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Eliseu Marlônio Pereira de Lucena Aiala Vieira Amorim (Organizadores) BOTÂNICA E DESENVOLVIMENTO ~ SUSTENTAVEL Palestras Magistrais, Simpósios e Mesas- Redondas do 62° Congresso Nacional de Botânica MlSOClAçAQ _fV,IIL1IRA DAS 1ED.JT0MM UffI"lfIUITÁAIAS Fortaleza 2011

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Eliseu Marlônio Pereira de LucenaAiala Vieira Amorim

(Organizadores)

BOTÂNICA E DESENVOLVIMENTO~

SUSTENTAVELPalestras Magistrais, Simpósios e Mesas- Redondas do

62° Congresso Nacional de Botânica

MlSOClAçAQ _fV,IIL1IRADAS 1ED.JT0MM UffI"lfIUITÁAIAS

Fortaleza2011

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José Edmar Urano de CarvalhoEmbrapa Amazônia Oriental, CP 48. CEP 66095-100, Belérn, PA, Brasil. e-mail: [email protected]

A cajazeira é especie produtora defrutos comestíveis nativa da América Tropical,co_mampla distribuição geográfica no Brasil e

provável centro de origem na Amazônia~"Bnlsilt~ira (Cavalcante 1976; Carvalho 2006).

ocasião do primeiro contato dos europeusos nativos do novo mundo, a cajazeira já

cultivada pelos aborígenes e se encontravaestado semidomesticada (Clement 1999).

O primeiro relato sobre essa.Anacardiaceae foi efetuado por Gabriel Soares

Souza, um viajante português que se tornouik"iprélsp,erosenhor de' engenho na Bahia e que

o Brasil em busca de riquezasdeixando como legado "O tratado

~c;de:;criti\rodo Brasil em 1587': importante obrao Brasil quinhentista. O capítulo "Em

se diz de algumas árvores de fruto que sena vizinhança do mar da Bahia" discorreu

a cajazeira, caracterizando-a como,,~..arvure comprida, de casca grossa e áspera, que

quando ferida, resina. a qual chamou"óleo branco como leite em fio, que é muito

'~\,peJ~ajosc)""com flores de cor brarica e frutosquando maduros. Enfatizou que

flores assim como os frutos tinham aroma~'agr'adáv,~l e que estes tinham pouco o quet'(;'·corner.em decorrência do volumoso caroço,

"o sabor é precioso, com ponta de azedo,natureza é fria e sadia" (Souza 2001).

Alguns autores atribuem ao viajanteL:t:4ran,cês[ean de Léry, autor do livro "Viagem

terra do Brasil': publicado primeiramente na~;t'Carlça,em 1572, como tendo sido o primeiro

o'. discorrer sobre a cajazeira. Nesse livro,"\-

ele descreve uma árvore que dava um fruto"chamado acaiou que tem a forma e o tamanhode ovo de galinha" e enfatizou, ainda, quequando maduro, o fruto "não só tem bom gostomas ainda dá um ~aldo acidulado agradável aopaladar" "(Léry 1961). Efetivamente, o acaioucitado por [ean de Léry é o caju e não o cajácomo, equivocadamente, se encontra emalgumas traduções da obra para o português.

Botânica e Ecologia

Os nomes comuns de uso mais correntesão: cajazeira e taperebazeiro. A primeiradenominação é de uso quase que generalizadonas regiões nordeste, centro-oeste e sudestedo Brasil e a segunda limitada. à AmazôniaBrasileira.

As palavras cajá e taperebá são deorigem tupi. Cajá é a forma vernaculizada deakayá e significa "fruta caroçuda': em alusãoao volumoso caroço da fruta.' Por sua vez,taperebá (de "ta"pera", aldeia extinta e "yba',árvore) significa "árvore das taperas', devidoao fato de que era planta bastante cultivadapelos indígenas, próximo às suas aldeias, eao migrarem lá ficavam as árvores junto dastaperas (Rodrigues 1894; Rodrigues 1905).Ressalte-se, porém, que o botânico RichardSpruce justifica a etimologia do nome comooriundo de tapir (anta) e ybá (fruto), ou seja,"fruto de anta" (Spruce 2006), em alusão aofato de que a fruta constitui-se em um dosalimentos desse mamífero. No entanto, háde se considerar a autoridade do botânicoJoão Barbosa Rodrigues, um estudioso danomenclatura indígena.

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A cajazeira foi classificada em 1753pelo botânico, médico e zoólogo suecoCarolus Linnaeus, recebendo a denominaçãode Spondias mombin L. O nome genéricosignifica ameixa, em alusão ao fato de quealguns viajantes e naturalistas, ao fazeremrelatos sobre a espécie compararam o cajáao fruto da ameixeira, Prunus domestica L.No Sistema de Classificação de Cronquist, aespécie está ordenada na seguinte sequênciahierárquica: divisão Magnoliophyta, classeMagnoliopsida, ordem Sapindales, famíliaAnacardiaceae, gênero Spondias e espécieSpondias mombin L.

Ocorrência e Distribuição Geográfica

No Brasil a área de dispersão geográficada espécie está situada entre as latitudes 3°27,em Roraima, e 23°S, no Rio de Janeiro, em locaiscom altitudes que variam entre 30 m e 815 m(Carvalho 2006). Rompendo as fronteiras doBrasil é encontrada em estado espontâneo naBolívia, Colômbia, Equador, Peru, Venezuela,nas Guianas, Honduras e México, nesse últimopaís em sítios com altitude de até 1.200 m(Carvalho 2006; Roosmaalem 1985).

Considerando-se os dez centrosde diversidade genética, propostos porGiacometti (1993) para as espécies frutíferasnativas do Brasil, a cajazeira é originária doCentro 2, que corresponde a Costa Atlânticae Baixo Amazonas. Essa área envolve o deltado rio Orinoco na Venezuela e se estende doOiapoque, no Amapá, aos limites a leste daAmazônia no Maranhão, incluindo a ilha deMarajó e o oeste do rio Tapajós.

Propagação

É mais frequentemente propagadapor sementes, embora possa também serpropagada por via assexuada, particularmentepor enxertia e estaquia. A propagação porsementes não é recomendada para implantaçãode pomares comerciais devido à segregaçãogênica, que implica acentuadas variações entreplantas.

Na propagação sexuada, a unidade depropagação é representada pelo volumosocaroço (pírênío) o qual contém entre zero ecinco sementes.

As sementes de cajá apresentamcomportamento ortodoxo no armazenamentopodendo, portanto, serem submetidas àsecagem e armazenadas em temperaturassubzero.

A germinação é lenta e com acentuadadesuniformidade devido às sementesapresentarem dormência fisiológica emecânica, esta última condicionada pelaporção córnea do endocarpo (Carvalho et al.1998).

Trabalhos recentemente desenvolvidosna Embrapa Amazônia Oriental demonstraramque o endocarpo é permeável à água e que adormência da maioria das sementes é superada'quando estas são armazenadas durante180 dias em embalagens à prova de vapord ' água, nas condições de ambiente natural daAmazônia (temperatura média de 26,8°C).

A aplicação de tratamentos pré-germinativos como escarificação dos caroços,imersão em água fria ou quente não aceleramnem uniformizam a germinação. Por outrolado, a pré-embebição das sementes emsolução de ácido giberélico (500 mg.L-l),durante 24 horas, favorece a germinaçãodas sementes, possibilitando, 60 dias apósa semeadura, obtenção de porcentagens degerminação entre 20 e 30%.

O método de propagação assexuadamais utilizado é a enxertia por garfagemno topo em fenda cheia, que proporcionaboa porcentagem de enxertos pegos e bomcrescimento dos enxertos. Convém salientarque comum ente o porta-enxerto é a própriacajazeira, obtida por via seminífera, mas háa possibilidade de se utilizar como porta-.enxertos espécies do mesmo gênero, emparticular o umbuzeiro (S. tuberosa Arr. Cam.)e a cajaraneira (S. dulcis Parkinson) (SouzaBleicher 2002).

Sucessos com a estaquia só têm sidoobtidos quando se utilizam estacas

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grandes, com comprimento superior a 1 me diâmetro de no mínimo 10 em. Isto limitaa propagação de genótipos superiores emescala comercial, em decorrência do reduzidonúmero de estacas que se pode obter dedeterminada planta-matriz.

Implantação e Manejo do Pomar

As mudas devem ser plantadas em- covas com dimensões de 40 em x 40 em x

40 em, previamente adubadas com estercocurtido ou composto orgânico e 200 g desuperfosfato triplo.

Os espaçarnentos indicados para oestabelecimento de pomares variam de 8m 8 m até 10 m x 10 m. Quando utilizadaem sistemas agroflorestais, especialmentenaqueles envolvendo o cupuaçuzeiro comocultura principal, a cajazeira tem sido plantadacom distância mínima entre si de 10m e sãodispostas entre quatro plantas de cupuaçuzeiro,o qual é plantado no espaçamento de 5 m x 5m.Esse arranjo possibilita a disposição de 100cajazeiras e 400 cupuaçuzeiros por hectare.

Quanto às recomendações de adubação,podas e controle de pragas as informaçõesdisponíveis são bastante escassas.

Utilização

O cajá, ao contrário do urnbu e dacajarana, raramente é consumido como frutafresca, em decorrência de apresentar escassaporção comestível. Além disso, há de seconsiderar que a maioria dos tipos de cajá tempolpa bastante ácida e os frutos sào bastanteperecíveis, o que limita sua comercializaçãocomo fruta fresca.

Atualmente, o principal produto daagroindústria do cajá é a polpa congelada,

. geralmente utilizada na elaboração derefrescos, sorvetes, licores e em bebidas lácteas.

Referências Bibliográficas

Sarvalho, ).E.lJ.; Nascimento, W.M.O. &Müller, C. H. 1998. Características físicase de germinação de sementes de espécies

frutíferas nativas da Amazônia. Belérn,Embrapa-CPATU.

Carvalho, P.E.R. 2006. Cajá-da-rnata, Spondiasmombin. In: Carvalho, PE.R. Espéciesarbóreas brasileiras. v.2., Pp. 127-132. Brasília, Embrapa InformaçãoTecnológíca, Colombo, EmbrapaFlorestas.

Clement, C.R. 1999. 1492 and the loss ofAmazonian crop genetic resources. IThe relation between domestication andhurnan population decline. EconomicBotany 53(2): 188-202.'

Léry, J. 1961. Viagem à terra do Brasil. Rio deJaneiro, Biblioteca do Exército.

Rodrigues, J.B.: 1984. Hortus fIuminensis oubreve notícia sobre as plantas cultivadasno Jardim Botânico do Rio de Janeiro.Rio de Janeiro, Typ. Leuzinger.

Rcdrigues, J.B. 1905. Mbaé kaá tapyiyetáenoyndaua ou a botânica: nomenclaturaindígena. Rio de Janeiro, ImprensaNacional.

Souza, F.X.& Bleicher, E. 2002. Comportamentoda cajazeira enxertada sobre umbuzeiroem Pacajus, CE. Revista Brasileira deFruticultura, 24(3):790-792.

Souza, G.S. 2000. Tratado descritivo do Brasilem 1587. Belo Horizonte, Itutiaia,

Spruce, R. 2006. Notas de um botânico naAmazônia. Belo Horizonte, Itatiaia.

van Roosmalcn, M.G.JvI. 1985. Fruits ofthe Guianan Flora. Utrecht, Instituteof Systematics Botanv!WageningenAgricultural University.