trans-
ferem, para o Executivo, grande
parte de sua atividade.
Diante do enorme empreendimen-
to de regular, a um só tempo, os flu-
xos das variáveis econômicas e da
ordenação do social, o desafio do
Estado Social foi sincronizar o seu
agir, com a temporalidade desses
dois processos. Ou seja, com o tem-
porário, o provisório, o incerto, con-
fundindo o tempo do direito, assim
criado, com o da política.
A ELEVAÇÃO DOS DIREITOS
SOCIAIS E ECONÔMICOS A DIREITOS
CONSTITUCIONAIS SIGNIFICA, ENTRE
OUTRAS COISAS, “A JURIDIFICAÇÃO
DA JUSTIÇA DISTRIBUTIVA”
SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
48 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
ções da denominada crise do Esta-
do-Providência. À declaração dos
Estados Nacionais sobre as limita-
ções de recursos financeiros para
atender aos gastos sociais crescen-
tes, adicionaram-se as críticas
oriundas de setores situados à es-
querda, no espectro de posições po-
líticas, quanto à publicização exces-
siva da esfera privada. Essa última
teria criado os cidadãos-clientes,
cujas opções de vida (de atividade e
de movimento) são controladas e
supervisionadas por agências buro-
cráticas, despersonalizadas.
As transformações nos sistemas
produtivo e de regulação do traba-
lho, tornadas possíveis graças às
revoluções tecnológicas, acompa-
nharam a “difusão do modelo neo-
liberal e do seu credo desregula-
mentador”. A influência e a expan-
são da presença de agências multi-
laterais de fomento, e a adoção dos
cânones neoliberais para a inserção
de economias nacionais nos circui-
tos globalizados da economia, con-
tribuíram para o aprofundamento da
crise do Estado-Providência.
Nos países centrais, os impactos
da “crise da seguridade” sobre o sis-
tema jurídico e sobre a atividade dos
tribunais relacionam-se com “uma
nova onda de inflação legislativa”
– cujas causas podem ser buscadas
na “desregulamentação da econo-
mia” – e com a exigência de novos
processos de regulação.
Para CITTADINO (2003), a compre-
ensão do processo de expansão do
poder judicial, tanto em países cen-
trais como nos periféricos, requer
diversas chaves de interpretação,
entre as quais as seguintes: a emer-
gência do fenômeno de normatiza-
ção de direitos, especialmente em
face de sua natureza, difusa e cole-
tiva, derivada da característica mas-
sificadora de nossa sociedade; as
transições pós-autoritárias que mar-
caram as décadas de 1970 e 80, e
trouxeram consigo a edição de Cons-
tituições democráticas, preocupadas
a criação de instâncias judiciais
transnacionais, a exemplo do Tri-
bunal Penal Internacional; e final-
mente, a emergência de discursos
acadêmicos e doutrinários, vincu-
lados à cultura jurídica, que per-
cebem no protagonismo / expansão
do poder judicial uma via de refor-
ço da lógica democrática.
Assim, o fenômeno de judiciali-
zação da política e das relações so-
ciais pode ser observado por duas
vertentes: a afirmativa, referente aos
direitos já declarados, e por meio da
possibilidade de virem a ser criados
direitos ainda ignorados. Esse fenô-
meno reafirma um processo de “de-
sestatalização do direito”.
O cenário mais específico estu-
dado neste trabalho, em que este
protagonismo do Poder Judiciário
tenta estabelecer-se, é o da demo-
cracia brasileira. Democracia que se
encontra em processo de consolida-
ção, muito embora autores (WERNECK
VIANNA et al., 2003; SADER, 2005) apon-
tem para um déficit em seu funcio-
namento que poderia pervertê-la em
um sistema de procedimentos forma-
lizados, extremamente fechados às
expectativas e demandas sociais.
Esse funcionamento deficitário
guardaria relação com a predomi-
nância do Executivo sobre o Legis-
lativo, que ganhou relevo em virtu-
de da paralisia decisória da repre-
sentação da maioria; em conseqüên-
cia, evidencia-se a primazia do ou-
tro poder através da prática, antide-
mocrática, da edição de Medidas
em reforçar instituições de garantia
do Estado Democrático de Direito,
dentre elas a Magistratura e o Mi-
nistério Público; a emergência do
fenômeno de criminalização da res-
ponsabilidade política, ou melhor,
da irresponsabilidade política, que
veio à baila diante das numerosas
investigações sobre corrupção na
classe política; os novos formatos
institucionais, derivados da mundi-
alização dos mercados e a emergên-
cia de uma pauta de debates sobre
AS TRANSFORMAÇÕES NOS SISTEMAS
PRODUTIVO E DE REGULAÇÃO DO TRABALHO,TORNADAS POSSÍVEIS GRAÇAS ÀS REVOLUÇÕES
TECNOLÓGICAS, ACOMPANHARAM A“DIFUSÃO DO MODELO NEOLIBERAL E DO
SEU CREDO DESREGULAMENTADOR”
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 49
Provisórias. Esse processo de toma-
da de decisões vem subtraindo a
formação da opinião, tanto no âm-
bito parlamentar, quanto no da so-
ciedade civil, nas questões estraté-
gicas para os rumos da sociedade
(WERNECK VIANNA, 2003).
Em virtude dessa primazia do
Executivo concedida à política eco-
nômica, e da concomitante diminui-
ção da esfera pública, têm-se obser-
vado uma crescente reação, por parte
da sociedade civil, das minorias
políticas às organizações sociais –
quando não do simples cidadão –,
no sentido de recorrerem ao Poder
Judiciário, contra leis, contra des-
mandos da Administração, por fim,
contra a omissão do papel do Esta-
do em relação às demandas sociais.
No que tange aos direitos sociais
propriamente ditos, CITTADINO (2003)
destaca que no Brasil o movimento
de incorporação da linguagem dos
direitos ao debate político, e ao or-
denamento jurídico, se deu por meio
da confluência de fatos que assola-
ram o país, nas já citadas décadas,
tais como: a emergência dos movi-
mentos de defesa dos direitos huma-
nos, na década de 1970 como reação
ao regime autoritário vigente; a luta
pela reconquista dos direitos de par-
ticipação política durante a transição
democrática nos anos 1980; a orga-
nização de diversos setores da socie-
dade civil, a partir de 1985 para par-
ticipar da elaboração da nova Cons-
tituição de 1988; a reação a denún-
cias de violações de direitos funda-
mentais da população mais pobre,
na década de 1990. Para a autora, a
Constituição Federal de 1988, que
abraçou todos os direitos da Decla-
ração da ONU como direitos funda-
mentais no Brasil (parágrafo 2º do
art. 5º), e introduziu, diversos me-
canismos processuais, que buscam
dar eficácia a estes direitos é, certa-
mente, a principal referência da in-
corporação da linguagem dos direi-
tos (CITTADINO, 2003. p.17).
no hiato entre a importância atribu-
ída à questão social na Carta de 1988
e a adoção de estratégias de Refor-
ma do Estado, orientadas por uma
agenda neoliberal.
No Brasil, problemas considera-
dos fundamentais como o ajuste fis-
cal do Estado, a privatização e a
abertura comercial – criação de con-
dições para a abertura de mercados
–, entram na agenda da reforma. A
opção pela Reforma Administrativa,
entretanto, só entra em pauta em
1995, após a eleição e posse de
Fernando Henrique Cardoso. Neste
momento, a reforma é considerada
condição, de um lado, da consoli-
dação do ajuste fiscal do Estado
brasileiro e, de outro, da existên-
cia no país de um serviço público
moderno, profissional e eficiente,
voltado para o atendimento das
necessidades dos cidadãos.
A reforma administrativa brasi-
leira vai sendo implementada e os
desenhos das novas políticas soci-
ais públicas focalizam, cada vez
mais, a questão da pobreza e nos
mecanismos de amortizá-la, em de-
trimento da ampliação da cidadania
e políticas redistributivas.
Diante de duas dinâmicas, por
um lado, o texto constitucional re-
cém aprovado, por outro, a agenda
de Reforma do Estado – que para
ser implementada exige uma larga
produção legislativa e/ou o uso de
Medidas Provisórias pelo Poder Exe-
cutivo – a sociedade civil começa a
enxergar nos instrumentos proces-
Nos anos 1990, a Reforma do
Estado tornou-se tema central em
todo o mundo como parte das res-
postas ao processo de globalização
da economia em curso. A redução
da autonomia dos Estados Nacio-
nais para formular e implementar
políticas começa a se delinear nos
anos 1970, mas só assume plena
definição na década de 1980. Por-
tanto, parte das razões que explicam
a centralidade do Poder Judiciário na
vida nacional pode ser encontrada
NOS ANOS 1990, A REFORMA DO
ESTADO TORNOU-SE TEMA CENTRAL
EM TODO O MUNDO COMO PARTE
DAS RESPOSTAS AO PROCESSO
DE GLOBALIZAÇÃO DA
ECONOMIA EM CURSO
SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
50 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
suais disponíveis, a possibilidade de
adentrar o espaço decisório do Esta-
do, ou seja, o espaço regulamentar.
Durante a década de 1980, o Ju-
diciário brasileiro descreveu uma tra-
jetória de informalização e facilita-
ção de acesso, por meio da abertura
dos Juizados de Pequenas Causas.
Para Werneck Vianna, a percep-
ção cappellettiana do caráter estra-
tégico do acesso à justiça para a for-
mação da cidadania encontrou recep-
ção na magistratura brasileira.
Com o amadurecimento da crítica
da processualística convencional, con-
verge-se para a criação dos Juizados
Especiais Cíveis e Criminais, por meio
da Lei 9.090, em 26 de setembro de
1995. Então, o Judiciário é exposto a
microlitigiosidade em seu estado bru-
to. Isso tirou os magistrados do meio
relativamente neutro em que se man-
tinham e lhes conferiu uma posição
digna para a invenção da sociabili-
dade (WERNECK VIANNA, 1999).
Portanto, como o processamen-
to, nesses Juizados Especiais, é
mais rápido, se comparado com a
Justiça Comum, eles concentraram
grande parte da demanda sobre di-
reito do consumidor, inclusive de
planos de saúde.
Influindo no cenário conflituoso
da saúde suplementar no Brasil, a
partir da década de 1990, registram-
se fatos marcantes, como o amadu-
recimento das relações de consumo,
atribuída à criação do próprio Códi-
go de Defesa do Consumidor (CDC),
tanto no que criou de salvaguardas
legais mediando este tipo de transa-
ção, quanto no que orientou a cria-
ção de uma cultura de consumo. O
consumidor de serviços assistenci-
ais de saúde passa a contestar arbi-
trariedades cometidas pelos opera-
dores de seus planos de saúde por
meio de reclamações ao Programa
de Defesa do Consumidor (Procon),
que promove a proteção da relação
consumeirista.
Mas, o Poder Judiciário encerra
contradições em relação à sua in-
1999, reajustassem as mensalidades
acima do percentual de 11,69%, au-
torizado, em 2005, pela ANS para
os contratos novos.
Essa dicotomia entre opiniões es-
tabelecidas pelo Judiciário é mais um
exemplo das contradições endógenas
de uma instituição judicial que tem
se aproximado do cenário político.
O crédito na via judicial de solu-
ção de litígios passa a ficar mais
atrativo, na medida que o instituto
da Tutela Antecipada passa a refle-
tir uma verdadeira revolução pro-
cessual, antecipando os efeitos da
futura decisão da ação (FUX, 2000).
Enquanto solução provisória e
paralela ao curso da ação judicial,
a antecipação da tutela é muitas
vezes buscada no Judiciário. E po-
derá ser aplicada, pelos magistra-
dos, nos conflitos existentes entre
clientes, de um lado, e planos e se-
guros de saúde, de outro.
FUX (2000) destaca o caráter dis-
cricionário da regra de aplicação
deste instituto, no sentido de que o
juiz dispõe desse poder de avalia-
ção da situação de segurança e da
situação de evidência.
A situação de segurança, por sua
vez, guarda ligação com a produção
de prova inequívoca / verossimilhan-
ça, apresentada, no requerimento da
Tutela Antecipada (TA), pelo represen-
tante legal do cliente / demandante.
Essa prova precisa evidenciar um
incremento no perigo / risco de vida,
associado à negação de cobertura
pelo plano ou seguro de saúde.
tervenção no campo regulamentar
da saúde suplementar. A decisão
crucial do STF, em 2003, que deixa
fora da órbita da Lei 9.656/98 e da
ação da Agência Nacional de Saúde
(ANS) os planos antigos de saúde,
parece contradizer as decisões da
maioria dos casos levantados du-
rante esta nossa pesquisa. Em pólo
oposto estaria a decisão, do TRF da
5ª Região (Recife), de não permitir
que as operadoras de planos e se-
guros-saúde antigos, anteriores a
INFLUINDO NO CENÁRIO CONFLITUOSO
DA SAÚDE SUPLEMENTAR NO BRASIL,A PARTIR DA DÉCADA DE 1990,
REGISTRAM-SE FATOS MARCANTES,COMO O AMADURECIMENTO DAS
RELAÇÕES DE CONSUMO
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 51
De outra parte, a situação de evi-
dência se relaciona mais fortemente
com aqueles casos em que existem
direitos disponíveis a serem garan-
tidos por meio da tutela.
A TA, porém, só poderá ser conce-
dida mediante requerimento da par-
te. Ou seja, o legislador excluiu a pos-
sibilidade de o magistrado, enquanto
representante funcional do Estado, dar
início à tutela sem que, antes, tenha
sido provocado para tanto. Ou seja, o
magistrado pode ter conhecimento da
ação em curso e da necessidade da
tutela, mas não poderá oferecê-la sem
que haja um pedido formal.
FUX (2000) esclarece que, no
jogo de poder entre os poderes re-
publicanos,
“ (...) o pregoado ativismo judicial, que
poderia ser efetivado por meio da TA,
recebeu um contrapeso conservador
por parte do legislador, que retirou com
a outra mão, a sedutora idéia da TA, ao
dispor no parágrafo 2 do art. 273 do
Código de Processo Civil, que: ‘Não se
concederá a antecipação da tutela
quando houver perigo de irreversibili-
dade do provimento antecipado’ (...)
Aqui se evidencia a distância entre o
legislador e a vida fenomênica, pois,
invariavelmente, as situações de ur-
gência na saúde, que reclamam a an-
tecipação da tutela, geram situações
irreversíveis, dado que a satisfação da
necessidade do demandante, via de re-
gra, deve ser imediata. Daí resultando,
quase sempre, que o fato do juiz decidir
pela concessão da TA já, por si só, re-
sulta numa decisão de difícil contesta-
ção, visto seus efeitos não poderem ser
anulados pelo simples fato de gan-
ho de causa para o plano de saúde
na ocasião do julgamento da ação.”
(FUX, 2000. p.45-46)
Neste exemplo de conduta de se-
tores do Judiciário é que se observa
o agir político do Magistrado, o agir
contra legem. Nos casos de anteci-
pação da tutela em situações urgen-
tes, podemos retirar exemplos da
chamada constitucionalização do
direito ordinário. Pois, nessas situ-
ações urgentes, o bem da vida, o
direito à cobertura integral em saú-
de, é interpretado pelo juiz à luz de
princípios valorativos da vida e da
dignidade humana.
plos em que duelarão o pressuposto
da legalidade e da justiça. Ou seja, a
lei escrita, já existente e altamente
anacrônica, a conceder um direito
num parágrafo, e a limitá-lo, restrin-
gi-lo ou anulá-lo no outro, se defron-
tará com a sensibilidade discricioná-
ria de alguns setores do Judiciário,
que evocam o valor humano da vida
como o bem maior a ser protegido.
Os efeitos do processo de judicia-
lização geral na saúde são inequívo-
cos. Os avanços alcançados, desde a
Constituição de 1988, na definição de
saúde enquanto direito social, e no
entendimento de que a saúde é um
bem de relevância pública, e que sua
denegação incorre em crime de res-
ponsabilização jurídica, expressa-
ram, ainda que no plano formal, a
ruptura com um modelo médico as-
sistencial privatista e meritocrático.
Nesse sentido, o atual texto consti-
tucional adotou uma concepção mais
abrangente de seguridade social, em
rota oposta à do seguro.
No entanto, nas palavras de COHN
(2003), as tradicionais e históricas
dicotomias no setor saúde, entre o
universal e o elegível, o público e o
privado, o preventivo e o curativo,
o rural e o urbano, o carente e o
não-carente e entre o discurso e a
prática das políticas de saúde não
foram superadas. Os problemas e
impasses antepostos à perspectiva
da conformação, no Brasil, da cida-
dania de uma ordem democrática
também incidiram sobre a saúde. A
herança da concepção da saúde res-
trita à assistência médica e pertinen-
Por tudo isso, os magistrados po-
dem conceder ou negar a antecipação
da tutela. Os que a concedem, podem
valer-se do que Fux chama do “dever
geral de segurança”; os que a dene-
gam podem invocar o argumento da
irreversão, ou mesmo o da pertinên-
cia de cláusulas contratuais, que ex-
cluam a cobertura ora reclamada.
Portanto, o contexto de antecipa-
ção da tutela judicial, em situações
urgentes, no campo da saúde suple-
mentar, será um dos possíveis exem-
OS EFEITOS DO
PROCESSO DE
JUDICIALIZAÇÃO
GERAL NA SAÚDE
SÃO INEQUÍVOCOS
SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
52 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
te à esfera privada contrapôs-se à
definição da saúde como direito do
cidadão e dever do Estado.
As proposições de mudança de
rota na orientação privatizante da
saúde, predominante, desde os anos
1930, preconizadas pela Constituição
Federal de 1988 (CF/88), por meio de
prestações ativas por parte do Esta-
do ainda não lograram plena efeti-
vação. O Sistema Único de Saúde
(SUS) convive com um expressivo
mercado de planos e serviços priva-
dos de saúde. Mas a própria CF/88
previu o enquadramento dos servi-
ços privados de saúde. A CF/88, além
de elevar a saúde à condição de di-
reito social, também assumiu a pos-
sibilidade de tal prestação de servi-
ços assistenciais ser oferecida pela
iniciativa privada. O bem ofertado é
tido como de relevância pública, de
interesse público. Ou seja, a sua de-
negação, independente da natureza
jurídica do prestador de serviço con-
fere responsabilização jurídica.
O constituinte, ao referir-se à re-
levância pública das ações e dos
serviços de saúde, pretendeu elevar
a saúde à mesma condição do direi-
to à vida e da dignidade da pessoa
humana, um dos fundamentos da
República (SANTOS, 1997).
A PESQUISA DE AÇÕES NO JUDICIÁRIO
O escopo de nossa pesquisa dá
prioridade às relações assimétricas
nos mercados, nos quais a defesa
da vulnerabilidade do consumidor
encontra abrigo por meio da inter-
venção do Poder Judiciário. Em es-
pecial, escolhemos descrever esta
assimetria em relação ao mercado
de planos e seguros de saúde.
Tendo em vista que a regulamen-
tação deste setor – Lei 9.656 – se
deu em 1998 e que algo em torno de
70% dos planos e seguros de saúde
têm contratos anteriores a este mar-
co legal, e que a intervenção da ANS
– criada em 2000, por meio da Lei
9.661 – foi limitada pelo STF, em
2003, em relação a esses contratos
possibilidade de garantia de uma
cobertura assistencial médica digna.
Embora formalmente, segundo os
contratos novos – aqueles firmados
a partir de janeiro de 1999, de acor-
do com o artigo 10 da Lei nº 9.656/
98, que institui o Plano-Referência de
assistência à saúde –, os planos de
saúde deveriam cobrir todas as do-
enças listadas no CID 10 da OMS,
entretanto, isso ocorre parcialmente.
A permissão para a comercialização
de quatro tipos opcionais de regimes
de atendimento – ambulatorial, hos-
pitalar, odontológico e obstétrico –,
admite a limitação de acesso.
Em relação a este mercado de pla-
nos e seguros de saúde encontram-
se conflitos nas mais variadas situa-
ções. Por exemplo: não-cobertura de
próteses e órteses; limitações em re-
lação ao atendimento de urgência e
emergência; necessidades de trans-
plantes de outros órgãos além dos
de rins e córneas; descredenciamen-
to de médicos, hospitais e laborató-
rios; aumentos abusivos de mensa-
lidade relacionados à faixa etária;
exigência de cheque-caução; limita-
ção de tempo de internação; descum-
primento contratual; cláusulas abu-
sivas em contrato; propaganda en-
ganosa e rescisão unilateral de con-
tratos por parte da operadora.
A pesquisa do LEPS/UFRJ (SALAZAR,
SCHEFFER & GROU, 2005) coletou deci-
sões que versavam sobre questões
de cobertura, carência, benefício le-
gal, erro médico, reajustes, rescisão
unilateral de contrato, rescisão uni-
lateral de contrato por falta de pa-
antigos, fica óbvio que esse cenário
é gerador de situações conflitantes.
Esses contratos antigos limitam
a cobertura das chamadas doenças
e lesões preexistentes, e alguns até
mesmo de doenças crônico-degene-
rativas, como diabetes, hipertensão,
câncer, hepatite B, hepatite C, Aids,
entre outras. Quando não negam co-
bertura, negam os procedimentos li-
gados ao tratamento da doença. Es-
sas demandas do tipo “paiol de pól-
vora”, encontraram no Judiciário a
O SISTEMA ÚNICO
DE SAÚDE (SUS)CONVIVE COM UM
EXPRESSIVO MERCADO DE
PLANOS E SERVIÇOS
PRIVADOS DE SAÚDE
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 53
gamento, descredenciamento de
prestadores de serviços médicos e
decisões sobre outros assuntos.
Foram avaliadas 611 decisões co-
letadas nos tribunais de Justiça dos
estados do Rio de Janeiro e São Pau-
lo, correspondendo às decisões profe-
ridas em Agravo de Instrumento nos
anos de 2003 e 2004, relativas à con-
cessão de Tutela Antecipada como
garantia provisória para conflitos
emergentes das relações entre clien-
tes e planos ou seguros de saúde.
TABELA 1 – Distribuição das decisões segundo assunto abordado e tribunal, 2003 e 2004
Fonte: LEPS/UFRJ 2004.
Por meio dos registros coleta-
dos, percebe-se que São Paulo com-
pareceu, no levantamento total, em
cinco de cada seis decisões (Tabe-
la 1). O assunto ‘cobertura’ respon-
deu por cerca de metade das deci-
sões do TJSP e por cerca de dois
terços no TJRJ. Os temas ‘benefício
legal (BL)’ e ‘rescisão unilateral de
contrato (RUC)’, com freqüências
em torno de 18% e 9%, aparecem
em segundo e terceiro lugar em
São Paulo e totalizam junto com o
assunto cobertura, aproximada-
mente 80% das decisões analisa-
das. No Rio de Janeiro, 17% das de-
cisões analisadas versaram sobre
RUC. Juntos, cobertura e RUC mo-
tivaram perto de oito em cada dez
decisões analisadas pelo TJRJ.
Quando considerados em conjunto
os dois tribunais, o perfil das de-
cisões analisadas se assemelha ao
da capital paulista, devido ao mai-
or número de registros identifica-
dos em São Paulo.
No TJRJ tiveram alguma signifi-
cância as questões residuais sobre
reajustes e não ocorreram deman-
das sobre carência, erro médico e
descredenciamento (Tabela 2).
Em ambos os tribunais, as deci-
sões favoráveis em primeira instân-
cia foram mais freqüentes do que as
de segundo grau, exceto para o tema
“reajustes” em São Paulo, em que a
freqüência das decisões recursais
favoráveis alcançou quase o dobro
das de primeiro grau (Tabela 2).
Em São Paulo (Tabela 2), os as-
suntos que apresentaram as maiores
freqüências de decisões favoráveis em
segunda instância (iguais ou superi-
ores a cerca de 70%) foram, em or-
dem decrescente: BL, reajuste, RUC,
cobertura e carência. As maiores re-
duções do número de decisões favo-
ráveis, em segunda instância, em re-
lação às de primeiro grau (diferenças
iguais ou superiores a 20%), foram
descredenciamento, erro médico e ca-
rência, em ordem decrescente.
No Rio de Janeiro, as proporções
de decisões favoráveis, tanto de pri-
meira quanto de segunda instânci-
as foram sempre mais elevadas do
TJSP TJRJ Total
Assunto Número de decisões
% Número de
decisões %
Número de decisões
%
Cobertura 275 053,8 065 0065,0 340 055,6
Carência 013 002,5 000 000,0 013 002,1
Benefício legal – 091 017,8 003 003,0 094 015,4
Erro médico 012 002,3 000 000,0 012 002,0
Reajustes 015 002,9 006 006,0 021 003,4
RUC* 046 009,0 017 017,0 063 010,3
RUC por falta de pagamento 021 004,1 002 002,0 023 003,8
Descredenciamentos 005 001,0 000 000,0 005 000,8
Outros assuntos 033 006,5 007 007,0 040 006,5
Decisões analisadas – total 511 100,0 100 100,0 611 100,0
SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
54 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
que em São Paulo. De maneira ge-
ral, as proporções de decisões de
segunda instância mostraram-se
sempre maiores que 70% (Tabela 2).
Quando consideradas todas as
demandas em conjunto, em ambos
os tribunais, o perfil das decisões
analisadas, quanto ao resultado fa-
vorável, se assemelha ao do tema
cobertura, em decorrência da eleva-
da freqüência de registros (acima de
50%) identificados (Tabela 2).
Na análise da Tabela 3, para
cada dez decisões sobre “cobertu-
ra” cerca de cinco (45,29%) versa-
vam sobre ‘coberturas diversas’,
tema que agrega muitos motivos,
com freqüências individuais bai-
xas. Quando considerados em con-
junto, tais motivos geraram a mai-
or demanda por cobertura, em am-
bos os estados. Observa-se, ainda,
que a metade restante das decisões
sobre o tema ‘cobertura’ versou
sobre seis temas.
Como demonstra a Tabela 3, das
decisões sobre cobertura com moti-
vo especificado, aquelas relaciona-
das com “próteses e outros materi-
ais” foram as mais freqüentes em
ambos os tribunais.
No TJSP aparecem, em segundo
e terceiro lugares, as decisões so-
bre câncer e obesidade mórbida. No
TJRJ tais posições foram ocupadas
pelos motivos ‘obesidade mórbida’
e ‘urgência e emergência’, este úl-
timo em condições iguais com
home-care (Tabela 3).
De forma geral, as decisões fa-
voráveis em segunda instância no
Rio de Janeiro, tenderam a apresen-
tar freqüências mais elevadas do
que no TJSP (Tabela 4).
Tal como observado nos demais
assuntos coletados na amostra, as
decisões de segunda instância tende-
ram a ser menos favoráveis do que
as correspondentes em primeiro grau.
As exceções foram as relativas à ‘obe-
sidade mórbida’, em ambos os tribu-
nais, e ‘urgência e emergência’ e
transplantes no TJRJ. Cabe destacar,
entretanto, que as baixas freqüências
observadas no Rio de Janeiro podem
estar associadas às expressivas vari-
ações registradas nas proporções das
decisões favoráveis nas primeira e
segunda instâncias (Tabela 4).
Quanto à fundamentação jurídi-
ca das decisões dos magistrados (Ta-
bela 5), houve referência à legisla-
ção específica do setor – Lei 9.656/
98 – em cerca de 129 das 611 coleta-
das, o que representa algo em torno
de 20%, quando consideradas tam-
bém as referências à Lei 9.656 asso-
ciadas ao CDC. Comparando com o
observado por Fux em 2000, quan-
do de 66 decisões coletadas, em São
Paulo e no Rio de Janeiro, apenas três
mencionavam essa Lei, ou seja, ape-
nas 4,54%, pode estar sinalizando um
crescimento da influência deste mar-
co legal do setor.
TABELA 2 – Número e proporção de decisões favoráveis nas primeira e segunda instâncias, segundo tribunal, 2003 e 2004
Tribunal Assunto Número de
decisões %
Decisões favoráveis em 1º grau
% Decisões
favoráveis em 2º grau
%
Cobertura 275 100,0 217 078,9 197 071,6
Carência 013 100,0 012 092,3 009 069,2
Benefício legal – permanência no plano coletivo
091 100,0 083 091,2 074 081,3
Erro médico 012 100,0 010 083,3 004 033,3
Reajustes 015 100,0 006 040,0 011 073,3
Rescisão unilateral do contrato* 046 100,0 038 082,6 033 071,7
Rescisão unilateral do contrato por falta de pagamento
021 100,0 015 071,4 014 066,7
Descredenciamentos 005 100,0 005 100,0 002 040,0
Outros assuntos 033 100,0 020 060,6 014 042,4
TJSP
Decisões analisadas – total 511 100,0 406 079,5 358 070,1
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 55
TABELA 2 – Número e proporção de decisões favoráveis nas primeira e segunda instâncias, segundo tribunal, 2003 e 2004 (continuação)
Fonte: LEPS/UFRJ 2004.
* O número de decisões tratando da rescisão unilateral de contratos coletivo é 49 (77,77%) frente a 14 (22,22%) de rescisão de contratos individuais ou familiares.
TABELA 3 – Distribuição das decisões sobre cobertura, segundo o problema de saúde e o tribunal, 2003 e 2004
Fonte: LEPS/UFRJ 2004.
Tribunal Assunto Número de
decisões %
Decisões favoráveis
em 1º grau %
Decisões favoráveis
em 2º grau %
Cobertura 065 100,0 055 084,6 051 078,5
Carência 000 — 000 — 000 —
Benefício legal – permanência no plano coletivo
003 100,0 003 100,0 003 100,0
Erro médico 000 — 000 — 000 —
Reajustes 006 100,0 005 083,3 005 083,3
Rescisão unilateral do contrato* 017 100,0 015 088,2 013 076,5
Rescisão unilateral do contrato por falta de pagamento
002 100,0 002 100,0 002 100,0
Descredenciamentos 000 — 000 — 000 —
Outros assuntos 007 100,0 007 100,0 006 085,7
TJRJ
Decisões analisadas – total 100 100,0 087 087,0 080 080,0
Cobertura 340 100,0 272 080,0 248 072,9
Carência 013 100,0 012 092,3 009 069,2
Benefício legal – permanência no plano coletivo
094 100,0 086 091,5 077 081,9
Erro médico 012 100,0 010 083,3 004 033,3
Reajustes 021 100,0 011 052,4 016 076,2
Rescisão unilateral do contrato* 063 100,0 053 084,1 046 073,0
Rescisão unilateral do contrato por falta de pagamento
023 100,0 017 073,9 016 069,6
Descredenciamentos 005 100,0 005 100,0 02 040,0
Outros assuntos 0040 100,0 027 067,5 020 050,0
Total
Decisões analisadas – total 611 100,0 493 080,7 438 071,7
TJSP TJRJ Total Assunto
Número de decisões % Número de decisões % Número de decisões %
Obesidade mórbida 031 011,3 07 010,8 038 011,2
Home care 021 007,6 06 009,2 027 007,9
Câncer 035 012,7 02 003,1 037 010,9
Transplante 019 006,9 03 004,6 022 006,5
Prótese e outros materiais 038 013,8 10 015,4 048 014,1
Urgência e emergência 008 002,9 06 009,2 014 004,1
Cobertura diversas 123 044,7 31 047,7 154 045,3
Decisões sobre cobertura – total 275 100,0 65 100,0 340 100,0
SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
56 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
TABELA 4 – Número e proporção de decisões favoráveis sobre cobertura nas primeira e segunda instâncias, segundo tribunal e problema desaúde, 2003 e 2004
Fonte: LEPS/UFRJ 2004.
TABELA 5 – Distribuição da fundamentação jurídica das decisões proclamadas segundo tribunal, 2003 e 2004
Fonte: LEPS/UFRJ 2004.
Tribunal Assunto Número de
decisões %
Decisões favoráveis em 1º grau
% Decisões
favoráveis em 2º grau
%
Obesidade mórbida 031 100,0 019 61,3 022 071,0
Home care 021 100,0 016 76,2 011 052,4
Câncer 035 100,0 033 94,3 030 085,7
Transplante 019 100,0 017 89,5 009 047,4
Prótese e outros materiais 038 100,0 025 65,8 022 057,9
Urgência e emergência 008 100,0 008 100,0 007 087,5
Cobertura diversas 123 100,0 099 80,5 096 078,0
TJSP
Decisões sobre cobertura – total 275 100,0 217 78,9 197 071,6
Obesidade mórbida 007 100,0 003 42,9 005 071,4
Home care 006 100,0 006 100,0 005 083,3
Câncer 002 100,0 002 100,0 002 100,0
Transplante 003 100,0 002 66,7 003 100,0
Prótese e outros materiais 010 100,0 010 100,0 007 070,0
Urgência e emergência 06 100,0 005 83,3 006 100,0
Cobertura diversas 031 100,0 027 87,1 023 074,2
TJRJ
Decisões sobre cobertura – total 065 100,0 055 84,6 051 078,5
Obesidade mórbida 038 100,0 022 57,9 027 071,1
Home care 027 100,0 022 81,5 016 059,3
Câncer 037 100,0 035 94,6 032 086,5
Transplante 022 100,0 019 86,4 012 054,5
Prótese e outros materiais 048 100,0 035 72,9 029 060,4
Urgência e emergência 014 100,0 013 92,9 013 092,9
Cobertura diversas 154 100,0 126 81,8 119 077,3
Total
Decisões sobre cobertura – total 340 100,0 272 80,0 248 072,9
Fundamentação Jurídica Total % TJSP % TJRJ %
CDC 068 011,1 055 010,8 013 013,0
Lei 9656/98 113 018,5 093 018,2 020 020,0
CDC e Lei 9656/98 181 029,6 016 003,1 000 000,0
Constituição Federal / 88 06 001,9 006 001,2 000 000,0
Não específica – CPC 408 066,8 341 066,7 067 067,0
Total 611 100,0 511 100,0 100 100,0
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 57
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A mudança de rota na postura
política dos tribunais pode ser evi-
denciada sob diversos focos de aná-
lise. A intervenção de Poder Judiciá-
rio no âmbito privado da saúde é
mais um exemplo, entre outros, do
ativismo político de alguns magis-
trados. O marco da constitucionali-
zação do direito ordinário reforça
essa postura. A pressão da socieda-
de civil por justiça, proveniente tan-
to das relações consumeiristas de
mercado quanto das relações com o
Estado, tem encontrado abrigo na
intervenção desta terceira parte.
O complexo processo de produ-
ção regulamentar que envolve, hoje,
o setor de assistência à saúde su-
plementar põe a ANS diante de imen-
sos desafios. Na análise de GAMA
(2002), a tônica pragmática que pre-
dominou na elaboração e na imple-
mentação da Lei 9.656/98 não pare-
ce predominar em outras instâncias
de decisão. As decisões provenien-
tes do Poder Judiciário estão ampa-
radas em legislações mais abrangen-
tes e em princípios fundamentais da
República brasileira, e buscam, cla-
ramente, a defesa do bem da vida e
da dignidade humana.
O perigo que existe na arena re-
gulatória diante da presença plural
de várias instâncias com poder de
influir no marco regulatório, é o de
que estes marcos reguladores mais
ampliados entrarem em rota de co-
lisão e ultrapassarem a centralida-
de da ANS no processo de regula-
ção da assistência médica suplemen-
tar (GAMA, 2002).
Embora o impacto da interven-
ção do Judiciário na situação de
melhoria ou ampliação de cobertu-
ra dos serviços assistenciais priva-
dos, de uma forma geral, não pos-
sa ser mensurado, tendo em vista
o escopo desta pesquisa, o tempo
de vigência da Lei 9.656/98 e o ní-
vel de crescimento da cultura soci-
etal de busca de soluções judiciais
A maior ou menor dificuldade
dessas demandas de alcançarem sua
realização pode ser explicada por
meio de um conjunto relevante de
variáveis. Dentre elas abordaremos,
nesse momento, apenas três: o grau
de mobilização da coletividade de
usuários, ou da sociedade civil em
geral; o grau de acomodação de in-
teresses políticos expressados no
marco regulatório do setor; e a ca-
pacidade administrativa / fiscaliza-
dora da ANS em relação aos opera-
dores de planos de saúde que des-
cumprem a lei, e o tipo de solução
enfatizada por essa instância. Essa
variável relaciona-se, mais forte-
mente, à situação fiscal e ao nível
de renda do operador de plano de
saúde. Esse fator também é deci-
sivo, na medida que indica a ca-
pacidade, do operador de oferecer
a cobertura assistencial acordada
(DRAIBE, 1999).
Pesquisadores sobre modelos de
seguridade social (VIANNA, 2000) re-
velam que os seguros universais e
públicos, ou administrados sem fi-
nalidades lucrativas, são a forma
custo-efetiva mais justa de se garan-
tir a saúde da população. No Brasil
a luta pela consolidação de um SUS
justo e digno para toda a população
é o que deveria nortear as políticas
públicas. A escolha pelas soluções
de mercado na área da saúde deve-
ria ser uma escolha e não uma fata-
lidade advinda da crença de que o
sistema público de saúde é para os
pobres. Além disso, o mercado de
– que está sendo monitorado a par-
tir dos dados coletados nessa amos-
tra pelo LEPS / UFRJ em relação ao
setor assistencial privado da saú-
de –, na conjuntura atual, a possi-
bilidade de que esta pluralização
institucional produza uma ação si-
nérgica entre os agentes envolvidos,
capaz de traduzir-se em benefício
coletivo, abre perspectivas poten-
cialmente inovadoras em termos de
ampliação do espaço público, de
ação para a cidadania.
NO BRASIL A LUTA PELA
CONSOLIDAÇÃO DE UM
SUS JUSTO E DIGNO
PARA TODA A POPULAÇÃO
É O QUE DEVERIA NORTEAR
AS POLÍTICAS PÚBLICAS
SOUZA, Maria Hildete S. C. et al
58 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007
planos de saúde é perspicaz na sele-
ção dos riscos que serão cobertos e
na maioria das vezes tem demons-
trado um descumprimento no cuida-
do integral à saúde de seus clientes.
Cabe assinalar a tensão que per-
meia o desenho regulamentar do
setor. Um pressuposto implícito na
formulação regulamentar é que os
laços burocráticos e clientelistas
que regem os interesses setoriais
devem ser rompidos na medida em
que se criem mecanismos institu-
cionais de participação social que
representem, equanimente, todos
os atores envolvidos. Assume-se,
assim, que a capacidade propositi-
va destas representações tenha peso
igualitário nas decisões sobre a re-
gulamentação, diminuindo assim a
margem de atuação de outras ins-
tâncias regulatórias, como o Judi-
ciário tem se convertido.
A presente avaliação permite que
se conclua que, embora o novo dese-
nho regulamentar tenha levado a uma
maior eficiência e representatividade,
também apresenta um viés distribu-
tivo, quando efetivamente posto em
prática. Com efeito, vem ocorrendo
um sancionamento das desigualdades
existentes entre as diversas enverga-
duras das empresas de saúde, como
suas capacidades implementadora,
técnica e financeira. Nesse sentido, ao
premiar os agentes mais capacitados,
corre-se o risco de reproduzir a desi-
gualdade (COHN, 2003).
Algumas pressões operam no
sentido de reduzir o compromisso
institucional – ANS – com normas
de natureza mais abrangente no
sentido de se garantir a integrali-
dade de cobertura assistencial à
saúde. Nesse sentido, a necessida-
de de flexibilizar os requisitos de
acesso das representações de todos
os atores envolvidos constitui um
grande desafio.
O marco regulatório do setor de
saúde suplementar vem sendo imple-
mentado em um quadro de mudan-
ças estruturais no setor e em um
al de escassez de recursos frente ao
vigor da demanda, houve, graças ao
do marco regulatório, uma real ex-
pansão de cobertura, no período re-
cente, após um tempo de disparida-
des na oferta de produtos. A meta
da integralidade, porém, permane-
ce como um ideal a ser perseguido.
Os problemas apontados em re-
lação à regulamentação do setor de
planos e seguros de saúde privados,
examinados durante esse trabalho,
sugerem a necessidade de um refi-
namento no debate, sobre qual deve
ser o modelo de regulamentação bra-
sileiro para o setor.
A falta de capacidade demons-
trada pelo Poder Executivo em im-
plantar um consenso em torno do
desenho da política regulatória, le-
vou a uma sistemática reedição de
Medidas Provisórias, desde a pro-
mulgação da Lei 9.656/98, hoje sob
a guarda da ANS.
Entretanto, é importante para a
sociedade brasileira que a regula-
mentação da saúde suplementar seja
pactuada em bases democráticas.
Para tanto, torna-se importante a
participação não apenas do Congres-
so Nacional, como também da soci-
edade civil organizada. Estas instân-
cias devem se pronunciar sobre a
criação de uma Lei que esteja em
harmonia com o conceito ampliado
de saúde (GAMA, 2002).
A presença de outros atores no
cenário regulamentar é uma ques-
tão que merece ser profundamente
estudada. O papel do Poder Judiciá-
ambiente marcado por profundas in-
certezas. O baixo investimento pú-
blico na oferta de serviços assisten-
ciais de saúde tem justificado a pro-
cura por soluções privadas e a ofer-
ta de serviços pelo mercado. E isso
implica mudanças institucionais
marcantes, introduzidas por uma
nova agenda do setor. Essa agenda,
hoje, tem como centro o aperfeiçoa-
mento do marco regulatório.
É importante ressaltar que, a
despeito da contínua queixa setori-
É IMPORTANTE PARA ASOCIEDADE BRASILEIRA QUE AREGULAMENTAÇÃO DA SAÚDE
SUPLEMENTAR SEJA PACTUADA
EM BASES DEMOCRÁTICAS
A intervenção do Poder Judiciário no setor de saúde suplementar – tutelas antecipadas como instrumento de garantia da assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 44-60, janeiro 2007 59
rio é moldar comportamentos e ar-
bitrar conflitos. A litigiosidade pre-
sente nas relações sociais que per-
passam o setor privado de assis-
tência à saúde tem dado voz a re-
clamos dos clientes que, amiúde,
se vêem a descoberto diante de
suas necessidades.
O fato de estes conflitos ganha-
rem espaço no Judiciário pode estar
demonstrando uma necessidade de
maior amadurecimento da regula-
ção dos planos de saúde. Não pode-
mos ser injustos em dizer que a le-
gislação não tem avançado na re-
gulamentação. Mas parece que, en-
quanto espaço público de articula-
ção de interesses, a ANS tem demons-
trado maior permeabilidade ao em-
presariado do que aos clientes / be-
neficiários de planos de saúde. Esse
fato pode ganhar contornos nítidos
ao analisarmos as demandas que
encontramos no Judiciário. Pois es-
sas demandas convergem para o Ju-
diciário por não encontrarem abri-
go em soluções extrajudiciais, que
poderiam partir da própria agência.
Dentro da perspectiva de descre-
ver a intervenção Judiciária nos con-
flitos inerentes ao setor de saúde
suplementar, a análise das 611 de-
cisões judiciais permitiu demonstrar
que o Poder Judiciário tem agido no
sentido de conceder, ou mesmo ga-
rantir, o direito à cobertura recla-
mada. Tem validado o direito à saú-
de, no sentido de preservar a vida
humana numa situação dramática,
tem garantido o direito em casos de
permanência em planos de saúde,
reajustes, carências, entre outros
itens. Esse comportamento do Ju-
diciário, como aliado do consumi-
dor em posição de vulnerabilidade,
tem trazido para a superfície do
debate regulatório demandas que se
repetem na justiça. Assim, embora
não seja da natureza do Judiciário
criar direito, esse Poder tem funci-
onado como mecanismo de afirma-
ção e de vocalização social, no sen-
tido de ampliar a abrangência do
escopo dos contratos privados de
assistência à saúde.
A robustez das demandas associ-
adas à cobertura assistencial, de-
monstrada pela pesquisa, revela que
há um nó crítico em relação à imple-
mentação da extensão de cobertura
nos marcos do Plano Referencial pro-
posto pela Lei 9.656/98, e as restri-
ções de acesso impostas pelos regi-
mes segmentados de atendimento,
além de tratamentos não incluídos
na legislação, como quimioterapia e
radioterapia, transplantes de outros
órgãos além de rins e córneas, trata-
mento domiciliar, entre outros.
Quanto à fundamentação jurí-
dica, a referência à Lei 9.656/98
ocorreu em cerca de 20% das deci-
sões coletadas. Esse é um sinal de
certo crescimento da utilização
desse instrumento legal em rela-
ção ao observado por Fux em 2000,
quando de 66 decisões coletadas,
em São Paulo e no Rio de Janeiro,
apenas três mencionavam tal Lei.
A maior referência jurídica foi o
CPC associado a referências ines-
pecíficas, em ambos os estados,
evidenciando que as situações nas
quais se concederam as TA, podem
ter sido as que Fux atribui ao ca-
ráter discricionário da regra de
aplicação deste instituto, no senti-
do de que o juiz dispõe desse poder
de avaliação da situação de segu-
rança e da situação de evidência. A
referência ao CDC foi pequena, e a
CF/88 mostrou-se residual.
Assim, o Judiciário tem sido um
instrumento muito valioso para o
exercício de uma cidadania jurídi-
ca. Mas se estamos diante de um
Poder Judiciário com um papel cen-
tral na construção da sociabilida-
de e diante de um desafio imenso,
sob o ponto de vista pedagógico,
na criação de uma cultura cívica
republicana, só o tempo, e futuros
estudos, o poderão afirmar.
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O Sistema Único de Saúde e o mercado suplementar de assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007 61
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
O Sistema Único de Saúde e o mercado suplementar de assistência à saúde no Brasil
The Unique Health System and the private health market in Brazil
Rosa Maria Lages Dias1 & Rosa Maria Souza de Pastrana2
1 Enfermeira; Especialista em Gestão em Saúde pela FGV/RJ; Gerente Geral de Integração com o SUS – GGSUS/ANS, Rio de Janeiro, Brasil.
2 Economista; Sanitarista da Seceretaria Estadual de Saúde, Governo do Estado do Rio de Janeiro, Doutora em Saúde Coletiva pelo IMS/
Uerj, Rio de Janeiro, Brasil.
RESUMO
A proposta deste artigo é abordar a relação entre o Sistema Único de Saúde (SUS) e o mercado Suplementar
de Assistência no Brasil, tendo como foco de análise o ressarcimento ao SUS. Destaca-se o esforço da Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS) no sentido de implantar mecanismos de regulação mais ágeis visando
assegurar os princípios e diretrizes do SUS. Enfatiza-se a importância da construção de bases propositivas de
uma agenda comum objetivando o aperfeiçoamento do Sistema Nacional de Saúde.
PALAVRAS-CHAVE: Sistema Único de Saúde; Saúde Suplementar; Setor Público; Setor Privado; Ressarcimento ao SUS.
ABSTRACT
This article approaches the relation between the “Sistema Único de Saúde” (Unique Health system)- SUS and the
private health market in Brazil using as its analyzing focus the refunds from the private to the public sector. It
highlights the efforts of ANS- Agência Nacional de Saúde Suplementar ( National Health Agency) in implementing
better regulating mechanisms in order to secure the principles and directions of SUS. It emphasizes the importance
of building bases of a common agenda aiming the improvement of SUS.
KEYWORDS: National Health System (BR); Supplemental Health; Public Sector; Private Sector; SUS Refunds.
DIAS, Rosa Maria Lages & PASTRANA, Rosa Maria Souza de
62 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007
INTRODUÇÃO
A abordagem deste tema requer,
mesmo que breve, uma retrospecti-
va da gênese do sistema de saúde
brasileiro, composto pelo subsiste-
ma público integrado pelos estabele-
cimentos públicos e os conveniados
e/ou contratados e o subsistema pri-
vado configurado pelo setor exclusi-
vamente privado e pelo setor suple-
mentar. Interessa, neste artigo, abor-
dar o Sistema Único de Saúde (SUS)
e sua relação com Setor Suplemen-
tar, tendo como foco de análise o pro-
cesso de ressarcimento ao SUS.
ARRETCHE (2005), ao reportar-se ao
modelo anterior ao SUS e seu lega-
do, afirma que:
“A fórmula de proteção à saúde
inaugurada por Vargas era a de um
modelo de seguro no interior do siste-
ma previdenciário. Sua massificação
durante o regime militar ampliando
significativamente o escopo da cober-
tura fazia com que direito a serviços
públicos de saúde ficasse restrito ape-
nas aos trabalhadores formais que
pagavam contribuições ao Instituto
de Previdência Social (INPS).”
Estas condições, por certo, mol-
daram o processo de formulação e
implantação do SUS e possivelmen-
te inibiram o ideário reformista.
A implantação do SUS no Brasil
inaugura um novo pacto social, a
partir do rompimento com o modelo
de seguro social e sua evolução para
o modelo de seguridade social.
As diretrizes do SUS previstas no
art. 7º da Lei 8.080 de 1990 consis-
tem: na descentralização com direção
única em cada esfera de governo; no
atendimento integral abrangendo as
atividades assistenciais curativas e
prioritariamente as atividades preven-
tivas e a participação da comunida-
de. O SUS baseia-se nos seguintes prin-
cípios constitucionais, entre outros:
universalidade de acesso aos servi-
ços de saúde; integralidade em todos
os níveis de assistência. De acordo
com CARVALHO & SANTOS (1995) o prin-
cípio da integralidade há de se fazer
lização das Ações e Serviços de Saú-
de: A Ousadia de Cumprir e Fazer
Cumprir a Lei”, aprovado pelo Con-
selho Nacional de Saúde, inspirou a
introdução do conceito de eqüidade.
CORDEIRO (1985) enfatiza as polí-
ticas de saúde e o complexo médico
industrial destacando entre outros
aspectos que a “privatização da
medicina” é um processo que se ace-
lera a partir de 1967, encontrando
suas bases materiais no setor priva-
do hospitalar, “lucrativo” e “não-lu-
crativo”. É neste período que os con-
vênios médicos estabelecidos entre as
empresas empregadoras e as empre-
sas tipo ‘cooperativas médicas e
empresas de medicina de grupo’ con-
tribuíram para o fenômeno da capi-
talização da prática médica.
BAHIA (2001), ao tratar das dimen-
sões do mercado de planos de saú-
de, informa que:
“Alguns dos esquemas assistenci-
ais coletivos privados, baseados na cap-
tação de recursos de empresas emprega-
doras e seus empregados destinados ao
financiamento de uma assistência mé-
dica hospitalar adicional àquela orga-
nizada pelo Estado, foram criadas nos
anos 40 e 50. Alguns exemplos disso
são: 1) no setor público como a Caixa
de Assistência aos Funcionários do Ban-
co do Brasil (CASSI) e a Assistência Patro-
nal para os servidores do Instituto de
Aposentadorias e Pensões dos Industri-
ários (atual GEAP); 2) no setor privado:
os sistemas assistenciais privados que
acompanharam a instalação da indús-
tria automobilística, particularmente as
montadoras estrangeiras.”
O setor suplementar de saúde no
Brasil se instalou à margem da re-
combinadamente com o princípio da
igualdade da assistência.
Os referidos autores argumentam
que o atendimento especial “desi-
gual” é exatamente o que preserva o
princípio da igualdade e possibilita
a justiça na assistência à saúde de
indivíduos com maior grau de carên-
cia física, mental ou sensorial. A pro-
pósito, a Norma Operacional Básica
SUS-01/93 que se fundamenta no
aparato legal disposto nas Leis 8.080
e 8.142 e no documento “Descentra-
A IMPLANTAÇÃO DO SUS NO BRASIL
INAUGURA UM NOVO PACTO SOCIAL,A PARTIR DO ROMPIMENTO COM O MODELO
DE SEGURO SOCIAL E SUA EVOLUÇÃO PARA
O MODELO DE SEGURIDADE SOCIAL
O Sistema Único de Saúde e o mercado suplementar de assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007 63
gulação do Estado. O processo de
regulamentação iniciou-se em 1998,
com a Lei 9.656. A Agência Nacio-
nal de Saúde Suplementar (ANS),
implantada em 2000, vinculada ao
Ministério da Saúde é o órgão res-
ponsável pela regulação deste setor.
O aumento expressivo da deman-
da, em função da inclusão de seg-
mentos antes excluídos, o sucatea-
mento da rede pública de saúde, o
‘desfinanciamento’ do setor público,
os incentivos governamentais e a
renúncia fiscal, contribuíram para
a expansão da clientela beneficiária
de planos privados, em especial
durante a implantação do SUS. Além
disto, o acesso aos planos coletivos
é considerado um benefício agrega-
do ao salário do trabalhador.
Os argumentos de BAHIA (2001)
corroboram esta afirmativa, ao ex-
plicitar que:
“Dois enunciados articulados
entre si explicam usualmente a ex-
pansão dos planos privados no Bra-
sil. Em uma primeira instância as
insuficiências do SUS são associa-
das à expansão da assistência médi-
ca suplementar evocando os avan-
ços das políticas de corte neoliberal.
Essa equação por sua vez remete
questões tanto às proposições refor-
mistas universalistas quanto às po-
líticas assistenciais seletivas.”
E acrescenta que o crescimen-
to das alternativas particulares,
corporativas e meritocráticas de-
safia, por um lado, a construção
de um sistema de proteção social
universal e redistributivo e, por
outro, evidencia perspectivas para
a regulação de uma segmentação
já consolidada.
A DIMENSÃO DO SETORSUPLEMENTAR NO BRASIL
O setor de saúde suplementar no
país é integrado por empresas que
operam os planos de saúde, presta-
dores de serviços de saúde, profis-
sionais de saúde e usuários dos ser-
viços vinculados às operadoras de
planos de saúde.
FIGURA 1 – Cartografia da distribuição das operadoras por unidade da federação (UF) de domicílio do beneficiário. Brasil, 2005
Fonte: Cadastro de Operadoras – ANS/MS – 29/08/2005. Censo Demográfico estimativa 2004 – IBGE.
DIAS, Rosa Maria Lages & PASTRANA, Rosa Maria Souza de
64 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007
O mapa revela forte concentração
de operadoras na região Sudeste. Cha-
ma atenção o estado de Roraima, si-
tuado na região Norte, com a menor
participação da Saúde Suplementar.
Nota: Operadoras ativas.
Fonte: Cadastro de Operadoras – ANS/MS – 29/08/2005.
QUADRO 1 – Operadoras por região da sede e modalidade. Brasil, 2005
No Quadro 1 é possível visuali-
zar que do total de 2.129 operado-
ras instaladas no Brasil, a medici-
na de grupo é a modalidade pre-
ponderante no país com uma parti-
cipação de 33%, seguida da Odon-
tologia de Grupo com 20%, e da Co-
operativa Médica, com 17%, confor-
me mostra o Gráfico 1.
GRÁFICO 1 – Operadora por Modalidade
Nota: Operadoras ativas.
Fonte: Cadastro de Operadoras - ANS/MS - 29/08/2005.
Modalidade da operadora Norte % Nordeste % Sudeste % Sul % Centro Oeste % Total
Medicina de Grupo 21 2,92 % 92 12,81 % 449 62,53 % 123 17,13 % 33 4,60 % 718
Odontologia de Grupo 8 1,85 % 79 18,29 % 248 57,41 % 80 18,52 % 17 3,94 % 432
Cooperativa Médica 18 4,90 % 63 17,17 % 183 49,86 % 67 18,26 % 36 9,81 % 367
Autogestão 10 3,16 % 35 11,08 % 172 54,43 % 57 18,04 % 42 13,29 % 316
Cooperativa Odontológica 6 3,70 % 27 16,67 % 90 55,56 % 27 16,67 % 12 7,41 % 162
Filantropia 2 1,85 % 6 5,56 % 86 79,63 % 13 12,04 % 1 0,93 % 108
Seguradora Especializada em Saúde 0 0,00 % 0 0,00 % 13 92,86 % 1 7,14 % 0 0,00 % 14
Administradora 0 0,00 % 1 8,33 % 7 58,33 % 4 33,33 % 0 0,00 % 12
Total 65 3,05 % 303 14,23 % 1.248 58,62 % 372 17,47 % 141 6,62% 2.129
O Sistema Único de Saúde e o mercado suplementar de assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007 65
A análise dos dados referentes à
evolução da receita das operadoras
demonstra um crescimento impor-
tante no período de 2001 a 2004,
revelando a magnitude desse setor,
no mercado de saúde no Brasil.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Trata-se de um estudo descriti-
vo, utilizando como fonte de dados
o cruzamento das Autorizações de
Internação Hospitalar (AIH) do Sis-
tema de Informações Hospitalares
(SIH) DATASUS / Ministério da Saúde,
com o cadastro de beneficiários dos
planos de saúde.
Nesta perspectiva, a Gerência
Geral de Integração com o SUS (GG-
SUS/ANS) realizou estudos visando
conhecer o perfil dos procedimentos
Modalidade 2001 2002 2003 2004
Operadoras Médico-hospitalares 21.853.984.892 24.588.012.956 26.324.588.300 30.615.291.171
Medicina de Grupo 6.428.813.338 8.573.510.110 9.641.781.285 10.691.581.567
Cooperativa Médica 8.426.229.933 7.802.956.121 8.478.436.858 10.471.912.450
Seguradora Especializada em Saúde 5.264.940.490 6.224.944.448 6.603.698.533 7.600.898.687
Filantropia 1.160.986.382 1.360.597.505 906.566.991 1.011.439.223
Autogestão 573.014.750 626.004.773 694.104.633 839.459.244
Operadoras Exclusivamente Odontológicas 493.918.012 580.304.286 650.052.261 790.765.124
Odontologia de Grupo 328.732.552 392.759.195 428.854.809 581.457.442
Cooperativa Odontológica 165.185.460 187.545.090 221.197.452 209.307.681
Total 22.347.902.904 25.168.317.242 26.974.640.562 31.406.056.294
QUADRO 2 – Evolução da receita por modalidade
Nota: Nas autogestões não são incluídas as autogestões patrocinadas.
Fonte: Diops/FIP - 06/2005.
identificados no ressarcimento ao
SUS, no ano de 2002, sob diversos
aspectos, dentre os quais: grupos
selecionados, executados no Siste-
ma Único de Saúde, e os identifica-
dos por quantidade, valor total, va-
lor médio e percentual de utilização.
Para fins estudo foram selecio-
nados e analisados 14 grupos da
tabela do Sistema de Informação
Hospitalar (SIH/SUS), por freqüên-
cia, valores totais e valores médios
de AIH e percentual de utilização nos
respectivos grupos. O método utili-
zado foi balizado pela comparação
entre o cruzamento dos atendimen-
tos identificados e valorados pela
Tabela Única Nacional de Equiva-
lência de Procedimentos (TUNEP), e os
dados de produção e faturamento do
SUS no período estudado.
Cabe destacar, porém, que os
valores considerados para análise se
referem aos valores praticados pela
tabela de procedimentos do SIH/SUS.
ARCABOUÇO LEGAL DORESSARCIMENTO AO SUS
O ressarcimento está previsto na
Lei 9.656, de 1998, nos seguintes
dispositivos:
“Art. 32. Serão ressarcidos pelas ope-
radoras dos produtos de que tratam o
inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, de
acordo com normas a serem definidas
pela ANS, os serviços de atendimento
à saúde previstos nos respectivos con-
tratos, prestados a seus consumido-
res e respectivos dependentes, em ins-
tituições públicas ou privadas, con-
veniadas ou contratadas, integrantes
do Sistema Único de Saúde – SUS.
DIAS, Rosa Maria Lages & PASTRANA, Rosa Maria Souza de
66 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007
§ 1º O ressarcimento a que se refere o
caput será efetuado pelas operadoras
à entidade prestadora de serviços,
quando esta possuir personalidade
jurídica própria, e ao SUS, mediante
tabela de procedimentos a ser aprova-
da pela ANS.
§ 2º Para a efetivação do ressarcimen-
to, a ANS disponibilizará às operado-
ras a discriminação dos procedimen-
tos realizados para cada consumidor.
§ 4º O ressarcimento não efetuado no
prazo previsto no § 3º será cobrado
com os seguintes acréscimos:
I – juros de mora contados do
mês seguinte ao do vencimento,
à razão de um por cento ao mês
ou fração;
II – multa de mora de dez por cento.
§ 5º Os valores não recolhidos no prazo
previsto no § 3º serão inscritos em dívi-
da ativa da ANS, à qual compete a co-
brança judicial dos respectivos créditos.
§ 6º O produto da arrecadação dos
juros e da multa de mora será reverti-
do ao Fundo Nacional de Saúde.
§ 7º A ANS fixará normas aplicáveis
ao processo de glosa ou impugnação
dos procedimentos encaminhados,
conforme previsto no § 2º deste artigo.
§ 8º Os valores a serem ressarcidos
não serão inferiores aos praticados
pelo SUS e nem superiores aos prati-
cados pelas operadoras de produtos
de que tratam o inciso I e o § 1º do
art. 1º desta Lei.”
E na Lei da Criação da ANS,
9.961/2000:
“Art. 4º Compete à ANS:
VI – estabelecer normas para res-
sarcimento ao Sistema Único de
Saúde – SUS.”
A Diretoria de Desenvolvimento
Setorial da ANS – DIDES, através da
Gerência Geral de Integração com o
SUS – GGSUS, vem desenvolvendo
um conjunto de estudos, dentre os
quais a avaliação analítica dos
atendimentos identificados, com o
objetivo de caracterizar o ressarci-
mento ao SUS como instrumento de
regulação de mercado, atuando
como instrumento de tutela preven-
tiva do contrato realizado entre o
beneficiário e a operadora, na me-
no ano de 2002 no SUS correspon-
deu a 77,39% dos procedimentos
dos grupos selecionados e a 65,44%
no cruzamento do ressarcimento ao
SUS. Em contrapartida, a análise
do financeiro no SUS demonstra
uma inversão nesses percentuais,
com 76,86% e 74,54%, respectiva-
mente. O valor médio das AIH apre-
senta uma diferença de cerca de 40%
mais elevada no cruzamento dos
atendimentos identificada do que
nas AIH do SUS.
A tabela demonstra, ainda, que
os percentuais dos grupos 32, 35,
46, 76 e 31, somados, totalizam cer-
ca de 58,32% do total financeiro do
ressarcimento ao SUS, mas repre-
senta 40,51% do financeiro do pró-
prio SUS. No entanto, quando se
considera o quantitativo de proce-
dimentos realizados, os valores são
semelhantes: 40,53% no SUS e 39,25
no cruzamento.
Da análise dos aspectos referen-
tes à freqüência, valores totais e
valores médios destacam-se os gru-
pos de procedimentos a seguir:
• O grupo 32 referente à cirurgia
cardiovascular e linfática respon-
deu por 1,8% dos atendimentos
ocorridos no SUS, e por 4,03%
dos procedimentos identificados
no cruzamento, sendo que na
análise dos valores financeiros
a relação é de 10,97% no SUS e
de 24,82% no cruzamento. O va-
lor médio das AIH identificadas,
no cruzamento e no SUS é de R$
dida que funcionaria como inibidor
do descumprimento do contrato por
parte das operadoras, podendo tam-
bém se constituir como ferramenta
de regulação de sistema de saúde,
tendo em vista que possibilitaria
conferir maior visibilidade ao aces-
so aos serviços de saúde no país.
ANÁLISE DOS DADOS
Observa-se na Tabela 1, que o
total dos procedimentos executados
CARACTERIZAR O RESSARCIMENTO AO
SUS COMO INSTRUMENTO DE REGULAÇÃO
DE MERCADO, ATUANDO COMO INSTRUMENTO
DE TUTELA PREVENTIVA DO CONTRATO
REALIZADO ENTRE O BENEFICIÁRIO
E A OPERADORA
O Sistema Único de Saúde e o mercado suplementar de assistência à saúde no Brasil
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007 67
TABELA 1 – Percentuais físicos e financeiros dos grupos em relação ao total do SUS e total do cruzamento classificados pelo financeiro do cruzamento. Brasil, 2002
Fonte: Sistema de Controle de Impugnações – ANS/MS. SIH/SUS.
Grupo Fisico % Financeiro % Valor Médio Fisico % Financeiro % Valor Médio % utilização
32 Cirurgia Cardiovascular e Linfática 220.042 1,80 593.077.103,31 10,97 2.695,29 5.196 4,03 20.119.849,76 24,82 3.872,18 2,36
35 Obstetrícia – Partos e outros procedimentos cirúrgicos 2.597.404 21,23 690.161.779,65 12,77 265,71 28.199 21,88 8.114.355,39 10,01 287,75 1,09
46 Transplante, retransplante e busca ativa de doador 15.620 1,57 87.969.240,20 3,16 5.631,83 505 2,08 5.226.175,59 6,52 10.348,86 3,23
76 Afecções Respiratórias 1.932.517 15,80 647.733.582,93 11,98 335,18 14.015 10,87 5.285.267,29 6,52 377,12 0,73
31 Cirurgia Urológica 191.799 0,13 170.664.552,39 1,63 889,81 2678 0,39 5.287.961,31 6,45 1.974,59 1,40
81 Afecções Neurológicas 281.924 5,60 109.290.492,65 6,89 387,66 3249 5,59 1.705.638,89 6,28 524,97 1,15
77 Cardiovasculopatias 788.309 6,78 334.397.875,81 4,42 424,20 1.183 4,80 633.525,51 2,75 493,34 0,15
74 Doenças Infecciosas e Parasitárias 829.764 2,30 239.186.470,38 2,02 288,26 6.192 2,52 2.230.112,49 2,10 360,16 0,75
63 Psiquiatria 754.721 2,15 480.304.812,27 2,30 636,40 3.056 2,91 1.200.389,02 2,09 392,80 0,40
33 Cirurgia Gastroenterológica e orgãos anexos 684.552 0,83 372.601.604,24 1,46 544,30 7.208 1,21 5.092.489,20 2,06 706,51 1,05
34 Cirurgia Ginecológica 393.858 3,38 136.054.032,94 1,68 345,44 2.789 3,69 919.163,49 1,53 329,57 0,71
38 Cirurgia Plástica 262.780 6,17 124.528.755,92 8,88 473,89 3.756 2,37 1.694.762,36 1,48 451,21 1,43
42 Cirurgia Tórax 101.364 3,22 78.814.278,54 2,52 777,54 1.559 2,16 1.668.174,53 1,13 1.070,03 1,54
80 Nefrologia clínica 413.480 6,44 90.814.160 6,19 219,63 4.754 0,92 1.238.318 0,78 260,48 1,15
Total 9.468.134 – 4.155.598.741 – 438,00 84.339 – 60.416.183 – 716,35 0,89
Total do SUS e batimento 12.233.702 –––– 5.406.391.841,17 –––– 441,93 128.883 –––– 81.056.576,97 –––– 628,92
% 77,39 –––– 76,86 –––– –––– 65,44 –––– 74,54 –––– ––––
DIAS, Rosa Maria Lages & PASTRANA, Rosa Maria Souza de
68 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 61-68, janeiro 2007
3.872,18 e de R$ 2.695,29, res-
pectivamente, o que representa
uma variação de 30,29%.
• Dos procedimentos com maior
percentual de utilização pela cli-
entela de planos de saúde no SUS,
o grupo 35 – obstetrícia – partos
e outros procedimentos cirúrgi-
cos responderam, no SUS, por
21,23% dos atendimentos ocorri-
dos e por 12,77% dos valores fi-
nanceiros envolvidos. No cruza-
mento, os percentuais são prati-
camente os mesmos, com 21,88%
das ocorrências e 10,01% dos
valores financeiros, no entanto,
o valor médio da AIH no cruza-
mento é de R$ 287,75 e R$ 265,71
no SUS, com uma variação per-
centual de 7,6%.
• O grupo 46, com participação de
1,57% e 3,10% no total de procedi-
mentos executados e no financei-
ro no SUS, respectivamente, cor-
respondeu no cruzamento a 2,08%
e 6,52% no total de procedimentos
identificados. O valor médio da AIH
apresentou uma variação percen-
tual de 83,8% de acordo com a ta-
bela em referência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo não pretende
ser conclusivo em sua análise, con-
tudo seus achados sugerem seleti-
vidade para alguns procedimentos
pela clientela beneficiária de planos
de saúde e demonstram a necessi-
dade de implantação de mecanismos
de regulação mais ágeis e com vis-
tas à garantia dos princípios e dire-
trizes do SUS.
Neste sentido a ANS vem buscan-
do integrar os setores público e su-
plementar com o objetivo de cons-
truir as bases propositivas de uma
agenda comum, visando aperfeiço-
ar o Sistema Nacional de Saúde.
JORGE & MALTA. (2005) corroboram
essa afirmativa ao argumentar que:
“Constata-se um grande esforço re-
gulatório da ANS na construção de uma
agenda de regulação concentrada na
macrorregulação, cabendo também ao
Estado discutir sua atuação sobre o
campo da regulação operativa. Este úl-
timo constitui o centro de reflexão do
atual trabalho, ou seja, como ampliar a
compreensão sobre as questões que ocor-
rem no cotidiano dessas relações, visan-
do ampliar o olhar do Estado/ANS, para
que se estabeleça uma nova interven-
ção nesse espaço atuando, sobre o mo-
delo da assistência praticado.”
Durante os meses de dezembro
de 2004 e fevereiro, março, abril e
junho de 2005, a ANS realizou cin-
co Encontros de Integração com o
SUS, envolvendo representantes do
Ministério da Saúde, da ANS, dos
Sistemas Estaduais e Municipais, do
Ministério Público, dos Conselhos de
Saúde e do Setor Suplementar nas
cinco regiões do país.
Os debates ocorridos nesses
eventos ratificaram a importância da
integração entre os dois setores, vi-
sando garantir os princípios de: uni-
versalidade, integralidade e eqüida-
de no sistema brasileiro de saúde.
REFERÊNCIAS
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tica de Saúde no Brasil. In: TRINDA-
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Ministério da Saúde, 2005.
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 69
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-20021
Public health spending in the municipalities of Minas Gerais – 2000-2002
Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P. Fortes2, Edite Novais da Mata Machado3 & Bruna Duarte Matias4
1 Este estudo é um dos resultados do Termo de Cooperação Técnica e Financeira celebrado entre a Secretaria de Estado da Saúde de Minas
Gerais e a Fundação João Pinheiro, em março de 2004.
2 Pesquisadora, Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES), Fundação João Pinheiro (FJP), Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
3 Pesquisadora, Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES), Fundação João Pinheiro (FJP), Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
4 Estagiária, Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES), Fundação João Pinheiro (FJP), Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
RESUMO
Analisa-se o gasto público com saúde nos municípios mineiros nos anos de 2000 a 2002, a partir dos dados
do Sistema de Informações de Orçamentos Públicos de Saúde do Ministério da Saúde (SIOPS). Os municípios
foram agregados segundo as condições de gestão estabelecidas pela NOB 96, faixas de população e as
macrorregiões de saúde do estado. Foram analisados os seguintes indicadores: percentual de recursos próprios
aplicados na saúde, despesa total per capita, participação da despesa com recursos próprios municipais na
despesa total com saúde, transferências do SUS por habitante, participação da despesa com pessoal na despesa
total com saúde e participação da despesa com investimento na despesa total com saúde. Constatou-se que os
municípios mineiros aumentaram o percentual de recursos próprios aplicados na saúde e que a maior parte
deles está cumprindo o que determina a Emenda Constitucional 29. É significativa a variação dos indicadores
analisados, não apenas entre os agrupamentos realizados como intra-agrupamentos. Os gastos próprios com
saúde, assim como os gastos totais não guardam correlação com as necessidades de saúde.
PALAVRAS-CHAVE: Gastos em Saúde; Desigualdades em Saúde; Necessidades e Demandas em Serviços de Saúde.
ABSTRACT
The present document analyzes the municipal public health expenditure in Minas Gerais state from year 2000 to
2002, based on data from the Public Health Budget Information System of the Ministry of Health (Siops). The
municipalities were grouped according to management conditions established by the 1996 Basic Operational Norm
(NOB) of the Brazilian Unified Health System (SUS), population groups and health regions. The indicators analyzed
were: percentage of municipal resources applied to health, total per capita expenditure, percentage of municipal
expenditure in relation to total health expenditure, SUS transferences per inhabitant, percentage of personnel and
investment expenditure in relation to total health expenditure. The study shows that the municipalities increased
the percentage of their own resources applied to health, and that most of them are following the principles establi-
shed by the Constitutional Amendment 29. The indicators vary significantly among and inside the studied groups.
The municipalities' own expenditure, as well as the total expenditure, are not related to health needs.
KEYWORDS: Health Expenditure; Health Inequalities; Health Services Needs and Demand.
FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
70 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
INTRODUÇÃO
O objetivo principal foi analisar o
gasto público com saúde nos municí-
pios mineiros nos anos de 2000 a
2002 a partir das informações dispo-
níveis no Sistema de Informações de
Orçamentos Públicos de Saúde do
Ministério da Saúde (SIOPS). Espera-
se que seus resultados possam con-
tribuir para o debate relativo ao fi-
nanciamento do Sistema Único de
Saúde (SUS), para o aprimoramento
do SIOPS, bem como subsidiar a ação
política dos gestores e usuários do
SUS no enfrentamento das desigual-
dades na alocação de recursos finan-
ceiros entre municípios. O conceito de
desigualdade utilizado diz respeito às
diferenças produzidas socialmente,
consideradas injustas, desnecessári-
as e evitáveis (WHITEHEAD, 1991).
A questão da desigualdade pres-
supõe, portanto, um julgamento das
causas das diferenças detectadas, o
que envolve um juízo de valor. A
partir do conceito de WHITEHEAD (1991),
serão consideradas injustas aquelas
que penalizam os municípios com
maiores necessidades de saúde.
Conforme já amplamente destaca-
do na literatura, as regras de indu-
ção à descentralização da política de
saúde favoreceram os municípios
com maior capacidade instalada, pri-
orizando a adesão ao SUS em detri-
mento da eqüidade territorial. Ou
seja, a descentralização não se fez
acompanhar de instrumentos com
vistas a reduzir a desigualdade na
alocação de recursos entre municí-
pios, um dos determinantes das de-
sigualdades em saúde. Ainda que, no
caso de Minas Gerais, a introdução
do Piso de Atenção Básica (PAB) te-
nha garantido uma redistribuição de
recursos que favoreceu a região mais
pobre do estado, revertendo uma si-
tuação na qual muitos municípios
de compensar desigualdades nas ne-
cessidades e requer o acompanha-
mento dos recursos alocados pelas
três esferas de governo, co-respon-
sáveis pelo financiamento da aten-
ção à saúde no país.
Além desta introdução, este estu-
do está constituído por mais cinco
seções. Na segunda seção é feita uma
breve caracterização dos municípi-
os mineiros, a partir de dados demo-
gráficos e financeiros, de modo a
contextualizar a discussão dos gas-
tos com saúde. A terceira seção ana-
lisa o gasto público com saúde nos
municípios de Minas Gerais toman-
do por base os dados do SIOPS e utili-
zando como categorias analíticas as
condições de gestão estabelecidas
pela NOB 01/96,1 as faixas de popu-
lação e as macrorregiões de saúde
do estado. A quarta seção busca con-
trapor o comportamento dos gas-
tos com saúde com aquele verifi-
cado para as receitas e também as-
sociar os gastos com medidas que
expressem as necessidades de saú-
de. Na quinta seção são apresen-
tadas as conclusões do estudo e na
última, as referências.
CARACTERIZAÇÃO DOS MUNICÍPIOSDE MINAS GERAIS
Minas Gerais possui 853 muni-
cípios e uma população total de
recebiam valores próximos de zero,
as mudanças, além de contempla-
rem apenas os recursos federais para
a atenção básica, não consideram os
diferenciais nas necessidades de saú-
de. Perseguir a eqüidade na distri-
buição dos recursos financeiros para
a saúde pressupõe a sua distribui-
ção de modo desigual como forma
1 A NOB 01/96 definiu o enquadramento dos municípios brasileiros em duas modalidades de gestão do sistema de saúde: plena da atenção
básica (GPAB) e plena do sistema (GPS). Apenas os municípios enquadrados em GPS têm garantido o repasse global, fundo a fundo, dos
recursos federais. Portaria n. 2.023/GM de 23/09/2004 estabelece, no seu artigo 4º, a Gestão Plena do Sistema como a única modalidade de
habilitação de municípios.
PERSEGUIR A EQÜIDADE NA DISTRIBUIÇÃO
DOS RECURSOS FINANCEIROS PARA A SAÚDE
PRESSUPÕE A SUA DISTRIBUIÇÃO DE MODO
DESIGUAL COMO FORMA DE COMPENSAR
DESIGUALDADES NAS NECESSIDADES
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 71
18.127.024 habitantes 2001).2 Ana-
lisando a distribuição dos municí-
pios segundo faixas de população,
observa-se que 61% deles possuem
até 10 mil habitantes e concentram
15% da população do estado. No
outro extremo, dez municípios pos-
suem mais de 200 mil habitantes e
respondem por quase 30% da popu-
lação do estado.
Quanto às modalidades de ges-
tão estabelecidas pela NOB 01/96,
772 municípios (91% do total, cor-
respondendo a 53% da população do
estado) estão habilitados na Gestão
Plena da Atenção Básica (GPAB), 55
(46% da população do estado) na
Gestão Plena do Sistema de Saúde
(GPS) e 26 não estão habilitados.3
Dos 853 municípios, 805 alimen-
taram o SIOPS em 2002, o que cor-
responde a 94% do total. Entre os
que não o fizeram, dois (Alfenas e
Campos Altos com cerca de 70 mil e
13 mil habitantes, respectivamente)
estão habilitados em GPSM. Em
2000 e 2001, este percentual foi de
95% e 93%, respectivamente.
A análise dos dados disponíveis
no SIOPS permite inferências tanto a
respeito do desempenho tributário e
econômico dos municípios mineiros
quanto à distribuição territorial dos
recursos financeiros municipais.
No primeiro caso, utilizou-se
um indicador (Indicador de Desem-
penho Tributário e Econômico/
IDTE)4 que permite, a partir da de-
terminação das receitas predomi-
nantes da arrecadação, extrair con-
clusões a respeito do desempenho
tributário e econômico dos muni-
cípios (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1998).
Em 2001, 694 municípios do esta-
do (86%) apresentaram um valor
para este indicador menor que 1,
podendo ser classificados como de
baixo desempenho econômico e tri-
butário. A Tabela 1 permite obser-
var a variação desse indicador se-
gundo a modalidade de gestão do
sistema de saúde municipal, as
faixas de população e as macror-
regiões de saúde, respectivamen-
te. Os municípios em Gestão Plena
do Sistema (GPS) caracterizam-se
por um IDTE médio mais elevado
e também por apresentarem, rela-
tivamente àqueles em Gestão Ple-
na da Atenção Básica (GPAB), uma
maior distância entre aqueles com
maiores e menores valores para o
IDTE.5 Embora considerados
iguais do ponto de vista de suas
atribuições no âmbito do SUS, são,
portanto, heterogêneos no que diz
respeito ao desempenho tributário
e econômico.
2 O ano de 2001 foi escolhido como referência em função de as informações disponíveis no SIOPS relativas às transferências constitucionais
estarem disponíveis de modo mais desagregado.
3 De acordo com informações disponíveis no site da Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais: www.saude.mg.gov.br em 01/06/2004.
(MINAS GERAIS, 2004)
4 Na construção do IDTE foram contempladas as receitas de impostos diretamente arrecadados (ou receitas tributárias próprias, RTP), as
transferências de ICMS TICMS) e as de FPM (TFPM). As duas primeiras são produto da base econômica dos municípios e refletem, portanto,
sua capacidade de gerar recursos. Embora represente uma transferência, a inclusão da TICMS explica-se porque ela deriva, predominante-
mente, do valor que é adicionado no município, sendo determinada, portanto, pela dimensão e dinamismo de suas bases econômicas. Nessa
perspectiva, municípios que têm nas receitas de ICMS, assim como nas receitas próprias, fontes importantes de financiamento de suas
despesas, caracterizam-se por bases econômicas mais dinâmicas. Contrariamente a essas duas receitas, as TFPM realizadas pelo governo
federal são determinadas predominantemente pelo critério populacional, não se vinculando ao movimento econômico dos municípios. Desta
forma, municípios com elevada dependência de transferências do FPM caracterizam-se por bases econômicas frágeis. A partir dessas
remissas relativas às origens das receitas, o IDTE foi calculado por meio da seguinte fórmula: IDTE = (RTP + TICMS) / TFPM. IDTE < 1, o
município classifica-se entre os de baixo desempenho econômico e tributário, já que sua receita predominante deriva das transferências do
FPM, que não são determinadas pela sua base econômica. IDTE> 1, o município classifica-se entre os de maior desempenho econômico e
tributário, cujo grau aumenta diretamente com a elevação do IDTE.
5 Sempre que se fizer referência à distância entre os municípios com maiores / menores valores para os indicadores analisados, estar-se-á
referindo à distância entre os 25% dos municípios com maiores valores e os 25% dos municípios com menores valores, ou seja, à distância
entre o percentil 75 e o percentil 25 da distribuição do indicador em questão.
FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
72 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
Ainda que o valor médio do
IDTE cresça quando se passa das
faixas relativas aos municípios
menos populosos para aquelas re-
ferentes aos mais populosos, ob-
serva-se que, entre os municípios
com mais de 200 mil habitantes,
Ribeirão das Neves diferencia-se
dos demais por apresentar um IDTE
menor que 1 (0,52), situando-se
entre os de baixo desempenho tri-
butário e econômico.
Quanto às macrorregiões, a do
Triângulo do Sul e do Norte apre-
sentam os maiores valores médios
para esse indicador, mas também
maior distância entre aqueles com
maiores / menores valores.
A fragilidade econômica da mai-
or parte dos municípios do estado
fica evidenciada também quando se
constata que quase 70% das recei-
tas de impostos diretamente arreca-
dados, bem como 37% das transfe-
TABELA 1 – Indicador de Desempenho Tributário e Econômico (IDTE) dos municípios agregados por gestão do sistema municipal de saúde, faixapopulacional e macrorregião de saúde. Minas Gerais – 2001
Fonte: Dados básicos: DATASUS. Informações de Saúde. Recursos Financeiros. Orçamentos públicos em saúde (SIOPS).Indicadores. <www.datusus.gov.br> Acesso em: jun. 2004.Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP). Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES).
Medida Estatística
Percentil Especificação Média Mediana Desvio padrão Mínimo Máximo
25 75
Gestão do sistema municipal de saúde
Plena da Atenção Básica 0,59 0,38 0,72 0,03 10,41 0,27 0,61
Plena do sistema de Saúde 2,39 1,34 2,64 0,25 12,91 0,85 2,54
Faixa Populacional
0 a 10.000 0,45 0,32 0,63 0,03 10,41 0,25 0,45
10.001 a 20.000 0,64 0,45 0,66 0,16 4,95 0,31 0,68
20.001 a 50.000 0,90 0,72 0,69 0,19 3,66 0,43 1,07
50.001 a 100.000 1,82 1,43 1,23 0,25 5,53 0,90 2,33
100.001 a 200.000 1,98 1,83 1,15 0,72 4,82 1,08 2,56
200.001 ou mais 6,08 6,35 3,87 0,52 12,91 2,40 8,96
Macrorregião de Saúde
Centro 1,19 0,50 1,93 0,14 12,91 0,34 1,20
Centro Sul 0,51 0,27 0,66 0,14 3,66 0,23 0,45
Jequitinhonha 0,35 0,33 0,13 0,18 0,62 0,25 0,43
Leste 0,53 0,31 0,91 0,17 5,56 0,24 0,40
Leste do Sul 0,39 0,33 0,20 0,16 1,18 0,26 0,48
Nordeste 0,31 0,29 0,12 0,16 0,72 0,24 0,34
Noroeste 0,76 0,62 0,47 0,19 2,10 0,42 0,90
Oeste 0,66 0,55 0,39 0,22 1,88 0,39 0,86
Região Norte de Minas 0,38 0,31 0,32 0,17 2,55 0,25 0,40
Sudeste 0,46 0,33 0,75 0,15 7,13 0,25 0,42
Sul 0,74 0,58 0,69 0,03 4,82 0,34 0,84
Triângulo do Norte 1,51 1,09 1,60 0,19 8,20 0,55 1,98
Triângulo do Sul 2,19 1,45 2,23 0,30 10,41 0,79 2,71
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 73
rências de ICMS estão concentradas
nos dez municípios com mais de
200 mil habitantes numa proporção
superior àquela referente à popu-
lação aí residente (31%), segundo a
Tabela 2. Como reflexo dessa situ-
ação, também os recursos vincula-
dos ao cumprimento da Emenda Cons-
titucional n. 296 (EC 29) estão con-
centrados nesses municípios num
percentual superior (34%) ao da po-
pulação aí residente. Esses municí-
pios recebem ainda 58% dos recur-
sos transferidos do Fundo Nacional
de Saúde aos fundos municipais.
TABELA 2 – Receitas dos municípios por faixa populacional (em valores correntes). Minas Gerais – 2001
Fonte: Dados básicos: DATASUS. Informações de Saúde. Recursos Financeiros. Orçamentos públicos em saúde (SIOPS).Indicadores. <www.datusus.gov.br> Acesso em: jun. 2004.Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP). Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES).
Nota: (a) FPM – Fundo de Participação dos Municípios.(b) ICMS – Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços.(1) População referente aos 808 municípios que alimentaram o SIOPS(2) RE_VINC_ EC_29 – Recursos Vinculados ao cumprimento da Emenda Constitucional 29.(3) REC_TOT_MUN_AD_DIR – Receita Total Municipal – Administração Direta.
6 A Emenda Constitucional 29 de 2000 estipula que até 2004 os municípios deverão gastar 15% da receita de impostos e transferências
constitucionais nas ações e serviços públicos de saúde. A partir de 2000, este percentual deverá ser, no mínimo de 7%, devendo a diferença
entre o percentual estipulado e o percentual aplicado ser reduzida à razão de, pelo menos, um quinto ao ano.
Comparando-se as demais faixas
de população, apenas naquela refe-
rente aos municípios com popula-
ção inferior a 10 mil habitantes a
participação nas receitas vinculadas
ao cumprimento da EC 29 (19%) é
superior à sua participação no total
da população do estado (15%). Esse
resultado reflete as regras do fede-
ralismo fiscal vigente no país, se-
gundo as quais a distribuição do
FPM tende a favorecer os municípi-
os de pequeno porte. Em função dis-
so, em Minas Gerais, 36% dos recur-
sos desse Fundo foram transferidos
Receita de impostos diretamente arrecadados
Transferência do FPM Transferência do ICMS Faixa populacional
Participação na população do estado
(1) (%) Participação (%) Per capita(r$) Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$)
0 a 10.000 14,81 2,89 10,60 35,62 298,99 14,61 122,60
10.001 a 20.000 12,80 3,38 14,33 18,84 182,96 10,52 102,11
20.001 a 50.000 17,56 6,34 19,60 19,13 135,43 14,64 103,62
50.001 a 100.000 14,31 10,37 39,31 10,59 92,00 14,94 129,68
100.001 a 200.000 9,97 7,96 43,36 6,12 76,31 8,31 103,61
200.001 ou mais 30,55 69,06 122,70 9,71 39,50 36,98 150,37
Transferência SUS total REC_VINC_EC_29 (2) REC_TOT_MUN_AD_DIR (3) Faixa populacional
Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$)
0 a 10.000 6,55 28,27 19,28 457,01 16,64 547,73
10.001 a 20.000 5,65 28,23 11,88 325,75 10,67 406,16
20.001 a 50.000 8,69 31,64 14,54 290,66 13,94 386,92
50.001 a 100.000 10,40 46,44 12,55 307,62 12,30 418,91
100.001 a 200.000 10,53 67,48 7,60 267,68 7,78 380,48
200.001 ou mais 58,17 121,65 34,15 392,24 38,66 616,64
FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
74 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
para os municípios com até 10 mil
habitantes em 2001, resultando num
valor per capita (R$ 299, em valo-
res correntes) bem superior ao ob-
servado nas demais faixas de popu-
lação (Tabela 2). Ainda como conse-
qüência do poder redistributivo do
FPM, se observa que a disponibili-
dade de recursos per capita para o
cumprimento da EC 29 é maior nos
municípios de pequeno porte.
Quando se analisa a distribui-
ção das receitas dos municípios
agrupados segundo a modalidade
de gestão, constata-se que os mu-
nicípios em GPAB que detêm ape-
nas 20% dos impostos diretamente
arrecadados respondem por 52% das
receitas vinculadas ao cumprimen-
to da EC 29 (Tabela 3). Tal fato re-
flete os efeitos redistributivos do
FPM, conforme já mencionado, que
garantem a esses municípios 76%
do total dos recursos transferidos.
As transferências do Fundo Nacio-
nal de Saúde, por sua vez, dadas
as regras do financiamento no SUS,
concentram-se nos municípios em
GPS (77%), garantindo-lhe um per
capita bem mais elevado (R$ 106,
em valores correntes) relativamen-
te aos municípios em GPAB (R$ 27,
em valores correntes).
TABELA 3 – Receitas dos municípios por gestão do sistema municipal de saúde (em valores correntes). Minas Gerais – 2001
Fonte: Dados básicos: DATASUS. Informações de Saúde. Recursos Financeiros. Orçamentos públicos em saúde (SIOPS).Indicadores. <www.datusus.gov.br> Acesso em: jun. 2004.Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP). Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES).
Nota: (a) FPM – Fundo de Participação dos Municípios.(b) ICMS – Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços.(1) RE_VINC_ EC_29 – Recursos Vinculados ao cumprimento da Emenda Constitucional 29.(2) REC_TOT_MUN_AD_DIR – Receita Total Municipal – Administração Direta.
Por fim, as receitas concentram-
se na macrorregião do Centro que,
possuindo 31% da população do es-
tado, responde por 61% das receitas
de impostos diretamente arrecada-
dos, por 38% das receitas de ICMS,
por 36% dos recursos vinculados à
EC 29 e por 46% das transferências
do Fundo Nacional de Saúde (Tabela
4). Nas macrorregiões Centro, Leste,
Sul, Triângulo do Norte e Triângulo
do Sul, a participação no total de re-
cursos vinculados à EC 29 é superi-
or à participação no total da popula-
ção do estado, o que as coloca, rela-
tivamente às demais, em melhores
condições de realizar gastos.
Tomando-se as macrorregiões
reconhecidamente com maiores ne-
cessidades de saúde como as do Je-
quitinhonha, Nordeste e Norte de
Minas, verifica-se que as suas par-
ticipações no total de recursos vin-
culados e nas transferências do SUS
são inferiores às suas participações
no total da população do estado, o
que as deixam em situação desfa-
vorável no que se refere às demais,
para gastos com saúde. Esta cons-
tatação reflete a sistemática de dis-
tribuição de recursos em vigor que,
ao favorecer os municípios com
uma economia mais dinâmica e com
maior capacidade de prestação de
serviços de saúde, penaliza justa-
mente os mais pobres.
Receita de impostos diretamente arrecadados
Transferência do FPM Transferência do ICMS Gestão do sistema municipal de saúde
Participação na população do estado
(1) (%) Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$)
Plena da Atenção Básica 52,77 20,38 20,96 76,38 179,92 47,16 111,04
Plena do sistema de Saúde 46,43 79,43 92,87 21,69 58,09 52,09 139,41
Transferência SUS total REC_VINC_EC_29 (1) REC_TOT_MUN_AD_DIR (2) Gestão do sistema municipal de saúde Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$)
Plena da Atenção Básica 22,44 27,18 51,58 343,01 46,49 429,25
Plena do sistema de Saúde 77,29 106,37 47,38 358,18 52,59 552,06
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 75
TABELA 4 – Receitas dos municípios por macrorregião de saúde municipal de saúde (em valores correntes). Minas Gerais – 2001
Fonte: Dados básicos: DATASUS. Informações de Saúde. Recursos Financeiros. Orçamentos públicos em saúde (SIOPS). Indicadores <www.datusus.gov.br > Acesso em: jun. 2004.Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP). Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES).
Nota: (a) FPM – Fundo de Participação dos Municípios.(b) ICMS – Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços.(1) RE_VINC_ EC_29 – Recursos Vinculados ao cumprimento da Emenda Constitucional 29.(2) REC_TOT_MUN_AD_DIR – Receita Total Municipal – Administração Direta.
Receita de impostos diretamente arrecadados
Transferência do FPM Transferência do ICMS Microrregião de saúde
Participação na população do estado (%) Participação (%) Per Capita (R$) Participação (%) Per Capita (R$) Participação (%) Per Capita (R$)
Centro 31,50 60,64 104,51 18,59 73,38 38,01 149,95
Centro Sul 3,88 1,39 19,41 5,11 163,44 3,47 111,05
Jequitinhonha 1,59 0,17 5,90 2,42 189,64 0,82 64,26
Leste 7,46 5,61 40,78 9,04 150,55 7,41 123,36
Leste do Sul 3,42 0,82 13,00 4,94 179,50 1,96 71,27
Nordeste 4,58 0,74 8,80 6,49 176,14 1,90 51,56
Noroeste 3,29 1,53 25,31 3,82 144,68 3,09 116,80
Oeste 5,67 2,63 25,20 6,47 141,97 4,62 101,21
Região Norte de Minas 7,84 1,80 12,48 9,54 151,33 4,33 68,70
Sudeste 8,15 7,52 50,10 9,38 143,06 6,00 91,45
Sul 13,41 8,54 34,56 16,89 156,53 13,31 123,31
Triângulo do Norte 6,01 5,86 52,96 4,26 88,23 8,34 172,51
Triângulo do Sul 3,20 2,74 46,39 3,04 118,03 6,73 261,09
Transferência sus total REC_VINC_EC_29 (1) REC_TOT_MUN_AD_DIR (2) Microrregião de saúde
Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$) Participação (%) Per capita (r$)
Centro 45,78 92,87 35,73 398,09 37,80 584,75
Centro Sul 4,16 68,47 3,61 326,06 3,33 417,36
Jequitinhonha 0,56 22,72 1,25 277,21 1,12 343,05
Leste 6,28 53,80 7,52 353,82 7,26 473,76
Leste do Sul 2,44 45,50 2,79 285,65 2,60 370,07
Nordeste 2,82 39,38 3,32 254,57 3,51 373,55
Noroeste 2,41 46,88 3,06 327,20 2,89 428,30
Oeste 4,18 47,17 4,95 306,35 4,54 390,60
Região Norte de Minas 7,50 61,11 5,64 252,43 6,05 375,95
Sudeste 8,24 64,61 7,51 323,46 7,83 468,34
Sul 6,92 32,99 13,78 360,69 12,36 449,24
Triângulo do Norte 3,64 38,74 6,32 369,48 6,26 507,49
Triângulo do Sul 5,05 100,77 4,51 493,94 4,47 679,14
FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
76 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
ANÁLISE DOS INDICADORESDE GASTOS COM SAÚDE
Para a análise dos indicadores
disponibilizados pelo SIOPS foram ex-
cluídos aqueles municípios cujas
informações apresentavam valores
negativos.7 Como resultado das ex-
clusões, trabalhou-se com um uni-
verso de 780, 808 e 804 municípios,
respectivamente nos anos de 2000,
2001 e 2002. O estudo dos indicado-
res evidenciou possíveis equívocos
no preenchimento dos dados pelos
municípios que, no entanto, não re-
sultaram em exclusões, tendo sido
destacados ao longo do estudo.
Os indicadores selecionados para
investigação nos três anos foram:
percentual de recursos próprios apli-
cados na saúde, despesa total per
capita com saúde, participação da
despesa com recursos próprios mu-
nicipais na despesa total com saúde,
transferências do SUS por habitante,
participação da despesa com pesso-
al na despesa total com saúde e par-
ticipação da despesa com investi-
mento na despesa total com saúde.
O percentual de recursos pró-
prios aplicados na saúde8 passou de
15% para 16,82%, em termos médi-
os, nos municípios habilitados na
Gestão Plena da Atenção Básica,
entre 2000 e 2002 e de 16,78% para
18,30%, naqueles habilitados em
Gestão Plena do Sistema, no mesmo
período (Tabela 5). Os dados mos-
tram ainda que, em 2002, três quar-
tos dos municípios em GPAB aplica-
ram mais de 13,80% de seus recur-
sos próprios em serviços de saúde,
enquanto para aqueles em GPS esse
percentual foi de 15,18%. Esses da-
dos confirmam, portanto, que os
brasileiros, tem-se que 41% deles
não cumpriram o que determina a
EC-29 em 2002, segundo dados do
Ministério da Saúde (MACHADO, 2003).
O Gráfico 19 mostra o compor-
tamento desse indicador interna-
mente a cada modalidade de ges-
tão no ano de 2002, complemen-
tando as informações em termos
médios. Além de permitir apreciar
a variabilidade, este gráfico infor-
ma que entre os municípios em
GPAB existem muitos com percen-
tuais discrepantes (outliers). A pre-
sença de outliers, nesse caso, apon-
ta para a necessidade de se buscar
investigar em que medida ela re-
sulta de um maior comprometi-
mento do poder público municipal
com as ações e serviços de saúde
ou de erros no preenchimento das
planilhas do SIOPS.
O percentual dos recursos pró-
prios aplicados na saúde é mais ele-
vado, em termos médios, nas faixas
relativas aos municípios mais po-
pulosos nos três anos analisados,
sendo de cerca de 20% naqueles com
mais de 100 mil habitantes em 2002
(Tabela 5). Nas demais faixas, esse
indicador oscila entre 16,55% (mu-
nicípios com até 10 mil habitantes)
municípios têm aumentado seus
gastos com saúde e que, em Minas
Gerais, eles estão cumprindo o que
determina a EC 29/2000. Quando se
considera o conjunto dos municípios
7 As informações foram coletados no site www.datasus.gov.br em 1º/06/2004.
8 Recursos próprios =receitas de impostos arrecadados pelos municípios acrescidos das transferências constitucionais. Este indicador visa
acompanhar o cumprimento da EC 29.
9 Os gráficos, denominados box-plot na literatura estatística, consistem em uma caixa, dois suportes e outliers. A linha que corta a caixa representa
a mediana dos dados. O extremo inferior da caixa representa o valor do primeiro quartil, abaixo do qual estão 25% dos dados da distribuição. O
extremo superior é o terceiro quartil, abaixo do qual estão 75% dos dados. Logo, o tamanho da caixa representa o intervalo que compreende os 50%
dos municípios, ou ainda, a distância entre os 25% dos municípios com maiores valores para a referida variável e os 25% com menores valores. Desta
forma, estes gráficos permitem apreciar a variabilidade intra-regional, complementando a informação fornecida em termos médios.
QUANDO SE CONSIDERA OCONJUNTO DOS MUNICÍPIOS
BRASILEIROS, TEM-SE QUE 41%
DELES NÃO CUMPRIRAM
O QUE DETERMINA AEC-29 EM 2002
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 77
TABE
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FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
78 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
a 17,84% (municípios com popula-
ção entre 50 mil e 100 mil habitan-
tes), no mesmo ano. Tal constata-
ção sugere que os municípios, so-
bretudo aqueles com mais de 100
mil habitantes, já tenham atingido
o limite em termos de suas possibi-
lidades de gastos com saúde.
Analisando-se o comportamento
deste indicador nas dez macrorregi-
ões de saúde do estado, verifica-se
que ele varia, em termos médios, de
14,77% no Nordeste a 18,12% no Tri-
ângulo do Sul em 2002 (Tabela 5).
O aumento no percentual de recur-
sos próprios aplicados na saúde
para o conjunto dos municípios ocor-
reu também, em termos médios,
para todas as macrorregiões, com
exceção do Jequitinhonha, onde fi-
cou relativamente estável.
O segundo indicador analisado
é a despesa total com saúde per ca-
pita, que representa a despesa per
capita com saúde realizada no mu-
nicípio com os recursos que pas-
sam pelo Fundo Municipal de Saú-
de, próprios e transferidos (Tabela 6).
Nos municípios em gestão plena da
atenção básica seu valor passou,
em termos médios, de R$ 88,35 em
2000 (em valores constantes médi-
os de 2002)10 para R$ 100,78 em
2002, o que representou um cresci-
mento de 14% no período. Nos mu-
nicípios em gestão plena do siste-
ma, o gasto total per capita médio
reduziu de R$ 207 (em valores de
2002) para R$ 195,58 (5,5% de va-
riação negativa).
Quando se considera o porte po-
pulacional, a despesa total per ca-
pita é mais elevada na faixa relati-
va aos municípios com mais de 200
mil habitantes nos três anos consi-
derados (R$ 221, em 2002), confor-
me a Tabela 6. Esse resultado re-
flete a modalidade de gestão a que
estão habilitados (gestão plena do
sistema) que lhes garante o recebi-
mento do total dos recursos fede-
rais aplicados no município. Deve-
se salientar que os municípios com
até 10 mil habitantes também se des-
tacam, em termos médios, logo
após os municípios com mais de
100 mil habitantes pelo valor relati-
Fonte: Dados básicos: DATASUS. Informações de Saúde. Recursos Financeiros. Orçamentos públicos em Saúde (SIOPS).Indicadores. <www.datusus.gov.br> Acesso em: jun. 2004.Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP). Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES).Notas: 1 – Municípios habilitados em Gestão Plena da Atenção Básica (GPAB):726; 2 – Municípios habilitados em Gestão Plena do sistema (GPS): 53.
GRÁFICO 1 – Percentual de recursos próprios dos municípios aplicados na saúde por gestão do sistema municipal de saúde. Minas Gerais – 2002
10 Os valores correntes de 2000 foram atualizados pelo IGP-DI da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 79
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FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
80 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
vamente elevado da despesa com
saúde per capita (R$ 126,64, em
2002). Para esse resultado podem
estar concorrendo a introdução de um
piso para as transferências federais
(PAB) que tendeu a favorecer os mu-
nicípios de pequeno porte populaci-
onal conforme se constatou para
Minas Gerais, e as regras do federa-
lismo fiscal brasileiro já salientadas,
que garantem a esses municípios um
valor per capita mais elevado para
os recursos vinculados à EC 29
(FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2003).
Analisando-se os municípios agre-
gados segundo as dez macrorregiões
de saúde do estado, observa-se que
a do Triângulo do Sul destacou-se,
nos três anos, pelo maior valor mé-
dio (R$ 199,42 em 2002), segundo a
Tabela 6. Os menores valores médi-
os foram encontrados nas macror-
regiões Jequitinhonha (R$ 85,59) e
Nordeste (R$ 97,31), regiões reconhe-
cidamente pobres do estado.
Com relação às transferências do
SUS per capita, ou seja, transferên-
cias do Fundo Nacional de Saúde, o
valor médio passou de R$ 30,70 em
2000 para R$ 33,84 em 2002 nos
municípios em GPAB (10% de aumen-
to) e de R$ 127,54 para R$ 115,67
nos municípios em GPS no mesmo
período (9% de redução), segundo a
Tabela 7. Observa-se ainda que um
quarto (percentil 25) dos municípios
em GPAB recebeu valores inferiores a
R$ 21,47, enquanto no outro extre-
mo, um quarto (percentil 75) rece-
beu valores superiores a R$ 38,64
em 2002 (Tabela 7). As diferenças
entre os valores per capita recebidos
pelos municípios para a atenção bá-
sica expressam a adesão diferencia-
da aos programas propostos pelo go-
verno federal (PAB variável) e tam-
bém o fato de terem sido considera-
dos os valores históricos na defini-
ção do piso de cada município. No
caso dos municípios em GPS, esses
valores foram de R$ 72,17 e R$
180,34, respectivamente. Neste caso,
às variações no âmbito do PAB so-
nicípios mais populosos são também
aquelas onde a distância entre os
municípios com maiores / menores
valores se mostrou mais elevada.
As transferências do SUS por ha-
bitante em termos médios, foram me-
nores na macro Jequitinhonha (R$
31,23) e na Sul de Minas (R$ 37,14) e
maior na Triângulo do Sul (R$ 97,02)
em 2002 (Tabela 7). A macro Jequiti-
nhonha destaca-se não apenas pelo
menor valor médio como também
pela menor distância entre os meno-
res / maiores valores, o inverso do
que ocorre com a do Triângulo do Sul.
Os menores valores da macro Jequiti-
nhonha, em que pese ter sido favore-
cida com a introdução do PAB, reflete
sua baixa capacidade instalada e,
portanto, de serviços. Na macro Sul
de Minas, os menores valores decor-
rem, entre outros fatores, do baixo
grau de adesão ao PSF decorrente, por
sua vez, da organização prévia dos
serviços de atenção básica segundo
um outro modelo assistencial (FUNDA-
ÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2003). No caso da
Triângulo do Sul, os elevados valo-
res podem estar refletindo tanto a mai-
or capacidade instalada quanto a ade-
são aos programas propostos pelo
governo federal (PAB variável).
Quando se considera a partici-
pação da despesa com recursos pró-
prios municipais na despesa total
com saúde, observa-se que ela pas-
sou de 66% em 2000 para cerca de
69% em 2002 nos municípios em
GPAB e de 40% para 43% naqueles
em GPS (Tabela 8). Acrescente-se
mam-se aquelas decorrentes das di-
ferenças nos valores transferidos para
atender à média e alta complexidade,
reflexo das diferenças na capacidade
instalada desses municípios.
Considerando-se o porte popula-
cional dos municípios, o valor das
transferências tende a ser maior, em
termos médios, nos municípios mais
populosos como era de se esperar,
dadas as regras de alocação de re-
cursos federais, já salientadas (Ta-
bela 7). As faixas relativas aos mu-
ANALISANDO-SE OS MUNICÍPIOS
AGREGADOS SEGUNDO AS DEZ
MACRORREGIÕES DE SAÚDE DO ESTADO,OBSERVA-SE QUE A DO TRIÂNGULO DO SUL
DESTACOU-SE, NOS TRÊS ANOS,PELO MAIOR VALOR MÉDIO
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 81
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82 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
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Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 83
que em três quartos dos municípi-
os em GPAB esse percentual foi su-
perior a 61% em 2002, o que vem
corroborar a importância da parti-
cipação do poder público munici-
pal no setor saúde. Nos municípi-
os em GPS, que recebem a totalida-
de dos recursos federais ocasionan-
do um aumento na despesa total,
constatou-se que os recursos pró-
prios respondem por mais de 31%
da despesa total para 75% deles.
A participação da despesa com
recursos próprios municipais na
despesa total tende a ser, em termos
médios, maior nos municípios me-
nos populosos e menor naqueles
mais populosos, refletindo as regras
de alocação dos recursos, conforme
já mencionado (Tabela 8).
Considerando-se as macrorregi-
ões de saúde, esse indicador osci-
lou, em termos médios, de 56% no
Nordeste a 74% no Sul de Minas (Ta-
bela 8). É interessante observar que
são também essas duas macrorre-
giões que se destacam pela maior
(Nordeste) e menor (Sul de Minas)
distância entre os municípios com
maiores / menores percentuais.
A respeito da estrutura dos gas-
tos, a participação das despesas
com pessoal na despesa total com
saúde cresceu no período analisa-
do nos municípios em GPAB, alcan-
çando 56% em 2002 (Tabela 9). Ob-
serva-se ainda que esse indicador
foi inferior a 48% em um quarto dos
municípios em GPAB e superior a 66%
também em um quarto desses mu-
nicípios. Nos municípios em GPS,
a participação das despesas com
pessoal também cresceu no perío-
do, em termos médios, chegando a
48% em 2002. Esse indicador é in-
ferior a 37% em 25% dos municípi-
os em GPS e superior a 60% tam-
bém para 25% deles.
A participação dos gastos com
pessoal no total da despesa também
aumentou, em termos médios, em
todas as faixas de população, sen-
do menor nos municípios mais po-
tal com saúde, houve ligeiro cresci-
mento nos municípios em GPAB, ten-
do sido, em média, de 6% em 2002
(Tabela 10). Os municípios em GPS
tiveram redução do percentual mé-
dio do gasto com investimento, que
foi de 3% em 2002. A distância entre
os municípios com maior / menor
participação das despesas com inves-
timento na despesa total é menor do
que aquela verificada para a despe-
sa com pessoal, sendo insignificante
entre os municípios em GPS. Foram
observados municípios com percen-
tuais discrepantes em ambas as mo-
dalidades de gestão, sugerindo a
possibilidade de erro nas informa-
ções. De qualquer modo, a elevação
dos gastos com investimentos nos
municípios em GPAB indica que os
gestores municipais estão empenha-
dos em aumentar sua capacidade
instalada com repercussões favorá-
veis sobre a conhecida desigualda-
de, na disponibilidade de serviços,
entre os municípios de Minas Gerais.
Tomando-se as macrorregiões de
saúde, a participação média dos gas-
tos com investimento na despesa to-
tal é maior no Triângulo do Sul (9%)
e menor no Jequitinhonha (4,72%).
DESPESAS MUNICIPAIS COM SAÚDEVIS-À-VIS AS RECEITAS MUNICIPAIS E AS
NECESSIDADES EM SAÚDE
Essa seção procura qualificar o
comportamento da despesa per ca-
pita com saúde dos municípios de
Minas Gerais por meio de seu con-
pulosos no que se refere aos menos
populosos (Tabela 9).
A participação dos gastos com
pessoal no gasto total variou, em
termos médios, de 48% na macro
Leste a 62% na Noroeste, em 2002
(Tabela 9). A distância entre os mu-
nicípios com maiores / menores per-
centuais, significativa em todas as
macro, é menor na Jequitinhonha.
Quanto à participação das despe-
sas com investimento na despesa to-
OS GESTORES MUNICIPAIS ESTÃO
EMPENHADOS EM AUMENTAR SUA
CAPACIDADE INSTALADA COM REPERCUSSÕES
FAVORÁVEIS SOBRE A CONHECIDA
DESIGUALDADE, NA DISPONIBILIDADE
DE SERVIÇOS, ENTRE OS MUNICÍPIOS
DE MINAS GERAIS
FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
84 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
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18,12
13,21
18,33
9,15
26
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75,54
78,92
76,23
34,43
34,65
52,21
63,89
63,94
71,31
Oeste
44
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45,90
56,18
18,15
16,77
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82,99
79,50
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61,51
66,95
Regiã
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78,99
73,64
74,64
14,52
16,37
45,35
39,97
40,99
60,38
Sudeste
46
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47,75
54,95
14,60
13,43
12,42
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4,14
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73,34
75,40
79,54
37,46
37,32
48,12
58,46
57,32
63,41
Sul
47,72
47,45
53,40
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15,18
12,57
10,21
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75,45
79,70
36,38
37,15
44,95
59,27
59,91
62,96
Triân
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47,79
49,93
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14,39
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24,46
77,89
73,44
78,35
36,19
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49,44
57,60
58,74
69,45
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gulo do Sul
41,75
43,92
53,94
14,20
13,84
16,73
14,82
13,61
13,66
65,38
69,45
80,13
30,79
34,65
39,99
56,14
53,69
67,84
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 85
TABE
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2002
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2001
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2000
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Macro
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Centro
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5,56
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Centro Sul
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– –
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– –
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– –
18,97
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17,59
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Nordeste
7,44
6,39
5,43
9,19
8,74
6,52
–
– –
38,75
45,71
26,31
0,17
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1,07
13
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Noroeste
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Oeste
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4,81
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6,58
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– –
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9,86
Sudeste
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5,22
5,32
6,86
6,30
5,09
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– –
35,85
32,98
20,63
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8,44
Sul
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6,98
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FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
86 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
fronto com indicadores de receita e
também com os índices municipais
de necessidade de saúde.11
Para tanto, buscou-se, em pri-
meiro lugar, comparar o comporta-
mento da despesa per capita com
TABELA 11 – – – – – Variação das despesas e das receitas dos municípios por gestão do sistemamunicipal de saúde, faixa populacional e macrorregião de saúde. Minas Gerais – 2000-2002
Fonte: Dados básicos:Datasus. Informações de Saúde. Recursos Financeiros Orçamentos públicos em saúde (SIOPS).Indicadores. <www.datusus.gov.br> Acesso em: jun. 2004.Elaboração: Fundação João Pinheiro (FJP). Centro de Estudos Econômicos e Sociais (CEES)
saúde (total e com recursos própri-
os) com aquele verificado para as
transferências do SUS per capita e
para os recursos vinculados para a
saúde per capita nos anos de 2000,
2001 e 2002 (Tabela 11).
Foi constatado que o aumento da
despesa total per capita média com
saúde dos municípios em GPAB en-
tre 2000 e 2001 (14%) foi superior à
dos valores médios das transferênci-
as do SUS (7%) e dos recursos vincu-
lados à EC 29 (6%). O crescimento da
despesa total per capita reflete, por-
tanto, a decisão do poder público
municipal em aumentar o percentu-
al de recursos aplicados nas ações e
serviços de saúde, conforme já cons-
tatado, o que resultou, por sua vez,
em um expressivo aumento da des-
pesa própria per capita média de 19%.
Tomando-se os municípios em
GPS, a despesa total per capita mé-
dia com saúde decresceu (5,54%)
entre 2000 e 2002, reflexo de uma
queda ainda mais acentuada nas
transferências federais (9,31%) e dos
recursos vinculados (8,29%). Cabe
salientar que, apesar da redução da
despesa total, as despesas com re-
cursos próprios se mantiveram pra-
ticamente constantes (aumento de
0,5%). O fato de a despesa com re-
cursos próprios ter crescido ainda
que menos de 1%, concomitantemen-
te a uma diminuição nos recursos
11 MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Saúde (2004). Trabalho desenvolvido em parceria entre o Centro de Desenvolvimento em Planejamento
Regional (CEDEPLAR) da UFMG e a Fundação João Pinheiro (FJP) no âmbito do Termo de Cooperação Técnica e Financeira celebrado entre o
estado de Minas Gerais, por intermédio da Secretaria de Estudo da Saúde e a Fundação João Pinheiro, a fim de viabilizar estudos na área de
saúde em 20 de março de 2003.
Variação (%) 2000/2002
Especificação Despesa Total Com Saúde Per Capita
Transferência do SUS
Per Capita
Recursos Vinculados à
Saúde Per Capita
Despesa com Recursos Próprios Per Capita
Gestão do Sistema Municipal de Saúde
Plena da Atenção Básica 14,07 6,96 5,65 18,57
Plena do sistema de Saúde - 5,54 - 9,31 - 8,29 0,50
Faixa Populacional
0 a 10.000 16,40 7,33 9,88 20,54
10.001 a 20.000 15,88 12,61 5,37 18,74
20.001 a 50.000 18,08 3,65 5,84 30,71
50.001 a 100.000 2,38 -0,97 - 1,54 5,57
100.001 a 200.000 -0,96 - 8,93 - 5,50 10,73
200.001 ou mais - 5,24 - 7,62 - 8,43 - 1,51
Macrorregião de Saúde
Centro - 3,30 - 7,00 - 6,53 1,48
Centro Sul 10,92 2,49 3,78 22,71
Jequitinhonha 7,11 4,69 8,48 8,56
Leste - 4,04 - 3,74 3,63 - 2,30
Leste do Sul 21,45 6,28 4,11 41,84
Nordeste 13,68 9,60 7,53 18,66
Noroeste 3,82 - 0,68 3,12 7,80
Oeste 10,46 1,73 2,79 22,23
Região Norte de Minas 30,44 53,54 - 6,69 5,85
Sudeste 6,11 - 9,72 3,19 29,25
Sul 12,89 - 1,34 3,31 21,45
Triângulo do Norte 3,53 - 20,04 2,51 24,05
Triângulo do Sul 0,77 - 6,31 10,75 8,56
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 87
vinculados de quase 9%, indica que
houve aumento do percentual apli-
cado em saúde, o que também já
havia sido observado.
Quando se analisa a evolução
dos dados dos municípios agrupa-
dos segundo faixas de população,
constata-se que o comportamento
dos municípios de pequeno porte foi
o mesmo daquele descrito para os
municípios em GPAB, mesmo porque
a quase-totalidade deles está habi-
litada nessa gestão. Os municípios
de grande porte apresentaram um
comportamento, em termos médios,
semelhante àquele descrito para os
municípios em GPS.
Quanto às macrorregiões de saú-
de, a despesa total decresceu, em
termos médios, em apenas duas:
Centro e Leste. Em ambas houve re-
dução das transferências do SUS,
e, na Centro, os recursos vincula-
dos também decresceram. As trans-
ferências do SUS reduziram tam-
bém, em termos médios, nas ma-
cro Sudeste, Triângulo do Norte e
Triângulo do Sul e, de modo pouco
expressivo nas macro Noroeste e
Sul; mas, nesses casos, a redução
das transferências federais não fo-
ram acompanhadas de decréscimos
na despesa total com saúde. A des-
pesa com recursos próprios só re-
duziu na macro Leste, apesar do
aumento dos recursos vinculados.
Analisando-se o conjunto dos
municípios, a despesa com saúde
com recursos próprios per capita
está fortemente correlacionada com
as receitas vinculáveis à saúde per
capita (coeficiente de correlação de
0,735), o mesmo não ocorrendo com
a despesa total per capita e as trans-
ferências do SUS per capita (coefici-
ente de correlação de 0,477). Tem-
se, portanto, que a variação da des-
pesa total acompanha o comporta-
mento da despesa com recursos pró-
prios, o que pode ser constatado por
meio da correlação entre estas últi-
mas variáveis (coeficiente de corre-
lação de 0,827).
lhantes apresentam valores de gas-
tos diferenciados e vice-versa.
Se a decisão acerca do montante
do gasto com recursos próprios é
uma iniciativa do poder público
municipal, fazer o gasto total per
capita ir ao encontro das necessida-
des relativas dos municípios requer
coordenação supramunicipal. Nesse
contexto, ganha relevância a adoção
pela esfera estadual de uma política
de equalização dos gastos, orienta-
da pelo princípio da eqüidade.
CONCLUSÕES
A análise dos dados do SIOPS per-
mitiu as seguintes conclusões:
1) A grande maioria dos municípi-
os mineiros tem cumprido sua
parte no financiamento da saú-
de. Como conseqüência, a parti-
cipação da despesa com recur-
sos próprios na despesa total
com saúde é expressiva na mai-
or parte deles. Em três quartos
dos municípios em GPAB, esta
participação foi superior a 60%
e naqueles em GPS foi superior
a 31%, em 2002.
2) A despesa total per capita mos-
trou grande variação entre os
municípios. Naqueles habilita-
dos em GPAB, o valor médio foi
de R$ 101 em 2002, sendo inferi-
or a R$ 76 para um quarto dos
municípios e superior a R$ 114
também para 25% dos municípi-
os. Nos habilitados em GPS, o
Visando qualificar as diferenças
no gasto total per capita com saú-
de dos municípios do estado, bus-
cou-se associar seus valores com
os índices municipais de necessi-
dade de cuidados com a saúde. Foi
constatado, conforme já esperado
face às regras de alocação dos re-
cursos federais, que não existe cor-
relação entre a despesa per capita
(total e própria) e as necessidades
de saúde, o que significa que mu-
nicípios com necessidades seme-
GANHA RELEVÂNCIA AADOÇÃO PELA ESFERA
ESTADUAL DE UMA POLÍTICA
DE EQUALIZAÇÃO DOS GASTOS,ORIENTADA PELO PRINCÍPIO
DA EQÜIDADE
FORTES, Fátima Beatriz Carneiro Teixeira P.; MACHADO, Edite Novais da Mata & MATIAS, Bruna Duarte
88 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007
valor médio do gasto foi de R$
196 em 2002, sendo inferior a R$
138 para 25% dos municípios e
superior a R$ 282 também para
um quarto dos municípios.
3) Além do gasto total per capita, a
análise constatou a existência de
variação significativa para todos
os indicadores analisados, não
apenas entre os agrupamentos re-
alizados para a análise como in-
tra-agrupamentos.
4) Corroborando o que já foi apon-
tado para os municípios em ges-
tão plena do sistema do país
como um todo (VIANA, FAUSTO &
LIMA, 2003), os municípios em
GPS de Minas Gerais (55), embo-
ra considerados iguais do ponto
de vista de suas responsabilida-
des na gestão das ações e servi-
ços de saúde na esfera munici-
pal, são bastante heterogêneos no
que diz respeito às diversas va-
riáveis aqui consideradas. Quan-
to ao porte populacional, verifi-
cou-se que 21 deles (38%) possu-
em menos de 50 mil habitantes.
No que se refere ao desempenho
tributário e econômico medido
pelo IDTE, foi constatado que ele
apresenta amplitude de variação
significativa, ou seja, de 0,25 a
12,91. Enquanto para um quar-
to dos 14 municípios o IDTE é
menor que 0,85, para outro um
quarto ele é superior a 2,54. Por
fim, foram observadas também
variações expressivas entre es-
ses municípios quanto ao com-
portamento dos indicadores aqui
analisados. As diferenças cons-
tatadas entre esses municípios
indicam que são também distin-
tas as capacidades desses muni-
cípios de organizarem e gerirem
seus sistemas de saúde.
5) Os dados disponíveis no SIOPS
mostram que, em 2002, a despe-
sa total com saúde dos municí-
pios é equivalente ao somatório
da despesa própria com saúde
com as transferências do SUS,
indicando que a esfera estadual
não transferiu recursos para os
municípios de Minas Gerais. Em
2000 e 2001, a despesa total foi
superior ao somatório da despe-
sa própria com as transferênci-
as do SUS em seis e dois muni-
cípios respectivamente.
6) O confronto do comportamento
da despesa com recursos própri-
os com o dos recursos vinculá-
veis à saúde (EC 29) e com o das
transferências do SUS permitiu
constatar, pelo menos, duas
questões. Em primeiro lugar,
aumentou o comprometimento
do poder público municipal com
as ações e serviços de saúde ex-
presso numa elevação do gasto
próprio municipal num percen-
tual superior ao aumento nos
recursos vinculáveis à saúde. Ou
seja, houve elevação dos percen-
tuais de recursos próprios apli-
cados na saúde, o que já havia
sido verificado a partir da análi-
se desse indicador. Em segundo
lugar, ainda que a elevação dos
gastos próprios tenha-se mostra-
do superior àquela havida nos
recursos vinculáveis, a correla-
ção entre estas duas variáveis se
mostrou elevada (coeficiente de
correlação de 0,735), mostrando
que a despesa com saúde tende
a ser maior nos municípios com
mais disponibilidade de recursos.
7) Os gastos próprios com saúde,
fruto de decisões isoladas dos
gestores municipais, não guar-
dam relação com as necessida-
des relativas dos municípios.
Também os gastos totais, corre-
lacionados positivamente com os
gastos próprios, não guardam
correlação com as necessidades.
Na medida que a eqüidade cons-
titui um princípio ordenador da
política estadual de saúde, e con-
siderando-se que em Minas Ge-
rais o poder estadual deverá au-
mentar seu gasto com saúde de
modo a cumprir a EC 29, parte
desse aumento poderia ser cana-
lizado para políticas concebidas
de modo a permitir que o estado
promova a eqüidade territorial.
8) Por fim, constou-se que é signi-
ficativa a adesão dos municípi-
os mineiros ao SIOPS. A existên-
cia de municípios, ainda que em
número não significativo, com
comportamento muito discre-
Gasto público com saúde nos municípios de Minas Gerais – 2000-2002
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 69-89, janeiro 2007 89
pante para todos os indicadores
aponta, no entanto, para a ne-
cessidade de se proceder a uma
avaliação mais minuciosa dos
dados de modo a detectar erros
e aperfeiçoar o sistema.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Emenda Constitucional nº 29,
de 2000. Altera os artigos 34, 35, 156,
160, 167 e 198 da Constituição Fede-
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Disposições Transitórias, para asse-
gurar os recursos mínimos para o
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BUENO, Ricardo Luiz Pereira
90 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São Paulo
Technical efficiency and management of public hospitals of the State of São Paulo
Ricardo Luiz Pereira Bueno1
1 Doutorando em Administração no PPGA-EA/UFRGS, professor assistente da disciplina de Serviços de Atenção Direta ao Paciente,
PROAHSA-EAESP/FGV-SP (2004-2005), Professor da Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
Rio Grande do Sul, Brasil. Para contato: [email protected]
RESUMO
Este artigo explora a nova política pública de gestão hospitalar paulista em relação ao seu desempenho. O texto
apresenta uma discussão sobre os desafios dos hospitais, bem como as peculiaridades que dificultam a avaliação
de sua eficiência. Para isso, foram selecionados aleatoriamente 11 hospitais gerais de propriedade do estado de São
Paulo, representando os modelos de gestão utilizados pelo Estado. Foram coletados: número de atendimentos
totais, número de partos, número total de exames de análises clínicas, número total de funcionários por leito e
dados sobre os recursos financeiros despendidos na operação. A análise desses dados se dá através da estimativa
de um indicador sintético de eficiência técnica e geração de um ranking, utilizando-se uma técnica não paramétrica,
chamada DEA (Data Envelopment Analysis).
PALAVRAS-CHAVE: Economia da Saúde; Modernização do Setor Público; Hospitais Públicos: Administração – Avaliação;
Administração Pública; Políticas públicas – Avaliação; Saúde Pública.
ABSTRACT
This article analyses the new public policy on hospital management in São Paulo in relation to their performance.
It discusses the challenges and peculiarity of this kind of organisation that create difficulties in the assessment of
their efficiency. For that purpose 11 hospitals belonging to the state of São Paulo, representing the management
model used by the state were randomly selected. The data collected includes: total number of health procedures,
number of births, total volume of clinical analysis exams, total number of full time employee per bed and financial
resources spent in the operation. The data analysis is performed using an estimate of a synthetic technical
efficiency indicator and generation of a ranking using a non-parametric technique called DEA – Data Envelopment
Analysis.
KEYWORDS: Health Economics; Modernization of Public Sector; Public Hospitals; Management – Assessment; Public
Administration; Public Policies – Evaluation; Public Health.
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São Paulo
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007 91
INTRODUÇÃO
A década de 1990 trouxe ino-
vações para o Setor Saúde do es-
tado de São Paulo (SES) em várias
áreas. Uma das atividades mais
afetadas foi a da gestão hospita-
lar, preocupação constante do go-
verno estadual, já que nesta épo-
ca havia 16 hospitais de sua pro-
priedade em fase final de constru-
ção. Colocá-los em operação era
um desafio, especialmente se ficas-
sem vinculados à administração
direta. Em função dessa realida-
de, estudou-se a implantação de
modelos organizacionais que refle-
tissem a nova forma de gestão
pública proposta pela Reforma do
Estado. Tendo em vista que o rela-
cionamento da eficiência técnica
com o modelo de gestão permane-
ce controverso na literatura, como
ressaltado por BURGESS & WILSON
(1996), os modelos de gestão não
estariam associados à eficiência
técnica, sendo que outros incenti-
vos ou condições é que a determi-
nariam. Neste trabalho, apresenta-
mos um estudo inédito mostrando
como a implementação do novo
modelo de gestão, por Organizações
Sociais em Saúde (OSS), afetou a
eficiência técnica dos hospitais pú-
blicos próprios do Estado (ALMEIDA
et al., 2001; BRESSER-PEREIRA, 1998).
O paper está dividido em cinco
seções; na primeira, o tema é con-
textualizado e são dadas informa-
ções gerais sobre os desafios da
gestão hospitalar; a segunda seção
define o que é um hospital e escla-
rece algumas características que
lhe são peculiares; a terceira seção
expõe os detalhes metodológicos,
as variáveis e o modelo matemáti-
co utilizado para gerar a fronteira
de eficiência técnica; a quarta se-
ção sintetiza os resultados obtidos
com o método e apresenta os esco-
res de eficiência técnica para cada
modelo de gestão; a quinta e últi-
ma parte expõe as conclusões e
ção pública gerencial. Para tanto,
tornou-se necessária a clara defini-
ção dos setores em que o Estado ope-
ra, bem como as principais ações em
relação ao accountability, que inclu-
íam: a participação de usuários; a
utilização de contratos de gestão
como forma de responsabilização por
resultados; adoção de mecanismos
de controle social nos serviços locais
e o aumento da transparência na im-
plementação das ações do governo,
possibilitando seu acompanhamen-
to e avaliação. As noções de controle
e accountability ficariam, dessa for-
ma, estreitamente ligadas à avalia-
ção e publicidade dos resultados e
informações dos órgãos, assim como
na institucionalização de mecanis-
mos de participação. Tratava-se, des-
se modo, de um avanço e de uma
visão múltipla do processo de res-
ponsabilização da administração pú-
blica (BRESSER-PEREIRA, 1998; PALOMO,
1998; PÓ e ABRÚCIO, 2004 e SÁ, 2001).
Habitualmente, os Estados mo-
dernos contam com quatro setores:
o núcleo estratégico, as atividades
exclusivas, serviços não exclusivos
e a produção de bens e serviços para
o mercado (BRESSER-PEREIRA,1998).
Nesta nova modelagem do Esta-
do, são considerados não exclusi-
vos todos aqueles serviços que o
Estado provê, mas que, como não
envolve o exercício do poder de Es-
tado, podem ser oferecidos também
pelo setores privado e público não
estatal (não governamental). Esses
serviços compreendem aqueles pres-
perspectivas no estudo da eficiên-
cia em hospitais públicos.
REFORMA DO ESTADO EGESTÃO HOSPITALAR
Em agosto de 1995, o Ministé-
rio da Administração e Reforma do
Estado (MARE) lançou o Plano Dire-
tor da Reforma do Estado, que ti-
nha por objetivo a implementação
da transformação da administração
pública burocrática em administra-
A IMPLEMENTAÇÃO DO NOVO
MODELO DE GESTÃO, POR ORGANIZAÇÕES
SOCIAIS EM SAÚDE (OSS), AFETOU AEFICIÊNCIA TÉCNICA DOS HOSPITAIS
PÚBLICOS PRÓPRIOS DO ESTADO
BUENO, Ricardo Luiz Pereira
92 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007
tados pelas áreas de educação, saú-
de, cultura e de pesquisa científica
(BRESSER-PEREIRA, 1998).
No eixo da gestão dos serviços
não exclusivos, buscou-se redefinir
as formas de propriedade através da
criação de um instrumento jurídico-
administrativo que desse mais agili-
dade ao aparelho do Estado, sendo o
modelo proposto o de Organizações
Sociais (OS), entidades de direito pri-
vado, sem fins lucrativos, com ativi-
dades consideradas de interesse so-
cial. No caso de atividades exclusi-
vas, foi proposta criação de Agênci-
as Executivas (AE) (ANDRÉ, 1999).
O instrumento utilizado, tanto na
constituição das AE quanto no ge-
renciamento por OS, é o contrato de
gestão. A contratualização tem por
base o enfoque agente-principal, em
que o Estado (principal) contrata um
terceiro (agente) para realizar uma
tarefa de relevância pública em tro-
ca de um pagamento. Esse enfoque
evidencia o controle sobre a perfor-
mance e informações contratuais
(COSTA et al., 2000).
Porém a questão da publiciza-
ção dos resultados permanece ain-
da controversa, os resultados di-
vulgados pela imprensa apontam
para o irrefutável sucesso do mo-
delo, em termos da satisfação dos
pacientes e acompanhantes, me-
lhor aproveitamento dos recursos
financeiros com custo médio de
internação 25% menor e um volu-
me de atendimento a pacientes 23%
maior, quando comparados a um
hospital da administração direta
(BRESSER-PEREIRA, 2005).
O CONTEXTO DO HOSPITAL PÚBLICO
Os hospitais estão, como a mai-
oria das organizações prestadoras
de serviços, imersos em um ambi-
ente competitivo e racionalizador.
Não somente os privados, mas tam-
bém os públicos, em sua grande
parte, estão expostos a complexas
mudanças que incluem: a Reforma
mais de 70% da população brasilei-
ra, e estabelece uma comparação
inicial entre os modelos de gestão na
administração pública da saúde pau-
lista, que são conseqüência das nu-
merosas reformas do Estado brasi-
leiro e de seu Setor Saúde, e a efici-
ência produtiva desses hospitais.
A América Latina conta com um
universo de cerca de 16.500 organi-
zações hospitalares, as quais de-
sempenham um papel central nos
sistemas nacionais de saúde (MARIN,
2001). NOVAES (1990) aponta a im-
portância do nível secundário de
atenção, composto por hospitais
gerais e ambulatórios de especiali-
dades, que são os principais apoios
para os serviços do nível primário
de atenção à saúde no âmbito da re-
gionalização desse setor. Aos hospi-
tais se destinam de 75% a 85% dos
recursos empregados no Setor Saú-
de, contudo os resultados decorren-
tes da aplicação desses recursos têm
sido pouco satisfatórios quanto à sua
eficiência para aqueles que os finan-
ciam (MARIN, 2001 e NOVAES 1990).
As mudanças profundas por que
passa nosso país em matérias como
sanitarismo, políticas socioculturais
e econômicas, associadas ao crescen-
te custo da atenção à saúde e em
especial o da atenção hospitalar, su-
gerem novos desafios para a gestão
dos serviços de saúde (MARIN, 2001).
O tema da gerência dos serviços
hospitalares tem emergido na Refor-
ma do Setor Saúde sob diversas
perspectivas, entre elas a que sepa-
do Sistema de Saúde, avanços tec-
nológicos em procedimentos e/ou
equipamentos para diagnóstico e
tratamento dos seus usuários (SHORT,
PALMER & DAVID, 2002).
Entretanto, apesar do mercado
brasileiro da prestação de serviços
hospitalares ser pujante e apresentar
números expressivos em termos de
Produto Interno Bruto (PIB), este ar-
tigo se preocupa com as unidades
hospitalares públicas e as convenia-
das que atendem ao SUS, ou seja, a
A AMÉRICA LATINA CONTA COM UM
UNIVERSO DE CERCA DE 16.500ORGANIZAÇÕES HOSPITALARES, AS QUAIS
DESEMPENHAM UM PAPEL CENTRAL NOS
SISTEMAS NACIONAIS DE SAÚDE
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São Paulo
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007 93
ra as funções de provisão dos servi-
ços das funções de financiamento
(SÁ, 2001 e MARIN, 2001).
A gestão hospitalar tem dupla
dimensão – a micro e a macro –,
sendo que ambas devem possibili-
tar a redução do custo com melho-
ria da eficiência e da qualidade dos
serviços de atenção, e a implemen-
tação de políticas públicas em saú-
de dos níveis local, regional e naci-
onal. Portanto, a gestão hospitalar
deve interessar tanto às autoridades
sanitárias quanto aos administrado-
res públicos (MARIN, 2001).
Partindo-se da premissa de que
a gestão hospitalar deve ser enten-
dida como gestão de uma política
pública, a sua formulação, execu-
ção e avaliação devem ser conduzi-
das institucionalmente pelo Estado
(MARIN, 2001).
O QUE SÃO OS HOSPITAIS?
São estabelecimentos de saú-
de destinados a prestar serviço, em
regime de internação (BRASIL, 2002).
São sistemas abertos, de grande
complexidade e amplitude, e logo se
adaptam, aprendem e influenciam o
ambiente, e por ele são influencia-
dos (PICCHIAI, 2000).
Conforme MARINHO (2001a), tra-
taremos os hospitais como organi-
zações profissionais, nas quais o
seu funcionamento depende da ca-
pacitação e do conhecimento de
seus executores. Assim, seus resul-
tados não podem ser facilmente
medidos ou padronizados. Como
apontado por DONABEDIAN (1993), os
resultados dependem fortemente da
relação profissional / usuário, ele
propõe um modelo de avaliação
composto por uma tríade de fato-
res (estrutura, processos e resulta-
dos). Ademais, algumas das difi-
culdades de mensuração nos hos-
pitais têm sido contornadas com a
adoção de critérios de avaliação e
tomada de decisão chamados de
indicadores de desempenho.
cia entre os geradores dos fatos e os
que deveriam utilizá-los como da-
dos para decisão.
Para BITTAR (2001), as informa-
ções são fundamentais para a ad-
ministração de qualquer hospital,
principalmente quando transforma-
das em indicadores, que são a quan-
tificação dos fatos.
BITTAR (1996) segmenta os indi-
cadores em duas categorias: seto-
riais e globais. Setoriais são aque-
les que mensuram a produtividade
de uma determinada área da orga-
nização, por exemplo, o número de
compras por número de comprado-
res, os indicadores globais são
aqueles que se prestam à gestão em
busca de melhores resultados, ou,
performance. Esse autor afirma que
tais indicadores medem o desem-
penho do hospital.
Conforme demonstrado por MA-
RINHO (2001a), os indicadores de per-
formance são incapazes de exprimir
resultados sintéticos de eficiência
produtiva, sendo freqüente a incom-
patibilidade entre indicadores par-
ciais. As variáveis fora de controle
dos administradores e, em outro
extremo as possibilidades de subs-
tituição do mix entre insumos e pro-
dutos, quando da opção por indica-
dores de performance também são
ainda pouco exploradas.
Ainda conforme MARINHO (2001a)
e BITTAR (2001), apesar de tais óbi-
ces, reconhece-se aqui a utilidade
dos indicadores na obtenção de da-
dos setoriais, ressaltando-se as inefi-
MALIK (2000) reconhece o pouco
uso dos indicadores de desempenho,
como por exemplo, a pouca discus-
são entre profissionais administra-
tivos e médicos sobre a afirmação
de que cada caso é um caso, ou de
que todos os procedimentos diag-
nósticos e terapêuticos são prescri-
tos com vistas ao bem-estar do pa-
ciente, independente do seu sistema
de financiamento (público ou priva-
do). Aliado a isso, a mesma autora
(MALIK, 2000), já constatou a distân-
A GESTÃO HOSPITALAR TEM DUPLA
DIMENSÃO – A MICRO E A MACRO –,SENDO QUE AMBAS DEVEM POSSIBILITAR
A REDUÇÃO DO CUSTO COM MELHORIA
DA EFICIÊNCIA E DA QUALIDADE
DOS SERVIÇOS DE ATENÇÃO
BUENO, Ricardo Luiz Pereira
94 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007
ciências específicas. Maiores detalhes
sobre esses indicadores hospitalares
podem ser obtidos em BITTAR (1996).
Conforme MARINHO (2001b), a lite-
ratura tem preconizado a utilização
de metodologias relacionadas às
fronteiras de eficiência, na avaliação
de desempenho de organizações do
setor público, bem como em organi-
zações complexas (MARINHO, 2000a).
Essas metodologias dividem-se
em duas linhas de pesquisa: a pri-
meira, mais tradicional em outros
campos da teoria econômica, cha-
mada ‘paramétrica’, tem a função
de produção definida a priori, com
a especificação de um erro esto-
cástico de distribuição bastante es-
pecífica. Um aprofundamento mai-
or nesses conceitos pode ser obti-
do em AIGNER, LOVELL & SCHMIDT
(apud MARINHO, 2001b).
A segunda linha de pesquisa é a
das fronteiras não estocásticas, no-
tadamente as que são obtidas por
intermédio da resolução de proble-
mas matemáticos, como a Data En-
velopment Analysis (DEA). Sobre
DEA, importante referência pode ser
encontrada em CHARNES, COOPER, LEWIN
& SEIFORD (1993).
Cientes das dificuldades na inter-
pretação dos resultados dos indica-
dores de performance, conforme de-
monstrado por MARINHO (2001b), e
das dificuldades para determinação
de uma função de produção para
cada um dos hospitais de nossa
amostra, optamos pela utilização da
DEA, que não requer a especifica-
ção de funções a priori.
Assim, este trabalho busca har-
monizar as metodologias dos indi-
cadores de performance e da esti-
mação de fronteiras de produção
para determinação do escore de efi-
ciência técnica que represente cada
hospital como um todo.
OBJETO E METODOLOGIA
Para a realização deste estudo
foram utilizados dados de hospitais
públicos do estado de São Paulo,
e de controle, sem interferências
do ambiente externo (BANDEIRA DE
MELLO apud PALOMO, 1998);
2. Administração indireta mista: en-
tendida como uma variação da
administração indireta, regulada
pela Lei Complementar n. 7 de
6/11/1969 no estado de São Paulo.
Esta forma pode se viabilizar pelo
estabelecimento de convênio entre
uma pessoa jurídica de direito pri-
vado com pessoa jurídica de direi-
to público. Isto posto, ao hospital
autárquico se dá a possibilidade
de gerir certo volume de recursos
obtidos através de convênio entre
o hospital e uma entidade de direi-
to privado que obtém receitas atra-
vés dos serviços prestados pelo hos-
pital, faturando contra o SUS e con-
tra terceiros os procedimentos hos-
pitalares. Esses recursos são rever-
tidos para a operação e em investi-
mentos na autarquia conveniada.
Esse tipo de gestão em saúde se
inicia no fim da década de 1970
(PALOMO, 1998); e
3. Administração por colaboração:
ocorre quando a operação de de-
terminado serviço público é dele-
gada para pessoa jurídica de di-
reito privado sem finalidade lucra-
tiva e com experiência na área da
gestão em saúde. Esse movimen-
to emerge no fim da segunda me-
tade da década de 1990 como um
novo modelo de gestão que reflete
as tendências da Reforma do Es-
tado. É exemplo desse modelo,
hospital de propriedade da Secre-
cada qual pertencente a um modelo
de gestão que está ligado a diferen-
tes etapas da Reforma da Adminis-
tração Pública brasileira. Os três ti-
pos de gestão são:
1. Administração direta: o hospital
é gerido e suprido por um órgão
central de direito público. Este
tipo de subordinação ocorre
quando a Administração Pública
é exercida pelos seus próprios ór-
gãos, e neles estão presentes ele-
mentos normativos, reguladores
A LITERATURA TEM PRECONIZADO AUTILIZAÇÃO DE METODOLOGIAS RELACIONADAS
ÀS FRONTEIRAS DE EFICIÊNCIA, NA AVALIAÇÃO
DE DESEMPENHO DE ORGANIZAÇÕES DO
SETOR PÚBLICO, BEM COMO EM
ORGANIZAÇÕES COMPLEXAS
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São Paulo
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007 95
taria de Estado da Saúde (SES),
operado e gerenciado por institui-
ções privadas, qualificadas como
Organização Social em Saúde, por
meio de um contrato de gestão, no
caso paulista conforme a lei com-
plementar 846/98 (PALOMO, 1998).
AMOSTRAGEM
A amostra foi selecionada alea-
toriamente conforme a base de da-
TABELA 1 – – – – – Estabelecimentos hospitalares do estado de São Paulo, segundo o tipo de gestão,em 1999
dos fornecida pela Secretaria, da
seguinte maneira: de início foram
separados os hospitais por tipo de
gestão, essa segmentação gerou
cinco listas diferentes, das quais
(conforme a Tabela 1), apenas as
linhas referentes a administração
direta, autarquia e organizações
sociais foram utilizadas e serviram
como forma de identificar os hos-
pitais, neste trabalho.
Para obtenção de um grau mais
elevado de comparabilidade, os hos-
pitais foram selecionados de acor-
do com os seguintes critérios: hos-
pitais gerais, ou seja, os que aten-
dem as quatro especialidades bási-
cas (BRASIL, 2002); hospitais de gran-
de porte, acima de 150 leitos; e que
tivessem sido planejados como con-
seqüência de intensa mobilização
popular (COHN, 1999).
O primeiro critério (hospitais ge-
rais) diz respeito à sua complexida-
de planejada. Por sua vez, o segun-
do critério aborda o porte em núme-
ro de leitos do hospital, já que exis-
Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS – Informações de Saúde.IBGE – AMS – Pesquisa de Assistência Médica Sanitária 1999.
tem estudos apontando para a exis-
tência de maiores níveis de eficiên-
cia em hospitais de menor porte, e,
portanto que o número de leitos é
positivamente correlacionado com
ineficiências alocativas (MARINHO &
FAÇANHA, 2001; GRUCA & NATH, 2001).
O último critério diz respeito à
participação popular no sistema de
saúde, fato que tem feito parte, e
crescido em amplitude, nos proces-
sos de Reforma do Sistema de Saú-
de desde a década de 1980, e tem
reflexos na definição de metas e ob-
jetivos para essas unidades hospita-
lares (TEIXEIRA, 1995; RIBEIRO, 1997;
COHN et al., 1999; ALMEIDA et al., 2001
e ALLEYENE, 2000).
Por não sabermos a proporção de
hospitais próprios do estado de São
Paulo que atendem todos os critéri-
os da amostragem, utilizamos as
formulações propostas por BUSSAB &
MORETTIN (2002) e JOHNSON (1994) para
determinar o tamanho da amostra:
Fórmula(1.0)
Onde:N = número de elementos na amostra;
Zα/2 = nível de significância bicaudal; e
ε = erro máximo.
O tamanho dessa amostra, 11
observações, tem um poder de 70%,
o mínimo recomendado por Contan-
driopoulos et al. (1994).
Embora a amostra apresente di-
ferença proporcional entre os mode-
los de gestão, estas não foram sig-
nificativas. A formulação utilizada
para o teste foi a seguinte:
H0 : ρ1 = ρ
H1 : ρ1 ≠ ρ
Onde:
ρ1
= proporção amostral; e
ρ = proporção do modelo de gestão no universo.
Fórmula (2.0)
Onde:
N = número de elementos no universo;
ρ1 = proporção amostral; e
ρ = proporção do modelo de gestão no
universo.
Nt
/)1( 11
1
ρρ
ρρ
−
−=
22/ )/(25,0 ε
αZN =
11671,10)3,0/96.1(25,0 2≅==N
Tipo de Gestão Estadual
Administração Direta 51
Administração Direta - outros órgãos 04
Autarquia 07
Organizações Sociais Públicas 02
TOTAL 64
BUENO, Ricardo Luiz Pereira
96 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007
Desta forma, não podemos rejeitar
que as proporções da amostra e do
universo são idênticas, com um va-
lor de p > 0,1, ou seja, conforme
BUSSAB & MORETTIN (2002), inexiste evi-
dência para se rejeitar H0. Em nosso
estudo, cada elemento da amostra
representa uma observação.
A apresentação dos dados dos
hospitais toma por base a unidade
de análise utilizada para categori-
zá-los e garantir a confidencialida-
de dos dados coletados.
Após a criação da lista amos-
tral, procedeu-se à consulta dos
nomes a SES, para verificar a ade-
quação aos critérios de amostragem
descritos antes.
Coleta de dados
Para a obtenção dos dados das
observações propostas no estudo,
foram contatados os gestores da
Secretária da Saúde do Estado de
São Paulo, com intuito de receber
autorização para a coleta das infor-
mações pertinentes, pois estas não
estavam disponíveis ao público,
seja em suporte eletrônico, seja em
meio impresso.
No estudo, a estratégia adotada
para assegurar a validade do ins-
TABELA 1-A – – – – – Teste de proporções da amostra frente ao universo
Fonte: Elaboração própria
trumento de medida compreendeu
uma prova-piloto em um hospital
escolhido aleatoriamente na amos-
tra, com a finalidade de verificar a
qualidade das perguntas, o grau de
compreensão, a disposição das pes-
soas em responder ao questionário
(TOBAR & YALOUR, 2001).
Durante o período da coleta de
dados algumas das unidades sele-
cionadas estavam validando seus
dados de 2002, assim, optou-se por
coletá-los nas respectivas unidades
hospitalares referentes ao ano de
2001. Essas ocorrências não invali-
dam o estudo, como ressaltado por
CHIRIKOS & SEARS (2000), pois, não
ocorrem alterações significativas
dos níveis de eficiência técnica no
curto prazo (NOVAES, 2000; CANO,
2002 & CHARNES et al., 1993).
Hipótese
A última etapa do estudo
consistirá na utilização de testes não
paramétricos para testar a hipótese
em estudo. A opção pela utilização
dos testes não paramétricos, chama-
dos de ‘livres de distribuição’, está
relacionada à natureza não para-
métrica da DEA e com a eficiência
do teste. Isto porque, conforme
HALSTEINLI, KITTELSEN & MAGNUSSEN
(2001); KITTELSEN, KJÆSERUD & KVAMME
(2001); KITTELSEN & MAGNUSSEN (1999)
e KITTELSEN (1999), o teste t, paramé-
trico, quando aplicado a pequenas
amostras, tem menor eficiência do
que o teste não paramétrico U, de
Mann-Whitney.
Neste estudo, foram utilizadas
escalas ordinais, contínuas e cate-
góricas, de acordo com a hipótese a
ser testada (JOHNSON, 1994; MELO,
2001; COOPER & SCHINDLER, 2003; BUS-
SAB & MORETIN, 2002; BOWLIN, 1998;
MARINHO, 2001b).
A hipótese a ser testada é a de
que os hospitais geridos por OSS são
mais eficientes que os demais.
Para tal, os testes foram execu-
tados em duas etapas; na primeira,
a hipótese I é testada para determi-
nar se há diferença entre os escores
de eficiência técnica da administra-
ção por OSS frente às demais; e, na
fase subseqüente, a hipótese a ser
testada é se o escore de eficiência
técnica dos hospitais administrados
por OSS pode ser considerado supe-
rior aos demais modelos de gestão.
Hipótese – IH0 α=0,05 : C = A e B
H 1α=0,05 : C ≠ A e B
Hipótese – IIH0 α=0,05 : C = A e B
H 1α=0,05 : C ≥ A e B
Onde:C = Escore de eficiência técnica do modelo
de gestão por OSS;
A e B = Escores de eficiência técnica dos
demais modelos de gestão;
Modelo de Gestão Proporção no Universo (%) Proporção na Amostra (%) Valor de p
Administração direta 60,81 45,45 > 0,1
Administração indireta 10,81 18,18 > 0,1
Administrados por OSS 18,92 36,36 > 0,1
Total 90,54 100
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São Paulo
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007 97
α = valor de alfa utilizado para construção
da região crítica.
Indicadores e variáveis
A determinação do número ide-
al de variáveis descrita por FITZSIM-
MONS & FITZSIMMONS (2000) leva em
conta que o modelo de DEA utiliza-
do pretende maximizar os produ-
tos e não minimizar insumos. Com
este objetivo, utilizamos no mode-
lo uma variável de produto a mais
que a de insumo, em busca de uma
maior especificação sobre quais
produtos podem ser otimizados.
Esse número foi obtido com o uso
da seguinte formulação:
Fórmula (3.0)
Onde:
V = número de hospitais utilizados no mo-
delo de DEA, originário do plano amostral
definido para este estudo;
I = número de variáveis de insumos; e
O = número de variáveis de produto.
ANDERSON & JENKINS (2003) desen-
volveram uma metodologia que
exclui insumos e/ou produtos do
modelo, de acordo com seu grau
de associação, em termos da vari-
ância. De maneira sintética, trata-
se da utilização de estatísticas
multivariadas, com as quais são
elaboradas matrizes de co-variân-
cia parcial (BUSSAB & MORETTIN,
2002; TOBAR & YALOUR, 2001).
A utilização da técnica de ANDER-
SON & JENKINS (2003) permitiu a redu-
ção das cinco variáveis coletadas de
insumos para apenas duas manten-
do-se poder explicativo maior que
70,00%, essas duas variáveis são: o
TABELA 2 – Variáveis de insumos e seu potencial explicativo para um modelo de duas variáveis,para o ano de 2001
número de funcionários por leito e
a despesa total realizada no perío-
do do estudo, como pode ser visto
na Tabela 2.
Fonte: Elaboração própria
A mesma técnica permitiu a re-
dução das 13 variáveis coletadas
de produto para apenas três, man-
tendo-se poder explicativo acima
de 65,00%. Essas variáveis foram:
o número de exames de análises
clínicas, número de partos e o nú-
mero de atendimentos totais por
funcionário, como pode ser visto
na Tabela 3.
TABELA 3 – Variáveis de produto e seu potencial explicativo para um modelo de três variáveis,para o ano de 2001
Fonte: Elaboração própria
Especificação do modelo
A fronteira de eficiência e o pa-
drão de comparação são extraídos
das observações e não de prescri-
ções anteriores. A fronteira carac-
teriza a best practice de referência,
na qual o escore máximo de refe-
rência será 100%.
O modelo adotado para mensu-
ração comparativa de eficiência en-
tre as unidades tomadoras de deci-
são, aqui identificadas como cada
hospital, é um modelo não paramé-
trico que tem sua origem no artigo
seminal de CHARNES, COOPER & RHODES
(apud MARINHO, 2001a), que empres-
Insumo –1 Insumo –2 Percentual em relação ao total de variáveis
Número de Funcionários por Leito Total das despesas realizadas 78,63
Número de Funcionários por Leito Despesa com salários 75,03
Área Construída (m²) Despesa com salários 74,08
Produto –1 Produto –2 Produto –3 Percentual em relação ao
total de variáveis
Número de partos Número total de exames de análises clínicas
Atendimentos totais por funcionários
67,92
Número de atendimentos em regime de urgência e emergência
Número de partos Número total de exames de análises clínicas
65,64
Número total de consultas médicas
Número total de exames de análises clínicas
Atendimentos totais por funcionários
65,38
OIV +≥
BUENO, Ricardo Luiz Pereira
98 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007
tam suas iniciais para nomear o
modelo, ou seja, CCR. Este modelo
não reconhece os retornos variáveis
de escala, dado que no curto prazo a
tecnologia de produção é constante.
O objetivo do modelo é estimar
a eficiência técnica das diferentes
formas de gestão características da
administração pública, na gestão
hospitalar a partir do final da dé-
cada de 1990, por meio da resolu-
Essa relação é um desenvolvi-
mento do problema proposto por
FARREL (1957), superando a então
limitação de um insumo ou um
recurso para o cálculo da eficiên-
cia técnica.
ção de n+1 problemas de progra-
mação linear. Os insumos são re-
presentados pelo X e a saída ou
produção pelo Y. Assim para reso-
lução dessa questão devemos de-
terminar o valor dos pesos atribu-
ídos a cada insumo ou produto,
bem como a extensão que cada
hospital pode expandir suas saí-
das ou reduzir seus insumos para
tornar-se eficiente.
Fórmula (4.0) * 100
sujeito a: j=1, ..., n
Onde:
u
yrj, xij, positivos, são os resultados e insumos conhecidos da j-ésima DMU; e
0 v,u ir ≥ são as ponderações (pesos) que serão determinadas pela resolução deste
problema.
Para FARREL (1957), a eficiência
de uma organização é uma medida
relativa à eficiência das outras que
operam em seu setor/mercado. Um
hospital será considerado eficiente
quando estiver operando na frontei-
ra de produção da best-practice de
seu mercado, sujeita a restrição de
que nenhum desses hospitais opera
acima desta fronteira.
Na equação (4.00) o numerador
representa a produção do hospital e
o denominador os insumos. Essa
razão determina um escalar análo-
go aos indicadores de performance.
Podemos citar que entre os pon-
tos positivos da DEA estão: caracte-
rizar a eficiência, através de uma
única medida-resumo, a possibili-
dade de prescindir de sistemas de
preços, e a dispensa de pré-especifi-
cações das funções de produção
subjacentes. Além disso, baseia-se
em observações individuais e não
na média das observações, produz
resultados alocativos eficientes no
sentido de Pareto.
Dentre as desvantagens da DEA
está a impossibilidade de incorpo-
rar erros estocásticos, o que torna
sua fronteira suscetível a erros de
medida, desvantagem que também
está presente nos indicadores de per-
formance. Erros também podem
ocorrer quando da utilização de
métodos paramétricos, e para evi-
tá-los o pesquisador terá mais tra-
balho pois, caberá um estudo cui-
dadoso do sistema produtivo do hos-
pital na determinação correta da
função de produção.
Os dados utilizados na análise
constam da Tabela 4, na qual os
nomes das organizações hospitala-
res foram substituídos pela respec-
tiva unidade de análise, ou seja, o
tipo de gestão.
r = 1, ..., s
i = 1, ..., m
1
1
1=≤
∑
∑
=
=
m
i
ii
s
r
rr
xv
yu
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São Paulo
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007 99
GESTÃO E EFICIÊNCIA
Os resultados do modelo imple-
mentado são úteis para aferir o que
GARCIA (2001) denomina como os
efeitos da mudança na mesogestão
institucional, quando se refere a
hospitais que tentam responder às
mudanças advindas das Reformas
do Setor Saúde em termos de sua
eficiência técnica na provisão de
serviços de saúde.
Com base nos dados coletados,
percebemos que a média das despe-
sas realizadas pelo modelo de ges-
tão das OSS é 11,60%, inferior ao
modelo da administração direta e
57,99% inferior ao modelo da admi-
nistração mista. No quesito ‘produ-
ção’ o modelo de gestão por OSS é,
em média, 51,71% superior à admi-
nistração direta e 31,04% em rela-
ção à administração mista.
Para nossos dados, os resultados
encontram-se no Gráfico I, no qual
podem ser vistos também os percen-
tuais de eficiência.
Observando-se o Gráfico I, veri-
ficamos que apenas o modelo de
gestão da administração por OSS
detém dois hospitais, C – 2 e C – 3,
considerados eficientes.
O modelo de administração di-
reta apresenta média de 66,85% de
eficiência técnica, sendo 80,15% o
maior valor e 52,48% o menor. Já
o modelo da administração por OSS
obteve média de 95,97% de efici-
ência técnica – a variação do es-
core de eficiência foi de 85,43% a
TABELA 4 – Dados dos hospitais selecionados do Estado de São Paulo por modelo de gestão eindicadores de performance no ano de 2001
Fonte: SES – Secretaria de Estado da Saúde e unidades hospitalares – 2002.
GRÁFICO I – Ranking de eficiência técnica utilizando o modelo CCR em 2001
Fonte: Elaboração própria.
100%. O modelo da administração
mista tem média de eficiência téc-
nica de 69,67%, ou seja, maior que
a média da eficiência técnica do
modelo de gestão da administra-
ção por OSS. O escore de eficiên-
cia para o modelo de gestão da ad-
ministração mista variou de
55,46% a 83,88%. Então, um dos
hospitais desta categoria apresen-
Modelo de gestão Hospital Número de funcionários
por leito
Total das despesas realizadas (1.000)
Número de atendimentos em regime de urgência e emergência
Número de exames de análises clínicas
Atendimentos por
funcionários
A – 1 6,43 23.697 201.192 159.256 164,56
A – 2 11,36 27.157 202.248 187.634 152,40
A – 3 7,56 27065 282.060 124.847 203,99
A – 4 8,83 28.855 234.012 258.960 174,11
Administração direta
A – 5 6,55 30.187 205.644 249.257 174,22
B – 1 5,91 72.502 182.945 589.244 163,77 Administração mista
B – 2 5,68 44.357,659 142.342 1.055.005 238,81
C – 1 4,17 26.627 34.201 426.924 111,34
C –2 2,8 20.583,1 23.547 701.267 368,08
C – 3 4,52 26.825,009 248.985 460.601 473,34 Administração por OSS
C – 4 5,37 24.141 54.811 396.223 102,30
BUENO, Ricardo Luiz Pereira
100 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007
tou algum grau de ineficiência. A
eficiência média entre os modelos
de gestão foi de 77,49%.
O estudo de DALMAU-MATARRODONA
& PUIG-JUNOY (2000) sobre a eficiên-
cia técnica dos hospitais espanhóis
afirma que sua ineficiência média
está em 10,10%, e que apenas 36%
desses hospitais podem ser consi-
derados eficientes.
sa média deste modelo de gestão é
superior ao menos em três milhões
de reais em comparação aos demais
modelos de gestão.
Verificamos que o modelo de ges-
tão por OSS implementado no estado
de São Paulo auxiliou na melhoria
da eficiência produtiva dos serviços
públicos hospitalares, tendo em vis-
ta que, no ranking gerado, esses
hospitais compõem o rol daqueles
considerados tecnicamente eficientes.
Com base nos resultados de nosso
estudo, percebemos que o nível de
ineficiência nos hospitais públicos do
estado de São Paulo é de 17,56%, em
2001, maior do que o proposto pela
literatura (10,10%). E apenas os hos-
pitais do modelo de gestão por OSS
são considerados eficientes.
Encontramos evidências de que
o modelo de gestão por OSS apre-
senta maior eficiência técnica que
os demais, tendo em vista o valor
de p nos testes estatísticos efetua-
dos em nosso trabalho, contrarian-
do, assim, o resultados da pesqui-
sa de BURGESS & WILSON (1996).
Tendo em vista os resultados
apurados, podemos afirmar que o
novo modelo de gestão implemen-
tado no estado de São Paulo, o mo-
delo de gestão por OSS, auxiliou na
melhoria da eficiência produtiva dos
serviços públicos hospitalares do
estado. Entretanto, nota-se um défi-
cit democrático em relação à publi-
cização dos dados financeiros e pro-
dutivos de forma institucional.
TABELA 5 – Resultados do teste U de Mann-Withney para a administração por OSS edemais modelos
Em nosso estudo, a ineficiência
média entre os hospitais pesquisa-
dos foi de 17,56%. E apenas 18,18%
dos hospitais foram considerados
eficientes com a aplicação do mo-
delo DEA – CCR.
Utilizamos o teste não paramé-
trico U de Mann-Withney para ve-
rificar a hipótese apresentada, cu-
jos resultados podem ser encontra-
dos na Tabela 5.
Fonte: Elaboração própria.
Assim, obtemos os valores de
p = 0,0061 para o teste em rela-
ção à diferença do desempenho, en-
quanto que o teste sobre o desem-
penho superior do modelo de ges-
tão por OSS obteve valor p = 0,0030.
Ambos estatisticamente significati-
vos em um nível de confiança de 95%.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A metodologia utilizada em nos-
so estudo permitiu grande redução
no número de variáveis e a obtenção
do maior poder explicativo possível
em relação aos dados disponíveis.
Com base nos resultados obtidos
verificamos que os hospitais do
modelo de gestão da administração
por OSS produzem mais que os de-
mais modelos de gestão, além de
serem mais eficientes na alocação
de seus recursos financeiros, reve-
lando também melhor produtivida-
de do trabalho. Os resultados indi-
cam no sentido compatível com as
teorias de reforma da máquina ad-
ministrativa, que julgam serem os
recursos melhor alocados quando
isto é atribuição de um órgão local
e não central.
Outra noção clara na literatura
tanto de gestão como econômica é a
idéia de poder de mercado, ou seja,
como a administração direta com-
pra para um grande número de hos-
pitais, o custo unitário dos produ-
tos tende a cair, respeitadas suas
elasticidades. Essa noção não se
sustenta, tendo em vista que a despe-
Modelo de DEA
Período Julgamento em relação a diferença entre o modelo de gestão por oss perante aos
demais
Julgamento em relação a superioridade do modelo de gestão por oss perante aos
demais
H0 Valor de p H0 valor de p
CCR 2001 Não aceita 0,0061 Não aceita 0,0030
Eficiência técnica e gestão de hospitais públicos do estado de São Paulo
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 90-103, janeiro 2007 101
Em que pese a existência de es-
tudos sobre a produtividade hospi-
talar, pouca atenção tem sido desti-
nada à avaliação da eficiência téc-
nica dos hospitais brasileiros, o que
dificulta a comparação adequada
dessas instituições.
Esse trabalho buscou apenas re-
alçar resultados dos modelos de
gestão e sua eficiência técnica, con-
tribuindo no sentido de se avaliar
comparativamente os mesmos em
operação na busca da sistematiza-
ção de informações úteis aos gesto-
res públicos e à sociedade.
Muitas são as dúvidas que me-
recem respostas, como por exemplo:
a questão da qualidade da atenção
médica e sua influência na eficiên-
cia da mesma, a questão da partici-
pação popular na microgestão e efi-
ciência do sistema de saúde e a ne-
cessidade do estabelecimento de cri-
térios para avaliação que possam
endereçar a complexidade do cuida-
do a saúde como parte da eficiência
técnica do hospital.
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104 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 104-109, janeiro 2007
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Correlação entre recursos financeiros e coeficiente de mortalidade infantil nas cinco macrorregiões doBrasil (de 1997 a 2002)
Correlation between financial resources and infant mortality rate in the five Brazilian macro-regions (from 1997 to 2002)
Jorge de Azevedo1, Luciana Nucci1, Cristiana Toscano1, Paul Douglas Fisher1 & Ronaldo Bordin1
1 Os autores são do Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), de Porto Alegre.
RESUMO
O repasse de recursos financeiros baseados na produção de procedimentos tais como consultas, exames e
tratamentos, parece não garantir a aquisição de melhores desfechos na saúde da população assistida. Consciente
deste problema, a Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul vem efetuando repasses a título de prêmio,
com base no coeficiente de mortalidade infantil (CMI). Este estudo tem por objetivo analisar a correlação entre
recursos financeiros e CMI utilizando-se de informações do Datasus sobre as cinco macrorregiões do Brasil, no
período de 1997 a 2002. Foi realizada análise de correlação de Pearson para cada ano e macrorregião. Constatou-
se correlação inversa entre repasse per capita e CMI para todas as regiões sendo que a força da associação é menor
na região norte, aumentando progressivamente nas regiões Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste e Sul. Conclui-se ser
plausível basear transferências no CMI. Outros estudos são necessários para melhor compreender a variabilidade
entre as regiões do impacto dessas aplicações sobre indicadores de saúde e os resultados paradoxais obtidos
quando se realizam as transformações dos valores de repasses para o dólar americano.
PALAVRAS-CHAVE: Economia da Saúde; Administração e Planejamento em Saúde; Gestão de Qualidade, Coeficiente de
Mortalidade Infantil.
ABSTRACT
Payment transfers based on procedures such as consultations, diagnostic tests and treatments, does not
guarantee better health outcomes in the health of assisted population. Aware of this problem, the “Health Office of
the State of Rio Grande do Sul” has been transferring funds to municipalities based on Infant Mortality Rates
(CMI). The main purpose of this study is to analyze the nature of the relationship between CMI and the funds
transferred, using information from DATASUS on the five macro-regions in Brazil from 1997 to 2002. The analysis
of Pearson’s correlation for each year and macro-region was carried out. It was evidenced the inverse correlation
between per capita transfer and CMI for all regions and the strength of the association is lower in the north region,
progressively increasing in the center-west region, northeast, southeast and south. We thus conclude that it is
reasonable to base fund transfers on CMI. Other studies are needed in order to better understand the variability
between regions suffering the impact of those resources over indicators of health care quality and the paradoxical
results obtained with transformation of values of funds transferred to American dollar.
KEYWORDS: Health Economics; Health Administration and Planning; Quality Management; Infant Mortality Rate.
Correlação entre recursos financeiros e coeficiente de mortalidade infantil nas cinco macrorregiões do Brasil (de 1997 a 2002)
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 104-109, janeiro 2007 105
INTRODUÇÃO E OBJETIVO
A definição de “Economia” como
ciência que se ocupa do estudo da
distribuição de recursos com o obje-
tivo de maximizar o bem estar soci-
al é válida para explicar a “Econo-
mia da Saúde” (GIL et al, 2001), as-
sim, economizar no sentido de oti-
mizar a aplicação de recursos não
significa obrigatoriamente gastar
pouco nem muito e sim gastar corre-
tamente. Quando o volume de recur-
sos é suficiente para atender todas
as necessidades de um determinado
setor, no nosso caso a saúde, aplicar
corretamente os recursos significa-
ria pagar a preço justo e obter o be-
nefício desejado (promoção da saú-
de entendida no seu sentido mais
amplo de promoção, proteção e re-
cuperação). Depreende-se daí a ne-
cessidade do financiador de criar
meios de avaliar qualitativamente a
contraprestação do benefício deseja-
do. Quando o volume de recursos é
escasso, insuficiente para atender
todas as necessidades, uma atribui-
ção adicional recai sobre o financia-
dor que é a de priorizar as aplica-
ções. A compreensão dos conceitos
de qualidade da atenção médica tra-
zidos por Donabedian (DONABEDIAN,
1985; 1986; 1988; 1990)são de fun-
damental importância para aborda-
gem da questão das formas de finan-
ciamento e avaliação.
A quantidade e o custo dos pro-
cedimentos gerados na assistência
à doença não têm sido uma boa me-
dida da qualidade da pretendida pro-
moção à saúde (ANON, 2002; YAZLE et
al, 2001). Conscientes do problema,
gestores dos sistemas de saúde de
vários países incluindo o Brasil vem
discutindo diferentes formas de fi-
nanciamento e descentralização e
cada vez mais baseando seus re-
passes em indicadores de desfecho
em saúde (JÚNIOR et al, 2003; PORTO,
1990; AGUIRRE, 2002). Uma das bar-
reiras principais a ser enfrentada é
a falta de banco de dados confiáveis
custos da assistência (CHIU, 1995).
O problema do aumento da deman-
da, da qualidade, quantidade, com-
plexidade e custos de procedimen-
tos frente a recursos finitos parece
não deixar alternativas, a não ser
priorizar ações; monitorar desfechos
e coibir desperdícios baseando re-
passes em indicadores de qualida-
de, otimizando assim os recursos
disponíveis principalmente quando
o aumento do aporte de recursos es-
tiver fora de cogitações.
No Brasil, o Ministério da Saú-
de mantém um conjunto de banco
de dados acessível via internet no
site www.datasus.org.br, que reú-
ne uma ampla gama de informa-
ções. Estes dados podem servir para
análises cujos resultados, uma vez
publicados, forneçam feedback para
aprimoramento da qualidade das
informações ali contidas, e aos pou-
cos ir viabilizando uma nova lógi-
ca para transferência de recursos
na área da saúde (JÚNIOR et al, 2003;
TEIXEIRA, 2003; FREITAS et al, 2001).
Embora intuitivamente seja fre-
qüente associar-se volume de recur-
sos com melhoria dos desfechos em
saúde, pouco se tem publicado em
relação a caracterização quantifica-
da dessas correlações. Verificando
como recursos financeiros repassados
e coeficiente de mortalidade infantil
se correlacionam e se a correlação
possui as mesmas características
para cada uma das cinco macrorre-
giões do território brasileiro, este
estudo tem por objetivo concluir se
que permitam calcular e monitorar
a evolução desses indicadores de
qualidade.Uma outra constatação
importante e que há vinte anos já
preocupava estudiosos na Inglater-
ra (MAXWELL, 1985) é que vem sen-
do cada vez mais difícil conciliar a
incorporação de novas tecnologias
médicas com os recursos muitas ve-
zes estáticos dos sistemas de saúde
e, somado a isso, o envelhecimento
das populações que forçam uma es-
calada contínua da demanda e dos
A QUANTIDADE E O CUSTO
DOS PROCEDIMENTOS GERADOS
NA ASSISTÊNCIA À DOENÇA NÃO
TÊM SIDO UMA BOA MEDIDA DA
QUALIDADE DA PRETENDIDA
PROMOÇÃO À SAÚDE
AZEVEDO, Jorge de et al
106 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 104-109, janeiro 2007
é plausível basear transferência de
recursos no coeficiente de mortali-
dade infantil.
MATERIAL E MÉTODO
A análise considerou dados se-
cundários do período de 1997-2002
obtidos do DATASUS e Instituto Bra-
sileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), disponível para acesso pú-
blico via internet. Número de óbitos
em menores de 1 ano foi obtido do
Sistema de Informações sobre Mor-
talidade (SIM), número de nascidos-
vivos do Sistema de Informações so-
bre Nascimentos (SINASC), dados
demográficos do IBGE. Os valores
de repasses financeiros incluíram
todo tipo de transferência feita pelo
Ministério da Saúde aos estados e
municípios (remuneração por servi-
ços produzidos e transferências fun-
do a fundo), constituída dos reem-
bolsos pelos procedimentos ambu-
latoriais e hospitalizações e recur-
sos destinados às atividades de pre-
venção e controle de doenças, obti-
dos do Sistema de Informações Am-
bulatoriais do SUS (SIA-SUS), Siste-
ma de Informações Hospitalares do
SUS (SIH-SUS) e Fundo Nacional de
Saúde (FNS), respectivamente. Não
foram computados os valores dos
percentuais sobre a receita de impos-
tos estatuais e municipais estabele-
cidos pela Emenda Constitucional No
29/2000. Os dados foram extraídos e
exportados para planilhas Excel. A
variável derivada “repasse per capi-
ta anual”, em reais, foi calculada
considerando o total de recursos fi-
nanceiros repassados e dados popu-
lacionais extraídos do IBGE. Foi rea-
lizada análise de correlação de Pear-
son para cada ano e macrorregião, e
os dados são apresentados em gráfi-
cos de dispersão por região, com in-
tervalos de confiança 95% utilizan-
do-se o programa SPSS v.12.0.
RESULTADOS, CONCLUSÕES ELIMITAÇÕES DO ESTUDO
Observando-se a tabela 1, cons-
tata-se uma variabilidade importan-
te no repasse de recursos financei-
ros per capita entre as macrorregi-
ões, com média no período avalia-
do, variando entre R$ 51,83 (Norte)
e R$ 75,82 por ano (Sudeste). O va-
lor médio do Coeficiente de Mortali-
dade Infantil (CMI) para o período
variou entre 17,13/1.000 (Centro-
Oeste) e 25,67/1.000 nascidos-vivos
(Nordeste). Paradoxalmente, a ma-
crorregião com maior valor médio
per capita (Sudeste) não foi a que
apresentou melhor CMI (Centro-Oes-
te), tampouco a de pior valor médio
per capita (Norte) foi a que apresen-
tou pior CMI (Nordeste).
TABELA 1 – Análise descritiva das variáveis “repasse médio anual em reais” e “Coeficiente deMortalidade Infantil” por macrorregião, no período de 1997- 2002.
A tabela 2 contém todos os pa-
res de valores de repasses per capi-
ta em reais (valores de “x” nos grá-
ficos) e CMI por 1000 nascidos vi-
vos (valores de “Y”), que constituí-
ram a base para confecção da tabe-
la 1 e dos gráficos de dispersão da
figura. Nela podemos observar que
para todas as regiões houve repas-
ses com valores crescentes; que a
Regiões Mínimo Máximo Média Desvio Padrão
Norte
Repasse 27,88 72,29 51,83 17,47
CMI 21,70 25,30 24,00 1,34
Nordeste
Repasse 38,82 85,16 63,82 17,96
CMI 23,90 27,40 25,66 1,45
Centro-Oeste
Repasse 43,12 85,11 64,00 15,64
CMI 16,00 18,70 17,13 0,94
Sudeste
Repasse 53,61 98,43 75,81 17,23
CMI 17,40 19,70 18,71 0,89
Sul
Repasse 53,02 89,89 71,68 13,66
CMI 16,50 24,60 19,61 2,90
Correlação entre recursos financeiros e coeficiente de mortalidade infantil nas cinco macrorregiões do Brasil (de 1997 a 2002)
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 104-109, janeiro 2007 107
região Sul foi a que apresentou para
todos os anos de 1997 a 2002 os
menores CMI; que a região Sudeste,
com exceção de 1998, foi a que re-
cebeu valores mais elevados de re-
passes per capita e que para todas
as regiões com exceção da Sudeste
houve aumento do CMI do ano de
1997 para o de 1998, apesar de ter
aumentado o valor do repasse.
A tabela 3 reúne em ordem cres-
cente os valores dos coeficientes de
correlação linear para cada macror-
região no período de 1997 a 2002
com respectivos valores de P.
Analisando-se os gráficos de dis-
persão da figura abaixo, constata-
se correlação inversa entre repasse
per capita anual e CMI para todas
as macrorregiões sendo que a for-
ça da associação é menor na região
Norte (r=-0,614; P=0,195), aumen-
tando progressivamente nas regiões
Centro-Oeste (r=-0,963; P=0,002),
Nordeste (r=-0,830; p=0,041), Su-
deste (r=-0,938; p=0,006) e Sul
(r= -0,963; p=0,002).
A correlação inversa entre as
variáveis para todas as macrorre-
giões nos leva, preliminarmente, a
concluir ser possível basear repas-
ses de recursos financeiros no CMI.
Entretanto, a importante variabili-
dade na força das associações su-
gere que os diferentes impactos da
aplicação dos recursos certamente
se devam a influência de fatores de
confusão e/ou interação manifestos
de forma diferente em cada macror-
região, e por estes motivos outros
TABELA 2 – Valores de repasses per capita em reais e coeficientes de mortalidade infantil por 1000nascidos vivos para cada ano e macrorregião.
TABELA 3 – Força das associações entre repasses per capita em reais e coeficiente de mortalidadeinfantil para cada macrorregião no período de 1997 a 2002. Coeficiente de correlação linear (r)com respectivos valores de P.
estudos são necessários para iden-
tificar tais fatores associados à va-
riabilidade per capita entre as regi-
ões; a forma de aplicação desses
recursos e do impacto dessas apli-
cações sobre indicadores de saúde.
Além disso, quando são realizadas
transformações dos valores de repas-
ses para o dólar americano basea-
do na cotação média de cada ano,
de 1997 a 2002, resultados opostos
e aparentemente paradoxais são en-
contrados, com correlação direta en-
tre as variáveis em questão e corre-
lação inversa entre CMI e taxa de
câmbio médio do dólar a cada ano.
Pensamos que mais fidedignos
serão os resultados quanto mais es-
Regiões rrrr PPPP
Norte - 0,614 0,195
Centro-Oeste - 0,825 0,043
Nordeste - 0,830 0,041
Sudeste - 0,938 0,006
Sul - 0,963 0,002
Regiões 1997 1998 1999 2000 2001 2002
Norte
Per capita 27,88 35,43 50,18 58,71 66,44 72,29
CMI 24,0 25,3 24,6 25,1 23,3 21,7
Nordeste
Per capita 38,82 48.00 61.75 69.80 79.42 85.16
CMI 26,5 27,4 25,,8 26,5 23,9 23,9
Centro-Oeste
Per capita 43,12 51,92 60,16 66,47 77,22 85,11
CMI 19,4 19,7 19,3 18,4 18,1 17,4
Sudeste
Per capita 53,61 60,57 72,30 78,79 91,04 98,43
CMI 24,6 21,1 19,3 18,7 17,5 16,5
Sul
Per capita 53,02 60,68 70,05 73,53 82,94 89,89
CMI 17,5 18,7 17,2 17,0 16,4 16,0
AZEVEDO, Jorge de et al
108 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 104-109, janeiro 2007
pecífica seja a análise, isto é, quanto
menor a extensão territorial estuda-
da (idealmente estudos ao nível mu-
nicipal) e quanto maior o período
analisado. A análise destes seis anos
(1997 a 2002) se deve ao fato de ser
o único período cujos dados demo-
gráficos, repasses financeiros e de
mortalidade estarem concomitante-
mente disponíveis para acesso públi-
co no site do DATASUS. Resolvemos
não fazer a análise mensal ao invés
de anual, para aumentar o número
de pares para análise de correlação,
pois, embora fosse viável obter re-
passes mensais de recursos, teríamos
sérios problemas com o Coeficiente
de Mortalidade Infantil Proporcional.
Este estudo é uma abordagem
inicial do tema. Como autores, vis-
lumbramos um longo e ramificado
caminho a ser percorrido até que se
possa alcançar o objetivo final que
seria estar estimando, para cada re-
gião, o impacto esperado sobre cada
indicador de desfecho considerando
um determinado volume de recurso
aplicado. Além disso, conhecer os
FIGURA 1 – Representações gráficas das correlações entre “Repasse per capita anual em Reais” (eixo dos X) e “Coeficiente de Mortalidade Infantil /1000nascidos vivos” (eixo dos Y) no período de 1997 a 2002 com curvas de IC 95%.
fatores associados que possam es-
tar interferindo neste resultado e,
assim, aprimorar esta forma de re-
passe de recursos e avaliação de re-
sultados, tendo em mente que este é
um processo dinâmico e, portanto
sujeito a variações a cada período.
Finalizamos citando Ernest Ru-
therford que viveu entre 1871-1937,
prêmio Nobel em química em 1908
e criador da física atômica moder-
na, que certa vez afirmou:
“ – We don’t have the money, so
we have to think”. (ALLIBONE, 1973)
Correlação entre recursos financeiros e coeficiente de mortalidade infantil nas cinco macrorregiões do Brasil (de 1997 a 2002)
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 104-109, janeiro 2007 109
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110 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Clusters and thresholds of science and technology in health
Catari Vilela Chaves1, Eduardo da Motta e Albuquerque2 & Sueli Moro3
1 Cedeplar-UFMG e Pucminas.
2 Cedeplar-UFMG.
3 Cedeplar-Health Innovation System; Cluster Analysis. UFMG.
RESUMO
Sistema Nacional de Inovação (NSI) é uma construção institucional que impulsiona o progresso científico-
tecnológico em economias capitalistas modernas. A literatura sobre economia da ciência e tecnologia (C&T)
permite desagregar o NSI em setores, pois a dinâmica de inovação é significativamente diferente entre eles. O
objetivo deste artigo é compreender as peculiaridades da distribuição dos países em relação aos indicadores de
C&T em saúde e, conseqüentemente, verificar se existe limiar de produção científica para o setor. O principal
resultado do artigo é a identificação de uma descontinuidade da produção científico-tecnológica em saúde entre
os países com sistemas maduros de inovação e países com sistemas imaturos.
PALAVRAS-CHAVE: Sistema de Inovação Setorial em Saúde; Análise de Cluster.
ABSTRACT
The literature on National Systems of Innovation (NSI) highlights how science and technology are the
engines of growth and sources of the wealth of nations. The interactions between science and technology are
important for the formation of NSIs. This paper investigates these interactions in general and in the health
sector. Investigations based on indicators of technological production (patents) and of scientific production
(indexed papers) have identified a threshold level that divides countries in two broad groups: beyond the
threshold are the developed countries, with mature NSIs, and below that threshold are the less developed
economies, with immature NSIs. The main finding is the identification of a threshold in the production of
science and technology in health. This health-related threshold, however, is different from the general threshold
identified previously: in the health sector, there is a discontinuity between immature NSIs and mature NSIs,
and not only an inflexion.
KEYWORDS: Health Innovation System; Cluster Analysis.
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 111
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é analisar
as peculiaridades da distribuição dos
países em relação aos indicadores de
ciência e tecnologia (C&T) em saúde.
Comparando esta distribuição com a
descrita por SILVA (2003), que anali-
sou a distribuição dos países para o
Sistema Nacional de Inovação (NSI,
na sigla em inglês)1, é fundamental
relacionar a infra-estrutura científi-
ca e tecnológica com o estágio de de-
senvolvimento dos diversos países
em termos de C&T. De início, será
utilizada a análise multivariada de
clusters hierárquicos, para estabe-
lecer uma tipologia entre os países,
de acordo com os regimes de intera-
ção a que pertencem. A seguir, será
discutida a possibilidade de existên-
cia de limiar de produção científica
para esse setor.
BERNARDES & ALBUQUERQUE (2003)
identificaram três grupos de países
com características semelhantes a
partir das estatísticas de artigos e
patentes. Segundo os autores, os
países menos desenvolvidos não
produzem artigos e/ou patentes e,
praticamente, não há articulação
entre as esferas científica e tecnoló-
gica. Isso significa que o setor pro-
dutivo não se beneficia dos avan-
ços científicos. Em termos de C&T,
apenas a produção científica contri-
bui para o crescimento econômico.
Este depende de outros fatores como
trabalho, disponibilidade de maté-
rias-primas, condições de saúde da
população, distribuição de renda
etc. Os países que se enquadram
nessa categoria são classificados
como pertencentes ao regime I. No
caso dos países em desenvolvimen-
to, artigos e patentes são produzi-
dos de forma sistemática, mas as
interações entre C&T ainda não es-
tão totalmente consolidadas. No en-
tanto, pode-se perceber contribuições
da produção científica e da tecnoló-
Para que os países possam evo-
luir para regimes de interação mais
avançados, sua infra-estrutura cien-
tífica, tecnológica e seu crescimen-
to econômico devem ser os elos fun-
damentais de uma rede de interações
que conecta os diversos componen-
tes do sistema de inovação. Isso sig-
nifica que países menos desenvol-
vidos possuem menor número de
conexões (entre produção científica,
produção tecnológica e crescimento
econômico) e, à medida que evolu-
em, as conexões entre as três esfe-
ras são efetivadas. Nesse sentido,
pode-se conjeturar o seguinte: o for-
talecimento da infra-estrutura cien-
tífica e tecnológica proporciona di-
namismo aos países menos desen-
volvidos e age como um elo de liga-
ção com as esferas econômicas e
sociais. A conexão com a esfera so-
cial fica clara quando a referência
passa a ser o setor saúde. Não há
dúvida de que países com sistema
de inovação avançado em termos de
saúde – como tecnologia médica
moderna, divulgação dos conheci-
mentos pela saúde pública etc. –
oferecem benefícios à população,
como queda da mortalidade infan-
til, aumento da expectativa de vida,
melhorias na produtividade do tra-
balho etc. Nestes países, as inova-
ções e intervenções sanitárias che-
gam à população por meio dos sis-
temas e serviços de saúde, que são
muito eficientes.
1 Mais especificamente, a análise refere-se a apenas uma parte do NSI, medida por artigos e patentes.
gica para o processo de crescimen-
to econômico. Os países que possu-
em essas características pertencem
ao regime II. Finalmente, os países
desenvolvidos possuem infra-estru-
tura científica e tecnológica bem
consolidada, existem mecanismos
de feedback entre ambas as dimen-
sões e interações entre C&T com a
esfera econômica. Esses países per-
tencem ao regime III.
A CONEXÃO COM AESFERA SOCIAL FICA
CLARA QUANDO AREFERÊNCIA PASSA ASER O SETOR SAÚDE
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
112 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
Em relação ao sistema de inova-
ção, a literatura sobre economia da
ciência e tecnologia enfatiza a impor-
tância dos investimentos em pesqui-
sa como forma de os países forma-
rem “massa crítica” em termos cien-
tíficos. A partir da formação dessa
base, haveria maior eficiência na pro-
dução de inovações tecnológicas
(medidas pela proxy patentes). Isso
significa que, ultrapassado o limiar
de produção científica, haveria mai-
or articulação entre a produção ci-
entífica e a tecnológica, indicando a
existência de mútua determinação
entre ambas. Assim, pode-se reconhe-
cer que a produção tecnológica for-
talece a científica que, por sua vez,
contribui para a expansão e o aper-
feiçoamento da tecnológica.
A hipótese básica deste artigo é a
de que, no sistema setorial de inova-
ção em saúde, a exigência para se
formar “massa crítica” e, conseqüen-
temente, ultrapassar o limiar de pro-
dução científica, é maior, relativamen-
te ao NSI agregado. O fundamento da
hipótese é de que o setor saúde é for-
temente dependente da ciência (NEL-
SON, 1995). Por isso, as exigências para
a transformação do conhecimento ci-
entífico em conhecimento tecnológico
são maiores neste setor, o que justifi-
ca a descontinuidade científico-tecno-
lógica que ocorre quando da passa-
gem do regime II para o regime III. A
conseqüência imediata é a necessida-
de de investimentos em infra-estrutu-
ra científica, sobretudo para os paí-
ses que estão aquém do limiar.
O artigo apresenta três seções. A
primeira sintetiza trabalhos anteri-
ores que discutem o papel da infra-
estrutura científica na construção de
sistemas de inovação e identifica li-
miares da produção científica em
geral (esses limiares são importan-
tes para a identificação dos três re-
gimes de interação). A segunda se-
ção apresenta a metodologia relati-
va à análise multivariada de clus-
ters hierárquicos. A terceira é dedi-
cada à análise dos resultados refe-
particularidades: em primeiro lugar,
o papel da ciência em processos de
catching up (processo que o Brasil
precisa realizar para superar a bar-
reira do subdesenvolvimento); em
segundo lugar, uma especificidade
do setor saúde de um país no está-
gio de desenvolvimento como o Bra-
sil, que se caracteriza por um “mo-
saico epidemiológico”, situado no
contexto internacional de uma des-
conexão entre carga da doença e re-
cursos para pesquisa.
A discussão apresentada nesta
seção contribui para a compreensão
da definição da metodologia apre-
sentada na seção seguinte e dos fun-
damentos teóricos que informam a
comparação entre clusters de paí-
ses para C&T em geral e para a saú-
de em particular.
O papel das universidades
e instituições de pesquisa
A partir da resenha do conceito
de sistema de inovação e da indi-
cação do papel da interação entre
as dimensões científica e tecnoló-
gica, é possível focalizar com mais
detalhe o papel das universidades
e instituições de pesquisa – os
componentes essenciais da infra-
estrutura científica.
Há uma literatura rica sobre o
tema. MEYER-KRAHMER & KULICKE
(2002) sintetizam de forma feliz o
papel das universidades na litera-
tura da economia da tecnologia:
“instituições na interseção entre o
conhecimento e a economia”. Três
rentes aos clusters para o NSI em
saúde, aos limiares de produção ci-
entífica e à especialização científi-
ca. Por fim, apresenta as principais
conclusões do artigo.
INFRA-ESTRUTURA CIENTÍFICA NACONSTRUÇÃO DE SISTEMAS DE INOVAÇÃO E
OS LIMIARES DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA
Pretende-se resenhar o papel da
infra-estrutura científica nos siste-
mas de inovação, indicando duas
O SETOR SAÚDE
É FORTEMENTE
DEPENDENTE
DA CIÊNCIA
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 113
textos são úteis para se ter uma no-
ção das pesquisas relevantes em re-
lação ao tema: KLEVORICK et al. (1995),
NARIN et al. (1997), COHEN et al. (2002)
KLEVORICK et al. (1995) investi-
gam a forma que as empresas in-
dustriais avaliam a ciência e sua
utilidade para a dinâmica inovati-
va das empresas. A pesquisa ali re-
latada (1995) é o Yale Survey, um
levantamento realizado junto a 650
empresas de 180 diferentes indús-
trias, que investigou questões re-
lacionadas a oportunidades tecno-
lógicas e condições de apropriabi-
lidade. Avanços no conhecimento ci-
entífico são fontes importantes de
oportunidades tecnológicas. Os re-
sultados são preciosos para identi-
ficar um canal de transferência de
conhecimentos que sai da infra-es-
trutura científica e chega à firma e
pode ser por ela absorvido.2 Esta
pesquisa é pioneira por especificar
essa relação e por avançar na dis-
cussão do papel de diferentes dis-
ciplinas científicas para diferentes
setores industriais.
O Yale Survey indica a importân-
cia da ciência universitária e da ci-
ência em geral para tecnologias in-
dustriais. Aponta, de forma precisa,
o peso de disciplinas específicas para
a indústria em geral (Ciências de
Materiais, Ciências da Computação,
Química e Metalurgia são as que
lideram o impacto entre os setores
industriais); indica setores industri-
ais que valorizam muito diversas
disciplinas científicas (a indústria de
medicamentos, por exemplo, atribui
elevada importância para a Biolo-
gia e as Ciências Médicas, enquan-
to a indústria de semicondutores
valoriza a Física e a Ciência da Com-
putação). O Yale Survey resume a
forma como os diversos setores in-
dustriais monitoram ativamente e
acompanham o que acontece na in-
fra-estrutura científica.
p. 6-20). Pesquisaram as referênci-
as existentes nas patentes a traba-
lhos científicos. Comparando os da-
dos de 1987-1988 e 1993-1994, iden-
tificaram um crescimento de 30% no
total de patentes. Para o mesmo pe-
ríodo, o total de referências a publi-
cações científicas com autores nor-
te-americanos passou de 17 mil para
50 mil (aumento de quase 200%).
NARIN et al. (1997) demonstram as
articulações crescentes entre as ino-
vações da indústria dos Estados
Unidos e a comunidade acadêmica.
Ou, em outras palavras, a crescente
dependência da indústria america-
na em relação à ciência (financiada
basicamente pelo setor público).
Os resultados gerais indicam a
importância da ciência financiada
publicamente para o dinamismo tec-
nológico da indústria norte-ameri-
cana. Desagregando os setores en-
volvidos, os resultados de NARIN et
al. (1997) indicam que as patentes
relacionadas a drogas e medica-
mentos são as que apresentam a
mais forte dependência em relação
à ciência pública.
No geral, os artigos científicos
citados pelas patentes das indústri-
as norte-americanas têm forte ori-
gem em instituições públicas (43,9%
dos Estados Unidos; 29,4% estran-
geiras), sendo que a soma das pa-
tentes de drogas e medicamentos
apresenta a maior participação to-
2 Para a compreensão desse canal, é importante a elaboração de COHEN & LEVINTHAL (1989), que avaliam o duplo papel das atividades de
pesquisa e desenvolvimento em firmas: elas alimentam tanto a inovação como o aprendizado. É importante o desenvolvimento de capaci-
dade de absorção de conhecimento externo, em especial de conhecimento gerado nas universidades.
O trabalho de NARIN et al. (1997)
apresenta dados deste mesmo senti-
do causal (da infra-estrutura cientí-
fica para as firmas). NARIN, HAMILTON
& OLIVASTRO (1997) realizaram um
estudo por encomenda da National
Science Foundation sobre a depen-
dência da indústria norte-america-
na em relação à ciência financiada
com recursos públicos (NSF, 1998.
OS RESULTADOS GERAIS INDICAM
A IMPORTÂNCIA DA CIÊNCIA
FINANCIADA PUBLICAMENTE
PARA O DINAMISMO TECNOLÓGICO
DA INDÚSTRIA NORTE-AMERICANA
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
114 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
tal de instituições públicas (79,1%
de todas as citações).
A pesquisa de COHEN et al. (2002)
é uma expansão e uma atualização
do Yale Survey, agora realizado
como Carnegie Mellon Survey (CMS).
O survey é mais amplo (envolve
1.267 empresas industriais), avalia
a opinião das firmas sobre univer-
sidades e instituições públicas de
pesquisa (o Yale Survey considerou
apenas universidades) e envolve fir-
mas de tamanhos diversos, incluin-
do start-ups. O Carnegie Mellon
Survey (CMS) é mais detalhado em
relação às fontes de informação uti-
lizadas pelas empresas industriais,
em especial ao discriminar entre a
importância das universidades e dos
laboratórios públicos de pesquisa
como fontes para “sugestão de no-
vos projetos” e como “contribuição
para o acabamento de projetos”.
Tal discriminação é especialmen-
te importante porque é uma nova e
qualificada fonte de questionamen-
to do “modelo linear” de tecnologia.
A rigor, segundo COHEN et al. (2002,
p. 7), as empresas consideram as in-
formações provenientes de universi-
dades e laboratórios públicos como
(ligeiramente) mais importantes para
o “acabamento de projetos” (36% do
total) do que para a “sugestão de
novos projetos” (32% do total). Ou
seja, a infra-estrutura científica é (li-
geiramente) mais utilizada para re-
solver problemas que surgem no de-
correr de atividades de pesquisa já
iniciada do que para iniciar novos
projetos de pesquisa. As empresas
iniciam projetos a partir de suas ati-
vidades produtivas, por sugestão de
clientes ou de fornecedores e, em al-
gum ponto do processo de P&D são
forçadas a procurar universidades e
laboratórios de pesquisa para com-
pletar o projeto. A existência de um
iniciados na produção científica.
Mas, ao contrário do que críticos
unilaterais do modelo linear pode-
riam supor, é necessária a presença
da infra-estrutura científica para a
conclusão de projetos iniciados sem
sua participação direta. O modelo
interativo da relação entre ciência e
tecnologia encontra, assim, forte
evidência empírica.3
O CMS (realizado em 1994) apre-
senta resultados razoavelmente com-
patíveis com o Yale Survey (realiza-
do em 1987). Por exemplo, a Ciên-
cia de Materiais continua sendo a
disciplina acadêmica de maior im-
pacto em termos dos setores indus-
triais que a consideram relevante.
Mas o CMS apresenta uma fo-
tografia mais completa dos seto-
res industriais. Dois elementos se
destacam em relação aos vínculos
entre setores industriais e pesqui-
sa acadêmica. Para tanto, a indús-
tria é desagregada em 36 diferen-
tes setores (segundo a classifica-
ção SIC), e são investigadas dez
diferentes disciplinas científicas
(biologia, química, física, ciênci-
as da computação, ciências de
materiais, medicina, engenharia
química, engenharia elétrica, en-
genharia mecânica e matemática).
Em primeiro lugar, o CMS apre-
senta uma avaliação abrangente dos
3 MEYER-Krahmer & SCHMOCH (1998), em estudo realizado na Alemanha sobre interação entre ciência e tecnologia em quatro campos tecnoló-
gicos, encontraram que mais de 50% dos pesquisadores universitários entrevistados nas áreas de microeletrônica, software e biotecnologia
avaliam ser a “limitada base industrial uma importante barreira para a interação (da universidade) com a indústria”. Esse ponto é muito
importante para demonstrar o efeito do crescimento da base industrial sobre a dinâmica interativa universidade-indústria, que por sua vez
é crucial para o crescimento da produção científica em geral.
setor produtivo envolvido em ativi-
dades inovativas constitui-se em
importante fonte de questões e pro-
blemas para a infra-estrutura cientí-
fica resolver, confirmando as pesqui-
sas de ROSENBERG (1982).
Ao contrário do que supunha o
modelo linear, os projetos não são
AS EMPRESAS CONSIDERAM AS
INFORMAÇÕES PROVENIENTES DE
UNIVERSIDADES E LABORATÓRIOS
PÚBLICOS COMO MAIS IMPORTANTES
PARA O “ACABAMENTO DE PROJETOS”DO QUE PARA A “SUGESTÃO
DE NOVOS PROJETOS
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 115
setores industriais que consideram
relevante (moderadamente ou mui-
to) alguma disciplina científica. Dos
36 setores industriais, 26 indústri-
as indicaram pelo menos uma dis-
ciplina considerada relevante por
mais de 50% das firmas investiga-
das. Esse dado sugere para Cohen
et al. (2002, p. 12) que a pesquisa
realizada em universidades e insti-
tuições de pesquisa tem impacto
generalizado e abrangente nas ati-
vidades de P&D industrial.
Em segundo lugar, entre as dez
disciplinas avaliadas, oito foram
consideradas importantes em pelo
menos um setor industrial por mais
de 50% das firmas.4
Cohen et al. (2002) apresentam
dados em relação à importância dos
diversos canais de fluxos de conhe-
cimento. O canal mais importante é
o das “publicações e relatórios”
(considerado pelo menos “modera-
damente importante” para 41,2% dos
entrevistados). O segundo canal
mais importante é a “interação in-
formal” (para 35,6%) e em terceiro
lugar está o canal “conferências e
encontros” (para 35,1%).
Finalmente, COHEN et al. (2002)
apresentam evidências quanto à
importância das instituições de pes-
quisa para as firmas de acordo com
o seu tamanho. O resultado encon-
trado indica que a pesquisa pública
é importante tanto para firmas gran-
des como para novas pequenas fir-
mas (start-ups).
O papel da ciência antes e durante
o processo de Catching Up
A situação prevalecente nos pa-
íses menos desenvolvidos não pode
ser compreendida a partir da apli-
cação direta e sem qualificações
das conclusões alcançadas na lite-
ratura sobre os países avançados.
Há diferenças que devem ser leva-
das em conta.
ca oferece “conhecimento para foca-
lizar buscas” (NELSON, 1982), ao in-
vés de ser uma fonte direta de opor-
tunidades tecnológicas. Em outras
palavras, a infra-estrutura científi-
ca em países em desenvolvimento
deve contribuir para vincular o país
aos fluxos científicos e tecnológicos
internacionais.
Neste sentido, o papel da ciên-
cia durante processos de catching
up pode ser desdobrado em três di-
mensões. Em primeiro lugar, ela
atua como um “instrumento de fo-
calização”, contribuindo para a
identificação de oportunidades e
para a vinculação do país aos flu-
xos internacionais. Em segundo lu-
gar, a ciência cumpre o papel de
instrumento de apoio para o desen-
volvimento industrial, provendo o
conhecimento necessário para a en-
trada em setores industriais estra-
tégicos (PEREZ & SOETE, 1988). Final-
mente, ela serve como fonte para
algumas soluções criativas que di-
ficilmente seriam obtidas fora do
país (exemplo: vacinas contra do-
enças tropicais, desenvolvimento de
tecnologias agrícolas específicas
em termos de climas, condições de
irrigação e características das ter-
ras, desenvolvimento de certas li-
gas metálicas, preparação de sof-
twares aplicados, etc.). Decerto que
há uma inter-relação entre esses
diferentes papéis, na medida que o
4 MEYER-KRAHMER & SCHMOCH (1998) destacam que no caso da Alemanha, mesmo tecnologias com baixa ligação com a ciência (como a
engenharia mecânica) podem ter forte interação entre universidade e indústria.
No que diz respeito ao papel da
ciência, a principal diferença reside
na contribuição que ela pode ofere-
cer durante o processo de catching
up: a infra-estrutura científica atua
como um “instrumento de focaliza-
ção” e como uma “antena” para
identificar oportunidades tecnológi-
cas e para constituir a capacidade
de absorção do país. Em um país
atrasado, a infra-estrutura científi-
O RESULTADO ENCONTRADO
INDICA QUE A PESQUISA
PÚBLICA É IMPORTANTE TANTO
PARA FIRMAS GRANDES COMO
PARA NOVAS PEQUENAS FIRMAS
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116 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
desenvolvimento da capacidade de
absorção é uma precondição para
desenvolvimentos tecnológicos lo-
cais, originais e incrementais.
Comparando as interações en-
tre as esferas da ciência e da tecno-
logia em países em processo de ca-
tching up (Coréia do Sul e Taiwan)
com o caso brasileiro, RAPINI (2000)
encontrou uma importante diferen-
ça: nos países em catching up é
possível estabelecer uma relação
estatística que sugere a existência
de causalidade tanto entre a pro-
dução científica (em termos de ar-
tigos científicos indexados pelo ISI)
e a produção tecnológica (em ter-
mos de patentes depositadas no
USPTO), como entre a produção tec-
nológica e a produção científica.5
Ou seja, identificou-se uma causa-
lidade recíproca entre as dimensões
científica e tecnológica ao longo do
processo de desenvolvimento ace-
lerado. Esse achado contrasta com
o caso brasileiro, no qual a autora
encontrou causalidade em apenas
um sentido: da produção científica
para a tecnológica.
Os limiares de produção científica
A pergunta é a seguinte: seria
necessária a superação de algum li-
miar de produção científica para que
fosse assegurada a existência de uma
massa crítica que permitisse à infra-
estrutura científica assumir os pa-
péis que lhe cabem durante o pro-
cesso de desenvolvimento?
BERNARDES & ALBUQUERQUE (2003)
sugerem ser possível representar em
um modelo bastante simples a evo-
lução das relações entre as dimen-
sões científica e tecnológica ao lon-
go do processo de desenvolvimen-
to. Trata-se de um modelo útil para
estabelecer alguns parâmetros para
a investigação do papel da intera-
3. a sugestão de que a interação
entre estas esferas muda ao lon-
go do processo de desenvolvimen-
to até alcançar um patamar ele-
vado de determinações recípro-
cas, nível de interação que é ca-
racterístico dos países avançados;
4. a conjectura de que esta trajetó-
ria evolucionista é impulsiona-
da pelo desenvolvimento da in-
fra-estrutura científica (o forta-
lecimento da infra-estrutura ci-
entífica é uma condição neces-
sária, embora não suficiente,
para detonar o desenvolvimen-
to tecnológico);
5. a conjectura da existência de li-
miares de produção científica que
devem ser superados para o alcan-
ce de novos estágios e de novos
níveis de interação entre as dimen-
sões científica e tecnológica;
6. o reconhecimento de que é possí-
vel integrar estas interações entre
ciência e tecnologia nas determi-
nações do crescimento econômico.
O modelo propõe a existência de
pelo menos três diferentes “regimes
de interação” ao longo do processo
de desenvolvimento. No ‘regime I’,
a infra-estrutura científica é ainda
muito pequena e incapaz de alimen-
tar uma produção tecnológica mí-
ção entre ciência e tecnologia. Seis
passos são necessários:
1. o reconhecimento de duas dimen-
sões diferentes entre as ativida-
des relacionadas à inovação: a ci-
entífica e a tecnológica;
2. a identificação de uma divisão de
trabalho institucional entre elas;
5 A causalidade é identificada através de uma técnica desenvolvida por GRANGER. RAPINI explica o sentido desta técnica e ressalta que o estudo
permite afirmar que as duas séries temporais (artigos e patentes) comportam-se de forma tal que a causalidade “no sentido de Granger” corre
nos dois sentidos. Para mais detalhes, ver RAPINI (2000).
IDENTIFICOU-SE UMA
CAUSALIDADE RECÍPROCA ENTRE
AS DIMENSÕES CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
AO LONGO DO PROCESSO DE
DESENVOLVIMENTO ACELERADO
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 117
nima.6 No ‘regime II’, a produção ci-
entífica cresce e pode determinar al-
guma produção tecnológica, mas não
a ponto de viabilizar um efeito retro-
alimentador sobre a produção cien-
tífica.7 Por fim, no ‘regime III’, as co-
nexões e interações estão plenamen-
te estabelecidas (como nos países de-
senvolvidos) e o principal determi-
nante do crescimento econômico é a
capacitação científica e tecnológica.
A discussão sobre os limiares
de produção científica contribui
para aprofundar a visão interativa
que nasce da crítica ao modelo line-
ar. A identificação da necessidade do
alcance de pontos de massa crítica
em termos de recursos científicos
para que a interação possa ser po-
tencializada sugere a crítica a um
“modelo linear invertido”, muitas
vezes implícito na literatura. Este
modelo sugere que, em primeiro
lugar, o país se desenvolve econo-
micamente, depois investe em tec-
nologia e, apenas em um terceiro
momento, aplica em ciência.
O principal problema do “mode-
lo linear invertido” é o desconheci-
mento do papel da infra-estrutura
científica na construção da “capaci-
dade de absorção” indispensável
para a imitação, para a adaptação
de tecnologias disponíveis em paí-
ses mais avançados e para a reali-
zação de inovações incrementais que
caracterizam os movimentos inici-
ais nos processos de catching up.
Portanto, ao tratarmos dos paí-
ses em desenvolvimento, é necessá-
rio combinar a crítica ao “modelo
linear” com a crítica ao “modelo li-
near invertido”, de modo a afirmar
que há mútua determinação e feed-
backs positivos entre as dimensões
científica e tecnológica.
O modelo proposto aqui pode ser
corroborado com base em uma aná-
lise estatística dos dados disponíveis
infra-estrutura científica nos países
subdesenvolvidos: há temas que não
podem ser resolvidos sem um inves-
timento de pesquisa localizado nes-
ses próprios países. O chamado “hi-
ato 10/90” sintetiza o problema e
indica a tarefa (GFHR, 2002).
O cenário mundial descrito pela
OMS pode ser sintetizado por um
desafio duplo: “epidemias emergen-
tes e problemas persistentes” (WHO,
1999. p.13-27). Esse cenário tem
uma distribuição desigual, em es-
pecial na distribuição da “carga da
doença evitável” (p. 22-27).
A articulação entre sistemas de
inovação e bem-estar social encon-
tra-se mais desenvolvida nos países
ricos. No cenário internacional, a
desigualdade do progresso tecnoló-
gico reflete-se na condição social das
populações mundiais. Possivelmen-
te, a inexistência ou o caráter incom-
pleto dos sistemas de inovação na
periferia determina essa desigualda-
de internacional.
No caso da saúde, a avaliação da
situação tecnológica indica de forma
dramática a enorme desigualdade
existente. Diversos estudos recentes
identificam de forma complementar
essa desigualdade (GFHR, 2002;
WHO, 1996, 2001; UNDP, 2001).
Em primeiro lugar, há uma im-
portante articulação entre o nível de
desenvolvimento e os recursos alo-
6 Esse regime caracterizaria a situação de numerosos países da África, que possuem alguma produção científica mas nenhuma produção
tecnológica identificada por patentes no USPTO (BANZE, 2000).
7 Esse regime caracterizaria, por exemplo, o caso brasileiro (RAPINI, 2000).
para 120 países (ver BERNARDES &
ALBUQUERQUE, 2003). Os resultados
desse estudo empírico estão apre-
sentados no Gráfico 1.
A grande desconexão entre a carga da
doença e os investimentos em pesquisa
A área de saúde possui uma par-
ticularidade que amplia o papel da
NO CENÁRIO INTERNACIONAL,A DESIGUALDADE DO PROGRESSO
TECNOLÓGICO REFLETE-SE NA CONDIÇÃO
SOCIAL DAS POPULAÇÕES MUNDIAIS
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
118 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
cados para a pesquisa e desenvol-
vimento em saúde: de acordo com a
OMS, os países de baixa e média ren-
da respondem por apenas 2,2% dos
fundos globais destinados para pes-
quisa em saúde (WHO, 1996, p. 218).
Certamente esse problema alocativo
é resultado imediato da inexistên-
cia de sistemas de inovação com-
pletos nesses países.
Em segundo lugar, como um re-
sultado de um esforço mais abran-
gente realizado pela OMS e pelo Ban-
co Mundial, desenvolveu-se uma
investigação visando criar instru-
mentos para a mensuração de im-
pacto dos agravos à saúde, como
primeiro passo para o planejamen-
to das ações específicas de combate
a estes agravos. O principal indica-
dor é o AVAI (sigla para Anos de Vida
Ajustados por Incapacidade, do in-
glês Disability Adjusted Life Years
– Daly), um indicador absoluto do
nível de saúde de uma população.
Esse novo indicador possui, frente
aos indicadores comumente usados
(tais como Índice de Mortalidade
Infantil ou Expectativa de Vida), a
vantagem de levar em conta todos
os agravos à saúde (doenças, aci-
dentes, condições ambientais e so-
ciais insalubres etc.), sejam eles fa-
tais ou não (MURRAY & LOPEZ, 1996).
A partir desse indicador, outros es-
tudos puderam ser desenvolvidos.
A OMS pôde encontrar, em estudo
sobre pesquisas no setor saúde,
“uma desconexão monumental” en-
tre a carga da doença e os gastos
em pesquisa e desenvolvimento:
enquanto a pneumonia e as doen-
ças diarreicas respondem por 15,4%
da carga da doença (e são as duas
maiores causas de morte no plane-
ta), recebem apenas 0,2% dos recur-
sos para P&D (WHO, 1996, p. xxviii).
Em terceiro lugar, em um desen-
volvimento desses estudos compa-
rativos, uma Comissão da OMS
(WHO, 2001) pôde articular a distri-
buição mundial de doenças e recur-
sos de P&D. O trabalho distingue
3) doenças do tipo III: aquelas ex-
clusiva ou predominantemente con-
centradas em países pobres (várias
doenças tropicais). Doenças do tipo
I contam com P&D público e priva-
do, derivando-se daí novos produ-
tos. Entretanto, muitas vezes a di-
fusão desses produtos para países
pobres é limitada, seja por custos
elevados seja por proteção patentá-
ria. Doenças do tipo II contam com
recursos mais limitados. Por fim,
as doenças de tipo III recebem uma
proporção muito baixa de P&D, e
“essentially no commercial based
R&D in rich countries” (p. 78).
Combinando a carga da doença e
a alocação de P&D, a OMS discute a
“oferta mundial de conhecimento
para lutar contra doenças”: “the ba-
sic principle that R&D tends to de-
cline relative to disease burden in
moving from Type I and Type III di-
seases is a robust empirical finding.
Type II diseases are often termed
negleted diseases and Type III disea-
ses very neglected diseases” (p. 78).
Em quarto lugar, é importante
destacar a iniciativa do Global Fo-
rum for Health Research (GFHR,
2002), talvez uma síntese de todos
os esforços internacionais apresen-
tados nessa seção. O Global Forum
destaca o “10/90 gap”: um hiato en-
tre o gasto com pesquisa em saúde
e a carga da doença. Segundo este
estudo, menos de 10% dos gastos
mundiais em pesquisa em saúde são
dedicados a doenças ou condições
que representam mais de 90% da
entre três tipos de doenças: 1) doen-
ças tipo I, presentes em países ricos
e em países pobres, com populações
vulneráveis expressivas nos dois
conjuntos de países (exemplos: do-
enças transmissíveis como hepatite
B e gripe e doenças não transmissí-
veis como diabete e doenças cardio-
vasculares); 2) doenças tipo II, pre-
sentes em países ricos e países po-
bres, mas com uma proporção subs-
tancial de casos em países pobres
(AIDS e tuberculose são exemplos);
O GLOBAL FORUM
DESTACA O “10/90 GAP”:UM HIATO ENTRE O GASTO
COM PESQUISA EM SAÚDE
E A CARGA DA DOENÇA
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 119
carga mundial da doença (p. 89-91).
Utilizando a classificação da OMS
(WHO, 2001), o Global Forum clas-
sifica doenças tropicais como es-
quistossomose, leishmaniose, onco-
cercose,8 filariose e doenças de Cha-
gas como doenças “muito negligen-
ciadas” (Tipo III).
Esses dados e resultados suge-
rem dois caminhos para nossa dis-
cussão aqui. Em primeiro lugar, eles
indicam a necessidade de a saúde ser
compreendida como um fenômeno
mundial, donde a importância de ini-
ciativas cooperativas internacionais,
envolvendo esforços de pesquisa e
apoio à constituição de sistemas de
saúde (que garantam a efetiva difu-
são das conquistas científicas e tec-
nológicas da humanidade). Em se-
gundo lugar, destacam a importân-
cia do esforço científico interno aos
países em desenvolvimento: perfis
epidemiológicos diferentes determi-
nam diferentes demandas sobre os
sistemas de pesquisa. Ou seja, ne-
nhum país do mundo pode deixar
de participar das redes internacio-
nais de pesquisa e difusão das ino-
vações e nenhum país pode contar
apenas com a difusão passiva de
inovações dos centros mais avança-
dos para resolver os seus problemas
básicos de saúde. Portanto, sistemas
de inovação têm um papel insubsti-
tuível para a saúde.
O perfil epidemiológico do Brasil
distingue-se do perfil de países avan-
çados pela presença dos “problemas
persistentes”, incluindo doenças tro-
picais, e também distingue-se dos
países mais pobres pela presença das
“epidemias emergentes”, envolvendo
doenças não transmissíveis (um ver-
dadeiro “mosaico epidemiológico”).9
fil epidemiológico do país apresenta
demandas muito especiais sobre o
sistema de saúde e sobre a infra-es-
trutura científica. E coloca o país
numa posição muito singular nos
fluxos internacionais de informações
científico-tecnológicas.
METODOLOGIA
Base de Dados
Indicadores de produção científica
Os dados sobre artigos cientí-
ficos foram fornecidos pelo Minis-
tério da Ciência e Tecnologia (MCT)
a partir da base do Institute for
Scientific Information (ISI), com-
posto pelo Science Citation Index
Expanded (SCI), Social Sciences Ci-
tation Index (SSCI) e Arts & Hu-
manities Citation Index (A&HCI).
São utilizados como proxies da
produção científica.
Para analisar a infra-estrutura
científica por país, serão utilizadas
todas as disciplinas referentes ao
sistema nacional de inovação (NSI)
e as disciplinas que se relacionam
ao setor saúde. Das 104 disciplinas
enumeradas pelo ISI, 47 são relaci-
onadas à saúde (ver Quadro 1.A do
8 Novas aplicações de substâncias (em geral inesperadas, como ressaltam GELIJINS et al., 1998) podem, por acaso, ajudar países pobres. Dois
exemplos: um medicamento veterinário da Merck (ivermectin) demonstrou ser eficaz no controle da oncocercose humana, um medicamento
da Pfizer (Zithromax) contra chlamidia mostrou-se eficaz contra o tracoma (Financial Times, November 11, 1998, p. 4).
9 BUCK et al. (1988) distinguem três estágios na evolução dos padrões de doenças: 1) estágio marcado por doenças infecciosas, associadas à
pobreza, má nutrição, falta de saneamento etc.; 2) doenças degenerativas, como doenças cardíacas e câncer; 3) problemas derivados de
poluição ambiental e problemas em famílias, comunidades e locais de trabalho que levam à violência, abuso de drogas, alcoolismo etc. Os
países desenvolvidos teriam passado por esses três estágios ao longo de um século, enquanto os países em desenvolvimento devem enfrentá-
las de uma só vez. Daí a menção ao “verdadeiro mosaico epidemiológico” (p. ix).
Por isso, o Brasil é um país que ne-
cessita de um sistema de saúde que
dê conta, simultaneamente, de lidar
com doenças degenerativas e com
doenças parasitárias. Portanto, o per-
SISTEMAS DE
INOVAÇÃO TÊM
UM PAPEL INSUBSTITUÍVEL
PARA A SAÚDE
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
120 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
anexo). As informações estão dispo-
níveis para o período de 2001 e in-
cluem 118 países para esse ano.
Indicadores de produção
tecnológica
O documento das patentes (soli-
citadas e concedidas) encontradas
no site do United States Patent and
Trademark Office (USPTO) contém as
informações utilizadas para a ela-
boração das bases de dados. Entre
essas informações está a classe tec-
nológica da patente. Existe uma
classificação internacional de paten-
tes preparada pela Organização
Mundial de Propriedade Intelectual
(OMPI, cujo site é www.wipo.org),
que possui diversos níveis de desa-
gregação: seções, subseções, clas-
ses e subclasses. São oito seções e
mais de 600 subclasses. Se, por um
lado, a alta desagregação das sub-
classes dificulta a análise por sepa-
rar tecnologias relacionadas, por
outro lado, a forma como a agrega-
ção é feita nos níveis de seção e sub-
seção tem a finalidade de atender às
necessidades dos escritórios de pa-
tentes e não de viabilizar análises
acadêmicas no campo da economia
da ciência e tecnologia.
Para superar esses problemas,
uma iniciativa do Observatoire des
Sciences et des Techniques (OST,
2000) propôs uma forma de agrega-
ção em seis domínios tecnológicos
e em 30 subdomínios tecnológicos.
O trabalho proposto pelo OST parte
da classificação internacional da
Organização Mundial de Proprieda-
de Intelectual, mas os agrega, com o
auxílio de especialistas das diversas
áreas, de forma a viabilizar informa-
ções para o formulador de políticas
e para o analista da área de econo-
mia da tecnologia. O “algoritmo” da
agregação, proposto pelo OST pode
ser encontrado em publicação da
entidade (OST, 2000, p. 409).
A classificação das patentes por
domínios e subdomínios tecnológi-
cos, por exemplo, oferece uma visão
sobre patentes foi feita por país do
inventor e os dados estão disponíveis
no endereço www.uspto.gov.
Sumarizando, em relação aos in-
dicadores de C&T, justifica-se o uso
de artigos publicados e de patentes
neste trabalho (em vez de indicado-
res derivados de artigos e patentes)
porque a observação simultânea des-
sas variáveis é importante para ana-
lisar as conexões entre C&T e para
formular modelos sobre processos
inovativos (SCHMOCH, 1997).
Indicador de crescimento
econômico
A literatura econômica que en-
fatiza o papel da C&T na determina-
ção do crescimento econômico é
ampla (PAVITT, 1991; ROSENBERG, 1990;
KLEVORICK e cols., 1995; NARIN e cols.,
1997; FREEMAN & SOETE, 1997). Na
verdade, as relações entre crescimen-
to econômico e desenvolvimento ci-
entífico são muito mais recíprocas
do que unidirecionais, já que a or-
dem de determinação é bilateral.
Essa concepção é válida, sobretu-
do, para países avançados que já
atingiram certo grau de interação
entre ambas as esferas.
O indicador de crescimento eco-
nômico é a renda, medida por pari-
dade do poder de compra, cuja fon-
te é o World Development Indica-
tors, 2003, disponível em CD-ROM.
Considerando que a análise realiza-
da conta com vários países, perten-
centes a diferentes estágios de de-
senvolvimento, o indicador de ren-
sobre o setor a que pertence a paten-
te. O levantamento de dados sobre
patentes para o setor saúde incluirá
os subdomínios tecnológicos relati-
vos à engenharia médica, química
orgânica, química macromolecular,
produtos farmacêutico-cosméticos e
biotecnologia. Com essa classifica-
ção, uma das maiores lacunas dos
estudos que utilizam estatísticas de
patentes pôde ser contornada. Isso é
especialmente importante para estu-
dos da área de saúde. A pesquisa
AS RELAÇÕES ENTRE CRESCIMENTO
ECONÔMICO E DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO
SÃO MUITO MAIS RECÍPROCAS DO QUE
UNIDIRECIONAIS, JÁ QUE A ORDEM DE
DETERMINAÇÃO É BILATERAL
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 121
da será utilizado sob o enfoque da
paridade do poder de compra.
RESULTADOS
Limiares de produção científica em saúde
O objetivo desta seção é compa-
rar o resultado sobre a existência
de limiares de produção científica
do sistema setorial em saúde com o
do sistema de inovação proposto por
BERNARDES e ALBUQUERQUE (2003). Como
apresentado na seção 1, um modelo
é utilizado para descrever a relação
entre ciência, tecnologia e cresci-
mento econômico. A hipótese é de
que as interações entre C&T são
importantes desde o início do pro-
cesso de desenvolvimento. Essas
interações possuem diferentes carac-
terísticas vis-à-vis dos estágios de
desenvolvimento em que os países
se encontram (p. 868).
Conforme explicitado, os países
que pertencem ao regime I não pro-
duzem ciência e/ou tecnologia, ex-
pressas pelos indicadores de artigos
e patentes, respectivamente. Os paí-
ses pertencentes ao regime II possu-
em artigos e patentes. Porém, sua
produção científica encontra-se abai-
xo do limiar de produção científica e
eles são considerados tecnologica-
mente imaturos. Há alguma intera-
ção entre ciência e crescimento e en-
tre tecnologia e crescimento, mas o
sentido de determinação é unidireci-
onal, o que significa que o cresci-
mento econômico não contribui de
forma decisiva para ampliar a infra-
estrutura científico-tecnológica. Por
fim, os países que participam do re-
gime III possuem capacidade cientí-
fico-tecnológica consolidada. As in-
terações entre C&T e crescimento eco-
nômico são recíprocas e os países são
considerados maduros em termos do
sistema nacional de inovação.
A análise de BERNARDES e ALBUQUER-
QUE (2003) sugere que
“Quando o regime muda, o núme-
ro de canais de interação entre infra-
estrutura científica, produção tecno-
Linearizada, a equação acima re-
sulta em:
Onde:
a = ln b0;
ln P* = log natural de patentes per capita;
ln A* = log natural de artigos per capita.
Os autores ajustaram duas linhas
compatíveis com duas regiões bem
definidas graficamente. A interseção
entre as duas linhas ocorreu no pon-
to onde A* era equivalente a 150 arti-
gos per capita. Este foi considerado o
“limiar” que identifica a transição do
regime II para o III. Assim, os países
abaixo e à esquerda desse ponto per-
tencem ao regime II e os que ficam
acima e à direita participam do regi-
me III. O gráfico 1 ilustra o limiar de
produção científica para o conjunto
de países que compõem o NSI.
Dando continuidade à análise pre-
cedente, esta seção visa testar a hi-
pótese de existência de um limiar
de produção científica para o siste-
ma de inovação em saúde. Os paí-
ses que fazem parte do regime I não
foram considerados na análise de
cluster por não possuírem artigos
e/ou patentes em saúde. Os 71 paí-
ses pertencentes aos regimes II e III
foram agrupados por meio de clus-
ters hierárquicos, tendo como vari-
áveis as quantidades de patentes per
lógica e crescimento econômico tam-
bém se modifica. Quando o país evo-
lui, mais conexões são ligadas e mais
interações passam a operar. O regime
III é aquele em que todas as conexões
e interações são realizadas.” (p. 875)
A questão investigada passa a ser:
separar os países que fazem parte dos
regimes II e III e, com isso, detectar o
limiar da produção científica.
Para definir o "limiar", os auto-
res propõem um modelo não linear
do tipo:
iueAP 1
0β
β∗∗
= (1.a)
iuAP ++=∗lnlnln 10
*ββ
iuAP ++=∗∗ lnln 1βα
(1.b)
(1.c)
AS INTERAÇÕES ENTRE
C&T SÃO IMPORTANTES
DESDE O INÍCIO DO PROCESSO
DE DESENVOLVIMENTO
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
122 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
capita e de artigos científicos per
capita para o ano de 2001.
Após classificar os países de
acordo com o regime a que per-
tencem, o modelo para o sistema
de inovação proposto por BERNAR-
DES e ALBUQUERQUE (2003) e adapta-
do por SILVA (2003) será testado
para o setor saúde.
A equação estimada é similar à
equação proposta por BERNARDES e AL-
BUQUERQUE (2003), à qual acrescentou-
se uma variável dummy de inclinação.
Onde:
ln P* = log natural de patentes per capita;
ln A* = log natural de artigos per capita.
0,90 (significativo no nível de 1%),
indica que um aumento de 1% na
quantidade de artigos publicados
eleva a quantidade de patentes em
cerca de 0,90%. Por outro lado, para
os países pertencentes ao regime III,
a elasticidade foi de 1,13 (correspon-
dente à soma de β1 e β2), significan-
do que um aumento de 1% na quan-
tidade de artigos aumenta a produ-
ção de patentes em cerca de 1,13%.
O limiar de produção científica
para o setor saúde foi identificado
através da mudança estrutural, ex-
pressa pela variável dummy de incli-
nação (DA3). Esta define claramente
dois padrões distintos de comporta-
mento relativos aos países que fazem
parte do regime II, representados pela
reta menos inclinada, e aos países do
regime III, representados pela reta
mais inclinada, conforme o Gráfico 2.
Por hipótese, a produção tecno-
lógica, a partir da produção cientí-
fica, é maior entre os países perten-
centes ao regime III relativamente
aos países do regime II. Isso signifi-
ca que os países do regime III con-
seguem produzir uma patente com
uma quantidade média de artigos
menor que a média produzida pelos
países do regime II, pois estes não
conseguiram obter massa crítica
suficiente para ultrapassar o limiar
de produção científica.
Os resultados encontrados nes-
te artigo foram similares aos encon-
trados por SILVA (2003) e por BER-
NARDES e ALBUQUERQUE (2003) em ter-
mos da existência de limiares de
DA3 = variável dummy D3 multiplicada
pela produção científica dos países do regi-
me III. Expressa mudança de inclinação ou
mudança estrutural.
Os resultados das estimativas
são apresentados na Tabela 1.
O melhor resultado refere-se ao
modelo estimado com duas variá-
veis dummies para os outliers: DP
para os outliers positivos, El Sal-
vador e Cazaquistão; e DN para o
outlier negativo, Indonésia. A intro-
dução das dummies para os outli-
ers foram úteis para modelar as ca-
racterísticas fixas desses países, as
quais não estavam no modelo. O R2
ajustado foi de 0,90. O valor esti-
mado para a elasticidade do regime
II, expresso pelo coeficiente β1, foi
GRÁFICO 1 – Artigos por milhão de habitantes (A*) x patentes por milhão de habitantes (P*) em1998. Dois subconjuntos são representados por diferentes símbolos e duas funções potência ajustamos subconjuntos. (em escala logarítmica)
Fonte: BERNANDES & ALBUQUERQUE (2003).
iuDAAP +++=∗∗ 3lnln 21 ββα
(1.d)
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 123
produção científica para o NSI em
saúde e para o NSI. A existência de
um limiar de produção científica
significa que os países conseguem
obter massa crítica em termos ci-
entíficos e, conseqüentemente, há
maior articulação entre as esferas
científica e tecnológica.
Dadas as características do setor
saúde, o ponto central é avaliar o
salto científico e tecnológico neces-
sário para que os países do regime II
possam ingressar no regime III. O
Gráfico 2 permite visualizar essa
questão. Em primeiro lugar, não foi
detectada interseção entre os dois
regimes e sim uma descontinuidade
na produção científico-tecnológica
entre ambos. Em segundo lugar, a
trajetória das retas representativas
dos regimes II e III não é convergen-
te. Isso ilustra a dificuldade cada vez
maior que os países do regime II en-
frentarão para alcançar um estágio
de desenvolvimento mais avançado,
caso não haja investimentos em C&T.
Uma consideração importante a
ser feita é que o limiar de produção
científica varia ao longo do tempo,
sendo identificado como um concei-
to dinâmico. Analisando o NSI total,
ALBUQUERQUE (2004, p. 9) sugere que:
“A investigação do comportamen-
to dos dados para outros anos (1974,
1982 e 1990) indica um padrão simi-
lar de cross-over, mas sugere que o
limiar tem se movimentado ao longo
do tempo: em 1974, sete artigos por
milhão de habitantes; em 1982, 28;
e em 1990, 60. Essa movimentação
do limiar pode ser interpretada como
uma indicação do aumento das exi-
gências em termos de infra-estrutura
científica para processos de catching
up, na medida que o tempo passa e o
sistema capitalista se desenvolve.”
A principal conclusão que se pode
tirar é de que há um limiar de pro-
dução científica para o setor saúde,
como ocorre para o sistema de ino-
vação como um todo (conforme os
resultados encontrados por SILVA
(2003), BERNARDES e ALBUQUERQUE
(2003)), pois foi detectada mudança
estrutural em termos da infra-estru-
tura científico-tecnológica. O “limi-
ar” é importante para demarcar o
esforço de produção acima do qual
o país estaria ingressando em um
novo regime, o que possibilita mai-
or eficiência em termos das conexões
entre C&T. No entanto, dada a des-
continuidade científico-tecnológica
para o setor, os países do regime II
teriam de realizar maior esforço para
ultrapassar o limiar, relativamente
aos países pertencentes a esse regi-
me e que compõem o NSI. Além do
aumento de sua produção científica,
os canais de conexões entre as vári-
as instituições componentes do sis-
tema de inovação precisam ser arti-
culados, para integrar as universi-
dades e institutos de pesquisa com o
complexo médico-industrial, através
de políticas industriais que incenti-
vem o setor produtivo.
Especialização científica em saúde
Uma medida importante para si-
tuar a produção científica do país é o
índice de especialização científica (Sci-
entific Revealed Comparative Advan-
tage – SRCA) proposto por LATTIMORE e
REVETZ (1996). Esse índice compara a
produção científica do país em uma
TABELA 1 – Equação de produção tecnológica para o sistema de inovação em saúde – paísespertencentes aos regimes II e III, 2001
Fonte: elaboração própria
(1) Modelo clássico de regressão – estimado pelo método dos mínimos quadrados ordinários (MQO).
*** significativa a 1%
** significativa a 5%
* significativa a 10%
Variáveis (1) (1)
Ait 0.81*** 0.90***
DA3 0.27*** 0.23***
DP – 2.90***
DN – -1.34*
C -3.74*** -4.11***
R2 (ajd.) 0.87 0.90
Teste de White 33.30 7.90
ititit NDPDADAP εββββα +++++= 43210 )3()(
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
124 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
sdisciplinadetotalmundosdisciplinadetotali
jmundoij
PP
PPSRCA
,,
,
/
)/(=
Onde:
SRCA = índice de especialização (Scientific Revealed Comparative Advantage);
P = artigos científicos;
i = país;
j = disciplina.
dada disciplina com a produção ci-
entífica mundial nessa mesma disci-
plina. Segundo os autores:
“Um país possui vantagem com-
parativa em um campo se a partici-
pação das publicações ou do núme-
ro de citações naquele campo for
maior que a participação das publi-
cações ou citações do mundo naque-
le campo. Então, se a medida for
maior que a unidade há vantagem
comparativa, se a medida ficar abai-
xo da unidade não há vantagem
comparativa.” (p. 9-10)
De acordo com PIANTA & ARCHI-
BUGI (1991), a especialização cor-
relaciona-se inversamente com o
volume de produção científica.
Isso significa que “países com tra-
dição científ ica estabelecida
(como EUA e Reino Unido) têm um
grau de especialização científica
menor que o esperado, o que su-
gere maior diversificação da pes-
quisa científica” (p. 341).
GRÁFICO 2 – Saúde geral – artigos e patentes (por milhão de habitantes), 2001.
Fonte: ISI, USPTO, elaboração própria.
As siglas de alguns países selecionados são dadas a seguir: IN (Índia); BR (Brasil); ZA (África do Sul); KR (Coréia do Sul); TW (Taiwan); IE (Irlanda); JP (Japão); USA
(Estados Unidos); CH (Suíça); SE (Suécia).
O índice de especialização é
calculado de acordo com a fór-
mula a seguir (LATTIMORE; REVETZ,
1996. p. 15):
Através do cálculo do SRCA, os
autores propõem uma tipologia em
termos de especialização científi-
ca para os países, classificando-
os segundo quatro padrões distin-
tos: industrial, saúde, recursos na-
turais e misto.
A partir do trabalho de LATTIMORE
& REVETZ (1996), ALBUQUERQUE (2004,
p. 18-19) calcula o índice de espe-
cialização para 118 países, fazen-
do uma adaptação: os cálculos são
efetuados para artigos indexados
ao ISI e não para citações.
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 125
Em primeiro lugar, em decor-
rência da identificação dos limia-
res de produção científica e da di-
visão dos países em três grandes
grupos para o NSI, foi possível
relacionar a infra-estrutura cientí-
fica com o padrão de distribuição
“Essa especialização possivel-
mente tem uma determinação no
peso e na sofisticação do sistema de
bem-estar social da Suécia, que deve
ter um forte padrão de interação com
o sistema de inovação, intermedia-
do pela infra-estrutura científica”
(ALBUQUERQUE, 2004. p. 19-20).
Esse também é o padrão de espe-
cialização da Finlândia e da Dinamar-
ca. A Noruega, apesar de possuir ele-
vada especialização em saúde, apre-
sentou, em 2001, especialização em
outras disciplinas: ciências aquáti-
cas, geol./petrol./ engenharia de mi-
nas; meio ambiente/ecologia; ciência
animal e engenharia civil.
Coréia do Sul e Taiwan (Tabelas 5
e 6, respectivamente) conseguiram
realizar o processo de catching up ao
longo das décadas de 1980 e 1990.
Caracterizados por possuírem sistemas
de inovação maduros sem ênfase em
saúde, esses países apresentaram es-
pecialização científica em diversas dis-
ciplinas relacionadas à engenharia e
atividades industriais, sendo classifi-
cados como tipicamente industriais.
O Brasil foi classificado como
misto, com viés para o setor médi-
co, por não apresentar concentra-
ção em grupos homogêneos de dis-
ciplinas (conforme Tabela 7). Ape-
sar de o setor saúde representar
38,23% da produção científica na-
cional, em termos mundiais não
possui vantagem comparativa
quando tratado em termos agrega-
dos,10 pois seu índice de especiali-
da produção de artigos entre as
diversas disciplinas.
À medida que a infra-estrutura
científica se amplia, melhora a dis-
tribuição do SRCA entre as diversas
disciplinas. Isso significa que os
países do regime III, situados aci-
1981 2001 Regime
Média Variância Média Variância I 34,05 10547,11 8,23 56,83 II 5,43 109,06 2,94 20,58 III 0,55 0,15 0,37 0,08
TABELA 2 – Índice de especialização científica – SRCA (média e variância)
Fonte: Albuquerque, 2004.
ma do limiar de produção científi-
ca, possuem SRCA médio mais bai-
xo, tanto em 1981 quanto em 2001,
indicando que a produção científi-
ca é bem distribuída entre as di-
versas disciplinas. Os países do re-
gime II, que estão abaixo do limi-
ar de produção científica, apresen-
tam maior concentração científica
com maior número de publicações
em um conjunto menor de disci-
plinas. Seu SRCA médio é superior
ao dos países do regime III. Final-
mente, os países do regime I, que
apresentam apenas produção cien-
tífica, mas não possuem patentes
depositadas no USPTO, têm os mai-
ores SRCA médios.
Em segundo lugar, Albuquerque
seleciona um conjunto de países e
lista todas as disciplinas com SRCA
superiores a 1,5.
Os Estados Unidos possuem a
infra-estrutura científica mais de-
senvolvida e completa do mundo,
mas não há concentração em ne-
nhum setor científico, o que justi-
fica sua baixa especialização (con-
forme Tabela 3, em 2001, direito e
comunicação, com SRCA de 2,8 e
2,1, apresentaram as maiores es-
pecializações). Por isso, foram ca-
racterizados como tendo especia-
lização mista. As disciplinas que
apresentaram maior SRCA relacio-
nam-se às ciências sociais aplica-
das e às humanas.
Quanto aos países nórdicos, é
nítida a especialização em saúde:
as disciplinas relacionadas a esse
setor apresentam os maiores SRCA.
No caso da Suécia, como pode ser
visto na Tabela 4, todas as disci-
plinas com SRCA superior a 1,5 são
relacionadas à saúde.
10 Quando o setor é desagregado, algumas disciplinas apresentam vantagem comparativa.
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
126 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
TABELA 4 – Especialização científica para Suécia – 1981, 1991 e 2001
Fonte: ISI, MCT, Albuquerque, E. M. (2004).
TABELA 3 – Especialização científica para os EUA – 1981, 1991 e 2001
Fonte: ISI, MCT, Albuquerque, E. M. (2004).
1981 1991 2001 Disciplina SCRA Disciplina SCRA Disciplina SCRA
Direito 2,156 Direito 2,326 Direito 2,887 Comunicação 2,046 Comunicação 2,313 Comunicação 2,138 Reabilitação 1,891 Reabilitação 2,042 Serviço social e Política social 2,042 Artes 1,713 Administração 1,782 Bibliot. e Ciên. Informação 1,993 Serviço social e Política social 1,700 Artes 1,776 Reabilitação 1,993 Educação 1,659 Bibliot. e Ciên. Informação 1,751 Artes 1,930 Saúde pública e Ciência da saúde 1,652 Ciência da saúde e Serviços 1,684 Educação 1,880 Administração 1,637 Educação 1,652 Saúde pública e Ciência da saúde 1,863 Psicologia 1,605 Serviço social e Política social 1,647 Literatura 1,843 Arte e Arquitetura 1,546 Arte e Arquitetura 1,645 Arte e Arquitetura 1,827 Literatura 1,510 Saúde pública e Ciência da saúde 1,627 Psicologia 1,782 Economia 1,507 Economia 1,610 Sociologia e Antropologia 1,729
Psicologia 1,604 Filosofia 1,726 Sociologia e Antropologia 1,600 Ciência política e Adm. pública 1,710 Eng. Aeroespacial 1,568 Religião e Teologia 1,644 Literatura 1,538 Clínica geral 1,617
Ciência da saúde e Serviços 1,565 Eng. aeroespacial 1,546
Economia 1,539
1981 1991 2001 Disciplina SCRA Disciplina SCRA Disciplina SCRA
Clin. Imunológica e Doenças Infec. 4,585 Dentística, Cir. Oral e Medicina 3,611 Dentística, Cir. Oral e Medicina 2,522 Fisiologia 4,270 Clin. Imunológica e Doenças Infec. 2,532 Med. Ambiental e Saúde Pública 2,246 Dentística, Cir. Oral e Medicina 3,103 Fisiologia 2,227 Saúde Pública e Ciência da Saúde 2,079 Imunologia 2,851 Otorrinolaringologia 2,085 Endocr., Nutrição e Metabolismo 2,069 Medicina Reprodutiva 2,722 Pesq. médica, órgãos e sistmeas 2,079 Ortopedia 1,991 Cirurgia 2,562 Imunologia 2,030 Fisiologia 1,744 Reumatologia 2,501 Ortopedia 1,987 Reumatologia 1,667 Urologia 2,423 Med. Ambiental e Saúde Pública 1,954 Clin. Imunológica e Doenças Infec. 1,566 Dermatologia 2,366 Endocr., Nutrição e Metabolismo 1,793 Imunologia 1,559 Ortopedia 2,357 Pediatria 1,693 Farmacologia/Toxicologia 1,545 Pesq. médica, órgãos e sistmeas 2,312 Oncologia e Pesquisa sobre Câncer 1,666 Oncologia e Pesquisa sobre Câncer 1,510 Farmacologia/Toxicologia 2,227 Clínica em Psicologia e Psiquiatria 1,664 Anestesiologia 2,078 Reumatologia 1,627 Otorrinolaringologia 2,037 Gastroenterologia e Hepatologia 1,627 Pesq., med. lab. e tecnologia méd. 1,875 Neurociência e Comportamento 1,592 Radiologia, Med. Nuclear e Imagens 1,671 Urologia 1,536 Neurologia 1,637 Endocr., Nutrição e Metabolismo 1,635 Pediatria 1,593 Gastroenterologia e Hepatologia 1,593
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 127
Fonte: ISI, MCT, Albuquerque, E. M. (2004).
TABELA 5 – Especialização científica para Coréia do Sul – 1981, 1991 e 2001
TABELA 6 – Especialização científica para Taiwan – 1981, 1991 e 2001
Fonte: ISI, MCT, Albuquerque, E. M. (2004).
1981 1991 2001 Disciplina SCRA Disciplina SCRA Disciplina SCRA
Ciência Política e Adm. Pública 7,716 Al., robótica e cont. de automação 6,399 Engenharia Mgmt/Geral 5,290 Agricultura/Agronomia 4,437 Engenharia Mecânica 4,332 Engenharia Elétrica e Eletrônica 3,744 Matemática 3,594 Engenharia Elétrica e Eletrônica 4,177 Tecnol. da Inform. e Comunicação 3,166 Tecnol. da Inform. e Comunicação 3,307 Eng. Aeroespacial 3,647 Al., robótica e cont. de automação 2,969 Engenharia Química 2,913 Ciência Política e Adm. Pública 3,229 Ciência da Computação e Engenharia 2,935 Clin. Imunológica e Doenças Infec. 2,762 Tecnol. da Inform. e Comunicação 3,102 Engenharia Mecânica 2,813 Al., robótica e cont. de automação 2,757 Ciência de Materiais e Engenharia 3,099 Engenharia Civil 2,278 Ciência dos animais 2,742 Ciência da Computação e Engenharia 2,926 Ótica 2,229 Biotecnologia e Mricorb. Aplicada 2,709 Engenharia Civil 2,733 Ciência de Materiais e Engenharia 2,161 Engenharia Nuclear 2,163 Eng. Matemática 2,557 Eng. Matemática 2,072 Química Inorgânica e Nuclear 2,095 Metalurgia 2,425 Engenharia Química 1,853 Química 2,012 Engenharia Química 2,367 Engenharia Ambiental/Energia 1,852 Ciência das plantas 1,996 Fís. aplicada, mat. cond., ciênc. mat.... 2,113 Eng. Aeroespacial 1,821 Ciência dos animais e das plantas 1,993 Engenharia Ambiental/Energia 2,079 Química agrícola 1,606 Farmacologia e Toxicologia 1,955 Química org./ ciênc. de pol. 2,039 Fís. aplicada, mat. cond., ciênc. mat.... 1,520 Engenharia Elétrica e Eletrônica 1,947 Gastroenterologia e Hepatologia 1,708 Ciência de Materiais e Engenharia 1,885 Ótica 1,685 Entomologia 1,864 Química agrícola 1,617 Fís. aplicada, mat. cond., ciênc. mat. 1,787 Química 1,612 Psicologia 1,638
1981 1991 2001 Disciplina SCRA Disciplina SCRA Disciplina SCRA
Biotecnologia e Mricorb. Aplicada 15,406 Química 4,241 Tecnol. da Inform. e Comunicação 3,135 Arte e Arquitetura 9,399 Metalurgia 4,188 Ciência de Materiais e Engenharia 3,023 Al., robótica e cont. de automação 8,818 Biotecnologia e Mricorb. Aplicada 3,608 Engenharia Mecânica 2,933 Eng. Matemática 5,783 Ciência de Materiais e Engenharia 3,501 Engenharia Elétrica e Eletrônica 2,639 Metalurgia 5,216 Al., robótica e cont. de automação 3,410 Engenharia Química 2,308 Tecnol. da Inform. e Comunicação 4,232 Engenharia Mecânica 3,307 Biotecnologia e Mricorb. Aplicada 2,299 Química 3,888 Engenharia Nuclear 3,222 Metalurgia 2,251 Estudos Ambientais, Geog. e Desenv. 2,986 Engenharia Química 3,120 Fís. aplicada, mat. cond., ciênc. mat. 2,186 Dermatologia 2,498 Engenharia Elétrica e Eletrônica 2,979 Engenharia Mgmt/Geral 2,170 Med. Ambiental e Saúde Pública 2,441 Química org./ ciênc. de pol. 2,788 Al., robótica e cont. de automação 1,976 Engenharia Mgmt/ Geral 2,418 Fís. aplicada, mat. cond., ciênc. mat. 2,711 Química org./ciênc. de pol. 1,744 Fís. aplicada, mat. cond., ciênc. mat. 2,202 Engenharia Mgmt/Geral 2,680 Química 1,738 Filosofia 2,165 Engenharia Ambiental/Energia 2,611 Engenharia Nuclear 1,735 Agricultura/Agronomia 2,163 Radiologia, Med. Nuclear e Imagens 2,359 Radiologia, Med. Nuclear e Imagens 1,665 Engenharia Nuclear 2,050 Tecnol. da Inform. e Comunicação 2,238 Engenharia Civil 1,538 Clin. Imunológica e Doenças Infec. 1,964 Comunicação 2,026 Eng. Aeroespacial 1,500 Física 1,916 Engenharia Civil 1,866 Ciência de Materiais e Engenharia 1,876 Eng. Aeroespacial 1,675 Engenharia Mecânica 1,742 Ciência da Computação e Engenharia 1,532 Ciência Política e Adm. Pública 1,702 Engenharia Ambiental/Energia 1,630 Farmacologia/Toxicologia 1,568 Ótica 1,551 Química org./ ciênc. de pol. 1,519
CHAVES, Catari Vilela; ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta e & MORO, Sueli
128 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
zação (0,84) está abaixo da unida-
de. No extremo oposto, têm-se a
agricultura e a agronomia, apresen-
tando vantagem comparativa em ní-
vel mundial, com o maior índice de
especialização científica do país (3,97).
Entre as 47 disciplinas que compõem
o setor saúde (ver Quadro 1.A do ane-
xo), 11 apresentam índice de especia-
lização superior à unidade em 2001,
revelando vantagem comparativa no
nível mundial: dentística, cirurgia oral
e medicina; biologia; entomologia; bi-
otecnologia e microbiologia aplicada;
pesquisa médica e tópicos gerais; mi-
crobiologia; medicina ambiental e saú-
de pública; farmacologia e farmácia;
clínica imunológica e doenças infec-
ciosas; biologia molecular e genéti-
ca; saúde pública e ciência da saúde.
De acordo com ALBUQUERQUE
(2004. p. 20) “possivelmente, em
processos de catching up, uma am-
pliação transitória da concentra-
ção em algumas áreas científicas
pode ser necessária (essa teria sido
uma das características do proces-
so de catching up na Coréia do Sul
e Taiwan)”. A análise da especiali-
zação científica do Brasil sugere a
necessidade de investimentos em in-
fra-estrutura científica de maneira
geral. Mas, num primeiro momen-
to, para facilitar o processo de ca-
tching up, seria interessante forta-
lecer áreas em que o país possui
vantagens comparativas, como
agricultura e ciências da saúde.
Isso possibilitaria ao país transpor
o limiar de produção científica e in-
gressar em um regime no qual as
interações entre ciência e tecnolo-
gia são mais eficientes.
CONCLUSÕES
A análise do sistema de inovação
setorial em saúde evidenciou a ocor-
rência de quebra estrutural na rela-
ção entre as dimensões científica e
tecnológica para o setor, de forma
similar à que ocorre com o sistema
nacional de inovação em geral. Essa
quebra estrutural representa o “limi-
ar de produção científica” requerido
para se atingir maior eficiência na
produção tecnológica. A partir desse
ponto o país consegue formar mas-
sa crítica em termos de pesquisa, de
modo que sua produção científica
possa ser canalizada e transforma-
da em produção tecnológica.
De forma distinta do NSI total,
para o setor saúde não houve inter-
seção entre os dois regimes e sim
descontinuidade na produção cientí-
fico-tecnológica. Esse resultado ilus-
tra a dificuldade que os países do
regime II terão para atingir estágios
mais avançados em termos de C&T,
pois a distância que separa os dois
regimes torna-se cada vez maior.
TABELA 7 – Especialização científica para Brasil – 1981, 1991 e 2001
Fonte: ISI, MCT, Albuquerque, E. M. (2004).
1981 1991 2001 Disciplina SCRA Disciplina SCRA Disciplina SCRA
Med. Ambiental e Saúde Pública 4,824 Agricultura/Agronomia 5,914 Agricultura/Agronomia 3,976 Biologia Molecular e Genética 3,714 Biologia 5,128 Dentística, Cir. Oral e Medicina 3,234 Multidisciplinar 3,265 Pesquisa Médica e Tópicos Gerais 4,078 Biologia 2,761 Biologia 3,238 Saúde Pública e Ciência da Saúde 3,574 Entomologia 2,482 Ciência dos animais 2,502 Ciência espacial 3,512 Biotecnologia e Mricorb. Aplicada 2,196 Química agrícola 2,387 Biologia Experimental 2,544 Pesquisa Médica e Tópicos Gerais 2,167 Entomologia 2,131 Biologia Molecular e Genética 2,287 Física 1,871 Ciência dos animais e das plantas 1,906 Med. Ambiental e Saúde Pública 2,238 Química agrícola 1,722 Espect./instrumentação e ciênc. anal. 1,871 Física 2,167 Espect./instrumentação e ciênc. anal.... 1,704 Al., robótica e cont. de automação 1,854 Biotecnologia e Mricorb. Aplicada 1,965 Ciência dos alimentos/nutrição 1,529 Fís. aplicada, mat. cond., ciênc. mat. 1,773 Geol/Petrol/Eng. de Minas 1,526 Ciência espacial 1,768 Física 1,740 Agricultura/Agronomia 1,671 Pesquisa Médica e Tópicos Gerais 1,531
Clusters e limiares de produção científico-tecnológica: Uma comparação entre C&T em geral e em saúde
Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007 129
Apesar de a produção de arti-
gos do setor saúde no Brasil res-
ponder por 38% da produção total
de artigos, o país não possui espe-
cialização científica em saúde em
termos agregados (SRCA = 0,84),
mas para 11 disciplinas componen-
tes do setor. O Brasil é classificado
como possuindo um sistema mis-
to, com viés para o setor saúde, por
não apresentar especialização cien-
tífica em grupos similares de dis-
ciplinas. Esses dados reforçam o
resultado da análise de cluster, que
classifica o Brasil entre o grupo de
países que possuem sistemas de
inovação imaturos ou maduros sem
ênfase em saúde, pertencente ao
regime II e, portanto, situado abai-
xo do “limiar”. É possível que a
ausência de ênfase sobre o setor
saúde tenha como conseqüência
piorar a situação do país no que
diz respeito à saúde mental, deixan-
do-o entre os países do regime I –
que possuem produção científica
em saúde mental, mas não produ-
ção tecnológica. Segundo CHAVES e
ALBUQUERQUE (2004. p. 19), “na ava-
liação dos dados internacionais,
percebe-se a existência de um du-
plo movimento na medida que os
países passam para níveis mais
desenvolvidos: por um lado, cresce
a produção científica de forma sig-
nificativa, por outro lado cresce
também a ênfase dada ao setor saú-
de”. Esses movimentos abrem a
possibilidade de os países, inclu-
indo o Brasil, construírem seus pro-
cessos de catching up enfatizando
o setor saúde. Por analogia, espe-
ra-se que a saúde mental seja tam-
bém beneficiada, caso ocorra o for-
talecimento do setor saúde.
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132 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 37, p. 110-132, janeiro 2007
ANEXO
QUADRO 1A – Disciplinas científicas1
Administração; agricultura/agronomia; al, robótica e cont. auto.; anestesiologia anestesiologia anestesiologia anestesiologia anestesiologia; arqueologia; arte e arquitetura; artes; biblioteconomia e ciência da informação; biologia;biologia;biologia;biologia;biologia;
biologia celular e do desenvolvimento; biologia experimental; biologia molecular e genética; bioquímica e biofísica; biotecnologia e microbiologiabiologia celular e do desenvolvimento; biologia experimental; biologia molecular e genética; bioquímica e biofísica; biotecnologia e microbiologiabiologia celular e do desenvolvimento; biologia experimental; biologia molecular e genética; bioquímica e biofísica; biotecnologia e microbiologiabiologia celular e do desenvolvimento; biologia experimental; biologia molecular e genética; bioquímica e biofísica; biotecnologia e microbiologiabiologia celular e do desenvolvimento; biologia experimental; biologia molecular e genética; bioquímica e biofísica; biotecnologia e microbiologia
aplicada; aplicada; aplicada; aplicada; aplicada; ciência da computação e engenharia; ciência da saúde e serviços;ciência da saúde e serviços;ciência da saúde e serviços;ciência da saúde e serviços;ciência da saúde e serviços; ciência das plantas; ciência de alimentos/nutrição; ciência dos animais; ciência dos animais
e das plantas; ciência dos materiais e engenharia; ciência espacial; ciência política e administração pública; ciências aquáticas; ciências da terra; cirurgia; clínica em psicologiacirurgia; clínica em psicologiacirurgia; clínica em psicologiacirurgia; clínica em psicologiacirurgia; clínica em psicologia
e psiquiatria; clínica geral; clínica imunológica e doenças infecciosas;e psiquiatria; clínica geral; clínica imunológica e doenças infecciosas;e psiquiatria; clínica geral; clínica imunológica e doenças infecciosas;e psiquiatria; clínica geral; clínica imunológica e doenças infecciosas;e psiquiatria; clínica geral; clínica imunológica e doenças infecciosas; comunicação; dentística, cirurgia oral e medicina; dermatologia;dentística, cirurgia oral e medicina; dermatologia;dentística, cirurgia oral e medicina; dermatologia;dentística, cirurgia oral e medicina; dermatologia;dentística, cirurgia oral e medicina; dermatologia; direito;
economia; educação; endocrinologia, metabolismo e nutrição;endocrinologia, metabolismo e nutrição;endocrinologia, metabolismo e nutrição;endocrinologia, metabolismo e nutrição;endocrinologia, metabolismo e nutrição; eng. Aeroespacial; engenharia ambiental/energia; engenharia civil; engenharia elétrica e eletrônica;
engenharia matemática; engenharia mecânica; engenharia mgmt/geral; engenharia nuclear; engenharia química; entomologia;entomologia;entomologia;entomologia;entomologia; espect./instrum./ciên. analit.; estudos
ambientais, geol e desenvolvimento; estudos clássicos; farmacologia e farmácia;farmacologia e farmácia;farmacologia e farmácia;farmacologia e farmácia;farmacologia e farmácia; filosofia; física; física aplicada/mat. cond./ciên. mat.; físico-química; fisiologia; gastroenterologiafisiologia; gastroenterologiafisiologia; gastroenterologiafisiologia; gastroenterologiafisiologia; gastroenterologia
e hepatologia; e hepatologia; e hepatologia; e hepatologia; e hepatologia; geol/petrol/engenharia de minas; hematologia;hematologia;hematologia;hematologia;hematologia; história; imunologia;imunologia;imunologia;imunologia;imunologia; instrumentação/medição; línguas; literatura; matemática; medicina ambientalmedicina ambientalmedicina ambientalmedicina ambientalmedicina ambiental
e saúde pública; medicina geral e interna; medicina reprodutiva;e saúde pública; medicina geral e interna; medicina reprodutiva;e saúde pública; medicina geral e interna; medicina reprodutiva;e saúde pública; medicina geral e interna; medicina reprodutiva;e saúde pública; medicina geral e interna; medicina reprodutiva; medicina veterinária/saúde animal; meio ambiente/ecologia; metalurgia; microbiologia;
multidisciplinar; neurociência e comportamento; neurologia; oftalmologia; oncologia; oncologia e pesquisa sobre câncer; ortopedia; neurociência e comportamento; neurologia; oftalmologia; oncologia; oncologia e pesquisa sobre câncer; ortopedia; neurociência e comportamento; neurologia; oftalmologia; oncologia; oncologia e pesquisa sobre câncer; ortopedia; neurociência e comportamento; neurologia; oftalmologia; oncologia; oncologia e pesquisa sobre câncer; ortopedia; neurociência e comportamento; neurologia; oftalmologia; oncologia; oncologia e pesquisa sobre câncer; ortopedia; ótica;
otorrinolaringologia; pediatria; pesq. médica, órgãos e sistemas; pesq./med. lab. e tecnol. médica; pesquisa médica e tópicos gerais; pesquisaotorrinolaringologia; pediatria; pesq. médica, órgãos e sistemas; pesq./med. lab. e tecnol. médica; pesquisa médica e tópicos gerais; pesquisaotorrinolaringologia; pediatria; pesq. médica, órgãos e sistemas; pesq./med. lab. e tecnol. médica; pesquisa médica e tópicos gerais; pesquisaotorrinolaringologia; pediatria; pesq. médica, órgãos e sistemas; pesq./med. lab. e tecnol. médica; pesquisa médica e tópicos gerais; pesquisaotorrinolaringologia; pediatria; pesq. médica, órgãos e sistemas; pesq./med. lab. e tecnol. médica; pesquisa médica e tópicos gerais; pesquisa
médica, diagnóstico e tratamento; psicologia; psiquiatria;médica, diagnóstico e tratamento; psicologia; psiquiatria;médica, diagnóstico e tratamento; psicologia; psiquiatria;médica, diagnóstico e tratamento; psicologia; psiquiatria;médica, diagnóstico e tratamento; psicologia; psiquiatria; química; química agrícola; química e análise; química inorgânica e nuclear; química orgânica;
radiologia, medicina nuclear e imagens; reabilitação; radiologia, medicina nuclear e imagens; reabilitação; radiologia, medicina nuclear e imagens; reabilitação; radiologia, medicina nuclear e imagens; reabilitação; radiologia, medicina nuclear e imagens; reabilitação; religião e teologia; reumatologia; saúde pública e ciência da saúde;reumatologia; saúde pública e ciência da saúde;reumatologia; saúde pública e ciência da saúde;reumatologia; saúde pública e ciência da saúde;reumatologia; saúde pública e ciência da saúde; serviço social e política social;
sistema cardiovascular e pesquisa em hematologia; sistema cardiovascular e respiratório;sistema cardiovascular e pesquisa em hematologia; sistema cardiovascular e respiratório;sistema cardiovascular e pesquisa em hematologia; sistema cardiovascular e respiratório;sistema cardiovascular e pesquisa em hematologia; sistema cardiovascular e respiratório;sistema cardiovascular e pesquisa em hematologia; sistema cardiovascular e respiratório; sociologia e antropologia; tecnologia da informação e comunicação;
toxicologia; urologiatoxicologia; urologiatoxicologia; urologiatoxicologia; urologiatoxicologia; urologia.....
Fonte: ISI, 2004.(1) As disciplinas relacionadas em negrito são relacionadas ao setor saúde.
REGIMES PAÍSES PAÍSES POR REGIME
Regime I
Albânia, Argélia, Armênia, Azerbaijão, Bolívia, Bósnia e Herzegovina, Camarões, Congo (Rep. Dem.), Congo (Peopl. Rep.), Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Gana, Guiné, Haiti, Iraque, Jamaica, Lesoto, Líbano, Líbia, Macedônia, Malawi, Mali, Marrocos, Maurício, Mauritânia, Mongólia, Myanmar, Namíbia, Nepal, Niger, Omã, Panamá, Paquistão, Paraguai, Portugal, Quirguistão, Rep. Malagasy, Senegal, Serra Leoa, Sudão, Tanzânia, Tunísia, Uganda, Uruguai, Usbequistão, Yemen, Zâmbia.
47
Regime II
África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Belarus, Brasil, Bulgária, Cazaquistão, Chile, China, Colômbia, Coréia do Sul, Croacia, Cuba, Egito, El Salvador, Equador, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Filipinas, Grécia, Honduras, Hungria, Índia, Indonésia, Irã, Irlanda, Itália, Jordânia, Kenia, Kuwait, Látvia, Lituânia, Malásia, México, Nigéria, Peru, Polônia, Rep. Checa, Rep. Dominicana, Romênia, Rússia, Singapura, Sri Lanka, Tailândia, Taiwan, Trindade e Tobago, Turquia, Ucrânia, Venezuela, Vietnã, Yugoslávia, Zimbabwe.
54
Regime III Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, EUA, Finlândia, França, Holanda, Israel, Japão, Noruega, Nova Zelândia, Reino Unido, Suécia, Suiça .
17
Total de países 118
TABELA 1A – Países componentes do NSI saúde por regime de interação – 2001
Fonte: USPTO, ISI, World Bank (elaboração própria).
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DIVULGAÇÃO EM SAÚDE PARA DEBATE
Revista do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES),voltada para a área de Saúde Pública e Saúde Coletiva, é dis-tribuída a todos os associados em situação regular com a te-souraria do CEBES.
Aceita trabalhos inéditos sob forma de artigos originais,artigos de opinião, artigos de revisão ou de atualização, rela-tos de casos e resenhas de livros de interesse acadêmico, po-lítico e social.
Os textos enviados para publicação são de total e exclusivaresponsabilidade dos autores.
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ARTIGOS
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1. Título em português e em inglês. O título deve expres-sar claramente o conteúdo do artigo.
2. Folha de apresentação com nome completo do(s)autor(es), endereço, e-mail e no rodapé as referências profis-sionais (contendo filiação institucional e titulação). Quandoo artigo for resultado de pesquisa com financiamento, citar aagência financiadora.
3. Resumo em português e inglês (abstract), em que fiqueclara uma síntese dos propósitos, dos métodos empregados edas principais conclusões do trabalho; descritores (descrip-tors), mínimo de três e máximo de cinco palavras, não ultra-passando o total de 700 caracteres (aproximadamente 120palavras). Para os descritores utilizar os apresentados no vo-cabulário estruturado (DECS), encontrados no endereço http://decs.bvs.br. Caso não sejam encontrados descritores disponí-veis para a temática do artigo, poderão ser indicados termosou expressões de uso conhecido.
4. Artigo propriamente dito.
a) as marcações de notas de rodapé no corpo do texto,deverão ser sobrescritas. Ex.: Reforma Sanitária1
b) para as palavras ou trechos do texto que são destaca-dos a critério do autor, utilizar aspas simples. Ex.: ‘portade entrada’.
c) quadros e gráficos deverão ser apresentados, também,em folhas separadas do texto, numerados e titulados cor-retamente com indicações das unidades em que se ex-pressem os valores e com as fontes correspondentes.
d) os autores citados no corpo do texto deverão estar escri-tos em caixa baixa (só a primeira letra maiúscula), obser-vando-se a norma da ABNT NBR 10520: 2001 (dispo-nível em bibliotecas). Ex.: Conforme Mario Testa (2000).
e) as referências bibliográficas no corpo do texto, deve-rão ser apresentadas entre parênteses em caixa alta se-guidas do ano e, se possível, da página. Ex.: (MIRANDA
NETTO, 1986; TESTA, 2000, p. 15).
5. Referências Bibliográficas deverão ser apresentadas nofinal do artigo, observando-se a norma da ABNT NBR 6023:
2000 (disponível em bibliotecas). Exs.:
CARVALHO, Antonio Ivo. Conselhos de saúde, responsabilidadepública e cidadania: a reforma sanitária como reforma do Es-tado. In.: FLEURY, Sônia Maria Teixeira (Org.). Saúde e demo-cracia: a luta do CEBES. São Paulo: Lemos, 1997. p. 93-112.
COHN, Amélia; ELIAS, Paulo Eduardo M.; JACOBI, Pedro. Participa-ção popular e gestão de serviços de saúde: um olhar sobre aexperiência do município de São Paulo. Saúde em Debate,Londrina (PR), n. 38, 1993. p. 90-93.
DEMO, Pedro. Pobreza política. São Paulo: Cortez, 1991. 111p.
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O artigo propriamente dito deve conter até 15 laudas.Os artigos que ultrapassarem este total, serão devolvidosaos autores.
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RESENHAS
Serão aceitas resenhas de livros de interesse da área deSaúde Pública e Saúde Coletiva, a critério do Conselho Edito-rial. Devem dar uma noção Devem dar uma noção do conteú-do da obra, de seus pressupostos teóricos e do público a que sedirige, em até três laudas.
ARTIGOS DE OPINIÃO
Serão aceitos trabalhos referentes a textos publicados narevista ou a assuntos de conjuntura de interesse nacional.Serão publicados a critério do Conselho Editorial. Devem con-ter até sete laudas.
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DIVULGAÇÃO EM SAÚDE PARA DEBATE
Journal of the Centro Brasileiro de Estudos de Saúde(CEBES) which focuses on Public Health and Collective Health,distributed to all associated individuals up-to-date withCEBES´ treasury.
It accepts original studies in the form of original articles,opinion articles, review or update articles, case studies andcritical book reviews of academic, political, or social interest.
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1. Title in Portuguese and English. Titles must clearlyexpress article content.
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3. Abstract in Portuguese and English, containing asummary of purpose, used methods and main work conclu-sions; descriptors, between three and five words, not morethan 700 characters (approximately 120 words). For descrip-tors use the ones presented in the available structuredvocabulary (DECS), which can be found at http://decs.bvs.br,in case available descriptors are not found for the article’stheme, terms or expressions of known use can be indicated.
4. Article.
a) footnote numbers inserted in the text must besuperscripted. E.g.: Sanitary Reform1
b) for highlighting words or excerpts the author shoulduse simple quotation marks. E.g.: ‘entrance’.
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1986; TESTA, 2000, p. 15).
5. Bibliographic References shall be presented in theend of the article, according to regulation ABNT NBR 6023:
2000 (available in libraries). E. g.:
CARVALHO, Antonio Ivo. Conselhos de saúde, responsabilidadepública e cidadania: a reforma sanitária como reforma do Estado.In.: FLEURY, Sônia Maria Teixeira (Org.). Saúde e democracia: aluta do CEBES. São Paulo: Lemos, 1997. p. 93-112.
COHN, Amélia; ELIAS, Paulo Eduardo M.; JACOBI, Pedro.Participação popular e gestão de serviços de saúde: um olharsobre a experiência do município de São Paulo. Saúde emDebate, n. 38, 1993. p. 90-93.
DEMO, Pedro. Pobreza política. São Paulo: Cortez, 1991. 111p.
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CAPA, DIAGRAMAÇÃO E EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
Adriana Carvalho & Carlos Fernando Reis da Costa
IMPRESSÃO E ACABAMENTO
Corbã Editora Artes Gráficas
TIRAGEM
3.500 exemplares
Esta revista foi impressa no Rio de Janeiro em janeiro de 2007.
Capa em papel couche 180 gr
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PROOFREADING
Sonia Regina P. Cardoso – portugueseNina Bandeira Seabra – inglêsLuciana Danielli de Araújo – bibliographic standardization
COVER, LAYOUT AND DESK TOP PUBLISHING
Adriana Carvalho & Carlos Fernando Reis da Costa
PRINT AND FINISH
Corbã Editora Artes Gráficas
NUMBER OF COPIES
3.500 copies
This publication was printed in Rio de Janeiro on january, 2007.
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