anthony hoekema - e as línguas

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CAPITULO 2

...E AS LINGUAS?

Anthony Hoekema

CONTEDO

5PREFCIO

CAPTULO 1

A HISTRIA DO FALAR EM LNGUAS7DO ANO 100 A 1900 D.C.71. O Montanismo82. O Testemunho de Ireneu (aproximadamente 130 - 200 d.C.)83. Tertuliano (aproximadamente 160 - 220 d.C.)104. Crisstomo (aproximadamente 345 - 405 d.C.)105. Santo Agostinho (354 - 430 d.C.)106. A Idade Mdia117. Os Meninos Profetas de Cevennes118. Os Jansenistas129. A Igreja Catlica Apostlica1210. Outros Grupos13O MOVIMENTO PENTECOSTAL13O NEOPENTECOSTALISMO16CAPTULO 2

O SIGNIFICADO DO FALAR EM LNGUAS PARA OS PENTECOSTAIS19CAPTULO 3

UMA AVALIAO BIBLICA DO FALAR EM LNGUAS261. Passagens dos profetas apresentadas pelos pentecostais que segundo alegam apoiam o falar em lnguas.262. Passagens apresentadas para demostrar que o falar em lnguas tinha que permanecer na igreja.283. Passagens apresentados para provar que h um batismo do Esprito distinto e posterior regenerao, do qual o falar em lnguas a evidncia fsica inicial304. A discusso da glossollia em I Corntios 12-14.41CAPTULO 4

UMA AVALIAO TEOLGICA DO FALAR EM LNGUAS511. No pode ser demonstrado conclusivamente que os dons milagrosos do Esprito, que incluem a glossollia, continuam na igreja.512. A doutrina distintiva das denominaes pentecostais que bsica em seus ensinamentos sobre a glossollia, a saber, que todo crente deve buscar um batismo do Esprito Santo posterior converso, no tem base nas Escrituras.563. A teologia do pentecostalismo ensina erroneamente que uma bno espiritual deve ser atestada por um fenmeno fsico.574. No pentecostalismo est implcita uma espcie de subordinao de Cristo ao Esprito Santo que no est em harmonia com a Escritura.585. A teologia do pentecostalismo tende a criar dois nveis de cristos: os que tem recebido o batismo do Esprito e os que no o tem recebido.596. A teologia do pentecostalismo implica que a igreja tem estado sem condutor, sem poder adequado, sem a plena luz, e sem uma experincia crist completa desde os fins do Sculo I at o princpio do Sculo XX.59CAPITULO 5

O QUE PODEMOS APRENDER DO MOVIMENTO QUE FALA EM LNGUAS62BIBLIOGRAFIA74LIVROS74Obras escritas por pentecostais:74Obras escritas por no pentecostais:74Obras eminentemente histricas:76PERIDICOS76

PREFCIO

O propsito principal deste livro fazer uma avaliao bblica e teolgica do fenmeno de falar em lnguas. Inclui uma breve sntese histrica da glossollia, assim como um captulo que aborda o que a igreja pode aprender do movimento que fala em lnguas.

Inicialmente, devo deixar claramente estabelecido que me sinto muito agradecido pelo que Deus est realizando por meio desses cristos de convices pentecostais, especialmente nos campos missionrios do mundo. Considero os pentecostais e neopentecostais irmos em Cristo, e portanto, o que direi acerca de seus pontos de vista sob a questo das lnguas, ser com esprito de amor cristo. Gostaria que meus amigos pentecostais vissem este livro como um dilogo teolgico com eles, que tem o propsito de alcanar uma melhor compreenso do que a Palavra de Deus ensina sobre o tema em questo.

Baseei minha exposio dos ensinamentos pentecostais e neopentecostais primeiramente em seus prprios escritos, especialmente em dois livros doutrinais de autores das Assemblias de Deus, publicados em castelhano pela Editorial Vida: O que isso significa? de Carl Brumback e O Esprito Mesmo Concedeu de Ralph M. Riggs. Tentei ser o mais justo e exato possvel, mesmo assim reconheo que posso ter incorrido em alguma incorreo. Sentirei agradecido se me chamassem ateno para tais inexatides.

Este livro nasceu de uma srie de conferncias dadas no Seminrio Teolgico Batista Conservador de Denver, Colorado, em outubro de 1964. Estou profundamente agradecido pelo convite para estas conferncias e pela cordial hospitalidade a mim deferida.

Desejo expressar meu apreo por todas as pessoas que me enviaram material, proporcionaram informao e responderam s minhas cartas. Estou endividado com vrios autores que escreveram sobre glossollia, e diversos amigos com os quais discutimos o tema. Gostaria tambm de agradecer aos meus alunos do Seminrio Calvino, cujas questes suscitaram meu interesse neste tema.

Sobretudo, dou graas ao Senhor que me capacitou para fazer este estudo. Que este livro magnifique o Pai que nos escolheu, ao Filho que morreu por ns e ao Esprito Santo que habita em ns.

ANTHONY HOEKEMA

CAPTULO 1

A HISTRIA DO FALAR EM LNGUAS

Os anos recentes tem testemunhado um notvel avivamento do interesse num fenmeno comumente conhecido como falar em lnguas. O nome mesmo no nos diz muito; obviamente todo falar se faz com a lngua. O que h de extraordinrio em falar em lnguas?

O falar em lnguas, ou glossollia, para usar a expresso tcnica, a emisso espontnea de sons num idioma em que o falante jamais aprendeu e nem sequer o entende. Este falar em lnguas praticado normalmente em certos tipos de grupos religiosos.

No entanto, o surpreendente que, ainda que por relativamente muito tempo o falar em lnguas esteve majoritariamente limitado s igrejas pentecostais, a partir de 1960 este fenmeno tem-se estendido s principais denominaes da cristandade. O falar em lnguas entrou nas igrejas episcopais (a alta), presbiterianas, metodistas, batistas, luteranas e reformadas. Quando a glossollia saltou das igrejas com fachada de armazm e de tabernculos pentecostais para os santurios gticos e as salas de casas particulares, os telgrafos comearam a soar, as mquinas de escrever trabalharam incessantes e as prensas rodaram pressurosamente. Da noite para o dia o falar em lnguas converteu-se em notcia de primeira pgina.

Apesar do falar em lnguas em grande escala no se iniciou antes do surgimento do pentecostalismo em 1906, o fenmeno havia-se apresentado anteriormente dentro e fora da igreja crist. Contudo, dentro da Igreja e at os princpios do Sculo XX, o falar em lnguas somente foi encontrado ocasionalmente, e isso entre grupos minoritrios.

Para entender as atuais manifestaes de glossollia devemos conhecer algo de sua histria. Ao apresentar esta breve histria no vou discutir o falar em lnguas fora da igreja crist, apesar de que algum possa encontrar muitos paralelos interessantes a este fenmeno entre os devotos de religies no crists. Tampouco quero neste momento discutir as referncias bblicas glossollia, uma vez que sero consideradas num captulo adiante. Comearei essa breve sntese histrica no ano 100 d.C., aproximadamente, porque esta data marca o fim aproximado do que poderamos chamar histria bblica e o comeo aproximado do que normalmente chamamos Histria da Igreja. O tratamento histrico ser realizado visualizando trs fases distintas: o perodo que vai do ano 100 ao 1900 d.C., o movimento pentecostal e o neopentecostalismo.

DO ANO 100 A 1900 D.C.

Ao fazer esta sntese, o que nos surpreende a falta de freqncia da glossollia na histria da igreja crist. Tambm nos chama a ateno o fato dos grupos em que se falavam em lnguas eram grupos minoritrios, que com freqncia encontravam-se sob perseguio. Ao examinar esta histria, vemo-nos de encontro com a seguinte pergunta: Somos obrigados a supor que as modernas aparies de glossollia so a continuao do dom carismtico de lnguas como ocorreu, por exemplo, em Corinto? Ou possvel que haja explicaes psicolgicas para este fenmeno que tornam a primeira suposio desnecessria e sobretudo errnea.?

1. O Montanismo

Os escritores pentecostais s vezes se referem ao montanismo como um movimento na igreja antiga do Sculo II que se lhes assemelha. Um destes autores expressa deste modo: Uma seita da igreja antiga que pode se classificada de pentecostal a que foi fundada por Montano da Frigia, que defendia uma estrita disciplina eclesistica e cria que a igreja receberia um novo batismo pentecostal. O mesmo autor cita Eusbio, o historiador da igreja do Sculo IV, para assinalar que Montano foi arrebatado em esprito, e introduziu-se numa espcie de frenesi e xtase irregular, delirando, falando e proferindo coisas estranhas. Duas companheiras de Montano, Priscila e Maximila, tambm falaram numa espcie de exttico frenesi.

Entretanto, se citado o montanismo como um precedente para o pentecostalismo, trata-se de um precedente pouco feliz, uma vez que a Igreja condenou-o considerando herticos os ensinamentos de Montano. Sua posio era que havia chegado a Era do Esprito, e que o Esprito agora falava por meio de Montano. Ele recebia novas revelaes que suplementavam e aumentavam a Bblia. Considerando que ento se iniciara a era final, Montano e seus associados conclamou as pessoas para se reunirem em Pepuza, Frigia, para esperar o fim do mundo. Montano e seus seguidores foram excludos da Igreja porque julgou-se que a pretenso dele de haver recebido revelaes superiores Bblia era contrria finalidade da Escritura. Portanto, ainda que no se pode negar que entre os montanistas ocorreu o falar em lnguas, o fato de ter ocorrido entre os membros deste grupo no propriamente uma grande recomendao.

2. O Testemunho de Ireneu (aproximadamente 130 - 200 d.C.)

A passagem de Ireneu que mais citada como indicativa da continuao da glossollia na igreja antiga se encontra em Contra as Heresias, V, 6, 1:

Por esta razo, o Apstolo declara: "Falamos sabedoria entre perfeitos", denominando "perfeitos" a quem tem recebido o Esprito de Deus, e que por meio do Esprito de Deus falam em todos os idiomas, como ele mesmo falava. De igual maneira, ns tambm ouvimos de muitos irmos na igreja que possuem dons profticos, e que por meio do Esprito falam toda classe de lnguas, e trazem luz coisas que esto escondidas dos homens, e declaram os mistrios de Deus para o beneficio geral, aos quais tambm o Apstolo denomina "espirituais", sendo espirituais porque participam do Esprito, e no porque tenham sido despojados de sua carne e se tenham convertido em seres puramente espirituais.

Os pentecostais citam freqentemente esta passagem para provar que no Sculo II d.C. havia pessoas que falavam "toda classe de lnguas". Contudo, tanto P. Feine quanto G. B. Cutten assinalam que, dado que a palavra traduzida por "toda classe de" um termo algo obscuro (a palavra grega dada por Eusbio paritodapais), no certeza que Ireneu esteja falando de idiomas estrangeiros ou de expresses extticas que no fossem idiomas especficos conhecidos.

No entanto, consideremos esta passagem com um pouco mais de cuidado. Vale fazer os seguintes comentrios:

(1) Quando em II. 32. 4. descreve-se os dons milagrosos do Esprito ainda na igreja de seu tempo, Ireneu menciona o exorcismo, a previso do futuro, vises, profecias, curas e at a ressurreio de mortos (ainda que B. B. Warfield diz que esta ltima se refere somente a pessoas ressuscitadas dentre os mortos nos tempos apostlicos e dos quais Ireneu teve notcias). Como se v, nesta lista dos dons do Esprito, Ireneu no menciona o falar em lnguas. Porque no? Se o dom tivesse existido em seu tempo, poderamos esperar que o mencionasse juntamente com o de profecia e de curas.

(2) Na passagem citada anteriormente, V, 6, 1, o propsito principal de Ireneu no discutir que os dons permanecem na Igreja, mas explicar que as expresses perfeito e espiritual, quando as usa o apstolo Paulo, no menosprezando de nenhum modo o valor do corpo humano. O argumento geral desta seo tem a ver com a doutrina da ressurreio do corpo, doutrina que os gnsticos negavam. Portanto, o que Ireneu diz aqui acerca de pessoas que "pelo Esprito falam toda classe de lnguas" puramente incidental com respeito ao seu propsito. Em outras palavras, o argumento que est apresentando teria o mesmo valor se estivesse falando tanto em relao ao Novo Testamento, como ao seu prprio tempo.

(3) H alguma possibilidade de que Ireneu esteja falando aqui no de um fenmeno que estivesse ocorrendo em seu tempo, mas do que havia ocorrido no tempo do Novo Testamento. Evidentemente, isso certo na primeira orao da citao em que o editor inseriu uma nota marginal que remete o leitor a 1 Corntios 2:6; Ireneu est aqui falando de pessoas na igreja de Corinto, que pelo Esprito de Deus falavam em "todas as lnguas". A segunda orao, que descreve os irmos da igreja que no s falam lnguas, mas tem outros dons profticos, desvenda coisas escondidas e declara os mistrios de Deus, termina com a declarao: "a quem tambm o apstolo denomina "espirituais". A palavra traduzida "denomina" no latim vocat, forma do presente do indicativo do verbo vocare "chamar ou nomear". Ireneu est dizendo que a estas pessoas Paulo as chama "espirituais". Se Ireneu quisesse dizer que certas pessoas de seu tempo eram pessoas as quais Paulo chamaria espirituais se ainda estivesse vivo, porque no expressou isso de uma forma muito mais clara? E porque Ireneu no usou o perfeito do subjuntivo em vez do presente do indicativo? tambm significativo que os dons espirituais dos quais fala a segunda orao so precisamente os descritos na Primeira Epstola aos Corntios, o que alude a primeira orao da citao. Portanto, possvel que Ireneu, no esteja aqui falando acerca de um fenmeno ocorrido em seus dias, mas simplesmente acerca do ocorrido nos tempos do Novo Testamento.

(4)Ademais, devemos admitir que Eusbio, o historiador da igreja, entendeu que Ireneu descrevia algo que estava ocorrendo no Sculo II. E as palavras iniciais da citao parecem dar ao leitor essa impresso: "De igual maneira, ns tambm ouvimos de muitos irmos na igreja ... que por meio do Esprito falam toda classe de lnguas...". As palavras "De igual maneira" e a repetio de "falar em lnguas" (que j havia sido mencionado na orao precedente) fariam pensar que "Ireneu est-se referindo a algo que ocorria em seu tempo. Se assim, temos evidncia para a continuao do dom de lnguas no Sculo II, ainda que no se nos diz se estes que falam lnguas eram montanistas ou membros das igrejas regulares e fica ento o problema do significado da expresso aos quais tambm o apstolo denomina espirituais".

3. Tertuliano (aproximadamente 160 - 220 d.C.)

H uma passagem de Tertuliano que indica que em seu prprio grupo era comum um certo tipo de falar exttico. Em seu livro Contra Mrcon desafia a Mrcon para que lhe mostre os seguintes fenmenos:

Que Mrcon ento mostre, como dons de seu deus, alguns profetas que no falem por sentido humano, mas com o Esprito de Deus, que predizem o futuro, e manifestem os segredos do corao; que mostre um salmo, uma viso, uma orao apenas que seja pelo Esprito, num xtase, isto , num arrebatamento (amenta), quem quer que haja experimentado uma interpretao de lnguas; mostre-me tambm, que alguma mulher de lngua jactanciosa de sua comunidade que profetize, alguma dentre essas suas irms especialmente santas. Pois agora, todos estes sinais (de dons espirituais) se produzem em meu partido sem nenhuma dificuldade ...

Acerca desta citao devemos anotar duas coisas: (1) Quando Tertuliano escreveu Contra Mrcion era montanista. J temos visto o fato de que a glossollia ocorria entre os montanistas o que dificilmente pode-se constituir em um argumento que a apoie. (2) Em toda a passagem nada se diz da glossollia, ainda que se menciona a interpretao de lnguas. Menciona-se o falar em xtase, falar num arrebatamento (amentia, sugere que a mente consciente no tem o controle, mas no se afirma especificamente que isso inclua o falar numa lngua desconhecida. Algum poderia falar em xtase num idioma conhecido).

4. Crisstomo (aproximadamente 345 - 405 d.C.)

Crisstomo, pai da Igreja do Sculo IV, d claro testemunho de que no havia glossollia na igreja de seu tempo. Ao comentar a discusso de Paulo sobre o falar em lnguas em 1 Corntios 12 e 14, diz: "Tudo isso muito obscuro, mas a obscuridade produz-se da nossa ignorncia dos fatos que se referem sua cessao, que havendo ocorrido ento, agora j no mais sucedem".

5. Santo Agostinho (354 - 430 d.C.)

Agostinho tambm testificou que no se observava glossollia na igreja de seu tempo. Porque na Sexta Homilia Sobre I Joo escreveu:

Nos primeiros tempos, o Esprito Santo caiu sobre os que creram e eles falaram em lnguas "segundo o Esprito os concedia que falassem". Eram sinais adaptados para seu tempo. Porque correspondeu quela demonstrao do Esprito em todas as lnguas para assinalar que o evangelho de Deus seria transmitido por meio de todas as lnguas, por toda a terra. Aquilo foi feito como uma demostraro ou sinal, e passou. Na imposio de mos para que as pessoas recebam o Esprito Santo, devemos agora esperar que falem em lnguas? Ou quando pomos as mos sobre os infantes [nota do editor: os nefitos ou novos convertidos], espera-se que alguns de vs venha a falar em lnguas; e acerca do no falar em lnguas, espera-se que haja algum to insensato para dizer que algum no tem recebido o Esprito Santo pois que se o tivesse recebido haveria de ter falado em lnguas como era naqueles tempos?

Tambm afirmou em outro escrito: "Porque, h algum que espera nestes dias que em quem se impem as mos para que recebam o Esprito devam imediatamente comear a falar em lnguas?"Portanto, parece que no tempo de Crisstomo no h evidncias de glossollia na igreja oriental, e que no tempo de Agostinho no h sinais de falar em lnguas na igreja ocidental. Neste ponto, uma pergunta nos sentimos impulsionados a formular: Se a glossollia um dom do Esprito to importante como os pentecostais e neopentecostais de hoje afirmam, porque Deus permitiu que simplesmente desaparecesse da igreja? Temos encontrado a glossollia entre os montanistas, mas l estava associada com um movimento sectrio que negava que as Escrituras estivessem encerradas na cnon. A declarao de Ireneu que muitos citam, como temos visto, poderia ser a descrio do falar em lnguas em tempos do Novo Testamento mais do que um fenmeno ocorrido nos dias dele.

6. A Idade Mdia

George Barton Cutten, autor de Falando em Lnguas, louvado pelos que estudam este tema como o mais antigo historiador da glossollia no idioma ingls. Seu comentrio sobre a relativa ausncia de glossollia durante a Idade Mdia muito interessante: " realmente surpreendente... que nesta era de maravilhas (o perodo medieval) haja aparecido com to pouca freqncia (o dom de lnguas)" (p. 37).

Diz-se que uma certa quantidade de indivduos do perodo medieval falaram em lnguas, particularmente em idiomas que nunca haviam aprendido. Diz-se que So Vicente Ferrer (1357-1419) falou a gregos, alemes e hngaros em seu dialeto valenciano nativo e estes o entenderam. Diz-se que So Lus Bertrand (1526-81) converteu a 30.000 ndios sul-americanos de diversas tribos e dialetos pelo uso do dom de lnguas. Tambm informa-se que So Francisco Xavier (1506-52) teve o dom de lnguas de forma to notvel que pde pregar aos nativos da ndia, China e do Japo em seus prprios idiomas, ainda que jamais os tivessem estudado. Cutten chega a indicar, no entanto, que estes informes contradizem o testemunho do prprio Xavier e as declaraes explcitas do historiador Jos Acosta. Este afirma que Xavier tinha que trabalhar arduamente para dominar o japons e outros idiomas que estudou. O artigo sobre Xavier na Enciclopdia Britnica menciona especificamente que ele favorecia o esforo que os missionrios faziam de estudar os idiomas nativos. Quando vemos, como se deu no caso de Xavier, o processo de floreamento da histria dos santos com lendas fantsticas, damo-nos conta de que temos que ter muita sobriedade para com outros relatos medievais acerca do dom milagroso de lnguas estrangeiras.

No tempo da Reforma algumas das melhores mentes da Europa esquadrinharam diligentemente as Escrituras para re-descobrir os padres neo-testamentrios de doutrina e vida. No entanto, nenhum dos reformadores achou que o falar em lnguas pertenceria categoria dos dons normais que Deus tem outorgado permanentemente Sua Igreja.

7. Os Meninos Profetas de Cevennes

Ao seguir adiante na direo do perodo moderno, devemos notar brevemente o que se diz sobre a glossollia dos assim chamados "Pequenos Profetas de Cevennes". Depois da revogao do Edito de Nantes em 1685, muitos protestantes saram da Frana e a vida se fez cada vez mais difcil para quem ficou. Desde 1685 at princpios do Sculo XVIII os pobres camponeses huguenotes de Cevennes, regio do Sul de Frana, tiveram que suportar terrveis provaes e cruis perseguies. Durante as perseguies, muitos destes campnios converteram-se em profetas. especialmente interessante notar que um grande nmero destes profetas eram crianas. Estes profetas de Cevennes caam em xtase e pronunciavam frases que acreditavam ser inspiradas pelo Esprito Santo. Dizia-se que alguns deles haviam falado em hebraico e latim, sem que jamais tivessem aprendido esses idiomas. Um deles disse que o Esprito de um anjo ou de Deus mesmo havia feito uso de seus rgos da voz; estava certo de que um poder superior falava por seu intermdio.

Dizem-se outras cosas interessantes sobre estes camisardos, como tambm se lhes chamou, diz-se que apareciam luzes no cu que os conduziam a lugares seguros, e vozes que cantavam para lhes dar alento. Warfield sublinhou que, em comum com os antigos montanistas, prediziam a pronta vinda do Senhor e o estabelecimento de seu reino sobre a terra, pretendendo que a difuso dos dons espirituais, evidentes em seus movimentos, fosse a preparao e sinal de seu iminente regresso. Warfield tambm nos fala da pregao de um tal Doutor Emes, morto no dia 22 de dezembro de 1707, que teria que se ressuscitar no 25 de maro de 1708. Infelizmente, o Dr. Emes no ressuscitou, pelo que os profetas tiveram que publicar um panfleto dando "As razes de Squire Lacy por que Dr. Emes no ressuscitou".

Quando refletimos no significado da glossollia como se apresentou entre os profetas de Cevennes ou camisardos, notamos vrias semelhanas entre eles e os montanistas do Sculo II. Perguntamo-nos, at que ponto essas experincias eram alucinatrias, uma vez que as alucinaes podem ser freqentes em tempos de angstia ou perigo. No que diz respeito ao falar em lnguas, Cutten assinala: "No encontramos nada neste ou em casos similares que no possam ser explicados por leis psicolgicas conhecidas".

8. Os Jansenistas

Diz-se com freqncia que houve glossollia entre os jansenistas do Sculo XVIII na Frana. O artigo sobre o jansenismo na Enciclopdia Britnica explica que o falar em lnguas era praticado pelos membros mais extravagantes do grupo, os quais com o tempo foram desqualificados pelos jansenistas de maior reputao.

9. A Igreja Catlica Apostlica

Uma manifestao mais extensa de glossollia apareceu no Sculo XIX na chamada Igreja Catlica Apostlica fundada por Edward Irving (1792-1834). A glossollia comeou neste grupo quando duas pessoas comearam a falar em lnguas desconhecidas na Esccia. Irving, que era ento pastor de uma congregao londrina, queria estes dons para sua igreja e desde ento comeou a orar por eles. Depois de um tempo, a glossollia ocorreu em seu grupo. Ainda que ao princpio tivesse a inteno de manter o falar em lnguas como um exerccio privado, logo Irving permitiu que os glossolalistas exibissem em pblico seu dom. Depois disso, como dizia Thomas Carlyle, amigo ntimo de Irving, os servios de sua igreja converteram-se numa verdadeira Babel.

Ao princpio pensou-se que estas lnguas eram idiomas estrangeiros verdadeiros. Mary Campbell, a jovem que foi a primeira a falar em lnguas na Esccia, pretendia falar o idioma das Ilhas Palaos. Esta pretenso, segundo um escritor, era "certa... com poucas probabilidades de serem postas em dvida com autoridade". No entanto, mais adiante a opinio era que os idiomas eram sinais sobrenaturais e no idiomas especficos.

Para uma avaliao completa da glossollia entre os irvingistas, como se chamou os seguidores de Irving, convidamos o leitor que a faze-la mediante a leitura do Captulo 4, do livro de Warfield, Miracles Yesterday and Today (Milagres, Ontem e Hoje). Neste captulo Warfield conta de certo Robert Baxter que se fez membro da igreja de Irving em 1831. Durante um tempo, Baxter tomou parte ativa no movimento. Mas quando no se cumpriram as profecias que haviam feito, os seus olhos foram abertos. Rompeu publicamente com o movimento dizendo a Irving que estava convencido de que "todos falvamos por um Esprito mentiroso e no pelo Esprito do Senhor". Baxter chegou a publicar um livro, em que expressou sua desiluso com os dons sobrenaturais supostamente outorgados congregao de Irving. Warfield segue dizendo que at Mary Campbell confessou mais tarde que a algumas de suas impresses pessoais ela havia dado o nome de voz de Deus. Podemos concluir observando que no se recebe uma impresso muito favorvel da glossollia ao estudar a histria da Igreja Catlica Apostlica.

10. Outros Grupos

Poderamos seguir adiante apontando que j havia glossollia entre os quakers (tremedores) e entre os primeiros mrmons (o artigo 7 dos artigos de f dos mrmons inclui o dom de lnguas para os mrmons). Poderamos observar que mais para frente houve manifestao de lnguas entre alguns dos convertidos de Whitefield e Wesley, e que houve glossollia no grande avivamento dos Estados Unidos e nos avivamentos da Esccia e Pas de Gales. Poderamos alm disso tomar nota de alguns exemplos de glossollia na Rssia e Armnia. Mas j se tem feito um esboo suficiente desta histria para provar que a glossollia tem ocorrido apenas ocasionalmente no passado, e que no se tem encontrado nos grandes segmentos da igreja crist histrica, mas em grupos minoritrios, alguns deles definitivamente herticos. Portanto, a glossollia no parte da grande tradio do cristianismo histrico, mas um fenmeno isolado que tem ocorrido esporadicamente sob circunstncias anormais.

O silncio comparativo destes muitos sculos de histria quanto glossollia deveria fazer pensar seriamente quem pretende que o dom de lnguas seja um dos dons permanentes do Esprito para a sua igreja. A voz da histria da igreja parece dizer-nos que o Esprito no tem seguido outorgando este dom ao povo de Deus, ao tempo em tem seguido guiando a sua igreja em toda a verdade. Os pentecostais contrargumentam que a razo do virtual desaparecimento deste dom da igreja que durante esses sculos o povo de Deus estava pecando contra Deus. Os cristos no criam completamente em todas as promessas de Deus, e o amor de muitos se esfriara. Contudo, a dificuldade desta interpretao que se constitui em uma grande acusao contra 1800 anos de histria eclesistica. Devemos crer honestamente que nenhum cristo dos sculos passados mrtires, missionrios, guerreiros ou santos, teve a classe de f, amor e dedicao mostrada pelos crentes pentecostais de hoje? Foi toda a histria da igreja desde o ano 100 at 1900 uma histria de apostasia?

O MOVIMENTO PENTECOSTAL

Em outubro de 1900, Charles Parham, ex-ministro metodista, inaugurou uma escola bblica em Topeka, Kansas. Parham havia sido cativado pelo movimento de santidade que ento estava em seu apogeu; cria que a santificao era uma segunda e definida obra da graa que destrua complemente o pecado inato. Tambm estava convencido de que depois que algum tenha obtido uma santificao real e a uno que permanece, ainda faltava um grande derramamento de poder que os cristos teriam que experimentar.

Antes do Natal de 1900, Parham, que devia sair por trs dias, pediu aos seus estudantes que procurassem na Bblia se haveria alguma evidncia do que ocorre com o batismo do Esprito Santo bno que cria ainda dever receber o crente convertido e santificado. Quando Parrana voltou, ficou maravilhado ao constatar que os quarenta estudantes haviam chegado a uma concluso idntica: Quando caiu a bno pentecostal, a prova indiscutvel em cada ocasio foi que eles falaram em outras lnguas. A partir da, o grupo comeou a buscar ativamente o batismo do Esprito Santo, acompanhada da evidncia que um exttico falar em lnguas.

Em 1 de janeiro de 1901 (ou seja, como nos lembram os pentecostais, no comeo mesmo do Sculo XX), a senhorita Agnes Ozman, uma das alunas de Parham, foi a primeira deste grupo que falou em lnguas depois que Parham lhe imps as mos. Os pentecostais chamam a esta experincia de o comeo do moderno avivamento pentecostal.

Logo, outros estudantes comearam a falar em lnguas, como tambm o fez o prprio Param. Este se convenceu de que todo o cristo deveria receber o batismo do Esprito Santo que ele e seus estudantes haviam recebido, e que deveriam falar em lnguas como evidncia de haver recebido este batismo. Parham agora comeou a levar a mensagem pentecostal ou a mensagem do evangelho pleno, como tambm foi chamado, e o pregou em varias cidades: Kansas City, em Kansas; Lawrence, em Missouri; El Dorado Springs, em Missouri, Galeria, em Kansas; Joplin, em Missouri; Orchard e Houston, no Texas. Em 1905, Parham estabeleceu um instituto bblico em Houston, Texas.

Entre os que estudaram no instituto de Houston e se convenceram da verdade da mensagem de Pentecostes estava W. J. Seymour, pregador negro do movimento de santidade. Aproximadamente neste tempo visitou Houston, Neeley Terry, mulher negra de Los Angeles, que assistiu igreja do Sr. Seymour e recebeu o batismo do Esprito Santo e o dom de lnguas. Ficou to impressionada com Seymour que persuadiu a igreja em Los Angeles a qual pertencia para que convidasse o irmo para pregar. No entanto, a primeira mensagem de Seymour em Los Angeles produziu tal hostilidade que o pregador visitante encontrou as portas fechadas para ele quando regressou para o culto da tarde. Impvido, Seymour comeou a pregar numa casa. Em 9 de abril de 1906, sete pessoas foram batizadas com o Esprito Santo e comearam a falar em lnguas. Estes acontecimentos chamaram tanto a ateno que o grupo logo se mudou para um edifcio na Rua Azusa, que anteriormente havia sido igreja mas que por ora era uma cocheira. Neste lugar de poucas pretenses, Seymour seguiu dirigindo cultos que tiveram a assistncia de crescentes nmeros de pessoas de diversas denominaes e raas. As reunies se seguiram durante trs anos, e chegaram a ser o centro do movimento pentecostal. De todo o pas veio gente misso da Rua Azusa para receber o batismo do Esprito e a evidncia das lnguas.

Aps isso seguiram anos de rpido crescimento. O assim chamado avivamento pentecostal estendeu-se a Chicago, Winnipeg e New York. Pouco depois de 1906, o evangelho pleno podia ser achado em todos os continentes. O movimento seguiu crescendo, at que hoje estima-se que h pelo menos 26 denominaes que se consideram parte do movimento pentecostal.

Consideremos brevemente alguns dos maiores corpos pentecostais dos Estados Unidos. O maior e mais influente deles as Assemblias de Deus com sede em Springfield, Missouri. Em abril de 1965 sua membresia total no pas era de mais de 555.000. Tinham mais de 8.400 igrejas, 10.000 ministros ordenados e 5.000 licenciados nos Estados Unidos. Sua principal escola o Instituto Bblico Central em Springfield e seu semanrio o Pentecost Evangel. Uma idia do tremendo alcance de sua atividade missionria pode-se deduzir do fato de que em abril de 1965 diziam ter 891 missionrios no estrangeiro, 15.105 igrejas e pontos de pregao no exterior e uma membresia estrangeira (incluindo aderentes e membros em plena comunho) de 1.472.766 pessoas. Isso significa que, de cada quatro pessoas que so membros ou aderentes das Assemblias de Deus, trs esto no campo missionrio, enquanto uma est nos Estados Unidos.

A segunda igreja pentecostal em importncia nos Estados Unidos a Igreja de Deus em Cristo. uma igreja negra fundada por C. H. Mason e C. P. Jones. Segundo Kelsey, este grupo tinha mais de 400.000 membros em 1963 contra apenas 31.000 que tinha em 1936. uma igreja de santidade que ensina que a santidade considerado um requisito para a salvao e para o batismo do Esprito.

O terceiro corpo pentecostal em importncia a Igreja de Deus com sede em Cleveland, Tennessee. Esta tambm a igreja pentecostal mais antiga do pas, havendo comeado em 1886 num avivamento dirigido no sudeste do Tennessee por Richard G. Spurling, pai, e seu. filho do mesmo nome. A. J. Tompson chegou a ser mais tarde o supervisor geral desta igreja, mas foi afastado em 1923. Esta tambm uma igreja de santidade que ensina que santificao segue a justificao e ao batismo do Esprito Santo segue a purificao ou santificao. Segundo cifras entregues por esta igreja em agosto de 1964, sua membresia total nos Estados Unidos e Canad era de mais de 200.000; nestes pases tinha quase 7.000 ministros (esta cifra provavelmente inclui ministros ordenados e licenciados) em aproximadamente 3.500 igrejas. No entanto, nessa data sua membresia mundial era de em torno de 400.000.

Segue em tamanho a Igreja Unida Pentecostal, que comeou quando se uniram duas igrejas em 1945, e que segundo Kelsey tem 175.000 membros. uma igreja das que se chamam unitrias: nega que h trs pessoas na Trindade, e ensinam que Pai, Filho e Esprito Santo so uma nica pessoa e que essa pessoa Jesus Cristo. Em conseqncia, seu ensinamento uma espcie singular de unitarismo que se centraliza na segunda pessoa e no na primeira; este unitarismo de tipo pentecostal conhecido tambm como o movimento S Jesus. As pessoas que tem sido batizadas no nome do Deus Trino tm que ser rebatizadas no nome de Jesus quando se fazem membros deste grupo. A maioria dos demais corpos pentecostais, as Assemblias de Deus em particular, tem repudiado firmemente este ensinamento unitrio. Pode ser interessante notar que a Igreja Unida Pentecostal tem um cdigo moral muito rgido. Oficialmente reprova coisas tais como o banho misto, a maquiagem, os desportos e as diverses mundanas, o uso da televiso, e probem que as mulheres cortem o cabelo. Num folheto publicado pela denominao entitulado A Questo do Cabelo, so dadas quinze razes pelas quais as mulheres devem ter o cabelo comprido.

Outro proeminente grupo pentecostal a Igreja Internacional do Evangelho Quadrangular (ou quadrado, ou ainda Foursquare em alguns pases), fundada em 1927 por Almee Semple McPherson. Esta igreja tambm ensina que os crentes devem receber o batismo do Esprito Santo e que este batismo deve ser atestado pelo falar em lnguas. Em 1965 este grupo dizia ter uma membresia total de 159.034 com 771 igrejas e 1647 ministros ordenados e licenciados em os Estados Unidos. Um folheto sobre misses publicado pela igreja em 1965 d as seguintes cifras: 1368 pastores nacionais e evangelistas, 1402 igrejas e pontos de pregao no estrangeiro e 96.432 membros e aderentes no campo missionrio.

Outro grupo pentecostal que deve ser considerado a Igreja de Deus Pentecostal, pelo menos pelo fato de que Oral Roberts pertencia a ele. Doutrinariamente tambm um grupo de santidade. A santificao considerada uma segunda obra da graa instantnea (ainda que tambm sustentam que progressiva). Considera o batismo do Esprito Santo como uma obra de graa adicional. Portanto, interessante notar que as cifras entregues pelo grupo em 1946 estavam classificadas em trs categorias: 26.251 membros, 8.043 salvos, 3.179 santificados e 1.724 batizados com o Esprito. Contudo, estatsticas mais recentes indicam que, em julho de 1956, a igreja dizia ter 60.665 membros, 1.331 igrejas e 2.446 ministros em os Estados Unidos. A membresia mundial total naquela data era 84.915 com 85 missionrios no estrangeiro.

Mais um grupo deve-se mencionar, Assemblias Pentecostais Mundiais. Esta tambm uma igreja negra que tinha uma lista de 50.000 membros e 600 igrejas em 1959. Esta igreja se ope s sociedades secretas, s datas de festas eclesisticas, ao uso de jias, de meias atrativas, de cabelo cortado ou alisado e de adereos de cores brilhantes.

Estes so pois, os principais corpos pentecostais nos Estados Unidos. H vrios outros grupos, a maior parte mais pequenos que os mencionados. Devido o crescimento rpido do pentecostalismo, no somente nos Estados Unidos mas em pases estrangeiros, este movimento com freqncia chamado terceira fora do cristianismo. H muitas igrejas pentecostais vigorosas em pases europeus como Noruega, Sucia, Finlndia, Dinamarca, Sua, Rssia, Itlia, Alemanha e Inglaterra. O pentecostalismo tambm forte na Amrica do Sul, especialmente no Brasil. As igrejas pentecostais tem sido muito ativas no trabalho missionrio; Bloch-Hoell, dando cifras do ano 1954, estima que naquele tempo o contigente de missionrios pentecostais era pelo menos trs vezes e meia maior que o considerado normal no mundo protestante. Ainda que difcil fazer uma estimativa de quantas pessoas no mundo poderiam se chamar pentecostais, certo que as cifras mundiais alcanam a vrios milhes. Enquanto Bloch Hoell estima que h aproximadamente seis milhes de seguidores pentecostais no mundo incluindo as crianas), John L. Sherril julga que h mais de 8.500.000 pentecostais no mundo, mais de 2.000.000 dos quais esto nos Estados Unidos.

O NEOPENTECOSTALISMO

Resta explorar mais uma fase da histria deste tema, fase que Russell T. Hitt tem denominado neopentecostalismo. Com esta expresso quero significar a passagem da glossollia para as igrejas estabelecidas. Antes de 1960, o fenmeno da glossollia estava confinado exclusivamente s igrejas pentecostais, no entanto, na atualidade j no assim.

Tudo comeou com Dennis Bennett, reitor da Igreja Episcopal de So Marcos em Van Nuys, Califrnia, nos arredores de Los Angeles. Por meio da influncia de um casamento celebrado em uma igreja vizinha recebeu o dom de lnguas, e achou que seria uma estimulante experincia espiritual os efeitos da qual se introduziram em sua vida cotidiana. Logo, umas setenta pessoas na congregao comearam a falar em lnguas, incluindo alguns dos mais conhecidos membros da congregao. Como a igreja estava dividida pelo problema, o Rev. Bennett renunciou reitoria em 3 de abril de 1960. A publicidade que se seguiu sua renncia serviu para difundir ainda mais a notcia deste novo turbilho de lnguas.

Atualmente, muitos episcopais esto praticando a glossollia. Frank Farrell informou em setembro de 1963 que, segundo se dizia, uns 2.000 episcopais estavam falando lnguas somente no sul da Califrnia. A glossollia tambm tem-se estendido pela Igreja Presbiteriana. Mais de 600 membros da Primeira Igreja Presbiteriana de Hollywood (a maior igreja local da denominao) haviam falado em lnguas, segundo uma informao. Alguns membros da Igreja Reformada da Amrica tambm tem comeado a falar em lnguas, provavelmente o mais conhecido deles seja o Rev. Harald Bredesen, pastor da Primeira Igreja Reformada de Mount Vernon, New York. O Rev. Bredesem recebeu o dom de lnguas num acampamento pentecostal em Green Lane, Pennsylvania, e desde ento tem sido um ativo propagandista da glossollia. Atualmente presidente da Sociedade da Bendita Trindade, grupo que atua como ponta de lana do movimento neopentecostal, particularmente por meio de sua revista trimestral (Trindade). A visita do pastor Bredesen ao campus da Universidade de Yale foi o que acendeu a faisca de um incndio de lnguas ali.

A glossollia tambm tem-se infiltrado nas igrejas luteranas. Provavelmente, o pastor luterano mais conhecido e que tem recebido o dom seja o Rev. Larry Christenson, pastor da Igreja Luterana da Trindade em San Pedro, Califrnia, que tem escrito bastante sobre o tema. O movimento penetrou na igreja metodista, Morton Kelsey menciona uma quantidade de ministros metodistas que tem recebido o dom de lnguas e tem sido instrumentos para d-lo a outros. O falar em lnguas tambm tem se estendido s igrejas batistas; o Senhor Kelsey descreve a experincia de dois ministros batistas que receberam o dom e cita o Dr. Francis Whiting, diretor do Departamento de Evangelismo da Conveno Batista de Michigan, como que tenho dito que a salvao do mundo est nos dons carismticos tais como o dom de lnguas.

Ademais, cabe destacar que a glossollia tem feito sua colheita tambm em pequenos grupos tais como InterVarsity Christiam Fellowship (grupo que em diversos pases trabalha com estudantes universitrios, com sede em Londres), Wycliff Bible Translators (misso dedicada traduo da Bblia a idiomas indgenas) e entre Os Navegantes. Tambm, o mesmo tem ocorrido em instituies bem conhecidas como Wheaton College, Westmont College e Fuller Seminary. Dentro do movimento neopentecostal, alm das atividades da Sociedade da Bendita Trindade, h reunies de pequenos grupos, denominados grupos de comunho do Esprito Santo, que celebram reunies e convenes de avano cristo. Uma organizao internacional denominada Associao Internacional de Homens de Negcios do Evangelho Pleno, com sede em Los Angeles, publica trs revistas Voz, Viso e Ponto de Vista. Esta organizao tem uma quantidade de diretores estrangeiros alm dos Estados Unidos, e captulos (organizaes locais) em pases to distantes como Austrlia e frica do Sul.

De todo o exposto, evidente que a glossollia na atualidade est-se estendendo para muito mais alm das fronteiras das igrejas pentecostais. Ainda que no haja dados disponveis, e ainda que o falar em lnguas nas outras igrejas nem sempre admitido abertamente, bvio que o nmero dos que falaram ou falam em lnguas fora das igrejas pentecostais deve ser bastante considervel. Particularmente, a difuso das lnguas em igrejas no pentecostais o que faz que a questo das lnguas seja um problema to vivo na atualidade.

CAPTULO 2

O SIGNIFICADO DO FALAR EM LNGUAS PARA OS PENTECOSTAIS

A prtica de falar em lnguas comum a todos os pentecostais, como tambm aos que comumente denominam-se neopentecostais. Antes de proceder a avaliao do falar em lnguas, devemos primeiro entender o significado da glossollia para quem o pratica.

Desde o comeo deve-se notar que h diferenas de opinio entre os pentecostais sobre se a santificao completa necessria antes que algum possa receber o batismo do Esprito que acompanhado pela glossollia. Por santificao completa entende-se quando algum fica completamente imune da presena do pecado em face de uma experincia instantnea. No princpio do movimento houve muita nfase na importncia dessa santificao instantnea. Lembre-se que Charles F. Parhan, em cujo instituto bblico comeou o movimento pentecostal, era um pregador da santidade que cria na santificao completa como uma segunda obra de graa depois da converso. Durante o avivamento em Los Angeles em 1906, muitas pessoas disseram haver recebido a santificao completa e consequentemente diziam que esta bno era necessria antes que algum pudesse receber o batismo do Esprito.

Entretanto, no decorrer do tempo, houve uma variao no ensinamento pentecostal. Ainda que alguns grupos pentecostais continuem com a nfase na necessidade da santificao completa como uma experincia que deve anteceder o batismo do Esprito, de modo que o batismo do Esprito fosse considerado por eles como uma terceira obra da graa subsequente regenerao (ou converso) e a santificao instantnea, a maioria dos grupos pentecostais tem abandonado esta posio. Hoje em dia, a maioria das igrejas pentecostais ensinam que a santificao no uma experincia instantnea, mas um processo que segue pela vida, ainda depois que algum recebe o batismo do Esprito. Portanto, a maioria dos pentecostais considera o batismo do Esprito como uma espcie de segunda obra da graa que ocorre depois da regenerao.

Mesmo assim, ambos os grupos de pentecostais concordam em que a glossollia a evidncia inicial do batismo do Esprito. Em virtude de no haver diferena de opinio entre ambos grupos sobre o ponto que nos ocupa (isto , o significado da glossollia), passarei por alto pela diferena de opinio sobre a questo da santificao completa que deveria seguir.

Ao determinar o significado da glossollia para quem a pratica, devemos portanto levar em conta outra diferena de opinio que existe entre os pentecostais. Nem todos esto de acordo no ponto de a glossollia invariavelmente acompanhar o batismo do Esprito. Alguns pentecostais sustentam que, ainda que o falar em lnguas seja uma das evidncias do batismo do Esprito, no necessariamente a nica evidncia, e que, portanto, uma pessoa pode receber o batismo do Esprito sem falar em lnguas. Alguns lderes pentecostais europeus como T. B. Barratt de Noruega e Lewi Pethrus de Sucia esto dispostos a admitir que, como uma exceo, o batismo do Esprito pode ocorrer sem glossollia. J. E. Stiles Jr., escreveu em Cristianismo Hoje: H uma crescente minoria entre pessoas do evangelho pleno que crem que as lnguas no se constituem em nica ou necessria evidncia do recebimento inicial do Esprito Santo. Aceitamos que uma evidncia. Ni1s Bloch-Hoell, cujo estudo histrico do movimento pentecostal o mais completo at agora publicado, afirma:

A opinio dominante do movimento pentecostal a que o batismo do Esprito acompanhado pelo falar em lnguas, mas, ao mesmo tempo, permite teoricamente, a possibilidade do batismo do Esprito sem glossollia.

V-se ento que, em que pese uma minoria de pentecostais admitir a possibilidade de batismo do Esprito sem glossollia, a maioria considera que o batismo do Esprito sem glossollia estaria incompleto ou carente de evidncia.

Mesmo que o leitor deva recordar-se que h pentecostais que no esto na posio da maioria, apresentarei o ponto de vista da maioria como tpico do movimento pentecostal. Ao apresentar o ponto de vista da maioria, reproduzirei at aonde for possvel, a posio sustentada pelas Assemblias de Deus, a maior igreja pentecostal dos Estados Unidos, e provavelmente o grupo pentecostal de mais influncia no mundo.

As Assemblias de Deus estabeleceram seus principais dogmas doutrinais no que chamam Declarao de Verdades Fundamentais, que compreende 19 artigos. O artigo 7 desta declarao diz:

Todos os crentes tm o direito a a promessa do Pai, a qual deveriam esperar ardente e intensamente: o batismo no Esprito Santo e no fogo, de acordo com o mandamento de nosso Senhor Jesus Cristo. Essa era a experincia normal de toda a Igreja Primitiva. Com ela chega investidura do poder para a vida e o servio, a concesso de dons e o uso deles na obra do ministrio (Lucas 24:49, Atos 1:4, 8; I Corntios 12:1-31). Esta experincia distinta e posterior experincia do novo nascimento (Atos 8:12-17; 10:44-46; 11:14-16; 15:7-9). Com o batismo do Esprito Santo vm experincias tais como a completa plenitude do Esprito (Joo 7:37-39; Atos 1:4-8), uma reverncia mais profunda a Deus (Atos 2:43; Hebreus 12:28), uma consagrao mais intensa a Deus e dedicao sua obra (Atos 2:42), e um amor mais ativo por Cristo, por sua Palavra e pelos perdidos (Marcos 16:20).

O Artigo 8 faz as seguintes afirmaes:

O batismo dos crentes no Esprito Santo testificado pelo sinal fsico inicial de falar outras lnguas conforme o Esprito as concede que falem (Atos 2:4). O falar em lnguas neste caso o mesmo em essncia que o dom de lnguas (1 Corntios 12:4-10, 28), mas difere em propsito e uso.

Justapondo estes dois artigos, chegamos s seguintes concluses:

1. Todos os crentes deveriam buscar o batismo do Esprito Santo.

2. Este batismo do Esprito distinto e posterior experincia do novo nascimento.

3. Este batismo do Esprito Santo outorga poder para a vida e o servio, maior consagrao, um amor mais ativo por Cristo, por sua Palavra e pelos perdidos.

4. O sinal fsico inicial do batismo do Esprito falar em outras lnguas.

5. Este sinal fsico inicial, ainda que seja o mesmo em essncia que o dom de lnguas de que fala I Corntios 12, diferente em propsito e uso.

Portanto, para as Assemblias de Deus e sua posio nisso tpica dos pentecostais em geral a glossollia to importante que todo crente deveria pratic-la como evidncia inicial do batismo do Esprito Santo que todos devem buscar obter. Cito um proeminente autor das Assemblias de Deus:

UMA experincia deve ser recebida por todos os que querem entrar no reino o novo nascimento ...do mesmo modo, ordena-se a todos os crentes que recebam uma experincia o batismo ou plenitude do Esprito. Novamente, as reaes fsicas, emocionais e intelectuais so to variadas como os que a recebem, mas, outra vez, uma evidncia acompanha uniformemente experincia: o testemunho do Esprito atravs de ns em outras lnguas.

Ralph M. Riggs, outro escritor das Assemblias de Deus, d dez razes por que deveramos receber o batismo do Esprito Santo pouco depois da converso. A importncia da glossollia para os pentecostais vem indicada pela seguinte declarao de Carl Brumback: " nossa sincera crena que sem esta evidncia (ou seja, a da glossollia) no pode haver um batismo completo com o Esprito Santo. Portanto, todo cristo deve buscar a glossollia, no por causa de si mesmo, mas como evidncia de que se tem recebido o batismo do Esprito Santo.

Pois bem, o que este batismo do Esprito, posterior e distinto do novo nascimento? Significa a entrada do Espirito Santo na vida de algum como Pessoa em Seu prprio nome e direito. Ralph Riggs descreve a experincia da seguinte maneira:

Como Esprito de Cristo, Ele veio na converso, trazendo a vida de Cristo, revelando a Cristo e o fazendo-se real. No batismo do Esprito, Ele mesmo, em Sua prpria pessoa cai sobre o crente que espera e o enche. Esta experincia to distinta da converso como o Esprito Santo distinto de Cristo. Sua vinda ao crente no batismo a vinda da terceira Pessoa da Trindade, aps a vinda de Cristo, que ocorreu na converso.

Ento, isso significa que algum no recebe o Esprito Santo em nenhum sentido no momento da converso? Pelo contrrio, todo cristo tem o Esprito Santo uma vez que Ele quem deve p-lo em contato com Cristo, e o Esprito quem deve operar a regenerao. Mas somente depois do batismo do Esprito, a Terceira Pessoa da Trindade toma o controle definitivo por direito prprio, e dispensa todo o complemento de seus dons. Em suma, ainda que se receba certos frutos do poder do Espirito no momento da regenerao ou converso, no recebe ao Esprito como pessoa que o enche completamente at o momento do batismo do Esprito Santo. A glossollia a evidncia inicial deste batismo do Esprito.

Sobre que base bblica esto fundamentados estes ensinamentos? Principalmente, no estudo de passagens do livro de Atos que descrevem certos grupos que falaram em lnguas quando o Esprito caiu ou veio sobre eles. Mais adiante examinaremos registros das Escrituras com maior detalhe.

Deve-se recordar que os pentecostais distinguem entre glossollia como evidncia inicial do batismo do Esprito e como um dom que o receptor pode continuar exercendo, Assim eles do razo ao fato bvio de que nem todos em Corinto tinham o dom de lnguas. Numa palavra, sua posio esta: todos os que recebem o batismo do Esprito devem falar lnguas como evidncia fsica inicial deste batismo. Nem todos os que recebem esta evidncia, no entanto, seguem exercendo o dom de lnguas.

Alm disso, o dom de lnguas opera de um modo duplo: devocional e congregacional. Como exerccio devocional poderia ser usado como um meio para orar, dar graas, cantar. Pelo uso do dom nesta forma algum edifica-se a si mesmo. O outro uso do dom congregacional. As lnguas deveriam ser usadas nos servios da igreja. Brumback afirma que bom que o pregador seja interrompido ocasionalmente por uma expresso em lnguas, ainda que no se propicia uma interrupo constante. Donald Gee, outro escritor das Assemblias de Deus, refletindo sobre as diferenas entre os servios pentecostais e os das igrejas protestantes regulares, expressa a questo de um modo mais bem ameno: Melhor um pouco de desordem e o Senhor operando que a ordem aparente da tumba e da morte. No entanto, quando se usam as lnguas no servio da igreja, devem ser interpretadas, por isso os pentecostais falam do dom de interpretao como um dom adicional. Sem intrprete, o que fala em lnguas deve calar-se na igreja.

Pode ser de interesse perguntar neste ponto: Segundo os pentecostais, como so estas lnguas? So idiomas humanos reais, ou so apenas expresses extticas que no tm similaridade com idiomas que atualmente se falam sobre a terra? Para responder a esta questo, devo, em primeiro lugar, reproduzir brevemente os ensinamentos pentecostais sobre as lnguas descritas na Bblia. Os pentecostais esto bem de acordo que as lnguas faladas no dia de Pentecostes eram idiomas reais, uma vez que Lucas afirma que cada homem ouviu os discpulos em sua prpria lngua. No que diz respeito glossollia em Corinto, Brumback afirma que ainda que haja uma diferena entre as lnguas em Atos e as de Corinto quanto ao propsito e operao, no h diferena entre elas quanto a sua natureza: noutras palavras, em Corinto assim como em Jerusalm, as lnguas eram idiomas estrangeiros reais falados por pessoas que no haviam tido uma preparao prvia nesse idioma.

Sobre a base do ponto de vista da glossollia na forma descrita nas Escrituras, Brumback sustenta que a glossollia na atualidade no falar uma linguagem celestial desconhecida para o homem, mas falar um verdadeiro idioma humano que, no entanto, desconhecido para a pessoa que fala; ainda afirma que h casos registrados em que expresses glossollicas tem sido identificadas como idiomas existentes, tanto por crentes pentecostais como no pentecostais. Brumback admite que s vezes a glossollia atual no um idioma genuno, mas uma pura algaravia; no entanto, esses casos so considerados fraudulentos, como uma tentativa de imitar o genuno dom de lnguas. Donald Gee, escritor pentecostal britnico, est de acordo que na atualidade a glossollia o falar de idiomas estrangeiros genunos. Ento pareceria que a posio pentecostal geral que a glossollia segundo se pratica na atualidade o falar um idioma estrangeiro genuno por pessoas que nunca tenham estudado o idioma em que falam e que no o entende no momento em que os esto falando.

No entanto, deve-se observar que nem todos os pentecostais esto de acordo neste ponto. Alguns pentecostais dizem-me em conversaes privadas que a glossollia de hoje poderia ser um falar um idioma estrangeiro existente, ou falar uma lngua em xtase que no tem similar na linguagem humana. Ademais significativo que pelo menos um dos escritores das Assemblias de Deus no compartilha do ponto de vista de que a glossollia de hoje seja sempre um idioma genuno. Stanley Frodsham, em um livro que sempre aparece recomendado no catlogo atual da Gospel Publishing House, agncia oficial de publicaes das Assemblias de Deus, tem isso a dizer acerca do dom de lnguas:

O filho de Deus tem o privilgio de ter uma linguagem com Deus, e nenhum homem entende esta linguagem secreta, porque ao santo lhe permitido falar no idioma da divindade, um idioma desconhecido para a humanidade... O santo mais humilde pode desfrutar de uma conversao sobrenatural com o que fez os mundos, num idioma no compreendido pelo homem nem pelo diabo.

Seguimos adiante agora para perguntar se o ponto de vista dos neopentecostais acerca do significado e valor da glossollia o mesmo que o que se lhe do os pentecostais segundo o que acabamos de descrever. uma pergunta difcil de responder porque no h uma interpretao teolgica autoritativa que seja obrigatria para todos os neopentecostais. No entanto, cabe destacar que o neopentecostalismo recebeu seu mpeto inicial dos pentecostais, uma vez que vrios lderes neopentecostais receberam o dom de lnguas em reunies pentecostais ou por meio da influncia de pentecostais. Portanto, historicamente o neopentecostalismo nasceu do pentecostalismo.

J se tem feito notar que h alguma diferena de opinio entre membros de igrejas pentecostais sobre se a glossollia invariavelmente acompanha o batismo do Esprito. Encontramos uma diferena de opinio similar entre os neopentecostais. Alguns neopentecostais crem que a glossollia uma das evidncias de haver recebido o batismo do Esprito, mas que no a nica evidncia nem a evidncia indispensvel. Para citar um exemplo, o Rev. Larry Christensom, pastor da Igreja Luterana da Trindade, em San Pedro, Califrnia, e lder do movimento pentecostal, no est de todo disposto a dizer que cada um dos que recebam o batismo do Esprito falaro em lnguas, de modo que se uma pessoa que no fale em lnguas esteja convencido de que no recebeu o batismo do Esprito. No entanto, concede que o livro de Atos nos da um padro que serve de muita ajuda em nossas vidas de hoje: a saber, a recepo do Esprito uma experincia instantnea que acompanhada pelo falar em lnguas. Portanto, segue dizendo:

Consumar a experincia de algum de receber o Esprito falando em lnguas lhe d objetividade experincia; eu creio que esta objetividade tem um valor definitivo para o contnuo caminhar no Esprito, porque falar em lnguas parece ter uma relao definida com a "poda" e "purificao" pela qual o cristo tem que passar.

Portanto, segundo Christensom, a glossollia, ainda que de um alto valor, no a evidncia indispensvel de haver recebido o batismo do Esprito

Segundo Morton T. Ke1sey, reitor episcopal que escreveu um livro sobre o falar em lnguas, o Rev. Tod Ewald, reitor da Igreja Episcopal de Corte Madera, Califrnia, compartilha dos pontos de vista de Christensom sobre as lnguas. Ke1sey segue dizendo que, em sua opinio, a maioria de quem fala lnguas nas mais antigas denominaes protestantes compartilham dos pontos de vista do pastor Christensom sobre as lnguas e sobre a experincia do Esprito Santo, isto , que as lnguas so uma sinal do batismo do Esprito, mas no o sinal indispensvel do acontecimento. Se Ke1sey est correto, isso poderia significar que o ponto de vista da maioria dos neopentecostais difere da maioria dentre os pentecostais.

No entanto, no estou certo de que o Senhor Ke1sey tenha razo em seu juzo. Tem-se encontrado uma quantidade de declaraes de proeminentes neopentecostais que afirmam que a glossollia no apenas uma possvel evidncia, mas a evidncia do batismo do Esprito Santo. Por exemplo, Robert Frost, professor de biologia no Colgio Westmont, escrevendo na revista Trindade, declara que, assim como uma confisso de f o sinal exterior de converso, o falar em lnguas a evidncia exterior do batismo do Esprito Santo (que ele chama "o dom do Esprito de Deus em sua plenitude"). Em uma edio anterior do mesmo peridico, o Rev. Edwin B. Stube, vigrio de Saint Lawrence, Sidney, Montana, e diretor da Sociedade da Bendita Trindade, afirma:

No Novo Testamento, o sinal normal ou evidncia do batismo do Esprito Santo o de falar em outras lnguas segundo o Esprito d que se fale ... Claramente se v que a inteno de Deus que todos os crentes recebam o batismo do Esprito Santo com o sinal que o Novo Testamento indica (a saber, o sinal de falar em lnguas).

Jean Stone, uma diretora da Sociedade da Bendita Trindade, e editora da revista Trindade, disse isso acerca da glossollia em um editorial: "Cremos que quando um crente batizado com o Esprito Santo, ele falar em novas lnguas segundo o Esprito lhe concede que fale e que esta investidura de poder (significada pela nova lngua) uma investidura para o servio". Neste mesmo editorial a Senhora Stone cita uma declarao oficial feita pela junta de diretores da Sociedade da Bendita Trindade em sua reunio de maro de 1963. O quarto pargrafo da declarao diz:

Cremos que quando um cristo recebe o batismo do Esprito Santo prometido por Jesus (Atos 1: 5, 8), o Esprito Santo confirma isso com uma capacidade sobrenatural de falar em uma lngua desconhecida para quem fala.

Os membros da junta de diretores que aparecem na edio da revista em que consta a declarao citada so os seguinte: Rev. Harald Bredesen, Rev. David J. du Plessis, Rev. Tod W. Ewald, Donald D. Stone, o Rev. Willian T. Sherwood, Jean Stone, o Rev. Edwin B. Stube. Pareceria que uma declarao feita pelos diretores da Sociedade da Bendita Trindade aproxima-se muito do que algum poderia esperar razoavelmente como pronunciamento oficial sobre os pontos de vista dos neopentecostais.

Portanto, concluirei que, com a possvel exceo de alguns, a posio dominante do neopentecostalismo sobre a significao da glossollia a mesma que a dos pentecostais: o falar em lnguas a evidncia necessria de que algum recebeu o batismo do Esprito Santo.

H que se reconhecer que a maioria dos neopentecostais no propicia o falar em lnguas nos servios dominicais regulares de suas igrejas, mas preferem o exerccio da glossollia em suas devoes privadas ou em pequenos grupos de orao. Tambm h que se admitir livremente que o falar em lnguas entre os neopentecostais est muito menos carregado de emoes que nos cultos de muitas igrejas pentecostais, sejam dominicais ou durante a semana. No entanto, estas diferenas no afetam o ponto bsico que agora est em discusso: a importncia da glossollia como evidncia do batismo do Esprito. Neste ponto, v-se claramente que a maioria dos neopentecostais est de acordo com os pentecostais.

CAPTULO 3

UMA AVALIAO BIBLICA DO FALAR EM LNGUAS

Evidentemente, reconhecemos que h muito o que a igreja pode aprender do pentecostalismo e do neopentecostalismo. Ainda que este ponto ser discutido de forma mais ampla no Captulo 5, permita-me dizer aqui que na igreja atual h uma premente necessidade de um maior enchimento do Esprito Santo, de um maior fervor em nossa adorao e um maior calor em nosso testemunho. Todos os que nos chamamos cristos queremos viver vidas mais cheias do Esprito Santo. Todos desejamos receber bem qualquer coisa que nos ajude a andar mais plenamente no Esprito.

No entanto, nossa maior preocupao como cristos bblicos deve ser permanecermos fiis aos ensinamentos da Palavra de Deus. No poderamos iniciar-nos em certo tipo de experincia religiosa e logo a seguir ir reivindicando uma doutrina a partir dela. Nossas doutrinas devem estar baseadas no na experincia mas nos ensinamentos das Escrituras. Portanto, devemos sujeitar o pentecostalismo, tanto em sua nova forma como na antiga, prova da Escritura. Por isso, neste captulo tenho o propsito de apresentar uma avaliao bblica dos ensinamentos dos pentecostais e neopentecostais sobre o falar em lnguas.

Antes, devemo-nos lembrar que nem todos os pentecostais e muito menos todos os neopentecostais sustentam a mesma posio sobre o falar em lnguas que foi esboada no Captulo 2. No entanto, ao fazer a avaliao bblica tomo por base a posio sobre o falar em lnguas sustentada pela maioria dos pentecostais e neopentecostais e que com toda certeza pode-se ter como tpica do movimento como um todo.

Ao conduzir esta avaliao bblica, pela ordem, tomarei os diversos grupos de passagens bblicas que so apresentadas pelos pentecostais em sua tentativa de encontrar um apoio bblico glossollia.

1. Passagens dos profetas apresentadas pelos pentecostais que segundo alegam apoiam o falar em lnguas.

Aqui devemos considerar duas passagens freqentemente citadas. Os pentecostais encontram uma predio do dom de lnguas em Isaas 28:11, 12. Na verso Revista e Atualizada esta passagem diz:

Pelo que por lbios gaguejantes e por lngua estranha falar o SENHOR a este povo, ao qual ele disse: Este o descanso, dai descanso ao cansado; e este o refrigrio; mas no quiseram ouvir.

Normalmente, ao citar esta passagem, os pentecostais deixam de lado a ltima frase, "mas no quiseram ouvir". Logo comeam a interpretar a passagem como se anunciasse a concesso do dom de lnguas igreja, aduzindo que, por meio deste dom, segundo o profeta, conceder-se-a repouso ao povo de Deus. No entanto, o que se esquece que luz do contexto, a passagem prediz claramente a vinda dos assrios contra o povo de Israel, como castigo pela sua desobedincia. O versculo 12 refere-se s advertncias profticas prvias que haviam sido desprezadas; por isso o castigo agora est a caminho: "Ao qual ele disse: Este o descanso, dai descanso ao cansado...; mas no quiseram ouvir." Afirmar que o repouso de que aqui se fala produto do falar em lnguas, como afirmam nossos amigos pentecostais, torcer o sentido do texto. O uso que Paulo faz desta passagem em I Corntios 14:21, alm disso, no apia a interpretao pentecostal. Porque o argumento de Paulo no que o falar lnguas estranhas produz repouso, mas antes, como nos tempos do Antigo Testamento, assim agora: esta forma de falar deixa as pessoas em sua incredulidade, em seus coraes endurecidos: "no quiseram ouvir, diz o Senhor".

Outra passagem proftica apresentada pelos pentecostais encontra-se no segundo captulo, de Joel. Na ltima parte deste captulo ocorre a promessa do derramamento do Esprito sobre toda carne que Pedro citou no dia de Pentecostes. Desta parte do captulo, os autores pentecostais dirigem-se ao versculo 23 para encontrar uma referncia chuva tempor e serdia:

Alegrai-vos, pois, filhos de Sio, regozijai-vos no SENHOR, vosso Deus, porque ele vos dar em justa medida a chuva; far descer, como outrora, a chuva tempor e a serdia.

Este versculo se une a Tiago 5:7, 8 que diz assim:

Sede, pois, irmos, pacientes at vinda do Senhor. Eis que o lavrador espera o precioso fruto da terra, aguardando-o com pacincia at receba a chuva tempor e serdia. Sede vs tambm pacientes, e fortalecei os vossos coraes, porque a vinda do Senhor est prxima. (Edio Revista e Corrigida)

Como a passagem de Tiago refere-se segunda vinda do Senhor, supe-se engenhosamente que a "chuva serdia" refira-se a um acontecimento que deve preceder imediatamente vinda de Cristo. A chuva deve-se relacionar de algum modo com o derramamento do Esprito pregado por Joel. Ento a concluso obvia: - a chuva tempor" ou a primeiras chuva tem que se referir ao dom de lnguas do dia de Pentecostes e na igreja primitiva, enquanto a chuva serdia" tem que ser a designao do movimento de lnguas destes ltimos tempos. Com freqncia ouve-se que os pentecostais referem-se ao avivamento pentecostal que comeou em 1901 como o movimento de "chuva serdia". Uma implicao desta expresso, luz das passagens de Joel e Tiago, que o movimento pentecostal um sinal da proximidade da vinda de Cristo e do fim do mundo. No entanto, esta interpretao da chuva tempor e da chuva serdia carece de todo apoio bblico, como revelar o mais elementar estudo destas passagens em seu contexto.

2. Passagens apresentadas para demostrar que o falar em lnguas tinha que permanecer na igreja.

Carl Brumback, em O que Quer Ser Isso?, refuta o argumento de que a glossollia era temporria e no tinha o propsito de seguir na igreja assinalando duas passagens que, segundo ele acha, ensinam que Deus queria que o dom de lnguas continuasse. A primeira passagem Marcos 16:17-18.

Estes sinais ho de acompanhar aqueles que crem: em meu nome, expeliro demnios; falaro novas lnguas; pegaro em serpentes; e, se alguma coisa mortfera beberem, no lhes far mal; se impuserem as mos sobre enfermos, eles ficaro curados.

Aqui Jesus deixa muito claro diz Brumback que as lnguas devem permanecer na igreja: "Estes sinais ho se acompanhar aqueles que crem... falaro novas lnguas.

No entanto, h dvidas quanto autenticidade desta passagem. A concluso longa de Marcos, na qual aparece este versculo, ausente nos dois unciais mais antigos, o Vaticano e o Sinatico, ambos do Sculo IV depois de Cristo. Ainda que a concluso longa encontra-se numa quantidade de manuscritos posteriores deste Evangelho, outros manuscritos tem uma concluso breve; pelo menos um original (Cdice Rgio, ou Manuscritos L) tem as duas concluses, a longa e a curta. Tambm h evidncias internas contra a autenticidade da concluso longa: usam-se certas construes e frases que no se usam comumente em Marcos ou que no aparecem em todo o Evangelho de Marcos. luz destes atos, parece altamente improvvel que a concluso longa de Marcos tenha sido parte do evangelho original. Em conseqncia, a maior parte dos comentaristas evanglicos consideram que a concluso longa de Marcos no genuna, incluindo notrios conservadores como Ned Stonehouse do Seminrio Westminster. Portanto, no pode ser correta nem corts sugerir, como Brumback, que os que tm dvidas sobre a autenticidade de Marcos 16:15-20 so como os modernistas que tiram da Bblia quaisquer passagens que lhes desagradam. Isso no questo de gostar ou no gostar, mas simplesmente uma questo de evidncia textual precedente dos manuscritos. (Veja-se nota marginal em Marcos 16:9 na Edio Revista e Atualizada da Sociedade Bblica do Brasil e nota de rodap na Bblia de Jerusalm - nota do tradutor) .

No entanto, suponhamos por um momento que Marcos 16:17-18 seja uma passagem com autoridade para ns (quem sabe aceitando-a como parte da Escritura ainda que estejamos de acordo que foi escrita por uma pessoa diferente de Marcos). Ainda assim teramos dificuldades com esta passagem. Lembrem-se que a passagem no fala somente de novas lnguas mas tambm de pegar em serpentes e beber alguma coisa mortfera, veneno mortal. Os pentecostais no se vm muito desejosos de aconselhar a sua gente que comece a pegar serpentes ou a tomar veneno para provar que so crentes verdadeiros. Ento, como deixam de lado o pensamento de que os dois sinais que se nomeiam ao final e tambm seguem aos que crem? Brumback sustenta que estes sinais milagrosas desapareceram da igreja por falta de f do povo de Deus. No entanto, o problema que h nesta explicao que segundo Brumback os pentecostais agora tm a f que a igreja no tinha nos sculos anteriores, e que por isso eles falam em lnguas. Mas ento perguntamos, por que no pegam serpentes ou bebem venenos mortais? A nica resposta que Brumback d a esta pergunta sugerir que na igreja primitiva o pegar em serpentes sem receber dano era feito "acidentalmente", e que ser preservados de veneno mortal ocorre somente quando esse veneno tenha sido tomado inadvertidamente ou administrado por um inimigo. No entanto, ao examinar o texto grego de Marcos 16:18, encontramos que ainda que a declarao acerca de beber veneno est em forma condicional ("se beberem alguma coisa mortfera, no lhes far dano algum' a declarao sobre pegar em serpentes no est na forma condicional, mas no futuro do indicativo: "pegaro em serpentes", igual declarao sobre as lnguas: "falaro novas lnguas". Portanto, segundo o texto, estes sinais seguiro aos que crem: falaro novas lnguas e pegaro em serpentes. Se o falar em lnguas deve ser tomado como um sinal que confirma os crentes na f, porque no chegar concluso de que o pegar em serpentes tambm deve ter a mesma funo de sinal? H muita razo para aceitar um sinal do mesmo modo que o outro, uma vez que em ambos casos o verbo grego est no futuro do indicativo: lalsousim ... arasim. Se Marcos 16:17-18 uma Escritura com autoridade, porque as igrejas pentecostais no tem cultos em que se pegam em serpentes?

Portanto, pelas razes esposadas, no creio que Marcos 16:17-18 prove que o dom de lnguas est em vigncia para a igreja de hoje.

Outra passagem apresentada por Brumback para demonstrar que a glossollia tinha que permanecer na igreja I Corntios l2:28. Esta passagem diz assim:

E a uns ps Deus na igreja, primeiramente apstolos, em segundo lugar profetas, em terceiro mestres, depois operadores de milagres, depois dons de curar, socorros, governos, variedades de lnguas.

Estou de acordo com Brumback que estas palavras so dirigidas no apenas igreja de Corinto, mas igreja de todos os tempos; a referncia aos apstolos prova Isso, porque certamente Deus no deu os apstolos somente para a igreja de Corinto. Brumback vai mais adiante com seu argumento dizendo que uma vez que entre os dons de Deus se mencionam "os que tem dom de lnguas", o dom de lnguas deve permanecer na igreja hoje.

isso que se prova nesta passagem? No, de forma conclusiva. Porque o texto comea dizendo que Deus estabeleceu apstolos na igreja. No entanto, os apstolos j no esto conosco, como admite o prprio Brumback. Podemos ento estar certos de que todos os dons mencionados neste versculo permanecem na igreja de hoje? Alm disso, h algumas expresses estranhas neste versculo. O quer dizer milagres" (dunmeis)? Permanecem na igreja? Nossos irmos pentecostais afirmam que o dom de cura (carsmatia iamton) permanece na igreja. Mas, podemos estar certos disso? O que quer dizer "socorros" (antilpseis)? Podemos estar certos de que estes dons ainda existem? O que quer dizer por "governos (kubernseis)? Leon Morris assinala que falta a compreenso da natureza exata de alguns destes dons. Ele diz: Podemos fazer... conjecturas... mas quando queremos reduzi-los a termos exatos, damo-nos conta que no sabemos nada acerca destes dons e as pessoas que os possuam. Desvaneceram-se sem deixar vestgios". Ora, eu no estou afirmando que posso provar com esta passagem que as lnguas j no existem na igreja; apenas estou dizendo que os pentecostais no podem provar irrefutavelmente com este texto que os dons ai mencionados permanecem na igreja.

3. Passagens apresentados para provar que h um batismo do Esprito distinto e posterior regenerao, do qual o falar em lnguas a evidncia fsica inicial

Aqui chegamos muito perto do corao mesmo do ensinamento pentecostal. Esta a doutrina central que distingue as igrejas pentecostais dos demais grupos protestantes e que como temos visto, tambm sustentada pela maioria dos neopentecostais. Devido o seu ensinamento sobre o batismo do Esprito Santo, h nas igrejas pentecostais uma enorme presso para que os crentes busquem, recebam ou obtenham o batismo. Algumas vezes as pessoas agonizam durante anos com o desejo de receber este dom. Quando era estudante de seminrio e vendia Bblias em Louisiana, conversei uma vez com uma mulher que era membro de uma igreja pentecostal.

- E seu marido? lhe perguntei.

- Ah! Ele est buscando foi a resposta.

- Buscando? O que quer dizer?

- Est buscando o Esprito Santo.

- Quer dizer insisti que ele no crente?

- Sim, claro que crente.

- Ento no vai igreja?

- Oh, sim, ele vai igreja todos os domingos.

- Bom, ento por que voc diz que ele est buscando?

- Porque ainda no recebeu o batismo do Esprito Santo.

- Durante quanto tempo ele est buscando?

- Por uns dez anos.

possvel imaginar-se a tenso espiritual e psicolgica que um ensinamento deste tipo pode produzir. Quando algum no recebe o batismo do Esprito Santo de imediato, faz um maior esforo. Quando depois de vrias tentativas no o recebe, esse algum sente-se terrivelmente frustrado. Tenho lido de pessoas que tiveram problemas mentais porque no puderam "receber". Os pentecostais ensinam que ainda que algum possa at ser salvo sem o batismo do Esprito, quem no passa por essa experincia no tem uma inteira consagrao nem todo o poder para o servio; dai que sem o batismo do Esprito a vida crist est incompleta e o seu ministrio embaraado.

Comumente estabelecem-se certas condies para obter o batismo do Esprito. O escritor Charles W. Conn, da Igreja de Deus, menciona as seguintes: separao do pecado, arrependimento e batismo, o ouvir com f, obedincia, desejo intenso, orao pelo dom. Ralph M. Riggs sugere as seguintes condies: (1) devemos ser salvos; (2) devemos obedecer isto , devemo-nos estar perfeitamente rendidos a Deus; 3) devemos pedir; (4) devemos crer. Em relao a isso Riggs diz que bom esperar ou ficar na presena do Senhor at receber esta bno. Por isso, os pentecostais com freqncia celebram reunies de espera nas quais as pessoas ficam para receber o batismo do Esprito.

A questo bsica que devemos enfrentar de ordem exegtica: ensina o Novo Testamento o que nossos irmos pentecostais dizem que ensina? O batismo do Esprito uma experincia distinta e posterior regenerao experincia pela qual todo o crente dever passar, e cuja evidncia inicial o falar em lnguas?

Vejamos em primeiro lugar o que ensina o Novo Testamento acerca de ser batizados com o Esprito Santo. H quatro casos nos Evangelhos em que Joo Batista aparece dizendo que Jesus batizar com o Esprito Santo: Mateus 3:11; Marcos 1:8; Lucas 3:16; e Joo 1:33. As primeiras trs so passagens paralelas; a passagem de Lucas (3:16) diz: Eu, na verdade, vos batizo com gua, mas vem o que mais poderoso do que eu, do qual no sou digno de desatar-lhe as correias das sandlias; ele vos batizar com o Esprito Santo e com fogo. A referncia bvia ao derramamento do Esprito que viria no dia de Pentecostes. Em Joo 1: 33 diz: Aquele, porm, que me enviou a batizar com gua me disse: Aquele sobre quem vires descer e pousar o Esprito, esse o que batiza com o Esprito Santo. Aqui novamente a referncia ao derramamento do Esprito Santo no dia de Pentecostes.

Estas palavras de Joo Batista so citadas por Lucas em Atos 1:5 como que tivessem sido pronunciadas pelo Senhor Jesus: Porque Joo, na verdade, batizou com gua, mas vs sereis batizados com o Esprito Santo no muito depois destes dias. Novamente a referncia bvia ao derramamento do Esprito no dia de Pentecostes. No segundo captulo de Atos, Lucas descreve este derramamento, e apresenta Pedro dizendo acerca de Cristo: Exaltado, pois, destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa do Esprito Santo, derramou isso que vedes e ouvis (At. 2:33). O derramamento do Esprito em Pentecostes, ento, o batismo do Esprito que Joo Batista e Jesus haviam anunciado. Portanto, nas passagens at aqui citadas a expresso ser batizados com o Esprito Santo no se refere a uma experincia que cada crente individualmente deve ter algum tempo depois de sua regenerao, mas a um acontecimento histrico que ocorreu no dia de Pentecostes.

Tinha que repetir-se este batismo pentecostal com o Esprito? H uma referncia a uma repetio deste batismo em Atos 11: 16. Pedro est em Jerusalm, relatando aos irmos da Judia o que havia ocorrido na casa de Cornlio em Cesaria poucos dias antes. Enquanto comeou a falar a Cornlio, diz Pedro, o Esprito Santo caiu sobre Cornlio e sobre os que estavam com ele, como sobre ns ao princpio. E agora segue o versculo 16: Ento, me lembrei da palavra do Senhor, quando disse: Joo, na verdade, batizou com gua, mas vs sereis batizados com o Esprito Santo. Temos que reconhecer que esta uma repetio do batismo do Esprito ocorrido em Pentecostes. Ao mesmo tempo, quando Cornlio e sua casa e amigos receberam o batismo, falaram em lnguas e magnificaram a Deus (At. 10:46). Teremos que indagar mais acerca do significado deste batismo com o Esprito Santo antes de podermos determinar se para esperar que todo crente passe por uma experincia semelhante nos dias de hoje. No entanto, cabe destacar que algum no pode usar a histria de Cornlio para provar que os crentes devem ter o batismo do Esprito aps regenerao, a qual se d mediante a f, uma vez que neste caso a f e o batismo do Esprito Santo ocorreram simultaneamente.

H outro lugar onde a palavra batizar est relacionada com o Esprito Santo: I Corntios 12:13. A verdade que se discute no contexto a da unidade da igreja. O captulo trata dos dons espirituais, mas j no versculo 4, Paulo argumenta que, ainda que haja diversidade de dons, h um s Esprito que distribui estes dons. No versculo 12, Paulo usa a analogia do corpo humano: Porque, assim como o corpo um e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, constituem um s corpo, assim tambm com respeito a Cristo". Agora segue o versculo 13:

Pois, em um s Esprito, todos ns fomos batizados em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres. E a todos ns foi dado beber de um s Esprito.

Alguns comentaristas (Calvino, Lenski, Grosheide no Novo Comentrio Internacional de Eardmans) entendem que batismo aqui refere-se ao batismo literal com gua; vrios outros (Hodge, Barnes) pensam na regenerao que ento chamada figurativamente de batismo do Esprito. No entanto, todos estes autores concordam que a passagem no se refere a um batismo do Esprito especfico, distinto e posterior regenerao, mas descreve a unidade em Cristo que todos os crentes desfrutam em virtude da obra regeneradora do Esprito Santo. Os pentecostais esto de acordo em que a primeira parte desta passagem refere-se experincia original de salvao dos crentes a quem se dirige. No entanto, Riggs sustenta que a segunda frase do versculo, "e a todos ns foi dado beber de um s Esprito", refere-se ao batismo do Esprito Santo no sentido pentecostal; portanto, afirma que esta passagem fala de duas experincias: a salvao e o batismo do Esprito Santo. No entanto, a segunda orao , sem sombra de dvidas, paralela primeira, e ambas as oraes enfatizam a unidade de todos os crentes, usando a palavra todos para indicar que a palavra aplica-se a todos os crentes. Se a segunda orao omitisse alguns crentes, a argumentao de Paulo seria prejudicada, haja vista que nem todos os crentes seriam membros de um corpo. Sugerir, como Riggs, que todos os membros da igreja de Corinto haviam tido o batismo do Esprito no sentido pentecostal, vai de encontro com a designao que Paulo faz dos Corntios como carnais e meninos em Cristo (3: l). Ademais, sobre a premissa de que este capitulo 12 aplica-se no apenas aos corntios, mas a todos os cristos, o versculo ento ensinaria que todos os cristos regenerados tambm so batizados com o Esprito no sentido pentecostal, o qual os pentecostais negam. Portanto, devemos concluir que I Corntios 12:13 usa a expresso em um s Esprito todos somos batizados em um corpo como uma descrio da regenerao de todos os crentes que simbolizada pelo batismo com gua, e no descreve uma segunda obra de graa ou um segundo enchimento com o Esprito ou uma segunda bno, posterior e distinta da regenerao.

Estes so os nicos lugares no Novo Testamento que falam de um batismo com o Esprito. No entanto, os pentecostais dizem que outras passagens falam deste batismo do Esprito com termos diferentes. Por exemplo, diz-se que a expresso selados com o Esprito descreve o batismo do Esprito Santo. Diz-se que passagens tais como II Corntios 1:22, Efsios 1:13 e Efsios 4:30 descrevem o batismo do Esprito. Consideremos algumas destas passagens, e vejamos de que forma so vistas pelos pentecostais: Efsios 1: 13 diz assim

Em quem tambm vs, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvao, tendo nele tambm crido, fostes selados com o Santo Esprito da promessa.

Ralph M. Riggs sustenta que, nesta passagem, selados com o Santo Esprito da promessa, designa o batismo do Esprito Santo. Ernest S. Willians, outro escritor das Assemblias de Deus, adota a mesma posio. Segundo a interpretao pentecostal, o batismo do Esprito uma experincia posterior e distinta do novo nascimento, uma experincia em que algum completamente cheio com o Esprito Santo. Conforme a base da exegese pentecostal de Efsios 1: 13, Paulo est falando aqui de uma experincia, que nem todos, mas somente alguns crentes desfrutam, que posterior regenerao.

No entanto, este no pode ser o sentido que Paulo d, uma vez que ele est falando claramente de uma bno que vem a todos os crentes. Toda a doxologia dos versculos 3 a 14 oferece um louvor a Deus pelas bnos concedidas a todos os crentes. Paulo comea referindo-se a todos os que recebem sua carta, quando diz: "Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abenoado com toda sorte de bno espiritual nas regies celestiais em Cristo" (v. 3). Segue louvando a Deus por estas bnos espirituais nos versculos seguintes. No versculo 13, muda da primeira para segunda pessoa: "Em quem tambm vs, referindo-se agora a seus leitores, sem incluir ele mesmo no entanto, no apenas a alguns deles, mas a todos eles. depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvao, tendo nele tambm crido, fostes selados com o Santo Esprito da promessa, uma orao dirigida a todos os crentes. Dizer que a inteno aqui dirigir-se a um grupo especfico de crentes, distintos dos demais pessoas que tiveram experincia da qual no teve a participao dos demais crentes fazer violncia ao contexto.

O aludido selo do Esprito refere-se possesso do Esprito como um penhor (v. 14) ou a garantia da herana da vida eterna que temos recebido pela f. O Esprito que agora habita sela em ns, e para ns, essa herana, d-lhe valor, atribui-nos a segurana de receb-la. Mas esta referendao no uma bno de que participam uns poucos crentes; compartilhada por todos os que crem verdadeiramente em Cristo. Para confirmao deste ponto, veja-se outro versculo desta epstola, 4:30: E no entristeais o Esprito de Deus, no qual fostes selados para o dia da redeno. Em versculos anteriores deste captulo 4, Paulo dirigi-se a todos seus leitores; permitido a ns agora supormos que o versculo 30 repentinamente venha limitar-se a um grupo seleto deles?

Nossos irmos pentecostais tambm sustentam que a expresso cheios do Esprito ou cheios do Esprito Santo descreve um batismo do Esprito que ocorre aps a converso. Ora, certo que a vinda do Esprito sobre os discpulos no dia de Pentecostes descrita em Atos 2:4 com estas palavras: Todos ficaram cheios do Esprito. No entanto, diz-se do grupo dos crentes em Atos 4:31: Tendo eles orado, tremeu o lugar onde estavam reunidos; todos ficaram cheios do Esprito Santo... Muitos dos que estavam aqui devem ter feito parte do grupo que recebeu o Esprito em Pentecostes. Se cheios do Esprito Santo quer dizer um batismo do Esprito posterior converso, Atos 4:31 no tem sentido; muitos destes discpulos j haviam recebido seu batismo do Esprito (como os pentecostais reconhecem), e no necessitavam receb-lo novamente. Se a expresso cheios do Esprito significa um novo enchimento do Esprito, como eu creio, ento a passagem nada diz acerca do ensinamento em discusso. Nessas palavras, Atos 4:31 permite deduzir o ensinamento de que os crentes necessitam ser cheios do Esprito repetidas vezes; mas no justo deduzir desta passagem que depois que algum se converte necessita ser batizado com o Esprito como uma espcie de segunda bno.

Os pentecostais tambm evocam Efsios 5:18 como uma passagem que ordena aos crentes que busquem o batismo do Esprito: E no vos embriagueis com vinho, no qual h dissoluo, mas enchei-vos do Esprito. certo que aqui ordena-se aos crentes que sejam cheios do Esprito isso nenhum cristo o nega. Mas a questo : este enchimento do Esprito uma especfica segunda bno posterior converso? Um estudo cuidadoso de Efsios 5:18 revelar que nesta passagem Paulo no est falando de um batismo do Esprito que uma segunda bno. Em meio de uma srie de exortaes muito prticas ele diz: Deixem de embriagar-vos com vinho, mas estejas continuamente cheios com o Esprito. Ambos imperativos esto no presente. A proibio no presente (No vos embriagueis com vinho) significa deixai de fazer o que ests fazendo; a exortao no tempo presente (enchei-vos do Esprito) significa faa isso continuamente, ou segue fazendo isso. Noutras palavras, o que Paulo est ordenando aqui um estado contnuo de ser cheio com o Esprito, no uma experincia simples, de uma vez para sempre, de segunda bno. Longe de sugerir que seus leitores no haviam recebido o Esprito, ele supe que esto selados com o Esprito (1: 13), e agora lhes pede que estejam sempre cheios com aquele Esprito que lhes tem dado a nova vida em Cristo. Portanto, Efsios 5:18 no ensina que os crentes devem buscar um batismo com o Esprito Santo como uma experincia de segunda bno assim de uma vez por todas.

Portanto, o nico exemplo claro no Novo Testamento de um batismo do Esprito posterior a Pentecostes o caso de Cornlio. No entanto, devemos aceitar imediatamente que h outros dois casos em que lemos de um recebimento do Esprito Santo em uma espcie de experincia pblica depois de Pentecostes: em Atos 8 onde no se menciona especificamente o falar em lnguas e em Atos 19, em que se menciona o falar em lnguas e o profetizar. Os pentecostais dizem que estes trs casos, os samaritanos em Atos 8, Cornlio em Atos 10 e os crentes efsios em Atos 19, tomados conjuntamente com Atos 2, constituem uma clara evidncia bblica da necessidade de um batismo do Esprito posterior converso. Na realidade, o argumento pentecostal em favor do batismo do Esprito fica em p ou cai com o material que Atos apresenta, porque Brumback admite que em I Corntios 12-14 no h o menor apoio idia de que o dom de lnguas esteja associado, em algum sentido direto, com o enchimento do Esprito Santo... Assim, se no se pode provar com I Corntios que a glossollia a evidncia fsica inicial do batismo do Esprito; ento tem que prov-lo com o livro de Atos. Passemos em revista de forma mais detida as aludidas passagens de Atos.

No dia de Pentecostes, todos os discpulos ficaram cheios do Esprito Santo e passaram a falar em outras lnguas, segundo o Esprito lhes concedia que falassem. (At. 2:4). Por que foi dado o dom de lnguas aos 120 discpulos nesta ocasio? Podem ser dadas pelo menos duas razes: (1) sua capacidade de falar em lnguas era um sinal de que verdadeiramente haviam recebido a prometida plenitude do Esprito este sinal foi dado, a propsito, com outros dois sinais: vento impetuoso e as lnguas como de fogo que apareceram sobre cada um deles; (2) sua capacidade de falar em lnguas era para dar-lhes a segurana de que o Esprito Santo lhes daria a capacidade necessria para comunicar a verdade do evangelho a todo o mundo. No estou sugerindo que os discpulos realmente usaram lnguas para testificar aos estrangeiros, porque no temos evidncias que assim o fizeram (ainda no dia de Pentecostes Pedro pregou, segundo parece, em aramaico, ou em linguagem comum da Palestina), mas estou dizendo que a glossollia serviu como um sinal alentador de que o Esprito lhes daria o poder para testificar a todas as naes do mundo.

Portanto, o que os 120 receberam no dia de Pentecostes foram trs sinais milagrosos que lhes asseguravam que havia sido concretizada a promessa do derramamento do Esprito. O falar em lnguas era apenas um desses sinais. Quando os pentecostais sustentam que a experincia dos discpulos em Pentecostes o padro para todos os crentes na atualidade, por que pensam somente na glossollia e no no som do vento impetuoso e nas lnguas de fogo?

Nesta ocasio, Pedro disse multido: Arrependei-vos, e ca