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Artigo técnico PROGRAMA DESTAQUE EM GOVERNANÇA DE ESTATAIS FLAVIA MOUTA FERNANDES | MAIARA MADUREIRA MENDES | PATRÍCIA BOLINA PELLINI UMA INTRODUÇÃO AOS ETFS – FUNDOS DE ÍNDICE FÁBIO DUTRA | GUILHERME DE SOUZA PIMENTEL | RÉGIO SOARES FERREIRA MARTINS IRPJ E JCP: DIFERENCIAIS BRASILEIROS JOSÉ ROBERTO AFONSO | MELINA ROCHA LUKIC IMERCADO, A BUSCA PELA EXCELÊNCIA OPERACIONAL AIRTON MINORU MURAKAMI | VIVIANE EL BANATE BASSO ESTRUTURA A TERMO DE TAXAS DE JUROS: DETERMINANTES MACROECONÔMICOS – APLICAÇÃO DO MODELO DE SVENSSON PARA O BRASIL JOSÉ MONTEIRO | ROGERIO MORI Entrevista FABIO GIAMBIAGI ECONOMISTA EDIÇÃO 2 | FEV/2016 bmfbovespa.com.br RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA DA BOLSA

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Page 1: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Artigo técnicoPROGRAMA DESTAQUE EM GOVERNANÇA DE ESTATAIS FLAVIA MOUTA FERNANDES | MAIARA MADUREIRA MENDES | PATRÍCIA BOLINA PELLINI

UMA INTRODUÇÃO AOS ETFS – FUNDOS DE ÍNDICE FÁBIO DUTRA | GUILHERME DE SOUZA PIMENTEL | RÉGIO SOARES FERREIRA MARTINS

IRPJ E JCP: DIFERENCIAIS BRASILEIROS JOSÉ ROBERTO AFONSO | MELINA ROCHA LUKIC

IMERCADO, A BUSCA PELA EXCELÊNCIA OPERACIONAL AIRTON MINORU MURAKAMI | VIVIANE EL BANATE BASSO

ESTRUTURA A TERMO DE TAXAS DE JUROS: DETERMINANTES MACROECONÔMICOS – APLICAÇÃO DO MODELO DE SVENSSON PARA O BRASIL JOSÉ MONTEIRO | ROGERIO MORI

EntrevistaFABIO GIAMBIAGI ECONOMISTA

EDIÇÃO 2 | FEV/2016bmfbovespa.com.br

RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 2: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

A Resenha da Bolsa, publicação lançada para incentivar a troca de conhecimento e informação de alta qualidade entre toda a comunidade fi nanceira brasileira, convida você a participar do “Prêmio Melhor Artigo Resenha da Bolsa”. A cada ano, será escolhido, pelo conselho editorial da revista, o melhor artigo publicado.

Confi ra a premiação:

Um prêmio à inspiração e ao conhecimento técnico

R$20.000,00 (vinte mil reais)

almoço com o conselho editorial da revista

convitecom direito a acompanhante, transporte e estadia para participar do Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, realizado pela Bolsa

Envie seu artigo para avaliação dos editores responsáveis. Acesse resenhadabolsa.com.br e saiba como enviá-lo.

1a E D I Ç Ã O

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RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA Conselho editorialCláudio Haddad, Gustavo Franco, José Roberto Mendonça de Barros, Márcio Gomes Pinto Garcia, Marcos Eugênio da Silva e Samuel Pessoa

Editores ExecutivosEdemir Pinto, Cícero Augusto Vieira Neto, Eduardo Refinetti Guardia, André d’Almeida Monteiro e Fabio Dutra

Coordenação editorialFSB Comunicação

Equipe ComunicaçãoMarita E. Bernhoeft, Ana Lúcia Matos Branco, Alisson Savio Silva Siqueira, Daniel Pfannemuller, Fernanda Kiyoko Nakao, Flavia Mangini e Rogério Guerra

A Resenha da Bolsa é uma publicação gratuita com o objetivo de promover o conhecimento e o debate técnico sobre os mercados administrados pela BM&FBOVESPA, difundindo as melhores práticas de gestão de risco e de trading. O conteúdo desta publicação não representa a opinião da Bolsa, nem deve ser interpretado como recomendação de compra ou de venda de ativos. Os artigos assinados expressam a opinião de seus autores. É proibida a reprodução parcial ou integral de textos contidos nesta publicação.

Artigo técnicoPROGRAMA DESTAQUE EM GOVERNANÇA DE ESTATAISFLAVIA MOUTA FERNANDES | MAIARA MADUREIRA MENDES | PATRÍCIA BOLINA PELLINI

UMA INTRODUÇÃO AOS ETFS – FUNDOS DE ÍNDICEFÁBIO DUTRA | GUILHERME DE SOUZA PIMENTEL | RÉGIO SOARES FERREIRA MARTINS

IRPJ E JCP: DIFERENCIAIS BRASILEIROSJOSÉ ROBERTO AFONSO | MELINA ROCHA LUKIC

IMERCADO, A BUSCA PELA EXCELÊNCIA OPERACIONALAIRTON MINORU MURAKAMI | VIVIANE EL BANATE BASSO

ESTRUTURA A TERMO DE TAXAS DE JUROS: DETERMINANTES MACROECONÔMICOS – APLICAÇÃO DO MODELO DE SVENSSON PARA O BRASILJOSÉ MONTEIRO | ROGERIO MORI

EntrevistaFABIO GIAMBIAGIECONOMISTA

EDIÇÃO 2 | FEV/2016bmfbovespa.com.br

RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Fevereiro 2016 Edição 2

A segunda edição da Resenha, em seu novo formato editorial, tem um amplo e diversificado escopo de conteúdos. A entrevista traz Fabio Giambiagi. O economista chama a atenção para a necessidade de reformas estruturais no país. Compara a questão da Previdência, por exemplo, com a discussão sobre o meio ambiente e como o tempo conspira contra o Brasil se nada for feito para alterar o rumo dos gastos nessa área.

Giambiagi alerta para o espírito anticapitalista que tomou conta de corações e mentes no país. “São, de um modo geral, expressões de uma sociedade que acredita que os recursos dependem de uma misteriosa ‘vontade política’, e não de produzir mais, ser mais produtivo e mais eficiente. Não se pode negar que a intervenção estatal em todas as suas dimensões, durante 50 anos, gerou um país melhor e mais desenvolvido. E isso deixou raízes profundas no imaginário nacional, embora guarde pouca relação com as prescrições recomendáveis no mundo de hoje. ”

A reflexão, a inovação e a produção de conhecimento estão entre os principais objetivos da Resenha. O cenário desafiador do país e dos mercados faz que essas tarefas se tornem ainda mais críticas.

Entre os artigos que publicamos, o Programa Destaque em Governança de Estatais, lançado pela BM&FBOVESPA em 2015, é objeto de uma profunda descrição de sua gênese, discussão e resultados. A Resenha traz também os detalhes de um lançamento importante que a Bolsa está preparando, o ETF de Renda Fixa. O novo produto demandou ampla reforma regulatória. Em outro artigo, são analisados a utilização de Juros sobre Capital Próprio (JCP) como forma especial de distribuir parte do resultado aos acionistas, a sua importância e, principalmente, os seus diferenciais tributários em nosso mercado.

A Resenha aborda em artigo como os altos volumes de transações e a complexidade de seus processos fizeram com que os mercados financeiro e de capitais busquem eficiência operacional por meio da automação. As autoridades reguladoras têm chamado a atenção para a necessidade de eliminação de riscos por meio, por exemplo, da redução do ciclo de liquidação. Neste contexto, destacam-se soluções como o iMercado, o tema central deste artigo.

Completando o conjunto de artigos, esta edição apresenta também um estudo técnico que visa sistematizar um modelo para previsão e explicação dos movimentos de curto prazo da estrutura a termo de taxas de juros pré-fixadas em reais do Brasil.

Nosso conselho editorial, formado por Cláudio Haddad, José Roberto Mendonça de Barros, Gustavo Franco, Samuel Pessoa, Márcio Gomes Pinto Garcia e Marcos Eugênio da Silva, renova o convite para uma ampla participação de seus leitores na Resenha, por meio do envio de artigos, cartas e sugestões.

Boa leitura!

carta ao leitor

Fev/2016

Page 4: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Artigo técnico

FABIO GIAMBIAGI ECONOMISTA

46ESTRUTURA A TERMO DE TAXAS

DE JUROS: DETERMINANTES MACROECONÔMICOS –

APLICAÇÃO DO MODELO DE SVENSSON PARA O BRASIL

33 IRPJ E JCP: DIFERENCIAIS

BRASILEIROS

Entrevista

14PROGRAMA DESTAQUE EM GOVERNANÇA DE

ESTATAIS

06

IMERCADO, A BUSCA PELA EXCELÊNCIA OPERACIONAL

39UMA INTRODUÇÃO AOS ETFS –

FUNDOS DE ÍNDICE

22

índice

Fev/2016

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CRÔNICA DE UMA CRISE FINANCEIRA

Notícias Agenda Memória do mercado

61 65 68

Fev/2016

Page 6: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

A conta chegouDe 2003 a 2014, o total de indivíduos que rece-

bem algum tipo de transferência do governo federal passou de 39 milhões para 78 milhões de pessoas. A conta da Previdência Social passou de 2,5% do PIB em 1988 para uma estimativa de 7,5% em 2015. Em 2014, o governo federal pagou muito mais de R$ 400 bilhões em benefícios previdenciários, R$ 85 bilhões em servi-ços de saúde, R$ 55 bilhões em seguro-desemprego e abono salarial e R$ 30 bilhões em Bolsa Família.

“Faço o paralelo entre a questão previdenciária e a questão ambiental. O mundo de novembro de 2015 não é muito diferente no que se refere à relação en-tre o homem e o meio ambiente do que o mundo de outubro de 2015, mas ele é dramaticamente diferente do mundo de 1965, 50 anos atrás. Com a Previdência, acontece a mesma coisa.” Com esta comparação, o eco-nomista Fabio Giambiagi tenta chamar a atenção para a necessidade de reformas estruturais no país. Com

graduação e mestrado na UFRJ, funcionário do BNDES, Giambiagi recorre ao humor e aos aforismos, além de extensa produção acadêmica, com mais de 25 livros pu-blicados, combinada com artigos e palestras, para tor-nar seus alertas mais palpáveis para o público em geral.

Assim, as barreiras que impedem o crescimento do Brasil são as “vacas sagradas”, como a Previdência. Segundo ele, as palavras “consenso” e “economistas” não podem ficar juntas na mesma frase porque é sa-bido que “nós economistas somos pródigos em brigar entre nós”. Sobre o papel do governo na economia, pontifica: “A tarefa principal do governo deve ser muito mais a de ensinar a pessoa a pescar que de dar o peixe. O problema é que viramos um país de pedintes, onde todo mundo tem algum peixe a pedir para o governo e agora o aquário está secando e o governo precisa racio-nar os peixes, porque quase ninguém sabe pescar”.

Leia sua entrevista a seguir:

entrevista

6 Fev/2016

FABIO GIAMBIAGIEconomista

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RESENHA – Em sua extensa pro-dução acadêmica, o senhor apon-ta o fato de o Brasil estar mal pre-parado para lidar com o mundo de hoje, o que vem contribuindo para a perda de dinamismo da nossa economia. Esta afirmação, feita de diferentes formas, nem é de hoje, quando a crise está mais grave e os problemas que o se-nhor descreveu ficaram mais ex-plícitos. Pelo contrário, o senhor vem apontando essa “aversão” a alguns dos princípios do capita-lismo há vários anos. Como mu-dar esse estado de coisas?

FABIO GIAMBIAGI – Eu diria que há três instâncias de atuação. A pri-meira, no nível mais básico, está ao alcance do indivíduo e depende da atitude de cada um. Qualquer empre-sa, empresário ou trabalhador pode se preparar melhor e se aprimorar com vistas à sua própria evolução e à sua melhor inserção no sistema e no mundo. A segunda é a seara de nós in-telectuais e pensadores que acredita-mos na pertinência das teses em favor do sistema. A terceira é a da liderança política. O Brasil teve cinco grandes líderes políticos nos últimos 35 anos. Os dois primeiros foram Tancredo Neves e Ulysses Guimarães, ícones da liderança civil em defesa do resta-belecimento da democracia nos anos 1980. O terceiro foi Fernando Collor, o modernizador dos anos 1990 – não o senador da base aliada de hoje –, com sua pregação e prática em favor da abertura econômica e da privati-zação, independentemente das ques-tões que levaram à sua saída do po-

der. O quarto foi Fernando Henrique, campeão da estabilização e das refor-mas dos seus dois governos. O quinto foi Lula, com a bandeira da inclusão social. É preciso agora uma liderança que capte a necessidade de o país mu-dar de rumos e que guie o país nessa nova etapa. É evidente a qualquer lei-tor de jornais que a presidente Dilma não exerce essa liderança.

RESENHA – A questão é política? Como colocar essas reformas na agenda do país? A oposição deve-ria fazer isso? Como construir um consenso para essas reformas?

FABIO GIAMBIAGI – Sim, a questão é política no seguinte sentido: a deci-são acerca de que rumos o país seguirá terá que ser tomada na arena política. Considero-me um quadro técnico e prezo isso: quem é técnico deve va-lorizar o seu papel, mas ao mesmo tempo reconhecer as suas limitações. Quem supervalorizou o papel do téc-nico em uma democracia em geral fra-cassou. Nas minhas palestras, sempre frisei isso: “o economista pode pensar X ou Y, mas quem decide é o políti-co”. Sejamos realistas, porém: quem faz e organiza a agenda é o Executivo, é quem está no governo. Faz sentido cobrar inconsistências da oposição, apontar contradições entre o que faz e o que fazia quando era governo, etc. Porém não faz muito sentido que se cobre da oposição um plano detalha-do de governo com a mesma profun-didade que devem ter os planos de quem está na posição de governante. E, obviamente, esqueçamos qualquer possibilidade de sair do Congresso

qualquer iniciativa global que vá além de uma colcha de retalhos. Insisto: quem tem que organizar e “tocar” a agenda é o Executivo. Sobre consen-sos, eu lembro uma frase genial do Millôr Fernandes: “O poder é o cama-leão ao contrário: todos tomam a sua cor”, para relativizar um pouco o pa-pel bloqueador resultante da fragmen-tação. Quando o núcleo de Poder está coeso e tem um bom diagnóstico e poder de articulação, o Congresso em boa parte vai atrás. Custa muito tem-po, muitas negociações, mas, como dizem os americanos, “at the end of the day”, foi assim que passaram a lei de privatizações, a desindexação da economia, o ajuste fiscal de 1999, o fator previdenciário, etc. Agora, quan-do o governo é uma nau sem rumo, aí, sim, o caos se instala e o Congresso aprova qualquer coisa. É o que acon-teceu neste ano horrível de 2015.

RESENHA – Existe um consenso técnico, do ponto de vista dos economistas, sobre o que deve ser feito? Existe um problema de comunicação aqui, ou seja, não se consegue demonstrar à popu-lação que essas mudanças lhe fa-riam muito bem?

FABIO GIAMBIAGI – As palavras “consenso” e “economistas” não po-dem ficar juntas na mesma frase por-que é sabido que nós economistas somos pródigos em brigar entre nós desde a época de Adam Smith. Mes-mo assim, deixando a brincadeira de lado, com certa licenciosidade e se nos restringirmos ao universo dos economistas que defendem ideias re-

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lativamente liberais, eu diria que sim, que há uma razoável homogeneidade em torno das teses de que é preciso ter contas públicas ajustadas, que não dá para transigir excessivamente com a inflação, que o “tripé” macroeconô-mico deve ser restabelecido, que uma reforma previdenciária é rigorosa-mente fundamental e que o país deve se posicionar de uma forma mais aberta na sua inserção no mundo.

RESENHA – O ex-ministro Mario Henrique Simonsen fez um duro ataque à Constituição de 1988, ainda naquela época, demons-trando como a nova Carta levaria o país ao quadro em que estamos hoje. No entanto, essa visão liberal, ou esse diagnóstico, parece longe de ser considerada um consenso ainda, quase 30 anos depois. Há alguma forma de mudar essa visão sobre o país? A sensação de quem acompanha o noticiário recente é que não só não evoluímos, como também parece que retrocede-mos. O senhor concorda?

FABIO GIAMBIAGI – O ex-secre-tário de Estado dos EUA Henry Kis-singer dizia que “a ausência de alter-nativas clarifica maravilhosamente a mente”. O Brasil viveu durante anos e anos a miragem de que o Estado po-dia tudo e que toda reivindicação po-deria ser aceita pela acolhida de um Tesouro generoso. O resultado foi o déficit público atual, da ordem de 9% do PIB. Na medida em que ficar claro para todos que “o cobertor está cur-to”, se tornará mais evidente que há escolhas a serem feitas. É um proces-

so. Precisamos mudar a mentalidade de muitas pessoas e esses processos de conversão não são súbitos, tomam seu tempo. O Brasil aceitou a ideia de “reajuste dos salários pela média”, que foi a base da URV, em 1994, de forma pacífica, mas isso se deu após quase dez anos de discussões infindáveis e o fracasso prévio de cinco planos de es-tabilização que tinham sido baseados nesse princípio. Acho que algo assim tende a acontecer com propostas de reformas como a da Previdência. Eu e alguns colegas estamos defendendo certas ideias nesse campo há mais de 20 anos. Um dia serão aceitas. Penso que teria sido melhor se tivessem vin-gado em 1995, no começo da estabi-lização, mas vale a frase de que “antes tarde do que nunca”.

RESENHA – Por que alguns países dão certo e outros não? Como o Brasil se encaixa nessa análise institucional sobre o crescimen-to? Como avançar em questões como educação, regulação, pro-dutividade, respeito às leis?

FABIO GIAMBIAGI – Aqui é im-portante tentar evitar o dilema “o que veio primeiro: o ovo ou a galinha?”. É evidente que a Alemanha, para pegar um caso paradigmático, tem mui-to mais e melhor aquilo que a gente gostaria que o Brasil tivesse: educa-ção, produtividade, etc. Ela já é um país desenvolvido há muito tempo, portanto é natural que muitas coisas lá sejam mais avançadas do que aqui. Parêntese: nos últimos tempos, infe-lizmente, até o futebol. Continuando: vamos fazer uma comparação mais

pertinente, porém, e olhar para o que países que no passado eram parecidos com o Brasil fizeram e os levaram a se diferenciar. E neste sentido as experi-ências de Coreia do Sul ou do Chile, por exemplo, deixam ensinamentos importantes. De um modo geral, em alguns casos mais e em outros me-nos, o que se constata olhando para as experiências que deram certo é a vigência do que eu chamo de “pentá-gono virtuoso”, composto de: i) am-biente de competição, ii) poupança doméstica relativamente robusta, iii) educação de qualidade, iv) boa infra-estrutura e v) gasto público eficiente. Não preciso dizer como estamos afas-tados desta receita. Em matéria de competição, somos o país do carto-rialismo e da reserva de mercado por excelência, nossa poupança domésti-ca é ridícula, a educação é sofrível, a infraestrutura está em pandarecos e a eficiência do gasto público dispensa comentários. Qualquer brasileiro que vá fazer turismo no Chile sente ver-gonha do Brasil. E 40 anos atrás eles estavam de certa forma pertinho da Bolívia. Os chilenos fizeram o dever de casa. Nós não.

RESENHA – Os países que chega-ram atrasados ao século 20 nor-malmente não deram mais certo, com poucas exceções. Estamos condenados ao atraso?

FABIO GIAMBIAGI – Não necessa-riamente. Não estamos condenados, embora estejamos em crise, no senti-do gramsciano, de Antonio Gramsci, que dizia que “a crise consiste precisa-mente do fato de que o velho morreu

entrevista

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sem que o novo ainda tenha nascido”. Confesso que, por vezes, a pobreza do debate público me deprime. O que me permite preservar certo otimismo, porém, é a quantidade de gente capaz que há nas diversas áreas. Creio que essa massa de pessoas acabará encon-trando uma liderança. Como dizia Ortega y Gasset, “eu sou eu e minhas circunstâncias”. O próprio Fernando Henrique, que se revelou um estadis-ta, não era claramente um líder antes de 1994 pela sua trajetória prévia. Mesmo tendo tido muitos méritos como presidente, ele foi em parte moldado pelo momento histórico em que lhe coube exercer o comando do país e pela equipe excepcional que trabalhou com ele. Tenho um amigo que afirma que “o Brasil precisa ter no governo três mil pessoas compe-tentes, honestas e articuladas para poder progredir”. E, lendo os jornais, vendo TV, dando palestras aqui e acolá, conversando com gente ótima que tive a felicidade de conhecer ao longo da vida em diversas áreas, vejo que temos material humano para le-var o país a um futuro bem melhor do que a realidade atual, na economia, na engenharia, no direito, na gestão, etc. Há muitos profissionais exce-lentes espalhados pelo Brasil, nos diversos ramos de atividade. O papel do governo deve ser encaixar essas pessoas no lugar correto e transmitir a mensagem certa à população, para liderar uma agenda de reformas. Es-tas requerem cinco condições: a) um bom diagnóstico, b) convicções firmes, c) energia para implementar a agenda, d) uma enorme capacida-de de persuasão e, finalmente, e) um

grande poder de articulação política. No dia em que esses requisitos forem cumpridos, o país vai dar um salto.

RESENHA – Em um dos seus livros, o senhor listou dez vacas sagra-das do Brasil que “acorrentam” o avanço do país: salário mínimo, que não é mínimo, Previdência, assistencialismo exacerbado, di-reitos dos incluídos, vinculação, juros subsidiados, transferências, taxação do capital, protecionis-mo e viés anticapitalista, que foi o começo da nossa conversa e tema de um dos seus livros mais recentes. Como mandá-las “para o matadouro”? Não lhe parecem todas resultantes do que o ex-mi-nistro Delfim Netto diz ser a cren-ça do brasileiro de que o governo cria dinheiro?

FABIO GIAMBIAGI – Não há espa-ço aqui para tratar todos os temas em detalhes, até pelo fato de que a lista é heterogênea e alguns pontos são mais defensáveis do que outros, mas da forma em que se deram as coisas no Brasil, essas questões levaram o Estado à exaustão e constituem o “decálogo do insucesso” do meu livro Brasil – Raízes do atraso, que escrevi em 2006, com título evidentemen-te inspirado no Raízes do Brasil, do mestre Sérgio Buarque de Holanda. Este livro teve uma trajetória inte-ressante. Ele vendeu muito durante alguns anos e depois fui me esque-cendo dele. Alguns anos depois, tive a alegria de que ele fosse indicado por uma instituição financeira como o livro do ano que ela escolhia para

Em matéria de competição, somos o país do cartorialismo e da reserva de mercado por excelência, nossa poupança doméstica é ridícula, a educação é sofrível, a infraestrutura está em pandarecos e a eficiência do gasto público dispensa comentários. Qualquer brasileiro que vá fazer turismo no Chile sente vergonha do Brasil. E 40 anos atrás eles estavam de certa forma pertinho da Bolívia.

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fazer uma edição especial para seus clientes VIP. A instituição me con-tratou então para fazer uma palestra sobre o livro e foi então que fui relê--lo. Entre a publicação do livro e esse pequeno prêmio tinham se passado alguns anos, durante os quais o Bra-sil vivera um boom. Me vi então na curiosa contingência de falar acerca de um livro relativamente pessimista sobre o país, numa situação de eufo-ria e na qual tudo parecia dar certo. E, entretanto, ao rever as páginas do livro, uma a uma, eu constatava que as “vacas sagradas” estavam todas lá: nenhuma fora removida. O tom da minha palestra foi fiel ao livro e acho que não fiz muito sucesso, por-que naquele contexto as pessoas es-tavam querendo comprar otimismo, quando minha mensagem foi mais ou menos a seguinte: “me desculpem fazer o papel de Cassandra, mas nós não temos um país para continuar crescendo 4 ou 5% ao ano”. E, infe-lizmente, eu estava certo. É claro que eu não poderia prever a intensidade dos erros tremendos que foram co-metidos depois entre 2012 e 2014, nem a crise política de 2015, mas a ideia de que há entraves profundos ao crescimento, associados a crenças muito enraizadas na mentalidade de um contingente expressivo de pes-soas no país, estava lá no meu livro escrito há dez anos. Observe-se, a propósito, esta pergunta de uma pro-va de geografia para alunos do nono ano de uma das melhores escolas do País: “Até os dias atuais, muitos paí-ses pobres ainda estão pagando os empréstimos tomados no exterior e mesmo tomando novos empréstimos.

A consequência é muito grave, pois, ao pagar as dívidas e os juros, resta-lhes pouco dinheiro para investir em educação, saúde, saneamento bási-co, etc. Nessas condições, é difícil realizar o desenvolvimento econô-mico e social. A dívida externa tor-na-se um grande obstáculo para os países pobres. Cite dois obstáculos que essa dívida externa produz”. A infeliz criatura, com menos de 15 anos, já aprende, de forma sub-rep-tícia, primeiro, que pagar as dívidas é ruim. Segundo, que cobrar dívidas, por parte do credor, conspira contra o desenvolvimento social. Terceiro, que juro é um pecado. Quarto, que o ideal seria que as dívidas fossem perdoadas, e, quinto, por analogia, que o Brasil é um país como o “sujei-to oculto” retratado na prova – que precisa viver da caridade. O desservi-ço que um professor que aplica uma prova dessas presta ao futuro do país é algo descomunal. Coloque-se essa mesma turma na Alemanha e os garo-tos vão aprender a se preparar muito melhor para o mundo, com aulas que ensinam a vida como ela é e não uma história de mocinhos e bandidos. O curioso é que o mesmo garoto que aprende na aula essas noções tolas de como é o mundo sai da aula e enten-de perfeitamente que se o Madureira enfrentar o Barcelona, de cada cem vezes que se enfrentarem o Barce-lona vai vencer 99 porque é muito melhor e é natural que assim seja. Por isso, no meu livro mais recente, Capitalismo – Modo de usar, coloco ênfase na associação entre as virtu-des da competição para o sistema fazendo o paralelo com o que ocorre

É claro que eu não poderia prever a intensidade dos erros tremendos que foram cometidos depois entre 2012 e 2014, nem a crise política de 2015, mas a ideia de que há entraves profundos ao crescimento, associados a crenças muito enraizadas na mentalidade de um contingente expressivo de pessoas no país, estava lá no meu livro escrito há dez anos.

entrevista

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no futebol, onde só os melhores che-gam na final da Champions League – e todo mundo aceita e encara isso como natural. Competição é o nome do jogo e a chave do sucesso.

RESENHA – Falando ainda das “vacas sagradas”, elas dificultam o desenvolvimento do mercado de capitais?

FABIO GIAMBIAGI – Esse é mais um caso em que as coisas estavam indo relativamente bem no país até 2007 e começo de 2008. Aprovei-tou-se um contexto delicado na crise de 2008 para impulsionar uma agen-da mais estatizante e que acarretou uma série de problemas. O que se vivenciava até 2007? Uma situação com um conjunto de intervenções importantes na economia, mas com contas públicas ajustadas, taxa de juros que tendencialmente estavam em declínio e um boom na Bolsa e no mercado de capitais, que fazia com que o papel do governo em termos relativos fosse minguando um pou-co. Quando vem a crise, há uma ação contracíclica estatal. E me parece que em relação a isso estamos todos de acordo que naquele momento ela era necessária. Mas depois o Estado não se retirou. Não é que não se re-tirou com a mesma velocidade com que entrou: na realidade não se re-tirou. Ele ficou e aí há uma série de situações em que o país sofreu uma regressão e o mercado de capitais não voltou a ter o peso relativo que teve até 2007. Eu diria que depois dessas intervenções todas do perío-do 2008-2014/2015, está na hora de

realmente se retomar uma agenda de fortalecimento do mercado de capi-tais, de retirada gradual do Estado da economia, etc.

RESENHA – O senhor gostaria de desenvolver um pouco com rela-ção a essa agenda de desenvol-vimento do mercado de capitais? Que ações acha que são essen-ciais e que deveríamos adotar?

FABIO GIAMBIAGI – Em boa par-te, elas estão associadas a essa agen-da maior do ajuste fiscal. Enquanto continuarmos tendo um déficit fiscal de quase 10% do PIB e uma inflação muito elevada como a dos últimos tempos, fica difícil. Evidentemente que não se trata de uma situação tão grave quanto a dos anos 1980, em que a gente teve todos aqueles pro-blemas que conhecemos muito bem. No entanto, é certamente um con-texto muito prejudicial para o tipo de iniciativas que vínhamos tendo até 2007, associadas ao alongamen-to do horizonte de referência dos investidores em um contexto de pre-visibilidade macroeconômica e juros declinantes, como os que se viviam até então. A agenda do ajuste fiscal está associada à agenda de recupe-ração da poupança pública e de re-cuperação da poupança agregada da economia. No bojo desse processo será possível retomar a própria agen-da de desenvolvimento do mercado de capitais, que vinha sendo tocada no período 2004-2007. Mas se essas grandes questões não forem endere-çadas a contento, é difícil.

A agenda do ajuste fiscal está associada à agenda de recuperação da poupança pública e de recuperação da poupança agregada da economia. No bojo desse processo será possível retomar a própria agenda de desenvolvimento do mercado de capitais, que vinha sendo tocada no período 2004-2007. Mas se essas grandes questões não forem endereçadas a contento, é difícil.

11Fev/2016

Page 12: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

RESENHA – Em que medida o viés anticapitalista no Brasil afeta o avanço dos mercados?

FABIO GIAMBIAGI – Há uma ques-tão de desconhecimento por parte de enorme maioria da população acerca de como funciona o mercado. Infe-lizmente, nesse sentido eu diria que a crise de 2008 gerou um problema mundial no sentido dessa desconfian-ça acerca do bom funcionamento dos mercados, que se acentuou não ape-nas no Brasil como também no resto do mundo, gerando episódios como os do Occupy Wall Street e outros si-milares em outros lugares do mundo. Isso gera a necessidade daqueles que defendem o livre funcionamento do sistema enfatizarem os benefícios do capitalismo. Mas gera também nas au-toridades o desafio de aprimorarem os controles regulatórios de uma forma que mitiguem os riscos de repetição de crises, como a que vivenciamos em 2008, decorrentes em parte de falhas de regulação, sem matar o desenvolvi-mento do sistema financeiro.

RESENHA – Poderia dar exemplos desse viés anticapitalista em nos-so cotidiano?

FABIO GIAMBIAGI – O livro cita vários, mas o manancial é inesgotá-vel. Basta ler os jornais uma semana, em qualquer época, e os exemplos se amontoam aos borbotões. Vejamos só alguns exemplos recentes: aprovação do Congresso da medida que revoga parcialmente o fator previdenciário, decisão do Congresso de estender a todos os aposentados os aumentos re-

ais do salário mínimo, a reivindicação generalizada das manifestações de ju-nho de 2013, que surgiram em defesa de menores tarifas, algo que é uma vio-lência contra a lógica econômica, e a reação que houve às medidas elemen-tares de ajuste propostas. São todas, de um modo geral, expressões de uma sociedade que acredita que os recursos dependem de uma misteriosa “vonta-de política” e não de produzir mais, ser mais produtivo e mais eficiente.

RESENHA – Por que essas ideias são tão populares no Brasil?

FABIO GIAMBIAGI – O Brasil cres-ceu muito entre 1930 e 1980 e o fez adotando exatamente políticas que não são as adequadas para o mundo de hoje. Por que deu certo naquele período histórico? Por uma série de razões que favoreceram aquele pro-cesso. Entre elas, o fato de que isso coincidiu com um processo de mi-gração campo-cidade, que é uma das razões tradicionais do desenvolvi-mento de alguns países durante certa fase da sua história, de que havia uma extensa pauta de importações com produtos que poderiam ser substi-tuídos por produção local, de que o processo se iniciou com uma carga tributária baixa, etc. Nessas condi-ções, a intervenção estatal em todas as suas dimensões, durante 50 anos, não se pode negar que gerou um país melhor e mais desenvolvido. E isso deixou raízes profundas no imaginá-rio nacional, embora guarde pouca relação com as prescrições recomen-dáveis no mundo de hoje.

A tarefa principal do governo deve ser muito mais a de ensinar a pessoa a pescar que de dar o peixe. O problema é que viramos um país de pedintes, onde todo mundo tem algum peixe a pedir para o governo e agora o aquário está secando e o governo precisa racionar os peixes, porque quase ninguém sabe pescar.

entrevista

12 Fev/2016

Page 13: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

RESENHA – O capitalismo é sujeito a crises. Como combatê-las sem sufocar as virtudes do empreen-dedorismo e da competição?

FABIO GIAMBIAGI – O livro Capi-talismo – Modo de Usar tem toda uma reflexão extensa sobre esse fenômeno e resgata o papel de Schumpeter, tal-vez o melhor teórico do capitalismo. Joseph Schumpeter dizia que capita-lismo estável é uma contradição em termos e que é essa instabilidade que gera o progresso. Ele tem uma frase fa-mosa que define o capitalismo como a “tempestade eterna da destruição cria-dora”. É justamente a vontade de criar, de derrubar barreiras, de inventar algo novo, de descobrir um novo método de produção ou comercialização, que faz o sistema se mover. Nesse processo, muita gente sofre perdas temporárias, há empresas que quebram, pessoas perdem o emprego, mas no conjunto esse mecanismo de organização social e econômica desenvolvido pelo ser hu-mano permitiu nos últimos 250 anos de história da humanidade um pro-gresso maior que o dos cinco mil anos anteriores. O governo deve procurar mitigar os efeitos negativos com ins-trumentos como o seguro-desemprego, mas o que precisamos entender é que o papel do governo deve ser comple-mentar e o que tem que funcionar é o sistema de mercado.

RESENHA – O Brasil ainda possui muita desigualdade de renda. Como conciliar políticas de re-dução da pobreza e crescimen-to? Qual deveria ser o papel do governo?

FABIO GIAMBIAGI – Vou usar um velho chavão. A tarefa principal do go-verno deve ser muito mais a de ensinar a pessoa a pescar que de dar o peixe. O problema é que viramos um país de pedintes, onde todo mundo tem algum peixe a pedir para o governo e agora o aquário está secando e o governo pre-cisa racionar os peixes, porque quase ninguém sabe pescar.

RESENHA – O senhor acha que a questão fiscal no Brasil, ou seja, como financiar o nosso contrato social, vai se equacionar através de um novo governo que tenha isso na agenda, ou isso é um assunto tão impopular que só vamos resol-ver isso em uma crise muito pro-funda? Qual é a sua visão?

FABIO GIAMBIAGI – Eu vou mudar um pouco os termos da equação. A pergunta faz menção ao financiamen-to do contrato social, que é um pro-blema, mas acho que a solução disso passa por mudar o próprio contrato social. Na minha defesa de uma refor-ma da Previdência seguidamente me defronto com a acusação de que eu defenderia uma posição tecnocrática que ignoraria o fato de que a Cons-tituição é um pacto social. O que eu digo é que isso não é verdade. Ob-viamente reconheço que a Constitui-ção é, sim, um pacto social, mas que, como todo pacto, pode ser repactua-do em função das circunstâncias. O conjunto de dispositivos que temos hoje referentes à Previdência são re-sultantes de um conjunto de fatos que prevaleceram de 1988 até agora, mas que têm que ser revistos à luz das no-

vas circunstâncias e, notadamente, de dois elementos. Em primeiro lugar, o fato de que hoje a Previdência, o INSS especificamente, pesa o triplo em ter-mos relativos do que pesava em 1988, pois naquela época gastávamos 2,5% do PIB e agora gastamos 7,5% do PIB. Em segundo lugar, o das mudanças demográficas, que são realmente dra-máticas em perspectiva na relação com o quadro que existia no fim dos anos 1980. Faço muito o paralelo en-tre a questão previdenciária e a ques-tão ambiental. O mundo de novem-bro de 2015 não é muito diferente no que se refere à relação entre o homem e o meio ambiente do que o mundo de outubro de 2015, mas ele é muito diferente do mundo de 1965, 50 anos atrás. Com a Previdência, acontece a mesma coisa. A situação demográfi-ca para a Previdência de dezembro de 2015 não vai ser muito diferente em relação à de novembro, mas a si-tuação de 2040 ou 2050 será radical-mente diferente da situação de agora. Só que as pessoas que, pela lei atual, se aposentariam na altura de 2050 já estão começando a entrar no mercado de trabalho agora. Então, se a gente não começar a pensar em qual vai ser o futuro daqui a 35 anos, o risco que corremos é de que as pessoas sejam atropeladas pelas circunstâncias e te-nham que arcar com uma carga tribu-tária que vai dificultar enormemente o progresso do país. O problema do futuro é que um dia ele vira presente e o presente vira passado. E, como diz o Paul McCartney e eu cito na epígra-fe de um dos meus livros, “yesterday came suddenly”. O tempo passa e um dia a conta da inércia chega.

13Fev/2016

Page 14: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Programa Destaque em Governança de EstataisIntrodução: situação conjuntural e diagnóstico dos problemas

Como área responsável pela aplicação, enforcement e manutenção do valor do “selo” dos Re-gulamentos dos Segmentos Especiais, como o Novo Mercado, a Diretoria de Regulação, por in-termédio da Superintendência de Regulação e Orientação a Emissores, iniciou, no fim de 2013, o mapeamento das principais práticas de governança corporativa adotadas em outras jurisdições1, recomendadas em códigos ou exigidas por algumas das principais bolsas internacionais.

O objetivo do trabalho era reunir subsídios para uma ampla discussão com o mercado sobre os possíveis aprimoramentos destes segmentos.

É importante relembrar, conforme relatou Maria Helena Santana, que “a premissa básica que norteou a criação, em dezembro de 2000, do Novo Mercado, (...) destinado a empresas que se compro-metem com a adoção de padrões elevados de governança corporativa, foi de que a redução da percepção de risco por parte dos investidores influenciaria positivamente a valorização e a liquidez das ações”2. Nesse sentido, direitos e garantias adicionais, além da redução na assimetria de informações entre controladores e administradores das companhias e participantes do mercado, poderiam mitigar os riscos percebidos pelos investidores.

A manutenção do valor do Novo Mercado implicava, portanto, a identificação do “estado da arte” da governança corporativa em outros países e a discussão sobre os possíveis avanços com o nosso mercado, considerando a necessária ponderação entre custos e benefícios e as diferentes realidades.

1 O mapeamento compreendeu Códigos de Governança Corporativa de 15 países, além dos requisitos de listagem relativos à governança corporativa de sete das principais bolsas estrangeiras e princípios e recomendações de institutos internacionais, como o International Corporate Governance Network (ICGN).2 Novo Mercado and Its Followers: Case Studies in Corporate Governance Reform, in FOCUS. The International Bank for Recons-truction and Development/The World Bank Group, 2008.

FLAVIA MOUTA FERNANDES

BM&FBOVESPA

MAIARA MADUREIRA MENDES

BM&FBOVESPA

PATRÍCIA BOLINA PELLINIBM&FBOVESPA

artigo técnico

14 Fev/2016RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 15: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Contudo, em meio às reflexões do grupo de trabalho, surgi-ram alguns questionamentos inevitáveis naquele momento: como seria conduzida a questão da governança nas estatais? Como dis-cutir avanços em termos de práticas de governança corporativa, especificamente com essas companhias?

Com efeito, é inegável a importância das estatais para o mer-cado de capitais brasileiro. Em 31/08/2015, havia 30 estatais lista-das na BM&FBOVESPA, das esferas federal, estadual e municipal, atuantes em seis setores da economia e responsáveis por 14,23% da capitalização de mercado (equivalente a R$ 300 bilhões). Essas companhias foram responsáveis, no período de setembro de 2014 a agosto de 2015, por 21,9% do volume médio diário negociado (equivalente a R$ 1,5 bilhão). Dessas estatais, oito são integran-tes do Ibovespa e dez do IBrX-100. Em relação à participação de pessoas físicas, merecem destaque o Banco do Brasil (324 mil), a Petrobras (323 mil) e a Cemig (123 mil).

Não obstante esse papel de destaque das estatais, dados sus-tentavam a necessidade de elevar o padrão de governança nestas empresas: no período compreendido entre janeiro de 2010 e abril de 2015, a capitalização das estatais listadas havia apresentado uma retração de 35% (apenas a Petrobras acumulava uma variação ne-gativa de 44%), sendo que, no mesmo período, a capitalização de todas as companhias listadas apresentou um incremento de 6,5%.

Com foco no aprimoramento das práticas de governança das estatais, foi anunciada, em abril de 2015, a proposta de de-senvolvimento de um programa específico para essas compa-nhias, um desafio para os envolvidos diretos no trabalho e uma resposta à necessidade de recuperar a imagem e a credibilidade dessas empresas.

A lógica foi a de que, se em 2000 a fragilidade da nossa re-gulação – com direitos, iniciativas adotadas pela administração das companhias e transparência insuficientes – justificou a criação do Novo Mercado, pautado pela adoção de práticas diferenciadas de governança corporativa, na atual circunstância, a proposta para as estatais deveria trilhar caminho semelhante, sendo compartilha-do com os mais diversos interessados – acionistas controladores (União, estados e municípios), agentes de mercado, investidores, reguladores, experts em governança e acadêmicos.

Além disso, era preciso propor um plano ambicioso, com práticas robustas, concretas e objetivas e, ao mesmo tempo, passí-veis de implementação no curto ou médio prazo, que não depen-dessem de alterações legislativas ou regulamentares. Algo prático, viável. Mas, além de equilibrar esses aspectos e considerar as ex-

pectativas de todos os interessados, havia uma premissa funda-mental: não entrar em questões ideológicas, como, por exemplo, a razão de ser das estatais, o papel do Estado na economia ou as privatizações e suas consequências.

O momento era mais que apropriado: além do cenário do-méstico, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) estava coordenando uma ampla discussão para aprimorar suas recomendações voltadas especificamente às estatais e o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) também estava discutindo o tema. Desta forma, o tra-balho começou com a recuperação do mapeamento das práticas de governança corporativa adotadas internacionalmente, seja nos códigos internacionais – OCDE e ICGN –, nos códigos nacionais ou nas regras de listagem de outras bolsas, e a análise de como po-deriam ser aplicadas às estatais.

Em busca de uma ampla literatura global sobre o tema, foram consultadas outras fontes como as Diretrizes da OCDE sobre Go-vernança Corporativa para Empresas de Controle Estatal, as Orien-tações da CAF (Corporación Andina de Fomento) sobre Gover-nança de Estatais, as práticas específicas adotadas por outros países (merecendo destaque a Suécia), os modelos adotados pelas estatais consideradas referência (em especial a Statoil), a legislação e a re-gulamentação aplicáveis a essas companhias, e, ainda, o diagnóstico dos principais gaps de algumas estatais listadas.

Após a conclusão desta etapa de pesquisa e organização do conteúdo, houve o diálogo com os experts, a análise da percepção geral a partir de matérias veiculadas pela imprensa sobre o assun-to e, evidentemente, intensas discussões internas. Ao fim desse processo, as bases para o desenvolvimento de programa especí-fico para as estatais estavam sedimentadas. Houve contribuições importantes de especialistas externos, como o advogado Marcelo Barbosa (de Vieira, Rezende, Barbosa e Guerreiro Advogados), do professor Curtis J. Milhaupt (da Columbia Law School) e do professor Mário Engler, que, além de ter grande experiência pro-fissional no assunto, teve como tese de doutorado Empresa Estatal – Função Econômica e Dilemas Societários.

As propostas iniciais de medidas de governança corporativa abrangeram, portanto, um minucioso trabalho de referências e de aplicabilidade à realidade brasileira, além da contribuição de profis-sionais com visão privilegiada sobre o tema e com grau de rigidez necessário para que as companhias se esforçassem em aprimorar suas práticas e que não inviabilizasse a adesão ao programa.

15Fev/2016 RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 16: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Discussões em Audiência Restrita e na Câmara Consultiva de Mercado de Governança Corporativa

Em uma proposta de trabalho como esta, é inevitável a com-paração com o surgimento do Novo Mercado nos anos 2000. De-finitivamente, o programa de governança de estatais se inspirou no Novo Mercado, mas guardava diferenças significativas, em parti-cular, quanto ao mecanismo de reconhecimento.

Como fonte de inspiração, citamos, mais uma vez, o proces-so de construção do segmento especial de listagem da então BO-VESPA. Maria Helena Santana, em junho de 20063, atribuiu “parte do sucesso à rede de parceria – e de iniciativas concretas – envolvendo agentes dos setores público e privado (...) com o objetivo de contribuir para que iniciativas que dependam de forças de mercado floresçam, mesmo em condições de mercado desfavoráveis”.

Deste modo, o meio que parecia mais próspero era unir forças e fomentar a discussão do assunto, com senso de realidade e propos-tas de soluções ponderadas, como bem pontuou o professor Mario Engler, afastando temas como a própria existência das estatais, cor-rupção e Operação Lava Jato.

A ideia foi organizar um mecanismo de consulta a participan-tes do mercado de capitais, sociedades de economia mista, contro-ladores públicos e investidores, a exemplo das audiências públicas já amplamente difundidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) previstas na Lei nº 6.385/764, em que a tônica é, de fato, abrir um canal de comunicação entre setores da sociedade. A audi-ência foi, portanto, um instrumento de apoio ao processo decisório, oferecendo aos interessados a oportunidade de encaminhamento de sugestões e comentários a textos originalmente propostos.

O modelo seguido pela BM&FBOVESPA foi intitulado de Audiência Restrita, não porque limitaria a participação de interessa-dos, mas porque era fundamental ouvir algumas pessoas-chave. Para tanto, foi desenhado um modelo que contemplava quatro reuniões

presenciais, algumas entrevistas com especialistas e recebimento de manifestações por escrito, além de discussões com áreas da própria BM&FBOVESPA e da CVM. Tudo isso em um mês.

A chance de todo este esforço se mostrar inócuo ao final era gigantesca. Havia três grandes riscos no processo de reuniões pre-senciais. O primeiro era a possibilidade de quórum baixo ou públi-co presente pouco heterogêneo. O segundo estava associado a uma participação burocrática dos convidados, muito mais para ouvir que para contribuir efetivamente. Por fim, o último risco era a partici-pação maciça para apontar os pontos negativos e trazer ao debate temas como investigações de corrupção, desviando o foco da apre-sentação concreta de alternativas.

A realidade foi bastante distinta: as reuniões presenciais, com duração total de dezesseis horas, contaram com um público médio de quarenta pessoas, entre representantes dos governos federal e estadual, sociedades de economia mista abertas, entidades de mercado, investi-dores e órgão regulador. Um público comprometido com a iniciativa, participativo e interessado em contribuir para um programa efetivo.

As maiores discussões envolveram os aprimoramentos de re-gras de divulgação de informações sobre a persecução do tão citado interesse público e também as medidas de instituição de requisitos mínimos para a indicação de membros da administração da empre-sa estatal, bem como da verificação da aderência dos candidatos aos referidos requisitos.

Depois dessa rodada de debates, o próximo passo era compilar todas as contribuições e decidir quais seriam ou não contempladas no novo texto do programa, o que culminaria com a divulgação da versão final do programa no último dia do mês de junho de 2015.

No entanto, as significativas contribuições daqueles con-sultados ao longo do processo e as reflexões do grupo envolvido resultaram em uma série de aprimoramentos ao texto original, levando a uma nova rodada de discussões, mas dessa vez, por meio da instalação da Câmara Consultiva de Mercado de Go-vernança de Estatais, criada para auxiliar a administração da BM&FBOVESPA na condução desse debate5.

3 Novo Mercado and Its Followers: Case Studies in Corporate Governance Reform, in FOCUS. The International Bank for Reconstruction and Development/The World Bank Group, 2008, p.3.4 Art. 8º, § 3º Em conformidade com o que dispuser seu regimento, a Comissão de Valores Mobiliários poderá:

I – publicar projeto de ato normativo para receber sugestões de interessados; II – convocar, a seu juízo, qualquer pessoa que possa contribuir com informações ou opiniões para o aperfeiçoamento das normas a serem promulgadas.

5 A Câmara contava com 20 representantes de entidades de mercado – Antonio Duarte Carvalho de Castro (Abrasca), Caio Weil Villares (Ancord), Claudio Pacheco Prates La-machia (OAB Nacional), Denise Pauli Pavarina (Anbima), Francisco Antonio Maldonado Sant’Anna (Ibracon), Geraldo Soares Leite Filho (Ibri), Luís Eduardo Ramos Lisbôa (ABBI), Manoel Félix Cintra Neto (ABBC), Mauro Rodrigues da Cunha (Amec), Reginaldo Ferreira Alexandre (Apimec), Sandra Guerra (IBGC), Walter Mendes de Oliveira Filho (CAF) – e especialistas – Carlos Alberto Rebello Sobrinho, José Guimarães Monforte, Maria Helena dos Santos Fernandes de Santana, Mário Engler Pinto Júnior e Pedro Oliva Marcílio de Sousa. Além disso, participaram como ouvintes Antonio Carlos Berwanger (CVM), Nina Maria Arcela (Ministério da Fazenda) e Murilo Francisco Barella (Ministério do Planejamen-to). A Câmara era presidida por Flavia Mouta Fernandes (BM&FBOVESPA) e a vice-presidência era ocupada por Roberto Augusto Belchior da Silva.

16 Fev/2016RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 17: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Em sua primeira missão, a Câmara deveria avaliar e co-mentar a nova versão do programa de governança de estatais. Na sequência, os integrantes teriam 30 dias para compartilhar a versão com demais interessados, compilar comentários e pros-seguir com a análise final antes de uma última rodada de discus-são e do envio do regimento do programa para deliberação do Conselho de Administração da BM&FBOVESPA.

As contribuições da Câmara não se encerraram com a edição do programa, pois terá ampla atuação na discussão sobre inovações nas práticas de governança corporativa es-pecíficas para estatais, propondo eventuais melhorias no programa. Além disso, será informada sobre as certificações concedidas pela BM&FBOVESPA.

Entre muitos erros e acertos, definitivamente a estraté-gia de um fórum de discussão foi vitoriosa. Todos que par-

ticiparam se sentiram ouvidos, ainda que suas manifestações não tenham sido atendidas na plenitude.

Programa Destaque em Governança de Estatais

Medidas de Governança Corporativa – Linhas de Ação

Intitulada Programa Destaque em Governança de Estatais, a iniciativa nasceu com um grupo de 25 medidas de governança corporativa divididas em quatro linhas de ação, sendo que algu-mas foram consideradas obrigatórias para fins de certificação e as demais opcionais, com ponderações distintas a depender da relevância e complexidade.

Linha de Ação Medidas Pesos

Transparência

Aprimoramentos ao Conteúdo do Formulário de Referência OBRIGATÓRIO

Política de Divulgação de Informações 2

Divulgação de Políticas e Regimentos Internos no Website da Estatal 1

Carta Anual de Governança Corporativa 1

Relatório Integrado ou de Sustentabilidade 1

Controles Internos

Alçadas de Decisão, Segregação de Funções, Treinamentos 1

Código de Conduta ou Integridade 4

Treinamentos sobre Código de Conduta 1

Instalação de Área de Compliance e Riscos OBRIGATÓRIO

Atribuições da Área de Compliance e Riscos 2

Auditoria Interna e Comitê de Auditoria Estatutário OBRIGATÓRIO

Divulgação do Relatório do Comitê de Auditoria Estatutário 4

Política de Administração de Riscos 2

Política de Transações com Partes Relacionadas OBRIGATÓRIO

Aprimoramento das Atribuições do Conselho Fiscal 1

Composição da Admi-nistração

Requisitos Mínimos para Indicação de Administradores OBRIGATÓRIO

Aderência aos Requisitos para Indicação de Administradores OBRIGATÓRIO

Comitê de Indicação 1

Avaliação dos Administradores 2

Vedação à Acumulação de Cargos 2

Mandato dos Conselheiros 1

Número de Membros do Conselho de Administração 1

30% de Conselheiros Independentes 4

Treinamentos 2

Compromisso do Controlador Público Compromisso dos Controladores Públicos 4

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artigo técnico

Fev/2016 RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 18: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Cada linha de ação representa uma preocupação especí-fica da BM&FBOVESPA.

A primeira – transparência – foi inspirada no artigo 238 da Lei Societária, que deu início a todas as pesquisas e que ressalta a existência de interesses antagônicos sob as socie-dades de economia mista – o interesse público tutelado pelo Estado e a finalidade lucrativa motivadora da participação acionária privada – e estabelece que, não obstante as obriga-ções do controlador das estatais sejam as mesmas dos contro-ladores das companhias privadas, é possível que a orientação das atividades da companhia vise ao atendimento do interes-se público que justificou a sua criação.

Por meio do artigo 238, a Lei Societária permite o sacri-fício do lucro em prol do interesse público que justificou a criação da estatal. Neste sentido, torna-se imprescindível que o referido interesse público seja claro, a fim de permitir que os investidores conheçam os objetivos do controlador da estatal e, assim, façam uma adequada avaliação do risco a que estão sujeitos. A transparência torna-se uma ferramenta primordial para que os custos implícitos relacionados ao comportamen-to do acionista controlador sejam corretamente contabiliza-dos, permitindo, a fiscalização da atuação da administração e dos acionistas controladores.

O principal documento que se tem hoje para a divulga-ção de informações relacionadas a uma companhia é o For-mulário de Referência. No entanto, com base na análise de algumas estatais listadas na BM&FBOVESPA, constatou-se que muitos pontos do documento deveriam ser aprimorados. Foi delineada, então, a principal medida de governança da linha “transparência”, considerada, para fins de certificação, obrigatória: o aprimoramento do Formulário de Referência. Foram elencados diversos itens que mereciam contar com in-formações adicionais, como a definição prévia e clara das di-retrizes públicas a serem perseguidas pela estatal, bem como os recursos envolvidos.

A segunda linha de ação – Controles Internos – preocupa-se com o estabelecimento de uma estrutura interna de contro-les funcional. Esta é, certamente, a linha de ação mais complexa e com maior grau de consenso ao longo das reuniões.

Com base nos princípios do Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission (COSO), um modelo mundialmente reconhecido de desenvolvimento, im-plementação e condução de controles internos, foram criadas

medidas que determinam que as estruturas e as práticas de controles internos estejam presentes em três linhas de prote-ção, alinhadas com uma Política de Administração de Riscos. A primeira conta com a implementação cotidiana de contro-les internos – e daí a determinação de elaboração de um Có-digo de Conduta, com conteúdo mínimo, estabelecimento de alçadas de decisão e de segregação de funções sensíveis em pessoas e setores diferentes –; a segunda, com a implantação de uma área de Compliance e Riscos, e, por fim, a terceira, com a instalação de uma auditoria interna; e de um Comitê de Auditoria Estatutário (CAE).

Houve o cuidado para que a criação dessas linhas de pro-teção não ocorresse somente no papel. Assim, foram estabele-cidos conteúdos mínimos para o Código de Conduta e para a Política de Administração de Riscos, previstas as funções das áreas de Compliance e da Auditoria Interna, e, para que essas áreas tivessem a independência necessária para sua atuação, determinou-se que deveriam ter estrutura e orçamento ade-quados às suas funções e que seus titulares fossem protegidos por mecanismos de independência.

Em relação ao CAE, recomendado internacionalmen-te, considerando os detalhes do órgão na Instrução CVM 308/99, não houve grandes inovações, salvo quanto à lide-rança por um membro independente, conforme definição prevista no próprio programa. Para atestar seu funcionamen-to efetivo, estabeleceu-se a divulgação do relatório do órgão junto às demonstrações financeiras, exigindo que, no referido relatório, houvesse a indicação das reuniões realizadas e os principais assuntos discutidos.

Por fim, a elaboração de uma Política de Transações com Partes Relacionadas, também em linha com as principais re-comendações internacionais, estabeleceu um conteúdo míni-mo obrigatório que conta, por exemplo, com a análise prévia dessas transações por órgão independente, como o CAE.

A terceira linha de ação foi, de longe, a mais polêmica. Todos consideravam extremamente importante que o Conse-lho de Administração das estatais tivesse, em sua composição, membros qualificados e isentos e que o órgão como um todo fosse diversificado.

Mesmo com a premissa de que não seria preciso vedar participações no órgão se houvesse um rol de critérios para a indicação de administradores rigoroso o bastante para impe-dir o “loteamento” dos cargos, havia uma demanda significa-

artigo técnico

18 Fev/2016RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

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Page 19: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

tiva das entidades de mercado para que fosse impedida a par-ticipação de pessoas ligadas ao governo ou partidos políticos nos órgãos de administração das estatais. Ou seja, era neces-sário um equilíbrio. Foi vedada a participação, no Conselho de Administração, de representantes de órgãos reguladores aos quais a estatal estaria sujeita, de dirigentes estatutários de partidos políticos e, ainda, de titulares de mandatos no Poder Legislativo. Foi limitada a 50% a participação, no Conselho de Administração, de indicados pelo Controlador Público que exerçam cargos de confiança, sendo que no máximo dois deles poderiam ser detentores de função comissionada sem vínculo efetivo com o ente federativo controlador.

Os requisitos para a indicação de administradores foram considerados obrigatórios, assim como o mecanismo utilizado para sua efetiva observação – a verificação da aderência dos in-dicados aos requisitos preestabelecidos, inclusive as vedações e limitações, deverá ser feita pelo Conselho de Administração, diretamente ou por meio de um Comitê de Indicação.

As demais medidas foram pontuais, replicando o que já é adotado pelos Códigos de Governança – a exemplo do núme-ro de membros do Conselho de Administração, previsto pelo IBGC – ou pelas companhias privadas com ações admitidas à negociação nos Segmentos Especiais da BM&FBOVESPA –, como o mandato de dois anos ou a impossibilidade de acumulação de cargos. Merece destaque a exigência de que o Conselho de Administração da estatal fosse composto por, no mínimo, 30% de membros independentes. Não obstante essa medida seja opcional para a certificação na Categoria 2, foi considerada de alta relevância, tendo a maior ponderação possível entre as medidas (4 pontos).

Por fim, a última linha de ação traz o compromisso do Controlador Público – sua medida, apesar de não ser obri-gatória, também tem a maior ponderação possível entre as medidas (4 pontos).

Ainda que o controlador acabe tendo um papel muito im-portante na adesão ao programa, deve demonstrar especifica-mente seu compromisso com as boas práticas de governança corporativa por meio da alteração do Código de Conduta apli-cável à alta administração para prever, no rol de violações à éti-ca pública, o dever de guardar sigilo de informações relevantes e o dever de divulgar essas informações relevantes ao diretor de Relações com Investidores. Desta forma, criou-se um me-canismo por meio do qual ministros ou secretários de Estado

poderiam ser sancionados – no caso, pelas Comissões de Ética Pública – pelo vazamento de informações relevantes, o que não seria possível pela regulamentação atualmente em vigor.

Mecanismo de Reconhecimento e Acompanhamento

Paralelamente à fase final de discussão do programa, foi estudado um mecanismo que permitisse aferir o atendimento das medidas pelas estatais que voluntariamente aderissem à iniciativa, bem como um mecanismo para o reconhecimento dessas companhias, com base em algumas premissas.

Não foram estabelecidas medidas que poderiam ser atendidas por meio de um simples check list, nem auditorias nas companhias.

Diante disso, o mecanismo de reconhecimento não po-deria avaliar a mera existência de estruturas internas ou de códigos e políticas. Ao longo das discussões, houve inúme-ros relatos de companhias que tinham estruturas internas, políticas e procedimentos muito bem desenhados, mas que não funcionavam. Portanto, estruturas e práticas “no papel” seriam insuficientes.

Além disso, o mecanismo deveria avaliar a efetividade das medidas sem que fosse necessária a realização de uma auditoria nas companhias. As medidas deveriam alcançar o maior grau de objetividade possível, com critérios para a identificação de sua efetividade.

Em segundo lugar, era imprescindível que o mecanismo de reconhecimento apresentasse mitigadores dos riscos aos quais a BM&FBOVESPA estaria sujeita em decorrência do reconhecimento, especialmente quando se trata de reputação. Com efeito, inúmeras acusações poderiam surgir, dentre as quais, (i) o excesso de subjetividade na análise; (ii) o favore-cimento de uma companhia em detrimento de outra; (iii) o reconhecimento da adoção de boas práticas para uma com-panhia que viesse a ser envolvida em escândalos, como de corrupção; (iv) a divulgação do compromisso com as práticas por uma companhia que não as implementasse.

A objetividade estabelecida como base de todo trabalho foi considerada como um mitigador desses riscos e o desenho do procedimento para o reconhecimento também seria uma ferramenta importante. Adotou-se, então, um procedimento por meio do qual a própria BM&FBOVESPA faria a análise das companhias – a avaliação pela mesma equipe permitiria

19Fev/2016 RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 20: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

um alinhamento que afastaria interpretações diversas sobre o modo de atendimento de determinada medida e a objetivi-dade da análise.

Por fim, era necessário um esforço efetivo das estatais para aprimorar suas práticas de governança corporativa, mas, por outro lado, o programa não poderia ser rígido, a ponto de inviabilizar a adesão.

Estabelecidas as premissas para a elaboração do mecanis-mo de reconhecimento, era necessário olhar para o programa como um todo: eram várias medidas de relevância e graus de complexidade. Algumas eram essenciais – seria inconcebível que qualquer companhia fosse reconhecida como detentora das melhores práticas sem que as tivesse adotado. Essas me-didas foram consideradas obrigatórias. As demais medidas, adicionais, mereciam um tratamento diferenciado, a depender da complexidade e do tempo demandado para sua implemen-tação. Por isso, as medidas foram ponderadas, e as companhias que as adotassem poderiam ganhar 1, 2 ou 4 pontos.

Neste cenário foram definidas duas categorias de certi-ficação. A primeira delas, a Categoria 1, representava o ideal das estatais e não havia a pretensão de nenhuma adesão no curto ou médio prazo. Para a certificação nessa categoria, a estatal deveria adotar todas as 25 medidas previstas no pro-grama. A Categoria 2 classificava as companhias que adotas-sem seis medidas consideradas obrigatórias e obtivessem 27 pontos (em um total de 37 pontos possíveis) nas medidas op-cionais nesta categoria.

Uma vez que a estatal recebesse a certificação, ficaria su-jeita ao monitoramento da BM&FBOVESPA, que passaria a acompanhar permanentemente a adoção das medidas de go-vernança corporativa do programa e sua efetividade.

Desta forma, foi previsto o monitoramento periódico, anual, com uma nova avaliação da companhia em que, em decorrência desta avaliação, poderia ser alterada a certifica-ção, rebaixando-a ou elevando-a. O monitoramento eventual permitiria colocar a certificação “em revisão” diante de infor-mações que poderiam indicar situações que justificariam a elevação ou o rebaixamento da categoria.

Além disso, ficou resguardado o direito de retirar a cer-tificação das estatais quando não houvesse informações sufi-cientes para continuar o monitoramento, as informações não fossem respaldadas ou, ainda, na hipótese de descumprimen-to das medidas do programa.

Todos os procedimentos para o monitoramento e o reconhecimento das estatais foram desenhados de modo a permitir sua certificação com base nas informações mais atuais, refletindo as práticas efetivamente adotadas por essas companhias. Desta forma, uma última regra prevista relacio-nada ao tema, qual seja a prerrogativa da BM&FBOVESPA em divulgar uma última certificação antes de descontinuar o acompanhamento da estatal, visa garantir ao mercado que a última certificação seja aquela mais próxima à realidade da companhia, mitigando o risco de que o pedido de desvincu-lação do programa seja feito a fim de evitar o rebaixamento de categoria.

ConclusãoUma vez finalizado e entregue o programa, o protago-

nismo das discussões sobre o tema está nas mãos das estatais. Aquelas que participaram das discussões e já haviam recebido uma análise prévia da BM&FBOVESPA teriam que percorrer todo um caminho de implementação das medidas de gover-nança e de adaptação das práticas já adotadas. Outras, que não estavam no radar, entraram em contato para pedir informações sobre o projeto, demonstrando grande interesse em participar.

Enquanto as companhias tratam do assunto interna-mente, há motivos para comemorar cada pequena vitória. Ao longo das discussões, muitas reconheceram que adotavam diversas práticas de governança, mas que sua divulgação era bastante deficiente e seria melhorada.

Além disso, a Comissão Interministerial de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias da União (CGPAR) divulgou três resoluções relacionadas com a governança corporativa nas empresas estatais federais e da administração de participações societárias da União. A primeira delas estabelece a obrigatoriedade para as empresas estatais da adoção de plano de trabalho anual pelos conselhos fiscais; a segunda, a obrigatoriedade de submeter as demons-trações financeiras anuais à auditoria por auditores indepen-dentes; a terceira, por fim, a obrigatoriedade para as empresas estatais de manter um canal de atendimento e de divulgar, em seus respectivos websites, informações sobre a estrutura de governança da companhia, demonstrações financeiras e ou-tros documentos.

O momento, agora, é de expectativa para a aguardada adesão pioneira.

20 Fev/2016RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 21: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

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21

artigo técnico

Fev/2016 RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

DA BOLSA

Page 22: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

GUILHERME DE SOUZA PIMENTEL

BM&FBOVESPA

FABIO DUTRABM&FBOVESPA

RÉGIO SOARES FERREIRA MARTINS

BM&FBOVESPA

Uma Introdução aos ETFs – Fundos de ÍndiceNos próximos meses, o mercado brasileiro deverá testemunhar o lançamento de uma nova e promissora categoria de produto: o ETF de Renda Fixa. Com o arcabouço regulatório prestes a ser finalizado e com o lançamento pela BM&FBOVESPA da infraestrutura para a negociação, criação e resgate de cotas, os gestores poderão listar os primeiros fundos desta categoria. Pela primeira vez em nosso mercado, qualquer investidor poderá negociar uma carteira de títulos de renda fixa tão facilmente quanto negocia uma ação, com preço em tela. Dentre os benefícios para as pessoas físicas, o pro-duto promete ampliar a experiência existente no Tesouro Direto e nos fundos de renda fixa tradicionais, ao proporcionar uma carteira diversificada de títulos com um potencial benefício tributário. Para os investidores profissionais, o produto será uma forma diferente de negociar títulos de renda fixa e administrar o caixa, com os benefí-cios de liquidez e transparência que caracterizam os produtos lista-dos. E, para o Tesouro Nacional, é um instrumento que pode auxiliar a gestão da dívida mobiliária federal, ao prover uma nova forma de acesso aos títulos.

O objetivo deste artigo é aproveitar o momento para revisar a história dos ETFs no Brasil, as características do produto e, de forma resumida, apresentar o mínimo que um investidor precisa saber para se considerar bem informado sobre esta classe de ativo que vem ganhando cada vez maior relevância no mercado internacional. Para aqueles que quiserem se aprofundar no assunto, uma lista com referências adicionais foi incluída como bibliografia no fim do artigo.

artigo técnico

22 Fev/2016

Page 23: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

O que são ETFs?Os Exchange-Traded Funds (ETFs), ou Fundos de Índice, são

veículos de investimento similares aos fundos mútuos, mas cujas co-tas são negociadas em bolsa de valores por um preço estabelecido em mercado, ou seja, o valor da cota é determinado pelas condições de oferta e demanda e segundo as regras de negociação da bolsa em que são listados.

O ETF é um fundo composto por uma cesta de ativos, negocia-do de forma consolidada e que necessariamente segue um índice de referência. Quando um investidor toma a decisão de investir em uma cota do ETF de Ibovespa, por exemplo, de forma geral, ele passa a ter exposição às ações que compõem esse índice.

Desde seu surgimento nos Estados Unidos no início dos anos 1990, os ETFs tornaram-se veículos de investimento bastante popu-lares, a ponto de em 2015 terem ultrapassado o tamanho da indús-tria de hedge-funds, acumulando quase US$3 trilhões de ativos sob gestão em todo o mundo1. Segundo a SEC (Securities and Exchange Commission), somente nos Estados Unidos havia quase 1.400 fun-dos listados no fim de 2014.

A maturidade dos ETFs como indústria (com seus diversos ti-pos de participantes especializados) e como classe de ativo se reflete no alto nível de sofisticação e de diversificação dos produtos dispo-níveis. Apesar da grande maioria desses fundos ter como objetivo a simples replicação do desempenho de certo índice de referência, hoje há ETFs que permitem exposição a todos os mercados (renda variável, renda fixa, commodities, moedas e volatilidade), geografias (países ou regiões), setores (dos tradicionais aos mais exóticos2) e diversas formas (gestão ativa ou passiva, alavancada, inversa, etc.).

O sucesso dos ETFs fez com que seu conceito básico – a lis-tagem em bolsa de um produto estruturado – fosse replicado para outros tipos de ativos, como instrumentos de dívida bancária (Ex-change-Traded Notes – ETNs) e commodities (Exchange-Traded Commodities – ETCs). Este conjunto de produtos estruturados negociados em bolsa recebe o nome genérico de Exchange-Traded Products, ou ETPs, dos quais os ETFs compõem a larga maioria.

No Brasil, os números ainda são modestos. Atualmente exis-tem 17 ETFs listados na BM&FBOVESPA3, todos referenciados a índices de ações, sendo dois deles estrangeiros (referenciados ao

S&P 500). Esses fundos atingiram, em agosto de 2015, um patrimô-nio total de R$3,7 bilhões, com volume diário de negócios acima de R$100 milhões. Investidores profissionais e pessoas físicas utilizam o produto para diversos fins, desde uma forma eficiente de se expor a um conjunto potencialmente grande de ativos (buy-and-hold) até estratégias mais sofisticadas de arbitragem, long & short e de negocia-ção em alta frequência.

Os ETFs seguem regulamentação específica no Brasil. Do ponto de vista da constituição e do funcionamento do produto, a principal referência é a Instrução CVM 359, de 2002, atualizada em 2013 pela Instrução 537, que passou a permitir a criação de fundos referenciados em índices de renda fixa. Do ponto de vista tributário, a Instrução Normativa 1.585, de 2015, da Secretaria da Receita Fe-deral (SRF), estabelece regras específicas sobre o Imposto de Renda incidente nesses fundos, e foi recentemente atualizada para incluir os dispositivos da Lei 13.043/2014, que estabeleceu uma tributação diferenciada para os ETFs de Renda Fixa.

Outra característica importante dos ETFs é que eles são fun-dos de investimento abertos, no sentido de que novas cotas podem ser criadas para investidores que aportarem recursos suficientes para tanto (e o fundo aumenta de tamanho nesse momento), ou cotas existentes podem ser canceladas a pedido do investidor titular, que recebe os recursos proporcionais às cotas entregues (e o fundo di-minui de tamanho). Este é o chamado mercado primário de cotas, distinto do mercado secundário, onde cotas já existentes trocam de titularidade por meio de negociação em bolsa. Essas criações (inte-gralizações) os cancelamentos (resgates) de cotas podem ser feitos em dinheiro (modelo in-cash) ou nos ativos componentes da carteira (modelo in-kind), dependendo do regulamento do fundo. As inte-gralizações e resgates no mercado primário exigem valores muitas vezes superiores aos valores típicos transacionados no mercado se-cundário e servem basicamente para a entrada ou saída de grandes investidores, que levariam muito tempo para montar ou desmontar suas posições no secundário, ou para operações de arbitragem, nas quais investidores negociam simultaneamente a cota e a cesta de ativos componentes para aproveitar (e corrigir) eventuais diferen-ças entre o valor de mercado da cota e da cesta. O valor teórico da cesta de ativos representada por uma cota é uma referência muito

1 “Exchange-Traded Funds grow bigger than hedge funds”, Financial Times, 21 de julho 2015.2 Nos últimos anos tem sido comum o lançamento de ETFs “temáticos”, em que é possível se expor a uma tese de investimento ou a um subconjunto de empresas altamente específico. Ver, por exemplo, http://www.etf.com/sections/features/23235-new-thematic-etf-firm-makes-its-pitch.html, http://www.pureetfs.com/index.html, ou http://www.direxioninvestments.com/products/direxion-ibillionaire-index-etf3 http://www.bmfbovespa.com.br/etf/fundo-de-indice.aspx?Idioma=pt-br

23Fev/2016

Page 24: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Participantes do mercadoO processo de criação, listagem e funcionamento diário de um ETF requer a participação de diversos agentes, cada um com espe-cialização e responsabilidades exclusivas. Os principais membros da cadeia de valor da indústria de ETFs no Brasil são:

Administrador:presta os serviços relacionados ao funcionamento e à manuten-ção do fundo, que podem ser prestados por ele mesmo ou por terceiros contratados. É responsável pela contratação e destitui-ção do gestor, custódia dos ativos, escrituração da emissão e do resgate de cotas, convocação de assembleias e demais ativida-des relacionadas ao dia a dia das operações do fundo.

Gestor:é o responsável pela gestão da carteira do fundo (compra e venda dos ativos componentes) e, portanto, por boa parte do desempenho do fundo perante o índice de referência. Para o gestor do ETF há um desafio diário em lidar com ativos ilíqui-dos, grandes resgates ou integralizações de cotas, emprés-timo dos ativos em carteira, escolha de ativos similares, etc. Os atuais gestores de ETFs no Brasil são o Banco do Brasil, a BlackRock, a CEF e o Itaú.

Provedor de índice: define a metodologia, calcula o valor e estabelece, por meio de contrato com o administrador, as condições de uso do índice de referência do fundo. No Brasil, alguns dos provedores que atuam na oferta de índices do mercado de capitais são a Associação Bra-sileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (An-bima), a BM&FBOVESPA, a FTSE, a MSCI e a S&P Dow Jones, que neste ano celebrou com a bolsa uma joint venture para a produção de novos índices ao mercado. A legislação brasileira proíbe que o provedor do índice seja parte relacionada ao administrador ou ao gestor do ETF. Isso evita potenciais conflitos de interesse.

Comissão de Valores Mobiliários (CVM):além de definir o arcabouço regulatório e conduzir com o mercado discussões para seu aprimoramento, a autarquia concede o registro do fundo (condição necessária para sua listagem em bolsa) e monitora seu funcionamento, aplican-do sanções quando cabíveis.

BM&FBOVESPA: perante o fundo, a bolsa executa os processos de listagem (análise da documentação do fundo para que suas cotas sejam admitidas à negociação) e de monitoramento (cumprimento das regras aplicáveis aos emissores listados). Perante os inves-tidores, presta os serviços usuais sobre os valores mobiliários negociados em seus ambientes (negociação eletrônica em li-vro central de ofertas, compensação e liquidação das opera-ções como contraparte central, depósito dos ativos em contas individualizadas por investidor, tratamento de eventos, etc.)

Corretoras:são responsáveis pela captação e relacionamento direto com os investidores e pela intermediação dos negócios entre eles, por meio do acesso que possuem aos ambientes e serviços presta-dos pela bolsa. Na maioria dos casos assumem também o papel de custodiantes, sendo responsáveis pela manutenção das con-tas dos investidores junto à central depositária da bolsa.

Formador de mercado:agente contratado pelo administrador e cadastrado pela bol-sa para prover liquidez às cotas do ETF no mercado secundá-rio. O formador de mercado assume o compromisso de com-prar e vender cotas por meio de ofertas firmes ao mercado e dentro de condições preestabelecidas em contrato firmado com a bolsa (que prevê, por exemplo, a quantidade mínima de cotas a serem ofertadas, o spread máximo entre os preços de compra e venda e o tempo de presença mínima durante o pregão). Hoje os formadores de mercado de ETF no Brasil são os bancos BTG Pactual, Citibank e Credit Suisse.

Agente autorizado: faz a intermediação entre os investidores e o administrador nas transações do mercado primário. Papel geralmente de-sempenhado por corretoras, que são cadastradas pelo admi-nistrador do fundo.

importante para a negociação dos ETFs e recebe alguns nomes como Indicative Optimized Portfolio Value (IOPV) ou Indicative Intraday Value (IIV). Em um mercado livre de oportunidades de arbitragem, o valor da cota negociada em mercado deve ser igual

ao seu IOPV, ajustado aos custos de transação. A existência de ar-bitradores e de um mercado líquido de cotas e de ativos faz com que eventuais diferenças de preço entre a cota e seus ativos sejam pequenas e temporárias.

artigo técnico

24 Fev/2016

Page 25: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Mercado global de ETFsSegundo levantamento da consultoria ETFGI, existem apro-

ximadamente quatro mil ETFs listados, em mais de 60 bolsas, em 51 países, administrados por quase 250 provedores, acumulando um patrimônio total de quase US$3 trilhões.

O Gráfico 1 abaixo mostra a evolução do número de ETFs e de outros ETPs desde o ano 2000, comprovando o enorme cresci-mento tanto do número de fundos quanto do patrimônio acumu-lado por eles nesse período.

Gráfico 1: Evolução do mercado global de ETPs

Fonte: BlackRock

O primeiro ETF de sucesso no mundo foi listado em 1993 nos Estados Unidos com o objetivo de replicar o índice S&P 500. Administrado pelo State Street e listado na NYSE ARCA com o ticker “SPY”, esse fundo permanece até hoje como o maior ETF do mundo, com patrimônio de aproxima-damente US$175 bilhões. Além de enorme, o SPY é altamente

líquido, negociando em torno de 15% das suas cotas diaria-mente no mercado.

Além de pioneiros, os Estados Unidos são também o maior mercado de ETFs do mundo, com US$2 trilhões em ativos, ou quase dois terços do patrimônio global da indústria. Em segun-do lugar está o Reino Unido, com patrimônio total de US$200

Global ETP Assets & Number of ETPs by Year1

Commodities & OthersFixed IncomeEquity

79

106 219 297 300 357524 883

1,541

2,220

2,694

3,543

4,311

4,7595,024

5,4315,713

0

1,000

2,000

3,000

4,000

5,000

6,000

0

500

1,000

1,500

2,000

2,500

3,000

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 Sep-15

#ETPsTotal Assets ($bn)

109 146 218 319 428 598851 772

1,1561,483

1,5251,944

2,396

2,797 2,778

25Fev/2016

Page 26: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

bilhões, ou um décimo do mercado norte-americano. Alemanha (US$150 bilhões), Japão (US$110 bilhões) e França (US$70 bi-lhões) completam a lista dos cinco maiores mercados por total de ativos administrados.

Entre as diversas classes de ativos ou estratégias perseguidas pelos ETPs, a renda variável predomina representando 77% do pa-trimônio global, seguida pela renda fixa com 15% e as commodities com 4%. Os ETPs alavancados, inversos ou ativos são produtos de nicho específico e somam os 4% restantes.

Do lado dos gestores globais há também uma nítida concen-

tração, dado que aproximadamente 50% dos ativos são adminis-trados pela BlackRock (iShares) com US$1 trilhão, Vanguard com US$470 bilhões e State Street com US$415 bilhões. A Invesco, quarta maior provedora global, tinha pouco mais de US$90 bi-lhões sob gestão, e a Charles Schwab, o décimo maior gestor, gere pouco mais de US$30 bilhões em ETFs.

Os ETFs podem ser utilizados para obter exposição em di-versos mercados. O Gráfico 2 abaixo mostra a distribuição do nú-mero de ETPs entre as diferentes categorias de investimento para o mercado norte-americano:

Gráfico 2: Número de ETPs por categoria (EUA, 2014)

Fonte: SEC

361

281252

214

327

209

34

6

16

15

3

0 73

96

2

Equity:International

Equity: Sectors

Equity: US Bonds: Taxable

Bonds:Municipal

Commodities Alt Strategies AssetAllocation

ETN ETF

artigo técnico

26 Fev/2016

Page 27: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Uma relação bastante utilizada para medir a penetração dos ETFs em diferentes mercados é a do volume negociado em ETFs em relação ao volume total negociado na bolsa. Essa relação traz números bastante expressivos para o México (38%), Nasdaq e NYSE (ao redor de 25%), Deutsche Boerse (13%). Bolsas asiáticas, como as da Coreia e do Japão, apresentam proporções ao redor de 8%, enquanto no Brasil o volume de ETFs ainda não alcança 2% do volume total da BM&FBOVESPA, o que sugere um potencial expressivo para o produto no país.

O caso mexicanoO México se destaca como o maior mercado de ETFs em

termos relativos ao volume total negociado na bolsa local. Essa proporção ultrapassa 40% em alguns períodos.

A grande representatividade dos ETFs no mercado mexi-cano tem relação direta com a internacionalização da oferta de produtos de investimento disponíveis daquele mercado, que, por sua vez, pode ser atribuída a dois grandes fatores: a facilidade de listagem e o benefício fiscal para ativos estrangeiros.

Facilidade para listagem de ativos estrangeiros

O mercado de ativos internacionais é um caso de sucesso na bolsa mexicana. É representado pelo Sistema de Cotação Interna-cional (SIC), que foi criado em 1995 e teve a primeira listagem em 1997. Por meio do SIC, a listagem de um ativo estrangeiro (ETF, ações, recibos, etc.) na bolsa mexicana conta com importantes dispensas regulatórias:• Pré-autorização: ativos ou emissores estrangeiros elegíveis

a serem listados no SIC são pré-autorizados pelo regulador (NBSC), ou seja, não requerem o processo de registro (do emissor ou dos títulos) junto à NBSC.

• Veículo local: para os ETFs, não há necessidade de constitui-ção de um novo veículo local.Com as dispensas listadas acima, leva-se poucos dias para a

listagem de um ativo internacional/ETF na bolsa mexicana.

Incentivo fiscal para ativos estrangeiros negociados no México

Há tributação diferenciada para investidores mexicanos que operam ativos estrangeiros via SIC. No comparativo com os Esta-dos Unidos, um investidor que estaria sujeito a Imposto de Renda a uma alíquota média de 30% no mercado de origem passa a ser tributado a 10% se realizar essa mesma operação no México. Esse

benefício fiscal teve impacto significativo na repatriação de capital mexicano que estava investido em mercados globais.

Esse conjunto de benefícios aos ativos internacionais tem níti-das consequências sobre a composição dos volumes observados na bolsa mexicana: os ETFs internacionais estão entre os mais líquidos do mercado (sendo quatro dos cinco mais negociados) e já respon-dem por quase metade do volume total de ETFs daquela bolsa.

Os ETFs de renda fixaEm 2002, a BlackRock lançou nos Estados Unidos o iBoxx

Investment Grade Corporate Bond Fund (ticker: “LQD”), o pri-meiro ETF de renda fixa do mercado americano e que hoje possui US$ 22 bilhões de patrimônio. Durante os primeiros quatro anos, outros ETFs de renda fixa foram lançados, mas havia somente dois gestores no mercado e a viabilidade do produto chegou a ser questionada por muitos participantes, pois ele mudava a manei-ra como a renda fixa era tradicionalmente negociada: no balcão, sem transparência de preços e com liquidação bilateral. Em 2007, o produto havia ganhado volume e tamanho suficientes para se es-tabelecer como uma alternativa viável de exposição à renda fixa, a SEC facilitou o processo de listagem e novos provedores surgiram. No fim de 2008, o mercado chegou a US$ 56 bilhões de patrimô-nio, com 61 fundos diferentes.

Durante a crise financeira de 2008 e com o resultante colap-so dos mercados de crédito e de títulos privados, os ETFs de ren-da fixa tiveram um desempenho extraordinário por seu perfil de liquidez com baixo risco de liquidação, dadas sua negociação em bolsa e liquidação por meio de contraparte central garantidora. Alguns fundos viram seus volumes negociados aumentar em oito a dez vezes, o que incrementou também o fluxo de integralizações e resgates e mudou o patamar da indústria. Hoje, existem mais de 800 ETFs de renda fixa ao redor do mundo, com exposição nas diversas subcategorias (soberanos, corporativos, inflação, money market, high-yield, emergente, conversível, etc.) e acumulando um patrimônio total superior a US$ 450 bilhões.

O mercado de ETFs no BrasilO primeiro ETF brasileiro foi lançado em 2004, por meio de

uma iniciativa do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômi-co e Social (BNDES). O PIBB11, gerido pelo Itaú, foi objeto de oferta pública e teve grande adesão de investidores pessoas físicas. Atualmente, na BM&FBOVESPA, existem 14 ETFs referenciados a índices de ações locais e dois referenciados a índices estrangeiros

27Fev/2016

Page 28: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

(S&P 500), com patrimônio total de R$ 3,3 bilhões e negociação média diária de R$ 140 milhões. São números ainda modestos se comparados aos demais mercados, mas que têm apresentado um crescimento consistente e significativo.

A BM&FBOVESPA, como forma de incentivar a liquidez desse mercado, oferece um conjunto de produtos e serviços re-lacionados aos ETFs ou aos seus índices de referência, como, por exemplo, o empréstimo de cotas, negociação a termo, contratos futuros, opções listadas e flexíveis (balcão) e aceitação das cotas do ETF como garantia perante as câmaras. Nem todos esses pro-dutos ou serviços estão disponíveis para todos os ETFs ou índices.

A lista atualizada pode ser obtida no site da bolsa.Em relação ao perfil dos investidores, a participação no vo-

lume negociado é diversificada. Os investidores institucionais são maioria, com 47% do volume, seguidos pelas instituições financei-ras (27%) e não residentes (21%). As pessoas físicas são apenas 5% do volume, o que revela bom potencial de crescimento nesse segmento. Outro fenômeno observado é o aumento do volume negociado por investidores de alta frequência (HFTs), em parti-cular estrangeiros, uma evidência de que o produto alcançou vo-lume suficiente para atrair atenção dessa classe de investidor, que não opera produtos ilíquidos.

Gráfico 3: Negociação média diária em ETFs

Fonte: BM&FBOVESPA, out/15

1519

28

49

118

99105

140

-

1.000

2.000

3.000

4.000

5.000

6.000

7.000

8.000

9.000

0

20

40

60

80

100

120

140

2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

ADTV - R$ Milhões Negócios / Dia

artigo técnico

28 Fev/2016

Page 29: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Regulação no BrasilEm 2002, a CVM publicou a Instrução 359, estabelecen-

do os princípios para constituição e funcionamento de ETFs no Brasil. Alterada em 2013 pela Instrução 537 para admitir fundos baseados em índices de renda fixa, os principais aspectos da regu-lação em vigor são destacados a seguir.

Constituição e características dos ETFsUm ETF deve conter, na sua razão social, a denominação

Fundo de Índice e a identificação do seu índice de referência, além de admitir suas cotas à negociação em bolsa de valores ou balcão organizado e ser constituído na forma de condomínio aberto, per-mitindo o resgate e a integralização de cotas junto ao administra-dor. O fundo deve ser administrado por agente autorizado pela CVM para tal função e ser registrado junto à autarquia e à bolsa de valores para que as cotas sejam admitidas à negociação.

O índice de referência deve ser aprovado pela CVM e obser-var os seguintes princípios:

Transparência: a metodologia de cálculo (composição, pe-sos, critérios de rebalanceamento e qualquer parâmetro necessá-rio à sua replicação) e o desempenho do índice devem estar dispo-níveis de forma completa e gratuita na internet.

Replicabilidade: a metodologia de cálculo deve possuir apenas regras predeterminadas e critérios objetivos, com objetivo de investi-mento claro e único, não sujeita a ajustes retroativos e com frequência de rebalanceamento que não impeça os investidores de replicá-lo.

Ausência de conflitos: o provedor do índice não pode ser parte relacionada ao administrador ou gestor do fundo, nem re-ceber pagamentos de potenciais emissores para a inclusão de seus títulos como componentes.

Além disso, é vedada a constituição de ETFs alavancados (que refletem um múltiplo do índice de referência), inversos (com desempenho oposto ao do índice de referência) e sintéticos (que reflitam o desempenho do índice por meio de derivativos, em vez dos ativos componentes do índice). É vedada a cobrança de qual-quer taxa de performance dos cotistas ou do fundo, dado que a política de investimentos é passiva.

As cotas do fundo podem ser objeto de empréstimo ou ga-rantia e permitem ao cotista exercer diretamente o direito de voto em assembleia de titulares dos valores mobiliários pertencentes ao fundo. As cotas podem ser integralizadas ou resgatadas em di-nheiro (in-cash) ou nos ativos financeiros que componham o índi-ce de referência (in-kind), pelo seu valor patrimonial apurado no fechamento do dia da solicitação. Na integralização de cotas pelo modelo in-kind, até 5% do valor da operação pode ser feito em ativos que não fazem parte do índice de referência, mas no caso de Fundo de Índice de Renda Fixa esse limite sobe para 20% se os ativos forem da mesma natureza (perfil de risco/retorno, risco de crédito e de liquidez, maturidade) que os do índice.

O gestor do fundo deve também manter o desempenho do fundo próximo ao do índice de referência, e essa proximidade é monitorada por meio de três indicadores diferentes, dispostos na Tabela 1 abaixo. Se algum desses indicadores de erro de aderência (tracking error) ultrapassar certos limites preestabelecidos, o fato deve ser comunicado imediatamente ao mercado e o gestor deve reenquadrar o fundo dentro de um prazo predeterminado. Caso não consiga fazê-lo, o administrador deve convocar uma assembleia geral de cotistas para explicar as razões do desenquadramento e de-liberar sobre a extinção ou não do fundo e sobre substituição ou não do administrador.

Tabela 1: Critérios e limites para o erro de aderência dos ETFs:

Indicador Limite (ETF RV) Limite (ETF RF) Prazo de readequação

Desvio-padrão em 60 pregões(i) 2% 1% 15 d.u.

Retorno acumulado(ii) em 60 pregões 2% 1% 15 d.u.

Retorno acumulado(ii) em 12 meses 4% 2% 30 d.u.

Fonte: Instrução CVM 359.(i) desvio-padrão das diferenças entre os retornos do fundo e do índice nos últimos 60 pregões.(ii) a diferença entre os retornos acumulados do índice e do fundo.

29Fev/2016

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Os ETFs devem ainda obedecer a critérios mínimos de com-posição. Para os ETFs de renda variável, no mínimo 95% do patri-mônio do fundo deve ser composto por ativos que integrem seu ín-dice de referência. Para os ETFs de renda fixa esse limite é de 80%, um pouco menos rigoroso. Dentro destes limites são admitidos ape-nas valores mobiliários ou ativos financeiros ofertados publicamen-te, títulos públicos federais e contratos futuros. Fora destes limites, o rol de ativos admitidos é mais amplo e contempla, por exemplo, títulos emitidos por instituições financeiras, operações compromis-sadas, cotas de outros fundos e outros derivativos.

Aspectos tributáriosAssim como os demais fundos de investimento, os ganhos

ou rendimentos auferidos pelas carteiras dos ETFs são isentos do Imposto de Renda, que incidirá exclusivamente sobre os ganhos ou rendimentos auferidos pelos cotistas. A Instrução Normativa RFB 1.585/2015 define o regime de tributação do Imposto de Renda incidente sobre os ganhos e rendimentos auferidos por co-tistas de ETF vinculados a Índices de Ações (arts. 24 a 27) ou a Índices de Renda Fixa (arts. 28 a 30).

Em termos gerais, os cotistas de ETFs de Índices de Ações devem apurar e submeter à tributação os ganhos auferidos (i) na

integralização de cotas por meio da entrega dos ativos; (ii) no res-gate de cotas por meio de ativos ou de dinheiro; ou (iii) na alie-nação de cotas, dentro ou fora da bolsa. A alíquota aplicável em todos os casos é de 15% sobre o ganho, para investidores locais.

Nas operações de integralização e de resgate de cotas, o ad-ministrador do fundo é responsável pelo cálculo, retenção e re-colhimento do Imposto de Renda, enquanto ao investidor recai a obrigação de informar o custo de aquisição dos ativos ou da cota, conforme o caso. Na alienação de cotas, dentro ou fora da bolsa, o próprio investidor é responsável pelo cálculo e recolhimento do Imposto de Renda devido, de maneira semelhante a uma aliena-ção de ações.

Por outro lado, as regras relativas ao Imposto de Renda apli-cáveis aos cotistas de ETFs de Renda Fixa distinguem-se tanto daquelas aplicáveis aos ETFs de Índices de Ações (tributados a 15%) quanto da regra geral para ativos de renda fixa (tributados por uma alíquota regressiva, de 22,5% a 15%, dependendo do pra-zo do investimento). No ETF de Renda Fixa, além da não haver a antecipação do Imposto de Renda via come-cotas, como ocorre nos fundos mútuos de renda fixa, a alíquota aplicável é decrescen-te com o prazo médio de repactuação da carteira do fundo (PRC), conforme descrito na Tabela 2 abaixo:

Tabela 2: Alíquota de Imposto de Renda aplicável ao ETF de Renda Fixa

Prazo médio da carteira do Fundo Cotistas locais Cotistas não residentes

Igual ou inferior a 180 dias 25% 25%

Entre 180 a 720 dias 20% 20%

Superior a 720 dias 15% Isento

Fonte: Lei 13.043, Art. 2º

A metodologia de cálculo do PRC ainda será definida pelo Ministério da Fazenda e é uma das últimas peças do arcabouço regulatório necessário para o lançamento deste produto no mer-cado. Frisa-se ainda que a negociação de cotas do ETF de Renda Fixa também não se sujeita à incidência do Imposto sobre Opera-ções Financeiras (IOF), comumente aplicado no resgate de ativos financeiros. Esse conjunto de benefícios tributários embutidos no ETF de Renda Fixa foi motivado pelo intuito de aumentar a liqui-dez do mercado de renda fixa e de títulos públicos em especial e

inspirado na experiência do Banco Mundial com seu modelo de ETF Patrocinado (Issuer-Driven ETF).

Quanto ao recolhimento do Imposto de Renda devido, na integralização de cotas por meio da entrega de ativos, o respon-sável será a instituição que intermediar a transferência dos ativos para o administrador do ETF (custodiante/corretora). No resgate de cotas, o responsável é o administrador do fundo, e na negocia-ção de cotas em mercados de bolsa ou de balcão organizado, o intermediário da operação (corretora).

artigo técnico

30 Fev/2016

Page 31: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Usos e benefícios dos ETFsUma das principais características dos ETFs é a versatilidade, já que podem ser utilizados para variadas estratégias de investimento. Algumas das principais são listadas a seguir:

Alocação passiva no índice (buy-and-hold):é a estratégia mais simples, para o investidor que deseja ter exposição a um índice específico. Além da posição “comprada” (long), o investi-dor pode tomar uma posição “vendida” (short) através do empréstimo de cotas.

Indexação de caixa: utilizada principalmente pelos gestores de recursos que desejam trans-formar o caixa de um fundo em exposição ao índice, sem comprometer a liquidez. Para os fundos de ações brasileiros, por exemplo, a regulação (ICVM 555) exige um mínimo de exposição de 67% no mercado de ações e os ETFs são utilizados para compor este percentual quando o gestor deseja manter uma posição de caixa/liquidez relevante sem desenqua-drar o fundo.

Estratégias Cash & Carry: utilização das cotas do ETF como instrumento à vista, combinado com uma posição contrária em derivativos futuros do mesmo índice de refe-rência. Essa estratégia também pode ser realizada com a cesta de ações que compõem o índice, porém de forma menos eficiente, dada a maior complexidade ou custo de negociar um maior número de ativos.

Alocação setorial: ETFs de índice setoriais são comuns e podem ser utilizados para apostas em setores específicos e/ou apostas entre setores, como, por exemplo, ficar comprado em setor de consumo e vendido em setor financeiro. Também conhecida como sector rotation, esta estratégia permite operar setores mitigando os riscos específicos das empresas componentes.

Entre os principais benefícios deste produto, podemos destacar:

Utilização em diferentes modelos de alocação: investidores têm utilizado o ETF como veículo preferido para aloca-ções indexadas, tendo em vista o menor impacto dos custos do ETF (geralmente mais barato que fundo de investimento tradicional) na rentabilidade do investimento.

Facilidade para arbitragem: o preço da cota do ETF tende a ser muito próximo do preço “justo” da cesta de ativos componentes. Quando há qualquer dispersão nesses preços, um arbitrador pode “criar” ou “destruir” cotas de ETF no mer-cado primário e fazer a compra ou venda das cotas no mercado se-cundário, aproximando novamente os dois. É uma operação simples e “sem risco” de mercado.

Diversificação: a carteira de um ETF é composta por dezenas de ativos. Com a diver-sificação da carteira, o risco é minimizado pela correlação entre os ativos.

Transparência: divulgação em tempo real do valor da cota negociada (valor de mer-cado) e do preço indicativo (IOPV), este último a cada 30 segundos no caso de ETFs de Índices de Ações. Além disso, há divulgação diária da composição da carteira (valor contábil) no site dos gestores e no portal da CVM.

Praticidade: por meio da compra de uma única cota, o ETF permite acesso a diver-sos ativos. Com uma baixa aplicação inicial (em torno de R$ 200 para alguns ETFs) é possível a investidores individuais obter uma exposi-ção mais sofisticada e de forma mais simples do que conseguiria por meio dos ativos individuais.

Baixo custo: taxas de administração dos ETFs tendem a ser menores que em fun-dos de investimento convencionais. Ainda, as cotas do ETF podem ser alugadas, gerando uma receita extra ao doador.

Por fim, é importante entender as principais diferenças e similarida-des entre os ETFs, fundos de investimento tradicionais e ativos indivi-duais. A Tabela 3 a seguir lista algumas das características e diferenças dos ETFs quando comparados a outros tipos de investimento.

Tabela 3: Características dos ETFs e dos produtos alternativos

Ações ETFs Fundos ativos Fundos passivos

Compra e venda no Intraday Sim Sim Não Não

Posições compradas e vendidas Sim Sim Não Não

Indexado a um Índice de referência Não Sim Não Sim

Diversificação Não Sim Sim Sim

Acesso via corretora Sim Sim Não* Não*

Listagem em bolsa Sim Sim Não* Não*

*Há exceções de fundos fechados que são listados em bolsa e acessados via corretora.Fonte: BM&FBOVESPA

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31Fev/2016

Page 32: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

ConclusõesOs ETFs são uma categoria de produto de investimento

muito bem-sucedida, sob qualquer métrica que se utilize: ta-manho, liquidez ou popularidade. São instrumentos versáteis utilizados por diversos tipos de investidores, para a realização de diferentes estratégias de investimento. Além disso, tendem a ser bastante eficientes em termos de custo, de negociação e de manutenção em carteira, o que em parte explica seu rápido cres-cimento no mundo todo.

Acreditamos que essa história de sucesso deve se repetir no Brasil, pelas características do produto que tentamos brevemente introduzir neste artigo. Podemos dizer que a indústria local ainda está aquém do seu potencial, mas a entrada do ETF de Renda Fixa pode injetar fluxo novo significativo e levar a categoria a um pata-mar mais alto. Dado o gosto do brasileiro pela renda fixa e o be-nefício tributário envolvido, não será surpreendente se o ETF de Renda Fixa ultrapassar aqui os 15% de participação no patrimônio do mercado global de ETFs observados atualmente.

BIBLIOGRAFIAEstudos e White Papers

BlackRock (2015), Bond ETFs: Benefits, Challenges, Opportunities, Viewpoint.

BlackRock (2013), Exchange Traded Products: Overview, Benefits and Myths, Viewpoint.

BlackRock (2015), Global ETP Landscape, September 2015

Invesco (2015), The ETF Toolkit: A Professional´s Guide to ETFs,

Investment Company Institute (2014), Understanding Exchange-Traded Funds: How ETFs Work, ICI Research Perspec-tive, vol.20, nº 5.

Rosenblatt Securities Inc (2015), Monthly ETP Review: 2014 in Review, Trading Talk.

Securities And Exchange Commission (2015), Request for Comment on Exchange-Traded Products, Release nº 34-75165, File nº S7-11-15.

State Street Global Advisors (2015), Global ETF Snapshot, September 2015

World Bank (2012), Issuer-Driven Exchange Traded Fund Program. Washington, DC.

Regulação

Comissão de Valores Mobiliários – Instrução 359

Secretaria da Receita Federal – Instrução Normativa 1.585/2015

Presidência da República – Lei 13.043/2014

Presidência da República – Decreto 6.306/2007

IOSCO (2013) Principles for the Regulation of Exchange Traded Funds

Bancos de dados e de notícias sobre a indústria

ETFGI (www.etfgi.com)

ETF Database (www.etfdb.com)

ETF.com (www.etf.com)

artigo técnico

32 Fev/2016

Page 33: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

JOSÉ ROBERTO AFONSOEconomista, doutor pela Unicamp e

mestre pela UFRJ, pesquisador do Ibre/FGV e professor do mestrado do IDP

MELINA ROCHA LUKICProfessora e pesquisadora em direito

tributário da FGV Direito-Rio, doutora pela Université Sorbonne Nouvelle – Paris 3.

IRPJ e JCP: Diferenciais Brasileiros

Há tempo se discute limitar a possibilidade de as empresas brasileiras usarem os Juros sobre o Capital Próprio ( JCP) como uma forma de distribuir lucros e pagar menos impostos. Até que recen-te medida provisória limitou parcialmente tal prática. Seria esta uma “jabuticaba” tributária do Brasil? Não se comenta, porém, que o sistema de tributação da renda das pessoas jurídicas também é algo incomum. Ainda que muito se fale sobre a questão, o JCP foi pouco estudado, desde a sua concepção, que atende a preceitos teóricos e a debates internacionais, até o seu efetivo uso, já que não seria tão difundido como se pensa e tendo em vista que gera receita pública no caso de ser distribuído a acio-nistas pessoas jurídicas, fato negligenciado e que tende a gerar análises equivocadas. Neste contexto, este artigo procura traçar um diagnóstico abrangente sobre tal regime especial, resgatando reflexões teóricas e evidências empíricas, com o objetivo de contribuir com novos subsídios técnicos destinados para quem debate e decide sobre tal matéria tributária.

O sistema de tributação da renda no Brasil pode ser considerado como um modelo “semidual”, em que diferentes alíquotas nominais do imposto se aplicam a diferentes tipos de renda. Aplica-se para a pessoa física a tabela progressiva para rendimentos como salários e aluguéis, com alíquotas variando de 0% a 27,5%. Já sobre rendimentos como juros, aplicações financeiras e ganho de capital, incluindo o JCP, são aplicadas alíquotas proporcionais e diferenciadas (sendo 15% a mais comum). Para evitar a dupla tributação da renda e promover a integração do Imposto de Renda incidente sobre Pessoas Físi-cas (IRPF) e Pessoas Jurídicas (IRPJ), fora a Contribuição Sobre o Lucro Líquido (CSLL), foi adota-da em 1995 a isenção incidente sobre os dividendos distribuídos. E ainda, para equiparar e incentivar o investimento pela empresa com capital próprio em relação à tomada de empréstimo, a mesma lei criou o regime do JCP, uma forma especial de distribuir parte do resultado aos seus acionistas que é deduzida da apuração do IRPJ, mas, ao contrário dos dividendos, sofre retenção de Imposto de Renda de 15% na fonte.

Antes de tudo, importa atentar que o Brasil tributa o lucro com uma alíquota (de 34% no caso das empresas, maior ainda no caso de instituições financeiras) muito superior à do resto do mundo – 24% na média mundial, 22% na dos europeus e 27% na dos latino-americanos. Esta comparação internacional costuma ser omitida quando se critica o tratamento dos resultados distribuídos pelas empresas, mas, em particular, foi fundamental para criação e ainda o é para justificar a aplicação do JCP. Em termos conceituais, aquela peculiaridade (exagerado IRPJ/CSLL) está embrionariamente vinculada a outra excentricidade (regime especial de distribuição de resultados).

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artigo técnico

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Por coerência e justiça, alterar ou mesmo extinguir o JCP deve passar pela concomitante e simultânea redução (radical) do IRPJ. É injusto ou inadequado, em razão do sistema dual aqui ado-tado, comparar a forma como o Brasil aplica o IRPF sobre renda de capital em relação aos outros países e ignorar como ambos apli-cam o IRPJ no caso daquelas rendas oriundas de lucro.

Dados estes princípios gerais, vale aprofundar o conhe-cimento do JCP, até como requisito para se discutir mais adequa-damente sua eventual revisão. De início, é uma falácia que seria esta uma invenção brasileira completamente descolada de refle-xões teóricas e do antigo e profundo debate internacional sobre a tributação da renda.

Trata-se de uma figura amplamente debatida e denominada internacionalmente por Allowances for Corporate Equity (ACE). A concepção teórica da proposta remonta a meados dos anos 1980 e sua implementação foi detalhada no início dos anos 1990. Em seguida, diversas proposições de reforma contemplaram o ACE, em especial na Europa. Além do Brasil, o sistema do ACE foi implementado na Croácia, Itália, Áustria, Portugal e mais recente-mente na Bélgica. Em essência, surgiu em razão do fato comum de os juros dos empréstimos tomados serem dedutíveis da base do IRPJ, enquanto os dividendos geralmente não o são. O tratamento diferenciado no tratamento dos rendimentos do capital próprio e da dívida junto a terceiros era vista, obviamente, como uma discri-minação contra o financiamento por capital próprio.

Experiência brasileiraO regime do JCP no Brasil foi criado pela Lei nº 9.249/95.

O cálculo do montante a ser assim distribuído é fruto da aplicação da variação pro rata dia da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) sobre as contas do patrimônio líquido. Mas o que é passível de dedução como despesa operacional foi limitado a 50% do lucro líquido do período de apuração a que corresponder o pagamento ou crédito dos juros ou a 50% dos saldos de lucros acumulados e reservas de lucros de períodos anteriores, o que for maior.

Não se deve esquecer o contexto em que foi feita a última reforma do IRPJ, que incluiu a criação do JCP. A estabilização de preços acabara de ser alcançada com o Plano Real e, com o fim da indexação generalizada da economia, se fazia necessário também suspender os seus resquícios da legislação tributária. Tal reforma extinguiu a correção monetária dos balanços e a inovação do JCP vinha para compensar os efeitos da inflação remanescente. Outras

mudanças foram a ampliação da base tributável através da vedação de dedutibilidade de certas despesas e a isenção na distribuição de dividendos. Procurava-se um aumento dos investimentos e uma maior capitalização das empresas, para buscar maior produtivida-de e assim impulsionar um crescimento sustentável.

As lições da teoria e dos outros países eram que a introdução do instituto reduziria a base tributável do IR em face da possibili-dade das próprias deduções. Para que não houvesse uma diminui-ção da arrecadação e um desequilíbrio das contas públicas com a diminuição da base tributável, a adoção deste regime deveria ser acompanhada de uma medida compensatória, como o aumento da alíquota do IRPJ. O Brasil optou por promover tal compensa-ção não via alíquota e sim com um alargamento da base tributá-vel. Assim, a mesma lei de 1995 (9.249) que criou o JCP também restringiu as possibilidades de dedutibilidade de certas despesas do IRPJ. Dois anos depois, outra lei (9.532) também limitou be-nefícios fiscais como os relativos aos investimentos em fundos regionais, programas de apoio a trabalhadores (alimentação e transporte) e ainda revogou isenções de entidades educacionais, de assistência social, saúde e esportes.

A estratégia funcionou, tanto que depois da criação do JCP foi espetacular o desempenho da arrecadação de IRPJ/CSLL: do-brou de 2,15% do PIB em 1995 para 4,14% em 2008, quando foi responsável por cerca de 16% do aumento da carga global no País. Cabe ressaltar que, após a crise financeira global, a carga daqueles tributos caiu mais do que a global, refletindo a desaceleração da economia e a derrocada dos lucros (não houve afrouxamento na incidência).

Especificamente sobre o JCP e tomando a informação mais atualizada, chama-se a atenção que o seu IR na fonte arre-cada R$9,2 bilhões (nos últimos doze meses até julho de 2015). Mesmo na recessão, a arrecadação do JCP-fonte cresce (6,9% ante igual período de 2013) na contramão do IRPJ/CSLL, que desabam (8% e 18%, respectivamente), e do total da receita fede-ral (3%). É possível suspeitar que, mesmo lucrando menos, mas com expectativas de piora no cenário, as empresas optaram por distribuir JCP, ou ainda que, diante dos rumores sobre a eventual extinção do JCP, foram estimuladas a acionar ao máximo tal me-canismo. Outro aspecto-chave e desconhecido sobre a arrecada-ção do JCP diz respeito à sua composição por destinatário: R$5 bilhões foram recolhidos por residentes no Brasil e R$4,3 bilhões por destinatários no exterior, tendo decrescido 4,4% e crescido 24,1%, respectivamente, no mesmo período antes examinado.

artigo técnico

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Além da já citada piora da confiança em relação aos negócios e à continuidade do JCP, é possível que haja um estímulo ao maior uso do mecanismo por estrangeiros, tendo em vista que por vezes não precisam submeter tais valores à tributação do lucro lá fora e ainda abatem o que foi retido no Brasil, ao contrário dos acionis-tas PJ brasileiros sobre os quais recai o IRPJ local.

Outra questão crucial sobre a receita tributária e o JCP en-volve a renúncia. Esta é calculada pela Receita Federal, seguindo metodologia internacional, que trata como uma forma especial de gasto público. Chama a atenção que neste cálculo o JCP não é tratado como benefício, incentivo ou desoneração. Trata-se de um regime especial ou peculiar de tributação dos lucros distribuí-dos e, como tal, tributado na fonte e que gera receitas. Como não há uma vantagem para alguns contribuintes e não está disponível para outros, o JCP não é oficialmente enquadrado no conceito de gasto tributário. Revogar ou o reduzir em nada reduzirá a renúncia do país – e mesmo o impacto em elevar a arrecadação tende a ser limitado, ao contrário do que se costuma pensar, porque pouco se conhece sobre sua aplicação.

Aplicação do JCP Se muito já se falou sobre possíveis vantagens do JCP, pouco

se analisou sobre sua efetiva utilização pelos contribuintes. Omite-se ou desconhece-se, nas análises sobre JCP, que boa parte dele se transforma em receita (dos acionistas que sejam PJ) e como tal aca-ba submetido ao IRPJ/CSLL, em sua maior parte, no caso daqueles que declaram pelo lucro real, com base nas alíquotas mais altas. Na

última consolidação de declarações do IRPJ divulgada pela RFB (2012), foi informada uma despesa total com JCP de R$29,4 bi-lhões, mas uma receita com os mesmos de R$14,7 bilhões, ou seja, o efeito líquido foi de R$14,7 bilhões, o equivalente a 6,2% do lucro operacional ou apenas 0,3% da receita líquida tributada de todos os contribuintes. A abertura setorial revela impressionante concen-tração no acesso ao benefício. Considerados apenas aqueles com despesa líquida (pagaram mais JCP do que receberam), do total de R$15,7 bilhões, 11,7% foi oriundo da fabricação de bebidas, 11,4% por eletricidade e gás, 10,2% por fabricação de veículos, 7,2% pelo comércio atacadista, 6,2% por metalurgia, 5,1% pelo comércio va-rejista, 4,9% pela fabricação de alimentos e 4,3% pela fabricação de produtos químicos. Portanto, alguns ramos da indústria de transfor-mação, o comércio e uma das utilidades são os que mais pagam JCP. Já do outro lado, dos que recebem, a concentração é ainda maior: 83% da receita foi declarada por instituições financeiras (que chega-ram a receber R$12,3 bilhões, mais do que pagaram em JCP, R$11,5 bilhões; logo, por princípio, a receita líquida positiva com tais ju-ros tende a aumentar o seu recolhimento de tributos (e justamente neste setor em que o lucro está sujeito há uma alíquota muito mais elevada de CSLL, hoje em 20%).

Uma análise mais recente e específica para grandes contri-buintes pode ser focada nas companhias abertas, que reúnem os maiores contribuintes do País1. A partir de dados extraídos da Economatica, foi possível investigar 334 empresas listadas na Bol-sa de Valores. A primeira surpresa é que o uso do JCP não é tão generalizado. Apenas um terço, ou 110 das empresas listadas, dis-tribuiu JCP em 2014.

1 Ainda que, em alguns casos, como das montadoras automobilísticas e de muitas filiais de multinacionais, as empresas sejam companhias fechadas.

ESPECIFICAMENTE SOBRE O JCP E TOMANDO A INFORMAÇÃO MAIS ATUALIZADA, CHAMA-SE A ATENÇÃO QUE O SEU IR NA FONTE ARRECADA R$ 9,2 BILHÕES (NOS ÚLTIMOS DOZE MESES ATÉ JULHO DE 2015). MESMO NA RECESSÃO, A ARRECADAÇÃO DO JCP-FONTE CRESCE (6,9% ANTE IGUAL PERÍODO DE 2013) NA CONTRAMÃO DO IRPJ/CSLL, QUE DESABAM (8% E 18%, RESPECTIVAMENTE), E DO TOTAL DA RECEITA FEDERAL (3%).

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Não gerar lucros em um exercício restringe o JCP, porém ainda se permite distribuir lucros acumulados ou da reserva de lucros. Das 219 empresas listadas em bolsa e que apresentaram lucro em 2013, apenas 108 distribuíram tais juros em 2014. Exa-tamente a metade dos contribuintes com lucro deixou de pagar JCP, mesmo que pudessem porque tinham gerado lucro. Ainda que tomadas só as empresas com maiores lucros (acima de R$ 100 milhões) em 2013, apenas 70 das 113 distribuiriam JCP em 2014. Mesmo podendo, cerca de 40% das empresas mais lucrativas do país não usaram o recurso especial.

O patrimônio líquido (PL) é outro parâmetro que baliza a distribuição do JCP e o senso comum seria o de que, no caso das maiores empresas do país, por tal critério nenhuma deixaria de aproveitar a oportunidade de distribuir lucros com menor impos-to. Consideradas somente empresas com PL acima de R$ 1 bilhão em 2014, verificou-se que apenas 68 das 151 empresas distribuí-ram JCP. Mais uma surpresa foi que apenas 45% das maiores em-presas aplicam tal regime.

A baixa adesão ao JCP mesmo entre as maiores empresas na-cionais pode ter a ver com a propensão à distribuição de lucros. Todas as empresas que distribuíram dividendos em 2014 igual-mente pagaram JCP. Mas somente 83 das 110 empresas que paga-ram JCP em 2014 também distribuíram dividendos.

O mesmo grupo de empresas investigadas pode ser visto pela ótica setorial. Das que distribuem JCP, os setores financeiros e de materiais básicos são os que mais os pagaram em relação à distribuição total – caso de 73% de suas empresas. Em seguida, se destacam o de telecomunicações, utilidade pública e construção e transporte (entre 40% e 50% da distribuição total).

Esta breve leitura do uso do JCP pelas companhias abertas suscita algumas reflexões conceituais. Na decisão para a distri-buição, o determinante óbvio é que tenha sido gerado lucro no período – não teria como deduzir o JCP da base tributável pelo IRPJ se esta base for zero ou negativa. A empresa pode optar por outros caminhos para reduzir a carga tributária – por exemplo, a dedução de ágio do lucro apurado e a compensação de prejuízos fiscais acumulados de anos anteriores.

A composição acionária pode ser uma variável decisiva para o uso do JCP. A vantagem tributária de dedução do JCP pela em-presa que o distribui pode desaparecer caso os seus controladores sejam holdings: os beneficiários PJs teriam que pagar a alíquota cheia do IRPJ de 34%, ainda que descontados os 15% retidos na fonte. Além disso, o beneficiário e acionista PJ também está su-jeito a recolher as contribuições PIS e Cofins sobre os valores re-cebidos de JCP (alíquotas de 3,65% no lucro presumido e 9,25% no real). Portanto, quando o acionista beneficiário for uma PJ, o suposto ganho envolvido no JCP pode não compensar se visto como um todo e, por isso, a empresa pagadora pode ser estimula-da a não distribuí-lo.

Alguns casos particulares podem desestimular a distribuição. Se o beneficiário for estrangeiro, eventualmente poderia sofrer du-pla tributação – como é o caso da possibilidade de não compen-sação do imposto retido no Brasil, conforme o tipo societário, nas empresas americanas, por exemplo. A distribuição futura pode ain-da ser afetada pela possibilidade de compensação dos resultados obtidos pela PJ no exterior com os resultados auferidos no Brasil.

Limitação proposta do JCPEm setembro de 2015, em meio a um novo pacote tributário

para aumentar a arrecadação e o resultado primário, foi editada medida provisória (MP nº 694) que limitou em 5% o máximo da TJLP aplicada no cálculo de JCP e que aumentou de 15% para 18% a alíquota do IR retido na fonte. O Ministério da Fazenda estimou o ganho de receita em apenas R$ 1,1 bilhão. A exposição de motivos basicamente alega que o JCP reduz a tributação das maiores empresas que pagam pelo lucro real, cita uma diferença de tributação em relação aos rendimentos do trabalho, além de afirmar ser uma renúncia continuada.

Antes de tratar do impacto, menciona-se que a justificação carece de consistência e coerência. Salvo a falta de precisão da redação, aparentemente a exposição confundiu a sistemática do regime no que tange à dedução pela PJ que paga da retenção na fonte em relação aos impostos devidos pela PJ que recebe JCP2.

2 A exposição de motivos alegou: “Quanto à tributação dos juros pelo pagamento, tem-se que as pessoas jurídicas que apuram o lucro real reduzem o pagamento de seus tributos, eis que os valores de juros pagos nos termos do referido art. 9º, em vez de serem tributados em até 34% (trinta e quatro por cento), somando-se IRPJ, adicional de IRPJ e CSLL, caso não houvesse esta renúncia fiscal, são tributados apenas a 15% (quinze por cento) diretamente na fonte, ex vi do § 2º do art. 9º da Lei nº 9.249, de 1995.” Esse argumento é questionável. Afinal, são dois regimes de tributação diferentes e que não se confundem. No sistema da PJ que paga o JCP, esta poderá deduzi-los da base de cálculo do IRPJ/CSLL de acordo com os limites legais, no sistema aplicável à PJ que os recebe, o IRPJ/CSLL por elas devido são descontados na fonte pela PJ que paga. Neste último caso, se a PJ apurar o IRPJ/CSLL pelo lucro real, o desconto na fonte será considerado mera antecipação e o JCP entrará na base de cálculo do IRPJ/CSLL da PJ, sendo normalmente tributado ao final à alíquota de 34%. Este regime não foi alterado pela MP, logo o JCP somente não será tributado à alíquota de 34% caso o beneficiário seja PF ou PJ não optante pelo Lucro Real, caso em que o desconto na fonte será considerado definitivo.

artigo técnico

36 Fev/2016RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

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Page 37: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Em outro argumento, sobre a diferente incidência sobre salários e ganhos de capital, foi omitida a opção brasileira por uma lógica geral do Imposto de Renda que siga o sistema dual, em que aquele efeito não é uma distorção, e sim uma característica da sistemática adotada3. Agora, o maior dos equívocos da exposição é qualificar o JCP como um benefício fiscal e ainda afirmar que seja continu-ado. Ignora, portanto, que se trata de uma sistemática especial de tributação da renda, que gera efetiva receita de IR na fonte e, o principal, que a própria RFB e a União, quando oficialmente me-dem o gasto tributário no processo orçamentário, nunca enqua-draram e mensuraram tais juros como uma renúncia4.

Sobre a limitação da TJLP, é observado que, desde 2006, a TJLP se manteve até o patamar de 5%, superando-o apenas a partir de 2013 – e atualmente se encontra em 6,5% ao ano. O corte de um quarto (1,5 em 6,5 pontos) da proporção aplicada para o cálculo do JCP obviamente provocará uma redução de seu montante. Porém, um efeito maior e à parte da medida pode ser a redução generalizada e expressiva dos lucros empresariais – res-tante a depender dos lucros acumulados para quem quiser manter a distribuição. Já a limitação da TJLP, paradoxalmente, reduzirá os ganhos esperados com o incremento (de três pontos) do IR retido na fonte sobre o montante pago a título de JCP.

Importante atentar mais para os efeitos das duas mudanças. Por certo, provocam aumento do tributo – no IRPJ, para quem paga JCP; e no IRRF, para quem os recebe. No primeiro caso, a limitação da TJLP em 5% fará com que o montante do JCP di-

minua em relação aos patamares atuais. Assim, a dedução fiscal relativa ao JCP será menor e, por consequência, o lucro da PJ que distribui será maior, o que representa um aumento da base de cál-culo do IRPJ. Já a maior alíquota do IRRF, tem um efeito mais direto e claro.

Em ambos os casos, a eficácia destes aumentos dos tri-butos deve atender ao princípio da anterioridade tributária, que proíbe a cobrança de tributos no “mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou” (para o IR não se aplica o princípio da noventena). É preciso que a medida seja convertida em lei até o último dia do exercício em que for edi-tada para que tais medidas surtam efeito no exercício financeiro seguinte, ou seja, em 20165.

Um último e importante comentário diz respeito ao ganho de receita esperado com a medida. Surpreendeu que seja tão pouco (R$1,1 bilhão) e até se noticiou a hipótese de a RFB subestimar a medida. Porém o que deveria mais surpreender é o desconhecimento da natureza do JCP, sobretudo do fato de que ele também gera receita – diretamente, pela retenção na fonte (ao contrário da distribuição de dividendos), e indiretamente, porque se transforma em receita do acionista que seja PJ e sujeita-se nova-mente ao IRPJ/CSLL. Isto para não mencionar que obviamente os contribuintes podem reagir às novas regras e mudar sua política de distribuição de resultados.

Muito antes de editar a MP, o próprio Ministério da Fazenda já respondera a requerimento parlamentar6 estimando um impacto

3 Assim, a mesma exposição alega: “...outra fonte de desequilíbrio emanada do dispositivo se refere ao fato de que, se um sócio pessoa física é beneficiário dos JCP, este paga apenas 15% (quinze por cento) de Imposto sobre a Renda, tributação definitiva, enquanto um trabalhador tem os seus rendimentos tributados em até 27,5% (vinte e sete inteiros cinco déci-mos por cento)”. Deixou de ser registrado que o país opta pelo sistema dual, que se caracteriza justamente pela aplicação de alíquotas diferenciadas aos dois citados rendimentos, em consonância com a prática internacional. Assim, alterar a sistemática do JCP sem levar em consideração todo o contexto geral de tributação do IRPJ/CSLL pode ser uma medida que não leve em consideração o equilíbrio e consistência.4 A exposição coloca que “destaca-se que já se passaram quase 20 anos de vigência do benefício, embora hodiernamente a concessão de benefícios fiscais tem sido orientada por períodos certos de tempo e não perenizada indeterminadamente”. Isso contraria a interpretação e a prática há anos adotadas pela RFB, que não classifica os JCP como gasto tributário. Tal fato também se justifica porque se trata mais de um instrumento para equiparar o financiamento por capital próprio ao financiamento externo, fazendo, portanto, parte do próprio sistema de tributação do IRPJ e CSLL.5 É possível que surjam dúvidas. Tais mudanças já se aplicarão aos lucros apurados em 2015, cujo respectivo JCP será distribuído em 2016 ou somente aos lucros apurados em 2016, e respectivo JCP pago em 2017? No que respeita à medida de limitação da TJLP, tal mudança se aplicaria aos lucros apurados a partir de 1/1/2016, desde que convertida em lei até 31 de dezembro de 2015. Já sobre a alíquota majorada para 18%, duas interpretações são possíveis. A que mais interessa ao Fisco é que a alíquota majorada já se aplicaria às distribuições realizadas em 2016, mesmo tendo por base os lucros gerados em 2015. O argumento seria que o fato gerador do IRRF não é o lucro gerado pela pessoa jurídica, mas sim o JCP cal-culado e pago como renda do beneficiário. Já uma visão pró-contribuinte, seria que a nova alíquota do IRRF somente poderia ser aplicada a partir de 2017, pois teria que ser aplicada sobre os lucros gerados em 2016 em virtude do princípio da anterioridade – ou seja, tendo em vista que o JCP é calculado sobre os lucros auferidos pela PJ, o fato gerador do IRRF seria o lucro auferido a partir de janeiro de 2016.6 Segundo a resposta ao Requerimento de Informação Parlamentar nº 274/2015, o Ministério da Fazenda e a Receita Federal do Brasil afirmam que, no caso de eliminação dos JCP, “haveria, por um lado, perda de arrecadação do IRRF sobre os rendimentos de JCP recebidos por pessoas físicas e por pessoas jurídicas que estejam no exterior (...). Por outro lado, haveria ganho de arrecadação com o fim da dedução dos pagamentos de JCP no IRPJ das Pessoas Jurídicas situadas no Brasil”. O documento ainda ressalta que “no caso de recebi-mento do JCP por PJ situada no país, pode-se considerar o impacto como nulo, por simplificação. Isso decorre do fato de que, ao pagar o JCP, a empresa controlada abate do IRPJ, ao passo que a empresa controladora, que recebe o JCP, oferece à tributação de IRPJ”. Portanto, o próprio Ministério da Fazenda e a Receita Federal admitem que eventuais ganhos com a extinção do JCP só ocorreriam no caso de pagamento de JCP a acionistas localizados no exterior, a saber: “o impacto, portanto, decorrente do fim do JCP, seria de um ganho de arrecadação de 19% sobre a base de cálculo que incide sobre PF e PJ no exterior. Isso decorre da perda de arrecadação de 15% de IRRF e dos ganhos de 34% de IRPJ/CSLL sobre o JCP (...). Caso se concretize esta hipótese, haverá ganho de arrecadação de R$ 5,84 bilhões por ano”.

37Fev/2016 RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

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com a total extinção do JCP de R$5,9 bilhões (baseado muito em cima das remessas ao exterior) e reconhecendo que isso induzi-ria a distribuição de lucro por outras formas e, o pior, provocaria desinvestimento – tendo em vista que, em suas próprias palavras, não terão mais incentivos para “manter em seu patrimônio líquido uma parcela de investimento superior ao seu ótimo de produção” com a finalidade de maximizar o pagamento do JCP.

Considerações finaisO regime dos juros sobre o capital próprio foi criado no

Brasil ao mesmo tempo que o país aplica sistemática e historica-mente uma das maiores alíquotas agregadas sobre a tributação dos lucros, alta taxa real de juros e carga tributária global, bem assim uma das menores taxas nacionais de investimento fixo. É funda-mental atentar que tal regime não está descolado do resto das regras de taxação dos lucros das empresas e dos rendimentos de capital dos acionistas e sua eventual extinção, e mesmo mudança, deve necessariamente considerar as condições que justificaram sua modelagem e promover alterações integradas. É um grande equívoco tratar esta como uma medida tributária isolada do resto do contexto tributário, fiscal e econômico.

É importante observar também que o regime do JCP não trouxe qualquer prejuízo ao desempenho da arrecadação do IRPJ/CSLL que, no prazo mais largo, ou seja, desde sua adoção, apresentou crescente razão em relação ao PIB, melhor até do que a carga tributária global da economia. Tal performance só foi ne-gativa nos últimos anos, mas isso se explicou claramente por conta da redução forte e contínua do lucro gerado pelas maiores empre-sas do país – afinal, não houve qualquer alteração legislativa rele-vante neste imposto (que passou quase incólume às desonerações ditas anticíclicas).

Em termos conceituais, o maior equívoco é pensar o JCP como um incentivo fiscal longo e mais uma desoneração fiscal, ig-norando que não o é, nem de fato, muito menos de direito, tanto que nunca constou no demonstrativo de gasto tributário elabo-rado periodicamente pelo Ministério da Fazenda e que integra as leis dos orçamentos da União. É certo que a RFB não cometeria um erro tão crasso em cima de um mecanismo tão comentado. Por isso é confirmada a tese de que o JCP não é exceção, mas faz parte da forma como o Brasil optou por tributar as rendas. Aliás, o Brasil é um dos poucos países em que se aplica um siste-

ma dual e no qual a alíquota aplicada sobre as pessoas jurídicas está muito acima de qualquer das médias (global, das economias emergentes e das latinas). A eventual alteração e extinção do JCP, por princípio, deveria ser acompanhada, simultaneamente, da re-dução desta alíquota.

Não poderia haver momento mais inoportuno para atenuar os efeitos do JCP e para questionar a sua existência. Se foi criada logo após o Plano Real para compensar a extinção da correção monetária dos balanços e atenuar os efeitos da inflação, justa-mente quando esta voltou a disparar e os juros reais de mercado atingem as taxas mais exorbitantes dos últimos anos, se advoga sua alteração, que, por menor que seja, impacta as posições pa-trimoniais das empresas, aumenta o custo de oportunidade de investir com recursos próprios e estimula o endividamento com os juros e encargos os mais caros possíveis, porém plenamente dedutíveis do IRPJ/CSLL. A nova cena macroeconômica do país, marcada por uma recessão profunda e, ao que tudo indica, prolongada, desaconselha a extinção e até mesmo a redução dos efeitos do JCP. O efeito inegável seria desestimular a destinação de capital próprio para inversões empresariais justamente no mo-mento em que a economia enfrenta uma queda drástica da taxa nacional de investimento e em que o governo foi forçado a redu-zir a concessão de crédito abundante e subsidiado através das ins-tituições financeiras oficiais. É unânime a opinião de que o país precisa elevar investimentos fixos como um dos motores para a retomada do crescimento econômico e, para tal, precisa encon-trar um novo padrão de financiamento que seja menos depen-dente, direta ou indiretamente, de recursos fiscais. Esta deve ser a principal razão para desaconselhar qualquer medida de reversão do JCP, pois não apenas deixaria de contribuir para a mudança do quadro da economia, como ainda significaria um sinal para agravar ainda mais a recessão.

Em suma, a alteração do JCP só se explica pela visão imedia-tista de se tentar a qualquer custo e de qualquer forma gerar mais receita e melhorar o resultado fiscal. Porém isso pode ter um custo muito mais alto para o médio e longo prazos. Por mais reduzido que seja o ganho esperado com a medida, é dado um claro e ine-quívoco sinal contra a capitalização das empresas e, ainda mais, em um momento de encilhamento geral do mercado de crédito no país, contra o investimento. Infelizmente, reforça a tese vista do estrangeiro de que o Brasil gosta tanto de cobrar imposto que opta por taxar até mesmo o seu crescimento econômico.

artigo técnico

38 Fev/2016RESENHA UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA BM&FBOVESPA

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AIRTON MINORU MURAKAMI BM&FBOVESPA

VIVIANE EL BANATE BASSO

BM&FBOVESPA

iMercado, a Busca Pela Excelência OperacionalEm função dos altos volumes de transações e da complexidade de seus processos, os mercados financeiro e de capitais sempre buscaram efi-ciência operacional por meio de automatização no tratamento e na troca de informações. Mais recentemente, as autoridades reguladoras têm chamado a atenção para a necessidade de eliminação de riscos por meio de recomendações, como a redução do ciclo de liquidação e a adoção de padrões de comunicação internacionalmente aceitos. Neste contexto, destacam-se soluções como o iMercado, cujo propósito é proporcionar maior nível de automatização nos processos de pós-negociação, beneficiando-se de mensagens e arquivos padronizados.

STP (Straight Through Processing)Na década de 1970, quando a Bovespa implantou um sistema que disseminava as informações

cursadas em seu pregão, o mercado de capitais brasileiro passou a conviver com os primeiros recursos tecnológicos de uma forma mais ampla. Desde então, outros marcos estreitaram a relação entre o mer-cado de capitais e a tecnologia da informação, tais como a desmaterialização dos ativos custodiados, o desenvolvimento do sistema de negociação eletrônica e os serviços de home broker. Atualmente, é impossível imaginar os processos dos mercados financeiros e de capitais sem o suporte de sistemas e infraestruturas tecnológicas extremamente robustas e sofisticadas.

Se, de um lado, estão à disposição os mais avançados e modernos recursos tecnológicos, do ou-tro, há uma demanda crescente por estes recursos, motivada principalmente pelos seguintes fatores:– Os instrumentos do mercado financeiro e de capitais possuem características específicas e, mui-

tas vezes, bem distintas uma das outras.– A quantidade de processos e procedimentos relacionados aos mais diversos tipos de instrumen-

tos do mercado financeiro e de capitais exige eficiência dos fluxos operacionais.– O dinamismo do mercado frequentemente demanda novos produtos e novos procedimentos.– O mercado necessita se adaptar às novas demandas legais e regulatórias.

Em função dos desafios oriundos dos fatores mencionados acima, há cerca de duas décadas sur-giu o conceito de STP (Straight Through Processing), sigla em inglês que caracteriza o conjunto de

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artigo técnico

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Page 40: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

iniciativas e soluções que visam à eficiência por meio da eliminação de intervenção manual no tratamento e na troca de informações entre as partes envolvidas nos fluxos operacionais. Quando há procedimentos execu-tados de forma manual, a possibilidade de erros operacionais se potencializa e há limitações para lidar com alto volume de transações.

Neste contexto, o STP apresenta-se como uma tendência para a indústria financeira e é desejado em to-das as etapas do ciclo de vida de uma transação, tanto (i) nos procedimentos internos e no tratamento pelos sistemas legados das instituições como (ii) nos mecanismos de comunicação entre as instituições envolvidas.

Na figura abaixo, é possível visualizar os principais processos da cadeia de valor do mercado de capitais, desde a pré-negociação, passando pela negociação, até a pós-negociação. Também, de forma ilustrativa, a figura apresenta o envolvimento dos principais atores, dentro do mercado brasileiro, nestes processos.

Figura 1 – Cadeia de valor no mercado de capitais brasileiro

Elaboração: BM&FBOVESPA

BM&FBOVESPA(Negociação)

BM&FBOVESPA(Clearing)

BM&FBOVESPA(Depositária) Corretoras Bancos Custodiantes Gestores

Emissão de Ativos

Pesquisa e Análise

Avaliação de Preço AdequadoGerenciamento de RiscoAcesso e Credenciamento

Ordem do Cliente

Execução de OrdemConfirmação de Operação

Market Data

Captura de Operações

Alocação e Repasse

Liquidação

Controle de Posições

Gerenciamento de Risco

Gerenciamento de Colaterais

Tarifação

Guarda de Ativos

Eventos Corporativos

PRÉ-

NEG

OCI

AÇÃO

NEG

OCI

AÇÃO

PÓS-

NEG

OCI

AÇÃO

artigo técnico

40 Fev/2016

Page 41: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Redução do ciclo de liquidaçãoA crise de 2008 foi um marco histórico para o mercado financeiro mundial. A sua magnitude e as con-

sequências avassaladoras obrigaram os órgãos reguladores a reavaliar os arcabouços legais e regulatórios para evitar que algo parecido ocorra novamente. Embora o foco principal tenha sido nas questões que envolvem diretamente o mercado de derivativos de balcão, o risco de contraparte central também foi um dos pilares das discussões. Neste sentido, a redução do ciclo de liquidação de operações se tornou crucial, tanto para a redução do risco de contraparte central como também para proporcionar maior eficiência no gerenciamento de liquidez.

Dentro deste contexto, os principais mercados começaram a trabalhar para reduzir seus ciclos de li-quidação. Alguns deles, como o mercado europeu e o de Hong Kong, já migraram o ciclo de liquidação do mercado à vista de ações de D+3 (três dias úteis da data de realização da operação) para D+2 (dois dias úteis da data de realização da operação). Outros, como o da Austrália e o dos Estados Unidos, anunciaram que migrarão este ciclo de liquidação também para D+2. A previsão é que o mercado australiano migre em março de 2016 1 e o americano, no terceiro trimestre de 2017 2.

A redução do ciclo de liquidação é uma tendência global que deve alcançar também o mercado bra-sileiro, possibilitando, desta forma, sua harmonização com os principais mercados internacionais. Trata-se, por enquanto, de uma discussão isolada na indústria local, mas que, no momento adequado, vai requerer um amplo envolvimento de todas as partes (reguladores, provedores de infraestruturas, associações, instituições do sell-side e do buy-side, etc.) para se avaliarem os impactos de uma possível migração do ciclo de liquidação do mercado à vista de D+3 para D+2.

Figura 2 – Ciclo de liquidação atual do mercado à vista no Brasil

D+0 D+1 D+2 D+3

– Realização da operação

– Identificação de comitente residente

– Identificação de comitente não residente

– Pre-Matching

– Autorização de custodiante

– Pre-Matching

– Liquidação – DvP (Delivery versus Payment)

A complexidade é grande e abrange adaptações em sistemas, processos, procedimentos operacionais e nos relacionamentos entre as instituições. Processos como alocação de operações, autorizações dos custodian-tes e conciliação entre corretoras e custodiantes (pre-matching) são os que provavelmente terão maior impacto.

Uma maneira de mitigar os riscos operacionais é estimular as adaptações aos poucos e de forma gra-dativa. Recentemente, a BM&FBOVESPA anunciou a redução de uma parte da grade de alocação de ope-rações do mercado à vista de ações. Desde junho de 2015, a identificação de comitentes locais passou a ser permitida somente no mesmo dia da realização da operação, e não mais em D+1. Para os comitentes

1 Detalhamento em http://www.asx.com.au/services/t2.htm2 Detalhamento em http://www.ust2.com

Elaboração: BM&FBOVESPA

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Page 42: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

não residentes, a identificação deixou de ser permitida até 21h30 de D+1 e passou para 17h00 de D+1. O objetivo final é que todo o processo de alocação do mercado à vista de ações se encerre às 13h00 de D+1. Porém este movimento, assim como outros similares, exigirá um nível maior de automatização nos fluxos operacionais e na comunicação entre as instituições.

Padronização de comunicação no mercado financeiro e ISO 20022

O princípio 22 dos Princípios para Infraestruturas do Mercado Financeiro (PFMI, na sigla em inglês)3, emitido pelo Banco Internacional de Compensações (BIS, na sigla em inglês) e pela Organização Interna-cional das Comissões de Valores Mobiliários (IOSCO, na sigla em inglês), recomenda que uma instituição provedora de infraestrutura para o mercado financeiro deve utilizar ou, no mínimo, acomodar padrões e procedimentos de comunicação internacionalmente aceitos, a fim de buscar eficiência nos processos de pa-gamento, compensação, liquidação e registro.

Nesta mesma linha, o Banco Central do Brasil (BCB), por meio dos Relatórios de Vigilância do Siste-ma de Pagamentos Brasileiro de 2013 4 e de 2014 5, também ressalta a adoção de padrões de comunicação internacionalmente aceitos em termos de competição e eficiência no sistema de pagamentos. Desde então, o BCB tem apoiado e conduzido discussões junto aos participantes com o intuito de uniformizar o conheci-mento e capturar a visão das instituições sobre o tema.

No entanto, embora as diretrizes estejam estabelecidas pelas autoridades reguladoras, a adoção, na prá-tica, requer uma avaliação de custos e benefícios muito cautelosa. Uma migração de tecnologia, muitas vezes acompanhada de adaptações de processos e procedimentos, exige investimentos consideráveis. Por outro lado, dependendo das características do modelo e segmento de atuação de determinada instituição, bem como de seus clientes, os benefícios podem compensar os investimentos realizados. Portanto, a avaliação da adoção ou não de padrões internacionalmente aceitos não deve considerar apenas o aspecto tecnológico. Trata-se de uma decisão do ponto de vista de negócio e estratégico da instituição.

Na BM&FBOVESPA, a integração da pós-negociação (IPN), projeto que unifica as clearings, trouxe inúmeras oportunidades. Em 2010, quando o projeto começou a ser estruturado e desenvolvido, foi realiza-da a avaliação sobre qual o padrão deveria ser adotado na comunicação com seus participantes. Após estudos e consultas a especialistas no assunto, verificou-se que o padrão ISO 20022 era o que estava despontando e sendo mais aceito no ambiente de pós-negociação.

A estrutura do padrão ISO 20022 é baseada em três camadas bem definidas: a primeira camada define os aspectos relacionados aos conceitos e aos processos de negócio; a intermediária trata do modelo de men-sagens do ponto de vista lógico; e a terceira trabalha a sintaxe das mensagens.

Para que uma mensagem seja construída, utiliza-se o princípio de cada camada. A primeira etapa passa pela definição do processo de negócio, dos envolvidos e das responsabilidades de cada parte envolvida. Es-tas informações, ou elementos funcionais, são organizadas em componentes de negócio. A partir dos com-ponentes de negócio, na camada lógica, são definidas as informações que as mensagens precisam conter, independentemente da sintaxe, organizadas nos componentes de mensagem. Por fim, na última camada, define-se a sintaxe da mensagem. Para esta representação física da mensagem, a ISO 20022 utiliza primor-dialmente a linguagem XML.

3 Documento original em http://www.bis.org/cpmi/publ/d101a.pdf4 Documento original em http://www.bcb.gov.br/htms/novaPaginaSPB/RELATORIO_DE_VIGILANCIA_SPB2013.pdf5 Documento original em http://www.bcb.gov.br/htms/novaPaginaSPB/Relatorio_de_Vigilancia_do_SPB_2014.pdf

artigo técnico

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Page 43: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Além destas camadas, a ISO 20022 tem um repositório único e centralizado de todo o seu conteúdo, contendo os dicionários e os componentes de negócio e de mensagem. Portanto, a construção de seus arqui-vos e mensagens baseados no padrão ISO 20022 é mais eficiente, principalmente em função da possibilidade de reúso dos componentes de negócio e de mensagem. Consequentemente, há também efeitos na redução de custos para elaboração e manutenção das mensagens.

Adicionalmente, a adoção do padrão ISO 20022 pode proporcionar outros benefícios, tais como facili-tar (i) o acesso e a comunicação com investidores e intermediários estrangeiros e (ii) a utilização de soluções e serviços de provedores de tecnologia estrangeiros.

Em função dos benefícios apresentados, a BM&FBOVESPA optou em construir todo o catálogo de mensagens e arquivos da Clearing BM&FBOVESPA com base no padrão ISO 20022. Para cada fluxo de negócio, buscam-se nos artefatos já existentes no repositório da ISO 20022 os atributos necessários para compor as mensagens e arquivos deste fluxo. Caso não exista equivalência, busca-se proximidade ao padrão.

Além dos fluxos entre a Clearing BM&FBOVESPA e seus participantes diretos, a BM&FBOVESPA também adotou a mesma estratégia de adoção do padrão ISO 20022 nos fluxos transacionais do serviço iMercado.

iMercadoDe uma forma simplificada, é possível separar o fluxo de informações relacionadas aos processos de

pós-negociação em duas etapas: (i) entre a BM&FBOVESPA e seus participantes diretos (sell-side) e (ii) entre o sell-side e o buy-side.

Na primeira etapa, em função dos sistemas e da infraestrutura tecnológica, bem como dos catálogos de mensagens e arquivos produzidos e divulgados pela BM&FBOVESPA, pode-se afirmar que a comunicação é absolutamente padronizada. Já na segunda, em função das diversas características e necessidades das ins-tituições, há espaço e oportunidades de padronização, buscando, desta forma, maior nível de automatização e redução de risco operacional.

Figura 3 – Fluxo de informação sem iMercado

Elaboração: BM&FBOVESPA

Sell-Side Buy-SideBM&FBOVESPAMensagense arquivos

padronizados

Falta de padronização na troca de informações

Pós-negociação

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Page 44: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

A proposta do iMercado é justamente prover a infraestrutura tecnológica e os catálogos padronizados de mensagens e arquivos para a comunicação entre o sell-side (essencialmente corretoras) e o buy-side (cus-todiantes, gestores, administradores e fundações) nos processos de pós-negociação.

6 Definição de conta master no Manual de Procedimentos Operacionais da Clearing BM&FBOVESPA: conta transitória, agrupadora de contas de comitentes que possuem vínculo especifico entre si, como o de gestão comum ou o de representação pelo mesmo intermedi-ário internacional, registradas sob o mesmo participante de negociação pleno, participante de liquidação ou participante de negociação.

Figura 4 – Fluxo de informação com iMercado

Elaboração: BM&FBOVESPA

Para fins elucidativo e ilustrativo, o iMercado pode ser comparado a uma rodovia por onde se trafegam caminhões de transporte de veículos novos (caminhões-cegonha) entre uma montadora e uma concessio-nária revendedora. Ou seja, o iMercado é o meio (a rodovia) por onde se trafegam mensagens e arquivos padronizados (os caminhões-cegonha). O tratamento das mensagens e dos arquivos, bem como as regras de envio ou recebimento, fica a critério das instituições de origem e destino (a montadora e a concessionária).

O iMercado possui essencialmente dois módulos: o módulo de mensageria e o módulo de arquivos. O módulo de mensageria tem o propósito de cobrir os fluxos transacionais, com processamento em tempo real. Atualmente, estão em desenvolvimento os fluxos relacionados à alocação de operações, ou seja, à troca de in-formações entre o sell-side e o buy-side para fins de identificação do comitente final. Por exemplo: no primeiro momento, determinada ordem de um gestor é executada por uma corretora, ainda sem a identificação do(s) fundo(s), ou seja, é executada na conta master 6 deste gestor. No segundo momento, para que a corretora exe-cutora identifique o(s) fundo(s) na clearing, é necessário que o gestor envie à corretora a informação da quan-tidade a ser alocada para cada fundo. É justamente nesta etapa que o iMercado disponibiliza a infraestrutura tecnológica e o catálogo de mensagens padronizadas. Utilizando o iMercado, a comunicação entre as corretoras e os gestores torna-se totalmente automatizada, ou seja, no caso específico do fluxo de alocação, tanto a corre-tora confirma a realização da operação para o gestor como o gestor informa a distribuição deste negócio nos seus fundos para a corretora. Com esta informação, recebida por meio das mensagens do iMercado, a corretora pode, sem nenhuma interferência manual (STP), gerar as mensagens de alocação que devem ser encaminhadas à clearing. As mensagens de alocação do iMercado contemplam a confirmação da operação realizada, os fluxos de repasse, o processo de identificação do comitente e as informações da nota de corretagem.

Sell-Side Buy-SideBM&FBOVESPA iMercado

Pós-negociação

Mensagense arquivos

padronizadosCatálogo demensagens

Padronização na troca de informações de pós-negociação entre sell-side e buy-side

artigo técnico

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Page 45: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

A previsão é que os fluxos de alocação estejam disponíveis em ambiente de produção a partir de 2016, no mesmo cronograma de implantação da segunda fase da clearing integrada. Após a implantação destes flu-xos de alocação, estão previstos outros processos, tais como cadastro de investidor estrangeiro, conciliação entre corretora e custodiante (pre-matching), liquidação, controle de posições, gerenciamento de colaterais e empréstimo de ativos.

Já o módulo de arquivos se propõe a oferecer padronização nos processos de conciliação, ou seja, arqui-vos diários aos custodiantes, gestores, fundações e administradores com as informações das posições de suas carteiras ou de clientes na(s) corretora(s) em que houver posição. Para que o arquivo passe a ser enviado diretamente pela clearing aos custodiantes, gestores, fundações e administradores, é necessário que a cor-retora aprove, apenas uma única vez, este envio. O arquivo contém informações de posições do mercado à vista, opções, termo, futuro, balcão, empréstimo de ativos, colaterais, liquidação financeira e informações da depositária (saldo em custódia e eventos corporativos). Este arquivo, denominado IMBARQ 7, tem previsão de implantação em conjunto com a segunda fase da clearing integrada.

7 Layout disponível em http://ipn.bmfbovespa.com.br, Novo Modelo, Catálogo de Mensagens e Arquivos.

Figura 5 – Módulos de arquivos do iMercado

Elaboração: BM&FBOVESPA

A adoção das mensagens do iMercado, portanto, irá permitir que os participantes dos mercados finan-ceiro e de capitais realizem seus processos de pós-negociação de forma totalmente automatizada. A adoção dos arquivos trará importantes reduções de tempo de processamento, custos e riscos operacionais nos pro-cessos de conciliação e abertura de dia. A eficiência decorrente da utilização, tanto das mensagens como dos arquivos do iMercado, mostra-se fundamental para o atingimento de metas de reduções significativas de grades de alocação, dos prazos do processo de conciliação entre corretoras e custodiantes, entre outros, e, consequentemente, do ciclo de liquidação do mercado à vista de ações de D+3 para D+2.

Sell-SideBM&FBOVESPA

iMercadoMódulo de

Arquivos

Pós-negociação

Mensagense arquivos

padronizados

APROVAÇÃO

IMBARQ

Gestores

Fundações

Administradores

Custodiantes

45Fev/2016

Page 46: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Estrutura a Termo de Taxas de Juros: Determinantes Macroeconômicos – Aplicação do Modelo de Svensson para o BrasilResumo: este trabalho visa sistematizar um modelo para previsão e expli-cação dos movimentos de curto prazo da estrutura a termo de taxas de juros pré-fixadas em reais do Brasil, baseado na relação dos movimentos em questão com os níveis e alterações que se processam nas variáveis macroeconômicas relevantes.A metodologia usada foi dividir o procedimento em duas etapas: na pri-meira etapa, o modelo de Svensson (1994) é usado para ajustar a ETTJ de cada data específica para obter os parâmetros daquela data. Isso é conse-guido através da maximização da estatística R2 na regressão de mínimos quadrados, como sugerido no artigo original de Nelson e Siegel (1987).Então, as medianas dos dois parâmetros de decaimento utilizados são calculadas e mantidas arbitrariamente constantes para facilitar o cálculo.Na segunda etapa, uma vez que os estimadores que melhor se ajustam às curvas de juros foram obtidos, outra regressão MMQO (Método de Mínimos Quadrados Ordinários) é realizada considerando os betas de Svensson dependentes de variáveis macroeconômicas de estado.

JOSÉ MONTEIRO Professor do Instituto Educacional

BM&FBOVESPA e mestre em Economia na FGV/EESP

ROGERIO MORIProf. Dr. da FGV/EESP

artigo técnico

46 Fev/2016

Page 47: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

1. Modelagem de estrutura a termo de taxas de jurosOs estudos sobre a ETTJ vêm sendo realizados desde a década de 1970, tanto por financistas como por

economistas. Os financistas estão interessados, entre outras coisas, em precificação de derivativos e hedge de títulos e derivativos de renda fixa.

Os economistas, por sua vez, têm buscado relacionar o comportamento da ETTJ com as variáveis ma-croeconômicas.

Os modelos não paramétricos (ou modelos de não arbitragem) irão buscar o perfeito ajuste da ETTJ em um dado instante no tempo, garantindo que não existam oportunidades de arbitragem entre vencimen-tos. Essa classe de modelos vai ser usada por operadores de taxas de juros, dado que no processo de preci-ficação de derivativos a condição de não arbitragem é característica importante. Exemplos de modelos não paramétricos são as splines cúbicas de McCulloch (1971-1975) e as splines exponenciais (Vasicek, 1977).

Os modelos de equilíbrio, que são uma classe de modelos paramétricos, são caracterizados pela mode-lagem da taxa instantânea, que evolui para os outros prazos através de modelagem do prêmio de risco para os vértices posteriores.

Alguns exemplos consagrados são Vasicek (1977), Cox, Ingersoll Jr. e Ross (1985) e Hull e White (1990). Segundo Caldeira (2011:98), “os métodos paramétricos apresentam algumas vantagens. Primeiro,

assumem especificações parcimoniosas, que propiciam intepretação econômica dos parâmetros. Segundo, podem ser impostas formas funcionais que obedecem a relações impostas pela teoria econômica”.

Esses atributos dos métodos paramétricos, aliados em geral à sua parcimônia, serão de grande utilidade no estudo do relacionamento da ETTJ com as variáveis macroeconômicas e de mercado.

Dessa forma, alguns dos métodos paramétricos de modelagem da ETTJ são descritos a seguir.O modelo de Nelson e Siegel (1987) consegue ajustar a ETTJ através da resolução de uma equação

diferencial para as taxas forward1 e integrá-la para obter a curva spot de juros. O ajuste de curvatura caracte-rístico das curvas de juros é conseguido com a introdução de um parâmetro de formato2, que é calculado de sorte a maximizar a estatística R2 da regressão em MMQO do modelo a seguir.

A curva spot que representa a ETTJ no modelo de Nelson e Siegel (1987)3 é descrita por:

/ /y 1 1exp exp exp0 1 2x b b xi

xib x

ixi

xi

= + - - + - - - -Q S S S S SV X X X X X# #& &G J Eq. (1)

para cada prazo τ.Como pode ser visto na equação (1), fixado o parâmetro x , todos os termos que acompanham os

regressores podem ser calculados para uma determinada data.Como os limites da segunda e da terceira parcelas tendem a zero quando o prazo tende ao infinito, o

termo 0b é chamado o fator de longo prazo, uma vez que é para essa taxa que o modelo está convergindo naquele momento.

A segunda parcela tende a zero quando o prazo tende ao infinito, logo 1b é chamado de fator de curto prazo.A terceira parcela tem um comportamento interessante. Ela atinge um pico em algum prazo intermedi-

ário e depois decresce monotonicamente até zero, no infinito. Logo, é um fator de médio prazo. Uma forma alternativa de escrever a Eq. (1) é utilizando o parâmetro 1m

i= :

1 As taxas forward são as taxas de juros estimadas pelo mercado para períodos que se iniciam e terminam no futuro. Exemplo: se o mer-cado espera que entre as próximas reuniões do Copom a taxa de juros vai ser 12% a.a., esta é a taxa forward nesse período. A curva pré nada mais é então que o acumulado das taxas forward mais um prêmio de risco.

2 , 1

im

= para facilitar a álgebra e as regressões, muda-se a variável tau por lambda.

47Fev/2016

Page 48: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

y e e e1 1

0 1 2x b bmx

bmx

= + - + - -mx mx

mx- -

-Q T TV Y Y Eq. (2)

O parâmetro m é a taxa de decaimento exponencial. Valores pequenos de m geram decaimentos len-tos, logo vão ajustar melhor a curva para prazos longos. Valores mais altos de m geram decaimentos rápidos e vão ajustar melhor a curva de juros no curto prazo. O valor de m também serve para definir o ponto de máximo do efeito de médio prazo capturado por 2b .

Svensson (1994) em seu artigo inclui um outro termo na equação de Nelson e Siegel (1987) com o intuito de melhorar a aderência do último em certas situações, como em curvas com formatos em S bem pronunciados, por exemplo. Este termo 3b é o regressor de uma parcela que contém o quarto termo da equação, com inclusão do parâmetro 2m .

A equação do modelo de Svensson (1994) é:

 y m e e e e e1 1 10 1

12

13

2

1 11

22b b

m xb

m xb

m x= + - + - - + - -

m x m xm x

m xm x

- --

--Q T T TV Y Y Y

Eq. (3)

Uma tentativa de compreensão da dinâmica da ETTJ ao longo do tempo ocorre no artigo de Diebold e Li (2006).

Nesse artigo eles vão buscar modelar a dinâmica da ETTJ ao longo do tempo, modelando os parâme-tros tb como possuindo comportamento de modelo autoregressivo.

Assim, de agora em diante, os parâmetros b , que valem para uma data específica qualquer, passarão a ser tb .

y e e e1 1t t t t1 2 3x b b

mxb

mx= + - + - -

mx mxmx

- --Q T TV Y Y

Eq.(4)

Uma outra visão importante que surge com Diebold e Li (2006) é a interpretação dos três fatores como nível ( 1b ), inclinação ( 2b ) e curvatura ( 3b ).

Huse (2011) vai tomar o modelo Nelson e Siegel (1987) e substituir os fatores latentes de Diebold e Li (2006) por coeficientes cuja dinâmica está atrelada a variáveis macroeconômicas de estado observáveis, como inflação, dívida, taxa básica de juros, etc.

A equação que rege o modelo de três fatores e um parâmetro é:

y e e e u1 1t t t t t0 1 2x b b

mxb

mxx= + - + - - +

mx mxmx

- --Q T T QV Y Y V

Eq. (5)Huse (2011) vai denominar , ''

t t ti b m= Q V um vetor que determina em cada instante de tempo t o formato da ETTJ.

Ele decompõe esse vetor em duas parcelas, a média e aquelas variáveis de estado que vão impactar as variáveis latentes.

Assim, a representação do modelo de Huse (2011) é :y X ut t t t tx xm b= +Q Q QV V V Eq. (6)

artigo técnico

48 Fev/2016

Page 49: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Com:

Mt

t

médio

médiot

b

m

b

mv

v= + b

m

-# # #& & & Eq.(7)

Segundo Huse (2011:3243), “embora esse modelo seja mais custoso de ser estimado do ponto de vista numérico que o Diebold e Li (2006), no caso geral em que o parâmetro tm também é estimado por variáveis de estado, esse custo é compensado pelo fato de ter a dinâmica dos parâmetros tb descritas pelas variáveis de estado”.

2. Modelo proposto 2.1. Ajuste da curva de juros

Devido às dificuldades econométricas existentes na utilização do modelo de Huse (2011), vamos reali-zar a estimação pelo modelo de Svensson (1994), calculando os parâmetros  e1 2m m para cada data de pregão na BM&F de acordo com o procedimento de Nelson e Siegel (1987) e utilizando a mediana dos resultados de ambas as séries4 para o cálculo da regressão entre os parâmetros b e as variáveis macroeconômicas re-levantes.

2.2. Regressão contra as variáveis de estadoAlém de todas as questões relacionadas à estimação de um modelo econométrico, uma questão impor-

tante que surge inicialmente é: qual a frequência ideal dos dados para a regressão?Certamente a frequência diária traria perturbações excessivas ao modelo, já que os agentes podem

exigir um intervalo de tempo superior a um dia para coletar, processar e tomar as decisões de negociação no mercado. Além disso, a existência de outras variáveis atuando e que não estarão presentes no modelo pode colocar ruído na estimação do problema.

A frequência mensal, por sua vez, poderia esconder comportamentos importantes no curto prazo, relacio-nados a mudanças nas expectativas dos agentes causadas por informações divulgadas entre um mês e o outro.

Escolheremos então a frequência semanal para realização dos testes estatísticos e da regressão dos pa-râmetros contra as variáveis de estado.

Assim, as variáveis que serão usadas como regressores devem, preferencialmente, ter atualizações se-manais, de sorte a que não existam períodos com valores inalterados por não divulgação em datas sucessivas.

Abaixo a lista das variáveis candidatas a variáveis explicativas para o modelo: a) A inflação esperada utilizada será a divulgada semanalmente no Boletim Focus do Banco Central e

reflete a expectativa de um conjunto de agentes bem informados sobre a inflação futura medida pelo IPCA divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

b) O Risco País será medido através do Credit Default Swap (CDS, na sigla em inglês). Como o CDS Bra-sil de cinco anos tem cotação diária, pode ser usado com frequência semanal como indicador do risco de default do país.

c) A inflação corrente utilizada no modelo será aquela sinalizada pelo IPC Fipe, calculado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) para a região metropolitana de São Paulo e divulgado sema-nalmente.

d) A taxa Selic será a variável que mede o nível corrente da taxa de juros.

4 Vários trabalhos acadêmicos locais seguem o artigo de Diebold e Li (2006) e arbitram o valor de λ em 0,0609, de sorte a evitar a estimação do mesmo.

49Fev/2016

Page 50: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

e) Taxa de câmbio nominal f) A taxa de juros externa utilizada será aquela dos Treasury Notes de dez anos, emitidos pelo governo dos

Estados Unidos. g) O risco sistêmico global será medido através do índice VIX, que mede a volatilidade implícita das op-

ções do S&P 500 e é divulgado pela Chicago Board Options Exchange.h) A atividade econômica entrará no modelo através de sua estimação pelos agentes de mercado contida

no Boletim Focus do Banco Central.i) O índice de commodities utilizado será o CRB, dada a importância da exportação de commodities agrí-

colas e minerais para a economia do país.

2.3. A escolha dos fatores mPara o cálculo dos valores dos diversos fatores diários  t1m Q V e t2m Q V foi realizado o mesmo proce-

dimento previsto no artigo seminal de Nelson e Siegel (1987), porém com os dois parâmetros lambda do modelo de Svensson (1994).

Para cada data disponível, fixam-se os dois m e realiza-se uma regressão em MMQO da ETTJ repre-sentada pelos seus parâmetros ,   ,0 1 2b b b e 3b .

Anota-se o valor da estatística R2 e deixa-se variar tanto t1m Q V como t2m Q V sobre um intervalo con-veniente.

Para cada par  ,t1m Q V t2m Q V existe um conjunto de estimadores de mínimos quadrados ,   ,0 1 2b b b e  3b e a estatística R2 associada à regressão.

O conjunto ,   ,0 1 2b b b , 3b ,  ,1 2m m que gerar o maior R2 é o que promove a maior aderência e, por-tanto, é o conjunto escolhido para modelar a ETTJ naquela particular data.

O método acima prescinde de um algoritmo de otimização e pode ser programado de maneira razoa-velmente simples em planilha eletrônica.

A razão para a não utilização de algoritmos de otimização robustos, como máxima verossimilhança, por exemplo, é a maior dificuldade de implantação vis-à-vis a precisão dos resultados obtidos.

Além disso, dependendo do algoritmo de otimização utilizado, podem ocorrer problemas de existência de ótimos locais que disparam o critério de parada do método em um ponto não adequado.

Diebold e Li (2006:346) afirmam: “Nós poderíamos estimar os parâmetros , , ,t t t t t0 1 2i b b b m= E H por métodos de mínimos quadrados não lineares, para cada mês t. Seguindo a prática de Nelson e Siegel (1987), entretanto, nós fixamos o tm em um valor pré-especificado, que nos permite computar os valores dos dois regressores (fatores de carga) e usar MMQO para estimar os betas (fatores), para cada mês t. Fazer isso aumenta não só a simplicidade e conveniência, mas também a credibilidade numérica, por nos permitir trocar centenas de otimizações numéricas desafiadoras por regressões de MMQO triviais”.

O problema, segundo eles, é escolher o valor adequado de m .Eles o escolhem partindo do pressuposto que o valor de m é aquele onde a carga do parâmetro de

curvatura atinge seu máximo. Se derivarmos o fator de carga de 2b em relação ao parâmetro m , chega-se à expressão:

ddc e 1 12

mmx mx= + + -mx- Q V! $ Eq. (8)

Que, para 30x = meses, resulta em ,0 0609m = , aproximadamente.O histograma dos valores do fator de decaimento m do modelo de Nelson e Siegel (1987) na amostra

utilizada no presente trabalho é dado a seguir:

artigo técnico

50 Fev/2016

Page 51: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Figura 1 – Histograma m – Modelo Nelson e Siegel

0

200

400

600

800

1,000

0.00 0.01 0.02 0.03 0.04 0.05

Series: LAMBDASample 1/02/2006 12/08/2014 Obs ervations 2246

Mean 0.005215Median 0.002941Maximum 0.050000Minimum 0.000667Std. Dev. 0.005985Skewness 2.258207Kurtosis 8.981364

Jarque-Bera 5257.016Probability 0.000000

Utilizando o valor mediano de m e substituindo na equação (9), teríamos que o valor para Brasil da maturidade, onde a carga do fator curvatura é máxima, é de 16 meses, cerca de metade do valor americano.

O histograma dos valores do fator de decaimento 1m do modelo de Svensson (1994) na amostra uti-lizada é dado abaixo:

Figura 2 – Histograma 1m – Modelo Svensson

0

100

200

300

400

500

600

700

800

0.00 0.02 0.04 0.06 0.08 0.10

Series: LAMBDA1Sample 1/02/2006 12/08/2014Observations 2246

Mean 0.010108Median 0.007143Maximum 0.100000Minimum 0.001000Std. Dev. 0.010762Skewness 2.983089Kurtosis 15.63886

Jarque-Bera 18280.19Probability 0.000000

51Fev/2016

Page 52: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

O histograma dos valores do fator de decaimento 2m do modelo de Svensson (1994) na amostra uti-lizada é dado a seguir:

Figura 3 – Histograma 1m – Modelo Svensson

Assim, 1m = 0,010108 e 2m = 0,011155 (valores medianos das séries de regressões) serão os fatores de decaimento utilizados no modelo de ajuste da ETTJ pré da BM&F.

Segundo a equação (9), as maturidades para Brasil onde as cargas sobre 2b e 3b são máximas são oito e sete meses respectivamente.

Um resultado importante das simulações realizadas é que realmente se comprova que a adição de um fator de decaimento realmente melhora o ajuste da ETTJ, conforme se pode observar na tabela abaixo:

Tabela 1: Total de melhores R2 por modelo

SV NS Total

2.240 6 2.246

99,7% 0,3% 100%

Outro resultado importante, o qual influi diretamente na estimação do modelo de regressão dos parâ-metros da curva de juros com função das variáveis macroeconômicas, é a verificação da qualidade do ajuste proporcionado pela utilização dos fatores de decaimento listados acima no modelo de Svensson (1994).

Para aferir isso, basta simular as curvas de juros com os lambdas utilizados, utilizando MMQO para cálculo dos parâmetros e verificando os valores de R2 resultantes.

0

100

200

300

400

500

0.0000 0.0125 0.0250 0.0375 0.0500 0.0625 0.0750 0.0875

Series: LAMBDA2 Sample 1/02/2006 12/08/2014Observations 2246

Mean 0.011155Median 0.007092Maximum 0.090909Minimum 0.000999Std. Dev. 0.016074Skewness 3.579309Kurtosis 17.03443

Jarque-Bera 23228.42Probability 0.000000

artigo técnico

52 Fev/2016

Page 53: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Figura 4 – Histograma dos R2 diários

0

400

800

1,200

1,600

2,000

0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0

Series: R2Sample 1/02/2006 12/08/2014Observations 2246

Mean 0.977393Median 0.991613Maximum 0.999810Minimum 0.182895Std. Dev. 0.049903Skewness -7.357050Kurtosis 82.68789

Jarque-Bera 614530.3Probability 0.000000

Pode-se observar que, para a amostra utilizada, os valores de 1m e 2m arbitrados oferecem um grande poder de ajuste aos dados, reproduzindo de maneira consistente a evolução da ETTJ pré em reais da BM&F.

3. Resultados3.1. Resultados das regressões

A tabela a seguir contém um resumo dos resultados das regressões realizadas:

Tabela 2: Resumo dos coeficientes das regressões

Variável b0 P-Valor b1 P-Valor b2 P-Valor b3 P-Valor

CDS 0,000072 0,06% -0,000086 0,10% -0,001820 0,00% 0,001715 0,00%

DCâmbio 0,024447 4,25% -0,026274 2,87% - - - -

DIPCA_Focus 4,542732 0,10% -3,912488 0,17% 48,664810 4,20% -52,565130 2,48%

DPIB_Focus 1,848100 0,48% -1,656633 0,75% - - - -

Selic - - 1,025172 0,00% 4,646737 0,00% -4,451462 0,00%

DSelic 0,388681 0,83% -0,613091 0,00% 6,417051 1,75% -6,007175 1,70%

D2006 0,124258 0,00% -0,124677 0,00% -0,342133 0,00% 0,317861 0,00%

D2007 0,102864 0,00% -0,104742 0,00% -0,370643 0,00% 0,351778 0,00%

D2008 0,118093 0,00% -0,116924 0,00% - - - -

D2009 0,108087 0,00% -0,107591 0,00% -0,246528 0,00% 0,190165 0,01%

D2010 0,107514 0,00% -0,107230 0,00% -0,109095 1,26% 0,093301 2,57%

D2011 0,104149 0,00% -0,103726 0,00% -0,249733 0,00% 0,233888 0,00%

D2012 0,090797 0,00% -0,094186 0,00% -0,481133 0,00% 0,434970 0,00%

D2013 0,095692 0,00% -0,097851 0,00% -0,293949 0,00% 0,269358 0,00%

D2014 0,105784 0,00% -0,105694 0,00% -0,182541 0,01% 0,164010 0,01%

53Fev/2016

Page 54: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

3.2. O modelo em funcionamento Nessa etapa o modelo será utilizado para replicar a ETTJ ao longo do tempo e verificar o distanciamen-

to das ETTJ obtidas pelo modelo em relação às ETTJ verificadas na realidade. Para medir esse distanciamento, vamos calcular a variância entre o modelo e a ETTJ observada para

cada vértice, numa espécie de Tracking Error5 das estimativas.A equação (3) com 1m = 0,010108 e 2m = 0,011155 será utilizada para calcular a ETTJ em cada uma das

sextas-feiras que fazem parte do período selecionado.

Gráfico 1 – Desvio-padrão (taxa real – taxa estimada) (% a.a.)

5 Desvio-padrão do retorno de uma carteira em relação ao seu referencial. O objetivo da medida é verificar se a previsão descola muito da taxa de juros observada.6Um computador que utilizaria o modelo com as entradas contidas nos modelos de regressão discutidos e enviaria ordens de compra e venda de contratos futuros de DI para vencimentos selecionados.

0,00%

0,10%

0,20%

0,30%

0,40%

0,50%

0,60%

0,70%

0,80%

0,90%

0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000

Vértice em dias úteis

Desvio padrão (taxa real – taxa estimada)

Des

vio

– Pa

drão

do

Erro

Percebe-se do gráfico acima que a aderência do modelo pode ser considerada razoável, dado que, para os maiores prazos, em 68% das vezes ele erra 0,7% a.a. para cima ou para baixo.

3.3. Utilização em algoritmos Para aferir se o modelo consistentemente acerta o comportamento da curva de juros, vamos observar

o valor do fechamento do mercado na quinta-feira, a sinalização dada pelo modelo para determinado vértice da curva na sexta-feira e verificar se o movimento sugerido realmente se materializou.

Uma maneira de fazer isso é admitir que existe um robot-trader6 que dispara ordens de compra e venda de contratos futuros de DI com vencimentos nos vértices onde existe liquidez suficiente.

Em vez de realizar a operação em si, para não poluir a análise com técnicas de trading e imunização que podem ser controversas, vamos realizar a seguinte rotina in-sample:

artigo técnico

54 Fev/2016

Page 55: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

a) Ao término da quinta-feira, é conhecida a ETTJ desse dia.b) Além da ETTJ, são conhecidas todas as variáveis explicativas relevantes, como taxa Selic, inflação e PIB

esperados no Boletim Focus, taxa de câmbio e CDS.c) Substitui-se essas variáveis na equação do modelo e verifica-se a ETTJ prevista para a sexta-feira.d) Nos vértices onde a ETTJ estimada apresenta taxa maior que a taxa de quinta-feira, anotamos como

“alta”.e) Nos vértices onde a ETTJ estimada apresenta taxa menor que a taxa de quinta-feira, anotamos como

“baixa”.f) Verificamos o que de fato ocorreu. Se o modelo previu “alta” e de fato aconteceu uma “alta” da taxa,

marcamos 1, caso contrário marcamos 0.O percentual de acertos em cada vértice será medido pela soma de números 1 apurados conforme os

passos acima. O resultado do back-test assim gerado pode ser resumido pelo gráfico a seguir:

Gráfico 2 – Back-test dentro da amostra para a previsão do modelo

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%2184

147210273336399462525588651714777840

15123780

Percentual dos trades certos sobre total

Vért

ices

Resultado back-test por vértice

Como o experimento acima é equivalente a jogar uma moeda, a distribuição de probabilidade associa-da é uma Be pQ V , com %p 50= .

Esta distribuição pode ser aproximada por uma distribuição normal, de acordo com a equação:

~ ;p N p n

p p1 -t T Q V Y

Eq. (12)Que é boa quando np 5$ .

55Fev/2016

Page 56: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Dado que n 464= e .p 0 5= , poderíamos propor um teste estatístico dado por::H0 O modelo é melhor que um trader jogando uma moeda para o alto;:H1 Não H0 .

Os resultados para este teste estão resumidos no gráfico a seguir:

Gráfico 3 – P-Valores dos testes de hipótese nos vértices

0%

20%

40%

60%

80%

100%

120%

0 500 1.000 1.500 2.000 2.500 3.000 3.500 4.000

P - V

alor

Vértices

P – Valor para modelo

Nota-se uma região onde os valores das estatísticas sugerem um comportamento bem distinto da sim-ples aleatoriedade.

A tabela abaixo contém o resumo dos vértices onde o modelo bate o simples lançamento de uma moeda, para um P-Valor limite de 10%:

Tabela 3: P-Valores relevantes para o modelo nos vértices

Vértice 168 210 252 273 294 315 336 357 378 399

P-Valor 6,33% 9,47% 1,22% 5,12% 2,59% 5,12% 3,27% 5,12% 6,33% 6,33%

3.4. Análise de sensibilidadeParece razoável supor que cada variável macroeconômica se manifesta nos diversos prazos da curva de

juros de maneira diferente.É possível avaliar esse fato qualitativamente através do modelo proposto.Como o ambiente macro se altera ao longo do tempo, vamos utilizar o ano de 2014 (mais recente da

amostra) para o exercício.

artigo técnico

56 Fev/2016

Page 57: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Cenários e movimentos sugeridos pelo modeloa) Aumento de 1 p.p. na Selic

Gráfico 4 – Aumento de 1 p.p. na Selic

10,0%

10,5%

11,0%

11,5%

12,0%

12,5%

21 63 105

147

189

231

273

315

357

399

441

483

525

567

609

651

693

735

777

819

1.00

8

1.51

2

2.52

0

Prazo em dias úteis

ETTJ – Análise de sensibilidade

Taxa pré-original Taxa pré-modelo

b) Depreciação cambial de 10%

Gráfico 5 – Depreciação cambial de 10%

10,0%

10,5%

11,0%

11,5%

12,0%

12,5%

13,0%

21 63 105

147

189

231

273

315

357

399

441

483

525

567

609

651

693

735

777

819

1.00

8

1.51

2

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0

Prazo em dias úteis

ETTJ – Análise de sensibilidade

Taxa pré-original Taxa pré-modelo

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Page 58: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

c) Aumento do CDS para 3%

Gráfico 6 – Aumento no CDS para 3%

10,0%

10,5%

11,0%

11,5%

12,0%

12,5%

13,0%

21 63 105

147

189

231

273

315

357

399

441

483

525

567

609

651

693

735

777

819

1.00

8

1.51

2

2.52

0

Prazo em dias úteis

ETTJ – Análise de sensibilidade

Taxa pré-original Taxa pré-modelo

d) Aumento de 0,5 p.p. na expectativa de inflação

Gráfico 7 – Aumento da expectativa de inflação de 50 p.b.

10,0%

10,5%

11,0%

11,5%

12,0%

12,5%

13,0%

13,5%

14,0%

14,5%

21 63 105

147

189

231

273

315

357

399

441

483

525

567

609

651

693

735

777

819

1.00

8

1.51

2

2.52

0

Prazo em dias úteis

ETTJ – Análise de sensibilidade

Taxa pré-original Taxa pré-modelo

artigo técnico

58 Fev/2016

Page 59: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

e) Aumento de 50 p.b. no PIB esperado

Gráfico 8 – Aumento no PIB esperado de 50 p.b.

10,0%

10,5%

11,0%

11,5%

12,0%

12,5%

13,0%21 63 10

5

147

189

231

273

315

357

399

441

483

525

567

609

651

693

735

777

819

1.00

8

1.51

2

2.52

0

Prazo em dias úteis

ETTJ – Análise de sensibilidade

Taxa pré-original Taxa pré-modelo

5. ConclusõesOs modelos parcimoniosos de ajuste de curva de juros já são ferramentas consagradas no campo das

finanças de mercado, sendo utilizados por clearings, provedores de informações financeiras, bancos centrais e instituições financeiras.

O procedimento abordado neste artigo, que é o de plugar o ajuste das curvas de juros com as variáveis que explicariam seus diversos movimentos, segue como tema de interesse na academia.

Neste sentido, buscou-se com este texto dar uma contribuição adicional ao assunto, por meio da documentação cuidadosa das etapas seguidas e de alguns detalhes metodológicos como:a) A utilização de uma série de tempo com dados da ETTJ da BM&F até o prazo de 15 anos. Embora os vértices

mais longos não ofereçam tanta precisão em função da baixa liquidez, se fez necessária a comprovação do fato pelos dados.

b) A utilização dos dois fatores de decaimento λ de Svensson (1994) para modelagem da curva de juros.c) Estes fatores de decaimento combinados tiveram melhor desempenho (medido pelo R2) que o modelo Nel-

son-Siegel (1987) original.d) Os valores de λ dos modelos de Nelson-Siegel (1987) e Svensson (1994) para a economia brasileira são dife-

rentes daquele usado por Diebold e Li (2006). A curva de juros brasileira tem seu pico em aproximadamente um terço do tempo que a americana.

e) O modelo de Svensson (1994) consegue capturar sinuosidades na curva de juros que o modelo de Nelson-Siegel (1987) não consegue, devido à utilização do segundo parâmetro.

Em relação aos resultados obtidos, algumas considerações podem ser realizadas:– De um modo geral, as análises de regressão resultaram em modelos satisfatórios do ponto de vista de expli-

cação dos dados. Embora tenham apresentado autocorrelação de resíduos, os fatos estilizados e sinais dos estimado-res foram equivalentes aos preconizados pela teoria econômica convencional.

– As regressões para relacionar os parâmetros da curva com as variáveis macro tiveram que ser controladas por dummies relativas a cada um dos anos da série. Este fato sinaliza que as condições de liquidez e outras que não pu-deram ser mapeadas por variáveis quantitativas ou qualitativas são comuns ao exercício civil em questão. Uma variável

59Fev/2016

Page 60: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

que pode ser testada em trabalhos futuros é o volume de derivativos negociados no mercado da BM&F, por exemplo.– Segundo o modelo, as variáveis que condicionam o nível das taxas de juros, ou a taxa de juros de longo

prazo, são: o nível da taxa Selic, a variação entre a semana corrente e anterior da taxa de câmbio, o nível do CDS e a va-riação entre a semana corrente e anterior do PIB e inflação esperados. Todos com sinal positivo, ou seja, um aumento em qualquer um dos itens acima provoca um aumento no nível da curva de juros.

– O valor da inclinação da curva de juros é função positiva da variação da inflação e do PIB, do nível do CDS e das variações da taxa de câmbio, PIB e inflação esperados.

De acordo com o modelo, se a variação da inflação é positiva, a curva de juros tende a ter uma inclinação positi-va. O inverso ocorre para o nível da taxa Selic. Ela entra no modelo em nível, com sinal positivo (negativo se tomarmos a tangente da taxa longa vis-à-vis a taxa curta). Ou seja, a contribuição da Selic para a inclinação é sempre negativa, sinalizando que quanto maior o choque hoje, menor a taxa amanhã e indicando a existência de reversão à média no longo prazo.

– A taxa de juros instantânea é a soma dos parâmetros de nível e inclinação. No modelo, a mesma vai depender em grande medida (e positivamente) da variação da inflação e do PIB esperados, porém com uma menor intensidade em relação à taxa de juros de longo prazo. Um outro resultado interessante é que seu valor não depende de variáveis dummies para ser explicado, o que sinaliza que seu valor não depende de condições de liquidez do mercado, por exemplo.

Como o assunto não se esgota aqui, espera-se que esta contribuição tenha servido para avanços nos estudos sobre o tema.

6. Referências BibliográficasBEVILACQUA, A.S.; MESQUITA, M.; MINELLA, A. Brazil: Taming Inflation Expectations. BCB, Working Paper Series, January, 2007.

CALDEIRA, J.F. Estimação da Estrutura a Termo da Curva de Juros no Brasil através de Modelos Paramétricos e Não Paramétri-cos. Análise Econômica, Porto Alegre, n.55, p.95-122, mar. 2011.

COX, J. C; INGERSOLL JR., J. E; ROSS, S. A. A theory of the term structure of interest rates. Econometrica, v. 53, n. 2, 385–407, 1985.

DIEBOLD, F.X.; LI C. (2006). Forecasting the Term Structure of Government Bond Yields. Journal of Econometrics, 130, 337-364

DUARTE, T.B.; NEVES, C.R,; FRAGA de MELO, E.; FRANKLIN JR., S.L. (2011). A estrutura a termo de taxas de juros no Brasil: modelos, estimação, interpolação, extrapolação e testes. Susep.

GOMES DA SILVA, C.; NUNES, C.V.A; HOLLAND, M. (2011). Sinalização de Política Monetária e Movimento na Estrutura a Termo de Taxas de Juros no Brasil. Economia, Brasília (DF), v.12, n.1, p.71–90, jan/abr 2011.

HULL, J.; WHITE, A. Valuating derivative securities using the explicit finite difference method. The Journal of Financial and Quantitaive Analysis, v. 25, n. 1, p. 87–100, 1990.

HUSE, C. (2011). Term Structure Modelling with Observable Variables. London School of Economics.

LEITE, A. L.; GOMES FILHO, R. B. P.; VICENTE, J. V. M. (2009). Previsão da Curva de Juros: um modelo estatístico com variáveis macroeconômicas. Trabalhos para Discussão, 186 – BCB.

MCCULLOCH, J. H. Measuring the term structure of interest rates. Journal of Business, v. 44, n. 1, p. 19–31, 1971.

______. The tax-adjusted yield curve. Journal of Finance, v. 30, n 3, p. 811–830, 1975.

NELSON, C. R.; SIEGEL, A. F.; (1987). Parsimonious Modelling of Yield Curves. Journal of Business, 60, 473-489.

SVENSSON, L. E. O. (1994). Estimating and Interpreting Forward Interest Rates: Sweden 1992-1994. National Bureau of Eco-nomic Research. NBER Working Paper Series 4871.

VASICEK, O. An equilibrium characterization of the term structure. Journal of Financial Economics, v. 5, n. 2, p. 177–188, 1977.

artigo técnico

60 Fev/2016

Page 61: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Volta por cimaOs futuros de petróleo bruto West Texas

Intermediate (WTI) têm sido negociados com um prêmio em relação ao Brent, fato que não era observado desde 2010. Três são os principais motivos para esse movimento: o fim da proibição de quatro décadas para as exportações de petróleo pelos Estados Uni-dos, bem como a redução da produção de xisto por esse país; o incremento da produção de petróleo no Mar do Norte; e a diminuição do número de posições vendedoras no WTI.

E tem mais: como o petróleo bruto não é o mesmo ao redor do mundo, há vários re-ferenciais globais de preços para a commo-dity, mas os mais utilizados são o WTI (ne-gociado na Nymex) e o Brent (negociado na ICE), sendo o primeiro tipo produzido nos EUA e o segundo, no Mar do Norte. Por isso, a precificação dos demais tipos de pe-tróleo acaba seguindo um ou outro.

(MarketWatch, 24/12/2015)

61

notícias

Fev/2016

Oportunidades Os Emirados Árabes Unidos tencio-

nam estabelecer câmara de compensa-ção e liquidação para a moeda chinesa, yuan, ainda sem data definida. Com isso, à medida que os laços econômicos com a China florescem na região, será o segundo país do Oriente Médio a mon-tar esse tipo de estrutura. O primeiro a fazê-lo foi o Qatar, em abril de 2015, cuja clearing engloba todos os estágios de uma operação cambial.

E tem mais: o anúncio dos Emirados Árabes Unidos, a segunda maior eco-nomia local depois de Arábia Saudita, acompanha a decisão do Fundo Mone-tário Internacional, em novembro de 2015, de admitir o yuan em sua cesta de Direitos Especiais de Saque, o que poderá incentivar outros países a usar a moeda chinesa em reservas, comércio e investimento.

E tem mais: outro sintoma do interes-se pelo yuan na região será o lançamen-to, pela Bolsa de Ouro e Commodities de Dubai, de um contrato futuro sobre yuan, o qual aguarda autorização regu-latória.

(Reuters, 26/12/2015)

Educação financeira?Para uma plateia formada por 150 estudantes da Universidade Fairleigh Di-

ckinson, em Madison, Nova Jérsei, além de professores e repórteres, Jon Corzine proferiu palestra sobre sucesso e fracasso, sem mencionar o nome MF Global, que comandou até a falência desta em 2011. Como investidor de private equity, Corzi-ne disse que não conseguira reverter a situação de uma corretora em dificuldades. Nessa rara conferência desde a quebra da MF Global, a mensagem principal do ex-executivo foi cultivar e aceitar a ambição sem ter medo de arriscar, dentro de limites, mencionando as boas intenções que tivera em relação à corretora, pois considerava que sua primeira obrigação era tentar salvá-la para que, se bem-suce-dido, pudesse dar sustentação ao papel de filantropo que pretendia desempenhar nos últimos anos de sua vida.

E tem mais I: antes da MF Global, Corzine trabalhou 24 anos para o grupo Gold-man Sachs, em Nova York. Depois de sua demissão em 1999, foi eleito senador pelo estado de Nova Jérsei, em 2000, e governador do mesmo estado, em 2005. Em 2010, assumiu o comando da MF Global. No ano seguinte, depois que vieram à tona as apostas feitas em papéis de algumas das nações mais endividadas da Eu-ropa, avaliadas em US$6,3 bilhões, a corretora abriu falência.

E tem mais II: Corzine é alvo de ação judicial movida pela xerife CFTC em 2013, em que é acusado de não supervisionar adequadamente a unidade de corretagem da holding, que mergulhava cada vez mais profundamente no colapso. O objetivo da ação é impedir permanentemente que ele atue na negociação ou na gestão de empresa ligada ao mercado de derivativos.

(Bloomberg, 4/12/2015)

Patrícia Brighenti é jornalista e tradutora juramentada.

Page 62: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Casa novaO novo pregão da Bolsa de Metais de Londres (LME) será aberto em

1º de fevereiro de 2016, na praça Finsbury, distrito financeiro de Londres. O endereço atual dos futuros de cobre e alumínio deixarão a sede atual, na rua Leadenhall, no dia 27 de janeiro. Nos dois dias úteis seguintes e antes da inauguração do novo espaço, as operações serão conduzidas no centro de re-cuperação de desastres da LME, em Chelmsford, leste de Londres. Funda-da em 1877 e atual proprietária da HKEx (entidade que reúne as bolsas e as atividades de clearing de Hong Kong), as primeiras instalações que a bolsa londrina ocupou eram situadas no andar de cima de uma loja de chapéus, no pátio Lombard. O edifício da rua Leadenhall é sede da instituição desde 1994. (Reuters, 10/12/2015)

Colarinho sujoSegundo a Autoridade de Conduta

Financeira (FCA), do Reino Unido, as condenações nos casos levados pela agência aos tribunais locais cresceram em 2015, com 14 pessoas sentencia-das à prisão, em comparação com duas em 2014. Esta elevação coincide com o novo foco do órgão em prestação de contas. Normas mais severas para in-divíduos que trabalham com serviços financeiros entrarão em vigor no Reino Unido em março próximo. Apesar de o dispositivo mais controverso das novas regras – “culpado até prova em contrá-rio” – ter sido eliminado pela Secretaria do Tesouro local no último minuto, os administradores ainda serão banidos ou multados caso a FCA prove que não to-maram todas as medidas razoáveis para evitar irregularidades em suas áreas de atuação. Essa iniciativa representa, em parte, resposta aos questionamentos do público e de políticos sobre o por-

quê de tão poucos executivos de ban-cos terem sido responsabilizados pela última crise financeira. O assunto foi destacado em relatório sobre a quebra da HBOS em 2008, envolvendo £20,5 bilhões. Apenas um ex-executivo foi investigado pela então Autoridade de Serviços Financeiros, órgão que antece-deu a FCA. Esta, porém, ainda conside-ra a possibilidade de investigar outros ex-executivos e membros do conselho de administração da HBOS.

E tem mais I: a proporção de multas aplicadas pela FCA também cresceu. Em 2015, 21 pessoas foram multadas, atin-gindo o total de £6,7 milhões, diante de 13 em 2014 e penas de £2,9 milhões.

E tem mais II: a FCA prepara-se agora para o julgamento do caso tabernula. Cin-co réus, entre os quais um ex-diretor do Banco Alemão, foram acusados de con-

duzir práticas de insider trading, pelo que podem pegar até o máximo de sete anos de prisão, se considerados culpados.

E tem mais III: ainda em resposta a es-cândalos, como os episódios de manipu-lação da Libor e do mercado de câmbio, análise independente conduzida pelo Banco da Inglaterra, pela Secretaria do Tesouro e pela própria FCA em 2015 propõe estender a pena máxima por abu-so de mercado de sete para dez anos.

E tem mais IV: nos Estados Unidos, o total de sanções monetárias aplicadas pela Comissão das Operações no Mer-cado Futuro de Commodities (CFTC) alcançou mais de US$3,2 bilhões em 2015, montante que inclui a maior mul-ta já aplicada na história da xerife norte- americana, de US$800 milhões.(Natural Gas Intelligence, 16/12, e FT.com, 27/12/20)

notícias

62 Fev/2016

Page 63: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

63Fev/2016

PossibilidadesA Bolsa de Taipé (TPEX) assinou pro-

tocolo de intenções com a Bolsa de Ativos Canadense (CSE), com o intuito de de-senvolver ambos os mercados, encorajar a troca de informações e buscar novas opor-tunidades para as bolsas e os respectivos emissores, enquanto a Bolsa de Valores de Taiwan (TWSE) intensificou o acordo de cooperação que matinha com a Bolsa da Coreia (KRX) desde o ano 2000, visando expandir os respectivos mercados de ETFs,

criar índices em conjunto e elevar a oferta de produtos. Ainda no quesito fundos de índice, as bolsas de valores saudita e algeria-na firmaram protocolo com vistas em apro-fundar e formalizar a cooperação existente entre as duas entidades, em prol da listagem cruzada de ETFs sobre os respectivos índi-ces de ações, permitindo-lhes compartilhar conhecimento e expertise e, eventualmen-te, explorar novas oportunidades para os respectivos mercados de capitais.

E tem mais: em outra frente, a KRX, que opera o mercado de emissões de carbono da Coreia, celebrou acordo com a Bolsa do Meio Ambiente de Bei-jing (CBEEX), a fim de buscar a interli-gação e a expansão dos dois mercados, o desenvolvimento de produtos inovado-res e a realização de eventos educacio-nais e promocionais.

(Mondo Visione, 1, 9, 16 e 21/12/2015)

Quando a crise vira entretenimentoNunca uma crise nacional foi sentida por tantos e compreendida por tão poucos. À

medida que os preços de bancos, ações, hipotecas e residências desmoronavam assusta-doramente entre 2008 e 2009, a maioria da população norte-americana – e mundial – não sabia o que se passava. Muitos livros e relatórios foram publicados, mas poucos foram lidos e entendidos. Entre as exceções, está o livro A Grande Aposta, de Michael Lewis, que conseguiu encontrar narrativa emocionante para uma crise de explicação complexa. Transposto para as telas de cinema pelo diretor Adam McKay, o filme tem o propósi-to de entreter. Pela dificuldade em transmitir conceitos complexos e abstratos no tempo de duração da película, a opção do diretor foi pelo aspecto visual, deixando de lado a substância. É muito difícil mostrar o que é obrigação de dívida não colateralizada, mas a imagem de locatários sendo despejados de suas residências porque o proprietário não pa-gou a hipoteca, embora tivessem pago seus aluguéis pontualmente, é bastante eficaz. Ou quando representa uma pessoa que compra várias casas sem poder pagar por elas como uma stripper girando ao redor do poste. Diante disso e de outros artifícios, a elucidação de conceitos financeiros é detalhada e clara o suficiente para fazer o público pensar que compreende o que está acontecendo, pelo menos enquanto tenta acompanhar o enredo, mesmo que, 24 horas depois, nada tenha sido, de fato, apreendido.

(Fusion, 11/12/2015)

Americanos, do norteA Nasdaq anunciou a aquisição do siste-

ma alternativo de negociação Chi-X Canadá, a partir da qual terá acesso direto ao mercado de renda variável canadense, o oitavo maior do mundo, promovendo maior uniformidade de tecnologias e funcionalidades para os mer-cados norte-americanos. Lançado em 2008, o Chi-X Canadá concentra cerca de 13% do volume das transações com ações naquele país, embora a fatia do Grupo TMX, proprie-tário da Bolsa de Valores de Toronto (TSE) e de outros sistemas de negociação, seja de 70%. O valor do negócio não foi revelado e a operação tem previsão de conclusão ainda no primeiro trimestre de 2016.

E tem mais I: em 2007, quando os sistemas alternativos começaram a proliferar no Ca-nadá, a fatia de mercado do Grupo TMX era de 99,6%.

E tem mais II: em dezembro de 2015, a Aequitas, que opera outra plataforma de ne-gociação canadense, registrou queixa junto à Secretaria de Defesa Econômica local con-tra o Grupo TMX, em que o acusa de uti-lizar sua posição dominante para manter o controle sobre a tarifação de dados de mer-cado no mercado de capitais do país.

(Bloomberg, 8/12/2015)

Page 64: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

notícias

64 Fev/2016

OnipresenteOs ataques digitais se tornaram frequentes nos últimos anos, com grandes cor-

porações e governos na mira de hackers. À medida que a tecnologia avança em rit-mo acelerado, as empresas prestadoras de serviços financeiros são confrontadas com uma série de ameaças cibernéticas, que podem envolver mensagens eletrôni-cas, modelos desatualizados de assinatura digital e violações em fornecedores ex-ternos. Afinal, são detentoras diretas de informações privadas e indiretas de ativos. No caso de contas de e-mail de clientes, entre dez e 30 tentativas de ataque são re-gistradas semanalmente. Se fraudadas, tais contas podem expor dados e acessos si-gilosos, bem como relações comerciais. Há também a questão sobre a forma como os funcionários protegem a tecnologia da informação de suas empresas, pois, por mais que sejam orientados sobre as melhores práticas de segurança, o inesperado sempre pode surgir. A computação em nuvem e os centros de dados, apesar de mais eficientes, também ficam à mercê de transgressões potenciais. Quanto aos vendors externos, é difícil saber o nível de segurança dos dados que abrigam. Para a indústria, as campanhas de educação, tanto voltadas aos consultores de investi-mento quanto aos clientes, ainda são a melhor saída para enfrentar o problema.

E tem mais: em outubro, a Associação Nacional de Futuros (NFA) norte-ameri-cana anunciou novas normas para seus membros, incluindo corretoras de câmbio, voltadas à segurança virtual e, em dezembro, a xerife CFTC aprovou propostas para alterar a regulamentação de testes e salvaguardas para os sistemas automatiza-dos utilizados por organizações de clearing de derivativos, mercados de contratos designados, sistemas de execução e repositórios de dados de swaps. As propostas, que estarão abertas para comentário público durante 60 dias, exigem que os siste-mas informatizados dessas estruturas críticas passem por cinco tipos de teste, cuja frequência deverá ser determinada pela análise apropriada de risco, quais sejam: vulnerabilidade, penetração, controles, resposta a incidentes de segurança e avalia-ções de risco da tecnologia empregada.

(LeapRate.com, 16/12, e InvestmentNews, 20/12/2015)

Vaquinha na coleiraEm dezembro, a Organização Interna-

cional de Comissões de Valores Mobiliá-rios (Iosco) publicou relatório a respeito de crowdfunding, ou financiamento coleti-vo, que proliferou a partir da crise de 2008 como canal alternativo de levantamento de capital. Segundo a Iosco, a maioria dos esquemas regulatórios para crowdfun-ding só foi implementada recentemente, estando aquém do necessário. Por con-seguinte, a entidade não só propõe abor-dagem internacional à supervisão e à fis-calização do mecanismo, como também alerta para os principais riscos enfrenta-dos pelos investidores de crowdfunding. Além dos usuais, como conflito de inte-resses, proteção de dados e fraude, estão riscos financeiros mais elevados, posto que a possibilidade de quebra é sempre mais associada a empresas startups; frau-des, atividades terroristas ou lavagem de dinheiro; problemas técnicos nos portais, que podem, simplesmente, sair do ar; ili-quidez, já que não há mercado secundá-rio para venda ou execução dos papéis; e inadequação das ofertas para todos os tipos de investidores. Para protegê-los, a Iosco propõe que os reguladores padro-nizem os requisitos de acesso, registro ou licença para a criação de portais; estabele-çam exigências de divulgação para emis-sores e portais; limitem os serviços que podem ser prestados pelas plataformas; exijam declarações assinadas pelos inves-tidores reconhecendo a compreensão dos riscos envolvidos; limitem o tamanho e o período de manutenção dos investimen-tos realizados em cada oferta; determi-nem a nomeação de custodiante para a guarda dos ativos dos investidores; e, por fim, considerem os riscos existentes entre as diferentes legislações internacionais, visto que os sistemas de crowdfunding uti-lizam plataformas sediadas na internet ou em smartphones.

(Mondo Visione, 21/12/2015)

Page 65: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

65

agenda

Fev/2016

Formação no Mercado de Ações com Análise Técnica

Carga horária

72 horas

Local

São Paulo

Público-alvo

Investidores e profissionais iniciantes no merca-do financeiro em áreas como Tesouraria, Back/Middle Office, Riscos, TI e gestão de recursos com interesse em desenvolver o conhecimento no mercado de ações e análise técnica.

Programa do Curso Módulo 1 – Mercado de Ações (24h): Visão geral do Sistema Financeiro Nacional (SFN) e os principais agentes. O Mer-cado de Ações – conceito, estrutura e principais características. Introdução às operações a Termo, Aluguel de ações e Exchange Trade Fund (ETF). Clubes de Investimento. Operações de day trade. Tributação no Mercado de Ações.

Módulo 2 – Análise Fundamentalista I (18h): Análises dos Principais Indicadores Financeiros: Liquidez, Endividamento, Rentabilidade e Capital de Giro. Risco e precificação de ações: conceito de risco e suas formas de medida. Desconto de fluxo de caixa para a precificação de ações. Taxa de crescimento da empresa com base na retenção de dividendos e no ROE. Modelo de Gordon e Dividend Discount Model (DDM).

Módulo 3 – Análise Fundamentalista II (18h): Indicadores de rentabilidade e o valuation das empresas. Estrutura de capital e geração de valor. Mitos do valuation e fatores que afetam as empresas. Múltiplos de valor e métodos de preci-ficação relativa. Precificação de IPOs e o valuation das ofertas. Estudos da estrutura do fluxo de caixa livre das empresas. Modelo de valuation pelo desconto do fluxo de caixa livre da firma.

Gestão de Riscos

Carga horária

171 horas

Local

São Paulo

Público-alvo

Profissionais do mercado financeiro interessa-dos em atuar na área de gestão de riscos como risco de mercado, liquidez e crédito, gestão de recursos/asset.

Programa do Curso Mapeamento dos fatores de risco de mercado. Ferramentas e modelos de gestão de risco de mercado. Estimação, deter-minantes e métodos de estimação do VAR. Avaliação e comparativo dos modelos de VAR. Backtesting/aderência. Críti-cas ao VAR. Testes de estresse. ShortFall Risk. Stop-Loss. Valores extremos. Componentes principais e VAR. Ferramentas e modelos de risco de crédito. Modelos de risco operacional. Ferramentas e modelos de risco de liquidez. Basiléia I, II e III. Implementação de políticas e práticas de gestão de risco. Sistema de risco BM&FBOVESPA – Risco de Contraparte Central. Riscos socioambientais e de governança corporativa.

Cursos do Instituto Educacional BM&FBOVESPA

Page 66: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

agenda

66 Fev/2016

Mercado de Renda Fixa Avançado

Carga horária

48 horas

Local

São Paulo/Rio de Janeiro

Público-alvo

Profissionais que atuam em áreas relacionadas ao mercado de renda fixa tais como produtos financeiros, Middle e Back office de tesouraria, estruturação de operações, gestão de carteiras e riscos além de investidores pessoas físicas.

Programa do Curso Motivação para a gestão de carteira de títulos de RF Nacionais e Internacionais. Conceitos de programação VBA. Traba-lhando com variáveis e Arrays. Criando funções de precificação de fluxos de caixas diversos. Estrutura a termo da taxa de juros. Sensitividade da taxa de juros e imunização. Precificação de títulos de RF Internacional. Gestão de risco. Gestão de carteiras de renda fixa.

Formação de Profissionais em Mercados Derivativos

Carga horária

144 horas

Local

São Paulo/Rio de Janeiro

Público-alvo

Profissionais do mercado financeiro que desejam operar nos mercados derivativos, definir políticas de hedge em empresas financeiras e não finan-ceiras e estratégias de investimentos.

Programa do Curso Características e dinâmica de negociação dos mercados derivativos. Derivativos de commodities na BM&FBOVESPA e em ou-tras bolsas. Índice de ações e mercado futuro de Ibovespa e do S&P500. Estrutura da taxa de juros a termo e as técnicas de interpolação. Mercado futuro e a termo de câmbio. Mercado futuro: DI, DDI e FRA. Mercado de treasuries e Títulos da dívida externa. Mercado de opções. Estratégias operacionais com opções. Mercado de swaps. Derivativos de crédito. Introdução aos produtos exóticos. Estratégias operacionais com derivativos. Práticas operacionais de hedge e de investimento. Tributação de derivativos. O mercado de investimentos responsáveis. Métricas de sustentabilidade para a decisão de investimentos.

Formação de Profissionais no Mercado Financeiro

Carga horária

63 horas

Local

São Paulo

Público-alvo

Investidores e profissionais iniciantes no merca-do financeiro em áreas como Tesouraria, Back/Middle Office, Riscos, TI e gestão de recursos com interesse em desenvolver o conhecimento no mercado financeiro.

Programa do Curso BM&FBOVESPA e a estrutura do mercado de capitais. Matemática financeira e as taxas de juros. Fundamentos macroe-conômicos. Produtos de renda fixa. Finanças corporativas e o mercado de ações. Introdução à análise fundamentalista. Introdução à análise técnica. Introdução aos mercados a termo e futuro. Introdução ao mercado de opção. Derivativos na BM&FBOVESPA. Estratégias financeiras com derivativos. Introdução à gestão de risco. Diversificação e gestão de riscos de mercado. Operações e estratégias: aspectos operacionais.

Page 67: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

67Fev/2016

Formação no Mercado de Ações com Análise Fundamentalista

Carga horária

60 horas

Local

São Paulo

Público-alvo

Investidores e profissionais iniciantes no merca-do financeiro em áreas como Tesouraria, Back/Middle office, Riscos, TI e gestão de recursos com interesse em desenvolver o conhecimento no mercado de ações e análise fundamentalista.

Programa do Curso Módulo 1 – Mercado de Ações (24h): Visão geral do Sistema Financeiro Nacional (SFN) e os principais agentes. O mer-cado de ações – conceito, estrutura e principais características. Introdução às operações a termo, Aluguel de ações e Exchange Trade Fund (ETF). Clubes de Investimento. Operações de day trade. Tributação no mercado de ações.

Módulo 2 – Análise Fundamentalista I (18h): Análises dos principais indicadores financeiros: Liquidez, Endividamento, Rentabilidade e Capital de Giro. Risco e precificação de ações: conceito de risco e suas formas de medida. Desconto de fluxo de caixa para a precificação de ações. Taxa de crescimento da empresa com base na retenção de dividendos e no ROE. Modelo de Gordon e Dividend Discount Model (DDM).

Módulo 3 – Análise Fundamentalista II (18h): Indicadores de rentabilidade e o valuation das empresas. Estrutura de capital e geração de Valor. Mitos do valuation e fatores que afetam as empresas. Múltiplos de valor e métodos de preci-ficação relativa. Precificação de IPOs e o valuation das ofertas. Estudos da estrutura do fluxo de caixa livre das empresas. Modelo de valuation pelo desconto do fluxo de caixa livre da firma.

Formação no Mercado de Renda Fixa

Carga horária

57 horas

Local

São Paulo

Público-alvo

Profissionais que atuam em áreas relacionadas ao mercado de renda fixa tais como produtos financeiros, Middle e Back office de tesouraria, estruturação de operações e riscos além de investidores pessoas físicas.

Programa do Curso Módulo I: Introdução ao Mercado de Renda Fixa (27 horas): O Sistema Financeiro Nacional e o mercado de renda fixa. O papel do Banco Central e do Copom e do Tesouro Nacional. Principais indicadores financeiros e fontes de informações. Características dos títulos de renda fixa. Montagem dos fluxos e contagem dos prazos. Rentabilidade e negociação de títulos. Características das taxas de juro no Brasil. Estrutura da curva da taxa de juro. Títulos públicos, privados e do agro-negócio. Apreçamento, negociação, liquidação e custódia. Principais normas, regulamentação e tributação.

Módulo II: Mercado de Renda Fixa Intermediário (30 horas): Mercado futuro de DI da BM&FBOVESPA. Estrutura a ter-mo da taxa de juro e o mercado de renda fixa. Estimação e técnicas de interpolação. Duration, convexidade e Imunização de títulos de renda fixa. Sensitividade da taxa de juro. Estratégias de negociação com títulos de renda fixa. Gestão da carteira de renda fixa.

Saiba mais sobre os cursos em bmfbovespa.com.br/educacional

Page 68: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Crônica de uma crise financeira

Livro sobre Encilhamento é destaque do Centro de Memória da Bolsa

memória do mercado

68 Fev/2016

Page 69: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

31 2

O Centro de Memória da BM&FBOVESPA guarda dois exempla-res originais raríssimos, com mais de 120 anos, do livro O Encilhamento – Cenas Contemporâneas da Bolsa do Rio de Janeiro em 1890,1891,1892. Trata-se de uma crônica da primeira crise financeira de grandes propor-ções no Brasil, que, ao longo dos anos, apren-deu a conviver com essas circunstâncias que se tornaram frequentes no noticiário do país.

O livro foi escrito por Alfredo d’Escrag-nolle-Taunay (1843-1899), o Visconde de Taunay. A princípio, saiu em um folhetim, em

1893, na Gazeta de Notícias, um dos grandes jornais da época. Temeroso com retaliações políticas, Taunay escreveu, primeiro, sob o pseudônimo Heitor Malheiros.

Taunay fala dos ricos que tinham “las-tro”, os cafeicultores paulistas, e dos em-presários que surgiram da noite para o dia. Enquanto a crise durou, ele descreve uma sociedade sem regras e as disputas entre “es-foladores” e “esfolados”. O livro é uma narra-tiva “da rápida mudança social dos primeiros anos da República”1 e de como a elite do país não estava preparada para elas.

O Visconde de Taunay fez sua carreira no Império, quando foi deputado, presidente de Província e senador pelo Partido Conser-vador. Escreveu alguns clássicos da literatura brasileira, como Inocência (1872), primeiro filme estrelado pela atriz Fernanda Torres (1983). O Visconde de Taunay era “um apre-ciador da liturgia dos salões aristocráticos”2. Seu mundo caiu com a República, proclama-da em 15 de novembro de 1889. Seu patri-mônio virou pó com a crise financeira que se seguiu ao fim do Império. O livro é um ajuste de contas com esse passado que ruiu.

1 e 2 1º edição do livro O Encilhamento assinado com pseudônimo Heitor Malheiros

3 e 4 2º edição do livro O Encilhamento já assinado como Visconde de Taunay

5 Alfredo d’Escragnolle-Taunay Visconde de Taunay – 1843-1899

1 ALONSO, A, “Jogo Frenético”, Folha de S. Paulo, 23/3/2008.2 ALONSO, A, “Jogo Frenético”, Folha de S. Paulo, 23/3/2008.

45

Foto: www.wikipedia.org

69Fev/2016

Page 70: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

3 FRANCO, G. H. B., A Primeira Década Republicana, in ABREU, M. P. (organizador), A Ordem do Progresso – Cem Anos de Economia Republicana – 1889 – 1989, Editora Campus, Rio de Janeiro, 1990.

A República foi abalada logo em seu início pela temerária política econômica adotada pelo famoso jurista e orador Rui Barbosa, o primeiro a ocupar o cargo de ministro da Fazenda após o fim do Império.

Barbosa acreditava que a emissão de moeda deveria atender às “legítimas ne-cessidades dos negócios”3. Na prática, pa-trocinou uma das mais rápidas e violentas expansões monetárias da história econô-mica do Brasil. Entre sua principal medida de política econômica, a lei bancária de 17 de janeiro de 1890, criando novidades nas regras financeiras, em setembro daquele mesmo ano, a quantidade de papel-moeda em circulação aumentou 40%.

A expansão monetária levou a uma

grande expansão do crédito, movimento que guarda semelhança com a tentativa recente, e sem sucesso, de gerar desen-volvimento econômico no Brasil sem au-mento das taxas de investimento.

A política de Rui Barbosa não tardou em inflar uma espantosa bolha especula-tiva. Empresas fantasmas foram criadas para pegar esse dinheiro fácil, a especula-ção tomou conta da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro e o custo de vida disparou.

A bolha ficou conhecida como enci-lhamento, uma referência às últimas provi-dências na preparação de um cavalo antes do páreo. Encilhar é apertar a cilha, a tira de pano ou couro que prende a sela ao cavalo. As revistas da época diziam que a diversão

dos pobres era o jogo do bicho, já muito popular no Rio de Janeiro. A dos ricos era o encilhamento, o jogo com as ações.

A Bolsa de Valores do Rio virou um au-têntico cassino com a roleta das emissões de “novas empresas” girando a toda velocidade. As ações começaram a subir com o excesso de liquidez na economia e as empresas fan-tasmas “assombraram” o Rio de Janeiro.

Logo no ano seguinte, 1891, a bolha estourou. Bancos e empresas quebraram. A moeda brasileira despencou em relação à libra esterlina, sua principal referência ex-terna na ocasião. Barbosa deixou a Fazenda no início de 1891. Foi substituído pelo mé-dico Joaquim Murtinho, ministro que ajus-tou a economia com ortodoxia.

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6 Vista da Rua do Rosário, primeiro endereço da Bolsa Livre de São Paulo 23 agosto de 1890

memória do mercado

70 Fev/2016

Page 71: Artigo técnico Entrevista UMA PUBLICAÇÃO TÉCNICA DA

Instituto Educacional BM&FBOVESPARua Líbero Badaró, 471, 5º e 6º andares – Centro – São Paulo – SP – (11) 2565-6313

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