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CAO – Crim Boletim Criminal Comentado n° 070
Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais
Mário Luiz Sarrubbo
Coordenador do CAO Criminal
Arthur Pinto Lemos Junior
Assessores
Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Marcelo Sorrentino Neira
Paulo José de Palma
Ricardo José Gasques de Almeida Silvares
Rogério Sanches Cunha
Analista Jurídica
Ana Karenina Saura Rodrigues
Boletim Criminal Comentado n° 070 – outubro 2019
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SUMÁRIO
SUMÁRIO --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 2
ESTUDOS DO CAOCRIM--------------------------------------------------------------------------------------------------- 3
1-Tema: ENUNCIADOS DO CAOCrim E SETOR DO ARTIGO 28 DO CPP (CONFLITOS CRIMINAIS) ............ 3
STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM ------------------------------ 6
DIREITO PROCESSUAL PENAL ------------------------------------------------------------------------------------------- 6
1- Tema: Violência doméstica. Lesão corporal leve. Representação. Retratação no cartório da Vara.
Irrelevância. Art. 16 da Lei n. 11.340/2006. Audiência específica. Necessidade. .................................. 6
2- Tema: Falta de perícia em área com vestígios de degradação leva à absolvição de acusado de crime
ambiental ..............................................................................................................................................7
DIREITO PENAL -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 9
1- Tema: Roubo e extorsão- Concurso Material- Exigência da entrega de cartões bancários com as
senhas e apoderamento de demais bens ............................................................................................... 9
2- Tema: Para Sexta Turma do STJ, prazo de prescrição não é suspenso durante o cumprimento de
transação penal ..................................................................................................................................... 9
Boletim Criminal Comentado n° 070 – outubro 2019
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ESTUDOS DO CAOCRIM
1-Tema: ENUNCIADOS DO CAOCrim E SETOR DO ARTIGO 28 DO CPP (CONFLITOS
CRIMINAIS)
ENUNCIADO 33- USO DE ATESTADO MÉDICO FALSO
O uso de atestado médico falsificado por particular se subsume ao crime do art. 304, do CP, c.c. arts.
297 ou 298 do CP, conforme a natureza pública ou privada do estabelecimento de saúde ao qual
tenha sido atribuída a emissão do documento.
ENUNCIADO 34 -FITA ADESIVA EM PLACAS DE VEÍCULO AUTOMOTOR - ART. 311, DO CP
Constitui adulteração de sinal identificador de veículo automotor (CP, art. 311) a alteração dos
sinais alfanuméricos de placas mediante aposição de fita isolante ou expediente similar, pois o tipo
penal não exige que a adulteração ou remarcação tenha caráter permanente.
ENUNCIADO 35- RECEPTAÇÃO DOLOSA DERIVADA DO ART. 311 DO CP
Quando não esclarecida a autoria do crime de adulteração do sinal identificador de veículo
automotor, remanesce a possibilidade, em caráter subsidiário, de imputar ao agente o crime de
receptação dolosa (CP, art. 180), na modalidade de conduzir coisa que sabe ser produto de crime (no
caso, o crime contra a fé pública).
ENUNCIADO 36- LESÃO CORPORAL QUALIFICADA – ART. 129, §9º, DO CP (aviso)
Nos casos que envolvam lesão corporal cometida contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge
ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das
relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, deve o Promotor de Justiça, observada sua
independência funcional, atentar-se que o fato não constitui infração de menor potencial ofensivo,
ainda que não se aplique ao caso a Lei Maria da Penha, pois a pena máxima cominada no tipo é de
três anos de detenção.*1*
1 ** O CAOCRIM observa, contudo, que este crime continua sendo perseguido mediante ação penal pública condicionada, pois é de natureza leve, nos termos do art. 88 da Lei 9.099/95, aplicado, a exemplo do art. 89, a crimes mesmo que não de menor potencial ofensivo.
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ENUNCIADO 37- FURTO SIMPLES CONSUMADO – REDUÇÃO DE PENA NOS TERMOS DO § 2º, DO
ART. 155, DO CP, NÃO O TORNA CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO
O crime de furto se consuma no momento em que o bem é retirado da esfera de disponibilidade da
vítima, mesmo que haja, logo em seguida à subtração, a prisão em flagrante do furtador, de tal
maneira que, mesmo quando incidente, em tese, o privilégio (CP, art. 155, §2.º), o fato não constitui
infração de menor potencial ofensivo.
ENUNCIADO 38- EXECUÇÃO NO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL
A atribuição para oficiar na execução penal de penas restritivas de direitos e de multa impostas pelo
Juizado Especial Criminal é do Promotor de Justiça oficiante neste Órgão, pois este é o competente
para tais execuções penais (Súmula 81 do TJSP).
Súmula 81 do TJSP: Compete ao Juízo do Juizado Especial Criminal executar seus julgados apenas
quando a pena aplicada é de multa ou restritiva de direitos, sendo irrelevante o fato de o réu estar
preso em razão de outro processo.
ENUNCIADO 39- MEDIDA ANTERIOR À PROPOSITURA DE AÇÃO PENAL E ATRIBUIÇÃO PARA
FUNCIONAR NO INQUÉRITO POLICIAL
A circunstância de ter o Promotor de Justiça funcionado em autos de medida anterior à propositura
da ação penal faz com que ele tenha atribuição para funcionar no inquérito policial correlato àquela
medida, salvo quando a divisão de atribuições da Promotoria de Justiça dispuser de forma diversa,
quando o inquérito policial for distribuído a outro Juízo, perante o qual aquele Promotor de Justiça
não tenha atribuição, ou quando a manifestação em medida cautelar houver sido exarada em plantão
judiciário ou em acumulação ou auxílio em cargo distinto.
ENUNCIADO 40- FORO COMPETENTE NO CRIME DE ESTELIONATO
No crime de estelionato, segundo atual diretriz do Superior Tribunal de Justiça, a competência se
define pelo lugar e momento da obtenção da vantagem indevida, onde se considera consumado o
delito (STJ, CC 161.881/CE, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, 3.ª SEÇÃO, julgado em 13/03/2019,
DJe de 25/03/2019; CC 162.076/RJ, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, 3.ª SEÇÃO, julgado em
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13/03/2019, DJe 25/03/2019; CC 167.025/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, 3.ª
SEÇÃO, julgado em 14/08/2019, DJe 28/08/2019). Admite-se, contudo, em situações excepcionais, a
relativização desse critério, se as circunstâncias do caso concreto revelarem que a colheita da prova
será mais viável e adequada em foro diverso daquele em que o agente obteve a vantagem indevida.
ENUNCIADO 41- GAECO E PROMOTOR NATURAL
Nos termos do Ato Normativo n.º 1.047/17 (GAECO), confere-se preponderância à atuação do
Promotor Natural em detrimento do Grupo, o qual deverá oficiar: a) nos procedimentos
investigatórios criminais por ele instaurados, nos inquéritos policiais por ele requisitados e nas
subsequentes ações penais, até decisão final, mediante atuação integrada com o Promotor de Justiça
Natural; b) nas representações por ele recebidas, nas peças de informações a ele endereçadas e nas
notícias de fato autuadas até a deliberação pela eventual instauração de procedimento investigatório
criminal ou requisição de inquérito policial; c) quanto a inquéritos policiais em curso, não requisitados
pelo Grupo, sua intervenção somente ocorrerá quando esta se revelar útil ou conveniente a critério
de seus integrantes.
ENUNCIADO 42- CRIMES MILITARES POR EXTENSÃO – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR
A Lei nº 13.491/17 ampliou a competência da Justiça Militar e alcança os crimes militares por
extensão, ou seja, aqueles que, embora não previstos no Código Penal Militar, mas no Código Penal
ou em leis esparsas, sempre que praticados por policiais militares em serviço ou em local sujeito à
Administração Militar, ressalvado que o crime de homicídio praticado por policial militar contra civil
compete ao Tribunal do Júri.
ENUNCIADO 43- COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL – AFASTADA EM CONCURSO DE
CRIMES QUANDO AS PENAS MÁXIMAS ABSTRATAMENTE COMINADAS SUPERAM DOIS ANOS E
QUANDO INCIDE CAUSA DE AUMENTO DE PENA
A competência do Juizado Especial Criminal é afastada quando há concurso de crimes e a somatória
das penas máximas abstratamente previstas para cada infração penal supera o limite de dois anos.
Também é afastada quando há incidência de causa de aumento de pena que faz com que a pena
máxima prevista para a infração penal supere dois anos.
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STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM
DIREITO PROCESSUAL PENAL:
1- Tema: Violência doméstica. Lesão corporal leve. Representação. Retratação no cartório da
Vara. Irrelevância. Art. 16 da Lei n. 11.340/2006. Audiência específica. Necessidade.
INFORMATIVO 656 DO STJ -QUINTA TURMA
Não atende ao disposto no art. 16 da Lei Maria da Penha, a retratação da suposta ofendida ocorrida
em cartório de Vara, sem a designação de audiência específica necessária para a confirmação do ato.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR:
A Lei Maria da Penha disciplina procedimento próprio para que a vítima possa eventualmente se
retratar de representação já apresentada. Dispõe o art. 16 da Lei n. 11.340/2006 que, "só será
admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal
finalidade" (HC 371.470/RS, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em
17/11/2016, DJe 25/11/2016). Dessarte, considerando que, no caso em apreço, a retratação da
suposta ofendida com relação ao art. 129, § 9°, do Código Penal (lesão corporal de natureza leve
praticada com violência doméstica) ocorreu somente no cartório da Vara, sem a designação de
audiência específica necessária para a confirmação do ato ilegal, deve ser cassada a decisão que
rejeitou a denúncia com base unicamente na retratação.
PROCESSO: HC 138.143-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em
03/09/2019, DJe 10/9/2019.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
A decisão em comento causa espécie. É que o crime, em tese cometido, foi o de lesão corporal de
natureza leve no ambiente doméstico e familiar (art. 129, §9º., do CP). A sua persecução criminal não
depende de pedido-autorização da vítima, pois inaplicável a Lei 9.099/95.
O STF, em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI 4424), pacificou a questão,
reconhecendo que o art. 41 da Lei 11.340/06 (que proíbe a aplicação da Lei 9.099/95) não viola a
Carta Maior. Decidiu que a ação penal nos crimes de lesão corporal dolosa (mesmo que de natureza
leve) cometido contra a mulher no ambiente doméstico e familiar é pública incondicionada. Na
mesma esteira, o STJ editou a súmula 542:
“A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher
é pública incondicionada”.
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Dentro desse espírito, mesmo que exista (dispensável) representação, sua retratação não opera
qualquer efeito.
2- Tema: Falta de perícia em área com vestígios de degradação leva à absolvição de acusado de
crime ambiental
DECISÃO DO STJ- Publicado em notícias do STJ
Em razão da falta de perícia técnica ou de justificativa para não a realizar em área com vestígios de
degradação ambiental, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu um réu
condenado a dois anos de detenção, em regime aberto, pela prática dos crimes ambientais previstos
nos artigos 38 e 38-A da Lei 9.605/1998.
"O delito deixou vestígios (imagens do local, laudo de verificação de denúncia, auto de infração do
IAP), sendo possível a realização do exame direto. E não foram apresentadas justificativas idôneas
para a não realização do exame pericial, impondo-se a absolvição do acusado diante da ausência de
prova acerca da materialidade delitiva", afirmou o relator do recurso, ministro Reynaldo Soares da
Fonseca.
De acordo com o artigo 38 da Lei 9.605/1998, é crime destruir ou danificar floresta de preservação
permanente – mesmo que em formação –, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção. Já
o artigo 38-A prevê como delito destruir ou danificar vegetação primária ou secundária – em estágio
avançado ou médio de regeneração – do bioma Mata Atlântica.
No caso dos autos, o réu teria destruído região de floresta considerada de preservação permanente,
parte dela localizada dentro da Mata Atlântica. A devastação teria ocorrido em cerca de quatro
hectares de uma propriedade particular, onde haveria, inclusive, uma nascente.
Tema complexo
Com base nos artigos 38 e 38-A da Lei 9.605/1998, o juiz de primeiro grau fixou a pena em dois anos
de detenção, em regime aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direito e suspensão condicional da pena. A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Paraná.
O ministro Reynaldo Soares da Fonseca destacou que, de acordo com o texto dos artigos da Lei
9.605/1998 utilizados para fundamentar a condenação, "o tema é complexo, não facilmente
identificável por leigos, sendo imprescindível a realização de perícia", na medida em que não é
qualquer supressão ou destruição de mata que caracteriza os crimes previstos naqueles dispositivos.
Exame direto
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O ministro ressaltou que o TJPR, ao manter a condenação, considerou o laudo pericial dispensável
quando o auto de infração, elaborado por autoridade competente para apurar a infração ambiental,
atesta a ocorrência do delito.
Entretanto, Reynaldo Soares da Fonseca ponderou que, nos casos em que a infração deixa vestígio,
o artigo 158 do Código de Processo Penal estabelece a necessidade do exame de corpo de delito
direto. Por outro lado, nos termos do artigo 167 do CPP, não sendo possível o exame de corpo de
delito quando desaparecem os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir o atestado pericial.
O relator também trouxe precedentes da Terceira Seção do STJ no sentido de que, havendo vestígios
do crime, a elaboração de perícia é imprescindível.
"Somente será possível a substituição de exame pericial por outros meios probatórios, na forma
indireta, para fins de comprovação da materialidade dos crimes ambientais de natureza material –
no caso, o artigo 38 da Lei 9.605/1998 –, quando a infração não deixar vestígios ou quando o lugar
dos fatos tenha se tornado impróprio à análise pelos experts, circunstâncias excepcionais que não se
enquadram na hipótese sub judice", concluiu o ministro ao decidir pela absolvição.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): AREsp 1571857.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
A perícia direta será realizada quando os vestígios materiais estiverem presentes, admitindo-se,
excepcionalmente, quando aqueles desaparecerem, o exame indireto, feito por meio de informes,
dados ou elementos fornecidos por terceiros (art. 167 do CPP).
No caso em comento, embora o local onde ocorreu o dano ambiental estivesse preservado, não foi
realizada perícia direta, tendo-se procedido a auto de verificação de dano indireto com base em
outros elementos existentes no inquérito policial.
Assim, inexistindo laudo direto afirmando o grau da supressão ou destruição de mata, tampouco
havendo justificativas acerca de eventual impossibilidade de sua elaboração, constatou-se a
ineficácia dos demais elementos de prova para a caracterização da materialidade do delito.
Em resumo, tratando-se de delito ambiental, inserido entre os que deixam vestígios, apenas poderia
ter sido comprovada a materialidade do crime por meio de exame pericial, já que os vestígios não
haviam desaparecido.
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DIREITO PENAL:
1- Tema: Roubo e extorsão- Concurso Material - Exigência da entrega de cartões bancários com as
senhas e apoderamento de demais bens
STJ- RECURSO ESPECIAL Nº 1.827.183 - SP
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PENAL. ROUBO E EXTORSÃO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL E VIOLAÇÃO DOS
ARTS. 157, § 2º, E 158, CAPUT C/C O § 1º, AMBOS DO CP. PLEITO DE RECONHECIMENTO DO
CONCURSO MATERIAL. PROCEDÊNCIA. EXIGÊNCIA DA ENTREGA DE CARTÕES BANCÁRIOS COM AS
RESPECTIVAS SENHAS E APODERAMENTO DE DEMAIS BENS. CONDUTAS DIVERSAS. DELITOS
AUTÔNOMOS. INCABÍVEL O RECONHECIMENTO DE CRIME ÚNICO. PRECEDENTES DO STJ.
RESTABELECIMENTO DA DOSIMETRIA CONSTANTE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE SE IMPÕE.
Recurso especial provido nos termos do dispositivo.
Esta jurisprudência foi incluída a pedido do Setor de Recursos Criminais Extraordinários e Especiais.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
Previsto no artigo 71, caput, do Código Penal, dá-se o crime continuado genérico (ou comum) quando
o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e,
pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os
subsequentes ser havidos como continuação do primeiro.
Apresenta os seguintes requisitos: a) pluralidade de condutas; b) pluralidade de crimes da mesma
espécie; c) elo de continuidade.
O crime continuado aproxima-se do concurso material ao exigir condutas provocando vários crimes.
Diferencia-se, no entanto, ao restringir sua aplicação a crimes da mesma espécie. Atualmente, parece
pacificado nos Tribunais Superiores que crimes da mesma espécie são aqueles previstos no mesmo
tipo penal, protegendo igual bem jurídico.
No caso do roubo (art. 157 do CP) e da extorsão (art. 158 do CP), em que pese protegerem o mesmo
bem jurídico, não estão previstos no mesmo tipo, sendo inviável, ainda que por ficção jurídica, falar-
se num só crime. Deve prevalecer o sistema do cúmulo material (art. 69 do CP).
2- Tema: Para Sexta Turma do STJ, prazo de prescrição não é suspenso durante o cumprimento de
transação penal
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DECISÃO DO STJ- Publicado em notícias do STJ
Durante o tempo transcorrido para o cumprimento das condições impostas em acordo de transação
penal (artigo 76 da Lei 9.099/1995) não há, por falta de previsão legal, a suspensão do curso do prazo
prescricional.
A tese foi fixada pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento a recurso
em habeas corpus para reconhecer a prescrição e declarar a extinção da punibilidade em um caso de
lesão corporal no trânsito.
Segundo o processo, o acusado bateu o carro e causou graves lesões na passageira que estava ao seu
lado. Fugiu sem prestar socorro e, em seguida, retornou à Argentina, onde estudava, sem dar
esclarecimentos à polícia nem o devido auxílio à vítima.
Foi celebrado acordo de transação penal, consistente no pagamento de R$ 150 mil à vítima da lesão
corporal, em 60 parcelas mensais. O acordo, porém, deixou de ser cumprido – o que levou o
Ministério Público a pedir a instauração da ação penal. A defesa alegou que já teria ocorrido a
prescrição da pretensão punitiva e pediu o trancamento da ação.
O Tribunal de Justiça do Ceará negou o pedido sob o argumento de que não se pode falar em
prescrição durante período de prova e sem o cumprimento total da transação penal oferecida pelo
Ministério Público.
No recurso em habeas corpus apresentado ao STJ, o recorrente alegou constrangimento ilegal por
estar sendo indevidamente processado com base em pretensão punitiva já prescrita. Disse que já
tinham transcorrido 12 anos desde o acidente e que não havia causa suspensiva ou interruptiva da
prescrição, motivo pelo qual pediu o trancamento da ação penal.
Sem previsão
Segundo o relator do recurso, ministro Antonio Saldanha Palheiro, a orientação jurisprudencial do
STJ considera que as causas suspensivas da prescrição exigem expressa previsão legal.
O ministro explicou que, embora a transação penal implique o cumprimento de uma pena restritiva
de direitos ou multa pelo acusado, não se pode falar em condenação, muito menos em período de
prova, enquanto durar o cumprimento da medida imposta, razão pela qual não se revela adequada
a aplicação do artigo 117, V, do Código Penal.
"A interrupção do curso da prescrição prevista no referido dispositivo legal deve ocorrer somente em
relação às condenações impostas após o transcurso do processo, e não para os casos de transação
penal, que justamente impede a sua instauração", afirmou.
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Antonio Saldanha Palheiro destacou ainda que o regramento da transação penal prevê apenas que a
aceitação da proposta não gera o efeito da reincidência, bem como impede a utilização do benefício
novamente em um prazo de cinco anos.
Ele observou que, como disposto na Súmula Vinculante 35 do Supremo Tribunal Federal, se o acordo
for descumprido, o Ministério Público poderá oferecer a denúncia, momento em que se dará início à
persecução penal em juízo.
"Não há previsão legal de que, celebrado o acordo, e enquanto não cumprida integralmente a
avença, ficará suspenso o curso do prazo prescricional", esclareceu.
Princípio da legalidade
De acordo com o relator, ao tratar de um instituto diverso, a suspensão condicional do processo, a
Lei 9.099/1995 previu de forma expressa, diferentemente da transação penal, que não correrá a
prescrição durante o prazo de suspensão. Semelhante previsão – destacou – consta do artigo 366 do
Código de Processo Penal, que, ao cuidar da suspensão do processo, impõe, conjuntamente, a
suspensão do curso do prazo prescricional.
"Assim, a permissão de suspensão do curso do prazo prescricional sem a existência de determinação
legal consubstancia flagrante violação ao princípio da legalidade", concluiu.
Como, no caso analisado, o prazo prescricional é de oito anos, e entre a data do fato e a denúncia
passaram-se mais de dez anos, a turma acompanhou o voto do relator e, de forma unânime,
reconheceu a prescrição da pretensão punitiva.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): RHC 80148.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
Cometido um crime de menor potencial ofensivo, isto é, cuja pena máxima não seja superior a dois
anos, o art. 76 da Lei 9.099/95 permite ao Ministério Público a proposição de transação penal, desde
que: a) o agente não tenha sido definitivamente condenado, pela prática de crime, a pena privativa
de liberdade; b) nem tenha sido beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela transação
penal; c) indiquem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os
motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.
A transação penal é medida despenalizadora que evita a deflagração da ação penal por meio do
cumprimento de obrigações normalmente correspondentes a penas restritivas de direitos ou multa.
Uma vez oferecida a proposta, designa-se audiência para que o agente tome ciência de seu conteúdo
e se manifeste sobre se concorda em se submeter à medida indicada. Caso concorde, aguarda-se o
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tempo necessário para o cumprimento da medida, que, a depender do caso, pode ser executada ao
longo de meses.
Mas, ao contrário do que faz na suspensão condicional do processo (art. 89, § 6º), a Lei 9.099/95 não
dispõe sobre a suspensão do prazo prescricional enquanto o agente cumpre a medida alternativa a
que se obrigou na transação. Em razão da falta de previsão legal, e por se tratar de medida que
prejudica o autor do crime, o STJ deu provimento a recurso em habeas corpus para afastar a
possibilidade de suspensão do prazo e reconhecer a extinção da punibilidade.
No caso julgado, o agente havia provocado culposamente um acidente de trânsito do qual
decorreram lesões corporais graves em uma pessoa. A transação penal consistiu no pagamento de
R$ 150.000,00 em sessenta prestações mensais, que não foram integralmente pagas, o que levou o
Ministério Público a oferecer denúncia.
A defesa alegou que o prazo prescricional havia transcorrido integralmente, mas o Tribunal de Justiça
local decidiu que não se poderia cogitar a prescrição durante o período em que o agente deveria
cumprir a transação penal. Manteve, assim, a decisão de primeira instância:
“Em que pese o requerimento ministerial no sentido de que seja reconhecida a prescrição da
pretensão punitiva após o decurso de oito anos contados da data do fato, cumpre reconhecer que
indiciado se encontra em período de prova, e, portanto, em fase de cumprimento da pena alternativa
imposta, cujo cumprimento efetivo e integral se constitui como causa extintiva da punibilidade do
autor.
(…)
Proposta a transação penal pelo titular da ação penal, não há que se falar em inércia, mas na adoção
de providência prevista em lei e cuja propositura se atribui de modo exclusivo ao Ministério Público,
que, observados os requisitos autorizadores, poderá utilizar-se desse instituto – idealizado como
alternativa menos gravosa ao oferecimento da denúncia – nos casos de infrações reconhecidas como
sendo de menor potencial ofensivo.
Desse modo, admitir a consolidação do fenômeno prescritivo durante o período de prova implicaria
em injustificável esvaziamento da proposta de transação penal, tornando-a ineficiente, além de
frustrar as justas expectativas de reparação da vítima.
Irrazoável que um instituto, no qual o autor da infração submete-se voluntariamente ao
cumprimento de pena alternativa, ainda que de modo antecipado, como forma de evitar os
constrangimentos decorrentes do ajuizamento de uma ação penal, tenha os seus efeitos exauridos
por força de prescrição, no exato momento em que o agente é obrigado a suportar um ônus a ele
imposto como condição suspensiva de um gravame ainda maior”.
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O STJ, contudo, refutou a tese, pois a Lei 9.099/95 não dispõe a respeito da suspensão do prazo
prescricional em decorrência da aceitação da transação penal. Admitir a suspensão, portanto,
caracteriza ofensa ao princípio da legalidade:
“Vale destacar que o regramento do referido instituto despenalizador prevê somente que a aceitação
da proposta não gerará o efeito da reincidência, bem como impedirá a utilização do benefício
novamente em um prazo de 5 anos (art. 76, § 4º, da Lei n. 9.099/1995).
Além disso, de acordo com o disposto na Súmula Vinculante n. 35 do Supremo Tribunal Federal,
descumprido o acordo, poderá o Ministério Público oferecer a denúncia, momento em que se dará
início à persecução penal em juízo.
Portanto, não há previsão legal de que, celebrado o acordo, e enquanto não cumprida integralmente
a avença, ficará suspenso o curso do prazo prescricional.
Impende rememorar, nesse sentido, que, “em observância ao princípio da legalidade, as causas
suspensivas da prescrição demandam expressa previsão legal” (AgRg no REsp n. 1.371.909/SC, relator
Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 23/8/2018, DJe de 3/9/2018).
Cabe destacar que a Lei n. 9.099/1995, ao tratar da suspensão condicional do processo, instituto
diverso, previu, expressamente, no art. 89, § 6º, que “não correrá a prescrição durante o prazo de
suspensão do processo”. Assim, determinou, no caso específico do sursis processual, diferentemente
da transação penal, que durante o seu cumprimento não correria o prazo prescricional.
Da mesma forma, semelhante previsão consta do art. 366 do Código de Processo Penal, que, ao
cuidar da suspensão do processo, impõe, conjuntamente, a suspensão do curso do prazo
prescricional.
Assim, a permissão de suspensão do curso do prazo prescricional sem a existência de determinação
legal consubstancia flagrante violação ao princípio da legalidade”.
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